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29 J/\N 1993 Sttor üe Uw PARLAMeNTAR\^MO PP.Í51P^IAL1^0? / eu PReFiRo PRESIDENCIALISMO OU PARLAMENTARISMO EDIÇÃO ESPECIAL

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29 J/\N 1993

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PRESIDENCIALISMO

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PARLAMENTARISMO

EDIÇÃO ESPECIAL

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Poittíea Nacional

ÍNDICE

Para entender melhor - presidencialismo - parlamentarismo 3 Secretaria Nacional de Formação Política • PT

Como são os sistemas? 3 Secretaria Nacional de Formação Política - PT

Alternativas parlamentares 5 CMvis Rossi

O Parlamentarismo e as minorias 5 Carlos Mathens

Parlamentarismo: de novo um casuísmo 6 Leonel Brízola

Que parlamentarismo? 7 Orestes Quércia

Presidencialismo o governo fraco 7 José Serra

Sistemas de governo - Parlamentarismo & Presidencialismo 9 Antônio Arcanjo Cota

Parlamentarismo? Por quê? 11 Leòncio Martins Rodrigues

Razões do presidencialismo 13 Athos Pereira

Opinião dos professores 13 João Batista Natali

Aos que defendem o parlamentarismo agora , 13 Carioca - Químico aposentado)

As reformas do Estado: Sistema de governo e sistema eleitoral 14 Sérgio de Azevedo

Parlamentarismo, presidencialismo.» que bicho i esse? 15 Tílden Santiago

Parlamentarismo versus presidencialismo 16 Sérgio A. Ligiero

Uma opção mais democrática 17 José Genoino

Inauguremos o presidencialismo! Klávio Aguiar

18

As razões do parlamentarismo 19 José Genoino

Fato político e histórico 20 José Diroeu

'Parlamentarismo permite a manipulação' Da Agência Folha

Parlamentarismo X Presidencialismo: colocando a questão em seu devido lugar José Raimundo Fontes

20

21

Pelo presidencialismo democrático 22 Antônio Marangon

Parlamentarismo e presidencialismo 23 Flores tan Fernandes

Opção parlamentarista 24

Presidencialismo Democrático 25 Adão Pretto e Outros

Leia a íntegra do manifesto presidencialista 26

Monarquia ou República? 28 Secretaria Nacional de Formação Política - PT

A abolição do parlamentarismo 28 Vladimir Ilkb Lênin

ASSINATURAS: Individual Cf$ 80.000,00 (6 meses) eCrt 160.000,00 (12 meses) Enídades sindicais eoutos Ct$ 100.000,00 (6 meses) eCi« 200.000,00 (12 meses) Exterior (via aérea) US$ 50,00 (6meses) e US$ 100,00 (12 meses) O pagamento deverá ser feito em nome do CPV • Centro de Documentação e Pesquisa Vergueiro em cheque nominal cruzado; ou vale postal DESDE QUE SEJA ENDEREÇADO PARA A AGÊNCIA DO CORREIO BELA VISTA • CEP 01390-970 - Código da Agónda 403.300.

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PoMíea Nacional

Parlamentarismo ou Presidencialismo Secretaria Nacional de Formação Política - PT Janeiro 1993 'Pano, eHtettden,

PRESIDENCIALISMO PARLAMENTARISMO

Executivo: Exercido pelo Presiden- te eleito pelo voto direto, com mandato delimitado (5 anos) Legislativo: Congresso independente do Executivo. Eleito diretamente pelo povo. Senado: Deve ser extinto ou redefinidas suas funções, restringindo-o apenas às questões atinentes à federação. Ministério: É uma equipe de governo que auxilia o presidente. Poderão ser escolhidos por ele, sem nenhuma Interferência do Congresso, ou o presidente escolhe e submete à aceitação do Congresso. Iniciativa de Leis: Tanto o Presi- dente como o Congresso têm pode- res para elaborar leis, sempre submetendo ao outro poder. Essência: Governo é representati- vo e baseia-se na separação de poderes. Há uma independência mútua entre Executivo e Legislativo.

Executivo: Exercido por um Pri- meiro-Ministro, que é indicado pelo partido que obtiver maioria na Câmara. Se não houver maioria, forma-se uma coalizão de duas ou mais legendas. Se o Primeiro- Ministro perde o apoio da maioria, ele cai e é formado um novo ministério. Presidente: Eleito diretamente pelo povo, ou indiretamente pelos parla- mentares. Divide o poder executivo com o Primeiro-Ministro Ministério: Escolhido pelo Primei- ro-Ministro, segundo orientação do partido ou coalizão que lhe dá apoio. Este ministério cai se cair o Primei- ro-Ministro. Senado: Pode ser extinto ou redefinir suas funções. Essência: Existe uma dependência mútua entre o executivo e legislativo. O governo só se instala com a autoriza- ção do parlamento e goza da confiança da maioria parlamentar.

Parlamentarismo ou Presidencialismo Secretaria Nacional de Formação Política - PT Janeiro 1993

c orno são os sistemas?

Buscar, nos outros países, ? modelos que possam ser adap-

tados á realidade brasileira é uma tarefa gigantesca porque não há duas eleições nem tampouco duas de- mocracias iguais no mundo inteiro, em suas conseqüências e em todos os por- menores de suas estruturas e dos seus regulamentos.

Regras sobre a maneira de se eleger parlamentares podem ser parecidas em puíses que adotam sistemas de governo (oialmente diferentes um do outro, exemplo: na Inglaterra, país parlamen- tarista e monárquico, adota-se o voto distrital e uninominal, da mesma maneira que fazem os Estados Unidos, país republicano e presidencialista.

Já a Espanha, monarquia parlamen- tarista, elege seus parlamentares prati- camente da mesma forma proporcional

.que faz o Brasil republicano e presidencialista.

Só por esses exemplos, se vé que a possibilidade de combinações entre sistemas eleitorais é enorme. Tampouco, existe um modelo que possa ser tido como ideal como o demonstram as queixas e propostas de modificações que circulam hoje em quase toda a Europa.

A Inglaterra adota o mais puro dos sistemas distritais. A Câmara dos Comuns, correspondente á Câmara dos Deputados no Brasil, tem 650 lugares que são ocupados pelos 650 vencedores daseleiçõesem 650 distritos, por maioria simples. O método pode levar a uma brutal distorção na proporcionalidade.

Caso concreto: em 1974. os liberais obtiveram 13,3% dos votos distribuí- dos pelo país todo, mas, como vence- ram em apenas 14 distritos, ficaram com 14 parlamentares ou 2,2 % do total — seis vezes menos do que teriam direito se fosse respeitada a proporcionalidade.

Na Itália, a polêmica é em tomo do próprio sistema de governo. Nas véspe- ras da última eleição parlamentar (maio passado), o próprio presidente da repú- blica da época, Francesco Cossiga, prg;

gou a adoção do presidencialismo em substituição do parlamentarismo. Exatamente o contrário do que ocorre no Brasil hoje, país em que, ao menos no Parlamento, formou-se uma nítida maioria em favor da substituição do presidencialismo pelo parlamentarismo.

No Japão, parlamentarista, os 512 membros da Dieta (equivalente á Câmara dos Deputados) são escolhidos em 130 distritos, nos quais se elegem de três a cinco deputados (os chamados distritos plurinominais).

Na Alemanha vigora o chamado sistema distrital misto. Parte dos depu- tados são eleitos nominalmente pelo voto distrital majoritário, e outra parte corresponde á lista fechada apresentada pelos partidos. Exatamente porrepresen- tar uma combinação do método propor- cional com o majoritário, o sistema ale- mão encanta os acadêmicos. Um estudo feito sobre os resultados eleitorais na Alemanha mostrou que o método pernu - te uma proporcionalidade quase perfeita, ao contrário do que ocorre na Inglaterra. A percentagem de votos eqüivale quase exatamente á percentagem de cadeiras atribuídas a cada partido.

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Quinzena

Também não podemos dizer que o método (proporcional, majoritário, nominal) tenha relação com o grau de desenvolvimento do país. No Brasil, subdesenvolvido, usa-se o método pro- porcional, pelo qual o numero de vagas nas casas legislativas é atribuído em função da proporção dos votos obtidos pelo partido.

O eleitor vota em nomes e náo em listas partidárias, mas, na Colômbia, igualmente subdesenvolvida, o voto vai para listas fechadas apresentadas pelos partidos. O eleitor não pode escolher João da Silva. Tem que votar na lista dos liberais ou conservadores, os dois grandes partidos colombianos.

Potítíea Nacional Na Bélgica e na Holanda, exemplos

de desenvolvimento com estabilidade, a regra proporcional também vale, como no Brasil, mas o voto vai para a lista partidária, como na Colômbia. Só que há uma particularidade nesses dois pa- íses europeus: o eleitor pode alterar a ordem de colocação dos candidatos na lista apresentada pelos partidos.

Assim, se o Partido "x" colocou João da Silva em 602 lugar na sua lista, com reduzidas chances de se eleger, o eleitor fanático por esse candidato pode puxá- lo para, digamos, o terceiro lugar, o que lhe daria quase certeza de chegar ao Parlamento.

Em Portugal e França, ao contrário

dos demais países parlamentaristas, nesses dois casos o presidente da Repú- blica é eleito diretamente e tem mais poderes do que o normalmente atribuí- do ao Chefe de Estado.

A conseqüência tem sido uma bata- lha surda entre o Chefe de Governo e o Chefe de Estado nos momentos em que cada um deles pertence a partidos dife- rentes.

Os exemplos citados demonstram que não é nem o sistema de governo nem a maneira de eleger representantes que fazem um país mais ou menos moderno, mais ou menos eficaz. A

REINO UNIDO

Sl»tem« de governo: Monarquia Consítuciona) Forma de escolha do rei: astsma de hereditanedade Podeie» do rei. Chele de Estado. Como todo o poder político ooncentra-se no pnmeiro-mmistro e seu gabinete, o monarca deve agir de acordo com sua orientação

Poderei do primeiro-ministro: Chele de Governo. É quem escolhe os membros do gabinete dentre os membros do seu própno partido. É, contudo, sujeito ao Pariamento no senbdo que deve expor e defender sua política ao deba» parlamentar. Regime partidário: Plunpartidarismo. Pnncipais Parti- dos: Conservador. Liberal. Trabalhista. Social Oemocra- la, Umonista Democrático. ' Legislativo: Parlamento bicameral. Câmara dos Comuns (650 membros eleitos por voto direto para mandato de 5 anos) a

^Tf i tf*" (ma,S de 1 ■000 membr0s: P"™"85' P8"» • "°^ da corte lordes leg.sladores. consultores jurídicos, 2 arcebispos, 24 bispos)

FflANÇA

Sistema de governo: Presidencialismo misto com Parlamentarismo Forma de escolha do presidente: Sulrágío universal Forma de escolha do primeiro-ministro: Nomeado pelo presidente Poderes do presidente: Amplos, inclusive nomear e demitir o pnmeiro-ministro e dissolver a Assembléia Nacional. Poderes do primeiro-ministro: Limitados; a Assembléia Nacional pode demíbar o governo por maioria absoluta. Contudo, é ainda responsável pela defesa das ações do governo e teria poderes de controle sobre a administração Regime partidário: Pluripartidansmo Pnncipais Partidos: Socialista. Frente Nacional, Comunista, União pela República, União pela Democracia. Legislativo: Senado (321 membros eleitos por colégio eleitoral para mandato de nove anos, 1/3 renovado a cada Ires anos; Assembléia Nacional (577 membros eleitos por voto direto para mandato de cinco anos).

ALEMANHA

Sistema de governo República federativa parlamentarista Forma de escolha do presidente: Escolhido pela Assembléia Federai a cada cinco anos.

Forma de escolha do primeiro-ministro: O Chanceler é nomeado pelo presi- dente, mas eleito por maioria absoluta da Assembléia Federal. Poderes do presidente: Chefe de Estado, nomeia o chanceler, mas não pode demiti-lo ou dissolver o Parlamento. Poderes do primeiro-ministro: Chele de Governo. Na pratca, é sempre o presidente do partido majornano. Tem poderes consideravelmente independentes e onenta a poiifca do governo. Pode ser deposto pela maioria absoluta do Parlamento, mas somente depois que este elegeu seu sucessor por maioria absoluta.

Regime partidário: Plunparodansmo (principais partidos União Democrática Cnstá. Social Demo- crata. Democrático Nacional, do Socialismo Demo- crático. Verde) Legislativo Parlamento bicameral (Conselho Federal, 68 membros: Assembléia Federal, 662 membros com mandato de 4 anos eleitos por sistema misto de represenlaçào proporcional e voto direto)

ITÁLIA

Sistema de Governo: República Parlamentarista Forma de escolha do presidente: Eleito pela Câmara e Senado junto com três representantes de cada região, por maioria absoluta, para mandato de sete anos, que náo pode ser mduodo. Forma de escolha do primeiro-ministro Indicado pelo presidente. Poderes do presidente: Pode convocar sessões especiais do Parlamento e dissdwè-lo. além de indicar o primeiro-ministro Pode ser, contudo indidado por alta traição ou mcapaadade de sustentar a constituição Poderes do primeiro-ministro É o único

ção do governo. "*Pon**vel pela direção da polífca e admínistra-

Reglme partidário: Plunpartidarismo. Prinapais partidos: Democrata Cristão - PDS (ex-comunista), Socialisla.

Legislativo: Câmara (630 membros); Senado (315 membros eleitos por voto direto para mandatos de dnco anos).

ESTADOS UNIDOS

Sistema de governo República presidencialista Forma de escolha do presidente: Por sufrágio direto e universal para mandato de 4 anos.

Poderes do presidente: Nomeia secretários de departamentos (cargo correspondente ao de ministro) e diretores de agendas governamentais, com a aprovação do Senado, Chefe do Executivo, responsável pela realização de tratados, comandante das Forças Armadas e Chele de Estado. Na prática. suas responsabilidades induem propor leis, formular a polibca externa, diplomacia e liderança de seu partido Regime partidário: Pluripartidansmo. Prindpais Partidos: Democrático e Republicano. Legislativo: Senado: 100 membros (2 por Estado) eleitos por voto direto com mandato de 6 anos; 1/3 renovado a cada dois anos. Câmara do Deputados: 435 membros eleitos pelo voto

direto segundo a população de cada Estado, mandato de 2 anos; o voto direto náo é obrigatono

Poderes do Congresso: Cnar impostos, emprestar recursos financeiros regular o comercio interestadual, dedarar guerra, disdpiinar seus próprios membros e determinar suas regras de procedimento.

JAPÃO

Sistema de governo Monarquia Consotuaonal Forma de escolha do Imperador Sstema de hereditanedade Foima de escolha do primeiro-ministro: Escolhido pela Dieta (Parlamento) entre seus membros. Em geral, é o lider do partido majonláno ou de um dos partidos coligados.

Poderes do imperador O imperador não tem poderes com relação ao governo. Seu principal papel consiste em formalidades como a indicação do primeiro-ministro, que é previamente designado pela Dieta. ^

Poderes do primeiro-ministro: Escolhe o gabinete Se a Câmara dos Deputados aprova uma resolução de censura ou recusa-se a dar um voto de confiança ao governo, o gabinete deve renunciar, a menos que a Câmara dos Deputados se dissolva em dez dias Regime partidário: Pluripartidarismo. Principais Partidos: Liberal-Oomocrata, Socialista, Komeito, Comunista). Legislativo: Bicameral. Câmara dos Deputados, 512 membros eleitos por voto direto para mandato dó 4

anos; Câmara de Conselheiros, 252 membros eleitos para mandato de 6 anos a metade renovada a cada 3 «IOS.

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PoMiea Nacional

Folha de São Paulo - 06.12.92

ALTERNATIVAS PARLAMENTARISTAS Os principais pontos divergentes do sistema

1-A ELEIÇÃO DO PRESIDENTE

Direta Mantém o sistema atual pelo qual o eleitorado escolhe diretamente o pre- sidente. É o método em vigor, por exemplo, na França, Portugal e Áus- tria.

Indireta O presidente é escolhido por um Co- légio Eleitoral. Na Alemanha, o colé- gio é formado pelos 662 membros da Câmara mais 518 representantes das Assembléias Legislativas.

2J0S PODERES DO PRESIDENTE

Modelo reina mas não governa O presidente limita-se às funções ce- rimoniais de chefe de Estado, como ocorre com a rainha da Inglaterra, por exempla

Modelo dá palpite mas não governa Na França e em Portugal, o presidente tem funções nas áreas de Defesa Na- cional e Relações Externas. Na Guer- ra do Golfo (91), foi Miterrand quem tomou as iniciativas.

3.COMO DERRUBAR O GOVERNO

Moção de censura "construtiva" É o sistema alemão. O governo sõ po- de ser derrubado, se for apresentado um governo alternativo. Visa dar res- ponsabilidade às oposições.

Moção de censura "destrutiva" Limita-se a derrubar o governo. A Itália é o grande exemplo: 50 gover- nos foram derrubados nos 46 anos de- corridos desde o final da 2- Guerra Mundial

Sistema majoritário O país é dividido em distritos eleito- rais e cada partido apresenta apenas um candidato por distrito. Elege-se o candidato a deputado mais votado em cada distrito.

4JCOMO ELEGER O GOVERNO

Sistema proporcional Podem ser eleitos vários deputados em cada distrito. Os partidos apresentam uma lista de candidatos naquele dis- trito. Se o partido obtiver três vagas, estão eleitos os três primeiros nomes da lista.

Sistema misto E o modelo alemão, pelo qual o elei- tor vota duas vezes na mesma cédula. Um voto vai para o candidato. O ou- tro voto vai para uma lista partidária. Metade das vagas é preenchida pelo voto nominal e metade, pela lista.

O Estado de São Paulo -08.1242

O parlamentarismo e as minorias

CARLOS MATHEUS

A atual preferência da maioria dos brasileiros pe- lo sistema parlamentarista não pode ser ainda conside- rada uma antecipação da mudança "de regime arpós o plebiscito de 1993. Confor- me indica a pesquisa publi- cada pelo Estado no domln- SC a diferença entre parla- mentaristas e presidencia- listas, além de ser pequena, resulta da recente influên- cia que o Congresso Nacio- nal vem exercendo sobre a opinião pública, por inter- médio do processo de afas- tamento do presidente da República. Entre maio e novembro, o parlamenta- rismo ganhou adeptos, fi- cando 6% à frente do presi- dencialismo.

Apesar.de contar com pe- quena maioria, o parlamen- tarismo continua sendo o regime preferido pelas eli-

tes e ainda distante das grandes massas populares. Basta examinar os resulta- dos da pesquisa feita pelo Instituto Gallup, dividida segundo os níveis de escola- ridade: entre as pessoas que têm instrução universitá- ria, 67,7% preferem o parla- mentarismo; entre as pes- soas de instrução secundá- ria e primária, apenas 45,1% e 26,5%, respectiva- mente, preferem o parla- mentarismo. O mesmo ocorre com os diferentes ní- veis sóoio-econômico* da população brasileira: 58,7% da classe A sáo parlamen- taristas contra apenas 30,4% da classe D/E.

Estes dados permitem di- zer que, embora o parla- mentarismo pudesse ven- cer hoje, leto seria ainda conseqüência das preferên- cias das elites nacionais,

que parecem visualizar neste sistema de governo maior proximidade ou aces- sibilidade ao poder. Já as classes mais pobres e de menor escolaridade nâo conseguem vislumbrar num parlamento forte, com poderes para governar, qualquer redução da atual distância que as separa do poder. Para estas camadas mais pobres da população, os deputados e senadores ainda estáo mais preocupa- dos com interesses pessoais ou de grupos do que com os interesses nacionais.

Nem sempre, no Brasil, as maiorias seguem as mino- rias. Estas, contudo, foram sempre as autoras das gran- des mudanças políticas. Bastariam alguns exem- plos. A Monarquia e a Repú- blica foram implantadas por minorias que acabaram

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Quinzena -- mm

Poitíiea Nacional conquistando o apoio pos- terior das maiorias.

No Império, as minorias diziam agir "pelo bem de todos e pela felicidade ge- ral da Nação", sem que esta efetivamente fosee consul- tada. A República resultou de um movimento militar sem apoio popular. Mino- rias depuseram Getúlio Vargas e Jtiáo Goulart, ele- geram Tajicredo Neves e afastaram Fernando Col- lor, procurando sempre conquistar o apoio poste- rior das maiorias.

Com o fiim do período mi- litar, os deputados e sena- dores vém buscando ter ca- da vez maior influência na vida política nacional: de Tancredo a Collor, eles vêm procurando agir em conso- nância com as aspirações populares, talvez para re- verter sua Imagem negati- va perante a maioria do po-

vo. Tanto o atual prestigio do Congresso Nacional quanto o desprestigio do presidente afastado, a ima- gem do presidente em exer- cício e a popularidade dos candidatos a presidente po- derão influir no resultado do plebiscito.

Para a maioria dos brasi- leiros, nem a escolha do sis- tema de governo, nem a es- colha do regime político sâo questões prioritárias. O plebiscito foi trazido por aquelas minorias parla- mentaristas e se Insere dentro de um quadro políti- co instável e de um quadro econômico fortemente re- cessivo. As grandes preocu- pações nacionais estão vol- tadas para a inflação, o de- semprego e as dificuldades econômicas atuais.

