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______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justiça Cível Brasileira 1 DEMANDAS REPETITIVAS E A MOROSIDADE NA JUSTIÇA CÍVEL BRASILEIRA Conselho Nacional de Justiça Departamento de Pesquisas Judiciárias Brasília, julho de 2011

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    DEMANDAS REPETITIVAS E A MOROSIDADE NA JUSTIA CVEL BRASILEIRA

    ConselhoNacionaldeJustiaDepartamentodePesquisasJudicirias

    Braslia,julhode2011

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    ConselhoNacionaldeJustiaPresidente do Conselho Nacional de Justia Ministro Cezar Peluso

    Corregedora Nacional de Justia Ministra Eliana Calmon

    Secretrio-Geral

    Fernando Florido Marcondes

    Secretrio-Geral Adjunto

    Jos Guilherme Vasi Werner

    Departamento de Pesquisas Judicirias

    Diretora Executiva

    Leda Marlene Bandeira

    Diretor de Projetos

    Pedro de Abreu e Lima Florncio

    Diretor Tcnico

    Ronaldo Assuno Sousa do Lago

    Pesquisadores

    Fernanda Paixo Arajo Pinto

    Ganem Amiden Neto

    Santiago Falluh Varella

    Estatsticos

    Igor Stemler

    Monique Brant

    Apoio Pesquisa:

    Pedro Amorim

    Ricardo Marques

    Thas Nascimento Silva

    Secretrias:

    Priscilla Gianini

    Josane Ribeiro

    Patrcia de Almeida

    Estagirias:

    Camila Leal

    Jaqueline Souza

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    SUMRIO

    1.Introduo___________________________________________________________________________4 2.RESUMOSDASPESQUISAS______________________________________________________________5 2.1FundaoGetlioVargas(FGVSP):Diagnsticosobreascausasdeaumentodasdemandasjudiciaiscveis,mapeamentodasdemandasrepetitivaseproposituradesoluesprprocessuais,processuaisegerenciaismorosidadedajustia__________________________________________________________5 2.2.PontifciaUniversidadeCatlicadoParanPUC/PR):DemandasrepetitivasrelativasaosistemadecrditonoBrasilepropostasparasuasoluo_________________________________________________9 2.3.PontifciaUniversidadedoRioGrandedoSulPUC/RS:Diagnsticosobreoprogressivoaumentodasdemandasjudiciaiscveisnobrasil,emespecialdasdemandasrepetitivasbemcomodamorosidadedajustiacivil___________________________________________________________________________________12 3.CONSIDERAESDODPJ_______________________________________________________________17 4.PROPOSTAS _________________________________________________________________________24 4.1.Litignciaprevidenciria_______________________________________________________________25 4.2.Litignciaemmatriaconsumerista _____________________________________________________26 4.3.Desestmulolitignciaabusiva ________________________________________________________28 4.4.GestoJudiciria_____________________________________________________________________29 4.5.Litignciaedemandasrepetitivas_______________________________________________________30 4.6.Alteraeslegislativas________________________________________________________________31 5.consideraesfinais___________________________________________________________________31

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    1.INTRODUO

    Com o objetivo de conjugar esforos com outras instituies para a realizao de

    pesquisas de interesse comum sobre questes relevantes que possam contribuir

    efetivamente na formulao de polticas judicirias, o CNJ lanou, em 16/11/2009, o

    Edital de Seleo n 01/09. O edital foi uma iniciativa pioneira no marco da parceria

    entre o Judicirio e a comunidade acadmica no que tange realizao de

    diagnsticos acerca de problemas na prestao jurisdicional no Brasil, bem como de

    realizao de propostas para seu aperfeioamento.

    O edital contava com cinco eixos temticos e foi bem recebido junto

    comunidade acadmica brasileira, uma vez que 26 propostas foram submetidas para

    anlise do CNJ. Desse total, cinco instituies foram selecionadas para a realizao de

    pesquisas.

    No eixo temtico relativo s demandas repetitivas e morosidade na justia cvel

    brasileira foram selecionadas trs instituies para desenvolverem pesquisas sobre o

    tema: Fundao Getlio Vargas (FGV-SP), Pontifcia Universidade Catlica do Paran

    (PUC-PR) e Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Apesar

    de trabalharem a partir do mesmo tema, os estudos dessas instituies apresentaram,

    conforme se ver a seguir, abordagens e escopos diferentes e complementares. Todo

    o trabalho de investigao, realizado ao longo de 2010 e que propiciou a anlise da

    morosidade judicial sob diferentes prismas, foi acompanhado pelo Departamento de

    Pesquisas Judicirias (DPJ)1 do Conselho Nacional de Justia.

    A presente publicao tem como objetivo principal apresentar as consideraes

    do DPJ a respeito dos resultados apresentados nos relatrios finais das trs pesquisas

    dessas instituies. Ao final do documento reunir-se- um conjunto de propostas de

    polticas especficas a respeito do tema.

    1DoravanteDPJ.

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    O presente documento est organizado da seguinte forma. Apresenta-se,

    primeiramente, um resumo das trs pesquisas contratadas pelo CNJ, com as

    respectivas propostas. Na parte seguinte, expem-se as consideraes do DPJ a

    respeito do tema juntamente com as sugestes de polticas pblicas setoriais para o

    enfrentamento da questo. Na ltima parte apresentam-se as consideraes finais.

    2.RESUMOSDASPESQUISAS

    2. 1 FUNDAOGETLIO VARGAS(FGVSP):DIAGNSTICO SOBREAS CAUSAS DEAUMENTO DAS DEMANDAS JUDICIAIS CVEIS, MAPEAMENTO DAS DEMANDASREPETITIVAS E PROPOSITURA DE SOLUES PRPROCESSUAIS, PROCESSUAIS E GERENCIAIS MOROSIDADEDA JUSTIA

    A pesquisa da FGV, ao realizar diagnstico sobre as causas externas e internas que impactam no aumento da litigiosidade no Brasil, parte da premissa de que um conjunto de atores influencia no aumento da litigncia e da morosidade judicial em

    nosso pas.

    O estudo, realizado por meio de pesquisa emprico-jurisprudencial, identificou as

    demandas judiciais repetitivas mais comuns, bem como principais temas e teses

    jurdicas investigadas. Dentre essas aes, foram escolhidos como estudos de caso os

    temas da Desaposentao (Direito previdencirio Justia Federal) e de Contratos bancrios (Direito do consumidor Justia Estadual). Foram selecionados para visitas in loco dois tribunais de justia (TJSP e TJRS) e um tribunal federal (TRF 3

    Regio), em virtude da grande representatividade processual existente nessas Cortes e

    da existncia de sistemas informticos mais propcios para a coleta de dados.

    O estudo prope que, para alm do cidado, que crescentemente tem se

    tornado mais consciente dos seus direitos, existem no Brasil vrios canais de incentivo judicializao dos conflitos, tais como: o prprio setor pblico, a advocacia e a mdia.

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    O setor pblico, ao criar ou violar direitos j existentes, contribui freqentemente

    para a gerao de zonas cinzentas de regulamentao, que favorecem o surgimento de demandas judiciais.

    A advocacia, na busca de novos nichos de atuao que favoream o ingresso de

    novos clientes, fomenta a reproduo da litigiosidade por meio da criao de novas teses jurdicas. Observa-se o fenmeno da expanso da advocacia massiva contenciosa (especificamente no mbito previdencirio, um nico escritrio pode ser responsvel por 25% dos processos de uma vara). Grandes escritrios conseguem

    oferecer formas de cobrana mais atraentes, muitas vezes vinculadas ao xito da

    demanda. Havendo concesso da gratuidade processual, o ajuizamento representa ao

    cliente somente possvel ganho, no implicando qualquer nus com despesas

    processuais. Nessa advocacia de massa notrio constatar deficincias freqentes na

    postulao tcnica (petio inicial e documentao) e na prpria conduo do processo

    que acarretam a necessidade de atos processuais adicionais e tornam o trmite judicial

    mais demorado.

