Psicologia e Religião (Tcc)

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0 UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC CURSO DE PSICOLOGIA FAGNER JOSÉ LAURETH W ILMAN PSICOLOGIA E RELIGIÃO: O OLHAR DA PSICOLOGIA SOBRE A EXPERIÊNCIA RELIGIOSA CRICÚM A, DEZEM BRO DE 2009

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UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC

CURSO DE PSICOLOGIA

FAGNER JOSÉ LAURETH W ILMAN

PSICOLOGIA E RELIGIÃO: O OLHAR DA PSICOLOGIA

SOBRE A EXPERIÊNCIA RELIGIOSA

CRICÚMA, DEZEMBRO DE 2009

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FAGNER JOSÉ LAURETH WILMAN

PSICOLOGIA E RELIGIÃO: O OLHAR DA PSICOLOGIA

SOBRE A EXPERIÊNCIA RELIGIOSA

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado para obtenção do grau de psicólogo no curso de psicologia da Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC.

Orientador: Prof. MSc. Jeverson Rogério Costa Reichow

CRICIÚMA, DEZEMBRO DE 2009

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FAGNER JOSÉ LAURETH WILMAN

PSICOLOGIA E RELIGIÃO: O OLHAR DA PSICOLOGIA

SOBRE A EXPERIÊNCIA RELIGIOSA

Trabalho de Conclusão de Curso aprovado pela Banca Examinadora para obtenção do Grau de psicólogo, no Curso de psicologia da Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC, com Linha de Pesquisa em Psicologia e Qualidade de Vida.

Criciúma, 02 de Dezembro de 2009.

BANCA EXAMINADORA

Prof. Jeverson Rogério Costa Reichow - (UNESC) - Orientador

Profª Elisiênia C. de S. Frasson Fragnani - Mestre - (UNESC)

Prof. João Luiz Brunel - Mestre - (UNESC)

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Dedico este trabalho a todos os que me

ensinaram a cultivar a fé; fé em Deus, fé no

ser humano, fé na vida.

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AGRADECIMENTOS

memória de meu coração já existem muitos espaços ocupados.

O primeiro espaço é daquele a quem devo a vida. Sou grato por Ele me

ter feito espaço de construção de conhecimento. Por me ter dado vontade e

capacidade de aprender. Agradeço por todas as oportunidades, por tudo que

construí ao abrigo de Sua divina proteção.

À minha família, em especial à minha mãe, pelo amor manifestado nos

tantos gestos de carinho: na comida preparada, na roupa lavada e passada, na

preocupação e no puxão de orelha por tantas noites mal dormidas.

Agradeço ao meu orientador, Prof. Jeverson e a todos os professores que,

de uma forma ou de outra, contribuíram para que eu me interessasse, sempre mais,

em conhecer a psiquê humana.

Minha gratidão aos irmãos da fé, padres, religiosos e leigos, os quais me

fizeram perceber que é bonito ter fé e que, por meio dela, posso encontrar um

sentido profundo para o meu existir.

Não poderia deixar de citar meus amigos e amigas, especialmente, os

amigos que a academia me proporcionou encontrar. Cada um, ao seu modo, foi,

também estímulo para o meu aprendizado.

Levo todos na memória do coração!

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finito para o entendimento é

Feurbach

dependente de uma antropologia limitada,

não aberta à transcendência, não aberta ao

desconhecido que habita nas profundezas

do ser humano e nas profundezas do ser

cósmico, pode algumas vezes conduzir a

J.Yves Leloup

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RESUMO

O presente Trabalho de Conclusão de Curso consiste em uma pesquisa bibliográfica quantitativa de caráter exploratório, tendo por objetivo compreender as relações entre psicologia e experiência religiosa no contexto atual. Para tanto, procurou-se averiguar: de que forma importantes autores e precursores da psicologia entenderam a experiência religiosa; como as quatro forças da psicologia lêem esses fenômenos atualmente, a partir de pesquisas empreendidas e do manejo de tais experiências na clínica psicoterápica; quais as relações entre saúde mental e experiência religiosa. Percebeu-se, a partir dos achados, que a psicologia, enquanto ciência que procura compreender o comportamento e o psiquismo humano, não pode deixar de considerar essa dimensão tão importante da vida humana e universalmente presente nas culturas. Ainda que a experiência religiosa possa ser um evento gerador de psicopatias, não há como negar seu importante contributo para a significação da existência humana.

Palavras-chave: Experiência religiosa. Religião. Psicoterapia. Saúde psicológica.

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ABREVIATURAS E SIGLAS

ACP Abordagem centrada na pessoa

CIC Catecismo da Igreja Católica

CID 10 Classificação Internacional de Doenças

DSM-IV Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 10

2 A EXPERIÊNCIA RELIGIOSA VISTA POR IMPORTANTES AUTORES DA

PSICOLOGIA .......................................................................................................... 12

2.1 Sigmund Freud (1907 1939) .......................................................................... 13

2.2 Carl Gustav Jung (1875 - 1961) ....................................................................... 17

2.3 Burrhus Frederic Skinner (1904-1990) ............................................................ 22

2.4 Abrahan Maslow (1908 -1970).......................................................................... 24

2.5 Carl R. Rogers (1902-1987) .............................................................................. 25

2.6 Rollo May (1909 - 1994) .................................................................................... 27

2.7 Eric Fromm (1900 1980) ................................................................................ 31

2.8 Viktor Emmil Frankl (1905 - 1997) ................................................................... 33

2.9 Jacob Levy Moreno (1889 - 1974).................................................................... 36

2.10 Wilhelm Reich (1897 - 1957) .......................................................................... 39

2.11 Alexander Lowen .......................................................................................... 41

2.12 Stanislav Grof (1931) ...................................................................................... 44

2.13 Ken Wilber (1949) ........................................................................................... 47

3 A INFLUENCIA DA EXPERIÊNCIA RELIGIOSA NA CONSTITUIÇÃO DO

PSIQUISMO E DOCOMPORTAMENTO HUMANO ................................................. 51

3.1 Conceituação de Alguns Elementos da Experiência Religiosa .................... 54

3.1.1 Religião .......................................................................................................... 54

3.1.2 Experiência Religiosa ................................................................................... 55

3.1.3 Espiritualidade .............................................................................................. 56

3.2 A Compreensão da Experiência Religiosa Segundo Escolas Psicológicas

Atuais ...................................................................................................................... 58

3.2.1 Perspectiva da Cognitivo-Comportamental................................................. 59

3.2.2 Perspectiva da Psicologia Psicanalítica ...................................................... 61

3.2.3 Perspectiva da Psicologia Humanista ......................................................... 66

3.2.4 Perspectiva da Psicologia Transpessoal ..................................................... 71

3.3 A Experiência Religiosa no Contexto Psicoterapêutico Atual ...................... 74

4 EXPERIÊNCIA RELIGIOSA E SAÚDE MENTAL ................................................. 83

4.1 Experiência religiosa e saúde mental: Um pouco da história ....................... 83

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4.2 O diagnóstico diferencial ................................................................................ 85

4.3 As classificações do DSM-IV e CID 10 ............................................................ 89

4.3.1 O DSM IV ..................................................................................................... 89

4.3.2 Transtorno de Transe Dissociativo .............................................................. 89

4.3.3 Características associadas .......................................................................... 91

4.3.4 Diagnóstico Diferencial ................................................................................ 91

4.3.5 CID - 10........................................................................................................... 92

5 METODOLOGIA ................................................................................................... 93

5.1 Introdução ........................................................................................................ 93

5.2 Organização dos dados pesquisados ............................................................ 93

6 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 96

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 99

ANEXO .................................................................................................................. 106

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1 INTRODUÇÃO

As relações entre psicologia e religião vêm de longa data. Semelhante ao

ocorrido em várias outros campos do saber científico, também, no campo da

psicologia, a religião foi, durante muito tempo, relegada a um conjunto de crenças

desprovidas de validação e, por isto, as quais, à guisa do positivismo cientificista,

não poderiam ser objeto da ciência como tal. Assim, pode-se ler nos anais da

história, um verdadeiro rechaço às questões pertinentes ao mundo do religioso,

entre os quais a própria experiência religiosa, da qual nascem as tradições

confessionais e seus sistemas de crenças.

Embora, tenha havido, durante muito tempo, esta separação entre os dois

campos de validação da experiência humana, tem-se assistido, nos últimos anos,

alguns esforços no sentido de tornar integrados tais campos de saber.

Especificamente na área da psicologia, parece que, com maior frequencia, estas

temáticas têm ganhado espaço em diversificadas linhas de pesquisa e, também,

dentro da própria clínica psicológica, uma vez que, as experiências religiosas nunca

deixaram de ser trazidas pelos pacientes ao contexto psicoterápico.

Ainda que as dicotomias tenham afastado religião / experiência religiosa e

psicologia, não há como negar que o homem é um ser eminentemente religioso. A

história é testemunha de uma busca incontida, por parte da humanidade, em se

relacionar com uma esfera que lhe signifique as vivências, principalmente aquelas

que lhe geram angustias e sofrimentos. Muitas vezes, a dimensão religiosa

necessita, também, ser re-elaborada, visto que, esta pode gerar vários problemas

psicopatológicos, conforme a psicologia já nos apontou.

Mas, questiona-

da presente pesquisa, ou seja, compreender a experiência religiosa, segundo o

paradigma psicológico na atualidade. Para alcançar tal intento, o primeiro capítulo da

se proporá a averiguar de que forma os grandes autores da psicologia (sendo muitos

deles, fundadores das principais correntes psicológicas) entendiam e/ou entendem a

religião e a experiência religiosa.

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O segundo capítulo tem o intuito de proporcionar o entendimento de como

a experiência religiosa influência no comportamento e a estruturação do psiquismo

humano. Além de conhecer o pensamento e os conceitos formulados por

importantes autores da psicologia, julgou-se necessário explicitar o significado de

Feitas tais considerações, a busca se dirigiu, de modo mais específico, ao

entendimento da experiência religiosa no contexto atual tido pelas quatro forças da

psicologia (perspectiva cognitivo-comportamental; psicanalítica, humanista e

transpessoal). Evidentemente, em alguns aspectos, tal abordagem retoma dados do

primeiro capítulo, visto que alguns autores se encontram vivos e atuantes no ramo

da psicologia. Isto ocorre, também, pelo fato de tais perspectivas caminharem, ao

menos em linhas gerais, na esteira de seus fundadores.

Ainda, no segundo capítulo, busca-se compreender como a psicoterapia

tem lidado com questões das experiências religiosas. Faz-se isto à luz dos achados

no capítulo antecedente bem como por meio do pensamento vigente nas escolas

psicológicas referendadas.

Para alcançar o objetivo principal, tomam-se, ainda, como objeto de

pesquisa, as relações entre experiência religiosa e saúde mental. Após a

apresentação de um breve histórico desta analogia, far-se-á algumas considerações

sobre o diagnóstico diferencial entre experiências espirituais e sintomas

psicopatológicos, bem como sobre o que é dito pelos manuais do DSM-IV e CID 10

acerca de tais experiências.

Em seu estágio final, o presente trabalho apresentará a metodologia

utilizada, especificando o entendimento do que vem a ser uma pesquisa bibliográfica

quantitativa e os dados gerais da organização da pesquisa. Serão tecidas, também,

as conclusões encontradas a partir do objetivo proposto inicialmente por meio das

respostas obtidas neste trabalho.

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2 A EXPERIÊNCIA RELIGIOSA VISTA POR IMPORTANTES AUTORES DA

PSICOLOGIA

O pensamento que norteia a compreensão de homem e de mundo,

segundo as escolas psicológicas, geralmente, postula a própria experiência dos

precursores destas escolas. Assim, faz-se mister entender que a compreensão e o

manejo da experiência religiosa, sob a perspectiva da psicologia, nasce, também, da

própria experiência religiosa dos precursores e dos principais pensadores de tais

escolas.

Não se pretende com esta idéia macular a objetividade científica dos

referenciais teóricos da psicologia. Antes, objetiva-se desmistificar certos

preconceitos em face ao rigor científico. Nesse sentido, Sudbrack (2001), respaldado

na fala de Harbermas, afirma que o posicionamento pessoal não contraria a dita

objetividade da ciência, mas é um ponto de partida que insere o ser humano num

diálogo com o pensamento alheio. O autor relata, ainda, que este diálogo é quem

conduz a uma reflexão crítica do próprio ponto de vista.

A partir do pressuposto supra mencionado, surgem alguns

Para Eliade (1992), o único meio para se compreender o universo mental

de outrem é se situando dentro dele, no seu próprio centro, para alcançar, a partir de

então, todos os valores que este universo (o qual é a própria pessoa) comanda.

Certamente, essa empresa da qual fala Eliade (1992) não é isenta de

riscos, uma vez que, como diz Rizzuto (2006), para formar uma representação,

analiticamente relevante, do paciente e da pessoa ou da situação trazida por ele ao

ambiente da psicoterapia, o analista terá de recorrer aos seus próprios processos

mnêmicos.

Os precursores da psicologia, quando em vida, ocuparam-se, fortemente,

em desvendar a experiência religiosa, seja a partir da experiência pessoal ou das

pesquisas empreendidas nesta esfera, o que, em hipótese, possibilitou à psicologia,

um maior entendimento desta questão.

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comportamento religioso, precisa primeiramente encarar os fatos, antes de tentar

religiosa, apenas, constrói-se nas bases do diálogo entre a subjetividade e a

objetividade científica.

Sudbrack (2001) sustenta que são muitos os posicionamentos dos

grandes autores da psicologia quanto a uma possível interpretação do fenômeno

religioso. Vários

subjetivação, outros, no entanto, acentuaram o aspecto social da experiência,

vinculando-o à religião enquanto instituição.

Para Hillman (1984), desde que Nietzsche declarou que Deus estava

morto e que Freud relegou a religião a uma neurose e uma ilusão, a psicologia tem

adentrado, com maior intensidade, nos domínios da teologia. Considera, também,

que há uma psicologiazação da experiência religiosa em muitos casos, enquanto,

em outros há uma análise puramente sócio-cultural da experiência religiosa.

É evidente que a questão da religião não pode ser, totalmente, dissociada

da experiência religiosa, nem está absolutamente ligada à religião. Essa relação

torna-se mais evidente quando é empreendida uma leitura minuciosa acerca das

obras de grandes autores da psicologia, precursores de grandes correntes

psicológicas.

Será visto, portanto, de que forma os grandes autores das escolas

psicológicas entendem a experiência religiosa.

2.1 Sigmund Freud (1856 - 1939)

Freud, o pai da psicanálise, certamente, foi um dos estudiosos que mais

se debruçou sobre a questão da religião como importante constituinte da psique

humana e do significado da experiência religiosa no comportamento humano. Para

Sudbrack (2001), Freud iniciou uma nova fase de reflexão no conhecimento

psicológico do ser humano e, ainda, na experiência religiosa.

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Argelazi (2008) entende que as idéias de Freud trouxeram novos e

importantes aportes no entendimento da religiosidade. Entre estes, pode-se destacar

a importância das vivências infantis bem como do inconsciente na vivência religiosa

e a ligação entre as práticas religiosas e atos defensivos. Por outro lado, as idéias

de Freud relegaram a religiosidade ao campo de uma patologia neurótica ou

psicótica, podendo, ainda, atuar como uma defesa ilusória.

Na fala de Dalgalarondo (2008), a pesquisa de Freud foi significante a

ponto de influenciar em diferentes áreas do saber, até mesmo, fora dos âmbitos da

psicologia como, por exemplo, na antropologia cultural, na sociologia, na filosofia e

na própria teologia.

Freud, conforme citado acima, escreveu muito sobre o tema em questão.

Em sua obra titulada de Psicopatologia da vida cotidiana, publicada em1936, ele

afirma crer que grande parte da concepção mitológica do mundo, a qual se estende,

difundindo-se até as religiões modernas, não seja outra coisa se não a psicologia

projetada no mundo externo.

Rizzuto (2006) ressalta que, nesta mesma obra, Freud já manifestara sua

idéia de que não fora Deus quem havia feito o ser humano, e sim que este criara

Aquele à sua imagem e semelhança.

Entre os principais escritos de Freud, relacionados à religião à experiência

religiosa, pode-se citar: Totem e Tabu (1912 - 1913), O futuro de uma ilusão (1927),

O mal estar na civilização (1930), Moisés e o monoteísmo (1934 - 1938). Em

algumas destas obras, há um contundente mergulho na experiência clínica

entendida, obviamente, sob o viés psicanalista. Já em Totem e tabu, é possível

encontrar um estudo antropológico da religião, conforme ocorrido no caso de

Moisés. Na mesma obra pode ser encontrada a afirmativa acerca do que, para

Freud, estava na gênese da experiência religiosa, ou seja, a figura paterna e a sua

relação com o indivíduo. Pois, para ele, a relação pessoal do homem com Deus

depende da relação com o pai e a mãe, em carne e osso, sendo que oscila e se

modifica de acordo com as nuances desta relação.

Fica clara, a partir do pressuposto assinalado acima, a analogia que

Freud faz entre a experiência religiosa e as vivências da infância. A seu ver, Deus é

a exaltação do pai e a religião é o que sustenta esta relação, a qual se mostra uma

ilusão em face da realidade, principalmente quando certas situações da vida se

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apresentam demasiadamente dolorosas. Tal entendimento da religião como uma

Em Totem e tabu, Freud (1996), também, realiza uma leitura antropológica

do mito judaico cristão, o qual, para ele, concederia o tônus da relação homem e

Deus. Nesta obra, ele explica o mito de um pai primevo e que fora assassinado

pelos filhos. Do sentimento de culpa, proveniente do parricídio, nascem os ritos e

crenças reparatórios que norteiam a crença religiosa e, logicamente, a instituição

religiosa.

Em O futuro de uma ilusão, publicado em 1927, a religião é comparada a

uma ilusão. Afirma Freud (1996, p.145):

quando em sua motivação prevalece a satisfação do desejo e prescindimos, por

isso, de sua relação com a realidade, exatamente como a própria ilusão renuncia à

Dalgalarondo (2008), ao fazer a leitura desta obra, diz que Freud

compara a religião com uma neurose infantil e uma ilusão. A ilusão de ser protegido

por alguém (Deus) em seu desamparo constitutivo. O autor cita que, segundo Freud,

o que superará esse estado de neurose e ilusão é o progresso humano trazido pela

razão, autoconhecimento e ciência.

Freud analisou, não somente, a religião enquanto instituição, mas também

cartas trocadas com o escritor Romain Rolland.

Dalgalarondo (2008) comenta que, para Freud, o sentimento religioso,

descrito por Ro

constituição da religião. Mas, que se sentia incapaz de experimentá-lo. Freud teria

negado que o sentimento oceânico esteja, original e exclusivamente, presente na

religiosidade. Esta era entendida, por ele, muito mais como um retorno à experiência

do bebê fundido à mãe. No dizer de Sudbrack (2001), a experiência mística, como

toda religião, é, para Freud, uma neurose coletiva, uma fuga para um mundo irreal e

fictício.

A fim de compreender, de fato, o pensamento de Freud, acerca da

experiência religiosa, muitos autores se ocuparam desta temática, inclusive os

inseridos na própria psicanálise. Destaca-se, entre estes, Ana Maria Rizzutto (2001),

a qual, em sua obra Por que Freud rejeitou Deus, explica a crítica freudiana a Deus

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e à religião como fruto de uma experiência na relação de conflito entre ele e os pais

religião podem ser lidas como uma psicobiografia não propositada da sua

2001 p. 255).

A mesma autora, em O nascimento do Deus vivo (2006), dedica várias

páginas ao estudo das concepções freudianas acerca da religião e da construção da

imagem de Deus na mente humana.

Para Dalgalarondo (2008), no entendimento de Freud, a experiência

religiosa tem uma marcante dimensão libidinal. A questão da experiência religiosa

não seria, apenas, uma ideação neutra, e sim uma projeção envolvendo intensa

carga libidinal. Entretanto, Rizzuto (2006), diz que, embora Freud tenha falado muito

da carga libidinal (no tocante à construção da imagem de Deus, por exemplo), não

menciona como esta carga é formada.

A experiência religiosa, também, é entendida, em Freud, como

sublimação. Ele vê na religião um desvio para os instintos sexuais e agressivos.

Dalgalarondo (2008) explica que, para Freud, a religião sancionava a recusa desses

impulsos por parte da sociedade. Já para Rizzuto (2006), a questão da sublimação

pode ser vista por outro ângulo, quando Freud fala que a representação de Deus é

uma sublimação da imagem do pai.

Para Rizzuto (2006), uma das maiores contribuições de Freud está,

justamente, em sua teoria das relações objetais, pela idéia de que o ser humano

usa, vitaliciamente, as imagens ou representações iniciais, pela dependência

humana a relações objetais ou, ainda, pela religiosidade como uma atividade objetal.

Rizzuto (2006) chama à atenção para o fato de que, na ótica freudiana, os

deuses e demônios são confabulações da mente humana. Para a psicanálise

convívio com o pai durante a infância. Logo, a relação com Deus oscila e se

modifica conforme as relações entre pai e filho. Segundo Rizzuto (2006, p.33), Freud

representação de Deus, seja ao longo da história da humanidade ou na história de

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A partir da concepção de que a experiência religiosa é uma representação

da relação de dependência da criança em relação aos pais, pode-se entender que a

experiência religiosa, em Freud, não pode ser vista como uma experiência primária,

pois, trata-se, na verdade, da derivação de outras experiências. Neste sentido,

Rizzuto (2006) entende que, visto sob a ótica freudiana, Deus estende o poder dos

pais até as regiões mais distantes do universo.

2.2 Carl Gustav Jung (1875 - 1961)

Um pensamento muito distinto das idéias freudianas, acerca da

experiência religiosa, pode ser encontrado na obra de Carl Gustav Jung. Segundo

que, para este, a religião e a experiência mística da qual a religião se origina são

pontos altos do auto-encontro e da auto-realização do ser humano, chamada, por

ele, como processo de individuação.

Jung (1978, p. 8), em sua obra Psicologia e religião, define religião da

seguinte forma:

Encaro a religião como uma atitude do espírito humano, atitude que de acordo com o emprego originário do termo: "religio", poderíamos qualificar a modo de uma consideração e observação cuidadosas de certos fatores dinâmicos concebidos como "potências": espíritos, demônios, deuses, leis, idéias, ideais, ou qualquer outra denominação dada pelo homem a tais fatores; dentro de seu mundo próprio a experiência ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos, perigosos ou mesmo úteis, para merecerem respeitosa consideração, ou suficientemente grandes, belos e racionais, para serem piedosamente adorados e amados.

