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Indaial – 2019 GEOGRAFIA URBANA Prof.ª Talita Cristina Zechner Lenz 1 a Edição

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Indaial – 2019

GeoGrafia Urbana

Prof.ª Talita Cristina Zechner Lenz

1a Edição

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Copyright © UNIASSELVI 2019

Elaboração:

Prof.ª Talita Cristina Zechner Lenz

Revisão, Diagramação e Produção:

Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri

UNIASSELVI – Indaial.

Impresso por:

L575g

Lenz, Talita Cristina Zechner

Geografia urbana. / Talita Cristina Zechner Lenz. – Indaial: UNIASSELVI, 2019.

213 p.; il.

ISBN 978-85-515-0378-2

1. Planejamento urbano. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.

CDD 910.091732

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apresentação

Caro acadêmico, seja bem-vindo à disciplina de Geografia Urbana! Nesta disciplina, trataremos de aspectos conceituais e empíricos relacionados à geografia e suas interfaces com o espaço urbano. A geografia urbana procura explicar a distribuição das cidades e as semelhanças e contrastes socioespaciais que existem entre e dentro delas.

O tema central da Unidade 1 será “a cidade, o urbano e a urbanização: formulações teórico-conceituais”, que oferece um panorama geral dos assuntos e aspectos que são estudados no plano da geografia urbana. Além de revelar o campo de estudo da geografia urbana, outro ponto central desta unidade consiste em apresentar e discorrer a respeito dos diferentes critérios que podem ser utilizados para classificar os espaços urbanos. Você aprenderá, ainda, quais são os principais agentes produtores do espaço urbano, além de entender o que é urbanização.

Na Unidade 1 desta disciplina, você conhecerá o conceito de rede urbana e poderá compreender como ocorre o processo de hierarquização e classificação das cidades. Seguindo este eixo temático, serão apresentadas as principais características do estudo Regiões de Influência das Cidades. Ao final desta primeira unidade, você irá conhecer as contribuições de Milton Santos no estudo da rede urbana brasileira.

Na Unidade 2, o foco dos estudos é o espaço urbano brasileiro. A unidade visa apresentar as principais fragilidades dos espaços urbanos brasileiros e, por outro lado, procura realçar algumas experiências positivas advindas das cidades brasileiras. Em se tratando dos problemas urbanos que afetam o Brasil e diversos outros países na atualidade, um dos importantes desafios que se impõe é o uso adequado dos recursos naturais e a busca por alternativas que visem minimizar os danos ambientais decorrentes do aumento da população residente em áreas urbanas, com o intuito de melhor a qualidade de vida da população e também de procurar um convívio mais harmonioso no que se refere à relação sociedade e natureza. Serão analisados aspectos como a rede de saneamento básico, violência urbana e a problemática das favelas.

Ainda na Unidade 2, para evidenciar alguns aspectos positivos da urbanização brasileira, serão analisados a experiência de Brasília e de Curitiba. No caso de Brasília, o enfoque está em evidenciar como o planejamento das cidades pode contribuir para a construção de cidades que sejam mais apropriadas e agradáveis para se viver. Ao examinarmos a experiência de Curitiba, atenção especial é dedicada na análise dos espaços

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Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos!

urbanos com finalidade de uso direcionada para o lazer, tal como ocorre com os parques urbanos. Outro aspecto a ser tratado será a relação entre o turismo e os espaços urbanos. Vamos conhecer quais são as principais modalidades de turismo que ocorrem neste espaço e qual a relação entre turismo, espaço urbano e patrimônio histórico.

Já na Unidade 3, o grande tema de estudo é o Planejamento Urbano. Vamos conhecer os aspectos conceitos do planejamento urbano e tomar contato com os principais instrumentos e ferramentas adotados no exercício de planejar as cidades. Além disso, vamos identificar e analisar alguns aspectos da dimensão ambiental do planejamento urbano. Por fim, o último tópico de estudos irá abordar o conceito de cidades para as pessoas, realçando a questão da mobilidade urbana.

Desejo a você uma ótima leitura e uma excelente jornada de estudos!

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NOTA

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Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais que possuem o código QR Code, que é um código que permite que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!

UNI

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UNIDADE 1 – A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS......................................................................................... 1

TÓPICO 1 – ASPECTOS INTRODUTÓRIOS DA GEOGRAFIA URBANA .............................. 31 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 32 O QUE ESTUDA A GEOGRAFIA URBANA? ................................................................................ 4

2.1 O QUE É URBANO? ........................................................................................................................ 92.2 OS AGENTES PRODUTORES DO ESPAÇO URBANO ............................................................ 162.3 O QUE É URBANIZAÇÃO? ......................................................................................................... 21

RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 28AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 29

TÓPICO 2 – O ESTUDO DA GEOGRAFIA URBANA NO BRASIL ............................................ 311 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 312 REDE URBANA E FUNÇÕES URBANAS ...................................................................................... 31

2.1 HIERARQUIA URBANA E CLASSIFICAÇÃO DAS CIDADES .............................................. 342.2 REDE URBANA BRASILEIRA: HIERARQUIA DAS CIDADES, SEGUNDO O REGIC ...... 38

RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 45AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 46

TÓPICO 3 – AS CONTRIBUIÇÕES DE MILTON SANTOS NA ANÁLISE URBANA ............ 491 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 492 AS CONTRIBUIÇÕES DE MILTON SANTOS NA ANÁLISE URBANA ................................ 49LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 59RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 64AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 65

UNIDADE 2 – O ESPAÇO URBANO BRASILEIRO ........................................................................ 69

TÓPICO 1 – DESAFIOS NOS ESPAÇOS URBANOS BRASILEIROS ......................................... 711 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 712 A QUESTÃO DO SANEAMENTO BÁSICO .................................................................................. 723 O PROBLEMA DA VIOLÊNCIA URBANA E A QUESTÃO DA SEGURANÇA PÚBLICA ...... 864 AS FRAGILIDADES DA QUESTÃO DA HABITAÇÃO NO BRASIL: FAVELAS E SEUS PROBLEMAS DE URBANIZAÇÃO .................................................................................... 93RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................102AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................104

TÓPICO 2 – ASPECTOS POSITIVOS DA URBANIZAÇÃO BRASILEIRA .............................1071 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1072 A EXPERIÊNCIA DE BRASÍLIA .....................................................................................................1073 A EXPERIÊNCIA DE CURITIBA .....................................................................................................115RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................128AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................129

sUmário

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TÓPICO 3 – O ESPAÇO URBANO E O TURISMO........................................................................1311 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1312 TURISMO NOS ESPAÇOS URBANOS .........................................................................................1313 TURISMO CULTURAL E PATRIMÔNIO .....................................................................................134LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................139RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................143AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................145

UNIDADE 3 – PLANEJAMENTO URBANO ...................................................................................147

TÓPICO 1 – O QUE É PLANEJAMENTO URBANO? ...................................................................1491 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1492 O QUE É PLANEJAMENTO URBANO E QUAL SUA RELEVÂNCIA PARA AS CIDADES? ............................................................................................................................................150

2.1 ETAPAS DO PLANEJAMENTO URBANO ...............................................................................161RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................169AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................171

TÓPICO 2 – A DIMENSÃO AMBIENTAL DO PLANEJAMENTO URBANO .........................1731 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1732 COMPONENTES DA QUALIDADE AMBIENTAL URBANA .................................................1733 PROCESSOS DE DEGRADAÇÃO E RECUPERAÇÃO DO AMBIENTE URBANO ...........180RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................185AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................187

TÓPICO 3 – A CIDADE PARA AS PESSOAS .................................................................................1891 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1892 CIDADE PARA PESSOAS, MOBILIDADE URBANA E ESPAÇOS PÚBLICOS ..................190LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................201RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................204AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................205

REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................207

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UNIDADE 1

A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES

TEÓRICO-CONCEITUAIS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir dos estudos desta unidade, você deverá ser capaz de:

• conhecer o campo de estudo da geografia urbana;

• aprender quais critérios são utilizados para classificar os espaços urbanos;

• reconhecer quais são os agentes produtores do espaço urbano;

• entender o que é urbanização; • conhecer o conceito de rede urbana;

• compreender o processo de hierarquização e classificação das cidades;

• reconhecer as principais características do estudo das regiões de influência das cidades;

• conhecer as contribuições de Milton Santos no estudo da rede urbana brasileira.

Esta unidade está organizada em três tópicos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – ASPECTOS INTRODUTÓRIOS DA GEOGRAFIA URBANA

TÓPICO 2 – O ESTUDO DA GEOGRAFIA URBANA NO BRASIL

TÓPICO 3 – CONTRIBUIÇÕES DE MILTON SANTOS NA ANÁLISE URBANA BRASILEIRA

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TÓPICO 1UNIDADE 1

ASPECTOS INTRODUTÓRIOS DA GEOGRAFIA

URBANA

1 INTRODUÇÃO

O objetivo deste tópico é apresentar a Geografia Urbana enquanto campo de estudos. Para tanto, inicialmente será examinado quais as possibilidades de análise que este campo disciplinar oferece e quais são as abordagens usualmente empregadas. Em seguida, discute-se o conceito de urbano procurando apontar quais são os elementos fundamentais que o caracterizam. Avançando, será discutido o conceito de urbanização, realçando as nuances que este conceito adquire no âmbito da Geografia.

O debate a respeito da geografia urbana toma força na atualidade, tendo em vista que a maior parte da população mundial reside em áreas urbanas. Além disso, mesmo aquela que vivem além dos limites administrativos ou funcionais de uma cidade terão seu estilo de vida influenciado em algum grau por uma cidade próxima ou mesmo distante. Neste sentido, compreender as interações espaciais que se estabelecem entre os espaços rurais e urbanos são questões relevantes no campo da geografia urbana. Outro aspecto interessante a ser observado é de que, o fenômeno de intensificação da urbanização desencadeia alguns problemas urbanos que são similares em distintas partes do mundo. Por outro lado, observa-se que os resultados desses processos se manifestam na diversidade de ambientes urbanos que caracterizam o mundo contemporâneo.

De modo geral, poderíamos dizer que que a geografia urbana é o ramo da geografia humana relacionado aos vários aspectos que compõem as cidades. Particularmente, a geografia urbana procura ainda explicar a distribuição das cidades e as semelhanças e contrastes socioespaciais que existem entre e dentro delas.

Outro aspecto importante que será analisado neste tópico consiste na análise dos elementos que caracterizam o espaço urbano e como eles podem variar de acordo com os diferentes países. Vamos apresentar o conceito de morfologia urbana para você e analisar quais são os principais agentes produtores do espaço urbano. Por fim, vamos conhecer um pouco a respeito da história da urbanização. Venha conosco!

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UNIDADE 1 | A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS

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2 O QUE ESTUDA A GEOGRAFIA URBANA?

O mundo contemporâneo é um mundo urbano. Isso é evidente na expansão das áreas urbanas e na extensão das áreas de influências urbanas em grande parte da superfície habitável do planeta. Na atualidade, os moradores urbanos superam em número os residentes rurais (PACIONE, 2005). Os lugares urbanos — cidades e vilas — são de fundamental importância: para a distribuição da população dentro dos países; na organização da produção, distribuição e das trocas econômicas; na estruturação da reprodução social e da vida cultural; e na alocação e exercício do poder (PACIONE, 2005). Na Figura 1 podemos observar o fenômeno da população urbana distribuída espacialmente pelo mundo. Acompanhe.

FIGURA 1 – MUNDO: POPULAÇÃO URBANA EM 2014

FONTE: <https://atlasescolar.ibge.gov.br/images/atlas/mapas_mundo/mundo_populacao_urbana.pdf>. Acesso em: 11 mar. 2019.

Ademais, além do que pudemos perceber na Figura 1 estima-se que o número de habitantes urbanos e o nível de urbanização global provavelmente aumentarão nos próximos anos. Mesmo aqueles que vivem além dos limites administrativos ou funcionais de uma cidade, terão seu estilo de vida influenciado em algum grau por uma cidade próxima ou mesmo distante. Nós habitamos um mundo urbano em que a disseminação de áreas urbanas e de influências urbanas se constituem de um fenômeno global. Os resultados destes processos se manifestam na diversidade de ambientes urbanos que caracterizam o mundo contemporâneo (PACIONE, 2005).

Observe na Figura 2 como o padrão de urbanização na cidade de Toronto, no Canadá, é planejado e organizado.

População residente em área urbana (%)

menos de 20de 20 a 40

de 20 a 60de 60 a 80mais de 80sem dados

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TÓPICO 1 | ASPECTOS INTRODUTÓRIOS DA GEOGRAFIA URBANA

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FIGURA 2 – TORONTO (CANADÁ): EXEMPLO DE CAPITAL URBANA

FONTE: <https://achahistory.org/images/conferences/2011_toronto/toronto_skyline.jpg>. Acesso em: 19 jun. 2019.

Toronto é uma das principais cidades do Canadá, e, como podemos observar nesta paisagem, vários traços eminentemente urbanos caracterizam essa cidade, tais como edificações verticalizadas e a concentração de um conjunto expressivo de prédios na área urbana. O estudo das cidades é um elemento central de diversas ciências sociais, incluindo a geografia, que oferece em seu aparato metodológico recursos específicos para analisar condição urbana. De acordo com Pacione (2005), o escopo e o conteúdo da Geografia Urbana são abrangentes e incluem o estudo de lugares urbanos como "pontos no espaço", bem como a investigação da estrutura interna das áreas urbanas.

Além disso, da Geografia Urbana derivam subáreas de estudo que procuram analisar aspectos como a dinâmica populacional no espaço urbano, economia urbana, política e governança, comunidades urbanas, habitação ou questões de transporte, entre outros temas. Para tanto, os estudos de Geografia Urbana baseiam-se em uma rica mistura de informações teóricas e empíricas para avançar nos conhecimentos sobre a cidade.

Por sua vez, Briney (2018) comenta que a Geografia Urbana é o ramo da geografia humana relacionado aos vários aspectos que compõem as cidades. Neste sentido, no rol de atribuições do geógrafo urbano está o estudo dos processos espaciais que criam padrões que podem ser observados em áreas urbanas. Para fazer isso, eles estudam, por exemplo, as características de determinado local, sua evolução e seu crescimento e, trabalhar com classificações como aldeias, vilas, municípios, cidades entre outros recortes espaciais, que variam conforme o país em que atuam. Outro aspecto que é estudado na Geografia Urbana é a localização da cidade e sua importância em relação a diferentes regiões e cidades. Aspectos econômicos, políticos e sociais dentro do espaço urbano também são importantes no estudo da Geografia Urbana.

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UNIDADE 1 | A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS

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Para estudar as diferentes dimensões que compõem o espaço das cidades, a Geografia Urbana articula saberes advindos de outras áreas da geografia. A geografia física, por exemplo, é importante para entender por que uma cidade está localizada em uma área específica, uma vez que as condições ambientais e locais desempenham um grande papel no desenvolvimento ou não de uma cidade. Já a geografia cultural pode ajudar na compreensão de várias condições relacionadas às pessoas que residem em determinada área sob o prisma da cultura, enquanto a geografia econômica ajuda a entender os tipos de atividades econômicas e empregos disponíveis em uma área. Campos fora da geografia, como gerenciamento de recursos, antropologia e sociologia urbana, também se articulam com a Geografia Urbana (BRINEY, 2018).

A Geografia Urbana procura ainda explicar a distribuição das cidades e as semelhanças e contrastes socioespaciais que existem entre e dentro delas. Neste sentido, Pacione (2005) sustenta que se todas as cidades fossem únicas e distintas, isso seria uma tarefa praticamente impossível. No entanto, embora cada cidade tenha um caráter individual e particular, os locais urbanos também exibem características comuns que variam apenas em grau de incidência, ou importância, dentro de cada tecido urbano específico. Todas as cidades contêm áreas de espaço residencial, linhas de transporte, atividades econômicas, infraestrutura de serviços, áreas comerciais e prédios públicos.

Em diferentes regiões do mundo, o processo histórico de evolução urbana pode ter seguido uma trajetória semelhante. Cada vez mais, processos semelhantes, como os de suburbanização e gentrificação, estão operando dentro de cidades distintas espalhadas ao redor do mundo. Além disso, as cidades também apresentam problemas comuns em graus variados, incluindo moradia inadequada, constrangimentos econômicos, pobreza, problemas de saúde, desigualdade social, congestionamentos e poluição ambiental (PACIONE, 2005).

Em resumo, muitas características e preocupações comuns são compartilhadas pelos lugares urbanos. Essas características e preocupações compartilhadas representam as bases para o estudo da Geografia Urbana. O caráter dos ambientes urbanos, em todo o mundo, é o resultado de interações entre uma série de forças ambientais, econômicas, tecnológicas, sociais, demográficas, culturais e políticas que operam em uma variedade de escalas geográficas que vão do global ao local (PACIONE, 2005).

NOTA

Acadêmico! Você conhece as expressões suburbanização e gentrificação?Apresentamos a seguir, de modo resumido, o significado de cada uma delas, acompanhe.

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TÓPICO 1 | ASPECTOS INTRODUTÓRIOS DA GEOGRAFIA URBANA

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Suburbanização: é um processo relacionado com o desenvolvimento de subúrbios em torno das grandes cidades e áreas metropolitanas. O processo de suburbanização é gerado pelo crescimento demográfico (aumento da população total) e pela reestruturação interna das cidades. Muitos residentes das grandes cidades já não vivem e trabalham na mesma área urbana, optando por viver em subúrbios e deslocar-se para trabalhar noutras áreas. Os subúrbios são áreas habitadas localizadas na periferia imediata de uma cidade, fora dos limites administrativos desta ou mesmo no exterior dos limites de uma conturbação.

FONTE: <http://www.forumdascidades.pt/content/suburbanizacao>. Acesso em: 19 jun. 2019.

A respeito do tema da suburbanização, é interessante apontar que, antigamente, os subúrbios eram relacionados a pessoas de baixo poder aquisitivo, que moravam nestes lugares pois o custo era mais baixo. Hoje, a procura por subúrbios tem vindo de pessoas com poder aquisitivo considerável e que buscam condomínios fechados de alto padrão, de modo a preservar-se do caos e da violência dos grandes centros, além de contar, muitas vezes, com o slogan de morar mais próximo de atrativos naturais.

Gentrificação: para entender a gentrificação imagine um bairro histórico em decadência ou que apesar de estar bem localizado é reduto de populações de baixa renda, portanto, desvalorizado. Lugares que não oferecem nada muito atrativo para fazer. Enfim, lugares que você não recomendaria o passeio a um amigo. Pense, porém, que de um tempo para cá, a estrutura deste bairro melhorou muito: aumentou a segurança pública e agora há parques, iluminação, ciclovias, novas linhas de transporte, ruas reformadas, variedade de comércio, restaurantes, bares, feiras de rua etc. Uma verdadeira revolução que traria muitos benefícios para os moradores da região, porém eles não podem mais morar ali, pois, depois de todos esses melhoramentos, o valor do aluguel dobrou, a conta de luz triplicou e as idas semanais ao mercadinho da esquina ficaram cada vez mais caras, ou seja, junto com toda a melhora, o custo de vida subiu tanto que não cabe mais no orçamento dos atuais moradores. E o mais cruel de tudo é perceber que, enquanto o antigo morador procura um novo bairro, pessoas de maior poder aquisitivo estão indo morar no seu lugar. Gentrificação vem de gentry, uma expressão inglesa que designa pessoas ricas, ligadas à nobreza. O termo surgiu nos anos 60, em Londres, quando vários gentriers migraram para um bairro que, até então, abrigava a classe trabalhadora. Este movimento disparou o preço imobiliário do lugar, acabando por “expulsar” os antigos moradores para acomodar confortavelmente os novos donos do pedaço. O evento foi chamado de gentrification, que numa tradução literal, poderia ser entendida como o processo de enobrecimento, aburguesamento ou elitização de uma área [...]. Um processo de gentrificação possui bastante semelhança com um projeto de revitalização urbana, com a diferença que a revitalização pode ocorrer em qualquer lugar da cidade e normalmente está ligada a uma demanda social bastante específica, como reformar uma pracinha de bairro abandonada, promovendo nova iluminação, jardinagem, bancos etc.

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UNIDADE 1 | A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS

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E quem se beneficia da obra são os moradores do entorno e, por tabela, a cidade toda [...]. Note, na charge a seguir, como o fenômeno da gentrificação altera a forma de uso dos espaços.

FONTE: <http://www.courb.org/pt/o-que-e-gentrificacao-e-por-que-voce-deveria-se-preocupar-com-isso/>. Acesso em: 19 jun. 2019.

Assim, ao iniciarmos o estudo da Geografia Urbana uma das primeiras inquietações que despontam consiste em entender o que estuda este campo disciplinar da geografia. Pacione (2005) pontua que existem duas abordagens básicas para a Geografia Urbana. A primeira refere-se à distribuição espacial dos municípios e cidades e às ligações entre elas: o estudo dos sistemas das cidades. A segunda refere-se à estrutura interna dos espaços urbanos: o estudo da cidade como um sistema (PACIONE, 2005).

Seguindo esta linha de pensamento, Strohaeckher (2017, p. 202) complementa que:

A Geografia Urbana [...] é o ramo da Geografia que se concentra nos estudos e interpretações sobre a localização e o arranjo espacial das cidades. Ela tem como objeto de estudo a sociedade urbana a partir de sua organização espacial, enfocando duas dimensões básicas: a interurbana e a intraurbana. Na escala interurbana, a Geografia estuda as relações/interações que se estabelecem entre diferentes cidades no âmbito econômico, político, social, cultural e/ou de gestão, conformando as redes e os sistemas urbanos. Na escala intraurbana, a Geografia objetiva analisar a organização espacial de uma cidade ou metrópole, especificamente, através do estudo de sua gênese, formação e dinâmica socioespacial, dos processos espaciais, dos agentes produtores do espaço urbano e seus interesses políticos e econômicos, do direito à cidade, das formas de representação do espaço social, da questão ambiental urbana.

Estes aspectos, atrelados a escala interurbana e intraurbana, serão examinados no decorrer desta disciplina. A autora, pontua ainda que:

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TÓPICO 1 | ASPECTOS INTRODUTÓRIOS DA GEOGRAFIA URBANA

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Outro elemento importante sobre o estudo inerente ao campo da Geografia Urbana é a compreensão de que as categorias espaço e tempo jamais devem estar dissociadas. O anacronismo temporal pode conduzir a interpretações equivocadas do fenômeno da urbanização da sociedade. Em síntese, espaço e tempo são categorias fundamentais e indissociáveis para a compreensão da organização espacial da sociedade humana ao longo da história (STROHAECKHER, 2017, p. 203).

2.1 O QUE É URBANO?

Ao abordar o conceito de urbano, é útil fazer uma distinção entre a questão do que é um lugar urbano e o que é urbano. Isso é mais do que um exercício de semântica. A distinção entre o urbano como uma entidade física e o urbano como uma qualidade que nos ajuda a entender a complexidade da vida urbana e ilumina diferentes abordagens para o estudo das cidades (PACIONE, 2005). Sobre o assunto, convém apontar que:

Apesar de tradicionalmente estabelecidas como modos de qualificar as sociedades e o espaço, as categorias rural e urbano estão sujeitas às transformações que vem sendo operadas no decorrer do tempo. Com efeito, a realidade histórica sobre tais categorias demonstra uma grande diversidade de estruturas e organizações (IBGE, 2017, p. 10).

Iniciamos nossa abordagem reconhecendo, sob o prisma internacional, os principais métodos empregados para identificar o espaço urbano, embasados nas contribuições de Pacione (2005), importante e renomado geógrafo britânico, a saber:

a) Tamanho da população: como os lugares urbanos são geralmente maiores do que os locais rurais, em algum momento, ao longo da escala do tamanho da população, deveria ser possível discernir quando uma aldeia/vila se torna uma cidade. Na prática, esse limiar populacional urbano varia ao longo do tempo e do espaço. Na Suécia, qualquer assentamento com mais de 200 habitantes é classificado como urbano no censo nacional, enquanto nos EUA o mínimo de população para o status urbano é de 2.500; na Suíça é 10.000, aumentando para 30.000 no Japão. Essa diversidade reflete o contexto social. Dada a distribuição esparsa do assentamento em muitas áreas da Suécia, um limiar de 200 pode ser apropriado, enquanto que em um país densamente povoado como o Japão, praticamente todos os assentamentos excedem uma população tão baixa de limiar urbano. Se não for explicitado, essas diferenças podem complicar a comparação internacional (PACIONE, 2005).

b) Base econômica: em alguns países o tamanho da população é combinado com outros critérios diagnósticos para definir um lugar urbano. Na Índia, por exemplo, um assentamento deve ter mais de 75% da população masculina adulta engajada em trabalho não agrícola para ser classificada como urbana (PACIONE, 2005).

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UNIDADE 1 | A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS

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c) Critérios administrativos: a maioria das cidades e vilas do mundo são definidas de acordo com critérios legais ou administrativos. A definição de lugares urbanos pelos governos nacionais leva a uma grande diversidade, o que cria dificuldades para a pesquisa comparativa que só pode ser superada por analistas urbanos construindo suas próprias definições e aplicando-as uniformemente em todo o mundo. Um segundo problema com as definições administrativas é que elas podem ter pouca correspondência com a extensão física real da área urbana. Um problema frequente é a subutilização, em que a área construída da cidade se estende além do limite administrativo urbano. Isso pode levar a grandes dificuldades fiscais para a cidade, que pode vir a sofrer com constrangimentos no que tange a arrecadação de impostos (PACIONE, 2005).

d)Definiçõesfuncionais: para abordar situações como as manchas urbanas, os pesquisadores urbanos criaram "regiões urbanas funcionais" que refletem a extensão real da influência urbana.

Conforme fica evidente, a adoção de distintos critérios, sejam eles o tamanho da população, a base econômica, os critérios administrativos ou funcionais, dependem do posicionamento e das intencionalidades dos diferentes gestores públicos, situados em distintos tempos e espaços. Além disso, as características inerentes a cada cidade também interferem no peso atribuído a cada um dos critérios apresentados.

Ainda no que diz respeito a distinção entre o espaço rural e urbano, um estudo do IBGE (2017) aponta que:

Conceitos centrais da Geografia, os espaços urbanos e rurais se apresentam na atualidade com características diversas e são marcados por relações e funções cada vez mais interligadas, o que evidencia a complexidade na definição de uma abordagem única para sua delimitação. Mesmo reconhecendo a dificuldade em estabelecer distinções entre o meio urbano e o meio rural, não se pode ignorar sua importância para fins da ação pública e privada tendo em vista o planejamento territorial do Brasil. A grande demanda de classificações por parte da academia, da administração pública e da sociedade em torno desse tema não deixa dúvidas quanto à pertinência dessa discussão de forma contínua, considerando diversas abordagens e escalas. As transformações que ocorreram no campo e nas cidades nos últimos 50 anos vêm a demandar, nos dias de hoje, abordagensmultidimensionaisnaclassificaçãoterritorial. O rural e o urbano, enquanto manifestaçõessocioespaciais, se apresentam de forma bastante complexa e heterogênea, portanto, a identificação de padrões dessas manifestações se constitui um desafio principalmente ao se considerar a extensão do território brasileiro (IBGE, 2017, p. 7, grifo nosso).

Complementando a classificação proposta por Pacione (2005), no quadro a seguir estão elencadas as técnicas e critérios de classificação do rural e do urbano, publicados recentemente em um estudo do IBGE, acompanhe:

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TÓPICO 1 | ASPECTOS INTRODUTÓRIOS DA GEOGRAFIA URBANA

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QUADRO 1 – PRINCIPAIS CRITÉRIOS UTILIZADOS PARA DEFINIR O ESPAÇO COMO URBANO

FONTE: Adaptado de IBGE (2017)

Como você pode observar, a utilização de cada critério depende do objetivo e da intencionalidade do sujeito responsável em classificar determinado espaço. Na prática, quando pensamos em abordagens multidimensionais, precisamos ter em mente que todas estas dimensões, ou seja, todos os aspectos da vida urbana, apontados anteriormente, operam no espaço concomitantemente, engendrando sua configuração espacial. Quer dizer, no campo disciplinar da geografia parece fazer sentido ter em mente uma pergunta de fundo quando se ouvir falar em “urbano” e “rural”. Urbano a partir de qual dimensão? Ou ainda: urbano segundo qual definição? E ainda refletir sobre: quem estabeleceu esta definição? A quem ela interessa? E quais são as possibilidades e os limites das mesmas?

Colaborando com esta discussão, Duarte (2007, p. 46) traz o exemplo de Portugal para contribuir com a reflexão:

Em outros países, a classificação de um município como urbano é feita por critérios estruturais e funcionais. Nos critérios estruturais estão os dados demográficos, como o número de habitantes, eleitores e, principalmente, a densidade demográfica; nos critérios funcionais encontra-se a presença de serviços básicos para a vida da cidade. Em Portugal, é preciso, para que um aglomerado populacional seja considerado cidade, que haja pelo menos metade dos seguintes serviços: hospital, farmácias, bombeiros, casa de espetáculo ou centro cultural, museu e biblioteca, hotel, escola de ensino médio, escola de ensino pré-primário e creches, transporte público, parques e jardins públicos.

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Retomando a descrição exposta no Quadro 1 (Principais critérios utilizados para definir o espaço como urbano), os quatro critérios iniciais têm sua compreensão facilitada pois você provavelmente já se aproximou, de alguma forma, deste conteúdo, direta ou indiretamente, ao longo do seu curso. Contudo, o debate sobre a morfologia urbana insere-se, particularmente, no âmbito dos estudos da Geografia Urbana. Vamos entender melhor do que se trata este conceito?

A morfologia urbana refere-se à forma, à função e ao layout da cidade. Neste sentido, atributos geográficos, incluindo forma, densidade e padrão de categorias de uso da terra refletem o resultado do processo de urbanização (MAYHEW, 2015). Sposito (2017a) também discorre sobre o tema. Acompanhe o fragmento da explicação, selecionado e exposto, a seguir:

MORFOLOGIA URBANA

Maria Encarnação Beltrão Sposito

Se o termo morfologia urbana designa aquilo que se refere à forma, o conceito de morfologia urbana vai muito além da análise das formas urbanas em si, embora a contemple. O próprio sentido dado ao termo “forma urbana” é variado e, apenas para ilustrar, vale lembrar que o apreço que arquitetos e urbanistas têm em relação ao estudo e ao projeto das formas urbanas. Num primeiro sentido, poderíamos identificar forma ao aspecto visível de uma coisa, ao arranjo ordenado de objetos ou a um padrão (SANTOS, 1985, p. 50). Em outras palavras, forma refere-se à aparência externa que um dado objeto tem e, ainda, como ressalta Serra (1987, p. 51), apoiando-se nas ideias de Locke, ao contorno de um dado objeto ou de um espaço, associando, assim, a forma às partes externas ou limítrofes de uma extensão, bem como ao que está circunscrito a esses limites. Assim pensando, o conceito de morfologia urbana, compreendendo o estudo da forma urbana, deveria se voltar à análise da extensão urbana.

Talvez, por isso, não sem frequência, o estudo da forma urbana remete à apreensão da planta urbana e à elaboração de tipologias, segundo as quais se procuram classificar diferentes planos urbanos e reconhecer as formas que as cidades têm em função desses planos ou mesmo da ausência deles, quando a configuração resultante da disposição das vias e de outros espaços da cidade é desordenada e/ou resulta de um processo em que o desenho prévio ou o planejamento não ocorreu.

Considerando-se a forma como um dos elementos constitutivos da morfologia e o plano urbano como arcabouço dessa forma, poderíamos reconhecer a extensão urbana como designativa da morfologia de uma cidade, já que a extensão do plano ou da planta urbana é o que, via de regra, orienta a expansão territorial e dá materialidade real ou potencial à redefinição da morfologia urbana [...].

FONTE: SPOSITO, M. E. B. Morfologia Urbana. In: SPOSITO, E. S. (Org.). Glossário de geografia humana e econômica. São Paulo: Editora Unesp, 2017. p. 297.

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A seguir, acompanhe um exemplo visual de uma morfologia urbana e o modo como se configura o desenho das ruas e a ocupação dos espaços:

FIGURA 3 – EXEMPLO DE MORFOLOGIA URBANA

FONTE: <https://i2.wp.com/epum.eu/wp-content/uploads/2018/09/Screenshot-2018-09-07-20.53.48-1.png?w=1361>. Acesso em: 19 jun. 2019.

Outra possibilidade de estudar o espaço urbano é a partir das análises dos fluxos. É adequado que a relação entre os espaços urbanos e rurais considere as ligações urbano-rurais, que podem ser representadas pelos fluxos de bens, pessoas, recursos naturais, capital, trabalho, serviços, informação e tecnologia, conectando zonas rurais e urbanas, tendo em vista que essas conexões são complementares e sinérgicas, interferindo na configuração espacial (IBGE, 2017).

Acerca da leitura do espaço a partir do prisma dos fluxos e sobre a combinação desta análise com distinção entre o urbano e o rural, Duarte (2007, p. 37) observa que:

Na economia brasileira, a grande revolução dos últimos anos foi o chamado agronegócio. Não mais aquela paisagem agrária ligada ao atraso, como um estágio pré-urbano. Não, pelo contrário, são regiões com vocação agrícola que apresentam os mais altos índices de desenvolvimento econômico e de qualidade de vida. Porém, é

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inegável que isso aconteceu graças a inovações mecânicas, físico-químicas e biológicas. As inovações mecânicas têm alguma relação com a história da mecanização da produção no campo; já as inovações físico-químicas e biológicas ganharam impulso nas últimas décadas. Em relação a essas inovações, por mais que sejam aplicadas no campo, nas regiões agrícolas, o desenvolvimento de pesquisa em ciência e tecnologia está intimamente ligado à realidade urbana. Os centros de excelência de pesquisa agrícola geralmente estão localizados em centros urbanos ou fazem parte de uma rede de instituições públicas e privadas dispersas pelo território nacional e internacional [...].

Ou seja, o comentário do autor ressalta que é possível que se estabeleça um entrelaçamento entre o espaço rural e o espaço urbano, que ocorre, sobretudo, em virtude das redes geográficas que se engendram.

Dependendo do enfoque pretendido, o uso de uma determinada forma de classificação do espaço pode ser insuficiente para apreender a realidade que se apresenta:

No Brasil, o Decreto Lei n. 311, de 02.03.1938 associa a delimitação de zonas rurais e urbanas aos municípios. Contudo, muitas vezes as transformações econômicas e sociais alteram profundamente a configuração espacial dos municípios sem que a legislação consiga acompanhar em tempo hábil as novas estruturas territoriais e o processo de distribuição espacial das populações e das atividades econômicas. É verdade também que os limitesoficiaisentrezonaurbanaezonarural, são em grande parte instrumentos definidos segundo objetivos fiscais que enquadram os domicílios sem considerar necessariamente as características territoriais e sociais do município e de seu entorno. Atendem, portanto, aos objetivos das prefeituras, mas dificultam políticas públicas e investimentos preocupados com as outras facetas e escalas da classificação rural-urbano (IBGE, 2017, p. 10, grifo nosso).

É notável que as transformações que ocorrem no espaço são dinâmicas e o balizamento a partir de uma lei, dependendo da situação, pode representar atrasos. Observe, também, que a lei que delimita as zonas rurais e urbanas é antiga, de 1938. Note as especificações apontadas na lei:

DICAS

Para acessar o conteúdo integral do Decreto da Lei n° 311, de 02/03/1938, acesse o link a seguir: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1930-1939/decreto-lei-311-2-marco-1938-351501-publicacaooriginal-1-pe.html.

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Vale realçar, ainda, que em se tratando dos limites oficiais entre zona urbana e zona rural e os objetivos fiscais, existem aspectos passíveis de críticas no que diz respeito ao tipo de imposto cobrado. O texto a seguir esclarece qual o tipo de imposto cobrado nas áreas rurais e urbanas.

ITR x IPTU – Qual imposto a pagar?

Muitos proprietários que possuem terras no entorno das cidades já depararam com este problema. Eles são surpreendidos com a cobrança do IPTU (Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana) de suas terras, nas quais mantêm suas atividades agrícolas ou pastoris. Há casos até de cobrança simultânea dos dois impostos: o IPTU e o ITR (Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural).

Esse fato tornou-se mais comum depois da Constituição de 1988, que deu mais poderes aos municípios para tributar. Com isso, eles decretaram a ampliação do perímetro urbano do município, abrangendo áreas rurais que estão sendo ocupadas com lavouras e pastagens. Só que muitas dessas áreas não têm nada de urbano.

O Código Tributário Nacional, em seu Artigo 31, estabelece os critérios pelos quais o imóvel pode ser considerado urbano. Tem que ter pelo menos três itens de uma lista de equipamentos e serviços públicos, como vias públicas, posteamento, iluminação pública, calçada, meio fio, rede de água e esgotos, escola pública e posto de saúde até 3 quilômetros de distância.

Essa confusão acontece em razão do critério adotado para a tributação dos imóveis nessas condições. O Código Tributário Nacional adotou o critério da localização. Ele diz que imóvel rural é aquele localizado fora da zona urbana do município. No entanto, para efeitos de tributação, a legislação agrária adotou o critério da destinação. Todo imóvel que for destinado à produção agrícola, avícola, pecuária etc. paga o ITR, independentemente de sua localização.

Para os casos dessa natureza, além de prevalecer a legislação agrária, a jurisprudência brasileira já consolidou esse entendimento. Portanto, o proprietário que tenha recebido a cobrança do IPTU deve pedir imediatamente o cancelamento desse imposto na prefeitura. Enquanto a propriedade for destinada à produção agrícola, o imposto devido é o ITR. Lembre-se: pagar dois impostos sobre o mesmo imóvel é bitributação, o que é ilegal.

FONTE: <http://www.nippo.com.br/campo/lei/lei438.php>. Acesso em: 17 mar. 2019.

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2.2 OS AGENTES PRODUTORES DO ESPAÇO URBANO

Além de entendermos quais são os critérios adotados para distinguir e caracterizar o espaço urbano, é necessário compreender quem são os agentes produtores do espaço urbano. Neste sentido, a contribuição de Roberto Lobato Corrêa é relevante. Em sua obra O espaço urbano, de 1989, considerada um clássico nos estudos da Geografia Urbana, o autor lança o questionamento: quem produz o espaço urbano? Para responder esta indagação, o autor criou uma tipologia de natureza analítica que identifica os principais agentes que formam o espaço urbano. Selecionamos um resumo desta obra acerca desta questão e o apresentamos a seguir.

Quem são estes agentes sociais que fazem e refazem a cidade?

a) Os proprietários dos meios de produção, sobretudo os grandes industriais. b) Os proprietários fundiários. c) Os promotores imobiliários. d) O Estado.e) Os grupos sociais excluídos.

Que estratégias e ações concretas desempenham no processo de fazer e refazer a cidade?

a) Os grandes proprietários industriais e as grandes empresas comerciais são, em razão da dimensão de suas atividades, grandes consumidores de espaço. Necessitam de terrenos amplos e baratos que satisfaçam requisitos locacionais pertinentes às atividades de suas empresas – junto a portos, a vias férreas ou em locais de ampla acessibilidade à população. Porém, as relações entre os proprietários dos meios de produção e a terra urbana são mais complexas. A especulação fundiária tem duplo efeito. De um lado onera os custos de expansão na medida em que esta pressupõe terrenos amplos e baratos. Do outro, o aumento do preço dos imóveis, resultante do aumento do preço da terra, atinge os salários da força de trabalho. É importante também considerar, que os conflitos entre proprietários industriais e fundiários não mais constituem algo absoluto como no passado. Isso se deve:

• ao desenvolvimento das contradições entre capital e trabalho, que torna perigosa a abolição de qualquer forma de propriedade, entre elas a da terra, pois isto poderia levar a que se demandasse a abolição da propriedade capitalista;

• através da ideologia da casa própria, que inclui a terra, pode-se minimizar as contradições entre capital e trabalho;

• à própria burguesia adquirir terras, de modo de que a propriedade fundiária passou a ter significado no processo de acumulação;

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• à propriedade da terra ser pré-requisito fundamental para a construção civil que, por sua vez, desempenha papel extremamente importante no capitalismo, amortecendo áreas de atividade industrial; e

• à propriedade fundiária e seu controle pela classe dominante terem ainda função de permitir o controle do espaço através da segregação residencial, cumprindo, portanto, significativo papel na organização do espaço.

Nas grandes cidades, onde a atividade fabril é expressiva, a ação espacial dos proprietários industriais leva à criação de amplas áreas fabris em setores distintos das áreas residenciais nobres, onde mora a elite, porém próximo às áreas proletárias. Deste modo, a ação deles modela a cidade, produzindo seu próprio espaço e interferindo decisivamente na localização de outros usos da terra.

b) Os proprietários de terras atuam no sentido de obterem a maior renda fundiária de suas propriedades, interessando-se em que estas tenham o uso mais remunerador possível, especialmente uso comercial ou residencial de status. Estão interessados no valor de troca da terra e não no seu valor de uso. Alguns dos proprietários fundiários, os mais poderosos, poderão até mesmo ter suas terras valorizadas através do investimento público em infraestrutura, especialmente viária.

A demanda de terras e habitações depende do aparecimento de novas camadas sociais, que tenham rendas capacitadas a participar do mercado de terras e habitações. Depende ainda da política que o Estado adota para permitir a reprodução do capital, como reforço do aparelho estatal pelo aumento do número de funcionários e através da ideologia da casa própria. Os diferenciais das formas que a ocupação urbana na periferia assume são, em relação ao uso residencial, o seguinte: urbanização de status e urbanização popular variando de acordo com a localidade da área.

Aquelas bem localizadas são valorizadas por amenidades físicas, como mar, lagoa, sol, verde etc.; e agem pressionando o Estado visando à instalação de infraestrutura. Tais investimentos valorizam a terra; e campanhas publicitárias exaltando as qualidades da área são realizadas ao mesmo tempo; consequentemente seu preço sobe.

Estas terras são destinadas à população de status. Como se trata de uma demanda solvável, é possível aos proprietários tornar-se também promotores imobiliários; loteiam, vendem e constroem casas de luxo. E com isso os bairros fisicamente periféricos não são mais percebidos como estando localizados na periferia urbana, pois afinal de contas bairros de status não são socialmente periféricos. Como exemplos, as cidades litorâneas como Rio de Janeiro, Salvador, Recife e Fortaleza, são frutos das valorizações fundiárias.

Naquelas mal localizadas e sem amenidades, serão realizados os loteamentos: as habitações serão construídas pelo sistema de autoconstrução

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ou pelo Estado, que aí implanta enormes e monótonos conjuntos habitacionais, que ocasionam vários distúrbios sociais.

c) Por promotores imobiliários, entende-se um conjunto de agentes que realizam, parcialmente ou totalmente, as seguintes operações: incorporação; financiamento; estudo técnico; construção ou produção física do imóvel; e comercialização ou transformação do capital-mercadoria em capital-dinheiro, agora acrescido de lucro.

Quais são as estratégias dos promotores imobiliários?

Produzir habitações com inovações, com valor de uso superior às antigas, obtendo-se, portanto, um preço de venda cada vez maior, o que amplia a exclusão das camadas populares.

É possível haver a produção de habitações para os grupos de baixa renda? Quando esta produção é rentável?

• é rentável se são super ocupadas por várias famílias ou por várias pessoas solteiras que alugam um cômodo;

• é rentável se a qualidade da construção for péssima, com seu custo reduzido ao mínimo;

• é rentável quando se verifica enorme escassez de habitações, elevando os preços a níveis insuportáveis.

A estratégia basicamente é a seguinte: dirigir-se, em primeiro lugar, à produção de residências para satisfazer a demanda solvável; e, depois, obtém-se ajuda do Estado no sentido de tornar solvável a produção de residências para satisfazer a demanda não solvável. Exemplos: BNH, COHABS, FGTS.

As estratégias dominantes, de construir habitações para a população que constitui a demanda solvável, tem um significativo rebatimento espacial. De fato, a ação dos promotores se faz correlacionada a: preço elevado da terra de alto status do bairro; acessibilidade, eficiência e segurança dos meios de transporte; amenidades naturais ou socialmente produzidas; e esgotamento dos terrenos para a construção e as condições físicas dos imóveis anteriormente produzidos.

A atuação espacial dos promotores se faz de modo desigual criando e reforçando a segregação residencial que caracteriza a cidade capitalista. E, na medida em que os outros setores do espaço produzem conjuntos habitacionais populares, a segregação é ratificada.

d) O Estado atua também na organização espacial da cidade. Sua atuação tem sido complexa e variável tanto no tempo como no espaço, refletindo a dinâmica da sociedade da qual é parte constituinte.

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O Estado dispõe de um conjunto de instrumentos que pode empregar em relação ao espaço urbano. São os seguintes:

• direito de desapropriação e precedência na compra de terras; • regulamentação do uso do solo; • controle de limitação dos preços das terras; • limitação da superfície da terra de que cada um pode se apropriar; • impostos fundiários e imobiliários que podem variar segundo a dimensão

do imóvel, uso da terra e localização; • taxação de terrenos livres, levando a uma utilização mais completa do espaço

urbano; • mobilização de reservas fundiárias públicas, afetando o preço da terra e

orientando; • espacialmente a ocupação do espaço; • investimento público na produção do espaço, através de obras de drenagem,

desmontes, aterros, e implantação de infraestrutura; • organização de mecanismos de créditos à habitação; e • pesquisas, operações testes como materiais e procedimento de construção,

bem como o controle de produção e do mercado deste material.

e) Os grupos sociais excluídos são aqueles que não possuem renda para pagar o aluguel de uma habitação digna e muito menos para comprar um imóvel. Este é um dos fatores, que ao lado do desemprego, doenças, subnutrição, delineiam a situação social dos grupos excluídos. A estas pessoas restam como moradia: cortiços, sistemas de autoconstrução, conjuntos habitacionais fornecidos pelo agente estatal e as degradantes favelas.

As três primeiras possibilidades habitacionais pressupõem uma vinculação a um agente sem, no entanto, ocasionar transformação da camada populacional excluída em agente modelador do espaço urbano. É na produção da favela, em terrenos públicos e privados que os grupos sociais excluídos se tornam, efetivamente, agentes modeladores. A ocupação destes terrenos que dão ensejo à criação das favelas é uma forma de resistência à segregação social e sobrevivência ante a absoluta falta de outros meios habitacionais. Aparentemente desprovida de qualquer elaboração espacial, as favelas acrescentam uma lógica que inclui a proximidade a mercados de trabalho.

Outro fenômeno observado é a progressiva urbanização da favela, até se tornar um bairro popular. Isto se explica pela ação dos moradores que pretendem a melhoria das condições de vida, conjuntamente com o Estado que, por motivos diversos, destina recursos à urbanização das favelas.

No processo de produção concreta de um bairro residencial ou de um distrito industrial, vários agentes estão presentes. Como exemplo, o bairro de Copacabana. Desde a década de 1870, são verificadas tentativas de valorização fundiária da área, entretanto de início malsucedidas. A partir de 1892, iniciou-se

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a valorização do local resultante de uma aliança de interesses comuns, firmada entre proprietários fundiários, promotores imobiliários, bancos e empresas industriais e comerciais. O Estado fazia-se presente pelos interesses comuns no poder. O capital fundiário imobiliário, associado a outros capitais, estava, entretanto, interessado apenas em produzir habitações para a população de status elevados, produzindo mesmo residências de veraneio e novos espaços. Do exposto dessume-se de que a partir de fins do século XIX, a cidade tornou-se objeto de lucro. Assim como em Copacabana, de modo semelhante, repetiu-se o fenômeno na Barra da Tijuca.

FONTE: <http://reverbe.net/cidades/wp-content/uploads/2011/08/Oespaco-urbano.pdf>. Acesso em: 9 mar. 2019.

Considerando o período que se estende de 1989 até a década de 2010, vários avanços surgiram no campo de estudo do espaço urbano e da atuação dos agentes na transformação das cidades. Furini (2014) sintetizou de modo didático como os agentes urbanos podem ser agrupados, tendo em vista seu campo de atuação, observe.

QUADRO 2 – CLASSIFICAÇÃO DOS AGENTES URBANOS CONFORME OS CAMPOS DE AÇÃO

FONTE: Adaptado de Furini (2014)

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Com base na proposta de classificação de Furini (2014), vamos pensar em alguns possíveis exemplos de atores? Como exemplo de agente que ajuda a produzir o espaço urbano em uma escala interurbana, poderíamos mencionar o presidente de um conselho estadual de turismo. Um agente individual que interfere no espaço urbano poderia ser uma pessoa física que se dirige até a sede da prefeitura municipal buscando orientações sobre quais regras seguir, no que diz respeito às obrigações de manutenção da calçada em frente à sua casa. Como agente privado, podemos mencionar uma construtora que “adota” e ajuda a manter e a cuidar da pracinha situada em frente ao local onde o edifício da referida construtora foi construído. Exemplo de agente urbano ativo seria o vereador que, na ocasião de realização da sessão da câmara, traz à tona as preocupações dos residentes de uma determinada rua que estão lidando com a ocupação indevida e desorganizada de um prédio situado no bairro. Já, um agente casual poderia ser um sujeito que está interessado em organizar uma maratona no centro da cidade para celebrar o aniversário do município, ou seja, irá realizar uma atividade pontual. Por sua vez, um dos agentes produtores do espaço urbano classificado como direto, seria o prefeito do município, enquanto que os representantes dos movimentos sociais, poderiam ser vistos como agentes subjetivos. Por fim, um exemplo de possível agente urbano regulamentado seriam os técnicos e especialistas do setor de planejamento urbano.

Esses exemplos nos ajudam a refletir sobre a diversidade de atores que atuam no espaço urbano. Lembre-se que dependendo do tipo de análise ou do tipo de direcionamento de uma pesquisa, poderão ser ponderados e selecionados determinados agentes em detrimento de outros. Neste momento, interessa ressaltar que é ampla a gama de atores envolvidos no processo de produção e consumo do espaço urbano.

2.3 O QUE É URBANIZAÇÃO?

A história da urbanização está atrelada à história das cidades. Em termos históricos, Uruk é considerada a cidade mais antiga, tendo sido erguida na região da Mesopotâmia, por volta de 4.500 a.C. Posteriormente, a cidade de Ur foi erguida por volta de 3.800 a.C. e é considerada emblemática na história das cidades. Ambas estavam situadas nas proximidades das margens do Rio Eufrates. Para os sumérios, no entanto, a primeira cidade foi Eridu, que foi fundada em 5.400 a.C., mas, provavelmente, não era uma “cidade” da mesma forma que Uruk ou Ur seria definida, considerando que as formas de organização deste espaço eram menos sofisticadas (MARK, 2014).