    Alm do setor pblico e da advocacia de massa, no se pode deixar de

    mencionar a mdia, que ao conscientizar as pessoas sobre seus direitos e sobre a forma como devem buscar a sua concretizao, muitas vezes aborda questes

    jurdicas de forma equivocada, incentivando o ingresso em juzo de pretenses

    descabidas ou que atravancam o funcionamento da mquina judiciria, sobretudo

    quando so divulgadas notcias incompletas ou sem o devido respaldo legal ou

    jurisprudencial.

    O caso da desaposentao: O primeiro estudo de caso da pesquisa foi o tema da Desaposentao. Trata-se de tese jurdica sobre a possibilidade de o segurado do

    INSS, que permaneceu a exercer atividade remunerada, renunciar ao benefcio atual

    para requerer nova aposentadoria, mais vantajosa. A partir da zona cinzenta de

    regulamentao sobre possibilidade de readequao do valor do benefcio para a figura

    do segurado contribuinte, a desaposentao passou a ser uma tese popularizada por

    meio de advogados, mdia e doutrinadores de direito previdencirio.

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    Inicialmente negada na esfera administrativa, a desaposentao passou a ser

    freqente no Judicirio aps o ano 2000 e se popularizou particularmente no TRF da 3

    Regio (em fins de 2008, j representava 50% dos processos judiciais em tramitao

    em algumas varas federais de So Paulo). No caso especfico da desaposentao,

    observa-se que a poltica de ampliao do acesso justia (criao dos juizados

    especiais e da gratuidade processual) contribuiu para aumentar a litigiosidade. Ao

    contrrio do que se imaginava, a criao do JEF no desafogou as varas federais e

    previdencirias existentes, tendo na realidade incentivado o ingresso de demandas

    repetitivas e a atuao da advocacia de massa.

    A profuso de regras, falta de clareza e instabilidade normativa na rea do

    Direito Previdencirio potencializam o surgimento de litgios entre segurados e INSS

    que posteriormente so levados para a esfera judicial. Instabilidade do entendimento

    jurisprudencial dos tribunais superiores a respeito de questes previdencirias tambm

    um componente da grande quantidade de processos previdencirios na justia

    federal.

    O caso dos contratos bancrios: No estudo de caso sobre direito do consumidor, com foco sobre contratos bancrios, observa-se a existncia de canais

    independentes de resoluo de conflitos que permitem ao consumidor optar em qual

    esfera (extrajudicial ou judicial) tentar resolver o seu problema. Em muitos casos, os

    consumidores procuram o Judicirio antes mesmo de tentar uma resoluo nas esferas

    extrajudiciais.

    Verifica-se que existem muitos incentivos para o aumento da judicializao dos

    conflitos na rea de direito do consumidor: o baixo custo de ingressar com aes aliado

    a uma grande possibilidade de sucesso, especialmente nos Juizados Especiais; a

    advocacia de massa que estimula o requerimento de indenizaes por dano moral e a

    propositura de aes judiciais em grandes quantidades sobre demandas idnticas

    (exemplo: assinatura bsica mensal de telefone fixo); a legislao processual que

    estimula o tratamento individual de demandas de massa ao invs de trat-las

    coletivamente e evitar a proliferao de casos repetitivos; e a freqente ausncia de

    uniformizao jurisprudencial dos Tribunais Superiores a respeito de matrias

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    envolvendo conflitos entre o consumidor e instituies financeiras, acompanhada da

    constante variao da jurisprudncia nos Tribunais Estaduais de todo o pas.

    A pesquisa atenta ainda para o contexto socioeconmico dos ltimos anos, onde

    a classe mdia (classe C) passou de 62 milhes de consumidores para 92 milhes

    (entre 2005 e 2010). Segundo dados da FEBRABAN, a populao bancarizada do

    pas dobrou de tamanho entre 1995 e 2005, passando de 40 milhes para 80 milhes

    de pessoas. Contudo, observa-se que grande parcela desses novos consumidores no

    adequadamente informada pelos bancos a respeito dos produtos e servios

    financeiros que passaram a adquirir. Ademais, a existncia de clusulas abusivas em

    contratos acompanhada de servios de atendimento ao consumidor falhos outro fator

    de estmulo ao ajuizamento de aes judiciais que poderiam ser evitadas.

    As principais concluses gerais da pesquisa esto elencadas abaixo:

    No que concerne identificao dos fenmenos e processos que acontecem fora do sistema judicial para avaliao das causas da morosidade deve-se

    ampliar a perspectiva de anlise observando-se o cenrio externo ao judicirio e

    no apenas o que ocorre dentro dele;

    As causas do aumento de litigiosidade e morosidade esto relacionadas regulao administrativa e legislativa, que criam ou que restringem o exerccio

    de direitos (zonas cinzentas regulatrias). Do ponto de vista interno, as causas

    esto principalmente relacionadas aos impactos da judicializao dos conflitos,

    ao gerenciamento do volume de processos, falta de uniformizao das

    decises, gesto de recursos humanos, organizao judiciria e conduta

    das partes.

    Deve-se observar a dinmica do trajeto das causas, pois seu tempo varivel e envolve diferentes atores, de acordo com o perfil dos casos e interesses

    envolvidos. As solues e filtros podem atuar e repercutir em diferentes

    momentos do trajeto (pr-processual, processual e gerencial). A eficcia dos

    filtros e das solues depende do mapeamento das causas externas e internas

    da litigiosidade no Judicirio, dos atores envolvidos e da trajetria do conflito.

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    Apresentou-se ento um conjunto de propostas nos mbitos normativo,

    procedimental e estrutural para o enfrentamento do fenmeno das causas repetitivas e

    da morosidade, dentre as quais se destacam as seguintes:

    Previdencirio: reviso de normas administrativas no INSS, incremento de recursos humanos e materiais da autarquia para melhor atendimento da

    populao; solues consensuais (conciliao processual e pr-processual);

    mecanismos processuais/gerenciais de racionalizao do julgamento de

    demandas repetitivas (julgamento padronizado), como a informatizao de atos

    processuais (processo eletrnico); incremento e capacitao dos recursos

    humanos do judicirio e de ofcios auxiliares, uniformizao de entendimentos

    jurisprudenciais e definio de critrios mais especficos para a concesso da

    assistncia judiciria gratuita.

    Consumidor: Regulamentao mais clara (legislao estatal e normas do conselho monetrio nacional e banco central) sobre procedimentos das

    instituies financeiras; educao para utilizao de crdito e tratamento do

    superendividamento; divulgao de listas de empresas mais reclamadas em

    rgos de defesa do consumidor e no judicirio; implementao, melhoria e

    utilizao de canais de atendimento extrajudiciais (agncias bancrias, SAC e

    ouvidorias); coletivizao de demandas, tratamento de conflitos massificados

    atravs do ajuizamento de aes coletivas; divulgao da cultura da

    conciliao e incremento e capacitao dos recursos humanos do Judicirio.

    2.2. PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DO PARAN PUC/PR): DEMANDAS REPETITIVAS RELATIVAS AOSISTEMA DECRDITONO BRASILE PROPOSTASPARASUA SOLUO

    O objetivo da pesquisa foi o de elaborar diagnstico a respeito das causas do

    aumento da demanda judicial cvel no Brasil, em especial das demandas repetitivas e

    propostas que visem soluo deste problema sem comprometer o acesso justia,

    de forma a tornar mais efetiva prestao jurisdicional no Brasil. A pesquisa foi

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    desenvolvida em trs fases: 1) coleta e anlise de dados para identificao das causas

    do problema apontado; 2) Identificao de solues para as questes levantadas e 3)

    organizao de workshop para apresentao e discusso das concluses e

    encaminhamento aos demais interessados, poderes constitudos, organizaes

    polticas e sociais.

    Em sua investigao sobre as causas das demandas cveis repetitivas no Brasil,

    a pesquisa identificou uma concentrao de feitos relacionados ao sistema de concesso e tomada de crdito como o principal responsvel para o progressivo aumento de demandas judiciais de massa no pas.

