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Rui Pinto Duarte Outubro 2012 Breve introdução ao Direito Comercial (para os alunos de Teoria Geral do Direito Privado) 0. Relação da origem da cadeira de Teoria Geral do Direito Privado com o Direito Comercial… 1. O Direito Comercial como “precipitado histórico” - Prevenção terminológica liminar (a “coisa” é diferente do que o nome leva crer...) - A evolução do conceito do Direito Comercial (direito dos comerciantes, direito dos atos de comércio, direito da empresa) - Dificuldades da definição de Direito Comercial - O surgimento e a evolução do Direito Comercial - A comercialização do Direito Civil - Direito Comercial e comércio - Direito Comercial e economia - A «invenção» da responsabilidade limitada e a sua (ilimitada…) relevância - Paralelos com o Direito do Trabalho e com o Direito do Consumo 1

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Rui Pinto DuarteOutubro 2012

Breve introdução ao Direito Comercial (para os alunos de Teoria Geral do

Direito Privado)

0. Relação da origem da cadeira de Teoria Geral do Direito Privado com o Direito

Comercial…

1. O Direito Comercial como “precipitado histórico”

- Prevenção terminológica liminar (a “coisa” é diferente do que o nome leva crer...)

- A evolução do conceito do Direito Comercial (direito dos comerciantes, direito dos atos de

comércio, direito da empresa)

- Dificuldades da definição de Direito Comercial

- O surgimento e a evolução do Direito Comercial

- A comercialização do Direito Civil

- Direito Comercial e comércio

- Direito Comercial e economia

- A «invenção» da responsabilidade limitada e a sua (ilimitada…) relevância

- Paralelos com o Direito do Trabalho e com o Direito do Consumo

- A fragmentação do Direito Comercial (Direito das Sociedades, Direito da Propriedade

Industrial, Direito dos Valores Mobiliários, Direito Bancário, Direito dos Seguros, etc...).

2. Evolução do direito comercial português

- O Código de Ferreira Borges

- A lei de 22 de junho de 1867 sobre sociedades anónimas

- O Código de Veiga Beirão

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- Linhas gerais da evolução posterior (derrogações sucessivas do Código de Veiga Beirão,

mas manutenção das suas regras estruturais)

- O caso da falência/insolvência desde 1899: Código das Falências de 1899, Código de

Processo Comercial de 1905, Decreto 21.758, de 22 de outubro de 1932 (instituidor da

insolvência dos não comerciantes), Código de Falências de 1935, CPC de 1939 (renovado

em 1961 e em 1967), Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de

Falência de 1993 e Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa de 2004

- Relevância do Direito da União Europeia

3. As fontes do direito comercial português vigente

- Leis Uniformes relativas ao Cheque e às Letras e Livranças

- O Código Cooperativo

- O Código das Sociedades Comerciais

- O diploma sobre o Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada (EIRL»)

- O Código dos Valores Mobiliários

- Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa

- A Lei do Contrato de Seguro

- Outros diplomas (v.g., ACE, consórcio e associação em participação, agência)

- O que resta do Código Comercial

4. Âmbito do Direito Comercial no direito português actual

- Alguns preceitos do Código Comercial (1.º, 2.º, 13, 230, 362, 366, 394, 397, 403, 463, 464

e 99)

- O art. 1.º do Código das Sociedades Comerciais

5. Algumas obrigações específicas dos comerciantes

Historicamente, a qualidade de comerciante teve as mais diversas consequências. Para

além de determinar a aplicação de regras substantivas próprias, determinou a submissão a

um foro próprio e a um regime específico de liquidação do património em benefício dos

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credores, em caso da insuficiência económica ou financeira. No direito português actual, não

existe a dualidade entre insolvência e falência que existiu entre 1932 e 19931 e a

competência dos tribunais de comércio não é tão vasta quanto foi noutros tempos2.

Embora com menos força do que no passado, a qualidade de comerciante releva ainda para

vários efeitos. Citem-se, sem preocupação de exaustão3 e sem considerar casos de

concurso de normas4:

A obrigação de ter escrituração (art. 29 do CCom);

