Sustentação 26 / Revista do Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Ceará

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SUSTENTAÇÃO Saúde e meio ambiente n.26.jan.fev.mar.abr. de 2010.venda proibida

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Saúde e meio ambiente. "Até que o lixo vire luxo". Pôr os pés fora de casa em Fortaleza significa atualmente, inevi- tavelmente, esbarrar em muito lixo amontoado em ruas e calça- das. Transitando a pé, de ônibus ou de carro, há sempre alguém ao lado lançando na rua as coisas mais variadas, de papel de bala à espiga de milho. E não há um quarteirão em que não se veja pelo menos um catador de lixo, com a mão enfiada na misé- ria do planeta. Ou em sua riqueza. p.41

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SUSTENTAÇÃO

Saúde e meio ambiente

n.26.jan.fev.mar.abr. de 2010.venda proibida

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Fazendo o SUS acontecer com preservação ambiental!

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06 editorial

08 entrevistaGuilherme Franco Netto

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15 opiniãoRaquel Maria Rigotto

25 opiniãoPaola Vasconcelos

25 opiniãoRafael Tomyama

38 notícia1a CNSA define estratégias para criação da Política Nacional de Saúde Ambiental

50 notíciaPesquisadores estudam potencial anticancerígeno de planta encontrada na serra de Baturité

52 opiniãoTarcísio Pequeno

55 vivências municipaisCariréMaracanaúPacatubaMilagresPedra BrancaCruzSobral

galeriaSérgio Cameira

77 cultura

78 outras palavras

17 especialSaúde e meio ambienteVamos cuidar da gente?

27 coberturaEm se plantando - corretamente - tudo dá

41 coberturaAté que o lixo vire luxo

36 notíciaSaúde Ambiental não causa estranhamento no Ceará

26 opiniãoRoselane Lomeo

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COSSEMSConselho das Secretarias e SecretáriosMunicipais de Saúde do Ceará

DIRETORIA EXECUTIVAPresidente: José Policarpo de Araújo Barbosa (Cascavel)Vice-Presidente: Wilames Freire Bezerra (Morada Nova)Secretaria Geral: Luzia Lucélia Saraiva Ribeiro (Senador Pompeu)Diretor Financeiro: Francisco Pedro da Silva Filho (Cruz)Secretaria de Articulação: Valéria Maria Viana Lima (Guaramiranga)

CONSELHO FISCALTitular: José Afrânio Pinto Pinheiro Júnior (Umirim)Suplente: Kélvia Carla de Oliveira Moreira (Paracuru)Titular: Maria Ledamir Pinheiro (Milhã)Suplente: Luiza Marilac Barros Rocha (Caucaia)Titular: Olimpia Maria Freire de Azevedo (Aratuba)Suplente: Áthila Nogueira Queiroz (Beberibe)

COMISSÃO INTERGESTORES BIPARTITEMembro NatoTitular: Alexandre José Mont’Alverne (Fortaleza)Suplente: Francisco Holanda Júnior (Fortaleza)

GRANDE PORTETitular: Carlos Hilton Albuquerque Soares (Sobral)Suplente: Maria Nizete Tavares Alves (Crato)

MÉDIO PORTETitular: Mário Lúcio Ramalho Martildes (Eusébio)Suplente: José Liberlando Alves Albuquerque (Mauriti)Titular: Manoel Lopes Martins (Pentecoste)Suplente: Adélia Maria Araújo Bandeira (Aracati)

PEQUENO PORTETitular: Josete Malheiro Tavares (Guaiúba)Suplente: Francisco Evandro Teixeira Lima (Pindoretama)Titular: Rodrigo Carvalho Nogueira (Deputado Irapuan Pinheiro)Suplente: Maria Ivonete Dutra Fernandes (Capistrano)

CESAUTitular: Paulo Márcio Sampaio (Barbalha)Suplente: Joana Furtado Figueiredo Neta (Aracoiaba)

PRODUÇÃODesigner: Janaína Teles Fotógrafo: Hercílio AraújoCapa: Janaína TelesJornalista: Clarisse Cavalcante MTB 1765/CERevisão: Lucélia Saraiva, Joseana Lima e Arnaldo Costa LimaIlustração: Telma Patricia Abreu Machado e Sérgio Cameira

Impressão: Expressão GráficaTiragem: 2.500 exemplares

Revista Sustentaçãojan.fev.mar.abr de 2010.n.26.venda proibida

COSSEMSRua dos Tabajaras, 268 Praia de Iracema

Fortaleza-CE CEP 60060-510Fones/Fax:

(85)31015444 / 31015436 / 32199099

www.cossemsce.org.br

editorial Pensar o conteúdo para uma revista so-bre saúde e meio ambiente foi, simultaneamente, um processo alegre e triste. Triste porque está aí o mundo, mostrando que aquele pesadelo antigo dos nossos tempos de criança, cheio de persona-gens estilizados em imensa pobreza e cercados de nuvens de fumaça, já estão ao nosso redor. O planeta está sujo, e cada vez mais pobre. E alegre porque parte de nós quer sempre acreditar no pos-sível. Quer ser Dom Quixote, lutando contra mi-lhares de moinhos de vento. Pensar saúde e meio ambiente hoje é sermos assaltados pelo senti-mento de abandono e hipocrisia que cerca a nossa postura com o planeta e com nós mesmos. Mas, ao mesmo tempo, nos leva ao encontro de muitos como João, na agroecologia, Raquel nas tramas contra o desenvolvimento sem responsabilidade social, Eunice e seu carrinho de coleta e de sonho. Pensar em saúde e meio ambiente é, por fim, uma contradição. Um espaço do consciente onde pode morar a omissão ou nossa atitude. Saltar de um ao outro requer construção coletiva. O caminho do empoderamento é a mobilização social. Então, acompanhemos atentos as mu-danças no país, com a criação da Política Nacio-nal de Saúde Ambiental, como estratégia que se pretende bússola para o mundo, aqui bem expli-cada por Guilherme, nosso entrevistado da edi-ção. Mergulhemos no painel da deterioração da saúde humana diante da degradação ambiental e pensemos nas alternativas para superação desse quadro. E por fim, nos enchamos de esperança ao ver as histórias de gente que está construindo ter-ra fértil sem agrotóxico e futuro familiar sobre re-ciclados. Não desembarque, não desça do mundo. Permita-lhe como sua morada, e por isso mesmo merecedor de todo o seu cuidado. Boa leitura!

Reciclepela vida!

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Nosso entrevistado, Guilherme Franco Netto, desde 1987 atua no Ministério da Saúde. Em 2009, ele assumiu a diretoria do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador da Secretaria de Vigilância em Saúde. Recentemente, coordenou a 1ª Conferência Nacional de Saúde Am-biental, realizada em dezembro de 2009, em Brasília, evento que representa um marco histórico para o país. Considerado uma das referências em Saúde Ambiental, o médico sanitarista iniciou sua experiência em Saúde Pública na convivência com profissionais expressivos como Hugo Tomasini, Sérgio Arou-ca e o próprio ministro da Saúde José Gomes Temporão, que participaram da construção do Sistema Único de Saúde (SUS). Doutor em Epidemiologia e mestre em Saúde Pública pela Tulane University of Louisiana, nos Estados Unidos, Netto também trabalhou no México como consultor de Desenvolvi-mento Sustentável e Saúde Ambiental da Organização Pan Americana de Saúde. Nessa entrevista, ele fala da relação entre ambiente e saúde e do contexto político e social de implementação da Política Nacional de Saúde Ambiental e garante: “É preciso construir políticas integradas de saúde e ambiente, que fortaleçam consciências ecossanitárias”.

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8 . entrevista Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Sustentação: Considerando que o princi-pal objetivo da I Conferência Nacional de Saúde Ambiental foi reunir subsídios para a implementação da Política Nacional de Saúde Ambiental, que impacto esse evento teve neste cenário em construção?Guilherme Franco Netto: Primeiro é necessá-rio fazer um resgate do processo da políti-ca da saúde brasileira. No início da década de 80, houve a possibilidade de construir o SUS. Nesse processo de construção, ti-vemos contribuições consistentes de vários líderes da reforma sanitária brasileira, en-tre eles o sanitarista Sérgio Arouca. Essas pessoas afirmavam que para dar conta da saúde pública, tínhamos que construir um Sistema que atendesse a realidade da socie-dade brasileira. Naquela época o sistema de saúde era fragmentado, pouco resolutivo e atendia um percentual muito pequeno da população. Existia a visão de que a saúde não era simplesmente a atenção médica, a assistência hospitalar, os modelos curativos de atenção, mas toda uma realidade que a determina. Essa foi perspectiva que preva-leceu no Brasil até a realização da 8ª Con-ferência Nacional de Saúde (1986), proces-so fundamental para a efetivação do SUS. A 8ª Conferência foi marco da legitimação do SUS e a partir dela que se incorporou a sociedade ao processo, antes restrito à perspectiva do governo. Além disso, a 8ª

CNS trabalhou a idéia de que temos que contribuir e atuar nos determinantes sociais e ambientais da saúde. Nesse contexto, a 1ª Conferência Nacional de Saúde Ambien-tal é um espaço privilegiado, em que as relações entre meio ambiente e saúde são trabalhadas para o fortalecimento de uma agenda intersetorial e tem como objetivo principal contribuir para a construção da primeira Política Nacional de Saúde Am-biental. A realização das conferências per-mite uma democracia mais ampla e partici-pativa, que contribui para a formulação de políticas públicas e a CNSA também vem nessa direção.

Sustentação: Qual a relação da CNSA com a Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92)?G.F.N.: Na Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92) foram assinados os mais importantes acordos ambientais como as Convenções do Clima e da Biodiversidade e a Agenda 21. Com a Agenda 21 o Brasil buscou inte-gralizar, baseada no desenvolvimento sus-tentável e que hoje chamamos de sustenta-bilidade. A Rio 92 iniciou o debate sobre a crise do meio ambiente global e o setor saúde passou a ter uma participação muito importante na agenda de construção da sus-tentabilidade socioambiental.

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Sustentação: Quais os principais desafios para o País na área de Saúde Ambiental?G.F.N.: Atualmente, podemos apontar três grandes aspectos ambientais relacionados à saúde. O primeiro deles é o subdesenvolvi-mento. As desigualdades sociais e econô-micas fazem parte de muitos países e apre-sentam conseqüências como a ausência de saneamento básico e infraestrutura urbana. Essa ausência gera uma série de proble-mas relacionados à saúde, como diarréias infantis, infecção respiratória, entre outras. Grande parte da população brasileira ainda não tem acesso a saneamento básico ade-quado. O segundo elemento é o desenvol-vimento, que apesar de gerar benefícios, causa poluição, degradações ambientais, além do aumento de doenças respiratórias e crônico-degenerativas, violência urbana e outros problemas enfrentados pela po-pulação brasileira. O último aspecto é a mudança climática. Dados da Organização Mundial da Saúde OMS, revelam que 25% das doenças, no mundo, estão relacionadas aos problemas ambientais. No Brasil a esti-mativa é de 18%.

Sustentação: É possível reverter esse quadro?G.F.N.: Claro. É importante entender que es-ses problemas são evitáveis, mas precisam ser compreendidos e trabalhados. Essa é a

proposta da Saúde Ambiental: trazer evidên-cias, fazer proposições, gerar mobilizações da sociedade e de outros setores, para que possamos influenciar positivamente nesses fatores. O caminho não é fácil, tendo em vista o desenvolvimento no Brasil. Na dé-cada de 50 enfrentamos o êxodo rural e na década de 60, a transformação da sociedade rural agrária em urbana industrial. Isso ge-rou novas questões na forma de ocupação do território e processos de consumo. Ainda hoje, existem esses problemas. Essa política que está sendo estruturada no país vem ao encontro do SUS, da Política Nacional de Meio Ambiente e da Política de Saneamen-to. A 1ª CNSA debateu todos os temas estru-turados e mobilizou a sociedade para buscar alternativas para enfrentar a situação.

Sustentação: Neste momento estruturante dessa Política, os papéis de cada ente do governo, de cada uma das partes envolvi-das, já estão definidos?G.F.N.: Eu não diria que os papéis estão bem definidos. Nenhuma política pública tem dono, pois ela pertence aos cidadãos. Todos devem participar da mobilização para a construção dessas políticas. A 1ª CNSA é exemplo disso. Ela mobilizou milhares de pessoas para discutir um tema novo e alertar sobre a urgência de cuidar melhor do planeta.

Sustentação: Os níveis de compreensão do tema variam pelas regiões do país ou são novos para todo mundo?G.F.N.: Esse é um tema novo para a popula-ção em geral. Esse processo de realização da 1ª CNSA culminou num diagnóstico dos principais problemas que envolvem a saúde ambiental em cada região. Para isso, foram considerados os aspectos das cida-des, campos e florestas. A participação de indígenas, empresários, agricultores e ou-tros profissionais contribuiu muito para o debate qualificado. O resultado foi muito positivo. Cabe agora seguir em frente com as agendas. A Política Nacional de Saúde Ambiental vai forçar uma mobilização dos setores envolvidos na direção dos proces-sos de planejamento territorial urbano e planejamento ambiental, uma articulação necessária para a execução desse projeto.

Sustentação: Como foi construída a CNSA?G.F.N.: A 1ª CNSA foi realizada em três etapas: municipal, estadual e nacional. To-das as etapas tiveram participação de di-versos segmentos da sociedade de todo o país. Na plenária nacional foram definidas 24 diretrizes e 48 ações estratégicas para a construção da Política Nacional de Saúde Ambiental. Essas propostas estão dividas em blocos, sendo que o primeiro diz res-peito aos processos produtivos e consumos

“Dados da Organização Mundial da Saúde OMS, revelam que 25% das

doenças, no mundo, estão relaciona-das aos problemas ambientais. No

Brasil a estimativa é de 18%.”

10 . entrevista Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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sustentáveis. O segundo é sobre infraes-trutura, que é basicamente saneamento, habitação, transporte etc. O terceiro tema aborda as articulações interinstitucionais, ações integradas e controle social. Isso é que o está sendo discutido no SUS hoje e que compõe o debate nacional sobre a formação social da saúde. Tem ainda os blocos: ‘Territórios Sustentáveis, Plane-jamento e Gestão Integrada’, ‘Informa-ção, Educação, Comunicação e Produção de Conhecimento’, e Marco regulatório e Fiscalização.

Sustentação: A formatação da Política Nacional de Saúde Ambiental está muito bem montada. Quais são os atores que vão levar adiante esse processo?G.F.N.: Temos duas grandes tarefas. Ago-ra temos que dar seguimento ao processo encaminhando. Isso deve envolver a Co-missão que organizou a 1ª CNSA, os Con-

selhos do Meio Ambiente, das Cidades e da Saúde, os sete Ministérios envolvidos e outros atores. Depois faremos a leitura das deliberações e propor medidas de aproxi-mação com os programas concretos de governo, fazendo com que os temas alcan-cem os fóruns que já existem no Governo Federal e já tratam dessas demandas. É isso que vai fazer com que as deliberações sejam examinadas pelas instâncias com-petentes do governo. Se temos áreas com vulnerabilidades que propiciam doenças transmitidas por vetores e outros elemen-tos, a saúde ambiental poderá agir e fazer com que essa realidade se transforme. Isso deve ser verificado pelos órgãos de gover-no para seguir com os desdobramentos disso. Os Ministérios envolvidos deverão encaminhar as propostas para os órgãos estaduais e locais ainda este ano. O obje-tivo disso é propor a política, construir o texto e ver medidas concretas.

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Sustentação: Qual o papel da gestão da saúde nesse contexto?G.F.N.: Desde início do processo da CNSA tivemos certeza que os gestores são funda-mentais para o debate sobre a Saúde Am-biental. A CNSA destinou espaço para a representação formal desses setores e de to-dos os entes federativos. Tanto o CONASS, quanto CONASEMS se envolveram na or-ganização da Conferência. Tivemos uma representação governamental bastante qua-lificada, em torno de 30% do total de dele-gados. Agora, essa participação deverá ser repercutida nos setores envolvidos. A saú-de tem em seu benefício à complexa orga-nização do SUS, sem correspondência em outras áreas por serem mais recentes e por terem políticas que estão ainda em etapas prévias ao que nós conseguimos alcançar nesse Sistema. O SUS tem representação em todo o país e a Secretarias de Saúde e os Conselhos Municipais de Saúde são componentes dele. Não tenho dúvidas que a saúde terá um papel importante neste se-gundo momento para que o debate alcance outros setores e outras representações. Os gestores de saúde são peças mestras neste desdobramento, planejando, executando as ações concretas que são definidas pelas pactuações, pelas priorizações da saúde pú-blica brasileira. Eles devem se apropriar da temática, que chama atenção da determina-ção social/ambiental da saúde.

“Os gestores de saúde são peças mestras neste desdobramento,

planejando, executando as ações concretas que são definidas pelas pactuações, pelas priorizações da

saúde pública brasileira.”

12 . entrevista Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Sustentação: Então o Congresso do COS-SEMS, com essa temática, vai ter uma im-portância estratégica para a própria Polí-tica Nacional de Saúde Ambiental. G.F.N.: A iniciativa do COSSEMS-CE em realizar um congresso com a mesma te-mática é fantástica, pioneira e muito atu-alizada. O evento tem tudo a ver com a 1ª CNSA e com o debate realizado na 15ª Conferência das Partes, da ONU (COP 15), na qual o Brasil teve um papel fundamen-tal a respeito da crise ambiental global. Os gestores devem se apropriar da temática da Saúde Ambiental e disseminar o conteúdo da Política Nacional de Saúde Ambiental, pois a iniciativa abrirá um caminho a nível nacional. As políticas públicas brasileiras

são fundamentais para fazer com que o cidadão brasileiro tenha inclusão so-

cial, qualidade de vida, bem estar e outros direitos. Não tenho dúvida

que o evento do COSSEMS representa um espaço estratégico, histórico, pois abrirá um debate interessante na saúde, capaz de contribuir com o SUS a qualificar sua pro-posta.

Sustentação: Como foi a participação do Brasil na COP 15?G.F.N.: O Brasil foi o único país que apre-sentou uma proposta concreta. Mostramos que vamos avançar em nossa tarefa de casa, atendendo os protocolos e agendas estabelecidas para enfrentar a mudança do clima. Ao apresentar a posição brasileira, o Presidente Lula foi aplaudido de pé e isso não é comum nesses fóruns. Saímos com uma posição fortalecida, embora a Confe-rência não tenha trazido resultado objetivo nenhum. O debate foi adiado para 2010, quando será realizada uma reunião na Ale-manha e em dezembro na 16ª COP, que

“Não tenho dúvida que o evento do COSSEMS representa um espaço

estratégico, histórico, pois abrirá um debate interessante na saúde, capaz de

contribuir com o SUS a qualificar sua proposta.”

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será no México. Não tenho dúvida de que o ano de 2010, o Brasil influenciará ainda mais o mundo. Outro aspecto foi à gran-de presença de brasileiros na Conferência, sendo a maior delegação, contou com mais de 720 pessoas atuando nos grupos de tra-balho. Eu e outros profissionais do Ministé-rio da Saúde, por exemplo, participamos de uma atividade conduzida pela Organização Mundial de Saúde, sobre Saúde e Mudança do Clima. Nessa atividade, apresentamos a experiência do Brasil e nosso plano de tra-balho para o desenvolvimento. Enfim, foi uma participação muito positiva.

Sustentação: Para encerrar, conte-nos um pouco sobre a história da Secretaria de Vi-gilância à Saúde e sua área de atuação?

G.F.N.: A Secretaria de Vigilância em Saú-de (SVS) foi criada em 2003, no primeiro mandato do Presidente Lula. Ela tem ori-gem no Centro Nacional de Epidemiologia, que era vinculado à FUNASA. A Secre-taria tem expandido muito seu escopo de atuações. Antes, no âmbito da FUNASA, o que se fazia era muito dirigido para o en-frentamento e proposição de ações de en-frentamento às doenças transmissíveis, que tiveram uma influência muito grande no passado. Com a transição epidemiológica, surgiu a necessidade de organizar serviços de vigilância epidemiológica, sanitária, de saúde do trabalhador e ambiental, voltados para essa complexidade. Entre as funções da Secretaria estão o desenvolvimento, junto com outras áreas do Ministério da

Saúde, da Política de Promoção da Saúde, relacionada com a determinação social da saúde, a própria vigilância e a informação para a tomada de decisão. Em 2009, no es-copo da SVS foi criado o Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador. Antes, o Departamento tinha suas ações concentradas na Coordenação Geral de Vigilância em Saúde Ambiental. e essa mudança de status demonstra o com-promisso do Ministério com o adequado tratamento do tema. Essa efetivação pos-sibilita o aperfeiçoamento das abordagens do setor saúde no país no enfrentamento das vulnerabilidades sócio-ambientais en-quanto integrantes da determinação social da saúde, sendo o objeto da 1ª Conferência Nacional de Saúde Ambiental.

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E quando o olhar nada mais alcança que o entulho num horizonte bucólico.

E quando a fragilidade da vida humana é posta à prova

e tudo aquilo que temos é aquilo que o local nos pode oferecer.

Habitar o local,

com o local.

Jelgava. Letónia . 2009

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Saúde Ambiental exige lucidez e ousadia

A decisão do COSSEMS do Ceará de colocar no centro dos debates de seu X Congresso a Saúde Ambiental, certamente será saldada como um direcionamento lúcido e ousado, especial-mente pelos que nos envolvemos no processo da I Conferência Nacional de Saúde Ambiental – I CNSA, ao longo de 2009. Lucidez porque reconhece a relevância da questão ambien-tal hoje: para além dos “ecochatos”, ou de cientistas minoritários que desde o século passado levantavam estas bandeiras, agora, os problemas estão fervilhando nas agendas de governança mun-

dial, ocupam lugar central em campanhas eleitorais e os meios de comunicação evi-denciam sua presença em nosso cotidiano. Lucidez porque vai abrir espaço para se desocultar o enorme impacto das transformações ambientais na saúde-doença humana (e dos ecossistemas dos quais dependemos) e, conseqüentemente, seu impacto tam-bém sobre as demandas de saúde da população, sobre os custos das ações no SUS... Para dar chão ao debate, vamos poder ver aquilo que a OPAS (2000) chama de “perigos tradicionais”, como a falta de acesso à água potável, saneamento básico deficiente nas moradias e na comunidade, contaminação dos alimentos por organis-mos patógenos, sistemas insuficientes de eliminação de resíduos sólidos, riscos de acidentes de trabalho na agricultura e indústria domésticas; vetores de doenças, espe-cialmente insetos e roedores. E também os “perigos modernos, que têm relação com um desenvolvimento rápido, que não leva em conta as salvaguardas para a saúde e o meio ambiente e com um consumo insustentável dos recursos naturais” (p.7-8), como: contaminação da água pela indústria e agricultura intensiva; contaminação do ar ur-bano pelas emissões de motores de veículos, centrais energéticas e indústria; riscos químicos e por radiação devidos à introdução de tecnologias industriais, agrícolas e de comunicação; mudanças climáticas se expressando como inundações, terremotos, secas, e perda da produção de alimentos. Como estes riscos impactam na morbidade dos cidadãos e cidadãs, na demanda aos serviços de saúde? E é também ousadia do COSSEMS pautar a Saúde Ambiental em seu Con-gresso anual. Porque, de fato, não temos uma Política Nacional de Saúde Ambiental elaborada e definida no Brasil – o que pode ser também uma “política”... a I CNSA se propôs a dar início ao debate, apontando diretrizes. Os gestores municipais da Saú-de são, sem dúvida, atores-chave no processo de construção desta exigente Política: não há como avançar nela sem superar os nós da intersetorialidade, sem repensar a Vigilância em Saúde e sua estrutura, sem um olhar ampliado sobre o território, sem encarar com coragem os desafios da atenção básica no SUS. E não sejamos ingênuos: neste campo são ainda mais evidentes os conflitos com projetos desenvolvimentistas, grupos econômicos poderosos, movimentos sociais em luta pela igualdade no acesso aos bens naturais... E me permitam um momento de“bairrismo”, já que não nasci nesta terra: uma vez mais, com lucidez e ousadia, o Ceará sai na frente, instigando inclusive a instância nacional a também abrir os olhos a estas questões, para além dos modismos. Que, na Terra da Luz, possamos iluminar o debate e o processo concreto de constru-ção de uma Política que, apesar de exigente, nos oferece um terreno muito propício a avivar a Reforma Sanitária, a inverter o modelo de atenção, a avançar no paradigma da promoção da saúde. E, sobretudo, nos re-ligar à Mãe Terra, ouvir seus cantos e clamo-res, palpar o cordão que dela nos traz a água, o ar, os alimentos, a beleza, os sonhos... e a saúde!

