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A Incorporação da Metodologia Hermenêutica... - Fobe
Revista Diálogos – N.° 21 – Mar. / Abr. - 2019
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A incorporação da metodologia hermenêutica na exegese bíblica
contemporânea.*
Jean Luc Fobe – PUC-SP1
Resumo.
A exegese na Teologia Bíblica tem a proposta da compreensão
plena dos textos das sagradas escrituras empregando as ferramentas
estruturalista e histórico gramatical. A hermenêutica corresponde ao
envolvimento racional cognitivo e emocional do seu intérprete, e
deslocando o seu significado para o leitor contemporâneo de forma
relevante. A distinção entre exegese e hermenêutica se faz
historicamente a partir da reforma com a valorização do sentido original
do texto das escrituras. A hermenêutica contemporânea ou filosófica se
desenvolve historicamente a partir do século XIX sendo aplicada
diretamente a interpretação bíblica. A metodologia hermenêutica
moderna desenvolvida desde Schleiermacher é apresentada
evolutivamente, com sentido crítico na incorporação de ferramentas para hermenêutica exegética contemporânea, capacitando o estudioso
das escrituras a se aproximar mais do sentido original e sensus plenior
dos textos das sagradas escrituras. As ferramentas ou chaves
hermenêuticas contemporâneas são apresentadas no processo de
incorporação metodológica do exegeta aumentando a sua compreensão
da Teologia Bíblica.
Palavras chaves: Hermenêutica Bíblica, Exegese Bíblica, método
hermenêutico exegético, integração exegese e hermenêutica.
1 Jean Luc Fobe, mestrando em Teologia pela Pontífícia Universidade Católica de São
Paulo. [email protected]
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The incorporation of hermeneuticla methodology in contemporary
biblical exegesis.*
Abstract. Exegesis in Biblical Theology has the proposition of full
understanding of the texts of the sacred scriptures employing the
structuralist and grammatical historical tools. Hermeneutics
corresponds to the cognitive and emotional rational involvement of its
interpreter, and shifting its meaning to the contemporary reader in a
relevant way. The distinction between exegesis and hermeneutics is
made historically from the reform with the appreciation of the original
sense of the text of the scriptures. Contemporary or philosophical
hermeneutics develops historically from the nineteenth century and is
actually applied to biblical interpretation. The modern hermeneutic
methodology developed since Schleiermacher is presented, with a
critical sense in the incorporation of tools for contemporary exegetical
hermeneutics, enabling the student of the scriptures to come closer122
to the original sense and sensus plenior of the texts of the sacred
scriptures. Contemporary hermeneutic tools or keys are presented in the
process of methodological incorporation of the exegete by increasing
their understanding of Biblical Theology.
Key words: Biblical Hermeneutics, Biblical Exegesis, exegetical
hermeneutic method, exegesis integration and hermeneutics.
A teologia bíblica e a exegese. A Teologia Bíblica (TB) tem como propósito a compreensão
teológica na sua essência propositiva ou sentido original, analisando os
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seus aspetos históricos e geográficos textuais imediatos, a compreensão
do seu leitor inicial, buscando o sentido original desvinculado de
aspectos dogmáticos ou doutrinários preconcebidos.
Classicamente a TB envolve dois processos distintos, sincrônico
implicando uma análise exegética do texto bíblico isolado ou no seu
contexto imediato, e o método diacrônico com intertextualidade
considerando a unidade teológica bíblica e a revelação progressiva
sobrenatural2.
A exegese é definida como um comentário ou dissertação de um
texto ou palavra para o seu esclarecimento, obtendo uma minuciosa
compreensão, descrição ou explicação.
A exegese bíblica é o processo na obtenção da explicação e
interpretação do texto bíblico principalmente no seu contexto imediato
criativo para o seu leitor imediato.
A compreensão do meio histórico narrativo, a complexidade
literária imediato temporal com a transposição para o leitor
contemporâneo é o objetivo primário da exegese bíblica, seguindo-se da
identificação da intenção primária do emissor e do texto, e qual é a
reflexão teológica revivida pelo leitor contemporâneo3.
A hermenêutica aborda a interpretação do texto para o leitor
atual, não necessariamente abordando o seu significado imediato,
promovendo uma abertura de possibilidades teológicas de acordo com a
necessidade do receptor da mensagem contemporânea.
A hermenêutica bíblica é considerada como a ciência e arte da
interpretação dos textos das sagradas escrituras, implicando em um
envolvimento racional cognitivo e emocional do seu intérprete, e
2 . GOLDSWORTHY, Graeme. “Biblical Theology and Hermeneutics.”
Southern Baptist Journal of Theology. 2006, 10 (2), p. 4-18. 3
. WEGNER. Uwe Exegese do Novo Testamento. Editora Sinodal. São
Leopoldo, Brasil, p. 11-13, 2001.
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deslocando o seu significado para o leitor contemporâneo de forma
relevante.
A distinção entre a exegese e a hermenêutica, historicamente, se
mantém até a influência do Iluminismo com a Reforma que passa a
incorporar a interpretação histórico gramatical, com elementos da
hermenêutica contemporânea, preservando a essência da busca da
interpretação original4.
A evolução histórica da hermenêutica influência diretamente os
princípios da exegese mantendo a base estruturalista e o método
histórico gramatical, com uma evolução na leitura hermenêutica
4/20
do texto, tornando relevante o texto bíblico para o tempo
presente, deslocando a mensagem teológica para a contemporaneidade.
A busca do sentido original e do sensus plenior da revelação das
escrituras sagradas contínua a ser o objeto da exegese5, e de uma
hermenêutica exegética se adaptando a progressão do pensamento pós-
moderno.