O autor faz uma distinção entre o que é, na sua concepção, confissão

religiosa (instituição) e religião vivida e experimentada. Segundo Jung (1978, p. 8),

ncias

sacralizados e formatados em uma construção mental inflexível e, freqüentemente,

-se em

emérito, e e

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Entretanto, Jung (1978), considera que este dado não caracteriza,

necessariamente, uma petrificação sem vida. Ao contrário, a religião pode continuar

representando uma forma de experiência religiosa para inúmeras pessoas durante

muito tempo, sem que seja necessário modificá-la.

Diferentemente de Freud, Jung parte do pressuposto de que a experiência

religiosa não é algo patológico, mas algo inerente ao psiquismo humano. Ele resgata

a experiência religiosa, entendida por Freud, como uma manifestação de caráter

neurótico, dando-lhe nova perspectiva de caráter mais positivo, propiciador de

saúde. Acerca de tal propósito, na obra Psicologia da religião, Jung (1983) diz:

[...] de todos os meus pacientes que tinham ultrapassado o meio da vida, isto é, que contavam mais de trinta e cinco anos, não houve um só cujo problema mais profundo não fosse o de uma atitude religiosa. Aliás, todos estavam doentes, em última análise, por terem perdido aquilo que as religiões vivas ofereciam em todos os tempos, a seus adeptos, e nenhum se curou sem ter realmente readquirido uma atitude religiosa própria, o que, evidentemente, nada tinha a ver com a questão de confissão (credo religioso) ou com a pertença a uma determinada igreja. (JUNG, 1983 p. 135-136).

A frase, acima, evidencia, ainda, o fato compreendido, por Jung, a partir

de sua própria experiência clínica, ou seja, do quão necessário se fazia ter um

entendimento da experiência religiosa que não o aplicado, até então, pela

perspectiva de Freud. Jung percebia uma urgência em abordar, de forma

diferenciada, a questão da religiosidade. Uma maneira que propiciasse outro olhar

sobre o fenômeno, não evidenciando um viés religioso, nem mesmo psicanalítico.

Para Jung, a verdadeira causa de neurose decorria da falta de seriedade

sem ter readquirido uma atitude religiosa própria

Jung demonstrava grande apreço por todas as religiões e foi, sem

dúvidas, um grande estudioso da religião, enquanto entidade cultural. Porque,

segundo ele, as religiões conservavam imagens simbólicas que provinham do

estabelecer uma posição espiritual que se contrapõe à natureza instintiva original,

uma atitude cultural em face da mera instintividade. Esta tem sido a função de todas

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Realmente, a obra de Jung é repleta de tentativas que pretendem

entender as questões espirituais e religiosas que envolvem o ser humano. No

entanto, esta busca não se faz numa perspectiva confessional, doutrinária, como já

fora manifestado acima, mas parte, da ótica fenomenológica, como o próprio Jung

afirma:

Na medida em que o fenômeno religioso apresenta um aspecto psicológico muito importante, trato o tema dentro de uma perspectiva exclusivamente empírica: limito-me, portanto, a observar os fenômenos e me abstenho de qualquer abordagem metafísica ou filosófica. Não nego a validade de outras abordagens, mas não posso pretender a uma correta aplicação desses critérios. (JUNG, 1983, p. 481).

De acordo com Dalgalarrondo (2008), o principal elemento da questão da

experiência religiosa em Jung, era sua visão desta como algo natural do ser

humano, inerente a sua condição. Seria, portanto, parte essencial, constitutiva da

natureza humana, por assim dizer, um instinto.

Para descrever a emoção provinda da experiência religiosa, na qual o

por Rudolf Otto. Ao empregar este termo, novamente, Jung manifesta sua idéia da

experiência religiosa como algo que foge ao querer humano, tal como uma realidade

que infusa:

Qualquer que seja a sua causa, o numinoso constitui uma condição do sujeito, e é independente de sua vontade. De qualquer modo, tal como o consensus gentium, a doutrina religiosa mostra-nos invariavelmente e em toda a parte que esta condição deve estar ligada a uma causa externa ao indivíduo. O numinoso pode ser a propriedade de um objeto visível, ou o influxo de uma presença invisível, que produzem uma modificação especial na consciência. Tal é, pelo menos, a regra universal. (JUNG, 1978, p. 9).

Outros conceitos, tais como os de inconsciente coletivo, arquétipo,

símbolo e self, correlacionam-se, perfeitamente, à problemática da experiência

religiosa na obra Jung.

Além do conhecido inconsciente pessoal, Jung entendeu que existia outra

dimensão do inconsciente, a qual chamou de inconsciente coletivo. Para ele, o

inconsciente tem elementos provindos de experiências do indivíduo outrora

conscientes e elementos herdados de uma natureza supra pessoal, presentes no

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inconsciente coletivo. (JUNG, 2002) Logo, assim como a morfologia corporal, a

psique é herdada em muitos aspectos.

Conforme Dalgalarondo (2008), para Jung, as experiências, sofrimentos e

aprendizados das gerações passadas estão armazenadas no inconsciente coletivo,

onde permanecessem disponíveis ao psiquismo de cada ser humano. Acerca disto,

Jung (2003, p. 15) afirma que uma camada superficial do inconsciente seria o dito

inconsciente pessoal, conforme entendido por Freud, mas que este repousaria sobre

ais Jung chamou de inconsciente

coletivo.

Na obra O homem e seus símbolos, Jung (1964) fala que no inconsciente

coletivo são encontrados os arquétipos. Os quais consistiam em categorias

universais, originárias e peculiares da alma humana. Seriam estes, conteúdos e

imagens próprias do inconsciente coletivo:

a quem falta conhecimento suficiente da psicologia do sonho e da mitologia. -se que

expressa certas imagens ou motivos mitológicos definidos. Mas estes nada mais são do que representações conscientes: seria absurdo supor que representações tão variadas pudessem ser transmitidas hereditariamente. O arquétipo é uma tendência para formar estas mesmas representações de um motivo representações que podem ter inúmeras variações de detalhes

sem perder a sua configuração original (JUNG, 1964, p. 67).

Segundo Veríssimo (2004, p.169), os arquétipos, na concepção de Jung,

denunciam um nível ontológico do ser humano. Assim sendo, Jung entendia que os

arquétipos são associados a experiências originárias do ser humano (feminino,

masculino, ordem, caos, a busca da medida, a transgressão da medida, a morte e o

renascimento, o materno e o paterno, angustia, êxtase, trágico, liberdade, etc.), as

suscitam a formação de imagens simbólicas, que surgem nos sonhos, nos mitos, na

De acordo com Jung, há uma analogia, facilmente verificável, entre as

imagens dos sonhos do homem moderno e as expressões da mente primitiva, sendo

Page 22: Psicologia e Religião (Tcc)

21

(1964, p. 67).

Logo, os denominados conteúdos do inconsciente pessoal e coletivo,

estando entre eles os arquétipos, teriam sua forma de expressão por meio dos

universo mítico-religioso, apontam para o ser, (o si-

feito, continuamente, pela cultura e pelos próprios indivíduos, como sua condição

mais própria, não sendo, portanto, algo pronto nem estático.

Neste mesmo universo mítico-religioso, encontra-se outro aspecto

déia de Deus no

inconsciente coletivo, como um arquétipo, uma imagem primordial.

Entretanto, ainda que Jung tenha entendido as imagens de Deus como

um arquétipo, ele, também, não descartou que, na formação das idéias acerca de

Deus, esteja a própria repre

isso mesmo, em etapas posteriores da vida, ainda que as imagens dos pais tenham

sido analisadas criticamente, corrigidas e reduzidas a dimensões humanas, contudo

continuam essas imagens a atuar aparentem

1972, p. 70).

Dalgalarondo (2008, p. 66), considera que, apesar de acentuar a

dimensão das imagens do divino como fruto de imagens arquetípicas

exclui a natureza cultural das representações de Deus, enquanto um fenômeno

Faz-se necessário ressaltar que, conforme Veríssimo (2004, p. 173), ao

-las

, compete ao

psicólogo, neste campo, determinar, na medida do possível, sua atuação psíquica,

sendo irrelevante saber se esta é, ou não, uma ilusão transcendental.

Page 23: Psicologia e Religião (Tcc)

22

2.3 Burrhus Frederic Skinner (1904-1990)

B. F. Skinner, autor de renome na psicologia comportamental, pensava na

religiosidade a partir da religião institucional. Na obra Ciência e comportamento

humano (2003), ele evidencia sua leitura da religião como uma agência de controle

social e a experiência religiosa mediante ao padrão de estímulo-resposta.

Para Skinner (2003, p.381), na religião, o controle se dá pela manipulação

compreendido sem se considerar certos processos que são empregados fora do

campo da religião, Estes processos

empregados fora da religião, referidos por Skinner (2003), são, justamente, o

estímulo-resposta, praticado por grandes líderes sociais e, também, políticos a fim

de se imporem.

Skinner (2003) afirma que a autoridade sobrenatural, outorgada a

religiosos, trata-se de uma forma de controle social, baseada em superstições. A

própria crença de céu / inferno e as regras de moral se baseiam num espectro amplo

de reforçadores positivos e negativos.

Segundo Skinner (2003), pode-se entender o céu como prêmio

(recompensa) às boas condutas e o inferno aos que, desobedecendo às regras

ditadas pela religião, vivem no pecado. O céu e o inferno condensam reforços

positivos e negativos.

Com relação à questão da emoção, tão presente nas experiências

religiosas, Skinner diz o seguinte:

Como a emoção usualmente é um meio de controle religioso, o condicionamento respondente é importante. A arte, a música, e os espetáculos religiosos geram respostas emocionais. [...] Essas respostas são transferidas para estímulos, verbais ou não verbais que mais tarde são usados pela agência com propósitos de controle. Algumas agências religiosas recorrem ao uso de drogas, seja para induzir condições emocionais ou motivacionais apropriadas, seja para induzir efeitos que parecem apoiar a alegação de uma conexão sobrenatural. (SKINNER, 2003, p.488).

Compreende-se, a partir desta citação, que, novamente, a dinâmica

estímulo-resposta é a única percepção retirada do fenômeno religioso. Neste

Page 24: Psicologia e Religião (Tcc)

23

sentido, também, a emoção é vista, na mesma perspectiva, como um produto dos

reforços de ordem psicológica e comportamental.

Além do protótipo da emoção, Skinner (2003) cita outro instrumento

religioso: o uso de contingências raras ou acidentais para controlar o comportamento

dos outros. Skinner se refere a situações nas quais se fazem previsões para o

futuro, envoltas em misticismo e superstições. Fato que, ao seu entender, não

passam de artimanhas para manter o controle social e a adesão à determinada

agência religiosa.

2.4 Abrahan Maslow (1908 -1970)

Um dos grandes nomes da Psicologia Humanista é, certamente, Abraham

Maslow (1908 1970), o qual viveu em Nova York, nos Estados Unidos. Em suas

pesquisas, considerou, principalmente, questões relativas ao crescimento e

desenvolvimento pessoais. Estudou uma pequena amostragem de pessoas notáveis

para determinar de que forma estes se diferenciavam de outras pessoas com saúde

mental considerada normal ou mediana.

De acordo com Rosa e Kahhale (2002), Maslow procurou compreender as

mais elevadas realizações que o ser humano é capaz de alcançar. Ele define esta

realização elevada como auto-atualização ou auto-realização, consistindo em

experimentar, de modo pleno, as próprias capacidades internas e individuais

enquanto pessoa. Ainda, segundo as autoras, Maslow denominou estas situações,

nas quais se alcança a auto-

-se de experiências de amor pleno, experiências

religiosas ou simplesmente vivências cotidianas. Para Maslow (s.d., p. 100) essa

experiência pode ser vivenciada em vários momentos, como por exemplo:

[...] na experiência parental, na experiência mística, ou oceânica, ou natural, a percepção estética, o momento criador, a introvisão terapêutica ou intelectual, a experiência orgástica, certas formas de realização atlética etc. A estes e outros momentos de felicidade e realização supremas chamarei

Page 25: Psicologia e Religião (Tcc)

24

Para Maslow, toda pessoa tem tendência para se auto-realizar. Mas,

precisa satisfazer outras necessidades, por ele apontadas na chamada hierarquia

das nas necessidades, antes de chegar a essa realização plena.

Em sua obra Introdução à psicologia do ser (s.d.), Maslow faz uma crítica

a um modelo de psicologia que passe à margem deste tipo de experiências, uma vez

que, para ele, as experiências culminantes estão entre as metas principais da vida,

validando e justificando a própria existência:

As experiências culminantes de puro prazer estão, para os meus sujeitos, entre as metas fundamentais da existência e são validações e justificações desta. Que o psicólogo as despreze, as ultrapasse de largo ou ignore até, oficialmente, a sua existência, ou o que ainda é pior nas Psicologias objetivistas, negue a priori a possibilidade de sua existência como objetos para estudo científico, é algo incompreensível. (MASLOW , s.d., p. 109).

Maslow (s.d., p.112), salienta, ainda, que a psicologia contemporânea tem

-ter em vez do ter, o esforço para realizar em vez da

realização, a frustração em vez da satisfação, a busca de alegria em vez da alegria

Maslow (s.d., p. 110) define o seu entendimento da experiência

culminante, tantas vezes mencionada por ele, da seguinte forma:

[...] a experiência culminante é unicamente boa e desejável, e nunca é experimentada como má ou indesejável. A experiência é intrinsecamente válida; a experiência é perfeita, completa e de nada mais precisa. É auto-suficiente. É sentida como algo intrinsecamente necessário e inevitável. É tão boa quanto devia ser. Provoca uma reação de reverência, encantamento, espanto, humildade e até de exaltação e devoção. A palavra

screver o modo de reação da pessoa à experiência.

Nas entrelinhas de sua obra Introdução à psicologia do ser, Maslow (s.d.)

parece criticar um modelo de psicologia que se focaliza na doença, na

psicopatologia e, não propriamente, no ser em questão. Para o autor, a verdadeira

psicologia deve se interessar mais pelos fins do que pelos meios, isto é, pelo que ele

denominou de experiências terminais, valores terminais, cognições terminais e pelas

pessoas como fins. Maslow (s.d.) titulou de Psicologia do Ser tal modelo de

entendimento da psicologia.

Page 26: Psicologia e Religião (Tcc)

25

Maslow (s.d.) toma, enquanto sujeitos de sua pesquisa, pessoas sadias,

em pleno funcionamento e, não apenas, as doentes, como fazem outros modelos

não está em

contrário, ele acredita que transcende a psicologia do comum e pode, em teoria,

incorporar todas as suas descobertas numa estrutura mais abrangente e global,

capaz de incluir tanto o doente como o são, tanto a deficiência como o ser e o vir a

ser. (MASLOW, s.d.).

De acordo com Rosa e Kahhale (2002, p. 252), Maslow considerava a

psicologia humanista como uma preparação para a quarta força, ou seja, a

psicologia transpessoal. Esta escola iria além da identidade do humanismo, dos

investigar as capacidades humanas máximas, incluindo o estudo da religião e a

2.5 Carl R. Rogers (1902-1987)

No dizer de Boainain Junior (1998), Rogers é, ao lado de Maslow e Rollo

May, um dos maiores líderes teóricos da Psicologia Humanista. E o método, por ele

criado, a ACP (Abordagem Centrada na Pessoa), é considerado um dos modelos

mais completos do entendimento humanista de Homem.

Conforme Rosa e Kahhale (2002), as contribuições de Rogers para a

psicologia e para a psicoterapia, como aspecto característico do movimento

humanista, contestam o modelo transferêncial da psicanálise e o objetivismo das

teorias comportamentais, propondo um modelo de psicoterapia que se funda na

Rogers (1980) defende que cada pessoa tem uma tendência inata,

biologicamente orientada, para atualizar as capacidades do eu, para o auto

Page 27: Psicologia e Religião (Tcc)

26

Na obra Um jeito de ser, Rogers (1980, p. 40) menciona um processo

direcional na vida, o qual caracterizaria uma tendência a um desenvolvimento mais

completo e complexo do ser:

Podemos dizer que em cada organismo, não importa em que nível, há um fluxo de movimento subjacente em direção à realização construtiva das possibilidades que lhe são inerentes. Há também nos seres humanos uma tendência natural a um desenvolvimento mais completo e mais complexo.

seria o nível mais alto de saúde psicológica. Cada pessoa guardaria, em si, um

impulso para ser competente, capaz, completa e autorrealizada. O organismo, na

concepção de Rogers, teria essa tendência para a autopreservação e valorização.

Entretanto, segundo as referidas autoras, para Rogers, o impulso para a

autoatualização pode ser prejudicado por experiências infantis e pela própria

aprendizagem.

Rogers não se deteve muito acerca da experiência religiosa. Na verdade,

é muito raro ver, em sua obra, qualquer referência à temática, inclusive à psicologia

transpessoal, da qual, o próprio Maslow é um dos precursores. Boainain Junior

a característica mais marcante do pensamento rogeriano,

o centrar-se na pessoa, o qual confere nome à sua abordagem, parece excluí-lo do

Entretanto, ao falar da prática psicoterapeutica, Rogers (1980) afirma que,

por meio dela, aprende-se sobre as condições psicológicas que propiciam um

aumento da consciência de si. Acrescenta que é justamente esta autoconsciência,

Após citar a necessidade e a função da consciência no ser humano, para

colocar o homem em sintonia com esse fluxo evolutivo, Rogers (1980) cita, também,

outras experiências de estados alterados de consciência, os quais, segundo ele,

aproximam-se de uma experiência transcendente de unidade. Acerca disto afirma:

Esse relato, tal como a descrição dos estados alterados de consciência, pertence ao terreno do místico. Tenho certeza de que nossas experiência terapêuticas e grupais lidam com o transcendente, o indescritível, o espiritual. Sou levado a crer que eu, como muitos outros, tenho subestimado a importância da dimensão espiritual e mística. (ROGERS, 1980, p. 48).

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27

Na mesma obra, uma vez citadas as experiências de físicos e químicos,

acerca da experiência mística, Rogers (1980) defende que exista uma tendência

formativa do universo, podendo esta, ser rastreada e observada no espaço estelar,

cristais, micro organismos mais complexos e nos seres humanos. Seria uma

tendência evolutiva para uma ordem maior. Explanando acerca desta tendência, o

autor declara:

Na espécie humana, essa tendência se expressa quando o universo progride de seu início unicelular para um funcionamento orgânico complexo, para um modo de conhecer e sentir abaixo da consciência, para um conhecimento consciente do organismo e do mundo externo, para uma consciência transcendente da harmonia e da unidade do sistema cósmico, no qual se inclui a espécie humana. (ROGERS, 1980 p. 50).

Ao final de sua vida, uma vez experimentados alguns fenômenos, os

Rogers (1980, p.31) afirma que considerava possível que cada um de nós fosse uma

,

ocasionalmente, encarnava-se num corpo humano.

2.6 Rollo May (1909 - 1994)

Rollo May, outro autor humanista-existencialista, deixa claro, em suas

obras, o entendimento sobre a sua crença na influência exercida pelo espírito na

formação da personalidade. Para May (2000), o que prova esta influência de aspecto

espiritual, na constituição da personalidade, é a tensão espiritual da qual provém o

sentimento de culpa, oriundo da percepção da diferença entre o que uma coisa é, e

o que ela deveria ser.

A contradição é, assim, prova da presença do espírito na natureza humana. Nós nos sabemos existencialmente portadores do espírito, e a relação introduz os elementos do incondicionado, de que somos infinitos e imperfeitos. À luz de tal tensão, torna-se perfeitamente compreensível que deveríamos experimentar o espírito a todo instante. (MAY, 2000, p 41).

Page 29: Psicologia e Religião (Tcc)

28

Em sua obra A arte do aconselhamento psicológico, May (2000) salienta

que os seres humanos não são criaturas, totalmente, horizontais, nem,

absolutamente, verticais, mas vivem tanto horizontal como verticalmente. Diz, ainda,

consciência do espírito provém dessa suprema tensão. No ponto de intersecção

entre o vertical e o horizontal surge o

41).

A fim de corroborar o entendimento desta questão, May (2000) salienta

que outros psicólogos, como Jung e Rank, também perceberam este dualismo da

natureza humana e admitiram precisar da teologia para responder essa busca

universal.

Para May (2000), é importante que o psicoterapeuta, chamado por ele de

aconselhador, esteja apto a lidar com questões relativas à experiência e à prática

religiosa de seus pacientes. Ao citar alguns exemplos de pessoas que se utilizam da

religião como fuga de realidades particulares, May afirma que a religião tem uma

tendência neurotizante ao separar as pessoas.

Outro aspecto apontado por May (2000, p. 170), o qual torna a

experiência religiosa algo doentio, é o fato de as religiões, muitas vezes, acabarem

No entendimento de May (2000), é a religião autêntica que fundamenta

a an

2000 p.173).

O grande problema, visto na ótica de May (2000) como um problema de

ordem religiosa, é a incapacidade de confiar, a qual configura o verdadeiro estado

neurótico de muitas pessoas. Sobre a qual afirma:

Se alguém puder ter confiança no sentido da vida, puder acreditar no valor último do próprio si-mesmo e do dos outros, puder confiar que o universo tem um significado no qual a própria insegurança pode ser superada, então poderá experimentar a confiança e a coragem que necessita para viver. (MAY, 2000, p. 173-174).

Para May (2000, p. 176), a saúde da personalidade está imbricada em

uma percepção de sentido para a própria vida e para a vida do mundo. O indivíduo

precisa acreditar numa finalidade para a sua vida, e a religião, no seu entendimento,

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29

é a crença num processo total da vida. Explica, entretanto, que o seu conceito de

qual confrontamos noss

May (2000) fala, ainda, que quanto mais profundos os pensamentos na

psicoterapia, maior a proximidade à teologia. A psicoterapia inicia com a

problematização da vivência eficaz do indivíduo neurótico, passando pela questão

do sentido e apontando para a teologia. O autor fala, também, da experiência da

graça e de seu correspondente em psicologia, assim chamada para clarificação.

das tensões na personalidade e um ajustamento d

tomar decisões egoístas, no entanto, terá consciência desta tendência, será menos

egocêntrica em suas motivações. Afirma, ainda, que, após a experiência da

clarificação e da graça, o indivíduo é tomado de um senso único de liberdade. Ele

encontrou finalmente a si próprio, encontrou seus semelhantes e encontrou o lugar

de todos no universo.

Na obra O homem a procura de si mesmo, May (2001) enfatiza aspectos

a ser considerados, no tocante à religião e à experiência religiosa em psicoterapia.

Faz uma crítica à postura freudiana, quando este dizia que a religião era, por si só,

uma neurose compulsiva. Sobre essa questão, o autor afirma que qualquer setor da

vida pode ser usado como neurose, até mesmo, a própria ciência, tornada por

muitos cientistas, uma verdadeira neurose.

