O problema do paradoxo do zero

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O PROBLEMA DO PARADOXO DO ZERO PRIMEIRA EDIÇÃO 2014 WILSON LUQUES COSTA

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O PROBLEMA DO PARADOXO DO ZERO

PRIMEIRA EDIÇÃO

2014

WILSON LUQUES COSTA

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Para a minha esposa Raquel, farol que me ilumina.

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Todos os direitos para Wilson Luques Costa

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.

A IMPORTÂNCIA PREPONDERANTE DOS PROBLEMAS

FILOSÓFICOS FRENTE A QUALQUER OUTRO ELEMENTO

DA FILOSOFIA COMO UM TODO

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Resumo

O principal objetivo de nosso trabalho

é justificar A importância preponderante dos

problemas filosóficos frente a qualquer outro

elemento da filosofia como um todo. Para

tanto, centrar-no-emos na necessidade da

aritmética, especialmente em Kant e Frege que

parecem acreditar em seus pressupostos. No

desenvolvimento de nosso trabalho,

procuraremos demonstrar a possível

precariedade da sua justificativa racional,

sobretudo, quando lidamos com o número

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zero. Queremos também enfatizar que não é

objeto desse trabalho a audácia de questionar

filósofos universais, mas colocar perguntas

que poderão despertar o desejo de respondê-las

ou problematizá-las por aqueles que,

porventura, puderem se interessar pelo

assunto.

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Palavras-chave

Necessidade, Contradição, Verdade, Filosofia, Kant, Frege.

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Abstract

The main objective of our work is to

justify the overriding importance of

philosophical problems facing any other

element of philosophy as a whole. Therefore,

we will focus on the need of arithmetic,

especially Kant and Frege who seem to believe

in their assumptions. In the development of

our work, we aim to show the potential

precariousness of their rationale, especially

when dealing with the number zero. We also

want to emphasize that this work is not subject

to universal philosophers audacity to question,

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but to ask questions that might arouse the

desire to answer them or problematize them by

those who, perhaps, may be interested in the

subject.

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Keywords

Need, Contradiction, Truth, Philosophy, Kant, Frege.

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Introdução

O presente trabalho tem como escopo

mostrar que não podemos ainda considerar a

chamada ciência matemática como a mais fiel

portadora daquilo que se denomina

necessidade. Podemos ainda dizer que a

palavra necessidade é um conceito muito

usado pelos filósofos para demonstrar algo que

está próximo da verdade ou que não contém

contradição. Consoante as palavras do filósofo

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alemão Immanuel Kant (1724 – 1804), “o uso

dogmático da razão sem crítica conduz (...) a

afirmações infundadas” (KANT, 1988, p.34).

Por isso que para justificar o nosso trabalho,

pretendemos apontar algumas inconsistências

na matemática, sobretudo na aritmética,

quando envolvemos o número zero numa

relação multiplicativa. Ao longo desse

trabalho, vamos relacionar os nossos

apontamentos críticos a algumas passagens de

textos do filósofo alemão Immanuel Kant e do

matemático alemão Gottlob Frege (1848 –

1925), para ao cabo dele propormos um olhar

mais atento para a aritmética antes de

considerá-la como exemplo de necessidade e

de não contradição. Esperamos também que o

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fazer filosófico aponha o seu olhar de coruja

vigilante diante de estados tidos como já dados

e que vele pela verdade somente demonstrada

pelas justificativas racionais que não lhe

apontem uma contradição, como parece

acontecer ainda quando tratamos da aritmética.

Não obstante tratarmos de conceitos

filosóficos mais adstritos a quem se interesse

pelo filosofar aparentemente mais esotérico,

pensamos que esse trabalho aponta para uma

clareza de entendimento que só será percebida

quando houver a vontade livre de compreender

do que ele trata. Assim sendo, o nosso trabalho

tem o propósito de fazer um elogio às

problematizações.

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Um olhar de espanto sobre a necessidade aritmética

Há com efeito em todo filosofar um

processo dialógico com os textos. Para tanto,

é necessário embrenhar-se de tal forma com

eles para que se efetive a sua compreensão. E

foi por ter contatado como o livro Crítica da

razão pura do filósofo alemão Immanuel Kant,

que percebemos a nossa não compreensão da

certeza depositada por ele naquilo que se

denomina matemática. A nossa dúvida

emanou-se quando percebemos que, não

obstante a matemática gozar de um status

racional em suas relações, a razão nem

sempre está ali para acudi-la com os seus

critérios. É o caso, quando, por exemplo, numa

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relação multiplicativa envolvemos o chamado

número natural zero. É comum aceitarmos em

nossos afazeres diários e acharmos até natural

que 1 x 0 = 0 é uma relação que resulta numa

verdade incontestável e absoluta. Todavia, ao

procurarmos nos estribar nos critérios

racionais, percebemos que temos dificuldades

extremas em justificar essa denominada

verdade. E foi pensando nisso que viemos

propor um olhar mais atento àquilo que

julgamos ser uma possível contradição. O fato

de citarmos o pensador de Königsberg, não

tem a intenção de imiscuirmo-nos em seu

tratado magno, nem muito menos tangenciar o

seu pensamento ou tentar denegá-lo; muito

pelo contrário, pretendemos isto sim

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simplesmente dialogar com alguns excertos

seus para alertar que a sua compreensão e

conceituação de juízo a priori como necessário

e universal colocam-se em xeque, quando o

filósofo alemão toma como fundamento para

as suas explicações à chamada matemática e

principalmente a aritmética. O mesmo pode-se

dizer em relação ao matemático alemão

Gottlob Frege, que também à maneira de Kant

aponta a aritmética como exemplo de

necessidade. O nosso propósito, portanto, é

fazer um contato com algumas pequenas

asserções, principalmente dos dois pensadores

já citados, para tentarmos apontar que as suas

certezas ainda carecem de uma justificativa do

tipo racional.

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Pretendemos também elaborar uma

conclusão propondo um olhar mais atento às

aporias matemáticas e justificar com o nosso

pequeno trabalho a importância da

contribuição do perguntar e das

problematizações para o processo filosófico.

Sempre é de bom tom saber que a filosofia

é um diálogo sobre as conceituações como

também sobre os ajustes e retificações que se

fazem necessários, quando erros e desvios

impregnam-se na linguagem. É sabido que

verdades arbitrárias e não fundadas no estrito

juízo da razão pressupõem outras tantas

arbitrariedades. Sendo assim, não devemos dar

desprezo a pontos fulcrais da filosofia que

possam aparentar meras vaidades egocêntricas

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que não nos servem para nada. É, por

exemplo, quando se trata da própria ciência ou

da própria ética. No livro Crítica da razão

pura, o filósofo alemão Immanuel Kant vai

tratar da definição do que é experiência e não

experiência, para poder tratar de juízos a priori

e não a priori, ou tratar antes da matemática

para firmar a sua conceituação e por fim para

tratar, desde que tudo racionalmente fundado,

das nossas ações em outros textos ou livros.