A evolução da exegese a partir da interpretação histórico
gramatical tem se voltado para a incorporação dos princípios
hermenêuticos modernos, abrindo a possibilidade da associação das
duas metodologias, o que pode ser nomeado de hermenêutica exegética.
O referencial metodológico da exegese contemporânea evoluiu
progressivamente da fundamentalista, estruturalista, e histórico-crítico,
4. CAHILL, Michal. The History of Exegesis and our Theological Future.
Theological Studies . 2000, 61, p. 332-347. 5. VIRKLER, Henry A; AYAYO, Kerelynne Gerber. Hermeneutics. Baker
Academic, Grand Rapids, USA, p. 24, 2007.
2. WEGNER. Uwe Exegese do Novo Testamento. Editora Sinodal. São
Leopoldo, Brasil, p. 15-23, 2001.
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até a influência da hermenêutica simbólica, interpretativa textual, e a
aplicação de uma metodologia desconstrutivista.
O método fundamentalista considera o texto impassível de
relação com a realidade atual, e que o leitor deve se adaptar sem
interação com a revelação das escrituras. A hermenêutica exegética
fundamentalista considera que a revelação do texto bíblico deve
incorporar uma interpretação literal independente da forma literária.
A metodologia estruturalista pressupõe uma análise sincrônica
do texto bíblico buscando a sua inserção imediata literária, e
particularmente a análise literária e das formas. O estruturalismo tem a
limitação, isoladamente, de permanecer somente no texto sem o objeto
da aplicação para o leitor.
O método histórico-crítico tem origem a partir do liberalismo
alemão com a aplicação das ciências humanas e da religião no sentido
amplo, e o mais empregado nas análises diacrônicas. Esta metodologia
identifica o texto bíblico fazendo parte de uma manifestação cultural
histórica e passível de questionamentos como qualquer texto histórico e
escrito.
A metodologia atual da exegese contemporânea ou hermenêutica
exegética incorpora elementos do método estruturalista e do método
histórico-crítico, também chamada baixa e alta crítica respectivamente,
buscando a incorporação dos elementos evolutivos históricos da
hermenêutica, tornando o texto das escrituras compreendido
historicamente com aplicação relevante para o leitor contemporâneo.
Evitando a secularização do método histórico-crítico, que
incorpora o liberalismo alemão e dá margem a interpretação das
escrituras como manifestação cultural e religiosa temporal e geográfica,
se tem incorporado os princípios da exegese teológica de Barth e a
canônica de
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Childs6, incorporando os elementos positivos da alta crítica, sem
promover um questionamento da essência da fé cristã. A incorporação das metodologias histórico-crítica e
estruturalista recebe a designação de método histórico gramatical, que é
a base fundamental da hermenêutica exegética. O texto para estudo exegético segue as linhas gerais da crítica
textual, quando existem variantes textuais como menor extensão e datação
mais antiga. O método histórico gramatical delimita o texto, as palavras
principais de perícope com análise dos verbos, personagens envolvidos,
qual o motivo do texto, situação espacial e geográfica, o porquê e de
que maneira, estrutura da passagem, tipo de linguagem empregada,
simbologia, cronologia dos eventos7.
O contexto histórico e cultural em conjunto com análise literária
e gramatical fazem parte da busca do sentido original do texto. A análise
exegética do texto inclui análise léxica, morfológica, estilística, sintática,
literária e teológica. O método histórico gramatical procura identificar
através do estudo do texto e seu contexto de elaboração a mensagem do
autor, e a sua apropriada compreensão para o leitor imediato da
mensagem. A metodologia histórico-crítica empregada na exegese traz a
necessidade de aplicação da interpretação do sentido do texto.
A aplicação dos princípios hermenêuticos em conjunto com a
metodologia histórico crítica favorece uma aplicação da mensagem do
texto contextualizada, sem a perda do sentido original ou sensus plenior.
A hermenêutica moderna ou contemporânea aborda o texto
escrito e o seu processo interpretativo, com os seus aspectos verbais e
não verbais, aplicando o estudo do significado, a filosofia da linguagem
e a semiótica.
6
. SCALISE, Charles J. Canonical Hermeneutics: Childs and Barth.
Scottish Journal of Theology. Feb 1994, 47, p. 61-88. 7. KUNZ, Claiton André. Método histórico-gramatical. In: Via teológica.
Curitiba: FTBP, 2008. Nº 16 (2), p. 23-53.
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A epistemologia da hermenêutica, fenomenologia da
interpretação, da comunicação e da linguagem tem sido aplicada na
interpretação textual bíblica objetivando o aprofundamento e relevância
da mensagem teológica das escrituras8.
A fenomenologia da comunicação verbal aplicada a
interpretação bíblica de centralizada no emissor, na mensagem e no
receptor, tem progressão histórica na hermenêutica das sagradas
escrituras.
O método histórico-crítico, sincrônico, centraliza a compreensão
da origem e produção do texto, o mundo e o tempo atrás do texto, e as
circunstâncias do autor. O estruturalismo diacrônico é uma mudança do
método histórico-crítico promovendo uma mudança para autonomia
isolada do texto. O texto, a partir da análise estruturalista, se
autolegitima e se torna o foco central do processo de comunicação. O
leitor passa a ser o centro do estudo hermenêutico a partir do processo
interpretativo no século XX, com análises diferentes, se valorizando as
relações do texto com o autor.
O desafio da hermenêutica moderna é que os três métodos de
análise do texto baseado na centralização isolada, são insuficientes
isoladamente no aprofundamento do sentido do texto, com manutenção
do seu original. A perspectiva atual é considerar o texto bíblico como
ato de comunicação literária entre o autor e o texto, motivando uma
interpretação da interação com o leitor. A hermenêutica geral associada
a metodologia literária possibilita uma interpretação teológica relevante.