Raquel Maria RigottoProfessora do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da UFC

Coordenadora do Núcleo Tramas – Trabalho, Meio Ambiente e Saúde para a Sustentabilidade - [email protected]

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opinião . 16 Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Saúde e meio ambienteVamos cuidar da gente?

O Brasil que influencia política e economicamente o mundo era um gigante adormecido. As tentativas bem sucedidas de desenvolvi-mento econômico das últimas décadas e o status quo gerado por este sucesso deu ao país carta branca para influenciar o mundo numa série de questões. Mas esse desenvolvimento teve custos al-tos para o nosso território, degradando o ambiente e agravando a saúde das pessoas. Construindo uma Política Nacional de Saúde Ambiental, o Brasil parece agora responder positivamente para qual direção vai caminhar essa força.

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especial . 17Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Não sou muito afeita a calendá-rios. Uso muito precariamente a agenda que tenho e sempre corro o risco de esque-cer compromissos marcados com muita antecedência. Mas em dezembro de 2009 fiquei absolutamente cooptada pelo pro-cesso diário de cobertura internacional da 15ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-15), que acon-teceu em Copenhague, na Dinamarca. Eu sabia que estávamos diante de mais um momento histórico, como foi o da Confe-rência das Nações Unidas sobre Ambien-te Desenvolvimento, a Rio 92, carregado de expectativas de alavancar as mudanças necessárias à tão sonhada sustentabilidade socioambiental, que já foi denominada de desenvolvimento sustentável. Há exatos quatro anos, eu defendia minha monogra-fia de conclusão da graduação como comu-nicadora social na qual analisava a cober-tura do tema “Meio Ambiente nos jornais impressos do Piauí”. Naquela época, foi frustrante per-ceber que quase não havia o componente ‘ser humano’ nas matérias construídas com temáticas ambientais. Os desastres, tendo como exemplo as enchentes e as secas que hora ou outra castigam o nordeste, eram atribuídos em sua maioria à fenômenos naturais normais de uma geografia pouco favorecida em variedades climáticas. Não havia relação entre aquilo que para mim era claramente, e intuitivamente, uma res-posta da natureza à um processo de desen-volvimento, com a ação humana. Parecia muito mais interessante deixar o caos na responsabilidade do divino. Mas eu não sa-bia precisar ao certo se aquele era um pro-blema do jornalismo, sempre afeito ao fan-tástico e inusitado, ou se não havia no país uma compreensão política de que sobre a seca, chuva, pragas de insetos, queimadas e outros fenômenos não se pode descartar a possibilidade de uma intervenção humana.

Como maior evento, até então, de discussão sobre os problemas ambientais do planeta, e no qual se elaborou a primei-ra versão de Agenda 21, a Rio 92 teve sua cobertura muito focada na diversidade do público presente, nas peculiaridades das comitivas, no imediatismo da factualida-de. Em Copenhague as coisas mudaram um pouco. Estava claro, numa linguagem massificada e na produção de uma série de reportagens, que o problema do clima está diretamente relacionando à ação hu-mana. E de lá poderiam ter sido propostos planos de reversão desse quadro complexo e assustador. O diagnóstico é preciso: se não reduzirmos drasticamente a emissão de gases causadores do efeito estufa na at-mosfera, podemos esquecer o plano de dar continuidade à espécie humana no planeta. A médica e pesquisadora minei-ra, radicada no Ceará, Raquel Rigotto, na publicação Desenvolvimento, ambiente e saúde: implicações da (dês) localização industrial (2008), afirma: “De fato, para que os problemas ambientais se afirmem socialmente, em primeiro lugar necessi-tam ser construídos e difundidos nos mun-dos simbólicos e reais dos vários atores sociais, até que sejam coletivamente re-conhecidos”. Perceber a mídia se mobili-zando em direção à necessidade concreta de uma intervenção estratégica, e política, nas causas dos problemas ambientais, in-dica que o debate está se massificando, o que é essencial para qualquer tentativa de sensibilização social. E são precisamente a sensibilização, o amadurecimento e a cor-responsabilização que poderão apontar um acordo para a reversão do termômetro que aponta o limite de aquecimento do planeta. Além, claro, do fato de que uma mudança na lógica do consumo e na utilização de recursos finitos é também uma necessida-de econômica. Não há mais abundância de matéria prima.

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especial . 19 Revista Sustentação . 2010 . edição 26

O Brasil como bússola

Copenhague apresentou ao mun-do um Brasil estrategicamente mais ma-duro, politicamente mais influente. Nosso país levou à reunião, com os 120 chefes de Estado de todo o mundo, uma proposta concreta de redução de emissões de gases entre 36,1% e 38,9% até 2010 com relação a 1990. Se compararmos ao Estados Uni-dos, que sinalizaram, mas não amarraram qualquer acordo, a redução de 17% até 2020, mas em relação a 2005, fica clara a postura corajosa do Brasil. Sem falar na presença física massiva de brasileiros, a maior delegação da COP 15, cerca de 720 pessoas. O Presidente Lula foi ovaciona-do pela assembléia em seu discurso final, aplaudido de pé. Dá orgulho, embora não seja isto o mais importante. Neste caso, importa mais entender que os aplausos são frutos de um longo caminho de mudanças que, aparentemente, o governo brasileiro se dispôs a percorrer.

Nenhuma decisão concreta e legal foi tomada em Copenhague. As enormes divergências ocorridas entre os países, a grande maioria pensando individualmente do alto de suas mágoas desenvolvimentis-tas herdadas do processo heterogêneo de globalização, adiaram para a COP 16 um possível acordo a ser firmado, de redução na emissão de gases causadores do efeito estufa. O evento será realizado no México, agora em 2010. O grande ganho, parece claro, é que estamos nos movendo para cuidar do nosso território, e oferecermos uma referência significativa para os outros países. E neste cenário, surge uma impor-tante novidade: a institucionalização de um diálogo entre os vários setores em torno de três questões que caminham paralelas e em profundo imbricamento: Saúde, Meio Am-biente e Cidades. Diálogo esse que vai dar origem à primeira formulação da Política Nacional de Saúde Ambiental.

Nosso país levou à Copenhague uma proposta concreta de redução de emissões de gases entre 36,1% e 38,9% até 2010 com relação a 1990. Se

compararmos ao Estados Unidos, que sinaliza-ram, mas não amarraram qualquer acordo, a re-

dução de 17% até 2020, mas em relação a 2005, fica clara a postura corajosa do Brasil.

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Mapeando o risco

Na esteira do crescimento eco-nômico e como uma da causas do caótico cenário ambiental em que vivemos, a ur-banização desordenada é determinante de uma série de vulnerabilidades sociais que resultam em doença e morte no Brasil e no mundo. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, em 2007 pelo menos 24% de todas as doenças e 23% das mortes prematuras em escala global ocorrem em razão de fatores de risco ambiental que são modificáveis. Em nosso país, esse percen-tual está estimado em 18%. E esse quadro não se deve ao surgimento de problemas inéditos, mas à acumulação de necessida-des bem antigas. Basta apontar que uma pesquisa recente do Ministério da Saúde comprovou que metade da população bra-sileira está, ainda hoje, submetida ao im-pacto do saneamento básico inadequado e de doenças a ele relacionadas, especial-mente nos estados do norte e do nordeste. Com a Rio 92 teve início o debate sobre a crise do meio ambiente global e o setor saúde passou a ter uma participação muito importante na agenda de construção da sustentabilidade sócio-ambiental. Atu-almente, três grandes aspectos ambientais relacionados à saúde são considerados focos onde as políticas públicas de saúde devem atuar. O primeiro é relacionado ao que os pesquisadores chamam de ‘perigos tradicionais’, característicos de países com heranças de subdesenvolvimento como o Brasil. São as já citadas deficiências de saneamento básico e infraestrutura urbana, que geram uma série de problemas relacio-nados à saúde, como diarréias infantis, con-taminações diversas etc. As diarréias agu-das ainda se caracterizam como principal causa de internação e de mortalidade infan-til nos países em desenvolvimento. São 1,3 bilhões de casos ocorrendo anualmente no mundo inteiro, dos quais 4 milhões levam à óbito. De acordo com os dados do Minis-tério da Saúde, em 2004 foram notificados mais de 2.350.000 casos de diarréias no Brasil, dos quais 51% ocorreram em meno-res de cinco anos.

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O Sistema Nacional de Informações de Intoxicações Tóxico-Farmacólogicas (Sinitox) registrou 208.880 casos de

intoxicação por agrotóxico.

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especial . 21Revista Sustentação . 2010 . edição 26

O segundo grupo de problemas, ditos “modernos”, está relacionado ao de-senvolvimento econômico, que gera polui-ção, degradações ambientais, aumento de doenças respiratórias e crônico-degenera-tivas, violência urbana, contaminação dos solos, da água para o consumo humano, dos alimentos e outros problemas enfrentados pela população brasileira. Em 2008 já ha-via 2.182 áreas com população potencial-mente exposta a contaminantes químicos, num total de 2,1 milhões de habitantes. Na lista dos principais contaminantes estão os agrotóxicos (20%), derivados do petróleo (16%), resíduos industrias (12%) e metais (11%), com maiores índices de exposição em São Paulo, Rio Grande do Norte e Rio de Janeiro. Além disso não podemos es-quecer as imensuráveis alterações que o desenvolvimento trouxe para a segurança alimentar, através inclusive do uso de agro-tóxicos e da disseminação da transgenia. O Departamento de Saúde do Trabalhador e Saúde Ambiental da Secretaria de Vigilân-cia em Saúde (MS) informa que entre 1985 e 2008, o Sistema Nacional de Informações de Intoxicações Tóxico-Farmacólogicas (Sinitox) registrou 208.880 casos de intoxi-cação por agrotóxico. Deste total, 100.220 ocorreram na Região Sudeste - só o Estado de São Paulo totalizou 67.424 vítimas. A Região Sul ficou em segundo lugar - 60.401 registros. No Centro-Oeste o total foi de 16.137, sendo 7.884 em Goiás, 5.417 no Mato Grosso do Sul, 1.951 no Mato Grosso e 885 no Distrito Federal. E o último aspecto está relacio-nado à crise ambiental global, contexto de

realização da COP-15 e de todas as outras versões do evento mundial, que se preocu-pa com as mudanças climáticas e os agrava-mentos sociais desencadeado pelo aumento da temperatura, entre eles a incidência ins-tável de secas, estiagens, enchentes, quei-madas, deslizamento de terra, furacões e terremotos. Entre 2003 e 2008, o Brasil re-gistrou 8.903 decretos de situação de emer-gência ou de estado de calamidade pública pela ocorrência de desastres naturais. E no período de 2003 a 2007 mais de 10 milhões de brasileiros foram afetados por fenôme-nos da natureza, com 824.117 desabrigados e desalojados no país, principalmente no Nordeste (315.863), Sudeste (299.509) e Sul (109.729). No entanto, apesar de já existir um mapeamento apontando uma necessidade concreta de originar políticas diferentes de uso dos recursos naturais e humanos, mui-tas políticas públicas, em nome do progres-so, caminham na contramão da tendência mundial de investir em sustentabilidade sócio-ambiental. No Ceará, pelo menos duas situações concretas exemplificam isso: a construção do complexo portuário do Pecém, investindo em siderurgia, petro-química e termoelétrica a carvão; e o início de exploração de urânio em Santa Quitéria. Em ambas as situações, é a saúde dos tra-balhadores e da comunidade envolvida que já está, genericamente, ameaçada pelos pro-cessos produtivos em questão. Para Rigotto, “estamos indo na contramão da relocaliza-ção dos processos produtivos no mundo, e devemos nos perguntar se essa é a única maneira de gerar desenvolvimento local”.

São precisamente a sensibilização, o amadurecimento e a

corresponsabilização que poderão apontar um acordo para a reversão do termômetro que aponta o limite

de aquecimento do planeta.

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Por uma mudança direcional e estratégica

A mobilização histórica vivida nesse momento no país, com a criação da Política Nacional de Saúde Ambiental, cujo processo de construção está elegendo as prioridades de atenção para a área em to-dos os estados do país, é uma tentativa de direcionar o fluxo de demandas nas áreas de saúde, meio ambiente e infraestrutura para uma maior e melhor resolubilidade. O Brasil resolveu entrar no combate e es-colheu como principal arma a corresponsa-bilização. O diretor do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde, Gui-lherme Franco Netto, diz que a “a Política Nacional é uma tentativa de construir uma estrada onde todos os diálogos necessários, entre os diversos setores envolvidos, pos-sam transitar”. E dessa maneira dizima-se a fragmentação que coloca em caminhos diversos a saúde, o meio ambiente, a edu-cação, as políticas das cidades. Claro que continua havendo as especificidades de cada área, mas o diálogo necessário entre elas começa a se efetivar. Essa construção da Política foi a principal motivação para a realização da I Conferência Nacional de Saúde Ambien-tal também em dezembro, bem próxima à COP-15, em Brasília. O evento, construí-do de modo ascencional, tal qual a tradi-ção das Conferências de Saúde, com início nos municípios, passando pelos Estados e chegando ao nível nacional, levou cerca de 1.600 pessoas a discutirem as diretrizes e ações estratégicas necessárias para a efeti-vação da Política.

Vigilância Ambiental como ferramenta de mudança

O processo de discussão que re-sultou na necessidade de elaboração da Política Nacional de Saúde Ambiental teve início há pelo menos cinco décadas atrás. Até a década de 60, a grande maioria dos brasileiros adoecia ou morria com pro-blemas relacionados a doenças infeccio-sas – tuberculose, hanseníase, as doenças imuno-previníveis – num espectro sanitário muito dramático. Com o desenvolvimento de tecnologias, a ampliação dos serviços de saúde e a melhoria da qualidade da vida em vários aspectos, esse perfil foi se modifi-cando no mundo todo. Os problemas crôni-co-degenativos – hipertensão arterial, dia-betes, neoplasias, acidentes violentos, entre outras coisas ocuparam lugar de destaque nas preocupações das políticas públicas de saúde no Brasil. Foi a chamada transição epidemiológica. “Mas a verdade é que nem foram embora as doenças infecciosas, nem resolvemos o problema das doenças crôni-cas. Então precisávamos de um novo arran-jo para fazer o desenvolvimento de ações mais adequadas para isso”, explica Netto. Esse novo arranjo foi exatamente a criação da Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde, que em 2003 absorveu as atribuições do antigo Centro Nacional de Epidemiologia (Cene-pi), assumindo também a gestão do Siste-ma Nacional de Vigilância Epidemiológica e Ambiental em Saúde. E em 2005 foi cria-do o Subsistema Nacional de Vigilância em Saúde Ambiental (SINVSA-SVS). Entre suas atribuições estão coordenação, avalia-ção, planejamento, acompanhamento, ins-

peção e supervisão das ações de vigilância relacionadas às doenças e agravos à saú-de no que se refere a: água para consumo humano; contaminações do ar e do solo; desastres naturais; contaminantes ambien-tais e substâncias químicas; acidentes com produtos perigosos; efeitos dos fatores físi-cos; e condições saudáveis no ambiente de trabalho. Cabe ainda ao SINVSA elaborar indicadores e sistemas de informação de vi-gilância em saúde ambiental para análise e monitoramento, promover intercâmbio de experiências e estudos, ações educativas e orientações e democratizar o conhecimento na área. No Ceará, o Núcleo de Vigilância Ambiental da Secretaria Estadual de Saúde (NUVAM) existe desde 2007. São três os seus focos de atuação: a qualidade da água para consumo humano (VIGIÁGUA), a qualidade dos solos (VIGISOLO) e a qua-lidade do ar (VIGIAR), todos sistemas de acompanhamento criados pela Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde. Mas o maior objetivo do NUVAM é fazer com que a Vigilância Ambiental se estruture nos municípios, para dar respostas aos Sistemas de Vigilância citados, propos-tos pelo Governo Federal. Das três áreas, é a primeira que já apresenta respostas rele-vantes no cuidado com a saúde humana. A Portaria GM 518, de 25 de março de 2004, estabelece os procedimentos e responsabi-lidades relativos ao controle e vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade. As demais áre-as sequer têm normatização.

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especial . 23Revista Sustentação . 2010 . edição 26

Na prática, isso significa que os municípios têm que cadastrar e emitir re-latórios mensais de todas as suas formas de abastecimento, independente do número de habitantes, além de realizar controle e vigilância sobre elas, informando tudo no Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Huma-no (SISAGUA). A CAGECE, prestadora que realiza o abastecimento de 81% dos municípios do Ceará, já realiza o contro-le mensal dessa água. “Antes dessa regu-lamentação, quando ocorria um surto de cólera, por exemplo, não sabíamos o que combater porque desconhecíamos a fonte do problema. Com o sistema on line isso ficou resolvido”, explica o técnico Sérgio Murilo Martins. E a água que não é for-necida pelos prestadores, dos cacimbões, chafarizes e outras fontes, é analisada pe-los Laboratórios Centrais do Estado, um central e cinco regionais, onde também são

analisadas as mostras para controle de qua-lidade dos solos. A estruturação ainda recente do setor, e o pouco efetivo de pessoal – sete servidores entre técnicos, supervisores e de apoio – impossibilita ações mais incisivas. Apesar disso, Martins considera um avanço as capacitações que são prestadas e as visi-tas constantes aos municípios, para verifi-car tanto denúncias quanto coletar material que comprovem as informações fornecidas pelos prestadores de água, por exemplo. “Mesmo com pouco efetivo já combate-mos muitas questões que afetavam a saúde humana. Em Canindé, por exemplo, houve um surto de hepatite e nós provamos que era por contaminação da água. Houve todo um movimento do Ministério Público e o abastecimento foi reestruturado”, explica. No Ceará, estão regulamentados como Vi-gilância Ambiental apenas o NUVAM-SE-SA e a Vigilância Ambiental de Fortaleza.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde, em 2007 pelo menos 24% de todas as doenças

e 23% das mortes prematuras em escala global ocorrem em razão

de fatores de risco ambiental que são modificáveis.

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Irradiando mudanças

Se o Brasil está preparado para li-derar o mundo no gigantesco processo de readequação de modos produtivos, se está realmente se movimentando nessa direção, e se esta será definitivamente uma opção de Estado, e não somente de governo, são especulações ainda sem qualquer pouso concreto. Temos o desafio de cuidar dos re-cursos que ainda dispomos de forma mais responsável e menos midiática possível. Uma tarefa complexa porque a lógica da sustentabilidade sócio-ambiental é extre-mamente desafiadora, quando fala de jus-tiça social e de possibilidades ambientais sustentáveis e não mais finitas. Há muito tempo estamos enga-tinhando. Agora vamos ter que caminhar, fazer a hora... e não esperar acontecer!

Entre 2003 e 2008, o Brasil registrou 8.903 decretos de

situação de emergência ou de estado de calamidade pública pela ocorrência de desastres naturais.

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Semi-árido, água e dengue

Para os nordestinos, principalmente os cea-renses, que convivem com a escassez da cultura da seca, a água é um tesouro, uma jóia, uma divindade que deve ser reverenciada. Talvez por isso armaze-nar água é um dos costumes mais tradicionais des-sas populações. Até quem não convive com a fal-ta d’água, mantém reservatórios em casa, mesmo tendo água na torneira. Mais do que uma tradição, trata-se também de um problema de saúde pública.

Diante do cenário da dengue, que só em 2009 causou 36 mortes no Ceará, conforme o boletim da Secretaria da Saúde do Estado (SESA), armazenar água é um grande risco. Isso porque onde há reservatórios de água limpa e parada, cer-tamente, também existe dengue. O Aedes aegypti, do ponto de vista am-biental, tem um lugar privilegiado nas residências cearenses, uma vez que 86% do território e cerca de 150 dos 184 municípios do Estado estão no semi-árido. Levantamento realizado por 96 instituições que compõem o Pacto das Águas estima que três milhões de cearenses não têm acesso à água potável e cinco milhões não possuem saneamento básico. Por uma questão de sobrevivência, a única alternativa que resta a estas pessoas é encher baldes, garrafões, botijões, tambores, bacias, tinas. É justamente nesse momento que escoa pelo ralo grande parte das tentativas de fazer com que a população entenda que guardar água é dar condições de dominação ao Aedes. Na apuração de muitas repor-tagens, observamos exemplos de como existe um limiar entre esse cos-tume e a consciência dos perigos da dengue. Não só em Fortaleza, como em municípios do Interior, moradores de bairros “altos” convivem com a irregularidade do abastecimento da rede; outras famílias guardam água para o banho e para o consumo porque a que chega pelos canos é “quen-te”, “tem muito cloro” ou “faz mal”. O fato é que, alheio a isso, o mosquito vai se reproduzindo e fazendo suas vítimas. A dengue está presente no Ceará desde 1986 e, tão cedo, não deixará de permanecer entre nós. Vemos que campanhas pasteurizadas em âmbito nacional não encontram muitos resultados em termos de mudança de comportamento. Devido a isso, o Estado assume, com a clara intenção de evitar o alastramento da grave doença, mantendo custos altíssimos com agentes de saúde, uma posição paternalista, na me-dida em que a população só desperta para o problema quando o agente de endemias chega para fazer a vistoria e colocar o “pozinho” nos ralos. A cultura de armazenar água não vai mudar de hoje para ama-nhã, até porque o meio ambiente e a realidade social da região não permi-tem. Ações regionalizadas, diretas, claras e permanentes podem ser uma alternativa em longo prazo, mas precisam, no entanto, ser voltadas para o armazenamento responsável, porque, afinal, ninguém está imune ao mosquito. É necessária uma mudança de postura consistente, que consiga fazer com que a população do semi-árido e também da capital cearense entenda que guardar água é um risco à saúde e não um atentado às tradi-ções culturais e sociais.

Paola VasconcelosJornalista, pós-graduanda em Jornalismo Científico - UFC

[email protected]

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O lazer e a atividade física adaptada na Saúde Mental

É oportuno dedicar um espaço de tempo para refletir sobre o lazer na vida das pessoas que apresentam determina-dos tipos de doença mental. O fato desta apresentar sintomas que podem provocar prejuízos como, a consciência limita-da de si, a auto-expressão restrita e o senso de autodomínio reduzido, muitas das atividades desenvolvidas no dia a dia desses indivíduos tornam-se diminuídas ou ausentes. Quanto ao lazer, Borges (2005) pontua que este na perspectiva individual demonstra estar associado à satisfa-

ção na vida e ao bem estar do sujeito, ou seja, à alegria e à qualidade de vida. Des-ta forma cada pessoa defini as atividades de lazer em sua vida associando-as aos desejos e aos valores das mesmas. Porém, o fato das limitações apresentadas pelo indivíduo com os comprometimentos advindos da doença mental, o torna muitas vezes incapaz de tomar iniciativas de escolhas e até mesmo de realizar algum tipo de atividade de lazer. Este fator poderá agravar ainda mais o quadro sintomático desta população. Portanto torna-se necessário que o lazer na vida das pessoas com doença mental venha a serrefletido e discutido. Alguns profissionais da área da saúde têm se dedicado a estudos que abordam o tema lazer, atividade física adaptada e doença mental. Uma investiga-ção intitulada: a influência da atividade física na qualidade de vida dos sujeitos com transtornos mentais, realizada por Borges (2005) com pacientes com diag-nóstico de esquizofrenia, cadastrados nos centros de convivência do município de Belo Horizonte obteve resultados relevantes. Entre os quais, verificou-se que a maioria dos pacientes (76,8%) percebem o lazer como parte do objetivo da satisfação no serviço de saúde Centro de Convivência. Este resultado demonstra que grande parte dos usuários percebem o lazer permeando o vínculo dos mesmos com as atividades ofertadas pelo serviço, embora estas atividades representem valor terapêutico e valor de trabalho para os profissionais dos serviços. No entanto nos parece que as atividades desses pacientes se resumem nas idas ao serviço de saúde mental e nenhuma outra participação em atividades que lhes tenham significância de lazer ou que lhes proporcionem sentimentos de prazer, alegria e satisfação. No entanto, mesmo que as atividades dos serviços de saúde investigados não fossem de cunho terapêutico, seria importante que este público frequentasse e vivenciasse outros ambientes. A Rede de Saúde Mental de Sobral também tem privilegiado a realização de vários estudos de significância. Entre alguns estudos, refiro ao estudo de Lo-meo (2006) sobre a percepção de liberdade no lazer dos usuários com transtornos ansiosos e de humor da rede de saúde mental de sobral, o qual verificou que os su-jeitos estudados demonstraram percepção restrita do lazer em suas vidas, e pouco envolvimento social, e que este fato deve ser devido aos níveis de influência dos transtornos mentais apresentados pelos pacientes. A grande contribuição de estudos com tal abrangência é atribuida a pos-sibilidade dos profissionais refletirem sobre suas ações e reformularem os projetos terapêuticos dos pacientes para que eles tenham a percepção do lazer em suas vidas, o realizem e alcancem melhor qualidade de vida.

