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Mônica Maria Tassigny, UNIFOR

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EDITORIAL

O tempo passa... escoa em nossas mãos. E novamente chegou o Natal! Chegamos à última edição da ANIMA de 2014 com saudades do ano velho e com muitas esperanças para o ano que vem.

Com grande satisfação a ANIMA traz em sua 28ª. edição os melhores trabalhados apresentados ao VI Seminário de Pesquisa da Estácio e II Jornada de Iniciação Científica da Universidade Estácio de SÁ, evento que tem como objetivo promover a visibilidade e a interdisciplinaridade do conhecimento científico.

Foram selecionados os melhores resumos para publicação em formato - Artigo Completo. A escolha dos trabalhos se deu mediante processo avaliativo apoiado por docentes das diversas áreas de conhecimento na Estácio.

Nesta edição publicamos 15 (quinze) estudos desenvolvidos na área ambiental, gestão, jurídica, saúde e tecnologia.

Assim, na área ambiental são apresentados três estudos, quais sejam: Acúmulo de resíduos sólidos nas margens do Rio Cotia (SP), Descarte adequado de medicamentos: alternativa possível e aplicação de informações, Sensoriamento remoto aplicado na conservação do solo.

Na área Jurídica são apresentados os estudos: Aplicação de medidas cautelares alternativas à prisão preventiva nos crimes de tráfico de drogas, A constituição do campo assistencial no Brasil, Direito fundamental à saúde x direito econômico das empresas de saúde suplementar, Legitimidade e parâmetros para efetivação de políticas afirmativas de promoção da igualdade étnico-racial no Brasil, O poder moderador e sua repercussão sobre o poder executivo, O processo administrativo disciplinar nas entidades paraestatais, Representações sobre formação de mediadores judiciais em Niterói.

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Da área da Saúde são três estudos: Avaliação do índice de

resto-ingesta em uma unidade de alimentação e nutrição (UAN) localizada na cidade de Antônio Carlos/SC, Células tronco e terapias regenerativas e, por último, o artigo Enfermagem na ATI UNESA Petrópolis).

As áreas de Tecnologia e Gestão contribuem com o conhecimento apresentado nos estudos: Caracterização mecânica de blocos cerâmicos utilizados em alvenaria na região norte do estado do Rio de Janeiro e A influência do “esquematismo” da indústria cultural na internet.

Desejamos a todos boas festas e uma leitura

muito proveitosa.

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11 ACÚMULO DE RESÍDUOS SÓLIDOS NAS MARGENS DO RIO COTIA (SP) - SILVA, Geni Ferreira; TIZZATTO, Elisangela G.; FERREIRA, Marcos Roberto; SANTOS, Michael Jackson Alves; MAJER, Alessandra Pereira.

17 DESCARTE ADEQUADO DE MEDICAMENTOS: ALTERNATIVA POSSÍVEL E APLICAÇÃO DE INFORMAÇÕES – SANTOS, Amanda Pereira; SOUZA, Dorenilde Santos; SOUZA, Eliene Rodrigues; BROUWER, Mônica da Silva Fernandes; MAJER Alessandra Pereira.

23 SENSORIAMENTO REMOTO APLICADO NA CONSERVAÇÃO DO SOLO – MIRANDA, Ciomara de Sousa; NADAI, Karla Bethânia L.; PARANHOS FILHO, Antônio Conceição.

29 CARACTERIZAÇÃO MECÂNICA DE BLOCOS CERÂMICOS UTILIZADOS EM ALVENARIA NA REGIÃO NORTE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - ALMEIDA, B. G. B; AZEVEDO, T. M; SÁ, T. V; SANTOS, A. L. H. A;

ALMEIDA, L.L.P.

35 A APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS À PRISÃO PREVENTIVA NOS CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS – VARGAS, Róbson.

43 A CONSTITUIÇÃO DO CAMPO ASSISTENCIAL NO BRASIL – BRAGA, Virna Ligia Fernandes.

49 DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE X DIREITO ECONÔMICA DAS EMPRESAS DE SAÚDE SUPLEMENTAR – ALVES, Osair; MARTINS, Marianne Rios de Souza.

55 LEGITIMIDADE E PARÂMETROS PARA A EFETIVAÇÃO DE POLÍTICAS AFIRMATIVAS DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE ÉTNICO-RACIAL NO BRASIL: AS CONTRIBUIÇÕES DO DIÁLOGO ENTRE CONSTITUIÇÃO E DIREITO INTERNACIONAL – CAMPINHO, Bernardo Brasil.

63 O PODER MODERADOR E SUA REPERCUSSÃO SOBRE O PODER EXECUTIVO – OLIMPIO, Telmo; MARQUES, Allan; BOLONHA, Carlos.

69 O PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR NAS ENTIDADES PARAESTATAIS – OLIVEIRA, Jahson Costa; MARTINS, Marianne Rios.

75 REPRESENTAÇÕES SOBRE FORMAÇÃO DE MEDIADORES JUDICIAIS EM NITERÓI – ALMEIDA, G. G. S. L. de.

81 RESTO-INGESTA EM UMA UNIDADE DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO (UAN) LOCALIZADA NA CIDADE DE ANTÔNIO CARLOS/SC – AQUINO, Gabriela Rodrigues Varela; ZIMMERMANN, R. S.; CLEMENTE, Isaura Hammerschmitt; ACIOLY, P. L.

87 CÉLULAS TRONCO E TERAPIAS REGENERATIVAS – CARVALHO, Husten da Silva; SOUZA, Luciana Borges Oliveira; LUZ, Flávia Cristina Oliveira; XAVIER, Eveliney Vicente de Alencar; SANTOS, João Paulo Bello; MAXIMIANO, Elizabeth; MATTOS, Adriana.

99 ENFERMAGEM NA UTI UNESA PETRÓPOLIS – MOTA, Gisele Luzia M. G.; DÁVILA, Érica V. W.; LARA, Christianne Reis de Souza; MONTEIRO, Ana Cláudia M.

105 A INFLUÊNCIA DO ESQUEMATISMO DA INDÚSTRIA CULTURAL NA INTERNET – FLORES, Bárbara de Almeida; TÁVORA, Getúlio.

Sumário

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 11

ACÚMULO DE RESÍDUOS SÓLIDOS NAS MARGENS DO RIO COTIA (SP)

ACCUMULATION OF SOLID WASTE IN THE BANKS OF COTIA RIVER

Geni Ferreira da Silva, Elisangela G. Tizzatto, Marcos Roberto Ferreira, Michael Jackson Alves dos Santos, Alessandra, P. Majer

RESUMO As matas ciliares são ambientes de grande importância ecológica, contribuindo com a manutenção da qualidade da água e dificultando o despejo de lixo em seu curso. Por este motivo é observado um acúmulo de resíduos nestas áreas, problema que vem se agravando na extensão do Rio Cotia. Neste contexto, este estudo visou avaliar, qualificar e quantificar os resíduos observados às margens do rio Cotia, identificando sua provável fonte de origem e testando o efeito das características da comunidade vizinha neste acúmulo. Para tanto, três áreas da margem com diferentes perfis de ocupação (próximo à área de conservação X área doméstica X área doméstica/industrial) foram avaliadas. Foram encontrados 1.562 itens, com massa de 246,801 kg, destes, a maior parte dos resíduos (64,14%) correspondeu a itens associados à construção civil, sendo seguida por plástico (29,38%) e papel (3,32%). Na comparação entre os pontos somente foi observada uma distinção na abundância, com a área residencial apresentando um maior número total de resíduos (p=0,012). A avaliação da fonte mais provável destes resíduos indica tanto um efeito associado aos moradores locais como o descarte ilegal por parte de caçambeiros associados à construção civil em áreas mais nobres.

ABSTRACT Riparian forests are ecologically important environments, contributing to the maintenance of water quality and hampering the garbage dump in their course. For this reason it is observed an accumulation of waste in these areas, a serious problem in Rio Cotia. This study aimed to evaluate, qualify and quantify residues observed on the banks of river Cotia, identifying its probable source of origin and testing the effect of the surrounding community. To this end, three areas with different margin occupation profiles were evaluated. 1,562 items were found, with 246,801 kg of mass, of whom the majority of the residues (64.14%) corresponded to items associated with construction, followed by plastics (29.38%) and paper (3.32%). Comparing the points, only a distinction in abundance was observed, with the residential area presenting a greater total number of residues. The assessment of the most likely source of these residues indicates both an effect associated with local residents as the illegal disposal associated with construction in richer areas.

Palavras-Chave: Resíduos Sólidos, Degradação ambiental, impacto ambiental, prevenção e controle, sensibilização pública. Keywords: Solid Waste, Environmental degradation, environmental impact, prevention and control, public awareness.

___________________________________________________________________________________1. Faculdade Estácio Europanamericana de Humanidades e Tecnologias, 2. Faculdade Estácio Cotia, 3. Centro Universitário Estácio Radial de São Paulo - Autor para correspondência – [email protected]

A mata existente à beira dos cursos fluviais e das

nascentes de água é denominada mata ciliar e,

corresponde a um ambiente de grande importância

como habitat e fonte de alimentos para a fauna

aquática e terrestre, sendo fundamental para a

conservação da biodiversidade (LEITE &

PEREIRA, 1996). Sua preservação é também de

suma importância por proporcionar a diminuição

dos processos de erosão e assoreamento no leito e

margem dos rios, o aumento da infiltração das

águas provenientes das chuvas para o

abastecimento dos lençóis freáticos e a

regularização da vazão das águas superficiais pela

redução da sua velocidade de escoamento. Além

disso, a presença dos componentes deste tipo de

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Geni Silva, Elisangela Tizzatto, Marcos Ferreira, Michael Santos, Alessandra Majer

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formação resulta num efeito filtro, inclusive no que

diz respeito ao acúmulo de resíduos sólidos,

dificultando o despejo de lixo e esgoto nos cursos

de água e também retendo e removendo parte dos

resíduos carregados por estes (KOBIYAMA et al.,

1998).

O acúmulo de resíduos sólidos representa um

problema sério em ambientes aquáticos, o que

inclui suas margens, já que podem resultar em

alterações físicas do ambiente, efeitos diretos e

indiretos sobre a fauna e flora, além de impactos

estéticos acentuados (e.g. MASCARENHAS et al.,

2004; MANZANO, 2009; COLABUONO et al.,

2010). Este tipo de lixo é definido como qualquer

resíduo nesta categoria (e.g. plástico, vidro,

borracha, metal, tecido, isopor, matéria orgânica e

madeira antropogênica) descartado, depositado ou

abandonado nos ambientes aquáticos, por qualquer

fonte (COE & ROGERS, 2000). Dentre esta

variedade de matérias-primas, os itens de plástico,

isopor e nylon geralmente constituem a maior

fração destes resíduos (ARAÚJO & COSTA,

2006), o que em muito se deve às suas

características intrínsecas, como baixa densidade

(que facilita sua flutuação, e consequente

dispersão), acumulação lenta, persistência, aporte

crescente com o tempo, e ampla disseminação do

uso (GREGORY, 1999).

Em ambientes naturais distintos, assim como as

margens de rios, dados relacionados ao grau de

divergência entre o estado atual do ambiente e o

seu ideal, são capazes de expressar sua saúde

ecossistêmica (ARAÚJO & COSTA, 2008) sendo

aplicáveis como importantes ferramentas de

gerenciamento, inclusive em situações de

disposição inadequada de resíduos sólidos. Neste

contexto o presente trabalho visou: (1) avaliar os

resíduos sólidos encontrados nas margens do rio

Cotia no que diz respeito à matéria-prima principal

e a provável fonte de origem; (2) quantificar, de

acordo com a matéria-prima principal a abundância

e massa destes resíduos; e (3) testar se as

características da comunidade vizinha influenciam

no tipo e quantidade de resíduo acumulado.

Três áreas da margem do Rio Cotia (SP) foram

consideradas como pontos de amostragem. A

primeira logo abaixo da represa do Morro Grande

(área com menor impacto), a segunda no bairro

Jardim Sandra (ocupação residencial), e a terceira

próxima ao km 27 da Rodovia Raposo Tavares

(marginada por casas e empresas). Em cada uma

destas, em uma área relativamente homogênea de

24 metros, foram dispostos 12 transectos

perpendiculares à linha d’água com largura de 2

metros e extensão de 5 metros. Cinco destes

transectos foram aleatoriamente selecionados para

a amostragem, nos quais todos os itens maiores

que 2,5 cm foram catalogados e pesados. Somente

no terceiro ponto foram amostrados somente

quatro transectos, em função da menor área

disponível.

Para fins de catalogação, os itens amostrados

foram divididos em nove tipos de resíduos sólidos

(plástico, tecido, vidro & cerâmica, metal, papel &

papelão, borracha, madeira, outros e resíduos de

composição mista) e também classificados quando

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ao seu uso. A comparação relativa à quantidade de

resíduo acumulado foi realizada por meio de uma

ANOVA multifatorial, seguida por um teste a

posteriori HSD de Tukey.

Considerando o estado inicial da área de estudo,

foram encontrados 1.562 itens, com massa de

246,8 kg. Destes, a maior parte dos resíduos, 64%,

correspondeu a itens associados à construção civil

(n = 1.002, 229 kg). A segunda categoria mais

abundante foi o plástico (29%, n = 459, 9.761 kg),

com a terceira e quarta destas categorias sendo

papel (3%, n = 52, 2,6210kg) e metal (1%, n =18,

0,934 kg), respectivamente.

Considerando a comparação entre os pontos de

amostragem, foi observado que a menor

quantidade de resíduos se deu no primeiro ponto,

próximo à reserva do Morro Grande. Neste ponto o

resíduo mais observado foi o plástico, com itens

como garrafas do tipo pet, saco de lixo, sacolas de

supermercado e fragmentos plásticos diversos.

Neste caso, a fonte principal de resíduos parece

associada às oferendas religiosas disposta nas

margens desse ponto. Já a maior quantidade de

resíduos foi encontrada no Jardim Sandra, onde os

itens mais frequentes no primeiro ponto também

foram comumente identificados, porém também

sendo observados sacos de areia e pedra, além de

outros itens associados à construção civil. Neste

caso, a primeira parte dos resíduos pode ser

parcialmente associada à ocupação doméstica do

entorno, com observações de queima de objetos

como moveis velhos e lixo em geral. Porém, outra

fonte de contribuição importante foi a utilização da

área para o descarte ilegal de entulho por parte dos

caçambeiros. Já no ponto próximo a Raposo

Tavares o resíduo mais observado foi o plástico,

com itens como garrafa pet, saco de lixo e

fragmento plástico também sendo os mais

frequentes. Resíduos associados à construção civil

também foram observados, porém, neste caso, a

fonte destes parece associada a obras realizada na

ponte que sustenta a rodovia e que se localiza na

lateral da área de amostragem.

Em termos de massa total, não foi observada uma

diferença no acúmulo observado entre os três

pontos de amostragem (GL = 2, F = 1,41 e p =

0,29; Fig. 1A). Porém, considerando a abundância

de resíduos esta diferença foi evidenciada com

maior número de itens no Jardim Sandra, bairro de

ocupação principalmente residencial (GL = 2, F =

6,4 e p = 0,012; Fig. 1B). Os demais pontos não

diferiram quanto à abundância.

Os resultados apresentados neste trabalho

correspondem a um diagnóstico inicial a respeito

dos resíduos acumulados às margens do Rio Cotia,

visando um futuro monitoramento e contínua

avaliação. Entretanto, apesar de iniciais, os dados

coletados até o momento permitem identificar dois

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principais tipos de resíduos sólidos como mais

relevantes, que por sua vez identificam diferentes

fontes. No caso dos resíduos associados à

construção civil suas características indicam uma

fonte externa ao ponto de amostragem, que

aparentemente recebe os itens gerados em bairros

mais nobres da região. Desta maneira, os impactos

associados a este descarte, são sentidos pela

população local do Jardim Sandra, cuja paisagem,

o tráfego de pedestres/veículos e drenagem urbana

são comprometidas, além de ocorrer a atração de

resíduos não inertes e vetores de doenças

(MORAIS, 2006).

Figura 1 – Comparação entre valores médios de (A) massa total de resíduos e (B) número total de resíduos entre os

pontos de amostragem. Ponto 1 - próximo à reserva do Morro Grande, Ponto 2 – Jardim Sandra, Ponto 3 - próximo à

rodovia Raposo Tavares.

Ao mesmo tempo, a perda da qualidade ambiental

destas áreas, resulta gradualmente em seu

abandono por parte da maioria dos moradores, uma

relação de aversão frente ao recurso natural

vizinho. Esta por sua vez, tem uma consequência

clara que é a acentuação da degradação ambiental,

já que a própria população acaba contribuindo com

o descarte inadequado naqueles pontos que ela já

considerada como perdidos. Este cenário não é raro

atualmente e os resultados mostram que já está

ocorrendo no Rio Cotia.

Para a recuperação da qualidade do rio e de suas

margens é essencial o restabelecimento do elo

afetivo entre este e a população local, visando que

estes indivíduos contribuam não só para a melhoria

das condições na área, mas também para sua

manutenção. Uma das ferramentas utilizadas para

alterar este panorama é a comunicação ambiental,

onde a partir do mapeamento das fontes e

influências associadas a um problema ambiental

específico, as informações sobre aquele assunto

conscientizam este publico e assim, contribuem

com a formação de cidadãos ambientalmente

educados (JOHN, 2000). Nessa perspectiva pode-

se dizer que o domínio da informação está

diretamente ligado ao poder de interferir e

reorientar as relações humanas e da sociedade com

a natureza (RAMOS, 1995).

O presente projeto visa justamente isso. O

diagnóstico aqui apresentado é somente a primeira

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etapa deste trabalho, que já inclui o monitoramento

sazonal do acúmulo de resíduos, e será expandido

para avaliar também a qualidade da água e

biodiversidade, visando gerar informações que

possam alimentar uma campanha de comunicação

ambiental específica para o rio Cotia e recuperar a

relação afetiva entre este e a população local.

ARAÚJO, M. C. B., COSTA, M., The significance

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beach. Pan American Journal of Aquatic

Sciences, 1, 28–34. 2006.

ARAÚJO, M. C. B.; COSTA, M. Environmental

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COE, J.M.; ROGERS, D.B. Marine Debris:

sources, impacts and solutions. 431 p., Springer-

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ISBN: 978-0387947594 2000.

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Vol.1, n. 1, p. 87-94, jul.. 2000.

KOBIYAMA, M.; GENZ, F.; MENDIONDO,

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MANZANO, A. B. Distribuição, taxa de

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MASCARENHAS, R., SANTOS, R.; ZEPPELINI,

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2004.

MORAIS, G. M. D. Diagnóstico da Deposição

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Uberlândia: subsídios para uma gestão

sustentável. Uberlândia, 2006. Dissertação

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DESCARTE ADEQUADO DE MEDICAMENTOS: ALTERNATIVA POSSÍVEL E APLICAÇÃO DE INFORMAÇÕES

PROPER DISPOSAL OF DRUG RESIDUES

Amanda Pereira Santos1, Dorenilde Santos de Souza1, Eliene Rodrigues de Souza1, Mônica da Silva Fernandes Brouwer1, Alessandra Pereira Majer1, 2, 3*

RESUMO Grande parte da população brasileira possui medicamentos em sua residência, porém estes não são geralmente descartados adequadamente nos casos de sobra ou vencimento, resultando em impactos ambientais negativos. Visando minimizar esta questão, este trabalho visou revitalizar o Ecoponto da Faculdade Estácio Cotia, realizando também uma avaliação quali-quantitativa destes resíduos. Desta maneira, a estrutura recebeu uma nova pintura, capa para as lixeiras e sinalização, incluindo além da coleta de comprimidos, líquidos e medicamentos pastosos/pó, também caixa para perfuro-cortantes. Quanto a avaliação dos itens descartados, foram descartados mais de 769 resíduos, sendo mais frequentes os comprimidos. A maior parte destes resíduos foi descartada de forma avulsa, sem rótulo ou com o rótulo danificado, porém nos demais foi possível determinar que 100% e 74% dos comprimidos e líquidos, respectivamente, se encontravam vencidos. Já considerando a classe terapêutica principal, foram observados tipos diversificados, sendo mais frequentes anti-hipertensivos, anticoncepcionais, anti-inflamatórios e antibióticos. Apesar da inexistência de informações sobre os possíveis impactos negativos associados a algumas destas substâncias, de modo geral são associados ao descarte inadequado de anticoncepcionais disfunções endócrinas em animais aquáticos e seres humanos, enquanto que para antibióticos a resistência microbiana é fato registrado, o que demonstra a importância deste tipo de iniciativa.

ABSTRACT Most people have drugs at their homes, but do not properly discard them in the case of leftovers or expiration date overdue. In order to minimize this problem, this study aimed to revitalize the residue disposal point at Faculdade Estácio Cotia also conducting a qualitative/quantitative assessment of these wastes. Thus, the structure received a new paint, cover for bins and signage. More than 769 residues were discarded so far, mainly pills. Most of this waste was disposed unlabeled, for the rest were determined that 100% and 74% of the tablets and liquid, respectively, were expired. When considering the main therapeutic class the more frequent were anti-hypertensives, contraceptives, anti-inflammatories and antibiotics. Despite the lack of information about the possible negative impacts of these substances, the improper disposal of contraceptives is associated to endocrine dysfunctions in humans and aquatic animals, whereas microbial resistance to antibiotics is registered, which demonstrates the importance of this type of initiative.

Palavras-Chave: Contaminação ambiental: prevenção e controle, sensibilização pública e educação ambiental. Keywords: Environmental contamination: prevention and control, public awareness and environmental education.

_______________________________________________________________ 1. Faculdade Estácio Cotia 2. Faculdade Estácio Europanamericana de Humanidades e Tecnologias 3. Centro Universitário Estácio Radial de São Paulo –Autor para correspondência –

[email protected]

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Amanda Santos, Dorenilde Souza, Eliene Souza, Mônica Brouwer, Alessandra Majer

Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 18

A organização mundial da saúde (OMS) define

medicamento como “qualquer substância química

num produto farmacêutico usada para modificar ou

explorar sistemas fisiológicos ou estados

patológicos em benefício do recebedor”.

Entretanto, no mundo todo se tem identificado a

presença de fármacos, tanto nas aguas como no

solo. Essa contaminação ambiental resulta do

descarte indevido e da excreção de metabólitos,

que por sua vez não são eliminados no processo de

tratamento de esgotos (BARCELOS et al., 2011).

Estes, porém, apresentam efeitos negativos claros

em diversas espécies. Os estrógenos sintéticos, por

exemplo, se constituem classe de fármacos

intensamente discutida considerando os possíveis

efeitos adversos, por interferirem no

desenvolvimento e reprodução de organismos

aquáticos, além de estarem relacionados ao

desenvolvimento de vários tipos de cânceres em

humanos. Estudo envolvendo peixes jovens da

espécie Rutilus rutilus, que foram expostos a

estrogênios sintéticos além de outros perturbadores

endócrinos, evidenciou uma feminização dos

peixes machos (ALVARENGA & NICOLETTI

2010). Também, bactérias presentes em ambientes

contaminados por antibióticos podem adquirir

resistência a essas substancias, visto que tais

organismos têm material genético com alta

capacidade de mutação. Ainda a contaminação dos

animais e do homem, pelos resíduos, acontece por

via oral, respiratória e cutânea, lembrando também

que diversas das espécies afetadas são, por sua vez,

fonte de alimento (UEDA, 2009).

No Brasil, analises em amostras de efluentes de

rios do estado do Rio de Janeiro, detectaram 9 de

13 compostos farmacêuticos investigados, dentre

eles reguladores de peso, anti–inflamatórios,

analgésicos e outras drogas de uso humano e

veterinário. O monitoramento de fármacos

residuais no meio ambiente vem despertando

grande interesse no desenvolvimento de método de

remoção adequados, devido ao fato de muitas

dessas substâncias serem frequentemente

encontradas em águas naturais e interferirem

significativamente na fisiologia, no metabolismo e

no comportamento das espécies (BELISÁRIO et

al., 2009).

Um ponto importante de entrada destas substâncias

no ambiente são as sobras, que por sua vez

apresentam várias causas. Dentre elas estão a

dispensação de medicamento em quantidade além

da necessária para o tratamento, as amostras-grátis

distribuídas pelos laboratórios farmacêuticos como

forma de propaganda, compra desnecessária de

medicamentos pela população e o gerenciamento

inadequado de medicamentos por parte de

farmácias e demais estabelecimentos de saúde

(EICKHOFF et al., 2009). Mas a destinação final

dos resíduos de origem farmacêutica pelo

consumidor final é a que apresenta maior lacuna na

legislação. Desta forma é um tema relevante para a

saúde pública, em virtude das diferentes

propriedades farmacológicas dos medicamentos

que, inevitavelmente, se tornarão resíduos

(BARCELOS et al., 2011). Considerando este

cenário, o presente trabalho teve como objetivos:

(1) a revitalização do ecoponto previamente

implantado na Faculdade Estácio Cotia, adequando

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a estrutura para o descarte de medicamentos na

instituição e permitindo assim a destinação final

correta destes resíduos por alunos e funcionários e

(2) a quantificação dos medicamentos descartados

e identificação de suas substâncias com ação

biológica.

A revitalização da área correspondente ao

ecoponto existente na instituição consistiu na

avaliação da estrutura para disposição de resíduos,

idealizando um melhor cumprimento de sua função

frente aos itens a serem coletados. O mesmo se deu

considerando sua localização dentro da instituição,

visando uma maior visibilidade e facilidade de

acesso.

Os resíduos descartados foram quantificados e

classificados quanto à validade e ação

biológica/terapêutica, sendo estas relacionadas

com os impactos ambientais descritos na literatura.

A revitalização do Ecoponto incluiu a reforma da

estrutura metálica que suporta as lixeiras

destinadas ao recebimento dos resíduos,

envolvendo esta a pintura e adição de porção

específica para disposição de caixa de papelão

voltada ao descarte de perfuro cortantes, que no

primeiro ano do Ecoponto foram descartados em

conjunto com diferentes medicamentos. A

estrutura agora conta com uma metragem de

92,3cm de altura, 1,55m de comprimento e 38,7cm

de profundidade, e se divide em lixeiras destinadas

ao recolhimento específico de: medicamentos

líquidos, sólidos, pomadas e a caixa para perfuro

cortantes.

A localização do Ecoponto também foi

considerada, sendo, entretanto, determinada que a

posição original era a mais adequada. Esta se

localiza em frente à entrada principal do prédio,

apresentando, portanto, excelente acesso e

visibilidade ao público da instituição. Para a

adequada identificação da estrutura foi adicionado

um cartaz informativo.

Dos medicamentos recebidos pelo Ecoponto a

maior parte correspondeu a itens de administração

oral (comprimidos ou líquidos), o que concorda

com a observação relatada por uma Instituição de

ensino com programa semelhante. Este programa

desenvolvido pela Faculdade de Farmácia da

UFRGS realiza campanha de descarte de

medicamentos vencidos (ROCHA et al., 2009) e

neste caso mais de 70% dos resíduos entram nesta

categoria. Este fato é atribuído a facilidade de

acesso e praticidade em termos de consumo

associada a este tipo de medicamento.

Considerando os comprimidos, que foram os

resíduos mais frequentes, até o momento foram

contabilizados 723 comprimidos, sendo 547 destes

descartados de modo avulso (fora da embalagem e

da cartela) o que impossibilitou sua identificação

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quanto aos demais parâmetros avaliados. Do total

que pode ser contabilizado, 100% dos

comprimidos se apresentaram fora do período de

validade. Já para líquidos, foram descartadas 39

itens, com 74,4% estando vencidas e 7,7% destas

sem rótulo ou com rótulo ilegível, o que

impossibilitou a determinação deste parâmetro.

Já considerando a classe terapêutica principal, para

comprimidos foram observadas substâncias com

dez tipos de ações distintos, sendo mais frequentes

anti-hipertensivos (28,9%), anticoncepcionais

(11,9%), anti-inflamatórios (11,3%) e antibióticos

(10,7%). Para os medicamentos líquidos, a

quantificação do volume foi dificultada em função

das diferenças em termos de tamanho e formato de

embalagens, porém foram mais frequentes

compostos antialérgicos, analgésicos,

antiasmáticos, antitussígenos e descongestionantes

nasais.

Apesar da inexistência de informações sobre os

possíveis impactos negativos associados a algumas

destas substâncias, de modo geral são associados

ao descarte inadequado de anticoncepcionais

disfunções endócrinas em animais aquáticos e

seres humanos (BELISÁRIO, 2009), enquanto que

para anti-inflamatórios e antibióticos a resistência

microbiana é fato registrado (BILA & DEZOTTI,

2003).

A simples instalação e revitalização do ecoponto

na instituição já permitiu observar a adesão de

vários alunos e funcionários da faculdade quanto á

destinação adequada de seus medicamentos em

desuso, demonstrando a importância da

disponibilização de uma estrutura para descarte

como o ecoponto. Apesar disso, são ainda raros

projetos similares, especialmente aqueles

desenvolvidos dentro de instituições de ensino

superior. Porém, projetos com objetivos similares

são desenvolvidos por algumas prefeituras

brasileiras ou mesmo outros países. Em Curitiba,

por exemplo, postos de recolhimento de

medicamentos estão presentes em pontos de

ônibus. Já em Portugal, assim como em outros

países desenvolvidos, existe um sistema integrado

de gestão de resíduos de embalagem e de

medicamentos instalados em drogarias e pontos de

fácil acesso para os consumidores (ALVARENGA

& NICOLETTI, 2010).

A importância deste tipo de iniciativa fica clara

quando se analisa os compostos presentes nestes

itens, assim como seus impactos conhecidos. Por

outro lado, a falta de informação sobre os possíveis

efeitos de inúmeras substâncias, tanto sobre a

espécie humana como sobre outras existentes no

ambiente, mostra o quão pouco se sabe sobre o

assunto atualmente, e quão importante é a

destinação correta destes resíduos. Por outro lado,

a falta de campanhas que visem a educação da

população em relação a este tema resulta na

continuidade do descarte inadequado, fato cujos

impactos negativos somente se acentuarão com o

crescimento populacional humano.

Considerando este fato, a próxima etapa do

presente projeto incluirá a elaboração e aplicação

da campanha de comunicação ambiental, por meio

da qual serão disponibilizados exemplos destes

fatos para a população da instituição. Com isso, se

espera uma potencialização do descarte observado

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até o momento no Ecoponto, estimulando também

um maior cuidado com as farmácias caseiras por

parte dos alunos e funcionários. Fazendo isso, a

instituição de ensino está cumprindo seu papel

estipulado nas políticas públicas e contribuindo

com a conscientização não só do seu público

interno, mas também com a disseminação deste

conhecimento a partir destes indivíduos.

ALVARENGA, L. S. V.; NICOLETTI, A. M.

Descarte doméstico de medicamentos e algumas

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SENSORIAMENTO REMOTO APLICADO NA CONSERVAÇÃO DO SOLO

REMOTE SENSING IN APPLIED SOIL CONSERVATION

Ciomara de Sousa Miranda, Karla Bethânia Ledesma de Nadai, Antonio Conceição Paranhos Filho

RESUMO A erosão é um processo pelo qual há remoção de uma massa de solo de um local e sua deposição em outros locais, como resultado da ação de forças exógenas. Objetivou-se neste estudo mapear as erosões, utilizando-se de geotecnologias, e trazer propostas de medidas de controle da degradação do solo e da água. Utilizando-se de imagens de satélite georreferenciadas, com operações de fusão, buffering e trabalhos de campo foi possível determinar, através da fotointerpretação, as áreas erodidas e também as áreas de APP. Gerou-se também, através de um modelo de elevação, o mapa de declividade do local. Através dos resultados das imagens, com a localização das erosões, propôs-se o método de estruturas construídas de paliçadas de bambu, essencial para o sucesso no controle da voçoroca. Com o uso das geotecnologias foi possível localizar e avaliar a situação da degradação do solo, podendo-se visualizar as áreas de erosão e em seguida propor uma medida intervenção eficaz e de baixo custo para o controle dos processos erosivos encontrados na propriedade rural.