No ano de 2.600 a.C., Ur era uma metrópole próspera e, em 2.900 a.C., era uma cidade murada com uma população de aproximadamente 65.000 habitantes. A urbanização continuou à medida que a cidade se expandia a partir do centro e, com o tempo, os campos outrora férteis que alimentavam a população estavam esgotados. O uso excessivo da terra, combinado com uma misteriosa mudança no

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rio Eufrates, que tirou as águas da cidade, resultou no complexo sendo finalmente abandonado por volta de 500 a.C. Eridu, talvez, por razões semelhantes, foi abandonado em 600 a.C. e Uruk em 650 a.C. (MARK, 2014). Verifica-se assim que o surgimento das cidades está relacionado com às possibilidades de sobrevivência humana propiciada pela produção de excedentes alimentares.

No centro de Ur, como em todas as cidades da antiga Mesopotâmia, estava o grande templo que era o local das funções cerimoniais, comerciais e sociais. As atividades religiosas, como os festivais, eram as principais reuniões sociais da época e essas ocasiões eram frequentemente usadas para distribuir alimentos e suprimentos excedentes para a população da cidade. Os sacerdotes do templo, que também eram os governantes da cidade a partir de 3.400 a.C., eram responsáveis por essa distribuição e dependiam fortemente dos agricultores da região para fornecer o excedente de que precisavam. Esse excesso de produção do campo não apenas supria a população da cidade com alimentos, mas também aumentava o comércio de longa distância com outras cidades ao longo do Eufrates, como Tikrit e Eridu. Como a urbanização continuou, no entanto, a necessidade de mais e mais matérias-primas esgotou os recursos naturais da região e, eventualmente, levou à falta de recursos necessários e ao abandono da cidade (MARK, 2014).

A urbanização se espalhou da Mesopotâmia para o Egito e de lá para a Grécia. No Egito, grande cuidado foi tomado para que o uso excessivo da terra não levasse ao esgotamento dos recursos. O foco das chamadas grandes cidades do Faraó estava em aspectos culturais como o desenvolvimento da escrita, arquitetura, leis, administração, além dos cuidados com o saneamento e estímulo ao comércio e à produção de artesanato. No Egito, o padrão de urbanização observado foi o disperso, caracterizada por assentamentos urbanos menores e mais especializados (MARK, 2014).

Em termos gerais, é possível afirmar que as cidades surgem a partir da necessidade de organização de um dado espaço no sentido de integrá-lo, e aumentar sua independência visando determinado fim, merecendo destaque a ideia de sobrevivência do grupo (SILVA JÚNIOR; ALMEIDA; VERAS, 2017).

Saltando desta fase inicial da história na qual surgiram as primeiras cidades, entre os séculos IV a XI, ocorre o desenvolvimento do feudalismo, pautado em uma nova estrutura de classes sociais e em um cenário no qual a terra passa a ser considerada sinônimo de riqueza. Nesta fase da história, a população passou a viver direta ou indiretamente da produção agrícola e surgiram cidades nos cruzamentos de estradas e nas embocaduras dos rios. Sob o prisma da urbanização, esta fase se caracteriza mais pela proliferação do que pelo aumento do tamanho das cidades. Ademais, as Cruzadas ocorrem por volta do século XI, ampliando o alcance e as diversificações dos produtos do comércio (SILVA JÚNIOR; ALMEIDA; VERAS, 2017).

Contudo, é com o advento do capitalismo e com as transformações decorrentes da Revolução Industrial que o fenômeno da urbanização e da

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expansão das cidades se intensifica. Carlos (2009) explica que a origem da cidade está atrelada à existência de uma ou mais funções urbanas, tais como: industrial, cultural, comercial, administrativa ou política que variam conforme suas condições históricas e suas diferenciações espaciais. Carlos (2009) pontua que a existência da cidade estaria vinculada à, pelo menos, seis elementos: divisão do trabalho; divisão da sociedade em classes; acumulação tecnológica; produção do excedente agrícola decorrente da evolução tecnológica; sistema de comunicação; e certa concentração espacial das atividades não agrícolas.

Assim, com o aumento das cidades, ocorre também o avanço dos estudos relacionados a este processo de transformação social e espacial e interessados em compreender o fenômeno da urbanização.

Pensar em urbanização nos remete a pensar no aumento das áreas urbanas e nas implicações espaciais deste processo.

Para Strohaecker (2017, p. 426):

a urbanização pode ser compreendida como um processo que se refere tanto à espacialização dos artefatos geográficos em suas diferentes configurações (abordagem físico-demográfica) bem como às mudanças nas relações comportamentais e sociais que ocorrem na sociedade, como resultado das inovações tecnológicas.

Envolve o estudo dos problemas e desafios envoltos neste processo de expansão das cidades. Estes aspectos atrelados à urbanização serão discutidos ao longo desta disciplina. Iniciaremos este debate, examinando os principais sentidos e usos atribuídos a este termo no campo da geografia. Para tanto, apresentamos as reflexões feitas por Sposito (2017b) a respeito do tema. Acompanhe:

Urbanização: um dos termos mais diversamente utilizados nas análises produzidas sobre o fato urbano é urbanização. A multiplicidade de acepções com as quais ele vem sendo empregado é consequência, de um lado, da variedade de profissionais que lidam com a problemática em pauta, cada um deles, recebendo uma formação diferente e dando realce a um aspecto desse processo multifacetado. De outro lado, lembramos que essa expressão já foi apropriada pela sociedade, no nível do senso comum, o que acaba esvaziando, muitas vezes, o seu conteúdo conceitual. Além disso, mesmo no âmbito científico, a compreensão de um conceito só é possível no escopo de uma teoria e, como há várias teorias para explicar a urbanização, o que se tem é uma multiplicação de sentidos. Para os profissionais do campo da engenharia, urbanização significa implantação de infraestruturas em espaços urbanos, como sistemas viários, redes de fornecimento ou captação, área de lazer etc. Muito frequentemente, para tais profissionais, todas as ações que envolvem a transformação material de espaços não urbanos em espaços urbanos são reconhecidas como urbanização.

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Para os que se dedicam à compreensão de dinâmicas demográficas, o sentido atribuído a esses termos tem sido o do aumento relativo das populações que vivem em cidades, havendo, então, a associação do conceito de urbanização à proporção de distribuição da população entre o campo e a cidade. Arquitetos e urbanistas abordam a urbanização de forma bastante associada ao urbanismo e, em função dessa identificação, prevalece a análise das configurações espaciais e dos conjuntos arquitetônicos que compõem os espaços urbanos, priorizando-se a abordagem das formas urbanas e das funções que se realizam em cada parcela dos territórios urbanos. Mesmo reconhecendo a identidade ou a indistinção que essas profissionais estabelecem entre os dois termos, é preciso observar, como destacou Choay (1965, p. 8), que urbanismo é um termo pesado e ambíguo, surgido em 1910, segundo Bardet (1959), e que tem muitos significados desde aqueles referentes aos trabalhos de engenharia civil, designando também os planos urbanos ou as formas urbanas características de cada época. Slater (1988, p.96), por exemplo, ressalta que, na bibliografia sobre o desenvolvimento urbano da América Latina, o termo urbanização “se encontra reduzido a uma consideração da estrutura social urbana, ou até mesmo, limitado a um estudo sobre a questão da habitação”.

Embora as visões apresentadas de forma sucinta possam ser identificadas com diferentes formações profissionais ou diferentes realidades urbanas, não se pode estabelecer generalizações ou se afirmar que essas acepções sejam utilizadas ou expressas pela totalidade dos profissionais que cada uma das áreas de formação citadas, ou que possam ser aceitas como consensuais para se aplicar a quaisquer realidades urbanas [...].

Há geógrafos que adotam, por exemplo, a visão demográfica do termo. Laborde (1994, p. 5), ao iniciar a abordagem da “dinâmica da urbanização”, apoia-se nos dados referentes ao aumento da população urbana no conjunto total da população, ainda que destaque, nas páginas seguintes, fatos, causas e consequências dessa dinâmica, ampliando o escopo inicial da análise. Embora utilize informações relativas aos parâmetros demográficos e políticos-administrativos considerados para se definir o que é cidade, Beaujeu-Garnier (1980, p. 24) é bastante ampla em seu enfoque:

urbanização é o movimento de desenvolvimento das cidades, simultaneamente em número e tamanho, isto é, o desenvolvimento numérico e espacial das cidades; ocupa-se de tudo que esta ligado à progressão direta do fenômeno urbano e transforma, pouco a pouco, as cidades ou os arredores e, frequentemente, umas e outros.

O esforço de se apresentar uma “definição” de cidade, como no dicionário organizado por Johnston (1994, p. 651, tradução nossa), também revela a pluralidade de acepções com as quais o termo vem sendo utilizado:

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TÓPICO 1 | ASPECTOS INTRODUTÓRIOS DA GEOGRAFIA URBANA

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se a urbanização for encarada apenas como um fenômeno demográfico, os lugares urbanos são aqueles nos quais os limiares de excesso da população e/ou densidade são frequentemente utilizados em definições dos censos dos lugares urbanos. Contudo, se a urbanização também for considerada tanto como processo estrutural ou processo de comportamento, então os lugares urbanos são aqueles com população acima de um certo tamanho ou densidade, contendo funções econômicas particulares na divisão espacial do trabalho, e com seus próprios estilos particulares de vida.

[...] Embora de formas diferentes, as perspectivas apresentadas até aqui incorporam às conceituações apresentadas para a urbanização a abordagem da dimensão espacial, ainda que, em nem todas elas, a dimensão temporal tenha sido privilegiada. A urbanização é um processo e, como tal, deve ser lida como movimento espaço espaço-temporal. Sposito (1992) ressaltou a importância de se realizar um esforço no sentido de buscar a unicidade tempo-espaço e de superar a tradição positivista de legar a análise do tempo à História e a análise do espaço à Geografia. [...]

Em função do exposto, para a compreensão da urbanização, enfocar as articulações entre o espaço e tempo exige que se enfrente o desafio de analisar as relações entre diferentes ritmos temporais, entre diferentes escalas e supõe o reconhecimento de rupturas temporais e descontinuidades espaciais. Tomando essa perspectiva, a urbanização é um processo de longa duração, que se inicia com o aparecimento das primeiras cidades e que se revela a partir de diferentes modos de produção, sob diversas formas. Em seu bojo podem ser reconhecidos fatos, dinâmicas e formas de intervenção que, estudados por diferentes profissionais, como nos exemplos já dados, devem ser entendidos e/ou planejados no contexto do processo maior. Essa abordagem teórica pressupõe a aceitação de que a urbanização expressa e ampara a existência de uma divisão social do trabalho entre o campo e a cidade, ela mesma divisão territorial, pois:

A urbanização contém/expressa a ideia de processo, remete, necessariamente, à análise da origem da evolução histórica das cidades, em relação ao nível de desenvolvimento das forças produtivas, ao estágio da divisão social e territorial do trabalho, às transformações de ordem política e social, às manifestações de caráter cultural e estético, às revoluções e contrarrevoluções ideológicas e do conhecimento, à Filosofia e à especulação, à Ciência e ao quadro do cotidiano, como já destacou Lefebvre em sua obra (SPOSITO, 1992).

FONTE: SPOSITO, M. E. Urbanização. In: SPOSITO, E. S. (Org.). Glossário de geografia humana e econômica. São Paulo: Editora Unesp, 2017, p. 469.

Como podemos observar, parte relevante do debate conceitual sobre urbanização se aproxima da complexidade que envolve a conceituação de urbano, vista anteriormente. Feitos estes esclarecimentos de natureza teórica, que visam situar você, acadêmico, sobre o ponto do qual partem as análises que serão feitas

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UNIDADE 1 | A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS

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ao longo da disciplina, no próximo tópico, vamos analisar, especificamente, as questões urbanas vinculadas à realidade brasileira. Todavia, antes de finalizar este tópico, deixamos uma sugestão de plano de aula para trabalhar estes conteúdos em sala.

DICA DE PLANO DE AULA

O que é espaço?Elaborado pelo professor Luiz Carlos Parejo

Direcionado para aulas do ensino médio

Objetivos O aluno deverá:

1) Compreender a organização do espaço e a sua construção.2) Perceber que existem diferentes percepções acerca do que é espaço nas

diferentes áreas do conhecimento. A Geografia se preocupa com o espaço produzido a partir das relações da sociedade com a natureza e das relações sociais em si.

3) Compreender que as relações econômicas, sociais, políticas, culturais etc. se materializam na forma de casas, prédios, ruas, rede urbana, equipamentos, sistemas de transportes, sistemas de produção agrícola etc. Esses objetos técnicos se fixam no espaço e permanecem por um certo tempo, convivendo com objetos de períodos mais recentes.

4) Perceber que equipamentos urbanos (objetos técnicos) mais antigos e novos formam o espaço atual, sendo que os antigos, muitas vezes, apresentam novos usos. Como exemplo temos o uso atual dos antigos casarios coloniais e do período cafeeiro ou da cana-de-açúcar por redes de fast-food e bancos, pontes que eram utilizadas para a passagem de animais e agora são usadas para passagem de automóveis.

5) Compreender que as análises e os estudos geográficos do espaço se realizam em uma perspectiva dialética de tempo e espaço e que o antigo e o novo interagem no processo de mudança, percebendo que esta herança espacial ajuda a entender a organização do espaço. Por exemplo, as cidades maiores de hoje, junto às linhas ferroviárias, correspondem a antigos entroncamentos ferroviários.

6) Compreender, a partir das abordagens anteriores, que o espaço é uma acumulação desigual de tempos e que se a lógica que o criou mudar, partes dele podem se transformar em um obstáculo e devem ser substituídos por novos objetos ou reaproveitados a partir de uma nova lógica.

Estratégias 1) Identificar, em um lugar da cidade: a rua da escola, a rua mais antiga, no

bairro mais importante, no centro comercial etc. a arquitetura das edificações. Os alunos deverão fotografar estes imóveis e organizar as fotos a partir da idade deles (eles devem organizar as fotos de forma intuitiva, a partir da sua visão de mundo).

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TÓPICO 1 | ASPECTOS INTRODUTÓRIOS DA GEOGRAFIA URBANA

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2) Escolher alguns imóveis e pedir para que os alunos descubram, através de pesquisas e entrevistas:

a) Quando cada edificação foi construída?b) Como eram usadas no início (residência, comércio, indústria etc.)? c) Qual é o uso atual? d) O que foi modificado do projeto inicial?e) O imóvel tem um valor de mercado elevado ou baixo?3) Pesquisar sobre o crescimento da mancha urbana da cidade (evolução) e/ou

das modificações na área rural (rodovias, ferrovias, sistemas de irrigação, tamanho das propriedades etc.).

4) Localizar, em um mapa ou planta, a área pesquisada, indicando os itens e colocando legenda com informações auxiliares e explicativas.

5) A partir da análise empírica, apresentar os conceitos de: acumulação desigual de tempos, rugosidades (marcas do passado no espaço), relação sociedade-natureza, organização do espaço etc.

6) A partir de filmes e/ou documentários e de um roteiro, apresentar as diferentes paisagens que formam a área pesquisada.

Correlacionar com os conceitos e avaliar como as s heranças "ajudaram" ou "atrapalharam" o desenvolvimento do lugar (a presença ou a falta de rodovias, ferrovias, aeroportos ou hidrovias, por exemplo).

Conclusão da atividadeConvidar moradores antigos para comparar o lugar, como era e

como é hoje. Convidar um representante da associação de bairro, um político ou um representante de uma ONG para um debate acerca dos problemas e potencialidades do lugar. Montar um painel sobre alguns lugares, como eram antes e como são hoje. Podemos usar como exemplo os engenhos de cana no Nordeste, as cidades cafeeiras do Centro Sul, a capital de São Paulo, o Rio de Janeiro etc. ou comparar as capitais Salvador (no ciclo da cana), Rio de Janeiro (ciclo do ouro até 1960) e Brasília (a partir da sua construção). Observar que as mudanças em Brasília foram muito pequenas.

Conceitos Espaço, construção do espaço, acumulação desigual de tempos,

rugosidade, relação sociedade-natureza.

Habilidades e Competências Ler, observar, analisar, interpretar, compreender, selecionar e elaborar

sistemas de investigação, reconhecer na aparência das formas visíveis e concretas do espaço geográfico atual os processos históricos construídos em diferentes tempos, descrever, localizar, pesquisar, sintetizar, questionar.

FONTE: <https://educacao.uol.com.br/planos-de-aula/fundamental/geografia-o-que-e-espaco.htm>. Acesso em: 17 mar. 2019.

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Neste tópico, você aprendeu que:

• O estudo das cidades é um elemento central de diversas ciências sociais, incluindo a geografia, que oferece em seu aparato metodológico recursos específicos para analisar condição urbana.

• Outro aspecto que é estudado na Geografia Urbana é a localização da cidade e sua importância em relação a diferentes regiões e cidades. Aspectos econômicos, políticos e sociais dentro das cidades também são importantes neste estudo.

• A Geografia Urbana procura, ainda, explicar a distribuição das cidades e as semelhanças e contrastes socioespaciais que existem entre e dentro delas.

• Embora cada cidade tenha um caráter individual e particular, os locais urbanos também exibem características comuns que variam apenas em grau de incidência ou importância dentro de cada tecido urbano específico.

• Muitas características e preocupações comuns são compartilhadas pelos lugares urbanos, tais como questões de mobilidade, congestionamentos, violência urbana e ocupação de áreas irregulares.

• A suburbanização é um processo relacionado com o desenvolvimento de subúrbios em torno das grandes cidades e áreas metropolitanas.

• Outro elemento importante sobre o estudo inerente ao campo da Geografia Urbana é a compreensão de que as categorias espaço e tempo jamais devem estar dissociadas.

• Apesar de tradicionalmente estabelecidas como modos de qualificar as sociedades e o espaço, as categorias rural e urbano estão sujeitas às transformações que vêm sendo operadas no decorrer do tempo.

• Diferentes critérios podem ser adotados para qualificar um local como urbano e os mesmos, variam entre os diferentes países.

• O conceito de morfologia urbana, compreendendo o estudo da forma urbana, deveria se voltar à análise da extensão urbana.

• Segundo Correa (1989), os principais agentes sociais que fazem e refazem a cidade são: os proprietários dos meios de produção, sobretudo os grandes industriais; os proprietários fundiários; os promotores imobiliários; o Estado; e os grupos sociais excluídos.

• Existem várias discussões conceituais de urbanização, no campo da geografia, a ênfase recai na leitura e compreensão da dimensão espaço temporal do referido processo.

RESUMO DO TÓPICO 1

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1 (ENADE, 2014) Os agentes sociais produtores do espaço urbano são aqueles que “fazem e refazem a cidade”: (I) os proprietários dos meios de produção (especialmente os industriais), (II) os proprietários fundiários, (III) os promotores imobiliários, (IV) o Estado e (V) os grupos sociais excluídos (CORREA, 1995).

Sobre esse assunto, é importante dizer que há relação de conflito entre os agentes assinalados com I, II, III e IV, e os agentes assinalados com V, dadas as suas posições divergentes no sistema econômico capitalista, o que se reflete nas cidades.

Considerando a realidade urbana brasileira, pode se afirmar que o conflito se faz em razão de que, enquanto o primeiro grupo de agentes atua direta ou indiretamente no sentido da reprodução capitalista do espaço, os grupos sociais excluídos:

FONTE: <http://portal.inep.gov.br/provas-e-gabaritos3>. Acesso em: 29 jul. 2019.

a) ( ) Determinam o processo produtivo do espaço urbano.b) ( ) Atuam no sentido da reprodução da força de trabalho e se incluem na

cidade, de acordo com o valor que sua renda pode pagar.c) ( ) Ocupam espaços ociosos deixados pelos agentes do primeiro grupo e

atuam no sentido da especulação imobiliária.d) ( ) Promovem ao espaço urbano um caráter segregatório, pois, em função

da sua baixa renda, ocupam a periferia das cidades.e) ( ) Lutam pelos mesmos interesses do primeiro grupo, dado o contexto da

ideologia capitalista

2 (UNISC, 2014) A Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, que acontecerão no Brasil, deram início a uma série de projetos de revitalização direcionados a determinadas zonas urbanas em cidades como Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP), Porto Alegre (RS), Belo Horizonte (MG) e Manaus (AM). Um dos possíveis efeitos disto diz respeito ao enobrecimento dessas zonas por meio da especulação imobiliária que ocasionará, em muitos casos, a valorização de terrenos, casas e apartamentos. Consequentemente, poderá haver uma transformação, pautada em condições econômicas, no perfil das pessoas que passarão a viver e a consumir serviços em tais áreas.

Qual alternativa apresenta o nome deste processo?

FONTE: <https://geovest.files.wordpress.com/2016/03/questc3b5es-sobre-gentrificac3a7c3a3o.pdf>. Acesso em: 29 jul. 2019.

AUTOATIVIDADE

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a) ( ) Conurbação.b) ( ) Macrocefalia urbana.c) ( ) Gentrificação. d) ( ) Verticalização. e) ( ) Urbanização.

3 Para classificar determinado espaço como rural ou urbano é possível recorrer a diferentes critérios, entre os quais, os chamados critérios administrativos. Sobre os mesmos, assinale a alternativa INCORRETA:

a) ( ) A maioria das cidades e vilas do mundo é definida de acordo com critérios legais ou administrativos.

b) ( ) A definição de lugares urbanos por governos nacionais leva a uma grande diversidade de situações.

c) ( ) Como os lugares urbanos são geralmente maiores do que os locais rurais este é o padrão internacional utilizado para classificar os espaços.

d) ( ) A diversidade de classificações dos espaços cria dificuldades para a pesquisa comparativa dos analistas urbanos.

4 O advento do capitalismo é dos fenômenos que nos ajudam o compreender o aumento das cidades e a intensificação da urbanização. Com relação ao surgimento das cidades, vimos que a existência das cidades estaria relacionada com a presença de seis elementos. Disserte sobre três deles.

5 O espaço geográfico encontra-se permeado por diversos atores sociais que exercem poder e força. Por esta razão, o espaço geográfico encontra-se em constante processo de redefinição. A respeito dos agentes urbanos, verifica-se que os mesmos podem ser classificados de distintas maneiras, dependendo do seu campo de atuação. Com relação às possíveis formas de classificação dos agentes urbanos, assinale a alternativa INCORRETA:

a) ( ) Intencional.b) ( ) Objetivo.c) ( ) Individual.d) ( ) Indesejado.

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TÓPICO 2

O ESTUDO DA GEOGRAFIA URBANA NO

BRASIL

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

No Tópico 1, desta unidade, analisamos como se constitui o campo de estudos da Geografia Urbana, quais são os agentes produtores do espaço urbano e entendemos o que é urbanização. Neste tópico, a intenção é averiguar os principais avanços realizados no estudo da Geografia Urbana no Brasil.

Os estudos da Geografia Urbana contemplam as análises das redes geográficas, que se caracterizam pelos sofisticados fluxos de bens, serviços, capitais, pessoas e informações. O objetivo deste tópico é, inicialmente, discutir conceitualmente a ideia de rede urbana, identificando o conjunto de elementos que a formam. Além disso, outro conceito que será trabalhado é o de hierarquia urbana, que visa classificar as cidades com base em critérios específicos. Além disso, vamos conhecer o chamado estudo das Regiões de Influência – REGIC. Venha conosco!

2 REDE URBANA E FUNÇÕES URBANAS

No âmbito dos estudos sobre a Geografia Urbana, conceitos como rede urbana, funções e classificação das cidades lançam luz sobre a leitura dos processos que transformam as cidades. Santos (1996) apud Sposito (2017b, p. 357) diz: “faz referência a polissemia do vocábulo rede, advertindo para as imprecisões e ambiguidades que podem decorrer desse fato.” Sendo assim, retomamos o entendimento (com base nas discussões realizadas na disciplina de Geografia do Brasil) de que, ao utilizarmos o conceito de redes, precisamos deixar evidente de qual base teórica está se partindo. No caso da Geografia Urbana, no plano nacional, é expressiva a contribuição de Roberto Lobato Corrêa, tendo como referência, seu livro intitulado A rede urbana, de 1989.

Começaremos nosso estudo sobre a rede urbana brasileira apresentando os aspectos centrais trabalhados por Corrêa (1989) em sua obra.

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UNIDADE 1 | A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS

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No bojo do processo de urbanização a rede urbana passou a ser o meio através do qual produção, circulação e consumo se realizam efetivamente. Via rede urbana e a crescente rede de comunicações a ela vinculada, distantes regiões puderam ser articuladas, estabelecendo-se uma economia mundial (CORRÊA, 1989, p. 5).

Por este motivo, considerando a relevância do conceito de rede urbana, os estudos nesta área vêm avançando tanto no plano teórico como no âmbito de operacionalização do conceito.

A seguir, é exposto o conceito de rede urbana trabalhando por Corrêa (1989, p. 6, grifo nosso):

IMPORTANTE

O que é rede urbana?

Admitimos a existência de uma rede urbana quando, ao menos, são satisfeitas as seguintes condições. Primeiramente haver uma economia de mercado com uma produção que é negociada por outra que não é produzida local ou regionalmente. Esta condição tem como pressuposto um grau mínimo de divisão territorial do trabalho. Em segundo lugar verificar-se a existência de pontos fixos nos territórios onde os negócios acima referidos são realizados, ainda que com certa periodicidade e não de modo contínuo. Tais pontos tendem a concentrar outras atividades vinculadas a esses negócios, inclusive aquelas de controle político-administrativo e ideológico, transformando-se assim em núcleos de povoamento dotados, mas não exclusivamente, de atividades diferentes daquelas da produção agropecuária e do extrativismo vegetal: comércio, serviços e atividades de produção industrial.

A terceira condição refere-se ao fato da existência de um mínimo de articulação entre os núcleos anteriormente referidos, articulação que se verifica no âmbito da circulação, etapa necessária para que produção exportada e importada se realiza plenamente, atingindo os mercados consumidores.

A articulação resultante da circulação vai dar origem e reforçar uma diferenciação entre núcleos urbanos no que se refere ao volume e tipos de produtos comercializados, às atividades político-administrativas, à importância como pontos focais em relação ao território exterior a eles, e ao tamanho demográfico. Esta diferenciação traduz-se em uma hierarquia entre os núcleos urbanos e em especializações funcionais [...].

Em síntese, Corrêa (1989) defende a ideia de que a rede urbana abarca um conjunto de centros funcionalmente articulados. Observe que a definição de rede urbana proposta por Corrêa (1989) está vinculada ao momento histórico em que ela foi concebida. O modo como o autor procura compreender os processos de produção, circulação e consumo foi adequado para aquele momento histórico. Sabemos que hoje, em face ao fenômeno da globalização e internacionalização da economia, o modo como se engendram espacialmente estes fluxos de

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TÓPICO 2 | O ESTUDO DA GEOGRAFIA URBANA NO BRASIL

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produção, circulação e consumo se alterou. Exemplo simples de tal situação, no caso brasileiro, é que diversas cidades — pequenas, médias e grandes — que contam com redes de supermercados, algumas inclusive pertencentes a redes internacionais, como é o caso da Walmart, que ofertam produtos advindos de vários cantos do mundo. Contudo, note que alguns elementos adotados como condutores da análise de Côrrea permanecem adequados para o estudo das redes urbanas na atualidade, tais como a ideia de articulação, diferenciação e hierarquia, conforme estudaremos adiante.

Seguindo com as ideias propostas por Corrêa (1989) acerca das Redes Urbanas, o autor pontua que é a partir de 1955 que se verifica uma grande difusão dos estudos de redes urbanas. Corrêa (1989) identifica as principais abordagens adotadas nos estudos das Redes Urbanas. As mesmas foram sintetizadas e expostas no quadro a seguir:

QUADRO 3 – DIFERENTES ABORDAGENS DOS ESTUDOS SOBRE REDE URBANA, SEGUNDO CORRÊA (1989)

DiferentesabordagensdeEstudosdasRedesUrbanas

Classificaçõesfuncionais

Entende que as cidades possuem diferenças no que se refere às suas funções e tais estudos enfatizam as diferenças que as cidades apresentam para compreender sua organização espacial, analisando a divisão territorial do trabalho no âmbito da rede urbana.

Dimensõesbásicasdevariação

Busca observar e comparar as características que variam entre cidades segundo as funções que desempenham. Adota técnicas descritiva que abrangem variáveis como ritmo de crescimento da população, a estrutura etária, a escolaridade, a proporção de homens e mulheres na população ativa, as taxas de desemprego e a renda per capita. Desta abordagem é criticado o fato de que grande número de variáveis é determinado sem nenhuma base teórica explícita.

Tamanho e desenvolvimento

Considera toda a rede urbana de um país, estabelecendo relações entre o tamanho das cidades de uma rede urbana e certos aspectos da vida econômica e social, tais como o seu desenvolvimento, sua difusão espacial, sua influência cultural, e sua capacidade de integração nacional. Apoia-se na ideia de que é através das cidades que as ligações com o mercado interno e as relações externas se estabelecem e se realizam.

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UNIDADE 1 | A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS

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Hierarquia Urbana

Procura compreender a natureza da rede urbana segundo a hierarquia de seus centros. Usualmente, esses estudos derivam de questionamentos acerca do número, tamanho e distribuição das cidades na rede urbana do país. A teoria das localidades centrais, de Walter Christaller (1933) constitui-se em relevante base teórica sobre a questão da hierarquia urbana.

Relaçõesentrecidadeseregiões

Trata da relação cidade-campo sob uma perspectiva geográfica considerando as relações entre uma grande cidade e sua hinterlândia constituída por centros urbanos menores e áreas rurais.

FONTE: adaptado de Corrêa (1989), Silva e Macêdo (2009) e Ferreira (2017)

Para Corrêa (1989, p. 70) “a rede urbana pode ser considerada como uma forma espacial através da qual as funções urbanas se realizam”. Por sua vez, as funções urbanas referem-se a atividades que são tipicamente realizadas na cidade, tais como função comercial, financeira, educacional, industrial entre outras.

DICAS

Para compreender o conceito de rede urbana de modo mais prático, assista ao vídeo disponível no link a seguir a respeito do processo de desconcentração industrial no estado de São Paulo, iniciado na década de 1970. O vídeo revela que este processo alterou profundamente seu mapa e território: a mancha metropolitana da capital se expandiu em direção ao Vale do Paraíba, Sorocaba e às regiões de Campinas e Ribeirão Preto, conglomerados urbanos especializados se formaram ao longo de uma densa malha rodoviária e as cidades médias assumiram a liderança do mercado em seu entorno.

• https://www.youtube.com/watch?v=CU7c7cDW_Qg.

2.1 HIERARQUIA URBANA E CLASSIFICAÇÃO DAS CIDADES

No Brasil, quando se trata do estudo dos espaços urbanos, uma preocupação recorrente dos pesquisadores consiste em classificar hierarquicamente as cidades procurando identificar e interpretar o significado das similaridades e das diferenças socioespaciais. Lembre-se que reconhecer um determinado padrão hierárquico não implica em desconsiderar as outras possibilidades teóricas e metodológicas de se estudar o modo como as cidades estabelecem relações inter e intra urbanas. Como vimos anteriormente, Corrêa (1989) contribui com os estudos pioneiros da rede urbana no Brasil.

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TÓPICO 2 | O ESTUDO DA GEOGRAFIA URBANA NO BRASIL

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No Brasil, uma forma de hierarquizar e classificar a rede urbana que vem sendo utilizado na prática, é o chamado estudo das regiões de influência. A respeito da hierarquização das cidades, Sposito (2017b, p. 364) comenta que:

Quando se analisam as redes urbanas do tipo hierárquico, verifica-se que elas se estruturam segundo polos (cidades) e suas áreas de influência, havendo relação direta entre a cidade no âmbito da rede, o tamanho da área que ela comanda, e consequentemente, a distância em que se encontra de outros polos urbanos e áreas rurais que estão na área de polorização.

Os estudos da rede urbana procuram analisar o comportamento da mesma em face às relações de subordinação, influência e complementaridade existentes entre elas. Neste sentido, o REGIC (Regiões de Influência das Cidades) é uma publicação organizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) que tem como objetivo estudar a hierarquia da rede urbana brasileira, com base nos fluxos de informações, bens e serviços. Para a organização e análise deste estudo, segundo o IBGE (2008, p. 8):

buscou-se definir a hierarquia dos centros urbanos e delimitar as regiões de influência a eles associadas a partir dos aspectos de gestão federal e empresarial e da dotação de equipamentos e serviços, de modo a identificar os pontos do território a partir dos quais são emitidas decisões e é exercido o comando em uma rede de cidades. Para tal, foram utilizados dados de pesquisa específica e, secundariamente, dados de outros levantamentos também efetuados pelo IBGE, bem como registros provenientes de órgãos públicos e de empresas privadas.

Os objetivos do REGIC são os seguintes, segundo Stenner (2013):

Gerais:

• Hierarquizar os centros urbanos. • Delimitar as regiões de influência associadas aos centros urbanos. • Compreender a articulação entre as cidades.

Específicos:

• Subsidiar o planejamento e as decisões quanto à localização das atividades econômicas de produção e consumo, das atividades culturais, dos serviços públicos.

Conforme evidenciam os objetivos do REGIC, os dados levantados por este estudo contribuem de forma positiva para o delineamento de ações de planejamento do espaço urbano. Seguindo esta linha de pensamento, Cantarim (2015, p. 119) comenta sobre a relevância de tal estudo:

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UNIDADE 1 | A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS

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O estudo da rede urbana é essencial para se compreender relações econômicas, de dependência e articulação interna e externa ao país. Por conta disso, é considerado importante na formulação de diagnósticos e proposições de políticas, planos e programas em nível regional, estadual e nacional. Em alguns casos, atores do setor privado também podem se beneficiar de tais estudos, dependendo do segmento do serviço ou bem ofertado. O desenvolvimento desses estudos de rede urbana supõe uma base metodológica que reflita com nitidez a realidade das articulações internas ao sistema de cidades. Desde as primeiras teorias relacionadas à conectividade e formas de dependência entre centros urbanos, no final do século XIX, as principais questões foram a distância, capital, comércio, bens e serviços – sendo que cada centro era considerado de forma isolada dentro do sistema.

Para exemplificar como é feito este tipo de análise, no mapa a seguir, apresenta-se a centralidade urbana avaliada em termos da oferta de serviços de saúde em todo o Brasil, observe:

FIGURA 4 – BRASIL: DISTRIBUIÇÃO DOS SERVIÇOS DE SAÚDE

FONTE: IBGE (2008, p. 156)

Nível de Centralidade

123456

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TÓPICO 2 | O ESTUDO DA GEOGRAFIA URBANA NO BRASIL

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Observe no mapa como é expressiva a concentração de serviços de saúde de alta centralidade na região Sudeste. Na Região Sul, Porto Alegre e Curitiba, ambas capitais, também se destacam na oferta dos serviços de saúde. E como estão espacialmente distribuídos os serviços de saúde na região onde você mora? É necessário se deslocar para outro município, caso você ou alguém de sua família necessita de um serviço médico especializado? Após estudarmos o conceito de rede urbana, você consegue identificar quais elementos da história do seu município ajudam a explicar a oferta ou a ausência de determinados serviços no seu local de residência?

Após observar os diferentes níveis de centralidade dos serviços de saúde apresentados no mapa, acompanhe no texto a seguir as análises acerca da distribuição espacial destes serviços:

Comentários sobre a distribuição espacial e a centralidade urbana dos serviços de saúde do Brasil

A centralidade urbana avaliada em termos da oferta de serviços de saúde destaca, no primeiro nível, as duas metrópoles nacionais com maior porte e complexidade, São Paulo e Rio de Janeiro. O segundo e o terceiro níveis correspondem aos centros capazes de prestar atendimento mais complexo, distinguindo- se entre si pelo tamanho. No segundo, estão as áreas das maiores capitais estaduais: Belo Horizonte, Recife, Fortaleza, Porto Alegre, Curitiba, Goiânia, Salvador, Belém e Manaus, bem como Brasília e Campinas. No terceiro nível, além de dez capitais estaduais (Vitoria, João Pessoa, Cuiabá, Campo Grande, Maceió, Teresina, São Luís, Natal, Aracaju e Florianópolis) destacam-se grandes centros regionais tradicionais, como Campina Grande, Juiz de Fora, Uberlândia, Ribeirão Preto e Londrina, entre outros.

Em termos de organização da rede, verifica-se que São Paulo apresenta todos os níveis. Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e Bahia contam com todos os níveis a partir do segundo, e Maranhão, Piauí, Rio Grande do Norte, Alagoas, Espírito Santo, Santa Catarina e Mato Grosso contam com todos os níveis a partir do terceiro. Apresentam redes truncadas os Estados do Rio de Janeiro, Ceará, Pernambuco, Goiás, Pará, Paraíba, Sergipe, Mato Grosso do Sul e Amazonas, com diversos níveis de primazia ou de carência.

No quarto nível, os centros são de menor porte, mas ainda predominam condições de atendimento de mais alta complexidade. Embora apresente alta concentração nos Estados de São Paulo, Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina, o quarto nível está representado em todo o País, em centros regionais longamente estabelecidos, a exemplo de Montes Claros, Joinville, Maringá, Arapiraca, Feira de Santana, Caruaru, Teresópolis, Sobral, Parnaíba, e em centros de projeção mais recente, como Sinop e Palmas.

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Cerca de 200 centros estão classificados no quinto nível, com condições de atender casos de média complexidade, e caracterizados pelo pequeno porte. Inexistentes apenas nos Estados do Amazonas e Roraima, estão distribuídos por todo o território, tal como ocorre com o último nível, constituído por 1.024 cidades de menor porte e complexidade. Essa distribuição concorda com as conclusões de estudo anterior (OLIVEIRA; CARVALHO; TRAVASSOS, 2004), que descreve o padrão de interiorização da atenção médica. Segundo esse estudo, os serviços de uso mais frequente estão disponíveis em praticamente todo o território nacional, e menos de 20% dos pacientes internaram-se em centros localizados a mais de 60km (as pessoas residentes para além desse limite representam apenas 1,3% da população total). Nas redes de alta complexidade, apenas um pequeno número de centros presta atendimento, e as pessoas que vivem mais longe têm pouca possibilidade de deslocar-se: apenas 3% dos pacientes internados para cirurgia cardíaca residiam em municípios situados a mais de 60km do centro em que se internaram (nesses municípios concentram-se cerca de 40% da população brasileira). Fica patente que, em relação à acessibilidade aos serviços de saúde no Brasil, as desigualdades têm impacto expressivo, o que compromete os ideais de equidade do atendimento.

FONTE: IBGE. Regiões de influência das cidades, Rio de Janeiro: IBGE, 2008, p. 156. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/estruturas/PZEE/_arquivos/regic_28.pdf>. Acesso em: 12 jul. 2019.

2.2 REDE URBANA BRASILEIRA: HIERARQUIA DAS CIDADES, SEGUNDO O REGIC

Segundo o estudo Regiões de Influência das Cidades (IBGE, 2008) a rede urbana brasileira é composta por 802 cidades que são denominadas de centros de gestão do território, classificadas de acordo com critérios como gestão pública, gestão empresarial e disponibilidade de equipamentos e serviços. No quadro a seguir, apresenta-se de maneira pormenorizada como as cidades foram classificadas em cinco grandes níveis, por sua vez subdivididos em dois ou três subníveis.

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TÓPICO 2 | O ESTUDO DA GEOGRAFIA URBANA NO BRASIL

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QUADRO 4 – CATEGORIAS UTILIZADAS NO REGIC PARA CLASSIFICAR OS MUNICÍPIOS BRASILEIROS

FONTE: Adaptado de IBGE (2008)

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UNIDADE 1 | A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS

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QUADRO 5 - CATEGORIAS UTILIZADAS NO REGIC PARA CLASSIFICAR OS MUNICÍPIOS BRASILEIROS

FONTE: Adaptado de IBGE (2008)

Notou como cada município pode ser classificado no Brasil? Agora que você compreendeu como foram classificados os municípios, observe no mapa a distribuição espacial da rede urbana brasileira. Aproveite e observe as formas de classificação do município onde você reside e do seu entorno.

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TÓPICO 2 | O ESTUDO DA GEOGRAFIA URBANA NO BRASIL

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FIGURA 5 – BRASIL: REDE URBANA (2007)

FONTE: IBGE (2008, p. 12)

Acerca do padrão espacial observado com relação a distribuição dos níveis hierárquicos, é possível realçar que:

A distribuição dos níveis hierárquicos no território é desigual, confrontando áreas que contam com uma rede urbana estruturada — com a presença de níveis encaixados e situados a intervalos regulares — e áreas onde há ausência de alguns níveis hierárquicos intermediários. O Centro-Sul do País é um exemplo do primeiro caso, pois conta com um significativo número de metrópoles, capitais regionais e centros sub-regionais, com grande articulação entre si. As Regiões Norte e Nordeste, por sua vez, ilustram o segundo caso, já que apresentam distribuições truncadas em que faltam níveis hierárquicos, apresentando um sistema primaz. Este ocorre tanto em áreas da Amazônia e do Centro-Oeste, onde há esparsa ocupação do território, quanto do Nordeste, apesar de sua ocupação consolidada e, em muitas áreas, densa. Nesta região, as capitais tradicionalmente concentram a oferta de equipamentos e serviços e são poucas as opções de centros de nível intermediário, ainda que deva ser notado que estes, apesar de poucos, são tradicionais, e exercem forte polarização em suas áreas, a exemplo de Campina Grande, Petrolina-Juazeiro, Juazeiro do Norte-Crato-Barbalha e Mossoró (IBGE, 2008, p. 13, grifo nosso).

RegiõesdeInfluênciaManausBelémFortalezaRecifeSalvadorBelo HorizonteRio de JaneiroSão PauloCuritibaPorto AlegreGoiâniaBrasilia

Os tracejados representamredes de múltiplas vinculações.

Hierarquia dos Centros Urbanos

Grande MetrópoleNacionalMetrópole Nacional

Metrópole

Capital Regional A

Capital Regional B

Capital Regional C

Centro Subregional A

Centro Subregional B

Centro de Zona A

Centro de Zona B

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Os estudos sobre a hierarquia urbana contribuem para o desenvolvimento de políticas públicas, além de oferecer indicativos sobre a distribuição espacial de serviços para outros atores, como empresas e pesquisadores da área de geografia e afins. Outra contribuição deste tipo de análise é identificar, por exemplo, qual distância uma pessoa que reside em determinada cidade usualmente percorre para alcançar um bem ou serviço, como um aeroporto ou hospital.

Para finalizar este tópico, apresentamos uma sugestão de aula para você e inspirar o desenvolvimento de outras atividades. Acompanhe!

Estudo das Cidades: metrópoles, megalópoles, redes urbanas e áreas metropolitanas.

Área de conhecimento: geografiaNível de ensino: ensino fundamental II

ConteúdosEstudo das Cidades: metrópoles, megalópoles, redes urbanas e áreas

metropolitanas.

ObjetivosCompreender as múltiplas interações entre sociedade e natureza nos

conceitos de território, lugar e região, explicitando que, da interação de cada um, resulta a identidade das paisagens e lugares.

Identificar e avaliar as ações dos homens em sociedade e suas consequências em diferentes espaços e tempos, de modo que construa referenciais que possibilitem uma participação propositiva e reativa nas questões sociais, culturais e ambientais.

Utilizar corretamente procedimentos de pesquisa da Geografia para compreender o espaço, a paisagem, o território e o lugar, seus processos de construção, identificando suas relações, problemas e contradições.

1ª Etapa: introdução do tema

Inicie a atividade dividindo a sala em pequenos grupos e sugira que, utilizando a ferramenta Google Maps, pesquisem a cidade em que a escola está. Oriente que os alunos localizem os centros comerciais, residenciais, industriais e rurais desta cidade. Disponibilizamos em “Para Organizar seu Trabalho e Saber Mais” o tutorial para o uso desta ferramenta.

Peça para que os grupos criem mapas e socializem, comparando se selecionaram as mesmas regiões.

Questione se eles acreditam que a cidade sempre se configurou dessa maneira, ou como eles acreditam que a cidade era antigamente.

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TÓPICO 2 | O ESTUDO DA GEOGRAFIA URBANA NO BRASIL

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Oriente que os grupos elaborem uma pesquisa sobre como era a cidade antigamente e como ocorreu o seu desenvolvimento, se foi um crescimento planejado ou não. Para isso sugira que os alunos busquem as informações na internet, em livros ou entrevistando os moradores mais antigos da região.

2ª Etapa: exploração do objeto

Organize os alunos em duplas produtivas, para que todos, de maneira colaborativa, explorem o objeto.

Convide os alunos a explorar a atividade interativa “Estudo das Cidades”, disponível no NET Educação. Nessa atividade, os alunos poderão ser prefeitos por um dia e, resolvendo alguns problemas da região, poderão promover o crescimento de uma cidade imaginária. Com isso os alunos entrarão em contato com conceitos como: conturbação, rede urbana, áreas metropolitanas, metrópoles e megalópoles.

Deixe que eles retornem à atividade interativa quantas vezes quiserem, conforme forem esclarecendo as dúvidas e se apropriando das informações. Aproveite para solucionar possíveis dúvidas a respeito dos conceitos que foram trabalhados.

3ª Etapa: construção de narrativa

Peça para aos alunos que, com as informações adquiridas durante a exploração da atividade interativa, classifiquem juntos a cidade que pesquisaram. Posteriormente, peça para que eles façam um levantamento dos pontos negativos e positivos em consequência de a cidade ser uma metrópole, uma megalópole, um centro urbano etc.

Divida-os em grupos e, focando nos pontos negativos levantados anteriormente, peça para que elaborem um plano de ação para melhorias na cidade. Cada grupo deverá propor melhorias em um determinado setor, moradia, transporte etc.

Oriente que, ao desenvolver o plano de ação, o grupo procure responder às seguintes perguntas:

- O que deverá ser feito para melhorar a situação da cidade?- Quem serão os responsáveis pelas ações que deverão ser realizadas? - Por que as ações indicadas serão necessárias?- Onde deverão ser implementadas as ações propostas?- Como deverão ser implementadas cada uma das ações?

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Peça aos alunos que apresentem os planos de ação e discutam com a turma. Aproveite para incluir no debate a seguinte reflexão: quais são os desafios encontrados por um gestor público para cumprir com o plano de melhorias na cidade?

Materiais Relacionados

Caro professor, antes de iniciar esta atividade, é importante que se aproprie de algumas informações sobre o tema. Selecionamos os links abaixo para ajudá-lo.

Leia o conteúdo disponível nos links abaixo:

Classificação das cidades: http://educacao.uol.com.br/geografia/ ult1701u56.jhtm.Urbanização:http://www.brasilescola.com/brasil/urbanizacao.htm.Urbanização, causas e consequências: http://www.not1.com.br/urbanizacao-causas-consequencias-conurbacao-metropole-megalopoles/.IBGE mostra a nova dinâmica da rede urbana brasileira: http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=1246. Impactos ambientais da urbanizaçãoGoogle Maps – como utilizar: http://www.google.com.br/help/maps/tour/.

Utilização do Google Maps e Google Earth no Ensino Médio: estudo de caso no Colégio Estadual da Polícia Militar – Diva Portela em Feira de Santana-BA: http://www.dsr.inpe.br/sbsr2011/files/p1657.pdf.

FONTE: INSTITUTO CLARO EMBRATEL. Estudo das Cidades: Metrópoles, megalópoles, redes urbanas e áreas metropolitanas. 2019. Disponível em: https://www.institutonetclaroembratel.org.br/educacao/para-ensinar/planos-de-aula/estudo-das-cidades-metropoles-megalopoles-redes-urbanas-e-areas-metropolitanas/. Acesso em: 3 jul. 2019.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• A ideia de que a rede urbana abarca um conjunto de centros funcionalmente articulados.

• O estudo das redes urbanas pode ser realizado a partir de diferentes abordagens, merecendo destaque os seguintes critérios: classificações funcionais, dimensões básicas de variação, tamanho e desenvolvimento, hierarquia urbana e, relações entre cidades e regiões.

• Quando se analisam as redes urbanas do tipo hierárquica, verifica-se que elas se estruturam segundo cidades e suas áreas de influência.

• Os estudos da rede urbana procuram analisar o comportamento da mesma em face às relações de subordinação, influência e complementaridade existentes entre elas.

• Os objetivos do REGIC são hierarquizar os centros urbanos; delimitar as regiões de influência associadas aos centros urbanos e, compreender a articulação entre as cidades.

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1 (ENADE, 2014)

AUTOATIVIDADE

Figura:Noçõessobrearedeurbana

Clássica Atual

Metrópole Nacional

MetrópoleRegional

Cidade Média

Cidade Pequena

Fluxo de pessoas

Fluxo de capitale bens

O progresso técnico e os fatores institucionais facilitam o transporte de bens e pessoas, as comunicações e a mobilidade do capital, redundando no aumento de inter-relações e interdependência econômica entre firmas, cidades e países. A rede urbana sofre transformações sob o efeito da globalização econômico-financeira, assim, a complementaridade entre centros urbanos de mesmo nível hierárquico conhece um aumento.

Com base na figura e o texto, em relação às noções sobre a rede urbana, é CORRETO afirmar que:

a) ( ) Na noção atual, a rede urbana hierárquica mantém-se e é superposta por novos fluxos de capitais e bens.

b) ( ) Na noção clássica, o progresso técnico, apesar de determinar a noção de hierarquia urbana, restringia o fluxo de capitais e de pessoas.

c) ( ) Na noção clássica, as cidades pequenas mantêm relações hierárquicas com cidades médias e anárquicas com metrópoles nacionais.

d) ( ) na noção atual, as metrópoles nacionais perdem seu poder hierárquico face à ampliação dos papéis das cidades médias e das metrópoles regionais.

e) ( ) na noção atual, as cidades pequenas rompem relações com centros intermediários e o fluxo de capital segue direto para metrópoles regionais e nacionais.

FONTE: <http://portal.inep.gov.br/provas-e-gabaritos3>. Acesso em: 29 jul. 2019.

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2 (IBGE, 2016) A rede urbana brasileira convive atualmente com um padrão espacial do tipo clássico, em que a hierarquia entre as cidades é bem definida, e um padrão urbano em que algumas cidades, de maior dinamismo, graças à maior eficiência das comunicações, subvertem as noções de hierarquia e de proximidade entre cidades. Cidades com redes técnicas avançadas estão próximas a cidades muito distantes, enquanto que cidades vizinhas, em que as redes técnicas são deficientes, mantêm fracas relações entre si. A revolução tecnológica torna as redes urbanas cada vez mais diferenciadas e complexas.

O padrão dominantemente não hierarquizado pode ser observado:

a) ( ) Na estrutura das redes de gestão pública.b) ( ) Na distribuição de bens e serviços centrais.c) ( ) Nos fluxos baseados em especializações produtivas. d) ( ) Nas conexões determinadas pela gestão empresarial.e) ( ) Na direção dos movimentos pendulares para trabalho.

