O Corpo Co-Manda - Uma Reflexão sobre Genética, Linguagem e Cultura.
-
Upload
jose-eliezer-mikosz -
Category
Documents
-
view
213 -
download
0
Transcript of O Corpo Co-Manda - Uma Reflexão sobre Genética, Linguagem e Cultura.
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
1/13
ISSN 1678-7730 N 86 FPOLIS, DEZEMBRO DE 2007.
O CORPO CO-MANDA: UMA REFLEXO SOBREGENTICA, LINGUAGEM E CULTURA
Jos Elizer Mikosz
EditorProfa. Dra. Luzinete Simes Minella
Conselho EditorialProf. Dr. Rafael Raffaelli
Prof. Dr. Hctor Ricardo LeisProfa. Dra. Jlia Silvia Guivant
Prof. Dr. Luiz Fernando ScheibeProfa. Dra. Miriam Grossi
Prof. Dr. Selvino Jos Assmann
Editores AssistentesCludia Hausman Silveira
Jos Elizer MikoszSilmara Cimbalista
Secretrio ExecutivoAngelo La Porta
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
2/13
1
O CORPO CO-MANDAUma Reflexo sobre gentica, linguagem e cultura.
Jos Elizer Mikosz
RESUMO
Este artigo apresenta algumas questes relativas a influncia mtua entre gentica,
linguagem e cultura, dando nfase ao corpo, sua biologia, como base na qual o
comportamento humano se desenvolve.
PALAVRAS-CHAVE: corpo, gentica, comportamento, linguagem, cultura.
ABSTRACT
This paper analyses some questions about the mutual influence between genetics,
language, and culture, focusing the physical body and its biology, as the cornerstone upon
which the human behavior develops.
KEYWORDS: human boby, genetics, behaviour, language, culture.
Concordo, afirmou a Duquesa; e esta a moral: seja o que voc parece ser. Ou sevoc no gostar desta frase, diga assim, mais simplesmente: nunca se imagine ser
o que poderia parecer para os outros, o que voc foi ou deveria ter sido, para noparecer outra coisa seno o que voc deveria ter parecido aos outros para no ser
outra coisa.
LEWISCARROLL, Alice no Pas das maravilhas
As coisas no so o que parecem ser. Nem so de outra maneira.
LANKAVATARA SUTRA
INTRODUO
H muita discusso a respeito da influncia dos aspectos meramente fsicos,
biolgicos e qumicos quanto a comandar, criar ou alterar comportamentos, a cultura em
que vivemos e a forma como pensamos e percebemos o mundo ao nosso redor. Cada
disciplina defende sua rea como a mais pertinente, a biologia, antropologia, lingstica,
psicologia, etc, daro explicaes voltadas mais para as suas prprias pesquisas. Porm
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
3/13
2
estamos numa poca que essas fronteiras no podem mais ser mantidas. As novas
descobertas cientficas esto se aproximando de algo que podemos chamar de
conscincia do tomo que, alm de fascinante, s pode ser pesquisado de forma
interdisciplinar. Este breve trabalho monogrfico pretende mostrar algumas questes
sobre o assunto de forma muito sucinta, apenas para instigar maior pesquisa e reflexo
sobre o tema.
As guisas de ilustrao rudimentar, podem fazer um paralelo do ser humano com a
informtica. O corpo como hardware, com sua capacidade de memria e aprendizado
limitados a sua configurao atual como ser humano. A linguagem, informaes, cultura,
como softwareque varia de acordo com as experincias e educao que programam o
ser humano. No queremos com isso dizer que as pessoas so como mquinas, muito
longe disso, pouco sabemos na verdade, mas serve como ponto de partida para nossa
reflexo. Usaremos essa metfora software/hardware algumas vezes no texto que se
segue.
OS LIMITES DO CORPO
No conheo a matria; adivinho imperfeitamente algumas de suas propriedades;ora, ignoro totalmente que a matria no possa pensar.
