Éticas e princípios de planejamento da permacultura · permacultura Organizado por Arthur Nanni -...

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Éticas e princípios de planejamento da permacultura Organizado por Arthur Nanni - texto original de Santos ( 2 015) e trechos traduzidos de Holmgren (2007) Na permacultura o planejamento é realizado a partir de uma base conceitual fundamentada em três éticas e doze princípios de planejamento. Essa base foi constantemente reconstruída ao longo da história da permacultura, inspirada em exemplos de comunidades pré-industriais e iniciativas e experiências de permacultores que já se compreendem em uma era pós- industrial. As éticas e os princípios de planejamento se constituem na base, para o que na permacultura é compreendido como o processo mais cartesiano adotado, o método de planejamento do espaço, que tem como premissa priorizar bons fluxos energéticos na paisagem a ser manejada. Éticas Holmgren (2013), coloca que as éticas da permacultura são fruto de pesquisas feitas sobre comunidades que viveram um longo tempo em equilíbrio com o seu ambiente. Isso não nega a importância do conhecimento adquirido pela humanidade na modernidade. Porém, para a transição para um futuro mais sustentável de baixa energia, necessitamos considerar também os valores e conceitos fora da norma civilizatória atual. Com isso, às três éticas fornecem o embasamento principal para qualquer reflexão ou ação em permacultura são: 1. O cuidado com a Terra – que atenta para um olhar holístico da existência da vida no Planeta na totalidade, onde todos os seres e todos os elementos são importantes e interdependentes. Remete a olhar o planeta em sua totalidade como local de habitação. “Significa cuidar da casa, do lugar, do território, como entendido pelas culturas primitivas e, mais recentemente, pelo conceito de biorregionalismo” (HOLMGREN, 2013, p.59). 2. O cuidado com as pessoas – é necessário cuidarmos da nossa saúde física e mental e dos que estão ao nosso redor. “Os limites para as melhorias materiais são tanto estruturais e internos a nós mesmos, bem como externos, políticos e ambientais” (HOLMGREN, 2013, p.59). Na visão da permacultura é necessário analisar-se e analisar as pessoas ao redor e refletir o que de fato traz bem-estar a elas. No modelo dominante de produção atual, temos o poder de compra como indicador de bem-estar social. A permacultura propõe que as pessoas e grupos reflitam o que de fato elas precisam para ter uma vida saudável, tanto no nível físico quanto no emocional e que reanalisem a questão do consumo e do desejo de consumir. 3. Cuidar do futuro – as produções dentro da permacultura tendem muitas vezes a serem abundantes, mas a ideia não é acumular e sim compartilhar e trocar para que cada vez mais pessoas possam ter acesso. Passando pela reflexão ética que envolve os dois primeiros conceitos, a redução e limitação de consumo e o compartilhamento de excedentes vêm como uma espécie de resultado. “Ao pensar sobre o que é suficiente, devemos considerar as necessidades e os desejos que impelem o ganho material e também a capacidade da terra e das pessoas de suprir aquelas necessidades e vontades” (HOLMGREN, 2013, p.61). Quanto maior a acumulação de um lado, maior a escassez de outro. Quanto maior a partilha de excedentes, maior igualdade social e equilíbrio ecológico. Nesse contexto, considera-se excedente não somente as produções, mas também o tempo. Visto que na permacultura a

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Éticas e princípios de planejamento dapermacultura

Organizado por Arthur Nanni - texto original de Santos (2015)e trechos traduzidos de Holmgren (2007)

Na permacultura o planejamento érealizado a partir de uma base conceitualfundamentada em três éticas e dozeprincípios de planejamento. Essa base foiconstantemente reconstruída ao longo dahistória da permacultura, inspirada emexemplos de comunidades pré-industriais einiciativas e experiências de permacultoresque já se compreendem em uma era pós-industrial.

As éticas e os princípios deplanejamento se constituem na base, para oque na permacultura é compreendido como oprocesso mais cartesiano adotado, o métodode planejamento do espaço, que tem comopremissa priorizar bons fluxos energéticos napaisagem a ser manejada.

Éticas Holmgren (2013), coloca que as éticas

da permacultura são fruto de pesquisas feitassobre comunidades que viveram um longotempo em equilíbrio com o seu ambiente. Issonão nega a importância do conhecimentoadquirido pela humanidade na modernidade.Porém, para a transição para um futuro maissustentável de baixa energia, necessitamosconsiderar também os valores e conceitosfora da norma civilizatória atual. Com isso, àstrês éticas fornecem o embasamento principalpara qualquer reflexão ou ação empermacultura são:

1. O cuidado com a Terra – que atentapara um olhar holístico da existênciada vida no Planeta na totalidade, ondetodos os seres e todos os elementossão importantes e interdependentes.Remete a olhar o planeta em suatotalidade como local de habitação.“Significa cuidar da casa, do lugar, doterritório, como entendido pelasculturas primitivas e, maisrecentemente, pelo conceito debiorregionalismo” (HOLMGREN, 2013,p.59).