1 A insolvência dos não comerciantes foi criada pelo Decreto 21.758, de 22 de outubro de 1932, tendo depois sido recolhida no Código de Processo Civil (CPC) de 1939. Até 1993, a secção do CPC sobre liquidação em benefício de credores dedicou um conjunto de subsecções à situação do “comerciante impossibilitado de cumprir as suas obrigações” (a chamada falência) e uma subsecção à “insolvência dos não comerciantes”. Esses regimes de falência e de insolvência dos não comerciantes eram diversos nalguns aspetos, designadamente quanto aos próprios pressupostos da sua declaração (os não comerciantes podiam ser declarados insolventes sempre que o seu ativo fosse inferior ao seu passivo, ao passo que a declaração de falência dos comerciantes em nome individual e das sociedades com sócios de responsabilidade limitada dependia do incumprimento de obrigações; no tocante às “sociedades de responsabilidade limitada”, a declaração de falência podia assentar nesse incumprimento ou na insuficiência do ativo para satisfazer o passivo, mas com a exigência de essa insuficiência ser “manifesta”). O Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência (CPEREF), aprovado pelo Dec.-Lei 132/93, de 23 de Abril, substituiu essa secção do Código de Processo Civil, unificando, sob o nome “falência”, a designação de regime dos processos de liquidação em benefício de credores (embora tenha mantido algumas diferenças de regime em função de o insolvente ser ou não titular de empresa, como a negação aos não titulares de empresas do acesso às providências de recuperação). O CPEREF foi substituído pelo Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado pelo Dec.-Lei 53/2004, de 18 de Março, que pôs de lado a designação de “falência”, passando a denominar “insolvência” todos os processos de execução universal em benefício de credores. 2 Entre 1833 (Código de Ferreira Borges) e 1932 existiu uma jurisdição comercial de carácter geral, sob o nome de “tribunais de comércio”, a qual foi extinta pelo Decreto 21.694, de 29 de Setembro de 1932. Só em 1997 (em resultado da Lei 37/96, de 31 de Agosto, e do Dec.-Lei 40/97, de 6 de Fevereiro) é que voltaram a existir tribunais especializados em matéria comercial, inicialmente com competência material limitada aos processos de recuperação de empresa e de falência (de resto, denominados, precisamente, “tribunais de recuperação da empresa e de falência”) e com competência territorial circunscrita às comarcas das zonas metropolitanas de Lisboa e Porto. Desde 1999, a Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei 3/99, de 13 de Janeiro (entretanto objeto de várias alterações) passou a prever tribunais de comércio de competência mais ampla, abrangendo questões relativas a insolvência, a sociedades, a propriedade industrial, a registo comercial e a concorrência (v. o respetivo art. 89). 3 Sobre as obrigações impostas aos comerciantes, v., por exemplo, Jorge Manuel Coutinho de Abreu, Curso de Direito Comercial, vol. I, 7.ª ed., Coimbra, Almedina, 2009, pp. 154 e ss., e Filipe Cassiano dos Santos, Direito Comercial Português, vol. I, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, pp. 191 e ss.4 Na verdade, existem outras normas das quais resultam regimes parcialmente iguais aos resultantes das normas referidas no texto (podendo servir como exemplo as normas do Código do IRC sobre obrigações contabilísticas das empresas).

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A obrigação de arquivar a correspondência, a escrituração e os documentos a ela

relativos (art. 40 do CCom);

A obrigação de dar balanço anual ao activo e passivo (art. 62 CCom);

A obrigação de prestar contas (art. 63 CCom);

A força probatória dos livros de escrituração comercial (art. 44 CCom);

A determinação da taxa de juros aplicável aos créditos (art. 102, § 3.º CCom);

A prova dos empréstimos e dos penhores (arts. 396 e 400 CCom);

O dever de apresentação à insolvência (art. 18 do CIRE);

O prazo prescricional dos créditos (art. 317, alínea b), do CC)5.

6. Alguns outros aspectos do regime das relações comerciais

- O regime de solidariedade nas obrigações comerciais (art. 100 CCom);

- Solidariedade do fiador (art. 101 CCom)

- Onerosidade e regime de juros (arts. 232, 395 e 102 CCom)

- Outras regras sobre prescrição (art. 174 CSC, preceitos relevantes das leis sobre letras,

livranças e cheques)

- Relevância dos usos (interpretação jurisprudencial do art. 407 CCom)

- Outras regras sobre forma dos actos (v. g., regime penhor a favor de bancos)

5 No caso dos comerciantes em nome individual, tem ainda especial relevância a comunicabilidade das dívidas aos cônjuges (art. 1691, n.º 1, alínea d) do CC e art. 15 do CCom).

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Anexo I

Extractos da História do Direito Comercial de Francesco Galgano6

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Inicialmente, é o ius mercatorum: não só porque regula a actividade dos mercadores, mas

também e sobretudo porque é direito criado pelos mercadores, direito que nasce dos

estatutos das corporações mercantis, do costume mercantil e da jurisprudência dos tribunais

consulares (de mercadores).

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Na idade moderna, que é a época das codificações do direito privado, a época da mediação

do Estado na regulação de todas as relações sociais, o antigo particularismo jurídico

apresenta-se de um modo diferente: o direito comercial é o direito dos códigos comerciais

separados dos códigos civis, das jurisdições comerciais separadas das jurisdições cíveis.

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O direito comercial, pese embora o nome, não corresponde necessariamente a uma

categoria económica, isto é, não está vinculado a um sector específico do sistema

económico.

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O direito comercial não é direito do comércio: não regula nem nunca regulou todo o

comércio; nunca foi um sistema normativo auto-suficiente que abrangesse todo um sector

da vida económica; também o direito civil contribuiu sempre para a regulação da vida

comercial através do direito das obrigações e das normas disciplinadoras dos contratos. Os

estatutos dos mercadores remetiam expressamente para o ius civile, que era então o direito

privado romano derivado do Corpus Juris, como fonte subsidiária do ius mercatorum. Para

os códigos civis remetem igualmente os modernos códigos comerciais, estabelecendo que a

“matéria mercantil” se regula in primis pelo código comercial e pelos usos do comércio,

regulando-se pelo código civil tudo o que neles se não compreenda.