    A conjuntura scio-econmica favorvel expanso de crdito, acompanhada de um sistema que no cria incentivos para a necessria responsabilidade de

    consumidores e financiadores, agravou o congestionamento do sistema judicial, por

    meio de demandas repetitivas ajuizadas majoritariamente nas metrpoles e capitais.

    A pesquisa de campo em sete cidades brasileiras (Aracaju, Braslia, Manaus, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro e So Paulo) comprovou o ajuizamento em massa de demandas com origem em contratos de consumo. Em caso especfico

    (Aracaju), dos 20 maiores demandantes locais, 14 so instituies financeiras, ou seja,

    praticamente do volume das aes ajuizadas por maiores demandantes envolvem o

    setor financeiro, evidenciando problemas estruturais nas relaes de crdito.

    O Judicirio, que acaba por atuar como ltimo elemento do mercado no sentido

    de garantir a exeqibilidade dos contratos, sofre visivelmente com as contradies de

    um sistema que cria incentivos para o consumo a despeito dos altos ndices de

    superendividamento e inadimplncia dos consumidores.

    O paradoxo pode ser melhor compreendido quando se observa que, s custas

    do congestionamento do Judicirio, tanto instituies financeiras quanto usurios

    parecem se beneficiar do quadro vigente. Especificamente em relao aos contratos de

    alienao fiduciria, verifica-se que ao proprietrio fiducirio interessa o

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    inadimplemento do contrato, uma vez que usufrui determinados benefcios tributrios.

    De outro lado, tambm interessa ao devedor fiducirio uma demanda lenta, durante a

    qual, via de regra, ele se mantm na posse do bem objeto da lide (automveis, na

    grande maioria).

    As concluses da equipe de pesquisa da PUC/PR os levaram a propor um

    conjunto de solues pr-processuais e processuais a serem levadas a efeito por

    intermdio de polticas judicirias e proposies legislativas, entre as quais

    destacamos:

    Propostas de medidas voltadas Administrao da Justia: a pesquisa prope a criao de unidades jurisdicionais especializadas, pois facilitariam o

    processamento das demandas repetitivas com base na racionalizao de

    processos e rotinas de trabalho. Iniciativas j observadas em algumas UFs

    poderiam ser utilizadas em todo o pas. Exemplos so verificados no Rio Grande

    do Sul, que criou um Grupo de Trabalho para o processamento de feitos

    bancrios e em Manaus se cogita criao de uma vara especfica para aes de

    busca e apreenso. O estudo sugere ainda: realizao de audincias pblicas

    com vistas definio de critrios gerais para posterior implementao nos

    processos individuais; utilizao de tcnicas de processamento em lote;

    padronizao serial de procedimentos e pautas temticas nos tribunais, visando

    melhor comunicao dos atos processuais e a organizao de datas de

    julgamento e de mutires de conciliao.

    Polticas pblicas que incentivem maior transparncia nos contratos de crdito: Outra proposta diz respeito disponibilizao de informaes claras a todos os indivduos acerca da tipologia, caractersticas e efeitos dos contratos de

    financiamento. Prope-se tambm maior transparncia acerca das informaes

    sobre a postura das instituies financeiras em seu relacionamento com clientes,

    disponibilizando, por exemplo, dados quantitativos e qualitativos acerca das

    demandas em que esto envolvidas. O estudo sugere ferramentas de

    disseminao da informao no sentido que seja fomentada a divulgao do teor

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    dos contratos e de suas clusulas, o nmero de aes envolvendo contratos, a

    quantidade de reclamaes contras as instituies financeiras, dentre outras.

    Alteraes legislativas: Estas mudanas estariam fulcradas na observao da prtica forense de que instituies financeiras e seus usurios no costumam

    privilegiar a conciliao extrajudicial como instrumento para a soluo de seus

    conflitos. A primeira proposta prev a constituio de mecanismo extrajudicial

    prvio, mediante a incluso de novo artigo no Cdigo de Processo Civil, que

    disponha a respeito da necessidade de instruo da petio inicial de ao

    revisional ou de recuperao do crdito concedido, por parte do autor (seja o

    usurio do servio bancrio que prope demanda revisional de contrato

    bancrio, seja a instituio financeira credora), com prova da realizao de

    reunio prvia (extrajudicial) de tentativa de conciliao entre instituio

    financeira e usurio. A segunda proposta prev uma soluo pr-processual por

    meio da alterao no Decreto-lei n. 911/69 que dispe sobre o contrato de

    alienao fiduciria. A inteno tornar obrigatria a exigncia de

    documentao que demonstre a capacidade financeira do contratante no

    momento de assinatura do contrato. Tal exigncia ser obrigatria na medida

    em que o projeto de lei prev que a apresentao de tal documento seja

    requisito necessrio para a obteno da liminar na ao de busca e apreenso.

    2.3. PONTIFCIA UNIVERSIDADEDO RIO GRANDEDO SUL PUC/RS:DIAGNSTICO SOBRE O PROGRESSIVO AUMENTO DAS DEMANDAS JUDICIAIS CVEIS NO BRASIL,EM ESPECIAL DAS DEMANDAS REPETITIVAS BEM COMO DA MOROSIDADE DA JUSTIA CIVIL

    Ancorada em uma perspectiva multidisciplinar, a equipe de pesquisadores da

    PUC-RS abordou o problema do crescimento das demandas cveis em nosso pas a

    partir de dois planos distintos de anlise: da oferta da prestao jurisdicional e, por outro lado, da demanda por estes servios. A opo por esta diviso buscou propiciar uma abordagem mais completa para o entendimento do problema, na medida em que a

    demanda pela jurisdio pouco pesquisada em nosso pas, sendo muito mais

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    freqentes os trabalhos que tratam da organizao do Poder Judicirio (e no do

    jurisdicionado).

    Perspectiva da Oferta:

    No que se refere oferta da jurisdio, o trabalho teve 02 (dois) enfoques

    especiais: (i) o primeiro, de uma comparao entre a eficincia relativa dos tribunais, a

    partir da aplicao do mtodo DEA (Data Envelopment Analysis) aos dados disponveis

    pelo CNJ e, (ii) o segundo, uma anlise gerencial dos cartrios judiciais, com a

    finalidade de tentar apontar possveis melhorias de gesto na prestao de servios

    jurisdicionais. No que se refere demanda, o trabalho consistiu na tcnica de

    entrevistar os diversos atores que interagem no mundo jurdico, partindo-se da

    premissa bsica de que devem ser mais bem estudadas as motivaes que levam as

    pessoas, fsicas e jurdicas, a acionar o Poder Judicirio.

    Eficincia relativa dos Tribunais Estaduais: A partir de correlaes entre indicadores judiciais possvel afirmar, de forma sinttica, que uma alta

    demanda judicial se traduz em maior carga de trabalho, a qual por sua vez induz

    a uma maior produtividade. Este aumento de produtividade, por sua vez, pode

    acabar impactando negativamente a qualidade do produto. Em sntese, os

    resultados do estudo mostram que, em linhas gerais, os maiores tribunais so os

    mais eficientes. Com esses resultados possvel lanar o seguinte raciocnio:

    quanto maior o nmero de casos judiciais por habitante, maior o nmero de

    casos por magistrado, maior o nmero de sentenas por magistrado e, em

    consequncia, menor a taxa de congestionamento dos processos. Em outras

    palavras, uma alta demanda judicial se traduz em maior carga de trabalho, a

    qual induz a uma maior produtividade.

