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Processo de Projeto e Produo de Espaos Pblicos em Cidades Histricas: Estudo de caso nas praas de So Joo Del Rei - MG

Designing Public Spaces in Heritage Sites: Case study in squares of So Joo del Rei -MG

Proceso de Diseo y Produccin del Espacio Pblico en Ciudades Histricas: Caso de Estudio en plazas de So Joo del Rei - MG

OLIVEIRA, Mariana Barbosa de Graduanda, Universidade Federal de So Joo del Rei, mariana-ufsj@hotmail.com

BRANDAO, Rafael Silva Professor Adjunto Doutor, Universidade Federal de So Joo del Rei, rbrandao@ufsj.edu.br

RESUMO Este trabalho tem como objeto o projeto de espaos pblicos, tendo como estudo de caso uma cidade histrica, buscando entender sua relao com o pensamento arquitetnico contemporneo, com edifcios existentes e a serem construdos e com o uso e apropriao dos espaos por parte da populao local. Para compreender as questes que envolvem o espao pblico foram aplicados mtodos consolidados de diagnsticos como o Comportamento Ambiental, Anlise Visual, Walkthrough, Questionrios Estruturados e Histria Oral em trs praas na cidade de So Joo del Rei, MG, sendo que aqui so apresentados os resultados da Praa da Estao como base para anlise. A aplicao dos mtodos, no entanto, mostrou-se insuficiente na produo de diretrizes de ao ou apropriao destes espaos, servindo apenas para reforar os dados obtidos na primeira percepo tcnica. Foram investigados mtodos de participao popular que tambm ofereceram resultados limitados. Conclui-se pela necessidade de um processo educativo dialgico que construa de fato uma autonomia dos usurios na proposio e apropriao espacial, viabilizando uma participao efetiva negociada juntamente aos preceitos tcnicos envolvidos, avaliando o espao no somente por sua forma, mas principalmente a partir das relaes que nele so estabelecidas.

PALAVRAS-CHAVE : praa, pblico, projeto, diagnstico, participao.

ABSTRACT This paper discusses the design of public spaces on heritage sites, and seeks to understand its relation with contemporary architectural thinking, existing and future buildings, and the occupation by the local population. The evaluation was carried out by applying consolidated diagnosis methods, such as Environmental Behavior, Visual Analysis, Walkthrough, Structured Questionnaires and Oral History in three public squares in So Joo del Rei. The results are presented only for the Station Square. These methods, however, proved to be insufficient in providing either design or activity guidelines, acting only as a reinforcement of the first technical perceptions. Participative methods also offered limited results, which points out the need of a dialogic educative process that builds the autonomy of the user regarding spatial design and occupation. This will effectively enable community participation along with technical premises and allow for projects that consider not only formal aspects, but also spatial relations.

KEY-WORDS : squares,public, design, diagnostic, participation.

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RESUMEN El obyecto de este trabajo es el diseo de espacios pblicos, tomando como caso de estudio una ciudad histrica, tratando de entender su relacin con el pensamiento arquitectnico contemporneo, con edificios existentes y edificios que sern construidos y con la apropiacin de los espacios de la poblacin local. Para comprender las cuestiones que involucran el espacio pblico, se aplicaron mtodos de diagnstico consolidados, como de Desempeo Ambiental, Anlisis Visual, Walthrough, Cuestionarios Estructurados y Historia Oral en tres plazas de la ciudad de So Joo del Rei, MG, siendo que aqu se presentan los resultados de la Plaza de la Estacin como la base para el anlisis. Sin embargo, la aplicacin de los mtodos result insuficiente en la produccin de lneas de accin o apropiacin de estos espacios, sirviendo apenas para reforzar los datos obtenidos en la primera visin tcnica. Tambin fueron investigados mtodos de participacin populares que ofrecieron resultados limitados. Los resultados confirmaron la necesidad de un proceso educativo dialgico que se basa de hecho a una autonoma de los usuarios en la proposicin y la apropiacin del espacio, lo cual permite la participacin efectiva combinada a principios tcnicos, evaluando el espacio no slo por su forma, pero sobre todo por la relacin en el que estn establecidas.

PALABRAS-CLAVE: plaza , pblico , diseo, diagnstico, participacin ..