De modo que o conceitual interfere no factual

e o factual, menos talvez, no conceitual. E é

por isso que é preciso fazer uma revisão nas

afirmações, para que essas possam ser

fundadas pela própria razão e não pelo

consenso dos princípios das autoridades; Kant

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é claro em aceitar que "ciência é algo que

progride, que avança, que acumula" por isso "

o conhecimento científico deve pois ser

necessário, universal e acumulativo ou

extensivo.” E foi pensando nisso que

propusemos uma leitura sobre os fundamentos

da aritmética para nos convencer, após disso,

de sua necessidade e universalidade e, por

conseguinte, de suas fundamentações

ulteriores; no Capítulo primeiro do livro

Crítica da razão pura, Kant fará uma distinção

entre o Conhecimento Puro e Empírico: “Os

conhecimentos“ a priori” ainda podem dividir-

se em puros e impuros. Denomina-se

conhecimento “a priori” puro ao que carece

completamente de qualquer empirismo”

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(KANT, 1988, p. 22); e para isso ele vai se

valer da importância da experiência como a

base da linguagem e por consequência de

nossos conhecimentos. Parece ser o propósito

de Kant primeiro fazer uma distinção entre o

conhecimento empírico do não empírico, para

poder, depois disso, fazer a distinção ou

distinções que podem ocorrer naquilo que se

denomina de a priori, ou seja, o conhecimento

que não passa pela experiência. É sabido que

Kant não nega o valor da experiência, pois o

próprio Kant inicia o I parágrafo da Crítica da

razão pura afirmando o caráter primordial da

experiência para a aquisição de nossos

conhecimentos; ele já enceta o parágrafo

confirmando o valor da experiência: “não se

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pode duvidar de que todos os nossos

conhecimentos começam com a experiência”

(KANT, 1988, p. 21). Todavia, percebemos

que ao invés de Kant começar definindo o que

é experiência, ele prefere fazer uma primeira

explicação tomando como base não uma

definição conceitual que virá no final do

parágrafo, mas a relação de nossos sentidos

com os chamados objetos sensíveis, o que

pode dificultar a leitura e o entendimento do

texto, porque Kant parece supor que todos já

compreendam o que é experiência: “como

haveria a exercitar-se a faculdade de se

conhecer, se não fosse pelos objetos que,

excitando os nossos sentidos, de uma parte,

produzem, por si mesmos, representações, e de

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outra parte, impulsionam a nossa inteligência a

compará-los entre si, a reuni-los ou separá-los,

e deste modo à elaboração da matéria informe

das impressões sensíveis para esse

conhecimento das coisas que se denomina

experiência? (KANT, 1988, p. 21). Parece ser

o intuito de Kant fixar-se menos na

experiência do que no a priori, porque para

Kant o a priori, ao contrário do conhecimento

empírico, tem o caráter da necessidade e, por

conseguinte, da universalidade. Kant bem

define no próprio capítulo citado o que é

conhecimento a priori, pois para ele são “todos

aqueles que são absolutamente independentes

da experiência.” (KANT, 1988, p. 22). Mas

esse não seria a nosso ver o problema que nos

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leva a citá-lo; Kant quando distingue o

empírico do a priori, envolve-se numa não

aparente tão difícil tarefa de também distinguir

os conhecimentos a priori em puros e em

impuros. Entretanto, em meio a tantas

particularidades da obra magna do mestre de

Königsberg, o que nos faz focar em parte de

sua obra é a sua fé, digamos assim, do caráter

necessário da aritmética; pois acreditamos que

a matemática ainda não possui a

universalidade e necessidade tão esperadas,

porquanto incorre em não soluções ensejadas

em seu próprio núcleo, que preferimos

provisoriamente denominá-las de anomalias.

É preciso antes compreender que não

são, a nosso parecer, para Kant a matemática e

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a aritmética o seu foco principal. Kant as

utiliza mais no sentido de dar uma base

fundadora para as suas argumentações.

Entretanto, não podemos tergiversar e assim

dar crédito às suas argumentações por se tratar

de Kant. É necessário compreender de onde

provém essa necessidade da aritmética que

muitos acreditam sem tanto questionar ou

colocar-lhe suspeitas como sobre as coisas

metafísicas. Sabemos que Kant vai colocar a

Metafísica abaixo da ciência matemática por

não conseguir responder às fundamentações

racionais, mas será que, não obstante a sua

linguagem artificial criada pelos homens, a

aritmética não cai nesse impasse se também

não responde a muitas outras fundamentações?

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O caráter de nossa suspeita tem uma

explicação, se não lógica pela sua própria

fundamentação, porque percebemos que, e não

desdenhando outras tantas anomalias que já

possam ocorrer (Parece que fica difícil

também saber se os números são finitos ou

infinitos) a chamada aritmética não consegue

explicar porque um determinado número

natural, a saber, zero, quando se envolve numa

relação multiplicativa com outros números ou

com o próprio zero cria algo, por um tipo de

condição de prova, anômalo ou não

explicativo, o que não ocorre com os demais

números denominados de naturais. E foi por

perceber esse estado anômalo que procuramos,

pela via da filosofia e não da matemática,

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questionar esse talvez provisório problema,

para que não sejam justificadas as palavras do

próprio Kant que já nos diz sobre esses

possíveis embaraços, porque “o desejo de

estender os nossos conhecimentos é tão grande

que só detém seus passos quando tropeça

numa contradição claríssima” (KANT, 1988,

p. 26). Como pretendemos ampliar essas

questões num trabalho de maior fôlego,

intencionaremos aqui tão somente fazer

algumas demonstrações para poder compará-

las posteriormente com a obra do próprio Kant

e de outro grande matemático, Frege, que

também parece depositar uma fé inabalável na

chamada aritmética. Somos sabedores dos

abismos que poderemos encontrar, ao tentar

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trabalhar com um tema de especialistas e de

difícil consenso, porém julgamos serem

necessárias as exposições de nossas dúvidas,

sobretudo quando acreditamos que fizemos se

não completa alguma razoável inserção pela

compreensão dos problemas, através de

leituras e de releituras dos próprios autores

como de seus mais diretos comentadores. Por

isso que para o bom funcionamento didático

de nossa exposição, preferiremos tratar de

alguns assuntos que procurarão seguir uma

determinada ordem.

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De onde provém a necessidade da aritmética?