2. O cuidado com as pessoas – énecessário cuidarmos da nossa saúdefísica e mental e dos que estão aonosso redor. “Os limites para asmelhorias materiais são tantoestruturais e internos a nós mesmos,bem como externos, políticos eambientais” (HOLMGREN, 2013,p.59). Na visão da permacultura énecessário analisar-se e analisar aspessoas ao redor e refletir o que defato traz bem-estar a elas. No modelodominante de produção atual, temos opoder de compra como indicador debem-estar social. A permaculturapropõe que as pessoas e gruposreflitam o que de fato elas precisampara ter uma vida saudável, tanto nonível físico quanto no emocional e quereanalisem a questão do consumo edo desejo de consumir.

3. Cuidar do futuro – as produçõesdentro da permacultura tendem muitasvezes a serem abundantes, mas aideia não é acumular e simcompartilhar e trocar para que cadavez mais pessoas possam ter acesso.Passando pela reflexão ética queenvolve os dois primeiros conceitos, aredução e limitação de consumo e ocompartilhamento de excedentes vêmcomo uma espécie de resultado. “Aopensar sobre o que é suficiente,devemos considerar as necessidadese os desejos que impelem o ganhomaterial e também a capacidade daterra e das pessoas de suprir aquelasnecessidades e vontades”(HOLMGREN, 2013, p.61). Quantomaior a acumulação de um lado, maiora escassez de outro. Quanto maior apartilha de excedentes, maiorigualdade social e equilíbrio ecológico.

Nesse contexto, considera-seexcedente não somente as produções, mastambém o tempo. Visto que na permacultura a

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ideia é de que o trabalho braçal seja o mínimopossível, para que se tenha tempo dedesenvolver outros tipos de trabalho eatividades. Holmgren, (2013, p.63) mencionaque em muitas sociedades agrícolas, o plantiode árvores e floretas valiosas e de vida longatem sido uma maneira tradicional deredistribuir tempo e recursos excedentes parao benefício das gerações futuras e do próprioplaneta. Mais nitidamente, sobretudo se oplantio for de frutíferas e árvores paraextração de madeira.

Princípios de planejamentoEm seguida são apresentados os doze

princípios de planejamento, que devemsempre estar em concordância com as éticas.Por isso, ficam situados na área central astrês éticas e, ao redor, os doze princípios deplanejamento, o que sugere que os últimossão guiados pelas éticas.

Os doze princípios de planejamentopermacultural foram desenvolvidos ao longode mais de duas décadas e publicados em2002 por David Holmgren através do livro“permacultura: princípios e caminhos além dasustentabilidade”, publicado em português noBrasil em 2013.

Segundo Holmgren (2013, p.12),

Os primeiros seis princípiosconsideram os sistemas de produçãosob uma perspectiva de baixo paracima dos elementos, organismos epessoas. Os demais seis enfatizam aperspectiva de cima para baixo dospadrões e relações que tendem aemergir por meio da auto-organizaçãoe coevolução dos ecossistemas.

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1. Observe e interaja“A beleza está nos olhos do observador”

O bom planejamento do espaçodepende de uma relação livre e harmônicaentre a natureza e as pessoas, na qual aobservação cuidadosa e interação atentaproporcionam a inspiração do planejamento,repertórios e padrões. Não é algo geradoisoladamente, mas através de uma interaçãocontínua e recíproca com o objeto deobservação.

A permacultura utiliza essas condiçõespara desenvolver, de maneira consciente econtínua, sistemas de uso da terra e de vidaque possam sustentar as pessoas em umfuturo onde a energia será decrescente emrelação aos dias atuais, pois não poderemoscontar com fontes não-renováveis como opetróleo.

Em sociedades de caçadores-coletorese em sociedades agrícolas cuja a produçãoera voltada ao consumo próprio, o ambientenatural atendia plenamente as demandas deconsumo da espécie humana e das demais.Essa realidade mudou quando a densidadepopulacional aumentou, exigindo uma maiorprodutividade agrícola que ocasionougrandes e constantes aportes de mão-de-obra. Atualmente, a sociedade industrialdepende de grandes e contínuos aportes deenergia proveniente de combustíveis fósseispara prover seus alimentos e outros bens eserviços.

Permacultores se utilizam de umaobservação cuidadosa e interação atenta

para fazer uso mais efetivo das capacidadeshumanas e reduzir a dependência de altatecnologia e de energias não-renováveis.Assim, deve-se observar o sistema como umtodo – de cima para baixo, relacionando ainterdependência dos objetos. A interaçãodeve se dar de baixo para cima – focandopontos que podem influenciar na mudançado sistema como um todo. Por exemplo, emuma horta/roça algumas plantas que podemser consideradas como “pragas”, na verdadepodem estar indicando a falta ou excesso dealgum nutriente no solo. Em vez de focar otrabalho na retirada dessas plantas, ou piorainda no uso de herbicidas, pode-se tentarcorrigir o solo com composto.

Mais do que a adoção e replicação de“soluções” que se mostraram satisfatórias, ofoco deste princípio é principalmente facilitara geração de pensamento de longo prazopara se criar novas soluções. No passado,foram a academia e a afluência urbana quetoleraram e até mesmo apoiaram esse tipode pensamento, enquanto a cultura agráriaconvencional, que se utiliza de muitosinsumos químicos, o suprimiu de maneiracruel.