VOLTAIRE, Cartas Inglesas
Mesmo que imaginemos que o crebro no traz nenhuma informao prvia,
nenhuma tendncia ou talento inato e que a gentica no influencie em nada o
comportamento das pessoas, somos obrigados a admitir que ele recebe as informaes
do mundo externo de um jeito bastante particular, com limites tpicos da raa humana
atravs de seus cinco sentidos. Se tivermos a pretenso de conhecer a verdade, teremosque encarar o fato de que ela sempre nos chegar atravs da nossa experincia corporal
nosso hardware- em um mundo material. Os insights, nossa criatividade e imaginao,
nossas idias iluminadas, nossa espiritualidade, vm dessas experincias no mundo,
mesmo que algumas delas nos paream inslitas ainda. Ser que o que percebemos
pode ser processado internamente de forma superior, atravs da nossa inteligncia e
informao e assim vermos a verdade alm das aparncias?
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
4/13
3
Algumas respostas dos organismos vivos em geral, mostram que temos, no mnimo,
mecanismos automticos inatos para conseguir sobreviver. Uma bactria submetida a
condies agressivas no seu meio ambiente, se contrair, dar sinais de desconforto,
desenvolver ou utilizar meios para escapar de tal situao1. Esta mesma bactria em
CNTP ficar relaxada e cumprir normalmente suas funes de alimentao e
metabolismo. Qualquer animal responder melhor ao prazer do que a dor, da qual tentar
se livrar. Ao admirarmos uma bela paisagem, ao sentirmos a atrao agradvel por uma
pessoa, apenas estamos respondendo a mecanismos naturais que no somos livres para
escolher, apenas fomos feitos para ser assim. Nosso hardwaretem essa predisposio.
Mesmo que vrias linhas do pensamento humano no admitam determinismos, com boas
razes geralmente, a base biolgica de nossos limites no pode ser desconsiderada.
Verificamos que, em mdia, ouvimos freqncias sonoras entre 20Hz a 20KHz,
nossa viso percebe um espectro de luz limitado. Ainda temos os sensores para as
impresses tteis, as do paladar e do olfato. Didaticamente descrevemos, por exemplo,
que nosso paladar identifica quatro sabores tpicos: doce, salgado, amargo e azedo/cido.
Mas que sabor tem a pimenta? Doce ou salgado? Uma combinao dos sabores bsicos?
E o picante uma excitao ttil das papilas filiformes? Se fossemos descrever todas as
possibilidades de sabores experimentados, certamente o que descrito didaticamente
no atenderia a nossa experincia. Da mesma forma nossa viso, mesmo limitada, v
milhes de possveis combinaes coloridas. Sabemos que existem as cores bsicas
como no arco-ris: vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, ndigo e violeta. O ndigo j
entra como uma variao do azul, mas quais outras cores existem? O preto, branco e
cinza, so cores? A cor magenta, com sua tonalidade rosada? Com que combinao das
cores do arco-ris se faz a cor fcsia? Quantos nomes existem para a cor azul e quantos
desses nomes seriam entendidos de forma igual por pessoas de mesma cultura? Sim,pois de culturas diferentes, verde-limo talvez no faa sentido para os esquims, como
tampouco os 24 nomes usados por eles para a cor branca, faa sentido para ns. O que
um azul petrleo, azul piscina, azul cu, azul cobalto, azul phthalo, azul ultramar ou azul
da Prssia? Para dar nomes para as cores, temos que enxerg-las primeiramente.
Nossos sentidos recebem um fluxo desordenado de impresses e o crebro tem que dar
1
Como no caso da bactria E. Coli que desenvolve um flagelo sintetizando uma molcula de AMP cclicoque se liga ao DNA, permitindo que a bactria se locomova para um ambiente mais favorvel.
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
5/13
4
conta filtrando, selecionando, reduzindo a experincia, rotulando tudo, resolvendo ento
o problema. E, com todos os limites naturais de nossos sentidos, nossa pretenso em
conhecer a verdade, mais como uma criao de verdades temporrias adaptadas
nossa capacidade humana de compreenso no momento.