6 Lisboa, Signo Editores, s/d (tradução portuguesa do original italiano de 1976), págs. 11 a 14 e 39 a 41.

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Se o direito comercial não é todo o direito do comércio, tão pouco é apenas o direito do

comércio; as actividades industriais constituem, desde que iniciaram, objecto do direito

comercial.

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A corporação mercantil estende os seus poderes, normativos e jurisdicionais, para fora da

sua esfera corporativa, desenvolvendo autênticas funções de governo da sociedade urbana.

A corporação estabelece, através dos seus próprios estatutos, uma regulação das relações

comerciais que será vinculativa não apenas para os comerciantes membros da corporação -

incluindo os artesãos -, mas também para terceiros, não comerciantes, que com estes

estabelecessem relações. A corporação cria, no seu próprio seio, jurisdições mercantis,

exercidas por juízes mercantis que, além da competência para conheceram das questões

controvertidas entre comerciantes, conhecem das causas entre comerciantes e não

comerciantes.

O ius mercatorum nasce, portanto, como um direito directamente criado pela classe

mercantil, sem a mediação da sociedade política; nasce como um direito imposto em nome

de uma classe, e não eclesiásticos, aos nobres, aos militares estrangeiros. Pressuposto da

sua aplicação é o mero facto de se haverem estabelecido relações com um comerciante. O

tribunal consular é o único competente para julgar as causas comerciais, bastando para tal

que apenas uma das partes seja comerciante; o não comerciante ou o estrangeiro que

renunciasse à jurisdição comercial perderia, de futuro, o direito de invocar em seu favor o ius

mercatorum e a jurisdição consular, e, em algumas cidades, estava mesmo impedido de

realizar qualquer tipo de comércio com membros da corporação mercantil.

A justificação dada a esta eficácia extra-corporativa do direito e da jurisdição mercantis é, na

sua origem, uma fictio iuris: qualquer pessoa que se relacione com um comerciante

presume-se - sem possibilidade de prova em contrário - também comerciante. A seguir,

configurou-se a ideia de privilégio; o direito comercial vincula qualquer pessoa em virtude de

privilegium mercaturae. A razão substancial para tal reside, de modo claro, na ascensão

política da classe mercantil. O poder que possui na cidade permite-lhe não apenas

desenvolver em benefício próprio o direito e a política municipais, mas também, quando o

crê necessário, fundar a sua pretensão hegemónica na mediação das instituições da cidade.

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As fontes dos ius mercatorum eram os estatutos das corporações mercantis, o costume

mercantil e a jurisprudência da cúria dos mercadores. Nos estatutos confluíam vários

materiais normativos: o juramento dos comerciantes - eleitos cônsules da corporação - que

continha o programa do seu mandato, as deliberações do conselho, formado pelos

comerciantes anciãos, e da assembleia geral dos comerciantes, e também os princípios

consolidados pelo costume e pela jurisprudência; paralelamente, uma magistratura de

comerciantes, dita estatutária, ocupava-se da compilação dos estatutos e da sua

actualização. O costume nascia da constante prática contratual dos comerciantes: as

modalidades contratuais que consideravam vantajosas convertiam-se em direito; as

cláusulas contratuais transformavam-se, uma vez generalizadas, no conteúdo legal dos

contratos. Por último, os comerciantes designados pela corporação, compunham os

tribunais que decidiam as controvérsias comerciais.

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A expressão ius mercatorum pertence à linguagem jurídica culta; usavam-na,

prevalecentemente, os glosadores como Bártolo e Baldo. A expressão possui um significado

especial: mais do que referir-se a um ramo de direito, significa um modo particular de criar

direito. Chama-se ius mercatorum porque foi criado pela classe mercantil, e porque regula a

actividade dos comerciantes.

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Anexo II

Excerto do livro Escritos sobre Direito das Sociedades

A autonomia patrimonial e a limitação da responsabilidade

Cada sociedade é titular de um património que é separado dos patrimónios dos seus sócios.

Nos casos em que a sociedade constitui uma pessoa jurídica, essa autonomia resulta

inevitavelmente dessa condição. No entanto, mesmo nos casos em que a condição de

pessoa jurídica está ausente, não é plena, ou é questionável, a referida autonomia

manifesta-se. É o que se passa nas sociedades civis (art. 999 do Código Civil) e nas

sociedades comerciais incompletas ou irregulares (por força da interpretação conjugada dos

arts. 36 e ss. do CSC)7.

O clímax da autonomia patrimonial é a responsabilidade limitada dos sócios, ou seja, a

limitação da responsabilidade dos sócios ao pagamento das contribuições para a sociedade

a que se obrigam ou, por outras palavras ainda, a irresponsabilidade dos sócios pelas

obrigações da sociedade.