FONTE: <https://arquivo.pciconcursos.com.br/provas/24562646/6f0dce6354d5/tecnologista_geografia_tipo_1.pdf>. Acesso em: 29 jul. 2019.

3 (UFC, 2010) A rede urbana brasileira está em contínua construção, constituindo-se em um conjunto de centros que tiveram origem nos diversos séculos da história do Brasil e que coexistem de forma hierarquizada em uma mesma região. Na Amazônia, a rede urbana, até os anos de 1960, tinha o padrão espacial dendrítico, comandada por Belém. As transformações verificadas a partir de 1970 introduziram maior complexidade à rede urbana, originando novos padrões espaciais não mais definidos pela rede fluvial nem por ligações exclusivas com a capital paraense. Assinale a alternativa que apresenta de modo correto a hierarquia de centros e metrópoles existentes na Região, de acordo com a classificação do IBGE.

a) ( ) Centros sub-regionais, centros regionais e metrópole global. b) ( ) Centros sub-regionais, centros regionais e metrópoles nacionais. c) ( ) Centros sub-regionais, centros regionais e metrópoles regionais. d) ( ) Centros regionais, metrópoles regionais e metrópoles nacionais. e) ( ) Centros sub-regionais, metrópoles regionais e metrópoles nacionais.

FONTE: <https://suburbanodigital.blogspot.com/2014/01/exercicios-resolvidos-de-geografia.html>. Acesso em: 29 jul. 2019.

4 O estudo da hierarquia urbana diz respeito à influência que as cidades exercem umas sobre as outras. Acerca do padrão espacial observado no Brasil com relação a distribuição dos níveis hierárquicos, assinale a alternativa CORRETA:

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a) ( ) A distribuição dos níveis hierárquicos no território é desigual.b) ( ) A rede urbana brasileira é coesa e curva.c) ( ) A distribuição dos níveis hierárquicos no território é homogênea. d) ( ) A rede urbana no Brasil é esparsamente povoada.

5 Os estudos da hierarquia urbana permitem caracterizar os diferentes níveis de complexidade de alguns serviços disponíveis em cada cidade. Neste sentido, tais estudos revelam a maneira como as cidades organizam-se dentro de uma escala de subordinação. Diante do exposto, disserte sobre a relevância do estudo das regiões de influência das cidades.

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TÓPICO 3

AS CONTRIBUIÇÕES DE MILTON SANTOS NA

ANÁLISE URBANA

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

No tópico de abertura desta unidade de estudo, nos debruçamos sobre o debate conceitual a respeito da Geografia Urbana e o processo de urbanização. No Tópico 2, conhecemos o conceito de rede urbana e suas contribuições para o estudo da geografia. Neste tópico, focaremos no estudo da obra de Milton Santos, no que se refere à temática urbana.

O geógrafo Milton Santos contribuiu de forma expressiva na análise da geografia do Brasil. Neste tópico, a intenção é refletir sobre os ensinamentos de Milton Santos relacionados ao fenômeno urbano. Analisaremos as várias fases da produção científica de Milton Santos, procurando identificar e explicar os principais conceitos cunhados pelo autor e que são utilizados nas análises urbanas.

2 AS CONTRIBUIÇÕES DE MILTON SANTOS NA ANÁLISE URBANA

Para estruturar nossa reflexão, partiremos da organização proposta por Sposito (1999). A referida autora organizou a produção de Milton Santos atrelada ao estudo do espaço urbano em três períodos.

A primeirafase engloba a produção científica de Milton Santos realizada entre 1948 e 1963. Neste período, o fato urbano foi enfocado em duas escalas: a da cidade e da rede urbana. A segundafase abarca o período e de 1964 e 1977. Nesta fase, o autor residiu e trabalhou fora do Brasil. O distanciamento do Brasil, a possibilidade de trabalhar em diferentes países e o compromisso com a construção de uma Geografia a partir do Terceiro Mundo são marcas deste período. A característica marcante deste período foi a iniciativa de produzir uma leitura do fato urbano em países subdesenvolvidos, hoje nomeados como países em desenvolvimento, de modo a ser capaz de incorporar à análise as especificidades

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UNIDADE 1 | A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS

dessa realidade. “O autor passou a contribuir para uma compreensão do processo de estruturação interna das cidades e das relações dessas cidades com outros espaços, em países subdesenvolvidos, não mais, apenas, tomando como referência a realidade brasileira” (SPOSITO, 1999, p. 28).

Sobre este período, Sposito (1999, p. 29) realça que:

O autor contribuiu de forma significativa para a produção de um arcabouço teórico-metodológico capaz de permitir uma leitura universal dos processos e dinâmicas que caracterizam a produção e estruturação das cidades e das redes urbanas em países subdesenvolvidos, mas apresentou, também, análises que interessaram, particularmente, à compreensão desses processos e dinâmicas nas cidades de Lima, Guadalajara, Brasília, Salvador e em países como a Costa do Marfim, Brasil, Argélia, Madagascar e Venezuela.

É nesta fase de sua produção científica que Milton Santos coloca a ênfase na análise das relações entre economia e estruturação dos espaços urbanos e cunha uma teoria denominada Os dois circuitos da economia urbana em países subdesenvolvidos.

Santos (1977) distingue coexistência de dois circuitos distintos na economia urbana de países subdesenvolvidos: o circuito superior e o circuito inferior. Para o autor, a diferença fundamental entre as atividades do sistema superior e do sistema inferior está baseada nas diferenças tecnológicas e de organização.

Um destes dois sistemas de fluxo é o resultado direto da modernização e diz respeito a atividades criadas para servir ao progresso tecnológico e à população que dele se beneficia. O outro é também um resultado da modernização, mas um resultado indireto, visto que concerne àqueles indivíduos que só parcialmente se beneficiam, ou absolutamente, não se beneficiam, do recente progresso técnico e das vantagens a ele ligadas (SANTOS, 1977, p. 37).

Seguindo com o entendimento de Santos (1977) sobre os fluxos que permeiam o espaço urbano, na sequência, selecionamos o fragmento do texto de Santos (1977, p. 38) no qual o autor discorre sobre os dois circuitos da economia urbana:

Simplificando, pode-se afirmar que o fluxo do sistema superior está composto de negócios bancários, comércio de exportação e indústria de exportação, indústria urbana moderna, comércio moderno, serviços modernos, comércio atacadista e transporte. O sistema inferior está essencialmente constituído por formas de fabricação de “capital não intensivo”, por serviços não modernos, geralmente abastecidos pelo nível de venda e varejo e pelo comércio em pequena escala e não moderno.

Além de Milton Santos, Sposito (1996, p. 45) também abordou, de maneira bastante esclarecedora, as características de cada circuito, conforme nos mostra o fragmento do seu texto exposto a seguir:

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TÓPICO 3 | AS CONTRIBUIÇÕES DE MILTON SANTOS NA ANÁLISE URBANA

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Características da teoria dos dois circuitos da economia urbana

O circuito superior seria caracterizado por:• o comércio varejista moderno;• a indústria, mesmo que, nos países subdesenvolvidos, representadas pelas

servidões à tecnologia externa (equipamentos, know-how, capital etc.), e o comércio de exportação;

• os bancos, elo de ligação para a exportação de divisas a partir dos países subdesenvolvidos;

• pela dependência ao setor externo, representado por firmas multinacionais e conglomerados.

Em resumo, o circuito superior seria definido por: capital abundante; tecnologia mais avançada na produção; exportação dos produtos acabados; organização bem burocratizada; assalariamento de toda a força de trabalho; e grande estocagem de produtos. A essas características, pode-se acrescentar a proporção de área ocupada pelos estabelecimentos em relação à área do equipamento econômico urbano e sua localização periférica, buscando ou se utilizando de instalações ora existentes ou mesmo de áreas antes não pertencentes ao perímetro urbano. [...]

Outro importante elemento ligado ao circuito superior é o Estado; através de suas políticas de desenvolvimento, financiando e favorecendo as grandes firmas pelas políticas de impostos e como fornecedor de infraestruturas [...].

Por outro lado, o circuito inferior seria caracterizado por:• subemprego, não emprego ou terceirização;• pela pobreza, tanto no campo quando na cidade, gerando explorados e

oprimidos e não econômica ou politicamente marginais; e seria original e complexo, compreendendo a pequena produção manufatureira, frequentemente artesanal, o pequeno comércio, de dimensões reduzidas, trabalham com pequenas quantidades, com pulverização de atividades e estoques reduzidos (trabalho em casa e vendedores rua).

Santos (1977, p. 43) sintetiza que: “o sistema superior utiliza um importante e elevado nível tecnológico, uma tecnologia de ‘capital intensivo’, enquanto no sistema inferior a tecnologia é ‘trabalho intensivo’, geralmente do local de origem ou localmente adaptada ou recriada”.

Seguindo com as fases do trabalho de Milton Santos elencadas por Sposito (1999, p. 29, grifo nosso) “o retorno ao Brasil ao final dos anos 70 pode ser tomado como referência para a demarcação de uma terceirafase, em que as preocupações teórico-metodológicas ganharam uma dimensão ainda maior”. Inúmeros livros e artigos foram publicados nesta fase, o que permitiria uma vasta reflexão e

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UNIDADE 1 | A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS

discussão sobre a produção científica deste período. Considerando o escopo delimitado para esta disciplina, optamos por analisar alguns conceitos teóricos-metodológicos que emergiram neste período.

Tais conceitos tornaram-se, de certa forma, referência na produção acadêmica nos anos vindouros para os pesquisadores que optaram estudar a geografia com base nos trabalhos de Milton Santos, referida por alguns como “teoria miltoniana”. Feito estes esclarecimentos, iremos tecer alguns apontamentos sobre os seguintes conceitos: fixosefluxos, horizontalidades e verticalidades, rugosidade,meiotécnico-científico-informacional,sistemadeaçõesesistemasde objetos e espaçogeográfico.

Comecemos com a ideia de fixose fluxos. De acordo com Santos (2006), a análise da configuração geográfica precisa atentar-se para o conjunto de fixos e fluxos que constituem o espaço:

O espaço é, também e sempre, formado de fixos e de fluxos. Nós temos coisas fixas, fluxos que chegam a essas coisas fixas. Tudo isso, junto, é o espaço. Os fixos nos dão o processo imediato do trabalho. Os fixos são os próprios instrumentos de trabalho e as forças produtivas em geral, incluindo a massa de homens. [...] Os fluxos são o movimento, a circulação e assim eles nos dão, também, a explicação dos fenômenos da distribuição e do consumo (SANTOS, 2006, p. 77).

Para Santos (2006), os fixos provocam fluxos, isto é, movimento e circulação:

Cada tipo de fixo surge com suas características, que são técnicas e organizacionais. E desse modo a cada tipo de fixo corresponde uma tipologia de fluxos. Um objeto geográfico, um fixo, é um objeto técnico, mas também um objeto social, graças aos fluxos. Fixos e fluxos interagem e se alteram mutuamente (SANTOS, 2006, p. 78).

A respeito dos diferentes tipos de fixos e fluxos que caracterizam o espaço, Pereira (2015, p. 8) sintetiza que:

O espaço geográfico é constituído por um conjunto de fixos formados pela infraestrutura e por um conjunto de fluxos representados pela circulação de pessoas e de bens materiais e imateriais, que mantiveram e/ou mantêm interações, alterações e transformações constantes ao longo da história da humanidade.

Vale ressaltar que embora os fixos e os fluxos contenham em si particularidades, as interações socioespaciais que ocorrem entre eles são constantes. Seguindo esta linha de pensamento, Santos e Silveira (2003, p. 167) pontuam que “a criação de fixos produtivos leva ao surgimento de fluxos que, por sua vez, exigem fixos para balizar o seu próprio movimento”.

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TÓPICO 3 | AS CONTRIBUIÇÕES DE MILTON SANTOS NA ANÁLISE URBANA

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Em sua obra, Milton Santos identificou novos recortes territoriais, os quais denominou de horizontalidades e verticalidades. Nas palavras do autor, “as horizontalidades serão os domínios da contiguidade, daqueles lugares vizinhos reunidos por uma continuidade territorial, enquanto as verticalidades seriam formadas por pontos distantes uns dos outros, ligados por todas as formas e processos sociais” (SANTOS, 2006, p. 16).

No plano global, as verticalidades é a expressão das forças exógenas, sendo assim, vetores de racionalidades vindas de fora, de cima e de longe. Por meio das redes técnicas e organizacionais, as verticalidades incidem e/ou se instalam no território e acabam sendo geradores de desagregação, divergência e desordem, mas, também, de novas possibilidades e dinâmicas. Por sua vez, na ordem local, as horizontalidades são a expressão das forças endógenas, sendo, portanto, vetores de racionalidades engendradas de dentro e de perto, no âmbito do espaço banal e contíguo, criadores de possível agregação e convergência, todavia, de eventuais conflitos e disputas (DEGRANDI, 2012).

Complementando esta ideia, Santos (2006) comenta que as forças que engendram o processo de horizontalização são centrípetas, ou seja, são forças de agregação e fatores de convergência em relação a uma base territorial específica. Por sua vez, a verticalização é conduzida por forças centrífugas, isto é, forças de fragmentação e fatores de desagregação (SANTOS, 2006).

Com relação a análise das horizontalidades e verticalidades no plano urbano, selecionamos a seguir o fragmento do Capítulo 12, do livro A natureza do espaço, no qual o autor discorre sobre o tema.

Fragmento do Capítulo 12: Horizontalidades e verticalidades

[...] Nas atuais condições, os arranjos espaciais não se dão apenas através de figuras formadas de pontos contínuos e contíguos. Hoje, ao lado dessas manchas, ou por sobre essas manchas, há, também, constelações de pontos descontínuos, mas interligados, que definem um espaço de fluxos reguladores. As segmentações e partições presentes no espaço sugerem, pelo menos, que se admitam dois recortes. De um lado, há extensões formadas de pontos que se agregam sem descontinuidade, como na definição tradicional de região. São as horizontalidades. De outro lado, há pontos no espaço que, separados uns dos outros, asseguram o funcionamento global da sociedade e da economia. São as verticalidades. O espaço se compõe de uns e de outros desses recortes, inseparavelmente. É a partir dessas novas subdivisões que devemos pensar novas categorias analíticas.

Enquanto as horizontalidades são, sobretudo, a fábrica da produção propriamente dita e o locus de uma cooperação mais limitada, as verticalidades dão, sobretudo, conta dos outros momentos da produção (circulação, distribuição, consumo), sendo o veículo de uma cooperação mais ampla, tanto econômica e politicamente, como geograficamente.

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UNIDADE 1 | A CIDADE, O URBANO E A URBANIZAÇÃO: FORMULAÇÕES TEÓRICO-CONCEITUAIS

Veja-se, como exemplo, a relação cidade/campo, em que a atração entre subespaços com funcionalidades diferentes atende à própria produção, já que a cidade, sobretudo nas áreas mais fortemente tocadas pela modernidade, é o lugar da regulação do trabalho agrícola. No segundo caso, as verticalidades, a solidariedade é obtida através da circulação, do intercâmbio e do controle. Vejam, como exemplo, as relações interurbanas. Trata-se de entender essas novas formas de solidariedade entre os lugares.

Poderíamos parafrasear Baudrillard, em seu Sistema dos Objetos, quando ele disse que “a funcionalidade não é mais o que se adapta a um fim, mas uma ordem de sistema”. De uma estruturação dita “natural”, existindo pela troca de energia entre os seus elementos (tal como eles são e como estão dispostos), passamos a uma valorização das coisas, por intermédio da organização, que comanda sua vida funcional. Na caracterização atual das regiões, longe estamos daquela solidariedade orgânica que era o próprio cerne da definição do fenômeno regional. O que temos hoje são solidariedades organizacionais. As regiões existem porque sobre elas se impõem arranjos organizacionais, criadores de uma coesão organizacional baseada em racionalidades de origens distantes, mas que se tornam um dos fundamentos da sua existência e definição.

A verticalidade cria interdependências, tanto mais numerosas e atuantes quanto maiores as necessidades de cooperação entre lugar. Assim como nos diz Giller Paché (1990, p. 91), nessa “nova geografia dos fluxos dos produtos” cria-se “um sistema de produção reticular”, a partir de suportes territoriais largamente redistribuídos, que asseguram a coesão do processo produtivo.

Essas interdependências tendem a ser hierárquicas e seu papel de ordenamento transporta um comando. A hierarquia se realiza através de ordens técnicas, financeiras, políticas, condição de funcionamento do sistema. A informação, sobretudo ao serviço das forças econômicas hegemônicas e ao serviço do Estado, é o grande regedor das ações que definem as novas realidades espaciais. Um incessante processo de entropia desfaz e refaz contornos e conteúdos dos subespaços, a partir das forças dominantes, impondo novos mapas ao mesmo território. E o crescente processo de homogeneização se dá através um processo de hierarquização crescente. A homogeneização exige uma integração dependente, referida a um ponto do espaço, dentro ou fora do mesmo país. Nos outros lugares, a incorporação desses nexos e normas externas têm um efeito desintegrador das solidariedades locais então vigentes, com a perda correlativa da capacidade de gestão da vida local.

De um modo geral, as cidades são o ponto de intersecção entre verticalidades e horizontalidades. Estudando a diferença entre lugares modernizados e lugares letárgicos no planalto no norte da Patagônia argentina, M. L. Silveira (1994, p. 75-77) examina o funcionamento da produção e da

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circulação, e mostra como “essas lógicas cruzam as cidades e produzem um arranjo territorial” em que se superpõem vinculações horizontais e verticais. As verticalidades são vetores de uma racionalidade superior e do discurso pragmático dos setores hegemônicos, criando um cotidiano obediente e disciplinado. As horizontalidades são tanto o lugar da finalidade imposta de fora, de longe e de cima, quanto o da contrafinalidade, localmente gerada. Elas são o teatro de um cotidiano conforme, mas não obrigatoriamente conformista e, simultaneamente, o lugar da cegueira e da descoberta, da complacência e da revolta.

Paralelamente, forças centrípetas e forças centrífugas atravessam o território, como tendências ao mesmo tempo contrastantes e confluentes, agindo em diversos níveis e escalas.

As forças centrípetas resultam do processo econômico e do processo social, e tanto podem estar subordinados às regularidades do processo de produção, quanto às surpresas da intersubjetividade. Essas forças centrípetas, forças de agregação, são fatores de convergência. Elas agem no campo, agem na cidade e agem entre cidade e campo. No campo e na cidade, elas são, respectivamente, fatores de homogeneização e de aglomeração. E entre o campo e a cidade, elas são fatores de coesão.

Nas condições atuais do meio técnico-científico, os fatores de coesão entre a cidade e o campo se tornaram mais numerosos e fortes. A agricultura moderna, à base de ciência, tecnologia e informação, demanda um consumo produtivo cuja resposta, imediata, deve ser encontrada na cidade próxima. Com a divisão interurbana do trabalho, as tarefas especializadas reduzem os respectivos custos unitários, aumentando a produtividade e a rentabilidade de cada agente individual e fortalecendo o conjunto de cidades.

As forças centrífugas podem ser consideradas um fator de desagregação, quando retiram à região os elementos do seu próprio comando, a ser buscado fora e longe dali. Pode-se falar numa desestruturação, se nos colocamos em relação ao passado, isto é, ao equilíbrio anterior. E de uma reestruturação, se vemos a coisa do ponto de vista do processo que se está dando. Entre os fatores longínquos, causadores de uma tensão local, contamos o comércio internacional, as demandas da grande indústria, as necessidades do abastecimento metropolitano, o fornecimento dos capitais, as políticas públicas ditadas nas metrópoles nacionais ou estrangeiras.

Forças centrípetas conduzem a um processo de horizontalização, forças centrífugas conduzem a um processo de verticalização. Mas, em todos os casos, sobre as forças centrípetas, vão agir forças centrífugas. Essas forças centrífugas se dão em diversas escalas, a maior delas sendo o planeta tomado como um todo, e seriam o que G. Uribe Sc S. de López (1993, p. 172) chamam de “fluxos

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universais”. Entre o lugar e o mundo, as outras escalas são regionais, supra-regionais, nacionais, continentais. Tal superposição faz com que a explicação do que se passa dentro de cada área deva obrigatoriamente incluir as escalas superiores. A solidariedade interna ao subespaço, providenciada pelas forças centrípetas, está permanentemente perturbada pelas forças centrífugas e deve permanentemente ser refeita.

O próximo conceito trabalhado por Milton Santos que iremos examinar é o de rugosidade. Propondo uma analogia simples, assim como as rugas são as marcas que temos em nosso rosto como resultado de condições e ações que se desenvolveram no passado, Santos (2006) defende a utilização deste conceito para analisar o espaço geográfico:

O que na paisagem atual representa um tempo passado, nem sempre é visível como tempo, nem sempre é redutível aos sentidos, mas apenas ao conhecimento. Chamemos rugosidade ao que fica do passado como forma, espaço construído, paisagem, o que resta do processo de supressão, acumulação, superposição, com que as coisas se substituem e acumulam em todos os lugares. As rugosidades se apresentam como formas isoladas ou como arranjos. É dessa forma que elas são uma parte desse espaço [...]. Ainda que sem tradução imediata, as rugosidades nos trazem os retos de divisões do trabalho já passadas (todas as escalas da divisão do trabalho), os restos dos tipos de capital utilizados e suas combinações técnicas e sociais com o trabalho. [...] (SANTOS, 2006, p. 92).

Colocando em termos simples, as rugosidades podem ser entendidas como heranças naturais e sociais, ou físico territoriais, socioterritoriais e sociogeográficas — para usar a adjetivação adotada por Santos (2006). Outra ideia que ajuda a entender este conceito é de combinações dos diversos fatores que compõem um arranjo espacial, em um tempo e espaço determinado. Pois como disse o autor: “as rugosidades, vistas individualmente ou nos seus padrões, revelam combinações que eram as únicas possíveis em um tempo e lugar dados” (SANTOS, 2006, p. 92).

Avançando na exposição dos conceitos trabalhados por Milton Santos (2006) iremos discorrer sobre o meiotécnico-científico-informacional. O autor sustenta que a história do meio geográfico pode ser entendida por meio de três etapas: o meio natural, o meio técnico, o meio técnico-científico-informacional. Com relação a etapa do meio natural, Santos (2006, p. 157) explica que:

Quando tudo era meio natural, o homem escolhia da natureza aquelas suas partes ou aspectos considerados fundamentais ao exercício da vida, valorizando, diferentemente, segundo os lugares e as culturas, essas condições naturais que constituíam a base material da existência do grupo. Esse meio natural generalizado era utilizado pelo homem sem grandes transformações. As técnicas e o trabalho se casavam com as dádivas da natureza, com a qual se relacionavam sem outra mediação.

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Sobre o período seguinte, ou seja, o segundo, que autor denomina de meio técnico e suas características, vale ressaltar que:

O período técnico vê a emergência do espaço mecanizado. Os objetos que formam o meio não são, apenas, objetos culturais; eles são culturais e técnicos, ao mesmo tempo. Quanto ao espaço, o componente material é crescentemente formado do “natural” e do “artificial”. Mas o número e a qualidade de artefatos variam. As áreas, os espaços, as regiões, os países passam a se distinguir em função da extensão e da densidade da substituição, neles, dos objetos naturais e dos objetos culturais, por objetos técnicos. Os objetos técnicos [...] juntam à razão natural sua própria razão, uma lógica instrumental que desafia as lógicas naturais, criando, nos lugares atingidos, mistos ou híbridos conflitivos. Os objetos técnicos e o espaço maquinizado são lócus de ações “superiores”, graças a sua superposição triunfante às forças naturais [...] Os tempos sociais tendem a se superpor e contrapor aos tempos naturais (SANTOS, 2006, p. 158).

Seguindo esta linha de pensamento é que autor inaugura o conceito de meio técnico-científico-informacional, o qual viria a ser bastante aludido em pesquisas científicas da área realizadas posteriormente. Nas palavras do autor Santos (2006, p. 159, grifo nosso):

O terceiro período começa praticamente após a Segunda Guerra Mundial, e sua afirmação, incluindo os países de terceiro mundo, vai realmente dar-se nos anos 70. É a fase a que R. Richta (1968) chamou de período técnico-científico, e que se distingue dos anteriores pelo fato da profundainteraçãodaciênciaedatécnica, a tal ponto que certos autores preferem falar de tecnociência para realçar a inseparabilidade atual dos dois conceitos e das duas práticas. Essa união entre técnica e ciência vai dar-se sob a égide do mercado. E o mercado, graças exatamente à ciência e a técnica, torna -se um mercado global. A ideia de ciência, a ideia de tecnologia e a ideia de mercado global devem ser encaradas conjuntamente e desse modo podem oferecer uma nova interpretação à questão ecológica, já que as mudanças que ocorrem na natureza também se subordinam a essa lógica. Neste período, os objetos técnicos tendemaseraomesmotempotécnicoseinformacionais, já que, graças à extrema intencionalidade de sua produção e de sua localização, eles já surgem como informação; e, na verdade, a energia principal de seu funcionamento é também a informação. Já hoje, quando nos referimos às manifestações geográficas decorrentes dos novos progressos, não é mais de meio técnico que se trata. Estamos diante da produção de algo novo, a que estamos chamando de meio técnico-científico-informacional.

Em síntese, Milton Santos realizou uma periodização do meio geográfico, conforme a sua apropriação pelas atividades humanas. Para tanto, identificou os três períodos anteriormente mencionados: meio natural, meio técnico e meio técnico-científico-informacional.

Milton Santos trabalha também com a ideia de sistemadeaçõesesistemasde objetos. O autor elege tais sistemas como dados centrais de uma definição do espaço geográfico e para a compreensão do mesmo. Santos (2006, p. 39) explica que:

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O espaço é formado por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como o quadro único no qual a história se dá. No começo era a natureza selvagem, formada por objetos naturais, que ao longo da história vão sendo substituídos por objetos fabricados, objetos técnicos, mecanizados e, depois, cibernéticos, fazendo com que a natureza artificial tenda a funcionar como uma máquina. Através da presença desses objetos técnicos: hidroelétricas, fábricas, fazendas modernas, portos, estradas de rodagem, estradas de ferro, cidades, o espaço é marcado por esses acréscimos, que lhe dão um conteúdo extremamente técnico. O espaço é hoje um sistema de objetos cada vez mais artificiais, povoado por sistemas de ações igualmente imbuídos de artificialidade, e cada vez mais tendentes a fins estranhos ao lugar e a seus habitantes. Os objetos não têm realidade filosófica, isto é, não nos permitem o conhecimento, se os vemos separados dos sistemas de ações. Os sistemas de ações também não se dão sem os sistemas de objetos. Sistemas de objetos e sistemas de ações interagem. De um lado, os sistemas de objetos condicionam a forma como se dão as ações e, de outro lado, o sistema de ações leva à criação de objetos novos ou se realiza sobre objetos preexistentes. É assim que o espaço encontra a sua dinâmica e se transforma.

No entendimento de Milton Santos o espaço geográfico ao ser definido como um conjunto de sistemas de objetos e ações e, portanto, envolve tanto os elementos artificiais, como prédios e praças, bem como o sistema de ações realizadas pelas pessoas que manipulam tais instrumentos no sentido de construir e transformar o meio, seja ele natural ou social. Caro acadêmico, seguindo com esta linha e pensando no espaço urbano do município onde você reside, quais elementos deste espaço poderiam ser classificados como sistemas de objetos e sistemas de ações?

Por fim, outro conceito trabalhado por Milton Santos que está atrelado aos conteúdos analisados pelo Geografia Urbana e pela ciência geográfica, de modo abrangente, é o de espaçogeográfico. A análise deste conceito permeia as discussões apresentadas nos conceitos anteriormente expostos. Para o presente estudo, selecionamos o fragmento de um artigo que discute o conceito de espaço geográfico trabalhado por Milton Santos e o apresentamos como leitura complementar na sequência. Boa leitura!

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LEITURA COMPLEMENTAR

MILTON SANTOS: CONCEPÇÕES DE GEOGRAFIA, ESPAÇO E TERRITÓRIO

Geografia,espaçoeterritório

[...]

Encontrar uma definição única para espaço, ou mesmo para território, relata Milton Santos, é tarefa árdua, pois cada categoria possui diversas acepções, recebe diferentes elementos de forma que toda e qualquer definição não é uma definição imutável, fixa, eterna; ela é flexível e permite mudanças. Isso significa que os conceitos têm diferentes significados, historicamente definidos, como ocorreu com o espaço e com o território.

Em Por uma geografia nova (1978), o conceito de espaço é central e compreendido como um conjunto de formas representativas de relações sociais do passado e do presente e por uma estrutura representada por relações que estão acontecendo e manifestam-se através de processos e funções. “O espaço é um verdadeiro campo de forças cuja formação é desigual. Eis a razão pela qual a evolução espacial não se apresenta de igual forma em todos os lugares” (SANTOS, 1978, p. 122).

[...] O espaço por suas características e por seu funcionamento, pelo que ele oferece a alguns e recusa a outros, pela seleção de localização feita entre as atividades e entre os homens, é o resultado de uma práxis coletiva que reproduz as relações sociais, [...] o espaço evolui pelo movimento da sociedade total (SANTOS, 1978, p. 171).

Na segunda parte dessa obra, o conceito de espaço aparece de modo mais evidente, apresentado como fator social e não somente como um reflexo social. Milton Santos denomina-o como uma instância da sociedade. Segundo o autor: “[...] o espaço organizado pelo homem é como as demais estruturas sociais, uma estrutura subordinada subordinante. É como as outras instâncias, o espaço, embora submetido à lei da totalidade, dispõe de uma certa autonomia (SANTOS, 1978, p. 145)”.

Para Milton Santos, o espaço precisa ser considerado como totalidade: conjunto de relações realizadas através de funções e formas apresentadas historicamente por processos tanto do passado como do presente. O espaço é resultado e condição dos processos sociais, elaboração amplamente difusa na geografia dos anos 1970-80 em países como a França, EUA e Brasil, pois era compreendido como uma categoria fundamental quando predominava a utilização de princípios do materialismo histórico e dialético.

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Desse modo, o espaço, além de instância social que tende a reproduzir-se, tem uma estrutura que corresponde à organização feita pelo homem. É também uma instância subordinada à lei da totalidade, que dispõe de certa autonomia, manifestando-se por meio de leis próprias. Assim, o espaço organizado é também uma forma resultante da interação de diferentes variáveis. O espaço social corresponde ao espaço humano, lugar de vida e trabalho: morada do homem, sem definições fixas. O espaço geográfico é organizado pelo homem vivendo em sociedade e, cada sociedade, historicamente, produz seu espaço como lugar de sua própria reprodução.

Nessa obra, é possível perceber a diferenciação entre território e espaço. Para Santos (1978), “a utilização do território pelo povo cria o espaço”; imutável em seus limites e apresentando mudanças ao longo da história, o território antecede o espaço. Já o espaço geográfico é mais amplo e complexo, entendido como um sistema indissociável de sistemas de objetos e ações, em que a instância social é uma expressão concreta e histórica. O território é um conceito subjacente em sua elaboração teórico-metodológica e representa um dado fixo, delimitado, uma área.

É importante notar que, se entendermos o território apenas como uma área delimitada e constituída pelas relações de poder do Estado, consoante se entende na geografia, estaríamos desconsiderando diferentes formas de enfocar o seu uso, as quais não engessam a sua compreensão, mas a torna mais complexa por envolver uma análise que leva em consideração muitos atores e muitas relações sociais.

Assim, o território pode ser considerado como delimitado, construído e desconstruído por relações de poder que envolvem uma gama muito grande de atores que territorializam suas ações com o passar do tempo. No entanto, a delimitação pode não ocorrer de maneira precisa, pode ser irregular e mudar historicamente, bem como acontecer uma diversificação das relações sociais num jogo de poder cada vez mais complexo.

Milton Santos elege as categorias forma, função, estrutura, processo e totalidade como as principais que devem ser consideradas na análise geográfica do espaço; este constitui a categoria principal e auxilia na compreensão do território. O espaço, dessa maneira, é construído processualmente e contém uma estrutura organizada por formas e funções que podem mudar historicamente em consonância com cada sociedade.

De acordo com Santos (1978), a forma é o aspecto visível, exterior de um conjunto de objetos: as formas espaciais; função é a atividade desempenhada pelo objeto criado; a estrutura-social-natural é definida historicamente: nela, formas e funções são criadas e instituídas. As formas e as funções variam no tempo e assumem as características de cada grupo social. É uma concepção histórica e relacional de geografia e do espaço.

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O processo significa a ação que é realizada de modo contínuo, visando a um resultado que implica tempo e mudança. Os processos ocorrem no âmbito de uma estrutura social e econômica, resultando de suas contradições internas. Assim, ao considerarmos esses processos em conjunto, podemos analisar os fenômenos espaciais na sua totalidade.

Totalidade e tempo são categorias fundamentais para o estudo do espaço. A totalidade possui caráter global e tecnológico; apresenta-se pelo modo de produção, pelo intermédio da FES (Formação Econômica e Social) e da história; é inseparável da noção de estrutura. Portanto, a totalidade espacial é estrutural.

O espaço deve ser considerado como uma totalidade, a exemplo da própria sociedade que lhe dá vida [...] o espaço deve ser considerado como um conjunto de funções e formas que se apresentam por processos do passado e do presente [...] o espaço se define como um conjunto de formas representativas de relações sociais do passado e do presente e por uma estrutura representada por relações sociais que se manifestam através de processos e funções (SANTOS, 1978, p. 122).

Em síntese, o conceito de espaço é central em sua abordagem eminentemente econômica e política elaborada conjugando aspectos das teorizações de pensadores como K. Marx, J. P. Sartre, D. Harvey e P. Claval. O espaço é organizado socialmente, com formas e funções definidas historicamente, pois se trata da morada do homem e do lugar de vida que precisa ser constantemente reorganizado. O espaço e o homem são sínteses dialéticas compreendidas numa combinação teórico-metodológica (bem elaborada pelo autor) entre elementos das argumentações de K. Marx e J. P. Sartre (existencialismo humanista): assim, Milton Santos dá centralidade ao sujeito-homem na construção do mundo e do espaço. Já o território é compreendido como espaço de uma nação, delimitado e regulado. Apresenta elementos fixos, resultantes da ação homem e seu trabalho bem como relações sociais e diferentes formas de ocupação e produção; corresponde ao recorte do espaço pelo processo de formação de um Estado-nação.

Outra obra muito importante da década de 1970 é Espaço e Sociedade (1979). Nela, Milton Santos retoma a discussão sobre o espaço e a FES – Formação Econômica e Social; o espaço apresenta-se como uma organização histórica que abarca a totalidade da vida social. Para Santos (1978), a totalidade corresponde às condições da evolução capitalista, exibida pelas estatísticas da produção e do comércio, mostrada pelas discussões em todos os níveis e pelos mais diversos meios de difusão e aspectos sociais, assim como as desigualdades geradas pelo próprio sistema capitalista.

Para Santos (1979), como o espaço é organizado socialmente, espaço e natureza são sinônimos, desde que se considere a natureza como uma instância transformada, uma segunda natureza, conforme Marx a denominou. O espaço, dessa maneira, corresponde às transformações sociais feitas pelos homens.

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O espaço reproduz a totalidade através das transformações determinadas pela sociedade, modos de produção, distribuição da população, entre outras necessidades, desempenham funções evolutivas na formação econômica e social, influencia na sua construção e também é influenciado nas demais estruturas de modo que torna um componente fundamental da totalidade social e de seus movimentos (SANTOS, 1979, p. 10).

O espaço consta como matéria trabalhada, constituindo-se num dos objetos sociais com maior imposição sobre o homem, ele faz parte do cotidiano dos indivíduos, por exemplo, a casa, o lugar de trabalho, os pontos de encontro, os caminhos que unem esses pontos são igualmente elementos passivos que condicionam as atividades dos homens e comandam a prática social. O espaço, mais uma vez, é produto e condição da dinâmica socioespacial. De acordo com Santos (1979), há uma organização social, um arranjo do espaço, de acordo com os interesses e necessidades de cada grupo.

O território também se repete como conceito subjacente e aparece como palco onde o capitalismo internacional prolifera enquanto o Estado empobrece, perdendo sua capacidade para criar serviços sociais. Nesse mesmo palco, ocorre uma apropriação da mais-valia desvalorização dos recursos controlados pelo Estado e supervalorização dos recursos destinados às grandes empresas, principalmente nos países periféricos. O território é o palco da proliferação do capital, espaço apropriado pelos agentes do capital através da divisão social do trabalho.

O espaço pode ser definido pelo conjunto de lugares compreendidos como porções do espaço produtivo e de consumo. Como já vimos na obra anterior, forma, função e estrutura são fundamentais para a compreensão da totalidade e do espaço; são aliadas na formação espacial junto com outros elementos que podemos destacar: divisão social do trabalho, urbanização e sistemas de fluxos, pois todos esses fatores têm influência na forma como o espaço é organizado.

Em Espaço e Sociedade (1979), a forma aparece como condição da história.

Milton Santos afirma que as formas permanecem como herança das divisões do trabalho efetivadas no passado e as formas novas surgem como exigência funcional da divisão do trabalho atual. As formas, que não têm as mesmas significações ao longo da história do país, da região, do lugar, representam a acumulação de tempo e sua compreensão depende do que foram as divisões do trabalho. Portanto:

Seria impossível pensar em evolução do espaço se o tempo não tivesse existência no tempo histórico, [...] a sociedade evolui no tempo e no espaço. O espaço é o resultado dessa associação que se desfaz e se renova continuamente, entre uma sociedade em movimento permanente e uma paisagem em evolução permanente. [...] Somente a partir da unidade do espaço e do tempo, das formas e do seu conteúdo, é que se podem interpretar as diversas modalidades de organização espacial (SANTOS, 1979, p. 42-43).

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Assim, para Milton Santos, o espaço é o resultado do desenvolvimento das forças produtivas, das relações de produção e das necessidades de circulação e distribuição. As regiões e os lugares não dispõem de autonomia, porém, sendo funcionais na totalidade espacial, influenciam no desenvolvimento do país; já a urbanização é resultado de tais processos historicamente determinados como localização geográfica seletiva das forças produtivas e das instâncias sociais [...].

FONTE: SAQUET, M. A.; SILVA, S. S. Milton Santos: concepções de geografia, espaço e território. Geo UERJ, v.10 n.2, p. 24-42, 2008.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que: • Milton Santos contribuiu de forma significativa para a produção de um

arcabouço teórico-metodológico capaz de permitir uma leitura universal dos processos e dinâmicas que caracterizam a produção e estruturação das cidades e das redes urbanas em países subdesenvolvidos.

• Santos distingue coexistência de dois circuitos distintos na economia urbana de países subdesenvolvidos: o circuito superior e o circuito inferior.

• O circuito superior utiliza um importante e elevado nível tecnológico, uma tecnologia de “capital intensivo”, enquanto no circuito inferior a tecnologia é “trabalho intensivo”, geralmente do local de origem ou localmente adaptada ou recriada.

• De acordo com Santos (2006) a análise da configuração geográfica precisa atentar-se para o conjunto de fixos e fluxos que constituem o espaço.

• Embora os fixos e os fluxos contenham em si particularidades, as interações socioespaciais que ocorrem entre eles são constantes.

• Em sua obra, Milton Santos (2006) identificou novas recortes territoriais os quais denominou de horizontalidades e verticalidades.

• As rugosidades podem ser entendidas como heranças naturais e sociais, ou físico territoriais, socioterritoriais e sociogeográficas.

• Milton Santos trabalha também com a ideia de sistema de objetos e sistemas de objetos. O autor elege tais sistemas como dados centrais de uma definição do espaço geográfico e para a compreensão do mesmo.

• Segundo Milton Santos (2006), o espaço organizado pelo homem é como as demais estruturas sociais, uma estrutura subordinada subordinante. É como as outras instâncias, o espaço, embora submetido à lei da totalidade, dispõe de uma certa autonomia.

• Milton Santos (2006) elege as categorias forma, função, estrutura, processo e totalidade como as principais que devem ser consideradas na análise geográfica do espaço.

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1 (ENADE, 2014)

AUTOATIVIDADE

A Terceira Revolução Industrial foi responsável por uma nova configuração espacial do mundo, a qual o geógrafo Milton Santos denominou de meio técnico-científico-informacional. Os objetos técnicos passam a ser, ao mesmo tempo, técnicos e informacionais, reorganizando o espaço com:

a) ( ) Uma intencionalidade que extrapola os limites nacionais, permitindo uma organização do espaço geográfico através de redes que ampliam os fluxos possíveis, mesmo sem a fixação concreta das atividades produtivas em muitos pontos do espaço.

b) ( ) Uma ampliação das desigualdades em escala global, reduzindo a importância dos capitais fixos (estradas, pontes, silos etc.) e dos capitais constantes (maquinário, veículos, fertilizantes etc.).

c) ( ) Uma maior propagação da informação e menor difusão das técnicas em escala global, fazendo com que as especializações produtivas sejam solidárias em nível mundial, apesar da inserção periférica de diversas partes do globo no processo produtivo.

d) ( ) Uma coexistência de pontos contínuos e contíguos, implicando em verticalidades formadas por pontos que se agregam sem descontinuidade e horizontalidades com pontos que, mesmo separados uns dos outros, asseguram o funcionamento da economia.

Pessoas online por cada100 mil pessoas napopulação

0-5

6-10

11-15

16-20

21-25

26-30

31+

nenhum dado

Pessoas online por cada 100 mil pessoas na população

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e) ( ) Um conteúdo técnico e científico, substituindo um meio técnico por um meio cada vez menos artificializado, isto é, sucessivamente instrumentalizado a parir dos interesses dos grupos hegemônicos

FONTE: <http://portal.inep.gov.br/provas-e-gabaritos3>. Acesso em: 29 jul. 2019.

2 (PREFEITURA ACARI, 2016) A figura a seguir esquematiza as relações entre cidades em uma rede urbana no período técnico-científico-informacional atual, correspondendo, portanto, a uma ilustração do modelo informacional de hierarquia urbana.

MetrópoleNacional

Metrópole Regional

Centro Regional

Cidade Local

Vila

ESQUEMA ATUAL

FONTE: Santos, M. Metamorfoses do espaço habitado. São Paulo: Hucitec, 1997, p.55. (adaptado).

Sobre as relações entre cidades nesse modelo de rede urbana é CORRETO afirmar que:

a) ( ) A metrópole nacional comanda as relações entre as cidades da rede urbana por dispor da maior concentração e diversidade de indústrias.

b) ( ) As cidades locais, com papéis específicos, podem estar articuladas diretamente com a metrópole nacional, sem que as relações dependam de agentes localizados em cidades intermediárias, promovendo o chamado curto-circuito da cidade próxima.

c) ( ) A metrópole regional reforça e amplia a sua influência na rede urbana em vista da montagem das modernas vias de transportes e da constituição dos meios de informação em tempo real (internet e telefonia celular, por exemplo), enfraquecendo a influência de metrópole nacional na área onde exerce essa função.

d) ( ) O centro regional atrai os agentes que desenvolvem atividades econômicas específicas e modernas da cidade local e da vila localizadas em seu entorno, reforçando o caráter escalonado entre as cidades nesse modelo de hierarquia urbana.

e) ( ) As vilas e cidades locais tecem as suas relações com a metrópole nacional em uma série de degraus ou etapas, que correspondem ao centro local e à metrópole regional, evidenciando o padrão piramidal e militar desse modelo de hierarquia urbana.

FONTE: <https://questoes.grancursosonline.com.br/questoes-de-concursos/geografia-urbanizacao/810577>. Acesso em: 29 jul. 2019.

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3 (CESGRANRIO, 2010) Referindo-se às manifestações geográficas decorrentes dos novos progressos, Milton Santos revela “a diferença, ante as formas anteriores do meio geográfico, vem da lógica global que acaba por se impor a todos os territórios e a cada território como um todo. [...] O meio geográfico tende a ser universal. Mesmo onde se manifesta pontualmente, [o meio geográfico] ele assegura o funcionamento dos processos encadeados a que se está chamando de globalização”.

Na perspectiva teórica anterior, o autor considera que estamos diante de um meio geográfico que representa a produção de algo novo, ao privilegiar a interação entre:

a) ( ) Natureza e trabalho.b) ( ) Técnica e natureza.c) ( ) Sociedade e história.d) ( ) Ciência, natureza e redes sociais.e) ( ) Técnica, ciência e informação.

FONTE: <http://www.mapadaprova.com.br/provas/cesgranrio/2010/seplag-pref-salvador-ba#>. Acesso em: 29 jul. 2019.

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UNIDADE 2

O ESPAÇO URBANO BRASILEIRO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• conhecer os principais desafios dos espaços urbanos brasileiros;

• reconhecer os aspectos positivos da urbanização brasileira;

• compreender a relação entre espaço urbano e turismo;

• analisar o conceito de patrimônio histórico.

Esta unidade está organizada em três tópicos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – DESAFIOS NOS ESPAÇOS URBANOS BRASILEIROS

TÓPICO 2 – ASPECTOS POSITIVOS DA URBANIZAÇÃO BRASILEIRA

TÓPICO 3 – O ESPAÇO URBANO E O TURISMO

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TÓPICO 1

DESAFIOS NOS ESPAÇOS URBANOS

BRASILEIROS

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

A urbanização brasileira está intimamente relacionada ao processo de industrialização, atividade que desencadeou um aumento da população que passou a residir em áreas urbanas. Fenômenos como o êxodo rural também contribuíram para esse processo de intensificação da população urbana. Particularmente, no Brasil, o fenômeno da migração tomou força a partir da década de 1970, tendo como importante estímulo as migrações motivadas pela busca de novas oportunidades de trabalhos no setor industrial.

Por conta deste e de outros fatores, a urbanização brasileira em muitos casos se deu de modo desordenado e gerando um inchaço populacional em municípios que não dispunham de condições adequadas, como de moradia, saneamento básico e empregos. Em face a este fenômeno, verifica-se, na atualidade, diversos problemas sociais, econômicos e ambientais nas áreas urbanas brasileiras. O objetivo deste tópico é conhecer e refletir sobre alguns dos principais problemas urbanos brasileiros.

Descreveremos e analisaremos questões relacionadas ao saneamento básico e suas implicações para a saúde pública. Ademais, analisaremos o padrão de distribuição espacial da rede de saneamento pelo território brasileiro, observando a disponibilidade ou não de rede de esgoto e do acesso à água encanada, atrelando esta problemática aos condicionantes sociais e econômicos. Vamos discorrer também sobre a violência urbana e o problema da segurança pública. Por fim, será feito uma discussão sobre a espacialidade das chamadas favelas e dos principais problemas de urbanização que se manifestam em tais espaços. Venha conosco!

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UNIDADE 2 | O ESPAÇO URBANO BRASILEIRO

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2 A QUESTÃO DO SANEAMENTO BÁSICO

Ao se tratar dos problemas urbanos na atualidade, um dos importantes desafios que se impõe é o uso adequado dos recursos naturais e a busca por alternativas que visem minimizar os danos ambientais decorrentes do aumento da população residente em áreas urbanas, com o intuito de melhorar a qualidade de vida da população e, também, de procurar um convívio mais harmonioso no que se refere à relação sociedade e natureza. Sobre este tema, Ojima (2006, p. 3) pontua que:

A bibliografia internacional acerca dos processos de expansão urbana vem apontando um conjunto de fatores associados aos impactos que o padrão de ocupação das áreas urbanas pode trazer, sendo eles desde os aspectos estéticos até impactos nos gastos públicos (consumo de água, energia elétrica e combustíveis fósseis, afastamento das áreas agrícolas, alocação de bens e serviços públicos), nos aspectos sociais (heterogeneização socioespacial, segregação social, aumento das distâncias diárias de locomoção) e nos aspectos ambientais (poluição da água e do ar, ilhas de calor, mudança nos regimes de precipitação, aumento de áreas alagáveis e alterações na incidência de doenças e problemas de saúde associados).

Ojima (2006) realça que para se pensar em alternativas que conciliam o uso do espaço urbano com as condições naturais existentes, pressupõe equilíbrio e práticas de planejamento:

Dentro do debate sobre os dilemas ambientais na virada do século podemos apontar a relação entre urbanização e meio ambiente como uma das mais evidentes. Não podemos negar que é na cidade que este dilema se torna mais contundente, pois as interfacessociais, econômicas e políticas se dão com maior intensidade. Mas embora natureza e cidade sempre estivessem na pauta das discussões sobre a crise ambiental como partes antagônicas de um processo de degradação sistemática, colocar o urbano em oposição à naturezareduzsignificativamenteacapacidadeanalíticadasforçassociais intrínsecas à chamada “crise ambiental”. Enfim, a natureza em si não pode ser interpretada única e exclusivamente como áreas “intocadas”, selvagens ou naturais (em seu sentido literal) (OJIMA, 2006, p. 3, grifo nosso).

Tal como se observa na citação, visões dicotômicas que separam a “sociedade” e a “natureza”, o “urbano” e o “rural” se mostram insuficientes para lidar com a dinâmica real e concreta dos assentamentos humanos na atualidade. O homem, no seu exercício de sobrevivência, seja no espaço rural ou urbano, interage e passa a fazer parte da natureza. O desafio consiste em se pensar em estratégias que permitam um convívio mais harmonioso entre estas partes.

Assim, iniciaremos nossa reflexão analisando a questão do saneamento básico no Brasil. Em nosso país, conforme a Lei nº 11.445/2007, saneamento básico é considerado como o conjunto de serviços, infraestruturas e instalações

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operacionais de: abastecimento de água potável; esgotamento sanitário; limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos; drenagem e manejo das águas pluviais urbanas (HELLER, 2015).

Contribuindo para este debate, no que tange ao campo da geografia que analisa o saneamento urbano, Heller (2015, p. 13, grifo nosso), ressalta que um aspecto fundamental no âmbito do saneamento básico refere-se à definição e estimativa da parcela da população que irá demandar por estes serviços em determinado tempo e em determinado espaço:

O setor de saneamento básico do Brasil acumula alguma tradição em operar com mudanças. Em verdade, na origem dos projetos de engenharia mais estruturados, que orientaram e orientam as intervençõesno setor, projeções sobreo crescimentopopulacional e da demanda pelos serviços constituem-se preocupação central. Tais projetos visam a certo alcance temporal e, para tanto, a prospecção sobre o futuro, ao longo desse período de alcance, procura ser desenvolvida. Essa tradição é muito vinculada a técnicas de projeção demográfica, uma vez que foi consolidada durante as décadas de 1960 a 1980, quando o crescimento populacional ocorria em taxas elevadas e se fazia necessário procurar sintonizar a capacidade dos sistemas, especialmente de abastecimento de água e de esgotamento sanitário, a uma população futura provável.