ABSTRACT Erosion is a process whereby there is a mass removal of soil from a site and its deposition elsewhere, as a result of the action of exogenous forces. The objective of this study to map the erosion, using the geo, and bring proposals for measures to control soil degradation and water. Using satellite images georeferenced with a merger, buffering and fieldwork was determined by remote sensing, the eroded areas and also areas of APP. It also generated through an elevation model, the slope of the site map. Through the results of the images, with the location of erosions, it was proposed the method of structures built of bamboo fences, which is essential for success in controlling gully. With the use of geo-technology were able to locate and assess the situation of soil degradation, and we could visualize the areas of erosion and then propose an effective intervention measures and cost-effective for the control of erosion found on the farm.

Palavras-chave Erosão, proposta de intervenção, geoprocessamento, conservação solo, Sensoriamento Remoto. Key-words Erosion proposed intervention, geoprocessing, soil conservation, Remote Sensing

___________________________________________________________________________________________1. FESCG – Mato Grosso do Sul – [email protected]

É imprescindível que nos ambientes rurais sejam

adotadas ações prioritárias em relação às

atividades de conservação de solo e de água, pois

são estes os principais recursos naturais que

mantém a atividade agropecuária. Diante da

realidade da gestão agropecuária, o produtor

necessita de ações estratégicas para desenvolver o

manejo sustentável dos recursos naturais.

Tal manejo passa pelo planejamento de uso dos

mesmos, com aplicação de conceitos introduzidos

para a abordagem da complexidade ambiental e

com avaliação dos problemas levando em conta

seus vários aspectos interdependentes: geologia,

solos, vegetação, clima, uso atual, hidrologia e

aspectos antrópicos (SANTOS 1996).

As propriedades rurais são constituídas pelas áreas

de vegetações nativas, reservas legais e áreas de

proteção permanente, incluindo nascentes, lagoas

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e cursos de água. A presença dessas estruturas

naturais realiza importantes serviços ambientais

em benefício dos produtores rurais por serem

responsáveis pela manutenção da qualidade da

água e da conservação do solo, sendo assim

essenciais para o sucesso socioeconômico das

propriedades rurais, estando, também, prevista na

legislação.

Aliada à queda da produtividade vegetal nas áreas

de drenagem, a erosão hídrica provoca efeitos

negativos nos recursos hídricos adjacentes devido

ao aumento da produção de sedimentos e,

consequentemente, dos riscos de assoreamento e

de alteração da qualidade da água, tornando-a

imprópria para a dessedentação animal. O

escoamento superficial propicia o carreamento de

sedimentos aderidos à matéria orgânica, nutrientes

e agroquímicos, capazes de causar contaminação e

redução da disponibilidade hídrica.

A degradação da pastagem é um grave problema

no ciclo produtivo na pecuária e, de acordo com

Macedo (1993), é um processo evolutivo de perda

de vigor e produtividade de forrageiras sem a

possibilidade de recuperação, fato que afeta a

produção e o desempenho animal, culminando na

degradação do solo e dos recursos naturais.

O uso das geotecnologias permite avaliar os

recursos e visualizar a situação da área de estudo,

além de anexá-los a bancos de dados

georreferenciados, obtendo-se assim uma

ferramenta para tomadas de decisões. As

vantagens do uso de imagens de satélite são

inúmeras, como a relação custo-benefício,

disponibilidade e aplicabilidade (PARANHOS

FILHO et al., 2008).

O planejamento ambiental visa adotar práticas que

buscam a sustentabilidade da atividade

agropecuária, visando à manutenção do

ecossistema, da produtividade vegetal e animal,

maximizar a rentabilidade e gerar um benefício da

ordem estratégica para a empresa rural.

O presente trabalho visa apontar diretrizes para o

planejamento ambiental da propriedade rural da

Fazenda Rio Grande, utilizando-se para isso as

geotecnologias. Através do levantamento do

estado ambiental é proposta ações de preservação,

recuperação, prevenção de danos ambientais e

otimização do uso dos recursos naturais.

A área de estudo é a propriedade rural Fazenda

Rio Grande, a qual está inserida na Bacia

Hidrográfica do Rio Paraná e na Sub-Bacia

Hidrográfica do Rio Pardo, no Município de

Jaraguari – MS, distante cerca de 40 km de

Campo Grande – MS.

Todo o processamento e extração de informações

das imagens foram realizados no software

Geomática Focus (PCI, 2009). O primeiro

procedimento a ser realizado foi a correção

geométrica da carta topográfica Jaraguari, e da

imagem do satélite LANDSAT 5, sensor TM,

datada de 08/08/2009 (INPE, 2009). Para tanto,

foram utilizados pontos de controles do terreno

(GCP) com coordenadas reais conhecidas obtidos

a partir da imagem ortorretificada do projeto

GLCF (Global Land Cover Facility).

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Em seguida realizou-se a classificação automática

supervisionada da cena LANDSAT 5/TM, sendo

as áreas de treinamento foram obtidas por meio de

visitas in locu observando a cobertura vegetal e

baseando-se nas classes propostas por Paranhos

Filho (2000).

Para se obter uma melhor resolução espacial da

imagem multiespectral utilizada, realizou-se a

fusão da banda pancromática do satélite CBERS-

2B, sensor HRC (INPE, 2009) com a imagem

multiespectral LANDSAT 5/TM (INPE, 2009)

utilizando-se o algoritmo Pansharp. Tal algoritmo

se baseia em preservar as características

espectrais, obtendo-se dessa maneira uma imagem

colorida, com melhor resolução espacial (no caso,

2,5m). Os arquivos de saída são interpolados

utilizando o método de convolução cúbica.

A partir das informações vetoriais dos cursos

d’água, retiradas pela fotointerpretação da

imagem fusionada, foram gerados mapas de

distância para a delimitação das Áreas de

Preservação Permanente (APP) em consonância

com o exigido pela Lei Federal 4771/1965

(BRASIL, 1965) e pela Resolução do Conselho

Nacional do Meio Ambiente, CONAMA, n.º

302/2002 (CONAMA, 20002). Para isso utilizou-

se a ferramenta Buffer. No caso da Fazenda Rio

Grande, os buffers gerados foram de 30 e 50

metros para respectivas larguras dos cursos

d’água, áreas úmidas e nascentes.

Para o reconhecimento do terreno utilizou-se o

Modelo Digital de Elevação (MDE) da Shuttle

Radar Topographic Mission (SRTM),

reamostrado pelo Projeto TOPODATA

(VALERIANO, 2008). Sendo assim, pode-se

obter os valores de declividade aplicando o

algoritmo SLP – Slope of Elevation.

Com os dados de campo e o do GPS (Sistema de

Posicionamento Global), foi possível fazer o

levantamento das erosões presentes na

propriedade. Estas verificações são

imprescindíveis para escolha do melhor método

de recuperação da área.

A Figura 1 mostra o mapeamento das áreas de

erosão e as Áreas de Preservação Permanente

(APP), é importante considerar que os processos

erosivos encontrados em áreas próximas às APP’s

causam problemas de assoreamento dos cursos

d’água.

A localização espacial destas feições erosivas é de

grande importância na determinação de sua

extensão e abrangência, como por exemplo, qual

corpo d’água será afetado pelo material carreado.

Facilita também no seu monitoramento,

determinação de medidas mitigadoras,

acompanhamento de recuperação de áreas,

análises temporais e geração de mapas

secundários, como o de vulnerabilidade

ambiental.

O permanente monitoramento das estruturas

construídas (paliçadas, terraços, cordões

vegetados) é essencial para o sucesso no controle

da voçoroca, fazendo a manutenção sempre que

necessário. Após chuvas fortes, deve-se fazer a

inspeção para verificar possíveis danos e adotar

medidas de reparos para conservá-las. Essa prática

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é de especial importância na fase inicial dos

trabalhos de implantação dos suportes de

proteção, quando os materiais ainda não estão

completamente consolidados.

Figura 1: Mapeamento das erosões e da APP.

As erosões identificadas na Figura 1 podem ser

visualizadas a seguir nos registros fotográficos

feitos em campo, mostrados na Figura 2.

A proposta de intervenção baseia-se na aplicação

de estruturas construídas de paliçadas de bambu, é

essencial para o sucesso no controle da voçoroca,

fazendo a manutenção sempre que necessário.

Após chuvas fortes, deve-se fazer a inspeção para

verificar possíveis danos e adotar medidas de

reparos para conservá-las. Essa prática é de

especial importância na fase inicial dos trabalhos

de implantação dos suportes de proteção, quando

os materiais ainda não estão completamente

consolidados.

a) Ponto 1:

erosão próxima a

APP

b) Ponto 2: erosão

em forma de ravina c) Ponto 3:

erosão em forma

laminar

Figura 2: Erosões localizadas na área de estudo.

Esta estrutura pode ser usada tanto para a

contenção das paredes verticais da voçoroca como

para a redução da velocidade de escoamento

superficial da enxurrada, contribuindo para a

retenção dos sedimentos transportados (Figura 3).

Com o tempo, o acúmulo de sedimentos na base

frontal da paliçada possibilita o surgimento de

vegetação ou, então, o bambu poderá brotar,

funcionando como uma barreira natural.

Recomenda-se reforçar a segurança das paliçadas

com amarras de arames de aço, principalmente

quando exercem a função de proteger as paredes

verticais, sendo que uma das extremidades da

amarra é fixada na ponta da tora de eucalipto e a

outra, na ponta de uma estaca de eucalipto

enterrada acima da parede da voçoroca, em terra

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firme e a amarra de aço deverá ficar esticada

(BALIEIRO & TAVARES, 2008).

a. Paliçada de Bambu

b. Água retida na paliçada

Figura 3: Exemplo de uso da paliçada (BALIEIRO &

TAVARES, 2008).

O desenvolvimento sustentável é um desafio na

empresa rural. Assim, o presente trabalho

demonstrou o quanto é necessário a realização do

planejamento no uso dos recursos naturais que são

tão requisitados no processo produtivo da

atividade agropecuária, sendo que o uso das

geotecnologias como ferramenta auxiliar na

gestão ambiental tornou possível a identificação

dos problemas e a caracterização da área

pesquisada, possibilitando a formulação de

práticas que buscam a sustentabilidade. A

pesquisa atingiu as expectativas, pois foi possível

avançar no estudo ambiental que promove a

integridade ecológica, acarretando na proteção,

recuperação e prevenção dos danos ambientais das

empresas rurais, sendo também um aliado no

alcance da responsabilidade social por promover

condições de uma vida sustentável para os

trabalhadores rurais.

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UFRJ, Empresa Brasileira de Pesquisas

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CARACTERIZAÇÃO MECÂNICA DE BLOCOS CERÂMICOS UTILIZADOS EM ALVENARIA NA REGIÃO NORTE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

MECHANICAL CHARACTERIZATION OF BLOCK CERAMIC USED IN MASONRY IN

THE NORTH REGION OF RIO DE JANEIRO STATE

1Almeida, B. G. B; 1Azevedo, T.M; 1SÁ, T. V; 1SANTOS, A. L. H. A; 1Almeida, L.L.P

RESUMO A Região Norte Fluminense situada no estado do Rio de Janeiro apresenta características que o coloca entre os maiores produtores de blocos cerâmicos para o mercado interno. Na construção civil para fabricação de estruturas em alvenaria podem ser utilizados blocos cerâmicos que devem seguir determinadas características e propriedades, mediante normas que venham garantir o seu desempenho. Para que isso seja garantido, é necessário que sejam feitos estudos mais detalhados e análises das propriedades desejadas. Este artigo faz um estudo entre vários fabricantes de blocos de alvenaria da Região Norte Fluminense para analisar comparativamente seus resultados. Foram escolhidas dez indústrias cerâmicas para um estudo da qualificação dos blocos segundo norma NBR 15270. Os blocos de vedação foram submetidos a ensaios de: análise dimensional (formas e dimensões), desvio das faces e em relação ao esquadro, absorção de água e resistência à compressão. De acordo com os resultados obtidos neste trabalho, podemos observar que as Indústrias Cerâmicas precisam padronizar o sistema de produção, para que nos produtos sejam qualificados em relação à NBR 15270.

ABSTRACT The northern region of Rio de Janeiro presents characteristics that place it among the greatest producers of ceramic blocks to attend the inner market. In the construction field it is possible to use ceramic blocks to produce masonry structures and they have to follow certain characteristics and properties according to rules which ensure their performance. In order to ensure the expected result, it is necessary to do deeper studies and analysis of the desired properties. This article presents a study about several producers of masonry blocks of the Northern region in order to compare and analyze the results. Ten ceramic industries were chosen for a study of the blocks qualification according to the rule NBR 15270. The sealing blocks were subject to experiments of dimensional analysis (forms and dimensions), deviations of faces and in relation to aligned pieces, water absorption and resistance to compression. According to the results obtained in this work, it is possible to realize that the ceramic industries need to standardize the production system for the purpose of qualifying the products in accordance with NBR 15270.

Palavras-chave: Blocos Cerâmicos, NBR 15270, Cerâmica Vermelha, Caracterização Mecânica. Keywords: Rule 15270, sealing blocks, red ceramic, mechanical characterization

_________________________________________________________________________________________ - Universidade Estácio de Sá (UNESA) – Campus Campos dos Goytacazes Avenida 28 de março, 423, Parque Santo Amaro, Campos dos Goytacazes – RJ, CEP 28020-740. E-mails: [email protected], [email protected], [email protected], [email protected], [email protected]

Durante toda a evolução do mundo a cerâmica

sempre esteve presente. Sua fabricação data desde

a antiguidade. Em todas as regiões e culturas ela

sempre esteve presente. A cerâmica tem destaque

artesanal e industrial. A farta disposição da matéria

prima faz com que esta se popularize cada vez

mais, havendo uma diversificação e

direcionamento na sua industrialização (Santos,

1989 e Vieira, 2000).

A indústria da cerâmica vermelha no Brasil é uma

das mais importantes. Atualmente a participação

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deste setor industrial chega a 1% do PIB (Produto

Interno Bruto). A concentração demográfica

brasileira está nas regiões Sul e Sudeste. Este fato

faz com que a indústria da cerâmica vermelha seja

concentrada nestas regiões, havendo uma

distribuição em todo o Brasil, concentrando o valor

de produção anual em US$2.500.00/ano (Johnston,

2009). Este segmento é especializado na produção

de tijolos furados e maciços, lajes, blocos de

vedação estruturais, telhas, manilhas entre outros

produtos ligados ao setor. Calcula-se que este setor

no Brasil movimenta somente em matéria prima

em torno de 60.000.000 toneladas de matérias

primas ao ano (Rizzatti et al, 2011)

Na região de Campos dos Goytacazes-RJ está

instalado um Polo Cerâmico composto por mais de

cem cerâmicas de pequeno e médio porte. Este

Polo é responsável por cerca de 35 % de toda a

produção de cerâmica vermelha do Estado do Rio

de Janeiro. Entretanto, as empresas locais

apresentam típicos problemas do segmento de

cerâmica vermelha no país como tecnologia

defasada, falta de apoio tecnológico, carência de

mão de obra qualificada, ausência de controle de

qualidade predominando produtos fora das

especificações técnicas devido a não exigência por

parte dos órgãos de fiscalização e consumidores,

etc. (Stevenson, 2001). É prática comum na região

as indústrias cerâmicas prepararem empiricamente

suas massas a partir de duas ou mais argilas em

proporções pré-determinadas. De modo geral as

massas preparadas são constituídas de uma argila

gorda (mais plástica) e de uma argila magra

(menos plástica), com consistência adequada para

conformação por extrusão (Vieira, 2004).

As amostras utilizadas neste trabalho são blocos de

vedação com dimensão 9x19x19, que foram

recolhidas de várias indústrias cerâmicas para uma

análise quantitativa e qualitativa do resultado final

do processo de fabricação, diante a NBR 1520.

Os ensaios foram realizados nos laboratórios da

Universidade Estácio de Sá - Campus Campos dos

Goytacazes, que conta com a aparelhagem básica

para a realização dos referidos ensaios como

prensa universal para a realização do ensaio

mecânico (Ensaio de Compressão), paquímetro

analógico (Análise dimensional), esquadro

metálico (Planeza das Faces e Desvio em relação

ao esquadro), balança digital de no máximo 5 kg

com duas casas decimais e caixa d’ água

(Absorção de Água).

Os blocos cerâmicos tiveram a conformidade

metrológica avaliada através das prescrições da

NBR 15.270-1. A determinação da massa seca e o

índice de absorção de água foram verificados e

calculados de acordo com a NBR 15.270-2. E os

métodos para a execução dos ensaios mecânicos

nos blocos cerâmicos de vedação, com objetivo de

medir a resistência máxima do bloco cerâmico a

compressão foram executados conforme NBR

15.270-3.

A pesquisa atingiu a região do Norte Fluminense

do estado do Rio de Janeiro. Foram realizadas a 10

empreendimentos do setor de blocos cerâmicos

Vermelhos e foram coletadas amostras de blocos

de vedação com dimensão 9x19x19. A figura 1

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apresenta as dimensões nominais de fabricação das

indústrias selecionadas para o desenvolvimento do

trabalho.

Quanto às tolerâncias dimensionais, todas as

indústrias cerâmicas apresentaram resultados

diferentes das nominais, de forma que esta

alteração ultrapasse os valores aceitos pela Norma,

que corresponde a uma variação de ± 3 mm de

tolerância dimensional relacionada à média das

dimensões efetivas (NBR 15270-1 e Santos et al,

2012).

(a)

(b)

(c)

Figura 1 – Resultados dos Desvios das dimensões dos tijolos em relação às dimensões nominais de fabricação (em

centímetros), (a) Comprimento, (b) Altura e (c) Largura.

Na figura 2 os valores dos septos dos blocos

cerâmicos das indústrias B, C, D e I ficaram fora

do estipulado pela NBR 15270 para todas as

amostras coletadas. Já as indústrias A, E, F, G, H e

J alcançaram os valores satisfatórios em

comparação a média de 6 mm de septo conforme

as especificação da norma. É importante observar

que houve uma grande variação das medições em

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uma mesma empresa, sendo que o menor valor de

espessura do septo observado foi de 2,1 mm e o

maior foi de 10,82 mm.

Figura 2 – Resultado das dimensões dos septos em

relação para cada indústria Cerâmica

Nos blocos cerâmicos também foram aferidos os

desvios de esquadro e faces. O desvio de esquadro

apresentou variação de 0,32 a 2,34 mm e o desvio

de flecha apresentou valores de 0,5 a 1,92 mm,

podemos observar que todas as amostras obtiveram

resultados dentro dos padrões da NBR 15270,

conforme figura 3.

Como pode observar, todos as indústrias cerâmicas

apresentaram resultados como desvio de flecha

e/ou esquadro inferiores ao máximo de 3 mm

admitido pela NBR 15270, embora em algumas

amostras estes valores tenham sido observado que

o desvio padrão ultrapassa o máximo estabelecido

pela norma.

(a) (b)

Figura 3 – Resultados da medicação do desvio, (a) Em relação ao Esquadro e (b) Planeza das Faces ou Flecha.

Quanto à absorção de água, quatro

empreendimentos participantes da pesquisa

apresentaram valores fora dos limites de 8 e 22%

estipulados pela NBR 15270. Os resultados da

absorção são apresentados na figura 4. É

importante ressaltar que os resultados ficaram na

faixa de 18,91 a 25,07%, valores próximos ao

limite.

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Figura 4 – Resultados do ensaio de Absorção de Água

dos Blocos cerâmicos, conforme NBR 15270

Os blocos também foram avaliados quanto à

resistência à compressão. Para a maioria das

amostras, os valores médios de resistência à

compressão ficaram abaixo de 1,5 MPa, que é o

mínimo recomendado pela NBR 15270 para bloco

cerâmico comum com dimensão de 9X19X19. A

figura 5 apresenta os resultados dos testes de

resistência à compressão dos blocos cerâmicos,

observa-se que as amostras apresentaram

resistência inferior ao mínimo exigido. Esta

variação também foi observada por Santos ET AL,

2012, que atribuíram o fenômeno à falta de

controle no processo de fabricação, uso matéria

prima não uniforme ou falta de controle na

secagem e queima dos produtos.

Figura 5 – Resultado do ensaio de Resistência Mecânica

dos blocos cerâmicos, conforme NBR 15270

A avaliação dos blocos Cerâmicos da Região Norte

Fluminense/RJ coletados em dez empresas do setor

selecionadas para a pesquisa, apresentaram muita

variação dos resultados comparados com a NBR

15270. As dimensões e os septos possuem uma

grande escala de desvio padrão, já que os

resultados de resistência mecânica não foram

satisfatórios quando confrontado com a Norma.

É importante ressaltar que muitas Indústrias

Cerâmicas da região Norte Fluminense/RJ

possuem processos tradicionais e sem controle de

alguns parâmetros como mistura e temperatura de

queima que influenciam diretamente nos resultados

negativos de algumas das características

analisadas, como por exemplo, a resistência

mecânica do Bloco cerâmico, onde não foi

alcançado o valor indicado pela NBR 15270, que é

de 1,5 MPa.

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A APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS À PRISÃO PREVENTIVA NOS CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS

APPLICATION OF PRECAUTIONARY MEASURES ALTERNATIVES TO PROBATION IN DRUG TRAFFICKING CRIMES

Róbson de Vargas

RESUMO Tomando como base uma sistematização da prisão cautelar e a existência de diferentes espécies de medidas cautelares alternativas, buscou-se analisar neste trabalho a aplicação das medidas cautelares alternativas nos crimes de tráfico de drogas, de maneira a se identificar, quais são os critérios eleitos pelos tribunais para a sua escolha e adequação (finalidade instrumental das medidas) e quais espécies de medidas efetivamente vem sendo aplicadas na prática. Procurou-se apresentar uma delimitação do entendimento do STF e do STJ sobre a matéria e, por conseguinte, a partir de uma análise quantitativa de acórdãos de Habeas Corpus, decorrentes da decretação da prisão preventiva ao paciente preso em flagrante por tráfico de drogas, apresentar o entendimento dos Tribunais de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), Santa Catarina (TJSC) e Paraná (TJPR), possibilitando, com essa amostragem, compreender a realidade prática desse sistema.

ABSTRACT Based on a systematization of the precautionary arrest and the existence of different kinds of alternative protective measures, we sought to analyze in this paper the application of alternative precautionary measures in drug trafficking crimes, in order to identify what are the criteria chosen by courts for their choice and suitability (instrumental purpose of the measures) and what kinds of measures are being effectively applied in practice. Sought to present a definition of understanding the STF and STJ on the matter and therefore, from a quantitative analysis of judgments Habeas Corpus, arising from the adjudication of probation patient arrested at the scene for drug trafficking, present understanding of the Courts of Justice of Rio Grande do Sul (Id), Santa Catarina (TJSC) and Paraná (TJPR), allowing, with this sample, understand the practical reality of this system.

Palavras-chave: Processo penal. Prisão cautelar. Instrumentalidade. Função. Tráfico de drogas. Keywords: Criminal Procedure. Precautionary prison. Instrumentality. Function. Drug trafficking.

___________________________________________________________________________ Mestre em Ciências Criminais pela PUCRS. Professor de Direito Público no Centro Universitário Estácio de Sá-SC. Advogado.

Um dos tormentos do processo penal brasileiro é

sem dúvida a prisão cautelar. Mergulhada em um

cenário de muitos dramas, parece não reagir frente

aos problemas impostos pelo seu próprio

desenvolvimento. Assim, permanece ávida em

torno de justificativas que possibilitem demonstrar

sua necessidade de manutenção, mesmo que isso

represente se aproximar de um modelo jurídico

autoritário em detrimento de um mais humano e

democrático.

A idealizada instrumentalidade divide espaço com

altos índices de encarceramento preventivo,

evidenciado que a sua utilização pelo Estado a

torna um poderoso instrumento intimitadório e

repressivo, sem esquecer-se do efeito sedante que o

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seu simbologismo opera na opinião pública que

reclama por uma justiça cada vez mais instantânea.

No âmbito do tráfico de drogas, a estratégia

unicamente repressiva tende a trazer mais fracassos

do que avanços, já que a simples promulgação de

uma lei, por mais dura que seja, acaba não surtindo

os efeitos esperados, até porque, o direito penal

exclusivamente, não desempenha nenhuma função

motivadora de respeito à norma.

Diante disso, é altamente questionável assentar

uma política criminal sob as bases do incremento

de penas e sob a restrição ou supressão de

garantias do acusado. De forma ilustrativa, leis

como a dos crimes hediondos (Lei n.º 8.072/1990)

ou a de “combate” ao crime organizado (Lei n.º

9.034/1995), dentre outras, são expressões desse

modelo exclusivamente dissuasório que confia na

força ameaçadora da lei.

Essa preocupação, se trazida para o processo penal,

especialmente para o campo da prisão cautelar,

tende a reforçar o sentido de que esta prisão,

embora decorrente da prática de crimes

genericamente graves e de maior impacto na

opinião pública, como é o caso do tráfico de

drogas, não pode ser revestida de natureza

repressiva ou punitiva, já que a sua função no

processo penal não é servir como punição

antecipada, mas proteger o normal

desenvolvimento do processo dos perigos

decorrente do estado de liberdade do agente

imputado.

Quando a prisão cautelar deixa de ter a finalidade

de instrumentalidade e o seu uso passa a ser

implementado e largamente ampliado, percebe-se o

seu grave desvirtuamento de função, a ponto se

tornar uma espécie de mecanismo publicitário do

sistema de justiça penal, fazendo acreditar na

fantasia de uma falsa solução, não só em relação ao

grave problema do tráfico de drogas, mas de

maneira geral, para toda forma de criminalidade.

A prisão cautelar está (ao menos formalmente)

inserida em um processo penal constitucional que

respeita as garantias fundamentais e, que por sua

vez, não se confunde com impunidade. Ademais, o

processo penal não pode ser visto como um

simples instrumento a serviço do poder punitivo.

Pelo contrário, deve desempenhar um papel de

limitador do poder e garantidor do indivíduo a ele

submetido (LOPES JR., 2009).

Esse processo penal de matiz constitucional

instrumentaliza o direito penal, visando conceder-

lhe efetividade dentro das pautas éticas priorizadas

pelos direitos fundamentais. Assim, pode-se

assinalar que cabe à Constituição a tutela do

processo, assegurando-se, a um só tempo, a

garantia constitucional do processo e o processo

como garantia constitucional dos direitos

(PRADO, 2006). E neste contexto, para que o

processo penal possa marcadamente ser um

instrumento de proteção dos direitos e garantias

individuais, deve assegurar ao acusado a

preservação, e manutenção do seu estado de

inocência, estabelecendo limitações ao uso da

prisão cautelar. Esses limites ao uso da prisão

cautelar, quando observados, realçam a presunção

de inocência.

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Portanto, o que deve ficar claro é que a prisão

cautelar muito mais que uma prisão sem

condenação, representa uma medida cautelar de

natureza processual penal que busca garantir o

normal desenvolvimento do processo e, por

consequência, a eficaz aplicação do poder de punir

(LOPES JR., 2009). Dito de outro modo, a prisão

cautelar possui um caráter instrumental, servindo

como uma garantia eficaz para que o processo

alcance o seu final (WEDY, 2006).

Por conseguinte, fugindo a uma finalidade e

tendência punitiva, a prisão cautelar deve se

constituir num mecanismo processual que visa

assegurar os meios e garantir o resultado do

processo (KARAM, 1993). Deste modo, em torno

desta concepção de prisão cautelar podemos

identificar que o seu objeto é garantir o normal

desenvolvimento do processo penal, sendo que o

seu papel será importante no sentido de assegurar

os instrumentos adequados e a própria utilidade do

seu resultado, considerando uma eventual demora

na prestação jurisdicional.

Em se tratando de tráfico de drogas, durante muito

tempo a jurisprudência do STF não afastou a

proibição da liberdade provisória, prevista

inicialmente na Lei n.º 8.072/1990, e reforçada

pela Lei 11.343/2006. De maneira geral, o

entendimento era de que a proibição de liberdade

provisória, nos casos de crimes hediondos e

equiparados, decorria da própria inafiançabilidade

imposta pela Constituição à legislação ordinária

(art. 5.º, XLIII, da CF).

Isso porque, o art. 2.º, II, da Lei n.º 8.072/1990

atendia ao comando constitucional, quando

considerava inafiançáveis os crimes de tortura,

tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o

terrorismo e os definidos como crimes hediondos.

Daí, que inconstitucional seria a legislação

ordinária que dispusesse diversamente, tendo como

afiançáveis delitos que a Constituição determina

serem inafiançáveis.1

Após muitas decisões e reflexões, em maio de

2012, por ocasião do julgamento do Habeas

Corpus n.º 104.339/SP, o STF em sessão plenária,

decidiu por maioria de votos, em declarar a

inconstitucionalidade da expressão “e liberdade

provisória” constante do caput do art. 44 da Lei n.º

11.343/2006. Percebe-se, portanto, que a partir

desse julgamento, a concessão de liberdade

provisória para o tráfico de drogas passou a ser

uma alternativa perfeitamente possível, desde que,

ausente qualquer perigo para o processo em razão

da liberdade do acusado.

A jurisprudência que se construiu no STJ em

torno da liberdade provisória para o tráfico de

drogas acompanhou de perto a orientação

emanada do STF, o que, em sede de liberdade

individual, não poderia ser diferente. Com a

declaração incidental de inconstitucionalidade

1 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. 1.ª Turma.

Habeas Corpus 103715. Rel. Min. Cármem Lúcia –

j. 23.03.2011 – public. 24.03.2011. Disponível em:

<http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoA

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Classe=0&origem=JUR&recurso=0&tipoJulgament

o=M>. Acesso em: 05 jan., 2013.

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pelo Plenário do STF na parte que proibia a

concessão de liberdade provisória aos

acusados de tráfico de drogas, o STJ também

passou a admitir o benefício, desde que não

houvesse necessidade de garantir o

acautelamento do processo. No que tange a

aplicação de medidas cautelares alternativas, é

possível identificar que o STJ, quando

evidencia a necessidade de acautelamento do

processo e conclui que realmente essa

alteração mostra-se necessária e adequada às

circunstâncias em que o delito foi praticado e

às condições pessoais do acusado, vem

aplicando, de maneira conjunta, as medidas

previstas nos incisos I, IV e V do art. 319 do

CPP (comparecimento periódico em juízo,

proibição de ausentar-se da Comarca e o

recolhimento domiciliar no período noturno e

nos dias de folga quando o investigado ou

acusado tenha residência e trabalho fixos),2

isso quando não deixa essa escolha a critério

do magistrado processante.3

2 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 5.ª Turma.

Habeas Corpus 269174. Rel. Min. Jorge Mussi – j.

15.08.2013 – public. 27.08.2013. Disponível em:

<http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/justica/detalh

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2013.

3 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 5.ª Turma.

Habeas Corpus 135422. Rel. Min. Sebastião Reis

Júnior – j. 27.09.2011 – public. 24.10.2011.

Disponível em:

<http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/justica/detalh

e.asp?numreg=200900845170>. Acesso em: 09 jan.,

2013.