O provérbio “a beleza está nos olhosdo observador” nos lembra que o processode observação influencia a realidade e quedevemos agir cautelosamente quanto averdades e valores absolutos.

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2. Capte e armazene energia

“Produza feno enquanto faz sol”

Vivemos em um mundo de riquezassem precedentes resultantes da coleta dosenormes estoques de combustíveis fósseiscriados pela Terra ao longo de bilhões deanos. Temos utilizado parte dessas riquezaspara aumentar nossa colheita dos recursosrenováveis da Terra em proporçõesinsustentáveis. A maior parte dos impactosadversos desta excessiva colheita ficarámais evidente, na medida em que adisponibilidade de combustíveis fósseis fordiminuindo. Em linguagem financeira,estamos consumindo o capital principal deforma tão irresponsável que levaria qualquerempresa à falência.

No atual estado da sociedadeindustrial, a questão energética é um pontochave a ser discutido e repensado. Apermacultura considera que a sociedadeprecisa partir para um modo de produção debaixo consumo energético, principalmenteexterno. Isso perpassa pela questão do quese consome e do quanto e que tipo deenergia foi utilizada na produção.

“Precisamos aprender comoeconomizar e reinvestir a maior parte dariqueza que estamos consumindo oudesperdiçando atualmente, de modo quenossos filhos e descendentes possam teruma vida razoável.”

É necessário entender como anatureza capta e armazena energia parapoder reconstruir o capital natural energéticonas paisagens, nas regiões e microbacias,no ambiente doméstico, na cultura e pensarno seu uso apropriado. Não basta somentetrocar o uso de combustíveis fósseis porenergias renováveis, é necessário, antes

reavaliar o nível de consumo. Reduzir oconsumo com produtos ou serviços quedurem mais tempo e repensar a utilidade decada coisa antes de consumir.

Conceitos inapropriados de riqueza noslevaram a ignorar oportunidades paracapturar fluxos locais de formas renováveis enão-renováveis de energia. Identificar e atuarnessas oportunidades, pode suprir a energiacom a qual poderemos nos manterplenamente, bem como nos proporcionar“renda” para nossas necessidades imediatas.

Algumas destas fontes de energiaincluem:

• Sol, vento e fluxos de escoamentosuperficial de água,

• Recursos desperdiçados deatividades agrícolas, industriais ecomerciais.

Os estoques mais importantes comvalor futuro incluem:

• Solo fértil com alto teor de húmus,• Sistemas de vegetação perene,

especialmente árvores, produção dealimentos e outros recursos úteis,

• Corpos e tanques de água,• Edificações com utilização passiva da

energia solar.

O provérbio “produza feno enquantofaz sol” nos faz lembrar que temos tempolimitado para captar e armazenar energia,antes que a abundância sazonal ouocasional desapareça.

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3. Obtenha rendimento“Saco vazio não para em pé”

Além de pensar em soluções a longoprazo que melhorem as condições de vida noplaneta, é necessário obter um rendimento acurto prazo. As necessidades humanasdiárias de alimentação, abrigo,disponibilidade de água, precisam sersupridas.

“Em nossas práticas cotidianas,devemos desenhar sistemas e organizarnossas vidas de modo a obtermosrendimento através de meios que otimizem apotência de trabalho útil de tudo o quefazemos”

Esse rendimento pode ser buscado deuma maneira que seja saudável para aspessoas envolvidas e em harmonia com adinâmica natural local e regional. Para issohá alguns itens que podem ser considerados:

• conservar a energia no sistema –pensando a questão da água porexemplo, pode se criar maneiras dese aproveitar a disponibilidade deágua local através da captação deágua da chuva, uso das águasprovenientes do uso doméstico embanho e cozinha para nutrição debananeiras através do sistema detratamento de água com círculo debananeiras. Em relação aoaquecimento de águas para banho oupias, em locais ou períodos de friointenso, pode-se utilizar calor solar oucalor produzido em fogão à lenha;

• produzir alimentos de base (bemadaptados ao ambiente local) – écomum em diferentes tipos deambientes que algumas espéciessejam bem adaptadas, sejam elas

nativas ou não, e produzam alimentosque podem servir como base da dietada população local, como mandioca,batatas, milho, feijões e outros cereaissilvestres da sua região;

• cultivo de espécies rústicas, quetrazem rendimento e não precisam demuito cuidado, como forrageiras (paraalimentação de animais e/ou uso nacompostagem), plantas alimentíciasespontâneas, algumas espéciesmedicinais e madeireiras;

• aumentar a fertilidade dos solos parauma maior produção de alimentoscom melhor qualidade nutricional.Dentre os itens de consumo humano,os alimentos estão entre os maisprimordiais. Investir em um solo fértilé investir em segurança alimentar.

