Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos ... · Milena Sanches Tayano dos...

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Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Revista Jurídica: órgão nacional de doutrina, jurisprudência, legislação e crítica judiciária. Ano 66, nº 483, Janeiro de 2018.

Diretor: Elton José Donato

Bimestral: 1953-1962; trimestral: 1963-1965; irregular: 1966-1967; anual: 1968; trimestral: 1977; bimestral: 1982; mensal: 1988

Tiragem: 4.000 exemplares

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ISSN 0103-3379

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ANO 66 – JANEIRO DE 2018 – Nº 483

RepositóRio AutoRizAdo de JuRispRudênciASupremo Tribunal Federal: 03/85

Superior Tribunal de Justiça: 09/90Tribunais Regionais Federais 1ª, 2ª e 4ª Regiões

FundAdoR

Professor Angelito Asmus Aiquel

diRetoR executivo

Elton José Donato

GeRente editoRiAl

Milena Sanches Tayano dos Santos

cooRdenAdoR editoRiAl

Cristiano Basaglia

conselho editoRiAlAda Pellegrini Grinover – Alexandre Pasqualini – Alexandre Wunderlich

Anderson Vichinkeski Teixeira – Antonio Janyr Dall’Agnol Jr.Araken de Assis – Arruda Alvim – Carlos Alberto Molinaro

Cezar Roberto Bitencourt – Daniel Francisco Mitidiero – Daniel UstárrozDarci Guimarães Ribeiro – Eduardo Arruda Alvim – Eduardo de Oliveira Leite

Eduardo Talamini – Ênio Santarelli Zuliani – Fátima Nancy AndrighiFredie Didier Júnior – Guilherme Rizzo Amaral – Humberto Theodoro Júnior

Ingo Wolfgang Sarlet – Jefferson Carús GuedesJoão José Leal – José Carlos Barbosa Moreira – José Maria Rosa TesheinerJosé Roberto Ferreira Gouvêa – José Rogério Cruz e Tucci – Juarez Freitas

Lúcio Delfino – Luis Guilherme Aidar Bondioli Luís Gustavo Andrade Madeira – Luiz Edson Fachin – Luiz Guilherme MarinoniLuiz Manoel Gomes Júnior – Luiz Rodrigues Wambier – Márcio Louzada Carpena

Mariângela Guerreiro Milhoranza – Paulo Luiz Netto LôboRolf Madaleno – Salo de Carvalho – Sergio Cruz Arenhart

Sérgio Gilberto Porto – Teresa Arruda Alvim Wambier – William Santos Ferreira

colAboRAdoRes destA ediçãoAndré Boccuzzi de Souza, Eduardo Luiz Santos Cabette,

Felipe Cunha de Almeida, Marcel Piterman

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Sumário

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Doutrinas

Civil, ProCessual Civil e ComerCial

1. Hipóteses de Desconsideração da Personalidade Jurídica: Requisitos à Luz do Direito Material e do Novo Código de Processo CivilFelipe Cunha de Almeida ...............................................................9

2. Panorama do Cumprimento das Prestações de Fazer e Não FazerMarcel Piterman ..........................................................................41

3. A Necessidade de Informação sobre a Presença de Glúten nos Produtos e a Forma de Sua VeiculaçãoAndré Boccuzzi de Souza .............................................................71

Penal e ProCessual Penal

1. Crimes Militares e a Lei nº 13.491/2017 em Relação ao Direito IntertemporalEduardo Luiz Santos Cabette .......................................................85

JurisprudênciaCivil, ProCessual Civil e ComerCial

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Superior Tribunal de Justiça .........................................................91

2. Tribunal Regional Federal da 1ª Região .......................................99

3. Tribunal Regional Federal da 4ª Região .....................................111

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência Civil, Processual Civil e Comercial ....119

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Penal e ProCessual Penal

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Supremo Tribunal Federal ..........................................................147

2. Superior Tribunal de Justiça .......................................................161

3. Superior Tribunal de Justiça .......................................................177

4. Tribunal Regional Federal da 2 Região .......................................193

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência Penal e Processual Penal .....................199

Índice Alfabético e Remissivo ...................................................221

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EDITORIAL

A Revista Jurídica trata de temas atuais e de suma relevância aos profissionais do direito. Os trabalhos doutrinários, de autoria de relevantes juristas, são divididos nas áreas cível e penal.

Doutrina Civil

O Mestre Felipe Cunha de Almeida analisou os pressupostos sobre a desconsideração da personalidade jurídica prevista no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor, bem como os requisitos configuradores, seja no âmbito do direito material, seja para o novo Código de Processo Civil.

O Doutorando Marcel Piterman discorre sobre o desenvolvimento histórico da execução das prestações de fazer e não fazer, desde as origens romanas até a ideia de que toda prestação de fazer ou não fazer deve ser convertida em perdas e danos. Após, o ensaio mostrará a necessidade de os meios executivos serem adequados à teoria da tutela dos direitos, como o fez o Código de Processo Civil Brasileiro de 2015.

O Professor André Boccuzzi de Souza fala que o consumo de glúten traz prejuízos aos consumidores que possuem doença celíaca, devendo ser por eles evitado. Para tanto e buscando garantir um consumo consciente, deve haver informação sobre sua presença ou nos rótulos ou embalagens dos produtos, de forma a atender aos comandos do Código de Defesa do Consumidor e da legislação correlata, que, inclusive, veicula claramente tal obrigação. Não obstante, entendeu o Superior Tribunal de Justiça que a mera informação em tela não atende completamente o diploma consumerista, de-vendo haver também indicação de advertência sobre os malefícios que o glú-ten acarreta à saúde dos doentes celíacos. O descumprimento a tais questões, por sua vez, pode acarretar a incidência de sanções ao fornecedor.

Doutrina Penal

O Delegado Eduardo Luiz Santos Cabette afirmou que o surgimento no cenário nacional da Lei nº 13.491/2017, com ingentes alterações na com-

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petência da Justiça Militar, tem gerado uma série de questionamentos e, já no início, emergiu a impressão açodada de que simplesmente se faria o trans-plante de todos os feitos em andamento pela Justiça Comum Estadual ou Federal para a Justiça Militar, sem consideração de qualquer questão quanto ao direito intertemporal e à natureza jurídica das normas alteradas.

Os Editores

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Doutrina

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Cível

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Hipóteses de desconsideração da personalidade Jurídica: requisitos

à luz do direito Material e do novo código de processo civil

Felipe Cunha de almeida

Mestre em Direito Privado pela Universidade do Rio Grande do Sul, Especialista em Direito Civil e Processual Civil com ênfase

em Processo Civil, Professor Convidado pelo UniRitter, Unisinos, IDC, Verbo Jurídico, ESA OAB/RS, URI – Erechim, Unesc, e de outros cursos de Pós-Graduação e Prática Jurídica, Advogado em Porto Alegre/RS, Ex-Professor de Graduação da Ulbra e PUCRS.

RESUMO: Este artigo analisou os pressupostos sobre a descon-sideração da personalidade jurídica prevista no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor, bem como os requisitos configuradores, seja no âmbito do direito material, seja para o novo Código de Processo Civil.

PALAVRAS-CHAVE: Boa-fé; desconsideração da personali-dade jurídica; Código Civil; Código de Defesa do Consumi-dor; requisitos; novo Código de Processo Civil.

ABSTRACT: This article analyzed the assumptions of disre-garding the legal personality provided for in the Civil Code and the Consumer Protection Code, as well as the configura-tional requirements both in the scope of the substantive law and in the new Civil Procedure Code.

KEYWORDS: Good faith; disregard of legal personality; Civil Code; Code of Consumer Protection; requirements; new Code of Civil Procedure.

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SUMÁRIO: Introdução; 1 Boa-fé; 2 Antecedentes históricos; 3 Pre-visão pelo Código Civil; 3.1 Previsão pelo Código de Defesa do Consumidor; 4 Ônus da prova; 5 Desconsideração e o novo Códi-go de Processo Civil; 5.1 Desconsideração inversa da personalidade jurídica; 5.2 Momento do requerimento; 5.3 Indeferimento liminar; 5.4 Honorários advocatícios; 5.5 Direito tributário e Justiça do Traba-lho; Conclusão; Referências.

introdução

O ordenamento jurídico é recheado de mecanismos no sentido de fa-zer valer a obrigação assumida entre as partes. Se A firma compromisso de promessa de compra e venda com B, por exemplo, deve cumprir o que con-tratou. Se a empresa Y contrata com a empresa X, ou com determinado con-sumidor, do mesmo modo e assim por diante, fica vinculada à contratação. Estas figuras, em um primeiro momento, responderão com seu patrimônio pelo inadimplemento.

Via de regra, o devedor inadimplente deve figurar no polo passivo da ação que o credor lhe move. Se for pessoa física aquele, mas também tiver pessoa jurídica, em princípio, os bens desta não respondem pela obrigação da pessoa física. Pode acontecer, por outro lado, de que a devedora é a pessoa jurídica, não respondendo os bens pessoais dos sócios pelo inadimplemento.

Contudo, há hipóteses que se apresentam no sentido de, por exemplo, buscar a responsabilidade pessoal do sócio por dívida de sua empresa. Tam-bém é possível situação inversa, ou seja, a responsabilidade patrimonial da empresa por dívida pessoal do sócio. Para tanto, a lei material exige que cer-tos requisitos sejam preenchidos para que tal possibilidade avance. Soma-se o fato, ainda, de que o novo Código de Processo Civil veio, de forma expres-sa, a regular a matéria: estamos tratando da denominada desconsideração da personalidade jurídica.

Dadas as razões acima colocadas, o objetivo deste artigo é o de ana-lisar a referida desconsideração da personalidade jurídica à luz do direito material, em um primeiro momento, ou seja, as disposições do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor sobre a matéria para, imediatamente, dirigir o estudo para o campo do direito processual civil, trazendo, também,

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decisões sobre a temática em exame, sob os olhares da boa-fé. Sobre o institu-to, Fran Martins assim leciona1:

A admissão, pelas sociedades, do princípio da personalidade jurídica, deu lugar a indivíduos desonestos que, utilizando-se da mesma, praticassem, em proveito próprio, atos fraudulentos ou com abuso de direito, fazen-do com que as pessoas jurídicas respondessem pelos mesmos. Numerosos desses fatos ocorreram nos Estados Unidos e na Inglaterra, sendo frequen-temente levados aos tribunais.

Estes passaram, então, quando assim ocorria, a desconhecer a personalida-de jurídica das sociedades para responsabilizar os culpados. Nos Estados Unidos chegou-se a falar em lifting the veil, ou seja, levantar o véu da pessoa jurídica para serem atingidos diretamente os sócios. Na Alemanha, o Pro-fessor Rolf Serick apresentou, na Universidade de Tubingen, a tese sobre “Aparência e realidade nas sociedades mercantis. Do abuso de direito por intermédio da pessoa jurídica”. O assunto interessou grandemente aos cír-culos jurídicos europeus, destacando-se, entre os que trataram dele, o Pro-fessor Piero Verrucoli, da Universidade de Pisa, na Itália, que escreveu a respeito o livro Superamento da personalidade jurídica das sociedades de capitais na common law e na civil law.

Constatado o fato de que a personalidade jurídica das sociedades servia a pessoas inescrupulosas que praticassem em benefício próprio abuso de di-reito ou atos fraudulentos por intermédio das pessoas jurídicas, que reves-tiam as sociedades, os tribunais começaram então a desconhecer a pessoa jurídica para responsabilizar os praticantes de tais atos.

Portanto, a jurisprudência norte-americana, por meio da denominada via especial da equity, com a sistematização no direito da Alemanha (Rolf Serick), passou a admitir a responsabilização dos sócios e administradores afastando a limitação existente nos atos constitutivos das sociedades, para as hipóteses de fraude, quando do exercício das atividades da pessoa jurídica2.

O artigo demonstrará, então, que existe a possibilidade de a execução ser direcionada, também, quando do preenchimento dos requisitos adiante estudados, aos sócios ou à pessoa jurídica (desconsideração da personalida-

1 MARTINS, Fran. Curso de direito comercial. 37. ed. In: ABRÃO, Carlos Henrique (Atual.). Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 168.

2 MIRAGEM, Bruno. Curso de direito do consumidor. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 516.

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de jurídica e desconsideração inversa da personalidade jurídica, respectiva-mente).

1 Boa-FÉ

Iniciamos o presente trabalho analisando um dos princípios centrais do Direito, ou seja, o princípio da boa-fé objetiva. Tal estudo é fundamental para se cogitar da desconsideração, como adiante veremos. Erros, equívocos em determinada administração são distantes da conduta de má-fé em que pese possam acarretar prejuízos aos credores.

Clóvis do Couto e Silva leciona com maestria sobre a boa-fé. O ilustre jurista aduz que o referido princípio apresenta diversos significados, dizendo que a doutrina diferencia estados subjetivos de consciência (ou seja, conheci-mento sobre certas circunstâncias), bem como adquirindo direitos, como, por exemplo, a percepção de frutos3.

Em que pese o Código Civil de 1916 não ter feito menção expressa à boa-fé, tal ausência não impedia que

[...] o princípio tenha vigência em nosso direito das obrigações, pois se trata de proposição jurídica, com significado de regra de conduta. O manda-mento de conduta engloba todos os que participam do vínculo obrigacio-nal e estabelece, entre eles, um elo de cooperação, em face do fim objetivo a que visam.4

Ensina Carlos Roberto Gonçalves que o princípio da boa-fé se divide em: a) boa-fé subjetiva; b) boa-fé objetiva, ou então também denominada de ética da boa-fé5. Em relação à boa-fé subjetiva, o autor referido assinala que tal instituto esteve presente no Código Civil de 1916, “[...] com a natureza de regra de interpretação do negócio jurídico”. A boa-fé subjetiva, por assim dizer, guarda relação com o conhecimento ou a ignorância da pessoa, sobre certos fatos, havendo a consideração do direito, para os fins específicos da situação a ser regulada. Melhor explicando, serve de tutela para aquele que “tem a consciência de estar agindo conforme o direito, apesar de ser outra re-alidade”. A boa-fé subjetiva” denota estado de consciência, ou convencimen-

3 COUTO E SILVA, Clóvis. A obrigação como processo. Rio de Janeiro: FGV, 2006. p. 33.4 COUTO E SILVA, Clóvis. Op. cit., p. 33.5 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais.

São Paulo: Saraiva, 2013. p. 55.

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to individual da parte ao agir em conformidade ao direito, sendo aplicável, em regra, ao campo dos direitos reais, especialmente em matéria possessó-ria”. Resumindo: a expressão “subjetiva” leva o intérprete, na sua aplicação, para o campo da interpretação em relação à intenção daquele que integra a relação jurídica, ou seja, o seu estado psicológico ou então a sua convicção íntima. Significa, portanto e em um primeiro momento, a “noção de entendi-mento equivocado, em erro que enreda o contratante”6.

Sergio Cavalieri Filho, direcionando-se à boa-fé objetiva, a proteção da confiança nas relações contratuais, ao abuso de direito, à onerosidade exces-siva, entre outros temas, aduz que mereceram maior discussão, o que oca-sionou e exigiu uma releitura profunda do conceito clássico do contrato. No Brasil, o marco dessa renovação teórica foi efetivado por meio do Código de Defesa do Consumidor, eis que, além de trazer novos princípios, passou a exigir a intervenção estatal, sobretudo quanto à autonomia da vontade, com o objetivo de assegurar a justiça e o equilíbrio contratual na nova sociedade de consumo7. Sobre a boa-fé objetiva, assim já decidiu o Superior Tribunal de Justiça8.

6 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. Op. cit., p. 55-56.

7 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de direito do consumidor. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 104.

8 “Direito civil. Recurso especial. Ação de indenização por danos materiais e compensação por dano moral. Negativa de prestação jurisdicional. Inexistência. Contrato de prestação de serviços. Função integrativa da boa-fé objetiva. Violação dos deveres de informação e lealdade. Inadimplemento. Exceção do contrato não cumprido. Cláusula penal. Redução equitativa. Dano moral. Não configurado. 1. Ação de indenização por danos materiais e compensação por dano moral ajuizada em 11.12.2007, de que foi extraído este recurso especial, interposto em 14.04.2014 e atribuído ao gabinete em 02.09.2016. 2. O propósito recursal é dizer sobre: (i) a negativa de prestação jurisdicional; (ii) o inadimplemento contratual das recorridas; (iii) a fixação da cláusula penal; (iv) o dano moral. 3. Ausente erro material, omissão ou contradição no acórdão recorrido, não há falar em violação do art. 535, I e II, do CPC/1973. 4. A relação obrigacional não se exaure na vontade expressamente manifestada pelas partes, porque, implicitamente, estão elas sujeitas ao cumprimento de outros deveres de conduta, que independem de suas vontades e que decorrem da função integrativa da boa-fé objetiva. 5. Se à liberdade contratual, integrada pela boa-fé objetiva, acrescentam-se ao contrato deveres anexos, que condicionam a atuação dos contratantes, a inobservância desses deveres pode implicar o inadimplemento contratual. 6. Se as recorridas, por sua culpa, não cumpriram a obrigação, não podem exigir o implemento da obrigação dos recorrentes, daí por que se configura, em favor destes, a exceção do contrato não cumprido. 7. A jurisprudência do STJ orienta que não há uma relação de proporcionalidade matemática exata entre o grau de inexecução da prestação e o de redução do valor da cláusula penal. 8. Recurso especial conhecido e

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Portanto, percebemos que, além da importância ímpar do princípio da boa-fé objetiva para as relações, aquela é presumida. Assim, quem alegar a má-fé deve prová-la9.

Em termos de desconsideração da personalidade jurídica e a boa-fé, Paulo Lôbo assevera que seu “[...] princípio norteador é a realização da justi-ça equitativa, sobretudo a prevalência da boa-fé”. É que não pode autorizar qualquer meio para se desviar das normas jurídicas, para se destruir valores10.

2 antecedentes Históricos

O contexto atual da teoria da desconsideração teve seu marco. Portan-to, importante uma breve viagem no tempo com fins para sabermos o nasce-douro da teoria ora em análise.

Em termos históricos, a doutrina estudada por César Fiuza, em espe-cial a monografia de César de Souza Mourão, refere que Rolf Serick foi o primeiro a sistematizar, dogmaticamente, o instituto. Contudo, em período anterior ao ano de 1912, as primeiras referências ao tema foram elaboradas

parcialmente provido.” (BRASIL. STJ, REsp 1655139/DF, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, J. 05.12.2017. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1662889&num_registro=201500936304&data=20171207&formato=HTML>. Acesso em: 21 dez. 2017)

9 “Direito civil e processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação revisional de contrato bancário. Interesse recursal. Ausência. Repetição em dobro do indébito. Impossibilidade. Má-fé do credor não demonstrada. Honorários advocatícios. Fixação por apreciação equitativa do juiz. Súmula nº 83/STJ. 1. Falta ao agravante o necessário interesse recursal quanto à pretensão de afastar a incidência de óbices aplicados ao recurso especial interposto pela parte adversa. 2. A repetição do indébito deve ocorrer na forma simples, e não em dobro, salvo prova da má-fé do credor, que não se presume. Precedentes. 3. Hipótese em que o Tribunal de origem limitou-se a afirmar que a cobrança das tarifas bancárias denominadas ‘NHOC’ constituía ‘expediente reprovável’, sem, contudo, demonstrar a má-fé da instituição financeira, isto é, ou seu intuito fraudulento ou abusivo na cobrança. Assim, mostra-se inviável a repetição em dobro do indébito. 4. Os honorários advocatícios, na ação de revisão de contratos bancários, devem ser fixados na forma prevista no art. 20, § 4º, do CPC/1973, dada a natureza declaratória e constitutiva do provimento jurisdicional. Precedentes. 5. Agravo interno não provido.” (BRASIL. STJ, AgInt-EDcl-REsp 1534561/PR, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, J. 27.04.2017. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1595866&num_registro=201501231025&data=20170512&formato=HTML>. Acesso em: 20 dez. 2017)

10 LÔBO, Paulo. Direito civil: parte geral. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 186.

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por Maurice Wormster, jurista norte-americano, vindo a consolidar-se nos Tribunais daquele país com a denominação de disregard doctrine11. E mais:

Registros doutrinários informam que o primeiro julgado em que foi apli-cada a teoria da desconsideração da personalidade jurídica foi o conhecido episódio de Salomon v. Salomon & Co. Ltd., ocorrido na Inglaterra, no final do século XIX.

O comerciante Aaron Salomon detinha 2.001 das 2.007 ações da empresa Salomon & Co. Ltd., enquanto as outras seis ações pertenciam a sua esposa e a seus cinco filhos. Como forma de integralizar o capital correspondente a sua participação acionária, Aaron Salomon cedeu seu fundo de comércio particular à sociedade, por valor superfaturado. Dessa forma, passou a ser credor da sociedade pela diferença, instituindo, ainda, uma garantia real em seu favor.

Na falência da referida sociedade, essa manobra permitiu ao sócio majori-tário, Aaron Salomon, primeiramente, o direito de não honrar os débitos sociais, já que dispunha da prerrogativa legal da limitação de sua responsa-bilidade, e, posteriormente, de executar seu crédito preferencialmente aos demais credores.

Tal estratagema gerou um litígio entre a massa falida de Salomon & Co. Ltd.12

O desfecho do litígio, segundo César Fiuza, foi no seguinte sentido: restou aplicada pela High Court e mantida pela Court of Appeal a teoria da desconsideração da personalidade jurídica sob o fundamento de inequívo-ca confusão patrimonial, com a condenação do comerciante ao pagamento das dívidas, confusão aquela entre o patrimônio societário e o pertencente a Aaron Salomon, “[...] já que, de fato, a companhia nada mais era que uma representação deste”13. Contudo:

Não obstante, atendendo-se aos princípios ortodoxos da separação patri-monial existente entre a pessoa jurídica e seus sócios, em 1897, a House of Lords, reformou as decisões proferidas, entendendo que, embora as ações da Salomon & Co. Ltd. estivessem concentradas nas mãos de um único sócio, não haveria qualquer ilicitude na constituição da companhia.14

11 FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 13. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. p. 153.12 FIUZA, César. Op. cit., p. 153.13 FIUZA, César. Op. cit., p. 154.14 FIUZA, César. Op. cit., p. 154.

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Por outro lado, há doutrina que diga que “[...] o leading case (primeiro caso) da teoria da desconsideração ocorreu nos Estados Unidos, ainda em 1809”. É o que explica Suzy Elizabeth Cavalcanti Koury, analisando o caso Bank of the United States v. Deveaux15. Eis o breve relato:

O Juiz Marshall, lifting the corporate veil, isto é, alcançando o véu protetor da personalidade jurídica da sociedade, no caso um banco, considerou ca-racterísticas pessoais dos sócios, para fixar como competente para julgar o caso a Federal Court, diante do fato de serem estrangeiros os administrado-res da instituição financeira.16

No Brasil, lembra César Fiuza, e há não muito tempo, que a teoria era aplicada pelos Tribunais nas hipóteses de abuso de direito e também fraude, com base na má utilização da sociedade. Em termos de direito positivo, ape-nas com o advento do Código de Defesa do Consumidor, em 199017, é que houve menção expressa à teoria18.

Portanto, daquele período mencionado até a atualidade, muitos anos se passaram até que o ordenamento pátrio inserisse expressamente a teoria da desconsideração da personalidade. Vamos à legislação material acerca do instituto.

3 previsão pelo código civil

César Fiuza, com toda a propriedade, explica que:

A inteligência humana criadora e produtiva também tem seu reverso. Logo se percebeu que a segurança atribuída pela personalidade jurídica, no que tange à separação patrimonial e à limitação da responsabilidade de seus membros, poderia ser utilizada para fins diversos dos sociais. A partir daí, surge uma nova teoria que visa a considerar ineficaz a estrutura da pessoa jurídica quando utilizada desvirtuadamente.19

15 FIUZA, César. Op. cit., p. 154.16 FIUZA, César. Op. cit., p. 154.17 César Fiuza entende o CDC trata o instituto de forma dissociada de suas raízes, sendo o

Código Civil, por sua vez, que faz a abordagem mais adequada da teoria. (FIUZA, César. Op. cit., p. 154)

18 FIUZA, César. Op. cit., p. 154.19 FIUZA, César. Op. cit., p. 153.

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Flávio Tartuce aduz que a pessoa jurídica é capaz tanto de direitos como de deveres e de forma independente dos integrantes que a compõem, não possuindo, ainda, vínculo com aqueles: “Em regra, os seus componentes somente responderão por débitos dentro dos limites do capital social, ficando a salvo o patrimônio individual dependendo do tipo societário adotado”20.

A desconsideração da personalidade jurídica autoriza o Magistrado a ignorar “[...] os efeitos da personificação da sociedade para atingir e vincu-lar responsabilidades dos sócios com o intuito de impedir a consumação de fraudes e abusos por eles cometidos, desde que causem prejuízos e danos a terceiros [...]”, em especial aos credores da empresa. A consequência da desconsideração é que tais danos poder ser reparados pelos bens particulares dos sócios, eis que o escudo que protege a pessoa jurídica é retirado para atin-gir aquele que está atrás, ou seja, os sócios ou administradores21. O estudo da desconsideração aponta, ainda, duas grandes teorias sobre o instituto:

a) teoria maior – a desconsideração, para ser deferida, exige a presença de dois requisitos: o abuso da personalidade jurídica + o prejuízo ao credor. Essa teoria foi adotada pelo art. 50 do CC/2002;

b) teoria menor – a desconsideração da personalidade jurídica exige um único elemento, qual seja, o prejuízo ao credor. Essa teoria foi adotada pela Lei nº 9.605/1998 – para os danos ambientais – e, supostamente, pelo art. 28 do Código de Defesa do Consumidor.22

Abaixo a transcrição dos dispositivos infraconstitucionais referidos por Flávio Tartuce, em especial o Código Civil:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber inter-vir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obriga-ções sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

O Superior Tribunal de Justiça é claro quanto à definição e aos efeitos da desconsideração da personalidade jurídica:

20 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 3. ed. São Paulo: Método, 2013. p. 149.

21 TARTUCE, Flávio. Op. cit., p. 149-150.22 TARTUCE, Flávio. Op. cit., p. 151.

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A conclusão em relação à inadimplência da sociedade decorreu não de simples ausência de bens, mas de atuação deliberada para não pagar cre-dores, o que caracteriza fraude, a permitir, nos termos da jurisprudência desta Casa e conforme citado na decisão agravada, a mencionada desconsi- deração.23

Como se sabe, o instituto da desconsideração é medida excepcional e, como tal, também deve aqui ser tratada. Inclusive tal alegação vem am-parada na doutrina de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery quando de suas lições acerca do novo Código de Processo Civil e o instituto da desconsideração. É que a regra geral é a da “[...] denominada autonomia e independência das personalidades jurídicas dos sócios (pessoas físicas), das pessoas jurídicas de que fazem parte”24. Os mestres sentenciam e ressaltam que a interpretação, portanto, deve ser restritiva:

Soma-se a isso que a dívida está sendo cobrada dos sócios, e não da so-ciedade empresária emitente do título. O pedido de desconsideração da personalidade jurídica é medida excepcional, cujo atendimento passa pela verificação dos pressupostos contidos no art. 50 do Código Civil, verbis:

“Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas re-

23 “Agravo interno no recurso especial. Personalidade jurídica. Desconsideração. Citação. Nulidade. Primeiro réu. Citação por edital. Local incerto. Reexame. Súmula nº 7 do STJ. Segundo réu. Comparecimento espontâneo. Impugnação. Súmula nº 283/STF. Fraude caracterizada. Intenção de não pagar credores. Impugnação. Art. 1.021, § 1º, do CPC. Súmula nº 182/STJ. Não conhecimento. 1. A ausência de impugnação a fundamento bastante do acórdão estadual atrai o óbice de que trata o Enunciado nº 283 da súmula do Supremo Tribunal Federal. 2. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória (Súmula nº 7 do STJ). 3. ‘Desconsiderar a personalidade jurídica consiste em ignorar a personalidade autônoma da entidade moral, excepcionalmente, tornando-a ineficaz para determinados atos, sempre que utilizada para fins fraudulentos ou diferentes daqueles para os quais fora constituída, tendo em vista o caráter não absoluto da personalidade jurídica, sujeita sempre à teoria da fraude contra credores e do abuso do direito’ (REsp 1.208.852/SP, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão, J. 12.05.2015, DJe 05.08.2015). 4. Agravo interno não conhecido.” (BRASIL. STJ, AgInt-REsp 1574437/MG, 4ª T., Relª Min. Maria Isabel Gallotti, J. 19.10.2017. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1649279&num_registro=201503156466&data=20171027&formato=HTML>. Acesso em: 4 jan. 2018)

24 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado. 16. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 622.

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lações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos admi-nistradores ou sócios da pessoa jurídica.”

Nesse sentido, não se desincumbiu o demandante de demonstrar a existên-cia dos referidos pressupostos legais. A ausência ou insuficiência de bens e mesmo as diversas demandas judiciais propostas contra os demandados por diversos credores não implica necessariamente o abuso da personali-dade jurídica. Necessário, ao efeito de autorizar a desconstituição da per-sonalidade da sociedade empresária, e redirecionamento da ação ordiná-ria contra os sócios quotistas, um conjunto probatório revelador de que a autonomia jurídica foi usada para lesar ou fraudar a terceiros de boa-fé.25

3.1 previsão pelo código de defesa do consumidor

Como estamos vendo, via de regra, sócios e patrimônios não se con-fundem entre pessoa física e jurídica. Bruno Miragem, inclusive, ensina que:

O princípio da separação da pessoa jurídica da pessoa de seus sócios ou constituintes (societas distat a singuli) comporta dois aspectos: a separação subjetiva da pessoa jurídica, pela qual sua personalidade não se confunde com a de seus sócios; e a separação objetiva, segundo a qual não se confun-dem o patrimônio da pessoa jurídica e o de seus sócios.26

Contudo, essas características, mesmo auxiliando e estimulando o de-senvolvimento da atividade econômica, limitavam os riscos do empreende-dor, dando margem, muitas vezes, a abusos, mau uso, desvio de finalidade27.

Ainda, Bruno Miragem leciona que o Código de Defesa do Consumi-dor apresenta duas funções básicas em sede de desconsideração da perso-nalidade jurídica, quais sejam: a) sanção pelo uso da pessoa jurídica para fins ilícitos genericamente considerados e b) garantia do consumidor pelos prejuízos28.

A previsão do instituto da desconsideração da personalidade jurídica, então, vem assim prevista pelo CDC:

25 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado. Op. cit., p. 622.

26 MIRAGEM, Bruno. Op. cit., p. 515.27 MIRAGEM, Bruno. Op. cit., p. 515.28 MIRAGEM, Bruno. Op. cit., p. 517.

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Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa ju-rídica provocados por má administração.

§ 1º (Vetado).

§ 2º As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades con-troladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.

§ 3º As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.

§ 4º As sociedades coligadas só responderão por culpa.

§ 5º Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuí-zos causados aos consumidores.

Pela leitura do dispositivo, diversas hipóteses são trazidas para fins de desconsideração, divididas em: a) ilicitude ou irregularidade da conduta do fornecedor e b) falência, insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica (mas não de forma automática, ou de per se): decorrente da má admi-nistração), podendo configurar a incompetência, má-fé, fraude29.

Claudia Lima Marques ressalta que a ampla previsão do CDC no tocante à desconsideração é cristalina no sentido da proteção do consumi-dor, quando a personalidade jurídica “[...] for obstáculo ao ressarcimento dos danos sofridos pelo consumidor”, e com especial destaque às hipóteses de acidente de consumo (de proporções catastróficas), nos termos do § 5º, art. 28 do CDC, eis que o patrimônio da empresa não será suficiente à repa-ração integral dos danos30.

Nessa decisão, percebe-se que houve pedido de desconsideração da personalidade jurídica, mas que restou afastado e com trânsito em julgado,

29 MIRAGEM, Bruno. Op. cit., p. 517-518.30 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das

relações contratuais. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 1411.

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inclusive. Contudo, em sede de cumprimento de sentença, houve a renova-ção do pedido, mas que, com causa idêntica, também restou indeferido31:

Constata-se que a decisão no processo de conhecimento, transitada em jul-gado, afastara a aplicação do CDC à espécie, decidindo-se ali também pela inexistência de pressupostos processuais e materiais necessários à aplica-ção da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, com base no art. 50 do Código Civil.

Portanto, não é viável a modificação de tal entendimento, quando do cum-primento da sentença, para se aplicar ao caso a teoria menor da desconsi-deração da personalidade jurídica e o Código de Defesa do Consumidor, afastados no título judicial, sob pena de ofensa à coisa julgada.

Pelo exposto, configurada a violação ao art. 467 do CPC/1973, dá-se pro-vimento ao recurso especial, reformando-se o v. acórdão recorrido, reco-nhecendo-se a inviabilidade de aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica em face da coisa julgada.

É como voto.

César Fiuza tece críticas ao art. 28 do CDC. Alerta o mestre que não deveria haver a desconsideração da personalidade com base na má-adminis-tração. Inclusive lembra o autor que a responsabilidade limitada surgiu exa-tamente para proteger o patrimônio pessoal dos sócios justamente na hipóte-

31 “Recurso especial. Processual civil e civil. Ação de reparação de danos materiais. Pedido de desconsideração da personalidade jurídica. Sócios excluídos expressamente da lide, sem aplicação do Código de Defesa do Consumidor na fase de conhecimento. Fase de cumprimento de sentença. Novo pedido de desconsideração, pela mesma razão: encerramento irregular da pessoa jurídica. Inviabilidade. Questão anteriormente decidida. Coisa julgada (CPC/1973, art. 467). Recurso provido. 1. Na hipótese, decisão proferida na fase de conhecimento, transitada em julgado, afastara a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e afirmara a inexistência de pressupostos processuais e materiais necessários à aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, com base no art. 50 do Código Civil. 2. Nesse contexto, é inviável a modificação de tal entendimento,quando do cumprimento da sentença, para se aplicar agora ao caso,com base na mesma razão já antes examinada, a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica e o CDC, afastados no título judicial, sob pena de ofensa à coisa julgada. 3. Recurso especial provido.” (BRASIL. STJ, REsp 1473782/MG, 4ª T., Rel. Min. Raul Araújo, J. 15.08.2017. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1623551&num_registro=201401998569&data=20170831&formato=HTML>. Acesso em: 31 out. 2017)

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se da má-administração. E alerta: “Não se deve confundir má-administração com má-fé”32.

O STJ vem nesse sentido: “[...] permitindo a desconsideração da perso-nalidade jurídica, por exemplo, pelo simples inadimplemento ou pela ausên-cia de bens suficientes para a satisfação do débito”33. Já quando trata a relação

32 FIUZA, César. Op. cit., p. 154.33 “Civil. Processual civil. Recurso especial. Recurso manejado sob a égide do NCPC.

Agravo de instrumento. Ação de rompimento contratual e indenização por danos morais e materiais. Fase de cumprimento de sentença. Relação de consumo. Ausência de ativos financeiros da empresa executada. Violação do art. 1.022, II, do NCPC. Não configurada. Desconsideração da pessoa jurídica. Art. 28, § 5º, do CDC (teoria menor) que não exige a prática de atos fraudulentos, mas não possui a hipótese de responsabilização do administrador. Art. 50 do CC (teoria maior) que permite a responsabilização do administrador não sócio, mas exige que as obrigações contraídas tenham sido realizadas com excesso de poder ou desvio do objeto social. Tribunal de origem que não indicou nenhuma prática de ato irregular ou fraudulento pelo administrador não sócio. Responsabilização indevida. Recurso especial conhecido e parcialmente provido. 1. Aplicabilidade do NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. De acordo com a jurisprudência desta Corte, a contradição ou obscuridade remediáveis por embargos de declaração são aquelas internas ao julgado embargado, devido à desarmonia entre a fundamentação e as conclusões da própria decisão; já a omissão, que enseja o oferecimento de embargos de declaração, consiste na falta de manifestação expressa sobre algum fundamento de fato ou de direito ventilado nas razões recursais. No caso dos autos houve manifestação do Tribunal de origem, ainda que em sentido contrário ao pretendido pela parte. Violação do art. 1.022 do NCPC não configurada. 3. Esta Corte já consolidou o entendimento de que nas relações jurídicas de natureza civil-empresarial, adota-se a teoria maior, segundo a qual a desconsideração da personalidade jurídica é medida excepcional que permite sejam atingidos os bens das pessoas naturais (sócios ou administradores), de modo a responsabilizá-las pelos prejuízos que, em fraude ou abuso, causaram a terceiros, nos termos do art. 50 do CC. 4. É possível atribuir responsabilidade ao administrador não sócio, por expressa previsão legal. Contudo, tal responsabilização decorre de atos praticados pelo administrador em relação às obrigações contraídas com excesso de poder ou desvio do objeto social. 5. A responsabilidade dos administradores, nestas hipóteses, é subjetiva, e depende da prática do ato abusivo ou fraudulento. No caso dos autos, não foi consignada nenhuma prática de ato irregular ou fraudulento do administrador. 6. O art. 50 do CC, que adota a teoria maior e permite a responsabilização do administrador não sócio, não pode ser analisado em conjunto com o § 5º do art. 28 do CDC, que adota a teoria menor, pois este exclui a necessidade de preenchimento dos requisitos previstos no caput do art. 28 do CDC permitindo a desconsideração da personalidade jurídica, por exemplo, pelo simples inadimplemento ou pela ausência de bens suficientes para a satisfação do débito. Microssistemas independentes. 7. As premissas adotadas pelo Tribunal de origem não indicaram nenhuma prática de ato irregular ou fraudulento pelo administrador não sócio.

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civil-empresarial, portanto, observadas as regras do art. 50 do Código Civil, a Corte entende que a não localização de bens, por si só, não autoriza a des-consideração da personalidade jurídica34.

4 Ônus da prova

Cabe ao autor alegar e provar os fatos constitutivos de seu direito, como sabida e notoriamente exige a legislação processual civil. É o que se percebe pelo entendimento do Tribunal gaúcho acerca de tal ônus, ou seja35:

8. Assim, não havendo previsão expressa no Código consumerista quanto à possibilidade de se atingir os bens do administrador não sócio, pelo simples inadimplemento da pessoa jurídica (ausência de bens) ou mesmo pela baixa registral da empresa executada, é forçoso reconhecer a impossibilidade de atribuição dos efeitos da desconsideração da personalidade jurídica ao administrador não sócio. 9. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.” (BRASIL. STJ, REsp 1658648/SP, 3ª T., Rel. Min. Moura Ribeiro, J. 07.11.2017. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1648357&num_registro=201700149274&data=20171120&formato=HTML>. Acesso em: 4 jan. 2018)

34 “Agravo interno no recurso especial. Cumprimento de sentença. Decisão monocrática. Art. 932 do CPC/2015. Possibilidade. Executada. Pessoa jurídica. Desconsideração da personalidade. Relação civil-empresarial. Art. 50 do Código Civil. Teoria maior. Atos ilícitos. Comprovação específica. Desvio de finalidade ou confusão patrimonial. Bens não localizados. Hipótese não configurada. Provimento. Agravo interno não provido. 1. Nos termos do art. 557 do CPC/1973 e do art. 932 do CPC/2015, pode o relator julgar monocraticamente recurso para alinhar a controvérsia ao entendimento jurisprudencial vigente. Precedentes. 2. O art. 50 do Código Civil, aplicável às relações civis-empresariais, adota a teoria maior da desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, só podendo ser aplicado quando comprovado especificamente desvio de finalidade ou confusão patrimonial. 3. A mera não localização de bens não permite a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica e acesso ao patrimônio dos sócios. Precedentes do STJ. 4. Agravo interno não provido.” (BRASIL. STJ, AgInt-REsp 585391/SP, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão, J. 07.11.2017. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1653034&num_registro=201600423710&data=20171114&formato=HTML>. Acesso em: 4 jan. 2018)

35 “Agravo de instrumento. Responsabilidade civil em acidente de trânsito. Cumprimento de sentença. Desconsideração inversa da personalidade jurídica. Blindagem patrimonial. Ônus da prova. A tese dos exequentes, de que o executado se utiliza indevidamente de empresas das quais é sócio para blindar seu patrimônio e, assim, esvaziar a execução, não restou minimamente comprovada nos autos, devendo ser mantida, pelo menos por ora, a decisão que indeferiu o pedido de desconsideração inversa da personalidade jurídica. Exegese do art. 333, I, do CPC.Agravo de instrumento desprovido.” (BRASIL. TJRS, AI 70055310148, 12ª C.Cív., Rel. Des. Umberto Guaspari Sudbrack, J. 10.10.2013. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/search?q=cache:www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php%3Fnome_comarca%3DTribunal%2Bde%2BJusti%25E7a%26versao%3D%26versao_fonetica%3D1%26tipo%3D1%26id_comarca%3D700%26num_

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Argumentam os credores que o devedor se utiliza das referidas empresas e de laranjas para praticar a chamada blindagem patrimonial, com fim ilícito, qual seja, impossibilitar a satisfação dos créditos dos ora recorrentes.

Sucede que a alegação dos agravantes não encontra amparo nas provas dos autos.

Com efeito, o fato de agravado ser sócio das empresas acima referidas não autoriza, por si só, concluir pela prática de ato visando ao esvaziamento da execução.

Nesse ponto, aliás, registro não haver impedimento de qualquer espécie para que o ora agravado seja o representante legal de uma, de outra ou de ambas as sociedades empresárias.

Identicamente, os fatos de estas terem considerável receita mensal, cada uma, e de serem proprietárias de veículos automotores não laboram em favor da tese dos exequentes.

A inidoneidade, nesse caso, não pode ser presumida.

Ainda que não tenham sido encontrados bens ou valores passiveis de penhora no patrimônio do devedor, diante dos elementos acostados aos autos, não se infere que estes estejam sendo acortinados pelas referidas sociedades empresárias, especialmente quanto aos veículos elencados na petição dos exequentes (fl. 125 do presente instrumento), a saber, duas Fiat Fiorino, utilitários de pequeno porte sabidamente utilizados para trabalho.

Nesse outro julgamento, percebemos a importância da prova a ser feita por quem postula a desconsideração36.

processo_mask%3D70055310148%26num_processo%3D70055310148%26codEmenta%3D5494618+RESPONSABILIDADE+CIVIL+EM+ACIDENTE+DE+TR%C3%82NSITO+e+CUMPRIMENTO+DE+SENTEN%C3%87A+e+DESCONSIDERA%C3%87%C3%83O+INVERSA+DA+PERSONALIDADE+JUR%C3%8DDICA++++&proxystylesheet=tjrs_index&client=tjrs_index&ie=UTF-8&site=ementario&access=p&oe=UTF-8&numProcesso=70055310148&comarca=Comarca%20de%20Parob%C3%A9&dtJulg=10/10/2013&relator=Umberto%20Guaspari%20Sudbrack&aba=juris>. Acesso em: 1º nov. 2017)

36 “Direito privado não especificado. Ação de cobrança. Crédito decorrente de empréstimo a juros ilegais. Nulidade da nota promissória reconhecida em ação de cobrança anteriormente proposta. Coisa julgada. Desconsideração da personalidade jurídica. Ação de cobrança proposta contra os sócios da emitente da nota promissória. Litigância de má-fé. Repetição de indébito. Honorários advocatícios. Apelo do autor. O credor, em que pese pudesse buscar o valor emprestado, contudo, não se desincumbiu do ônus de comprovar o valor que efetivamente lhe era devido, expurgado do débito o montante

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A respeito da desconsideração, finalizamos este tópico com as lições Humberto Theodoro Júnior37:

Demonstrando o credor estarem presentes os requisitos legais, o juiz deve-ria levantar o véu da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atingisse os bens particulares dos sócios, de forma a impedir a concretiza-ção de fraude à lei ou contra terceiros.

Dos ensinamentos acima, o notável jurista inicia ressaltando a exigên-cia da demonstração, pelo credor, sobre os requisitos de lei a autorizarem a desconsideração, ou seja, no sentido da prova pelo interessado.

referente aos juros ilegalmente pactuados. De outra forma, requereu somente o valor da nota promissória declarada nula, onde constam os encargos ilegalmente exigidos, o que ofende a coisa julgada. O pedido de desconsideração da personalidade jurídica é medida excepcional, cujo atendimento passa pela verificação dos pressupostos contidos no art. 50 do Código Civil. Nesse sentido, não se desincumbiu o demandante de demonstrar a existência dos referidos pressupostos legais. Apelo dos réus: Na presente demanda, o credor não se desincumbiu do ônus de comprovar o valor efetivamente devido, daí a sua improcedência, não, porém, a caracterização da má-fé processual. Não há, portanto, que se falar em condenação do autor nas penas por litigância de má-fé, porquanto não configuradas quaisquer das hipóteses previstas no art. 17 do CPC. O pedido de repetição de indébito, conforme previsto no art. 940 do Código Civil vigente, exige a prova da má-fé e a postulação deve ser feita em reconvenção ou em ação própria. No caso, além de a má-fé não estar evidenciada, o pedido foi formulado em sede de contestação, que não é o meio adequado para tal. Os honorários advocatícios não comportam majoração, porquanto fixados em quantia que atende às exigências do art. 20, § 4º, do CPC, observados os critérios do § 3º do mesmo dispositivo legal. Improvidas as apelações.” (BRASIL. TJRS, AC 70033236225, 19ª C.Cív., Relª Desª Mylene Maria Michel, J. 22.03.2011. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/search?q=cache:www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php%3Fnome_comarca%3DTribunal%2Bde%2BJusti%25E7a%26versao%3D%26versao_fonetica%3D1%26tipo%3D1%26id_comarca%3D700%26num_processo_mask%3D70033236225%26num_processo%3D70033236225%26codEmenta%3D4046939+DESCONSIDERA%C3%87%C3%83O+DA+PERSONALIDADE+JUR%C3%8DDICA++A%C3%87%C3%83O+DE+COBRAN%C3%87A+PROPOSTA+CONTRA+OS+S%C3%93CIOS+DA+EMITENTE+DA+NOTA+PROMISS%C3%93RIA+++++&proxystylesheet=tjrs_index&client=tjrs_index&ie=UTF-8&site=ementario&access=p&oe=UTF-8&numProcesso=70033236225&comarca=Comarca%20de%20Camaqu%C3%A3&dtJulg=22/03/2011&relator=Mylene%20Maria%20Michel&aba=juris>. Acesso em: 1º nov. 2017)

37 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil: processo de conhecimento: procedimento comum. 56. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. I, 2015. p. 397.

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5 desconsideração e o novo código de processo civil

O novo Código de Processo Civil veio a regular a matéria e apontou o procedimento à luz do contraditório e da ampla defesa. Em relação ao insti-tuto da desconsideração inversa propriamente dito, a previsão da legislação processual civil igualmente é aplicável, e será também objeto de análise mais adiante38:

Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.

[...]

§ 2º Aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração in-versa da personalidade jurídica.

Sendo a modalidade de desconsideração direta ou a inversa, Humberto Theodoro Júnior é categórico e taxativo ao apresentar os requisitos que a con-figuram, quais sejam, “abuso de direito, consubstanciado pelo desvio de fina-lidade da pessoa jurídica ou pela confusão patrimonial”, ressaltando o ilustre jurista, com base também na posição do STJ que mais abaixo será trazida, que tal medida é excepcional, o que exige a presença dos requisitos previstos pelo art. 50 do Código Civil39. Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery definem o instituto neste sentido, lembrando mais uma vez40:

Consiste na possibilidade de se ignorar a personalidade jurídica autônoma de entidade moral sempre que esta venha a ser utilizada para fins fraudu-lentos ou diversos daqueles para os quais foi constituída, permitindo que o credor de obrigação assumida pela pessoa jurídica alcance o patrimônio particular de seus sócios ou administradores para a satisfação de seu crédito.

Gustavo Tepedino, Maria Celina Bodin de Moraes e Heloisa Helena Barboza aduzem que incide a desconsideração da personalidade jurídica quando, por exemplo, há intenção prejudicar, de fraudar41.

38 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Op. cit., p. 398.39 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Op. cit., p. 398.40 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil comentado. 11. ed. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 378.41 TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena, MORAES, Maria Celina Bodin. Código

Civil interpretado conforme a Constituição da República: parte geral e obrigações (arts. 1º a 420). 3. ed. São Paulo: Renovar, v. I, 2014. p. 133.

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5.1 desconsideração inversa da personalidade jurídica

Além da desconsideração da personalidade jurídica nos moldes em que até este momento analisado, é possível que aquela venha a ocorrer de forma inversa, nos termos do parágrafo único do art. 133 do Código de Pro-cesso Civil, como brevemente referido anteriormente:

Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.

§ 2º Aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração in-versa da personalidade jurídica.

Paulo Lôbo assim leciona:

O CPC/2015 (art. 133, § 2º) admite, igualmente, a desconsideração inversa da personalidade jurídica. Tal se dá quando o sócio controlador de socie-dade empresária transfere parte de seus bens à pessoa jurídica controlada com o intuito de fraudar terceiro, a exemplo do cônjuge ou companheiro em relação à futura partilha dos bens do casal em divórcio ou dissolução de união estável. Nessa hipótese, não é alcançado o patrimônio do contro-lador, mas sim o da pessoa jurídica, no montante correspondente ao que lhe foi transferido.42

Portanto, para essa espécie de desconsideração, o que ocorre é a res-ponsabilização da pessoa jurídica, mas em decorrência das obrigações assu-midas pelos sócios43.

Em que pese tal decisão tenha entendido pelo indeferimento do pedi-do, discorre sobre a finalidade da desconsideração44:

42 LÔBO, Paulo. Direito civil: parte geral. 6. ed. Op. cit., p. 189.43 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: parte geral e

LINDB. 13. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2015. p. 400.44 “Agravo de instrumento. Locação. Fiadores. Desconsideração inversa da personalidade

jurídica. Caso em que o exequente carece dos pressupostos legais para atingir os bens da empresa da qual os fiadores/executados são sócios-administradores. A desconsideração inversa da personalidade jurídica depende da instauração de incidente processual nos moldes do art. 133, § 2º, do CPC e da prova do abuso da pessoa jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial (CC, art. 50). Agravo de instrumento desprovido.” (BRASIL. TJRS, AI 70074018524, 16ª C.Cív., Relª Desª Cláudia Maria Hardt, J. 27.07.2017. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/search?q=cache:www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_

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Outrossim, considerando que a finalidade do instituto é combater a utiliza-ção indevida da pessoa jurídica por seus sócios, a desconsideração inversa da personalidade jurídica não prescinde do atendimento aos pressupostos específicos estabelecidos no art. 50 do CC.

[...]

Desse modo, sem a instauração do incidente e a prova do abuso da pessoa jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial (CC, art. 50), os agravantes carecem dos pressupostos legais para atingir os bens da empresa da qual os fiadores/executados são sócios.

5.2 Momento do requerimento

Questão de relevância ímpar para a continuidade deste artigo é a análi-se do momento que poderá haver a desconsideração da personalidade jurídi-ca, ou melhor: do momento em que é postulada. Em especial há irresignação daquele que terá contra si a responsabilidade, sendo natural que se insurja a respeito dessa circunstância. No caso concreto, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que a desconsideração efetivada em sede de cumprimento de sen-tença não afronta qualquer direito do responsável, em especial o contraditó-rio e a ampla defesa45:

processo.php%3Fnome_comarca%3DTribunal%2Bde%2BJusti%25E7a%26versao%3D%26versao_fonetica%3D1%26tipo%3D1%26id_comarca%3D700%26num_processo_mask%3D70074018524%26num_processo%3D70074018524%26codEmenta%3D7387872+LOCA%C3%87%C3%83O+e+FIADORES+e+DESCONSIDERA%C3%87%C3%83O+INVERSA+DA+PERSONALIDADE+JUR%C3%8DDICA++++&proxystylesheet=tjrs_index&cl ient=t j rs_ index&ie=UTF-8&si te=ementar io&access=p&oe=UTF-8&numProcesso=70074018524&comarca=Comarca%20de%20Porto%20Alegre&dtJulg=27/07/2017&relator=Cl%C3%A1udia%20Maria%20Hardt&aba=juris>. Acesso em: 3 jan. 2018)

45 “Direito civil e do consumidor. Desconsideração da personalidade jurídica. Pressupostos processuais e materiais. Observância. Citação dos sócios em prejuízo de quem foi decretada a desconsideração. Desnecessidade. Ampla defesa e contraditório garantidos com a intimação da constrição. Impugnação ao cumprimento de sentença. Via adequada para a discussão acerca do cabimento da disregard. Relação de consumo. Espaço próprio para a incidência da teoria menor da desconsideração. Art. 28, § 5º, do CDC. Precedentes. 1. A desconsideração da personalidade jurídica é instrumento afeito a situações limítrofes, nas quais a má-fé, o abuso da personalidade jurídica ou confusão patrimonial estão revelados, circunstâncias que reclamam, a toda evidência, providência expedita por parte do Judiciário. Com efeito, exigir o amplo e prévio contraditório em ação de conhecimento própria para tal mister, no mais das vezes, redundaria em esvaziamento do instituto nobre. 2. A superação da pessoa jurídica afirma-se como um incidente processual e não como um processo incidente, razão pela qual pode ser deferida nos próprios autos, dispensando-se

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Nada obstante, é de se ressaltar que a desconsideração da personalidade jurídica é instrumento afeito a situações limítrofes, nas quais a má-fé, o abuso da personalidade jurídica ou confusão patrimonial estão revelados, circunstâncias que reclamam, a toda evidência, providência expedita por parte do Judiciário.

Com efeito, exigir o amplo contraditório em ação de conhecimento própria para tal mister, no mais das vezes, redundaria em esvaziamento do insti-tuto nobre.

[...] Seguindo a mesma linha, o anteprojeto para o novo Código de Processo Civil, de forma inédita, disciplina o “incidente de desconsideração da per-sonalidade jurídica”, mediante o qual o sócio ou terceiro será simplesmen-

também a citação dos sócios, em desfavor de quem foi superada a pessoa jurídica, bastando a defesa apresentada a posteriori, mediante embargos, impugnação ao cumprimento de sentença ou exceção de pré-executividade. 3. Assim, não prospera a tese segundo a qual não seria cabível, em sede de impugnação ao cumprimento de sentença, a discussão acerca da validade da desconsideração da personalidade jurídica. Em realidade, se no caso concreto e no campo do direito material fosse descabida a aplicação da disregard doctrine, estar-se-ia diante de ilegitimidade passiva para responder pelo débito, insurgência apreciável na via da impugnação, consoante art. 475-L, IV. Ainda que assim não fosse, poder-se-ia cogitar de oposição de exceção de pré-executividade, a qual, segundo entendimento de doutrina autorizada, não só foi mantida, como ganhou mais relevo a partir da Lei nº 11.232/2005. 4. Portanto, não se havendo falar em prejuízo à ampla defesa e ao contraditório, em razão da ausência de citação ou de intimação para o pagamento da dívida (art. 475-J do CPC), e sob pena de tornar-se infrutuosa a desconsideração da personalidade jurídica, afigura- -se bastante – quando, no âmbito do direito material, forem detectados os pressupostos autorizadores da medida – a intimação superveniente da penhora dos bens dos ex-sócios, providência que, em concreto, foi realizada. 5. No caso, percebe-se que a fundamentação para a desconsideração da pessoa jurídica está ancorada em ‘abuso da personalidade’ e na ‘ausência de bens passíveis de penhora’, remetendo o voto condutor às provas e aos documentos carreados aos autos. Nessa circunstância, o entendimento a que chegou o Tribunal a quo, além de ostentar fundamentação consentânea com a jurisprudência da Casa, não pode ser revisto por força da Súmula nº 7 do STJ. 6. Não fosse por isso, cuidando-se de vínculo de índole consumerista, admite-se, a título de exceção, a utilização da chamada ‘teoria menor’ da desconsideração da personalidade jurídica, a qual se contenta com o estado de insolvência do fornecedor somado à má administração da empresa, ou, ainda, com o fato de a personalidade jurídica representar um ‘obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores’, mercê da parte final do caput do art. 28, e seu § 5º do Código de Defesa do Consumidor. 7. A investigação acerca da natureza da verba bloqueada nas contas do recorrente encontra óbice na Súmula nº 7 do STJ. 8. Recurso especial não provido.” (BRASIL. STJ, REsp 1096604/DF, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão, J. 02.08.2012. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=986955&num_registro=200802186484&data=20121016&formato=HTML>. Acesso em: 1º nov. 2017)

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te intimado do pedido, ocasião em que será oportunizada sua defesa com as provas a ela inerentes (art. 64 do anteprojeto).

