Refeição feita em casa perde qualidade

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Editor responsável: Sérgio Luis de Deus [email protected] JUVENTUDE Pesquisa revela queda no consumo de drogas em escolas PáGINA 13 4 GAZETA DO POVO Sexta-feira, 17 de dezembro de 2010 Vida e Cidadania Hortaliças 15,4 44,3 Frutas 14,3 59,3 Farinha de mandioca 8,4 1,9 Massas 4,1 6,1 Biscoitos 4,3 6,4 Iogurte 0,9 4,3 Sais e condimentos 4,1 7,1 Óleos e gorduras 7,6 9,9 Bebidas alcoólicas 2,1 19,2 Bebidas não alcoólicas 16,9 84,7 Alimentos preparados e misturas industriais 1,4 8,4 Carnes 17,9 31,9 Aves e ovos 14 18,3 Principais produtos consumidos, em quilos por ano Açúcares, doces e produtos de confeitarias 19,3 23,4 Leite de vaca pasteurizado 11,6 40,2 Pão francês 9,2 14 Feijão 10,3 7,3 Arroz 27,6 18,6 Famílias com renda até R$ 830 Famílias com renda superior a R$ 6.225 Infografia: Gazeta do Povo Fonte: IBGE. Infografia: Gazeta do Povo Fonte: IBGE. NA BALANÇA A diferença no consumo de calorias pode ser explicada pelo aumento das refeições fora de casa. 2003 24,1% 2009 31,1% Refeições fora de casa, em % dos gastos com alimentação Consumo diário de calorias Em kcal por dia por pessoa 2003 1.791kcal 2009 1.611kcal 60,6 59,2 63,6 55,3 Carboidratos 6,1 6,7 5,6 7,7 Proteínas animais 5,5 5,4 5,6 5,2 Proteínas vegetais 27,8 28,7 25,2 31,8 Gorduras Origem das calorias Veja em que grupos de alimentos está concentrado o consumo calórico das refeições. % das calorias ingeridas por dia Média nacional Média nacional 20% mais pobres 20% mais ricos 2003 2009 Foto: Daniel Castellano. Montagem: Rodrigo Montanari / Gazeta do Povo Feijão e arroz já não são tão populares no dia a dia O que o brasileiro come z O feijão com arroz já não é mais o prato-símbolo do cardápio brasi- leiro. De 1975 para 2009, a compra desses itens caiu drasticamente, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O arroz polido teve redução de 60% na quantidade anual per capita adquirida – de 31,6 quilos para 12,6 quilos. A aquisição do feijão para consumo em casa passou de 14,7 quilos anuais para 7,4 quilos (redução de 49%). Já a compra do açúcar caiu de 15,8 quilos para 3,3 quilos (79% menor). Por outro lado, o consumo de refrigerante de guaraná saltou de 1,3 quilo anual per capita para 6 quilos. A comparação foi feita entre as regiões metropolitanas de Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Curitiba, Porto Alegre, além de Brasília, levando-se em conta dados do Estudo Nacional de Despesa Familiar (Endef) (1974/1975) e do levantamento “Aquisição alimen- tar domiciliar per capita”. Para fins de padronização, as quantidades medidas em litros foram transfor- madas em quilos. A mudança de hábito se ref lete diretamente na saúde – levanta- mento divulgado pelo Ministério da Saúde na terça-feira passada aponta que entre 1996 e 1997 aumentaram em 10% as mortes provocadas por diabete, doença ligada ao excesso de peso. “Os car- boidratos complexos, como o arroz e o feijão, estão associados às fibras, que são importantes para prevenção de doenças. Essa mudança na alimentação, da tra- dicional para a industrializada, reduz a quantidade de fibras, que são importantes para a prevenção da doença cardiovascular, a diabe- te, da obesidade e de alguns tipos de câncer”, afirma o professor Carlos Augusto Monteiro, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). A queda na compra desses itens básicos acentuou-se mais recente- mente. De 2003 para 2009, a aqui- sição anual de arroz polido caiu 40,5%; a de feijão, 26,4%; e a aqui- sição do açúcar refinado caiu 48,3%. Nesse mesmo período subiu o consumo de alimentos preparados e misturas industriais – o que não era computado na Endef. Hoje, a média nacional des- ses produtos está em 3,5 quilos anuais, alcançando 