Resposta à Petição "( NÃO) PROGRESSÃO NA CARREIRA EM 2010"

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Q-6563/2014 (UT6) I Lida a exposição remetida por V.ª Ex.ª, devo esclarecer que, a seu tempo, foi conscientemente tomada a decisão de apenas suscitar, junto do Tribunal Constitucional, a situação daqueles professores que, à data da entrada em vigor das alterações introduzidas pelo diploma em epígrafe no Estatuto da Carreira Docente (ECD), estivessem integrados na categoria de professor titular. Na verdade, apenas em relação aos mesmos se colocava a questão da ultrapassagem de docentes com maior antiguidade no índice remuneratório detido na data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 75/2010 (concretamente, no índice 245). Assim, a perversidade da solução contida no artigo 8.º, n.º 1, do referido diploma, face ao disposto no artigo 7.º, n.º 2, b), restringia-se aos professores titulares, por ser aos docentes com esta categoria que explicitamente se dirigia esta última norma, por essa via criando-se o referido efeito de ultrapassagem, cœteris paribus. A situação descrita, que em termos finais foi corroborada pelo Tribunal Constitucional, muito embora se admitisse a viabilidade de a inconstitucionalidade ser eliminada por via da cláusula de salvaguarda contida no artigo 10.º do mesmo diploma, em caso algum poderia ser transposta para os docentes que, preenchendo a previsão do artigo 8.º, n.º 1, não fossem professores titulares por, quanto a estes (docentes na antiga categoria de professor), não existir norma que permitisse ou impusesse a inversão de posições remuneratórias. II V.ª Ex.ª parece, contudo, fazer referência a assunto diverso. Assim, suponho que estará em causa, para docentes que completaram o tempo de serviço necessário à progressão até 31 de dezembro de 2010 (data em que se iniciou o congelamento das progressões, sucessivamente prorrogado até à atualidade), a circunstância de se continuar a exigir, após a data de entrada

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Q-6563/2014 (UT6)

 

I

Lida a exposição remetida por V.ª Ex.ª, devo esclarecer que, a seu tempo, foi conscientemente tomada a decisão de apenas suscitar, junto do Tribunal Constitucional,  a situação daqueles professores que,  à data da entrada em vigor das alterações  introduzidas pelo diploma em epígrafe   no   Estatuto   da   Carreira   Docente   (ECD),   estivessem   integrados   na   categoria   de professor titular.

Na  verdade,  apenas  em relação  aos  mesmos  se  colocava  a  questão  da  ultrapassagem de docentes com maior antiguidade no índice remuneratório detido na data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 75/2010 (concretamente, no índice 245).

Assim, a perversidade da solução contida no artigo 8.º, n.º 1, do referido diploma, face ao disposto no artigo 7.º, n.º 2, b), restringia-se aos professores titulares, por ser aos docentes com esta categoria que explicitamente se dirigia esta última norma, por essa via criando-se o referido efeito de ultrapassagem, cœteris paribus.

A situação descrita, que em termos finais foi corroborada pelo Tribunal Constitucional, muito embora se admitisse a viabilidade de a inconstitucionalidade ser eliminada por via da cláusula de   salvaguarda   contida   no   artigo   10.º   do  mesmo   diploma,   em   caso   algum   poderia   ser transposta para os docentes que, preenchendo a previsão do artigo 8.º, n.º 1, não fossem professores  titulares  por,  quanto a estes   (docentes  na antiga categoria  de professor),  não existir norma que permitisse ou impusesse a inversão de posições remuneratórias.

 

II

V.ª Ex.ª parece, contudo, fazer referência a assunto diverso. Assim, suponho que estará em causa, para docentes que completaram o tempo de serviço necessário à progressão até 31 de dezembro de 2010 (data em que se iniciou o congelamento das progressões, sucessivamente prorrogado até à atualidade), a circunstância de se continuar a exigir, após a data de entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 75/2010, a realização de avaliação intercalar.

Esta  questão  foi   já  apreciada,  em momento oportuno,  pelo  Provedor  de  Justiça,  após  ser recebido um conjunto de queixas  de docentes  que apresentavam, em comum, a  seguinte situação de facto:

a)      Os docentes encontram-se posicionados no atual 6.º escalão, índice remuneratório 245;

b)      Completaram 4 anos de serviço docente neste escalão em 2010, designadamente em data anterior a 1 de setembro desse ano;

c)      Obtiveram avaliação do desempenho no ciclo avaliativo 2007-2009 mínima de Bom e na última avaliação do desempenho realizada nos termos previstos no Decreto Regulamentar n.º 11/98, de 15 de maio, obtiveram a classificação de Satisfaz;

d)     Não obstante, os docentes não viram o escalão remuneratório alterado em 2010,

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Apreciadas estas queixas à luz do quadro legal pertinente, o Provedor de Justiça defendeu junto da Administração Educativa o seguinte :

É isento de dúvida que os docentes têm direito a ver contabilizado, para efeitos de progressão, todo o tempo de serviço correspondente ao posicionamento no índice 245, sem prejuízo do desconto  associado ao período entre  30.08.2005  e  31.12.2007,  por   força  do  disposto  nos artigos 10.º, ns. 8 e 14, do Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de janeiro, artigo 7.º, nºs. 1, 4 e 5, do Decreto-Lei n.º 75/2010, de 23 de junho, artigos 1.º e 4.º da Lei n.º 43/2005, de 29 de agosto, e artigos 1.º e 2.º da Lei n.º 53-C/2006, de 29 de dezembro.

