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ESCOLA INCLUSIVA: Adaptar-se para incluir Transtornos do Déficit de Atenção Referencial Teórico Texto 1 Carta de um aluno ao seu professor Oi e obrigado por ler a minha carta. Eu sou o aluno que normalmente não para quieto na carteira, ao que você pede muitas vezes que fique calado. E que, às vezes, quando você explica, entende antes que termine a explicação, mas, se tem que repetir, se aborrece. Às vezes, posso ser muito mal-educado ou explosivo para chamar a atenção. Eu gosto de falar de assuntos que você crê que não são para a minha idade. Você está sempre dizendo aos meus pais que não posso aprender, contudo, se algo me interessa, eu aprendo facilmente, mas, quando tenho suficientes conhecimentos, abandono por desinteresse. Não respondo à autoridade, mas sim ao entendimento e às explicações. Aprendo por imitação, seu exemplo é muito importante. Segundo você, sempre estou rompendo normas e criando umas novas. Sou um gênio “em potencial” que, se me centrasse em algo, seria o melhor... Meus pais me levaram ao médico e disseram que tenho TDA-H, uma coisa chamada Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade, e isso quer dizer que não paro quieto, não posso concentrar-me durante muito tempo, me distraio facilmente e, além do mais sou hiperativo. O médico queria que eu tomasse Ritalina®. Minha mãe disse que isso nem pensar, que as anfetaminas somente criam drogados. Então, minha mãe pesquisou e faço coisas que coloco minha energia (esporte, artes marciais, Tai-chi, ioga) e ela evita me dar alimentos com açúcar e assim me sinto mais relaxado. Não gosto que me tratem como uma criança pequena, apesar de que certas coisas eu sei menos, mas isso não significa que não sei, estou em processo. Se tivesse mais tempo para assimilar as coisas, aprenderia de forma diferente. Se não aprendo de uma forma tradicional... por que me ensina sempre da mesma forma? E se fosse de uma forma mais prática? Estou perguntando sempre por quê? Isso não quer dizer que estou colocando você à prova, somente significa que tenho curiosidade. Se não sabe a resposta, diga. Não tem problema! Só me ajude para que eu encontre a resposta. Gostaria que me incluísse nas decisões que me afetam, não sou simplesmente mais um aluno. Gostaria também que você reconhecesse que sou diferente, não que me classifique como diferente. Quando não posso me concentrar, faça alguma atividade diferente: um jogo, dê uma saidinha... mas não grite comigo. Sei que, muitas vezes, se desespera em classe, pois simplesmente a ignoro.

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Transtornos do Déficit de Atenção – Referencial Teórico

Texto 1 – Carta de um aluno ao seu professor

Oi e obrigado por ler a minha carta.

Eu sou o aluno que normalmente não para quieto na carteira, ao que você pede muitas

vezes que fique calado. E que, às vezes, quando você explica, entende antes que termine a

explicação, mas, se tem que repetir, se aborrece. Às vezes, posso ser muito mal-educado ou

explosivo para chamar a atenção. Eu gosto de falar de assuntos que você crê que não são

para a minha idade. Você está sempre dizendo aos meus pais que não posso aprender,

contudo, se algo me interessa, eu aprendo facilmente, mas, quando tenho suficientes

conhecimentos, abandono por desinteresse. Não respondo à autoridade, mas sim ao

entendimento e às explicações. Aprendo por imitação, seu exemplo é muito importante.

Segundo você, sempre estou rompendo normas e criando umas novas. Sou um gênio “em

potencial” que, se me centrasse em algo, seria o melhor...

Meus pais me levaram ao médico e disseram que tenho TDA-H, uma coisa chamada

Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade, e isso quer dizer que não paro quieto,

não posso concentrar-me durante muito tempo, me distraio facilmente e, além do mais sou

hiperativo.

O médico queria que eu tomasse Ritalina®. Minha mãe disse que isso nem pensar, que as

anfetaminas somente criam drogados. Então, minha mãe pesquisou e faço coisas que coloco

minha energia (esporte, artes marciais, Tai-chi, ioga) e ela evita me dar alimentos com

açúcar e assim me sinto mais relaxado.

Não gosto que me tratem como uma criança pequena, apesar de que certas coisas eu sei

menos, mas isso não significa que não sei, estou em processo. Se tivesse mais tempo para

assimilar as coisas, aprenderia de forma diferente.

Se não aprendo de uma forma tradicional... por que me ensina sempre da mesma forma?

E se fosse de uma forma mais prática? Estou perguntando sempre por quê? Isso não quer

dizer que estou colocando você à prova, somente significa que tenho curiosidade.

Se não sabe a resposta, diga. Não tem problema! Só me ajude para que eu encontre a

resposta. Gostaria que me incluísse nas decisões que me afetam, não sou simplesmente mais

um aluno. Gostaria também que você reconhecesse que sou diferente, não que me classifique

como diferente. Quando não posso me concentrar, faça alguma atividade diferente: um jogo,

dê uma saidinha... mas não grite comigo.

Sei que, muitas vezes, se desespera em classe, pois simplesmente a ignoro.

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Você tem se preocupado em saber o que acontece comigo?

Um abraço com amor

José Manuel

(Esta carta foi escrita por José Manuel Piedrafita Moreno, hoje educador e escritor do livro “Niños Indigo –

Educar em la Nueva Vibración) in TDA-H da Teoria à Prática de Clarice Peres – RJ: Wak Editora, 2013.

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Texto 2 – Algumas considerações a respeito dos processos de atenção

e de seus distúrbios

A observação de crianças de uma maneira geral, assim como o trabalho

com aquelas que apresentam dificuldades dentro do campo de atuação

terapêutica, tem-nos ensinado muito a respeito do que chamamos, atenção.

