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FACULDADE MERIDIONAL - IMED PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM DIREITO PPGD CURSO DE MESTRADO EM DIREITO O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL EM AMARTYA SEN COMO FUNDAMENTO DAS DECISÕES DO STF NOS ANOS DE 2013 E 2014 MARLON ANDRÉ KAMPHORST Passo Fundo, 2015

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FACULDADE MERIDIONAL - IMED

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM DIREITO – PPGD

CURSO DE MESTRADO EM DIREITO

O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL EM

AMARTYA SEN COMO FUNDAMENTO DAS DECISÕES DO STF

NOS ANOS DE 2013 E 2014

MARLON ANDRÉ KAMPHORST

Passo Fundo, 2015

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COMPLEXO DE ENSINO SUPERIOR MERIDIONAL - IMED

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM DIREITO – PPGD

CURSO DE MESTRADO EM DIREITO

O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL EM

AMARTYA SEN COMO FUNDAMENTO DAS DECISÕES DO STF

NOS ANOS DE 2013 E 2014

MARLON ANDRÉ KAMPHORST

Dissertação apresentada à Faculdade Meridional/IMED, como parte das exigências do Programa de Pós-Graduação em Direito, na linha de pesquisa “Direito, Democracia e Sustentabilidade”, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre.

Orientador: Prof. Dr. Neuro Jose Zambam

Coorientadora: Profa. Dra. Salete Oro Boff

Passo Fundo, 2015

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CIP – Catalogação na Publicação

K15d Kamphorst, Marlon André

O direito ao desenvolvimento sustentável em Amartya Sen

como fundamento das decisões do STF nos anos de 2013 e

2014 / Marlon André Kamphorst. – 2015.

149 f.: il. ; 30 cm.

Dissertação (Mestrado em Direito) – Faculdade Meridional – IMED, Passo Fundo, 2015.

Orientação: Prof. Dr. Neuro José Zambam. Coorientação: Profa. Dra. Salete Oro Boff. 1. Sen, Amartya Kumar, 1933 -. 2. Desenvolvimento

sustentável. 3. Brasil. Supremo Tribunal Federal. I. Zambam, Neuro José, orientador. II. Boff, Salete Oro, coorientadora. III. Título.

CDU: 503.2:34

Catalogação: Bibliotecária Angela Saadi Machado - CRB 10/1857

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DEDICATÓRIA

Dedico a todas as pessoas que entendem que o respeito à vida não se

circunscreve à vida humana e que veem na proteção à natureza uma forma de

amar ao próximo.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha noiva Greice pelo incentivo, compreensão, companheirismo e

amor de todas as horas. A minha mãe, pai (sempre presente) e irmão pelo

incentivo, serenidade e pelos exemplos de vida e pela amizade incondicional.

Agradeço também a meu orientador professor Neuro Zambam, pela parceria,

ensinamentos e companheirismo; a professora Salete Oro Boff, pelos conselhos,

bem como todo o corpo docente e aos funcionários do Curso de Mestrado em

Direito da IMED pelos fartos ensinamentos de Direito e de vida. Por fim, agradeço

aos queridos colegas da turma 2013/2015 pelo convívio alegre e prazeroso, pela

amizade que se mantem e pelas experiências compartilhadas.

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EPÍGRAFE

Desenvolvimento e a eliminacao de privacoes de liberdade que limitam as

escolhas e as oportunidades das pessoas de exercer ponderadamente sua

condicao de agente.

Amartya Sen

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RESUMO

Resumo: O objetivo deste estudo é fundamentar o desenvolvimento sustentável

como um direito fundamental. A pesquisa é uma exigência do PPG da IMED

como trabalho de conclusão do Mestrado em Direito, e está vinculada a linha de

pesquisa “Fundamentos do Direito e da Democracia” e possui como marco teórico

Amartya Sen. O método utilizado será o dedutivo, com a finalidade de obter uma

conclusão acerca das premissas apresentadas. A existência de um direito

fundamental é a premissa maior e o desenvolvimento sustentável, a menor. Como

técnica de pesquisa será abordado o panorama geral da problemática do

desenvolvimento econômico especialmente nas obras “Sobre Ética e Economia”,

“A Ideia de Justica”, “As Pessoas em Primeiro Lugar: a etica do desenvolvimento

e os problemas do mundo globalizado” e “Desenvolvimento como Liberdade” de

Sen, em dialogo com outros autores e comentadores no objetivo de deduzir com

base na Constituição Federal e nas decisões do STF a existência de um direito

fundamental ao desenvolvimento sustentável. O fenômeno ambiental se constrói

sobre um aparente dilema entre desenvolvimento e preservação implicando a

construção de novos padrões de comportamento a serem observados tanto pelo

Estado quanto pela sociedade civil em busca de um ideal de sustentabilidade.

Nesse sentido, o sistema de proteção dos direitos fundamentais estabelecidos

pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 garante igualmente,

através do artigo 225, o direito e o dever de promover o equilíbrio do meio

ambiente tanto para as presentes como para as futuras gerações. Podemos

considerar o desenvolvimento sustentável um direito fundamental, imperativo da

interpretação sistêmica entre a Constituição e as decisões do STF, que lhe

confere, em grande parte dos julgados, notas de fundamentalidade. A teoria de

Sen contribui para a reestruturação e (re)valorização da economia para o bem-

estar humano, considerando os valores que cada cultura preconiza como

importantes para si e para sua coletividade, resgatando os sentidos do vínculo e

do limite das relações entre humanidade e natureza.

Palavras-chave: Democracia. Desenvolvimento sustentável. Direitos.

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ABSTRACT

Abstract: The objective of this study is fundamental to sustainable development

as a fundamental right. Research is an IMED PPG's requirement as a working

conclusion of the Master in Law, and tied the line of research "Law Basics and

democracy" and has the theoretical basis Amartya Sen. The method used will be

deductible, with the order to obtain a conclusion of the assumptions presented.

The existence of a fundamental right is the major premise and sustainable

development, the smallest. As a research technique will be discussed the

overview of the economic development issues especially in the works "On Ethics

and Economics", "Justice Idea," "The People First: the ethics of development and

the globalized world problems" and "Development as Freedom" Sen in dialogue

with other authors and commenters in order to deduce based on the Federal

Constitution and the decisions of the Supreme Court the existence of a

fundamental right to sustainable development. The environmental phenomenon is

built on an apparent dilemma between development and preservation implying the

construction of new patterns of behavior to be observed by both the state and civil

society in pursuit of an ideal of sustainability. In this sense, the system of

protection of fundamental rights established by the Constitution of the Federative

Republic of Brazil in 1988 guarantees also, in Article 225, the right and the duty to

promote the balance of the environment both for the present and for future

generations. We consider sustainable development a fundamental, systemic

imperative of interpretation between the Constitution and the decisions of the

Supreme Court, which gives it a large part of the trial, fundamentality notes. Sen's

theory contributes to the restructuring and (re) valorization of the economy to

human well-being, considering the amounts that each culture advocates as

important for you and your community, rescuing the senses of the bond and the

limits of the relationship between humanity and nature.

Keywords: Rights. Sustainable development. Democracy.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CF/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

STF Supremo Tribunal Federal

STJ

MP

Superior Tribunal de Justiça

Ministério Público

ONU

PNUMA

PNMC

PIB

ADI

CC

ADO

CPC

EUA

RE

MS

ADPF

Organização das Nações Unidas

Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

Politica Nacional Sobre Mudanca do Clima

Produto Interno Bruto

Ação Direita de Inconstitucionalidade

Código Civil

Ação Direita de Inconstitucionalidade por Omissão

Código de Processo Civil

Estados Unidos da América

Recurso Especial

Mandado de Segurança

Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................... 2

1 O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SUTENTÁVEL .................................. 8

1.1 O direito ao desenvolvimento e o distanciamento entre ética e economia 10

1.1.1 A liberdade como medida do desenvolvimento ................................. 20

1.2 A igualdade como alcance das capacidades ............................................ 30

1.2.1 Amartya Sen e o desenvolvimento sustentável ................................. 36

2 DIREITO FUNDAMENTAL AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA

CF E NAS DECISÕES DO STF DOS ANOS 2013 E 2014 .............................. 45

2.1 O direito fundamental ao desenvolvimento sustentável .......................... 46

2.1.1 O artigo 225 da Constituição da República Federativa do Brasil 50

2.2 A abordagem do STF sobre o desenvolvimento sustentável nos

anos de 2013 e 2014 ................................................................................ 56

2.2 A teoria de Amartya Sen como fundamento das decisões do STF ............ 67

3 A EFETIVAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL COMO UM

DIREITO FUNDAMENTAL .............................................................................. 75

3.1 A legislação ambiental ............................................................................ 76

3.1.1 A judicialização do meio ambiente e os atores processuais ...... 87

3.1.1.1 O descumprimento da legislação e a responsabilidade por dano

ambiental . ................................................................................................... 94

3.2 Amartya Sen e a efetivação do direito ao desenvolvimento sustentável 100

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 114

REFERÊNCIAS .............................................................................................. 122

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INTRODUÇÃO

A sustentabilidade, ao longo das últimas décadas, tem atraído o

interesse dos mais diversos campos do conhecimento. A preocupação

ambiental passou a ser compartilhada a partir da constatação de um cenário

paradoxal, o esgotamento dos recursos naturais e a continuidade de um

modelo de desenvolvimento econômico que agrava, em larga medida, a

situação ecossistêmica da vida no planeta.

A profundidade desse binômio reflete, sobremaneira, na redução da

diversidade de biomas, espécies vegetais e animais, na diminuição sistemática

da capacidade autorregenerativa do ecossistema, no aumento das catástrofes

naturais, na redução da qualidade de vida das populações mais pobres e a

consequente degradação do sistema de proteção dos direitos fundamentais.

De um modo geral, há uma clara oposição entre o modelo adotado pela maioria

dos países e a constitucionalidade efetiva do desenvolvimento sustentável.

Apesar do aparato jurídico, político e social existente, ainda subsiste a

supressão de direitos fundamentais básicos como comer, morar e beber água

potável. Em um consolidado sistema de polarização social, caracterizado pelo

protagonismo econômico, o sujeito não só é privado dos direitos materiais de

subsistência como, em larga medida, também daqueles direitos ligados à

participação nos empreendimentos sociais e do Estado, da ciência, da

tecnologia, entre outros.

Nesse cenário, o direito fundamental ao desenvolvimento sustentável

vem sendo denegado em função do protagonismo econômico e suas metas,

que giram em torno do aumento do PIB, da valorização dos rendimentos do

capital fixo, do controle da inflação pela variação oportunista da taxa de juros,

entre outros fatores. Nesse contexto, o problema ambiental, de afetação

imediata no direito dos indivíduos e da sociedade, não raro é considerado

empecilho ao crescimento econômico.

Frente à afirmação inicial de que o direito ao desenvolvimento

sustentável constituiu-se positivamente em solo nacional, é perene que seja

analisado em que condições, diante da ordem jurídica, moral, política, social e

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cultural esse direito fundamental vem se efetivando e, mais especificamente, se

de fato, existe a possibilidade do direito ao desenvolvimento sustentável.

Embora o direito exista, a sua efetivação carece de amparo nos poderes

constituídos, para que atuem de forma sistêmica. O legislativo deve produzir a

lei; o executivo fiscalizar essa mesma ordem para com todas as pessoas e

entidades e o judiciário aplicar com rigor as penas existentes, a fim de que seja

incorporada como lei moral válida para todos e culturalmente aceita,

correspondida e aplicada no dia a dia.

Frente a isso, Sen propõe que o crescimento econômico sirva a

liberdade, e o mecanismo de mercado e suas ramificações sejam instrumentos

pelos quais as populações implementem a condição de homens e mulheres

livres. Mais do que isso, desenvolvimento não é só crescimento econômico, é

também um conjunto de benefícios acessíveis a todos os indivíduos. Isso

implica, sobretudo, em um reposicionamento estrutural do significado e da

compreensão do desenvolver-se e do libertar-se, à medida que há,

paralelamente, uma tentativa de reaproximação de conceitos éticos aos

conceitos econômicos.

Nesse panorama, a principal certeza que emerge da aproximação entre

as liberdades e as igualdades, é que elas serão o substrato da ideia de

desenvolvimento na esteira da sustentabilidade. A proximidade desses

conceitos visa justamente a reavaliar o desenvolvimento a partir de uma

superação do axioma segundo o qual a economia é a única medida para se

afirmar o progresso.

A perspectiva desta dissertação perpassa a necessidade de

fundamentar o desenvolvimento sustentável como norma constitucional e sua

efetivação no cenário social, numa conjuntura que converge para o diálogo

interdisciplinar e demonstra os benefícios recíprocos das liberdades pessoais e

da legislação ambiental caminharem juntas.

Quando se aborda a aproximação entre o direito e a sustentabilidade, é

pertinente enfocar as possibilidades concretas para sua efetivação, eis que

mais do que mera adequação formal (previsão legal e caso concreto), a busca

pela realização de um direito fundamental insere-se na tentativa global de

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preservar a qualidade de vida para todos, tanto para as atuais como para as

futuras gerações.

Esta pesquisa é uma exigência do PPG da IMED como trabalho de

conclusão do Mestrado em Direito, e está vinculada a linha de pesquisa

“Fundamentos do Direito e da Democracia” e analisará o debate

contemporâneo acerca do direito fundamental ao desenvolvimento sustentável,

sua existência e efetivação, utilizando como marco teórico as lições de Amartya

Sen, como balisador para as decisões operadas pelo STF nos anos 2014 e

2015. Como critério científico, foram analisadas todas as decisões que

envolvam desenvolvimento sustentável e direito fundamental, nos anos de

2014 e 2015, sendo que 17 (dezessete) decisões serviram de suporte as

citações diretas, indiretas e paráfrases na medida que, consideram o

desenvolvimento sustentável um direito fundamental.

Como técnica de pesquisa será abordado o panorama geral da

problemática do desenvolvimento econômico nas obras “Sobre Ética e

Economia”, “A Ideia de Justiça”, “As Pessoas em Primeiro Lugar: a etica do

desenvolvimento e os problemas do mundo globalizado” e “Desenvolvimento

como Liberdade” de Sen, objetivando evidenciar que a economia não deve

estar somente ligada à busca do autointeresse e do acúmulo de bens, mas

também inserido em uma dimensão ética.

Sen recompõe o indivíduo como agente social que deve adotar uma

concepção ética, de modo a minimizar o seu autointeresse ao invés de

maximizá-lo para obtenção de satisfação pessoal. Um sujeito inserido neste

contexto, considera o seu meio envolvente e não somente suas motivações

pessoais, valendo-se das capacidades como maneira de aproximação ao agir

econômico sem negligenciar os aspectos éticos inerentes.

Portanto, o encontro das leituras de contexto realizadas por Sen e o

cenário político-jurídico brasileiro acerca do desenvolvimento sustentável é

capaz de subsidiar uma compreensão mais ampla das razões, dificuldades e

possibilidades de efetivação desse direito, razão que torna a pesquisa

pertinente, relevante e atual.

Nessa esteira teórico-analítica, o objetivo a ser alcançado é o de

analisar a existência de um direito fundamental ao desenvolvimento

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sustentável, diante da previsão Constitucional (CF/1988), e da posição

emanada pelo STF, especialmente nas decisões analisadas nos anos de 2013

e 2014.

Assim, postula-se investigar com base no pensamento seniano, a

insustentabilidade do atual modelo de desenvolvimento que impede a adoção

de um padrão sustentável que promova as liberdades, as capacidades e a

realização humana. Do mesmo modo que, também, busca-se conceituar o

desenvolvimento sustentável a partir de sua previsão legal do artigo 225 da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, considerando

decisões do STF, tendo como marco teórico inicial a ADI 3540/STF, julgada em

31 de Agosto de 2005, circunscrita pela análise das decisões do Supremo dos

anos 2013 e 2014, bem como apontar as condições, alternativas e

possibilidades para a sua efetivação.

Contudo, em termos mais específicos, a pesquisa pretende abordar o

contexto da efetividade do direito fundamental ao desenvolvimento sustentável,

mediante a análise do cenário que enseja a reflexão (distanciamento entre

ética e economia), os mecanismos jurídicos existentes no ordenamento

brasileiro e as possibilidades de sua realização.

Dessa forma, considerando os três principais núcleos da pesquisa (cisão

entre ética e economia, direito fundamental ao desenvolvimento sustentável no

ordenamento jurídico e formas de sua efetivação), o trabalho almeja analisar os

conceitos produzidos pela literatura afeta ao tema sustentabilidade em relação

às previsões legais e às decisões proferidas no âmbito do Supremo Tribunal

Federal, sobretudo a partir de uma interpretação orgânica e dialética dessas

fontes de justificação do direito fundamental ao desenvolvimento sustentável.

Uma inspeção aos dispositivos legais e à jurisprudência correlata será

verificada nesse processo, considerando a ligação necessária que se

pretenderá buscar entre Constituição, decisões e a realização desse direito.

Neste sentido, procura-se analisar no primeiro capitulo os conceitos de

liberdade e igualdade propostos por Sen, no objetivo de fundamentar a

possibilidade e a necessidade de posicionar as pessoas como condicionantes

sociais, na busca de transpassar o modelo econômico e exclusivo de

progresso, com a afirmação da ética nas relações econômicas. Para, após,

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desenvolver as diretrizes do desenvolvimento sustentável na visão seniana,

como substrato da fundamentação desse modelo de desenvolvimento vir a ser

qualificado com um direito fundamental.

No segundo capitulo, busca-se prover e justificar o desenvolvimento

sustentável como um direito fundamental, com esteio na Constituição Federal

Brasileira e na posição alicerçada pelo Supremo Tribunal Federal, no

julgamento de ações que se coadunam com a fundamentalidade desse modo

de desenvolvimento que compreende a proteção constitucional ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado. Asserção que vai ser corroborada pelas

decisões do STF analisadas, que implicam a proteção ambiental como bem

coletivo e considerada, em determinados aspectos, como prioridade em

relação à atividade econômica, cujos princípios devem ser ponderados e

harmonizados.

A efetivação do desenvolvimento sustentável demanda uma gama de

leis e ordenamentos jurídicos, a amparar a atuação judicial em defesa do meio

ambiente constituem o aspecto central do terceiro capítulo. Nessa perspectiva,

além da tímida atuação das instituições de defesa ambiental e do cidadão, o

surgimento do Ministério Público como defensor dos direitos difusos, é um

alento contra a impunidade tão vastamente produzida.

Trata-se também, a responsabilidade pelo dano ambiental quando

descumprida a legislação que sedimenta o desenvolvimento sustentável, o que

demanda em um aparato punitivo, mas que se arraiga a aspectos preventivos,

diante da atuacao do MP, notadamente por meio do inquerito civil e do termo

de ajuste de conduta, como forma ágil e eficiente de proteger o meio ambiente,

evitando-se a morosidade das demandas judiciais.

Considerando a natureza bibliográfica do presente trabalho, o metodo

adotado no seu desenvolvimento e o dedutivo, com o objetivo de deduzir a

conclusão de que o desenvolvimento sustentável é um direito fundamental,

diante das premissas apresentadas. A existência de um direito fundamental é a

premissa maior e o desenvolvimento sustentável, a premissa menor.

Para tanto, realizou-se pesquisa bibliográfica de vários autores acerca

do tema proposto, revisao de artigos doutrinários em revistas especializadas,

jornais, Internet, jurisprudencia e eventual coleta de dados junto à biblioteca e

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jurisprudência do STF, através de consulta ao site (www.stf.gov.br),

diretamente aos arquivos de decisões e aos autos de processos na sede do

Supremo Tribunal Federal.

Por sua natureza democrática, essa análise repousa sobre a

necessidade de uma avaliação estrutural do atual modelo de desenvolvimento

e da própria interpretação; a imersão do sujeito no pensamento e na ação da

sustentabilidade como uma tarefa democrática séria, da qual depende o futuro

geracional do planeta; a chegada a um novo conceito e finalidade do

desenvolvimento a partir da liberdade, igualdade e democracia.

Esses pressupostos, afora outros, indicam a necessidade de formar uma

base, tanto interpretativa como de ação, para o projeto da participação social

enfocado pela sustentabilidade. Isso porque, a ligação a ser estabelecida entre

desenvolvimento como liberdade, participação social e sustentabilidade deve

ser democrática, acima de tudo. Não por conta de uma coerência meramente

conceitual, mas porque a participação do sujeito no mundo já não pode mais

ser pensada sem a democracia.

A partir dessa perspectiva inicial, é fundamental, pela ênfase que se

quer dar ao desenvolvimento sustentável, aproximar os conceitos de liberdade,

sustentabilidade e democracia. A produção de bens e serviços no

desenvolvimento sustentável, em um contexto de reconciliação entre ética e

economia, precisa estar alinhada com os direitos que emanam da Constituição

e no plano cotidiano da sociedade, representar mais qualidade de vida para

todos.

O cenário e as formas de atuação que limitam a compreensão do

desenvolvimento são passíveis de serem identificados pela análise de Sen; a

existência positiva do direito ao desenvolvimento sustentável é, por seu turno,

justificável a partir da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e

da consagrada interpretação pelos tribunais superiores; por fim, o

relacionamento dialético dessas estruturas do conhecimento é capaz de

apontar alternativas e ações que redimensionem o caráter fundamental do

direito ao desenvolvimento sustentável.

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1 O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SUTENTÁVEL

Ao verificar a aproximação do conceito de desenvolvimento com as

noções de liberdade e igualdade, Amartya Sen faz uma análise não circunscrita

apenas ao campo da economia, mas em um sentido mais apurado, em o

Desenvolvimento como liberdade. E, nesse panorama, a principal questão que

nasce dessa aproximação é: o que significa desenvolver-se com liberdade?

Mais do que isso: como a liberdade e a igualdade podem subsidiar a análise da

ideia de desenvolvimento na esteira da sustentabilidade? Por fim: é possível

afirmar, então, que a aproximação desses conceitos visa justamente a reavaliar

o conceito de desenvolvimento a partir da superação do axioma segundo o

qual a economia é a única medida para se afirmar esse desenvolvimento?

O ponto de partida de Sen é claro: o paradoxo entre

superdesenvolvimento e miséria. Como uma das mais drásticas marcas do

século XXI, a desigualdade social extrema requer, para dizer o mínimo, uma

profunda discussão sobre o que é o desenvolvimento e como ele deve atentar

para a liberdade e igualdade dos sujeitos que compõem, em todos os

segmentos, o tecido social (SEN, 2010).

É nesse contexto que o Desenvolvimento como liberdade passa a ter

sentido. Dentro de um consolidado sistema de polarização social, caracterizado

pelo protagonismo econômico e político – que sozinho intenta conceituar

desenvolvimento - o sujeito não só é privado dos direitos materiais de

subsistência como, em larga medida, também daqueles direitos ligados à

participação nos empreendimentos sociais e do Estado. Sob esse foco, a ideia

de desenvolvimento como liberdade passa a ser envergada em direção a essa

nova condição que o sujeito deve desempenhar: o de partícipe da dinâmica

social.

Contudo, inobstante essa breve aproximação, a menção ao

desenvolvimento, à liberdade, à igualdade e à participação social ainda parece

constituir-se um tema demasiado abstrato. Nessa senda faz-se imperioso

questionar: em qual plano a busca do sujeito por participação social – que visa

ao melhoramento da sua condição de vida e da comunidade – deve ser

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desempenhada? Sob este aspecto, todo o conjunto de capacidades que podem

ser desenvolvidas pelo sujeito precisa ter um marco objetivo, realizável no

plano concreto.

É dessa necessidade de concreção que nasce a aproximação do

desenvolvimento como liberdade, participação social e sustentabilidade, que

vem a ser a determinante que especifica o plano de atuação do sujeito-

partícipe no mundo social. A partir disso, o sentido de se estimular a

participação social ganha corpo, mesclando a busca pela melhor condição de

vida a uma preocupação mais abrangente. A sustentabilidade é direcionada,

assim, para o campo democrático (unidade do pensar e do agir, da

epistemologia e da ética) com vista às condições reais de uma vida sustentável

no planeta.

Ainda assim, essa metodologia democrática do participar precisa

estabelecer consensos: de que é necessário partir de uma avaliação estrutural

do atual modelo de desenvolvimento (e da própria interpretação do mesmo); de

que a imersão do sujeito no pensamento e na ação da sustentabilidade é uma

tarefa democrática séria, da qual depende o futuro geracional do planeta; de

que a chegada a um novo conceito e finalidade do desenvolvimento só é

possível com as ideias de liberdade, igualdade e democracia.

Todos esses pressupostos, afora outros que é possível considerar, vão

indicar a necessidade de se formar uma base – tanto interpretativa como de

ação – para o projeto da participação social enfocado na sustentabilidade. Isso

porque, a ligação a ser estabelecida entre desenvolvimento como liberdade,

participação social e sustentabilidade deve ser democrática – acima de tudo.

Não por conta de uma coerência meramente conceitual, mas porque a

participação do sujeito no mundo já não pode mais ser pensada sem a

democracia. Esse filão democrático é, noutro aspecto, um método de trabalho

cujo fim aponta justamente para o seu próprio aperfeiçoamento.

A partir dessa perspectiva inicial, é fundamental, a ênfase que se quer

dar à noção de desenvolvimento de Amartya Sen, balizadora de toda

argumentação, que visa aproximar os conceitos de liberdade, participação,

sustentabilidade e democracia com vista a robustecer a condição de ativo,

social e participativo do sujeito contemporâneo. Aliás, é justamente o conceito

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de capabilidade de Sen – a ser analisado – que condensa as propriedades

efetivas que aquele sujeito precisará reunir.

Assim, ter-se-á uma análise das razões que levam Sen a teorizar o

“desenvolvimento como liberdade” (é o panorama que circunda o livro) e uma

inspeção aos conceitos de liberdade e igualdade, umbilicalmente ligados

àquela dinâmica aproximativa. Tais análises serão desenvolvidas,

respectivamente, nos tópicos seguintes, não sem já direcionar tais conteúdos à

questão da participação democrática, das atuações específicas em prol do

direito à sustentabilidade. A arquitetura orgânica do trabalho servirá, nesse

sentido, para tornar o tema em sua totalidade, sem isolamentos temáticos e

conceituais.

1.1 O direito ao desenvolvimento e o distanciamento entre ética e

economia

Tratar do pensamento de Amartya Sen significa dizer a quem a obra

responde e a quais ideologias combate. O economista indiano, prêmio Nobel

de economia de 1988 e autor de Desenvolvimento como liberdade, é o primeiro

a fazer uma análise significativa da liberdade e que, em seu cerne, é sinônimo

de privação, miséria e empobrecimento multicontextual, sedimento substantivo

da “violacao de liberdades politicas elementares e de liberdades formais

básicas” (SEN, 2010, p. 9).

Amartya Sen, com uma coragem científica lúcida desmistifica, em larga

medida a liberdade, propalada pela intenção liberal de servir à vontade livre.

Quer dizer: trouxe a discussão do desenvolvimento para uma análise

eminentemente crítica da função que a liberdade e a igualdade cumprem na

delimitação do que é e do como se interpreta o desenvolver-se.

Nesse sentido, quando afirma que os conceitos técnicos mais

dramáticos da economia, como PIB, renda per capita servem como condições,

como meios para se pensar e realizar a expansão das liberdades (SEN, 2010),

rompe com um modelo de interpretação do desenvolvimento, segundo o qual a

economia é o único meio capaz e legítimo para medir o quão desenvolvida é

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uma nação. É certo que a questão das condições de liberdade, em

determinada medida, é oriunda da teoria de John Rawls1, sobretudo à medida

que está “inserida nesse contexto de profunda preocupacao com a justica”

(ZAMBAM, 2004). Todavia, essa influência determinante sequer é negada pelo

economista.

Sob esse aspecto, a aproximação entre desenvolvimento e liberdade na

forma como preparada por Sen insere-se na estrutural tentativa de pensar uma

teoria da justiça para o mundo contemporâneo. Cuida-se, portanto, de uma

resposta a um progressivo e consolidado esquema de segregação ideológica

entre economia e ética, cuja pauta é estabelecida por um modelo neoliberal de

mensuração do progresso econômico. E, também por isso, aproximar

desenvolvimento de liberdade significa, portanto, reaproximar a economia da

ética. Esse último aspecto indica, por outro lado, a vigência de um corte

estrutural forte entre progresso econômico e agir humano (economia e ética).

A razão para a separação entre economia e ética é genealogicamente

remota e redescobre um esquema social, político e ideológico de

aperfeiçoamento da ideia de produção e acúmulo de capital. Do ponto de vista

científico, desde a separação de disciplinas como a Teologia (Idade Média) e

Política (Modernidade), os rumos traçados pela economia indicam uma

progressiva filiação à função pragmática de seu objeto e método, voltados para

a pesquisa interna dos elementos que, em sentido bastante estrito, a compõem

(SEN, 1999).

Diante desse cenário, as questões econômicas estão alicerçadas em

uma eficiência pragmática, no crescimento do PIB e na riqueza, enquanto

aspectos morais e de justiça são relegados a graus mínimos de importância. O

comportamento de maximização do autointeresse, mesmo que na tentativa de

relacioná-lo a um contexto ético, normalmente apresenta uma dicotomia entre

egoísmo e altruísmo, entre o indivíduo e o todo, distanciando o comportamento

1 A influência de John Rawls no pensamento de Sen pode ser verificada, mais especificamente, em sua Teoria da Justiça, obra na qual estabelece uma crítica contundente à noção de rawlsiana de justiça como equidade. Para Sen, as contribuições de John Rawls às ideias de equidade e justiça convidam para a celebração, e ainda há outras ideias presentes em sua teoria da justiça que demandam, como já afirmei, uma análise crítica e reformulação. Dentre os aspectos que carecem de mais investigações, Sen inclui a relevância do comportamento real e das perspectivas globais e as alternativas ao contratualismo. De modo geral, o pensamento rawlsiano precisa ser revisitado e superado a partir de novos elementos que a contemporaneidade global vem desenvolvendo (SEN, 2011, p. 82).

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individual do comportamento social. Consecutivamente a isso, os indivíduos de

um mesmo grupo podem ter interesses que são em parte convergentes e em

parte conflitantes.

Para Sen (1999, p. 23), portanto,

Pode-se dizer que a importância da abordagem ética diminuiu substancialmente com a evolução da economia moderna. A metodologia da chamada ‘economia positiva’ nao apenas se esquivou da análise econômica normativa como também teve o efeito de deixar de lado uma variedade de considerações éticas complexas que afetam o comportamento humano real e que, do ponto de vista dos economistas que estudam esse comportamento, são primordialmente fatos e não juízos normativos. Examinando as proporções das ênfases nas publicações da economia moderna, é difícil não notar a aversão às análises normativas profundas e o descaso pela influência das considerações éticas sobre a caracterização do comportamento humano real.

Nesse contexto, numa economia positivista, calcada na técnica particular

e hermética, não há espaço para a discussão ética. A própria motivação

humana passou a estar relacionada a um plano quase que exclusivamente

econômico, prescindindo da ideia de multicontexto, de cultura da diversidade e,

fundamentalmente, tornando a própria busca da felicidade uma prerrogativa

economicista (SOUZA, 2012). A individualidade voltada para o todo, para a

unidade entre o eu e o nós se esvai e é substituída por uma visão privada do

mundo.

Sobre a relação interesse particular e público, recorda Valls (2004, p. 25)

que a ética grega “colocava, realmente, a busca da felicidade no centro das

preocupacoes eticas” e suplantada pelo atomismo particularista, pela

maximização dos desejos particulares em detrimento do bem público. Nesse

diapasão, passa a perder sentido o fato de o próprio Aristóteles partir, no

contexto da etica eudemonista, do “estabelecimento da nocao de felicidade”, a

qual visa, substancialmente, “buscar o que e o bem agir em escala humana, o

agir segundo a virtude” (ARISTÓTELES, 2001). Uma análise mais profunda,

revela que e essa “escala humana”, universal, coletiva, que perde, em larga

medida, o sentido.

Aliás, o próprio Aristóteles (2001, p. 35) estabelece que a “excelência

moral é produto do hábito”, e já vem potencializada nas pessoas, e “Portanto,

nem por natureza nem contrariamente a natureza a excelência moral é

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engendrada em nós, mas a natureza nos dá a capacidade de recebê-la, e esta

capacidade se aperfeiçoa com o hábito.” Notadamente, contudo, o hábito moral

está ligado, amplamente, à relação humana cotidiana, à inter-relação das

pessoas na sociedade, o que requer mais do que o contato imediato,

pragmático com o outro. Este, por seu turno, não é – e isso já na visão

aristotélica, mas melhor trabalhada em Kant – condição de realização do

interesse particular. Significa que a moralidade forma-se como conjunto,

confluência de pessoas no tecido social: a interdependência não é apenas

comercial e econômica, mas social.

No tocante às ideias recém-evocadas – kantismo e interesse ou vontade

particular - é necessário estabelecer um paralelo primeiro entre o declínio da

importância ética e o início do pensamento liberal e, depois, entre o sujeito

como meio e Kant. Tal empreendimento realiza-se com um fim apenas

ilustrativo e adjeto das razões que afastaram a economia da ética, já que não

haverá priorização por uma busca radical às origens, inclusive revolucionárias,

do pensamento liberal.

Mesmo assim - sobretudo para entender a condição nova do indivíduo

depois do Renascimento, do Iluminismo, da Reforma Protestante, das

revoluções burguesas do século XVIII e XIX – é necessário indicar que a

relação indivíduo-sociedade é bastante influenciada pelo conceito de interesse

ou vontade particular nascido e criado na teoria liberal. A busca por liberdade

(cujo itinerário indica, como cediço, a própria não linearidade da história desse

conceito) está alçada desde as revoluções políticas inglesas e francesas às

revoluções industriais, fundamentais dentro da história econômica do mundo

(LOSURDO, 1998).

