PICCININI HISTÓRIA DA PROFISSÃO DOCENTE (1)

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HISTRIA DA PROFISSO DOCENTE13HISTRIA DA PROFISSO DOCENTE NO BRASIL: ALGUMAS LEITURASProfessora Cludia Lino Piccinini Faculdade de EducaoUniversidade Federal do Rio de Janeiroclpiccinini @ gmail.comINTRODUOO desafio de estruturar este texto se baseia na re-elaborao a partir de mltiplas leituras e debates realizados na disciplina Tpicos Especiais de Pesquisa, no curso de Doutorado em Educao da PUC- RJ.A organizao do texto se far em torno de duas possibilidades, a primeira, de ordem cronolgica e, a segunda, de acordo com questes relativas formao do professorado brasileiro que considero fundamentais para a compreenso da histria da profisso docente, isto , a gnese da profisso docente, a institucionalizao da formao dos professores, o associativismo e a feminizao. importante destacar, neste incio da reflexo, as palavras de Benito (1999:16) de que toda configurao histrica aponta para um jogo entre prticas e as atribuies configuradas no imaginrio coletivo, isto , o ofcio de ensinante, hoje, constitui uma tradio inventada em boa medida pelos prprios atores que o representam e por vrias imagens de identidade que criaram a mesma sociedade que o reconhece e o legitima. Como atores intervindo na cena docente justo que, ora margeando, ora mergulhando nos processos constitutivos do magistrio, formemos uma idia dos fatores que contriburam para sua constituio ao longo de dcadas de histria. Sabemos que no h discurso fechado em si mesmo, mas um processo discursivo do qual se podem recortar e analisar estados diferentes (Orlandi, 1999). Desta forma, meu esforo de re-leitura de vrios (as) autores (as) que se puseram a desvendar esse lcus profissional poder contribuir com um novo esforo interpretativo que espero seja satisfatrio e desperte a vontade de ampliar conhecimentos sobre a profisso que abraamos.OS PROFESSORESO mnimo que se exige de um educador que seja capaz de sentir os desafios do tempo presente, de pensar a aco nas continuidades e mudanas do trabalho pedaggico, de participar criticamente na construo de uma escola mais atentas realidades dos diversos grupos sociais .Antnio NvoaOs professores tm sido considerados como agentes de interesses socioeconmicos a servio do Estado. Nessa perspectiva, vivem os contraditrios de serem agentes de reproduo da ordem dominante e, ao mesmo tempo, de serem vistos como potncia ameaadora desta ordem (Catani, 2003). Para Nvoa (citado por Catani, 2003), os professores no vo somente responder a uma necessidade social de educao, mas tambm cri-la (p.585), em um espao de entrecruzamento de interesses e aspiraes socioeconmicas. Surgem algumas questes: Como compreender o papel da docncia no universo social de ontem e de hoje? Como atribuir valores em relao a sua participao nas lutas sociais? Como entender os avanos e os retrocessos desta categoria profissional?A produo de estudos de base histrica sobre a profissionalizao docente tem nos ajudado a construir uma viso menos ingnua do que foi a gnese da docncia no Brasil. Percebemos, por exemplo, que a entrada da mulher na profisso se constitui em um grande esforo de visibilidade e aceitao do trabalho da mulher, at ento desconsiderada como figura participante da sociedade. Entendemos o associativismo como a organizao possvel em tempos de consolidao do trabalho do professor e de pouca compreenso do seu papel social. Passamos pelo ideal utpico, porm extremamente fundante, da escola de professores de Ansio Teixeira, marco do possvel, mas ainda a se realizar na esfera do poltico e do pblico. Por fim, sonhamos com a necessidade de um estatuto tico da profisso como um passo adiante no seu fortalecimento e compromisso, sem o qual o ofcio de mestre no se apoderar de seu verdadeiro valor.UMA RETROSPECTIVA HISTRICAA EDUCAO JESUTICANo Brasil os jesutas se dedicaram pregao da f catlica e ao trabalho educativo. Quando aqui chegaram logo perceberam que no seria possvel converter os ndios f catlica sem que soubessem ler e escrever. Desta forma, as congregaes religiosas atuaram como congregaes docentes (Nvoa, 1995). Por volta