    Anlise da gesto de processos administrativos: Diferentemente do esperado inicialmente, o processo (enquanto conjunto de atividades) no apresentou

    maiores problemas de organizao. O conjunto de atividades realizadas nas

    varas se mostrou bem uniforme nos diferentes locais analisados (Rio Grande do

    Sul, So Paulo e Par). Os principais problemas e conseqentes pontos de

    melhoria residem nas questes de pessoal, organizao do trabalho, infra-

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    estrutura e na motivao das equipes. Em relao pessoal, percebeu-se

    deficincias de qualificao em conceitos bsicos de gesto, que geram perdas

    de oportunidades de otimizao do tempo ou dos recursos de maneira a

    contribuir para a celeridade do processo. Outra questo a ser analisada diz

    respeito motivao dos servidores. A atividade desempenhada carece de

    estmulo, tanto pela repetitividade das atividades como pelo fato do juiz ou

    desembargador ser visto como a nica fonte de trabalho intelectual. Com

    relao infraestrutura, de maneira geral existe falta de espao nos locais,

    principalmente nos cartrios. Percebe-se tambm certa tenso entre a 1 e a 2

    instncias, em termos de infraestrutura a acesso a recursos. H a percepo

    generalizada de que a 2 instncia teria acesso diferenciado a recursos

    materiais e humanos, enquanto que a 1 instncia no teria acesso a recursos

    similares.

    Perspectiva da demanda As entrevistas realizadas com agentes internos (juzes e desembargadores) e

    externos (advogados, pessoas jurdicas e pessoas fsicas) esto agrupadas em trs

    categorias de motivao: motivaes para litigar, para recorrer e para estabelecer

    acordos.

    Motivao para litigar: Os usurios do Judicirio so agentes racionais que tm variadas motivaes para litigar: ausncia ou baixo nvel dos custos, incluindo

    aqui tambm o baixo risco; a busca de um ganho; busca do Judicirio como

    meio, por exemplo, para postergar responsabilidades (uso instrumental); e a

    percepo de ter sido lesado moral, financeira ou fisicamente. Dentre todas

    essas motivaes, sobressaem-se em muito, na percepo dos diversos grupos

    de entrevistados, a conjugao de baixos custos com baixa exposio a riscos.

    Motivao para recorrer: Um tpico sobre o qual h ampla convico na sociedade brasileira, desde os cidados comuns, passando pelos operadores do

    Direito at a literatura especializada, diz respeito relao entre percepo de

    morosidade da Justia e as mltiplas e cumulativas possibilidades de recurso.

    Prevaleceu, no entanto, entre os entrevistados na pesquisa a percepo de que

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    atualmente estejam concorrendo diversos fatores que tornam este instrumento

    vulnervel ao uso abusivo daqueles que ao invs de embasarem seu recurso na

    firme convico de uma tese ou prova, valem-se dele para litigncia de m-f,

    para retardar o cumprimento da sentena.

    Motivao para acordo: H vrias facetas que concorrem para a realizao de acordos ou conciliaes. H uma percepo ampla de que se a leso ao direito

    foi muito grande, a resistncia a acordo aumentaria, porquanto h uma

    perspectiva de satisfao na prpria condenao do opositor. Diversos

    entrevistados colocaram em relevo a importncia de agentes mediadores

    capazes de mostrar s partes envolvidas as alternativas de sada do conflito

    pela via de uma composio e os potenciais ganhos. Com isso muitas vezes

    abrem-se perspectivas que, por si s, a parte envolvida no divisava no calor do

    confronto. Magistrados confirmaram que a tendncia atual, em relao a

    acordos, tende a estar prximo do final do processo antes de no seu incio, o

    que s refora a importncia de se sensibilizar os jurisdicionados para a

    realizao de acordos no incio das demandas, o que serviria para desafogar

    todo o sistema.

    A equipe da PUC-R apresentou propostas agrupadas em dois blocos: a) do lado

    da oferta da prestao jurisdicional e, b) do lado da demanda pela prestao

    jurisdicional. Seguem abaixo, algumas delas:

    Propostas do lado da oferta da prestao jurisdicional:1) Maior padronizao nas decises porque a atual falta de padronizao (i) aumenta

    muito o nmero de processos e (ii) dificulta muito o nmero de acordos. Exemplo

    : Adoo de smulas vinculantes no STJ e um maior nmero de smulas no

    prprio STF; 2) Ampliao de varas especializadas; 3) Aperfeioamento dos sites dos tribunais: Os sites poderiam conter estatsticas das decises, de modo

    a sinalizar para as partes das suas chances de xito; 4) Criao de maiores filtros na fase inicial do processo, como por exemplo, utilizao mais efetiva do

    art. 285-A do CPC, de modo a se criar barreiras mais rgidas s aes

    descabidas. 5) Destinar mais apoio (fsico e financeiro) aos Tribunais

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    16

    relativamente mais eficientes. Os menos eficientes s receberiam desde que se

    obrigassem a seguir determinadas regras/metas fixadas pelo CNJ; 6) Aumentar a agilidade dos Tribunais quanto definio de competncia dos rgos

    judicirios quando se constata que est iniciando um movimento de demandas

    repetitivas. Nestes casos, deveriam ser desde logo estabelecidos juzes

    especficos para tais casos, de modo a evitar a proliferao de decises

    diferentes, que geraro mais processos. Em casos das demandas serem

    procedentes, automaticamente deveria ser criado algum mecanismo de ao

    coletiva, com efeito vinculante a todos os demais casos.

    Propostas do lado da demanda pela prestao jurisdicional: 1) reviso dos parmetros da assistncia judiciria gratuita e a definio de pobreza dever

    ter amparo em dados estatsticos e no no entendimento relativo dos

    magistrados. A assistncia judiciria gratuita s deve ser concedida em casos

    de renda familiar ao redor de 2 (dois) salrios mnimos ou ento se adotando o

    limite de remunerao para efeito de iseno do imposto de renda. Esta

    mudana pode ser feita por alterao legislativa (incluso de limite especfico na

    Lei 1.060/50) ou por meio de uma padronizao definida pelo CNJ em conjunto

    com os demais tribunais; 2) Estabelecimento de limites mais rgidos para a possibilidade do advogado firmar honorrios apenas pelo xito, porque este tipo

    de honorrios estimula o ajuizamento de aes 3) Criao de incentivos para realizao de mais acordos. Por exemplo, dentre os critrios do art. 20 do CPC,

    quando da fixao da sucumbncia, poderia ser inserida regra expressa para

    majorar/minorar honorrios sobre se aquele caso poderia ou no ter sido

    previamente encerrado por acordo. Alm disso, outro incentivo poderia ser

    criado: se o Autor efetuar proposta para acordo nos autos e a R recusar, em

    caso de condenao da R dentro dos valores da proposta, os honorrios de

    sucumbncia seriam majorados. O objetivo seria forar a parte a analisar melhor

    a hiptese de encerrar o processo por acordo; 4) O valor da pena da litigncia de m-f precisa ser sensivelmente elevado (sem limitao ao valor da causa,

    podendo ultrapass-la e devendo ser fixada de modo a efetivamente coibir

    novos comportamentos deste tipo); 5) Como regra, os recursos passariam a no

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    17

    ter efeito suspensivo; e 6) H que se consolidar, efetivamente, um sistema de aes coletivas que atuasse no sentido de que, uma vez tendo sido julgada

    determinada questo, esta deciso passasse a ser vinculante para todos os

    envolvidos, inclusive aqueles que ainda no ingressaram com aes no Poder

    Judicirio.

    3.CONSIDERAESDODPJ

    Aps a promulgao da Constituio Federal de 1988, observa-se crescente

    aumento da litigiosidade no Brasil, fenmeno que surge em funo do amplo rol de

    direitos proporcionados pela Nova Carta, quase como um corolrio do processo de

    redemocratizao e das dcadas de direitos suprimidos da populao. Enquanto em

    1990, o Judicirio recebeu 3,6 milhes de processos2, j na dcada de 2000, esse

    volume rapidamente ultrapassou o patamar de 20 milhes de aes. Esse crescimento

    observado durante o perodo de 2004 a 2009 apresentado no Grfico 1, que mostra a

    evoluo recente da litigiosidade brasileira (vide abaixo).

    Grfico 1 Total de casos novos no Poder Judicirio3 (Justia Estadual, Federal e do Trabalho)

    2004 a 2009.

    2BancoNacionaldeDadosdoPoderJudicirio.3SistemadeEstatsticadePoderJudicirio(SIESPJ),vigentedesde2005.