Nesse contexto, é ilustrativa a análise de Hegel acerca, por exemplo,

das fases da maior revolução burguesa do século XVIII, a Revolução Francesa

de 1789. Isso porque, a liberdade, no dizer de Hegel (1999) foi sendo refinada

ao longo das reivindicações – muitas delas violentas – até chegar ao

liberalismo. Este, por seu turno, funda-se no conceito de vontade particular, a

qual tem diante de si - porque liberta da ideia de criatura (protestantismo) e da

noção de servilismo (feudalismo) – o próprio interesse como fundamento. A

virtude política de Aristóteles é perdida, e se torna mais clara, portanto, a

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posterior refuga da ideia de coletividade, de felicidade para além do aspecto

economicista.

À medida que o liberalismo – resultado do primado burguês da liberação

em relação ao catolicismo (plano religioso), do feudalismo (plano econômico) e

do absolutismo monárquico (plano político) – condensa a economia, inspirando

justamente aquela tendência já tratada de se pensar pragmaticamente, essa

caracteristica do “interesse e vontade particular” como ponto de convergencia e

que passa a definir a efetiva separação entre ética e economia (SEN, 1999).

Ou seja, não tem mais sentido falar em relação entre homens senão sob

o aspecto particular, economicista e, diante disso, a coletividade e a ética

perdem terreno (KANG, 2011). Tal é o panorama da aproximação das ideias de

declínio da importância ética e início do pensamento liberal, brevemente

situado. Dentro desse ambiente, falar em direitos civis, democracia,

desenvolvimento sustentável tem menor atratividade.

Todavia, esse cenário faz lembrar a segunda aproximação já aludida:

Kant e a máxima do homem como fim. Como panorama do Desenvolvimento

como liberdade, tal relação faz muito sentido, já que pensar o progresso

multicontextual a partir da ideia de liberdade vai requerer, no mínimo, que se

tenha reduzido substancialmente o subjetivismo de uma premissa como: o

interesse particular é o fundamento da felicidade.

Mesmo quando se trata a liberdade em um campo mais amplo, como o

Estado e as instituições, o princípio da autonomia de Kant ainda se mantém

forte, já que, no fundo, as condições de vida (para além do pragmatismo

econômico) referem-se a um sujeito concreto e que empreende também a

reflexão moral – o mesmo – futuramente, será o sujeito social e participativo.

Kant (2009) esclarece sobre o princípio da autonomia: escolher sempre de

modo tal que as máximas de nossa escolha estejam compreendidas, ao

mesmo tempo, como leis universais, no ato de querer.

Acrescenta Kant (1991, p. 224)

[...] realmente existem leis morais puras que determinam plenamente a priori (sem atender a motivações empíricas, isto é, a felicidade) o fazer, ou deixar de fazer, ou seja, o uso da liberdade de um ente racional em geral; estas leis comandam-

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nos de um modo absoluto [...] e em todos os sentidos são portanto necessárias

Disso resulta, quase que obviamente, uma refuga do entendimento

liberal segundo o qual o interesse particular funda a sociedade. Se, por um

lado, esta última concepção deixa de lado a ética, lacerando, portanto, as

ligações com o discurso moral: por outro, isso vai significar a adoção indireta

de uma moral particularista, privatista, contrária à noção kantiana e à própria

tentativa de Sen de reaproximar ética e economia.

Do ponto de vista do agir humano como um todo, o redimensionamento

de ética e economia em um mesmo vetor, ao contrário da ideia antes evocada,

vai estabelecer como fundamento que a ação humana é primordialmente ética.

Mais do que isso: pensar o desenvolvimento como liberdade corresponde,

justamente, a esse fundamento, o qual enseja a importante aplicação de suas

menções no campo econômico e o direcionamento de grande parte das ações

dos homens que têm na economia o estabelecimento de suas diretrizes,

obrigações, anseios, enfim, o futuro, do qual a moralidade não pode se separar

(VALLS, 2004).

Porém, essa busca por um fundamento coletivo – e que explica toda a

tentativa de reatar ética e economia – não faz desaparecer o interesse

particular. Caso assim fosse, o próprio uso da liberdade como medida para o

desenvolvimento seria inútil, já que, radicalmente, ser livre tem um sentido

concreto. Essa liberdade se objetiva neste e naquele sujeito, os quais possuem

ambições, necessidades específicas e não necessariamente coletivas. O que

desaparece é, todavia, a desistência de um diálogo ético contínuo com a

economia, redescobrindo, pari passu, os seus limites, as suas funções etc.

Afinal, como lembra Oliveira (1993), que a liberdade existe tanto como

substância coletiva como quanto querer livre.

De modo que Sen não prega o fim do desenvolvimento, mas vai além da

própria interpretação moral desenvolvida por Kant, já que considera como

importantes questões relativas à miséria, à fome, ao analfabetismo, às

intervenções democráticas as quais determinam também o comportamento

moral. A própria liberdade depende de fatores contingentes, que variam de

nação para nação, de continente para continente e que vão reivindicar, em

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último caso, uma atenção que não é apenas econômica – basta lembrar a

exigência de que esse pensamento parta do ambiente democrático. E, nesse

cenário, também a necessidade de considerar o homem como fim e não como

meio é um pressuposto, o que torna Kant importante dentro do diálogo.

É o próprio Sen quem explica.

A visão da racionalidade como auto-interesse [sic] implica inter alia,uma decidida rejeicao da concepcao da motivacao “relacionada a etica”. Tentar fazer todo o possivel para obter o que gostariamos pode ser parte da racionalidade, e isso pode incluir o empenho por objetivos desvinculados do auto-interesse, os quais podemos valorizar e desejar promover. Considerar qualquer afastamento da maximização do auto-interrese uma prova de irracionalidade tem de implicar uma rejeição do papel da ética na real tomada de decisão (SEN, 1999, p. 31).

Quando, portanto, Sen fala em “autointeresse” está tratando daquela

noção de vontade particular, de atendimento a necessidades isoladas do

compromisso ético. A motivação que está disposta no mundo – nos indivíduos

e no próprio projeto político das soberanias – perde, inclusive com o avanço

tecnológico voltado para o desenvolvimento como progresso econômico, uma

noção mais aproximada de reflexão ética. A liberdade, a igualdade, a

participação democrática, o crescimento sustentável da indústria, o futuro

geracional do mundo, à medida que não são indicadores claros do

desenvolvimento, são relegados a um plano secundário.

Nesse ideário, ao passo que o Produto Interno Bruto – PIB tornou-se,

numa clara inspiração economicista de progresso, à medida do

desenvolvimento, os estados nacionais passaram a enveredar as suas políticas

econômicas para alcançar PIBs maiores. Ou seja, maior o PIB, maior o

desenvolvimento oficial do país. Política econômica, nesse contexto, vai

significar o conjunto de medidas para consolidar uma economia estável e

crescente, cujo índice ilustrador desse crescimento é justamente o Gross

Domestic Product- GDP (KANG, 2011).

No pensamento de Sen há, de um lado, a preocupação com a visão

economicista, que singulariza a conceituação de desenvolvimento em um

índice. Por outro, as graves injustiças sociais que se radicam, do ponto de vista

filosófico, no divórcio entre a ética e a economia, mas cujas raízes mais

profundas estão na execução concreta de um modelo econômico que tem a

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desigualdade como condição de sucesso. Como manejo ideológico, dissemina

a concepcao do “autointeresse” como projeto de vida e liberdade (PINZANI,

2010).

O que faz, portanto, Sen teorizar a liberdade como medida do

desenvolvimento tem como base a ação fundada na generalização do

autointeresse como única motivação do comportamento humano. Só que, essa

ação é contrária à ética e não pode, por isso, promover o contentamento

esperado. Diante disso, somente uma ação coletiva, de cooperação social e

capaz de amadurecer o agir responsável corresponderia a uma opção ética

séria e estruturalmente voltada para o melhoramento abrangente das

condições de vida. No fundo, o que está em jogo é a capacidade de unificação

do projeto pessoal com o fim coletivo, amparado no sentimento de

responsabilidade e regozijo com a sociedade em que se vive, e não somente a

satisfação pessoal momentânea.2

Nesse sentido, do ponto de vista da atitude singular do sujeito, a questão

volta-se ao autointeresse e à atrofia da capacidade de desenvolvimento de

uma postura ética. Logo, o combate se situa no plano da consciência ética e da

reflexão moral difusamente estabelecida – o desenvolvimento das

capabilidades (o que será oportunamente analisado). Todavia, é importante

recobrar Sen (1999, p. 10): “[...] a economia, como ela emergiu, pode tornar-se

mais produtiva se der uma atenção maior e mais explícita às considerações

eticas que moldam o comportamento e o juizo humano”. Significa, portanto,

que a mudança requer também uma ação de dentro para fora, no âmago do

pensamento econômico.

Contudo, essas medidas de combate à dissociação entre ética e

economia, por ora somente indicam o nível subjetivo ou a consequência

daquela cisão para os agentes envolvidos. A noção de capabilidades será

retomada na sequência do trabalho. Dessa forma, o diagnóstico produzido por

Sen também relê os aspectos fragmentários (sempre entre ética e economia)

2 Pinzani (2010, p. 169) esclarece: “Atribuimos autonomia a um sujeito quando ele e capaz de agir conforme um projeto pessoal de vida boa (projeto que,contudo,pode ser inspirado por modelos pré-existentes) e de considerar a si e a outros sujeitos como capazes de estabelecer relações de direitos e deveres (em outras palavras: quando é capaz de ver a si e aos outros como titulares de direitos e possuidores de deveres)”.

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também existentes nos sujeitos, para além da expressão política de suas

ações.

Portanto, do ponto de vista dos sujeitos também é possível identificar,

afunilando as ideias de interesse particular ou “autointeresse”, a razoes que

levam ao surgimento do Desenvolvimento como liberdade. Se já restaram

constados alguns conceitos ligados à condição do sujeito no processo de

afastamento entre ética e economia (é exemplo a ideia de interesse particular),

Sen recupera a ideia de agente.

Diz o economista.

Estou usando o termo agente [...] em sua acepção mais antiga – e mais grandiosa – de alguém que age e ocasiona mudança e cujas realizações podem ser julgadas de acordo com seus próprios valores e objetivos, independentemente de as avaliarmos ou não também segundo algum critério externo [...] da condição de agente do indivíduo como membro do público e como participante de ações econômicas, sociais e políticas (interagindo no mercado e até mesmo envolvendo-se, diretamente, em atividades individuais ou conjuntas na esfera política ou em outras esferas) (SEN, 2010, p. 34). (grifo nosso).

Por mais que Sen já indique nessa passagem uma condição pós-

Desenvolvimento como liberdade, idealizando algo como que um dever-ser de

sujeito que reunifica ética e economia está-se, ainda no plano da reavaliação

do modelo hermético de economia, como primeiro estágio para a postulação da

liberdade como explicitação do desenvolvimento. Ou seja, tudo que o sujeito

não é nessa fase é agente de “acoes econômicas, sociais e politicas”. Sob

esse aspecto, este indivíduo é um carente de conteúdo, em que o processo de

tomada de consciência desse ambiente segregado está por iniciar. No fundo, é

o próprio distanciamento entre ética e economia que impede, nesse primeiro

plano, que o sujeito seja agente.

Em larga medida, portanto, o que está como cenário do

Desenvolvimento como liberdade é uma crítica prévia ao comportamento

autointeressado, único que tem sentido no âmbito das escolhas econômicas.

Tal região comportamental identifica, no dizer de Timm de Souza (2000, p. 149-

150), “o estranho e abissal contraste que se estabeleceu, nos últimos tempos,

entre o frenetismo e a superficialidade dolorosa em que habitam as mônadas

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desesperadas que constituem a massa dos indivíduos da cultura capitalista e

pós-industrial”.

Existe, como contraprodução à ideia de agente, um sistemático e

nevrálgico sistema de contínuo afastamento daqueles conceitos. Continuidade

quer significar, nesse âmbito, a manutenção das estruturas que executam o

atomismo econômico e, por outro lado, o desestímulo da transformação de

indivíduos em agentes, sobejamente pelo caráter contraproducente que isso

representaria.

Ainda uma vez, a partir da lição de Timm de Souza (2000, p. 150), é

preciso anotar que esta última tentativa (de reduzir o crivo que faz nascer os

agentes) deflagrou uma situacao mais ou menos visivel: “o homem – e a

mulher – pós-modernos tudo querem, tudo desejam, menos profundidade de

qualquer tipo; é nisto que a velocidade e o frenetismo apostam, é nisto que se

baseia todo o espectro de (im)possibilidades”.

Inobstante, Oliveira (1993, p. 248) esclarece que

Foi a partir dessa concepção do homem como indivíduo isolado que se articulou a ética da sociedade moderna, a dimensão normativa da ‘racionalidade econômica’ do modo de producao capitalista. No seu cerne está a ideia de liberdade identificada ao interesse próprio, o que se vai concretizar em livre iniciativa, livre concorrência, livre mercado. Numa palavra, aqui se identifica, pura e simplesmente, liberdade como interesse próprio.

O que se vai esclarecendo é a percepção de que tanto no indivíduo

quanto nas instituições, mutatis mutandis, a marca ideológica é única: o

afastamento do mundo coletivo e, portanto, a minimização atrofiante da ética.

Eis, portanto, uma das estruturas concretas – vivida tanto no imaginário quanto

no agir cotidiano. Mais tarde, será ainda possível relacionar a superação dessa

crise às tentativas de incluir o sujeito no rol participativo para a sustentabilidade

(do indivíduo ao agente); por ora, a crise é diagnóstico e panorama da obra de

Sen.

Percebendo a complexidade dos problemas sociais Boff (2013, p. 107)

acrescenta que

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As sociedades contemporâneas, por conta de sua organização e de seus problemas, são complexas. O acelerado processo de globalização evidencia as desigualdade que retratam as deficiências do ordenamento social, das concepções de justiça e as disparidades entre o progresso econômico, a opulência e a pobreza. De outra parte, oferece as condições para a maior e melhor integração entre os povos, culturas e a consequente expressão e respeito das diferenças.

A elaboração de uma teoria do desenvolvimento como liberdade atende,

portanto, ao combate de um largo e consolidado esquema de realidades

paradoxais que reduzem, substancialmente, a nitidez do próprio conceito de

justiça (deve-se lembrar as origens rawlsianas do pensamento de Sen). Ainda

assim, a liberdade, como conceito que se liga à própria autorrealização do

homem (OLIVEIRA, 1993), pressupõe uma série de conceitos afetos e que,

efetivamente, a tornam concreta no plano político e social. Mais em específico,

a sua existência como exposição da ideia de desenvolvimento depende de

determinantes ligadas, por exemplo, à igualdade jurídica e social.

1.1.1 A liberdade como medida do desenvolvimento

A visão da liberdade moderna é, do ponto de vista filosófico, ligada ao

Iluminismo e, do ponto de vista político, tem relação com revoluções burguesas

dos séculos XVII e XVIII. Ainda que não seja possível aventar todas as

características e implicações dessa origem de uma forma mais precisa, é

inarredável o fato de que contrastam dramaticamente das formas antigas e

médias de se entender o sentido e a existência do homem na comunidade.

Na perspectiva moderna, a liberdade passou a representar a

possibilidade de trocas e transações como efetivos direitos ligados à

individualidade pública, avalizada para prosperar e dominar a sociedade civil a

partir de interesses particulares. Nesse aspecto, temas como privação da

liberdade, redução das oportunidades, terão sempre como prisma a

necessidade de se reconhecer ao sujeito o direito de trocas e transações

econômicas, ainda que tais elementos sejam oriundos de um comportamento

tipicamente mercadológico (SEN, 2010).

Mesmo assim, no tocante à liberdade como medida do desenvolvimento,

Sen (2010, p. 29) e categórico em afirmar que “o desenvolvimento tem de estar

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relacionado sobretudo com a melhoria da vida que levamos e das liberdades

que desfrutamos”. Em geral, significa dizer que o criterio renda,

industrialização, aumento do PIB são indicativos importantes, mas não

suficientes quando as liberdades sao, ao mesmo tempo, “fins primordiais” e

“meios principais”. Para Sen, o crescimento econômico deve ser instrumento

de expansão das liberdades. O aumento do capital e da renda deve servir

como meio de acesso a condições concretas de melhoramento da qualidade de

vida.

Se, por um lado, “ser genericamente contra o mercado seria quase tão

estapafúrdio quanto ser genericamente contra a conversa entre pessoas”, por

outro “vem depois do reconhecimento da importância direta da liberdade de

troca – de palavras, bens, presentes” (SEN, 2010, p. 21). Portanto, para Sen o

mercado nao deve ser imediatamente refutado e suas práticas “genericamente”

suprimidas. Aliás, a ideia de generalidade quer significar, justamente, que as

críticas determinadas precisam ser feitas mas que, enquanto organização

econômica, é contraproducente a apologia a algo como o fim do mercado.

É por isso que o economista afirma categoricamente: “na visao do

desenvolvimento como liberdade, os argumentos de diferentes lados têm de

ser apropriadamente considerados e avaliados” (SEN, 2010, p. 22). Tanto

quem defende a prevalência absoluta das atuais práticas de mercado como

quem rechaca, por completo, o “mecanismo de mercado” está unilateralmente

equivocado. Se é certo que as práticas de mercado precisam ser revistas,

sobretudo para serem alinhadas às condições de vida e a um grau maior de

liberdade, também é patente que o mercado é capaz de dar contribuições

significativas a esse processo.

Contudo, em meio a esse cenário díspar de compreensão do

desenvolvimento, seria suficiente oferecer o conceito de liberdade em um

sentido genérico, básico, como um grande pressuposto para as sociedades

democráticas e como ponto inarredável para o mecanismo de mercado? Sen

(2010, p. 10) responde: “para uma compreensão mais plena da relação entre

desenvolvimento e liberdade, precisamos ir além desse reconhecimento

básico”, ou seja, caminhar para uma visao instrumental do crescimento

econômico.

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Em funcao dessa necessidade de “ir alem”, Sen (2010, p. 25) faz uma

crucial e elucidativa distinção entre liberdades instrumentais e substantivas que

auxilia, sobretudo, a tarefa de analisar sem confusões as estruturas

fundamentais através das quais é possível afirmar que a liberdade é defensável

como medida (meio e fim) do desenvolvimento. Tanto o papel instrumental

quanto constitutivo da liberdade desembocará na conclusão orgânica da obra:

o desenvolvimento pode ser medido pela experiência na liberdade.

Sen (2010, p. 56) ainda considera: “a importância intrinseca da liberdade

humana como o objetivo preeminente do desenvolvimento precisa ser

distinguida da eficácia instrumental da liberdade de diferentes tipos na

promocao da liberdade humana”. Significa, em outras palavras, que a liberdade

em um sentido constitutivo por si só é insuficiente, porque não oferece

elementos concretos, práticos, pelos quais se possa propor, sem leviandade,

que ela própria é a medida do desenvolvimento. Portanto, o que constitui a

liberdade passa pela análise das formas instrumentais que a fazem existir.

Dentro dessa proposta, Sen tipifica cinco formas instrumentais de

liberdade, capazes de produzir uma análise mais completa do grau de

liberdade vivido. São elas: (1) liberdades políticas, (2) facilidades econômicas,

(3) oportunidades sociais, (4) garantias de transparência e (5) segurança

protetora (SEN, 2010).

Acerca de como essas tipologias se relacionam, explica Sen (2010, p.

25).

Cada um desses tipos distintos de direitos e oportunidades ajuda a promover a capacidade geral de uma pessoa. Eles podem atuar complementando-se mutuamente [...]. Na visao do “desenvolvimento como liberdade”, as liberdades instrumentais ligam-se umas às outras e contribuem com o aumento da liberdade humana em geral.

É a partir dessa ligação abrangente que as liberdades políticas (1) –

incluindo os assim denominados direitos cívicos – correspondem àquelas

oportunidades de decisão quanto aos princípios e formas que desejam ver no

governo. Mais do que isso, possibilitam a crítica aos modelos políticos de

definição de metas e de uso das políticas públicas, crítica esta que demonstra,

em um segundo momento, a própria liberdade de expressão dentro do

ambiente democrático. O pluripartidarismo oferece, além disso, a possibilidade

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de uma escolha pessoal do “agente” e, em geral, as liberdades políticas

condensam as próprias características democráticas.

Se é possível falar em participação social, atividade de agente e

compromisso com a causa sustentável, então a liberdade política deve estar

largamente reconhecida, já que corresponde, justamente, à oportunidade real

de o indivíduo participar, ativa e discursivamente, da vida pública de seu país.

Nesse sentido, as liberdades políticas são importantes para a tentativa de se

afirmar a busca pelas capacidades democráticas de um sujeito que age em

função da sustentabilidade – daí, inclusive, a ideia de instrumentalidade dessa

modalidade de liberdade (SEN, 2010).

Por outro lado, as facilidades econômicas (2) são, em geral, as

condições de um indivíduo para trocar bens e utilizar seus recursos como

melhor lhe apraz. São as capacidades que as pessoas adquirem de acordo

com as movimentações do próprio mercado, sobretudo em contextos como o

do aumento de rendimentos, das trocas de bens, de acesso a financiamentos,

etc. Complementariamente, as oportunidades sociais (3) “sao as disposicoes

que a sociedade estabelece em áreas como educação e saúde, as quais

influenciam a liberdade substantiva de o indivíduo viver melhor” (SEN, 2010, p.

59).

São essas condições objetivas que definem, em larga medida, o acesso

do indivíduo a hospitais e escolas de qualidade, aos meios de informação

capazes de o manterem informado de forma qualificada. Uma vez disponíveis

esses elementos básicos, mais chances de se incrementar o contexto das

decisões políticas e da participação do indivíduo. Por outro lado, a

precariedade dessas condições sociais vai impossibilitando a) as condições de

bem-estar imediatos e b) a probabilidades de o sujeito tornar-se participativo –

daí sua importância crucial para o conceito de agente participativo.

No tocante às garantias de transparência (4), Sen explica.

As garantias de transparência respeitam à necessidade de abertura que as pessoas podem esperar: a liberdade de lidar uns com os outros sob a garantia de clareza e de esclarecimento. Quando essa confiança é seriamente atingida, a vida de muitas pessoas – diretamente interessadas ou terceiros - pode ser afetada negativamente pela falta de lisura. As garantias de transparência (incluindo o direito à clareza) podem, assim, ser uma categoria importante de liberdades instrumentais. Tais garantias têm um

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evidente papel instrumental na prevenção da corrupção, da gestão irresponsável e dos arrangismos subterrâneos (SEN, 2010, p. 60).

Nesses cenários de corrupção que se extremam ao redor do mundo –

sobretudo no Brasil contemporâneo - faz todo o sentido a locução de Sen sobre

a transparência. Afora estar em conexão com a democracia, aproxima o sujeito

da dinâmica institucional e administrativa, o que será futuramente, para o

sujeito participativo, uma questão de interação mais direta com as metas e

rumos do estado (CASAGRANDA; ZAMBAM, 2014).

Por fim, “ainda que muito bem funcione um sistema econômico”, e

imperativo criar mecanismos de socorro frente a intempéries mais graves, ou

seja, uma segurança protetora (5). É necessário, diz Sen (2010, p. 60) uma

“previdencia social para proporcionar uma rede de proteção social que evite

que a população afetada se veja reduzida a uma miséria abjeta e até, nalguns

casos, exposta à fome e à morte”. Em tal âmbito, serao necessários alguns

“dispositivos institucionais permanentes”, capazes, imediata e

emergencialmente, de prover as condições mínimas para a existência da

liberdade (são exemplos dados pelo economista, dentre outros, o seguro-

desemprego e bancos alimentares).

Todas essas condições, à medida que se cruzam como capacidades

necessárias à liberdade, afastam o desenvolvimento das tradicionais

interpretações restritivas que, no nível global, tomam o aumento do PIB como

medida eficaz de desenvolvimento e, no âmbito da vida do indivíduo, acreditam

que o critério renda é o único capaz de indicar o grau de liberdade vivido.

Enquanto instrumentos, ligam-se à ideia de uma liberdade constitutiva ao

passo que “aumentam diretamente as capacidades das pessoas, mas tambem

suplementam-se mutuamente e podem, além disso, reforçar umas às outras”

(SEN, 2010, p. 61).

Aliás, não é difícil compreender que um indivíduo com boas condições

de saúde, educação, moradia esteja mais disposto a, inclusive, participar dos

rumos do seu país e a pensar, consciente da estrutura global do meio

ambiente, a sustentabilidade. Quanto mais um sujeito gasta seu tempo e seus

recursos para suprir sozinho deficiências da terceira liberdade instrumental (as

oportunidades sociais (3)), menos ele estará interessado em participação

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social, já que não é evidente que as crises graves que assolam o sujeito em

particular torná-lo-ão mais socialmente ativo.

É o próprio Sen (2010, p. 258) que elucida a questão por meio de um

exemplo.

A educação também amplia os horizontes, e em um nível material, ajuda a difundir os conhecimentos sobre planejamento familiar. E, obviamente, mulheres instruídas tendem a gozar de mais liberdade para exercer sua condição de agente nas decisões familiares, inclusive nas questões relacionadas à fecundidade e à gestação de filhos (grifo nosso).

No exemplo da mulher instruída, está explícito que os meios

(instrumentos) para a vida livre é que direcionam o sujeito para tantos outros

aspectos da vida, seja no âmbito doméstico ou social. A liberdade não pode,

justamente por isso, estar simplificada a um esquema formal de enunciação de

um axioma como todos são livres e iguais. As condições que fazem a liberdade

existir no dia a dia deste ou daquele sujeito é que concretizam e tornam visível

o desenvolvimento. Não é, portanto, um aumento nominal na renda per capita

ou no PIB que vai indicar, univocamente, o estágio de desenvolvimento de uma

nação.

Retomando este aspecto, tem-se que o critério renda não é suficiente

para indicar o desenvolvimento e, consequentemente, a liberdade. Tal

afirmação, no fundo, é amplamente comprovada justamente com a postulação

das liberdades instrumentais, que compreendem, como visto, muito mais do

que “reursos” ou “renda que dispoem” (SEN, 2010, p. 40).

Sen empreende essa análise ao tratar da liberdade, capacidade e

qualidade de vida, sendo importante inspecionar esses elementos porque

condizem, diretamente, às noções que circundam a liberdade teorizada pelo

autor. A liberdade desde a perspectiva da qualidade de vida é ainda hoje atual

porque, drasticamente, abissais e básicos problemas se mantêm, a despeito de

toda a movimentação do mercado, das tecnologias.

Se, por um lado, esse paradoxo é o próprio ponto de partida do autor

(como tratado no tópico precedente), por outro ele descobre (descortina) as

realidades mais carentes de ação social, institucional, filantrópica. Indo além, é

possível afirmar que, dentro de um cenário tão díspar, é impossível acreditar

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que um cálculo matemático que origina uma cifra chamada renda per capita é

capaz de ler o ambiente social para identificar o grau de liberdade e fornecer,

por si só, todas as condições instrumentais de liberdade. Tal visão

desconsidera elementos como: cultura, ambiente político e social, costumes,

religiões.

Sendo assim,

[...] a perspectiva baseada na liberdade apresenta uma semelhança generica com a preocupacao comum com a ‘qualidade de vida’, a qual também se concentra no modo como as pessoas vivem (talvez mesmo nas escolhas que têm), e não apenas nos recursos ou na renda de que elas dispõem. O enfoque na qualidade de vida e nas liberdades substantivas, e não apenas na renda e na riqueza, pode parecer um afastamento das tradições estabelecidas na economia, e em certo sentido é mesmo [...]. Mas, na verdade, essas abordagens mais amplas estão em sintonia com as linhas de análise que têm sido parte da economia profissional desde o princípio (SEN, 2010, p. 40/41) (grifo nosso).

Portanto, é fundamental tratar da qualidade de vida para além do critério

renda. Disso depende, substancialmente, o reconhecimento do conceito de

liberdade como tratado por Sen. Aliás, desde Aristóteles as capacidades

múltiplas direcionam para a vida feliz e não uma unidade restritiva como a

riqueza. Não obstante, também para os modernos Gregory King, François

Quesnay, Lavoisier, dentre outros, a importância da renda é instrumental e

depende das circunstâncias.

Isso não significa, contudo, a eliminação do critério renda como

instrumento. Tanto a defesa irrestrita do mecanismo de mercado quanto o seu

contrário e prejudicial à ideia de liberdade instrumental. Por um lado, “a

negação de oportunidades de transação, por meio de controles arbitrários,

pode ser, em si, uma fonte de privacao de liberdade” e, por outro, essa

privação pode ser realizada a partir da concepcao dogmática de que “os

mercados expandem a renda, a riqueza e as oportunidades econômicas das

pessoas” (SEN, 2010, p. 42).

Como já mencionado, Sen não prega o ocaso do mecanismo de

mercado, apenas dimensiona suas atividades para o âmbito da

instrumentalidade, o que reduz, com bastante significado, a importância de um

exame restritivo do desenvolvimento. Em uma análise do conceito de liberdade,

o que ora se faz, essa chamada quer indicar, precisamente, que é dúbia –

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senão falaciosa – a tentativa de se pregar: quanto mais renda, mais livre, numa

típica interpretação privatista, utilitarista e economicista.

O que se estabelece, portanto, entre o crescimento econômico e as

liberdades, sejam elas instrumentais ou constitutivas, é inter-relação e

complementaridade, sobretudo à medida que “a contribuicao do crescimento

econômico tem de ser julgada não apenas pelo aumento de rendas privadas,

mas também pela expansão de serviços sociais [...] que o crescimento

econômico pode possibilitar” (SEN, 2010, p. 61).

Tal grau de complementaridade e interdependência entre ambos fatores

é exemplificado com o uso, no Japão, de investimentos humanos e criação de

oportunidades sociais. Cumpre destacar que “o desenvolvimento econômico

do Japão foi claramente muito favorecido pelo desenvolvimento dos recursos

humanos relacionados com as oportunidades sociais que foram geradas”

(SEN, 2010, p. 61/62). O exemplo prático é capaz, mais uma vez, de ligar

crescimento econômico com liberdades instrumentais, indicando, por fim, a

insuficiência do critério renda.

Todavia, essa averiguação do critério renda encaminha-se, em Sen,

para uma distinção também crucial entre as oportunidades criadas pelo sistema

de mercado e o direito das pessoas a realizarem transações e trocas. Este

último aspecto – importante recordar – é uma liberdade instrumental

(facilidades econômicas (2)) ou um direito associado à política de vivência em

sociedade, em nada devedora da benevolência do mercado, como assaz tenta-

se pregar. Portanto, este último argumento [de que o mercado cria

oportunidades] “é totalmente diferente do argumento de que as pessoas têm o

direito de fazer transacoes e trocas” (SEN, 2010, p. 43).

A partir dessas considerações enfatizamos que a perda oriunda da

privação dessa facilidade econômica (o direito de transação e troca) tem

implicações sociais e não apenas econômicas. Dentro do ambiente econômico

ainda prevalece o direito de as pessoas, a partir de convicções não diretamente

ligadas ao mercado, decidir onde trabalhar, em que ramo atuar, etc. O contrário

disso importaria na desconsideração do valor central da própria liberdade. No

fundo, o que está em jogo é a completa desconsideração de valores (a

liberdade é um deles) que se julgou não pertencerem diretamente à economia.

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Isso fez com que o mercado centralizasse todas as determinantes do

desenvolvimento e, em tal restrição, é comum que se considere o aumento do

PIB ou o aumento da renda per capita indicativos suficientes do

desenvolvimento. Sen cita o liberal John Hicks, que assim apresenta a questão:

“os principios liberais [...] nao eram, em primeiro lugar, principios econômicos;

eram uma aplicação à economia de princípios considerados aplicáveis a um

campo bem mais amplo” (apud SEN, 2010, p. 45).

Por essas e outras razões é que, quando se fala em capacidades do

agente e qualidade de vida, o mercado parece negar interesse pela

problemática, sobejamente porque não são critérios técnicos capazes de

indicar – seja nominal ou proporcionalmente – se o desenvolvimento aumentou

ou diminuiu. E é por isso que a análise capacidades do agente e qualidade de

vida acaba se relacionando aos conceitos de mercados e liberdades.

Assim, tanto instrumental quanto constitutiva ou substantivamente, a

liberdade reúne-se em torno de uma unidade que somente em observância de

todos os elementos integradores é capaz de se tornar unívoca. Sen usa clareza

ao indicar que se trata de uma das possíveis visões que podem dimanar da

problemática liberdade versus desenvolvimento. Nao existe, assim, “um criterio

de desenvolvimento único e preciso segundo o qual as diferentes experiências

de desenvolvimento sempre podem ser comparadas e classificadas” (SEN,

2010, p. 52). Segue aduzindo.

Dada a heterogeneidade dos componentes distintos da liberdade, bem como a necessidade de levar em conta as diversas liberdades de diferentes pessoas, frequentemente haverá argumentos em direções contrárias. A motivação que fundamenta a abordagem do ‘desenvolvimento como liberdade’ não consiste em ordenar todos os estados – ou todos os cenários alternativos – em uma ‘ordenacao completa’, e sim em chamar a atenção para aspectos importantes do processo de desenvolvimento, cada qual merecedor de nossa atenção (SEN, 2010, p. 52).

A liberdade é, portanto, um conceito polissêmico cujas determinantes

culturais, religiosas e sociais interferem no processo de unificação conceitual.

Todavia, está ele ciente de que determinados aspectos ligados à liberdade não

podem ser mitigados – ou completamente exterminados – apenas por questões

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de ordem política, religiosa, oriundas da particularidade consuetudinária que se

origina ao redor do mundo através dos séculos.