1 INTRODUO

Este trabalho tem como objeto o projeto de espaos pblicos, tomando como estudo de caso praas

em cidades histricas, buscando entender sua relao com processo de pensamento contemporneo,

com edifcios existentes e a serem construdos e com o uso e apropriao dos espaos por parte da

populao local. Trata-se da apresentao dos resultados obtidos na pesquisa Identidade e

Pertencimento em Espaos Pblicos de Cidades de Pequeno Porte, desenvolvida pela autora em seu

Trabalho Final de Graduao.

Entende-se aqui o espao pblico como o espao da ao poltica e de reproduo de diferentes

expresses culturais. um bem comum para todos, que de modo geral so espaos de convvio e

encontro, onde se confrontam diferenas, se explicitam conflitos e se praticam urbanidade e poltica

(QUEIROZ e FRANCH, 2010). Neste sentido, aproxima-se da definio de Massey (2008) que,

construindo o conceito de espao em oposio e contrapartida ao conceito do tempo, afirma que o

espao definido por ser: construdo a partir de relaes; mltiplo e heterogneo na sua

simultaneidade, e sempre em processo. O conceito de pblico tambm aqui pode ser expandido para

alm de sua esfera organizacional (como administrado pelo Estado ou outro tipo de agente pblico

em oposio a agentes privados), configurando-se a partir de caractersticas espaciais como acesso,

escala, hierarquia e organizao, que permitem nveis maiores ou menores de ao e apropriao.

Neste sentido, possvel utilizar categorias propostas por autores como Hertzberger (1996) para

analisar e intervir nestes espaos dentro do mbito de atuao da arquitetura e do urbanismo.

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Avaliar os espaos livres urbanos sob uma tica da apropriao e no da gesto, no entanto, no

significa que tais espaos esto isentos de suas influncias sistmicas e estruturais do capitalismo.

Observa-se que a funo social e coletiva do espao pblico foi transformada no decorrer da histria,

e de modo particularmente intenso aps o processo de industrializao. Espacialmente, as novas

diretrizes orientadoras das intervenes foram reforadas pelos ideais do Movimento Modernista.

Com a consolidao e complexidade dos sistemas capitalistas, a cidade passa a ser conduzida cada

vez mais na direo do comrcio e das trocas. Lefebvre (2001) define a cidade como cidade

produto, onde o valor de troca predomina sobre o valor de uso e os monumentos e os edifcios

passam a funcionar em prol do lucro advindo das atividades tursticas ou de iniciativas privadas.

Tambm a arquitetura, por agir diretamente sobre os espaos, da modernidade

contemporaneidade, tem sido produzida, distribuda e consumida como uma mercadoria. Ou seja, o

espao de atuao da arquitetura adquiriu maior valor de troca, e em detrimento do de uso, e

consequentemente a arquitetura como objeto construdo e experienciado tambm (KAPP, 2005).

Inmeros espaos (ruas, praas, parque), a despeito de altos investimentos recebidos, atendem s

necessidades da sociedade de forma precria, excludente ou superficial. Reconhece-se isso como

sintoma da insuficincia dos mtodos tradicionais de diagnstico e investigao do espao pblico

dentro do campo da proposio espacial (Arquitetura e Urbanismo), o que motivou esta investigao.

Considera-se que os espaos urbanos dependem das pessoas como seus principais agentes

transformadores, capazes de lhes oferecer vida e significado desde que eles sejam dotados de

elementos capazes de induzir uso e permanncia (GEHL, 2013).

Nas cidades histricas brasileiras, restries impostas pelos rgos de controle do patrimnio que

buscam conter ou retardar o voraz processo de transformao capitalista acabam por limitar ainda

mais as possibilidades de atuao sobre o espao pblico. Muitas vezes, o dever de lembrar,

discutido por Jeudy (2005), leva a uma prtica da preservao pela preservao e no por um

contexto socialmente referenciado. Isso acaba por banalizar o espao, congelando-o, esvaziando-o de

uso e, por isso, de significado. Neste sentido, urge-se revisar os mtodos tradicionais de anlise e

projeto no espao pblico de modo a conduzir a processos menos burocrticos e controladores e

mais participativos ou ativadores dos espaos urbanos.