Se o plebiscito convém às minorias, caberá a estas de- monstrar às maiorias as

promessas de um futuro melhor, contidas em cada alternativa, para benefício da maioria da Nação. Náo bastarão argumentos jurí- dicos ou científicos para que pessoas de baixa esco- laridade e altas carências econômicas se deixem per- suadir por determinado sis- tema de governo ou regime político. Tal como já ocor- re com os partidos, as maio- rias tenderão a escolher mais em funçáo de pessoas reais do que de argumentos abstratos. A

■ Cario» Mmtbcu» i dimor do Inaiiluto Gallup de Opinião Pública

Jornal do Brasil - 27.12.92

Parlamentarismo: de novo, um casuísmo

O movimento parlamentarista no Brasil - com exceção de algumas per- sonalidades honradas e outras que historicamente, esposam a tese do parlamentarismo - é mais um expe- diente cínico e traiçoeiro entre aque- lea que as elites brasileiras têm utili- zado para conservar o poder e evitar que a população defina, pela sua vontade soberana, os destinos do País. Na verdade, as classes dirigentes do nosso País, ha'muito, dentro do pró- prio sistema presidencialista de go- verno, o têm procurado invalidar, fa- zendo com que este regime se anule, em razão dos vícios e distorções a que o levaram. As oligarquias e grupos dominantes começam a destruir o pre- sidencialismo no próprio processo eleitoral, pela interferência do poder econômico, pelas restrições legislati- vas e judiciárias que impõem às elei- ções e, mais recentemente, pela desa- busada interferência dos meios eletrô- nicos de comunicação no processo de formação da consciência nacional.

Mas, sobretudo, anulam as possibi- lidades do presidencialismo quando, por aqueles expedientes, conduzem ao governo aqueles que não queiram mu- danças ou os que, as desejando, não tenham os mínimos meios para im- plantá-las e, assim, frustrem as ex-

pectativas e os direitos do povo bra- sileiro.

Tanto isso é verdade que, nos últi- mos 40 anos - desde a eleição de Vargas -, o Brasil não ten a chance de eleger um governo coerente, cuja expressão eleitoral majoritário- se re- flita na área parlamentar. Desde 1950, ou se elege um presidente com um Congresso já formado, ou se elege um Congresso em meio a um mandato presidencial. Para um governante, so- breviver a um quadro desta natureza, só à custa de manobras, arranjos e concessões. Ainda mais agora, em meio a um sistema de comunicção avassalador, de natureza empresarial e monopolista, muito mais voltado para os interesses da manutenção do status quo do sistema econômico neocolonial do que preocupado em defender os valores nacionais e os direitos e aspi- rações da população.

Em 50, ainda não havia no povo brasileiro a plena consciência da natu- reza perversa e da própria inviabilida- de do modelo econômico imposto ao País após a 2- Guerra. Mesmo assim, o governo Vargas tomou-se um marco na História do desenvolvimento autô- nomo deste país e do av&mço das lutas sociais do povo brasileiro.

Agora, tudo se tomou mais grave e

complexo. A crise brasileira atingiu patamares desesperadores, como nun- ca se viu em nossa História, e é neste quadro que se aproximam, depois de quase meio século, eleições gerais, coincidentes, em 93. Presidente, vice, dois terços do Senado, toda a Câmara dos Deputados, governadores e até deputados estaduais, todos eleitos juntos, num só dia, num só voto, o povo brasileiro poderá eleger um go- verno comprometido, acima de tudo, com a população, e que conte com a maioria do Congresso e o apoio de um sólido conjunto de governadores para executar um programa de transforma- ção que tire, finalmente, o nosso País da crise a que o levaram.

Esta é a oportunidade que se abre diante de nosso povo. O parlamenta- rismo, agora, surge como um casuís- mo, como o mecanismo de usurpação de um direito que negaram ao povo brasileiro por tantos anos. Em 61, precisaram esconder-se numa madru- gada para violar a Constituição, ras- gando o regimento da Câmara dos Deputados, a fim de impor aquele re- gime absurdo. Hoje, com um plebis- cito, seria impensável que a população fosse renunciar a esta chance, cassan- do a si própria o direito de instituir um governo que abra novos caminhos

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Quinzena para o Brasil para os brasileiros, deixando que, em seu lugar, ascendam ao poder os acordos, conchavos e ar- ranjos parlamentares das elites brasi- leiras.

Esta é a primeira e a principal ra- zão por que o povo brasileiro rejeita- rá, como o fez antes, esta nova mano- bra das castas elitistas de nosso País.

SíssíííSííííiíí

PoMiea Nacional

Leonel Brizola Governador do Estado

do Rio de Janeiro

Transcrito do Estado de São Paulo de 21/12/92. •

Mandado publicar pelo PDT

Diário Popular - 27.12.92

Que parlamentarismo?

PRESTES QUtRCIA

0plebiscito marcado para abril do próxi- mo ano, no qual o povo deverá escolher entre o presidencialismo e o parlamen-

tarismo, além de artificial — pois a popula- ção jamais exigiu a mudança do sistema de governo —, propõe ao eleitorado que, caso vença a opção parlamentarista, assine um cheque em branco em favor de um regime cujo funcionamento é absolutamente desco- nhecido na prática, inclusive dos próprios parlamentaristas.

Vejamos como se poderá dar um dos maio- res equívocos da história da República, de conseqüências institucionais imprevisíveis.

Na cédula, o eleitor poderá escolher entre o presidencialismo e o parlamentarismo — por razões óbvias não vamos levar em conta a volta à monarquia, ainda que sejam as melho- res as intenções de seus autores.

O presidencialismo é conhecido do eleitor — ele conhece suas virtudes, seus pontos fracos, seu funcionamento, suas realizações, sua potencialidade, sua adequação a ura pais em desenvolvimento, que exige ações decidi- das, profundas e rápidas, ratificadas previa- mente com a eleição do presidente e a aceita- ção de seu programa de governo.

E qual o parlamentarismo que sairá das umas, caso a sociedade decida encetar esta aventura?

Ninguém sabe, muito menos os parlamen- taristas.

Instalado um parlamentarismo sem face; os parlamentaristas terão o encargo de desenhar o rosto do novo regime, sem que a população se tenha manifestado a respeito, pois não terá sido consultada.

Nesta desconfortável circunstância, o Con- gresso Nacional gastará um tempo precioso, cuja extensão é imprevisível, para debater, detalhar e apresentar ao País ura modelo de parlamentarismo. Vale lembrar duas agravan- tes: primeira, os urgentes problemas nacionais (inflação, retomada do desenvolvimento, de- semprego, saúde, educação, violência urbana, transportes, resgate da dívida social, entre outros) não ficarão congelados à espera de um melhor tempo para sua solução — ao

contrário, serão exacerbados pelo imobilis- mo político e governamental instalado no Pais; segunda, os parlamentares irão elaborar um sistema de governo desconhecendo as preferências ou mesmo as opiniões do eleito- rado, em um vôo cego de conseqüências dramáticas.

Em momento nenhum a população se pro- nunciou sobre as características de um even- tual novo regime. Vamos a alguns poucos exemplos, indicadores da gravidade da situa- ção. O presidente da República será eleito diretamente ou pelo Congresso? (Não pode- mos desprezar um fato histórico recente: a eleição direta de presidente da República foi conquistada nas ruas e praças pela popula- ção, em um dos momentos mais belos da nossa História). Por falar era Congresso, ele continuaria constituído de Câmara dos Depu- tados e Senado, ou o Senado simplesmente seria eliminado? Caso seja confirmada a so- brevivência'do Senado, a quais regras eje estaria subordinado? A dissolução dS:Câmata implicaria automaticaraente ria dissolução do Senado? A eleição do priraeiro-ministro seria feita por voto da Câmara c do Senado, ou apenas a Câmara teria o poder de escolha? A eleição do primeiro-ministro exigiria maioria absoluta ou bastaria maioria simples, que seria o suporte de um governo nascido fraco, pois existe a hipótese nada desprezável de ser impossível á formação de maioria absoluta? O "novo" presidente da República seria figu- ra decorativa ou teria funções que não sabe- mos quais no governo? Quais as regras para a dissolução do Congresso c do Gabinete? Na hipótese da dissolução do Congresso, as no- vas eleições seriam convocadas por um presi- dente que poderia ter sido eleito indiretamen- te, ou por um priraeiro-rainistro eleito indire- tamente? Restará á população apenas a possi- bilidade de assistir bestificada á resolução de tantos problemas que a atingem diretamente sem poder raanifestar-se?

Considerando esses dados, fica evidente que o parlamentarismo será aventura cara, imobilizante e de vantagens mais do que duvidosas. A

Orrutt Qoircb t 4o PMDB

Folha de São Paulo - 20.12.92

Presidencialismo

o governo fraco José Serra

Durante um debate promovido por estudantes da Universidade de Brasí- lia, o deputado Vladimir Palmeira, presidencialista convicto, resumiu com lucidez e franqueza as nossas di- ferenças em relação ao sistema de go- verno: ele quer o presidencialismo porque, nesse sistema, o Poder Exe- cutivo é mais fraco em relação ao Le- gislativo. Eu defendo o parlamenta- rismo porque considero necessário um Poder Executivo mais forte. O resumo do Vladimir parece surpreendente à luz dos argumentos antiparlamenta- ristas mais popularizados, quase todos enfatizando que, dentro do novo sis- tema, o Legislativo tomaria as "rédeas do país nos dentes".

Quando menciono Executivo mais forte, não penso, evidentemente, em repressão aos direitos individuais ou sociais, nem em opressão ao Legisla- tivo. Penso exclusivamente na capaci- dade do governo para definir e im- plementar políticas públicas, de forma mais coerente e persistente. Penso na "eficácia", na "legitimidade" e na "flexibilidade" do sistema de gover- no, num contexto democrático.

Em conferência feita no final de 1989, no Instituto de Estudos Avan- çados da USP, o professor Alfred Stepan distinguiu com clareza esses três atributos, os mais relevantes de um sistema de governo.

A "eficácia" reflete a capacidade do sistema para gerar maiorias no Le- gislativo e entendimentos entre esse poder e o Executivo, de modo a via- bilizar a formulação e implementação de políticas públicas. A "legitimida- de" relaciona-se com a capacidade do governo de, simultaneamente, vincu- lar-se às opiniões predominantes no país e manter-se dentro do espírito e das normas constitucionais. A "flexi- bilidade" consiste precisamente na capacidade do sistema político de evitar ou resolvei as crises governa- mentais, de modo a impedir que se transformem em crises do regime de-

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SííííSíSiííiíSíííiSK:

Quinzena PoMiea NaeÍon*l mocrático.

No parlamentarismo há um grande incentivo à "eficácia", pois a existên- cia do governo depende da maioria do Congresso, é formado a partir dessa maioria. Note-se que, diante de even- tuais e reiteradas dificuldades para reunir maioria que respalde um gabi- nete ministerial, o Parlamento poderá ser dissolvido, ameaça que influirá poderosamente para induzir à estabili- dade de uma coalizão governamental. Além disso, como lembra o professor Stepan, a participação de partidos e membros do Congresso no governo é bem concreta e, se a coalizão se desfi- zer, ficará fora da administração. Este é outro incentivo para afinar a maioria parlamentar e o Executivo e, portanto, para reforçar a eficácia do sistema político. Não é por menos que no parlamentarismo os governos têm maioria legislativa durante 90% do tempo, segundo estimou Alfred Ste- pan à luz da experiência de países de- senvolvidos e subdesenvolvidos.

Já no presidencialismo, o descasa- mento entre Executivo e Legislativo é natural, notadamente diante de políti- cas públicas que despeitam fortes rea- ções corporativas ou são consideradas impopulares e/ou quando se está no período final do governo, um ou dois anos antes das eleições. Isso tudo, mais o fato de que o governo é forma- do independentemente da maioria do Congresso, leva a que, no presiden- cialismo, o Executivo raramente conte com maioria legislativa e seja, segun- do estimativas de Stepan, minoritário durante mais de dois terços do tempo. Nesse sistema, o Legislativo, ao con- trário do que se pensa, tem tanto ou mais poder do que no parlamentaris- mo, mas tem menos "responsabilida- de".

Face à sua condição de minoritário- quase-sempre, não espanta que o go- verno no sistema presidencialista so- fra, com relativa freqüência, impasses e choques que estimulam o uso de medidas excepcionais, como, no Bra- sil, decretos-lei e medidas provisórias. O recurso a esses instrumentos é bem mais raro no sistema parlamentarista. No presidencialismo, sua utilização freqüente amplia os impasses e os confrontos entre os poderes, cm fortes perdas de legitimidade do sistema po- lítico. Lembre-se o primeiro trimestre

do governo Collor, cuja propensão a adotar medidas excepcionais e a não prestar atenção ao espírito e às normas constitucionais foi duplamente incen- tivada pelo tamanho da crise econô- mica e por sua condição de partida- riamente minoritário no Congresso.

Mais ainda, no parlamentarismo a crise governamental não tende a tor- nar-se uma crise do regime pois, para mudar o chefe do governo, basta o voto da Câmara, enquanto no presi- dencialismo seria necessário um peno- so impeachment ou um golpe de Esta- do. Elege-se um monarca a cada qua- tro ou cinco anos e o fracasso de sua política de governo provoca-lhe, no máximo, o desgosto de observar o colapso dos índices de popularidade, mas não a perda do cargo, que abriria caminho para retificações mais con- sistentes naquela política.

À pouca flexibilidade do sistema acrescenta-se também a intensificação do processo de barganha fisiológica com setores do Legislativo, como re- curso de um governo ajoelhado por seu fracasso. Nesse processo, são en- fraquecidos os partidos cujos parla- mentares são mais suscetíveis à bar- ganha. Os próprios ministros desses partidos, mais fiéis ao presidente do que à sua legenda, encarregam-se do trabalho.

As experiências brasileiras e de outros países da América Latina é ri- quíssima para ilustrar as considera- ções anteriores. Evidentemente, seria um erro elementar acreditar que as vi- cissitudes do processo democrático na região são explicadas somente pelo presidencialismo. Há outros fatores históricos e estruturais por trás delas. Mas um erro simétrico seria desconsi- derar a importância do sistema de go- verno presidencialista como fator que acirra as crises e estreita as chances da consolidação democrática.

Nos debates, toda vez que é subli- nhada a superioridade teórica do par- lamentarismo, não falta quem sublinhe a menor aplicabilidade das considera- ções feitas em relação a alguns países presidencialistas. Nesses casos, como nos Estados Unidos, afora condições históricas e peculiares dos sistemas políticos nacionais, um fator crucial que os diferencia dos sistemas presi- dencialistas de pauses como o Brasil é a predominância do "bipartidarismo",

que modera (embora não elimine) sig- nificativamente o efeito das essências de incentivos mencionadas anterior- mente.

MITOS E REALIDADES A propósito da experiência interna-

cional, o professor Alfred Stepan con- seguiu compilar informações sobre mais de cem países que se tornaram independentes desde 1945 parta, corro- borar a instabilidade e a fraqueza do presidencialismo. Seus números, evi- dentemene, não estabelecem relações de causalidade, nem permitem prever automaticamente tendências reais a partir de mudanças político-institucio- nais a serem promovidas neste ou na- quele país. Mas sugerem, pelo menos, o caráter "mitológico" de argumentos antiparlamentaristas ou pró-presiden- cialistas envergonhados.

Constatou-se, por exemplo, (pie, de 1973 a 1989, entre 38 países não de- senvolvidos, a chance de golpes mili- tares em países sob sistemas presiden- cialistas foi duas vezes maior do que em países sob diferentes variantes do sistema parlamentarista. Do mesmo modo, a totalidade dos países que des- frutaram do regime democrático sem interrupção entre 1979 e 1987 inicia- ram sua vida independente sob regi- mes de corte parlamentarista.

Há outra evidência especialmente relevante para o Brasil: o regime de- mocrático se manteve sem interrup- ções entre 1979 e 1988 no máximo em 41 países do mundo. Entre estes há países parlamentaristas e presidencia- listas mas, "em nenhum deles", pre- valecia um sistema mulüpartidário.

Entre os países não desenvolvidos que foram democráticos durante pelo menos um ano entre i 973 e 1987, o Executivo teve minoria legislativa du- rante mais da metade do tempo nos sistemas presidencialistas. Em países parlamentaristas obteve 83% do tem- po.

Há ainda evidências que desmen- tem a suposta maior rotatividade do primeiro escalão governamental sob o parlamentarismo, o que significaria maiores descontinuidade e instabilida- de na gestão governamental. Entre 1950 e 1980, durante os anos de go- vernos democráticos na Europa Oci- dental, nos Estados Unidos e na Amé-

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Quinzena PoUtiea Nacional rica Latina, a permanência média de um ministro nos sistemas presidencia- listas eqüivaleu à metade da vida mé- dia exibida nos sistemas parlamenta- ristas. Entre 1945-80, cerca de dois terços dos ministros em sistemas par- lamentaristas, contra somente 25% dos ministros em sistemas presiden- cialistas, serviram a mais de um go- verno, fator que reforça e valoriza a experiência na gestão governamental

parlamentarista. Não é exatamente o contrário que tem sido veiculado no presente debate no Brasil? A elevada rotatividade ministerial no presiden- cialismo é, na verdade, um instru- mento de "compra" de apoio parla- mentar.

José Serra á economista e deputado federal pelo PSDB de Sáo Paula Foi secretário do Planeja- mento do Estado de Sâo Paulo (governo Montoro).

Sistemas de Governo Parlamentarismo & Presidendalsmo Cota, Antônio Arcanjo Caderno do Povo - Editora Arcângelus

SISTEMAS DE GOVERNO PARLAMENTARISMO

PRESIDENCIALISMO I - Só existem duas formas de

governo: MONARQUIA E REPÚBLICA

O Parlamentarismo e o Presiden- cialismo são sistemas de governo e não regimes políticos.

Existem vários regimes políticos tais como: Democracia, Comunismo, Capitalismo, Socialismo, Fascismo, Totalitarismo, Militarismo, etc. Vigo- rou no Brasil de 1964 a 1985 o regime militarista com: Humberto de Alencar Castelo Branco, Artur da Costa e Sila, Augusto Rademaker Griinewald, Emílio Garrastazu Mediei, Ernesto Geisel e João Batista Figueiredo.

II-O QUE É CIDADÃO? O indivíduo adquiri a cidadania

com o título de eleitor; assim se toma mais importante do que o "Governo" e mais valioso do que o próprio "Es- tado" ; pois através do voto ele é ca- paz de modificar a forma, o sitema de governo e o regime em que está su- bordinado.

O "Cidadão" tem amis valor do que todo o ouro do universo. Ele é a peça fundamental da "Polis" (Cívitas - Cidade); pois foi aí, que surgiu o interesse pela administração pública para dirigir os destinos do "País" e da "Sociedade".

EI - O QUE É CONSTITUIÇÃO? Constituição ou Carta Magna é a

lei principal de um "Estado" (País, Nação), que define competência dos três poderes; Poder Judiciário - Poder Legislativo - Poder Executivo, de que se compõe o governo e estabelece os direitos e deveres^ do cidadão.

IV - O "PARLAMENTARISMO" originou-se na Inglaterra; surgiu atra- vés de uma Assembléia de Barões, do Clero Católico e de Burgueses (Co- merciantes e Artesões), que mais tarde

formaram um "Conselho" , logo após "João Sem Tena" (Rei da Inglaterra) ter jurado a Magna Carta em 1215 D.C., garantindo as liberdades públi- cas aos cidadãos.

Durante o reinado de Henrique 111, em 1258 D.C., o "Cooselho" impôs ao Reá os "Estatudos de Oxford", pelo qual o Parlamento (Poder Legis- lativo) passou a funcionar bicameral- mente: Câmara dos Comuns (Burgue- ses) e Câmara dos Lordes (Nobres). Foi quando a influência do Parla- mento passou a preponderar sobre a do Rei, limitando o arbítrio do sobe- rano.

Os Ministros e o Chanceler do Rei seriam escolhidos pelo Parlamento,

nascendo aí o "Sistema Parlamenta- rista".

V - AS CARACTERÍSTICAS DO PARLAMENTARISMO são: O Par- tido Político que eleger o maior nume- ro de Parlamentares torna-se majoritá- rio e escolhe entre os seus pares (Deputados) o "Primeiro-ministro", o qual exerce o Poder Executiva Seus auxiliares, Ministros são escolhidos (Eleitos) pelos colegas parlamentares de seu Partido e são responsáveis pe- rante o Parlamento e a ele prestam contas. Portanto, no Sistema Parla- mentarista, quem governa é o Primei- ro-ministro, tanto na forma de gover- no Monárquico, como na forma de governo Republicano. Quando houver uma crise de Gabinete devido o Voto de Desconfiança, o Presidente da Re- pública ou o Rei ou a Rainha dissolve o Congresso e convoca novas elei- ções. O partido majoritário ou uma coligação de vários partidos se reú- nem e elegem um outro Primeiro-mi- nistro e organizam um novo ministério composto exclusivamente de prla- mentares.

No sistema "Parlamentarista", o Rei reina, mas não governa; o Pre- sidente da República é o chefe de Es- tado, mas não tem força de mando político administrativo, que está a cargo do Primeiro-ministro, que é o chefe de governo. O Partido Político majoritário ou coligado com outro Partido Político através de seus repre- sentantes no Parlamento escolhe o Primeiro-ministro e elege, pelo voto indireto, o Presidente da República ou pelo voto direto (caso da França e de Portugal). Na Monarquia isto não acontece, porque o Rei ou a Rainha têm cargo vitalício, isto é, por toda a vida, até morrer.

Na América só existe um País com o Sistema Parlamentarista, que e o Canadá. O chefe de Estadof é o Go- vernador Geral nomeado pelo monar- ca da Inglaterra; o chefe de governo é o "Primeiro-ministro".

Na Europa, na Ásia, na África e na Oceania, existem vários Pauses que adotam o Sistema Parlamentarista, tanto na forma de governo Republica- no como na Monárquica,

Nos Países de Regimes Marxistas (Comunistas) o Parlamentarismo é ex- drúxulo , é capenga e pró-forma.