4. Muito embora o recorrente tenha colacionado aos autos acórdão paradig-ma desta Quarta Turma a exigir citação dos sócios em desfavor de quem foi desconsiderada a personalidade jurídica (REsp. 686.112/RJ), entendo ser o precedente inaplicável ao caso ora em exame.

Primeiramente porque se cogita, na espécie, de sentença condenatória em fase de cumprimento, nos termos da nova sistemática introduzida pela Lei nº 11.232/2005, a qual, como é de cursivo conhecimento, ostentou como traço marcante a dispensa de citação do próprio devedor para iniciar-se a fase satisfativa. Com mais razão, descabe então falar em citação dos sócios em relação aos quais se operou a constrição patrimonial.

Por outro lado, o próprio relator daquele processo trazido como paradig-ma posteriormente alterou sua posição em outro julgado, mais recente, ao entender que a superação da pessoa jurídica afirma-se como um incidente processual e não como um processo incidente, razão pela qual pode ser deferida nos próprios autos da falência, nos termos da jurisprudência sedi-mentada do STJ, verbis:

Processo civil. Arts. 458, II, e 535, I e II, do CPC. Ofensa. Não ocorrência. Súmula nº 284/STF. Análise de cláusulas de contrato e reexame de pro-va. Súmulas nºs 5 e 7 do STJ. Matérias infraconstitucionais. Prequestio-namento. Ausência. Súmula nº 211/STJ. Autofalência. Desconsideração da personalidade jurídica. Arresto dos bens dos sócios. Desnecessidade de ação autônoma. Decretação no processo falimentar. Impugnação via recursos cabíveis. Desrespeito ao contraditório, ampla defesa e devido processo legal. Não ocorrência. Impugnação via recursos cabíveis. Pre-cedentes. Súmula nº 83/STJ.

O Tribunal de Justiça gaúcho, analisando pedido de desconsideração, ressaltou que tanto o art. 50 do Código Civil, como o art. 134 do Código de Processo, autorizam o procedimento a qualquer momento46. Nesse outro

46 “Apelação cível. Direito privado não especificado. Ação anulatória de alteração contratual de sociedade limitada na junta comercial acerca de venda de quotas sociais. Afastamento da decadência. Desnecessidade de outorga uxória. Rejeição do pedido inicial. I – Lide versando sobre anulação de alteração de contrato social em vista da venda de quotas sociais pelo cônjuge da autora, que é atualmente viúva e alega ausência de outorga para referida venda e prejuízo de sua meação. II – Afastamento da decadência decretada em sentença. Em primeiro lugar, a inicial foi amparada em alegação de desconsideração da personalidade jurídica, o que pode ser arguido em qualquer momento, conforme

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caso, contudo, a decisão entendeu (considerando as peculiaridades em julga-mento) que o momento da desconsideração, já na ação de conhecimento, foi inapropriado47:

Relativamente à desconsideração da personalidade jurídica, melhor sorte não assiste ao autor, uma vez que não se verifica, no atual momento pro-cessual, a possibilidade partir diretamente para os bens particulares dos sócios. O feito se encontra em fase de conhecimento, e a desconsideração pretendida deverá ser analisada em caso de inexistirem bens da empresa ré, o que ainda não se verificou.

art. 50 do Código Civil e art. 134 do novo Código de Processo Civil. Em segundo lugar, houve arguição, na inicial, também, de simulação de ato jurídico, sendo que o prazo decadencial, neste caso, deve iniciar a partir da dissolução da sociedade conjugal, que se deu com a morte do marido da autora. III – Rejeição do pedido inicial com força no art. 487, I, do novo Código de Processo Civil, considerando a não comunicação das quotas sociais do falecido marido da autora com o patrimônio comum ao casal, na linha do disposto no art. 1.659 do Código Civil, bem como a desnecessidade de outorga uxória para a venda de ditas quotas pelo falecido à sua mãe, conforme art. 1.647 do mesmo Diploma. Recurso desprovido à unanimidade.” (BRASIL. TJRS, AC 70074581109, 17ª C.Cív., Relª Desª Liege Puricelli Pires, J. 26.09.2017. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/search?q=cache:www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php%3Fnome_comarca%3DTribunal%2Bde%2BJusti%25E7a%26versao%3D%26versao_fonetica%3D1%26tipo%3D1%26id_comarca%3D700%26num_processo_mask%3D70074581109%26num_processo%3D70074581109%26codEmenta%3D7463963+desconsidera%C3%A7%C3%A3o+da+personalidade+e+momento++++&proxystylesheet=tjrs_index&client=tjrs_index&ie=UTF-8&site=ementario&access=p&oe=UTF-8&numProcesso=70074581109&comarca=Comarca%20de%20Catu%C3%ADpe&dtJulg=26/09/2017&relator=Liege%20Puricelli%20Pires&aba=juris. Acesso em: 1º nov. 2017)

47 “Recurso inominado. Ação de cobrança. Cheque. Termo de incidência dos juros de mora a contar da data da primeira apresentação da cártula para pagamento, quando constituída a mora. Art. 397 do Código Civil combinado com art. 52, II, da Lei nº 7.357/1985. Desconsideração da personalidade jurídica. Momento processual inadequado. Fase de conhecimento. Impossibilidade. Sentença reformada. Recurso parcialmente desprovido.” (BRASIL. Turmas Recursais, Recurso Cível nº 71006649289, Quarta Turma Recursal Cível, Rel. Dr. Luís Francisco Franco, J. 20.10.2017. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/search?q=cache:www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php%3Fnome_comarca%3DTribunal%2Bde%2BJusti%25E7a%26versao%3D%26versao_fonetica%3D1%26tipo%3D1%26id_comarca%3D700%26num_processo_mask%3D71006649289%26num_processo%3D71006649289%26codEmenta%3D7504094+desconsidera%C3%A7%C3%A3o+da+personalidade+e+momento++++&proxystylesheet=tjrs_index&client=tjrs_index&ie=UTF-8&site=ementario&access=p&oe=UTF-8&numProcesso=71006649289&comarca=Comarca%20de%20Porto%20Alegre&dtJulg=20/10/2017&relator=Lu%C3%ADs%20Francisco%20Franco&aba=juris>. Acesso em: 1º nov. 2017)

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5.3 indeferimento liminar

É possível que o requerimento quanto à desconsideração da personali-dade jurídica seja liminarmente indeferido, haja vista a determinação do § 4º do art. 134 do Código de Processo Civil:

Art. 134. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial.

[...]

§ 4º O requerimento deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica.

Tereza Arruda Alvim Wambier é clara e objetiva ao asseverar que a norma supratranscrita tem ligação direta com o plano do direito material48:

O § 4º remete ao direito material a ser aplicado pelo juiz ao decidir sobre dever ou não ser desconsiderada a pessoa jurídica. No plano do direito civil, do direito do consumidor e em outros ramos do direito material é que são previstos requisitos específicos para a incidência da teoria da desconsi-deração naquele ramo específico do direito. Deve o requerente indicar, des-de logo, as provas que pretende produzir. Mas esse dispositivo faz referên-cia a uma dose mínima de “aparência de bom direito”, de plausibilidade da alegação, sem o que o incidente pode e deve ser liminarmente indeferido.

Tal assertiva vem plenamente contextualizada em caso análogo decidi-do pela Corte gaúcha49:

48 WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 330.

49 “Agravo de instrumento. Cumprimento de sentença. Pretensão à desconsideração inversa da personalidade jurídica. Indeferimento pelo juízo de origem. Recurso da exequente. A inexistência de bens da pessoa física do devedor não determina a pretendida sujeição do patrimônio da pessoa jurídica de que é sócio. Inexistência de prova, no caso, de confusão patrimonial entre as pessoas física e jurídica, tampouco do alegado abuso de direito ou do desvio de bens. Consequente manutenção da decisão agravada. Agravo de instrumento desprovido.” (BRASIL. TJRS, AI 70064790553, 19ª C.Cív., Relª Desª Mylene Maria Michel, J. 03.12.2015. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/search?q=cache:www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php%3Fnome_comarca%3DTribunal%2Bde%2BJusti%25E7a%26versao%3D%26versao_fonetica%3D1%26tipo%3D1%26id_comarca%3D700%26num_processo_mask%3D70064790553%26num_processo%3D70064790553%26codEmenta%3D6589377+PRETENS%C3%83O+%C3%80+DESCONS

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Como se vê, a simples circunstância da inexistência de bens da pessoa física não determina a pretendida sujeição do patrimônio da pessoa jurídica de que é sócio o devedor.

A parte agravante alega que a constituição de empresa no mesmo ramo de atuação, na qual a devedora é detentora de 99% das cotas sociais, configura abuso de forma da personalidade jurídica.

Tal situação, contudo, exige a adequada demonstração probatória, o que não se verifica na espécie, cumprindo referir que os elementos de ponde-ração que instruem o agravo de instrumento nem sequer indiciam tais cir-cunstâncias.

Os documentos de fls. 33/34 (fls. 183/184, original) cópia da declaração de renda remetida pela Receita Federal e informação do Fisco Estadual, ape-nas revelam que a pessoa física [...] é detentora de 99% do capital social da empresa [...]; que as “empresas” [...] (CNPJ nºs [...] e [...]) não apresentam atividade desde 21.12.2012 e que a pessoa jurídica [...] não possui atividade desde 28.05.2012.

De objetivo, a rigor, o agravante comprovou apenas inatividade da deve-dora (firma individual) e a frustração das tentativas de penhora on line.

Inexiste, por outro lado, demonstração de que a devedora tenha agido em desvio de finalidade da pessoa jurídica de que é sócia com 99% das cotas, ou mesmo a ocorrência de confusão patrimonial.

[...]

Outrossim, inviável concluir, com mínima certeza, pela ocorrência de en-genho da devedora, consistente na abertura de “nova empresa” em 2010, antes mesmo de prolatada a sentença (02.03.2011) para se furtar ao paga-mento dos encargos sucumbenciais (R$ 800,00 e R$ 500,00), ora objeto de cumprimento de sentença.

Ressalto, por fim, que a “nova pessoa jurídica” igualmente se encontra sem atividade, como acima visto, desde 2012, antes mesmo da primeira tenta-tiva frustrada de penhora on line em face da devedora, então ocorrida em 15.04.2013, fl. 52.

IDERA%C3%87%C3%83O+INVERSA+DA+PERSONALIDADE+JUR%C3%8DDICA+e+INDEFERIMENTO+PELO+JU%C3%8DZO+DE+ORIGEM++++&proxystylesheet=tjrs_index&client=tjrs_index&ie=UTF-8&site=ementario&access=p&oe=UTF-8&numProcesso=70064790553&comarca=Comarca%20de%20Porto%20Alegre&dtJulg=03/12/2015&relator=Mylene%20Maria%20Michel&aba=juris>. Acesso em: 3 jan. 2018)

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Reunindo essas considerações, não verifico, no caso concreto, o abuso de personalidade, ao efeito de autorizar, ao menos por ora, a pretendida des-consideração inversa da personalidade jurídica.

5.4 Honorários advocatícios

Em face da instauração e tramitação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, mostra-se possível a fixação de honorários advo-catícios, no caso concreto, eis que50:

Em relação ao mérito, na esteira do que já adiantei quando deferi o pedido de efeito suspensivo, reproduzo a motivação daquela decisão, a fim de evi-tar tautologia, adotando-a como razões de decidir, verbis:

“Vistos.

Recebo o agravo de instrumento, na medida em que atendidos os pres-supostos de admissibilidade.

Quanto ao pedido de efeito suspensivo, estou por deferi-lo.

No caso, insurge-se a parte agravante contra decisão que deixou de fi-xar honorários advocatícios quando julgou improcedente o incidente

50 “Agravo de instrumento. Responsabilidade civil. Incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Fixação de honorários advocatícios sucumbenciais. Possibilidade. Preliminar de intempestividade do recurso rejeitada, porquanto atendido o cumprimento do prazo recursal a contar da decisão que não acolheu os embargos de declaração opostos pela parte. Diante da instauração do incidente, com citação e constituição de advogado para sua defesa, e demonstrado que não era o caso de desconsideração de personalidade jurídica, deve, por consequência, o autor/agravado responder pelas custas e honorários sucumbenciais do advogado da outra parte, já que deu causa à instauração do incidente. Aplicação dos princípios da causalidade e da sucumbência. Preliminar rejeitada e agravo de instrumento provido.” (BRASIL. TJRS, AI 70074863473, 9ª C.Cív., Rel. Des. Eugênio Facchini Neto, J. 27.09.2017. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/search?q=cache:www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php%3Fnome_comarca%3DTribunal%2Bde%2BJusti%25E7a%26versao%3D%26versao_fonetica%3D1%26tipo%3D1%26id_comarca%3D700%26num_processo_mask%3D70074863473%26num_processo%3D70074863473%26codEmenta%3D7469428+INCIDENTE+DE+DESCONSIDERA%C3%87%C3%83O+DA+PERSONALIDADE+JUR%C3%8DDICA+e+FIXA%C3%87%C3%83O+DE+HONOR%C3%81RIOS+ADVOCAT%C3%8DCIOS+SUCUMBENCIAIS+e+POSSIBILIDADE++++&proxystylesheet=tjrs_index&client=tjrs_index&ie=UTF-8&site=ementario&access=p&oe=UTF-8&numProcesso=70074863473&comarca=Comarca%20de%20Caxias%20do%20Sul&dtJulg=27/09/2017&relator=Eug%C3%AAnio%20Facchini%20Neto&aba=juris>. Acesso em: 3 jan. 2018)

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de desconsideração da personalidade jurídica da empresa (fls. 99/103), por entender não ser cabível na espécie.

É sabido que com o advento do CPC/2015, o pedido incidental de des-consideração de personalidade jurídica passou a revestir a forma de uma intervenção de terceiros.

Assim, tendo a empresa agravante (cujos sócios foram alvo do incidente de desconsideração de personalidade jurídica) sido devidamente cita-da, constituindo advogado para sua defesa ao incidente instaurado, e demonstrado que não era o caso de desconsideração de personalidade jurídica, deve, por consequência, o autor/agravado responder pelas custas e honorários sucumbências do advogado da outra parte, já que deu causa à instauração do incidente.

Portanto, em face do princípio da causalidade, deve ser imposto ao agravado a verba honorária devida à parte vencedora do incidente, na medida em que não logrou êxito acerca do cabimento da instauração do incidente de desconsideração de personalidade jurídica.

Nesse sentido, cito recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o ED-AREsp 813964/SP, sob Relatoria do MM. Ministro Marco Buzzi, julgado em 30.05.2017, DJe 08.06.2017, proferiu seguinte trecho em seu voto:

[...] 1. Com efeito, há omissão no julgado relativamente aos honorários advocatícios motivo pelo qual imperiosa a integralização do feito. O acolhimento da tese recursal no sentido de impossibilitar a desconsi-deração da personalidade jurídica em razão da não caracterização de desvio de finalidade ou confusão patrimonial impõe o arbitramento de honorários advocatícios sucumbenciais em benefício do sócio excluído do polo passivo da execução, não tendo havido mero ‘incidente’ como alega o embargado, mas sim efetiva instauração de procedimento liti-gioso entre as partes, incidindo, portanto, o princípio da causalidade. [...]

Logo, deve ser concedido efeito ativo para o fim de sobrestar eventual andamento do incidente, até julgamento do agravo.

Por isso, defiro o efeito suspensivo postulado, para o fim de sobrestar eventual andamento do incidente, até julgamento deste agravo.”

E nesses termos mantenho meu posicionamento, pois, tendo em vista os princípios da sucumbência e da causalidade, a empresa agravante faz jus aos honorários sucumbenciais.

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Ante o exposto, rejeito a preliminar contrarrecursal e dou provimento ao agravo, a fim de arbitrar a verba honorária devida no valor de R$ 1.500,00, a ser corrigida pelo IGP-M e com juros de mora de 1% ao mês desde a data do julgamento do incidente.

Portanto, dado o alerta sobre a possibilidade de fixação da verba hono-rária em sede de análise sobre o pedido de desconsideração da personalidade jurídica.

5.5 direito tributário e Justiça do trabalho

Quando as dívidas têm natureza tributária, podemos observar que a situação é mais rígida, eis que se dispensa o incidente de desconsideração51:

Isto porque, em se tratando de execução fiscal de crédito tributário, tem-se que a sistemática de responsabilização insculpida nos arts. 134 e 135, III, do CTN é orientada pelas prerrogativas do crédito público insculpidas na Lei de Execução Fiscal, a qual é incompatível com o incidente de descon-sideração da personalidade jurídica previsto no novel CPC nos arts. 133 e seguintes.

51 “Agravo de instrumento. Direito tributário. Execução fiscal. Incidente de desconsideração da personalidade jurídica. 1. É incompatível com as prerrogativas dos créditos públicos tributários o incidente de desconsideração da personalidade jurídica previsto nos arts. 133 e seguintes do CPC/2016, mormente em se tratando de hipótese de pretensão de redirecionamento por suposta dissolução irregular, em que a hipótese de responsabilidade do art. 135, III, do CTN, vem densificada pela presunção enunciada no verbete da Súmula nº 435 do STJ. 2. Tendo em vista que a decisão de origem não apreciou a caracterização em si da hipótese de redirecionamento e esta depende de análise fática (desempenhada exclusivamente nas instâncias ordinárias de jurisdição), o respeito ao princípio do duplo grau de jurisdição se impõe, sob pena de supressão de instância. Inteligência do art. 5º, LV, da CF; art. 5º, § 2º, da CF c/c Decreto nº 678/1992 (Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de São José da Costa Rica – Art. 8º, 2, h). Recurso provido, liminarmente.” (BRASIL. TJRS, AI 70074007097, 1ª C.Cív., Rel. Des. Carlos Roberto Lofego Canibal, J. 19.12.2017. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/search?q=cache:www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php%3Fnome_comarca%3DTribunal%2Bde%2BJusti%25E7a%26versao%3D%26versao_fonetica%3D1%26tipo%3D1%26id_comarca%3D700%26num_processo_mask%3D70074007097%26num_processo%3D70074007097%26codEmenta%3D7608217+tribut%C3%A1rio+e+%22desconsidera%C3%A7%C3%A3o+da+personalidade%22++++&proxystylesheet=tjrs_index&client=tjrs_index&ie=UTF-8&site=ementario&access=p&oe=UTF-8&numProcesso=70074007097&comarca=Comarca%20de%20Sapucaia%20do%20Sul&dtJulg=19/12/2017&relator=Carlos%20Roberto%20Lofego%20Canibal&aba=juris>. Acesso em: 3 jan. 2017)

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Cabe, ademais, salientar que, tratando-se de pretensão de redirecionamen-to por dissolução irregular, em que se agrega ao art. 135, III, do CTN o enunciado da Súmula nº 435 do STJ, a presunção disposta no verbete tra-duz, à evidência, incompatibilidade de aplicação do incidente trazido pelo novo diploma adjetivo.

Na Justiça do Trabalho, também nos parece mais objetiva a inversão, ou seja: funciona no sentido de buscar o adimplemento do débito trabalhista, de forma primordial52. Nesta outra decisão, por outro lado, percebe-se a ne-cessidade de o exequente demonstrar a insolvência da reclamada para, então, redirecionar a execução para a pessoa dos sócios53:

52 “Agravo de petição. Da desconsideração inversa da personalidade jurídica. A des- consideração inversa da personalidade jurídica consiste no afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, para, ao revés do que ocorre na desconsideração da personalidade propriamente dita, atacar o patrimônio da pessoa jurídica por obrigações do sócio. Uma vez que o escopo da disregard doctrine é combater a utilização indevida do ente societário por seus sócios, é possível a desconsideração inversa da personalidade jurídica, alcançando-se bens da sociedade em razão de dívidas contraídas pelo sócio. Agravo de petição interposto pelo exequente a que se dá provimento.” (BRASIL. Tribunal Regional da Quarta Região, Agravo de Petição nº 0000298-65.2010.5.04.0305, Seção Especializada em Execução, Red. p/o Ac. Des. João Alfredo Borges Antunes de Miranda, J. 04.10.2016. Disponível em: <https://www.trt4.jus.br/search?q=cache:cs4mA1WID9AJ:iframe.trt4.jus.br/gsa/gsa.jurisp _sdcpssp.baixar%3Fc%3D57232536+%22desconsidera%C3%A7%C3%A3o+da+personalidade+jur%C3%ADdica%22+inmeta:DATA_DOCUMENTO:2016-07-05..2017-07-05++&client=jurispssl&site=jurisp_sp&output=xml_no_dtd&proxystylesheet=jurispssl&ie=UTF-8&lr=lang_pt&proxyreload=1&access=p&oe=UTF-8>. Acesso em:3 jan. 2018)

53 “Agravo de petição. Desconsideração da personalidade jurídica. Prova da insolvência. Necessária. Mesmo na seara do direito do trabalho, em que se adota a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, é imprescindível a comprovação da insolvência da sociedade para que se admita o redirecionamento da execução aos sócios, não ficando ao livre arbítrio do exequente a possibilidade de executar os sócios precedentemente à pessoa jurídica condenada. A desnecessidade de se provar a existência de fraude ou confusão patrimonial não significa que se desincumbe o exequente de, ao menos, comprovar a inexistência de patrimônio da condenada, ou seja, a sua insolvência. Assim, dado provimento ao agravo de petição para sustar a execução em face dos sócios, prosseguindo-se em face da devedora principal.” (BRASIL. Tribunal de Justiça da Quarta Região, Agravo de Petição nº 0000039-39.2012.5.04.0131, Seção Especializada em Execução, Red. p/o Ac. Desª Ana Rosa Pereira Zago Sagrilo, J. 17.04.2017. Disponível em: <https://www.trt4.jus.br/search?q=cache:rzgN6Q8uyksJ:jbintra.trt4.jus.br:8080/pje_2grau_helper/jurisp%3Fo%3Dd%26c%3D9272496%26v%3D18544992+%22desconsidera%C3%A7%C3%A3o+da+personalidade+jur%C3%ADdica%22+inmeta:DATA_DOCUMENTO:2016-07-05..2017-07-05++&client=jurispssl&site=jurisp_sp&output=xml_no_dtd&proxystylesheet=jurispssl&ie=UTF-8&lr=lang_pt&proxyreload=1&access=p&oe=UTF-8>. Acesso em: 3 jan. 2018)

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Na seara trabalhista, todavia, seguindo a linha do direito do consumidor e do direito ambiental, convencionou-se adotar a teoria menor da desconsi-deração da personalidade jurídica, segundo a qual basta a prova da insol-vência da sociedade para que se admita a desconsideração da sua perso-nalidade e a execução diretamente aos bens dos sócios, sem a necessidade de comprovação de fraude ou confusão patrimonial. Tal entendimento tem como escopo a proteção do trabalhador – hipossuficiente frente à empre-sa – que entregou sua força de trabalho ao empregador sem que, contudo, tenha posteriormente recebido a devida contraprestação pecuniária.

Portanto, percebe-se que, mesmo na seara do direito do trabalho, em que se adota a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, é imprescindível a comprovação da insolvência da sociedade para que se admita o redirecionamento da execução aos sócios.

conclusão

De tudo o que foi trazido a este artigo, seja em sede de direito material, seja em sede de direito processual, a desconsideração da personalidade jurí-dica (inversa, inclusive) deve ser tratada como exceção à regra.

É que, por se tratar de um instituto que invade o patrimônio da pessoa que, em um primeiro momento, não originou determinada dívida, deve ser cabalmente comprovada, por exemplo, a má-fé daquele que busca se utili-zar de pessoa jurídica para não cumprir suas obrigações. Inclusive Carlos Roberto Gonçalves é taxativo acerca da teoria ora estudo, ressaltando a frau-de e a má-fé, no sentido de: “Permite tal teoria que o juiz, em casos de fraude e de má-fé, desconsidere o princípio de que as pessoas jurídicas têm existên-cia distinta da de seus membros [...]”54.

As premissas acima são facilmente observadas pelos requisitos exigi-dos pelo ordenamento e, ainda, com ônus probatório daquele que a requer, como analisado em momento anterior. Muitas vezes, é difícil separar a má-fé da má administração, por exemplo. Tendo em conta tal assertiva é que a teo-ria deve, ou não, ser aplicada, considerada a natureza jurídica da relação, cí-vel ou consumidor, por exemplo, a atrair seus respectivos dispositivos de lei.

Por outro lado, se é bem verdade que estamos e há muito atravessan-do severa crise que se alastra por diversos setores da sociedade (economia,

54 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: parte geral. 11. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2013. p. 249.

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ensino, segurança, saúde, entre outros) e, por tal, razão o inadimplemento é cristalino, por outro, não pode ser tentativa, especialmente em fraude ou má-fé, para o não cumprimento das obrigações assumidas, e não honradas.

Arnoldo Wald assim sintetiza:

Esse instituto da desconsideração constitui um meio de defesa de quem foi vítima do abuso do direito ou do ato ilícito, praticado pela sociedade, ou em razão de um fato que, também, dificulte o exercício do direito de ressar-cimento de prejuízos pela pessoa jurídica.55

O fato é que o caso concreto é que deve ser analisado. Não havendo a má-fé, o dolo, a fraude, tal expediente não deve ser utilizado, em princípio. O credor não tem o condão de figurar como franco-atirador, escolhendo e pos-tulando o redirecionamento da execução quando infrutífera, por exemplo, contra a pessoa jurídica devedora, sob pena de subversão dos institutos, além de movimentar o Poder Judiciário de forma equivocada.

É claro que a natureza e as consequências do inadimplemento podem ocasionar danos catastróficos, como, por exemplo, danos ambientais. A am-pliação do polo passivo com a inclusão dos sócios, administradores, pode fa-cilitar a defesa do consumidor e privilegiar o princípio da reparação integral.

reFerÊncias

BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, de 11 de janeiro de 2016. Brasília/DF, 11 de janeiro de 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm>.

______. Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Brasília/DF, 11 de setembro de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm>.

______. Código de Processo Civil. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Brasília/DF, 16 de março de 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm>.

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FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: parte geral e LINDB. 13. ed. São Paulo: Atlas, v. I, 2015.

55 WALD, Arnoldo. Direito civil: introdução e parte geral. 13. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2011. p. 219.

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panoraMa do cuMpriMento das prestações de Fazer e não Fazer

marCel piterman*-**

Mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Doutorando em Direito pela Universidade de Lisboa.

RESUMO: O presente ensaio analisa o desenvolvimento histórico da execução das prestações de fazer e não fazer, desde as origens roma-nas até a ideia de que toda prestação de fazer ou não fazer deve ser convertida em perdas e danos. Após, o ensaio mostrará a necessida-de de os meios executivos serem adequados à teoria da tutela dos direitos, como o fez o Código de Processo Civil Brasileiro de 2015.

PALAVRAS-CHAVE: Direito; tutelas; prestações; processo; exe-cução.

ABSTRACT: This essay examines the historical development of the enforcement of positive and negative personal obligations, from the Roman origins to the idea that all especific performances must be converted into losses and damages. Afterwards, the essay will show the need for enforcement resources to be adequate to the theory of the protection of rights, as did the Brazilian Civil Procedural Rules of 2015.

KEYWORDS: Law; protection; performances; procedure; enforce-ment.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Panorama histórico do cumprimento das prestações de fazer e não fazer; 1.1 Do Direito romano ao Direito mo-derno; 1.2 A influência do liberalismo e a intangibilidade da vontade humana. Toda a prestação deve ser convertida em perdas e danos; 2 Panorama atual do cumprimento das prestações de fazer e não fazer; 2.1 Os meios executivos devem ser adequados à tutela dos direitos. A tutela específica das prestações de fazer e não fazer; 2.2 A tutela jurisdicional mandamental e as técnicas processuais para sua concretização; Conclusão; Referências.

* E-mail: [email protected].** Autor do livro Curso de direito penal – Teoria geral do crime. 1. ed. Curitiba: Juruá, v. I,

2016. E-mail: [email protected].

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introdução

O presente trabalho tem por propósito analisar o desenvolvimento da execução das prestações de fazer e não fazer em uma perspectiva cultural do direito processual civil, consoante a proposta que reconhece a importân-cia e a eficácia dos direitos fundamentais. Em um primeiro momento, será analisado o desenvolvimento histórico da execução civil ao longo do direito processual, que desencadeia na máxima nemo potest praecise cogi ad factum e na noção de que toda prestação de fazer ou não fazer deve ser convertida em perdas e danos. Verificar-se-á que essa ideia influencia decisivamente o orde-namento processual civil brasileiro moderno na feição do Código de Processo Civil de 1973.

Após, o foco do problema, sempre fixado nas relações entre cultura e processo, terá em conta a necessidade de pensar-se o processo civil na pers-pectiva de uma tutela jurisdicional adequada e efetiva à tutela dos direitos, como o fez o Código de Processo Civil de 2015. Sob esse aspecto, denotar-se-á uma reviravolta cultural no trato do tema, que tem como consequência, ine-xoravelmente, a tutela específica dessas obrigações, concretizada por meio de técnicas processuais adequadas e efetivas. É o que se passará a expor.

1 panoraMa Histórico do cuMpriMento das prestações de Fazer e não Fazer

1.1 do direito romano ao direito moderno

Antes de adentrar em uma breve análise da evolução do tema ao longo das diversas fases do formalismo processual, cumpre destacar, consoante a doutrina, que as prestações de fazer e não fazer constituem espécies de pres-tação de fato, que podem ter natureza positiva ou negativa. Exemplo daquela é a participação de artista em espetáculo, e desta, a obrigação de sigilo do médico. As prestações de fato negativas ainda possuem uma subespécie, que se constitui em uma obrigação de permissão ou tolerância. Quanto ao tempo de execução, as prestações ainda podem ser instantâneas, que se realizam de uma só vez, ou duradouras, cuja execução compreende uma série de atos ou abstenções, e quanto à possibilidade de substituição do devedor no cumpri-mento da obrigação, elas são fungíveis, quando podem ser executadas por pessoa diversa do devedor, e infungíveis, quando a prestação é exclusiva

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do devedor, em razão da qualidade pessoal (infungibilidade natural) ou por convenção (infungibilidade convencional)1.

Dito isso, cumpre destacar algumas observações históricas acerca da execução civil, voltadas, sempre que possível, para a execução das presta-ções de fazer e não fazer. Quando se volta os olhos para o Direito romano, verifica-se que toda sociedade primitiva faz uso da autotutela. E a sociedade romana partiu inicialmente de um sistema de autotutela, que, de acordo com a doutrina, é a forma histórica mais antiga de realização do direito subjetivo contra a vontade do obrigado, embora logo se tenha demonstrado que nela predominam mais desvantagens que vantagens, como, por exemplo, chegar--se à guerra civil, o que, à evidência, não interessa ao conjunto dos cidadãos. Em muitos casos, quem não tem direito pode se tornar vitorioso pela força e prevalece o direito da força sobre a força do direito2.

Tanto para os romanos como para os germânicos, a execução não pas-sava do exercício de coerção privada, sujeito a estritas regras legais. O credor é quem decide se o seu direito é capaz de execução via coerção, e se conclui afirmativamente, é por meio de seus próprios esforços, que não derivam de uma autorização oficial, que vai coagir seu devedor ao cumprimento3.

Consoante a doutrina, o poder de realizar os preceitos do direito ob-jetivo partiu da autotutela e chegou à jurisdição (monopólio estatal), pas-sando, antes, por um sistema de arbitragem voluntária e, no ordo judiciorum privatorum, de arbitragem obrigatória, sendo o árbitro (judex) investido pelo magistrado4.

No Direito romano, a ideia de jurisdição não ia além dos poderes que tinha o juiz no processo de conhecimento, não sendo jurisdicional a ativida-de executiva5. Na doutrina italiana, à época em que Chiovenda escrevera os Principii (1903), também dominava a opinião de que a execução constituía mero exercício de império, atividade administrativa, e de que a jurisdição se adscrevia à cognição e se exauria com a sentença, na tentativa de justifi-car semelhante conceito com a ideia romana do ius dicere, ligada ao especial

1 Por todos, GOMES, Orlando. Obrigações. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 47-52.2 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto; MITIDIERO, Daniel. Curso de processo civil. São

Paulo: Atlas, v. 1, 2010. p. 7.3 ENGELMANN et al. The roman procedure. In: A history of continental civil procedure. New

York: Kelley, 1969. p. 373.4 DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 33.5 CUENCA, Humberto. Processo civil romano. Buenos Aires: Ejea, 1957. p. 12.

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ordenamento dos romanos, com o que, posteriormente, discordou o mesmo Chiovenda, já nas Instituições (1933-1934), quando verificou que também na execução se efetiva a atuação da lei mediante uma substituição de atividade6. O devedor, no período arcaico, era reduzido à condição de escravo, sem qual-quer possibilidade de defesa. A execução tinha natureza penal. Não havia contraditório. Naqueles doutrinadores que ainda hoje negam o contraditório na execução, é inegável a influência do Direito romano7.

No período clássico do processo romano, portanto, havia um respei-to pelo patrimônio das pessoas, acima da sua dignidade, daí a verificação de ameaça de um mal maior em virtude do inadimplemento – semelhante à execução indireta – sobre a pessoa do devedor. Segundo a doutrina, essa execução, de caráter cruel, tratava-se de execução pessoal, porque pela dívida respondia diretamente o corpo do devedor, enquanto o patrimônio só inte-ressava mediatamente8.

Denominava-se manus injectio o mais antigo dos meios executórios do Direito romano. Segundo Leopoldo Wenger, perdurou até o período da cognitio, quando conviveu com a moderna actio iudicati9. A manus injectio ti-nha natureza privada e penal, e caracterizava-se com o emprego da força contra o próprio obrigado. Acorrentado em praça pública, se não pagasse a dívida, poderia ser levado à morte.

No período formular, havia, na execução, a presença do magistrado no início do procedimento, que não afastava os atos praticados pelo próprio exequente. Tratava-se de um estágio intermediário entre a autotutela e o mo-nopólio estatal. A partir de então, os romanos passaram a entender que a

6 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, v. 2, 1969. p. 14-15.

7 DINAMARCO, Cândido Rangel. Op. cit., p. 38.8 CUENCA, Humberto. Op. cit., p. 47-489 De acordo com o autor, tanto na legis actio per manus iniectionem como na actio iudicati o

credor deveria expor sua pretensão ante o pretor de modo verossímil, prima facie. I – Uma vez concedida a actio iudicati pelo pretor contra o executado, este poderia manifestar-se: 1. que reconhece a pretensão do autor. Nesse caso, emite-se um decreto de execução se o devedor não cumpre a obrigação e se o credor solicita nesse sentido. 2. O demandado pode defender-se contra a actio iudicati e afirmar: a) que a sentença é falsa ou nula; b) que a dívida foi paga; c) qualquer outra objeção possível de ser alegada em outras ações, com relação a actio iudicati, haverá um número reduzido delas, e serão, em parte, objeções no sentido mais amplo, e, em parte, exceções técnicas. II – Se é negada a actio iudicati pelo pretor, não haverá execução nem processo. (WENGER, Leopold. Actio iudicati. Buenos Aires: EJEA, 1954. p. 14-15)

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execução corporal correspondia ao desejo de vingança do credor insatisfeito, e não ao interesse público de garantir o funcionamento das normas de convi-vência. Foram ditadas normas atenuadoras do sistema anterior e houve gra-dativo deslocamento da responsabilidade para o patrimônio do devedor10.

No ordo judiciorum privatorum, não havia a execução específica, desti-nada à entrega de coisa certa ou ao cumprimento de obrigações de fazer ou não fazer. O objeto das obrigações dessa natureza convertia-se em pecúnia. A presença do magistrado, nesse procedimento, ia, aos poucos, diminuindo a autoridade do credor. Enfim, superado o período clássico, com a cognitio fecha-se o ciclo da jurisdicionalização11.

O que caracterizou o período pós-clássico da cognitio extra ordinem foi o fato de o pretor realizar todo o processo, invadindo, no de execução, a área reservada aos particulares12. Daí o nome de extra ordinem. Tal procedimento, chamado de sub-rogação, é, por alguns, considerado a origem remota de nos-sa execução por expropriação13.

No processo da cognitio era possível a execução específica destinada à entrega de coisa determinada (com a conversão em pecúnia apenas no caso de impossibilidade de execução direta), o que não havia sido concebido nos períodos precedentes. Trata-se de passo importante à efetividade da execu-ção – um dos pontos fundamentais do Direito romano, consoante a dou trina14.

No período justinianeu (século VI), com a consolidação do poder pú-blico e a transformação da mentalidade dos cidadãos, alheados do primiti-vo individualismo e acostumados com a autoridade do Estado, a execução realizava-se pela autoridade estatal, assim refreando o particular em seu ím-peto de vingança, retirando caráter penal e reduzindo a agressão contra o patrimônio do executado às justas proporções da obrigação descumprida. Da execução indireta, isto é, do esforço para satisfazer o credor por meio da aplicação de meios que atuam sobre a vontade do devedor, o Direito romano volta-se à execução direta, ao permitir e exigir que o objeto a que tem direito o credor seja retirado do devedor e alcançado ao exequente15.

10 DINAMARCO, Cândido Rangel. Op. cit., p. 43.11 Idem, p. 49.12 CUENCA, Humberto. Op. cit., p. 132.13 SCIALOJA, Vittorio, Procedimiento civil romano. Buenos Aires: Ejea, 1954. p. 298.14 DINAMARCO, Cândido Rangel. Op. cit., p. 52.15 ENGELMANN, et al. The roman procedure. In: Op. cit., p. 374.

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As invasões bárbaras na Itália representaram retrocesso no Direito ro-mano, que já havia eliminado a autotutela e a execução pessoal, com a inter-venção estatal nos litígios e dosagem na invasão patrimonial imposta ao exe-cutado. O direito dos invasores desenvolvia-se à margem da interferência do poder público, reconhecendo-se aos particulares grande dose de autonomia, com abusos que não eram reprimidos pela rudimentar organização política do Estado16.

Nos domínios das civilizações bárbaras, o estado não tinha nem meios, nem autoridade, nem competência para interferir nas contendas entre parti-culares. Os povos germânicos eram profundamente individualistas, e a civi-lização era atrasada e não se acomodava sob a autoridade de um estado forte, a exemplo dos romanos. A doutrina, em razão disso, visualizou um notável retrocesso no Direito romano, de volta às origens, especialmente se for con-siderado que já havia sido eliminada a autotutela e a execução pessoal como formas ordinárias de solução de litígios17.

Consoante a doutrina, constituem características fundamentais da execução medieval a ausência de agressão patrimonial sem prévia cognição, salvo nos títulos executivos extrajudiciais, e o afastamento dos atos de auto-ridade privada. Além da execução pessoal, havia também a execução real, que corresponde à execução moderna. A execução pessoal, consistente na prisão por dívida em cárcere público, foi gradativamente sendo restringida, reservada a casos especiais18.

No que diz respeito ao Direito luso-brasileiro, cumpre referir que o Di-reito português, a partir do século XIII, passou a receber influência do Direito romano, especialmente por força da Universidade de Bolonha, graças à reno-vação dos estudos jurídicos por meio do método das glosas ao Corpus Juris Civilis e dos brocardos, que atraía estudantes de outros países, especialmente do recém-criado reino de Portugal19.

No século XV, editaram-se as ordenações Afonsinas. Nessa época, ain-da havia aplicação subsidiária de preceitos contidos em leis imperiais, nas glosas de Acúrsio e na opinião de Bartolo. Depois, vieram as Ordenações

16 DINAMARCO, Cândido Rangel. Op. cit., p. 54.17 Idem, p. 45-55.18 Idem, p. 63-65.19 Idem, p. 66.

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Manoelinas (século XVI) e as Filipinas (século XVII). Logo após, a Lei da Boa Razão restringiu a aplicação do Direito romano20.

O caminho normal, segundo a doutrina, era pedir a execução per officium iudicis, observadas as formas estabelecidas nas Ordenações Filipinas, Livro III, Título 86 e seguintes. Quanto aos instrumentos, o Direito português, em vez de reconhecer-lhes execução aparelhada, admitiu que servissem de fundamento a uma ação sumária especial, chamada “assinação de 10 dias” (Ordenações, Livro III, Título 25), e a sentença assim conseguida poderia ser depois executada pelas vias ordinárias21.

Ainda diziam as ordenações que, na execução específica das obriga-ções de entrega de coisa ao devedor

assinar-lhe-ha o Juiz da execução termo de dez dias, a que entregue, se hi for achado. E não sendo hi achado, será citado para lhe assinarem o dito termo a sua revelia, se não acudir a citação. O qual termo passado, se a não entregar, se tirará logo em effeito de poder da parte condenada, sem mais para isso ser citada, e será entregue ao vencedor.22

No Direito brasileiro anterior, até 1850, estavam vigentes as ordena-ções lusitanas. A partir de então, o Regulamento nº 737, de 25 de novembro de 1850, passou a regular “a ordem do Juízo no Processo Commercial”. Tal decreto, embora regulasse a execução de sentença, a assinação de 10 dias e a ação executiva, era omisso quanto à execução forçada das obrigações de fazer e não fazer23. Não obstante, havia, na prática, tal execução, a qual era disci-plinada pela doutrina e jurisprudência, que se aproximou daquilo previsto

20 Idem, p. 67-68.21 LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de execução. São Paulo: Saraiva, 1946. p. 31-32.22 PORTUGAL. Ordenações Filipinas. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984. Livro III,

Título LXXXVI, 15.23 No entanto, regulava a execução “das sentenças sobre acção real, ou cousa certa, ou em

especie” nos seguintes dispositivos: “Art. 571. Quando o réo fôr condemnado por sentença a entregar cousa certa, será citado para em 10 dias fazer a entrega deIla. Art. 572. Si o réo dentro em 10 dias não entregar a cousa por ter sido alienada depois de litigiosa (art. 494), a sentença será executada contra o terceíro, de cujo poder se tirará a cousa, sem que seja ouvido antes de ser ella depositada. Art. 573. Póde tambem o exequente, em vez de executar sentença contra o terceiro, executar o condemnado pelo valor della, si já se achar estimado na sentença, ou requerer o juramento in litem, que será prestado e regulado conforme os arts. 172, 173 e 174. Art. 574. Si o vencido não tiver com que pague a estimação da cousa que alienou em fraude da execução, será preso até pagar, ou até um anno si antes não pagar”.

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no Código de Processo Civil de 1973. Nessa época, portanto, já não se falava mais nas medidas corporais destinadas a convencer o executado a cumprir a obrigação, consoante a doutrina de Dinamarco24.

Em 1890, o Decreto nº 763, de 19 de setembro, “manda observar no pro-cesso das causas cíveis em geral o Regulamento nº 737 de 25 de novembro de 1850, com algumas excepções e outras providencias”25. O regulamento previa a ação executiva, fundada em títulos extrajudiciais. Pela primeira vez no or-denamento jurídico brasileiro um diploma legislativo deu eficácia executiva a atos extrajudiciais26.

24 DINAMARCO, Cândido Rangel. Op. cit., p. 76.25 “O Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo

Exercito e Armada, em nome da Nação, considerando: Que as normas prescriptas para os processos das acções civeis difficultam e muitas vezes embaraçam a liquidação dos direitos e interesses em litigio, não só pela sua excessiva morosidade, como pelos pesados gravames que acarretam ás partes; Que a conservação de taes normas não se justifica por qualquer motivo de ordem superior, ou se trate de garantir pela amplitude da discussão a indispensavel exposição e fundamento do direito dos litigantes ou se trate de assegurar a acção da justiça por um completo esclarecimento do juizo; Que ao contrario as formulas complicadas e dilatorias do regimen vigente, como o tem demonstrado a experiencia, não servem sinão para favorecer as pretensões desprotegidas de direito e da justiça; Que, finalmente, não ha fundamento em direito para que os interesses, sujeitos á competencia, do fôro civil, não sejam igualmente resguardados pela garantia de uma justiça prompta e efficaz; Decreta: Art. 1º São applicaveis ao processo, julgamento e execução das causas civeis em geral as disposições do regulamento n. 737 de 25 de novembro de 1850, excepto as que se conteem no titulo 1º, no capitulo 1º do titulo 2º, nos capitulos 4º e 5º do titulo 4º, nos capitulos 2º, 3º e 4º e secções 1ª e 2ª do capitulo 5º do titulo 7º, e no titulo 8º da primeira parte. Paragrapho unico. Continuam em vigor as disposições legaes que regulam os processos especiaes, não comprehendidos no referido regulamento. Art. 2º Perante o juiz que accumular a jurisdicção civil e commercial, serão propostas as causas respectivas sem discriminação das duas competencias, seja qual for a natureza do feito com relação ás pessoas ou ao seu objecto. Onde, porém, houver vara privativa do commercio, a acção será proposta perante o juizo competente, com indicação especificada da jurisdicção. Art. 3º A excepção ou allegação de incompetencia, sob o fundamento de ser a causa civil ou commercial, não póde ser opposta depois da contestação; e sendo omittida ou julgada improcedente, não se annullará mais o feito por motivo dessa incompetencia, nem ex-officio, nem a requerimento das partes. Art. 4º Revogam-se as disposições em contrario.”

26 “Das acções executivas – Art. 308. Compete esta acção: § 1º Aos fretes de navios (titulo VI parte II Codigo). § 2º Aos fretes e alugueis de transporte por agua ou por terra (Cap. VI Tit. III parte I Codigo). § 3º As despezas e commissão de corretagem (art. 64 Codigo). Art. 309. Para ser concedido o mandado executivo é essencial que a petição que o requer seja instruida com os documentos seguintes: § 1º Com a carta de fretamento ou conhecimento de frete e recibo de descarga e entrega, no caso do § 1° do art. 308. § 2º Com a cautela e recibo respectivo (arts. 100 e 109 Codigo). § 3º Com as facturas ou minutas das negociações, ou certidões extrahidas dos livros dos corretores, no caso do § 3º do

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Finalmente, no século XX, com a edição dos códigos estaduais, são introduzidos aperfeiçoamentos, afinal, o Regulamento nº 737 já contava, a essa altura, com mais de meio século quando adveio o regime da legislação descentralizada e, justamente nesse meio século, tomou “alento científico a técnica do processo civil”27.

1.2 A influência do liberalismo e a intangibilidade da vontade humana. toda a prestação deve ser convertida em perdas e danos

O Código de Processo Civil de 1939 foi produto de evolução científi-ca do processo civil na Europa ocorrida a partir de meados do século XIX. A doutrina destaca, entre várias características, a adoção da oralidade, de Chiovenda. Este, com base na experiência deduzida da história, conclui que o processo oral é, com ampla vantagem, mais conforme à natureza e às exigên-cias da vida moderna, e proporciona uma decisão com economia, simplicida-de e presteza. Chiovenda, ao observar a história do processo civil, demonstra que o processo romano foi oral, porque a prova destinava-se à formação do livre convencimento do juiz, baseado na imediata observação dos elementos da cognição, ao passo que, no antigo processo germânico, o procedimento

art. 308. Art. 310. O mandado executivo deve determinar que o réo pague in continente, ou se proceda a penhora nos bens que elle offerecer ou lhe forem achados, tantos quantos bastem para pagamento da divida e custas. Art. 311. Accusada a penhora, serão assignados seis dias ao réo para allegar seus embargos. Art. 312. Si dentro dos seis dias o réo não allegar embargos, será a penhora julgada por sentença, e se proseguirá nos termos ulteriores, como na execução da sentença. Todavia poderá o réo appellar da referida sentença. Art. 313. Dentro dos seis dias assignados, poderá o réo produzir testemunhas, e protestar pelo depoimento da parte. Art. 314. Com os embargos, documentos, e prova testemunhal, si a houver, serão os autos conclusos ao Juiz, que receberá ou rejeitará os embargos. Art. 315. Si forem recebidos os embargos, o Juiz assignará ao autor cinco dias para contestal-os; depois da contestação terá logar a dilação das provas que será de dez dias, e arrazoando o autor e réo, dentro de cinco dias cada um, será a causa julgada afinal. Art. 316. Si forem rejeitados, se procederá na fórma do art. 312. Art. 317. Si o réo appellar, não poderá o autor sem fiança receber o paga mento. Art. 318. Quando a penhora executiva fôr para pagamento de fretes, será feita nas mercadorias que deverem os fretes, sómente nos casos seguintes:§ 1º Si tiverem sido préviamente embargadas, ou depositadas a requerimento do capitão (arts. 527 e 619 Codigo), ou pelo commissario ou conductor. § 2º Si ainda se acharem em poder do dono ou consignatario, dentro ou fóra das estações publicas (arts. 527 e 619 Codigo, e art. 520 deste Regulamento). Art. 319. Si as mercadorias depositadas ou embargadas tiverem sido vendidas, por serem de faci deterioração, ou de guarda arriscada e dispendiosa, a penhora se fará de preferencia no preço dellas.”

27 DINAMARCO, Cândido Rangel. Op. cit., p. 75.

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foi oral, porém, devido a razões exteriores. Desaparecendo essas razões, o processo medieval italiano lentamente se transformou de oral em escrito, por influência do caráter formal da prova germânica e do sistema da prova legal que dela se originou. Já o processo ordinário do direito comum determinou a formação dos processos escritos e, a partir do século XVIII, por obra da dou-trina, teve início uma lenta reação, que conduziu à restauração da oralidade28.

Esse diploma processual eliminou a assinação de 10 dias e deu nova feição à ação executiva, a partir do art. 298, em um procedimento especial sincrético. A execução propriamente dita era de títulos judiciais apenas, pela via ordinária, e a execução das obrigações de fazer foi regulada a partir do art. 998 do Código de Processo Civil.

Nessa época, Liebman chegou a afirmar que as obrigações de fazer ou não fazer eram, em maior ou menor extensão, inexequíveis. Isso pelo fato de que o cumprimento dessas obrigações depende necessariamente da vontade do devedor de praticar uma atividade ou abster-se dessa prática, e parece que, nesses casos, a prestação ou abstenção voluntária do próprio obrigado se torna insubstituível e não existe possibilidade prática de dar ao credor sa-tisfação na forma específica pelos meios executivos29.

A essa dificuldade real, acrescenta outra, de caráter jurídico, pois, en-quanto o emprego da força aparece legítimo quando realizado pelos órgãos de execução sobre as coisas, acaba suscitando reações por parte da doutrina quando se cogita do emprego da força sobre a pessoa do obrigado para cons-trangê-lo ao cumprimento da obrigação. Chega, até mesmo, a mencionar o esforço de encontrar meios de induzir o devedor ao cumprimento voluntário da obrigação, sob a ameaça de pesadas sanções, como fez a jurisprudência francesa, com o sistema das astreintes30.

Consoante Liebman, chama-se astreinte a condenação pecuniária pro-ferida em razão de tanto por dia de atraso, destinada a obter do devedor o cumprimento de obrigação de fazer pela ameaça de uma pena suscetível de aumentar indefinidamente. Caracteriza-se a astreinte pelo exagero da quantia em que se faz a condenação, que não corresponde ao prejuízo real causado ao credor pelo inadimplemento, nem depende da existência de tal prejuízo. Cita,

28 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3, 1969. p. 46-47.

29 LIEBMAN, Enrico Tullio. Op. cit., p. 337. 30 Idem, p. 334-337.

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ainda, a doutrina e jurisprudência francesas e registra que se trata de uma pena imposta com caráter cominatório para o caso de o obrigado não cumprir a obrigação no prazo fixado pelo juiz. Refere, também, que a jurisprudência francesa aplica idênticos meios nas obrigações de não fazer, embora considere “duvidoso que se incluam rigorosamente na figura das astreintes”. Liebman ainda menciona, além das astreintes, o contempt of court do Direito inglês e a condenação em multas pecuniárias, sem limites de importância, e prisão até seis meses, consoante § 888 da ZPO alemã. Todavia, admite que esses meios coativos não têm propriamente caráter executório, porque visam conseguir o adimplemento da obrigação pela prestação do próprio executado, compelido a cumpri-la para evitar as pesadas sanções que o ameaçam. Por fim, confessa que o Direito brasileiro não conhece nada comparado a esses meios executi-vos, o que torna a tutela dessas obrigações muito menos eficiente31.

Então, sob a vigência do Código de Processo Civil de 1939, a partir do art. 99832, proferida a “condenação” a praticar ato ou abster-se dele, ou a pres-

31 LIEBMAN, Enrico Tullio. Op. cit., p. 337-339.32 Da execução das obrigações de fazer ou não fazer: “Art. 998. Se a execução tiver por fim

a prática ou abstenção de qualquer ato, ou a prestação de serviço, citar-se-á o condenado para cumprir a condenação no prazo que a sentença determinar, ou no fixado pelo juiz, após arbitramento, se necessário. Art. 999. Se o executado não prestar o serviço, não praticar o ato ou dele não se abstiver no prazo marcado, o exequente poderá requerer o pagamento da multa ou das perdas e danos, prosseguindo a execução nos termos estabelecidos para a de pagamento de quantia em dinheiro liquida, ou ilíquida, conforme o caso. Art. 1.000. Se o fato consistir em obra, ou serviço, que possa ser feito por terceiro, o exequente poderá requerer seja avaliado o serviço, ou obra, e feito á custa do executado, mediante concorrência em hasta pública. Parágrafo único. O arrematante prestará caução, arbitrada pelo juiz que atenderá ao valor da indenização, em caso de inexecução, demora ou má execução da obra. Art. 1.001. Arrematada a obra, os respectivos pagamentos serão adiantados pelo exequente, que poderá exigir desde logo, do executado o total do custo, mediante execução pela forma estabelecida para a condenação por quantia certa. Art. 1.002. Dando o arrematante por cumprida a sua obrigação, assim o julgará o juiz, se não houver oposição do exequente. No caso de oposição, o juiz, após a vistoria, decidirá se a obrigação está, ou não, cumprida. Art. 1.003. Se a obra não for feita no prazo marcado, ou se a execução for incompleta, ou defeituosa, o exequente poderá, autorizado pelo juiz e feito arbitramento, concluí-la ou concertá-la, correndo as despesas por conta da caução depositada pelo arrematante. Art. 1.004. Se o exequente preferir a indenização das perdas e danos, far-se-á a liquidação, prosseguindo-se como na execução por quantia certa. Art. 1.005. Se o ato só puder ser executado pelo devedor, o juiz ordenará, a requerimento do exequente, que o devedor o execute, dentro do prazo que fixar, sob cominação pecuniária, que não exceda o valor da prestação. Art. 1.006. Condenado o devedor a emitir declaração de vontade, será esta havida por enunciada logo que a sentença de condenação passe em julgado. § 1º Os efeitos da declaração de vontade que dependa do cumprimento de contraprestação ficarão em suspenso até o cumprimento desta. § 2º Nas promessas de

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tar determinado serviço, era ao executado indicado prazo para cumprimento. Se não o cumprisse, caberia ao exequente escolher entre o prosseguimento da execução pela obrigação subsidiária de perdas e danos e a realização por par-te de terceiro da obra ou serviço devido, à custa do executado. Já o art. 1.005 do Código de Processo Civil de 1939 dispunha, para o caso de obrigação que só pudesse ser executada pelo devedor pessoalmente, que o juiz fixasse co-minação pecuniária, mas não podendo esta exceder o valor da prestação, afir-mava a doutrina que se tratava apenas de fixação antecipada, e talvez parcial, das perdas e danos33.

Tal o pensamento da época, fruto da nítida influência do liberalismo, mas também, talvez, pelo fato de, pela dicção legal, a multa não exceder o valor da prestação, daí não poderia ser comparada à técnica da astreinte fran-cesa.

Com a edição do Código de Processo Civil de 1973, a mais significativa alteração foi a equiparação dos títulos executivos judiciais aos títulos extra-judiciais. O código eliminou a medieval ação executiva e passou a autorizar a “execução pura” para títulos judiciais ou extrajudiciais. O modelo original do Código de Processo Civil de 1973 reservou o livro II ao processo de exe-cução e separou a atividade executiva da atividade cognitiva, fazendo com que a sentença condenatória abrisse caminho à execução. Sem dúvida, na elaboração do Código de Processo Civil de 1973, havia o pensamento de que o inadimplemento de um fazer ou não fazer gerava apenas o direito à inde-nização em pecúnia.

Tal afirmação encontra-se no Digesto – “quia non facit quod promisit, in pecuniam numeratam condemnatur, sicut evenit in omnibus faciendi obligationi-bus” (Celso, Dig. 42, 1, 13, 1) – e nas observações de comentadores, como Bartolo – “quando est in obligaione rem dari, quis praecise compellitur; in obliga-tionibus autem facti quis non praecise compellitur; sed liberatur solvendo interesse” (Comentário à lei 1, Dig. De actionibus empti vendidi, 19, 1) – e Antonio Fabro – “Nemo praecise potest cogi ad factum, quia sine vi et impressione id fieri non po-

contratar, o juiz assinará prazo ao devedor para executar a obrigação desde que o contrato preliminar preencha as condições de validade do definitivo. Art. 1.007. O réu condenado a abster-se da prática da qualquer ato será citado, sob as cominações da sentença, para o não práticar. Parágrafo único. Contravindo o executado a proibição, a pana lhe será imposta pelo processo estabelecido para as medidas preventivas (art. 685)”.