Uma vez que o papel constitutivo da liberdade relacionado a liberdade

substantiva produz o enriquecimento da vida humana, eis que, não é estrutural

e publicamente defensável que limites de motivação particular sejam preferidos

em detrimento da ordem democrática, dos direitos humanos, da redução da

fome e miséria, dentre outros problemas crassos que ainda persistem (SEN,

2010, p. 55).

A exigência de Sen, porém, é de igual forma cristalina: que os sujeitos

envolvidos nessa tensão entre cultura e liberdade participem das discussões

públicas a esse respeito. Sendo assim, se um modo de vida tradicional tem de

ser sacrificado para que a pessoas saia da pobreza devastadora [...], então as

pessoas diretamente envolvidas que têm de ter a oportunidade de participar da

decisao do que deve ser escolhido” (SEN, 2010, p. 53).

Por ora, a questão dos sujeitos somente se relaciona aos pressupostos

que orbitam ao redor da liberdade, sendo a participação uma exigência da

democracia, ou seja, ainda entendida num sentido genérico e referencial. Aliás,

como já mencionado, a democracia é uma necessidade do próprio

desenvolvimento do mecanismo de mercado (SEN, 2010, p. 45)3.

Existe, portanto, um caráter inarredável entre liberdade,

desenvolvimento econômico e democracia. Esta, enquanto método das

próprias discussões públicas acerca das características, meios e fins da

liberdade, revela, além de tudo, um estágio civilizacional e político maduro, mas

ainda incapaz de percorrer todos os confins do mundo, mesmo no ocidente,

sobretudo porque a pobreza extrema não é apenas um óbice à vida deste ou

daquele indivíduo, mas obstáculo à própria democracia (SEN, 2010).

Sen (2010, p. 207) ensina que

Desenvolver e fortalecer um sistema democrático é um componente essencial do processo de desenvolvimento. A importância da

3 Sen (2010) questiona a capacidade de o autoritarismo produzir crescimento econômico. A pergunta que se faz e: “O autoritarismo realmente funciona bem?” Por mais que a Coreia do Sul, Cingapura e China tenham demonstrado, apenar de seus regimes políticos autoritários, crescimento econômico maior do que alguns Estados menos autoritários (Índia, Costa Rica e Jamaica), bastaria que se recordasse que a liberdade do povo, que se calca na dimensão social e cultural, é muito mais ampla do que o registro do PIB e importa, portanto, na diferença entre análise restritiva e abrangente de desenvolvimento.

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democracia reside, como procuramos mostrar, em três virtudes distintas: (1) sua importância intrínseca, (2) suas contribuições instrumentais e (3) seu papel constitutivo na criação de valores e normas. Nenhuma avaliação da forma de governo democrática pode ser completa sem considerar cada uma dessas virtudes.

De acordo com isso, tanto a liberdade quanto a democracia partem da

necessidade última de distinção entre instrumentalidade e constituição. O

conceito de liberdade – grassado como ponto-chave do desenvolvimento – é,

substancialmente, formado pela extensão cumprida por seus papéis,

instrumental e constitutivamente. O que Sen deixa claro, portanto, é a

iminência do sentido prático, objetivo que a liberdade deve representar.

Mais do que um princípio universal movido desde o esclarecimento

moderno, dizer que o sujeito é livre constitui uma tarefa a ser realizada em

duas frentes: a demarcação do sentido valorativo e normativo da liberdade e o

seu desenvolvimento instrumental, calcado na ideia do como fazer?, sobretudo

porque valores e condições objetivas são pressupostos para argumentar a

necessidade de um sujeito participativo: o pelo quê lutar e a reunião das

capacidades para tanto.

Ainda assim, à medida que tratar dessas condições objetivas de

participação parece também requer a atenção ao conceito de igualdade. Mas,

oportuno, que tal conceito seja analisado, não sem estar ligado às ideias de

Sen e à questão da participação ativa do agente no âmbito do desenvolvimento

sustentável. Inserta no contexto do desenvolvimento, mormente enquanto

oponível à atual forma de atenção às carências humanas, a igualdade obteve

tratos distintos, sobretudo pela diversidade de segmentos, instituições e

ideologias que se propuseram a indicar o quem vem a ser um sujeito e uma

sociedade igual.

1.2 A igualdade como alcance das capacidades

O conceito de igualdade de Sen significa, sobretudo, a manutenção de

uma íntima ligação com a ideia de liberdade. É a deficiência das formas de a

liberdade existir – mormente no tocante ao papel instrumental – que vai

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indicando, circunscrita e concretamente, as diferenças abissais entre as

capacidades de uns e de outros, o que interfere diretamente no âmbito da

igualdade.

Sobre esse aspecto, o trato do conceito de igualdade pode ser muito

bem exposto a partir da análise da privação das capacidades (oportunidades

sociais enquanto liberdade instrumental), já que indica um ponto de partida

díspar e desigual. Mais do que isso, parte do pressuposto, já brevemente

aludido, de que o critério renda é apenas um dos indicativos da privação das

capacidades. 4

Por isso,

[...] a necessidade de alguma forma igualitária para defender uma teoria indica a importância amplamente atribuída à não discriminação, que pode ser vista como motivada pela ideia de que, na ausência desse requisito, uma teoria normativa seria arbitrária e tendenciosa. Parece haver aqui um reconhecimento da necessidade de alguma forma de imparcialidade para a viabilidade de uma teoria (SEN, 2011, p. 327).

Mais do que implicações internas no conjunto dos conceitos de uma

teoria da justiça, a igualdade vai indicando, na medida em que sofre as

alterações inerentes à ideologia que a defende e caracteriza, que se trata

sempre de uma igualdade de algo. Ou seja, a particularização – ou migração

para o campo concreto - do axioma geral do igualitário requer sempre a

pergunta: “igualdade de que?”.

Ainda assim, é necessário estabelecer, com vista à importância da

igualdade e à fundamental característica da capacidade para a vida humana:

“devemos exigir a igualdade de capacidades?” Sen (2011, p. 329) estabelece:

“tenho de dizer que a resposta e nao, e por várias razoes distintas”. Essas

razões que negam um uso comum da igualdade das capacidades entre as

diversas teorias da justiça, com significativa importância para o campo do

desenvolvimento como liberdade, vão delinear uma séria de caracterizações

que tornam a igualdade um conceito incapaz de ser unívoco.

4 O autor esclarece sobre a pertinência do conceito de igualdade nos debates acerca da liberdade e justiça. Mesmo em uma teoria como o utilitarismo, é estabelecida uma reflexão sobre a igualdade: “igualdade de tratamento entre os seres humanos, atribuindo igual importância aos ganhos e às perdas de utilidade de todos, sem excecao” (SEN, 2011, p. 326).

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A primeira oposição de Sen à exigência da igualdade de capacidades é

esta: as capacidades se ligam às oportunidades substantivas e a vantagens

individuais, ao que não se pode atribuir, imediatamente, uma contribuição clara

aos processos de equidade e justica. Isso porque a “capacidade e, de fato,

nada mais do que uma perspectiva em cujos termos as vantagens e

desvantagens de uma pessoa podem ser razoavelmente avaliadas” (SEN,

2011, p. 331)

E segue aduzindo:

A questão central aqui diz respeito às múltiplas dimensões nas quais a igualdade importa, que não são redutíveis à igualdade em um único espaço, seja de vantagem econômica, recursos, utilidades, qualidade de vida ou capacidades. Meu ceticismo em relação a uma compreensão unifocal das exigências da igualdade (nesse caso, aplicada à perspectiva das capacidades) é parte de uma crítica mais ampla de uma visão unifocal de igualdade (SEN, 2011, p. 331).

Essa perspectiva reavalia, portanto, a ideia de “igualdade de que”,

tratando de orientar a discussão para além de uma matriz simples, ou seja, de

cuja resposta indique um único ambiente no qual essa igualdade deva ser

quista e incorporada, mesmo dentro do processo de compreensão do

desenvolvimento como liberdade. A tentativa liga-se à intenção de se pensar a

igualdade “como um ideal social que impulsiona a busca pela superacao das

situações que ameaçam as pessoas, a estabilidade social e o equilíbrio

ambiental” (ZAMBAM, 2012, p. 247).

Em segundo lugar, segue aduzindo Sen (2011, p. 331), “pode haver

outras exigências sobre juízos distributivos, que podem não ser mais bem-

vistas como exigências de igual liberdade geral para diferentes pessoas, em

qualquer sentido claro”. Existem, de acordo com essa linha de pensamento,

variações provocadas, por exemplo, pelo esforço e trabalho pessoal que

tornem a exigência da igualdade um contrassenso, incapaz de produzir

melhorias à ideia de justiça.

Por fim, as duas últimas razões que levam Sen objetar um apego

exclusivo à ideia de igualdade das capacidades são, as diferentes formas de se

definir capacidade e o fato de a igualdade não ser o único valor a ser

considerando por uma teoria da justiça. Ambas as ideias correspondem a um

mesmo eixo interpretativo e que estabelece – se bem que na esteira das

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razões anteriores – a incapacidade de consensos unívocos e unifocais. No

fundo, a capacidade é definida também a partir dos contextos locais (culturais,

políticos, econômicos) e que reduzem um sentido prático de definições gerais.

Todavia, ao negar a concentração exclusiva na igualdade de

capacidades, ou em considerações gerais baseadas na capacidade, Sen não

desqualifica “o papel extremamente significativo das capacidades na ideia de

justica”. Significa que “a busca arrazoada de um elemento muito importante da

justiça social, que não desloque todo o resto, ainda pode ter um papel crucial

no empreendimento de melhorar a justica” (SEN, 2011, p. 333).

Aliás, essa ideia de justiça social, sobretudo, tem relevância para a

aproximação de conceitos como liberdade, desenvolvimento, capacidades e

suas respectivas privações. O contexto da privação das capacidades – que

diretamente se relaciona às oportunidades de se incrementar a renda, o acesso

à cultura, à educação, a sistemas eficientes de saúde e controle epidemiológico

– influi na igualdade desses acessos e não sob um ponto de vista formal, cuja

unidade não se dá justamente pela variação abissal entre os sistemas de

suprimento das carências.

Zambam (2012, p. 247) sintetiza.

A busca pela superação das graves desigualdades inicia pela constatação das diferenças que caracterizam as pessoas. Existe uma ampla variedade de comportamentos, culturas, formas de organização, entre outras, que definem as relações externas entre as pessoas e a sua estrutura de relacionamento externo. Essa constatação é decisiva porque é a razão da qualidade de vida das pessoas e do equilíbrio de suas relações que se evidencia a preocupação com a justiça e se organiza a vida da sociedade.

Tal concepção responde a um cenário que torna a exigência formal de

igualdade das capacidades impraticável. Partir do pressuposto de que a

equidade positiva das capacidades é suficiente e desejável em absoluto

importa, dentre outros, na supressão das características que diferenciam,

drasticamente, os tipos de problemas vividos ao redor do mundo. E, ademais,

considerando a relação íntima entre oportunidades e capacidades, a questão

da igualdade descamba, não raramente, para o critério da renda e sua

importância no contexto das privações e desigualdades.

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A resposta dada por Sen é a mesma daquela dada em relação ao grau

das liberdades: “Essa limitacao [ver a desigualdade como desigualdade de

renda] tem o efeito de contribuir para que se negligenciem outros modos de ver

a desigualdade e a equidade, modos que influenciam de maneira muito mais

abrangente a elaboracao das politicas econômicas” (SEN, 2010, p. 146). Como

regra, é a responsabilização singularizada, polarizada e unívoca da

desigualdade de renda que afeta uma compreensão abrangente dos problemas

que importam em desigualdade.

Daí o porquê de uma privação sistemática das capacidades – meios de

os indivíduos contribuírem para a própria qualidade de vida e para a qualidade

de vida de todos – minar as tentativas de concretização da justiça social. Sem

o atendimento das necessidades básicas as oportunidades de, por exemplo,

prosperar se dizimam e, consequentemente, a desigualdade se constitui, por

fim, como afastamento entre grupos sociais, como fome crônica, como

analfabetismo, como morte prematura pelo débil controle de epidemias. E,

como prova da irredutibilidade do critério abrangente da origem das

desigualdades, populações com rendas maiores, ainda assim, sofrem

desigualdades de ordem racial, de gênero, de orientação sexual, de credo e

ideologia política.

Sobre esse aspecto, a privação das capacidades de se emergir da

pobreza, do racismo, da xenofobia, da intolerância religiosa é alastrada e se

constitui como um desafio plural, que não apenas exige respostas da economia

política. Ainda que o critério renda tenha fundamental importância no tocante à

igualdade, a pobreza é muito maior do que o acesso equânime à condições de

elevação da renda, sobretudo porque para a economia a igualdade de renda

seja a menos possível e desejável (SEN, 2011).

O que está em jogo, sobejamente, é a disparidade nas oportunidades

sociais disponibilizadas e que conduzem – como previsão producente do

mecanismo de mercado – ao anacrônico sistema de convívio entre a alta

tecnologia como braço do capital e a fome, a doença, e a morte endêmica,

cenário este que “denuncia a ocorrencia de injusticas” e, por outro lado, que

torna mais necessário o “debate e aprofundamento sobre a construcao da

justica” (ZAMBAM, 2012, p. 245).

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Esse cenário é avaliado por Sen e Kliksberg (2010) nos termos da

participação social.

A relevância da cidadania e da participação social não é apenas instrumental. Elas são partes integrais daquilo que devemos preservar. Temos de combinar a noção básica de sustentabilidade corretamente defendida por Brundtland, Solow e outros, com uma visão ampla dos seres humanos – uma visão que inclua os agentes cujas liberdades têm valor, não apenas como recipientes reduzidos a meros padrões de vida (SEN; KLIKSBERG, 2010, p. 72).

Ainda assim – em que pese a já instituída pluralidade de contextos que

se cruzam no tema da liberdade e igualdade, a percepção de um

desenvolvimento como liberdade deverá, no dizer de Sen (2010), estar voltado

para a sustentabilidade, às condições ambientais e sociais do uso dos recursos

escassos, das matérias-primas e da tecnologia.

As condições de sustentabilidade, de cunho pessoal e no plano Estatal,

devem também ser pensadas de modo intergeracional. Nesse sentido, refere

Boff (2013, p. 128), que

[...] as políticas voltadas para o desenvolvimento se imbricam nas políticas para a promoção da sustentabilidade intergeracional. Propostas como diversificar a sustentabilidade econômica, por meio de investimentos em estrutura básica, na educação e na qualidade de vida, associadas ao incremento de investimentos em fontes renováveis e alternativas de energia, são meios de se efetivar os direitos sociais, econômicos e difusos, bem como de implementar a cautela e a responsabilidade da atual geração para com as necessidade das futuras gerações.

Em sentido mais restrito, pensar a liberdade, o bem-estar das

populações como objetivos, e os recursos econômicos como meios, atende,

justamente, a uma interpretação ecossistêmica da vida e das necessidades

que ultrapassam a esfera do humano. Aliás, trata-se, muito mais, de atender a

conceitos como liberdade e igualdade com uma relação cruzada com a

economia, aparentemente insensível para as condições de desigualdade e

ausência de oportunidades ao redor do globo.

Dentro desse sentido, a própria pauta da sustentabilidade terá o condão

de reconduzir a ideia de oportunidades e igualdade, sobretudo por conta das

implicações abrangentes decorrentes da reflexão sobre a vida do planeta que,

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muito mais do que apenas significar um trato específico em relação aos

recursos naturais escassos, vai importar a reavaliação das relações sociais, da

moradia nas cidades, do acesso ao trabalho. (SEN, KLIKSBERG, 2010).

1.2.1 Amartya Sen e o desenvolvimento sustentável

Para situar o que Sen entende por desenvolvimento sustentável é

necessário, preliminarmente, compreender tal conceito dentro de seu gênero: a

sustentabilidade. A diferenciação gênero/espécie identifica o grau de

abrangência de um e outro conceito. O desenvolvimento sustentável é, nesse

sentido, a aplicação do conceito de sustentabilidade no âmbito político-

econômico.

Isso porque a noção de sustentabilidade abarca uma gama mais vasta

de ligações e implicações em múltiplas disciplinas, ainda que não haja, no dizer

de Rattner (1999) sequer unanimidade quanto ao próprio conceito de

sustentabilidade, já que este “transcende o exercicio analitico de explicar a

realidade e exige o teste de coerência lógica em aplicações práticas, onde o

discurso e transformado em realidade objetiva” (RATTNER, 1999, p. 233)5.

Para Boff (2012, p. 32) sustentabilidade significa

[...] toda ação destinada a manter as condições energéticas, informacionais, fisíco-quimícas que sustentam todos os seres vivos, especialmente a Terra viva, a comunidade de vida e a vida humana, visando sua continuidade e ainda atender as necessidades da geração presente e das futuras, de tal forma que o capital natural seja mantido e enriquecido em sua capacidade de regeneracao, reproducao e coevolucao”.

Todavia, apesar desse jogo denso de ligações pressuposto no conceito

de sustentabilidade – e da própria dificuldade de reduzir tais aspectos em uma

5 Rattner e ainda mais profundo e estabelece, no nivel conceitual, que a “sustentabilidade também nos remete a uma dimensão temporal pela comparação de características de um dado contexto ecológico e sociocultural no passado, presente e futuro. O primeiro serve como parâmetro de sustentabilidade, enquanto que o último requer a definição do estado desejável da sociedade no futuro” (1999, p. 234).

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noção unívoca – é possível dizer que sustentabilidade é a implicação

necessária entre justiça social, qualidade de vida e meio ambiente (JACOBI,

1999). Os três elementos correspondem à (i) implicação social coletiva da

sustentabilidade, (ii) ao elemento individual de melhoria nas condições

pessoais de vivência e (iii) à preocupação em nível global com o futuro das

espécies (homem e não homem).

Ainda que de forma geral, é possível perceber a imbricação conceitual

desses três elementos em dois aspectos: (i) a imediata relação entre sociedade

e indivíduo e (ii) entre ecologia e desenvolvimento, sobretudo considerando

que as grandes ações em âmbito ambiental são exigidas no nível da produção

de bens e serviços - ou seja, são demandas postas à economia e à política e

que nasceram de forma pontual a partir da bandeira ambientalista, do

“manifesto pela sobrevivencia do planeta, de bichos e plantas ameacados pela

extinção e no Terceiro Mundo, assumiu a forma de defesa da sobrevivência

social dos desvalidos” (JACOBI, 1999, p. 28).

Novamente remontando o aspecto conceitual, é possível afirmar,

portanto, que a noção de sustentabilidade nasce da preocupação ambiental

(biólogos e ecologistas em geral). Assume, então, um status no direito e na

economia, sobretudo após a análise das razões da degradação ambiental, que

Sen (2010) classifica como uma interpretação restritiva da ideia de

desenvolvimento – a identificação sem mediação do desenvolver-se com o

crescimento dos índices econômicos clássicos.

A sustentabilidade - enquanto pensamento mais abrangente sobre as

consequências ecológicas do crescimento econômico - é que coloca a

exigência de uma nova forma de desenvolvimento que foi assumida por Sen.

Portanto, o desenvolvimento sustentável como matéria do direito e da

economia tem suas raízes no problema ambiental (na sustentabilidade em sua

perspectiva ecológica) e visa, nesse sentido, a reduzir uma interpretação

econômica que “prioriza o desenvolvimento econômico em detrimento da

dimensao humana, social e ambiental” (ZAMBAM, 2012, p. 135).

Aliás, essa “dimensao humana, social e ambiental” aludida por Zambam

retoma os três elementos afetos ao conceito geral de sustentabilidade: a

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existência pessoal6, a vida coletiva e a preocupação ecológica global que,

nesse sentido, constituem-se efetivamente como marcas conceituais da

sustentabilidade e que a põe em contato mais direto com o conceito de

desenvolvimento sustentável de Sen.

Daí Sen tomar como ponto de partida o fato de que a exploração

contínua e exagerada dos recursos naturais compromete a saúde do planeta e

a vida das futuras gerações. A economia, por seu turno, é responsável por

grande parte dessa exploração, já que se vale da natureza no processo

produtivo e no beneficiamento de produtos. Disso nasce, sobremaneira, a

necessidade de se pensar os compromissos e responsabilidades da economia

no plano da sustentabilidade. Desenvolvimento sustentável é uma preocupação

de Sen justamente porque reavaliar as implicações do setor na natureza

constitui-se como forma de entender o papel instrumental que a economia terá

de desempenhar.

Do ponto de vista genealógico, o desenvolvimento sustentável é assim

apresentado por Sen:

A ideia de desenvolvimento sustentável surgiu essencialmente da preocupação relacionada à excessiva exploração dos recursos naturais e ambientais. Já no seu início, a discussão sublinhou os limites da atividade econômica imposta pelo ambiente físico, e concluiu que espécies e ecossistemas deveriam ser utilizados de maneira que lhes permitisse renovação indefinida (ZAMBAM, 2012, p. 136).

De um modo bastante preciso, é colocado em foco todo o panorama

aberto pelo próprio Desenvolvimento como liberdade, cuja mentalidade a que a

obra visa responder é, justamente, a mesma que pensa o desenvolvimento

sustentável com um interesse secundário, mormente patrocinado pela ideia de

preservação das condições de exploração dos recursos naturais. Aliás, a

ligação umbilical entre liberdade e desenvolvimento sustentável tem em comum

o cenário de uso irrestrito e imperialista das condutas econômicas e, por outro

lado, o desafio de tratar a liberdade a partir de um sentido coletivo, capaz de

6 Jacobi (1999, p. 41) avalia essa dimensão pessoal (ator concreto) na dinâmica da sustentabilidade, já que “a ideia de sustentabilidade implica na prevalência da premissa de que é preciso estabelecer uma limitação definida nas possibilidades de crescimento e um conjunto de iniciativas que levem em conta a existência de interlocutores e participantes sociais relevantes e ativos através de práticas educativas e de um processo de diálogo informado, o que reforca um sentimento de corresponsabilizacao e de constituicao de valores eticos”.

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atrair a atividade do sujeito para além da redoma dos interesses particulares

(SEN, 2010).

Significa dizer, portanto, que o desenvolvimento sustentável é um

conceito cuja produção discursiva e social é coletiva, emanada da coalizão

estrutural das forças que atuam contra o logicismo do mecanismo de mercado.

Isso vai justificar, mais adiante, a afirmação de um sujeito social e politicamente

ativo, que se conduz a partir de bandeiras coletivas tal como, de fato, é a

sustentabilidade. Por ora, este sujeito tem diante de si um desafio fundamental

enquanto leitura: a degradação ecossistêmica e a aceleração do consumo

(SEN, 2010).

Importa constar, portanto, que o desenvolvimento sustentável está

ligado, também em Sen, à propriedade regenerativa do sistema ecológico

frente ao uso irrestrito dos recursos naturais escassos e parte de um

pressuposto que na visão de Kesselring (2007, p. 115) pode ser assim definido:

“o crescimento econômico nao e, por conseguinte, nenhuma condicao

suficiente para uma melhora na qualidade de vida”. Claramente, tal premissa

possui relação com a ideia da insuficiência do critério PIB/renda per capita,

como já destacado.

No dizer de Zambam (2012, p. 136), “a organizacao da arquitetura da

sociedade, composta por interesses em permanente conflito e, não raras

vezes, contraditórios, necessitada superar concepções e práticas que dificultam

ou desprezam as muitas formas de cooperacao”. Esses interesses particulares

– e o substancial e exclusivo atendimento aos mesmos – está ordenando para

aquela visão do crescimento econômico como suficiente para exprimir,

inclusive, o melhor grau de liberdade e, portanto, são diametralmente opostos a

uma concepção sistêmica e orgânica de desenvolvimento.

Se, então, é grave desconsiderar o crescimento econômico para as

“politicas de desenvolvimento”, o que se forma como nova base epistemológica

para pensar o desenvolvimento é, como segue afirmando Zambam (2012, p.

137), “a necessidade de uma abordagem imparcial, que inclua, alem das

demandas particulares ou de grupos de interesses específicos, a preocupação

com as futuras gerações, o equilíbrio dos recursos ambientais e as

necessidades dos paises, especialmente dos mais pobres”.

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Dentro desse âmbito de reflexão, é preciso aclarar o que esta nova base

epistemológica retém: a superação do sentido teleológico do lucro e da

exploração dos recursos naturais, da mão de obra, da vontade particular

traduzida em consumo. A mudança estrutural do fim, enquanto liberdade,

redefine um modo de pensar e de agir e se constitui como uma formação

coletiva do pensamento da ação social. Sob esse aspecto, teria pouco sentido

discutir o desenvolvimento como liberdade desconsiderando a sustentabilidade

e as crises energéticas, por exemplo.

Todavia, a preocupação com o ecossistema não se reduz a uma

tentativa, interna ao mecanismo de mercado, de manter uma regeneração

utilitária dos recursos naturais, como que mera conservação das condições de

se continuar explorando. O futuro, do ponto de vista sustentável, não condiz a

uma interpretação pragmática do ecológico, mas tem como entendimento

sedimentado um valor moral superior: a qualidade de vida planetária e o futuro

geracional do mundo. É, no dizer de Zambam (2012, p. 139), um “valor moral

substantivo” de matriz “universalista” e, no dizer de Sachs (2002, p. 58), “um

desafio planetário”.

Aliás, dentro dessa mesma ideia, Loureiro (2003, p. 92) esclarece.

O pensamento ambientalista parte da premissa correta de que o mundo é um só, que os problemas sociais, políticos, econômicos e de preservação da natureza não se limitam a fronteiras. A sociedade global exige solidariedade e cooperação sem fronteiras. No entanto, esse aspecto de uma globalização ambiental precisa ser visto com cuidado e por um viés político. O fenômeno da globalização da economia de mercado e a internacionalização dos grandes conglomerados empresariais não apresenta tendência hegemônica na direção de uma globalização ecológica, mas para a consolidação hegemônica de um capitalismo financeiro

Em larga medida, a constatação operada diz respeito diretamente à

questão das dificuldades de se concretizar ações sustentáveis em planos

globais. A “necessidade de uma análise integrada das atividades econômicas,

sociais e políticas, envolvendo uma multiplicidade de instituições e muitas

condições de agente relacionadas de forma interativa”, ao passo que

democratiza e alastra a visão do todo, também se constitui como dificuldade

intrínseca (SEN, 2010, p. 11).

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A comunhão de recursos e núcleos temáticos parece constituir a grande

via metodológica segundo a qual o pensamento da sustentabilidade é feito e as

ações políticas são pautadas. A consciência – traço fundamental para se poder

falar, mais tarde, em agente participativo, mas já agora de possibilidades

concretas dessa unidade metodológica – da relação que estabelece com a

natureza parece exigir uma dupla concepção dos recursos naturais, e que

Zambam (2012, p. 127) assim define: “ao mesmo tempo em que justamente

utiliza esses recursos como meio importantes e indispensáveis para alcançar

seus objetivos, [o homem] tem uma atitude que pode ser caracterizada como

contemplacao, preservacao e responsabilidade”, e tal consciencia e que o

“impede de reduzi-los [os recursos] a simples meios para satisfação de seus

interesses imediatos”.

Oliveira refere que (2012, p. 297)

Em síntese, podemos dizer que o conceito tradicional de sustentabilidade é antropocêntrico e, portanto, dado seu caráter especista, instrumental em relação à natureza, ecossistemas e indivíduos não-humanos. Resumidamente o lema é: sejamos sustentáveis porque isto convém aos nossos interesses, ao nosso bem-estar, a nossa sobrevivência. Em uma variação: sejamos sustentáveis para seguirmos explorando/coisificando a natureza, os animais.

Não é por acaso, assim, que as diretrizes e consensos da ideia de

sustentabilidade e contexto global direcionam-se para uma espécie de agir

ético, pautado, com grande precisão, em toda a gama de constatações até aqui

apresentadas.7

A consciência histórica das origens e rumos traçados pela visão

economicista, limitada, bem como do uso ilimitado dos recursos naturais

escassos, identificam as razões do agir, compreendendo a ação política aqui e

agora como uma resposta a um desenvolvimento progressivo de concepções

não ecossistêmicas (PADILHA, 2002).8

7 Nesse sentido, para Oliveira (2013, p. 49) a “Ética da terra, e por excelencia uma Ética

Ecocêntrica. Está voltada para a coletividade, e não para os indivíduos (ex.: investe contra a extinção de espécies, conquanto não se atenha aos seres singularmente considerados): o todo é maior do que as partes, o conjunto é mais valioso do que as suas partes.” 8 A diferença entre o Antropocentismo e Biocentrismo, se posta no fato de que no primeiro o homem está no centro do universo e utiliza a natureza pensando no bem estar e não existe a

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À medida, portanto, que se percebe a relação entre economia capitalista

e esgotamento dos recursos naturais, torna-se mais clara a razão de se

aproximar a sustentabilidade da ideia de desenvolvimento como liberdade,

ainda que o desenvolvimento econômico não seja, para Sen, prescindível no

contexto da sustentabilidade.

É Zambam quem esclarece.

O desenvolvimento econômico opera, nessa nova perspectiva, como um meio importante para o desenvolvimento humano sustentável. Essa afirmação é decisiva para a fundamentação de uma concepção alternativa, porque existem outros meios, tão importantes quanto este, que efetivamente contribuem para o desenvolvimento global. Sua importância deriva da capacidade de legitimar o valor moral da sustentabilidade (ZAMBAM, 2012, p. 138).

A aproximação entre economia e sustentabilidade – que recobra

diretamente aspectos da necessária recondução de um diálogo ético-

econômico – indica, por um lado, o suprimento de uma necessidade corrente

de alterar o status isolado da economia para o de ciência que mantém relações

com as outras ciências sociais e, por outro, atende a uma exigência bem mais

complexa e nevrálgica: prover a saúde e o bem-estar do planeta.

Ainda que os aspectos relativos à reaproximação da ética e da economia

já tenham sido tratados nos tópicos anteriores, não é demais ou

contraproducente – agora sob a égide sustentável – recobrar um efeito

específico do afastamento entre essas duas estruturas conceituais e que

impacta sobremaneira no quesito vida sustentável: “a paixao infantil” da

economia pelos conceitos abstratos que, no dizer de Piketty (2014, p. 38),

relegam a pesquisa histórica e as outras ciências sociais a um plano

secundário intocado. A sustentabilidade, contudo, requer condutas e ações

políticas específicas e objetivas, ao que se somam os diálogos também

concretos de interpretação e releitura.

É a partir dessa metodologia da sustentabilidade que tem sentido

incorporar a economia enquanto ciência com interesse e responsabilidade

ambiental, ainda que o ecossistema, no dizer de Zambam (2012, p. 143),

preocupação com o valor intrínseco dos outros seres, enquanto que o segundo reconhece o valor intrínseco dos seres vivos além da vida humana.

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“organiza-se a partir de diversos níveis de integração e superação ou

eliminacao de anomalias naturais”, enquanto as formacoes sociais “nao

espelham as mesmas caracteristicas”. Aliás, a abrangencia do discurso

sustentável para as outras ciências sociais visa, justamente, a retificar esse

defeito estrutural que é o mantimento das desigualdades sociais crônicas.

Assim, significa dizer que somente uma intervenção ativa no campo da

sustentabilidade é capaz de fazer surgir correções na ordem social e ambiental.

Isso compreende, dentre outras, posturas e ações políticas e éticas, capazes

de realimentar o desejo de transformação estrutural – sistêmica – dos

ambientes sociais e ecológicos. Tal necessidade explicita, mais uma vez, a

organicidade e interdependência da questão ambiental à social.

Em uma releitura dos critérios de sustentabilidade de Sachs, Zambam

(2012, p. 143) sinaliza

Fundado numa compreensão sistêmica de sociedade e de gerenciamento dos recursos disponíveis, entre os quais devem ser destacados os humanos, os ambientais e os tecnológicos, esse entendimento fundamenta uma relação na qual não existe uma sobreposição de interesses e de vontades, exceto por graves motivos, mas a ação integrada, solidária e cooperativa entre os envolvidos, num processo dinâmico e viável na sua estruturação teórica e operacional (grifo nosso).

Portanto, a partir das concepções correntes acerca do desenvolvimento

sustentável (Sen, Sachs, Capra, dentre outros), é possível apontar

determinantes específicas e metodológicas do combate ao uso indiscriminado

dos recursos naturais, das epidemias crônicas, do sistemático não atendimento

das necessidades humanas básicas e da disparidade no campo das

oportunidades sociais, ou seja, dos problemas ecossistêmicos e sociais.

Tais elementos são estabelecidos não como finalização de um conjunto

de consensos fixos, mas como pano de fundo do debate que o trabalho

pretende levar adiante nos próximos capítulos. Portanto, tem-se que o debate

acerca da sustentabilidade em uma aproximação com a economia e com a

pretensão de incluir como partícipes ativos os cidadãos requer, mais uma vez,

que: a) reconheça os limites estruturais das abordagens simplistas e isoladas;

b) seja um processo democrático e partilhado; c) seja metodologicamente

sistêmico, conduzido por matrizes ecológicas e sociais; d) não se limite às

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hierarquias estabelecidas no plano social e que, a priori, determinam os

fundamentos e o proceder operacional.

Outros elementos podem ser angariados ao longo do trabalho, tal como

a participação social (o agente socialmente ativo) como fundamento

democrático da concretização da sustentabilidade ambiental, social, cultural,

ecológica etc. (SACHS, 2002). Tais aspectos retratam ora pequenos e grandes

avanços obtidos no processo de discussão pública da sustentabilidade, ora

panoramas relidos nos contextos e passíveis de abordagem.

Diante disso, as condições estruturais que tornam possível agir com

vista à sustentabilidade, sobretudo no elemento humano (agentes ou sujeitos),

são aspectos que necessitam ser abordados, justamente à medida que

representam a atuação direta na sociedade e a caracterização do papel de

agente.