8,3 quilos entre os 20% mais ricos. No carrinho do supermercado, o que ocupa maior espaço hoje são bebidas e infusões (a média domi- ciliar per capita é de 50,7 quilos), seguidas por laticínios (43,7 qui- los). Só então entram cereais e legu- minosas (39 quilos), frutas (28,9 quilos), hortaliças (27,1 quilos) e carnes (25,4 quilos). “Sem dúvida, a gente percebe uma mudança no cardápio do brasileiro”, afirma o gerente da Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008/2009, Edilson Nascimento Silva. A alteração do hábito alimen- tar tem a ver com a falta de tempo, aponta o estudioso. “Hoje a gente se depara com famílias que pas- sam o dia todo fora de casa, não têm tempo de preparar o alimen- to, além do custo de ter uma empregada doméstica, ou cozi- nheira. É o efeito da alimentação fora. Outra questão é o uso da ali- mentação semipronta, que são rápidas, mas que amanhã podem trazer problemas à saúde”. (AE) O levantamento “Aquisição alimentar domiciliar per capita” mostra um retrato nítido da desi- gualdade na mesa do brasileiro. Produtos como laticínios, frutas, verduras e legumes, gordura ani- mal, bebidas alcoólicas e refeições prontas são mais consumidos por aqueles que têm maior rendi- mento. A carne bovina de primeira aparece pouco no cardápio dos mais pobres. O consumo de alcatra, por exemplo, foi de 200 gramas anuais per capita para aqueles com renda familiar de até R$ 830. Já os mais ricos (com ren- da acima de R$ 6.225) adquiriram 2,6 quilos – diferença de 1.200%. O consumo de filé mignon chama ainda mais atenção – 8 gramas per capita para as meno- res rendas, ante 850 gramas entre os mais ricos. O consumo de carne de segunda, entretanto, foi equi- valente entre os dois grupos (6 quilos para a renda mais baixa, 6,2 quilos para a renda maior). No caso da bebida alcoólica, a diferença foi de 799% – aqueles com menor renda compram 2,1 quilos anuais per capita, enquanto aqueles com rendimentos supe- riores compram 19,2 quilos. O consumo de alimentos preparados é 514% maior entre os mais ricos em relação aos mais pobres (8,4 quilos contra 1,3 quilo). O mesmo ocorre com bebidas não alcoólicas (401% de diferença), iogurtes (379%), frutas (316%), leite de vaca pasteurizado (246%). Já arroz, feijão e farinha de mandioca foram mais adquiridos por aqueles com menor renda. Quem ganhava até R$ 830, adqui- riu 27,6 quilos de arroz e 10,6 quilos de feijão. Os que têm renda acima de R$ 6.225 compraram 18,6 qui- los e 7,3 quilos respectivamente. Já o cafezinho foi consumido por todas as classes com pouca variação. Aqueles com menor renda adquiriram 2,2 quilos de café moído; os de maior renda, 2,8 quilos. (AE) z GASTOS Comida na mesa conforme cabe no bolso COMPORTAMENTO Refeição feita em casa perde qualidade Estudo mostra que consumo de frutas e verduras deixa a desejar. Há abuso na ingestão de açúcares e gorduras. Falta educação alimentar RIO DE JANEIRO Agência Estado z O brasileiro está comendo mal em casa. As frutas e verduras, que deveriam corresponder a uma pro- porção entre 9% e 12% das calorias diárias ingeridas, representam apenas 2,8%. Já os açúcares livres equivalem a 16,4% das calorias disponíveis nas residências, quan- do a recomendação é de que fique em 10%. Os alimentos essencial- mente calóricos (óleos e gorduras vegetais, gordura animal, açúcar de mesa e refrigerantes) atingem 28% da caloria consumida. Entre os 20% mais ricos, o consumo des- ses alimentos ultrapassa a propor- ção recomendada por nutricionis- tas, de 30% – a porcentagem alcança 31,8%. Os dados fazem parte do levan- tamento “Avaliação nutricional da disponibilidade domiciliar de ali- mentos no Brasil”, feito com base na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008/2009. Para chegar a essas informações, os