O presente trabalho faz a descrição dos elementos progressistas
da hermenêutica com a perspectiva de sua incorporação pragmática ao
método exegético buscando uma fusão entre exegese e hermenêutica,
ou uma hermenêutica exegética.
8. VAN DER MERWE, D. ‘Reading the Bible in the 21st century: Some
hermeneutical principles: Part 1’, Verbum et Ecclesia. . 2015, 36(1), p. 1-8.
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A incorporação metodológica da exegese com a hermenêutica
não é de toda estranha, já tendo Bultmann abordado a proximidade das
duas9.
A hermenêutica exegética como fundamentação teórica
metodologia possibilita uma sólida compreensão história gramatical do
texto, e uma compreensão relevante contemporânea para o leitor com
consequente busca de uma reflexão teológica aprofundada.
Evolução contemporânea da hermenêutica. A hermenêutica contemporânea tem uma evolução histórica
progressiva a partir Schleiermacher e Dilthey, com a hermenêutica
fenomenológica e existencialista (Husserl e Heidegger), filosófica de
Gadamer, fenomenológica de Ricouer, crítica de Habermas,
estruturalismo contemporâneo de Patte, desconstrutivismo de Derrida,
teologia dialética e exegética de Barth e Bultmann, teologia
hermenêutica de Thieselton e Vanhoozer, e hermenêutica literária de
Culpepper e Moore.
A interpretação bíblica contemporânea tem sua origem com
Daniel Ernst Schleiermacher (1768-1834) com a sua proposta inovadora
na época, que inicia a ruptura dos conceitos de emissor, mensagem e
receptor como independentes, propondo que o ser humano tem uma
disposição linguística como essência existencial. A interpretação tem
potencialmente dois aspectos o gramatical e o psicológico. O aspecto
gramatical da interpretação corresponde ao contesto da compreensão do
texto em todas as suas dimensões, adquirindo a palavra um sentido que
lhe é próprio. O aspecto psicológico do texto é a reação emocional
induzida no leitor, além da simples compreensão racional. A
compreensão do discurso envolve dois momentos, o da compreensão e
o da interpretação particular existencial. A hermenêutica a partir de
9. PATTE. Daniel. What is Structural Exegesis. Wipf and Stock Publishers,
Eugene, Oregon, USA, p. 4, 1976.
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Schleiermacher passa a analisar o texto como uma condição existencial
do leitor em busca de uma interpretação10
.
A inovação de Schleiermacher é abordar a hermenêutica como
um processo complexo que envolve a mediação entre o sistema
linguístico de composição do texto e uma mensagem particular
individual, com interação entre uma comparação linguística e uma
abordagem psicológica. Se faz um processo comparativo com estruturas
de linguagem contemporâneas promovendo atualização pragmática do
texto11
.
Os conceitos de Schleiermacher foram retomados posteriormen-
te pelo filósofo Wilhelm Dilthey (1833-1911), que popularizou a teoria
da compreensão geral proposta previamente com a terminologia de cír-
culo hermenêutico, simbologismo iniciada por Shleiermacher até Hei-
degger, indicando que a compreensão textual se move constantemente
entre as partes na procura da plena compreensão do sentido12
.
O processo interpretativo é o continente verbal linguístico
responsável na determinação do sentido do texto. O texto deve ser
interpretado no seu conjunto a partir da análise individual de cada
elemento constitutivo. A hermenêutica é considerada uma necessidade
epistemológica e não filológica. A textualização tem um contexto
histórico com o registro existencial e pessoal como manifestação
cultural. A hermenêutica filosoficamente adquire uma perspectiva meta
teórica para compreender as experiências humanas demonstradas em
uma expressão linguística. A hermenêutica histórica e epistemológica
adquire um aspecto histórico existencial do autor e do escritor que
10. RICOEUR, Paul. "Schleiermacher's Hermeneutics." The Monist, 1977,
vol. 60 (2), p. 81-97. 11. LANDA, Garcia; ANGEL, José. Retroactive Thematization, Interaction,
and Interpretation: The Hermeneutic Spiral from Schleiermacher to
Goffman. Belgian English Language and Literature. 2004 (2), p. 155-166. 12
. KEANE, Nial; LAWN, Chris. The Blackwell Companion to
Hermeneutics, First Edition. John Wiley & Sons, Inc. West Sussex, UK,
2016.
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necessitam ser compreendidos. Dilthey amplia o conceito de uma
hermenêutica existencial da própria pessoa, e a desloca uma
cosmovisão atual da existência humana e os seus rumos. O texto é
analisado no seu contexto imediato histórico, geográfico, gramatical, a
percepção do leitor inicial e as suas consequências para a época. O texto
deve ser compreendido pela visão existencial do seu autor na mensagem
e na sua contextualização, o leitor adquire a compreensão do sentido
original pela visão do escritor13,14
A fenomenologia hermenêutica de Martin Heidegger (1889-
1976) e reflexiva de Edmund Husserl (1859-1938) avança no processo
da compreensão hermenêutica contemporânea. A visão de Heidegger é
da compreensão do texto com a conscientização como objeto da
reflexão da existência humana ou uma experiência pessoal, com a
crítica do historicismo e psicologismo, baseados na lógica da análise da
intencionalidade. A teoria reflexiva de Husserl é orientada para o
aspecto teórico do texto e não para as dimensões das experiências
vividas pelo autor ou leitor 15
. As duas visões distintas hermenêuticas
propostas por Heidegger e Husserl em conjunto permitem uma análise
dialética da hermenêutica, uma visão ontológica do autor e receptor,
associada a análise do texto. Na figura do círculo hermenêutico de
Heidegger o leitor entra no mundo criado pelo texto e incorpora a sua
mensagem.
