O inexplicável caso da Orelha de Lolô

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Análise do conto "o inexplicável caso da orelha de lolô" pela perspectiva da hermenêutica simbólica e dos mitos

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  • OBJETIVOAnalisar algumas das relaes entre o mito arcaico das Moiras e o entrelaamento dos

    personagens Anzio, Branca e Lol construdos na rede de signifcaes inslitas que tecida no conto "O caso inexplicvel da orelha de Lol".

    INTRODUOO destino, linha que rege a vida de todos os seres mexe com o imaginrio humano, uma

    vez que ele vem reforar a inefccia de se fugir aos desgnios divinos. Deste modo, ele aparece na Mitologia Grega como algo que est acima dos homens e dos prprios deuses e ningum, alm das Moiras, capaz de gui-lo. Cabe trade fandeira velar pelo destino de cada criana que nasce no mundo, defnindo desde seu nascimento o trajeto de sua vida at a morte. Assim como o destino do homem determinado na mitologia pelas fguras de Clotos (que puxa o fo da vida), Lquesis (que o mede) e tropos (que o corta), no serto goiano o destino do sertanejo determinado pelo coronel, fora que governa seu universo, determinando quanto e como ser a vida de seus agregados.

    Universidade Federal de GoisPrograma de Ps-Graduao em Letras e Lingustica

    X Congresso de Pesquisa e Extenso Conpeex

    O FIO DA MOIRA EM O CASO INEXPLICVEL DA ORELHA DE LOLRODRIGUES, Letcia Cristina Alcntara 1;.CNOVAS, Suzana Y. L. Machado2 FL/UFG

    1E-mail: [email protected] 2E-mail: [email protected]

    FUNDAMENTAO TERICAOs coronis

    A literatura produzida em solo goiano na primeira metade do sculo XX chama a ateno por trazer a tona a denncia social, uma das caractersticas do Regionalismo desenvolvido no Modernismo ps 1930. Nesse contexto, a obra de Bernardo lis se destaca, uma vez que o escritor utiliza-se de diversos artifcios para desnudar as mazelas sofridas pelo sertanejo, sujeito aos mandos e desmandos dos senhores da terra, uma das fguras formadoras da sociedade brasileira. Em uma sociedade que se desenvolveu patriarcal e aristocraticamente (FREIRE, 2000, p. 247), a fgura do coronel surge no apenas como senhor da terra, meio econmico promovedor da sobrevivncia do homem sertanejo, mas tambm senhor de tudo que est relacionado terra. Seu poder herdado da famlia patriarcal, que tem a propriedade rural sujeita sua vontade, cuja ordem no podia ser questionada e poder era virtualmente ilimitado e poucos freios existiam para sua tirania (HOLANDA, 1995). esse poder quase ilimitado, herdado pelo coronel que lhe confere o statu quo de senhor da vida e da morte, ele quem traa o destino de seus protegidos e crias.

    As moiras

    Deusas da primeira gerao na mitologia grega, as Moiras nasceram de Nix, a noite. Cloto () segura o fuso e tece o fo da vida; Lquesis () puxa e enrola do fo tecido e tropos () corta o fo da vida. Segundo a mitologia, as irms utilizavam-se da Roda da Fortuna, que ao girar durante o tecer do fo, apresenta o carter variante da vida do homem, ora privilegiada, ora indesejada. Segundo Duffy (2007), a palavra mais empregada por Homero em Ilada para se referir fortuna dos homens Moira, que utilizada no sentido de o que est destinado/fadado ao homem. O destino, ou as Moiras, mostra-se infexveis, inevitveis, pois o homem no pode abandonar sua fortuna, nem se esconder dela. inexorvel que tropos corte o fo tecido e sorteado pelas irms, afnal, a sua funo. Assim, o destino s conduz a um caminho, ao derradeiro fnal.

