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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA-GO Sistema atena nº: 201300161416 O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por intermédio da Promotora de Justiça infrafirmada, com amparo nos artigos 37, caput, § 4º e 129, inciso III, ambos da Constituição Federal, no sistema aberto de proteção e defesa dos interesses difusos e coletivos estatuído pela fusão harmônica das Leis 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) e 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa) 1 , e, ainda, como com fulcro nos autos do Inquérito Civil anexo, ajuíza a presente ACÃO CIVIL PÚBLICA , com pedidos liminares, contra MUNICÍPIO DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA-GO, pessoa jurídica de direito público interno, com sede na Av. José Pereira do Nascimento, Nº 3.581, Fone: 62 – 3977 – 7100, Paço Municipal, Setor Oeste, nesta cidade, representado por sua Prefeita Municipal Adailza Crepaldi, pelas razões fáticas e jurídicas que passa a expor. 1 Reafirme-se que o vínculo de combate à improbidade se faz por meio da ação civil pública, nos termos dos artigos 17 e 18 da LGIA, com aplicação supletiva da Lei 7.347/85 (...).” (OSÓRIO, Fábio Medina. Obstáculos processuais ao combate à improbidade administrativa: uma reflexão geral. Improbidade Administrativa: responsabilidade social na prevenção e controle. Vitória: CEAF, 2005, p. 217). Av. Maranhão, esq, com Rua 10 – Setor Alto Alegre CEP 76590-000 - Tel/fax: (62) 3364-1020

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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE SÃO

MIGUEL DO ARAGUAIA-GO

Sistema atena nº: 201300161416

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por intermédio da

Promotora de Justiça infrafirmada, com amparo nos artigos 37, caput, § 4º e 129,

inciso III, ambos da Constituição Federal, no sistema aberto de proteção e defesa dos

interesses difusos e coletivos estatuído pela fusão harmônica das Leis 8.625/93 (Lei

Orgânica Nacional do Ministério Público), 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) e

8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa)1, e, ainda, como com fulcro nos autos

do Inquérito Civil anexo, ajuíza a presente

ACÃO CIVIL PÚBLICA , com pedidos liminares,

contra MUNICÍPIO DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA-GO,

pessoa jurídica de direito público interno, com sede na Av. José Pereira do

Nascimento, Nº 3.581, Fone: 62 – 3977 – 7100, Paço Municipal, Setor Oeste, nesta

cidade, representado por sua Prefeita Municipal Adailza Crepaldi, pelas razões fáticas

e jurídicas que passa a expor.

1 “Reafirme-se que o vínculo de combate à improbidade se faz por meio da ação civil pública, nos termos dos artigos 17 e 18 da LGIA, com aplicação supletiva da Lei 7.347/85 (...).” (OSÓRIO, Fábio Medina. Obstáculos processuais ao combate à improbidade administrativa: uma reflexão geral. Improbidade Administrativa: responsabilidade social na prevenção e controle. Vitória: CEAF, 2005, p. 217).

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1 – DOS FATOS

Foi instaurado no âmbito desta Promotoria de Justiça o inquérito civil

público nº: 201300161416, que segue anexo em sua integralidade, para analisar as

contratações irregulares na área de saúde através de credenciamento na Prefeitura de

São Miguel do Araguaia, mediante inexigibilidade de licitação, situação de nepotismo

e existência de servidora fantasma.

O procedimento foi instaurado no mês de abril de 2013 a partir de

denúncias de pessoas que teriam participado do processo de credenciamento ao

argumento que a seleção não teria tido um critério de seleção justo, dando azo à

contratação de apaniguados políticos, por isso a existência de pessoas contratadas que

configuram nepotismo.

Na oportunidade, os reclamantes fizeram constar a lista final do processo

de credenciamento nº: 001\2013, onde alertavam:

A senhora Lucivância Teixeira de Paula teria sido contratada em razão

de ter trabalhado na campanha da então Prefeita Municipal. As enfermeiras Cynthia

Cardoso Viana e Thalita Camargo Silveira, estariam em situação de nepotismo em

razão de, respectivamente, ser namorada do Vice-Prefeito e ter vínculos com a

Secretária de Saúde.

