Ronei Baldissera - editorakarywa.files.wordpress.com · o papel institucional das Águas na...

220

Transcript of Ronei Baldissera - editorakarywa.files.wordpress.com · o papel institucional das Águas na...

Ronei Baldissera

Anna Maria Siebel

Arlene Anlia Renk

Eliara Solange Mller

Daniel Albeny Simes

Daniel Galiano

Josiane Maria Muneron de Mello

Mirian Carbonera

Silvana Winckler

(Orgs.)

Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

So Leopoldo

2016

Editora Karywa 2016 So Leopoldo RS [email protected]

http://editorakarywa.wordpress.com

Conselho Editorial: Dra. Adriana Schmidt Dias (UFRGS Brasil) Dra. Cndida Graciela Chamorro (UFGD Brasil)

Dr. Cristbal Gnecco (Universidad del Cauca Colmbia)

Dr. Eduardo Santos Neumann (UFRGS Brasil)

Dr. Ezequiel de Souza (IFAM Brasil) Dr. Ral Fornet-Betancourt (Aachen Alemanha) Dra. Tanya Angulo Alemn (Universidad de

Valencia Espanha) Dra. Yisel Rivero Bxter (Universidad de la

Habana Cuba)

Comisso cientfica: Profa. Ma. Ana Cristina Confortin Profa. Dra. Anna Maria Siebel Profa. Dra. Arlene Anlia Renk Prof. Dr. Daniel Galiano Profa. Dra. Eliara Solange Mller Prof. Dr. Jacir Dal Magro Profa. Dra. Silvana Winckler

Profa. Dra. Josiane Maria Muneron de Mello Prof. Dr. Junir Antonio Lutinski Profa. Dra. Leila Zanatta Prof. Dr. Mrcio Antnio Fiori Profa. Dra. Maria Assunta Busato Prof. Dr. Ronei Baldissera

Apoio: Fundao de Amparo Pesquisa e Inovao do Estado de Santa Catarina FAPESC Rede Guarani/Serra Geral

* Os textos so de responsabilidade de seus autores.

Diagramao e arte-finalizao: Rogrio Svio Link

M514 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul. [e-book] / Orgs. Ronei Baldissera, Anna Maria Siebel, Arlene Anlia Renk, Eliara Solange Mller, Daniel Albeny Simes, Daniel Galiano, Josiane Maria Muneron de Mello, Mirian Carbonera, Silvana Winckler. So Leopoldo: Karywa, 2016.

217p.

ISBN: 978-85-68730-11-9

1. Ecologia; 2. Gentica; 3. Nanotecnologia; 4. Sustentabilidade; 5. Controle biolgico; I. Organizadores.

CDD 570

SUMRIO

APRESENTAO ..................................................................................................... 11

CONTRIBUIES PARA A CONSTRUO EPISTEMOLGICA NAS CINCIAS AMBIENTAIS .......................................................................................................... 14

Carlos Alberto Coce Sampaio Isabel Jurema Grimm

VIVNCIAS INTERDISCIPLINARES E MULTIPROFISSIONAIS E A EDUCAO AMBIENTAL: UM RELATO DE EXPERINCIA .......................................................... 32

Adriana C. Bauermann Junir A. Lutinski

Ndia Szinwelski

MELHORAMENTO GENTICO DE SEMENTES REALIZADO POR CAMPONESAS E CAMPONESES NO OESTE DE SANTA CATARINA .................................................. 37

Ana Elsa Munarini Andreia da Silva Foss

Arlene Renk Silvana Winckler

QUAL O PERFIL GERAL DOS DISCENTES DO CURSO DE CINCIAS BIOLGICAS DA UNOCHAPECO? ..................................................................... 42

Anglica Cella Cristiane L. L. Garbinato

Ingridy M. Colpani Luan M. V. Lazarotto

Silvete A. Rodrigues Ronei Baldissera

SUSTENTABILIDADE NA ABORDAGEM ESCOLAR E O AUXLIO DA EDUCAO AMBIENTAL NO PENSAMENTO ECOLGICO EM ESCOLAS ESTADUAIS DE NOVO BARREIRO RS ......................................................................................... 47

Daniela da Costa Anelise Francesquetto

Anglica Beilfuss Camila R. M. Perusato

4 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

Laura Oestreich Simoni Peixoto

Tais L. Konflanz

O PAGAMENTO POR SERVIOS AMBIENTAIS (PSA) E SUA ESTREITA LIGAO COM A CONVENO SOBRE DIVERSIDADE BIOLGICA .......................... 51

Francis Pierre Ferlin Silvana Terezinha Winckler

IMPACTOS SOCIOECONMICOS IDENTIFICADOS APS A CONSTRUO DA HIDRELTRICA FOZ DO CHAPEC ....................................................................... 56

Gelso Lemes de Campos Arlene Anlia Renk

A POLTICA URBANA NO BRASIL E A SUA (IN)ADEQUAO AO PROGRAMA HABITAT DA ONU................................................................................................ 61

Jauro Sabino Von Gehlen Silvana Terezinha Winckler

FLORESTA NACIONAL DE CHAPEC: REVISO DE PESQUISAS REALIZADAS NA UNIDADE DE CONSERVAO .......................................................................... 65

Kariane P. Druzian Manuela G. dos Passos

DESENHO ANIMADO: UMA FERRAMENTA PEDAGGICA NA SENSIBILIZAO AMBIENTAL EM TURMA DE PR-ESCOLA DO COLGIO TRS MRTIRES, PALMEIRA DAS MISSES-RS ................................................................................ 69

Laura Oestreich Anelise Francesquetto

Anglica Beilfuss Camila R. M. Perusato

Daniela da Costa Simoni Peixoto

Tais L. Konflanz

TICA NO USO DE ANIMAIS EM PESQUISAS ........................................................... 73 Lus Gustavo Bressan

Anna Siebel

O PAPEL DAS ORGANIZAES SOCIAIS NA DISSEMINAO DOS PROJETOS DE ENERGIA RENOVVEIS: O CASO DE ITAPIRANGA-SC .......................................77

Luiz Paulo Klock Filho Rodrigo Barichello

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 5

O CONHECIMENTO DE GESTANTES DE FATORES SOCIOAMBIENTAIS PREDISPONENTES AS INFECES DO TRATO URINRIO ....................................... 82

Maria S. T. dos Santos Mariana S. Menegatti

Lucimare Ferraz Silvana dos Santos Zanotelli

Jucimar Frigo Arnildo Korb

POTENCIAL DIDDICO DA TRILHA INTERPRETATIVA NO CURSO DE ENFERMAGEM ...................................................................................................... 87

Marina Winckler

REPERCUSSES TERRITORIAIS DO MODELO DE SETOR ELTRICO: GERAO HIDRELTRICA NO OESTE CATARINENSE .............................................................. 91

Maycon Fritzen

VALORAO ECONMICA DE DANOS AMBIENTAIS NOS PROCEDIMENTOS DE FISCALIZAO REALIZADOS PELOS RGOS ADMINISTRATIVOS DE PROTEO AMBIENTAL DE CHAPEC .................................................................. 96

Liliane Nuncio Silvana Winckler

SANEAMENTO BSICO: LEGISLAO INCLUSIVA, APLICABILIDADE EXCLUDENTE ...................................................................................................... 101

Ricardo de Mattos Martins Cunha

O PAPEL INSTITUCIONAL DAS GUAS NA ESTRUTURAO TERRITORIAL DA BACIA DO PRATA.................................................................................................106

Vera Lucia Fortes Zeni Luiz Fernando Scheibe

CLASSIFICAO HIDROQUMICA DO SISTEMA AQUFERO SERRA GERAL (SASG) EM UMA REA INSERIDA NA BACIA DO RIO CHAPEC/IRANI-MUNICPIO DE CHAPEC-SC ............................................................................... 112

Fabio L. Carasek Jacir D. Magro

Adriana L. S. Klock Luiz F. Scheibe

6 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

COMPOSIO DE INVERTEBRADOS AQUTICOS EM DUAS PAISAGENS CAMPESTRES DO SUL DO BRASIL.......................................................................... 117

Gabriela Galeti Walkiery L. Raimundi

Diego A. Costa Bruna M. Capitanio

Ronei Baldissera

EFEITO DE PROTETOR FSICO NA SEMEADURA DIRETA DE EUGENIA UNIFLORA L. E PARAPIPTADENIA RIGIDA (BENTH.) BRENAN EM UMA REA DE FLORESTA OMBRFILA MISTA EM PROCESSO DE RESTAURAO ................... 122

Isabela Giordani Adriano Dias de Oliveira

Marluci Pozzan Camila Kissmann

ENTOMOFAUNA EDFICA ASSOCIADA CULTURA DE MILHO TRANSGNICO E CONVENCIONAL NO MUNICPIO DE IRACEMINHA, ESTADO DE SANTA CATARINA, BRASIL ............................................................................. 127

Indira Klein Alceu Cericato

Jackson F. Preuss

ESTIMATIVA DA REA DE VIDA DE TRS ESPCIES DE PEQUENOS MAMFEROS NEOTROPICAIS NO SUL DO BRASIL .................................................. 131

Mara M. de Souza Kariane P. Druzian

Daniel Galiano

COMUNIDADES DE MACROINVERTEBRADOS ASSOCIADOS A BROMLIAS DE RESTINGA DO GNERO VRIESEA .......................................................................... 135

Ndia Kroth Jos Junior dos Santos

Jennifer Breaux Ronei Baldissera

Daniel Albeny Simes

RIQUEZA E DISTRIBUIO TEMPORAL DE ANUROS (AMPHIBIA, ANURA) EM UMA REA URBANA DO MUNICPIO SO MIGUEL D OESTE, SC, BRASIL............ 140

Jackson F. Preuss

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 7

VARIAO TEMPORAL NA DIETA DE ATHENE CUNICULARIA (CORUJA-BURAQUEIRA) AO LONGO DE UM GRADIENTE AMBIENTAL NO SUL DO BRASIL ................................................................................................................ 145

Vanessa de O. Pinto Eliara S. Mller

Ronei Baldissera

DIVERSIDADE DE ARTRPODES DE SOLO EM UMA UNIDADE DE CONSERVAO NO SUL DO BRASIL ..................................................................... 150

Vanessa R. de Mello Jos J dos Santos

Sandra M. Sabedot Bordin Julia R. Ernetti

Ronei Baldissera

RELAO DO ESTRESSE OXIDATIVO COM A NEFROTOXICIDADE INDUZIDA PELO CLORETO DE MERCRIO EM RATOS: INVESTIGAO DO POTENCIAL ANTIOXIDANTE DA ALPINIA ZERUMBET............................................................... 156

Adrieli Sachett Rafael Chitolina

Fernanda Bevilaqua Anna M. Siebel

Ricieri N. Mocelin Marta Giachini

Monica Zanatta Silvana M. Wildner

Cssia Sacchett Walter Antonio R. Jnior

Marthiellen R. L. Flix Alini Tereza Gularte

Adriano T. Ramos Angelo L. Piato

Greicy M. M. Conterato

SUSCEPTIBILIDADE LARVAL DE AEDES AEGYPTI (LINNAEUS, 1762) (DIPTERA: CULICIDAE) AOS EXTRATOS DE ILEX PARAGUARIENSIS A. ST.-HIL. E ILEX THEEZANS MART. EX REISSEK ...................................................................160