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Quinzena @ PolttUa Nacional

ü Partido Político Único nega toda espécie de liberdade, caindo na in- congruência da Ditadura do Profe- tariado, onde a oligarquia do mando toma-sç evidente e a luta pelo Poder é feita nos bastidores, sem que o Povo o saiba ou dela participe. Não existe o Voto de Desconfiança, que é uma característica do bom funcionamento do sistema, corrigindo as falhas da Política e da Administração Pública

do Mandatário e dos Representantes nos Poderes Legislativos.

VI - O PRESIDENCIALISMO ori- ginou-se nos Estados Unidos da Amé- nca do Norte para substituir o monar- ca (o rei) com todas as suas prerroga- uvas, com a diferença de não ser he- reditário e vitalício. (Foi a primeira experiência republicana), no Sistema Presidencialista, no mundo. Após a independência das 13 (treze) colônias inglesas na América, formou-se, em 1776 uma "Confederação" , com o nome de Estados Unidos da América do Norte. Onze (11) anos depois, 1787, verificaram a sua incapacidade e fraqueza para continuar existindo; fez-se uma campanha para a mudança, transformando-se a "Confederação" em "Federação" , um Estado Único.

Os 13 (Treze) Países (Estados) Confederados, na época, perderam as suas prerrogativas de Soberania e Federalizaram-se, formando um Es- tado só; apenas mantiveram a autono- mia administrativa de cada uma das Províncias, que conservam errada- mente até hoje os nomes de Estados, pois na realidade, não o são.

As eleições do Presidente da Repú- blica e do Vice-Presidente são reali- zadas pelo processo indireto; o Povo (Eleitor) escolhe os delegados de seu Partido e estes (Delegados) se reúnem em uma Assembléia exclusivamente para escolher o candidato que foi in- dicado na Convenção partidária das prévias eleitorais à Presidência da Re- pública.

Em toda a História dos Estados Unidos da América, sempre ganhou o Partido majoritário, isto é, aquele que conseguiu levar o maior número de Delegados (Representantes) ao Colé- gio Eleitoral. Nunca houve deserção, isto é, um delegado de um Partido voftr num outro candidato que não seja o seu. Após o escrutínio , acaba

a sua finalidade, dissolve-se a Assem- bléia (Colégio Eleitoral).

O primeiro Presidente da República dos Estados Unidos da América do Norte, eleito, foi Jorge Washington, em 1787. Ele passou a ter o poder po- lítico em suas mãos para todo o terri- tório nacional, exercendo o Poder Executivo com todas as prerrogativas que caracterizam o Presidencialismo.

Os governadores das Províb- ciasamericanas, chamadas errada- mente de (Estados), não possuem "Soberania" e estão sujeitos ao go- verno central de Washington, exercido pelo Presidente da República. Caso um Governador de uma Província (Estado) desrespeite a Constituição Federal de 1787, que está em vigor até hoje, o referido Mandatário Pro- vincial está sujeito a uma interven- ção em sua Província (Estado) por parte do chefe de Estado, o Presidente da República, que, no sistema Presi- dencialista exerce o Poder Executivo, que é o Chefe de Estado e Chefe de Governo.

VII - AS CARACTERÍSTICAS DO PRESIDENCIALISMO são:

a) O Presidente da República exer- ce o Poder Executivo com todas as suas prerrogativas, é o Chefe de Esta- do e do Governo ao mesmo tempo, apenas limitado pela "Constituição";

b) Os Ministros (seus auxiliares) são escolhidos pelo Presidente da Re- pública, isto é, os ocupantes dos mi- nistérios são cargos de confiança, ex- clusivamente dele;

c) Tem todo o comando político e militar em suas mãos, independente do Poder Legislativo; só em caso de guerra ele submete ao Parlamento o pedido de autorização e também em alguns casos graves de problemas econômicos.

Nos Países onde existem uma Pseudo- democracia, os Presidentes da Repú- blica de Sistema Presidencialista são verdadeiros monarcas, abusam do Po- der Político, formando oligarquias de- sonestas, praticando toda a sorte de nepotismoss* e favores empregatícios a correligionários políticos de sua grei e de parentes.

VUI - CONCLUSÃO O Sistema Parlamentarista é o mais

honesto e o mais Democrático, porque garante as liberdades publicas dos ci- dadãos que são afiançadas pelo Par- lamento, que é a caixa de ressonância de todos os reclamos feitos à Nação. Os parlamentares protestam, denun- ciando qualquer tipo de arbitrarieda- de.

A atuação do Podo* Executivo, é exercida pelo Primeiro-Mimstro, que é o Chefe de Governo, e está sempre sob o controle do Voto de Descon- fiança. Este é dado pelo Parlamento, onde se processa a votação "Sim" ou "Não", que decidirá se o Gabinete continua ou será dissolvido.

No Sistema Presidencialista pelo contrário o Poder Executivo é exerci- do pelo Presidente da República, que é chefe de "Estado" e de "Governo" ao mesmo tempo, é um verdadeiro "Ditador Legal", investido de plenos poderes, é um "príncipe" temporário; Por mais liberal que ele seja e respeite a "Constituição", não tendo que prestar conta a ninguém, só abandona o cargo quando termina o seu manda- to. ^

Antônio Arcanjo Cota é professor, ajudou a fundar o PT, com a reorganizaçáo do PSB, desfiliou-se do PT e reingressou no PSB na nova fase.

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VERÍSSIMO

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iiiiiiiiii Quinzena

SííiíSSÍ:*::

PoMiea Nacional

Folha de Sáo Paulo - 06.12.92

Parlamentarismo? Por quê?

Leôncio Martins Rodrigues No ritmo alucinado, e alucinante,

das mudanças, reformas e contra-re- formas que caracteriza o sistema polí- tico brasileiro, o eleitorado será cha- mado a dizer, no próximo mês de abril, se prefere a monarquia ou a re- pública, o presidencialismo ou o par- lamentarismo. Deixemos de lado a questão da improvável, mas não im- possível, opção monárquica para nos concentrarmos na opção presidencia- lismo vs. parlamentarismo.

Quais os lados positivos e negati- vos de cada opção? Uma das princi- pais vantagens do parlamentarismo se- ria evitar situações como a que pode resultar da eleição de um presidente sem base partidária no Legislativo. Do ângulo dos valores democráticos, o presidencialismo teria vários aspectos negativos gerados pela personificação do processo político e conseqüente acirramento das disputas. Contraria- mente, a favor do presidencialismo geralmente se enfatiza a diminuição dos riscos de crises de governabilida- de resultantes da formação, nos regi- mes parlamentaristas, de gabinetes minoritários em sistemas partidários fragmentados. Os ministérios presi- dencialistas seriam mais estáveis do que os gabinetes parlamentaristas. Esta estabilidade estaria ligada, em larga medida, ao fato de o chefe de Estado, que é ao mesmo tempo o che- fe do governo, ter um mandato por tempo determinado, o mesmo aconte- cendo com o mandato dos parlamenta- res. Desse modo, os regimes presiden- cialistas tenderiam a ser não apenas mais estáveis como mais eficientes do que os parlamentaristas. Outra vanta- gem do presidencialismo viria de o compromisso político do chefe do go- verno ser antes com o povo do que com a facção parlamentar da classe política.

Para complicar a contabilidade das vantagens e desvantagens de cada re- gime, certos aspectos, que os presi- dencialistas avaliam positivamente, são vistos negativamente pelos parla-

mentaristas. O prazo fixo de governo no presidencialismo seria uma des- vantagem, porque um chefe de gover- no incompetente não poderia ser destituído, enquanto, inversamente, se fosse competente, não poderia ter o seu mandato prolongado, como acon- teceria com um primeiro-ministro no parlamentarismo. Conseqüentemente, ao contrário do que dizem os presi- dencialistas, o parlamentarismo daria mais estabilidade e eficiência à admi- nistração pública. Por sua vez, os pre- sidencialistas podem contestar que o parlamentarismo seja mais democrá- cito e leve a um melhor equilíbrio en- tre os poderes. Muitos cientistas polí- ticos consideram que o Congresso dos Estados Unidos é um corpo legislativo extremamente poderoso quando equi- parado com os Legislativos dos siste- mas parlamentaristas europeus^1-'.

Assim, considerando os dois mo- delos em termos típico-ideais, para um conjunto de vantagens, pode-se apontar um conjunto de desvantagens. Mas, apesar disso, parece não haver dúvida de que o presidencialismo ten- de a projetar as lideranças populistas, os demagogos populares dos palan- ques (ou da TV), enquanto o parla- mentarismo projeta as lideranças há- beis nas manobras de bastidores, nos arranjos políticos, nas palavras cida- dãs ao pé do ouvido. Para utilizar uma imagem zoológica: o presidencialismo favorece os leões (às vezes os gorilas) das praças públicas enquanto o parla- mentarismo favorece as raposas (às vezes ratazanas do parlamento).

É difícil apontar, em termos abs- tratos, qual o melhor sistema. Do ân- gulo de uma apreciação mais concreta, a varo do parlamentarismo poder-se-ia argumentar que os regimes presiden- cialistas nunca tiveram um bom fun- cionamento na América Latina( ). Ocorre, no entanto, que não se pode desprezar, ou menosprezar, outros fatores de ordem social e cultural (o autoritarismo, o militarismo, a violên- cia, a burocracia, a pobreza, o analfa- betismo etc) que, na América Latina e

em outras partes, não favorecem a democracia (parlamentar ou presiden- cialista). Nesse ponto, o exemplo de muitos países europeus mostra que o parlamentarismo - especialmente nos países mais pobres da Buropa latina - deixou muito a desejar nas situações de radicalização ideológica e frag- mentação partidária. O parlamentaris- mo da 22 Repúbüca espanhola (1931- 36), o da Itália até a ascensão de Mus- solini, em 1922, e também o da Ale- manha da República de Weimar (1919-1933), não evitaram a ascensão de regimes de tipo fascista. Na Fran- ça, o regime parlamentar da 4* Repú- blica (1946-1958) foi marcado por su- cessivas crises ministeriais, e acabou levando à emenda constitucional de 1962 que impôs a eleição direta e po- pular do presidente da República, criando um regime presidencialista (ou semipresidencialista). Na verdade, a maioria dos regimes parlamentaristas que funcionaram sem crises maiores eram monarquias (Suécia, Holanda, Reino Unido, Bélgica etc.). Nos EUA, o presidencialismo suportou bem o embate de grandes crises eco- nômicas, como a de 1929, e soube conduzir as políticas de integração das minorias étnicas. Os exemplos acima indicam que um adequado funciona- mento das democracias, em termos dos requisitos de representatividade e funcionalidade, depende de um con- junto de fatores, dos quais um dos mais importantes é a existência de uma cultura política democrática que se funda no consenso, na capacidade de postergação das expectativas, no espírito cívico, na obediência e conti- nuidade das regras do jogo político e na percepção dos concorrentes como adversários e não como inimigos. Aqui, é preciso admitir que esse tipo de cultura está mais associada aos paí- ses de religião protestante do que de religião católica.

A luz dessas observações, como votar no próximo dia 21 de abril? Uma das dificuldades de opção vem do fato de que o plebiscito, aparente-

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im Quinzena PoHtiea Nacional

mente democrático, que transferiu ao povo a escolha do sistema de governo, não indica que modelo de parlamenta- rismo será implantado no país. (A de- cisão caberá aos parlamentares e não aos eleitores). Desse modo, imaginan- do que a opção presidencialista seja derrotada, que tipo de parlamentaris- mo teríamos? Com eleição do presi- dente por voto popular direto ou por voto dos deputados (e senadores)? O Senado continuaria a existir? Com que atribuições? Poderia ele ser dissolvi- do, tal como a Câmara Federal? Em que condições? Senado e Câmara Fe- deral participariam da eleição do pri- meiro-ministro? Este seria eleito por voto aberto ou secreto? Por maioria simples ou absoluta? (A escolha do primeiro-ministro por maioria absoluta parece a solução mais lógica, mas co- mo proceder quando essa maioria não é alcançada? Iríamos para a maioria simples, o que significaria um gover- no minoritário?) Com que poderes e funções ficaria o presidente da Repú- blica? A eleição do presidente deveria coincidir com a eleição do Congresso? Haveria vice-presidente? Deveria ele, na hipótese de existir, ser obrigato- riamente do mesmo partido do presi- dente? Em que condições poderia ocorrer a dissolução do parlamento e de um gabinete? Quem teria o poder de convocar novas eleições: o primei- ro-ministro ou o presidente? Ministros poderiam ser destituídos isoladamente pelo parlamento? O primeiro-ministro teria que ser escolhido obrigatoria- mente entre os deputados ou poderia ser um senador? Apenas parlamenta- res poderiam integrar os gabinetes?

Considerando as características da cultura política brasileira e o fato de que, há pouco tempo, multidões reuni- ram-se nas praças públicas para rei- vindicar o direito de eleger o presi- dente, se no plebiscito a maioria assi- nalar parlamentarismo, provavelmente teremos um modelo híbrido, semipre- sidencialista ou semiparlamentarista, era que o presidente eleito por voto popular direto teria muita legitimidade (especialmente se a eleição for em dois tumos) e conservaria poderes im- portantes, continuando a ser uma peça

essencial do jogo político(3). Não é difícil prever, em tal situação, os pro- blemas de governabilidade advindos dos possíveis desentendimentos entre

um presidente legitimado pelo voto popular direto e um primeiro-ministro legitimado pelo parlamento.

Na hipótese de que a opção parla- mentarista saia vencedora, somente a partir de maio é que as negociações sobre o modelo de parlamentarismo serão para valer. E difícil prever quanto tempo será necessário para se chegar a um acordo e se promover as alterações constitucionais necessárias, inclusive no próprio regimento interno da Câmara. Mas, em princípio, a partir de outubro de 1993, teremos a revisão constitucional. Muito provavelmente, as discussões sobre o modelo parla- mentarista irão coincidir com a refor- ma constitucional, sobrecarregando enormemente a agenda do Congresso. Mas os problemas não param aí. O parlamentarismo a nível federal seria incompatível com as eleições diretas para os governadores e também para os prefeitos das capitais e das grandes cidades. Logo, a mudança das consti- tuições estaduais e municipais se im- pera. A conclusão é óbvia: a classe política brasileira mergulhará por mais alguns anos na discussão do modelo que deverá pautar o jogo dos interes- ses políticos no país, ampliando o pe- ríodo de incertezas quanto ao cenário institucional futuro. Convém lembrar que dezenas de dispositivos constitu- cionais votados em outubro de 1988 continuam aguardando regulamenta- ção e que, em 1994, teremos eleições para presidente. Câmara de Deputa- dos, dois terços do Senado, governa- dores dos Estados e assembléias le- gislativas.

Considerando que não há nada que, entre nós, garanta a superioridade do parlamentarismo, a prudência reco- mendaria dar um pouco mais de tempo à experiência presidencialista iniciada sob a Constituição de 1988. Um país não pode ficar mudando, a todo mo- mento, as regras do jogo, criando a perpétua impressão de que tudo é pro- visório. Mudanças institucionais su- cessivas, tanto na economia como na política, dificultam as previsões e o planejamento. É preciso ter em conta os custos do aprendizado de uma dada mudança. Numa conjuntura de crise econômica e social grave, começar uma nova experiência que ameaça abrir um vazio institucional prolonga- do, pode implicar um grave risco para

nossa estabilidade democrática. Não se trata de defender o imobilismo, mas sim de mudar menos para mudar me- lhor. As instituições da democracia, para se tomarem "sagradas" e legíti- mas, para se incorporarem aos costu- mes, para serem introjetadas pelos ci- dadãos, não podem ser alteradas a to- do momento. •

Notas (1) - Ver, pof exemplo, Arend Lijphart, "As Demo-

cracias Contemporâneas", Lisboa, Gradiva, 1989, pág. 113;

(2) - Cf. especialmente as análises de Bolívar La- mounier, "Brasil: Rumo ao Parlamentaris- mo", Juan Unz, "Presidencialismo ou Parla- mentarismo: Faz Alguma Diferença?" e Ar- turo Valenzuela, "Partidos Pollbcos e Crise presidencial no Chile: Proposta para um Go- verno Presidencialista" In: Bolívar Lamounier (org.). "A Opçáo Parlamentarista", S. Paulo, Idesp-Editora Sumaré, 1991 e Juan Unz e Alfred Stepan, "Political Crafting of Democra- ting Consolidalion or Destruction: European and South American Comparisons", Atlanta (EUA), 1986 (mimeo). Uma ctfbca das posi- ções de Unz encontra-se em Dieter Nohlen, "Sistemas de Gobiemo: Perspectivas Con- ceptuales y Comparativas" iru Dieter Nohlen e Maria Femández iargs,), "Presidencialismo versus Parlamentarismo", Editorial Nueva Sociedad, 1991.

(3) - As vantagens de um modelo misto 9seinipre- sidendalista ou semipariamentarista) para a América Latina são defendidas por Giovanni Sartori ("Neither Presidencialism Mor Paria- mentarianism", Columbía University, junho de 1990, mimeo.) e por Nohlen, (op. dL). A nós, parece o pior dos sistemas.

Lôondo Martins Rodrigues é professor titular de Ciência Política da Unicamp e da USP e membro do Cedec (Centro de Estudos de Cultura Contem- porânea). É autor de "Partidos e Sindicatos" e "Cut os Militantes e a Ideologia*.

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Quinzena PoMíea Nacional

O Plantador-W123- l^a 15.12.92

Razões do Presidencialismo Athos Pereira

Aos trabalhadores e ao povo inte- ressa que o sistema de governo seja mais de-

mocrático. A seguir, apresentamos alguns ar-

gumentos que mostram que o presidencialis-

mo é mais democrático.

No presidencialismo, tanto o poder

legislativo, quanto o executivo, têm origem

no voto popular, o que lhes assegura legiti- midade e permite que um controle o outro.

Este equilíbrio de poderes gera democracia.

No parlamentarismo, apenas o le- gislativo é eleito pelo povo. O chefe do exe-

cutivo é eleito pelos deputados. Esta prática

não fortalece o legislativo, pelo contrário, faz

com que o legislativo seja um apêndice do

gabinete. Tanto é assim que nos paises parla-

mentaristas da Europa 95% das leis são origi-

nárias do poder executivo, enquanto no pre-

sidencialismo americano, 2/3 das leis são de

iniciativa do legislativo.

A famosa flexibilidade, que seria as-

segurada pelo parlamentarismo, que permiti- ria a mudança de governo a qualquer mo-

mento, através da convocação de eleições, é falsa. Mais correto seria dizer que no parla-

mentarismo as eleições são convocadas para

o momento em que isso interressa ao parti- do dominante.

Não foi por acaso que Margaret

Tatcher convocou eleições gerais para logo

depois da guerra nas Malvinas. Foi para ex-

plorar o prestígio adquirido. Da mesma for-

ma procedeu John Major, que fez as últimas

eleições no momento em que as pesquisas indicavam sua vitória.

Já George Bush, submetido ao ca-

lendário democrático do presidencialismo,

não teve área de manobra para explorar o

prestígio adquirido na Guerra do Golfo e te-

ve que marchar para uma derrota anunciada.

Isto mostra que é o presidencialismo que as-

segura rotatividade no poder, permitindo re-

Folha de São Paulo -16.11.92

A OPINIÃO DOS PROFESSORES Parlamentarismo e presidencialismo

José Murillo de Carvalho

Neutralizavão do poder central

(imperador/presidente) é tema

[ constante na história do Brasil ;ndependente. Se adotado, o

! pí.rlamentarismo fortaleceria os

i partidos políticos

l jciano Martins

A instituiçâc do parlamentarismo

comporta riscos: há muitos

partidos e eles são fracos. NSo há

uma burocracia que assegure a

continuidade das decisões do

Estado durante as crises de gabinete

Maria Teresa Sadeic | O parlamentarismo distribui melhor

| as responsabilidades. Mas é preciso

| definir mecanismos para

. constituição do governo, suas

; relações com o Congresso e adotar

as reformas eleitoral e partidária

Rachel Meneguello

O tema é institucionalmente muito

complexo para um plebiscito. Os

americanos desconhecem o que

seja o parlamentarismo e os

ingleses o que seja o

presidencialismo. Mesmo

simplificado, o debate no Brasil é

didático

1 Brasílio Sallum Jr.

O presidencialismo prossegue seu

processo de desgaste e-as

lideranças nacionais

presidencialistas estão

enfraquecidas.As elites tendem ao

parlamentarismo pelo temor de

uma nova opção Lula x Collor

Luiz Felipe de Alencastro

A transição democrática pós-74

embute a dinâmica presidencialista.

A população, com as diretas-já,

pediu a reconquista da soberania

sobre o mandato presidencial. O

impeachment funcionou

Francisco Weffort

j O parlamentarismo é necessário j por uma questão de

governabilidade. Mas ele é

incompatível com o atual sistema

eleitoral e com a manutenção do \

"^presidencialismo" dos

governadores nos estados

Leônclo Martins Rodrigues

| Há uma compulsão brasileira pelas

| mudanças. Se adotado, o

I parlamentarismo mergulharia o pais

num vácuo político. O

presidencialismo, apesar dos

defeitos, mantém a persistência das

regras políticas

S

,'

ai alternativa de políticas e de dirigentes.

Por outro lado, a idéia de que no

presidencialismo, toda crise de governo se

transforma necessariamente em crise de es-

tado, a ser resolvida através de golpe, acaba

de ser desmentida por nossa própria histó-

ria. Destituímos Fernando Collor sem sacri-

ficar nenhuma conquista democrática.