BORGES, K. E. L. Influência da Atividade Física na Qualidade de Vida dos Sujeitos com Transtornos Mentais. Dissertação apresentada às provas de doutoramento no ramo de Ciências do Desporto nos termos do Decreto-Lei n° 216/92 de 13 de Outubro. Porto, Pt, 2005.LOMEO, R.C. Percepções de Liberdade no Lazer dos clientes do CAPS - Sobral com Transtornos de Ansiedade e de Humor. Revista de Políticas Públicas de Sobral/CE.v.6, n.2, p.1-92, jul./dez. 2005/200.

Roselane LomeoProfessora do Curso de Educação Física da Universidade Estadual Vale do Acaraú

Especialista em Saúde Mental e Saúde da Famí[email protected]

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Em se plantando – corretamente – tudo dá

Num estado em que grande parte das oportunidades de trabalho e renda estão na capital, a agroecologia ergue no semi-árido cearense a esperança de restabelecer entre o homem e a terra, entre saúde e ambiente, uma relação salutar e sustentável. Inundando de um novo sentido a labuta do agricultor, essa prática renega o progresso vazio e enche de vida as terras áridas do Ceará.

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cobertura . 27Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Quem visita a casa de João Fé-lix não imagina que aquela terra quase foi abandonada. A horta no quintal com co-entro verdinho, a cisterna branca contras-tando com o céu limpo e azul, a plantação de neem balançando tímida com o pouco vento e as portas da casa todas abertas dão ao visitante a sensação de que ali existe uma forma de progresso. Angustiado com o pouco feijão que via florescer no plantio, com o milho que não atingia metade da al-tura normal do pé, o agricultor de Choró-Limão, município do semi-árido cearense, ia largar tudo em busca de melhor sobrevi-vência em outros lugares. Mal sabia ele que não era infertilidade o problema da terra, mas cansaço. Assim como todo ser huma-no, tudo o que é vivo no planeta também cansa. Foi a agroecologia que mudou o pensamento de João. Quando participou de uma capacitação e um intercâmbio com ou-tros agricultores que já exercitavam a práti-ca, promovidos pela ONG Esplar – Centro de Pesquisa e Assessoria e pelo Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Choró, o agricultor e a família aprende-ram que a terra tem seus ciclos, que quando respeitados podem garantir fertilidade lon-gínqua. A monocultura, prática comum em grande parte das lavouras Brasil afora, as-sociada às queimadas como forma de pre-paração da terra para o plantio, enfraquece

e empobrece o solo, até esgotá-lo de vez. É assim desde os tempos de Cabral, situa-ção super dimensionada pelo agronegócio no país. Na agroecologia, além de incen-tivar a diversidade no plantio, três práticas são abolidas na lida com a terra: o uso de agrotóxicos, o uso de trator e a realização de queimadas. “Eu tenho consciência que desertifiquei essa terra, mas hoje o que eu puder fazer por ela, eu vou fazer”, diz o agricultor, com um brilho no olho de fazer inveja a qualquer descrença. A história de João e das 63 famí-lias que compõem o consórcio agroecoló-gico de Choró, Quixadá e Canindé mudou há cerca de sete anos, quando a parceria da Esplar com o Sindicato começou a pro-mover as primeiras intervenções na área. Um dos grandes objetivos era estabelecer a produção de algodão agroecológico. Esse algodão, hoje super valorizado no mercado internacional, é cultivado sem qualquer in-terferência de insumos artificiais. O adubo, o mesmo utilizado para preparar a terra para outras culturas, tem uma receita peculiar: fezes e urina de vaca, resto de fígado de boi moído, sangue de boi e cinzas de restos de lenha, calda nutritiva preparada em etapas durante 45 dias, e lançada no solo. Além da calda, quase tudo o que consideramos lixo, pode ser utilizado como fertilizante: restos de colheitas anteriores, de alimentos, minhocas, entre outros.

“O trabalho dos consórcios também empodera as mulheres, faz elas lutarem por seus direitos e muda o entendimento do papel dessa mulher na agricultura, tão importante quanto o do homem” (Paula Insaurrale – agrônoma)

28 . cobertura Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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A terra que João cultiva ainda não é dele no papel. Está em processo de re-forma agrária pelo Incra. Mas nela trabalha toda a família: o agricultor, a esposa e os três filhos mais velhos. Francisca Antônia, que além de agricultora é também agente comunitária de saúde, diz que a agroecolo-gia mudou os hábitos de toda a comunida-de, especialmente na alimentação. “A bata-ta, a cenoura, o coentro, o pimentão, eram todos distanciados da mesa. Com as nossas quintas e plantando várias coisas nós per-cebemos que não precisava comer só milho ou só feijão”, explica Francisca. A segu-rança alimentar é um dos grandes desafios gerados pelos perigos modernos da saúde ambiental. O uso de agrotóxicos, o cultivo de alimentos transgênicos, o esgotamento de estoques marinhos e a contaminação da carne para consumo humano figuram entre os principais vilões do setor. Além de garantir uma alimenta-ção de qualidade, a agroecologia resguarda os agricultores do contato com o agrotó-xico. Antigamente, o uso em larga escala na região, adoeceu e levou à óbito muitos trabalhadores, fatos relatados pelas famí-lias da região, além de contaminar tanto a vegetação, como o ar, a água e o solo. Nos consórcios, o plantio da árvore do neem gera um vermífigo e inseticida natural, sem esse impacto negativo, especialmente para quem aplica. Também conhecida como nim ou amargosa, é uma árvore “multiuso”, com um conjunto variado de utilidades. Das suas folhas, frutos, sementes, casca e madeira podem ser feitas diversas aplica-ções, tanto como fonte de materiais usa-dos pela medicina, veterinária, cosmética, como na produção de adubos e no controlo de pragas. De acordo com a Agência Na-cional de Vigilância Sanitária, o Brasil já é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, gerando em 2009 uma receita de US$ 7 bilhões e um consumo de 700 mil toneladas no país. Para o gerente de avalia-ção de riscos da Anvisa, Ricardo Augusto Velloso, “implementar medidas que garan-tam a segurança do usuário, do produtor e do consumidor, e que gerenciem o impacto ambiental são grandes desafios, que tornam necessários os investimentos em educação, treinamento e capacitação técnica do usuá-rio no campo”.

“Eu tenho consciência que de-sertifiquei essa terra, mas hoje o que eu puder fazer por ela, eu vou

fazer” (João Félix – agricultor)

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Para o engenheiro agrônomo Pedro Jorge Ferreira Lima, a “grande diferença entre o fazendeiro e o agricul-tor familiar se revela na hora que apare-ce uma praga na lavoura, ou antes dis-so, quando o fazendeiro manda alguém pulverizar. O agricultor familiar põe a maquina nas costas e vai lá aplicar. En-tão eles sabem o valor de não trabalhar com agrotóxico”, explica. As duas outras pontas do tripé – não uso de tratores e de queimadas – também fazem diferença na vida das famílias, com diminuição das infecções respiratórias e da desertifica-ção dos solos. “Alguns colegas às vezes dizem que é bobagem não aceitar uma queimadinha pequena. Não sei o que é isso. Para mim não existe queimada pe-quena se todas as vezes elas matam a vida que tem na terra”, diz João.

A família de João mostra que a agroe-cologia não muda só a percepção sobre o meio ambiente, mas sobre o próprio papel da família na simbiose com a terra. “O trabalho dos con-sórcios também empodera as mulheres, faz elas lutarem por seus direitos e muda o entendimen-to do papel dessa mulher na agricultura, tão importante quanto o do homem”, explica a en-genheira agrônoma Paula Insaurrale. Francisca hoje sabe que o que ela faz não é só ‘dar uma ajudinha ao marido’. Mais que isso, Francisca é parte e um dos grupos de mulheres que fazem brotar em seus quintais a fonte de quase toda a nutrição da casa. E da cura de doenças básicas, com o uso das plantas medicinais. E a pequena Carolina, de pouco mais de dois anos, já é fruto do novo momento na vida do casal. Com uma pazinha que mal cabe nas mãos, ela vai cedinho chafurdar na terra enquanto pai e mãe resguar-dam a sua nutrição.

“A batata, a cenoura, o coentro, o pimentão, eram

todos distanciados da mesa. Com as nossas quintas e

plantando várias coisas nós percebemos que não precisava

comer só milho ou só feijão”(Francisca Antônia)

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Um bichinho chamado bicudo

Quando começaram a cultivar a terra para o plantio de algodão agroecoló-gico, os agricultores consorciados enfren-taram um inimigo para lá de persistente: o bicudo. O inseto ataca as flores do al-godão, impedindo que elas brotem. Com uma capacidade de multiplicação veloz, o bicudo fez muitos agricultores desistirem de cultivar algodão. Em outros estados do nordeste, como a Bahia, as plantações são erradicadas após a colheita, e enterra-dos os galhos, para interromper o ciclo do desenvolvimento do inseto. Na plantação de João, a alternativa de combate parece simples quando narrada pelo agricultor. É retirando os besouros um a um que João consegue produzir um dos melhores algo-dões da região. “Não adianta brigar com o bicudo, não tem maneira de acabar com ele sem veneno, que a gente não usa. Então a gente faz o controle todo dia. Pelo menos uma parte do algodão ele deixa pra nós”, conta sério o que soa surpreendente. O técnico agrícola Sérgio Giorgia-no, que faz o acompanhamento técnico pela Esplar na região, explica que “para o algo-dão já falta oferta, tamanha é a demanda”. A pluma produzida com o envolvimento de cerca de 300 famílias nos municípios cearenses de Tauá, Nova Russas, Parambu e Independência, Choró, Quixadá, Quixe-ramobim, Canindé, Sobral, Massapé, For-quilha e Santana do Acaraú, é quase toda destinada à exportação para a França, que confecciona um tênis 100% agroecológico, com borracha amazônica e couro bovino rio grandense. No Brasil, outras empresas também utilizam o algodão para calçados e confecções.

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Casas de sementes

Os consórcios incentivam ainda uma prática que resgata o valor das se-mentes crioulas: as casas de sementes. Ne-las os agricultores podem doar espécies de sementes que sobrem de suas plantações anuais, servindo para troca e empréstimo a outros agricultores. Periodicamente são realizados seminários na região com os administradores dessas casas, onde essa troca de experiências é realizada. Isso pre-serva as características das espécies e fa-vorece a autonomia dos agricultores, uma vez que conseguem cedo suas sementes e podem se preparar antes do período chu-voso, não precisando esperar pela doação do Governo. “Se uma comunidade perdeu uma espécie porque parou há algum tem-po de plantar, ou nunca plantou por falta de conhecimento da semente, pode viver essa experiência a partir desse contato. Essa permuta muitas vezes recupera uma prática que estava perdida, e ainda freia a erosão genética, uma vez que as varieda-des possibilitam um leque maior de culti-vos”, explica Pedro Jorge. Preservar as sementes, na era dos transgênicos, mais que uma questão cul-tural é uma questão de sobrevivência das espécies, especialmente de milho e soja. A ONG Esplar faz parte da Campanha por um Brasil Livre de Transgênicos, que teve início na década de 90, e seus profissionais reconhecem que é preciso inclusive alterar o nome da campanha. “Hoje os transgêni-cos fazem parte do agronegócio do país, já entraram fortemente na cadeia produ-tiva brasileira, então o que precisamos é monitorar essa inserção”, diz Pedro Jorge. As espécies de transgênicos são economi-camente viáveis, mas sua utilização sem

monitoramento adequado representa ris-cos e causa prejuízos ao meio ambiente e aos trabalhadores rurais. Uma das práticas mais comum é o uso de espécies de milho e soja resistentes ao herbicida roundup®, à base de glifosato e patenteado pela Mon-santo, empresa norte-americana. No agronegócio brasileiro, gran-de parte das plantações de soja e milho transgênicos funciona da seguinte manei-ra: fazendeiros adquirem as sementes ge-neticamente modificadas que sobrevivem à aplicação de roundup, que destrói tudo mais ao seu redor, como as ervas exóti-cas e outros organismos vivos da lavoura, evitando que as mesmas ‘interfiram’ nas plantações. Esse herbicida, quando utili-zado maciçamente nessas áreas, junto ao milho, algodão, soja ou outros alimentos, prejudica o ambiente quando elimina as fontes naturais de vida do solo, contami-nando inclusive os mananciais, e quem está em contato com ele, já que pesquisas indicam que o glifosato pode causar infer-tilidade e impotência masculina. Matéria publicada no site com-ciencia.com aponta ainda que “a soja trans-gênica resistente ao herbicida roundup é plantada em muitos lugares no Brasil lado a lado com outras culturas, ou a poucos metros de distância de lavouras conven-cionais, o que se torna suficiente para que ocorram cruzamentos entre ambas, disse-minando o gene de resistência ao herbicida em milhares de plantas cultivares, que não eram transgênicas”. Essas plantas serão po-linizadas por insetos que podem também não sobreviver ao contato, desencandeando uma complexa alteração na cadeia de seres vivos existente na agricultura.

“Se uma comunidade perdeu uma espécie porque parou há algum

tempo de plantar, ou nunca plantou por falta de conhecimento

da semente, pode viver essa experiência a partir do contato

com a Casa de Sementes” (Pedro Jorge – Esplar)

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Desafios

Esplar e Sindicato dos Agriculto-res e Agricultoras reconhecem que implan-tar a agroecologia no semi-árido cearense é um desafio imenso. Primeiro porque a prática das queimadas ocorre no Brasil desde o uso da terra pelos índios, de acordo com as primeiras informações que se tem notícia. É difícil desacostumar um povo de uma prática que é mais rápida e impõe menos sacrifícios físicos aos trabalhadores. Só quando há um despertar de consciência, muitas vezes estimulado pela troca de ex-periências, é que se torna possível acreditar em mudanças. Além disso, é preciso acelerar o processo de reforma agrária no estado, uma vez que de posse da terra os trabalhadores rurais terão mais autonomia para participar progressivamente dos consórcios. Neste cenário político, um apoio do poder públi-co também seria interessante, até para via-bilizar a comercialização dos produtos da agricultura familiar, cujo escoamento ain-da necessita do trabalho de atravessadores nem sempre dotados de idoneidade. Mas se por um lado as coisas ca-minham devagar, por outro o progresso salta das fruteiras e canteiros de hortaliças das diversas casas como as de João e Fran-cisca. Orgulhosos pela saúde e sustento ga-rantidos, eles nos ensinam o que puderam aprender enfiando as mãos na terra. “Fa-lam tanto em aquecimento global, mas por que não dão mudas às pessoas e ensinam a plantar? Até um saquinho de feijão ou de açúcar pode servir para colocar um broto. Se em cada casa pelo menos uma pessoa fi-zer isso, quantas árvores vão ser no final?”, questiona João. Serão muitas, mas nada além do número necessário para a preser-vação da vida no planeta.

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Vitor Vital Permacultor, Designer e Produtor

[email protected]

Quem pensa que a agroecologia so-mente é viável para áreas pequenas de culti-vo e baseada apenas na agricultura familiar, pode se surpreender ao conhecer a experiên-cia da Agroindústria Santa Fé (ASF), em Ita-pajé, que está desenvolvendo todos seus pro-cessos produtivos com base nos parâmetros da permacultura, a “cultura permanente”. Um deles é a produção agrícola ecológica. Além de ser um processo de reflorestamento que valoriza a recomposição da biodiversida-de nativa, a agrofloresta também é planejada para o abastecimento familiar, inserindo toda espécie produtiva adaptável ao habitat local. O projeto está se desenvolvendo no distrito de Serrote do Meio, onde moram pouco mais de quinhentos habitantes vivendo basicamente da agricultura. São chefes de fa-mília que trabalham em terras de propriedade da Agroindústria Santa Fé, que está inativa há cerca de 10 anos, desde que foi criada. Em 2009. no entanto, os proprietários elaboraram um projeto de trabalho fundamentado nos parâmetros do desenvolvimento sustentável. Foi quando teve origem o Projeto Unidade Rumo, que por vezes se confunde com o pró-prio planejamento estratégico da empresa. Com os objetivos de produzir ali-mentos de forma ecológica, promover rela-ções de trabalho saudáveis, organizar e esco-ar a produção de alimentos local, realizar o manejo ecológico do território da ASF e be-neficiar a produção agrícola da propriedade, o Projeto Unidade Rumo está identificando potencialidades e desenvolvendo todo seu sistema produtivo para uma produção com qualidade e ecoeficiência, se baseando nos parâmetros do desenvolvimento sustentável. Para implantar o projeto, será re-alizada em 2010 uma série de oficinas de orientação para as famílias de agricultores. A primeira delas aconteceu nos dias 6 e 7 de fevereiro, em Serrote do Meio, distrito de Ita-pajé, ministrada por Nashira Mota, consul-tora em agroecologia e presidente do NAVE – Núcleo de Agroecologia e Vegetarianismo. “Esse tipo de capacitação serve tanto para divulgar a iniciativa para o público de gran-des cidades, principalmente Fortaleza, como também para motivar a agricultura familiar local, já que as formas de produção agrícola degradantes ainda estão longe de serem ex-

tintas na região”, disse Mota. Além de ser um processo de reflo-restamento onde se valoriza a recomposição da biodiversidade nativa, a agrofloresta tam-bém é planejada para o abastecimento fami-liar, inserindo toda espécie produtiva adap-tável ao habitat local. Os SAF’s, sistemas agroflorestais, são uma alternativa com algu-mas boas experiências bem sucedidas, como a de Ernst Goetsch (um bom vídeo sobre a experiência pode ser visto em http://www.you-tube.com/watch?v=9bA-rlhs7-E), na Bahia. Este ano já estão confirmadas no Serrote do Meio as oficinas de saneamento ecológico, quintais produtivos, biodigestor e planejamento permacultural, todas em uma articulação entre a ASF, o Mangará – Institu-to para o Desenvolvimento Sustentável, a As-sociação de Moradores do Serrote do Meio Walter Cavalcante Sá, a V. Grilo – Permacul-tura, Design e Produção, o NAVE – Núcleo de Agroecologia e Vegetarianismo e o ESSA – Laboratório de Estudos da Sustentabilidade Socioambiental.

Indústria adota agroecologia como alternativa

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“Esse tipo de capacitação serve tanto para divulgar a iniciativa para o público

de grandes cidades, principalmente Fortaleza,

como também para motivar a agricultura familiar local, já que as formas de produção

agrícola degradantes ainda estão longe de serem

extintas na região”(Nashira Mota - NAVE)

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Por uma política municipal de saneamento ambiental

O processo de redemocratização do país tem re-sultado numa gradativo amadurecimento da consciên-cia política do meio popular. Ainda existe certamente muita manipulação na política institucional, mas já não é tão fácil a imposição da política fisiológica praticada tradicionalmente por uma parcela dominante. Mesmo que as decepções e descaminhos não tenham deixado completamente o cenário e diante da crise da democra-cia representativa, é inegável o valor da democracia

participativa como amálgama transparente, constituinte da identidade bra-sileira e indutor do desenvolvimento nacional. Somos parte desse processo. A administração popular em Fortale-za, tendo à frente a companheira Luizianne Lins, tem promovido avanços no que tange à construção de um espaço urbano com saúde, equidade, jus-tiça social, conforto e qualidade de vida para a população. São inúmeras iniciativas que decorrem da renovação dos métodos de governar com parti-cipação popular, ou seja, a eficácia das políticas decorrem da sintonia com as necessidades reais do povo, da capacidade de escutar as pessoas que são as maiores interessadas e fiscais da aplicação correta dos recursos. Mas é preciso avançar ainda mais dentro de um planejamento urba-nístico que permita o direito à cidade às atuais e às futuras gerações. A crise ambiental global impõe a adoção imediata de programas e medidas práticas de desenvolvimento sustentável, materializadas na Agenda 21. É neste contexto que surgem as Conferências de Saúde Ambiental. E é essencial que os trabalhadores e trabalhadoras aproveitem o momento propício para avançar na implementação de políticas participativas de Sane-amento Ambiental, sintonizadas com a legislação nacional. Saneamento ambiental envolve um conjunto complexo e integrado de ações, muito além de apenas realizar a coleta domiciliar de lixo: partem desde a educação ambiental para evitar o desperdício, passando pelo forne-cimento de água e esgoto, destinação de resíduos sólidos com coleta seletiva, inclusive de entulho e podas, controle de vetores e efluentes, despoluição de solos e recursos hídricos, drenagens, até o marco regulatório que estabeleça e discipline ciclos fechados de atividades econômicas, nas esferas da produ-ção e do consumo. Hoje, na realidade, é evidente a insuficiência de políticas públicas de saneamento básico. Nas cidades inchadas muitas pessoas vivem em con-dições insalubres, em áreas alagáveis, em meio à lama e lixo. Enquanto isso os governos pagam caro e tentam regular a prestação de serviços por meio de concessões privadas que em geral não conseguem sanar satisfatoriamente os problemas sociais e ambientais das metrópoles. Será este o melhor modelo? Desejamos poder colaborar decisivamente para encontrar os cami-nhos de políticas efetivas de saneamento ambiental, que beneficiem a popu-lação como um todo, dentro de um compromisso coletivo com a sustentabi-lidade planetária.

Rafael TomyamaCoordenador da Célula de Políticas Ambientais da Secretaria Municipal do

Meio Ambiente e Controle Urbano de Fortaleza (SEMAM)[email protected]

opinião . 35Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Realizada em outubro de 2009, a I Conferência Estadual de Saúde Ambiental do Ceará apresentou uma delegação afinada com a temática e um imenso potencial de contribuição com as deliberações nacionais. Com 336 delegados participantes, a I Conferência Estadual de Saúde Am-biental do Ceará foi realizada no período de 7 a 9 de outubro de 2009, e resultou de um amplo processo de elaboração junto ao Conselho Estadual de Meio Ambiente (COEMA), o Conselho Estadual de Saú-de (CESAU) e diversos representantes de movimentos sociais. Em preparação para a etapa estadual foram realizadas 11 etapas regionais, considerando a regionalização feita pela Secretaria das Cidades, já que o tempo hábil não permitia que o critério fos-se das 21 regionais de saúde. Houve tam-bém a I Conferência Municipal de Saúde Ambiental de Fortaleza, onde foram esco-lhidos 240 representantes, considerando as particularidades da capital. Apesar de nova, a proposta de instituir uma política de Saúde e Meio Ambiente, considerando a necessidade de incorporar as mudanças ambientais às prá-ticas de saúde pública, não surpreendeu

Saúde Ambiental não causa estranhamento no Ceará

os participantes da I Conferência Estadual de Saúde Ambiental do Ceará. A afirmação é da co-ordenadora do evento, Zélia Franklin Albuquerque. “Uma coisa que nos surpreendeu foi a intimidade que a po-pulação presente nas con-ferências teve com a temá-tica. Não houve nenhuma dificuldade de discutir a questão da Saúde Ambien-tal. Houve um entendi-mento muito claro de que cuidar do meio ambiente e cuidar da cidade era cuidar da saúde. Isso foi fundamental para seguirmos a metodologia nacional, de tirar resoluções para a etapa nacional”. As etapas estaduais construí-ram diretrizes, 16 em cada, e ações estra-tégicas que forma levadas à I Conferência Nacional de Saúde Ambiental, realizada em Brasília, de 9 a 12 de dezembro, com o tema “A saúde ambiental na cidade, no campo, na floresta e no litoral: construindo a cidadania, qualidade de vida e territórios

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sustentáveis”. O evento reuniu as ini-ciativas discutidas desde as últimas

Conferências Nacionais das três principais áreas envolvidas: Saú-de, Meio Ambiente e Cidades. “Desde as resoluções delibera-das nas últimas Conferências dessas áreas, entendemos que o processo não poderia aconte-cer de forma isolada, cada um no seu espaço, mas dentro de uma intersetorialidade, que é uma bandeira do SUS”, explica Franklin. Nacionalmente foram

definidas seis categorias de par-ticipação: os movimentos sociais,

os trabalhadores, as ONGs, as em-presas, os pesquisadores e os servi-

dores públicos (federais, estaduais e municipais).