2 O MTODO: ANLISE DE ESPAOS PBLICOS EM SO JOO DEL-REI

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Em So Joo Del Rei, foram investigadas a Praa dos Ferrovirios, popularmente conhecida como

Praa da Estao; a Praa Carlos Gomes, conhecida como Largo do Carmo, e a Praa de Matosinhos.

As duas primeiras esto localizadas na regio central da cidade, dentro do permetro de tombamento

do centro histrico e prximo a edificaes com tombamento nacional, sendo-lhes atribuda

importncia no contexto do patrimnio da cidade. Possuem semelhanas nas dimenses de suas

reas destinadas ao lazer, permanncia e vegetao, porm esto inseridas em contextos urbanos

distintos. A Praa da Estao est localizada em uma parcela da cidade significativamente modificada

pelo crescimento urbano e possui entorno caracterizado principalmente por atividades comerciais,

caracterizando-se como um espao central na cidade. O Largo do Carmo, por sua vez, est localizado

em uma rea historicamente preservada, com comrcio moderado e entorno relativamente

residencial, apresentando grande relevncia para a convivncia e o lazer local. A Praa de Matosinhos

est localizada no bairro de mesmo nome que se destaca na cidade pelo constante crescimento

urbano e comercial. A praa sofreu inmeras intervenes, sendo a ltima denominada Travessia

Eficiente, que se traduz em uma interveno urbanstica de mobilidade urbana. Embora as trs praas

tenham sido estudadas no mesmo nvel de profundidade e a anlise geral se refira ao conjunto de

dados levantados, os exemplos de resultados apresentados neste trabalho se referem apenas ao

diagnstico da Praa da Estao.

A anlise das praas foi direcionada para suas reas de convvio social, composio do entorno

imediato, usos e articulao com o tecido urbano. Apoiado em mapas, entrevistas, anlise visual e

morfolgica, os estudos seguiram procedimentos consolidados de diagnstico para projeto,

levantando a atual situao do local, observando seus usos e identificando o conflito e o convvio

entre o espao (projeto, forma) e os usos existentes.

Comportamento Ambiental

Esta uma categoria analtica que estuda, a partir de observaes do pesquisador ou projetista, a

relao dos nossos comportamentos e aes com o ambiente fsico-espacial. Neste processo atenta-

se para as relaes das pessoas com o espao, comportamentos padro, formas de apropriao e

perodo de ocorrncia das aes. Del Rio (1990) sugere a investigao das sequncias

comportamentais, palcos de ao e os territrios. A aplicao deste conceito consolidou-se por

visitas rea que tinham por objetivo compreender como os usurios das praas e a populao do

entorno se apropriam do espao, identificando aes de pessoas e sua relao com o espao.

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O Mapa Comportamental da Praa da Estao foi realizado ao longo da pesquisa em diversos

horrios do dia, sendo o perodo da manh entre 9h e 11h30 e o perodo da tarde entre 16h e 18h30

os que foram possveis observar maior movimentao. No perodo noturno a praa no recebe

muitos visitantes, sendo apenas alguns jovens que se encontram em rodas de msica durante no

evento casual criado pelos universitrios denominado Quinta Lei. Nos mapas apresentados na Figura

1 foram traados os principais pontos de acesso de acordo com a localizao do usurio, a diviso

das atividades na Praa, onde e qual atividade era realizada em determinado lugar.

Figura 1: Mapas comportamentais realizados na Praa: (a) Mapa comportamental de usos; (b) Mapa comportamental de acessos

(a) (b)

Os mapas indicam uma porcentagem significativa de espao ocioso, apesar de um bom ndice de

ocupao da praa. O desenho no favorece todos os tipos de uso e em alguns casos, h bancos que

acabam ficando desocupados por seu posicionamento equivocado. Tambm possvel perceber que

a limitao de acessos prejudica o uso de alguns espaos, como aquele localizado no canto oeste da

praa. Como se trata de uma anlise predominantemente funcional, e no perceptiva, a

incorporao destas diretrizes ao projeto acaba levando a solues pontuais e bvias que no

exploram de fato os potenciais estticos e de apropriao da praa. O mapa comportamental

mostrou-se um exerccio vlido como abordagem inicial para compreender a ocupao do espao

urbano, porm sua avaliao restringe-se ao olhar do tcnico, que traa o mapa das atividades a

partir exclusivamente de sua observao. A falta de contato com os usurios no invalida o mapa,

porm o deixa incompleto.