Ana C. Knakiewicz Junir A. Lutinski

Carin Guarda Ariane Pars

8 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

Alencar Belotti .......................................................................... 160 Maria A. Busato ........................................................................ 160 Walter A. Roman Junior ........................................................... 160

EFEITO ANTIMICROBIANO DE NANOPARTCULAS DE XIDO DE ZINCO (ZNO) FRENTE AS BACTRIAS STAPHYLOCOCCUS AUREUS E ESCHERICHIA COLI ................................................................................................................... 164

Ana Paula Capelezzo Laura C. Mohr

Janayne S. Godoy Alessandra S. Bellei Francieli Dalcanton

Mrcio Antnio Fiori Josiane Maria M. de Mello

EFEITO SINERGTICO DE DUAS ESTRATGIAS DE CONTROLE BIOLGICO DE LARVAS DO MOSQUITO AEDES AEGYPTI ............................................................. 169

Cristiano Bordignon Jos Junior dos Santos

Jennifer Breaux Daniel Albeny Simes

EFEITOS CITOTXICOS E GENOTXICOS DE LODOS DE ESTAES DE TRATAMENTO DE GUA EM ALLIUM CEPA .......................................................... 174

Douglas L. Carlesso Francini Franscescon

Jacir Dal Magro Anna M. Siebel

Cassiano L. Rambo

AVALIAO DO MECANISMO DE AO TIPO-ANTIDEPRESSIVO DE ALPINIA ZERUMBET (ZINGIBERACEAE) EM CAMUNDONGOS ............................................. 179

Fernanda Bevilaqua Ricieri Naue Mocelin

Celso Grimm Junior Nairo Stefanello da Silva Junior

Thales Luis Brust Buzetto Greicy Michelle Conterato Walter Antonio Roman Jr

Angelo Luis Piato

AVALIAO DO EFEITO PROTETOR DE EXTRATO RICO EM ANTOCIANINAS PARA DANOS CITXICOS EM CLULAS MERISTEMTICAS DE ALLIUM CEPA L. EXPOSTAS A SULFATO DE COBRE .................................................................... 184

Francini Franscescon

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 9

Samara C. Mazon Aline Bohn

Julia Ernetti Jacir Dal Magro Anna M. Siebel

Cassiano L. Rambo Greicy M. M. Conterato

EMPREGO DE RESINAS NA OBTENO DE ACETATO DE EUGENILA EM SISTEMA LIVRE DE SOLVENTE ORGNICO ...........................................................189

Josiele Salet Tischer Jos Vladimir de Oliveira

Jacir Dal Magro Natlia Bracht Malagutti

POTENCIAL ANTI-DIABTICO E HIPOLIPEMIANTE DO EXTRATO DO FRUTO DA ERVA-MATE (ILEX PARAGUARIENSIS) ............................................................194

Katiuska Marins Ciro E. F. Fernandes Fernanda Bevilaqua

Jacir D. Magro Jose V. Oliveira

Rafael Chitolina Leila Zanatta

Monica S. Zanatta Giana L. Piccinin

Alan J. Groto Mariane Schneider

Eduarda Ibagi Emily Fantin

Marta Giachini Amanda Schonell

Ana P. Zanatta

EFEITO LARVICIDA DE EXTRATOS VEGETAIS PARA CONTROLE DO AEDES AEGYPTI: UMA REVISO INTEGRATIVA ............................................................... 199

Maria Isabel G. da Silva Barbara Zanchet

Carin Guarda Vanessa S. Corralo

Walter Antonio R. Junior

PRODUO DE BIODIESEL POR VIA ENZIMTICA A PARTIR DE LEOS RESIDUAIS DE FRIGORFICO DE AVES ................................................................. 204

Mariane Coppini

10 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

J. Vladimir Oliveira Jacir Dal Magro

Mariellis Gabriel

EXPOSIO AO CHUMBO ALTERA A EXPRESSO GNICA DE SISTEMAS REDOX NO ENCFALO DE RATOS ....................................................................... 209

Rafael Chitolina Leila Zanatta

Adrieli Sachett Eduarda Ibagy Camile Peretti

Ricieri N. Mocelin Matheus Marcon

rico M. M. Flores Jussiane S. da S. de Oliveira

Angelo Luis Piato Ana Paula Herrmann

Marcos Henrique Barreta Valrio V. M. P. Junior

Greicy M.M. Conterato

EXPOSIO A FRMACOS DETECTADOS EM GUAS DE SUPERFCIE PROVOCA ALTERAES COMPORTAMENTAIS EM PEIXES-ZEBRA (DANIO RERIO) ................................................................................................................ 213

Samara C. Mazon Julia R. Ernetti

Francini Franscescon Kanandra T. Bertoncello

Fernanda W. Oliveira Anna M. Siebel

Matheus F. Marcon Ricieri N. Mocelin

Angelo L. Piato

APRESENTAO

Esse livro fruto do esforo coletivo de vrios profissionais ligados ao Programa de Ps-Graduao em Cincias Ambientais e ao Curso de Cincias Biolgicas da Universidade Comunitria da Regio de Chapec UNOCHAPEC para entregar sociedade os resultados de pesquisas realizadas por pesquisadores de vrias instituies brasileiras. Os trabalhos aqui publicados foram apresentados em forma de pster e/ou oralmente durante a realizao do I Encontro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento na Grande Fronteira Mercosul, que foi realizado em junho de 2016 sob os auspcios da UNOCHAPEC.

O I Encontro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento na Grande Fronteira Mercosul foi idealizado a partir da misso do Programa de Ps-Graduao em Cincias Ambientais da Unochapec de gerar conhecimento cientfico e ainda ser um frum permanente para a discusso de questes ambientais. Dessa forma, houve a criao, no ano de 2015, da Comisso de Eventos do PPG Cincias Ambientais, a qual ficou responsvel pela organizao do evento em parceria com o Curso de Cincias Biolgicas, a FAPESC e a Rede Guarani/Serra Geral.

O objetivo do I Encontro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento na Grande Fronteira Mercosul foi instigar discusses sobre o modelo de desenvolvimento do Oeste Catarinense e seu impacto sobre o meio ambiente, bem como disseminar conhecimentos e experincias cientficas entre o meio acadmico e a sociedade civil.

O presente livro est dividido em trs partes. A primeira parte apresenta os textos produzidos na rea de Sociedade e Meio Ambiente, trazendo resultados e discusses relacionados educao ambiental e ensino de Cincias, impactos sociais e ambientais da instalao e expanso da matriz energtica no Oeste Catarinense, uso da gua e saneamento bsico, sade pblica, desenvolvimento e planejamento rural e urbano, e segurana alimentar. A segunda parte apresenta os trabalhos produzidos na rea de Recursos Naturais e Ecologia, trazendo resultados e discusses relacionados biodiversidade, ecologia de populaes, ecologia trfica, restaurao ecolgica e caracterizao de recursos hdricos. A terceira parte est voltada rea de Tecnologia e Inovao em Meio Ambiente e apresenta trabalhos relacionados ao estudo e controle de vetores, efeitos

12 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

ambientais de resduos slidos e lquidos, ensaios sobre o efeito ambiental de contaminantes, engenharia de alimentos, avaliao da ao de extratos de plantas, obteno de biodiesel e nanotecnologia.

PARTE 1 SOCIEDADE E

MEIO AMBIENTE

CONTRIBUIES PARA A CONSTRUO EPISTEMOLGICA NAS CINCIAS AMBIENTAIS

Carlos Alberto Coce Sampaio

Isabel Jurema Grimm

Resumo: Neste captulo busca-se lanar olhares para as bases tericas e conceituais refletindo a interdisciplinaridade e o interculturalismo como prticas para a construo da epistemologia ambiental, no que constitui o campo das Cincias Ambientais. Questiona-se: de que forma a interdisciplinaridade (PHILIPPI Jr., RAYNAUT, NICOLESCUS) e o dilogo intercultural (QUIJANO, MIGNOLO, SANTOS) entretm vnculos com diversas matrizes do pensamento complexo (Morin), com a teoria da racionalidade ambiental (LEFF) buscando integrar processos e prticas investigativas, associadas com as cincias da natureza, da vida e da sociedade (cultura), isto , o que estabelece as Cincias Ambientais. O estudo resultou em consideraes que expressam o potencial do interculturalismo, a urgncia da interdisciplinaridade como mtodo, a reflexo sobre a crise como anuncio da episteme hegemnica que no consegue ser instituda e a coexistncia como forma menos convencional de produzir o conhecimento ambiental.

Introduo

Em face da indissociabilidade entre os sistemas sociais e naturais e a necessidade de tratar de forma complexa (MORIN, 2007), os problemas derivados e sua abordagem passaram a ter uma perspectiva integradora, que lance mo de procedimentos epistemolgicos, tericos e metodolgicos diferenciados, priorizando o tratamento interdisciplinar.

Nas cincias ambientais o objeto de anlise naturalmente multidisciplinar e requer a convergncia de conhecimentos distintos possibilitando a reflexo vista por diferentes campos. Neste sentido, a interdisciplinaridade emerge naturalmente e passa a ser identificada como atitude e como mtodo na produo de conhecimento.

Da mesma forma a complexidade das relaes sociais e a

diversidade cultural requerem novas formas de elaborar e produzir conhecimento. Conceber conhecimento num vis intercultural estimula produo do saber para alm de suas fronteiras, revendo forma de

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 15

organizar o conhecimento, onde as fronteiras entre as cincias parecem demarcar terrenos e assegurar verdades.

Nas Cincias Ambientais, a interdisciplinaridade surge como uma reao fragmentao do conhecimento, pautada nas demandas socioambientais e na perspectiva do desenvolvimento sustentvel. Diante da complexidade das questes com as quais a cincia contemporaneamente se depara, a interdisciplinaridade rompe fronteiras entre disciplinas, possibilitando trocas no campo conceitual, metodolgico e na colaborao cientifica entre as reas comuns.

Outro aspecto da crise do saber cientfico moderno est em continuar perpetuando a relao de desigualdade colonial (QUIJANO, 2002; MIGNOLO, 2003; SANTOS et al., 2005), recorrendo aposta numa monocultura do saber, onde conhecimento local normalmente representado como estando, de uma ou outra maneira, em oposio ao conhecimento moderno. Da mesma forma emergem evidencias de que a cincia normal enquanto paradigma vigente aborda os fenmenos de forma reducionista, conduzida de modo cada vez mais monodisciplinar, a ponto de se perder a complexidade contextual na qual est inserida. Como alternativa a este modelo, a perspectiva interdisciplinar, quando evidencia as relaes indissociveis entre homem e natureza, deve criar as bases para pensar o conhecimento ambiental (DIAS et al., 2015).

Frente a esta realidade a interculturalidade tem se tornado tema de debate, estando presente nas polticas pblicas e nas reformas educativas e constitucionais, sendo importante tanto na esfera nacional-institucional como no mbito da cooperao inter/transnacional. Embora esta presena seja efeito e resultado das lutas dos movimentos sociais, polticos e ancestrais, suas demandas pelo reconhecimento dos direitos da transformao social, tambm pode ser vista, por perspectiva que a liga aos processos de descolonizao. O colonialismo, forjado enquanto conceito epistmico na poca imperial continua sendo sinnimo de empobrecimento de saberes, na medida em que promove guetizao dos saberes, obliterando outras formas de conhecimento, produo e transmisso de experincias (SOUZA et al., 2005).