Com os excedentes, pode se pensarem alternativas de consumo ou decomercialização. Por exemplo, as árvoresfrutíferas costumam trazer uma abundânciade frutificação em um período concentradodo ano. O beneficiamento dessas frutasatravés do feitio de conservas, geleias, chás,frutas secas, sucos e polpas podem trazerum aproveitamento da produção por maistempo e também uma diversidade maior dealimentos ao longo do ano. Essesexcedentes, desde a fruta in natura, até osprodutos beneficiados também podem sercomercializados em forma de venda ou troca.

Assim como sugere Holmgren, “osexcedentes e os excessos podem ser umincentivo para encontrar novos modoscriativos de se obter um rendimento”

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4. Pratique a autorregulação e aceite conselhos (feedbacks)“Os pecados dos pais recaem sobre os filhos atéa sétima geração”

A autorregulação é um dos objetivos doplanejamento de um sistema, ainda quejamais seja totalmente alcançado. Como nãotemos controle dos inúmeros fatores queenvolvem cada processo, por vezes sãonecessárias interferências ou manutenções.

A interação com a natureza podefornecer feedbacks positivos que contribuempara ampliação da produção ou feedbacksnegativos, que podem diminuir a produção,por algum motivo, evitando que o sistematodo entre em colapso. Quando umapopulação está construindo suaautossuficiência, ela está mais próxima dereceber feedbacks que são importantes paraa humanidade como um todo, mas quedevido ao estilo de vida da sociedademoderna, ficam ocultados para a maioria daspessoas, ou só ganham visibilidade quandoocorre uma catástrofe ou um evento degrande proporção. Holmgren (2013) dá oexemplo do cultivo de um bosque paraprodução de lenha e consequentementeenergia. Uma comunidade buscará utilizar amadeira de maneira adequada para quesempre haja lenha disponível. Já no modelomoderno, o consumidor de energia elétricaque é gerada a muitos quilômetros dedistância, fornecida pelas empresas privadase estatais, não consegue ter noção dasconsequências que esse sistema traz nocurto, médio e longo prazos, comocomunidades atingidas pelas barragens,desflorestação, diminuição da fauna,desequilíbrio de ecossistemas inteiros, queacabam por promover o êxodo rural, perdade saberes tradicionais, descontrole climáticoe perda da biodiversidade.

O objetivo usual de se projetar sistemassustentáveis com risco zero de feedback

negativo é como se tentar criar filhos semexposição a riscos imunológicos e deacidentes; isso resulta em riscos mais gravesno futuro. Fica claro que a ampla aceitaçãode riscos oriundos de feedback negativo temque ser controlada por princípios éticos eaplicados primeiramente a nós mesmos,famílias e comunidades (nessa ordem), aoinvés de externalizá-los como normalmenteacontece nas economias de larga escala.

Um sistema composto de elementosautossuficientes e independentes é maisrobusto para enfrentar turbulências. Oemprego de variedades de plantas e raças deanimais mais resistentes, semidomesticadose com capacidade de se reproduzirem, aoinvés de outras muito melhoradas edependentes da tecnologia, é uma estratégiaclássica da permacultura que exemplificaeste princípio.

A economia globalizada dos dias atuaisleva a uma instabilidade maior, onde osefeitos se propagam rapidamente em todo omundo. Por outro lado, a reconstrução daautossuficiência, tanto no nível do elementocomo no nível do sistema, aumenta aresiliência. Num mundo de energiadecrescente, onde passaremos a dependerapenas das energias renováveis, aautossuficiência será mais valorizada namedida em que a capacidade de fornecerinsumos em grandes quantidades e de formacontínua diminuir e se reduzirem aseconomias de escala e de especialização.

A teoria de Gaia que considera a Terracomo um sistema autorregulado tal como umum organismo vivo. Isso torna sua imagemadequada para representar este princípio.

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5. Use e valorize os serviços e recursos renováveis“Deixe a natureza seguir seu curso”

Sob o ponto de vista antropocêntrico,os recursos renováveis são aqueles que sãorenovados e repostos por processos naturaisao longo de uma nova geração, ou seja, naespécie humana seria algo com ciclo de uns20 anos. Em linguagem financeira, recursosrenováveis deveriam ser vistos como renda(juros do capital), enquanto recursos nãorenováveis deveriam ser considerados comoativos financeiros (capital principal). Gastarnosso capital principal para viver o dia-a-dia éinsustentável em qualquer língua.

Segundo Holmgren o planejamentopermacultural deve ter por objetivo fazer omelhor uso de recursos naturais renováveispara o manejo e a manutenção dasproduções, ainda que seja necessário lançarmão de alguns recursos não renováveis noestabelecimento do sistema.

Os serviços renováveis (ou funçõespassivas) são aqueles que obtemosnaturalmente de plantas, animais, solo eágua, sem consumi-los. Por exemplo, quandousamos uma árvore para obter madeiraestamos usando um recurso renovável, masquando usamos a árvore para obtermossombra e abrigo, desfrutamos dos benefíciosda árvore viva, que não implicam consumonem coleta de energia. Esse entendimentosimples é óbvio, mas também poderoso noplanejamento de sistemas onde funçõesmuito simples se tornaram dependentes do

uso não renovável e não sustentável derecursos.