Podemos definir atenção como uma capacidade geral de estarmos receptivos

ao que se passa no mundo, de modo a sermos capazes de, dentre um conjunto

de fatos que nos chegam, selecionarmos alguns deles para que os

compreendamos de um modo mais efetivo. Significa, portanto, uma capacidade

para selecionar os estímulos sobre os quais nossa atenção e nossa inteligência

irão se concentrar. Vemos, portanto, que a atenção está ligada às nossas

possibilidades de aprendizagem.

A atenção depende de nossa curiosidade pelas coisas, de nossos interesses,

de nossa capacidade de compreensão, das condições do ambiente e de nossas

capacidades de detectar estímulos e selecionar, entre muitos que estão

ocorrendo simultaneamente, aqueles que nos interessam.

Observamos pessoas, não são muitas, que são capazes de estar atentas a

diversas coisas ao mesmo tempo, conseguindo lidar adequadamente com

estímulos que chegam por todos os lados. São pessoas com um estado de

atenção bastante acentuado, sendo que poucas coisas lhes passam

despercebidas. Pessoas com um perfil desse tipo são vistas, em geral, como

hiperativas, ou melhor, como sendo capazes de fazer várias coisas ao mesmo

tempo, sem se perderem ou desorganizarem. Podemos dizer que são os

“hiperativos produtivos”, que nos surpreendem pela capacidade de dar conta de

tantas coisas simultaneamente. Não é fácil encontrar alguém assim.

Vemos, por outro lado, pessoas que apresentam uma capacidade de atenção

geral e que selecionam determinados acontecimentos que ocuparão o centro de

sua atividade mental, enquanto que outros fatos ficarão em um segundo plano,

ou seja, fora do campo de atuação principal da atenção em um determinado

momento. Esse talvez seja o perfil da maior parte das pessoas. Podemos

denominar este processo de atenção seletiva, isto é, a pessoa concentra-se em

um aspecto, e os demais se tornam secundários.

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Via de regra, a atenção dirigida àquilo que foi selecionado pode ser de alta

intensidade, ou seja, a pessoa pode estar muita atenta ao que está fazendo,

dando até mesmo a impressão, para quem vê de fora, de que ela está

desatenta, porque parece alheia a outros estímulos. Na realidade, precisamos

fazer uma distinção entre ser desatento, enquanto uma situação permanente, e

estar desatento, enquanto uma situação temporária e devida ao fato de que a

pessoa está mais presa a certos aspectos dentro de uma situação, não

valorizando os demais, pelo menos naquele momento. Nestes casos, não há um

problema de desatenção propriamente dito, mas sim uma atenção mais

seletiva, mais concentrada, que obscurece os outros acontecimentos ou

estímulos.

Encontramos, ainda, crianças que apresentam uma dificuldade geral de

atenção, ou seja, parece difícil, para elas, separar um estímulo do ambiente e

dirigir sua atividade mental para aquela. Quando conseguem prender sua

atenção em algo, isso ocorre de uma forma rápida, o que leva a uma

compreensão mais superficial do acontecimento, porque não permite uma

análise mais aprofundada. Não há tempo suficiente de concentração para

analisar com mais detalhes alguma coisa. Tudo se passa como se todos os

estímulos estivessem chamando a atenção ao mesmo tempo, como se

competissem entre si. Isso quer dizer que, embora muitos estímulos possam

estar chamando a atenção da criança ao mesmo tempo, em nenhum deles ela

consegue prender sua atenção. É como se o processo de detecção de estímulos

estivesse funcionando, mas sem um controle seletivo adequado. Como tudo

chama a atenção ao mesmo tempo, e como a criança não consegue prender o

foco de sua atenção em um estímulo mais específico, uma tendência de seu

comportamento pode ser no sentido da hiperatividade.

Assim sendo, uma série de ações podem estar sendo realizadas, mas sem

um objetivo específico e bem determinado. É como se a criança fizesse tudo,

sem fazer nada. A atenção volta-se para tudo, mas não se prende a coisa

alguma de uma maneira mais efetiva. A criança pega nas mãos um objeto que

chamou sua atenção, mas, antes mesmo de explorá-lo, já está caminhando na

direção de um outro objeto qualquer, como um aparelho de som, um

interruptor ou um barulho qualquer que ela ouve. Nesses casos, estamos

falando de uma “hiperatividade não-produtiva”. A criança em nada se concentra

por um tempo mais prolongado, tornando-se dispersiva. São crianças com esse

tipo de perfil, com dificuldades permanentes de atenção, que podem ser

caracterizadas como apresentando um real transtorno de atenção. Em geral,

essas crianças apresentam, em seu desenvolvimento, alguns problemas ligados

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à capacidade de adquirir linguagem, de aprendizagem e mesmo de

relacionamento social.

Comumente, tais transtornos de atenção não vêm sozinhos, podendo ser

sintoma de algum problema ligado ao desenvolvimento da criança. A atenção

está relacionada a uma série de fatores:

Depende de nossa capacidade para detectar estímulos e selecioná-los,

ou seja, para focarmos nossa atenção sobre um determinado assunto ou

aspecto do ambiente.

Depende de nossa capacidade de compreensão, isto é, quando estamos

frente a uma situação que não conseguimos entender, nossa atenção

tende a mudar de foco.

Depende de nossos interesses, ou seja, existem assuntos, objetos ou

acontecimentos que nos despertam mais interesses do que outros, o

que, obviamente, prende mais nossa atenção. Vemos algumas crianças,

por exemplo, que conhecem todos os modelos e marcas de automóveis.

Outros nunca estiveram atentos a isso, mas conhecem, por outro lado,

tudo sobre determinados animais e assim por diante.

A atenção também depende, e em muito, das condições ambientais.

Vivemos em um mundo altamente estimulante. Podemos até mesmo

afirmar que há uma espécie de superestimulação. Muitas coisas

acontecem ao mesmo tempo. O mundo está cheio de sons competindo

entre si (pessoas falando, TV ligada, rádio, ruídos da rua) assim como de

imagens (pessoas, quadros, objetos, TV, revistas) em um grau tão

elevado, que exige um esforço muito grande dos processos nervosos

responsáveis pela atenção. Por exemplo: é difícil para uma criança fazer

sua tarefa de casa em um ambiente com TV ligada, pessoas andando de

um lado para outro, falando, gritando, cantarolando, com o ruído que

vem da rua, com música ao seu lado e daí por diante.