De acordo com o ECD, na versão do Decreto-Lei n.º 270/2009, de 30 de setembro, vigente desde 1.10.2009, a progressão na carreira docente dependia, na categoria de professor, 6.º escalão, índice 245:

a) Da permanência de 6 anos de serviço docente efetivo no escalão imediatamente anterior;

b)De, pelo menos, dois períodos de avaliação de desempenho em que seja atribuída a menção qualitativa mínima de Bom;

c) Da frequência, com aproveitamento, de módulos de formação contínua que, no período em avaliação, correspondam em média a 25 horas anuais (cfr., respetivamente, artigos 1.º e 11.º do Decreto-Lei n.º 270/2009, e artigo 37.º, nºs. 2, alínea a) e 5, alínea a), iii), do ECD).

A par do regime geral de progressão, o mesmo Decreto-Lei n.º 270/2009 consagrou um regime transitório de progressão ao escalão seguinte, até ao final do 2.º ciclo de avaliação (2009-2011), isto tendo em conta que a avaliação do desempenho dos docentes se realiza no final de cada  período  de  dois  anos  escolares  e  que  o  ano  escolar  de  2009/2010  correspondia  ao primeiro ano do segundo ciclo de avaliação iniciado.

Este  regime transitório,  abrangendo os  docentes  que preenchessem o  requisito   (geral)  de tempo de serviço nos anos civis de 2009 e de 2010, consagrou justamente especialidades em matéria de avaliação. Exigindo, em qualquer caso, a avaliação no ciclo de 2007-2009 e que esta não fosse inferior a Bom, quanto aos docentes que preenchessem o requisito de tempo em 2009,   admitiu   que   lhes   fosse   considerada   a   avaliação   obtida   nos   termos   do   Decreto Regulamentar n.º 11/98, de 15 de maio, desde que igual ou superior a Satisfaz; quanto aos demais, previu que, mediante requerimento, tivesse lugar a apreciação intercalar do respetivo desempenho [cfr. artigo 7.º, nº. 6, alíneas a) e b), do Decreto-Lei n.º 270/2009].

Esta versão do ECD veio, entretanto, a ser alterada pelo Decreto-Lei n.º 75/2010, de 23 de junho,  que entrou em vigor   logo em 24.06.2010  (cfr.  artigos  1  e  19.º).  Nos   termos deste regime, a progressão depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos gerais:

a)      Permanência   de   um   período   mínimo   de   serviço   docente   efetivo   no   escalão imediatamente anterior;

b)      Atribuição, nas duas últimas avaliações, de menções qualitativas não inferiores a Bom;

c)      Frequência,   com aproveitamento,   de  determinado  número  de  módulos  de   formação contínua (cfr. artigo 37.º, n.º 2, do ECD).

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Para a progressão ao 7.º  escalão,  que é  o que estava em causa,  esse período mínimo de serviço docente efetivo passou a ser de 4 anos, exigindo-se, ainda, a obtenção de vaga [cfr. artigo 37.º, nºs. 3, alínea b), e 5, do ECD].

Todavia, para salvaguarda das expectativas daqueles docentes que, no momento da entrada em vigor do diploma, se encontravam prestes a reunir os requisitos gerais para progressão, a obtenção de vaga foi apenas exigível aos que preencheram aqueles requisitos a partir do início do ano escolar de 2010-2011, ou seja, a partir de 01.09.2010 (cfr. artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 75/2010).

Neste condicionalismo, parece poder concluir-se, desde logo, que os docentes não reuniam o requisito de tempo de serviço docente exigido para progredir de acordo com o regime geral do ECD, na versão do Decreto-Lei n.º 270/2009, nem de acordo com o regime transitório deste diploma. Na verdade, em qualquer dos regimes, teriam de completar 6 anos de tempo de serviço docente no índice 245, o que, de facto, não aconteceu.