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2 DIREITO FUNDAMENTAL AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

NA CF E NAS DECISÕES DO STF DOS ANOS 2013 E 2014

O direito fundamental ao desenvolvimento sustentável é, no atual

contexto constitucional, uma construção interpretativa que une dois tipos de

corroboração: a legal e a jurisprudencial. Posto de outro modo: não há, na

Constituição Brasileira de 1988, uma previsão direta, como por exemplo, o

desenvolvimento sustentável é um direito fundamental de todo e qualquer

cidadão ou da sociedade, de modo que o seu fundamento deve ser buscado a

partir de uma interpretação sistêmica, ou seja, na qual as partes são

compreendidas como pertencentes a um sistema e cujo sentido é produzido

em recurso ao todo.

O método sistêmico pressupõe que o ordenamento jurídico é um todo

unitário e permite escolher o significado da norma que seja coerente com o

conjunto, não de forma isolada, mas com todo o aparato jurídico. Nesse

sentido, a Constituição deve ser interpretada em conjunto com as decisões que

analisam seu sentido.

Sob este aspecto, muitos são os elementos presentes no texto

constitucional de forma não explícita, tal como a própria adesão ao modelo

predominante de desenvolvimento econômico. Significa dizer que o texto

constitucional contém bases não positivas e, por outro lado, que há

normatividade produzível a partir da conjunção de regras, princípios,

fundamentos e objetivos do Estado. Esse é o caso do direito fundamental ao

desenvolvimento sustentável, cuja exigibilidade técnica – se cumpre os

requisitos para, por exemplo, ser exigido judicialmente – não será objeto de

análise.

Diante dessa inexistência positiva, o direito fundamental ao

desenvolvimento sustentável deverá advir como resultado de uma

interpretação sistêmica do artigo 225 da Constituição de 1988 e do contorno

fundamental a ele produzido pelas decisões proferidas pelo Supremo Tribunal

Federal. A primeira ponderação, versará sobre as caracterizações

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fundamentais do direito ao desenvolvimento sustentável e visará ao

estabelecimento da efetiva fundamentação desse direito nas bases escolhidas.

Será exposta, ainda, a caracterização do artigo 225 da Constituição de

1988 como primeiro fundamento do direito fundamental ao desenvolvimento

sustentável, bem como as decisões do STF dentro do mesmo propósito, como

segundo fundamento. Após, serão analisadas as decisões do STF em

contraposição ao marco teórico de Sen, sobretudo de modo a se vislumbrar a

relação que possuem na temática da economia e da proteção ambiental,

denotando desse esforço a vinculação da teoria seniana com os fundamentos

apresentados nas decisões.

2.1 O direito fundamental ao desenvolvimento sustentável

A identificação do caráter fundamental de um direito é, em um primeiro

momento, de ordem jurídico-positiva. Significa que a barreira do positivado foi

transposta e, com isso, a necessidade de se explicar as razões formais pelas

quais um imperativo existente é axiomático: o direito está na Constituição.

Pressupõe, com isso, enquanto ligação imediata dos conceitos de sujeito e

norma, uma mera subsunção (SARLET, 2001).

Todavia, dentro de uma definição não restritiva do que seja um direito

fundamental, esse caráter é uma construção orgânica ou sistêmica, ainda que

permaneça constitucional. Sistêmica no sentido de pertencer ao núcleo do

direito como uma derivação da compreensão do Estado como um organismo

(elementos constitutivos e matéria do regramento), como uma consequência

natural que pertence ao jurídico à medida que outras bases estão aí postas.

No contexto do direito ao desenvolvimento sustentável, essas bases são

o artigo 225 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – em

geral todo o capítulo VI que trata do meio ambiente – e toda a construção

jurisprudencial, em âmbito constitucional (ações constitucionais), que resume

uma série de princípios e metas em torno da relação desenvolvimento e meio

ambiente.

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O que significa dizer, portanto, que uma interpretação sistêmica do

direito constitucional é capaz de fazer derivar o caráter constitucional do direito

ao desenvolvimento sustentável. Se, porventura, parte-se de um contexto pré-

dado de proteção ao meio ambiente, tem-se conjuntamente uma forma

interpretativa na qual o intérprete deve considerar as normas constitucionais

não como isoladas e dispersas, mas como preceitos integrados – evitando-se,

assim, contradições internas no seio da Constituição (SILVA, 2004).

A contradição interna, nesse sentido, seria desconsiderar a eminência

do direito ao desenvolvimento sustentável quando a Constituição lhe outorga

um status constitucional forte, muito bem expresso na complexidade de sujeitos

e bens jurídicos envoltos na previsão do artigo 225, caput, da Carta Maior. Não

obstante, o contexto interpretativo dos tribunais superiores, sobretudo o

Supremo Tribunal Federal, não faz senão ratificar, em larga medida, um tipo de

interpretacao que transcende o elemento “positivo” e estabelece o direito ao

desenvolvimento sustentável como fundamental.

Nesse âmbito, o próprio conceito de desenvolvimento sustentável, já

tratado, é capaz de subsidiar um aporte interpretativo, já que contém um

caráter sistêmico de interpretação de necessidade, recurso escasso, meio

ambiente e futuro geracional da humanidade. Ou seja, “a necessidade de um

modelo alternativo de desenvolvimento, que se pode chamar de ‘sustentável’,

impõe-se diante da necessidade de contemplar a pluralidade de interesses,

preocupacoes e aspiracoes das sociedades” (ZAMBAM, 2012, p. 135). Se,

então, essa necessidade é de caráter eminente, global e convém ao direito

(mais como uma necessidade urgente do que como uma liberalidade), então

não é possível que seja afastada do âmbito constitucional como um direito

fundamental.

Aliás, mais do que um direito fundamental atrelado à personalidade

individual, ao destinatário singular da regra, a fundamentação do direito ao

desenvolvimento sustentável leva em consideração a coletividade total

envolvida no projeto de qualificar, pelo direito, as condições da vida presente e

futura, sobretudo se levada em consideracao a “ambiguidade e ausencia de um

consenso na esfera conceitual e terminológica” do que seja um direito

fundamental (SARLET, 2001, p. 32).

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Portanto, é preciso esclarecer que o apelo ao caráter fundamental da

sustentabilidade visa, como regra, um fim que é, imediatamente, um fim

coletivo (teleologia coletivista). Essa conclusão pode ser buscada na

identificação feita pelo legislador constituinte dos destinatários da previsão

legal de um meio ambiente ecologicamente equilibrado – e também dos

responsáveis pela realização deste projeto. O artigo 225, caput, aqui tomado

tão somente em relação a este aspecto particular, estabelece, tanto em relação

ao direito (para quem) quanto ao dever (por quem), que “todos tem direito ao

meio ambiente ecologicamente equilibrado”. Mas, vai alem: “poder público” e

coletividade” tem o dever de protege-lo e preservá-lo.

Sobre esse aspecto, os sujeitos do direito ao desenvolvimento

sustentável são eminentemente coletivos. A alusão é mais significativa do que

pode parecer: indica que todo um sistema de direitos e prerrogativas – ligado a

todos os indivíduos – atrela-se ao direito à sustentabilidade, reforçando, nesse

ponto, a organicidade e interdependência de direitos. Não há como garantir a

liberdade, a igualdade e direitos constitutivos em geral partindo-se de uma

interpretação constitucional não orgânica, que prescinda da sustentabilidade

como condição ao exercício dos demais direitos.

Isso significaria, outrossim, reduzir o conteúdo político-social da

Constituição e torná-la, simplesmente, uma carta técnica de organização

hierárquica de poderes e estrutura. Dessa conclusao resulta: “nao há dúvida de

que ela deve significar algo alem do direito positivo: ‘um espelho refletindo a

alma nacional’, talvez; uma expressao dos ideais da nação, aspirações a

valores esperados” (MICHELMAN, 2005, p. 132).

Mais do que isso, a sustentação do caráter fundamental do direito ao

desenvolvimento sustentável representa a essencialidade de se tratar do

assunto no âmbito constitucional, aí reproduzindo e desenvolvendo a

preocupação ambiental como uma rede interligada de cooperação e ação

(ZAMBAM, 2012, p. 136).

Do ponto de vista econômico, a discussão acerca de um novo modelo de

desenvolvimento já foi capaz de apresentar o déficit de uma interpretação

restritiva de progresso (SEN, 2010), inclusive de modo a estabelecer critérios

importantes para se perseguir uma ética para o próprio desenvolvimento. Por

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seu turno, a discussão nas ciências naturais sobre o futuro do planeta (das

espécies vivas como um todo) é uma das mais ativas no contexto global de

uma preocupação do tipo universal, e na visão de (LEITE, 2003), sobretudo, ao

ir além do âmbito acadêmico e provocar interações sociais importantes, –

ações de conscientização, protestos e denúncias.

Contudo, o direito, internamente, tem demonstrado uma preocupação

técnica que decorre do reconhecimento do caráter fundamental de uma

garantia constitucional: a exigibilidade perante o Estado - alteração de status –

e o consequente desenvolvimento de ações concretas que visem à realização

desse direito (MICHELMAN, 2005).

Significa dizer que, reconhecido o caráter fundamental, torna-se exigível,

inclusive em recurso às instâncias judiciais, a efetivação desse direito. Essa

alteração de status corresponde a uma mudança paradigmática da

sustentabilidade de princípio do direito ambiental a direito fundamental efetivo,

exigível9. Contudo, o estado, em relação aos sujeitos do direito ao

desenvolvimento sustentável, deve tutelar de forma direta e agir no processo

de consecução e implementação de diretrizes sustentáveis? Além disso, de

que ordem ou dimensão é o direito ao desenvolvimento sustentável?

O problema do caráter fundamental do direito ao desenvolvimento

sustentável desemboca, então, na questão de se o fundamento desse último

direito é o mesmo – e, portanto, com a mesma alocação na terceira dimensão

de direitos – do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado inserido

no artigo 225 da Constituição de 1988. E, se, além disso, a titularidade do

direito é individual ou metaindividual.

Este último aspecto leva em consideração a interdependência dos

direitos fundamentais e, assim, a proximidade do modus da exigibilidade de um

e outro direito: ligação entre as dimensões de direitos e a forma como, em cada

uma, é possível exercer a jurisdição constitucional (SOUZA JUNIOR, 2005).

A análise desses dois aspectos – filiação do direito ao desenvolvimento

sustentável no direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e sujeitos

9 Outra implicação desse reconhecimento do status fundamental do direito ao desenvolvimento sustentável refere-se à atuação judicial e à possibilidade de intervenção do Poder Judiciário no âmbito Executivo. Trata-se, sobremaneira, de um problema de atuacao e “extensao do Judicial”, sobretudo se se considerar uma especie de legislatura judicial que decorre da falta de regulamentação de leis ambientais precisas (LEAL, 2013, p. 217).

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legítimos a exigi-los – poderá ser feita, com maior acuidade e precisão, no

estudo do artigo 225 da Constituição de 1988 e, na sequência, na interpretação

emanada dos tribunais superiores – julgamento das ações constitucionais.

2.1.1 O artigo 225 da Constituição da República Federativa do Brasil

A compreensão do fundamento constitucional do direito ao

desenvolvimento sustentável é sempre sistêmica e reporta, com isso, toda a

ordem democrática do Estado de Direito. Significa, portanto, que os próprios

fundamentos da nação e seus objetivos podem estar dispostos como

justificações do desenvolvimento sustentável.

De um ponto de vista constitucional mais específico, estabelece o artigo 225,

caput, da Constituição brasileira de 1988:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Genericamente, estão aí arrolados os sujeitos destinatários da norma e,

por outro lado, os responsáveis pela realização conjunta do direito versado.

Chama atenção, contudo, a instituição de uma cooperação entre Estado e

sociedade, o que faz transparecer, nitidamente, o caráter compartilhado e não

restritivo da realização do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Todavia, de um ponto de vista mais abrangente, a existência do

dispositivo legal citado traduz, como faz expressamente constar na ADI 3540

que (BRASIL, 2005, p. 11/12), “a consagracao constitucional, em nosso

sistema de direito positivo, de uma das mais expressivas prerrogativas

asseguradas às formacoes sociais contemporâneas”. Nao obstante, como

segue aduzindo, “essa prerrogativa, que se qualifica por seu caráter de

metaindividualidade, consiste no reconhecimento de que todos têm direito ao

meio ambiente ecologicamente equilibrado”.

Portanto, a relacao entre o “todos” e o caráter metaindividual reforça,

substancialmente, as ligações cooperativas como esforços para a perseguição

do ideal de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Por outro lado,

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estabelece a preocupação ambiental como uma matéria global, objeto do

próprio ordenamento jurídico pátrio. Nesse contexto, a tutela ao meio ambiente,

à medida que é considerada terceira dimensão de direitos, está ligada a

aspectos reais da sociabilidade humana.

Bonavides (1993, p. 481) explica.

Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geração tendem a cristalizar-se neste fim de século enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano mesmo [...]. Emergiram eles da reflexão sobre temas referentes ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade (grifo nosso).

A relação que se estabelece entre meio ambiente e humanidade indica,

portanto, que vários aspectos estão ligados à questão ambiental, sendo

fundamentais para a realização dos direitos individuais, difusos e coletivos.

Nessa seara, o “desenvolvimento”, como diz Bonavides (1993), passa a ser

compreendido como integrante do rol de relações com a previsão constitucional

do artigo 225. Notadamente, o direito ao desenvolvimento sustentável é

indissociável de uma previsao do tipo “todos tem direito ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado”.

Claramente, torna-se perceptível a compreensão não individualista do

direito, porque se trata, fundamentalmente, de compreender o desenvolvimento

sustentável em uma perspectiva de direito coletivo, sobretudo se se levar em

consideração o aspecto global do tema e a implicação multiabrangente da

sustentabilidade: afetação econômica, política e social. Na esteira do direito ao

meio ambiente ecologicamente equilibrado, tratar da sustentabilidade na ideia

de desenvolvimento vai pressupor componentes cooperativos, participativos e

que liguem o estágio constitucional (reconhecimento) às práticas sociais que

tendem a realizar essa previsão organicamente sintetizada.

Ainda em relacao à ideia de “coletividade” expressa no próprio caput do

artigo 225 da Constituição de 1988, tem-se que ela se liga a um dos objetivos

fundamentais da nação, disposto no artigo terceiro, inciso segundo da

Constituicao: “garantir o desenvolvimento nacional”. A garantia do

desenvolvimento nacional é, em uma interpretação menos restrita, de ordem

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coletiva, plural e engloba todos os componentes sociais, políticos e econômicos

do tecido social, isto é, o desenvolvimento, entendido como objetivo da nação

pressupõe a ação de todos e que seja para todos.

A isso se liga, sobremaneira, a necessária compreensão da unidade

constitucional, segundo a qual a previsão expressa na Carta Magna funda um

mesmo sentido político ideológico e, nesse sentido, as previsões aí constantes

são coerentes. Com isso, as disposições constitucionais, devem manter, entre

si, estreita coerência e organicidade, sobretudo considerando os objetivos, os

fundamentos e os princípios que inauguram o texto constitucional (MORAES,

2007).

Qual é, contudo, a relação que pode ser estabelecida entre princípios

constitucionais, o artigo 3°, II (desenvolvimento nacional) e o artigo 225, caput,

da Constituição brasileira de 1988 (meio ambiente ecologicamente

equilibrado)? É possível que ambas as estruturas constitucionais possam ser

mediadas pela ideia de desenvolvimento sustentável?

Pode-se, inicialmente, assumir a premissa segundo a qual tanto o

desenvolvimento quanto o meio ambiente são problemas ou questões de

ordem global (SILVA, 2002). Soma-se a isso a ideia de que o próprio artigo 225

da Constituição brasileira de 1988 – em consideração a esse ambiente geral de

preocupação ambiental gerado pela Declaração de Estocolmo sobre Meio

Ambiente (1972) – já tratou de tornar essa temática um assunto nacional, ou

seja, enraizado na cultura jurídica pátria (BRASIL, 2005).

Sobre esse aspecto, há uma ideia de desenvolvimento latente às

próprias preocupações ambientais do legislador constituinte. Mais do que isso,

há uma ligação implícita entre desenvolvimento e meio ambiente, de modo que

não se pode pensar outro modelo para o desenvolvimento nacional senão

aquele pautado no postulado ambiental de protecao ao futuro do planeta: “a

atividade econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios

destinados a tornar efetiva a protecao ao meio ambiente” (BRASIL, 2005, p. 2).

Esse elemento, portanto, atrela o artigo 3°, II da Constituição brasileira

de 1988 ao artigo 225 do mesmo diploma legal: o modelo de desenvolvimento

deve ser sustentável. O desenvolvimento sustentável é um direito

constitucional cujo caráter fundamental assenta-se na representação global da

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necessidade de se preservar a vida presente e futura. Não se trata, portanto,

de mera disposição subjetiva, ligada a um indivíduo concreto mas sim a toda a

coletividade.

A partir desse pressuposto, o artigo 225 da Constituição brasileira de

1988 segue em um sentido mais programático, estabelecendo:

§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade.

Em se tratando de ações a serem tomadas pelo Poder Público, portanto

limitadas à esfera institucional, todas as previsões do parágrafo primeiro podem

ser aplicadas às atividades econômicas que pululam na sociedade civil. O risco

primordial, de ordem coletiva, ligado ao exercício da atividade econômica

estabelece-se sob a ótica do cuidado com o meio ambiente e, portanto,

levando em consideração uma prerrogativa constitucional forte: a

sustentabilidade.

Essa relação entre cuidado com o meio ambiente e exercício da

atividade econômica segue sendo objeto da sequência do artigo 225.

§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei. § 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. § 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma

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da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. § 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais. § 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas (grifo nosso).

Percebe-se que há no texto constitucional uma relação de zelo à

proteção ambiental. E isso de modo a justificar uma proposição que expresse a

harmonia entre atividade econômica e desenvolvimento sustentável, inclusive

impondo condições e exigências à exploração econômica (é exemplo o

parágrafo 2° do artigo 225).

É decorrência estrutural de coerência, nesse contexto, que o progresso

econômico seja limitado por normas de ordem ambiental. Portanto, normas de

desenvolvimento sustentável são limitações ao poder irrestrito do mecanismo

de mercado, sob o fundamento global (ponto de vista geográfico) e universal

(ponto de vista da abrangência teórica do postulado). A disposição

constitucional, nesse sentido – o exemplo é o artigo 225 da Constituição

Brasileira de 1988 – tem dupla significação: sintetiza uma preocupação mais

abrangente, da ordem do mundo da vida e possibilita, no plano jurídico-

constitucional, a realização de medidas para a efetivação do cuidado como o

meio ambiente.

No dizer de Torres (2005, p. 111),

Não há, no art. 225, só um direito subjetivo reconhecido, mas uma determinação objetiva, e não programática, ao ‘Poder Público’, em todas as suas dimensões, sob a forma de autêntico mandamento constitucional, a ser respeitado em todos os seus termos, mormente pelos responsáveis por atividades diretamente vinculadas com afetação a qualquer espécie de bem ambiental.

O que Torres reforça é a já aludida restrição das atividades econômicas

em função da proteção ambiental. Os bens ambientais predominam como

formas ou condições da vida coletiva e o interesse econômico imediato deve,

frente a isso, ser limitado ou, ainda, posto em relação com as exigências do

desenvolvimento sustentável.

No dizer de Gomes (2008, p. 5), essa consciência da necessidade de

harmonização entre desenvolvimento e proteção ambiental remonta todo um

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contexto social e histórico de afirmação da agenda ambiental em setores como

o direito e a política e que, no Brasil, conduziu o legislador constituinte de 1988

à própria redação do artigo 225.

Ou seja,

A Constituição Federal também estabeleceu medidas e providências cabíveis [...] que se destinam a assegurar a efetividade do Meio Ambiente equilibrado, presentes nos incisos de I a VIII do art. 225. A inserção de um capítulo tratando, especificamente, das questões ambientais na Constituição Federal é reflexo, já neste tempo, de uma consciência de preservação, em decorrência dos problemas ambientais emergentes e das pressões populares que se iniciaram a partir da década de 70, com a organização da sociedade civil brasileira (GOMES, 2008, p. 5).

Nesse cenário, podemos inferir que desenvolver-se de forma sustentável

significa, em âmbito geral, um combate planetário ao uso ilimitado dos recursos

naturais e ambientais escassos e, por outro lado, mudança na qualidade de

vida, nos hábitos e na relação pessoal com o meio ambiente.

Significa, portanto, a interiorização pelo texto constitucional de

elementos transnacionais de proteção ao meio ambiente, da titularidade

coletiva desse direito e, sobretudo, conforme alerta Fiorillo (2009), da

compreensão de que o ecossistema não se traduz ou se interpreta somente

por meio da lógica econômica do contrato, da propriedade privada de alguém

em específico.

Refere Fiorillo (2009, p. 100/103):

O art. 225 da Constituição Federal estabelece, [...] que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é bem de uso comum do povo, e essencial ä sadia qualidade de vida. Destarte. [...] Daí poderemos reiterar nossa visão no sentido de que o art. 225 da Constituição, ao estabelecer a existência jurídica de um bem que se estrutura como sendo de uso comum do povo e essencial a qualidade de vida, configura uma nova realidade jurídica, disciplinando bem que não é público, nem, muito mesmo, particular. O povo, portanto, é que exerce a titularidade do bem ambiental

O artigo 225 da Constituição brasileira de 1988 constitui o primeiro pilar

de sustentação do caráter fundamental do direito ao desenvolvimento

sustentável. Está, além disso, conectado a todo o texto constitucional e a sua

interpretação adequada somente é possível considerando-se os demais

aspectos da sustentabilidade presentes, por exemplo, na noção de objetivos da

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nação, nos moldes do desenvolvimento econômico e em todo o capítulo

destinado à proteção ambiental. Ainda assim, contudo, é necessário analisar

como esse conteúdo constitucional é interpretado pelo STF, sobretudo

considerando que o ato de decidir conforme a Constituição é uma leitura e

atualização constante da ideia de proteção ambiental.

2.1.1.1 A abordagem do STF sobre o desenvolvimento sustentável nos anos de 2013 e 2014

O caráter fundamental do desenvolvimento sustentável pode agora ser

examinado, ainda sob a égide da justificação, a partir do âmbito jurisprudencial

– o artigo 225 da Constituição de 1988 foi o primeiro pilar do argumento de que

o modelo sustentável de desenvolvimento encontra raízes na Constituição

enquanto direito fundamental.

No fundo, a relação que se pretende estabelecer é entre os julgados do

STF e uma visão de desenvolvimento que remete à preocupação global com o

meio social, econômico, político e ambiental. Assim, a cadeia jurisprudencial

deverá considerar, para corroborar a pretensão de justificar como fundamental

o direito ao desenvolvimento sustentável, que ao direito importa não só

aspectos jurídico-normativos muito específicos, mas também elementos

relativos à vida em sociedade e ao equilíbrio do meio ambiente.

Para este propósito, e como critério científico, foram analisadas todas as

decisões que envolvam desenvolvimento sustentável e direito fundamental,

produzidas nos anos de 2014 e 2015 produzidas pelo STF, sendo que 17

(dezessete) decisões serviram de suporte as citações diretas, indiretas e

paráfrases, na medida que consideram o desenvolvimento sustentável um

direito fundamental.

Inicialmente, foi utilizado, como marco histórico específico a Ação Direta

de Inconstitucionalidade 3.540, julgada em 2005 pelo Supremo Tribunal

Federal, que mesmo estando fora do critério cientifico adotado, é a decisão que

formou a posição do STF nesse aspecto e vem sendo utilizada e citada em

grande parte dos julgados analisados, medida da importância de sua analise

interpretativa.

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Ainda que outros tantos julgados sejam, de igual forma, capazes de

fornecer uma visão da maneira que o STF decide em relação ao

desenvolvimento sustentável, as decisões selecionadas ganham em clareza e

especificidade, relacionando-se com precisão ao artigo 225 da Constituição

Brasileira de 1988 e ao próprio pensamento de Sen.10

O marco histórico tomado, a Ação Direta de Inconstitucionalidade n.

354011, julgada pelo Supremo Tribunal Federal em 2005 versou – em termos

mais abrangentes e para além dos aspectos processuais comuns às ações

constitucionais – sobre a tensão entre direito ambiental e o exercício da

atividade econômica. A discussão pautou-se no ferimento do artigo 225,

parágrafo 1°, inciso III da Constituição Brasileira de 1988 pela Medida

Provisória 2.166/6712, que previa a possibilidade de alteração ou supressão de

espaços territoriais destinados à preservação ambiental.13

Os dois aspectos fundamentais em torno dos quais girou a decisão -

proteção ao meio ambiente e desenvolvimento de atividades econômicas –

transcenderam a discussão sobre o aspecto formal da inconstitucionalidade e

10 É possível afirmar que entre 2005 e 2014 – lapso este que não será analisado com mais precisão – foram prolatados alguns julgamentos importantes para a temática ora apresentada, vindo a se constituir como provas de que o diálogo sobre o direito ao desenvolvimento sustentável se mantém ininterrupto no cenário dos tribunais superiores. Quando oportunos e necessários, também esses julgamentos serão mencionados de uma forma adjacente, sempre com a pretensão de sedimentar um núcleo teórico estável que mantém a unidade dos julgados. 11 Os elementos processuais constitucionais da ADI 3540/2005 não são objetos imediatos da pesquisa; todavia, tem-se: “trata-se de ação direta que, ajuizada pelo eminente Senhor Procurador-Geral da República, objetiva o reconhecimento da inconstitucionalidade do artigo 1º da Medida Provisória nº 2.166- -67, de 24/08/2001, na parte em que alterou o art. 4º, “caput” e §§ 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º e 7º, da Lei nº 4.771, de 15/09/1965, que instituiu o antigo Código Florestal. Cabe-me observar, no entanto, que sobreveio ao ajuizamento da presente ação direta a edição da Lei nº 12.651, de 25/05/2012, que expressamente revogou os diplomas normativos ora questionados neste processo objetivo de controle abstrato de constitucionalidade, como claramente resulta do seu artigo 83, que assim dispoe: “Art. 83. Revogam-se as Leis nºs 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e suas alterações posteriores, e a Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001.” (grifei) Sendo esse o contexto, entendo configurada, na espécie, hipótese de extinção anômala deste processo de fiscalização concentrada de constitucionalidade em virtude da revogação superveniente tanto da Medida Provisória nº 2.166-67/2001 quanto da Lei nº 4.771/1965” (BRASIL, 2005). 12 “Altera os arts. 1o, 4o, 14, 16 e 44, e acresce dispositivos à Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965, que institui o Código Florestal, bem como altera o art. 10 da Lei no 9.393, de 19 de dezembro de 1996, que dispõe sobre o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR, e dá outras providencias.” 13 O Procurador-Geral da República sustentou em suas razões a inconstitucionalidade da MP 2.166/67 por desatender ao comando legal do artigo 225, §1°, III da Constituição. Segundo arguiu, havia a necessidade de lei regulamentar a alteração ou supressão de espaços territoriais destinados à preservação ambiental, de modo que os órgãos administrativos – como fazia constar a MP – não tinham competência constitucional para deliberar sobre tal ordem.

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representaram uma importante síntese jurídico-constitucional no tocante à

posição do ordenamento jurídico brasileiro frente à questão ambiental já em

2005.

Levando em consideração a relação já estabelecida entre

desenvolvimento como liberdade e os aspectos restritivos da visão econômica

tradicional e dominante (SEN, 2010), a temática abordada pelos ministros do

Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da ADI 3540, tende a

recuperar instâncias globais do elemento ambiental e conduzir a uma

interpretação coerente com o ordenamento jurídico pátrio.

Diante disso, o voto do Ministro-Relator Celso de Mello é esclarecedor,

sobretudo à medida que parte de uma clara concepção da relação que se deve

estabelecer entre desenvolvimento e sustentabilidade.

A ementa do julgado, para o propósito do trabalho, já é esclarecedora.

MEIO AMBIENTE – DIREITO À PRESERVAÇÃO DE SUA INTEGRIDADE (CF ART. 225) – PRERROGATIVA QUALIFICADA POR SEU CARÁTER METAINDIVIDUAL – DIREITO DE TERCEIRA GERAÇÃO (OU DE NOVÍSSIMA DIMENSÃO) – QUE CONSAGRA O POSTULADO DA SOLIDARIEDADE – NECESSIDADE DE IMPEDIR QUE A TRANSGRESSÃO A ESSE DIREITO FAÇA IRROMPER, NO SEIO DA COLETIVIDADE, CONFLITOS INTERGENERACIONAIS – ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS (ART. 225, §1°, III) – ALTERAÇÃO E SUPRESSÃO DO REGIME JURÍDICO A ELES PERTINENTE – MEDIDAS SUJEITAS AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA RESERVA DE LEI – SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE – POSSIBILIDADE DE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, CUMPRIDAS AS EXIGÊNCIAS LEGAIS, AUTORIZAR, LICENCIAR OU PERMITIR OBRAS E/OU ATIVIDADES NOS ESPAÇOS TERRITORAIS PROTEGIDOS, DESDE QUE RESPEITADA, QUANTO A ESTES, A INTEGRIDADE DOS ATRIBUTOS JUSTIFICADORES DO REGIME DE PROTEÇÃO ESPECIAL – RELAÇÕES ENTRE ECONOMIA (CF, ART. 3°, II C/C ART. 170, VI) E ECOLOGIA (CF, ART. 225) – COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS – CRITÉRIOS DE SUPERAÇÃO DESSE ESTADO DE TENSÃO ENTRE VALORES CONSTITUCIONAIS RELEVANTES – OS DIREITOS BÁSICOS DA PESSOA HUMANA E AS SUCESSIVAS GERAÇÕES (FASES OU DIMENSÕES) DE DIREITOS (RTJ 164/158, 160/161) - QUESTÃO DA PRECEDÊNCIA DO DIREITO À PRESERVAÇÃO AO MEIO AMBIENTE – UMA LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL EXPLICITA À ATIVIDADE ECONÔMICA (CF, ART. 170, VI) – DECISÃO NÃO REFERENDADA – CONSEQUENTE INDEFERIMENTO DO PROCEDIMENTO DE MEDIDA CAUTELA (grifo nosso).

A primeira importante referência da decisão é (i) o cenário internacional

de proteção ao meio ambiente e que se liga, em grande medida, às

necessidades globais de uma geração sustentável – resposta à atuação do

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mecanismo de mercado em atenção a uma concepção restritiva (economicista)

de desenvolvimento.

Mais em específico, tais são os aspectos trazidos à discussão por

ocasião do julgamento: (ii) o enquadramento do direito ambiental nas

dimensões de direitos, (ii) o aspecto intergeracional do cuidado com o meio

ambiente, (iii) a agenda global de proteção ao meio ambiente (Declaração de

Estocolmo de 1972) e (iv) a titularidade coletiva do direito ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado.

Importante perceber a relação entre a ADI 3540/2005 e o diagnóstico

feito por Sen (2010) no tocante ao distanciamento entre ética e economia. Os

aspectos versados pela decisão levam em consideração a relação íntima entre

meio ambiente, economia e o âmbito global.

Se, por um lado, o meio ambiente oferece uma “restricao ao direito à

atividade econômica”, como diz Celso de Mello, entao, por outro lado, está-se

replicando o argumento de Sen de que a economia concebida como

crescimento a todo custo deve dar lugar a uma concepção de desenvolvimento

“relacionado, sobretudo, com a melhora da vida que levamos e das liberdades

que desfrutamos”, o que nao pode ocorrer em um meio ambiente

ecologicamente desequilibrado (SEN, 2010, p. 29).

Quando o STF, no julgamento da ADI 3540, (BRASIL, 2005, p. 2) diz

que “a atividade econômica nao pode ser exercida em desarmonia com os

principios destinados a tornar efetiva a protecao ao meio ambiente”, está, do

ponto de vista teórico, explicitando uma concepção de economia muito ligada à

desenvolvida por Sen, ou seja, aquela economia cujos limites ambientais

motivam sua reestruturação a partir de elementos não imediatamente técnicos,

como qualidade de vida, justiça social. Não há espaço, dentro de uma visão

econômica que visa à liberdade, senão para a concepção de que o meio

ambiente equilibrado constituiu um terreno de efetivação dessa liberdade.

Logo, no âmbito do STF, a interpretação desse modelo de economia vai

significar a prolação de decisões limitativas à atividade econômica concebida

nos moldes tradicionais, calcadas na criticada visão restritiva de

desenvolvimento. É nesse sentido que a ADI 3540 tem significação simbólica,

porque consolida um entendimento aberto e multidisciplinar da importância da

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proteção ao meio ambiente frente às atividades do mecanismo de mercado. É,

por outro lado, uma aplicação coesa e estruturante do próprio artigo 225 da

Constituição Brasileira de 1988.

Enquanto marco, portanto, a ADI 3540 atrela os julgamentos posteriores

a uma unidade performativa que caracteriza a forma de decidir, sobretudo de

modo a evitar retrocessos interpretativos na aplicação do conteúdo

constitucional. Contudo, é possível que os julgamentos posteriores

acrescentaram algo de significativo e contenham atualizações de aspectos

relevantes quanto à justificação legal do direito ao desenvolvimento

sustentável.

De um ponto de vista genérico, também os julgamentos prolatados em

2013 e 2014 partem das mesmas bases interpretativas já presentes no

julgamento da ADI 3540/2005: a metaindividualidade dos direitos ligados à

proteção ambiental, a subordinação legal do direito às atividades econômicas

ao direito ao meio ambiente, ou seja, da supremacia do interesse coletivo em

relação às demandas individuais, dentre tantas outras.