Finalmente, cabe ressaltar que. quando falamos de sistema de governo, esta-

mos falando de sistemas democráticos. Quem tenta confundir o sistema presiden- cialista democrático com suas caricaturas

merece ser lembrado que foram sistemas de

governos parlamentaristas que produziram

primeiros ministros célebres, como Hitler e

Mussolini. #

AOS QUE DEFENDEM O

PARLAMENTARISMO AGORA

Precisa-se lembrar que devemos sempre combater a causa e não os efeitos. A burguesia, com seu sistema capitalista de exploração e concentra- ção de renda, tanto no Parlamentaris- mo ou Presidencialismo como na Mo- narquia, nunca resolveu os grandes problemas sociais (aliás agravam) em país algum, e muito menos resolveu ou resolverá aqui. É bom que os de- fensores do Parlamentarismo agora, sejam eles de esquerda, do centro, da direita e tumbém os oportunistas de "esquerda", saibam que no Presiden- cialismo pode - se acabar com crises (estas provocadas pelos senhores do poder), inclusive com seduções mais radicais e profundas. Agora mesmo, com pressão popular, tiramos um pre- sidente através da Constituição. Fica então provado que é mais fácil mudar o presidente, pois este é um só, do que quinhentos e tantos deputados e senadores, que em sua maioria legis- lam em causa própria ou em defesa de grupos econômicos, sempre contra os trabalhadores e o chamado "Pdvão".

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Quinzena PoUtiea Nacional Basta ver o aumento do salário-míni- mo e do salário dos aposentados, que e corrigido de quatro em quatro me- ses.

No Presidencialismo atual, o Con- gresso é um dos três poderes, portanto tem suas atribuições. Mas o Governo Collor, a maioria dos congressistas, a não ser os de esquerda, foram coni- ventes com a política collorida, dei- xando que Elle governasse 9 meses por decreto e medidas provisórias.

Vemos assim, que o Parlamento no Brasil não é confiável, também como o presidente, pois depende da forma- ção de cada indivíduo política e

ideologicamente. Mudar a regra do jogo agora, quando o país está em cri- se econômica e política, é oportunis- mo, casuísmo, é desviar a atenção do povo dos grandes problemas, como os baixos salários, desemprego, falta de moradia, saúde, etc. O que essa elite de exploradores querem é mais uma vez nos enganar; mudar o sistema por causa de crise? Quem faz as crises são os senhores donos do poder e não os trabalhadores. Estes não podem ficar nessa de combater crises, fabricadas pelos capitalistas. Temos que comba- ter o próprio capitalismo, o qual é o produtor das crises. Mudar a regra do

jogo Agora é mudar a mosca mas a Mer». continuará a mesma.

Como foi dito acima, temos que combater a causa e não os efeitos. A causa é o sistema capitalista de explo- ração da força de trabalho dos traba- lhadores. A saída então é um governo verdadeiramente democrático e popu- lar que nos conduza ao verdadeiro so- cialismo. Não importa, para nós tra- balhadores, que o governo que ante- ceda o governo popular seja Parla- mentarista ou Presidencialista, mudar a regra do jogo é golpe branco. #

CARIOCA (Químico Aposentado)

Soto Urbano -WU- Dezembro 1992

AS REFORMAS DO ESTADO; SISTEMA DE GOVERNO E SISTEMA ELEITORAL

O Brasil entra em 93 com uma árdua tarefa a ser cumprida: a discussão e definição de uma agenda de mudanças que irá traçar o perfú político do país. Os ajustes a que deve se submeter a jovem democracia brasileira apontam para um possível

aumento da representatividade do sistema político nacional, indicando novas formas de relacionamento entre sociedade civil e Estado.

PARLAMENTARISMO VERSUS

PRESIDENCIALISMO

Em abril do próximo ano estaremos con- vocados a participar de um plebiscito nacional onde teremos que escolher entre três alternativas: Monarquia Constitucional, República Parlamen-

tar ou República Presidencialista. Todas as pes- quisas de opinião realizadas até o momento des- cartam a opção monárquica, devendo a disputa ocorrer entre Presidencialismo versus Parlamen- tarismo.

E interessante notar que existe um certo con- senso entre os defensores das duas posições em relação a algumas questões relevantes. Em pri- meiro lugar, todos concordam que o atual Presi- dencialismo não funciona adequadamente. Em- bora a crise dos anos 80 seja decorrente de diver- sos fatores, ficou patente a incapacidade do Esta- do brasileiro de processar e implementar macro decisões. O fracasso de quase uma dezena de pla- nos econômicos anunciados na última década não deixa dúvidas a respeito da grave crise insti- tucional. O dilema seria entre reformar o atual Presidencialismo ou mudar o sistema de governo.

Os defensores do Parlamentarismo argumen- tam que este sistema permite ao governo dispor de maioria parlamentar, uma vez que é fruto de negociações prévias realizadas no Congresso. Além disso, induziria o Poder Legislativo a uma grande co-responsabilidade com o Executivo, pois a escolha c permanência do Primeiro-Minis- tro e de seu gabinete depende sempre da concor- dância da maioria dos congressistas. Alegam, ain- da, que em caso de crise institucional pode-se, através de "voto de desconfiança", substituir com relativa facilidade o primeiro-ministro ou desti-

tuir alguns dos seus ministros. Em caso de impas- ses mais graves é possível a dissolução da Câmara e a convocação de eleições gerais para formação de nova maioria parlamentar. Estas característi- cas dariam grande capacidade de governabilidade ao Parlamentarismo, evitando que crises conjun- turais pudessem - como tem ocorrido ao longo da nossa trajetória presidencialista - colocar em xe- que o próprio regime democrático. Por fim, usam como elemento demonstrativo da superioridade deste sistema de governo o fato de que, exce- tuando os Estados Unidos, todos os países desen- volvidos são parlamentaristas.

Diferentemente do sistema presidencialista - onde o Presidente da República acumula as fun- ções de Chefe de Estado e Chefe de Governo, no Parlamentarismo há uma nítida separação en- tre estas duas figuras. Assim, a chefia do Estado seria exercida pelo Presidente da República, que tem a função primordial de representar o país. Por outro lado, a chefia do governo estaria a car- go do Primeiro-Ministro escolhido pela maioria do parlamento e responsável diretamente pelo dia-a-dia da administração pública.

Seria ilusório, no entanto, imaginar que estas características gerais levariam a sistemas parla- mentaristas relativamente homogêneos. Na p <ti- ca há uma enorme gama de variedades deste sis- tema, sendo possível encontrar exemplos, como o da Itália, em que o Presidente tem uma função semelhante a dos Monarcas das Monarquias Constitucionais até situações mais híbridas, como o caso francês, no qual o Presidente é responsá- vel pela política exterior e pelo comando das for- ças armadas.

Em contraposição, os defensores do Presiden- cialismo afirmam que a via que o Parlamentaris- mo possui para terminar com o conflito entre o Poder Executivo e o Legislativo é na verdade a supressão do primeiro enquanto poder autôno- mo. Em segundo lugar, lembram toda a tradição,

expectativa e esperança do povo brasileiro na eleição direta para Presidente. Neste sentido, a evocação à "campanha das diretas" é quase auto- mática, afirmando-se que a maior parte da popu- lação repudia o parlamentarismo, pois este signi- ficaria a volta das eleições indiretas para a chefia do governo. Ressaltam também que, em grande medida, a modernização do país foi decorrência de iniciativas de presidentes que, em muitos ca- sos, contavam inicialmente com pouco respaldo ■ do parlamento. Outros argumentam, ainda, que o Presidencialismo permite "cortar atalhos" no ca- minho do desenvolvimento, devido a maior sinto- nia entre o Presidente e o sentimento da maioria do país. Segundo este ponto de vista, o parla- mento tenderia a ser mais conservador, defensor do "status-quo" e resistente a mudanças "vis a vis" ao Poder Executivo.

Por fim, outros críticos, mesmo aceitando teo- ricamente as diversas vantagens do Parlamenta- rismo, consideram que o Brasil ainda não estaria maduro para a implantação deste sistema de go- verno, em virtude da fraqueza do nosso sistema partidário, do baixo desenvolvimento de uma cul- tura política de maior participação, da postura "delegativa" da maior parte dos eleitores etc. Da mesma forma que o Parlamentarismo, também este sistema possibilita uma infinidade de varian- tes, que vai desde um Presidencialismo Imperial, do tipo mexicano, até uma situação de maior equilíbrio de poderes entre o Legislativo e Exe- cutivo como ocorre nos Estados Unidos.

Por outro lado, há duas grandes questões insti- tucionais não equacionadas que, dependendo do seu encaminhamento, podem levar as duas pro- postas acima mencionadas a adquirirem configu- rações diversas. De uma maneira geral, tanto os defensores do Parlamentarismo como do Presi- dencialismo concordam com a necessidade de uma reforma partidária e de uma nova lei eleito- ral.

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Quinzena üü w SíííííSSS;

PoMiea Nacional Há unanimidade virtual sobre a urgência de se

criar mecanismos institucionais que levem a uma diminuição do número de partidos e ao fortaleci- mento das agremiações políticas. Hoje existe uma enorme profusão de partidos, muitos funcio- nando como legendas de aluguel ou para respon- der a interesses particularistas de grupos de polí- ticos regionais, o que termina por confundir o eleitor e banalizar a importância dessas associa- ções como intermediadoras dos interesses da so- ciedade frente ao Estado. Além disso, pela atua! legislação, os partidos somente são importantes para viabilizar as candidaturas dos postulantes aos cargos do Poder Legislativo. Uma vez eleitos, os parlamentares de fato não necessitam mais le- vá-los em conta. Dados fornecidos pela Câmara Federal mostram uma enorme discrepância entre o quadro dos deputados eleitos, segundo os di- versos partidos, e a atual correlação de forças partidária, decorrente da forte migração de par- lamentares entre as diversas legendas.

As mudanças no sistema eleitoral

Em relação à mudança na legislação eleitoral, o objetivo buscado seria o aumento da repre- sentatividade, barateamento das campanhas e a diminuição da influência do poder econômico. No referente a este último ponto, as propostas abrangem desde uma nova regulamentação, que incentive a transparência das contribuições dos diversos grupos sociais nas campanhas, até a par- ticipação do próprio Estado cobrindo parte des- tes gastos.

Um dos grandes questionamentos ao atual modelo de representação parlamentar vem dos estados mais populosos, especialmente da região sudeste, que se sentem sub-representados na Câ- mara dos Deputados. Medidas casuísticas toma- das durante o período militar, a fim de manter o domínio sobre o Congresso, superdimensionaram a participação dos Estados das regiões Norte e Nordeste O debate sobre Parlamentarismo ver- sus Presidencialismo possui uma dimensão regio- nal, quase nunca explicitada, mas que não deve ser subestimada. Não é por acaso, por exemplo, que muitas dai principais lideranças presidencia- listas no Congresso são de Estados do Nordeste. Com a implantação do Parlamentarismo, segura- mente haveria uma maior transferência.de poder para as regiões Sudeste e Suldo país, seja em fun- ção da reformulação da representação por Estado na Câmara dos Deputados, seja pela inevitável restruturação do poder do Senado, que deixaria de funcionar como Câmara alta para dedicar-se a outras funções como resolver conflitos entre Es- tados membros da Federação aprovação de acor- dos internacionais etc.

Ainda no que diz respeito ao aprimoramento da representatividade e diminuição dos custos das campanhas, uma das propostas mais ventila- das se refere à-implantação do voto distrital, on- de o eleitor escolheria entre um número reduzi- do de candidatos, cada um deles representando um partido. Segundo os defensores desta tese, o voto distrital, além de baratear e simplificar a campanha, vincularia estreitamente o parlamen- tar com sua base e possibilitaria ao público uma cobrança e controle maior do representante elei- to. A nível municipal, isto poderia significar um melhor canal para encaminhar as demandas tan- to para o governo estadual como para o federal. Por outro lado, isto forçaria a uma maior impor- tância e fortalecimento da vida partidária, já que caberia ao partido indicar os candidatos de cada distrito.

As críticas a esta proposta são de várias or- dens. Para começar, a montagem dos distritos não é algo neutro. Dependendo da maneira que se faça o recorte, pode-se mudar completamente o resultado de uma eleição. No entender de al- guns críticos, se a intenção é buscar maior repre- sentatividade das demandas locais não há neces- sidade desta reforma, pois, na prática, mesmo no atual sistema de voto proporcional, a maior parte dos deputados estaduais e federais são eleitos por bases municipais bem nítidas.

A outra grande crítica ao voto distrital, na sua forma pura, explora o lado "perverso" desta busca de se priorizar os pleitos municipais. Segundo es- tes críticos corre-se o risco de termos "vereadores federais", preocupados apenas com a sua base parlamentar municipal, incapazes de pensar o país como um todo. Além disso, os críticos lem- bram que este sistema penaliza a participação das minorias, terminando por ser assim menos repre- sentativo que o da eleição proporcional.

Preocupados com as duas últimas críticas - su- per valorização das demandas locais e baixa rep- resentação das minorias • hoje em dia a maior parte dos defensores do voto distrital propõe um sistema híbrido, como ocorre na Alemanha. Nes- te sistema distrital, embora a maior parte dos parlamentares seja eleita pelos distritos, reserva- se uma parte das cadeiras para serem ocupadas pelo critério de proporcionalidade, ou seja, em função da soma de votos obtidos pelos diversos partidos em todos os distritos. Os eleitores se- riam informados previamente por cada partido da lista dos candidatos que participariam da dis- puta através do voto de legenda. Com isto, recu- pera-se parte da representatividade das minorias e também possibilita-se a eleição de parlamenta- res sem vinculação a bases locais específicas, e, portanto, tendentes a pensar as questões esta- duais ou nacionais sob um prisma mais geral. De Iquebra, reforça-se ainda mais a importância dos partidos políticos, pois caberia a eles não só ela- borar a lista como também a hierarquia dos can- didatos na mesma.

Pode-se perceber, pelas considerações acima, a complexidade do tema, a grande diversidade de ivariantes nos dois sistemas de governo e a umbi- |lical vinculação deste tema com os rumos da re- forma partidária e eleitoral, atualmente em pauta no Congresso Nacional. Isto para não falar da discussão sobre a possibilidade de extensão do sistema parlamentarista para os níveis estadual e municipal No momento, até por uma questão de viabilidade política, ou seja, para evitar confron- tos com os governadores e potenciais candidatos a estes cargos, os parlamentaristas têm restrito sua proposta ao governo federal.

No âmbito municipal os impactos deste plebis- cito ocorrerão fundamentalmente via transfor- ma decorrentes 'de reformas nas legislações de questões complementare» como a lei eleitoral e a reforma partidária, preconizadas pelos defen- sores de ambos sistemas de govemo. Frente a es- te cipoal de alternativas e possibilidades, o que deve ser exigido pelo eleitor é, em primeiro lu- gar, uma definição prévia da nova legislação elei- toral c partidária. Em segundo, espaço c possibi- lidades de um amplo debate sobre o tema, que culmine com a explicitação clara sobre que tipo de parlamentarismo e Presidencialismo estare- mos escolhendo em abril de 1993. 0

Sérgio de Azevedo, consultor da ANSUR, é pro- fessor titular do Departamento de Ciência Política daUFMG

SOLO URBANO 5

Pelejando -N?102- DezJJanJ92 Jornal Mensal das CEBs, CPT ePOde

Minas Gerais

Parlamentarismo,

presidencialismo... que bicho é esse?

Em 1993, no dia 21 de abril, os brasileiros poderão votar, em plebiscito, escolhendo o presi- dencialismo. Mas, embora já este- ja tão perto o momento da deci- são, o 'debate sobre o assunto é muito fraco. 0 que é um plebis- cito? 0 que é parlamentarismo? E presidencialismo?

Primeiro vamos entender o que é um-plebiscito: é uma vota- ção em que o eleitor diz SIM ou NÃO a uma proposta. Assim, em 1993, vamos votar pelo parla- mentarismo ou pelo presidencia- lismo.' •

Tanto um, como o outro, são formas de se exercer o gover- no de um país. No presidencia- lismo, acontece atualmente no Brás" o presidente é eleito pelo povi,w Existe o Congresso Nacio- nal iDeputados federais e sena- dores) que devem fiscalizar a atuação do Presidente da Repú- blica.

No parlamentarismo os depu- tados federais e senadores elegem um primeiro-ministro. É esse Pri- meiro-ministro quem, de fato, governa a nação. Os deputados (e senadores) devem fiscalizar a atuação do Primeiro-ministro e podem depô-lo quando eJe não estiver agindo de acordo com sua plataforma de campanha.

Tudo isso é apenas uma in- trodução ao tema, pois, na verda- de, existem várias formas de par- lamentarismo... E também várias formas dè presidencialismo, é preciso que os grupos de refle- xão, as comunidades de base, as associações, os sindicatos, discu- tam bastante o tema para que possam tomar uma posição polí- tica diante do plebiscito de abril de 1993.

Agora, uma coisa é impor- tante, desde já: é preciso tomar cuidado com aqueles que apre- sentam o parlamentarismo (ou com aqueles que apresentam o presidencialismo) corno a solu- ção' para os problemas do país. De nada adianta o país ser pre- sidencialista, ou parlamentarista.

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Quinzena ÍSíSíSi;

se não houver uma política social e econômica voltada para os inte- resses do povo, dos trabalhado- res. Assim como, de nada adian- tará o plebiscito se o povo não tiver condições de escolher cons- cientemente uma ou outra forma

Política Nacional de governo. Só assim, escolhendo conscientemente, poderemos, de^ pois, cobrar de nossos governan- tes que exerçam seus mandatos sempre obedecendo os interesses públicos, aos interesses do povo.

Políticas Governamentais -N^86- Dez. 1992

Parlamentarismo versus

Presidencialismo Sérgio A. Ligiero

Esse tipo de formulação, é, no mí- nimo, imprecisa e gera expectativas excessivas sobre o sistema de gover- no. A maior parte desses males só será sanada com políticas substantivas de médio e longo prazos, que dependem de programas e projetos a serem for- mulados e postos em disputa, não sendo, portanto, aplicáveis automati- camente após a construção de um no- vo arranjo institucional. As mudanças neste último campo visam, na verda- de, redesenhar o terreno em que pos- sivelmente serão implementadas estas políticas.

Neste sentido, sob a ótica demo- crática, devemos ter como fio condu- tor das escolhas institucionais a busca de mecanismos que garantam a con- solidação de um sistema político de- mocrático. Ou seja, instituições que combinem racionalidade política com representatividade da sociedade.

Assim, chegamos a uma outra idéia, também enganosa, normalmente difundida nos debates: a de que o sis- tema parlamentarista ou o sistema pre- sidencialista seja necessariamente um mais democrático do que o outro. A princípio, enquanto modelos, qualquer um dos dois pode redundar em gover- nos democráticos. E nenhum dos dois fornece esta garantia.

No parlamentarismo, o governo de- riva do Parlamento e é responsável perante este. Ou seja, o chefe de Go- verno (primeiro-ministro, premier, chanceler, etc.) e o seu gabinete de- pendem do Legislativo, pois dele ex- traem sua autoridade e a ele ficam

sujeitos, sob o risco do voto de censu- ra ou de desconfiança, que o força a demitir-se.

Esse princípio de responsabilidde é essencial no funcionamento do gover- no parlamentarista. Ele tem dupla ca- racterística: é jurídico, na medida em que é previsto constitucionalmente ou no costume; e é político, na medida em que o dispositivo jurídico quase nunca é acionado, bastando a inviabi- lidade de sustentação do governo no Legislativo para que o primeiro seja forçado a demitir-se. O princípio está vinculado ao contexto político e não a procedimentos pré-determinados. Ou seja, a sustentação é política e não constitucional, de modo que o gover- no é facilmente sujeito à troca na oca- sião de uma crise política. Por esta ra- zão, o parlamentarismo é tido como um sistema de governo politicamente mais flexível.

No sistema presidencialista, o pre- sidente é eleito por um período de tempo fixado na Constituição e sua autoridade provém da votação popular direta ou indireta. A questão da sua responsabilidade só é colocada em ca- sos extremos de crime, como ocorreu no caso do impeachment do presi- dente Collor, não se tratando de um mecanismo cotidiano do sistema. Por esta razão, o presidencialismo é con- siderado um sistema de governo poli- ticamente mais rígido.

Os dois sistemas também se dife- renciam pela composição. No parla- mentarismo há: l-o chefe de Estado (presidente, rei, etc), que representa a nação e tem, normalmente, poderes

formais ou simbólicos; 2 - o chefe de Governo (primeiro-ministro, premier, etc.), que é quem governa com seu gabinete, mas também tem prerrogati- vas legislativas; e 3 - o Parlamento, de onde emana o governo. No presi- dencialismo há: l-o chefe de Estado e de Govero na mesma figura (o pre- sidente), que é quem governa e cos- tuma ter iniciativa legislativa; e 2 - o Legislativo.

O poder e a função desses órgãos variam de um caso para o outro, mas esta variação só é significativa em al- guns casos específicos. Como no caso da V República francesa, na qual o presidente é eleito por voto popular ainda que o sistema seja tido como parlamentarista.

PAPEL DOS PARTIDOS No parlamentarismo, normalmente,

apenas o Parlamento tem legitimidade de base popular (eleito pelo povo) e o governo é vulnerável em relação a ele; enquanto no presidencialismo, tem le- gitimidade popular tanto o Parla- mento quanto o presidente, sendo este invulnerável em relação ao primeiro.

O pariamentarismo funciona à base da maioria parlamentar. Ou seja, para se sustentar, um gabinete (que é a ca- beça do governo, formada por minis- tros) precisa ou estar apoiado no maior partido, circunstância em que o líder do partido é o chefe do Governo, ou precisa construir uma coalizão com vários partidos, circunstância em que a chefia de governo é negociada.

Vê-se a importância que têm os partidos políticos neste regime. Com raras exceções, é somente através de- les que se pode consolidar um gover- no pois, como vimos, não há a garan- tia constitucional de permanência do governo, como no presidencialismo. Neste, um presidente pode se manter no poder mesmo que completamente isolado no Congresso pois ele é, si- multaneamente, chefe de Governo e de Estado. Os partidos perdem im- portância e o Executivo procura nego- ciar, apartidariamente, com os parla- mentares. Isto, no regime presidencia- lista em que o Legislativo ainda pos- sui um poder capaz de fazer equilíbrio com o Executivo.