Quando as sociedades iniciaram o seu desenvolvimento, nos últimos séculos da Idade

Média, os sócios (no mínimo, alguns) eram responsáveis pelas obrigações sociais. O

processo que levou às “sociedades de responsabilidade limitada” foi longo e teve como

passo determinante a “invenção” das companhias privilegiadas8.

7 Sobre a relação entre personalidade jurídica e autonomia patrimonial, v. A. Ferrer Correia, A Autonomia Patrimonial como Pressuposto da Personalidade Jurídica, in Estudos Vários de Direito, Coimbra, 1982, pp. 547 e ss., e Lições de Direito Comercial, vol. II, Sociedades Comerciais, cit., pp. 51 e ss.8 Sobre as origens das “sociedades de responsabilidade limitada”, v. por exemplo, Fernand Braudel, Os Jogos das Trocas, Lisboa e Rio de Janeiro, Cosmos, 1985, pp. 391 e ss. (trad. do original francês de 1979), Francesco Galgano, História do Direito Comercial (trad. do original italiano de 1980), Lisboa, Signo, s/d, pp. 61 e ss., Guido A. Ferrarini, Origins of Limited Companies and Company Law Modernisation in Italy: a Historical Outline na obra colectiva VOC 1602-2002 400 Years of Company Law (edited by Ella Gepken-Jager, Gerard van Solinge e Levinus Timmerman, Kluwer, 2005), pp. 189 e ss., Rui Manuel de Figueiredo Marcos, As Companhias Pombalinas, Coimbra, Almedina, 1997, pp. 14 e ss., e Jorge Manuel Coutinho de Abreu, Curso de Direito Comercial, vol. II, Das Sociedades, cit.,

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Foi no âmbito destas que primeiro foi consagrada a responsabilidade limitada dos membros

de sociedades, como foi nele que primeiro as participações dos sócios foram representadas

por títulos negociáveis (as ações). As iniciativas – públicas ou apadrinhadas pelo poder

político – de constituição dessas companhias assentavam mesmo nesses dois pilares do

direito das sociedades: a limitação do risco e a fácil mobilização do valor investido pelos

sócios.

O que demorou mais de dois séculos foi a plena extensão ao campo da autonomia privada

do que nasceu como prerrogativa pública: só no século XIX é que os Estados permitiram a

constituição de sociedades por acções sem dependência de autorização casuística9.

Na Europa continental, a criação de formas societárias “de responsabilidade limitada” aptas

a dar forma a projetos empresariais de porte inferior ao das sociedades por ações ainda

demorou mais umas décadas. É que, as primeiras leis de liberalização das sociedades por

ações continham requisitos difíceis de preencher nos pequenos projetos empresariais –

nomeadamente o da exigência de um certo número de acionistas. Só com a lei alemã de

1892 sobre as sociedades por quotas é que se iniciou no espaço continental a facilitação da

limitação da responsabilidade dos sócios nos pequenos projetos.

Ainda assim, ficou de fora a possibilidade de os comerciantes singulares alcançarem essa

limitação de risco. Tal último passo, na generalidade dos países europeus, só foi dado com

a criação das sociedades por quotas unipessoais – nomeadamente em transposição da 12.ª

diretiva comunitária em matéria de sociedades10.

pp. 75 e ss. Sobre o caso dos Estados Unidos da América, v. Herbert Hovenkamp, Enterprise and American Law 1836-1937, Harvard University Press, 1991, mormente pp. 12, 13 e 49 e ss. 9 Sobre essa “conquista da liberdade”, v. a síntese clássica de Georges Ripert no livro Aspects Juridiques du Capitalisme Moderne, 2.ª ed., Paris, LGDJ, 1951, mormente pp. 56 e ss. Entre nós, v., por exemplo, Ilídio Duarte Rodrigues, A Administração das Sociedades por Quotas e Anónimas, Lisboa, Petrony, 1990, pp. 17 e ss., Luís Brito Correia, Os Administradores de Sociedades Anónimas, Coimbra, Almedina, 1993, pp. 77 e ss., Jorge Manuel Coutinho de Abreu, Curso de Direito Comercial, vol. II, Das Sociedades, cit., pp. 77 e ss., e António Pereira de Almeida, Sociedades Comerciais, 4.ª ed., Coimbra, Coimbra Editora, 2006, pp. 37 e ss. Para o caso dos Estados Unidos da América, v. o citado Herbert Hovenkamp, Enterprise and American Law 1836-1937, nos lugares citados.10 No caso português, os empresários singulares podem também alcançar a limitação da responsabilidade por meio da figura do estabelecimento individual de responsabilidade limitada

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A responsabilidade limitada foi, e continua a ser, um dos principais alicerces do

capitalismo11. Sem ela o mundo não seria o que é, pois não teria sido possível reunir capitais

de modo a formar as empresas gigantes que transformaram a economia e promoveram o

desenvolvimento tecnológico12. A limitação da responsabilidade terá sido mesmo a inovação

legislativa que mais contribuiu para o desenvolvimento do capitalismo. Daí que não seja

excessivo sublinhar a sua importância.