Hans-Georg Gadamer (1900-2002) faz uma reformulação dos
conceitos de Heidegger e Dilthey deslocando a hermenêutica para uma
manifestação ontológica do homem a partir da linguagem, ampliando o
13. DILTHEY, Wilhem; JAMESON, Frederic. The Rise of Hermeneutics
New Literary History. 1972, Vol. 3 (2), p. 229-244. 14. MAKKREEL, Rudolf. "Wilhelm Dilthey", The Stanford Encyclopedia
of Philosophy. (Fall 2016 Edition), Edward N. Zalta (ed.), URL =
<https://plato.stanford.edu/archives/fall2016/entries/dilthey/>. 15
. Von HERRMANN, Friedrich-Wilhelm. Hermeneutics and Reflection:
Heidegger and Husserl on the Concept of Phenomenology, Kenneth Maly
(tr.), Toronto University Press, 2013.
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sentido do círculo hermenêutico para uma metáfora do diálogo com a
fusão com a comunicação. O universo linguístico torna possível
reconstruir o sentido original no tempo e no espaço da existência
humana, mais do que o texto e sua mensagem, a hermenêutica propicia
o conhecimento das pessoas. A historicidade na interpretação do texto
transcende o ser humano e recobra a força da tradição. Quando se
obtém um sentido ontológico, historicamente valido, estamos diante do
seu significado. A hermenêutica transcende também o aspecto histórico
e gramatical do texto e torna relevante a experiência contemporânea do
receptor. A história vivida passa a ser experiência na tradição, e é
aplicável para o leitor distante. A experiência do leitor é mais relevante
do que o texto isoladamente ou do autor16
.
Paul Ricouer (193-2005) propõem que a interpretação seja
direcionada para o texto como elemento essencial no processo
hermenêutico. A hermenêutica incorpora uma tensão entre as intenções
subjetivas iniciais do autor e o significado objetivo percebido pelo leitor.
O texto adquire um processo existencial próprio, além do aspecto da
tradição de Scheleimacher, do aspecto da historicidade de Dilthey, da
ontologia do leitor de Heidegger e interage com o conceito do círculo
hermenêutico de Gadamer. A teoria hermenêutica de Ricouer dá vida
própria ao mundo do texto. O leitor é influenciado pelo texto e passa a
ser transformado por ele. A interação texto e leitor é
epistemologicamente independente do propósito inicial do escritor, e
transcende o tempo e a cultura, o texto passa ter vida autônoma e
independente. Existe um distanciamento dialético da criação do texto e
a sua leitura, especialmente na literatura ficcional em que adquire vida
própria. A interpretação estruturalista do texto é preterida com uma
interação com a própria psique do leitor. A interpretação
16 . REGAN, Paul. Hans-Georg Gadamer’s philosophical hermeneutics:
Concepts of reading, understanding and interpretation. META:
RESEARCH IN HERMENEUTICS , PHENOMENOLOGY , AND
PRACTICAL PHILOSOPHY. Dec 2012 ,Vol IV (2), p. 286-303.
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fenomenológica de Paulo Ricouer materializa a ruptura entre o
significante inicial e aquele dado pelo leitor. A metodologia filosófica
hermenêutica é centrada em três fases de um arco: explicação,
compreensão e apropriação17
.
A articulação entre a hermenêutica bíblica e a filosófica é a
interpretação de um corpo textual com a incorporação de simbologia do
próprio texto. A prática existencial aproxima a hermenêutica bíblica e a
filosófica com a mudança do comportamento, a religiosidade promove a
regeneração da vontade e uma capacidade criativa da imaginação. A
dialética entre filosofia e fé é poética existencial, e é uma argumentação
racional. A ética é ontológica, a partir da interação entre fé e razão. O
terceiro ponto de contato entre a hermenêutica bíblica e filosófica é conceitual e especulativa, com base neoplatônica e Aristotélica. O
simbolismo religioso do mal e sua fenomenologia na condição no
mundo ocidental tem reflexo direto na hermenêutica a partir da leitura
do receptor. Paul Ricoeur vai além da perspectiva de Heidegger, que
considerou o homem essencialmente dependente da linguagem como
conhecimento pessoal e de relacionamento. A linguagem é manifestação
única e pessoal que pode ser compreendida por outros. A linguagem
incorpora símbolos dentro da perspectiva de comunicação que vai além
do seu significado imediato18
.
A hermenêutica crítica de Jürgen Habermas (1929-) aborda os
limites do preconceito do leitor no processo de interpretação do texto. A
interpretação do texto é dependente da capacidade do leitor de interagir
com os seus pressupostos ideológicos. Existe uma barreira a ser
transporta de maneira racional pelo leitor com a mensagem do texto, e
indiretamente do emissor. O texto pode ser submetido a um processo de
17
. GHASEMI, A et al. Ricoeur’s Theory of Interpretation: A Method for
Understanding Text. World Applied Sciences Journal. 2011, 15 (11), p.
1623-1629. 18
. ITAO, A D S. Paul Ricoeur’s Hermeneutics of Symbols: A Critical
Dialectic of Suspicion and Faith. KRITIKE. Dec 2010. Vol 4(2), p. 1-17.
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distorção pela ideologia cultural e moral do leitor que necessita ser
reconhecida criticamente no processo de interpretação. A perspectiva
ontológica não é desvinculada do ambiente social, moral e cognitivo do
leitor como fator limitante no sentido original e do sensus plenior19
A teologia dialética e exegética de Karl Barth (1886-1968)
amplia o horizonte da compreensão hermenêutica apontando que não
existe um sentido único textual, com tensões dialética, muitas opostas
na mensagem. A teologia dialética incorpora o conceito de paradoxo de
Kirckgard, indo além, e admitindo tensões entre verdades
aparentemente opostas na interpretação do texto bíblico20,21
.