Anlise Visual

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De acordo com Del Rio (1990), os trabalhos que orientam os estudos nesta rea esto ligados s

teorias de paisagem urbana, sendo as publicaes de Gordon Cullen um importante referencial. O

mtodo considera importante avaliar a paisagem sobre trs aspectos: a tica, o lugar e o contedo. A

tica considera as reaes a partir das percepes visuais dos trajetos, edifcios e espaos; o lugar

leva em conta a posio que o indivduo ocupa em relao ao que est sendo observado; e o

contedo, que se refere ao conjunto de significados apurados nas sensaes do espao, por meio das

cores, escalas, texturas, entre outros elementos.

O mtodo de Anlise Visual, assim como o Mapa Comportamental parte da observao do tcnico.

Ao realizar a Anlise Visual na Praa da Estao foi feito o registro fotogrfico, apresentado na figura

2, abordando tudo aquilo considerado relevante ao olhar do observador para compreender o espao.

Foi produzido um mapa do entorno onde as principais edificaes so destacadas. Com esse mapa

possvel compreender como o entorno imediato de um espao pblico proporciona a ele um uso

diferente. A Praa da Estao est localizada no centro da cidade e cercada por edifcios comerciais

o que proporciona uma intensa movimentao de pessoas durante o dia.

Figura 2: Mapa de Anlise Visual

A anlise visual apresenta como vantagem sobre a observao comportamental o fato de tratar-se

de uma anlise perceptiva, que considera tambm fatores no funcionais ou racionais. Ela permite

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verificar no apenas potenciais de uso, mas tambm experincias de ocupao e visadas possveis. O

modelo de registro fotogrfico permite acessos mltiplos aos dados, com novas interpretaes que

podem complementar as percepes iniciais. Na Figura 4 percebem-se diversos usos planejados ou

no, provocados por diferenas de nvel, sombreamentos ou arranjos formais. O mtodo apresenta

como desvantagem, como o anterior, a viso limitada ao tcnico, que quem conduz o registro

fotogrfico. Alm disso, a anlise acontece dentro de uma lgica de inventrio, registrando vises e

observaes, mas h uma dificuldade na transformao destas em diretrizes claras de interveno.

Walkthrough (passeio ou entrevista acompanhado)

Esta ferramenta baseia-se na aquisio de informaes sobre determinado local atravs de um

passeio com algum usurio do espao em questo. O registro do percurso pode ser realizado por

meio de fotografias, desenhos e gravao de udio e vdeo, abrangendo todos os ambientes, no qual

os aspectos fsicos servem para articular as reaes dos participantes em relao ao ambiente

(RHEINGANTZ, 2009). Criado por Kevin Lynch, esse instrumento possibilita que os observadores se

familiarizem com o espao e faam a identificao dos aspectos negativos e positivos do local.

Como a Praa no considerada um espao de grande porte, frequentada por aproximadamente um

nmero de pessoas entre 17 e 23 que utilizam efetivamente o espao, alm daqueles que passam ou

param por um curto espao de tempo houve a tentativa de entrevistar diariamente ao menos 15

pessoas. No entanto nem sempre foi possvel alcanar esse nmero devido indisposio dos

usurios ou pela pouca quantidade de pessoas presentes na Praa nos momentos das visitas. Esse

mtodo se inicia com perguntas bsicas para estimular a conversa, j sugeridas pelos

desenvolvedores do mtodo, tais como: 1) O que voc considera importante nessa Praa? 2) O que

funciona bem? 3) O que no funciona? 4) O que deve ser modificado? 5) O que deve ser mantido? 6)

O que esse espao significa para voc?

O Walkthrough foi o mtodo onde foi possvel obter o maior nmero de informaes sobre o lugar,

pois contava com inmeras ferramentas de aproximao dentre as quais a fotografia, que permitiu

extrair um olhar sensvel do usurio. As perguntas para iniciar a aplicao do mtodo produzem um

resultado semelhante ao de entrevistas ou conversas informais, mas de forma mais direta e sucinta.