Cerca de 800 pessoas, de todas as regionais de Fortaleza, se reuniram para a realização das Pré-Conferências Munici-pais de Saúde Ambiental, promovidas pela Prefeitura Municipal de Fortaleza, através da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Controle Urbano (SEMAM), da Secreta-ria Municipal de Saúde e da Fundação de

Desenvolvimento Habitacional de Fortale-za (Habitafor). Nas 11 regiões determina-das no Ceará, os municípios que tivessem interesse em sediar o evento, com um por-te populacional razoável, e que quisessem assumir a realização da Conferência, num sentido de co-participação, receberam o apoio da Comissão Organizadora da Con-ferência Estadual. A Conferência Estadual de Saúde Ambiental foi lançada através de vídeo-conferência exibida na Assembléia Legislativa, no dia 13 de julho, com a par-ticipação de cerca de 120 pessoas represen-tativas de todas as categorias. No setor de Vigilância Ambien-tal da Secretaria Municipal de Saúde de Fortaleza, a expectativa gira em torno das deliberações da etapa nacional, embora al-gumas iniciativas já estejam prosseguindo na cidade, entre elas a realização de um se-minário municipal, em março de 2010, que vai traçar um Plano de Trabalho e Ação na área. Serão 50 pessoas discutindo as prio-ridades nas áreas de Saúde do Trabalhador e Saúde Ambiental. “Quando a Comissão Nacional convidar para o debate, já estare-mos caminhando com situações mais con-cretas”, declara Franklin.

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1ª CNSA define estratégias para a criaçãoda Política Nacional de Saúde Ambiental

Com o objetivo de propiciar o de-bate da Sustentabilidade Socioambiental com a sociedade e definir diretrizes para a política pública integrada no campo da saúde ambiental, foi realizada em Brasília, de 9 a 12 de dezembro, a 1ª Conferência Nacional de Saúde Ambiental (CNSA). Coordenada pelos Ministérios da Saúde, Meio Ambiente e Cidades, a CNSA mo-bilizou mais de 60 mil pessoas em todo o país e aprovou 24 diretrizes e 48 ações que servirão de subsídio para a implementação da primeira Política Nacional de Saúde Ambiental do país. A 1ª CNSA teve como lema “Saú-de e Ambiente: vamos cuidar da gente”, e tema “A saúde ambiental na cidade, no campo e na floresta: construindo cidada-nia, qualidade de vida e territórios sus-tentáveis”. A conferência é uma resposta

do governo federal à crescente demanda para que se construa a Política Nacional de Saúde Ambiental. Sua realização atende às deliberações da III Conferência Nacional de Meio Ambiente (maio/2008), da 13ª Conferência Nacional de Saúde (novem-bro/2007), e da 3ª Conferência Nacional das Cidades (novembro/2007). É também uma iniciativa dos conselhos nacionais de Saúde, Cidades e do Meio Ambiente. A integração entre governo e sociedade revela a consolidação de um processo construído coletivamente e que representa um importante canal de demo-cracia participativa e controle social. A construção de diretrizes e ações estratégi-cas para a saúde ambiental é fruto do es-forço e dedicação dos diversos segmentos da sociedade que participaram desta Con-ferência, entre eles representantes de Or-

ganizações Não Governamentais (ONGs), trabalhadores formais e informais, setor empresarial, movimentos sociais e setor governamental. Dessa forma, deverão sub-sidiar a construção de uma política integra-da para a redução de riscos à saúde pela melhoria das condições de vida da popula-ção, bem como pela diminuição dos danos ao meio ambiente. As propostas estão dividas em seis temas: Processos Produtivos e Consumo Susten-tável; Infraestrutura; Articulação Interins-titucional, Ações Integradas e Controle Social; Territórios Sustentáveis, Planeja-mento e Gestão Integrada; Educação, In-formação, Comunicação e Produção de Conhecimento; e marco Regulatório e Fis-calização. A plenária apontou a necessidade do avanço no processo da reforma agrária,

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saneamento básico e ambiental nas áreas urbanas, núcleos rurais e comunidades in-dígenas, quilombolas com proteção dos re-cursos naturais. E também pela ampliação e garantia de acesso universal à água de qualidade. Também pedem a criação, im-plantação e implementação de consórcios intermunicipais para o tratamento e desti-nação adequada dos resíduos e implemen-tação de programas de gestão integrada de resíduos sólidos, com foco na diminuição de geração desses resíduos. O fortalecimento do controle so-cial sobre as políticas de saúde ambiental foi reivindicado como forma de intervir e deliberar sobre políticas públicas, planeja-mento e gestão, ampliando a fiscalização no cumprimento das decisões legais de saúde ambiental. A garantia e efetivação das ações de saúde ambiental, os recursos e a educação foi outro ponto. O controle social terá governabilidade sobre a fisca-lização às agressões ao meio ambiente,

fortalecendo os canais de denúncias e ga-rantindo a participação da sociedade civil nas decisões públicas com relação à saúde ambiental. Na avaliação de Guilherme Fran-co Netto, coordenador geral da 1ª CNSA e diretor de Vigilância em Saúde Ambien-tal e Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde, a CNSA conseguiu trabalhar de maneira muito propositiva, e vai contribuir na elaboração de diversas políticas públi-cas, o que vai contribuir para a qualidade de vida dos brasileiros. “Posso afirmar que a coragem e a determinação dos delegados de todo o Brasil tornaram possível a reali-zação dessa Conferência”. Para Netto, as deliberações e dire-trizes propostas contribuirão na elaboração de diversas políticas públicas e melhoria da qualidade de vida dos brasileiros. “O governo brasileiro poderá dizer em Cope-nhague que aqui fomos capazes de discutir a Saúde Ambiental em nível elevado”.

como forma de fortalecer a agricultura fa-miliar orgânica e agroecológica. Também foi proposta a garantia de áreas agrícolas para essas atividades, acompanhadas de assistência técnica, extensão rural e me-lhoria da qualidade de vida. Os delegados acreditam que a fórmula propicie a dimi-nuição do êxodo rural e incentiva a diver-sidade de produção nas comunidades agrí-colas.Uma outra solicitação pede orientação e informação para o processo de capacitação de pequenos produtores e trabalhadores ru-rais, incluindo as comunidades indígenas, quilombolas e populações tradicionais, criando políticas públicas para a produção de produtos agroecológicos, limitando a área de monocultivo, erradicando-se o uso de agroquímicos sintéticos, proibindo o uso de transgênicos e fortalecendo a agri-cultura familiar. Quanto à infraestrutura, os de-legados propuseram a universalização do

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Texto Orientador da 1ª Conferência Nacional de Saúde Ambiental

Em consonância com os princípios democráticos e com os direitos de cidadania estabelecidos na Constituição Federal é necessário superar alguns desafios na construção da política de saúde ambiental brasileira, tais como:• Ampliar a participação e o controle social no enfrentamento das injustiças e iniqüidades;• Aumentar a consciência sobre os graves e complexos problemas da saúde relacionados à questão ambiental;• Superar a fragmentação das ações entre os vários setores de go-verno e sujeitos sociais;• Reduzir os impactos negativos da dinâmica do desenvolvimento na saúde das populações, em especial aquelas mais vulneráveis;• Fomentar um modelo de desenvolvimento econômico territorial na cidade, no campo e na floresta, que aponte para a sustentabili-dade socioambiental de forma integrada e integral. A médica Rosa Wolff, do Centro Regional de Referên-cia em Saúde do Trabalhador, com sede em Santa Maria, trouxe dados alarmantes da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2006. “Setenta mil pessoas morrem no Brasil por intoxicação por agrotóxicos. No mundo, são 3 milhões. Podemos chamar isso de defensivos agrícolas? Não! Devemos chamar do que eles realmen-te são: venenos desenvolvidos para matar, e essa definição inclui o homem”, ressaltou. As substâncias químicas presentes nos agro-tóxicos provocam desde rinites e distúrbios de comportamento, até alterações neurológicas (dificuldade de aprendizagem, retardo mental) e mutagênicas que podem provocar cânceres e anencefa-lias (bebês sem cérebro), entre outras. Os sintomas da intoxica-ção são comuns a outras doenças, como dores de cabeça, cansaço, cãimbras, diarréias, depressão, etc., o que dificulta o diagnóstico pela intoxicação crônica e mesmo a aguda. O objetivo da Conferência [de Saúde Ambiental] é con-solidar políticas de saúde ambiental que gerem redução de doen-ças e mortes relacionadas à degradação de matas e rios, poluição, condições de trabalho inadequadas, entre outros. Ou seja, o foco da discussão é como melhorar as condições de vida da população com a redução de danos ao meio ambiente. De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), 24% das doenças e 23% das mortes prematuras são relacionadas a degradação am-biental. No Brasil, essa estimativa é de 18%. Para o diretor do Departamento de Vigilância Ambiental em Saúde e da Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde, Guilherme Franco Netto, o Brasil obteve conquistas tanto na formatação quanto na aplicação de políticas públicas de saúde ambiental e citou como exemplo o estabelecimento de regras rígidas para água para consumo humano fornecida por empre-sas de abastecimento.

A ação humana sobre a natureza faz parte da história da civilização. Neste inicio de século, porém, a consciência sobre os impactos desta intervenção tem adquirido maior dimensão. Além dos riscos ambientais provocados pela ação humana, a permanên-cia ou agravamento das desigualdades sociais e econômicas, nas várias regiões do planeta, especialmente nas mais pobres, demons-tram a insustentabilidade socioambiental decorrente do modelo de desenvolvimento econômico, bem como suas conseqüências sobre a saúde das populações. Alguns dos elementos deste cenário são: o esgotamen-to dos recursos naturais, como a água e as florestas; os processos acelerados de desertificação; a intensificação de eventos climáticos extremos; a crise urbana relacionada à carência de serviços de sa-neamento básico, habitação, transporte e segurança pública; desas-tres tecnológicos; poluição química de ambientes urbanos e rurais; e a emergência e re-emergência de doenças. Estes problemas são interdependentes. Seus impactos vão além das fronteiras locais e temporais. Os efeitos deste cenário são produzidos e sentidos pelas populações. Em relação ao Brasil, país que apresenta ampla diversi-dade ambiental, cultural, étnica e fortes contrastes econômicos, as situações de saúde e suas relações com o meio ambiente devem ser analisadas a partir de seus territórios, considerando as caracterís-ticas das populações e os possíveis cenários de desenvolvimento, sejam eles na cidade, no campo ou na floresta. A busca de soluções para este quadro diversificado requer a formulação e gestão de políticas públicas interdisciplinares,

integradas, intersetoriais, participativas e ter-

ritorializadas.

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Pôr os pés fora de casa em Fortaleza significa atualmente, inevi-tavelmente, esbarrar em muito lixo amontoado em ruas e calça-das. Transitando a pé, de ônibus ou de carro, há sempre alguém ao lado lançando na rua as coisas mais variadas, de papel de bala à espiga de milho. E não há um quarteirão em que não se veja pelo menos um catador de lixo, com a mão enfiada na misé-ria do planeta. Ou em sua riqueza.

Até que o lixo vire luxo

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Eunice da Conceição Sousa, 34 anos, acorda cedo desde criança para lutar por sua sobrevivência. Mãe de dois filhos, dos quais só cuida de um – o outro lhe foi tomado pelo pai tão logo nasceu, porque Eunice sofria de uma crise depressiva – a cearense de Uruburetama fugiu com a mãe dos maus-tratos paternos aos cinco anos, deixando para trás os dez irmãos e toda a sua memória afetiva da primeira infância. Órfã da mãe aos quatorze anos, em For-taleza fez e viveu de tudo um pouco: foi empregada doméstica, auxiliar de produ-ção numa fábrica de castanhas, pedinte de rua, interna do Hospital Psiquiátrico Mira e Lopez. Teve dois maridos – dos quais um morreu assassinado - e pulou de emprego em emprego até se tornar catadora de lixo, ou recicladora, como prefere a nomenclatu-ra oficial. Foi no lixo que Eunice reencon-trou a possibilidade de ter sua própria renda sendo mãe solteira. Todas as manhãs, Euni-ce já sai com seu carrinho de coletar levan-do junto a filha Raíza, a pequena morena de seis anos, que deixa na escola. Antes Raíza

não estudava e acompanhava a mãe o dia inteiro em sua rota de coleta. Raíza sofreu desidratação e Eunice recebeu o ultimato do Conselho Tutelar: se ainda saísse com a menina poderia perder a guarda da filha. Pela segunda vez, não. Daí em diante, a re-cicladora só junta lixo pela manhã, enquan-to a pequena segue seus estudos. No resto do tempo, estão juntas feito casa e botão. A vida de Eunice aponta que sua conduta podia ser de absoluta derrocada, mas um diálogo com a recicladora, que voltou a estudar recentemente num Centro de Edu-cação para Jovens e Adultos, aponta uma consciência para lá de concreta, e por que não, politizada, dessas que deixam pessoas como eu, cheias de oportunidade na vida, de queixo caído e coração na mão. Eunice não se importa em tra-balhar com o lixo, mas acha que a cidade está muito mais suja do que deveria e que as portas estão muito fechadas para pesso-as como ela. “Quando boto meu carro na rua, esqueço de todos os problemas. Vou só apanhando lixo e deixando de imaginar bobagem. Mas acho que a Prefeitura podia

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apoiar o nosso trabalho, porque os lugares que usam o lixo já estão lotados de cole-gas”. Eunice se refere às ONGs e Associa-ções Comunitárias que reúnem poucos dos mais de 6000 recicladores de Fortaleza, de acordo com uma pesquisa realizada pelo Imparh em 2006. Mas embora com pouca abertura, ainda é o terceiro setor, aqui in-cluindo as Associações Comunitárias, que faz algum papel ambiental de impacto no Ceará. Quem não está incluído no escopo de atuação desses espaços vive na margi-nalidade. O lixo que esses recicladores apa-nham, e especialmente o lixo que não serve para qualquer reciclagem, lixo molhado, representam hoje um dos maiores proble-mas ambientais da cidade. Na verdade do país e do mundo inteiro. No momento em que escrevo essa matéria, 90% da escala-da de um jornal de exibição nacional, fala sobre desastres diretamente relacionados aos problemas ambientais, entre eles o lixo. São Paulo está sofrendo alagamentos constantes, que destroem sua paisagem ur-bana e consequentemente seu status social, porque não há lugar por onde a água das chuvas possa escorrer. Os bueiros estão entupidos de lixo. O atual estado de sujeira porque passa o país e o mundo é parte de um pro-cesso histórico de onde é impossível se compartimentar causas e conseqüências, tudo está intrinsecamente relacionado, num arranjo de determinação desses problemas. O crescimento urbano desordenado, as vul-nerabilidades sociais geradas pelas precá-rias condições de saneamento básico e in-fraestrutura adequada nas grandes cidades, os riscos gerados pelo desenvolvimento calcado na exploração desmedida de nos-sos recursos naturais e humanos e o consu-mo inconsciente são algumas das questões que podemos resgatar dos dados históricos para mapear o caminho que nos trouxe ao excesso de lixo. Até 2050 seremos 9,2 bilhões de pessoas no planeta, 60% vivendo nas áreas urbanas, onde acontecem a maior parte dos problemas de gestão dos resíduos sólidos exatamente pelas condições precárias de vida dos conglomerados humanos. Qua-se 10 bilhões de pessoas produzindo lixo todos os dias no mundo! De acordo com

o IBGE, o Brasil soma hoje cerca de 190 milhões de habitantes, dos quais 81% estão concentrados em áreas urbanas. No Brasil são produzidos todos os anos cerca de 83 milhões de toneladas de lixo, dos quais 40,5% têm destinação adequada, seja nos aterros sanitários, na compostagem ou na reciclagem por separação manual. O res-tante não aparece nas estatísticas oficiais. Está, entre outros destinos, nos cerca de 1.000 pontos de lixo, os chamados lixões, somente em Fortaleza, de acordo com da-dos da Secretaria Municipal de Meio Am-biente – SEMAM. Rafael Tomyama, coordenador de Políticas Ambientais da SEMAM, escla-rece a complexidade do tema e reconhece que a situação é assoladora. “Se cada in-divíduo separa o lixo seco do molhado e a coleta mistura tudo, não adianta nada. Não basta fazer educação ambiental. Tem que haver decisão política”. A boa novidade é que a discussão sobre a necessidade de implementação de uma coleta seletiva já está no gabinete na Prefeitura Municipal de Fortaleza. Existe uma Comissão Perma-nente pensando no assunto, e há um Plano de Gerenciamento de Resíduos estabeleci-do em 2009 para os próximos 10 anos. O plano contempla a criação de Ecopontos, que são locais para a destinação de entulhos – lixos originados nas constru-ções civis – que se separados corretamente podem se transformar novamente em mate-rial de construção. Serão construídos ainda galpões para separação, prensagem e venda do material recolhido seletivamente pelos caminhões contratados pela Prefeitura. Na discussão sobre o aumento do IPTU, ini-ciada em 2009 pela Prefeitura, foi incor-porada a coleta seletiva em condomínios ainda como projeto piloto, podendo se tor-nar obrigatória. Aqueles condomínios que cumprirem corretamente a tarefa de separar o lixo seco, que é genericamente reciclável, do lixo molhado, terá 5% de desconto no valor do IPTU. Mas e quanto aos recicladores de lixo, como Eunice e outros milhares de fortalezences? A idéia do Plano de Ge-renciamento é que eles deixem de existir, sendo reaproveitados em outras funções da cadeia produtiva que se pretende oficializar em torno do lixo. “A coleta seletiva feita

Lixo domiciliar é aquele produzido por residências e estabelecimentos comer-ciais, de origem conhecida, vegetal e inerte (material não-orgânico proveniente de construção), colocado nas calçadas e nas portas de ca-sas e condomínios. O limite diário não deve ultrapassar os 50 kg.

Os restos de poda devem ser acondicionados em sacos ou amarrados em feixes que não ultrapassem 50 kg e devem ser colocados nas calçadas nos dias de coleta evitando que fiquem espalhados nas ruas ou jogados em terrenos baldios formando as rampas de lixo.

Fortaleza tem 1.400 pontos de lixo mapeados, os quais contêm lixo solto, entulho e restos de poda. Os três principais agentes causado-res de lixões são os grandes geradores que não dão des-tinação correta aos resíduos produzidos; os carroceiros e o descarrego clandestino.

Com um quilo de vidro que-brado faz-se exatamente um quilo de vidro novo. E a gran-de vantagem do vidro é que ele pode ser reciclado infini-tas vezes. Em compensação, quando não é reciclado, o vidro pode demorar 1 milhão de anos para decompor-se.

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hoje em Fortaleza por essas pessoas é uma coisa draconiana, são seres humanos nas ruas, atravessando a cidade inteira em bus-ca do lixo dos bairros ricos, muitas vezes com toda a família, sem qualquer humani-zação, sem qualquer direito”, diz Tomya-ma. Para o coordenador, é impossível dar continuidade a essa situação, nem que seja oficializada. A existência desses trabalha-dores causa hoje uma série de problemas no trânsito da cidade e nos serviços de saú-de. “A grande maioria deles estoca em casa o lixo, porque só vale à pena repassar aos depósitos uma quantidade grande de mate-rial. Esses resíduos acumulados nos quin-tais geram contaminação, geram dengue,

atraem ratos, enfim, uma série de doenças”, completa o coordenador. O comércio ilegal do lixo, que hoje acontece em Fortaleza, reforça a con-dição sub-humana desses trabalhadores informais, embora isso seja uma grande contradição. Afinal de contas, não está so-brando emprego na cidade. Mas quando vendem o material recolhido nos depósi-tos, muitas vezes clandestinos, espalhados na cidade - material esse que será revendi-do a um preço alto por atravessadores di-versos - os recicladores não dimensionam o valor do seu trabalho e de seu produto. Eunice sequer sabe precisar quanto recebe por cada carga que leva para os depósitos.

“Às vezes ganho quatro, às vezes cinco re-ais. Não sou muito boa em conta não”. É importante afirmar que a importância da destinação correta é ambiental, mas é tam-bém econômica, porque toda matéria prima está cada vez mais rara e mais cara. E não é apenas em Fortaleza que ainda salta latente a falta de uma política pública adequada à destinação dos resíduos sólidos. Em 2008, apenas seis municípios cearenses possuíam aterros sanitários. No mesmo ano, o Governo do Estado do Ce-ará lançou o Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos Urbanos (PGIRSU), que consiste no pagamento de parcelas referen-tes ao Índice de Qualidade Municipal do

Cada 50 quilos de papel usa-do transformado em papel novo evita que uma árvore

seja cortada.

A quantidade de lixo produ-zida semanalmente por um

ser humano é de aproxi-madamente 5 Kg. Ou seja, só o Brasil produz 240 mil toneladas de lixo por dia.

Uma lata de alumínio leva de 80 a 100 anos

para decompor-se.

2,6 milhões de habitantes de Fortaleza atendidos pela

Ecofor produzem uma média de 80 mil toneladas de lixo

por mês, ou seja, 960 mil toneladas por ano.

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Meio Ambiente (IQMMA). O índice equi-vale a 2% da arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), cuja distribuição visa à implantação de aterros sanitários nos mu-nicípios que ainda utilizam lixões. De acordo com a presidente do Conselho de Políticas e Gestão de Meio Ambiente do Governo do Estado, Maria Tereza Farias, 138 municípios encaminha-ram seus projetos e já cresceu para onze o número de aterros, que deverão ser admi-nistrados em forma de consórcio, cada um beneficiando vários municípios. A expecta-tiva é que sejam efetivados cerca de trinta consórcios. “A maioria dos municípios não têm aterro e a idéia é que, no fim de três anos, os municípios tenham o destino final adequado para os resíduos sólidos, evi-tando os prejuízos ambientais provocados pelos lixões”, destacou o titular da Supe-rintendência Estadual de Meio Ambiente - SEMACE, Herbert de Vasconcelos Rocha. Entre os prejuízos está o fato dos lixões

desordenados serem foco de doenças, po-luírem os solos, contaminarem os recursos hídricos e emitirem gás metano, “que é 25 vezes mais potente que o CO2 na contribui-ção do efeito estufa”, disse. No entanto, mesmo a construção de aterros sanitários é insuficiente para re-solver a problemática do lixo no Estado. É preciso considerar que os aterros têm vida útil finita. O que recebe a coleta de Fortaleza e Caucaia, por exemplo, só su-portará mais cinco anos, no máximo, de recebimento de resíduos, segundo análise da SEMAM. Lançar lixo inadvertidamen-te por quaisquer ambientes de uso público é crime, contemplado pela Lei dos Crimes Ambientais. Administrativamente, tanto na esfera federal quanto nas esferas esta-duais e municipais, leis e outras normas contemplam a problemática dos resíduos e impõem sanções. Mas isso esbarra em ou-tros problemas, tanto de origem estrutural quanto de origem sociológica. Não há fis-cais suficientes para monitorar o compor-

cobertura . 45Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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tamento individual das pessoas. “Vamos encher as cidades de câmaras e torná-las imensos Big Brothers? É esse o dever do poder público?”, questiona Tomyama. Para o Promotor de Justiça do Estado de São Paulo, Édis Milaré, “sem dúvida, o imperativo legal é necessário, às vezes, indispensável. Mas, há também outro imperativo que deve comandar-nos nas soluções individuais e coletivas para os problemas do lixo, sejam eles graves ou leves, cotidianos ou ocasionais: é o impe-rativo ético, ou seja, a consciência de nos-sa responsabilidade, pessoal e social, com referência à geração e ao destino do lixo”. Consumir de maneira sustentável, embora há quem duvide de que isso seja possível, já que a lógica de nosso sistema econômi-co tem como base o consumo pelo con-sumo, pode ser uma alternativa. E se não há ponteiro que indique quanto de ética é necessária para mobilizar a humanidade, na dúvida é melhor começar o trabalho em casa. É preciso assimilar que a falta de destinação correta dos resíduos é um pro-blema governamental, mas também e espe-cialmente, é um problema social. E o cerne

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é a educação, de onde parte toda e qual-quer transformação social. A velha história que virou ditado popular: uma andorinha só não faz verão. Quantos de nós enten-demos os prejuízos causados pelo lixo que se atira da janela do transporte? Quantos de nós temos pequenos lixeiros nos carros, nas bolsas ou enxergamos os lixeiros nas calçadas? “A questão do lixo, o que a gente faz a vida toda, é tirar da nossa vista”, diz Tomyama. E da nossa responsabilidade. Não será possível promover qualquer mu-dança ambiental enquanto cada um de nós não internalizar a certeza de que somos sim sujeitos da degradação, e podemos ser sujeitos da transformação. Há alguns projetos de Educação Ambiental caminhando a passos lentos no Ceará. Uma iniciativa do Governo Esta-dual é enviar técnicos para os municípios a fim de capacitarem professores das Es-colas Estaduais, Agentes Comunitários de Saúde, entre outros multiplicadores. São cursos de 40 horas, com elaboração de um Plano de Ação como resultado final. Mas é “uma gota no oceano”, como descreve o coordenador de Proteção Ambiental da SEMACE José Wiliams de Souza.