Esse conjunto levou o STF, no julgamento do Agravo Regimental

715977 em 18/02/13, de relatoria do Ministro Dias Tofolli, a insistir (BRASIL,

2013a, p. 4) “Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Trata-se de um típico direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão),

que assiste a todo o genero humano”. Tal compreensao do direito ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado em nada difere do posicionamento já

adotado em 2005.

Segue, contudo, o acórdão (BRASIL, 2013a, p. 4/5):

A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a ‘defesa do meio ambiente’ (CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral.

Apesar dos traços comuns com o julgamento da ADI 3540, aqui se

especifica melhor a relação binominal entre economia e sustentabilidade,

inclusive nos termos como expressos na preocupação de Sen (2010). O

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“interesse empresarial” identifica a propensao da economia de elevar-se sobre

o meio ambiente pelo argumento do suprimento das necessidades humanas.

Segundo esse viés de justificação, que, contudo, desde o diagnóstico de Sen

não pode mais ser encarado como absoluto, a sociedade como um todo é

devedora dos avanços proporcionados pela racionalidade econômica e os

“efeitos indesejados” nao passam de precos ou consequencias mais ou menos

inclusas na opção pelo desenvolvimento.

Aliás, essa ideia e retomada por D’Isep (2009, p. 54) quando lembra:

[...] o desenvolvimento sustentável enfatiza a sociabilidade do capitalismo, pois o condiciona a uma visão antropocêntrica. Tanto o ‘ecologismo’ quanto o ‘capitalismo selvagem’ excluem do ordenamento jurídico esta visão (antropocêntrica), que se traduz no homem (social, coletivamente abordado) e sua qualidade de vida.

Uma posição em relação a essa tensão – interesses corporativos do

capitalismo e ecologia – é gerada nas decisões prolatadas pelo STF, momento

em que se vai demonstrando a insustentabilidade de uma tese que relega a um

segundo plano a preocupação com o desenvolvimento sustentável. Nesse

ponto, o fundamento da decisão (ARE 715977) inverte essa lógica e, nesse

sentido, toma partido em relação àquele embate: indica a submissão das

pretensoes econômicas à “defesa do meio ambiente”.

Essa base do decidir é importante e, no fundo, explicita, ao menos no

âmbito do discurso jurídico oficial, um fundamental consenso e consciência

acerca dos papéis destinados ao Estado no tocante à proteção do meio

ambiente. Tal modo de decidir parece ratificar, portanto, o fato de que “os

instrumentos jurídicos de caráter legal e de natureza constitucional objetivam

viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente”, o que e confirmado pelo próprio

ARE 715977. (BRASIL, 2013a, p. 5)

Importante perceber: a constitucionalidade que vincula a decisão legal

tambem vincula a atuacao administrativa: “Nao há discricionariedade do

administrador frente aos direitos consagrados constitucionalmente, sendo,

nesse aspecto, vinculada a atividade administrativa” (BRASIL, 2013b, p. 1),

significando que todo o Estado, ao menos em seu conteúdo burocrático, já

conta com os elementos constitucionais de proteção ao meio ambiente e,

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consequentemente, da anterioridade legal da sustentabilidade em relação à

economia (STF, Agravo de Instrumento AI 805417, julgado em 05/03/2013).

Essa dimensao “administrativa” indica que o caráter fundamental do

direito ao desenvolvimento sustentável é de abrangência democrática, ou seja,

comporta uma leitura e aplicação em setores da sociedade civil e do Estado e,

com isso, não se restringe a uma percepção apenas judiciária. Aliás, a própria

origem constitucional indica essa dimensão abrangente do direito ao

desenvolvimento sustentável, de modo que sua aparição objetiva pode muito

bem ser percebida nas decisões proferidas pelo STF.

Nesse sentido, o próprio STF demonstra a superação daquilo que

Bobbio (1992, p. 25) vai chamar de preocupacoes quanto “a sua natureza e o

seu fundamento, se sao direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos”,

mas parte-se da necessidade iminente de garanti-los. O processo de decidir

pela prevalência do direito ao desenvolvimento sustentável em relação às

prerrogativas econômicas encerra, em grande medida, um posicionamento

mais perene e firme a partir do qual garantias são desenvolvidas.

É frente a esse espírito de garantias aos direitos fundamentais que

segue se posicionando o STF (Recurso Extraordinário n. 673681, julgado em

05/12/2014), sobretudo tendo em vista o típico embate entre forças econômicas

e sustentabilidade. Refere (BRASIL, 2014a, p. 12) que

O princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional [...] representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações.

Reaparece, mais uma vez, o caráter não imediatista da proteção ao

meio ambiente. A consolidação de uma sociedade justa e equilibrada passa,

sobretudo, pela atribuição de importância ao futuro geracional, ou seja, às

gerações que dependerão das condições do planeta para terem vida digna.

O esforço constitucional, nesse sentido, não pode olvidar o problema do

desenvolvimento sustentável, sobremaneira no tocante à conservação das

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condições mínimas de vida para todos. No fundo, não se trata de uma proteção

meramente utilitária do uso dos recursos naturais escassos, mas uma

preocupação com a qualidade de vida em um futuro democrático.

A regência da atividade econômica pelos preceitos fundamentais de

proteção ao meio ambiente – um elemento de justificação reiteradamente

presente nos julgados – aparece como fundamental. O que acaba por recobrar

muitos dos elementos pelos quais, em Sen, há o diagnóstico da separação

entre ética e economia.14

É possível, aliás, atentar novamente para a consciência da

complexidade de uma tensão que verse sobre os interesses econômicos e o

meio ambiente. Daí o posicionamento do STF em relação a esse paradigma

ser fundamental. Isso leva, no julgamento do Recurso Extraordinário 679641,

julgado em 30/10/2014, o STF a repisar, em síntese (BRASIL, 2014b, p. 3/4)

que:

[...] princípios constitucionais da livre iniciativa e da liberdade de comércio interpretados e aplicados em harmonia com o do desenvolvimento social saudável. [...] Princípios constitucionais (art. 225) a) do desenvolvimento sustentável e b) da equidade e responsabilidade intergeracional. Meio ambiente ecologicamente equilibrado: preservação para a geração atual e para as gerações futuras. Desenvolvimento sustentável: crescimento econômico com garantia paralela e superiormente respeitada da saúde da população, cujos direitos devem ser observados em face das necessidades atuais e daquelas previsíveis e a serem prevenidas para garantia e respeito às gerações futuras.

O mesmo posicionamento já constava do julgamento, em 26/03/2014, do

Recurso Extraordinário 700872, ao confrontar meio ambiente e propriedade

privada. De igual forma e antes disso, o Agravo de Instrumento 802389, julgado

em 25/02/2013 já dispunha (BRASIL, 2013c, p. 5) que:

14 Nesse sentido, esclarece Sen (1999, p. 23) que “Pode-se dizer que a importância da abordagem ética diminuiu substancialmente com a evolução da economia moderna. A metodologia da chamada “economia positiva” nao apenas esquivou-se da análise econômica normativa como também teve o efeito de deixar de lado uma variedade de considerações éticas complexas que afetam o comportamento humano real e que, do ponto de vista dos economistas que estudam esse comportamento, são primordialmente fatos e não juízos normativos. Examinando as proporções das ênfases nas publicações da economia moderna, é difícil não notar a aversão às análises normativas profundas e o descaso pela influência das considerações éticas sobre a caracterização do comportamento humano real.

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A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a ‘defesa do meio ambiente’ (CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral. Doutrina. Os instrumentos jurídicos de caráter legal e de natureza constitucional objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente, para que não se alterem as propriedades e os atributos que lhe são inerentes, o que provocaria inaceitável comprometimento da saúde, segurança, cultura, trabalho e bem-estar da população, além de causar graves danos ecológicos ao patrimônio ambiental, considerado este em seu aspecto físico ou natural.

Seguindo o padrão dos julgados até então analisados poder-se-ia aduzir,

como prevalentes, os seguintes elementos: a) prioridade do direito ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado sobre a atividade econômica; b) a

existência de um sistema constitucional de proteção ao meio ambiente; c) a

atuação conjunta do Estado e da sociedade civil na defesa dos direitos

coletivos derivados da proteção ao meio ambiente; d) a normatividade forte do

art. 170 VI e 225 da Constituição; e) a justificação sistêmica (constituição,

códigos e tratados internacionais) do direito fundamental ao desenvolvimento

sustentável, dentre outros.

Além disso, a unidade teórica dos julgados, expressa em todas as

decisões, recobra o que já a ADI 3540/2005 havia tornado consenso,

demonstrando que os princípios constitucionais e doutrinais básicos presentes

em 2005 permanecessem os mesmos. Refere o julgado (BRASIL, 2005, p. 3)

que

O princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações

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Todos esses elementos justificam, ainda hoje, a postulação do caráter

fundamental do direito ao desenvolvimento sustentável. Não há como atender à

prioridade dos direitos ligados à proteção ambiental sobre o interesse

econômico senão pela sua justificação sistêmica, pelo reforço da atuação

conjunta da sociedade, pelo apelo à Constituição, às leis, aos acordos e

tratados internacionais, às próprias decisões do STF como subsídios e

justificações do desenvolvimento econômico sustentável como forma de religar

ética e economia, condições de vida digna e futuro das gerações.

Por um lado, a existência do art. 225 da Constituição denota a

cristalização de muitos dos elementos contemporâneos de proteção ambiental,

da preocupação do legislador em incluir o problema ambiental no rol dos

elementos do Estado. Por outro, os julgados do STF desempenham a tarefa de

atualizar o conteúdo constitucional com as demandas da sociedade, com as

caracterizações doutrinárias do que vem a ser o direito ao desenvolvimento

sustentável e a função do Judiciário nesse processo (STF, ADI 3540/2005).

Se, nesse sentido, e verdade que “o principio do desenvolvimento

sustentável [está...] impregnado de caráter eminentemente constitucional”, da

mesma forma como o “ direito à preservacao do meio ambiente, que traduz

bem de uso comum da generalidade das pessoas, [deve...] ser resguardado

em favor das presentes e futuras geracoes”, entao a importância fundamental

do direito ao desenvolvimento sustentável só pode ser a consequência lógica

do compromisso com essas verdades – as quais foram repisadas em todos os

julgados analisados.

Alem disso, “o meio ambiente nao e incompativel com projetos de

desenvolvimento econômico e social que cuidem de preservá-lo como

patrimônio da humanidade” (BRASIL, 2007, p. 2), de modo que o seu caráter

fundamental não ilide a manutenção dos sistemas de produção de bens e

serviços, conforme fundamentos da Ação Civil Originária n. 876, julgada em

19/12/2007 pelo STF.

Mais do que isso, o direito fundamental ao desenvolvimento sustentável

visa, segundo a linguagem de Sen (1999), a reconciliar as pretensões

econômicas com a estrutura ética que subjaz à sustentabilidade. Desse modo,

pretende viabilizar condições econômicas que se compatibilizem com as

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exigências da proteção ao meio ambiente. Nesse sentido, o direito ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225 da Constituição) e o direito

fundamental ao desenvolvimento sustentável não são senão perspectivas

distintas para a consolidação do mesmo projeto de sustentabilidade.

Nesse escopo, as decisões do STF atuam como justificações efetivas de

toda uma mentalidade que é constitucional, mas também global, de proteção

ambiental. Há aí, portanto, a tradução dos aspectos gerais da proteção ao meio

ambiente – sobretudo diante do contraponto com os interesses decorrentes da

atividade econômica – em normatividade. Se, por si só, a constitucionalidade

não se traduz em legislação, em procedimento administrativo, em políticas

públicas de proteção ao meio ambiente, então o Judiciário desempenha a

tarefa política de democratização dos elementos sustentáveis – a judicialização

da política ou politização do Judiciário (ENGELMANN; CUNHA FILHO, 2013).

Diante desses aspectos, o teor predominante das decisões do STF

aponta para a importância e iminência da proteção ambiental por intermédio do

desenvolvimento econômico sustentável. Significa, portanto, que a atividade

econômica tem finalidades que não podem ser entendidas como incompatíveis

com a proteção ambiental. Uma correta interpretação dos objetivos e

fundamentos do Estado, nesse sentido, tende a aproximar, ainda mais, essas

duas estruturas.

Uma vez que não há a pretensão de abolir o sistema de produção de

bens e serviços, mas a adequação desses procedimentos econômicos a uma

dinâmica de sustentabilidade passaria a viger como forma de conciliar ética e

economia? Ou seja, há, nesse cenário, uma compatibilidade entre o trabalho

político do STF e a pretensão de Sen em conciliar economia e ética?

No escopo de responder aos questionamentos, seguiremos analisando

que Sen propõe que o desenvolvimento como liberdade e a superação da ética

sobre a economia e o desenvolvimento como liberdade devem passar pelo viés

sustentável enquanto preocupação global, e as decisões do STF projetam a

matriz ambiental em contrapartida à relação com a atividade econômica,

buscando a ponderação e harmonização de suas atividades.

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2.2 A teoria de Amartya Sen como fundamentos das decisões do

STF

O cenário formado pela justificação do direito ao desenvolvimento

sustentável – art. 225 da Constituição e as decisões do STF – conduz a um

novo pressuposto: a proposta de Sen – desenvolvimento como liberdade e

superação da dicotomia ética-economia – é compatível com o substrato teórico

da atuação do STF. Assim, diante da constitucionalização da proteção ao meio

ambiente, pressupõe-se que o desenvolvimento seja sustentável e, assim, a

ação no âmbito da liberdade e da consciência perpassa aspectos de efetivação

da norma, alcançáveis através da exteriorização da condição de agente,

justamente o propósito de Sen.

Seguindo essa premissa, é preciso recordar que a conciliação entre

ética e economia visa a estabilizar o princípio da sustentabilidade por meio de

práticas econômicas sustentáveis e, com isso, estender a compreensão do

desenvolvimento para além dos padrões técnicos da economia tradicional, que

é majoritária. A aproximação entre os saberes, é vista por Sen (1999, p. 10) no

sentido de que “[...] a economia, como ela emergiu, pode tonar-se mais

produtiva se der uma atenção maior e mais explícita às considerações éticas

que moldam o comportamento e o juizo humano”.

O desenvolvimento, na visão de Sen, é verificado a partir da liberdade

que produz. Assim, os níveis de mensuração da economia tradicional

(crescimento do PIB, da renda per capita etc.) são parciais e desconsideram

vários elementos sociais, políticos e culturais que compõem o critério de

avaliação do desenvolvimento, englobando igualmente aspectos da liberdade

de seus cidadãos, a qual passa, inevitavelmente, pela compreensão da

importância do meio ambiente.

Nesse contexto importa considerar que o atual interesse pela

sustentabilidade surge dessa tomada de consciencia” e do reconhecimento de

que os discursos sobre desenvolvimento e liberdade devem passar pelo âmbito

sustentável enquanto preocupação global. “O desafio ambiental faz parte de

um problema mais geral [...] nos quais o bem é desfrutado em comum em vez

de separadamente por um só consumidor” (SEN, 2010, p. 343). Portanto,

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afirmar que o direito ao desenvolvimento sustentável é fundamental, expressa

justamente essa consciência.

Por seu turno, as decisões do STF, nesse sentido, podem ser assim

expressas: a proteção ambiental tem prioridade em relação à atividade

econômica e ambos os direitos aí implicados devem ser harmonizados. Desse

modo, a proteção ao meio ambiente pressupõe que o desenvolvimento seja

sustentável e que, dada a ordem constitucional estabelecida, seja um direito

fundamental em que todos os cidadãos são os destinatários da norma.

Quanto aos elementos que aproximam Sen da unidade doutrinária ou

teórica dos julgados, inobstante poderem ser diversos, tais são as estruturas

que, aparentemente, ligam um e outro: a) a iminência do discurso ambiental; b)

a não ruptura completa com o modelo de desenvolvimento econômico; c) a

prevalência dos direitos ligados à proteção ambiental em relação à atividade

econômica e d) a necessidade de interpretar o conteúdo ético da economia.

Em um primeiro momento, a atenção à primeira estrutura (iminência do

discurso ambiental) em Sen parece conduzir ao problema da globalização dos

discursos e, nesse sentido, à alocação do problema ambiental como uma

causa e problema típico do ocidente industrializado (SEN, 1999, p. 18).

Todavia, o apelo às retóricas antiocidente não seria apropriado para tratar das

razões pelas quais se deve, na atualidade, encarar como também estatal o

problema ambiental. Além de que a ideia de que o oriente resistiu à

industrialização já ter sido superada.

Nesse sentido, o argumento de Sen é mais genérico e pode ser assim

formulado: a não atenção ao problema ambiental conduzirá a humanidade ao

colapso energético e comprometerá o futuro (SEN, 2010). Por seu turno, o

argumento do STF, presente nos julgados, parte do mesmo pressuposto: é

necessário garantir as condições de vida digna e desenvolvimento às gerações

futuras.

Genericamente, essa tese também pertence à própria teoria da justiça

de Sen (2011), a qual, justamente focando no elemento concreto de realização

da liberdade – e, portanto, em detrimento das origens conceituais mais

abstratas do elemento justo - passa pela reavaliação dos conceitos de

desenvolvimento e sujeito livre.

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Isso significa – para além do diálogo de Sen com Burke - que a

sustentabilidade, apesar da urgência e importância, é um assunto cujo debate

sempre implicará dissensos e controvérsias, mas que, ainda assim, é um

diálogo iminente (SEN, 2011). Tal razão explica, por outro lado, a reincidência

do tema nas decisões do próprio STF. Mais do que isso, as decisões tomadas

não se formam senão com uma dose de controvérsia e insatisfação.

Ainda assim, a base comum entre o argumento de Sen e dos

argumentos que lastreiam as decisões do STF é verdadeira e encontra

subsídios nos índices de crescimento demográfico, nas dificuldades de acesso

às reservas de recursos naturais, na crescente emissão de poluentes, no uso

desregrado de defensivos agrícolas e no desmatamento. É isso que torna o

desenvolvimento sustentável o “condutor de grande parte da literatura

ambiental” (SEN, 2011, p. 64).

Sob esse aspecto, a aproximação entre sustentabilidade e

desenvolvimento econômico não pretende ser mera análise conjuntural das

razões, do sistema de justificação ou o porquê da degradação (visão descritiva

do problema), mas implica, sustenta Sen (2011, p. 65), uma postura de agente.

A razão profunda de argumentar em favor do desenvolvimento sustentável é

assim exposta por Sen (2011, p. 65): “Nao deveriamos nos preocupar em

preservar – e na medida do possível expandir – as liberdades substantivas

atuais das pessoas ‘sem comprometer a capacidade das futuras geracoes’ de

ter as mesmas – ou até mais – liberdades?”

A pergunta de Sen traduz com clareza a relação entre o marco teórico

das liberdades substantivas e o direito ao desenvolvimento sustentável. Isso

significa que a preservação dos recursos naturais e ambientais escassos não

pretende apenas manter os meios para a manutenção da produção de bens e

serviços, mas garantir tanta ou mais liberdade para as gerações futuras.

Por outro lado, aquilo que em Sen (2010, p. 9) é expresso como uma

contradição da sociedade capitalista, ou seja, a opulência versus a falta de

acesso às liberdades mais básicas (privações), é um ponto de partida

suficiente para situar o diálogo com o mundo e criar, inclusive, acordos e

tratados internacionais que são, em primeiro lugar, consensos em defesa da

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vida. A referência que o STF faz a esses documentos internacionais corrobora

a ideia comum de que a proteção ambiental é uma agenda global.

Afora ser global, essa abordagem é também complexa, porque importa

considerar não só a economia, mas a política, a cultura, a religião e todos os

fatores que incentivam ou desaceleram a busca por liberdade. Contudo, central

para a teoria de Sen é a reavaliação interna da economia, de seus hábitos,

meios e progresso. Em sentido estrito, a economia não é negada

absolutamente, desconsiderada enquanto segue um determinado modelo

econômico, carecendo apenas ser acrisolada (SEN, 1999, p. 23).

Nessa segunda estrutura – a não ruptura com o modelo de

desenvolvimento econômico – também o STF, lastreado pela própria

Constituição, tenta redimir uma economia predatória por meio da harmonização

dos interesses. A atividade econômica, todavia, é reconhecidamente

capitalista, de modo que mesmo a atuação do Estado em relação aos ajustes

econômicos é um agir nos mesmos moldes. Significa, nesse sentido, que

também as decisões proferidas pelo STF não visam negar a estrutura-base do

modelo de desenvolvimento.

Nesse sentido, o protagonismo de Sen em relação às considerações

sobre a liberdade como medida do desenvolvimento é também o protagonismo

não contundente do STF. Essa falta de ataque à estrutura do modelo

predatório de desenvolvimento econômico, contudo, é a marca da não

extrapolação dos limites constitucionais atribuídos ao órgão. O STF está

restringido pela Constituição, e esta, por seu turno, abriga o modelo dominante

de produção de bens e serviços.

Por outro lado, o elemento liberdade, no sentido como está em Sen,

aparece de forma tênue nos julgamentos do STF quando o assunto é a tensão

entre economia e meio ambiente. Isso se dá, contudo, não por um problema de

condução do julgamento ou falta de análise do conteúdo ventilado nas ações,

mas porque compreende a proteção ambiental como um direito de titularidade

coletiva, enquanto a liberdade como marca do desenvolvimento parece referir-

se mais às condições pessoais – individuais, portanto – de vida digna.

Não se pode concluir a partir desses poucos elementos que o STF, no

sistema de julgamentos com base no problema global do meio ambiente, tenha

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mais coesão por tratar, em último caso, a questão da liberdade como uma

causa coletiva e não apenas como uma relação entre condições e liberdade

individual – diálogo que conduziria ao debate entre liberais e comunitaristas. O

que está em jogo, em sentido mais abrangente, é que a base comum, seja em

uma análise coletivista ou individualista, ainda é a do modelo predominante de

desenvolvimento econômico.

Todavia, a relação entre a liberdade em Sen e os direitos coletivos como

predominantes em questões relativas ao meio ambiente pode retornar na

análise da terceira estrutura: a prevalência dos direitos ligados à proteção

ambiental em relação à atividade econômica. Aí estariam, basicamente, noções

de direitos ligados à coletividade e individualidade, respectivamente. Isso

porque a proteção ambiental, conforme posicionamento do STF, objetiva a

tutela coletiva que é, em um sentido genérico, a tutela de toda a humanidade, o

que inclui mesmo as gerações não nascidas.

Por seu turno, a atividade econômica visa ao desenvolvimento

econômico – portanto, não abrangente – e tem como substrato um direito

constitucionalmente inferior ao direito à vida, que é o direito ao acesso aos

bens e serviços não naturais. Em geral, a posição do STF é consistente e

opera desde a lógica constitucional que hierarquiza, mesmo formalmente,

direitos entre si. Sob este aspecto, não deve ser retórica a postulação da

preferência do direito à vida ao direito à propriedade privada, por exemplo.

Portanto, quando está em jogo o confronto entre a atividade econômica

e a proteção ambiental torna-se difícil recorrer somente à tese distintiva entre

direito individual e coletivo. Assim sendo, o recurso àquele primeiro critério –

hierarquia do direito à vida – parece fornecer uma razão mais decisiva quanto à

predominância da proteção ambiental em relação ao direito à atividade

econômica.

Aliás, quanto a esse aspecto – localizar na positivação, com caráter

fundamental, um direito – Sen (1999, p. 65) faz uma importante alusao: “a

concepção de que os direitos não podem ser intrinsecamente importantes está

razoavelmente arraigada na tradicao econômica hoje estabelecida”. Mais do

que isso, e a própria influencia utilitarista, do “welfarismo”, que reduz, segundo

Sen, a importância da ideia de direitos estabelecidos. Mas há outro motivo: “a

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falta de interesse que a economia do bem-estar tem demonstrado por qualquer

etica complexa” (SEN, 1999, p. 66)15.

Tal razão reconduz, assim, a problemática para a questão da

aproximação entre ética e economia. Como Sen (1999, p. 19) destaca, “o

contraste não se dá necessariamente entre o autointeresse, de um lado, e

algum tipo de preocupacao geral por todas as pessoas, de outro.” Assim, a

preocupação em agir de determinada forma que não seja somente a

autointeressada, permeará a noção de que o agir ético necessariamente não

vai ser vinculado ao agir baseado no interesse próprio, mas no dever de

vincular a ação à moralidade, à responsabilidade e à ética, pois vai considerar

outros fatores que não só as motivações pessoais, como no caso o interesse

em preservar para as futuras gerações.

Na visão de Sen, esse aspecto da prevalência da proteção ambiental

sobre os direitos econômicos pode ser reconstruído pela própria ideia de

conciliação entre economia e ética, portanto. Há uma relação muito próxima

entre liberdade, economia e sustentabilidade e a ideia de prevalência torna-se

imbricação ou correspondência: liberdade individual e comprometimento social

(SEN, 2010, p. 343). A distinção, por exemplo, entre direitos de tutela individual

e coletiva vai se tornando menos evidente.

Isso porque a economia baseada na ética é capaz de perceber os riscos

de uma atividade econômica predatória. Essa consciência gera, como

consequência necessária, a tomada de cuidados ambientais que, por sua vez,

ensejarão melhores condições de vida aos cidadãos e, com isso,

proporcionarão mais liberdade.

A aproximação entre ética e economia, argumenta Sen (1999, p. 104)

traz consequência positivas, ainda que não seja uma tarefa fácil. Contudo,

essas dificuldades não ilidem o caráter iminente de uma interpretação

abrangente do desenvolvimento. O que, em relação às decisões do STF, pode

ser chamado de tentativa de harmonização entre economia e proteção

15 Mesmo que não seja objeto aqui analisar a importância ou deficiência da positivação, a ideia de que o direito ao desenvolvimento sustentável obtenha um caráter fundamental, constitucionalmente construído, não visa a criar uma realidade pela via do direito positivo, mas sim institucionalizar um elemento que já faz parte do contexto constitucional brasileiro. Estão aí as decisões do STF como representações da importância e realidade desse discurso.

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ambiental. Em Sen aparece sob a forma da economia e das condições de

liberdade, assim, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, expressado na

Constituição Federal e nas decisões do Tribunal Constitucional Pátrio, é, sem

dúvida, uma condição de liberdade.

A harmonização ou equilíbrio entre ecologia e desenvolvimento

econômico, elemento presente tanto em Sen quanto nas decisões proferidas

pelo STF, pode muito bem ser traduzida na ideia de um direito ao

desenvolvimento sustentável. Este último, enquanto síntese de dois tipos de

pretensões ou interesses, pode significar a recondução da economia tradicional

ao elemento ético, ao mesmo tempo em que, em um sentido prático, importa a

adoção de hábitos econômicos não predatórios, ou seja, revitalização dos

processos de produção de bens e serviços de modo a não prejudicar ou

impedir a proteção ambiental.

Ainda que essa recondução da economia à ética vise, em Sen, a

agregar liberdade aos indivíduos, incrementando as condições pelas quais

trabalham e vivem em sociedade, é uma tarefa que parte do pressuposto liberal

da liberdade individual frente às determinações do mercado, ainda assim o

problema ecológico não está atenuado. Aliás, o desrespeito à proteção

ecológica é uma atitude contraditória mesmo para o capitalismo mais

tradicional (SEN, 1999, p. 94), porque já um raciocínio otimizante (maior lucro

com o menor dano) seria mais bem compatível como a manutenção dos

sistemas econômicos do que uma opção cega pelo lucro a qualquer custo.

Todavia, essa ideia da proteção ambiental como reserva das condições

materiais (os recursos naturais escassos) de produção de bens e serviços é,

ela mesma, também problemática, sobretudo porque desconsidera, a relação

hierárquica entre direito à vida e direito aos bens materiais – essa posição

hierárquica é constitucional e adotada pelas decisões do STF. Mais do que

isso, submete as condições de vida, que dependem da proteção ambiental, ao

desejo latente de preservação das condições do lucro e, nesse sentido,

professa: sem preservar a vida não se preserva o sistema da lucratividade.

Nesse sentido, como refere Derani (2008, p. 63), “a questao ambiental e,

em essência, subversiva, visto que é obrigada a permear e a questionar todo o

procedimento moderno de produção e de relação homem-natureza, estando

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envolvida com o cerne da conflituosidade da sociedade moderna”. Essa

mesma pretensão de crítica é a base da análise feita por Sen (2010), já que a

aproximação entre ética e economia pressupõe, de início, uma avaliação dos

hábitos do mecanismo de mercado em função da proteção ambiental e do

incremento das liberdades individuais.

Assim, tanto em Sen quanto na base teórica das decisões do STF há um

reconhecimento efetivo da necessidade de se desenvolver uma economia

sustentável que se radica, como visto, na iminência da crítica ao capital. A

percepção de que o problema ambiental alude responsabilidades

compartilhadas está presente tanto no marco teórico traçado por Sen quanto

no segundo fundamento (as decisões do STF) que justifica o caráter

fundamental do direito ao desenvolvimento sustentável.

Trata-se de reconhecer o direito ao desenvolvimento sustentável como

fundamental não por razões ainda ligadas à necessidade de manter um

substrato para a produção de bens e serviços, mas pelo fato de que a

sustentabilidade, via de regra, não é somente econômica, mas diz respeito à

vida social, à cultura dos povos e à política dos países, imperativo fundamental

para compreender o porquê de o desenvolvimento sustentável ser

fundamental.

Predita fundamentalidade, produziu legislação vasta, de cunho

constitucional e infraconstitucional, que preocupou-se de forma intensa com a

temática da proteção ambiental, criando-se um verdadeiro microssistema

jurídico-ambiental, de preservação e proteção do meio ambiente considerado

como de vanguarda no mundo.

Porém, em que pesem os avanços legislativos, o país continua incapaz

de conter a destruição ambiental, permeiam a ausência de implementação do

direito fundamental ao desenvolvimento sustentável. O surgimento do

Ministerio Público como defensor dos direitos difusos, notadamente por meio

do inquerito civil e do termo de ajuste de conduta, é um alento contra a

impunidade que em conjunto com a responsabilização de ordem administrativa,

civil e penal pelo dano ambiental se radicam como formas de efetivar esse

direito como fundamental.

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3 A EFETIVAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL COMO

UM DIREITO FUNDAMENTAL

A Constituicao Federal consagrou, em seu art. 225, o direito ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado como um direito fundamental (art. 5º § 2º,

CF) e está intimamente relacionado à dignidade da pessoa humana, um dos

fundamentos do Estado Democrático de Direito brasileiro.

Expressão do princípio da indivisibilidade dos direitos humanos

fundamentais, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado estende

e reforça o significado do direito à vida (art. 5, caput), à saúde (arts. 196 e s.)

além da dignidade da pessoa humana (art. 1, III) para garantir uma vida

saudável e digna de ser vivida, capaz de propiciar o desenvolvimento humano,

antes de mera sobrevivência.

Ao lado desse direito, caminha, obviamente, um dever de protecao, que

se impoe aos vários agentes, públicos e privados, para que atuem de forma a

dar efetividade ao ordenamento. A parte do Estado, há uma vinculacao no

sentido de tornar possivel a concretizacao dos direitos fundamentais e,

primordialmente, os que tocam à dignidade humana.

Pode-se dizer que há uma vinculacao estatal que acumula as posicoes

de agente degradador, quando empreende na construção de obras e divisas,

desconsiderando os bens ambientais, (conivente com a acao depreciadora do

meio ambiente), e omisso na funcao estatal de licenciar e fiscalizar as próprias

acoes. Aquem dessa posicao Estatal, deve ser lembrado que a questao do

ambiente nao denota apenas uma atitude passiva de nao interferencia, tambem

sao necessárias medidas positivas à consecucao da tutela ambiental

adequada.

Logo, o objetivo da proteção do artigo 225 não abarca somente os

elementos naturais (água, ar, solo, flora, fauna), mas também os seus aspectos

artificiais e culturais, incluindo a estética da paisagem natural e o ambiente

construído pelo homem, cuja interação propicie o desenvolvimento equilibrado

da vida em todas as formas. O meio ambiente, representa um bem jurídico

autônomo que resulta da combinação de elementos do ambiente natural e da

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sua relação com a vida humana, o que demanda sentimento e atitude fraterna

de todos ao seu meio. A partir dessas acepções, verificamos que o meio

ambiente, conforme artigo 225 da Constituição Federal de 1988 é um bem de

todos, indistintamente e que sua preservação compete tanto ao poder público

quanto à coletividade.

Dessa forma, a existência da legislação ambiental é esteio para a busca

da efetividade do desenvolvimento sustentável, como respeito à lei e como

punição por condutas em desacordo com a legalidade. Veremos que as leis

existentes guarnecem o meio ambiente e, se cumpridas, são alicerce á

efetivação desse modelo de desenvolvimento; se descumpridas, a punição

pode ter caráter educativo e de eficácia futura.

3.1 A legislação ambiental

O direito ambiental brasileiro está situado entre decisões políticas que

implicam sobretudo na escolha de valores éticos, jurídicos, culturais,

econômicos e sociais que demandam a luta pela própria afirmação. Em 1998,

posteriormente à Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, a Constituição

Federal reservou um capítulo próprio para a proteção ambiental.16

No Estado do Rio Grande do Sul, a Constituição Estadual alicerça os

valores expostos na Constituição Federal e vai além ao erigir a manutenção do

meio ambiente como essencial à qualidade de vida dos seres humanos. No

documento estadual vem assentado que17,

16 Antes de 1988, não havia menção específica à proteção ambiental, enquanto que à atual enumera também, além do capítulo próprio, normas que derivam ao desenvolvimento sustentável, que poderão ser encontradas, por exemplo, nos arts. 5º LXXII, art. 20, incisos II e IV (Bens da União), artigos 21 inciso XIX e XX e 22 incisos IV, XII, XXVI (Competência da União), artigo 23 incisos III, VI, VII, IX e XI (Competências Matérias Comuns), artigos 24 incisos VI, VII e VIII (Competência Legislativa Concorrente), art. 129 inciso III (Funções do Ministério Público), artigo 170 inciso VI (Princípios de Ordem Economica), artigo 174 paragrafo 3º (Atividade Garimperira), artigo 182 (Politica Urbana), artigo 186 inciso II (Função Social da Propriedade Rural), artigo 200 inciso VIII (Atribuições do SUS), artigo 216 (Patrimonio Cultural) e artigo 231 paragrafo 1 (Terras Indigenas). Além disso, a legislação ambiental que as constituições dos 26 Estados Brasileiros, mais o Distrito Federal, instituíram em muitos aspectos, proteção ambiental mais abrangente do que a imposta na Constituição Federal, algumas com riquezas de detalhes. 17 Existe no Rio Grande do Sul, por exemplo, o Bioma-Pampa, cuja biodiversidade é de importância histórica, advinda das tradições dos gaúchos, que deve ser objeto de lei estadual.