Diante deste contexto, neste captulo busca-se lanar olhares para as bases tericas e conceituais refletindo a interdisciplinaridade e o interculturalismo como princpios para a construo da epistemologia ambiental. Questiona: de que forma a interdisciplinaridade e o dilogo intercultural entretm vnculos com diversas matrizes do pensamento

16 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

complexo e com a teoria da racionalidade ambiental buscando integrar processos e prticas investigativas, associadas com as cincias da natureza, da vida e da sociedade (cultura).

Os resultados levam a refletir de forma modesta com os autores de que a crise social, ambiental e cultural pela qual passa a sociedade contempornea anuncio de uma episteme hegemnica e fragmentar; de que h formas menos convencionais de produzir conhecimento; que a epistemologia vigente cala o Outro na reproduo da hegemonia e o coexistir como forma de ouvir, debater e refutar.

A construo do conhecimento ambiental

Preocupaes ambientais no estavam presentes nas discusses no campo das cincias sociais e tampouco como revindicaes de movimentos sociais at final dos anos de 1960 e princpio de 1970, decorrente fundamentalmente dos movimentos antiatmicos e pacifistas. Em diferentes tempos e formas, a dicotomia sociedade natureza permeou o discurso e as prticas no campo cientfico e social.

Neste contexto surgiu o movimento ecocentrista, influenciado pelo naturalismo do sculo XIX, em que se pressupunha que toda ao humana era uma ameaa natureza. Alm daqueles que atribuam natureza o centro do universo, h de se considerar os grupos que colocam a sociedade nesta centralidade e que seguem o antropocentrismo ou antropocentrismo crtico.

A concepo do homem como centro do universo possibilitou a expanso da tcnica e cincia. Porto Gonalves (2006) reala que esta ocorre a partir do conhecimento humano sobre a natureza, pois somente a partir da relao de dominao da natureza que o progresso/ desenvolvimento foi e atualmente possvel. Dominar a natureza era condio ao modelo de desenvolvimento dominante, para legitimao das verdades produzidas pela cincia e para consolidao do domnio de determinados povos, pois, conforme afirma o autor:

A verdade cientfica deslocou outras formas de construo de conhecimento e se tornou uma verdade possuda por uma espcie de mais-valia simblica: o que cientfico bom e, assim, o Estado e os gestores passaram a invocar a verdade cientfica como se fosse A Verdade. Com isso, outros saberes tornaram-se menores- folclore; o saber popular tornou-se um no saber; a religio perdeu seu reino; a arte passou a ser acessria, entretenimento; a filosofia, pouco a

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 17

pouco foi deslocada e, at mesmo a poltica, para os gregos a mais sublime das Artes, passou a ser substituda por uma espcie de saber competente, uma mera administrao das coisas, deixando de ser o lcus por excelncia onde todas as falas estavam convidadas a trazer a sua verdade. (PORTO GONALVES, 2006, p. 85)

A cincia moderna cartesiana, representada por Bacon, Descartes, Newton e Galileu, entre outros, partiu da concepo do mundo natural separado do mundo humano. No sculo XVIII, com o advento da Revoluo Industrial, foi adotado um novo sistema nos meios de produo, os quais geravam uma nova configurao econmica, social e ambiental. A partir deste marco, o mtodo cientfico usado para se compreender a realidade de forma fragmentada e a concepo da natureza como um banco de recursos ilimitado e disponvel para o uso humano passa a caracterizar a sociedade ocidental.

O conhecimento cientfico se fundou no propsito de dominao da natureza, possibilitou criao de tecnologias que automatizaram a produo de alimentos, frmacos e energia. A transformao nos modos de produo nos pases colonizados contribuiu de forma significativa para imposio de cultura antropocntrica e eurocntrica.

O progresso a qualquer custo serviu como pressuposto para expanso da industrializao e urbanizao de sociedades ocidentais, alm de contribuir para agravar desigualdades sociais e variadas formas de desastres ambientais, ameaando vida de espcies no humanas, qualidade do ar, gua, solo e ecossistemas. A intensa e constante degradao na esfera ambiental e social decorrente da maneira como o conhecimento cientfico cartesiano se consolidou, refletindo o modo com que a sociedade ocidental se relaciona com a natureza. Neste ponto preciso novas formas de construo do conhecimento, com perspectiva integradora, que lance mo de procedimentos epistemolgicos, tericos e metodolgicos diferenciados, priorizando o tratamento interdisciplinar.

Neste contexto surge a rea de Cincias Ambientais (CiAmb) no mbito da Coordenadoria de Aperfeioamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES), criada em 2011, em decorrncia da experincia de Programas de ps-graduao da rea Interdisciplinar, sobretudo da Cmara de Meio Ambiente e Agrrias, objetivando abordar os desafios ambientais, considerando a interao entre sistemas antrpicos e naturais que emergem no mundo contemporneo.

18 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

A partir da interdisciplinaridade, que congrega diferentes reas do conhecimento em torno de um ou mais temas em busca de um entendimento comum, h um mtodo de construo do conhecimento que se sustenta na compreenso da complexidade ambiental/social e na resoluo de suas problemticas, tais pressupostos, constitui-se a linha mestre da produo nas Cincias Ambientais.

Assim, a relao homem e ambiente est imbricada nos Programas de Ps-Graduao interdisciplinares na rea de Cincias Ambientais, a partir dos significados culturais atribudos ao ambiente e dos conhecimentos sobre a natureza, devem ser valorizados e pensados sob uma lgica complexa e de interao entre os saberes.

Da diversidade cultural suscita a pluralidade de conhecimentos sobre a natureza. Ignorar a existncia de conhecimentos no cientficos em detrimento de supostas certezas possibilitou a expanso da lgica dominante, do capitalismo e do colonialismo. Para Leff (2001, p.145), saber ambiental deve extrapolar campo das cincias ambientais, caracterizada pelas disciplinas isoladas para se compreender fragmentos da totalidade, ele deve (...) abrir-se ao terreno dos valores ticos, dos conhecimentos prticos e dos saberes tradicionais.

A constante relao de interdependncia entre esfera local, regional e global evidencia que para compreenso dos fenmenos naturais, em nvel macro, importante enxergar peculiaridades daqueles que habitam a esfera local. Considera-se que a proposta do interculturalismo, como instrumento para construo do conhecimento cientfico, desafio para o campo das cincias ambientais, na medida em que se presume concepo de nova forma de racionalidade, pois segundo Leff (2001, p. 153), contato entre diversos saberes:

(...) no surge uma fuso perfeita de suas diferenas, mas um novo tecido que entrelaa os fios do saber de uma fuga de vrias linhas de sentido e onde se conjugam novas foras sociais e potenciais ambientais, onde se funda uma nova ordem, entre o sensvel e o inteligvel. Ali se enlaa uma nova tica e uma nova episteme onde se forma uma nova racionalidade e se constituem novas subjetividades. (LEFF, 2001, p. 153)

Para criar solues para problemticas ambientais importante reconhecer que alm da cincia, existem grupos sociais que operam a partir de racionalidades em que relao com a natureza no est calcada na dominao e tampouco na sua mercantilizao. No Sul, a pluralidade de

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 19

culturas fundamenta a pluralidade de conhecimentos sobre meio ambiente. Coexistindo com conhecimento cientfico esto curandeiros, pescadores, rezadores, parteiras, castanheiras, pajs, agricultores, indgenas entre outros grupos que, ao longo de sua histria, constituram sua cultura a partir de relaes especificas com a natureza.

Por fim, na relao meio ambiente e conhecimento importante o apontamento de Santos et al. (2005), ao colocar que o pluralismo epistemolgico comea pela democratizao interna da cincia. A descolonizao da cincia se torna possvel atravs da ecologia dos saberes em detrimento da monocultura, a ser alcanada por meio da igualdade de oportunidades aos diferentes conhecimentos em disputas epistemolgicas para que seja feito um debate entre eles. No estudo e nas prticas sociais relacionadas s temticas do meio ambiente, esta mudana envolve questes de ordem epistemolgicas, sociais, polticas e econmicas.

Conhecimento: da hegemonia pluralidade

Cincia tida como forma hegemnica de construo do conhecimento, para a representao do real, tentando ser nica promotora e juza da verdade. Diante dos problemas sociais e ambientais que constituem desafios sociedade contempornea, ela se demonstra insuficiente. Decorre disso, sua capacidade quase nica de responder s questes tcnicas e tecnolgicas e pelo fato dos cientistas adotarem teorias, mtodos e tcnicas numa linguagem quase nica para buscarem compreender questes humanas, seus processos e relaes, detendo conhecimento e controlando sua reproduo.

Assim, se verdade que o conhecimento no se constitui em atividades individuais, mas faz parte do legado histrico e cultural humano, no retorna igualitariamente entre seus criadores acentuando a disparidade entre os que o possuem e que dele esto privados gerando desigualdades crescentes entre naes e povos. Para Santos et al. (2005), faz-se necessria atitude de questionamento e debate sobre o sentido e aplicao dos diferentes saberes, onde todas as formas de conhecimento possam construtivamente participar.

Para epistemologia crtica, mais correto comparar todos os conhecimentos (incluindo cientfico) em funo de suas capacidades para realizao de determinadas tarefas em contextos sociais delineados por lgicas particulares (SANTOS et al., 2005). Os autores procuram demonstrar que atual reorganizao global da economia capitalista se

20 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

assenta na produo contnua e persistente de diferena epistemolgica, que no reconhece existncia, em p de igualdade, de outros saberes, e que por isso se constitui, de fato, em hierarquia epistemolgica.

Figura 1 - Hierarquia do conhecimento

Fonte: adaptado de Souza et al., 2005.

Neste sentido destacam que a tenso entre cincia e emancipao se manifesta em particular nas relaes Norte-Sul, em que o Sul onde problemas da expropriao, supresso, silenciamento e distribuio desigual dos bens econmicos e culturais ocorrem de forma mais acentuada. Contudo, para os autores o que mais interessa a cognio dessas desigualdades.

O conhecimento tcnico cientfico preside a globalizao neo-liberal e baseia a sua hegemonia na forma credvel com que desacredita todos os saberes rivais, sugerindo que no so comparveis, em termos de eficcia e coerncia, cientificidade das leis de mercado. (Santos et al., 2005, p. 45)

Mignolo (2003) perpassa pela crtica colonialidade do poder e dos processos de subalternizao e aponta para emergncia de novos loci de enunciao, gnose liminar que expresso de uma razo subalterna lutando para afirmao dos saberes historicamente subalternizado (p. 76). Para o autor, vive-se a emergncia de outro pensamento, pensamento liminar que aponta para razo ps-ocidental. Essa gnose ou pensamento liminar reflexo crtica sobre produo do conhecimento. Implica na sua redistribuio geopoltica at ento pautada na colonizao epistmica e subalternizao de todas as formas de saberes que no estivessem pautadas nos cnones da cincia eurocntrica (MIGNOLO, 2003).