O fato de o mtodo ser composto por ferramentas existentes em outros mtodos o torna mais

completo. No entanto o passeio propriamente dito nem sempre foi cumprido, uma vez que as

pessoas frequentemente no esto dispostas a faz-lo. Quando os usurios eram frequentadores

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assduos da praa, a entrevista, a fotografia e a opinio sobre o lugar eram realizados durante

conversa em algum ponto da praa que a pessoa se sentia mais confortvel. Exemplos dos dados

coletados so apresentados nas Figuras 3 e 4.

Figura 3: Exemplo de fotos tiradas por participantes do walkthrough. As seguintes frases foram mencionadas pelos usurios ao realizar as fotos (a) As flores rosas so a coisa mais bonita da praa; (b) Eu gosto da sombra das rvores. bom e d

um desenho bonito no cho.

Fonte: Fotos realizadas por sujeitos da pesquisa.

Figura 4: Exemplo de fotos tiradas por participantes do walkthrough. As seguintes frases foram mencionadas pelos usurios ao realizar as fotos (a) Eu acho bom sentar aqui e ver a Maria Fumaa. No gosto da grade, mas ela importante para as

crianas no entrarem l; (b) O lixo no cho muita falta de respeito. A prefeitura tinha que colocar mais lixeiras

Fonte: Fotos realizadas por sujeitos da pesquisa.

Os resultados indicam tanto preferncias estticas - como o desejo por um maior cuidado paisagstico

com escolha de flores e rvores, ou a necessidade de mais sombra e conforto na praa ou mesmo na

percepo da liberdade de acesso visual e fsico aos espaos como elementos funcionais e de

gesto como a questo da segurana e da manuteno e limpeza.

Mesmo com a fotografia combinada ao discurso transmitindo um pouco da sensibilidade dos

usurios em determinado espao, o mtodo ainda foca em uma anlise espacial imediata. Como o

contato muito rpido o participante nem sempre exerce uma reflexo cuidadosa sobre o espao,

nem invoca elementos histricos da sua relao com o lugar. Tambm cabe ressaltar que o universo

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de observaes est restrito experincia espacial prvia daquele usurio, j que ele incapaz de

evocar referncias no vivenciadas. Como h pouca diversidade na ocupao dos espaos pblicos na

cidade, o usurio no consegue imaginar outros potenciais de uso para o espao e acaba se limitando

a observaes primrias ou bvias. Assim, embora o Walkthrough apresente-se como estratgia de

acesso s percepes do usurio, verifica-se que as respostas so muitas vezes imediatistas e

semelhantes quelas obtidas por um tcnico em uma observao do local. Falta um contato

prolongado e sistematizado com o usurio que o permita de fato refletir sobre o espao e contribuir

para ampliao de seu potencial de utilizao.

Questionrios Estruturados e Histria Oral

O Questionrio Estruturado consiste em formular um conjunto de perguntas pr-estabelecidas ao

usurio com o intuito de conhecer a percepo dele sobre o espao, que so realizadas por

instrumento escrito. A Histria Oral funciona como uma conversa, que busca criar uma atmosfera de

informalidade junto ao entrevistado, aproximando-se dele e tentando, a partir disso, coletar

informaes a respeito da sua relao com o espao. Essa ltima estratgia acaba por aparecer, ainda

que de forma introdutria, nos processos desenvolvidos nos demais mtodos.

Foram aplicados dois modelos de questionrios s pessoas de todas as idades nas praas, sendo uns

com respostas de mltipla escolha e o outro com respostas dissertativas. No total foram aplicados 30

questionrios. A segunda opo oferece ao usurio mais liberdade de resposta, no entanto a maioria

das pessoas no se dispunha a escrever, seja por no serem alfabetizadas e por se sentirem

constrangidas com a prpria escrita. Os resultados obtidos nos modelos de questionrio no se

diferenciaram de forma relevante e foram semelhantes aos obtidos atravs do Walkthrough. Mesmo

com a gama de opes de respostas do primeiro modelo, as pessoas sempre optavam por respostas

bvias e sem reflexo.