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Sobre o caso do nepotismo, convém repisar que o Ministério Público

aguarda posicionamento do Poder Judiciário local sobre o tema desde fevereiro de

2014, em autos próprios. Além disso, convém frisar que a enfermeira Chyntia possuía

vínculos familiares com o antigo gestor e, mesmo após atuação insistente do

Ministério Público, conseguiu trabalhar no Município quase que durante toda a gestão

anterior.

Segundo relatos, os socorristas condutores do SAMU não possuem curso

específico exigido para o desempenho de suas tarefas. O médico Hugo de Leon

Rodrigues Barreto possui tia médica no Município.

A pessoa jurídica contratada, empresa do médico Natanael Martins

Coelho, também teria sido beneficiada em razão de o médico ter supostamente sido um

dos financiadores da campanha da atual Prefeita.

A fisioterapeuta Delman Gomes da Silva seria servidora fantasma. Já a

farmacêutica Elcylene Candida Morais teria sido beneficiada por ter sido cabo eleitoral

da atual gestora municipal.

Consoante se infere dos documentos constantes nos autos, no início da

gestão da atual Prefeita foi encaminhado documento constando as principais

irregularidades levantadas pelo Ministério Público na gestão anterior, recomendando

que a atual adotasse providências visando sanar e evitar os mesmos erros.

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No referido documento, foi expressamente consignada a necessidade de

regularização do quadro funcional e a deflagração de concurso público para aquelas

áreas em que não existem candidatos remanescentes no concurso público vigente à

época, conforme determina o art. 37, II da CR.

A senhora Prefeita sobre o tema afirmou, à época: “tudo a seu tempo,

evidente que estaremos envidando esforços para levantar a situação do quadro

funcional”

Após a requisição de informações e de documentos sobre o assunto a

senhor Prefeita, através do ofício nº: 258\2013 defendeu a regularidade da manobra e

junta documentos sobre o fato.

O edital de credenciamento nº: 001\2013 dá conta que a Prefeita, por

intermédio do Fundo Municipal de Saúde, representado pelo então Secretário

Municipal de Saúde, realizariam credenciamento de pessoas físicas e jurídicas para a

prestação de serviços da área de saúde, mediante inexigibilidade de licitação.

O credenciamento, foi realizado como vislumbrado, contratou: cirurgiões

dentistas, profissionais de educação física, serviços médicos das diversas

especialidades, enfermeiros, farmacêuticos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos,

nutricionistas, psicólogos, socorristas condutores de ambulâncias, técnicos de

enfermagem, terapeutas ocupacionais, serviços laboratoriais e ambulatoriais e

fornecimento em regime de consignação de órteses de próteses.

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Após a terceirização da saúde, foi expedida a recomendação nº:

03\2013 orientando e explicando os motivos jurídicos da nulidade do credenciamento

em comento, recomendando a anulação do credenciamento, a rescisão unilateral dos

contratos já entabulados, a promoção da imediata adequação do respectivo edital que

regeria os contratos temporários, mediante processo seletivo simplificado, visando

evitar a dissolução de continuidade dos serviços públicos, através de critérios

objetivos.

Além disso, foi recomendado que deflagrasse procedimento licitatório

específico para a contratação de pessoas jurídicas, sem celebrar ou permitir a

participação da execução, direta ou indireta, de servidor público efetivo nos moldes do

art. 9º da Lei de licitações.

Por fim, durante o período de vigência dos contratos temporários deveria

adotar medidas hábeis a promover a realização de concurso público, com a urgência

que o caso requer.

Através do ofício nº: 277\2013 a senhora Prefeita Municipal se

posicionou novamente pela legalidade do procedimento.

2 – DO DIREITO

2.1 – PRELIMINARMENTE. DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO.