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 21

Gnose liminar, como conhecimento, produzida na interseo dos colonialismos modernos e do conhecimento produzido na perspectiva das modernidades coloniais. forma de conhecimento construdo nos espaos liminares, fronteiras da diferena colonial. poderosa e emergente gnosiologia que, na perspectiva do subalterno, est deslocando e absorvendo as formas hegemnicas do conhecimento. Contudo, no se trata de forma de sincretismo ou hibridismo, mas de um sangrento campo de batalha na longa histria da subalternizao colonial do conhecimento e da legitimao da diferena colonial (MIGNOLO, 2003, p. 35). Pensamento liminar na perspectiva da subalternidade para o autor mquina para descolonizao intelectual e, portanto, para a descolonizao poltica e econmica (MIGNOLO, 2003, p. 76).

Santos et al., (2005) contribui para o debate ao afirmar que projetos civilizadores, libertadores ou emancipatrios, visaram reduzir a compreenso do mundo compreenso ocidental do mundo. Exemplo reduo dos conhecimentos dos povos conquistados condio de manifestaes de irracionalidade, de supersties ou, quando muito, de saberes prticos e locais, cuja relevncia dependeria da sua subordinao nica fonte de conhecimento verdadeiro, a cincia. Essa situao de subordinao e invisibilidade do Sul, a negao da diversidade inerente ao colonialismo.

Entretanto, para alm das dimenses econmicas e polticas, o colonialismo teve forte dimenso epistemolgica e que no terminou com o fim dos imprios coloniais. O fim do colonialismo poltico no significou fim do colonialismo como relao social (colonialidade do poder

1). Neste

debate Quijano (1992) discute o conceito de colonialidade do poder e Dussel (1994) o de transmodernidade. Tais conceitos apontam para diferena colonial como elemento fundamental para se pensar a constituio do sistema moderno/colonial. Os autores balizam para perspectiva de que impossvel pensar a modernidade ocidental sem pensar na colonialidade do poder e saber. Essa ideia implica em ver a modernidade de forma indissocivel da colonialidade.

Santos et al., (2005) afirmam que a produo do conhecimento hegemnico (ocidente) exigiu a criao de um Outro, constitudo como

1 Padro de controle, hierarquizao e classificao da populao mundial que afeta todas as dimenses da existncia social, e que tem no conceito de raa seu eixo estruturante, ao que

Quijano (2005) denominou colonialidade do poder.

22 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

ser intrinsecamente desqualificado, disponvel para ser usado e apropriado. Descoberta do Outro, no contexto colonial, envolve sempre a produo ou reconfigurao de relaes de subalternidade. Contudo, para Mignolo (2003), o projeto (des)colonial deve reverter este processo: descolonizao do ser e saber conduz a mudana no horizonte econmico e poltico. necessrio concretizar o "sonho descolonial", no qual instituies esto a servio da vida, ao invs das pessoas estarem a servio das instituies. Esta frmula base da retrica moderna da lgica do colonialismo (duas caras da mesma moeda), da qual se precisa desprender a fim de permitir mudanas radicais.

Portanto, necessrio considerar a busca de nova concepo mais vasta e profunda dos saberes, dando prioridade ao romper das fronteiras em termos de produo de conhecimento, dando lugar a projetos e perspectivas das relaes interculturais. preciso, como expe Quijano (1992), liberdade para produzir, criticar e mudar, intercambiar cultura e sociedade. preciso, como se prope nas Cincias Ambientais, pensar a interdisciplinaridade em busca de solues aos problemas que afetam a sociedade contempornea, e que so intrnsecos s atividades sociais, econmicas, tecnolgicas. So problemas que ultrapassam competncias acadmicas especificas, que no se regem por grupos, geografia poltica, espacial ou econmica, mas, que busca a construo do conhecimento com base universal, que resulte em solues s demandas atuais da sociedade como um todo.

Interdisciplinaridade nas Cincias Ambientais

A interdisciplinaridade no mbito da academia, de acordo com Raynaut (2014, p. 5), tem demonstrado ser instrumento capaz de romper a rigidez das fronteiras disciplinares onde, envoltos por um objetivo comum, especialistas de diferentes reas do conhecimento colaboram para fundar, com uma perspectiva durvel, uma nova estruturao da pesquisa e do ensino. A esta nova perspectiva o autor denomina interdisciplinaridade de liga. Diferentemente da interdisciplinaridade instrumental, de carter pragmtico e pontual, a interdisciplinaridade de liga possui caractersticas de no de juntar de modo temporrio competncias diversificadas, mas como uma nova postura no mbito da pesquisa e ensino. Interdisciplinaridade instrumental ou interdisciplinaridade de liga segue Raynaut:

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 23

(...) por mais diferentes entre si que sejam, compartilham uma caraterstica comum: as disciplinas chamadas para colaborarem trabalham sobre objetos que podem ser abordados na sua materialidade, sem referncia questo de produo e de circulao do sentido dentro dos sistemas estudados. (RAYNAUT, 2014, p. 5)

Portanto, no campo das teorias que interpretam a natureza e os seres humanos em sociedade, necessitamos de epistemologias hbridas, de narrativas como mesclas de histria na direo de uma nova aliana entre natureza e cultura. Necessitamos de novos paradigmas que no se apresentem fragmentados (disciplinas) e que possam trazer respostas aos problemas socioambientais que afligem a sociedade contempornea (GRIMM, 2010).

Para Nicolescu (1999, p. 45) a interdisciplinaridade seria a transferncia de mtodos de uma disciplina para outra, onde sua prtica ultrapassaria a disciplina, mas cuja finalidade continuaria sendo a disciplina. Assim, como apontam Grimm et al., (2015) h que se aclarar que o fenmeno da interdisciplinaridade posterior prtica disciplinar, emergindo como novo recurso intelectual da evoluo da cincia, e como resposta a novos desafios que o ser humano encontra na prpria sobrevivncia. Logo, a interdisciplinaridade no deve negligenciar as disciplinas, j que delas depende.

Conceituando a disciplina desde o ponto de vista da cincia, esta pode ser entendida como um tipo de saber especfico que possui um objeto determinado e reconhecido, bem como conhecimentos e saberes relativos a este objeto e mtodos prprios. A tentativa de estabelecer relaes entre as disciplinas e suas diferentes formas de pesquisa que d origem ao que se denomina interdisciplinaridade. Entretanto importante observar a lacuna existente entre as cincias naturais e as cincias humanas, e a necessidade da complexidade como abordagem diante do arsenal epistemolgico (HEEMANN, 2004, p. 49), das diferentes reas do conhecimento.

A interdisciplinaridade deve como um eixo articulador, ou seja, uma ligao entre disciplinas que pode atender a demanda de informaes capaz de preencher as fissuras existentes no conhecimento. Entretanto, o desafio est em adotar uma nova postura diante do conhecimento, uma mudana de atitude em busca da unidade do pensamento. Para Leff (1994), a interdisciplinaridade pode ser entendida como a construo de um novo

24 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

objeto cientfico, a partir da colaborao de diversas disciplinas e no somente como o tratamento comum de uma temtica.

Para Gadotti (2000) em termos metodolgicos, a prtica interdisciplinar implica em (a) integrao de contedos; (b) passar de uma concepo fragmentria para uma concepo unitria do conhecimento; (c) superar a dicotomia entre ensino e pesquisa, considerando o estudo e a pesquisa, a partir da contribuio das diversas cincias; (d) ensino-aprendizagem centrado numa viso que aprendemos ao longo de toda a vida (educao permanente).O autor destaca a importncia de uma formao continuada, integradora entre as diversas reas do conhecimento abolindo a fragmentao do saber e acima de tudo aliando teoria prtica.

O contexto interdisciplinar supe abertura de pensamento, curiosidade onde o que se busca a partir dos saberes cientfico (especialista) e popular (conhecimento autctone) e a construo de um novo conhecimento que leve os envolvidos a refletirem a cerca das solues aos problemas que os rodeia. Para Leff (1994), a interdisciplinaridade uma dinmica grupal que produz estmulos para o avano do conhecimento, inclusive dentro de cada disciplina, pois, cada cincia tem sua sensibilidade para os problemas sociais. Contudo ressalta que a interdisciplinaridade gera benefcios, mas tambm dificuldade de dilogo e comunicao entre cientistas.

A interdisciplinaridade uma prtica para a produo do conhecimento, que promove intercmbios tericos entre as cincias e funda novos objetivos cientficos. Interage o saber das mais diferentes campos disciplinares e evoca tambm um espao comum, uma coeso intercultural, onde, destaca Leff (1994), cada especialista desde sua especialidade aportam conhecimentos teis gesto ambiental, pois esta complexa (MORIN, 2007) necessitando um trabalho interdisciplinar para tratar seus problemas.

Neste contexto, a interdisciplinaridade no mbito das Cincias Ambientais surge como contraponto fragmentao e ao reducionismo epistemolgico no mundo contemporneo, exigindo mudanas no campo conceitual, metodolgico e na colaborao cientifica entre disciplinas, buscando novos processos de produo e valorizao de conhecimentos cientficos e no cientficos e dar conta dos novos problemas, de diferentes naturezas e com nveis de complexidade crescentes (FARIA, 2015, p.107) entre eles os de natureza ambiental.

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 25

Emergentes da interao de processos sociais e ecolgicos (Philippi Jr. et al., 2013, p. 518), os problemas ambientais j no pode mais ser visto sob uma tica fragmentada, isolada prpria do paradigma da cincia moderna, que faz emergir um conflito inconcilivel entre as reas do conhecimento, separando as cincias da natureza das cincias humanas e sociais (FARIA, 2015, p.106). Parte da a necessidade da unidade de pensamento, do dilogo entre disciplinas que possam interagir tendo como atitude e como mtodo a produo de conhecimento, que respeitem os diferentes saberes e fazeres em busca de solues para os conflitos ambientais vivenciados.

Interculturalismo: para pensar a Cincia Ambiental a partir do outro saber

Para configurar o verdadeiro conhecimento socioambiental necessrio levar em conta trajetrias constitutivas da cincia e dos saberes culturais, refutando a unidimensionalidade da matriz de pensamento e de valores privilegiando o dilogo com as alteridades (GRIMM & SAMPAIO, 2012). Ela, a epistemologia socioambiental deve redefinir a histria do conhecimento, integrando-se a uma nova filosofia dos processos culturais, cognitivos, tecnolgicos, imaginativos, ticos, estticos, utpicos, por meio de alianas entre os tempos do esprito e da matria, assim poder construir os sentidos da vida e do mundo pela educao (ou reeducao) dos sentidos (FLORIANI, 2009).

Para aqueles que defendem a filosofia intercultural (...) forma como significamos o mundo e a ns mesmos (MENEZES, 2011, p. 326), tal processo que no solitrio, mas coletivo, com encontros e desencontros entre diferentes povos, que interagem e se influenciam pelas trocas de conhecimentos, ou mesmo pela destruio dos conhecimentos daqueles que so subjugados, pode ser o caminho para a construo do verdadeiro saber ambiental.