A Histria Oral obteve resultados mais objetivos, uma vez que os questionrios ou desenhos

intimidavam algumas pessoas. Um artifcio utilizado para se obter um melhor resultado na Histria

Oral foi a contraposio s respostas fornecidas pelos usurios. A indicao de problemas nos pontos

apontados como positivos pelo entrevistado incentivava o dilogo, ao leva-lo a argumentar e explicar

os motivos de sua resposta. Dessa forma foi possvel adquirir respostas mais slidas e com um pouco

de reflexo. Ainda assim, os resultados foram apenas complementares em relao aos obtidos pelos

demais mtodos, sem apresentao de assuntos no abordados.

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Anlise dos mtodos consolidados

Antes de iniciar a aplicao dos mtodos houve um estudo do local, a partir da observao tcnica,

sem interagir com nenhum usurio para que fosse possvel traar a forma e os usos da Praa. Todos

os mtodos foram aplicados no decorrer de oito meses, em dias e horrios diversificados. O objetivo

era aplic-los em 15 pessoas diariamente, no entanto, foram excees os dias em que foi possvel

atingir essa meta. Os usurios nem sempre estavam dispostos a participar e em alguns casos

respondiam s perguntas de forma imediata em concordncia ou discordncia. Foram abordadas

pessoas que visitam a praa mais de trs vezes por semana e tambm aquelas que somente passam

pelo local, mas no permanecem, ou permanecem por um curto espao de tempo. Foi possvel

desenvolver uma pesquisa mais completa com as pessoas que frequentam a Praa mais de uma vez

por semana, sendo permitido testar mais de um mtodo com a mesma pessoa.

Aps todas as tentativas houve uma comparao entre os resultados obtidos nas primeiras

observaes sem contato com o pblico com os resultados proporcionados pela aplicao dos

mtodos. O processo, exaustivo e demorado, simplesmente reforou as primeiras observaes

realizadas na percepo tcnica, no oferecendo nenhuma novidade a respeito das relaes sociais

existentes, tampouco indicando novas possibilidades de uso. Dessa forma os processos de

diagnstico, projeto e/ou produo do espao pblico constantemente trazem respostas referentes

apenas s questes formais (na maior parte das vezes bvias) e, diante da complexidade de aes e

relaes sociais que so estabelecidas em um espao pblico, considera-se esta abordagem

excessivamente reducionista. As respostas coletadas no foram capazes de orientar apropriaes ou

aes sobre o espao, nem construir uma orientao crtica que estimulasse o usurio a pensar em

novas formas de ocupao. Percebe-se que muitas vezes na prpria formulao dos instrumentos, o

tcnico induz, consciente ou inconscientemente, as respostas que busca encontrar.

Percebeu-se ainda uma inclinao a buscar resultados negativos. Arquitetos e estudantes de

arquitetura frequentemente se frustram ao realizar estudos de determinada rea ao perceber que o

espao que gostariam de intervir no apresenta nenhum problema para os usurios e os mesmos no

desejam nenhum tipo de melhoria no local. Faz-se necessrio, no atual contexto da arquitetura,

meios de aproximar as pessoas das infinitas possibilidades de apropriao que o espao ainda possui

como parte do processo de avaliao.

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3 PARTICIPAO E ESPAO PBLICO

Discusses conceituais

Os espaos pblicos de convivncia em So Joo Del Rei se restringem basicamente a praas e largos,

tendo sido detectado que os moradores acreditam que a cidade no oferece opes diversificadas de

lazer. Os questionrios indicaram que um grande nmero de pessoas no utilizava o espao publico

da cidade (acima de 60% dos entrevistados) e mesmo o restante dos respondentes reclamava da falta

de diversidade. Na maior parte dos casos, informavam que frequentavam apenas as praas, pois estes

eram os nicos espaos pblicos oferecidos pela cidade. Tendo em vista o nmero elevado de praas

e largos na cidade, principalmente na rea central, notou-se aps mais entrevistas que a insatisfao

dos moradores no se trata somente da quantidade ou tipo de espaos pblicos, mas sim a

diversidade de oportunidade de lazer.