de 1570, vinte e um anos aps a chegada dos Jesutas, a ordem j era composta por cinco escolas de instruo elementar (Porto Seguro, Ilhus, So Vicente, Esprito Santo e So Paulo de Piratininga) e trs colgios (Rio de Janeiro, Pernambuco e Bahia) (Lima, 1997).Na Europa, desde o sculo XVIII ao comeo do XIX, vai sendo delineado um corpo de conhecimentos especficos e de tcnicas destinadas a nortear o trabalho dos professores (Catani, 2003). No caso dos Jesutas o documento que baseava as aes educativas e o estatuto profissional era chamado de Ratio Studiorum. No Brasil, os jesutas no se limitaram ao ensino das primeiras letras; alm do curso elementar eles mantinham os cursos de Letras e Filosofia, considerados secundrios, e o curso de Teologia e Cincias Sagradas, de nvel superior, para formao de sacerdotes. No curso de Letras estudava-se Gramtica Latina, Humanidades e Retrica; e no curso de Filosofia estudava-se Lgica, Metafsica, Moral, Matemtica e Cincias Fsicas e Naturais (Lima, 1997). Os jesutas permaneceram como mentores da educao brasileira durante duzentos e dez anos, at 1759.A REFORMA POMBALINAIdealizada e levada a cabo pelo marqus de Pombal, primeiro-ministro de Portugal de 1750 a 1777, a Reforma Pombalina dos Estudos Menores (que se desdobra, de fato, em duas grandes reformas, a de 1759 e a de 1772) , sem dvida, um momento decisivo na histria da profisso docente no mundo luso-brasileiro (Mendona, 2005). A reforma anti-jesutica e anti-congregacionista marca uma etapa de secularizao do ensino.Com a sada dos Jesutas, e principalmente, com a ruptura no modelo organizacional e educacional, a educao brasileira precisa se reestruturar. Isto , se as escolas da Companhia de Jesus tinham por objetivo servir aos interesses da f, Pombal pensou em organizar a escola para servir aos interesses do Estado. Esta estatizao da educao, se afastando dos ideais catlicos, torna tarefa do Estado a orientao e superviso da educao pblica e privada, exceo da educao estritamente domstica (Mendona, 2005). Entretanto, enquanto o controle do Estado realmente se faz presente, com esforos de regulamentao e de seleo dos mestres atravs da Real Mesa Censria, criada em 1772; o processo de laicizao, na prtica, no se consolida. Portanto, a Reforma Pombalina no tem carter religioso, mas poltico, no sentido de desbancar a influncia da igreja na educao e na cultura, diminuindo tambm o seu poderio econmico.O resultado da deciso de Pombal foi que, no princpio do sculo XIX, a educao brasileira estava reduzida a praticamente nada. O sistema jesutico foi desmantelado e nada que pudesse chegar prximo deles foi organizado para dar continuidade ao trabalho educativo. A instruo primria teve reforma tmida, ficando por conta das famlias e das mltiplas formas de ensinar e aprender (padres, igrejas, associaes filantrpicas, corporaes profissionais) as primeiras letras, o aprofundamento nos colgios ou em aulas pblicas na Corte de latim, retrica, filosofia etc. Mais tarde na colnia brasileira, sob o reinado de D. Joo VI ocorre a unificao do sistema de instruo primria estatal, a adoo de um mtodo, a definio de contedos, a autorizao ou proibio de livros, a normatizao e a formao de um corpo profissional (chamados de professores Rgios no sc XVIII) (Villela, 2003:99 a 101). O financiamento da educao se d atravs da instituio do "subsdio literrio" para manuteno dos ensinos primrio e mdio. Alm de exguo, este tributo nunca foi cobrado com regularidade e os professores ficavam longos perodos sem receber vencimentos espera de uma soluo vinda de Portugal.Os professores, geralmente mal preparados para a funo, e regulados pelo Estado patro, no possuam em sua maioria formao para o trabalho a ser executado. Eram nomeados por indicao ou sob concordncia de bispos e se tornavam "proprietrios" vitalcios de suas aulas rgias. Pela precariedade da carreira docente, a maior parte dos professores no exerciam a profisso em tempo integral, tendo outras tarefas para lhes garantir o sustento.Para Villela (2003), trs sculos da poca moderna so marcados pela mudana do modelo de impregnao cultural (marcado pela precariedade) para uma sociedade munida de