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Art. 250. O meio ambiente é bem de uso comum do povo, e a manutenção de seu equilíbrio é essencial à sadia qualidade de vida. § 1.º A tutela do meio ambiente é exercida por todos os órgãos do Estado. § 2.º O causador de poluição ou dano ambiental será responsabilizado e deverá assumir ou ressarcir ao Estado, se for o caso, todos os custos financeiros, imediatos ou futuros, decorrentes do saneamento do dano.

Art. 251. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo, preservá-lo e restaurá-lo para as presentes e futuras gerações, cabendo a todos exigir do Poder Público a adoção de medidas nesse sentido. § 1.º Para assegurar a efetividade desse direito, o Estado desenvolverá ações permanentes de proteção, restauração e fiscalização do meio ambiente, incumbindo-lhe, primordialmente: [...] XIV - promover a adoção de formas alternativas renováveis de energia; XV - estimular a criação de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs); XVI - valorizar e preservar o Pampa Gaúcho, sua cultura, patrimônio genético, diversidade de fauna e vegetação nativa, garantindo-se a denominação de origem.

Dentre as Leis Federais que regulamentam o meio ambiente sob a ótica

do desenvolvimento sustentável, podemos citar a Lei 12.651/2012 (Código

Florestal), a Lei 6.938/81 (Política Nacional do Meio Ambiente), a Lei 7.661/88

(Gerenciamento Costeiro), a Lei 7.802/89 (Lei dos Agrotóxicos), a Lei 8.974/95

(Engenharia Genética), a Lei 9.433/97 (Recursos Hídricos), a Lei 9.605/98 (Lei

dos Crimes Ambientais), a Lei 9.985/00 (Unidades de Conservação), a Lei

11.284/06 (Floresta Pública).

A Lei 6.938/81 que estabeleceu o Sistema Nacional do Meio Ambiente

(SISNAMA), pode ser considerada o marco teórico de influência legal

necessária a outras leis ambientais federais e estaduais. Em sua constituição,

o SISNAMA compreende o Conselho de Governo como órgão maior, o

Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) como órgão consultivo e

deliberativo, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) como órgão central e o

Sobre a valorização e preservação do Bioma-Pampa, afirma Rech (2011, p. 35) “O pampa gaúcho nada mais é do que as pastagens naturais utilizadas para a criação de gado, as quais devem ser conservadas na sua diversidade, garantindo-se, inclusive, a denominação de origem. É, sem dúvida, um patrimônio natural de significado valor histórico, cultural e econômico que nao pode ser descaracterizado.”

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Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis

(IBAMA) como o órgão executivo.18

As partes da Administração que tratam das questões do meio ambiente

no âmbito federal são denominadas órgãos setoriais e, na esfera dos Estados,

de órgãos seccionais, sendo que ao lado destes, existem repartições e

instituições ambientais dos municípios, chamadas de órgãos locais do sistema

do meio ambiente. O sistema busca integrar os órgãos regionais e locais na

execução das regras estabelecidas pelo CONAMA, sendo que a fiscalização

das normas e dos padrões de qualidade ambiental deve ser executada pelo

IBAMA.

A Lei nº. 6.938 de 1981, em seu artigo 4º, inciso I, estabelece que “A

Política Nacional do Meio Ambiente visará: I - à compatibilização do

desenvolvimento econômico social com a preservação da qualidade do meio

ambiente e do equilibrio ecológico”. Nessa linha de pensamento, o que se

pretende com esse dispositivo é a conciliação do desenvolvimento econômico

com o equilíbrio ecológico.

18 Divisão de poderes e funções vem estabelecida pela lei 6.938/81, em seu art. 6º, que assim dispoe: “Os órgaos e entidades da Uniao, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, bem como as fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental, constituirão o Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, assim estruturado: I - órgão superior: o Conselho de Governo, com a função de assessorar o Presidente da República na formulação da política nacional e nas diretrizes governamentais para o meio ambiente e os recursos ambientais; II - órgão consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), com a finalidade de assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo, diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente e os recursos naturais e deliberar, no âmbito de sua competência, sobre normas e padrões compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida; III - órgão central: a Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República, com a finalidade de planejar, coordenar, supervisionar e controlar, como órgão federal, a política nacional e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente; IV - órgãos executores: o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - Instituto Chico Mendes, com a finalidade de executar e fazer executar a política e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente, de acordo com as respectivas competências; V- Órgãos Seccionais: os órgãos ou entidades estaduais responsáveis pela execução de programas, projetos e pelo controle e fiscalização de atividades capazes de provocar a degradação ambiental; VI - Órgãos Locais: os órgãos ou entidades municipais, responsáveis pelo controle e fiscalização dessas atividades, nas suas respectivas jurisdições; § 1º - Os Estados, na esfera de suas competências e nas áreas de sua jurisdição, elaborarão normas supletivas e complementares e padrões relacionados com o meio ambiente, observados os que forem estabelecidos pelo CONAMA.; § 2º Os Municípios, observadas as normas e os padrões federais e estaduais, também poderão elaborar as normas mencionadas no parágrafo anterior.; § 3º Os órgãos central, setoriais, seccionais e locais mencionados neste artigo deverão fornecer os resultados das análises efetuadas e sua fundamentação, quando solicitados por pessoa legitimamente interessada.; § 4º De acordo com a legislação em vigor, é o Poder Executivo autorizado a criar uma Fundação de apoio técnico científico às atividades do IBAMA.

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Matriz também percebida na visão seniana de que o desenvolvimento

econômico deve ser baseado em outros fatores que não somente o seu

autointeresse. Refere Sen (1999, p. 31) que “Tentar fazer todo o possivel para

obter o que gostaríamos pode ser parte da racionalidade, e isso pode incluir o

empenho por objetivos desvinculados do autointeresse, os quais podemos

valorizar e desejar promover.” O afastamento do interesse exclusivamente

individual vem a promover a ação sustentável, percebida também pelo STF, no

julgamento do RE 700872/SC, em 26/03/14, em que a Ministra Rosa Weber

(BRASIL, 2014c, p. 2) refere que

MEIO AMBIENTE - RESERVA EXTRATIVISTA - CONFLITO DE INTERESSE - COLETIVO VERSUS INDIVIDUAL. Ante o estabelecido no artigo 225 da Constituicao Federal, conflito entre os interesses individual e coletivo resolve-se a favor deste último. PROPRIEDADE - MITIGACAO. O direito de propriedade nao se revela absoluto. Está relativizado pela Carta da República - artigos 5o, incisos XXII, XXIII e XXIV, e 184

Nessa visão, o meio ambiente representa um bem jurídico autônomo,

que resulta da combinação de elementos do ambiente natural e da sua relação

com a vida humana. Estes elementos materiais também são bens jurídicos e

podem ser utilizados para fins econômicos, desde que o uso não leve a uma

apropriação individual do meio ambiente como um bem imaterial.

Assim, é possível verificar que a construção dos direitos de terceira

dimensão tende a identificar a existência de valores concernentes a uma

determinada categoria de pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais

prosperando a típica fragmentação individual de seus componentes de maneira

isolada, tal como ocorria em momento pretérito.

Importa acrescentar que os direitos de terceira geração possuem

natureza essencialmente transindividual, porquanto não possuem destinatários

especificados, como os de primeira e segunda geração, abrangendo a

coletividade como um todo, e que transcendem o plano local ou nacional, mas

fazem parte de uma arena global. Preceito referendado pelo Ministro Celso de

Mello, no julgamento do RE 673681/SP, em 05/12/14, quando asseverou

(BRASIL, 2013a, p. 5) que

A preocupacao com a preservacao do meio ambiente – que hoje transcende o plano das presentes geracoes, para tambem atuar em

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favor das geracoes futuras [...] – tem constituido, por isso mesmo, objeto de regulacoes normativas e de proclamacoes juridicas que, ultrapassando a provincia meramente domestica do direito nacional de cada Estado soberano, projetam-se no plano das declaracoes internacionais, que refletem, em sua expressao concreta, o compromisso das Nacoes com o indeclinável respeito a esse direito fundamental que assiste a toda a Humanidade.

São direitos de titularidade difusa ou coletiva, alcançando destinatários

indeterminados ou, ainda, de difícil determinação, mas que contemplam a

humanidade como um todo. Os bens ambientais, tanto os constituídos do

ambiente natural, como os integrantes do ambiente cultural devem ser

considerados como bens de interesse público, sujeitos a um regime jurídico

especial que condiciona as atividades elementares a esse exercício. A

titularidade individual do direito ao meio ambiente não significa que não seja

mais um bem coletivo, mas consagra um direito de exercício metaindividual, de

caráter indivisível, o que repercute em uma atitude pessoal, implicando uma

característica de direito individual.19

19 Nesse sentido, já havia mencionado o Ministro Celso de Mello em outras decisões, que se posicionam fora do critério científico adotado no presente trabalho, [análise das decisões proferidas pelo STF nos anos de 2013 e 2014], mas que serviram de substrato e fundamento destas, e vem sendo citadas corriqueiramente quando do julgamento dos recursos que envolvem matéria ambiental e, mais especificamente, sobre o desenvolvimento sustentável. Portanto, importante, considerá-las no apego teórico do estudo. Ao proferir o voto condutor do julgamento da ADI 1856/RJ, afirmou o Ministro (BRASIL, 2011, p. 21/22) que “Vale referir, Senhor Presidente, neste ponto, ate mesmo em face da justa preocupacao revelada pelos povos e pela comunidade internacional em tema de direitos humanos, que estes, em seu processo de afirmacao e consolidacao, comportam diversos niveis de compreensao e abordagem, que permitem distingui-los em ordens, dimensoes ou fases sucessivas resultantes de sua evolucao histórica. Nesse contexto, e tal como enfatizado por esta Suprema Corte (RTJ 164/158-161), impende destacar, na linha desse processo evolutivo, os direitos de primeira geracao (direitos civis e politicos), que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais, e que realcam o principio da liberdade. Os direitos de segunda geracao (direitos econômicos, sociais e culturais), que de outro lado, identificam-se com as liberdades positivas, reais ou concretas, pondo em relevo, sob tal perspectiva, o principio da igualdade. Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os direitos de terceira geracao (ou de novissima dimensao), que materializam poderes de titularidade coletiva atribuidos, genericamente, e de modo difuso, a todos os integrantes dos agrupamentos sociais, consagram o principio da solidariedade e constituem, por isso mesmo, ao lado dos denominados direitos de quarta geracao (como o direito ao desenvolvimento e o direito à paz), um momento importante no processo de expansao e reconhecimento dos direitos humanos, qualificados estes, enquanto valores fundamentais indisponiveis, como prerrogativas impregnadas de uma natureza essencialmente inexaurivel, [...], que confere particular enfase, dentre os direitos de terceira geracao (ou de novissima dimensao), ao direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado: “Com efeito, um novo pólo juridico de alforria do homem se acrescenta historicamente aos da liberdade e da igualdade. Dotados de altissimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geracao tendem a cristalizar-se neste fim de seculo enquanto direitos que nao se destinam especificamente à protecao dos interesses de um individuo, de um grupo ou de um determinado Estado. Tem primeiro por destinatário o genero humano mesmo, num momento

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Quanto a esse aspecto, no tocante à degradação do meio ambiente, não

há dúvidas de que as consequências geradas são prejudiciais a toda a

humanidade, e sendo o fato global e de efeitos intergeracionais, exsurge a

necessidade de que a solução seja de igual abrangência. Pois, o direito ao

meio ambiente ecologicamente equilibrado apresenta-se como uma forma a

garantir a preservação do meio natural às presentes e futuras gerações,

conforme preceitua o artigo 225 da Constituição da República Federativa do

Brasil de 1988.

Considera-se o desenvolvimento sustentável como um direito

transgeracional, ou seja, ultrapassa as gerações, logo, é plenamente verificável

que os postulados que reclamam a preservação ambiental encontram esteio na

necessidade de se assegurar às futuras gerações os instrumentos

imprescindíveis para o desenvolvimento de suas potencialidades.

Ao julgar a ADI n° 1.856/RJ, em 26/05/11, que tratava da

inconstitucionalidade de Lei 2.895/98 do Estado do Rio de janeiro que permitia

a competicoes entre aves das racas combatentes [rinha de galos], o Ministro

Celso de Mello, estabeleceu os fundamentos do voto que serviram de substrato

ao julgamento do ARE 679641/RS em 30/10/14, em que o Ministro Gilmar

Mendes, utiliza como fundamento da decisão, referindo, (BRASIL, 2014b, p. 3),

que a

Adequacao da arguicao pela correta indicacao de preceitos fundamentais atingidos, a saber, o direito à saúde, direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (arts. 196 e 225 da Constituicao Brasileira) e a busca de desenvolvimento econômico sustentável: principios constitucionais da livre iniciativa e da liberdade de comercio interpretados e aplicados em harmonia com o do desenvolvimento social saudável. [...] preservacao para a geracao atual e para as geracoes futuras [...] Atendimento ao principio da precaucao, acolhido constitucionalmente, harmonizado com os demais principios da ordem social e econômica.

Quando à redação do caput do artigo 225 da Constituiçâo da República

Federativa do Brasil de 1988, refere como “todos”, faz mencao aos já nascidos

(presente geração) e ainda aqueles que estão por nascer (futura geração),

expressivo de sua afirmacao como valor supremo em termos de existencialidade concreta. Os publicistas e juristas já os enumeram com familiaridade, assinalando-lhes o caráter fascinante de coroamento de uma evolucao de trezentos anos na esteira da concretizacao dos direitos fundamentais. Emergiram eles da reflexao sobre temas referentes ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, à comunicacao e ao patrimônio comum da humanidade.”

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cabendo àqueles zelar para que esses tenham à sua disposição, no mínimo, os

recursos naturais que hoje existem.

Assim, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, enquanto direito

dotado de densidade principiológica, apresenta-se como instrumento robusto

para se propiciar o desenvolvimento das múltiplas e complexas capacidades

apresentadas pelas pessoas, tal como elemento alcançado pelo princípio da

dignidade da pessoa humana e seus diversos influxos informadores.

A positivação adotada pela Carta Magna permite que se fale em Estado

de direito ambiental, o que impregna todas as normas que se relacionam ao

vasto leque do domínio normativo da expressão "meio ambiente". Atenta ao

problema da projeção das gerações futuras no que concerne ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado e seguindo o alerta sobre a necessidade de um

comportamento solidário e cooperado, a Constituição Brasileira estabeleceu o

dever de todos defender e preserver o meio ambiente para as presentes e

futuras gerações.

Entretanto, tal previsão obstaculiza-se aos paradigmas dominantes no

direito, na medida em que a construção de um novo sujeito de direito – o

sujeito transgeracional – não limitado espacial e temporalmente, impõe a

vinculação de direitos a um sujeito em parte não nascido, ou seja, implicaria na

imposição constitucional de um dever para com quem ainda não existe.

Deve ser compreendido que o meio ambiente é patrimônio comum da

humanidade, e se insere como sendo uma herança do passado que,

transitando pelo presente, é destinado aos hóspedes futuros do planeta,

devendo, para tanto, estar assegurado. O direito fundamental ao

desenvolvimento sustentável passa a representar, não apenas um ideário de

determinado momento histórico, mas uma norma dotada de eficácia,

imediatamente aplicável e, portanto, reveste-se de um dever moral e jurídico.

Trata-se um poder-dever do cidadão, no sentido que todos possuem o

direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, como essencialidade do

fator humano, bem como, todos possuem o dever de defender e preservar o

meio ambiente no presente, para que possa ser compartilhado e utilizado pelas

gerações futuras. Tecidas assim as diretrizes para o surgimento do sujeito

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abstrato (gerações futuras), que ainda não é vida, mas que será sujeito social

no futuro, e que possui, lá, direito ao meio ambiente sadio.

A consagração do direito ao ambiente em nível fundamental determina

que nenhum agente, público ou privado, pode tratá-lo como um meio para

obtenção de determinado fim, ou como um valor menor, ou indefinido, ou

infinito, [...] Esta previsão concede ao cidadao o direito a um “valor minimo

ambiental” que, para Grimone (2012, p. 117), “Esse minimo, que pode variar de

caso para caso, é uma prestação indispensável que o Estado deve ofertar ao

cidadão com o intuito de resguardar, ainda que de maneira incompleta,

determinado direito fundamental.” E, portanto, pode ser judicialmente exigivel,

pois corresponde à existência de um núcleo essencial do direito fundamental

ao ambiente e à qualidade de vida.

Podemos inferir que o meio ambiente encontra íntima e umbilical relação

com os componentes que cercam o ser humano, os quais são de

imprescindível relevância para a sua existência, sendo, inclusive, insumos para

o desenvolvimento de todas as suas complexas e plurais potencialidades, tal

como instrumento que assegura a materialização do princípio da dignidade da

pessoa humana. (FIORILLO, 2010).

O Ministro Ayres Brito, em seu voto ao analisar a Ação Direta de

Inconstitucionalidade n°. 4.029/AM, salientou que (BRASIL, 2012, p. 39):

E, em materia de meio ambiente, eu tendo a achar que tudo e urgente e tudo e relevante, pela qualificacao que do meio ambiente faz a Constituicao Federal, às expressas, no artigo 225, dizendo que o meio e um direito - ecologicamente equilibrado, claro - de todos, e “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida". Ou seja, o meio ambiente e um conceito hoje geminado com o de saúde pública, saúde de cada individuo, sadia qualidade de vida, diz a Constituicao, e por isso que estou falando de saúde, e hoje todos nós sabemos que ele e imbricado, e conceitualmente geminado com o próprio desenvolvimento. Se antes nos diziamos que o meio ambiente e compativel com o desenvolvimento, hoje nos dizemos, a partir da Constituicao, tecnicamente, que nao pode haver desenvolvimento senao com o meio ambiente ecologicamente equilibrado. A geminacao do conceito me parece de rigor tecnico, porque salta da própria Constituicao Federal. (grifou-se)

Decisão esta de 2012, que serviu de pano de fundo à posição

referendada pelo Ministro Dias Tóffoli ao julgar o AI 802389/MG em 25/02/13,

onde definiu que (BRASIL, 2013c, p. 5/6)

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A ATIVIDADE ECONOMICA NAO PODE SER EXERCIDA EM DESARMONIA COM OS PRINCIPIOS DESTINADOS A TORNAR EFETIVA A PROTECAO AO MEIO AMBIENTE. [...] a invocacao desse postulado, quando ocorrente situacao de conflito entre valores constitucionais relevantes, a uma condicao inafastável, cuja observância nao comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservacao do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras geracoes.

Percebe-se que a fundamentação dos julgados, quando não idênticas,

são complementares, e versam sobremaneira da análise realizada pelo

Tribunal na ADI 3540/05, quando então como acuidade os Minstros

examinaram o tema. É denotável, desta maneira, que a constitucionalização do

meio ambiente no Brasil viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que

concerne, especificamente, às normas de proteção ambiental. Tal fato decorre

da premissa que os robustos cânones e princípios norteadores foram elevados

ao patamar constitucional, assumindo colocação eminente, ao lado das

liberdades públicas e dos direitos fundamentais.

Decorrente de tal fato, produz efeito erga omnes, sendo, portanto,

oponível contra todos, incluindo pessoa física/natural ou jurídica, de direito

público interno ou externo, ou mesmo de direito privado, como também ente

estatal, autarquia, fundação ou sociedade de economia mista. Impera, também,

evidenciar que, como um direito difuso, não subiste a possibilidade de

quantificar quantas são as pessoas atingidas, pois a poluição não afeta tão só

a população local, mas sim toda a humanidade.

Nessa senda, o direito à integridade do meio ambiente substancializa

verdadeira prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, ressoando a expressão

robusta de um poder deferido, não ao indivíduo identificado em sua

singularidade, mas num sentido mais amplo, atribuído à própria coletividade

social.

Assim, com a nova sistemática entabulada pela redação do artigo 225

da Carta Maior, o axioma do direito fundamental ao desenvolvimento

sustentável está atrelando o meio ambiente como vetor da sadia qualidade de

vida, ou seja, manifesta-se na salubridade, precipuamente, ao vincular a

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espécie humana está se tratando do bem-estar e das condições mínimas de

existência.

O poder público possui papel fundamental na consecução desse

objetivo, justamente porque o constituinte determinou uma série de ações e

obrigações estatais na definição de espaços territoriais a serem protegidos, que

para Milaré (2000) são as áreas de proteção especial, áreas de preservação

permanente, as reservas legais e as unidades de proteção.

Explicita melhor Milaré (2000, p. 178/215),

A Constituição da Republica, em seu art. 225, I, II, III e VII, define como dever do Poder Público: a preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais e o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; a preservação da diversidade e integridade do patrimônio genético do pais. Primeiramente, cria-se um direito constitucional fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Como todo direito fundamental, o direito ao ambiente ecologicamente equilibrado é indisponível

E, portanto, a efetividade do direito, estabelecida pela Constituição

Federal, pode ser entendida tanto como eficácia jurídica quanto eficácia social,

como sendo a capacidade (potencial) de uma norma constitucional para

produzir efeitos legais, o que por sua vez, significa o desempenho concreto da

função social do direito e representa a materialização, no mundo dos fatos, dos

preceitos legais, que simboliza a aproximação entre o dever-ser normativo e o

ser da realidade social.

Entrementes, no seio desta realidade socialmente ambientada por

valores, desejos, culturas e atos, reveste-se de grande importância para a

efetividade do desenvolvimento sustentável a pessoa consciente, que possui

papel fundamental em termos de conhecimento e de informação das

consequências da devastação ambiental para o prospecto das gerações

futuras, e quiçá, dessa própria geração.

Segundo Grimone (2012, p. 152),

uma das formas de contribuição do cidadão para o desenvolvimento sustentável é o consumo consciente. O consumidor, atuando de maneira responsável, pode diminuir o desperdício, diminuindo a utilização de recurso naturais como a água, participar do reuso dos materiais através da coleta seletiva, incentivar a agricultura familiar e orgânica, adquirindo produtos da localidade onde vive, e principalmente controlando o impulso de consumir, refletindo mais sobre a real necessidade de se adquirir determinada mercadoria.

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A atuação social, utilizando da condição de agente para desenvolver e

atuar socialmente na profusão do agir sustentável, diante da afirmação de um

sujeito social e politicamente ativo, que se conduz a partir de bandeiras

coletivas, como é o caso da sustentabilidade, no sentido de vislumbrar a leitura

entre a degradação ecossistêmica e a aceleração do consumo (SEN, 2010).

O aparato Estatal e as condições estruturais que tornam possível agir

com vista à sustentabilidade, sobretudo no elemento humano (agentes ou

sujeitos), são aspectos que representam a atuação direta na sociedade e a

caracterização do papel de agente da pessoa humana, e que conforme

Grimone (2012, p. 153/155) através de judicialização da questão ambiental

pode ser efetivada pelo cidadão por meio do direito de petição previsto no

artigo 5º inciso XXXIV da Constituição Federal, utilizando-se dos remédios

legais, como o habeas corpus (artigo 5 LXVIII), o mandado de segurança

(artigo 5, inciso LXIX), o mandado de injunção (artigo 5 LXXI), o habeas data

(artigo 5 LXXII) e a ação popular (artigo 5 LXXIII).

As dificuldades na aplicação das normas jurídicas de defesa ambiental

no Brasil decorrem também de antigos problemas do desempenho dos órgãos

públicos, como a falta de vontade política, o clientelismo, a corrupção, a

preparação profissional deficiente e a falta de estratégias e programas

adequados de implementação legal.

Assim, o grau de efetividade do art. 225 demanda uma densidade

variável, de acordo com os termos linguísticos neles empregados, nos quais a

eficácia diferenciada deixa variar também a intensidade dos deveres do poder

estatal para a sua realização, diante da correlação existente entre direito e

dever que, conforme estabelecido no caput do artigo, constitui uma obrigação

fundamental não autônoma, justamente porque está ligada umbilicalmente ao

direito fundamental de usufruir um meio ambiente equilibrado, formando uma

conexão funcional de complementariedade, adequação e fortalecimento,

exatamente por ser este dever consequência da dimensão objetiva do direito

que pode ser direcionado tanto contra o Estado como contra a sociedade civil

em geral, de forma coletiva ou individual.

O exercício desse dever traz benefícios não apenas para o titular do

direito subjetivo ao ambiente, mas alcança uma dimensão de utilidade geral,

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beneficiando o conjunto dos cidadãos e o Estado, pois, o artigo 225 estatui um

direito de aplicação imediata, pela incidência do artigo 5º § 1º da Constituição

Federal, vinculando desde logo, todas as entidades públicas e privadas, sendo

possível afirmar que a regulamentação posterior através de lei ordinária

representa a densificação da exigência desse direito já previsto

constitucionalmente.20

3.1.1 A judicialização do meio ambiente e os atores processuais

As transformacoes havidas na sociedade contemporânea fizeram

emergir uma nova categoria de interesses ou direitos, os quais passaram a se

localizar entre o público e o privado e a colocar em xeque esta dicotomia. A

multiplicacao dos direitos, a hipercomunicacao digital e a massificacao social

sao algumas das expressoes que rotulam as mudancas sociais, politicas,

econômicas e culturais. Estas modificaram o mundo no seculo que findou,

restando claro nesse periodo o desenvolvimento de corpos sociais

intermediários, cuja finalidade seria atuar resguardando uma coletividade, em

prol de interesses comuns.

Os seus titulares constituem grupos indeterminados e indetermináveis

de pessoas, entre as quais inexiste vinculo juridico ou fático preciso (como os

sindicatos ou em um grupo reduzido de pessoas que tenha adquirido um

determinado bem de consumo bastante raro, quando entao estar-se-á tratando

de direitos coletivos stricto sensu), motivo pelo qual os seus efeitos espraiam-

se pela coletividade. Os direitos difusos sao, enfim, como um feixe ou conjunto

de interesses individuais, de pessoas indetermináveis, unidas por pontos

conexos.

Diante do surgimento desta nova categoria de direitos, localizada entre

as esferas pública e privada, de titularidade difusa ou coletiva, restou muito

clara a inadequacao do direito processual tradicional para a tutela destes

direitos em Juízo, na medida em que os instrumentos ate entao existentes de

20 Segundo a Constituição Federal, o Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) § 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. (grifou-se)

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acesso à Justica nao estavam aptos à tutela dos interesses ou direitos

metaindividuais, onde as tradicionais construcoes juridico-processuais viram-se

em serias dificuldades para captar satisfatoriamente a complexidade

subjacente à imbricacao dos vários interesses convergentes, concorrentes e

contrapostos.

Por um lado, o direito de exigir do Estado a garantia da tutela

jurisdicional, por meio do livre acesso à Justica, e corolário lógico da assuncao

pelo Estado, com exclusividade, da tarefa de julgar. O art. 5º, inc. XXXV, da

Carta Magna de 1988, consagrou o principio da inafastabilidade do controle

jurisdicional, sendo este um pressuposto do Estado Democrático de Direito. De

outro, porem, o surgimento dos direitos metaindividuais demonstrou que, na

realidade, passaram a existir direitos que extrapolam o sistema juridico-

processual posto à disposicao.

Com o surgimento da acao civil pública, a legitimidade para o ingresso

da acao junto ao Poder Judiciário passou a ser concorrente e disjuntiva,

porquanto todos e cada um dos legitimados passou a estar apto a tutelar o

interesse metaindividual de que e co-titular, sem a autorizacao dos demais, nao

havendo a obrigacao de faze-lo em conjunto. O paradoxo hoje existente, no

sentido da democratizacao na defesa destes interesses, propostos pela acao

civil, não vem sendo utilizado pelo cidadão, mas quase que exclusivamente por

um órgão estatal, o Ministério Público.21

Com o advento da Constituicao de 1988, o Ministerio Público adquiriu

nova configuracao institucional, sendo inúmeras as conquistas alcancadas no

sentido de angariar novas atribuicoes à instituicao e novas garantias a seus

membros, que lhes asseguram autonomia funcional e administrativa. Pela nova

roupagem constitucional, passou a ser ente independente, nao vinculado a

qualquer dos poderes estatais, o que se posta, como essencial à funcao

jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem juridica do regime

21 Ação Civil Pública, para Milare (2000, p. 196) regula “as acoes de responsabilidade por danos patrimoniais e morais, causados a bens de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagistico, bem como a qualquer outro direito difuso ou coletivo.” Assim, em razao da natureza do interesse material que ela tutela, ou seja, a acao e pública porque tem como objeto a defesa de bens que compoem o patrimônio social e público, assim como os interesses difusos e coletivos.

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democrático e dos interesses sociais e individuais indisponiveis na busca do

interesse público.

A estruturacao do art. 127 da CF/88, corroborada pelo art. 1° da Lei

Orgânica do Ministerio Público (Lei n° 8.625/93) e pelo art. 1° da Lei Orgânica

do Ministerio Público da Uniao (Lei Complementar n° 75/93). Esse se

apresenta como figura de verdadeiro poder de Estado, constituindo, para

muitos, um quarto poder de Estado. Ao órgao que legisla, ao que executa, ao

que julga, se acrescentaria, o que defende a sociedade e a lei, perante a

justica, mesmo em agindo com parte ex adversa do mesmo Estado que lhe

emprega.

A legitimacao da atuacao do Ministerio Público procede de sua

configuracao teleológica como órgao da sociedade, embora formalmente órgao

estatal. A designacao “parquet” tem origem na Franca, onde os procuradores

do rei ficavam sobre o assoalho da sala de audiências e não sobre o estrado

ao lado do magistrado como acontece atualmente. Do sentido de piso, evoluiu

para designar o Ministério Público, como instituição essencial à justiça, como

uma malha que se estende a todos os ramos do direito, em especial àqueles

de interesse social.

Assim, apresenta-se, como agente-parceiro da consolidacao e

ampliacao dos novos espacos de interlocucao social que surgiram a partir da

consagracao do regime democrático, servindo de canal privilegiado às

demandas que visam à concretizacao dos novos direitos e ao resgate da

cidadania da parcela majoritária da populacao brasileira que vive, ainda, à

margem dos processos politico e econômico. A transformacao por que passou

o Ministerio Público sintonizou-se com a emergencia de nova forma de

expressao da cidadania, que doravante reforcaria a atuacao dos Promotores e

Procuradores de Justica.22

A entidade, de fato, encontra-se à disposicao do cidadao e da

comunidade, e marcante a sua vinculacao às causas comunitárias e à

população em geral, porque o acesso ao Parquet dá-se de forma direta,

22 Promotor e Procurador, se diferenciam, no sentido que o primeiro atua no primeiro grau de jurisdição (o das Varas Cíveis, Criminais e outras, onde atua um Juiz de Direito isoladamente) e o segundo atua no segundo grau de jurisdição (a dos Tribunais, nas Câmaras Cíveis e Criminais, onde estão os Desembargadores).

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informal e sem burocracia. O Ministerio Público assume assim, papel impar de

aglutinador dos interesses da sociedade e desempenhando a funcao

organizada de servir ao povo, labutando pela consagracao fática dos direitos e

garantias previstos no ordenamento constitucional.

Dessa forma, possui legitimidade para sua defesa em juizo, a partir da

injuncao do art. 129, inc. III, da Constituicao Federal, que assim dispoe: “sao

funcoes institucionais do Ministerio Público: [...] promover o inquerito civil e a

acao civil pública, para a protecao do patrimônio público e social, do meio

ambiente e de outros interesses difusos e coletivos” .

Da mesma forma, o art. 14, § 1°, da Lei n° 6.938/81, que erige a Politica

Nacional do Meio Ambiente, referindo expressamente que “o Ministerio Público

da Uniao e dos Estados terá legitimidade para propor acao de responsabilidade

civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente”. Possui, pois a

relevante tarefa de agir judicialmente em defesa dos bens ambientais. Assim,

quando ajuiza acao civil pública, nao encarna um interesse próprio, pois nao e

titular do interesse que defende em juizo, eis que age como substituto

processual, na tutela de um interesse difuso, coletivo ou individual homogeneo.

Alem das acoes e omissoes dos particulares (pessoas fisicas e/ou

pessoas juridicas), ao Ministerio Público incumbe agir no sentido de realizar o

controle da Administracao Pública, visto que muitos danos sao produzidos ao

ambiente atraves da participacao direta ou indireta, ativa ou omissiva do

próprio Estado, em especial na (in) execucao de politicas públicas referentes

ao direito fundamental ambiental. Entretanto, esta legitimidade nao lhe e

exclusiva, mas concorrente relativamente aos entes estatais e paraestatais,

assim como às associacoes que preencham determinados requisitos legais,

conforme dispoe o art. 5º da Lei da Acao Civil Pública.

O objeto da acao civil pública e bastante abrangente, fruto da

combinacao do art. 129, inc. III, da Constituicao Federal com o art. 1° da Lei n°

7.347/85, com a redacao que lhe deu a Lei n° 8.078/90 (Código de Defesa do

Consumidor) e inclui a protecao, dentre outros interesses metaindividuais,

como por exemplo o patrimônio público, do consumidor e do meio ambiente.