É comum, mesmo entre os filósofos,

acreditar na necessidade da aritmética. Porém

seria de se perguntar: De onde provém a

necessidade da aritmética? São sabidamente

conhecidas e reconhecidas as dúvidas que se

colocam quanto às questões de Deus,

liberdade, alma etc. O próprio filósofo alemão

Immanuel Kant nos dá esse exemplo, quando

aborda sobre a Metafísica, dizendo-nos que

“sua marcha é, no princípio, dogmática; quer

dizer, ela enceta confiadamente o seu trabalho

sem ter provas de potência ou impotência de

nossa razão para tão grande empresa” (KANT,

1988, p. 25). Mas deixa de elaborar a mesma

pergunta à matemática e principalmente à

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aritmética por acreditá-la e creditá-la ao que

parece infalível. Kant em seu livro já nos

informa de sua necessidade e universalidade,

sem pelo menos nos explicitar o porquê dessa

certeza; ao contrário, mostra-nos essa

confiança como coisa simplesmente dada de si

para si, sem ao menos questioná-la: “pois

desfrutando de certeza uma parte de nossos

conhecimentos, a Matemática, concebe-se a

fagueira esperança de que os demais cheguem

ao mesmo ponto” (KANT, 1988, p. 26). O que

efetivamente estamos procurando fazer é um

perguntar a essa certeza kantiana. Será que

Kant não percebia que essa certeza estava

possivelmente eivada de um possível processo

indutivo? Como poderia Kant depositar essa

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certeza sobre os números se não o conhecemos

em sua plena totalidade? Sabemos que o

processo indutivo, que parte do particular para

o geral, não nos afirma nada sobre a totalidade

das coisas; por isso também que,

independentemente da dúvida da condição da

prova que proporemos nesse trabalho,

julgamos precipitada essa certeza kantiana,

que deveria ser antes tratada, para se chegar às

suas questões transcendentais. É como que,

como grande filósofo que foi e é se

desinteressasse ou não percebesse a dimensão

deste possível problema. Nesse sentido, Kant,

a nosso ver, não procurou usar os instrumentos

da razão para creditar a razão e posteriormente

os seus tão elementares e transcendentais

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argumentos. Como bem nos informa uma

passagem do livro: A filosofia a partir de seus

problemas, “o núcleo essencial da filosofia não

é constituído de crenças tematicamente

definidas e racionalmente fundadas, senão de

problemas e soluções”. No texto trabalhado no

curso de Especialização em Docência em

Filosofia pela Unesp, podemos destacar que

aprendemos com Antonio Trajano Menezes de

Arruda que filosofia é espanto; “ com efeito,

nada é capaz de provocar espanto/perplexidade

a não ser um problema, uma questão”

(ARRUDA, 2011, p.11). Por isso esse trabalho

não tem a objetivação primeira de definir um

problema e, por conseguinte, a sua solução,

que seria, a nosso ver, uma tarefa um tanto

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quanto despropositada para o momento; esse

trabalho vem mais no intuito de se fazer um

elogio às problematizações filosóficas que,

excetuando alguns poucos trabalhos até o

momento publicados, não vem se constituindo

como o leitmotiv de um filosofar que pretenda

sair do seu secular “comentarismo”, pois “o

“comentarismo” é o principal fator que tem

entravado o aparecimento na universidade

brasileira de uma reflexão filosófica original

regular e consistente.” Outro ponto que nos

leva à consecução do que aqui se pretende

tratar é a tentativa de mostrar que é necessário

fazer um ajuste na chamada aritmética, se se

pretende tê-la como um paradigma de uma

ciência que se constitui nas bases seguras da

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necessidade e universalidade. Sem pretender

adentrar e nem sequer perpassar as obras

titânicas de Kant e Frege, objetiva-se aqui

também mostrar que a conceituação de a priori

coloca-se em xeque na matemática, quando ela

não consegue explicitar pelos próprios

instrumentos da razão as suas possíveis aporias

e contradições. Mas como demonstrar essas

possíveis contradições e aporias que a

matemática e, sobretudo, a

aritmética incidem? Como encetar e embasar

o método ou caminho? São justamente essas

perguntas que também se colocam à própria

ciência, porquanto é deveras difícil demonstrar

uma razão, sem que se aponte para perguntas

que já se problematizam. Por isso que em face

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dessas dificuldades que gerariam outras

dificuldades, pretende-se não tirar o foco do

assunto e seguir num abrir de janelas que não

poderiam ser fechadas, funcionando menos

como janelas esclarecedoras, que é o propósito

desse trabalho. Para isso, agora, pretendemos

apresentar aquilo que preferimos denominar de

condição da prova. Podemos dizer que a

condição da prova é um tipo de fórmula, a

saber, a x b = c sse c : b = a que tenta explicar

a não contradição dos números nela aplicados

num efeito de multiplicação e divisão. Não

obstante, a dificuldade de esclarecer ou

justificar lógica ou racionalmente como essa -

vamos chamá-la provisoriamente assim -

condição da prova se deu, deve-se, no entanto,

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atentar como e por que os elementos nela

testados (chamemos de números naturais)

apresentam-se ora como imagens idênticas, ora

não. Apresentada a condição da prova,

passaremos a aplicar os elementos numéricos

naturais para a justificação das imagens. Na

condição da prova, chamaremos valores de

verdade e de não contradição quando os

elementos possuírem a mesma imagem, e não

incidirem em contradição e chamaremos de

contradição ou aporia, quando houver pelo

menos uma ou mais imagens diferentes, ou

imagens idênticas, mas que geram contradição.

Para tanto, embasamo-nos nas ideias do

filósofo austríaco Wittgenstein acerca das

regras: “somente por meio do seguimento

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correto da regra pode-se demonstrar, ou seja,

julgar se uma demonstração tem força

comprobatória.” (BUCHHOLZ, 2008, p.37).

Exemplo 1. a = 2 b = 3 c = ? Escolhidos

esses números, vamos aplicá-los na Condição

da Prova: 2 x 3 = 6 sse 6 : 3 = 2. Após a

aplicação da condição da prova aos elementos

naturais escolhidos acima, podemos perceber

que as imagens são idênticas para a, b e c;

sendo a = 2 b = 3 e c = 6.

Sendo assim, podemos considerar

dentro das regras estabelecidas como

verdadeiros e não contraditórios. Agora vamos

escolher os números maiores ou iguais a zero,

a saber, a = 1 b = 0 c = ? -- escolhidos esses

números, vamos à aplicação da condição da

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prova: 1 x 0 = 0 sse 0 : 0 = 1. Feita a aplicação

da condição da prova, envolvendo agora o

número zero, percebemos que para as imagens

serem idênticas, haveria que ocorrer uma

contradição na matemática ou aritmética, o

que concorreria para algumas análises que

pretendemos fazer, ou melhor, nessas

condições apresentadas, ocorreu uma

contradição num juízo a priori e a aritmética

colocou-se em xeque diante dos juízos da

razão: Princípio da Identidade, Princípio do

Terceiro Excluído, Princípio da Causa

Eficiente, Princípio da não Contradição.