Segundo May (2001), especificamente em relação à religião, a pergunta a

ser feita é se ela aumenta o grau de dependência, mantendo, ou não, o indivíduo

infantilizado. Contudo, assinala o autor, o difícil é penetrar no significado íntimo das

atitudes religiosas, avaliando-as não como crenças teóricas, mas como aspectos

afetivos da relação orgânica da pessoa com sua vida. Há de se reconhecer, para a

pessoa, a relação entre religião e dependência.

May (2001) atesta que metade do seu trabalho psicoterapêutico tem sido

desta experiência, que ele escreve acerca de aspectos que considera de

fundamental importância a questões ligadas à religião.

Page 31: Psicologia e Religião (Tcc)

30

As pessoas de formação religiosa demonstram, a princípio, zelo maior que o das outras para reformar a si mesmas e a sua vida. Mas em seguida, inclinam-se a uma atAs duas atitudes são naturalmente contraditórias e paralelas também aos efeitos contraditórios da religião. [...] A primeira atitude o vivo interesse por resolver os próprios problemas não necessita comentários; é uma função da fé no significado e no valor da vida, é contribuição construtiva de uma religião amadurecida e, tem influencia dinâmica sobre a terapia. (MAY, 2001, p. 164).

Para May (2001), a atitude, do direito divino de ser cuidado, é algo nocivo

à maturidade da pessoa, uma vez que, seu bom comportamento se motiva pela

obediência e esta, geralmente, não se pauta numa opção responsável segundo a

ética. Assim, o fazer o bem, sempre, tem de ser recompensado. E quando a

recompensa não vem (visto que, na verdade, a própria virtude já é a recompensa) a

pessoa se sente ressentida.

Não obstante, há uma tendência alinhada à dependência religiosa de

outorgar a dignidade, o poder e o prestígio a outrem. Embora não exclusiva da

religião, May (2001) fala que esta tendência é deveras encontrada em relação a

figuras de identificação, tais como, padres, rabinos, pastores e líderes políticos e

sociais. O que, em psicoterapia, chama-se de transferência.

May (2001) identifica, ainda, outro aspecto negativo advindo desta mesma

crença, assim como a pessoa se sente sujeita a uma ação poderosa de outrem a

quem considera superior, também, identificará pessoas que considera inferior a si e

sobre as quais tem o direito de exercer seu domínio.

No entendimento de May (2001, p. 168), as formas neuróticas, de usar a

religião, têm algo em comum, pois, por meio delas, a pessoa evita enfrentar a sua

solidão e ansiedade. Segundo o autor, quando a religião assume esta forma, torna-

se uma racionalização para disfarçar a

profundezas está basicamente sé e que é inevitável, em última análise fazer sozinho

Diz May (2001) que é, precisamente, por meio da análise, que a pessoa,

sentindo ansiedade, procura a autoridade do analista. Mediante tal perspectiva, é

importante que a pessoa se pergunte sobre qual ansiedade lhe faz desejar refugiar-

se junto a uma autoridade ou identificar de qual problema está tentando fugir.

Page 32: Psicologia e Religião (Tcc)

31

May (2001) fala, também, que a religião é construtiva quando fortalece, na

pessoa, o senso de dignidade e de valor e, ainda, quando desenvolve consciência

ética, liberdade e responsabilidade.

No parecer de May (2001), para conhecer-se o efeito produzido pela

religião sobre a pessoa, é importante se questionar até que ponto a crença ou a

prática de determinada religião é uma fuga da liberdade, um modo de se tornar

menos pessoa ou uma maneira de fortalecer esta quanto à sua responsabilidade e

capacidade ética.

2.7 Eric Fromm (1900 1980)

Eric Fromm tece, em suas obras, muitos comentários acerca de questões

pertinentes às instituições religiosas. Em sua famosa obra Análise do homem (1970),

o autor dedica algumas páginas à questão da fé. Comenta que, em sua época, a

igreja e, também a fé, em face ao progresso da razão, foram menosprezadas.

Na obra, Fromm lança mão de várias perguntas sobre a natureza e o

destino da fé frente às mudanças sociais de seu tempo. A partir desses

questionamentos, Fromm (1970) descreve seu entendimento sobre o significado da

fé. Para

impregna as suas experiências, que capacita o homem a enfrentar a realidade sem

Para Fromm (1970, p. 170), a fé designa um traço de caráter e não o

conteúdo de uma crença em algo. O autor fala, ainda, da fé racional e irracional:

resulta da experiência própria da pessoa, de pensamento ou sentimento, mas se

Fromm (1970) caracteriza a fé irracional pelo poder exercido sobre a

pessoa que acredita. Acerca desta submissão a outrem, ou seja, da fé irracional,

Fromm (1970) afirma que a pessoa renuncia a uma independência interior,

substituindo sua experiência particular pela experiência da autoridade. Para

exemplificar seu postulado, o autor fala do que acontece na hipnose e, também, no

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32

- ecem quando as pessoas

aderem, cegamente, a um líder.

casos de grandes cientistas, como Copérnico, Galileu, Newton, Kepler.

Nas palavras de Fromm (1970, p. 176), essa fé tem raízes na própria

experiência, na confiança em sua capacidade de pensar, observar e julgar. A fé no

Fromm (1970) fala que ter fé numa pessoa diz respeito à fé que temos em

nós mesmos e na humanidade. Para o autor, a fé na humanidade é a mesma fé que

foi expressa, em termos religiosos, no ocidente pela religião judaico-cristã e,

também, nas idéias político-sociais de seu século.

Salienta Fromm (1970) que a fé racional se baseia na experiência interior

de cada indivíduo, não é, portanto, um desejo pré-concebido. Logo, a experiência de

ter fé em algo é fruto e resultado de nossa própria observação e reflexão. O autor

afirma que a base da fé racional é a produtividade.

Fromm (1970) fala, também, que a fé racional não pode se aliar ao uso do

poder. Para ele, quando os sistemas religiosos se unem ao poder, acabam por

abandonar a fé racional, fazendo com que as religiões se corrompam e percam o

seu vigor.

O autor salienta que há uma conexão entre a fé racional e o objeto

própria experiência produtiva, nada pode ser seu objeto, que transcenda a

ex

própria experiência (uma fé ensinada religiosamente, por exemplo) não pode ser

entendida como uma fé racional.

No entendimento de Fromm (1970), algumas seitas que não

compartilhavam

salientarem a capacidade de amor e a semelhança do homem a Deus em seu

simbolismo religioso. Disse o mesmo em relação aos sistemas políticos que

pregavam a liberdade e a democracia.

Para Fromm (1

seguintes é saber se essa fé será uma fé irracional em chefes, máquinas, sucesso,

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33

ou a fé racional no homem, fundada na experiência de nossa própria atividade

omem não pode viver sem fé. Há,

relativamente, menor diferença entre a fé de um místico em Deus e a fé de um ateu

na humanidade, que a fé em um Deus, cujo poder estimula a impotência do ser

humano.

2.8 Viktor Emmil Frankl (1905 - 1997)

Viktor Frankl nasceu em Viena, em 1905. É um dos grandes expoentes do

humanismo existencialista. Criou um método chamado de Logoterapia, a

psicoterapia do sentido da vida, trata-se, portanto, da cura por intermédio do sentido.

Frankl desenvolveu este método psicoterapeutico após vivenciar a

segunda guerra mundial, na qual foi prisioneiro nos campos de concentração

nazista. Na seguinte citação, percebe-se que ele entende que a procura pelo sentido

da vida é o que, realmente, move as pessoas na procura ao atendimento

psic

de inferioridade, mas muito mais com uma sensação de falta de sentido, com um

18).

Para Frankl (1990), o sentido é um fato antropológico, pois o homem,

sempre, tem procurado um significado para sua vida, o que os animais não fazem. A

necessidade de sentido, para ele, vai muito além do que qualquer outra necessidade

e o interesse básico, capaz de motivar o ser humano a qualquer coisa, é a vontade

de sentido.

Heckerth (2004) afirma que Frankl leu a busca por sentido como

expressão de um inconsciente espiritual. Frankl acreditava que iria além de Jung,

quando, alinhando-se aos existencialistas, colocava uma carga de responsabilidade

no homem, enquanto ser livre e responsável.

A crítica de Frankl a Jung, decorre do fato de Jung considerar que a

religiosidade se liga a impulsos e instintos. No entendimento de Frankl (1990), Jung

não teria localizado, corretamente, a religiosidade inconsciente do ser humano, uma

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34

vez que não situou Deus num inconsciente pessoal e existencial, mas numa esfera

coletiva. É como se, para Jung, algo dentro da pessoa, que não ela própria, a

impelisse para Deus. Tal postura, para Frankl (1990), retira a responsabilidade que a

pessoa tem pelas suas próprias opções.

coletivo tem as menores probabilidades de abrigar a religiosidade precisamente por

que a religiã

Em sua obra A presença ignorada de Deus (1985), Frankl ultrapassa as

fronteiras do psicofísico em direção à consciência, do inconsciente espiritual e da

existência humana à pessoa profunda. Diz Xausa (1985, p. 9), no prefácio da edição

da obra de Frankl:

A logoterapia, portanto, é uma psicologia que sem perder o rigor científico, introduz a noção de transcendência na ciência do homem. Vai além da imanência rumo à transcendência, transformando-se numa mensagem libertadora do ser humano, ao libertá-lo dos determinismos tanto psicológicos, como sociais.

Nesta mesma obra, Frankl (1985) faz várias críticas à psicanálise, ao falar

do mecanicismo psicanalítico, o qual, segundo ele, havia reduzido o homem a

impulsos e instintos. À psicologia, um novo conceito de ser humano seria trazido

pela análise existencial. Esta, segundo de Frankl (1985, p. 21) se concentraria na

autonomia da existência espiritual.

análise existencial há o que Frankl (1985) chamou de consciência de algo espiritual

ou existencial. Assim, o homem existe autenticamente quando não está sendo

dirigido, ou seja, apenas quando é o responsável. A existência, somente, é autentica

Xausa (1988) explica que o homem para a logoterapia, e evidentemente

para Frankl, é uma entidade bio-psico-espiritual. É um sujeito existencial a espiritual.

Esse car

Quanto a este ponto, segundo Frankl (1985), a logoterapia está centrada

e focalizada no espiritual, o qual representa a dimensão noológica, distinta da

dimensão psicológica. Conforme Xausa (1988), esse ser espiritual não é algo feito

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35

pela cultura ou dado pela genética. É o que a pessoa de fato é. E essa dimensão do

ser humano escapa ao entendimento psíquico ou biológico aprendidos pela ciência.

Frankl (1985) diz que esse aspecto espiritual pode ser encontrado tanto

Xausa (1988) explica que, para Frankl, o inconsciente espiritual não é

único, há, também, um inconsciente instintivo. O inconsciente é entendido como algo

muito diferente das categorias racionais e intelectuais e é, justamente, deste

espectro do não racional e inconsciente, que provem a espiritualidade, tal qual uma

compreensão imediata de si mesma. (XAUSA, 1988, p. 126).

espiritual no sentido religioso e sim a vários fenômenos, como por exemplo,

inclinações e afetos que não podem derivar somente do instinto nem do psico-físico,

pertencem ao psico-

É notável na obra de Frankl a proximidade de seu modelo psicoterápico

com a religião. Entretanto, em sua obra A questão do sentido em psicoterapia, Frankl

(1990) evidencia que a função da religião é salvar a alma, enquanto a função da

psicoterapia é curá-la.

Xausa (1988) comenta que a logoterapia adota uma atitude de

neutralidade em relação à religião, salvaguardando, também, as fronteiras entre

psicologia e teologia. A autora cita que, para Frankl, a psicoterapia se move num

plano aquém da fé revelada, pois esta é uma decisão da pessoa, pertencente a uma

esfera transcendental e não ao campo científico.

Entretanto, no entender de Xausa (1988, p. 112), uma vez que a

logoterapia se interessa, especialmente, pelo sentido e este ser experimentado,

Xausa (1988) enfatiza que, para Frankl, a compreensão do sentido se dá

segundo dois aspectos: psicológicos e ontológicos. Enquanto ontológico, o

fenômeno se orienta para metas infinitas do ser finito e, assim, a ontologia ilumina a

se

psicodinâmica, mas fenomenológica, afastando-se do empirismo científico que

Page 37: Psicologia e Religião (Tcc)

36

Para Frankl (1990), é essa dimensão espiritual, presente no ser humano,

que o faz buscar um sentido para sua vida. O não encontrar uma causa ou um

sentido para viver é, a partir da perspectiva de Frankl, a maior causa das neuroses,

embora não seja a única.

2.9 Jacob Levy Moreno (1889 - 1974)

Jacob Levi Moreno (1989-1974) nasceu em Bucarest, mudando-se com

seus pais para Viena aos cinco anos de idade. Em 1925, foi para os Estados Unidos,

onde faleceu em Nova York em 1974.

No dizer de Lindqvist (1998, p. 241), o estilo pessoal de pensar de

Moreno tem profunda conotação religiosa. A religião proporcionou a Moreno a

-se em

consideração o fato de que Moreno fora criado dentro dos costumes e práticas da

religião judaica.

Bezerra (2002) comenta que, mais tarde, durante a adolescência e

juventude, Moreno participou de um grupo de jovens judeus, o qual fundou a

judeus procuravam construir caminhos libertários, retomando o misticismo

autora, era uma seita surgida dentro do judaísmo como resposta ao sofrimento e

miséria das comunidades judias radicadas na Rússia e Polônia durante o Sec. XVIII.

Linqdvist (1998) assinala uma das histórias mais emblemáticas da

infância de Moreno, a qual serviria de amostra ao que viria ser o pensamento de

Moreno em relação a Deus e suas concepções acerca da criatividade/

espo

Para o autor, há, nesta história, um simbolismo das idéias cósmicas de Moreno e,

ainda, da autointerpretação que Moreno tinha ao acreditar que mudaria os rumos da

psicologia e das instituições sociais.

Page 38: Psicologia e Religião (Tcc)

37

Embora sendo de origem judaica, Lindqvist (1998) explica que durante

sua vida, Moreno leu diferentes autores religiosos e em 1910 formulou sua idéia de

Deus. Para ele, Deus não poderia ser entendido como um criador distante, mas

como uma força ativa do universo, a qual se manifestava nos lugares onde

funcionassem a criatividade e espontaneidade.

Lindqvist (1998) explica que as idéias de Moreno, acerca de Deus, são

muito próximas às idéias de Martin Buber, do qual se recebeu a famosa teoria do

encontro. Para Buber, assim como para Moreno, o grande Tu (Deus) é quem

possibilitaria as relações humanas eu-tu, nas quais, Deus seria realmente

encontrado e contactado, e não apenas, pensado e expressado. Entretanto, há

controvérsias de que Moreno teria formulado tais teorias antes de Buber.

Em 1920, Moreno publica The words of de Father (As palavras do Pai).

Segundo Lindqvist (1998), este foi o ponto alto do pensamento religioso de Moreno.

Neste livro, segundo Lindqvist, Moreno argumenta em favor de uma visão cósmica,

na qual o homem assume uma responsabilidade por sua vida, tornando-se assim o

- dido na

obra de Moreno, é o que ele chamou de autointerpretação do homem.

Os modernos apóstolos da ausência de Deus, ao romperem com as amarras que uniam o homem a um sistema divino, a um Deus supramundano, em sua pressa entusiasmada, cortaram um pouco demais, cortaram também o próprio self do homem. Por meio do mesmo ato pelo qual emanciparam o Homem de Deus, emanciparam o homem de si mesmo. Eles dizem que Deus está morto, mas foi o homem que morreu. (MORENO, 1983, p. 8 apud LINDQVIST, 1998, p. 249).

Lidqvist (1998) cita, também, que este livro gerou muitas controvérsias,

pelas quais alguns o denominaram uma amostragem da megalomania e insanidade

de Moreno, enquanto outros o consideram a grande e principal obra do autor.

Moreno, tanto na obra As palavras do Pai quanto em muitos outros de

seus escritos, fala de Deus. Entretanto, ressalta-se que, embora falasse muito de

Deus, Moreno dissocia sua imagem do divino das imagens pré-concebidas pela

teologia. Ele queria, de acordo com Lidqvist (1988), encontrar uma nova

compreensão de Deus. Em sua obra, fica evidente a distinção feita por ele entre o

Deus do primeiro status e o Deus do segundo status.

Page 39: Psicologia e Religião (Tcc)

38

Todas as afirmações e negações de Deus, todas suas imagens giram em torno desse, o Deus segundo status, o Deus que havia recebido o reconhecimento nas questões do universo, por assim dizer. Mas há um outro status de Deus, que mesmo como símbolo tem sido negligenciado, que é o status de Deus antes do Sabbath, desde o momento da concepção, durante o processo e criação e evolução do mundo e de si próprio. (MORENO, 1985, p. 32 apud LINDQVIST, 1998, p. 245).

Na citação, acima, Moreno (1985) enfatiza o que, na sua obra, é de

fundamental importância na estruturação de uma dimensão mística do processo de

espontaneidade e criatividade. Moreno mostra que o Deus criador tem sido

esquecido, uma vez que, a religião tem evidenciado a noção de Deus como Senhor

(o Deus segundo status). Tal fato se mostra evidenciado quando ele cita a questão

ao Senhor. Isto demonstra que o reconhecimento

se confere a Deus, enquanto Senhor, poderoso, dominador e não enquanto princípio

da criatividade/ espontaneidade (Deus primeiro status) ou o Deus criador do

universo e de todas as coisas.

Segundo (Lindqvist, 1998, p. 241), a relevância da religião para o

psicodrama pode ser compreendida sob três aspectos: o primeiro refere-se à

Moreno, ao final de sua vida, já não escrevia muito sobre suas idéias

religiosas, contudo, segundo Lindvist (1988), ele tinha uma visão de que a

secularização e o materialismo eram grandes ameaças para a humanidade.

Um dos maiores dilemas do homem em nossos dias é que ele perdeu a fé num ser supremo, e, em muitas vezes, em qualquer sistema de valor como guia de conduta. Seria o universo guiado apenas pela mudança e pela espontaneidade? A resposta psicodramática á alegação de que Deus está morto é que ele pode ser facilmente trazido de volta à vida. Seguindo o exemplo de Cristo, demos e podemos dar a ele uma nova vida. [...]. (MORENO, 1975 p. 21-22 apud LINDQVIST, 1998, p. 246).

Para Moreno, segundo Lindvist (1988), o evento importante trazido pela

religião moderna (entendida por Moreno como o cristianismo) foi a substituição, se

não o abandono, do Super Deus cósmico, ilusório, por um simples homem que se

Page 40: Psicologia e Religião (Tcc)

39

chamava filho de Deus Jesus Cristo. O extraordinário nele não era a cultura ou a

magia intelectual, mas o fato da corporificação. Ou seja, Deus havia assumido um

corpo e fazia e criava como compete a um ser humano.

Todos podem retratar sua versão de Deus por meio das próprias ações, e, assim, comunicar sua própria versão aos outros. Não é mais o mestre ou o papa que corporifica Deus. A imagem de Deus pode assumir forma e corpo por intermédio de qualquer homem o epilético, o esquizofrênico, a prostituta o pobre e o rejeitado. Todos eles podem, a qualquer momento, subir ao palco, quando chegar o momento da inspiração, e dar a versão do significado do universo. Deus está sempre dentro de nós e entre nós, assim como acontece com as crianças. Em vez de descer dos céus, ele entra pelo palco. (MORENO, 1975 p. 21-22 apud LINDQVIST, 1998, p. 246).

Lindqvist (1998) afirma que, para Moreno, o processo terapêutico é,

sobretudo, uma tarefa cosmológica e, ainda, ressalta que um método terapêutico

despreocupado com as enormes implicações cósmicas, atreladas ao destino do

homem, é, certamente, um método incompleto e inadequado.

2.10 Wilhelm Reich (1897 - 1957)

Wilhelm Reich nasceu em 1887 na Áustria. Foi psiquiatra, psicólogo e

físico. Viveu em vários lugares na Alemanha, na Dinamarca, na Suécia e na

Noruega. Mas, a maior parte de sua produção científica bem como de suas mais

importantes descobertas, desenvolveu-se nos Estados Unidos a partir de 1939.

Foi nos Estados Unidos, mais precisamente em Nova York, que Reich

comprou um terr

Reich tinha a sua casa, seu escritório e seu laboratório.

Por não acatar a um decreto da Suprema Corte dos Estados Unidos, o

Page 41: Psicologia e Religião (Tcc)

40

Segundo Raknes (1988), na teoria reichiana, encontra-se um acentuado

estudo e teorização acerca do fluxo energético, isto é, da bioenergia. Esta, no

entendimento de Reich, é percebida, subjetivamente, por meio de uma sensação

prazerosa, quando em livre fluxo; e sentida desagradável, dolorosa ou

angustiantemente quando este fluxo é interrompido por algum motivo.

Raknes (1988, p. 60) afirma que Reich trabalhou na associação

conteúdos reclusos no inconsciente não se manifestavam tanto no que o paciente

dizia, mas no como ele dizia. Essa descoberta conduziu à inovação de Reich,

Reich demonstrou que os traços caracteriais levados à experiência consciente do paciente, eram passíveis de mudança. Demonstrou também como diferentes características associam-se e formam uma estrutura caracterial que tem também a função de evitar impressões e emoções indesejadas e que, além disso, pode ser chamada couraça caracterial. (RAKNES, 1988, p. 60-61).

Raknes (1988) explica que, em posse deste entendimento, Reich

procurava analisar a estrutura caracterológica a fim de tornar consciente o problema

que impedia o fluxo energético nessa couraça. E, uma vez a desbloqueando, tornar

possível uma mudança na própria estrutura do caráter.

No que tange às suas origens religiosas, segundo Raknes (1988), embora

de origem judaica, Reich não recebeu nenhuma formação desta origem nem de

outro credo religioso. Não aderiu, também, a nenhum sistema religioso de crenças.

Reich estudou o antigo e o novo testamento, apenas, por interesse científico e intuito

de adquirir conhecimento sobre a história das religiões.

Raknes (1988, p.101-102) comenta que, na obra Ether, Deus e o Diabo,

Reich enfatiza q

Entretanto, assegura o autor, Reich entendeu que tais impulsos não eram

gerados, na verdade, por forças demoníacas e, sim, pela própria frustração dos

impulsos primários naturais, como o amor sexual, o desejo de conhecimento e

independência, os quais são considerados nocivos pelas religiões.

Page 42: Psicologia e Religião (Tcc)

41

Assim, a religião, em vez de ser o que era originariamente uma expressão das correntes orgônicas e do contato orgônico com os seres humanos e com os animais, com toda a natureza e com o cosmos , tornou-se um meio para reprimir o livre metabolismo da energia e para perverter os impulsos naturais primários em secundários, inimigos da vida. (RAKNES, 1988, p. 102).