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    18

    Diferentemente da realidade vigente nos pases desenvolvidos, onde o processo

    de consolidao dos direitos processou-se em etapas, por meio das geraes dos

    direitos4, no Brasil e demais pases da Amrica Latina, o processo foi mais pontual

    efmero, fenmeno que Boaventura de Sousa Santos denomina curto-circuito

    histrico, na passagem dos regimes autoritrios para os de cunho democrtico.5

    Esse sbito aumento na demanda por servios judiciais at o ano de 2009, em

    funo dos fenmenos acima destacados e do seu prprio carter repentino, no

    contou com adequado aparelhamento da estrutura para sua oferta. Gerou-se, por

    conseguinte, situao de significativo congestionamento e de elevada morosidade na

    prestao dos servios judiciais, que nada mais so do que os reflexos de uma

    demanda incompatvel com a oferta, cujo efeito inexorvel o aumento do preo, que

    em analogia no sistema judicial representada pelo elevado congestionamento e pelo

    aumento da morosidade.

    Para fazer face a essa realidade, necessrio no somente analisar os

    aspectos relativos estrutura dos rgos judicirios e de como processam os litgios e

    4Direitosindividuais(primeiragerao),direitossociais(segundagerao)edireitoscoletivos(terceiragerao).5V.Boaventura,S.Santos(2007)ParaumarevoluodemocrticadajustiaSoPaulo:EditoraCortez.Pg.20.

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    19

    os administram, mas tambm urge questionar como as demandas judiciais se formam

    e se desenvolvem at se consolidarem, algumas, como demandas de massa, com

    enorme potencial de congestionamento do sistema. Somente com essa viso sistmica

    e dinmica poder-se- identificar onde residem os gargalos, as inoperncias, os

    conflitos latentes e, assim sendo, fazer as corretas sugestes de polticas judiciais.

    As pesquisas da FGV, da PUC-PR e da PUC-RS, ao destacarem a importncia

    da anlise do ambiente externo ao Judicirio para o combate da morosidade judicial,

    descortinaram aspectos que muitas vezes passam despercebidos pelos atores da

    Justia brasileira, uma vez que tendem a se concentrar nos problemas internos

    relativos prestao jurisdicional ou a trabalhar mais nos efeitos do que sobre as

    causas da morosidade e da excessiva litigiosidade brasileira.

    De fato, por mais que o Judicirio identifique e solucione gargalos que

    prejudicam o funcionamento da mquina judicial, a Justia precisa estar atenta aos

    fenmenos externos ao sistema judicial, sob pena de permanecer sempre defasada

    diante de novos desafios e realidades. Da a importncia de se estudar e esmiuar

    como surgem as demandas massivas, de como so processadas no Poder Judicirio e

    quais os seus efeitos futuros.

    Portanto, a anlise completa sobre as causas da morosidade na justia cvel

    brasileira pressupe no somente questionamentos a respeito dos seus fatores

    intrnsecos, imanentes, mas tambm daqueles extrnsecos e exgenos ao sistema, que

    condicionam o surgimento das situaes de conflito e a instaurao dos litgios.

    Qualquer proposta de melhoria com relao morosidade da justia cvel no pas e de

    como se defrontar com o significativo volume processual passa por uma anlise

    complementar e dinmica desses dois eixos. Busca-se, assim, no somente colher

    sugestes de aperfeioamentos realidade presente, mas tambm a respeito de como

    paulatinamente adequ-los s necessidades futuras.

    Destaca-se que, de acordo com o IPEA no documento Sistema de Informaes

    sobre Percepo Social Suplemento Justia (2010), dos brasileiros que acreditam ter

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    20

    tido um direito subjetivo lesado em 2009, 63% no procuraram o Judicirio.6 Na

    Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios de 2009 (PNAD), no suplemento de

    Justia, das pessoas entrevistadas que tiveram situao de conflito entre 2004 e 2009,

    30,8% no procuraram o Poder Judicirio.

    Estudo demonstrou7, a partir da anlise dos dados do Relatrio Justia em

    Nmeros, publicado pelo DPJ, que existe correlao entre o ndice de

    desenvolvimento humano (IDH), o Produto Interno Bruto (PIB) dos estados e o nmero

    de casos novos e de carga de trabalho. Esse resultado plausvel, uma vez que o

    avano nos ndices de desenvolvimento social e do nvel de riqueza propicia

    populao maior conhecimento dos seus direitos e tambm condies mais favorveis

    para a contratao de advogados e de servios de consultoria jurdica. Na

    supramencionada pesquisa do IBGE, por exemplo, das pessoas que vivenciaram

    situao de conflito entre os anos de 2004 e 2009, 6,8% no acionaram a Justia

    porque no sabiam que podiam utiliz-la ao passo que 6% alegaram que custaria

    muito caro. Diante desse panorama, de se esperar que haja um incremento na

    demanda por servios judiciais de massa no Brasil com o seu contnuo

    desenvolvimento socioeconmico.

    Portanto, se os atuais nveis de litigiosidade j causam elevada taxa de

    congestionamento no Poder Judicirio, esses dados demonstram que pode haver uma

    demanda latente bastante expressiva por servios do Poder Judicirio, com

    perspectivas de aumento no futuro. Por conseguinte, necessrio que o Judicirio se

    prepare para enfrentar a situao, sob o risco de se deparar com um quadro de

    congestionamento do sistema judicial ainda mais grave do que o presente.

    Como o ndice de litigncia no Brasil elevado e ainda existe um nmero

    significativo de potenciais usurios que no recorreram aos servios judicirios,

    6 SIPS Sistemade Indicadoresde Percepo Social: Justia, 17denovembrode2010. Institutode PesquisasEconmicasAplicadas(IPEA).7 SADEK, Maria Tereza. Justia em Nmeros: Novos ngulos, disponvel em:,acessoem15/03/2010.

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    21

    conclui-se que predomina uma realidade de excessiva concentrao de demanda por

    esses servios. Ou seja, no Brasil, poucos usam muito o Poder Judicirio ao passo que

    muitos ainda o utilizam pouco. Recente estudo realizado pelo CNJ a respeito dos cem

    maiores litigantes nos tribunais do Pas de fato aponta para essa concentrao de

    demandas8.

    Diante desse cenrio, o efetivo combate s causas da morosidade da justia

    pressupe um conjunto de aes para eliminar as razes por detrs da excessiva

    litigncia, concentrada em alguns atores, que, na maioria das vezes, utilizam o sistema

    desnecessariamente.

    Uma das vertentes de atuao nesse sentido demandaria a atuao mais

    coordenada e harmnica do setor pblico (principal litigante nacional conforme

    levantamento deste CNJ) que colabora com a criao de zonas cinzentas de

    regulamentao ao editar uma profuso de atos normativos muitas vezes em

    discordncia com a jurisprudncia dos tribunais, o que s acarreta a necessidade de o

    Judicirio voltar a se manifestar em grande nmero de situaes, agravando os nveis

    de congestionamento. Uma coordenao de aes no setor pblico precisa envolver a

    formatao de uma regulao administrativa e legislativa que desestimule a

    judicializao dos conflitos e o quadro de insegurana jurdica que muitas vezes

    colocado diante dos cidados.

    Nesse sentido, h que se observar melhor a trajetria dos conflitos antes de sua

    chegada ao Judicirio. A criao pura e simples de novas portas de acesso ao

    Judicirio deve ser encarada com cautela, uma vez que na medida em que so

    abertas, surgem novos volumes de demandas para a apreciao da Justia que to

    somente aumentam o congestionamento judicial. Os Juizados Especiais Cveis e

    Federais, por exemplo, no implicaram reduo de demandas, mas sim o aumento na

    visibilidade de demandas latentes que antes no chegavam ao Judicirio. Se a

    ampliao do acesso justia no for conjugada capacidade de processamento das

    8RelatrioCemMaioresLitigantes,disponvelemhttp://www.cnj.jus.br/.

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    22

    demandas judiciais, a morosidade se torna inevitvel, com reflexos srios sobre a

    efetividade do sistema, j que como Rui Barbosa apontava justia tardia no justia.