um sistema complexo de ensino estatal. Por muito tempo ainda, iriam conviver vrias formas de transmisso de conhecimentos e vrias instituies se ocupariam desta tarefa, mas, na medida em que os Estados docentes (ou Estados patres) se consolidam, estabelece-se um sistema homogneo, regulado e controlado.O BRASIL IMPERIAL Em 1824 outorgada a primeira Constituio brasileira. O Art. 179 desta Lei Magna dizia que a "instruo primria gratuita para todos os cidados".Em 1823, na tentativa de se suprir a falta de professores institui-se o Mtodo Lancaster, ou do "ensino mtuo", onde um aluno treinado (decurio) ensina um grupo de dez alunos (decria) sob a rgida vigilncia de um inspetor. Em 1826 um Decreto institui quatro graus de instruo: as escolas primrias, Liceus, Ginsios e Academias (Lima, 1997).Em 1827 elaborada a Lei Geral do Ensino (D. Pedro I). Esta lei o primeiro passo para a interferncia estatal na organizao docente, prevendo exame de seleo de professores para o exerccio docente e propondo a criao de escolas primrias em todas as cidades e vilas. Propunha ainda a abertura de escolas que pudessem ser freqentadas por meninas, com um currculo prprio (Villela, 2003). O ato adicional de 1834, transfere s provncias a responsabilidade pela organizao dos sistemas de ensino (primrio e secundrio) e pela formao dos docentes, sob dois aspectos: (i) controle estatal ideolgico (seleo por concursos, inspeo e vigilncia) e (ii) melhoria do estatuto scio-profissional docente atravs da posse de um conhecimento especializado, da configurao de um discurso prprio e de organizao enquanto categoria (Villela, 2003). Graas ao Ato de 1834, em 1835, surge a primeira escola normal do pas, em Niteri. um momento de descentralizao administrativa mas no poltica do ensino. A classe senhorial ainda mantm o controle, mas prefere um Estado civilizado em tempos de industrializao, trabalho assalariado etc. O objetivo: organizar a sociedade para ganhar apoio mais slido para seus objetivos, isto , a autoridade Imperial (Villela, 2003). Entretanto, o modelo liberal implantado nas escolas normais, deixou de lado a tradio do ofcio, ignorando at mesmo os artesos de formao gremial e tcnica, conformando a base da pedagogia, que descartaria as artes baseadas unicamente na prtica e conformaria uma srie de falcias sobre essas escolas de formao (Benito, 1999). O perodo chamado de Perodo da Reao - 1836 a 1852 tem como objetivo principal refrear o carro da revoluo em funo do predomnio do racionalismo iluminista. pela instruo que se atingiria os estgios mais elevados de civilizao, ou seja, manter as diferenas mas em um patamar civilizado (abrir escolas para fechar prises) (Villela, 2003). As escolas normais nascem em um momento cuja misso era elevar o nvel intelectual e moral da populao, unificando padres culturais e de convivncia social, ideais atrelados ao projeto conservador da poca. A PRIMEIRA ESCOLA NORMAL DO BRASILA Escola Normal de Niteri (1835) teve influncia nas decises sobre a esfera educacional, sendo um laboratrio de prticas para todo o pas. Os organizadores desta escola, os saquaremas, grupo conservador que comandavam o governo do Estado, pretendiam difundir sua viso de mundo e para isso era necessrio fazer com que cada indivduo identificasse os objetivos dessa classe como seus, portanto, era preciso civilizar para melhor conhecer e controlar o povo. O objetivo era formar o professor como capaz de reproduzir o tipo de conhecimento que desejavam difundir, sem subverter as condies materiais dessa sociedade, mas que, ao contrrio, a conservasse tal como se apresentava. Logo, esta escola seria uma instituio destinada a consolidar e expandir a supremacia dessa classe senhorial no poder (Villela, 2003:105).Esta escola normal mantinha a tradio de formao moral e religiosa em primeiro plano, secundarizava a questo metodolgica (Lancaster, mtodo com potencial disciplinador hierarquia e ordem) e apagava a formao laica do futuro professor. Alm de garantir o acesso somente aos de boa morigerao. Desta forma, o saber se distribua em pores que variavam de acordo com a parcela da populao qual se destinava excludos (escravos, mesmo