Já  de acordo com o regime geral  de progressão do Decreto-Lei  n.º  75/2010,  a  conclusão, quanto   ao   requisito   de   tempo   de   serviço,   é   diversa,   na   medida   em   que   os   docentes completaram 4 anos de tempo de serviço docente no  índice 245 em momento anterior  a 1.9.2010.  No   que   respeita   ao   requisito   da   avaliação   do   desempenho,   a   progressão   está dependente do cumprimento da exigência contida no artigo 37.º, n.º 2, alínea b), do ECD, ou seja, a atribuição, nas duas últimas avaliações, de menções qualitativas não inferiores a Bom.

Nesta matéria,  esclareceu a Direção-Geral  dos Recursos Humanos da Educação, através da Circular n.º B10050664R, de 3.12.2010, no seu ponto 22, que “os docentes em situação de progredir até 31 de dezembro 2010 que dispõem unicamente da avaliação do desempenho do ciclo avaliativo de 2007/2009 podem mobilizar a última classificação obtida nos termos do Decreto-Regulamentar n.º 11/98, de 15 de maio, face ao estipulado no artigo 16.º do Decreto-Lei 15/2007, com exceção dos docentes a quem se aplica a Apreciação Intercalar”.

Entendeu-se,   ainda,   que,   nestes   casos,   não   devia   aplicar-se   a   exigência   de   avaliação  por apreciação intercalar constante do artiga 7.º, nº. 6, alínea b), do Decreto-Lei n.º 270/2009.

Assim,   como   se  demonstrou,   apenas   com as   alterações   introduzidas  pelo  Decreto-Lei   n.º 75/2010 no regime de progressão na carreira,  os docentes passaram a reunir as condições para progredir ao escalão seguinte. Ou seja, os docentes não reuniam o requisito de tempo de serviço docente exigido para progredir de acordo com o regime geral do ECD, na versão do Decreto-Lei   n.º   270/2009,   nem  de   acordo   com  o   regime   transitório   deste   diploma.  Não integraram,  por   isso,  o  âmbito  de  aplicação  dos  docentes   sujeitos  à  apreciação   intercalar prevista no Decreto-Lei n.º 270/2009.

Já de acordo com o regime geral de progressão do Decreto-Lei n.º 75/2010, e no que respeita ao   requisito   da   avaliação   do   desempenho,   a   progressão   está   dependente   tão   só   do cumprimento da exigência contida no artigo 37.º, n.º 2, alínea b), do ECD, ou seja, a atribuição, nas duas últimas avaliações, de menções qualitativas não inferiores a Bom.

Assim,  no  entendimento  deste  órgão do  Estado,  nem todos os docentes em situação de progredir até 31.12.2010 ficaram sujeitos à apreciação intercalar:  esta apenas se aplicou a quem reuniria, em 2010, condições para progredir nos termos do Decreto-Lei n.º 270/2009. Com efeito, o diploma que se lhe seguiu – o Decreto-Lei n.º 75/2010 – regulando, de forma 

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global  as  condições  de  progressão,  quer  no   regime-regra,  quer  no   transitório,  não  incluiu qualquer   exigência   relativa   à   avaliação   intercalar. De   onde   se   conclui   que   esta   não   era aplicável a todas as situações em que a progressão seria possível até ao final de 2010, mas apenas – o que se defendeu – às que integravam o âmbito de aplicação da norma que previu esse meio de suprimento da avaliação. Em todos as demais, manteve aplicação o artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 15/2007, acima referido.

Uma vez  que  os  docentes   reuniram,  em 2010,  os   requisitos  para  progressão  na   carreira, quanto   a   tempo   de   serviço   e   avaliação   do   desempenho, entendeu-se que os mesmos deveriam ser reposicionados no escalão seguinte àquele em que se encontram, com efeitos reportados ao dia 1 do mês seguinte àquele em que completaram o tempo de serviço necessário (artigo 37.º do ECD).

Transmitida tal posição à Administração Educativa, esta manifestou a sua discordância, fundamentada em síntese na consideração de que o regime transitório do Decreto-Lei n.º 270/2009, e a exigência aqui ínsita de submissão a apreciação intercalar, era aplicável aos docentes na situação descrita, posição em que se ancorou o membro do Governo pertinente no indeferimento dos pedidos formulados pelos docentes em questão.

Tornou-se,   pois   forçoso   reconhecer   que   não   logrou   este   órgão   do   Estado   convencer   a Administração Educativa no sentido de vir a corrigir a atuação contestada.

Entendeu-se,   assim,   que   se   encontravam  esgotadas   as   possibilidades   de   intervenção   útil quanto à questão enunciada.

Supondo que corresponderá a situação descrita àquela que parece ser evidenciada por V.ª Ex.ª, espero ter sido esclarecedora.

Apresento a V.ª Ex.ª os melhores cumprimentos,

Helena Vera-Cruz Pinto Provedor de Justiça

Provedora-Adjunta de Justiça www.provedor-jus.pt

[email protected] R. do Pau de Bandeira, n.º 9

  1249-088 Lisboa

Fax.: +351 21 392 66 53 Tel.: +351 21 392 66 00