Cada 50 quilos de alumínio usado e reciclado evita que

sejam extraídos do solo cerca de 5.000 quilos de

minério, a bauxita. Quantas latinhas de refrigerante você

já jogou fora até hoje?

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Quando conscientizar faz a diferença

Duas escolas separadas pelo lixo. Foi esse o quadro ambiental que Raimundo Nonato Lima Filho encontrou quando as-sumiu a direção do Centro de Educação de Jovens e Adultos Monsenhor Hélio Cam-pos (CEJA), na periferia do Pirambu, em Fortaleza. Inconformado inicialmente com o desprazer estético que incomodava todos os educadores da escola, Nonato decidiu investigar a fundo o problema, em busca de soluções. “Como é que nós educadores ía-mos permitir que aquele quadro continuas-se?”, diz o diretor. A alternativa mais sensa-ta, e também mais duradoura, foi dialogar com a comunidade, que basicamente estava acostumada a depositar na calçada que se-para as duas escolas quase todo o lixo da Avenida Monsenhor Hélio Campos. “Tinha o contêiner na calçada que vivia cheio, e muito lixo transbordando nos arredores. Entramos em contato com Se-cretaria Executiva Regional I - SER (todas as SER de Fortaleza têm sua própria célu-la de política ambiental) e também com a Ecofor. Queríamos que retirassem aquele contêiner de nosso muro e que passassem a coletar constantemente para evitar aquele amontoado”, conta Lima. O segundo passo foi realizar um Fórum com todas as repre-sentações sociais responsáveis e influentes no tema para construir uma agenda de so-luções. A iniciativa ecoou pelo bairro. For-maram-se multiplicadores nas duas escolas e foi implementado o Programa Porta a Porta, onde a Ecofor recolhe de forma pro-

gramada o lixo que a população não lança mais na calçada da escola, mas deixa na sua própria calçada nos dias programados. Palestras foram realizadas com o objetivo de sensibilizar a comunidade para a importância de seguir as orientações. An-tes da iniciativa do CEJA, as motos de co-leta, que no passado apanhavam o lixo das ruas e becos, eram muitas vezes roubadas por moradores da periferia. Um plantio de árvores foi programado na calçada da es-cola, assim como a grafitagem do muro. Oficinas de geração de renda foram oferta-das nas duas escolas, onde os participantes aprenderam que o lixo é uma grande fonte de renda e uma ótima matéria-prima para a criatividade. E agora o muro está limpo ou-tra vez. O grande ganho? A comunidade ter participado do processo. “Houve participa-ção do poder público, mas houve também a consciência de que aquele lixo afetava a saúde das pessoas, a qualidade de vida de-las”, disse Lima. É possível que o lixo vire luxo. Que na sua existência concreta seja fonte de novas alternativas para a moda, a arqui-tetura, o urbanismo, o designer de peças, como já acontece especialmente nas gran-des cidades. Mas esse movimento tem que se massificar. Sair das ONGs e dos ateliês e cair na boca, e na atitude, do povo. Fazer de todas as Eunices do Brasil multiplicadoras de uma nova consciência cultural, ambien-tal e subjetiva. Essa sim será a nossa grande revolução.

“Houve participação do poder público, mas houve também a consciência de que aquele lixo afetava a saúde das pessoas, a qualidade de vida delas”(Raimundo Nonato Lima)

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Pesquisadores estudam potencial anticancerígeno de planta encontrada na serra de Baturité

Uma substância extraída de uma planta encontrada no caminho do Pico Alto, na região serrana próxima ao município de Guaramiranga, está sendo avaliada por pesquisadores cea-renses pelo seu potencial uso no trata-mento do câncer. As vitafisalinas, com-postos presentes na planta Acnistus arborescens - conhecida popularmente como “esporão de galo falso” ou “ma-rianeira” -, foram testadas in vitro em duas linhagens de células leucêmicas e conseguiram reduzir o número de célu-las tumorais existentes. Os resultados do estudo, que começou em 2005, foram divulgados em artigos produzidos pelo grupo, que reúne cientistas dos departamentos de Fisiologia e Farmacologia, de Quími-ca Orgânica e Inorgânica e de Clínica Odontológica, todos da Universidade Federal do Ceará (UFC). Foi cons-tatado que além de inibir o aumen-to do número das células doentes, os compostos ainda induziram algumas à apoptose (processo de morte celular programada). No mesmo estudo também foi avaliada a citotoxicidade das vitafisali-nas em células mononucleares de san-gue periférico (PBMC). O teste com células sanguíneas é um dos procedi-mentos usados por pesquisadores para avaliar se a substância em teste pode ser tóxica não só para células cancerí-genas mas também para as sadias. No entanto, após 72 horas de tratamento, nenhum dos compostos testados redu-ziu o número de células sanguíneas. Danilo Rocha, que pesquisa

os efeitos anticancerígenos das vitafi-salinas em sua tese de doutorado, no Departamento de Farmacologia, ex-plica que os principais motivos para a escolha da Acnistus arborescens como objeto de seu estudo é o fato da plan-ta já ser usada pela medicina popular para o tratamento da doença. Além disso, as vitafisalinas fazem parte de um grupo já bastante conhecido por pesquisadores, o dos vitaesteróides, que tem apresentado diversos efeitos farmacológicos. Além disso, de acordo com um dos artigos publicados pelo grupo, as plantas, hoje, têm um importante papel no atendimento básico de apro-ximadamente 80% da população mun-dial. Na área de tratamento do câncer, substâncias derivadas de plantas têm se revelado como potentes agentes quimioterápicos. “E mesmo quando o produto isolado não se comporta como uma droga efetiva, ele pode prover um meio adequado para a conversão em um agente clinicamente útil”, diz o texto redigido pelos pesquisadores. Apesar de o estudo ser recen-te e ter sido feito apenas na fase pré-clínica (com amostras de células, sem a participação de cobaias vivos), Da-nilo afirma que o potencial das vitafi-salinas tem despertado o interesse de laboratórios particulares. Ele ressalta, no entanto, que como a pesquisa está no início, alguns resultados obtidos ainda não podem ser revelados. Mas o pesquisador assegura que eles têm sido promissores. “Estamos empolgados com essas substâncias”, diz.

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Custo alto das pesquisas encarece o medicamento

Apesar da matéria-prima para a extração da vitafisalina ser facilmen-te encontrada no Ceará, o pesquisador responsável pelo estudo não tem ex-pectativa de produção de um remédio de baixo preço para o tratamento do câncer. Ele explica que isso se deve aos altos custos das próximas fases, quan-do drogas contendo a substância serão testadas em cobaias – primeiro em ani-mais, depois em seres humanos. “Os estudos clínicos são muito caros. Essa é a grande dificuldade dos pesquisadores locais. Para chegar até o medicamento, é quase impossível fazer tudo por conta própria. É preciso bus-car o apoio dos grandes laboratórios.

E eles vão repassar esses custos para o produto final”, explica. Para ter uma idéia da complexidade do estudo, prin-cipalmente por se tratar de uma possí-vel droga anticancerígena, ele ressalta que, no teste com pessoas, por exem-plo, é preciso avaliar diferentes grupos. E isso demanda a participação de labo-ratórios de vários países. O estudo das vitafisalinas tem como principal local de pesquisa o La-boratório de Oncologia Experimental, do departamento de Fisiologia e Far-macologia. A Funcap apoia o centro através de projetos de financiamento às atividades dos pesquisadores res-ponsáveis.

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Natureza e Felicidade

“Tudo quanto é percebido encontra-se na natureza”Alfred North Whitehead – O Conceito de Natureza

Um dos meus heróis intelectuais da antiguidade é o filósofo he-lênico (isso é, do mundo Grego após as conquistas de Alexandre, pós-Aristotélico, portanto) Epicuro. Para Epicuro, a filosofia, ou, se quiser-mos, o conhecimento, dividia-se em três partes: canon, física e ética, com essa ordem de precedência. Por canon, entenda-se, aos preços de hoje, a lógica, base do pensamento. Física era o estudo da physis, que

se pode bem traduzir por “natureza”, ou seja, compreendia o conjunto das ciências naturais, mas era, para Epicuro, sobretudo a cosmologia, o estudo da estrutura e constituição última do mundo. Por ética, não entendia ele um sistema moral, mas a teoria do que constitui a felicidade humana e a forma prática de realizá-la. Chamei atenção para a ordem das ciências porque, para Epicuro, a base para a investigação do que constitui o bem para o Homem é o conhecimento da natureza. Também, para ele, nenhuma filosofia se justifica se não tiver por fim e objetivo a felicidade humana. Epicuro foi um atomista. Isto quer dizer que ele pertencia a uma linhagem de filó-sofos que foi largamente minoritária no pensamento grego, quase que totalmente subjugada pela corrente predominante, inaugurada por Parmênides e consolidada por Sócrates, Platão e Aristóteles. Como atomista, obviamente, sustentava que não era a matéria, e no caso de Epicuro, nem mesmo o próprio espaço e o tempo, contínua, que não podia ser dividida indefinidamente, ao contrário do que ensinava Aristóteles. Professava ainda, também em oposição a Aristóteles, a existência do vazio, no qual os átomos se moviam incessantemente. Uma máxima atomista famosa assevera que tudo o que há são átomos e o vazio. Não são, porém, esses os aspectos do atomismo e do pensamento epicurista que aqui mais nos interessam. O que justifica a invocação do filósofo é a ligação que sua doutrina estabelece entre o conhecimento da natureza e a felicidade humana. Para entendê-la, deve-mos recuar a uma idéia profunda dos filósofos da physis, particularmente cara aos atomistas. A natureza não tem intenções nem objetivos, e não há desígnios antropomórficos ou super naturais por trás dela, para além de suas próprias leis internas e do acaso. Em particular, a natureza é irritantemente indiferente aos negócios humanos. Por que é esta visão cosmológica importante? Porque se assim é, não devemos procurar aquilo que constitui o bem do Homem, a forma de vida que lhe convém, no cum-primento de algum dever ou função que desígnios insondáveis lhe reservem, que possam porventura justificar, ou desculpar, a dor, o sofrimento, o sacrifício e a doença. A virtude do Homem e a sabedoria da vida bem vivida estão na busca da felicidade. Ou seja, em seguir com naturalidade, mas não sem sabedoria, aquilo a que sua própria natureza o inclina. A essa singela filosofia deu-se o nome de hedonismo, e foi frequentemente muito mal entendida e mui duramente atacada. Seu conceito chave é o de felicidade, ou o de prazer, seu associado (e foi precisamente a má interpretação desses conceitos a forma favorita de distorcer o epicurismo). No entanto, em Epicuro as idéias de prazer e de felicidade encon-tram formulação extremamente simples: O prazer não é outra coisa que a ausência da dor, assim como é a felicidade a suspensão do sofrimento. Ao contrário do mundo físico, não há vácuo ou estado neutro no espaço afetivo. O ser humano, em acordo à sua própria natureza, há que almejar o prazer e buscar a felicidade. Essa busca não estaria, porém, na excitação desmedida dos sentidos, nos excessos da sensualidade, na gratificação imediata e irrefletida dos desejos, pois a tais efêmeros estados seguir-se-iam invariavelmente a dor e o sofrimento. A sabedoria consiste precisamente no ajuizamento dessas relações para que possa o indiví-duo manter afastado de si tais perturbações do bem estar físico e espiritual. Pode-se afirmar que Epicuro, sem que desse termo se utilizasse, criou, ou pelo menos propagou, o conceito de prazer, ou felicidade sustentável. Uma felicidade que deriva, afinal, da simplicidade e da frugalidade. Penso haver assim, me valendo do antigo filósofo, estabelecido uma conexão entre natureza e saúde, desde que vocês concordem em adotar, como faço, a sinonímia entre feli-

52 . opinião Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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cidade e saúde, uma vez que a última a concebo inteira, como do corpo e do espírito, o que envolve a ausência de inquietações da mesma forma que a de febres e inflamações. Essa co-nexão vai da natureza para a felicidade, uma vez que a obtenção da última está subordinada à compreensão da primeira e consiste em harmonizar a ecologia interna, material e afetiva, da mesma forma que é naturalmente harmônica a natureza. Neste ponto, devemos compreender com toda clareza que a natureza não se pode desarmonizar. O que quer que a ela ou nela aconteça não interfere um átimo em sua harmo-nia, pois a ela cabe simplesmente ser o que é, o que quer que seja. Nós é que a ela atribuímos qualidades que de per se não possui. Assim, quando falamos em desequilíbrio da natureza, estamos na realidade falando na sua precarização qua habitat para nós e outras espécies. Afetar esse habitat, a ponto de torná-lo inóspito a nossa felicidade e saúde, ou talvez mesmo definitivamente impróprio à vida humana, esse o tanto de poder que nos corresponde. Para a natureza mesma isso nada representa, mas para a espécie humana pode tudo representar, inclusive, pelo nosso extermínio, o fim da natureza para nós. Encerro com alguns versos de Jorge Drexler, que dizem o que acabo de dizer me-lhor do que eu poderia:

“Una vida lo que um sol, vale...Una estrellita de nadaEn la periferia de una galaxia menorUno , entre tantos millonesE un grano de polvo girando a su alrededorNon dejaremos huellaSolo polvo de estrellas.”

Tarcísio PequenoPresidente da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento

Científico e Tecnológico – [email protected]

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Fazendo o SUS acontecer com preservação ambiental!

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vivências municipais

Todas as informações divulgadas nos textos a seguir são de inteira responsabilidade dos seus respectivos autores.

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Envie seu texto [email protected]

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A Saúde de adolescentes: quanto mais o profissional de saúde conhece, maiores êxitos

. Introdução A adolescência é um momento da vida humana carac-terizado por profundas mudanças físicas, emocionais, mentais e sociais. As principais manifestações da puberdade são: o estirão puberal, o desenvolvimento gonadal, o desenvolvimento dos ór-gãos de reprodução e das características sexuais secundárias, as mudanças na composição corporal e no desenvolvimento dos sis-temas e órgãos internos (Brasil, 2007). Do mesmo modo, ocorrem modificações nas relações sociais, na família, na escola e na comu-nidade. Os adolescentes vivenciam um processo contínuo de busca de autonomia e independência. A importância da saúde física e psicossocial e as circunstâncias que aumentam os riscos a que se expõem os adolescentes impõem um lugar de destaque nas políti-cas públicas de saúde. Consciente desta posição, o governo federal criou o Programa de Saúde do Adolescente e publicou suas bases programáticas em 1989, atualmente chama-se Área de Saúde do Adolescente e Jovem (Brasil, 2007). Segundo o Sistema de Infor-mação da Atenção Básica – SIAB (2009) a população adolescente do município de Cariré-Ceará, ou seja, de 10 a 19 anos de idade é de 3.910. A Estratégia Saúde da Família é o meio de reorgani-zação da prática assistencial dos adolescentes com novos critérios de abordagem, levando em consideração o meio em que vive o sujeito.. Objetivo O estudo, de caráter descritivo e natureza qualitativa, re-

alizado em janeiro de 2010, tem como objetivo descrever as ações desenvolvidas na atenção básica à saúde, relacionadas à saúde dos adolescentes. . Metodologia Utilizou-se um instrumento de coleta de dados junto aos nove enfermeiros dos Centros de Saúde da Família a fim de descrever as ações desenvolvidas na atenção à saúde dos adoles-centes. Foram citadas pelos enfermeiros como principais ações: grupos terapêuticos de encontros mensais, com atividades lúdicas incluindo teatro, danças, dinâmicas, rodas de conversas entre pro-fissional e família e discussões sobre DST’S, sexo seguro, álcool e outras drogas; incluindo medidas de promoção e prevenção como um componente fundamental da pratica assistencial, ao invés da atenção estritamente biológica e curativa –incluindo também como ação a consulta individual dos enfermeiros com orientações diversas e devidos encaminhamentos para atendimento odontoló-gico, médico, serviço de imunização, serviço ginecológico e pla-nejamento familiar.. Conclusão Percebe-se que os enfermeiros em suas ações voltadas aos adolescentes ainda encontram limitações, porém buscam no-vos modelos de atenção que fuja do modelo biomédico, motivados a criarem novas estratégias de cuidar do adolescente na perspecti-va de priorizar o falar do adolescente no seu contexto sociocultural e na sua história de vida.

Referência Bibliográfica:Brasil, Ministério da Saúde. A Saúde de Adolescentes e Jovens. 2007

Francisco Rosemiro Guimarães Ximenes Neto, Secretário da SaúdeDaniele Tomaz Aguiar, Coordenadora da Atenção à Saúde

Francisco Rodrigues Martins, Coordenador da Vigilância à SaúdeDenise Tomaz Aguiar, EnfermeiraJuliana Tomaz Aguiar, Enfermeira

Cariré

56. vivências Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Perfil epidemiológico das doenças diarréicas agudas nas unidades de saúde de Maracanaú entre 2007 e 2009

. Resumo A doença diarréica aguda é considerada ainda importante causa de morbimortalidade nos países em desenvolvimento, in-cluindo o Brasil. Sua elevada incidência e a subnotificação dos casos por parte dos profissionais de saúde e da população suscitam atenção no setor de vigilância. O estudo tem como objetivo des-crever a distribuição das doenças diarréicas agudas por semana epidemiológica e ano, a incidência por faixa etária e o plano de tratamento utilizado nas unidades de saúde do município de Mara-canaú no período compreendido entre 2007 a 2009. Trata-se de um estudo descritivo com abordagem quantitativa sendo apresentado os dados a partir das informações semanais que são enviadas pe-las unidades de saúde do município de Maracanaú para o setor de vigilância epidemiológica. Em todos os anos em estudo, percebe-se que o maior número de casos foram concentrados no primeiro semestre dos respectivos anos, havendo um declínio considerável no início do segundo semestre e voltando a aumentar o número de casos ao final dos anos avaliados, provavelmente devido à associa-ção com o aumento da intensidade das chuvas no período conside-rado. Na distribuição dos casos por faixa etária, nota-se uma maior incidência na população menor de ano, seguido pelo grupo de 1 a 4 anos e de 5 a 9 anos, sendo a menor incidência na faixa etária acima de 10 anos. Em se tratando do plano de tratamento, 73% dos pacientes utilizaram o plano A no período avaliado, seguido do plano B com 25,6% e apenas 1,4% da população fizeram uso do plano C, o que mostra ainda mais a importância das unidades bási-cas de saúde quanto a identificação e acompanhamento dos casos visando a redução do agravamento dos mesmos. Dessa forma, os profissionais devem estar atentos a esta problemática uma vez que se trata de um grande desafio para a saúde pública.. Introdução Na maioria dos países em desenvolvimento as doenças diarréicas constituem uma das principais causas de morbimortali-dade entre as crianças menores de cinco anos, sendo esta consta-tação válida também para o Brasil(2). É importante ressaltar que a diarréia atinge pessoas de qualquer faixa etária, mas é na infância que esta afecção causa maior mortalidade. Ela figura como a ter-ceira causa mais comum de doenças em crianças dos países em desenvolvimento e é responsável por cerca de um terço de todas as hospitalizações entre os menores de cinco anos(5). Deste modo, as doenças diarréicas reclamam grande demanda de atenção nos ser-viços de saúde e solicitam, das autoridades sanitárias, preocupação constante. Se de um lado a diarréia é reconhecida como uma im-portante causa no quadro de morbimortalidade do país, de outro, a implantação de um sistema para sua vigilância encontra várias dificuldades, como por exemplo, a falta de notificação dos surtos ao serviço local de saúde por parte dos profissionais e da popula-ção mais carente que está acostumada a conviver com casos de diarréia e por isso não lhe dá a devida importância, considerando-a aconteci-mento banal na vida das pessoas(4). Com o advento da epidemia de cólera, a CNDE – Coor-denadoria Nacional de Doenças Entéricas, do Ministério da Saúde,

implantou o Programa de Monitorização de Doenças Diarréicas Agudas no País, no ano de 1994.O Programa de Monitorização das Doenças Diarréicas Agudas (MDDA), consiste em coletar dados referentes aos casos de diar-réia que buscam atendimento nas Unidades de Saúde (US), atra-vés destas informações, acompanhar e avaliar, com o objetivo de detectar alterações no comportamento das doenças diarréias em cada área, para que se possa tomar medidas de prevenção e con-trole destas doenças, como também se traçar o perfil do número de casos de diarréias no país, fornecendo dados para o setor de saneamento de cada estado, quanto ao estabelecimento das áreas prioritárias de atuação, qualidade dos serviços prestados e avaliar a influência que as ações de saneamento trazem na qualidade de vida das populações(6).

No município de Maracanaú, o Sistema de Monitorização de Doenças Diarréicas Agudas – SISDIA, foi implantado em 2003, registrando 4.638 casos e perfazendo um coeficiente de incidência na população da ordem de 24,8/1.000hab. Dessa forma, o presente estudo tem como objetivo des-crever a distribuição das doenças diarréicas agudas por semana epidemiológica e ano, a incidência por faixa etária e o plano de tratamento utilizado nas unidades de saúde do município de Mara-canaú no período compreendido entre 2007 a 2009.. Material e Métodos Trata-se de um estudo de cunho descritivo com aborda-gem quantitativa, sendo os dados apresentados o resultado das in-formações semanais de vinte e quatro unidades básicas de saúde e uma unidade hospitalar da rede pública, enviadas à Secretaria Municipal de Saúde, especificamente para a gerência de Vigilância Epidemiológica e, depois de sua consolidação, remetidas à 3ª Co-ordenadoria Regional de Saúde e repassadas para a Secretaria de Saúde do Estado do Ceará, no período de 2007 a 2008. Em 2009, foram acrescidas mais duas unidades básicas de saúde. De acordo com o Manual de Monitorização de Doen-ças Diarréicas Agudas (2008) “a diarréia aguda é uma síndrome clínica de diversas etiologias que se caracteriza por alterações do volume, consistência e freqüência das fezes, mais freqüentemente

Maracanaú

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associada com a liquidez das fezes e o aumento no número de eva-cuações. Com grande freqüência costuma ser acompanhada de vô-mitos, febre, cólicas e dor abdominal. Algumas vezes pode apre-sentar muco e sangue (disenteria). Em geral é auto-limitada, isto é, tende à cura espontaneamente, com duração entre 2 a 14 dias, e sua gravidade depende da presença e intensidade da desidratação ou do tipo de toxina produzida pelo patógeno que provocar outras síndromes”(4). Foi considerado como o plano A de tratamento aquele em que o paciente é submetido a tratamento com hidratação oral em domicílio. Já o plano B, quando o paciente é submetido a trata-mento com hidratação oral e/ou venosa em ambulatório. Enquanto o plano C, quando houver indicação de reidra-tação venosa em hospital(3). No município de Maracanaú, as unidades básicas de saúde juntamente com a unidade hospitalar informam semanalmente todos os casos de diarréias que foram atendi-dos nos serviços públicos de saúde e de emer-gência através de um formulário específico.Para o cálculo de incidência foi utilizado como numerador o número de pacientes com um episódio de do-ença diarréica aguda dividido por mil habitantes do Município de Maracanaú, no ano de ocorrência da doença que o levou a procurar assistência médica. A população utilizada para o cálculo de inci-dência de episódios de diarréia foi a estimada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).. Resultados e Discussões No ano de 2007, foram notificados 16.294 casos de Doenças Diarréicas Agudas na população de Maracanaú e o coeficiente de incidência foi de 81,9/1.000hab. Já no ano de 2008, as notificações dos casos somaram 16.960, aumentando o coeficiente de inci-dência para 84,9/1.000hab; e em 2009, fo-ram notificados 16.056 casos dessas doenças perfazendo um coeficiente de incidência de 79,6/1.000hab apresentando um decréscimo em relação aos anos anteriores. Em todos os anos em estudo, percebe-se que o maior número de casos foram concentrados no primeiro semestre dos respectivos anos, havendo um declínio considerável no início do segundo semestre e voltan-do a aumentar o número de casos ao final dos anos avaliados, pro-vavelmente devido à associação com o aumento da intensidade das chuvas no período considerado(1)(Gráfico 1).