33 LIEBMAN, Enrico Tullio. Op. cit., p. 339-340, nota 5.

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test, ideoque in obligationibus faciendi succedit praestatio eius quod interest” (Ra-tionalia, Genebra, 1926, em comentário à lei 6, pár. 2 Dig. liv. VIII, tit. 5). De sorte que a expressão nemo praecise potest cogi ad factum é de ser atribuída ao comentador Fabro, no ano de 1626, consoante Liebman34.

Significa, consoante João Calvão da Silva, que “ninguém pode ser co-agido precisamente (de uma maneira absoluta) a realizar um facto, porque isso não pode ser feito sine vi et impressione, isto é, sem violência (coacção) e sem opressão (impressão-choque)”, visto que “nas obrigações de fazer, se sub-roga à prestação o pagamento do id quod interest”35.

A doutrina, de modo geral, menciona que essa ideia contribuiu deci-sivamente para que, na tutela específica, a impossibilidade da realização da obrigação in natura fosse substituída pelo equivalente monetário, isto é, da entrega do valor equivalente ao da obrigação descumprida36. De referir-se, outrossim, que a expressão também se fez presente nos ordenamentos jurídi-cos do fim do século XIX até a metade do século XX, a exemplo do art. 1.142 do Código Civil francês, manifesto reflexo dos princípios de liberdade e de defesa da personalidade, próprios do pensamento do Estado Liberal, do libe-ralismo econômico, do racionalismo iluminista e do jusnaturalismo. Tal era a força desse pensamento que encerrava a impossibilidade de constranger o devedor ao adimplemento específico da obrigação, com a necessidade de a prestação ser convertida em pecúnia.

Não havia como se obter a tutela in natura da prestação inadimplida, mas apenas a sua conversão em dinheiro, até porque o Estado, nessa época, não estava preocupado em garantir ao credor o bem objeto do contrato, mas apenas em manter em funcionamento os mecanismos de mercado, para o que bastava uma sanção negativa, como a nulidade ou o pagamento em pecúnia.

Como refere a doutrina, “o Estado liberal, para dar garantia de liber-dade às pessoas, não podia interferir na esfera jurídica do particular, e, por essa razão, não poderia assegurar, diante do inadimplemento do contrato,

34 LIEBMAN, Enrico Tullio. Op. cit., p. 334-335.35 SILVA, João Calvão da. Cumprimento e sanção pecuniária compulsória. Coimbra: Almedina,

1987. p. 218-219.36 RIBEIRO, Darci Guimarães. O processo no direito comparado. In: Da tutela jurisdicional às

formas de tutela. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 189.

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a entrega do próprio bem contratado ou a tutela jurisdicional específica”37. Nessa época, importou-se a autonomia da vontade e utilizava-se a técnica da sub-rogação, acaso inadimplidas as obrigações de fazer ou não fazer, pelo equivalente ao da prestação não cumprida, uma evidência à característica da substitutividade da jurisdição38.

Segundo a doutrina, o procedimento do Código de 1973 refletia orien-tação para a patrimonialização dos direitos e a “unificação dos meios execu-tórios”. Tal orientação derivava do desapego ao direito material, o que redu-zia a atividade executiva à técnica da expropriação, independentemente da natureza da prestação a que se obrigou o executado39. O que determina a pa-trimonialidade executiva do Código de 1973, atentou bem a doutrina, é a sa-cralização da autonomia individual e de sua incoercibilidade (nemo ad factum praecise cogi potest). Por debaixo da patrimonialidade pulsava, na verdade, a proteção ao valor da liberdade individual. A execução, portanto, limitava--se apenas ao patrimônio do executado, com medidas sub-rogatórias que, por definição, não lhe forçavam a vontade. Não era possível, enfim, coagir a vontade do executado, exigindo-se a sua colaboração para obtenção da tutela jurisdicional. Também evidenciou-se que as técnicas processuais executivas, voltadas à agressão do patrimônio do executado, estavam todas previstas em lei, sendo, nomeadamente, técnicas processuais típicas40.

Lembre-se que os enfadonhos §§ 1º a 7º do art. 634 do Código de 1973 exigiam concorrência pública, com a necessidade de perícia, publicação de editais, prestação de caução e uma péssima condição negocial, o que gerava total desinteresse de terceiros na prestação do fato. Em suma, o Código de 1973 foi completamente incapaz de viabilizar as tutelas dos direitos que não dependiam de prestações do demandado e, assim, não requeriam as modali-dades executivas disciplinadas originariamente pelo código.

37 MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela dos direitos. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 283.

38 CHIOVENDA, Giuseppe. Op. cit., v. 2, p. 3.39 FLACH, Daisson. A nova execução de títulos extrajudiciais. In: ALVARO DE OLIVEIRA,

Carlos Alberto (Coord.). A nova execução de títulos extrajudiciais. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 32.

40 MITIDIERO, Daniel. O processualismo e a formação do Código Buzaid. Revista de Processo, São Paulo, n. 183, maio 2010. p. 187.

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2 panoraMa atual do cuMpriMento das prestações de Fazer e não Fazer

2.1 os meios executivos devem ser adequados à tutela dos direitos. A tutela específica das prestações de fazer e não fazer

Esse pensamento, que predominou, praticamente, até a primeira re-forma do Código de 1973, não tinha em mente os direitos não patrimoniais, personalíssimos e transindividuais. Na verdade, o modelo executivo original do Código de Processo Civil era impotente para viabilizar, por exemplo, a tutela ressarcitória na forma específica, como despoluir um rio, a tutela inibi-tória, como não divulgar um segredo, e a tutela de remoção do ilícito, como apreender um produto nocivo à saúde do consumidor. Enfim, não viabiliza-va a tutela específica dos direitos e apenas permitia a tutela ressarcitória pelo equivalente monetário41.

Nesse período, havia apenas um sistema totalmente dominado pela ideia de dano e ordenado à prestação de uma tutela jurisdicional tão somente repressiva, não havendo nenhum dispositivo idôneo à viabilização de uma tutela preventiva, especialmente mediante abstenções. Com o advento da Lei nº 8.952, de 13 de dezembro de 1994, foi, finalmente, implementada a tutela específica das prestações de fazer e não fazer no âmbito do processo civil nacional. Alcançou-se, finalmente, aquele ideal chiovendiano, tantas vezes mencionado na doutrina, de que o processo deve dar a quem tem direito, tanto quanto seja praticamente possível, tudo e exatamente aquilo que ele tem o direito de conseguir42.

Acerca da famosa afirmação de Chiovenda, respeitado setor da dou-trina formula uma espécie de crítica que merece certa atenção. Afirma-se, por exemplo, que, embora a frase realce a necessidade de se dar “exatamente

41 Essa mudança de mentalidade com o Decreto-Lei nº 58/37, que estabelece a adjudicação compulsória do imóvel por parte do promitente comprador. Ainda, podem ser citadas, como pioneiras, porém restritas às obrigações de prestar declaração de vontade, as seguintes obras: VIDIGAL, Luís Eulálio Bueno. Da execução direta das obrigações de prestar declaração de vontade. São Paulo: Saraiva, 1965; SANCHES, Sidney. Execução específica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978; YARSHEL, Flávio Luiz. Tutela jurisdicional das obrigações de prestar declaração de vontade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. De notar- -se que a disciplina para o cumprimento específico das obrigações de prestar declaração de vontade está hoje no art. 501 do Código de Processo Civil de 2015.

42 CHIOVENDA, Giuseppe. Dell’azione nascente dal contratto preliminare. Saggi di diritto processuale civile (1894-1937). Milano: Giuffrè, v. 1, 1993. p. 110.

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aquilo”, o próprio Chiovenda, nas suas instituições, admite que o direito ma-terial pode deixar de ser efetivamente tutelado por ausência ou inadequação de técnica processual43.

De fato, refere Chiovenda que se, por sua natureza ou por falta de meios de sub-rogação, não se pode conseguir um bem senão com a execução por via coativa, e os meios de coação não estão autorizados na lei, aquele bem não é conseguível no processo, salvo a atuação (se possível, por sua vez) da vontade concreta de lei que deriva da lesão ou inadimplemento do direito a uma prestação; salvo, por exemplo, o direito ao ressarcimento do dano44.

No entanto, não é possível pensar o direito desligado de seu contexto cultural, já que “pertence aos domínios da cultura, sofre seus influxos e ca-minha pelos corredores da história”45. Assim, a crítica não procede, já que, no contexto cultural daquela época, em que Chiovenda formula sua teoria da jurisdição, a legislação italiana apenas admitia os meios sub-rogatórios de execução.

Esse, a toda evidência, era o panorama vivenciado sob o Estado Le-gislativo, em que a jurisdição caracterizava-se pela atuação de uma vontade concreta da lei. Esse era o espelho da cultura da época. Se não estava na le-gislação italiana, não se podia executar. Não havia atuação da vontade da lei quando se pensava em outra técnica executiva que não fosse a técnica da sub--rogação. Para a época, Chiovenda estava certo, ou, no mínimo, foi coerente com seu pensamento. De notar-se que o célebre processualista reconhecia a existência de meios executivos suficientes para a tutela específica de deter-minadas obrigações, embora não houvesse a previsão legal necessária para a sua utilização, o que evidenciava essa característica marcante do Estado Legislativo, ou seja, uma atividade jurisdicional plenamente vinculada à lei.

Assim, cumpre referir que, por meios executivos, se entendem as me-didas que a lei permite aos órgãos jurisdicionais colocarem em prática para o fim de obter-se que o credor logre praticamente o bem a que tem direito. Es-ses meios executivos podem dividir-se em meios de coação e de sub-rogação. Dizem-se meios de coação aqueles em que os órgãos jurisdicionais tendem a

43 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 1, 2015. p. 137.

44 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, 1969. p. 290.

45 MITIDIERO, Daniel. Op. cit., p. 166.

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fazer conseguir para o credor o bem a que tem direito com participação do obrigado, e, pois, se destinam a influir sobre a vontade do obrigado para que se determine a prestar o que deve. Tais são as multas, o arresto pessoal, os sequestros com função coercitiva etc.46.

Já os meios de sub-rogação dizem-se aqueles com que os órgãos ju-risdicionais objetivam, por sua conta, fazer conseguir para o credor o bem a que tem direito, independentemente de participação e, portanto, da vontade do obrigado. Acerca dessa divisão, Chiovenda confessa que o ordenamento italiano carece de uma praxe ou de uma norma geral que, a exemplo da de outros direitos (sistema das astreintes francês; contempt of court inglês), auto-rize o juiz civil a aplicar multas ou outras penalidades como meio de sanção ou de coação. Portanto, Chiovenda reconhece a existência de bens que, por sua natureza, não admitem outra execução, a não ser por coação, visto não se poderem conseguir sem o concurso da vontade do obrigado: tais os bens conseguíveis com a prática de uma atividade não fungível da parte de um obrigado47.

Feitas todas essas observações, o pensamento chiovendiano deve ser compreendido na sua totalidade e consoante o seu contexto cultural, e, com isso, colhe-se a consequência de que, se, por sua natureza ou por falta de meios de sub-rogação, não se pode conseguir um bem senão com a execução por via coativa, e os meios de coação não estão autorizados na lei, aquele bem não é conseguível no processo, salvo a atuação (se possível, por sua vez) da vontade concreta de lei que deriva da lesão ou inadimplemento do direito a uma prestação; salvo, por exemplo, o direito ao ressarcimento do dano.

E aplicando essa consequência ao Direito italiano, na época em que Chiovenda publica suas Instituições, tendo em vista tudo o que foi dito an-teriormente sobre os meios executivos nele admitidos, deve-se concluir que: a) pode haver execução pelas obrigações de dar em geral, mas somente pelos meios de sub-rogação, e não por meios de coação, os quais só são admitidos em casos especiais; se falta a possibilidade de prática de meios de sub-roga-ção, a execução é impossível; b) pode haver execução para as obrigações de fazer, mas unicamente com os meios de sub-rogação previstos em lei, e desde que a atividade devida pelo obrigado seja fungível, e não por meios de coa-ção, porque não admitidos; se faltar a possibilidade prática da sub-rogação,

46 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, op. cit., v. 1, p. 288.47 Idem, p. 290.

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ou se a atividade devida for infungível, é impossível a execução, salvo sem-pre o direito eventualmente derivado, como o ressarcimento dos danos; c) em respeito às obrigações de não fazer, visto faltar uma norma expressa de lei que autorize o único meio de sub-rogação concebível, isto é, o emprego da força para impedir a atividade vedada, por faltarem igualmente normas que autorizem meios de coação, deve-se considerar que não é possível a execu-ção, salvo sempre os direitos derivados da lesão do direito imaginário48.

Esse, basicamente, também era o quadro existente no Código de Pro-cesso Civil até o ano de 1994, já que a ideia de processo de execução tinha por objetivo promover a transformação do mundo fático, sem o concurso da von-tade do obrigado, e a execução era vista como uma atividade necessariamen-te posterior à cognição, que atuava tão somente por meios sub-rogatórios, não sendo tarefa do juiz dar ordens às partes.

A partir de 1994, então, inverte-se o quadro. Sob a inspiração do valor efetividade, ganha corpo a tutela in natura das prestações de fazer e não fa-zer, só convertível em perdas e danos se impossível a obtenção do resultado prático correspondente ou não mais interessar ao autor. A tutela específica, a partir daí, apenas não será concedida: a) se o credor não quiser; ou b) se for impossível a prestação na forma específica.

De acordo com a doutrina, tornar-se-ia impossível o resultado específi-co “quando, com o não cumprimento pontual, desaparece objetivamente seu interesse (utilidade) para o titular do direito”. E acrescenta o seguinte: “para que ocorra a impossibilidade por perda de interesse, devem existir elementos concretos que afastem a utilidade do cumprimento tardio do dever”49.

Trata-se, portanto, de uma verdadeira “reviravolta cultural”, na feliz expressão de Barbosa Moreira, e nem pode parecer exagerado mencionar que, com o advento do Código de Processo Civil de 2015, trata-se de algo mais do que uma mera reforma, trata-se de uma autêntica revolução50. Cai por terra, definitivamente, o aforismo nemo praecise potest cogi ad factum.

O Código de Processo Civil de 2015 dispensa ação de execução de sen-tença, na linha dos processos sincréticos, e quebra o princípio da tipicidade

48 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, op. cit., v. 1, p. 290-291.49 TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e de não-fazer e sua extensão aos

deveres de entrega de coisa. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 328-330.50 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A revolução processual inglesa. In: Temas de direito

processual. 9. série. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 83-84.

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dos meios de execução, que fundou o Código de 1973. O juiz está agora auto-rizado a determinar a modalidade de execução adequada a cada caso concre-to, a exemplo da imposição de astreintes e de medidas necessárias de apoio, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras, o impedimento de atividade nociva, se necessário, com requisição de força policial e até mesmo o bloqueio de valores da Fazenda Pública51.

No que concerne às prestações de fazer ou não fazer, consoante o art. 497 e parágrafo único, habilita-se o juiz a conceder tutela específica e de-terminar providências asseguradoras de resultado prático equivalente ao do adimplemento, valendo-se até de medidas de cunho material e, assim, de ca-ráter mandamental ou executivo, além de requisição de força policial. E para a concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo, sendo que não está afastada a possibilidade de tutela de urgência, liminarmente ou no curso do procedimento (art. 294, parágrafo único).

Portanto, o Código de Processo Civil de 2015 deu-se conta da necessi-dade de pensar os meios de execução a partir das tutelas dos direitos. Some--se a isso a necessidade de, uma vez prolatada a decisão da causa, impor-se o problema, no mais das vezes, de concretizá-la. E no direito processual civil contemporâneo também essa atividade não escapa à influência da necessi-dade de estruturar-se o formalismo do processo na perspectiva dos direitos fundamentais e da cooperação entre as pessoas do juízo52.

Essa concretização deve necessariamente passar pela coordenação en-tre os planos do direito material e do direito processual. Nesse sentido, à tu-tela dos direitos (eficácia e efeitos de conteúdo material) – tutela ressarcitória, restitutória, inibitória, de remoção do ilícito etc. – deve corresponder no pla-no processual uma tutela jurisdicional adequada (eficácia e efeitos processu-ais ou jurisdicionais), regida pelas normas próprias deste plano (declaratória, constitutiva, condenatória, mandamental, executiva lato sensu). Verifica-se, assim, que a tutela jurisdicional (plano do direito processual) serve à tutela

51 Nesse sentido, STJ, 1ª Seção, EREsp 770.969/RS, Rel. Min. José Delgado, J. 28.06.2006, DJ 21.08.2006, p. 224.

52 MITIDIERO, Daniel. Colaboração no processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 141.

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do direito (plano do direito material)53. As prestações do art. 497 do Código de Processo Civil exigem uma atividade pessoal ou abstenção do devedor. Atuam sobre a vontade do obrigado54. Diferente, nas obrigações de dar, o que interessa ao credor é a coisa que lhe deve ser entregue55. Atuam sobre o patrimônio do devedor.

Atualmente, consoante a doutrina, a execução é direta (ou por sub--rogação), na qual o Estado prescinde da colaboração do executado para efe-tivar a prestação devida, e indireta, quando é imposta medida coercitiva que atua sobre a vontade do executado como forma de compeli-lo a cumprir a ordem judicial. Busca-se promover a execução com a “colaboração” do exe-cutado, para que ele cumpra a prestação devida. Na execução direta o Estado prescinde da colaboração do executado para efetivar a prestação devida e substitui a vontade do executado pela conduta do próprio Estado ou de ter-ceiro. As medidas executivas são levadas a efeito mesmo contra a vontade do executado; sua vontade é irrelevante. São adotadas medidas sub-rogatórias, tais como o desapossamento, na execução para a entrega de coisa; a trans-formação, na execução das prestações de fazer fungíveis (art. 817 do Código de Processo Civil de 2015); e a expropriação, técnica utilizada nas obrigações pecuniárias56.

Na execução indireta, em vez de o Estado tomar providências que de-veriam ser tomadas pelo executado (a “substitutividade” de Chiovenda)57,

53 PITERMAN, Marcel. Direito e processo: tutela dos direitos e tutela jurisdicional na perspectiva dos direitos fundamentais. Revista Jurídica, v. 65, n. 472, p. 27-58, fev. 2017.

54 Na contramarcha da evolução, o Código Civil de 2002, quando trata das obrigações de fazer infungíveis, dispõe da seguinte forma: “Art. 247. Incorre na obrigação de indenizar perdas e danos o devedor que recusar a prestação a ele só imposta, ou só por ele exeqüível. Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado. Assim também a doutrina, de modo geral, afirma que “de referência à extensão do poder do credor, não se lhe permite exigir que a prestação seja satisfeita coativamente na forma específica se, para tanto, há que sacrificar a liberdade ou outros direitos personalíssimos do devedor. A obrigação de fazer converte-se em obrigação de dar, satisfazendo-se a prestação com o pagamento de perdas e danos, se não for das que por outrem podem ser cumpridas, à custa do devedor” (GOMES, Orlando. Op. cit., p. 48-49).

55 LIEBMAN, Enrico Tullio. Op. cit., p. 334.56 Por todos, ASSIS, Araken de. Manual da execução. 19. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2017. p. 201-203.57 De acordo com Chiovenda, chama-se execução processual a atuação prática, da parte

dos órgãos jurisdicionais, de uma vontade concreta da lei que garante a alguém um bem

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ele força, por meio de pressão psicológica, que o executado cumpra a obri-gação. A vontade do executado é importante. As medidas executivas contam com a participação do executado. São elas a coerção patrimonial, realizada por meio de multas, e a coerção pessoal, realizada por meio da prisão58.

A doutrina clássica afirma que a execução indireta não é propriamente execução. Como as medidas de coerção indireta visam a que o próprio exe-cutado cumpra a obrigação, não poderiam ser confundidas com a execução, já que esta não se opera por meio do cumprimento59. Fala-se em execução forçada60.

No entanto, se for necessário, para a tutela efetiva dos direitos, coagir indiretamente o devedor, por meio da imposição de multas, não se pode ne-gar que essa modalidade se trata de forma autêntica de execução, aliás, im-prescindível à tutela dos direitos fundamentais e ao Estado Constitucional, a exemplo da tutela inibitória, que, em regra, é imposto um não fazer sob pena de multa, e da tutela ressarcitória na forma específica, que se impõe mediante um fazer sob pena de multa.

Aliás, nas prestações infungíveis o magistrado não poderá utilizar téc-nicas sub-rogatórias, já que, como anteriormente visto, estas modalidades de prestação de fato não podem ser cumpridas por terceiro, mas apenas por meio de técnicas executivas indiretas, como a coerção patrimonial e a coerção pessoal61.

da vida e que resulta de uma verificação (CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, op. cit., v. 1, p. 285).

58 ASSIS, Araken de. Op. cit., p. 198-201.59 Por exemplo, Francesco Carnelutti (Diritto e processo. Napoli: Morano, 1958. p. 44) afirmava

que “[...] s’insinua un tipo intermedio di sanzione, che non è né restituzione né penitenza; parlando con precisione vi si dovrebbe dare il nome di misura coercitiva. Il suo caraterre sta in ciò, che essa non esercita né funzione satisfattiva, come la restituzione, né funzione liberatoria, come la penitenza, ma esclusivamente una funzione preventiva”.

60 LIEBMAN, Enrico Tullio. Op. cit., p. 15.61 A respeito da prisão civil, sustenta-se que pode ser utilizada como mecanismo de execução

destinado a convencer o demandado a cumprir decisões que imponham o cumprimento de um dever de não fazer (por exemplo, de não poluir um rio), ou o cumprimento de um dever de fazer (por exemplo, praticar um ato imprescindível à tutela de um direito da personalidade), que não exijam a disposição de dinheiro ou de qualquer forma de patrimônio. A autorização legal para o uso da prisão como meio de execução está no art. 536, caput e seu § 1º, do CPC e no art. 84, § 5º, do CDC. Tais normas conferem ao juiz o poder para utilizar o meio executivo “necessário” a cada caso conflitivo concreto. Tais normas são claras em autorizar o uso do meio executivo não expressamente tipificado na lei, permitindo que o juiz identifique o meio de execução “necessário”, justificando

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Portanto, mesmo entre os remédios de natureza definitiva, prefere-se cada vez mais aqueles tendentes a prevenir o aparecimento do dano, e não apenas a reconduzir a situação litigiosa ao status quo ante. E isso porque, evi-dentemente, nem sempre se revela satisfatória ou adequada a modalidade tradicional de tutela sancionatória ou repressiva, seja sob a forma primária de restituição ao estado anterior, seja sob a forma secundária de ressarcimento em dinheiro62. Basta pensar-se nos chamados “direitos absolutos”, ligados ao direito de personalidade, como o direito à vida, à integridade física e psíqui-ca, à liberdade, à honra, à imagem, ao nome, à intimidade, que merecem essa particular atenção.

Sob a perspectiva do formalismo valorativo, a doutrina menciona não haver razão convincente para tutelar-se as obrigações de pagar quantia com técnicas menos agressivas do que as técnicas das obrigações de fazer e não fazer. Tal fenômeno decorre, segundo se pensa, de uma supervalorização da propriedade no sistema capitalista atual, protegendo-a mais do que a própria liberdade do cidadão, o que é facilmente verificável no comparativo entre o sistema de tutela dos deveres de pagar quantia e dos deveres de fazer e não fazer63.

Todavia, embora a tutela condenatória atue na fase da execução por meio da técnica da sub-rogação, não se pode afastar, de plano, a possibili-dade de o juiz aplicar uma astreinte, de modo a dar mais efetividade à sua decisão, mas, advirta-se, isso apenas poderá ocorrer eventual e excepcional-mente, a depender das circunstâncias do caso concreto64.

a oportunidade para a sua utilização diante das particularidades do caso concreto e da insuficiência das demais modalidades de execução para dar efetividade à decisão. (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 2, 2015. p. 809)

62 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do formalismo no processo civil: proposta de um formalismo-valorativo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 112.

63 AMARAL, Guilherme Rizzo. Cumprimento e execução da sentença: sob a ótica do formalismo--valorativo. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2008. p. 141.

64 No CPC atual, contudo, muito embora continue havendo sistemática específica para o cumprimento da sentença relativa a obrigações de pagar quantia, sistemática essa que não prevê o uso da multa periódica, o art. 139, IV, prevê de forma expressa que ao juiz incumbe “determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária. É inequívoco que a multa de que trata o art. 537 constitui técnica de tutela de caráter indutivo, coercitivo ou mandamental. Desse modo, deve-se reconhecer que, em hipóteses excepcionais, e no exercício do poder- -dever previsto no art. 139, IV, poderá o juiz fixar a multa de que trata o art. 537 também

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2.2 a tutela jurisdicional mandamental e as técnicas processuais para sua concretização

A tutela jurisdicional mandamental, nas sentenças relativas a presta-ções de fazer e não fazer, encontra seu campo de aplicação porque atua sobre a vontade do devedor e não sobre seu patrimônio. De nada adianta, por-tanto, uma tutela condenatória para impedir um ilícito, seu prosseguimento ou agravamento. Esta é inadequada para tornar efetiva a tutela jurisdicional esperada, impondo-se a ameaça de medidas coercitivas. Prevalece a norma principal da efetividade sobre a segurança65.

A doutrina, de modo geral, ainda distingue a tutela específica do re-sultado prático equivalente nas prestações de fazer e não fazer. Com efeito, algumas vezes, a tutela específica coincide com o ato do próprio devedor, enquanto, em outras, o que importa é o resultado prático-jurídico equivalen-te ao ato do devedor. Na primeira hipótese está-se diante da infungibilidade prática e a execução específica somente poderá ser alcançada com a colabora-ção do devedor. Para induzi-lo, o sistema prevê meios de coerção indireta. Já a segunda hipótese prevê caso de infungibilidade apenas aparente, mas o ato não pode ser praticado por terceiro, a obrigação é infungível, cujo resultado pode ser obtido mediante provimentos jurisdicionais propiciadores da tutela específica, em que a própria decisão produz os efeitos do ato do devedor66. A

para a tutela dos deveres de pagar quantia. Tais hipóteses verificar-se-ão, geralmente, quando todas as demais medidas executivas forem frustradas ou se revelarem, prima facie, ineficientes, como ocorre quando o devedor oculta seu patrimônio impedindo, assim, a expropriação. É preciso, contudo, ter muita cautela na utilização de multa coercitiva com tal finalidade, na medida em que ela não deve se revestir de caráter punitivo para agravar a situação do devedor que já não dispõe de patrimônio para cumprir a obrigação principal.” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 658) Na doutrina, já sustentavam o cabimento do uso da multa periódica para o cumprimento da decisão que condena ao pagamento de quantia, entre outros: MITIDIERO, Daniel. Direito fundamental à tutela jurisdicional adequada e efetiva, tutelas jurisdicionais diferenciadas e multa processual para o cumprimento das obrigações de pagar quantia. In: Processo civil e estado constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 96-105; ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Teoria e prática da tutela jurisdicional. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 174-176; MARINONI, Luis Guilherme. Op. cit., p. 450-457.

65 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do formalismo no processo civil: proposta de um formalismo-valorativo, op. cit. p. 183.

66 WATANABE, Kazuo. Tutela antecipatória e tutela específica das obrigações de fazer e não fazer: arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, v. 19, 1996. p. 19-20.

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obtenção do resultado prático equivalente, ainda que próximo ao da presta-ção, não corresponde ao cumprimento da obrigação67.

Caso o credor requeira a conversão da tutela específica da obrigação em perdas e danos (art. 499 do Código de Processo Civil de 2015), trata-se de direito potestativo de optar entre o cumprimento específico ou sua conver-são, hipótese em que, como observa a doutrina, o sistema vem abrandando a rigidez imposta pelos princípios da demanda e da estabilidade da lide, em prol da efetividade68.

Acerca das técnicas processuais existentes, as medidas coercitivas visam pressionar o réu para que ele cumpra o mandamento judicial. Tal é a astreinte, técnica de tutela coercitiva e acessória, que visa pressionar o réu para que ele cumpra mandamento judicial, pressão esta exercida por meio de ameaça ao seu patrimônio, consubstanciada em multa periódica a incidir em caso de descumprimento69.

De origem francesa, as astreintes, a partir de intenso movimento da ju-risprudência, ganharam fundamento geral e preciso com o surgimento da Lei nº 72.226, de 5 de julho de 1972. Atualmente, em vista da Lei nº 91.650, de 9 de julho de 1991, é possível dizer que o ordenamento francês traça com precisão os contornos dessa técnica. A doutrina menciona o art. 33 da seção 6 do Capítulo II da Lei nº 91.650, de 9 de julho de 1991, intitulada “L’astreinte”: “todo juiz pode, mesmo de ofício, ordenar uma astreinte para assegurar a execução de sua decisão”, e após afirma-se que “a astreinte é independente da indenização”, para concluir não haver dúvida acerca do caráter coercitivo da astreinte, já que não se confunde com a indenização e destina-se a assegurar a execução das decisões judiciais.

De acordo com a doutrina, portanto, a multa possui natureza jurídica de técnica de coerção patrimonial e não de indenização, cujo destinatário é a parte e não o Estado70, aplica-se tanto para os deveres de fazer fungíveis como para os infungíveis, estes são tutelados apenas por meio da multa, e aqueles

67 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Teoria e prática da tutela jurisdicional, op. cit., p. 186.

68 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do formalismo no processo civil: proposta de um formalismo-valorativo, op. cit., p. 201.

69 AMARAL, Guilherme Rizzo. As astreintes e o processo civil brasileiro: multa do artigo 461 do Código de Processo Civil e outras. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 85.

70 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Teoria e prática da tutela jurisdicional, op. cit., p. 186.

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podem ser prestados também por terceiro, não está limitada pelo valor do dano ou da prestação inadimplida e exige proporcionalidade entre a efetivi-dade e a segurança71.

De acordo com a doutrina, a multa deve ser fixada pelo juiz com pru-dência e bom senso, até de ofício, levando em conta de forma proporcional a norma principal da efetividade, de modo a compelir o demandado a obede-cer a decisão e cumprir a obrigação assumida. A lei, nesse sentido, permite alterar o valor da multa ou a sua periodicidade, caso verifique sua insuficiên-cia ou excessividade72.

Quanto ao momento que a multa pode ser cobrada, o art. 537 resolveu a controvérsia que havia a respeito, ao dispor, no § 3º, que decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juí-zo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da senten-ça favorável à parte. O § 4º esclarece que a multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado, e o § 5º esclarece que o dispositivo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.

Ao contrário da regra geral para as execuções provisórias (art. 520 do Código de 2015), em que o credor pode levantar os valores depositados em juízo mediante apresentação de caução idônea, na execução provisória do crédito resultante da incidência da multa os valores depositados em juízo deverão, assim, remanescer e somente poderão ser levantados quando do trânsito em julgado da sentença favorável à parte.

Além da multa coercitiva, outras técnicas processuais podem ser utili-zadas para o adimplemento das prestações de fazer ou não fazer, de acordo com o rol exemplificativo do § 1º do art. 536 do Código de Processo Civil de 2015. Além dessas medidas, a jurisprudência admite o bloqueio de valores da Fazenda Pública para custeio de tratamento médico e ressalva a impossibili-dade do contempt of court no Direito brasileiro, que está limitado à sanção do art. 77, IV, § 2º do Código de Processo Civil de 201573.

71 AMARAL, Guilherme Rizzo. As astreintes e o processo civil brasileiro: multa do artigo 461 do Código de Processo Civil e outras, op. cit., p. 103-105.

72 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Teoria e prática da tutela jurisdicional, op. cit., p. 187.

73 Nesse sentido: “Prisão civil. Depósito. Depositário infiel. Alienação fiduciária. Decretação da medida coercitiva. Inadmissibilidade absoluta. Insubsistência da previsão constitucional

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Interessante o tratamento que o direito Estadunidense confere às injunctions. Taruffo e Hazard Jr. as conceituam como uma decisão que ordena ao réu a realização de uma conduta ou sua abstenção de agir. Uma injunction que exige um fazer é chamada mandatory injunction. Aquela que exige um não fazer é denominada prohibitory injunction74.

Sobre a execução das injunctions do Direito norte-americano, extrai-se que, em várias hipóteses, a indenização em dinheiro é o único remédio prá-tico. Todavia, em diversos casos que a indenização não é adequada, como, por exemplo, na repetição do ilícito (poluição), o órgão judicial simplesmen-te ordena ao réu que não pratique a conduta específica. Na maioria das ve-zes, uma injunction nesses termos é suficiente, e violar a injunction poderá resultar em penalidades monetárias extremamente altas. Pode-se exigir o financial security para garantir o respeito à injunction, ou recorrer a outras téc-nicas executivas, como, por exemplo, que o réu exiba relatórios periódicos de sua conduta, ou que um inspetor independente monitore o respeito da decisão, ou até mesmo que uma pessoa (administrador) assuma a direção das atividades cobertas pela injunction. Geralmente, essas medidas são tomadas quando a injunction envolve uma instituição pública. No caso das prestações de fazer infungíveis, denominadas de specific performance injunctions, refere a doutrina que as cortes têm relutância em compelir a conduta pessoal, uma vez que seria impossível assegurar uma performance de boa-fé do artista. O resultado pode ser atingido indiretamente. O artista pode ser proibido de atuar, já que a inatividade seria contra os interesses do astro, ele provavel-mente iria cumprir a obrigação75.

A derradeira sanção a ser aplicada ao devedor recalcitrante é o contempt of court. Significa a recusa em cumprir uma ordem do juiz. São duas espécies de contempt, o civil contempt, que consiste na prisão, ou em uma pe-nalidade em dinheiro, até que o “ofensor” concorde em cumprir a ordem, cujo propósito é coagir ao cumprimento. E o criminal contempt, que consiste em prisão ou multa monetária, para aquele que recusou o cumprimento da

e das normas subalternas. Interpretação do art. 5º, LXVII e §§ 1º, 2º e 3º, da CF, à luz do art. 7º, n. 7, da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica). Recurso improvido. Julgamento conjunto do RE 349.703 e dos HC 87.585 e 92.566. É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito” (STF, Pleno, RE 466.343/SP, Rel. Min. Cezar Peluso, J. 03.12.2008, DJe 04.06.2009).

74 TARUFFO, Michele; HAZARD JÚNIOR, Geofrey C. American civil procedure: an introduction. New Haven: Yale University, 1993. p. 196.

75 Idem, p. 197-198.

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ordem, cujo propósito é punir o ofensor e prevenir outros de desobedecerem a corte. O contempt aplica-se no caso da ordem de fazer e de não fazer. Uma ação de indenização, por exemplo, não é executável via contempt, consoante a doutrina76.

Portanto, no Direito norte-americano, não cabe prisão por dívida. To-davia, se o executado obstaculiza a localização de seus bens, poderá estar sujeito à injunction contra essa obstrução, executável via contempt of court. Importante registrar que a civil ou criminal injunction apenas podem ser im-postas mediante prévio contraditório, denominado order to show cause. Tudo isso ocorre em uma audiência denominada show cause hearing. Geralmente, a parte desiste da violação do preceito antes da audiência. No caso de aplicar o criminal contempt, é necessária a prova do dolo e o standard probatório (mode-lo de constatação) é o mesmo exigido em casos criminais, beyond a reasonable doubt77.

Ainda consoante a doutrina, o poder do contempt é essencial para man-ter a autoridade do órgão judicial em determinar as responsabilidades dos litigantes. Ao mesmo tempo, corre-se o risco de seu exercício arbitrário. Por isso, alguns sustentam que outro juiz deve ser designado para determinar o contempt. Enfim, a justiça do processo depende da imparcialidade e prudên-cia dos juízes e não apenas das regras do procedimento78.

Afirmava-se que o resultado prático equivalente excepciona a regra de que a decisão deve estar adstrita ao pedido. Imaginava-se o exemplo de a parte solicitar o fechamento da indústria poluidora e o juiz determinar na sentença a instalação de um filtro, diante do princípio da execução menos gravosa para o devedor. Sustentava-se, nesse caso, a existência de uma ver-dadeira mitigação do princípio da congruência entre o pedido e a sentença79.

Nessa mesma linha, diante de uma releitura do princípio da congru-ência, na qual se afirma que a única concordância exigida por ele é entre o pedido mediato e o bem da vida concedido pela sentença, sustentou-se que o art. 461 do Código de 1973, correspondente aos arts. 497 e 536 do Código de Processo Civil de 2015, trazia uma verdadeira exceção ao princípio, ao pos-

76 Idem, p. 202.77 TARUFFO, Michele; HAZARD JÚNIOR, Geofrey C. Op. cit., p. 203. Acerca dos modelos

de constatação no direito probatório: KNIJNIK, Danilo. A prova nos juízos cível, penal e tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2007. passim.

78 TARUFFO, Michele; HAZARD JÚNIOR, Geofrey C. Op. cit., p. 204.79 MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela dos direitos, op. cit., p. 104-107.

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sibilitar a entrega de bem da vida diverso daquele pretendido pelo deman-dante, desde que assim a este alcance o resultado prático equivalente àquele pretendido com o bem da vida originariamente postulado80.

Todavia, quando se toma por base a distinção entre técnica processual (meio) e tutela jurisdicional (fim), conclui-se que o juiz, para atingir determi-nado fim (a tutela jurisdicional mandamental), apenas utilizou-se de outra técnica processual (um meio para atingir o fim), sem haver qualquer quebra no princípio da demanda ou do dispositivo em sentido material. As técnicas processuais, diferentemente das tutelas jurisdicionais, independem de pedi-do e podem ser tomadas sem consideração ao princípio da demanda.

conclusão

Do que foi exposto, conclui-se que o processo civil é fenômeno eminen-temente cultural, produto do homem, e não da natureza. Na atual quadra da marcha, a tutela jurisdicional deve ser adequada ao direito material, supera-da, de vez, a noção de que o processo só pode oferecer uma tutela repressiva, pelo equivalente em pecúnia, às partes, oriunda, como se viu, da pessoaliza-ção dos direitos, fenômeno ocorrido desde o Direito romano tardio.

Além de ser uma tutela adequada, deve a tutela jurisdicional ser espe-cífica ao direito material, e, nesse sentido, o processo deve ser estruturado de modo a propiciar às pessoas, mediante técnicas colocadas à disposição do órgão judicial, tudo e exatamente aquilo a que fazem jus no plano do direito material. O Código de Processo Civil de 2015, sob esse aspecto, cumpre a missão.

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80 AMARAL, Guilherme Rizzo. Cumprimento e execução da sentença: sob a ótica do formalismo- -valorativo, op. cit., p. 156-157.

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a necessidade de inForMação soBre a presença de glúten nos produtos

e a ForMa de sua veiculaçãoandré BoCCuzzi de Souza

Advogado, Professor Universitário, Bacharel em Direito pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul – USCS,

Especialista (Pós-Graduação Lato Sensu) em Direito Constitucional pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus.

RESUMO: O consumo de glúten traz prejuízos aos consumidores que possuem doença celíaca, devendo ser por eles evitado. Para tan-to e buscando garantir um consumo consciente, deve haver informa-ção sobre sua presença ou nos rótulos ou embalagens dos produtos, de forma a atender aos comandos do Código de Defesa do Consu-midor e da legislação correlata, que, inclusive, veicula claramente tal obrigação. Não obstante, entendeu o Superior Tribunal de Justiça que a mera informação em tela não atende completamente ao diplo-ma consumerista, devendo haver também indicação de advertência sobre os malefícios que o glúten acarreta à saúde dos doentes celía-cos. O descumprimento a tais questões, por sua vez, pode acarretar a incidência de sanções ao fornecedor.

PALAVRAS-CHAVE: Direito do consumidor; direito à informação; doença celíaca; advertência; glúten; hipervulnerabilidade; hipossu-ficiência; Política Nacional das Relações de Consumo; saúde; boa-fé; vício; vício de qualidade; liberdade de escolha; consumo consciente; fato do produto; impropriedade do produto; sanção.

O glúten é um conjunto de proteínas (e não um carboidrato), sendo a combinação de dois grupos de proteínas: a gliadina e a glutenina, encontradas dentro de grãos de trigo, cevada e centeio – mais precisamente no endosperma, a reserva nutritiva do embrião da planta1.

Seu consumo é bastante prejudicial para uma parcela da população, notadamente para as pessoas que possuem doença celíaca (há estudos que

1 Disponível em: <http://www.glutenconteminformacao.com.br/o-que-e-gluten/>. Aces- so em: 14 dez. 2017.

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indicam, inclusive, a existência de uma intolerância ou sensibilidade a ele, o que acaba por atingir um número ainda maior de indivíduos).

Por essa razão, os portadores dessa doença precisam evitar o consu-mo do glúten. Mas, para que assim possam agir, dependem que os produtos tragam a informação sobre sua presença. Assim, os produtos devem trazer informações, em seu rótulo ou bula, se contêm ou não glúten.

Essa obrigação de informar sobre a presença ou não do glúten nos pro-dutos encontra-se veiculada no art. 1º da Lei Federal nº 10.674/20032, que dispõe, in verbis:

Art. 1º Todos os alimentos industrializados deverão conter em seu rótulo e bula, obrigatoriamente, as inscrições “contém glúten” ou “não contém glúten”, conforme o caso.

A esse respeito, Leonardo de Medeiros Garcia3 ressalta que a

Lei nº 10.674/2003, em seu art. 1º, dispõe que todos os alimentos industria-lizados deverão conter em seu rótulo e bula, obrigatoriamente, as inscrições “contém glúten” ou “não contém glúten”, conforme o caso, concluindo que a ideia do legislador ao prever tal obrigação aos fornecedores foi proteger os consumidores portadores de doença celíaca.

Registre-se, em complemento, que a obrigação de constar na embala-gem dos produtos a existência de glúten também se encontra contemplada no item nº 2.1 do Regulamento4 anexo à Resolução-RDC nº 40, de 8 de feverei-ro de 2002, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa.

Aliás, em complemento, ressalta-se que a exposição de motivos da Re-solução supracitada trouxe os seguintes pontos como justificativa para sua edição:

[...].

considerando que a doença celíaca ou síndrome celíaca e a dermatite her-petiforme são doenças causadas pela intolerância permanente ao glúten;

2 Que substituiu a anterior Lei Federal nº 8.543/1992, que já trazia a obrigação semelhante. 3 GARCIA, Leonardo de Medeiros. Código de Defesa do Consumidor comentado – Artigo por

artigo. 12. ed. Bahia: JusPodivm, 2016. p. 282.4 Regulamento Técnico para rotulagem de alimentos e bebidas embalados que contenham glúten.

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considerando que o glúten é o nome dado a um conjunto de proteínas pre-sentes no trigo, aveia, cevada, malte e centeio; e

considerando a necessidade de padronização da advertência a ser declara-da em rótulos de alimentos que contenham glúten;

[...].

Destarte, a respeito do tema, interessante aresto pode ser extraído do Superior Tribunal de Justiça5, cabendo dele destacar os seguintes trechos:

[...].

Pode-se aferir a gravidade da doença celíaca por meio da descrição das suas causas e diagnóstico:

“A doença celíaca é um transtorno autoimune do intestino delgado que ocorre em pessoas geneticamente predispostas de todas as idades a partir de meados da infância.

Os sintomas incluem dor e desconforto no sistema digestivo, obstipação e diarreia crônicas, atraso do desenvolvimento fisiológico em crianças, ane-mia e, embora seja possível que estes sintomas não se cheguem a manifes-tar e tenham também sido descritos sintomas noutros órgãos. Muitas das pessoas com a doença apresentam insuficiência de vitaminas devido à di-minuição da capacidade do intestino delgado em absorver de forma eficaz os nutrientes dos alimentos [...]” (Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Doen%C3%A7a_cel%C3%ADaca>).

É, portanto, uma doença autoimune, que afeta o intestino delgado interfe-rindo diretamente na absorção de nutrientes essenciais ao organismo como carboidratos, gorduras, proteínas, vitaminas, sais minerais e água, decor-rente da intolerância permanente ao glúten em pessoas geneticamente pre-dispostas.

Conforme a fonte supracitada, “atualmente, o único tratamento eficaz é uma dieta isenta de glúten durante toda a vida”, pois não existem medi-camentos capazes de impedir as lesões e que o corpo ataque o intestino na presença de glúten. Daí a importância da informação nas embalagens de alimentos comercializados de que é “isento de glúten” ou qual a quanti-dade ministrada da proteína. Isso porque, se porventura uma pessoa com doença celíaca consumir alimentos com glúten ou traços de glúten, a inges-

5 STJ, REsp 1.600.172/GO, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, J. 15.09.2016.

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tão poderá provocar uma inflamação crônica apta a impedir a absorção de nutrientes.

Além do art. 31 do Código de Defesa do Consumidor, que estatui uma “obrigação geral de informação” ao consumidor, a Lei nº 10.674/2003 pre-vê, em seu art. 1º, que “todos os alimentos industrializados deverão conter em seu rótulo e bula, obrigatoriamente, as inscrições ‘contém glúten’ ou ‘não contém glúten’, conforme o caso”.

[...].

Portanto, da dicção do art. 1º da Lei Federal nº 10.674/2003 e do item nº 2.1 do Regulamento anexo à Resolução-RDC nº 40, de 8 de fevereiro de 2002, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa, vê-se que os for-necedores devem indicar, no rótulo ou embalagem dos produtos, a existência ou não de glúten.

Tem-se, pois, norma dirigida não apenas aos vulneráveis – presunção que já milita a favor de todo consumidor (art. 4º, I, do CDC) –, mas aos con-sumidores que gozam de uma espécie de dupla vulnerabilidade, naquilo que a doutrina mais atual vem denominando de hipervulnerabilidade (ou, para al-guns, de hipossuficiência), demandando, por isso mesmo, uma proteção ainda mais aprofundada.

Outrossim, atende-se aos princípios estatuídos pela Política Nacional das Relações de Consumo, de forma a respeitar a saúde dos consumidores, buscar a melhora de sua qualidade de vida, observar a transparência e har-monia das relações de consumo, sempre com suporte no princípio da boa-fé, que deve nortear toda relação consumerista, restando por atender, também, aos direitos básicos do consumidor a proteção de sua saúde, a educação e di-vulgação sobre o consumo adequado dos produtos e a informação adequada e clara sobre os produtos, inclusive acerca dos riscos que apresentem, nos termos dos arts. 4º, caput e inciso III, e 6º, I, II e III, todos do diploma consu-merista.

Aliás, o próprio Código de Defesa do Consumidor dispõe, em seu art. 8º, que “os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os con-siderados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu respeito”, assim como, em seu art. 9º, que “o fornecedor de produtos e serviços potencialmente nocivos ou perigosos à

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saúde ou segurança deverá informar, de maneira ostensiva e adequada, a respeito da sua nocividade ou periculosidade, sem prejuízo da adoção de outras medidas cabíveis em cada caso concreto”.

Ao instituir a obrigação de informação sobre a presença ou não do glúten nos produtos, há, ainda, o cumprimento ao princípio da ação gover-namental (art. 4º, II, do Código de Defesa do Consumidor), seja no âmbito da instituição da referida obrigação de informação trazida pela Lei Federal nº 10.674/2003, seja no que concerne à fiscalização de seu cumprimento.

Avançando-se na temática, o Superior Tribunal de Justiça já reconhe-ceu que não basta tão somente a indicação de que o produto contém ou não glúten, devendo essa informação vir acompanhada de advertência quanto aos malefícios de tal substância aos portadores de doença que não podem consumi-la, em acórdão que restou assim ementado6:

Direito do consumidor. Administrativo. Normas de proteção e defesa do consumidor. Ordem pública e interesse social. Princípio da vulnerabilida-de do consumidor. Princípio da transparência. Princípio da boa-fé objeti-va. Princípio da confiança. Obrigação de segurança. Direito à informação. Dever positivo do fornecedor de informar, adequada e claramente, sobre riscos de produtos e serviços. Distinção entre informação-conteúdo e in-formação-advertência. Rotulagem. Proteção de consumidores hipervulne-ráveis. Campo de aplicação da Lei do Glúten (Lei nº 8.543/1992 ab-rogada pela Lei nº 10.674/2003) e eventual antinomia com o art. 31 do Código de Defesa do Consumidor. Mandado de segurança preventivo. Justo receio da impetrante de ofensa à sua livre iniciativa e à comercialização de seus produtos. Sanções administrativas por deixar de advertir sobre os riscos do glúten aos doentes celíacos. Inexistência de direito líquido e certo. Denega-ção da segurança.

1. Mandado de segurança preventivo fundado em justo receio de sofrer ameaça na comercialização de produtos alimentícios fabricados por em-presas que integram a Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação – ABIA, ora impetrante, e ajuizado em face da instauração de procedimen-tos administrativos pelo Procon-MG, em resposta ao descumprimento do dever de advertir sobre os riscos que o glúten, presente na composição de certos alimentos industrializados, apresenta à saúde e à segurança de uma categoria de consumidores – os portadores de doença celíaca.

6 STJ, REsp 586316/MG, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, J. 17.04.2007.

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2. A superveniência da Lei nº 10.674/2003, que ab-rogou a Lei nº 8.543/1992, não esvazia o objeto do mandamus, pois, a despeito de disciplinar a maté-ria em maior amplitude, não invalida a necessidade de, por força do art. 31 do Código de Defesa do Consumidor – CDC, complementar a expressão “contém glúten” com a advertência dos riscos que causa à saúde e segu-rança dos portadores da doença celíaca. É concreto o justo receio das em-presas de alimentos em sofrer efetiva lesão no seu alegado direito líquido e certo de livremente exercer suas atividades e comercializar os produtos que fabricam.

3. As normas de proteção e defesa do consumidor têm índole de “ordem pública e interesse social”. São, portanto, indisponíveis e inafastáveis, pois resguardam valores básicos e fundamentais da ordem jurídica do Estado Social, daí a impossibilidade de o consumidor delas abrir mão ex ante e no atacado.

4. O ponto de partida do CDC é a afirmação do princípio da vulnerabi-lidade do consumidor, mecanismo que visa a garantir igualdade formal--material aos sujeitos da relação jurídica de consumo, o que não quer dizer compactuar com exageros que, sem utilidade real, obstem o progresso tec-nológico, a circulação dos bens de consumo e a própria lucratividade dos negócios.

5. O direito à informação, abrigado expressamente pelo art. 5º, XIV, da Constituição Federal, é uma das formas de expressão concreta do princípio da transparência, sendo também corolário do princípio da boa-fé objetiva e do princípio da confiança, todos abraçados pelo CDC.

6. No âmbito da proteção à vida e saúde do consumidor, o direito à infor-mação é manifestação autônoma da obrigação de segurança.

7. Entre os direitos básicos do consumidor, previstos no CDC, inclui-se exatamente a “informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, com-posição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem” (art. 6º, III).

8. Informação adequada, nos termos do art. 6º, III, do CDC, é aquela que se apresenta simultaneamente completa, gratuita e útil, vedada, neste úl-timo caso, a diluição da comunicação efetivamente relevante pelo uso de informações soltas, redundantes ou destituídas de qualquer serventia para o consumidor.

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9. Nas práticas comerciais, instrumento que por excelência viabiliza a cir-culação de bens de consumo, “a oferta e apresentação de produtos ou ser-viços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros da-dos, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores” (art. 31 do CDC).

10. A informação deve ser correta (= verdadeira), clara (= de fácil entendi-mento), precisa (= não prolixa ou escassa), ostensiva (= de fácil constatação ou percepção) e, por óbvio, em língua portuguesa.

11. A obrigação de informação é desdobrada pelo art. 31 do CDC, em quatro categorias principais, imbricadas entre si: a) informação-conteúdo (= características intrínsecas do produto e serviço), b) informação-utiliza-ção (= como se usa o produto ou serviço), c) informação-preço (= custo, formas e condições de pagamento), e d) informação-advertência (= riscos do produto ou serviço).

12. A obrigação de informação exige comportamento positivo, pois o CDC rejeita tanto a regra do caveat emptor como a subinformação, o que trans-muda o silêncio total ou parcial do fornecedor em patologia repreensível, relevante apenas em desfavor do profissional, inclusive como oferta e pu-blicidade enganosa por omissão.

13. Inexistência de antinomia entre a Lei nº 10.674/2003, que surgiu para proteger a saúde (imediatamente) e a vida (mediatamente) dos portadores da doença celíaca, e o art. 31 do CDC, que prevê sejam os consumidores informados sobre o “conteúdo” e alertados sobre os “riscos” dos produtos ou serviços à saúde e à segurança.

14. Complementaridade entre os dois textos legais. Distinção, na análi-se das duas leis, que se deve fazer entre obrigação geral de informação e obrigação especial de informação, bem como entre informação-conteúdo e informação-advertência.

15. O CDC estatui uma obrigação geral de informação (= comum, ordinária ou primária), enquanto outras leis, específicas para certos setores (como a Lei nº 10.674/2003), dispõem sobre obrigação especial de informação (= se-cundária, derivada ou tópica). Esta, por ter um caráter mínimo, não isenta os profissionais de cumprirem aquela.

16. Embora toda advertência seja informação, nem toda informação é ad-vertência. Quem informa nem sempre adverte.

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17. No campo da saúde e da segurança do consumidor (e com maior razão quanto a alimentos e medicamentos), em que as normas de proteção devem ser interpretadas com maior rigor, por conta dos bens jurídicos em questão, seria um despropósito falar em dever de informar baseado no homo medius ou na generalidade dos consumidores, o que levaria a informação a não atingir quem mais dela precisa, pois os que padecem de enfermidades ou de necessidades especiais são freqüentemente a minoria no amplo univer-so dos consumidores.

18. Ao Estado Social importam não apenas os vulneráveis, mas sobretudo os hipervulneráveis, pois são esses que, exatamente por serem minoritários e amiúde discriminados ou ignorados, mais sofrem com a massificação do consumo e a “pasteurização” das diferenças que caracterizam e enrique-cem a sociedade moderna.

19. Ser diferente ou minoria, por doença ou qualquer outra razão, não é ser menos consumidor, nem menos cidadão, tampouco merecer direitos de segunda classe ou proteção apenas retórica do legislador.

20. O fornecedor tem o dever de informar que o produto ou serviço pode causar malefícios a um grupo de pessoas, embora não seja prejudicial à ge-neralidade da população, pois o que o ordenamento pretende resguardar não é somente a vida de muitos, mas também a vida de poucos.

21. Existência de lacuna na Lei nº 10.674/2003, que tratou apenas da infor-mação-conteúdo, o que leva à aplicação do art. 31 do CDC, em processo de integração jurídica, de forma a obrigar o fornecedor a estabelecer e di-vulgar, clara e inequivocamente, a conexão entre a presença de glúten e os doentes celíacos.

22. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.

Recentemente, ao verificar a possibilidade de eventual divergência no âmbito de suas Turmas, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça pa-cificou o entendimento assente no referido Tribunal Superior7. Confira-se:

Processo civil. Processo coletivo. Direito do consumidor. Ação coletiva. Di-reito à informação. Dever de informar. Rotulagem de produtos alimentí-cios. Presença de glúten. Prejuízos à saúde dos doentes celíacos. Insuficiên-cia da informação-conteúdo “contém glúten”. Necessidade de complemen-tação com a informação-advertência sobre os riscos do glúten à saúde dos

7 EDv-REsp 1.515.895/MS, Rel. Min. Humberto Martins.

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doentes celíacos. Integração entre a Lei do Glúten (lei especial) e o Código de Defesa do Consumidor (lei geral).

1. Cuida-se de divergência entre dois julgados desta Corte: o acórdão em-bargado da Terceira Turma que entendeu ser suficiente a informação “con-tém glúten” ou “não contém glúten”, para alertar os consumidores celíacos afetados pela referida proteína; e o paradigma da Segunda Turma, que en-tendeu não ser suficiente a informação “contém glúten”, a qual deve ser complementada com a advertência sobre o prejuízo do glúten à saúde dos doentes celíacos.

2. O CDC traz, entre os direitos básicos do consumidor, a “informação ade-quada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentam” (art. 6º, III).

3. Ainda de acordo com o CDC, “a oferta e a apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantida-de, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores” (art. 31).

4. O art. 1º da Lei nº 10.674/2003 (Lei do Glúten) estabelece que os alimen-tos industrializados devem trazer em seu rótulo e bula, conforme o caso, a informação “não contém glúten” ou “contém glúten”, isso é, apenas a informação-conteúdo. Entretanto, a superveniência da Lei nº 10.674/2003 não esvazia o comando do art. 31, caput, do CDC (Lei nº 8.078/1990), que determina que o fornecedor de produtos ou serviços deve informar “sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores”, ou seja, a informação-advertência.