Propostas interculturais supem revitalizao do conceito de multiculturalismo, diante do dinamismo das culturas e da interao entre grupos de culturas distintas. Multiculturalidade ocorre na interao entre sujeitos, reconhecendo que h conflitos na relao entre sistemas culturais distintos, o que sugere aprendizagem, cooperao e intercmbio. Uma perspectiva multicultural permite o reconhecimento da existncia de sistemas de saberes plurais, alternativos cincia moderna. Autores que perfilham esta crtica tm vindo a lutar por uma maior abertura

26 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

epistmica, no sentido de tornar visveis campos de saber que o privilgio epistemolgico da cincia tendeu a neutralizar, e mesmo ocultar, ao longo de sculos (SANTOS et al., 2005, p. 22), relacionada ao plano dos fatos, dos acontecimentos, via relaes inter tnicas.

De acordo com Fornet-Betancourt (2012), a filosofia intercultural defende reconstruo de universalidade temporalmente pluralista, construda sobre base de dilogo intercultural, como mecanismo para engrandecimento do mundo. Para o autor, filosofia intercultural trabalha com conceito de cultura que o situa mais alm do multiculturalismo. Por um lado, contraria opinies multiculturalistas que afirmam que o desafio no est em organizar coexistncia cultural da pluralidade ou gestionar relaes entre culturas, mas desenvolver entre as culturas uma de prticas interativas, que qualificariam a coexistncia como convivncia intercultural. Nesse processo, culturas podem experimentar trocas de conhecimento. Por outro, filosofia intercultural expressa oposio frente ao transculturalismo, por defender que tal interao automaticamente provoca desintegrao das culturas e de suas referncias identificadoras.

Considera-se que dilogo entre culturas representa novo paradigma que abre possibilidade real de redimensionar a historicidade e de substituir, com ele, qualitativamente nossa relao com a histria, porque dilogo entre culturas lugar onde memrias e tradies da humanidade se encontram para intercambiar suas historias, e no para substitu-las por pretensiosa universalidade (FORNET-BETANCOURT, 2010). Assim Histria Universal est impregnada por pensamento colonialista europeu, que subjuga populaes de culturas distintas, porm no menos importantes. De acordo com o autor:

(...) nos encontramos frente a um pensamento hegemnico com uma concepo que segue uma linha de desenvolvimento que converte a histria em um programa cuja cronologia global privatiza as temporalidades alternativas de outras culturas e por vezes provoca seu desaparecimento do mapa mundial. (FORNET-BETANCOURT, 2010, p. 17)

Tais temporalidades alternativas so concebidas pelo pluralismo cultural, o qual parte do pressuposto que toda a diversidade cultural positiva e enriquecedora, e que diversidade no somente deve ser respeitada, como ainda, celebrada. Pluralismo cultural se funda no principio de igualdade, de diferena, respeito e aceitao do Outro.

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 27

A partir da negao do ritmo, de suas histrias e seus tempos reais, culturas so apresentadas ao mundo como incapazes de acompanhar progresso histrico conhecido da cronologia do calendrio da histria. Tal pensamento foi determinante na rotulao de povos desenvolvidos e subdsenvolvidos. Fornet-Betancourt (2010) denomina de povos integrados e povos excludos da Histria. Tais denominaes faz pensar se povos sero integrados Histria, sero reconhecidos e inclusos para assim contriburem ampliando a Histria? Ou gradativamente teremos mais povos excludos?

Para Menezes (2011, p. 328) (...) a Interculturalidade apresenta interrogaes e novas perspectivas diante de um contexto em que perdemos a memria, a possibilidade do dilogo e a riqueza dos saberes.

Interculturalidade estimula para pensarmos Educao para alm de suas fronteiras, revendo a forma como se organiza conhecimento, onde fronteiras entre cincias parecem demarcar terrenos e assegurar verdades. Referindo-se sobre importncia do dilogo entre diferentes reas do conhecimento, Menezes (2011, p. 327) afirma que (...) pensar a interculturalidade significa, portanto colocarmos em dilogo diferentes reas do conhecimento, o que vai ao encontro da produo do conhecimento por meio da proposta interdisciplinar.

De acordo com Menezes a questo central :

(...) pensarmos sob que condies se fazem possveis os dilogos interculturais, tendo como referncia o campo da Educao. Ser nesta perspectiva que nos perguntamos: que entre-lugares ainda so possveis dentro de uma sociedade que j demarcou to bem seus espaos e formas de convivncia? De que forma as instituies sociais, tais como a escola, a universidade e o terceiro setor, enquanto um espao difuso de organizao social, vem pensando e experenciando a interculturalidade? Que sujeitos emergem desses entre-lugares e como os dilogos interculturais contribuem na releitura da prpria ideia de cultura e de conhecimento? (MENEZES, 2011, p. 328)

Relevncia destas questes aceita, por se compreender interculturalidade como categoria conceitual, que implica necessariamente repensar representaes que se faz do Outro (O que a maioria dos indivduos pensam das comunidades agrcolas tradicionais?). Desse modo, relao entre educao e cultura se amplia, pois no se limita a reflexo dos

28 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

contedos culturais, ultrapassando assim viso multiculturalista que reconhece somente valor intrnseco de cada cultura.

Interculturalidade no se limita a pensar Educao como espao escolar que privilegia determinados saberes e modos de produzir conhecimento em detrimento de outros saberes, mas propor dilogos que buscam construo de relaes recprocas, de respeito ao saber que vem do outro numa atitude de escuta e interlocuo com estes saberes. Questes que interferem no cotidiano de diferentes comunidades podem ser pensadas a partir da categoria conceitual da interculturalidade, contribuindo para reconstruo do conhecimento (de comunidades afetadas negativamente pelo colonialismo excludente).

preciso pensar interculturalidade no como disciplina, mas como mtodo interdisciplinar, promovendo descolonizao de nossos modos de compreenso, relao humana e relao ambiental. Repensar a relao socioambiental proposta da interculturalidade, fundamental para seu reconhecimento como instrumento para se pensar questes sociais e ambientais. No h caminho traado que se indique como dilogos interculturais tornar-se-o viveis. Neste paradoxo de buscar pistas possveis de concretizao desses dilogos se depara com necessidade de pensar interculturalidade no exato momento em que ela se constri (MENEZES, 2011, p. 328).

Hbitos de pensar e de como fazer - e que o induz a determinao de diferentes graus de desenvolvimento - esto lastrados no paradigma da suficincia, logo, a prtica da interculturalidade e da interdisciplinaridade nas Cincias Ambientais, somente poder acontecer quando ocorre desprendimento do pesquisador de tal paradigma, que se entende como ultrapassado para aprofundar temas relativos ao meio ambiente e a sociedade.

Consideraes Finais

Partindo do pressuposto que s um olhar que d conta da dimenso dos conflitos atuais poder fazer face complexidade do nosso mundo e aos desafios ambientais contemporneo; observando que o crescimento dos saberes, acentua a desigualdade entre os que os possuem e os que deles esto privados, gerando assim desigualdades crescentes no interior dos povos e entre as naes do nosso planeta; enfatiza-se a necessidade de um outro olhar, voltado interdisciplinarmente para a soluo dos problemas atuais.

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 29

A longa histria de valorizao dos conhecimentos cientficos marcou a relao entre as culturas dominantes e dominadas. Esses conhecimentos tm sido reproduzidos e sistematizados de modo a legitimar a imposio da economia e poltica europeia globalizante, desde a poca da dominao colonial e ps-colonial.

A partir da anlise terica alcanou importantes resultados que levaram a refletir de forma modesta com os autores, fazendo emergir alguns apontamentos a cerca do tema central:

A crise social, ambiental e cultural pela qual passa a sociedade resultado de uma episteme hegemnica, que no consegue ser instituda hegemonicamente. O modo eurocntrico de construo de conhecimento se imps como totalidade para compreender o universo, uma vez que se difunde como dominador e ideolgico.

H formas no cientificas de produzir conhecimento sobre meio ambiente. Para compreender as problemticas ambientais atuais, considera-se importante recorrer e criar espaos de dialogo entre conhecimentos, a fim de reunir as partes que configuram o todo, no intuito de encontrar melhores formas de produzir cincia, compreendendo a amplitude das questes ambientais e inspirando para novos questionamentos.

A integrao de culturas cientficas e no cientficas na gesto de prticas sociais voltadas para construo de projetos de vida, permite a valorizao de diferentes conhecimentos e reconhecimento de identidades culturais. Coexistir como forma de ouvir, debater e refutar reflete novas possibilidades de epistemologia frente pluralidade cultural, mesmo reconhecendo e lidando com os conflitos inerentes integrao intercultural.

Portanto, considera-se importante que nas Cincias Ambientais se estabelea relaes de integrao e dilogo entre conhecimentos cientficos e no cientficos, entre disciplinas, que se combata a imposio da epistemologia cultural dominante, que incorporarem uma depurao histrica dos mitos das culturas superiores, desenvolvendo uma concepo justa das culturas de pertencimento e das experincias dos sujeitos de modo a superarem-se confrontos, contradies e excluses.

30 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

Referencias

DUSSEL, Enrique. Caminhos de libertao latino-americana. So Paulo: Paulinas, 1985. v. II: Histria, colonialismo e libertao.

DUSSEL, Enrique. El encubrimiento del Otro: hacia el origen del "mito de la modernidad". La Paz, Bolvia: Plural Editores, 1994.

FLORIANI, Dimas; KNECHTEL, Maria do Rosrio. Educao ambiental, epistemologia e metodologia. Curitiba: Vicentina, 2003.

FORNET-BETANCOURT, Ral. Teora y prxis de la filosofia intercultural. Revista del pensamiento y anlise; n10; 2010; ISSN: 1130-6149. Disponvel em: . Acesso em: 12 jun. 2012.

GLIESSMAN, Stephen. R. Agroecologia: processos ecolgicos em agricultura sustentvel. Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 2000. 656 p.

HEEMANN, A. Consideraes sobre alguns obstculos interdisciplinaridade na Ps-Graduao. Desenvolvimento e Meio Ambiente. Curitiba: Editora UFPR n. 10, p. 47-51, jul./dez. 2004.

LEFF, Enrique. Interdiciplinariedad y ambiente: bases conceptuales para el manejo sustentable de los recursos. In: Ecologia y Capital. Racionalidad ambiental, democracia participativa y desarrollo sustentable. Mxico: Siglo XXl, 1994. p. 68-123.

LEFF, Enrique. Pensar a complexidade ambiental. So Paulo: Cortez, 2003. p. 15-63.

LEFF, Enrique. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Rio de Janeiro: Vozes, 2002.

MENDES DE MENEZES, Magali. Nos interstcios da cultura: as contribuies da filosofia intercultural. Educao, Porto Alegre, v. 34, n. 3, p. 324-329, set./dez. 2011. Disponvel em: . Acesso em: 12 jun. 2012.

MIGNOLO, Walter. Colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003. 505p.

MINISTRIO DO MEIO AMBIENTE. A conveno sobre diversidade biolgica. Braslia: Centro de informao e Documentao Lus Eduardo Magalhes - CID Ambiental, 2006.

http://www.erevistes.uji.es/index.php/recerca/article/viewFile/121/111http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/faced/article/viewFile/7410/6782

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 31

NICOLESCU, B. Manifesto da transdisciplinaridade. So Paulo: Trion, 1999. 167p.

PORTO GONALVES, C. A globalizao da natureza e a Natureza da globalizao. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2006.

QUIJANO, Anbal. A Colonialidade do saber. In: LANDER, Edgardo (Org.). A colonialidade do saber. Eurocentrismo e Cincias Sociais. Perspectivas latino americanas. So Paulo: CLACSO Livros, 2002.