Na distribuição dos casos por faixa etária, nota-se uma maior incidência na população menor de ano, seguido pelo gru-po de 1 a 4 anos e de 5 a 9 anos, sendo a menor incidência na faixa etária acima de 10 anos. Em relação à incidência, os casos de diarréia na faixa etária menor de ano foi 1,7 vezes maior do que a do grupo etário de 1 a 4 anos, 5,1 vezes maior que de 5 a 9 anos e 11,4 vezes maior que a do grupo com mais de 10 anos. No período de 2007 a 2009, a média do coeficiente de incidência foi de 528,6/1.000hab na faixa etária menor de ano, seguido de 313,6/1.000hab no grupo de 1 a 4 anos, 103,3/1.000hab na faixa etária de 5 a 9 anos e 46,2/1.000hab na população maior de 10 anos (Tabela 1).

Em se tratando do plano de tratamento, 73% dos pacien-tes utilizaram o plano A no período avaliado, seguido do plano B com 25,6% e apenas 1,4% da população fizeram uso do plano C (Tabela 2). Vale ressaltar que para realização do cálculo da incidên-cia e da distribuição pelo plano de tratamento, não foi utilizado o grupo de faixa etária ignorada.

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. Considerações Finais As doenças diarréicas agudas são ainda um grande de-safio da saúde pública, apresentando uma incidência elevada no município de Maracanaú. No período de 2007 a 2009 foram no-tificados 49.310 casos dessas doenças perfazendo um coeficiente de incidência médio de 82,1/1.000hab. O primeiro semestre dos anos em estudo é considerado o responsável pelo maior número de casos registrados o que chama a atenção dos profissionais para esse período. O grupo mais atingido é o da população menor de ano, que representa uma incidência média de 528,6/1.000hab, ou seja, 1,7 vezes maior do que a do grupo etário de 1 a 4 anos, 5,1 vezes maior que de 5 a 9 anos e 11,4 vezes maior que a do grupo com mais de 10 anos. Dentre os planos de tratamento, o mais utilizado foi o plano A, seguido do plano B e C, o que mostra ainda mais a im-portância das unidades básicas de saúde quanto à identificação e acompanhamento dos casos visando a redução do agravamento dos mesmos. É necessário que os profissionais de saúde estejam aten-tos a esta problemática, notificando oportunamente os casos iden-tificados na sua área de cobertura e realizando capacitações rela-cionadas a temática ora abordada para que as dificuldades quanto a identificação e notificação dos casos venham a ser reduzidas.

Referências:1. FAÇANHA, M. C. e PINHEIRO, A. C. Comportamento das doenças diarréicas agudas em serviços de saúde de Fortaleza, Ceará, Brasil, entre 1996 e 2001. Cad. Saúde Pública. 2005, 21(1): 49-54.2. MINISTERIO DA SAÚDE. Brasil – A Baixa Qualidade do Soro Caseiro em Salvador. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php (acesso em 26 de janeiro de 2010).3. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Diarréias agudas, aspectos epidemiológicos. Dispo-nível em http://www.funasa.gov.br (acesso em 03 de janeiro de 2010).4. MONITORIZAÇÃO DAS DOENÇAS DIARRÉICAS AGUDAS – MDDA - NORMAS E INSTRUÇÕES. 2ª Edição, São Paulo, 2008. Disponível em ftp://ftp.cve.saude.sp.gov.br/doc_tec/hidrica/doc/mdda08_manual.pdf (acesso em 18 de janeiro de 2010).5. PEREIRA, I. V. e CABRAL, I. E. Diarréia Aguda em crianças menores de um ano: subsídios para o delineamento do cuidar. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2008, 12 (2): 224 – 229.6. SILVA, S. R. et al. Monitorização das doenças diarréicas agudas no estado do Es-pírito Santo – Brasil. Secretaria de Estado da Saúde do Espírito Santo. Disponível em http://www.bvsde.paho.org/bvsaidis/saneab/peru/brasam070.pdf (acesso em 02 de fevereiro de 2010).

Ana Maria Girão Neri, Coordenadora Vigilância à saúde Geysa Maria Nogueira Farias, Gerência Vigilância Epidemiológica

Camila de Oliveira Prata, Enfermeira técnica em Vigilância Epidemiológica Adrianne Paixão Cruz, Médica veterinária

Francimaire Teodósio de Oliveira, Engenheira civilVladia de Almeida Camurça, Enfermeira

Celiane P. Ximenes Farias, Enfermeira técnica da Regional III (Fortaleza-CE)

vivências. 59Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Mortalidade de mulheres em idade fértil: análise de situação no município de Maracanaú no período de 2007 a 2009

. Resumo A investigação das mortes de mulheres em idade repro-dutiva tem como principal objetivo proporcionar a melhoria da qualidade do sistema de informação sobre a mortalidade materna, uma vez que este indicador é pactuado. A população de mulheres em idade reprodutiva representa parcela importante da população geral e constitui ainda fração considerável da força produtiva do país. Embora esse grupo não tenha recebido a devida atenção nas últimas décadas, atualmente é grande o interesse mundial para essa temática. A avaliação da mortalidade por uma determinada doença pode trazer grande contribuição ao conhecimento epide-miológico da mesma. O presente estudo tem como objetivo ava-liar a ocorrência em registros das mortes em mulheres em idade reprodutiva, identificando e agrupando as causas básicas desses óbitos. Trata-se de um estudo descritivo, de base populacional, e inclui todos os óbitos de mulheres na faixa etária de 10 a 49 anos, residentes no município de Maracanaú e que ocorreram no período de 2007 a 2009. A coleta de dados procedeu-se através da análise das declarações de óbitos e do instrumento de investigação de óbi-to de mulher em idade fértil. Utilizaram-se as categorias segundo os grupos de causa da CID-10. Foram identificados 144 óbitos de mulheres em idade fértil, de 10 a 49 anos, residentes no município de Maracanaú e que foram a óbito nesta cidade. O grupo de cau-sas básicas mais representado foi o das neoplasias, seguido pelo o das doenças do aparelho circulatório, óbitos por causas externas e doenças infecciosas e parasitárias. As mortes por complicações da gravidez, parto e puerpério foram pouco significativas e represen-taram a décima causa destes óbitos.. Introdução

A investi-gação das mortes de mulheres em idade reprodu-tiva tem como principal objetivo proporcionar a melhoria da quali-dade dos sistemas de informação so-bre a mortalidade

materna uma vez que este indicador faz parte do pacto pela vida (Portaria GM/MS nº 325, de 21 de fevereiro de 2008) onde é pro-posto a redução do mesmo. Dessa forma, devido à sub-informação e o sub-registro das declarações de óbito (Dos), os municípios pas-saram a realizar a investigação de todos os óbitos de mulheres em idade fértil. Para fins de investigação, são considerados óbitos de mulheres em idade fértil aqueles ocorridos em mulheres de 10 a 49 anos de idade conforme Portaria MS/GM nº 1.119, de 5 de junho de 2008.A população de mulheres em idade reprodutiva representa parcela importante da população geral e constitui ainda fração conside-rável da força produtiva do país. No Brasil, esse grupo é repre-

sentado por uma média de 61.162.839 mulheres considerando os anos em estudo, enquanto no município de Maracanaú esse grupo responde por 69.299 mulheres nessa faixa etária. Embora esse grupo não tenha recebido a devida atenção nas últimas décadas, especialmente em países em desenvolvimen-to, atualmente é grande o interesse mundial para essa temática, tendo em vista que os programas de saúde da mulher pretendem abranger não só a questão da reprodução, como também aquelas relacionadas às suas condições específicas de trabalho e de vida(1). Como conseqüência de sua crescente independência e maior participação no mercado de trabalho, as mulheres passaram a adquirir hábitos e comportamentos que eram mais freqüentes na população masculina, como fumar, beber e maior liberdade sexual. Ficaram, assim, também mais expostas ao estresse e outros riscos associados às doenças crônicas, bem como aos acidentes e outros tipos de violência(3). Da mesma maneira que diferentes populações estão ex-postas a variados tipos e graus de riscos, mulheres e homens, em função da organização social das relações de gênero, também estão expostos a padrões distintos de sofrimento, adoecimento e morte. Partindo-se desse pressuposto, é imprescindível a incorpo-ração da perspectiva de gênero na análise do perfil epidemiológico e no planejamento de ações de saúde que tenham como objetivo promover a melhoria das condições de vida, a igualdade e os direi-tos de cidadania da mulher(5). A avaliação da mortalidade por uma determinada doença pode trazer grande contribuição ao conhecimento epidemiológico da mesma. Na análise da mortalidade por causas, como se mencio-nou, a confiabilidade da informação fica na dependência da quali-dade do preenchimento da declaração de óbito pelos profissionais responsáveis (2). Entretanto, os estudos a partir dessa fonte de dados são muito úteis por trazerem subsídios importantes para um conheci-mento aproximado das causas básicas de mortalidade, de sua evo-lução no tempo e de sua distribuição no espaço e segundo atributos individuais (4). Dessa forma, o presente estudo tem como objetivo avaliar a ocorrência em registros das mortes em mulheres em idade repro-dutiva, identificando e agrupando as causas básicas desses óbitos.. Material e Métodos Trata-se de um estudo descritivo, de base populacional, e inclui todos os óbitos de mulheres na faixa etária de 10 a 49 anos, residentes no município de Maracanaú e que ocorreram no período de 2007 a 2009. A coleta de dados procedeu-se após a identificação das declarações de óbitos, a codificação da causa básica da morte e avaliação do instrumento de investigação de óbito de mulher em idade fértil padrão do município de Maracanaú. Utilizaram-se as categorias segundo os grupos de causa da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10)(6).

Maracanaú

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Depois da revisão das fichas, as mesmas foram digitadas no Sistema de Informação de Mortalidade (SIM). Procedeu-se en-tão ao agrupamento e distribuição dos óbitos por causa e grupos etários, fornecendo-se a mortalidade proporcional para cada cate-goria. Garantiu-se a confidencialidade das fontes de informa-ção, sem identificação de qualquer sujeito participante no estudo, de qualquer profissional ou instituição de saúde envolvidos. Res-peitou-se ainda o anonimato dos familiares entrevistados durante a investigação domiciliar realizada pela equipe de saúde.. Resultados e Discussões Identificaram-se 144 óbitos de mulheres em idade repro-dutiva para o município no período estudado. Estes óbitos ocorre-ram na maior parte das vezes em hospitais (70,8%), seguindo-se aqueles em domicílio (16%), na via pública (6,9%) e em outros locais (6,3%). Em relação ao estado civil, 54,2% eram solteiras, 36,1% casadas, 2,8% separadas judicialmente, 2% viúva. Quanto à ocu-pação, 67,4% das mulheres tinham atividade remunerada registra-da na declaração de óbito, enquanto 31,9% não tinham algum tipo de atividade assalariada. No que se refere ao grau de instrução, 58,3% tinham algum grau de escolaridade e apenas 6.9% nunca tinham estudado; vale ressaltar que em 34,7% dos atestados de óbitos não havia registros desses dados. A distribuição etária dessas mulheres mostra que a con-tribuição proporcional para o total de óbitos femininos em idade reprodutiva aumentou com o aumento da idade. Após avaliação das DO, codificação das mesmas confor-me a CID-10 e investigação complementar, obteve-se, com relação às causas básicas da morte, que as mulheres morreram com maior freqüência por neoplasias, por doenças do aparelho circulatório, por causas externas e por doenças infecciosas e parasitárias. As mortes por complicações da gravidez, parto e puerpério represen-taram a décima causa de morte neste grupo populacional. (Tabela 1).

Observa-se que, na faixa etária de 10 a 19 anos, a maior causa de morte foi o conjunto das causas externas e neoplasias. Tal fato também se repetiu no grupo etário de 20 a 29 anos, referindo-se as causas externas. Já na faixa dos 30 aos 39 anos, a maior causa de óbito foram as doenças do aparelho circulatório. Enquanto que na faixa de maior idade, dos 40 aos 49 anos, manteve-se a impor-tância das doenças do aparelho circulatórias, entretanto as neopla-sias foram as maiores responsáveis pelos óbitos. Analisando os diversos grupos de causas básicas de óbi-to, constata-se que as neoplasias foram responsáveis por 22,9% do total de óbitos, tendo as neoplasias da mama e do colo do útero contribuído com 42,4% desses óbitos (Tabela 2). As doenças he-morrágicas intracerebral e as cardiomiopatias foram responsáveis por 58,1% das mortes por doenças do aparelho circulatório, sendo este o segundo grupo de causas básicas mais acometido (Tabela 3). Em relação às mortes por causas externas, a Tabela 4 mostra que os acidentes de trânsito e as auto-intoxicações por ex-posição intencional representaram 56,2% dos óbitos por esse gru-po de causas, que corresponderam à terceira causa de morte na população feminina estudada. As doenças pelo HIV representaram 42,9% dos óbitos do grupo de doenças infecciosas e parasitárias, seguidas pela tuberculose pulmonar com 21,5% desses óbitos (Ta-bela 5).

vivências . 61Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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. Considerações Finais Foram identificados 144 óbitos de mulheres em ida-de fértil, de 10 a 49 anos, residentes no município de Maraca-naú e que foram a óbito nesta cidade. O grupo de causas básicas mais representado foi o das neoplasias, seguido pelo o das doenças do aparelho cir-culatório, óbitos por causas externas e doenças infecciosas e parasitárias. As mortes por complicações da gravidez, parto e puerpério foram pouco significativas e representaram a déci-ma causa destes óbitos.A mortalidade aumentou genericamente com o aumento das faixas etárias. Nos grupos de 10 a 19 anos, predominaram os conjuntos das causas externas e neoplasias; no grupo etário de 20 a 29 anos, repetiu-se os fatos referentes as causas externas; no de 30 a 39 anos, predominaram as doenças do aparelho circulatório e no de 40 a 49 anos, manteve-se a importância das doenças do aparelho circulatórias, entretanto as neoplasias foram as maiores responsáveis pelos óbitos. Vale ressaltar, que para uma boa análise dos dados epidemiológicos, faz-se necessário a completitude dos cam-pos das declarações de óbito concomitante ao instrumento de investigação de óbito de mulher em idade fértil.

Referências1. ALBUQUERQUE, R. M. et al. Causas e fatores associados à mortalidade de mulheres em idade reprodutiva em Recife, Brasil. Cad. Saúde Públ. 1998, 14(Supl. 1): 41-48.2. CHIAVEGATTO FILHO, A.D.P. et al. Mortalidade por doença hipertensi-va em mulheres de 20 a 49 anos. Rev. Bras. Epidemiol. 2004, 7 (3): 252-258.3. HADDAD, N. e SILVA, M. B. Mortalidade feminina em idade reprodutiva no Estado de São Paulo, Brasil, 1991-1995: causas básicas de óbito e mortali-dade materna. Revista de Saúde Pública. 2000, 34 (1): 64-70.4. HADDAD, N. e SILVA, M. B. Mortalidade por Doenças Cardiovasculares em Mulheres em Idade Reprodutiva (15 a 49 anos), no Estado de São Paulo, Brasil, 1991 a 1995. Arq Bras Cardiol. 2000, 75 (5): 369-374.5. Ministério da Saúde. 2004 ano da mulher. 1ª ed., 1ª reimpr. – Brasília, 2004. Disponível em http://dtr2001.saude.gov.br/editora/produtos/livros/pdf/04_0570_M.pdf (acesso em 11 de janeiro de 2010).6. Organização Mundial da Saúde. CDI-10; tradução Centro Colaborador da OMS para a Classificação de Doenças em Português. 2ª ed. rev. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1994.

Ana Maria Girão Neri, Coordenadora Vigilância à saúde Geysa Maria Nogueira Farias, Gerência Vigilância Epidemiológica

Camila de Oliveira Prata, Enfermeira técnica em Vigilância Epidemiológica Adrianne Paixão Cruz, Médica veterinária

Francimaire Teodósio de Oliveira, Engenheira civilVladia de Almeida Camurça, Enfermeira

Celiane P. Ximenes Farias, Enfermeira técnica da Regional III (Fortaleza-CE)

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Ratos, não alimente essa ideia!

Leptospirose é uma doença infecciosa, febril, de início abrupto, que pode variar desde um processo inaparente até formas graves, com alta letalidade. Acomete animais domésticos e silves-tres e o homem como final da cadeia epidemiológica. Os animais silvestres, mamíferos (roedores, herbívoros, insetívoros, carnívoros), aves, répteis e anfíbios são portadores ou reservatórios de leptospiras para o homem e espécies doméstica. É causada por uma bactéria, que pertence ao gênero leptospira. Essas bactérias podem permanecer viáveis em solo úmido ou na água por semanas a meses, entretanto para manter o seu ciclo vital necessitam de um hospedeiro animal. A ocorrência de leptospirose está estreitamente vinculada aos fatores ambientais, que podem dar lugar a um foco de infec-ção, cuja amplitude está na dependência de condições favoráveis.A transmissão da infecção humana resulta do contato direto da pele ou mucosa com a urina de animais infectados, principalmente roedores, diluída em coleções hídricas ou águas e lama de enchen-te. Raramente pelo contato direto com sangue, tecido, órgão ou urina de outros animais infectados. No Brasil, no de 2004 foram confirmados 3.094 casos de leptospirose (1,73/100.000hab). No ano de 2005 foram confirma-dos 3.464 (incidência 1,88/100.000hab). Em 2006, houve 4.538 casos confirmados (incidência 2,43/100.000hab). No ano de 2007, foram 3.327 (incidência 1,76/100.000hab) e em 2008 foram con-firmados 3.476 casos (incidência 1,83/100.000hab). Verificou-se aumento significativo do número de casos de leptospirose no ano de 2006. No Ceará no período de 2001-2005 foram confirmados 314 ca¬sos, com 46 óbitos (letalidade de 14,6%, superior à leta-lidade média nacional para o período, que foi de 11,8%). O coe-ficiente de incidência anual mé¬dia é de 0,8/100 mil hab. (média nacional: 1,7/100 mil habitantes). No ano de 2006, foram 106 con-firmados (1,29/100.000hab), e para o ano de 2007 e 2008, foram confirmados 60 e 79 casos (0,72 e 0,93/ 100.000 hab. respectiva-mente). No município de Pacatuba no período de 2004 a 2009 foram confirmados 06 casos. O óbito, ficando com o coeficiente de mortalidade de 1,74/100.000hab.

Gráfico: Taxa de Incidência e Mortalidade de LeptospirosePacatuba -2004 á 2009.

De acordo com dados obtidos no Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB), Monguba tem uma população de 3.052 habitantes onde 89% tem casa de tijolo e 11% tem casa de taipa revestida, sendo considerada uma área de risco, haja visto, ter uma cobertura de 33% de sistema de esgoto, fossa 54% e 13% a céu aberto e em relação ao destino do lixo, 71,4% tem coleta publica sistemática, 18,3% enterrado /queimado e 10,3% a céu aberto .

Frente a esse problema, emergiram os seguintes questio-namentos: Como promover a sensibilização da comunidade diante as doenças transmitidas por roedores? Quais ações serão desenvol-vidas para identificação das áreas de risco? . Objetivo geralCombater e controlar os roedores no bairro da Monguba. . Objetivo Especifico. Capacitar os Agentes Comunitários de Saúde da área envolvi-das; Sensibilizar a comunidade sobre as doenças que os roedores transmitem; Identificar áreas de risco, fazendo à anti-ratização e a desratização.. Metodologia Desratização, realizada no mês de fevereiro de 2009 em 400 imóveis, 03 terrenos baldios e 02 sucatas no bairro de mon-guba e ao mesmo tempo os agentes comunitário de saúde da lo-calidade distribuíram panfletos informativos e orientações sobre a doença, onde foi reforçado que é preciso que a comunidade mante-

nha o ambiente limpo livre de roedores. Essa ação teve participação intersetorial, envolvendo os seguintes se-tores: Vigilância Sanitária, Endemias, Programa Saúde da Família, Mobilização Social, Serviço de Limpeza e Comunidade. Essa ação preventiva em educação Saúde, com destaque a leptospirose teve com resultado: limpeza do bairro, coleta de lixo, diminuição dos roedores e cons-cientização da comunidade em relação ao conhecimen-to das doenças transmitidas pelo rato principalmente a leptospirose e hábitos de higiene.

Pacatuba

Fonte: Sistema de Informação de Agravos notificáveis (SINAN) e Sistema de Mor-talidade (SIM) Ministério da Saúde janeiro 2010.

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Conclusão Em suma, o trabalho desenvolvido pela equipe de Vigi-lância á Saúde em parceria com a comunidade, conseguiu atingir suas metas propostas através da: notificação, investigação epide-miológica de casos, detecção da área de risco, controle de roe-dores (anti-ratização e desratização), destino adequado do lixo e cuidados com a higiene. Estabelecendo desta forma, a integração entre profissionais de saúde e a população no combate e controle de roedores e seus respectivos agravos à saúde.

Referências:BRASIL. Ministério da Saúde. Sistema Nacional de Vigilância em Saúde: Relató-rio de Situação: Ceará. 2. ed. Brasília, 2006. BRASIL. Ministério da Saúde. Doenças infecciosas e parasitárias: aspectos clíni-cos, vigilância epidemiológica e de controle – guia de bolso. Brasília: Fundação Nacional de Saúde, 2008. ______. Ministério da Saúde. Sistema de Informação de Agravos Notificáveis (SI-NAN) e Sistema de Mortalidade (SIM). Disponível em:< http://portal.saude.gov.br/portal/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=21383>. Acesso em 13 jan. 2010.______. Ministério da Saúde. Sala de Situação em Saúde. Disponível em: <www.saúde.gov.br/saladesituação>. Acesso em 12 jan. 2010.GENOVEZ, M.E. Leptospirose: uma doença além da época das chuvas. 2007. Arti-go Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2007.1/leptospirose/index.htm> Acesso em 19/01/2010.