Para Reich, segundo o entendimento de Raknes (1988), ao reprimir os

impulsos primários, sobretudo o amor sexual, a religião reprimia, em maior ou menor

escala, as próprias bases biológicas da experiência religiosa.

Apesar da crítica à repressão da sexualidade, tão própria de muitas

religiões, Reich não empreendeu grandes estudos acerca da natureza da

experiência mística ou dos processos nela imbricados.

2.11 Alexander Lowen

O neo-reichiano, Alexander Lowen, criou a análise bioenergética que, no

seu dizer, trata-se de uma abordagem que integra pontos de vista orientais e

ocidentais, visando entender tensões que constrangem o corpo, ao mesmo tempo

em que mobiliza as energias do corpo para eliminar tais tensões. Afirma Lowen

Lowen procura entender a saúde, acrescentando a ela, o conceito de

espiritualidade. Contudo, o autor considera que, primeiramente, deve-se mudar o

conceito de saúde, transformando-o em uma definição positiva, a qual leve em

consideração os sentimentos que habitam o ser humano, os movimentos

espontâneos e a profunda ligação a outros organismos e à natureza.

Para Lowen (2001, p. 15), é a partir deste senso de união com uma força

seres humanos são criaturas espirituais, também teremos de admitir que a saúde

Page 43: Psicologia e Religião (Tcc)

42

Lowen (2001) entende que a perda da ligação com os outros, com os

animais e com a natureza é responsável por várias perturbações mentais. E, em

consonância com a perda de sintonia exterior, há, também, a perda das ligações

do corpo, a uma atenuação do espírito vital, a um decréscimo em seu nível

untas, elas formam

a saúde integral da pessoa. O autor acentua a manifestação do espírito na vibração

e graciosidade do corpo:

A saúde mental reflete objetivamente na vitalidade do corpo, a qual se manifesta no brilho dos olhos, na coloração e no calor da pele, na espontaneidade da expressão, na vibração do corpo e na graciosidade dos movimentos. Os olhos têm especial importância, porque são o espelho da alma. Neles pode ser vista a vida do espírito. (LOWEN, 2001, p.16).

Lowen (2001) considera que não há na medicina ocidental algo que se

ocupe com o todo, com a inteireza do ser. A medicina estaria negando, assim, a

unidade básica ou a totalidade do indivíduo. Para ele, esta idéia é fruto da

dissociação entre espírito e corpo. O espírito foi limitado à mente.

No entendimento de Lowen, a ruptura, apenas, poderá ser superada ao

que o corpo é imbuído de um espírito que é ativado por sua psique e ciente de suas

2001 p. 34).

Para Lowen (2001), de modo geral, a medicina ocidental procura curar a

doença e não conservar a saúde, tal como ocorre na medicina oriental. O autor

enfatiza que os tratamentos a doenças se fixam, exclusivamente, ou na dimensão

psíquica, desconsiderando o corpo ou na dimensão física, desprestigiando o espírito.

Para ele, quando a meta de um tratamento é algo específico, localizado, geralmente,

a medicina encontra soluções.

Entretanto, segundo Lowen (2001, p. 17), esta prática não alcança,

totalmente, a saúde da pessoa e nem atua sobre as causas obscuras do problema,

Lowen (2001) afirma que somos moldados por nossas experiências de

vida e que traumas emocionais, de acordo com a profundidade e intensidade dos

Page 44: Psicologia e Religião (Tcc)

43

sentimentos, são, geralmente, expressos por meio de respostas corporais. Toda a

experiência vivida por uma pessoa afeta o seu corpo e é registrada na sua mente.

Embora a psiquê, entendida como conceito vitalístico, tenha sido relegada

à metafísica, foi justamente por meio da psicologia, e mais especificamente por meio

da psicanálise, que se abriu caminho para a compreensão do espírito enquanto

fenômeno energético. Segundo a ótica freudiana, este caminho é inerente à

descoberta da sexualidade, a partir do entendimento de que a histeria é o respaldo

físico de um conflito psíquico. Depois desta descoberta, fizeram-se, ainda, outras

considerações acerca de algumas doenças mentais com respaldo corporal.

No que diz respeito à questão da sexualidade, no entender de Lowen

(2001), esta deve ser vista como integrante do corpo todo. Para ele, o ser humano é

uma criatura sexualmente diferenciada em todas as células do seu corpo. O mesmo

acontece com a espiritualidade, a qual constitui uma função do corpo todo.

sexualidade transforma-se numa abstração, e a sexualidade dissociada da

Para Lowen (2001), quando nosso espírito se entrega, plenamente, a uma

ação, esta se torna espiritual em virtude da transcendência do eu. A qual pode ser

mesma espécie de arrebatamento ocorrida no ato sexual acontece também na união

Tanto no orgasmo como na experiência mística há um senso de comunhão com as forças superiores do universo. Todavia enquanto a experiência mística é tranqüila e suave, a experiência orgástica assemelha-se a um terremoto. [...] Na experiência mística a pessoa abandona o seu eu; no orgasmo, o eu é tragado por um dilúvio de energia e sentimento. (LOWEN, 2001, p. 105).

Lowen (2001) fala, também, que a transcendência pode ser alcançada por

atos de natureza não sexual ou mística. Isto acontece quando, por exemplo, o ser é

tocado de grande compaixão mediante algum fato marcante. Assim, ele não mais

acredita ter um espírito e, sim, ser possuído por este.

Page 45: Psicologia e Religião (Tcc)

44

Na mesma perspectiva, para Lowen (2001), os atos criativos, oriundos da

inspiração e paixão, também, são entendidos como uma experiência de

transcendência. Nela, o artista renuncia ao seu ego e se funde a sua obra de arte.

Ao falar da questão da fé, Lowen (2001) faz uma distinção entre a fé,

enquanto sistema de crenças e enquanto postura corporal. Conforme explica o

autor, não é a crença ou o conteúdo do sistema de crenças de uma pessoa o

responsável pela cura, mas a própria natureza da fé ou a estimulação do espírito em

resposta à crença.

Lowen (2001) fala que as curas espirituais não são frutos de uma força

externa. Nem mesmo as curas praticadas pela medicina são, de fato, garantidas

pelas técnicas ou medicamentos. Para ele, trata-se de frutos de uma postura da

própria pessoa. Ele entende que a fé atua interiormente, embora possa ser evocada

como experiência de amor.

Para Lowen (2001), se a fé não estiver dentro dessa dimensão de uma

abertura para a vida, como uma resposta corporal a ela, certamente, não será algo

positivo para a pessoa, nem lhe alcançará as curas que, muitas vezes, busca-se no

âmbito religioso.

2.12 Stanislav Grof (1931)

Stanislav Grof nasceu em Praga no ano de1931. É médico psiquiatra, com

formação psicanalítica. De acordo com Grof e Grof (2001), uma profunda

experiência em uma sessão psicodélica, realizada para fins de treinamento, atraiu a

atenção de Grof para estados de consciência incomuns, os estados alterados da

consciência.

A partir desta experiência e de muitas outras que se seguiram, em

diferentes formas, Grof se convenceu de que a compreensão clássica da psique

humana não poderia explicar os fenômenos que observava.

que até então eram considerados como doença mental, ele passou a ver como

Page 46: Psicologia e Religião (Tcc)

45

então, a exploração do potencial terapêutico destes estados e os desafios teóricos

inerentes a tais experimentos.

Acerca disto Grof e Grof (2001, p. 24) cita:

A visão de mundo criada pela ciência ocidental tradicional, e que dominou a nossa cultura, é, em sua forma mais religiosa, incompatível com toda noção de espiritualidade. Num universo em que somente o palpável, o material e o mensurável são reais, todas as modalidades de atividades religiosas e místicas são consideradas reflexos de ignorância, da superstição e da irracionalidade ou imaturidade emocional. Por conseguinte, interpretam-se as experiências diretas de realidades espirituais como episódios psicóticos manifestações de doença mental.

Di Biase e Rocha (2005, p. 74) comentam que, também, pertence à Grof a

Terapia da Respiração Holotrópica, a qual é um modelo de psicoterapia realizado a

partir de: hiperventilação (respiração acelerada e profunda), música evocativa,

trabalho corporal, troca de experiências em grupo e desenhos de mandala,

realizados em locais apropriados.

Grof e Grof (2001) explicam que, desde que Jung introduziu o conceito de

inconsciente coletivo na psicologia, muitas experiências que, até então,

encontravam-se sem explicação, aproximaram-se de um maior entendimento. Por

meio destas interpretações, também deu-se nova explicação às experiências

místicas vivenciadas pelas tradicionais religiões ocidentais e orientais. Logo, ficava

evidente que se fazia necessário um novo modelo de psique.

Segundo Grof e Grof (2001), entender a consciência de forma tão

ampliada, nos faz pensar que os conteúdos das experiências que ocorrem, quando

esta se amplia, não são causais ou arbitrários. Para Grof e Grof (2001, p. 27) trata-

o entendimento de Grof, pode ser, na verdade, curativa e transformadora, desde que

ocorra nas circunstâncias corretas.

Grof, assim como Wilber, criou um mapa interior da emergência espiritual,

ao qual, geralmente, confere-se o nome de cartografia da consciência. Embora o

espectro da experiência espiritual seja muito rico, Grof e Grof (2001) observou que o

conteúdo de experiências espirituais pode ser incluído em três categorias: o primeiro

grupo envolve experiências da história de vida, trata-se, portanto, do biográfico; o

Page 47: Psicologia e Religião (Tcc)

46

segundo grupo está ligado à questão da morte e renascimento, por vincular-se ao

trauma do nascimento, chamou-se de perinatal; o último grupo, próximo ao

inconsciente coletivo de Jung, por ir além dos limites da experiência humana,

denominou-se transpessoal.

d

expansão da consciência o senso de identidade do indivíduo se expande, para ale

Grof e Grof (2001, p. 33-34) descrevem, ainda, algumas formas, as quais

se tratam de variedades da emergência espiritual, consideradas como expansão

espacial da consciência:

1. A crise xamânica;

2. O despertar da Kundalini;

3.

4. Renovação psicológica por meio do retorno ao centro

5. A crise de abertura psíquica;

6. Experiências com vidas passadas;

7. Comunicações com espíritos-

8. Experiências de proximidade da morte;

9. Experiências de contratos próximos com OVNIS;

10. Estados de possessão.

2.13 Ken Wilber (1949)

Ken Wilber nasceu em 1949 no Nebraska, Estados Unidos. Wilber é autor

de, aproximadamente, quinze livros e inúmeros artigos. Di Biase e Rocha (2005, p.

Page 48: Psicologia e Religião (Tcc)

47

integ

ser considerado a principal teorização no campo da psicologia transpessoal.

Segundo Tabone (1999), Wilber considera que cada escola de psicologia

ou psicoterapia, assim como também as religiões, está focada em determinado nível

de consciência. Para cada um destes níveis, podem ser aplicadas diferentes

abordagens.

Por considerar que as teorias do psiquismo são complementares,

tratando-se de enfoques válidos quando associados ao seu nível de consciência, o

trabalho de Wilber pode ser considerado uma tentativa de integração dos

conhecimentos. Isto explica, no entendimento de Tabone (1999), porque Wilber

valoriza as várias teorias. Acrescente-se a isto, também, a consideração que Wilber

demonstra aos líderes espirituais, principalmente, aos orientais.

Na obra O espectro da consciência, Wilber (1999) compara a consciência

a um espectro eletromagnético. Tabone (1999) diz que, no espectro da consciência,

desenvolvido por Wilber, cada um dos níveis surge de um dualismo repressão /

projeção o qual restringe o self, conferindo, ao indivíduo, um senso de identidade.

Cada nível apresenta determinadas patologias, consideradas uma espécie de

alienação. Além disso, há, também, em cada um dos níveis, pontos positivos,

virtudes, potencial para crescimento, etc.

Di Biase e Rocha (2005) afirmam que a cartografia da consciência de

Wilber contém três níveis básicos, os quais, por sua vez, são subdivididos em faixas.

Este espectro da consciência se inicia na fragmentação da consciência, chamado de

consciência cósmica pelas tradições religiosas. Os três níveis são: mente,

existencial e ego.

Wilber resume o espectro da consciência da seguinte forma:

De maneira simplista podemos encarar tudo isso assim: a energia mobilizada no nível da mente é pura, sem forma (isto é, vazia), atemporal,

desintegrar, assumindo imagens e formas dualísticas. Consequentemente, cada nível se caracteriza pela natureza da desintegração dualística que nela ocorre. Assim sendo, no nível existencial, a energia desintegrou-se e fragmentou-

o os adornos e coloridos daquele nível, ao passo que no nível do ego ela se desintegrou ainda mais em energia corpórea versus energia psíquica. O nível da sombra

Page 49: Psicologia e Religião (Tcc)

48

representa simplesmente uma continuação da desintegração, onde a própria energia psíquica se cinde e fragmenta. (WILBER, 1999, p. 153).

acontece durante toda a evolução da consciência. Assim sendo, uma vez alcançado,

o nível superior engloba o nível inferior.

Os níveis indicados por Wilber (1999) se subdividem em: domínios

inferiores, níveis intermediários e reinos superiores. O autor explica que os níveis

instintos, sensações e percepções

simples e impulsos emocionais-

Wilber (1999) considera que, logo no primeiro estágio, existe certo

processo de transcendência, o qual pode provir da diferenciação inicial do bebê com

a mãe e, também, nas fases do desenvolvimento. Porém, tal transcendência mostra-

se, ainda, limitada ao nível do ego.

Tabone (1999) explica que no nível do ego, o homem reintegrou a psique,

porém, está alienada de seu corpo e, por isto, ambiente e corpo são vistos como

ameaça à existência.

O nível existencial, explicam Di Biase e Rocha (2005), é um movimento

da mente cósmica rumo à diversificação. Neste nível, o homem é identificado com

seu organismo, criando uma identidade pessoal e se fragmentando ao não

identificar-se com o cosmo.

Tabone (1999) considera que, embora psique e soma estejam integradas

a

totalidade.

No nível da mente, há um encontro com a consciência universal, o qual,

enquanto Deus, Yavé, Braman, etc.

entendimento da autora, é fruto de uma busca pela verdadeira identidade da

consciência não dividida.

Page 50: Psicologia e Religião (Tcc)

49

A partir deste modelo de desenvolvimento da consciência, e no que se

-se entender que,

é encarada como positiva, inclusive como propiciadora de

unidade e plenitude para a pessoa. O que, logicamente é, em última instância, o

objetivo de qualquer pessoa que procura a ajuda da psicologia.

Na obra O projeto Atman, Wilber (1999) fala de sua visão transpessoal do

desenvolvimento humano. Ele explica toda a estruturação dos ciclos de vida, desde

estruturas pré-pessoais até estruturas transpessoais. Estes aspectos incluem, ainda,

o estágio ego-corpo; pré-verbal, ego persona; normalidade, ego maduro e estágio

transverbal.

Segundo Wilber (1999), no estágio do ego, compreendido entre a idade

personae, tende a

diferenciar-se delas, a desidentificar-se delas, a trancendê-las. Tende, assim, a

integrar todas as suas possíveis personae no ego maduro e começa então a

diferenciar-se do ego ou desidentificar-se dele, para descobrir, pela transformação,

centauro.

O centauro, segundo

atinge a estabilidade do nível centauro, os elementos da personalidade bruta, o

corpo, o ego, a personae, a sombra e os chacras inferiores tendem a entrar em

harmonia espontaneamente. Pois, a pessoa está começando a transcendê-los e,

assim, deixa de manipulá-los e explorá-los compulsivamente. O centauro existencial,

entretanto, é, também, uma transição para as esferas superiores, sutis, tranpessoais

do ser, atingindo uma esfera superior de transcedência e integração.

Wilber (2001) lança, também, alguns questionamentos sobre a existência

de estágios para o desenvolvimento espiritual. O autor faz algumas colocações

acerca da relação entre o desenvolvimento psicológico e o desenvolvimento da

espiritualidade. Também, questiona se é necessário que uma pessoa tenha de

completar o desenvolvimento psicológico antes do acontecimento de um genuíno

desenvolvimento espiritual.

Page 51: Psicologia e Religião (Tcc)

51

3 A INFLUÊNCIA DA EXPERIÊNCIA RELIGIOSA NA CONSTITUIÇÃO DO

PSIQUISMO E DO COMPORTAMENTO HUMANO

Quais seriam as influências da experiência religiosa sobre o psiquismo

humano? De que forma essa experiência atua sobre o comportamento das pessoas?

Subjetiva e comportamentalmente, de que maneira as pessoas reagem às

experiências religiosas ao longo do curso de sua vida?

Conforme explanado, no capítulo anterior, os olhares dos grandes autores

da psicologia sobre a experiência religiosa são muito diferentes. Tanto no que se

refere à natureza do fenômeno em si, quanto ao grau de importância dado a este,

somente, nas breves linhas, expostas anteriormente, há uma imensa gama de

postulados, os quais, por si só, já renderiam muitas outras considerações.

Até mesmo as escolas psicológicas, as quais se desenvolveram a partir

das teorizações dos autores estudados, têm dado, à experiência religiosa, graus de

importância muito díspares, divergentes, inclusive, da relevância dada, ao fenômeno

religioso, por seus fundadores.

Dentro desta conceitualização múltipla, de como se dá e de que forma

pode-se compreender o fenômeno religioso, sob o ponto de vista da psicologia,

nasce a chamada Psicologia da Religião.

Como ponto de partida, há de se entender que não há, dentro da

Psicologia da Religião, um consenso no que tange aos processos de investigação da

experiência. Mesmo porque, as escolas psicológicas partem de diferentes visões de

homem e de mundo. Talvez, por isto, até mesmo as definições do que se entende

por psicologia da religião são bastante diversas.

Tomando a definição de Ancona-Lopez (2002, p. 79), pode-se entender a

Já Aletti (2004, p. 20) define a psicolo

(2004, p. 299) ao afirmar que a competência da psicologia frente ao fenômeno

domínio que

Como se pode perceber, as definições, acima, refletem olhares diversos

Page 52: Psicologia e Religião (Tcc)

52

dos partem de escolas

psicológicas diferentes, a saber, respectivamente, o existencialismo/ humanista e a

psicanálise.

Dentro da Psicologia da Religião, há escolas que fixam seus estudos na

dimensão mais social do fenômeno (ritualismos e aspectos normativos),

desenvolvendo, portanto, suas pesquisas. Há outras que se debruçam sobre os

aspectos psicológicos da experiência, como citado anteriormente por Aletti (2004).

Não obstante, os diferentes enfoques dados à experiência religiosa, pelas

escolas psicológicas, podem sofrer possíveis reducionismos entre os campos de

conhecimento da psicologia e os da religião. Ancona-Lopez (2002) afirma que um

dos desafios metodológicos na construção dos conhecimentos da chamada

to às especificidades de cada uma

destas áreas, seja da psicologia ou das tradições religiosas.

Segundo o entendimento de Ancona-Lopez (2002, p. 79), há dois

possíveis reducionismos no tocante ao estudo dos fenômenos religiosos. Um destes

reducionismos ac

para explicá-

religião à psicologia, conforme afirma a autora.

Neste caso, comenta Ancona-Lopez (2002), os fenômenos religiosos são,

geralmente, considerados semelhantes a qualquer outra expressão de processo

humano. Não há referência à própria cultura religiosa imbrincada, nem mesmo

desacredita-se dos significados desta.

Ancona-Lopez (2002), comenta ainda, que tal compreensão exclui a

transcendência, pelo princípio de que afirmar ou negar a existência do objeto

religioso não é intento da psicologia da religião.

Um segundo reducionismo, apontado por Ancona-Lopez (2002, p. 79), é o

fato contrário, quando o investigador submete as explicações psicológicas à

compreensão religiosa. Pautando sua prática sob esta perspectiva, o pesquisador

os fenômenos e experiências em termos de valores decorrentes d

refere às posições extremadas frente ao fenômeno religioso, Ancona-Lopez (2002)

propõe uma visão interdisciplinar que construa pontes entre os diversos saberes,

Page 53: Psicologia e Religião (Tcc)

53

sem, no entanto, negar as diferenças existentes.

Nesta perspectiva, Valle (2005) considera uma ilusão da psicologia,

acreditar que tem todas as chaves de leitura para a compreensão do fenômeno

religioso, querendo reduzi-lo a uma dinâmica puramente psicológica.

No entendime

complementaridade não impede de se procurar levar ao limite o ponto de vista de

que as disciplinas não percam o contato umas com outras, mesmo porque, cada

uma delas não é capaz de abarcar o inteiro campo de investigação e trabalham,

Na visão de Franco Filho (2004), abordar a experiência religiosa é um

grande desafio, principalmente, por dois motivos: a abordagem do fenômeno, ao

-se,

no enquadramento do fenômeno como uma experiência

normal ou patológica. Para este autor, a psicologia, ao abordar a questão do

fenômeno religioso, deve ter por meta procurar os elementos psicodinâmicos

fomentadores dessa experiência.

Neste segmento, para Heckert (2004, p. 336), não compete à psicologia a

e aos estágios da fé.

Alves (1996) destaca, ainda, outro elemento do estudo e do trato da

experiência religiosa, o qual diz respeito ao envolvimento pessoal de quem estuda o

fenômeno religioso. O autor afirma que ao lidar-se com a experiência religiosa, está-

se lidando com algo que, em suma, não é alheio ao ser. Para o autor, quando se fala

sobre a questão, está-se lidando consigo próprio:

É fácil identificar, isolar e estudar a religião como o comportamento exótico de grupos sociais restritos e distantes. Mas é necessário reconhecê-la como presença invisível, sutil, disfarçada, que se constitui num dos fios com que se tece o acontecer do nosso cotidiano. A religião está mais próxima de nossa experiência pessoal do que desejamos admitir. O estudo da religião, portanto, longe de ser uma janela que se abre apenas para panoramas externos, é como um espelho em que nos vemos. Aqui a ciência da religião é também ciência de nós mesmos: sapiência, conhecimento saboroso. (ALVES, 1996, p. 9 -10).

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54

Dalgalarondo (2008 p. 19) corrobora o pensamento de Alves (1996),

3.1 Conceituação de Alguns Elementos da Experiência Religiosa

Feitas algumas considerações gerais sobre a diversidade de

entendimentos frente à experiência religiosa, faz-se necessária, uma breve

explanação e distinção de termos, os quais, embora estejam co-relacionados à

questão religiosa de forma geral, têm significados levemente distintos. Em seguida,

serão conferidos breves conceitos dos termos: religião, experiência religiosa e

espiritualidade, partindo do campo de investigação psicológica.