No caso da sombra, quando plantamosárvores caducifólias próximas a umaedificação, diminuímos a demanda porenergia. Isso ocorre porque no período deverão elas projetarão sombra na edificação,ajudando a manter o ambiente mais fresco eno inverno as folhas caem, proporcionandomais calor solar no ambiente no período frio.Assim, será menos necessário o uso deenergia artificial para o controle térmico doambiente.

Tanto nas comunidades ricas como naspobres, o uso de dejetos humanos, comouma fonte renovável de fertilidade, apóstornados inofensivos pelo serviço ecológicode micróbios em sistemas de compostagem,tal como o sanitário seco, é uma dasaplicações mais importantes e universaisdeste princípio.

O provérbio “Deixe a natureza seguirseu curso” nos faz lembrar de outro aspectodeste princípio – o eficaz equilíbrio dinâmicoque a natureza obteve em milhões de anosde evolução deve ser respeitado seguido ecopiado, para que nossa pegada ecológicanão desestabilize o ótimo climático quevivemos.

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6. Não produza desperdícios“Não desperdice para que não lhe falte”“Um ponto na hora certa economiza nove”

A minimização de desperdícios pode sedar através de cinco atitudes: recusar,reduzir, reaproveitar, reparar e reciclar. Vê-seque na sociedade moderna, o discursoambiental é absorvido somente quando se vênele uma possibilidade de criar mercados,com produtos e serviços com rotulagem“ambientalmente correta”. Nesse sentido asempresas pouco ou nada falam das quatroprimeiras atitudes mencionadas e focamapenas na reciclagem, que sozinha não écapaz de superar os problemassocioambientais gerados por uma civilizaçãoconsumista. Um bom exemplo a esserespeito são os produtos gerados comreciclagem de garrafas PET. O consumidorcompra, considerando que está fazendo suaparte para a conservação da natureza,quando na realidade todos as quatro atitudesnegligenciadas deveriam ser ponto dereflexão antes da compra de qualquerproduto. Ao invés da compra de umacamiseta de PET ou qualquer outro produtoindustrial, o consumidor pode investir porexemplo na compra de produtos em feirasorgânicas, ou em alguma oportunidade queestimule a autossuficiência. Devemos buscardimensionar nosso consumo e optar semprepor produtos e serviços não industrializados,de produtores locais. Certamente a questãodo desperdício e do consumo perpassam porquestões de valores sociais e individuaisrelacionados ao que uma sociedade precisapara ser saudável e ao que os indivíduosprecisam para serem felizes.

Com a grande mídia induzindo acompra aliada a prazer e felicidade, aspessoas tendem a viver e trabalhar paraaumentar o poder de consumo. Esse modelopode então ser melhor caracterizado como“consumir/excretar”. A visão de pessoascomo simples consumidores e excretorespode ser biológica, mas não é ecológica.

Ainda que uma readaptação daindústria para modelos menos ofensivos epoluidores seja algo positivo, deve-se aceitaresse momento apenas como uma transiçãopara uma sociedade de baixo consumo e emharmonia com os ciclos naturais. Oreaproveitamento dos produtos abundantes énecessário atualmente, mas apenas comomedida transitória.

A minhoca é um ícone adequado paraeste princípio porque sobrevive através doconsumo de resíduos vegetais existentes nosolo (desperdícios), convertendo-os emhúmus que melhora o próprio solo para ela,para micro-organismos que vivem na terra epara as plantas. Dessa forma, a minhocacomo todos os organismos vivos é parte darede onde o que uns produzem serve deinsumo para outros.

O provérbio “não desperdice para quenão lhe falte” nos lembra que é fácil agirmossem responsabilidade e causar desperdíciosem tempos de abundância, mas essedesperdício pode ser a causa de privaçõesfuturas.

“Um ponto na hora certa economizanove” nos faz lembrar do valor de umamanutenção que previne desperdícios e dotrabalho envolvido nos esforços significativosde restauração e reparo. Apesar de ser muitomenos interessante do que buscar maneirasde usar abundâncias indesejadas, amanutenção daquilo que já temos vai setornar um assunto atual e de grandesproporções num mundo com energia emdeclínio. Todas as estruturas e sistemas sedepreciam em valor e todos os sistemasecológicos e sistemas humanos sustentáveisdedicam recursos para manutenção na horacerta.

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7. Design partindo de padrões para chegar aosdetalhes“Às vezes as árvores nos impedem de ver afloresta”

Esse princípio remete aodesenvolvimento de “uma linguagem depadrões de planejamento em permaculturaao focar exemplos de estruturas eorganizações que parecem ilustrar o usoequilibrado de energia e recursos”(HOLMGREN, 2013).

Nosso mundo está recheado depadrões que são resultado de milhares, porvezes milhões de anos de coevolução entreas espécies e o meio físico, permitindo quetodas vivam em harmonia nos ecossistemas.As espécies que se extinguiram nessecaminhar evolutivo são a resposta de umanão adaptação energética ao meio. Por outrolado, todas as espécies, sejam elas da faunaou da flora, que coabitam um ecossistema,são um reflexo de boa adaptação e, comoexemplos de eficiência adaptativa ao meio,nos fornecem pistas para se estabelecersistemas produtivos e de viver mais eficientese, portanto, eficazes.