téc- nicos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) anali- saram apenas os alimentos dispo- níveis nas residências, também divulgados ontem na pesquisa “Aquisição alimentar domiciliar per capita”. “Está mal preparado o cardápio dos brasileiros”, afirma o gerente da POF, Edilson Nascimento Silva. “Há uma interferência na disponi- bilidade e preço dos produtos – frutas, legumes são normalmente alimentos de difícil acesso e o pre- ço interfere. As pessoas fazem opções por cardápio mais barato”, explica. Silva ressaltou que a pesquisa demonstra que o consumo de pro- teína é satisfatório – 12,1% das calorias disponíveis diariamente, quando o ideal é entre 10% e 15%. “O que está faltando é uma educa- ção alimentar, uma política volta- da para ensinar o cidadão a consu- mir mais legumes, mais frutas”, complementa. Ana Beatriz Vasconcellos, coor- denadora-geral da Política de Alimento e Nutrição do Ministério da Saúde, afirma que esse deve ser um esforço intersetorial, o que inclui o setor produtivo. “É preciso garantir a oferta melhor de ali- mentos: aumentar o crédito para que produtores façam com que suas frutas, verduras e legumes tenham condições de serem distri- buídas em todas as regiões. E a melhoria da qualidade dos ali- mentos industrializados – redu- ção da gordura, do sódio, do açú- car. É preciso o engajamento do setor produtivo.” No período avaliado – de maio de 2008 a maio de 2009 –, a disponibilidade média per capi- ta de alimentos foi de 1.611 calo- rias. Na pesquisa anterior, era de 1.791. A diferença pode ser atri- buída aos alimentos consumidos fora de casa. Comparando-se os resultados atuais e os da POF anterior, de 2002/2003, a despesa com alimentação no domicílio caiu de 75,9% dos gastos mensais para 68,9%. Calorias para todos O levantamento mostra ainda que o teor de ácidos graxos saturados, cujo consumo está associado a pro- blemas como doenças cardiovas- culares e diabete, está próximo do limite de 10% das calorias na faixa de renda que vai de R$ 2.491 a R$ 4.150 (9,1%) e de R$ 4.150 a R$ 6.225 (9,5%). A faixa de renda mais alta, acima de R$ 6.225, já ultrapassou o limite recomendado – chega a 10,6%. Em relação à pesquisa anterior, a POF 2008/2009 mostra ainda o crescimento da participação no total de calorias de alimentos como pão francês (13% a mais), bis- coito (10%), queijos (16%), refrige- rantes (16%), bebidas alcoólicas (28%) e refeições industrializadas (40%). Por outro lado, registraram redução em alimentos como arroz (queda de 6%), feijões (18%), fari- nha de trigo (25%), leite (10%) e açúcar (8%). Região Sul O estudo do IBGE também consta- tou que a Região Sul do país tem a despensa mais farta. A aquisição anual per capita de carnes (35,7 quilos), laticínios (67,4 quilos), bebidas e infusões (64,1 quilos), hortaliças (38,6 quilos), frutas (36,5 quilos) e alimentos preparados e misturas industriais (4,8 quilos) está acima das respectivas médias nacionais e de outras regiões. Para os pesquisadores, essa diferença pode ser explicada pelo hábito cul- tural, com aquisições mais fre- quentes e localização do domicílio próxima da área de trabalho – as pessoas vão em casa para almoçar. INTERATIVIDADE E o seu cardápio, como está? De que forma controla os gastos com comida? Escreva para [email protected] As cartas selecionadas serão publicadas na Coluna do Leitor. “O que está faltando é uma educação alimentar, uma política voltada para ensinar o cidadão a consumir mais legumes, mais frutas.” Edilson Nascimento Silva, gerente da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008/2009. “Essa mudança na alimentação reduz a quantidade de fibras, que são importantes para a prevenção de doenças.” Carlos Augusto Monteiro, professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).