A coleta de dados para análise da presente

pesquisa deu-se através de arquivos

disponibilizados pelo endereço eletrônico de

cada um dos Tribunais de Justiça estaduais,

através do link destinado a pesquisa de

jurisprudências no período de julgamento

compreendido entre 01/01/2012 e 01/01/2013,

lembrando que o início da vigência da Lei

12.403/2011 se deu em 04/07/2011. As

palavras-chave utilizadas na pesquisa foram

tráfico de drogas, medidas cautelares e ordem

concedida. Todavia, os acórdãos

demonstravam, algumas vezes, a presença de

concurso de crimes, situação em que o

paciente havia sido preso pelo tráfico de

drogas e mais outro delito, como por exemplo,

porte de arma, roubo ou associação para o

tráfico de drogas. Sendo assim, optou-se por se

analisar apenas as decisões que trataram

exclusivamente de pacientes presos em

flagrante por tráfico de drogas (art. 33 da Lei

n.º 11.343/2006) e que foram contemplados

com medidas cautelares alternativas.

Foi possível encontrar 42 (quarenta e dois)

acórdãos no TJRS, 21 (vinte e um) acórdãos

no TJSC e 32 (trinta e dois) acórdãos no TJPR.

De um modo geral, pode-se dizer que há nas

decisões substituindo a prisão preventiva por

medidas cautelares alternativas, manifestações

considerando a primariedade e os bons

antecedentes do paciente, a residência e o

trabalho fixo, bem como a pequena quantidade

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de droga apreendida, tudo respaldado pela

falta de fundamentação idônea da decisão de

1.º Grau, que, por se utilizar de premissas

genéricas, como a da gravidade abstrata do

crime de tráfico de drogas, deixava de

especificar os elementos concretos do fato a

justificar a prisão.

Sendo assim, considerando as decisões

analisadas, sejam elas emanadas do TJRS, do

TJSC ou do TJPR, é possível afirmar que em

relação ao fumus comissi delicti, todos os

acórdãos indicaram claramente a sua presença,

especialmente por se tratar de prisão em

flagrante, cujas circunstâncias estavam a

demonstrar, sem muitas dificuldades, a

materialidade (especialmente através da

quantidade de droga apreendida), e a autoria

do crime.

Já quanto à presença do periculum libertatis,

consubstanciado na demonstração da

finalidade para qual a medida alternativa está

sendo decretada, observamos que a sua

delimitação, na maioria das decisões, não

restou muito clara. Isso porque, ao passo que

as medidas foram sendo aplicadas, não se

identificou se era para atender a necessidade

da aplicação da lei penal, para a investigação

ou a instrução criminal ou, ainda, para evitar a

prática de infrações penais.

Em linhas gerais, quando constatado a

primariedade, os bons antecedentes, a

residência fixa, o trabalho lícito e a pequena

quantidade de droga apreendida, os Tribunais

afastaram o periculum libertatis que poderia

ensejar a decretação ou manutenção da prisão

preventiva. Por outro lado, ao aplicar nestes

casos, as medidas cautelares alternativas, a

finalidade por essa decretação não se mostrou

evidente. Sem essa demonstração, prevalece

inegavelmente uma desvirtuação dos

princípios constitucionais penais que não

materializam de forma mais precisa a própria

noção de devido processo legal.

Acerca desta questão, cumpre anotar que no

julgamento pelo TJRS do Habeas Corpus n.º

70051018695, restou consignado que a

necessidade de cautelaridade, após constatada

a presença do fumus commissi delicti e do

periculum libertatis, poderia se satisfazer com

o comparecimento pessoal do sujeito em juízo,

devendo o magistrado fixar o prazo e as

condições deste comparecimento, com o

objetivo de verificar as atividades

desenvolvidas pelo agente. Essa obrigação

periódica, em determinadas situações, poderá

atender às exigências da cautelaridade no caso

concreto.

Quanto à adequação das medidas, que permite

analisar quais espécies poderiam ser aplicadas

ao caso concreto como forma de alcançar os

fins pretendidos, nossa compreensão é de que

a variação de possibilidades encontradas (ora

se aplicando apenas uma, ora se aplicando

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duas ou mais), indica primeiro, a existência de

uma margem de discricionariedade do

julgador, que, considerando a gravidade do

crime, suas circunstâncias, bem como as

condições pessoais do indiciado ou acusado,

pode optar por uma ou mais medidas

alternativas como forma de atender o critério

da necessidade.

Já num segundo momento, indica que algumas

medidas encontram maior adesão do que

outras, sendo que algumas não foram aplicadas

em momento algum. Por certo, existem

questões, especialmente relacionadas à

fiscalização da medida, que precisam ser

consideradas no momento da sua decretação

para que exista o mínimo de efetividade.

Todavia, o mais relevante a nosso ver é que as

mesmas não sirvam de subterfúgio para a

antecipação de pena e como mecanismo de

prevenção geral ou especial.

Dentre as decisões avaliadas, pode-se afirmar

que a cumulação de medidas cautelares é a

regra, muito embora nos pareça, que o § 1.º, do

art. 282 do CPP, onde se lê: “as medidas

cautelares poderão ser aplicadas isolada ou

cumulativamente”, priorize o contrário. Sendo

assim, a primeira conjugação mais lembrada

pelos Tribunais estaduais (posição que

encontra receptividade nas decisões emanadas

do STJ), se dá pela substituição da prisão

preventiva pela aplicação de 3 (três) medidas

cautelares alternativas do art. 319 do CPP: I

(comparecimento periódico em juízo, no prazo

e nas condições fixadas pelo juiz, para

informar e justificar atividades); IV (proibição

de ausentar-se da Comarca quando a

permanência seja conveniente ou necessária

para a investigação ou instrução); e V

(recolhimento domiciliar no período noturno e

nos dias de folga quando o investigado ou

acusado tenha residência e trabalho fixos).

A primeira medida como salientado

anteriormente, é tida como a que garante um

controle mais efetivo pela jurisdição. Já a

proibição de ausentar-se da Comarca, se

reveste de uma cautelaridade evidente,

podendo servir para a proteção da prova ou

para a eficácia da lei penal quando presente o

risco de fuga do acusado. Por fim, a medida de

recolhimento domiciliar no período noturno e

nos dias de folga, embora se questione acerca

de sua finalidade cautelar, pode contribuir para

diminuir o risco de fuga ou a tutela da prova.

Num segundo momento, também foi possível

encontrar referência à aplicação conjunta das

medidas dos incisos I e IV (comparecimento

periódico em juízo e proibição de ausentar-se

da Comarca); dos incisos I, II e V

(comparecimento periódico em juízo,

proibição de acesso ou frequência a

determinados lugares e recolhimento

domiciliar durante o repouso noturno e nos

dias de folga); dos incisos I, IV e VIII

(comparecimento periódico em juízo,

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proibição de ausentar-se da Comarca e fiança);

e, ainda, dos incisos IV e V (proibição de

ausentar-se da Comarca e recolhimento

domiciliar durante o repouso noturno e nos

dias de folga). Apenas no julgamento do

Habeas Corpus n.º 70048725071, oriundo do

TJRS, foi possível encontrar a aplicação de

apenas uma cautelar alternativa, a do inciso I

(comparecimento periódico em juízo), todos

do art. 319 do CPP.

Por último, merece ser destacado que,

especialmente o TJSC em seus julgamentos,

vem se abstendo de analisar a necessidade e

adequação das medidas cautelares, deixando

essa tarefa a cargo do Juízo processante.

Assim, o Tribunal catarinense determina a

expedição de alvará de soltura em favor do

paciente, facultando ao Juízo a quo a aplicação

de uma ou mais medidas cautelares previstas

nos incisos do artigo 319 do CPP que entender

pertinentes ao caso concreto. A nosso juízo,

quando o Magistrado de 1.º Grau não

demonstrar fundamentadamente a necessidade

e adequação das medidas, o acusado poderá

impetrar novo Habeas Corpus para que o

Tribunal decida sobre essa imposição.

Na avaliação acerca da aplicação das medidas

cautelares alternativas, feita a partir do crime

de tráfico de drogas, o que se pode constatar é

que o cenário de crise em que se encontra

mergulhada a prisão preventiva permanece

quase que inalterado, especialmente porque o

campo de incidência das novas medidas

apresenta-se muito restrito, existindo certa

dificuldade de se apontar a finalidade

instrumental que dá legitimidade a sua escolha

e adequação.

Contudo, na perspectiva reforçada pelo STF

com a possibilidade de liberdade provisória

agora também para o tráfico de drogas, se

consolida a presunção de inocência no sistema

cautelar. O entendimento do STJ, com

decisões garantindo a aplicação de medidas

cautelares alternativas, realça a

excepcionalidade da prisão preventiva e o

inafastável dever que tem o Juiz de Direito de

bem fundamentar suas decisões judiciais.

Pode-se perceber que em alguns casos, foi

aplicada apenas a medida de comparecimento

periódico em juízo. Já em outros, além dessa

medida, somou-se a proibição de ausentar-se

da Comarca e o recolhimento domiciliar no

período noturno e nos dias de folga. O certo é

que a cumulatividade de medidas se

apresentou como a regra, muito embora, os

fatos guardassem circunstâncias sempre muito

parecidas (agente primário e sem antecedentes,

com residência fixa e trabalho lícito, e autuado

com pequena quantidade de droga).

Por fim, pensamos que as medidas dos arts.

319 e 320 do CPP precisam estar alinhadas a

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uma exigência cautelar que, por certo, não é a

mesma da prisão preventiva, mas existe e

precisa ser lembrada. Embora as novas

medidas não sujeitem o acusado aos mesmos

efeitos decorrentes do recolhimento ao cárcere,

elas limitam certos direitos e impõem certas

restrições.

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A CONSTITUIÇÃO DO CAMPO ASSISTENCIAL NO BRASIL

THE CONSTITUTION OF ASSISTANCE FIELD IN BRAZIL

Virna Ligia Fernandes Braga

RESUMO O presente artigo resulta do projeto de doutoramento e busca analisar o processo de transição entre um Estado ausente e outro que, gradativamente, foi assumindo a responsabilidade sobre a assistência social como um todo. Metodologicamente, a abordagem parte do conceito de reciprocidade, no qual as doações traziam status a quem doava e estabeleciam, também, uma hierarquia entre doador e receptor.

ABSTRACT This article is the result of the doctoral project and seeks to analyze the process of transition from one state away and another that gradually was taking responsibility for social assistance as a whole. Methodologically, the approach is based on the concept of reciprocity, in which the donations brought status to those who donated and also established a hierarchy between donor and recipient.

Palavras-chave Assistência, Filantropia, Estado, Minas Gerais. Keywords Assistance, Philanthropy, State, Minas Gerais.

_____________________________________________________________________________________ - Mestra em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF, linha de pesquisa “Poder, Mercado

eTrabalho”. Dissertação defendida em dezembro de 2006: Entre a Honra e o Mercado: análise do processo de formação do movimento docente em Juiz de Fora (1934-1964). Doutoranda em História pela mesma universidade.

Como um problema social sem precedentes, a

pobreza tem suscitado debates variados bem como

a busca por estratégias capazes de minimizar seus

efeitos devastadores. A assistência adquiriu,

portanto, um caráter imprescindível no

enfrentamento da chamada “questão social”,

através de iniciativas da própria sociedade civil e

também do poder público. Deste modo, as

tentativas de solucionar tal questão remontam às

primeiras leis inglesas, voltadas para os pobres em

meados do século XVI4 e chegam, atualmente, aos

modelos de previdência social que conhecemos.

4 Os historiadores dataram o século XVI como marco

divisório entre uma assistência mais e menos racional, a

partir da criação da Lei dos Pobres na Inglaterra, em

1531. A lei cobrava uma taxa da população para que a

ajuda aos pobres fosse feita. Muito embora a gestão

desses recursos fosse descentralizada, era o Estado

quem administrava os fundos captados e, também,

“complementava com seus próprios recursos um dos

A análise a ser realizada sobre a pobreza se pauta

na perspectiva da história social e, portanto,

trabalharemos com abordagens advindas da

história e da sociologia a fim de alcançar uma

compreensão ampliada do conceito de pobreza e da

própria caracterização do pobre. A pobreza será

analisada a partir do contexto histórico que a

formata e define e que, também, gera uma noção

específica acerca do pobre e da própria assistência.

A proposta é buscar as origens da pobreza e sua

transformação em uma “questão social” que exigiu

a atenção de sociedades e governos.

Foi no contexto de transição do feudalismo para o

sistema capitalista que a sociedade medieval

passou por mudanças radicais em suas formas de

sociabilidade; redes de solidariedade construídas

durante séculos se dissolveram diante do crescente

mais amplos sistemas de assistência à pobreza existente

no mundo”. [4]

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desenvolvimento das relações capitalistas de

produção. Apesar da pobreza e dos pobres sempre

estarem presentes na história da humanidade, em

determinado momento na Idade Média os

desvalidos e miseráveis tiveram sua condição e

percepção pela sociedade transformadas.

No Brasil, o aumento de pobres e desvalidos

começa a incomodar já nos anos finais do período

imperial, quando as práticas assistenciais existentes

até então se tornaram insuficientes para socorrer o

crescente número de indivíduos necessitados de

algum tipo de auxílio alheio. A abolição da

escravidão agravou tal situação, trazendo à tona

uma sociedade em transformação: brancos, não

brancos e imigrantes, lutavam para sobreviver nos

centros urbanos, boa parte em situação de risco

social. Não havia política pública para inserção do

negro recém liberto na sociedade republicana,

tampouco para os pobres de modo geral. A miséria

não era só uma ameaça, mas uma realidade

premente para aqueles que não conseguiam um

emprego capaz de lhes garantir a sobrevivência.

Nesse contexto, sociedade e Estado desenvolvem

uma série de iniciativas para tentar dirimir ou

controlar a pobreza, ampliando o escopo

assistencial gradativamente.

As práticas assistenciais estiveram presentes em

Minas Gerais desde muito cedo e, no decorrer do

período imperial, já existia uma rede assistencial

que se ramificava pelo território mineiro e que

contava com subsídio do estado. Entretanto, este

quadro sofreu alterações diante das mudanças

ocorridas no país a partir da abolição e da inserção

do trabalho assalariado. Através da pesquisa de

doutoramento, temos obsevado que tanto a

sociedade quanto o estado de Minas Gerais

reconfiguraram suas formas de atuação quanto ao

auxílio aos desvalidos diante destas mudanças, o

que levou à progressiva institucionalização da

assistência.

No caso de Minas Gerais, como em grande parte

dos estados brasileiros, os socorros iniciais à

pobreza se originaram das inúmeras Santas Casas

de Misericórdia existentes. Essas instituições de

caridade se responsabilizaram pelo auxílio aos

pobres, aos indigentes em geral, aos órfãos, aos

mendigos, às viúvas, inválidos e doentes de todo

tipo. No decorrer da pesquisa foram identificadas

inúmeras casas de caridade, como eram chamadas

as Santas Casas, espalhadas pelas cidades mineiras.

Estas desempenharam um importante papel na

distribuição da assistência de forma geral; como

também no processo de institucionalização dos

socorros.

É a partir deste momento que tem início a pesquisa

aqui desenvolvida, exatamente no processo de

especialização e institucionalização da assistência,

logo após a proclamação da República no Brasil.

Nosso objetivo primordial é traçar um panorama

da constituição do campo assistencial no estado de

Minas Gerais, atentando para a atuação da

sociedade civil e do executivo: quais as

instituições, de que forma atuavam, como

conseguiam se manter, como se organizavam. Qual

o papel do governo, as políticas sociais, suas

iniciativas para lidar com a questão social.

A documentação produzida pelas casas de caridade

(Santas Casas de Misericórdia) do estado de Minas

Gerais permite compreender a organização e

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distribuição da assistência em seu âmbito privado,

resultante das iniciativas caritativas e filantrópicas

oriundas da própria sociedade diante da

pauperização. Já os documentos oficiais,

produzidos pelo governo mineiro, via Secretaria do

Interior, através do setor de Saúde e Assistência

Pública, fornecem elementos para a análise das

propostas e iniciativas do estado de Minas quando

confrontado com a amplitude de sua questão

social.

Durante a elaboração da qualificação e no decorrer

da pesquisa de doutoramento, houve a percepção

de que as Misericórdias ocupam um lugar

fundamental na história da assistência em Minas

Gerais.5 Elas serão analisadas, contudo, como parte

do aparelho assistencial mineiro e não como objeto

central deste estudo. Importante destacar que os

quadros de enfermos destas casas de caridade são

instrumentos de análise indispensáveis para a

percepção de “quem eram os pobres”, os

“desvalidos” que necessitavam da caridade alheia.

Um grande número de asilos e orfanatos, com

inúmeros relatórios de funcionamento, balanços

financeiros, quadros de internos e de asilados,

muitos deles com detalhes sobre cor, profissão e

idade, compõem a documentação sobre a

assistência pública e privada em Minas Gerais. O

socorro aos pobres alienados não foi abordado por

se tratar de um tema amplo e que, pela quantidade

de fontes disponíveis, implicaria na elaboração de

5 A importância das Santas Casas de Misericórdia na

distribuição da assistência pode ser percebida em várias

regiões do Brasil e existem diversos trabalhos que

constituem a historiografia sobre o tema.

outra pesquisa, com objetivos diversos dos que se

encontram em desenvolvimento.

A tese abarca um recorte temporal que vai de 1888

a 1923 e tem como marco inicial a abolição da

escravidão no Brasil, devido às transformações

sociais profundas que o fim da escravidão impôs

ao país. O marco final, o ano de 1923, foi

escolhido porque, de certo modo, a criação do

CNT – Conselho Nacional do Trabalho e da Lei

Elói Chaves representa uma iniciativa pioneira por

parte do Estado para o longo processo de

universalização da assistência ao trabalhador no

Brasil, ainda em curso. A lei garantia

aposentadoria por tempo de serviço ou invalidez,

pensão para herdeiros no caso de falecimento do

trabalhador, socorros médicos e medicamentos por

preços especiais. No entanto, era limitada a

algumas categorias específicas de trabalhadores. Já

o Conselho Nacional do Trabalho (CNT), criado

para substituir o Departamento Nacional do

Trabalho, foi concebido para atuar como um órgão

consultivo do governo em assuntos relacionados ao

trabalho e à previdência social. Deste modo

representava uma forma de regulamentação do

setor na década de 1920.6

Com o aumento da pobreza, sociedade e Estado se

viram obrigados a reestruturar as práticas

assistenciais vigentes, pois estas já não conseguiam

abarcar o número cada vez maior de desvalidos

que necessitavam de auxilio. Desta forma, houve

uma ampliação do campo da assistência de um

modo geral, bem como sua progressiva

institucionalização a partir de uma parceria entre as

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iniciativas vindas da sociedade (via instituições de

auxilio, caridade e filantropia) e do Estado (com o

predomínio da prática da concessão de

subvenções).

A redefinição do público-alvo das práticas

assistenciais esteve diretamente ligada às

mudanças sociais, econômicas e políticas, que

interferiram no perfil populacional. Foi a partir dos

anos iniciais da República que uma série de leis e

decretos relacionados à assistência de modo geral

foram criados, estes estabeleciam os parâmetros de

funcionamento de várias instituições de socorro e

tratavam da distribuição de recursos do governo

federal para o socorro público nos estados. As

políticas de proteção social também se voltavam

para a construção de casas para os trabalhadores,

conforme o quadro (Quadro 01):

Sobre os marcos regulatórios da assistência social

no Brasil, Cláudia Maria Ribeiro Viscardi analisa

as leis e decretos aprovados e colocados em vigor

entre 1889 e 1930, muito embora sua abordagem

se volte para os inseridos no mercado de trabalho.

Em 1890, houve a criação de um Banco dos

Operários para a construção de moradias populares

para os trabalhadores da cidade do Rio de Janeiro,

por meio do Decreto n° 843 de 11 de outubro. Tal

iniciativa, para Viscardi, demonstrava a atenção

dos gestores para com as mazelas decorrentes do

pós-abolição nos centros urbanos. Muitas famílias

viviam em péssimas condições nas cidades, que

recebiam um crescente número de imigrantes e

ainda eram o destino de boa parte da população do

campo. Era preciso “estabelecer algum tipo de

política pública de caráter protecionista” para que

os desvalidos não ameaçassem a República recém-

instaurada.7

Com relação à assistência aos pobres fora do

mercado de trabalho, após 1889, houve um

aumento considerável e que afetou diretamente as

finanças das casas de caridade, o numero de

doações passou a ser insuficiente para uma

demanda em crescimento. Esta situação levou a

uma racionalização das práticas assistenciais e da

própria atuação das Santas Casas, seguida de uma

ampliação da atuação do Estado no socorro à

pobreza. Houve uma separação dos espaços de

assistência, ao fim do século XIX, o que levou a

algumas alterações na estrutura dos hospitais: a

caridade foi progressivamente cedendo espaço para

a medicalização e os espaços de cura foram se

especializando.

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pobre: misericórdias, caridade e poder no Império

Português: 1500 – 1800, Comissão Nacional para

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Portugueses, Lisboa, 1997.

SOUZA, Samuel Fernando de. “A questão social

é, principalmente e antes de tudo, uma questão

jurídica”: o CNT e a judicialização das relações de

trabalho no Brasil (1923-1932). Cad. AEL, v.14,

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VISCARDI, Claudia Maria Ribeiro. Trabalho,

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primeira República. In: LOBO, Valéria Marques;

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Virna Braga

Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 48

Quadro 01 - Legislação social no Brasil na Primeira República 8

8 O quadro não apresenta toda a legislação social do período, pois enfatiza leis e decretos voltados ao campo da

assistência aos pobres. Existem trabalhos que apresentam uma sistematização da legislação assistencial no Brasil, como

os de LOUZADA, VISCARDI, DELGADO, VISCARDI. Contudo, os mesmos são voltados para a assistência aos

trabalhadores, diferente da legislação assistencial para os pobres fora do mercado de trabalho. Deste modo, no ‘Portal

legislação’ do site do Senado Federal foi possível acessar as leis e decretos ligados ao tema “Socorro Público”

http://legis.senado.leg.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=102137&tipoDocumento=DEC&tipoTexto=PUB

Decreto 439 31 de maio de 1890

Estabelece as bases da organização da assistência à infância

desvalida na capital federal; mandava recolher à Casa de São

José e ao Asilo de Meninos Desvalidos, para manter e educar,

menores do sexo masculino, de seis aos 21 anos.

Decreto 843 11 de outubro de 1890 Concede favores ao Banco dos Operários para auxiliar a

construção de casas para os operários e classes pobres.

Decreto 896 29 de junho de 1892 A Assistência Médico-Legal de Alienados, constituída com o

Hospício Nacional, as colonial S. Bento e Conde de Mesquita,

na ilha do Governador, e os asilos da mesma natureza que

forem criados na Capital Federal, tem por fim socorrer,

gratuitamente ou mediante retribuição, os indivíduos de

ambos os sexos, sem distinção de nacionalidade, e que,

enfermos de alienação mental, carecerem de tratamento.

Decreto 1559 7 de outubro de 1893 Reorganiza o serviço da Assistência Médico-legal de

Alienados e os asilos da mesma natureza que forem criados na

Capital Federal.

Decreto 1154 7 de janeiro de 1904 Autoriza o Governo a ceder ao Instituto de Proteção e

Assistência à Infância do Rio de Janeiro um dos edifícios

nacionais existentes na Capital Federal, ou a dar ao mesmo

Instituto, mensalmente aluguel de casa.

Decreto 5125 1 de fevereiro de 1904 Organiza os fins dos estabelecimentos de assistência a

alienados, sua constituição, seu pessoal, nomeação,

substituição, vencimentos, vantagens e penas disciplinares.

Decreto 5964 16 de abril de 1906 Abre ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores o crédito

de $10.000 para representação do Brasil no Quarto Congresso

Internacional de Assistência Pública e Privada em Milão.

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 49

DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE X DIREITO ECONÔMICO DAS EMPRESAS DE SAÚDE SUPLEMENTAR

FUNDAMENTAL RIGHT TO HEALTH X ECONOMIC RIGHTS OF SUPPLEMENTAL HEALTH

ENTERPRISES

Osair Alves, Marianne Rios de Souza Martins

RESUMO Este artigo visa realizar uma análise sobre a eficácia ou não dos direitos prestacionais, tratando de forma mais ampla o direito fundamental à saúde frente ao direito econômico das empresas de saúde suplementar, para entender melhor os direitos sociais prestacionais e sua eficácia. Buscou-se responder: Diante do conflito existente entre o direito fundamental à saúde do contratante de planos de saúde e o direito econômico das operadoras de saúde suplementar, qual tem prevalecido nas decisões proferidas pelos magistrados do Estado do Espírito Santo? Optou-se por uma pesquisa exploratória com coleta de dados junto à jurisprudência firmada no Tribunal de Justiça do Espírito Santo no ano de 2012, concluindo que dessas decisões 90% foram favoráveis aos consumidores.

ABSTRACT This article aims to analyze the effectiveness or ineffectiveness of provisional rights, addressing more broadly the fundamental right to health in front of the economic rights of health supplement enterprises, to understand better the provisional social rights and their effectiveness. It was sought to answer: Given the conflict between the fundamental right to health of the health plan’s hirer and the economic right of the supplementary health operators, which one has prevailed in the decisions handed down by the magistrates of the Espírito Santo State? An exploratory research was chosen, made with data collection on the jurisprudence firmed by the Espírito Santo Court in 2012, concluding that 90% of these decisions were favorable to consumers.

Palavras chave: Direito à Saúde. Direitos Sociais. Direitos prestacionais. Keywords: Right to Health. Social Rights. Provisional Rights.

_______________________________________________________________________ Bacharel em Direito formado pela Faculdade Estácio de Vila Velha. Professora Universitária, advogada, Mestre em Direitos e Garantias Fundamentais Constitucionais pela Faculdade de Direito de Vitória-ES (FDV), Coordenadora do Núcleo de Pesquisa e Trabalho de Conclusão de Curso Estácio de Vila Velha.

O presente artigo irá analisar o conflito existente

entre o direito fundamental à saúde do contratante

de planos de saúde e o direito econômico das

operadoras de saúde suplementar, verificando o

que tem prevalecido nas decisões proferidas pelos

magistrados do Estado do Espírito Santo,

verificado se caráter prestacional de determinados

direitos sociais são obstáculos para sua efetivação.

O artigo buscará responder a seguinte indagação:

Diante do conflito existente entre o direito

fundamental à saúde do contratante de planos de

saúde e o direito econômico das operadoras de

saúde suplementar, qual tem prevalecido nas

decisões proferidas pelos magistrados do Estado do

Espírito Santo?

O tipo de pesquisa será a exploratória, com

utilização do procedimento técnico, bibliográfico e

coleta de dados jurisprudenciais junto ao portal do

TJ-ES para verificar os processos judiciais que

tratam do tema, no ano de 2012 averiguando o

percentual de decisões em favor dos consumidores.

O direito fundamental à saúde é uma garantia

constitucional onde em seu art. 196 a Constituição

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Osair Alves, Marianne Martins

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define que a saúde é direito de todos e dever do

Estado.

É de fácil constatação que a vida do ser humano é

algo imensurável, pois entre todos os seres vivos, o

homem necessita de muito mais que apenas direito

à vida biológica para realizar-se plenamente e

desfrutar de todos os direitos a ele assegurados

constitucionalmente, ressaltando-se ainda que nem

o próprio indivíduo possa aceitar condição que

menospreze seu valor.

O Estado deve zelar pelo resguardo dos direitos

sociais dos indivíduos, dentre eles a saúde, ainda

que em caráter preventivo, cabe então, ao Poder

Público o dever da proteção, que se dará, por meio

da aprovação pelo Parlamento de normas penais

incriminadoras, pela atuação da polícia ostensiva

para coibir crimes, pelo exercício do poder de

polícia estatal com o fim de impedir obras

irregulares que possam prejudicar os demais

cidadãos, além de várias outras medidas protetivas

(SOUSA JUNIOR, 2006).

O principio da proibição do retrocesso social,

assim este principio não tem aceitação universal,

“[...] desta forma acentue-se que mesmo os que

acolhem a tese de proibição do retrocesso

entendem que o princípio da proporcionalidade

pode inspirar uma nova regulação dos direitos

fundamentais [...]” (CANOTILHO, 2003, p.131).

Percebe-se que a eficácia ou não dos direitos como

a saúde é o de que o Estado não possui ou não quer

possuir auxílios bastantes para prestar atenção a

toda causa social, discutindo e se debatendo as

questões do que seria possível e razoável a ser

exigir do Poder Público.

Amaral (2004, p. 116) entende que:

Deslocar a decisão para o Judiciário em

hipóteses que envolvam “escolhas

dramáticas” é querer alargar para aquele

Poder competências que não são suas. O

Judiciário não está legitimado pelo voto para

tomar tais opções. Muito pelo contrário, é a

própria Constituição que cerca a magistratura

com garantias próprias, para que possa ela

desempenhar seu ofício alheia a pressões de

momento. O Judiciário não pode atuar sob a

influência da opinião pública.

Desta forma, constata-se que o Judiciário vem cada

vez mais ocupando um lugar de destaque na

efetivação do direito fundamental como garantia

constitucional.

Destaca-se então a supremacia da efetivação dos

direitos fundamentais sobre a autonomia privada,

dando ênfase à essencialidade do direito envolvido

prevalecer sobre o interesse privado.

No Brasil existe uma lei específica que trata da

saúde suplementar, é a lei 9.656 de 1998, esta

dispõe sobre os planos e seguros privados de

assistência à saúde, embora o direito à saúde seja

uma garantia constitucional a própria Carta Magna

em seu art. 199 permite a participação de empresas

privadas na prestação de serviços à saúde.

No Brasil existem várias legislações que tratam o

tema da saúde, na Lei 8.080/90 no artigo 3º pode

se destacar que a saúde também se relaciona com a

educação, a moradia, o trabalho, o saneamento

básico, a renda, o meio ambiente, o transporte, o

lazer e o acesso a serviços essenciais, portanto esse

direito é bem mais abrangente, pois uma série de

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 51

fatores contribui para que o cidadão tenha o aceso

à saúde realmente respeitado.

Calcula-se que 25,7% das mulheres e 23,0% dos

homens brasileiros estejam cobertos por um plano

de saúde. O percentual da população brasileira que

possui um plano de saúde varia de um mínimo de

20,7% entre pessoas de até 18 anos, a um máximo

de 29,5% entre pessoas de 40 a 64 anos de idade.

Entre pessoas com mais de 65 anos a cobertura

atinge 26,1% para os homens e 28,2% para as

mulheres. (IBGE, 2008).

No que tange o conflito existente entre o direito

econômico das empresas de saúde suplementar

frente ao direito fundamental à saúde do cidadão

que lhe é garantido pela Constituição Federal, vê

se que inúmeras vezes esse conflito só consegue

ser solucionado com a interferência do Poder

Judiciário.

No ano de 2012 tiveram 243 decisões sobre o tema

no Tribunal de Justiça do Espírito Santo, porém a

presente pesquisa foi delimitada quanto à análise

das decisões em sede de apelação.

Em sede de acórdão de apelação em 2012, foram

encontradas 90 decisões, sendo que desse total

90% foram favoráveis aos consumidores (Figura

01).