Para além desta diferenciação bási- ca, que não garante maior natureza democrática a qualquer dos dois sis-

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Quinzena ■^'■■■x'::S:$>:^:::r:

Política Nacional

temas, há uma diversidade de combi- nações institucionais nos sistemas de- mocráticos ocidentais que difuculta qualquer afirmação categórica sobre o grau, comparativamente maior ou me- nor, de democracia em um outro sis- tema.

Nesta diversidade de casos empíri- cos, podem ser identificados distor- ções sérias nos dois tipos de sistemas. De sorte que a discussão que se atem em comparar os modelos, buscando desvalorizar um frente ao outro, nor- malmente toca nas possíveis fraquezas de outro, ignorando as suas próprias. Na verdade, a avaliação dos casos de- ve considerar os inúmeros fatores que se combinam concretamente ou se es- tará, no mínimo, simplificando a aná- lise e tendendo a usá-la levianamente.

De fato, concretamente, qualquer dos dois sistemas, para ganhar dese-

nho institucional mínimo, precisa do acompanhamento de mecanismos múltiplos (federalismos, sistemas eleitoral e partidário, etc), a maioria dos quais comum a qualquer sistema democrático e não específico a um único sistema.

Acrescente-se que, em cada uma das experiências concretas, foi a com- binação desses mecanismos com as condições políticas, históricas, so- ciais, econômicas e culturais da socie- dade em questão que deu a cara efeti- va do regime.

Além disso, deve-se considerar que o próprio momento de definição desta combinação é determinante, na medi- da em que tem natureza política, ou seja, de disputa e não técnica. Assim, entra em disputa uma constelação de interesses dos mais nobres aos mais mesquinhos. Ou seja, o processo não parte de uma situação ideal zerada.

RISCOS De qualquer maneira, as duas críti-

cas mais pertinentes dirigidas aos dois modelos de governo democrático po- dem ser suavizadas pelas respostas dadas em algumas experiências cons- titucionais.

No que diz respeito ao parlamenta- rismo, aponta-se para o risco de insta- bilidade do Executivo, na medida em que pode haver uma incapacidade crônica dos governos de se sustenta- rem, o que implicaria em vetos cons- tantes do Legislativo. Já existem ra-

cionalizações constitucionais com o objetivo de consertar isso: uma seria condicionar a demissão do governo à sua substituição automática; outra se- ria a exigência da qualificação da maioria para o voto de desconfiança.

No que diz respeito ao presiden- cialismo, aponta-se para o impasse latente entre Legislativo e Executivo. O que também já foi suavizado em al- guns casos com mecanismos constitu- cionais: dá-se poder de dissolução do Congresso e de convocação de elei- ções ao presidente; e dá-se, para equilibrar, o poder ao Parlamento de convocar nova eleição presidencial.

E preciso transcender a discussão sobre modelo de sistema de governo. Em vez de confrontar as formas pos- síveis do presidencialismo ou do par- lamentarismo, devemos avaliar as rea- lidades social, política e institucional brasileiras.

Qualquer investimento no sentido da consolidação democrática precisa combinar essas características com al- gum dos dois possíveis modos de ar- ranjo institucional de tomada de deci- sões em regimes democráticos. Este arranjo precisa ser capaz de incorpo- rar a imensa diversidade da sociedade brasileira, sem comprometer a racio- nalidade das políticas e a governabili- dade.

Nossa sociedade é extremamente complexa e heterogênea, rica em grandes e pequenas minorias, o que gera uma enorme quantidade de de- mandas ao Estado. O processamento destas demandas pelo poder público depende dos canais de mediação - as instituições representativas, com des- taque para os partidos e para o Con- gresso Nacional.

A experiência institucional brasilei- ra tem se conduzido por uma tradição de centralismo, autoritarismo e exclu- são da participação popular, e que tem se expressado na forma institucional do presidencialismo. O Legislativo, enquanto poder, instituição e espaço de expressão da diversidade da socie- dade, tem sido historicamente subju- gado a um papel menor pelos arranjos

oligárquicos do nosso presidencialis- mo. Sem contar o caldo cultural do messianismo que esta forma de gover- no tem feito prosperar.

E necessária uma inversão dessa lógica preponderante na nossa histó-

ria. É necessária uma inserção do Le- gislativo no sistema político, atribuin- do-lhe responsabilidades maiores. Ao mesmo tempo, é necessário um forta- lecimento dos partidos nacionais, de maneira a implodir o padrão oligár- quico regionalizado do nosso sistema político.

O sistema parlamentarista tem no Legislativo seu principal órgão. Na maioria das democracias que o adota- ram, ele foi um importante fator de democratização ao fortalecer os parti- dos e a representação.

Contudo, qualquer que seja o sis- tema de governo que adotarmos, ele deve ser acompanhado de um pacote de reformas que inclua a mudança do sistema eleitoral, do sistema partidário e dos meios de comunicação, pelo menos. Sem estas alterações, o desen- volvimento da representação e da par- ticipação fica obstruído e as forças retrógradas da sociedade brasileira poderão se rearticular, mantendo as velhas práticas, seja sob o parlamenta- rismo, seja sob o presidencialismo. #

Sérgio A. Ligiero é sociólogo e pesquisador do IBASE.

Brasi Agora -N»30-21.12.92a24.01.93

Uma opção mais democrática

José Genoíno A discussão sobre sistema de go-

verno, antes de ser ideológica, é aci- ma de tudo política. Trata-se de per- ceber, a partir do funcionamento téc- nico-político, qual dos dois regimes oferece mais vantagens democráticas. Existem boas razões práticas para su- por que o parlamentarismo é mais de- mocrático.

A experiência histórica mostra que o presidencialismo não funcionou até agora em toda a América Latina. Ca- racterizou-se como um modelo institu- cional a serviço das elites, seja para concentrar capital, para oprimir a luta por direitos ou para manter as massas deserdadas da cidadania. O presiden- cialismo caracterizou-se também por abrir as portas para ditaduras milita- res. Sempre que os setores populares ameaçam o stotus quo das elites, a

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Quinzena If PoiiUea Nacional instituição presidencial mostra-se in- capaz de mediar o conflito. O anti-re- formismo do presidencialismo o faz incapaz de estabelecer equilíbrio e justiça sociais.

Quando os países da América Lati- na não vivem períodos de ditaduras abertas, o presidencialismo permite que as Forças Armadas exerçam uma tutela militar - mais ou menos intensa de acordo com as circunstâncias de cada país - sobre o sistana político. Somada ao poder imperial do presi- dente e ao formalismo do Parlamento, a tutela faz do presidencialismo um regime de semi-ditadura. Existem momentos de funcionamento demo- crático, mas existem outros do blo- queio do sistema político, de cercea- mento de liberdades e de repressão aos movimentos sociais.

A essência do parlamentarismo consistem em que o governo só se instala com a autorização do Parla- mento. O governo goza da confiança da maioria parlamentar e é politica- mente responsável perante a Câmara dos Deputados. Este princípio da res- ponsabilidade, que está fundado no voto de censura que o Parlamento po- de emitir contra o governo, representa condições de vantagem do parlamen- tarismo sobre o presidencialismo, nos seguintes pontos: a) permite uma maior fiscalização dos deputados so- bre as atividades do executivo; b) re- duz enormemente a possibilidade de formação de governos com minorias políticas; c) reduz o potencial de crise institucional na medida em que as cri- ses políticas são solucionadas, nor- malmente, com a formação de um no-

vo governo. Três conseqüências importantes

podem ser deduzidas desse processo: a) a sociedade adquire maior poder de controle sobre o governo através da pressão sobre os parlamentares; 2) o parlamentarismo induz o governo a uma ação mais eficaz em decorrência dos mecanismos de controle da socie- dade e do Parlamento sobre o mesmo; e 3) pela razão anterior e também por- que há um menor espaço para a troca de favores entre o governo e o Parla- mento, diminuem as possibilidades de corrupção. Por estas e outras razões o parlamentarismo é uma opção mais democrática. •

Josá Genofno é deputado federal PT-SP.

Srasí Agora -N*30-21.12.92 a 24.01.93

Inauguremos o presidencialismo!

Flávio Aguiar

O Brasil carece de uma tradição re- publicana. Dizer que na República a experiência presidencialista não deu certo é esquecer as origens de nossa República, num golpe militar onde o Exército usurpou o Poder Moderador de D. Pedro U, e sua continuidade de vida pública trancada, A República Velha, seja sob a "ditadura parla- mentar" de Pinheiro Machado, seja sob a política do café com leite, onde a questão social acabou considerada caso de polícia, não foi propriamente republicana, mas herdeira das oligar- quias deserdadas pelo fim da escravi- dão e do império. Depois, com a meia revolução de 1930, inaugurou-se o império getulista, que acabou no Es- tado Novo. Dezoito anos de democra- cia populista desaguaram no golpe de 64, precedido pelo golpe parlamenta- rista de 1961, cortado pelo plebiscito de 1963. O regime militar esvaiu-se, mas deixou seu legado na fragilidade da Nova República, e ainda abriu es- paço para o populismo entreguista de

Fernando Collor. Atribuir essa eterna crise da vida republicana brasileira, provocada pela sanha golpista das elites, ao presidencialismo, é o mesmo que atribuir a ascensão de Adolf Hi- tler ao parlamentarismo, porque ele era primeiro-ministro.

Em 1930 Vargas inaugurou o co- mício (na Esplanada do Castelo) como caminho em eleição presidencial, num gesto que não se completou. Jamais o espaço da vida púbüca se constituiu de forma estável e ampla no Brasil, sempre puxado para os paços e gabi- netes. Para constituir este espaço, dentro de nosso acúmulo cultural e de nossas lacunas, não se pode prescindir de um momento de acesso direto ao espaço de exercício do poder - que a eleição presidencial, direta, pelo voto universal, representa, e com o campo de poder que a presidência deve ter - emanando do povo e sendo exercido em seu nome e para seu bem-estar - para citar um velho chavão liberal, de boa cepa.

O Brasil necessita ainda resgatar o princípio republicano em sua vida pú- büca, dentro dos parâmetros de sua história. Não adianta fingirmos que somos o que não somos: nem o hábito faz o monge, nem o fraque, o inglês. Somos um país de tradição lusa, se- bastianista, de presença africana e na- tiva e de correntes migratórias mais recentes, o que deu origem a um "po- vo novo", a cavar e a construir sua própria tradição. Não adianta fugir do espelho: acabaremos como o persona- gem de Machado, enlevado pelas pró- prias roupas, que não se vê mais, se as despe. Necessitamos, isto sim, é de banhos periódicos de politização. Pre- sidencialismo, com repartição real de poderes. #

Flávio Aguiar é professor da USP e editorialista do Brasil Agora.

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PoííUea Nacional Folha de São Paulo - 24.12.92

As razões do parlamentarismo José Genoino

A discussão sobre sistema de go- verno, antes de ser ideológica, é, aci- ma de tudo, política. Trata-se de per- ceber, a partir do funcionamento téc- nico-político, qual dos dois sistemas oferece mais vantagens democráticas. Partimos do pressuposto, confirmado pela história, de que quanto mais de- mocrático for o funcionamento insti- tucional, mais o sistema sócio-político tenderá a produzir justiça e equilíbrio social e eficácia governamental. Existem várias razões para supor que o parlamentarismo é mais democrático do que o presidencialismo. Destaca- mos algumas.

Primeiro: no único regime pres^ dencialista que deu certo no mundo, o americano, a eleição do chefe de go- verno é indireta: os eleitores escolhem um colégio eleitoral que elege o pre- sidente. Este governa soberanamente, não compartindo o poder com os se- cretários de Estado, ao contrário das decisões coletivas dos gabinetes par- lamentaristas.

Nos Estados Unidos existe uma se- paração rigorosa dos poderes. O Par- lamento americano é o mais poderoso do mundo, mas não tem vínculos sóli- dos com o governo. O presidente tem enorme dificuldade em aprovar pro- jetos legislativos e financeiros. Isto tende a produzir uma certa paralisia no governo ou um déficit de governa- bilidade. O sistema partidário funcio- na com base num bipartidarismo falsi- ficado na medida em que os deputados votam como querem, sem a fidelidade partidária do parlamentarismo. O sis- tema partidário americano é um dos mais oligarquizados do mundo.

Segundo: a experiência prática mostra que no Brasil e na América Latina o presidencialismo, além de abrir portas para as ditaduras, exacer- ba os poderes do presidente e debilita os do Parlamento. As instituições parlamentares são uma camuflagem para acobertar os poderes imperiais do presidente. As Forças Armadas exer- cem um grande papel político, mesmo

não estando diretamente no governo. Isto constitui a chamada tutela militar sobre o sistema político. Decorre dis- so um caráter semiditatorial do presi- dencialismo. Sempre que os setores populares ameaçam o status quo das elites, a instituição presidencial mos- tra-se incapaz de mediar o conflito. O antí-reformismo do presidencialismo fez dele um modelo institucional a serviço das elites que sempre governa- ram na América Latina.

No presidencialismo, a relação en- tre Executivo e Parlamento pode ser definida como um jogo de "submis- são" e "instabilidade". Se o presi- dente tem maioria parlamentar, a rela- ção toma-se fisiológica e clientelista. Se não a tem, instala-se a instabilida- de política com todas as suas nefastas decorrências. O modelo presidencial mostra-se incompatível com a partici- pação democrática dos demais agentes políticos nas decisões, sejam partidos, a sociedade civil ou outras instituições e poderes estatais. O presidencialis- mo, ao impermeabilizar soluções ne- gociadas dos conflitos sociais, tem servido para esmagar a luta por direi- tos, produzindo o analfabetismo e a miséria, ao lado da concentração de riquezas.

Terceiro: o parlamentarismo, pre- dominantemente na Europa, tem se apresentado como a forma de governo das democracias desenvolvidas do sé- culo 20.

Do ponto de vista político, o par- lamentarismo caracteriza-se pela res- ponsabilidade política do governo pe- rante o Parlamento, pois a sua exis- tência depende deste. Mas o Parla- mento também tem uma determinada responsabilidade perante o governo na medida em que este pode antecipar as eleições legislativas, o que flexibiliza o jogo político, ao contrário do presi- dencialismo que é um contrato por prazo fixo. Tecnicamente, esta dupla responsabilidade tende a produzir uma maior eficácia no governo e um maior realismo e menor demagogia no Par- lamento.

No parlamentarismo, o jogo políti-

co adquire maior fluidez e as decisões governamentais, normalmente, são negociadas no Parlamento. Com isso, não só os partidos mais organizados adquirem maior relevância, mas tam- bém os grupos da sociedade civil, pois a base negociai das decisões gover- namentais lhes dá um maior poder de pressão sobre o governo. No parla- mentarismo, portanto, tanto a vida política como as relações entre os grupos da sociedade sofrem um pro- cesso de maior contratualização, cujas conseqüências são relações mais de- mocráticas e um maior equilíbrio so- cial.

Quarto: a implantação do parla- mentarismo no Brasil deve ser acom- panhada por outras reformas. Aqui destacamos apenas uma: o estabeleci- mento da representação proporcional dos Estados no Parlamento. Quanto ao modelo de parlamentarismo, existem várias questões a serem definidas, das quais também destacamos uma: ma- nutenção da eleição direta do presi- dente da República, a exemplo da França e Portugal.

Setores do PT e da esquerda afir- mam que o momento do parlamenta- rismo não é este porque Lula pode chegar à Presidência da República. O parlamentarismo seria uma maquina- ção das elites para evitar que os opri- midos tenham a chance histórica da redenção. Descontado o messianismo, cabe argumentar que em política, a ri- gor, tudo é possível. Maluf ou um ou- tro também podem chegar lá. O que importa é que a democracia só se afirma com a consolidação de institui- ções democráticas. A existência destas é a única garantia para qualquer pro- jeto conseqüente de reformas sociais. N ós também queremos Lula na Presi- dência, mas com instituições demo- cráticas e com as condições de gover- nabilidade fornecidas pelo parlamen- tarismo. #

José Genoino é deputado federal pelo PT de Sáo Paulo; foi líder do partido na Câmara dos Deputa- dos.

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Quinzena Folha de Sâo Paulo - 02.01.93

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Polítíca Naeionai

Fato político e histórico

JOSÉ DIRCEU

Esquecer que se lutou 30 anos pelas diretas pode deslegitimar o

sistema de governo

Somos pelo parlamentarismo repu- blicano com eleição direta do presiden- te da República. Entendemos que não podemos implantar democraticamente o parlamentarismo no Brasil desconhe- cendo nosso passado histórico e nossa cultura política. O povo brasileiro lu- tou 30 anos por eleições diretas para presidente, sendo esta a palavra de ordem institucional que mobilizou o país e iniciou o fim da ditadura militar. Desconhecer esse fato político e histó- rico, e partir para um sistema parla- mentarista com eleição indireta do presidente, pode significar o início da deslegitimação do novo sistema.

Nossa proposta parlamentarista é democrática; ela visa fundamentalmen- te o controle democrático do governo pelo povo, através de uma crescente intervenção da sociedade, particular-

mente dos setores organizados, nos negócios públicos. Estimulando o au- mento da representatividade dos parti- dos e dos mandatos legislativos, o parlamentarismo abre também espaços para o debate de programas, a fiscali- zação e a pressão popular. Além disso, está associado de forma indissolúvel à reformas democráticas, no que diz respeito à representação na Câmara, ao papel do Senado, ao sistema partidário e eleitoral, à administração pública e à atual legislação de concessões de rádio e televisão.

Nosso objetivo é aumentar a repre- sentatividade e legitimidade das insti- tuições republicanas brasileiras. Nesse caso, devemos levaram conta as con- dições históricas e culturais em que estamos organizando o sistema de go- verno parlamentar: após 25 anos de ditadura militar, apesar da redemocra- tização, vivemos num sistema institu- cional que fortalece o poder unipessoal e imperial do presidente, falseia a vontade popular, inviabiliza os parti- dos, destrói a soberania do Parlamento e impede o controle e a participação popular nos negócios públicos.

E verdade que as reformas democrá- ticas, que já iniciamos com a nova lei partidária, e o parlamentarismo podem e devem superar estes obstáculos à

democratização do poder no Brasil. Mas por isso mesmo faz-se necessária a eleição direta do presidente da Repú- blica, com. poderes de ..dissolver o Parlamento, comandar as Forças Ar- madas. Manteria também, o presiden- te, as atribuições que a Constituição de 88 lhe assegura no que diz respeito às relações externas e a defesa nacional, já que todas dependem de autorização do Parlamento.

A presença de um poder republicano eleito diretamente seguramente levará o Parlamento e os partidos políticos a exercerem o governo na direção demo- crática que o parlamentarismo aponta, contrabalançando as tendências oligár- quicas e autoritárias de nossas elites.

Para nós, a questão do parlamenta- rismo republicano democrático é estra- tégica; somente esse sistema desgover- no viabilizará e criará condições para as reformas econômicas e sociais ne- cessárias para a ruptura da atual estru- tura de privilégios e concentração de riqueza e poder existente no Brasil, dando continuidade à histórica luta de nosso povo pela democracia, que on- tem significou a luta pelas diretas e hoje tem o nome de parlamentarismo.©

JOSÉ DIRCEU. 46, é deputado federal pelo PT de 55o Paulo e secrecírio-geral do partido.

Folha de São Paulo - 13.1Z92

'Parlamentarismo permite a manipulação'

O deputado federal Wladimir Palmeira (RJ) acha que o presi- dencialismo permite um maior equilíbrio entre os poderes. Para ele. os regimes de gabinete aca- bam " 'anulando'' o papel do Par- lamento, uma vez que é o primei- ro-ministro quem tem uma relação direta com a população.

Palmeira afirma que o presiden- cialismo já é maioria na bancada federal e acredita numa vitória tranqüila nas bases do partido. A seguir leia os principais trechos da entrevista:

• Folha - O presidencialismo

nãu seria uma concepção mes- siânica, de quem adia que se pode governar diretamente com as massas?

Wladimir Palmeira - Boba- gem. Pode haver líderes messiâni- cos tanto no parlamentarismo co- mo no presidencialismo. Em al-

guns regimes de gabinete o pri- meiro-ministro é que acaba tendo uma relação direta com a popula- ção, anulando o papel legislativo do Parlamento. A Grã-Bretanha é um caso típico. Não há dúvida entre nós do PT que qualquer governo tem que cotapor com o Congresso. E o presidencialismo permite maior equilíbrio entre os poderes.

Folha - Mas o parlamentaris- mo não acaba facilitando a reso- lução das crises?

Palmeira - Não há a menor prova a esse respeito. Há países em que o parlamentarismo fun- ciona bem e outros em que o presidencialismo funciona bem. Agora, é preciso dizer que o parlamentarismo permite mais manipulação. Margaret Thatcher, por exemplo, passou uma década no poder porque podia convocar eleição quando era mais conve-

niente para ela. Já George Bush nao teve jeito, pois a democracia americana prevê eleições a cada quatro anos. Se houvesse parla- mentarismo nos Estados Unidos, Bush certamente teria convocado eleições após a Guerra do Golfo, quando sua popularidade estava lá em cima.

Folha - Quais é a sua opinião sobre o movimento parlamenta- rista?

Palmeira • Há nele pessoas que acreditam sinceramente na causa, que têm uma visão doutrinária. Mas há também uma direita cujo objetivo central é amputar as elei- ções diretas para presidente da República, porque acham que vão perder, para a esquerda em 1994. Acho isso um absurdo. Primeiro, porque a democracia pressupõe a possibilidade de qualquer um che- gar ao poder pelo voto. Segundo,

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Quinzena Política Nacional porque ao expressar esse temor, a direita dá a si própria um atestado de fragilidade.