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De início, é importante registrar que a ação civil pública, prevista no

art.129, III, da Constituição Federal e na Lei Federal n.º 7.347/85, é a via adequada

para a proteção do patrimônio público em juízo. O Ministério Público é Instituição

legitimada por lei para aforar ação civil pública com a finalidade de obter provimentos

jurisdicionais aptos a tutelar interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos.

Dentre os interesses difusos tutelados pelo Ministério Público,

encontrasse a defesa do patrimônio público. Nesse sentido, é uníssona a jurisprudência

do Superior Tribunal de Justiça, que culminou na edição da Súmula n.º 3292.

Já o Município possui legitimidade passiva para esta ação, pois é a

pessoa jurídica de direito público responsável pelos atos administrativos apontados

como ilegais nesta ação e pelas obrigações de fazer que se pretende sejam impostas.

Já o Fundo Municipal de Saúde, não obstante constar como contratante e

possuir CNPJ próprio, apenas para fins contábeis, não possui personalidade jurídica

própria3 e está vinculado à Secretaria Municipal de Saúde, órgão municipal.

“FUNDO E CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE - NATUREZA CONTÁBIL E

FINANCEIRA - INEXISTÊNCIA DE PERSONALIDADE JURÍDICA PRÓPRIA -

CITAÇÃO PARA RESPONDER À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL

-NULIDADE - CITAÇÃO EFETIVADA PELA INTIMAÇÃO DO RÉU OU DE SEU

ADVOGADO NO RETORNO DOS AUTOS À VARA DE ORIGEM. Nula resulta a

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citação de órgão auxiliar da administração pública municipal, sem personalidade

jurídica própria, e todo o processado, sendo parte passiva legítima o Município. (...)”

(TJMG, Agravo de Instrumento 1.0000.00.165589-3/000, Rel. Des. Orlando Carvalho,

1ª Câmara Cível, julgamento em 01/02/2000, publicação em 04/02/2000)”

2.2 – DAS DIVERSAS ILEGALIDADES DOS CONTRATOS DE

CREDENCIAMENTO

Os contratos de credenciamento do Fundo Municipal de Saúde são ilegais, pelos

motivos que passamos a discorrer, em diferentes tópicos:

2.2.A – DO DESRESPEITO AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO

CONCURSO PÚBLICO

De acordo com a Constituição Federal:

"Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da

União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de

legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao

seguinte:

I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que

preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma

da lei;

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II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em

concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a

complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as

nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e

exoneração" grifei

A exigência do concurso público para a investidura em cargo ou

emprego público, por sua vez, está fundado nos princípios da moralidade, da

impessoalidade e da eficiência. O sistema possibilita a escolha, por mérito, das pessoas

mais aptas ao exercício de funções em prol da Administração Pública.

Os serviços prestados por médicos, enfermeiros, odontólogos e outros

profissionais de saúde são imprescindíveis para a sociedade, portanto devem ser

prestados de forma ininterrupta pela administração pública. Os serviços são

caracterizados pela regularidade, continuidade e tecnicidade, qualidades de um cargo

público que o direciona no sentido de ser provido em caráter efetivo, por meio de

concurso público.

Diante da defasagem do quadro de pessoal da saúde, o Município

optou por contratar profissionais da rede privada, em detrimento da realização de

concurso público. Os cargos estão vagos e há disponibilidade financeira, mas o

município ignorou seu dever de executar diretamente os serviços. Os profissionais

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estão trabalhando no Município por meio de vínculo precário, sem se submeterem às

normas constitucionais dos servidores públicos.

No caso em tela, a terceirização serve para mascarar a relação de

emprego existente, não protegendo o interesse público, favorecendo o apadrinhamento

político e burlando a exigência constitucional do concurso público.

Tais profissionais são subordinados ao Secretário Municipal de Saúde,

cumprindo carga horária e plantões definidos por ele em unidades de saúde do

Município, percebendo vencimentos regularmente, em valores combinados com o

próprio secretário ao serem admitidos.

Sabe-se que a Constituição Federal admite o vínculo por meio de cargo

público, emprego público e por contratação temporária, esta apenas para atender a

excepcional interesse público, por tempo determinado.