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Capa do caderno Vida e Cidadania, Gazeta do Povo.

Transcript of Refeição feita em casa perde qualidade

Editor responsável: Sérgio Luis de Deus – [email protected]

Juventude

Pesquisa revela queda no consumo de drogas em escolaspágina 13

4 GAZETA DO POVOSexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Vida e Cidadania

Hortaliças

15,4 44,3

Frutas

14,3 59,3

Farinha de mandioca

8,4 1,9

Massas

4,1 6,1

Biscoitos

4,3 6,4

Iogurte

0,9 4,3

Sais e condimentos

4,1 7,1

Óleos e gorduras

7,6 9,9

Bebidas alcoólicas

2,1 19,2

Bebidas não alcoólicas

16,9 84,7

Alimentos preparadose misturas industriais

1,4 8,4

Carnes

17,9 31,9

Aves e ovos

14 18,3

Principais produtos consumidos,em quilos por ano

Açúcares, doces eprodutos de confeitarias

19,3 23,4

Leite de vaca pasteurizado

11,6 40,2

Pão francês

9,2 14

Feijão

10,3 7,3

Arroz

27,6 18,6

Famíliascom rendaaté R$ 830

Famílias comrenda superior

a R$ 6.225

O que obrasileiro

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Infografia: Gazeta do PovoFonte: IBGE.Infografia: Gazeta do PovoFonte: IBGE.

NA BALANÇA

A diferença noconsumo de caloriaspode ser explicada peloaumento das refeiçõesfora de casa.

2003

24,1%2009

31,1%

Refeições fora de casa,em % dos gastos com alimentação

Consumo diário de caloriasEm kcal por dia por pessoa

2003

1.791 kcal2009

1.611 kcal

60,6 59,263,6

55,3

Carboidratos

6,1 6,7 5,67,7

Proteínas animais

5,5 5,4 5,6 5,2Proteínas vegetais

27,8 28,725,2

31,8Gorduras

Origem das caloriasVeja em que grupos de alimentosestá concentrado o consumocalórico das refeições.% das calorias ingeridas por dia

Médianacional

Médianacional

20% maispobres

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2003 2009

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Feijão e arroz já não são tão populares no dia a dia

O que o brasileiro

come

z O feijão com arroz já não é mais o prato-símbolo do cardápio brasi-leiro. De 1975 para 2009, a compra desses itens caiu drasticamente, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O arroz polido teve redução de 60% na quantidade anual per capita adquirida – de 31,6 quilos para 12,6 quilos. A aquisição do feijão para consumo em casa passou de 14,7 quilos anuais para 7,4 quilos (redução de 49%). Já a compra do açúcar caiu de 15,8 quilos para 3,3 quilos (79% menor). Por outro lado, o consumo de refrigerante de guaraná saltou de 1,3 quilo anual per capita para 6 quilos.

A comparação foi feita entre as regiões metropolitanas de Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Curitiba, Porto Alegre, além de Brasília, levando-se em conta dados do Estudo Nacional de Despesa Familiar (Endef) (1974/1975) e do levantamento “Aquisição alimen-tar domiciliar per capita”. Para fins de padronização, as quantidades medidas em litros foram transfor-madas em quilos.

A mudança de hábito se reflete diretamente na saúde – levanta-mento divulgado pelo Ministério da Saúde na terça-feira passada aponta que entre 1996 e 1997 aumentaram em 10% as mortes provocadas por diabete, doença ligada ao excesso de peso. “Os car-boidratos complexos, como o arroz e o feijão, estão associados às fibras, que são importantes para prevenção de doenças. Essa mudança na alimentação, da tra-dicional para a industrializada, reduz a quantidade de fibras, que são importantes para a prevenção da doença cardiovascular, a diabe-te, da obesidade e de alguns tipos de câncer”, afirma o professor Carlos Augusto Monteiro, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).

A queda na compra desses itens básicos acentuou-se mais recente-mente. De 2003 para 2009, a aqui-sição anual de arroz polido caiu 40,5%; a de feijão, 26,4%; e a aqui-sição do açúcar refinado caiu 48,3%. Nesse mesmo período subiu o consumo de alimentos preparados e misturas industriais – o que não era computado na Endef. Hoje, a média nacional des-ses produtos está em 3,5 quilos anuais, alcançando 8,3 quilos entre os 20% mais ricos.