O problema é como conseguir um estado de concentração com tanto

estímulo chegando ao mesmo tempo e sobrecarregando o sistema

responsável pela atenção. Fica difícil para a criança selecionar o estímulo

sobre o qual ela vai operar, quando muita coisa chama sua atenção ou é

de seu interesse: uma música que está sendo tocada, ou um assunto

que aparece na TV pode ser mais interessante do que a matéria da

escola que ela está estudando. Nesses casos, não estamos falando de

problemas de atenção. Estamos diante de situações externas que

dificultam o processo de atenção seletiva por um excesso de estímulos

competitivos. É claro que, no caso de crianças com problemas de

atenção, uma situação ambiental como essa agravaria ainda mais o seu

distúrbio. O nível de estímulos pode ser tão acentuado a ponto de

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provocar uma situação de desconforto e de adversidade para os

processos de atenção e concentração.

Os transtornos de atenção também não podem ser confundidos com

deficiências que atingem a audição e a visão. Por exemplo, uma criança que

apresenta um problema auditivo demonstrará uma dificuldade para perceber

sons, o que não significa que tenha um problema de atenção. Seu problema

está mais centrado em uma dificuldade para ouvir. Portanto, é comum que pais

refiram que seus filhos parecem não ouvir quando chamam, que são desatentos

quando solicitados para tomar banho, fazer lição, escovar dentes e outras

tarefas que, do ponto de vista deles, são abomináveis. Nessas situações, tendo

sido eliminada a possibilidade de déficit auditivo (que se manifesta numa série

de situações e que pode ser avaliado por exames específicos), podemos estar

frente a um “fazer de conta” que não ouviu, uma vez que a criança pode não

estar querendo interromper algo que prende seu interesse para fazer alguma

coisa não-desejada naquele momento. Por sua vez, uma criança com

deficiência visual terá dificuldades para detectar determinados estímulos que

fogem de sua capacidade visual. Isso também não é falta de atenção.

Crianças com reais problemas de atenção tendem a apresentar essas

dificuldades em todas as situações que estão vivendo. Têm dificuldades para se

concentrar, tendem a ser hiperativos, tudo chama a atenção ao mesmo tempo,

têm um curto tempo de exploração dos objetos, não sabem como explorar os

objetos de uma forma mais efetiva, têm dificuldades para jogar ou brincar com

pessoas da mesma idade e acompanhá-las em suas atividades e, em geral,

apresentam problemas associados de desenvolvimento, podendo envolver,

principalmente, a aquisição da linguagem e a aprendizagem. Quanto à escola,

tendem a manifestar problemas mais evidentes quando lidando com os

conceitos mais elaborados. Na época da alfabetização, eles parecem se

acentuar, uma vez que esse período corresponde a um processo complexo que

exige mais atenção, mais habilidades de linguagem e condições mais favoráveis

de aprendizagem.

É importante salientar que crianças pequenas, principalmente até os dois

anos de idade, tendem, em geral, a uma aparente hiperatividade. Isso significa

que muitas coisas as atraem ao mesmo tempo, que manipulam ou brincam com

seus brinquedos muito rapidamente, principalmente quando mais novas.

Porém, tal característica não significa, necessariamente, um problema de

atenção. O fato é que as crianças pequenas estão passando por um processo

de amadurecimento geral, sendo que, quanto mais se desenvolvem em todos

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os sentidos, mais elas se tornam aptas a aumentar o tempo de atenção e

manipulação de objetos. Elas começam a ficar mais tempo sentadas explorando

um mesmo brinquedo por um tempo mais prolongado. Parece que o brinquedo,

mesmo sendo velho, é cheio de novidades que atraem a criança. Portanto, a

tendência geral é a de crianças pequenas comportarem-se de modo mais

atuante motoramente, querendo mexer em tudo ao mesmo tempo. Quando se

aproximam do segundo ano de idade, podemos observá-las como que mais

atentas e introspectivas.

É também importante apontar que, se, por um lado, a atenção depende do

processo de maturação biológica da criança e de suas capacidades de ir

compreendendo melhor o mundo, depende também, por outro lado, de uma

atitude familiar no sentido de ajudar a criança a organizar sua atenção e

comportamento. Podemos apontar como de fundamental importância para a

obtenção dessa organização comportamental e atencional a colocação de

limites nítidos para a criança: algumas coisas podem ser feitas, outras não;

determinadas coisas podem ser exploradas, outras não. A criança deve saber

quais os objetos que ela pode manipular, explorar, que estão à disposição de

suas necessidades de manusear e aprender. Porém, deve também entender

que uma série de objetos ou de ações não são de sua alçada, por apresentarem

riscos para ela própria (como aparelhos elétricos), ou porque não são de uso

infantil, como é o caso de objetos mais delicados, por exemplo.

Tais limites, colocados de forma sistemática, tranquila, firme e com clareza,

ajudam de maneira muito eficiente as crianças a se organizarem e a focarem

sua atenção de modo seletivo, aprendendo a lidar com duas noções muito

importantes para o desenvolvimento geral: a noção do SIM e do NÃO. Esses

limites, na medida em que são internalizados pela criança, ajudam-na no

sentido de controlar a hiperatividade natural que apresentam e no sentido de

melhor dirigirem sua atenção. Dessa forma, ela pode estar recebendo uma

ajuda muito útil no sentido de melhor compreender o mundo das pessoas e das

coisas e, como resultado, adaptar-se à realidade de um modo mais produtivo

para seu desenvolvimento.

Zorzi, Jaime L. Aprendizagem e distúrbios da linguagem escrita. Porto Alegre: Artmed, 2003.