3.1.1 Religião

Segundo Jaspard (2004), definir o termo religião é um trabalho árduo e,

frequentemente, passível de críticas. Ao reportar-

encontram-se, em sua gênese, dois verbos latinos: religare e religere. Ambos

significam, respectivamente, religar e recolher ou juntar. Logo, a religião, para este

autor, estaria relacionada com as formas pelas quais a pessoa se re-conecta, une-se

ao compreendido pelas religiões como o sagrado, o divino.

Nesta perspectiva, Heckert (2004) entende a religião como ponte que se

propõe a ligar o homem ao sagrado, a partir da sistematização da fé, a qual,

segundo o autor, anima as pessoas particularmente, e, também, os grupos.

Koenig (2001 apud Peres, Simão e Nasello, 2007) define a religião

enquanto sistema organizado de crenças, métodos, cerimônias e insígnias

projetadas para ajudar a proximidade do sujeito com o sagrado e/ou transcendente.

-

relacionadas à Deus ou deuses; em segundo lugar, sentimentos, afetos e emoções

Page 55: Psicologia e Religião (Tcc)

55

Amatuzzi (2000) apresenta, ainda, outro ponto na afirmação de que a

religião, assim como diversas formas de espiritualidade e vivências filosóficas, tem

um caráter de re-ligação com um sentido último, ou seja, a religião é o que situa a

pessoa no todo, e orienta a sua vida.

No parecer de Dalgalarondo (2008), a religião é fruto da experiência

religiosa. Segundo o autor, não há como pensar na religião sem tocar no material

que a tece, ou seja, na experiência humana e seus limites.

3.1.2 Experiência Religiosa

Para explanar o significado de experiência religiosa, o teólogo Leonardo

salienta que esta é a ciência ou o conhecimento que o ser humano adquire quando

sai de si e se põe a compreender o objeto por todos os lados.

mais presente dentro de quem o quer conhecer, na medida em que ele se abre mais

Para Boff (2002, p. 42),

neste encontro, entre a consciência e o objeto, que se estrutura a experiência, não,

porém, sem que haja modificações em ambos. Assim sendo, no entender de Boff, a

experiência é um processo criativo.

Amatuzzi (1998) corrobora com o entendimento de Boff, ao afirmar que o

termo experiência é definido como conhecimento obtido na prática, no trato concreto

com objetos particulares, estabelecendo uma relação com o objeto, na qual é gerada

a consciência do contato e a consciência de significados contidos implicitamente.

Entende-se, portanto, a partir do pensamento deste autor, que a

experiência não é, somente, o contato com um objeto, mas a própria consciência

gerada no contato com este. Quanto à experiência religiosa, especificamente,

Page 56: Psicologia e Religião (Tcc)

56

Amatuzzi (1998, p. 53) a define da seguinte maneira:

O termo experiência religiosa se refere, pois, ao aspecto imediato, autêntico, do conhecimento religioso, enquanto consciência do contato, de significações potenciais, e não a elaborações intelectuais consideradas enquanto isoladas em um contato de realidade básico.

Valle (1998), em seu livro Psicologia e experiência religiosa, utiliza-se de

um te

trata a experiência religiosa. Valle (1998) explica que a tradução literal deste termo

apresentando um sentido perceptível a quem o vivencia.

Veríssimo (2004) acrescenta outro elemento para explicar a experiência

religiosa, o entendimento desta como uma conexão com o coletivo. Assim, o autor

interpreta a experiência religiosa como um movimento do indivíduo para dentro e

para fora de si.

-

(2004, p. 189) diz que, na experiência, faz-se uma introspecção profunda, a qual

permita ao indivíduo auscultar o seu clamor mais íntimo. No tocante à experiência

- -se que, ultrapassando as medidas do instante

presente, ao se religar com símbolos, mitos e rituais próprios da condição humana, a

as

situações e modos típicos da existência e sua personalidade individual, uma síntese

3.1.3 Espiritualidade

Segundo Zilles (2004), existem muitos conceitos para o termo

espiritualidade. Entretanto, para a grande maioria das pessoas, trata-se de ponto

que, ainda, gera inúmeras indagações, por ser um conceito vago, provindo de sua

Nesta perspectiva, Paiva (2004, p. 119) considera que o termo

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57

espiritualidade contém uma grande riqueza, mas também uma grande ambigüidade,

-se como sutil, insinuante, portador de

liberdade, mas, como o vento, sopra onde quer e muitas vezes não se sabe de onde

Para os filósofos, segundo Zilles (2004), o termo está relacionado a

uma qualidade, algo que supera uma entidade material. Para os teólogos, pelo

menos os judaico-cristãos, a espiritualidade pode estar relacionada à mística,

sínteses doutrinais, demandas religiosas, identidades congregacionais e, ainda,

referendada no que diz a própria revelação, contida na bíblia.

Segundo Zilles (2004, p. 13), quando a bíblia fala do espírito do

-se não a uma parte do homem, mas ao todo em sua relação

com Deus. Desta maneira, a espiritualidade não é a exclusão da materialidade, mas

a relação do homem todo corpo e alma

Pessini (2004, p. 60), embora concorde que o termo se refere a uma

relação total do homem com Deus, diz que se deve distingui-la de concepções

doutrinais ou ritualismos religiosos. Para o autor, enquanto a religião transforma a

experiência de Deus, dando-

espiritualidade se orienta pela experiência do encontro vivo com Deus. Esse

encontro sempre novo e inspirador, é vivido como gerador de sentido, entusiasmo de

Há, ainda, uma diferenciação clássica, usualmente, utilizada para se

separar, radicalmente, o significado de espiritualidade de crença ou experiência

religiosa, sendo uma experiência que não prescinde de uma conexão com o

sagrado. Segundo Paiva (2004), nesse caso, configura-se o distanciamento entre o

pessoal e o institucional, como uma oposição entre espiritualidade e religião e a

recusa de um Deus entendido como sagrado, divino mediante um Deus pessoal.

Paiva (2004, p. 123) comenta algumas das formas de espiritualidade que

, entre as quais se podem citar:

ioga, meditação transcendente, práticas zen, cultos afros, druidismo, religião do

vegetal, xamanismos, entidades tectônicas; pelos quais, segundo o autor, buscam-

se caminhos de reintegração entre a pessoa e o mundo.

Para Camon-Angerami (2004), é importante ter, claramente, que

espiritualidade não é a busca de um ser superior ou, até mesmo, de alguma verdade

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58

absoluta que esteja regendo nossa vida. Embora a experiência religiosa possa ser

entendida como uma forma de espiritualidade, não prescinde de uma crença

religiosa ou de uma ligação com o sagrado.

Assim sendo, ainda que não se ligue a uma imagem codificada de Deus,

a espiritualidade é uma busca particular, a partir de uma experiência pessoal, por

meio da qual a pessoa vivência um significado de vida. Segundo Camon-Angerami

(2004, p. 227), a espiritualidade são todas as manifestações humanas que buscam a

superação de si, a superação de obstáculos que possam estar agrilhoando a própria

vida.

3.2 A Compreensão da experiência religiosa segundo escolas psicológicas

atuais

Vê-se, ainda, na atualidade, muita resistência à experiência religiosa,

sobretudo, por parte de escolas tradicionais da psicologia, as quais, calcadas na dita

ciência cartesiana e positivista, não consideram que há, no humano, uma dimensão

ulterior ao próprio psiquismo, capaz de transcender os limites biológicos da própria

mente. Para tais escolas, certamente, o psiquismo está restrito às transmissões

sinápticas.

vicção moderna que

sustenta a primazia do físico sobre o espiritual nos coloca, em última instância ante

uma psicologia sem alma, onde o psíquico não pode ser senão um efeito

Há, também, outras escolas, dentro da psicologia, que observam a

dimensão religiosa como produto exclusivo de uma dimensão social, sendo,

portanto, um construto social e não algo natural e imanente da subjetividade

experiência que nasce da psique humana, sendo por causa disso um fenômeno

Serão apresentadas, a seguir, considerações acerca das quatro grandes

forças da psicologia (Psicologia Cognitivo Comportamental, Psicanálise, Psicologia

Humanista e Psicologia Transpessoal), no que se refere ao entendimento da

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59

experiência religiosa na atualidade.

3.2.1 Perspectiva Cognitivo - Comportamental

No entendimento de Fraas (1997), o behaviorismo não tem interesse pela

religiosidade, como ocorre, também, em relação a outros processos interiores,

inerentes ao ser humano, permanecendo, assim, fora da esfera de pesquisa

possível. Segundo o autor, a contribuição que o behaviorismo concede ao

questionamento psicológico religioso está na medida em que consegue explicar, pela

teoria do reforço, porque determinados comportamentos são adotados por um

indivíduo e por outros não, ou ainda, por quais motivos determinados

comportamentos são extintos.

Entretanto, para Fraas (1997), ainda que os processos de reforço tenham

uma efetiva importância na formação da disposição de comportamentos religiosos

(costumes, exemplos, modelos), o conteúdo específico do comportamento religioso

permanece intacto.

Segundo Toledo Filho (2008), a psicologia comportamental, organizada

por W atson, tinha como proposta, estudar o comportamento que pudesse ser

observável, previsível e qualificável. Tal postura restringia, evidentemente, o estudo

da religiosidade com suas vivências e sentimentos inerentes.

Os estudos empreendidos, pela psicologia experimental, segundo Toledo

Filho (2008), levavam, sempre, em consideração o comportamento suscetível a

observação e o levantamento de estatísticas, os quais, na verdade, não agregavam

novidades ao estudo da experiência religiosa.

Como visto, anteriormente, Skinner, grande pensador do behaviorismo,

também teceu algumas considerações sobre a religião e a influencia desta sobre as

pessoas. Suas considerações descreviam a religião como uma agência de controle

social, e a experiência religiosa, segundo o padrão de estímulo-resposta.

No entender de Capovilla (2004), o modelo de psicologia, adotado por

Skinner, é um modelo determinista e ambiental, o qual retira a responsabilidade das

pessoas por tudo que lhes acontece e, também, pela busca de cura para as suas

mazelas. Conforme o autor, esse determinismo é levado até as últimas

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60

conseqüências na obra Além da liberdade e da dignidade, na qual Skinner atribui o

comportamento humano a uma pura determinação ambiental.

Segundo Capovilla (2004), o modelo da psicologia de Skinner se

aproxima a um modelo médico crente de que as pessoas não são responsáveis nem

pelo problema, nem pela solução deste. E, ainda, que tudo de que precisam é,

simplesmente, tratamento. Como a maioria destes problemas envolve o

comportamento, ou é produzida por maus hábitos, fazem-se necessários alguns

reforços que extingam ou punam tais comportamentos inadequados.

Na atualidade, segundo Paiva (2007), os estudos dentro da psicologia

cognitiva se dividem em quatro sentidos principais. O primeiro deles seria o estudo

dos processos mentais de representação e memória, algo que, no entendimento de

Paiva, provém da Psicologia da Gestalt e surge como uma alternativa ao

behaviorismo. Paiva (2007, p. 183) afirma que, neste sentido,

pesquisas sobre atribuição de causalidade a Deus, enfrentamento religioso,

processos de conversão, transformação de identidade religiosa, tendência ao

O segundo sentido, apontado por Paiva (2007), dentro do modelo

cognitivo na atualidade, seria a Terapia Cognitivo Comportamental, de cunho

behaviorista, método este, que procura entender os processos mentais conscientes,

mediados por estímulos repostas, conforme já pontuado, acima, por Capovilla

(2004).

O terceiro sentido se refere ao estudo da inteligência, conforme um

modelo computacional, no qual, segundo Paiva (2007), pode-se enquadrar o estudo

da inteligência artificial.

O quarto segmento de estudos dentro da linha cognitiva, diz respeito à

neurofisiologia da cognição. De acordo com Paiva (2007, p. 184), as condições

neurofisiológicas (pré- são principalmente cerebrais, mas podem incluir

outros sistemas orgânicos; nesse sentido encaixa-

igência na

condições pré-psíquicas que tornaram possível filogeneticamente e

o

Page 61: Psicologia e Religião (Tcc)

61

Segundo Paiva (2007), a Psicologia evolucionista entende que a cognição

se desenvolveu como os órgãos do corpo humano, por via da seleção natural. A

partir desta concepção, a psicologia evolucionista compreende os processos

cognitivos como funções de sobrevivência e reprodução. Paiva (2007, p.185)

enfatiza que tais processos cognitivos não dizem respeito, apenas, à questão de

O autor explica que este é um campo bastante novo, aparecendo na

esfera científica em meados da década de 1990. Entre os principais pesquisadores,

Paiva (2007, p.185) cita Pascal Boyer, para quem

propriedades dos conceitos e as orientações religiosas são subprodutos de sistemas

Paiva (2007, p. 185) atenta, ainda, para o fato de a Psicologia evolutiva,

proposta a entender o sistema neuro-cognitivo, não excluir a cultura como agente

capacitação psicológica, a qual, segundo pesquisadores da área, tem estrutura

neurológica.

3.2.2 Perspectiva Psicanalítica

Certamente, a perspectiva psicológica que deu um enfoque mais negativo

à religião e a experiência religiosa foi a psicanálise. Entretanto, tem se evidenciado,

depois das prerrogativas freudianas, inúmeras contribuições, mui diversas das

postuladas pelo fundador da psicanálise frente ao fenômeno universal da busca do

transcendente. Partindo deste pressuposto, será observado o viés psicanalítico, no

que diz respeito ao seu entendimento da experiência religiosa.

As posições do pai da psicanálise, Sigmund Freud, no tocante à religião e

às questões da experiência religiosa, são muito difundidas no meio científico até a

atualidade. Segundo Sudbrack (2001), o diagnóstico freudiano relegou a

estágio de pré-eu, assemelhando-se ao estado do embrião no útero materno. É

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62

muito conhecido o entendimento de Freud quanto à religião enquanto uma neurose

coletiva, uma ilusão e uma fuga frente à realidade.

religiosas tinham suas raízes em fantasia e ilusão e poderiam ser responsáveis pelo

enha atribuído, diretamente, a causa

da psicose à religião, apenas à neurose). Koening (2007) salienta que esta visão

negativa de religião permaneceu até os tempos modernos no campo da saúde

mental.

Entretanto, dentro do viés psicanalítico, existem várias outras

contribuições que divergem de forma multifacetada do pensamento freudiano acerca

da religião e da experiência religiosa. Poderiam ser citadas, entre outras, as

contribuições de Klein, Adler, Margaret Mahler, Kestenberg, etc. Serão ressaltadas,

no entanto, as contribuições de Erick Erikson e David Winnincott.

Faz-se importante, antes de adentrar propriamente vertentes

psicanalíticas, ter-se, claramente, que, conforme Franco Filho (2004, p. 301), para a

igiosa está entranhada na experiência

e superego. O autor afirma que toda experiência religiosa (segundo a psicanálise) é,

jos limites, são os limites da

Com esta idéia, acrescenta Franco Filho (2004, p. 300), não se pretende

dizer que Deus seja um produto do inconsciente, mas, simplesmente, que Deus é

pensado a partir das categorias do inconsciente. Mesmo porque, re-intera o autor,

não compete à psicanálise o objeto da experiência religiosa, mas a psicodinâmica

desta.

Tal psicodinâmica, assim entendida sob o viés da psicanálise, segundo

Eizirik, Kapczinski e Bassols (2001), por mais que a teoria psicanalítica se

desenvolva, sempre partirá do determinismo psíquico e da existência do

inconsciente.

Ao se analisar a psicodinâmica religiosa a partir do inconsciente, Valle

(2004) aponta a ilusão e o desejo como duas chaves de leitura da religiosidade por

parte da psicanálise na atualidade. A questão da ilusão será tratada adiante, quando

nos reportarmos à obra de Winnincott.

No que diz respeito à questão do desejo, é sabido que a teologia já tem

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63

da busca de

um relacionamento com o transcendente, como algo implícito no coração humano.

A célebre obra Confissões de magistro, de Santo Agostinho (1973),

guarda uma das idéias, mais comumente, usadas no meio teológico para explicar a

busca de Deus e a imanência desse desejo como algo próprio do humano. Nela,

Agostinho (1973) fala que o ser humano é alguém criado para Deus e que o coração

humano sente uma inquietação ininterrupta enquanto não descansar nele. Alguns

teólogos entendem essa afirmação como algo direcionado ao pós morte e outros a

colocam como perspectiva básica existencial, explicativa para um sentimento de

incompletude, de nostalgia que, muitas vezes, aninha-se no coração humano; poder-

se- ia chama-lo de vazio existencial.

Também, o arcabouço doutrinário das religiões, dedica-se a explicar o

homem como um ser eminentemente religioso. No Catecismo da Igreja Católica

(CIC), por exemplo, já no capítulo primeiro, lê-se que o ser humano é dignificado por

iou para uma comunhão com Ele, e, por

isso, o humano sente este desejo de comunhão com o divino, como uma força

propulsora de vida. A partir de tal concepção, explica-se o fato da religião (enquanto

comportamento religioso, enquanto caminho de busca de Deus) ser um fenômeno

universal.

O escritor alemão Alselm Grunn, na obra Se quiser experimentar Deus

(2001), afirma que não há experiência sem que o homem se abra à experiência.

Segundo este autor, não há experiência desinteressada, somente pode experimentar

alguma coisa, quem a deseja experimentar.

Do ponto de vista da psicologia, mais propriamente da psicanálise,

quando visto a partir de uma dimensão inconsciente, o desejo é entendido como

essencial para a experiência. Assim, Vale (2004) considera que se deve levar em

conta, não, apenas, o objeto de desejo, como também o desejo do objeto.

Segundo Vale (2004), há uma tensão entre o desejo e o objeto, algo que é

intrínseco à natureza da experiência de limite-transcendência, fato que não é,

apenas, positivo, como também criativo. É a partir desta tensão que nasce a

experiência religiosa, a qual, por sua vez, pode levar tanto a crer quanto a não crer.

Seguindo a mesma linha de pensamento, Valle (2004) chama a atenção

para teoria das relações objetais, a qual tem sido muito festejada em vários círculos

de psicólogos no Brasil e no exterior. Cita, inclusive o autor, que no tempo pós-

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64

freudiano, ganha força o modelo relacional, entendendo-se que a principal matéria

prima da vida mental são as relações com o outro, e não os impulsos, como

acreditado por Freud.

Segundo Valle (2004), no modelo das relações objetais, depara-se com

um novo entendimento da experiência religiosa e, ainda, sobre o que ela se assenta

na maioria dos casos, ou seja, as representações e idéias de Deus. Quem auxilia na

compreensão do modelo relacional é o psicanalista inglês David Winnincott.

Valle (2004, p. 288) apresenta três aspectos da obra de Winnincott, os

quais ele considera de fundamental importância para a nova visão da experiência

religiosa por parte da psicanálise:

Primeiro uma visão do amadurecimento do ser humano diferente da visão determinista de outras teorizações da psicanálise, calcadas em concepções que valorizam unilateralmente o pulsional; segundo, uma conceituação ampla da natureza humana como tendente à integração, suposto um adequado ambiente facilitador; e, terceiro, uma maneira genial de descrever a gênese e constituição do self a partir de objetos e fenômenos transicionais.

Segundo Valle (2004), Winnincott entendeu que a gênese e constituição

do self infantil se dão, a partir de objetos transicionais, pela mediação das

brincadeiras. Por meio do brincar (espaço da ilusão), emerge e evolui o sujeito (self)

e a própria realidade externa. O autor explica que o fenômeno transicional acontece

mediante ao processo em que a criança se espelha num objeto que a possibilita sair

de um estado de simbiose com o mundo (inclusive com a própria mãe) para outro

estado no qual possa se perceber enquanto um ser diferenciado de tudo que o

circunda.

Quanto aos objetos, Valle (2004, p. 290) afirma que são investidos de

mundo interno da criança e o mundo externo, entre a fantasia de onipotência (ilusão)

e sua decepção (dês-ilusão) ante as frustrações que levam a uma maior consciência

No entender de Valle (2004), embora Winnincott não tenha se referido

propriamente a experiência religiosa, a força simbólica do objeto transicional é

conectada com muitos outros momentos da vida social e cultural adulta em diversas

contingências, destacando, entre estas, a experiência religiosa.

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Conforme Valle (2004), a religião, como a arte e a cultura em geral,

equivale ao que os objetos e fenômenos transicionais são na esfera do self. O

espaço simbólico do fenômeno transicional (ilusão e desilusão) é entendido como o

espaço em que acontece psicologicamente a experiência religiosa.

Diferentemente de Freud, segundo Valle (2004, p. 293), Winnincott

vivência da ilusão, sem a qual não há evolução na capacidade

imaginativa e cognitiva, nada tem haver com a alucinação propriamente dita ou,

,

e também não é uma verdade, mas o lugar da emergência do verdadeiro, porta

tecida pela ilusão criativa, não pode ser relegada a algo patológico.

Outro psicanalista que, também, forneceu forte contribuição ao

entendimento da experiência religiosa foi seguramente Erik Erikson. Segundo

Rizzuto (2006), Erikson contribuiu à psicanálise ao descrever, detalhadamente, as

zonas e modos como acontece a função perceptual.

De acordo com Eizirik, Kapczinski e Bassols (2001, p. 23), Erikson

entendeu que a personalidade não está pronta ao final da infância, ao contrário, ela

se desenvolve ao longo de toda a vida. Os autores chamam a atenção para o fato de

que Erikson entendia que o ego s

para organizar informações externas, testar percepções, selecionar memórias,

Para tal, conforme Eizirik, Kapczinski e Bassols (2001), Erikson

desenvolveu os oito estágios de ego, ao longo dos quais a personalidade vai sendo

moldada. Para cada estágio, explicam os autores, Erikson descreveu aspectos

positivos e negativos, marcados por crises e afetados pela cultura pessoal e sua

interação no contexto social.

Segundo Dalgalarrondo (2008), a grande contribuição de Erickson está no

desenvolvimento de uma matriz materna para a experiência religiosa. O autor

explica que, diferentemente de Freud, para Erikson, o que está na base da religião

não é a relação inconsciente com a imago paterna, mas a relação inconsciente com

a imago materna. Segundo Dalgalarrondo (2008, p. 61), para Erickson, a religião

No entendimento de Dalgalarrondo (2008), Erikson acreditava que a

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66

confiança, nascida do cuidado, é, de fato, o que move as pessoas a buscar uma

determinada religião. Neste sentido, todas as religiões têm, em comum, uma

constante rendição infantil aos provedores, os quais, por sua vez, são

dispensadores, tanto de felicidade terrena, quanto de saúde espiritual.

Dalgalarrondo (2008) explica que, na perspectiva relacional do bebê com

a mãe (aqui se remetendo à rejeição momentânea da mãe que amamenta, ao ter um

seio mordido), nasce, também, o sentimento de culpa e os esforços de expiação, tão

recorrentes no âmbito religioso.