    Tambm vale destacar que o estudo elaborado pela PUC-RS aponta para a

    existncia de um cenrio no Brasil de significativo estmulo litigncia, a custos

    irrisrios, que incitaria a utilizao dos servios judiciais at a exausto. Essa realidade

    assemelhar-se-ia ao pressuposto terico da tragdia dos comuns, estudado nas

    cincias econmicas. De acordo com esse conceito terico, o livre acesso e a

    dificuldade de excluso de um recurso comum e finito o condenaria, inexoravelmente,

    superexplorao. Isso ocorreria porque os benefcios da explorao aumentam para os

    agentes medida que utilizam o recurso, ao passo que os custos da utilizao so

    divididos perante todos usurios.

    De acordo com a pesquisa da PUC-RS vige atualmente com relao ao

    Judicirio brasileiro uma situao em que quase impossvel excluir-lhe o acesso, ao

    passo que os custos de sua utilizao so socializados, pois a morosidade e o

    congestionamento afetam a todos. O artigo 5 da Constituio Federal que assegura o

    direito de petio a todos, o direito ao contraditrio, ampla defesa, os inmeros

    recursos existentes, aliados ampla utilizao dos benefcios da assistncia judiciria

    gratuita explicariam essa constatao. Some-se a isso ainda a acirrada concorrncia

    no mercado de servios advocatcios e a pouca propenso desses profissionais

    realizao de conciliaes, que se chegar a uma realidade de utilizao excessiva,

    fcil e desimpedida de um recurso comum, cuja excluso de acesso difcil ou quase

    impossvel.

    Em geral as situaes de tragdia dos comuns no so solucionadas por meio

    de aumento dos recursos comuns superutilizados. Esse paliativo somente adiaria a

    situao de exaurimento dos recursos comuns. As solues passam antes pela

    atribuio de custos individuais utilizao excessiva dos recursos comuns.9 Tal

    9Podesefazer,porexemplo,umparalelocomasituaodepagamentodecontadeguaemcondomnios.Seogastocomorecursocomum(gua)divididoperantetodos,independentementedouso,humestmulonaturalsobreutilizaoeaoseuexaurimento.Asituaonoseresolveaumentandoovolumedeguadisponvel,quesomente adiar a exausto do recurso comum. A instalao de hidrmetros por apartamentos e a cobrana

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    23

    ponderao s reitera que solues de aumento da estrutura dos servios judiciais,

    bem como as de cunho processual e gerencial no podem ser pensadas de modo

    isolado, uma vez que podem envolver um efeito perverso de potencializador de

    demandas diante das quais o Judicirio pode no reunir condies para conferir um

    tratamento adequado.

    Tanto a FGV quanto a PUC-PR identificaram as questes consumeristas

    relacionadas a instituies financeiras como um dos principais focos das demandas de

    massa na justia brasileira, responsveis, portanto, pela mencionada sobreutilizao.

    Enquanto a FGV ressalta problemas de falta de clareza das regulamentaes como um

    dos fatores preponderantes para a judicializao de massa nesse segmento, a PUC-

    PR destacou a conjuntura socioeconmica favorvel expanso do crdito e a

    inexistncia de incentivos adequados para responsabilizao de consumidores e

    financiadores as principais razes para essa excessiva litigncia. J a PUC-RS, por

    meio de entrevistas perante os atores, usurios e operadores do sistema de justia,

    identificou, dentre as principais motivaes para litigar, a conjugao dos baixos custos

    com a reduzida exposio a riscos.

    Levantamento do CNJ sobre os 100 maiores litigantes em 2010 parece

    corroborar a hiptese de que a expanso recente nas operaes de crdito pode

    constituir causa relevante para o aumento dos processos judiciais distribudos, j que

    grande parcela das aes ajuizadas envolvem instituies financeiras. A pesquisa da

    PUC/PR realizou pesquisa de campo em vrias capitais e levantou que a maioria dos

    processos cveis nos grandes centros envolve: buscas e apreenses decorrentes de inadimplncia em arrendamentos mercantis ou alienaes fiducirias de automveis;

    revises contratuais no pertinente a juros em crditos diretos ao consumidor e outras formas de mtuo; cobranas decorrentes de inadimplncia em crditos consignados diretamente em folha de pagamento, bem como discusses quanto aos critrios dessas

    cobranas; e, por fim, discusses relativas a cobranas e revises dos critrios dessas

    cobranas no que se refere a cartes de crdito.

    individualizada do recurso, no entanto, levariam naturalmente os usurios a limitarem o uso s suas reaisnecessidades.

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    24

    Pesquisas de opinio tambm apontam nesse sentido. Levantamento realizado

    em sete Estados entre outubro e dezembro do ano passado10 apontou que 25% das

    1570 pessoas entrevistadas apontaram j ter sofrido cobranas indevidas decorrentes

    de relaes de consumo.

    Como o aumento de demandas, principalmente na rea de consumidor, ser

    cada vez mais difcil de conter nos prximos anos, a pesquisa da FGV-SP levanta uma

    importante pergunta sobre a qual o Judicirio precisa urgentemente se debruar: h

    espao para uma convivncia harmoniosa entre mecanismos de filtragem da litigncia

    judicial e a garantia do acesso Justia? O estudo pondera que o acesso justia

    precisa deixar de ser compreendido apenas sob a lgica quantitativa de aes

    ajuizadas. Eventuais mecanismos de filtragem de conflitos podem representar, alm de

    conteno, a prpria soluo dos conflitos em esferas distantes do Poder Judicirio,

    indo ao encontro do acesso justia sem um vis necessariamente restritivo.

    A partir dos resultados contidos nos trs relatrios de pesquisa, que

    descortinaram novos aspectos e comprovaram empiricamente vrias percepes j

    existentes a respeito da morosidade judicial, torna-se especialmente oportuno pontuar

    algumas propostas levantadas para o enfrentamento da excessiva litigiosidade

    brasileira, conforme ser exposto no prximo tpico.

    4.PROPOSTAS

    Diante do desafio de apresentar solues para o enfrentamento da excessiva

    litigiosidade no Brasil, este DPJ compilou e dividiu por tpicos os principais

    encaminhamentos sob o tema. O objetivo da exposio dessas propostas to

    somente o de facilitar o debate a respeito do tema e, portanto, o DPJ no se posiciona

    a respeito de nenhuma dessas sugestes mas apenas as apresenta para que

    eventualmente possam servir para pautar futuras polticas judicirias com foco no

    aperfeioamento da prestao jurisdicional.

    10RelatrioICJBrasil,4trimestrede2010,elaboradopelaEscoladeDireitodaFGVSP.

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    25

    4.1.LITIGNCIAPREVIDENCIRIA

    Necessidade de reviso do arcabouo normativo do INSS: O excesso e a complexidade das instrues normativas dos rgos do Ministrio da

    Previdncia (Presidncia do INSS, Diretoria Colegiada do INSS, Conselho

    Nacional da Previdncia Social, Conselho de Recursos da Previdncia Social)

    muitas vezes ocasiona divergncias com a legislao federal, dando margem

    para o questionamento judicial das condutas da autarquia, que muitas vezes no

    atenta para a jurisprudncia consolidada em vrias questes de direito

    previdencirio. Em face disso, iniciativas coordenadas de reviso dessas

    normas, com a participao da AGU e da Procuradoria Federal Especializada do

    INSS, poderiam revelar-se oportunas para a harmonizao desse arcabouo

    normativo com a legislao ordinria e com a Constituio Federal.

    Maior nfase na conciliao em processos previdencirios: Apesar de algumas iniciativas importantes, como o Plano de Reduo de Demandas

    apoiado pela Procuradoria-Federal Especializada junto ao INSS (PFE-INSS),

    muitas varas relutam e sequer incentivam a realizao de acordos judiciais,

    (com base no entendimento de que benefcios previdencirios so indisponveis)

    fazendo com que a conciliao em matria previdenciria ainda seja pouco

    realizada.