Verificamos que o número zero causa um

problema para a justificação racional de seu

produto. Desse modo, parece que nos

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encontramos diante de um problema na

matemática e, em particular, na aritmética.

Evidente é que quando tentamos colocar esse

problema, não estamos advogando, nem nos

embasando na frase conhecida de Marx (1818

– 1883) que afirma que “a tradição de todas as

gerações mortas oprime como um pesadelo o

cérebro dos vivos” (GIANNETTI, 2008, p.25)

-- e é diante disso que preferimos a definição

de que “um problema é formulável na

linguagem, em uma sentença interrogativa” e

estribando-nos nessa definição que

formulamos a seguinte pergunta: Por que a

condição da prova aponta uma contradição na

matemática e, em particular, na aritmética,

quando trabalhamos com o número zero? Se

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retornarmos ao livro A filosofia a partir de

seus problemas (de Mario Ariel Gonzáles

Porta), vamos encontrar a seguinte afirmação:

“O núcleo essencial da filosofia não é

constituído de crenças tematicamente definidas

e racionalmente fundadas, senão de problemas

e soluções”. Nesse sentido, é oportuno apontar

para a necessidade primeira de um perguntar e

dialogar, do que propriamente a volição de

uma problematização e a consequente solução;

mister é pois destacar que, não obstante o tema

tratar das problematizações, o intuito é um

perguntar, posto haver, em nosso

entendimento, uma diferença de grau entre o

perguntar e o problematizar. Entendemos que

há uma diferença de grau entre o perguntar e o

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problematizar, já que o perguntar traria em seu

bojo menos um conhecimento holístico dos

problemas tratados; o perguntar seria a ante-

sala das problematizações, porquanto traz em

si ainda a não compreensão plena das

problematizações; no perguntar subjaz, talvez,

a pátina das compreensões parciais; o

perguntar seria uma primeira etapa que precisa

ser trabalhada e polida, seria a escada que

poderia levar às problematizações, mas não o

seu patamar. Se o perguntar é a ante-sala das

problematizações, a problematização, por seu

turno, é o patamar do perguntar ao problema;

de maneira que enquanto a pergunta duvida

tout court, a problematização pergunta para os

problemas, ou melhor dizendo, sabe dos

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problemas, por isso pergunta; a

problematização é um perguntar consciente,

porque tem seu alvo, seu télos; a

problematização seria um diálogo interposto

entre outros diálogos, por isso dialético. Como

bem se afirma, “se o público em geral não

entende o que os filósofos fazem e crê que

cada um simplesmente diz o que quer isso se

deve, em grande medida, ao fato de que não

entende o problema ou, mais ainda, não toma

consciência de um problema”.

Por isso são, com efeito, de vital

importância para a filosofia os problemas

filosóficos, porque ao problematizarem

mostram e denotam que o filosofar é um in

fieri e que as problematizações vêm adicionar

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ou corrigir alguns pontos não tão claros ou

evidentes; mas para isso como bem nos

informa o texto trabalhado em nosso curso “é

preciso desvencilhar-se do hábito, pois “o

hábito, embora seja em geral uma coisa

vantajosa, pois sem ele teríamos que estar

sempre reaprendendo as coisas e as

habilidades, tem o inconveniente de gerar uma

impressão falsa de conhecimento‟‟ e “para

neutralizar esse inconveniente, é preciso

vencer a tendência para se comportar segundo

a inércia do hábito, do costume” e a pergunta é

como fazer para desvencilhar-se do hábito já

que o hábito é um empecilho para o caminho

das problematizações? Por isso, “a coragem

intelectual” é um meio de quebrar esses

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grilhões que nos acorrentam. Todavia, não é o

ser simplesmente corajoso que valida as

problematizações, porque um homem corajoso

é somente um homem corajoso; é preciso

saber dos problemas; coragem sem

conhecimento é um modo temerário de postar-

se diante dos problemas; a coragem filosófica

exige o denodo pela compreensão intelectual;

e é nisso que a filosofia diferencia-se da

prática do senso comum; por isso a filosofia

não é um perguntar simplesmente vazio.

Voltando às problematizações, podemos dizer

que elas são também a tentativa de um ajuste

que enjeita por isso uma teleologia sistêmica,

porque, conforme Kant, “todos os filósofos

que construíram sistemas viveram num intenso

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sentimento de fragilidade.” (BOTUL, 2000, p.

54) e elas muitas vezes não são e nem

pretendem ser a negação (apóphasis) ou a

eliminação de um paradigma, nem muito

menos uma aceitação passiva; as

problematizações são um estímulo ao filosofar

e ao espanto; é também uma penetração

obsessiva pelos textos, ou melhor, um

mergulho constante nos seus enredamentos, ou

seja, um auscultar mais de perto e não um

simples passar; não se problematiza a filosofia

e os filósofos, se não lemos ou conhecemos as

suas obras e os seus mais argutos

comentadores. Depois de abordarmos sobre o

perguntar e as problematizações, cabe agora

interpor uma pergunta entre dois filósofos, não

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no escopo de problematizar, já que fizemos a

distinção entre problema e pergunta; e a

pergunta surge no intuito de tentar elucidar,

antes, se ela é cabível. Mas antes gostaríamos

de tomar o quadrado dos opostos para tentar

demonstrar o nosso perguntar primeiro para

Kant e depois para Frege. O quadrado dos

opostos é uma figura crida pelos “lógicos

medievais” (CHAUI, 2010, p.129). Essa figura

possibilita, segundo as suas regras, “visualizar

as proposições segundo a qualidade,

quantidade, a modalidade e a relação.”

(CHAUI, 2010, p.129). Desse modo,

procuraremos, abaixo, apresentar o quadrado

dos opostos para facilitar a nossa análise. O

quadrado dos opostos é constituído de “vogais

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minúsculas que indicam a quantidade e a

qualidade (a, e, i, o)” (CHAUI, 2010, p. 129),

onde (a) Universal Afirmativa e (o) Particular

negativa. Pelo quadrado dos opostos, somos

informados pelas suas regras que (o) coloca-se

em contradição com A. Sendo assim, tomamos

como proposição universal para (a) Toda

aritmética é necessária e (o) Alguma aritmética

não é necessária. Nesse sentido, podemos dizer

que quando a razão não consegue justificar

racionalmente por que 1 x 0 = 0 , devemos

alocá-la em (o) – numa sentença particular que

irá contraditar a universalidade de sua

necessidade.