Folha - Como o sr. avalia a correlação de forças internas do PT a respeito desse assunto? Palmeira - Na bancada federal o presidencialismo já é majoritário e se observa também um crescimen- to dessa posição entre prefeitos do partido. Mesmo em São Paulo

estamos avançando. Há ainda en- tre os parlamentaristas do PT uma corrente que pode adotar o presi- dencialismo, pois condiciona a mudança do regime de governo a determinadas reformas. Somados a esses companheiros teremos uma vitória tranqüila nas bases do partido. Mas mesmo sem eles estamos preparados para ganhar. £

PARLAMENTARISMO X PRESIDENCIALISMO: COLOCANDO A QUESTÃO EM SEU DEVIDO LUGAR

José Raimundo Fontes O incipiente debate até agora de-

senvolvido em tomo do sistema de governo tem deixado de lado questões cruciais para o movimento operário- popular, centrando-se, quase que ex- clusivamente, em aspectos funcionais do Parlamentarismo e do Presidencia- lismo. Embora se referenciem em pressupostos distintos e apresentem argumentos opostos, os principais de- batedores do tema, na sua maioria, se restringem a descrever e a indicar as vantagens e desvantagens da forma de governo que defendem, transforman- do-a em modelo ideal de organização política para o país. Nesta perspecti- va, acabam concebendo o espaço ins- tituição-govemo como sendo uma es- pécie de lugar exclusivo da luta polí- tica e instituidor do social como um todo, que permaneceria inalterado e informado pelas profundas desigual- dades econômicas e políticas.

Entendemos que o conjunto das forças sociais e políticas verdadeira- mente comprometidas com transfor- mações estruturais da sociedade bra- sileira não deve pensar o sistema de governo a partir de sua extenoridade, de seu arcabouço jurídico-formal. En- tre a alternativa parlamentarista e a Presidencialista, devemos considerar qual das duas, no momento histórico atual, encena maiores e efetivas po- tencialidades para emergência e per- manência de meios institucionais mais capazes de radicalizar o processo de construção de uma sociedade real- mente democrática e mais igualitária e que, portanto, seja portadora de con- dições que permitam o desencadea- mento de uma praxis coletiva das am-

plas massas trabalhadoras e marginali- zadas, a gestão de experiências que propiciem uma nova correlação de forças sociais e cristalização de novos padrões de cultura política.

Nesse horizonte, nem o Parlamen- tarismo, nem o Presidencialismo, con- cebido formalmente se constitui em um fim estratégico, isto é, em um mo- delo de ordenação político-social ins- taurador de uma sociedade mais justa, mais humana e fraterna. Por isso mesmo, a opção pela permanência do Presidencialismo ou pela instalação- restauração do Parlamentarismo deve se fundamentar numa concepção muito mais tática, subordinada a uma visão programática de sociedade que possa a vir a se construída como re- sultante das lutas e conflitos dos oprimidos e excluídos contra os domi- nadores, do que na defesa da atual or- dem institucionalizada e na crença permanente em instituições da Demo- cracia formal burguesa, que, no Bra- sil, sempre foi atrofiada e instrumen- talizada pelas elites retrógradas.

Ao nosso ver, é ancorada nossas premissas que deve residir a preferên- cia das correntes vinculadas aos inte- resses populares pela continuidade do sistema Presidencialista. No estágio atual de correlação de forças na so- ciedade, das lutas e experiências polí- ticas acumuladas, das condições exis- tentes para a atuação político-eleito- ral-institucional das correntes e parti- dos de esquerda e das expectativas em curso no seio da maioria da popula- ção, a eleição para Presidente se constitui um momento político privi- legiado, como ficou demonstrado em 1989. Uma candidatura presidencial

que enfeixe um programa transfonna- dor e que aponte para um avanço so- cial do país tem tudo para aglutinar e unificar amplos setores das classes trabalhadoras, das camadas médias e populares, conformando um poderoso pólo de forças sociais capazes de en- frentar os blocos conservadores, rea- cionários e de direita.

E não se diga que essa é uma ar- gumentação conjuntural, pragmática e instrumentalizadora no enfoque do sistema de governo. Pelo contrário, a disputa político-eleitoral para a Presi- dência da República pode favorecer plenamente a intervenção das massas, permitindo a clarificação e demarcção de interesses fundamentais na ordena- ção da sociedade, estimulando a auto- organização para a defesa e conquista das reivindicações e transformações que atendam às necessidades dos segmentos populares. Ademais, é um processo rico e educativo panTa dis- puta de hegemonia pelos trabalhado- res porque pode fazer brotar uma consciência situada em um patamar elevado e politizado do processo polí- tico; porque pressupõe, também, o confronto de projetos globais e de concepções ideológicas reveladores de todo o corpo social. E, finalmente, chegando ao governo, as forças so- ciais populares terão bem mais condi- ções para disputar-obter-impor um consenso social, onde as iniciativas deverão estar entre os sujeitos até en- tão marginalizados da vida política do país e não mais com os poderosos que sempre estivei&im no governo e no po- der.

Ao contrário, o Parlamentarismo fragmenta, regionaliza, despolitiza e enfraquece a ação político-eleitoral dos trabalhadores e camadas popula- res, obscurecendo a natureza ideoló- gica e de classes das eleições em ge- ral, dando margem para que os meca- nismos de alienação política utilizados pela classes dominantes sejam otimi- zados em sua eficácia. Isso é o Parla- mentarismo. E este, acoplado com o voto distrital, será o paraíso das elites dominantes e uma arapuca que apri- sionará os partidos e correntes que se reivindicam defensores dos interesses dos trabalhadores e da grande maioria do nosso povo. #

José Raimundo Fontes é professor de História da UESB (Conquista-BA), militante do PT desde a sua fundação, foi candidato a Vice-Prefelto em 1992 pelo PT em Vitória da Conquista-BA.

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Quinzena

Brasil Agora - W 28/29 - Dez. 1992

w Política Nacional

Pelo presidencialismo democrático O Congresso Nacional aprovou a

realização de um plebiscito, em 21 de abril de 1993, dando ao povo o direito de decidir se quer um sistema parla- mentarista ou presidencialista. A dis- cussão, por enquanto, não ganhou as bases e também não motiva suficien- temente os meios políticos e a inte- lectualidade do país. Esta ausência de debate e discussão sobre o tema anun- cia o temor de uma imatura decisão a ser tomada pelos eleitores durante o plebiscito.

O fracasso da experiência presi- dencialista, especialmente em face dos desdobramentos da crise envolvendo o primeiro presidente eleito depois de 30 anos de arbítrio estão estimulando defensores do parlamentarismo. Há parlamentarismo para todos os gostos. Vão desde o parlamentarismo bom- moço de Mário Covas ao parlamenta- rismo com a pena-de-morte do Amaral neto. Todos eles, empurrados pela ocasião momentânea de desgaste cau- sado pela roubalheira patrocinada pelo presidente Collor, se animam em ver a saída da crise através das portas do parlamentarismo.

O debate sobre o sistema de gover- no é travado de forma superficial. Atribui-se a ele propriedades mágicas, como se fosse possível explicar o de- senvolvimento social e econômico de determinadas nações exclusivamente pelo sistema de governo por elas adotado. Há os que ingenuamente pregam que a simples mudança de sistema de governo vai lançar o país nos níveis do primeiro mundo, na mo- dernidade.

O Brasil teve experiência parla- mentarista até 1889, quando um grupo de pessoas, chegadas ao governo, de- cidiu adotar a forma republicana. Mesmo na República, a legitimidade dos governantes só teve conquista plena há pouco mais de 40 anos, quando o eleitor pôde decidir quem iria governá-lo. Segmentos importan- tes como as mulheres só adquiriram o direito de voto em 1934 e os analfa-

betos e militares na Constituição de 1988.

Embora o Brasil tenha assistido ao mando presidencialista, é preciso re- conhecer que a grande maioria dos presidentes não foram eleitos. Dos eleitos pela via direta, poucos espe- lharam a transparência e a moralidade exigida pelo eleitor. Dos últimos eleitos lembre-se que Jânio Quadros renunciou e Collor sofreu processo de impeachment. Mesmo com Vargas, o país não fugiu à imagem de um siste- ma gerador de ditadores e caudilhos. Mas os defensores do parlamentarismo esquecem que personalidades como Hitler e Mussolini chegaram ao poder amparados por este sistema.

No caso brasileiro, o parlamenta- rismo seria implantado num memento de fragilidade partidária e quando o Congresso está formado por parla- mentares, na sua grande maioria, eleitos por um sistema eleitoral vicia- do, de temerária índole ética, onde prevalecem os interesses corporati- vistas. Uma prova de frágil vida parti- dária expressou-se na eleição do pre- sidente Collor, que chegou ao cargo num partido criado às vésperas da eleição. E a possibilidade de mudar de sistema de governo no momento em que as instituições buscam uma defi- nição no papel da representação polí- tica é, por si só, uma questão temerá- ria.

Entendemos que, neste momento, entregar ao Parlamento a tarefa de eleger os governantes é cassar o di- reito conquistado pelo cidadão de dar legitimidade ao eleito. Ainda que o eleitor tenha errado uma vez, é preci- so exercitar a democracia do voto para que, tanto eleitor como eleito, apren- dam o significado da representação democrática.

Os defensores do sistema parla- mentarista partem do princípio de que o atual Congresso expressa a vontade soberana da nação. O sistema parla- mentar bicameral apresenta distorções que precisam ser corrigidas. A vonta-

de dos 503 deputados pode ser anula- da pela decisão dos 84 senadores. Além do mais, há discrepância e dis- torções na representação geopolítica na Câmara dos Deputados, permitindo que o peso do voto seja desigual para o parlamentar de um estado para ou outro. Enquanto para Rondônia um deputado representa apenas 15.600 pessoas, um deputado paulista repre- senta 20 vezes mais, ou 563.400 pes- soas. O mesmo vale para os senado- res, com a dispandade de que tanto São Paulo como Rondônia possuem três vagas no Senado. Os conceitos de igualdade enunciados na Carta de 1988 não se expressam na formação do Parlamento brasileiro e, deste mo- do, temível seria ampliar o poder da casa a ponto de poder eleger o primei- ro ministro.

Além disso, no parlamentarismo, há uma fusão de interesses entre os pode- res Executivo e Legislativo. O Legis- lativo fica sem autonomia, já que se atrela ao compromisso com o ministro eleito. Bem diferente do presidencia- lismo, que divide as funções de go- verno e fortalece o Parlamento na me- dida em que os órgãos não se interde- pendem. Ou seja, o presidencialismo diversifica os centros de poder e per- mite divergências entre eles.

Faz parte da tradição da esquerda brasileira o princípio de que quanto mais direta a democracia, melhor. O mundo de hoje não permite que os trabalhadores decidam tudo a toda ho- ra, por isso a necessidade da demo- cracia na representação. Mas a repre- sentação no presidencialismo é mais direta: o povo elege diretamente os governantes.

No parlamentarismo o povo apenas elege o colégio eleitoral, que teria a tarefa de eleger o governante. Há, pois, um distanciamento entre o sen- timento do eleitor e o compromisso do eleito. Sem delegação direta do elei- tor, distancia-se a relação entre go- vernante e governados.

Num país com as características do

mémmmmmmmmmím

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Quinzena FoUtieo Madonal Brasil, onde não se transpira plena maturidade política, a eleição paria- naentar é corporativa, clientelista e não enseja a ampla manifestação po- pular. Pelo contrário, as massas são dirigidas e compradas pelo poder eco- nômico e pela força da mídia. Toda a vez que o povo se expressa em grande mobilizações aparecem aqueles que desejam fechar esta porta com casuís- mos e leis antipopulares. Tem sido as- sim na frustração das Diretas Já, na campanha presidencial de 1989 e na luta pelo impeachment. Só a mobili-

Florestan Fernandes A Constituição Inacabada Vias Histórias e Significado Político São Paulo - Estação Liberdade, 1989

zação condiziu a mudanças e o Parla- mento tem se dobrado à vontade po- pular.

O contexto histórico mostra que o parlamentarismo é nascido de um pacto entre o poder absoluto dos reis e o nascente poder político da burgue- sia. Faz apenas cem anos que supera» mos, no Brasil, a monarquia, e não temos porque adotar um sistema de governo que é um pacto entre a bur- guesia e a aristocracia. Há questões bem mais sérias a estudar, tais como o regime político marcado pelo mono-

pólio dos meios de comunicação, pelo tutela militar sobre o Estado, por um sistema eleitoral antidemocrático ou por uma democratização maior na composição dos membros do poder Judiciário.

Enfim, a frustração de objetivos — e de políticos capazes de honrar o cargo de presidente - não deve afastar o PT da luta por manter o sistema presiden- cialista democrático. #

Antônio Marangon é Deputado Estadual - PT, pre- sidente da Comissão de Cidadania e Direitos Hu- manos da AL-RS.

Parlamentarismo e presidencialismo

É natural que os constituintes se voltem para o parlamentarismo, como- se ele fosse uma panacéia. O golpe de 1964, a ditadura e a sua continuidade sob a "Nova República" simplificam a equação: o presidencialismo consti- tui a fonte de todos os males. No en- tanto, a questão não é tão simples. O parlamentarismo é uma realidade his- tórica. Não é possível engendrá-lo por puro voluntarismo. A menos que se pretenda, inç>lantando-o sem base no querer coletivo popular, que ele se tome, por sua vez, a fonte de todos os males...

Dadas as condições concretas de existência do Povo brasileiro, a razão objetiva indicará facilmente que os regimes políticos são secundários. Não é a forma de governo que deter- mina a sociedade. É esta que determi- na a forma de governo. Mantidas as atuais condições históricas, o parla- mentarismo seria um substituto ideal do presidencialismo. Este se esgotou e se desmoralizou, porque tem servido à mais ampla, cruel e visível espoliação das classes subalternas, dos oprimidos do campo e da cidade. Ele é um ins- trumento de opressão, de demolição da humanidade dos pobres e dos hu- mildes, um agente colonial de repres- são e de reprodução da barbárie. Os parlamentares não podem se esquecer disso. Porque não foram os presiden- tes, sozinhos, que empreenderam essa terrível façanha, Eles contaram, sem-

pre, com a colaboração permanente e prestimosa dos parlamentares e dos partidos. Um parlamento que não de- fende a democracia para a Nação não pode pretender a democracia para si próprio. Toma-se um dos artífices da democracia restrita e, de parlamento, converte-se em auxiliar do poder mais forte. O poder estatal propriamente dito fica nas mãos de um complexo político, que abrange o presidente, os manda-chuvas militares, os parlamen- tares, os magistrados, as elites das classes privilegiadas e o "alto esca- lão" ministerial e burocrático. No rol das classes privilegiadas entram os re- presentantes da burguesia internacio- nal e os governantes das grandes po- tências, com os Estados Unidos à frente, para os quais a soberania na- cional e a democracia, em países peri- féricos, são uma pilhéria.

Essa é a realidade, vista em preto e branco. A adulteração do Parlamento começou no Primeiro Império, se aprofundou no Segundo Império (sob a tutela sábia do "neto de Marco Au- rélio") e foi levada às últimas conse- qüências na Primeira República. Quer dizer, ela se iniciou e se ampliou sob o parlamentarismo, e se completou dentro da moldura histórica de uma oligarquia da escala nacional, que se batizou de "republicana", mas cuja primeira realização consistiu em des- truir o republicanismo revolucionário e em institucionalizar uma República

que era o seu próprio retrato, tão "im- perial" quanto a velha monarquia e tão "colonial" quanto o antigo regime escravista.

É interessante ler Paulo Prado, Re- traio do Brasil, com um olhar desmis- tificador. A insistência no subjetivo, na "tristeza brasileira", na "luxúria" ("numa terra radiosa vive um povo triste"), na "cobiça", no "romantis- mo" e o post-seriptum que esclarece a matriz goethiana (sic!) da interpreta- ção. A idéia-mestra, de que "aqui a luxúria e o desleixo social aproxima- ram e reuniram as raças", salienta quanto os de cima se revoltavam con- tra um destino histórico que os jogou nos trópicos, no meio de portugueses broncos, de negros e mulatos saídos da escravidão, uma nação que invia- bilizava seus sonhos eurocêntricos. Por isso, com um olho tocavam os ne- gócios, enriqueciam e cuidavam do seu poder; com o outro não perdiam de vista a civilização na e da Europa, enquanto deixavam crescer e reprodu- zir-se a barbárie mais sórdida aqui dentro.

Os de cima eram a sociedade, de- terminavam o Estado e a forma de go- verno - e se lixavam para o Povo, do qual não se sentiam parte. Só que eles não eram tão livres a ponto de ultra- passar uma democracia restrita, de privilégios e para os privilegiados. A civilização, vinda de fora e consumida como livro, caviar, champanha, mu-

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Quinzena

lheres da vida ou fórmulas políticas, era uma planta de estufa. Ela não se opunha à barbárie, mas justificava-a e escondia-a. As "necessidades práti- cas" alimentavam a barbárie, que não minguava nas relações entre os déci- ma, mas comia solta contra os de bai- xo. Como manter a "sociedade orga- nizada" de outro modo? O escravo só temia o castigo corporal; o operário só se curvava à polícia. "Manter a or- dem" era uma questãode "pulso fir- me", A classe se sobrepunha a tudo: à religião, à lei, à solidariedade huma- na. Nesses confins não havia cultura cívica sequer entre os de cima, sua vi- da refinada e seus salões ilustrados imprimiam um toque europeu à vida do cidadão livre, prisioneiro de seus costumes e deveres, que sonhava com os ares da civilização distante e de seus espaços infinitos...

Eis aí o essencial Herdamos da Colônia, do Império, da Primeira Re- pública uma sociedade civil que não era civilizada, embora ansiasse pela civilização, e que só era humana para os que possuíam uma condição de prol, alicerçada na riqueza, no privi- légio e no poder. A infra-estrutura dessa sociedade civil exigia, como seu inferno, a barbárie como reprodução daqueles que, aos milhares criavam a riqueza, sustentavam o privilégio e impunham a necessidade não só do poder, mas do poder absoluto. O Es- tado senhoril e escravista era absolu- tista, malgrado o parlamentarismo "inglês", que nele prevalecia. O Es- tado oligárquico era absolutista, ape- sar do federalismo e do "equilíbrio de poderes", tomados de empréstimo aos Estados Unidos. "Progresso" para os de cima; "ordem" para os de baixo: a realidade histórica fazia do presiden- cialismo uma variante "moderna" do parlamentarismo, porque a função do governo mantinha-se inalterável - colocar e maníer o Povo no seu lu- gar'.

Quais são os requisitos econômi-

cos, culturais e políticos do parla- mentarismo e do presidencialismo? Mesmo os parlamentares que defen- dem com tanto ardor o parlamentaris- mo não os definem! Ao contrário, são parcos e por vezes vesgos ou surdos- mudos diante das transformações ca- pitalistas mais urgentes, relacionadas com eliminação da fome, da miséria e

@ PoMiea Nacional

da doença, com a reforma agrária, com a reforma urbana, com a reforma educacional, com a revolução demo- crática... Querem começar pelo céu, pelo cume do edifício. E com isso en- tregam a sociedade civil e a sociedade política à dominação direta e à hege- monia ideológica monolítica das clas- ses dominantes. Com isso, trocam um diabo coxo por um sad. E ignoram que têm ao alcance das mãos um meio para encetar a transformação da so- ciedade civil e do Estado, que não põem em prática por serem, em sua maioria, membros ativos ou represen- tantes fiéis das classes dominantes. Como elas, não querem abolir a forma despótica vigente da dominação de classe e de exercício direto do mono- pólio burguês do poder estatal, por medo do Povo, das reformas e revolu- ções capitalistas e, principalmente, do fim da "transição democrática".

O fim da "transição democrática" marcaria a verdadeira implantação da República e do presidencialismo. Qui- çá, poderia representar a instauração de um republicanismo revolucionário, que hoje não ficaria confinado aos drculos esclarecidos de elites "radi- cais". Seria uma republicanismo re- volucionário das classes subalternas, dos que "não têm nada a perder" com o advento da democracia e que, cer- tamente, introduziriam fortes doses de libertarismo anarquista, de socialismo ou de comunismo proletários no repu- blicanismo revolucionário. Portanto, o ponto central está nos requisitos eco- nômicos, sociais, culturais e políticos da democratização da sociedade civil.

E é aqui que se concentra a resistência à mudança dos estratos dominantes das classes possuidoras e de suas eli- tes políticas, empenhadas em manter, no texto constitucional (e quiçá até através do parlamentarismo), a extre- ma concentração da riqueza, do pres- tígio social, da cultura e do poder.

Nas atuais condições históricas, pouco adianta alterar a forma de go- verno sem tocar nas questões cruciais. Teremos um novo tipo de Estado au- tocrático, a serviço da defesa dos inte- resses dos poderosos, numa conjuga- ção que tomará o parlametarismo fun- cional para a ampliação de desenvol- vimento desigual, com todos os seus fatores e seqüelas. Os partidos da or- dem, por sua vez, se consolidarão.

mas ninguém poderá dizer de antemão que eles alterarão seu reacionarismo diante dos miseráveis da terra, dos operários e dos oprimidos em geral. É sintomático que as reformas mais ur- gentes sejam consideradas "radicais" por muitos constituintes que encaram o parlamentarismo como "a melhor saída". Por isso, penso que a priori- dade cabe às transformações da socie- dade civil; está na conquista de peso e voz pelos de baixo na sociedade civil e no Estado. O colapso do Congresso diante da ditadura e o uso do colégio eleitoral dão uma prova cabal das in- clinações e possibilidades dos parla- mentares, quando eles se sentem pres- sionados pelas classes dominantes. Para inverter esse quadro seria preciso que os parlamentares se identificassem de modo inquebrantável com a revo- lução democrática, o que, infelizmen- te, não é o caso. #

' Folha de Sáo Paulo, 14/9/1987. Transcrito por Andes, ano Vil, 33, out 1987.