5. Para que a informação seja correta, clara e precisa, torna-se necessária a integração entre a Lei do Glúten (lei especial) e o CDC (lei geral), pois, no fornecimento de alimentos e medicamentos, ainda mais a consumidores hipervulneráveis, não se pode contentar com o standard mínimo, e sim com o standard mais completo possível.

6. O fornecedor de alimentos deve complementar a informação-conteúdo “contém glúten” com a informação-advertência de que o glúten é prejudi-cial à saúde dos consumidores com doença celíaca.

Embargos de divergência providos para prevalecer a tese do acórdão pa-radigma no sentido de que a informação-conteúdo “contém glúten” é, por

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si só, insuficiente para informar os consumidores sobre o prejuízo que o alimento com glúten acarreta à saúde dos doentes celíacos, tornando-se ne-cessária a integração com a informação-advertência correta, clara, precisa, ostensiva e em vernáculo: “Contém glúten: o glúten é prejudicial à saúde dos doentes celíacos”.

Essa obrigação, como sedimentada nos acórdãos acima transcritos, funda-se no próprio direito à informação do consumidor8, que, nos termos do art. 31 do Código de Defesa do Consumidor, deve ser correta, clara, pre-cisa, ostensiva e em língua portuguesa, sobre diversos aspectos do produto, de acordo com o rol trazido pelo referido dispositivo legal, que, registre-se, é meramente exemplificativo. As informações abarcarão, como visto nos pre-cedentes trazidos alhures, tanto a informação-conteúdo como a informação--advertência.

Nessa linha, para melhor analisar o tema, importa trazer a assertiva de Fabiana D’Andrea Ramos9, no seguinte sentido:

[...].

Também é importante destacar o aspecto relativo ao momento do cumpri-mento da obrigação de informar. Sendo obrigação legal autônoma, a sua incidência ocorre durante toda a relação de consumo, desde o mais sim-ples contato social (que tenha o consumo como finalidade), passando pela celebração do contrato, execução até o momento pós-contratual. É correto afirmar, entretanto, que há momentos em que a observância da obrigação de informar será especialmente relevante. É o que ocorre no momento pré--contratual, pois as informações aí transmitidas são essenciais para a for-mação do consentimento do consumidor. Considerando que as normas de tutela têm entre seus objetivos o de reintegrar a racionalidade nas relações de consumo, natural que se despenda maior esforço para que as escolhas do consumidor sejam refletidas e autodeterminadas. A racionalização das opções do consumidor é, seguramente, a mais importante função da obri-gação de informação.

8 Cuja importância é amplamente reconhecida pela doutrina e pela jurisprudência, mencionando-se, como referência do tema, o acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça (AgRg-AgRg-REsp 1261824/SP, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, J. 14.02.2012).

9 RAMOS, Fabiana D’Andrea. Superendividamento maior é problema do mercado de crédito, não do consumidor. Consultor Jurídico – Conjur, São Paulo, ago. 2017. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2017-ago-16/garantias-consumo-superendividamento- -maior-problema-mercado-credito-nao-consumidor>. Acesso em: 16 ago. 2017.

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[...].

Em relevante precedente, o Superior Tribunal de Justiça assentou que:

A liberdade de escolha do consumidor, direito básico previsto no inciso II do art. 6º do CDC, depende da correta, fidedigna e satisfatória informação sobre os produtos e os serviços colocados no mercado de consumo.

A autodeterminação do consumidor é indissociável da informação que lhe é transmitida, pois é um dos meios de formar a opinião e produzir a toma-da de decisão daquele que consome. Assim, se a informação é adequada, o consumidor age com mais consciência; se é falsa, inexistente ou omissa, retira-se-lhe a liberdade de escolha consciente.

[...].

Mais do que obrigação decorrente de lei, o dever de informar é uma for-ma de cooperação, uma necessidade social. Na atividade de fomento ao consumo e na cadeia fornecedora, o dever de informar tornou-se autêntico ônus pró-ativo incumbido aos fornecedores (parceiros comerciais, ou não, do consumidor), pondo fim à antiga e injusta obrigação que o consumidor tinha de se acautelar (caveat emptor).10

Aliás, anote-se que

nada mais coerente que, na relação de consumo, o polo que detenha pleno conhecimento do produto oferecido – quer por tê-lo produzido, quer por manter vínculo com seu processo de fabricação ou distribuição –, seja tam-bém o responsável por prestar ao polo vulnerável (que desconhece todo esse processo) o necessário esclarecimento para que este possa tomar ati-tude consciente diante do produto posto à venda no mercado: adquiri-lo ou rechaçá-lo.11

Dentre as posições que o direito à informação assume no âmbito do direito do consumidor, tem-se, inegavelmente, sua correlação com a liberda-de de escolha do consumidor, de modo a garantir seu consumo consciente e uma decisão no mesmo sentido. No caso específico do glúten, a informação sobre sua existência em determinado produto permite ao consumidor, de for-ma livre e consciente, optar por consumidor (ou não) aquele determinado

10 STJ, REsp 1.469.087/AC, 2ª T., Rel. Min. Humberto Martins, J. 18.08.2016.11 Trecho extraído do acórdão proferido pelo STJ, REsp 1.364.915/MG, 2ª T., Rel. Min.

Humberto Martins, J. 14.05.2013.

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produto e, por consequência, o próprio consumo do glúten. E tal assertiva ganha ainda mais razão pela necessidade de também constar os malefícios do consumo do glúten aos que não podem consumi-lo, na esteira dos princípios e dos direitos básicos dos consumidores já mencionados anteriormente.

O direito à informação ganha, assim, ainda mais relevo na proteção do consumidor, servindo como matriz do microssistema consumerista e dialo-gando com outras normas, mesmo que correlatas. Nesse sentido, como apon-ta Bruno Miragem12:

Dentre as grandes transformações operadas no sistema jurídico brasileiro pelo direito do consumidor, situa-se a positivação do direito à informação como espécie de direito subjetivo concreto, previsto por lei, e reconhecido em todas as espécies de relações de consumo [...].

Consistem de deveres que visam garantir a veracidade e a possibilidade de reconhecimento dos termos da oferta bem como da apresentação dos produtos e serviços (inclusive a rotulagem, embalagens, bem como qual-quer outro modo de apresentação. Eventual descumprimento dos mesmos, dá causa a uma oferta enganosa, ou podem expor o consumidor a riscos à saúde e segurança, e por isso deverá ser sancionada. Neste sentido, o des-cumprimento do dever pode dar causa tanto ao cumprimento específico da obrigação como a qual se compromete a oferta (quando esta for mais vanta-josa ao consumidor), quanto a imposição das sanções específicas previstas no CDC (multa etc.). [...].

Por outro lado, anote-se que o art. 18, § 6º, II, do Código de Defesa do Consumidor prescreve que:

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não durá-veis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da dispari-dade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua na-tureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

[...].

§ 6º São impróprios ao uso e consumo:

12 MIRAGEM, Bruno. Curso de direito do consumidor. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 293/294.

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[...].

II – os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsifica-dos, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ain-da, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação;

[...]

Vê-se, pois, que há presunção de impropriedade para o uso e consumo dos produtos em desacordo com as normas regulares de fabricação, distribui-ção ou apresentação, situação que caracteriza vício de qualidade. A depender do caso individual, pode inclusive haver a ocorrência de fato do produto (de-feito), nos termos do art. 12 e seu § 1º do Código de Defesa do Consumidor, considerando, sobretudo, as consequências que podem advir do consumo de glúten por aqueles que não podem consumi-lo.

Assim, cumpre aos fornecedores informar no rótulo ou embalagem dos produtos a existência ou não de glúten (informação-conteúdo), bem como, se presente tal substância, sobre o prejuízo que acarreta à saúde dos doentes celíacos, indicando, como informação-advertência, a expressão “contém glú-ten: o glúten é prejudicial à saúde dos doentes celíacos”.

Como visto, a primeira informação (se contém ou não glúten) em de-corrência especialmente da Lei Federal nº 10.647/2003 e a segunda em con-sequência do quanto decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em julgado já transcrito acima.

A ausência de informações nos moldes acima consignados, por sua vez, além de configurar infração ao art. 1º da Lei Federal nº 10.674/2003 (e ao próprio Regulamento anexo à Resolução-RDC nº 40, de 8 de fevereiro de 2002, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa), acaba por violar também o art. 18, § 6º, II, do Código de Defesa do Consumidor, tornando o produto, em consequência, impróprio para o uso e consumo (já que em de-sacordo com as normas regulamentares consignadas), e o art. 31, caput, do referido diploma legal, ante a ausência de informações adequadas.

Em assim agindo, ou seja, descumprimento a legislação supracitada, estarão os fornecedores (em regra, de forma objetiva e solidária) sujeitos à aplicação de sanção administrativa (que não exige eventual dano concreto, sendo ele meramente potencial) pelos órgãos integrantes do Sistema Nacio-nal de Defesa do Consumidor (SNDC), que contam com poder de polícia e atribuição para fiscalização do mercado de consumo.

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Também estarão sujeitos à sanção por infração sanitária, de acordo com a Lei Federal nº 6.437/1977, nos termos do art. 2º da Resolução-RDC nº 40, de 8 de fevereiro de 2002, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa.

Podem, ainda, suportar eventual ação coletiva (de maneira geral) que busque a adequação da conduta (inserção das informações ou proibição de comercialização dos produtos sem elas) e a indenização pelos danos causa-dos a toda a coletividade.

E, por fim, os fornecedores poderão também ser responsabilizados a indenizarem eventuais consumidores prejudicados pela prática, tanto por possíveis danos materiais como morais, de acordo com o art. 6º, VI, do Có-digo de Defesa do Consumidor, observadas as demais normas trazidas no diploma legal em questão.

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Doutrina

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Penal

criMes Militares e a lei nº 13.491/2017 eM relação ao direito interteMporal

eduardo luiz SantoS CaBette

Delegado de Polícia, Mestre em Direito Social, Pós-Graduado em Direito Penal e Criminologia, Professor de Direito Penal, Processo

Penal, Criminologia e Legislação Penal e Processual Penal Especial na Graduação e na Pós-Graduação do Unisal, Membro do Grupo de Pesquisa

de Ética e Direitos Fundamentais do Programa de Mestrado do Unisal.

O surgimento no cenário nacional da Lei nº 13.491/2017, com in-gentes alterações na competência da Justiça Militar, tem gerado uma sé-rie de questionamentos.

De início, emergiu a impressão açodada de que simplesmente se faria o transplante de todos os feitos em andamento pela Justiça Comum Estadual ou Federal para a Justiça Militar, sem consideração de qual-quer questão quanto ao direito intertemporal e à natureza jurídica das normas alteradas.

Em sensato artigo a respeito dessa temática, Fernando Galvão foi um dos pioneiros em seu enfrentamento. O autor identificou a natureza material da norma do Código Penal Militar, já que estabelece a definição do que sejam crimes militares. Nesse passo, Galvão entende que o des-locamento para a Justiça Militar somente se poderá dar se não houver agravamento da situação do réu. Caso contrário, fatos ocorridos antes da promulgação da Lei nº 13.491/2017 prosseguiriam em andamento pela Justiça comum1.

1 GALVÃO, Fernando. Natureza material do dispositivo que amplia o conceito de crime militar e o deslocamento dos inquéritos e processos em curso na justiça

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Por seu turno, em videoaula sobre o mesmo tema, Renato Brasileiro apresenta o entendimento de que a norma em destaque seria de natureza puramente processual penal e, portanto, regida pela regra do tempus regit actum, ou seja, teria aplicação imediata para todos os processos em curso e vindouros, bem como inquéritos policiais. Não seria de se apurar se há bene-fício ou malefício ao réu com o deslocamento. A regra de competência deve-ria ser cumprida. Caberia, sim, ao Juiz Militar verificar, no caso concreto da aplicação da norma penal em voga, se esta configura novatio legis in pejus ou in mellius. Ou seja, a regra de competência seria aplicada de imediato, inclu-sive para casos anteriores. No Juízo Castrense é que se avaliaria qual norma material deveria ser aplicada2.

Entende-se que razão assiste a Fernando Galvão. A norma do art. 9º do CPM, embora estabeleça a competência ratione materiae da Justiça Castrense, também, concomitantemente, define os crimes militares. Então, num primei-ro lançar de olhos, trata de matéria estritamente processual penal (compe-tência), mas, num segundo momento, elabora o conceito de crime militar e regula a aplicação do Código Penal Militar, abrangendo, inclusive, penas, excludentes, agravantes, atenuantes etc. Portanto, também tem o caráter de norma penal. Trata-se, em suma, daquilo que se tem convencionado chamar de “norma híbrida”, ou seja, ao mesmo tempo material e formal.

Conforme leciona Avena:

Normas mistas ou híbridas são aquelas que apresentam duplicidade de caráter, vale dizer, incorporam tanto um conteúdo processual quanto um conteúdo material. A relevância desta constatação repercute diretamente no aspecto relacionado à eficácia da lei no tempo. Isto porque, detectada a natureza mista no âmbito de um determinado regramento, será inevi-tável, no aspecto relativo ao seu conteúdo material, o reconhecimento da retroatividade em relação a atos já realizados ou decisões já consumadas. [...] Nas primeiras, com efeito, a norma possui uma determinada natureza (material ou processual), em que pese se encontre incorporada a diploma de caráter distinto. É o caso, por exemplo, do direito de silêncio do réu em

comum para a justiça militar. Disponível em: <https://www.observatoriodajusticamilitar.info/single-post/2017/11/23/Natureza-material-do-dispositivo-que-amplia-o-conceito- -de-crime-militar-e-o-deslocamento-dos-inqu%C3%A9ritos-e-processos-em-curso-na- -Justi%C3%A7a-Comum-para-a-Justi%C3%A7a-Militar>. Acesso em: 2 dez. 2017.

2 Cf. BRASILEIRO, Renato. Nova Competência da Justiça Militar – Lei nº 13.491/17. Disponível em: www.youtube.com.br. Acesso em: 2 dez. 2017.

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seu interrogatório, que, a despeito de sua previsão no Código de Processo Penal (art. 186), possui caráter nitidamente assecutatório de direito (ma-terial). Já nas segundas, a normas apresentam dupla natureza, vale dizer, material em uma determinada parte e processual em outra. Como exemplo de disposição híbrida, cuja interpretação ainda hoje é objeto de impasse entre os tribunais pátrios, menciona-se o art. 366 do CPP, modificado pela Lei nº 9.271/1996, dispondo que, “se o acusado, citado por edital, não com-parecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventi-va, nos termos do disposto no art. 312”. Precitado artigo, como se vê, insere conteúdos distintos: conteúdo processual no aspecto em que determina a suspensão no processo ao réu, que, citado por edital, não compareceu ao interrogatório e nem nomeou defensor. Neste enfoque, a carga é nitida-mente processual, pois relativa ao fluxo procedimental. Não há dúvidas de que aspectos pertinentes à prescrição possuem natureza material – tanto que regulado este instituto no âmbito do Código Penal, sendo lá previstas, também, as causas interruptivas (art. 117) e suspensivas (v.g., art. 116, I) do lapso prescricional. Considerada, pois, essa duplicidade de conteúdo inserta em uma mesma norma, muitas dúvidas surgiram quanto à possi-bilidade da sua retroatividade para alcançar fatos anteriores à sua vigên-cia. De uma forma geral, consolidou-se a jurisprudência que, no tocante ao aspecto processual (suspensão do processo), não cabe a retroatividade da norma em face da regra tempus regit actum. Por outro lado, relativamente à suspensão do prazo prescricional, apesar de tratar de aspecto material in-serto à norma, sua retroatividade importaria em causar prejuízo ao réu, já que importa no estabelecimento da imprescritibilidade do crime enquanto não tomar o réu conhecimento formal da acusação.3

Na visão de Brasileiro, a questão se resumiria a tratar-se de uma “nor-ma heterotópica”, ou seja, alocada no Código Penal Militar, mas, na verdade, tratando de matéria processual. Portanto, advoga o estudioso que a norma seria processual e seu caráter penal ou material seria tão somente aparente, devido a uma questão de topografia.

Esse fenômeno de normas heterotópicas é existente, mas, para que re-almente se configure, mister se faz que a referida norma legal não tenha cará-

3 AVENA, Norberto. Processo penal esquematizado. São Paulo: Método, 2013. p. 42-43.

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ter misto ou híbrido, trate realmente de um tema processual ou penal (jamais processual e penal), estando alocada num diploma diverso de sua natureza.

O que ocorre no caso da definição de crime militar e sua utilização para o estabelecimento da competência da Justiça Militar não é o fenômeno do heterotopismo, acenado por Brasileiro. Trata-se, isto sim, da presença de uma norma de caráter misto ou híbrido, esteja ela prevista onde quer que seja (note-se que Avena chama a atenção para a irrelevância de onde esteja a norma prevista, pois o que importa são as matérias por ela tratadas de forma concomitante, tornando-a mista ou híbrida – vide supra).

Sendo uma norma híbrida, como ficaria a sua aplicação aos casos já em andamento, ocorridos, portanto, antes de sua vigência?

A regra para a atuação das normas processuais é a aplicação imediata aos atos a serem praticados no processo em andamento (sistema do isola-mento dos atos processuais). Mas a norma para as leis de caráter penal é a vedação de sua retroação quando prejudiciais ao réu.

Surgiram então três posições doutrinárias:

a) divisão da norma em duas partes – aplica-se a parte processual de imediato e a parte penal somente pode ser aplicada aos crimes cometidos após a entrada da lei em vigor. Haveria a alteração da competência e, na Justiça Castrense, seria aplicada a norma penal mais benéfica, de acordo com o Código Penal Militar e a Legislação Penal em geral (posição defendida por Renato Brasileiro, embora com a argumentação de que haveria uma norma heterotópica e não mista ou híbrida – vide supra);

b) aplicação por inteiro da norma – a norma não pode ser cindida. Deveria ser aplicada por inteiro a todos os casos, anteriores e pos-teriores, pois que, num cômputo geral, a alteração de competência seria mais benéfica. Essa visão não se sustentaria de forma alguma em todos os casos;

c) a norma não pode ser dividida, mas também não pode ser aplicada aos casos anteriores à sua vigência sempre que contiver matéria penal prejudicial que deve prevalecer quando à aplicação da nor-ma no tempo. Este tem sido o entendimento predominante e que, no nosso parecer, corroborando a posição de Galvão, deve ser apli-cado às alterações promovidas no conceito de crime militar e nas regras de competência da Justiça Militar pela Lei nº 13.491/2017.

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Em se tratando de norma híbrida, o caráter material deve prevalecer para estabelecimento de sua retroatividade ou não. Assim sendo, cada caso concreto deverá ser cuidadosamente analisado, de modo que a norma deverá ser aplicada em sua inteireza, sem a criação de uma lex tertia. Não é, portanto, cabível a alteração da competência e a aplicação, na Justiça Militar, da norma mais benéfica. Se o caráter material (penal) for mais benéfico na Justiça Co-mum, então ali deverá permanecer o feito e ser aplicada a lei in totum, sem divisão. Se o deslocamento para a Justiça Castrense não importar em prejuízo ao réu sob o aspecto material (penal), então este deverá ser levado a efeito. Obviamente, nos casos ocorridos posteriormente à entrada em vigor da nova lei, a competência será da Justiça Militar sem levar em consideração se há lex mitior ou lex gravior.

reFerÊncias

AVENA, Norberto. Processo penal esquematizado. São Paulo: Método, 2013.

BRASILEIRO, Renato. Nova Competência da Justiça Militar – Lei nº 13.491/17. Disponível em: www.youtube.com.br. Acesso em: 2 dez. 2017.

GALVÃO, Fernando. Natureza material do dispositivo que amplia o conceito de crime militar e o deslocamento dos inquéritos e processos em curso na justiça comum para a justiça militar. Disponível em: <https://www.observatoriodajusticamilitar.info/single-post/2017/11/23/Natureza-material-do-dispositivo-que-amplia-o-conceito- -de-crime-militar-e-o-deslocamento-dos-inqu%C3%A9ritos-e-processos-em-curso-na- -Justi%C3%A7a-Comum-para-a-Justi%C3%A7a-Militar>. Acesso em: 2 dez. 2017.

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Jurisprudênciacível

STJSuperior Tribunal de JuSTiça

Recurso Especial nº 1.166.568 – SP (2009/0224975-7)Relator: Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região)Recorrente: Maria Zélia Arrepia Fenólio e outroAdvogados: Fábio Becsei – SP163013

Maria de Fatima de Andrade Becsei e outro(s) – SP173985 Diana Maria Guimarães Carvalho – DF047106

Recorrido: Abílio Augusto Arrepia – EspólioRepr. por: Alice Adelaide Gonçalves – InventarianteAdvogado: Mauricio Maluf Barella e outro(s) – SP180609

EMENTA

recurso especial – sucessão – Bens à colação – valor dos Bens doados – aplicação da lei vigente à Época da aBertura da sucessão

– aplicação da regra do art. 2.004 do cc/2002 – valor atriBuído no ato de liBeralidade coM correção MonetÁria atÉ a data da sucessão – recurso especial iMprovido1. Tendo sido aberta a sucessão na vigência do Códi-

go Civil de 2002, deve-se observar o critério estabelecido no art. 2.004 do referido diploma, que modificou o art. 1.014, pará-

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grafo único, do Código de Processo Civil de 1973, pois a contradição presente nos diplomas legais, quanto ao valor dos bens doados a serem trazidos à colação, deve ser solucionada com observância do princípio de direito intertemporal tempus regit actum.

2. O valor de colação dos bens deverá ser aquele atribuído ao tempo da liberalidade, corrigido monetariamente até a data da aber-tura da sucessão.

3. Existindo divergência quanto ao valor atribuído aos bens no ato de liberalidade, poderá o julgador determinar a avaliação por perícia técnica para aferir o valor que efetivamente possuíam à épo-ca da doação.

4. Recurso especial não provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma, por unanimidade, negar provimento ao recurso es-pecial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira (Presidente) e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 12 de dezembro de 2017 (data do Julgamento).

Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região) Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região) – Relator:

Trata-se de recurso especial interposto por Maria Zélia Arrepia Fenólio e outro, com fundamento no art. 105, III, a, da Constituição Federal, em face de acórdão do eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim emen-tado:

“INVENTÁRIO – COLAÇÃO DE BENS DOADOS – GARANTIA DE IGUALDADE DOS QUINHÕES HEREDITÁRIOS – VALOR DOS BENS CONSIDERADO AO TEMPO DA LIBERALIDADE – INCIDÊNCIA DE

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CORREÇÃO MONETÁRIA ATÉ A ABERTURA DA SUCESSÃO - INCI-DÊNCIA DO ART. 2.004 DO CÓDIGO CIVIL – AGRAVO DESPROVIDO.” (fl. 192)

Os embargos de declaração foram rejeitados.

Apontam os recorrentes, em suas razões, violação ao art. 1.014, pará-grafo único, do Código de Processo Civil de 1973, sustentando, em síntese, que os bens doados pelo autor da herança aos herdeiros devem ser trazidos à colação com base no valor que possuíam à época da abertura da sucessão, pois ainda integram o patrimônio do donatário, consoante entendimento fir-mado no Enunciado nº 119 aprovado na I Jornada de Direito Civil, promovi-da pelo Conselho da Justiça Federal.

Nas contrarrazões, o recorrido pede o desprovimento do recurso (fls. 227-231).

A Subprocuradoria-Geral da República opinou pelo conhecimento e provimento do recurso especial, em parecer assim sintetizado:

“RECURSO ESPECIAL – ART. 105, III – ALÍNEA A, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – VIOLAÇÃO AO ART. 1.014, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC – INVENTÁRIO – COLAÇÃO DOS BENS DOADOS – VALOR DOS BENS CONSIDERADOS AO TEMPO DA ABERTURA DA SUCESSÃO – EN-TENDIMENTO JURISPRUDENCIAL CONSOLIDADO

Nos termos do entendimento adotado por esse Superior Tribunal de Justi-ça, os bens colacionados devem ser avaliados com base no valor que pos-suíam ao tempo da abertura da sucessão. Parecer pelo conhecimento e pro-vimento do recurso especial.” (fl. 258)

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região) – Relator:

Colhe-se dos autos que os recorrentes apresentaram agravo de instru-mento no inventário dos bens deixados por Abílio Augusto Arrepia, óbito ocorrido em 18.11.2004, em face de decisão do Juízo da 6ª Vara de Família e Sucessões do Foro Central de São Paulo que determinou que o valor dos bens imóveis trazidos à colação deverão ser apurados considerando o valor

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ao tempo da liberalidade, com correção monetária até a data da abertura da sucessão.

Interposta apelação, o eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo manteve a decisão, entendendo, quanto ao tema, cabível a aplicação dos arts. 2.004 e 2.005 do Código Civil de 2002, nos seguintes termos:

“É certo que o instituto da colação tem o objetivo de igualar a legitima, trazendo para o acervo a partilhar bens doados em antecipação. Para ga-rantir tal igualdade na partilha, necessária a atualização do valor recebido pelo herdeiro beneficiado pela doação, corroído pelo fenômeno inflacio-nário e distanciado da atual realidade do mercado. Para tal fim, a regra do art. 2.004 do Código Civil é clara ao estipular que o valor, para fins de co-lação, é aquele fixado no ato da liberalidade, atualizado até o momento da sucessão.

Tanto é assim que o MM. Juiz, na decisão agravada, determinou a reali-zação de perícia técnica dos bens a colacionar, caso as partes não se com-ponham quanto ao valor de cada um deles, sendo certo que a pretensão dos recorrentes não encontra amparo nas disposições legais aplicáveis à espécie (arts. 2.004 e 2.005 do novo Código Civil).” (fls. 193-194)

Inconformados, os recorrentes Maria Zélia Fenólio e Osvaldo Sebastião Fenólio manejaram recurso especial sustentando negativa de vigência ao art. 1.014, parágrafo único, do Código de Processo Civil de 1973.

Inicialmente, cumpre ressaltar que, consoante o art. 1.787 do CC/2002, a sucessão é regulada pela lei em vigor ao tempo de sua abertura.

Na presente hipótese, verifica-se que a abertura da sucessão ocorreu em 18.11.2004 e, portanto, em vigor, na época, o Código de Processo Civil de 1973 e o Código Civil de 2002.

O art. 1.014 do Código de Processo Civil de 1973 tem a seguinte re-dação:

Art. 1.014. No prazo estabelecido no art. 1.000, o herdeiro obrigado à co-lação conferirá por termo nos autos os bens que recebeu ou, se já os não possuir, trar-lhes-á o valor.

Parágrafo único. Os bens que devem ser conferidos na partilha, assim como as acessões e benfeitorias que o donatário fez, calcular-se-ão pelo valor que tiverem ao tempo da abertura da sucessão.

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Dispõe o art. 2.004 do Código Civil de 2002:

“Art. 2.004. O valor de colação dos bens doados será aquele, certo ou esti-mativo, que lhes atribuir o ato de liberalidade.

§ 1º Se do ato de doação não constar valor certo, nem houver estimação feita naquela época, os bens serão conferidos na partilha pelo que então se calcular valessem ao tempo da liberalidade.

§ 2º Só o valor dos bens doados entrará em colação; não assim o das ben-feitorias acrescidas, as quais pertencerão ao herdeiro donatário, correndo também à conta deste os rendimentos ou lucros, assim como os danos e perdas que eles sofrerem.”

Consoante se extrai dos textos legais acima transcritos, verifica-se a ocorrência de antinomia entre o Código Civil de 2002 – visto que, no capítulo IV, “Da Colação”, o art. 2.004, caput, estabelece que os bens doados serão tra-zidos à colação pelo valor atribuído no ato de liberalidade – e o Código de Pro-cesso Civil de 1973, no Capítulo IX, Seção VI, denominada “Das Colações” – em que o art. 1.014, parágrafo único, determina que os bens recebidos em doação deverão ser calculados pelo valor que tiverem ao tempo da abertura da sucessão.

Na hipótese, tendo sido aberta a sucessão em 18.11.2004, deve-se obser-var o critério estabelecido no art. 2.004 do Código Civil de 2002, que modifi-cou o art. 1.014, parágrafo único, do Código de Processo Civil de 1973, pois a contradição presente nos diplomas legais, quanto à fixação do valor dos bens doados a serem trazidos à colação, deve ser solucionada com observância do princípio de direito intertemporal tempus regit actum.

Sobre a questão, leciona Humberto Theodoro Júnior (in Curso de Direito Processual Civil, v. III, 46. ed., 2014, Ed. Forense):

“O valor básico para a colação é aquele pelo qual o bem figurou no ato de liberalidade (Código Civil de 2002, art. 2004). A regra do parágrafo único do art. 1.014 do Código de Processo Civil, que previa a colação pelo va-lor do bem ao tempo da abertura da sucessão foi implicitamente revogada pelo novo Código Civil. Continua, no entanto, vigorando para as sucessões abertas antes do advento da atual regra de direito material, em face do princípio de que toda sucessão se rege pela lei do tempo de sua abertura.” (p. 250)

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Dessa forma, consoante se extrai do texto do art. 2.004 do CC/2002, o valor de colação dos bens deverá ser aquele atribuído ao tempo da doação. Todavia, apesar da ausência de previsão expressa, o valor dos bens deverá ser corrigido monetariamente até a data da abertura da sucessão para preser-var a igualdade dos quinhões legitimários.

A propósito, transcrevo a lição de Caio Mario da Silva Pereira (in Insti-tuições de Direito Civil, v. VI, 21. ed., Ed. Forense, 2014), verbis:

“Determinando que se apure o valor que os bens trazidos à colação tinham ‘ao tempo da liberalidade’ (art. 2.004, § 1º), o Código, todavia, não deve ser interpretado no sentido de que prevaleça o valor nominal ou histórico, da doação. A avaliação, nesse caso, é ‘retrospectiva’, mas encontrado aquele valor, procede-se à sua atualização monetária, sem a qual será impossível compará-lo aos dos demais bens, avaliados no curso do inventário, e, em consequência, repartir igualitariamente o patrimônio hereditário.” (p. 386)

Cabe ressaltar que, se o valor atribuído aos bens no ato de liberalidade não corresponder ao valor que efetivamente possuía à época, é cabível a rea-lização de avaliação dos bens através de perícia técnica, conforme determina-do pelo Tribunal de origem.

Ademais, a interpretação do art. 2.004 do CC/2002 apresentada na I Jornada de Direito Civil promovida pelo Conselho da Justiça Federal (Enun-ciado nº 119), no sentido de que, “Para evitar o enriquecimento sem causa, a colação será efetuada com base no valor da época da doação, nos termos do caput do art. 2004, exclusivamente na hipótese em que o bem doado não mais pertença ao patrimônio do donatário. Se, ao contrário, o bem ainda integrar seu patrimônio, a colação se fará com base no valor do bem na época da abertura da sucessão, nos termos do art. 1.014 do CPC, de modo a preservar a quantia que efetivamente integrar a le-gítima quando esta se constituiu, ou seja, na data do óbito (resultado da interpretação sistemática do art. 2004 e seus parágrafos, juntamente com os arts. 1.832 e 884 do Código Civil)”, não se coaduna com as regras estabelecidas no Código Civil de 2002 sobre a matéria, bem como afronta o princípio de direito intertemporal tempus regit actum.

Sobre o citado Enunciado nº 119 do CJF, expõe o professor Luiz Paulo Vieira de Carvalho que “Essa dicotomia de critérios, é, com todas as vênias, ina-dequada à hipótese presente, não se coadunando nem com a vontade do falecido, nem com a mens legislatoris”. Afirma, ainda, o referido autor que “enunciado não é lei, não sendo, portanto, dotado de força obrigatória; assim sendo, não pode contrariar

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a lei e o sistema adotado pelo legislador (a representar a vontade do jurisdicionado no contexto em que a regra se apresenta) ao regulamentar a matéria”. E conclui: “não se mostra possível a utilização de critérios diversos para a obtenção do valor de conferên-cia, consoante estampado no referido Enunciado nº 119, que leva em conta, a uma, os bens que ainda estão situados no patrimônio dos donatários; e, a duas, aqueles que já não o estão, mesmo porque também cabível aqui a aplicação do vetusto brocardo (ain-da, porém, com hodierna e plena aplicabilidade): o que a lei não restringe, não cabe ao intérprete restringir” (in Direito das Sucessões, 3. ed., Ed. Atlas, 2017, p. 976-981).

É descabida, portanto, a pretensão formulada pelos recorrentes de atri-buir aos bens trazidos à colação, que ainda integram o patrimônio do dona-tário, o valor que tinham na data do óbito do doador, sob pena de afronta ao art. 2.004 do CC/2002, em vigor à época da abertura da sucessão.

Diante do exposto, nega-se provimento ao recurso especial.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO QUARTA TURMA

Número Registro: 2009/0224975-7

Processo Eletrônico REsp 1.166.568/SP

Números Origem: 200801939528 5007404 5007404002 5007404901 755205 75522005

Pauta: 12.12.2017 Julgado: 12.12.2017

Relator: Exmo. Sr. Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região)

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Antonio Carlos Ferreira

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Antônio Carlos Pessoa Lins

Secretária: Dra. Teresa Helena da Rocha Basevi

AUTUAÇÃO

Recorrente: Maria Zélia Arrepia Fenólio e outro

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Advogados: Fábio Becsei – SP163013 Maria de Fatima de Andrade Becsei e outro(s) – SP173985 Diana Maria Guimarães Carvalho – DF047106

Recorrido: Abílio Augusto Arrepia – Espólio

Repr. por: Alice Adelaide Gonçalves – Inventariante

Advogado: Mauricio Maluf Barella e outro(s) – SP180609

Assunto: Direito civil – Sucessões – Inventário e partilha

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Quarta Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira (Presidente) e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

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TrF 1ª r.Tribunal regional Federal da 1ª região

Apelação/Reexame Necessário nº 0004274-94.2017.4.01.9199/MGRelatora: Desembargadora Federal Gilda Sigmaringa SeixasApelante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSProcurador: DF00025372 – Adriana Maia VenturiniApelado: Joanes Edgar Dias Martins (menor)Advogado: MG00147354 – Simone Marie Moreira e Brandao de Miranda e outros(as)Remetente: Juízo de Direito da Comarca de Francisco Sa/MG

EMENTA

previdenciÁrio – Menor soB guarda (§ 2º do art. 16 da lei nº 8.213/1991, na redação original) – óBito do segurado ocorrido na vigÊncia da lei nº 9.528/1997, que eXcluiu a pessoa do Menor soB guarda, por deterMinação Judicial, do rol de dependentes da previdÊncia social –

inconstitucionalidade – terMo inicial – correção MonetÁria – Juros de Mora – antecipação de tutela:

requisitos preencHidos – sentença Mantida

1. Segundo a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte, deve-se aplicar, para a concessão de benefí-cio de pensão por morte, a legislação vigente ao tempo do óbito do instituidor.

2. No caso, o termo de guarda foi deferido à instituido-ra do benefício e o óbito desta ocorreu quando já em vigor a Lei nº 9.528/1997, que excluiu do rol de dependentes de segurados da Previdência Social o menor sob guarda, dando nova redação ao art. 16 da Lei nº 8.213/1991.

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3. A Eg. Corte Especial deste Tribunal, ao julgar a Arguição de Inconstitucionalidade na Remessa Oficial nº 1998.37.00.001311-0/MA, Relª Desª Fed. Assusete Magalhães, acolheu o pleito de arguição de inconstitucionalidade quanto à supressão da expressão “menor sob guarda por decisão judicial” do art.16, § 2º, da Lei nº 8.213, na redação da Medida Provisória nº 1.523, de 11 de outubro de 1996, reeditada e convertida na Lei nº 9.528, de 1997. Precedentes desta Corte.

4. A parte autora comprovou a dependência econômica em re-lação à instituidora do benefício, fazendo jus, portanto, ao benefício de pensão por morte.

5. Quanto à data inicial do benefício, por se tratar a repre-sentada de menor impúbere, não corre a prescrição, nos termos do art. 198, inciso I do CC 2002 e art. 103, parágrafo único da Lei nº 8.213/1991, sendo a pensão devida desde a data do óbito do insti-tuidor do benefício, salvo reformatio in pejus.

6. Honorários advocatícios devidos no percentual de 10% (dez por cento) sobre as prestações vencidas até o julgamento da apela-ção, nos termos do enunciado da Súmula nº 111 do STJ.

7. Juros e correção monetária nos termos do Manual de Cál-culos da Justiça Federal, em sua versão mais atualizada, nos termos do voto.

8. Implantação do benefício, no prazo máximo de 30 dias (CPC, art. 273), com comunicação imediata à autarquia previdenciária.

9. Apelação do INSS desprovida.10. Remessa oficial parcialmente provida.

ACÓRDÃO

Decide a Primeira Turma, por unanimidade, negar provimento à ape-lação do INSS e dar parcial provimento à remessa oficial.

Brasília, 9 de agosto de 2017.

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido inicial com o qual pretendia o benefício de pensão por morte decorrente do falecimento da guardiã legal da parte autora.

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Sustenta a parte autora, em suas razões de apelação, fazer jus ao benefí-cio, tendo em vista que sempre dependeu economicamente da falecida segura-da que, na condição de guardiã do menor, custeava todas as despesas referen-tes à sua criação, tais como moradia, alimentação, educação, saúde, etc.

O INSS apelou requerendo a reforma total da sentença.

O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento da apelação.

É o relatório.

VOTO1

A questão posta nos autos cinge-se à verificação da existência ou não de direito adquirido do menor sob guarda, na forma do § 2º do art. 16 da Lei nº 8.213/1991, à pensão por morte, quando o óbito do ex-segurado ocorreu na vigência da Lei nº 9.528/1997.

A sentença apelada entendeu que “o óbito da ex-segurada da Previ-dência ocorreu quando já estava em vigor a nova redação do § 2º do art. 16 da Lei nº 8.213/1991, dada pela Lei nº 9.528/1997, que exclui a figura do menor sob guarda do rol de beneficiário da Previdência Social, independentemente da comprovação de sua dependência econômica” (fl. 121).

O art. 16, § 2º da Lei nº 8.213/1991, em sua redação originária estabe-lecia que:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condi-ção de dependentes do segurado:

[...]

§ 2º Equiparam-se a filho, nas condições do inciso I, mediante declaração do segurado: o enteado; o menor que, por determinação judicial, esteja sob a sua guarda; e o menor que esteja sob sua tutela e não possua condições suficien-tes para o próprio sustento e educação.

A Lei nº 9.528/1997 excluiu do rol de dependentes de segurados da Previdência Social o menor sob guarda, dando nova redação ao art. 16 da Lei nº 8.213/1991, nos seguintes termos:

1 Participaram do Julgamento os Exmos. Srs. Desembargador Federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira e Desembargador Federal Carlos Augusto Pires Brandão.

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Art. 16. (Omissis):

§ 2º O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante decla-ração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.

Desta forma, somente os enteados e menores tutelados vêm sendo ins-critos como dependentes dos segurados. Foram excluídos os menores postos sob guarda em virtude de determinação judicial, ainda que estejam sob a dependência econômica do segurado do Regime Geral de Previdência Social.

Conforme assinalado pela Desembargadora Ângela Catão, no ReecNec 2006.38.13.005211-4/MG, a matéria em discussão já foi objeto de interpreta-ções divergentes no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, que acabou con-solidando entendimento no sentido de que a concessão de benefício previ-denciário vincula-se ao princípio do tempus regit actum, de modo que o direito à pensão por morte só surge com o óbito do segurado, em cujo momento é que devem ser analisadas as condições legais para a sua concessão, arredan-do a tese do direito adquirido.

Nesse sentido, têm decidido de maneira unânime a Quinta e a Sexta Turma do E. STJ, verbis:

PREVIDENCIÁRIO – PENSÃO POR MORTE – MENOR SOB GUARDA JUDICIAL – BENEFICIÁRIO – ÓBITO POSTERIOR AO ADVENTO DA MP 1.523/1996 – ART. 16, § 2º, DA LEI Nº 8.213/1991, COM REDAÇÃO DA LEI Nº 9.528/1997I – Em regra, os benefícios previdenciários são regidos pelo princípio tempus regit actum.II – O menor sob guarda judicial, nos moldes do art. 16, § 2º da Lei nº 8.213/1991, não tem direito a perceber pensão por morte se a condição fática necessária à concessão do benefício, qual seja, o óbito do segurado, sobreveio à vigência da Medida Provisória nº 1.523/1996, posteriormente convertida na Lei nº 9.528/1997, que alterando o disposto no art. 16, § 2º da Lei nº 8.213/1991, acabou por afastar do rol dos dependentes da Previdên-cia Social a figura do menor sob guarda judicial.

Recurso provido. (REsp 438844/RS, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., DJ 04.08.2003, p. 364)

[...]

PREVIDENCIÁRIO – PENSÃO POR MORTE – MENOR SOB GUARDA – APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DO FATO GERADOR DO BENEFÍCIO

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1. Resta incontroverso nesta Corte o entendimento de que a lei a ser aplica-da para fins de percepção de pensão por morte, é aquela em vigor quando do falecimento do segurado, que constitui o fato gerador do benefício pre-videnciário, inexistindo direito adquirido de menor sob guarda na vigência da lei anterior.

2. Precedentes.

3. Recurso conhecido. (REsp 436375/RS, Rel. Min. Paulo Gallotti, 6ª T., DJ 19.12.2003, p. 631)

Ocorre que a Eg. Corte Especial deste Tribunal, ao julgar a Arguição de Inconstitucionalidade na Remessa Oficial nº 1998.37.00.001311-0/MA, Relª Desª Fed. Assusete Magalhães, acolheu o pleito de arguição de inconstitu-cionalidade quanto à supressão da expressão “menor sob guarda por decisão judicial” do art. 16, § 2º, da Lei nº 8.213, na redação da Medida Provisória nº 1.523, de 11 de outubro de 1996, reeditada e convertida na Lei nº 9.528, de 1997, in verbis:

CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO – ARGUIÇÃO DE INCONSTI-TUCIONALIDADE DO § 2º DO ART. 16 DA LEI Nº 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.523, DE 11.10.1996, REEDITADA E CONVERTIDA NA LEI Nº 9.528/1997 – SUPRESSÃO DO MENOR SOB GUARDA JUDICIAL DO ROL DE BENEFICIÁRIOS DO RE-GIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL, NA CONDIÇÃO DE DEPEN-DENTE DO SEGURADO – AFRONTA AOS ARTS. 227, § 3º, II E VI, E 5º, CAPUT, DA CF/1988 – INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA

I – A redação original do § 2º do art. 16 da Lei nº 8.213/1991 estabelecia que se equiparavam “a filho, nas condições do inciso I, mediante declaração do segurado: o enteado; o menor que, por determinação judicial, esteja sob a sua guarda; e o menor que esteja sob sua tutela e não possua condições suficientes para o próprio sustento e educação”.

II – A Medida Provisória nº 1.523, de 11.10.1996, reeditada e convertida na Lei nº 9.528/1997, alterou o aludido § 2º do art. 16 da Lei nº 8.213/1991, para estabelecer que “o enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento”, suprimindo, portanto, o menor sob guarda judicial do rol de beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependente do segurado.

III – A Constituição Federal consagra, em relação à criança e ao adolescen-te, o princípio da proteção integral, cabendo à família, à sociedade e ao Es-

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tado o dever de, solidariamente, assegurar-lhes, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissio-nalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negli-gência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, direitos naturais fundamentais (art. 227, caput, da Carta Magna).

IV – O constituinte elenca, ainda, no § 3º do art. 227 da Carta Maior, sete normas indicativas das obrigações que o legislador ordinário não pode dei-xar de cumprir, entre as quais destacam-se a garantia, ao menor – criança e adolescente –, dos direitos previdenciários e trabalhistas, e o estímulo do Poder Público ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou ado-lescente órfão ou abandonado.

V – “Sabemos que a supremacia da ordem constitucional traduz princípio essencial que deriva, em nosso sistema de direito positivo, do caráter emi-nentemente rígido de que se revestem as normas inscritas no estatuto fun-damental. Nesse contexto, em que a autoridade normativa da Constituição assume decisivo poder de ordenação e de conformação da atividade estatal – que nela passa a ter o fundamento de sua própria existência, validade e eficácia –, nenhum ato de Governo (Legislativo, Executivo e Judiciário) po-derá contrariar-lhe os princípios ou transgredir-lhe os preceitos, sob pena de o comportamento dos órgãos do Estado incidir em absoluta desvalia jurídica.” (ADI 2.215/PE, Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 26.04.2001)

VI – Desse modo, a norma contida no art. 16, § 2º, da Lei nº 8.213/1991 – na redação dada pela Medida Provisória nº 1.523, de 11.10.1996, reeditada e convertida na Lei nº 9.528/1997 –, na parte em que exclui o menor sob guarda judicial da condição de dependente, colocando-o à margem da pro-teção previdenciária estatal, é inconstitucional, pois não se harmoniza com as garantias estabelecidas na Lei Maior, entre elas as do art. 227, caput, § 3º, II e VI, da Carta.

VII – Ademais, a discriminação trazida pela nova redação do § 2º do art. 16 da Lei nº 8.213/1991 – ao excluir o menor sob guarda judicial da condição de dependente do segurado –, afronta, também, o princípio constitucional da isonomia, previsto no art. 5º, caput, da CF/1988, pois, do ponto de vista essencial – não do nomen iuris do instituto jurídico sob cuja tutela vivem –, os menores sujeitos à guarda judicial de outrem necessitam dos mesmos cuidados e da mesma proteção estatal dispensada aos tutelados, diante do infortúnio da morte do guardião ou tutor, conforme o caso.

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VIII – Acolhimento da arguição de inconstitucionalidade do § 2º do art. 16 da Lei nº 8.213/1991, com a redação dada pela Medida Provisória nº 1.523, de 11.10.1996, reeditada e convertida na Lei nº 9.528/1997, na parte em que excluiu o menor sob guarda judicial do rol dos beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependente do segurado.

(TRF 1ª R., INREO 1998.37.00.001311-0/MA, Corte Especial, e-DJF1 21.09.2009, p. 222)

A respeito, cite-se, dentre outros, os seguintes julgados:

PREVIDENCIÁRIO – MENOR SOB GUARDA (§ 2º DO ART. 16 DA LEI Nº 8.213/1991, NA REDAÇÃO ORIGINAL) – ÓBITO DO SEGURADO OCORRIDO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.528/1997, QUE EXCLUIU A PESSOA DO MENOR SOB GUARDA, POR DETERMINAÇÃO JUDICIAL, DO ROL DE DEPENDENTES DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – INCONSTI-TUCIONALIDADE – TERMO INICIAL – CORREÇÃO MONETÁRIA – JUROS DE MORA – ANTECIPAÇÃO DE TUTELA: REQUISITOS PREEN-CHIDOS – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA

1. A antecipação de tutela é concedida quando, existindo prova inequívo-ca, se convença o Juiz da verossimilhança da alegação e ocorrer fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou ficar caracterizado abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu (art. 273, I e II, do CPC), impondo-se sua confirmação.

2. O direito ao benefício previdenciário de pensão por morte só surge com o óbito do segurado, em cujo momento é que deverão ser analisadas as con-dições legais para a sua concessão, segundo a legislação vigente na época.

3. O termo de guarda foi deferido ao avô das autoras em 15.01.2001 (fl. 13) e o óbito deste ocorreu em 25.12.2003 (fl. 14), quando já em vigor a Lei nº 9.528/1997, que excluiu do rol de dependentes de segurados da Pre-vidência Social o menor sob guarda, dando nova redação ao art. 16 da Lei nº 8.213/1991.

4. Em recente decisão a Eg. Corte Especial deste Tribunal, ao julgar a Arguição de Inconstitucionalidade na Remessa Oficial nº 1998.37.00.001311-0/MA, Relª Desª Fed. Assusete Magalhães, acolheu o pleito de arguição de incons-titucionalidade quanto à supressão da expressão “menor sob guarda por decisão judicial” do art. 16, § 2º, da Lei nº 8.213, na redação da Medida Provisória nº 1.523, de 11 de outubro de 1996, reeditada e convertida na Lei nº 9.528, de 1997.

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5. Embora as suplicantes tenham requerido o benefício após 30 (trinta) dias do óbito, a pensão por morte deve ser deferida a contar da data do óbito por serem menores quando do falecimento do ex-segurado, não correndo contra elas a prescrição, nos termos do art. 198, inc. I, do Código Civil.

6. A correção monetária e os juros devem incidir na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal.

7. Verba honorária em conformidade com o art. 20, § 4º, do CPC.

8. Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da juris-dição federal (§ 3º do art. 109 da CF/1988), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, o que ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia e Mato Grosso. Em se tratando de causas ajuizadas perante a Justiça Federal, o INSS está isento de custas por força do art. 4º, inc. I, da Lei nº 9.289/1996, abrangendo, inclusive, as despesas com oficial de justiça.

9. Remessa oficial a que se dá parcial provimento. Antecipação de tutela confirmada.

(REO 0005195-95.2006.4.01.3813/MG, Relª Desª Fed. Ângela Catão, 1ª T., e-DJF1 p. 80 de 18.10.2013)

APELAÇÃO CÍVEL – PREVIDENCIÁRIO – PENSÃO POR MORTE – TRABALHADOR RURAL – ÓBITO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.528/1997 – MENOR SOB GUARDA DA AVÓ – DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA – EXCLUSÃO PELA LEI Nº 9.528/1997 – INCONSTITUCIO-NALIDADE DECLARADA PELA CORTE ESPECIAL DESTE TRIBUNAL – CONCESSÃO DEVIDA – PRESSUPOSTOS LEGAIS ATENDIDOS – TER-MO INICIAL DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO – CORREÇÃO MONE-TÁRIA – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – RECURSO PROVIDO

1. A Lei nº 9.528/1997 alterou o art. 16, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, excluindo o menor sob guarda judicial do rol de dependentes equiparados ao filho, de modo que, a partir de então, este último passou a não fazer jus ao bene-fício previdenciário de pensão pela morte do respectivo guardião.

2. Inobstante isso, este Tribunal, pela Corte Especial, por maioria, declarou a inconstitucionalidade do § 2º do art. 16 da Lei nº 8.213/1991, com redação dada pela Medida Provisória nº 1.523, de 11.10.1996, reeditada e convertida na Lei nº 9.528/1997, com relação à exclusão do menor sob guarda judicial da condição de dependente do segurado (INREO 1998.37.00.001311-0/MA; Arguição de Inconstitucionalidade na Remessa Ex Officio, Relª Desª Fed.

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Assusete Magalhães, Publicação: 21.09.2009). Precedentes deste Tribunal. No caso dos autos, a guarda embora não judicial, está devidamente com-provada nos autos, manifestando-se o Ministério Público Federal neste sentido ante a realidade fática dos menores sob dependência econômica e de toda a ordem em relação à avó.

3. É possível a concessão de tutela antecipada, ainda que de ofício, em ações de natureza previdenciária, tendo em vista a natureza alimentar do benefí-cio previdenciário e por se encontrarem presentes os requisitos específicos do art. 273 do CPC. Precedentes.

4. É assegurada a pensão por morte ao cônjuge e filhos menores de tra-balhador rural, que, em decorrência de presunção legal, são dependentes previdenciários, nos termos da lei de regência. No caso, atendidos os pres-supostos legais, os autores (menores) fazem jus ao benefício de pensão pela morte de sua avó falecida (segurada da Previdência Social e guardiã das crianças).

5. Segundo a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte, deve-se aplicar, para a concessão de benefício de pensão por morte, a legislação vigente ao tempo do óbito do instituidor (Súmula nº 340/STJ).

6. Direito ao benefício de pensão por morte no valor de um salário mínimo, a partir do óbito, pois que a parte autora é absolutamente incapaz.

7. A prescrição quinquenal não corre contra os absolutamente incapazes (art. 198, inciso I do CC 2002 e art. 103, parágrafo único da Lei nº 8.213/1991).

[...]

(AC 0009073-30.2010.4.01.9199/MG, Rel. Des. Fed. Ney Bello, 1ª T., e-DJF1 p. 530 de 19.12.2013)

No caso dos autos, verifica-se que havia sido concedida a guarda defi-nitiva do autor à instituidora do benefício.

Na hipótese, ficou comprovada nos autos a dependência econômica do apelante, demonstrando que a detentora da guarda do menor não visava pro-porcionar ao autor, ora apelante, um acréscimo de renda com a concessão da pensão por morte, mas sim garantir sua subsistência após o advento morte.

Desta forma, o autor faz jus à pensão pleiteada, conforme acima expli-citado.

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Quanto à data inicial do benefício, por se tratar a representada de me-nor impúbere, não corre a prescrição, nos termos do art. 198, inciso I do CC 2002 e art. 103, parágrafo único da Lei nº 8.213/1991, sendo a pensão devida desde a data do óbito, salvo reformatio in pejus.

Quanto aos indexadores/índices de recomposição monetária e baliza-mento de juros de mora alusivos ao período pretérito/vencido, para o fim – inclusive – de oportuna expedição de precatório/RPV na fase própria (li-quidação e cumprimento/execução), aplicam-se os índices/percentuais pre-vistos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, sempre em sua “versão mais atualizada” em vigor ao tempo do cumprimento/liquidação do julgado (até, portanto, a homologação dos cálculos).

A expressão “versão mais atualizada” se deve compreender não ape-nas quanto às alterações legislativas, mas mesmo para além do sentido for-mal, com o ora pré-autorizado influxo (em técnica de adoção de “cláusula ge-ral/aberta”) das eventuais supervenientes posições do STF e do STJ havidas (de já até lá), sumuladas ou não, oriundas de “recurso repetitivo”, de “reper-cussão geral” ou de “controle concentrado de constitucionalidade” (ADIn, ADC, ADPF), atendidas as possíveis modulações temporais e circunstanciais, nada havendo de censurável em tal critério, que, antes o contrário, curva-se à unidade do ordenamento, é preventivo, ponderado e eficiente.

É que o art. 100 da CF/1988 irradia regra de necessária isonomia/igual-dade, que afasta casuísmos de tempo/espaço no trato do tema (flutuações jurisprudenciais), não podendo tais vetores (atualização monetária e juros) serem definidos com oscilações indesejáveis que estabeleçam tratamentos díspares na fixação das dívidas do Erário.

É de se considerar-se, a necessidade de atenção aos vetores estipulados pelo art. 926 do CPC/2015 (estabilidade, integridade e coerência da jurispru-dência) e de respeito à força normativa da Constituição Federal e à uniformi-dade da legislação federal.

Em tal mesma linha de argumentação, o (sempre polêmico) trato da atualização monetária ou dos juros de mora entre a expedição do precatório ou da RPV e seu efetivo pagamento igualmente seguirá, seja para os aplicar, seja para os repudiar, as definições do Manual de Cálculos em suas versão então mais atualizada em tal instante, com o perpassar, pois, do paulatino palmilhar da jurisprudência qualificada do STJ/STF (como acima detalhada).

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Honorários advocatícios devidos no percentual de 10% (dez por cento) sobre as prestações vencidas até a prolação da sentença, nos termos do enun-ciado da Súmula nº 111 do STJ. Caso a sentença tenha fixado valor inferior ao entendimento jurisprudencial, deve ela prevalecer na ausência de recurso da parte autora.

Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da juris-dição federal (CF, art. 109, § 3º), o INSS está isento do pagamento de custas processuais somente quando lei estadual específica prevê a isenção, o que ocorre nos Estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia e Mato Grosso. Em se tratando de causas ajuizadas perante a Justiça Federal, o INSS está isento de custas por força do art. 4º, I, da Lei nº 9.289/1996.

Em face do exposto, nego provimento à apelação do INSS e dou parcial pro-vimento para a remessa oficial para fixar o pagamento dos juros e correção mo-netária conforme orientações do Manual de Cálculos da Justiça Federal, e estabelecer o pagamento dos honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até o julgamento da apelação (Súmula nº 111/STJ). Sem custas.

Implantação do benefício, no prazo máximo de 30 dias (CPC, art. 273), com comunicação imediata à autarquia previdenciária.

É como voto.

Desembargadora Federal Gilda Sigmaringa Seixas

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TrF 4ª r.Tribunal regional Federal da 4ª região

Apelação Cível nº 5000142-67.2015.4.04.7105/RSRelator: Juiz Federal Marcelo de NardiApelante: Roseile Pauli Klein (autor)Advogado: Angelo Felipe Zuchetto RamosApelado: União – Fazenda Nacional (réu)

EMENTA

triButÁrio – internalização irregular de Mercadorias estrangeiras – locação do

veículo transportador, responsaBilidade da proprietÁria – pena de perdiMento

Comprovado que as mercadorias apreendidas foram intro-duzidas irregularmente no País, conclui-se que a proprietária do veículo assumiu o risco do delito ao alugar o automóvel perdido ao ex-marido (condutor na ocasião), mormente quando outorga-da procuração para o uso do veículo no Brasil, na Argentina e no Paraguai.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por una-nimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 13 de dezembro de 2017.