O Município réu admitiu seus servidores de forma ilegal e como

veremos a seguir de forma fraudulenta, mediante contrato.

Tais contratos não conferem qualquer direito trabalhista aos servidores,

tais como férias, décimo terceiro salário, aviso prévio, etc., nem direitos inerentes a

cargos públicos, como a estabilidade. Os profissionais, como condição para laborar no

Município réu, ficam reféns de uma admissão irregular e precária.

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Essa situação desmantela a estruturação das carreiras públicas, bem

como qualquer plano de cargos e salários, criando a balbúrdia nas relações de trabalho

e na organização dos serviços.

Mais grave, ainda, é que por meio dos contratos celebrados, o Município

fixa os salários a seu bel prazer, sem respeito aos austeros princípios da administração

pública, inclusive da impessoalidade e da moralidade. Rasga-se ainda o princípio da

legalidade administrativa, pois a remuneração se dará em patamares distintos dos

fixados em lei, e quebra-se a isonomia.

Enfim, afrontam-se os artigos 37, caput e inciso X e 39, caput e § 1º.

Com a recusa da Prefeita Municipal em atender a Recomendação

ministerial, prevendo a realização de concurso público, deflui-se que o Município

pretende continuar contratando médicos e outros profissionais de saúde por contratos,

indefinidamente, fora das hipóteses de contratação temporária previstas na Carta de

1988.

Nesta ação pede-se a imposição de obrigação ao Município de realizar

imediatamente concurso público para provimento de cargos efetivos, em substituição

aos contratados ilegais.

Enquanto não for concluído o concurso público e nomeados os

aprovados, o Município pode realizar contratações temporárias para atender à

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excepcional condição da falta de concursados e da necessidade do serviço, devendo

para tanto abrir processo seletivo e admitir a participação de profissionais mediante

inscrição, dando publicidade ao certame.

2.2.B – DA ILEGALIDADE DA TERCEIRIZAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO

DE SAÚDE

É certo que a Administração Pública possui a faculdade de transferir a

terceiros a execução de algumas atividades, desde que sejam meramente acessórias.

No âmbito federal, a matéria é assim tratada:

Decreto n.º 2.271/97:

“Art. 1.º No âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e

fundacional poderão ser objeto de execução indireta as atividades materiais

acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de

competência legal do órgão ou entidade.

§ 1º. As atividades de conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes,

informática, copeiragem, recepção, reprografia,telecomunicações e manutenção de

prédios, equipamentos e instalações serão, de preferência, objeto de execução

indireta.”

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A contrario sensu, segue-se que todas as atividades essenciais aos

assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade pública, a

exemplo da saúde, não são passíveis de terceirização.

Com efeito, o artigo 196 da CF/88 estabelece que a saúde é dever do

Estado, expressão que engloba todos os entes federativos (União, Estados e

Municípios). O artigo 18 da Lei n.º 8.080/90, por sua vez, diz que compete direta e

precipuamente ao Município promover a organização, controle, avaliação, gestão e

execução das ações e serviços de saúde pública.

Nessa linha de raciocínio, tem-se que o Município não pode terceirizar a

execução de serviços ligados à saúde pública, por se tratar de uma das atividades

imanentes ao fim para o qual foi concebido.

Essa conclusão também encontra respaldo na jurisprudência consolidada

do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, cuja Súmula n.º 331 adota o entendimento

de que a terceirização de atividades-fim é ilegal, somente se admitindo a contratação

de serviços terceirizados ligados a atividade-meio do tomador e desde que inexistente

a pessoalidade e a subordinação direta.

Segundo Hely Lopes Meirelles6, “serviços próprios do Estado são

aqueles que se relacionam intimamente com as atribuições do Poder Público

(segurança, polícia, higiene e saúde pública etc.) e para a execução dos quais a

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Administração usa da sua supremacia sobre os administrados. Por esta razão, só

devem ser prestados por órgãos ou entidades públicas, sem delegação a particulares.

Tais serviços, por sua essencialidade, geralmente são gratuitos...”