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Texto 3 – Um trio de respeito: Distração, Impulsividade e

Hiperatividade

Quando pensamos em TDA (Transtorno do Déficit de Atenção), não

devemos raciocinar como se estivéssemos diante de um cérebro “defeituoso”.

Devemos, sim, olhar sob o foco diferenciado, pois, na verdade, o cérebro do

TDA apresenta um funcionamento bastante peculiar, que acaba por lhe trazer

um comportamento típico, que pode ser responsável tanto por suas melhores

características como por suas maiores angústias e desacertos vitais.

O comportamento TDA nasce do que se chama trio de base alterada. É a

partir desse trio de sintomas – formado por alterações da atenção, da

impulsividade e da velocidade da atividade física e mental – que se irá

desvendar todo o universo TDA, que, muitas vezes, oscila entre o universo da

plenitude criativa e o da exaustão de um cérebro que não para nunca.

Por esse motivo, será feita agora uma análise minuciosa do trio de sintomas

que constitui a espinha dorsal do comportamento TDA:

ALTERAÇÃO DA ATENÇÃO: Este é, com certeza, o sintoma mais

importante no entendimento do comportamento TDA, uma vez que esta

alteração é condição sine qua non para se efetuar o diagnóstico. Uma pessoa

com comportamento TDA pode ou não apresentar hiperatividade física, mas

jamais deixará de apresentar forte tendência à dispersão.

Com o passar do tempo, o próprio TDA se irrita com seus lapsos de

dispersão, pois estes acabam gerando, além dos problemas de relacionamento

interpessoal, grande dificuldade de organização em todos os setores de sua

vida. Essa desorganização gera um gasto de tempo e de esforço muito maior

do que o necessário para realizar suas tarefas cotidianas.

É importante destacar que o termo transtorno do déficit de atenção não

traduz com precisão, ou mesmo com justiça, o que ocorre com a função da

atenção no TDA. Se por um lado o adulto e a criança TDAs têm profunda

dificuldade em se concentrar em determinado assunto ou enfrentar situações

que sejam obrigatórias, por outro lado podem se apresentar hiperconcentrados

em outros temas e atividades que lhe despertem interesse espontâneo ou

paixão impulsiva. Exemplos disso são as crianças com jogos eletrônicos ou

adultos com esportes, computadores ou leitura de assuntos específicos. Em tais

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casos, tanto as crianças como os adultos TDAs terão dificuldade em se desligar

ou desviar sua atenção para outras atividades.

Pelo que foi visto, o uso do termo “déficit de atenção” pode levar a um

entendimento incorreto da capacidade atentiva de um TDA e, por isso mesmo,

preferimos usar o termo “instabilidade de atenção”, que nos parece ser mais

correto que o termo déficit, já que este traz consigo somente a ideia pejorativa

de uma deficiência absoluta e imutável.

IMPULSIVIDADE: Antes de tudo, deve-se ter em mente que a palavra

impulso tem um significado próprio: 1) ação de impelir; 2) força com que se

impele; 3) estímulo, abalo; 4) ímpeto, impulsão.

Todas essas definições literais irão ajudar a entender a maneira pela qual o

TDA reage diante dos estímulos do mundo externo. Pequenas coisas são

capazes de lhe despertar grandes emoções, e as forças dessas emoções gera o

combustível aditivado de suas ações.

A mente de um TDA funciona como um receptor de alta sensibilidade que,

ao captar um pequeno sinal, reage automaticamente sem avaliar as

características do objeto gerador do estímulo. Um exemplo simples dessa

situação seria o caso de um caçador que, ao detectar um simples ruído na

floresta, põe em disparo uma AR-15, a fim de abater sua caça. Poucos minutos

após a rajada de tiros, descobre que a sua grande presa não passava de um

inofensivo tatu que apenas abrira um pequeno buraco no solo, com o intuito de

se abrigar.

Quanta energia em vão! Exagerado! – diria a maioria das pessoas. Mas, na

verdade, tudo não passou de um ato impulsivo, ou seja, disparou, depois

pensou.

Crianças costumam dizer o que lhes vem à cabeça, envolver-se em

brincadeiras perigosas, brincar de brigar com reações exageradas, e tudo isso

pode render-lhes rótulos desagradáveis como “mal-educada”, “má”, “grosseira”,

“agressiva”, “estraga-prazeres”, “egoísta”, “irresponsável”, “autodestrutiva” etc.

Nas crianças TDAs esses comportamentos são, além de mais intensos, mais

frequentes. E, é claro, isso será um dos fatores de grande influência na

formação de uma autoestima cheia de “buracos”. Todo TDA, na vida adulta,

apresentará problemas com sua autoestima, e este é o maior de todos os

desafios de seu tratamento: a reconstrução dessa função psíquica que, em

última análise, constitui o espelho da própria personalidade.

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Se o comportamento dos TDAs não for compreendido e bem administrado

por eles próprios e pelas pessoas com quem convivem, consequências no agir

poderão se manifestar sob diferentes formas de impulsividade, tais como:

agressividade, descontrole alimentar, uso de drogas, gastos demasiados,

compulsão por jogos, tagarelice incontrolável. Para eles tudo é MUITO. Muita

dor, muita alegria, muito prazer, muita fé, muito desespero. E, se pudermos

fazê-los ver a força poderosa que esse impulso pode ter, quando bem

direcionado na construção de uma existência que valha a eles quanto à

humanidade, teremos feito a nossa parte nesse processo.

HIPERATIVIDADE FÍSICA E MENTAL: É muito fácil identificar a

hiperatividade física de um TDA. Quando crianças, eles se mostram agitados,

movendo-se sem parar na sala de aula, em sua casa ou mesmo no playground.