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RELATÓRIO

Trata-se de apelação contra sentença em procedimento comum (ev59 na origem) que julgou improcedente pedido de anulação de auto de infração fiscal e termo de apreensão e guarda fiscal referido, revogando medida limi-nar que suspendia a aplicação da pena de perdimento (ev5 na origem). Em razões (ev63 na origem) a autora sustenta que a própria sentença reconhece sua conduta como, no máximo, de falta de cautela, merecendo reforma a de-cisão recorrida.

Com contrarrazões (ev68 na origem), veio o processo a julgamento.

VOTO

O Juízo de origem revogou a medida liminar julgando improcedente o pedido nas seguintes linhas (ev59):

[...] as circunstâncias fáticas não deixam dúvidas quanto à conduta, no mí-nimo, temerária, da autora, ao “alugar” seu veículo, sem adotar maiores cautelas, ao senhor Luciano da Silva Gamarra, do qual, segundo a autora, estava separada à época dos fatos.

A situação dos autos foi minuciosamente por mim analisada por ocasião do pedido liminar (evento 5), cujos fundamentos peço vênia para transcrever:

[...]

No caso em apreço, conforme descrito no Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal nº 1010800/386/2014 (evento 4, out1, fl. 01), o automóvel de placas IRD 0183 foi apreendido por estar transportando mer-cadorias estrangeiras, desacompanhadas de documentação fiscal idônea.

Contra a decretação da pena de perdimento do bem se insurge a deman-dante, alegando ser a proprietária do veículo e que não teve nenhuma rela-ção com a conduta que deu ensejo à infração.

As hipóteses de aplicação da pena de perdimento de veículo em razão do cometimento de ilícitos fiscais estão previstas no art. 104 do Decreto-Lei nº 37/1966, o qual estabelece:

Art. 104. Aplica-se a pena de perda do veículo nos seguintes casos:

[...]

V – quando o veículo conduzir mercadoria sujeita à pena de perda, se pertencente ao responsável por infração punível com aquela sanção.

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O Decreto nº 6.759/2009 (Regulamento Aduaneiro) repete a disposição, dando as seguintes diretrizes:

Art. 688. Aplica-se a pena de perdimento do veículo nas seguintes hi-póteses, por configurarem dano ao Erário (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 104; Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 24; e Lei nº 10.833, de 2003, art. 75, § 4º):

[...]

V – quando o veículo conduzir mercadoria sujeita a perdimento, se per-tencente ao responsável por infração punível com essa penalidade;

[...]

§ 2º Para efeitos de aplicação do perdimento do veículo, na hipótese do inciso V, deverá ser demonstrada, em procedimento regular, a respon-sabilidade do proprietário do veículo na prática do ilícito.

Art. 674. Respondem pela infração (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 95):

I – conjunta ou isoladamente, quem quer que, de qualquer forma, con-corra para sua prática ou dela se beneficie;

II – conjunta ou isoladamente, o proprietário e o consignatário do veí-culo, quanto à que decorra do exercício de atividade própria do veículo, ou de ação ou omissão de seus tripulantes; [...]

A interpretação da legislação de regência, portanto, conduz ao raciocínio de que a aplicação da penalidade de perdimento de veículo pressupõe que pertença o veículo transportador ao proprietário das mercadorias apreen-didas ou, ainda, prova da responsabilidade do proprietário do veículo na prática da infração, entendida esta como o transporte de mercadorias su-jeitas ao perdimento.

Quanto à proporcionalidade entre o valor do bem e o das mercadorias apreendidas, segundo se extrai dos autos, foram encontrados no interior do automóvel itens avaliados em aproximadamente R$ 6.000,00 (seis mil reais), valor que engloba três autos de infração (um para cada autuado que se encontrava no veículo).

O veículo foi avaliado pelo Fisco em R$ 34.845,00 (trinta e quatro mil, oito-centos e quarenta e cinco reais – evento 1, cpf6, fl. 03).

O Fisco apontou que, em face da reincidência do Sr. Luciano, condutor do veículo, devia ser afastada a alegação de desproporcionalidade da pena, pontuando ser inverossímil que a autora desconhecesse a prática ilícita perpetrada pelo próprio marido (evento 1, cpf6, fl. 07).

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É interessante notar que, na decisão do Fisco datada de 03.10.2014 (evento 1, cpf6, fls. 02-08), consta que “alega a interessada que o veículo estaria ‘locado’ ao próprio esposo” (fl. 06 – grifei), e não ao ex-companheiro, como consta na petição inicial. Na fl. 07 (evento 01, cpf6), a autoridade fiscal ain-da considerou que era improvável o desconhecimento da autora sobre as atividades desenvolvidas pelo próprio marido, “mormente ao se conside-rar que ambos habitam a mesma residência”, o que dá a entender que, no curso do processo administrativo, a autora ainda matinha vínculo (prova-velmente união estável) com o Sr. Luciano. Do contrário, certamente teria relatado a separação, na esfera administrativa, fator que agora alega para subsidiar sua tese de desconhecimento da prática delituosa. (Registra-se que a autora não juntou a este feito suas petições deduzidas perante o Fis-co, a fim de verificar-se se tratava o Sr. Luciano como marido ou ex-marido, companheiro ou ex-companheiro, naquela esfera.)

A corroborar o supraexposto, no sentido de que a autora ainda mantinha sua união com o autuado na data dos fatos, como relatado pela autoridade fiscal, note-se que, na procuração datada de 08.11.2013, consta que a autora e o Sr. Luciano habitavam no mesmo endereço (evento 03, proc1, fl. 01).

Interessante notar, ainda, que, na referida procuração, a autora outorgou poderes ao Sr. Luciano para “usar o veículo em apreço em todo o território nacional ou estrangeiro, especialmente Argentina e Paraguai” (evento 03, proc1, fl. 03), o que indica seu conhecimento acerca das viagens realizadas pelo companheiro.

No auto de infração anexado no evento 04, out1, fl. 02, datado de 09.07.2014, consta que o veículo em questão fora utilizado de maneira recorrente – ao todo dez viagens a Foz do Iguaçu, em seis meses – pelo marido (ou ex?) da autora para cometer infrações à legislação aduaneira, conforme relatório Sinivem – Sistema Integrado Nacional de Identificação de Veículos em Mo-vimento.

Nesse passo, cabe pontuar que o Sr. Luciano responde a dezesseis proces-sos administrativos fiscais de perdimento de mercadorias, bem como a cin-co representações fiscais para fins penais, caracterizando a habitualidade na prática de introdução clandestina de mercadorias no país.

À luz de todo esse contexto, entendo que não há prova inequívoca de que a autora desconhecia a prática delituosa perpetrada pelo seu (ex?) compa-nheiro, o qual é reincidente nesta conduta, fator que reflete no afastamento da proporcionalidade da medida de perdimento.

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Bem por isso que a autoridade fiscal afastou a alegação da desproporcio-nalidade da pena, já que o autuado era reincidente e que a proprietária do veículo, na qualidade de esposa do autor, coabitando a mesma residência, provavelmente possuía conhecimento acerca desses fatos.

Pondero, ainda, que a autora não comprovou ter se separado do autuado, conforme alegou na inicial.

De toda sorte, a tese da autora, no sentido de que não tinha conhecimento dos fatos, embora me pareça inverossímil, pela ausência de prova inequí-voca, não prescinde da necessária dilação probatória.

Assim, para garantir a eficácia da sentença às partes envolvidas, bem como considerando a possibilidade de maior esclarecimento dos fatos, entendo que a tutela antecipada deve ser parcialmente deferida, tão somente para o fim de suspender-se a aplicação da pena de perdimento até o deslinde deste feito. Indefiro, porém, a tutela, no que tange à imediata restituição do bem à autora, pois tal medida praticamente esgota o objeto da ação e demanda o julgamento da certeza do direito da requerente, o que não é possível aferir em sede de cognição sumária, típica das tutelas de urgência.

[...]

As evidências constantes dos autos, além de corroborarem que as merca-dorias apreendidas foram introduzidas irregularmente no País, e que, por isso, são suscetíveis à decretação da pena de perdimento, não deixam dú-vidas de que a Parte Autora aceitou o risco do empreendimento delitivo do seu então ex-marido (condutor do veículo na ocasião), o que demonstra a sua participação, ainda que de forma indireta, para a prática que ensejou dano ao Erário, pois, ao ceder o meio de transporte utilizado, foi decisiva na perpetração do ilícito, afastando a escusa acerca do desconhecimento do crime esgrimida por ocasião da petição inicial.

No ponto, registre-se que, tão logo realizado o contrato de locação do veí-culo, datado de 08.11.2013 (evento 1, CONTRA5), o senhor Luciano passou a utilizá-lo em suas viagens ao Paraguai. Confira-se, pelo documento abai-xo colacionado (evento 28), que as viagens começaram 6 (seis) dias após a assinatura da avença, ocorrendo de forma intermitente até a apreensão do veículo:

Tal situação, somada ao fato de a procuração outorgada ao senhor Luciano conferir peculiar poder para “usar o veículo em apreço em todo o território nacional ou estrangeiro, especialmente Argentina e Paraguai”, não deixam

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dúvidas de que a autora tinha ciência dos fins destinados ao veículo pelo seu ex-companheiro.

Além disso, ao longo da instrução não restou produzido, ônus que exclusiva-mente competia à autora (art. 373, inciso I, do CPC), qualquer elemento de pro-va hábil a chancelar a propalada boa-fé defendida. Com efeito, nenhuma explicação plausível acerca das circunstâncias que determinaram o aluguel restou demonstrada, de modo a referendar que Luciano tivesse, ao arrepio de seu consentimento, utilizado o veículo apreendido para o transporte ir-regular de produtos descaminhados. Pelo contrário: há, inclusive, elementos indiciários que apontam, salvo melhor juízo, elevada fragilidade da tese de boa-fé aventada.

Note-se, no ponto, que as duas testemunhas ouvidos em Juízo (degrava-ções anexadas ao evento 43) pouco acrescentaram ao feito, prestando, na ocasião, apenas informações evasivas e incapazes de demonstrar, com a devida segurança que o caso requer, que a conduta ilícita ora examinada tenha sido realizada sem a plena consciência da autora. Ambas se restrin-giram, em síntese, a apontar o exercício da profissão de fotógrafa pela de-mandante, sem, contudo, precisar o estado civil da autora à época, pouco auxiliando na exata definição das datas de início e final do namoro/união estável.

Ademais, esclareço que a relação da autora com o Senhor Luciano pouco, ou nada, influencia na questão sob análise, uma vez que devidamente com-provado nos autos ser de conhecimento da autora o fato de que Luciano utilizava o veículo para viagens ao Paraguai.

Destaco, por fim, dirimindo eventuais dúvidas, que a proporcionalidade entre o valor das mercadorias apreendidas e o valor do veículo deve su-plantar a mera questão aritmética, atingindo o campo axiológico, conso-ante leciona a ilustre Desembargadora Federal Maria de Fátima de Freitas Labarrére no seguinte julgado:

TRIBUTÁRIO – ADUANEIRO – LIBERAÇÃO DE VEÍCULO APREEN-DIDO – PERDIMENTO – RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO TRANSPORTADOR – PRINCÍPIO DA PROPORCIO-NALIDADE – 1. A jurisprudência deste Tribunal, amparada na Súmula nº 138 do TFR, firmou o entendimento de que a pena de perdimento do veículo não poderá se desapegar do elemento subjetivo e nem des-considerar a boa-fé. 3. A responsabilidade do proprietário do veículo transportador, quando este não era o dono da mercadoria, demonstra--se através do conhecimento, ainda que potencial, da utilização de seu

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veículo na prática do ilícito e de indícios que afastem a presunção de boa-fé. 4. A proporcionalidade não deve ser interpretada levando-se em conta unicamente o enfoque matemático, o que não significa que se está a desprezar o princípio da proporcionalidade visto sob o prisma axiológico, o qual tem por último fim impedir a habitualidade do contrabando e do descaminho, e reprimir tal prática pelo grande infrator episódico. 5. O princípio da proporcionalidade veda tanto o excesso como a inoperância ou a ação insuficiente, constituindo um limite ao poder de polícia administrativa. No campo do sanciona-mento administrativo, atua restringindo ou afastando a imposição de pena de perdimento quando outra penalidade menos grave puder sa-tisfatoriamente coibir o ilícito cometido, sem mostrar-se inócua ante os efeitos desta, por exigência de adequação axiológica e finalística. (TRF 4ª R., Apelação/Reexame Necessário nº 2006.71.07.000611-3, 1ª T., Relª Desª Fed. Maria de Fátima Freitas Labarrère, DE de 01.06.2010, gri-fo nosso)

A corroborar tal entendimento, leia-se:

TRIBUTÁRIO – PENA DE PERDIMENTO – VEÍCULO TRANSPOR-TADOR (AUTOMÓVEL) – REQUISITOS – 1. Esta Corte entende que a pena de perdimento só deve ser aplicada ao veículo transportador quando concomitantemente houver: a) prova de que o proprietário do veículo apreendido concorreu de alguma forma para o ilícito fiscal (Inteligência da Súmula nº 138 do TFR); b) relação de proporcionali-dade entre o valor do veículo e o das mercadorias apreendidas. 2. O princípio da proporcionalidade, em casos de infração da legislação aduaneira, não deve ser sopesado tão-somente em função da proporção a ser observada entre o valor pecuniário do veículo e aquele atribuído à mercadoria apreendi-da. Hão de serem considerados, ainda, os diversos bens jurídicos tutela-dos por essa legislação, tais como arrecadação tributária, soberania nacional, balança comercial, concorrência leal, saúde pública e direitos do consumidor. (TRF 4ª R., Apelação Cível nº 0000403-91.2009.404.7214, 2ª T., Relª Desª Fed.l Luciane Amaral Corrêa Münch, DE de 07.04.2010, grifo nosso)

No caso em apreço, não pairam dúvidas acerca da habitualidade da con-duta (evento 28).

Por fim, reforço que a restrição sofrida pela demandante decorre de ex-pressa previsão legal, oriunda de conduta aparentemente irregular, e com supedâneo em normas de fiscalização tributária, não se tratando de mera conveniência da administração. Nesse contexto, é indispensável a compro-vação cabal da inexistência de vínculo e de benefício da autora com a ati-

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vidade ilícita para que haja a liberação do veículo apreendido, o que não restou suprido no caso em tela.

Formalizada sem êxito tal missão, a manutenção do ato administrativo hostilizado é medida que se impõe.

Distintamente do que consta na apelação, a decisão recorrida minucio-samente apreciou as provas trazidas ao processo para concluir contrariamen-te ao interesse da apelante, nada havendo que autorize efetiva mudança na solução apontada pelo Juízo de origem.

HonorÁrios de advogado eM recurso

Vencida a autora e apelante também em fase recursal, incide o § 11 do art. 85 do CPC. Majoram-se a alíquota dos honorários de advogado de sucumbência impostos pelo Juízo de origem para 11%, mantidos os demais parâmetros da sentença.

Pelo exposto, voto por negar provimento à apelação.

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EmEntário CívEl

ação de coBrança – seguro oBrigatório dpvat – seguradora –

inovação recursal – iMpossiBilidade

35318 – “Ação de cobrança de seguro obrigatório. DPVAT. Sentença de procedência. Apelo da seguradora. Inovação recursal. Impossibilidade. Argumentação de pagamento integral sem comprovação. Preclusão consumativa. Não é dada a parte apelante oportuni-dade de inovar na apelação e deduzir fatos não alegados no primeiro grau. Correção mo-netária incidente desde a data do evento danoso. Juros moratórios computados da citação. Sentença mantida. Recurso conhecido e improvido.” (TJCE – Ap 0193986-20.2013.8.06.0001 – Rel. Durval Aires Filho – DJe 09.01.2018 – p. 24)

ação de interdição – curatela provisória – iMpossiBilidade – deMonstração da lucidez e

capacidade de discerniMento da agravada – ausÊncia dos requisitos

35319 – “Agravo de instrumento. Ação de interdição. Curatela provisória. Impossibili-dade. Demonstração da lucidez e capacidade de discernimento da agravada. Ausência dos requisitos. 1. É possível a nomeação de curador para aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida civil (art. 1.767, inciso I, do Código Civil). A concessão de curatela provisória é perfeitamen-te admissível, com fulcro na legislação processual civil. Contudo, não havendo provas de que a curatelanda não possui discernimento para os atos da vida civil ou é pródiga, descabe a interdição. 3. Recurso não provido. V.V. Agravo de instrumento. Ação de in-terdição. Tutela antecipada. Curatela provisória. CC, art. 1.766. Risco de grave e iminente dilapidação do patrimônio. Demonstração. Requisitos do art. 300 do CPC/2015. Presença. Bloqueio judicial de transações bancárias. Recurso parcialmente provido. Diante de risco de grave e iminente dilapidação patrimonial, o bloqueio de transações bancárias é medida que se impõe. Requisitos do art. 300 do CPC/2015 presentes. Recurso parcialmente provi-do.” (TJMG – AI-Cv 1.0000.17.056916-4/001 – 5ª C.Cív. – Rel. Luís Carlos Gambogi – DJe 09.01.2018)

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ação de oBrigação de Fazer – direito à saúde e à vida –

cuMulação de pedidos – rÉus distintos – possiBilidade

35320 – “Agravo de instrumento. Ação de obrigação de fazer. Direito à saúde e à vida. Cumulação de pedidos. Réus distintos. Possibilidade. Existência de conexão entre os pe-didos. Precedentes dos Tribunais pátrios. Preliminar de inépcia da inicial rejeitada. Tra-tamento de saúde domiciliar. Menor portador de encefalopatia crônica não especificada. Demonstração da necessidade de utilização contínua de aparelhos hospitalares em sua residência que lhe garantem melhores condições de vida. Aumento substancial no con-sumo de energia elétrica. Ausência de condições financeira para o custeio do serviço de energia elétrica. Responsabilidade dos entes públicos. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.” (TJCE – AI 0628361-77.2016.8.06.0000 – Rel. Paulo Airton Albuquerque Filho – DJe 11.01.2018 – p. 15)

ação de oBrigação de Fazer – indenização por dano

Material e coMpensação35321 – “Processual civil. Agravo interno no recurso especial. Ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por dano material e compensação por dano moral. Embargos de declaração. Omissão, contradição ou obscuridade. Não ocorrência. Reexame de fatos e provas. Inadmissibilidade. Dissídio jurisprudencial prejudicado. Ausentes os vícios do art. 535 do CPC/1973, rejeitam-se os embargos de declaração. O reexame de fatos e provas em recurso especial é inadmissível. A incidência da Súmula nº 7/STJ prejudica a análise do dissídio jurisprudencial pretendido. Precedentes desta Corte. Agravo interno não pro-vido.” (STJ – AgInt-REsp 1.605.034 – (2016/0131575-5) – 3ª T. – Relª Min. Nancy Andrighi – DJe 19.12.2017 – p. 3910)

ação de restituição – indenização por danos Materiais e Morais –

oBra inacaBada – culpa eXclusiva do rÉu – reForMa da casa –

reeMBolso eM doBro dos valores pagos – MÁ-FÉ conFigurada

35322 – “Apelação cível. Ação de restituição de importâncias pagas e indenização por danos materiais e morais. Obra inacabada. Culpa exclusiva do réu contratado para re-formar a casa da autora. Reembolso em dobro dos valores pagos. Má-fé. Configurada. Compensação das despesas realizadas para a execução da obra. Inovação recursal. Dano moral. Evidenciado. Quantum minorado. Litigância de má-fé. Não configuração. Ônus su-

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cumbenciais. Manutenção. I – Verificado o inadimplemento contratual, por parte do Réu/ora Apelante, que se comprometeu a reformar a casa da Autora, no prazo de 12 (doze) semanas, e não o fez, abandonando a obra, na fase de demolição, deixando o imóvel, in-clusive, sem portas, conforme se verifica pelos documentos juntados aos autos, obrigando a Recorrida a contratar outros profissionais para terminar o serviço, é cabível a devolução, em dobro, da quantia paga, haja vista a irresponsabilidade por parte dele, que descum-priu o encargo. II – Não se conhece de pedido formulado somente em sede de recurso, atinente à compensação, pelo Réu/Construtor, dos valores gastos na obra, porque não foi submetido à apreciação do juiz a quo, sendo vedada a inovação recursal, sob pena de supressão de instância e abalo à segurança jurídica. III – O abandono injustificado da obra no imóvel caracteriza dano moral, uma vez que tal dissabor ultrapassa a esfera do mero aborrecimento, causando a sensação de impunidade e de impotência do consumidor. IV – Mitiga-se o valor arbitrado a título de dano moral se sopesadas as especificidades do caso, bem como as circunstâncias dos autos, que, na espécie, mostra-se exagerado, de modo que o instituto cumpra sua função, sem que se revele fonte de enriquecimento ilícito. V – Não merece acolhida o pedido de condenação do Recorrente por litigância de má-fé, haja vista que o recurso é o meio adequado para as partes manifestarem seu inconformismo com as decisões judiciais, não merecendo qualquer reprimenda quando veiculado de acordo com as determinações legais, como ocorre, in casu. VI – Quanto à verba sucumbencial, tendo a Autora decaído em parte mínima do pedido, deve a parte Ré arcar integralmente com os ônus sucumbenciais, como fixado na sentença. Apelação cível conhecida e parcialmente provida.” (TJGO – AC 200793699576 – 5ª C.Cív. – Rel. Des. Francisco Vildon Jose Valente – DJe 15.01.2018 – p. 53)

ação declaratória – nulidade de protesto cuMulada coM

indenizatória – não indicação do dispositivo de lei Federal

35323 – “Agravo interno no recurso especial. Ação declaratória de nulidade de protesto cumulada com indenizatória. Não indicação do dispositivo de lei federal supostamen-te violado ou objeto de interpretação divergente pelos tribunais. Incidência da Súmula nº 284/STF. Agravo interno desprovido. 1. A não individualização e a não indicação, na petição de recurso especial, do dispositivo legal cuja interpretação tenha sido divergente, atraem a incidência do verbete nº 284 da Súmula do Supremo Tribunal Federal. 2. Agravo interno desprovido.” (STJ – AgInt-REsp 1.669.905 – (2017/0102223-4) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 19.12.2017 – p. 3928)

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ação deMolitória – antecipação de tutela – violação ao art. 535

do cpc – não caracterizada35324 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação demolitória c/c pedido de antecipação de tutela. Violação ao art. 535 do CPC. Não caracterizada. 1. Não há que falar em violação do art. 535, II, do CPC, haja vista que o Tribunal de origem manifestou acerca da matéria tida como omissão pelo recorrente. 2. Agravo interno não provido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 1.088.006 – (2017/0088147-4) – 3ª T. – Relª Min. Nancy Andrighi – DJe 19.12.2017 – p. 3703)

ação Monitória – interdição – curadoria – gratuidade da

Justiça – desnecessidade35325 – “Agravo de instrumento. Ação monitória. Interdição. Curadoria. Gratuidade da justiça. Desnecessidade. Indeferimento. Decisão mantida. Não obstante a alegação do Autor de que não possui condições financeiras, para arcar com as custas iniciais do pro-cesso, estas no valor aproximado de R$ 5.085,60 (cinco mil, oitenta e cinco reais e sessen-ta centavos), ele não conseguiu comprovar sua condição de hipossuficiência financeira, e é Embaixador aposentado da República, com um valor patrimonial no montante de R$ 1.124.869,29 (um milhão, cento e vinte e quatro mil, oitocentos e sessenta e nove reais e vinte e nove centavos). Agravo de instrumento conhecido e desprovido.” (TJGO – AI 201692631330 – 5ª C.Cív. – Rel. Des. Francisco Vildon Jose Valente – DJe 15.01.2018 – p. 52)

ação negatória de paternidade – Filiação – sentença eXtra petita – reconHeciMento de

vínculo socioaFetivo35326 – “Apelação. Ação negatória de paternidade. Filiação. Sentença extra petita. Re-conhecimento de vínculo socioafetivo. Independente de ter sido pedido pela requerida. Ausência de prova de inexistência do vínculo. DNA. Ausência de paternidade biológica. Retificação do registro civil. Impossibilidade. Prevalência da paternidade socioafetiva. Sentença mantida. Preliminar afastada. Recurso não provido. Não é razoável excluir a paternidade de menor em razão de exame de DNA que afastou a paternidade biológica, negando-lhe a condição de filho de que sempre desfrutou desde o seu nascimento, vis-to que o menor tem o autor como pai e seu grupo familiar como referência de família, caracterizando-se, no presente caso, a paternidade socioafetiva. Não estando afastada, nos autos, a filiação socioafetiva, esta relação impera sobre a verdade biológica. Incabí-

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vel, assim, alteração no registro civil e qualquer repercussão patrimonial decorrentes da paternidade biológica. Preliminar afastada. Recurso não provido.” (TJMS – Ap 0800097-12.2015.8.12.0040 – 1ª C.Cív. – Rel. Des. João Maria Lós – DJe 15.01.2018)

aliMentos coMpensatórios – negativa de prestação

Jurisdicional – não realização da audiÊncia de conciliação –

JulgaMento antecipado da lide35327 – “Recurso especial. civil e processual civil. Direito de família. Alimentos compen-satórios. Negativa de prestação jurisdicional. Não realização da audiência de conciliação. Julgamento antecipado da lide. Demanda extinta por impossibilidade jurídica do pedido e ausência de interesse processual. 1. Pretensão da demandante, ora recorrente, de re-cebimento de alimentos compensatórios. 2. Inocorrência de violação do art. 535, II, do CPC/1973 pelo acórdão recorrido. 3. Desnecessidade de realização de audiência inicial de tentativa de conciliação, tendo sido o processo extinto sem resolução do mérito (impos-sibilidade jurídica do pedido e falta de interesse processual). 4. Entendimento prevalente no Superior Tribunal de Justiça no sentido da natureza excepcional dos alimentos com-pensatórios no ordenamento jurídico brasileiro, em razão de seu caráter indenizatório. 5. Ausência de interesse processual, na espécie, pois não finalizada a partilha de bens, tendo a demandante, em seu nome, diversos bens que integravam o patrimônio comum. 6. Recurso especial desprovido.” (STJ – REsp 1.655.689 – (2013/0342284-3) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 19.12.2017 – p. 3921)

dano Moral – inscrição indevida eM cadastro restritivo de crÉdito

– preliMinar de litispendÊncia ou coneXão reJeitada –

serviços não contratados35328 – “Direito civil. Processual civil. Apelações cíveis. Ação de indenização por danos morais. Inscrição indevida em cadastro restritivo de crédito. Preliminar de litispendência ou conexão rejeitada. Serviços não contratados pelo autor. Relação consumerista. Respon-sabilidade do prestador de serviço independente da existência de culpa. Inteligência do art. 14 do CDC. Fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do recorrido (art. 333, II, do CPC). Ausência de comprovação. Aplicação do art. 6º, VII, do CDC. Dano moral in re ipsa. Majoração do quantum indenizatório de R$ 500,00 (quinhentos reais) para R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Correção monetária, a ser realizada com base no INPC, a contar da data do arbitramento, nos termos da Súmula nº 362, do STJ. Fixação dos juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês a contar do evento danoso. Responsabilidade ex-

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tracontratual. Manutenção dos honorários advocatícios no patamar de 10% (dez por cento do valor da indenização). Apelações conhecidas. Recurso da demandada improvido. Ape-lo do demandante parcialmente provido. 1. Tratam-se de apelações cíveis interpostas por Alexandre Gomes Pinheiro e TIM Celular S/A, adversando sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Mombaça/CE, nos autos da ação declaratória de inexistência de débito c/c indenização por danos morais, com pedido de tutela antecipada, proposta pelo primeiro em desfavor da segunda, que julgou parcialmente procedente o pedido au-toral. 2. Vislumbra-se que a controvérsia gira em torno da caracterização de danos morais indenizáveis, causada pela suposta inscrição indevida do nome do autor nos cadastros de proteção ao crédito. 3. Antes de adentrar no mérito, necessário se faz apreciar a prejudicial suscitada pela empresa TIM Celular S/A, que alega que o autor ajuizou anteriormente outro processo com o mesmo objeto, tendo sido realizado acordo que resultou no pa-gamento do valor de R$ 3.300,00 (três mil e trezentos reais), e retirado o seu nome dos órgãos de proteção ao crédito e cancelado o contrato que originou a dívida, o que impõe o reconhecimento da litispendência ou conexão, extinguindo-se o feito, sem resolução de mérito, ou reunindo-se as ações, a fim de que sejam decididas simultaneamente. 4. Não há que se falar em litispendência ou conexão no caso em liça, posto que, restou compro-vado que a questão discutida nos presentes autos fundamenta-se em contrato diverso daquele que motivou o ajuizamento do processo de nº 6793-69.2013.8.06.0126, razão pela qual rejeito a prejudicial por falta de amparo legal. 5. Afirma a demandada, que no mo-mento da contratação, é exigida uma série de documentos pessoais, donde se conclui que fora utilizada documentação original ou falsificação de boa qualidade, impossível de ser detectada, estando afastada, em razão da ação de terceiros (fraudadores), a sua respon-sabilidade, mesmo porque foi também lesada, uma vez que prestou serviços sem receber por eles. 6. Não tendo a promovida comprovado que os seus serviços foram efetivamente contratados pelo promovente, não merece guarida a simples alegação de que, no momen-to da contratação, são exigidos diversos documentos, eis que a demandada deve assumir o risco do negócio e tomar todos os cuidados necessários no sentido de evitar fraudes, não podendo a responsabilidade ser transferida para os que são vítimas de ilicitudes. 5. Des-ta feita, deverá ser o autor indenizado pelos danos morais experimentados, pois, apesar de não ter sido usuário da requerida, teve o seu nome indevidamente inserido em lista de inadimplentes (fl. 17), aplicando-se à hipótese dos autos o art. 14, caput, do CDC, na medida em que a promovida responde, independentemente da existência de culpa, pelos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços. 6. Mis-ter se faz salientar que por se tratar de relação de consumo, cabe à empresa promovida o ônus de comprovar que é devida a cobrança que ensejou a inserção do nome do autor nos cadastros de inadimplentes, nos termos do art. 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor. 7. Frise-se, por oportuno, que o banco recorrente não comprovou que o contrato foi realmente celebrado pelo recorrido, não se desincumbindo, portanto, do ônus de comprovar fato desconstitutivo do direito do autor. 8. Considerando que não restou comprovado que o apelante tenha firmado negócio jurídico com a recorrida, sendo de inteira responsabilidade da mencionada instituição qualquer lesão advinda de contrato fraudulento, configurando-se, portanto, dano moral in re ipsa, a mera inclusão indevida em cadastros restritivos de crédito. 9. Da leitura da sentença de piso, observa-se que o

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juízo a quo arbitrou a título de indenização por danos morais o valor de R$ 500,00 (qui-nhentos reais). 10. Nesse contexto, foi fixado valor inferior ao adotado à época dos fatos (2013) por este sodalício, devendo portanto o montante ser majorado para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), atendendo parcialmente pleito do autor, quantum que se mostra razoável e condizente com a realidade dos descritos na peça inaugural. 11. A correção monetária do montante reparatório por danos morais deve observar a Súmula nº 362 do STJ, segundo a qual ‘a correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento’, devendo a correção monetária ocorrer, portanto, a partir da prolação do presente acórdão. 12. O índice a ser utilizado para a correção monetária do montante reparatório por danos morais é o INPC – Índice Nacional de Preços ao Consumidor, apu-rado pelo IBGE, por ser o que melhor indica a variação inflacionária. 13. Em se tratando de responsabilidade extracontratual, caso dos autos (eis que o demandante não contratou os serviços da demandada), é firme o entendimento do STJ no sentido de que os juros moratórios devem ser fixados a contar do evento danoso, nos termos da Súmula nº 54 do STJ (‘Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual’), inclusive no caso de indenização por danos morais. 14. Destarte, os juros moratórios relacionados ao montante indenizatório por danos morais devem ser fixados, a contar do evento danoso, no percentual de 1% (um por cento) ao mês, em consonância com o art. 406, do Código Civil e art. 161, § 1º, do CTN. 15. No que diz respeito aos ho-norários advocatícios, observa-se que foram arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da indenização, montante adequado à espécie, considerando a natureza da causa e a sua pequena complexidade, de tal sorte que deve ser mantida, não merecendo guarida o pleito de majoração formulado pelo autor, ora apelante. 16. Recursos conhecidos. Ape-lação interposta pela demandada improvida. Apelação aforada pela promovente parcial-mente provida.” (TJCE – Ap 0006794-54.2013.8.06.0126 – Relª Helena Lúcia Soares – DJe 09.01.2018 – p. 20)

dano Moral e Material – contrato de eMprÉstiMo consignado –

relação consuMerista – Fraude – responsaBilidade oBJetiva

da instituição Financeira35329 – “Direito civil e processual civil. Apelação cível. Ação de indenização por danos materiais e morais. Contrato de empréstimo consignado. Relação consumerista. Fraude. Responsabilidade objetiva da instituição financeira. Inteligência da Súmula nº 479, do STJ. Anulação do instrumento contratual. Ausência de fatos impeditivos, modificativos ou ex-tintivos do direito do autor (art. 333, II, do CPC). Dano moral in re ipsa. Quantum indeni-zatório mantido. Valores indevidamente descontados. Restituição na forma simples. Da-nos materiais. Ausência de impugnação. Questão não examinada. Obediência ao princípio do tantum devolutum quantum appellatum. Correção monetária. INPC. Danos morais a partir da data do arbitramento. Danos materiais a contar da data do evento danoso. Juros mora-

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tórios fixados em 1% ao mês a partir do evento danoso. Responsabilidade extracontratual. Recurso conhecido e parcialmente provido. 1. Trata-se de apelação cível interposta pelo Banco Industrial do Brasil S/A, adversando sentença proferida pelo juízo da vara única da comarca de Aracoiaba/CE, nos autos da ação de indenização por danos materiais e mo-rais, ajuizada por Maria Ferreira da Silva, que julgou parcialmente procedente o pleito autoral. 2. In casu a controvérsia gira em torno da caracterização ou não de danos materiais e morais indenizáveis, causada por suposto empréstimo consignado fraudulento realiza-do em nome da parte autora, bem como acerca da possibilidade da restituição em dobro dos valores indevidamente descontados. 1. Trata-se de apelação cível interposta pelo Ban-co Industrial do Brasil S/A, adversando sentença proferida pelo juízo da vara única da comarca de Aracoiaba/CE, nos autos da ação de indenização por danos materiais e mo-rais, ajuizada por Maria Ferreira da Silva, que julgou parcialmente procedente o pleito autoral. 2. In casu a controvérsia gira em torno da caracterização ou não de danos materiais e morais indenizáveis, causada por suposto empréstimo consignado fraudulento realiza-do em nome da parte autora, bem como acerca da possibilidade da restituição em dobro dos valores indevidamente descontados. 3. Inicialmente deve ser enfatizado que a lide estabelecida entre as partes é de natureza consumerista, encontrando amparo no Código de Defesa do Consumidor, porquanto autor e réu inserem-se, respectivamente, nos con-ceitos de consumidor e de fornecedor, consagrados nos arts. 2º, caput, e 3º, caput, do refe-rido diploma legal, tendo o STJ, relativamente a matéria, editado a Súmula nº 297, in verbis: ‘o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras’. 4. O art. 14, caput, do CDC estabelece que ‘o fornecedor de serviços responde, independente-mente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre a sua fruição e riscos’. 4. Compulsando minudentemente os presentes fólios, verifica-se que o CPF, o RG e o comprovante de endereço (supostamente da recor-rida) apresentados pelo recorrente às fls. 128/130) são completamente diferentes dos do-cumentos trazidos aos autos pela apelada (fls. 25, 26 e 142) e dizem respeito, em verdade, a pessoa diversa da recorrida. 5. Desta feita, constata-se que se trata de contrato fraudu-lento, não tendo o banco recorrente comprovado que o contrato foi realmente celebrado pela recorrida, tampouco que o dinheiro objeto do empréstimo tenha sido efetivamente revertido em benefício da demandante, não se desincumbindo, portanto, de comprovar fato desconstitutivo do direito do autor. 6. No caso vertente, não restou comprovado que a apelada tenha firmado negócio jurídico com o banco recorrente, sendo de inteira respon-sabilidade da mencionada instituição bancária qualquer lesão advinda de contrato frau-dulento, configurando-se, portanto, o dano in re ipsa, dispensando a sua comprovação, segundo precedentes STJ e TJCE. 7. Assiste razão ao recorrente, a restituição da quantia indevidamente subtraída deve ocorrer na forma simples, vez que não restou comprovada a má-fé da instituição financeira, merecendo reproche a sentença guerreada nesse aspecto. 4. O art. 14, caput, do CDC estabelece que ‘o fornecedor de serviços responde, independen-temente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre a sua fruição e riscos’. 4. Compulsando minudentemente os presentes fólios, verifica-se que o CPF, o RG e o comprovante de endereço (supostamente da recor-

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rida) apresentados pelo recorrente às fls. 128/130) são completamente diferentes dos do-cumentos trazidos aos autos pela apelada (fls. 25, 26 e 142) e dizem respeito, em verdade, a pessoa diversa da recorrida. 5. Desta feita, constata-se que se trata de contrato fraudu-lento, não tendo o banco recorrente comprovado que o contrato foi realmente celebrado pela recorrida, tampouco que o dinheiro objeto do empréstimo tenha sido efetivamente revertido em benefício da demandante, não se desincumbindo, portanto, de comprovar fato desconstitutivo do direito do autor. 6. No caso vertente, não restou comprovado que a apelada tenha firmado negócio jurídico com o banco recorrente, sendo de inteira respon-sabilidade da mencionada instituição bancária qualquer lesão advinda de contrato frau-dulento, configurando-se, portanto, o dano in re ipsa, dispensando a sua comprovação, segundo precedentes STJ e TJCE. 7. Assiste razão ao recorrente, a restituição da quantia indevidamente subtraída deve ocorrer na forma simples, vez que não restou comprovada a má-fé da instituição financeira, merecendo reproche a sentença guerreada nesse aspecto. 8. Em obediência ao princípio do tantum devolutum quantum appellatum (previsto no art. 1.013 do CPC/2015 e no art. 515 do CPC/1973), deixo de examinar o valor arbitrado a título de danos materiais, posto que não houve insurgência contra essa questão, tendo havido, portanto, aceitação nesse aspecto. 9. O quantum indenizatório deve ser mantido, vez que se mostra razoável e condizente com a realidade dos fatos narrados nos autos, encontrando-se em perfeita sintonia com o patamar adotado pela egrégia corte superior, bem como por esse sodalício. 10. Depreende-se, pois, que a sentença foi omissa quanto à incidência, percentual e índice da correção monetária e juros moratórios, o que será sana-do de ofício. 11. O montante reparatório por danos morais deve observar a Súmula nº 362 do STJ, segundo a qual: ‘a correção monetária do valor da indenização do dano moral in-cide desde a data do arbitramento’, devendo a correção monetária ocorrer, portanto, a partir da prolação do decisum fustigado. 12. No que tange à correção monetária do valor da indenização por danos materiais, o STJ já decidiu que: ‘nos termos do Enunciado nº 43 da Súmula do STJ, a correção monetária, em caso de danos materiais, corre desde a data do evento danoso’ (STJ, EDcl-REsp 538279/SP, Relª Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª T., DJe 29.08.2012), devendo a correção monetária incidir, por conseguinte, a contar da data do efetivo prejuízo. O índice a ser utilizado para a correção monetária dos montantes repara-tórios por danos morais e materiais é o INPC – Índice Nacional de Preços ao Consumidor, apurado pelo IBGE, por ser o que melhor indica a variação inflacionária. 13. No que tange aos juros moratórios, saliente-se que, em se tratando de responsabilidade extracontratual, caso dos autos (eis que a demandante não contratou com o promovido), é firme o entendi-mento do STJ no sentido de que os juros moratórios devem ser fixados a contar do evento danoso, nos termos da Súmula nº 54 do STJ: ‘os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual’, inclusive no caso de indenização por danos morais. Desta feita, os juros moratórios relacionados aos montantes indenizató-rios por danos morais e materiais devem ser fixados, a contar do evento danoso, em 1% (um por cento) ao mês, em consonância com o art. 406, do Código Civil e com o art. 161, § 1º, do CTN. 14. Recurso conhecido e parcialmente provido. Sentença reformada no sen-tido de determinar que a restituição ocorra na forma simples.” (TJCE – Ap 0001045-45.2007.8.06.0036 – Relª Helena Lúcia Soares – DJe 09.01.2018 – p. 18)

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deFesa do consuMidor – apelação cível – ação de restituição

– danos Morais e Materiais – ilegitiMidade passiva ad causaM

35330 – “Direito civil e processual civil. Código de Defesa do Consumidor. Apelação cí-vel. Ação de restituição c/c indenização por danos morais e materiais. Preliminar de ile-gitimidade passiva ad causam. Rejeitada. Compra de aparelho celular. Defeito apresentado no prazo da garantia. Falha não sanada no período de 30 (trinta) dias. Direito do consu-midor de exigir a restituição do valor pago pelo produto. Inteligência do art. 18, § 1º, II, do CDC. Devolução das parcelas pagas pelo serviço de telefonia no período em que não pode utilizá-lo. Manutenção do montante reparatório arbitrado a título de danos mate-riais. Danos morais configurados. Redução do respectivo quantum indenizatório. Correção monetária e juros moratórios. Matéria de ordem pública. Arbitramento de ofício. Recur-so conhecido e parcialmente provido. 1. Cuida-se de apelação cível interposta por TIM Nordeste S/A, adversando sentença exarada pelo Juízo da 25ª Vara Cível desta Comarca, nos autos da ação de restituição c/c indenização por danos morais e materiais, interposta por João Vancarder Pereira Sousa, que julgou parcialmente procedente o pleito autoral. 2. Consoante já decidiu o STJ, ‘a melhor exegese dos arts. 14 e 18 do CDC indica que todos aqueles que participam da introdução do produto ou serviço no mercado devem responder solidariamente por eventual defeito ou vício, isto é, imputa-se a toda a cadeia de fornecimento, a responsabilidade pela garantia de qualidade e adequação’, de modo que ‘no sistema do CDC fica a critério do consumidor, a escolha dos fornecedores solidá-rios que irão integrar o polo passivo da ação’, o qual poderá ‘exercitar sua pretensão con-tra todos ou apenas contra alguns desses fornecedores, conforme sua comodidade e/ou conveniência’ (STJ, REsp 1077911/SP, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., DJe 14.10.2011. Destarte, não poderá a apelante eximir-me do dever de responder por eventuais danos materiais e morais causados ao recorrido, razão pela qual rejeito a prejudicial de ilegi-timidade passiva ad causam, por falta de amparo legal, passando à análise do mérito da questão. 3. A controvérsia gravita em torno da caracterização ou não de danos materiais e morais indenizáveis, em razão de defeitos apresentados no aparelho celular adquirido pelo autor junto à empresa promovida, bem como pela cobrança de fatura, em razão do plano contratado, no período em que ficou impossibilitado de utilizar o referido aparelho. 4. Inicialmente deve ser enfatizado que, em razão da manifesta relação de consumo, a solução do conflito reside no art. 18, § 1º, I, II e III, do Código de Defesa do Consumidor. Destarte, caso não seja sanado o defeito, no prazo legal, tem o consumidor, a faculdade de exigir, a substituição do produto, a restituição do valor pago ou a redução proporcional do preço, à sua escolha. 5. Considerando que o defeito não foi solucionado no prazo de 30 (trinta) dias, tem a parte autora, o direito a restituição do valor despendido com o apa-relho celular, ou seja, as 08 (oito) prestações adimplidas, totalizando o valor de R$ 559,20 (quinhentos e cinquenta e nove reais e vinte centavos). A restituição das parcelas pagas pelo serviço de telefonia, durante os meses de novembro/2003 a março/2004, período em que o apelado não pôde utilizar os serviços em face do seu aparelho celular encon-trar-se na oficina para concerto, também é medida que se impõe, totalizando o valor de

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R$ 710,25 (setecentos e dez reais e vinte e cinco centavos). 6. Impende ressaltar, que fo-ram consideráveis os aborrecimentos suportados pelo recorrido, posto que o seu aparelho celular, com pouco tempo de uso, apresentou problema que não foi resolvido no prazo legal, ficando impossibilitado de utilizá-lo, apesar de diversas vezes ter entrado em conta-to com a oficina autorizada e com a fabricante, o que seguramente causou-lhe transtornos e inquietações que ultrapassam o mero dissabor, razão pela qual deverá ser indenizado pelos danos morais experimentados. 7. Depreende-se da leitura da sentença vergastada que a magistrada de piso arbitrou a título de indenização por danos morais o valor de 40 (quarenta) salários mínimos. 8. Ressalte-se, por imperioso, que a avaliação pecuniária do dano moral ainda é objeto de acaloradas discussões doutrinárias, porquanto inexistem dispositivos legais que estabeleçam critérios objetivos, em razão da sua própria natureza, que, por definição, independe de qualquer vinculação com prejuízo material. 9. Destarte, cabe ao julgador, ao seu prudente arbítrio, guardadas as peculiaridades de cada caso, fixar valor suficiente à reparação do dano, mas que, ao mesmo tempo, não se constitua em instrumento de enriquecimento indevido do ofendido. A indenização deve guardar proporcionalidade entre o sofrimento suportado e as condições econômicas do ofensor e da vítima. Nesse contexto, impende salientar que o quantum arbitrado pela Juíza a quo a título de danos morais foi bem superior ao adotado por este sodalício razão pela qual reduzo para o valor de R$ 10.000,00 (dez) mil reais, o qual se mostra razoável e condizente com a realidade dos fatos narrados na peça inaugural, atendendo pleito do recorrente. 10. Observa-se que a sentença fustigada foi omissa no tocante à correção monetária e aos juros moratórios, cuja omissão será suprida de ofício, por se tratar de matéria de ordem pública. 11. A correção monetária do montante reparatório por danos morais deve obser-var a Súmula nº 362 do STJ, segundo a qual ‘a correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento’, in casu a partir da prolação do presen-te acórdão. O índice a ser utilizado para a correção monetária do montante reparatório por danos morais é o INPC – Índice Nacional de Preços ao Consumidor, apurado pelo IBGE, por ser o que melhor indica a variação inflacionária. 12. Quanto à correção monetária do valor da indenização por danos materiais, o STJ já decidiu que: ‘nos termos do Enunciado nº 43 da Súmula do STJ, a correção monetária em caso de danos materiais, corre desde a data do evento danoso’ (STJ, EDcl-REsp 538279/SP, Relª Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª T., DJe 29.08.2012), devendo incidir, por conseguinte, a contar do efetivo prejuízo. 13. No que pertine aos juros moratórios, saliente-se que, em se tratando de responsabilidade contra-tual, o STJ decidiu que: ‘os juros moratórios possuem como termo inicial a data da citação’ (STJ, EDcl-REsp 538279/SP, Relª Min. Isabel Gallotti, 4ª T., DJe 29.08.2012). Destarte, os juros moratórios referentes aos danos morais e materiais devem ser fixados a contar da citação, em 1% (um por cento) ao mês (art. 406 do Código Civil e art. 161, art. 1º, do CTN). 14. Recurso conhecido e parcialmente provido. Sentença parcialmente reformada.” (TJCE – Ap 0759250-78.2000.8.06.0001 – Relª Helena Lúcia Soares – DJe 09.01.2018 – p. 26)

nota:Trata-se de Apelação interposta adversando sentença proferida nos autos de ação de restituição c/c indenização por danos morais e materiais interposta, que julgou parcial-mente procedente o pleito autoral.

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Na exordial, a parte autora aduziu que no dia 25.06.2003, celebrou com a promovida contrato de compra e venda de um aparelho celular Samsung Compact, no valor de R$ 699,00 (seiscentos e noventa e nove reais), a ser pago em 10 (dez) prestações men-sais de R$ 69,90 (sessenta e nove reais e noventa centavos), mediante a exigência da contratação do plano de serviço alternativo 480 (quatrocentos e oitenta) minutos por, no mínimo, 12 (doze) meses, a contar da data da assinatura do termo de compromisso.Salientou, o requerente, que no dia 28.10.2003, o aparelho celular, ainda na garantia fornecida pelo fabricante (12 meses), apresentou defeitos os quais impossibilitavam a sua utilização, oportunidade em que o entregou à autorizada Samsung “Cell Shop”, na mesma data para conserto, tendo sido informada nos 03 (três) dias úteis seguintes, que o aparelho necessitava de troca de peça, que seria solicitada à Samsung e, no prazo de 15 (quinze) dias, estaria pronto, posto que constatado defeito de fabricação, a ser coberto pela garantia.Após o transcurso de 17 (dezessete) dias da entrega do aparelho à autorizada, o pro-movente compareceu à loja e também entrou em contato, via telefone, com a Samsung, que ficou de examinar a possibilidade de fornecer outro aparelho. Decorridos 30 (trinta) dias do início do problema, procurou novamente a autorizada Samsung, que lhe forne-ceu um laudo sobre o defeito do aparelho, azo em que conversou pessoalmente com um representantes da requerida, visando suspender ou cancelar o seu contrato, porém fora informado de que a responsabilidade era da Samsung e que a promovida nada poderia fazer. Desta feita, foi obrigado a continuar pagando o plano de 480 (quatrocentos e oi-tenta) minutos para não perder a sua linha telefônica vinculada ao aparelho defeituoso, sofrendo danos morais (emergentes) e danos materiais (lucros cessantes), por ter ficado impossibilitado de usar o telefone na sua atividade laboral, posto que é representante comercial. Desta feita, ingressou com a presente ação, postulando, em sede de tutela antecipada, pela suspensão da vigência do contrato de serviço de telefonia e pagamento das duas últimas prestações (9ª e 10ª), com a manutenção da sua linha telefônica. No mérito, pleiteou pelo recebimento das 08 (oito) parcelas do aparelho já pagas, no valor de R$ 559,20 (quinhentos e cinquenta e nove reais e vinte centavos) com correção mone-tária e juros moratórios, bem como dos valores pagos pelo serviço de telefonia relativo aos meses de novembro/2003 a março/2004 (período durante o qual não pôde utilizar o serviço por culpa da promovida), importando no total de R$ 710,25 (setecentos e dez reais e vinte e cinco centavos), acrescido de correção monetária e juros moratórios. Requereu, outrossim, indenização por danos materiais (lucros cessantes), em razão dos prejuízos sofridos no desempenho da sua atividade, bem como o pagamento de 40 (quarenta) salários mínimos, a título de indenização por danos morais.Na contestação, a demandada pleiteou, preliminarmente, a extinção do feito sem reso-lução de mérito, alegando a sua ilegitimidade passiva ad causam. No mérito, requereu a improcedência dos pleitos autorais, sob o argumento de ausência de ato ilícito e de nexo de causalidade entre o suposto dano e qualquer ato da promovida.Réplica acostada, rechaçando, a parte autora, os argumentos suscitados na peça con-testatória.Repousa sentença na qual o julgador a quo, rejeitou a preliminar de ilegitimidade pas-siva ad causam, suscitada pela demandada, concedendo a tutela antecipada postula-da, no sentido de suspender o pagamento do plano de serviços e o pagamento das duas últimas prestações do aparelho, assegurando a manutenção da linha telefônica do autor, azo em que julgou parcialmente procedente o pedido autoral, indeferindo

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o pedido de indenização por danos materiais (lucros cessantes), condenando a pro-movida a restituir ao promovente as 08 (oito) parcelas no valor de R$ 69,90 (sessenta e nove reais e noventa centavos) pagas pelo aparelho totalizando R$ 559,20 (quinhentos e cinquenta e nove reais e vinte centavos), bem como a devolver os valores pagos pelos serviços de telefonia relativos aos meses de novembro/2003 a março/2004, no valor de R$ 710,25 (setecentos e dez reais e vinte e cinco centavos) à título de indenização por danos materiais (danos emergentes), condenando a demandada, ainda, ao pagamento de 40 (quarenta) salários mínimos, a título de indenização por danos morais, além das custas processuais e honorários advocatícios,no percentual de 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação.Inconformada, a demandada interpôs o presente apelo, pugnando, preliminarmente, pela extinção do processo, sem resolução de mérito, em razão da sua ilegitimidade passiva ad causam, sob o argumento de que, na condição de comerciante, apenas inter-mediou a aquisição do aparelho celular pelo demandante, comprando-o da Samsung e revendendo-o ao autor, não participando da fabricação, da construção, da produção ou mesmo da importação do aparelho celular, de modo que a fabricante do aparelho celular (Samsung) deve responder por eventuais danos causados ao promovente. No mérito, protestou pela improcedência dos pleitos exordiais, alegando, em suma, que não praticou nenhum ato ilícito, inexistindo qualquer motivo para a concessão da tu-tela antecipada, a qual deve ser revogada, salientando que a situação vivenciada pelo apelado configura mero aborrecimento, não tendo sido comprovados os alegados da-nos morais, bem como que os supostos danos materiais (danos emergentes) não foram demonstrados pelo recorrido.Nas contrarrazões recursais a parte apelada pugnou pela improcedência do recurso, com a manutenção da sentença de piso.O TJCE conheceu da Apelação para dar-lhe provimento, reformando a sentença de piso no sentido de reduzir o quantum indenizatório arbitrado a título de Danos Morais para o patamar de R$ 10.000,00 (dez mil reais), e, de ofício, determinar, que o quantum inde-nizatório seja corrigido monetariamente pelo INPC, a partir da data do arbitramento, neste Tribunal, nos termos da Súmula nº 362 do STJ, fixando o termo inicial da correção monetária dos danos materiais a data do evento danoso, nos termos da Súmula nº 43, do STJ e a incidência dos juros moratórios em 1% (um por cento), a partir da citação, mantendo-a nos demais termos.Irineu Strenger, em estudo elaborado sobre o dano moral, assim nos elucida:“Quando se fala em dano moral se tem em conta, especialmente, a caracterização do resultado lesivo, considerando-se, como primeiro aspecto, a verificação ou não de um dano, segundo sua concepção genericamente admitida, ou seja, a existência de um ato ilícito punível, vale dizer, identificado com a ofensa ou lesão de um direito ou de um bem jurídico qualquer.A matéria relacionada com o dano indenizável é bastante ampla e exige, para sua exata compreensão e aplicação, numerosas distinções, às vezes empanadas por variada ter-minologia que usam os escritores.O dano moral, por não ter nenhuma vinculação com os valores econômicos ou patri-moniais, não é, por si mesmo, suscetível de apreciação pecuniária, e, por isso, deve ser uma indenização que se traduza numa soma de dinheiro, estabelecida livremente pelos juízes.