Na busca por uma sociedade adaptadaaos ciclos naturais, nossos esforços estarãomais no sentido de adaptar-nos aos padrõesnaturais locais, que buscar inovaçõestecnológicas para reparar nossos erros.Dentro disso entram as escalas deplanejamento, que na permacultura estãoorganizadas basicamente através de zonasenergéticas que são manejadas conforme aintensidade de uso, inclinação do terreno e

também na observação dos setores de sol,vento, umidade, água, fogo, dentre outros.

A modernidade se orientou no sentidode desarrumar qualquer intuição ou bomsenso sistêmico, que consegue com primaziaordenar a imensa variedade de opções epossibilidades de planejamento, que seapresentam em todos os campos daatividade humana. O vício de dar enfoque acomplexidade dos detalhes, resulta noplanejamento de elefantes brancos que sãograndes e imponentes, mas que nãofuncionam, ou monstros sagrados queconsomem toda nossa energia e recursos,sempre ameaçando escapar do nossocontrole, tal como as grandes cidades. Ossistemas complexos que funcionam tendem aevoluir a partir de sistemas simples quefuncionam, de forma que, encontrar o padrãoadequado para um determinadoplanejamento é mais importante do queentender todos os detalhes dos elementos dosistema.

O provérbio “Às vezes as árvores nosimpedem de ver a floresta” nos faz lembrarque os detalhes tendem a desviar nossapercepção da natureza do sistema; quantomais perto nos aproximarmos, menor será anossa capacidade de entender a questãocomo um todo.

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8. Integrar ao invés de segregar“Muitos braços tornam o fardo mais leve”

Tanto entre seres humanos, quanto nasrelações entre elementos naturais e outrosanimais, as relações estabelecidas sãoimportantíssimas para a vida e a dinâmicadesses grupos. A permacultura acredita querelações cooperativas e simbióticas tendem acontribuir mais do que relações meramentecompetitivas, na construção de umasociedade com práticas adequadas emharmonia com a natureza. Dessa forma, oobjetivo de um planejamento autorregulado efuncional é dispor os elementos de talmaneira que cada um deles satisfaça asnecessidades e aceite os produtos dosdemais elementos.

Nosso viés cultural ocidental que focana complexidade dos detalhes, nos leva aignorar a complexidade dos inter-relacionamentos. A nossa tendência ésempre optar pela segregação dos elementoscomo a estratégia padrão de planejamento,com intuito de reduzir a complexidade dosrelacionamentos. Essas soluções surgem em

parte devido ao nosso método científicoreducionista que separa os elementos paraestudá-los isoladamente. Qualquerconsideração sobre como eles funcionamsendo parte de um sistema integrado temsempre por base as conclusões tiradas doseu estudo isoladas, portanto, do sistemacompleto.

Holmgren coloca que “nas sociedadestradicionais estáveis, nas quais todos osrecursos estão totalmente alocados, papéisdefinidos, obrigações mútuas estabelecidas,contribuições, impostos e outros, osmecanismos sociais prevalecem sobre oscompetitivos”. Um dos grandes exemplos quepode ser utilizado para esse princípio é o usoda criação de galinhas dentro de um sistemaagroflorestal, onde a ave pode viverlivremente e tem alimento disponível emabundância, bem como fornece adubação dosolo através do seu esterco.

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9. Use soluções pequenas e lentas“Quanto maior, pior a queda”“Devagar e sempre ganha a corrida”

A sociedade moderna valoriza avelocidade, seja no transporte, seja naprodução, seja nas relações de consumo.Holmgren diz que “A ideia de que o maisrápido é melhor na produção agrícola eindustrial, no transporte, na comunicação enas viagens, na alimentação e em quasetodos os aspectos da vida estáprofundamente enraizada como uma normacultural.”

Os sistemas devem ser projetados paraexecutar funções na menor escala que sejaprática e eficiente no uso da energia paraaquela função. A escala e a capacidadehumanas deveriam ser a unidade de medidapara uma sociedade sustentável democráticae humana.

Nas últimas décadas a disponibilidadede energia barata continuou a subsidiarsistemas de larga escala. Porém, com o fimda energia barata eles se deslocarão paraeconomias de escala natural em favor dossistemas pequenos.

A conveniência e o poderproporcionados por uma mobilidade maior epela tecnologia da informação tem sido um“cavalo de Tróia”, destruindo comunidades eaumentando as demandas de energia.Mobilidade e velocidade têm se tornado tãoprejudiciais, que movimentos do tipo“Alimento Lento” e “Cidades Lentas” sefortalecem a cada dia.

A revolução das comunicações e dosdispositivos móveis deu novo ímpeto à ideiade que velocidade é uma boa coisa, mas, denovo, lados negativos característicos têmsurgido como as avalanches de mensagensindesejadas ou de compromissos, cujaresposta não pode ser protelada, pois podeacarretar em não interesse por uma daspartes da comunicação, ameaçando asamenidades do processo.