Antonio Celso G. Albuquerque, Técnico da Vigilância SanitáriaAline de Lima Oliveira, Técnica da Vigilância Sanitária

Vladia Almeida Camurça, Coordenadora de Imunização

64 . vivências Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Projeto cozinhando na comunidade

. Introdução A avaliação do crescimento físico é um importante instru-mento para se conhecer a saúde tanto individualmente, quanto co-letivamente. Atualmente aceita-se amplamente que o crescimento é condicionado pela herança genética (transmitida pelos pais não pelo grupo étnico) associado aos fatores externos como o meio ambiente natural e social, no que se refere às doenças e à nutrição. É a partir do reconhecimento da influência que as condições de vida exercem. Sobre o crescimento que os organismos internacionais de saúde, como a Organização Mundial da Saúde (OMS), e nacio-nais, como o Ministério da Saúde (MS) e a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), preconizam o acompanhamento do crescimento como atividade de rotina na atenção à criança 2-5 anos. Apesar de o direito inalienável de todo ser humano de não padecer de fome e desnutrição ter sido reafirmado sucessiva-mente em conferências dos países membros das Nações Unidas em 1948, a desnutrição infantil continua a ser um dos problemas mais importantes de saúde pública do mundo atual, devido a sua magnitude e conseqüências desastrosas para o crescimento, desen-volvimento e sobrevivência das crianças. A desnutrição é a segunda causa de morte mais freqüen-te em menores de 5 anos nos países em desenvolvimento devido aos efeitos potencializadores das formas moderadas e leves des-sa doença. Em recente inquérito realizado em nível mundial, em 79 hospitais, verificou-se que muitos profissionais de saúde têm idéias ultrapassadas e/ou desconhecem a conduta adequada para o tratamento de crianças gravemente desnutridas. A inadequação do tratamento geralmente resulta da falta de reconhecimento do estado fisiológico alterado e da redução dos mecanismos homeos-táticos que ocorrem na desnutrição. Diante da avaliação de crianças com estado nutricional de risco e baixo peso atendidas pelo Programa do Leite no Município de Milagres-CE, surgiu a necessidade da criação do projeto ”Cozi-nhando na Comunidade” em parceria com a Secretaria Municipal da ação social e a Secretaria Municipal de Cultura, onde serão de-senvolvidas atividades de educação continuada as mães e nutrizes que optaram pelo aleitamento misto. No primeiro momento, serão utilizadas as dietas preconizadas pelo AIDPI com gêneros alimen-tícios de baixo custo.. Objetivo geral Contribuir, junto às equipes das ESF, nas áreas de preven-ção e da desnutrição orientando no seu tratamento. . Objetivos específicos Informar a respeito da alimentação cotidiana de baixo custo, compatível com a realidade da população em questão; Mos-trar que a baixo custo o problema da desnutrição pode ser resolvi-do no município; Implementar um programa de alimentação alter-nativa, para prevenção e tratamento da desnutrição; Estimular as mães a utilizarem medidas de higiene básica, principalmente nos cuidados diários com as crianças.. Materiais e métodos Com o objetivo de adquirirmos um conhecimento prévio

da situação serão utilizados os seguintes procedimentos: 1) Identificação dos desnutridos a partir do acompanhamentosemestralmente dos beneficiários do Programa Leite Fome Zero; 2) Contato com os agentes comunitários de saúde para promover a aproximação com as famílias de risco.3) Contato com as famílias de risco para verificar se as mesmasquerem cooperar com o projeto. 4) Descobrir o que estas famílias querem saber a respeito dadesnutrição. 5) Aplicação do questionário sócio-econômico-demográfico. De acordo com os conhecimentos adquiridos nesse perí-odo e durante visitas as famílias, serão elaboradas palestras infor-mativas enfocando as deficiências teórico-práticas sobre o assunto em questão. Além das palestras já programadas no trabalho outras poderão ser ministradas de acordo com as necessidades apontadas pela equipe responsável das ESF. Além do esclarecimento destas dúvidas serão proferidas discussões com material didático apro-priado (data show, cartazes, álbum seriado sobre desnutrição, entre outros), às quais abordarão os seguintes aspectos: A) Noções sobre os efeitos da desnutrição; B) Informações sobre medidas de prevenção; C) Importância de uma dieta alimentar adequada; D) Instituição de uma alimentação alternativa para prevenção e controle da desnutrição. E) Higiene dos alimentos. Serão realizadas pequenas oficinas, com instruções para o preparo de refeições saudáveis pelas mães. Em seguida, as refei-ções preparadas serão degustadas pelas crianças. Em paralelo com as oficinas, as crianças que compõe o público alvo desse projeto, participarão de atividades educativas sobre noções básicas de alimentação saudável. Para as atividades serão necessários os seguintes mate-riais: fogão; panela; 01(um) botijão de gás; materiais descartáveis (pratos, talheres); gêneros alimentícios descritos nas receitas a se-guir; fantoches; lápis de cera; lápis de cor; cartolinas; papel cartão.

Milagres

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. Descrição das Atividades1° Passo- Seleção das mães de crianças de alto risco inseridas no Programa Leite Fome Zero para início das oficinas e gradativa-mente capacitar as demais áreas onde se encontram mães com crianças nesta mesma situação.2° Passo- Disponibilizar local apropriado.3° Passo- Reunir o material necessário para a realização das ofi-cinas: Fogão, panela, copo medida, materiais descartáveis (pratos, talheres), gêneros alimentícios descritos nas receitas.4° Passo- Convocação das mães para início das oficinas.4.1. Apresentação da ministrante; 4.2. Divisão das participantes em pequenos grupos;4.3. Distribuição dos gêneros alimentícios para os grupos;4.4. Orientação aos participantes sobre o manejo e a forma de pre-paro das receitas;4.5 Após o preparo, as mesmas deverão ser oferecidas as crianças de forma a analisar a aceitação ou não no primeiro momento.. Avaliação As mães deverão ser orientadas quanto ao volume e a quantidade diárias a serem oferecidas e necessidade de retorno a unidade após o prazo de 1 semana da implementação do proces-so para que seja verificado o ganho satisfatório ou não de peso. Obs- É importante que o ACS fiscalize essa mãe buscando ou não comprovar essa prática.. Resultados esperados Espera-se que ao final das avaliações a criança tenha ga-nho de peso satisfatório. Em caso negativo, será reavaliado a não ocorrência do resultado positivo.AIDPI- Atenção Integral as Doenças Prevalentes na Infância . Conclusão Para a prevenção e combate da desnutrição infantil, a participação do governo é de fundamental importância, porém in-dependente desta condição, o seu controle pode ser conseguido através da conscientização das famílias sobre a importância do aleitamento materno, terapia de reidratação oral, imunização, su-plementação alimentar adequada, alimentações alternativas entre outras medidas simples e de custo baixo. A participação do profissional de saúde é de suma im-portância nesses casos, e projetos como este também apresentam um papel social e educativo importante, porém representam pouco em relação ao contexto geral de crianças desnutridas, por isso este projeto está sendo incentivado e apoiado pelo município de Mi-lagres – CE, no intuito de contribuir para redução da desnutrição infantil.

Milena Pinto chaves, NutricionistaFrancisca Vânia dos Santos Cruz, Tecnóloga de Alimentos

66. vivências Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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O Emprego do Plano Diretor Municipal nas Ações de Saúde – Uma Es-tratégia Eficaz de Educação Ambiental e Melhoria da Qualidade de Vida: O Homem e Seu Ambiente em Perspectiva

. Resumo O Plano Diretor Municipal é um instrumento básico da política municipal de desenvolvimento e expansão urbana, obriga-tório para municípios com população superior a 20.000 habitantes, a qual tem como finalidade orientar a atuação do poder público e da iniciativa privada na construção dos espaços urbano e rural na oferta dos serviços públicos essenciais, visando assegurar me-lhores condições de vida para a população (Constituição Federal, artigo 182). O resultado, formulado como Lei Municipal, é a ex-pressão do pacto firmado entre a sociedade e os poderes Executivo e Legislativo. . Justificativa Sua empregabilidade na área da saúde está relacionada a diretrizes para promoção da saúde coletiva, tais como saneamento básico, preservação do meio ambiente, incentivar a participação popular na tomada de decisões, além de propor soluções para a melhoria da qualidade da gestão municipal, tornando-a mais apta a utilizar os recursos públicos e a prestar melhores serviços à po-pulação.. Objetivo Objetivamos avaliar a eficácia do PDM como fator condi-cionante à melhoria do ambiente, tornando este sustentável, equi-librado e socialmente justo, de forma a garantir qualidade de vida para as presentes e futuras gerações.. Metodologia Refere-se a um estudo de natureza descritiva-compara-tiva, cujo coleta de dados se baseou na análise de indicadores de saúde, de impacto social e de gestão de políticas públicas. Acom-panhamos a evolução populacional de 1999 até 2009, como parâ-metro de análise de movimentos migratórios da zona rural para a sede do Município.. Resultados Em 1999, a população de Pedra Branca contabilizava 37.204 habitantes, sendo que 56,3% estavam na zona rural. Em 2009, o total populacional saltou para 42.395, sendo que, deste, 61% estavam fixados na zona rural, caracterizando uma conside-rável desaceleração do fluxo migratório para a sede do Município. De 2007 até 2009, após implementação do PDM, ouve Aumento de 5% da população na zona rural. Isso se deve em parte pela Lei Municipal instituída para normatizar o zoneamento de cidade, tais como normas para uso e ocupação regular do solo e código de obras e edificações, este último, instituído em 2007, dando ênfase a instalações hidro-sanitárias e controle de vetores (fechamento obrigatório de reservatórios d’água com finalidade de se manter o índice de infestação predial para o Aedes aegypti zerado). . Conclusão A atitude do homem face ao seu papel no ambiente é fun-damental para o equilíbrio deste. A partir de 2007, foi evidente a fixação da população na zona rural, o que contribuiu para me-

lhoria do ambiente urbano. A migra-ção desordenada da zona rural afeta o equilíbrio urbano, por meio da inviabi-lização de recursos e capacidades ins-taladas, submeten-do os indivíduos a condições precárias de existência. Um resultado positivo após a implantação do PDM se deu no controle do Ae-des aegypti, onde o Município por 4 anos consecutivos contabilizou índice de infestação pre-dial “zero”, além do que, possibilitou uma maior cobertura de imóveis para eliminação de focos, contabilizando dez ciclos anuais. Nesse sentido, para controle de toda essa problemática, é necessário não só investir no campo, impedindo a fuga de contingentes para a sede, mas promover a elaboração e execução de estratégias como o PDM, independentemente do tamanho do Município, permitindo à popu-lação adquirirem padrões de comportamento ambiental e sanitário e promovê-la á condições melhores de expectativa de vida.

Referências:PM de Pedra Branca. Lei Orgânica do Município de Pedra Branca, Ceará. 1990.SMS de Pedra Branca. Plano Municipal de Saúde 2005 – 2009. Secretaria Munici-pal da Saúde de Pedra Branca, Ceará. Revisada 2009;BRUBAKER, Sterling. Viver na Terra; O Homem em Seu Ambiente. Washington, DC.: Ed. Cultrix, 1976; COSTA, Manoel Augusto. Urbanização e Migração Urbana no Brasil. Rio de Ja-neiro, RJ. IPEA/INPES, 1975;DIAS, Genebaldo Freire. Populações Marginais em Ecossistemas Urbanos. Brasí-lia, DF. IBMARNR, 1989;IBGE. Senso Demográfico, População Municipal. 1999 a 2009. www.ibge.gov.br;LEITE, Lesley Gasparini. Plano Diretor: Obrigatório por Força da Lei Municipal. In, Revista Direito Público. São Paulo, SP. 1991;LIMA, Regina Amodêo Pacheco. A Ação do Homem nos Ecossistemas. Rio de Janeiro, RJ. Fundação Getúlio Vargas, 1979.

Francisco Roberto Teixeira Marrocos, Coordenador da Atenção BásicaTânia Maria Leite Parente, Secretária Municipal da saúde

Leila Alves Machado, Coordenadora da Vigilância Epidemiológica

Pedra Branca

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Gerenciamento dos Resíduos Sólidos de Saúde: um processo da Vigilância Sanitária e Meio Ambiente do Município de Cruz

. Introdução O município de Cruz tem uma população de 23 mil habitantes, localizado na região norte do Estado do Ceará, a 246 km da Capital Fortaleza, pertence a 12 ª Microrregional Acaraú. Tem em seu Sistema Local de Saúde um Hospital Municipal de 56 leitos, oito Equipes de Saúde da Família, Oito Equipes de Saúde Bucal, um Centro de Especialida-de Odontológica, um Núcleo de Apoio a Saúde da Família, uma Clínica de Fisioterapia e um Centro de Saúde.. Justificativa Os Resíduos Sólidos das Unidades de Saúde do Mu-nicípio de Cruz, sempre constituiu-se um problema sério para a Administração Pública de Saúde, devido principalmente a forma de coleta que gerava um desconforto no seu manuseio e descarte ineficaz nos lixões com prejuízo ao meio ambiente, onde falta de informações a seu respeito poderia produzir doenças. Diante da situação foi realizado oficinas de planejamento da Vigilância Sanitária em parceria com Secretaria de Meio Am-biente do Município ‘na premissa de melhorar o gerenciamento dos resíduos gerados pelas unidades de saúde. . Objetivos . Fortalecer a atenção ao assunto “resíduos sólidos dos serviços de saúde”; . Permitir o conhecimento das fontes geradoras dos resíduos. A Unidade Hospitalar é a maior geradora com variedades de tipos de resíduos distribuídos em dezenas de setores com atividades di-versas; . Melhorar o método de coleta, embalagem, transporte e destino adequados; . Reduzir e/ou eliminar os riscos a saúde dos funcionários, clientes e comunidades; . Evitar o manuseio para fins de seleção dos resíduos, fora da fonte geradora; . Reduzir o volume de resíduos para incineração e coleta especial; . Colaborar para reduzir a poluição ambiental, gerando , incineran-do e encaminhando ao local adequado. . Metodologia . Reconhecer as fontes geradoras dos resíduos hospitalares; . Identificar e classificar todos os tipos de resíduos por fonte gera-dora ou setores e serviços envolvidos; . Rotinizar condutas para seleção, coleta e transporte dos resídu-os hospitalares, classificando-os conforme as normas técnicas que foram estabelecidas e legislação vigente contemplando: periculo-sidade, volume e reciclagem; . Definir atribuições aos diversos serviços e setores envolvidos, com a operacionalização do programa em cada uma das suas di-ferentes etapas; 1. Identificação e classificação dos resíduos hospitalares 1.1. Resíduos Infecciosos Grupo 1 - Material proveniente de isolamentos, sangue

humano e derivados, material patológico, materiais perfurantes e cortantes, resíduos de diagnóstico e tratamento (gaze, drenos, son-das, absorventes e qualquer material sujo com resíduos e fluidos corpóreos) 1.2. Resíduos especiais Grupo 2 - Material radioativo, farmacêutico e químicos. 1.3. Resíduos comuns Grupo 3 - Materiais provenientes das áreas administrati-vas, resíduos alimentares da produção de alimentos, áreas externas e jardins, sucatas e embalagens reaproveitáveis. 2. Acondicionamento e destino dos resíduos hospitalares Grupo 1 - material perfuro cortante em caixas de papelão reaproveitadas e adaptadas para esta finalidade, demais resíduos em sacos plásticos brancos identificados com a simbologia de ma-terial infectante - destino: incineração ou aterro sanitário através de sistema de coleta especial; Grupo 2 - material radioativo; Grupo 3 - vidros, plásticos, papel, papelão, metais e outros ma-teriais recicláveis recebem embalagens próprias conforme o tipo de material - destino: reciclagem interna ou venda como sucatas diversas. A separação e embalagem são realizadas no local de ori-gem e transportada em carro especial com coleta sistemática nas unidades de saúde. . Métodos de funcionamento

1. Organograma

Cruz

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2. Organograma

. Recursos humanos e materiais - EPIRceursos humanos: 02Materiais: lucas, botas, óculos de proteção, macacãoTransporte: moto, carroça

. Quantidade de resíduos coletados por unidade de saúde

Tabela. 1- coleta : junho a dezembro de 2009

. Resultados

. Melhoria na classificação e acondicionamento nas unidades ge-rados dos resíduos, até a coleta pelo profissional no manuseio ade-quado dos resíduos sólidos;. Sensibilidade dos profissionais nas unidades de saúde; . Melhoria na proteção humana;. Preservação dos recursos naturais;. Ambiente limpo e saudável.

Referências:Resolução CONAMA nº 05 de 05 de agosto de 1993;Resolução RDC nº 33 de 02 de fevereiro de 2003;NBR 12808 de 1993Manual de gerenciamento de resíduos de serviços de saúde / Ministério da Saúde, Série A. Normas e Manuais Técnicos, Agência Nacional de Vigilância Sanitária. – Brasília: Ministério da Saúde, 2006.

Ricardo do Nascimento Leite, Técnico de Meio Ambiente Douglas Carpegiany Castro Silva, Coordenador da Vigilância Sanitária

Francisco Pedro da Silva Filho, Secretário da Saúde

vivências . 69Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Minha Rua Cada Vez Melhor

. Introdução Espera-se que em pouco tempo nosso planeta conte com mais áreas urbanas do que áreas rurais. A urbanização desenfreada trouxe consigo enormes repercussões na saúde da população. Pro-blemas como a insuficiência dos serviços básicos de saneamento, coleta e destinação adequada do lixo e condições precárias de mo-radia, tradicionalmente relacionados com a pobreza e o subdesen-volvimento, somam-se agora à poluição química e física do ar, da água e da terra, problemas ambientais antes considerados “moder-nos” [1]. Tendo como preocupação a saúde pública, considerando o homem parte integrante da natureza e, nesta condição, neces-sitando do meio ambiente saudável para ter uma vida salubre, o Governo Federal promoveu a 1.ª Conferência Nacional de Saúde Ambiental (1.ª CNSA), convocada pelo Presidente da República por meio de Decreto de 14.5.2009, (DOU de 15.5.2009). Com os lemas “Saúde e Ambiente: vamos cuidar da gente” e “A saúde ambiental na cidade, no campo e na floresta: construindo cidadania, quali-dade de vida e territórios sustentáveis”, o evento reuniu milhares de participan-tes em Brasília/DF, delegados eleitos nas etapas regionais [2]. Em dezembro de 2009 realizou-se uma primeira tentativa de construir a Política Nacional em Saú-de Ambiental através da 1.ª CNSA. A saúde ambiental hoje tem o desafio de promover uma melhor qua-lidade de vida e saúde nas cidades e a oportunidade de enfrentar o absurdo qua-dro de exclusão social, sob a perspectiva da eqüidade [1]. Pacatuba, diante das situações que demonstram a relação entre o meio ambiente e a saúde concretizou o Progra-ma Minha Rua Cada Vez Melhor com o objetivo de levar a população pacatubana uma melhor qualidade de vida na sua rua, de porta em porta. . O programa O Programa Minha Rua Cada Vez Melhor tem como ob-jetivo uma reincorporação das questões do meio ambiente, edu-cação, esporte, cultura e ação social nas políticas de saúde, e a integração dos objetivos da saúde ambiental. O Programa prevê uma abordagem mais integrada, com mecanismos intersetoriais que possibilitem um diálogo amplo entre as partes, disponibilizado enormes benefícios na conquista de melhores condições de vida, para a população pacatubana. O método do Programa é a união de projetos com o ob-jetivo de trazer a população uma satisfação em um ambiente com mais saúde. Vale ressaltar que saúde é definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um completo estado de bem-estar

físico, mental e social e não meramente a ausência de doença[3]. A idéia foi levar a uma determinada localidade todos os serviços pú-blicos de porta em porta. Assim cada secretaria propõe um projeto vinculado a sua demanda. . Os projetos Projeto Mutirão de limpezaRealização: Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Infra-estru-tura.Com o objetivo de deixar as ruas de Pacatuba mais agradáveis, o mutirão de limpeza visa uma ação conjunta dos setores de infra-estrutura, desenvolvimento urbano, setor de limpeza e núcleo de meio ambiente com ações da limpeza e de educação ambiental direta, incentivando a comunidade a perceber sua rua, como res-ponsáveis pelo seu entorno, cativando-os a cuidá-la com atitudes

simples e carinhosas.Ações: . Mutirão de limpeza, . Entrega de cartilhas com calendário de Coleta.. Sinalização para conscientização de acondicionamento de lixo e . Educação Ambiental.Procedimentos: . Limpeza das Ruas na forma de mutirão com caiação do meio fio, tampa buraco, capina, retirada de ponto de lixo., Nos pontos de lixo retirado serão postas placas de proibição de despejo de lixo no local.. Abordagem de forma direta nas casas para a conscientização do acondiciona-mento dos resíduos.Projeto de ArborizaçãoRealização: Núcleo de Meio Ambiente.O objetivo da doação de mudas é incen-tivar a comunidade a plantar árvores para obter uma melhor qualidade de vida, através de:. Redução de temperatura pela cobertura de superfícies refletoras de calor

. Aumento da taxa de evapotranspiração, tornando o ambiente mais úmido e menos quente.. Retenção de até 70% da poeira em suspensão.Ações: . Doações de mudas.. Educação Ambiental.Procedimentos: . Adquirir mudas pela SEMACE. Cartilhas relacionadas ao desmatamento, a flora.Projeto Entulho X ArteRealização: FUNTEC Os lugares que hoje são usados como depósitos de lixo serão tra-

Pacatuba

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balhados para receber a arte que caracterize a cultura local, de pre-ferência feito pela própria população local. O objetivo é tornar o local agradável e desvincular a imagem de ponto de lixo.Ações: . Diagnóstico cultural local.. Painéis de arte.Procedimentos: . Descobrir artistas locais. Caracterizar a cultura local. Desenvolver uma arteProjeto Educação em MovimentoRealização: Secretaria de EducaçãoVisa aproximar a comunidade da escola. Através de terapia comu-nitária, palestras e vídeos sobre: Redução da violência, Direitos sociais, Preconceitos, Combate às drogas. Visa também mostrar os talentos da comunidade e apresentações artísticas, nas Escolas.Ações: . Visita Domiciliar. Atividades educativasProcedimentos: . Visita Domiciliar - Mobilizar a comunidade para: Acesso e permanência e sucesso escolar, Esclarecer sobre: bolsa família, Transporte escolar, Merenda escolar, Divulgar as ações da SME. Falar sobre o programa mais educação.. Atividades educativas - Palestras sobre: Drogas: causas e conse-qüências, Violência doméstica. Apresentações Artísticas: oficinas de artes, capoeira, violão, torneio de xadrez, flauta, hip hop. Víde-os Sobre: Preconceitos (crianças), Direitos sociais (adolescentes), Participação social (adulto), Ações da Prefeitura (geral), Ações da Sec. de Educação.Projeto O esporte resgatando a brincadeira popularRealização: Secretaria de EsportesObserva-se cada vez mais que o contato das crianças com jogos, brincadeiras e brinquedos tradicionais, vem perdendo espaço para equipamentos de alta tecnologia, como os vídeo-games, compu-tadores, televisores e brinquedos de controle remoto. Tendo em vista a importância dos brinquedos e brincadeiras populares no de-senvolvimento das potencialidades das crianças e na preservação da identidade e cultura da comunidade, a Secretaria de Esportes através do Programa Minha Rua Cada Vez Melhor, pretende de-senvolver o Projeto “O esporte resgatando a brincadeira popular”, cujo objetivo central é resgatar antigos brinquedos e brincadeiras.Ações: . Atividades esportivas.Procedimentos: . Corrida de saco, pião, bambolê, pula corda, carimba, amarelinha, elástico, peteca, etc.Projeto Abordagem Sistêmica para o Resgate de Raízes Realização: Secretaria da mulher, Cidadania e Diretos Humanos.Com o objetivo de diminuir o índice estatístico de vítimas de violência doméstica a Secretaria da Mulher, Cidadania e Dire-tos Humanos por meio do Projeto Abordagem Sistêmica para o

Resgate de Raízes propõem através de roda de conversa propor-cionar melhoria na auto-estima, restabelecimento de vínculos e o resgate de raízes para as famílias beneficiadas pelo Programa.Ações: . Abordagem Sistêmica. Panfletagem .Procedimentos: . Roda de Conversa. Entrega de panfletos sobre a violência doméstica.Projeto Ação Social Realização: Secretaria de ação social.Ações: . Visitas DomiciliaresProcedimentos: . Roda de Conversa - a Ação Social disponibilizou psicólogos, as-sistentes sociais, entre outros. . Serviços de corte e manicura de porta em porta.Projeto Mutirão da DengueRealização: Secretaria de SaúdeAntevendo o período chuvoso, objetivamos mobilizar a comuni-dade para a prevenção da Dengue.Ações: . Mutirão da dengue. Sensibilização em relação às formas preventivas de evitar a den-gue.Procedimentos: . Envolvidos: Técnicos da mobilização social, agentes de ende-mias e defesa civil.. Visita domiciliar. Tenda de apoio para orientação da dengue e outras endemiasProjeto Estratégia saúde da família Realização: Secretaria de SaúdeNo dia do evento toda equipe de saúde da família pertencente à área a ser trabalhada, estará intensificando suas atividades na Rua do projeto. Ações: . Visitas domiciliares com agentes comunitários de saúde, enfer-meira e médico.. Abordagem de algumas patologias de maior relevância na comu-

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nidade. Prevenção, Detecção e cura!. Saúde Bucal preventiva na unidade básica de saúdeProcedimentos: . Visita domiciliarProjeto Regularização Numérica das CasasRealização: Secretaria de FinançasNo dia do evento a equipe da Secretaria de Finanças numera as casas que estão irregulares com sua numeração e se as ruas estão com suas placas corretas e conservadas.Ações: . Numeração segundo Prefeitura.. Placas de identificação das ruasProcedimentos:. Identificação das casas através do cadastro da Prefeitura.. Identificação das placas de ruas em péssima condição é reposta nova e as ruas sem placas são confeccionadas e colocadas.. Resultados “Uma rua limpa se transforma em segurança pública, em bem estar”. A opinião é do pacatubano Josemir Alves, morador da Rua Topázio, no Conjunto Alvorada. O endereço foi o pionei-ro de um projeto que promete aproximar ainda mais a prefeitura da população, o Minha Rua Cada Vez Melhor. “É legal porque conscientiza as pessoas a não jogarem lixo nas ruas”, avalia a ado-lescente, Juliana Farias, 14 anos. As amigas Michele Ferreira, 13 anos, e Maria das Dores, 14 anos, fizeram coro com Juliana. “Eu adorei. Isso aqui vai mudar a cara daqui”, considera Michele. A dona de casa Maria do Perpétuo Socorro que o diga. Sentadinha em um batente na Rua Raimundo do Vale, ela observava o trabalho dos garis. “Fiquei feliz sim. É bom a gente saber que estão olhando para o nosso bairro. Legal ver a rua limpinha. A gente não pode só reclamar. Quando tem trabalhos como esse aqui, a gente tem que elogiar também”, afirma. A também dona de casa Flaviana Go-mes, pensa o mesmo. Moradora da Rua Sabino Chagas, “Além da limpeza da rua, os serviços que foram trazidos ajudaram porque a gente não precisou sair do bairro para procurar”. O auxiliar de ser-viços gerais, Francisco Rodrigues Junior, concorda. “Estou aqui há um ano e essa é a primeira vez que vejo tanto serviço junto ao mesmo tempo. Tomara que não seja só essa vez e que outras ruas recebam também” [4]. Em cada casa ficava claro que o serviço, de fato, contribuía com a autoestima dos moradores.