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O dinheiro se dá não porque o bem lesionado seja suscetível de apreciação pecuniária, como os bens patrimoniais, mas como compensação.Na verdade, somente a jurisprudência, a ductibilidade de contemplação dos casos con-cretos e específicos pode dar um conceito de dano moral que contemple a verdadeira vocação do instituto de assegurar uma justa compensação a todos aqueles que sofreram lesão na situação favorável ou de vantagem que possuíam em relação a determinados bens.Ressarcir os danos morais, ainda que seja de modo pecuniário, à falta de outro melhor, não é materializar os interesses morais, mas, ao contrário, espiritualizar o direito en-quanto este não se limita à proteção dos bens econômicos, envolvendo também outros bens não econômicos que são inseparáveis da pessoa humana.Tenha-se, porém, em conta que a impossibilidade de uma exata valoração do dano moral não deve conduzir à sustentação que sua apreciação pelo juiz será absolutamen-te arbitrária. Isso conduz à insegurança e à injustiça. Haverá decisões que ascendem a uma soma além do bom-senso e outros valores sem nenhuma transcendência, irrisórios ou puramente simbólicos.Há quem sustente que, no dano moral, deve levar-se em conta a condição social e eco-nômica do ofendido. Porém, isso nos leva, em princípio, a subestimar o dano moral dos pobres. Nesse sentido, estamos de acordo com a opinião de que não vale mais a dor dos ricos que a dos pobres, e resulta imoral medir a dor em função do dano patrimonial que se possa ter sofrido. Deve-se, contudo, considerar a personalidade do agente, as circunstâncias condicionantes do delito e a gravidade da falta cometida, atendendo a índole do fato, se culposo ou doloso, o tipo de antijuridicidade, etc. A gravidade da falta para os fins ressarcitórios se mede pelo resultado danoso.Como contribuição para um entendimento abrangente do dano moral, oferecemos a seguinte definição:‘Chama-se dano moral qualquer ato não patrimonial que faça repercutir na esfera da pessoa física ou jurídica consequências que afetem sua situação social, comunitária, econômica ou familiar, causando danos avaliáveis segundo o grau e extensão de seus efeitos.’” (Novo Código Civil – Dano moral. Juris SÍNTESE, n. 52, mar./abr. 2005)

deFesa do consuMidor – prograMa luz da terra – rede de eletriFicação

rural – prescrição – terMo inicial35331 – “Direito do consumidor. Programa Luz da Terra. Rede de eletrificação rural. Prescrição. Termo inicial. Revisão do contexto fático-probatório. Súmula nº 7/STJ. Au-sência de prequestionamento. Súmula nº 211/STJ. 1. O STJ entende que ‘é do momento em que a concessionária incorpora ao seu patrimônio a rede elétrica do recorrido que, em tese, se tem configurado o enriquecimento ilícito, com aumento do ativo da recorrente e diminuição do passivo do recorrido, devendo ser este, portanto, o marco inicial do prazo prescricional’ (REsp 1.418.194/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., DJe 27.11.2015). 2. Afastar as conclusões assentadas no acórdão impugnado de que não há como reconhe-cer a incidência da prescrição ao caso em análise, uma vez que ‘não há mínima notícia

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nos autos a respeito da data em que ocorreu a efetiva incorporação da rede pela conces-sionária’ (fl. 94, e-STJ), demanda revolvimento das provas constantes dos autos, o que é defeso na via eleita, conforme a Súmula nº 7/STJ: ‘A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial’. 3. A divergência jurisprudencial, com fundamento na alínea c do permissivo constitucional, fica prejudicada em razão do óbice da Súmula nº 7/STJ, porquanto não é possível encontrar similitude fática entre o acórdão combatido e os arestos paradigmas, uma vez que as suas conclusões díspares ocorreram não em vir-tude de entendimentos diversos sobre uma mesma questão legal, mas, sim, em razão de fundamentações baseadas em fatos, provas e circunstâncias específicas de cada processo. 4. Quanto à suposta ofensa ao art. 515 do CPC/1973, a jurisprudência do STJ entende que ‘a prescrição decretada no juízo singular, uma vez afastada, permite ao tribunal ad quem julgar as demais questões suscitadas no recurso, ainda que não tenham sido analisadas diretamente pela sentença e desde que a causa encontre-se suficientemente “madura”’ (REsp 1.113.408/SC, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª T., Julgado em 28.09.2010, DJe 08.10.2010). 5. O Tribunal a quo não emitiu juízo de valor sobre as questões jurídicas levantadas em torno dos arts. 138 e 143 do Decreto nº 41.019/1957, com a alteração do Decreto nº 98.335/1989; e 39 do Código de Defesa do Consumidor. O Superior Tribunal de Justiça entende ser inviável o conhecimento do Recurso Especial quando os artigos tidos por violados não foram apreciados pelo Tribunal a quo, a despeito da oposição de Embargos de Declaração, haja vista a ausência do requisito do prequestionamento. Incide, na espécie, a Súmula nº 211/STJ. 6. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.” (STJ – REsp 1.698.261 – (2017/0234752-5) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 19.12.2017 – p. 2998)

desapropriação – interesse social – reForMa agrÁria –

declaração de nulidade35332 – “Processual civil e administrativo. Declaração de nulidade da desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária. Ofensa ao art. 535 do CPC/1973 caracteri-zada em parte. 1. Trata-se na origem de ação declaratória de nulidade dos atos praticados visando à desapropriação para fins de reforma agrária da Fazenda Sapituva, localizada no Município de Itapetininga/SP, com área total de 503,80 ha, inscrito no Sistema Nacional de Cadastro Rural sob o nº 6360610244490. 2. Em primeiro grau o pedido foi julgado pro-cedente, sendo tal decisão mantida pelo Tribunal de origem. 3. Há omissão apenas quanto à análise da alegada ilegitimidade ativa do Espólio de Clovis Scripilliti e Siderúrgica Barra Mansa S/A por não serem titulares de direito real sobre imóvel rural afetado pela desa-propriação. 4. Apesar de tal matéria de ordem pública ter sido rechaçada em primeiro grau, o pedido de seu exame foi feito pelo recorrente nos Embargos de Declaração opostos contra o aresto proferido pelo Tribunal de origem. Contudo, a Corte local não enfrentou a matéria no julgamento da apelação e da remessa oficial, que devolvera amplamente todos os temas em que sucumbente a Fazenda Pública. 5. Recurso Especial parcialmente

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provido para anular o aresto proferido nos Embargos de Declaração e determinar o retor-no dos autos ao Tribunal de origem para que profira novo julgamento e aborde a matéria omitida.” (STJ – REsp 1.657.911 – (2016/0337582-5) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 19.12.2017 – p. 2225)

despeJo – lei do inquilinato nº 8.245/1991 – BenFeitorias

necessÁrias e úteis – indenização – coMpensação – descaBiMento

35333 – “Direito civil e processual civil. Apelação cível. Ação de despejo. Lei do Inqui-linato nº 8.245/1991. Preliminares de cerceamento de defesa e ilegitimidade ativa. Não configuração. Benfeitorias necessárias e úteis. Indenização. Compensação. Descabimento. Renúncia expressa. Cláusula contratual. Súmula nº 335, STJ. Aplicação de juros e multa estabelecida no contrato de locação. Cabimento. Recurso conhecido e improvido. Sentença mantida. 1. Trata-se de apelação cível interposta por Caetano Mendes de Sousa, adversan-do sentença que julgou procedente o pleito inicial, confirmando a antecipação de tutela anteriormente concedida que determinou o despejo do réu, declarando rescindido o con-trato de locação celebrado entre as partes, condenando o promovido ao pagamento dos alugueres em atraso, até o dia da efetiva devolução do imóvel locado, com juros e corre-ções, além do pagamento de custas e honorários advocatícios no percentual de 20% (vinte por cento) sobre o montante da condenação. 2. Antes de perquirir o mérito necessário se faz analisar as preliminares levantadas pelo apelante, quais sejam, nulidade da sentença por cerceamento de defesa e ilegitimidade ativa. 3. A primeira prejudicial diz respeito a anulação da sentença por cerceamento de defesa, em face do julgamento antecipado da lide, posto que não lhe foi oportunizado arrolar testemunhas para comprovar a veraci-dade dos fatos articulados na peça inicial. 4. Mister se faz ressaltar, que o magistrado é o destinatário das provas e a ele cabe aferir sobre a conveniência ou não da realização da dilação probatória, e se entender que as provas trazidas à colação são suficientes para o julgamento da lide, poderá dispensá-la, cujo comportamento não caracteriza cerceamento de defesa como arguiu o apelante. 5. Assim, não há cerceamento de defesa no julgamento antecipado da lide quando as questões versadas nos autos, sejam elas de direito ou de fato, não necessitam de dilação probatória, posto já existentes nos autos todos os elementos necessários à formação do convencimento do julgador, como indicado nos fólios. Rejeito a prejudicial requestada por falta de amparo legal. 6. Quanto à preliminar de ilegitimidade ativa, a recorrente aduz que o imóvel em questão é de propriedade da Sra. Francisca Lino Bezerra, atualmente falecida e, na sentença de piso o magistrado alegou que inexiste ra-zão para o reconhecimento da alegada prejudicial, vez que a documentação apresentada pelo promovente/apelado comprova que o imóvel fora adquirido pelo Sr. Francisco das Chagas Ribeiro Ponte. 7. Destarte, segundo a apelante, ainda existe razão para a configu-ração da ilegitimidade, vez que a ação fora intentada pela pessoa jurídica F. C. Ribeiro Ponte e não pela pessoa física Francisco das Chagas Ribeiro Ponte. 8. É de notório conheci-

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mento que a locação se enquadra no direito obrigacional, inexistindo, portanto, necessida-de de que o locador seja o proprietário do imóvel, objeto do contrato. Assim, no contrato de locação firmado pelas partes, vislumbra-se claramente que quem figura como locador do imóvel é a pessoa jurídica F. C. Ribeiro Ponte, legítima detentora do direito de propor a presente ação de despejo, conforme disposto na própria Lei do Inquilinato. Desta feita, deixo de acolher a suscitada preliminar por falta de amparo legal. 9. No mérito, o recor-rente pugna pela reforma da sentença vergastada, para que seja julgada improcedente a ação, condenando a parte requerida ao pagamento a título de reparação de danos, pelas benfeitorias realizadas no imóvel, asseverando que, muito embora exista no contrato de locação cláusula que impossibilita à retenção do imóvel por realização de benfeitorias, esta só permaneceu ali por se tratar de um modelo de outro contrato, não tendo sido este o seu interesse. 10. No caso sub judice, existe disposição contratual, estipulada na cláusula primeira do contrato de locação (fls. 10/12), de que ‘toda e qualquer benfeitoria autoriza-da pelo locador, ainda que útil ou necessária, ficará automaticamente incorporada ao imó-vel’. 11. Observa-se, pois, a existência de uma vedação contratual para retenção do imóvel, por parte do locador, no caso de realização de benfeitorias não indenizadas, vedação esta autorizada por lei e sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça, vejamos: Súmula nº 335: ‘nos contratos de locação, é válida a cláusula de renúncia à indenização das benfeitorias e ao direito de retenção’. 12. No tocante à multa, juros e correção monetária, é imperioso ressaltar que o apelante alega que a aplicação de multa, juros e correção monetária é in-devida, vez que fora utilizado apenas o contrato de fls. 10/12, único que prevê essa apli-cação, posto que os anteriores não regem a referida cláusula. Ocorre que, o contrato em questão é o que está em vigência, estando plenamente válido por não infringir nenhuma regra quanto a sua forma, devendo, desta feita, ser fielmente cumprindo como pactuado entre as partes. 13. Apelação cível conhecida e improvida. Sentença mantida.” (TJCE – Ap 0037973-48.2011.8.06.0167 – Relª Helena Lúcia Soares – DJe 09.01.2018 – p. 22)

eXecução – cÉdula de crÉdito BancÁrio garantida por

aval eM nota proMissória – instruMento passível de

circulação Mediante endosso35334 – “Apelação. Ação de execução. Cédula de crédito bancário garantida por aval em nota promissória. Instrumento passível de circulação mediante endosso em preto. Ne-cessidade de apresentação do título original. Honorários. Fixação em âmbito recursal. Possibilidade. Cláusula de barreira. I – A cédula de crédito bancário é título executivo extrajudicial e representa dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, conforme estabe-lece o caput do art. 28 da Lei nº 10.931/2004, podendo, inclusive, ser transferida mediante endosso, nos termos do § 1º do art. 29 da mesma norma. II – A juntada do original do documento representativo de crédito líquido, certo e exigível, consubstanciado em título de crédito com força executiva, é a regra, sendo requisito indispensável não só para a

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execução propriamente dita, mas, também, para todas as demandas nas quais a preten-são esteja amparada na referida cártula. III – A dispensa da juntada do original do título somente ocorre quando há motivo plausível e justificado para tal, o que não se verifica no caso. Precedentes do STJ. IV – Embora devidamente intimado para anexar ao caderno processual o título original, o autor colacionou apenas cópia autenticada do contrato de empréstimo, motivo pelo qual a magistrada, acertadamente, indeferiu a petição inicial. V – Considerando o desprovimento deste recurso e levando em conta que o réu, citado, ofertou contrarrazões, revela-se cabível a fixação de honorários recursais. Não obstante a jurisprudência dos Tribunais Superiores caminhar no sentido do não cabimento de hono-rários recursais quando não há fixação de honorários na primeira instância, deve-se com-patibilizar tais julgados com o entendimento, também dos Tribunais Superiores, de que os honorários recursais têm natureza de cláusula de barreira e visam a evitar a interposição reiterada de recursos, devendo, destarte, serem fixados na hipótese de não provimento do recurso. Recurso conhecido e desprovido.” (TJGO – AC 201591725810 – 4ª C.Cív. – Relª Desª Nelma Branco Ferreira Perilo – DJe 09.01.2018 – p. 103)

HonorÁrios de advogado sucuMBenciais – agravo eM recurso

especial – não conHeciMento

35335 – “Processual civil. Revisão de honorários advocatícios sucumbenciais. Não co-nhecimento do agravo em recurso especial que não ataca os fundamentos da decisão recorrida. Agravo interno improvido. Não demonstração da alegada divergência juris-prudencial. Embargos de divergência liminarmente indeferidos. I – Embargos de diver-gência liminarmente indeferidos diante da ausência de comprovação da alegada diver-gência jurisprudencial nos termos do art. 1.043, § 4º, do CPC/2015, c/c o art. 266, § 4º, do RISTJ. II – Conforme preveem os citados dispositivos legais, a parte deve fazer prova da divergência jurisprudencial por meio de certidão, cópia ou citação de repositório oficial ou credenciado de jurisprudência, inclusive em mídia eletrônica, em que foi publicado o acórdão divergente, ou com a reprodução de julgado disponível na rede mundial de computadores, indicando a respectiva fonte, e mencionando as circunstâncias que iden-tificam ou assemelham os casos confrontados. III – No caso dos autos, a parte agravante se limitou a alegar, na petição de embargos de divergência, que houve violação do art. 85, § 3º, inciso I, do CPC/2015, descumprindo todos os requisitos legais para sua interposição. IV – O mero inconformismo com a decisão agravada não enseja a necessária imposição da multa, prevista no § 4º do art. 1.021 do Código de Processo Civil de 2015, quando não configurada a manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso, por decisão unâ-nime do colegiado. V – Agravo interno improvido.” (STJ – AgInt-ED-Ag-REsp 1.032.119 – (2016/0328024-3) – 1ª S. – Rel. Min. Francisco Falcão – DJe 19.12.2017 – p. 1555)

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Juros de Mora – data da conta de liquidação e da eXpedição da

requisição de pequeno valor ou do precatório – repercussão geral

35336 – “Cabimento de juros de mora no período compreendido entre a data da conta de liquidação e da expedição da requisição de pequeno valor ou do precatório. Repercus-são geral. RE 579.431/RS. Juízo de retratação. Art. 1.030, II, do CPC/2015. 1. Trata-se de encaminhamento do Vice-Presidente do STJ para fins do juízo de retratação previsto no art. 1.030, II, do CPC, tendo em vista o julgamento do RE 579.431/RS do STF. 2. Depreen-de-se dos autos que o Tribunal de origem, de modo fundamentado, tratou das questões suscitadas, resolvendo de modo integral a controvérsia posta. Na linha da jurisprudência desta Corte, não há falar em negativa de prestação jurisdicional nem em vício quando o acórdão impugnado aplica tese jurídica devidamente fundamentada, promovendo a integral solução da controvérsia, ainda que de forma contrária aos interesses da parte. Assim, não havendo no acórdão recorrido omissão, obscuridade ou contradição, não fica caracterizada ofensa ao art. 535 do CPC/1973. 3. É certo que a orientação do STJ estava pacificada no sentido de que não incidem juros de mora, em execução contra a Fazenda Pública, no período compreendido entre a data da conta de liquidação e da expedição do requisitório, desde que observado o prazo constitucional para pagamento. 4. Sem embar-go, o Supremo Tribunal Federal, nos autos do RE 579.431/SC (Rel. Min. Marco Aurélio), reconheceu a existência de repercussão geral em relação ao tema, concluindo o julgamento do Recurso Extraordinário em 19 de abril de 2017. 5. Em suma, entendeu o Supremo Tri-bunal Federal que incidem juros da mora no período compreendido entre a data da reali-zação dos cálculos e a da requisição ou do precatório. Considerando que a mesma orienta-ção foi adotada pelo Tribunal de origem, não se justifica a reforma do acórdão recorrido. 6. Recurso Especial não provido em juízo de retratação (art. 1.030, II, do CPC/2015).” (STJ – REsp 1.491.564 – (2014/0276192-9) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 19.12.2017 – p. 2082)

Juros de Mora – incidÊncia no período coMpreendido entre a

data da elaBoração dos cÁlculos e a eXpedição da rpv ou do

precatório – Juízo de retratação35337 – “Embargos de declaração. Ofensa ao art. 1.022 do CPC não configurada. Intuito de rediscutir o mérito do julgado. Inviabilidade. Processual civil. Juros de mora. Incidên-cia no período compreendido entre a data da elaboração dos cálculos e a expedição da RPV ou do precatório. Juízo de retratação. Art. 1.030, II, do CPC/2015. 1. ‘A jurisprudência do STJ firmou entendimento no sentido de ser desnecessário aguardar o trânsito em julga-do para a aplicação do paradigma firmado em sede de Recurso Repetitivo ou de Repercus-

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são Geral’ (AgRg-EDcl-AREsp 706.557/RN, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., Julgado em 06.10.2015, DJe 13.10.2015). 2. Conforme consignado na decisão embargada, o Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 579.431, com repercussão geral reco-nhecida, realizado na sessão de 19.04.2017 (Rel. Min. Luiz Fux, DJe 30.06.2017), enfrentou a questão jurídica trazida no presente feito, firmando tese contrária à fixada pela Corte Especial do STJ, no julgamento do REsp 1.143.677/RS, sob o rito do art. 543-C do CPC. 3. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 1.022 do CPC. Os Embargos Declaratórios não constituem instrumento adequa-do para a rediscussão da matéria de mérito, nem ao prequestionamento de dispositivos constitucionais com vistas à interposição de Recurso Extraordinário. 4. Não há lacuna na apreciação do decisum embargado. As alegações do embargante não têm o intuito de solucionar omissão, contradição ou obscuridade, mas denotam a vontade de rediscu-tir o julgado. 5. Embargos de Declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-AgRg-REsp 1.573.171 – (2015/0311278-0) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 19.12.2017 – p. 2113)

Medida cautelar – JulgaMento da ação principal – perda de oBJeto

35338 – “Medida cautelar. Julgamento da ação principal. Perda de objeto do recurso. 1. Recurso de apelação contra sentença proferida em medida cautelar antecipatória. 2. Em consulta à Ação Principal nº 0026586-90.2009.4.02.5101, observa-se a que já se encontra sentenciada. Conforme reiterada jurisprudência do STJ, a ação cautelar perde o objeto após o julgamento da ação principal, considerando a relação acessória existente entre am-bas. Perda de objeto da presente ação cautelar e do respectivo recurso de apelação (STJ, Corte Especial, AGRMS 20494, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 22.04.2014; STJ, 1ª T., AIREsp 1246939, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 06.02.2017). 3. Recurso de apelação prejudicado.” (TRF 2ª R. – AC 0490249-45.2009.4.02.5101 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Ricardo Perlingeiro – DJe 12.01.2018 – p. 239)

penHora – aceitação pela Fazenda – pedido de suBstituição posterior

– penHora on line – ausÊncia de JustiFicativa – suBstituição indevida

35339 – “Agravo de instrumento. Execução fiscal. Penhora de bens. Aceitação pela Fa-zenda. Pedido de substituição posterior. Penhora on line. Ausência de justificativa. Subs-tituição Indevida. Recurso provido. O pedido de substituição de bens objeto de penhora e depósito deve vir acompanhado de justificativa, nos moldes previstos no art. 848 do NCPC/2015. Recurso provido. V.V. Ementa. Agravo de instrumento. Execução fiscal. Pe-nhora de bens móveis. Substituição por penhora on line. Medida já deferida anteriormente, sem insurgência da devedora em tempo e modo. Manutenção do contexto fático. Decisão que autoriza novamente a substituição. Alegação de ausência de justificativa. Preclusão.

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1. Em sede de execução, se, em momento anterior, sob idênticas condições – penhora de bens móveis já aceita pelo credor e pendente de alienação por iniciativa particular –, a substituição por penhora de dinheiro já fora admitida, independentemente da apresenta-ção de justificativa, é de se ter por preclusa a oportunidade do credor de se insurgir contra a decisão que defere novamente a penhora on line, face à frustração da primeira medida, ante a inexistência de saldo. 2. Recurso desprovido (Desª Áurea Brasil).” (TJMG – AI-Cv 1.0024.13.295176-5/001 – 5ª C.Cív. – Rel. Luís Carlos Gambogi – DJe 10.01.2018)

penHora on line – sisteMa BacenJud – conta corrente conJunta – ausÊncia de solidariedade

eM relação a terceiros35340 – “Apelação cível. Embargos de terceiro. Penhora on line. Sistema BacenJud. Conta corrente conjunta. Ausência de solidariedade em relação a terceiros. Precedente do STJ. Comprovação de titularidade integral do valor constrito. Desbloqueio. Procedência do pedido inicial. Sentença reformada. ‘Na conta corrente conjunta solidária, existe solidarie-dade ativa e passiva entre os correntistas apenas em relação à instituição financeira man-tenedora da conta corrente, de forma que os atos praticados por qualquer dos titulares não afeta os demais correntistas em suas relações com terceiros’. ‘Aos titulares da conta corrente conjunta é permitida a comprovação dos valores que integram o patrimônio de cada um, sendo certo que, na ausência de provas nesse sentido, presume-se a divisão do saldo em partes iguais’ (REsp 1510310/RS).” (TJMG – AC 1.0000.17.037525-7/001 – 5ª C.Cív. – Rel. Carlos Levenhagen – DJe 09.01.2018)

nota:Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença proferida que acolheu, par-cialmente, os embargos de terceiros, “apenas para determinar o desbloqueio de cin-quenta por cento dos valores bloqueados na conta corrente de titularidade conjunta do embargante com o seu filho, executado nos autos da ação de execução fiscal”. Em suas razões recursais, o Estado de Minas Gerais pugna pela reforma da sentença, aduzindo, em apertada síntese, que, “no caso de conta conjunta, cada um dos corren-tistas é credor de todo o saldo depositado, de forma solidária. O valor depositado pode ser penhorado em garantia da execução, ainda que somente um dos correntistas seja responsável pelo pagamento do tributo. Se o valor supostamente pertence somente a um dos correntistas – estranho à execução fiscal – não deveria estar nesse tipo de conta, pois nela a importância perde o caráter de exclusividade”.Adesivamente, houve outro recurso onde se alegou que os valores bloqueados perten-ciam ao recorrente com exclusividade e são provenientes da venda de veículo, de sua propriedade. Sustentou que a solidariedade ativa e passiva dos créditos e débitos, na conta corrente conjunta, só existe em relação à instituição financeira; destacando que os atos praticados por qualquer dos titulares não pode afetar o outro no que tange às re-lações obrigacionais com terceiros. Afirmou ter restado sobejamente comprovado que o saldo indevidamente constrito tem origem na venda de veículo que lhe pertencia ex-clusivamente, sendo imperativa a ordem de desbloqueio de todo o valor e não apenas

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de 50% (cinquenta por cento), conforme determinado pelo juízo primevo. Requereu, ao final, a majoração do percentual fixado a titulo de honorários advocatícios, para 20% (vinte por cento) do valor do débito.O TJMG negou provimento ao apelo interposto pelo Estado de Minas Gerais e deu provimento ao apelo adesivo, interposto por José Xavier Gomes Filho, para reformar a d. sentença recorrida e julgar procedentes os embargos de terceiros, determinando o desbloqueio integral do valor bloqueado.Em razão da sucumbência, condenou o embargado no pagamento de honorários advo-catícios, que fixo em 12% do valor da causa, já considerado neste percentual a majora-ção pelo trabalho em grau recursal a que refere o art. 85, § 11, do CPC.Em trabalho desenvolvido sobre a penhora on line, os ilustres Juristas Fernando Cabeças Barbosa e Carlos Augusto Pagani assim esclarecem:“No trânsito das informações entre a justiça, o Banco Central e as instituições finan-ceiras, é garantida a máxima segurança, com utilização de sofisticada tecnologia de criptografia de dados.Segundo informações do próprio Banco Central, o Sistema BacenJud não impacta a quebra de sigilo bancário das pessoas físicas e jurídicas, eis que já é permitido aos juí-zes, por força de lei, determinar o bloqueio de ativos financeiros e obter de entidades públicas ou privadas as informações necessárias para instrução de processos, respeita-das as regras constitucionais e processuais vigentes.[...]Com o Sistema BacenJud, não há necessidade do envio do documento em papel, nem envolvimento do Bacen no processo, pois o próprio juiz, repita-se, preenche o docu-mento eletrônico via Internet, contendo todas as informações inscritas no ofício comum. Esses dados são transmitidos, com segurança, diretamente aos bancos, que cumprem as ordens e retornam as informações aos juízes.Ante essas considerações, exsurge clara a conclusão de que o sistema apenas permite que um ofício encaminhado em papel seja agora realizado via Internet, racionalizan-do os serviços no âmbito do Banco Central e possibilitando ao Poder Judiciário mais agilidade no cumprimento de suas ordens no âmbito do Sistema Financeiro Nacional.[...]Dessa forma, com absoluta certeza e sem medo de errar, conseguir-se-á diminuir a an-gústia da trilogia cidadão, advogado e juiz, na medida em que se buscará rápida solu-ção do litígio, traduzindo-se em maior confiança e esperança para o cidadão, desafogo para os juízes e serenidade para os advogados.” (A necessidade da utilização da penho-ra on line no juízo cível. Repertório de Jurisprudência IOB, 3/20756, nº 20/2003, p. 537, 2ª quinz. out. 2003)

posse – ação de Manutenção – danos Morais e Materiais – conversão eM indenização

por desapropriação indireta – possiBilidade – prescrição aFastada

35341 – “Apelação cível. Ação de manutenção de posse c/c indenização por danos mo-rais e materiais. Conversão em indenização por desapropriação indireta. Possibilidade.

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Prescrição afastada. Dano moral. Não comprovado. Correção monetária pelo INPC. Alte-ração de ofício. Juros Compensatórios. Incidência da Súmula nº 618 do STF. Juros mora-tórios de 6% (seis por cento) ao ano, devidos conforme o art. 100 da Constituição Federal. Não cumulativos. Precedentes jurisprudenciais. Prequestionamento. Impossibilidade. 1. Tendo a desapropriação indireta sido reconhecida pelo Município Apelante em sede de contestação, bem como oportunizada às partes se manifestarem sobre o assunto, é per-mitida, em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, a conversão da possessória em indenização por desapropriação indireta, cujo valor será aquele apurado em laudo pericial constante dos autos. Precedente do Superior Tribunal de Justiça. 2. A prescrição, nas ações indenizatórias por desapropriação indireta, era vintenária, conforme o verbete da Súmula nº 119 do Superior Tribunal de Justiça. Contudo, com a entrada em vigor do Código Civil de 2002, em 11.01.2003, tal prazo foi reduzido para quinze anos, ou seja, o mesmo da ação de usucapião extraordinário (art. 1.238, caput, do referido diploma legal). 3. Relativamente às alegações da Autora/Apelada acerca do constrangimento sofri-do, nada há de elementos para comprová-los, não sendo o dano moral, no caso, decorrên-cia lógica da desapropriação indireta, sendo a reforma da sentença, quanto a este tópico, medida imperativa. 4. A correção monetária, sobre o quantum devido à Autora, a título de indenização por desapropriação, terá como termo inicial a data da avaliação do imóvel em discussão (maio de 2015, fl. 154) e será calculada de acordo com o índice que melhor reflete a inflação, o INPC, razão pela qual a sentença deve ser modificada, de ofício, neste aspecto. 5. De acordo com a jurisprudência assentada no Superior Tribunal de Justiça, os juros compensatórios são calculados a partir da efetiva ocupação do imóvel (Súmula nº 69 do STJ), devendo ser fixados em 6% (seis por cento) ao ano, a começar da data da edição da Medida Provisória nº 1.577/1997, que se deu em 11.06.1997, até 13.09.2001 e, nos demais períodos, a taxa dos juros compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano, conforme prevê a Súmula 618 do Supremo Tribunal Federal. 6. Os juros moratórios, na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, ex vi do art. 15-B do Decreto-Lei nº 3.365/1941, apenas serão devidos a partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do artigo 100 da Constituição Federal (Súmula Vinculante nº 17 do STF). 7. Os juros compensatórios e os juros moratórios não são devidos concomitantemen-te, visto que estes últimos somente ocorrem em razão do inadimplemento do devedor e, portanto, não são cumuláveis. 8. Referente ao prequestionamento, dentre as funções do Poder Judiciário não se encontra a de órgão consultivo. Recurso de apelação cível conhe-cido e parcialmente provido.” (TJGO – AC 201691620980 – 5ª C.Cív. – Rel. Des. Francisco Vildon Jose Valente – DJe 15.01.2018 – p. 52)

prescrição intercorrente – eXecução de sentença – suspensão eM razão

da inÉrcia do eXequente eM dar regular andaMento ao Feito

35342 – “Agravo de instrumento. Execução de sentença. Suspensão da execução em ra-zão da inércia do exequente em dar regular andamento ao feito. Prescrição intercorrente.

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Verificada. Súmula nº 150 do STF. Condenação do exequente ao pagamento de custas e honorários advocatícios. Prequestionamento. Recurso conhecido e provido. Ocorrido o arquivamento da execução pelo prazo prescricional previsto em lei, em razão da desídia do exequente em dar regular andamento ao feito, após a penhora de bens do executado e a realização de praças cujo resultado foi negativo, verifica-se a concretização da prescrição intercorrente, nos termos da Súmula nº 150 do Supremo Tribunal Federal.” (TJMS – AI 1411084-47.2016.8.12.0000 – 1ª C.Cív. – Relª Desª Tânia Garcia de Freitas Borges – DJe 15.01.2018 )

propriedade – reconHeciMento dos requisitos eM relação ao

FilHo da proprietÁria do iMóvel – conceito de possuidor para eFeito

de eXclusão do crÉdito triButÁrio – interpretação literal iptu – isenção

35343 – “Processual civil e tributário. IPTU. Isenção. Reconhecimento dos requisitos em relação ao filho da proprietária do imóvel. Conceito de possuidor para efeito de exclusão do crédito tributário. Interpretação literal. Violação do art. 111, II, do CTN configurada. 1. A controvérsia em deslinde versa sobre isenção de IPTU reconhecida judicialmente em função das condições pessoais do filho da proprietária do imóvel objeto da tributação. 2. Entendeu o Tribunal de origem que o CTN atribui ao titular do domínio útil, bem como ao possuidor a qualquer título do imóvel, a condição de contribuinte do IPTU. Sendo assim, a isenção prevista na lei municipal deve alcançar o filho portador de deficiência física da titular da propriedade imobiliária. 3. O recorrente argui violação ao art. 111, II, do CTN, pois deve ser interpretada literalmente a legislação que disponha sobre exclusão do crédito tributário. 4. Assiste razão ao recorrente. O possuidor de que trata o art. 34 do CTN é aquele que exerce por direito real algum dos poderes inerentes à propriedade (art. 1.196 do CC/2002). Não se confunde com a figura do detentor, muito menos com a do filho dependente da verdadeira titular do direito de usar, gozar e dispor da coisa imóvel. 5. A interpretação conferida à disciplina estabelecida no CTN destoa da jurisprudência do STJ. 6. Prescindível para julgamento do apelo nobre adentrar o texto da legislação local. Basta aferir a compatibilidade da decisão a quo com a legislação federal utilizada como fundamento do aresto recorrido. 7. Recurso Especial provido.” (STJ – REsp 1.701.597 – (2017/0213953-3) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 19.12.2017 – p. 3143)

registro civil – alteração do noMe – transeXualidade –

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possiBilidade – eXposição a situações veXatórias e HuMilHantes

35344 – “Apelação cível. Alteração de registro civil. Transexualidade. Alteração do nome. Possibilidade. Exposição a situações vexatórias e humilhantes. Inexistência no or-denamento jurídico de previsão que torne o pedido inviável. Princípios da dignidade da pessoa humana e da inviolabilidade da intimidade. Sentença mantida. O reconhecimento judicial do direito dos transexuais à alteração de seu prenome, conforme o sentimento que eles tenham de si mesmos, ainda que não submetido à cirurgia de transgenitalização, é medida que se revela em consonância com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Se não existe no ordenamento jurídico qualquer vedação à alteração de registro de pessoa transexual, deve-se ressaltar os princípios e valores que a Constituição da República sobreleva. O princípio da dignidade da pessoa humana, enquanto princípio fundamental da República Federativa do Brasil constitui diretriz que deve nortear a alte-ração de registro civil de transexual. Justifica-se a alteração pretendida ante as particula-ridades do caso, em que o nome de registro masculino está dissonante com a identidade social, o que leva a parte a situações vexatórias ou embaraçosas. Recurso não provido.” (TJMG – AC 1.0000.17.043099-5/001 – 5ª C.Cív. – Rel. Carlos Levenhagen – DJe 09.01.2018)

sFH – Fcvs – quitação do saldo devedor – carteira HipotecÁria e iMoBiliÁria

35345 – “Administrativo. CEF. Sistema Financeiro de Habitação – FCVS. Quitação do saldo devedor. Carteira hipotecária e imobiliária do clube naval. Honorários advocatícios. 1. Cuida-se de apelação interposta pela Caixa Econômica Federal, que se insurge à sua condenação para dar a quitação do saldo devedor do contrato de mútuo com recursos do Fundo de Compensação das Variações Salariais – FCVS, bem como requer a redução dos honorários advocatícios. 2. O FCVS é uma espécie de seguro que visa cobrir eventual saldo devedor existente após a extinção do contrato, consistente em resíduo do valor con-tratual causado pelo fenômeno inflacionário. A liquidação antecipada do saldo devedor com cobertura do FCVS está condicionada à satisfação dos requisitos expressamente pre-vistos no art. 2º, § 3º, da Lei nº 10.150/2000, quais sejam, previsão de cobertura do Fundo, devido recolhimento da contribuição ao FCVS e celebração do contrato até 31.12.1987. As-sim, o direito dos apelados em obter a quitação do contrato e o cancelamento da hipoteca é respaldado pela cobertura do Fundo de Compensação de Variações Salariais – FCVS. 3. As questões operacionais administrativas que envolvem o procedimento de habilitação do fundo são previstas na legislação de responsabilidade da CEF e do Clube Naval, ine-xistindo inexequibilidade da sentença. 4. Verifica-se que não foi determinado na sentença o pagamento em espécie, mas a sua quitação. Correta a sentença que julgou o pedido procedente, para condenar a CEF a promover a habilitação e quitação do saldo residual do contrato de financiamento relativo ao imóvel matriculado sob o nº 131.787, junto ao 9º Ofício do RGI, com a utilização de recursos do FCVS. 5. No que tange aos honorários

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advocatícios, a CEF deu causa ao ajuizamento da demanda, pois negou a cobertura resi-dual do contrato de financiamento, sob a alegação de que os mutuários possuíam mais de um imóvel. Verifica-se que os apelados foram obrigados a vir a juízo para obter a docu-mentação em dispendioso e longo processo, devendo a sucumbência significar algo que leve a CEF a mudar de conduta. Assim, correta a condenação fixada em 10% do valor da causa (R$ 381.521,49 – fls. 10 da inicial), nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. 6. Apelação improvida.” (TRF 2ª R. – AC 0156038-46.2015.4.02.5101 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Alcides Martins – DJe 15.01.2018 – p. 144)

sFH – necessidade de depósito Judicial de valores incontroversos

35346 – “Agravo de instrumento. Direito civil. Sistema financeiro de habitação. Necessi-dade de depósito judicial de valores incontroversos. Recurso não provido. 1. Agravo de instrumento interposto em face de decisão que, nos autos de ação ordinária objetivando, a título de tutela de urgência, a manutenção na posse do imóvel, indeferiu o pedido por ausência de probabilidade do direito invocado. 2. A diretriz traçada no art. 50, da Lei nº 10.931/2004 dispôs que a parte demandante deve efetuar o depósito, em juízo, do valor controvertido das prestações, repassando diretamente à credora os valores incontrover-sos, apenas com a finalidade de suspender os efeitos da inadimplência, nas ações em que se discutem cláusulas de financiamento habitacional. Precedentes: TRF 2ª R., 5ª T.Esp., Ag 00066863020114020000, e-DJF2R 02.08.2017; TRF 2ª R., 5ª T.Esp., Rel. Des. Fed. Aluisio Gonçalves de Castro Nunes, e-DJF2R 28.08.2013. 3. Não comprovado, nos autos, o depó-sito da parcela controvertida. 4. Agravo de instrumento não provido.” (TRF 2ª R. – AI 0012141-63.2017.4.02.0000 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Ricardo Perlingeiro – DJe 12.01.2018 – p. 206)

título eXecutivo Judicial – coisa Julgada – coMpleMentação de

aposentadoria – prescrição não reconHecida

35347 – “Apelação. Título executivo judicial. Coisa julgada. Complementação de apo-sentadoria. RFFSA. Prescrição não reconhecida. Honorários. CPC/2015. 1. Recurso de apelação contra sentença que julgou procedentes os embargos à execução, reconhecendo excesso de execução em relação aos herdeiros de Guaracy Barbosa Lima, e a extinção da execução quantos aos herdeiros de Antonio Zeferino do Carmo. O título executivo (Pro-cesso nº 057962392.1900.4.02.51010 refere-se à condenação da União Federal e do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS ao pagamento de complementação de aposentadoria a empregados da Rede Ferroviária Federal S/A – RFFSA. 2. O Superior Tribunal de Justiça

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tem o entendimento firme no sentido de que a execução do título executivo deve ser ads-trita ao comando da decisão transitada em julgado, não sendo cabível, em embargos à exe-cução, a discussão acerca de possíveis vícios imateriais que poderiam ter sido alegados no processo de conhecimento, sob pena de violação do princípio da coisa julgada (STJ, 2ª T., AgRg-REsp 1435.543PR, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 15.05.2014). Portanto, afigura--se inviável a alteração, na fase de execução, do que já se encontra imutável pelo trânsito em julgado, sob pena de ofensa à garantia constitucional da coisa julgada. 3. A pretensão deferida aos ora exequentes estava limitada à complementação de aposentadoria, não ha-vendo qualquer menção a aumentos futuros deferidos à categoria a qual se encontravam quando aposentados. Constatada a quitação do débito de complementação de aposenta-doria em relação aos exequentes herdeiros de Antonio Zeferino do Carmo, deve ser extin-ta a execução quanto a esses demandantes. Por outro lado, reconhece-se que, realmente, a ação originária foi ajuizada em 1983, de sorte que os valores retroativos a serem pagos aos demais exequentes herdeiros de Guaracy Barbosa Lima estarão limitados ao ano de 1978, em observância à prescrição quinquenal. 4. Os exequentes dos autos principais iniciaram a execução em 24.03.1986. Pelos mais diversos motivos, expedições de ofícios à RFFSA, óbi-tos de demandante, aguardo para juntada de documentos, decisão em Conflito de Compe-tência, entre outros, fizeram com que o feito demorasse mais de 30 anos. Tais fatos devem ser relevantes para a negativa da prescrição, pois comprovado está que os exequentes não foram inertes, não podendo ser penalizados pelos acontecimentos ocorridos durante o processo de execução. Considerando a sucessão de acontecimentos que tiveram o condão de interromper/suspender o prazo prescricional, não há que se reconhecer a prescrição da pretensão executória. 5. Reforma da sentença apenas quanto à condenação em hono-rários advocatícios, para que se amolde aos termos do CPC/2015. O Superior Tribunal de Justiça propugna que, em homenagem à natureza processual material e com o escopo de preservar-se o direito adquirido, as normas sobre honorários advocatícios não são alcan-çadas por lei nova. A sentença, como ato processual que qualifica o nascedouro do direito à percepção dos honorários advocatícios, deve ser considerada o marco temporal para a aplicação das regras fixadas pelo CPC/2015 (STJ, 4ª T., REsp 1465535, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 22.08.2016). No caso em tela, a sentença foi publicada em 12.05.2017, quando já em vigor o CPC/2015, sendo aplicáveis suas disposições quanto aos honorários advocatícios. 6. Recurso de apelação dos exequentes não provido. Recurso de apelação da União Federal parcialmente provido.” (TRF 2ª R. – AC 0004427-12.2016.4.02.5101 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Ricardo Perlingeiro – DJe 12.01.2018 – p. 197)

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JurisprudênciaPenal

STFSupremo Tribunal Federal

11.12.2017 Primeira Turma

AgRg no Recurso Extraordinário nº 893.496 São Paulo

Relatora: Min. Rosa Weber

Agte.(s): Rinaldo Maziero

Adv.(a/s): Eliezer Pereira Martins e outro(a/s)

Agdo.(a/s): Ministério Público do Estado de São Paulo

Proc.(a/s)(es): Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo

EMENTA

direito penal Militar e processual penal Militar – recurso eXtraordinÁrio interposto

soB a Égide do cpc/1973 – negativa de prestação Jurisdicional – art. 93, iX, da constituição da

repúBlica – nulidade – inocorrÊncia – razões de decidir eXplicitadas pelo órgão Jurisdicional –

alegação de oFensa ao art. 5º, liv e lv, da constituição da repúBlica

– contraditório e aMpla deFesa – devido processo legal – inaFastaBilidade da

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Jurisdição – ausÊncia de repercussão geral – recurso eXtraordinÁrio que não Merece trÂnsito

– agravo ManeJado soB a vigÊncia do cpc/2015

1. Inexiste violação do art. 93, IX, da Constituição Federal. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o referido dispositivo constitucional exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões do seu convencimento, desnecessário o exa-me detalhado de cada argumento suscitado pelas partes.

2. O entendimento adotado na decisão agravada reproduz a jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal. O exame da alegada ofensa ao art. 5º, LIV e LV, da Lei Maior, observada a estreita moldura com que devolvida a matéria à apreciação desta Suprema Corte, dependeria de prévia análise da legislação infraconstitucional aplicada à espécie, bem como do revolvimento do quadro fático de-lineado na origem, o que refoge à competência jurisdicional extraor-dinária prevista no art. 102 da Magna Carta.

3. As razões do agravo interno não se mostram aptas a infir-mar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada.

4. Agravo interno conhecido e não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal em conhecer do agravo e negar-lhe provimento, nos termos do voto da Relatora e por maioria de votos, em sessão virtual da Primeira Turma de 1º a 07 de dezembro de 2017, na conformidade da ata do julgamento. Vencido o Ministro Marco Aurélio.

Brasília, 11 de dezembro de 2017.

Ministra Rosa Weber Relatora

RELATÓRIO

A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): Contra a decisão por mim proferida, pela qual negado seguimento ao recurso, maneja agravo interno Rinaldo Maziero.

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A matéria debatida, em síntese, diz com a decretação da perda do pos-to e da patente de policial militar, bem como a cassação de seus proventos, em razão da declaração de indignidade e incompatibilidade com o oficialato.

O agravante ataca a decisão impugnada, ao argumento de que a viola-ção dos preceitos da Constituição Federal se dá de forma direta, o que afasta a aplicação da Súmula nº 279/STF. Afirma a existência de repercussão geral da matéria. Insiste na tese da nulidade por negativa de prestação jurisdicio-nal. Sustenta “[...] a não aplicação do decidido no ARE 748.371-RG/MT (Tema nº 660) e no ARE 639.228-RG (Tema nº 424) e na Súmula nº 280/STF [...]” (doc. 08, fl. 10). Reitera a afronta aos arts. 5º, XXXVI, LIV e LV, 37, caput, e 93, IX, da Lei Maior. Requer o sobrestamento do recurso até a decisão final da ADI 4.882, ADPF 418 e do RE 601.146-RG (Tema nº 358).

O Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo julgou a contro-vérsia em decisão cuja ementa reproduzo:

“POLICIAL MILITAR – Representação para declaração de indignidade/incompatibilidade oferecida em razão de condenação com trânsito em jul-gado à prisão de seis anos de reclusão pela prática de homicídio. Defesa do representado pleiteando a produção de prova oral, o sobrestamento do feito no aguardo do julgamento de revisão criminal e arguindo a nulidade da representação diante da inexistência de lei regulando seu rito e as regras de prescrição. Não cabimento de instrução probatória e do sobrestamento da tramitação da representação. Rejeição das preliminares argüidas. De-cisão de mérito lastreada em condenação transitada em julgado. Conduta incompatível com o oficialato. Decretação da perda do posto e da patente. Precedente aplicação da sanção de reforma administrativa disciplinar. De-cisão unânime quanto à rejeição das preliminares e ao mérito. Divergência no que diz respeito à cassação ou não dos proventos. Maioria que se posi-ciona pela cassação dos proventos.” (Doc. 05, fl. 14)

Recurso extraordinário interposto sob a égide do CPC/1973.

Agravo manejado sob a vigência do Código de Processo Civil de 2015.

É o relatório.

VOTO

A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): Preenchidos os pressupos-tos genéricos, conheço do agravo interno e passo ao exame do mérito.

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Nada colhe o agravo.

Transcrevo o teor da decisão que desafiou o agravo:

“Vistos etc.

Contra Rinaldo Maziero foi apresentada Representação de Indignidade/Incompatibilidade junto ao Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo com objetivo de excluir o representado dos quadros da Polícia Mili-tar. A representação foi julgada procedente em acórdão cuja ementa trans-crevo:

‘POLICIAL MILITAR – Representação para declaração de indignida-de/incompatibilidade oferecida em razão de condenação com trânsito em julgado à prisão de seis anos de reclusão pela prática de homicí-dio. Defesa do representado pleiteando a produção de prova oral, o sobrestamento do feito no aguardo do julgamento de revisão criminal e arguindo a nulidade da representação diante da inexistência de lei re-gulando seu rito e as regras de prescrição. Não cabimento de instrução probatória e do sobrestamento da tramitação da representação. Rejeição das preliminares arguidas. Decisão de mérito lastreada em condenação transitada em julgado. Conduta incompatível com o oficialato. Decreta-ção da perda do posto e da patente Precedente aplicação da sanção de reforma administrativa disciplinar. Decisão unânime quanto à rejeição das preliminares e ao mérito. Divergência no que diz respeito à cassa-ção ou não dos proventos. Maioria que se posiciona pela cassação dos proventos.’

A matéria debatida, em síntese, diz com o juízo de indignidade ou incom-patibilidade com o oficialato, efetuado pela Corte a quo, para fins de decre-tação da perda do posto e da patente de militar condenado por sentença penal transitada em julgado, com a consequente cassação dos proventos a que fazia jus.

Contra o acórdão, maneja recurso extraordinário, com base no art. 102, III, da Lei Maior, Rinaldo Maziero. Aparelhado o recurso na ofensa aos arts. 5º, XXXVI, LIV, LV; 37, caput; e 93, IX, da Constituição Federal.

É o relatório.

Decido.

Preenchidos os pressupostos extrínsecos.

Nada colhe o recurso.

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Da leitura dos fundamentos do acórdão prolatado na origem, constato ex-plicitados os motivos de decidir, a afastar o vício da nulidade por negativa de prestação jurisdicional arguido. Destaco que, no âmbito técnico-proces-sual, o grau de correção do juízo de valor emitido na origem não se con-funde com vício ao primado da fundamentação, notadamente consabido que a disparidade entre o resultado do julgamento e a expectativa da parte não sugestiona lesão à norma do texto republicano. Colho precedente desta Suprema Corte na matéria, julgado segundo a sistemática da repercussão geral:

‘Questão de ordem. Agravo de Instrumento. Conversão em recurso extraordinário (CPC, art. 544, §§ 3º e 4º). 2. Alegação de ofensa aos in-cisos XXXV e LX do art. 5º e ao inciso IX do art. 93 da Constituição Federal. Inocorrência. 3. O art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da deci-são. 4. Questão de ordem acolhida para reconhecer a repercussão geral, reafirmar a jurisprudência do Tribunal, negar provimento ao recurso e autorizar a adoção dos procedimentos relacionados à repercussão geral.’ (AI 791.292-QO-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, Plenário Virtual, DJe 13.08.2010)

O exame de eventual ofensa aos preceitos constitucionais indicados nas ra-zões recursais, consagradores dos princípios do devido processo legal, do contraditório e ampla defesa e da proteção ao direito adquirido, ao ato jurí-dico perfeito e à coisa julgada, (art. 5º da Lei Maior), bem como ao princípio da legalidade (art. 37, caput), demanda, em primeiro plano, a interpretação das normas infraconstitucionais aplicáveis à espécie, de tal modo que, se afronta ocorresse, seria indireta, o que não atende à exigência do art. 102, III, a, da Lei Maior, nos termos da remansosa jurisprudência deste egrégio Supremo Tribunal Federal, verbis:

‘Recurso extraordinário representativo da controvérsia. Aplicação re-troativa de lei mais benéfica às infrações de trânsito. Exegese das nor-mas de trânsito. Interpretação realizada à luz das normas do Código Brasileiro de Trânsito revogado e do vigente. Matéria eminentemente infraconstitucional. Ausência de repercussão geral. 1. Não apresenta re-percussão geral o recurso extraordinário que discute efeitos de normas de trânsito revogadoras e revogadas. 2. É pacífica a jurisprudência da Corte no sentido de que os conceitos dos institutos do direito adquirido, do ato jurídi-co perfeito e da coisa julgada não se encontram na Constituição Federal, senão

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na legislação ordinária, mais especificamente na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. 3. Ausência de repercussão geral.’ (RE 657.871-RG, Rel. Min. Dias Toffoli, Pleno, DJe 17.11.2014)

‘PREVIDENCIÁRIO – REAJUSTE DE BENEFÍCIOS – ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA RELATIVOS AOS ANOS DE 1997, 1999, 2000, 2001, 2002 E 2003 – CONSTITUCIONALIDADE – PERCENTUAIS SUPERIORES AO ÍNDICE NACIONAL DE PREÇOS AO CONSUMI-DOR (INPC) – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA – REAFIR-MAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA – 1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 376.846, rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 02.04.2004, afastou a alegação de inconstitucionalidade das normas que fixaram os índices de correção monetária de benefícios previdenciá-rios empregados nos reajustes relativos aos anos de 1997, 1999, 2000 e 2001, que foram de um modo geral superiores ao INPC e observa-ram os comandos normativos de regência. 2. Tratando-se de situações semelhantes, os mesmos fundamentos são inteiramente aplicáveis aos índices de reajuste relativos aos anos de 2002 e 2003. 3. Incabível, em recurso extraordinário, apreciar violação ao art. 5º, XXXV e XXXVI, da Cons-tituição Federal, que pressupõe intermediário exame e aplicação das normas infraconstitucionais pertinentes (AI 796.905-AgR/PE, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª T., DJe de 21.5.2012; AI 622.814-AgR/PR, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª T., DJe de 08.03.2012; ARE 642.062-AgR/RJ, Relª Min. Ellen Gracie, 2ª T., DJe de 19.08.2011). 4. Agravo a que se conhece para, desde logo, negar seguimento ao recurso extraordinário, com o reconhecimento da reper-cussão geral do tema e a reafirmação da jurisprudência sobre a matéria.’ (ARE 808.107-RG, Rel. Min. Teori Zavascki, Pleno, DJe 01.08.2014)

‘Alegação de cerceamento do direito de defesa. Tema relativo à suposta violação aos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal. Julgamento da causa dependente de prévia análise da adequada aplicação das normas infraconstitucio-nais. Rejeição da repercussão geral.’ (ARE 748.371-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, Pleno, DJe 01.08.2013)

Ademais, não logrou a parte recorrente demonstrar, de forma efetiva, a existência de repercussão geral da controvérsia.

Observo que este Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sen-tido de que não basta a mera descrição do instituto em tela, nem a simples referência a precedente recursal. Cabe à parte recorrente a demonstração formal e fundamentada da existência de repercussão geral da matéria, in-dicando especificamente as razões que evidenciem a relevância econômica,

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social, política ou jurídica, ainda que tal repercussão já tenha sido presumi-da ou declarada em outro processo. Insuficiente a mencionada preliminar, inadmissível o recurso extraordinário. Colho precedentes:

‘AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO – PROCESSO CIVIL – COMPETÊNCIA – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – PRELIMINAR FORMAL DE REPERCUSSÃO GERAL – AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO – ART. 543-A, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL C/C ART. 327, § 1º, DO RISTF – AGRAVO REGI-MENTAL DESPROVIDO.’ (ARE 834.512-AgR, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª T., DJe 27.04.2016)

‘AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO – AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DA PRELIMINAR DE REPERCUSSÃO GERAL DAS QUESTÕES CONSTITUCIONAIS SUSCITADAS – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMU-LAS NºS 282 E 356 DO STF – ADMINISTRATIVO – EXERCÍCIO DE FUNÇÃO PÚBLICA – REGULARIDADE DO VÍNCULO – NECESSI-DADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO – IN-CIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 279 DESTA CORTE – AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO

I – A mera alegação, nas razões do recurso extraordinário, de existência de repercussão geral das questões constitucionais discutidas, desprovi-da de fundamentação adequada que demonstre seu efetivo preenchi-mento, não satisfaz a exigência prevista no art. 543-A, § 2º, do CPC, introduzido pela Lei nº 11.418/2006, e no art. 327, § 1º, do RISTF.

II – Ausência de prequestionamento das questões constitucionais sus-citadas. Incidência da Súmula nº 282 do STF. Ademais, se os embargos declaratórios não foram opostos com a finalidade de suprir essa omis-são, é inviável o recurso, nos termos da Súmula nº 356 do STF.

III – Inviável em recurso extraordinário o reexame do conjunto fático--probatório constante dos autos. Incidência da Súmula nº 279 do STF.

IV – Agravo regimental a que se nega provimento.’

(ARE 820.902-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2ª T., DJe 28.08.2014)

‘AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO – IN-TERPOSIÇÃO EM 27.02.2017 – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – PRE-LIMINAR DE REPERCUSSÃO GERAL – DEFICIÊNCIA NA FUNDA-MENTAÇÃO

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1. Nos termos da orientação firmada nesta Corte, cabe à parte recorrente demonstrar fundamentadamente a existência de repercussão geral da matéria constitucional em debate no recurso extraordinário, mediante o desenvolvimento de argumentação que, de maneira explícita e clara, revele o ponto em que a matéria veiculada no recurso transcende os li-mites subjetivos do caso concreto do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico.

2. Revela-se deficiente a fundamentação da existência de repercussão geral de recurso extraordinário que se restringe a alegar de forma gené-rica que a questão em debate tem repercussão geral.

3. Agravo regimental a que se nega provimento, com previsão de apli-cação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC. Nos termos do art. 85, § 11, CPC, majoro em ¼ (um quarto) a verba honorária fixada anteriormente, devendo ser observados os §§ 2º e 3º do mesmo dispo-sitivo.’ (RE 930.889-AgR, Rel. Min. Edson Fachin, 2ª T., DJe 02.05.2017)

A análise efetuada pelo Tribunal a quo, enfim, enfrentou o conjunto pro-batório para firmar seu convencimento, razão pela qual compreensão di-versa demandaria o revolvimento do quadro fático delineado, procedi-mento vedado em sede extraordinária. Aplicação da Súmula nº 279/STF: Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário. Nesse sentido: ARE 893.283-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T., DJe 24.08.2015; e ARE 969.273-AgR, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª T., DJe 10.08.2016, cuja ementa transcrevo:

‘PENAL E PROCESSO PENAL – AGRAVO REGIMENTAL NO RE-CURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO – OFENSA REFLEXA – REEXAME DE FATOS E PROVAS – AGRAVO REGIMENTAL DES-PROVIDO – 1. A alegada ofensa aos incisos I, XXII, XXIX, XXXV, LIV e LV do art. 5º da CRFB reclama reexame da legislação infraconstitu-cional aplicável à espécie, impossível na via do recurso extraordinário, por configurar ofensa indireta à Constituição Federal. 2. Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário (Enunciado nº 279 da Súmula do STF). A pretensão de revisão das razões que ensejaram a rejeição da queixa crime, principalmente no que toca à decadência, reclama revisão de fatos e provas, inviável na via estreita do recurso extraordinário. 3. Agravo regimental desprovido.’

Nesse sentir, não merece processamento o apelo extremo, ausente ofensa a preceito da Constituição da República.

Nego seguimento ao recurso (art. 21, § 1º, do RISTF).”

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De início, observo que o agravante se equivoca ao indicar a inaplica-bilidade da Súmula nº 280/STF, uma vez que a decisão impugnada, acima transcrita, nada fala sobre sua incidência (doc. 07).