De acordo com o seguinte enxerto, Dalgalarrondo (2008) afirma que

Erikson procurou associar sucessivamente as relações mãe e bebê com as

vivências religiosas dos grupos sociais:

Assim, a tarefa básica da religião é reafirmar aquela primordial relação, aquele primevo reconhecimento, posto que todo ser humano conserva profundamente, ao longo de sua vida, a sensação de perda e de indissolubilidade de confiança básica, que implica, segundo o autor, uma

Dalgalarrondo (2008) destaca, ainda, um paralelo interessante no

pensamento de Erikson, relativo à religião e o sonho. Partindo do pressuposto de

que a religião poderia ser equiparada a uma neurose, entendida basilarmente, por

Freud, como uma regressão ao estado infantil, Erikson concluiu que o sonho,

também, era uma manifestação de regressão, visto que o funcionamento onírico se

assemelhava ao processo de formação do sintoma neurótico. Entretanto, sonhar,

segundo o autor, era considerado, por Erikson, como algo saudável, necessário e

até curativo.

3.2.3 Perspectiva da Psicologia Humanista

O nascimento da psicologia humanista ocorreu no início da década de 60,

nos Estados Unidos. Segundo Boianain Junior (1998), num primeiro momento, a

psicologia humanista se tratava de um movimento, o qual congregava várias

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67

tendências e que, além de uma oposição ao behaviorismo e à psicanálise, tinha, em

comum, algumas propostas, adesões e influências.

Entre estas influencias, Boinain Junior (1998) destaca as Teorias

Neopsicanalíticas de autores como: Adler, Rank, Jung, Reich, Ferenczi, Horney,

Sullivan, Erikson e Fromm; as teorias Gestalticas de Goldstein e Lewin; a Gestalt-

terapia de Perls, além do Psicodrama, de Moreno. Há, ainda, um grande contributo

das Psicologias existenciais / fenomenológicas de autores como Rollo May, nos

Estados Unidos e de Viktor Frankl com a sua Logoterapia, na Europa. Além dos

autores já citados, Boinain Junior (1998) ressalta as escolas americanas de

psicologia da personalidade, sobretudo, a contribuição de Rogers e Maslow, sendo o

último, considerado o principal precursor da nova escola.

Sudbrack (2001, p. 22) salienta, na perspectiva humanista, o contributo de

Eric Berner à análise dos relacionamentos, e de Roberto Assagioli à Psicossintese.

Enquanto ponto convergente entre vários métodos, o autor desta

não é mais o mecânico da saúde mental do behaviorismo, nem o mestre

mesmo, o médico que cura, mas, é um pedagogo que ajuda a própria pessoa a se

re-construir.

Segundo Boinain Junior (1998), além da oposição ao behaviorismo e à

psicanálise e da absorção das escolas que não se identificam com estas correntes, o

movimento humanista se caracterizava por um grupo de estudiosos em torno de

assuntos comuns, definição proposta por Maslow, ao lançar a revista de Psicologia

Humanista em 1957. Entre os assuntos abordados estavam: a criatividade, amor,

self, o crescimento, transcendência do ego, auto-realização, organismo,

necessidades básicas de satisfação, entre outros.

Boinain Junior (1998, p. 30) assinala que a perspectiva humanista não

estar e o potencial humano de crescimento e auto-

psicologia humanist

condição humana, em distanciamento do qual, as patologias podem então ser

Esta perspectiva pode ser encontrada de forma muito evidente, na obra

Introdução à psicologia do ser, de Maslow, citada, anteriormente, neste trabalho. Na

qual Maslow (s.d) criticava um modelo psicológico que tomava os doentes, da

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68

sociedade, como parâmetros para estudo e classificações, resultando em um retrato

pessimista da natureza humana.

Por isto, Maslow (s.d), em suas pesquisas, tomava por base,

personagens bem sucedidos da história e não os doentes, para enfatizar as

potencialidades humanas, a capacidade de autorrealização, inerente ao ser humano.

Além dos assuntos de interesse comum, como apontado acima, há

embora este tema possa ser entendido por algumas abordagens do humanismo,

eu sentido mais amplo, caracteriza, antes, uma temática

transpessoal, a qual, sob este aspecto, vincula a psicologia humanista à psicologia

transpessoal.

O humanismo, segundo Boinain Junior (1998, p. 34), entende que o

comportamento humano não é determinado por forças externas à consciência, seja

pelo ambiente, pelo passado ou o inconsciente, como fazem outras teorias. O

comportamento é, sim, fruto das escolhas que o próprio ser humano faz e de sua

interação com o meio. O homem não é, segundo esta visão, algo dado, pronto,

para crescer, um movimento de sair de si, um projetar-se, um devir, um incessante

tornar-

Esta tendência ao crescimento, conforme o entendimento do humanismo,

é manifestada, sobretudo, nas obras de Maslow e Rogers, nas quais autorrealização

e autoatualização são entendidas como meta da psicoterapia e, portanto, como

ponto mais elevado das necessidades humanas e do auto desenvolvimento humano.

Sobre isto, Rogers (1980, p. 40) destaca:

Podemos dizer que em cada organismo, não importa em que nível, há um fluxo de movimento subjacente em direção à realização construtiva das possibilidades que lhe são inerentes. Há também nos seres humanos uma tendência natural a um desenvolvimento mais completo e mais complexo.

Tal temática pode, também, ser claramente perceptível nas obras de

Maslow, quando, elecando uma pirâmide, de necessidades humanas, a qual tem

sido usada, frequentemente, no âmbito da psicologia organizacional, Maslow (s/d)

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69

coloca a autorrealização no topo de tal pirâmide, como objetivo mais alto a ser

alcançado. Para Maslow (s.d, p. 100), a autorrealização pode ser alcançada e

vivenciada em vários momentos como:

[...] na experiência parental, na experiência mística, ou oceânica, ou natural, a percepção estética, o momento criador, a introvisão terapêutica ou intelectual, a experiência orgástica, certas formas de realização atlética etc. A estes e outros momentos de felicidade e realização supremas chamarei

No sentido de compreender a experiência religiosa, mediante os principais

objetivos da psicologia humanista, ao menos segundo Maslow e Rogers, Fraas

(1997) faz um questionamento sobre, até que ponto, o princípio da autorrealização,

de Maslow, ou da autorregulação, de Rogers, não estaria reduzindo o ser humano a

um nexo funcional intrapsiquico, psicologizando, assim, a experiência religiosa.

Para Fraas (1997), da mesma forma que a psicologia cognitiva não

adentra na natureza do fenômeno religioso em si, e a psicanálise freudiana o

patologiza enquanto fruto de neuroses, também, o humanismo se mostra de maneira

a reduzir a experiência religiosa aos âmbitos do psiquismo, diminuindo-a a uma

experiência exclusivamente psíquica.

Já para Wilber (1999, p.66), quando os humanistas se referem ao

potencial do ser humano, entendido entre outras noções, como autonomia, eu

centrado, autenticidade e sentido, eles estariam se referindo, na verdade, à noção

do corpo-mente total. No entendimento do autor, isto carcterizaria uma intuição por

Ao se preocupar em descrever os potenciais de corpo-mente total - a

intuem um nível superior de ser e de consciência, o qual está além dos níveis do ego

e da persona.

Para exemplificar seu postulado, Wilber (1999) cita May, que entende que

o ego, o corpo e o inconsciente não podem ser autônomos. Eles existem como

partes de uma totalidade e é nela que a vontade e a liberdade se assentam. Assim,

Wilber compreende que a autorrealização nada mais é que o aparecimento

consciente desta totalidade.

Page 70: Psicologia e Religião (Tcc)

70

Segundo Boinain Junior (1998) muitos motivos têm aproximado a visão

humanista da visão transpessoal. Na ACP (Abordagem Centrada na Pessoa) e nos

modelos de psicologia adotados por Maslow, há muitas aberturas propiciando a

aproximação de muitos psicólogos, na atualidade, a práticas da psicologia

transpessoal.

O próprio Maslow já apontou, há idos anos, que considerava a psicologia

humanista uma preparação para uma quarta força dentro da psicologia, referindo-se

no caso, a tranpessoal, conforme, a citação abaixo:

Devo também dizer que considero a psicologia humanista, ou a Terceira Força em Psicologia, apenas transitória, uma preparação para a quarta

no cosmos do que as necessidades e interesses humanos, indo além do humanismo, da identidade, da individuação e quejandos [...]. Necessitamos de algo maior do que somos. (MASLOW, s.d., p. 12).

No caso da ACP, Boainain Junior (1998) afirma que há atualmente e entre

os psicólogos, muitas discordâncias quanto à tendência místico-trancendente-

espiritual da última fase do pensamento de Rogers, principalmente no que diz

respeito à importância de tais pensamentos para o todo da obra rogeriana, e quanto

a uma maior abertura da ACP à perspectiva transpessoal. Segundo o autor, um

grupo, cada vez mais expressivo dentro da ACP, se não em números, ao menos pela

qualidade do trabalho, tem aproximado pontos fundamentais da ACP das práticas

emergentes da psicologia transpessoal.

Os psicólogos que seguem o pensamento de Rollo May e de Victor

Frankl, dois fortes expoentes do humanismo existencialista, certamente, também

não têm grandes dificuldades em relacionarem as temáticas da espiritualidade e

questões de ordem religiosa ao contexto terapêutico. Assim, o próprio May (2000)

enfatizava a importância da busca do sentido de vida para a existência e da

necessidade de se valorizar o ser humano.

Se alguém puder ter confiança no sentido da vida, puder acreditar no valor último do próprio si-mesmo e do dos outros, puder confiar que o universo tem um significado no qual a própria insegurança pode ser superada, então

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71

poderá experimentar a confiança e a coragem que necessita para viver. (MAY, 2000, p. 173-174).

A mesma busca por significado pode ser, facilmente, encontrada na

logoterapia de Victor Frankl (1990), como o próprio nome da escola já diz, terapia do

sentido. Para Frankl, o que move os seres humanos é, exatamente, a busca do

sentido e o que o torna doente, é a perda deste sentido.

Xausa (1988, p. 112), ressalta que, como a logoterapia se interessa

especialmente pelo sentido e este é experimentado, muitas vezes, por meio de uma

relação aos seus efeitos na vid

Frankl (1990) não se alinha a um credo, especificamente, religioso, mas

entende que o sentido da vida está, indubitavelmente, ligado a questões ontológicas

do ser, as quais perpassam a filosofia e o fazer das religiões. Entretanto, tenha ou

não religião, o homem se lança, na verdade, na busca de um sentido para o viver.

Quando o sentido desvanece, segundo Frankl (1990), instaura-se a doença.

Allport (1975) diz que, do ponto de vista da psicologia, é necessário que

se aponte para uma estreita analogia existente entre a orientação religiosa e outros

esquemas de nível elevado, os quais influenciam o curso do desenvolvimento

humano.

Ainda, para Allport (1975), cada homem, tenha inclinações religiosas ou

não, possui suas próprias pressuposições definitivas e acredita que não pode viver

de suas verdades. Estas idéias, segundo o autor, sejam ideologias, filosofias ou

simples idéias acerca da vida, exercem uma pressão criativa sobre a conduta

humana.

3.2.4 Perspectiva da Psicologia Transpessoal

Segundo Di Biase e Rocha (2005), principalmente, a partir do

Renacentismo (Séc. XVI), e, sobretudo, nos últimos 100 anos, a humanidade tem se

afastado progressivamente de uma visão espiritual de homem e de universo. Isto

vem sendo reforçado pelo sucesso da visão científico materialista da modernidade.

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No ocidente, outro fator que corrobora para este fenômeno, no entender

dos autores, é o próprio afastamento do cristianismo daquilo que foi, em seus

primeiros séculos, entendido como experiência da busca de Deus e que fora

Grof e Grof (2001) exemplificam esta idéia quando falam que é muito

comum se encontrar uma bíblia em todos os cantos. Até os políticos se utilizam de

Deus nos seus discursos. Entretanto, caso algum membro de uma comunidade

religiosa tenha uma experiência espiritual intensa, semelhante à dos místicos

famosos, provavelmente, até mesmo o sacerdote o encaminhará a um psiquiatra.

Logo, a própria religião, muitas vezes, perdeu sua dimensão mística e sua essência

espiritual.

Por estes e outros motivos, Di Biase e Rocha (2005) falam que é sentido,

na atualidade, um vazio causado pela ausência da experiência de conexão cósmica

e, também, pela falta de uma mitologia capaz de responder aos desafios que o

mundo contemporâneo impõe.

Ainda assim, enfatizam Di Biase e Rocha (2005), vê-se, atualmente, um

movimento de retorno ao sagrado a partir da própria ciência. No qual, também,

colaboram os novos paradigmas das ciências holísticas, formando novas alianças

entre ciência e espiritualidade.

A simples consciência de que somos parte de um organismo planetário como a terra, delicado e pleno de vida, ameaçado de extinção e a percepção transcendente de uma inteligência universal geradora do cosmos, da vida e da consciência, que permanentemente nos acompanha e auxilia, desperta em nós imensos poderes, capazes de transformar completamente nossa existência e a de nossa comunidade, desde que coloquemos em ação transformadora tal percepção cósmica. (DI BIASI e ROCHA, 2005, p. 29).

Os autores, supracitados, afirmam que são estes fatores, junto a essa

nova percepção, que tem conduzido o ser humano a uma experiência terapêutica da

transcendência e da ação altruísta transformadora.

Para Grof e Grof (2001), a obra de Jung representa um marco na

caminhada rumo à nova avaliação da espiritualidade. Atualmente, segundo os

autores, a convergência entre os avanços revolucionários na ciência moderna e a

visão de mundo das escolas místicas tem alcançado grande público. Estão

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73

uma nova importância ao espiritual; que não se reduz a números, medidas e pesos,

além de, acima de), quer conduzir do espiritual do indivíduo para um espiritual

transpessoal, pode-

De acordo com Di Biase e Rocha (2005), os autores, da área

transpessoal, a vêem como um modelo espectral que unifica as escolas de

psicologia e psicoterapia num quadro coerente. Os autores enfatizam que, para

consideração durante o tratamento somente as faixas transpessoais do espectro da

al

estudadas, descritas e desenvolvidas por Stanislav Grof e Ken Wilber, levam em

consideração todos os níveis do espectro da consciência. Pode-se, por este motivo,

afirmar-

(DI BIASE; ROCHA, 2005, p. 73).

Cavalcanti (2004) explica que a psicologia transpessoal tem sua principal

preocupação nos aspectos transcendentes e místicos do indivíduo no seu caminhar

rumo à autorrealização, dando ênfase à espiritualidade e ao potencial do indivíduo

para a transcendência e a considerado inerente ao homem. Assim, explica a autora,

a psicologia transpessoal procura oportunizar ao indivíduo o experimento da

consciência unificada enquanto fundamento de tudo.

Segundo Di Biase e Rocha (2005, p. 69), as pesquisas modernas têm

constitui por vários níveis interconectados entre si, e simultaneamente com toda a

É sobre esta compreensão básica que psicólogos transpessoais, como

Grof e Wilber, vão direcionar o seu entendimento da experiência humana no que

tange a experiência espiritual. Para estes pensadores, dados os postulados acima, é

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74

fácil compreender que o entendimento da consciência e da espiritualidade não se

pode prender aos limites da mente e da consciência.

3.3 A Experiência Religiosa no Contexto Psicoterapêutico Atual

Segundo Cambuy, Amatuzzi e Antunes (2006), os psicólogos têm se

deparado, com maior freqüência, com questões envolvendo a experiência religiosa

no âmbito da psicoterapia, seja na clínica psicológica, em consultórios particulares

ou em atendimentos institucionais (como os que acontecem em centros de saúde e

clínicas-escola).

De acordo com os autores, a presença da religiosidade nos

atendimentos clínicos não é esporádica, mas está, muitas vezes, extremamente

ligada ao problema psicológico trazido para a psicoterapia. Conforme Cambuy,

Amatuzzi e Antunes (2006), têm-se encontrado casos, nos quais os problemas de

percepção ou de comportamento (como, por exemplo, influência de demônios ou

outros espíritos nas atividades cotidianas) têm sido interpretados como problemas

espirituais ou religiosos. Ou, ainda, esclarecimentos religiosos para problemas

psicológicos, como, por exemplo, a culpabilidade, principalmente, no campo da

sexualidade, alimentada por doutrinas religiosas ou diretamente por líderes

religiosos.

Entretanto, o trato a questões pertinentes à experiência religiosa dos

pacientes foi banido durante muito tempo do contexto psicoterápico. Segundo Peres

(2004), o distanciamento entre o aspecto espiritual do ser humano e as psicoterapias

ocidentais, afastaram muitos psicoterapeutas de importantes conhecimentos na

promoção da cura psicológica. No entender do autor, isto ocorre por uma visão

fragmentada do ser humano, transmitida, por muito tempo, na academia e utilizada

no trato dos sintomas apresentados no contexto clínico.

Para Peres (2004, p. 147), o maior desafio à psicoterapia atualmente é a

mudança de paradigma da visão de homem, considerado um ser bio-psico-social,

não se incluindo nesta visão a dimensão espiritual. Entretanto, segundo o autor,

embora a maior parte das psicoterapias, ainda, trabalhe na perspectiva da

racionalização, já existem aberturas a novos modelos que integram a espiritualidade

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75

processo de alargamento dos paradigmas ocidentais para melhor qualidade do

Para Camon-Angerami (2004), embora durante muito tempo a

religiosidade tenha sido afastada da psicoterapia, indubitavelmente, ela continuou a

fazer parte da vida dos pacientes. Diferentemente do que muitas vezes se apregoa

nas academias, para o autor, a busca de psicoterapia não exclui o caminhar na

perspectiva religiosa.

Nesse sentido, Camon-Angerami (2004), partindo do paradigma

existencialista, afirma que transcendência, a espiritualidade e a religiosidade não

podem ser deixadas de lado no contexto psicoterapeutico. No que tange à

experiência religiosa, especificamente, a sua presença em psicoterapia é muito

importante.

No que concerne, de modo mais específico, às relações entre a religião e

a psicoterapia, segundo Peres et al. (2007), alguns estudos recentes têm mostrado

que a integração entre ambas se mostra um tanto difícil, ao passo que a integração

entre psicoterapia e espiritualidade é possível e tem dado bons resultados. Os

mesmos estudos, segundo os autores, apontam alguns postulados éticos a se

considerar no manejo de questões referentes á espiritualidade e à religiosidade:

A habilidade de inquirir sobre a vida religiosa e espiritual dos pacientes é um elemento importante da competência dos terapeutas; as informações sobre a vida religiosa e espiritual desses pacientes revela frequentemente dados importantes para superação das suas dificuldades; o processo do inquérito sobre esse domínio deve ser respeitoso; e há um potencial significativo quando o terapeuta exagera suas convicções pessoais abandonando o princípio da neutralidade. (PERES et al., 2007, p.139).

No entendimento de Bairrão (2004), a experiência religiosa

(compreendida como a relação com o sagrado por meio de uma religião) não é, de

todo, compatível com o que se entende comumente por saúde dentro de um

processo psicoterapeutico.

Para Bairrão (2004), a clínica psicológica e as psicoterapias partem de

dois pressupostos básicos: da existência de uma entidade anímica, geralmente

entendida como aparelho psíquico e, também, do fato de este aparelho ter a

necessidade de reconquistar a saúde, ou seja, de que ele possa estar doente. O

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autor entende que, mesmo que todas as religiões se refiram de alguma forma à

saúde, na prática, nem sempre, as vivências religiosas proporcionam isso.

Segundo Bairrão (2004), muitas vezes, as religiões sacrificam a saúde do

corpo e o conforto psicológico de seus fiéis, mediante a propugnação de uma radical

alteridade em detrimento de uma abnegação de si próprio. Assim, as religiões

impõem que é a relação com o divino quem define o que é saúde,

independentemente, do prejuízo ou benefício do fiel.

Veríssimo (2004) elucida que a experiência religiosa não se prende às

crenças de uma determinada religião, embora, muitas vezes, esteja pautada em

elementos dela. Para o autor, a experiência do sagrado está para além de uma

relação impessoal povoada por convenções. Segundo este entendimento, o sagrado

é uma descoberta e uma elaboração pessoal e coletiva.

No que se refere à dimensão pessoal, Veríssimo (2004) entende que a

esfera particular trata da relação de cada um com o sagrado de forma única, sendo

que esta relação pode, por vezes, destoar da proposta ou imposta pela religião.

Aliás, assinala o autor, muitos conflitos podem nascer desta dicotomia entre o

celebrado e o vivido, entre o experimentado e o conceituado.

Veríssimo (2004) cita, inclusive, situações em que o sagrado, cultuado

coletivamente, não é experimentado na esfera pessoal e, então, ou a pessoa nega a

coletividade ou aceita a doutrina passivamente e se anula. Afirma, portanto:

Quem baseia sua fé em um relato sem se colocar como uma testemunha viva dos dramas cifrados nas imagens e símbolos, não percebe que existe algo único na elaboração de sua fé. Sua fé é celebrada coletivamente, mas constitui-se e vai se desenvolver de forma única, em que o sentido se fará em uma relação ímpar com o sagrado e permanecerá, em certo sentido, intransmissível. (VERÍSSIMO, 2004, p. 178).

Peres et al. (2007), defendem que o psicoterapeuta deve incluir nas

discussões a questão da espiritualidade. Para os autores, a psicoterapia é,

sumariamente, um processo de autocura do cliente. Por isto, ela deve estar voltada

para os clientes e seus respectivos sistemas de crenças, procurando, ainda,

potencializar as capacidades destes, uma vez que, a terapia funciona enquanto os

clientes aceitem participar dela.

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a espiritualidade devem ser consideradas pelos terapeutas em suas abordagens, e

mesmo estratégias psicoterápicas que valorizem tais sistemas de crenças, devem

Mas, como identificar uma experiência religiosa? Como entender se ela é

saudável ou não para o paciente? No intuito de compreender a experiência religiosa,

Veríssimo (2004) diz que é necessário ter-se alguns cuidados. Para ele, uma

experiência religiosa não se dá, simplesmente, porque a tradição assim a prescreve

ou porque alguma autoridade religiosa tenha feito a leitura de determinado

fenômeno. Ainda segundo o autor, não é a exegese, a instituição da religião, ou um

mestre, ou, ainda, fatos empíricos, que definem se trata-se ou não de uma

experiência religiosa.

Para se averiguar tal suposição, Veríssimo (2004, p. 175) afirma que se

deve considerar que a experiência do sagrado não é um acontecimento bizarro ou

espetacular, algo que, ainda, não tenha sido conhecido pela ciência. Pois, trata-se

de algo, realmente, experimentado a partir de uma vivência, na qual é sentido,

pensado, interrogado; algo com quem se estabelece uma relação. Algo que

necessita de uma abertura por parte do humano:

Para que se configure um autêntica experiência religiosa, é preciso sentir-se provocado, chamado a sair de si e a comungar na presença da divindade na esfera da existência, buscar o sentido dessa presença, permitir-se recebe-la com alegria, com espanto, com angustia, com inquietação, com êxtase. (VERÍSSIMO, 2004, p. 176).