No carrinho do supermercado, o que ocupa maior espaço hoje são bebidas e infusões (a média domi-ciliar per capita é de 50,7 quilos), seguidas por laticínios (43,7 qui-los). Só então entram cereais e legu-minosas (39 quilos), frutas (28,9 quilos), hortaliças (27,1 quilos) e carnes (25,4 quilos). “Sem dúvida, a gente percebe uma mudança no cardápio do brasileiro”, afirma o gerente da Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008/2009, Edilson Nascimento Silva.

A alteração do hábito alimen-tar tem a ver com a falta de tempo, aponta o estudioso. “Hoje a gente se depara com famílias que pas-sam o dia todo fora de casa, não têm tempo de preparar o alimen-to, além do custo de ter uma empregada doméstica, ou cozi-nheira. É o efeito da alimentação fora. Outra questão é o uso da ali-mentação semipronta, que são rápidas, mas que amanhã podem trazer problemas à saúde”. (AE)

O levantamento “Aquisição alimentar domiciliar per capita” mostra um retrato nítido da desi-gualdade na mesa do brasileiro. Produtos como laticínios, frutas, verduras e legumes, gordura ani-mal, bebidas alcoólicas e refeições prontas são mais consumidos por aqueles que têm maior rendi-mento.

A carne bovina de primeira aparece pouco no cardápio dos mais pobres. O consumo de alcatra, por exemplo, foi de 200 gramas anuais per capita para aqueles com renda familiar de até R$ 830. Já os mais ricos (com ren-da acima de R$ 6.225) adquiriram 2,6 quilos – diferença de 1.200%.

O consumo de filé mignon chama ainda mais atenção – 8 gramas per capita para as meno-res rendas, ante 850 gramas entre os mais ricos. O consumo de carne de segunda, entretanto, foi equi-valente entre os dois grupos (6 quilos para a renda mais baixa, 6,2 quilos para a renda maior).

No caso da bebida alcoólica, a diferença foi de 799% – aqueles com menor renda compram 2,1 quilos anuais per capita, enquanto aqueles com rendimentos supe-riores compram 19,2 quilos. O consumo de alimentos preparados é 514% maior entre os mais ricos em relação aos mais pobres (8,4 quilos contra 1,3 quilo). O mesmo ocorre com bebidas não alcoólicas (401% de diferença), iogurtes (379%), frutas (316%), leite de vaca pasteurizado (246%).

Já arroz, feijão e farinha de mandioca foram mais adquiridos por aqueles com menor renda. Quem ganhava até R$ 830, adqui-riu 27,6 quilos de arroz e 10,6 quilos de feijão. Os que têm renda acima de R$ 6.225 compraram 18,6 qui-los e 7,3 quilos respectivamente. Já o cafezinho foi consumido por todas as classes com pouca variação. Aqueles com menor renda adquiriram 2,2 quilos de café moído; os de maior renda, 2,8 quilos. (AE)

z Gastos

Comida na mesa conforme cabe no bolso

Comportamento

Refeição feita em casa perde qualidadeEstudo mostra que

consumo de frutas

e verduras deixa a

desejar. Há abuso na

ingestão de açúcares

e gorduras. Falta

educação alimentar

rio de JaneiroAgência Estado

z O brasileiro está comendo mal em casa. As frutas e verduras, que deveriam corresponder a uma pro-porção entre 9% e 12% das calorias diárias ingeridas, representam apenas 2,8%. Já os açúcares livres equivalem a 16,4% das calorias disponíveis nas residências, quan-do a recomendação é de que fique em 10%. Os alimentos essencial-mente calóricos (óleos e gorduras vegetais, gordura animal, açúcar de mesa e refrigerantes) atingem 28% da caloria consumida. Entre os 20% mais ricos, o consumo des-ses alimentos ultrapassa a propor-ção recomendada por nutricionis-tas, de 30% – a porcentagem alcança 31,8%.