    Tecendo o fo

    As Estruturas Antropolgicas do Imaginrio proposta por Gilbert Durand busca a classifcao de imagens dentro de dois grandes regimes simblicos: o noturno e o diurno. No primeiro regime as imagens se organizam ao redor de dois grupos: mstico - smbolos de inverso e intimidade - e sinttico que de divide em cclico e rtmico. No segundo regime encontram-se as imagens caracterizadas por uma anttese, formadas a partir da "dupla polarizao das imagens" (DURAND, 2002, p. 67), gerando um antagonismo entre as imagens que iro se reunir em torno de trs agrupamentos que se interligam ao medo da queda. Durand (2002), no regime Diurno das Imagens, classifca os smbolos em trs epifanias frente angustiante face do tempo, implacvel e irresoluto para com a humanidade.

    Os smbolos teriomrfcos contemplam o simbolismo animal, por vezes o mais frequente nas imagens. J os smbolos nictomrfcos englobam os smbolos das trevas e do barulho, uma vez que o tempo, por ser irracional e sem piedade negro. Por fm, h os smbolos catamrfcos, em que residem as imagens dinmicas da queda, do fm, da morte. O conto CIOL traz a histria trgica de um amor entre primos. E aps Branca recusar-se a cumprir o destino traado pelo av, que mandou com que ela se casasse com o primo, ela foge com o negro Lol. Anzio, diante da recusa da prima voltar para casa com ele, decreta a sentena para o negro: - Que desgraado! Merecia morrer, o desaforado! (LIS, CIOL, 2011, p. 41). O ato de decretar o destino de Lol, como uma punio pelos atos cometidos contra a prima, aproxima Anzio das Moiras, visto que essas tambm decretam a morte. Anzio assume o papel de tropos, e com seu punhal, declara-se senhor pronto para partir o fo tecido pelas outras irms gregas.

    CONCLUSO

    A vastido de imagens que esto presentes nas obras de Bernardo lis encantadora. O autor cria redes interligadas entre essas imagens que confguram o ambiente perfeito para o aparecimento de personagens complexas, cruis, reais e ao mesmo tempo fantsticas. Pretendeu-se, assim, compreender como essa rede imagtica era tecida e o quanto alguns personagens se aproximavam do mito das Moiras. Anzio, como representando da classe dominante do serto goiano, a personagem que primeiro vai desenvolver o papel de algoz da vida humana, detendo o poder de vida e morte tanto de Lol quanto de Branca, pois a qualquer momento ele poderia ter retirado Branca de dentro do calabouo e lhe dado uma nova chance. Seu comportamento demonstra o quanto irresoluta a morte e a ordem de um coronel.

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    CHEVALIER, Jean; GHEERBRAND, Alain. Dicionrio dos Smbolos: mitos, sonhos, costumes, gestos, formas, fguras, cores, nmeros. Trad. Vera da Costa e Silva. 15.ed. Rio de Janeiro : Jose Olympio, 2000.

    DUFFY, James. A concepo de Homero do Destino. Trad. Leonardo Teixeira de Oliveira. Disponvel em . Acesso em 20 nov. 2012.

    DURAND, Gilbert. As estruturas antropolgicas do imaginrio. 2.ed. So Paulo: Martins Fontes, 2001.

    LIS, BERNARDO. O caso inexplicvel da orelha de Lol. In: ______. Os melhores contos de Bernardo lis. Seleo de Gilberto Mendona Teles. 2.ed. So Paulo: Global, 2011. p. 35-44.

    FREYRE, Gilberto. Introduo Segunda Edio. In: SANTIAGO, Silviano (coord.). Intpretes do Brasil. Rio de Janeiro: Nova Aguiar, 2000. p. 755-804.

    ______. Caractersticas gerais da colonizao portuguesa do Brasil: formao de uma sociedade agrria, escravocrata e hbrida. In: SANTIAGO, Silviano (coord.). Intpretes do Brasil. Rio de Janeiro: Nova Aguiar, 2000. p. 235-279.

    HOLANDA, Srgio Buarque de. Razes do Brasil. 26. Ed. So Paulo: Companhia das Letras, 1995.

    MIRCEA, Eliade. Imagens e Smbolos. Traduo de Maria Adozinda Oliveira Soares. Lisboa: Arcdia, 1979.

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