Na atualidade, contudo, as estratégias de planejamento urbano, no que se refere à oferta de serviços de saneamento básico se alteraram. “O crescimento das populações deixou de ser significativo, sendo que, entre seus componentes, o crescimento vegetativo, graças à estabilização das taxas de fecundidade, deu lugar aos processos migratórios, afetando assimetricamente os municípios brasileiros” (HELLER, 2015, p. 13). A projeção do efeito desta dinâmica migratória sobre um dado município é complexa e demanda esforços de planejamento capazes de incorporar este aspecto da dinâmica populacional.

FIGURA 1 – O PROBLEMA DA FALTA DE TRATAMENTO DE ESGOTO EM ÁREAS URBANIZADAS

FONTE: <http://arquivos.ana.gov.br/imprensa/publicacoes/ATLASeESGOTOSDespoluicaodeBaciasHidrograficas-ResumoExecutivo_livro.pdf>. Acesso em: 8 abr. 2019.

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Embora o acesso à água e ao esgotamento sanitário seguros, conforme a Resolução A/RES/64/292, da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 2010, sejam considerados direitos humano fundamentais (HELLER, 2015), no Brasil verifica-se que este direito ainda não é assegurado para todas as parcelas da população. A respeito do quadro do saneamento no Brasil: “quadro do atendimento adequado por serviços e soluções de saneamento no País ainda se revela preocupante: déficitdecercade40%dapopulaçãototalemabastecimentodeágua,de60%emesgotamentosanitárioede40%nomanejoderesíduossólidosurbanos” (HELLER, 2015, p. 15, grifo nosso).

Em se tratando do modo como a população brasileira tem acesso à água em suas residências, no gráfico a seguir, verificam-se as soluções e práticas utilizadas para o abastecimento de água em proporção de domicílios por macrorregião e Brasil, observe:

GRÁFICO 1 – GRÁFICO BRASIL E MACRORREGIÕES: FORMAS UTILIZADAS PARA O ABASTECIMENTO DE ÁGUAS NOS DOMICÍLIOS

FONTE: Heller (2015, p. 16)

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Antes de comentarmos sobre o gráfico, a seguir, elencamos o glossário da legenda:

GLOSSÁRIO IBGE

Abastecimento:

1) Com canalização interna: a) por rede geral: quando o domicílio for servido de água canalizada proveniente de rede geral de abastecimento, com distribuição interna para um ou mais cômodos; b) poço ou nascente: quando o domicílio for servido de água canalizada ligada a poço ou nascente, com distribuição interna para um ou mais cômodos; c) outra forma: quando o domicílio tiver distribuição interna, mas o reservatório (ou caixa) for abastecido com águas das chuvas, por carro-pipa etc.

2) Sem canalização interna: a) por rede geral: quando o domicílio for proveniente de uma rede geral, canalizada para a propriedade, sem haver distribuição interna no domicílio; b) poço ou nascente: quando o domicílio for servido de água proveniente de poço ou nascente próprios, sem distribuição interna; c) outra forma: quando a água utilizada no domicílio for apanhada em fonte pública, poço, bica etc., localizados fora da propriedade e sem distribuição interna no domicílio

FONTE: <https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2009/glossario_PNAD_2009.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2019.

Observe no gráfico que em todas as regiões brasileiras existem parcelas da população que ainda não possuem acesso à água, sendo que o maior constrangimento, neste sentido, ocorre na Região Norte. É também na Região Norte onde se situa a maior parcela da população brasileira que conta com um acesso limitado de água, qualificado como rede geral, poço ou nascente e outra forma sem canalização interna, ou seja, o nível de conforto e comodidade deste montante da população é bastante reduzido, pois precisam “buscar” a água fora de casa. A Região Sudeste é a que apresenta a melhor situação no que se refere à presença de uma rede geral de água com canalização, seguida pelas Regiões Sul e Centro Oeste.

Em se tratando das dificuldades de acesso à água, este problema apresenta-se de forma mais acentuada em populações urbanas do que em populações rurais, tal como evidencia o gráfico a seguir.

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GRÁFICO 2 – BRASIL: POPULAÇÃO URBANA E RURAL RESIDENTE EM DOMICÍLIOS COM AUSÊNCIA DE CANALIZAÇÃO INTERNA DE ÁGUA, SEGUNDO AS DIFERENTES FORMAS DE

ABASTECIMENTO

FONTE: Heller (2015, p. 16)

Dentre os fatores que explicam a maior dificuldade da população em ter acesso à água nas áreas urbanas, menciona-se o fato de que parte expressiva da população urbana reside em áreas de ocupação irregular, onde o problema da falta de acesso à água é acentuado. Cumpre realçar que a falta de acesso à água constitui-se em um importante problema de saúde pública, pois a ausência deste recurso aumenta significativamente o risco em relação à algumas doenças. O professor do Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, Paulo Barrocas, assevera que a falta de água aumenta o risco de diarreia, hepatite A e cólera (GRILLO; SULINA, 2015).

Nesta entrevista, Barrocas explica que a falta de água canalizada pode ser perigosa, pois fontes, poços, carros pipas nem sempre são alternativas seguras sob o ponto de vista sanitário. Por conta disso, aumenta o risco de a população contrair as chamadas doenças de veiculação hídrica, isto é, que derivam da falta da qualidade da água. Doenças como diarreia, hepatite A, cólera e parasitoses, para ilustrar são causadas pelo consumo de água ou alimentos contaminados por fezes. Além disso, o especialista reforça que quando a água não está canalizada na residência, elevam-se os riscos de uma inadequada higienização dos alimentos e das mãos, o que pode aumentar as doenças gastrointestinais, com destaque para a diarreia (GRILLO; SULINA, 2015).

A respeito dos problemas estruturais responsáveis pelo quadro da distribuição espacial do acesso à água encontrada no Brasil, Heller (2015, p. 17) analisa que estas situações:

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Envolvem, entre outros aspectos, baixa capacidade de adequadamente planejar e executar as obras; baixo nível de fiscalização quanto à correta e responsável aplicação de recursos públicos; incapacidade de assegurar sustentabilidade às intervenções realizadas; grande distância entre o caráter pontual das intervenções e seu enquadramento em um planejamento de mais longo alcance; modelos tarifários financeira e socialmente discutíveis; regulações inexistentes ou ineficazes; incipiente controle social; inadequadas e, muitas vezes, conflituosas relações interfederativas; insuficientes relações intersetoriais.

Como podemos perceber, ações de políticas públicas voltadas ao acesso da água, em condições seguras e de qualidade, constitui-se em um importante desafio a ser superado.

Após analisarmos a questão do acesso à água, vamos estudar a situação do acesso à rede de esgoto no Brasil. Para tanto, no mapa a seguir é exposto o panorama da distribuição espacial do sistema de esgoto pelas diversas regiões brasileiras.

FIGURA 2 – BRASIL: PANORAMA GERAL DA COLETA E TRATAMENTO DE ESGOTOS

FONTE: <http://arquivos.ana.gov.br/imprensa/publicacoes/ATLASeESGOTOSDespoluicaodeBaciasHidrograficas-ResumoExecutivo_livro.pdf>. Acesso em: 8 abr. 2019.

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A interpretação do mapa nos mostra que a situação do atendimento da população brasileira com serviços de esgotamento sanitário revela insuficiências e limitações, quando percebemos que 43% da população é atendida por sistema coletivo (rede coletora e estação de tratamento de esgotos) e que 12% é atendida por solução individual (fossa séptica).

Você sabe o que é uma fossa séptica? Apresentamos a definição a seguir para que você possa acompanhar e compreender de maneira adequada a situação do saneamento no Brasil.

IMPORTANTE

O que é uma fossa séptica?

As fossas sépticas são recipientes construídos ou instalados no local para manter durante tempo determinado os dejetos domésticos, industriais, ou comerciais, com o objetivo de sedimentar os sólidos e reter o material contido nos esgotos, para transformá-los bioquimicamente, em substâncias e compostos mais simples e menos poluentes. São utilizadas em locais desprovidos de rede pública de esgoto. A fossa séptica pode receber os dejetos de uma ou várias edificações, desde que sua capacidade seja compatível com a quantidade de pessoas que utilizam. Fossa séptica é um dispositivo de tratamento de esgotos destinado a receber a contribuição de um ou mais domicílios e com capacidade de dar aos esgotos um grau de tratamento compatível com a sua simplicidade e custo. Normalmente é constituída de sistema muito simples, uma caixa enterrada no solo, onde permanece a parte sólida, e a parte líquida segue para um processo de purificação para ser diluída e absorvida pelo solo.

As fossas sépticas evitam o lançamento dos dejetos humanos em rios, mananciais, e na superfície. Sua utilização ainda impede alterações nas formas de vida aquática dos corpos receptores, não contaminando solo e água. [...] O sumidouro consiste basicamente no mesmo princípio da fossa, com a diferença que o objetivo não é a retenção, mas a dispersão dos resíduos líquidos no solo.

FIGURA – EXEMPLO DE FOSSA SÉPTICA E SUMIDOURO

FONTE: <http://portal.iphan.gov.br/uploads/publicacao/Man_SaneamentoBasicoResidencial_m.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2019.

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Seguindo com o mapa, verifica-se que 18% da população se enquadra na situação em que os esgotos são coletados, mas não são tratados. Este panorama é crítico, pois embora o risco de contado direto da população com os resíduos seja minimizado, diminuindo de alguma forma o risco de doenças relacionadas ao contato direto com os rejeitos, sob o ponto de vista ambiental, a situação é preocupante. O estudo da Agência Nacional de Águas (2017), ressalta que o problema da falta de tratamento do esgoto é ainda mais acentuado nas áreas urbanas:

O lançamento de esgotos domésticos nos corpos d’água sem adequado tratamento ou em desconformidade com os atuais padrões legais estabelecidos para lançamento de efluentes, resulta em comprometimento da qualidade da água do corpo receptor e pode inviabilizar o atendimento aos usos atuais e futuros dos recursos hídricos a jusante do lançamento. Isso ocorre especialmente em áreas urbanizadas. Numa avaliação do Índice de Qualidade de Água – IQA, realizada pela ANA, para dados de qualidade da água obtidos em 1.683 pontos em todo o País no ano de 2013, 19% apresentaram qualidade considerada regular/ruim/péssima. Esse número sobe para 39% ao se considerar apenas os pontos de monitoramento localizados nas áreas urbanas (ANA, 2017, p. 23).

Por fim, o dado mais alarmante refere-se aos 27% da população completamente desprovidos de atendimento, ou seja, não há coleta nem tratamento de esgotos. Heller (2015) comenta a insuficiência do setor de saneamento básico no Brasil:

[...] não é exagero indicar que a situação da área de saneamento básico tem se mostrado em descompasso com o padrão de desenvolvimento almejado pela sociedade brasileira, não tendo sido ainda capaz de romper com seu legado histórico de exclusão das parcelas mais pobres da população, com reflexos na saúde humana e com o significativo passivo ambiental acumulado. Assim, por razões diversas, pode-se afirmar que o setor ainda não vem acompanhando, na mesma velocidade, os avanços observados em outras políticas públicas brasileiras, a despeito da maior consolidação de seu ordenamento institucional e legal (HELLER, 2015, p. 13).

FIGURA 3 – O PROBLEMA DA FALTA DE ESGOTO NO BRASIL

FONTE: <https://www.bancadejornalistas.com.br/falta-de-saneamento-basico-no-brasil-e-grande-ameac%CC%A7a-a-saude-publica>. Acesso em: 15 abr. 2019.

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O fato de os problemas relacionados ao saneamento básico apresentarem-se de modo mais intenso nas áreas urbanas, está vinculado à relação que se estabelece entre geração de esgotos e tamanho da população. Isto é, áreas urbanas, por serem densamente povoadas, precisam lidar com uma quantidade excessiva de rejeitos que não são condizentes com a disponibilidade hídrica disponível em tais espaços.

Como se sabe, as principais concentrações populacionais ocorrem nas capitais das Unidades da Federação e seu entorno, em decorrência da disponibilidade de serviços, infraestrutura, logística e outros elementos que privilegiam o desenvolvimento de todos os tipos de atividades nessas regiões, o que acaba atraindo um maior número de pessoas para tais espaços e, por conseguinte, concentrando a maior quantidade dos esgotos gerados (ANA, 2017).

Para se ter uma ideia mais precisa deste problema, a Agência Nacional de Águas (2017, p. 28) estimou a carga de esgotos geradas utilizando como indicador a chamada “Demanda Bioquímica de Oxigênio – DBO, parâmetro que caracteriza a parcela orgânica dos efluentes provenientes de esgotamento sanitário, usualmente empregado na avaliação de impactos nos corpos receptores e no dimensionamento de processos de tratamento”. Os resultados dessa mensuração revelaram que:

Nessa estimativa foi considerado o valor “per capita” de 54 g DBO/habitantes/ dia e dados de população urbana obtidos a partir de projeções do IBGE ou fornecidos diretamente pelos prestadores do serviço de esgotamento sanitário de cada município. No País são geradas cerca de 9,1 mil toneladas de DBO/dia, sendo os 106 municípios com população acima de 250 mil habitantes responsáveis por48%dessetotal (ANA, 2017, p. 28, grifo nosso).

Para finalizar nossa reflexão sobre a questão do saneamento básico do Brasil, apresentamos uma reportagem publicada no portal de notícias UOL, acompanhe:

Como o Brasil pode melhorar o problema do saneamento básico?

Carlos Madeiro

Para especialistas ouvidos pelo UOL, a Lei do Saneamento Básico cumpriu uma parte importante do ponto de vista burocrático: ser o marco legal do setor, que até 2007 não tinha nenhuma lei que regulasse. Mas, na avaliação deles, faltaram investimentos para ampliar o acesso aos serviços, o que levou o país a avançar pouco nos índices. “O grande avanço foi o contorno legal, para que empresas públicas e privadas tivessem estabelecidas regras”, afirma o presidente da Abes, Roberval Tavares. “Mas quando a gente olha os indicadores, embora tenha havido avanço em algumas regiões, os índices, na média, são para lamentar”.

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Tavares afirma que o pouco avanço se deve à histórica falta de interesse dos governantes: “O grande princípio para melhoria está relacionado à prioridade de governo, tanto do Legislativo, quanto do Executivo. Tem que colocar com agenda de Estado, de forma perene”.

O presidente do Instituto Trata Brasil, Edson Carlos, também viu avanços abaixo do esperado no país neste período. “O que se esperava com a Lei, com o Ministério das Cidades, era fazer o Brasil avançar numa velocidade maior, mas isso não aconteceu”, afirma. Com o baixo investimento, a meta de não ter mais casas sem esgoto ou sem água encanada até 2033 deve ser adiado. “Se você pensar o Plano Nacional de Saneamento foi promulgado dezembro 2013 e estimou que o Brasil deveria gastar R$300 bilhões em 20 anos (para universalizar o sistema), teríamos então de ter aí entre R$15 e 16 bilhões por ano só para cumprir com o déficit. E em nenhum ano passou de R$12 bilhões, que foi em 2014. A CNI já fala em 2054 (o fim do déficit) se seguir os indicadores de investimentos. E olha que estamos falando de água potável e esgoto, que é o mínimo aos seus cidadãos”, pontua.

[...]

“Modeloexclusivodefinanciamentopúblicofracassou”

Roberto Tavares, presidente da Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais, afirma que o setor de saneamento precisa ter novos avanços e modernizar. “A lei foi positiva principalmente por ser um setor da infraestrutura que não tinha um marco legal, diferente de outros segmentos, como o elétrico e telecomunicações. Mas tangenciou em questões muito importantes do ponto de vista da segurança jurídica”, afirma Tavares. “Mesmo com a lei temos normas que hoje estão no STF (Supremo Tribunal Federal), como a titularidade do serviço das regiões metropolitanas”.

Tavares afirma que é necessário modernizar a lei para garantir menos burocracia ambiental e a entrada de empresas privadas nos investimentos do setor. “Esse modelo exclusivo de financiamento do setor público (FGTS e Orçamento Geral da União) não deu certo, e são os números quem dizem isso: 22 Estados têm menos de 50% de cobertura de tratamento sanitário”, diz Tavares.

“É mais fácil chegar em um rincão e encontrar o sujeito com um celular do que ele com água potável de qualidade e esgotamento sanitário de qualidade”. Outra coisa defendida pelas empresas estaduais de saneamento é a criação de um fundo garantidor às empresas que investirem no saneamento. “Não dá para ampliar a participação privada só dando como garantia os recebíveis que vão gerar aqueles negócios. As empresas poderiam capitalizar esse fundo com o PIS e Cofins que pagam mensalmente. Se todas as empresas aderissem, teríamos R$4 bilhões em um ano”, afirma Tavares.

FONTE: MADEIRO, C. Como o Brasil pode melhorar o problema do saneamento básico? UOL Notícias, Maceió, fev. 2017. Disponível em: <https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2017/02/12/como-o-brasil-pode-melhorar-o-problema-do-saneamento-basico.htm>. Acesso em: 20 abr. 2019.

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Quais são as condições da rede de esgoto no município onde você reside? Você conhece as condições da rede de esgoto no município onde você reside? Você as considera adequadas? Você consegue relacionar o quadro atual da rede de saneamento básico com alguns fatos históricos relevantes do seu estado ou município? Reflita sobre os fatores que desencadearam ou não mudanças recentes na estrutura de saneamento urbano da sua cidade.

Tal como podemos observar na reportagem e nas reflexões apresentadas, o Brasil ainda precisa trabalhar fortemente na superação dos desafios relacionados aos problemas de saneamento básico. E tal como você aprendeu neste tópico, é necessário ter em mente que a busca de alternativas para isso preciso levar em conta a dimensão ambiental de tal processo, bem como estar em consonância com a realidade social e econômica do contexto no qual se encontra inserida.

Trabalhamos até agora com a perspectiva do saneamento básico, destino de efluentes urbanos e esgoto, contudo, não menos importante, é o destino dos resíduos sólidos da cidade. Neste âmbito, apresentamos uma sugestão de plano de aula que permite trabalhar a questão do destino do lixo urbano com a alunos do ensino fundamental.

Destinos do lixo urbano: aterro sanitário e lixão

Autora: Angélica Pall Oriani

Conteúdos• Aterro sanitário• Lixão• Lixo urbano

Objetivos• Discutir as diferenças entre aterro sanitário e lixão como destinação do lixo

urbano.• Relacionar o crescimento urbano ao aumento do consumo e produção de

lixo.• Refletir sobre o descarte de materiais consumidos na escola.

Série/Ano: 4º ano do Ensino Fundamental

Vale destacar que apesar da sugestão de atividade ser para o 4º ano, esse conteúdo pode ser retomado ou reforçado considerando outras abordagens nos anos sequenciais do primeiro ciclo do ensino fundamental.

Previsão para aplicação: 3 aulas (50 minutos/aula)

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1ª Etapa: início de conversa

Inicie as atividades com os alunos indagando se sabem o que acontece com o lixo quando ele é colocado nas lixeiras externas de nossas residências. Na sequência, projete imagens de lixões e de aterros sanitários ou, caso não consiga projetar, mostre imagens impressas e passe para a turma visualizar.

Peça que descrevam as imagens e que assinalem as diferenças entre as condições de preparo para a recepção de resíduos por parte desses dois locais. Questione se conhecem algum desses dois locais, se já viram ou ouviram falar a respeito.

2ª Etapa: destinação do lixo urbano: aterro sanitário e lixão

Tendo conversado inicialmente com os alunos, explique que a produção de lixo no espaço urbano é um problema, já que não há tantos locais para a destinação adequada desses resíduos. Tente mostrar na lousa de giz ou no quadro branco que quanto maior e mais desenvolvida economicamente é uma cidade, mais ela tende a produzir lixos. Aproveite para explicar que não são apenas as pessoas em suas casas que produzem lixo, mas também as fábricas e empresas, e que muitas vezes todo o lixo gerado por esses estabelecimentos é encaminhado para um local específico.

Na sequência, anote na lousa as diferenças entre o lixão e o aterro sanitário e peça para que os alunos registrem em seus cadernos.

• Lixão: trata-se de um local que não teve nenhum tipo de preparo para receber os lixos. Neles, o líquido produzido pelo apodrecimento (use também a palavra adequada desse processo que é decomposição) dos resíduos pode penetrar no solo e comprometer a água que está embaixo da terra, que se chama lençol freático. Porque não são fiscalizados e controlados, os lixões atraem animais e insetos, como ratos, urubus e moscas, colocando em risco a saúde daqueles que trabalham nesses locais, como catadores informais que procuram materiais recicláveis.

• Aterro sanitário: trata-se de uma área previamente preparada para receber os resíduos. Nesse local, há impermeabilização do solo com materiais como a argila, o que impede a contaminação dos lençóis freáticos pelo chorume. Além disso, há captação do metano, que assim como o líquido de chorume, é um gás liberado no processo de apodrecimento do lixo e que pode ser utilizado para produzir energia.

Após ter explicado as diferenças fundamentais entre essas duas formas de destinação do lixo, você poderá questionar a turma sobre quais desses dois destinos existem com mais frequência e poderá aproveitar a ocasião para gerar um momento de leitura de um texto jornalístico, com o dessa matéria no site do G1, que afirma que no “Brasil tem quase 3 mil lixões em 1.600 cidades”. Caso prefira não levar a matéria impressa, poderá dividir a sala em pequenos grupos para que os alunos leiam o texto jornalístico ou realizar leitura em voz alta.

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Explique que cuidar do lixo produzido por uma cidade é um investimento alto e que os lixões acabam sendo mais baratos do que os aterros sanitários. Por isso, lixões são mais comuns do que os aterros sanitários, com destinação adequada.

Na sequência, oriente os alunos a respeito da nossa própria produção de lixo. Fale que os lixões são espaços inadequados para a destinação do lixo e dos resíduos e que os aterros são mais adequados, ainda mais quando a eles se combinam outras ações, como a da separação do lixo e da coleta seletiva, que se trata do procedimento que contribui para a reciclagem.

3ª Etapa: investigando a escola

Após ter conversado com os alunos a respeito da produção de lixo, oriente-os a investigarem a produção de lixo na escola. Informe que a atividade será importante para que possam pensar e refletir sobre a produção de lixo em um espaço que existe na sociedade, que são as escolas. Ter uma visão do espaço em que o estudante está inserido é uma atividade muito pertinente no sentido de abordar o local, porém, vale orientar a turma para que estabeleça comparações e se relacione com o geral.

Divida os estudantes em grupos pequenos e oriente-os a investigar os pátios e dependências da escola, procurando as lixeiras e as formas por meio das quais os resíduos estão sendo armazenados. Dê alguns encaminhamentos no sentido de explicar aos alunos que devem percorrer todos os espaços da instituição, que devem anotar quantas lixeiras encontraram ou se encontraram lixo pelo chão, e, caso possível, que conversem com funcionários a respeito da produção de lixo pela escola para saber quantos sacos de lixo são gerados diariamente.

Seria pertinente se você dividisse os estudantes em grupos maiores no momento de explorar o espaço da escola, de modo que um grupo averigue a instituição antes do intervalo dos alunos e outro faça esse exercício após o intervalo. Ao retornarem à sala com as anotações em mãos, os grupos irão produzir coletivamente um texto informativo a respeito de seus achados.

4ªEtapa:compartilhandoosresultadosdasinvestigações

Nesse penúltimo momento da atividade, os grupos irão compartilhar os resultados de suas investigações com o restante da turma. Organize as apresentações de modo que as diferenças entre o pré e o pós-intervalo na escola fiquem evidentes. Ao final das apresentações, faça uma breve síntese com os alunos, conduzindo a reflexão para que percebam a necessidade de propor soluções mais adequadas para o armazenamento e o descarte de resíduos na escola, para pensarem meios de levar isso para a vida em sociedade também.

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Aproveite para fazer indagações e pedir que reflitam sobre o quanto todas as escolas da cidade, do estado e do país produzem de lixo; somada essa quantidade à produção de nossas casas, esses valores se tornam ainda maiores. Enfatize que para a preservação ambiental há necessidade de propor soluções para a destinação adequada dos lixos urbanos e que muitas dessas ações que podem contribuir para a preservação ambiental começam com nossas ações diárias nos espaços que frequentamos.

Questione-os a respeito dessas possíveis soluções para a escola e coletivamente reflitam sobre as que os alunos levantarem. Enfatize que as soluções podem ser de naturezas diversas e sugira aos alunos que tentem conscientizar outros estudantes da escola para que se sensibilizem acerca da produção de lixo no espaço escolar. Sugere-se a confecção de cartazes tematizando a produção de lixo na instituição, de modo que os estudantes possam pensar sobre o quanto de lixo cada um e todos produzem.

5ªEtapa:confecçãodecartazesesensibilizaçãodoscolegasnaescola

Na última etapa dessa atividade, você poderá fornecer papel manilha ou cartolina e pedir aos alunos que, em grupos, confeccionem cartazes para serem fixados próximos aos locais em que mais observaram concentração de lixo após o intervalo, por exemplo. Os alunos poderão utilizar os resultados dos textos informativos que elaboraram para inserir nos cartazes. Além disso, se a escola não tem separação de resíduos para coleta seletiva, é possível propor que façam um cartaz contendo informações acerca da importância dessa atividade para a destinação adequada dos resíduos da escola. Oriente-os também a tentar sensibilizar os colegas a respeito da manutenção da limpeza dos espaços escolares.

Vale mencionar que o conteúdo desse conjunto de aulas aborda apenas a destinação de lixo urbano, mas que você, professor(a), poderá ampliar o conteúdo e tematizar a coleta seletiva e a reciclagem como formas de dar continuidade a essa questão.

Materiais relacionados

1) Professor(a), para compreender as diferenças entre lixão e aterro sanitário, bem como para refletir sobre a importância da destinação adequada do lixo urbano, assista no YouTube essa série com oito episódios, intitulada “O caminho do Lixo”.

2) Leia o artigo de Carlos Alberto Mucelin e Martha Bellini, intitulado “Lixo e impactos ambientais perceptíveis no ecossistema urbano” (2008).

3) Investigue, também, se na sua cidade há um lixão ou um aterro, se há coleta seletiva e quais são as condições de destinação de resíduos. Assim, você poderá exemplificar ou até mesmo ter maiores detalhes a respeito do que acontece na sua localidade para ensinar aos alunos.

FONTE: <https://www.institutonetclaroembratel.org.br/educacao/para-ensinar/planos-de-aula/destinos-do-lixo-urbano-aterro-sanitario-e-lixao/>. Acesso em: 19 abr. 2019.

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3 O PROBLEMA DA VIOLÊNCIA URBANA E A QUESTÃO DA SEGURANÇA PÚBLICA

O estudo da violência é abrangente e perpassa diversas áreas do saber. Podemos discorrer sobre a violência a partir de diferentes perspectivas e campos disciplinares, tais como a psicologia, sociologia, antropologia, da saúde entre outros. Nossa intenção é realçar alguns aspectos relacionados ao aumento da violência que vêm aumentando nos últimos anos, sobretudo, nos espaços urbanos.

A violência urbana sempre foi uma preocupação importante para os governos locais e para os formuladores de políticas públicas. Com o aumento da urbanização vivenciada na última década em diversos países e cidades, esta questão torna-se ainda mais urgente. Os centros urbanos são hoje o lar de metade da população mundial e estima-se que a população residente em áreas urbanas siga em ascensão nos próximos 25 anos (WORLD BANK, 2011).

O desenvolvimento das cidades tem contribuído para o crescimento econômico geral e abriu oportunidades para milhões de pessoas melhorarem expressivamente suas condições de vida e ascenderem socialmente em diversas partes do mundo. No entanto, ainda que a pobreza tenha diminuído em termos globais, observa-se que está crescendo em muitas áreas urbanas (WORLD BANK, 2011).

Nas grandes metrópoles, a desigualdade se mostra espacialmente nos contrastes das áreas que abrigam camadas ricas e prósperas da população, dignamente empregadas e vivendo em condições apropriadas no que diz respeito aos níveis básicos de conforto e segurança, em contraste com o ritmo expressivo de aumento da população urbana residentes em favelas.

Em alguns casos, importantes áreas urbanas das cidades se deterioraram em “zonas proibidas” que prejudicam a governança geral da área e tendem a manter a população residente em tais áreas em um perigoso ciclo de pobreza e violência. Convém apontar que o aumento da violência não acompanhou o crescimento dos centros urbanos em todos os lugares do mundo de forma idêntica, de modo que a relação entre crescimento urbano e violência ainda não está absolutamente clara e resolvida. Ainda assim, é certo que muitas cidades viram uma dramática escalada de violência nas áreas urbanas, particularmente na América Latina e na África. Também está claro que, mesmo em regiões com níveis relativamente baixos de violência urbana, como o Oriente Médio ou a Europa Ocidental, em muitos casos, essa violência urbana é maior do que a violência baseada em zonas rurais (WORLD BANK, 2011).

Convém ressaltar que olhares advindos do campo disciplinar da geografia urbana podem contribuir nos estudos sobre a violência urbana. A incidência da violência urbana varia no tempo e no espaço, revelando que nesta dinâmica são formados territórios específicos de violência, que podem por exemplo, serem

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zonas de constantes arrastões ou verdadeiros circuitos de venda e consumo de drogas. Em nosso país, uma das áreas urbanas que, lamentavelmente, se constitui em exemplo emblemático de um território de violência urbana, é a Cracolândia:

FIGURA 4 – CRACOLÂNDIA

FONTE: <https://www.theguardian.com/cities/2017/nov/28/cracolandia-sao-paulo-feira-crack-dentro>. Acesso em: 22 abr. 2019.

Compreender a espacialidade da violência, neste sentido, pode ajudar na elaboração de planos de ações que almejem mitigar este terrível problema da sociedade atual. Em face a urgência do tema, no âmbito da geografia vem se engendrando uma área de estudos denominada “Geografia do Crime”. Sobre o assunto, Francisco Filho (2003, p. 27) explica que:

A configuração de uma Geografia do Crime se daria da seguinte forma: O espaço urbano se apresenta como algo complexo, campo onde as relações humanas se estabelecem e se cristalizam nas suas formas e nas relações entre elas. É nesse espelhamento entre as ações e sua dinâmica no território que surge uma geografia do crime, em que cada ação de quebra da ordem e, consequentemente, de um ato de violação dos direitos do cidadão, adquire uma dinâmica e personalidade própria, estabelecendo um conjunto de ações que se interligam a outros fenômenos urbanos, interferindo e moldando a percepção que cada indivíduo passa a ser do espaço onde vive, estabelecendo novas texturas e morfologias no crescimento do tecido urbano, como consequência final de todo o processo. Falar em violência, portanto, e estabelecer sua geografia, é entender como o crime adquire uma organização, uma estrutura própria que faz seu reflexo no espaço urbano se sentir presente.

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As implicações relacionadas à chamada “violência crônica”, isto é, aquela que se apresenta de modo constante e vai sendo construída historicamente, são diversas e nocivas. Entre as quais, é possível mencionar que a violência recorrente transforma redes e relações sociais de formas que podem corroer a confiança e a ação coletiva efetiva. Ademais, o clima de medo e desconfiança criado pela violência crônica pode tornar-se tão arraigado que gera mais violência, que então se justifica como defesa. Além disso, a violência, ou o medo dela, impede o investimento, estigmatiza os bairros, corrói a coesão social e limita o acesso ao emprego e às oportunidades educacionais. No nível individual, os moradores urbanos em áreas de criminalidade e violência podem adiar o início de pequenos negócios e deixar de praticar algumas formas de solidariedade com vizinhos por medo de que essas ações os coloquem em maior risco de vitimização (WORLD BANK, 2011).

O clima resultante de insegurança também enfraquece a governança urbana, limitando a mobilidade e criando medo e desconfiança entre os membros da comunidade. Esses impactos são especialmente pronunciados em cidades nas quais as instituições já são frágeis. Tendo em vista os efeitos anteriores, a violência é claramente incapacitante tanto para as comunidades afetadas quanto para a cidade mais ampla (WORLD BANK, 2011).

Refletindo sobre a violência urbana, outro aspecto a ser ressaltado, sob o prisma da espacialidade, é o de que a incidência de crimes e ações violentas em determinadas áreas urbanas, acaba por constranger o acesso da população aos espaços públicos — especialmente os com finalidade de lazer, como as praças. Sobre este tema, García e Esteves Júnior (2017) advertem que o espaço público, sendo o lugar por excelência onde se materializam as relações entre os habitantes, o poder e a cidadania, tornou-se cenário de diversos problemas urbanos. A convivência com a violência, vandalismo, roubo, comércio e consumo de drogas tornou-se comum, atentando diretamente contra o direito de uma espacialidade coletiva saudável e livre, que permitisse que cada indivíduo fosse capaz de desfrutar de espaços públicos na sua cidade.

As consequências e o alcance da violência e do crime são sérias e prolongadas, influenciando assim o desenvolvimento e o comportamento dos indivíduos, afetando suas relações na sociedade e capazes de desencadear diversos problemas de segregação social e urbana, como também socioespaciais, tais como o abandono da vida pública em espaços públicos. Isso pressupõe uma divisão, muitas vezes não perceptível, entre grupos sociais em um espaço físico específico, onde normalmente não se define por que essa divisão ocorre; nem o escopo de suas consequências é claro, e mesmo que seja possível preveni-las ou revertê-las por meio de políticas ou intervenções por parte do poder público (GARCÍA; ESTEVES JÚNIOR, 2017).

Com o intuito de retratar e evidenciar a intensidade do problema da violência no Brasil na atualidade, apresentamos alguns resultados publicados

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no Atlas da Violência de 2018, elaborado pela IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada em conjunto com o FBSP – Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Conforme a pesquisa realizada, salta aos olhos que:

Em 2016, o Brasil alcançou a marca histórica de 62.517 homicídios, segundo informações do Ministério da Saúde (MS). Isso equivale a uma taxa de 30,3 mortes para cada 100 mil habitantes, que corresponde a 30 vezes a taxa da Europa. Apenas nos últimos dez anos, 553 mil pessoas perderam suas vidas devido à violência intencional no Brasil. [...] Ao analisar a evolução dos homicídios no país na última década, verificamos uma enorme heterogeneidade entre as Unidades Federativas, em que se observaram variações nas taxas de -56,7%, como no caso de São Paulo, a +256,9%, como no Rio Grande do Norte. Os dados mostram como a situação é mais grave nos estados do Nordeste e Norte do país, onde se situam as sete UFs com maiores taxas de homicídios por 100 mil habitantes, sendo elas: Sergipe (64,7), Alagoas (54,2), Rio Grande do Norte (53,4), Pará (50,8), Amapá (48,7), Pernambuco (47,3) e Bahia (46,9). Quando analisamos a violência letal contra jovens, verificamos, sem surpresa, uma situação ainda mais grave e que se acentuou no último ano: os homicídios respondem por 56,5% da causa de óbito de homens entre 15 a 19 anos. Quando considerados os jovens entre 15 e 29 anos, observamos em 2016 uma taxa de homicídio por 100 mil habitantes de 142,7, ou uma taxa de 280,6, se considerarmos apenas a subpopulação de homens jovens. A juventude perdida trata-se de um problema de primeira importância no caminho do desenvolvimento social do país e que vem aumentando numa velocidade maior nos estados do Norte (IPEA; FBSP, 2018, p. 3).

Para termos uma ideia da dimensão do problema dos homicídios do Brasil, observe o mapa a seguir:

FIGURA 5 – MUNDO: COMPARAÇÃO DO NÚMERO DE HOMICÍDIOS NO BRASIL EM RELAÇÃO AOS DEMAIS PAÍSES

FONTE: <https://super.abril.com.br/blog/contaoutra/o-brasil-tem-mais-assassinatos-do-que-todos-estes-paises-somados/>. Acesso em: 29 abr. 2019.

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Os dados do mapa, referentes ao ano de 2015, nos mostram que ocorreram no país 59 mil assassinatos. Para efeito de comparação, este número de assassinatos refere-se à soma de todos os assassinatos ocorridos em 2015 nestes 52 países: EUA, Canadá, Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia, Egito, China, Mongólia, Malásia, Indonésia, Austrália, Nova Zelândia, Coreia do Sul, Coreia do Norte, Japão, Portugal, Espanha, Reino Unido, Irlanda, França, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, Alemanha, Itália, Suíça, Dinamarca, Noruega, Suécia, Finlândia, Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia, República Tcheca, Eslováquia, Áustria, Hungria, Belarus, Ucrânia, Romênia, Moldávia, Bulgária, Eslovênia, Croácia, Bósnia-Herzegovina, Sérvia, Montenegro, Albânia, Grécia e Macedônia. Infelizmente, é lamentável a situação do nosso país com relação à violência.

Quando comparamos a evolução das taxas de homicídios do Brasil com outros países da América do Sul, constata-se que ficamos atrás apenas para a Colômbia, observe no gráfico:

GRÁFICO 3 – EVOLUÇÃO DAS TAXAS DE HOMICÍDIOS NA AMÉRICA LATINA

FONTE: IPEA, FBSP (2018, p. 12)

Observe no gráfico como é expressiva a taxa do número de homicídios no Brasil. Perdemos apenas para a Colômbia, país que ainda lida com conflitos políticos relacionados às guerrilhas. Se compararmos os dados do Brasil com a taxa da média mundial, fica evidente que ainda temos muitos desafios para serem superados se desejarmos alcançar níveis adequados de qualidade de vida. Examinemos agora a situação do Brasil em suas diferentes unidades federativas.

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FIGURA 6 – BRASIL: TAXA DE HOMICÍDIOS POR UNIDADE FEDERATIVA EM 2016

FONTE: <https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/brasil-chega-a-taxa-de-30-assassinatos-por-100-mil-habitantes-em-2016-30-vezes-a-da-europa-diz-atlas-da-violencia.ghtml>. Acesso

em: 18 abr. 2019.

Como podemos observar no mapa, a média geral do Brasil alcançou a taxa de 30 homicídios para cada 100 mil habitantes. Este número é bastante expressivo, mas é necessário levar em conta as particularidades das regiões desta taxa. Observe que a variação espacial destas taxas é notável, considerando que em Sergipe a taxa chega a 64,7%, seguida por Alagoas, com 54,2% e Rio Grande do Norte com 53,4%, apresentando as piores taxas do país. Por sua vez, no mesmo período a taxa de São Paulo foi de 10,9% e de Santo Catarina, 14,2%, sendo estes os estados com as menores taxas de homicídios do país.

A respeito da redução do número de homicídios registrados em São Paulo, selecionamos o fragmento da matéria publicada na Gazeta do Povo (FONTES, 2018, p. 1) que trata do assunto.

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Os motivos para a redução, entretanto, não são consenso entre os estudiosos do tema. Um ponto sobre o qual os pesquisadores parecem concordar é que a redução não pode ser atribuída a um único fator. De um lado, aparecem iniciativas do poder público que contribuíram para o resultado. “A partir dos anos 2000 houve um aumento no número de casos de assassinato resolvidos pela polícia, ocasionando a prisão dos homicidas”, explica Zanetic." "Além do fortalecimento do setor de investigação da polícia, a maior apreensão de armas de fogo e o esforço das secretarias municipais em enfrentar o problema – que é, usualmente, da alçada dos governos do estado e federal – também têm relação com a queda na quantidade de assassinatos. Mais um fator importante é de ordem demográfica: a diminuição do número de jovens, que são as principais vítimas dos assassinatos do país. Outra questão relevante, entretanto, não se relaciona a políticas públicas, mas aos próprios criminosos. Ator determinante nesse cenário é a facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), que domina o tráfico de drogas em São Paulo. “Há muitos relatos, que vêm das comunidades e dos próprios policiais, de que essa organização controla ações violentas mais extremas”, afirma o pesquisador." Apesar do argumento ser refutado oficialmente pelas autoridades, a hipótese ganha força justamente se relacionada à maior eficiência da polícia nas investigações. Com maior risco de prisão, a ordem pode ter sido primar pela cautela em relação a assassinatos. “Não por bondade, mas porque muitos homicídios atrapalham os negócios”, afirma Zanetic.

Tal como se observa na citação, há sempre um entrelaçamento de fatores que contribuem para a melhoria dos indicadores. Além disso, observe que tais mudanças podem estar vinculadas a aspectos conjunturais. Para finalizar esta etapa da reflexão, questionamos: por que as cidades são tão frequentemente associadas à violência? Parte do conhecimento comum no plano da geografia urbana e da violência urbana delineia um cenário particular: o rápido crescimento das cidades alimenta a formação caótica de favelas, na qual a superlotação e a competição por recursos escassos se combinam com fraca presença da segurança do Estado para fomentar a criminalidade e a violência (WORLD BANK, 2011). Somado a tais fatores, a falta de acesso à saúde, educação e mercado de trabalho também integram o conjunto de aspectos que participam deste cenário.

A análise sobre os problemas das favelas no Brasil será realizada na sequência. Contudo, é necessário realçar que não há nada inevitável sobre a violência no ambiente urbano. Megacidades como Cairo e Tóquio estão entre as cidades mais seguras do mundo. Da mesma forma, grandes cidades como Bogotá, Nova York e São Paulo tiveram uma queda notável nos crimes violentos, apesar das populações densas e em crescimento (WORLD BANK, 2011).

Tenhamos em mente então, que a relação entre cidades e violência é bastante complexa e merece ser estudada sempre estando atento aos seus condicionantes temporais, espaciais, sociais, econômicos, culturais e ambientais.

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4 AS FRAGILIDADES DA QUESTÃO DA HABITAÇÃO NO BRASIL: FAVELAS E SEUS PROBLEMAS DE URBANIZAÇÃO

Outro problema típico dos espaços urbanizados no Brasil refere-se ao crescimento do número de favelas. O fenômeno de emergência das favelas, contudo, não é recente. Neste sentido, para iniciarmos a discussão sobre o assunto, iremos expor o trecho do artigo de Adauto Lúcio Cardoso que contextualiza a ideia de favela historicamente.

A questão das favelas assume hoje uma dimensão sem precedentes na história do Brasil. Embora seja considerado um problema com raízes históricas no final do século XIX, de início a favela era um problema localizado nos grandes centros e assumia, em termos proporcionais, ainda uma dimensão mais pontual. Cortiços, estalagens ou casas de cômodos eram as formas de moradia predominantes entre as camadas populares no final do século XIX e início do século XX. Identificadas, na concepção higienista, como focos de contaminação e de propagação de doenças, as habitações dos pobres eram também consideradas como locais de concentração das chamadas classes perigosas. Os cortiços foram formalmente proibidos pela legislação, já no final do século XIX, assim como também foram objeto de programas de erradicação, como, por exemplo, através da famosa política do “bota-abaixo” que caracterizou a gestão do Prefeito Pereira Passos (1903-1907) na cidade do Rio de Janeiro.

O sucesso da política de erradicação de cortiços no Rio de Janeiro resultou na transferência do problema: na falta de outras opções, a população de baixa renda subiu os morros, ocupou as áreas de mangues e alagados, as áreas públicas ou outros terrenos pouco valorizados pelo mercado. Esses assentamentos tinham como principais características a ocupação do solo sem parcelamento regular prévio, a precariedade física das moradias, a ausência de infraestrutura e a irregularidade da propriedade do solo. No entanto, em outras cidades, nem todas as favelas eram invasões: no Nordeste, era comum o denominado “aluguel do chão”, ou seja, a permissão da ocupação pelo proprietário, sem parcelamento, através da contrapartida do pagamento de um arrendamento, na grande maioria dos casos sem contratos formais. Essa situação favorecia o proprietário com a valorização do terreno, através da consolidação da ocupação, ocorrendo posteriormente o despejo dos moradores, sem direito à indenização, na medida em que não estavam protegidos por contratos formais. Em outras cidades, principalmente no Sudeste, a invasão era a forma predominante de ocupação, preferencialmente de terrenos públicos, o que aumentava a possibilidade de permanência. Em muitos casos, a ocupação era – e ainda é – apoiada por políticos ou por agentes públicos, em troca de apoio eleitoral, seguindo o esquema clientelista clássico.

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Uma boa parte das favelas se localizava também, generalizadamente no país, através da ocupação de terras inadequadas, principalmente mangues, margens de cursos d’água ou encostas de alta declividade. Nos casos de mangues e assemelhados, o “terreno” ia sendo constituído juntamente com a construção da casa, através de aterros sucessivos e a consequente expansão do assentamento em direção à área alagada. Ao longo do século XX, as favelas foram se consolidando como a principal alternativa de moradia para as populações de baixos rendimentos [...].

Até os anos 1990, considerava-se que o processo de rápida urbanização com altas taxas de migração rural-urbana, era a principal causa da chamada favelização das grandes cidades. O crescimento urbano acelerado, associado à baixa capacidade de investimentos e de regulação pública sobre as áreas urbanasestariamnaraizdoproblemadasfavelas,segundoainterpretaçãodominante nas décadas de 60 e 70 [...].

O desenvolvimento econômico associado à urbanização acelerada ainda teve como fator agravante a incapacidade do poder público em realizar investimentoseminfraestruturasurbanaseemampliarasuacapacidadederegulaçãodomercado fundiário e imobiliário. As cidades cresceram, pois, com pouco ou nenhum planejamento, e com o investimento em infraestrutura seguindo (e não antecedendo) a ocupação efetiva do solo. Além dos problemas ambientais gerados pela ocupação de terras inadequadas e do custo elevado das soluções técnicas para urbanizar áreas já ocupadas, gerou-se uma enorme desigualdade de acessibilidade a recursos e serviços, o que agravou o processo de especulação com a terra. É importante ressaltar que, dado o baixo grau de consolidação do setor financeiro no país, até os anos 1970, as opções de investimento de capital eram restritas e parcela significativa das poupanças foi investida no setor imobiliário, o que resultou em fortes processos de especulação com a terra. Com isso gerou-se uma enorme disparidade entre os preços da terra nos mercados formais e as possibilidades de renda da maioria da população. É nesse quadro de escassez relativa de terra urbanizada a preços acessíveis, que se dá a formação das favelas [...].

FONTE: CARDOSO, A . L . Avanços e desaf ios na exper iênc ia bras i le i ra de urbanização de favelas.  Cadernos Metrópole, São Paulo, n. 17, p. 219-240, jan. – jun. 2007. Disponível em: http://www.urbanismo.mppr.mp.br/arquivos/File/CARDOSO_Avancosedesafiosnaxperienciabrasileiradeurbanizacaoeavelas.pdf. Acesso em: 22 jul. 2019.

A questão das favelas no âmbito dos estudos da geografia urbana é bastante desafiadora pois é neste espaço em que se encontram várias condições que fogem do escopo de áreas urbanas planejadas, começando pelo fato de que tais áreas de habitação costumam ocupar espaços inadequados, muitos deles com restrições de uso previstas em lei devido às características ambientais (e as regras não são respeitadas). Observe a imagem a seguir:

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FIGURA 7 – FAVELA DA ROCINHA – RIO DE JANEIRO (RJ)

FONTE: <https://www.agenciapreview.com/favela-da-rocinha/>. Acesso em: 22 abr. 2019.

Observe também como se deu o processo de ocupação urbana na favela de Patare, na Venezuela. Atente para o modo como a paisagem natural foi utilizada para receber moradias de modo não planejado.

FIGURA 8 – FAVELA PATARE NA VENEZUELA

FONTE: <https://www.pinterest.es/pin/555702041513135643/>. Acesso em: 22 jul. 2019.

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Ao lançarmos o olhar sobre a paisagem de uma favela, podemos contatar e deduzir a presença de algumas condições “anormais” ou “fora do padrão” se comparado com outros espaços urbanos em áreas das cidades que respeitam algumas normas consideradas necessárias e apropriadas para a estruturação de uma cidade. Vamos rapidamente pensar em alguns destes aspectos? Nesta imagem, verifica-se que muitas casas estão situadas próximas a áreas verdes (sem respeitar o recuo necessário), as residências encontram-se muito próximas (quase coladas umas nas outras) o que é bastante diferente do que se encontram em outros bairros da cidade do Rio de Janeiro (considerando o exemplo proposto), o padrão de arruamento não é adequado e nem suficientemente espaçoso, como ocorre em outras áreas, e o acesso à rede elétrica, em muitos casos, ocorre de forma irregular (aquilo que muitos conhecem como “gatos”). Estas são apenas algumas das características que diferem a favela de outros espaços urbanos das cidades. Iremos explorar quais são os elementos e aspectos constituintes de uma favela e refletir sobre alguns desdobramentos decorrentes.

No Brasil, no âmbito dos estudos geográficos, as favelas recebem a denominação de aglomerado subnormal. Este conceito é adotado no Censo Demográfico e utilizado como base de análise pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Sobre este conceito, menciona-se que ele “possui certo grau de generalização de forma a abarcar a diversidade de assentamentos irregulares existentes no País, conhecidos como: favela, invasão, grota, baixada, comunidade, vila, ressaca, mocambo, palafita, entre outros” (IBGE, 2010, p. 26).

No estudo dos aglomerados subnormais, são levados em conta características como o seu tamanho, localização, acessibilidade, densidade de ocupação e características dos domicílios, incluindo os serviços disponíveis, como abastecimento de água, esgotamento sanitário, destino do lixo e disponibilidade de energia elétrica (IBGE, 2010).

Com relação às formas de identificação de tais tipos de aglomerados, a seguir são expostos os critérios adotados pela instituição:

Comoseidentificaumaglomeradosubnormal?

O setor especial de aglomerado subnormal é um conjunto constituído de, no mínimo, 51 (cinquenta e uma) unidades habitacionais (barracos, casas...) carentes, em sua maioria de serviços públicos essenciais, ocupando ou tendo ocupado, até período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou particular) e estando dispostas, em geral, de forma desordenada e densa.

A identificação dos Aglomerados Subnormais deve ser feita com base nos seguintes critérios:

a) Ocupação ilegal da terra, ou seja, construção em terrenos de propriedade alheia (pública ou particular) no momento atual ou em período recente (obtenção do título de propriedade do terreno há dez anos ou menos); e

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b) Possuírem pelo menos uma das seguintes características: urbanização fora dos padrões vigentes — refletido por vias de circulação estreitas e de alinhamento irregular, lotes de tamanhos e formas desiguais e construções não regularizadas por órgãos públicos; e precariedade de serviços públicos essenciais.

Os Aglomerados Subnormais podem se enquadrar, observados os critérios de padrões de urbanização e/ou de precariedade de serviços públicos essenciais, nas seguintes categorias:

a) invasão;b) loteamento irregular ou clandestino; e c) áreas invadidas e loteamentos irregulares e clandestinos regularizados em

período recente.

FONTE: IBGE. Censo demográfico 2010: aglomerados subnormais, primeiros resultados. Rio de Janeiro: Ministério do Planejamento Desenvolvimento e Gestão, 2010. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/92/cd_2010_aglomerados_subnormais.pdf. Acesso em 25 de abril de 2019.