Nalguns casos, porém, o legislador impõe aos sócios de sociedades de responsabilidade

limitada responsabilidade pelas obrigações das mesmas. No direito português vigente,

merecem destaque:

O caso da sociedade (por quotas ou anónima) que domina totalmente outra (por

quotas ou anónima), à qual a lei impõe responsabilidade pelas obrigações da

sociedade dominada, constituídas antes ou durante a existência de domínio total

(arts. 491 e 501 do CSC);

(EIRL). Para um balanço da experiência do EIRL e uma previsão pessimista sobre o seu futuro, v. José Engrácia Antunes, O Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada: Crónica de uma Morte Anunciada, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, ano III, 2006. Na literatura anterior, v. Maria Ângela Coelho, A Limitação da Responsabilidade do Comerciante em Nome Individual, in Revista de Direito e Economia, anos VI/VII, 1980/1981, e (com os apelidos Bento Soares) A Limitação de Responsabilidade do Comerciante Individual: o EIRL e a Sociedade por Quotas Unipessoal em Confronto, in Colóquio “Os Quinze Anos de Vigência do Código das Sociedades Comerciais” (obra colectiva), Fundação Bissaya Barreto, Instituto Superior Bissaya Barreto, Coimbra, 2003, António Pereira de Almeida, A Limitação da Responsabilidade do Comerciante Individual, in Novas Perspectivas do Direito Comercial (obra colectiva), Coimbra, Livraria Almedina, 1988, José de Oliveira Ascensão, O Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada ou o Falido Rico, in Estruturas Jurídicas da Empresa (obra colectiva), Lisboa, AAFDL, s/d (1989?) e Estabelecimento Comercial e Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada, in Novas Perspectivas do Direito Comercial (obra colectiva), Coimbra, Livraria Almedina, 1988 (também publicado na Revista da Ordem dos Advogados, ano 47, I, Abril 1987), Albino Matos, Constituição do E.I.R.L. e Liberação do Capital, in Revista do Notariado, ano X, n.º 37, 1990/1 (Janeiro-Abril).11 Note-se que as “sociedades de responsabilidade limitada” não foram o único mecanismo de limitação do risco que o capitalismo desenvolveu. Como exemplos de outros, citem-se o seguro, entre os mais antigos, e os “produtos derivados” entre os mais recentes.12 V., paradigmaticamente, o que escrevem Tadeusz Kowalik no verbete Capital da Enciclopédia Einaudi (na edição portuguesa publicada pela Imprensa Nacional - Casa da Moeda, v. vol. 40, pp. 99 e ss.) e Irfan Habib na História da Humanidade publicada pela UNESCO (na edição portuguesa, vol. V, Verbo 2000, p. 35). Já Adam Smith, apreciando as sociedades por acções do seu tempo, escreveu: “This total exemption from risk, beyond a limited sum, encourages many people to become adventurers in joint stock companies, who would, upon no account, hazard their fortunes in any private copartnery” (The Wealth of Nations, Books IV-V, Londres et alii, Penguin Books, 1999, pp. 330).

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O caso do sócio único de sociedade declarada falida13, que responde ilimitadamente

pelas obrigações sociais contraídas no período posterior à concentração das quotas

ou ações, se, nesse período, não tiverem sido observados os preceitos legais que

estabelecem a afetação do património da sociedade ao cumprimento das respetivas

obrigações (art. 84 do CSC).

13 É a expressão do art. 84 do CSC, havendo, porém, a realçar que o instituto que em Portugal tradicionalmente era designado “falência” é actualmente designado “insolvência”, sendo a pessoa ou entidade objecto da respectiva declaração designada “insolvente” – e não “falida”.

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Anexo III

Índice do Código Comercial com indicação das partes revogadas

Livro Primeiro - Do Comércio em Geral

Título I. Disposições Gerais (arts. 1.º a 6.º) Título II. Da Capacidade Comercial e dos Comerciantes (arts. 7.º a 18)

Capítulo I. Da Capacidade Comercial Capítulo II. Dos Comerciantes

Título III. Da Firma (arts. 19 a 28) [revogado]

Título IV. Da Escrituração (arts. 29 a 44) Título V. Do Registo (arts. 45 a 61) [revogado]

Título VI. Do Balanço e da Prestação de Contas (arts. 62 e 63) Título VII. Dos Corretores (arts. 64 a 81) [revogado]

Título VIII. Dos Lugares Destinados ao Comércio Capítulo I. Das Bolsas (arts. 82 a 92) [revogado]

Capítulo II. Dos Mercados, Feiras, Armazéns e Lojas (arts. 93 a 95)

Livro Segundo - Dos Contratos Especiais de Comércio

Título I. Disposições Gerais (arts. 96 a 103) Título II. Das Sociedades (arts. 104 a 223) [revogado]

Título III. Da Conta em Participação (arts. 224 a 229) [revogado]

Título IV. Das Empresas (arts. 230)