O Estado de São Paulo ■ 15.01.93

Opção- parlamentarista

Estado — Parlamentarísmo ou presidencialismo?

Luia — Parlamentarísmo, sem muita convicção. O PT está dividido. O presidencia- lismo, você já sabe o que é: na pior das hipóteses, é isso que está ai. O parlamenta- rismo tem algumas incógni- tas. Aprovado o parlamen- tarismo, que tipo de refor- ma partidária virá? Que ti- po de legislação eleitoral? Eu vou votar no parlamen- tarismo porque acho que é a forma mais democrática de se exercitar o poder. O Con- gresso fica mais vulnerável às pressões da sociedade. Agora, tudo isso é teoria, porque está ligado ao tipo de político que você elege.

Estado — O seu parlamentaris- mo é com eleições diretas ou indi- retas para presidente?

Lula — As eleições têm de ser diretas. O presidente tem que ser eleito para po- der ter força. Eu sou favorá- vel á existência da figura do primeiro-ministro, mas ja- mais o primeiro-ministro pode ser mais forte que o presidente. O presidente tem que ter poderes para pe- dir a destituição do primei- ro-ministro.

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Presidencialismo Democrático Cresce a onda parlamentarista. Esta

é a bandeira de setores da direita para enfrentar a crise política provocada pelo governo Collor. Mas, curiosa- mente, setores de esquerda e até do PT estão embarcando nesta.

Esta proposta tem um caráter mági- co e se apresenta como democrática, embora seja golpista. Isto é humano, ninguém gosta de ser visto como de- fensor de idéias autoritárias.

Aos trabalhadores interessa o sis- tema de governo mais democrático. É por isso que defendemos o presiden- cialismo e uma tática democrática para o PT.

A tradição da esquerda sempre foi a de defender a democracia a mais di- reta possível Por que deveriam os trabalhadores delegarem a outros, no caso os parlamentares, o poder de ele- ger o chefe de governo? Ainda mais que, aqui no Brasil, so-

mente nas eleições majoritárias pre- valece o princípio de que a cada cida- dão corresponde um voto. Certamente por isso, as forças progressistas têm alcançado alguns êxitos nestas dispu- tas.

Para as eleições proporaonais a ló- gica é outra. Ela privilegia os fun- dões, faz com que as regiões mais adiantadas do País sejam subrepre- sentadas. Permite, por exemplo, que o peso eleitoral do Acre seja 16 vezes maior que o peso eleitoral dos Estados do Centro-Sul.

Além disto, as eleições proporcio- nais são o campo do abuso do poder econômico e do clientelismo. O de- bate, quando ocorre, é paroquial e despolitizado. E esta câmara escura que faz com que o Congresso Nacio- nal seja uma imagem real invertida do Brasil. Nele os setores majoritários da sociedade são minorias insignifican- tes.

Existem parlamentaristas que de- fendem também uma mudança na le- gislação eleitoral. É preciso no en- tanto lembrar que qualquer mudança nesta legislação passa pelo Congresso Nacional. Este mesmo que tem se destinguido por uma longa história de subserviência fisiológica ao Poder

Executivo, sem dúvida porque padece de ilegitimidade congênita.

A história do parlamentarismo no Brasil é longa e triste. Começou com a independência e foi até o fim do Im- pério, intimamente ligada ao trabalho escravo. Esperamos que não ocorra a ninguém a idéia de salientar as virtu- des democráticas deste parlamentaris- mo escravista.

Costuma-se ressaltar deste período a estabilidade que teria sido propicia- da por aquele parlamentarismo. É du- vidoso que esta seja uma virtude a ser louvada por oprimidos. Felizmente, esta estabilidade só existe nos livros de história oficial, que procuram es- conder dezenas de rebeliões populares do Brasil do século passado.

Sob a República, o parlamentaris- mo fez sua reaparição em 1961, atra- vés das baionetes de militares golpis- tas, que tentaram impedir a posse de João Goulart. Isto foi o ensaio geral do golpe de 64, que em seu rastro deixaria uma herança de repressão, tortura e eleições indiretas.

Mas os problemas do parlamenta- rismo não ocorrem apenas nos trópi- cos. As ditaduras burocráticas do Leste Europeu eram também parla- mentaristas. O sistema de governo do Irak de Sadam Hussein é parlamenta- rista.

Mesmo na Inglaterra, berço reco- nhecido da democracia, este sistema de governo tem seus problemas, ex- cluí da representação institucional mi- norias significativas, como é o caso do eleitorado do Partido Liberal. Este partido já chegou a obter 20% dos votos nas eleições para conquistar apenas 2% das cadeiras do parlamen- to. E verdade que, neste caso, o par- lamentarismo é combinado com um caprichoso voto distrital.

Afirmamos que o parlamentarismo geraria uma simbiose entre o Legisla- tivo e o. Executivo, o que reduziria ainda mais a autonomia do Legislati- vo, comprometendo definitivamente a necessária independência entre os po- deres.

Hoje, muitos companheiros buscam angustiados uma palavra de ordem mágica capaz de mobilizar o povo. Na

década passada, eles achavam que a luta pela constituinte, cheia de pré-re- quisitos, poderia cumprir este papel. Esta proposta não comoveu ninguém e o PT agiu com sabedoria ao não em- barcar neste canto de sereia. Quem sensibilizou o povo foi a luta emi- nentemente presidencialista pelas di- retas. Não cabe ao PT propor a ressur- reição de formas indiretas de repre- sentação.

O centro da atividade partidária deve ser a mobilização do povo contra a política do governo Collor. A idéia do Pariamentarismo já não será capaz de mobilizar porque o povo rejeita filtros à sua participação.

Por outro lado, o governo ainda não está completamente esgotado. Isto significa que a aprovação do parla- mentarismo teria um caráter golpista e favoreceria a direita. Por todas estas razões, o PT deve manter sua tradição democrática e anti-golpista, lutar para derrotar o governo Collor através da mobilização popular nas ruas, demar- cando-se de golpistas e oportunistas, cujo principal objetivo é participar do governo para aplicar a mesma polMca recessiva de Collor.

Quando formos capazes de operar, através da mobilização popular, uma significativa alteração na correlação de forças, poderemos estabelecer ou- tros objetivos, sempre democráticos, populares e intimamente ligados aos interesses dos trabalhadores, dentro da compreensão de que o PT é o grande instrumento capaz de despertar as energias revolucionárias do povo. f

Adão Pretto, Dep. Federal, PT/RS Athos Pereira, Secretário Geral, Dir. Regional PT/GO Chico Vigilante, Dep. Federal, PT/DF Cid Benjamim, membro Diretório Regio- nal, PT/RJ Hamilton Pereira, Executiva Nacional, PT/GO Lucy Choinasky, DepJederal, PT/SC Paulo Bernardo, Dep.Federal, PT/PR Pedro Tonelli, Dep.Federal, PT/PR Ricardo Moraes, Dep.Federal, PT/AM Rubens Otoni Gomide, Pre. Diretório Regional, PT/GO Sandra Stariing, Dep.Federal, PT/MG Vaidi Camárdo, membro Diretório Nacio- nal, PT/GO Vladimir Palmeira, Dep. Federal, PT/RJ

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PoUtiea Naeionaí Folha de São Paulo ■ 15.01.93

Leia a íntegra do manifesto presidencialista República versus monarquia

Presidencialismo versus parlamentarismo

Introdução

O parlamentarismo é uma flor inglesa que se difundiu pela Europa nórdica como forma de perpetuação de suas monarquias. Teve sorte variável no resto do mundo. Não pegou mesmo foi na grande província neobritânica que é a América do Norte. Ali é que surgiu, aliás, como uma invenção política, a repú- blica moderna e o presidencialismo. Seus princípios básicos tmabém se difundiram como forma nova de governo democrático, fiel à representação popular, especialmente atrativa, porque entrega efetivamente todo poder ao eleitorado e porque dá a cada cidadão a confiada esperança de que ele pode vir a ser o presidente.

O parlamentarismo, por sua natureza, é o regime que melhor corresponde a sociedades estáveis, contentes consigo mesmas, cujos governos não são chamados a transfigurar e dinamizar suas sociedades. O que aspiram é tão só conservá-la tal qual é, fiel à sua vetusta tradição. Mesmo transfiguradas pela moder- nização tecnológica, emo ocorreu no Japão, elas permanecem atadas ao arcaísmo monár- quico.

O presidencialismo é o regime das nações que se concebem, não como resíduos históricos, mas como projetos de si mesmas a serem elaborados conceitualmente, institu- cionalizados politicamente e realizados so- cialmente. Nações como o Brasil, chamadas a um esforço lúcido e persistente de auto- edificação para livrar-se das heranças sociais negativas e colocar em seu lugar a realização da vontade secular de fanura, de beleza e feliciadade de seu povo.

O parlamentarismo é o regime que mais se concilia com o desejo de manter ou de restaurar a monarquia. Ainda quando a esteriliza, retirando o poder do rei para transferi-lo ao Parlamento, o faz para que a realeza sobreviva, mesmo quando já é cruamente extemporânea. Esta congeniali- dade essencial faz de todo monarquista um aguerrido parlamentarista, e de muitos parlamentaristas, evergonhados saudosistas da realeza.

O Presidencialismo é figadalmente republi- cano. Sua meta mais alta e o ideal de um governo do povo, pelo povo para o povo. Abraçado nessa bandeira estiveram ontem os que lutaram pela abolição da escravidão, pela independência do Br sil, pela República. É hoje a postura daqueles que estão desconten- tes com o Brasil tal qual é, e lutam para transformá-lo, a fim de fazer desse país a casa de todos os brasileiros, em que cada cidadão tenha seu emprego, cada criança sua escola e cada necessitado o socorro de que carece e todos vivam em liberdade e dignidade.

Um parlamentarismo sem rei é como um país sem capital, em que tudo se confunde. Acaba configurando-se como uma farsa absurda que obriga o chefe de Estado a posar de rei, para se dar alguma dignidade.

enquanto abre espaço ao verdadeiro gover- nante, que é o primeiro-ministro.

O presidencialismo põe a cidadania diante da figura de um líder por ela escolhido, em eleições livres e competitivas, para governar no decurso de um mandato prescrito, sob o controle do Parlamento e do Judiciário. Ninguém pode se equivocar sobre a responsa- bilidade e a respeitabilidade de seu governo. E ele que responde por. seus atos e pelos atos de cada ministro. É ele que se defronta com o Parlamento, requerendo a aprovação de seu

programa de governo e_ reclamando as leis de que o país necessita. É ele que trata com o Judiciário para garantir o estado de direito. Ele é quem encarna a nação na luta pelo cumprimento de seu destino.

Os Três Poderes A rejeição do parlamentarismo como

forma de governo não importa em nenhuma diminuição da influência e do prestígio do Parlamento. Ao contrário, situando-o no que lhe é específico e liberando-o das responsabi- lidades de assumir o poder executivo, lhe dá até condição de melhor desempenhar o alto papel que lhe cabe na vida das nações.

Sob o regime presidencialista moderno, o Parlamento ganha consistência e especifici- dade para compor, ao lado do Judiciário, as duas fontes básicas de poder, que governam em contrapeso com o executivo. Dentro dessa institucionalidade, o Parlamento, o Judiciário e o governo coexistem e integram, mantendo- se cada qual no exercício de suas funções mutuamente fecundantes. Neste âmbito, o Parlamento contribui, primacialmente, ao pôr em confronto pelo debate entre os partidos políticos, o entendimento c a avaliação dos temas e dos problemas relevan- tes para o povo e para a nação.

Ainda nesse mesmo âmbito, o Parlamento pode cumprir melhor sua segunda função, a mais específica, que é legislar. Também, no corpo do tríplice poder, o Parlamento exerce melhor sua terceira função capital, que é controlar a ação do governo, preservar a ordem constitucional e a legalidade democrá- tica, combatendo os abusos de poder e a corrupção.

O presidencialismo não quer absorver os outros poderes, respeita a cada qual em sua esfera. Luta dentro do concerto tripartite para formular e pôr em execução um progrma de governo que enfrente os problemas que se colocam, buscando tanto as soluções politica- mente possíveis, aqui e agora, como as diretrizes de mais longo alcance. O novo presidencialismo, que se vai configurando no Brasil, é respeitador das prerrogativas do Congresso. Executor fiel de suas determina- ções e submisso à sua fiscalização. O que lhe falta para exercer-se de forma superior é toda uma nova legislação ordenadora da vida política que o país está areclamar.

O parlamentarismo, dividindo o poder em duas entidades dissímiles e conflitivas —o chefe de Estado, encarnando a tradição como

uma espécie de Rei em licença, e o chefe do governo que é um mero agente operativo— atado por servidão perpétua à maioria parlamentar que o apoia— se estratifica, de fato, é como o governo dos deputados.

Qualquer análise crítica dessa complexa institucionalidade mostra que ela é tão pouco recomendável para o governo da União como seria a entrega do governo das cidades a suas Câmaras, fazendo do prefeito um mero mandatário dos vereadores, ou entregando o poder nos Estados hs suas Assembléias Legislativas. Só a ingenuidade mais risível permitiria supor que assim se pode compor governos nacionais, estaduais ou locais menos sujeitos ao cliencelismo e à corrupção e menos tendentes a crises. Muito ao contrário, o parlamentarismo —governo dos deputados e dos vereadores— é o mais sujeito aos velhos vícios e pragas do poder: a corrupção, o favoritismo, a instabilidade e a inoperãncia que achacam o Brasil há séculos.

Acresce que só a suprema hipocrisia

restringiria o parlamentarismo à órbita federal, proibindo os estados e os municípios de adotá-lo. Inevitavelmente, uma vez imposto o parlamentarismo à União, se desencadearia a luta das Assembléias Legis- lativas e das Câmaras de Vereadoreí apra alcançarem igual direito de mando e des- mando.

Virtualidades Costuma-se associar o parlamentarismo ou

o presidencialismo a qualidades genéricas que figuram cada um deles como o sumo das bondades ou das maldades, ou como a panacéia que resolveria todos os problemas de uma nação. Na verdade das coisas, um regime ou outro pode ser o mais recomendá- vel para cada situação concreta. Quem, temerário, negaria à Inglaterra e ao Japão o bom desempenho de seus parlamentarismos? Quem seria suficientemente ousado para condenar o desempenho do presidencialismo norte-americano? Ambos os regimes foram capazes de conduzir aqueles países através de décadas a séculos enfrentando as mais graves crises e vencendo terríveis desafios.

Nada mais ilusório do que a afirmação leviana de que o presidencialismo é autoritá- rio, mas eficiente e o parlamentarismo é democrático, mas ineficaz. Parlamentarismo e presidencialismo, em diferentes contextos históricos, se encarnaram em regimes legais ou arbitrários, competentes ou ineficazes, corruptos ou impolutos.

Há, entretanto, algumas propensões e virtualidades inerentes a cada um desses regimes. O parlamentarismo costuma ser vocacionalmente monárquico e intrinseca- mente elitista, antipopular, conservador, liberal, e socialmente irresponsável. O Presidencialismo, por sua vez, é vocacional- mente republicano e propenso ao populismo, à legalidade democrática e à modernidade. Seu objetivo ideal é. a desmonopolização do poder político.

É freqüente associar o presidencialismo ao

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mm Quinzena PotHiea Nocional despotismo e ao arbítrio, o que, podendo efetivamente ocorrer, precisa ser denun- ciado. Em muitas ocasiões, chefes de Estado lornaram-se tiranos, mas isso não decorre do exercício do seu mandato presidencial, e sim da degradação dele. Quando a República dá lugar à ditadura, já não estamos diante de um presidente da República, ainda que ele se designe assim. Estamos de frente a um usurpador que abocanha o governo para impor o arbítrio fechando ou avassalando o Parlamento, subjugando e desmoralizando o Judiciário, censurando a imprensa e a universidade. Os efeitos dessa degradação, de que temos experiência tão recente e tão carnal, são o espezinhamento da dignidade dos cidadãos, sujeitos à perseguilção, à tonura, ao exilio e à morte.

O risco sempre presente de que sobrevenha o arbítrio, como ocorreu conosco e como ocorreu também em sociedades avançadas como a italiana e a alemã, nos obriga a mantermo-nos precavidos e atentos. Não nos olvidemos de que em todos esses casos, aliás, o despotismo veio a partir de institucionalida- des parlamentaristas. Esta proclividade não é obrigatória nem mecânica, como não o é, também, o suposto compromisso liberal do parlamentarismo.

Só uma cidadania lúcida na defesa dos seus direitos, conduzida por partidos políticos ideológicos, responsáveis e respeitáveis, servida por uma imprensa e uma universidade livres, integrada por um sistema de comuni-

cações defendido contra monopólios e parti- darismos, pode fazer face a tais riscos. Somente uma sólida institucionalidade demo- crática, garantida por esta cidadania, dentro de um regime republicano, liderado por um presidente eleito, nos livra das duas ameaças que pesam sobre a democracia: os assaltos dos militaristas, detentores legais da força, para fugir da submissão que devem ao poder civil e da obediência jurada à Constituição; e a subversão dos totalitarismos fanáticos de iodas as ordens, sempre predispostos a erodir as bases da representação popular.

Nossa Herança A crônica histórica do parlamentarismo

brasileiro registra como seu traço distintivo a instabilidade. No Império vimos suceder-se, de 1840 a 1889, nada menos que 36 gabinetes, cuja duração média foi de um ano e meio. Na experiência do parlamentarismo oportunista imposto ao presidente João Goulart tivemos três gabinetes em 17 meses. Foi um tempo de tumulto, até que o povo o proscrevesse num plebiscito em que nove milhões contra novecentos mil eleitores restabeleceram o regime presidencialista.

Essa perigosa instabilidade deve ser debi- tada ao seu funcionamento, através dos votos de confiança e da rápida sucessão de gabinetes, o que não enseja qualquer continu- idade administrativa. Assim é efetivamente. Tanto que os modernos parlamentarismos europeus tiveram de voltar ao fortalecimento do Executivo paracompensar esta instabili- dade e os inconvenientes dos vazios do poder que ela gera.

A instabilidade inerente ao parlamenta- rismo traz como seqüela mais grave a incapacidade de pôr em execução pogramas de longo alcance. Um presidente pode propor, já na campanha eleitoral, um

programa de governo —como o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek e o New Deal de Roosevelt— mobilizando para ele o apoio da cidadania para executá-lo no curso de seu mandato. É muito improvável que qualquer mobilização desse porte e dessa natureza possa ser inspirada e conduzida por um gabinete parlamentarista.

Não é difícil conceber no Brasil um partido político com um programa de mobilização nacional. Dificílimo é admitir que ele ganhe os outros partidos, através do debate parla- mentar, para uma ação conjunta com a integridade e a continuidade indispensável para colocálo em prática.

Sendo o Brasil um país-problema tamanhos são os reptos com que nos defrontamos, estamos desafiados a eleger governos com programas de ação bem planejados e de longo prazo. Isto obviamente é alcançável muito mais facilmente pelo presidencialismo. Só por essa via é possível enfrentar, na conjuntura, o deseprego, a inflação gaio- pante, a estagnação econômica, e a fome e a degradação decorrentes.

Também é através de um presidencialismo, encarnado por lideranças nacionais capazes de mobilizar toda a cidadania, que podemos, no plano estrutural, criar uma nova economia garantidora de uma rosperidade general izável a todos os brasileiros, reduzindo as diferen- ças abismais entre as classes sociais, para que o Brasil, afinal, ingresse na civilização emergente como um povo livre, próspero, feliz e dono de seu destino.

A principal propensão atribuída ao parla- mentarismo é seu caráter conservador. Isso

se comprova, exemplarmente, ao constatar- se que o parlamentarismo imperial, que regeu os destinos do país, por mais de meio século, manteve a escravidão num tempo em que o mundo inteiro já a repelia energicamente. Com efeito, foi o parlamentarismo imperial brasileiro que, por sua fidelidade canina ao patronato escravista a manteve, fazendo do Brasil o último país a abolir a escravatura.

Mais expressivo ainda desse reacionarismo é o fato de que no curso de todas aquelas seis décadas em que a civilização se renvava, movida pelo progresso da ciência e das técnicas, dom Pedro 2? não criou, por iniciativa própria, nenhuma escola de nível superior. Esse fato é tão espantoso quanto o seu descaso pelo ensino fundamental como formador da cidadania moderna.

Na ótica imperial, o povo era a escravaria que não precisava de letras. Sua sensibilidade só se comovia, de fato, para a caridade. Por isso é que suas únicas obras assinaláveis foram as grandes e nobres edificações que levantou para o amparo aos cegos e aos surdos mudos. Tamanho atraso e anacro- nismo tiveram, evidentemente, um papel casual no medíocre desempenho do Brasil como nação dentro da civilização industrial.

Outro atributo maior do parlamentarismo é a irresponsabilidade legal e judiciária do monarca, no sentido-de que ele é declarado inepto para se fazer culpado, por mais absurda que seja sua conduta. Em conseqüên- cia, pode fugir de qualquer julgamento. Escapa também, pela circunstância de que reina mas não governa, ficando assim inimputável para o impeachment. Já o

presidente da República, Investido nas responsabilidades e nos poderes constitucio- nais, governa efetivamente e, em conseqüên- cia, fica sujeito a erro e ao impedimento.