Após analisarmos os elementos conceituais e descritivos que compõem um aglomerado subnormal, observe na imagem a seguir uma das deficiências encontradas neste tipo de aglomerado, relacionada à distribuição da rede elétrica. Registros de luz são instalados em barracos sem seguir padrões de segurança.

FIGURA 9 – EXEMPLO DE PRECARIEDADE DE SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS NOS AGLOMERADOS SUBNORMAIS

FONTE: <http://g1.globo.com/sp/santos-regiao/noticia/2012/12/com-nome-de-novela-comunidade-nao-tem-agua-luz-e-servico-postal.html>. Acesso em: 22 abr. 2019.

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O estudo realizado pelo IBGE (2010) revela que o tamanho do aglomerado subnormal e sua inserção no tecido urbano formal varia bastante por toda a extensão territorial do Brasil, abarcando cidades que contavam com pequenos aglomerados subnormais, que se apresentavam de maneira fragmentada no conjunto urbano e, por outro lado, incluem cidades onde predominavam grandes aglomerados subnormais, alguns com mais de 10 mil domicílios.

Observe no cartograma a seguir a comparação de duas áreas de aglomerados subnormais. O primeiro, retrata um exemplo de uma grande favela enquanto o segundo, por sua vez, representa espacialmente várias pequenas favelas distribuídas pelo tecido urbano de São Paulo. Porém, antes de partir para a análise do cartograma, você se recorda quais são as características desta forma de representação espacial? Vamos recordar? De acordo com Sanchez (1973, p. 37), o cartograma “é um tipo de representação que se preocupa menos com os limites exatos e precisos, bem como as coordenadas geográficas, para se preocupar mais com as informações que serão objeto da distribuição espacial no interior do mapa”. Trata-se de uma forma de representação que pode ser utilizada para pequenos ou grandes espaços e que pode ser construída em qualquer escala.

FIGURA 10 – CARTOGRAMAS COMPARATIVOS DE AGLOMERADOS SUBNORMAIS

FONTE: IBGE (2010, p. 30)

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Segundo a investigação do IBGE (2010), a respeito do tamanho e da densidade das áreas ocupadas pelos aglomerados subnormais, elas interferem na qualidade de vida da população, tendo em vista que quanto mais densa a área, a acessibilidade, a circulação de ar e a insolação apresentam condições mais críticas.

A respeito da distribuição espacial deste tipo de aglomerado, constata-se que ele “pode surgir da ocupação de áreas pouco propícias à urbanização regular, como encostas de elevada declividade, áreas sujeitas à inundação, áreas de manguezal ou de praia” (IBGE, 2010, p. 28-29). Outro fato relevante é que tais tipos de aglomerados costumam surgir próximos a áreas com grandes concentrações de emprego e infraestrutura, como é o caso da área conturbada das metrópoles. Exemplo de tal situação pode ser visualizado na imagem a seguir.

FIGURA 11 – AGLOMERADO SUBNORMAL CAMINHO DAS ÍNDIAS, NO LITORAL DE SÃO PAULO, OCUPANDO O MANGUE

FONTE: <http://g1.globo.com/sp/santos-regiao/noticia/2012/12/com-nome-de-novela-comunidade-nao-tem-agua-luz-e-servico-postal.html>. Acesso em: 22 abr. 2019.

No mapa a seguir observa-se a distribuição espacial dos aglomerados subnormais no Brasil, com base nas informações do último Censo de 2010.

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FIGURA 12 – BRASIL: DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DOS AGLOMERADOS SUBNORMAIS EM 2010

FONTE: IBGE (2010, p. 39)

A leitura deste mapa evidencia como a problemática dos aglomerados subnormais está estreitamente relacionada à localização das metrópoles. De acordo com o estudo realizado, “as metrópoles que constituem o topo da hierarquia urbana são polos de concentração da produção econômica e do emprego, lugar onde estava localizada a maioria dos aglomerados subnormais” (IBGE, 2010, p. 39). O estudo do processo de emergência dos aglomerados subnormais nos mostra que se trata de um fenômeno que salta escalas. Isto é, só podemos entender as origens e os fatores que levaram a formação de um aglomerado subnormal quando extrapolamos a dimensão espacial exclusiva de cada município. Em regiões metropolitanas, os fatores que ajudam a entender os motivos de formação de um aglomerado subnormal costuma estar fortemente atrelados às relações espaciais que se estabelecem com os municípios vizinhos. Como exemplo, não seria possível compreender a formação de favelas no

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município de Palhoça (SC), sem analisar os fluxos econômicos e sociais que se estabelecem com a capital Florianópolis, tal como, não seria possível “explicar a ocorrência de aglomerados subnormais em um município como Diadema (SP) sem levar em conta o contexto da Região Metropolitana de São Paulo, no qual ele está inserido” (IBGE, 2010, p. 40). Ademais, observe no mapa (Figura 12) como também é expressiva a concentração de tais aglomerados na Região Sudeste.

Ainda com relação ao padrão de localização dos aglomerados subnormais, conforme estudamos, eles podem ser de diversos tamanhos. Neste sentido, conforme acompanhamos com frequência nos noticiários, nosso país abriga grandes favelas que chegam a ter o tamanho de verdadeiras cidades. Para termos uma ideia, em termos comparativos, as Regiões Metropolitanas de São Paulo, do Rio de Janeiro e de Belém somadas concentravam quase a metade (43,7%) dos domicílios em aglomerados subnormais do total do País (IBGE, 2010).

Outro apontamento relevante identificado pelo IBGE (2010) refere-se à relação entre a incidência de aglomerados subnormais e o tamanho das cidades. Particularmente, constatou-se que:

[...] 44,8% dos domicílios particulares ocupados em aglomerados subnormais estavam em municípios com mais de 1 milhão de habitantes, enquanto 55,2% estavam em municípios com menos de 1 milhão de habitantes [...]. Havia a presença de aglomerados subnormais em cidades de médio porte, mas a análise por Regiões Metropolitanas mostrou um número menor de domicílios em aglomerados subnormais nos espaços urbanos menos populosos (IBGE, 2010, p. 40).

Ou seja, em termos simples, o problema das favelas ocorre de modo mais acentuado nas grandes cidades, onde os espaços disponíveis para moradia são mais escassos e os preços dos terrenos, das moradias e dos aluguéis tendem a ser a mais caros quando comparados aos valores praticados em cidades pequenas ou médias, caracterizando a chamada especulação imobiliária, estudada pela geografia urbana.

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RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• A urbanização brasileira está intimamente relacionada ao processo de industrialização, que desencadeou um aumento da população que passou a residir em áreas urbanas.

• Saneamento básico é considerado como o conjunto de serviços, infraestruturas e instalações operacionais de: abastecimento de água potável; esgotamento sanitário; limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos; drenagem e manejo das águas pluviais urbanas.

• Em se tratando das dificuldades de acesso à água, este problema apresenta-se de forma mais acentuada em populações urbanas do que em populações rurais.

• As fossas sépticas são recipientes construídos ou instalados no local para manter durante tempo determinado os dejetos domésticos, industriais, ou comerciais, com o objetivo de sedimentar os sólidos e reter o material contido nos esgotos, para transformá-los bioquimicamente, em substâncias e compostos mais simples e menos poluentes. São utilizadas em locais desprovidos de rede pública de esgoto.

• O lançamento de esgotos domésticos nos corpos d’água sem adequado tratamento ou em desconformidade com os atuais padrões legais estabelecidos para lançamento de efluentes, resulta em comprometimento da qualidade da água do corpo receptor e pode inviabilizar o atendimento aos usos atuais e futuros dos recursos hídricos a jusante do lançamento.

• A incidência da violência urbana varia no tempo e no espaço, revelando que nesta dinâmica são formados territórios específicos de violência.

• Compreender a espacialidade da violência pode ajudar na elaboração de planos de ações que almejem mitigar este terrível problema da sociedade atual.

• O clima resultante de insegurança enfraquece a governança urbana, limitando a mobilidade e criando medo e desconfiança entre os membros da comunidade.

• Cortiços, estalagens ou casas de cômodos eram as formas de moradia predominantes entre as camadas populares no final do século XIX e início do século XX os quais deram origem a favelização como conhecemos hoje.

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• No estudo dos aglomerados subnormais, são levados em conta características como o seu tamanho, localização, acessibilidade, densidade de ocupação e características dos domicílios, incluindo os serviços disponíveis, como abastecimento de água, esgotamento sanitário, destino do lixo e disponibilidade de energia elétrica.

• O problema das favelas ocorre de modo mais acentuado nas grandes cidades, onde os espaços disponíveis para moradia são mais escassos e os preços dos terrenos, das moradias e dos aluguéis tendem a ser a mais caros quando comparados aos valores praticados em cidades pequenas ou médias.

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AUTOATIVIDADE

1 (ENADE, 2008)

Considerando as Figuras 1 e 2 anteriores, e a relação homem-natureza no que se refere às questões ambientais, sociais e econômicas decorrentes da apropriação dos recursos naturais, julgue os itens seguintes.

I- O fenômeno verificado na Figura 1 não decorre de fato isolado, mas de um conjunto de acontecimentos interligados, resultantes do crescimento urbano e dos impactos deste sobre os ecossistemas.

II- O Estatuto das Cidades (Lei Federal n° 10.257, de 10 de julho de 2001) prevê a desocupação urbana de áreas de preservação permanentes, como a representada na Figura 2, previstas pela legislação de zoneamento ambiental.

III- Os manguezais, áreas especiais frágeis, são considerados de proteção permanente desde a aprovação do Código Florestal brasileiro.

IV- Os manguezais, que se estendem da foz do rio Amazonas até o delta do rio Parnaíba (PI), têm recebido monitoramento dos órgãos federais e estaduais competentes, que asseguram os limites de ocupação dessas áreas pela urbanização.

Agora, assinale a opção correta:a) ( ) Apenas um item está certo.b) ( ) Apenas os itens I e II estão certos. c) ( ) Apenas os itens I e III estão certos. d) ( ) Apenas os itens II e III estão certos. e) ( ) Todos os itens estão certos.

FONTE: <https://www.aprovaconcursos.com.br/questoes-de-concurso/questao/649032>. Acesso em: 22 ago. 2019.

FIGURA 2 - PAISAGEM DE MANGUEZAL DO LITORAL BRASILEIRO.

FIGURA 1 - PAISAGEM URBANA DO LITORAL BRASILEIRO.

FONTE: <http://twixar.me/QFY1>Acesso em: 9 out. 2019

FONTE: <https://rochesterenvironment.com/images/Genesee%20River%202010.

JPG> Acesso em: 9 out. 2019

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2 (Concurso Prefeitura de São João do Araguaia – PA, 2018) Após quatro anos de quedas sucessivas, as favelas voltaram a se expandir no Rio de Janeiro. É o que mostra o levantamento feito pelo Instituto Pereira Passos (IPP) com fotos aéreas e publicado no jornal O Globo. A pesquisa revela que a área total das 1.018 comunidades cariocas aumentou 0,31% entre 2012 e 2016, totalizando 46,12 milhões de metros quadrados. Não parece muito, mas é como se, em quatro anos, surgisse na cidade do Rio outra favela com 10 mil habitantes.

Esse processo espacial que ocorre nas grandes cidades brasileiras, como o Rio de Janeiro:

a) ( ) Promove uma ocupação geográfica mais racional do espaço urbano, uma vez que aproxima a população mais carente do seu local de trabalho, reduzindo os custos com transportes.

b) ( ) É provocado por fatores como a descontinuidade das políticas públicas voltadas para a moradia da população mais carente e o alto preço dos imóveis nas áreas com melhor infraestrutura.

c) ( ) Está diretamente relacionado à especulação imobiliária promovida por movimentos sociais associados ao crime organizado, que reservam para os membros da comunidade os melhores lotes de terra.

d) ( ) Trata-se da segregação socioespacial praticada pelas classes pobres com o objetivo de exigir melhorias da infraestrutura urbana dessas áreas a fim de valorizar suas moradias no mercado imobiliário.

FONTE: <http://www.tierrasdeamerica.com/2017/08/03/aumentam-favelas-rio-dejaneiro/>. Acesso em: 24 abr. 2018.

3 (SEDUC-CE, 2018) Classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas com relação à urbanização brasileira:

( ) Nos grandes centros urbanos, o aumento da degradação ambiental é consequência exclusiva da ação dos grupos mais pobres da sociedade, que poluem rios e lagoas com efluentes domésticos e lançam seus resíduos sólidos indiscriminadamente sobre ruas ou terrenos abandonados.

( ) Destaca as grandes cidades como palco de contradições entre inovações, modernização e pobreza.

( ) A primazia de metrópoles regionais como Manaus, Fortaleza e Curitiba se acentua, tornando-as centro de controle da vida econômica e política do País, rebaixando o tradicional comando exercido por São Paulo e Rio de Janeiro.

( ) Conjuntos habitacionais, favelas e cortiços, de um lado, e condomínios exclusivos, murados e controlados, de outro, demarcam os extremos da diferenciação espacial da habitação nas cidades brasileiras.

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Está correta, de cima para baixo, a seguinte sequência:

a) ( ) V – F – V – F.b) ( ) V – V – F – F.c) ( ) F – V – F – V.d) ( ) F – F – V – V.

FONTE: <https://www.qconcursos.com/questoes-de-concursos/questoes/bcf9e6d9-e6>. Acesso em: 22 ago. 2019.

4 A violência urbana é um problema que atinge cidades de diferentes tamanhos e incide em diversos países. No Brasil, dentre os fatores que estão atrelados a esta problemática, merece destaque a falta de planejamento urbano e a intensificação do tráfico de drogas. Acerca da violência urbana, avalie as seguintes asserções e a relação proposta entre elas.

I- As consequências e o alcance da violência e do crime são sérias e prolongadas, influenciando o desenvolvimento e o comportamento dos indivíduos.

PORQUE

II- Tais consequências afetam as relações que os indivíduos estabelecem em sociedade e são capazes de desencadear diversos problemas de segregação social e urbana, como também socioespaciais, tais como o abandono da vida pública em espaços públicos.

A respeito dessas asserções, assinale a opção CORRETA. a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma

justificativa da I. b) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição

falsa. c) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é um complemento

da I. d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.

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TÓPICO 2

ASPECTOS POSITIVOS DA URBANIZAÇÃO

BRASILEIRA

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

No tópico anterior, examinamos os diversos problemas que decorrem de um processo de urbanização não planejado e seus diversos desdobramentos nas dimensões sociais, ambientais, políticas e econômicas. Neste tópico, a intenção é conhecer um pouco da história do projeto das cidades Brasília e Curitiba. A seleção destas cidades decorre do fato de que elas são consideradas exemplos de capitais planejadas. Vamos juntos conhecer a trajetória destas cidades?

Neste tópico, você irá compreender que a construção da cidade de Brasília está atrelada a um contexto que ultrapassa a dimensão do planejamento urbano, articulando-se também a questões políticas e econômicas. Outro aspecto interessante que será apresentado é a relação entre a concepção de uma cidade e a escolha dos modais de transporte que serão privilegiados. Esta relação é bastante estreita e desencadeia consequências que se estendem por muitos e muitos anos, tendo em vista que o sistema viário é um importante elemento de sustentação para a cidade e as alterações nos mesmos, embora possíveis e desejáveis, no Brasil, tendem a ser onerosas e lentas. No caso de Curitiba, iremos realçar a dimensão dos espaços públicos, conhecendo um pouco mais da história da cidade que acabou ficando conhecida na atualidade, por seus parques e espaços públicos de lazer.

2 A EXPERIÊNCIA DE BRASÍLIA

Para entendermos como surgiu a cidade de Brasília, precisamos ter em mente que esta cidade é fruto de um longo processo e de um plano urbanístico rigoroso. Mata (2014) observa que a criação da cidade foi apontada como marco das intenções que previam o desenvolvimento da região do Planalto Central e, por ter sido projetada de acordo com diretrizes modernas, é considerada uma expressão do urbanismo moderno. Coelho (2008, p. 65) relata que: “a construção de Brasília no final dos anos 50 do século XX representa a tentativa de concretização de uma utopia urbana. A ideia de uma capital moderna como nova representante política do Brasil traduzia um projeto de sociedade num momento de grande desenvolvimento econômico no país”.

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UNIDADE 2 | O ESPAÇO URBANO BRASILEIRO

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Coelho (2008) explica que a concepção de Brasília ocorreu concomitantemente com o boom da indústria automobilística e, sob o prisma do planejamento urbano, recebeu a interferência de dois conceitos em alta naquele momento histórico: os princípios da Carta de Atenas e o modelo das “Cidades Jardim” de Ebenezer Howard.

A Carta de Atenas é um documento que discorre sobre as premissas do urbanismo resultantes do IV Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM), realizado em Atenas em 1933. Trata-se de um documento abrangente e que não será analisado de maneira pormenorizada em virtude do escopo delimitado para essa disciplina. Convém, todavia, realçar alguns elementos que o compõem para que possamos ter ideia do contexto urbanístico do período.

A primeira parte do manifesto refere-se à relação da cidade com a sua região, acompanhe:

A cidade é só uma parte de um conjunto econômico, social e político que constitui a região. Raramente a unidade administrativa coincide com a unidade geográfica, ou seja, com a região. O recorte territorial administrativo das cidades pode ter sido arbitrário desde o início ou pode ter vindo a sê-lo posteriormente, quando, em decorrência do seu crescimento, a aglomeração principal uniu-se a outras comunidades e depois as englobou. Esse recorte artificial se opõe a uma boa gestão do no conjunto. De fato, certas comunidades suburbanas puderam adquirir inopinadamente um valor imprevisível, positivo ou negativo, seja tornando-se sede de residências luxuosas, seja acolhendo centros industriais dinâmicos, seja reunindo miseráveis populações operárias. Os limites administrativos de aço que compartimentam o complexo urbano tornam-se então paralisantes. Uma aglomeração constitui o núcleo vital de uma extensão geográfica cujo limite é constituído pela zona de influência de uma outra aglomeração. Suas condições vitais são determinadas pelas vias de comunicação que asseguram suas trocas e ligam-se intimamente a sua zona particular. Só se pode enfrentar um problema de urbanismo referenciando-se constantemente aos elementos constitutivos da região e, principalmente, a sua geografia, chamada a desempenhar um papel determinante nessa questão: linhas de divisão de águas, morros vizinhos desenhando um contorno natural confirmado pelas vias de circulação, naturalmente inscritas no solo. Nenhuma atuação pode ser considerada se não se liga ao destino harmonioso da região. O plano da cidade é só um dos elementos do todo constituído pelo plano regional (CIAM, 1933, p. 1).

Observe como já no início deste documento, publicado em 1933, são elencados aspectos que seguem em evidência na atualidade, tais como o alcance da região de influência de uma cidade e suas interfaces com o ambiente natural e com a esfera econômica. Como será examinado na sequência, a escolha de Brasília para a construção da capital do país, levou em conta aspectos como clima considerado estável, mudança da capital para o interior no intuito de protegê-la de possível invasões costeiras, tendo em vista que a antiga sede da capital era o Rio de Janeiro – RJ e, sob a ótica econômica, a ênfase em planejar uma cidade na qual o meio de transporte predominante seria o rodoviário que estava em consonância com o forte poder da indústria automobilística do momento.

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DICAS

Para conhecer o conteúdo da Carta de Atenas na íntegra, você pode acessar o link a seguir:http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Atenas%201933.pdf.

Outra inspiração do planejamento urbano que estava em voga no momento histórico da criação de Brasília era o chamado modelo das “Cidades Jardim”, de Ebezener Howard. Vamos entender do que se tratava esta modelo? Na concepção de Ebezener Howaerd, a Cidade Jardim é uma cidade projetada para garantir à sua população, condições de vida e de trabalho saudáveis; suas dimensões devem ser suficientes para permitir o pleno desenvolvimento da vida social; cercado por um cinturão rural, sendo o seu fundamento a totalidade de um bem público ou gerido por uma confiança em nome da comunidade (ANTONI, 2004). Essa ideia de cidade visa oferecer uma alternativa às grandes cidades e subúrbios industriais. Essa expressão foi introduzida por Ebenezer Howard em 1898 em sua obra: To-morrow ou Cidades-Jardins de Amanhã. Nesta concepção, a Cidade-Jardim constitui o módulo básico de uma metrópole, o protótipo de uma cidade ecológica e um satélite de uma grande cidade (ANTONI, 2004).

Na imagem a seguir, apresentamos o modelo de Cidade-Jardim proposto por Ebezener Howard, observe.

FIGURA 13 – MODELO DE CIDADE-JARDIM PROPOSTO POR EBEZENER HOWARD

Área residencial Áreas verdesEdificações institucionaisGrande avenidal

Área comercialÁrea indústrial

FONTE: <http://2.bp.blogspot.com/_-p34h9oGuCw/SRsaexnJdOI/AAAAAAAAASY/ouCAggzAjek/s1600-h/normal_cidade-jardim-diagrama-n-2_cor.bmp>. Acesso em: 22 jul. 2019.

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A solução de Howard para os problemas vivenciados na época, por volta de 1898, relacionados ao despovoamento rural e ao crescimento desenfreado das grandes cidades foi a criação de uma série de pequenas cidades planejadas que combinariam as amenidades da vida urbana com o acesso imediato à natureza, típica dos ambientes rurais. As principais características do esquema de Howard eram: (1) a compra de uma grande área de terras agrícolas dentro de uma área circular; (2) o planejamento de uma cidade compacta cercada por um amplo cinturão rural; (3) o alojamento de residentes, indústria e agricultura dentro da cidade; (4) a limitação da extensão da cidade e a prevenção da invasão do cinturão rural; e (5) o aumento natural do valor da terra a ser usado para o bem-estar geral da cidade (GARDEN CITY, 20--).

Neste sentido, a cidade-jardim ideal de Howard estaria localizada em uma área de seis mil acres e seria propriedade privada de um pequeno grupo de indivíduos; essa empresa, ao manter a propriedade, manteria o controle do uso da terra. A receita, para pagar a hipoteca e financiar os serviços da cidade, seria aumentada exclusivamente pelos aluguéis. A indústria privada seria incentivada a alugar e usar o espaço na cidade. Apenas uma fração da área do terreno seria construída pelos 30.000 habitantes da cidade; o resto seria usado para fins agrícolas e recreativos (GARDEN CITY, 20--).

Segundo o modelo de Howard, no centro da cidade haveria um jardim/parque rodeado pelo complexo cívico e cultural, incluindo a prefeitura, uma sala de concertos, museu, teatro, biblioteca e hospital. Seis grandes avenidas principais iriam irradiar deste centro. Concêntrico a esse núcleo urbano, haveria um parque, um shopping center e um conservatório, uma área residencial e, no limite, a indústria. O tráfego se moveria ao longo de avenidas que se estendiam ao longo dos raios e avenidas concêntricas (GARDEN CITY, 20--).

Em 1903, Ebezener Howard teve o prazer de ver seu plano realizado. Uma

cidade-jardim chamada Letchworth foi desenvolvida a cerca de 48 quilômetros ao norte de Londres, em Hertfordshire, Inglaterra. Em 1920, a segunda cidade-jardim foi criada, a Welwyn Garden City. Ela também foi estabelecida nos arredores de Londres. O conceito de Howard de interligar o país e a cidade em uma cidade planejada de tamanho predeterminado gozou de ampla popularidade no planejamento de novas cidades subsequentes. Sua ênfase nas áreas de cinturões verdes e nas densidades populacionais controladas também se tornou parte integrante do planejamento suburbano e urbano (GARDEN CITY, 20--).

DICAS

Se você desejar conhecer a obra Cidades-Jardins de Amanhã pode acessá-la no link: https://books.google.com.br/books?hl=pt-BR&lr=&id=aTjH3-4qUwkC&oi=fnd&pg=PA7&dq=cidades+jardim%E2%80%9D+de+Ebenezer+Howard+&ots=po9MM3Fy2R&sig=mDcfSrI2x1NgXBmVqU1NwQHA6Z4#v=onepage&q=cidades%20jardim%E2%80%9D%20de%20Ebenezer%20Howard&f=false.

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Inspirado pela ideia de Cidade-Jardim, de Ebezener Howard, o projeto de Brasília surge como uma cidade funcional e setorizada e procura racionalizar e maximizar a utilização do espaço. Coelho (2008, p. 66) pontua que:

o projeto da construção de Brasília como uma “cidade do futuro” moderna pode ser associado ao projeto de mudança política, administrativa e espacial da capital brasileira para o interior do Brasil, região conhecida anteriormente pelo baixo povoamento e atraso de desenvolvimento econômico e social – o projeto de construção de uma capital moderna no interior do país visava alterar essa imagem. [...] O isolamento geográfico e a ausência de investimentos estatais dificultavam a dinamização econômica e populacional dessa parte do Brasil.

Após situarmos a criação de Brasília no contexto dos principais movimentos urbanísticos que estiveram atrelados à sua concepção, na sequência, será exposto um texto síntese a respeito da trajetória histórica da cidade, acompanhe:

História de Brasília

A pedra fundamental do novo centro do poder brasileiro foi lançada em 1922, no centenário da Independência, próximo a Planaltina, atual região administrativa do DF. Em 1956, com nova demarcação da futura capital, o então presidente da República, Juscelino Kubitschek, deu início de fato à realização do projeto que durou séculos. Na mesma área das coordenadas que Dom Bosco apontou e às margens do Lago Paranoá, Brasília começou a ser erguida.

O conceito

Para organizar a logística da obra, foi criada a Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap), que lançou no mesmo ano o “Concurso Nacional do Plano Piloto da Nova Capital do Brasil” com o objetivo de selecionar projetos urbanísticos para a construção da cidade.

Dentre dezenas de propostas, a vencedora, do arquiteto e urbanista Lúcio Costa, foi escolhida justamente pela simplicidade: a ideia, entregue em uma folha branca e desenhada a lápis, partiu do traçado de dois eixos cruzando-se em ângulo reto, como o sinal da cruz.

Uma dessas linhas, o Eixo Rodoviário, tinha o traço levemente inclinado, o que dava à cruz a forma de um avião. Ele seria a via que leva às áreas residenciais – hoje, Asa Sul e Asa Norte. A outra linha, que representava o Eixo Monumental, abrigaria os prédios públicos e o palácio do Governo Federal no lado leste; a Rodoviária e a Torre de TV no centro, e os prédios do governo local no lado oeste.

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Lúcio Costa não só desenhou os traços que definiram a capital do país, mas também previu como seria a alma de Brasília, como afirmou no livro “Memória descritiva do Plano Piloto”: Cidade planejada para o trabalho ordenado e eficiente, mas ao mesmo tempo cidade viva e aprazível, própria ao devaneio e à especulação intelectual, capaz de tornar-se, com o tempo, além de centro de governo e administração, num foco de cultura dos mais lúcidos e sensíveis do país.

FIGURA - MARCO ZERO E ESPLANADA DOS MINISTÉRIOS EM 30/09/1958

FONTE: <http://www.df.gov.br/historia/>. Acesso em: 1° maio 2019.

Com o projeto urbanístico aprovado, Juscelino escolheu Oscar Niemeyer como o arquiteto responsável pela construção dos monumentos. O carioca foi autor das principais estruturas da cidade: o Congresso Nacional, os Palácios da Alvorada e do Planalto, o Supremo Tribunal Federal e a Catedral de Brasília. Além da dupla Oscar e Lúcio, completavam o time que fez desta cidade um museu a céu aberto, figuras inspiradas como Burle Marx, com jardins e praças, e Athos Bulcão, com os painéis de azulejos que são marca registrada da capital.

FIGURA – OSCAR NIEMEYER E A CONSTRUÇÃO DOS MONUMENTOS DE BRASÍLIA

FONTE: <http://www.df.gov.br/historia/>. Acesso em: 1º maio 2019.

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O nascimento

Em 21 de abril de 1960, Brasília nascia para o mundo e para a sua gente. Com os projetos urbanístico de Lúcio Costa e o arquitetônico de Oscar Niemeyer, surgia uma cidade sob formas inovadoras, diferente de tudo já feito até então. A data de seu nascimento não foi coincidência: marcava o dia da morte de Tiradentes, um dos líderes mineiros que defendeu a independência do Brasil no século XVIII. O simbolismo ajudou a fortalecer em Brasília o ideal de liberdade de um povo e a coragem de uma nação, associando a inauguração à ideia de independência e rendendo homenagem aos inconfidentes que haviam sonhado com um Brasil livre.

Conforme a construção de Brasília seguia em frente, foram surgindo pequenos acampamentos ao redor do Plano Piloto para abrigar os trabalhadores que vieram para construir a nova capital. O primeiro acampamento foi chamado de Cidade Livre, que hoje é o Núcleo Bandeirante. Os demais agrupamentos mais tarde tornaram-se inicialmente as cidades satélites que agora são as 31 regiões administrativas que compõem o Distrito Federal.

A consagração

Não são só os monumentos que fazem visitantes e turistas se renderam à grandeza da capital. Graças ao território plano e à ausência de grandes construções verticais, o céu de Brasília acabou conhecido como um dos mais bonitos do país, que, para muitos, praticamente substitui o mar ao emoldurar as construções de traços modernos e os largos espaços verdes que completam a paisagem.

Por conta desse conjunto de beleza e da importância arquitetônica, Brasília recebeu em 1987 o título de Patrimônio Cultural da Humanidade, concedido pela Unesco. [...] A forma como Brasília foi povoada tornou-a plural, miscigenada e sincrética, representando a identidade de todo o Brasil. Na busca por dias e futuro melhores, milhares de brasileiros de diversos cantos do país, em especial do Nordeste e de Minas, vieram para construir a capital e buscar uma vida nova. Eles ficaram conhecidos como candangos. Os pioneiros, que fixaram moradia na cidade entre 1960 e 1965, ainda guardam histórias e casos daquela época. [...] Essa mistura de tanta gente diferente fez da nossa cidade um rico caldeirão de sotaques, sons e cores [...].

FONTE: DISTRITO FEDERAL. História: Brasília: a cidade sonho. Brasília: Governo do Distrito Federal, [20--]. Disponível em: <http://www.df.gov.br/historia/>. Acesso em: 2 maio 2019.

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DICAS

No link a seguir, você poderá assistir a um vídeo de cinco minutos, com imagens do Arquivo Público do Distrito Federal, que sintetiza de forma animada como foi o processo de construção da cidade. Confira: https://www.youtube.com/watch?v=qRjqdX9HlYs.

Embora no âmbito do planejamento urbano a experiência de Brasília seja emblemática, a experiência recente tem evidenciado que existem uma série problemas urbanos para serem enfrentados na atualidade. Sobre o assunto, Oliveira e Peluso (2017, p. 5) mencionam que: “no momento atual, o crescimento urbano faz-se em detrimento do meio natural e da qualidade de vida, seja em grandes metrópoles ou em pequenas cidades, seja em áreas nobres ou em áreas carentes, e a Capital Federal não é exceção à regra”.

Dentre os fatores que conduziram a esta situação, Oliveira e Peluso (2017) comentam que a população urbana aumentou continuamente no Distrito Federal, de modo que, da inauguração da cidade aos dias atuais, o vetor migratório para o Distrito Federal somado ao próprio crescimento natural têm gerado a densificação urbana que promove o uso intensivo do solo e sua mudança de uso. Outro problema encontrado é que os vários planos de ordenamento territorial não impediram que as áreas preservadas da cidade e, em especial, a área do tombamento, fossem ocupadas indevidamente.

Por fim, salientamos a fala de Guia e Cidade (2010, p. 146) acerca dos principais problemas geográficos e contemporâneos de Brasília:

No contexto da urbanização brasileira, mesmo com as condições favoráveis a um processo diferenciado da tradição urbana e social do país, Brasília fugiu à regra geral. A propriedade pública da terra e a forte presença estatal como “força motriz” da economia local passaram a ser utilizados como instrumentos de organização socioespacial seletivos e excludentes. O processo estendeu-se a toda a região que hoje conforma o Aglomerado Urbano. De forma simplificada, pode-se afirmar que o Aglomerado Urbano de Brasília vive, desde a sua implantação no Planalto Central, um impasse entre o crescimento demográfico, o oligopólio de terras e a forte presença do Estado na estruturação socioespacial. Tal impasse aponta para uma dupla realidade: a) a do centro urbano consolidado, concentrador de renda e população e b) uma periferia regional formada por municípios de baixa dinâmica econômica, com elevadas taxas de migração e mobilidade pendular, indicadores do forte descasamento espacial entre local de moradia e trabalho.

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3 A EXPERIÊNCIA DE CURITIBA

Além de Brasília, Curitiba também é uma das cidades brasileiras que se destaca no âmbito do planejamento urbano, tendo ficado famosa pelo seu sistema de transporte e pela presença de parques públicos espalhados ao longo da cidade. Para entendermos melhor como a capital paranaense foi construída, iniciamos a reflexão apresentando um recorte de um artigo científico que resume os principais fatos atrelados ao planejamento urbano de Curitiba.

O Planejamento Urbano em Curitiba

A fundação da Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais ocorreu em 29 de março de 1693 quando o capitão-povoador Matheus Martins Leme, respondendo aos “apelos de paz, quietação e bem comum do povo”, promoveu a primeira eleição para a Câmara de Vereadores e a instalação da Vila, como exigiam as Ordenações Portuguesas.

No ano de 1721 a vila passou a ser chamada de Curitiba. O responsável por esta mudança foi o ouvidor Raphael Pires Pardinho. O Ouvidor Pardinho estabeleceu, então, que as casas não poderiam ser construídas sem autorização da Câmara e deveriam ser cobertas com telhas, e que as ruas já iniciadas teriam que ser continuadas, para que a vila crescesse com uniformidade. Pode-se observar nestes fatos a preocupação existente para que a cidade pudesse se desenvolver organizadamente.

Em 1886 foi criado o Passeio Público em área de banhado do Rio Belém. Na oportunidade, a intenção era instituir nesta área de 70.000 m² um ambiente onde a população curitibana pudesse passar momentos de lazer com seus familiares e amigos.

Esta primeira iniciativa em Curitiba serviu de exemplo para que posteriormente as ações de planejamento urbano previssem a criação de espaços públicos de lazer para a população local e que, ainda, pudessem proteger margens dos rios que cortavam a cidade.

Em 1895, elaborou-se o Primeiro Código de Posturas e, em 1905, foi proibida a construção de casas de madeira no centro da cidade. Ainda neste ano, as ruas centrais foram calçadas e, em 1913, os bondes puxados por mulas foram substituídos pelos bondes elétricos (OLIVEIRA, 2001, p. 97).

No ano de 1940 o então prefeito Rozaldo de Mello Leitão contratou a Empresa de Engenharia Coimbra Bueno & Cia Ltda para conceber o Plano Diretor de Curitiba. Esta, por sua vez, contratou para este trabalho o urbanista francês Alfredo Agache (1943), que tinha como normas diretivas:

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1) O saneamento, com a drenagem dos banhados, canalização dos rios e ribeirões e construção da rede de esgotos; arborização de ruas e avenidas, criação de um horto municipal; 2) Circulação: descongestionamento do centro da cidade e criação das perimetrais externas (0,1,2,3); 3) Órgãos funcionais: construção de um centro destinado às atividades administrativas, criação de um centro comercial, de um centro militar e de uma cidade universitária na periferia da cidade (OLIVEIRA, 2001, p. 97).

Na década de 50 iniciou-se estudos de planejamento visando à preservação do meio ambiente, sendo que o novo código de posturas dispunha de legislação sobre a destinação de lixo e a extração de areia em áreas ainda não ocupadas da cidade. Ainda neste período surgiu a Comissão de Planejamento de Curitiba – COPLAC que possuía como objetivo, controlar espacialmente a cidade.

A Linha do Tempo, apresentada a seguir, serve para situar o leitor sobre como a cidade de Curitiba vem tratando do planejamento urbano. Pode-se observar que as ações de intervenção da prefeitura para modificar e melhorar as condições da cidade se dá em torno de dez anos. Afirmar que houve a tentativa de proporcionar crescimento ordenado no meio urbano de Curitiba é correto, mesmo observando que o crescimento espacial desta, por vezes, foi mais rápido do que as previsões e ações dos gestores municipais, o que incisivamente provocou em determinados bairros crescimento desordenado e ocupação de áreas protegidas.

TABELA – LINHA DO TEMPO DAS AÇÕES DE PLANEJAMENTO EM CURITIBA

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A participação popular cresceu no começo dos anos 80 e a cidade se voltou às ações sociais. Com isso, Curitiba continuou a promover iniciativas nas áreas de meio ambiente, transporte, habitação, saúde, educação e geração de emprego e renda. Estas e outras ações nomearam a cidade segundo a municipalidade de “capital ecológica” e o urbanismo aplicado nesta passou a se chamar de urbanismo ecológico.

“Ao propor-se à ideia de Curitiba como ‘capital ecológica’, procurou-se criar no imaginário da população um sentido de ‘identificação’ com a cidade, um sentido de orgulho em ‘pertencer’ à cidade de Curitiba” (MENEZES, 1996, p. 154).

O título de capital ecológica exerceu - e ainda exerce na década de 2000 - apelo a ação ambiental em Curitiba. Este conceito largamente divulgado e incentivado pelos meios de comunicação reproduziu:

Ao longo do período um repertório de imagens simbólicas (“cidade brasileira com melhor qualidade de vida”, “cidade que pode salvar o mundo”, “cidade do futuro”, “cidade modelo” e outras), além da educação ambiental que foi outro ponto de sustentação na construção do cenário de “capital ecológica”, partindo do princípio de que “é mais fácil conscientizar a população a partir do problema local, do problema do dia a dia das pessoas”, a educação ambiental passou a fazer parte da filosofia das atividades de planejamento da cidade (MENEZES, 1996, p. 155).

Este cenário propiciou intenso crescimento e modificações no território urbano. A intervenção dos planejadores em bairros e favelas pretendia como objetivo orientar a conscientização ambiental para que a população residente passasse a exercer cidadania aliada à melhoria de qualidade de vida.

A educação ambiental nos parques públicos tinha por finalidade fazer com que a população assumisse os espaços públicos da cidade. O sentido de assumir não significa que a população deva substituir o serviço de manutenção do patrimônio e dos locais públicos executados pela Prefeitura, mas sim conhecer melhor, os “espaços de encontro” disponíveis na cidade e suas potencialidades para o lazer. O desejo era de integração da população com os espaços públicos resultasse numa tomada de consciência com relação à sua importância como participante ativa no processo de conservação do meio em que vive (MENEZES, 1996, p. 157).

Deste modo, os gestores municipais passaram a intensificar ações isoladas de planejamento em extensões territoriais ao longo de rios e remanescentes. As áreas verdes amplamente divulgadas, serviram para atender e projetar o município externamente. Esta atitude demonstrou a tendência em propor a integração e melhoria da qualidade de vida diante das novas perspectivas do

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lazer aos curitibanos. A partir da implantação destes parques, o cenário urbano transforma a organização espacial da cidade, altera a paisagem e estimula a integração com o meio ambiente.

FONTE: RIBEIRO, R. M.; SILVEIRA, M. A. Planejamento urbano, lazer e turismo: os parques públicos em Curitiba–PR. Turismo - Visão e Ação, Curitiba, v. 8, n. 2, p. 309-321, fev. 2006. Disponível em: https://siaiap32.univali.br/seer/index.php/rtva/article/view/293/254. Acesso em: 15 abr. 2019.

Como podemos observar no relato anterior, já no ano de 1721 Curitiba demonstrava ter preocupações com o padrão de construções de casas e de arruamento, aspectos considerados positivos na trajetória de construção desta metrópole. Chama atenção também, a tônica colocada sobre os espaços públicos voltados para o uso dos pedestres, destoando, deste modo, das inspirações de planejamento urbano de Brasília, que estavam voltadas para o uso de carros. A ideia de planejamento urbano de Curitiba apresenta assim alguns princípios que a aproximam da concepção de cidades para as pessoas, tal como examinaremos a seguir e você poderá compreender.

A preocupação com o saneamento que, conforme vimos no tópico anterior, constitui-se em um problema importante das metrópoles atuais, estava previsto no chamado Plano Agache, de 1943. A preocupação com a questão ambiental também esteve em evidência ao longo da história do planejamento urbano de Curitiba. Dentre os vários aspectos que ajudaram a compor a capital paranaense, chama atenção a criação dos parques urbanos.

Os chamados parques urbanos referem-se às áreas públicas com amplos espaços verdes e situados dentro das cidades. São usualmente frequentadas pela população para a prática de esportes, atividades de lazer, entretenimento e como opção de contato com a natureza nos centros urbanos (SEMEIA, 2018).

Sobre este tema, Ribeiro e Silveira (2006, p. 314) observam que:

A primeira iniciativa de planejar parques em Curitiba data de 1886 com a inauguração do Passeio Público de Curitiba. Esta intervenção no território foi motivada para sanear as margens do Rio Belém, naquela região um charco, através de sua canalização. Esta foi considerada a primeira obra de saneamento da cidade e trouxe à sociedade da época uma opção de lazer para as famílias nos finais de semana, já que neste local foi instalado o primeiro zoológico da cidade. Após a criação dos vários outros parques em Curitiba e a transferência de vários animais para o novo Zoológico, localizado no Parque Regional do Iguaçu, este espaço deixou de receber grande número de visitantes, no entanto, é caminho de passagem para turistas no trajeto percorrido pela Linha Turismo e consta em material publicitário da cidade.

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Oliveira (1996, p. 40) lembra que:

A criação de parques e bosques em áreas urbanas insere-se dentro da política de preservação ambiental e melhoria da qualidade de vida, definida com base no II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), de 1976. Essa política de preservação institucionalizou-se na forma de leis e decretos municipais somente no final dos anos 70. Isto provocaria uma substancial modificação da paisagem urbana devido à expressiva arborização e ao embelezamento e restauração de praças, jardins e logradouros públicos.

Conforme fica evidente na fala de Oliveira (1996), políticas de incentivo a preservação ambiental e melhoria da qualidade de vida contribuíram positivamente para que parques e bosques urbanos fossem construídos em meio à metrópole paranaense dando continuidade ao que já vinha sendo executado desde o início da organização da cidade nos séculos anteriores. Os benefícios dos parques situados em áreas urbanas são diversos, incluindo sua dimensão estética, sua possibilidade de uso como um espaço de convívio da família e das comunidades para atividades de lazer, recreação e práticas de esportes. Seja pelo seu apelo estético ou por suas possibilidades de uso, os parques urbanos também se constituem de relevantes atrativos turísticos. Os parques podem ainda contribuir com a reconstrução da tranquilidade dos indivíduos.

Além disso, os parques urbanos desempenham ainda outras funções socioambientais relevantes, merecendo destaque a atenuação de ruídos e sua função enquanto condicionar do microclima (MARTINS; ARAÚJO, 2014). A respeito dos espaços verdes situados em áreas urbanas, Rodrigues, Pasqualetto e Garção (2017, p. 27) destacam que:

É inegável os benefícios proporcionados pelas áreas verdes. De modo efetivo, a arborização contribui para melhoria e estabilidade microclimática, pela redução das amplitudes térmicas, diminuição da insolação direta, elevação das taxas de evapotranspiração, redução na velocidade dos ventos, dentre outros fatores de forma indireta, como redução da poluição visual, sonora, e valorização econômica das propriedades.

Tal como se observa, são diversos os benefícios propiciados pelas áreas verdes nas cidades. Por conta disso, os planos diretores da cidade precisam estar atentos à necessidade que a população apresenta em usufruir de tais espaços, privilegiando ações voltadas para a expansão e manutenção de tais espaços públicos. Na reportagem exposta a seguir, comenta-se a respeito dos benefícios dos parques urbanos para as metrópoles, acompanhe:

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Entenda a importância dos parques para o equilíbrio das metrópoles

As áreas verdes são os pulmões das cidades. Elas impactam positivamente na qualidade de vida de quem mora no seu entorno ou usufrui de sua estrutura

Morar pertinho de um parque, com pássaros, lagos e flores, e ter onde recarregar as energias em meio ao concreto é qualidade de vida para quem está nas metrópoles. Ao respirar fundo o ar mais puro das áreas arborizadas, além de aliviar o estresse da rotina moderna, o indivíduo afasta a possibilidade até mesmo de desenvolver doenças como depressão e ansiedade.

No Brasil, ao menos seis grandes cidades estão entre as mais arborizadas e todas elas contam com espaços verdes em suas áreas urbanas que cumprem esse papel: parques como o Farroupilha, em Porto Alegre, Flamboyant, em Goiânia, Serra do Curral, em Belo Horizonte, Lagoa do Taquaral, em Campinas, Jardim Botânico, em Curitiba e o Ibirapuera, em São Paulo.

A importância dos parques nessas estruturas urbanas é vital. Os parques funcionam como pulmões para a comunidade. “Pode-se dizer que são uma espécie de ar condicionado dentro das cidades. Uma metrópole de concreto, totalmente asfaltada, com muito cimento, não consegue reter a umidade e essas áreas ajudam a regular o clima”, explica Ângela Kuczach, diretora executiva da ONG Rede Nacional Pró Unidades de Conservação (Rede Pró UC).

As áreas verdes fazem ainda fazem mais pelo entorno. Elas servem, destaca Ângela, para mostrar ao homem que a natureza não depende dele para viver, ao contrário, é ele, o homem, quem depende da natureza. “As árvores fornecem oxigênio, mas não é só isso, tem a questão do bem-estar. É comprovado que estar em meio à natureza diminui o estresse e melhora a qualidade de vida”, diz. Os parques garantem o equilíbrio climático e uma boa qualidade do ar.

Além dos parques em si, a presença de árvores nas ruas e avenidas também impacta positivamente na vida das cidades. Essas mesmas seis cidades, Goiânia, Campinas, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba e São Paulo estão no topo do ranking de arborização, de acordo com o último censo do IBGE de 2010.

Goiânia tem a maior proporção no país de domicílios com arborização nas quadras, com um índice de 89,5%. O levantamento levou em consideração apenas os municípios com mais de 1 milhão de habitantes. O estudo aponta também que quanto maior a arborização, melhor as condições do entorno. “São cidades que melhor respeitam os parâmetros urbanísticos e equilibram urbanização com o plantio de árvores, por exemplo. Isso traz para a comunidade local não só um espaço de lazer, mas mostra o quanto é importante ter este contato com a natureza”, analisa Heitor Rodrigues Liberato Júnior, presidente da Sociedade Brasileira de Arborização Urbana.

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Mais qualidade de vida

O impacto de um parque em uma cidade vai além da função ecológica, estética e de lazer. “As áreas verdes nas cidades ajudam a manter a temperatura mais baixa, evitando as ilhas de calor, que são bastante frequentes em grandes metrópoles de intensa urbanização”, explica o presidente da Sociedade Brasileira de Arborização Urbana.

Muito mais do que uma mancha verde em meio ao concreto, os parques nas grandes metrópoles trazem benefícios reais à população. Ele cita como exemplo positivo de investimento em arborização o caso de Nova York, nos Estados Unidos. “Na época do governo Obama (Barack) foi feito um levantamento a respeito das áreas verdes e foi constatado que cada US$1 investido no plantio de árvores gerava uma economia de US$2 em saúde”, destaca.

As principais áreas verdes das cidades mais arborizadas do país

Parque Flamboyant, em Goiânia - Em uma área superior a 125 mil metros quadrados, o parque concentra árvores nativas do Cerrado. Entre seus espaços comunitários estão pistas de corrida e ciclovia. É um convite à prática esportiva. Além disso, conta com dois lagos e área infantil.

Lagoa do Taquaral, Campinas - Considerado um dos mais importantes espaços de lazer da cidade, o parque reúne diversos espaços para atividades recreativas e culturais. Mas não é só isso! Além da área bastante arborizada no entorno da lagoa, há bosques para piquenique e um viveiro de pássaros.

Parque da Serra do Curral, Belo Horizonte - Com 400 mil quadrados, o parque tem espécies de Cerrado e Campo de Altitude. Além disso, mantém vestígios de Mata Atlântica. Você pode passear por córregos, fazer trilhas e curtir a vista em mirantes. O que não falta são áreas de convívio e muito espaço para relaxar e apreciar a natureza.

Parque Farroupilha, Porto Alegre - Conhecido como Parque da Redenção, reúne mais 10 mil árvores. Durante a floração, na Primavera, o colorido de espécies como o Ypê-roxo encantam quem passa pela região. Entre as atrações estão o lago, o espelho d’água e o chafariz. A Redenção conta ainda com o auditório Araújo Vianna, que recebe shows e espetáculos durante o ano todo.

Jardim Botânico, Curitiba - Área de proteção, o parque conta com coleções de plantas que são fontes de estudo e pesquisa. Com 178 mil metros quadrados, contabiliza mais de 60 espécies vegetais e mais de 40% de sua área total é um bosque de preservação permanente. Além dos moradores, o local atrai visitantes o ano todo.

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Ibirapuera, São Paulo - Com uma área superior a 1,5 milhão metros quadrados, o Ibirapuera é um dos parques mais visitados da América Latina. Em seus domínios, o visitante encontra museus, como o Museu de Arte Contemporânea, auditório, planetário, viveiro e muitos, mas muitos locais para curtir a natureza e praticar esportes ao ar livre.

FONTE: <https://g1.globo.com/especial-publicitario/em-movimento/noticia/2018/07/23/entenda-a-importancia-dos-parques-para-o-equilibrio-das-metropoles.ghtml>. Acesso em: 2 maio 2019.

Você já havia pensado sobre os diversos benefícios que um parque urbano pode trazer para uma cidade? Para finalizar este assunto e retomarmos para a experiência de Curitiba, na atualidade a cidade conta com diversos parques e bosques, tais como o Bosque Alemão, Bosque Italiano, Bosque de Portugal, Parque Barigui, Parque Tanguá, Parque Tingui entre vários outros. Observe algumas imagens.

FIGURA 14 – PARQUE TANGUÁ EM CURITIBA – PR

FONTE: <https://www.ademilar.com.br/blog/onde-morar/conheca-parque-tangua-curitiba/>. Acesso em: 2 maio 2019.

FIGURA 15 – PARQUE BARIGUI EM CURITIBA – PR

FONTE: <https://www.tripadvisor.com.br/LocationPhotoDirectLink-g303441-d553398-i68260668-Parque_Barigui-Curitiba_State_of_Parana.html>. Acesso em: 2 maio 2019.

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Vale ressaltar que algumas das áreas transformadas em parques em Curitiba fazem parte de um processo de recuperação de áreas degradadas, como é o caso do parque Tanguá, que inicialmente era destinado a uma pedreira e, do parque São Lourenço que anteriormente havia sido uma fábrica de adubos e de cola. Ou seja, observe que os parques podem ser uma alternativa para recuperar áreas que foram degradadas e que não são mais adequadas para desenvolver determinadas atividades econômicas.