Por vezes chegam a andar aos pulos, como seus passos fossem lentos demais

para acompanhar a energia contida nos músculos. Em ambientes fechados,

mexem em vários objetos ao mesmo tempo, derrubando grande parte deles no

ímpeto de checá-los simultaneamente. São crianças que costumam receber

designações pejorativas como: “bicho-carpinteiro”, “elétricas”,

“desengonçadas”, “pestinhas”, “diabinhos”, “desajeitadas”.

Já nos adultos, essa hiperatividade costuma se apresentar de forma menos

exuberante, o que fez, no passado, com que alguns estudiosos pensassem que

o TDA tendia a desaparecer com o término da adolescência. Hoje se sabe que

isso não é verdade. O que ocorre é uma adequação formal da hiperatividade à

fase adulta.

A hiperatividade mental ou psíquica apresenta-se de maneira mais sutil, o

que não significa, em hipótese alguma, que seja menos penosa que sua irmã

física. Ela pode ser entendida como um “chiado” cerebral, tal qual um motor de

automóvel desregulado que acaba por provocar um desgaste bastante

acentuado. É o adulto que interrompe a fala do outro o tempo todo, muda de

assunto antes que o seu interlocutor possa elaborar uma resposta e que não

dorme à noite porque seu cérebro fica tão agitado que não consegue se

desligar. A energia hiperativa de um TDA pode causar-lhe incômodos

cotidianos, principalmente se ele precisar se adequar ao ritmo não tão elétrico

dos não TDAs.

Silva, Ana Beatriz B. Mentes Inquietas – RJ: Objetiva, 2009

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Texto 4 – A ciência finalmente no rumo certo do entendimento de um

cérebro TDA...

O transtorno do déficit de atenção (TDA) deriva de um funcionamento

alterado no sistema neurobiológico cerebral. Isso significa que substâncias

químicas produzidas pelo cérebro, chamadas neurotransmissores, apresentam-

se alteradas quantitativa e/ou qualitativamente no interior dos sistemas

cerebrais, que são responsáveis pelas funções da atenção, impulsividade e

atividade física e mental no comportamento humano. Trata-se de uma

disfunção, e não de uma lesão, como anteriormente se pensava.

O cérebro de um TDA, em forma e aparência, em nada difere dos cérebros

que não apresentam um funcionamento TDA; a diferença está no íntimo dos

circuitos cerebrais que são movidos e organizados pelos neurotransmissores,

que seriam os combustíveis que alimentam, modulam e fazem funcionar todas

as funções cerebrais. Assim, os neurotransmissores seriam a gasolina dos

carros, as quedas-d’água que geram a energia das grandes hidrelétricas ou

mesmo a energia atômica das usinas nucleares.

A compreensão do componente neurobiológico no funcionamento do

transtorno do déficit de atenção foi revolucionária para o tratamento do

problema, uma vez que mudou a forma de pensar sobre todo o processo vital

de seus portadores. Essa nova visão tornou-se unanimidade na comunidade

médica na década de 90 e foi o pilar gerador da eficiência que os tratamentos

medicamentosos alcançaram na melhoria da qualidade de vida dos TDAs. É

claro que um longo caminho de pesquisas ainda deve ser percorrido, tendo em

vista que o mecanismo exato que rege o comportamento TDA ainda não é

totalmente compreendido. Tem-se a ponta do iceberg e isto se deve à enorme

complexidade dos sistemas cerebrais, em especial o sistema atentivo, que é o

principal responsável pelo estado de consciência humana. A existência se traduz

na capacidade do ser humano de atentar para si mesmo (como indivíduo único)

e para todo mundo ao seu redor. E, na verdade, esta é a essência da vida

humana: relacionar-se consigo mesmo e com os outros, sem perder a

individualidade e, simultaneamente, contribuir com o todo universal.

Os passos no sentido de definir a anatomia e a bioquímica dos cérebros

TDAs foram de gigante, em termos científicos. Cada um deles forneceu a

certeza de que esse transtorno não é uma simples incapacidade moral para se

comportar, se interessar pelo mundo ao seu redor, ou ainda uma falta de

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vontade de acertar-se profissional, afetiva ou socialmente. Isso tira da fronteira

da “marginalidade social” (daqueles que estão à margem da sociedade)

milhares de pessoas que, se pudessem ser tratadas, orientadas e organizadas,

poderiam estar desempenhando suas potencialidades ou mesmo seus talentos

especiais, contribuindo assim, para uma sociedade mais aprazível de se viver.

“No longo caminho entre a arrumação genética e a entrada na escola,

milhares de coisas podem dar errado no cérebro de um indivíduo”

(Arnold,1995).

Tal afirmação traduz bem a longa história da ciência, rumo ao entendimento de

como funciona um cérebro TDA e seus muitos fatores causais. Onde essa

história se iniciou não se sabe dizer; no entanto, a mudança no “foco” da

questão possibilitou retirar o TDA da esfera moralista e punitiva e levá-lo para

uma esfera científica e passível de tratamento. E isso é o que realmente

importa.

Os diversos fatores causais que estão envolvidos no funcionamento do

cérebro TDA são:

Fatores genéticos

Todos os estudos científicos indicam que fatores genéticos desempenham

importante papel na gênese do transtorno do déficit de atenção. Isso é

constatado por estudos epidemiológicos que mostraram uma maior incidência

do problema entre parentes de crianças não TDAs. Se bem que, até o

momento, não se dispõe de mecanismos que possam determinar a

probabilidade estatística exata de adultos com TDA terem filhos com este

mesmo funcionamento mental. Deve-se, nesse caso, afirmar que o transtorno

possui um caráter hereditário, sem um grau de probabilidade determinado.

Estudos realizados em gêmeos idênticos, ou seja, que possuem o mesmo

material genético, apresentaram concordância na faixa de 50%. Isso nos faz

pensar que o fator hereditário (genético) é importante, mas não o único na

manifestação do comportamento TDA, pois, se assim fosse, a concordância

entre gêmeos idênticos deveria ser de 100%.