Assim, os serviços públicos sociais devem ser prestados diretamente

pelo Município através de seus agentes e servidores públicos. Para garantir os serviços

de assistência pública à saúde a todos, a Constituição Federal previu a existência do

Sistema Único de Saúde – SUS, de responsabilidade dos entes públicos, na forma do

art. 198, inciso I, da CF/88. A Constituição facultou a prestação de serviços de saúde

também à iniciativa privada, 6 Direito Administrativo Brasileiro, 20ª edição,

Malheiros Editores, São Paulo, 1995, pág. 296 porém apenas de forma complementar

(art. 199, § 1º, CF), como será detalhado no próximo tópico.

Trata-se, nesses casos, de falsa terceirização, com a contratação de

pessoal pelo poder público sem obediência às normas constitucionais e legais

existentes, mascarando uma relação de emprego, permitindo distorções tais como a

realização de tarefas estranhas às suas atribuições relacionadas, fundamentalmente, à

atividade-fim de órgãos públicos, onde não haveria limites à quantidade ou à

remuneração do pessoal contratualmente arregimentado.

No caso em tela, a terceirização é fraudulenta porque os serviços são

todos prestados nas próprias unidades de saúde do Município (hospital municipal e

PSFs), com utilização de móveis, equipamentos e materiais de trabalho adquiridos

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pelo próprio Município. Não há qualquer ampliação do serviço público, e sim

substituição do prestador de serviços.

O objeto das terceirizações é o mero fornecimento de trabalhadores para

prestação de serviços na área de saúde, com carga horária definida pela secretaria de

saúde, havendo contratação de pessoal para exercer atividades típicas de cargos

públicos, burlando a regra do concurso público.

Acresce-se, por fim, que o modelo concebido por lei neste Município –

provimento em caráter efetivo dos servidores da saúde – é completamente distinto do

adotado pelo poder executivo, portanto este deveria ter enviado projeto de lei à câmara

municipal, solicitando autorização para repassar recursos públicos para os contratados,

distanciando-se do modelo legal de provimento dos cargos municipais.

2.2.C – DA ILEGALIDADE DO CONTRATO DE CREDENCIAMENTO E DA

FALTA DE LICITAÇÃO

No Brasil coexistem três formas de prestação de serviços à saúde, quais

sejam: (a) a atenção particular tradicional; (b) a saúde suplementar, prestada através de

planos e seguradoras de saúde, também numa relação de direito privado; e (c) o

serviço público de saúde, que constitui o SUS (Lei n. 8.080, art. 4º).”

Essa estrutura do sistema de saúde está delineada no artigo 199, CR/88,

verbis:

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“Art. 199 – A assistência à saúde é livre à iniciativa privada. § 1º - As instituições

privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde,

segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo

preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos.”

A Constituição Federal reconheceu que as estruturas públicas poderiam

ser insuficientes para acolher toda a demanda do SUS, e admitiu que o Poder Público

pudesse complementar sua rede própria com serviços privados contratados ou

conveniados. Ou seja, instituições particulares podem participar do SUS

esporadicamente, quando o serviço público for insuficiente em determinada área e

determinado período. A prestação do serviço público de saúde permanece sob

responsabilidade direta da União, Estados e Municípios, de forma universal e

permanente.

Fiel a esse preceito constitucional, o legislador ordinário federal regulou

na Lei n. 8.080/90, que “a iniciativa privada poderá participar do Sistema Único de

Saúde – SUS, em caráter complementar” (artigo 4º, § 2º) e que “quando as suas

disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à

população de uma determinada área, o Sistema Único de Saúde (SUS) poderá

recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada.” (art. 24).

Portanto, é possível que os integrantes do sistema único de saúde,

quando não consigam por seus próprios hospitais, laboratórios, clínicas, médicos,

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enfermeiros, etc., prestar os serviços de assistência à saúde, promovam contratos ou

convênios com a iniciativa privada, de modo a garantir que todos os usuários do

sistema tenham acesso a todos os mecanismos, cirurgias, tratamentos, etc. necessários

para conferir maior efetividade ao direito constitucional à saúde.