    Priorizao das cortes superiores na pacificao da jurisprudncia sobre demandas previdencirias: tal conduta poderia desestimular o excesso de judicializao na primeira instncia e o ajuizamento de recursos repetitivos em

    massa. Tal procedimento minimizaria o fenmeno da criao de teses jurdicas

    oportunistas que se aproveitam de controvrsias jurisprudenciais para fomentar

    o ingresso de demandas de massa.

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    26

    4.2.LITIGNCIAEMMATRIACONSUMERISTA

    Aperfeioamento da regulamentao do CMN e do BACEN: observa-se que muitos conflitos nas relaes de clientes com bancos (identificados como os

    maiores litigantes na justia estadual, de acordo com levantamento deste CNJ)

    poderiam ser esclarecidos e regulamentados de forma mais objetiva pelo

    Conselho Monetrio Nacional e pelo Banco Central, dispensando inclusive

    proposies legislativas, devido ao alto grau de enforcement que essas

    instituies possuem sobre as instituies financeiras. Isso poderia contribuir

    para evitar uma srie de reclamaes relacionadas a algumas prticas bancrias

    comumente discutidas no Judicirio.

    Maior ateno do Judicirio para o tratamento do fenmeno do superendividamento: A questo do sobreendividamento um fenmeno que tem se propagado nas sociedades de consumo desenvolvidas. Vrios pases j

    se conscientizaram dessa problemtica e desenvolveram sistemas de tutela

    especfica para o consumidor excessivamente endividado (EUA, Frana, Blgica

    e Alemanha). O judicirio brasileiro deve analisar o fenmeno, bem como o seu

    impacto para o sistema judicial. O CNJ, por exemplo, poderia se engajar tanto

    no incentivo para realizao de campanhas educativas (em relao ao uso

    consciente do dinheiro) quanto em programas de mediao e conciliao entre

    os superendividados e seus credores. Ainda mais recente, no caso brasileiro,

    a vertiginosa expanso do crdito imobilirio (que este ano deve chegar ao

    montante de R$ 85 bilhes), que pode representar no curto e mdio prazo, uma

    avalanche de aes relativas ao inadimplemento de contratos de compra de

    imveis, uma vez que muitos compradores parecem estar desavisados dos

    riscos e dos nus que esto assumindo em um momento de euforia no mercado

    de imveis nacional. Cabe lembrar ainda que no Brasil ainda no existe uma lei

    especfica que confira pessoa fsica um mecanismo global para a sua

    recuperao financeira, a exemplo do que ocorre com as empresas (Lei n.

    11.101/05). H apenas a figura da insolvncia civil (regulamentada pelos artigos

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    27

    748 a 782 do Cdigo de Processo Civil) que constitui um instrumento muito mais

    voltado para a garantia da satisfao dos credores.

    No mbito das polticas judicirias, um projeto especfico de educao para o

    consumo consciente poderia ser includo na pauta da Comunicao do CNJ que,

    a propsito, j vem obtendo xito em diversas campanhas de esclarecimento ao

    pblico. A divulgao populao deve esclarecer sobre as conseqncias do

    inadimplemento contratual, inclusive apontando nmeros sobre a quantidade e

    tipos de processos envolvendo esses concessionrios de crdito.

    Alm das alteraes legislativas discorridas, poder-se-ia empreender esforos

    normativos questo da concesso de crdito. Nesse sentido seria

    recomendvel a realizao de Termo de Cooperao entre o Judicirio e o

    Banco Central com o objetivo de que sejam desenvolvidas propostas concretas

    que cobam a concesso indiscriminada de crdito ao consumidor, sem a devida

    comprovao de garantias para a liquidez do pagamento. A exigncia de

    documentos que demonstrem a capacidade financeira do tomador de crdito no

    momento da assinatura do contrato poderia ser objeto de iniciativa desta

    parceira.

    Transparncia: A FGV-SP aponta para a necessidade de maior divulgao das listas de empresas mais reclamadas em rgos de defesa do consumidor e

    no Poder Judicirio; implementao, melhoria e utilizao de canais de

    atendimento extrajudiciais (agncias bancrias, SAC e ouvidorias).

    Outra proposta, apresentada pela PUC/PR, refere-se implantao de uma

    poltica de transparncia, visando disponibilizar aos cidados informaes sobre

    os diversos tipos de contrato, suas caractersticas e efeitos que so fornecidos

    pelas instituies financeiras.

    A difuso de conhecimento sobre os assuntos econmicos pode servir de

    instrumento efetivo preveno de demandas judiciais. Cabe ao Poder Pblico

    fomentar aes nesse sentido, por se tratar de legtimo representante das

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    28

    causas coletivas. Iniciativas dessa natureza garantiriam maior efetividade ao

    processo de disseminao de informaes sobre os efeitos malficos da

    inadimplncia contratual.

    A divulgao de ranking contendo os maiores litigantes bancrios e financeiros

    nos sites do Judicirio poderia ser importante instrumento de consulta aos

    cidados, orientando-os sobre as conseqncias de eventuais litgios por

    descumprimento contratuais. Outra proposta formulada refere-se divulgao

    de informaes sobre as diferentes caractersticas dos contratos de crdito

    ofertados. As propostas das equipes de pesquisa incorporam ainda iniciativas

    como o envio das informaes dos maiores litigantes em assuntos bancrios s

    organizaes da sociedade civil no controle social do poder econmico; s

    entidades de classe envolvendo crdito (como Febraban); aos organismos de

    proteo e estabilizao do sistema financeiro; aos editores que publicam

    ranking entre empresas que promovem prticas sustentveis; s entidades que

    promovam premiaes de qualidade e responsabilidade socioambiental e, ainda,

    s entidades de classe dedicadas comunicao de massa, como a ABI

    Associao Brasileira de Imprensa.

    4.3.DESESTMULOLITIGNCIAABUSIVA

    Medidas para limitao da utilizao desnecessria e abusiva do Poder Judicirio: Algumas propostas nesse sentido envolveriam a Restrio ao uso do benefcio da Assistncia Judiciria s pessoas fsicas isentas de obrigatoriedade

    de declarao de imposto de renda, cuja aplicao defendida por este

    Departamento de Pesquisas Judicirias. Alm disso, existe a possibilidade de

    criao de incentivos para realizao de mais acordos por meio da fixao de

    critrio para majorar/minorar honorrios de sucumbncia com base na anlise se

    o caso poderia ou no ter sido previamente encerrado por acordo (art. 20 do

    CPC), regulamentao mais especfica da litigncia de m f com majorao da

    pena por essa conduta e estabelecimento de rejeio a proposta de acordo

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    29

    dentro dos precedentes dos tribunais como um elemento caracterizador dessa

    infrao.

    4.4.GESTOJUDICIRIA

    Tabelas Processuais Unificadas: Uma questo digna de nota apontada pela pesquisa da PUC/PR foi o registro da no implantao das tabelas processuais

    unificadas na grande maioria das capitais visitadas (Resoluo CNJ n 46/2007).

    Diversos foram os fatores apontados pelos entrevistados para justificar a

    ausncia das tabelas, os quais se destacam: dificuldades metodolgicas e

    reaes contrrias a esta implantao, falta de suporte e/ou treinamento e ainda

    total desconhecimento da situao, dentre os principais problemas enfrentados.

    O ponto fulcral do problema reside no descumprimento da Resoluo n

    46/2009, ocasionando a ausncia de uniformizao da coleta de dados por

    intermdio de classes, assuntos e movimentos para a identificao das causas

    repetitivas que assolam o Poder Judicirio11. desnecessrio afirmar que a

    ausncia das tabelas prejudica a gesto judiciria voltada garantia de maior

    celeridade processual e melhoria da eficincia da prestao jurisdicional.

    notria, nos estudos de administrao pblica, a necessidade de traar

    estratgias para o conhecimento sobre quem o usurio dos servios para que,

    a partir de ento, sejam desenvolvidos os meios para a melhor prestao dos

    servios. Afinal, no h possibilidade de haver gerenciamento efetivo sem o

    devido conhecimento do prprio ramo. A partir desse pressuposto, torna-se

    premente apontar solues para a lacuna existente nos modelos de

    administrao judiciria de Tribunais que desconheam seus prprios

    demandantes.