Para finalizar este tópico, deixamos como sugestão o plano de aula a seguir que permite trabalhar aspectos relacionados ao planejamento ou da falta dele com os alunos do Ensino Médio.

A importância do planejamento urbano para as cidades

Autor: Thiago Gerheim de Andrade Coautor(es): Bárbara da Silva SantiagoEstrutura Curricular:

• Modalidade – nível de ensino: Ensino Médio.• Componente curricular: Geografia.Tema: Estrutura e dinâmica de diferentes espaços urbanos e o modo de vida na cidade.

Dados da aula: o que o aluno poderá aprender com esta aula.

Perceber como o planejamento das cidades, em todas as esferas que as englobam, ajudam no crescimento destas e na melhoria da qualidade de vida dos moradores.

Duração das atividades: 3 aulas de 50 minutos

Conhecimentospréviostrabalhadospeloprofessorcomoaluno: que o aluno tenha conhecimento das principais causas do crescimento/inchaço das cidades.

Estratégias e recursos da aula

ORIENTAÇÕES AO PROFESSOR(A): Professor, esta aula tem como objetivo mostrar a importância do planejamento das cidades, e caso exista, trabalhar o plano diretor do município.

AULA 1 Momento 1: mostrar aos alunos as duas imagens a seguir e pedir que

eles respondam às questões propostas. (Esta atividade pode ser entregue aos alunos e as respostas às questões serem escritas ou o professor poderá levantá-las em forma de debate e os alunos podem ir respondendo de forma oral).

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UNIDADE 2 | O ESPAÇO URBANO BRASILEIRO

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FIGURA – FOTO AÉREA DE TERESÓPOLIS/RJ

FONTE: <http://www.tyba.com.br/portugues/minha_conta/ampliacao.php?file=cd218_238>. Acesso em: 20 abr. 2012.

FIGURA – FOTO AÉREA DE CURITIBA

FONTE: <http://www.flickr.com/photos/fotoaereabrasil/4363086025/>. Acesso em: 20 abr. 2012.

1) O que você percebe de igual nessas duas fotos?2) O que você percebe de diferente nas fotos?3) Consegue identificar quais são as duas cidades?4) Com relação ao crescimento dessas cidades, analisando somente as fotos é

possível dizer qual suportaria esse crescimento com melhor qualidade? Por quê?

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TÓPICO 2 | ASPECTOS POSITIVOS DA URBANIZAÇÃO BRASILEIRA

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Momento 2: apresente aos alunos as charges a seguir: (elas irão nortear os principais problemas referentes ao planejamento urbano nas cidades brasileiras).

FIGURA – CHARGE 1

FONTE: <http://architetandoverde.blogspot.com.br/2011/09/sustentabilidade-urbana.html>. Acesso em: 20 abr. 2012.  

FIGURA – CHARGE 2

FONTE: <http://www.eucurtoeucuido.com.br/site/noticias.php>. Acesso em: 20 abr. 2012.

FIGURA – CHARGE 3

FONTE: <http://weslen.pereira.zip.net/>. Acesso em: 20 abr. 2012.

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UNIDADE 2 | O ESPAÇO URBANO BRASILEIRO

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FIGURA – CHARGE 4

A diferença entre estado de alerta ...

e estadode calamidade.

FONTE: <http://www.matutando.com/charge-diferenca-entre-estado-de-alerta-estado-de-calamidade/>. Acesso em: 20 abr. 2012.

FIGURA – CHARGE 5

FONTE: <http://www.matutando.com/charge-enchentes/>. Acesso em: 20 abr. 2012.

FIGURA – CHARGE 6

Espere,vai começar"InsensatoCoração"!

Sejasensata e saia logo

dai!

FONTE: <http://www.ambrosia.com.br/2012/04/03/o-universo-de-angeli/ocupacao-angeli-charge-transito/>. Acesso em: 20 abr. 2012.

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TÓPICO 2 | ASPECTOS POSITIVOS DA URBANIZAÇÃO BRASILEIRA

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AULA 2 Momento 1: o Professor deverá apresentar aos alunos o plano

diretor do município, considerando ser este um instrumento da política de desenvolvimento dos municípios com a finalidade de orientar a atuação do poder público e privado na construção dos espaços urbanos essenciais, visando assegurar melhores condições de vida para a população.

Momento 2: propor uma atividade aos alunos de investigação em campo.

Os alunos serão divididos em seis grupos e caberá a cada grupo produzir um vídeo de sua cidade com base nos problemas urbanos apresentados nas charges.

Com caráter informativo, este material servirá para os alunos perceberem se o município está se preocupando e se organizando para resolver os principais problemas ligados ao planejamento urbano.

Os alunos, além de imagens, poderão consultar e entrevistar representantes do poder público ligados ao problema em questão.

AULA 3 Momento 1: estes vídeos, depois de editados pelos próprios alunos,

serão apresentados para toda a turma.

Momento 2: com o uso dos vídeos o professor deverá fazer as considerações com relação ao planejamento em seu município utilizando da realidade de campo (trabalho feito pelos alunos).

Recursos Complementares

Perspectivas do Planejamento Urbano no Brasil (http://www.flaviovillaca.arq.br/pdf/campo_gde.pdf).

A importância do Plano Diretor para os Municípios (http://www.sebraesp.com.br/Institucional/PoliticasPublicas/Documents/cartilha_diretor.pdf).

Avaliação

A participação da turma em todos os momentos e o empenho na realização da atividade de campo deverá ser a forma de avaliar a turma nessa aula.

FONTE: <http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=40793>. Acesso em: 3 maio 2019.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Sob o prisma do planejamento urbano, a criação de Brasília recebe a interferência de dois conceitos em alta naquele momento histórico: os princípios da Carta de Atenas e modelo das “Cidades Jardim” de Ebenezer Howard.

• A criação de Brasília foi apontada como marco das intenções que previam o desenvolvimento da região do Planalto Central e, por ter sido projetada de acordo com diretrizes modernas é considerada uma expressão do urbanismo moderno.

• A ideia de uma capital moderna como nova representante política do Brasil traduzia um projeto de sociedade num momento de grande desenvolvimento econômico no país.

• A concepção de Brasília ocorreu concomitantemente com o boom da indústria automobilística.

• O projeto da construção de Brasília como uma “cidade do futuro” moderna pode ser associado ao projeto de mudança política, administrativa e espacial da capital brasileira para o interior do Brasil, região conhecida anteriormente pelo baixo povoamento e atraso de desenvolvimento econômico e social — o projeto de construção de uma capital moderna no interior do país visava alterar essa imagem.

• Os arquitetos Lúcio Costa e Oscar Niemeyer foram importantes atores na construção de Brasília.

• Curitiba é uma das cidades brasileiras que se destaca no âmbito do planejamento urbano, tendo ficado famosa pelo seu sistema de transporte e pela presença de parques públicos espalhados ao longo da cidade.

• Os chamados parques urbanos referem-se às áreas públicas com amplos espaços verdes e situados dentro das cidades.

• Os benefícios dos parques situados em áreas urbanas são diversos, incluindo sua dimensão estética, sua possibilidade de uso como um espaço de convívio da família e das comunidades para atividades de lazer, recreação e práticas de esportes.

• Os parques urbanos desempenham funções socioambientais relevantes, merecendo destaque a atenuação de ruídos e sua função enquanto condicionar do microclima.

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AUTOATIVIDADE

1 (ENADE, 2011)

Existem diferenças fundamentais no processo de urbanização de países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Um dos exemplos de cidade de país desenvolvido é Frankfurt, na Alemanha, e um outro exemplo de cidade em país subdesenvolvido é Cabul, no Afeganistão. Com base no enunciado e nas figuras anteriores, assinale a opção que expressa características de urbanização em países desenvolvidos e subdesenvolvidos, respectivamente.

a) ( ) Formação de rede urbana mais recente, ligada à Primeira Revolução Industrial; existência de rede urbana bastante simples, mas completa na maioria dos países.

b) ( ) Formação de rede urbana mais aberta e inconsolada; existência de rede urbana mais antiga, em especial após a Primeira Guerra Mundial.

c) ( ) Formação de rede urbana mais antiga, ligada à Segunda Revolução Industrial; existência de rede urbana mais recente, em especial após a Segunda Guerra Mundial.

d) ( ) Formação de rede urbana mais densa e interligada; existência de rede urbana bastante rarefeita e incompleta na maioria dos países.

e) ( ) Formação de rede urbana acelerada e direcionada para um número reduzido de cidades; existência de rede urbana moderna, mas inacabada na maioria dos países.

FONTE: <http://download.inep.gov.br/educacao_superior/enade/provas/2011/GEOGRAFIA.pdf>. Acesso em: 22 ago. 2019.

2 Os parques urbanos são áreas verdes que podem trazer qualidade de vida para a população das cidades. Dentre os benefícios proporcionados por tais espaços, é INCORRETO afirmar que:

a) ( ) Eles proporcionam contato com a natureza.b) ( ) Permitem a realização de práticas de recreação e de lazer.c) ( ) Representam um espaço de uso restrito aos turistas.d) ( ) Colaboram com a qualidade de vida das áreas urbanas.

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3 O projeto da construção de Brasília como uma “cidade do futuro” moderna pode ser associado a um projeto de mudança política. Com relação à transferência da capital brasileira e à construção de Brasília, analise as sentenças a seguir:

I- Os objetivos da transferência da capital do Brasil para o Planalto Central incluem o estímulo ao povoamento e ao desenvolvimento das regiões interioranas do país,

PORQUE

II- Nesta época, a grande maioria da população brasileira estava concentrada nas regiões próximas ao litoral.

A respeito dessas asserções, assinale a opção CORRETA:a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa

da I. b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma

justificativa da I. c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa. d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.

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TÓPICO 3

O ESPAÇO URBANO E O TURISMO

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

No âmbito dos estudos da Geografia Urbana, nos interessa compreender os diferentes processos e atividades que se desenrolam no espaço urbano, as causas e condições que o engendram e, por conseguinte, as derivações que decorrem desta dinâmica espacial. Neste sentido, o objetivo deste tópico é explicar de que forma o turismo se relaciona com o espaço urbano.

Vamos conhecer também as relações entre turismo cultural patrimônio e espaços urbanos. Você vai entender que a prática do turismo cultural ocorre tanto em espaços tradicionalmente conhecidos, tais como igrejas, museus e teatros bem como, se manifesta através de passeios por zonas urbanas. Outro ponto a ser analisado, é que a experiência turística acontece apoiada tanto em elementos concretos, como praças e centros históricos, tal como, abarca dimensões subjetivas e tácitas. Também iremos discutir a relevância do planejamento turístico. Venha conosco!

2 TURISMO NOS ESPAÇOS URBANOS

Existem muitas formas adotadas para classificar os diferentes tipos de turismo. O critério utilizado depende do enfoque pretendido. Quando o elemento central da classificação é o turismo, é recorrente a categorização da atividade turística com base na motivação da viagem. Deste entendimento, derivam tipologias de turismo como: turismo religioso, turismo de negócios ou turismo de aventura. Vale ressaltar, que esta forma de classificação elege uma motivação principal — que não é exclusiva. Para exemplificar, imagine um turista que tenha como motivação principal de uma viagem, o apelo religioso e a experiência de fé que a viagem irá lhe proporcionar e que decide ir conhecer o Vaticano. Ainda que a motivação principal seja religiosa, é muito possível que este turista desfrute de experiências relacionadas ao turismo gastronômico, por exemplo.

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UNIDADE 2 | O ESPAÇO URBANO BRASILEIRO

Outra forma de organizar e classificar as atividades turísticas, é adotar como critério a dimensão espacial da atividade, tendo como aspecto central o “onde” em qual espaço o turismo ocorre. Seguindo este pensamento, podemos refletir que o turismo no espaço rural, por exemplo, abarca amplo conjunto de práticas turísticas, tais como: o turismo de aventura, o turismo de natureza ou o agroturismo.

Ao discorrer sobre a natureza do turismo, Funari e Pinsky (2007, p. 7) pontuam:

Por que as pessoas se deslocam, aos milhões? Pelas mais diferentes razões os objetivos da viagem podem ser o descanso, a diversão, mas também o trabalho, o aprendizado ou o aperfeiçoamento profissional, entre muitos outros. Todas essas movimentações implicam contato humano e cultural, troca de experiencias entre os viajantes e a população local.

Da mesma forma, o turismo no espaço urbano envolve diferentes tipologias de turismo, tais como o turismo de negócios, o turismo de eventos e o turismo cultural. A este respeito, observa-se que a prática do turismo pode contribuir para a conservação do patrimônio histórico das cidades. Para Henriques (2003) são muitas as motivações para que procurem destinos urbanos, podendo incluir neste rol a vontade de visitar familiares e amigos, viagens relacionadas ao universo do trabalho (visitas a clientes, congressos, feiras e reuniões) e fazer compras. Em se tratando da motivação de fazer compras, Henriques (2003, p. 165) esclarece que: “embora como principal motivação de turismo, nomeadamente internacional, não seja comum, ou tenha relevância apenas para segmentos bastante restritos e diferenciados de mercado, constitui causa frequente de deslocações de curta duração”. Este é o caso, por exemplo, de pessoas que residem em áreas que dispõem de uma gama de oferta de serviços e produtos menos vasta e sofisticada do que aquelas que são encontradas nas cidades maiores. Complementando esta análise, Henriques (2003, p. 165) observa que:

Assistir um acontecimento desportivo ou espetáculo, conhecer ou rever um museu, divertir-se num parque temático, fruir certa paisagem ou ambiente urbano, são outras motivações possíveis para visitar a cidade. (...) Já quem vai a Nova Iorque ou São Francisco, quem visita Salvador ou Buenos Aires, quem se aventura por Bombaim ou Marraquexe, vai, normalmente, ou na maior parte das situações, não por um determinado aspecto ou elemento em particular, mas pela própria experiência de viver a cidade, o seu colorido e movimento, respirar a atmosfera local, imbuir-se do espírito do lugar. Outras vezes ainda, não será tanto uma vontade específica, um qualquer interesse em concreto, mas mais o simples desejo de evasão, a vontade de gozar de uns dias de descanso e mudar de ambiente a justificar a viagem.

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E você, gosta de viajar? Se pudesse escolher um destino para conhecer, qual seria? Seria um espaço natural ou urbano? Ao fazer este agradável exercício mental, observe que é muito provável que um amplo espectro de motivações cruze a sua mente ao mesmo tempo. E esta reflexão irá ajudá-lo a compreender que as motivações de viagem e os distintos modos de como cada atrativo turístico é desfrutado por cada turista.

Ao entrar em uma igreja com relevantes atributos estéticos e históricos, é possível tirar uma fotografia em frente à escadaria principal e olhar brevemente o interior da mesma, ou então, é possível adentrar nesta igreja, se aquietar, observar cada detalhe que compõem o altar, imaginar quantas celebrações religiosas já aconteceram neste espaço, pensar em quantas pessoas já tiveram experiências de fé neste espaço, fazer uma prece, tirar algumas fotografias e então partir. Com este exemplo, nos interessa realçar que não existem visitas melhores ou piores, são visitas que ocorrem por motivações diferentes. Vale lembrar que, quando da ocasião da realização do planejamento turístico de uma cidade, é importante conhecer os diferentes tipos de turistas que irão visitar os atrativos e as implicações decorrentes destas distintas formas de uso.

Ainda sobre este assunto, convém ressaltar dois aspectos centrais. O primeiro diz respeito à relação entre o turismo e a comunidade local. Tendo em vista que estes dois atores sociais se utilizam do mesmo espaço, menciona-se que uma cidade, antes de atrair visitantes, deveria ser atraente para a própria comunidade. Evidentemente, se pensarmos que parte da experiência turística está pautada na busca pelo diferente, é “natural”, que um museu que conte a história dos colonizadores de determinado município, exerça mais atração aos visitantes advindos de outras cidades do que dos residentes, que possivelmente já conhecem a história. Ainda assim, nos interessa ressaltar que uma cidade turística poderia (e deveria) ser agradável e aprazível aos seus próprios citadinos. Retomando o exemplo dos parques urbanos de Curitiba, analisados no tópico anterior, tem-se um exemplo concreto de atrativo turístico e de atrativo para a comunidade.

O segundo elemento a ser destacado é que o turismo é uma atividade que requer planejamento e organização. Para que a comunidade local possa desfrutar dos efeitos positivos advindos da cadeia multiplicadora do turismo (aqueles benefícios econômicos diretos e indiretos que acabam beneficiando a economia da cidade, seja pela arrecadação de impostos ou pelo estímulo à economia e aos empregos locais) o planejamento da atividade é fundamental. É mediante o planejamento turístico (e por conseguinte, a execução do mesmo) que os eventuais impactos negativos da atividade turística podem ser minimizados, que a utilização e conservação do patrimônio cultural pode ocorrer de forma equilibrada e ainda, trata-se de uma prática que permite o envolvimento da comunidade local em assuntos nos quais a participação da mesma é relevante.

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UNIDADE 2 | O ESPAÇO URBANO BRASILEIRO

3 TURISMO CULTURAL E PATRIMÔNIO

Dando continuidade ao debate sobre as formas de turismo que ocorrem no espaço urbano, nos aproximamos dos termos turismo cultural e patrimônio. Ao discorrer sobre a origem do termo patrimônio, Rodrigues (2007, p. 16) explica que:

A palavra patrimônio pode assumir sentidos diversos. Originalmente esteve relacionada à herança familiar, mais diretamente aos bens materiais. No século XVIII, quando, na França, o poder público começou a tomar as primeiras medidas de proteção aos monumentos de valor para a história das nações, o uso de “patrimônio” estendeu-se para os bens protegidos por lei e pela ação de órgãos especialmente constituídos, nomeando o conjunto de bens culturais de uma nação.

Ao pensarmos em patrimônio e turismo, é adequado entendermos que a ideia de patrimônio cultural é abrangente e ultrapassa as paredes dos antigos casarios e dos tetos maravilhosos das igrejas que foram pintadas a mão. Para ajudar a esclarecer esta ideia, selecionamos a explicação de Funari e Pinsky (2007, p. 8) a respeito do assunto.

O que entendemos por Patrimônio Cultural?

[...] Pode-se e deve-se, portanto, discutir se o fato em si do deslocamento já constitui um fato cultural. Talvez seja mais adequado observar que o turismo cultural efetiva-se quando da apropriação de algo que possa ser caracterizado como bem cultural, seja o que for. Antes que nos entendam mal, não estamos nos referindo a apropriar-se de um cinzeiro num café parisiense, um coral em Fernando de Noronha ou um santo barroco sobrevivente em uma igreja de Ouro Preto. Uma caminhada demorada pelo Quartier Latin, em Paris, pode ser culturalmente mais expressiva que uma visita burocrática ao Museu do Louvre (e seguramente mais do que uma tarde no Magazine Printemps), da mesma forma que simples feijão com arroz num pequeno restaurante frequentado por baianos, na Baixa do Sapateiro, em Salvador, pode nos ajudar a entender mais a cidade do que um vatapá saboreado na companhia de uma legião de turistas.

Chegamos então ao ponto do que é e do que pode ser considerado patrimônio cultural. Poderíamos mesmo dizer que patrimônio cultural é tudo aquilo que constitui um bem apropriado pelo homem, com suas características únicas e particulares. Enquanto um sanduíche do McDonald’s busca ser rigorosamente igual em todo o mundo, dos ingredientes básicos ao tempero, da forma de servir aos acompanhamentos, um mesmo peixe pode ser preparado, a sua maneira, por diferentes cozinheiros: embrulhado em folhas de banana, no litoral paulista; com leite de coco e azeite de dendê no litoral baiano; cozido lentamente em panelas de barro nas moquecas capixabas; como filé, na manteiga, acompanhado de molho de alcaparras em restaurantes elegantes e simplesmente frito “a doré”, na beira da praia. Tanto o hambúrguer do Mc

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quanto o peixe podem ser vistos como bens culturais. O sanduíche, porém, representa um bem cultural global, padronizado, que passa a ideia de que as pessoas viajam, mas não saem do lugar. O pescado, neste exemplo, é uma iguaria local e é esta particularidade que muitos de nós buscam quando vão viajar (ainda que possamos, também, refugiarmo-nos no sanduíche, quando cansamos da imersão na cultura local).

Às vezes, a solenidade atribuída ao termo patrimônio sugere que dele façam parte apenas os grandes edifícios ou grandes obras de arte, mas o patrimônio cultural abrange tudo que constitui parte do engenho humano e, por isso, pode estar no cerne mesmo do turismo. Desta forma, podemos e devemos ampliar muito a nossa compreensão do conceito, com todas as implicações decorrentes das epistemológicas às práticas.

O turismo tende a considerar o patrimônio cultural como aquele que se volta para certos tipos de atividade mais propriamente “culturais”, tais como as visitas a museus, a cidades históricas ou a roteiros temáticos, como a rota dos queijos e dos vinhos, por exemplo. Este é um aspecto importante do turismo moderno, pois os maiores países, regiões e cidades receptoras de turistas podem ser identificados como destinos ávidos por cultura, como é o caso da Itália, o país com o maior número de patrimónios tombados pela Unesco, mas também da França, Egito, Grécia, Turquia e Grã-Bretanha. No Brasil, este é o caso das cidades coloniais de Minas Gerais e das missões jesuíticas no Sul. [...] Ainda que a política de patrimônio tenha preservado muito desigualmente os bens culturais, com o predomínio do grandioso e rebuscado em detrimento daquilo que representava os costumes e anseios de muitos, não cabe dúvida de que o contato direto com museus, edifícios e artefatos históricos permite uma salutar abertura para a variedade cultural, no passado e no presente.

FONTE: FUNARI, P. P. A.; PINSKY, J. Turismo e patrimônio cultural. São Paulo: Contexto, 2007.

Notou na explicação de Funari e Pinsky (2007) como o conceito de patrimônio é amplo e fundamental para pensarmos sobre a prática do turismo nos espaços urbanos? Conhecer e entender o patrimônio de cada cidade é um ponto fundamental para o planejamento turístico e para propiciar uma experiência turística agradável ao visitante. Analisando este tema sob o prisma da geografia urbana, fica evidente que embora o turista se desloque para conhecer o padrão arquitetônico e a morfologia urbana de uma cidade (por exemplo), elementos estes que fazem com que a cidade visitada seja diferente da cidade de origem, os aspectos mais tácitos e subjetivos do patrimônio também irão fazer parte da experiência do visitante. Isto é, imagine um turista que observa atentamente o casario histórico de uma cidade colonial. No seu exercício de contemplar, ele também poderá estar atento ao modo como as pessoas caminham pelas ruas, o que elas estão fazendo, quais são os sons que caracterizam a cidade e uma série de outros aspectos, que ao longo da vivência do turista, caminham lado a lado, conferindo autenticidade as cidades, lugares e paisagens.

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Sobre este assunto, Rodrigues (2007, p.15) explica que:

O turismo cultural, tal qual o concebemos atualmente, implica não apenas a oferta de espetáculos ou eventos, mas também a existência e preservação de um patrimônio cultural representado por museus, monumentos e locais históricos. Além do valor cultural específico, do ponto de vista do turismo cultural, esses bens materiais possuem outro valor, o de serem objetos indispensáveis, cujo consumo constitui a base de sustentação da própria atividade.

Em face ao exposto, fica evidente a necessidade de se preservar o patrimônio histórico das nossas cidades. Sabe-se, contudo, que os trâmites e processos de preservação do patrimônio requerem importante esforço de negociação os diversos setores sociais, envolvendo cidadãos e poder público. Selecionamos algumas imagens de destinos urbanos que foram tombados como Patrimônios Históricos e Culturais da Humanidade que foram tombados pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) no Brasil. Acompanhe!

FIGURA 16 – CENTRO HISTÓRICO DE OURO PRETO (MG)

FONTE: <https://viagemeturismo.abril.com.br/materias/patrimonios-culturais-da-humanidade-unesco-brasil/>. Acesso em: 25 jul. 2019.

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FIGURA 17 – CENTRO HISTÓRICO DE OLINDA (PE)

FONTE: <https://viagemeturismo.abril.com.br/materias/patrimonios-culturais-da-humanidade-unesco-brasil/>. Acesso em: 25 jul. 2019.

FIGURA 18 – RUÍNAS DE SÃO MIGUEL DAS MISSÕES (RS)

FONTE: <https://viagemeturismo.abril.com.br/materias/patrimonios-culturais-da-humanidade-unesco-brasil/>. Acesso em: 25 jul. 2019.

Preservar o patrimônio histórico e cultural das cidades — de forma eficiente e organizada — é uma prática benéfica para os residentes e para os visitantes, pois, como disse Rodrigues (2007, p. 17):

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UNIDADE 2 | O ESPAÇO URBANO BRASILEIRO

A partir do final da década de 1970, verificou-se a valorização do patrimônio cultural como um fator de memória das sociedades. Hoje entendemos que, além de servir ao conhecimento do passado, os remanescentes materiais de cultura são testemunhos de experiencias vividas, coletiva ou individualmente, e permitem aos homens lembrar e ampliar o sentimento de pertencer a um mesmo espaço, de partilhar uma mesma cultura e desenvolver a percepção de um conjunto de elementos comuns, que fornecem o sentido de grupo e compõem a identidade coletiva. Assim, acreditamos que preservar o patrimônio cultural – objetos, documentos escritos, imagens, traçados urbanos, áreas naturais, paisagens e edificações – é garantir que a sociedade tenha maiores oportunidade de perceber a si própria.

DICAS

Para encerrar esta unidade, selecionamos uma proposta de plano de aula voltada para o ensino fundamental para trabalhar a temática do turismo nos espaços urbanos com os seus futuros alunos. Disponível no link: http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=36864.

NOTA

Para conhecer mais sobre a prática do turismo nos espaços urbanos, acompanhe a leitura complementar que selecionamos para você a seguir. Boa leitura!

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LEITURA COMPLEMENTAR

A TRANSFORMAÇÃO DO ESPAÇO URBANO EM FUNÇÃO DO TURISMO

Rachel Sant'Anna Murta

Atransformaçãodoespaçourbano

A organização dos elementos que compõem o espaço urbano se dá a partir do estabelecimento de relações de ordem associadas a uma hierarquia de valores. Quando se pensa o desenvolvimento do turismo como uma possibilidade para uma determinada localidade configurada como área urbana, é preciso buscar no espaço dessa localidade os meios existentes para que as propostas relativas às atividades turísticas sejam bem-sucedidas. Castrogiovanni (2000) acredita que:

O espaço deve ser visto como um fator da evolução social, portanto, produzido e reproduzido constantemente. O movimento histórico é que constrói o espaço, que é uma instância da sociedade, portanto, como instância, contém e é contido pelas demais instâncias. As cidades são partes representativas da complexidade que é o espaço geográfico. As instâncias móveis das cidades, ou seja, os fluxos, são importantes, pois são eles que dão vida aos fixos. Os turistas, papel que assumimos quando estamos em movimento no espaço, fazem parte dos fluxos. Eles não são meros observadores deste espetáculo de interações, mas parte dele. Os fluxos também interagem, formam resistências, aceleram mudanças, criam expectativas, desconstroem o aparentemente rígido cenário urbano (CASTROGIOVANNI, 2000, p. 24).

Esse autor considera que sobre a paisagem urbana projetam-se duas perspectivas: a visão global e a visão específica. A visão global abrange o conjunto regional como uma totalidade, partindo do geral para o específico, sugerindo uma leitura de conjunto em que é possível perceber a paisagem natural e a paisagem construída. A visão específica destaca os elementos marcantes e singulares da paisagem urbana, o que exige uma leitura minuciosa e atenta, e nela se incluem os indivíduos urbanos, considerados por Castrogiovanni (2000, p. 28) como “os atores que se movimentam e ajudam a construir o espaço urbano, portanto, a diferenciá-lo”. Suas ações marcam o espaço, criando sinais e signos que são historicamente incorporados à paisagem. Essas marcas ou marcos referenciais podem ser reconhecidos e destacados na paisagem por sua presença física ou por seu valor simbólico e contribuem para a configuração do espaço também como um recurso turístico.

Na definição da Organização Mundial do Turismo (1998) recursos turísticos são todos os bens e serviços que, por intermédio da atividade do homem e dos meios com que ele conta, tornam possível a atividade turística e satisfazem

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as necessidades da demanda. Ao discutir o valor dos recursos turísticos culturais, cabe considerar o valor atribuído aos bens que constituem o patrimônio cultural material de uma localidade. Para essa função, entram em cena atores distintos que representam grupos sociais também distintos, com interesses diversos. Nesse sentido, Dias (2006) afirma que:

Um único bem pode dar margem, portanto, a várias leituras, que diferirão do conteúdo simbólico assumido pelo grupo social que o adota como patrimônio. Assim, um monumento poderá ser valorizado como um local de culto por uns, como um monumento de valor histórico e de qualidades estéticas por outros, enquanto os turistas poderão vê-lo como um símbolo que identifica determinado território (seja uma localidade, seja um país) (DIAS, 2006, p. 83).

O mesmo autor comenta que essa multiplicidade de abordagens não se dá de forma excludente, mas complementar, ou seja, o mesmo bem assume valores simbólicos múltiplos que devem ser considerados pelas políticas culturais que devem ser pensadas e aplicadas de acordo com novas demandas sociais “que incluem a participação e possibilitam conciliar os interesses gerais e nacionais da conservação do patrimônio cultural com as novas formas de concebê-lo em termos regionais, locais e de acordo com os diferentes grupos sociais que coexistem em um determinado território” (DIAS, 2006, p. 83).

Cabe aqui discutir tanto o processo de ressignificação dos espaços, que acontece destacadamente na dimensão física, por permitir a visualização das transformações, quanto o processo de ressignificação do patrimônio, que se configura no plano simbólico, no plano da interpretação e da atribuição de valor, sendo próprio de cada tempo, de cada contexto, de cada grupo da sociedade. Inicialmente tem-se que, na dimensão física, o processo de transformação das cidades, principalmente as metrópoles, pela relevância dos impactos sobre a sua população e também sobre as outras cidades em seu entorno, vem despertando o interesse de estudiosos que percebem na complexidade do fenômeno de transformação um campo fértil de análise.

Nos tempos atuais, uma sucessão de tendências socioeconômicas, políticas e culturais flexibilizam a caracterização das cidades, considerando, por exemplo, que atividades econômicas se desenvolvem em alguns locais e declinam em outros, podendo ou não ser resgatadas em uma etapa posterior. As tendências influenciam não somente a própria cidade, como também a sua relação com outras, tanto próximas quanto distantes. Law (2000) considera dois principais fatores de influência para analisar a transformação do espaço urbano nas metrópoles: a ampliação da base econômica urbana e a consolidação de sua condição como centro/polo regional de serviços. Este último fator diz respeito à referência que as grandes cidades passam a constituir para os municípios em seu entorno, no sentido de concentrarem uma rede completa de serviços, muitos dos quais não estão disponíveis em qualquer localidade. Além disso, o mesmo autor considera que a evolução nos processos e nos meios de comunicação também

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afetou o crescimento das cidades a partir do momento em que capacitou as cidades para competirem umas com as outras pela facilidade de divulgar suas qualidades, seu potencial, ampliando sua área de influência.

As influências sobre o espaço da cidade variam com o tempo e as administrações públicas, representadas por seus órgãos competentes e, na melhor das hipóteses, com o respaldo da população local, vêm atuando no sentido de adaptar fisicamente o meio urbano às novas demandas de seu uso e funcionamento. Essas adaptações interferem no dia-a-dia dos moradores, na medida em que modificam o trânsito em áreas específicas, geram barulho e poeira, suspendem temporariamente atividades e comprometem a imagem urbana circunstancial ou definitivamente. Não com a mesma intensidade nem da mesma maneira, atingem também os turistas, que, se mal informados, podem avaliar negativamente a cidade pela imagem que diante deles se apresenta. Em contrapartida, os resultados das adaptações podem trazer benefícios facilitando o dia-a-dia da cidade que foi temporariamente afetado e apresentando novas possibilidades de uso dos espaços transformados tanto para a população quanto para os turistas, se for o caso.

O processo de transformação ligado ao turismo remete à ideia de criar na cidade espaços para serem “consumidos” como produtos turísticos e são diversas as consequências que daí decorrem. Sobre isso, recorre-se ao pensamento de Luchiari (2001):

Se a conclusão mais fácil nos leva à constatação de que o processo de produção de lugares para o consumo acaba por consumir e degradar os próprios lugares, numa outra perspectiva podemos considerar que essas novas paisagens da urbanização turística representam também as formas contemporâneas de espacialização social, por meio das quais estamos construindo novas formas de sociabilidade, mais híbridas e mais flexíveis (LUCHIARI, 2001, p. 108).

Nesse movimento de produção e reprodução de lugares turísticos, a mudança física contempla referências espaço-temporais que, se por um lado buscam no passado, na história cultural do lugar, o motor da atratividade pretendida, podem, por outro lado, projetar para o futuro, a partir de sua forma e função, um novo papel na atividade turística para uma cidade inteira ou uma área específica dentro do espaço urbano.

O espaço transformado é, então, ressignificado, ou seja, passa a integrar a paisagem urbana de uma nova maneira, com outra forma – seja um imóvel restaurado ou um novo espaço construído – e, talvez, outra função. Na dimensão física, percebe-se um novo elemento que marca presença visualmente, que é percebido, que pode ser compreendido e registrado na memória de quem passa diante dele. No contexto da transformação física, os elementos transformados, caso constituam bens patrimoniais, são passíveis de outro processo de ressignificação. Para construir a discussão sobre a ressignificação do patrimônio material, uma

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UNIDADE 2 | O ESPAÇO URBANO BRASILEIRO

análise que remete à dimensão simbólica dos bens e dos valores a eles atribuídos, parte-se da complexidade da cidade – cenário vivo no qual se inserem – que, segundo Corrêa (2003):

pode ser analisada segundo diferentes dimensões que se interpenetram. A dimensão cultural é uma delas e por seu intermédio amplia-se a compreensão da sociedade em termos de suas relações sociais, econômicas e políticas, assim como tornam-se inteligíveis as espacialidades e temporalidades que estão associadas a essas dimensões (CORRÊA, 2003, p.157).

O território da cidade assume características também complexas e apresenta-se fragmentado com relação a seu uso, a sua função, a seus fluxos, a seus habitantes e visitantes. Estes, referenciados em seus locais de origem, constroem novos significados no contato com o local visitado, buscando o “novo” que a experiência turística pretende e pode proporcionar. Sobre essa relação simbólica dos turistas com o local visitado, sobrepondo-se e não necessariamente integrando-se no cotidiano da população, Pereira (2006, p. 1) comenta que:

O cotidiano, recriado por diretrizes racionais que não reconhecem os contornos imateriais dos diversos territórios que configuram o lugar e a cultura, deixa de ser o sustentáculo efetivo do turismo cultural. Assim novos significantes turísticos se colocam como possibilidade que não encontram expressão imediata na (i)materialidade em constante transformação, reacendendo desejos e recriando necessidades.

A recriação do cotidiano por essas diretrizes racionais, que se aplicam como uma espécie de máscara sobre as condições reais de conformação do território e de estabelecimento de relações sociais e práticas culturais próprias de cada localidade, produz questionamentos com relação à percepção do espaço e à identidade cultural. Esses questionamentos decorrem da ideia de que a fragmentação que caracteriza as sociedades acaba sendo forçadamente unificada por avaliações superficiais que desconsideram as mudanças evolucionárias a partir delas mesmas, o que Hall (2001) menciona ao escrever sobre a condição de “descentramento” das sociedades pós-modernas. Estas sociedades, sob o ponto de vista desse autor, são caracterizadas pela diferença e “atravessadas por diferentes visões e antagonismos sociais que produzem uma variedade de diferentes ‘posições de sujeito’ – isto é, identidades – para os indivíduos” (HALL, 2001, p. 17). Tais identidades e as relações que são possíveis a partir de seu reconhecimento se projetam sobre o território da cidade e passam a ser analisadas, questionadas, assumidas e expressadas na construção da dimensão sociocultural de cada comunidade que habita o espaço urbano [...].

FONTE: MURTA, R. S. A transformação do espaço urbano em função do turismo. V Seminário da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Turismo. Anais... Belo Horinzonte, 2008, p. s/p.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• Existem muitas formas adotadas para classificar os diferentes tipos de turismo. O critério utilizado, depende do enfoque pretendido.

• O turismo no espaço urbano envolve diferentes tipologias de turismo.

• Uma cidade, antes de atrair visitantes, deveria ser atraente para a própria comunidade.

• O turismo é uma atividade que requer planejamento e organização.

• O turismo transformou-se numa das mais importantes faces da globalização, contribuindo para estreitar as distâncias entre as diversas partes do globo.

• O turismo é um consumidor do espaço, e a referência a este é permanente, pois o turista desloca-se do espaço de sua residência para outro em que permanecerá durante algum tempo; por outro lado há o espaço onde ocorre o deslocamento de um ponto a outro.

• São diversas as particularidades que caracterizam a relação entre o turismo e o território no que diz respeito à produção e ao consumo de territórios pelo turismo, considerando que o principal objeto de consumo do turismo é o espaço, com seus objetos e ações, com seus fixos e seus fluxos.

• Cidades podem ser incorporadas, espontaneamente, ao circuito das localidades turísticas, devido à sua valorização (cultural) pela atividade, ou, então, induzir o desenvolvimento do turismo, por meio de políticas e do planejamento da atividade, caso essa incorporação espontânea não ocorra, direcionando os equipamentos urbanos já construídos e aqueles a construir, em função de uma urbanização para o turismo.

• A organização dos elementos que compõem o espaço urbano se dá a partir do estabelecimento de relações de ordem associadas a uma hierarquia de valores.

• Recursos turísticos são todos os bens e serviços que, por intermédio da atividade do homem e dos meios com que ele conta, tornam possível a atividade turística e satisfazem as necessidades da demanda.

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• As influências sobre o espaço da cidade variam com o tempo e as administrações públicas, representadas por seus órgãos competentes e, na melhor das hipóteses, com o respaldo da população local, vêm atuando no sentido de adaptar fisicamente o meio urbano às novas demandas de seu uso e funcionamento.

• A relação entre o turismo e o espaço urbano gera um processo denominado turistificação que, de forma simplificada, pode ser entendido como o processo de transformação de uma área específica da cidade em função do turismo, seja para o turismo ou pelo turismo.

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1 (ENADE, 2018) O turismo e o lazer assumem, na contemporaneidade, papel destacado na regeneração e revitalização de centros urbanos. Por esse motivo, muitas cidades com potencial turístico têm direcionado esforços para desenvolver novos produtos e novas estratégias de regeneração e dinamização não só do seu tecido econômico e social, mas também na criação de novos territórios, no estímulo à fruição de diferentes patrimônios e na (re)funcionalização dos espaços de lazer, conferindo-lhes novos usos e significados.

FONTE: SIMÕES, P. O turismo e o lazer na cultura de consumo: impactos nas variáveis do tempo e no espaço. Disponível em: <https://www.uc.pt/>. Acesso em: 10 de jul. 2018 (adaptado).

Nesse contexto, espaços urbanos como praças e parques podem se tornar importantes áreas de lazer e turismo. Segundo estudos da área, três fatores devem ser considerados na adoção de práticas e atividades em determinado espaço público, para que sejam inclusivas: a função social desempenhada pelo local; as atividades já desenvolvidas no espaço; e a identificação dos padrões de comportamento dos usuários desse espaço público. Considerando essas informações, avalie as afirmações a seguir. I - A inter-relação entre as condições do meio físico, as atividades

desenvolvidas e a diversidade das pessoas são de suma importância para se avaliar o grau de inclusão social que um espaço público propicia.

II - Entre as atividades inclusivas a serem desenvolvidas em um espaço público, destacam-se as atividades espontâneas, como brincadeiras, caminhada, passeio e descanso, e as atividades formais, organizadas por instituições privadas ou públicas, como intervenções artísticas, eventos culturais e ações promocionais.

III - A função social desempenhada por um espaço de lazer e turismo é dinâmica, visto que se configura de acordo com o contexto vivenciado em seu entorno e pode ser política, social, comercial, cultural e/ou turística.

É correto o que se afirma em:

a) ( ) I, apenas. b) ( ) III, apenas. c) ( ) I e II, apenas. d) ( ) II e III, apenas.e) ( ) I, II e III.

FONTE: <http://download.inep.gov.br/educacao_superior/enade/provas/2018/turismo.pdf>. Acesso em: 22 ago. 2019.

AUTOATIVIDADE

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2 O turismo vem provocando a reconfiguração dos espaços e nas paisagens nas cidades chamando atenção à crescente prática do turismo urbano. Sobre o assunto, analise as sentenças a seguir:

I - A relação entre o turismo e o espaço urbano gera um processo denominado turistificação.

PORQUE

II - A prática do turismo ocorre alheia aos interesses da comunidade e das entidades locais, sem gerar impactos.

A respeito dessas asserções, assinale a opção CORRETA:a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa

da I. b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma

justificativa da I. c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa. d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.

3 O planejamento da atividade turística na esfera municipal envolve os princípios orientadores para o desenvolvimento da atividade turística no município. A respeito do assunto, assinale a alternativa INCORRETA:

a) ( ) O planejamento turístico dá início ao processo de turistificação, que ocorre quando um espaço é apropriado pelo turismo.

b) ( ) Os territórios turísticos culturais permanecem constantes e idênticos ao longo do tempo e do espaço.

c) ( ) Os territórios eleitos pelo turismo na atualidade não são, em todos os casos, os mesmos de ontem, e não, necessariamente, serão os mesmos de amanhã.

d) ( ) Os territórios turísticos são decorrentes da competitividade espacial entre lugares.

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UNIDADE 3

PLANEJAMENTO URBANO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir dos estudos desta unidade, você deverá ser capaz de:

• conhecer o conceito e os principais instrumentos do planejamento urbano;

• identificar e analisar alguns aspectos da dimensão ambiental do planejamento urbano;

• compreender o conceito de cidade para pessoas;

• entender a relevância de ações sustentáveis para as cidades.

Esta unidade está organizada em três tópicos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – O QUE É PLANEJAMENTO URBANO?

TÓPICO 2 – A DIMENSÃO AMBIENTAL DO PLANEJAMENTO URBANO

TÓPICO 3 – A CIDADE PARA AS PESSOAS

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TÓPICO 1

O QUE É PLANEJAMENTO URBANO?

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

O objetivo deste tópico é apresentar o campo de estudos do planejamento urbano e explicar como esse campo disciplinar está relacionado com a Geografia Urbana. Vamos compreender quais são as ideias centrais que permeiam o planejamento urbano e entender quais os principais mecanismos e instrumentos adotados para conduzir o processo de planejamento das cidades.

De modo geral, para começarmos, realçamos que o planejamento urbano e regional nos remete à ideia de planejamento futuro do crescimento físico, dos usos e ocupações das cidades e de sua expansão em uma escala regional. Ressaltamos também que o planejamento urbano pode ser visto como um esforço para administrar a cidade, muitas vezes para evitar ou aliviar problemas urbanos comuns.

No decorrer dos estudos, entenderemos, também, que, em se tratando do planejamento urbano, os planos diretores, os planos de revitalização urbana e as legislações de zoneamento que regulam a ocupação do solo são instrumentos amplamente utilizados.

Você estudará que o planejamento urbano envolve as etapas de diagnóstico, prognóstico, propostas e gestão urbana e, juntos, vamos desvendar as características de cada uma dessas etapa. Por fim, estudaremos que os planos de desenvolvimento regional permitem que ocorra uma articulação entre as distintas escalas geográficas nas quais se engendram os processos de planejamento e desenvolvimento. Preparado para começar? Então venha conosco!

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2 O QUE É PLANEJAMENTO URBANO E QUAL SUA RELEVÂNCIA PARA AS CIDADES?

O termo planejamento urbano e regional nos remete à ideia de planejamento futuro do crescimento físico, dos usos e ocupações das cidades e de sua expansão em uma escala regional (OLIVEIRA, 2017). O planejamento urbano refere-se tanto a ações coletivas que moldam e melhoram os assentamentos humanos quanto a uma área profissional e acadêmica que se desenvolveu para guiar o crescimento urbano e melhorar as condições das cidades, sobretudo, das cidades industriais. Enquanto área de atuação profissional, o planejamento urbano deriva de áreas da arquitetura, engenharia civil e da saúde pública. O planejamento urbano do século XX recorreu cada vez mais a conhecimentos e práticas científicas sociais e, no final do século, a pesquisa de planejamento urbano passou a receber relevantes contribuições da geografia, da sociologia urbana, da antropologia urbana e da literatura de estudos urbanos e regionais (EHRENFEUCHT, 2016).

Para Mayhew (2005), o planejamento urbano é uma tentativa de administrar a cidade, muitas vezes para evitar ou aliviar problemas urbanos comuns, como a deterioração urbana, a superpopulação, problemas de tráfego e congestionamento, entre outros. Seguindo esta linha de pensamento, Duarte (2007) sustenta que se trata de um conjunto de medidas tomadas para que se alcance os objetivos previamente delimitados, considerando os recursos disponíveis e os fatores externos que podem influir no processo.

Acerca da relação entre o planejamento urbano e a geografia, verifica-se que o planejamento se sobrepõe à geografia quando examina os espaços da vida cotidiana, as relações espaciais entre suas diferentes dimensões e os processos que as criam. A pesquisa e a prática de planejamento urbano também envolvem ações e políticas públicas (EHRENFEUCHT, 2016). Duarte (2007) também ressalta a dimensão espacial inerente ao planejamento urbano, uma vez que tal processo reconhece e localiza as tendências locais e regionais que podem interferir no desenvolvimento das cidades e, além disso, mediante à definição de estratégias e valendo-se também das políticas públicas, estabelece as regras de ocupação do solo e explicita as restrições, proibições e limitações relacionadas ao espaço das cidades que deverão ser observadas para manter e aumentar a qualidade de vida dos moradores das cidades.

Os estudos do planejamento urbano envolvem várias áreas de especializações inter-relacionadas, incluindo habitação, transporte, desenvolvimento comunitário, desenvolvimento econômico, planejamento ambiental, entre outros. Além disso, no período recente, o escopo do planejamento urbano se expandiu e passou a incorporar questões que vão desde a transição para fontes de energia renováveis, recuperação de áreas ambientais degradadas, mitigação da mudança climática e aumento da vulnerabilidade ambiental à preservação do patrimônio cultural e aspectos relacionados à convivência no espaço urbano (EHRENFEUCHT, 2016).

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IMPORTANTE

O planejamento urbano e regional refere-se também à concepção e à instituição de políticas e leis que servem para orientar o uso da terra, especialmente em áreas metropolitas ou subáreas, geralmente estando atrelada à direção de governos.

O planejamento urbano e regional é uma atividade inerentemente espacial que visa fornecer uma estrutura espacial das atividades ou de usos da terra que, de alguma forma, possam ser melhores do o padrão existente sem planejamento (GREGORY et al., 2009).

Para cumprir com seus objetivos, o planejamento urbano e regional envolve análises estatísticas preditivas sobre o crescimento futuro da população e das atividades economias, combinadas com projetos arquitetônicos e paisagísticos (muitas vezes na forma de mapas de uso da terra e de zoneamento) para prever e antecipar a manifestação física de tal crescimento no espaço. Nesse sentido, sistemas de informática (especialmente os de informação geográfica) auxiliam na execução dos projetos de planejamento urbano (GREGORY et al., 2009).

Discorrendo sobre o assunto, Duarte (2007) lembra que no contexto do

planejamento urbano, as definições dos objetivos são fundamentais, pois são elas que:

i) motivam a equipe durante a elaboração do planejamento, incentivando a busca por soluções inovadoras; ii) servem de filtro para determinar qual a amplitude e a profundidade que são necessárias nas informações requeridas e; iii) são balizas que orientam, quando da execução do plano, os procedimentos de ajustes provocados pelas inevitáveis alterações do contexto externo (DUARTE, 2007, p. 23).

Gregory et al. (2009) comentam que, em uma perspectiva histórica, os ideais utópicos para a disposição física e estrutura social das cidades e sociedades existem há séculos, mas a criação do planejamento formal como profissão e atividade na governança resultou de uma série de preocupações políticas e sociais. Entre elas, merecem destaque as preocupações relacionadas à saúde pública, ao saneamento, à pobreza e à violência nos espaços urbanos nos séculos XIX e XX, aspectos esses que acabaram por estimular este campo de estudos. De modo geral, o planejamento urbano se apoia nos ideais do modernismo e na crença de que a razão científica e o uso das técnicas são os caminhos apropriados para atingir os objetivos de ordem, coerência e regulação.

No século XX, o planejamento foi institucionalizado em diferentes escalas de governo (por exemplo: federal, estadual e municipal) para gerenciar

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o crescimento e a expansão das cidades, especialmente em termos de uso da terra e provisão de infraestrutura (particularmente transporte e serviços públicos) (GREGORY et al., 2009). Vale lembrar que o impacto da globalização e da competição entre as cidades globais reduz a autoridade dos planejadores que trabalham em escala urbana e regional, tendo em vista o amplo leque de interações espaciais que se formam no espaço urbano das cidades. Observe, nas imagens a seguir, uma experiência exemplar de planejamento urbano realizada na Dinamarca.

FIGURA 1 – EXEMPLO DE PLANEJAMENTO URBANO NO MUNICÍPIO DE BRONDLY, COPENHAGEN, DINAMARCA (VISTA AÉREA)

FONTE: <https://preview.redd.it/2wd7wemjkcxz.jpg?width=960&crop=smart&auto=webp&s=588067d1aacf624aebf65454270fa41bb1226028>.

Acesso em: 3 jun. 2019.

FIGURA 2 – EXEMPLO DE PLANEJAMENTO URBANO NO MUNICÍPIO DE BRONDLY, COPENHAGEN, DINAMARCA (VISTA DETALHADA)

FONTE: <https://i.pinimg.com/564x/e4/d9/9d/e4d99d0b49d0b42b3814a86ec799cfa5.jpg>. Acesso em: 31 maio 2019.

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Observe na imagem o quão exitosa, organizada e, inclusive, bela é essa experiência de planejamento urbano. Na execução deste projeto foram considerados aspectos como: o número de residências que compõem cada pequeno núcleo, foi mantido um recuo do terreno apropriado entre as casas (para que elas não ficassem excessivamente próximas entre si); na porção individual de cada terreno, foi mantido uma área de jardim que embeleza o entorno paisagístico de cada propriedade; foi analisada e mantida uma distância adequada e confortável entre os diferentes núcleos que compõem a vizinhança; a afluência em relação à via de acesso mais próximo é bastante facilitado e organizado (note que cada núcleo conta com uma saída próxima para rodovia de entorno. Todos esses aspectos, e outros que poderiam ser apontados, contribuíram para a beleza estética deste conjunto de residenciais e, sobretudo, para o bem-estar e conforto dos seus residentes. Ao discutir a dimensão teórica do conceito de planejamento urbano e regional, Oliveira (2017, p. 318) pontua que:

Qualquer tentativa de definição implica na compreensão da intensa disputa epistemológica e discursiva desse campo, bem como do próprio objeto do planejamento urbano e regional (espaço, cidade e região). Em termos gerais, essa disputa é permeada por visões dicotômicas entre espaço físico (receptáculo de unidades habitacionais e produtivas; lócus de relações e fluxo) e espaço produto social (construído a partir de relações sociais em permanente conflito).