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(A) Toda aritmética é necessária

(O) Alguma aritmética não é necessária

Posta essa concisa e breve explicitação,

urge apor as seguintes perguntas: 1. De onde

provém a necessidade da aritmética e se é de

fato verdadeira? De onde provém

racionalmente tal assertiva? Desenvolvidas

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essas breves considerações anteriores, iremos

tratar dos princípios da razão relacionados com

o problema ou o perguntar colocado pela

aporia. Para isso é preciso, antes, darmos uma

pequena definição desses princípios. Como

bem nos informa o livro Introdução à filosofia

de Marilena Chauí, a razão tem os seus

princípios, pois “desde seus primórdios, a

filosofia considerou que a razão opera segundo

certos princípios...” (CHAUI, 2010, p.71).

Podemos assim dizer que são quatro os

princípios que constituem a razão: 1. Princípio

da Identidade 2. Princípio da não contradição

3. Princípio do Terceiro Excluído 4. Princípio

da Causa Suficiente.

Page 49: O problema do paradoxo do zero

49

Antes de tudo, pretendemos deixar

claro que não é objeto desse trabalho a

problematização desses princípios, embora

problematizáveis. Todavia, queremos nos

escorar em pelo menos dois desses princípios

para podermos elaborar um tipo de teste, já

que sem tais princípios a razão ficaria

comprometida. Ao observarmos, na condição

da prova, a expressão 1 x 0 = 0 sse 0 : 0 = 1,

vamos reparar que o que resulta no teste fere

de um certo modo o princípio da contradição

que “ afirma que uma coisa ou uma ideia da

qual algo é afirmado e negado, ao mesmo

tempo e na mesma relação, são coisas ou

ideias que se negam a si mesmas e que por isso

se autodestroem.” (CHAUI, 2010, p.72).

Page 50: O problema do paradoxo do zero

50

O que queremos destacar é que,

conforme a nossa exposição, para ser verdade

que 1 x 0 = 0, é preciso reconhecer que 0 : 0 =

1 (ad hoc), o que parece não ser aceito

momentaneamente na matemática. Assim

sendo, e tomando como critério o princípio

citado, não queremos reconhecer, conforme

esse princípio enuncia “que as coisas e as

ideias contraditórias são impensáveis e

impossíveis” (CHAUI, 2010, p.72). Desse

modo, pretendemos apontar para uma

preocupação com o impasse criado e não com

a destruição de um paradigma que vem sendo

aceito até com muita eficácia. Somos, com

efeito, sabedores dos avanços da chamada pós-

modernidade; sabemos ainda que é quase

Page 51: O problema do paradoxo do zero

51

impossível e de um esforço hercúleo abranger

a totalidade dos avanços e descobertas tanto na

ciência como entre outros campos; mas isso

não nos impede de tratar questões que estão

em meio à sociedade. Entretanto, aprendemos

ainda que, ao menos no senso comum, há o

falso (F) e o verdadeiro (V), sobretudo e

particularmente na aritmética. Se temos 2 x 3

= 6 não pode resultar cinco, dadas as devidas

regras e não seria possível ser 5, nem 4, nem 2.

Sabemos também, embora questionável a

nosso ver, da universalidade da causação, ou

seja, 2 x 3 é a causa de 6. Se entendemos que

2 x 3 é a causa de 6, a pergunta é: qual é ou

são a causa e/ou causas de Zero (0)? E por que

para ser verdade que 1 x 0 = 0, ou seja, que

Page 52: O problema do paradoxo do zero

52

zero posposto à igualdade é consequência de 1

x 0 ser 0 : 0 a causa do 1? O que desejamos

demonstrar com os exemplos citados é que são

gerados problemas para a aritmética e por

consequência em parte substancial da chamada

matemática universal. Vale lembrar que se

tomarmos o número cinco, é possível

especular sobre as suas quase infindas causas,

a saber, (30/6), (2 + 3), (60/12) etc (isso seria a

nosso ver também outro problema) -- só para

citarmos alguns poucos exemplos. Já no que

concerne ao número zero, teríamos algumas

dificuldades em provar a sua causalidade no

estrito juízo da razão, a saber, 1 x 0 (?); 2 x0

(?) ad infinitum. Nos exemplos citados acima,

estamos tratando da causalidade, quando

Page 53: O problema do paradoxo do zero

53

consideramos o envolvimento de relações e

sinais da regra do jogo; não estamos

considerando os números simplesmente dados

e colocados numa sequência como no exemplo

(0, 1, 2, 3, 4...). Embora o enfoque de nosso

trabalho repouse sobre a possível contradição

que se estabelece quando aplicamos o número

zero numa multiplicação e divisão, caberia

ressaltar também que aqui consideramos o

conceito de número a priori, ou seja,

independente de qualquer experiência. O

próprio matemático alemão Johann Gottlob

Frege já nos diz que “a aritmética não tem

absolutamente nada a ver com sensações.”

(FREGE, 1989, p.89). O foco desse trabalho

não é a questão se o número pode relacionar-se

Page 54: O problema do paradoxo do zero

54

funcionalmente, e isto Frege já confirma em

seu livro Os Fundamentos da Aritmética: “para

que uma verdade seja a posteriori requer-se

que sua demonstração não se possa manter

sem apelo a questão de fato.” (FREGE, 1989,

p.89). Por isso, Frege já define a matemática a

priori: “é possível conduzir a demonstrar

apenas a partir de leis gerais que não admitem

nem exigem demonstração.” (FREGE, 1989,

p.89). É preciso antes notar e saber que a nossa

demonstração não se refere à demonstração de

fato, ou seja, empírica.

Page 55: O problema do paradoxo do zero

55

Um passar por Kant e Frege

Em seu livro Crítica da razão pura, o filósofo

alemão Immanuel Kant faz uma alusão ao

conhecimento a priori, ou seja, o

conhecimento que se dá sem o uso da

experiência e faz a seguinte afirmação

referindo-se à matemática e ao próprio

conhecimento a priori: “ora, é fácil demonstrar

que no conhecimento humano existem

realmente juízos de um valor necessário e na

mais rigorosa significação universal; por

conseguinte, juízos puros, a priori. Se se quer

um exemplo da própria ciência, basta reparar

em todas as proposições da matemática.”