Os dados fazem parte do levan-tamento “Avaliação nutricional da disponibilidade domiciliar de ali-mentos no Brasil”, feito com base na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008/2009. Para chegar a essas informações, os téc-nicos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) anali-saram apenas os alimentos dispo-níveis nas residências, também divulgados ontem na pesquisa “Aquisição alimentar domiciliar per capita”.

“Está mal preparado o cardápio dos brasileiros”, afirma o gerente da POF, Edilson Nascimento Silva. “Há uma interferência na disponi-bilidade e preço dos produtos – frutas, legumes são normalmente alimentos de difícil acesso e o pre-ço interfere. As pessoas fazem opções por cardápio mais barato”, explica.

Silva ressaltou que a pesquisa demonstra que o consumo de pro-teína é satisfatório – 12,1% das calorias disponíveis diariamente, quando o ideal é entre 10% e 15%. “O que está faltando é uma educa-ção alimentar, uma política volta-da para ensinar o cidadão a consu-mir mais legumes, mais frutas”, complementa.

Ana Beatriz Vasconcellos, coor-denadora-geral da Política de Alimento e Nutrição do Ministério da Saúde, afirma que esse deve ser um esforço intersetorial, o que inclui o setor produtivo. “É preciso garantir a oferta melhor de ali-mentos: aumentar o crédito para que produtores façam com que suas frutas, verduras e legumes tenham condições de serem distri-buídas em todas as regiões. E a melhoria da qualidade dos ali-mentos industrializados – redu-ção da gordura, do sódio, do açú-car. É preciso o engajamento do setor produtivo.”

No período avaliado – de maio de 2008 a maio de 2009 –, a disponibilidade média per capi-ta de alimentos foi de 1.611 calo-rias. Na pesquisa anterior, era de 1.791. A diferença pode ser atri-buída aos alimentos consumidos fora de casa. Comparando-se os resultados atuais e os da POF anterior, de 2002/2003, a despesa com alimentação no domicílio caiu de 75,9% dos gastos mensais para 68,9%.

Calorias para todosO levantamento mostra ainda que o teor de ácidos graxos saturados, cujo consumo está associado a pro-blemas como doenças cardiovas-culares e diabete, está próximo do limite de 10% das calorias na faixa de renda que vai de R$ 2.491 a R$ 4.150 (9,1%) e de R$ 4.150 a R$ 6.225 (9,5%). A faixa de renda mais alta, acima de R$ 6.225, já ultrapassou o limite recomendado – chega a 10,6%.

Em relação à pesquisa anterior, a POF 2008/2009 mostra ainda o crescimento da participação no total de calorias de alimentos como pão francês (13% a mais), bis-coito (10%), queijos (16%), refrige-rantes (16%), bebidas alcoólicas (28%) e refeições industrializadas (40%). Por outro lado, registraram redução em alimentos como arroz (queda de 6%), feijões (18%), fari-nha de trigo (25%), leite (10%) e açúcar (8%).

região sulO estudo do IBGE também consta-tou que a Região Sul do país tem a despensa mais farta. A aquisição anual per capita de carnes (35,7 quilos), laticínios (67,4 quilos), bebidas e infusões (64,1 quilos), hortaliças (38,6 quilos), frutas (36,5 quilos) e alimentos preparados e misturas industriais (4,8 quilos) está acima das respectivas médias nacionais e de outras regiões. Para os pesquisadores, essa diferença pode ser explicada pelo hábito cul-tural, com aquisições mais fre-quentes e localização do domicílio próxima da área de trabalho – as pessoas vão em casa para almoçar.

interatividade

E o seu cardápio, como está? De que forma controla os gastos com comida?

Escreva [email protected] cartas selecionadas serão publicadas na Coluna do Leitor.

“O que está faltando é uma educação alimentar, uma política voltada para ensinar o cidadão a consumir mais legumes, mais frutas.”

edilson nascimento silva, gerente da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008/2009.

“Essa mudança na alimentação reduz a quantidade de fibras, que são importantes para a prevenção de doenças.”

Carlos augusto monteiro, professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).