Título V. Do Mandato (arts. 231 a 277)

Capítulo I. Disposições Gerais

Capítulo II. Dos Gerentes, Auxiliares e Caixeiros

Capítulo III. Da Comissão

Título VI. Das Letras, Livranças e Cheques (arts. 278 a 343) [revogado]

Título VII. Da Conta Corrente (arts. 344 a 350)

Título VIII. Das Operações de Bolsa (arts. 351 a 361)

Título IX. Das Operações de Banco (arts. 362 a 364)

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Título X. Do Transporte (arts. 366 a 393)

Título XI. Do Empréstimo (arts. 394 a 396)

Título XII. Do Penhor (arts. 397 a 402)

Título XIII. Do Depósito (arts. 403 a 407)

Título XIV. Depósito de Géneros e Mercadorias nos Armazéns Gerais (arts. 408 a 424)

Título XV. Dos Seguros (arts. 425 a 462) [revogado]

Capítulo I. Disposições Gerais

Capítulo II. Dos Seguros contra Riscos

Secção I. Disposições Gerais

Secção II. Do Seguro contra Fogo

Secção III. Do Seguro de Colheitas

Secção IV. Do Seguro de Transportes por Terra

Capítulo III. Do Seguro de Vidas

Título XVI. Da Compra e Venda (arts. 463 a 476)

Título XVII. Do Reporte (arts. 477 a 479)

Título XVIII. Do Escambo ou Troca (art. 480)

Título XIX. Do Aluguer (arts. 481 e 482)

Título XX. Da Transmissão e Reforma dos Títulos de Crédito (arts. 483 e 484)

Livro Terceiro - Do Comércio Marítimo (arts. 485 a 691) [revogados 485 a 487 e 489 a 573]

Livro Quarto - Das Falências (arts. 692 a 749) [todo revogado desde 1899]

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Anexo IV

Extratos do Código Comercial

Art. 1º (Âmbito da lei comercial)14

A lei comercial rege os actos de comércio, sejam ou não comerciantes as pessoas que

neles intervêm.

Art.º 2.º (Actos de comércio)

Serão considerados actos de comércio todos aqueles que se acharem especialmente

regulados neste Código, e, além deles, todos os contratos e obrigações dos comerciantes,

que não forem de natureza exclusivamente civil, se o contrário do próprio acto não resultar.

Art.º 13.º (Quem é comerciante)São comerciantes:

1.º As pessoas, que, tendo capacidade para praticar actos de comércio, fazem deste

profissão;

2.º As sociedades comerciais.

Art.º 15.º (Presunção de comercialidade)As dívidas comerciais do cônjuge comerciante presumem-se contraídas no exercício do seu

comércio.

Art.º 29.º (Obrigatoriedade da escrituração mercantil)Todo o comerciante é obrigado a ter escrituração mercantil efectuada de acordo com a lei.

Art.º 40.º (Obrigação de arquivar a correspondência, a escrituração mercantil e os documentos)

14 As epígrafes dos artigos do Código Comercial não fazem parte do texto legal.

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1. Todo o comerciante é obrigado a arquivar a correspondência emitida e recebida, a sua

escrituração mercantil e os documentos a ela relativos, devendo conservar tudo pelo

período de 10 anos.

2. Os documentos referidos no número anterior podem ser arquivados com recurso a meios

electrónicos.

Art.º 44.º (Força probatória escrituração comercial)Os livros de escrituração comercial podem ser admitidos em juízos a fazer prova entre

comerciantes, em factos do seu comércio, nos termos seguintes:

1.º Os assuntos lançados nos livros de comércio, ainda quando não regularmente

arrumados, provam contra os comerciantes, cujos são; mas os litigantes, que tais assentos

quiserem ajudar-se, devem aceitar igualmente os que lhes forem prejudiciais;

2.º Os assentos lançados em livros de comércio, regularmente arrumados, fazem prova em

favor dos seus respectivos proprietários, não apresentando o outro litigante assentos

opostos em livros arrumados nos mesmos termos ou prova em contrário.

3.º Quando da combinação dos livros mercantis de um e de outro litigante, regularmente

arrumados, resultar prova contraditória, o tribunal decidirá a questão pelo merecimento de

quaisquer provas do processo.

4.º Se entre os assentos dos livros de um e de outro comerciante houver discrepância,

achando-se os de um regularmente arrumados e os do outro não, aqueles farão fé contra

estes, salva a demonstração do contrário por meio de outras provas em direito admissíveis.

§ único. Se um comerciante não tiver livros de escrituração, ou recusar apresentá-los, farão

fé contra ele os do outro litigante, devidamente arrumados, excepto sendo a falta dos livros

devida a caso de força maior, e ficando sempre salva a prova contra os assentos exibidos

pelos meios admissíveis em juízo.

Art.º 62.º (Obrigatoriedade do balanço)Todo o comerciante é obrigado a dar balanço anual ao seu activo e passivo nos três

primeiros meses do ano imediato.