Já a assistência básica em saúde configura serviço essencial de

relevância pública, a ser prestado diretamente pelo Poder Público, em caráter contínuo,

permanente.

A ideia é a seguinte: a inoperância da rede pública não pode servir de

desculpa para sonegar o direito à saúde. O poder público não pode ficar na posição

cômoda de comprar todos os serviços na rede privada. As disposições constitucionais e

legais são claras ao exigirem a atuação complementar, subsidiária, eventual, a exigir

do poder público a implementação de providências que garantam a resolutividade do

sistema, com o recrutamento de pessoal por meio de concurso público.

O caráter complementar previsto na Constituição não autoriza a

transferência da prestação dos serviços públicos ao particular, devendo-se manter clara

e inequívoca a dicotomia de que trata a norma constitucional. Nesse sentido, seja

destacado o pensamento da doutrina, na voz de MARIA SYLVIA ZANELLA DI

PIETRO:

“No entanto, a própria Constituição faz referência à possibilidade de serem os

serviços públicos de saúde prestados por terceiros, que não a Administração Pública.

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Com efeito, o art. 199, §1°, estabelece que ‘as instituições privadas poderão

participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes

deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as

entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos.

A Constituição fala em contrato de direito público e em convênio. Com relação aos

contratos, uma vez que forçosamente deve ser afastada a concessão de serviço

público, por ser inadequada para esse tipo de atividade, tem-se que entender que a

Constituição está permitindo a terceirização, ou seja, os contratos de prestação de

serviços tendo por objeto a execução de determinadas atividades complementares aos

serviços do SUS, mediante remuneração pelos cofres públicos. Tratase dos contratos

de serviços regulamentados pela Lei n° 8.666, de 21.6.93, com as alterações

introduzidas pela Lei n° 8.883, de 8.6.94. pelo art.6°, inciso II, dessa lei, considera-se

serviço ‘toda atividade destinada a obter determinada utilidade de interesse para a

Administração, tais como: demolição, conserto, instalação, montagem, operação,

conservação, reparação, adaptação, manutenção, transporte, locação de bens,

publicidade, seguro ou trabalhos técnicoprofissionais.’É importante realçar que a

Constituição, no dispositivo citado, permite a participação de instituições privadas

‘de forma complementar’, o que afasta a possibilidade de que o contrato tenha por

objeto o próprio serviço de saúde, como um todo, de tal modo que o particular

assuma a gestão de determinado serviço. Não pode, por exemplo, o Poder Público

transferir a uma instituição privada toda a administração e execução das atividades

de saúde prestadas por um hospital público ou por um centro de saúde; o que pode o

Poder Público é contratar instituições privadas para prestar atividades-meio, como

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limpeza, vigilância, contabilidade, ou mesmo determinados serviços técnico-

especializados, como os inerentes aos hemocentros, realização de exames médicos,

consultas etc.; nesses casos, estará transferindo apenas a execução material de

determinadas atividades ligadas aos serviço de saúde, mas não sua gestão

operacional.

A Lei n° 8.080, de 19-9-90, que disciplina o Sistema Único de Saúde, prevê, nos

arts.24 a 26, a participação complementar, só admitindo-a quando as

disponibilidades do SUS ‘forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à

população de uma determinada área”, hipótese em que a participação complementar

‘será formalizada mediante contrato ou convênio, observadas, a respeito, as normas

de direito público’ (entenda-se, especialmente, a Lei n° 8.666, pertinente a licitações e

contratos). Isso não significa que o Poder Público vai abrir mão da prestação do

serviço que lhe incumbe para transferi-la a terceiros; ou que estes venham a

administrar uma entidade pública prestadora do serviço de saúde; significa que a

instituição privada, em suas próprias instalações e com os seus próprios recursos

humanos e materiais, vai complementar as ações e serviços de saúde, mediante

contrato ou convênio.”7

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região já se deparou com a questão,

tendo o seu Órgão Especial definido que:

“AGRAVO REGIMENTAL. TERCEIRIZAÇÃO DO SERVIÇO DE SAÚDE.