Figura 01 – Decisões do Tribunal de Justiça do Espírito

Santo em 2012

Na pesquisa (Figura 02) foi constatada decisões de

erro médico, no qual o consumidor entrou com

uma ação devido a um erro cometido pelo médico

durante o procedimento, negativa de atendimento

quando o consumidor chega ao hospital com uma

emergência e o plano de saúde lhe nega tal

demanda, negativa de cobertura que é aquela em

que o plano de saúde alega que tal procedimento

não é coberto pelo plano, prazo de carência que é

quando o plano alega que o tempo de adesão ao

plano ainda não permite tal atendimento, reajuste

de faixa etária quando o plano quer fazer um

reajuste maior devido a idade do contratante e

reembolso de despesas de quando devido a

situação o consumidor paga as despesas de seu

próprio bolso e depois solicita o reembolso ao

plano de saúde.

90%

10%

0%

20%

40%

60%

80%

100%

Decisões favoráveis aos consumidores

Decisões desfavoráveis aos consumidores

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Osair Alves, Marianne Martins

Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 52

Figura 02 - Decisões do Tribunal de Justiça do Espírito

Santo em 2012 – Distribuição.

Foi constatado através dos objetos de pesquisa que

a maioria são relativas negativa de cobertura,

seguido pela negativa de atendimento, depois vem

o prazo de carência, o reajuste por faixa etária e o

reembolso de despesas.

A negativa de atendimento é aquela na qual o

consumidor chega ao hospital com uma

emergência e lhe é negado o atendimento,

diferenciando-se da negativa de cobertura pelo fato

de que nesta é negado o atendimento sobre a

alegação de que tal procedimento não é coberto

pelo plano de saúde do solicitante.

O direito fundamental à saúde é uma garantia

constitucional e é reconhecido no âmbito

internacional em documentos como a Declaração

Universal dos Direitos do Homem, de 1948 e o

Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,

Sociais e, Culturais de 1966, bem como pela

Constituição da República de 1988, como todo

direito prestacional a saúde depende da

concretização daquele que legisla

constitucionalmente, para que se possa adquirir

eficiência na sua prestação através de leis e

políticas sociais que garantam sua efetividade.

Nota-se que tal efetividade ou não de direitos como

a saúde e o de que o Estado não possui ou não quer

possuir auxílios suficientes para prestar este

serviço com a qualidade que a população precisa,

neste sentido o Estado tem o dever de prevenir,

fiscalizar e reprimir violações aos direitos

fundamentais como a saúde, devendo punir tais

infratores, tal prevenção deve acontecer através de

medidas de caráter jurídico e administrativo.

O direito fundamental á saúde é uma garantia

constitucional, mas devido a ineficácia do Poder

Público em fazer valer esse direito, a própria

Constituição outorgou ao setor privado a

possibilidade de explorar esse serviço através de

uma contraprestação pecuniária por parte do

consumidor, o que fez proliferar no Brasil os

Planos de Saúde, muitos sem a menor condição de

estarem em funcionamento, com isso naturalmente

começaram a aparecer os conflitos que em via de

regra só são solucionados via Poder Judiciário.

Conclui-se que diante do conflito existente entre o

direito fundamental à saúde do contratante de

planos de saúde e o direito econômico das

operadoras de saúde suplementar tem prevalecido

nas decisões proferidas pelos magistrados do

Estado do Espírito Santo o entendimento de que na

grande maioria das vezes o Poder Judiciário tem

decidido favoravelmente ao consumidor, tendo em

vista que ao longo do ano de 2012, 90% das ações

julgadas em sede de apelação foram pelo

procedimento do pedido em favor do consumidor.

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Osair Alves, Marianne Martins

Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 53

Foi possível verificar através do levantamento de

dados jurisprudencial que os motivos que tem

ensejado as lides entre os consumidores e as

operadoras de saúde suplementar foram os

seguintes: 56,62% referente a negativa de

cobertura, 24,72% a negativa de atendimento,

6,7% a prazo de carência, 1,1% a reajuste por faixa

etária e 1,1% a reembolso de despesas.

AMARAL Gustavo org. p/ TORRES, Ricardo

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 55

LEGITIMIDADE E PARÂMETROS PARA A EFETIVAÇÃO DE POLÍTICAS AFIRMATIVAS DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE ÉTNICO-RACIAL NO BRASIL: AS CONTRIBUIÇÕES DO DIÁLOGO ENTRE CONSTITUIÇÃO E DIREITO INTERNACIONAL

LEGITIMACY AND PARAMETERS TO THE IMPLEMENTATION OF AFFIRMATIVE ACTION

TO PROMOTE ETHNIC AND RATIAL EQUALITY: CONTRIBUTIONS FORM THE DIALOGUE BETWEEN CONSTITUTION AND INTERNATIONAL LAW

Bernardo Brasil Campinho

RESUMO A partir de padrões de incorporação de tratados internacionais de direitos humanos e sua eficácia na consolidação de políticas afirmativas no Brasil, este trabalho analisa as interlocuções entre a Convenção Internacional para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, a Constituição brasileira e a legislação federal sobre políticas afirmativas de igualdade étnico-racial, particularmente no campo da educação superior e na contratação para o serviço público, com o intuito de verificar a sua legitimidade, tendo por base a análise de argumentos de reparação, justiça distributiva e diversidade, bem como trazer alguns parâmetros para aplicação destas políticas, a partir da análise conjunto das normas citadas e da interpretação das mesmas os pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e pelo Comitê da ONU para Eliminação da Discriminação Racial. Os resultados encontrados permitiram concluir que o dialogo normativo entre Convenção da ONU para Eliminação da Discriminação Racial e a Constituição tem produzido as condições de legitimação e implantação de políticas afirmativas de igualdade étnico-racial no Brasil, com alto grau de aderência e fidelidade aos parâmetros interpretativos postos pelo Comitê de Eliminação da Discriminação Racial e pelo Supremo Tribunal Federal, realizando tanto justiça distributiva como justiça como reconhecimento.

ABSTRACT From patterns of incorporation of international human rights treaties and their effectiveness in the consolidation of affirmative action policies in Brazil, this paper analyzes the dialogues between the International Convention on the Elimination of All Forms of Racial Discrimination, the Brazilian Constitution and federal law about affirmative action policies of ethnic-racial equality, particularly in the field of higher education, and contracting for public service, in order to verify its legitimacy, based on the analysis of arguments repair, distributive justice and diversity, as well as bring some parameters for implementing these policies, from the set of analysis mentioned standards and interpretations by the jurisprudence of the Supreme Court and by the UN Committee on Elimination of Racial Discrimination. The results showed that the normative dialogue between the UN Convention for the Elimination of Racial Discrimination and the Constitution has produced the conditions of legitimacy and implementation of affirmative action policies of ethnic-racial equality in Brazil, with a high degree of fidelity and adherence to the interpretative parameters posed by the Committee on the Elimination Racial Discrimination and by the Supreme Court, performing both distributive justice and justice as recognition.

PALAVRAS-CHAVE Legitimidade; Parâmetros; Políticas Afirmativas; Igualdade Étnico-Racial; Brasil. KEYWORDS Legitimacy; Parameters; Affirmative Actions; Ethnic and Ratial Equality; Brazil.

____________________________________________________________________________ 1 – UNESA – Rio de Janeiro - [email protected]

Este trabalho é um resultado parcial de pesquisa

conduzida no âmbito do Edital Pesquisa

Produtividade 2014-2015 da Universidade Estácio

de Sá sobre padrões de incorporação de tratados

internacionais de direitos humanos e sua eficácia

na consolidação de políticas afirmativas no Brasil,

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Bernardo Campinho

Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 56

buscando analisar, neste ponto, o modelo (de ações

afirmativas) mais adotado no Brasil: as cotas

étnico-raciais.

Segundo Joaquim Barbosa Gomes (2001, p. 39),

“as ações afirmativas podem ser definidas como

um conjunto de políticas públicas e privadas de

caráter compulsório, facultativo ou voluntário,

concebidas com vistas ao combate à discriminação

racial, de gênero, de origem nacional, bem como

para corrigir os efeitos presentes da discriminação

praticada no passado, tendo por objetivo a

concretização do ideal de igualdade de acesso a

bens fundamentais como educação e emprego”.

O tema das ações afirmativas na questão da

igualdade étnico-racial passou a ter profunda

relevância no Brasil com a experiência iniciada no

início do século XXI de criação de mecanismos de

cotas para índios e afrodescendentes no acesso à

educação superior, com a reserva de vagas em

universidades públicas.

A legitimidade destes mecanismos foi (e ainda tem

sido) questionada com base na ideia de igualdade

formal perante a lei presente na Constituição da

República (art. 5º, caput e inciso I), razão pela qual

surge a necessidade de aferir se as políticas

afirmativas de cotas étnico-raciais para acesso à

educação superior e a recente legislação federal

sobre cotas da mesma natureza na realização

podem ser consideradas como discriminações

positivas razoáveis à luz da Constituição, de forma

a atender o conteúdo do princípio da igualdade, e

de forma a criar parâmetros para sua efetivação.

Neste ponto, o método de análise escolhido foi o

de privilegiar o diálogo entre o Direito

Internacional dos Direitos Humanos e o sistema

constitucional brasileiro, procurando estabelecer

simetrias e referências que possam criar discursos

de justificação e orientações para operacionalizar o

princípio da igualdade, buscando identificar

elementos que permitam compreender se as

políticas afirmativas na seara das relações étnico-

raciais são compatíveis ou não com este princípio e

como aplica-las corretamente de acordo com

padrões de direitos humanos.

No âmbito do Direito Internacional, verificou-se

que Convenção Internacional de Todas as Formas

de Discriminação Racial (1966), tratado

internacional que, no seu art. 1º, inciso IV,

estabelece que “não serão consideradas

discriminações racial as medidas especiais tomadas

como o único objetivo de assegurar progresso

adequado de certos grupos raciais ou étnicos”,

”contanto que, tais medidas não conduzam à

manutenção de direitos separados para diferentes

grupos raciais e não prossigam após terem sidos

alcançados os seus objetivos”.

Por sua vez, norma internacional destinada a

promover a igualdade étnico-racial dialoga

perfeitamente com os princípios fundamentais

constitucionais adotados pelo Brasil no art. 3º: a

construção de uma sociedade livre, justa e solidária

(inciso I), a redução das desigualdades sociais

(inciso III) e a vedação a qualquer forma de

discriminação, inclusive aquela de caráter relativo

a raça ou cor (inciso IV).

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Bernardo Campinho

Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 57

Todos estes dispositivos, interpretados em

conjunto e tendo a definição de medidas

temporárias, prevista no art. 1º, IV, da Convenção

da ONU para a Eliminação de Todas as Formas de

Discriminação Racial, fundamentam a criação de

mecanismos de caráter inclusivo, no sentido de

combater desigualdades étnico-raciais social e

historicamente construídas, para realizar a plena

igualdade e a justiça social, como requer a

Constituição de 1988.

Neste sentido, esta interpretação é convergente

com o documento final da III Conferência Mundial

de Combate ao Racismo, Discriminação Racial,

Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância

Correlata, realizada em Durban, na África do Sul,

em 2001, no qual os Estados ali presentes, ao tratar

das medidas de prevenção e combate ao racismo e

à discriminação racial, xenofobia e intolerância

correlata, se pronunciaram nos seguintes termos:

Reconhecemos que a desigualdade de

condições políticas, econômicas, culturais e

sociais podem reproduzir e promover o

racismo, discriminação racial, xenofobia e

intolerância correlata, e têm como resultado a

exacerbação da desigualdade. Acreditamos

que a igualdade de oportunidades real para

todos, em todas as esferas, incluindo a do

desenvolvimento, é fundamental para a

erradicação do racismo, discriminação racial,

xenofobia e intolerância correlata (...)

Acreditamos firmemente que a educação, o

desenvolvimento e a implementação fiel das

nossas normas e obrigações dos direitos

humanos internacionais, inclusive a

promulgação de leis e estratégias políticas

econômicas e sociais, são cruciais no combate

ao racismo, à discriminação racial, à

xenofobia e à intolerância correlata (...)

Destacamos a necessidade de se desenhar,

promover e implementar em níveis nacional,

regional e internacional, estratégias,

programas, políticas e legislação adequados,

os quais possam incluir medidas positivas e

especiais para um maior desenvolvimento

social igualitário e para a realização de

direitos civis, políticos, econômicos, sociais e

culturais de todas as vítimas de racismo,

discriminação racial, xenofobia e intolerância

correlata, inclusive através do acesso mais

efetivo às instituições políticas, jurídicas e

administrativas, bem como a necessidade de se

promover o acesso efetivo à justiça para

garantir que os benefícios do desenvolvimento,

da ciência e da tecnologia contribuam

efetivamente para a melhoria da qualidade de

vida para todos, sem discriminação.

A ideia de que as ações afirmativas para a

igualdade étnico-racial são compatíveis com

ambos os padrões da igualdade (formal e material)

encontra também fundamento na Recomendação

(ou Comentário Geral) número 32 do Comitê das

Nações Unidas para a Eliminação da

Discriminação Racial (item 6 da Recomendação),

que expressamente entende que “o conceito de

medidas especiais se baseia no princípio de que as

leis, políticas e práticas adotadas devem

complementar-se, quando as circunstâncias o

aconselhem, com a adoção de medidas especiais

temporárias destinadas a garantir o pleno exercício

dos direitos humanos e das liberdades

fundamentais por grupos desfavorecidos”.

Como explica Flávia Piovesan, ao comentar a

Convenção Internacional para a Eliminação de

Todas as Formas de Discriminação Racial, “faz-

necessário combinar a proibição da discriminação

com políticas compensatórias que acelerem a

igualdade enquanto processo”, na medida em que

“não basta apenas proibir a discriminação,

mediante legislação repressiva”, pois “são

essenciais estratégias promocionais capazes de

estimular a inserção e a inclusão de grupos

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socialmente vulneráveis nos espaços sociais”

(Piovesan, 2006, p. 183).

O debate constitucional reflete profundamente as

concepções trazidas na Convenção Internacional

para a Eliminação de Todas as Formas de

Discriminação Racial, ainda que não de forma

expressa. A evidência disto se encontra no

julgamento da Arguição de Descumprimento de

Preceito Fundamental n. 186 no Supremo Tribunal

Federal brasileiro, ocasião em que se avaliou a

constitucionalidade ou não de políticas de ações

afirmativas conduzidas por decisões

administrativas de universidades públicas federais

(o caso dizia respeito à Universidade de Brasília).

Foi realizada a análise dos votos proferidos pelos

Ministros na Arguição de Descumprimento de

Preceito Fundamental número 186 e foi possível

perceber que a normativa internacional encontra-se

implícita nos votos citados, seja para perceber as

políticas afirmativas de acesso à universidade com

realização da igualdade e não como privilégio, seja

para realçar o caráter provisório destas políticas.

A decisão do Supremo Tribunal Federal neste caso

também consagrou a ideia de igualdade como

respeito às diferenças e seu significado em

sociedades pluralistas, como pode se perceber no

trecho a seguir destacado:

Pensar a igualdade segundo o valor da

fraternidade significa ter em mente as

diferenças e as particularidades humanas

em todos os seus aspectos. A tolerância em

tema de igualdade, nesse sentido, impõe a

igual consideração do outro em suas

peculiaridades e idiossincrasias. Numa

sociedade. marcada pelo pluralismo, a

igualdade só pode ser igualdade com igual

respeito às diferenças. Enfim, no Estado

democrático, a conjugação dos valores da

igualdade e da fraternidade expressa uma

normatividade constitucional no sentido de

reconhecimento e proteção das minorias.

As políticas afirmativas de igualdade étnico-racial

forma positivadas no plano federal com a Lei

12711/2012, que instituiu o modelo das cotas no

acesso à universidade obrigatório nas

universidades federais e regulamentou a matéria

com base no que o STF decidiu na ADPF 186.

Analisando a Lei Federal 12711/2012, há uma

profunda aderência aos conceitos trazidos da

Convenção Internacional para Eliminação de

Todas as Formas de Discriminação Racial:

igualdade substantiva por meio de medidas

afirmativas, caráter provisório destas medidas e

necessidade de acompanhamento e avaliação dos

resultados das mesmas (arts. 3º, 6º e 7º).

Outra medida do Estado brasileiro, a Lei Federal

12990/2014, amplia o alcance das políticas

afirmativas de igualdade étnico-racial para o

campo da seleção de quadros da Administração

Pública federal reserva de 20% (vinte por cento)

das vagas oferecidas nos concursos públicos para

provimento de cargos efetivos e empregos públicos

no âmbito da administração pública federal, das

autarquias, das fundações públicas, das empresas

públicas e das sociedades de economia mista

controladas pela União (art. 1º), desde que o

número de vagas oferecidas no edital do concurso

seja igual o superior a três (art. 1º, parágrafo 1º).

Igualmente há previsão de avaliação da política

(art. 5º da Lei 12990/2014) e a previsão de seu

caráter temporário (10 anos, conforme estabelece o

art. 6º da Lei 12990/2014). Diferente da Lei

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12711/2012 (ações afirmativas no acesso à

educação superior), no entanto, a Lei 12990 (ações

afirmativas nos concursos públicos federais) não

estabelece um ótimo de representação de grupos

étnico-raciais a partir da sua presença no contexto

social e cultural de cada localidade (“proporção no

mínimo igual à de pretos, pardos e indígenas na

população da unidade da Federação onde está

instalada a instituição”), mas sim um piso uniforme

nacional (20% (vinte por cento) das vagas

oferecidas nos concursos públicos para provimento

de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito

da administração pública federal, das autarquias,

das fundações públicas, das empresas públicas e

das sociedades de economia mista controladas pela

União). Ademais, a Lei 12990/2014 se refere

apenas aos negros, não tratando de políticas

afirmativas para concursos públicos no que se

refere aos grupos indígenas brasileiros.

Cabe ainda assinalar que há três discursos de

justificação das políticas afirmativas de igualdade

étnico-racial: reparação, justiça distributiva e

diversidade.

A argumentação com base em reparação/justiça

compensatória, pela qual as ações afirmativas se

justificam em sociedades que por longo tempo

adotaram políticas de subjugação de um ou várias

categorias de pessoas por outras, de corrigir os

efeitos perversos da discriminação passada

(Gomes, 2001, p. 62), o que no caso brasileiro se

refere aos descendentes de africanos, os quais

foram trazidos à força para o país e escravizados, e

aos indígenas e seus descendentes, que foram em

grande parte dizimados ou escravizados (Souza

Neto e Feres Júnior, 2008, p. 367).

O argumento relacionado à justiça distributiva

repousa no pressuposto de que um indivíduo ou

grupo social tem direito de reivindicar certas

vantagens, benefícios ou mesmo o acesso a

determinadas posições, às quais teria naturalmente

acesso caso as condições sociais sob as quais

vivem fossem de efetiva justiça (Gomes, 2001, p.

66).

Finalmente, o argumento da diversidade surge na

jurisprudência da Suprema Corte dos Estados

Unidos e se relaciona com o pluralismo, com a

construção de uma sociedade “amiga da

diferença”, no sentido de estimular um maior

entendimento inter-racial e a demolição de

estereótipos (Souza Neto e Feres Júnior, 2008, p.

352).

Todos os três argumentos estão presentes no

preâmbulo da Convenção Internacional para a

Eliminação de Todas as Formas de Discriminação

Racial, quando ocorre o repúdio ao colonialismo e

a todas as práticas de segregação e discriminação a

ele associadas, bem como aos prejuízos que a

discriminação racial causa às sociedades humanas

(“a discriminação entre os homens por motivos de

raça, cor ou origem étnica é um obstáculo a

ralações amistosas e pacíficas entre as nações e é

capaz de disturbar a paz e a segurança entre povos

e a harmonia de pessoas vivendo lado a lado até

dentro de um mesmo Estado”), trazendo como

objetivo “promover o entendimento entre raças e

construir uma comunidade internacional livre de

todas as formas de segregação racial e

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 60

discriminação racial”. Os já mencionados arts. 1,

IV, e 2, II, da Convenção destacam em maior grau

a questão da justiça distributiva, como também o

faz a Recomendação Geral n. 32 do Comitê de

Eliminação da Discriminação Racial, embora

residualmente existam referências à questão da

diversidade.

No plano do sistema constitucional brasileiro, há

um equilíbrio, a partir dos princípios fundamentais

do art. 3º, entre argumentos de justiça distributiva e

argumentos de diversidade/reconhecimento, como

o julgamento da ADPF 186 no Supremo Tribunal

Federal tornou evidente. A justificas dos projetos

de lei que originaram as Leis 12711 e 12990

caminham igualmente no sentido de dar maior

peso aos argumentos relacionados à redistribuição

e à diversidade.

A conclusão do trabalho é de que o dialogo

normativo entre Convenção da ONU para

Eliminação da Discriminação Racial e a

Constituição tem produzido as condições de

legitimação e implantação de políticas afirmativas

de igualdade étnico-racial no Brasil, com alto grau

de aderência e fidelidade aos parâmetros

interpretativos postos pelo Comitê de Eliminação

da Discriminação Racial e pelo Supremo Tribunal

Federal, realizando tanto justiça distributiva como

justiça como reconhecimento.

FERES JÚNIOR, João; DAFLON, Verônica;

BARBARELA, Eduardo; RAMOS, Pedro. Feres

Júnior, João; Daflon, Verônica; Barbarela,

Eduardo; Ramos, Pedro. Levantamento das

políticas de ação afirmativa nas universidades

estaduais (2013). Levantamento das políticas de

ação afirmativa (GEMAA), IESP-UERJ, 2013.

Disponível em:

http://gemaa.iesp.uerj.br/files/Levantamento_3(1).

pdf. Acesso em 13 de setembro de 2014.

GOMES, Joaquim B. Barbosa. Ação afirmativa e

princípio constitucional da igualdade: o Direito

como instrumento de transformação social. A

experiência dos EUA. Rio de Janeiro: Renovar,

2001.

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Direito

Constitucional Internacional. São Paulo: Saraiva,

2006.

SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; FERES

JÚNIOR, João. Ação Afirmativa: normatividade e

constitucionalidade. In: Igualdade, Diferença e

Direitos Humanos. Organizadores: Daniel

Sarmento, Daniela Ikawa e Flávia Piovesan. Rio de

Janeiro: Lumen.

1 Com relação às primeiras experiências de políticas

afirmativas nas universidades públicas, segundo estudo

do Grupo de Estudos Multidisciplinar das Ações

Afirmativas do Instituto de Estudos Sociais e Políticos

da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, trabalho

conduzido por João Feres Júnior, Verônica Toste

Daflon, Eduardo Barbabela e Pedro Ramos, “Em 2003,

entrou em vigor a Lei Estadual nº. 4.151, que instituiu

reserva de vagas para o ingresso de alunos pretos e

pardos nas universidades estaduais do Rio de Janeiro,

Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e

Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF).

Na Universidade do Estado da Bahia (UNEB) a política

foi criada por meio da deliberação número 196/2002 do

Conselho Universitário (...) (Feres Júnior, João; Daflon,

Verônica; Barbarela, Eduardo; Ramos, Pedro, 2013, p.

6).

2 Documento final da III Conferência das Nações

Unidas de Combate ao Racismo, Discriminação Racial,

Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância

Correlata. Disponível em:

http://www.oas.org/dil/port/2001%20Declara%C3%A7

%C3%A3o%20e%20Programa%20de%20A%C3%A7

%C3%A3o%20adotado%20pela%20Terceira%20Confe

r%C3%AAncia%20Mundial%20contra%20o%20Racis

mo,%20Discrimina%C3%A7%C3%A3o%20Racial,%2

0Xenofobia%20e%20Formas%20Conexas%20de%20In

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toler%C3%A2ncia.pdf. Acesso em 13 de setembro de

2014.

3 O Comitê das Nações Unidas para a Eliminação da

Discriminação Racial é um órgão da ONU formado por

especialistas independentes que monitora a aplicação da

Convenção da ONU para a Eliminação de Todas as

Formas de Discriminação Racial, com base em previsão

do art. 8º da Convenção. Informações no site do Comitê:

http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/CERD/Pages/CER

DIndex.aspx. Acesso em 13 de setembro de 2014.

Segundo Flávia Piovesan, cabe ao Comitê examinar as

petições individuais, os relatórios encaminhados pelos

Estados-partes e as comunicações interestatais,

ressaltando a autora que o sistema de petições

individuais só se aplica aos Estados que fizeram ou

fizerem uma declaração habilitando o Comitê a recebe-

las e a examiná-las, pois o direito de petição é previsto

sob a fórmula de cláusula facultativa; finalmente,

Piovesan esclarece que a decisão do Comitê é destituída

de força obrigatória ou vinculante, mas é publicada no

relatório anual elaborado pelo Comitê, e este é

encaminhado à Assembleia Geral da ONU (Piovesan,

2006, p. 185-186).

4 Segundo a Convenção da ONU para a Eliminação de

Todas as Formas de Discriminação Racial, “o termo

medidas especiais compreende medidas que em alguns

países podem se denominar ‘ações afirmativas’,

‘medidas afirmativas’ ou ‘ações positivas’, quando

correspondam ao disposto no parágrafo 4º do art. 1º ou

no parágrafo 2º do art. 2º da Convenção...” (item 12 da

Recomendação Geral n. 32 do Comitê da ONU para

Eliminação da Discriminação Racial).

5 Segundo relato da agência de notícias do STF, os

Ministros citados se manifestaram nos seguintes termos:

Ministro Ricardo Lewandowski: “o ministro

Lewandowski afirmou que as políticas de ação

afirmativa adotadas pela UnB estabelecem um ambiente

acadêmico plural e diversificado e têm o objetivo de

superar distorções sociais historicamente consolidadas.

Além disso, segundo o relator, os meios empregados e

os fins perseguidos pela UnB são marcados pela

proporcionalidade e razoabilidade e as políticas são

transitórias e preveem a revisão periódica de seus

resultados. Quanto aos métodos de seleção, o relator os

considerou “eficazes e compatíveis” com o princípio da

dignidade humana...”; o Ministro Celso de Mello

sustentou que “o sistema adotado pela UnB obedece a

Constituição Federal e os tratados internacionais que

tratam da defesa dos direitos humanos”; o ministro

Marco Aurélio disse que “as ações afirmativas devem

ser utilizadas na correção de desigualdades, com a

ressalva de que o sistema de cotas deve ser extinto tão

logo essas diferenças sejam eliminadas”; Ministro

Joaquim Barbosa lembrou que “as ações afirmativas não

são ações típicas de governos, podendo ser adotadas

pela iniciativa privada e até pelo Poder Judiciário, em

casos extremos” e defendeu que, com as ações

afirmativas, ““A igualdade deixa de ser simplesmente

um princípio jurídico a ser respeitado por todos, e passa

a ser um objetivo constitucional a ser alcançado pelo

Estado e pela sociedade”; finalmente, o Ministro Gilmar

Mendes reconhece “as ações afirmativas como forma de

aplicação do princípio da igualdade, que, em muitos

casos, exige uma ação do Poder Público no sentido de

realizar a equiparação a partir da constatação de que

determinado grupo se encontra em situação vulnerável”.

Os trechos dos votos e manifestações dos Ministros que

foram citados podem ser conferidos no site da Agência

de Notícias STF:

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?

idConteudo=206042&caixaBusca=N. Acesso em 13 de

setembro de 2014. Na reportagem, há link para votos e

outras matérias sobre o julgamento da ADPF 186.

6

Decisão do Supremo Tribunal Federal na Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental disponível

em:

http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStfArq

uivo/anexo/ADPF186.pdf. Acesso em 13 de setembro

de 2014.

7 Art. 3º da Lei 12711/2012: “em cada instituição

federal de ensino superior, as vagas de que trata o art.

1o desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por

autodeclarados pretos, pardos e indígenas, em proporção

no mínimo igual à de pretos, pardos e indígenas na

população da unidade da Federação onde está instalada

a instituição, segundo o último censo do Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)”.

Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-

2014/2012/lei/l12711.htm. Acesso em 13 de setembro

de 2014.

8 Além do já citado art. 3º (nota anterior), o art. 6º diz

que Art. 6o O Ministério da Educação e a Secretaria

Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial,

da Presidência da República, serão responsáveis pelo

acompanhamento e avaliação do programa de que trata

esta Lei, ouvida a Fundação Nacional do Índio (Funai).

Por sua vez, o Art. 7o O Poder Executivo promoverá,

no prazo de 10 (dez) anos, a contar da publicação desta

Lei, a revisão do programa especial para o acesso de

estudantes pretos, pardos e indígenas, bem como

daqueles que tenham cursado integralmente o ensino

médio em escolas públicas, às instituições de educação

superior. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-

2014/2012/lei/l12711.htm. Acesso em 13 de setembro

de 2014.

9 Neste sentido, confira-se a justificativa do PL

6378/2013, que deu origem à Lei 12990/2014:

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 62

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostr

arintegra;jsessionid=8CD9489DA65A72CF1DFB25BC

7ABB9932.proposicoesWeb1?codteor=1177136&filena

me=PL+6738/2013. Acesso em 13 de setembro de

2014.

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 63

O PODER MODERADOR E SUA REPERCUSSÃO SOBRE O PODER EXECUTIVO

THE MODERATING POWER AND ITS REPERCUSSION ON THE EXECUTIVE POWER

Telmo Olímpio, Allan Marques, Carlos Bolonha

RESUMO O presente artigo produz uma perspectiva para que se possam ser compreendidas as relações do Poder Moderador no Brasil-Império com a Supremacia Executiva desenvolvida ao longo tempo, objetivando suas implicações sobre a Constituição de 1988. Busca-se, desse modo, alcançar de que maneira a hodierna configuração do Poder Executivo, após a Constituição Cidadã, manteve a trajetória institucional brasileira de uma preponderância do Poder Executivo sobre os demais poderes da República. Conveniência política momentânea ou acomodação estrutural do poderio alargado durante o século XX pelo Executivo? Pretende-se responder esta pergunta como modo de contribuir com o estudo sobre as instituições brasileiras e seu comportamento na contemporaneidade, procurando soluções para as crises que exigem, cada vez mais, um aprimoramento destas mesmas instituições com a finalidade de dar-lhes agilidade na tomada de decisão. É imperioso, portanto, um estudo profundo das raízes de nosso Poder Executivo dentro da estrutura estatal para conceber conceitos que ajudem a compreendê-lo e garanta sua funcionalidade.

ABSTRACT This paper produces an overview that can be understood as the relations of Moderating Power in Brazil-empire with Executive Supremacy developed over time aiming its implications on the 1988 Constitution. The aim of this paper is thus to achieve that way today's configuration of the Executive after the Citizen Constitution has kept the Brazilian institutional trajectory with a preponderance of the Executive Branch over the other Branches of government. Momentary political convenience or structural accommodation of extended might by the Executive in the twentieth century? The paper pursues a way of contributing to the study of Brazilian institutions and their behavior in contemporary times looking for solutions to crises that require increasingly an improvement these institutions in order to give them flexibility in decision making. It is imperative therefore a thorough study of the roots of our Executive Branch within the state structure as a way to conceive concepts that help to understand it and ensure its functionality.

Palavras-chave Constituição Cidadã; Poder Moderador; Separação de Poderes; Supremacia Executiva; Teoria Institucional. Keywords Brazilian Constitution; Executive Supremacy; Institutional Theory; Moderating Power; Separation of Powers.

______________________________________________________________________ 1- Graduando da Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Monitor de Teoria do Estado.

E-mail: [email protected]. 2- Graduando da Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail:

[email protected]. 3- Professor Adjunto da Faculdade Nacional de Direito e do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade

Federal do Rio de Janeiro. E-mail: [email protected].