QUIJANO, Anbal. Colonialidad y modernidad-racionalidad. In: BONILLO, Heraclio (comp.). Los conquistados. Bogot: Tercer Mundo Ediciones; FLACSO, 1992. p. 437-449.

RAYNAUT C. Os desafios da produo do conhecimento: o apelo para interdisciplinaridade. Revista Internacional Interdisciplinar INTERthesis, Florianpolis, v.11, n.1, p. 1-22, Jan./Jun. 2014.

ROMERO, Carlos Gimenes. Pluralismo, multiculturalismo e interculturalidad. Educacin y Futuro. Revista de investigacin aplicada y experiencias educativas. N. 8, p. 11-20, 2003. Disponvel em: . Acesso em: 12 jun. 2012.

SANTOS, B. de S; MENESES, M. P. G. de NUNES, J. A. Introduo: para ampliar o cnone da cincia: a diversidade epistemolgica do mundo. In: SANTOS, Boaventura de Sousa (Org.). Semear outras solues: os caminhos da biodiversidade e dos conhecimentos rivais. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2005.

VIVEIROS DE CASTRO, E. A inconstncia da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. Cosac & Naify, So Paulo, 2002.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Civiliza%C3%A7%C3%A3o_Brasileirahttp://red.pucp.edu.pe/ridei/wp-content/uploads/biblioteca/100416.pdf

VIVNCIAS INTERDISCIPLINARES E MULTIPROFISSIONAIS E A EDUCAO AMBIENTAL: UM RELATO DE EXPERINCIA

Adriana C. Bauermann*

Junir A. Lutinski**

Ndia Szinwelski***

Resumo: O projeto Vivncias Interdisciplinares e Multiprofissionais (VIM) fruto de um processo de discusses entre professores da Unochapec com objetivo de elaborar propostas para a consolidao da formao e fortalecimento do SUS. O VIM 2016 por conta da conjuntura atual do Oeste Catarinense, focou suas intervenes nas questes ambientais e para isso contou com a participao de cerca de 330 estudantes de 11 cursos diferentes, trabalhando na metodologia de seis momentos diferentes, onde quatro destinaram-se s tutorias; um momento para vivncia nos Centros de Sade da Famlia (CSF) nos municpios de Chapec, Xanxer e Xaxim e um momento para realizao da interveno nos territrios sobre a Dengue, Zica Vrus, Febre Chikungunya e coleta seletiva do lixo. Esta prtica (estudo, vivncia e interveno) proporcionou um olhar interdisciplinar para os envolvidos e para a indissociabilidade entre a sade e o meio ambiente. Palavras-chave: Formao Profissional, Sade e Meio ambiente, Sistema nico de

Sade.

Introduo

O projeto Vivncias Interdisciplinares e Multiprofissionais (VIM) fruto de um processo de discusses entre professores da Universidade Comunitria da Regio de Chapec Unochapec, pertencentes rea de Cincias da Sade, rea de Cincias Humanas e Jurdicas e rea de Cincias Exatas e Ambientais, que compreendem a necessidade de interao entre os acadmicos de diferentes cursos numa perspectiva interdisciplinar, para aprender a efetivar aes conjuntas observando,

* Acadmica do 7 perodo do Curso de Farmcia. Universidade Comunitria da Regio de

Chapec-UNOCHAPEC. ** Professor Dr. do Programa de Ps-Graduao em Cincias da Sade. Universidade

Comunitria da Regio de Chapec-UNOCHAPEC. *** Professora, Mestre em Sade Pblica, coordenadora do VIM 2016. Universidade

Comunitria da Regio de Chapec-UNOCHAPEC.

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 33

atuando, discutindo e elaborando propostas para a consolidao da formao e, fortalecer o Sistema nico de Sade (SUS) (UNOCHAPEC, 2010; BRASIL, 2009). Esta proposta visa exerccios de vivncia articulados a partir dos componentes curriculares disciplinares das diferentes graduaes, perspectiva na qual, os estudantes dos cursos envolvidos observaram a estrutura e o funcionamento do SUS, sob um olhar da realidade dos municpios de Chapec, Xanxer e Xaxim, regio Oeste de Santa Catarina.

A atividade envolveu os profissionais das Secretarias de Sade e professores da Unochapec na formao dos estudantes, atravs do conhecimento terico-prtico. Tambm permitiu aos envolvidos o exerccio do trabalho em equipe, favorecendo a percepo da interdisciplinaridade como elemento essencial da prtica (multi)profissional na rea da sade, sustentando a ideia de Frigotto (2008), onde traz a questo da interdisciplinaridade como uma necessidade e como problema fundamental no plano material histrico-cultural e epistemolgico da sociedade, alm de promover a articulao interinstitucional e intersetorial (governo e sociedade) e a integrao ensino-servio-comunidade a partir de metodologias ativas de ensino-aprendizagem, reconhecendo na prtica assuntos como epidemiologia, sociedade, sade e meio-ambiente.

O projeto VIM 2016, por conta da conjuntura epidemiolgica atual, focou nas questes ambientais, relatadas de modo crtico e constante, principalmente na regio oeste catarinense. A grande incidncia de doenas associadas ao cuidado com o ambiente, como a Dengue, Zica Vrus e Febre Chikungunya chamou ateno da populao brasileira nos ltimos meses e colocou a sade pblica em alerta. Dessa forma, uma das etapas do VIM 2016, a interveno, teve como proposta a conscientizao sobre o controle dessas doenas bem como sobre a coleta seletiva e a reciclagem do lixo.

Materiais e mtodos

Este trabalho um relato de experincia acerca do projeto VIM 2016 e relata os resultados gerados nas intervenes realizadas nos trs municpios envolvidos. O projeto nesta edio contou com 330 estudantes de onze cursos diferentes, sendo eles: educao fsica, enfermagem, fisioterapia, medicina, nutrio, odontologia, servio social, psicologia, cincias biolgicas, farmcia e medicina veterinria.

34 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

Os estudantes foram divididos em grupos de 12 participantes garantindo a participao dos diferentes cursos, sendo que cada grupo contou com o auxlio de dois tutores docentes e/ou estudantes do stricto sensu. O VIM trabalhou na metodologia de seis momentos diferentes, abordando os princpios e diretrizes do SUS, definio de objetivos, metas e estratgias comuns, vivncia e interveno. No dia 15 de maro de 2016, os acadmicos se reuniram nos espaos dos Centros de Sade da Famlia, totalizando 26 locais de vivncia, 10 em Chapec, 8 em Xanxer e 8 CSF em Xaxim. Os estudantes permaneceram inseridos nos servios por cerca de 8 horas, observando a realidade local, conhecendo seu funcionamento, equipe de trabalho, territrio e ambiente no qual est inserida. Utilizaram um dirio de campo para anotaes pessoais e efetuaram entrevistas na comunidade.

Todos os estudantes realizaram as vivncias utilizando a camiseta do projeto e foram recebidos nos CSFs por acolhedores responsveis pelas unidades. Aps a vivncia, os estudantes tiveram uma capacitao sobre as doenas Dengue, Chikungunya e Zika e sobre coleta seletiva e reciclagem. No dia 16 de abril os estudantes, juntamente com os tutores e profissionais da rede de sade dos trs municpios realizaram as intervenes nos territrios, com distribuio de folders informativos sobre o mosquito Aedes aegypti e as doenas: Dengue, Zica Vrus e Febre Chikungunya, desenvolvendo tambm atividades recreativas relacionadas ao tema com as crianas e jovens nos municpios de Xanxer e Chapec. No municpio de Xaxim, as intervenes foram desenvolvidas no centro da cidade com foco no trabalho sobre a destinao correta do lixo e a coleta seletiva, alm da distribuio de mudas de plantas nativas do Viveiro Florestal da Unochapec e aes ldicas para as crianas.

Resultados e discusso

No primeiro momento do projeto VIM 2016 os tutores apresentaram aos estudantes os objetivos e as etapas do projeto, alm de uma discusso sobre os princpios e as diretrizes do SUS e leitura sobre territorializao e mapeamento em sade. Nesse momento pde-se perceber o embasamento terico prvio que os estudantes possuam e assim, discorrer alguns aspectos sobre o SUS e sanar algumas dvidas que foram surgindo no decorrer do encontro.

No segundo momento, os grupos articularam coletivamente o roteiro da vivncia que seria realizada nos Centros de Sade da Famlia.

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 35

Esses roteiros serviram basicamente como um suporte para os estudantes no momento da prtica, com perguntas pr-estruturadas anteriormente. O momento da insero possibilitou aos estudantes a assimilao do que foi trabalhado nas tutorias em sala e a prtica vivenciada de fato, o que gerou uma compreenso das potencialidades e dos desafios enfrentados pelos profissionais dos CSF, entendendo sua dimenso de cidadania, social, cultural e ambientalmente. As vivncias possibilitaram ao grupo a discusso sobre algumas das questes vivenciadas, elencando os problemas mais evidentes para todos e a partir disso, construir um plano de interveno na comunidade.

Os problemas potenciais encontrados pelos estudantes, relatados pelas prprias CSF e pelas Secretarias da Sade referiam-se s doenas transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti. J no municpio de Xaxim, verificou-se a necessidade em trabalhar sobre a coleta seletiva do lixo assunto tambm muito pedido pela Secretaria da Sade. Nesse sentido, foi possvel entender de forma mais ampla as necessidades da comunidade para as intervenes.

No momento das intervenes, as equipes levaram orientaes sobre os cuidados com o mosquito Aedes aegypti, a diferena entre as doenas transmitidas pelo mosquito (Dengue, Febre Chikungunya e Zica vrus) e dicas de preveno. Esta prtica (estudo, vivncia e interveno) se constitui como uma iniciativa de reformulao do processo de formao profissional, buscando contemplar as reais necessidades do Sistema de Sade no Brasil a partir da viso dos estudantes, levando em considerao as especificidades regionais e mostrando que o contato e o dilogo com a comunidade pode despertar o interesse para o diagnstico do territrio em que est situado, envolvendo as caractersticas econmicas, culturais, sociais e ambientais da populao local. O VIM possibilita a insero dos estudantes nos servios de sade, a aproximao da academia com a comunidade e representa uma forma de reorganizao da formao em sade com um olhar voltado para o SUS. O VIM 2016 proporcionou um olhar interdisciplinar para os envolvidos e um olhar para a indissociabilidade entre a sade e o meio ambiente.

Referncias

BRASIL. Ministrio da Sade. Ministrio da Educao. Programa Nacional de Reorientao da Formao Profissional em Sade Pr-Sade: objetivos,

36 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

implementao e desenvolvimento potencial / Ministrio da Sade, Ministrio da Educao. Braslia: 2009.