ATIVIDADES PRÓPRIAS TÍPICAS E FUNDAMENTAIS, DO ESTADO. As

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atividades próprias, típicas e fundamentais do Estado, como Segurança, Saúde e

Justiça, não podem ser terceirizadas. Grave lesão à ordem e a economia públicas

não caracterizadas. Na hipótese, a terceirização é que causaria grave lesão à ordem

pública.” (Tribunal Federal da 1ª Região. Corte Especial. PET n.

200101000042297/MA. Rel. Des. Fed. TOURINHO NETO. Julgado em 15.03.2001.

Votação por maioria. DJU de 04.06.2001, p. 11)”

Portanto, é ilegal a contratação, por meio de credenciamento, para a

terceirização de toda a mão de obra relativa aos cargos efetivos, quando se trata da

própria atividade típica do Município, realizada nas unidades de saúde locais.

Ficou comprovado que não houve utilização de qualquer equipamento

ou estrutura física da associação ré, que aliás não possui sede neste Município. E,

ainda que se admitisse a terceirização do serviço, esta não poderia ter sido realizada

por meio de contrato de credenciamento. Isto porque o credenciamento exige que o

serviço seja prestado ao cidadão às expensas e nas dependências do credenciado – ex:

hospital, laboratório ou clínica particular –, mediante contrapartida em dinheiro pela

secretaria municipal de saúde, conforme a tabela do SUS.

No presente caso houve contratação de serviço para ser prestado nas

dependências do próprio município, mediante remuneração. Portanto, tal contrato a

rigor tem como objeto a prestação de serviço, e não o credenciamento de unidade de

saúde privada.

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Por consequência, deveria ter sido precedida de procedimento de

licitação, em uma das modalidades previstas no art. 22 da Lei n. 8666/93, e não por

meio de chamamento público para credenciamento, como foi feito pelo Município réu.

Havia possibilidade de competição entre outras pessoas jurídicas o que

obrigava a abertura de processo de licitação. É nítido que o Município, por meio do

secretário municipal de saúde, dispensou indevidamente a licitação, violando a lei de

licitações e contratos. Mesmo assessorado por advogados do Município, a secretaria

denominou de contrato de credenciamento um contrato que era nitidamente de

prestação de serviços, com o fim de burlar a exigência de licitação.

A Prefeita afirmou que o credenciamento foi efetivada porque isso

constituía uma opção mais vantajosa para a administração, porém não explicou no que

consistia tal vantagem nem demonstrou cálculo que a comprovasse.

Portanto, houve fraude ao contrato de credenciamento, pois o gestor do

contrato – secretário municipal de saúde – conscientemente praticava atos dissonantes

da previsão contratual, tendo assinado a avença para fins diversos dos ali previstos, ou

seja, para supostamente trazer economia. Ou seja, o objeto do contrato nunca foi

executado, já que a própria secretaria de saúde fazia todo o recrutamento de

profissionais e controlava diretamente o serviço prestado ao município.

Essa prática causou prejuízos ao Fundo Municipal de Saúde, pois este

despendeu vultosos recursos com a associação ré sem que fosse prestado algum

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serviço relevante, já que o próprio gestor do Fundo – o secretário de saúde – realizava

o serviço contratado – arregimentação de mão de obra na área de saúde.

É necessário a declaração de nulidade do contrato administrativo, com

efeitos ex tunc, diante das várias irregularidades acima descritas, e do claro desvio de

finalidade praticado pelo gestor municipal. Os efeitos da declaração, entretanto, não

podem alcançar os valores devidamente repassados aos profissionais de saúde, que

laboraram de boa-fé, nem os tributos e encargos previdenciários que incidiram sobre

os pagamentos.

3. DAS MEDIDAS LIMINARES

A Lei de Ação Civil Pública (Lei n. 7347/85) prevê:

“Art. 12 Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em

decisão sujeita a agravo”.