Perpassando pelos 190 anos em que o Estado

Brasileiro tem no topo de seu ordenamento jurídico

uma Constituição Codificada, pode-se perceber a

evolução da estrutura estatal. Notadamente o Poder

Executivo revela-se proeminente em qualquer

análise histórica constitucional que se possa fazer

do Brasil. A primeira Constituição, com maior

tempo de vida, a de 1824, possui uma diferença

notável em comparação às Constituições que a

sucedem: o Poder Moderador. Embora se viva

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 64

atualmente os 25 anos da Constituição Cidadã,

ainda não se consegue delimitar adequadamente a

atuação do Poder Executivo e o seu diálogo com o

Legislativo e o Judiciário.

Neste contexto de solidificação de uma nova

Constituição, enfrenta-se ainda questões pouco

discutidas como a capacidade legiferante do Poder

Executivo ou, ainda, a demasiada influência que o

Poder Executivo exerce sobre o Supremo Tribunal

Federal. Os presentes questionamentos interferem

diretamente na configuração da Separação de

Poderes e, por conseguinte, na cristalização da

tenra democracia brasileira. Em vista de analisar

estas questões, toma-se como hipótese que se pode

ainda vislumbrar desdobramentos deste 4º Poder

Imperial na formação, na importância e nas

atribuições do Poder Executivo brasileiro.

Precisamente sobre a ideia de uma vida

constitucional para além do texto, pode-se

conceber que a influência do Poder Moderador ao

longo do tempo não depende de sua prescrição no

diploma legal. Sob este broquel, entende-se como

o desacoplamento estrutural do Poder Executivo se

desenvolveu, causando sua sobrepujança sobre os

demais poderes da República. (VERMEULE et

POSNER, 2010.)

Com o método hipotético-dedutivo adotado, visa-

se a revisão bibliográfica histórica e política que

possam embasar densamente a discussão que

envolve a estrutura do Poder Executivo e como

esta foi se delineando ao passar dos anos,

entretanto, busca-se primordialmente perceber

estes aspectos na Constituição de 1988, que tornou

o Brasil um Estado Democrático de Direito.

Nesta expedição, tem-se como marco teórico a

teoria institucional norte-americana, trazendo

como expoente de estudo sobre o Poder Executivo

a obra Executive Unbound de Posner e Vermeule.

No cenário nacional, toma-se como determinante a

obra Sua Majestade o Presidente do Brasil de

Ernest Hambloch.

Neste painel, aspira-se demonstrar que existe uma

tendência na organização institucional brasileira

que leva a uma preponderância do Poder

Executivo, tendo em vista a quantidade e a pujança

de suas competências constitucionais. Avaliando,

assim, o Poder Moderador como ditame propulsor

deste modelo de arranjo institucional no Brasil.

O Poder Moderador presente na Constituição de

1824 é um ponto de partida que abre possibilidade

de analisar a formação do Poder Executivo no

Brasil para além dos aspectos estritamente

jurídicos, aliando, assim, as perspectivas histórica

e política. Somente deste modo, pode-se chegar a

um desenho fiel da realidade em que se possa

compreender o atual exercício do Poder Executivo

após a Constituição Cidadã de 1988.

Deste modo, o Poder Moderador, apesar de ter sido

idealizado pelo pensador francês Benjamin

Constant6, só teve vida útil no Brasil e em

Portugal. Fazendo, portanto, deste instituto jurídico

algo genuinamente atrelado às raízes brasileiras.

Desse modo, busca-se na história nacional a

concepção das instituições políticas e jurídicas de

modo a contribuir com uma Teoria Institucional

do Brasil. Ajudando, pois, a compreender os

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 65

fenômenos e crises contemporâneas a fim de

superar dificuldades com a agilidade que os dias

hodiernos exigem.

De olhos fitos sobre o Poder Moderador, é

elementar a análise de que a Constituição de 1824

o delineou em seu texto como primordial para o

exercício do poder político, mas também firmou a

figura do Imperador como uma união hipostática

dos papéis do Executivo e do Moderador. Em

síntese, no primeiro passo vislumbra-se o marco da

Carta Constitucional de 1924.

O extenso período de duração da Constituição de

1824, em um total de 65 anos que jamais foi

alcançado por nenhuma outra Constituição que a

seguiu, nos faria acreditar na fonte de estabilidade

política provinda de suas notáveis diferenças para

com as demais: a Monarquia, enquanto forma de

governo; e o Poder Moderador, como um sistema

de garantir plenos poderes ao Imperador. Neste

sentido, é que o texto constitucional de 1824 define

o Poder Moderador como “a chave de toda a

organização Politica.”

Antes do golpe republicano de 1889, o Brasil

constituiu aos poucos sua própria forma de arranjo

político, e mantinha o Imperador como figura

central deste modelo. Neste sentido é que

encontramos também, no epicentro, o Poder

Executivo que controla o judiciário pela nomeação

de Magistrados, a Igreja pela nomeação de Bispos

e as Forças Armadas. Assim, pode-se conceber que

desde a primeira formação da conjuntura jurídica e

política do Brasil houve privilégio ao Poder

Executivo para mitigação de crises e conflitos e

como mantenedor da estabilidade nacional.

No Brasil, o Imperador teve importância primaz

para o desenho do Poder Moderador idealizado por

Benjamin Constant. Esta união hipostática que

vivemos entre os poderes Executivo e Moderador

no período imperial revela-se como uma inovação

institucional das relações de poder.

Apesar de os republicanos vislumbrarem no

modelo presidencialista norte-americano um novo

horizonte para o Brasil, não se pode deixar de lado

que, de modo pujante, a figura do Imperador

representou grande influência diante dos primeiros

anos da República, nos governos dos Marechais

Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto. Pode-se

talvez atribuir a esta não-radicalidade de mudanças

na estrutura do poder governamental que impediu

revoltas e crises nesta ruptura.

A importância do Imperador se desvela como

fundamental para compreendermos o desenvolver

da história política do Brasil. Sem dúvida, pela

união de poderes em uma única pessoa, encontra-

se o mais alto grau de centralidade política que se

viveu até hoje.

Não há a ingenuidade de se pensar que o Poder

Moderador se perpetuou na vida constitucional

brasileira tal qual ele foi arquitetado. Isso seria,

antes de tudo, um completo absurdo. Não obstante,

o Poder Moderador, como instituto notável no

ordenamento jurídico brasileiro, tanto pelo vigor

quanto pela quase exclusividade com a qual foi

aplicado ao Brasil, pode ser considerado o

precursor de uma gravidade latente conferida ao

Poder Executivo e, por sua vez, à pessoa do

Presidente da República.

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Após o advento da República em 1889 e logo após

a promulgação da Constituição de 1891, o Brasil

viveu períodos de autoritarismo que, se no início,

visavam a não-fragmentação do território

brasileiro, mais tarde deu sinais de que era, de

certo modo, algo próprio da vida constitucional

brasileira. Por isso tivemos idas e vindas, até nos

firmamos como uma democracia a partir de 1988,

situação que tem perdurado por 25 anos.

(HAMBLOCH, 1981, p. 57.)

Neste cenário, consegue-se ver de que forma a vida

constitucional funciona com maleabilidade, não

aderindo rigidamente à Constituição escrita. Por

esta fresta gerada pela disparidade do que se vive e

daquilo que se consagra na Carta Constitucional,

vê-se perpassar a influência que o Poder

Moderador exerceu e exerce sobre a hegemonia

executiva. A este comportamento da vida

constitucional podemos chamar de Constituição

Invisível em consonância com Laurence Tribe.

(TRIBE, 2010.)

A Separação de Poderes, que a Constituição de

1988 trata em seu artigo 3º, tem sofrido de forma

bastante brusca as rápidas mudanças que o mundo

tem vivido. Neste quadro, a necessidade de

tomadas ágeis de decisão tem conferido ao Poder

Executivo uma importância primaz para o

funcionamento do país. Este fato fica evidente na

quantidade de atribuições, no quadro de

funcionários e na centralidade de poder que

qualificam o Executivo. (CANOTILHO et al,

2013, p. 1183.)

Conforme divulgado pelo IPEA em 2009, o Poder

Executivo concentrava 79% dos empregos

públicos, frente a apenas 21% dos demais Poderes

da República. Este dado revela a influência não só

econômica mas também de atividades

desenvolvidas dentro do Executivo. Além disso, o

Poder Executivo detém funções essenciais para

vida pública como o funcionamento de bancos e

universidades, de segurança pública e previdência

social, de relações internacionais e diplomacia,

entre outros. Isto evidentemente é um elemento do

próprio presidencialismo que une as figuras do

Chefe de Governo e do Chefe de Estado no

Presidente da República.

É no Presidente da República que encontramos

uma diferença crucial para as cúpulas dos demais

Poderes. O Poder Judiciário, conta com 11

ministros no Supremo Tribunal Federal e o

Legislativo com 513 Deputados Federais na

Câmara de Deputados e 81 Senadores no Senado

Federal; totalizando 594 em todo Congresso

Nacional. Neste quadro, vislumbramos que esta

centralidade no Poder Executivo o torna o poder

mais ágil e competente para agir em crises que

necessitem de acelerada superação. (SCHIMITT,

2006.)

Nos diálogos institucionais entres os Poderes

Executivo e Legislativo, o que tem tomado grande

espaço no debate público são as Medidas

Provisórias. Ao tentar se debruçar sobre esta

questão, são levantadas com frequência apenas

duas hipóteses para o uso quantitativo de Medidas

Provisórias: o abuso por parte do Executivo; ou a

deliberada complacência dentro do Poder

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 67

Legislativo. No entanto, parece antes de tudo que

se trata de uma acomodação da própria vida

constitucional visando ao equilíbrio histórico

brasileiro baseado no Poder Executivo.

(VERMEULE, 2011.)

Enquanto o diálogo travado com o Judiciário,

devemos analisar que o Presidente da República é

o responsável por indicar Ministros à Suprema

Corte e, neste sentido, já exerce influência sobre a

formação do mais poderoso órgão judiciário do

país. Entretanto pode-se perceber em casos

emblemáticos a influência Executiva no órgão

jurisdicional, como no caso do Instituto Chico

Mendes10

cujos autos marcam definitivamente este

ponto essencial de estabilidade que o Executivo

tem representado no arranjo institucional

brasileiro.

O Poder Executivo, tal como se configurou depois

da Constituição de 1988, apresenta uma

proeminência notável quando o confrontamos com

o Legislativo e o Executivo. Entretanto, temos que

considerar a marca do Poder Moderador, como raiz

história desta Supremacia Executiva.

Pode-se, portanto, perceber que o Poder

Moderador, como instituto e valor constitucional

reverberante, do Brasil Império marcou de maneira

influente nossa história institucional. Permitindo

não só uma Supremacia Executiva como uma

atuação atinada quando cotejada com os outros

poderes. Vê-se na Constituição Cidadã que há certa

acomodação estrutural do poderio alargado durante

o século XX pelo Executivo, como reflexo do

Poder Moderador.

1 Este artigo foi elaborado no âmbito do Laboratório de

Estudos Teóricos e Analíticos sobre o Comportamento

das Instituições (LETACI) vinculado à Faculdade

Nacional de Direito (FND) e ao Programa de Pós-

Graduação em Direito (PPGD) da Universidade Federal

do Rio de Janeiro (UFRJ), com financiamento do

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico (CNPq) pela concorrência do Edital

Universal de 14/2013 (Processo 483289/2013-2); da

Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa

do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) pela

concorrência do Edital APQ1 - Auxílio à Pesquisa

Básica 2013/1 (Processo E-26/111.351/2013) e do

Edital 41 de 2013 - Apoio a Grupos Emergentes de

Pesquisa no Estado do Rio de Janeiro (Processo E-

26/110.095/2014),. Página oficial do LETACI:

http://letaci.com/site

5 O Poder Moderador que se analisa está delimitado no

exposto pela Constituição do Brasil de 1824, sendo o

quarto poder detentor da força coativa frente aos demais

poderes. BRASIL. Constituição (1824). Constituição

Política do Império do Brazil.

6 O idealizador do conceito de Poder Moderador foi o

pensador francês de origem suíça Henri-Benjamin

Constant de Rebeque (1767–1830). Conforme a sua

concepção, o poder real em uma Monarquia

Constitucionalista desempenha uma função natural, que

seria a de um mediador neutro, sendo capaz de resolver

conflitos entre os três poderes instituídos e também

entre as facções políticas. Os únicos países a aplicarem

a teoria de Benjamin Constant foram o Brasil, entre

1824 e 1889, e Portugal, entre 1826 e 1910.

7 Isto pode ser confrontado na Constituição Política do

Império do Brasil de 1824, artigo 98, ipsis litteris: “o

Poder Moderador é a chave de toda a organização

Politica, e é delegado privativamente ao Imperador,

como Chefe Supremo da Nação, e seu Primeiro

Representante, para que incessantemente vele sobre a

manutenção da Independência, equilíbrio, e harmonia

dos mais Poderes Políticos.”

8 O conceito formulado por Laurence Tribe ajuda a

compreender como a vivência dos valores

constitucionais contribui para o entendimento e até

interpretação do texto constitucional. Aplicando ao que

se estuda neste artigo, pode-se contemplar que a forte

vivência do Poder Moderador nos legou um valor, uma

confiança exacerbada do Poder Executivo que permitiu

por parte de uma dominação. Apesar de não mais

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presente no texto este valor de “Moderação Executiva”

molda e constrói aplicação que se dar a Constituição de

1988. Cf. TRIBE, Laurence H. The Invisible

Constitution. New York: Oxford University, 2010.

9 Podemos aqui ter como uma referência Carl Schmitt,

uma vez que ele foi um dos autores mais contundentes

ao tratar do Poder do Soberano. Isto fica muito bem

exposto na frase pela qual principia uma de suas mais

importantes obras Teologia Política: “Soberano é o que

decide sobre a exceção.” Atualmente, vive-se um série

de dificuldades nas quais podemos enxergar pequenos

estados de exceção. Esta ideia de Carl Schmitt contribui

substancialmente para entendermos o Poder Executivo

hoje e suas atribuições. Cf. SCHMITT, Carl. Teologia

Política. Belo Horizonte: Ed. Del Rey, 2006.

10 O caso do Instituto Chico Mendes é emblemático

para o direito constitucional brasileiro porque se trata de

uma revisão na decisão do Supremo Tribunal Federal

em menos de 24 horas. A Ação Direta de

Inconstitucionalidade (ADI 4029) foi proposta pela

Associação de servidores do IBAMA alegando vícios

formais e materiais na feitura da lei 11.516/07 que criara

o Instituto Chico Mendes, a partir da Medida Provisória

nº 366/07. Apesar de serem descartados os vícios

materiais, o erro formal levou ao STF julgar como

inconstitucional a lei em 7 de março de 2012 com

efeitos ex tunc.

BOBIO, Noberto. Liberalismo e Democracia. São

Paulo: Brasiliense, 2000.

CANOTILHO, J. J. Gomes; MENDES, Gilmar F.;

SARLET, Ingo W.; STRECK, Lenio L. (Coords.)

Comentários à Constituição do Brasil. São

Paulo: Saraiva/Almedina, 2013.

HAMBLOCH, Ernest. Sua Majestade o

Presidente do Brasil: Um estudo do Brasil

Constitucional (1889-1934). Brasília: Editora

Universidade de Brasília, 1981.

LAZARI, Igor; BOLONHA, Carlos. A

Conveniente Supremacia do Poder Executivo

vis-à-vis a Coordenação Constitucional de

Poderes. Livros do XXII Anais do Congresso

Nacional do CONPEDI/UNINOVE. 1ed.

Florianópolis: FUNJAB, 2013, v. 1, p. 220-237.

POSNER, Eric A.; VERMEULE, Adrian. The

Executive Unbound: After The Madisonian

Republic. New York: Oxford University Press,

2010.

SCHMITT, Carl. Teologia Política. Belo

Horizonte: Ed. Del Rey, 2006.

VERMEULE, Adrian. The Atrophy of

Constitutional Powers (January 6, 2011). Harvard

Public Law Working Paper No. 11-07.

TRIBE, Laurence H. The Invisible

Constitution. New York: Oxford University,

2010.

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O PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR NAS ENTIDADES PARAESTATAIS

ADMINISTRATIVE DISCIPLINARY PROCESS IN PARASTATALS

Jahson Costa de Oliveira, Marianne Rios de Souza Martins

RESUMO As entidades paraestatais contribuem para o desenvolvimento, dada sua participação na formação de pessoas para a indústria, comércio e serviços. Sendo assim questiona-se: Quais aspectos devem ser observados pelo SEBRAE ao adotar um procedimento específico desvinculado das Leis 8.429/92 e 8.112/90 para processo administrativo disciplinar? O trabalho se baseia em pesquisa exploratória em busca da resposta. Analisar-se-á o conceito, natureza jurídica e princípios e a possibilidade jurídica de um procedimento próprio para o processo administrativo disciplinar. É também baseado na aplicação de questionário nas entidades do Sistema SEBRAE, com o intuito de verificar como se dá o procedimento.

ABSTRACT The parastatals contribute to the progress, given their participation in training people for industry, commerce and services. Thus, the question is: Which aspects should be observed by SEBRAE when adopting a specific procedure unlinked of Laws 8429/92 and 8112/90 for administrative disciplinary process? The paper is based on exploratory research in order to find the answer. It examines the concept, legal nature and principles and the juridical chance of a proper procedure for the administrative disciplinary process. It is also based on a questionnaire in SEBRAE System entities, in order to verify how the procedure takes place.

Palavras-chave Processo Administrativo. Entidade Paraestatal. Procedimento específico. Keywords: Administrative Process. Paraestatal. Specific Procedure.

____________________________________________________________________________________ Advogado formado pelo Curso de Direito da Faculdade Estácio de Vila Velha. Empregado do SEBRAE/ES no cargo de Assistente e nomeado para a função de Pregoeiro na Comissão Permanente de Licitação desde abril de 2007. Professora Universitária, advogada, Mestre em Direitos e Garantias Fundamentais Constitucionais pela Faculdade de Direito de Vitória-ES (FDV). Coordenadora do Núcleo de Pesquisa e Trabalho de Conclusão de Curso da Faculdade Estácio de Vila Velha.

O tema da presente pesquisa é o processo

administrativo disciplinar nas entidades

paraestatais. Tal instrumento utilizado pela

Administração Pública com vistas à investigação

de desvios de conduta praticados por seus

servidores, positivado no ordenamento jurídico

pela Lei 8.112/90, que dispõe sobre o regime

jurídico dos servidores públicos civis da União, das

autarquias e das fundações públicas federais.

A pesquisa buscará responder a seguinte

problemática: Quais aspectos devem ser

observados pelo SEBRAE ao adotar um

procedimento específico desvinculado das Leis

8.429/92 e 8.112/90 para processo administrativo

disciplinar?

Para o desenvolvimento deste trabalho, utilizar-se-

á da pesquisa exploratória, na busca dos

fundamentos para embasá-lo. Com vistas ao

embasamento do tema proposto, foi realizada

pesquisa bibliográfica e documental, de cunho

exploratório, além da aplicação de questionário nas

entidades do SEBRAE, com o objetivo de obter

dos empregados responsáveis pelas Assessorias

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 70

Jurídicas e Auditorias Internas a opinião a respeito

do estudo.

Quanto à natureza jurídica destes entes, veja-se o

dizer doutrinário a respeito. Tratar-se-á sempre no

âmbito das entidades paraestatais, pois a doutrina

não especifica o SEBRAE singularmente,

abarcando-o no gênero paraestatal, da qual

podemos dizer o SEBRAE é espécie.

Marçal Justen Filho conceitua essas entidades

como pessoa jurídica de direito privado criada por

lei para, atuando sem submissão à Administração

Pública, promover o atendimento de necessidades

assistenciais e educacionais de certas atividades ou

categorias profissionais, que arcam com sua

manutenção mediante contribuições compulsórias.

(2011, p. 291)

Com relação aos princípios que norteiam as

atividades das paraestatais, dentre elas o SEBRAE,

recorre-se mais uma vez aos escritos doutrinários

visando elucidar o tema.

Por serem pessoas jurídicas de direito

privado, as pessoas de cooperação

governamental sujeitam-se basicamente às

regras de direito privado. Todavia, o elo de

vinculação que as deixa atreladas ao Poder

Público resulta na emanação de normas de

direito público, sobretudo no que toca à

utilização dos recursos, à prestação de contas

e aos fins institucionais.

Praticam atos de direito privado, mas se

algum ato for produzido em decorrência do

exercício de função delegada estará ele

equiparado aos atos administrativos e, por

conseguinte, sujeito a controle pelas vias

especiais, como a do mandado de segurança.

(CARVALHO FILHO, 2012, p. 531)

Ficam obrigadas a atender aos mesmos princípios

que regem a administração, conforme destacado na

Carta Constitucional, em seu art. 37 (legalidade,

impessoalidade, moralidade, publicidade e

eficiência)

Não podem, portanto, afastar-se de tais princípios

constitucionais em suas atividades, sob o risco de

incorrerem em ato contrário a um dos postulados, o

que pode ensejar penalidade face algum prejuízo

que possa vir a ser causado à Administração.

Relativo aos agentes sujeitos à observância do

Processo Administrativo Disciplinar, a lei que o

regulamenta é a 8.429/92. Por este diploma

incluem-se na esfera de alcance do processo todos

os servidores públicos, vinculados ou não à

administração.

Resta claro que os empregados das entidades

integrantes das paraestatais, inclusive o SEBRAE,

que é o objeto do estudo em questão, encontram-se

abarcados pela disciplina do diploma que regula os

atos de improbidade administrativa afeitos aos

servidores públicos, equiparados que são a estes

nos casos de desvios de conduta.

Também o Código Penal trata do funcionário

público para efeitos de aplicação de pena por crime

contra a administração pública, em seu art. 327.

Assim, tem-se a imputação de pena e

aplicabilidade aos empregados das entidades

paraestatais na mesma medida dos servidores

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públicos, uma vez que constam previstos no

ordenamento ora apresentado.

Ingressam, então, estes agentes na regra da Lei

8.429/1992, sendo também destinatários do

Processo Administrativo Disciplinar.

Existe diferença marcante nos Estatutos dos

empregados das pessoas jurídicas privadas e dos

entes públicos, materializadas na legislação

correlata, a saber, Consolidação das Leis do

Trabalho e Lei 8.112/1990.

Em leitura ampla, crê-se estarem inseridos na

regulamentação da CLT, por abarcados no

conceito de empregado, os servidores da

Administração Pública. No entanto, a norma

especial não nos deixa tomar tal interpretação.

A Lei 8.112/1990 normatiza a matéria relativa às

relações entre os servidores e a Administração,

desde o provimento, passando pelas promoções e

regime disciplinar, até a aposentadoria. Os

destinatários desta norma constam bem

referenciados, conforme segue:

Art. 1º. Esta lei institui o regime jurídico dos

servidores públicos civis da União, das

autarquias, inclusive as em regime especial, e

das fundações públicas federais.(BRASIL,

1990)

Portanto, excluem-se do raio de ação da CLT os

servidores públicos da União, e também os

servidores dos estados e municípios, pela aplicação

de suas legislações próprias face o princípio da

simetria.

O ápice da questão, depois de explanadas as

normas, é o regimento no qual se enquadram os

empregados das entidades paraestatais.

Marçal Justen Filho (2011, p. 291) apresenta as

seguintes características: - São pessoas jurídicas

de direito privado; - Não estão submissas à

Administração Pública (ou seja, são autônomas); -

Recursos oriundos de contribuições compulsórias.

Não se visualiza nenhuma referência ao regime dos

empregados. Mas não há necessidade. É bem claro

que são pessoas jurídicas de direito privado, e

como já se discorreu a respeito da Lei 8.112/1990 e

a quem ela se destina, por óbvio é que os demais

estão sujeitos à Consolidação das Leis

Trabalhistas, aí abarcados os empregados das

entidades paraestatais.

Com o intuito de entregar melhor base ao estudo,

foi aplicado questionário entre as Unidades

Jurídicas e de Auditoria dos SEBRAE’s nos

Estados da federação. O objetivo era a verificação

quanto à existência de procedimento específico

naquela unidade ou, caso negativo, como se

procede quando da necessidade de verificação de

falta cometida por empregado.

De início, questionou-se quanto à existência de

algum normativo a respeito do Processo

Administrativo Disciplinar na entidade. Das

respostas recebidas, percebe-se unanimidade

quanto à inexistência de procedimento específico.

No entanto, chama a atenção a resposta do Estado

do Rio Grande do Norte transcrita na sequência:

Não possuímos um procedimento

administrativo disciplinar por entendermos

que isso não se aplica ao Sistema “S”. Quanto

à sindicância, por sua vez, entendemos ser

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aplicável, mas não possuímos normativo.

(LIMA, 2013)

A colaboradora apresenta discordância quanto à

pertinência do tema ao SEBRAE, o que se pode

verificar pensamento distinto logo a seguir, quando

a pergunta trata da opinião a respeito de um

procedimento específico para o SEBRAE.

Argumentos interessantes vieram dos Estados do

Ceará e Rio Grande do Norte:

O lado positivo seria padronizar os processos.

O lado negativo é o de se igualar cada vez

mais ao serviço público, comprometendo a

eficiência organizacional com processos

burocráticos. (LEONARDO, 2013).

Acredito que isso fortalece o sistema.

(CORREIA, 2013).

Quando se pergunta a respeito de qual

procedimento é seguido, veja-se a resposta do

SEBRAE Amazonas:

Baseado unicamente no princípio do

contraditório e ampla defesa. Na prática o rito

é basicamente o mesmo da administração

pública: constitui comissão de sindicância;

solicita esclarecimentos; contata testemunhas;

faz acareação, se necessário; e encerra com

relatório contendo a opinião da Comissão

para o Superintendente validar ou não.

(LEONARDO, 2013).

A existência de um procedimento específico,

conforme já discorrido na presente pesquisa, sem

dúvida trará significativo ganho para as entidades,

uma vez que as comissões formadas terão

normativo que irá direcionar os trabalhos, evitando

fragilidades que comprometam as instituições,

principalmente no que diz respeito a passivos

trabalhistas por irregularidades nas relações destas

com seus empregados.

Concluiu-se pela possibilidade relativa de

procedimento desvinculado. Isto porque não há

inconstitucionalidade nas leis mencionadas, e o

fato de serem as entidades paraestatais instituídas

por lei e subvencionadas pela União por meio de

contribuições parafiscais, não há como dela

desgarrarem-se seus empregados. Diz-se

possibilidade relativa por não existir vício

constitucional em se estabelecer procedimento

próprio para tais entes, como já existe com os

Regulamentos de Licitações e Contratos, desde que

estes, ao simplificar, não inovem a ponto de

anularem a norma própria, com ritos que

extrapolem os limites de sua competência, que são

bem descritos por seus Estatutos e Regimentos

Internos.

Pode ser concluído que os aspectos a serem

observados pelo SEBRAE ao adotar um

procedimento específico desvinculado das Leis

8.429/92 e 8.112/90 para processo administrativo

disciplinar, são os a seguir elencados:

a) Formação das comissões por 03 (três)

empregados estáveis, não indicados;

b) Não obrigatoriedade de publicação da

composição das comissões;

c) Não obrigatoriedade da Sindicância, podendo

partir diretamente para o PADI;

d) Os prazos podem ser flexibilizados, com vistas

a tornar mais célere o procedimento, previstas

as prorrogações desde que razoáveis;

e) As penalizações podem, também, ser

flexibilizadas, face a natureza jurídica celetista

dos empregados.

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Esta proposta de norma própria decorre da

pesquisa, apontando como diploma subsidiário a

Lei 8.112/90, que tem capítulo destinado ao

Processo Administrativo Disciplinar. A proposta

traz os pontos principais a serem observados

quando da formação do Regulamento, com vistas a

diferenciar-se de maneira a não torná-lo sem efeito.

Portanto, depois de analisadas as possibilidades,

buscado na doutrina e na legislação pátria, têm-se

que o procedimento específico para as entidades

paraestatais no que diz respeito ao Processo

Administrativo Disciplinar é possível, e o dizemos

ser de maneira relativa em função das possíveis

lacunas, que demandarão a subsidiariedade às leis

especiais.

Perfeitamente é, pelo exposto, cabível a elaboração

de manual de processo administrativo disciplinar

para o SEBRAE, da mesma maneira que se dá com

o Regulamento de Licitações e Contratos,

tornando-o adequado à realidade dos empregados a

ele vinculado.

BRASIL. Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990.

Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores

públicos civis da União, das autarquias e das

fundações públicas federais. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8112c

ons.htm. Acesso em: 10 mai. 2013.

BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

Código Civil. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L

10406.htm>. Acesso em 17 mar. 2013.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de

Direito Administrativo. 12 ed. Rio de Janeiro:

Lumen Juris, 2005.

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito

Administrativo. 7 ed. Belo Horizonte: Fórum,

2011.

LEONARDO, Elizandra Litaiff. Gerente da

Assessoria Jurídica do SEBRAE - AM. Entrevista

concedida a Jahson Costa de Oliveira em 09 abr.

2013. Manaus, 2013.

LIMA, Ana Regina Feijão. Gerente Unidade

Auditoria Interna do SEBRAE - RN. Entrevista

concedida à Jahson Costa de Oliveira em 05 abr.

2013. Natal, 2013.

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REPRESENTAÇÕES SOBRE FORMAÇÃO DE MEDIADORES JUDICIAIS EM NITERÓI

REPRESENTATIONS ON JUDICIAL MEDIATORS TRAINING IN NITERÓI

Gabriel Guarino SantaAnna Lima de Almeida

RESUMO Este artigo tem por objeto de reflexão a mediação judicial, sob um olhar específico do Direito, impactado pela Antropologia. Temos como objetivo analisar a formação de mediadores judiciais na Comarca de Niterói, especificamente quanto às representações que os mediadores possuem de sua própria formação e treinamento. Quanto ao método, nos apropriamos de ferramentas metodológicas da antropologia interpretativa para analisarmos as experiências de formação de mediadores, buscando elucidar quais suas representações, como agentes diretos na prática de mediação, acerca do próprio processo de formação. Como resultados e conclusões preliminares, tratando-se de uma pesquisa em andamento, temos que as representações trazidas pelos agentes do campo não se restringem à abordagem institucional do Judiciário, ligados à eficiência e celeridade, mas agregam outras concepções de mediação não restritas àquelas trabalhadas nos processos de formação. Contraditoriamente, ainda, as iniciativas de formação se centram num modelo ligado a formação jurídica e ao Poder Judiciário.

ABSTRACT This article aims at judicial mediation, by considering Law through an anthropological approach. Our objective is to analyze the training process of judicial mediators in the Court of Niteroi, specifically regarding the representations that the mediators themselves have about their training. In what concerns the research methods, we use methodological tools of the interpretative anthropology in order to understand how they see their own training process. As results and preliminary conclusions, since this is an ongoing research, we see that the representations that are brought up by the agents are not restricted to those of institutional speech from the Judiciary Branch, but they are related to others conceptions of mediation not restricted to those worked on its training process. Yet, the mediator’s training process is still related to judiciary culture and its practices.

Palavras-chave: mediação, mediação judicial, formação de mediadores, cultura judiciária, Poder Judiciário. Keywords:

mediation, judicial

mediation, mediator’s

training, judicial

culture, Judicial

Branch.

________________________________________________________________________ 1 - UFF – Rio de Janeiro – [email protected]

Este artigo tem por objeto de reflexão a formação

do mediador judicial, sob um olhar específico do

Direito, impactado pela Antropologia.

A mediação de conflitos, considerada inicialmente

como “meio alternativo de resolução de conflitos”,

é definida como um método de auto composição

indireta, ou assistida, onde há um terceiro

imparcial intervindo no conflito (AZEVEDO,

2013). Trata-se de uma prática ainda recente dentro

do cenário de administração de conflitos no Brasil.