FRIGOTTO, Gaudncio. A interdisciplinaridade como necessidade e como problema nas Cincias Sociais. Rev. Centro de Ed. E Let. Da Unioeste. v. 10 n 1 p. 41.62, 2008. Disponvel em: . Acesso em: 08 jun. 2016

UNOCHAPECO Universidade Comunitria da Regio de Chapec. Projeto Interdisciplinar e Multiprofissional VIM. Chapec. 2010.

http://e-revista.unioeste.br/index.php/ideacao/article/view/4143/3188

MELHORAMENTO GENTICO DE SEMENTES REALIZADO POR CAMPONESAS E CAMPONESES NO OESTE DE SANTA

CATARINA

Ana Elsa Munarini*

Andreia da Silva Foss**

Arlene Renk***

Silvana Winckler****

Resumo: Este artigo objetiva estudar aspectos da experincia do Movimento de Mulheres Camponesas e do Movimento de Pequenos Agricultores no oeste catarinense, com enfoque na recuperao, produo e melhoramento gentico de sementes crioulas e de plantas medicinais, evidenciando como camponesas e camponeses foram resgatando e acumulando conhecimento tradicional associado ao patrimnio gentico. Os principais elementos de anlise emprica foram buscados nos arquivos do MMC/SC e MPA/SC, e possibilitam identificar os processos destas experincias e a elaborao de estratgias que envolvem e motivam a participao dos homens e mulheres do campo. A metodologia essencialmente qualitativa, consistindo em abordagem descritiva das experincias relatadas nos arquivos mencionados, mediada pela reviso de literatura. Palavras-Chave: Agrobiodiversidade on farm, Conhecimento Tradicional,

Sementes Crioulas.

Introduo

De modo geral, a literatura registra que as mulheres foram as principais responsveis pelo desenvolvimento da agricultura. Eram elas que realizavam a coleta e o armazenamento das sementes, a classificao das melhores espcies e variedades para o consumo humano e animal, o melhoramento de cultivares pela seleo de sementes e mudas, ao tempo

* Bacharel em Direito e mestranda em Cincias Ambientais pela Unochapec. ** Bacharel em Cincias Biolgicas e mestranda em Cincias Ambientais pela Unochapec. *** Universidade Comunitria da Regio de Chapec. Av. Senador Attlio Fontana, 591, Efapi,

Chapec SC, 89809-000. **** Universidade Comunitria da Regio de Chapec. Av. Senador Attlio Fontana, 591, Efapi,

Chapec SC, 89809-000.

38 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

que acumulavam experincias acerca de sua utilizao nos cuidados com a sade da famlia e da comunidade. Ao longo dos anos observavam a adaptao das plantas ao clima, indo desde a melhor poca para plantio at a melhor planta para cada solo.

Em relao s sementes, no incio do sculo XX, surgiram laboratrios e indstrias de produo de sementes, sendo aqueles os responsveis pelo melhoramento gentico das sementes. Como no caso brasileiro, onde esse avano foi potencializado por programas governamentais que implementaram a Revoluo Verde

1. Nesse sentido

as variedades crioulas de sementes foram gradativamente substitudas pelas hbridas e, mais recentemente, pelas hbridas transgnicas.

Nesse processo histrico, observa-se a presena do Estado como rgo regulador dos direitos de propriedade industrial dos laboratrios, porm omisso quanto aos direitos dos camponeses biodiversidade e aos conhecimentos a ela associados. Sendo esses conhecimentos tradicionais, definidos por Santilli (2004) como os processos, prticas e atividades tradicionais dos povos indgenas, quilombolas e populaes tradicionais, passando de gerao em gerao, fazendo parte do modo de vida da comunidade, de sua cultura, mesmo quando s algumas pessoas da comunidade detm esse saber.

Este trabalho tem como objetivo descrever como camponesas e camponeses do MMC/SC e do MPA/SC foram mantendo e aprofundando o conhecimento sobre as plantas medicinais e sementes crioulas, compreendendo alguns conceitos relacionados aos saberes tradicionais e legislao que regulamenta essa matria.

Reviso de literatura

Encontramos inmeras referncias tericas de pesquisadores como Juliana Santilli, Manuela Carneiro da Cunha e Vandana Shiva, entre outros, que se dedicam a estudar o conhecimento tradicional, assim como a Legislao que regulamenta essa matria.

1 A Revoluo Verde promoveu um pacote de desenvolvimento de cultivares como arroz, trigo e milho de altssimo rendimento. Esse sucesso inegvel teve seus custos. Um deles foi a

homogeneizao macia de cultivares (CUNHA, 2012).

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 39

Para Santilli (2004), o conhecimento tradicional associado ao patrimnio gentico segue alguns princpios fundamentais, como a proteo atravs de um sistema jurdico que contemple os direitos territoriais e culturais dos povos e comunidades tradicionais; a proteo da integridade intelectual e cultural, valores espirituais associados aos conhecimentos tradicionais e o reconhecimento de seu valor intrnseco.

A Conveno da Diversidade Biolgica definiu agrobiodiversidade como um termo amplo que inclui todos os componentes da biodiversidade que tm relevncia para a agricultura e a alimentao. Numa linguagem mais simples, a agrobiodiversidade pode ser compreendida como a parcela da biodiversidade utilizada pelo homem na agricultura, ou em prticas correlatas, na natureza, de forma domesticada ou semidomesticada.

Esses termos so importantes quando se busca a proteo e regulamentao do acesso ao conhecimento tradicional associado ao patrimnio gentico cultivado por agricultores tradicionais, que no caso em anlise so os camponeses do oeste catarinense.

O Protocolo de Nagoia, aprovado em 2010, sinalizou que a biodiversidade e os conhecimentos tradicionais associados deveriam tornar-se um elemento cada vez mais importante para os pases. No Brasil, a Lei 13.123/2015, conhecida como Lei da Biodiversidade, dispe sobre bens, direitos e obrigaes, relativos, entre outros, ao conhecimento tradicional associado ao patrimnio gentico. Essa lei define regras de repartio de benefcios com os detentores do saber tradicional e cobe o patenteamento ilegal de conhecimentos tradicionais associados ao patrimnio gentico.

Resultados e discusso

A preocupao com o avano das biotecnologias e a percepo de que estas no vm contribuindo, efetivamente, para a melhoria das condies de vida no campo levou os movimentos aqui estudados a avaliar o seu impacto na segurana e na soberania alimentar dos agricultores, que vm perdendo o poder de deciso acerca do qu e como cultivar, compelidos pelos mecanismos do agronegcio. Este um dos principais impactos da industrializao no campo.

Motivo pelo qual o Movimento de Mulheres Camponesas no Estado de Santa Catarina iniciou, no ano 2000, um Programa de recuperao, produo, melhoramento de sementes crioulas de hortalias, visando o resgate, a conservao, o cultivo e o melhoramento de variedades crioulas

40 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

de diversas espcies. Assim como, no mesmo perodo, o Movimento de Pequenos Agricultores (MPA) iniciou a execuo de um projeto de conservao on farm, e multiplicao de sementes crioulas e varietais, principalmente de milho. A agrobiodiversidade on farm, nas palavras de Cunha (2012, p. 445), a conservao de que se incumbem naturalmente as agricultoras e os agricultores tradicionais, quando mantm diversidade de variedades de cultivares em seus roados. Nesse ambiente, os cultivares coevoluem com as demais espcies e variedades e adaptam-se, igualmente, s mudanas climticas e a outros eventos que poderiam representar uma ameaa a sua conservao.

Entre as aes prticas observa-se a organizao de uma rede de famlias guardis de sementes crioulas; a multiplicao de sementes crioulas e varietais e, a realizao de pesquisa e melhoramento com variedades crioulas junto as camponesas e camponeses.

Os arquivos e informativos pesquisados de cada Movimento so reveladores das diversas formas que as organizaes criam para esclarecer e divulgar suas aes de melhoramento gentico de sementes levando informaes para os camponeses e suas famlias. Estas prticas colocam em evidncia as questes emblemticas sobre os conhecimentos tradicionais associados ao patrimnio gentico e a biodiversidade.

Referncias

CUNHA, Manuela Carneiro. Questes suscitadas pelo conhecimento tradicional. Revista de Antropologia. So Paulo, USP, v. 55, n1, 2012.

NERLING, Daniele; MUNARINI, Anderson; DAL MAS, Vanessa; SANTOS, Emelson; REGINATTO, Charles. Conservao e multiplicao de sementes crioulas e varietais pelos camponeses do Movimento dos Pequenos Agricultores de Santa Catarina. Cadernos de Agroecologia, 2013, v. 8, n 2.

SANTILLI, Juliana. Conhecimentos Tradicionais associados a Biodiversidade: Elementos para a construo de um regime jurdico Sui Generis de Proteo. Ano 2004. Disponvel em: . acesso em: 10 maio 2016.

SHIVA, Vandana. Biopirataria: A pilhagem da natureza e do conhecimento. Traduo de Laura Cardellini Barbosa de Oliveira. Ed. Vozes: Rio de Janeiro, 2001.

http://www.anppa.org.br/encontro_anual/encontro2/GT/GT08/juliana_santilli.pdf

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 41

Documentos do MMC

Cartilha do Movimento de Mulheres Camponesas: Mulheres Camponesas em defesa da sade e da vida. MMC/Nacional, s/d.

Cartilha do Movimento de Pequenos Agricultores: Conservao e multiplicao de sementes crioulas, experincia com guardies de sementes. MPA/SC, s/d.

Informativo do MMA. Ano VIII, Edio, 47, nov/dez de 2000.

QUAL O PERFIL GERAL DOS DISCENTES DO CURSO DE CINCIAS BIOLGICAS DA UNOCHAPECO?

Anglica Cella*

Cristiane L. L. Garbinato*

Ingridy M. Colpani*

Luan M. V. Lazarotto*

Silvete A. Rodrigues*

Ronei Baldissera**

Resumo: O presente estudo traa um perfil de discentes do curso de Cincias Biolgicas da Universidade Comunitria da Regio de Chapec Unochapec, Chapec SC, Brasil. O estudo foi realizado com 67 alunos de 2 a 8 perodos de vrias idades, ambos os gneros e diferentes cidades. Um questionrio com 15 perguntas abertas e fechadas foi aplicado no ano de 2015. Aproximadamente 27% dos discentes possuem FIES, 40 discentes residem em Chapec e 27 em cidades vizinhas. A mdia geral do curso variou positivamente com as horas trabalhadas semanalmente pelos discentes. Nenhuma outra varivel influenciou na mdia geral, incluindo as categorias bolsa de pesquisa, ensino ou extenso. A classe de rendimentos mais frequente foi a que englobava de 2,5 a 4 salrios mnimos. A atuao na pesquisa e extenso foi baixa, provavelmente pelo fato da maioria dos discentes trabalharem mais de 16 horas semanais. Palavras-chave: Educao Superior, Estudantes de Biologia, Perfil acadmico.

Introduo

O curso de Cincias Biolgicas da Unochapeco ofertado desde 1992 e conta com as modalidades de licenciatura e bacharelado. O curso conta com estrutura de 14 laboratrios, Museu de Cincias Naturais e Viveiro Florestal, que servem para trabalhos com educao ambiental e complemento de estudos para os estudantes. Alm das aulas em laboratrios, os acadmicos participam de congressos e palestras,

* Curso de Cincias Biolgicas da Universidade Comunitria da Regio de Chapec -

UNOCHAPEC. Avenida Atlio Fontana, 591E, 89809-000, Chapec, SC, Brasil. ** Laboratrio de Ecologia, Curso de Cincias Biolgicas, Universidade Comunitria da Regio

de Chapec. Avenida Senador Atlio Fontana, 591E, 89809-000, Chapec, SC, Brasil.