Os sentidos, diante das nossas idias, parecem to limitados, ser que estamos
imersos e em contato com algo no to bvio como o mundo percebido pelos sentidos? O
inconsciente coletivo junguiano e seus arqutipos universais e imutveis ou o
inconsciente social de ERIC FROMM2, a incompreensvel mente coletiva estudada por
FRANK NATALE3, so formas de contato com algo alm dos cinco sentidos? Ento nossa
mente pode ser influenciada por essa imerso no coletivo? Hoje temos ainda as redes
eletrnicas mundiais formando uma espcie de inteligncia coletiva4. Tudo isso
influenciando o relacionamento entre os indivduos e desses com a biosfera?
A FUNO DA LINGUAGEM
BENJAMIN WHORF (inFAY, p. 78) defende a tese de que o que sentimos funo de
um sistema lingstico dentro do qual ns operamos como seres cognitivos: E isto
precisamente o que o sistema lingstico faz: ele fornece os princpios bsicos no qual osfluxos indiscriminados de estmulos so organizados em uma experincia de sentido
verdadeiro. Dessa forma a linguagem cria significados recortando, filtrando a realidade.
No prefcio do livro Portas da Percepo (HUXLEY), COSTA PINTO comenta:
diferena de HEIDEGGER, porm, HUXLEY considera que tanto o esquecimento da totalidadedo ser quanto seu oposto a abertura da conscincia para a irrupo dos acontecimentos so umfenmeno do mundo biolgico. Para ele, o crebro e o sistema nervoso seriam uma vlvula redutora,
2A diferena entre a expresso de JUNG, inconsciente coletivo, e o inconsciente social aqui empregada
a seguinte: o inconsciente coletivo indica diretamente a psique universal, grande parte da qual no podenem mesmo tornar-se consciente. O conceito de inconsciente social parte da noo do carter repressivoda sociedade e se refere quela parte especfica da experincia humana que uma determinada sociedadeno permite que atinja a conscincia.
3FRANKNATALE criador do The Natale Institute (TNI) que trabalha com desenvolvimento da conscincia
criativa baseado em diversas pesquisas como Campos Morfogenticos (SHELDRAKE), Inconsciente Coletivo(JUNG ), Sincronia ou Srie (KAMMERER & PAUL BEING ), Cognio (MASLOW ), Iluminao (BUCKE ), Auto-lembrana (GURDJIEFF) e estudos das religies Budistas e Hindus.
4 Coordenada por PIERRE LVY, pesquisa comunidades como sistemas cognitivos, aumentando a
cooperao intelectual, principalmente as de natureza digital. Maiores informaeswww.collectiveintelligence.info.
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
6/13
5
que evita por meio do carter seletivo da memria e das restries impostas pela linguagem que ohomem seja esmagado pela torrente de informaes a que sua oniscincia potencial estaria sujeita.
As cores no existem no mundo e sim, internamente em nosso crebro. So
estmulos vibratrios luminosos que excitam clulas na retina do olho. No ser humano
essas clulas esto divididas em dois grupos, os cones, responsveis pelas sensaes de
cor e os bastonetes, responsveis pela sensibilidade luminosa. Os estmulos recebidos
pelas clulas so enviados atravs de impulsos nervosos pelo nervo tico passando pelo
quiasma ptico, trato ptico, terminand0 no corpo geniculado lateral e dali se estende em
filamentos nervosos, chamados radiao ptica, pelo tubrculo quadrigmeo anterior. A
rea visual no crebro, de todas as reas corticais, a que tem dado mais exatas e mais
fecundas observaes experimentais no domnio de diagnstico e especulao. Ela
apresenta nitidamente a zona de projeo ou de sensao, a zona de percepo e a de
reconhecimento ou de gnosia (DELMAS, p. 193). Isso, por si s, no explica quem est
observando dentro de ns ou o que a conscincia.
Temos um corpo fsico altamente especializado, com funes vitais trabalhando
independentemente de nossa interveno. Alm disso, reflexos puramente orgnicos
como frear o carro numa emergncia, piscar antes de ser atingido por um cisco, girar a
cabea em direo a um som alto repentino (encefalogiria), por exemplo, independem de
nossa deciso, nem passam pelo crebro, muito menos teramos tempo de pensar, so
reflexos de um observador atento e gil, o prprio corpo.