Como já explicado em outra ocasião (DUARTE;

ALMEIDA, 2014), tal política foi inaugurada com

a Resolução n. 125 de 29 de novembro de 2010 do

Conselho Nacional de Justiça. No campo jurídico,

seja por meio de livros de doutrina, seja por meio

de Projetos de Lei referentes à regulamentação da

mediação a mediação tem sido tratada como

“objeto de estudo” do Direito.

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Entretanto, pouco há sobre as práticas de

mediação, isto é, sobre os aspectos procedimentais

de como se realiza uma sessão de mediação, que

consistem nas técnicas de negociação que

permitem tal “tratamento adequado de conflitos”.

A mais expressiva fonte disponibilizada no campo

é o “Manual de Mediação Judicial” (AZEVEDO,

2013) cujo enfoque, porém, é de manual: seu

intuito é prescrever o conjunto de técnicas a serem

utilizados, não sendo, por óbvio, uma descrição do

que se faz, mas um manual sobre o que se

deve(ria) fazer. Menos assim se tem disponível

sobre o modo de transmissão de tais técnicas, ou

seja, pouco sabe como se forma efetivamente um

mediador.

Ante o cenário exposto acima, esta pesquisai tem

como objetivo estudar como os mediadores

entendem e compreendem o seu próprio processo

de formação. Nesta perspectiva, o esforço se dirige

não só a entender como eles enxergam a

implantação desta política de mediação no Rio de

Janeiro (e em Niterói especificamente) e os erros e

acertos dos processos de capacitação e formação

vivenciados, mas especialmente busca

compreender quais as representações que eles

possuem sobre e que significados atribuem ao que

seja a formação do mediador de conflitos e

também a mediação de conflitos em si.

No que se refere à metodologia e à forma de

análise dos resultados, partimos de um olhar

inspirado na Antropologia comparativa,

pressupondo que as práticas, os discursos e

representações do mundo do direito mantêm uma

relação recíproca de influência com a sociedade

brasileira (GEERTZ, 1973; 1997).

As experiências que descrevemos resultam: a) de

pesquisa na modalidade observação participante

que incluiu a frequência de um dos pesquisadores

em Curso de Formação de Mediadores do TJRJ,

realizado em julho de 2012 na Comarca de Niterói,

e no primeiro Curso Básico de Mediação da Escola

Nacional de Mediação e Conciliação, realizado de

Agosto a Dezembro de 2013, por meio da

plataforma de Educação à Distância (CEAD) da

Universidade de Brasília; b) por meio de

entrevistas com os mediadores, com o objetivo de

ouvi-los diretamente acerca do próprio processo de

formação.

Quanto às representações e percepções dos

mediadores acerca de sua própria formação, o

interesse específico se dirige aos mediadores

atuantes na Comarca de Niterói. Os mediadores

entrevistados totalizam 14 mediadores, dentre os

que atuaram no período de 2012 até o presente

momento. Importante frisar que, estando a

pesquisa ainda em andamento, até a presente data,

foi entrevistada parte deste grupo. Todas as

pessoas ouvidas realizaram sua formação básica

em cursos do TJRJ, e alguns realizaram

posteriormente o curso da ENAM. Destacamos a

propósito que não temos o objetivo de formar uma

mostra quantitativamente relevante, mas sim que a

análise qualitativa, devidamente contextualizada,

que possa contribuir e fomentar reflexões críticas

ao campo da mediação de conflitos.

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A implantação da mediação no Tribunal de Justiça

do Estado do Rio de Janeiro se inicia em 2009,

quando foram realizados os primeiros cursos de

formação de mediadores. Para tanto, foram

firmadas parcerias com o Conselho Nacional de

Justiça e a Secretaria de Reforma do Judiciário.

Destas parcerias foram realizados os primeiros

cursos de formação de mediadores junto aos

Tribunais de Justiça Estaduais (BUZZI, 2011, p.

53), incluindo-se aí o Tribunal de Justiça do Rio de

Janeiro.

Este primeiro momento de formação, onde foram

formados os mediadores hoje mais experientes

atuando no Tribunal, ocorreu num contexto muito

incipiente da implantação da política de mediação:

não havia ainda sido instalados os Centros de

Mediação nas Comarcas do Estado. Estes

primeiros cursos foram oferecidos para

magistrados, servidores e eventuais acadêmicos e

advogados. O modelo foi o mesmo que seria

reproduzido posteriormente pelos cursos do

próprio Tribunal de Justiça do Rio, como o

descrito em outra ocasião (ALMEIDA, 2012) e

incluía um Curso de 40h/a, eminentemente teórico,

onde eram apresentados os pressupostos, a teoria

da mediação, e algumas práticas simuladas. Estas

horas teóricas, no modelo adotado pelo TJRJ, eram

oferecidos em modulo intensivo, em geral em dez

aulas, cada uma com quatro horas de duração, ao

longo de uma ou duas semanas.

Em 2013, com o primeiro curso de formação de

mediadores da ENAM, órgão do Ministério da

Justiça, houve, em tese, um rompimento com o

antigo modelo do curso de formação de

mediadores, predominantemente teórico, para um

modelo de formação baseado em prática. Ter-se-ia,

assim, um “modelo baseado em competências”

(AZEVEDO, 2012). O curso da ENAM foi

realizado na modalidade de ensino a distância e no

período de quatro meses (Agosto a Dezembro de

2013, no caso observado). Consistia em leituras

semanais, vinculadas a um fórum de discussão on-

line, atividades de questionário, e prática simulada.

O curso, em termos de carga horária, somava 100

h/a.

Marcar esses dos dois momentos de formação é

relevante porque serão referenciados pelos

mediadores em suas falas, especialmente, por se

tratarem de cursos oferecidos de maneira distinta.

Um presencial, de 40h, em dias consecutivos num

intervalo de duas semanas; outro a distância, de

100h, em quatro meses. Os dois, no entanto, com a

mesma premissa: ser um curso de formação de

mediadores judiciais. A percepção daqueles que

realizaram os dois momentos é que a vinculação

estrita ao manual, vivenciada no Curso da ENAM,

permitiu um consolidar teórico das técnicas e uma

segurança em aplicá-las que aquele primeiro

momento, no TJRJ, não permitiu.

Para que o procedimento seja satisfatório, pensam

os entrevistados, o mediador deve ser capaz de

executar algumas técnicas e possuir algumas

habilidades que, em tese, deveriam ser adquiridas

em sua formação, sob o risco de ineficiência do

procedimento – quando não violação ética dos

deveres de imparcialidade, neutralidades e outros

aplicáveis.

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 78

É recorrente na fala deste grupo o “encantamento”

pela mediação: sendo esta compreendida não como

um mero procedimento, mas aberta a outra lógica

de abordagem de conflitos e, também, de postura

frente à vida, à sociedade e às relações humanas.

Noções, pois, que são expressas na recorrente

expressão de que “quando conheci a mediação,

fiquei encantada”. Esse encantamento também se

percebe na busca de outras fontes de leitura que

apresentam diversas abordagens de mediação. Do

público ouvido, nenhum dos entrevistados se ateve

somente às bibliografias indicados pelo Tribunal.

Houve o contato com elementos teóricos de outras

obras sobre o assunto tais como o livro “A

Comunicação Não Violenta” (ROSEMBERG,

2006), por exemplo.

Ocorre que, da maneira que os mediadores

referenciam seus momentos de formação, torna-se

claro que o momento de formação inicial, pelo

TJRJ (que em tese os capacitaria) não foi

satisfatório pois não possibilitou um aprendizado

efetivo de técnicas, funcionando como uma

apresentação inicial, intensiva, porém ainda assim

“fascinante”. Deste modo, o que ocorreu é que o

aprendizado teórico e a atuação prática se deram de

forma desarticulada ainda que concomitantemente,

pois “se aprendeu fazendo”. Os motivos para tal

demandam maior investigação, mas pode-se

afirmar que a ausência de mediadores mais

experientes no Tribunal (afinal, eram as primeiras

turmas) impactou nessa formação, reforçando a

lógica de se passar do teórico direto para a prática

real. Este cenário/abordagem, ainda hoje, persiste:

o numero baixo de mediadores faz com que aquela

ideia de estágio supervisionado ainda hoje não

tenha sido implantada. Os mediadores que

capacitaram em 2012 foram “direto a mesa”

mediar, sem que houvesse um período de

observação e supervisão anterior.

Os entrevistados veem, também, a mediação como

uma oportunidade de tratar as pessoas que chegam

ao Judiciário de maneira mais humana. Pois, para

eles, na prática, não é o advogado o protagonista,

mas os próprios sujeitos em conflito. Isto contrasta

com a expectativa institucional de gestão do

Tribunal que associa os meios alternativos com

eficiência, celeridade e diminuição do número de

processos.

Assim, os entrevistados entendem o processo de

formação de medidores insuficiente, se focado

apenas nas iniciativas institucionais do Tribunal, já

que a mediação na prática é muito mais complexa.

Tem que a mediação possui abordagens diversas e

amplas, por outras matrizes teóricas, que podem se

somar àquela praticada no Judiciário. Entendem

que a formação do mediador deve ser continuada,

sem ponto necessariamente final e que a atividade

de supervisão, orientada e constante, é hoje a

principal deficiência do modelo. Reconhecem que

o Curso da ENAM permitiu uma vinculação sólida

às técnicas do Tribunal, o que no primeiro

momento de formação não havia sido possível.

Admitem ainda que a lacuna entre a consolidação

teórica e a prática prévia pode levar à reprodução

dos papeis consolidados de suas outras carreiras

prévias (como advogados, assistentes sociais,

psicólogos, por exemplo) na prática de mediação, e

não de mediadores propriamente ditos.

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Como resultados e conclusões preliminares, temos

que as representações trazidas pelos agentes do

campo não se restringem à abordagem institucional

dada pelo Judiciário ao tema, ligada à eficiência e

celeridade, mas agregam outras concepções de

mediação não restritas àquelas trabalhadas nos

processos de formação. Contraditoriamente, ainda,

as iniciativas de formação se centram num modelo

ligado a formação jurídica e ao Poder Judiciário.

Tal contradição sugere a ausência de consenso

sobre o que fazem os mediadores e o que o

Tribunal deles espera.

AZEVEDO, André Goma. Políticas públicas para

formação de mediadores judiciais: uma análise do

modelo baseado em competências. In: Meritum,

v. 7, n. 2 Belo Horizonte, jul./dez. 2012. pp. 104-

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RESTO-INGESTA EM UMA UNIDADE DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO (UAN) LOCALIZADA NA CIDADE DE ANTÔNIO CARLOS/SC

Gabriela Rodrigues Varela de Aquino, Renata Zimmermann, Isaura Hammerschmitt Clemente, Patrícia Acioly

RESUMO As Unidades de Alimentação e Nutrição (UAN) são locais que devem oferecer refeições nutricionalmente saudáveis aos seus comensais. Nestes locais é necessário um maior controle sobre desperdício a fim de reduzir o percentual de resto-ingesta e até mesmo custos, o que gera em beneficio mútuo tanto para a unidade quanto para o comensal que pode usufruir de uma alimentação com maior qualidade. O objetivo deste estudo foi avaliar o índice de resto-ingesta em uma UAN localizada no município de Antônio Carlos/SC. Este estudo foi realizado durante seis dias, onde foram pesadas todas as preparações prontas do almoço antes de serem servidas e as que ficaram no buffet e pastrought foram pesadas após a finalização do almoço, bem como a pesagem do que ficou nos pratos e bandejas dos comensais. Os resultados depois de tabulados foram aplicados em fórmulas especificas onde chegou-se em resultados como o índice de resto-ingesta, quantidade consumida, consumo per capta e número de pessoas que poderiam ser alimentadas com os restos. Sabendo que o Brasil é um dos países que mais desperdiça alimentos no mundo, se faz necessário um maior controle do índice de resto-ingesta nas UAN’s a fim de beneficiar a unidade e os comensais.

ABSTRACT Units of Food and Nutrition (HFS) are places that should offer nutritionally healthy meals to its diners. In these places you need greater control over waste in order to reduce the percentage of intake and rest-even costs, which generates mutual benefit for both the unit and for dinner they can enjoy a higher quality food. The aim of this study was to evaluate the rate of rest-intake in a UAN in the municipality of Antônio Carlos / SC. This study was conducted over six days, which were heavy already prepared lunch before being served and those that were the buffet and pastrought were weighed after completion of lunch, and the weighing of what was in the dishes and trays of diners . The results were then tabulated applied in specific formulas which arrived on the results as the ratio of rest-intake, amount consumed, consumption per capita and the number of people who could be fed with the remains. Knowing that Brazil is a country that wastes more food in the world, it is necessary to better control the rate of rest-UAN's intake in order to benefit the unit and diners.

Palavras-chave: Unidade de Alimentação e Nutrição. Resto-ingesta. Consumo. Desperdício. Sobras. Keywords: Food and Nutrition Unit. Resto-intake. Consumption. Waste. Leftovers

____________________________________________________________________________

Os estabelecimentos responsáveis pela produção e

distribuição de alimentação coletiva são

denominados Unidades de Alimentação e Nutrição

(UAN’s) (GOMES; JORGE, 2012), onde as

refeições devem ser equilibradas nutricionalmente,

devendo atender o perfil dos comensais, acatando

as práticas higiênico-sanitárias vigentes a

legislação (SILVA; SILVA PIOLI; PESSINA,

2010).

De acordo com a lei n. 12.305/2010 que estabelece

a Política Nacional de Resíduos Sólidos, o gerador

responsável por resíduos deve tomar medidas

corretas para o gerenciamento e descarte do

mesmo, onde o controle do desperdício é o maior

desafio da administração, gerando impacto técnico,

financeiro e ambiental. (CHAMBERLEM;

KINASZ; CAMPOS, 2012).

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O Brasil é o país que mais desperdiça

mundialmente. Segundo dados da Organização

das Nações Unidas, de toda produção do nosso

país 30% é destinado para o lixo (SANTOS et al.,

2007). Tendo em vista que o decreto lei n. 2.848,

de 1940, impede que restaurantes deem as sobras

de comida para quem precisa, responsabilizando os

estabelecimentos no caso de uma pessoa passar

mal com o alimento doado, ou seja, toda

alimentação desperdiçada obrigatoriamente precisa

ser descartada (AUGUSTINI et al., 2008).

Desperdício são todas as sobras alimentares, tanto

as quantidades produzidas e não distribuídas

(sobras), como aquelas servidas e não ingeridas

(restos) (CASTRO et al., 2003; GOMES; JORGE,

2012). O aumento no índice de restos alimentares

está correlacionado diretamente com o

planejamento errôneo do número de refeições

produzidas, falta de dados sobre a frequência dos

comensais no estabelecimento, deficiência no

treinamento dos manipuladores quanto à produção

e ao porcionamento, falta de conhecimento dos

hábitos alimentares dos comensais e deficiência na

habilidade dos manipuladores na preparação dos

pratos (AMORIM, 2010; RICARTE et al., 2008).

O controle de resto-ingesta pode ser feito pelos

índices de conversão, pelo uso das receitas

padronizadas, com fatores de correção e sempre

tendo o número de refeições que serão servidas

(AUGUSTINI et al., 2008), ou seja, adequado em

quantidades, necessidades, porcionamento e

aceitabilidade do cardápio. (BRADACZ, 2003).

Para Veloso, Santana e Oliveira (2007) um recurso

para a satisfação do comensal e diminuição das

sobras e restos é a aplicação de um questionário de

satisfação para analisar os serviços oferecidos.

Sabe-se que um percentual de resto-ingestão

superior a 10% para a população sadia, indica que

os cardápios estão mal elaborados/ planejados e

executados (MATTIELO, 2008). Para Vaz (2006),

a porcentagem das sobras numa UAN deve ser de

3%, sendo considerando como aceitável o valor

entre 7 e 25 gramas de resto por pessoa.

Diante do exposto, e somando o fato de que o

Brasil é o país que mais desperdiça alimentos

mundialmente, o objetivo deste estudo foi avaliar o

índice de resto-ingesta em uma UAN localizada no

município de Antônio Carlos/SC, visando

identificar os fatores que interferem no desperdício

bem como o controle dos mesmos para que haja a

redução do desperdício.

Esta pesquisa trata-se de um estudo de caso,

realizada em uma UAN localizada no município de

Antônio Carlos/SC. A pesquisa ocorreu durante

seis dias nos meses de abril e maio. As aferições

das pesagens foram realizadas no período

matutino, somente no almoço, totalizando nos seis

dias 1123 comensais.

Foi realizada a pesagem de todas as preparações

prontas, das sobras de todo alimento presente nas

panelas, cubas e do passthrou (sobras limpas) e

dos restos que é caracterizado por todo alimento

que o comensal deixou no prato e bandeja (sobras

sujas). Para a realização da coleta de dados foram

utilizadas duas balanças da seguinte maneira: para

as preparações prontas e as sobras suja e limpa foi

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utilizada uma balança digital da marca

Micheletti®, com precisão mínima de 100g e

capacidade máxima de 15kg com margem de erro

de 5g, calibrada em julho/2012, já para os restos a

balança utilizada é de carrinho da marca

Caudura®, modelo 03, nº 51264, ano 1993, com

capacidade máxima de 300kg calibrada em

março/2013. Os colaboradores foram orientados

quanto ao uso de uma lixeira própria para o

descarte do resto, onde somente iria ser usado para

o trabalho nos dias em questão e no horário de

almoço, não foi permitido o descarte de mais nada

que não fosse às sobras das bandejas e pratos dos

comensais e por fim a alimentação do buffet que

foi utilizada.

Segundo Mattielo (2008), as fórmulas utilizadas

para quantificar resto-ingestão são as seguintes:

Para obtenção do peso da refeição distribuída foi

feito a pesagem da(s) cuba(s) de cada preparação,

depois de pronta(s), sendo descontado o valor dos

respectivos recipientes. Já para a pesagem das

sobras e dos restos, foram colocados em sacos

plásticos de lixo, sendo que o peso do mesmo foi

descontado. Os valores obtidos foram somados

resultando no total de alimentos distribuídos.

Desse total ocorreu a subtração do peso das sobras

e dos restos encontradas após a distribuição das

refeições.

Quantidade consumida = total produzido –

(sobra + resto)

Para determinar o percentual de resto-ingesta foi

pego o peso total do resto, dividido pela

quantidade consumida e multiplicado por 100.

Índice de resto-ingestão em (%) = (Peso do resto

/ quantidade consumida) x 100

O consumo per capta foi determinado pela

quantidade consumida dividida pelo número de

refeição.

Consumo per capta = quantidade consumida/

número de refeições

E para sabermos quantas pessoas poderiam ser

alimentadas com a quantidade de comida que foi

jogada fora, utilizou-se o peso do resto dividido

pelo consumo per capta.

Pessoas alimentadas = Peso do Resto / per capta

Após o cálculo das variáveis acima citadas, pôde-

se fazer uma avaliação do desperdício na Unidade

de Alimentação e Nutrição estudada.

Para melhor compreensão, os resultados foram

apresentados em tabela e gráficos

O período de coleta na Unidade de Alimentação e

Nutrição ocorreu nos dias 15, 19 e 22 de abril e 3,

6 e 13 de maio, no horário do almoço, período em

que foram oferecidas 1123 refeições. O cardápio

era composto por basicamente arroz, feijão, sopa e

ovo frito, dois tipos de carne, um acompanhamento

quente e quatro tipos de saladas.

Na tabela 1, estão apresentados os valores de

sobras ou restos de alimentos. Nota-se que os

restos 25,97%, totalizaram 30,98kg que divididos

pela média per capta poderiam alimentar

aproximadamente 52 pessoas nestes seis dias de

almoço pesquisados. Colaborando com esse dado

Akatu (2004) nos enfatiza que o Brasil é um dos

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campeões mundiais de desperdício, e que

aproximadamente uma família desperdiça por ano

1 bilhão de dólares, o equivalente para alimentar

500 mil famílias. Colaborando ainda com esses

dados Velloso (2002) relata que o desperdício de

alimentos é de 39 mil toneladas/dia, quantidade

esta suficiente para alimentar 19 milhões de

brasileiros com três refeições ao dia.

Com base nestes dados, estima-se que em um ano

o desperdício de alimentos equivaleria a mais de 1

tonelada de lixo, especificamente 1884,61 Kg,

quantidade de alimento suficiente para alimentar o

equivalente a 2991 pessoas neste período.

Tabela 1: Valores de sobras/restos acompanhados

DATA QUANTIDADE

CONSUMIDA

ÍNDICE DE

RESTO-

INGESTA (%)

CONSUMO

PER CAPTA

N° PESSOAS

ALIMENTADAS

COM AS SOBRAS

15/04 119,997 kg 3,17% 621,74g 6,12 pessoas

19/04 126,195 kg 3,16% 685,84g 5,83 pessoas

22/04 119,922 kg 2,86% 627,86g 5,47 pessoas

03/05 131,286 kg 4,1% 694,63g 7,75 pessoas

06/05 127,757 kg 4,71% 658,54g 9,15 pessoas

13/05 104,360 kg 7,97% 492,26g 16,9 pessoas

TOTAL PESQUISA 729,517 kg 25,97% 51,22 pessoas

MÉDIA 121,58 Kg 4,32% 630g 8,5 pessoas

Fonte: Dados primários

De acordo com Amorim (2010), os valores

aceitáveis de sobras são de até 3% (7 a 25g por

pessoa), com intervalos de classificação: ótimo (0 a

3%); bom (3,1 a 7,5%) e inaceitável (acima de

10%). Assim, a UAN estudada se classificaria no

índice resto-ingesta como bom (média de 4,32%).

Apenas em um dia obteve-se o máximo

rendimento com índice resto-ingesta ótimo

(2,86%). Tais dados podem nos remeter as

informações de que as mesmas refeições possam

estar sendo preparadas com muita frequência, a

apresentação e aparência dos alimentos não estão

de acordo com os hábitos dos comensais, a

utilização de utensílios inadequados para servir

como o uso de escumadeiras no lugar de uma

colher, a concha grande ao invés de uma média ou

pequena, o fato de o comensal não precisar pagar a

comida pelo peso do prato, a falta da

conscientização dos mesmos sendo apropriado o

uso de campanhas que facilitem o entendimento da

clientela quanto à importância do não desperdício,

ou até mesmo pode estar ocorrendo uma falha no

planejamento quanto ao número de refeições e

falta de ficha técnica.

O total de resto diário onde a média foi de 5,163

Kg, sendo o menor desperdício encontrado no dia

22/04 com 3,438 Kg e o maior desperdício em

13/05 com 8,320 Kg. Pode ser visualizado os

dados percentuais na Tabela 1.

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 85

De todas as preparações realizadas nos seis dias de

coleta. Pode-se observar que a cenoura não é uma

preparação muito bem aceita, pois sua média do

per capita foi de 21 gramas, assim sendo Nunes

(2008) nos traz como 50g per capita da cenoura,

sua sobra no buffet foi de 4,8 Kg, aparecendo no

cardápio três dos seis dias contabilizados.

O peixe frito e o purê de abóbora aparecem no

cardápio apenas uma vez durante o período

estudado, e mesmo assim as sobras contabilizam

1,320Kg e 3,870Kg respectivamente, levando em

consideração que o consumo per capita do peixe

foi de 26 gramas, e o do purê de abóbora 78

gramas. Sendo que o consumo per capita do peixe

é de 70g, conforme afirma Nunes (2008), pode-se

deduzir que a preferência foi pela carne ensopada

ou ovo servido no mesmo dia.

As preparações quentes que não apresentaram

nenhuma sobra foram o arroz integral, o frango ao

molho e a couve refogada. Já se referindo das

saladas, as que não contabilizaram sobras sujas

foram a acelga e a rúcula com tomate. Todas essas

preparações foram realizadas apenas um dia dos

seis estudados.

Percebe-se a importância do monitoramento do

índice de resto-ingesta nas UANs para que o

nutricionista responsável dimensione/acompanhe o

desperdício, refletindo em uma melhora na

qualidade da alimentação, bem como uma redução

dos custos. O uso da ficha técnica se torna uma

verdadeira aliada no combate ao desperdício, uma

vez que padroniza todas as preparações,

enfatizando também a importância da realização de

treinamento com os funcionários, implementação

de medidas educacionais referentes ao consumo

consciente com os comensais e conhecimento

referente aos hábitos alimentares dos mesmos.

Diante do exposto e somando o fato de que o

Brasil é um dos países que mais desperdiça comida

mundialmente, é de extrema importância que haja

um melhor planejamento em Unidades de

Alimentação e Nutrição, a fim de reduzir o

desperdício.

Notou-se que na UAN estudada o índice de resto-

ingesta teve muita variação. Os registros presentes

neste trabalho podem servir como subsídio para a

implantação de medidas corretivas a fim de reduzir

o desperdício como, a revisão do cardápio para

verificar se está de acordo com as preferências dos

comensais, orientação aos funcionários e

implementação de informações sobre o consumo

alimentar consciente para que haja uma diminuição

na taxa de resto-ingesta.

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CÉLULAS TRONCO E TERAPIAS REGENERATIVAS

STEM CELLS AND THERAPY REGENERATIVE

Husten da Silva Carvalho, Luciana Borges Oliveira de Souza,

Flávia Cristina Oliveira da Luz, Eveliney Vicente de Alencar Xavier, João Paulo Bello dos Santos, Elisabeth Maximiano, Adriana Mattos

RESUMO Há mais de uma década inúmeros grupos de pesquisa têm se dedicado ao estudo das células tronco e de seus potenciais usos no estabelecimento de terapias celulares. Apesar das controvérsias éticas, os riscos de formação de tumores e de rejeição imunológica, os meios de comunicação tendem a exacerbar a expectativa de eficácia terapêutica em pacientes cujas terapias convencionais não funcionam. Isto somado à existência de regras flexíveis para o uso de células tronco em países como a China, Índia e Alemanha, tem provocado a proliferação de instituições que oferecem terapias celulares, mesmo que não tenham sido testadas suficientemente quanto a seus riscos e eficácia. Com base nos últimos avanços científicos sobre a biologia das células tronco, propomos uma revisão que introduza esse assunto através de uma discussão sobre sua definição, origem e classificação, bem como suas aplicações atuais na medicina regenerativa.

ABSTRACT For over a decade several research groups have been dedicated to the study of stem cells biology and the establishment of possible novel therapeutic uses for these cells. Besides ethical issues, risk of tumor development and immunologic rejections, media have the tendency to exaggerate therapeutic efficacy in patients which conventional treatments have failed. In addition to that, flexible regulations about stem cells uses in several countries, such as Chine, India and Germany, could be blamed for the growth of institutions offering cellular therapies even though these strategies have not yet been tested for safety and efficacy of the methods. Based on the last advances about stem cells biology, we propose a review to discuss definitions, origin and classification as well as current applications of these cells in regenerative medicine.

Palavras-Chaves: Células tronco; Terapia regenerativa; Ensaios clínicos; Ética; Medicina regenerativa.

Keywords: Stem cell; Regenerative Therapies; Clinical trials; Ethics; Regenerative medicine.

_____________________________________________________________ 1- Primeiro Autor - Professor adjunto-UNESA 2- Aluna de Iniciação Científica UNESA 3- Aluna de Iniciação Científica UNESA 4- Aluna de Iniciação Científica UNESA 5- Aluno de Iniciação Científica UNESA 6- Professora Colaboradora UNESA 7- Professora Colaboradora UFRJ

A terapia celular é um conjunto de alternativas

terapêuticas que visa a utilização de células

indiferenciadas, com capacidade de auto

renovação, na recuperação de tecidos com danos

(Daley, 2010). Há mais de uma década vários

grupos de pesquisa vêm se dedicando à descoberta

do potencial de células tronco e ao estabelecimento

de terapias celulares. No entanto, os diversos

meios de comunicação têm atribuído poderes

terapêuticos exagerados às células tronco que,

associados à regras flexíveis para o uso de tais

células em alguns países, como a China, a Índia e a

Alemanha, além da falta de esperança por parte de

pacientes, tem estimulado a proliferação de

instituições que oferecem terapias celulares à

pacientes, mesmo que não tenham sido testadas

suficientemente quanto a seus riscos e eficácia

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 88

(DALEY, 2012). Por outro lado, quando

devidamente utilizadas, suas contribuições na

medicina moderna tem sido de grande importância,

tanto por sua ampla utilização na pesquisa básica,

quanto pelo desenvolvimento de novas opções

terapêuticas na prática clínica (DALEY, 2010).

Suas características as tornam capazes de ser

empregadas em vários campos dentro das ciências

biológicas e médicas (CHIEN, 2008). Tendo como

base os últimos avanços sobre a biologia das

células tronco, propomos uma revisão que

introduza esse assunto através de uma discussão

sobre a aplicação mais atual dos diferentes tipos de

células-tronco na medicina regenerativa.

Procuraremos estabelecer um quadro sobre as

diferentes terapias sendo aplicadas em modelos

experimentais e ensaios clínicos para as doenças

consideradas de alta prevalência e/ou com

limitadas alternativas de tratamento. Para tanto

utilizamos a base de dados da área de saúde para

obtenção de artigos, tais como: MEDLINE,

LILACS e Scielo, DeCS (Descritores em Ciências

da Saúde), Portal CAPES e Portal de Revistas

Científicas da BVS.

Células tronco embrionárias

Há muitos relatos sobre o potencial de

diferenciação das células tronco embrionárias

humanas (CTEH), mas apesar de muito progresso e

conhecimento acumulados, seu uso clínico ainda

está em estágio inicial (LI et al., 2010). Este atraso

aconteceu em grande parte por preocupações

éticas, religiosas ou jurídicas, e também pela

publicação de estudos que associaram seu uso ao

aparecimento de teratomas (MORENO, 2010).

Diferenciação de progenitores neurais da linhagem

ectodérmica a partir de CTEH foi relatada em

estudo que mostrou eficácia na reparação tecidual

em casos de acidente vascular cerebral (DAADI et

al., 2008) e de lesão da medula espinal (SHARP et

al., 2010). Estudo com modelos de lesão da medula

espinhal in vivo mostrou que CTEH diferenciam-se

em oligodendrócitos, causando reconstrução das

bainhas de mielina (HU et al., 2009). Neurônios

dopaminérgicos foram gerados a partir do

tratamento com CTEH, em modelo animal

(FRILING et al., 2009) e em modelo ex vivo

(BISSONNETTE et al., 2011), mostrando forte

potencial terapêutico. A terapia com CTEH, em

modelo animal também tem sido bem sucedida na

geração de novos neurônios motores da medula

espinal, cujo funcionamento precário causa a

esclerose lateral amiotrófica (LI et al., 2007). O

primeiro ensaio clínico usando CTEH aprovado

pela Food and Drug Administration (FDA), nos

EUA, foi para o tratamento de pacientes com lesão

medular. Neste estudo, células progenitoras de

oligodendrócitos geradas a partir de CTEH e

diferenciadas estão sendo usadas para promover o

crescimento de nervos e reparar as bainhas de

mielina (STRAUSS, 2010). Outra aplicação de

CTEH sobre o sistema nervoso é o tratamento de

distrofia macular de Stargardt. Idelson e

colaboradores, em 2010, demonstraram que CTEH

diferenciam-se em células do epitélio pigmentado

da retina e podem substituir células danificadas no

paciente, recuperando a visão (IDELSON et al.,

2009). Ensaios clínicos para doenças cardíacas

envolvendo uso de CTEH, ainda não foram

iniciados, no entanto, cardiomiócitos derivados de

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 89

CTEH podem ser utilizados em modelos in vitro

para testes de drogas ou na indústria farmacêutica

(DICK et al., 2010). Para diabetes tipos I e II, a

substituição de células β seria a melhor solução, no

entanto a escassez de dadores é muito grande.