Os teólogos alemães Rudof Bultmann (1884-1976) e Dietrich
Bonhoffer (1906-1945), abordam de maneira distinta a necessidade do
significado hermenêutico do texto bíblico. Bultmann considera que o
texto deve refletir uma interpretação ontológica na sua
autocompreensão, incorporando o pensamento existencialista de
Heidegger. Bonhoffer com a sua teologia da esperança, aborda a
necessidade da interpretação se distanciar da religiosidade institucional
e centralizar na revelação divina. A distinção de significância
hermenêutica dos dois permite a identificação da necessidade de busca
da identidade e uma chave hermenêutica no texto direcionada,
existencial ou espiritual, o leitor passa a se compreender ou
compreender a revelação divina22
.
19. ROBERGE, Jonathan. What is critical hermeneutics? Thesis Eleven.
2011, 106(1), p. 5–22. 20 . TRIBBLE, H. W. What is the Dialectical Theology? Review &
Expositor. 1936, 33(1): 27–41. 21. VORONKOVA, L. P. “Crisis Theology” and Its Dialectical Problems.
Soviet Studies in Philosophy,. 1980, 19(2), p. 27–43. 22 . RICHARDS, Jeffrey Jon. Hermeneutics and homiletics of Rudolf
Bultmann and Dietrich Bonhoeffer in the American discussion. A
Dissertation Submitted to the Theological Faculty of the Philipps-
University Marburg, Marburg, Germany, Summer Term, 2008 for the
Degree, Doctor of Theology.
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Mikhail Bakthin (1895-1975) propôs que a linguagem extrapola
a expressão da cognição do homem, a prática da redação é um processo
fundamentalmente social, moral e político, indo até além da
manifestação individual pessoal. A literatura é a manifestação cognitiva
do reflexo do contexto do seu autor. A comunicação é a expressão da
intimidade de cada um, projetada na linguagem. A expressão da
linguagem é única, apesar da possibilidade de releitura posterior. A
hermenêutica deve não somente buscar a interpretação do texto para o
leitor, mas deve buscar a intenção cognitiva do emissor, somando o
enunciado proposto por Heidegger da manifestação cognitiva da
influência social, política que influenciaram o autor. A linguagem é
expressão hermenêutica que necessita ser traduzida para a compressão
cognitiva do emissor e de suas influências. Além das relações
cognitivas ou puramente éticas, a linguagem tem relações estéticas na
sua construção, implicando na necessidade da compreensão da
ferramenta linguística empregada na busca do sentido, mesmo sendo o
sentido ético o mais apropriado. A proposta é de uma compreensão
integrada estética, ética e cognitiva. A proposta hermenêutica de
Bakthin propõem uma integração entre cognitiva progressiva Kant,
ontológica de Heidegger e simbólica de Heggel23
.
A metologia hermenêutica de Rudolf Bulltmann (1884-1976),
no período imediato a teologia liberal alemã, pressupunha a necessidade
da compreensão da inserção histórica de narrativa textual e sua
mudança temporal procurando distinguir a sua incorporação na fé, com
distinção do que seria mito e fato histórico21
. O mito e o preconceito
crítico do texto bíblico deve ser devidamente identificado na busca de
um sentido que se torne relevante para o leitor, mas relegando a
interpretação alegórica como válida. A relevância do Novo Testamento
existe para a percepção do homem como centralidade de mensagem. Na
sua análise sobre a Teologia Exegética do Novo Testamento (Das
23
. ÇALISKAN, S. Ethical Aesthetics /Aesthetic Ethics: The Case of
Bakhtin. Journal of Arts and Sciences Say. May, 2006, 5, p. 1-8.
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Problem einer theologischen Exegese des Neuen Testament,1921) existe
uma crítica sobre o método hermenêutico histórico que limita a busca do
significado do texto no passado se omitindo da sua aplicação ao homem
contemporâneo. A proposta final da busca de uma hermenêutica relevante
se faz pela necessidade de uma interpretação de relevância existencial pela
associação de uma análise histórica, filológica, com a busca da necessária
desmitologização e restrição dos preconceitos existenciais do próprio
exegeta (“New Testament and Mythology.”, 1947). A hermenêutica deve
ter aplicação para a compreensão da fé como objetivo último, a exegese
não pode ser realizada sem um profundo conhecimento gramatical do texto
e o reconhecimento das limitações autoexistenciais do exegeta (“Das
Problem der Hermeneutik” was published in Zeitschrift für Theologie und
Kirche in 1950). O Teólogo da Esperança, Dietrich Bonhoffer (1906-1945), tendo
como base o conceito que o NT é a revelação do messias e o AT o seu
anúncio, propôs uma hermenêutica integrada a teologia sistemática e com
uma chave de leitura cristocêntrica. Na sua perspectiva a exegese não
poderia se omitir de revelar uma mensagem ontológica cristocêntrica com
uma ação pneumatológica direta. O princípio hermenêutico desconstrutivista de Jacques Derrida
(1930-2004) propõem que o texto apresenta elementos na sua
composição que necessitam ser analisados individualmente para
compor as possibilidades potenciais de interpretação. O texto além de
uma mensagem pragmática fechada possui elementos que a partir do
processo de desmembramento, e posteriormente de reconstrução
permitem ir além da mensagem primária do autor, admitindo uma
relação metafísica com o leitor. Longe da meta de obter o sentido
original e o sensus plenior, o desconstrutivismo busca as alternativas
potenciais de leitura. A inovação de Derrida é a incorporação de uma
relação de diálogo entre a pessoa do leitor e do texto, que é modificado
pela incorporação progressiva das possibilidades das potenciais
mensagens. O leitor se apropria do texto mediante a desconstrução. O
preconceito do leitor, preconizado por Habermas, interage com o leitor
de maneira progressiva obtendo uma nova leitura, mesmo plural, do
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sentido do texto. A ida ao texto, por parte do leitor, possibilidade de
maneira progressiva uma hermenêutica transformativa. A fragmentação
e reconstrução como princípio metodológico é dirigida para qualquer
forma de expressão da comunicação, independente da reflexão teológica
e sem a exigência do sentido original, e admite uma multiplicidade de
sentidos a partir da interação texto leitor. Cada elemento textual passa a
ter significado isoladamente, representando uma cena isolada da
mensagem, que adquire significado isolado. O processo
desconstrutivista é considerada pós estruturalistas, se desprendendo da
análise fragmentada para obtenção do sentido potencial amplo do texto.