Referências:[1] GOUVEIA, Nelson. Saúde e meio ambiente nas cidades: os desafios da saú-de ambiental. Saúde soc. [online]. 1999, vol.8, n.1, pp. 49-61. ISSN 0104-1290.IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2000. Fortaleza: IBGE, 2000.[2] CUNHA, Paulo Roberto. A relação entre meio ambiente e saúde e a importância dos princípios da prevenção e da precaução . Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 633, 2 abr. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6484>. Acesso em: 10 de dez. de 2009.[3] FLECK, Marcelo Pio de Almeida. O instrumento de avaliação de qualidade de vida da Organização Mundial da Saúde (WHOQOL-100): características e perspec-tivas. Ciênc. saúde coletiva [online]. 2000, vol.5, n.1, pp. 33-38. ISSN 1413-8123.[4] LESSA, LUCÍLIO E SOUZA RAQUEL. POPULAÇÃO AVALIA O MINHA RUA CADA VEZ MELHOR. GOVERNO MUNICIPAL DE PACATUBA, CADA VEZ MELHOR, 27 NOV. 2009. DISPONÍVEL EM: <HTTP://WWW.PACATU-BA.CE.GOV.BR/NOTICIAS/TEXTO.ASP?VAR=920&C=N>. ACESSO EM:29 DE NOV. DE 2 009.

Rodrigo de Oliveira Teófilo, Secretario Municipal de SaúdeCecília Daniela Brito, Coordenadora do Meio Ambiente

72 . vivências Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Vigilância da qualidade da água para consumo humano no Município de Sobral-Ce

Atualmente a água é um dos recursos naturais que apre-senta maior vulnerabilidade na sua disponibilidade para a manu-tenção da vida no planeta. A disponibilidade de água significa que ela está presente não somente em quantidade, mas também que sua qualidade seja satisfatória para suprir as necessidades de um deter-minado conjunto de seres vivos. O uso da água pelo ser humano para qualquer finalidade resulta na deterioração da sua qualidade, limitando geralmente seu potencial de uso (SARDINHA, 2008). A água, recurso essencial às funções vitais, existente na biosfera na forma líquida, cobre cerca de ¾ do globo terrestre, sendo que mais de 97% estão nos oceanos e menos de 3% são de água doce. Desse percentual, 77% estão congeladas nos círculos polares, 22% é composta de água subterrânea, e apenas 1% está disponível como água não salgada superficial, apropriada para o consumo humano (SILVA, 2005). Os cursos d’água foram importantes demarcadores na história para a conquista e definição de novas fronteiras entre po-vos. Sendo a água um recurso fundamental para a sobrevivência humana, o que justifica a preferência dessas áreas para o cultivo agrícola, criação de animais e para o crescimento dos aglomera-dos urbanos. Infelizmente, o ser humano não tem dado o valor e a prioridade necessária a este recurso natural, bastando observar que grande parte dos rios é utilizada para o descarte dos efluentes gerados nas cidades e pelas indústrias (MASCARENHAS, 2009). De acordo com Loureiro (2000), a natureza finita dos re-cursos hídricos, contém um aspecto crítico, que deve ser analisada sob a ótica do crescimento populacional. São poucos, os outros recursos essenciais à vida, que estão restritos por limites de dis-ponibilidade tão definidos quantos estes. Entretanto, pode-se dizer que com a concentração populacional, o consumo “per capta”, de água tende a diminuir, isto repercute na saúde e nos padrões da qualidade de vida. A garantia de acesso à água em quantidade su-ficiente e com qualidade adequada vem adquirindo cada vez mais, contornos estratégicos para a sobrevivência das nações. Segundo o Ministério das Relações Exteriores (2010), os recursos hídricos vêm ganhados cada vez mais importância do

manejo sustentável da água para o bem estar das populações e para o desenvolvimento das regiões. O Brasil detém 12% de água doce do planeta, o que resulta em 53% dos recursos hídricos da América do Sul, esses dados o coloca em destaque no contexto internacional, visando fortalecer a cooperação em manejos destes recursos. Portanto o Brasil vem buscando promover iniciativas, a fim de garantir pleno acesso à água às populações das regiões. O principal propósito da qualidade da água é a proteção à saúde pública. Os critérios adotados para assegurar essa quali-dade têm por objetivo fornecer uma base para o desenvolvimento de ações que, se propriamente implementadas junto à população, garantirão a segurança do forne-cimento de água através da elimi-nação ou redução à concentração mínima de constituintes na água conhecidos por serem perigosos à saúde. Visando à avaliação da qua-lidade da água de abastecimento, foi implementado o desenvolvi-mento de tecnologias como pro-posta metodológica para monito-ramento de água em municípios abrangidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) (D’ÁGUILA et al, 2000). A oferta de água em quantidade e qualidade adequadas é fator imprescindível para a prevenção de riscos à saúde e melhoria de qualidade de vida da população. Por este motivo, o setor saúde assumiu, historicamen-te, um papel ativo na vigilância da água para consumo humano. Diante da necessidade de padronizar as ações relacio-nadas à vigilância da qualidade da água para consumo humano no país, a Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS/MS) definiu um Modelo de Atuação da Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano, estabelecendo princípios e diretrizes, as bases conceituais e gerenciais, bem com as ações necessárias para sua implementação e concretização por meio de um Programa Nacio-nal de Vigilância Ambiental em Saúde Relacionada à Qualidade da Água para Consumo Humano (VIGIAGUA) (BRASIL, 2006). A portaria de nº 518 de 25 de março de 2004 estabelece os procedimentos e responsabilidades relativos ao controle e vigi-lância da qualidade da água para consumo humano no país e ainda define o padrão de potabilidade, e dá outras providências. São ações básicas do Programa Nacional de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano (VIGIÁGUA):. Cadastramento e inspeção das diversas formas de abastecimento e consumo de água, tanto das coletivas como das individuais;. Realização de coletas conforme cadastramento e o monitoramen-to da qualidade; . Avaliação e análise integrada das informações reunidas pela vi-gilância e as fornecidas pelos responsáveis dos controles da qua-lidade da água;

Sobral

Figura 2: Sistema de Abastecimento Individual (SAI)

Figura 2:Sistema de Abastecimento Coletiva (SAC)

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. Realização de uma sistemática e permanente avaliação de riscos à saúde humana de cada sistema de abastecimento ou solução al-ternativa;. Fiscalização do controle da qualidade da água produzida e distri-buída e as práticas operacionais adotadas; . Investigação de surtos e epidemias; . Conhecimento dos aspectos conceituais e técnicos relacionados à qualidade e ao abastecimento de água para consumo humano e sobre os conceitos e procedimentos para as boas práticas em abas-tecimento de água;. Sistematização e interpretação de dados gerados pelos responsá-veis pelo controle da qualidade da água, pela vigilância epidemio-lógica, pelos órgãos ambientais e gestores de recursos hídricos;. Conhecimentos necessários para realização de inspeções em sis-tema de abastecimento de água. Em Sobral, principal município da região noroeste do es-tado do Ceará, com população de 182.430 habitantes, a vigilância da qualidade da água tem como finalidade o mapeamento de áreas de risco de contaminação de água para consumo humano, quer seja aquela distribuída por Sistemas de Abastecimento de Água (SAA), as provenientes de Soluções Alternativas Coletivas (SAC) e das Soluções Alternativas Individuais(SAI). Os SAA são instalações compostas por conjuntos de obras civis, materiais e equipamentos, destinados à produção e à distribuição canalizada de água potável para populações, sob a responsabilidade do poder público, mesmo que administrada em regime de concessão ou permissão (figura 1). Os SAC correspondem a toda modalidade de abasteci-mento coletivo de água distinta do sistema de abastecimento de água, incluindo, entre outras, poço comunitário, distribuição por veículo transportador, chafarizes, instalações condominiais hori-zontal e vertical (figura 2). Os SAI entendem-se todas e qualquer solução alternativa de abastecimento de água que atenda a um único domicílio, por exemplo, cacimba, cacimbões, poço profundo. A tabela 01 mostra as formas de abastecimento de água para consumo humano, tanto coletivas como individuais, cadas-tradas no município de Sobral, bem como os domicílios cadastra-dos e a população atendida no ano de 2009.

Tabela 1. Formas de abastecimento de água para consumo humano cadas-tradas e população atendida em Sobral-Ceará, no ano 2009.

Fonte: Vigilância Ambiental/Secretaria da Saúde e Ação Social de Sobral-CE

Como pode ser observado na tabela 1, a maioria da po-pulação de Sobral é atendida por SAA. Na sede do município o abastecimento é realizado por duas Estações de Tratamento: A Estação de Tratamento do Sumaré, a qual se subdivide em duas instalações (ETA I e ETA II) com uma vazão/dia de 1200 m³/h em 24 hrs e responsável pelo abastecimento de cerca de 80% da po-pulação (164.583 usuários). A segunda é a Estação de Tratamento Dom Expedito, que possui uma vazão de 300 m³/h em 24 hrs e é responsável em abastecer 20% da sede da município, atendendo portanto 31.554 usuários. As estações que abastecem sede de Sobral, a água é cap-tada de mananciais superficiais (Rio Acaraú e Ayres de Sousa) e seu tratamento é do tipo Convencional, ou seja, passam pelas se-guintes etapas: captação, adução, floculação, decantação, filtração, desinfecção, correção de pH, fluoretação e distribuição. O serviço de vigilância ambiental da Secretaria da Saúde e Ação Social de Sobral, além de manter o cadastro atualizado das formas de abastecimento de água para o consumo humano e o da população atendida, realiza o monitoramento da qualidade da água através de um plano de amostragem de vigilância para fins de análise físico-químicos: cloro residual livre e turbidez; fluoreto e bacteriológicos: Coliformes totais e Escherichia coli. Este trabalho tem como objetivo garantir a população o acesso a água com qua-lidade compatível com padrão de potabilidade estabelecido pela Portaria 518/2004. O plano de amostragem para Vigilância da Qualidade da Água faz parte do compromisso da gestão municipal e atende o parâmetro o art. 5° inciso IV da Portaria 518/2004: “São deveres e obrigações do MS (...) definir diretrizes especificas para o estabe-leciemnto de um plano de amostragem a ser implementado pelos Estados, Distrito Federal ou Municípios, no exercício das ativi-dades de vigilância da qualidade da água, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS”. Os métodos de amostragem utilizados para o monitora-mento dos parâmetros deverão estar em consonância com as nor-mas nacionais, com vista em garantir a eficiência e qualidade da execução do monitoramento da coleta de amostras, onde deverá, também, existir planejamento, infra-estrutura e operação. No plano de amostragem municipal de Sobral de 2009, foram definidas 636 amostras, no entanto foram realizadas 720, atingindo um percentual de 113,2%.

Na tabela 02 se apresenta o monitoramento da Vigilância da Qua lidade da Água para o consu-mo humano em Sobral, segundo o plano de amostra-gem para as análises físico-químicas e bacteriológicas, realizadas pela o serviço de vigilância ambiental de Sobral.

Tabela 02. Monitoramento da qualidade da água para consumo humano segundo o plano de amostragem. Sobral-Ce. 2009.

Fonte: Vigilância Ambiental/Secretaria da Saúde e Ação Social de Sobral-CE

Técnica da vigilância ambien-tal e agente comunitária de saúde orientando a comunida-de sobre o uso e a proteção da água para consumo humano em um córrego do distrito de Rafael Arruda- Sobral-Ce.

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Para a coleta das amostras de água, uma equipe da vi-gilância ambiental se desloca até o local do sistema de abasteci-mento de água cadastrado, munida de frascos estéril e, em seguida estas amostras são enviadas ao LACEN. No momento da coleta a equipe procura envolver os Agentes Comunitários de Saúde na identificação dos fatores de exposição de risco de contaminação da água e na atuação junto à comunidade e responsáveis pelo forneci-mento de água para correção dessas situações. Os resultados das amostras analisadas são divulgados para os responsáveis pela distribuição da água, para a comunidade e para os profissionais da Estratégia Saúde da Família (ESF). A equipe da Vigilância Ambiental tem uma atuação pro ativa junto à direção dos órgãos responsáveis pela distribuição da água nas coletividades na busca de melhoria das estações de trata-mento e de distribuição da água. Nos locais onde a comunidade utiliza sistemas de abas-tecimentos alternativos, como lagos, rios, córregos, cacimbas, são realizadas sessões educativas com a comunidade, com a participa-ção dos profissionais ESF, visando à adoção de boas práticas em todas as partes constituintes e etapas dos processos e sistemas de produção e abastecimento de água. Coleta de amostras em pontos de distribuição de água para o consumo humano. Jordão, distrito de Sobral. Coleta de água em grande reservatório com Agente Co-munitária de Saúde. com Açude Bouqueirão, distrito de Sobral,

Referências: BRASIL. Ministério da Saúde. Vigilância e Controle da Qualidade da Água para Consumo Humano. Brasília: [s.n.] 2006. ______. Ministério das Relações Exteriores. Recursos Hídricos. Disponível em:http://www.mre.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1934&Itemid=520. Acesso 25 de janeiro de 2010D’ÁGUILA, P. S. ; ROQUE, O. C. C.; MIRANDA, C. A. S. ; FERREIRA, A. P., 2000. Avaliação da qualidade de água para abastecimento público do Município de Nova Iguaçu. Artigo, Rio de Janeiro: Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Osvaldo Cruz. MASCARENHAS, L. M. A.; FERREIRA, M. E.; FERREIRA, L. G, 2009. Sen-soriamento remoto como instrumento de controle e proteção ambiental: análise da cobertura vegetal remanescente na Bacia do Rio Araguaia. Uberlândia. Sociedade & Natureza vol. 21 n°1 SARDINHA, D. S.; CONCEIÇÃO, F. T.; SOUZA, A. D. G.; SILVEIRA, A.; JU-LIO, M.; GONÇALVES, J. C. S. I,, 2008. Avaliação da qualidade da água e autope-duração do Ribeirão do Meio, Leme (SP). Artigo Técnico, São Paulo: Engenharia sanitária Ambiental vol.13, p.329-338. SILVA, A.L.M. Direito do meio ambiente e dos recursos naturais, v. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

Carlos Hilton Albuquerque Soares, Secretário de Saúde e Ação Social Maria Socorro Carneiro Linhares, Coordenadora de Vigilância á Saúde

Suely Torquato, Gerente do Serviço de Vigilância Ambiental

vivências . 75Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Um olhar sobre o Tracoma

Tracoma é uma infecção causada pela bactéria Clamydia tracomatis, doença pouco conhecida e comum de ser encontrada que pode provocar até a perda da visão. O foco da prevenção e do tratamento ao tracoma é a realização de exames para detectar a doença em crianças do ensino infantil e fundamental (até 5ºano), conforme orientação da Secretaria Estadual de Saúde/MS. A Secretaria de Saúde do município de Pacatuba vem densenvolvendo um trabalho junto as escolas municipais realizan-do exames nos alunos de forma intensiva desde 2007 contando com 3 agentes de endemias (Francisco Evaristo de Castro , Maria Helena Menezes Sales e Roberta Maria da Silva Aquino) para o desempenhos destas atividade. Segundo a Coordenadora Municipal do Programa de Controle ao Tracoma Alzira Frota de Alcântara, o trabalho con-tínuo e perseverante tem trazido bons resultados, visto que além dos alunos examinados nas escolas municipais, os casos positivos recebem a visita domiciliar dos agente de endemias para realiza-ção do exame nos familiares (comunicantes) que tiveram contatos com a criança para verificar um possível contágio na família desse aluno com tracoma. Abaixo segue uma tabela com os casos detectados nos anos de 2008 e 2009, bem como a quantidade de alunos e comuni-cantes examinados.

. Forma de trabalho Antes dos exames em sala de aula, os agente de endemias explicam para as crianças o que é o tracoma, dizem que a doença atinge, principalmente, quem costuma coçar os olhos com as mãos sujas e que a contaminação pode se dar por meio de objetos como lápis, caneta, borracha e colcha de cama que estejam sendo usados por alguém doente. Informa que o exame é simples: consiste na eversão (levantamento) da pálpebra dos olhos do paciente e na observação clínica com a ajuda de uma lupa. Se for detectada a presença de pelo menos cinco folículos na parte interior da pálpe-bra, há tracoma. É uma doença que tem cura, mas tem que ter higiene. Para isso, a participação dos professores em sala de aula é fun-damental. recomendação essencial para prevenir a doença.Para a continuidade do trabalho contamos com a ajuda dos professores, que dão orientações sobre higiene pessoal. É proposta, que a abor-dagem do tema deixe de ser orientação e faça parte do currículo escolar, como tema transversal nas disciplinas de Ciências e Biolo-gia. Já a prevenção começará desde o primeiro dia de aula, a fim de que as crianças até o 9º ano sejam examinadas. Outro reforço vem dos agentes de saúde do Programa de Saúde da Família (PSF), que são orientados a observar sinais de tracoma durante as visitas domiciliares.

O controle do traco-ma para os pacientes in-fectados é feito com a ad-ministração do antibiótico azitromicina, distribuído pelo Ministério da Saúde (MS), com gerenciamen-to da Sesa. A prescrição em Pacatuba é feita por um clínico-geral do PSF, nos casos mais simples, ou por um oftalmologista, nos mais complicados. A

marcação das consultas é garantida pela Secretaria Municipal de Saúde. O retorno se dá seis meses após a medicação, os agentes retornam às escolas e às casa do paciente para garantir que não houve reinfestação, em 2010 esse retorno se acontecerá com três meses após a tomada da medicação, visto que será assegurado o controle a referida doença no município.. Outras informações Histórico: Os primeiros registros do tracoma no mundo são bem antigos, tais como na China, no século XXVII a.C.. A

literatura da área informa que as províncias do Ceará, na região do Cariri, e do Maranhão fo-ram as portas de entrada da doença no Brasil, no século XVIII, com a deportação de ciganos ex-pulsos de Portugal. No Interior cearense, tam-bém é conhecida como ´dordói´. Hoje, segundo

o Ministério da Saúde, está presente em todo o território nacional. Transmissão: Por contato direto, de uma pessoa para ou-tra; indireto, por meio de objetos contaminados; ou por moscas que podem carregar a bactéria. Sintomas: Olhos vermelhos, irritados, lacrimejantes, co-çando, com secreção, sensação de areia ou intolerância à luz. Mui-tas vezes pode ser assintomática. Há seis tipos de tracoma.. Folicular: Presença de cinco ou mais folículos, de pelo menos 0,5mm de diâmetro, na parte superior interna da pálpebra. O trata-mento é feito à base de antibióticos.. Intenso: O tracoma inflamatório intenso caracteriza-se por espes-samento da pálpebra, que se apresenta enrugada e avermelhada. Cicatrização: A cicatrização conjuntival tracomatosa consiste na presença de cicatrizes esbranquiçadas nas pálpebras. Triquíase: Quando observa-se que, pelo menos, um cílio atrita o globo ocular (bate nas palpebras) ou quando há evidên-cia de remoção recente de cílios invertidos. A dor sentida é muito intensa. É preciso fazer cirurgia de rotação da margem palpebral para evitar a cegueira. Opacidade: A opacificação da córnea é a cegueira parcial ou total. A cura só é possível por meio de um transplante corneano.

lzira Frota de Alcântara, Coordenadora do Projeto TracomaMaria Helena Menezes Sales, Agente de Endemias

Roberta Maria da Silva Aquino, Agente de Endemias

Pacatuba

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para ler para ouvir para ver

CD“Dindinha”Ceumar

Disco de estréia da cantora mineira Ceu-mar, lançamento da Atração Fonográfica. Dindinha tem produção de Zeca Baleiro, co-produção de Ceumar, produção execu-tiva de Tata Fernandes, direção artística de Ceumar, Tata e Zeca. A cantora assina também quase todos os arranjos de base. O repertório é cuidadosíssimo e variado. Vem da delicada Dindinha para o áspero Banzo, de Itamar Assumpção, uma de suas melhores peças novas de 1996. Volta a Zeca Baleiro com Cantiga, que tem leve sabor de anos 60, na construção poética (na maneira de lidar com as sílabas, cos-turando no fio da sonoridade palavras em inglês, português, italiano) e também no arranjo de violões de corda de aço e cordas soltas. Ceumar fez de Dindinha um disco luminoso, marcando uma estréia que hon-ra a fonografia. É uma estrela sofisticada com todas as qualidades, as necessárias e as mais que suficientes, para fazer sucesso popular. (www.ceumar.com.br)

Filme“Abraços partidos”Pedro Almodóvar.Drama.Espanha

Um homem escreve, vive e ama na escu-ridão. Quatorze anos antes, ele sofreu um acidente de carro na ilha de Lanzarote, perdendo a visão e a mulher de sua vida. Esse homem usa dois nomes: Harry Caine, pseudônimo lúdico com o qual assina trabalhos literários, histórias e roteiros, e Mateo Blanco, seu nome verdadeiro, com o qual vive e assina os filmes que dirige. Depois do acidente, Mateo Blanco se reduz ao pseudônimo e passa a viver graças aos roteiros que escreve e à ajuda que tem de Judit García, sua fiel produto-ra, e do filho dela, Diego, seu secretário, datilógrafo e guia. Certa noite, Diego sofre um acidente e Harry se encarrega de cuidar dele. Durante os primeiros dias de convalescença, Diego pergunta a Harry sobre a época em que respondia pelo nome de Mateo Blanco e descobre o que houve 14 anos antes. Uma história emocionante e terrível, cuja imagem mais expressiva é a fotografia de dois amantes se abraçando, rasgada em mil pedaços.

Livro“Arouca, meu irmão-Uma trajetória” a favor da saúde coletiva”Oraganização de Guilherme Franco Netto e Regina Abreu Prefácio de José Gomes Temporão

Mas por que Sergio Arouca? Trabalhar com o legado de Sergio Arouca é relacio-nar-se com as bases filosóficas, teóricas e políticas do que se convencionou deno-minar a Reforma Sanitária, processo de luta da sociedade brasileira pelos direitos fundamentais à saúde. O pensamento e a ação política de Arouca foram determinan-tes nos principais acontecimentos relativos a esse processo, desencadeado por sua pro-dução e atividade acadêmica, notadamente sua tese “O dilema preventivista”, seguido do período da construção do projeto anti-hegemônico da saúde, expresso por sua atuação no Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES), sua assunção à presidên-cia da FIOCRUZ e à presidência da VIII Conferência Nacional de Saúde, seguido de seus dois mandatos legislativos na Câmara Federal. A vida pública de Sergio Arouca expressa, portanto, um projeto co-letivo, congregando diferentes personagens que se preocuparam em conjugar no campo da saúde a luta mais ampla pelos ideais de uma democracia socialista, participativa e plural num período em que o Brasil vivia sob o arbítrio da ditadura militar.

cultura . 77Revista Sustentação . 2010 . edição 26

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Para ser grande, sê inteiro: nada teu exagera ou exclui.Sê todo em cada coisa. Põe quanto és no mínimo que fazes.Assim em cada lago a lua toda brilha, porque alta vive

Fernando Pessoa

78 . outras palavras Revista Sustentação . 2010 . edição 26

Ilustração> Telma Patricia A

breu Machado (Portugal) . telm

a_machado1@

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