Art.º 99.º (Regime dos actos de comércio unilaterais)

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Embora o acto seja mercantil só com relação a uma das partes será regulado pelas

disposições da lei comercial quanto a todos os contratantes, salvo as que só forem

aplicáveis àquele ou àqueles por cujo respeito o acto é mercantil, ficando, porém, todos

sujeitos à jurisdição comercial.

Art.º 100.º (Regra da solidariedade nas obrigações comerciais)Nas obrigações comerciais os co-obrigados são solidários, salva estipulação contrária.

§ único. Esta disposição não é extensiva aos não comerciantes quanto aos contratos que,

em relação a estes, não constituírem actos comerciais.

Art.º 101.º (Solidariedade do fiador)Todo o fiador de obrigação mercantil, ainda que não seja comerciante, será solidário com o

respectivo afiançado,

Art.º 102.º (Obrigação de juros)Haverá lugar ao decurso e contagem de juros em todos os actos comerciais em que for de

convenção ou direito vencerem-se e nos mais casos especiais fixados no presente Código.

§ 1 .º A taxa de juros comerciais só pode ser fixada por escrito.

§ 2.º Aplica-se aos juros comerciais o disposto nos artigos 559.º, 559.º-A e 1146.º do Código

Civil.

§ 3.º Poderá ser fixada por portaria conjunta dos Ministros da Justiça e das Finanças e do

Plano uma taxa supletiva de juros moratórios relativamente aos créditos de que sejam

titulares empresas comerciais, singulares ou colectivas.

Art.º 230.º (Empresas comerciais)Haver-se-ão por comerciais as empresas, singulares ou colectivas, que se propuserem:

1.º Transformar, por meio de fábricas ou manufacturas, matérias-primas, empregando para

isso, ou só operários, ou operários e máquinas;

2.º Fornecer, em épocas diferentes, géneros, quer a particulares, quer ao Estado, mediante

preço convencionado;

3.º Agenciar negócios ou leilões por conta de outrem em escritório aberto ao público, e

mediante salário estipulado;

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4.º Explorar quaisquer espectáculos públicos;

5.º Editar, publicar ou vender obras científicas, literárias ou artísticas;

6.º Edificar ou construir casas para outrem com materiais subministrados pelo empresário;

7.º Transportar, regular e permanentemente, por água ou por terra, quaisquer pessoas,

animais, alfaias ou mercadorias de outrem.

§ 1.º Não se haverá como compreendido no n.º 1.º o proprietário ou o explorador rural que

apenas fabrica ou manufactura os produtos do terreno que agriculta acessoriamente à sua

exploração agrícola, nem o artista industrial, mestre ou oficial de ofício mecânico que exerce

directamente a sua arte, indústria ou ofício, embora empregue para isso, ou só operários, ou

operários e máquinas.

§ 2.º Não se haverá como compreendido no n.º 2.º o proprietário ou explorador rural que

fizer fornecimento de produtos da respectiva propriedade.

§ 3.º Não se haverá como compreendido no n.º 5.º o próprio autor que editar, publicar ou

vender as suas obras.

Art.º 231.º (Noção de mandato comercial)Dá-se mandato comercial quando alguma pessoa se encarrega de praticar um ou mais

actos de comércio por mandado de outrem.

(…)

Art.º 232.º (Remuneração do mandatário)O mandato comercial não se presume gratuito, tendo todo o mandatário direito a uma

remuneração pelo seu trabalho.

§ 1.º A remuneração será regulada por acordo das partes, e não o havendo, pelos usos da

praça onde for executado o mandato.

§ 2.º Se o comerciante não quiser aceitar o mandato, mas tiver apesar disso de praticar as

diligências mencionadas no artigo 234.º, terá ainda assim direito a uma remuneração

proporcional ao trabalho que tiver tido.

Art.º 362.º (Natureza comercial das operações de banco)São comerciais todas as operações de bancos tendentes a realizar lucros sobre numerário,

fundos públicos ou títulos negociáveis, e em especial as de câmbio, os arbítrios,

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empréstimos, descontos, cobranças, aberturas de créditos, emissão e circulação de notas

ou títulos fiduciários pagáveis à vista e ao portador.

Art.º 366.º (Natureza comercial do contrato de transporte)O contrato de transporte por terra, canais ou rios considerar-se-á mercantil quando os

condutores tiverem constituído empresa ou companhia regular permanente.

(…)

Art.º 394.º (Requisitos da comercialidade do empréstimo)Para que o contrato de empréstimo seja havido por comercial é mister que a cousa cedida

seja destinada a qualquer acto mercantil.

Art.º 395.º (Retribuição do empréstimo mercantil)O empréstimo mercantil é sempre retribuído.

§ único. A retribuição será, na falta de convenção, a taxa legal do juro calculado sobre o

valor da cousa cedida.

Art.º 396.º (Prova do empréstimo mercantil entre comerciantes)O empréstimo mercantil entre comerciantes admite, seja qual for o seu valor, todo o género

de prova.

Art.º 397.º (Requisitos da comercialidade do penhor)Para que o penhor seja considerado mercantil é mister que a dívida que se cauciona

proceda de acto comercial.