Com a metodologia desconstrutivista cada elemento do texto passa a ser
independente. O desconstrutivismo de Derrida aplicado a hermenêutica
propõem uma ruptura com a unidade do texto, valorizando os seus
elementos individuais e a interação com o leitor24
. Daniel Patte (1939-) reconhecido pelo seu método exegético
estruturalista ou estruturalismo contemporâneo faz a proposição de
incorporação dos métodos exegéticos clássicos com uma interpretação
hermenêutica. Considerando a distância da narrativa do autor, a exegese do
texto deve passar por um processo de revitalização mediante a metodologia
hermenêutica dando vida ao texto, tornando-o um novo discurso. O
processo exegético é revitalizado transpondo a mensagem reinterpretada
pela hermenêutica, dando-lhe um caráter ontológico e significativo para o
leitor contemporâneo. O texto é submetido a uma análise da sua
composição entre os elementos, personagens, mensagens, organização
sintática e semântica. O estruturalismo proposto se desloca de uma simples
análise histórico-gramátical para uma decomposição construtiva em busca
de uma compreensão hermenêutica, sem desvinculação do seu sentido
original, distinto da nova hermenêutica8.
24 . YEGEN,Ceren; ABUKAN, Memet. Derrida and Language:
Deconstruction. International Journal of Linguistics. 2014, Vol. 6 (2), p.
48-61.
8. PATTE. Daniel. What is Structural Exegesis. Wipf and Stock Publishers,
Eugene, Oregon, USA, p. 337-358, 1976.
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Anthony Thiselton (1937-) faz a análise que a hermenêutica
contemporânea, a partir de Gadamer, que aplica a fusão com a filosofia,
que é elemento importante na compreensão dos elementos ontológicos
do texto, a busca do significado do ser, e passa a ser a centralidade da
metodologia hermenêutica. A hermenêutica bíblica deve ir além do
reconhecimento e da integração da história do intérprete e historicidade
do texto. O texto precisa passar por uma modernização do seu sentido, o
sentido da mensagem é dependente do contexto, e a sua relevância
obrigatoriamente passa por uma transposição temporal do significado.
Incorporando a necessidade de uma teologia sistemática no processo
hermenêutico, também destaca o preconceito do intérprete que necessita
ser identificado para uma melhor percepção de uma mensagem
relevante contemporânea. Além da hermenêutica pastoral e ontológica
com uma visão horizontal, se admite também uma leitura social25
.
A hermenêutica literária de Alan Culpepper (1972-) não é
considerada inovativa, mas permite uma compreensão ampliada do
texto bíblico principalmente no NT. O primeiro aspecto é a
identificação do texto como metafórico, sendo um espelho da realidade
da época narrativa da comunidade cristã primitiva, a vida e ensinos de
Jesus Cristo. Os personagens são construídos a partir da sua descrição
no texto adquirindo vida própria, personalidade e independência. O
escritor deixa elementos textuais que devem ser identificados
identificando a sua personalidade e intenção. A hermenêutica literária
não abandona os outros conceitos da hermenêutica mas promove um
aprofundamento da análise exegética com o intuito de aprofundamento
da mensagem26
.
25. BARTHOLOMEW, Craig G.“Three Horizons: Hermeneutics from the
Other End―An Evaluation of Anthony Thiselton’s Hermeneutic
Proposals.” European Journal of Theology 5.2 (1996), p. 121-135. 26
. PORTER, S. E.; ROBINSON, Jason C, Hermeneutics: An Introduction
to Interpretive Theory. Eerdmans, Grand Rapids, USA. 2011.
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Stephen Moore (1954-) segue os passos do pós-estruturalismo e
do desconstrutivismo no aprofundamento da hermenêutica bíblica,
sendo nomeada de hermenêutica crítica. A hermenêutica critica de
Moore, distinta da de Habermas, considera que exista um processo
evolutivo transformando as estruturas ideológicas pessoais, a
hermenêutica centrada no leitor não somente é limitada, como
excessivamente criativa com nítido reflexo do contexto social do
hermeneuta27
.