Infelizmente, semelhante ao que acontece com

hepatócitos, a diferenciação de células-β a partir de

CTEH é difícil e ineficiente (NOGUCHI et al.,

2010). CTEH podem diferenciar-se em

progenitores com marcadores de células tronco

mesenquimais (CTM) que, por sua vez, são

capazes de diferenciar para osteogênese,

adipogênese e condrogênese (OLIVIER et al.,

2006). Condrócitos foram gerados de CTEH,

podendo ser utilizados na reparação de lesão da

cartilagem, assim como adipócitos, para ser

empregados em investigações sobre o metabolismo

lipídico e obesidade (HANNAN &

WOLVETANG, 2009). Além disto, verificou-se

que CTM derivadas de CTEH tem fortes efeitos

imunomoduladores (YEN et al., 2009).

Células tronco embrionárias induzidas

As CTEI são consideradas ferramentas úteis para o

desenvolvimento de drogas e modelos de doenças,

no entanto, vetores retrovirais usados para

introduzir elementos de reprogramação gênica,

como o oncogene c-Myc, limita o uso em estudo

clínico, uma vez que podem induzir ao câncer

(EBBEN et al., 2011).

Células tronco adultas

Células tronco adultas são facilmente obtidas e

permite o transplante autólogo, evitando

complicações relacionadas à rejeição imunológica.

Outra vantagem é a redução dos riscos de

formação neoplásica. Embora tenham potencial de

diferenciação mais limitado, um estudo in vitro

demonstrou que são capazes de se diferenciar em

tipos celulares independentes de sua origem

germinativa (MOODLEY et al., 2010). Vários

estudos relataram que o transplante de células

tronco adultas causa reparação de órgãos

danificados in vivo, como a reparação do tecido

ósseo e revascularização do tecido isquêmico

cardíaco (MENASCHE et al., 2008;

CHIMUTENGWENDE-GORDON & KHAN,

2012). Sabe-se que a capacidade de renovação e

reparação em tecidos ou órgãos é extremamente

dependente de células tronco residentes que geram

células específicas (PASSIER & MUMMERY,

2003). O estado de repouso ou senescência não é

bem compreendido, mas é fundamental para

manter uma população de células que não exerçam

qualquer outra função, senão a de gerar tecidos

específicos durante regeneração (SNIPPERT &

CLEVERS, 2011).

Células tronco hematopoiéticas

Transplantes de células tronco hematopoiéticas

(CTHs) são indicados em doenças hematológicas

malignas e não malignas. A maioria dos

transplantes realizados é autólogo, em diferentes

tipos de câncer, sendo o mieloma múltiplo a

indicação mais comum. No entanto, o

desenvolvimento de procedimentos igualmente

eficientes e menos tóxicos, estão diminuindo a

utilização deste tipo de transplante. Ultimamente

as CTHs vêm sendo utilizadas no tratamento de

tumores, quando induzidas a diferenciar em células

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natural killer (NK) e em células dendríticas que

atacam células tumorais (LJUNGMAN et al.,

2009). No entanto, como a geração destas células

exige manipulação genética, seu uso terapêutico

continua a ser investigado. Resultados promissores

de ensaios pré-clínicos já foram descritos para

várias doenças, tais como diabetes mellitus

(TRIVEDI et al., 2008), cirrose (PAI et al., 2008),

doença de Crohn (CASSINOTTI et al., 2008)[61]

e distúrbios do sistema nervoso (BURT et al.,

2009).

Células tronco mesenquimal

Devine e colaboradores, em 2003, sugeriram que

CTM de primatas podem ser direcionadas para

vários órgãos não-hematopoiéticos e proliferar no

interior de tecidos (DEVINE et al., 2003). Com

este trabalho, tornou-se possível considerar que

uma distribuição sistêmica de CTM seria uma

interessante estratégia para tratamentos. Após

divulgação de numerosos relatórios que mostraram

efeitos benéficos de terapias com uso de CTM, em

modelos experimentais de autoimunidade e lesão

aguda (VAN et al., 2008; MORIGE et al., 2010;

JUREWICZ et al., 2010), ensaios clínicos com

base nessas mesmas células foram iniciados. Um

estudo clínico envolvendo 15 pacientes afetados

por esclerose múltipla e 19 pacientes com

esclerose amiotrófica lateral, tratados com infusão

de CTM, demonstrou aumento na proporção de

células T regulatórias CD4+ CD25+ em sangue

periférico (KARUSSIS et al., 2010) e o

procedimento mostrou-se seguro. Pacientes com 10

dias após o infarto agudo do miocárdio receberam

CTM por infusão intravenosa e experimentaram

melhora (HARE et al., 2009). No entanto,

pacientes tratados com estas mesmas células por

via intracoronária, após infarto agudo do

miocárdio, não apresentaram melhora (MEYER et

al., 2006). Kharaziha e colaboradores, em 2009,

divulgaram dados obtidos de ensaios clínicos em

fase I-II, onde oito pacientes em estágio final de

cirrose no fígado após tratamento com injeção de

CTM, demonstraram melhora nas condições

clínicas (KHARAZIHA et al., 2009). Em 2007,

Mohamadnejad e colaboradores obtiveram

resultados semelhantes e ainda demonstraram que

as CTM são melhores que CTH no tratamento de

cirrose hepática (MOHAMADNEJAD et al.,

2007). Ensaios clínicos também demonstraram que

CTM autólogas, derivadas de tecido adiposo,

foram capazes de tratar fístula perianal de origem

criptoglandular ou associada a doença de Crohn

(GARCÍA-OLMO et al., 2005). Ensaio clínico

com uso combinado de CTE e CTM também

promoveu produção de insulina (TRIVEDI et al.,

2008). Recentemente, pacientes afetados por lúpus

eritematoso sistêmico refratário, tratados com

CTM, demonstraram melhora (BERNARDO &

FIBBE, 2012).

Células progenitoras endoteliais

Células progenitoras endoteliais (CPE) derivadas

de humanos têm sido isoladas de populações

CD34+/lin- ou CD34 +/VEGFR2+ e, ao serem

administradas em camundongos, diferenciam-se

em células endoteliais que expressam o marcador

endotelial PCAM (Platelet endothelial cell

adhesion molecule) ou o fator de Von Willebrand

(RAFII & LYDEN, 2003). A habilidade das CPE

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 91

em promover revascularização de tecidos lesados

ou isquêmicos tem sido adotada em ensaios com

humanos para tratamento da isquemia (SEEGER et

al., 2005).

A fração de células mononucleares de medula

óssea

Ainda não está claro qual a fração celular, CTH ou

CTM, que apresenta maior plasticidade (HOWS,

2005). Por esta razão, autores propuseram que a

utilização de um conjunto de células que possam

dar suporte à proliferação e à manutenção das

células tronco, como a fração de células

mononucleares (FCM) da medula óssea, é melhor

do que o uso de um único tipo celular (VILAS-

BOAS et al., 2004). Estudos em seres humanos

indicaram a possibilidade de regeneração de

cardiomiócitos (ASSMUS et al, 2010;

MIETTINEN et al., 2010). Estudo envolvendo

meta análises, em pacientes com doença

coronariana que receberam injeção

intracoronariana de FCM, também apresentaram

melhora (HENNING, 2012). Em um estudo

semelhante, com administração de FCM por via

intracoronária, não se observou grande benefício

(TRAVERSE et al., 2011). Em 2012, uma revisão

com incorporação de mais 20 estudos clínicos,

sugeriu que a terapia com FCM, pode melhorar

moderadamente a função do coração a longo prazo,

no entanto, os dados ainda eram insuficientes para

chegar a conclusões mais seguras (CLIFFORD et

al., 2011). Atualmente, a European Society of

Cardiology for Stem Cells and Cardiac Repair,

recebeu financiamento do European Union

Seventh Framework Programme for Research and

Innovation (EU FP7-BAMI) para realização de um

estudo em larga escala que, utilizando os

procedimentos de tratamento padronizados, tentará

determinar se a terapia com FCM é realmente

eficaz no tratamento de enfarte do miocárdio

(CLIFFORD et al., 2011). Quanto à doença arterial

periférica, um estudo de revisão, no qual apenas 2

dos 37 artigos publicados preencheram os critérios

de inclusão, concluiu que os efeitos de injeções

intramusculares de FCM em pacientes com

isquemia de membros inferiores, é capaz de

favorecer o Índice Tornozelo-Braquial e diminuir o

número de amputações (MOAZZAMI et al., 2011).

Subsequentemente, um estudo que associa a

aplicação de injeções subcutâneas do fator

estimulador de colónias de granulócitos (G-CSF),

antes da injeção com FCM intramuscular,

conseguiu resultados com melhora e menor

proporção de amputações (RANDALL, 2012).

Cobellis e colaboradores, em 2008, demonstraram

melhora do fluxo sanguíneo e aumento da

densidade de capilares à longo prazo (12 meses)

após duas infusões de células autólogas da medula

óssea em artéria femural de pacientes com doença

arterial periférica grave (PAD) e isquemia de

membros (COBELLIS et al., 2008). Apesar dos

avanços, estratégias terapêuticas atuais para doença

arterial periférica, permanecem muito limitadas.

Um estudo com 118 pacientes portadores de

diabetes tipo II, submetidos à implantação autóloga

da FCM, no próprio pâncreas, através de um

cateter, demonstrou segurança e eficácia (HU et

al., 2012). Pesquisas em modelo animal relataram

que a infusão de FCM, no fígado, amenizou a

fibrose através da expressão da metaloproteinase-9

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 92

(MMP-9), melhorando as funções do fígado e

aumentando a taxa de sobrevivência de pacientes

com doença hepática (TAKAMI et al., 2012).

Com base nestes resultados, foi iniciado um ensaio

clínico com infusão de células autólogas de medula

óssea em pacientes cirróticos e que demonstrou

segurança do procedimento e eficácia (TERAI et

al., 2006). Por outro lado, o transplante autólogo da

FCM na artéria hepática de 58 pacientes com

doença hepática alcoólica, todos com cirrose, não

resultou em melhoria da função hepática (SPAHR

et al., 2013). Estudos clínicos emergentes

relacionados ao tratamento de lesão no cérebro e

na medula espinal têm estimulado inúmeros grupos

de pesquisa. Um estudo clínico incluindo 60

pacientes com hemorragia intracerebral

demonstrou que o implante autólogo da FCM

reduz o comprometimento neurológico e melhora a

atividade neurológica da vida diária dos pacientes

(RAHEJA et al., 2012). Um estudo clínico de

comparação entre as formas de administração da

FCM intra-arterial ou intravenosa, em pacientes

com lesão na medula espinhal na fase subaguda e

na fase crônica, demonstrou que todos os pacientes

na fase subaguda, tratados por via intra-arterial,

apresentaram melhora parcial, e um em cada

quatro pacientes subagudos, tiveram melhora após

administração via intravenosa. Melhora também

foi encontrada em um paciente crônico que

recebeu células por via intra-arterial (SYKOVÁ et

al., 2006). Outro estudo, em modelo animal,

demonstrou que tratamento com FCM é capaz de

favorecer a regeneração nervosa periférica,

dependendo da quantidade de células

administradas (RAHEJA et al., 2012). Quanto à

neuropatia diabética, estudo recente demonstrou

que FCM exerce efeitos terapêuticos, favorecendo

neovascularização e neuroproteção (Kim et al.,

2012). Foi demonstrado, em modelo animal, que

tratamento com FCM promoveu a regeneração

óssea e neovascularização em coelhos (ZHANG et

al., 2009) [96]. Li e colaboradores, em 2012,

demonstraram que pacientes portadores de

osteoporose idiopática, após tratamento com FCM

passaram a apresentar aumento significativo nos

níveis do fator IGF-1, o que favoreceu ganho de

densidade mineral óssea (Li et al., 2012)[97].

Estudos envolvendo a aplicação de células-tronco

em modelos biológicos têm sido capazes de

elucidar os efeitos de agentes farmacológicos;

contribuído para o esclarecerecimento de

mecanismos patofisiológicos específicos e

permitido melhor compreensão sobre os processos

envolvidos na formação e plasticidade de órgãos.

No entanto, o potencial mais importante destas

células é o de ser capaz de substituir tecidos com

lesão. Nos últimos anos, um grande número de

resultados tem sido publicado a partir de

protocolos de pesquisa, estudos pré-clinicos e

seleção clínica, no entanto, as terapias ainda

apresentam riscos e obstáculos a serem vencidos.

Novos estudos com variáveis controladas e

padronizadas são necessários para que a eficiência

e a capacidade de regeneração de tecidos sejam

constatadas. Estudos têm demonstrado que o

tratamento com células-tronco adultas,

principalmente aquelas da FCM da medula óssea,

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apresenta grande vantagem e um modo geral, seja

pela obtenção mais fácil de células, seja pelos

resultados na regeneração de tecidos em diferentes

órgãos. Embora falhas em estudos clínicos e em

práticas terapêuticas tenham sido identificadas,

pesquisas com a FCM continuam em andamento e

os resultados sobre os efeitos de novas terapias

com FCM têm nos dado grande otimismo quanto à

segurança e eficácia.

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WANG, Y. X.; LEE, K. M.; YEUNG, K. W.; LI,

Z. R.; HE, W.; GRIFFITH, J. F.; LEUNG, K. S.;

QIN, L. Continuous occurrence of both insufficient

neovascularization and elevated vascular

permeability in rabbit proximal femur during

inadequate repair of steroid-associated

osteonecrotic lesions. Arthritis Rheum. v. 60, n.

10, p. 2966-2977, out. 2009.

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ENFERMAGEM NA ATI UNESA PETRÓPOLIS

NURSING IN ATI UNESA PETRÓPOLIS

Gisele Luzia Marques Correa Mota, Érica Vinhaes Weber Dávila,

Christianne Reis de Souza Lara, Ana Claudia Moreira Monteiro

RESUMO A Universidade Estácio de Sá - campus Petrópolis desenvolveu um projeto multidisciplinar: Academia da Terceira Idade com intuito de desenvolver ações de pesquisa, ensino e extensão voltados para o atendimento das necessidades da população idosa. A pesquisa surgiu para atender as demandas de cuidados de enfermagem através de atividades educativas desenvolvidas pelos acadêmicos do curso de Graduação em Enfermagem. O objetivo foi traçar o perfil dos idosos atendidos no projeto para que possa ser oferecida uma assistência de enfermagem de qualidade baseada nas necessidades dos integrantes do grupo. Método: Pesquisa de campo com, entrevistas individuais semi estruturadas com perguntas abertas e fechadas, para avaliar aspectos importantes na vida do idoso. Resultados: foi estudada uma população e 15 idosos, e avaliado diversos itens que estão descritos na pesquisa. Conclusão: A educação em saúde para os idosos proporciona alternativas que atendem suas condições biopsicossociais, promovendo a saúde e prevenindo doenças e incapacidades que acometem a terceira idade.

ABSTRACT The Estácio de Sá University - campus Petrópolis developed a multidisciplinary project: senior Academy in order to develop actions of research, teaching and extension geared to meet the needs of the elderly population. The research appeared to meet the demands of nursing care through educational activities developed by scholars of the undergraduate program in nursing. Goals: profile of the elderly in the project so that we can offer a quality nursing care based on the needs of the members of the group. Method: field research with individual semi structured interviews with open and closed questions, to evaluate important aspects in the life of the elderly. Results: we studied a population 15 and older, and evaluate various items that are described in the research. Conclusion: health education for the elderly, provides alternatives that meet your biopsicosociais conditions, promoting health and preventing diseases and disabilities that affect seniors.

Palavras-Chave: idoso, enfermagem, educação em saúde, enfermagem geriátrica, Politica de saúde. Keywords: elderly, nursing, health education, geriatric nursing, health policy.

_____________________________________________________________________________________ 1- Acadêmica de Enfermagem do 4º período - graduação em Enfermagem da Universidade Estácio de Sá - Campus

Petrópolis - RJ

2- Acadêmica de Enfermagem do 5º período - graduação em Enfermagem da Universidade Estácio de Sá campus

Petrópolis - RJ

3 - Enfermeira Mestre em Educação pela Universidade Católica de Petrópolis (UCP), Docente da Universidade Estácio

de Sá campus Petrópolis e Coordenadora do curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Estácio de Sá -

Campus Petrópolis – RJ. E-mail: [email protected]

4- Enfermeira Mestre em Enfermagem pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Docente da

Universidade Estácio de Sá campus Petrópolis e Coordenadora de Estágio do curso de Graduação em Enfermagem do

campus Petrópolis – RJ. E-mail: [email protected]

INTRODUÇÃO

O momento demográfico por que passa a

população brasileira se caracteriza por baixas

taxas de fecundidade, aumento da

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Gisele Mota, Érica Dávila, Christianne Lara, Ana Monteiro

Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 100

longevidade e urbanização acelerada. A

interação dessas transformações tem levado

a um crescimento significativo da população

idosa com relação aos demais grupos etários.

Segundo as projeções estatísticas da

Organização Mundial da Saúde (OMS), o

período de 1975 a 2025 será a era do

envelhecimento. A população de idosos no

país crescerá 16 vezes – colocando o Brasil

como a sexta população de idosos, ou seja,

mais de 32 milhões de pessoas com 60 anos

ou mais. Paralela a essa transição

demográfica ocorreu uma importante

transformação do perfil das doenças na

população, no qual as patologias do

envelhecimento, que costumam ser crônicas

e múltiplas, ganharam maior expressão no

conjunto das sociedades.

O Brasil envelhece de forma rápida e

intensa. No Censo de 2000, contava com

mais de 14,5 milhões de idosos (IBGE,

2002), em sua maioria com baixo nível

socioeconômico e educacional e com uma

alta prevalência de doenças crônicas e

causadoras de limitações funcionais e de

incapacidades.¹. No Rio de Janeiro, a

população maior de 60 anos corresponde a

12,27% do total. Em Petrópolis, a proporção

de idosos é de 13,44% da população geral,

sendo a expectativa de vida no município de

70.06 anos (IBGE, 2000).

A sociedade brasileira – diante da

constatação nos dados estatísticos e

observação da presença cada vez mais

constante dos idosos na comunidade –

começa a exigir o posicionamento dos

governantes por meio de leis que amparem

esta etapa do ciclo evolutivo, que é a velhice.

Discute-se o envelhecimento digno, fala-se

em inclusão social, exige-se o preparo de

profissionais das áreas do conhecimento

(saúde, educação, assistência social, etc.)

para atender as necessidades dessa nova

clientela. No que se refere ao trabalho de

suas habilidades, há a exigência de uma

equipe multiprofissional e interdisciplinar

para atender de forma integral ao idoso.

Diante desta perspectiva a Universidade

Estácio de Sá campus Petrópolis desenvolveu

um projeto multidisciplinar: a Academia da

Terceira Idade com intuito de desenvolver

ações de pesquisa, ensino e extensão voltados

para o atendimento das necessidades da

população idosa do município de Petrópolis.

Com o envelhecimento, podem surgir

inúmeras causas de fragilidade ou risco para os

indivíduos, das quais se destacam a presença

de múltiplas patologias, algumas vezes

situação econômica precária, ingestão de

muitos medicamentos, perdas de autonomia e

independência e dificuldade de adaptação do

idoso às exigências do mundo moderno que

em conjunto levam o idoso ao isolamento

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 101

social. Assim, podemos dizer que existem

perfis diferenciados de envelhecimento: a)

processo de perdas e abandonos do físico ao

intelectual; b) processo de libertação da

responsabilidade com filhos e emprego – este

marcado pela aposentadoria.

A ideia de realizar a pesquisa surgiu a partir

da constatação de verificar a saúde dos idosos

que participam do projeto Academia da

Terceira Idade, com intuito de atender as

necessidades de cuidados de enfermagem já

diagnosticado através de trabalhos

desenvolvidos pelos graduandos do curso de

Graduação Enfermagem da Universidade

Estácio de Sá - campus Petrópolis. O corpo

docente e discente resolveu traçar um perfil

dos idosos para que posteriormente possam

desenvolver intervenções de enfermagem

através da consulta de enfermagem e educação

em saúde tendo como meta a promoção da

saúde e melhoria da qualidade de vida.

A meta do enfermeiro educador é,

obviamente, promover a saúde. A educação e

a promoção da saúde fazem parte dessa

iniciativa. Ao mesmo tempo, o enfermeiro

como educador é um importante facilitador

de mudanças. O aprendizado como

intervenção deve ser considerado no

contexto de outras intervenções de

enfermagem que efetuarão mudanças. A

enfermeira educadora Susan Bastable ainda

ressalta que “no contexto do cuidado em

saúde, o aumento de enfermeiros que

ensinem e ajudem os outros a aprender é

contínuo”. Certamente, devido às mudanças

que ocorrem rapidamente no sistema de

saúde, influenciando as responsabilidades de

sua prática.

Definimos como Objetivos: Traçar o perfil

dos idosos atendidos no projeto Academia da

Terceira Idade UNESA – campus Petrópolis

para que posteriormente possamos oferecer

assistência de enfermagem de acordo com as

necessidades dos integrantes do grupo.

Descrição metodológica: Este estudo foi

realizado através de uma pesquisa de campo

com, a realização de entrevistas individuais

semiestruturadas com perguntas abertas e

fechadas aos idosos, para avaliar os aspectos:

autoestima, autonomia, hábitos saudáveis,

patologias crônicas e sequelas, vacinação do

idoso, sociabilidade, adesão a terapia

medicamentosa e acompanhamento médico.

Este projeto iniciou-se em 15 de Julho de

2012, através do corpo docente e discente do

curso de graduação em Educação Física A

população atendida no projeto são idosos do

município de Petrópolis a partir de 55 anos de

idade. A ideia de realizar a pesquisa surgiu

com a necessidade de verificar a saúde dos

idosos que participam do projeto Academia da

Terceira Idade, com intuito de atender as

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Gisele Mota, Érica Dávila, Christianne Lara, Ana Monteiro

Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 102

demandas de cuidados de enfermagem já

diagnosticados através de atividades

educativas desenvolvidas pelos acadêmicos do

curso de Graduação Enfermagem da

Universidade Estácio de Sá - campus

Petrópolis. Resolvemos traçar um perfil dos

idosos para que posteriormente possamos

desenvolver intervenções de enfermagem

através da consulta de enfermagem e educação

em saúde tendo como meta a promoção da

saúde e melhoria da qualidade de vida da

população assistida. A meta do enfermeiro

educador é promover a saúde. Ao mesmo

tempo, o enfermeiro como educador é um

importante facilitador de mudanças. O

aprendizado como intervenção deve ser

considerado no contexto de outras

intervenções de enfermagem que efetuarão

mudanças.

Foi realizado estudo descritivo, com

abordagem qualitativa. Para Marcus e Liehr

(2001, p. 123), “(...) a pesquisa qualitativa

combina as naturezas científica e artística da

enfermagem para aumentar a compreensão da

experiência de saúde humana. É um termo

genérico que abrange uma multiplicidade de

suportes filosóficos e métodos de pesquisa”.

Segundo Minayo (2004) a pesquisa qualitativa

se aplica aos estudos da história, das

representações, das relações, das crenças, das

opiniões, que os humanos fazem a respeito de

como vivem, constroem seus artefatos e a si

mesmos, sentem e pensam. Esse tipo de

metodologia permite desvelar processos

sociais ainda pouco conhecidos referentes a

grupos particulares, propicia a construção de

novas abordagens, revisão e criação de novos

conceitos durante a investigação. Caracteriza-

se também pela empiria e pela sistematização

progressiva de conhecimento até a

compreensão lógica interna do grupo ou do

processo em estudo. Pode ser utilizada para a

elaboração de novas hipóteses, construção de

indicadores qualitativos, variáveis e tipologias.

A pesquisa descritiva é caracterizada pela

necessidade de se explorar uma situação não

conhecida, da qual se tem necessidade de

maiores informações. Explorar uma realidade

significa identificar suas características, sua

mudança ou sua regularidade (LEOPARDI,

2001). Para Gil (2007), esse tipo de pesquisa

tem como objetivo principal a descrição das

características de determinada população ou

fenômeno. Vários estudos podem ser assim

classificados, e uma de suas características

mais relevantes é a utilização de técnicas

padronizadas de coleta de dados, tais como o

questionário e a observação sistemática.

Local do Estudo: Este estudo foi realizado no

campus da UNESA em Petrópolis, no

consultório de enfermagem durante a consulta

foi utilizado um instrumento de coleta de

dados durante a entrevista com os idosos,

participaram do estudo 15 idosos que faziam

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 103

parte do projeto academia da terceira idade

(ATI)

A população atendida no projeto são Idosos do

município de Petrópolis, são idosos de ambos

os sexos a partir de 55 anos de idade. Em

levantamento inicial foram obtidas 300

inscrições em 07 dias de oferecimento de

projeto; Sendo 90% do gênero feminino, 10%

de gênero masculino. Inicialmente obtivemos a

constatação de elevado índice de hipertensos e

cardiopatas, (70%), de co-morbidades, (60%),

sedentarismo, (80%).

Em abril 2013 estudamos uma população de

15 idosos, sendo 87% do sexo feminino e

13% do sexo masculino. Dentre a faixa etária

de 55 à 60 temos 13% , de 60 à 65 anos temos

20% , 65 à 74 anos temos 33% e de 70 à 84

anos são 33% . Destes 80% são aposentados,

5% pensionistas e 15% não possuem

aposentadoria Em relação aos hábitos de vida:

93% não fumam, 7% fumam atualmente e

13% pararam de fumar há 5 anos. Fazem uso

de bebidas alcoólica 47%, destes 40%

frequentemente e 7% raramente. Em relação

atividade física 20% não praticam, pois são

iniciantes no grupo, 80% realizam atividade

física orientada duas vezes por semana. Todos

relataram boa convivência em família e 93%

com boa convivência social. Em relação a

saúde 73% são hipertensos, 20% diabéticos e

5% com doença neoplásica, 26% já

apresentam sequelas, destas 13% com AVC e

13% com problemas vasculares. Todos fazem

acompanhamento médico, 70% realizaram

consultas recentes, 5% há um ano, 20% há

mais de 1 ano e 5% há mais de 3 anos. Destes

80% aderem a terapia medicamentosa, 13%

não faz uso e 7% não precisa utilizar a

medicação diária. Quanto a habilitação para o

auto-cuidado: 93% conseguem realizar

hábitos de higiene sem auxílio, 87% realizam

atividades cotidianas do lar, 26% possuem

habilidades tecnológicas, 46% utilizam celular

e telefone , 93% usam transporte coletivo sem

precisar de ajuda, e somente 73% manuseiam a

própria renda. Em relação a necessidade de

sono e repouso 80% dormem em torno de 6 à 8

horas por dia e 20% possuem insônia, fazendo

uso de medicação. Quanto a imunização 93%

estão em dia com a vacina influenza e 47%

com esquema de vacina dupla adulto-DT

completo.

O idoso hierarquiza seus valores de forma que

atenda às suas necessidades, proporcionando a

ele o equilíbrio para viver com

responsabilidade e autonomia. A tarefa do

enfermeiro - educador é levar o idoso à

reflexão, à autoconsciência que possibilitam a

avaliação das próprias potencialidades e, pela

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Gisele Mota, Érica Dávila, Christianne Lara, Ana Monteiro

Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 104

ação da vontade, a instauração de novos

valores em si e no mundo. Percebe-se que a

educação do idosoo correu, aconteceu que o

mesmo foi educado, quando nele se caracteriza

a autonomia, como superação da dependência.

A enfermagem atua em educação e saúde para

os idosos, como uma meta para melhora da

qualidade de vida, observando sua capacidade

funcional e sua independência física e mental,

tanto na convivência familiar quanto

comunitária, proporcionando alternativas que

atendam suas condições biopsicossociais,

valorizando a promoção da saúde e a

prevenção de doenças e de incapacidades que

acometem a terceira idade. Contribuições /

implicações para a Enfermagem:

Evidenciou-se a necessidade da implantação

da consulta de enfermagem aos idosos que

fazem parte deste projeto, visando a promoção

da saúde e melhoria da qualidade de vida.

BASTABLE, S. B. O enfermeiro como

Educador: princípios de ensino-aprendizagem

para a prática de Enfermagem. Porto Alegre:

Artmed, 2010.

BRASIL. Ministério da Saúde, 2006. Política

Nacional de Saúde da Pessoa Idosa, Portaria

nº 2.528 de 19/10/06. . Brasília, DF.

GIL, A.C. Como elaborar projetos de pesquisa.

4 ed. 10 reimpressão. São Paulo. Atlas, 2007.

IBGE. Censo Demográfico 2000 -

Resultados do universo. Disponível

em: http://www.ibge.gov.br. Acesso em: 20

out. 2013.

LEOPARDI, M. T. et al. Metodologia da

Pesquisa na Saúde. Santa Maria: Palite, 2001.

MINAYO, M. C. de S. O desafio do

conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde.

8.ed. São Paulo: Hucitec, 2004.

MARCUS, M.; LIEHR, P.R. Abordagens de

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Utilização. Rio de Janeiro: Guanabara

Koogan, 2001.

_____. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO /

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO.

PARECER Nº 11/2000 (que aprova as

Diretrizes Curriculares Nacionais para a

Educação de Jovens e Adultos) aprovado em

10/05/2000.

UNATI – UNIVERSIDADE ABERTA DA

TERCEIRA IDADE. Cursos para terceira

idade. Disponível em: http://www.unati.uerj.br

Acesso em: 05/10/2013

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-122, out./ dez. 2014 - 105

A INFLUÊNCIA DO “ESQUEMATISMO” DA INDÚSTRIA CULTURAL NA INTERNET

Bárbara de Almeida Flores Getúlio Távora

RESUMO O objetivo deste artigo é investigar a influencia da Indústria Cultural na Internet. Partindo da hipótese de que a Internet é uma mídia que permite uma superação da Indústria Cultural por sua capacidade tecnológica de difusão, desenvolvimento e criação de produtos culturais e conhecimentos sem os estereótipos da cultura de massa. Contudo, a influência da Indústria Cultural se expressa na forma alienada com a qual seus usuários a utilizam. Para provar esta hipótese, utilizaremos o arcabouço teórico da teoria da Escola de Frankfurt e os estudos recentes sobre a consolidação e desenvolvimento da Internet, como os de Pierry Lévy e André Lemos, e realizamos uma pesquisa no site Socialbakers (http://www.socialbakers.com/

Facebook-statistics) como forma de comprovar a influencia da Indústria Cultural na forma com a qual os usuários utilizam a Internet.

ABSTRACT The aim of this paper is to investigate the influence of the culture industry on the Internet. Assuming that the Internet is a medium that allows overcoming the cultural industry for technology diffusion, development and creation of cultural products and knowledge without the mass culture stereotypes. However, the influence of the culture industry is expressed in the alienated form with which your users to use. To test this hypothesis, we will use the theoretical framework of the theory of the Frankfurt School and the recent studies on the consolidation and development of the Internet, such as Pierry Lévy and André Lemos, and conducted a survey in Socialbakers site (http: // www.

socialbakers.com/Facebook-statistics) as a way to prove the influence of the Cultural Industry in the way in which users use the Internet.

Palavras-chave: esquematismo; Indústria Cultural; redes sociais; Internet; Facebook; Twitter; Youtube. Keywords: esquematismo; Indústria Cultural; redes sociais; Internet; Facebook; Twitter; Youtube.