Nossos sentidos nos trazem informaes que nosso crebro processa. A linguagem
filtra essas informaes dando sentido a elas. Podemos dizer que nossa base epigentica
que nos capacita a criar essa linguagem. Toda informao um recorte na realidade, a
informao completa est no caos, incognoscvel para ns.
EDUCAO E CULTURA
Cultura um produto; histrica; inclui idias, padres e valores; seletiva; instruda; baseia-se em smbolos; e uma abstrao do comportamento e
dos produtos do comportamento.
ALFREDKROEBERe CLYDEKLUCKHOHN(in WILSONO. EDWARD)
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
7/13
6
No seu livro Conscincia pelo Movimento, FELDENKRAIS (p. 19) diz: Ns agimos de
acordo com a nossa auto-imagem. Esta, que, por sua vez, governa todos os nossos atos
condicionada em graus diferentes por trs fatores: hereditariedade, educao e auto-
educao. No podemos fazer muito a respeito da hereditariedade e da educao que
recebemos. Somos educados/programados dentro de uma cultura e dificilmente
conseguiremos nos adaptar a uma outra muito diferente depois de adultos. Podemos ter
hbitos que so desagradveis ou incompreensveis por outros. Podemos achar ridculas
a moda, a esttica e as crenas de culturas diferentes e, se no formos rgidos demais,
podemos admir-las mas sentindo que elas no fazem parte do nosso mundo particular.
Somos diferentes hereditariamente e, nem sempre, em nome da igualdade, essas
diferenas so respeitadas. Isso gera conflitos, muitas vezes suprimindo necessidades
vitais do indivduo por causa das necessidades da sociedade e de sua cultura, gerando
sentimentos de culpa, inadequao e, muitas vezes, a ponto de comprometer nossa
sade fsica e mental. Esse o resultado negativo da educao e cultura, porm, h os
elementos positivos que mantm a sociedade identificada com valores comuns a todos,
que organiza, protege, etc.
A cultura pode mudar hbitos naturais, criar vlvulas sublimadoras de instintos
considerados pouco teis ou ameaadores para a sociedade, como os esportes e as artes
por exemplo, mas s vezes usam mecanismos controladores, autoritrios e
supersticiosos.
Muitas terapias trabalham na integrao entre intelecto, emoo e o corpo5 por
perceber a interdependncia entre eles. O ser ntegro o que convive em harmonia com
essas partes, ou seja, essas partes integradas e no divididas como acontece
comumente. Um dos terapeutas pioneiros que percebeu a enorme importncia de
trabalhar com o corpo foi WILHELM REICH, introdutor da Bionergtica. Reich, discpulo de
Freud, viu que diversos desvios da personalidade e neuroses, estavam relacionados a
represses e a traumas. Reich descobriu que o organismo cria tenses para se conter ou
se defender. Essas tenses criam diversas couraas como anis em torno de regies
corporais especficas. O trabalho da bioenergtica dissolver essas couraas,
5
Essa diviso, tambm didtica, deixa de fora o que poderamos chamar do lado espiritual do ser humano,sua alma, apesar de ser a nfase das terapias atuais ditas de Nova Era.
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
8/13
7
devolvendo a individualidade natural e saudvel do paciente atravs de terapias
corporais. Mesmo FREUD percebeu que seriam inevitveis terapias envolvendo o corpo:
As enfermidades psquicas revelam apenas qualidades. Todavia, sempre parecem depender dos
chamados fatores quantitativos, da resistncia e da fora, da catexia de energia, das experincias eaes psquicas. Em uma reunio do crculo mais ntimo de analistas, Freud uma vez aconselhou-nosa ser prudentes. Tnhamos, disse, que estar preparados para esperar perigosos desafios de umafutura organoterapia terapia psquica da neurose. (...) A psicanlise dever um dia estabelecer-sesobre uma base orgnica. Isso era uma verdadeira intuio freudiana! (REICH, p. 104).
Fica a impresso de que um software inadequado s funes esperadas pela
natureza, quanto ao funcionamento correto do hardware, pode prejudic-lo, ou for-lo a
se alterar para adaptao. Certos discursos e sugestes tm poder de produzir crenas e
f, persuaso, como no caso das religies, das terapias psicolgicas, e de integrarsocialmente o indivduo desorientado ou em sofrimento. Esses discursos no necessitam
ter base alguma de verdade para serem efetivos, influenciam no comportamento, no bem
estar geral e sade do indivduo.