Kevin J. Vanhoozer (1957-) questiona o que foi perdido na
hermenêutica contemporânea considerando que a hermenêutica bíblica
deveria ser a alma da teologia. A hermenêutica não pode se omitir de
uma visão canônica, sistemática e doutrinária sob risco de esvaziamento
da sua proposta principal que é servir de meio para a revelação
sobrenatural. O perigo da hermenêutica filosófica é que ocorra a perda
da mensagem da verdade revelada nas escrituras. A interpretação do
texto pode ser um processo reducionista, direcionada para o leitor
independente da proposta inicial do escritor, o intérprete passa a ser o
centro da metologia hermenêutica. O texto deixa de transformar o leitor,
mas o leitor transforma o texto, com risco de perda da sua proposta
doutrinária. A hipótese propositiva de Hodge-Henri de indução e
dedução do texto bíblico não pode ser esquecida a partir de uma
proposta de metologia interpretativa textual em termos de revelação,
com informações de uma revelação teológica construtiva da pessoa. Na
sua proposta de evitar um desvio de finalidade da interpretação do texto
ele propõem: buscar a verdade por trás do texto com uma análise
histórica aplicada; a verdade do texto identificando o veículo
empregado cognitivamente pelo escritor e que está contido na forma
27
. MOORE, S. D. Doing Gospel Criticism as/With a “Reader.” Biblical
Theology Bulletin: Journal of Bible and Culture, 1989, 19(3), p. 85–93.
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literária do texto; e a verdade transmitida pelo texto com uma
interação como leitor28
.
A Nova Hermenêutica proposta genericamente por Ernst Fuchs
(1903-1983) e Gerhard Ebeling (1912-2001) se contrapõem ao princípio
que a revelação dos textos bíblicos tem como foco o leitor cristão,
motivado por uma ação pneumatológica, para uma perspectiva
existencial que suplanta a moral e ética cristã. A mensagem dos textos
bíblicos mediada pela linguagem tem um aspecto transformador do
leitor que independe do processo de fé ou ação sobrenatural. A
experiência humana é mais importante que o processo de revelação. O
texto bíblico não se restringe ao seu sentido pragmático de revelação
sobrenatural, mas passa a ser a própria revelação do ser projetado. A
liberdade da interpretação textual é primazia no processo de
autorevelação metafísica e ontológica. A nova hermenêutica adquire
uma relevância ética existencial em detrimento de uma revelação
sobrenatural, abondando o propósito definido pelo autor29
.
Integracionismo da exegese e da hermenêutica: uma meta a
ser atingida. A hermenêutica moderna tem um caráter histórico evolutivo a
partir do pensamento filosófico dos seus autores, que de maneira
progressiva incorpora a busca do sentido e históricos originais para um
sentido ontológico a partir do texto.
A interpretação contemporânea motiva uma relevância para o
texto para o leitor mediante uma resposta cognitiva e fenomenológica.
28
. VANHOOZER, Kevin J. Lost in interpretation? Truth, scripture, and
hermeneutics. JETS. March 2005, 48(1), p. 89–114. 29
. SURBURG. Raymund E. The New Hermeneutic Versus the Old
Hermeneutics in New Testament Interpretation THE SPRINGFIELDER.
January 1974 Volume 38 (1), pp 13-21. Ivan Oliver. The 'Old' and the
'New' Hermeneutic in Sociological Theory. The British Journal of
Sociology. December 1983, Vol. 34 (4), p. 519-55.
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A abordagem clássica da exegese histórico gramatical em busca
do sentido original e o sensus plenior necessita uma confrontação com
os estudos hermenêuticos contemporâneos com o objetivo de uma
atualização metodológica e conceitual para manter sua relevância da TB
em tempos de pós modernidade.
O questionamento central é se a abordagem metodológica
conceitual da hermenêutica moderna de emissor, mensagem (texto) e
receptor pode ser incorporado pela exegese sem uma ruptura de sua
essência. A resposta é que se faz necessário um intermediário para a
interpretação da mensagem para o receptor. A pessoa do hermeneuta
não somente é essencial na tradução e atualização do texto para a
compreensão do leitor, como deve empregar uma metodologia
elaborada (Atos 8,31)
A proposta de uma hermenêutica exegética integracionista não
pode abandonar a proposta inicial de busca do sentido original do texto
e o sensus plenior, como meta da TB (2 Pedro 1,20), mantendo a
instrumentalização da metodologia histórico gramatical.
O modelo hermenêutico integracionista também deve estender a
percepção dos três elementos essenciais da comunicação: emissor,
mensagem (texto), e receptor, para uma visão pneumatológica que age
no texto e no receptor.
A neo-ortodoxia da inspiração textual bíblica de Barth vai além
da ação pneumatológica no emissor (2 Pedro 1,21) e da mensagem (2
Timóteo 3,16-17) para uma ação sobrenatural no receptor. A neo-
ortodoxia de Barth não nega a importância da tratativa hermenêutica do
texto, mas incorpora o quarto elemento sobrenatural no processo que o
apóstolo Paulo na Carta aos Coríntios chama de vivificação (2 Coríntios
3,6).
A proposta integracionista desloca a exegese da metodologia
exegética meramente interpretativa histórica para uma relevância
contemporânea.
Faz-se necessário a identificação de quais métodos
hermenêuticos possibilita em essência a preservação da base
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metodológica da exegese, ampliando o seu horizonte interpretativo com
a devida relevância, mantendo a integridade do sentido dentro da
perspectiva de preservação da sua mensagem original.
A possibilidade de sentidos diversos possíveis do texto, uma
reação dinâmica do receptor (preconceito-transformação) é inegável,
mas deve manter sempre a sua proposta primordial de revelação da
verdade sobrenatural das escrituras.
A abordagem dinâmica linguística e psicológica de
Schleiermacher tem aplicação direta em busca de uma hermenêutica
exegética, ampliando a compreensão mediante o emprego da ferramenta
linguística, e sua interação com leitor além da compreensão racional. A
dimensão psicológica de Schleiermacher admite a motivação
pneumatológica do texto bíblico.