Tal como consignado na decisão agravada, inexiste violação do art. 93, IX, da Constituição Federal de 1988. Na compreensão desta Suprema Corte, o texto constitucional exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões de seu convencimento, sem necessidade, contudo, do exame detalhado de cada argumento esgrimido pelas partes. Cito precedentes:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO – MATÉRIA PENAL – ALEGADA VIOLAÇÃO A PRECEITOS CONSTITUCIONAIS – OFEN-SA INDIRETA À CONSTITUIÇÃO – CONTENCIOSO DE MERA LEGA-LIDADE – OFENSA AO ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚ-BLICA – INOCORRÊNCIA – AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.” (ARE 1.029.825-AgR/MT, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª T., DJe de 01.08.2017)

“Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Matéria crimi-nal. Violação do art. 93, IX, da Constituição Federal. Não ocorrência. Pre-cedentes. Agravo regimental não provido. 1. Não há falar em violação do art. 93, inciso IX, da Constituição, pois a jurisdição foi prestada, no caso em espécie, mediante decisões suficientemente motivadas, tendo a instância antecedente, como se observa dos acórdãos proferidos, explicitado suas razões de decidir. 2. Consoante firme jurisprudência da Corte, ‘só se consi-dera nula a decisão desprovida de fundamentação, não aquela que, embora concisa, contenha motivação’ (AI 847.887/MG-AgR, 1ª T., Relator o Minis-tro Luiz Fux, DJe 16.02.2012). 3. Regimental ao qual se nega provimento.” (ARE 933.976-AgR/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, 2ª T., DJe de 21.02.2017)

“DIREITO PENAL – AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDI-NÁRIO – SUPOSTA VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓ-RIO, DA AMPLA DEFESA, DOS LIMITES DA COISA JULGADA E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL – AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL – CONTROVÉRSIA DECIDIDA COM BASE NA LEGISLAÇÃO INFRA-CONSTITUCIONAL PERTINENTE E NO CONJUNTO FÁTICO-PROBA-TÓRIO DOS AUTOS – SÚMULA Nº 279/STF – AUSÊNCIA DE VIOLA-ÇÃO AO ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – 1. Por ausência de questão constitucional, o Supremo Tribunal Federal rejeitou preliminar de repercussão geral relativa à controvérsia sobre suposta violação aos prin-cípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal (Tema nº 660 – ARE 748.371-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes). 2. Para chegar a conclusão diversa do acórdão recorrido, seriam

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necessárias a análise da legislação infraconstitucional pertinente e a rea-preciação dos fatos e do material probatório constante dos autos (Súmula nº 279/STF), o que inviável em recurso extraordinário. 3. A decisão está devidamente fundamentada, embora em sentido contrário ao interesse da parte agravante. 4. Agravo interno a que se nega provimento.” (ARE 999.032- AgR/GO, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª T., DJe de 06.02.2017)

Ressalto já declarada a inexistência de repercussão geral da matéria relacionada à alegação de violação dos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, bem como da matéria concernente ao inde-ferimento do pedido de produção de provas no âmbito de processo judicial, quando o julgamento da causa depender de prévia análise da adequada apli-cação das normas infraconstitucionais. Os acórdãos estão assim ementados:

“Alegação de cerceamento do direito de defesa. Tema relativo à suposta violação aos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal. Julgamento da causa dependente de prévia análise da adequada aplicação das normas infraconstitucionais. Rejeição da repercussão geral.” (RE 748.371-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, Pleno, DJe 01.08.2013)

“RECURSO – Agravo convertido em Extraordinário. Inadmissibilidade deste. Produção de provas. Processo judicial. Indeferimento. Contraditó-rio e ampla defesa. Tema infraconstitucional. Precedentes. Ausência de repercussão geral. Recurso extraordinário não conhecido. Não apresenta repercussão geral recurso extraordinário que, tendo por objeto a obrigato-riedade de observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, nos casos de indeferimento de pedido de produção de provas em processo judicial, versa sobre tema infraconstitucional.” (ARE 639.228-RG, Rel. Min. Cezar Peluso, Pleno, DJe 31.08.2011)

Constato, por seu turno, que o Tribunal de origem, na espécie, se las-treou na prova produzida para firmar seu convencimento, razão pela qual a aferição da ocorrência de eventual afronta aos preceitos constitucionais invo-cados no apelo extremo exigiria o revolvimento do quadro fático delineado, procedimento vedado em sede extraordinária.

Aplicação da Súmula nº 279/STF: “Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário.” Colho precedentes:

“DIREITO PENAL – AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDI-NÁRIO COM AGRAVO – CONTROVÉRSIA DECIDIDA COM BASE NA

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LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL PERTINENTE E NO CON-JUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS – SÚMULA Nº 279/STF – 1. A parte recorrente se limita a postular a análise da legislação infraconsti-tucional pertinente e uma nova apreciação dos fatos e do material probató-rio constante dos autos, o que não é possível nesta fase processual. Nessas condições, a hipótese atrai a incidência da Súmula nº 279/STF. 2. Agravo interno a que se nega provimento.” (ARE 1.044.261-AgR/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª T., DJe de 30.06.2017)

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO (LEI Nº 12.322/2010) – MATÉRIA PENAL – ALEGADA VIOLAÇÃO AO PRECEITO INSCRITO NO ART. 93, IX – INOCORRÊNCIA – REEXAME DE FATOS E PROVAS – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA Nº 279/STF – RECURSO IMPROVIDO – Não cabe recurso extraordinário, quando interposto com o objetivo de discutir questões de fato, ou de examinar matéria de caráter probatório.” (ARE 971.340-AgR/MG, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª T., DJe de 29.06.2016)

De outro lado, o entendimento consignado na decisão impugnada re-flete a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal na matéria, razão pela qual não há falar em afronta aos preceitos constitucionais invocados no re-curso, a teor da decisão que desafiou o agravo. Cito precedentes:

“I. Praça da Polícia Militar do Estado: perda da graduação e conseqüente expulsão da corporação: processo específico (CF, art. 125, § 4º, parte final): decisão recorrida baseada no exame da eticidade da conduta do represen-tado: ausência de cerceamento de defesa: precedente. 1. As praças ‘não têm posto nem patente, mas apenas graduação’ (cf. RE 121.533, 1ª T., Pertence, DJ 30.11.1990): assim, a ‘perda da graduação’, aqui realizada em procedi-mento próprio, por decisão do tribunal competente – onde a ‘defesa ofere-ceu contra-razões (fls. 32/38), juntou documentos (fls. 40/69 e 81/82) e ar-rolou testemunhas, todas inquiridas (fls. 95/97)’ – tem como consequência a exclusão das praças. 2. De qualquer forma, a exclusão, no caso, decorreu do reconhecimento pelo Tribunal a quo de que o recorrente ‘carece de con-dições morais necessárias ao elevado padrão que deve ser considerado na corporação policial militar’, o que não diverge do requerido na representa-ção, que, embora em sua parte inicial, afirmou expressamente ter sido ofe-recida ‘para perda de graduação e declaração de incompatibilidade para o desempenho das funções de policial militar’ do recorrente. 3. A posterior transferência para a reserva remunerada não impede que, transitado em julgado o acórdão, seja executada a decisão de perda da graduação e con-

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sequente exclusão.” (RE 217.781/RS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª T., DJ de 22.10.2204)

“Recurso extraordinário. Também os oficiais das Polícias Militares só per-dem o posto e a patente se forem julgados indignos do oficialato ou com ele incompatíveis por decisão do Tribunal competente em tempo de paz. Esse processo não tem natureza de procedimento ‘para-jurisdicional’, mas, sim, natureza de processo judicial, caracterizando, assim, causa que pode dar margem à interposição de recurso extraordinário. - Inexistência, no caso, de ofensa ao art. 5º, LVII, da Constituição. Recurso extraordinário não co-nhecido.” (RE 186.116/ES, Rel. Min. Moreira Alves, 1ª T., DJ de 03.09.1999)

Cito decisões monocráticas em casos semelhantes: ARE 1.004.769/SP, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 29.08.2017, com trânsito em julgado em 24.10.2017; RE 745.869/RN, de minha lavra, DJe de 04.11.2016, com trânsi-to em julgado em 01.02.2017; e ARE 987.636/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 08.09.2016, com trânsito em julgado em 11.10.2016.

Por fim, quanto à alegação de que a matéria discutida no acórdão recorrido é similar à do RE 601.146-RG (Tema nº 358), não assiste razão ao agravante, por ausência de identidade entre o paradigma apontado e o caso presente.

As razões do agravo não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada.

Agravo interno conhecido e não provido.

É como voto.

VOTO

O Senhor Ministro Marco Aurélio – A prestação jurisdicional previs-ta no art. 93, inciso IX, da Constituição Federal pressupõe o enfrentamento, pelo órgão julgador, de todas as causas de pedir veiculadas pela parte, exceto quando, fixado o entendimento, surja a incompatibilidade. Provejo o agravo para que o extraordinário tenha regular sequência.

PRIMEIRA TURMA EXTRATO DE ATA

AgRg no Recurso Extraordinário nº 893.496

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Proced.: São Paulo

Relatora: Min. Rosa Weber

Agte.(s): Rinaldo Maziero

Adv.(a/s): Eliezer Pereira Martins (168735/SP) e outro(a/s)

Agdo.(a/s): Ministério Público do Estado de São Paulo

Proc.(a/s)(es): Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo

Decisão: A Turma, por maioria, conheceu do agravo e negou-lhe pro-vimento, nos termos do voto da Relatora, vencido o Ministro Marco Aurélio. Primeira Turma, Sessão Virtual de 01.12.2017 a 07.12.2017.

Composição: Ministros Marco Aurélio (Presidente), Luiz Fux, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes.

Disponibilizou processos para esta Sessão o Ministro Edson Fachin, não tendo participado do julgamento desses feitos o Ministro Alexandre de Moraes por sucedê-lo na Primeira Turma.

Carmen Lilian Oliveira de Souza Secretária da Primeira Turma

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STJSuperior Tribunal de JuSTiça

Revisão Criminal nº 3.900 – SP (2017/0063342-2)Relator: Ministro Reynaldo Soares da FonsecaRequerente: João AntônioAdvogado: Defensoria Pública da UniãoRequerido: Justiça Pública

EMENTA

penal e processo penal – revisão criMinal Fundada no art. 621, i, cpp – estelionato previdenciÁrio

(art. 171, § 3º, cp) praticado por terceiro não BeneFiciÁrio da Fraude – criMe instantÂneo

de eFeitos perManentes – entendiMento Jurisprudencial do stF superveniente à

condenação – prescrição do ius puniendi reconHecida – ineXistÊncia de erro JudiciÁrio

– iMpossiBilidade de concessão de indenização (art. 630, cpp) – devolução dos valores pagos

a título de pena de Multa: possiBilidade1. Ao negar seguimento a recurso especial da defesa, com am-

paro no Enunciado nº 83 da Súmula/STJ, compara-se o tratamento dado ao mérito da controvérsia pelo Tribunal de segundo grau com o entendimento prevalente nesta Corte sobre o mesmo tema. Nesse sentido, é de se reconhecer a existência de exame de mérito da con-trovérsia apto a definir a competência deste Tribunal para o exame da revisão criminal. Inteligência do art. 240 do Regimento Interno do STJ.

2. Cabível o manejo da revisão criminal fundada no art. 621, I, do CPP em situações nas quais se pleiteia a adoção de novo entendi-mento jurisprudencial mais benigno, desde que a mudança jurispru-

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dencial corresponda a um novo entendimento pacífico e relevante.3. A jurisprudência desta Corte tem entendido que o crime de

estelionato previdenciário praticado para que terceira pessoa possa se beneficiar indevidamente da fraude tem natureza de crime ins-tantâneo com efeitos permanentes, devendo ser contado o prazo prescricional a partir do recebimento da primeira prestação do be-nefício indevido. A orientação se alinha com o entendimento exara-do pela Corte Suprema, ao examinar o Agravo Regimental no ARE nº 663.735/ES, quando reconheceu a natureza binária do crime de estelionato previdenciário, a depender de quem pratica a conduta, o próprio beneficiário da vantagem indevida ou um intermediário para que terceira pessoa receba o benefício previdenciário ilicita-mente.

4. No caso concreto, reconhecida a natureza jurídica do deli-to como crime instantâneo de efeitos permanentes, o termo inicial do prazo prescricional é a data do pagamento da prestação do pri-meiro benefício indevido que ocorreu em março/1985. Dado que a pena máxima em abstrato cominada para o delito do art. 171, § 3º, do CP é de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses, aplica-se-lhe o prazo pres-cricional de 12 (doze) anos, previsto no art. 109, III, do CP. Vê-se, assim, que a prescrição do direito estatal de exercer o jus puniendi ocorreu em 1997. Entretanto a denúncia somente veio a ser recebida em 03.08.2004.

5. Não há como se reconhecer a existência de erro judiciário capaz de gerar indenização por injusta condenação (art. 630, CPP) se a sentença condenatória fundou-se em interpretação jurisprudencial controversa à época da condenação e que somente veio a se firmar após a confirmação da sentença pelo Tribunal de segundo grau.

6. Rescindida a condenação, tem direito o autor à devolução dos valores que pagou, indevidamente, a título de pena de multa, devidamente atualizados pelos índices previstos no Manual de Cál-culos da Justiça Federal e acrescidos de juros de mora contados a partir do trânsito em julgado da revisão criminal.

7. Revisão criminal que se julga procedente, para reconhecer a prescrição da pretensão punitiva do requerente em relação à condena-ção que lhe foi imposta pelo Juízo Federal da 8ª Vara Criminal da Se-ção Judiciária de São Paulo, na Ação Penal nº 2000.61.81.000278-5/SP.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima in-dicadas, acordam os Ministros da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, julgar procedente a revisão criminal, para reco-nhecer a prescrição da pretensão punitiva do requerente, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Ribeiro Dantas (Revisor), Antonio Saldanha Palheiro, Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer, Maria Thereza de Assis Moura, Jorge Mussi, Sebastião Reis Júnior e Nefi Cordeiro votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz.

Brasília (DF), 13 de dezembro de 2017 (data do Julgamento).

Ministro Reynaldo Soares da Fonseca Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (Relator):

Trata-se de revisão criminal ajuizada por João Antônio, representa-do pela Defensoria Pública da União, com amparo no art. 621, I, do Códi-go de Processo Penal, buscando a rescisão de decisão monocrática do Min. Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ/SP) proferida no REsp 1.264.437/SP, que negou seguimento a seu recurso especial, ao fundamento de que o acórdão do Tribunal Regional da 3ª Região, que confirmara a conde-nação do réu por estelionato previdenciário (art. 171, § 3º, do CP), se alinhava perfeitamente à jurisprudência desta Corte que entende que “no estelionato praticado contra a Previdência Social, pelo próprio beneficiário, o prazo pres-cricional se inicia com a supressão do recebimento do benefício e não com o recebimento da primeira parcela, visto que o delito, no caso, é permanente, considerando que a ofensa ao bem jurídico tutelado se reitera mês a mês”.

Inconformado, o requerente, amparado em precedentes do Supremo Tribunal Federal (HC 86467, Relator(a): Min. Marco Aurélio, Tribunal Ple-no, Julgado em 23.04.2007, DJe-042, Divulg. 21.06.2007, Public. 22.06.2007, DJ 22.06.2007, p. 00016, Ement. v. 02281-02, p. 00334, LEXSTF v. 29, nº 344, 2007, p. 432-443; HC 95564, Relator(a): Min. Cármen Lúcia, Relator(a) p/ Acórdão: Min. Marco Aurélio, 1ª T., Julgado em 30.06.2009, DJe-204, Divulg. 28.10.2009, Public. 29.10.2009, Ement. v. 02380-02, p. 00368, RT v. 99, n. 892, 2010, p. 519-525 e HC 85601, Relator(a): Min. Cezar Peluso, 2ª T., Julgado em 06.11.2007,

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DJe-152, Divulg. 29.11.2007, Public. 30.11.2007 DJ 30.11.2007, p. 00127, Ement. v. 02301-02, p. 00323, RCJ v. 21, n. 138, 2007, p. 137-138) insiste em que o delito, na realidade, tem natureza jurídica de crime instantâneo com efeitos permanentes, devendo sua prescrição ser contada a partir do recebimento da primeira prestação do benefício indevido.

Assim sendo, como a pena em abstrato cominada ao delito em questão equivale a 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses, em razão da majorante do § 3º do art. 171 do CP. Assim sendo, como a primeira parcela do benefício foi con-cedida em março/1985 e a última em outubro/1996, o prazo para o Estado exercer o jus puniendi esgotou-se em março/1997, antes do oferecimento da denúncia, em outubro/2001.

Alega que a decisão rescindenda equivocou-se ao tratar a questão como se o ora requerente fosse o beneficiário da aposentadoria indevida, quando, na realidade, ele atuou como intermediário. O beneficiário foi o Sr. Andrés Uriondo Salazar.

De consequência, a condenação penal teria sido contrária à evidência dos autos, merecendo revisão.

Pede, assim:

c) seja julgada totalmente procedente a presente ação de revisão criminal para que seja reconhecida a prescrição a pretensão punitiva do requeren-te nos autos do REsp 1.264.437/SP (2011/0161983-6);

d) sejam restabelecidos todos os direitos perdidos e resultantes da conde-nação em espécie (CPP, art. 627), determinando-se que sejam acostados imediatamente aos autos originários o teor completo do acórdão, para o fiel cumprimento da decisão (CPP, art. 629)

e) Nos termos do art. 630 do CPP, seja reconhecido o direito do requerente a uma justa indenização, a ser liquidada no juízo cível competente, pelos prejuízos sofridos com o acórdão e em função do qual foi submetido à pena de reclusão de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses e 53 (cinquenta e três) dias-multa, ao valor de 1/30 (um trinta avos) do valor do salário mínimo reajustado;

f) Que sejam devolvidos com os devidos juros e correção monetária todos os valores pagos a título de pena pecuniária;

g) requer, a expedição incontinenti do devido Alvará de Soltura, inclusive com a comunicação ao Magistrado processante, via fax ou outro meio eletrônico, para que proceda com a soltura do Autor, de pronto.

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Às fls. 966/972, concedi a liminar, para suspender os efeitos da conde-nação criminal até o julgamento do mérito da presente revisão criminal.

Instado a se manifestar sobre a controvérsia, o órgão do Ministério Pú-blico Federal que atua perante esta Corte opinou (e-STJ fls. 992/994) pelo não conhecimento ou improcedência da revisão criminal, em parecer assim ementado:

PENAL – PROCESSO PENAL – REVISÃO CRIMINAL – ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL (ART. 171, § 3º, DO CP) – RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO – INCOMPETÊNCIA DO STJ PARA EXA-ME DE PEDIDO REVISIONAL – PARECER PELO NÃO CONHECIMEN-TO OU IMPROCEDÊNCIA DA REVISÃO CRIMINAL.

É o relatório.

Ao revisor.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (Relator):

A revisão criminal preenche os pressupostos do art. 105, I, e, da Cons-tituição Federal e do art. 621, I, do CPP.

Não procede a alegação do Ministério Público Federal de que esta Cor-te seria incompetente para julgar a revisão criminal, em virtude de a decisão proferida no Recurso Especial nº 1.264.437/SP, pelo Ministro Ericson Mara-nho (Desembargador convocado do TJ/SP), ao negar seguimento ao recurso especial da defesa, com amparo no Enunciado nº 83 da Súmula/STJ, não ter adentrado o mérito da questão.

Não há como se negar que a aplicação do dito verbete sumular exige a prévia comparação da orientação adotada pelo Tribunal a quo no exame do mérito da controvérsia com a orientação adotada por esta Corte em relação ao mesmo tema.

Ora, nos termos do art. 105, I, e, da Constituição Federal, somente com-pete ao Superior Tribunal de Justiça o julgamento de revisões criminais de seus próprios julgados.

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

I – processar e julgar, originariamente:

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e) as revisões criminais e as ações rescisórias de seus julgados;

Por sua vez, o art. 621 do Código de Processo Penal dispõe:

Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:

I – quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

II – quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;

III – quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.

Além disso, o art. 240 do Regimento Interno deste eg. STJ prevê que:

“No caso do inciso I, primeira parte, do art. 621 do Código de Processo Pe-nal, caberá revisão, pelo Tribunal, do processo em que a condenação tiver sido por ele proferida ou mantida no julgamento do recurso especial, se seu fundamento coincidir com a questão federal apreciada.”

De tais dispositivos depreende-se a exigência de que tenha havido jul-gamento de mérito por parte desta Corte, quando examinou a controvérsia em sede de recurso especial.

E, na hipótese em exame, não há como se negar que houve exame de mérito.

Também não se sustenta a alegação do Ministério Público Federal de que a revisão criminal fundada no art. 621, I, do CPP jamais se presta a discu-tir incidência de novel orientação jurisprudencial.

É bem verdade que, de regra, a interpretação literal do art. 621, I, do CPP somente admite o manejo da revisão criminal “quando a sentença con-denatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos” (grifei), o que não corresponde à hipótese efetiva dos autos na qual o autor, na realidade, apóia sua tese em interpretação jurisprudencial superveniente do Supremo Tribunal Federal que lhe é benéfica.

De outro lado, com a visão ampla e lúcida que lhe é peculiar, Tourinho Filho ensina que “uma condenação injusta é prejudicial não somen-

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te ao réu, mas também à sociedade, que passa a desacreditar da Justiça. Em virtude dessa situação, desde épocas remotas, se admitem providências para impugnar a injustiça de uma decisão condenatória” (in TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 922).

Nessa mesma linha de pensamento, Márcia Bispo pondera existir “uma linha de tensão entre o valor “segurança jurídica” instituída pela imu-tabilidade da coisa julgada, que tem assento constitucional no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, e o valor “justiça”. Tal tensão não poderia ser re-solvida de outro modo, a não ser pela necessidade de relativização do mito da coisa julgada imutável e indiscutível em nome da verdadeira justiça” (in BISPO, Márcia Margareth Santos. A revisão criminal no processo penal brasileiro: aspectos relevantes. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 18 abr. 2012. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.36498&seo=1>. Acesso em: 16 mar. 2017.)

A autora lembra, inclusive, que Aury Lopes Júnior (in Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 5. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, v. II, 2011) admite a possibilidade de revisão criminal em situações nas quais se pleiteia a adoção de novo entendimento jurisprudencial mais benigno, como ocorreu, por exemplo, com o entendimento, hoje pacífico, acerca da inconsti-tucionalidade do regime integralmente fechado para os crimes hediondos. O autor, entretanto, condiciona a admissibilidade de tal pedido a uma mudan-ça jurisprudencial efetiva que corresponda a um novo entendimento pacífico e relevante.

Com tudo isso em mente, tenho que a revisão criminal merece ser co-nhecida.

No mérito, como já havia adiantado na decisão em que apreciei o pedi-do de liminar, tem razão o requerente.

Com efeito, equivocou-se o acórdão impugnado na presente revisão criminal ao considerar que o réu era o beneficiário da aposentadoria indevi-da, quando, na realidade, a denúncia (e-STJ fls. 25/27) descreveu sua partici-pação no delito como a de antigo funcionário do INSP que possuía escritório especializado na intermediação de pedidos de aposentadoria e que, nessa qualidade, inseriu certidão de tempo de trabalho falsa no pedido de benefício de aposentadoria para Andrés Uriondo Salazar.

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A denúncia foi datada de 10.10.2001 (e-STJ fl. 27). Por decisão de 25.10.2001, a MMª Juíza Federal da 8ª Vara Criminal de São Paulo – SJ/SP (e-STJ fls. 310/313) rejeitou a denúncia na Ação Penal nº 2000.61.81.000278-5, por reputar prescrita a ação penal, considerando que a conduta do acusado se exaurira em 1985, com a utilização do meio fraudulento e, por isso, o prazo prescricional de 12 (doze) anos, nos termos do art. 109, IV, do CP, do delito de natureza instantânea, deveria ser contado daí.

Somente com o provimento do Recurso em Sentido Estrito interposto pelo Ministério Público Federal, em acórdão do TRF 3ª Região proferido em 03.08.2004 (e-STJ fls. 394/397), é que a denúncia veio a ser recebida. Após julgamento do mérito, a sentença transitou em julgado em 31.08.2015 (cf. cer-tidão à e-STJ fl. 961).

Ocorre que a jurisprudência desta Corte tem entendido que o crime de estelionato previdenciário praticado para que terceira pessoa possa se bene-ficiar indevidamente tem natureza de crime instantâneo com efeitos perma-nentes, devendo ser contado o prazo prescricional a partir do recebimento da primeira prestação do benefício indevido.

Nesse sentido, confiram-se, entre outros, os seguintes precedentes:

PENAL – PROCESSUAL PENAL – RECURSO EM HABEAS CORPUS – ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO – PRESCRIÇÃO – INOCORRÊNCIA

1. Tratando-se de crime de estelionato previdenciário praticado para que terceira pessoa possa se beneficiar indevidamente tem natureza de crime instantâneo com efeitos permanentes, devendo ser contado o prazo prescricional a partir do recebi-mento da primeira prestação do benefício indevido.

2. Não há falar em prescrição da pretensão punitiva, porquanto não decor-rido prazo superior a 8 anos (art. 109, IV, do CP) entre os marcos interrup-tivos, necessários à sua configuração.

3. Recurso em habeas corpus improvido.

(RHC 66.487/PB, Rel. Min. Nefi Cordeiro, 6ª T., Julgado em 17.03.2016, DJe 01.04.2016) – grifei.

PENAL E PROCESSO PENAL – AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – 1. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL – ACÓRDÃO PA-RADIGMA PROFERIDO PELO MESMO TRIBUNAL – NÃO CABIMEN-TO – SÚMULA Nº 13/STJ – 2. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 107, IV; 109, V; 110, § 1º; 119 E 171, TODOS DO CP – NÃO OCORRÊNCIA – CRIME DE

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ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO PRATICADO PELO BENEFICIÁRIO – DELITO PERMANENTE – PRESCRIÇÃO NÃO IMPLEMENTADA – 3. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO

1. O recorrente apresentou como paradigma acórdão proferido pela mes-ma Câmara que julgou o acórdão ora recorrido. Dessa forma, tem-se que não ficou caracterizada a divergência jurisprudencial conforme disciplina a alínea c do permissivo constitucional, o qual se refere expressamente à “interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal”. A pro-pósito, confira-se o que dispõe o verbete nº 13 da Súmula desta Corte: “A divergência entre julgados do mesmo tribunal não enseja recurso especial”.

2. A natureza jurídica do crime de estelionato previdenciário depende da pessoa que pratica a conduta. Tratando-se de terceiro, o crime é instantâneo de efeitos permanentes, cuidando-se do próprio beneficiário, o crime é permanente. Portanto, não há se falar em prescrição nem em violação dos arts. 107, inciso IV; 109, inciso V; 110, § 1º; e 119, bem como do art. 171, todos do Código Penal.

3. Agravo regimental improvido.

(AgRg-REsp 1.497.147/SP, Rel. Min. Leopoldo de Arruda Raposo (De-sembargador Convocado do TJ/PE), 5ª T., Julgado em 28.04.2015, DJe 13.05.2015) – grifei.

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO – CRIME INSTANTÂNEO DE EFEITOS PERMA-NENTES QUANDO PRATICADO POR TERCEIRO NÃO BENEFICIÁ-RIO – PRESCRIÇÃO – TERMO INICIAL – PAGAMENTO DA PRIMEIRA PRESTAÇÃO DO BENEFÍCIO INDEVIDO – PRECEDENTES – AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO

1. O estelionato previdenciário é crime instantâneo de efeitos permanentes quando cometido por servidor do INSS ou por terceiro não beneficiário que pratica a fraude, sendo consumado no momento do pagamento da primeira prestação do benefício indevido. Precedentes.

2. Agravo regimental não provido.

(AgRg-REsp 1.347.082/RS, Rel. Min. Moura Ribeiro, 5ª T., Julgado em 21.08.2014, DJe 26.08.2014) – grifei.

AGRAVO REGIMENTAL – PENAL – ESTELIONATO – FRAUDE CON-TRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL – ART. 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL – CRIME COMETIDO PELO PRÓPRIO BENEFICIÁRIO – NATUREZA DE

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CRIME PERMANENTE – ENTENDIMENTO CONSOLIDADO PELA SU-PREMA CORTE – DATA DA CONSUMAÇÃO DO DELITO – CESSAÇÃO DO PAGAMENTO – TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL – SUSPENSÃO ADMINISTRATIVA DO RECEBIMENTO DAS PRESTA-ÇÕES INDEVIDAS PELO INSS – ART. 111, INCISO III, DO CÓDIGO PE-NAL – PRECEDENTE DA TERCEIRA SEÇÃO – RESTABELECIMENTO DO PAGAMENTO POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL – AUSÊNCIA DE ARDIL OU FRAUDE NO RECEBIMENTO – ESTADO DE PERMA-NÊNCIA AFASTADO – AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO

1. O delito de estelionato previdenciário capitulado no art. 171, § 3º, do Código Penal, segundo a jurisprudência pacificada do Supremo Tribunal Federal, tem na-tureza binária. Assim, praticado pelo próprio beneficiário dos valores indevidos, é crime permanente, cujo momento consumativo se protrai no tempo, já que o Agen-te tem o poder de fazer cessar, a qualquer tempo, a ação criminosa. Por outro lado, praticado por terceira pessoa para permitir que outrem receba a vantagem ilícita, constitui-se crime instantâneo de efeitos permanentes, pois todos os elementos do tipo penal são verificados no momento da conduta. Precedentes.

2. Deve ser afastado o estado de permanência delitiva quando o pagamento do benefício é restabelecido por força de decisão judicial, na medida em que ausentes os elementos essenciais do tipo penal - fraude e a indução a erro –; o que afasta a ilicitude do recebimento e, portanto, o próprio crime. Precedentes.

3. Colhe-se dos autos que o pagamento foi suspenso administrativamente no ano de 1999 e restabelecido em novembro do mesmo ano (1999) por força de decisão judicial proferida em mandado de segurança; para, final-mente, ser suspenso definitivamente em novembro de 2009.

4. Cessada a permanência com a suspensão administrativa do pagamento no ano de 1999 e considerando o prazo prescricional de 12 (doze) anos, nos termos do art. 109, inciso III, do Código Penal, é de ser afastada a alegação de prescrição, na medida em que não decorrido prazo superior entre a data do crime (cessação do pagamento indevido) e o recebimento da denúncia, ocorrido em 14.12.2010.

5. Agravo regimental desprovido.

(AgRg-REsp 1.271.901/RJ, Relª Min. Laurita Vaz, 5ª T., Julgado em 18.02.2014, DJe 07.03.2014) – grifei.

AGRAVO REGIMENTAL – RECURSO ESPECIAL – DIREITO PENAL – ART. 171, § 3º, DO CP – ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO CIRCUNS-

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TANCIADO – RECEBIMENTO INDEVIDO DE BENEFÍCIO – AGENTE ATIVO É TERCEIRO RESPONSÁVEL PELO LANÇAMENTO FRAUDU-LENTO DO BENEFÍCIO PARA PESSOA DIVERSA – TIPIFICAÇÃO DO DELITO – CRIME INSTANTÂNEO DE EFEITOS PERMANENTES – PRES-CRIÇÃO – OCORRÊNCIA

1. O Superior Tribunal de Justiça, em particular a Sexta Turma, entende que o cri-me instantâneo de efeitos permanentes é aquele que se consuma instantaneamente, não havendo continuidade temporal na conduta ofensiva; seus efeitos, no entanto, prolongam-se no tempo.

É o caso de terceiro que frauda documentos para permitir que outrem seja benefi-ciado com aposentadoria indevida.

2. O caso dos autos refere-se a terceira pessoa, atual agravada, que fraudou documentos e lançou indevidamente dados para conceder remuneração a outra pessoa; logo, trata-se de crime instantâneo de efeitos permanentes.

3. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as razões reuni-das na insurgência são incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão agravada.

4. Agravo regimental improvido.

(AgRg-REsp 1.396.403/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª T., Julgado em 01.10.2013, DJe 14.10.2013) – grifei.

Dito entendimento, segue a orientação fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Agravo Regimental no ARE nº 663.735/ES, quando a Corte Su-prema reconheceu a natureza binária do crime de estelionato previdenciário, a depender de quem pratica a conduta, o próprio beneficiário da vantagem indevida ou um intermediário para que terceira pessoa receba o benefício previdenciário ilicitamente.

Confira-se a ementa do julgado:

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO – CRIME DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO – RÉU BENEFICIÁRIO DAS PARCELAS INDEVIDAS – CRIME PERMANENTE – PRESCRIÇÃO – TERMO INICIAL – HIGIDEZ DA PRETENSÃO PUNI-TIVA – PRECEDENTES

1. Em tema de estelionato previdenciário, o Supremo Tribunal Federal tem uma jurisprudência firme quanto à natureza binária da infração. Isso porque é de se distinguir aquele que, em interesse próprio, recebe o benefício ilicitamente

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daquele que comete uma falsidade para permitir que outrem obtenha a vantagem indevida. No primeiro caso, a conduta, a despeito de produzir efeitos permanentes no tocante ao beneficiário da indevida vantagem, materializa, instantaneamente, os elementos do tipo penal. Já naquelas situações em que a conduta é cometida pelo próprio beneficiário e renovada mensalmente, o crime assume a natureza perma-nente, dado que, para além de o delito se protrair no tempo, o agente tem o poder de, a qualquer tempo, fazer cessar a ação delitiva. Precedentes.

2. Agravo regimental desprovido.

(ARE 663.735 AgR, Relator(a): Min. Ayres Britto, 2ª T., Julgado em 07.02.2012, Acórdão Eletrônico DJe-056, Divulg. 16.03.2012, Public. 19.03.2012 – grifei)

Reconhecida a natureza jurídica do delito como crime instantâneo de efeitos permanentes, o termo inicial do prazo prescricional é a data do pa-gamento da prestação do primeiro benefício indevido que ocorreu em mar-ço/1985. Dado que a pena máxima em abstrato cominada para o delito do art. 171, § 3º, do CP é de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses, aplica-se-lhe o prazo prescricional de 12 (doze) anos, previsto no art. 109, III, do CP. Vê-se, assim, que a prescrição do direito estatal de exercer o jus puniendi ocorreu em 1997. Entretanto a denúncia somente veio a ser recebida em 03.08.2004.

do pedido de indenização

Pede o autor a fixação de justa indenização, fundada no art. 630 do CPP, tanto em função da injusta condenação sofrida quanto em razão do tem-po em que ficou indevidamente preso.

Com efeito, a interpretação que vem sendo dada ao art. 630 do CPP tanto por esta Corte quanto pelo Supremo Tribunal Federal é no sentido de que a vítima de erro judiciário tem direito a receber indenização do Estado em casos de desconstituição de sua condenação em sede de revisão criminal ou de excesso injustificado de sua permanência na prisão. Nesse sentido, en-tre outros, os seguintes precedentes:

EMENTA: Erro judiciário. Responsabilidade civil objetiva do Estado. Direi-to à indenização por danos morais decorrentes de condenação desconstituída em re-visão criminal e de prisão preventiva. CF, art. 5º, LXXV. C. Pr. Penal, art. 630.

1. O direito à indenização da vítima de erro judiciário e daquela presa além do tempo devido, previsto no art. 5º, LXXV, da Constituição, já era previsto no art. 630 do C. Pr. Penal, com a exceção do caso de ação penal privada e

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só uma hipótese de exoneração, quando para a condenação tivesse contri-buído o próprio réu.

2. A regra constitucional não veio para aditar pressupostos subjetivos à regra geral da responsabilidade fundada no risco administrativo, conforme o art. 37, § 6º, da Lei Fundamental: a partir do entendimento consolida-do de que a regra geral é a irresponsabilidade civil do Estado por atos de jurisdição, estabelece que, naqueles casos, a indenização é uma garantia individual e, manifestamente, não a submete à exigência de dolo ou culpa do magistrado.

3. O art. 5º, LXXV, da Constituição: é uma garantia, um mínimo, que nem impede a lei, nem impede eventuais construções doutrinárias que venham a reconhecer a responsabilidade do Estado em hipóteses que não a de erro judiciário stricto sensu, mas de evidente falta objetiva do serviço público da Justiça.

(RE 505.393, Relator(a): Min. Sepúlveda Pertence, 1ª T., Julgado em 26.06.2007, DJe-117 Divulg. 04.10.2007, Public. 05.10.2007, DJ 05.10.2007, p. 00025, Ement. v. 02292-04, p. 00717, LEXSTF v. 29, n. 346, 2007, p. 296-310, RT v. 97, n. 868, 2008, p. 161-168, RDDP n. 57, 2007, p. 112-119)

PROCESSUAL PENAL – RECURSO ESPECIAL – REVISÃO CRIMINAL – ERRO JUDICIÁRIO – DIREITO À JUSTA INDENIZAÇÃO PELOS PRE-JUÍZOS SOFRIDOS

É devida indenização uma vez demonstrado erro judiciário ex vi art. 5º, in-ciso LXXV, da Constituição Federal e art. 630 do CPP. In casu, restaram de-vidamente comprovados os prejuízos sofridos pelo recorrente, razão pela qual não há óbice a uma justa indenização.

Recurso provido.

(REsp 253.674/SP, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., Julgado em 04.03.2004, DJ 14.06.2004, p. 264)

O direito à indenização, entretanto, depende da demonstração da exis-tência de efetivo erro judiciário.

Ora, no caso concreto, estamos diante de situação em que o reconheci-mento da prescrição do direito do Estado de punir o autor deriva de modifi-cação superveniente de entendimento jurisprudencial a respeito do assunto.

À época da condenação, é de se reconhecer que havia dúvida plausível a respeito da natureza jurídica do delito praticado pelo autor (se permanente

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ou instantâneo), não se podendo atribuir ao julgador um erro jurídico por ter se filiado a uma das correntes. Tanto mais que até os dias atuais há doutri-nadores que ainda defendem a plausibilidade do entendimento que reputa o estelionato previdenciário como um crime único.

Assim sendo, tenho que, no caso concreto, não há como se reconhecer a existência de erro judiciário na condenação imposta com amparo em entendi-mento jurisprudencial prevalente à época do julgado. Sem erro, não há falar em direito à indenização.

do pedido de devolução dos valores pagos a título de pena de Multa

De outro lado, rescindida a condenação, tem direito o autor à devolu-ção dos valores que pagou, indevidamente, a título de pena de multa, devida-mente atualizados pelos índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal e acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, contados a partir do trânsito em julgado da presente revisão criminal.

Ante o exposto, julgo procedente a presente revisão criminal, reconhe-cendo a prescrição da pretensão punitiva do requerente em relação à conde-nação que lhe foi imposta pelo Juízo Federal da 8ª Vara Criminal da Seção Judiciária de São Paulo, na Ação Penal nº 2000.61.81.000278-5/SP.

Expeça-se alvará de soltura, se por outro motivo o autor da revisão criminal não estiver preso.

É como voto.

Ministro Reynaldo Soares da Fonseca Relator

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA SEÇÃO

Número Registro: 2017/0063342-2

Processo Eletrônico RvCr 3.900/SP

Matéria criminal

Números Origem: 00002786320004036181 200061810002785 2786320004036181

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Pauta: 13.12.2017 Julgado: 13.12.2017

Relator: Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca

Revisor: Exmo. Sr. Ministro Ribeiro Dantas

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Haroldo Ferraz da Nobrega

Secretário: Bel. Gilberto Ferreira Costa

AUTUAÇÃO

Requerente: João Antônio

Advogado: Defensoria Pública da União

Requerido: Justiça Pública

Assunto: Direito penal – Crimes contra o patrimônio – Estelionato majorado

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Terceira Seção, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Terceira Seção, por unanimidade, julgou procedente a revisão criminal, para reconhecer a prescrição da pretensão punitiva do requerente, nos ter-mos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Ribeiro Dantas (Revisor), Antonio Saldanha Palheiro, Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer, Maria Thereza de Assis Moura, Jorge Mussi, Sebastião Reis Júnior e Nefi Cordeiro votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz.

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STJSuperior Tribunal de JuSTiça

Recurso em Habeas Corpus nº 87.553 – MS (2017/0182050-6)Relator: Ministro Reynaldo Soares da FonsecaRecorrente: Alex Sander Ramos Veiga (preso)Advogado: Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso do SulRecorrido: Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul

EMENTA

recurso ordinÁrio eM HaBeas corpus – prisão cautelar – trÁFico de drogas, receptação e

adulteração de sinal de veículo autoMotor – eXcesso de prazo na instrução processual – inocorrÊncia – princípio da razoaBilidade

– coMpleXidade da causa – pluralidade de criMes – diversas perícias – incidente

de dependÊncia toXicológica – instrução processual encerrada – súMula nº 52 do stJ

– ausÊncia de constrangiMento ilegal1. O prazo para a conclusão da instrução criminal não tem as carac-

terísticas de fatalidade e de improrrogabilidade, fazendo-se imprescindível raciocinar com o juízo de razoabilidade para definir o excesso de prazo, não se ponderando a mera soma aritmética dos prazos para os atos processuais (Precedentes do STF e do STJ) (RHC 62.783/ES, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., Julgado em 01.09.2015, DJe 08.09.2015).

2. No caso, considera-se regular o prazo de tramitação do pro-cesso. Embora a ação penal envolva somente o recorrente, trata-se de causa complexa pois ele é acusado do suposta prática de 3 (três) crimes graves, quais sejam, tráfico de drogas (935kg de maconha), receptação e adulteração de sinal de veículo automotor. Ademais, o Magistrado de primeiro grau informou acerca da necessidade de

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realização de algumas perícias, com elaboração de laudo metalográ-fico, além do toxicológico, e da instauração do incidente de depen-dência toxicológica. Por fim, a instrução processual encontra-se en-cerrada. Incidência do Enunciado nº 52 da Súmula do STJ.

3. Ausente a alegada desídia da autoridade judiciária na con-dução da ação penal, não há falar em constrangimento ilegal hábil a ser reparado por este Superior Tribunal de Justiça (Precedentes).

4. Recurso conhecido e não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima in-dicadas, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Os Srs. Ministros Ribeiro Dantas, Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer e Jorge Mussi votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 12 de dezembro de 2017 (data do Julgamento).

Ministro Reynaldo Soares da Fonseca Presidente e Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (Relator):

Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus, com pedido liminar, interposto pela Defensoria Pública em benefício de Alex Sander Ramos Veiga contra o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul que denegou a ordem no julgamento do HC 1406868-09.2017.8.12.0000.

O recorrente, preso em flagrante em 19 de março de 2016 e convertida a custódia em preventiva, foi denunciado pela suposta infringência ao art. 33 da Lei nº 11.343/2006 porque teria sob sua posse 935 kg (novecentos e trinta e cinco quilos) de maconha, embaladas em 850 (oitocentos e cinquenta) tabletes (denúncia às e-STJ fls. 9/11). A denúncia foi aditada para que o recorrente passasse a responder, também, por receptação e adulteração de sinal de veí-culo automotor.

Irresignada com o excesso de prazo na prisão cautelar, a defesa impe-trou habeas corpus perante o Tribunal de origem. A ordem, como antes rela-

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tado, foi denegada, nos termos do acórdão de STJ fls. 74/83, o qual foi assim ementado:

HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE DROGAS – EXCESSO DE PRAZO – INOCORRÊNCIA – TRÂMITE REGULAR – COMPLEXIDADE DO FEI-TO – INEXISTÊNCIA DE DESÍDIA DO MAGISTRADO – CONSTRANGI-MENTO ILEGAL INEXISTENTE – ORDEM DENEGADA

Caso a extrapolação dos prazos processuais tenha dado em decorrência de peculiaridades do caso concreto, Inexiste a ocorrência de constrangimento ilegal por excesso de prazo, ainda mais se não restar demonstrada desídia do magistrado condutor da ação.

Nas razões do presente recurso (e-STJ fls. 91/98), a Defensoria Públi-ca sustenta haver constrangimento ilegal por excesso de prazo na instrução processual, ao argumento de que o paciente está preso desde 19.03.2016, sem previsão de data para encerramento da instrução processual. Aduz que se trata de causa simples e a demora no andamento da ação penal não pode ser atribuída à defesa.

Pugna, liminarmente e no mérito, pela revogação da prisão preventiva do recorrente, com a expedição de alvará de soltura.

Contrarrazões às e-STJ fls. 103/112.

Indeferido o pedido liminar (e-STJ fls. 120/122) e prestadas as infor-mações (e-STJ fls. 129/138), o Ministério Público Federal manifestou-se pelo desprovimento do recurso (e-STJ fls. 140/141).

Consulta realizada ao sítio eletrônico do Tribunal de Justiça local reve-la que o recorrente permanece preso, já foram apresentadas alegações finais e o processo originário (nº 0000711-27.2016.8.12.0004) está concluso para análi-se do pedido de remissão formulado pela defesa.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (Relator):

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

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A questão jurídica limita-se a verificar a existência de constrangimento ilegal na prisão cautelar do recorrente, ao argumento de excesso de prazo na instrução processual.

A Constituição Federal, no art. 5º, inciso LXXVIII, prescreve: a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. No entanto, essa garantia deve ser compatibilizada com outras de igual estatura constitucional, como o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório que, da mesma forma, precisam ser asseguradas às partes no curso do processo.

Sobre esse aspecto, é cediço que O prazo para a conclusão da instrução criminal não tem as características de fatalidade e de improrrogabilidade, fazendo-se imprescindível raciocinar com o juízo de razoabilidade para definir o excesso de prazo, não se ponderando a mera soma aritmética dos prazos para os atos processuais (Prece-dentes do STF e do STJ) (RHC 62.783/ES, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., Julgado em 01.09.2015, DJe 08.09.2015).

Trago à balha a síntese dos fatos contida nas informações prestadas pelo Juízo de primeiro grau (e-STJ fls. 130/135):

[...]

A constrição teve por título prisão em flagrante por, supostamente, ter o paciente cometido o crime de tráfico ilícito de drogas no dia 19.03.2016, quando surpreendido transportando 935 kg de maconha.

O flagrante foi homologado e a prisão convertida em prisão preventiva pelo magistrado plantonista, nos autos nº 0001490-19.2016.8.12.0800, nos seguintes termos:

“Trata-se de comunicação da prisão em flagrante de Alex Sander Ramos Vega [brasileiro, estudante, RG 2030539 SSP/MS, CPF XXXX, nascido aos 21.03.1996, natural de Amambaí/MS, filho de Ezequiel Ribeiro Vega e Maria Tereza Vieira Ramos] pela prática, em tese, do delito de tráfico ilícito de substância entorpecente previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 porque ele foi surpreendido transportando em um veículo automotor (Mitsubishi, modelo L200. cor branca, placas FNJ-6876 de Mogi das Cruzes/SP) cerca de 850 (oitocentos e cinquenta) tabletes de uma substân-cia esverdeada análoga á maconha, cuja massa totalizou 935kg (novecentos e trinta e cinco quilos), com destino a cidade de Dourados (MS).

É o relatório. Decido.

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O flagrante está formalmente em ordem e comporta homologação. Deve-ras, o autuado foi preso em uma das situações previstas no art. 302 do CPP, estando verificada, assim, a situação de flagrância. Logo após a captura, o preso foi apresentado à autoridade competente, que, por sua vez, ouviu o condutor, colhendo sua assinatura e entregando a este cópia do termo e re-cibo de entrega do preso. Em seguida, procedeu à oitiva da testemunha que acompanhou o condutor, bem como ao interrogatório do conduzido sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas. Oportunizou-se a comunicação à família do preso ou pessoa por ele indicada. Ao final, a autoridade lavrou o auto. Depois disso, foi entregue ao preso, mediante recibo, a respectiva nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e o das teste-munhas. Também encontra-se satisfeita a exigência do § 1º do art. 50 da Lei nº 11.343/2006 (laudo de exame de constatação, com resultado positivo para a substância conhecida como maconha, de uso proscrito no Brasil, conforme a atualização da Portaria SVS/MS nº 344 de 12 de maio de 1998) – fl. 13.

Com o advento da Lei nº 12.403/2011, não sendo a hipótese de relaxamento do flagrante, o juiz pode converter a prisão em flagrante em preventiva (CPP. art. 310, inciso II), quando presentes os requisitos do art. 312 do CPP e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diver-sas da prisão, ou conceder liberdade provisória, com ou sem fiança (CPP, art. 310, inciso III).

No caso vertente, a conversão da prisão cm flagrante em preventiva é me-dida que se impõe. A imputação que pesa sobre o autuado é de ter cometi-do o crime de tráfico de drogas (Lei nº 11.343/2006, art. 33, caput), o qual é doloso punido com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 anos, o que autoriza o decreto de prisão preventiva a teor do inciso I do art. 313 do CPP. Nesse momento, não está evidenciada a presença de nenhuma excludente de antijuridicidade. o que afasta a vedação do art. 314 do CPP quanto ao decreto de prisão preventiva.

Analisando o teor dos depoimentos dos policiais que efetuaram o fla-grante, Leandro Moya Vasconcelos (fls. 6-7) e Pietro Talles Sanches Ribas (fls. 8-9), aliados ao interrogatório do conduzido, no qual este confessa a prática delitiva (fl. 14), e certo que há prova da existência do crime e indí-cios suficientes de autoria recaindo sobre o autuado (fumus commissi delicti). Igualmente, está presente o periculum libertatis, sendo a custódia cautelar do autuado necessária para garantia da ordem pública, haja vista a enorme quantidade de droga apreendida 935 Kg da substância conhecida como

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maconha que estava sendo transportada à cidade de Dourados/MS pelo autuado, a indicar a presença de periculosidade social reveladora da neces-sidade da prisão. Isso, por si só, evidencia a gravidade concreta da conduta imputada e legitima a manutenção da prisão processual.

Nesse sentido, colaciona-se o seguinte julgado do STJ que manteve a prisão cautelar para garantia da ordem pública em razão de quantidade de droga bem inferior àquela apreendida nos autos:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS – TRÁFICO INTE-RESTADUAL DE ENTORPECENTES – PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA – PRETENDIDA REVOGAÇÃO – ELEVADA QUANTIDADE DO ESTUPEFACIENTE APREENDIDO – POTENCIALIDADE LESIVA DA INFRAÇÃO – GRAVIDADE – NE-CESSIDADE DE ACAUTELAMENTO DA ORDEM PÚBLICA – CUS-TÓDIA JUSTIFICADA E NECESSÁRIA – CONDIÇÕES PESSOAIS FA-VORÁVEIS – IRRELEVÂNCIA – COAÇÃO ILEGAL NÃO DEMONS-TRADA – 1. Não há ilegalidade na manutenção da prisão preventiva quando demonstrado, com base em fatores concretos, que a segregação se mostra necessária, dada a gravidade da conduta incriminada. 2. A natureza lesiva e a elevada quantidade do estupefaciente apreendido em poder da recorrente – mais de 10 (dez) quilos de maconha – e as circunstâncias em que se deu a prisão em flagrante – no aeroporto ten-tando embarcar com a referida droga com destino a Estado diverso, após ter sido contratada para efetuar o transporte da substância tóxica – bem demonstram a periculosidade social da acusada e a gravidade concreta do delito que lhe é imputado, autorizando a conclusão pela necessidade da segregação para a garantia da ordem e saúde pública. 3. Condições pessoais favoráveis não têm em princípio, o condão de, isoladamente, revogar a prisão cautelar, se há nos autos elementos su-ficientes a demonstrar a necessidade da custódia. PRISÃO ANTECIPA-DA – INCIDÊNCIA DA LEI Nº 12.403/2011 – IMPOSSIBILIDADE – GRAVIDADE DO DELITO – MEDIDAS ALTERNATIVAS QUE NÃO SE MOSTRARIAM SUFICIENTES PARA ACAUTELAR A ORDEM E SAÚDE PÚBLICA – AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL – 1. Indevida a aplicação de medidas diversas da prisão quando a segre-gação encontra-se justificada na gravidade concreta do delito cometido, a demonstrar a insuficiência das medidas alternativas para acautelar a ordem e saúde pública. 2. Recurso improvido. (STJ, RHC 41.374/MS, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª T., Julgado em 26.11.2013, DJe 05.12.2013)

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Por fim, as medidas cautelares diversas da prisão, elencadas no rol do art. 319 do CPP revelam-se inadequadas e insuficientes para resguardar a ordem pública, porquanto não impediriam a continuidade da narcotrafi-cância pelo autuado. A falta de vinculação ao distrito de culpa (residência fixa e ocupação lícita) torna inadequadas as medidas de comparecimento periódico em juízo; proibição de ausentar-se da Comarca; e de recolhimen-to domiciliar no período noturno e nos dias de folga. E analisando as cir-cunstâncias do fato e as condições pessoais do autuado conclui-se que seria insuficiente a aplicação das medidas de proibição de acesso ou freqüên-cia a determinados lugares e de proibição de manter contato com pessoa determinada. Por sua vez, revelam-se impertinentes ao caso concreto as medidas de suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira; e de internação provisória, porque, ao que parece, o autuado e plenamente imputável. O inciso II do art. 323 do CPP veda expressamente a possibilidade de concessão de fiança. E, final-mente, no âmbito desta Comarca ainda não está implementado o sistema de monitoração eletrônica.

Por tudo isso, impõe-se a prisão preventiva do autuado.

Ante o exposto, converto a prisão em flagrante de Alex Sander Ramos Vega [brasileiro, estudante, RG 2030539, SSP/MS, CPF XXXX, nascido aos 21.03.1996, natural de Amambaí/MS, filho de Ezequiel Ribeiro Vega e Maria Tereza Vieira Ramos] em prisão preventiva, a fim de garantir a ordem pública. Expeça-se mandado de prisão preventiva em desfavor do autuado, com prazo de validade de 20 anos a contar da data do fato (prazo prescricional), observando a Resolução nº 137 do CNJ, especialmente o § 2º de seu art. 5º. Dê-se ciência ao Ministério Público, especialmente para fins do art. 50 da Lei nº 11.343/2006, e à Defensoria Pública.

Assim que retomado o expediente no Cartório Distribuidor da Comarca de Amambai, o presente auto de prisão em flagrante deverá ser distribuído, cabendo ao juízo competente (natural) designar e realizar a audiência de custódia.

E certo que, antes do início da audiência, a serventia, à qual for distribuído o presente auto de prisão em flagrante, deverá providenciar: (a) consul-ta de informações sobre a vida pregressa dos autuados no sistema Sigo; (b) juntada dos antecedentes dos autuados; e (c) certidão sobre a existência ou não de mandados de prisão em desfavor dos autuados pendentes de cumprimento, em consulta ao SIGO e ao BNMP do CNJ.

Às providências.

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Ponta Porã/MS, 20 de março de 2016.

[assinatura digital]

Eguiliell Ricardo da Silva

Juiz de Direito Plantonista”

Em audiência de custódia realizada em 21.03.2016, foi ratificada a decisão mencionada e indeferido o pedido de liberdade provisória.

Em audiência de instrução realizada no dia 06.07.2016, nos presentes au-tos, o Ministério Público aditou a denúncia para que o recorrente passasse, também, a responder pelos delitos de receptação e adulteração de sinal identificador de veículo automotor. Após manifestação da defesa, foi rece-bido o aditamento da denúncia.

Na mesma oportunidade foram inquiridas as testemunhas, bem como in-terrogado o recorrente. Ademais, atendendo a requerimento da defesa, foi determinada a instauração de incidente de dependência toxicológica, dis-tribuído em apenso, autos nº 0000298-77.2017.8.12.0004.

Em mutirão carcerário foi mantida a segregação do recorrente, uma vez constatada a regularidade da ordem de prisão.

Homologado o laudo pericial do incidente de dependência toxicológica e trasladadas cópias para a ação penal, foi determinada intimação das partes para, querendo, re-quererem diligencias e, nada sendo requerido, apresentarem alegações finais.

As partes não requereram diligências e os autos se encontram com carga ao Ministério Público para apresentação de alegações finais.

Desta forma, salvo melhor juízo, o retardo do feito decorre também de in-cidente requerido pela defesa e, encerrada a instrução processual, não mais se cogita de constrangimento decorrente de excesso de prazo para forma-ção da culpa, conforme Súmula nº 52 do STJ.

[...]

O Tribunal de origem, por sua vez, não reconheceu o excesso de pra-zo, entendendo que o feito ostentava tramitação regular dentro dos limites legais.

Confira-se (e-STJ fls. 77/82):

[...]

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Assim, requer a concessão de liminar a fim de que seja revogada a prisão preventiva da paciente, para que seja colocada em liberdade, e, ao final, a confirmação da ordem, em razão de estar caracterizado o constrangimen-to ilegal por excesso de prazo no término da instrução. Segundo consta das informações existentes nos autos, o paciente foi preso em flagrante no dia 19.03.2016, tendo sido a prisão convertida em preventiva na audiência de custódia em 21.03.2016, e foi denunciado como incurso nas penas do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, tendo sido instaurada a ação penal n.0000711-27.2016.8.12.0004, sendo que, posteriormente, na audiência re-alizada em 06.07.2016, a denúncia foi aditada para acrescer as imputações ao acusado da prática dos delitos previstos nos arts. 180 e 311, do Código Penal, pois o veículo que conduzia era produto de crime e estava com sinal de identificação adulterado (fls. 127-129, dos autos da ação penal).