Mesmo com a reorganizao recente da atuao profissional do Arquiteto e Urbanista, com a criao

de um conselho regulatrio prprio (O Conselho de Arquitetura e Ubanismo - CAU, Lei n12.378 de

2010), percebe-se um distanciamento entre a arquitetura e a experincia urbana cotidiana e dos

processos participativos. Sintomas disto aparecem nos altos ndices de autoconstruo e

autoproduo de edifcios (MENDES, 2006) e, na gesto pblica, na falta de corpo tcnico qualificado

na elaborao, implantao e fiscalizao de polticas pblicas urbanas (SOUZA, 2011). Kapp,

Nogueira e Baltazar (2009) indicam que este distanciamento entre o arquiteto e seu pblico, se deve

imagem projetada pelo primeiro como figura elitista, autoritria e desconectada das reais

necessidades e desejos do usurio.

Em So Joo Del Rei a participao popular no se faz presente nos processos de projeto, a exemplo

de uma interveno proposta pela Prefeitura Municipal para a Praa da Estao, que no condiz com

o que os usurios dizem esperar da praa em reformas futuras. As apropriaes pr-estabelecidas

pelos usurios atravs de adaptaes no espao esto sendo ignoradas no projeto, deixando claro

que em nenhum momento houve a tentativa de anlise cuidadosa do espao, tampouco das relaes

nele estabelecidas.

A autonomia individual ou coletiva nos processos participativos citada por Souza (2011) como fator

fundamental, definida como a capacidade do indivduo ou um grupo de indivduos de realizarem

escolhas com liberdade, responsabilidade e conhecimento a respeito do assunto abordado, onde seja

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possvel garantir igualdade de oportunidade na participao nos processos de deciso que

tangenciem o interesse coletivo.

Descrevendo sua experincia na tentativa de construo de processos participativos dentro do Curso

de Arquitetura e Urbanismo da UFSJ, a arquiteta e professora Helena Marchisotti (SOUZA, 2015)

ressaltou seu entendimento do papel do arquiteto como apenas mais um integrante do processo,

desvinculando dele a imagem de nico manipulador do espao ao afirmar que o arquiteto tem o

papel e a caneta enquanto as outras pessoas possuem a experincia e o conhecimento daquele lugar,

ento cabe ao arquiteto intermediar a necessidade e desejos dessas pessoas com seu conhecimento

tcnico. De acordo com Souza (2015), antes de iniciar o processo participativo importante mapear

as atividades do local e observar sem interferir (processo no qual os mtodos tradicionais podem

auxiliar) para facilitar a conciliao de desejos e necessidades distintos. Deve-se evitar o foco

excessivo nas questes tcnicas, ampliando a percepo das relaes sociais e apropriaes

existentes para, com sensibilidade, compreender o que as pessoas esperam dele.

Exemplo de aplicao

Na tentativa de focar no potencial do espao, promover o pensamento crtico para diferentes formas

de apropriao e incluir a participao popular nestes processos, realizou-se uma experincia com a

Metodologia de Leitura Participativa para Desenvolvimento de Diretrizes de Projeto Urbano

elaborada por Santiago (2014). O objetivo foi realizar um estudo dos desejos dos usurios com

relao ao espao a partir de uma exposio de fotos do local para os usurios e um breve

questionrio informal e oral composto por perguntas curtas a respeito do que a pessoa gostaria de

fazer naquele espao. As perguntas so desenvolvidas de acordo com o local e servem apenas para

iniciar o primeiro contato com usurio, para que ele seja posteriormente convidado a escolher

figuras que representam diversas atividades para compor a foto impressa do local criando um

ambiente de acordo com seus interesses. Ao pedir o usurio para compor a imagem com as figuras

possvel transcrever atravs de um mtodo participativo, diretrizes que possam auxiliar no processo

projetual e iniciar uma reflexo crtica sobre novas formas de apropriao.

A Metodologia de Leitura Participativa para Desenvolvimento de Diretrizes de Projeto Urbano foi

aplicada a 9 usurios e o resultado obtido se diferencia dos demais mtodos por sua capacidade em

conseguir se aproximar de forma mais significativa das percepes e dos desejos necessidades do

usurio. Os resultados so apresentados nas Figuras 5 e 6.