(KANT, 1988, p.23). Claro está que não

pretendemos adentrar a perquerição do que é

Page 56: O problema do paradoxo do zero

56

matemática para Kant no século XVIII. É do

conhecimento por aqueles que se interessam

por Kant o que Kant entendia como

matemática. Todavia, essa afirmação, mesmo

que a matemática não contemplasse na visão

de Kant o que entendemos hoje matemática

com o seu avanço e a sua dinâmica, parece-nos

um pouco precipitada; primeiro, talvez, porque

Kant possuísse uma inabalável fé na

matemática; segundo porque não acreditava

numa possível contradição ou aporia. Nesse

sentido, podemos considerar que um juízo a

priori para Kant, no caso a matemática,

porquanto a aritmética entrega o corpus da

matemática universal, deixa ser necessário e

universal e não a priori. Se considerarmos que

Page 57: O problema do paradoxo do zero

57

há uma aporia ou uma não justificação

racional, então poderíamos questionar se a

matemática é necessária e universal? Como

vimos, necessidade implica não contradição e

a contradição coloca em xeque também a sua

universalidade. Kant parece ter uma fé

extrema de que o a priori é sinônimo também

de necessidade e vice-versa, pois é resoluto

mais uma vez ao informar em seu livro, mais

precisamente no capítulo II de sua Introdução:

“se encontramos uma proposição que tem que

ser pensada com caráter de necessidade, tal

proposição é um juízo “ a priori”( KANT

1988, p.23). Sendo assim, poderíamos também

perguntar ao texto de Kant que, se assim for, a

matemática não é mais um a priori? Quanto à a

Page 58: O problema do paradoxo do zero

58

prioridade da matemática, podemos dizer que,

a nosso ver, essa não seria afetada, apesar de

Kant afirmar na sua Crítica da razão pura mais

o seguinte: “ um juízo, pois, pensado com

rigorosa universalidade, quer dizer, que não

admite exceção alguma, não se deriva da

experiência e sem valor absoluto a priori”

(KANT, 1988, p.23). Mas a nossa resposta a

contrapelo de Kant é dizer que o que

caracteriza o a priori, antes de ser a sua

necessidade e universalidade, é a sua

capacidade de se estabelecer

independentemente de toda e qualquer

experiência. Por isso, a necessidade de tentar

corrigir os desvios e anomalias do sistema,

antes de se tentar eliminar paradigmas

Page 59: O problema do paradoxo do zero

59

seculares. O objetivo é mostrar as anomalias

da aritmética e que a sua verdade absoluta está

longe de nos confortar.

Com efeito, Frege (1848-1925) foi um

matemático que revolucionou a lógica, a partir

do século XIX. Podemos ainda dizer que Frege

é um desses luminares do mesmo coturno de

Kant e que a sua contribuição talvez não possa

ainda ser mensurada com a devida e ilibada

capacidade. Todavia julgamos que não seria de

todo uma afronta à sua capacidade, se

pudéssemos estabelecer um pequeno diálogo

como o seu pensamento. Para isso, entretanto,

e não ignorando a extensa bibliografia que gira

em torno do seu pensamento, pretendemos nos

valer de alguns excertos retirados do excelente

Page 60: O problema do paradoxo do zero

60

artigo do professor da Unesp, Lúcio Lourenço

Prado, intitulado “ Frege e o Elogio da razão

pura”, publicado na revista Cognitio, número

2, volume 10. Nesse artigo, podemos, para o

nosso propósito, destacar a seguinte afirmação

“a demonstração de qualquer teorema da

aritmética, se a consideramos analítica em

sentido fregiano, deve, pois, ser levada adiante

até que se chegue aos primeiros princípios

lógicos elementares, como os de não

contradição ou de identidade.” No texto,

vamos encontrar a crença de Frege na

aritmética, quando no texto se compara a

aritmética com a geometria ou com as demais

matemáticas e principalmente quando se

afirma sobre a aritmética: “mas não se pode,

Page 61: O problema do paradoxo do zero

61

de maneira alguma conceber alguma outra

aritmética na qual os princípios sejam outros

[...] “portanto, para Frege, aritmética é, como a

lógica, a manifestação pura dessas leis

necessárias da razão.” [...] “ A aritmética é,

pois, ao contrário da geometria, absolutamente

universal em sua aplicação e abrangente, pois,

se aplica a todo universo do entendimento

humano. Apresentados esses pequenos

excertos do artigo sobre Frege, poderíamos

perguntar se não caberia, antes do problema,

uma dúvida acerca dessas supostas certezas.

Se ocorrer, de fato, uma contradição na

aritmética ou se não for resolvido esse impasse

ou aporia, não seria temeroso, sob os estritos

ritos da razão, aceitarmos essas „certezas´?

Page 62: O problema do paradoxo do zero

62

Em seu livro Discurso do Método, o filósofo

francês René Descartes (1595 - 1650) já nos

alerta sobre o “nunca aceitar, por verdadeira,

cousa nenhuma que não conhecesse como

evidente” (DESCARTES, ????., p.63). Nesse

sentido, observamos que alguns aspectos da

aritmética, se não são inteiramente

paralógicos, causam-nos ao menos uma dúvida

ou uma suspeita diante dos critérios de ordem

racional; o pai da filosofia moderna, Descartes,

ainda nos ensina que se deve “evitar

cuidadosamente a precipitação e a prevenção;

e nada incluir em “nossos” juízos que não se

apresentasse tão clara e distintamente...”

(DESCARTES, ????, p.63); e isso significa

dizer que a clareza e a distinção exigidas da

Page 63: O problema do paradoxo do zero

63

aritmética encontram-se a nosso juízo sob

suspeição. Após tratarmos do perguntar da

necessidade e universalidade da aritmética e,

por conseguinte, da matemática universal,

pensamos já estarmos em condições de, ao

invés de responder aos impasses apresentados,

formular a seguinte pergunta: Por que a

matemática goza de uma aceitação plena de

sua necessidade e universalidade, sem que se

tenha ainda pelo que apresentamos o estofo

suficiente para isso? Kant no prefácio à

Segunda Edição da Crítica da Razão Pura

(1787) confirma que “a matemática, desde as

eras mais longínquas a que remonta a história

da razão humana, ingressou, entre o povo

Page 64: O problema do paradoxo do zero

64

admirável dos gregos, no caminho seguro de

uma ciência” (KANT, 1988, p.32).

Page 65: O problema do paradoxo do zero

65

Conclusão

Com isso, pretendemos também

considerar justificados os nossos esforços na

escolha do tema proposto por essa ínclita

universidade: A importância preponderante

dos problemas filosóficos frente a qualquer

outro elemento da filosofia como um todo. Por

outro lado, queremos esclarecer que isso não

significa dizer que a ciência matemática foi

relegada a uma metafísica menor; muito pelo

contrário: o que se deseja aqui com esse

singelo trabalho é alertar para as possíveis

falhas dos sistemas e para as suas possíveis

correções, para que a ordem do discurso

racional não se coloque sub-judice filosófico.