Alterações estruturais e funcionais no TDA

Os indícios mais fortes de que o transtorno do déficit de atenção apresenta

uma alteração na estrutura cerebral de seus portadores vêm dos inúmeros

estudos realizados por meio de exames de neuroimagem. Essa categoria de

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exames visa obter imagens que mostrem o funcionamento do cérebro e não só

sua imagem estática. Dentre eles, podemos citar o PET (Tomografia por

Emissão de Pósitrons) e o SPECT (Tomografia por Emissão de Fóton Único);

ambos podem visualizar tanto a estrutura como a atividade das regiões

cerebrais em determinado momento.

As conclusões desses estudos foram unânimes em descrever uma

hipoperfusão cerebral localizada mais significativamente na região pré-frontal e

pré-motora do cérebro. Essa hipoperfusão significa que a região frontal, nas

pessoas com TDA, recebe um menor aporte sanguíneo do que deveria e, como

consequência, há uma diminuição do metabolismo nesta área, que, ao receber

menos glicose (oriunda do sangue), terá menos energia e funcionará com seu

desempenho reduzido. Se nos lembrarmos de que o lobo frontal é o principal

responsável pela ação reguladora do comportamento do ser humano, podemos

avaliar que o seu hipofuncionamento está diretamente ligado às alterações

funcionais apresentadas no transtorno do déficit de atenção. A forma como o

lobo frontal regula o comportamento ocorre pelo exercício das seguintes

funções:

Fazer manutenção dos impulsos sob controle

Planejar ações futuras

Regular o estado de vigília

“Filtrar” estímulos irrelevantes, que são responsáveis por nossa distração

Acionar as reações de luta e fuga

Estabelecer conexão direta com o sistema límbico (centro das emoções),

com o centro da fome e da sede

Regular a sexualidade, o grau de disposição física e mental e muitos

outros impulsos de aspecto fisiológico

Em última análise, conclui-se que a ação reguladora do comportamento

humano é feita pelo lobo frontal, que exerce uma série de funções de caráter

inibitório, cabendo a ele puxar o freio de mão do cérebro humano no que diz

respeito aos seus pensamentos, impulsos e velocidade de suas atividades físicas

e mentais. E é justamente isso que falha no cérebro do TDA, seu filtro ou freio

perde eficácia reguladora por receber menos glicose, sua fonte maior de

energia, em função da já citada hipoperfusão sanguínea da região frontal. Sem

“freio”, o cérebro TDA terá uma atividade muito mais intensa, será

bombardeado por uma tempestade de pensamentos e impulsos numa

velocidade muito acima da média. Isso irá ocasionar uma grande

desorganização interna que, muitas vezes, encobrirá potencialidades, aptidões,

talentos e muita inteligência, num grande emaranhado mental.

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Foi visto até aqui que a sede estrutural do transtorno do déficit de atenção

está localizada no lobo frontal; no entanto não se pode esquecer que não existe

um compartimento estanque na organização cerebral. Todas as regiões

interligam-se, formando uma grande rede de informações que constitui a base

do comportamento humano. Essas informações são passadas de neurônio a

neurônio, de regiões a regiões, pelos neurotransmissores que irão determinar a

ativação ou a inibição destas, modulando, assim, o agir dos indivíduos.

No caso específico do transtorno do déficit de atenção, os

neurotransmissores mais participativos, nesse processo de desregulagem no

funcionamento do lobo frontal, seriam as catecolaminas, que incluem a

noradrenalina e a dopamina. Em 1970, C. Kornetsky descreveu sua hipótese

das catecolaminas na tentativa de explicar os sintomas do TDA. Sua hipótese

foi postulada a partir da observação clínica de que estimulantes como a

Ritalina® e algumas anfetaminas produziam grande efeito terapêutico em

portadores de TDA. Partindo do conhecimento científico de que esses

estimulantes aumentam a quantidade dos neurotransmissores noradrenalina e

dopamina, Kornetsky passou a acreditar que o funcionamento TDA seria, talvez,

consequência de uma baixa produção ou uma subutilização desses

neurotransmissores. Essa hipótese continua sendo bastante defendida nos dias

atuais, mesmo que muitos estudos recentes apontem para a participação de

outros neurotransmissores no funcionamento bioquímico do cérebro TDA. A

serotonina, “estrela” na bioquímica da depressão, parece ter seu papel de

coadjuvante nessa dança tão complexa que ocorre nos cérebros de pessoas

com TDA. Só o tempo poderá nos dizer, com suas verdades inevitáveis, o papel

de cada neurotransmissor nessa orquestra TDA. Entretanto, os “sinais” de que

se dispõe hoje dão a certeza de que os sistemas neuroquímicos (da química

cerebral) encontram-se alterados nas pessoas com TDA, a nisto reside a origem

do problema.

Fatores ambientais (externos)

Além da hipótese genética, a ocorrência do TDA está muitas vezes

correlacionada a complicações durante a gravidez e no parto, inclusive com

relatos de traumatismos neonatais. Nesse aspecto, as alterações encontradas

nos sistemas dopaminérgicos, serotoninérgicos e outros eventuais

neurotransmissores não seriam provocadas por registros individuais herdados

de seus antepassados (origem genética), e sim por acidentes ocorridos durante

o período gestacional ou posterior a este. Como exemplo dessa situação,

podemos citar:

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Hipóxia (privação de oxigenação suficiente) pré e pós-natal

Traumas obstétricos

Rubéola intrauterina e outras infecções

Encefalite e meningite pós-natal

Traumatismo cranioencefálico (TCE)

Deficiência nutricional

Exposição a toxinas

Corroborando os fatores externos no surgimento do comportamento TDA,

encontram-se inúmeros trabalhos que estabelecem uma correlação bastante

significativa entre crianças que têm peso corporal muito abaixo ao nascerem e

uma probabilidade maior de apresentarem na idade adulta dificuldades

atentivas e comportamentais bem marcadas.