Pequenas e certeiras estratégias demanejo, trazem resultados lentos, mas quepodem ser eficazes e duradouros. Esseprincípio pode ser aplicado em escaladoméstica e pessoal, quando buscamossoluções que interfiram em pequena escala,mas que trazem um bom resultado a longoprazo.

Outros exemplos práticos nos oferecemuma visão mais equilibrada de oposição àatração de processos mais velozes esistemas de larga escala. Por exemplo, arápida resposta das culturas agrícolas aosfertilizantes solúveis é, muitas vezes, poucoduradoura. Esterco e minerais rochososnaturais geralmente proporcionam umanutrição para a planta que é mais equilibradae prolongada.

Em silvicultura, as espécies de rápidocrescimento muitas vezes têm vida curta,enquanto outras espécies, mais valiosas e decrescimento aparentemente mais lento,depois da segunda ou terceira décadaaceleram o crescimento e acabam superandoas de rápido crescimento.

Nas cidades com grande densidadepopulacional, a aparente conveniência evelocidade dos automóveis congestionam otrânsito e prejudicam a qualidade de vida,enquanto bicicletas, mais eficientes quantoao consumo de energia, proporcionamliberdade de deslocamento sem barulho oupoluição.

O provérbio “Quanto maior, pior aqueda” nos faz lembrar de uma dasdesvantagens do tamanho e crescimentoexcessivo. Por outro lado, o provérbio“Devagar e sempre ganha a corrida” é umdos muitos que estimulam a paciência, aomesmo tempo em que traz uma reflexãosobre uma verdade comum na natureza e nasociedade.

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10. Use e valorize a diversidade“Não coloque todos seus ovos numa única cesta”

O planeta que habitamos é compostopor uma imensa variedade de espéciesanimais e vegetais, culturas, solos, rochasque formam diversos biomas e paisagens. Jáse conhece as consequências produzidaspelas monoculturas induzidas por humanos,seja em nível de saúde – em decorrência dabaixa variabilidade de nutrientes na dietaalimentar e o alto nível de agrotóxicos, sejaem nível de relações entre povos – comguerras e atos violentos que trazem umaimposição de uma cultura sobre outra,principalmente por questões de poder nosterritórios.

A policultura é uma das maisimportantes e amplamente reconhecidasaplicações do uso da diversidade parareduzir a vulnerabilidade a “pragas”,variações climáticas desfavoráveis eflutuações de mercado. A policultura tambémreduz a dependência nos sistemas demercado e reforça a autossuficiência eautoconfiança da família e da comunidade,pois proporciona uma gama maior de bens eserviços. Contudo, de forma alguma apolicultura é a única aplicação desteprincípio.

A diversidade dos vários sistemas decultivo reflete as características peculiares danatureza e situação do local e do contextocultural. A diversidade das estruturas, tanto a

de entes vivos como as construídas, é umaspecto importante deste princípio, assimcomo a diversidade entre espécies epopulações, inclusive comunidadeshumanas. A conservação de pelo menosalguns, dentre a grande diversidade deidiomas e culturas no planeta, épossivelmente tão importante quanto àconservação da biodiversidade.

Apesar de exercer forte impacto nahumanidade e na biodiversidade, a reduçãoda orgia de uso de energia fóssil fará comque, no longo prazo, a sua substituiçãoestimule uma nova diversidade em nível locale biorregional.

Em suma, a diversidade é naturalmenteintrínseca à nossa vida, e devemos desfrutá-la, aprender com ela e cultivá-la, seja naprodução alimentícia, seja no convíviohumano. Somente através de um caminhoque aceite e proporcione a diversidade, é quese pode garantir segurança alimentar eharmonia nas populações humanas.

O provérbio “Não coloque todos seusovos numa única cesta” incorpora oentendimento popular que a diversidadeproporciona um seguro contra as peças quea natureza e a vida cotidiana nos pregam.

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11. Use os limites e valorize o marginal“Não pense que está no caminho certo somenteporque ele é o mais batido”

O ícone do sol subindo no horizonte eum rio em primeiro plano nos mostra ummundo composto por contornos e bordas.

Os estuários nas zonas da maréconstituem uma interface complexa ente aterra e o mar e podem ser vistos como umgrande mercado ecológico de trocas entreesses dois grandes domínios de vida. A águarasa permite a penetração da luz solar, quepossibilita o crescimento de algas e plantas,proporcionando também áreas onde as avesaquáticas e outros pássaros buscamalimento. A água doce dos rios que drenamas micro bacias escoa sobre a água salgada,que é mais densa e que oscila para lá e paracá entre as marés, redistribuindo nutrientespara as inúmeras formas de vida que pululamnesse habitat.

Na natureza, as zonas periféricas –limites e conexões entre um sistema e outro,seja um ambiente, um ecossistema ou umbioma – são pontos ricos em diversidade eenergia. É no contato entre a atmosfera e acrosta terrestre que está contida a vida ediversos processos energéticos presentes noplaneta Terra. Por exemplo, “os limites

terrestres sustentam um número maior deespécies de aves do que qualquer sistemade vegetação, pois os recursos de ambos ossistemas estão disponíveis” (HOLMGREN,2013, p. 341).