Segundo Allport (1975), existe uma grande diversidade quanto ao grau de

influência que a religião exerce na vida das pessoas, bem como, nas formas de

maturidade relativas à perspectiva religiosa. Isto se dá, conforme o autor, porque o

desenvolvimento religioso do ser humano é influenciado por seu temperamento e

formação, estando, também, sujeito a interrupções durante o processo de

crescimento religioso.

Nesse sentido, afirma Allport (1975), não é função da psicologia, uma vez

voltada ao estudo da experiência religiosa, a comprovação das verdades de fé, mas,

cabe a ela, a investigação sobre de que forma e porque as pessoas aderem a

determinadas verdades, as quais, em suma, representam os significados finais de

várias personalidades em diferentes tempos e lugares.

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Para Aletti (2004), o psicólogo deve estar atento ao grau de importância

dado à experiência religiosa, bem como, às deformações patológicas que podem

estar imiscuídas na significação e ressonâncias da religiosidade para a pessoa.

Sobre a qual o autor tece a seguinte consideração:

A tarefa do psicólogo é tematizar seja a relevância do vivido religioso na estruturação ou reestruturação da personalidade, seja a ambivalência de uma experiência que não está isenta da vulnerabilidade a distorções patológicas, particularmente assinaladas, por exemplo, por redobramentos narcisistas ou por um uso fetichista dos objetos religiosos. (ALLETTI, 2004, p. 20-21).

Ratificando a idéia de Allport (1975), sobre o objetivo da psicologia ao se

enveredar nos caminhos da experiência religiosa, Alletti (2004) entende que, ao

psicólogo, cabe entender não os conteúdos, mas os percursos que dão ao homem

um posicionamento em relação à religião.

Para Giovanetti (2004), para entender a experiência religiosa, é

importante, ao psicólogo, não desvinculá-la das formas de religiosidade presentes no

contexto em que se vive. Sobre o qual afirma:

As características do novo estilo de vida na sociedade contemporânea colaboram para que assistamos a um crescimento significativo da religião individualista comparativamente com as formas de religiosidade tradicional. Hoje, as pessoas buscam explicitar sua relação com o transcendente em crenças que não derivam da igreja, mas de convicções pessoais. (GIOVANETTI, 2004, p. 144).

De acordo com Giovanetti (2004), há, atualmente, um predomínio da

religião vivida sobre a religião institucional, o que não significa um abandono da

religião tradicional, mas o convívio entre os dois tipos de religiosidade.

Segundo o autor, os estilos de vida em voga na pós-modernidade,

pautados na individualidade de caráter niilista, são, por excelência, os lugares da

vivência religiosa do homem contemporâneo. Giovanetti (2004) vê, neste estilo de

religiosidade, uma marca específica: a valorização do self

Numa perspectiva criteriológica do manejo das experiências religiosas e

da espiritualidade em psicoterapia, conforme Peres et al. (2007), a associação

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Psiquiátrica Americana (The American Psychiatric Association) publicou, em 2006,

algumas recomendações à psicoterapeutas que trabalhem com a espiritualidade e

religiosidade na prática clínica. Entre estes aspectos, Peres et al. (2007, p. 139)

descrevem:

Identificar se variáveis religiosas e espirituais são características clínicas relevantes às queixas e aos sintomas apresentados; pesquisar o papel da religião e da espiritualidade no sistema de crenças; identificar se idealizações religiosas e representações de Deus são relevantes e abordar clinicamente essa idealização; demonstrar o uso de recursos religiosos e espirituais no tratamento psicológico; utilizar o procedimento de entrevista para acessar o histórico e envolvimento com religião e espiritualidade; treinar intervenções apropriadas a assuntos religiosos e espirituais e atualizar a respeito da ética sobre temas religiosos e espirituais na prática clínica.

Para Valle (2004, p. 288), a partir de uma perspectiva psicanalítica, a

compreensão da experiência religiosa, entendida como experiência do sagrado,

precisa ser buscada na própria história de vida, pois, segundo o autor, tal

exem com o afetivo, o

cognitivo e o conativo antes mesmo que se desenvolva na criança algum grau de

experiência subjetiva, as imagens do sagrado, tidas como responsáveis por tecer a

experiência religiosa do indivíduo, vão se formando desde o primeiro constituir-se do

self do indivíduo.

Valle (2005) afirma que compete, ao psicólogo, perscrutar quais as

motivações, sentimentos, desejos, compreensões e atitudes expressas nos

comportamentos religiosos. O psicólogo deve analisar e estudar como e por que o

homem se re-liga ao sagrado.

Semelhante à fala de Allport (1975) e Alletti (2004), acima citadas, Valle

(2004) entende que o interesse e objetivo do psicólogo devem ser a compreensão

dinâmica da experiência e do comportamento religioso, como uma vivência que

influencia, singularmente, o seu desenvolvimento pessoal e de sua vida.

Para Cencini (2001), a história pessoal é a morada do mistério. Segundo

o autor, não se pode compreender uma pessoa, em profundidade, sem que haja

uma viagem ao passado, sem evidenciar, portanto, uma cuidadosa atenção à sua

história pessoal. Para o autor, ler a história pessoal é condição indispensável para

que o psicólogo possa, com a pessoa, discernir a experiência religiosa atual.

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Se por um lado psicoterapeutas religiosos como Cencini (2001) e Grunn

(2001) entendem a necessidade de se procurar, na própria história de vida do

paciente, o entendimento de sua experiência religiosa, outros autores sugerem que

se dê maior importância ao vivido culturalmente. Dados que, na esteira de Jung,

seriam os conteúdos do inconsciente coletivo.

À guisa do entendimento junguiano acerca da experiência religiosa,

segundo Veríssimo (2004, p. 172), é importante, ao psicólogo, familiarizar-se com o

sagrado. Ele precisa, portanto, pesquisar sobre o significado dos símbolos, mitos e

ra

poder pensar sobre a experiência religiosa.

Essa busca de compreensão crítica, com acentuada revisão nos métodos

e práticas, configura o método fenomenológico, o qual, segundo Veríssimo (2004),

parece o mais apropriado para se lidar com as experiências religiosas. Neste

método, o pensamento deve observar e acompanhar, atenciosamente, o

aparecimento de expressões produzidas pelas vivências, as quais podem ser

consideradas experiências religiosas.

A experiência religiosa, conforme Veríssimo (2004), constitui-se de uma

dimensão coletiva e outra pessoal, singular. Entretanto, segundo o autor, cada

pessoa experimenta a fé de forma integrada com a sua própria existência. Nesta,

estão imiscuídos os desejos mais íntimos da pessoa bem como, sua personalidade,

a sua origem familiar e cultural, questões pertinentes à educação e às experiências

de vida, a própria observação e o interesse pelos relatos de outras experiências e

também, a vivência dos temas arquetípicos pelo contato com os símbolos.

Avesso a este entendimento, Bairrão (2004) elucida que algumas teorias

do aparelho psíquico se propõem a substituir, integralmente, a dimensão não

objetivável do transcendente, a qual, segundo o autor, independente de ser

irrepresentável, há de ser suposta como real.

Bairrão

experiência espiritual, consubstanciando-a a uma representação psíquica em

detrimento do real. Para o autor, essa hipervalorização da capacidade humana de

representar mentalmente as coisas, reduz o real da experiência espiritual a uma

noção (religiosa) de idolatria.

Segundo Bairrão (2004), o espiritual deve ser entendido como algo que

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81

faz sentido e não pode ser reduzido a uma categoria cognitiva. Assim, segundo o

autor, o psicoterapeuta precisa acolher seu paciente, também, como um ser

espiritual, capaz de ter uma experiência espiritual e de cuja experiência se podem

haurir inúmeros conhecimentos úteis ao processo psicoterapeutico.

No mesmo viés, Allport (1975) diz que uma personalidade desenvolvida

jamais fabricaria sua religião, puramente, a partir de fragmentos emocionais. Para o

autor, o sentimento religioso é a síntese de muitos aspectos ligados a inúmeros

fatores da constituição do ser que o fazem sentir-se ligado à totalidade do ser.

Para Angerami (2004, p. 230), faz-

esteja aberto para poder abarcar o conteúdo trazido pelo paciente no tocante aos

seus valores religiosos e aceitá-los de modo harmonioso, sem preconceitos e

tampouco sem julgamentos pré-co

Partindo de uma concepção positiva de ser humano, na qual se dê a ele a

capacidade e a responsabilidade por suas escolhas, o autor diz que é preciso aceitar

as buscas de autocrescimento e autoconhecimento dos pacientes, as quais, em

suma, são os motivos que os levam à psicoterapia.

Angerami (2004) afirma que é importantíssimo considerar os valores da

religiosidade do paciente, seja como parâmetros importantes para a superação

pessoal, ou enquanto destoantes de sua própria busca de superação individual. E

para tal, é necessário que o psicoterapeuta reveja seus próprios valores a fim de não

se perder em conflitos frente aos valores do paciente.

Acerda disto, Allport (1975) diz que é importante que o psicólogo tenha o

cuidado de não projetar seus próprios sentimentos, principalmente, sobre as

questões religiosas, nas quais se encontram muitas ambigüidades de significado.

Ancona-Lopes (2005) fala que a grande dificuldade do psicólogo, na

busca do entendimento da religiosidade de seus pacientes, está na dificuldade de

lidar com seus próprios preconceitos. Por isto, é de estrema importância que o

psicoterapeuta tome distância de suas próprias representações religiosas ao lidar

com este fenômeno no contexto psicoterapêutico. A autora indica a necessidade de

o psicólogo se desligar de suas próprias concepções religiosas a fim de

compreender como o cliente vivência a sua fé.

Também, neste sentido, Aletti (2008, p. 123) considera que é muito

importante que o psicoterapeuta verifique, frequentemente, suas próprias

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deve questionar-se, continuadamente, se sua fala ou ação ajudam a si própria ou ao

paciente.

Fazendo um intercambio entre a psicoterapia e a direção espiritual, Aletti

(2008) aponta, ainda, alguns critérios, os quais considera de importância, para a

manutenção da neutralidade do terapeuta e do diretor espiritual face às questões

que o consulente traz.

Para tanto, segundo Aletti (2008), faz-se necessário: aceitar a

incompletude e o gradualismo intrínseco ao processo de crescimento humano; saber

escutar, ouvir o que não é dito; escutar, abstendo-se de gratificações voyeuristas,

pois o pretendido é obter um conhecimento em função do consulente e não o saciar

de curiosidades particulares; saber esperar, conferir tempo para que o consulente se

mostre visando à autenticidade do sujeito; encontrar palavras para escutar, pois

muitas intervenções, ao invés de tranqüilizar, atrapalham; trabalhar uma abordagem

que se funde na neutralidade, a qual pode fazer com que o paciente aprofunde sua

fé ou liberte-se dos resíduos patológicos de sua religiosidade.

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83

4 EXPERIÊNCIA RELIGIOSA E SAÚDE MENTAL

4.1 Experiência religiosa e saúde mental: Um pouco da história

Dalgalarrondo (2008) faz uma interessante leitura dos meandros

históricos que deram o tônus da relação entre psicopatologia e religião nos tempos

que nos precederam e na atualidade. O autor afirma que há uma antiga e íntima

relação entre religião e loucura.

Segundo Dalgalarrondo (2008), já na Grécia antiga, considerava-se que a

loucura era causada pelas divindades. Hipócrates, numa perspectiva médica,

considerou a loucura como produto da natureza: dos humores internos do corpo, dos

ventos, das águas e dos alimentos. A partir desta concepção, aconteceu uma

desmitologização da loucura em face de uma perspectiva humana e naturalizada do

processo de enlouquecimento.

Na Idade Média e na Renascença, conforme Dalgalarrondo (2008), a

loucura foi, novamente, vinculada ao religioso e, sobretudo, baseada no cristianismo

medieval, como uma manifestação demoníaca. Segundo esta visão, os males eram

vistos como frutos do demônio. Assim, pecado e doença se tornaram, intimamente,

relacionados. Flagelamentos e rituais de penitencias de diversas formas eram

maneiras encontradas pelos penitentes, em especial pelos cristãos, para aplacar a

ira divina e alcançar o perdão e a redenção.

A idade média traz, ainda, uma ambivalência no entendimento da doença,

seja ela física ou mental. Dalgalarrondo (2008) diz que, se por um lado a doença era

entendida como condenação pelo pecado, por outro, o louco e o doente podiam,

também, significar fontes de redenção para si e para outrem. Aparecem, então,

muitas figuras interessantes, vários santos do catolicismo, os quais, na caridade

cristã, dedicavam-se ao cuidado dos doentes e pobres. Conforme Dalgalarrondo

(2008), os doentes e as pessoas com transtornos metais podiam tanto significar o

pecador punido ao peso da doença, quanto o Cristo disfarçado à esperta da

caridade dos cristãos.

Segundo Dalgalarrondo (2008), Phillipe Pinel (1745 -1826), grande

reformador da prática psiquiátrica, escreveu um tratado no qual apontava os

Page 84: Psicologia e Religião (Tcc)

84

excessos religiosos como fator de grande relevância para o desabrochar de doenças

mentais. Entre as várias causas psíquicas e sociais (designadas por Pinel como

como a ambição exagerada e frustrada de tristezas agudas e amores não

correspondidos. No caso específico da loucura religiosa, Pinel via este matiz da

loucura como algo, extremamente, difícil de tratar, sendo necessário, portanto, a

retirada, da vida daquela pessoa, de todos os elementos religiosos que

configuravam a sua cultura.

No âmbito da psicologia propriamente dita, Koening (2007) traz a

contribuição de William James, o qual, em 1902, já havia escrito em sua famosa

obra, As variedades da experiência religiosa, sobre vários aspectos referentes às

interligações entre psicopatologia e experiência religiosa.

Entretanto, segundo Koening (2007), foram os estudos de Freud que

deram à religião um status de geradora e mantenedora de neuroses. Freud, como

explanado anteriormente, considerava a religião e as crenças religiosas como

práticas infantis e neuróticas. Para Koning (2007), as idéias de Freud, aliadas a

estudos posteriores, enfatizaram a natureza irracional das crenças religiosas e o seu

potencial maléfico. Tais crenças se instauraram até os dias atuais nos âmbitos da

saúde mental.

Segundo Menezes Júnior e Moreira-Almeida (2009), a presença

constante de místicos, videntes e médiuns na sociedade tem desafiado a

compreensão dos profissionais de saúde mental no sentido de que se faça uma

diferenciação adequada entre uma experiência espiritual saudável e o que seria um

transtorno psicótico ou dissociativo com conteúdo religioso.

Menezes Júnior e Moreira-Almeida (2009) ressaltam que as contribuições

de Jung ajudaram a criar novos modos de se olhar o fenômeno religioso, dando-lhe

um entendimento muito diverso do psicopatológico, disseminado por Freud. Na

esteira do entendimento apontado por Jung, segundo os autores, gradualmente, vão

se dando novos significados e novos entendimentos para a experiência religiosa,

como fator de saúde e não, apenas, de psicopatologia.

Atualmente, conforme Sudbrack (2001, p. 115), a psicologia

transpessoal tem ajudado a dar outra noção às experiências religiosas, as quais,

como vimos acima, durante muito tempo, foram denominadas, indiscriminadamente,

Page 85: Psicologia e Religião (Tcc)

85

Esta nova abordagem, dentro da psicologia, segundo Sudbrack (2001, p.

verdade, uma espécie de vivência mística, isto é, de alguma realidade objetiva,

qualquer que seja disso a interpretação, cristã

segundo Sudbrack (2001, p. 122), encontram-se, costumeiramente, sintomas muito

próximos à doença psíquica. Segundo o autor, a fixação ideológica de um medo

próprio, pessoal, em figuras diabólicas é um desafio tanto para a teologia, quanto

para a psiquiatria, pois caracteriza graus imaturos da consciência, ao passo que, a fé

madura estaria sempre aberta ao diálogo.

Se a experiência religiosa mediada por uma figura do mal configura-se

algo patológico na maioria das vezes, por outro lado, considera Sudbrack (2001), a

experiência sem figura não é menos potencialmente patológica. Assim, o autor

comenta um estudo feito por renomados pesquisadores da psicologia transpessoal,

entre estes, Vaugham, Naranjo e Wilber, para os quais a verdadeira experiência

transpessoal pode ser reconhecida nas seguintes características:

1) Uma totalidade integrada, claramente reconhecível, em contraste com um diluir-se indiferenciado; 2) Uma intuição conscientemente percebida, em contraste com o transe; 3) Confiança em vez de dependência infantil; 4) Compreensão das oposições em vez de percepção indiferenciada; 5) Espontaneidade e não mera reatividade; 6) Altruísmo e não narcisismo; Pureza de coração e não ignorância. (SUDBRACK, 2001, p. 123).

O seguinte enxerto de Sudbrack (2001, p. 125) esclarece a distinção entre

4.2 O diagnóstico diferencial

Na atualidade, já é comum falar-se em diagnóstico diferencial entre uma

autentica experiência religiosa e uma experiência psicopatológica. Muitos autores

têm se dedicado a caracterizar os aspectos que as diferenciam.

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Conforme Koenig (2007, p. 96), nos últimos 20 anos, tem-se dado maior

atenção ao estudo científico da religião e sua relação com a saúde e a doença

mentais. Embora, haja muito trabalho, ainda, a se realizar, o autor ressalta que já se

tem acumulado evidências para respostas mais objetivas a questionamentos, como

por exemplo: relações entre religião, espiritualidade e psicose; a incidência da

psicopatia sobre pessoas religiosas; relações de inclinação entre religião e psicose e

vice e versa; conversão religiosa e psicose e associação entre delírios religiosos e

psicopatologia.

Koenig (2007, p. 96) propõe, também, a necessidade de se ter subsídios

para questionar: a maneira de diferenciar experiências religiosas ou espirituais

evolução dos transtornos psicóticos; o efeito das psicoses nas crenças espirituais ou

religiosas das pessoas, entre outras. Segundo o autor, várias pesquisas

sistemáticas, em todo o mundo, têm colaborado na busca por respostas mais

concretas a estas questões.

Grof e Grof (2001) apontam alguns critérios para que se possa

distinguir o a experiência espiritual de um transtorno mental. Segundo os autores, a

experiência espiritual é suave, geradora de sensações agradáveis; não é, portanto,

geradora de conflituosidade; estimula a aceitação de mudanças; integra-se à

consciência diária da pessoa; não gera a necessidade de discutir o assunto

frequentemente e ajuda a pessoa numa lenta mudança na sua autocompreensão e

na compreensão do mundo.

Já para as experiências que indicam transtorno mental, Grof e Grof (2001)

apontam a intensidade do fenômeno; sensações desagradáveis; a não diferenciação

do que é interno e do que é externo; atitudes ambivalentes por parte da pessoa;

necessidades de controle; resistência a mudanças; perturbações na consciência

diária; necessidade de discussão da experiência com outrem, além de provocarem

mudanças bruscas na forma como as pessoas vêem o mundo e a si mesmas.

Menezes Júnior e Moreira-Almeida (2009) apresentam pesquisas atuais,

as quais discorrem sobre sintomas diferenciadores acerca do que pode ser doença

mental e do que deve ser compreendido como uma experiência religiosa. Os autores

salientam, contudo, que estes critérios não devem ser considerados, isoladamente, e

sim em conjunto. São elencados nove sintomas:

Page 87: Psicologia e Religião (Tcc)

87

1) Ausência de sofrimento psicológico;

2) Ausência de prejuízos sociais e ocupacionais;

3) A experiência tem duração curta e ocorre episodicamente;

4) Existe uma atitude crítica sobre a realidade objetiva da experiência;

5) Existe compatibilidade da experiência com algum grupo cultural ou religioso;

6) Ausência de comorbidades;

7) A experiência é controlada;

8) A experiência gera crescimento pessoal;

9) A experiência é voltada para os outros.

Dalgalarrondo (2008) faz, também, uma síntese na qual apresenta uma

diferenciação entre as experiências espirituais e sintomas psicopatológicos. Entre

outros aspectos, deve-se observar: características relativas ao conteúdo das

vivências, características das experiências sensoriais; duração (tempo), grau de

insight, orientação em relação a outras pessoas, estilo de vida e personalidade do

sujeito, etc., conforme exposto no anexo 1. Já no anexo 2, pode-se observar uma

lista de fatores positivos e negativos da experiência religiosa sobre a saúde mental.

Citando elementos que mais se destacam, atualmente, no campo de

estudo da psicopatologia e da experiência religiosa, Dalgalarrondo (2008) cita as

relações entre: fanatismo religioso, sectarismo e psicopatologia; êxtase, transe,

possessão e mediunidade e, também, as experiências de quase morte (EQM), as

quais, segundo o autor, têm sido bastante estudadas em vários centros de pesquisa.

Peres (2004) comenta, também, sobre a incidência de vários estudos no

que concerne aos estados alterados da consciência (EAC). Segundo o autor, estes

representam ferramentas, utilizadas no entendimento de novos padrões de

sentimento comportamento e pensamento.

Na seguinte citação, Menezes Júnior e Moreira-Almeida (2009), reportam-

se à fala de Sims sobre a compreensão deste acerca experiência saudável, pois

segundo os autores, para Sims:

O indivíduo compreende a incredulidade dos outros e tem reservas de discutir a sua experiência com os outros que acredita que não a compreenderão, é descrita com convicção e, por fim, o indivíduo sente necessidade de efetuar alguma mudança no seu comportamento depois da experiência vivida. Já a experiência patológica se revela em resultados que são compatíveis com uma história de transtorno mental e surge sempre

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associada a outros transtornos psiquiátricos. (MENEZES; MOREIRA, 2009, p. 77).

Entretanto, Dalgalarrondo (2008), também ao citar Sims, comenta que é

difícil separar experiências espirituais e sintomas psicopatológicos de forma geral.

Para este autor, mesmo quando experientes e bem treinados, os profissionais terão

dificuldade de separar ambas as experiências, por elas serem separadas, na maioria

dos casos, por um tênue divisor.

