Textos Para o Nivelamento

1
SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL INSTITUTO FEDERAL DE ALAGOAS CAMPUS MACEIÓ DIRETORIA DE ENSINO COORDENAÇÃO DE LICENCIATURA EM LETRAS TEXTO 1 História de flor Carlos Drummond de Andrade Furtei uma flor daquele jardim. O porteiro do edifício cochilava, e eu furtei a flor. Trouxe-a para casa e a coloquei num copo. Logo senti que ela não estava feliz. O copo destina-se a beber, e uma flor não é para ser bebida. Passei-a para um vaso e notei que ela me agradecia revelando melhor sua delicada composição. Quantas novidades há numa flor, se a contemplarmos bem. Sendo o autor do furto, eu assumia a obrigação de conservá-la. Renovei a água do vaso, mas a flor empalidecia. Temi por sua vida. Não adiantava restituí-la ao jardim. Nem apelar para o médico de flores. Eu a furtara, eu a via morrer. Já murcha e com a cor particular da morte, peguei-a docemente e fui depositá-la no jardim onde nascera. O porteiro estava atento e repreendeu-me: – Que ideia a sua, de vir jogar lixo neste jardim! TEXTO 2 E aquilo se foi constituindo numa grande lavanderia, agitada e barulhenta, com as suas cercas de varas, as suas hortaliças verdejantes e os seus jardinzinhos de três e quatro palmos, que apareciam como manchas alegres por entre a negrura das limosas tinas transbordantes e o revérbero das claras barracas de algodão cru, armadas sobre os lustrosos bancos de lavar. E os gotejantes jiraus, cobertos de roupa molhada, cintilavam ao sol, que nem lagos de metal branco. E naquela terra encharcada e fumegante, naquela umidade quente e lodosa, começou a minhocar, a esfervilhar, a crescer, um mundo, uma coisa viva, uma geração, que parecia brotar espontânea, ali mesmo, daquele lameiro, e multiplicar-se como larvas no esterco. (Aluísio Azevedo. O Cortiço. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 20)

description

para aulas de nivelamento

Transcript of Textos Para o Nivelamento

Page 1: Textos Para o Nivelamento

SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL

INSTITUTO FEDERAL DE ALAGOAS CAMPUS MACEIÓ

DIRETORIA DE ENSINO COORDENAÇÃO DE LICENCIATURA EM LETRAS

TEXTO 1

História de flor

Carlos Drummond de Andrade

Furtei uma flor daquele jardim. O porteiro do edifício cochilava, e eu furtei a flor.

Trouxe-a para casa e a coloquei num copo. Logo senti que ela não estava feliz. O copo

destina-se a beber, e uma flor não é para ser bebida.

Passei-a para um vaso e notei que ela me agradecia revelando melhor sua delicada

composição. Quantas novidades há numa flor, se a contemplarmos bem.

Sendo o autor do furto, eu assumia a obrigação de conservá-la. Renovei a água do

vaso, mas a flor empalidecia. Temi por sua vida. Não adiantava restituí-la ao jardim. Nem

apelar para o médico de flores. Eu a furtara, eu a via morrer.

Já murcha e com a cor particular da morte, peguei-a docemente e fui depositá-la no

jardim onde nascera. O porteiro estava atento e repreendeu-me:

– Que ideia a sua, de vir jogar lixo neste jardim!

TEXTO 2

E aquilo se foi constituindo numa grande lavanderia, agitada e barulhenta, com as suas

cercas de varas, as suas hortaliças verdejantes e os seus jardinzinhos de três e quatro palmos,

que apareciam como manchas alegres por entre a negrura das limosas tinas transbordantes e o

revérbero das claras barracas de algodão cru, armadas sobre os lustrosos bancos de lavar. E os

gotejantes jiraus, cobertos de roupa molhada, cintilavam ao sol, que nem lagos de metal

branco.

E naquela terra encharcada e fumegante, naquela umidade quente e lodosa, começou a

minhocar, a esfervilhar, a crescer, um mundo, uma coisa viva, uma geração, que parecia

brotar espontânea, ali mesmo, daquele lameiro, e multiplicar-se como larvas no esterco.

(Aluísio Azevedo. O Cortiço. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 20)