Visão multifatorial

Como se pôde observar, o conhecimento sobre a origem do TDA ainda é

limitado. Por essa razão, deve-se ter a humildade de saber que a chave que

abre o funcionamento TDA – e que talvez não seja a única – pode ser uma

ferramenta capaz de abrir várias portas e deixar passar conteúdos distintos

que, “misturados” em proporções individualizadas, permitam a formação dos

diversos comportamentos TDAs.

Essa visão parece-nos apropriada, uma vez que nenhuma hipótese sobre a

origem do funcionamento TDA mostrou-se, por si só, capaz de explicar todos os

casos do transtorno. Destaca-se ainda o fato de que o estresse provocado por

ambientes desestruturados, ou mesmo o aumento de demandas no

desempenho pessoal ou social, pode exacerbar em grande escala os sintomas

do TDA. Assim também, fatores estressantes somados podem alterar a

bioquímica de um cérebro geneticamente predisposto e levá-lo a manifestar

comportamentos semelhantes ao de uma pessoa TDA.

Essa compreensão abre a possibilidade de se identificar e,

consequentemente, ajudar pessoas com comportamento equivalente ao TDA,

sem história genética positiva. Com isso se pode compreender que a genética

não é uma fatalidade, mas sim uma probabilidade, de fato, das mais

importantes. No entanto, sua manifestação sofre influências externas, que

poderão contribuir para que esta seja favorável ou desfavorável à vida do

indivíduo.

Silva, Ana Beatriz B. Mentes Inquietas: TDAH. RJ: Objetiva, 2009.

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Texto 5 – Critérios Diagnósticos para Transtornos de

DéficitAtenção/Hiperatividade

A. Ou (1) ou (2)

(1) Seis (ou mais) dos seguintes sintomas de desatenção persistiram por pelo

menos seis meses em grau mal adaptativo e inconsistente com o nível de

desenvolvimento:

Desatenção:

(a) Frequentemente não presta atenção a detalhes ou comete erros por

omissão em atividades escolares, de trabalho ou outras

(b) Com frequência tem dificuldades para manter a atenção em tarefas ou

atividades lúdicas

(c) Com frequência parece não ouvir quando lhe dirigem a palavra

(d) Com frequência não segue instruções e não termina seus deveres

escolares, tarefas domésticas ou deveres profissionais (não devido a

comportamento de oposição ou incapacidade de compreender instruções)

(e) Com frequência tem dificuldades para organizar tarefas e atividades

(f) Com frequência evita, demonstra ojeriza ou reluta em envolver-se em

tarefas que exijam esforço mental constante (como tarefas escolares ou

deveres de casa)

(g) Com frequência perde coisas necessárias para tarefas ou atividades (p. ex.,

brinquedos, tarefas escolares, lápis, livros ou outros materiais)

(h) É facilmente distraído por estímulos alheios à tarefa

(i) Com frequência apresenta esquecimento em atividades diárias

(2) Seis (ou mais) dos seguintes sintomas de hiperatividade persistiram por pelo

menos 6 meses, em grau mal adaptativo e inconsistente com o nível de

desenvolvimento:

Hiperatividade:

(a) Frequentemente agita as mãos ou os pés ou se remexe na cadeira

(b) Frequentemente abandona sua cadeira na sala de aula ou outras situações

nas quais se espera que permaneça sentado

(c) Frequentemente corre ou escala em demasia, em situações impróprias

(em adolescentes e adultos, pode estar limitado a sensações subjetivas de

inquietação)

(d) Com frequência tem dificuldade para brincar ou se envolver

silenciosamente em atividade de lazer

(e) Está frequentemente “a mil” ou muitas vezes age como se estivesse “a

todo vapor”

(f) Frequentemente fala em demasia

Impulsividade:

(g) Frequentemente dá respostas precipitadas antes das perguntas terem sido

completamente formuladas

(h) Com frequência tem dificuldade para aguardar a vez

(i) Frequentemente interrompe ou se intromete em assuntos alheios (p. ex.,

em conversas ou brincadeiras)

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B. Alguns sintomas de hiperatividade-impulsividade ou desatenção causadores de

comprometimento estavam presentes antes dos sete anos de idade.

C. Algum comprometimento causado pelos sintomas está presente em dois ou mais

contextos (p. ex., na escola, ou no trabalho e em casa).

D. Deve haver claras evidências de um comprometimento clinicamente importante no

funcionamento social, acadêmico ou ocupacional.

E. Os sintomas não ocorrem exclusivamente durante o curso de um Transtorno Global do

Desenvolvimento, Esquizofrenia ou outro Transtorno Psicótico, nem são melhores

explicados por outro transtorno mental (p. ex., Transtorno do Humor, Transtorno de

Ansiedade, Transtorno Dissociativo ou um Transtorno da Personalidade).

Codificar com base no tipo:

314.01 Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, Tipo Combinado: se tanto o

Critério A1 quanto o Critério A2 são satisfeitos durante os últimos 6 meses.

314.00 Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, Tipo Predominantemente

Desatento: se o Critério A1 é satisfeito, mas o Critério A2 não é satisfeito durante os

últimos 6 meses.

314.01 Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, Tipo Predominantemente

Hiperativo-Impulsivo: se o Critério A2 é satisfeito, mas o critério A1 não é satisfeito

durante os últimos 6 meses.

Nota para codificação: Para indivíduos (em especial adolescentes e adultos) que

atualmente apresentam sintomas que não mais satisfazem todos os critérios, especificar

“Em remissão parcial”.

Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais – DSM IV

DSM-IV

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Texto 6 – O que mudou no diagnóstico do TDAH – DSM-V

O que mudou no diagnóstico do TDAH com a nova edição do DSM-V, o Manual de Estatística

e Diagnóstico de Transtornos Mentais

Escrito pelo Prof. Dr. Paulo Mattos

Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro

Mestre e Doutor em Psiquiatria e Saúde Mental

Pós-doutor em Bioquímica

Presidente do Conselho Científico da ABDA

Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro

Mestre e Doutor em Psiquiatria e Saúde Mental

Pós-doutor em Bioquímica

Presidente do Conselho Científico da ABDA

O chamado “DSM”, Manual de Estatística e Diagnóstico da Associação Americana de

Psiquiatra, teve a sua quinta edição lançada no congresso de psiquiatria, ocorrido em São

Francisco, em maio de 2013.