Nesse sentido, podemos dizer que esse

Page 66: O problema do paradoxo do zero

66

trabalho, não obstante aparentar um discurso

com laivos matemáticos coloca-se e insere-se

naquilo que compreendemos como o processo

do espanto filosófico e das suas

problematizações. É em certa medida, e em

última instância, tudo isso um distanciamento

e um olhar “oblíquo de Capitu” para as

questões matemáticas e de ordem racional que,

de uma maneira ou outra, interferem

decididamente nos discursos filosóficos e

quiçá estéticos e políticos. É sabido que

discursos de teor estético talvez não gozem de

tanta razão como a matemática tem gozado;

talvez porque o belo não necessite da razão

como a própria razão necessita dela da própria

razão. O belo, embora passível de

Page 67: O problema do paradoxo do zero

67

discordância, nos espanta pela sua própria

razão, porque pode ser apenas uma

concordância ou uma contradição entre a causa

eficiente e o sujeito cognoscente; já a razão

impõe-nos as suas próprias leis, se

objetivamos, com efeito, segui-la.

Page 68: O problema do paradoxo do zero

68

NOTAS

[1] Necessidade lógica: Conforme o Dicionário

Básico De Filosofia (JUPIASSÚ, p.198), “ é

necessária a proposição cuja contraditória

implica a contradição, seja em termos absolutos,

seja dependendo de certos pressupostos do

universo do discurso.

[2] Tomamos a figura da coruja como símbolo da

vigilância filosófica.

[3] Aqui consideramos o tipo de verdade

necessária, aquela que se daria “independente da

experiência “. O conceito de verdade é um

campo aberto às discussões filosóficas. Mas para

o que pretendemos no texto, esse conceito

parece-nos bem apropriado.

[4] Para as nossas considerações, aplicamos o

sentido de esotérico no sentido de tradição, o que

equivale a dizer que se aplica “aos iniciados”, ou

melhor, para aqueles que sabem do que se trata.

[5] Aqui não pretendemos dizer que pode ser

outro o resultado, mas mostrar a precariedade da

prova.

Page 69: O problema do paradoxo do zero

69

[6] Tratamos no texto rapidamente sobre Juízo a

priori. Entendamos aqui Juízo a priori como

aquele que não passa pela experiência.

O que focamos é que parece que para Kant é

dado que Juízo a priori possui as

características já inerentes de necessário e

universal e é esse o nosso propósito mostrar que

Kant talvez se engane.

[7] Justificativa do tipo racional é principalmente

a que segue as leis da razão citadas no próprio

texto.

[8] Conforme Murachco, a carência, necessidade.

A nosso ver, conforme ainda Murachco, seria

melhor áporos: difícil, sem saída. p.465

[9] Colocamos não experiência no sentido

daquilo que não passa pelos sentidos.

[10] Factual no sentido dos fatos; das coisas

vividas.

[11] Revista Cognitio, v.10 – n.2 –

julho/dezembro, 2009.

[12] Objetos Sensíveis são tudo aquilo que

sensibiliza os sentidos.

[13] Já explicitamos numa nota anterior.

[14] Essa afirmação será demonstrada à frente.

[15] É preciso saber que, para esse singelo

trabalho, não é a obra monumental de Kant que

nos interessa, mas sim as suas assertivas acerca

da matemática.

[16] Para uma maior compreensão desse tema,

sugestionamos o livro A Filosofia a partir de

seus problemas. (Vide Bibliografia).

Page 70: O problema do paradoxo do zero

70

[17] Embora tenhamos também uma crença de os

números serem infinitos, nada ainda pode provar

essa verdade, a nosso parecer. Aliás, o conceito

infinito cairia numa contradição se provado.

Pensamos que confundimos conceitualmente

infinito com extenso.

[18] Esse tema deverá ser aprofundado com

outros diálogos. Mas julgamos que o que aqui

está exposto, já nos dá uma base suficiente para

o que objetivamos propor.

[19] A Filosofia a partir de seus problemas

(PORTA, Mario Ariel Gonzáles Porta), São

Paulo. Loyola, 2002, p.25

[20] Texto de Antonio Trajano Menezes Arruda.

Unesp. Filosofia Geral e Problemas Metafísicos.

(d01). São Paulo, 2011.

[21] Arruda, op. cit., p.34

[22] Adotamos simplesmente um tipo de regra

para um jogo acordado entre os jogadores. A

ideia é trabalhar com um tipo de resposta padrão.

O desvio é considerado anômalo. Esse é um

assunto que gera um filosofar sem fim, que é a

nosso ver o que move o processo filosófico.

[23] Usamos a Condição da prova para nos dar

um pouco do exemplo de possível não solução; é

preciso compreender que o intuito não é

demonstrar a condição da prova, mas perceber

que aquilo que pode ser questionado pela razão,

comprova a razão. Para esse caso, julgamos ser

necessária uma análise mais pormenorizada em

outro trabalho.

[24] Ao fazermos a demonstração da condição da

prova, observamos que a aritmética responde de

modo contraditório ao que se tem respondido.

Page 71: O problema do paradoxo do zero

71

[25] Arruda, op. cit. pp.11/12

[26] Porta, op. cit. p.25

[27] Porta, op. cit. p.26

[28] Arruda, op. cit. p.5

[29] Arruda, op. cit. p.6

[30] Língua grega: visão semântica, lógica,

orgânica e funcional. 2.ed. São Paulo. Discurso

Editorial. Petrópolis: Editora Vozes, 2002.2v.

[31] Ao tentarmos elaborar essa sucinta

demonstração, pretendemos menos obscurecer

do que clarificar, pois julgamos que o Quadrado

dos Opostos pode nos auxiliar na nossa

argumentação.

[32] Figura retirada da internet para auxiliar-nos

na explicitação da contradição.

[33] É bem possível problematizar os juízos da

razão, mas não é esse por ora o nosso objetivo.

[34] Intencionamos somente apontar para um

desvio ou um problema que poderá ser

solucionado.

[35] São esses a nosso ver outros problemas que

pretendemos trabalhar em outro trabalho.

[36] Os excertos referentes acerca de Kant foram

extraídos do Livro Crítica da Razão Pura. Trad.

J. Rodrigues de Mereje. EMMANUEL (sic)

Kant. Crítica da Razão Pura. São Paulo. Ediouro.