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 43

ressaltando-se a Jornada de Estudos Ambientais, realizada anualmente na Unochapec (UNOCHAPEC, 2016).

O objetivo do curso formar um profissional que tenha a capacidade de compreender a organizao e evoluo dos seres vivos e sua relao com o meio ambiente podendo atuar na elaborao de estudos, projetos ou pesquisas cientficas em diversas reas do conhecimento (UNOCHAPEC, 2016). Levando em considerao as amplas opes de insero no mercado de trabalho, tanto na docncia quanto na pesquisa, torna-se importante conhecer o perfil dos futuros profissionais que exercero tais funes para a sociedade.

Brito (2009) ressalta que um levantamento do perfil de discentes torna-se pertinente para as universidades na medida em que se acessa informaes bsicas de seus estudantes, o que pode auxiliar na tomada de decises para o planejamento de atividades, projetos e reestruturaes curriculares. Esse tipo de pesquisa bsica tambm til para os docentes no processo de ensino-aprendizagem, uma vez que lana luz sobre padres sociais e acadmicos dos discentes, que geralmente no esto diretamente acessveis.

Estudos sobre a caracterizao do perfil de discentes de cursos de Cincias Biolgicas so escassos. Portanto, este estudo teve por objetivo traar um perfil geral dos discentes do curso de Cincias Biolgicas da Unochapec. Nesse sentido, buscou-se acessar informaes relacionadas principalmente a aspectos sociais, acadmicos e econmicos.

Materiais e mtodos

Um questionrio annimo com 15 perguntas abertas e fechadas (disponvel em https://goo.gl/NtFIuu) foi aplicado a 67 discentes (56% do total do curso). Oito questes eram qualitativas e sete quantitativas. O questionrio foi aplicado durante as aulas do segundo ao oitavo perodo do ano letivo de 2015/2. O primeiro perodo no foi amostrado, pois os acadmicos ainda no teriam uma mdia geral do curso. J para o dcimo perodo do curso de bacharelado, no houve atividades no semestre da coleta de dados. Os dados foram compilados e organizados em planilha eletrnica. Para cada varivel qualitativa, foram montadas tabelas de frequncias de ocorrncia. Para cada varivel quantitativa, foram comparadas as mdias entre diferentes categorias atravs de Testes t de Student. Uma matriz de correlao de Pearson foi calculada com todas as variveis quantitativas para acessar o grau de associao entre as mesmas.

https://goo.gl/NtFIuu

44 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

Resultados e discusso

Dos 67 discentes, 23 cursavam o 2. perodo, 21 o 4. perodo, 16 o 6. perodo e sete o 8. perodo. Percebe-se, assim, que, em princpio, houve um aumento na procura pelo curso nos ltimos anos. A maioria dos discentes (67%) esto cursando Bacharelado e poucos possuem FIES (27%). Apenas 13 discentes (~19%) atuam na pesquisa e tm bolsa de iniciao cientfica. Leo et al. (2013) encontraram resultado semelhante, no qual cerca de 13% dos estudantes participavam de grupos de pesquisa na graduao de Enfermagem. Esse nmero ainda menor para as bolsas de extenso (~0,08%). Por outro lado, os discentes que possuem algum tipo de bolsa de ensino perfazem em torno de 40% dos entrevistados.

A maioria dos discentes eram do sexo feminino (47, ~70%). A mdia de idade dos discentes de 21,28 anos (desvio-padro 3,67 anos), padro encontrado, em geral, nas universidades federais do Brasil (FONAPRACE, 2011). O tamanho mdio das famlias foi de 3,66 pessoas (desvio-padro 1,24 anos). A maioria dos discentes (60%) reside em Chapec e a grande maioria solteira (86%). A mdia do tempo de deslocamento at a Universidade foi maior (97,5 26 minutos) para os discentes que residem fora da cidade comparados com aqueles que residem em Chapec (30,46 60 minutos) (Teste t = -6,168; P < 0,001). Dados semelhantes foram encontrados por Nakamae (1997), no qual a maioria dos discentes eram solteiros e prevalecia um tempo em torno de 30 minutos para deslocamento at a instituio.

Nakamae (1997) tambm mostrou que mais da metade dos universitrios estudam menos de dez horas semanais, tempo que similar ao encontrado no presente estudo (mdia 12,67 10,6 horas semanais). A nota mdia geral dos discentes do curso de 7,67 0,67. Os discentes que moram em Chapec apresentaram nota mdia (7,63 0,64) igual a dos discentes que moram em outras cidades (7,84 0,64) (Teste t = -1,165; P = 0,251). Os homens apresentaram nota mdia geral (7,9 0,7) estatisticamente igual s mulheres (7,6 0,6) (Teste-t = -1,803; P = 0,087). A nota mdia geral entre alunos que possuem algum tipo de bolsa (Pesquisa ou Extenso) (7,74 0,57) no foi diferente da mdia dos alunos que no realizam essas atividades (7,62 0,63) (Teste t = 0,379; P = 0,706).

Quarenta e quatro (65%) discentes declararam trabalhar pelo menos 16 horas semanais e houve uma correlao positiva e significativa entre horas de trabalho semanais e mdia geral (r = 0,392; P = 0,002). Isso quer dizer que os discentes que mais trabalham apresentaram maior mdia

Ronei Baldissera et al. (Orgs.) 45

geral. No houve correlaes significativas entre a mdia geral e as variveis idade, tamanho da famlia, tempo de deslocamento, tempo de estudo e renda. O alto nmero de discentes que trabalham pode ser um fator importante para explicar a baixa procura por atividades vinculadas pesquisa e extenso.

Com relao renda declarada pelos discentes, a classe mais frequente foi a que englobava rendimentos de 2,5 a 4 salrios mnimos com 31 ocorrncias, seguida da classe entre 1 a 2 salrios mnimos. Nas universidades federais nacionais, 41% das famlias apresentam uma renda mensal de 3 salrios mnimos (FONAPRACE, 2011). Por outro lado, Ferreira (2000) mostrou que apenas 12% dos estudantes de medicina possuam renda mensal inferior a 10 salrios mnimos. No presente estudo, observou-se que quanto mais os discentes trabalham, maior a renda (r = 0,263; P = 0.03). A variao na renda dos discentes no influenciou a mdia geral do curso ( = -0,057; P = 0,672).

Referncias

BRITO, A.M.R. de; BRITO, M.J.M; SILVA, P.A.B. Perfil sociodemogrfico de discentes de enfermagem de instituies de ensino superior de Belo Horizonte. Escola Anna Nery Revista de Enfermagem, v. 13, n. 2, p. 328-333, 2009.

FERREIRA, R.A.; PERET FILHO, L.A; GOULART, E.M.A.; VALADO, M.M.A. O estudante de medicina da Universidade Federal de Minas Gerais: perfil e tendncias. Revista da Associao Mdica Brasileira, v. 46, n. 3, p. 224-231, 2000.

Frum Nacional de Pr-Reitores de Assuntos Comunitrios e Estudantis. Perfil socioeconmico e cultural dos estudantes de graduao das universidades federais brasileiras. 2011. Disponvel em: . Acesso em: 21 maio 2016.

LEO, E.R. et al. Perfil acadmico, crenas e autoeficcia em pesquisa de enfermeiros clnicos: implicaes para o Programa de Pesquisa de Enfermagem de um Hospital na Jornada Magnet. Einstein. So Paulo, v. 11, n. 4, p 507-513, 2013.

NAKAMAE, D.D. et al. Caracterizao socioeconmica e educacional do estudante de enfermagem nas escolas de Minas Gerais. Revista da Escola de Enfermagem da USP, v. 31, n. 1, p. 109-118, 1997.

http://201.57.207.35/fonaprace

46 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

UNOCHAPEC. UNIVERSIDADE COMUNITRIA DA REGIO DE CHAPEC. Sntese do projeto pedaggico do curso de graduao em Cincias Biolgicas-PPC, 2016. Disponvel em: . Acesso em: 18 maio 2016.

https://www.unochapeco.edu.br/

SUSTENTABILIDADE NA ABORDAGEM ESCOLAR E O AUXLIO DA EDUCAO AMBIENTAL NO PENSAMENTO ECOLGICO

EM ESCOLAS ESTADUAIS DE NOVO BARREIRO RS

Daniela da Costa*

Anelise Francesquetto*

Anglica Beilfuss*

Camila R. M. Perusato*

Laura Oestreich*

Simoni Peixoto*

Tais L. Konflanz**

Resumo: Frente ao grande risco ambiental devido aos gravssimos impactos antropolgicos de suma importncia buscar minimizar tais atividades. Partindo do pressuposto que a escola, pblica ou particular, tem um importante papel na luta contra os devastadores impactantes ambientais, este trabalho tem como objetivo geral integrar o tema sustentabilidade no mbito escolar, buscando analisar o desempenho da escola, na tentativa de formar o pensamento crtico e ecolgico dos alunos, pois no mbito escolar que inicia-se a formao de uma conscincia ecolgica. Neste trabalho buscou-se integrar prticas de Educao Ambiental como uma ferramenta de livre uso das escolas no auxlio da formao da conscincia ambiental dos estudantes.

Palavras-chave: Conscincia ecolgica, Educao bsica, Sustentabilidade.

Introduo

A sustentabilidade tornou-se uma questo de vida ou morte devido a ameaas ambientais nunca registradas antes. Deste modo cabe sociedade escolher seu futuro, e isso implica em escolher unir-se em prol do meio ambiente ou aceitar a situao atual e esperar a destruio da diversidade (BOFF, 2012).

* Graduandas do Curso de Cincias Biolgicas da UFSM. ** Mestre em Ensino Cientfico e Tecnolgico.

48 Meio ambiente e desenvolvimento na grande fronteira Mercosul

A Educao Ambiental assume o desafio de garantir a construo de uma sociedade sustentvel, promovendo afinidade com o planeta e seus recursos, valores ticos como colaborao, solidariedade, generosidade, tolerncia, dignidade e respeito diversidade. Necessitando ser acima de tudo um ato poltico voltado para a transformao social, sendo apropriado para transformar valores e atitudes, construindo assim novos hbitos e conhecimentos, protegendo uma nova tica, que sensibiliza e conscientiza no processo de formao do ser humano, da sociedade e da natureza, mantendo o equilbrio global para melhorar a qualidade de vida (CUBA apud CARVALHO, 2006).

A escola por sua vez, tem um papel importante na formao de cidados no que tange a temtica da Educao Ambiental, ou seja, a escola deve atuar como um agente de formao socioambiental. O tema deve ser abordado em todas as disciplinas do currculo, assumindo o seu papel de tema transversal. Os educadores tm funo decisiva na abordagem da Educao Ambiental no dia a dia escolar, fazendo com que os alunos desenvolvam um pensamento crtico e ecolgico, obtendo assim como perspectiva uma transformao de hbitos e prticas sociais e a formao de uma cidadania ambiental (JACOBI, 2005).

O presente estudo traz como objetivo levar o tema Sustentabilidade para dentro da escola, analisando o desempenho desta em relao temtica, no sentido de formar um pensamento crtico e ecolgico dos alunos. As atividades de Educao Ambiental foram realizadas no municpio de Novo Barreiro, regio noroeste do estado do Rio Grande do Sul, com 38 adolescentes de uma escola estadual, inseridos em turmas de primeiro e segundo anos do ens