O seu planejamento começou muitos anos antes, em 1999, quando uma série de colaborações

delineou as questões que precisavam ser mais bem esclarecidas na então vigente quarta

edição, DSM-IV, sempre através de pesquisas científicas. Uma segunda fase, entre 2003 e

2008, compreendeu 13 conferências internacionais com os maiores especialistas de cada uma

das diferentes áreas (transtornos infantis, transtornos de ansiedade, dependência de drogas,

doenças degenerativas, etc.), incluindo o TDAH. A confecção do DSM-V envolveu os chamados

Grupos de Trabalho, Grupos de Estudo e as chamadas Forças-Tarefa, a quem coube a maior

parte da revisão dos critérios diagnósticos que constituem o manual. Parte do trabalho

realizado por todos estes pesquisadores será utilizada na confecção da CID-11, a futura versão

da Classificação Internacional de Doenças proposta pela Organização Mundial da Saúde (OMS),

que é a referência oficial para diagnósticos na maioria dos países do mundo, incluindo o Brasil.

O Professor Luis Rohde, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, fez parte da equipe

responsável pelo TDAH. Cerca de 300 consultores internacionais foram ouvidos, além de

milhares de comentários postados no site por médicos especialistas e não especialistas,

pacientes e familiares, além das associações de pacientes.

Alguns diagnósticos psiquiátricos pouco ou nada mudaram na quinta edição, outros se

modificaram de modo significativo; alguns diagnósticos novos foram propostos e outros foram

abandonados. No caso do TDAH, foram poucas as modificações.

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A lista de 18 sintomas, sendo 9 de desatenção, 6 de hiperatividade e 3 de impulsividade (este

dois últimos computados conjuntamente) permaneceu a mesma que na edição anterior. O

ponto-de-corte para o diagnóstico, isto é, o número de sintomas acima do qual se faz o

diagnóstico, também permaneceu o mesmo (6 sintomas de desatenção e/ou 6 sintomas de

hiperatividade-impulsividade). No caso de adultos, este número passou para 5 sintomas, o que

é um novo critério. A lista de sintomas de desatenção e hiperatividade-impulsividade

compreende o critério A. Todos estes sintomas, para serem considerados clinicamente

significativos, devem estar presentes pelo menos durante 6 meses e serem nitidamente

inconsistentes com a idade do indivíduo (ou seja, ser muito mais desatento ou inquieto do que

o esperado para uma determinada idade).

A necessidade de haver comprometimento em pelo menos duas áreas diferentes (casa e

escola, por exemplo), critério C, permaneceu como antes. A necessidade de haver claro

comprometimento na vida acadêmica, social, profissional, etc. (critério D), também

permaneceu idêntica.

O critério E se modificou em relação à DSM-IV. Antes, não era possível fazer o diagnóstico de

TDAH caso houvesse um quadro de Autismo, o que agora é possível. Entretanto, permanecem

as exigências de os sintomas não ocorrerem exclusivamente durante outro quadro

(esquizofrenia, por exemplo) e não serem mais bem explicados por outro transtorno

(ansiedade e depressão, por exemplos).

O critério B, que determina a idade de início dos sintomas, também se modificou.

Anteriormente, era necessário demonstrar que os sintomas estivessem presentes antes dos 7

anos de idade, o que era particularmente difícil no caso de adultos com TDAH que geralmente

tem dificuldade para lembrar-se deste período e cujos pais já são mais velhos. O limite de

idade foi modificado para 12 anos, algo que alguns grupos de pesquisa já vinham fazendo

anteriormente.

Os “subtipos” foram retirados do manual; ao invés disso, optou-se pelo emprego do termo

“apresentação”, denotando que o perfil de sintomas atuais pode se modificar com o tempo (o

que é bastante comum). O termo “subtipo” favorecia uma interpretação errada que aquela era

uma “subcategoria” estável, fixa, do TDAH. As apresentações mantem as mesmas “divisões”

que os antigos subtipos: com predomínio de desatenção, com predomínio de hiperatividade-

impulsividade e apresentação combinada.

O novo DSM-V traz a opção de TDAH com Remissão Parcial, que deve ser empregado naqueles

casos onde houve diagnóstico pleno de TDAH anteriormente (isto é, de acordo com todos os

critérios), porém com um menor número de sintomas atuais.

Uma última novidade desta quinta edição é a possibilidade de se classificar o TDAH em Leve,

Moderado e Grave, de acordo com o grau de comprometimento que os sintomas causam na

vida do indivíduo.

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A DSM-V recebeu algumas críticas por parte da imprensa e de alguns pesquisadores, porém

nenhuma das críticas apresentadas com relação ao diagnóstico de TDAH foi fundamentada em

resultado de pesquisa científica, mas sim em meras “opiniões pessoais”, algo que é

obviamente inaceitável nos tempos modernos. Cabe ressaltar que o uso do DSM-V tem como

maior benefício padronizar diagnósticos clínicos (mesmo que de modo imperfeito), diminuindo

a variabilidade que ocorreria caso cada pesquisador tivesse sua “opinião pessoal” sobre o

assunto. Não seria possível, por exemplo, comparar os resultados de um tratamento realizado

por uma equipe X com aqueles realizados por outra equipe Y, se cada uma delas chamar de

“TDAH” um quadro clínico muito diferente. Por fim, é importante dizer que os critérios do

sistema DSM-V devem ser investigados por um profissional com experiência clínica. Por

motivos óbvios, não é possível fazer um diagnóstico definitivo conhecendo apenas a lista de

sintomas que caracteriza uma determinada doença.

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