RPBA Boletim de Jurisprudência Fiscal n.º 4 de 2015

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Boletim de Jurisprudência Fiscal Edição n.º 4/2015 (Junho) Aplicação do regime dos preços de transferência a alienações, pelo acionista, de acções de uma sociedade a outra A venda pelo accionista de acções numa sociedade a uma outra foi apreciada em duas recentes decisões de Tribunais Arbitrais (TA), que de alguma forma se contradizem. Nesses casos a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) socorreu-se do regime dos preços de transferência (RPT) previsto no artigo 63.º do Código do IRC e na Portaria 1446-C/2001, de 21 de Dezembro. Decisão do TA, no processo n.º 130/2013-T, de 19 de Dezembro de 2013. Neste caso, a AT considerou existirem relações especiais e um valor de alienação das acções demasiado alto, socorrendo-se do estabelecido no RPT, no artigo 36.º, n.º 4, da LGT, e no artigo 6.º, n.º 4, do Código do IRS. Tendo determinado esse quantum em excesso através de um método que pretendeu uma aproximação ao valor de mercado, a AT requalificou aquele montante como rendimento de capitais. O TA anulou a liquidação considerando (i) que o RPT não é aplicável à determinação de rendimentos de capital, mas apenas a rendimentos profissionais; (ii) que a correcção do valor de transmissão de acções tem uma previsão especial no artigo 52.º, n.º 2, alínea b), do CIRS (no qual o valor é determinado com base no último balanço) e (iii), por fim, que a presunção estabelecida no artigo 6.º, n.º 4, do CIRS, foi ilidida pela Requerente, porque se provou que os lançamentos na conta de sócios foram feitos a título de suprimentos (“espécie do conceito de «mútuos», expressamente referido naquele artigo”). Decisão do TA, no processo n.º 275/2014-T, de 5 de Dezembro de 2014. Neste caso a AT também se socorreu do RPT, tendo determinado o valor de mercado da alienação das acções com recurso à regra prevista no artigo 15.º, n.º 3, do Código do Imposto do Selo. Desconsiderou uma parte do montante lançado na conta de sócios (pela correcção em baixa do valor de alienação das acções) e, concomitantemente, requalificou o excesso como rendimentos de capitais ao abrigo do referido artigo 6.º, n.º 4, do Código do IRS.

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Boletim de Jurisprudência FiscalEdição n.º 4/2015 (Junho)

Aplicação do regime dos preços de transferência a alienações, pelo acionista, de acções de uma sociedade a outra

A venda pelo accionista de acções numa sociedade a uma outra foi apreciada em duas recentes decisões de Tribunais Arbitrais (TA), que de alguma forma se contradizem. Nesses casos a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) socorreu-se do regime dos preços de transferência (RPT) previsto no artigo 63.º do Código do IRC e na Portaria 1446-C/2001, de 21 de Dezembro.

Decisão do TA, no processo n.º 130/2013-T, de 19 de Dezembro de 2013.

Neste caso, a AT considerou existirem relações especiais e um valor de alienação das acções demasiado alto, socorrendo-se do estabelecido no RPT, no artigo 36.º, n.º 4, da LGT, e no artigo 6.º, n.º 4, do Código do IRS. Tendo determinado esse quantum em excesso através de um método que pretendeu uma aproximação ao valor de mercado, a AT requalificou aquele montante como rendimento de capitais. O TA anulou a liquidação considerando (i) que o RPT não é aplicável à determinação de rendimentos de capital, mas apenas a rendimentos profissionais; (ii) que a correcção do valor de transmissão de acções tem uma previsão especial no

artigo 52.º, n.º 2, alínea b), do CIRS (no qual o valor é determinado com base no último balanço) e (iii), por fim, que a

presunção estabelecida no artigo 6.º, n.º 4, do CIRS, foi ilidida pela Requerente, porque se provou que os lançamentos na conta de sócios foram feitos a título de suprimentos (“espécie do conceito de «mútuos», expressamente referido naquele artigo”).

Decisão do TA, no processo n.º 275/2014-T, de 5 de Dezembro de 2014.

Neste caso a AT também se socorreu do RPT, tendo determinado o valor de mercado da alienação das acções com recurso à regra prevista no artigo 15.º, n.º 3, do Código do Imposto do Selo. Desconsiderou uma parte do montante lançado na conta de sócios (pela correcção em baixa do valor de alienação das acções) e, concomitantemente, requalificou o excesso como rendimentos de capitais ao abrigo do referido artigo 6.º, n.º 4, do Código do IRS.O TA considerou reunidas as condições para a aplicação do RPT, admitiu que a avaliação prevista no artigo 15.º, n.º 3, do Código do IS, apesar de não ser a mais adequada, era ainda assim admissível, e que os lançamentos nas contas dos sócios não eram totalmente cobertos pelos contratos (tal como corrigidos pela AT), criando um excesso de distribuição que devia ser tributado ao abrigo do artigo 6.º, n.º 4, do Código do IRS.

Para obter mais informações sobre estes temas contacte: Ana Rita Pereira / [email protected] e Bruno Botelho Antunes / [email protected]