A teoria reflexiva de Husserl orientada para o aspecto teórico do
texto e não para as dimensões das experiências vividas pelo autor ou
leitor é uma metodologia disruptiva que abandona os conceitos da
ferramenta histórico gramatical limitando a construção da busca do
sentido original e mesmo sensus plenior. A aplicação reflexiva de
Husserl restringe a abordagem exegética da TB com limitação na sua
aplicação para uma hermenêutica bíblica somente cognitivo existencial
autoapropriada.
A fenomenologia de Heidegger admitindo uma interação
dinâmica texto leitor, retomada posteriormente por Ricouer e Derrida,
aborda a compreensão tanto de uma compreensão racional como
pneumatológica do texto bíblico. A crítica da fenomenologia
hermenêutica é a sua desvinculação da proposição inicial do texto
transferindo a mensagem para uma perspectiva individual ontológica,
objeto da reflexão da existência humana particular ou uma experiência
pessoal exclusiva ou centrada. A interação entre texto e leitor é uma
realidade incorporável pela proposta de hermenêutica exegética, mas
não se valida uma experiência pessoal independente e relativizada do
sentido original e sensus plenior das escrituras.
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Os princípios hermenêuticos de Dilthey de análise no seu
contexto imediato histórico, geográfico, gramatical, percepção do leitor
inicial e as suas consequências para a sua época se sobrepõem a
metodologia histórico gramatical. A projeção existencial do autor,
preservando a mensagem na sua contextualização, com progressão de
sua compreensão e projeção contemporânea já faz parte da metologia
histórico gramatical.
A hermenêutica literária de Culpepper é relevante para a exegese,
considerada como ferramenta de aprofundamento da compreensão do
texto.
O preconceito do leitor, que pode acarretar limitação no
processo de compreensão textual, também deve ser reconhecido, a
proposta de Derrida de desconstrução e interação progressiva com o
texto com aproximação da mensagem textual possibilita uma melhor
compreensão, com o cuidado de não promover uma ruptura da
mensagem de revelação da verdade sobrenatural do texto bíblico. A
entrada no círculo hermenêutico do autor de maneira repetitiva promove
uma mudança do preconceito do leitor para uma percepção progressiva
da mensagem.
O processo de revitalização do texto proposto por Daniel Patte
como método exegético estruturalista ou estruturalismo contemporâneo
também pode ser considerado relevante para uma exegese integracionista. A hermenêutica literária de Culpepper acrescenta uma nova
dimensão na exegese contemporânea como ferramenta interpretativa.
As críticas de Kevin J. Vanhoozer sobre os limites da atuação da
hermenêutica filosófica são pertinentes para manter os princípios da
exegese bíblica e sua aplicação para a TB. A hermenêutica filosófica
não pode se abster da centralização na verdade sobrenatural da
revelação e manifestação doutrinária.
A perspectiva da hermenêutica de Thiselton identifica a missão
holística potencial da compreensão do texto, que passa a partir de uma
atualização do significado abordar uma visão pastoral, ontológica e
mesmo social.
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A neo-ortodoxia da inspiração textual de Karl Barth não pode
ser deixada em segundo plano na proposta de integração exegese e
hermenêutica, mantendo o elemento pneumatológico na relação escritor
e texto e leitor. A ferramenta hermenêutica cristocêntrica na
hermenêutica proposta por Bonhoffer também deve ser incorporada na
metodologia de uma hermenêutica integracionista, cristocêntrica e
respeitando uma teologia sistemática.
Conclusão: A exegese como processo de interpretação bíblica deve ser a
alma da teologia empregando ferramentas metodológicas. O texto
bíblico para uma TB revelação teológica devida e sua consequente
interpretação, a partir de uma análise cognitiva pessoal com interação
pneumatológica. O exegeta deve ser um elemento intermediário facilitador
no processo de esclarecimento da interpretação do texto revelado. A incorporação de uma compreensão mais aprofundada do texto
mediante metodologias hermenêuticas é fundamental para uma relevância
do texto como veículo da revelação (1 Tessalonicenses 5:21). A hermenêutica contemporânea tende a deslocar a importância
metafísica para o leitor, muitas vezes omitindo a proposta inicial do texto,
omitindo a ação pneumatológica transformadora necessária para uma TB,
fundamentada da busca do sentido original do texto e sensus plenior. A hermenêutica moderna quando excede os limites já apontados,
com a ruptura da revelação pragmática do autor deve ser rejeitada pela
hermenêutica exegética. A hermenêutica exegética ou integrativa deve incorporar as
ferramentas valiosas desenvolvidas pela hermenêutica a partir de
Schleiermacher, sempre as reservas de não se distanciar do sentido
original do texto e o sensus plenior, e que a centralidade deve ser focada
para o texto, e suas interações com o leitor. O processo transformador
da interpretação do texto deve ser identificado como direcionado para
uma ação pneumatológica como essência e não do leitor.
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As ressalvas do reducionismo apontadas por Vanhoozer da
hermenêutica filosófica, e as restrições da nova hermenêutica associada
ao liberalismo teológico são uma preocupação fundamentada para evitar
o processo de ruptura entre a exegese fundamentada no método
histórico-gramatical e a hermenêutica. A autonomia do texto bíblico e seu
processo transformador ontológico no leitor apontada por Paul Ricoeur
deve ser lembrada no processo exegético (Hebreus 4:2). O exegeta contemporâneo deve empregar todas as ferramentas
metodológicas para o seu trabalho interativo com o texto bíblico,
mantendo a base histórico-gramatical, processo interpretativo histórico,
identificações das limitações de preconceito do exegeta, análise das
possibilidades interpretativas, análise estrutural do texto, possibilidades
de intertextualidade, reconhecimento dos ensinos doutrinários, processo
transformador do texto frente ao leitor, reconhecimento da ontologia do
leitor, e manter a visão canônica, sistemática e doutrinária das sagradas
escrituras.
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