Parte dessas disputas estão relacionadas ao amplo espectro de temas trabalhados no contexto do planejamento urbano e regional. Por conta disso, existe um consenso referente ao seu caráter interdisciplinar. A respeito das contribuições advindas de distintos campos disciplinares no estudo do planejamento urbano, Oliveira (2017, p. 318) explica que:

Nas abordagens teóricas é comum encontrar a distinção entre urbanismo — área de especialização de engenheiros e arquitetos-urbanistas, relacionada a intervenções físicas nas cidades. Dentre elas estão obras viárias e de infraestrutura sanitária, melhoramento de edificações, embelezamento etc. — e planejamento urbano — abordagem multidisciplinar envolvendo, além dos engenheiros e arquitetos-urbanistas, conhecimentos específicos das áreas de administração pública, ciência política, sociologia urbana, economia urbana e regional, direito urbanístico, geografia e afins. Todas fundamentadas em uma concepção integrada e de longo prazo do fenômeno urbano, em torno de suas problemáticas espaciais, físicas e sociais.

Conforme podemos observar, diferentes campos disciplinares enfocam dimensões particulares do planejamento urbano e regional. Ainda assim, na realização e execução de um projeto de planejamento urbano, o ideal é que este seja conduzido por uma equipe multidisciplinar apta a compreender a dimensão interdisciplinar inerente ao exercício do planejamento urbano, para assim ser capaz de propor melhores soluções para os sofisticados e entrelaçados problemas urbanos que atingem nossas cidades. No que se refere aos instrumentos utilizados no contexto planejamento urbano e regional, destacam-se os seguintes:

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FIGURA 3 – PRINCIPAIS INSTRUMENTOS DOS PLANEJAMENTOS URBANO E REGIONAL

FONTE: Adaptado de Oliveira (2017)

Conforme fica evidente na ilustração, ao se tratar do planejamento urbano, os planos diretores, os planos de revitalização urbana e as legislações de zoneamento que regulam a ocupação do solo são instrumentos amplamente utilizados. Por sua vez, no âmbito do planejamento regional, os planos de desenvolvimento regional, os estímulos fiscais, os fundos de financiamento e os investimentos em infraestrutura são ferramentas frequentemente utilizadas. Oliveira (2017) comenta que, na atualidade, a atividade de planejar, seja na escala urbana ou regional, vem incorporando preocupações atreladas às condições ambientais das cidades e regiões, levando em conta as premissas do desenvolvimento socioeconômico e sustentável e valendo-se também de ferramentas como o monitoramento de áreas de risco e o zoneamento ambiental. Vamos conhecer um pouco melhor estes instrumentos?

• Plano diretor: “é o instrumento básico da política pública territorial municipal que tem como objetivo organizar o crescimento e o funcionamento de uma cidade” (SANTORO, 2017, p. 321). A elaboração do plano diretor é de iniciativa do poder executivo e o mesmo deverá ser aprovado por lei. No que diz respeito ao conteúdo do plano diretor, Santoro (2017, p. 321) explica que: “seu conteúdo envolve princípios, diretrizes e objetivos para a política urbana, além de regras territoriais para áreas urbanas e rurais, e instrumentos urbanísticos de gestão e financiamento da transformação do território”. Duarte (2007, p. 75) reforça que “o plano diretor é o instrumento por excelência do planejamento urbano, principalmente, quando se trata da escala municipal”. Esse instrumento está relacionado com as diretrizes propostas pelo Estatuto das Cidades, conforme abordaremos em seguida. A seguir, será exposto o conceito de plano diretor conforme sua definição legal, acompanhe:

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NOTA

O artigo 40, do parágrafo primeiro, do Estatuto da Cidade, diz que o plano diretor é parte integrante do processo de planejamento municipal, devendo o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual incorporar as diretrizes e as prioridades nele contidas.

O plano diretor é obrigatório (além das cidades com mais de 20 mil habitantes) para municípios em área de especial interesse turístico e sob influência de empreendimentos ou atividades com impacto ambiental de âmbito regional ou nacional [...]. Nas cidades com mais de 500 mil habitantes, é também obrigatória a implementação de um plano integrado de transportes. Outrossim, ciente das alterações promovidas pelo próprio plano diretor, além daquelas próprias das dinâmicas socioeconômicas, o estatuto prevê que aquele seja revisto a cada dez anos.

Quem elabora o plano diretor?

[...] Em sua elaboração estão envolvidos técnicos, políticos, organizações da sociedade civil (como ONGs, associações de classes etc.) e toda e qualquer pessoa [...]. As diretrizes básicas do plano diretor são propostas por um corpo técnico formado por urbanistas, engenheiros, médicos, agrônomos, enfim, profissionais de diferentes áreas — diversidade que tende a tornar o plano mais bem estruturado. Esse corpo técnico pode ser interno à prefeitura, mas frequentemente, e isso é benéfico, são profissionais de ONGs e empresas privadas, que atuam na área de planejamento urbano, que são os condutores das propostas preliminares. Essa participação externa à prefeitura geralmente traz visões diferentes daquelas dos que estão em contato cotidiano com os problemas da cidade. Esses profissionais atuam em diferentes cidades, em contextos diversificados, por vezes com características socioeconômicas aproximadas — o que permite que tragam olhares diversificados aos problemas de cada município, enxergando soluções espelhadas em propostas contida no plano diretor [...].

Como é elaborado o plano diretor?

Há etapas na elaboração do plano diretor, não importa a dimensão da cidade, que são comuns. Em alguns municípios, algumas dessas etapas merecem mais ou menos atenção. Porém, todas elas são fundamentais para o sucesso de um plano diretor, principalmente quando, desde a primeira etapa (o diagnóstico) até a última (gerenciamento e atualizações) todas elas estejam presentes na consciência dos envolvidos na elaboração do plano — dos técnicos à população e aos políticos [...].

Gerenciamento do plano diretor

O plano diretor aprovado e, já implementado, não tem forças para conduzir, de forma autônoma, isto é, unicamente como uma lei a ser respeitada, suas propostas a bom termo. É necessário que a prefeitura municipal, através de uma ou algumas de suas características, por vezes de um órgão específico, mas sempre sob total responsabilidade da prefeitura, gerencie o plano [...]. Gerenciá-lo, portanto, compreende, em primeiro lugar, o controle para que suas recomendações sejam respeitadas, além de atualizações, uma vez que a cidade é um organismo vivo que se altera internamente ao longo do tempo e sofre influências externas de escalas distintas (regional, estadual, nacional e mesmo internacional) que modificam as condições sob as quais as propostas do plano foram feitas.

FONTE: DUARTE, F. Planejamento urbano. Curitiba: Editora Ibpex, 2007. p. 93.

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O plano diretor é um documento robusto e que contempla várias dimensões relacionados ao uso do espaço das cidades. No UNI a seguir, apresentamos um exemplo de plano diretor para você observar quais elementos caracterizam esse instrumento na prática. Observe como o instrumento dispõe sobre distintos aspectos relacionados ao uso e ocupação do município, tais como: gestão urbana, políticas de desenvolvimento econômico, políticas de desenvolvimento social, o planejamento da atividade turística (considerando que essa é uma atividade relevante que ocorre no espaço do município), habitação e regularização fundiária, saneamento, drenagem urbana, abastecimento de água, mobilidade urbana, zoneamento, manejo dos resíduos sólidos entre outros.

DICAS

O documento pode ser acessado neste link: https://leismunicipais.com.br/plano-diretor-balneario-camboriu-sc.

O município no qual você reside conta com um plano diretor? Você conhece esse documento? Pesquise e procure conhecer esse importante instrumento de gestão urbana das cidades. Caso você resida em um pequeno município, investigue e tome contato com o plano diretor de um município vizinho que disponha desse documento na sua região. Normalmente, é no site da prefeitura municipal que encontramos o plano diretor da cidade.

Agora que entendemos as características do plano diretor, vamos analisar a relação desse instrumento com o Estatuto das Cidades. Conforme comentamos anteriormente, o surgimento dos planos diretores está historicamente atrelado às disposições contempladas no Estatuto das Cidades. Você já ouviu falar a respeito disso?

Para iniciarmos esta discussão, partimos do pensamento de Duarte (2007) que afirma que o direito urbanístico é um par essencial para a consolidação do planejamento urbano. Além disso, o direito urbanístico permite que se organize o espaço da área urbana, tendo em vista que a abrangência do planejamento urbano ultrapassa o espaço urbano em si, pois ordena também o espaço das áreas rurais que em suas inter-relações afetam a cidade. Particularmente, essas ações ocorrem “através de imposições de ordem pública, expressas em normas de uso e ocupação do solo urbano ou urbanizável, ou de proteção ambiental, ou enuncia as regras estruturais e funcionais da edificação urbana coletivamente considerada” (MEIRELLES, 1993 apud DUARTE, 2007).

Nesse contexto, Santin e Marangoin (2008, p. 89) apontam que:

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O Estatuto da Cidade (Lei n° 10.257/2001), também denominado de Lei do Meio Ambiente Artificial, tem como objetivo formular diretrizes gerais de administração do ambiente urbano. Veio para regulamentar os artigos 182 e 183 da Constituição Federal frente aos reclames de ordem pública, interesse social, bem-estar dos cidadãos e equilíbrio ambiental, estabelecendo normas gerais para a política de desenvolvimento urbano [...]. O Estatuto da Cidade deixou a cargo de cada Município efetivar os seus dispositivos segundo as características locais, regulamentadas no Plano Diretor.

O Estatuto das Cidades abarca tanto as chamadas diretrizes gerais para a execução da política urbana, que incluem aspectos relacionados à gestão democrática, cooperação entre governos, planejamento das cidades e a garantia do direito a cidades sustentáveis, bem como incluem instrumentos específicos direcionados para guiar a política urbana, incluindo o plano diretor — anteriormente comentado —, as regras relacionadas ao parcelamento, uso e ocupação do solo (que serão descritas com maiores detalhes em seguida), as diretrizes orçamentárias, entre outros.

Em síntese, Duarte (2007) analisou o estatuto integralmente, identificou e comentou os aspectos centrais dispostos no Estatuto das Cidades, os quais serão transcritos a seguir:

Pontos de realce do Estatuto das Cidades

No primeiro parágrafo dessa lei, diz que esse estatuto regula o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental. E segue com 16 diretrizes gerais, que merecem ser resumidas e brevemente comentadas, quais sejam:

I- a garantia do direito a cidades sustentáveis: que o direito à terra, aos equipamentos etc. estejam comprometidos tanto com a geração atual como com as futuras;

II- a gestão democrática: feita diretamente pela população ou por associações representativa em todas as fases do planejamento urbano, da formulação ao acompanhamento dos programas e projetos;

III- a cooperação: sendo esta uma palavra chave quando explicita envolvimento das diversas instâncias de governo, da iniciativa privada e dos setores da sociedade;

IV- o planejamento do desenvolvimento das cidades: cujo objetivo é o de evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente;

V- a oferta de equipamentos urbanos (os quais devem ser públicos), além de serviços de transportes;

VI- a ordenação e controle do uso do solo: visando ao uso adequado dos imóveis; à compatibilidade de usos próximos; ao parcelamento do solo e uso de imóveis sem que causem impactos negativos na infraestrutura

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urbana; ao uso de imóveis para bem comum, evitando excessivas especulações imobiliárias que prejudiquem o bom desenvolvimento urbano e, além disso, à boa qualidade ambiental;

VII- a complementaridade entre as atividades urbanas e rurais visando ao desenvolvimento socioeconômico integrado do município;

VIII- o respeito aos limites da sustentabilidade ambiental, social e econômica: isso quando da permissão para a instalação de equipamentos e serviços;

IX- a justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização;

X- a adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e financeira dos gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano;

XI- a recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha resultado a valorização dos imóveis urbanos;

XII- a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagísticos e arqueológico;

XIII- as audiências do poder público municipal e da população: sempre que envolver implantação de empreendimentos que possam ser prejudiciais ao contexto ambiental e social do entorno;

XIV- a regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por populações de baixa renda;

XV- a simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo: desse modo possibilita a redução de custos e aumento da oferta de unidades habitacionais;

XVI- a isonomia de condições para os agentes públicos e privados na promoção de empreendimentos e atividades relativos ao processo de urbanização, atendido o interesse social.

FONTE: DUARTE, F. Planejamento urbano. Curitiba: Editora Ibpex, 2007. p. 80.

Como podemos observar nos pontos realçados por Duarte (2007), os aspectos contemplados no Estatuto das Cidades, nos Planos Diretores e nos demais instrumentos voltados ao planejamento urbano, existe um entrelaçamento entre todas essas dimensões que, em tese, deveriam conduzir os agentes que planejam o espaço urbano, em um caminho de sinergias e pautados em boa governança. No plano das ideias, podemos reconhecer que a ideia central por detrás de todos esses instrumentos é minimizar os possíveis efeitos negativos do processo de intensificação da urbanização, em linhas gerais. O debate e a emergência de ferramentas que facilitem a concepção e realização do planejamento urbano permitem que os problemas urbanos apontados na unidade anterior sejam mitigados.

Em se tratando do ferramental utilizado no âmbito do planejamento urbano, podemos mencionar ainda os planos de revitalização urbana. A expressão “revitalização urbana” refere-se a um conjunto de iniciativas

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destinadas para reorganizar uma estrutura de cidade existente, particularmente em bairros em declínio devido a razões econômicas ou sociais. As iniciativas de revitalização urbana geralmente incluem a melhoria das características do ambiente urbano, como a qualidade do pavimento e a funcionalidade das calçadas. Ademais, dependendo do uso pretendido do bairro revitalizado, os projetos também podem contemplar a necessidade de melhorar o envolvimento da comunidade e a ocupação dos espaços públicos, oferecendo novas instalações de entretenimento, como parques e museus. Verifica-se que, em várias iniciativas, os projetos de revitalização visam preparar partes da cidade para cumprir a função econômica desejada, ajustando a rede de serviços públicos a requisitos específicos (URBAN, 2019).

IMPORTANTE

Um espaço urbano revitalizado, com infraestrutura efetiva, pode criar as condições para uma cidade eficiente, capaz de promover inovação, maior qualidade de vida e desenvolvimento econômico com prosperidade compartilhada e respeito ambiental. Nesse sentido, parcerias público-privadas podem ajudar a facilitar a implementação de projetos de revitalização urbana (URBAN, 2019).

Um dos projetos de revitalização urbana internacionalmente conhecidos é a experiência da cidade de Toronto, no Canadá. Dentre as várias ações desenvolvidas para revitalizar o espaço urbano da cidade, chamamos a atenção para a praia urbana construída na cidade, com o intuito de oferecer um espaço público de lazer para a comunidade e para os turistas, em plena área central da cidade, observe:

FIGURA 4 – PRAIA URBANA EM TORONTO, NO CADANÁ (1)

FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/2/2c/Hto_Park_and_Urban_Beach_Skyline.jpg/800px-Hto_Park_and_Urban_Beach_Skyline.jpg>. Acesso em: 31 maio 2019.

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FIGURA 5 – PRAIA URBANA EM TORONTO, NO CANADÁ (2)

FONTE: <https://www.claudecormier.com/wordpress/wp-content/uploads/2013/10/hto-urban-beach-3.jpg>. Acesso em: 31 maio 2019.

Outro recurso utilizado para conduzir e ordenar o planejamento urbano são as chamadas legislações de zoneamento, que, em termos simples, são as leis que regem o uso dos terrenos urbanos. A respeito desse tipo de lei, é pertinente ressaltar que:

O zoneamento é instrumento jurídico de ordenação do uso e ocupação do solo. Em um primeiro sentido o zoneamento consiste na repartição do território municipal à vista da destinação da terra e do uso do solo, definindo, no primeiro caso, a qualificação do solo em urbano, de expansão urbana, urbanizável e rural; e no segundo dividindo o território do Município em zonas de uso. Foi sempre considerado, nesta segunda acepção, como um dos principais instrumentos do planejamento urbanístico municipal, configurando um Plano Urbanístico Espacial (SILVA, 2007, p. 270).

São as leis de zoneamento que vão determinar, por exemplo, quais áreas da cidade serão destinadas para a ocupação de indústrias, quais são adequadas para exercer a função residencial e quais apresentam restrições ambientais e que, por isso, requerem um conjunto de cuidados concernentes a sua ocupação específicos.

Por fim, mencionamos os planos de desenvolvimento regional, que também exercem influência no contexto do planejamento urbano. Os planos de desenvolvimento regional permitem que ocorra uma articulação entre as distintas escalas geográficas em que se engendram os processos de planejamento e desenvolvimento. Assim, enquanto o planejamento urbano abarca fortes elementos locais, em virtude do próprio arcabouço que o forma, incluindo aí a elaboração dos planos diretores e a legislação de zoneamento — conforme vimos

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— são os planos de desenvolvimento regional, por sua vez, que permitem uma articulação entre o planejamento urbano e o seu contexto regional.

Os planos de desenvolvimento regional são mais abrangentes e se ocupam em analisar e projetar as ações de desenvolvimento a partir de um espectro de análise mais robusto. O planejamento do desenvolvimento regional é realizado pelos governos e pode, também, contar com a participação da comunidade local e das entidades de classe e, de modo geral, procuram delinear e realizar propostas que visem melhorar o bem-estar das pessoas, preocupando-se com as condições atuais e futuras dos indivíduos. Nesse sentido, tais planos deveriam articular-se com o planejamento urbano, a fim de intensificar as possíveis sinergias advindas desses dois campos de atuação de planejamento e desenvolvimento dos territórios.

2.1 ETAPAS DO PLANEJAMENTO URBANO

Após analisarmos o conceito de planejamento urbano, compreendermos sua relevância para as cidades e conhecermos seus principais instrumentos, examinaremos as principais etapas que são percorridas durante a realização do planejamento urbano. O modo como o planejamento urbano pode ser subdividido pode variar de acordo com a metodologia empregada. Contudo, mesmo perante algumas particularidades, o desenvolvimento de um plano urbano segue alguns estágios em comum. Nesta disciplina, trabalharemos com a divisão sugerida por Duarte (2007), que tem a seguinte estrutura:

FIGURA 6 – ETAPAS DO PLANEJAMENTO URBANO

Diagnóstico: é a analise de uma situação, compondo um cenário da realidade existente.

Prognóstico: considerando a situação atual da cidade, se nada for feito, como essa cidade será no futuro?

Propostas: são elas que tornam um futuro previsível e um futuro possível.

Gestão Urbana: conjunto de instrumentos e atividades que visam assegurar o bom funcionamento de uma cidade.

FONTE: Adaptado de Duarte (2007)

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Tal como comentamos, algumas etapas do planejamento são gerais, embora seja possível encontrar variação de nomenclatura conforme a literatura e documentos disponíveis. Todas as fases listadas são atravessadas pela questão básica do planejamento, que consistem em manter em mente quais são seus objetivos, suas finalidades (DUARTE, 2007).

Partindo desse entendimento, a etapa do diagnóstico consiste na análise de uma situação, compondo o cenário da realidade existente. O diagnóstico é construído com base nos dados disponíveis ou que serão coletados (DUARTE, 2007). O autor ressalta ainda que:

[...] se fizermos a análise da composição populacional de uma cidade, tendo como objetivo o planejamento urbano, precisaremos saber o número de habitantes da cidade, qual a taxa de crescimento da população nos últimos anos, a composição etária, o grau de escolaridade etc., mas não nos interessa saber, por exemplo, para que times torcem ou quantos deles bebem cerveja. Essas duas últimas informações são irrelevantes para o diagnóstico da cidade, se o objetivo for o planejamento urbano. Nesse caso, não é preciso obter esses dados, embora eles possam ser fundamentais se o objetivo for outro, como o de criar campanhas de marketing para uma marca regional de cervejas. Dizemos isso porque, para fazer o inventário de uma realidade, não partimos da coleta de dados, mas sempre, da pergunta transversal ao planejamento: para quê? E quando respondemos a essa pergunta (para um plano de desenvolvimento socioeconômico, por exemplo), já lançamos as bases analíticas que devem ser utilizadas (DUARTE, 2007, p. 25).

Observe no fragmento de Duarte (2007) a relevância de se compreender e incorporar no exercício de planejar a preocupação com a finalidade dos dados obtidos. Esse aspecto é realçado porque algumas vertentes teóricas comentam que o primeiro estágio do diagnóstico é a coleta de dados, também chamada de inventário. Note que esse estágio pode até ser verdadeiro, desde que se tenha claro como será analisada e trabalhada esta informação.

Após apurar as informações que permitem caracterizar o recorte espacial delimitado e responder às perguntas de fundo do planejamento, o passo seguinte envolve a realização de três procedimentos que procuram responder quais são as condicionantes, as potencialidades e as deficiências de uma região (DUARTE, 2007). Para responder a essas perguntas, uma das metodologias amplamente empregada é a chamada análise SWOT, termo em inglês que significa forças (strengthness), fraquezas (weakness), oportunidades (opportunities) e ameaças (threats), a qual se apresenta a seguir.

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FIGURA 7 – ELEMENTOS QUE COMPÕEM A ANÁLISE SWOT

FONTE: <https://www.consultoriaiso.org/wp-content/uploads/2017/04/IMAGEM-001.jpg>. Acesso em: 31 maio 2019.

Esse tipo de análise é utilizado em diversas áreas profissionais e de estudos, tais como o planejamento estratégico e a gestão de organizações. Pensando em uma cidade, podemos elencar alguns possíveis exemplos, para melhor elucidar o conceito. A ideia de forças nos remete a algum aspecto positivo e interno das cidades, que poderia ser, por exemplo, a presença de um centro histórico relevante para o patrimônio cultural de toda região; uma possível fraqueza, seria algum aspecto negativo do cenário da cidade, tal como a ausência de uma rota turística para estimular a visitação do centro histórico. Seguindo essa linha de pensamento, uma oportunidade seria algum fator externo a cidade, mas que poderia trazer benefícios ao planejamento urbano, tal como ônibus mais silenciosos e menos poluentes, há um preço mais acessível e adequados para circular no perímetro urbano. Por fim, uma ameaça seria um fator externo que poderia prejudicar o planejamento urbano de uma cidade, como o fato de um município estar situado às margens de um rio e estar suscetível a enchentes, por exemplo. A análise dos fatores internos e externos ajuda no delineamento do planejamento urbano e permite que busquem alternativas para minimizar os impactos negativos e estratégias adequadas para potencializar aquilo que a cidade tem de melhor.

A próxima etapa do planejamento é o prognóstico. Sobre esse estágio, Duarte (2007, p. 27) esclarece que: “é importante chegar ao final do diagnóstico conhecendo com segurança como a cidade está hoje e como ela chegou a esse ponto. Aí, incluídos aspectos demográfico, físico-territoriais, legais, sociais e econômicos”.

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Após conhecer os elementos do passado da história da cidade e analisar a situação atual, a intenção é refletir sobre o futuro da cidade. Trata-se de pensar em possíveis cenários caso nada seja feito no contexto do planejamento urbano. Em seguida, o propósito é tecer possíveis cenários e ações de planejamento urbano que permitam balizar a gestão da cidade da melhor forma possível. Duarte (2007) realça que, em se tratando de prognósticos, mesmo previsões cautelosas podem ser contestadas por mudanças bruscas na realidade. Nesse sentido, a habilidade de prever vários cenários, baseados na combinação de diferentes variáveis é importante para que o planejamento urbano do município possa gerar bons resultados.

A etapa seguinte denomina-se propostas. As propostas são elaboradas com base nas informações previamente apuradas e considerando os possíveis cenários que foram desenhados. Duarte (2007, p. 30) menciona alguns exemplos de propostas de planejamento urbano, a saber:

Nessas propostas entram aspectos de obras de infraestrutura que sirvam ao desenvolvimento econômico de uma região ou à melhoria da qualidade de vida da população de um bairro, com tendências a crescer além do que a situação atual comportaria; mudanças nas leis que regulam a ocupação do solo para evitar que áreas de mananciais sejam ocupadas e estimular que outras regiões cresçam mais longe do que é permitido; criação de formas alternativas de participação do cidadão no dia a dia da cidade, para que ele seja corresponsável pela qualidade de vida urbana.

Por fim, a última etapa do planejamento urbano é a chamada gestão urbana, que se refere ao “conjunto de instrumentos, atividades, tarefas e funções que visam a assegurar o bom funcionamento de uma cidade” (ACIOLY JUNIOR; DAVIDSON, 1998, p. 75). Ou seja, trata-se de mecanismos e práticas adotados para assegurar que os itens dispostos e elencados no plano urbano sejam operacionalizados e controlados da melhor forma possível. Além disso, vale ressaltar que a execução do planejamento no município envolve o manejo de posições e pontos de vistas distintos. Nas palavras de Acioly Junior e Davidson (1998, p. 75):

[...] ela visa garantir não somente a administração da cidade, como também a oferta dos serviços urbanos básicos e necessários para que a população e os vários agentes privados, públicos e comunitários, muitas vezes com interesses diametralmente opostos, possam desenvolver e maximizar suas vocações de forma harmoniosa.

Conforme podemos notar no fragmento em realce, o exercício do planejamento urbano é sofisticado e requer esforços, também a execução de boas práticas de gestão por parte dos diversos atores envolvidos. Nesse sentido, Duarte (2007) reforça que alguns aspectos são basilares para a gestão urbana, a saber: conhecimento das leis que regulamentam os planos diretores, clareza do provimento de recursos necessários, e qualificação dos profissionais para implementar e gerenciar as propostas.

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TÓPICO 1 | O QUE É PLANEJAMENTO URBANO?

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Para finalizar este tópico e pensando em sua futura atuação como professor, selecionamos um plano de aula de Geografia para o Ensino Fundamental II que permite trabalhar a questão dos diferentes tipos de uso do solo nas cidades, acompanhe!

PLANO DE AULA

Cidades- Aprofunde conceitos sobre a importância de algumas medidas para o

equilíbrio e manutenção da vida nos centros urbanos.

Conteúdos- Urbanização.- Alterações climáticas.- Uso e ocupação do solo.

Objetivos- Entender as chuvas como um fenômeno natural, que sofre interferência dos

seres humanos e leva a consequências (inundações).- Perceber-se integrante, dependente e agente transformador do ambiente,

identificando seus elementos e as interações entre eles, contribuindo ativamente para a melhoria do meio ambiente.

- Identificar e avaliar as ações dos homens em sociedade e suas consequências em diferentes espaços e tempos, de modo que construa referenciais que possibilitem uma participação propositiva e reativa nas questões socioambientais locais.

- Questionar a realidade, formular problemas e propor soluções para eles, utilizando, para isso, o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e verificando sua adequação.

1ª Etapa: atividade de campoO próximo passo é organizar um roteiro de estudo do meio, para conhecer,

in loco, como é o planejamento do uso do solo em sua cidade. Inicialmente, peça aos alunos que se organizem em grupos, cada um responsável por fazer uma lista de itens a se observar, de acordo com os pontos da discussão em sala de aula sobre o uso do solo: um grupo voltado para observar as áreas verdes (se são poucas, muitas, se estão espalhadas ou não), outro grupo voltado para observar as áreas de risco (áreas de encosta ou próxima as margens de rio, para verificarem como e onde as casas estão construídas), um terceiro grupo voltado para observar ações de prevenção relacionadas à drenagem de águas pluviais e coleta de lixo (se observam excesso de lixo nas ruas, entre outros).

Além de um roteiro de observação, cada grupo de alunos deve fazer um roteiro de entrevista com moradores nos pontos observados visando a descobrir se os moradores têm consciência desses problemas relacionados à ocupação do solo.

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UNIDADE 3 | PLANEJAMENTO URBANO

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Por fim, antes de sair a campo, os alunos devem socializar as observações e perguntas que elaboraram para receber críticas dos próprios colegas. Assim eles podem finalizar o roteiro para sair a campo.

O passeio pela cidade deve incluir paradas em pontos estratégicos: locais próximos às margens de um rio ou represa, uma área de risco e uma área de forte concentração urbana.

No retorno da visita de campo, os alunos devem complementar suas observações fazendo uma busca na Internet para pesquisar dados gerais sobre a cidade (população, rede de esgoto, área verde, entre outras variáveis ligadas ao uso do solo). Uma opção de site para se pesquisar é: Portal de Cidades do IBGE (https://www.ibge.gov.br/cidades).

Já em sites como os da Prefeitura de seu município, ou do Estado, peça aos alunos que pesquisem ações que estão sendo realizadas para reduzir riscos e consequências de catástrofes como enchentes e inundações.

2ªEtapa:atividadedefechamentoSolicite aos alunos que criem um cartaz, trazendo os principais pontos

levantados acerca do que observaram, registraram e pesquisaram na Internet, de modo que consigam conscientizar a população sobre maneiras de evitar ou, ao menos, minimizar problemas relacionados a possíveis catástrofes em decorrência da má ocupação do solo.

Observe as percepções inicial e final dos alunos sobre a relação entre fenômenos naturais e a interferência dos seres humanos na ocupação do solo, suas causas e consequências.

Verifique como os alunos realizaram os roteiros de pesquisa de campo, como os associaram suas pesquisas às informações disponibilizadas na Internet, e como interpretaram esse universo de informações para realizar a apresentação final.

3ª Etapa: introdução do temaExplore, em uma conversa inicial com seus alunos, o que eles observam

em sua cidade, como eles imaginam que ela era há 10, 50, 100 anos atrás. Como era a paisagem — seus rios, seu relevo, os locais onde morava gente ou não morava?

Solicite aos alunos que busquem, na Internet ou outra fonte disponível (como familiares e conhecidos), fotos da cidade em diferentes épocas, registrados em imagens, demonstrando a ocupação do solo, por exemplo. É importante que você realize previamente uma pesquisa das imagens da cidade para socializar com os alunos e garantir que o conjunto das imagens possibilite a leitura sugerida a seguir.

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TÓPICO 1 | O QUE É PLANEJAMENTO URBANO?

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Pergunte o que eles observam nessas imagens. O que foi alterado com relação ao uso do solo? Por que foi alterado? Houve alguma consequência dessas alterações? Houve alguma população específica que mais tenha sofrido com essas consequências? Qual teria sido essa população?

Lembre os alunos de que chuvas são fenômenos naturais, que alterações climáticas podem interferir em fenômenos naturais, como o regime das chuvas, mas que ações do homem que alteram a paisagem podem provocar alterações climáticas — selecionando com eles, para exemplificar, algumas imagens da pesquisa proposta no início dessa atividade.

4ª Etapa: atividadesApresente aos alunos a leitura da reportagem: Enchente no Rio está

entre as mais fatais nos últimos 12 meses no mundo (publicado em 07/04/2010 no site do jornal “O Estado de São Paulo”).

Esclareça os termos mais difíceis, e certifique-se de que os alunos compreenderam que a reportagem trata das consequências da grande enchente que atingiu a região serrana do Rio de Janeiro e foi uma das catástrofes maior gravide no mundo associadas a chuvas.

Inicie um debate com eles a partir das seguintes questões: Por que ocorreram tantas mortes? O que são áreas de risco? O que essa catástrofe tem a ver com a ocupação do solo?

No último parágrafo, a matéria explica que “11% das pessoas expostas a catástrofes naturais vivem em países pobres, mas em países pobres ocorrem mais de 53% de mortes relacionadas a essas catástrofes”. Pergunte aos alunos o que isso quer dizer, e por que isso acontece.

Nesse momento, apresente a atividade interativa “Cidade: ocupação e saneamento”. Acompanhe os alunos durante a realização das atividades propostas e aproveite para discutir o que aprenderam a respeito dos seguintes aspectos: ocupação urbana, moradia em locais inadequados, enchentes e possíveis alternativas, coleta de lixo, dentre outros.

Materiais Relacionados

Antes de iniciar esta atividade é importante que se aproprie de algumas informações sobre o tema e conheça alguns sites que poderá indicar aos alunos no decorrer das atividades. Selecionamos os links a seguir para ajudá-lo.

Reportagem

https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,enchente-no-rio-esta-entre-as-mais-fatais-nos-ultimos-12-meses-no-mundo,534900 (Enchente no Rio está entre as mais fatais nos últimos 12 meses no mundo)

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https://educacao.uol.com.br/disciplinas/geografia/urbanizacao-do-brasil-consequencias-e-caracteristicas-das-cidades.htm (Urbanização do Brasil: consequências e características das cidades)

A cidade não para a cidade só cresce

Pode ser que seja necessário retomar com os alunos os conceitos de bacia hidrográfica e ciclo da água, para que compreendam a formação das enchentes.

Sobre este tema, indicamos os seguintes links:

http://www2.ana.gov.br/Paginas/default.aspx (Agência nacional das águas)

https://www.youtube.com/watch?v=g26Wk4gpkws (Vídeo Ciclo da Água do CODAU — Centro Operacional de Desenvolvimento e Saneamento de Uberaba).

FONTE:<https://www.institutonetclaroembratel.org.br/educacao/para-ensinar/planos-de-aula/cidades-i/>. Acesso em: 3 jun. 2019.

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RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• O termo planejamento urbano e regional nos remete à ideia de planejamento futuro do crescimento físico, dos usos e ocupações das cidades e de sua expansão em uma escala regional.

• O planejamento urbano refere-se tanto a ações coletivas que moldam e melhoram os assentamentos humanos quanto a uma área profissional e acadêmica que se desenvolveu para guiar o crescimento urbano e melhorar as condições das cidades, sobretudo, das cidades industriais.

• O planejamento urbano é uma tentativa de administrar a cidade, muitas vezes para evitar ou aliviar problemas urbanos comuns.

• O planejamento urbano reconhece e localiza as tendências locais e regionais que podem interferir no desenvolvimento das cidades.

• O planejamento urbano e regional refere-se à concepção e à instituição de políticas e leis que servem para orientar o uso da terra, especialmente em áreas metropolitas ou subáreas, geralmente estando atrelada à direção de governos.

• No século XX, o planejamento foi institucionalizado em diferentes escalas de governo (por exemplo: federal, estadual e municipal) para gerenciar o crescimento e a expansão das cidades, especialmente em termos de uso da terra e provisão de infraestrutura (particularmente transporte e serviços públicos).

• Ao se tratar do planejamento urbano, os planos diretores, os planos de revitalização urbana e as legislações de zoneamento que regulam a ocupação do solo são instrumentos amplamente utilizados.

• No âmbito do planejamento regional, os planos de desenvolvimento regional, os estímulos fiscais, os fundos de financiamento e os investimentos em infraestrutura são ferramentas frequentemente utilizadas.

• O Estatuto da Cidade (Lei n° 10.257/2001), também denominado de Lei do Meio Ambiente Artificial, tem como objetivo formular diretrizes gerais de administração do ambiente urbano.

• A expressão “revitalização urbana” refere-se a um conjunto de iniciativas destinadas a reorganizar uma estrutura de cidade existente, particularmente em bairros em declínio devido a razões econômicas ou sociais.

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• O zoneamento é um instrumento jurídico de ordenação do uso e ocupação do solo.

• Os planos de desenvolvimento regional permitem que ocorra uma articulação entre as distintas escalas geográficas em que se engendram os processos de planejamento e desenvolvimento.

• O planejamento urbano envolve as etapas de diagnóstico, prognóstico, propostas e gestão urbana.

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1 No processo de realizar o planejamento das cidades, os planos de desenvolvimento regional são um dos instrumentos utilizados. Com relação a esse instrumento, avalie as seguintes asserções e a relação proposta entre elas.

I- Os planos de desenvolvimento regional permitem que ocorra uma articulação entre as distintas escalas geográficas em que se engendram os processos de planejamento e desenvolvimento.

PORQUE

II- Enquanto o planejamento urbano abarca fortes elementos locais, em virtude do próprio arcabouço que o forma, incluindo a elaboração dos planos diretores e a legislação de zoneamento, são os planos de desenvolvimento regional que permitem uma articulação entre o planejamento urbano e o seu contexto regional.

A respeito destas asserções, assinale a opção CORRETA:

a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa da I.

b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma justificativa da I.

c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.

d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.

2 A geografia urbana e o planejamento urbano são dois campos de atuação e de estudos que se entrelaçam e se complementam. Com relação aos estudos do planejamento urbano, sabemos que este abarca olhares e dimensões interdisciplinares. Ademais, tal processo nem sempre foi institucionalizado. Nesse sentido, disserte sobre o processo de institucionalização do planejamento urbano ocorrido no século XX.

3 ( ENADE, 2014) A Lei n° 10.257, aprovada em 2001, tem méritos que justificam seu prestígio em boa parte dos países do mundo e suas virtudes não se esgotam na qualidade técnica ou jurídica de seu texto. Num mundo que se urbaniza crescentemente e que a maior contribuição a esse processo ocorre nos países pobres, o tratamento dado à terra na lei merece ser conhecido. Portanto, em que pese a abordagem holística composta por diferentes aspectos, o tema central é a função social da propriedade. Em síntese, a lei

AUTOATIVIDADE

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define como regular a propriedade urbana de modo que os negócios que a envolvem não constituam obstáculo ao direito à moradia para a maior parte da população, visando, com isso, combater a segregação, a exclusão territorial, a cidade desumana, desigual e ambientalmente predatória.

FONTE: MAR/CATO, E. O Estatuto da Cidade Periférica. In: Carvalho, C. S.; ROSSBACH, A. C. O Estatuto da Cidade: comentado. São Paulo: Ministério das Cidades/Aliança das Cidades, 2010. Disponível em: http://www.cidades.gov.br. Acesso em: 30 jul. 2014 (adaptado).

Considerando a citação que trata da política urbana do Estatuto da Cidade, avalie as seguintes afirmações.

I- A regulamentação dos artigos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988 estabelece que o panejamento territorial municipal deve ser resultado de um trabalho restrito a técnicos de alto nível acadêmico, incorporando para esse fim os planos de gestão e ordenamento territorial elaborados nas escalas nacional, estaduais, regionais, metropolitanas, municipais e intermunicipais.

II- A Lei n° 10.257, denominada Estatuto da Cidade, define um extenso conjunto de instrumentos para que o município tenha condições de construir uma política urbana que concretize, de fato, a função social da propriedade urbana e o direito de todos à cidade. Contudo, tal legislação, embora fundamental, não é suficiente para resolver problemas estruturais de uma sociedade historicamente desigual, na qual o direito à cidade ou à moradia legal não são assegurados à maioria da população.

III- A Lei n° 10.257 não trata apenas da terra urbana, assumindo um enfoque holístico, pois abrange também, por exemplo: diretrizes e preceitos sobre planos e planejamento urbano; sobre gestão urbana e regulação estatal; fiscal e jurídica (em especial sobre as propriedades fundiárias e imobiliárias), regularização da propriedade informal, participação social nos planos, orçamentos, parcerias público-privadas, leis complementares e gestão urbana.

É CORRETO o que se afirma em:

a) ( ) I, apenas.b) ( ) II, apenas.c) ( ) I e III, apenas.d) ( ) II e III, apenas.e) ( ) I, II e III.

FONTE: <https://www.aprovaconcursos.com.br/questoes-de-concurso/questao/642394>. Acesso em: 19 set. 2019.

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TÓPICO 2

A DIMENSÃO AMBIENTAL DO PLANEJAMENTO

URBANO

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

O estudo do planejamento, conforme estamos acompanhando, apoia-se em uma ampla gama de conceitos e instrumentos de gestão que auxiliam a conceber projetos e a gerenciar ações relacionadas ao espaço urbano. Neste tópico, a intenção é realçar a dimensão ambiental do planejamento urbano. Pretende-se evidenciar que a relação entre sociedade e natureza e a cidade e o meio ambiente, são indissociáveis.

Enquanto abordagens antigas tendiam a enxergar esses dois elementos de forma dicotômica, ou seja, o ambiente natural em oposição ao ambiente urbano, nos interessa ressaltar aqui como ações de planejamento urbano podem incorporar a dimensão ambiental de modo consciente e sustentável.

2 COMPONENTES DA QUALIDADE AMBIENTAL URBANA

A expressiva concentração de pessoas e atividades econômicas em cidades inevitavelmente cria uma pressão localizada sobre o meio ambiente, pois, embora as áreas urbanas abriguem atualmente metade da população mundial, eles ocupam apenas 2,8% a área terrestre do mundo (UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME, 2013). Essa densa concentração de pessoas em uma pequena proporção de área de terra desencadeia alguns problemas ambientais urbanos.

Dentre os problemas urbanos vinculados à dimensão ambiental, é possível mencionar a relação entre o meio ambiente e a saúde, que se manifesta em decorrência de adversidades no abastecimento de água e da provisão do saneamento. A qualidade do ar, a gestão dos resíduos sólidos e a questão da drenagem da água também podem desencadear importantes problemas ambientais urbanos.

Ao mesmo tempo, atividades que ocorrem em áreas urbanas podem ter implicações para as condições ambientais em outros lugares no mundo. Isso porque as cidades dependem de uma ampla gama de recursos que advém de

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UNIDADE 3 | PLANEJAMENTO URBANO

fora de suas fronteiras geográficas (incluindo água, energia, alimentos e matérias-primas para a produção de bens): demandas que podem ter efeitos ambientais significativos sobre locais distantes (UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME, 2013).

Sobre esse tema, há um crescente consenso a respeito da preocupação com o bem-estar das gerações futuras que precisam se casar com uma preocupação com o bem-estar das gerações atuais, e isso requer engajamento das esferas econômicas, políticas e sociais, em uma variedade de escalas, do local ao global (UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME, 2013).

Ao discorrem sobre a dimensão ambiental do planejamento urbano, Ribeiro e Vargas (2001) defendem a ideia da qualidade urbana, que seria formada por um conjunto de componentes aptos para proporcionar a chamada qualidade ambiental urbana. Os aspectos componentes da qualidade ambiental urbana foram organizados no quadro a seguir.

QUADRO 1 – COMPONENTES DA QUALIDADE AMBIENTAL URBANA

ESPACIAIS BIOLÓGICO SOCIAIS ECONÔMICOS

Bem-estar, vegetação, espaços abertos, tranquilidade.

Saúde física, saneamento,

isolamento, níveis de ruído, qualidade

do ar.

Organização comunitária, de

classe, associações.

Oportunidade de emprego, trabalho,

negócios.

Acessibilidade, sistema viário,

transporte.

Saúde mental, estresse,

congestionamento, filas, solidão, reclamações.

Realização pessoal, amizade, afeto,

reconhecimento.

Produtividade, economia e

deseconomia de aglomeração, custo de vida, competição

complementariedade.

Desenho urbano, elementos visuais,

monotonia, desordem,

informação.

Segurança, trânsito, edificações,

marginalidade.

Contatos, encontros, privacidade,

solidariedade.Diversidade de

escolhas.

Referências, orientação, história,

marcos.

Atividades de lazer, recreação, cultura,

compras.

Uso e ocupação do solo, densidades, conflito de uso,

facilidades, permeabilidade,

segregação.

Realização profissional, mobilidade,

oportunidades.

Acesso e opções de moradia, trabalho, serviços urbanos, serviços sociais,

transporte.

FONTE: Ribeiro e Vargas (2001 apud CUNHA, 2008, p. 269)

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TÓPICO 2 | A DIMENSÃO AMBIENTAL DO PLANEJAMENTO URBANO

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Observe no quadro a diversidade de aspectos que interferem na qualidade ambiental urbana. Note como os aspectos estão entrelaçados e como os aspectos naturais e artificiais se combinam e, em conjunto, afetam a qualidade de vida dos residentes em áreas urbanas. Para além dos aspectos físicos em si, tal como uma praça com vegetação e beleza estética, é necessário, por exemplo, que as condições de segurança sejam adequadas para permitir que sua função, enquanto espaço público de lazer, se cumpra.

NOTA

Vale lembrar que, dentre as várias funções desempenhadas pela cidade, ela é, provavelmente, antes de tudo, um espaço de vida. É o espaço no qual o ser humano vive e busca caminhos para a sua realização e bem-estar.

Por isso, quando se projetam as linhas de um metro, por exemplo, para além dos aspectos meramente técnicos, seria fundamental que se pensasse no conforto e na conveniência dos usuários (tal como ocorre em alguns países desenvolvidos), de modo que a experiência de usar o transporte público, de modo global, fosse aprazível — que o trem fosse pontual, que a estação fosse confortável, que os horários das linhas fossem condizentes com a intensidade dos fluxos de passageiros e assim por diante. Nesse sentido, ressaltamos que, para além do planejamento dos espaços urbanos, é fundamental que se tenha acesso a mecanismos que viabilizem a gestão do ambiente urbano.

Sobre este assunto, Ribeiro e Vargas (2001) comentam que os instrumentos tradicionais de gestão ambiental urbana podem ser agrupados em quatro grupos, tal como nos revela a ilustração a seguir, acompanhe:

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UNIDADE 3 | PLANEJAMENTO URBANO

FIGURA 8 – INSTRUMENTOS TRADICIONAIS DE GESTÃO AMBIENTAL URBANA

Instrumentos tradicionais deGestão Ambiental Urbana

Normativos

Envolvem aslegislações de uso do solo, regulamentação

de padrões de emissão de poluentes, dentre

outros.

Corretivos Preventivos

Abarcam as intervençõesdiretas de implantação

e manutenção de infraestrutura de

saneamento, plantio deárvores, serviço de coleta

de resíduos, etc.

Fiscalização e Controle

Incluem a delimitação deespaços territoriais protegidos(parques e praças), avaliaçõesde impacto ambiental, análise

de risco e licenciamento ambiental entre outros.

Visam assegurar queas atividades realizadas

no espaço urbano estejamconformes às normas

vigentes.

FONTE: Adaptado de Ribeiro e Vargas (2001)

Observe no organograma que os instrumentos tradicionais podem ser de diferentes naturezas. Em outras palavras, eles podem ter como função orientar e precaver quais ações serão empreendidas no espaço geográfico e podem, ainda, ter a função de “punir”, ou seja, de utilizar-se de mecanismos que possam assegurar aquilo que foi anteriormente balizado. Lembre-se, então, que tais instrumentos podem ser normativos, corretivos, preventivos ou ter a finalidade de fiscalização e controle. Ou seja, parte desses instrumentos estão focados no “antes”, a precaução; e outros enfocam o “depois” da correção, o ajuste.

Em termos conceituais, o instrumental tradicional apontado deveria ser capaz de conduzir e nortear a qualidade ambiental urbana. Na prática, contudo, os referidos instrumentos vêm apresentando algumas insuficiências.

Ribeiro e Vargas (2001) observam que a restrição da eficácia estaria atrelada e condicionada a alguns aspectos, merecendo destaque a impossibilidade de se implementar todas as ações necessárias em decorrência da escassez de recursos financeiros, humanos e técnicos. Além disso, no espaço urbano cruzam-se interesses de diversas ordens (econômicos, sociais e culturais), antagônicos aos do gestor urbano, ou ainda, pode existir um desconhecimento generalizados sobre a dimensão ambiental que permeia o espaço urbano da cidade, levando ao imobilismo e colocando obstáculos para a realização dos objetivos delineados (RIBEIRO; VARGAS, 2001). Nesse cenário, o resultado é um só:

[...] a falta de cooperação e a dificuldade no estabelecimento de parcerias. As ações, em vez de se somarem, se neutralizam ou se confrontam, numa sinergia negativa, e a qualidade do ambiente urbano, ao invés de melhorar, frequentemente se deteriora, levando ao desamino de seus moradores e até mesmo ao desejo desses de mudarem de cidade (RIBEIRO; VARGAS, 2001, p. 14).

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Para minimizar essa problemática, Ribeiro e Vargas (2001) sugerem a inclusão de “novos instrumentos”, para serem incorporados e aliados ao aparato instrumental tradicional, tais como: educação ambiental, projetos de comunicação voltados para a temática, além de ações de marketing e negociações ambientais, aptas a aumentar a eficiência dos responsáveis pela gestão ambiental urbana. Na visão das autoras, tais ações podem contribuir para a construção de sinergias positivas no panorama da gestão ambiental urbana.

Analisando as sinergias positivas atreladas ao meio ambiente e às cidades, elencamos a seguir algumas possibilidades de integrar a gestão ambiental e gestão urbana. As cidades podem usar uma variedade de princípios e abordagens para integrar o meio ambiente no planejamento e gestão urbana.

É pertinente reconhecer que as ações tomadas nas cidades são essenciais para resolver ou minimizar os problemas ambientais globais. Pois é na escala local que a maioria das estratégias territoriais se desenvolve. Reforçamos que as cidades são locais importantes para se envolver com questões ambientais, tendo em vista que a maior parte da população vive em cidades.

Estratégias ambientais para áreas urbanas precisam ser apoiadas por alguns princípios fundamentais, para que englobem o envolvimento dos residentes urbanos, o apoio político e o compromisso por parte dos gestores urbanos, assim como o entusiasmo generalizado dos residentes urbanos. As estratégias precisam ser sustentadas por estruturas de governança que facilitem a integração das preocupações ambientais no processo de planejamento (UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME, 2013).

Você conhece o termo governança? Vamos entender melhor do que se trata e como esta definição está associada à gestão dos territórios?

Governança Territorial

Valdir Roque Dallabrida

O território é ambiente de relações que se mesclam entre formas de disputa de poder, logo conflituosas, ou de cooperação, pois é onde se expressam as diferentes formas de pensar e agir das pessoas, não só daquelas que habitam o território, também daquelas que, mesmo de fora, têm interesses projetados naquele recorte espacial. Além disso, os atores internos ou externos que atuam e/ou interferem no território representam diferentes setores, que poderiam ser sintetizados em três termos que utilizamos cotidianamente: sociedade civil, agentes estatais e do mercado.

Assim sendo, hodiernamente, os processos de gestão do território são complexos, pois precisam integrar associativamente não apenas a ação do

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Estado e sociedade civil, também os agentes do mercado. Tais processos de gesta são chamados pela literatura contemporânea de governança territorial (DALLABRIDA, 2015, 2016). Como decorrência dessa compreensão, a dinâmica territorial precisa ser vista como espaços de concertação e governança territorial. A concertação social entendida como processo em que representantes das diferentes redes de poder socioterritorial, através de procedimentos voluntários de conciliação e mediação, assumem a prática de gestão territorial de forma decentralizada e colaborativa. Isso implica na participação de diferentes atores sociais, econômicos e institucionais, como protagonistas do processo (DALLABRIDA, 2007).