___________________________________________________________________________ 1. Formanda de graduação do Curso de Comunicação Social da Faculdade Estácio de Sá de Belo Horizonte,

email:[email protected] 2. Mestre e orientador do trabalho, professor do curso de Comunicação Social da Faculdade Estácio de Sá de

Belo Horizonte, email: [email protected]

A generalização da Internet se concretizou a partir

de meados dos anos de 1990, de forma que

podemos considerá-la um fenômeno recente na

história da comunicação social. Destarte, a Internet

passou a ser nos últimos 20 anos uma das

principais ferramentas de difusão de informação,

utilizada mundialmente por todos os setores de

nossa sociedade - políticos, econômicos e

culturais.

O desenvolvimento tecnológico das últimas

décadas possibilitou a evolução e a consolidação

da Internet como uma importante mídia, isto é,

uma ferramenta ou ainda um meio intermediário de

difusão, transmissão e comunicação de dados,

informações e mensagens, de forma global. A

potencialidade da Internet permite, por um lado, a

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Bárbara Flores, Getúlio Távora

Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 106

difusão livre de dados e informações, contudo, por

outro lado, e cada vez mais, crescem as formas de

controle e acompanhamento de sua utilização, por

meio de mecanismos políticos e jurídicos, que são

utilizados para limitar e controlar sua utilização,

como ficou expresso nos casos do Site Wikileaks e

a retirada do Site Megaupload da Web9.

Esclarecer os mecanismos que fazem com que os

usuários utilizem a Internet de forma banal e

aproveitando tão pouco seus potenciais técnicos é

um caminho para superar esses limites e

possibilitar aos usuários uma utilização melhor

desta mídia. Identificamos na maneira limitada de

utilização da Internet elementos similares aos

presentes na relação dos usuários com as demais

mídias de massa que são parte e produto da

Indústria Cultural. O que nos levou a questionar:

por que, diante de uma mídia com tantas

potencialidades, grande parte dos internautas

permanece seguindo a mesma forma com a qual se

relacionam com as demais mídias?

É fato que a Internet possibilita aos usuários uma

relação diferente da forma com a qual eles

consomem os produtos da Indústria Cultural, i.e,

não sendo somente receptores passivos de

informações e produções, mas tendo a

possibilidade de serem produtores ativos e

transmissores autônomos e autênticos de

informações e conhecimentos. Tentaremos mostrar

neste artigo que a utilização dos usuários da

Internet reproduz o esquematismo criado neles pela

9 Em janeiro 2012, o site Megaupload foi fechado pelo

governo Norte americano por terem considerado que o

mesmo violava os direitos autorais em suas

publicações.

Indústria Cultural, o que não permite que rompam

a alienação e desenvolvam uma utilização livre e

autônoma.

Para comprovar a hipótese apresentada,

buscaremos fundamentar de forma sucinta o

conceito adorniano de Indústria Cultural, de

cultura de massa e principalmente de

esquematismo apresentado no livro Dialético do

Esclarecimento (1985), como forma de esclarecer

a forma esquemática com a qual consumimos as

mercadorias da Indústria Cultural. Em seguida,

observaremos por meio da análise da utilização do

site Youtube e das redes sociais Facebook e

Twitter, a expressão da influência da Indústria

Cultural na utilização da Internet.

Com a larga utilização da Internet nos últimos 20

anos como uma ferramenta de comunicação,

difusão de informação, conhecimento, integração e

interação de indivíduos por todo o globo, e a

possibilidade da criação de um mundo paralelo,

com produções autônomas e a capacidade

interativa, em que o usuário elabora, teoricamente,

o conteúdo de sua navegação (LÉVY, 2003), a

Internet apresenta-se como uma ferramenta de

possibilidades técnicas ilimitadas, o que a tornou

um dos meios mais utilizados atualmente.

Lévy, possuidor de uma leitura otimista da

utilização das potencialidades da Internet, diz: “O

uso socialmente mais rico da informática

comunicacional consiste, sem dúvida, em fornecer

aos grupos humanos os meios de reunir suas forças

mentais para constituir coletivos inteligentes e dar

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Bárbara Flores, Getúlio Távora

Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 107

vida a uma democracia em tempo real” (LÉVY,

2003, p. 62).

Relacionado a esta potencialidade da Internet, de

construir uma nova sociedade, colocada por Lévy,

é o usuário que pode, em sua navegação, elaborar

seus caminhos de forma que não siga interesses

externos, distanciando-se dos conteúdos dos

monopólios. Também, pode o usuário criar novos

conteúdos e disponibilizá-los livremente para

outros, construindo uma rede interativa fora da

lógica mercadológica, de forma horizontal,

rizomática e não centralizada.

Todavia, o que se percebe empiricamente é que a

utilização pelos usuários dessa poderosa

ferramenta é muito aquém das possibilidades

ofertadas por ela. Boa parte dos usuários segue

uma conduta alienada, dirigida pelos temas da

televisão, ou mesmo pelas ferramentas mais

superficiais da Internet. Assim é a utilização de

portais de notícias dos monopólios de impressa

(G1 e R7) e a utilização das comunidades virtuais

como o Orkut e o Facebook, em que há a

subutilização de uma ferramenta de comunicação e

interação, tornando-a uma ferramenta egocêntrica

de exposição pessoal.

No livro a Dialética do Esclarecimento, a

alienação das massas é entendida como uma

imposição da Indústria Cultural, imposição esta

que é ao mesmo tempo finalidade e condição

necessária à perpetuação do poder dessa mesma

indústria e do poder das outras esferas dominantes

da sociedade de consumo (ADORNO;

HORKHEIMER, 1985). Deve-se entender por

alienação a atrofia da autonomia do pensamento

crítico das massas, portanto a destituição das

massas de sua capacidade de pensar por si só, o

que cria condições para a aceitação sem resistência

dos desígnios de interesse das classes dominantes.

Partindo desse pressuposto, Adorno e Horkheimer

indicam a criação, pela Indústria Cultural, de um

padrão de desejos predeterminados e tomados

como autênticos pela massa, constituindo um

mecanismo complexo, o qual chamam de

usurpação do esquematismo.

A Teoria Crítica10

demonstra o quanto os aspectos

alienantes presentes na Indústria Cultural, desde

sua criação aos dias atuais, alcançaram um elevado

patamar de alienação das massas, expresso no alto

grau de consumo de seus produtos de forma

acrítica, devido, entre outros fatores, ao

refinamento da sutileza de sua dominação

ideológica e o dilatado tempo de propagação

sistemática de seus artigos na sociedade, somados

a vertiginosos avanços das tecnologias da

comunicação, sem oposição esclarecida.

A consolidação da Indústria Cultural como um

aparato primordialmente relacionado à economia,

tem por função, além da lucratividade, a difusão da

ideologia da classe dominante, função esta que se

presta à manutenção pacífica das relações da

estrutura sócio-econômica. O que é realizado por

meio de seus produtos, ao que os filósofos

frankfurtianos chamam de cultura de massas. Estes

produtos possuem uma esquematização do

pensamento dos consumidores, que criam a

10

A teoria de Adorno e Horkheimer também é referida

por teoria crítica por alguns autores na literatura.

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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 108

necessidade de seu próprio consumo, “a

esquematização do procedimento aparece nos

produtos mecanicamente diferenciados revelarem-

se, afinal de contas, como sempre iguais”

(ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 102).

O processo de criação e imposição de desejos às

massas é feito para que aparente ser o oposto do

que na verdade é: a Indústria Cultural dissimula a

satisfação da escolha popular, propagando a

imagem de que sua produção é guiada pelo desejo

das massas. A Indústria Cultural produz

“indivíduos psiquicamente debilitados”,

necessários à continuidade da estabilidade social e

econômica vigente, sempre ávidos pelo consumo

dos produtos que contribuem para sua própria

alienação.

Os indivíduos psiquicamente debilitados, segundo

Adorno e Horkheimer, são aqueles a que lhes falta

esclarecimento. Segundo Kant, em seu texto:

“resposta à pergunta: que é esclarecimento?”:

O esclarecimento é a saída do homem de sua

menoridade, da qual ele mesmo é culpado. A

maioridade é a capacidade de se fazer ele

mesmo o uso de seu entendimento sem

direção de outro individuo. O homem é o

próprio culpado de sua menoridade se a causa

dele não se encontra na falta de

entendimento, mas na falta de decisão e

coragem de servir-se de si mesmo sem a falta

de outrem. (KANT, 2005, p.63).

A falta do esclarecimento e a condição de pensar

por si mesmo faz com que alguns homens passem

a pensar de forma esquematizada pela Indústria

Cultural, que usa o “esclarecimento” como

mistificação das massas. O esquematismo presente

na Indústria Cultural é um termo cunhado por Kant

“para designar o procedimento mental pelo qual

referimos nossas percepções sensíveis a conceitos

fundamentais, que ele chama de categorias”

(DUARTE, 2002, p.39). Adorno e Horkheimer

vão apropriar-se desse termo, não no mesmo

sentido de Kant, para definir a forma pelo qual a

Indústria Cultural reorganiza no pensamento das

massas a sua forma de conceituar e percepção as

coisas sensíveis, ou seja, as coisas e os fenômenos

do mundo, para utilizá-los em seus interesses.

Uma das maiores expressões do esquematismo nas

massas, criado pela Indústria Cultural, é a sensação

de autonomia sobre seu pensamento, da condição

que o indivíduo tem sobre seus gostos e as

necessidades que possa vir a ter. Na verdade, esta

sensação de poder de escolha e de vontades sobre

suas necessidades nada mais é do que a usurpação

do esquematismo da forma de pensar dos

indivíduos feita pela Indústria Cultural, de forma

que esses indivíduos sempre achem necessário o

consumo de algum produto para suprir esses

desejos. A Indústria Cultural cria nos indivíduos

uma necessidade permanente de consumir seus

produtos, que é a essência da cultura de massas.

Esta é a primeira e principal forma da manifestação

do esquematismo do pensamento das massas.

O capitalismo monopolista11

, sendo um sistema de

exploração que pretende perpetuar sua condição de

manter uma classe no poder, classe que representa

uma parte muito pequena da população mundial,

cria um mundo de ilusões para esconder seus

objetivos de exploração e seus interesses

mercadológicos, que não são os de um “bem-estar”

11

Capitalismo monopolista é o capitalismo resultante da

fusão do capital bancário com o capital industrial

gerando, portanto, os monopólios. (LENIN, V. I ;1979)

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para a população e, sim, o privilégio de uma

pequena parte do globo, a classe dominante. Para

garantir o controle ideológico da população, cria

vários mecanismos de sua dominação em que parte

importante desses é garantida através da Indústria

Cultural. Ela, como todo o seu sistema, cria um

mundo de ilusões cheio de valores burgueses que

tornam a relação principal entre os homens um tipo

de relação mercadológica baseada em interesses de

bens.

Habermas tem a mesma posição de Adorno e

Horkheimer ao considerar que a Indústria Cultural

dissemina produtos para o consumo das massas,

tornando-as um instrumento de "redução das

capacidades de fazer um uso crítico da razão"

(LIPOVETSKY, 1989, p.15). O sociólogo Manuel

Castells (1999, p.360) vai levantar sua crítica sobre

essa concepção adotada pelos frankfurtinianos. O

autor observa de forma crítica a visão das “pessoas

como receptáculos passivos de manipulação

ideológica […]”, e para contrapor esta visão de

que as massas são alienadas afirma que “os

indivíduos possuem um nível de autonomia para

organizar e decidir seu comportamento”.

A Alienação do espectador em favor do

objeto contemplado (o que resulta de sua

própria atividade inconsciente) se expressa

assim: quanto mais ele contempla, menos

vive, quanto mais ele aceita reconhece-se nas

imagens dominantes da necessidade, menos

compreende sua própria existência e seu

próprio desejo. Em relação ao homem que

age, a exterioridade do espetáculo aparece no

fato de seus próprios gestos já não serem

seus, mas de um outro que os representa por

ele. É por isto que o espectador não se sente

em casa lugar algum, pois o espetáculo esta

em toda a parte. (DEBORD, 1997, p.24).

A Teoria Crítica de Adorno e Horkheimer terá

grande consonância com a teoria de Debord sobre

a sociedade do espetáculo. Como Debord (1997,

p.14) afirma, o espetáculo é um instrumento do

sistema capitalista de unificação dos gostos, uma

forma de relação social entre pessoas, mediada por

imagens, resultante do modo de produção

capitalista. “Informação, propaganda, publicidade,

consumo e divertimento constituem mecanismos

particulares do espetáculo”. Para ele, a essência

desse espetáculo é a aparência projetada para cada

indivíduo. É a imagem que o indivíduo passa sobre

si para o resto da sociedade, como um produto do

sistema. Ele passa também a ser considerado como

uma mercadoria a partir da definição enquanto um

ser que tem algo a oferecer e não mais o que ele

realmente é, enquanto ser. Observando assim que

nessa sociedade há um processo de alienação do

espectador, onde a mercadoria passa a ocupar

todos os espaços da vida social através do

espetáculo lançado nas mercadorias para o lazer e

o consumo dos indivíduos.

Entre os teóricos existem várias contradições sobre

os reais efeitos que a Indústria Cultural pode trazer

nos sentimentos dos indivíduos, principalmente no

que diz respeito a sua alienação e interferência em

sua capacidade de pensar. A alienação das massas

ao receberem os produtos da Indústria Cultural

veiculados pelas mídias afirmada na Teoria Critica

é questionada por Lipovetsky:

o consumo midiático não é o coveiro da

razão, o espetacular não abole a formação da

opinião crítica, o show da informação

prossegue a trajetória das Luzes. A mídia

substituiu a Igreja, a escola, a família, e

outras instituições, como forma de

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socialização e meio de transmissão do saber.

(LIPOVETSKY, 1989, p.225).

Com a pós-modernidade, várias concepções em

relação a Midia Mass e sua relação com os

usuários vão surgir a partir da premissa de que elas

rompem as barreiras mercadológicas e dos

monopólios, e consequentemente com o controle

dos capitalistas, no comportamento e na cultura das

massas, apesar de alguns autores afirmarem que ela

nada mais é do que a expressão de maneira nova

das mesmas relações mercadológicas.

A pós-modernidade para Daniel Bell

corresponde exatamente à fase pós-industrial

da sociedade de consumo, onde a produção

de bens e serviços (ligados ao grande

consumo de energia) é modificada de acordo

com as novas tecnologias (digitais) da

informação". "A fase pós-moderna da

sociedade não é uma ruptura com a dinâmica

monopolista de capitalismo, mas uma

radicalização do desenvolvimento de sua

própria lógica. Embora esta não seja uma

ruptura com a sociedade capitalista".

(LEMOS, 2004, p.63)

A partir da criação da Internet, surge a noção de

ciberespaço. Lévy (1999, p.17) entende “o

ciberespaço como um sistema de comunicação

formado a partir da interligação dos computadores

em rede”. Afirma que o ciberespaço é um meio

virtual onde ocorrem as interações entre os

usuários, que recebem uma infinidade de

informações. O ciberespaço amplia suas fronteiras

à medida que este espaço é preenchido pelos

próprios, usuários que escolhem de forma livre os

caminhos que seguirão neste ambiente.

Certamente a Internet é uma mídia de grande

potencial técnico que pode trazer para os usuários

as possibilidades de interações livres no caminho

de buscar novas informações e interações com

outros usuários. Ela cria mecanismos onde eles

passam não só de meros receptores, mas também

criadores de textos, vídeos, e informações,

tornando-os autores e criadores de novos

conhecimentos e novas relações interpessoais.

Porém, o que observamos é que estes usuários

podem não estar usufruindo todo seu potencial

desta ferramenta, levando para ela muitas vezes

comportamentos influenciados pela Indústria

Cultural e pelos monopólios, colocando em

questão se realmente sua ação nesta mídia tem sido

de forma livre e autônoma.

Lévy vai observar ainda que este novo meio de

comunicação vai desenvolver um novo tipo de

cultura de massas, a “Cibercultura”. Para Lévy

(1999, p.17), a cibercultura é a unidade de um

conjunto de técnicas, de práticas, de atitudes, de

modos de pensamento e de valores que se

desenvolvem juntamente com o crescimento do

ciberespaço.

Castells (1999) define esta cultura que passa a

existir com a formação da sociedade em rede como

a “cultura da virtualidade real”. Para ele, o

universo digital é mais um ambiente de símbolos

que conduz os usuários não a uma nova realidade

virtual, mas a um experimento humano assimilado

de uma maneira mais abrangente e de maior

diversidade. Para Castells (2003, p.167), “é uma

cultura real" tendo em vista que ela trata de uma

base objetiva e material da experiência e própria

existência humana. O que difere é a forma como

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elas representam a realidade e a constroem em suas

representações e seus significados.

Segundo Bittencourt (2012, p.20), a partir do

momento em que ocorre a expansão da Internet, e a

possibilidade de existir um maior

compartilhamento de conhecimentos criados por

estes mesmos usuários, atingiu-se um nível jamais

imaginado até então nas estruturas epistemológicas

das eras precedentes. Ele acredita que existe uma

“curiosa tendência de se dizer que a Internet

consumou o esvaziamento das relações pessoais”.

Lévy vai chamar de “inteligência coletiva” a

experiência dos usuários conectados às redes

eletrônicas, que difundem novos saberes, conceitos

e informações.

O problema da inteligência coletiva é

descobrir ou inventar um além da escrita, um

além da linguagem tal que o tratamento da

informação seja distribuído e coordenado por

toda a parte, que não seja mais apanágio de

órgãos sociais separados, mas se integre

naturalmente, pelo contrário, a todas as

atividades humanas, volte às mãos de cada

um (LÉVY, 2003, p. 17 ).

Baudrillard acredita que esta nova relação entre os

usuários não os coloca como uma retribalização,

mas de uma mera circulação de informações. Ele

faz uma crítica às relações entre os usuários das

redes que fazem uma "simulação de interação e

não verdadeiras interações" que, segundo o autor,

aumentam a vertente destruidora da comunicação.

Segundo André Lemos, o pensamento de

Baudrillard é aquele do excesso: “quanto mais

informações trocamos, menos estamos em

comunicação. Trocamos o real pelo hiper-real, a

verdadeira comunicação pela sua simulação.

Estaríamos diante de uma encefalação eletrônica,

onde o real desaparece com a instituição do seu

simulacro”. (LEMOS, 2004, p.72).

É verdade que com a Internet surge uma interação

em tempo real criando nos usuários a necessidade

de obter respostas rápidas e imediatas de vários

conteúdos. Certamente esta é uma característica da

modernidade que se reflete em vários aspectos

sociais e das relações entre as pessoas. A Internet

vai ser mais um exemplo da expressão da forma

rápida de agir desta sociedade. Mas autores como

Virilio vão criticar essas informações que circulam

e cobram respostas tão rápidas de seus usuários

que, segundo o autor, estabelecem "uma

institucionalização do esquecimento". Para Virilio,

quanto mais este “saber” cresce, mais o

desconhecido aumenta ou, melhor dizendo, quanto

mais se antecipa a informação número, mais os

usuários passam a ter consciência de essência

incompleta e fragmentar. Para ele “O pensamento

coletivo imposto pelos diversos media visava

aniquilar a originalidade das sensações (...) um

estoque de informações destinado a programar sua

memória” (LEMOS, 2004, p.73). Esta percepção

de Virilio é mais uma expressão da maneira como

o esquematismo atua no pensamento das massas.

Para o sociólogo, o usuário contemporâneo das

tecnologias passou a ser um receptor passivo, a

partir do momento em que ele se coloca no papel

de responder a estímulos imediatos. Ele acredita

que esta maneira dos usuários se comunicarem não

os deixa terem uma compreensão completa dos

fatos e das informações que recebem, por estar no

meio virtual de forma "ingênua e desprovida", de

maneira que suas atitudes autônomas estejam

reduzidas, comprometendo a sua condição de ter

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seus próprios pensamentos e conclusões sobre as

informações que lhes são oferecidas.

A influência do esquematismo da Indústria

Cultural na Internet talvez possa ser demonstrada a

partir da analise da utilização comum dos recursos

mais populares da rede. Assim, para observar este

fenômeno, vamos levantar alguns dados das

principais redes sociais utilizadas na Internet, que

são hoje: o Facebook; o Twitter e o Youtube.

Levantamos os dados estatísticos no site

Socialbakers12

, um site tcheco que produz

estatísticas sobre redes sociais com objetivos de

medir, comparar e constatar o sucesso de várias

empresas na Internet. A Socialbakers vende seus

serviços para essas empresas para que elas possam

avaliar suas atuações nas principais redes sociais

da Internet e disponibiliza gratuitamente na

Internet os dados mais gerais.

Nossa pesquisa foi realizada no dia 26 de

novembro de 2013 e nos forneceu um ranking com

as dez páginas do Facebook com maior número de

“fãs” em todos os países ligados à rede mundial de

computadores. O que observamos pelos dados

registrados na tabela 1, que as cinco páginas mais

acessadas e ‘curtidas’ do Facebook são: Rihana,

Eminem, Shakira, The Simpsons e Harry Potter,

que são produtos da Indústria Cultural. As duas

primeiras são páginas do próprio Facebook, o que

pode ser desconsiderado por apresentarem, não

uma busca dos usuários dessa rede social, mas a

própria utilização desta, no geral. Da terceira à

12

http://www.socialbakers.com/Facebook-statistics

oitava, para ficarmos com as cinco páginas que

realmente expressam a utilização dos internautas

no Facebook, e a primeira é da artista Rihana,

cantora produzida pela Indústria Cultural, em sua

página estão cadastradas 80.498.338 “fãs”. Por

esses dados podemos ver que três das cinco

páginas que estão presentes no ranking são de

produtos da Indústria Cultural e as outras duas,

produtos diretamente relacionados a ela.

Como estamos analisando a presença da Indústria

Cultural, que tem seu principal foco no

entretenimento, é interessante apresentar os dados

deste segmento na rede social. Na tabela 1.2

podemos analisar dados das dez páginas do

Facebook de entretenimento com maior número de

“fãs”. Destes dez sites, nove são de produtos da

Indústria Cultural. Em primeiro lugar, com

69.703.259 fãs, está a página TexasHoldemPoker,

onde usuários jogam um tipo de poker que é

jogado por celebridades em um programa de

televisão nos Estados Unidos e outros países. E em

segundo lugar, temos o The Simpsons, com

68.625.620 “fãs”, um seriado juvenil produzido

pela FOX.

Na tabela 2 podemos verificar os dados levantados

para os dez perfis com maior número de seguidores

na rede social Twitter. Dos dez perfis levantados

na pesquisa, os sete mais seguidos são

KatyPerry (@katyperry), Justin Bieber

(@justinbieber), LadyGaga (@ladygaga) , Barack

Obama (@BarackObama), Britney

Spears (@britneyspears) e Justin Timberlake

(@jtimberlake). Todos, indiscutivelmente,

produtos da Indústria Cultural.

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Tabela 1: Páginas do Facebook

Posição Página Fãns

1 Facebook for Every Phone 341.743.162

2 Facebook for Every Phone 341.743.162

3 Rihanna 80.498.338

4 Eminem 78.103.039

5 Youtube 76.929.399

6 Coca-Cola 76.347.075

7 Shakira 74.509.537

8 Texas HoldEm Poker 69.703.259

9 The Simpsons 68.625.620

10 Harry Potter 66.628.694

Na tabela 2.2 foram levantados dados sobre os dez

twitts ligados ao segmento de entretenimento com

maior número de seguidores no mundo. Na tabela

podemos verificar que dos dez primeiros colocados

neste ranking, quatro são: Legendários

(@Legendarios) com 5.323.539 seguidores,

programa Pânico (@programapanico) com

8.010.147, e mais dois programas de televisão

estrangeiros, todos os produtos da Indústria

Cultural. Os outros são relacionados a aplicativos

para o uso do Twitter e outros dois que não

conseguimos identificar.

Na tabela 3 levantamos os dados dos canais do

Youtube cujos vídeos obtiveram um conjunto

maior número de visualizações. Dentre os dez

primeiros, nove são relacionados a produtos da

Indústria Cultural e um não conseguimos

identificar.

Na tabela 3.1 foram apresentados os dados dos

canais do Youtube na categoria de entretenimento.

Novamente, dos dez canais de entretenimento com

mais visualizações, nove são relacionados

diretamente à Indústria Cultural e um não

conseguimos identificar.

É interessante ainda ressaltar a coincidência dos

mesmos perfis aparecerem nas 3 principais redes

sociais do mundo, que são o Facebook, o Twitter e

o Youtube. Isso é um elemento no qual podemos

nos basear para observar que na Internet, que tem

um grande potencial técnico, em que os usuários

poderiam traçar de forma livre os caminhos de

busca de informações, conhecimentos novas

formas de relação, diferentes das outras mídias

tradicionais, como TV e rádio, em que a relação

entre as mídias e os usuários é de produtor para

receptor passivo, contudo vemos que sua utilização

é em grande parte restrita.

Pela pesquisa realizada no site socialbakers,

podemos observar a influência que a Indústria

Cultural tem na Internet. Contudo, também deixa

transparecer que essa influência se dá

principalmente pela ação dos internautas que

seguem consumindo as mercadorias culturais

mesmo diante de uma possibilidade de superação

dessas relações alienadas, ditadas pela Indústria

Cultural. Isso talvez possa ser explicado, como

apresentamos, pelas teorias de Adorno e

Horkheimer (1985), ao definir a atitude dos

usuários como predeterminadas por um

esquematismo criado e internalizado pelos

produtos da cultura de massas.

Apresentação das Tabelas com o resultado da

pesquisa

Fonte de todas as tabelas: Socialbakers-

http://www.socialbakers.com/Facebook-statistics

dia acessado no dia 27 de Nov. de 2013 entre 7 e

12 horas.

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Tabela 1.2 - Páginas do Facebook de Entretenimento

Posição Página Fãs

1 Texas HoldEm Poker 69.703.259

2 The Simpsons 68.625.620

3 Harry Potter 66.628.694

4 Family Guy 54.438.630

5 Candy Crush Saga 54.192.753

6 Mr. Bean 49.322.969

7 Avatar 48.615.261

8 South Park 48.139.046

9 Titanic 45.819.196

10 SpongeBob SquarePants 45.336.280

Tabela 2- Perfis do Twitter

Posição Perfil Seguidores

1 Katy Perry (@katyperry) 47.903.055

2 Justin Bieber (@justinbieber) 47.346.407 3 Lady Gaga (@ladygaga) 40.717.046

4 Barack Obama (@BarackObama) 40.220.635

5 Taylor Swift (@taylorswift13) 37.149.553 6 Youtube (@Youtube) 36.768.387

7 Britney Spears (@britneyspears) 34.407.083

8 Rihanna (@rihanna) 32.925.905 9 Instagram (@instagram) 29.378.287

10 Justin Timberlake (@jtimberlake) 28.776.233

A Internet possui potencialmente uma capacidade

de desenvolver não apenas uma utilização livre e

autônoma, como nos indica Lévy, como pode

também ser utilizada pela Indústria Cultural para a

propaganda e disseminação de suas mercadorias

culturais. O último aspecto, i.e., a utilização da

Internet em função da Indústria Cultural, parece ser

a forma de maior utilização da Internet, em

detrimento da utilização de toda a capacidade da

rede em romper a lógica de meros receptores de

informações e consumidores passivos de produtos

predeterminados. Este aspecto fica comprovado

pelos resultados da pesquisa apresentados no

tópico “Breve exposição analítica da utilização

Tabela 2.1 - Perfis do Twitter de Entretenimento

Posição Perfil Seguidores

1 UberSocial (@UberSoc) 11.158.274 2 TwitPic (@TwitPic) 90.51.511

3 Programapanico (@programapanico) 8.010.147

4 Funny Or Die (@funnyordie) 7.682.372 5 SportsCenter (@SportsCenter) 6.244.045

6 OMG Facts (@OMGFacts) 5.898.937

7 OneLouderpps (@OneLouderApps) 5.550.625 8 BET's106& Park (@106andpark) 5.447.689

9 Twitcam (@twitcam) 5.422.706

10 Legendários (@Legendarios) 5.323.539

Tabela 3 - Canais do Youtube

Pos Canal Assinantes Visualizações

1 Machinima 10.136.328 4.644.337.595

2 Rihanna VEVO 11.201.410 4.393.542.710 3 JustinBieber VEVO 6.932.778 4.193.366.837

4 TurkishMusic-Türkçe Müzik 2.209.315 4.123.688.752

5 Officialpsy 6.650.872 3.328.384.652 6 PewDiePie 16.667.951 2.917.175.749

7 Eminem VEVO 8.115.446 2.887.180.215

8 Expertvillage 2.232.985 2.875.093.873 9 IGN 3.875.454 2.836.204.340

10 Smosh 13.877.714 2.786.309.195

Tabela 3.1- Canais do Youtube de Entretenimento

Pos Canal Assinante Visualizações

1 PewDiePie 16.667.951 2.917.175.749

2 Expertvillage 2.234.941 2.875.093.873

3 Smosh 13.877.714 2.786.309.195 4 Atlantic Records 1.581.131 2.702.263.363

5 Rooster Teeth 6.691.177 2.562.175.164

6 TheEllenShow 7.407.155 2.278.776.399 7 YOGSCAST Lewis & Simon 6.282.579 2.273.997.527

8 Ultra Music 1.873.137 2.253.439.613

9 CollegeHumor 5.450.596 2.140.158.207 10 Fueled By Ramen 1.888.046 2.131.426.241

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geral da Internet”. As estatísticas exibidas mostram

que os principais perfis, canais e páginas de

algumas das principais redes sociais da Internet são

sistematicamente de músicos, artistas, produtos da

indústria do entretenimento etc., enfim, de

produtos da Indústria Cultural.

Ainda que pareça que essa utilização se deva pela

inserção da Indústria Cultural na Internet, esse não

é o aspecto principal, pois, cultura de massas, a

principal forma de sua mercadoria, não está, ainda,

sendo produzida em escala industrial na Internet,

tal como tem sido desenvolvida nos demais meios

de comunicação. As causas dessa não inserção

podem ser muitas, contudo, não poderemos tratar

dessa questão nesse artigo, pois foge do escopo de

nossas investigações, mas parece ser uma posição

plausível. O aspecto principal da Internet ser

utilizada de maneira restrita deve ser encontrado na

postura do usuário, que segue a mesma lógica com

a qual consome os demais produtos culturais e se

relaciona com as demais mídias tradicionais,

quando está diante de uma ferramenta tão

poderosa.

Essa postura é determinada, como apresentamos

anteriormente, pelo esquematismo da Indústria

Cultural, que em seu processo de produção cria

uma relação com seus consumidores que os aliena

para o consumo de seus produtos, por meio de seus

próprios produtos. A alienação é feita por meio da

usurpação da forma autônoma de pensamento das

massas, criando uma forma esquemática

predeterminada, em que no indivíduo se expressa

como uma semiformação, i.e., o individuo não é

mais capaz de pensar por si mesmo e por isso entra

num ciclo vicioso, no qual o fato de consumir um

determinado produto reforça a necessidade do

mesmo produto e de novos produtos desse

segmento cultural do capitalismo.

A semiformação criada nos indivíduos pelos

produtos culturais é expressa em outros domínios

da vida, determinando os comportamentos e as

relações em todas as esferas da sociedade.

Destarte, desde a forma das relações mais íntimas

às mais públicas, as pessoas, de maneira geral,

reproduzem os valores, os clichês, os estilos, os

jargões determinados e propagandeados nos

produtos culturais da cultura de massas.

Possivelmente, é essa postura determinada pela

semiformação, que leva os usuários da Internet a

terem uma utilização tão amesquinhada das

potencialidades presentes na rede. Talvez a análise

da utilização geral da Internet, por meio dos sites,

redes sociais e perfis mais procurados e acessados

possam demonstrar ainda mais o quanto a Indústria

Cultural influencia na atitude dos internautas.

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