    11 Vale mencionar, que dos estados visitados, Sergipe e Rio de Janeiro demonstraram efetivamente implantar as tabelas, ao observar a importncia da iniciativa de padronizao de procedimentos, inclusive ao preparar manuais de instruo e treinamento de usurios, iniciativas essas que poderiam ser incentivadas para outras unidades da federao.

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    30

    A partir do problema diagnosticado, seria altamente recomendvel o Conselho

    Nacional de Justia tomar providncias nos sentido de propor solues para a

    efetiva implantao das tabelas processuais unificadas, a fim de contribuir para

    o aperfeioamento da gesto judiciria. A alternativa sugerida pela equipe de

    pesquisa da PUC-PR envolve a disseminao de um sistema especfico (ou a

    possibilidade de acoplamento a sistemas pr-estabelecidos) para a efetiva e

    uniforme implantao das tabelas em todo o territrio nacional.

    Maior disseminao das tecnologias de informao e comunicao (TICs) no mbito da gesto judiciria. Sugerido pela equipe da PUC-PR, esse tema j vem sendo amplamente debatido no CNJ, seja por intermdio da

    Comisso Permanente de TI e Infra-estrutura, seja por meio dos diversos

    projetos em andamento, como o Processo Judicial Eletrnico (PJe), de grande

    envergadura.

    4.5.LITIGNCIAEDEMANDASREPETITIVAS

    Criao de varas especializadas em demandas repetitivas: A equipe da PUC-PR considera oportuna a criao dessas varas especializadas, sobretudo

    em causas bancrias, para o processamento dos diversos autos versando

    especialmente sobre contratos de crdito. Quanto pertinncia da proposta

    formulada, do ponto de vista da organizao judiciria o funcionamento de

    unidades judicirias especializadas de fato parece revestir-se de maior

    eficincia. Com a especializao, tende-se a cuidar mais detidamente natureza

    e especificidades da matria, seja no treinamento de servidores que prestam

    apoio aos magistrados, seja no prprio modus operandi da tramitao

    processual. Dentre as vantagens da especializao pode-se citar: maior

    facilidade em implantar treinamentos a mediadores/conciliadores para otimizar

    acordos; eleio de pautas temticas para julgamentos em bloco; padronizao

    do processamento interno dos feitos (despachos e intimaes), dentre outras

    iniciativas. Nesse contexto, seria particularmente interessante a criao de

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    31

    centrais de conciliao extrajudicial especializadas em demandas repetitivas

    para evitar a instaurao dos litgios. Nos estudos de caso empreendidos, a

    equipe de pesquisa verificou que as demandas repetitivas envolvem assuntos de

    menor complexidade, como os casos bancrios. Desse modo, a segmentao

    no necessitaria de um nmero pr-determinado de serventurios, mas poderia

    se organizar de acordo com rotinas estabelecidas previamente e organizadas de

    tal modo a tornarem-se especializadas no processamento das demandas de

    massa.

    4.6.ALTERAES LEGISLATIVAS

    Regulao do crdito ao consumidor: Seria interessante criar mecanismos que exigissem documentao comprobatria da capacidade financeira do

    contratante nas operaes de crdito, tais como o Decreto-Lei n. 911/69, a fim

    de promover maior garantia ao cumprimento do contrato12. A equipe de pesquisa

    da PUC-PR mencionou que modelo similar existe na Unio Europia, a qual

    implantou o princpio do emprstimo responsvel em suas diretivas, como

    medida preventiva do superendividamento. Nesse sentido, o Banco Central pode

    ter um papel central na fiscalizao dos contratos bancrios. De fato, relevante

    determinar qual o percentual de endividamento exeqvel para o cidado

    comum, a fim de evitar que o comprometimento inviabilize posteriormente a

    liquidao do contrato. H, no presente caso, notrio excesso por parte das

    entidades bancrias ao concederem crdito a consumidores que sabidamente

    no possuem condies financeiras de cumprir suas obrigaes contratuais,

    ocasionando clara leso ao consumidor.

    5.CONSIDERAESFINAIS

    O presente trabalho buscou sistematizar os resultados das pesquisas

    desenvolvidas por FGV-SP, PUC-PR e PUC-RS no marco do Edital CNJ n.1/2009, o

    12VideAnexoIIdoRelatrioFinaldePesquisadaPUCPR,p.137.

  • ______________Demandas Repetitivas e a Morosidade na Justia Cvel Brasileira

    32

    qual representou uma oportunidade mpar de colaborao do meio acadmico no que

    tange realizao de diagnsticos e propostas para o combate da morosidade judicial.

    A participao de trs instituies no estudo do mesmo tema revelou-se

    bastante profcua, uma vez que cada universidade pde realizar recortes

    metodolgicos e se aprofundar em pontos especficos diante das mltiplas facetas do

    complexo problema da morosidade. Os relatrios, de forma sinttica, identificaram os

    seguintes desafios que se colocam para o Judicirio: 1) uma trajetria de judicializao em que vrios atores (governo, mdia e advocacia) fomentam o crescimento da litigiosidade; 2) uma conjuntura socioeconmica que colaborou para um crescimento vertiginoso de demandas ligadas ao sistema de crdito no Brasil e 3) um quadro de variados incentivos para a litigao e para a interposio de recursos, o que s refora a morosidade e o congestionamento do sistema judicial, em um ciclo vicioso e em um contexto em que a cultura de conciliao ainda encontra pouco espao.

    Diante desses desafios, conclui-se que, em face da crise da morosidade judicial,

    o Judicirio no pode agir mais reativamente ao aumento sistemtico da litigncia

    processual. Aes de carter proativo, capitaneadas pelo Poder Judicirio, incluindo o

    CNJ, so necessrias para o efetivo combate do problema e passam pelo

    aperfeioamento da gesto judicial, pela legitimao dos mecanismos alternativos de

    resoluo de conflito, pela elaborao de polticas de reduo e filtro das demandas

    judiciais e pela cooperao interinstitucional com rgos da Administrao Pblica (no

    caso presente com INSS, Ministrio da Previdncia Social e Banco Central) e com

    instituies privadas ligadas ao maior nmero de litgios (Bancos, empresas de

    telefonia etc).

    DEMANDAS REPETITIVAS E A MOROSIDADENA JUSTIA CVEL BRASILEIRASUMRIO1. INTRODUO2. RESUMOS DAS PESQUISAS2. 1 FUNDAO GETLIO VARGAS (FGVSP): DIAGNSTICO SOBRE AS CAUSAS DEAUMENTO DAS DEMANDAS JUDICIAIS CVEIS, MAPEAMENTO DAS DEMANDASREPETITIVAS E PROPOSITURA DE SOLUES PRPROCESSUAIS, PROCESSUAIS EGERENCIAIS MOROSIDADE DA JUSTIA2.2. PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DO PARAN PUC/PR): DEMANDASREPETITIVAS RELATIVAS AO SISTEMA DE CRDITO NO BRASIL E PROPOSTAS PARASUA SOLUO2.3. PONTIFCIA UNIVERSIDADE DO RIO GRANDE DO SUL PUC/RS: DIAGNSTICOSOBRE O PROGRESSIVO AUMENTO DAS DEMANDAS JUDICIAIS CVEIS NO BRASIL,EM ESPECIAL DAS DEMANDAS REPETITIVAS BEM COMO DA MOROSIDADE DAJUSTIA CIVIL

    3. CONSIDERAES DO DPJ4. PROPOSTAS4.1. LITIGNCIA PREVIDENCIRIA4.2. LITIGNCIA EM MATRIA CONSUMERISTA4.3. DESESTMULO LITIGNCIA ABUSIVA4.4. GESTO JUDICIRIA4.5. LITIGNCIA E DEMANDAS REPETITIVAS4.6. ALTERAES LEGISLATIVAS

    5. CONSIDERAES FINAIS