que libertos, eram proibidos de freqentar qualquer tipo de escola) e mulheres (ler, escrever, contar e prendas domsticas). Em fins do sculo XIX surge um currculo unificado (para homens e mulheres), com nivelamento por baixo, por exemplo, na matemtica e demais disciplinas de formao geral (Villela, 2003:106 a 109). Para Nvoa (1991:125), as escolas normais esto na origem de uma profunda mudana, de uma verdadeira mutao sociolgica, do pessoal docente primrio. Sob sua ao, os mestres miserveis e pouco instrudos do incio do sculo XIX vo, em algumas dcadas, ceder lugar a profissionais formados e preparados para o exerccio da atividade docente. Caberia Escola Normal estabelecer a distino entre o velho mestre-escola e o novo professor primrio. As mulheres, que no incio eram proibidas de freqentar a Escola Normal, so admitidas em dias alternados, depois em perodos diferenciados e mais tarde em regime misto (1880). Entretanto, os vrios cortes oramentrios e a no prioridade atribuda formao de professores so fatores chave no desmantelamento destas instituies. O descompromisso com a Escola Normal no significava desistncia de um projeto de direo da sociedade pela via dos professores, pois, na verdade, acionavam-se outros mecanismos para garantir o mesmo fim (Villela, 2003: 109 a 113). Entretanto, a formao alcanaria momentos de revalorizao, ainda no final do sculo XIX (Villela, 2003:127).A PRIMEIRA REPBLICA A Primeira Repblica proclamada adota na organizao escolar um modelo com ntida influncia da filosofia positivista.A Reforma de Benjamin Constant tinha como princpios orientadores liberdade e laicidade do ensino, como tambm a gratuidade da escola primria. Estes princpios seguiam a orientao do que estava estipulado na Constituio brasileira.Os docentes vivem, na virada do sculo XX, um perodo de euforia: a idia de que a escola emancipatria por natureza, pois portadora das luzes, atinge ento seu ponto culminante. A escola e a instruo encarnam o progresso: os docentes so seus agentes (Nvoa, 1991). Entretanto, importante saber que no ano de 1900, segundo o Anurio Estatstico do Brasil, do Instituto Nacional de Estatstica, cerca de 75% da populao brasileira era de analfabetos. A febre de mtodos importados: intuitivo e lies das coisas, com a introduo de novos conceitos, ocasionam uma verdadeira revoluo nas representaes da escola e do ato de ensinar. A lgica positivista de August Conte adotada em 1880, na primeira Escola Normal pblica da Corte. Benjamin Constant, de 1890 a 1892, idealiza um projeto arrojado de escola de formao e o Pedagogium. A Escola da Praa (SP), entretanto, a que consegue permanecer com um modelo mais acabado, sob a orientao de Caetano de Campos, propiciando aos futuros mestres o que havia de mais atualizado no exerccio da prtica cotidiana escolar, tornando-se smbolo do magistrio em 1894 (Villela, 2003:117 e 118).Cinco dcadas se passam at a feminizao da profisso (por volta de 1880 elas j ocupariam a maioria das vagas nas escolas normais). Das preceptoras sexualmente vulnerveis e socialmente deslocadas s professoras, muitas lutas se estabeleceram (Villela, 2003:119). Os estudos de Jane Almeida (citados por Villela, 2003) apontaram que esta feminizao est associada com: (i) expanso quantitativa do magistrio que passa a atender a populao de baixa renda; (ii) desvalorizao profissional frente tica capitalista; (iii) mulheres assumindo o papel de regeneradoras morais da sociedade (naturalmente puras); (iv) enraizamento das ideologias de domesticidade e maternagem, reforadas pelo discurso higienista e positivista.Entretanto, a apropriao deste discurso pelas mulheres lhes permitiu abrir caminho para sua rpida insero profissional, via enquadramento s normas morais dominantes, isto , o que lhes foi possvel no momento histrico vigente (Villela, 2003:122)As mudanas sociolgicas sofridas pelo corpo profissional vo propiciar condies para a construo das primeiras associaes (Nvoa, 1991), responsveis por debates trocas de informaes e por reivindicar melhorias no estatuto profissional. Jornais e revistas pedaggicas so responsveis por veicularem discusses importantes e por impregnarem os