OS GENES
Pode alguma forma de comportamento estar associada aos genes? Quem observou
filhotes de ces ou gatos deve saber como so diferentes os seus comportamentos. Uns
so mais calmos e dorminhocos, outros brincalhes, alguns mal-humorados e mais
agressivos. Do mesmo modo, filhotes de animais humanos nascem com um tnus
particular de temperamento, antes que algum tipo de influncia externa atue nesse
sentido. O temperamento est associado como cada um se relaciona com os demais,
com o ambiente e situaes em geral.
Os animais possuem sistemas de comunicao s vezes impressionantemente
sofisticados, mas no os inventam, nem os ensinam para os outros (...) so
rigorosamente prescritos por genes e no podem ser alterados pelo aprendizado
(WILSON, p. 124). O que leva a crer que no temos a mesma base no caso do ser
humano?
Lembrando de nossa metfora, a cultura chegar atravs de informaes software
que sero processadas e guardadas na memria do crebro hardware, da forma
como esse hardwarefor capaz de assim fazer, ligado a determinaes genticas, mesmo
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
9/13
8
que estas sejam extremamente flexveis, com infinitas possibilidades e que se alterem
com o tempo numa co-evoluo gene-cultura como teorizado por EDWARD WILSON (p.
129). Genes e cultura se complementam interagindo de forma criativa na experincia do
indivduo.
Portanto os genes esto ali, antes que a cultura, capacitando o ser humano a
interagir com o mundo dentro de um cdigo especfico que varia de pessoa para pessoa.
Segundo ANDREW SAYER (p. 15) uma criana aprende muito antes de adquirir uma
linguagem (...) nem todos os nossos comportamentos sociais so adquiridos ou mediados
pela linguagem (...). Talvez, brincando com a palavra, possamos dizer que no, que tudo
est dentro da linguagem sim, incluindo a linguagem dos cdigos genticos.
Os estudos sobre gentica comportamental esto apenas no incio. WILSON (p. 147)
nos diz que: O principal ponto fraco da gentica comportamental humana e sociolgica
humana contempornea que apenas um pequeno nmero de genes e regras
epigenticas relevantes foram identificados. (...) A razo que a gentica comportamental
humana tecnicamente muito difcil nesse nvel.
O CENTSIMO MACACO E O CONCEITO DE ZEIGEIST
Uma espcie de macaco japons Macaca Fuscata das ilhas do norte do Japo, foi
observada em seu habitat natural durante 30 anos. Cientistas jogavam batatas doce na
areia da praia para os macacos. Estes as comiam mesmo sujas de areia. Uma fmea de
18 meses chamada Imo solucionou a questo lavando a batata num riacho perto e
ensinou seu truque sua me. Outros macacos jovens, amigos da Imo, aprenderam
tambm a se livrar da areia nas batatas, apenas alguns macacos mais velhos que no
aprenderam o truque com seus filhos, continuavam comendo as batatas com areia. Essainovao cultural gradualmente se espalhou entre 1952 a 1958, sempre observada pelos
cientistas.
No outono de 1958 algo aconteceu. Numa das manhs um determinado nmero de
macacos lavava suas batatas. Vamos supor que fossem 99 macacos. Ao final da manh,
mais um aprendera, o centsimo macaco. Ento aconteceu! Nessa noite quase todos na
tribo lavavam batatas doces antes de com-las. A energia adicionada deste centsimo
macaco criou, de algum modo, uma quebra cultural. Macacos de outras ilhas
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
10/13
9
Takasakiyama comearam a lavar suas batatas doces. Assim, essa teoria diz que quando
um determinado nmero crtico de seres consegue uma conscincia, esta conscincia
nova pode ser comunicada aos demais6. Pode ser que a histria no seja verdadeira, ou
que a observao desses cientistas no tenha sido correta. Quem sabe o mesmo
fenmeno que aconteceu com a Imo se repetiu entre outros macacos jovens nas outras
ilhas. De qualquer forma, temos na nossa sociedade alguns indcios de uma ressonncia
de idias. Algumas invenes, manifestaes artsticas e culturais, moda, descobertas e
invenes cientficas, entre outras idias criativas, podem acontecer em diversos lugares
ao mesmo tempo e sem que exista comunicao entre os grupos ou pessoas envolvidas.