Busca o cumprimento de obrigacao de fazer, de nao fazer e/ou à condenacao

em dinheiro. Importa aludir que na acao de cunho ambiental nao se discute,

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necessariamente, a legalidade do ato impugnado causador da degradacao

ambiental que se visa a evitar, fazer cessar e/ou compensar, mas e a

potencialidade de dano que o ato possa trazer aos bens ambientais que servirá

de fundamento para a acao, seu processamento e a respectiva decisao.

Nesse aparato, o Ministerio Público ocupa o papel de maior destaque no

cenário juridico nacional na defesa dos interesses supraindividuais, sendo

responsável pelo ajuizamento da maioria das acoes civis públicas na defesa do

meio ambiente. Infelizmente, e por diversas razoes, dentre as quais se destaca

a ausencia de recursos materiais para a propositura de acoes e ainda a falta de

cultura ativa da primazia do coletivo ao individual, as pessoas e ate as

associacoes de defesa ambiental tem tido pouca atuacao judicial.

Visivelmente, a sociedade nao está preparada e mobilizada para exercer

o seu direito-dever de protecao ao meio ambiente, que acaba sendo exercida

quase que exclusivamente pelo Ministerio Público. Devido a isso, a acao civil

pública consagrou, nao o “público, pessoas ou diferentes atores” mas, o

Ministerio Público, como gestor do papel de autor na defesa dos interesses

difusos e coletivos, historicamente, deixando de lado o exclusivismo das

funcoes de autor no campo criminal e da tarefa de fiscal da lei no terreno civel,

para nesta esfera passar a exercer um mister de magnitude social

Nao e somente na atuacao processual que a instituicao exerce o seu

mister constitucional de protecao ao meio ambiente. Hodiernamente, e

justamente na sua atuacao extrajudicial, exercida atraves do inquerito civil e do

termo de ajuste de conduta, que desempenha sua atividade mais intensa e

efetiva a servico da tutela ambiental. De forma efetiva, pode-se, na via

extrajudicial, obter resultados mais eficazes, nao somente pela celeridade ou

ate imediatidade da solucao, mas tambem pela qualidade da atitude

pretendida, em decorrencia da voluntariedade na sua prestacao.23

23 Neste sentido, Cappelli (2003) elenca as vantagens da atuacao extrajudicial do Ministerio Público na defesa do meio ambiente: a) morosidade no julgamento das demandas – mesmo reconhecendo-se a costumeira complexidade das acoes civis públicas por envolverem a formacao de uma prova altamente tecnica, a qualidade de titulo executivo extrajudicial do compromisso de ajustamento, expressamente prevista em lei e confirmada pela jurisprudencia, confere inegável vantagem à utilizacao do segundo, comparativamente à primeira; b) e ainda preponderante a visao privatista da propriedade, a opcao pelos valores da livre iniciativa e do crescimento econômico em detrimento das questoes ambientais nos arestos que apreciam a materia; c) maior abrangencia do compromisso de ajustamento do que da decisao judicial em face dos reflexos administrativos e criminais; d) menor custo, já que o acesso à Justica e caro

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O inquerito civil, [criado pela Lei n° 7.347/85 - Lei da Acao Civil Pública],

para Morato Leite (2011, p. 351) e uma funcao institucional do Ministerio

Público, sendo este o único dos legitimados à acao civil pública com poder de

instaurar e presidir tambem o inquerito civil. Trata-se da formalizacao de um

expediente pre-processual, administrativo e investigativo, no qual o Ministerio

Público pode promover diligencias, requisitar documentos, informacoes,

exames e pericias, expedir notificacoes, tomar depoimentos, proceder a

vistorias e inspecoes.

Já o termo de ajuste de conduta (TAC) ingressou no universo juridico

com a funcao de solucionar por meio da composicao de forma rápida e

eficiente os conflitos coletivos surgidos no convivio social, porquanto e uma

forma de negociar diretamente com os autores e responsáveis pela reparacao

do dano impondo menos ônus às partes, pelo qual a pessoa reconhece

implicitamente que sua conduta ofende interesse difuso ou coletivo, e assume

a obrigacao de eliminar a ofensa atraves da adequacao de seu comportamento

às exigencias legais. 24

Tal conceito, expressa-se no dizer de Fiorilo (2002, p. 285/287)

Trata-se o instituto de meio de efetivação do pleno acesso á justiça, porquanto se mostra como instrumento de satisfação da tutela dos direitos coletivos, à medida que evita o ingresso em juízo, repelindo os reveses que isso pode significar à efetivação do direito material.[...] Vale lembrar que se trata de um ajuste de conduta, e condutas são previstas em lei, objetivando determinar as que deverão ter um fornecedor infrator. Obviamente, o compromisso feito ao Ministério Público não deve jamais ficar aquém do que diz a lei. Ao contrário, deve regularizar, tornar justo, conforme seus ditames, o proceder do fornecedor, até mesmo porque esse compromisso terá força de título executivo extrajudicial, na hipótese de se descumprimento

Trata-se de um mecanismo de solução pacífica de conflitos, com

natureza jurídica de transação, consistente no estabelecimento de certas

regras de conduta a serem observadas pelo interessado, incluindo a adoção de

medidas destinadas à salvaguarda do interesse difuso atingido. O instrumento, (v.g. custo pericial, honorários advocaticios); e) maior reflexo social da solucao extrajudicial, ao permitir o trato de problemas sob diversas óticas: por ecossistemas e por bacias hidrográficas (promotorias regionais, temáticas e volantes), por assuntos (permitindo estabelecer prioridades, bem como a realizacao de audiencia públicas e a intervencao da comunidade, o que resultará na obtencao de decisoes consensuais e, consequentemente, maior efetividade do trabalho). 24 Segundo Fiorilo (2002, p. 285), “Por ocasiao do inquerito civil, poderá ser firmado compromisso de ajustamento de conduta, conforme preleciona o parágrafo 6 do art. 5 da Lei 7.347/85.”

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assim, pode ser conceituado como um documento escrito contendo a

promessa de adequar certo procedimento a um padrao de comportamento

adotado, sob pena de severas consequencias, eis que deve contemplar a

totalidade da recomposicao, utilizando-se do sistema de obrigacoes de nao

fazer, fazer e condenacao em dinheiro, como preve o art. 3º da Lei 7.347/85.

O termo de ajuste de conduta tem destacada importância na tutela do

meio ambiente, porquanto instrumento intimamente ligado a um dos principios

basilares do Direito Ambiental, qual seja o principio da prevencao, apto a

proteger o bem ambiental quando ainda na iminencia de ser degradado, muito,

devido à sua qualidade de contornar a morosidade dos processos judiciais,

principalmente daqueles que envolvem causas ambientais, ante à

infungibilidade dos bens ambientais. Assim, diante da funcao preventiva e

inibitória da Acao Civil Pública e do Inquerito civil, a atuacao extraprocessual do

Ministerio Público busca a implementacao do principio ambiental da prevencao

e, em última análise, a concretizacao do direito constitucionalmente previsto ao

meio ambiente sadio e equilibrado.

Dessa forma, no momento em que a Constituição Federal de 1988

previu, de forma expressa e em capítulo próprio, que todos têm direito ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado, concedeu não somente o status

constitucional, mas também o de direito fundamental, categoria que se reveste

de proteção absoluta, encontrando-se imune até mesmo ao poder constituinte

derivado e que, in casu, encontra-se intimamente ligado ao Princípio da

Dignidade da Pessoa Humana, vetor de todo o ordenamento jurídico

constitucional.

Porém, não basta a previsão abstrata dos direitos fundamentais no texto

constitucional, sendo imperioso sua concretização. Enquanto no plano jurídico

há uma crescente normatização da matéria ambiental em nível

infraconstitucional, inclusive no âmbito criminal, no plano fático, há uma

crescente degradação e devastação da natureza, oriundas principalmente do

aumento dos novos meios e novas tecnologias de produção, aliadas ao

consumismo desenfreado.

Proeminente a atuação extrajudicial do Ministério Público, notadamente

por meio do inquérito civil e do termo de ajuste de conduta, como forma ágil e

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eficiente de proteger o meio ambiente, evitando-se a morosidade das

demandas judiciais. A efetivação do direito fundamental ao meio ambiente

sadio e equilibrado depende dos instrumentos de salvaguarda dos recursos

ambientais com assento constitucional e em legislação infraconstitucional.

Sem menosprezo à tutela processual do meio ambiente, a qual se

mostra mais efetiva quando o dano ambiental já se encontra consumado, e

bem por isso, tem-se que são as formas extraprocessuais e preventivas, ainda

quando devam surtir efeitos a longo prazo, caso da educação ambiental,

aquelas que realmente podem fazer a diferença no que tange à mudança de

rumo a ser adotada pela humanidade em relação ao meio ambiente.

Em conformidade com a visão de mundo ecocêntrica25, o homem está

inserido no meio ambiente, dele também fazendo parte, motivo pelo qual para

que haja efetividade ao direito fundamental e ao princípio fundamental referido,

há que reconhecer a ligação e interação do homem com o meio ambiente e

que este seja ecologicamente equilibrado, a fim de propiciar o bem-estar

necessário.

A exigência de conscientização e a adoção de medidas sistêmicas de

tutela ambiental guardam próxima relação com a atual e futura qualidade de

vida no planeta. É fundamental a revelação de uma nova ética pessoal e

comunitária, dotada de cidadania ambiental consciente e participativa no

combate à visão fracionada e meramente utilitarista do meio ambiente, a fim de

transformar a realidade insustentável vigente e construir caminhos para

integração ecológica. No mundo da vida, a harmonia entre desenvolvimento e

preservação do meio ambiente não é uma tarefa singela, porém também não

deve ser uma utopia.

3.1.1.1 O descumprimento da legislação e a responsabilidade por dano ambiental

A propriedade privada não é mais um direito absoluto, vez que

obrigatoriamente deve respeitar sua função social (artigo 5º, XXIII, Constituição

Federal) e, no caso da propriedade privada rural, deve respeitar, inclusive, sua

25 O ecocentrismo, segundo (DEVALL, 2001) “afasta o homem do centro do universo e inclui a imagem de um ambiente completo e relacional”. Assim, o ambiente passa a ser considerado em seu todo, no qual o homem é parte integrante.

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função ambiental, que compreende a utilização adequada dos recursos

naturais e preservação do meio ambiente (artigo 186, II, Constituição Federal).

Podemos entender que todo aquele que optar pela exploração

econômica de determinada atividade potencialmente ou não potencialmente

perigosa ao ambiente, obriga-se a reparar quaisquer danos porventura dela

oriundos, independentemente de culpa ou dolo na provocação do prejuízo

ambiental.

O dano ambiental não faz parte e não é aceito como consequência

natural do exercício de qualquer atividade, nem tampouco, do exercício do

direito de propriedade, ficando à margem dos limites lícitos destes, e, portanto,

desencadeador do dever de reparar que resta absorvido pelo risco natural que

qualquer atividade proporciona ao seu empreendedor.

Há um direito fundamental difuso de todos os brasileiros (inter-gerações)

de viver em um ambiente ecologicamente equilibrado, como extensão do

próprio direito à vida. Para não parecer um direito simplesmente retórico do

ordenamento constitucional, esse direito fundamental de vida em ambiente

sadio é tratado simultaneamente pelo direito ambiental.

Através de uma proteção preventiva, decorrente de um sistema de

instrumentos administrativos que buscam harmonizar a vida moderna em

sociedade, com a preservação e ordenação do ambiente, e de uma proteção

repressiva, tipificando penal e administrativamente eventuais agressões ao

ambiente, além, é claro, de uma proteção reparatória, que busca determinar

um sistema de reconstituição do ambiente lesado, impondo ao causador do

dano o dever de reparar.

A responsabilidade objetiva parte dos mesmos pressupostos da

responsabilidade civil subjetiva (ação ou omissão, dano e nexo causal), menos

o pressuposto subjetivo da culpa ou dolo, e são pressupostos da

responsabilização que surgem em razão do dano ambiental. O uso irregular do

meio ambiente constitui abuso desse direito, e é inevitavelmente entendido

como acontecimento danoso. Portanto, qualquer atividade que direta ou

indiretamente cause degradação ao meio ambiente ou mesmo a um dos seus

componentes, e sem prévia aceitação pelo Poder Público através de regular

licenciamento, é passível de ser reprimida.

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Quanto a responsabilidade patrimonial do causador de um dano

ambiental segue uma ótica severa de apuração, já que, em regra, um

particular, ao explorar uma atividade e auferir lucros com a mesma, pode estar

explorando recursos ambientais que simultaneamente integram um interesse

difuso maior de preservação do meio ambiente e que a degradação afronta

diretamente.

Dentre as características da responsabilidade patrimonial decorrente do

dano ambiental, a ausência da ideia de culpa, que é a consequência principal

do regime adotado pelo artigo 14, parágrafo 1º, da Lei 6.938/81, posto que o

dano ambiental não exige para ser causa de responsabilização do causador do

dano ambiental, que este tenha agido com culpa (agir sem visar ao dano, mas

com conduta negligente, imprudente ou imperita) ou dolo (agir visando

conscientemente à prática do dano).

Havendo mais de um poluidor, qualquer um, ou todos, respondem

solidariamente pela reparação do dano ambiental. Portanto, a responsabilidade

pelo dano ambiental será sempre solidária, se o dano não puder ser delimitado

a um único poluidor, ou mesmo em caso de dano preexistente em uma cadeia

de degradação, com possibilidade do responsabilizado se voltar em regresso

contra o verdadeiro poluidor.

Igualmente o Poder Público pode ser responsabilizado por um dano

ambiental, quando age diretamente como poluidor (construindo uma obra) ou

quando se omite diretamente não agindo como deveria para diminuir a lesão ao

meio ambiente (deixando de instalar usina de tratamento de lixo ou esgoto). O

artigo 14, parágrafo 1º, a Lei no. 6.938/81, estabelece que a reparação pelo

dano ambiental alcança prejuízos causados ao meio ambiente e a terceiros.

Significa dizer que um determinado dano ambiental pode causar um prejuízo

coletivo, que gera o surgimento de um direito difuso da coletividade.

Para Miláre (2000, p. 334), o dano ambiental pode ser definido como a

lesão aos recursos ambientais com consequente degradação e alteração

adversa do equilíbrio ecológico e da qualidade de vida. Importante salientar

que por “lesao aos recursos ambientais” nao se trata apenas dos recursos

naturais, mas também alcançando recursos artificiais e culturais que compõem

o meio ambiente. Mesmo assim, importante salientar que a poluição, como

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forma de degradação ambiental, não é mensurada por padrões administrativos

ou regras apenas, mas pela aferição do resultado danoso ao meio ambiente.

Quando ocorrer um dano, estaremos diante da responsabilidade civil, e

do consequente dever de reparar, que suscita, por seu turno, outras duas

situações: a restituição do ambiente lesado ao seu estado anterior à ocorrência

do dano e a indenização pecuniária como forma de compensação. A Política

Nacional de Meio Ambiente, instituída pela Lei no. 6.938/81, estabelece que

será seu objetivo, dentre outros, impor ao poluidor e ao predador ambiental, a

obrigação de recuperar e indenizar os danos causados, através do pagamento

de valores indenizatórios e por meio da recuperação do ambiente degradado.

A responsabilidade por degradação ambiental é tripla, podendo o

mesmo ato infrator desencadear, alternativa ou cumulativamente,

consequências de ordem penal, civil e administrativa. A responsabilidade civil

por dano ambiental foi introduzida no país em 1981, pela Lei 6.938 (art. 14 §

1°) e regulamentada processualmente pela Lei da Ação Civil Pública

(7.347/85), a responsabilização administrativa e penal sofreram uma profunda

reformulação em 1998, com a promulgação da lei dos crimes ambientais

(9.605).

Esses últimos dois tipos de responsabilidade não dependem,

necessariamente, da realização de um dano ambiental, bastando que o ator

lesivo ultrapasse os limites legais fixados ou exponha a risco a salubridade do

meio ambiente ou a saúde das pessoas, enquanto as sanções civis e penais

devem ser fixadas pelo judiciário, as administrativas são impostas pelos

próprios órgãos executivos dos três níveis de governo, na base das leis

vigentes de cada ente federativo.

No entender de Morato Leite existe diferença entre a responsabilidade

penal e a civil. Afirma que (2013, p. 114), “a primeira tem como objetivo aplicar

penas em condutas ilícitas e a última se caracteriza pela obrigação de

indenizar a vitima pelo dano causado.” Entretanto, no âmbito da

responsabilidade civil, o maior problema consiste na fixação do montante

monetário para compensar um dano ambiental, já que os bens ambientais,

turísticos, paisagísticos etc, não possuem um valor de mercado e justamente

essa dificuldade tem levado, na última década, à crescente substituição da

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condenação em dinheiro pelo cumprimento de obrigação de fazer, como no

caso de plantação de árvores, e, especialmente, a realização de medidas

compensatórias, como no caso de aquisição de bens para auxiliar na

fiscalização ambiental.

Segue afirmando Fiorilo (2002, p. 30)

O direito ambiental, atento a essas modificações e considerando a importância dos bens tutelados, adota a responsabilidade civil objetiva. Consagrou-se, portanto, a responsabilidade objetiva em relação a danos ambientais. A adoção pela Constituição Federal do regime da responsabilidade objetiva implica a impossibilidade de alteração desse regime jurídico da responsabilidade civil, em matéria ambiental, por qualquer lei infraconstitucional.

Para Silva (2003), a responsabilidade civil é aquela que impõe ao infrator

a obrigação de ressarcir o prejuízo causado por sua conduta. Ela pode ser

contratual, quando fundamentada em um contrato, ou pode ser extracontratual,

quando decorrer de exigência legal, ato ilícito ou até mesmo por ato lícito. A

própria legislação vigente dispõe no artigo 14, §1º, da Lei nº 6.938/81, a

obrigatoriedade da indenizacao pelo ilicito civil, ao prever que: “Sem obstar a

aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado,

independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos

causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.”

Além disso, a evidente insuficiência das indenizações civis –

normalmente repassadas a fundos pouco eficientes e mal controlados –

causaram uma maior ênfase doutrinária nos meios processuais disponíveis

para prevenir o próprio dano, como, por exemplo, a ação inibitória (art. 461 do

CPC).

Entre as diferentes responsabilidades, a transação e a suspensão

condicional do processo penal, são condicionadas pela prévia composição do

dano ambiental na área civil; além disso, o valor da prestação pecuniária paga

pelo condenado no processo penal será deduzido da possível indenização civil

(arts. 12, 27 e s. da Lei 9.605/98). Uma vez decididas no juízo criminal, não se

pode, no âmbito da responsabilidade civil, questionar mais a existência do fato

ou a identidade do autor (art. 935 do novo Código Civil).

O acolhimento da responsabilidade penal da pessoa jurídica mostra que

houve atualizada percepção do papel das empresas no mundo contemporâneo,

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99

eis que, podemos perceber que nas últimas décadas a poluição, o

desmatamento intensivo, a caça e a pesca predatórias não são mais praticados

só em pequena escala, mas o crime ambiental é principalmente corporativo.

A sanção do crime ambiental e a sanção da infração administrativa no

tocante à pessoa jurídica guardam quase uma igualdade. Conforme art. 225, §

3°, da CF “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente

sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e

administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos

causados”. Assim, a responsabilidade penal da pessoa juridica só será

dissuasória de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente se ela for

implementada através de sanções econômicas, que propiciem a compensação

e/ou a reparação do dano ocorrido ou que consigam prevenir a degradação

ambiental no tempo certo.

Já prevista no art. 1° da Lei 7.347/1985, a responsabilização pelo dano

ambiental extrapatrimonial ou moral, autoriza-se pelo art. 5°, V e X, da CF, e, é

fundamental para a integralização da reparação exigida pelo texto

constitucional. O dano extrapatrimonial possui caráter subjetivo quando importa

em degradação ou sofrimento físico ou psíquico do indivíduo (chamado dano

reflexo). O dano extrapatrimonial é de caráter objetivo quando não repercute

exclusivamente na vítima individual, mas diretamente no meio social, ou seja,

atinge valores imateriais da coletividade, como a qualidade de vida. A

reparação do dano extrapatrimonial geralmente se dará por meio de

indenização pecuniária, o que demanda análise extremamente subjetiva por

parte do julgador.

A responsabilidade civil ambiental não cuida apenas da reparação de

direitos intersubjetivos, próprios da responsabilidade civil clássica: nela está

implícita uma função preventiva e precaucional, com o desestímulo das

atividades poluidoras pela possibilidade de aplicação de sanções, a

internalização dos custos ambientais, o caráter pedagógico da

responsabilização, o estímulo ao aumento de investimentos em tecnologia e a

restrição da instalação e funcionamento de empresas ambientalmente

irresponsáveis. Recepcionado aqui pela Constituição Federal, a Lei n° 6.938/81

trouxe grande avanço ao estabelecer, no art. 14 § 1°, a responsabilização

objetiva do poluidor.

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100

Os interesses difusos passam a ter disciplina processual específica e

autônoma, paralela ao sistema processual interindividual, com a promulgação

da Ação Popular (lei n° 4.717, de 29 de junho de 1965), da Ação Civil Pública

(Lei n° 7.347/85) e do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90). Tais

diplomas deram estrutura a um processo civil coletivo, contemplando as

particularidades dos interesses difusos. Nesse sentido a posição doutrinária e

jurisprudencial dominante é pela não incidência das excludentes de

responsabilidade do Código Civil (caso fortuito e força maior) nas demandas

ambientais, bem como pela imprescritibilidade da ação reparatória quando se

trata de dano ao macrobem ambiental, de interesse comunitário.

Há, por consenso doutrinário, uma hierarquia das formas de reparação

do dano ao meio ambiente, que pode ser extraída da leitura sistêmica dos

artigos 4° VI e VII, e do 14° §1 da Lei n. 6.938/81, sob a ótica da Constituição

Federal. Na reparação do dano ambiental deve-se, sempre que tecnicamente

possível, privilegiar a restauração natural, com a recuperação efetiva da área

degradada, mediante restabelecimento do status quo ante. A restauração

natural possibilita a neutralização dos impactos ocasionados pelo dano, além

de apresentar um caráter pedagógico.

3.2 Amartya Sen e a efetivação do direito ao desenvolvimento

sustentável

Para a concretização do direito ao desenvolvimento sustentável é

necessária a inserção de princípios que irão resguardar os recursos ambientais

e permitir que a economia desenvolva-se de forma racional. O

desenvolvimento, então, deve cumprir as diretrizes traçadas pela sociedade,

bem como satisfazer as necessidades da população a fim de proporcionar uma

relação equilibrada de bem-estar e crescimento.

Sen conceitua o desenvolvimento como um processo integrado de

expansão de liberdades reais que as pessoas desfrutam. Refere (2010, p. 18)

quanto aos fins primordiais do desenvolvimento, ser preciso que “se removam

as principais fontes de privação de liberdade: pobreza e tirania, carência de

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oportunidades econômicas e destituição social sistemática, negligência de

serviços públicos e intolerância ou interferência excessiva de Estados

repressivos.”26

A liberdade, para Sen, (2010) é central para o processo de

desenvolvimento, e sua privação, no caso da liberdade econômica pode gerar

a privação de liberdade social, assim como a privação de liberdade social ou

política pode gerar a privação de liberdade econômica. Por meio destas inter-

relações, entre liberdades de tipos diferentes, a condição de agente emerge

como motor fundamental do desenvolvimento já que, além de constituí-lo,

também fortalece outros tipos de condições de agentes livres.

Assim, temos que as liberdades e direitos também contribuem muito

eficazmente para o progresso econômico, além de constituírem o

desenvolvimento. Sen considera, igualmente a importância do crescimento do

PNB ou das rendas individuais, como meio de expansão das liberdades, que

também dependem de determinantes como as disposições sociais e

econômicas (serviços de educação e saúde) e os direitos civis (participação em

discussões públicas).

Quanto ao desenvolvimento sustentável, este deve, além de satisfazer

as necessidades imediatas de uma sociedade e seu crescimento, associar esta

intenção com o não comprometimento da qualidade de vida das gerações

futuras. E, é nesse contexto que a sustentabilidade faz sentido. 27

Para que se entenda a sustentabilidade, devemos recordar das posições

tomadas em Copenhague e na Rio 92 que se constituíram, segundo Sachs,

(2007) uma recusa implícita de teorias economicistas que fazem do

crescimento o objetivo central. O desenvolvimento sustentável apoia-se em

uma tríade composta pelos requisitos ambiental, social e econômico.

A importância do meio ambiente, por sua vez, fica mais clara quando

afirmamos que o problema que se coloca, portanto, não consiste na escolha

26 Refere, ainda Sen (2010, p. 54) que “uma visao considera o desenvolvimento um processo “feroz”, com muito “sangue, suor e lágrimas” – um mundo no qual sabedoria requer dureza.” 27 O desenvolvimento, ao qual está imbricada a sustentabilidade é compreendido por Sachs (2009, p. 232), como “um processo intencional e autodirigido de transformacao e gestao de estruturas socioeconômicas, direcionado no sentido de assegurar a todas as pessoas uma oportunidade de levar uma vida plena e gratificante, provendo-as de meios de subsistência decentes e aprimorando continuamente seu bem-estar, seja qual for o conteúdo concreto atribuido a essas metas por diferentes sociedades em diferentes momentos históricos”.

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entre crescimento e qualidade do ambiente, mas sim em se tentar harmonizar

objetivos socioeconômicos e ambientais.

Na visão de Sen (2010, p. 28/29), pode-se afirmar que

Os fins e os meios do desenvolvimento requerem análise e exame minuciosos para uma compreensão mais plena do processo de desenvolvimento; é sem dúvida inadequado adotar como nosso objetivo básico apenas a maximizacao de renda ou de riqueza, […] Pela mesma razão, o crescimento econômico não pode sensatamente ser considerado um fim em si mesmo. O desenvolvimento tem de estar relacionado sobretudo com a melhora da vida que levamos e das liberdades que desfrutamos. Expandir as liberdades que temos também permite que sejamos seres sociais mais completos, pondo em prática nossas volições, interagindo com o mundo em que vivemos.

Nesse contexto, é possível perceber a relação entre desenvolvimento

econômico, como um fim em si, e o desenvolvimento sustentável como

integrante da dignidade da pessoa humana. Assim, para buscar a efetivação do

desenvolvimento sustentável como um direito fundamental deve-se

compreender a relação entre a dignidade e o desenvolvimento. A primeira é o

fim do segundo, que é origem da primeira como direito. Não obstante, garantir

os vários aspectos do primeiro conceito é fundamental para que haja

desenvolvimento, o qual é essencial para a manutenção das condições

existenciais para uma vida saudável.

Ainda sobre esta interligação, reforça Sen (2010, p. 18), que

A ligação entre liberdade individual e realização de desenvolvimento social vai muito além da relação constitutiva – por mais importante que ela seja. O que as pessoas conseguem positivamente realizar é influenciado por oportunidades econômicas, liberdades políticas, poderes sociais e por condições habilitadoras como boa saúde, educação básica e incentivo e aperfeiçoamento de iniciativas.

Em última análise, as semelhanças ou correlações entre o princípio da

dignidade da pessoa humana e o conceito de desenvolvimento sustentável têm

uma explicação lógica. O objetivo de ambos é o ser humano ou a pessoa

natural e a garantia de condições de vida sustentada em direitos e deveres.

Para Sen (2010), a finalidade do desenvolvimento deve ser vista como um

processo de expansão das liberdades substantivas das pessoas, sendo muito

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semelhante às colocações de Sarlet quando define a antítese da dignidade da

pessoa. Refere (2010, p. 76) que

Tudo, portanto, converge no sentido de que também para a ordem jurídico-constitucional a concepção de homem-objeto (ou homem-instrumento), com todas as consequências que daí podem e devem ser extraídas, constitui justamente a antítese da noção de dignidade da pessoa.28

Feita até aqui a análise de alguns conceitos de desenvolvimento, bem

como da correlação com o princípio da dignidade da pessoa humana,

necessário é realizar a vinculação da efetivação do desenvolvimento

sustentável como um direito fundamental e a posição de Sen quanto à

condição de agente no exercício das liberdades substantivas.

Pois, de nada adianta, o aparelhamento de um Ministério Público

atuante quando as pessoas não agem de forma a perceber os problemas e

minimizar a atuação do Estado, mas promover a medida do dia a dia, seguindo

os princípios de desenvolver-se sustentavelmente, consciente e atuante, de

maneira retomando Sen, a modificar o mundo através da consciência e cultura

dos povos.

Sobretudo, porque o problema ambiental tende a manifestar-se em

praticamente todos os quadrantes do planeta, pela geração de modalidades

variadas de degradação ecológica, que desconhecem fronteiras. Como bem

descreve Morato Leite (2003), passamos por uma crise ambiental decorrente

do atual estágio de desenvolvimento da humanidade, no qual condições

tecnológicas, industriais, formas de organização e gestões econômicas da

sociedade estão em conflito com a qualidade de vida.

O Direito, por ser uma ciência mutável, deve renovar-se para

acompanhar a evolução da sociedade e, consequentemente, a garantia da

efetividade de suas normas para com a sociedade. A recuperação da crise

ambiental não ocorrerá apenas com a conciliação do desenvolvimento

28 O que se percebe, em última análise, é que onde não houver respeito pela vida e pela integridade física e moral do ser humano, onde as condições mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde não houver limitação do poder, o controle e punição da corrupção, como forma de permitir a degradação ambiental, enfim, onde a liberdade, a autonomia, a igualdade e os direitos fundamentais não forem reconhecidos e minimamente assegurados, não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana e esta, por sua vez, poderá não passar de mero objeto de arbítrio e injustiças.

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econômico e social, mas de um desenvolvimento sustentável, a partir de

princípios civilizatórios. Deixando inclusive, a responsabilidade pela proteção

ambiental de estar sobre o domínio apenas do ente público como também do

privado, adotando o Estado o comportamento de uma nova cidadania,

comprometida com as consequências decorrentes do desenvolvimento e a

consciência do uso racional e ético dos recursos naturais, objetivando o

equilíbrio ecológico e a preservação do patrimônio ambiental.

O homem, aos olhos de Sen, é um agente, uma pessoa, um ser capaz

de agir, de intervir no mundo, de produzir mudanças, promover seus valores e

de realizar seus objetivos. Sua posição, em última análise, é a de um filósofo e

não de um economista, pois vai da economia à filosofia em prol da liberdade e,

não da utilidade. Tal aspecto é verificado quando o autor cita Aristóteles

afirmando que a riqueza evidentemente não é o bem que estamos buscando

(2010, p. 29) sendo ela “meramente útil e em proveito de alguma outra

coisa”. (grifo nosso)

Sen (2010, p. 77) demonstra, de maneira ímpar, que

Os fins e os meios do desenvolvimento exigem que a perspectiva da liberdade seja colocada no centro do palco. Nessa perspectiva, as pessoas têm de ser vistas como ativamente envolvidas – dada a oportunidade – na conformação de seu próprio destino, e não apenas como beneficiárias passivas dos frutos de engenhosos programas de desenvolvimento. O Estado e a sociedade têm papéis amplos no fortalecimento e na proteção das capacidades humanas. São papéis de sustentação, e não de entrega sob encomenda. A perspectiva de que a liberdade é central em relação aos fins e aos meios do desenvolvimento merece toda a nossa atenção. [grifo nosso]

A afirmação do presente estudo perpassa, o entendimento que converge

para a afirmacao da condicao de agentes sociais, atuando como “ativamente

envolvidas” e nao somente como recatados “beneficiários passivos” das

relações Estatais e pessoais. A existência do direito (CF, Leis, Tratados), deve

vir interligada pela atitude consciente de que o meio ambiente deve ser

respeitado por ser um bem de todos, e o desenvolvimento sustentável, mesmo

que reconhecido constitucionalmente, deve abarcar as atitudes diárias das

pessoas, e não somente a ingerência de atos estatais em prol da

sustentabilidade.

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As políticas públicas, notadamente aquelas voltadas para a educação e

saúde, complementam as oportunidades abertas pelo comprometimento das

instituições e pelas atividades econômicas, cobrindo lacunas e ajudando na

superação das privações e na construção do cidadão agente, este, agora

capaz, de elevar o direito ao desenvolvimento sustentável, como efetivação

prática.

No Brasil, ainda que não de maneira explícita, há suporte constitucional

para fundamentar a implementação de um direito ao desenvolvimento

sustentável através, como visto, da interpretação sistemática do texto

constitucional, mais especialmente, da leitura combinada do artigo 170, que

coloca, entre os princípios da ordem econômica, a defesa do meio ambiente,

com o caput do artigo 225, que visa à garantia do direito a uma vida de

qualidade às presentes e futuras gerações.29

Para Freitas (2012, p. 63), alguns aspectos nucleares devem estar

reunidos para que este paradigma possa implementar-se na sociedade, dentre

eles:

a consideração de que sustentabilidade é uma determinação ética e jurídico-institucional, constitucionalmente tutelado no Brasil no art. 3º, 170, VI, e 225; é uma determinação ética e jurídico institucional de responsabilização objetiva do Estado pela prevenção e precaução; é uma determinação ética e jurídico-institucional de sindicabilidade ampliada de escolhas públicas e privadas; é uma determinação ética e jurídico-institucional de responsabilidade pelo desenvolvimento de baixo carbono, compatível com os valores constitucionais que não se coadunam com a ânsia mórbida do crescimento econômico como fim em si

A partir dessa construção, verifica-se que a sustentabilidade deve

nortear o desenvolvimento e não o contrário. Deve-se fazer uma releitura, uma

reconstrução valorativa de todo ordenamento jurídico, sendo a sustentabilidade

em todas suas dimensões norteadora em qualquer programa consequente de

aplicação constitucional. Canotilho confirma que é tempo de considerar a

sustentabilidade como elemento estrutural típico do que hoje designamos

Estado Constitucional. Mais do que isso, a sustentabilidade configura-se como

29 No mesmo sentido Freitas (2012) destaca a sustentabilidade como princípio e direito ao desenvolvimento sustentável a partir de uma característica multidimensional indissolúvel, que ressalte a importância da consideração de suas diversas dimensões que são interdependentes e indivisíveis.