Este princípio funciona com base napremissa de que o valor e a contribuição dasbordas e os aspectos marginais e invisíveisde qualquer sistema deveriam não apenasser reconhecidos e preservados, mas que aampliação desses aspectos pode aumentar aestabilidade e a produtividade do sistema.Por exemplo, aumentando-se a borda entre oterreno e a margem de uma represa pode-seaumentar a produtividade de ambos. Umplanejamento que percebe o limite como umaoportunidade e não como um problema temmaiores chances de sucesso e adaptação(HOLMGREN, 2007).

O provérbio “Não pense que está nocaminho certo somente porque ele é o maisbatido” nos lembra que as coisas maiscomuns, óbvias e populares não sãonecessariamente as mais significativas ou demaior influência.

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12. Responda criativamente às mudanças“A verdadeira visão não é enxergar as coisascomo elas são hoje, mas como serão no futuro”

Por mais que o planejamento aconteçade forma mais ampla antes da execução ouno começo, é necessário que ele sejaconstantemente reavaliado conforme osresultados obtidos. Holmgren (2013) afirmaque a permacultura se refere à durabilidadedos sistemas vivos naturais e da culturahumana, mas essa durabilidade dependeparadoxalmente em grande medida deflexibilidade e mudança. Alguns fatores queestão fora de previsão podem influenciar emresultados não esperados. Por isso acriatividade se faz necessária para conseguirsuperar mudanças inesperadas.

A borboleta, que é a transformação deuma lagarta, é o símbolo da ideia demudança adaptativa que é mais estimuladorado que ameaçadora.

Embora seja importante integrar esseentendimento de fluidez e mudançascontínuas na nossa consciência do dia-a-dia,a aparente ilusão de estabilidade,permanência e sustentabilidade se resolvepelo reconhecimento de que a natureza das

mudanças depende da escala. Quando seconsidera qualquer sistema em particular, asmudanças rápidas, de pequena escala eduração dos seus elementos contribuem, narealidade, para uma estabilidade de ordemmais elevada do próprio sistema. Vivemos eagimos num contexto histórico de rotatividadee mudanças em sistemas de múltiplas egrandes escalas; isso gera uma nova ilusãode mudanças sem-fim, sem qualquerpossibilidade de estabilidade ousustentabilidade. Um sentido sistêmico econtextual do equilíbrio dinâmico entreestabilidade e mudança contribui para oplanejamento que é evolucionário mais doque acidental.

O provérbio “A verdadeira visão não éenxergar as coisas como elas são hoje, mascomo serão no futuro” enfatiza que entendermudança é muito mais que a projeção degráficos estatísticos mostrando tendências.Também estabelece uma ligação cíclica entreeste último princípio de planejamento e oprimeiro sobre observação.

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ConclusãoO desenvolvimento sustentável para

atender as necessidades humanas, dentro delimites ecológicos, exige uma revoluçãocultural maior que qualquer uma dasmudanças profundas ocorridas no últimoséculo. O planejamento e as ações dapermacultura no último quarto de séculomostraram que essa revolução é complexa emultifacetada. Embora ainda continuemos anos debater com as lições de sucesso efracasso do passado, o mundo de energia emdeclínio que está surgindo, vai adotar muitasdas estratégias e técnicas da permacultura,como meios óbvios e naturais de se viverdentro de limites ecológicos, quando asriquezas reais diminuírem.

Por outro lado, o declínio de energia vaidemandar respostas em tempo real parasituações novas e adaptações incrementaisde sistemas inadequados existentes, bemcomo as melhores inovações criativasaplicadas a problemas de planejamentomenores e mais corriqueiros. Tudo isso deveser feito sem os orçamentos milionários e o“oba-oba” normalmente associados àsinovações atuais do desenho industrial.

Os princípios de planejamento dapermacultura jamais poderão substituir oconhecimento técnico e as experiências

práticas de sucesso. Contudo, essesprincípios podem oferecer uma estruturaconceitual para a geração contínua desoluções para situações e locais específicos,que são necessárias para se avançar alémdos êxitos limitados do desenvolvimentosustentável até um reencontro entre cultura enatureza.

Referências BibliográficasHOLMGREN, David. Os Fundamentos daPermacultura - versão resumida. Tradução:Alexander Van Parys Piergili e AmantinoRamos de Freitas. 2007. Disponível em:<http://holmgren.com.au/downloads/Essence_of_Pc_PT.pdf>. Acesso em: 28 mai 2017.

HOLMGREN, David. Permacultura:princípios e caminhos além dasustentabilidade. / David Holmgren;tradução Luzia Araújo. – Porto Alegre: ViaSapiens, 2013. 416p.

SANTOS, Leticia dos. A ressignificação doespaço geográfico através dapermacultura. 73 p. Trabalho de Conclusãode Curso (graduação). Universidade Federalde Santa Catarina. 2015. Disponível em:http://permacultura.ufsc.br/files/2015/07/TCC-Leticia-Revisado.pdf. Acesso em: 28 mai2017.

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