Art.º 403.º (Requisitos da comercialidade do depósito)Para que o depósito seja considerado mercantil é necessário que seja de géneros ou de

mercadorias destinados a qualquer acto de comércio.

Art.º 407.º (Depósitos em bancos ou sociedades)

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Os depósitos feitos em bancos ou sociedades reger-se-ão pelos respectivos estatutos em

tudo quanto não se achar prevenido neste capítulo e mais disposições aplicáveis.

Art.º 463.º (Compras e vendas comerciais)São consideradas comerciais:

1.º As compras de cousas móveis para revender, em bruto ou trabalhadas, ou

simplesmente para lhes alugar o uso;

2.º As compras, para revenda, de fundos públicos ou de quaisquer títulos de crédito

negociáveis;

3.º A venda de cousas móveis, em bruto ou trabalhadas, e as de fundos públicos e de

quaisquer títulos de crédito negociáveis, quando a aquisição houvesse sido feita no intuito

de as revender;

4.º As compras e revendas de bens imóveis ou de direitos a eles inerentes, quando aquelas,

para estas, houverem sido feitas;

5.º As compras e vendas de partes ou de acções de sociedades comerciais.

Art.º 464.º (Compras e vendas não comerciais)Não são consideradas comerciais:

1,º As compras de quaisquer cousas móveis destinadas ao uso ou consumo do comprador

ou da sua família, e as revendas que porventura desses objectos se venham a fazer;

2.º As vendas que o proprietário ou explorador rural faça dos produtos de propriedade sua

ou por ele explorada, e dos géneros em que lhes houverem sido pagas quaisquer rendas;

3.º As compras que os artistas, industriais, mestres e oficiais de ofícios mecânicos que

exercerem directamente a sua arte, indústria ou ofício, fizerem de objectos para

transformarem ou aperfeiçoarem nos seus estabelecimentos, e as vendas de tais objectos

que fizerem depois de assim transformados ou aperfeiçoados;

4.º As compras e vendas de animais feitas pelos criadores ou engordadores.

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Anexo V

Extratos do Código das Sociedades Comerciais

Art.º 1.º (Âmbito geral de aplicação)1. A presente lei aplica-se às sociedades comerciais.

2. São sociedades comerciais aquelas que tenham por objecto a prática de actos de

comércio e adoptem o tipo de sociedade em nome colectivo, de sociedade por quotas, de

sociedade anónima, de sociedade em comandita simples ou de sociedades em comandita

por acções.

3. As sociedades que tenham por objecto a prática de actos de comércio devem adoptar um

dos tipos referidos no número anterior.

4. As sociedades que tenham exclusivamente por objecto a prática de actos não comerciais

podem adoptar um dos tipos referidos no nº 2, sendo-lhes, nesse caso, aplicável a presente

lei.

Art.º 174.º (Prescrição)1. Os direitos da sociedade contra os fundadores, os sócios, os gerentes, os

administradores, os membros do conselho fiscal e do conselho geral e de supervisão, os

revisores oficiais de contas e os liquidatários, bem como os direitos destes contra a

sociedade, prescrevem no prazo de cinco anos, contados a partir da verificação dos

seguintes factos:

a) O início da mora, quanto à obrigação de entrada de capital ou de prestações

suplementares;

b) O termo da conduta dolosa ou culposa do fundador, do gerente, administrador, membro

do conselho fiscal ou do conselho geral e de supervisão, revisor ou liquidatário ou a sua

revelação, se aquela houver sido ocultada, e a produção do dano, sem necessidade de que

este se tenha integralmente verificado, relativamente à obrigação de indemnizar a

sociedade;

c) A data em que a transmissão de quotas ou acções se torne eficaz para com a sociedade

quanto à responsabilidade dos transmitentes;

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d) O vencimento de qualquer outra obrigação;

e) A prática do acto em relação aos actos praticados em nome de sociedade irregular por

falta de forma ou de registo.

2. Prescrevem no prazo de cinco anos, a partir do momento referido na alínea b) do número

anterior, os direitos dos sócios e de terceiros, por responsabilidade para com eles de

fundadores, gerentes, administradores, membros do conselho fiscal ou do conselho geral e

de supervisão, liquidatários, revisores oficiais de contas, bem como de sócios, nos casos

previstos nos artigos 82.º e 83.º.

3. Prescrevem no prazo de cinco anos, a contar do registo da extinção da sociedade, os

direitos de crédito de terceiros contra a sociedade, exercícios contra os antigos sócios e os

exigíveis por estes contra terceiros, nos termos dos artigos 163.º e 164.º, se, por força de

outros preceitos, não prescrevem antes do fim daquele prazo.

4. Prescrevem no prazo de cinco anos, a contar da data do registo definitivo da fusão, os

direitos de indemnização referidos no artigo 114.º.

5. Se o facto ilícito de que resulta a obrigação constituir crime para o qual a lei estabeleça

prescrição sujeita a prazo mais longo, será este o prazo aplicável.

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