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uma dimensão auto-compreensiva de uma constituição que leve a sério a

salvaguarda da comunidade política em que se insere.

Afirma Canotilho (2010, p. 12 - 13) que

A força normativa da Constituição ambiental dependerá da concretização do programa jurídico-constitucional, pois qualquer Constituição do ambiente só poderá lograr força normativa se os vários agentes – públicos e privados – que atuem sobre o ambiente o colocarem como fim e medida das suas decisões [...] No seu conjunto, as dimensões jurídico-ambientais e jurídico-ecológicas permitem falar de um Estado de direito ambiental e ecológico. O Estado de direito, hoje, só é Estado de direito se for um Estado protetor do ambiente e garantidor do direito ao ambiente; mas o Estado ambiental e ecológico só será Estado de direito se cumprir os deveres de juridicidade impostos à atuação dos poderes públicos. Como se irá ver nos desenvolvimentos seguintes, a juridicidade ambiental deve adequar-se às exigências de um Estado constitucional ecológico e de uma democracia sustentada.

O direito ao desenvolvimento sustentável constitui-se, portanto, em

princípio constitucional basilar dos caminhos de implementação de políticas

capazes de efetivarem o princípio na esfera social. Este direito assume seu

caráter objetivo no campo político sem negar uma moldura jurídica como

princípio jurídico norteador de decisões políticas.

Essa recepção e interpretação que se faz do direito ao desenvolvimento

sustentável, como fundamental ao desenvolvimento em todas suas dimensões,

colocar-se-á em dado momento como paradigma à efetivação da justiça

ambiental. A aproximação da Justiça ambiental ao desenvolvimento

sustentável irá emergir de um contexto de crise ecológica global que favorece

uma reflexão sobre a equidade ambiental. Ressalte-se que ao tratar de justiça

ambiental, contempla-se para além de questões de justa distribuição dos

riscos, a própria questão da justiça como um valor e do acesso à justiça, em

sentido amplo.

O viés exploratório e modelo capitalista no qual se está inserido, enseja

reflexivamente o agravamento das injustiças sociais e ambientais. A

insustentabilidade do desenvolvimento é a causa principal destas injustiças e

irremediavelmente será sua reformulação essencial para a efetivação ou ao

menos implementação dos preceitos de justiça (sócio) ambiental.

Em primeiro momento, é preciso que se conceba o desenvolvimento sob

novo viés, agora multidimensional, capaz de considerar diversas dimensões em

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igual patamar de importância e o viabilizar em sua plenitude, seja, econômico,

social, ambiental, humano e jurídico. Esta nova visão permite que

“desenvolver-se” nao se restrinja apenas a questões econômicas de

crescimento quantitativo e de mercado, inserindo ao menos novos valores a

serem considerados, permitindo que a sustentabilidade seja também

multidimensional.

A pretensão de que as pessoas do mundo podem ser unicamente

categorizadas de acordo com algum sistema singular e abrangente de divisão

vai contra a crença ultrapassada de que os seres humanos, como categoria

“sao todos iguais”, como tambem contra a compreensao mais plausivel de que

são diversamente diferentes.

Sen e Kliksberg (2010, p. 43) afirmam que

a principal esperança de harmonia no mundo contemporâneo se encontra na pluralidade de nossas identidades que se cruzam umas com as outras e agem contra as divisões rígidas em torno de uma linha única e endurecida de divisão impenetrável. Nossa humanidade compartilhada é desafiada brutalmente quando o confronto é unificado em um só suposto sistema dominante de classificacao […]. A diversidade plural pode ser muito unificadora, de uma forma que um sistema único de divisões predominantes não é

Não é de surpreender que pessoas vejam o mundo de acordo com uma

ideia fundamentalista, ou preordenada que elimina todas as outras distinções.

Contra isso, podemos referir que as pessoas, podem lutar pelo direito de

escolher as prioridades entre as múltiplas associações, filiações e identidades,

pois, na democracia tem-se o direito humano de acesso a uma educação

ampla que seja preparatória para escolher, e não apenas para seguir. O que se

verifica também quanto ao desenvolvimento.

Essa multidimensionalidade do desenvolvimento permite considerar no

seu progresso, o meio ambiente que lhe dá os recursos e a sociedade que o

sustenta. Do contrário, quando restrito a limites de crescimento econômico,

agrava as injustiças ambientais e, consequentemente, a busca por justiça

ambiental que, na verdade, é socioambiental, pois se baseia em premissas

igualmente de lutas sociais e, que vêm de encontro a este desenvolvimento

insustentável, buscando reformulá-lo a fim de que as injustiças também sejam

reduzidas.

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Entretanto, combater um modelo de desenvolvimento já enraizado, que

apenas molda-se aos anseios da sociedade e não efetivamente transforma seu

modo de produção, é um árduo desafio em uma sociedade capitalista

dominada pelo excesso de consumo e exploração predatória. A

conscientização e a educação ambiental, prevista na ordem legal brasileira

(CF, artigo 225), são formas de mover as pessoas a uma nova forma de agir.

Para Sen, a educação pode propiciar melhores condições de

modificação social. Exemplifica esse encadeamento, descrevendo fatos e

considerações históricas da China e da Índia, em suas relações no tocante à

abertura de mercados. Expõe que o papel de um povo alfabetizado quanto a

outro semianalfabeto traz consequências diversas para o processo de

desenvolvimento de uma nação.

Destaca Sen (2010, p. 63/64)

O contraste entre Índia e China tem alguma importância ilustrativa nesse contexto. Os governos desses dois países empenham-se já há algum tempo (a China desde 1979 e a Índia desde 1991) na mudança para uma economia mais aberta, internacionalmente ativa e orientada para o mercado. [...] Quando adotou a orientação para o mercado em 1979, a China já contava com um povo altamente alfabetizado – em particular os jovens – [...] Em contraste, a Índia possuía uma população adulta semianalfabeta quando adotou a orientação para o mercado em 1991 [...] As condições de saúde na China também eram muito melhores do que as encontradas na Índia devido ao compromisso social do regime pré-reforma tanto com os serviços de saúde quanto com os de educação. Singularmente, esse compromisso [...] criou oportunidades sociais às quais foi possível dar um aproveitamento dinâmico depois de o país adotar a orientação para o mercado. O atraso social da Índia, com sua concentração elitista na educação superior, sua vasta negligência com relação à educação elementar e o descaso substancial para com os serviços básicos de saúde deixou o país despreparado para a expansão econômica.

Portanto a educação tanto no caso chinês, como no caso brasileiro é

pedra fundamental para o desenvolvimento da personalidade crítica, capaz de

analisar e compreender o meio ambiente como um bem de todos, e finito. Na

proposta da presente pesquisa, o direito, quando aliado ao desenvolvimento

como sustentável, à condição de agente, ao aspecto de fundamentalidade

imputado pela Constituição Federal e a interpretação do STF no sentido de

garantir a defesa ambiental em igualdade de condições aos direitos

constitucionais, possivelmente permitirá a redução das desigualdades

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ambientais e sociais e efetivação de uma Justiça socioambientalmente

sustentável.

Não basta que exista um ordenamento jurídico de tutela do meio

ambiente, pois são necessárias construção e preocupação científica que

assegurem efetividade e eficácia. Há uma profusão de normas ambientais que

colidem e se sobrepõem, desprovidas de princípios norteadores e de

cientificidade. Kant (1991), nesse sentido, já afirmava que de fato, a

diversidade das regras necessita de princípios, mas é a exigência da razão que

leva ao entendimento cientificamente correto.

Desenvolver-se sustentavelmente, considerando o meio ambiente e a

sociedade que nele habita é um direito fundamental a ser devidamente

considerado e tutelado, uma vez que diretamente amenizador das graves

injustiças socioambientais, e assim, servirá como paradigma à plena efetivação

e implementação dos preceitos basilares de uma justiça ambiental, capaz de

amenizar a propagação das injustiças socioambientais.

Nesse sentido, reforça Sarlet (2010, p. 22) :

O Estado Socioambiental de Direito, longe de ser um Estado “Minimo”, e um Estado regulador da atividade econômica, capaz de dirigi-la e ajustá-la aos valores e princípios constitucionais, objetivando o desenvolvimento humano e social de forma ambiental sustentável. O princípio do desenvolvimento sustentável, expresso no art. 170 (inciso VI) da CF88, confrontando com o direito de propriedade privada e a livre iniciativa (caput e inciso II do art. 170), também se presta a desmitificar a perspectiva de um capitalismo liberal individualista em favor de sua leitura à luz dos valores e princípios constitucionais socioambientais.

Para a implementação e efetivação do direito fundamental ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado, é necessário o maior e irrestrito acesso à

informação e aos processos decisórios, visando à democratização do processo

ambiental que, como direito (e também como norma fundamental), só tem

efetivação plena em um regime democrático, com amplo acesso dos cidadãos

interessados à informação. Tal direito pode vir a assumir, porém, uma feição

retórica, caso não haja a verdadeira efetivação pelo poder público e pela

coletividade. Aspecto esse levantado por Sen, quando compara a instrução do

povo chinês e indiano, que somente vai alicerçar a modificação de uma

situação vigente com a qualificação educacional das pessoas.

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Justificam Sen e Kliksberg (2010, p. 69) que

se as pessoas forem de fato agentes dotados de raciocínio (e não apenas pacientes, sempre carentes), então pode existir uma abordagem que envolva discussão pública e emergência e sustentação de prioridades favoráveis ao ambiente, acompanhadas de um alargamento da compreensão quanto às dificuldades ecológicas que estamos enfrentando. Isso, igualmente, deveria nos conduzir a um reconhecimento da capacidade dos seres humanos para pensar e julgar por si sós. Uma capacidade que valorizamos, hoje, e uma liberdade que gostaríamos de preservar para o futuro.

Considera que as motivacoes da acao humana nao sao apenas

instrumentais, mas tambem guiam-se por valores de solidariedade e altruismo.

Sendo possivel que exista uma preocupacao autentica com as especies e com

o bem-estar das geracoes futuras, pois esta concepcao estaria acima de

questoes como o desenvolvimento sustentável, na medida em que o meio

ambiente nao deve ser valorizado apenas por seu potencial de suprir

necessidades à vida, mas por seu valor em si.

Assim, para a concretização do princípio fundamental contido no caput

do art. 225 da Constituição da República de 1988, este deve ser interpretado

em consonância com outros dispositivos da mesma Carta que, conforme

Moraes (2007, p. 816)

em consonância com o art. 1º., III, que consagra como fundamento da República o princípio da dignidade da pessoa humana; o art. 3º., II, que prevê como objetivo fundamental da República o desenvolvimento nacional; e o art. 4º., IX, que estipula que o Brasil deve reger-se em suas relações internacionais (...) a permitir maior efetividade na proteção do meio ambiente.

Para a proteção do meio ambiente e materialização do direito

fundamental contido no caput do art. 225, a Constituição estabelece,

difusamente, regras diversas relacionadas à proteção do meio ambiente.

Referidos dispositivos podem ser vistos nos arts. 170, VI; 173, §5º.; 174, §3º.;

186, II; 200, VIII; 216, V; 231, §1º.; além de regras específicas contidas nos

parágrafos e incisos do próprio art. 225.

Tais regras que produzem efetividade ao direito fundamental a um meio

ambiente ecologicamente equilibrado, constituem sua proteção, conforme

reconheceu o Supremo Tribunal Federal (STF), como prerrogativa jurídica de

titularidade coletiva, reconhecido, no processo de desenvolvimento dos direitos

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humanos, como poder atribuído não a um indivíduo considerado em sua

singularidade, mas a toda uma coletividade social titular de direitos

fundamentais individuais e coletivos.30

O direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,

como direito coletivo, tem caráter conflituoso tendo em vista que pode servir de

restrição a outros direitos fundamentais, como o direito de propriedade e o

desenvolvimento econômico, pela simples imposição do uso racional e a

contenção à livre iniciativa. Nesse sentido, determina Sampaio (2003, p. 105):

“A sua relacao tensa com os demais direitos fundamentais e com os interesses

coletivos, exige uma intervenção legislativa conciliadora. E, diante de casos

concretos, a mediacao judicial equilibrada”.

Apesar de existirem conflitos entre direitos fundamentais, para uma justa

efetivação, os julgadores utilizam-se da ponderação, como no caso do direito

fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e do direito

fundamental à propriedade. O STF, já se posicionou nesse sentido, através do

Ministro Dias Tófoli ao julgar em 25/02/13 o AI 805417, quando definiu

(BRASIL, 2013b, p. 4 - 5) que

A QUESTÃO DO DESENVOLVIMENTO NACIONAL (CF, ART. 3º, II) E A NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DA INTEGRIDADE DO MEIO AMBIENTE (CF, ART. 225): O PRINCÍPIO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL COMO FATOR DE OBTENÇÃO DO JUSTO EQUILÍBRIO ENTRE AS EXIGÊNCIAS DA ECONOMIA E AS DA ECOLOGIA. [...] objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente, para que não se alterem as propriedades e os atributos que lhe são inerentes, o que provocaria inaceitável comprometimento da saúde, segurança, cultura, trabalho e bem-estar da população.

Conjuntura jurídica reiterada por Celso de Mello, ao julgar o RE

673681/SP em 05/12/14, quando referiu que (BRASIL, 2014a, p. 6)

30 Cumpre rememorar que já em 1995, o Supremo Tribunal Federal, considerava o direito ao meio ambiente como um bem coletivo. Afirmou o Ministro Celso de Mello, quando analisou o MS 22164/SP em 30/10/95 que “o direito a integridade do meio ambiente - típico direito de terceira geração - constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, a própria coletividade social.”

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Todos sabemos que os preceitos inscritos no art. 225 da Carta Politica traduzem, na concrecao de seu alcance, a consagracao constitucional, em nosso sistema de direito positivo, de uma das mais expressivas prerrogativas asseguradas às formacoes sociais contemporâneas. Essa prerrogativa, que se qualifica por seu caráter de metaindividualidade, consiste no reconhecimento de que todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Trata-se – consoante já o proclamou o Supremo Tribunal Federal (RTJ 158/205-206, Rel. Min. CELSO DE MELLO) [...] de um tipico direito de terceira geracao (ou de novissima dimensao), que assiste, de modo subjetivamente indeterminado, a todo o genero humano.

Postura favorável ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,

reiterada pela corte, como um todo, como referiu o Ministro Dias Tóffoli ao

julgar o AI 805417/MG em 25/12/13:

Ademais, esta Corte já firmou a orientacao de que e dever do Poder Público e da sociedade a defesa de um meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e as futuras geracoes, sendo esse um direito transindividual garantido pela Constituicao Federal, a qual comete ao Ministerio Público a sua protecao (BRASIL, 2013b, p. 2).

Alicerçado por Celso de Mello ao julgar o RE 673681/SP em 05/12/14,

quando asseverou (BRASIL, 2014a, p. 10) que

Sao todos esses motivos que tem levado o Supremo Tribunal Federal a consagrar, em seu magisterio jurisprudencial, o reconhecimento do direito de todos à integridade do meio ambiente e a competencia de todos os entes politicos que compoem a estrutura institucional da Federacao em nosso Pais, com particular destaque para os Municipios, em face do que prescreve, quanto a eles, a própria Constituicao da República (art. 30, incisos I, II e VII, c/c o art. 23, incisos II e VI).

Portando o meio ambiente é protegido como elemento determinante à

essencial qualidade de vida. Esse direito não persegue concepções abstratas,

mas exprime um desejo de um habitat saudável para que o homem, individual

e coletivamente, possa desenvolver suas atividades de forma também a

preservar o meio ambiente para as futuras gerações. O direito ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado é a expressão maior, no campo

ambiental, do direito fundamental à vida. Assim, podemos referir que um meio

ambiente sadio e ecologicamente equilibrado é um insaciável valor social a ser

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requerido, porque determina um desejo universal e prioritário da humanidade: a

vida31.

31 Quanto a esse aspecto, Franco del Pozo (2000, p. 48), faz a seguinte questão: É o direito humano à vida dependente de pré-requisito para um direito humano ao meio ambiente?" E responde (2000, p. 48 - 49) “O direito a vida e o mais fundamental de todos os direitos, já que se não há vida, não há existência, e portanto, não se tem nem direitos nem obrigações, nem nada. Neste sentido, o direito à vida poderia ser considerado como um pré-requisito, não somente para o direito ao meio ambiente, mas também para todos os demais direitos garantidos.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A construção do desenvolvimento sustentável, como direito fundamental,

ocorreu de forma gradual, refletindo as necessidades e carências essenciais do

ser humano, enquanto indivíduo inserido em sociedade. Todavia, tal tarefa não

se encontra finalizada, pelo contrário, a evolução rumo à conquista dos direitos

está em pleno desenvolvimento estimulado, de maneira substancial, pela

profusão das informações proporcionados pelo avanço da tecnologia e pela

rapidez das informações.

Esse panorama demanda a necessidade de as pessoas agirem de forma

ativa na busca de uma visão evolutiva do desenvolvimento considerando a

sustentabilidade, redimensionando o próprio conceito de progresso,

respeitando assim, igualmente o direito fundamental ao desenvolvimento

sustentável.

Pois, o homem usa os recursos naturais como se os mesmos fossem

ilimitados. O processo humano de evolução, de forma geral, encontrou-se

subsumido à ideia da inevitabilidade da degradação ambiental, a qual foi

percebida, por vezes, como condição e, por outras, como efeito do progresso

pretendido. A produção desmedida, como percebe Sen (2010), vinculada

somente ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) dos países, entendem

que os elementos da natureza devem ser vistos como recursos para a

continuidade do progresso e da riqueza humana.

Resta cristalina, assim, a visão de mundo antropocêntrica, ainda hoje

reinante, que identifica o homem no centro do universo e das coisas, as quais

lhe entornam e lhe servem de meio para a consecução de seus objetivos.

Essa visão resulta no colapso futuro da capacidade de o planeta

fornecer bens e serviços naturais aos seres humanos. A capacidade do planeta

de produzir água potável, reciclar nutrientes do solo, minimizar o impacto de

desastres naturais e controlar o clima, dentre outros, está comprometida.

Porém, a partir de uma série de catástrofes naturais, lenta e

gradualmente o homem vai percebendo e apreendendo os sinais que o meio

ambiente vem lhe oferecendo no sentido de que seu limite de tolerabilidade à

poluição e à devastação está muito próximo. Diante disso, vem promovendo

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medidas paliativas, como no caso dos EUA, buscar implementar plano de

ações no sentido de reduzir em 32% a emissão de dióxido de carbono das

centrais termoelétricas até 2030, através de padrões rígidos, mas exequíveis

para usinas de energia.

Atraves do chamado “Plano Energia Limpa” que, segundo informacoes

do EPA (Agencia de Proteção Ambiental dos Estados Unidos)32, propõe um

cronograma de ações para minimizar o impacto do aquecimento global no

mundo para que as centrais termoelétricas americanas voltem aos níveis de

emissão de dióxido de carbono emitidos em 2005.

No Brasil, a preocupação ambiental, vem se tornando realidade a ser

implementada por políticas públicas, como no caso da Lei nº 12.305/10, que

institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), considerada atual, pois

contém instrumentos importantes para permitir o avanço necessário ao País no

enfrentamento dos principais problemas ambientais, sociais e econômicos

decorrentes do manejo inadequado dos resíduos sólidos.

A lei prevê a prevenção e a redução na geração de resíduos, tendo

como proposta a prática de hábitos de consumo sustentável e um conjunto de

instrumentos para propiciar o aumento da reciclagem e da reutilização dos

resíduos sólidos (aquilo que tem valor econômico e pode ser reciclado ou

reaproveitado) e a destinação ambientalmente adequada dos rejeitos (aquilo

que não pode ser reciclado ou reutilizado).33

A preocupação com a utilização racional dos recursos naturais é

marcada por um processo histórico de avanços e retrocessos que são

impulsionados, principalmente, pelo modelo econômico e desenvolvimentista

adotado pelos paises. Modernamente, o termo “desenvolvimento sustentável”

vem sendo cunhado com bastante frequência, notadamente a partir da I

Conferência Mundial de Meio Ambiente realizada em Estocolmo no ano de

1972.

O conceito de desenvolvimento sustentável surge para enfrentar a crise

ecológica e tem como pressuposto a existência de sustentabilidade social,

32O documento completo pode ser verificado em: http://www2.epa.gov/sites/production/files/2015-08/documents/cpp-final-rule.pdf 33 Informações do Ministério do Meio Ambiente, sendo que o programa na integralidade, bem como seus resultados já alcançados, podem ser conferidos em: http://www.mma.gov.br/pol%C3%ADtica-de-res%C3%ADduos-sólidos

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econômica e ecológica, sendo que essas dimensões explicitam a necessidade

de tornar compatível a melhoria nos níveis e na qualidade de vida por meio da

preservação ambiental.

Nesse sentido, a afirmação universal da garantia ao meio ambiente

equilibrado no rol dos direitos humanos não teve por finalidade o simples

adorno retórico de textos normativos, constituindo um conjunto de valores

compartilhados ante as crises enfrentadas pela sociedade, alicerçada em torno

da solidariedade e da justiça social, visando à comunhão entre o

desenvolvimento socioeconômico e a inviolabilidade do ecossistema. A

expressao “direitos fundamentais” aplica-se àqueles direitos inerentes à própria

existência do ser humano anteriores ao Estado e por isso inclusive por ele

devem ser reconhecidos e respeitados, restando positivados na esfera

constitucional de cada Estado Nacional, portanto circunscritos a um

determinado povo ou nação dentro dos valores reconhecidos por estes.

No Brasil, a Constituição Federal de 1988, rompendo com antiga

tradição de descaso para com a temática ambiental, de forma inovadora,

consagrou um direito fundamental de terceira dimensão, caracterizado pela

titularidade difusa, ao prever expressamente no art. 225 da magna carta o

direito ao meio ambiente sadio e equilibrado. De forma dinâmica e sistêmica, a

Constituição acrescentou ainda outros dispositivos vinculados indiretamente ao

sistema de preservação ambiental, como o artigo 170, inciso IV e 3 inciso II,

que são de fundamental importância para a manutenção do equilíbrio ambiental

e do desenvolvimento sustentável do país. Assim é que a legislação pátria

reconhece que o meio ambiente equilibrado, além de um direito, deve ser um

princípio norteador das ações públicas e privadas no país.

As normas ambientais positivadas no texto constitucional de 1988, além

de representarem, de forma clara, o imperativo poder-dever do Estado e da

coletividade de proteção do meio ambiente, integram-se ao ordenamento

jurídico nacional, apresentando valores, objetivos e princípios fundamentais da

República Federativa do Brasil. A segurança e o bem-estar, valores de uma

sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, confirmam que o meio

ambiente equilibrado é um direito coletivo, porquanto ele se constitui em

condição para que sejam atingidos e respeitados os direitos à dignidade

humana e à vida.

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No mesmo sentido, também a legislação infraconstitucional preocupou-

se de forma intensa com a temática da proteção ambiental, tendo surgido um

verdadeiro microssistema jurídico-ambiental, que se encontra entre os mais

avançados do mundo. Preservação e proteção do meio ambiente: estes são os

maiores objetos destas normas.

Porém, em que pesem os avanços no que concerne à legislação

ambiental, o país continua incapaz de conter a produção de riscos ecológicos,

num flagrante descompasso existente entre os objetivos da Política Nacional

do Meio Ambiente e o modelo de desenvolvimento econômico vigente. Em

contrapartida à avançada legislação brasileira relativa à matéria ambiental, há a

ausência de sua implementação.

No plano dos fatos, portanto, face à ausência de mudanças substanciais

no trato com o meio ambiente, o efeito é contrário, havendo uma crescente

degradação da natureza oriunda principalmente dos novos meios de produção

e do surgimento da sociedade de consumo. O meio ambiente, assim, passa a

ser hipoteticamente elevado ao grau máximo de segurança jurídica, diante da

previsão constitucional do direito fundamental ambiental.

Ao se analisar o contexto social onde está inserido o mandamento

constitucional ambiental e no qual deve o mesmo restar concretizado, percebe-

se com nitidez as características de apatia e omissão da sociedade brasileira

frente à temática ambiental. O coletivo porta-se, no mais das vezes, como

cliente do Estado no que concerne a políticas públicas neste setor, não

percebendo a sua importância tampouco assumindo a sua responsabilidade na

luta pela preservação ambiental.

Para garantir a eficácia plena das normas de preservação ambiental, é

essencial a participação da coletividade. Sen define o desenvolvimento como

um processo de expansão das liberdades reais à disposição das pessoas.

Estas liberdades incluem o direito ao trabalho, à alimentação, à educação, à

saúde, à informação, a votar e ser votado, e outras liberdades possíveis.

Assim, a extensão e expansão das liberdades políticas, como a livre

manifestação e o voto, participam da promoção de todas as outras

oportunidades e dos direitos sociais, como saúde e educação.

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Dessa forma, o alicerce da democracia é a participação popular nas

ações com repercussão em toda a sociedade, o ser humano consciente de

suas capabilidades, agindo na condição de agente participativo e decisor no

seio social. Seguindo a linha democrática e participativa, a Constituição Federal

insere o dever de atuação da coletividade na gestão ambiental.

Ao Estado brasileiro incubem os papeis de agente normativo e regulador

da atividade econômica, exercendo as funcoes de fiscalizacao, incentivo e

planejamento. Essa intervencao estatal, que se caracteriza na possibilidade do

Estado de interferir direta ou indiretamente na ordem econômica para a

promocao de valores e objetivos da ordem social, obriga-o a assumir

ativamente a condicao de impor normas e de exercer uma atuacao reguladora

frente às atividades econômicas, sempre obedecendo aos imperativos

constitucionais, sendo o art. 225, da Carta Magna, seu norte fundamental.

Nessa perspectiva, o modelo normativo e regulatório brasileiro nao

possui apenas o vies econômico, com a insercao da iniciativa privada na vida

econômica e na fixacao de mercados e de precos, mas se destina tambem a

propiciar a realizacao de certos valores de natureza social, que indiretamente

ou diretamente sao abarcados como finalidades da regulacao econômica, tais

como a efetivacao e a protecao dos direitos fundamentais, incluindo aqui, o

direito ao desenvolvimento econômico nacional e a protecao do meio ambiente.

A Politica Nacional Sobre Mudanca do Clima (PNMC), e a

personificacao dessa intervencao do Estado que a criou como meio de regular

as atividades econômicas que influenciam a mudanca do clima, propondo

instrumentos e mecanismos para esse fim. Cabe mencionar ainda que o papel

do Estado de protetor do clima tambem atinge a própria implementacao da

PNMC, nao basta apenas instituir a politica, e necessário implementá-la no

seio social, em todos os entes da federacao como forma de concretizacao da

justica climática social.

E para tanto, a sociedade brasileira tem funcao essencial a ser exercida

em meio ao ambiente democrático, pois, o pluralismo e a participacao

democrática social, como um artificio politico, requer tambem que a sociedade

interaja, participando ativamente do desenvolvimento social, principalmente,

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reclamando a efetividade de politicas públicas, como a PNMC e a implantacao

do ideário de desenvolvimento sustentável.

A Constituição Federal Brasileira determina que “todos tem direito ao

meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e

essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à

coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras

geracoes”. O art. 225, caput, da Constituição de 1988 estabelece a norma

principal do direito ambiental brasileiro cuja efetividade e consecução do direito

fundamental ao desenvolvimento sustentável requer que os atores políticos e

econômicos devam passar a combinar crescimento com desenvolvimento

sustentável, em lugar de enxergá-los como contraditórios.

Combinação que surge, pois, para criar uma resposta à necessidade de

harmonizar os processos ambientais aos socioeconômicos, maximizando a

produção dos ecossistemas, para favorecer as necessidades humanas

presentes e futuras. Podemos inferir que a maior virtude dessa abordagem é

que, além da incorporação definitiva dos aspectos ecológicos no plano teórico,

enfatiza a necessidade de inverter a tendência autodestrutiva dos processos de

desenvolvimento em relação à destruição inconsequente e desmedida do meio

ambiente.

Dentre as transformações mundiais das últimas décadas, tomam

destaque aquelas vinculadas à degradação ambiental. Articulam-se, portanto,

entre os maiores poluidores como Estados Unidos da América e China, ações

em busca da diminuição dos danos ambientais, em contrapartida ao

crescimento econômico e industrial, ao soar o alarme dado pelos fenômenos

de aquecimento global e a destruição da camada de ozônio, dentre outros

problemas.

Mudanças estão havendo, pois, devemos compreender que as questões

econômicas e ambientais caminham de forma indissociável e qualquer tentativa

de separá-las estaria fadada ao insucesso. Grandes avanços foram

conseguidos devido à construção teórica ocidental dos direitos humanos, no

entanto, sua reconstrução diária é necessária para que tais avanços não

redundem na legitimação da exclusão social ou no tratamento do meio

ambiente como um elemento dissociado do ser humano.

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Sustentabilidade importa considerar a diversidade socioambiental que

enriquece o mundo e suas relações sociais. A economia, por sua vez, mostra-

se carente de um tratamento que se volte às questões do bem-estar humano,

como defende Sen, em detrimento de sua função meramente

desenvolvimentista.

Nesse sentido, podemos observar que a grande contribuição da obra de

Sen para a reestruturação de valores consiste nessa (re)valorização da

economia para o bem-estar humano e na adoção da definição de

“Desenvolvimento como Liberdade”, numa perspectiva humanista, que permita

o tratamento da questão da sustentabilidade humana pela ótica subjetiva,

considerando os valores que cada cultura preconiza como importantes para si

e para sua coletividade, na consolidacao de sua “condicao de agente”.

Da mesma forma, Sen infere a necessidade de que o conceito de

desenvolvimento sustentável não caminhe somente pela órbita das

necessidades humanas, de forma egoísta, mas instigue a pensar o meio

ambiente como algo maior, intrínseco aos territórios essenciais à realização da

vida, remetendo-se à ideia de resgatar os sentidos do vínculo e do limite nas

relações entre humanidade e natureza.

Considerando as lições de Sen, podemos concluir que o conceito de

desenvolvimento deve voltar-se à humanidade, de forma a dotá-la da “condicao

de agente”, a fim de que as pessoas possam interferir em prol da salvaguarda

dos valores da sustentabilidade ambiental perante a sociedade e o Estado.

Mais que isso para que lhes seja possível atuar de forma mais incisiva e efetiva

nas questões do desenvolvimento sustentável, instituído como direito

fundamental, pois demanda reflexos na qualidade de vida de todos, condição

fundamental para uma vida digna.

Assim, a lei brasileira não deixa de atribuir legitimidade jurídico-política

para as pessoas, mas também para organizações públicas e privadas e para

os órgãos estatais, como o Ministério Público, agirem em razão da defesa ao

meio ambiente. Sendo de destaque a atuação dos Ministérios Públicos

Estaduais e Federais na defesa ambiental, utilizando-se de meios jurídicos,

como a ação civil pública, ação penal, execuções, e formas extraprocessuais,

como Inquérito Civil e o Termo de ajustamento de conduta (TAC), a promover a

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responsabilização pelos danos ambientais, sendo a punição também meio de

prevenção de danos e, portanto, de efetivação do direito fundamental ao

desenvolvimento sustentável.

A atuação do STF nesse sentido merece destaque, pois seguindo o

entendimento de que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é

um princípio fundamental ao qual todo o cidadão possui direito, vem

produzindo diversas decisões nas quais interpreta nesse sentido, como no

caso da possibilidade ou não de importação e utilização de pneus usados

(ADPF 101-3/DF), da proibição de atos cruéis contra animais (RE 153.531/SC

e ADI 1.856/RJ), da desnecessidade de lei para autorizar obras ou atividades

em espaços territoriais que sejam especialmente protegidos (ADI 3.540-1/DF)

e, por fim, a irrazoabilidade da proibição estadual de plantação de eucalipto

para a produção de celulose (ADI 2.623-2/ES). Esses eventos constituem

exemplos da formação de uma verdadeira jurisprudência constitucional

ambiental pelo Supremo Tribunal Federal que reconhece o meio ambiente

saudável como um direito fundamental garantido a todo o cidadão brasileiro.

Logo, a gestação e implementação de estratégias de desenvolvimento

atentas ao dever ético de proteção da qualidade ambiental, para as presentes e

futuras gerações, a participação ativa do cidadão com capacidade de intervir

como agente na sociedade, implementam, justificam e fundamentam o

desenvolvimento sustentável como um direito fundamental, ora pela

interpretação sistêmica do ordenamento jurídico, em especial o artigo 225 da

Constituição Federal, demais artigos da constituição e leis infraconstitucionais,

em conjunto com a posição do STF.

O Supremo Tribunal Federal considera o desenvolvimento sustentável

com um direito fundamental, promovendo a integridade do meio ambiente a

tipico direito de terceira geracao. A acao constitui prerrogativa juridica de

titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmacao dos direitos

humanos, a expressao significativa de um poder atribuido, nao ao individuo

identificado em sua singularidade, mas num sentido verdadeiramente mais

abrangente, à própria coletividade social, que em busca da efetivacao deste

direito fundamental deve agir, pessoal e conjuntamente na busca da

consideração ambiental no respeito às pessoas de hoje e do amanhã, ao meio

ambiente e, enfim, a vida.

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