professores com os debates de sua poca.A dcada de 1920, marcada pelo confronto de idias entre correntes divergentes, influenciadas pelos movimentos europeus, culminou com a crise econmica mundial de 1929. Esta crise repercutiu diretamente sobre as foras produtoras rurais que perderam do governo os subsdios que garantiam a produo (Lima, 1997).A SEGUNDA REPBLICA Com a Revoluo de 30 o Brasil entra no mundo capitalista de produo. As riquezas geradas no perodo anterior permitem que o Brasil possa investir no mercado interno, na produo industrial e crescer do ponto de vista econmico. O crescimento e a nova realidade brasileira passam a exigir uma mo-de-obra especializada e para tal era preciso investir na educao. A educao, a servio do Estado, vista como importante na formao do cidado e, principalmente, como fator que auxiliaria a alavancar a economia do pas. Logo, em 1930, criado o Ministrio da Educao e Sade Pblica e, em 1931, o governo provisrio organiza, atravs de uma srie de decretos, o ensino secundrio e as universidades brasileiras ainda inexistentes. Estes Decretos ficaram conhecidos como "Reforma Francisco Campos (Vicentini, 2005). No bojo desta reforma est a regulamentao do professorado de ensino secundrio e fica estabelecida a oposio entre os "velhos mestres" e licenciados (Vicentini, 2005:217). Em 1932 um grupo de educadores lana nao o Manifesto dos Pioneiros da Educao Nova, redigido por Fernando de Azevedo e assinado por vrios educadores da poca. Ainda em 1932 inaugurada a primeira "escola de educao" de nvel universitrio, a "Escola de Professres" do Instituto de Educao do Rio de Janeiro do ex-Distrito Federal, que em 1935 se incorpora Universidade do Distrito Federal, criada por Ansio Teixeira. Para Ansio (1969) o preparo do magistrio necessidade de grande escala e de imensa urgncia, ante o crescimento vertiginoso do sistema escolar em todos os seus nveis. Na viso dos Pioneiros era preciso unificar a formao dos professores (prepar-los no nvel universitrio) e tambm torn-los um s corpo profissional (Mendona, 2002). Em 1934 a segunda Constituio da Repblica dispe, pela primeira vez, que a educao direito de todos. Tambm em 1934, foi criada a Universidade de So Paulo. A primeira a ser criada e organizada segundo as normas do Estatuto das Universidades Brasileiras de 1931.As diferenas no sistema educacional tambm assumiram configuraes distintas na organizao profissional. A primeira associao do professorado pblico organizou-se em So Paulo (1902 a 1918). No Rio de Janeiro o Sindicato dos Professores do Municpio do Rio de Janeiro (1931) se formou por iniciativa do magistrio secundrio particular e se caracterizou pela luta por melhores salrios e condies de trabalho (Vicentini, 2005:334).A despeito das mudanas no sistema educacional permanecem as diferenas que acabam por constituir, no interior da categoria, modos distintos de conceber a profisso e as prticas associativas, bem como de articular as estratgias de luta em torno das quais se do as tentativas de definir e de redefinir a identidade profissional e a imagem social (Vicentini, 2005:338). Em funo da instabilidade poltica deste perodo, Getlio Vargas, num golpe de estado, instala o Estado Novo e proclama uma nova Constituio. Com a entrada de Gustavo Capanema frente do MES muda radicalmente o sentido atribudo por Ansio ao educador intelectual, que passa a ser visto como um burocrata a servio do projeto estatal (Mendona, 2002:171). Extinguia-se tambm o sonho de Ansio de estruturao autnoma do campo da educao... (idem). A PROFISSO DOCENTE NA PONTA DO DEBATE - A GNESE, A INSTITUCIONALIZAO DA FORMAO, O ASSOCIATIVISMO E A FEMINIZAO.Nvoa (2002) desabafa com sua clareza magistral e mesmo falando de Portugal nos faz pensar que suas palavras so direcionadas tambm a ns brasileiros.De tempos em tempos, o pas acorda de sobressalto. Ora um arrojo de entusiasmo, at mesmo de paixo, ora um impulso de desespero com o estado do ensino. Grupos e personalidades juntam-se em programas de salvao nacional, apelando conscincia das elites e do povo. Quem tem por ofcio ler os papis da histria conhece bem a inutilidade destes gestos. Programas