Desafio Brasileiro Acabamos de viver no Brasil uma instância

agudíssíma em que o regime presidencial foi posto à prova de forma mais severa. Um presidente eleito pela maioria do eleitorado, uma figura jovem, moderna, dinâmica, acusado verossimilmeme pela imprensa de abuso de poder, de improbidade administra- tiva e de impregnação com práticas de corrupção, foi julgado e deposto. O vice- presidente eleito com o titular, assumiu tranqüilamente a Presidência para comple- mentar o mandato, compôs com independên- cia o seu ministério e entrou em exercício com plenos poderes.

O assinalável é que isso ocorreu dentro da institucionalidade, sem qualquer perturbação da ordem e com a mais viva participação da cidadania, que foi às ruas e praças em grandes manifestações de massa, contra a corrupção e a impunidade. O mais belo é que essas manifestações tiveram à frente uma juventude recuperada para si mesma e para a pátria, exigindo dignidade dos mandatários e o mais cru enfrentamento e punição St todas as formas de corrupção.

Esse episódio histórico exemplar, mais que qualquer especulação doutrinária, ditou duas lições indeléveis para a memória nacional. Primeiro, o reconhecimento da maturidade alcançada pelo Brasil como nação moderna servida por uma institucionalidade constitu- cional plenamente capaz de impor o estado de direito. A segunda lição é de que o nosso presidencialismo, dentro do sistema tripartite em que ele se exerce no Brasil, é plenamente responsável diante do Parlamento, diante do Judiciário, e sobretudo perante a cidadania

Conta o Brasil, paradoxalmente, com alguns facilidades e recursos que poderiam ajudar na implantação de um regime parla- mentar. Primeiro que tudo, a suntuosidade e o conforto dos edifícios da Câmara e do Senado, dos mais belos e mais amplos que um Parlamento dispõe em todo mundo. Além da amplitude das edificações, da qualidade de seus equipamentos JC de sua esplêndida decoração, contamos conrt um corpo de competentes servidores, mais números do que qualquer outro, também medido em escala mundial.

Só é de se perguntar se um Parlamento que se deu tantas regalias, ou que graciosamente as recebeu da ditadura militar, quando estava impedido de legislar, legitimamente se recomenda para assunmir os poderes executi- vos no governo do Brasil. O certo é que, também nós, parlamentares, estamos desafia- dos a superar deficiências notórias para o melhor desempenho de nossas funções específicas. É igualmente certo, que nada nos autoriza a atitude de arrogância e de elitismo, que pretenda tirar do povo brasileiro a suprema conquista de compor seus governos pelo voto direto e secreto.

Há inegavelmente um pendor clientelista que caracteriza, às vezes, o parlamentar brsileiro, o que de resto é compreensível, num país em que o exercício da carreira política parlamentar é entendido menos como função legislativa do que como forma de

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Quinzena possibilita uma nova estruturação partidária e um novo regime eleitoral. A cristalização desse objetivo, que jamais se alcançaria mediante a adoção abrupta do parlamenta- rismo, poderá ser realizado, entretanto, através de um presidencialismo comprome- tido com os princípios republicanos e a defesa dos interesses populares, que patrocine a reforma já inadiável das leis que regulam a organização partidária, o sistema eleitoral, a forma das eleições, a justiça eleitoral c o custeio da eleições, no sentido de democrati- zálas

As questões e os desafios políticos básicos que se colocam hoje ao Brasil não são a opção

PoMíea Nacional entre a monarquia e a república, e entre o parlamentarismo e o presidencialismo. São, isto sim, a defesa da União contra as ameaças que podem alçar-se contra ela em razão dos desníveis regionais e das tensões provocadas pelo surgimento de uma nova ordem interna- cional em que tudo é posto em causa, inclusive a soberania das nações.

A militância da vida política brasileira não é feita nos partidos, mas num conglomerado de interesses cristalizados em corpos eleito- rais clientelísticos. Nos cinco mil municípios brasileiros o ativismo político é vivido, principalmente, pelo corpo de vereadores e seus suplentes, que somados aos respectivos cabos eleitorais ultrapassam, 300,000 ativis- tas. Uma vasta clientela mais sedenta de

favorecimento do que de reivindicações políticas e ideológicas.

É certo, porém, que a cidadania brasileira, que forma já um eleitorado próximo de 100 milhões, concentrado principalmente nas metrópoles, vem alcançando um nível cada vez mais alto de politização, o que já acesso aos órgãos de governo, especialmente na administração da região de cada deputado ou senador. Um parlamentar brasileiro precisa de um grande esforço para resistir ao clamor do eleitorado, que, em sua pobreza, espera dele, principalmente, favores e benesses.

Parlamentarismo ou Frestaenciaiismo Secretaria Nacional de Formação Política - P7 Janeiro 1993

\ os exemplos dos quadros das : páginas 8 e 9, podemos obser- | var minimamente as diferenças | entre estes dois tipos de

;|ÍÍ:: governo. Nos dois sistemas, Japão e

Reino Unido, que são monarquias constitucionais parlamentaristas, está presente a figura do imperador (ou rei), que assume o poder pelo sistema da hereditariedade.

No Japão, o imperador não tem po- deres com relação ao governo e seu principal papel consiste em formalida- des, como a indicação do Primeiro- Ministro, que é previamente designado pela Dieta (Câmara dos Deputados).

Na Inglaterra, o rei é o Chefe de Estado, mas age de acordo com as orientações do Primeiro-Ministro.

Nos dois exemplos citados, obser- vamos que o Primeiro-Ministro, que é escolhido pela Câmara, é quem detém todo o poder do governo. Tanto no Japão como na Inglaterra, o regime partidário é o pluripartidarismo e o sistema legislativo é Bicameral (Câmara dos Comuns e Câmara dos Lordes, na Inglaterra - Câmara dos Deputados e Câmara dos Conselheiros, no Japão).

Também nos quadros de exemplo, temos sistemas de repúblicas parlamen- taristas e repúblicas presidencialistas. O que queremos explicitar é que, junto com a escolha do sistema de governo — presidencialismo ou parlamentarismo — também vai-se decidir se o Brasil continua república ou volta à monarquia.

Muitos são os argumentos para que voltemos à monarquia. Já existe um movimento nacional monarquista que nasceu no Rio de Janeiro e está crescendo por todo o país.

Os argumentos utilizados pelos par- lamentaristas-monarquistas vão desde afirmar que o Brasil ao tempo da

Monarquia era um país de padrão de "primeiro-mundo", com amplas liber- dades e estabilidade política. Outro argumento alinhado pelos monarquistas é de que a figura do rei, por ser naturalmente supra-partidária, independe de interesses setorizados e pode assim, permanentemente, estar **a favor do povo". Para os monarquistas, a República é fonte de desgraças e de instabilidade política; para isso, lem- bram que, em todo o período republica- no, o único presidente eleito diretamen- te pelo voto universal, que cumpriu seu mandato por completo, foi Juscelino Kubistchek; os demais ou foram nomeados em processos ditatoriais ou via arranjos institucionais, ou não conseguiram concluir seu mandato.

Os argumentos em favor da repúbli- ca são muitos e têm respaldo majoritário na sociedade brasileira; os principais argumentos apontam a república como o regime que mais se coaduna com a democracia, já que ninguém assume o poder por designação divina ou por hereditariedade, e sim pelo voto universal direto ou indireto.

Efetivamente no Brasil, a tradição monárquica é rompida em 1889 e seria muito difícil convencer a maioria de nossos cidadãos que uma pessoa deves- se ser conduzida ao posto máximo do governo pelo simples fato de ter nas veias o mesmo sangue de um imperador deposto em 1889.0 povo brasileiro tem pouca experiência de eleição direta para presidente, mas, se quiser continuar exercendo este direito, é bom lembrar que isso só será possível se o Brasil continuar republicano. Caso contrário, teremos nosso direito de cidadãos ainda mais reduzidos. Quem vai governar o país será um rei e um primeiro-ministro e nenhum dos dois estaá respaldado pelo voto direto do povo. #

Lênln, Vladimirllich O Estado e a Revolução Coleção Bases - voL 51 São Paulo - Global -1987

A ABOLIÇÃO DO

PARLAMENTARISMO A Comuna - escreveu Marx - não seria

uma corporação parlamentarista, mas sim uma corporação de trabalho, executiva e legislativa ao mesmo tempo L.I

C~1 Em vez de decidir uma vez a cada três ou seis anos que membros da classe dominante haveriam de representar a es- magar ("ver-und zertreten") o povo no Parlamento, o voto universal serviria para o povo, organizado em comunas, encontrar trabalhadores, inspetores e contadores co- locados a seu serviço, da mesma maneira que o voto universal serve a qualquer pa- trão para o mesmo fim.

Essa notável crítica do parlamenta- rismo, feita em 1871, hoje também fi- gura, graças ao predomínio do social- chauvinismo e do oportunismo, entre as "palavras esquecidas", do marxis- mo. Os ministros e parlamentares pro- fissionais, os traidores do proletariado e os "mascates" socialistas de nossos dias deixaram a crítica do parlamenta- rismo por conta dos anarquistas e, ba- seados nesse juízo assombroso, decla- raram que toda crítica do parlamenta- rismo é "anarquismo"! Não é de es- tranhar que o proletariado dos países parlamentaristas "adiantados", enoja- do ao ver "socialistas" como Schei- demann, David, Legien, Sembat, Re- naudel, Henderson, Vandervelde, Stauning, Branting, Bissolati, e Cia., tenha manifestado cada vez mais sim- patia pelo anarco-sindicalismo, apesar de este ser irmão do oportunismo.

Mas, para Marx, a dialética revolu- cionária nunca foi essa vaga frase de moda, essa ninharia em que foi con- vertida por Plekhánov, Kautsky e ou-

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Quinzena ■ ^

tros. Marx soube romper implacavel- mente com o anarquismo, pela incapa- cidade deste em aproveitar até o "es- tábulo" do parlamentarismo burguês - sobretudo quando se sabe que não se está perante situações revolucionárias - porém, ao mesmo tempo, também

sabia fazer uma crítica autenticamente revolucionária, proletária, do parla- mentarismo.

Decidir uma vez a cada tantos anos que membros da classe dominante oprimirão e esmagarão o povo no Parlamento: esta é verdadeira essência do parlamentarismo burguês, não só nas monarquias constitucionais parla- mentares, como também nas repúbli- cas mais democráticas.

Mas se colocamos a questão do Estado, se enfocamos o parlamenta- rismo - cmo uma instituição do Esta- do - do ponto de vista das tarefas do proletariado nesse terreno, onde está, então, a alternativa ao parlamentaris- mo? Como se pode prescindir dele?

Temos que dizê-lo mais uma vez: as lições de Marx, baseadas na expe- riência da Comuna, estão tão esqueci- das que para o "social-democrata mo- derno" (leia-se para o atual traidor do socialismo) é simplesmente incompre- ensível outra crítica a parlamentarismo que não seja a anarquia ou a reacioná- ria.

A alternativa para sair do parla- mentarismo não está, naturalmente, em abolir as instituições representati- vas e a elegibilidade, mas sim em transformar as instituições representa- tivas de lugares de charlatanice em corporações "de trabalho". "A Co- muna não seria uma corporação par- lamentarista, mas sim uma corporação de trabalho, executiva e legislativa ao mesmo tempo".

"Não uma corporação parlamenta- rista, mas sim uma corporação de tra- balho": esse tiro vai direto ao coração dos modernos parlamentares e dos parlamentares "cachorrinhos de luxo" da social-democracia! Veja-se qual- quer país parlamentar, dos Estados Unidos à Suíça, da França à Inglater- ra, Noruega, etc.: O verdadeiro tra- balho "estatal" é feito nos bastidores e executado pelos ministros, pelas re- partições públicas, pelos Estados- Maiores. Nos parlamentos não se faz mais que tagarelar, com a finalidade especial de iludir a "plebe". E isso

:

Poittíea Nacional é tão certo que até na república russa, república democrático-burguesa, antes de se conseguir criar um parlamento

verdadeiro, todas essas chagas do parlamentarismo se destacaram de imediato. Heróis de filistefsmo apo- drecido como os Skóbelevs e os Tse- retélis, os Tchemovs e os Avkséntievs se ajustaram para aviltar até os sovie- tes, segundo o padrão do mais sórdido parlamentarismo burguês, converten- do-os em lugares de charlatanice va- zia. Nos sovietes, os senhores minis- tros "socialistas" enganam os aldeões ingênuos com frases e com resolu- ções. No governo, desenvolve-se uma festa contínua, de um lado para "ali- mentar" alternativamente, com em- preguinhos bem remunerados e hono- ríficos, o maior número possível de esseristas e mencheviques, e, de ou- tro, para "distrair a atenção" do povo. Enquanto isso, nas repartições públi- cas e nos Estados-Maiores "realiza- se" o trabalho "estatal"! O DieloNa- roda, órgão do partido govemista, dos "socialistas-revolucionários", há pou- co tempo reconhecida em um editorial - com essa sinceridade inimitável da gente da "boa sociedade" na qual "todos" exercem a prostituição políti- ca - que até nos ministérios dirigidos por "socialistas" (perdoem-me a ex- pressão), que até nesses ministérios todo o aparelho burocrático continua sendo, de fato, velho, funcionando à antiga e sabotando uma absoluta "li- berdade" as iniciativas revolucioná- rias! E mesmo que não tivéssemos es- sa confissão, isso por acaso não é de- monstrado pela história da participa- ção dos esseristas e mencheviques no governo? A única coisa característica nisso é que os senhores Tchemov, Russánov, Zenzinov e os demais re- datores do Dielo Naroda, em associa- ção ministerial com os democratas constitucionalistas, perderam o pudor até o ponto em que não se envergo- nham de dizer em público, sem rubor, como se se tratasse de uma insignifi- cância, que em "seus" ministérios tu- do continua como antes! Para enganar os camponeses ingênuos, frases revo- lunário-democráticas, e para agradar os capitalistas, o papelório burocráti- co-ofidal: esta é a essência da "hon- rosa" coalizão.

A Comuna substitui o parlamenta-

rismo venal e apodrecido da sociedade burguesa por instituições nas quais a liberdade de opinião e de discussão não degenera em farsa, pois aqui os parlamentares têm eles mesmos que trabalhar, executar suas leis, compro- var os resultados, respondo- direta- mente a seus eleitores. As instituições representativas continuam, mas desa- parece o parlamentarismo como sis- tema especial, como divisão entre o trabalhado legislativo e o executivo, como situação privilegiada para os deputados. Sem instituições represen- tativas não se pode conceber a demo- cracia, menos ainda a democracia proletária; sem parlamentarismo, po- de-se e deve-se concebê-la, se a críti- ca da sociedade burguesa não é para nós uma frase vazia, se a aspiração de derrotar o domínio da burguesia é pa- ra nós uma aspiração séria e sincera, e não uma frase "eleitoral" para caçar os votos dos operários, como o é nos lábios dos mencheviques e esseristas, como o é nos lábios dos Scheide- manns, dos Legiens, dos Sembats e dos Vanderveldes.

E extremamente instrutivo que Marx, ao falar das funções daquela burocracia de que a Comuna e a de- mocracia proletária necessitam, tome como termo de comparação os empre- gados de "qualquer outro patrão", ou seja, uma empresa capitalista comum, com "operários, inspetores e contado- res".

Em Marx não há o menor rastro de utopismo, pois não inventa nem tira de sua fantasia uma "nova" socieda- de. Não, Marx estuda, como um pro- cesso histórico-natural, como nasce a nova sociedade a partir da velha es- tuda as formas dessa transição. Parte da experiência real do movimento proletário de massa e se esforça por ti- rar daí as lições práticas. "Aprende" com a Comuna como não temeram aprender todos os grandes pensadores revolucionários com a experiência dos grandes movimentos da classe oprimi- da e jamais lhes dirigirão "sermões" pedantes (no estilo: "Não se deveria ter empunhado as armas!", de Plekhá- nov, ou: "Uma classe deve saber mo- derar-se", de Tseretéli).

Não se pode falar de abolição da burocracia de repente, em toda parte e totalmente. Isso é uma utopia. Porém Òestruir de imediato a velha máquina

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Quinzena W PoHtíea Nacional

burocrática e começar no mesmo ins- tante a construir outra nova, que per- mita ir reduzindo gradualmente toda burocracia, não é uma utopia; é a ex- periência da Comuna, é a tarefa es- sencial e imediata do proletariado re- volucionário.

O capitalismo simplifica as funções da administração "do Estado", per- mite suprimir a "administração hierár- quica" e reduzir tudo a uma organiza- ção dos proletários (como classe do- minante), que toma a seu serviço, em nome de toda a sociedade, os "operá- rios, inspetores e contadores".

Não somos utópicos. Não "sonha- mos" em como se poderá prescindir de uma vez de todo governo, de qual- quer subordinação; esses sonhos anar- quistas, baseados na incompreensão das tarefas da ditadura do proletaria- do, são fundamentalmente estranhos ao marxismo e, de fato, só servem pa- ra adiar a revolução socialista até que os homens sejam diferentes. Não, nós queremos a revolução socialista com homens como os de hoje, com homens que não podem passar sem subordina- ção, sem controle, sem "inspetores e contadores".

Mas é à vanguarda armada de todos os explorados e trabalhadores, ao proletariado, que devem se submeter. A "administração hierárquica" especí- fica dos funcionários do Estado pode e deve começar a ser substituída ime- diatamente, da noite para o dia, pelas simples funções de "inspetores e contadores", funções que hoje já são plenamente acessíveis ao nível de de- senvolvimento dos habitantes das ci- dades e que podem ser perfeitamente

desempenhadas pelo "salário de um operário".

Organizemos a grande produção, nós mesmos, os operários, partindo do que já tenha sido criado pelo capita- lismo, baseando-nos em nossa própria experiência de trabalho, estabecendo uma disciplina rigorosíssima, férrea, mantida pelo poder estatal dos operá- rios armados; reduzamos os funcioná- rios públicos do papel de simples exe- cutores de nossas ordens, ao papel de "inspetores e contadores" responsá- veis, removíveis e modestamente re- munerados (em conjunto, natural- mente, com os técnicos de todos os gêneros, tipos e graus): essa é a nossa tarefa proletária, por aí pode-se e de- ve-se começar, quando se levar a ca- bo a revolução proletária. Este come- ço, com base na grande produção, conduz por si mesmo à extinção gra- dual de toda burocracia, à criação gradual de uma ordem - ordem sem aspas, ordem que não se parecerá em nada com a escravidão assalariada -, de uma ordem em que úS funções de inspeção e de contabilidade, cada vez

mais simplificadas, serão executadas rotativamente por todos, logo se con- verterão em costume e, por último, desaparecerão como funções especiais de uma camada especial da soe iedade.

Um engenhoso social-democrata alemão da década de 70 do século passado disse que o correio era um modelo de economia socialista. Isso é muito correto. Hoje, o correio é uma empresa organizada no estilo de um monopólio capitalista de Estado. O imperialismo pouco a pouco vai trans- formando todos os trustes em organi-

l^àgWcampânha^

zações desse tipo. Neles, vemos essa mesma burocracia burguesa colocada acima dos "simples" trabalhadores, famintos e vergados pelo trabalho. Mas o mecanismo de administração social já está preparado aqui. Basta derrubar os capitalistas, destruir com a mão de ferro os operários armados, a resistência destes exploradores, rom- per a máquina burocrática do Estado moderno e teremos perante nós um mecanismo de alta perfeição técnica, livre do "parasita" e perfeitamente suscetível de ser posto em marcha pelos próprios operários unidos, con- tratando os técnicos, inspetores e contadores e remunerando o trabalho de todos eles, como o de todos os funcionários "do Estado" em geral, com o salário de um operário. Estae' uma tarefa concreta, uma tarefa práti- ca, realizável imediatamente em rela- ção a todos os trustes, que libera os trabalhadores da exploração e que le- va em conta a experiência já iniciada praticamente (sobretudo no terreno da organização do Estado) pela Comuna.

Organizar toda a economia nacio- nal como está organizado o correio, para que os técnicos, os inspetores, os contadores e todos os funcionários em geral recebam ordenados oue não se- jam superiores ao "salário de um ope- rário", sob o controle e a direção do proletariado armado: esse é o nosso objetivo imediato. Esse é o Estado que necessitamos e essa é a base eco- nômica sobre a qual deve repousar. Nisso é que dará a abolição do parla- mentarismo e a conservação das ins- tituições representativas; isso é o que livrará as classes trabalhadoras da

prostituição destas instituições pela burguesia. •

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Os principais pontos do projeto aprovado pela Câmara:

■ Somente os eleitores inscritos até 10 de janeiro poderão partici- par. O voto è obrigatório para maiores de dezoito ano e facultativo para analfabetos, maiores de 70 anos e menores de 18 anos.

■ O modelo de cédula oferece três opções: parlamentarismo com República, parlamentarismo com Monarquia e presidencialismo com República. A fórmula é contestada pelos presidencialistas.

■ Vencerão a forma e o sistema que obtiverem a maioria dos vo- tos válidos. Isto significa que serão somados em favor do sistema parlamentarista os votos dados tanto ao parlamentarismo repu- blicano quanto ao parlamentarismo monárquico.

■ Durante os 60 dias anteriores á véspera do plebiscito, as emis- soras de rádio e TV reservarão uma hora diária á propaganda eleitoral gratuita: 30 minutos durante o dia e igual período â noite. Cada frente terá dez minutos em cada um dos períodos.

■ As três correntes serão representadas por três frentes parla- mentares registradas perante a Mesa do Congresso e às quais poderão se vincular entidades representativas da sociedade civil

■ Se mais de uma frente pedir registro para defender a mesma posição, caberá á Mesa do Congresso decidir qual delas terá a representação. Cabe recurso com efeito suspensivo da decisão.

■ Para a campanha do plebiscito, as frentes poderão receber con- tribulçfies e doações de pessoas físicas e juridicas Essas contri- buições poderão ser deduzidas como despesas, para efeito do Imposto de Renda, até o limite de 45 mil UFIRs