Consultamos, todavia, outros tantos livros que

não foram aqui citados. Cotejamos os textos com

o livro com tradução de Valerio Rhoden e Udo

Baldur. São Paulo. Nova Cultural. Como nesse

trabalho não nos apoiamos no texto original ou

em outras línguas modernas, vale considerar as

nossas posições diante dos textos traduzidos. É

sabido que a tradução muitas vezes subverte o

Page 72: O problema do paradoxo do zero

72

texto original, mas não cremos que esse seja o

caso em tela. Preferimos o texto da Ediouro,

porque julgamos mais simples e esclarecedor,

sem a similaridade com a língua alemã sintética.

[37] Cognitio. op. cit.,

[38]Cognitio. op. cit. p.274

[39] Cognitio. op. cit. PP. 274/275

[40] Referimo-nos às certezas do senso comum

ou do princípio da autoridade ou não justificadas

pelos critérios da razão. O filósofo inglês Francis

Bacon faz uma abordagem pertinente a esse

assunto, quando trata daquilo que ele denomina

ídolos.

Page 73: O problema do paradoxo do zero

73

Bibliografia

ARRUDA, Antonio Trajano Menezes. In:

Filosofia Geral e Problemas Metafísicos. São

Paulo. Unesp/Redefor. 2011.

BOTUL, Jean-Baptiste. A vida sexual de

Immanuel Kant. Trad. Isabel Maria Lureiro.

São Paulo. Unesp. 2002.

BUCHHOLZ, Kai. Compreender Wittgenstein.

Trad. Vilmar Schneider. Editora Vozes.

Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

CHAUI, Marilena. Iniciação à filosofia:

ensino médio, volume único. São Paulo: Ática

-2010.

Page 74: O problema do paradoxo do zero

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DESCARTES, René. Discurso do Método.

Trad. João Cruz Costa. São Paulo. Ediouro.

S/D.

FREGE, Gottlob. Os fundamentos da

aritmética. Trad. Luiz Henrique dos Santos. 4.

Ed. São Paulo: Nova Cultural. 1989. (Os

Pensadores).

GIANNETTI, Eduardo. O livro das citações:

um breviário de idéias replicantes. São Paulo:

Companhia das Letras. 2004.

JAPIASSÚ, Hilton. Dicionário básico de

filosofia / Hilton Japiassú e Danilo Marcondes.

4 ed. Atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. Ed,

2006.

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KANT, Imannuel. Textos Seletos. In: Prefácio

à Segunda Edição da Crítica da Razão Pura

(1787). Vozes. Petrópolis, 1985. Trad.

Raimundo Vier. Edição Bilíngue.

______________Crítica da Razão Pura. Trad.

Valerio Rohden e Udo Baldur Mosburger. São

Paulo: Nova Cultural, 1991. (Os Pensadores).

_______________ Crítica da Razão Pura.

Trad. J. Rodrigues de Merege.

Ediouro.1988(?).

MURACHCO, Henrique Graciano. Língua

Grega: visão semântica, lógica, orgânica e

funcional. 2 ed. São Paulo. Discurso Editorial.

Petrópolis. Editora vozes, 2002, 2v.

Page 76: O problema do paradoxo do zero

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PORTA, Mario Ariel Gonzáles. A filosofia a

partir de seus problemas. São Paulo. Loyola,

2002.

PRADO, Lúcio Lourenço. Revista Cognitio –

Volume 10 – Número 2 - Julho – Dezembro

2009. In: `Frege e o “ Elogio da Razão Pura”.

Page 77: O problema do paradoxo do zero

77

Esse texto foi desenvolvido na Unesp de Marília como trabalho de conclusão de curso para a obtenção do título de Especialista em Docência em Filosofia para Professores do Ensino Fundamental e Médio.

Esse assunto, na verdade, assomou-me nas aulas de Mestrado em Filosofia na PUC-SP, no ano de 2002, mas naquele instante não tive uma boa recepção e isso me impediu de prosseguir no escopo de desenvolvê-lo numa tese de mestrado ou doutorado, o que contribuiu também para a interrupção de meu curso de mestrado.

Todavia, não posso negar que obtive tantas outras referências posteriores, a saber, de Olavo de Carvalho, por e-mails elogiosos e incentivadores, do escritor e biógrafo Fernando Jorge, e do poeta, ensaísta e filósofo Antonio Cicero, só para citar alguns.

Mas não cabe aqui rememorar as angústias e as façanhas.

Espero sim que esse opúsculo contribua para o embate filosófico.

Maiores informações sobre o autor e dessas palavras poderão ser obtidas no Blog O Simulacro do Futuro, na própria internet ou no e-mail que segue.

[email protected]

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Palavras autorizadas de Antonio Cicero

Caro Wilson Luques Costa,

Por minha vez, congratulo-o pela publicação do livro. Claro que o autorizo a utilizar as palavras que lhe encaminhei. Embora os meus parcos conhecimentos de matemática não me permitam acompanhar inteiramente os seus argumentos, achei muito intrigantes e originais as suas ponderações sobre o princípio de identidade e o paradoxo do zero. Torço para que você aprofunde e torne cada vez mais claras as suas intuições. Um grande abraço, Antonio Cicero

# O meu muito obrigado especial ao Antonio Cicero

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Algumas outras palavras

"Tenho a maior apreciação pelos seus estudos..." "Acho os seus estudos interessantes e valiosos..." Olavo de Carvalho Filósofo brasileiro, radicado atualmente nos EUA. Até onde li, os seus livros são ótimos. A filosofia é realmente sua marca. Parabéns. Maria L Alba Poeta “Ascurra eu sei onde é: fica em Santa Catarina. O que não sei é quem é Wilson Luques. Agora acho esse desconhecimento horrível!” Um beijo carinhoso. Maria Duarte Guerra Fonte: BLOG ACONTECIMENTOS DO POETA ANTONIO CICERO # O autor faz saber que só houve a autorização para a publicação dessas palavras do poeta e filósofo Antonio Cicero. As demais palavras são oriundas de e-mails recebidos de Olavo de Carvalho e da poeta Maria de Lourdes Alba.

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Wilson Luques Costa

Nascimento em São Paulo (15/02/1960). Formação em Jornalismo, com Pós-Graduação em Psicologia pela Universidade de São Paulo e em Filosofia para Professores para o Ensino Fundamental e Médio pela Unesp. Colaborações com textos para o Jornal O Escritor e para a Revista Coyote entre outros. Já reuniu, no suporte livro, poesia, contos, filosofia, reflexões, memórias etc. Possui também passagens por cursos de Mestrado em Educação (Unisal) e Filosofia (PUC-SP) e Extensivos de Grego e Latim pelo Mosteiro de São Bento. Reside atualmente em São Paulo, onde é Professor da Disciplina de Filosofia do Ensino médio.

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Filosofia

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Teoria do Conhecimento

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Brasil

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2014

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edição própria do autor

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