de salvao e reformas educativas acumulam-se, lado a lado, nas mesmas prateleiras. Serviram, talvez, para sossegar algumas conscincias. No serviram para mudar a nossa relao com a cultura e a educao, nem para transformar as nossas escolas (p. 238 e 239).Pode-se afirmar que a partir da segunda metade de Oitocentos, os mestres foram sendo progressivamente substitudos pelos professores, mesmo na educao domstica e, nesse movimento outras caractersticas vo sendo tornadas imprescindveis aos sujeitos...como habilitaes e o domnio dos conhecimentos ensinados (Vasconcelos, 2005 :60).Para Fernandes (1998), so visveis as transformaes (das razes histricas ao debate contemporneo) da atividade docente: em primeiro lugar, o questionamento de sua identidade profissional, onde o professor v o seu papel diminudo frente interveno de outros parceiros no universo escolar; em segundo lugar, a tendncia a uma profissionalidade global, com a ampliao das competncias docentes, e em terceiro lugar, a tendncia especializao.No final do sc XIX, o desenvolvimento cientfico suscita mais questes: a superioridade do expert em relao ao professor, a expanso do sistema de ensino, os professores como necessitados do controle do Estado e da universidade, o recente desenvolvimento das cincias da educao, frente segregao do docente do processo de produo de saber pedaggico. Para a autora (Vasconcelos, 2005) necessrio integrar a anlise historiogrfica s questes anteriores, permitindo relacionar a histria das cincias da educao com a evoluo dos sistemas escolares e as mudanas da profisso docente. Em um destes trabalhos (Nvoa, 1998) foi demonstrado que frente ao avano da produo cientfica em educao, as competncias e saberes dos professores (saberes da experincia e da reflexo sobre a prtica) so depreciadas. Benito (1999) enxerga a ruptura entre duas culturas educacionais, a escolar e a acadmica. A cultura escolar vem da tradio inventada pela experincia, da identidade do grupo profissional distinta do conhecimento experto (p.24 e 25).Segundo Magalhes, os professores tm um papel como construtores do humano, nos planos material, civilizacional e antropolgico. Nestes termos, a reflexo sobre os professores na histria representa uma reviso e, em especial, um alargamento das representaes histricas das aes e funes dos professores na sociedade (1999:9).Mas o que mudou na histria da profisso? Traos foram mantidos? possvel perceber continuidades? Sim e no. O que mudou fundamentalmente durante o sculo XIX foi o prprio estatuto docente que seria marcado pela conquista da forma escolar moderna em detrimento de outras mais antigas, isto , da transio de uma educao menos sistemtica, para um conjunto de saberes, normas e valores prprios da atividade e que passam a definir a ao dos professores (Villela, 2003).Esta profisso seria definida pelo projeto conservador que a instituiu. Os professores, mesmo aderindo a este projeto hegemnico, passaram a produzir um discurso articulado em torno da defesa das prerrogativas do seu ofcio buscando a conquista de autonomia por meio da participao, por exemplo, em movimento associativos. Talvez a maior descontinuidade entre o velho mestre-escola e novo professor primrio que emerge no final do sculo XIX seja, exatamente a da conquista de uma identidade profissional (Villela, 2003).Entretanto, ao reinterpretar o papel da mulher na profisso docente, Jane Almeida (1998) alerta para as presses e controles que hoje ainda se estabelecem sobre o trabalho docente feminino: o controle scio econmico do sistema capitalista; a normatizao do trabalho pelas regras masculinas de uma sociedade patriarcal e as construes de carter ideolgico (por exemplo, a mulher vista como cuidadora e educadora, e, portanto, este "seu lugar por excelncia"), que desde a gnese da profisso tm norteado no s os rumos assumidos pela profisso como tambm tm permitido que esta se estabelea como um movimento de resistncia profissional.REFERNCIAS BIBLIOGRFICASALMEIDA, J. S. de Vestgios para uma reinterpretao do magistrio feminino em Portugal e Brasil (sculos XIX XX). IN: SOUZA, R. F. de et al. 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