Para Koenig (2007, p. 102), embora possa ser difícil distinguir crenças de

experiências psicóticas e crenças não-

já que o envolvimento religioso não-psicótico pode ter impacto positivo no curso da

doença e freqüência de exacerbações psicóticas, merecendo, assim, apoio e

podem indicar presságio de pior prognóstico e, por isso, deveriam ser tratados de

Infelizmente, conforme Koenig (2007), há, ainda, muito sobre a relação

entre religião e doença psicopatológica que permanece desconhecido, o fato que

aponta a necessidade de serem produzidas mais pesquisas. Porém, o que já se

conhece justifica, ao menos, alguns passos cautelosos que se possam dar adiante.

uma cuidadosa história espiritual, apoiar o envolvimento religioso não-psicótico e

considerar intervenções de grupos espiritualmente fundamentadas para pacientes

Peres et al. (2007) acentua que, atualmente, a experiência religiosa

deixou de ser considerada fonte de patologia, sendo considerada, em alguns casos,

como promotora de re-equilíbrio e saúde da personalidade.

Peres et al. (2007, p. 140) afirma que vários estudos, realizados na

spiritualidade estão

associados com melhores índices de saúde, incluindo longevidade, habilidades de

ou e -IV, reconhece que os temas espirituais e religiosos podem

ser foco de consulta e do tratamento psiquiátrico psicológico.

Page 89: Psicologia e Religião (Tcc)

89

4.3 As classificações do DSM-IV e CID 10

4.3.1 O DSM IV

Segundo o DSM-IV, a característica essencial dos Transtornos

Dissociativos é uma perturbação nas funções, habitualmente integradas, de

consciência, memória, identidade ou percepção do ambiente. O distúrbio pode ser

súbito ou gradual, transitório ou crônico.

Esta seção compreende os seguintes transtornos: Amnésia

Dissociativa; Fuga Dissciativa; Transtorno Dissociado de Identidade; Transtorno de

Despersonalização; Transtorno Dissociativo sem outra Especificação. Os sintomas

dissociativos, também, são incluídos nos conjuntos de critérios para Transtornos de

Estresse Agudo, Transtorno de Estresse Pós-Traumático e Transtorno de

Somatização.

Uma perspectiva transcultural, segundo o DSM-IV, é particularmente

importante na avaliação dos Transtornos Dissociativos, uma vez que, em muitas

sociedades, estados dissociativos são uma expressão, comum e aceita, de

atividades culturais ou de experiências religiosas. A dissociação não deve ser

considerada como inerentemente patológica e, muitas vezes, não acarreta

sofrimento ou prejuízo significativos ou leva a uma busca de auxílio. Entretanto,

diversas síndromes, culturalmente definidas, caracterizadas por dissociação,

causam real sofrimento e prejuízo e são reconhecidas nos locais em que ocorrem

como manifestações de patologia.

4.3.2 Transtorno de Transe Dissociativo

A característica essencial é um estado involuntário de transe , o qual não

é aceito pela cultura da pessoa como parte normal de uma prática cultural ou

religiosa coletiva e causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo emocional.

Este transtorno proposto não deve ser considerado em indivíduos que entram,

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90

voluntariamente, em estado de transe ou possessão, sem sofrimento, no contexto de

práticas culturais e religiosas amplamente aceitas pelo seu grupo cultural.

Tais estados voluntários, e não patológicos, são comuns e constituem a

imensa maioria dos transes de possessão encontrados em variadas culturas.

Entretanto, alguns indivíduos, que passam por transe ou estados de transe de

possessão culturalmente normais, podem desenvolver sintomas que causam

sofrimento ou prejuízo e que, portanto, poderiam ser considerados candidatos ao

proposto transtorno.

Os locais específicos onde ocorrem os casos de transe dissociativo

mostram considerável variação transcultural com relação à natureza precisa dos

comportamentos apresentados durante o estado alterado, presença ou ausência de

alterações sensoriais dissociativas (por exemplo, a cegueira), identidade assumida

durante esses estágios e grau de amnésia experimentada após o estado alterado.

No transe, a perda da identidade habitual não está associada com o

aparecimento de identidades alternativas e as ações executadas durante o estado,

geralmente, não são complexas (por exemplo, movimentos convulsivos: cair, correr,

etc.). No transe de possessão, existe o aparecimento de uma ou diversas entidades

alternativas distintas, com comportamentos, recordações e atitudes característicos.

As atividades executadas, pela pessoa, tendem a ser mais complexas (por exemplo,

conversas coerentes, gestos característicos, expressões fáceis e verbalizações

específicas, culturalmente estabelecidas como pertinentes a determinado agente

que toma posse do indivíduo). Amnésia completa ou parcial é relatada, com maior

freqüência, após um episódio de transe de possessão que após um episódio de

transe (embora relatos de amnésia após um transe não sejam incomuns).

Muitos indivíduos, com este transtorno proposto, exibem aspectos de,

apenas, uma espécie de transe, mas existem casos onde são apresentadas uma

sintomatologia mista ou flutuação entre os tipos de transe ao longo do tempo, de

acordo com parâmetros culturais locais.

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91

4.3.3 Características associadas

Variantes das condições apresentadas são descritas em quase todas as

sociedades tradicionais, em todos os continentes. A prevalência parece diminuir com

o aumento da industrialização, mas permanece elevada entre as minorias étnicas

tradicionais em sociedades industrializadas. Existem consideráveis variações locais

na idade e modo de início. O curso, tipicamente, é episódico, com duração variável

dos episódios agudos, de minutos a horas. Foi relatado que, durante um estado de

transe, os indivíduos podem ter um limiar aumentado para a dor, ingerir materiais

não comestíveis (por exemplo, vidro) e experimentar um aumento da força muscular.

Os sintomas de um transe patológico podem ser aumentados ou

reduzidos em resposta a indícios ambientais e orientações de outros. Os

presumíveis agentes de possessão, em geral, são de natureza espiritual (por

exemplo, espíritos de mortos, entidades sobrenaturais, deuses, demônios, etc.) e,

muitas vezes, são vistos fazendo exigências ou expressando animosidade.

Os indivíduos com transe de possessão patológico, tipicamente,

vivenciam um número limitado de agentes (de um a cinco) de modo seqüencial, não

simultâneo. As complicações incluem tentativas de suicídio, automutilação e

acidentes. Mortes têm sido relatadas, correspondente a arritmias cardíacas.

4.3.4 Diagnóstico Diferencial

No DSM IV, os indivíduos, cuja apresentação satisfaz os critérios para

pesquisas, seriam diagnosticados como casos de Transtorno Dissociativo Sem

Outra Especificação. Este diagnóstico não deve ser feito se o estado de transe é

considerado, em virtude de efeitos fisiológicos diretos, de uma condição médica

geral (a qual seria diagnosticada como Transtorno Mental a uma Condição Médica

Geral Sem Outra Especificação) ou de uma substância (diagnosticada de

Transtorno Relacionado à Substância Sem Outra Especificação).

Os sintomas do estado de transe (por exemplo, ouvir ou ver entes

espirituais e ser controlado ou influenciado por outros) podem ser confundidos com

Page 92: Psicologia e Religião (Tcc)

92

as alucinações e delírios de Esquizofrenia, Transtorno do Humor com Aspectos

Psicóticos ou Transtorno Psicótico Breve. O estado de transe pode ser

distinguido por sua congruência cultural, sua duração mais leve e ausência de

sintomas característicos dos outros transtornos.

Os indivíduos, com Transtorno Dissociativo de Identidade, podem ser

diferenciados dos que apresentam sintomas de transe e possessão, pelo fato de os

últimos, tipicamente, descrevem espíritos externos ou entidades que ingressaram

em seus corpos e assumiram o controle. O transtorno proposto não deve ser

considerado em indivíduos que ingressam em transes ou estados de possessão

voluntariamente e sem sofrimento ou prejuízo, no contexto de práticas culturais e

religiosas.

4.3.5 CID-10

Também, no CID-10, podemos encontrar referências a transtornos de

ordem religiosa, sob as designações de F44 e F44.3. Ambos se referem,

respectivamente, a Transtornos Dissociativos (de conversão) e a Estados de transe

e possessão.

Especificamente, em F44.3 (Estados de transe e possessão)

encontramos transtornos que se caracterizam pela perda de identidade, sem que

haja, entretanto, perda da consciência do meio ambiente por parte do sujeito. Neste

transtorno, incluem-se, somente, estados de transe involuntário, excluindo, desta

forma, estados de transe que advenham de contexto cultural ou religioso do sujeito.

A caracterização deste transtorno exclui ainda:

Esquizofrenia (F20.-);

Intoxicação por substância psicoativa (F10-F19 com quarto caráter comum 0);

Síndrome pós-traumática (F07. 2);

Transtorno Orgânico da personalidade (F07. 0);

Transtornos Psicóticos agudos e transitórios (F23.-).

Page 93: Psicologia e Religião (Tcc)

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5 METODOLOGIA

5.1 Introdução

O presente trabalho constitui-se de uma pesquisa teórica, bibliográfica

desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e

as que se propõem à análise das diversas posições acerca de um problema,

também costumam ser desenvolvidas quase exclusivamente a partir de fontes

A classificação da pesquisa, como

problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses. Pode-se

dizer que estas pesquisas têm como objetivo principal o aprimoramento de idéias

Este trabalho se baseia em diversas referências, artigos e dissertações de

mestrado disponíveis nos bancos de dados on-line nacionais e internacionais, tais

como: Scielo, Google acadêmico, artigos já publicados em livros ou revistas, livros

da biblioteca universitária da UNESC, da biblioteca particular do professor orientador

e da próprio autor.

5.2 Organização dos dados pesquisados

Os dados encontrados foram organizados em três capítulos teóricos:

1. A experiência religiosa vista por importantes autores da psicologia;

2. Influências da experiência religiosa sobre o psiquismo e comportamento

humano;

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94

3. Experiência religiosa e saúde mental.

No primeiro capítulo, procurou-se averiguar qual o entendimento de

grandes autores da psicologia sobre a experiência religiosa. Para tal, foram

escolhidos treze autores de grande expressão dentro da psicologia, os quais tenham

se manifestado de forma mais explicita sobre a religião, mais precisamente, sobre a

experiência religiosa. É importante mencionar que a escolha de tais autores se deu

em função de serem fundadores/precursores de grandes escolas da psicologia ou

em função do fato de terem deixado marcos teóricos quanto ao entendimento do

assunto.

Este capítulo conta com uma interlocução inicial e treze sub-capítulos, nos

quais, de forma concisa, são apresentados os principais pensamentos de cada um

dos autores a respeito da temática em questão.

O segundo capítulo, ao tratar da influencia religiosa sobre o psiquismo,

procura esclarecer, no seu primeiro sub-capítulo, acerca das definições de religião,

experiência religiosa e espiritualidade, termos que, mesmo tendo algumas

similaridades, possuem definições muito variadas e, até mesmo, destoantes que

podem prejudicar um maior entendimento acerca dos mesmos.

Este capítulo traz, ainda, as evoluções do pensamento das quatro

grandes forças da psicologia (Behaviorismo, Psicanálise, Humanismo e

Transpessoal), quanto ao seu entendimento da experiência religiosa na atualidade.

Se no primeiro capítulo, procurou-se identificar o principal pensamento dos

precursores da psicologia em relação à temática da experiência religiosa, neste,

procurou-se identificar a forma como, atualmente, as escolas têm abordado o

assunto, dando enfoque às evoluções na forma de encarar este fenômeno.

O mesmo capítulo apresenta, também, algumas páginas que explanam o

manejo da experiência religiosa no contexto da psicoterapia na atualidade. Neste

espaço, procurou-se apresentar o pensamento atual de vários pesquisadores do

assunto. Para tanto buscou-se respaldo em revistas e artigos científicos, a fim de ter

posse de discussões mais recentes relacionadas à psicoterapia e à experiência

religiosa.

O terceiro capítulo trata de questões pertinentes à associação entre

psicopatologia e religião/experiência religiosa, bem como, sobre a relação entre

psicopatologia e espiritualidade. Neste capítulo, são apresentados, brevemente,

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alguns eventos históricos que marcam as relações entre doença mental e

experiência religiosa.

O capítulo expõe, também, estudos atuais sobre os critérios para se fazer

um diagnóstico diferencial. Além disso, apresenta a inclusão das categorias de

transtorno de possessão e transtornos religiosos, somados aos transtornos

dissociativos no CID-10 e DSM-IV.

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6 CONCLUSÃO

É inegável a universalidade da experiência religiosa. A busca por uma

experiência com o divino, com um ser que é maior que o humano e que, de alguma

forma, manifesta-se e dialoga, existencialmente, com o ser criado, é algo que pode

ser vislumbrado, sem grandes esforços, em todas as culturas e em todas as épocas.

Mudam-se as imagens, mudam-se as concepções do divino, mudam-se

os ritos, mas, permanece no coração humano, o desejo de entrar em comunhão com

outra esfera da existência. Neste sentido, a experiência religiosa não comporta,

somente, o relacionamento com uma figura, ou com um ser imaterial, transcendente,

mas com algo capaz de plenificar a vida, um sentido que ajuda a o ser humano

geradora da experiência religiosa, foi materializada durante muito tempo nos

recônditos das religiões.

advindo do

-ligar, tornar a ligar), pode-se entender que, em sua gênese

ou na sua experiência fundante, conforme explanado por Jung (1973), a religião tem

por objetivo levar o ser humano a entrar em comunhão com a esfera divina e

responder, consequentemente, por meio de uma experiência religiosa, ao que Frankl

Afirmar que somente as experiências religiosas respondem a estas

questões, profundamente arraigadas no coração humano, seria uma injustiça

cometida contra os não religiosos, os quais, encontram sentido para suas vidas, em

outras esferas significantes. Também, seria ingenuidade acreditar que a religião,

sempre, teve, claro para si, o propósito de levar o homem a conferir significado à sua

existência, uma vez que, no intuito de impor um sentido encontrado, muitas vezes os

homens geraram guerras e disputas em nome da religião.

O passado é testemunha de que, muitas vezes, a religião, em defesa do

dogma ou da fé, esqueceu- -

questões mais profundas, perdendo-se, num dogmatismo que exclui a eterna

novidade de cada experiência religiosa e o componente subjetivo que perpassa

essas experiências.

Page 97: Psicologia e Religião (Tcc)

97

O próprio texto bíblico expressa esta impossibilidade de objetivação do

fenômeno, ao afirmar que o espírito sopra onde, quando e como quer. Entretanto, os

mesmos textos guardam chaves de leitura para o discernimento de tais experiências,

segundo um entendimento religioso. Como por exemplo, na seguinte frase, atribuída

Para o cristianismo, não há como pensar uma experiência religiosa

desconectada da pessoa de Cristo e de sua vida, uma vez que, entende-se que, em

Cristo, Deus se permite ser conhecido. Na mesma perspectiva, não há como

encontrar um sentido de vida que não condiga com o Evangelho de Cristo. Não há

como pensar, segundo a mística cristã, uma experiência religiosa que não gere, no

homem, os mesmos pensamentos e sentimentos de Cristo. Esta é, certamente uma

verdade de fé irredutível na experiência religiosa das tradições cristãs.

Assim, também, não há como o judaísmo entender uma experiência

religiosa que não se funde nos textos da Torá ou no profetismo vétero-testamentário.

Nem mesmo será possível para o islamismo pensar sua experiência de fé diferente

ao sentido da experiência, por outro, uma interpretação destoante do vivido pode

gerar dificuldades na aceitação das experiências que fogem a esta compreensão. E

traria, ainda mais, dificuldades ao âmbito privado, quando a pessoa pudesse sentir

que sua experiência não condiz com o entendimento tido e definido pela religião.

A antropologia cristã, baseada nos textos bíblicos e em especial na

passagem do livro de Gênesis, sempre, entendeu o homem enquanto ser feito à

imagem e semelhança de Deus. Entendendo-se que o ser humano tenha sido criado

à imagem e semelhança de Deus, faz-se necessário, na sua condição de criatura,

que o homem busque habitar o seu próprio interior e descubra-se como um lugar

privilegiado da presença de si e, também, da presença de Deus.

Por isto, Santo Agostinho, em sua obra Confissões, afirmava que quanto

mais o ser humano se conhece, mais poderá conhecer a Deus. Ao se afastar de si

mesmo, o humano se afasta, também, de Deus. Na visão de Agostinho, a

experiência religiosa é uma profunda experiência antropológica.

Karl Rahner, um dos maiores expoentes da teologia na atualidade, afirma

que quando o ser humano se experimenta radical e intensamente, ele toca no

mistério que o constitui. Rahner diz que este constitui o momento em que o ser

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98

humano se sente de forma mais profunda, no qual faz a sua verdadeira experiência

religiosa, entendida pelo autor como experiência de Deus.

Pode-

oportunidade para que o homem possa ser ele mesmo, auto atualizado, como diria

Maslow? Como alguém que alcançou o processo de individuação, conforme

apontado por Jung? Ou, como quem encontrou o sentido da vida, como, bem

Entendendo o Deus religioso enquanto figura construída, culturalmente,

pelo homem, ou seja, à imagem e semelhança do homem (o que, de todo, não é

sem razão), a psicologia, durante muito tempo, ignorou a busca pelo transcendente.

Deixou de se enriquecer do milenar conhecimento religioso, por se focalizar nas

psicopatias do religioso, ainda, tão evidentes em muitos contextos socio-religiosos. A

psicologia relegou toda a experiência religiosa ao âmbito do psicopatológico.

Entretanto, novas formas de vislumbrar tal fenômeno têm conferido, à

experiência religiosa, outra dimensão, conforme apresentado no decorrer do

presente estudo. A psicologia tem aurido novos significados da experiência religiosa

mediante uma postura diferente frente a tais temas tão, constantemente, levantados

nos contextos psicoterápicos.

A emergência destes temas, aliados a uma abertura da psicologia a

outras espiritualidades, não necessariamente religiosas, tem ajudado na construção

de um diagnóstico diferencial para o que, de fato, seja uma experiência religiosa, e

também, para o que não deve se compreendido como tal. Embora as pesquisas

nesta área tenham avançado nos últimos anos e os psicólogos tenham dado maior

abertura para estes temas na psicoterapia, há ainda um longo caminho a percorrer.

Finalizando as conclusões obtidas com esta pesquisa, desde o

pensamento inicial dos grandes autores da psicologia, passando pelo entendimento

das principais escolas, pelo trato de tais questões em psicoterapia, além das

relações entre experiência religiosa e psicopatologia, torna-se perceptível a

complexidade do tema abordado bem como do quanto a psicologia, ainda, precisa

adentrar nessa área. Por enquanto, resta repetir junto ao filósofo francês, Blaise

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REFERÊNCIAS

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ANEXO

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Diferenciação entre experiências espirituais e sintomas psicopatológicos

Características Experiências espirituais Sintomas psicopatológicos

Conteúdo das

vivências.

Os conteúdos seguem uma doutrina

religiosa: são aceitáveis pelo

subgrupo cultural

O conteúdo é bizarro;

geralmente, reivindica um status

divino ou a posse de poderes

especiais.

Características das

experiências

sensoriais (ilusões,

alucinações, visões,

vozes).

Os elementos sensoriais são mais

Os elementos sensoriais são

dão a sensação de serem percepções reais.

Modalidade sensorial das vivências.

Predominantemente alucinações e ilusões visuais.

Predominantemente alucinações auditivas.

Grau de certeza das vivências

As crenças se formam com a possibilidade da dúvida. geralmente, há certeza absoluta.

Insight Às vezes, presente, noutras ausente Frequentemente, insight ausente.

Duração da vivência Duração breve. Duração longa.

Controle volitivo Há, por parte do sujeito, um grau de controle e direcionamento sobre as vivências.

São experiências vivenciadas sem qualquer controle por parte do sujeito.

Orientação em relação a outras pessoas

Vivências são orientadas em relação a outras pessoas.

Vivências são quase sempre orientadas para si (autoorientadas)

Significado para vida do sujeito

Experiências, geralmente, desintegrativas, produzindo a deteriorização vital do sujeito.

Positividade / negatividade

As vivências têm, de modo geral,

sujeito.

As vivências têm, de modo geral, sentido negativo para vida do sujeito.

Implicação na ação do sujeito

São experiências nas quais o

produzindo sua vida.

São experiências nas quais o

agidoexperiência

Relação com sintomas psicopatológicos em outras esferas da vida

articulam com outros sintomas de transtornos mentais.

Geralmente, são vivências isoladas. Ao lado do delírio ou da alucinação mística, há outros sintomas psicóticos.

Estilo de vida e de personalidade do sujeito

Tanto o estilo de vida como a personalidade do sujeito revelam religiosidade presente e antecedendo a vivência.

O estilo de vida e a personalidade indicam alterações e deteriorização associados a transtornos mentais

Comunicação da experiência com outras pessoas

Sujeito busca relatar sua experiência para outras pessoas, sobretudo, de seu grupo cultural.

Sujeito é, geralmente, reticente em relatar e discutir essas experiências.

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Possíveis fatores positivos e fatores negativos da

religião e da religiosidade sobre a saúde mental

Fatores ou efeitos positivos Fatores ou efeitos negativos

Fornecer um conjunto de sentidos e significados plausíveis para a existência, para o sofrimento e para a morte.

Por meio da idéia maniqueísta de bem e de mal absolutos, figuras do mal, como o demônio, podem disponibilizar um perseguidor constante.

Produzir e fornecer uma rede de apoio social acessível e, culturalmente, aceitável para o sujeito.

Diminuir a liberdade individual por meio de cobranças exigentes do grupo sócio religioso em relação tanto a comportamentos quanto a pensamentos, fantasias e valores.

Estabelecer padrões comportamentais saudáveis em relação ao uso de álcool, tabaco e drogas ilícitas.

Estabelecer padrões de conduta moral de difícil alcance, produzindo uma sensação constante de culpa, insuficiência e baixa autoestima.

Fornecer padrões de coping relacionados a perdas vitais, como viuvez, perda de amigos ou parentes, envelhecimento. Oferecer formas ritualizadas de luto.

Sujeitos com orientação homossexual, com identidade transexual ou outros comportamentos diferem da norma, embora muitas vezes intensamente interessados na vida religiosa, sofrem rejeição e discriminação por grupos religiosos dos quais nasceram ou querem ingressar.

Práticas rituais podem fornecer a sensação de pertencer a um grupo, de contato com o sagrado e de proteção divina, podem contribuir na realização de sentimento religioso.

Práticas rituais, emocionalmente, intensas, podem desencadear episódios psicóticos ou de outros transtornos mentais.

Difundir a idéia de solidariedade e de igualdade, vinculando valores e comportamentos relacionados à aceitação, tolerância, ajuda e apoio a outras pessoas e grupos. Aparentados ao sentido de solidariedade, estariam a piedade, a caridade, o amor ao próximo e à natureza, etc.

Engendrar idéias sectárias de superioridade do próprio grupo e de inferioridade de pessoas ou grupos externos ou distintos em termos culturais, religiosos ou étnicos, ou de outra diferença de qualquer natureza, estimulando assim o racismo, o sexismo, o classismo, o etnocentrismo, o preconceito, a discriminação religiosa, etc.