Em síntese, a governança territorial pode ser concebida como um processo de planejamento e gestão de dinâmicas territoriais que envolvem atores diferenciados, tais como, agentes estatais, empresariais e atores sociais, que transcorre em contextos de sociedades complexas, conflituosas e regidas por processos multiescalarmente interpenetrados, implicando desafios na sua prática (DALLABRIDA, 2016).

Acerca de sua noção, ou autores, em geral, referem-se aos processos de articulação de atores sociais, econômicos e institucionais em redes de poder socioterritorial (DALLABRIDA, 2007) com vista ao planejamento, tomado de decisão e gestão de assuntos públicos no território (FARINÓS, 2008; DALLABRIDA, 2007), como um modo de organização da ação coletiva. Como característica, tais processos se assentam numa lógica inovadora, partilhada e colaborativa (FERRÃO, 2010), numa concepção qualificada de democracia e num maior protagonismo da sociedade civil, respeitando, no entanto, o papel insubstituível do Estado (DALLABRIDA, 2015).

Assim, propõem-se o entendimento de governança territorial na forma como está expresso em Dallabrida (2015, p. 325): “A governança territorial corresponde a um processo de planejamento e gestão de dinâmicas territoriais que dá prioridade a uma ótica inovadora, partilhada e colaborativa, por meio de relações horizontais”. Esse processo inclui lutas de poder, discussões, negociações e, por vezes, deliberações, entre agentes estatais, representantes dos setores sociais e empresariais, de centros universitários ou de investigação. Uma questão importante deve ser ressaltada: processos desta natureza fundamentam-se num papel insubstituível do Estado, numa noção qualificada de democracia e no protagonismo da sociedade civil, objetivando harmonizar uma visão sobre o futuro e um determinado padrão de desenvolvimento territorial (DALLABRIDA, 2015).

Entre os propósitos da governança territorial está a gestão dos assuntos públicos com impacto nos territórios com vistas a acordar uma visão partilhada para o futuro entre todos os níveis e atores envolvidos, de modo a assegurar

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TÓPICO 2 | A DIMENSÃO AMBIENTAL DO PLANEJAMENTO URBANO

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a representação de diferentes grupos e interesses territoriais (FARINÓS, 2008; DALLABRIDA, 2007; 2015). Apesar da grandeza dos propósitos, análises sobre a prática de processos de governança territorial revelam ainda a falta de integração setorial e intragovernamental das políticas públicas que impactam os territórios. Ainda, em relação às experiências de associativismo territorial, seja de cunho social ou empresarial, a prática não demonstra a eficácia necessária para governar um território de forma associativa e participativa (DALLABRIDA, 2015). São apenas alguns dos desafios a serem superados, o que não significa desmerecimento de sua importância como estratégia de ampliação do protagonismo territorial.

Por fim, Jessop (2006) ressalta que, apesar do contexto mundial sociopolítico-econômico que exige novas formas de governo e em que emergem formas de governança, se mantêm um papel político central para o Estado nacional. No entanto, este papel se redefine devido à rearticulação mais geral dos níveis de organização política e econômica supranacionais, nacionais, regionais e locais. Com isso, a governança exige novos instrumentos jurídicos para o governo, orientados para favorecer o intercambio e a cooperação entre a pluralidade de atores que, hodiernamente, intervêm nos processos de decisão que incidem sobre os territórios.

FONTE: DALLABRIDA, V. R. Governança territorial. In: GRIRBELER, M. P. D.; RIEDL, M. (Orgs.) Dicionário de desenvolvimento regional e temas correlatos. Porto Alegre: Conceito, 2017.

Caro acadêmico, você notou como os processos de governança territorial permitem a articulação entre os aspectos ambientais e urbanos que permeiam a gestão das cidades? Esse escopo conceitual nos ajuda a pensar em soluções e alternativas para os espaços onde residimos.

Cumpre reconhecer que, para incorporar a análise da dimensão ambiental nos estudos do planejamento urbano, é fundamental que se apoie em abordagens integradas. Tais abordagens permitem identificar as múltiplas dimensões e escalas dos problemas ambientais que ocorrem nos espaços urbanos. Essa abordagem deve priorizar os arranjos de governança, que podem fornecer uma base sobre quais ferramentas específicas para integrar o ambiente no planejamento e gerenciamento urbano possam ser utilizadas. Cidades em diferentes estágios de crescimento populacional e desenvolvimento econômico enfrentam problemas ambientais diferentes e exigem soluções adequadas para cada realidade. Em quaisquer que sejam os casos particulares, no entanto, a participação de uma série de partes interessadas e o compromisso político são importantes; assim como assegurar que as atividades sejam harmonizadas e integradas com outros níveis de governo (UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME, 2013).

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UNIDADE 3 | PLANEJAMENTO URBANO

3 PROCESSOS DE DEGRADAÇÃO E RECUPERAÇÃO DO AMBIENTE URBANO

Seguindo com as reflexões sobre a dimensão ambiental do planejamento urbano, iremos ressaltar dois conceitos que são usualmente empregados ao se tratar do assunto: degradação e recuperação.

De modo geral, a degradação ambiental refere-se ao processo pelo qual o meio ambiente — o ar, a água e a terra — é progressivamente contaminado, excessivamente explorado ou destruído. Quando o ambiente se torna danificado, diz-se que a degradação ambiental ocorre. Assim, a degradação ambiental é a deterioração do meio ambiente através do esgotamento de recursos como água do ar, solo e florestas, a destruição de ecossistemas e a extinção da vida selvagem (ENVIRONMENTAL, c2012).

A degradação ambiental, tal como a degradação da terra e a poluição da água, do ar ou do solo, é causada pelo mau uso dos recursos, ausência de planejamento urbano, infraestrutura deficiente e má governança e monitoramento da gestão urbana. Tal descuido, somados a problemas como má administração de recursos alocados para gestão ambiental e urbana, acidentes industriais (que despejam resíduos e rejeitos na natureza excessivamente), aumento da poluição nas cidades, entre várias outras mazelas ambientais, têm crescido de tal forma na atualidade, que os chamados serviços ecossistêmicos estão sendo comprometidos em todas as regiões do mundo. Quando esses fatores são sobrepostos a fenômenos de mudança ambiental global, tal como mudanças climáticas (alterações nos padrões de precipitação, aumento do nível do mar, aumento da frequência de ondas de calor e assim por diante, dependendo da localização), a possibilidade da intensificação dos problemas ambientais nos espaços urbanos apresenta-se, infelizmente, como um cenário a ser enfrentado (RENAUD et al., 2008).

Os efeitos da degradação ambiental nos espaços urbanos geram consequência para a saúde, qualidade de vida e produtividade das cidades. Dentre os problemas decorrentes da degradação ambiental, podemos ressaltar: a poluição da água e sua escassez; a poluição do ar; resíduos sólidos e tóxicos que não são descartados adequadamente (que além de prejudicar a saúde, afeta a produtividade através da poluição dos recursos hídricos subterrâneos); poluição sonora excessiva (que muitas vezes deriva da falta de planejamento urbano) entre vários outros problemas, conforme examinamos na unidade anterior deste livro didático. No tópico a seguir, discutiremos algumas possibilidades para melhorar a qualidade ambiental urbana das cidades.

Por fim, deixamos uma sugestão de plano de aula para trabalhar com os alunos a questão dos aspectos ambientais relacionais ao espaço urbano. Particularmente, a atividade problematiza a questão do lixo. Acompanhe!

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TÓPICO 2 | A DIMENSÃO AMBIENTAL DO PLANEJAMENTO URBANO

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Plano de aula

Lixocomoformadepoluição

Aula destinada para os alunos do quinto ano do ensino fundamental

Objetivos de aprendizagem: identificar o lixo como forma de poluição a partir de exemplo em seu entorno.

Habilidades da BNCC: identificar e descrever problemas ambientais que ocorrem no entorno da escola e da residência (lixões, indústrias poluentes, destruição do patrimônio histórico etc.), propondo soluções (inclusive tecnológicas) para esses problemas.

Materiais necessários: Papel A4.

Para você saber mais:http://qnesc.sbq.org.br/online/cadernos/01/lixo.pdf http://www.cenedcursos.com.br/meio-ambiente/lixo-consequencias-

desafios-e- solucoes/

Sugestõesdelinkqueapresentaconceitodelixo:https://portalresiduossolidos.com/o-que-e-lixo/

Sugestõesdelinkqueapresentaconceitodepoluição:https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geografia/tipos- poluicao.htm

Contextos prévios: espera-se que os alunos já saibam o conceito de:

Lixo: um produto que foi descartado e que não tem valor nenhum. O lixo que pode ser reaproveitado de alguma forma é chamado de resíduo sólido. O lixo que não pode ser aproveitado é chamado de rejeito.

Poluição: poluição é definida por alterações indesejáveis nas propriedades físicas, químicas e/ou biológicas do meio ambiente, trazendo danos e desequilíbrios à natureza e ao desenvolvimento de populações naturais e humanas.

Tema da aula

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UNIDADE 3 | PLANEJAMENTO URBANO

Tempo sugerido: 2 minutos

Orientações: leia o tema com os alunos. Pergunte aos alunos: “O que é lixo?”. Espera-se que os alunos respondam que lixo é o que não queremos mais, o que se pode jogar fora.

Contextualização

Tempo sugerido: 5 minutos

Orientações: leia as informações do slide com os alunos. Pergunte aos alunos: “Você sabe quantas sacolas de lixo sua família produz em casa?”, “E só você, quantas sacolas de supermercado você enche de lixo em um dia? Pense nas folhas que você arranca ou rasga do caderno, por exemplo”, “Aqui na escola você imagina quantas sacolas de lixo são produzidas por dia?” Se não for possível projetar o slide escreva em cartolinas/papel kraft ou no quadro, assim os alunos poderão acompanhar a leitura das informações do slide.

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TÓPICO 2 | A DIMENSÃO AMBIENTAL DO PLANEJAMENTO URBANO

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Problematização

Tempo sugerido: 5 minutos

Orientações: leia a pergunta com os alunos do slide projetado. Você pode escrever a pergunta no quadro se não for possível fazer a projeção. Faça os alunos pensarem sobre o trajeto que fazem todo dia, de sua casa para a escola e vice-versa, fazendo-os refletirem no que eles vêm ou não vêm no caminho. Alguns podem dar exemplos como: “quando eu venho para a escola eu tenho que descer da calçada porque está cheia de lixo.”, ”A rua é cheia de lixo no chão.”, “Tem um lugar que todo mundo joga as sacolas de lixo no fim da rua.”

Para estimular mais ideias aos alunos pergunte “Você considera o lixo um problema? Na sua casa, na escola, no bairro da escola?”.

Ação propositiva

Tempo sugerido: 25 minutos

Orientações: distribua uma folha de papel A4 para cada aluno. Explique aos alunos que eles devem desenhar o caminho, “um mapa”, da casa deles até a escola com os locais onde tem descarte de lixo como lixeiras, marcar onde as sacolas de lixo ficam acumuladas no chão (esquinas normalmente), onde tem

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UNIDADE 3 | PLANEJAMENTO URBANO

Tempo sugerido: 13 minutos

Orientações: peça aos alunos que escrevam três ações para diminuir a quantidade de lixo no dia a dia deles. Espera-se que escrevam: “Não usar copo descartável”, “Usar sacola retornável”, “Usar garrafa de refrigerante de vidro”. Peça para os alunos lerem uma das ações escritas por eles. Incentive os alunos a falarem como colocariam essas ações em prática.

FONTE: <https://novaescola.org.br/plano-de-aula/5057/lixo-como-forma-de-poluicao>. Acesso em: 14 jun. 2019.

entulho e outras formas de lixo que eles se lembrarem. Deixe-os desenhando por 15 minutos. Observe que o “mapa" é uma representação do caminho que o aluno faz, um mapa mental, não se espera que haja conceitos cartográficos, afinal não é o objetivo da aula. Por isso, não se espera desenhos complexos nesta faixa etária, veja exemplos de mapa mentais no link: https://www.neusarocha.com.br/projetos/produzindo- mapas-mentais-6-ano.

Desenhe no quadro um exemplo com base nos mapas mentais do link. Entretanto, mesmo não sendo o foco da atividade, você proporcionará aos alunos a oportunidade de construção da noção de localização relativa dos objetos no espaço.

Após o tempo para desenhar, diga que vocês vão fazer uma lista, no quadro, das formas de descarte mais comuns, que mais apareceram nos desenhos. Peça aos alunos para ditarem as formas que eles desenharam, peça que cada um cite uma forma, assim todos poderão participar da atividade. Se espera que eles citem: “na lixeira”, ‘na calçada”, “no terreno vazio”. Quando as formas se repetirem marque com um “I” na frente do nome já escrito na lista, assim ao acabarem a lista é possível verificar qual o tipo mais comum.

Os mapas podem ser colados no mural da sala para que ocorra uma comparação entre as quantidades de lixo nos caminhos.

Sistematização

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Dentre os problemas urbanos vinculados à dimensão ambiental, é possível mencionar a relação entre o meio ambiente e a saúde, que se manifesta em decorrência de adversidades no abastecimento de água e da provisão do saneamento.

• A qualidade do ar, a gestão dos resíduos sólidos e a questão da drenagem da água também podem desencadear importantes problemas ambientais urbanos.

• Atividades que ocorrem em áreas urbanas podem ter implicações para as condições ambientais em outros lugares no mundo.

• As cidades dependem de uma ampla gama de recursos que advém de fora de suas fronteiras geográficas (incluindo água, energia, alimentos e matérias-primas para a produção de bens): demandas que podem ter efeitos ambientais significativos sobre locais distantes.

• A qualidade urbana é formada por um conjunto de componentes aptos para proporcionar a chamada qualidade ambiental urbana.

• Para além do planejamento dos espaços urbanos, é fundamental que se tenha acesso a mecanismos que viabilizem a gestão do ambiente urbano.

• Os instrumentos tradicionais de gestão ambiental urbana podem ser normativos, corretivos, preventivos ou de fiscalização e controle.

• A inclusão de “novos instrumentos”, para serem incorporados e aliados ao aparato instrumental tradicional, tais como: educação ambiental, projetos de comunicação voltados para a temática e, ações de marketing e negociações ambientais podem aumentar a eficiência dos responsáveis pela gestão ambiental urbana.

• A governança territorial corresponde a um processo de planejamento e gestão de dinâmicas territoriais que dá prioridade a uma ótica inovadora, partilhada e colaborativa, por meio de relações horizontais.

• Cumpre reconhecer que, para incorporar a análise da dimensão ambiental nos estudos do planejamento urbano, é fundamental que se apoie em abordagens integradas. Tais abordagens permitem identificar as múltiplas dimensões e escalas dos problemas ambientais que ocorrem nos espaços urbanos.

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• A degradação ambiental, tal como a degradação da terra e a poluição da água, do ar ou do solo, é causada pelo mau uso dos recursos, ausência de planejamento urbano, infraestrutura deficiente e má governança e monitoramento da gestão urbana.

• Os efeitos da degradação ambiental nos espaços urbanos geram consequência para a saúde, qualidade de vida e produtividade das cidades.

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AUTOATIVIDADE

1 Os municípios brasileiros, pelas competências constitucionais que lhes foram atribuídas, constituem atores decisivos na implementação do planejamento e na gestão ambiental urbana. Para tanto, os municípios valem-se de alguns instrumentos normativos. Sobre esse assunto, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Os instrumentos de gestão urbana são de exclusividade do poder estadual.

b) ( ) Tais instrumentos incluem as avaliações de impactos ambientais.c) ( ) Os referidos instrumentos estão em desuso, em face a constante

atualização das políticas ambientais nacionais. d) ( ) Tais instrumentos envolvem as legislações de uso do solo e

regulamentação de padrões de emissões de poluentes.

2 Governança é um termo utilizado por diferentes áreas do conhecimento, principalmente, a Sociologia, a Política, a Administração, a Economia e a Geografia. No plano da Geografia Urbana, é possível falar em Governança Territorial. Disserte sobre esse conceito.

3 (ENADE, 2017) Dentre as várias formas e processos de movimentos de massa, destacam-se os deslizamentos nas encostas, em razão da sua interferência grande e persistente com as atividades do homem, da extrema variância de sua escala, da complexidade de causas e mecanismos, além da variabilidade de materiais envolvidos.

FONTE: FERNANDES, N.; AMARAL, C. Movimentos de Massa: uma abordagem geológico-geomorfológica. In: GUERRA, A.; CUNHA, S. Geomorfologia e Meio Ambiente. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000 (adaptado).

Sobre as dinâmicas e os processos que compõem os movimentos de massa, as ocupações urbanas e os riscos ambientais, avalie as afirmações a seguir.

I- Apesar de os fatores do meio físico serem centrais na compreensão e explicação dos fenômenos mencionados, fatores bióticos, especialmente o ser humano, podem participar, de modo significativo, dessas dinâmicas.

II- Um conjunto de ações, como, mapeamentos de suscetibilidade, monitoramento de encostas e de índices pluviométricos pode reduzir a gravidade dos impactos causados pelos fenômenos mencionados, especialmente, os relacionados à vida humana.

III- Os movimentos de massa, por se caracterizarem como um processo natural típico de planícies aluviais, fazem parte da própria evolução geomorfológica, através da deposição de sedimentos nesses ambientes.

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É correto o que se afirma em:

a) ( ) II, apenas.b) ( ) III, apenas.c) ( ) I e II, apenas.d) ( ) I e III, apenas.e) ( ) I, II e III.

FONTE: <https://www.aprovaconcursos.com.br/questoes-de-concurso/questao/635485>. Acesso em: 19 set. 2019.

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TÓPICO 3

A CIDADE PARA AS PESSOAS

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Acima de tudo, nunca perca a vontade de caminhar. Todos os dias, eu caminho até alcançar um estado de bem-estar e me afasto de qualquer doença. Caminho em direção aos meus melhores pensamentos e não conheço pensamento algum que, por mais difícil que pareça, não possa ser afastado ao caminhar (SOREN AABYE KIERKGAARD, filósofo dinamarquês, 1813-1855).

Conforme estudamos até aqui, uma das preocupações centrais da Geografia Urbana é compreender como se configuram os espaços urbanos e quais as implicações do processo de urbanização.

Ao longo desta disciplina, fomos entendendo que quando o deslocamento das pessoas em direção aos centros urbanos se dá de forma desordenada, os problemas decorrentes de tais processos são complexos e demandam importantes esforços para que sejam solucionados.

Neste sentido, seja visando planejar uma nova cidade — como foi o caso de Brasília — ou seja, para “remediar” problemas que já estão em curso nas cidades, compete aos estudiosos do planejamento urbano (ainda que não exclusivamente a eles) examinar, encaminhar as estratégias possíveis e tentar solucionar os problemas urbanos.

Colocando de modo bastante simples, o que precisa ser observado é que algumas experiências de planejamento urbano, inspiradas pelo pensamento chamado de “modernistas”, têm se mostrado insuficiente para atender o quadro atual de muitas cidades. Em linhas gerais, a principal crítica é que projetos como o da cidade de Brasília, puseram muita ênfase na questão da forma, da estética e no sistema de transporte baseado nos carros. Contudo, falharam ao negligenciar a dimensão humana inerente ao processo de planejamento das cidades. Assim, o objetivo deste tópico é refletir sobre as ideias das cidades voltadas para as pessoas. Venha conosco!

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UNIDADE 3 | PLANEJAMENTO URBANO

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2 CIDADE PARA PESSOAS, MOBILIDADE URBANA E ESPAÇOS PÚBLICOS

Vamos começar este tópico examinando as ideias centrais publicadas no livro Cidade para pessoas, escrito por Jan Gehl. O livro foi publicado em 2015 pelo arquiteto e urbanista dinamarquês, professor universitário aposentado e consultor que reúne ampla experiência teórica e prática sobre o estudo das cidades.

As ideias de Jan Gehl são contemporâneas e expressam alternativas para se pensar na questão da qualidade de vida urbana com base em reflexões teóricas e projetos práticos realizados em mais de 200 cidades, tais como Copenhage (Dinamarca), Moscou (Rússia), Nova York (Estados Unidos), Londres (Reino Unido) entre outras.

Gehl (2015) sustenta que, por décadas, a dimensão humana tem sido negligenciada nos estudos do planejamento urbano, enquanto questões como a crescente ascensão do tráfego de carros seguem em evidência. Além disso, ideologias de planejamento dominantes — o modernismo em particular — colocaram especificamente uma baixa prioridade no espaço público, no pedestrianismo e no papel do espaço da cidade como ponto de encontro para os moradores urbanos. Outrossim, forças de mercado e as tendências arquitetônicas mudaram gradualmente o foco das inter-relações e dos espaços comuns da cidade para os edifícios individuais, que no processo se tornaram cada vez mais isolados e introvertidos.

Uma característica comum a quase todas as cidades — independentemente da localização global, da viabilidade econômica e do estágio de desenvolvimento — é o fato das pessoas que ainda usam o espaço da cidade não vêm sendo tratadas de maneira apropriada. Espaço limitado, obstáculos, ruído, poluição, risco de acidentes e condições geralmente vergonhosas são típicos para os moradores da cidade na maioria das cidades do mundo. Tais fragilidades dificultam o estímulo aos pedestres, como uma forma de transporte. Assim, a função tradicional do espaço da cidade como ponto de encontro e fórum social para os moradores da cidade foi reduzida, ameaçada ou eliminada (GEHL, 2015).

ESTUDOS FUTUROS

Estas são algumas das ideias trabalhadas por Jan Gehl. Para expor de modo sintético as ideias tratadas pelo autor no livro Cidade para Pessoas, selecionamos uma resenha da obra para você que se encontra na Leitura Complementar, ao final deste tópico. Boa leitura!

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TÓPICO 3 | A CIDADE PARA AS PESSOAS

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DICAS

FIGURA – LIVRO CIDADES PARA PESSOAS

FONTE: <http://statics.livrariacultura.net.br/products/capas_lg/874/42135874.jpg>. Acesso em: 17 set. 2019.

Se você desejar consultar o livro Cidade para pessoas, poderá fazê-lo acessando link: https://archive.org/details/LivroCidadeParaPessoasJanGehl.

Recomendamos também que você assista a entrevista na qual Jan Gehl explica o conceito de cidades para pessoas. Nessa entrevista o autor expõe de modo claro e didático suas ideias centrais. Confira!

DICAS

Para garantir a qualidade de vida nas cidades, é preciso superar a arquitetura modernista, apostando na integração entre moradia e trabalho e nos deslocamentos não motorizados. É o que defende o arquiteto dinamarquês Jan Gehl. Confira o que pensa um dos mais influentes urbanistas sobre o planejamento do desenho urbano e a utilização dos espaços públicos nesta entrevista conduzida pelo jornalista Denis Russo (https://www.youtube.com/watch?v=fgcNxIlycic).

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UNIDADE 3 | PLANEJAMENTO URBANO

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Esperamos que as ideias de Jan Gehl possam inspirar e ajudar nas ocasiões de reflexões dos problemas urbanos atuais. Tal como você pode observar, em uma concepção de cidade voltada para pessoas, priorizam-se alternativas de mobilidade urbana focadas em pedestres, no uso de bicicletas e no transporte público de qualidade.

Com relação ao estímulo ao uso de bicicletas nas áreas urbanas, Gehl (2015, p. 185) ressalta que:

[...] o convite para pedalar implica que o tráfego de bicicletas esteja integrado na estratégia geral de transportes. É preciso criar condições para levar bicicletas nos trens e metrôs, e de preferência também em ônibus urbanos, para que seja possível viajar combinando bicicleta e transporte público. Os táxis também deveriam poder levar bicicletas quando necessário.

FIGURA 9 – EXEMPLO DE INTEGRAÇÃO DE MODAIS DE TRANSPORTE NA ALEMANHA

FONTE: <http://bicyclegermany.com/Images/Trains/Leine0051Loading.jpg>. Acesso em: 18 jun. 2019.

FIGURA 10 – EXEMPLO DE INTEGRAÇÃO DE MODAIS DE TRANSPORTE NA ALEMANHA (2)

FONTE: <http://bicyclegermany.com/Images/Trains/100_0075%20bike%20on%20street%20car.jpg>. Acesso em: 18 jun. 2019.

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TÓPICO 3 | A CIDADE PARA AS PESSOAS

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Observe nas imagens como a experiência de sincronizar os distintos modais de transportes é confortável, fluída, prática e conveniente para o usuário. É importante ressaltarmos que, diferente do que ocorre na maior parte das cidades brasileiras, não basta que se criem leis para incentivar o uso de modais alternativos ao uso do carro. É preciso construir condições para que os citadinos usufruam da cidade. Em países nos quais tais experiências são exitosas, há um conjunto integrado de ações que facilitam este entrelaçamento de modais. Por exemplo, os terminais de ônibus e trem possuem uma área de bicicletário, as ciclovias são construídas de modo coerente, várias empresas possuem uma área de vestiário para os funcionários tomarem ducha após pedalarem (caso seja indicado ao clima local) e assim por diante. A intenção de apresentar essas informações é de que possamos nos inspirar e pleitear, junto aos governantes, soluções efetivamente inteligentes e convenientes, distanciando-se de experiências recheadas de leis e normativas que, simplesmente, acabam por oferecer, muitas vezes, fragmentos de ciclovias que terminam abruptamente, dificultando seu uso.

Ainda tratando da questão da integração entre as bicicletas com os demais modais de transporte, Gehl (2015, p. 185) reforça que o estímulo ao uso de meios de transportes alternativos implica em condições apropriadas e convenientes para os usuários:

Outra importante ligação em um sistema integrado de transporte é a possibilidade de estacionar bicicletas com segurança em estações e terminais. É também preciso ter boas opções de estacionamento para bicicletas ao longo das ruas em geral, em escolas, escritórios e residências. Novos edifícios industriais e de escritórios deveriam incluir estacionamento para bicicletas, vestiários e chuveiros como parte normal de seu programa.

Além do mais, outro ponto interessante ressaltado no livro Cidade para pessoas, é o fato dos aspectos que constituem a qualidade urbana, tal como a mobilidade e o uso dos espaços públicos com finalidade de lazer, não são tratados de forma isolada. Ao contrário, o autor propõe uma visão integradora dos processos que permeiam o uso dos espaços urbanos, tal como fica aparente no fragmento da obra que iremos expor a seguir:

Como conceito, “a vida entre edifícios” inclui todas as diferentes atividades em que as pessoas se envolvem quando usam o espaço comum da cidade: caminhadas propositais de um lugar a outro; calçadões, paradas curtas; paradas mais longas; ver vitrines; bater papo e encontrar pessoas; fazer exercícios; dançar; divertir-se; comércio de rua; brincadeiras infantis pedir esmolas; e entretenimento de rua.

Caminhar é o início, o ponto de partida. O homem foi criado para caminhar e todos os eventos da vida — grandes e pequenos — ocorrem quando caminhamos entre outras pessoas. A vida em toda a sua diversidade se desdobra diante de nós quando estamos a pé.

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UNIDADE 3 | PLANEJAMENTO URBANO

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Em cidades vivas, seguras, sustentáveis e saudáveis, o pré-requisito para a existência da vida urbana é oferecer boas oportunidades de caminha. Contudo, a perspectiva mais ampla é uma infinidade de valiosas oportunidades sociais e recreativas apareça quando se reforça a vida a pé.

Por vários anos, durante os quais a circulação de pedestres foi tratada, sobretudo, como forma de transporte dentro do planejamento de tráfego, a vida na cidade, repleta de nuances e oportunidades, foi amplamente ignorada ou negligenciada. Os termos usados eram “tráfego de pedestres”, “fluxo de pedestres”, “capacidade de calçada” e “cruzar a rua com segurança”.

Mas nas cidades, há muito mais em caminhar do que simplesmente andar! Há um contato direto entre as pessoas e a comunidade do entorno, o ar fresco, o estar ao ar livre, os prazeres gratuitos da vida, experiencias e informações. Em essência, caminhar é uma forma especial de comunhão entre pessoas que compartilham o espaço público como uma plataforma e estrutura [...].

FONTE: GEHL, J. Cidades para pessoas. São Paulo: Perspectiva, 2015, p. 19.

Por fim, ressaltamos que as premissas de uma cidade focada em pessoas estão atreladas à perspectiva do desenvolvimento sustentável. Particularmente, em se tratando do plano urbano, os principais aspectos que tendem a ser vinculados ao desenvolvimento sustentável são o consumo de emissão, emissão de gases e resíduos poluentes, atividade industrial, fornecimento de energia, gerenciamento de água, esgoto e transportes. “Transporte é um item particularmente relevante na contabilidade verde, porque é responsável por um consumo massivo de energia, pelas consequentes emissões de carbono e pela pesada poluição” (GEHL, 2015, p. 105).

Agora, gostaríamos de propor uma reflexão: após o debate realizado neste tópico, quais são as impressões que você tem sobre o espaço urbano da sua cidade? No seu entendimento, ele foi projetado pensando nas pessoas? Quais seriam os aspectos considerados positivos e que coadunam com a perspectivas que estudamos das cidades para as pessoas? Após as ideias apresentadas, quais seriam os possíveis encaminhamentos para serem feitos na sua cidade, com vistas a melhorar a dimensão humana do uso dos espaços urbanos?

Caro acadêmico, visando auxiliar no processo de sua formação enquanto professor, apresentamos, a seguir, uma sugestão de plano de aula a ser trabalhada com os alunos do Ensino Fundamental.

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TÓPICO 3 | A CIDADE PARA AS PESSOAS

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PLANO DE AULA

ESPAÇOS PÚBLICOS E PRIVADOS

Ano: 1°ano do Ensino Fundamental

Unidade temática: O sujeito e seu lugar no mundo

Objetivos de aprendizagem: Construir o conceito de espaço público e privado.

Habilidade (s) da Base: (EF01GEO3) Identificar e relatar semelhanças e diferenças de usos do espaço público (praças, parques) para o lazer e diferentes manifestações.

Sobre este plano: ele está previsto para ser realizado em uma aula de 100 minutos. Serão abordados aspectos que fazem parte do trabalho com a habilidade de Geografia, EF01GEO3: Identificar e relatar semelhanças e diferenças de usos do espaço público (praças, parques) para o lazer e diferentes manifestações, que consta na BNCC [...]. Para o desenvolvimento deste plano é importante que os alunos estejam sentados em duplas.

Materiais necessários: imagens dos slides 3 ou semelhantes, diferentes imagens de espaços públicos e privados que poderão ser impressos em nosso material complementar ou recortado de materiais dos quais o professor tenha acesso, como jornais, revistas, livros sem uso etc.

Material complementar: imagens de diferentes espaços públicos e privados, disponíveis em: https://nova-escolaproducao.s3.amazonaws.com/6Ub7Cn9urzn3YcxpPJHWy9XRgJpMve9eyQrWFvBzBVmCegWJ3TuHWCHJQRYD/geo1- 03und1-contextualizacao-imagens.pdf

Ficha para preenchimento de palavras-chave utilizada na sistematização da aula “Aprendi que” disponível em: https://nova-escola- producao.s3.amazonaws.com/qexQVknNbWa6yBTHRnEskkAkhUVntU9ebvRaKGTSq3wZMK4MabTyR6dKRhJ9/geo1- 03und1-sistematizacao-tabela-aprendi-que.pdf

Para você saber mais: para aprofundar seus conhecimentos sobre o assunto consulte os artigos disponíveis em: https://escolakids.uol.com.br/cidades-espacos-publicos-e-privados.htme http://www.batebyte.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=1468

Contextos prévios: para o desenvolvimento das discussões e reflexões desta aula é importante que os alunos já tenham refletido sobre a importância das regras e normas de convivência para um bom convívio social [...].

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UNIDADE 3 | PLANEJAMENTO URBANO

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Tema da aula

Tempo sugerido: 5 minutos

Orientações: Projete ou apresente o tema aos alunos. Dê um tempo para que eles leiam a temática da aula. Auxilie-os na leitura se julgar necessário. Questione os alunos sobre o que entenderam da temática e o que eles pensam a respeito dessa indagação. Aproveite para fazer o levantamento dos conhecimentos prévios dos estudantes, questionando se já ouviram algo sobre o tema, em qual momento escutaram essas expressões e a que elas os remetem. Conclua dizendo que tais reflexões farão parte desta aula.

Contextualização

Tempo sugerido: 10 minutos

Orientações: projete esse slide aos alunos. Dê um tempo para que leiam o questionamento e observem as imagens. Caso necessário, ajude-os nesse momento realizando uma leitura coletiva (com o seu auxílio). Permita que

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TÓPICO 3 | A CIDADE PARA AS PESSOAS

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os alunos nomeiem os espaços por eles reconhecidos. Neste momento, para introduzi-los ainda mais na temática da aula, faça as seguintes perguntas: Quais desses lugares podem ser utilizados por várias pessoas ao mesmo tempo? Quais destes espaços podem ser utilizados apenas por pessoas conhecidas ou que recebam autorização para acessá-lo? Permita que os alunos dialoguem sobre as questões e demonstrem as variadas hipóteses de respostas sobre ela, mas não interfira nesse momento. A construção do conceito será abordada durante a aula.

Materiais complementares: imagens de diferentes espaços públicos e privados disponível em: https://nova-escola- producao.s3.amazonaws.com/6Ub7Cn9urzn3YcxpPJHWy9XRgJpMve9eyQrWFvBzBVmCegWJ3TuHWCHJQRYD/geo1- 03und1-contextualizacao-imagens.pdf

Como adequar a sua realidade: você poderá apresentar esse slide de forma impressa ou escrevê-lo no quadro. Caso não queira imprimir as imagens deste slide, que estão presentes no material complementar, recorte figuras de diferentes espaços como, escola, casa, hospital, praça, rua, parques etc., de livros que não utiliza mais, revistas ou jornais. Outra opção é desenhar os espaços em folha sulfite e nomeá-los.

Problematização

Tempo sugerido: 15 minutos

Orientações: projete este slide aos alunos. Este é o momento de promover análise e dimensionamento do tema. Dê um tempo para que leiam os questionamentos do diálogo. Caso necessário ajude-os nesse momento realizando uma leitura coletiva (com o seu auxílio). Permita que os alunos explorem suas hipóteses no momento de responder às indagações. Para que relacionem o questionamento às suas vivências solicitem que fechem os olhos e imaginem: Os diversos espaços que já frequentaram em sua cidade. A rua de

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sua casa. A sua casa. Um consultório médico, entre outros lugares que julgar necessário. Ao término desse momento permita que os alunos socializem as conclusões, informando quais dos espaços por eles pensados podem ser frequentados por diferentes pessoas ao mesmo tempo e quais espaços são frequentados apenas por pessoas autorizadas.

Como adequar a sua realidade: no momento de propor aos alunos que imaginem diferentes lugares associando ao questionamento do slide você poderá dizer o nome de um local conhecido em sua cidade, seja ele um parque, um museu etc.

Ação propositiva

Tempo sugerido: 45 minutos

Orientações: terminadas as socializações do slide anterior, projete ou escreva no quadro o próximo questionamento da aula e realize uma leitura coletiva (todos os alunos lendo com auxílio da professora). Nos primeiros 15 minutos, entregue a cada dupla de alunos duas imagens, podem ser todas de espaços públicos, de espaços privados ou variadas. Solicitem que as duplas conversem entre si e cheguem a um consenso sobre qual conceito, público ou privado, pertence aquela imagem. Reserve o tempo restante dessa etapa, 30 minutos, para que as duplas socializem suas conclusões. Para isso, divida o quadro em duas partes e escreva em uma delas PÚBLICO e na outra PRIVADO. Os alunos deverão mostrar as imagens que possuem, nomeá-las, explicar em qual lado do quadro irão colocá-la e os motivos para esse enquadramento. Intervenha, propondo reflexões caso algum aluno comenta algum erro no momento desta classificação, se isso ocorrer permita que outros alunos da turma exponham as suas ideias para justificar o erro cometido e por qual motivo aquela imagem deve ser classificada de outra maneira.

Como adequar a sua realidade: caso não queira imprimir as imagens sugeridas que estão presentes no material complementar, você poderá recortar

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TÓPICO 3 | A CIDADE PARA AS PESSOAS

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figuras de diferentes lugares como rua, praça, praia, interior de moradia, de loja, de mercado, cinema etc., de livros que não utiliza mais, revistas ou jornais.

Sistematização

Tempo sugerido: 25 minutos

Orientações: projete este slide aos alunos ou escreva o comando no quadro. Entregue aos alunos uma folha impressa com o mesmo conteúdo deste slide. Comece questionando quais palavras ficaram em suas memórias quando usamos a expressão Espaço Público e quais palavras explicam seus entendimentos sobre a expressão Espaço Privado. Neste momento, é importante que você retome possíveis dificuldades conceituais, exemplificando, por exemplo que espaços públicos são aqueles de uso comum como a rua, uma praça, um parque. Já os espaços privados pertencem a alguém e requer autorizações para o seu acesso e permanência, como as moradias e lojas. Anote no quadro a as palavras-chave ditadas pelos alunos, ou seja, àquelas que resumem o assunto trabalhado e identificam suas ideias para servir de referência ao conceito. Realize a leitura destas palavras com os alunos e solicite que as copiem no espaço adequado da ficha. Para finalizar solicite que desenhem no respectivo lugar um espaço público e um privado identificado nas proximidades de seu local de vivência.

Materiais complementares: Ficha para preenchimento disponível em:https://nova-escola- producao.s3.amazonaws.com/qexQVknNbWa6yBTHRnEskkAkhUVntU9ebvRaKGTSq3wZMK4MabTyR6dKRhJ9/geo1- 03und1-sistematizacao-tabela-aprendi-que.pdf

Como adequar a sua realidade: caso não imprima a ficha “Aprendi que:” disponível no material complementar, você poderá solicitar que os alunos copiem as palavras-chave no caderno e posteriormente realizem um desenho para cada espaço.

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Aprendi que:

Espaços Públicos Espaços Privados

Desenho Desenho

FONTE: <https://novaescola.org.br/plano-de-aula/4871/espacos-publicos-e-privados>. Acesso em: 14 jun. 2019.

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TÓPICO 3 | A CIDADE PARA AS PESSOAS

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LEITURA COMPLEMENTAR

RESENHA

Cidades para pessoas

Bárbara Reichert

Cidades para pessoas, livro escrito por Jan Gehl, arquiteto e urbanista dinamarquês, professor universitário aposentado e consultor, cuja carreira foi construída com base no princípio de melhorar a qualidade de vida urbana através da reorientação do planejamento urbano em favor de pedestres e ciclistas. Este livro analisa muitas das ideias seminais de Gehl, examina algumas das cidades do mundo que se desenvolveram com êxito nas últimas décadas e estabelece os desafios para o futuro. Baseado em trabalhos que fez na Europa, Austrália e Américas, tem um alcance global, com dados comparativos de como pedestres utilizam os espaços públicos, cujo apelo maior é a rapidez com que ele tem sido capaz de ajudar algumas cidades a transformar suas ruas de tráfego intrincado em paraísos para as pessoas. O autor aborda, de forma aprofundada e objetiva, questões que são fundamentais à qualidade de vida na cidade e que se refletem na escala dos espaços, nas soluções de mobilidade, nas dinâmicas que favorecem a vitalidade, sustentabilidade e segurança das áreas urbanas, na valorização dos espaços públicos, nas possibilidades de expressão individual e coletiva, na beleza daquilo que pode ser apreendido ao nível do observador.

O autor do livro foca naquilo que a cidade tem de mais importante: sua dimensão humana, as oportunidades de encontro que ocorrem nos espaços de vivência das relações cotidianas e como esses territórios precisam ser estruturados para que essa dimensão não se perca. A premissa condutora deste livro é que nossas cidades podem ser melhores se forem pensadas para aqueles que as criaram: as pessoas. Gehl destaca “inicialmente nós moldamos as cidades — depois elas nos moldam. Assim, quanto mais humano for o espaço urbano que produzirmos, mais valorizada nossa dimensão humana estará. Uma cidade de pessoas para pessoas”.

A organização do livro aborda questões que são fundamentais à qualidade de vida na cidade com os seis seguintes capítulos; a dimensão humana; os sentidos e a escala; a cidade viva, segura, sustentável e saudável; a cidade ao nível dos olhos; vida, espaço, edifícios — nessa ordem; cidades em desenvolvimento.

A dimensão humana é o capítulo que abre o livro. Neste texto, o autor aborda como esse tema foi esquecido e negligenciado no planejamento urbano, enquanto outras questões ganham mais força, como a acomodação do aumento do tráfego de automóveis. Nesse cenário, a prioridade dada aos carros é um dos principais inimigos. “O carro espreme a vida urbana para fora do espaço público”, analisa. Jan Gehl busca a cidade criada para as pessoas, para o convívio ao nível

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dos olhos, para a qualidade de vida. Nada de busca pela forma, mas pela escala humana. Resumindo, uma preocupação crescente com a dimensão humana no planejamento urbano reflete uma exigência distinta e forte por melhor qualidade de vida urbana. Comparado a outros investimentos sociais — particularmente os de saúde e de infraestrutura de veículos — o custo de incluir a dimensão humana é tão modesto, que os investimentos nessa área serão possíveis a cidades do mundo todo, independentes do grau de desenvolvimento e capacidade financeira.

No segundo capítulo, os sentidos e escala, também são fundamentais na qualidade de vida na cidade e que refletem na escala dos espaços e nas soluções de mobilidade. A mobilidade é um componente essencial à saúde da cidade, elas não podem ser pensadas apenas para os carros. O natural ponto de partida do trabalho de projetar cidades para pessoas é a mobilidade e os sentidos humanos, já que estes fornecem a base biológica das atividades, do comportamento e da comunicação no espaço urbano.

No terceiro capítulo, a cidade viva, segura, sustentável e saudável, Gehl cita que é preciso que haja uma política urbana integrada a fim de desenvolver essas cidades. A cidade viva precisa de uma vida urbana variada e complexa, onde as atividades sociais e de lazer estejam combinadas, deixando espaços para a necessária circulação de pedestres e tráfego, bem como oportunidades para participação na vida urbana. A cidade segura é crucial para que as pessoas abracem o espaço urbano. A cidade sustentável está em crescente interesse no planejamento, priorizar o pedestre e as bicicletas modifica o perfil do setor de transportes e é um item expressivo nas políticas sustentáveis em geral.

A cidade ao nível dos olhos é o tema do capítulo quatro que traz uma visão geral e sistematizada dos mais importantes critérios de qualidade: proteção; proteção contra o tráfego e acidentes — sensação de segurança; proteção contra o crime e violência; proteção contra experiências sensoriais e desconfortáveis, conforto; oportunidades para caminhar; oportunidades para permanecer em pé; oportunidades para sentar-se; oportunidades para ver; oportunidades para ouvir e conversar; oportunidades para brincar e praticar atividade física e, prazer; escala; oportunidades de aproveitar os aspectos positivos do clima; experiências sensoriais positivas. É um fato interessante e instigante que os melhores e mais funcionais espaços urbanos do mundo demonstram um cuidadoso tratamento geral de todos os critérios de qualidade.

No quinto capítulo, vida, espaço, edifícios — nessa ordem, o autor aborda a necessidade de priorizar a vida, os edifícios vêm depois. Se as cidades e os edifícios pretendem atrair as pessoas para virem e permanecerem em seus espaços, a escala humana vai exigir nova e consistente abordagem. No processo de planejamento, em vez da sequência que prioriza os edifícios, depois os espaços e depois a vida, o trabalho com a dimensão humana requer que a vida e os espaços sejam considerados antes das edificações. As exigências para elaboração de novos edifícios, visa garantir que suas funções e seu projeto sustentem e enriqueçam o espaço público e a vida urbana, são inerentes à sequência: vida, espaço, edifícios.

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TÓPICO 3 | A CIDADE PARA AS PESSOAS

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Cidades em desenvolvimento é o tema do sexto e último capítulo do livro onde aponta que a dimensão humana é uma questão crucial no mundo todo. A maioria das pessoas agora vive nas cidades e as cidades estão crescendo de forma explosiva. O rápido crescimento das populações urbanas dos países emergentes é o catalisador de muitos problemas e desafios. Em muitas regiões, abrigar tantos novos moradores levou ao surgimento nas cidades de grandes áreas de habitação informal, densamente povoadas e carentes de todos os tipos de serviços.

Em resumo os capítulos do livro Jan Gehl falam sobre o planejamento das cidades e a lacuna que existe ao se pensar primeiro nas formas do edifício, no skyline, na cidade vista do avião e se esquecer das pessoas e da vida urbana. Os temas abordados são importantes para nós arquitetos nos questionarmos em relação ao interesse nas pessoas e na vida. Os arquitetos de hoje competem pela forma, mais do que por ideias humanísticas, preocupam-se mais pela tendência. O trabalho do arquiteto deveria seguir as palavras do Arquiteto Ralph Erskine que disse uma vez: “para ser um bom arquiteto, você precisa amar as pessoas. Porque arquitetura é uma arte aplicada e lida com a moldura da vida das pessoas. Os edifícios emolduram nossas vidas”. Ninguém examinou tanto a morfologia e o uso do espaço público quanto Jan Gehl. Ao ler este livro, qualquer pessoa com interesse no tema de mobilidade urbana, terá uma grande percepção, das relações entre os espaços públicos e a sociedade civil e de como os dois estão entrelaçados.

FONTE: REICHERT, B. Cidades para pessoas. Revista Infinity, Itapiranga, v. 4, n. 1, p. 178-181, 2019. Disponível em: http://revista.faifaculdades.edu.br/index.php/infinity/article/view/588/368. Acesso em: 18 set. 2019.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• Cidades para pessoas foi um livro escrito por Jan Gehl, arquiteto e urbanista dinamarquês, professor universitário aposentado e consultor, cuja carreira foi construída com base no princípio de melhorar a qualidade de vida urbana através da reorientação do planejamento urbano em favor de pedestres e ciclistas.

• As ideias de Jan Gehl são contemporâneas e expressam alternativas para se pensar na questão da qualidade de vida urbana com base em reflexões teóricas e projetos práticos realizados em mais de 200 cidades, tais como Copenhage (Dinamarca), Moscou (Rússia), Nova York (Estados Unidos), Londres (Reino Unido) entre outras.

• Jan Gehl sustenta que, por décadas, a dimensão humana tem sido negligenciada nos estudos do planejamento urbano, enquanto questões como a crescente ascensão do tráfego de carros seguem em evidência.

• Uma característica comum a quase todas as cidades — independentemente da localização global, da viabilidade econômica e do estágio de desenvolvimento — é o fato das pessoas que ainda usam o espaço da cidade não vêm sendo tratadas de maneira apropriada.

• O autor do livro foca naquilo que a cidade tem de mais importante: sua dimensão humana, as oportunidades de encontro que ocorrem nos espaços de vivência das relações cotidianas e como esses territórios precisam ser estruturados para que essa dimensão não se perca.

• A premissa condutora deste livro é que nossas cidades podem ser melhores se forem pensadas para aqueles que as criaram: as pessoas.

• Os capítulos do livro Jan Gehl falam sobre o planejamento das cidades e a lacuna que existe ao se pensar primeiro nas formas do edifício, no skyline, na cidade vista do avião e se esquecer das pessoas e da vida urbana.

• Em uma concepção de cidade voltada para pessoas, priorizam-se alternativas de mobilidade urbana focadas em pedestres, no uso de bicicletas e no transporte público de qualidade.

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AUTOATIVIDADE

1 A ideia de planejar as cidades com foco nas pessoas tem ganhado força no período atual. Nesse sentido, alguns planos de mobilidade urbana passaram a incluir o uso das bicicletas em seus planos. Acerca deste assunto, assinale a alternativa INCORRETA:

a) ( ) O uso das bicicletas como forma de transporte implica em sua integração na estratégia geral de transportes.

b) ( ) O uso das bicicletas acarreta em lentidão na integração dos modais de transporte, dado à sua natureza.

c) ( ) O futuro da mobilidade urbana não está na bicicleta, no carro, no ônibus ou em qualquer modo de transporte, mas na integração entre eles.

d) ( ) Além de contribuírem com a mobilidade urbana, as bicicletas podem melhorar a saúde da população, diminuindo gastos com a saúde pública.

2 O planejamento urbano envolve projetos e regulação dos usos do espaço das cidades e enfocam a forma física, as funções econômicas e os impactos sociais do ambiente urbano e a localização de diferentes atividades dentro deste espaço. Na atualidade, emergem debates relacionados ao uso da cidade pelas pessoas. Sobre esse assunto, avalie as seguintes asserções e a relação proposta entre elas.

I- Durante décadas, a dimensão humana tem sido negligenciada nos estudos do planejamento urbano.

PORQUE

II- As concepções de planejamento urbano modernistas enfatizam o uso dos espaços públicos, o pedestrianismo e o papel do espaço da cidade como ponto de encontro para os moradores urbanos.

A respeito dessas asserções, assinale a opção CORRETA:

a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa da I.

b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma justificativa da I.

c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa. d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.

3 (ENADE, 2011) A definição de desenvolvimento sustentável mais usualmente utilizada é a que procura atender às necessidades atuais sem comprometer

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a capacidade das gerações futuras. O mundo assiste a um questionamento crescente de paradigmas estabelecidos na economia e na cultura política. A crise ambiental no planeta, quando traduzida na mudança climática, é uma ameaça real ao pleno desenvolvimento das potencialidades dos países. O Brasil está em uma posição privilegiada para enfrentar os enormes desafios que se acumulam. Abriga elementos fundamentais para o desenvolvimento: parte significativa da biodiversidade e da água doce existentes no planeta; grande extensão de terras cultiváveis; diversidade étnica e cultural e rica variedade de reservas naturais. O campo do desenvolvimento sustentável pode ser conceitualmente dividido em três componentes: sustentabilidade ambiental, sustentabilidade econômica e sustentabilidade sociopolítica. Nesse contexto, o desenvolvimento sustentável pressupõe:

a) ( ) A preservação do equilíbrio global e do valor das reservas de capital natural, o que não justifica a desaceleração do desenvolvimento econômico e político de uma sociedade.

b) ( ) A redefinição de critérios e instrumentos de avaliação de custo-benefício que reflitam os efeitos socioeconômicos e os valores reais do consumo e da preservação.

c) ( ) O reconhecimento de que, apesar de os recursos naturais serem ilimitados, deve ser traçado um novo modelo de desenvolvimento econômico para a humanidade.

d) ( ) A redução do consumo das reservas naturais com a consequente estagnação do desenvolvimento econômico e tecnológico.

e) ( ) A distribuição homogênea das reservas naturais entre as nações e as regiões em nível global e regional.

FONTE: <https://www.questaocerta.com.br/questao/MzI1NTc3>. Acesso em: 19 set. 2019.

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