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Figura 5: Exerccio projetual desenvolvido com os usurios (a)Figuras com possibilidades de usos; (b) Sobreposio de imagens produzida por usurio que gostaria de tivesse mais incentivo para o lazer infantil.

Figura 6: (c) Sobreposio de imagens produzida por usurio que gostaria que a grama fosse mais utilizada; (d) Sobreposio de imagens produzida por um usurio que deseja mais lazer para crianas e que exista na praa festas, como, por exemplo,

festa Junina, por isso a escolha pela fogueira

Percebe-se claramente nas imagens o efeito sinergtico da aplicao do mtodo. Ao ver uma imagem

com um possvel uso, o sujeito rapidamente expande seu universo de possiblidades. Por exemplo, um

usurio, ao ver a imagem de uma fogueira, imediatamente pensou na possibilidade de acontecerem

festas juninas na Praa, que garantiria no s a diverso, mas tambm uma maior movimentao

noturna, o que proporcionaria mais segurana. Observa-se que o resultado obtido limitado pela

gama de figuras ofertadas e normalmente reflete desejos prximos ao universo j familiar ao usurio.

A diversidade de oferta de situaes , assim, fundamental para o sucesso do projeto. Apesar deste

limite, foi possvel traar uma srie de potenciais claros, desde a ocupao da grama, passando por

mais opes de diverso para as crianas, por rvores com copas mais adensadas para proporcionar

mais sombra at a consolidao da abertura dos caminhos nos canteiros que j foram criados pelos

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prprios usurios. Observa-se que o carter ldico da atividade extremamente produtivo para o

exerccio criativo do usurio.

4 CONCLUSO

As praas so espaos onde diversas atividades podem acontecer e para compreender como ocorre

essa variao no uso torna-se imprescindvel a utilizao de mtodos de avaliao do espao que

abordem a percepo crtica do indivduo sobre o ambiente em questo, assim como nos processos

de apropriao que foram estabelecidos e no somente anlises formais e desconectadas das

relaes sociais consolidadas.

Percebeu-se que a utilizao dos mtodos consolidados, embora levassem a uma primeira

aproximao com os espaos estudados, no levaram a significativas alteraes de apropriao, e sim

ao reforo dos padres j estabelecidos. Estes processos se traduzem em uma anlise muito objetiva,

reduzindo a arquitetura em uma dimenso puramente material. Isto refora uma tendncia

contempornea de produo de espaos formatados com funes previsveis, como se tivssemos

diariamente um roteiro a seguir (GUATELLI, 2012). Ao produzir espaos para usurios passivos, poda-

se diariamente a capacidade imaginativa e a disposio para o inesperado, contribuindo para a

formao de pessoas cada vez mais alienadas.

Mesmo as tentativas de participao propostas ainda so incipientes, pois careceram de um tempo

prolongado de contato com usurio, propondo uma reflexo verdadeiramente crtica sobre o espao

cotidiano e uma expanso do seu universo de referncias de apropriao espacial. Neste sentido,

percebe-se que o processo de real participao exige no uma apropriao acrtica da esttica,

desejos, tecnologias e sistemas populares, mas sim uma rediscusso mais profunda entre os agentes

produtores e receptores do espao, em um processo que pode ser classificado como reeducativo. A

educao aqui no entendida em sua forma tradicional, mas como a construo, por parte de

acadmicos, profissionais e leigos, uma curiosidade epistemolgica (FREIRE,2014), na qual todos

estes sujeitos envolvidos caminhem de uma abordagem ingnua para uma crtica, se aproximando de

forma cada vez mais rigorosa do nosso objeto cognoscvel de interesse que o espao. Apenas assim

ser possvel uma interveno de fato consciente e participativa.

Faz-se necessria uma arquitetura que seja capaz de pensar situaes que proporcionem uma

apropriao mais livre e diversificada dos espaos, principalmente nos espaos pblicos, colocando

essa situao como uma condio mnima e bsica para pensar a (re) ativao de determinado

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lugar, ou seja, uma arquitetura que seja suporte para essas atividades e no objeto. Afinal, ativar o

lugar, torn-lo propcio ao uso e passvel de permanncia constante sempre foi o grande desafio do

arquiteto.

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