No âmbito desta ação civil pública, é necessária a antecipação dos

efeitos da tutela, para obrigar o Município a suspender os efeitos os contratos advindos

do credenciamento n]: 001\2013, ainda em vigor, e a realizar concurso público para

provimento dos cargos vagos na área de saúde.

A caracterização do fumus boni iuris e do periculum in mora autorizam o

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Juízo a deferir o pedido liminar, inaudita altera pars, com fulcro em relação aos

interesses metaindividuais, a sistematicamente prescrita nos artigos 11 e 12 da Lei n.º

7.347/85 e 84, § 3.º e 4.º, da Lei n.º 8.078/90.

Pela conjugação dos dispositivos legais acima citados, depreende-se que

o juiz pode conceder liminarmente a tutela de mérito sempre que for relevante o

fundamento da demanda e houver justificado receio da ineficácia do procedimento

jurisdicional, se concedido somente a final.

Há prova inequívoca da ilegitimidade dos contratos firmados pelo Fundo

Municipal de Saúde, diante dos fundamentos jurídicos aqui delineados, extraindo-se

dos autos do inquérito civil público todos os documentos comprobatórios dos fatos

aqui alegados.

A verossimilhança das alegações é também extraída da argumentação

jurídica exposada nos itens anteriores, demonstrando afronta ao Princípio do Concurso

Público, terceirização indevida do serviço, ausência de licitação e ilegalidades diversas

na execução dos contratos de credenciamento.

O perigo da demora é patente, porquanto se aproxima o fim do exercício

de 2014, sendo necessário regularizar a situação para vigorar a partir de 1º de janeiro

de 2015.

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Urge, dessa forma, a concessão de medida liminar que obste a

continuidade deste estado absurdo de coisas.

No ato da concessão da liminar, requer-se a fixação de multa diária, em

valor não inferior a R$ 2.000,00, para o caso de descumprimento das obrigações de

fazer e não fazer acima apontadas, tudo conforme previsões dos artigos 11 e 12, § 2º

da Lei de Ação Civil Pública e 461 do Código de Processo Civil. A multa diária –

dirigida às pessoas jurídicas rés e também aos gestores públicos (Prefeito Municipal e

Secretário de Saúde) – é imprescindível para garantir o cumprimento da decisão

liminar.

4 – DOS PEDIDOS

Por todo o exposto, o Ministério Público pede e requer:

A) o recebimento e processamento da ação;

B) a notificação do Município réu para se pronunciar no prazo de 72 horas sobre o

pedido liminar, de acordo com o art. 2o da Lei n.º 8.437/92;

C) vencido o prazo acima, com ou sem manifestação do Município, a antecipação dos

efeitos da tutela, para:

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C.1) suspender os contratos advindos do credenciamento nº: 001/13 do Fundo

Municipal, após a contratação por critérios objetivos, visando evitar a dissolução de

continuidade do serviço público;

C.2) obrigar o Município a não contratar ou credenciar pessoa jurídica para terceirizar

contratos com profissionais de saúde que prestem serviços públicos;

C.3) obrigar o Município a realizar concurso público para provimento dos cargos

efetivos necessários na área de saúde;

C.4) enquanto não forem efetivamente providos os cargos efetivos, obrigar o

Município a contratar os profissionais diretamente, mediante processo seletivo

público, conforme as regras de contratação temporária e os princípios da

impessoalidade, publicidade e eficiência;

D) a citação dos réus para responderem à ação, sob pena de revelia;

E) no mérito:

E.1) confirmação das tutelas descritas nos itens C.1, C.2, C.3 e C.4, acima;

E.2) declaração de nulidade dos contratos advindos do credenciamento n. 001/13;

F) a condenação dos réus nas custas e despesas processuais.

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O Ministério Público protesta provar o alegado pelos meios de prova juridicamente

admissíveis, em especial a prova documental e testemunhal.

Dá à causa o valor de R$ 1.000,00.

São Miguel do Araguaia/GO, 22.07.2014.

Cristina Emília França Malta

Promotora de Justiça

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