Esse fenmeno tem sido chamado de zeitgeist, o esprito do tempo.
Esses dois fenmenos foram descritos aqui para exemplificar uma idia dentro dos
conceitos de inconsciente coletivode JUNG, e dos campos morfogenticosdos bilogos.
CAMPOS MORFOGENTICOS
Esses campos so uma teoria alm dos genes, apesar de ainda no sabermos o
grau de interferncia dos genes no assunto que se segue, pois as pesquisas ainda esto
sendo desenvolvidas. Todas as clulas vm de outras clulas, e todas as clulas herdamcampos de organizao. Os genes so parte desta organizao. Tm um papel essencial.
Mas no explicam a prpria organizao. Graas biologia molecular, sabemos o que os
genes fazem, como capacitar o organismo a produzir e sintetizar determinadas protenas.
Muitos organismos so clulas livres, incluindo fungos, bactrias e amebas. Alguns
do forma a esqueletos minerais complexos, como nas diatomceas (algas
microscpicas) e nos radiolrios. Produzir protenas certas no tempo certo no explica os
complexos esqueletos de tais estruturas sem que haja outras foras atuando no jogo.Essas foras so os campos morfogenticos. Esses campos esto relacionados, por
exemplo, com o fato de certas estruturas microtubulares da clula solidificarem enquanto
outras no.
SHELDRAKE comenta que os hbitos dos organismos so de importncia central para
o desenvolvimento biolgico, Eu acredito que a seleo natural dos hbitos tm papel
6
Informaes tiradas do site: http://www.wowzone.com/monkey.htm. H diversos estudos reais sobre oassunto, no necessariamente essa histria em particular.
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
11/13
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
12/13
11
quanto tememos a morte, evitando nos identificar com algo que sabemos ter um fim. Mas
talvez nada morra, numa concepo lavoisieriana, nosso corpo apenas retornar para a
natureza, da mesma forma que surgiu dela, e assim, talvez essas outras dimenses do
nosso ser, tenham tambm seu papel e uma outra continuidade nesse universo.
Somos deuses com nus, mas temos o consolo de carregarmos em nosso corpo os
tomos que, a milhes e milhes de anos atrs, participaram do Big Bange das estrelas
que se desenvolveram a partir dali. Carregamos em ns a histria e o mistrio desse
universo.
de se pensar, no deixa de ser um privilgio...
-
8/14/2019 O Corpo Co-Manda - Uma Reflexo sobre Gentica, Linguagem e Cultura.
13/13
12
REFERNCIAS
1. DELMAS, A. Vias e Centros Neurais. Guanabara Koogan. Rio de Janeiro, 1973.
2. FAY, Brian. Contemporary Philosophy of Social Science. A Multicultural Approach.Blackwell. London, 1999.
3. FELDENKRAIS, Morse. Conscincia pelo Movimento. Summus Editorial. So Paulo, 1977.
4. FROMM, Erich. Meu Encontro com Marx e Freud. Zahar. Rio de Janeiro, 1979.
5. HUXLEY, Aldous. As Portas da Percepo/Cu e Inferno. Editora Globo. Rio de Janeiro,2001.
6. POPPER, Karl R. Cincia: Conjecturas e Refutaes. Editora Universidade de Braslia.Braslia, 1974.
7. REICH, Wilhelm. A Funo do Orgasmo. Editora Brasiliense. So Paulo, 1983.
8. SAYER, Andrew. Method in Social Science, A Reallistic Approuch. Routledge. London,1992.
9. SLOTERDIJK, Peter. Regras para o Parque Humano. Uma Resposta a Carta de Heideggersobre o Humanismo. Estao Liberdade. So Paulo, 2000.
10. WILSON, Edward O. A Unidade do Conhecimento. Consilincia. Editora Campus. SoPaulo, 2003.