Da dinâmica dos fatos, extraída da denúncia, fls. 01-4, dos autos da Ação Penal em referência, tem-se que:

“[...] Consta dos inclusos Autos de Inquérito Policial que, na data de 19 de março de 2016, por volta das 20h45min, na Rua da República, centro, próximo ao Posto Limeira, em Amambai/MS, o denunciado foi flagrado transportando, a quantidade de 935 kg (novecentos e trinta e cinco qui-los) da substância entorpecente conhecida como maconha, embaladas em 850 (oitocentos e cinquenta) tabletes, sem autorização legal e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Segundo restou apurado, nas circunstâncias de local, data e hora acima mencionadas, uma equipe de GU/PM, durante policiamento ostensivo e preventivo, avistou o veículo modelo e marca L200/Mitsubishi, cor branca, placas FNJ-6876, de Moji das Cruzes/SP, deslocando-se em atitude suspei-ta, aparentando estar com excesso de peso.

Assim, os milicianos realizaram acompanhamento tático, dando ordem de parada com sinais sonoros e luminosos, entretanto, o condutor, ora denun-ciado, seguiu em alta velocidade, empreendendo fuga.

Ato contínuo, os milicianos lograram êxito em apreender o veículo e o con-dutor, posteriormente identificado como sendo Alex Sander Ramos Veiga.

Realizada a averiguação do veículo, os policiais localizaram em seu interior e na caçamba, 850 (oitocentos e cinquenta) tabletes, da substância entorpe-cente conhecida vulgarmente como maconha, totalizando 935 Kg (nove-centos e trinta e cinco quilos).

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Perquirido informalmente sobre os fatos, o denunciado relatou que pegou o veículo em Coronel Sapucaia/MS, e que receberia R$ 30.000,00 (trinta mil reais), para transportar a droga até a cidade de Dourados/MS.

Em razão destes fatos, o denunciado foi autuado em flagrante delito e enca-minhado à Delegacia de Policia, para as providencias cabíveis.

A substância entorpecente foi apreendida (Auto de Exibição e Apreensão fls. 10-11) e atestada sua autenticidade (Laudo de Constatação Preliminar de fl. 13). O automóvel foi apreendido (fls. 10-11), bem como a quantia de R$ 257,00 (duzentos e cinquenta e sete reais), em moeda corrente nacional, e posteriormente depositada em conta vinculada (fl. 12).

Às fls. 25-28 constam as fotografias da droga e do veículo.

Inquirido em sede policial, o denunciado confessou a prática delituosa (Auto de Qualificação e Interrogatório fls. 15-16).

Realizada audiência de custódia, converteu-se a prisão em flagrante de Alex Sander Ramos Veiga em preventiva (Auto de Prisão em Flagrante nº 0001490-19.2016, fls. 34-37/40-41).

Ante o exposto, o Ministério Público Estadual denuncia Alex Sander Ra-mos Veiga como incurso no artigo 33 caput da Lei nº 11.343/2006. [...]” Em razão de tais fatos, o paciente foi denunciado.

No tocante ao alegado excesso de prazo para encerramento da instrução criminal, não assiste razão à defesa.

É cediço que, o reconhecimento da figura do excesso de prazo na configu-ração da culpa por meio de habeas corpus é medida excepcional, que só pode ser admitida nos casos em que a demora resulte da inércia do próprio aparato judicial (em obediência ao princípio da razoável duração do pro-cesso, previsto no art. 5º LXXVIII da Constituição Federal); ou quando im-plique em ofensa ao princípio da razoabilidade; ou ainda em decorrência exclusiva de diligências suscitadas pela acusação.

O direito à razoável duração do processo está previsto expressamente no art. 5º, LXXVIII da Constituição Federal, que preceitua: “A todos, no âmbi-to judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do proces-so e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.” Os Tribunais superiores já consolidaram o entendimento de que o prazo para formação da culpa (encerramento da instrução criminal) de réu preso, não é absoluto, podendo ser dilatado com base no princípio da razoabilidade (proporcio-nalidade), variando conforme as peculiaridades de cada processo.

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Essa é a lição do ilustre doutrinador Renato Brasileiro de Lima, que con-signa que:

“Assim, segundo entendimento pretoriano, ‘aplica-se o princípio da razo-abilidade ara justificar o excesso de prazo, caso haja regular tramitação do feito, com eventual retardamento no julgamento do paciente causado pela complexidade do processo, decorrente da pluralidade de acusados (onze), do desmembramento do feito em relação aos pacientes, bem como pela necessidade de expedição de diversas cartas precatória para o interroga-tório dos réus. Justifica-se eventual dilação de prazo para a conclusão da instrução processual, quando a demora não é provocada pelo Juízo ou pelo Ministério Público, ma sim decorrente de incidentes do feito e devido à observância de trâmites processuais sabidamente complexos’.”

(LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. 5. ed. Salvador: JusPo-divum, 2017, p. 987)

No caso em tela, embora o paciente estejam presos preventivamente desde 19.03.2016, as informações prestadas pela autoridade coatora, bem como a movimentação dos autos da Ação Penal nº 0000711-27.2016.8.12.0004, mos-tram que o feito não está parado.

Em consulta ao sistema SAG PG5 Comarca de Amabai, autos da Ação Pe-nal relativa aos fatos informados no presente writ, verifico que a denúncia em face do paciente foi oferecida em 29.03.2017, tendo sido recebida em 18.04.2016, e posteriormente aditada na audiência realizada em 06.07.2016.

Em 25.05.2016, o paciente apresentou defesa preliminar (fls. 68-70), e em 30.05.2016 o magistrado designou audiência de Instrução e julgamento para 06.07.2016.

Em 20.06.2016 sobreveio aos autos a juntada do laudo pericial da substân-cia entorpecente apreendida (fls. 92-96) e, em 01.07.2016 o laudo pericial do veículo apreendido (fls. 110-125), sendo que nesse ficou constatado que o chassi e a placa haviam sido adulterados, e que o chassi revelado após exa-me químico estava cadastrado para um veículo semelhante que segundo consulta ao Renavam está com ocorrência de Furto/Roubo.

Em 06.07.2016 realizou-se a audiência de instrução (fls. 127-129), tendo o Ministério Público aditado a denúncia, sendo que o magistrado determi-nou que se oficia-se à delegacia requisitando cópia do boletim de ocorrên-cia em que registrada a subtração do referido veículo apreendido.

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Em 06.09.2016 o magistrado determinou que se reiterasse o pedido à de-legacia referente ao B.O do veículo, bem como, determinou a distribuição com urgência do incidente de dependência toxicológica distribuído.

Em mutirão carcerário, em 29.05.2017, a situação do paciente foi reanaliza-da, mantendo-se sua prisão preventiva.

Como se observa, não existe o alegado constrangimento ilegal, pois o juízo não ficou inerte, logo, não deu causa ao retardamento da instrução pro-cessual, tendo em vista que realizou o que lhe cabia, dando andamento à instrução processual criminal.

Registra-se, por oportuno, ser pacífico o posicionamento no sentido de que os prazos indicados para encerramento da instrução criminal não são abso-lutos e servem, especialmente, como parâmetro geral, variando conforme as peculiaridades de cada processo.

Nesse sentido, é o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, senão vejamos, verbis:

[...]

Portanto, verifico que a ação penal está tendo seu trâmite regular, não haven-do desídia do magistrado durante a instrução, sendo justificada eventual demora pela complexidade do feito, uma vez que necessária a realização e análise de lau-dos periciais, a saber, laudo metalográfico, além do toxicológico, e da instauração do incidente de dependência toxicológica, sendo necessário a nomeação de perito e realização de exame médico, restando superada a alegação de constrangimento por excesso de prazo.

Nesse contexto, inviável o reconhecimento do alegado excesso de prazo; primeiro, porque em razão da confrontação entre o tempo de segregação cautelar com a pena mínima cominada ao tipo imputado; segundo, porque o extrato de movimentação processual não indica a ocorrência de desídia judicial no impulsionamento do feito. (g.n.)

No caso, a defesa alega que o paciente está preso desde 19.03.2016 e há excesso de prazo na instrução processual.

Embora a ação penal envolva somente o recorrente, trata-se de causa complexa pois ele é acusado de suposta prática de 3 (três) crimes graves, quais sejam, tráfico de drogas, receptação e adulteração de sinal de veículo automotor. O Magistrado de primeiro grau informou acerca da necessidade de realização de algumas perícias, com elaboração de laudo metalográfico,

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além do toxicológico, e da instauração do incidente de dependência toxico-lógica.

Ademais, o recorrente, mesmo que involuntariamente e no exercício do amplo direito de defesa, deu causa à procrastinação do feito, tendo em vista a necessidade da instauração de incidentes e realização das perícias. Por fim, consulta realizada ao sítio eletrônico do Tribunal de justiça local revela que a ação penal originária não ficou paralisada, o processo teve constante impulso judicial e instrução processual encontra-se encerrada.

Para a caracterização do excesso de prazo, a demora excessiva deve estar vinculada à desídia do Poder Público, em decorrência, por exemplo, de eventual procedimento omissivo do magistrado ou da acusação, o que não se verifica na espécie, uma vez que a ação penal apresenta processamento dentro dos limites da razoabilidade.

A ação se desenvolve de forma regular, sem comprovação de desídia ou inércia do Magistrado singular, inclusive com o encerramento da instrução processual.

Nesse contexto, incidem, ainda, os enunciados das Súmulas nºs 52 e 64 desta Corte Superior, as quais consignam que:

Súmula nº 52 – Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de cons-trangimento por excesso de prazo. (Súmula nº 52, Terceira Seção, Julgado em 17.09.1992, DJ 24.09.1992)

Súmula nº 64 – Não constitui constrangimento ilegal o excesso de prazo na instrução, provocado pela defesa. (Súmula nº 64, Terceira Seção, Julgado em 03.12.1992, DJ 09.12.1992 p. 23482)

Ainda nesse sentido:

[...]

1. A questão do excesso de prazo na formação da culpa não se esgota na simples verificação aritmética dos prazos previstos na lei processual, devendo ser analisada à luz do princípio da razoabilidade, segundo as circunstâncias detalhadas de cada caso concreto. 2. Examinando a ordem cronológica, verifica-se que a dilação do prazo para o término da instrução não se deu de maneira irregular, ten-do o feito tramitado dentro dos limites da razoabilidade. 3. Na hipótese, o feito conta com 16 acusados, assistidos por advogados distintos, diversas testemunhas, havendo necessidade de realizar audiência por videoconfe-rência e sendo registrado o desmembramento do feito em relação a um

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dos acusados.Ademais, já há audiência designada para a oitiva da última testemunha e interrogatório dos réus. [...] (HC 420.309/RJ, Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., Julgado em 16.11.2017, DJe 24.11.2017, g.n.)

[...] II – Os prazos processuais não tem as características de fatalidade e impror-rogabilidade, fazendo-se imprescindível raciocinar com juízo de razoabilidade para definir o excesso de prazo, não se ponderando a mera soma aritmética dos prazos para os atos processuais (precedentes). III – Na hipótese, verifica-se que os trâmites processuais ocorrem dentro da normalidade, não se tendo qual-quer notícia de fato que evidencie atraso injustificado ou desídia atribuí-vel ao Poder Judiciário, razão pela qual, por ora, não se reconhece o cons-trangimento ilegal suscitado. [...] (RHC 88.588/MS, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., julgado em 14.11.2017, DJe 22.11.2017, g.n.)

[...] 2. O excesso de prazo para o término da instrução criminal, segundo enten-dimento jurisprudencial deste Tribunal, deve ser aferido dentro dos limites da razoabilidade, considerando circunstâncias excepcionais que venham a retardar a instrução criminal e não se restringindo à simples soma aritmética de prazos pro-cessuais. 3. Na hipótese, apesar de custodiado o paciente desde 10.06.2013, o retardo no processamento do feito criminal adveio da complexidade da causa, evidenciada pelo número de acusados (três) e de vítimas (quatro) envolvidos – o que acarretou a expedição e renovação de cartas precató-rias para várias comarcas –, pela redistribuição do feito por deslocamento de competência, bem como pela necessidade de apreciação dos diversos pedidos formulados pela defesa dos réus (transferências prisionais e rela-xamento de custódia), sem se divisar qualquer desídia do magistrado sin-gular na condução da marcha processual. 4. Habeas corpus não conhecido.

(HC 304.054/PE, Rel. Min. Gurgel de Faria, 5ª T., J. 28.04.2015, DJe de 18.05.2015, g.n.)

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DO RECURSO PRÓPRIO (NÃO CONHECIMENTO) – ROUBO CIRCUNSTANCIADO, RECEPTAÇÃO E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA (HIPÓTESE) – PRISÃO PREVENTIVA (PRETENDIDA REVOGAÇÃO) – EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA (ALEGAÇÃO) – PLURALIDADE DE RÉUS; EXPEDIÇÃO DE CARTAS PRECATÓRIAS (COMPLEXIDADE DO FEITO) – PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE (ADOÇÃO) – CONSTRANGIMENTO ILEGAL (NÃO CONFIGURADO)

[...] 2. Caso em que, de acordo com a inicial acusatória, o paciente e outros denunciados “agem de forma planejada, cada um com tarefa específica, visando o cometimento de crimes de roubo, além de porte de arma de fogo,

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receptação e uso de documentos falsos. Enquanto dois dos membros exe-cutam diretamente o roubo, utilizando uma motocicleta, outros dois ficam em um veículo para dar apoio às ações criminosas do grupo criminoso, sendo que o membro responsável pela abordagem direta, transportado na garupa da motocicleta, logo que se afasta do local do crime, entra no veí-culo de apoio, visando dificultar a localização e abordagem da motocicleta utilizada no crime”.

3. O constrangimento ilegal por excesso de prazo não resulta de um critério aritmé-tico, mas de uma aferição realizada pelo julgador, à luz dos princípios da razoabili-dade e da proporcionalidade, levando em conta as peculiaridades do caso concreto.

4. Eventual retardo na tramitação do feito justifica-se pela pluralidade de réus e pela necessidade de expedição de cartas precatórias (Precedentes).

5. Ausente a alegada desídia da autoridade judiciária na condução do feito, não cabe falar em constrangimento ilegal. Ao revés, constata-se que o Ma-gistrado, a despeito das circunstâncias adversas, procura imprimir à ação penal andamento regular.

6. Habeas corpus não conhecido. (HC 310.593/CE, de minha relatoria, 5ª T., J. 20.08.2015, DJe de 28.08.2015)

Não comprovada a desídia do Poder Judiciário na condução do pro-cesso, não se vislumbra constrangimento ilegal hábil a ser reparado por este Superior Tribunal de Justiça.

Ante o exposto, conheço do recurso ordinário em habeas corpus e nego--lhe provimento.

É o meu voto.

Ministro Reynaldo Soares da Fonseca Relator

CERTIDÃO DE JULGAMENTO QUINTA TURMA

Número Registro: 2017/0182050-6

Processo Eletrônico RHC 87.553/MS

Matéria criminal

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Números Origem: 0000711-27.2016.8.12.0004 14068680920178120000 1406868092017812000050000 7112720168120004

Em Mesa Julgado: 12.12.2017

Relator: Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Jose Adonis Callou de Araujo Sa

Secretário: Me. Marcelo Pereira Cruvinel

AUTUAÇÃO

Recorrente: Alex Sander Ramos Veiga (preso)

Advogado: Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso do Sul

Recorrido: Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul

Assunto: Direito penal – Crimes previstos na legislação extravagante – Crimes de tráfico ilícito e uso indevido de drogas – Tráfico de drogas e condutas afins

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Quinta Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso.”

Os Srs. Ministros Ribeiro Dantas, Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer e Jorge Mussi votaram com o Sr. Ministro Relator.

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TrF 2ª r.Tribunal regional Federal da 2ª região

Recurso em Sentido EstritoNº CNJ: 0003224-80.2014.4.02.5102 (2014.51.02.003224-6)Relator: Desembargador Federal Paulo Espirito SantoRecorrente: Ministério Público FederalProcurador: Procurador Regional da RepúblicaRecorrido: Jerônimo Henrique da Silva PinheiroDefensor Público: Defensoria Pública da UniãoOrigem: 02ª Vara Federal de Niterói (00032248020144025102)

EMENTA

penal e processual penal – recurso eM sentido estrito – indícios de Fraude na concessão de

BeneFício previdenciÁrio – aplicação do princípio in duBio pro societate – receBiMento da denúncia

I – Mesmo no caso de a denúncia apresentar uma deficiência, contanto que esta seja superável e que haja a constatação do crime, deve ser recebida a peça acusatória, exercendo-se, apenas, um juízo de probabilidade, sem a incursão no mérito dos elementos constan-tes na inicial, e aplicando-se o princípio in dúbio pro societate.

II – Seja para fins de apuração de responsabilidade do acusado pelo delito, seja para fins de se constatar a presença de dolo ou mes-mo de incapacidade do agente à época dos fatos, a sua participação deve ser apurada, sobretudo no caso, em que a inicial logrou apon-tar, satisfatoriamente, o liame entre sua conduta e o delito narrado, além de possibilitar o pleno exercício do direito de defesa.

III – Recurso ministerial provido. Recebimento da denúncia, nos termos da Súmula nº 709, do STF, com o regular prosseguimento do feito.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos, acordam os Desembargadores Federais da 1ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.

Rio de Janeiro, 13 de dezembro de 2017.

Desembargador Federal Paulo Espirito Santo Relator

RELATÓRIO

Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto pelo Ministério Pú-blico Federal contra a decisão (fls. 06/10) da lavra do MM. Juiz Federal da 2ª Vara Federal de Niterói/RJ (especializada em matéria criminal), Fabricio Antonio Soares, que, em face da ausência de elementos mínimos acerca da autoria e materialidade do delito, rejeitou a denúncia oferecida em face de Jerônimo Henrique da Silva Pinheiro.

A inicial acusatória narra a prática, em tese, do delito capitulado no art. 171, § 3º, do Código Penal em virtude de fraude na concessão de benefício previdenciário (auxílio-doença). Segundo o MM. Juiz sentenciante, a denún-cia foi oferecida sem elementos que pudessem afastar a veracidade das ano-tações constantes da CTPS do denunciado.

Em razões de recurso, argumenta o MPF, às fls. 18/25, haver justa cau-sa suficiente ao recebimento da inicial acusatória. Para tanto, sustenta, em síntese, o seguinte:

– conforme relata a peça acusatória de fls. 01/03, corroborada pelos documentos que instruem o procedimento investigatório, o de-nunciado, efetivamente, obteve a concessão, por meio fraudulen-to, de benefício previdenciário ao qual não fazia jus, valendo-se de vínculos de trabalho aparentemente falsos com 3 (três) emprega-dores distintos, com o flagrante intuito de garantir a qualidade de segurado, gerando considerável prejuízo aos cofres da União;

– diferentemente do que afirma o juiz a quo na decisão de fls. 06/10, as informações obtidas junto ao Conselho Nacional de Informa-ções Sociais – CNIS e também perante o Cadastro de Contribuintes do ICMS/RJ – que, a toda evidência não possuem, assim como

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qualquer outro documento, presunção absoluta de veracidade –, não foram “utilizados como único fundamento para a desconsideração de vínculos empregatícios”, considerados para a propositura da ação penal;

– foram considerados para a propositura da ação penal as declara-ções prestadas pelo acusado em sede policial, o relatório conclu-sivo de fls. 117/121, elaborado pela Previdência Social e as pes-quisas externas promovidas por servidores daquele órgão, dentre outros elementos; e

– a apuração do grau de responsabilidade do acusado pelo delito, eventual constatação de ausência de dolo ou mesmo de incapaci-dade do agente à época dos fatos, são questões a serem levantadas e oportunamente enfrentadas durante a instrução criminal, no cur-so da correspondente demanda.

Em contrarrazões (fls. 38/42), a defesa pede a manutenção da sentença terminativa recorrida, insistindo no argumento de inexistência de indícios mínimos de autoria e materialidade para a deflagração da ação penal.

Às fls. 57/62, o Ministério Público Federal, na condição de custus legis, apresentou parecer, opinando pelo provimento do recurso.

É o relatório.

Rio de Janeiro, 13 de dezembro de 2017.

Desembargador Federal Paulo Espirito Santo Relator

VOTO

Como relatado, cuida-se de Recurso em Sentido Estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a decisão (fls. 06/10) da lavra do MM. Juiz Federal da 2ª Vara Federal de Niterói/RJ (especializada em matéria criminal), Fabricio Antonio Soares, que, em face da ausência de elementos mínimos acerca da autoria e materialidade do delito, rejeitou a denúncia oferecida em face de Jerônimo Henrique da Silva Pinheiro. A decisão deve ser reformada.

Com efeito, cabe consignar, inicialmente, que, nos termos do art. 41 do Código de Processo Penal, “A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato cri-minoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimen-

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tos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas”.

Por outro lado, de acordo com o art. 395 do aludido diploma proces- sual, com a redação dada pela Lei nº 11.719/2008, as causas para a rejeição da denúncia são as seguintes:

a) Quando a denúncia for manifestadamente inepta;

b) Faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; e

c) Faltar justa causa para o exercício da ação penal.

É sabido, outrossim, que, mesmo no caso de a denúncia apresentar uma deficiência, contanto que esta seja superável e que haja a constatação do crime, deve ser recebida a peça acusatória, exercendo-se um juízo de pro-babilidade, sem a incursão no mérito dos elementos constantes na inicial, na medida em que vige no nosso ordenamento jurídico o princípio in dubio pro societate.

Na hipótese, analisando-se o relatado na peça acusatória, e, bem assim, os documentos que instruem o procedimento investigatório; as declarações prestadas pelo próprio acusado em sede policial; o relatório conclusivo de fls. 117/121, elaborado pela Previdência Social; e as pesquisas externas pro-movidas por servidores da Autarquia, verifica-se que a denúncia não é inep-ta, encontrando-se presentes os pressupostos processuais e as condições para o exercício da ação penal; além da existência de justa causa a justificar o seu recebimento.

Registre-se que, na espécie, a inicial acusatória expôs, de forma de-talhada, a conduta ilícita supostamente praticada pelo acusado Jerônimo Henrique da Silva Pinheiro, que, no dia 17.09.2010, teria, dolosamente, re-querido e obtido êxito na concessão fraudulenta de auxílio-doença perante a agência da Previdência Social localizada no Bairro de Fátima, Niterói/RJ, valendo-se de vínculos empregatícios falsos, com ajuda de terceiro, cujo rece-bimento teria perdurado até o dia 30.11.2012, e gerado aos cofres públicos do INSS, um prejuízo calculado em R$ 104.227,76 (cento e quatro mil e duzentos e vinte e sete reais e setenta e seis centavos), caracterizando, em tese, o ilícito penal, existindo fortes indícios da ocorrência de dolo na sua conduta.

A denúncia também detalhou, satisfatoriamente, os vínculos empre-gatícios falsos supostamente lançados pelo acusado, quais sejam: Café e

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Restaurante Pedro II Ltda. (02.02.2000 – 15.02.2006); KRS Eletrônica Com. e Representações Ltda. (01.07.2006 – 30.08.2007) e Antônio Carlos Pacheco (02.02.2007 – 30.08.2008), sendo certo que, em seu depoimento, o próprio Jerônimo Henrique, além de se limitar a dizer que não se lembrava de ter trabalhado nos referidos estabelecimentos, embora afirmasse que possuía vínculos empregatícios quando obteve o benefício previdenciário, atribuiu as atividades fraudulentas a um sujeito chamado “Carlos”, não fornecendo, porém, qualquer informação que pudesse legar a autoridade policial a iden-tificar e localizar esse indivíduo.

Fora isso, a denúncia também esclareceu que os vínculos apontados pelo denunciado eram integralmente extemporâneos, e que teriam sido ca-dastrados no sistema competente através de GFIPs após a rescisão dos perti-nentes contratos trabalhistas.

Destarte, seja para fins de apuração de responsabilidade do acusado pelo delito, seja para fins de se constatar a presença de dolo ou mesmo de in-capacidade do agente à época dos fatos, a sua participação deve ser apurada, sobretudo no caso, em que a inicial logrou apontar o liame entre sua conduta e o delito narrado e possibilitou o pleno exercício do direito de defesa.

Diante do exposto, dou provimento ao Recurso em Sentido Estrito inter-posto pelo Ministério Público Federal, para receber a denúncia, nos termos da Súmula nº 709, do STF, determinando o regular prosseguimento do feito.

É como voto.

Rio de Janeiro,13 de dezembro de 2017.

Desembargador Federal Paulo Espirito Santo Relator

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EmEntário PEnal

concussão – corrupção passiva – alegação de pena-Base

eXcessiva – não ocorrÊncia32046 – “Penal. Habeas corpus. Concussão. Corrupção passiva. Alegação de pena-base excessiva. Não ocorrência. Fundamentação concreta quanto à culpabilidade, motivo e circunstâncias. Trancamento da ação penal prejudicado. Sentença de condenação já pro-ferida. Execução provisória. Possibilidade. Julgamento da apelação. Pedido de prisão do-miciliar. Ausência de comprovação quanto à necessidade. 1. Em relação ao pedido de trancamento da ação penal, este mostra-se prejudicado, uma vez que já proferida a sen-tença condenatória e já confirmada no julgamento do recurso de apelação pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. 2. Ausente flagrante ilegalidade na hipótese, em relação à fixação da pena-base, pois concreta a motivação apresentada quanto às três circunstâncias judiciais, culpabilidade, motivo e circunstâncias do crime. 3. Não se visualiza constrangimento ile-gal ao paciente quanto à quantidade e valor do dia-multa, tendo em vista sua boa con-dição financeira, como afirmado na sentença. 4. Quanto ao pedido de regime domiciliar, girando a compreensão da matéria na necessidade do exame de diversos elementos, não ficou evidenciada e comprovada a imprescindibilidade da referida medida. 5. Ordem de-negada.” (STJ – HC 402.830 – (2017/0135915-5) – 6ª T. – Rel. Min. Sebastião Reis Júnior – DJe 15.12.2017)

criMe seXual – trancaMento da ação penal – inÉpcia da denúncia

– ausÊncia de Justa causa32047 – “Penal e processo penal. Recurso em habeas corpus. 1. Crime sexual. Art. 217-A c/c art. 226, II, do CP. Trancamento da ação penal. Inépcia da denúncia. Ausência de justa causa. Superveniência de sentença condenatória. 2. Ausência de data específica. Desne-cessidade. Lapso temporal. Crime cometido em ambiente familiar contra criança. 3. Prisão provisória. Réu reincidente específico. Pai/avô da vítima. Gravidade concreta da condu-ta. Necessidade de resguardo da ordem pública. 4. Recurso em habeas corpus improvido. 1. O trancamento da ação penal na via estreita do habeas corpus somente é possível, em caráter excepcional, quando se comprovar, de plano, a inépcia da denúncia, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito. Com a superveniência da sentença, referidas alegações ficam enfraquecidas, uma vez que a prolação de sentença denota a ap-tidão da inicial acusatória para inaugurar a ação penal, implementando-se a ampla defesa

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e o contraditório durante a instrução processual, que culmina na condenação lastreada no arcabouço probatório dos autos. Portanto, não se pode falar em ausência de aptidão da denúncia nos casos em que os elementos carreados aos autos autorizam a prolação de sen-tença. 2. Não há irregularidade na ausência de indicação de data específica do delito, por-quanto praticado em continuidade delitiva, durante lapso efetivamente especificado na inicial acusatória, entre os anos de 2012 e 2014. Destaque-se, ademais, que em crimes dessa natureza, praticados no ambiente familiar, de forma reiterada e contra criança, torna-se difícil especificar data e hora das condutas, o que não diminui a precisão da imputação. Dessarte, tem-se preservada a ampla defesa. 3. No que concerne ao pedido de liberdade, tem-se que a Corte local indeferiu o pleito, em virtude de o recorrente ser reincidente específico, tendo praticado ‘atos libidinosos contra a vítima M.C.S., sua filha/neta, fruto de crimes de estupro contra sua filha J.S.C., o que, por óbvio, demonstra a periculosidade do agente’. Portanto, ‘é de se considerar suficientemente fundamentada a decisão que, invocando elementos concretos dos autos, considera que a custódia cautelar do paciente é necessária ao resguardo da ordem pública’. 4. Recurso em habeas corpus improvido.” (STJ – Rec-HC 87.653 – (2017/0186214-5) – 5ª T. – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – DJe 18.12.2017)

eXecução penal – inadequação da via eleita – livraMento

condicional – indeFeriMento – Faltas graves – ausÊncia de

requisito suBJetivo – ineXistÊncia de constrangiMento ilegal

32048 – “Execução penal. Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Inadequação da via eleita. Livramento condicional. Indeferimento. Faltas graves. Ausência de requi-sito subjetivo. Inexistência de constrangimento ilegal. Habeas corpus não conhecido. 1. O Supremo Tribunal Federal, por sua 1ª T., e a Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal pró-pria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade. Esse entendimento objetivou preservar a utilidade e a eficácia do mandamus, que é o instrumento constitucional mais importante de proteção à liberdade individual do cidadão ameaçada por ato ilegal ou abuso de poder, garantindo a celeridade que o seu jul-gamento requer. 2. In casu, o acórdão proferido pelo Tribunal de origem não dissentiu da orientação desta Corte de que, apesar de a falta grave não interromper o prazo para a ob-tenção de livramento condicional, o histórico carcerário conturbado do reeducando pode ser utilizado para evidenciar o não preenchimento do requisito subjetivo para a obtenção do benefício. 3. Habeas corpus não conhecido.” (STJ – HC 423.924 – (2017/0289210-5) – 5ª T. – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – DJe 18.12.2017)

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eXecução penal – progressão de regiMe – eXaMe criMinológico

– iMposição pelo triBunal seM FundaMentação idÔnea –

constrangiMento ilegal32049 – “Agravo regimental. Habeas corpus. Execução penal. Progressão de regime. Exa-me criminológico. Imposição pelo Tribunal sem fundamentação idônea. Constrangimento ilegal. Ocorrência. Pretensão de simples reforma. Decisão mantida por seus próprios fun-damentos. 1. Mantidos os fundamentos da decisão agravada, porquanto não infirmados por razões eficientes, é de ser negada simples pretensão de reforma. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-HC 421.185 – (2017/0271456-1) – 6ª T. – Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJe 15.12.2017)

eXecução penal – reMição da pena – pretendido cÔMputo Fictício

dos dias de traBalHo ou estudo “reMição Ficta” – iMpossiBilidade

32050 – “Embargos de declaração recebidos como agravo regimental. Habeas corpus. Exe-cução penal. Remição da pena. Pretendido cômputo fictício dos dias de trabalho ou estudo (‘remição ficta’). Impossibilidade. Ausência de previsão legal. 1. Nos termos do art. 33 c/c art. 126 da Lei de Execução Penal, a remissão da pena exige a efetiva realização de ativi-dade laboral ou de estudo por parte do reeducando, ‘o qual deve comprovar, de modo inequívoco, seu real envolvimento no processo ressocializador, razão por que não existe a denominada remição ficta ou virtual’ (RHC 124.775-AgR, DJe 19.12.2014). 2. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, ao qual se nega provimento.” (STF – EDcl--HC 132.779 – Mato Grosso do Sul – 1ª T. – Rel. Min. Alexandre de Moraes – J. 01.12.2017)

eXecução provisória de pena restritiva de direitos – art. 147

da lep – iMpossiBilidade32051 – “Agravo regimental em habeas corpus. Execução provisória de pena restritiva de direitos. Art. 147 da Lei de Execução Penal. Impossibilidade. 1. A Terceira Seção desta Cor-te, no julgamento do EREsp 1.619.087/SC, dirimiu a controvérsia acerca da possibilidade da execução provisória da pena restritiva de direitos, ao entendimento de que o Supre-mo Tribunal Federal, ao modificar sua jurisprudência no julgamento do HC 126.292/SP, não considerou a possibilidade de se executar provisoriamente a pena restritiva de direi-tos antes do trânsito em julgado da condenação, dispondo tão somente sobre a prisão do

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acusado condenado à pena privativa de liberdade em segundo grau, antes do trânsito em julgado, a teor do disposto no art. 147 da Lei de Execução Penal. 2. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-HC 425.944 – (2017/0302827-1) – 6ª T. – Rel. Min. Sebastião Reis Júnior – DJe 15.12.2017)

eXtorsão – pena-Base aciMa do MíniMo legal – idoneidade

da FundaMentação Judicial na valoração negativa da culpaBilidade – Motivação adequada – regiMe inicial

FecHado – pena-Base aciMa do MíniMo legal – FundaMentação

concreta – constrangiMento ilegal não evidenciado

32052 – “Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Não cabimento. Extorsão. Pena--base acima do mínimo legal. Idoneidade da fundamentação judicial na valoração nega-tiva da culpabilidade. Motivação adequada. Regime inicial fechado. Pena-base acima do mínimo legal. Fundamentação concreta. Constrangimento ilegal não evidenciado. Habeas corpus não conhecido. 1. Diante da hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso pró-prio, a impetração não deve ser conhecida, segundo Orientação Jurisprudencial do Su-premo Tribunal Federal – STF e do próprio Superior Tribunal de Justiça – STJ. Contudo, considerando as alegações expostas na inicial, razoável a análise do feito para verificar a existência de eventual constrangimento ilegal. 2. A dosimetria da pena deve ser feita seguindo o critério trifásico descrito no art. 68, c/c o art. 59, ambos do Código Penal – CP, e, no caso de majoração da pena-base, o Juiz sentenciante deve efetuar a dosimetria da pena ‘atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comporta-mento da vítima’. Na hipótese, verifica-se que a majoração da pena-base foi devidamente fundamentada no que se refere à culpabilidade, em que as instâncias ordinárias observa-ram que a conduta do réu, dolosa, excedeu a normalidade, haja vista que o paciente foi ao local constranger a vítima por 4 vezes, mesmo após conseguir extorquir uma quantia em dinheiro (R$ 1.000,00). 3. Não resta evidenciado constrangimento ilegal no que se refere ao regime inicial de cumprimento de pena imposto ter sido o fechado, a despeito da re-primenda corporal ter sido estabelecida em patamar superior a 4 e inferior a 8 anos de re-clusão, tendo em vista que a pena-base foi fixada acima do mínimo legal, em razão da cir-cunstância judicial desfavorável presente na hipótese. Habeas corpus não conhecido.” (STJ – HC 423.935 – (2017/0289256-0) – 5ª T. – Rel. Min. Joel Ilan Paciornik – DJe 18.12.2017)

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Furto – princípio da insigniFicÂncia – atipicidade Material –

não reconHeciMento32053 – “Penal. Habeas corpus. Furto (1) Princípio da insignificância. Atipicidade material. Não reconhecimento (2) Valor da res furtiva equivalente a mais de um salário mínimo vi-gente à época dos fatos (3) Ordem denegada. 1. Consoante entendimento jurisprudencial, o ‘princípio da insignificância – que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentaridade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal – tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material [...] Tal postulado – que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da con-duta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento, e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada – apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público’ (HC 84.412-0/SP, STF, Min. Celso de Mello, DJU 19.11.2004). 2. In casu, verifica-se que não é insignificante a conduta de furtar vários bens avaliados em R$ 908,90, equivalente a mais de um salário mínimo vigente à época dos fatos. Em tais circunstâncias, não há como reconhecer o caráter bagatelar do comportamento imputado, havendo afetação do bem jurídico. 3. Ordem denegada.” (STJ – HC 424.309 – (2017/0291279-5) – 6ª T. – Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJe 15.12.2017)

Furto – tentativa – peça de carne Bovina – restituição dos Bens à

vítiMa – reincidÊncia X aplicação do princípio da insigniFicÂncia –

eXcepcionalidade do caso concreto – atipicidade Material da conduta

32054 – “Penal e processo penal. Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Desca-bimento. Tentativa de furto de 1 (uma) peça de carne bovina, no valor total de R$ 118,06, (cento e dezoito reais e seis centavos). Restituição dos bens à vítima. Reincidência x apli-cação do princípio da insignificância. Excepcionalidade do caso concreto. Atipicidade ma-terial da conduta. Ordem concedida de ofício. 1. O Superior Tribunal de Justiça, seguindo entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, passou a não admitir o conheci-mento de habeas corpus substitutivo de recurso previsto para a espécie. No entanto, deve--se analisar o pedido formulado na inicial, tendo em vista a possibilidade de se conceder a ordem de ofício, em razão da existência de eventual coação ilegal. 2. De acordo com a orientação traçada pelo Supremo Tribunal Federal, a aplicação do princípio da insig-nificância demanda a verificação da presença concomitante dos seguintes vetores (a) a

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mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada. 3. O princípio da insignificância é verdadeiro benefício na esfera penal, razão pela qual não há como deixar de se analisar o passado criminoso do agente, sob pena de se instigar a multiplicação de pequenos crimes pelo mesmo autor, os quais se tornariam inatingíveis pelo ordenamento penal. Imprescindível, no caso con-creto, porquanto, de plano, aquele que é reincidente e possui maus antecedentes não faz jus a benesses jurídicas. 4. Posta novamente em discussão a questão da possibilidade de aplicação do princípio da insignificância, mesmo diante da reincidência do réu, a Terceira Seção desta Corte, no julgamento do EREsp 221.999/RS (Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Julgado em 11.11.2015, DJe 10.12.2015), estabeleceu a tese de que a reiteração cri-minosa inviabiliza a aplicação do princípio da insignificância, ressalvada a possibilidade de, no caso concreto, a verificação que a medida é socialmente recomendável. 5. Situação em que a tentativa de furto de 1 (uma) peça de carne bovina, avaliada em R$ 118,06 (cento e dezoito reais e seis centavos), bem como o produto foi devolvido à vítima. 6. Ademais, como o próprio Juízo de primeiro grau havia afirmado, ao conceder a liberdade provisó-ria, que o paciente encontra-se desempregado, em situação de hipossuficiência social, uma vez que faz tratamento clínico, recebendo tão somente o valor do bolsa-família, devendo--se, pois, concluir que se trata também de caso de furto famélico. 7. Assim, na espécie, a situação enquadra-se dentre as hipóteses excepcionais em que é recomendável a aplicação do princípio da insignificância a despeito da existência de reincidência, reconhecendo-se a atipicidade material da conduta. Precedentes análogos: AgRg-REsp 1415978/MG, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., Julgado em 02.02.2016, DJe 15.02.2016 e AgRg-AREsp 633.190/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª T., Julgado em 14.04.2015, DJe 23.04.2015, entre outros. 8. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para restabelecer a sentença absolutória.” (STJ – HC 418.945 – SP – (2017/0255116-0) – 5ª T. – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – DJe 13.12.2017)

nota:A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus em favor de um homem que havia sido condenado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) a 11 meses e 20 dias de prisão, em regime fechado, por ter furtado uma peça de carne bovina avaliada em R$ 118,06.O episódio aconteceu em um supermercado. O homem tentou subtrair a peça de carne, mas o sistema de segurança do estabelecimento comercial impediu a consumação do delito.O juízo de primeiro grau absolveu o réu. A sentença declarou atípica a conduta (princí-pio da insignificância) e também aplicou o art. 17 do Código Penal (crime impossível), porque o sistema de segurança possibilitou a recuperação da carne.Decisão reformadaO TJSP, entretanto, deu provimento ao recurso do Ministério Público. O acórdão en-tendeu pela impossibilidade de aplicação do princípio da insignificância e afastou a atipicidade da conduta em razão de o homem ser contumaz na prática de furtos. Para o TJSP, “a absolvição resultaria em incentivo à conduta delituosa”.

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No STJ, o relator, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, reconheceu que o princípio da insignificância não deve ser aplicado a todo e qualquer crime contra bem de baixo valor e tampouco legitimar reiteradas condutas delitivas, mas, diante das circunstâncias do caso concreto, entendeu pela impossibilidade da punição.Sentença restabelecida“Como o próprio juízo havia afirmado, em audiência de custódia, ao conceder a liber-dade provisória ao paciente, ele está desempregado, em situação de hipossuficiência social, uma vez que faz tratamento clínico e, por causa disso, não consegue emprego, recebendo tão somente o valor do bolsa família. Diante desse quadro, concluo que se trata, também, de caso de furto famélico”, disse o ministro.A Quinta Turma, ao acompanhar o voto do relator, restabeleceu a sentença absolutória do juízo de primeiro grau.

Furto qualiFicado e rouBo qualiFicado (latrocínio) –

prisão cautelar – eXcesso de prazo – ineXistÊncia de desídia

do JudiciÁrio – instrução encerrada – FundaMentos da

preventiva – Motivação idÔnea32055 – “Habeas corpus. Furto qualificado e roubo qualificado (latrocínio). Prisão cautelar. Excesso de prazo. Inexistência de desídia do Judiciário. Instrução encerrada. Fundamen-tos da preventiva. Motivação idônea. Gravidade concreta da conduta. 1. A teor da Súmula nº 52 desta Corte Superior, encerrada a instrução processual, afastada está a alegação de constrangimento ilegal por excesso de prazo, tanto mais se não há evidências de desídia do Judiciário na condução da ação penal, em vias de ser sentenciada. 2. Na hipótese, o Magistrado singular apresentou motivação apta a justificar a necessidade da prisão pre-ventiva para a garantia da ordem pública, dada a gravidade concreta da ação criminosa e a reiteração de conduta delitiva pelo paciente – após a prática do furto da quantia de R$ 3.600,00 (três mil e seiscentos reais) –, paciente e corréus voltaram ao local do crime para nova subtração, ao se depararem com a vítima, mataram-na a pauladas dentro de sua própria residência). 3. Inviável a aplicação de medidas cautelares diversas da pri-são, quando a segregação se encontra fundada na gravidade efetiva do delito, indicando que as providências menos gravosas seriam insuficientes para acautelar a ordem pública. 4. Ordem denegada.” (STJ – HC 400.411 – (2017/0117172-1) – 6ª T. – Rel. Min. Sebastião Reis Júnior – DJe 15.12.2017)

Furto qualiFicado tentado – participação eM organização

criMinosa – Falsidade ideológica –

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uso de docuMento Falso – nulidade no decreto da prisão preventiva

32056 – “Recurso em habeas corpus. Furto qualificado tentado. Participação em organi-zação criminosa. Falsidade ideológica. Uso de documento falso. Nulidade no decreto da prisão preventiva. Supressão de instância. Tribunal de origem não conheceu do writ pela ausência do decreto prisional. Inexistência de flagrante ilegalidade. Instrução deficiente. Excesso de prazo na formação da culpa. Inocorrência. Ausência de desídia do magistrado. Complexidade do feito. Pluralidade de réus e delitos. Expedição de cartas precatórias. Marcha processual regular. Recurso em habeas corpus parcialmente conhecido e, nessa ex-tensão, desprovido. 1. A tese de ausência de fundamentação para a decretação da prisão preventiva do recorrente não foi analisada pelo Tribunal a quo no acórdão impugnado, pois a defesa não trouxe aos autos a cópia do Decreto prisional, restando inviabilizado o seu exame por este Tribunal Superior, sob pena de supressão de instância. No ponto, cons-tata-se que o recurso em habeas corpus está deficientemente instruído diante da ausência de cópia que Decretou a prisão preventiva, documento essencial ao exame da controvérsia e da plausibilidade do pedido. 2. Ademais, constitui entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça que somente configura constrangimento ilegal por excesso de prazo na formação da culpa, apto a ensejar o relaxamento da prisão cautelar, a mora que decorra de ofensa ao princípio da razoabilidade, consubstanciada em desídia do Poder Judiciário ou da acusação, jamais sendo aferível apenas a partir da mera soma aritmética dos prazos processuais. In casu, trata-se de feito com pluralidade de réus, em que houve expedição de diversas cartas precatórias, bem como necessidade de aditamento da denúncia, em razão da dificuldade de identificação correta do próprio recorrente, o que contribuiu para a morosidade da instrução. Não há, pois, falar em desídia do Magistrado condutor, o qual tem diligenciado no sentido de dar andamento ao processo, não podendo ser imputado ao Judiciário a responsabilidade pela demora. Ademais, em consulta ao andamento proces-sual no site do Tribunal de origem, www.tjce.jus.br, observa-se que a Ação Penal nº 14832-09.2016.8.06.0075 possui audiência de instrução designada para o dia 20.02.2018. Recurso em habeas corpus parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido.” (STJ – Rec-HC 80.185 – (2017/0008979-5) – 5ª T. – Rel. Min. Joel Ilan Paciornik – DJe 18.12.2017)

HoMicídio tentado – prisão preventiva – pretensão de

reconHeciMento de ausÊncia de FundaMentação da custódia

– indicação de eleMento concreto consistente na periculosidade do agente

32057 – “Recurso em habeas corpus. Homicídio tentado. Prisão preventiva. Pretensão de reconhecimento de ausência de fundamentação da custódia. Indicação de elemento con-creto consistente na periculosidade do agente. Constrangimento ilegal manifesto. Ausên-

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cia. 1. Diz a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que toda prisão imposta ou mantida antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória, por ser medida de índole excepcional, deve vir sempre baseada em fundamentação concreta, isto é, em ele-mentos vinculados à realidade. 2. No caso, a segregação cautelar do recorrente se encontra consubstanciada na periculosidade do agente, dando conta da eventual reincidência do acusado e da gravidade em concreto do delito cometido. Precedente. 3. Recurso em habeas corpus improvido.” (STJ – Rec-HC 84.588 – (2017/0116435-0) – 6ª T. – Rel. Min. Sebastião Reis Júnior – DJe 15.12.2017)

inJúria religiosa e racial – ação penal – causa

iMpeditiva da prescrição32058 – “Civil e processo civil. Responsabilidade civil. Dano moral. Injúria religiosa e racial. Ação penal. Causa impeditiva da prescrição. Art. 200 do CC/2002. Ocorrência. 1. Ação ajuizada em 29.05.2013. Recurso Especial interposto em 20.05.2015 e atribuído a este Gabinete em 25.08.2016. 2. O propósito recursal consiste em determinar a legalidade na decretação da prescrição da pretensão de reparação dos danos morais suportados pelas recorrentes, considerando que o mesmo evento danoso pode ser compreendido como um fato típico e, portanto, crime, o que interromperia o prazo prescricional, nos termos do disposto no art. 200 do CC/2002. 3. O comando do art. 200 do CC/2002 incide quando houver relação de prejudicialidade entre as esferas cível e penal, isto é, quando a con-duta originar-se de fato também a ser apurado no juízo criminal, sendo fundamental a existência de ação penal em curso ou ao menos inquérito policial em trâmite. 4. Não é possível afastar a aplicação do art. 200 do CC/2002 em hipóteses que envolvam, além do pedido de indenização, discussões relacionadas à existência de responsabilidade solidária entre o autor da ofensa e aquele que consta no polo passivo da controvérsia, em razão da relação de preposto. 5. Recurso especial conhecido e provido.” (STJ – REsp 1.704.525 – (2015/0140025-5) – 3ª T. – Relª Min. Nancy Andrighi – DJe 18.12.2017)

interceptação teleFÔnica – decisões de prorrogação e novas

queBras – ausÊncia de indicação de eleMentos concretos a JustiFicar o deFeriMento da Medida eXcepcional

– ilegalidade reconHecida32059 – “Processual penal e penal. Recurso especial. Art. 33 C/C art. 35, ambos da Lei nº 11.343/2006. Interceptação telefônica. Decisões de prorrogação e novas quebras. Au-sência de indicação de elementos concretos a justificar o deferimento da medida excepcio-nal. Ilegalidade reconhecida. Provimento. 1. É exigida não só para a decisão que defere a

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interceptação telefônica, como também para as sucessivas prorrogações, a concreta indi-cação dos requisitos legais de justa causa e imprescindibilidade da prova, que por outros meios não pudesse ser feita. 2. Diante da ausência de fundamentação suficiente e válida, resta considerar eivadas de ilicitude as decisões que deferiram as prorrogações da medida de interceptação telefônica, assim como as novas decisões de quebra do sigilo telefônico. 3. Recursos especiais providos para declarar nulas as prorrogações e as novas quebras autorizadas e, bem assim, das provas consequentes, a serem aferidas pelo magistrado na origem, devendo o material respectivo ser extraído dos autos, procedendo-se à prolação de nova sentença com base nas provas remanescentes, estendido seus efeitos aos demais corréus, ficando prejudicadas as demais questões arguidas nos recursos especiais.” (STJ – REsp 1.691.902 – AP – (2015/0005810-6) – 6ª T. – Rel. Min. Nefi Cordeiro – DJe 04.12.2017)

nota:O vertente acórdão trata de recursos especiais interpostos em face de acórdão de ape-lação.Os recorrentes alegaram ofensa ao art. 5º da Lei nº 9.296/1996, art. 63 do CP, art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/1906 e art. 386, II, do Código de Processo Penal.Mencionaram ainda a falta de fundamentação das diversas prorrogações da intercep-tação telefônica.Afirmaram que a interceptação telefônica foi iniciada exclusivamente em denúncia anônima.Alegaram a exclusão da agravante, porquanto somente se prova a reincidência com cer-tidão de comprovação do trânsito em julgado da sentença condenatória anterior, com menção em que se tornou irrecorrível, o que não existe nos presentes autos.Menciona que ao recorrente não deve sobressair o regime fechado, pois a pena em de-finitivo pelo Relator foi abaixo dos 08 (oito) anos de reclusão, bem como o outro voto coloca genericamente a majoração de pena para que ele fique com a pena final de mais de 08 (oito) anos.Aduz ainda que, excluída a agravante da reincidência, faz jus à causa de diminuição do tráfico no patamar máximo, por preencher os requisitos previstos no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006.Sustentaram que a apreensão de drogas, embora apreendida com alguns réus apenas, valeu indiscriminadamente para todos os outros com base apenas em escutas telefôni-cas. Não se pode incutir provas a todos os réus se o recorrente, quando de sua prisão, não foi pego com nenhuma pílula de ecstasy.Mencionaram a ocorrência de reformatio in pejus, pois, em sede de Embargos de Decla-ração, o órgão do Ministério Público foi favorável ao recurso para manter a pena do recorrente naquela aplicada pelo relator da apelação criminal, qual seja a pena de 07 (sete) anos, 2 (dois) meses e 10 (dez) dias de reclusão, uma vez que o revisor não pode-ria majorar a pena para 08 (oito) anos, 04 (quatro) meses e 21 (vinte e um) dias.Requereram o provimento do recurso a fim de reconhecer a nulidade da interceptação telefônica, a ausência de materialidade delitiva, reduzir a pena com o afastamento da reincidência e a incidência a minorante do tráfico no patamar máximo com a posterior fixação de regime menos gravoso.

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Por unanimidade de votos, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça declarou a nulidade de prorrogações de interceptações telefônicas autorizadas sem fundamen-tação.Vale trazer trecho do voto do relator?“Assim, tratando-se de invasão à privacidade do cidadão, há de se justificar não apenas a legalidade da medida, mas sua ponderação como necessária ao caso concreto, o que não se verificou no caso em tela, em que tão somente deferido o pedido formulado sem qualquer motivação concreta.Note-se que sequer há remissão aos fundamentos utilizados na representação pelo De-legado de Polícia, tampouco na manifestação ministerial, que, de todo modo, entende majoritariamente esta Corte, exigiria acréscimo pessoal pelo magistrado, a indicar o exame do pleito e clarificar suas razões de convencimento.O que resta, pois, é a ausência de fundamentação casuística, em genérico decreto de deferimento das prorrogações e novas quebras, medida cabível a qualquer procedi-mento investigatório, e assim incapaz de suprir o requisito constitucional e legal da fundamentação.Assim, inafastável a conclusão de que as prorrogações e as novas quebras de intercep-tação telefônica careceram de fundamentação válida, exigida, consoante art. 5º da Lei nº 9.296/1996, o que atrai a mácula de ilicitude. A propósito:PROCESSUAL PENAL E PENAL – HABEAS CORPUS – SUBSTITUTIVO DE RECUR-SO ESPECIAL, ORDINÁRIO OU DE REVISÃO CRIMINAL – NÃO CABIMENTO – ART. 33 C/C ART. 35, AMBOS DA LEI Nº 11.343/2006 – INTERCEPTAÇÃO TELEFÔ-NICA – FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM – AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE ELEMENTOS CONCRETOS A JUSTIFICAR O DEFERIMENTO DA MEDIDA – CON-CESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO – [...] 3. Diante da ausência de fundamentação su-ficiente e válida, eiva-se de ilicitude as decisões que deferem medida de interceptação telefônica. 4. Habeas corpus não conhecido, mas, de ofício concedida a ordem para decla-rar nula a medida de interceptação telefônica relativa à Ação Penal nº 0105.08.270182-9, assim como das provas consequentes, devendo o material respectivo ser retirado dos autos e para nova sentença. (HC 185.443/MG, Rel. Min. Nefi Cordeiro, 6ª T., Julgado em 12.04.2016, DJe 23.05.2016)RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE DROGAS E ASSO-CIAÇÃO – PRISÃO PREVENTIVA – MOTIVAÇÃO INIDÔNEA – FALTA DE INDI-CAÇÃO DE ELEMENTOS CONCRETOS A JUSTIFICAR A MEDIDA – NULIDADE DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS – OCORRÊNCIA – NÃO DEMONSTRA-ÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE – MEDIDAS QUE PERDURARAM POR MAIS DE 1 ANO SEM MOTIVAÇÃO – CONSTRANGIMENTO ILEGAL FLAGRANTE – PRO-VIMENTO – EXTENSÃO DE OFÍCIO AOS CORRÉUS – 1. A prisão processual deve ser decretada no caso de situações extremas, em meio a dados sopesados da experiência concreta, porquanto o instrumento posto a cargo da jurisdição reclama, antes de tudo, o respeito à liberdade. In casu, o magistrado de primeiro grau não indicou qualquer fun-damento concreto a demonstrar a presença dos requisitos da prisão preventiva. Limi-tou-se a afirmar que se trata de uma quadrilha e que “os autos falam por si sós”, sem ex-plicitar qual motivo autoriza a medida extrema. Afirmou, também, genericamente, que a instrução criminal não seria a mesma com os réus soltos, sem apontar concretamente o risco à instrução do feito. Extensão de ofício aos corréus. 2. São nulas as interceptações telefônicas deferidas em decisões carentes de fundamentação concreta, que não apon-

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tam a imprescindibilidade da medida. Hipótese em que a autoridade policial requereu a quebra de sigilo amparada apenas no tipo de crime supostamente cometido (tráfico de drogas), sem qualquer demonstração da inexistência de outros meios investigativos. E o magistrado a quo limitou-se a acolher o pedido policial e o parecer ministerial, que também não estava motivado, sem tecer qualquer mínima consideração, em violação à Lei nº 9.296/1996. Ademais, o ato, viciado em sua origem, perdurou por mais de 1 ano sem motivação. Embora esta Corte venha admitindo, na linha do que já decidiu o Supremo Tribunal Federal (HC 92.020/DF), a chamada fundamentação per relationem, não há como adotá-la na espécie, porquanto o próprio requerimento policial, acolhido pelo magistrado, carecia de motivação idônea. Extensão de ofício aos corréus. 3. Recur-so ordinário provido a fim de revogar a prisão preventiva do recorrente na ação penal aqui tratada, bem como para declarar ilegais as interceptações telefônicas, determinan-do a exclusão das provas delas decorrentes. Em consequência, decretar a nulidade do processo, ab initio, inclusive da denúncia, ressalvando a possibilidade de outra ser ofe-recida, desde que baseada em elementos diversos. De ofício, estende-se essa decisão a todos os denunciados. (RHC 61.069/RJ, Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., Julgado em 28.06.2016, DJe 03.08.2016)

licitação – Fraude – denúncia – reJeição – ausÊncia de

deMonstração do especial FiM de agir e do preJuízo ao erÁrio

– eleMentos iMprescindíveis à conFiguração do delito

32060 – “Penal. Art. 89 da Lei nº 8.666/1993. Fraude à licitação. Prefeito. Lei nº 8.038/1990. Denúncia. Rejeição. Ausência de demonstração do especial fim de agir e do prejuízo ao erário. Elementos imprescindíveis à configuração do delito. Violação dos arts. 41 e 395, III, do CPP. Súmula nº 07/STJ. I – Com ressalva a posicionamento pessoal, esta Col. Corte Superior, após inicial divergência, assentou entendimento de que, para a configuração do crime previsto no art. 89 da Lei nº 8.666/1993, imprescindível demonstrar elemento subjetivo especial do tipo consistente na vontade de causar dano ao erário, bem como a configuração do efetivo prejuízo aos cofres públicos. II – No presente caso, verifica-se que o acórdão ora atacado concluiu que a narrativa da exordial acusatória demonstra ‘em tese, o cometimento de irregularidades administrativas, a serem eventualmente apuradas em esfera própria’ e que da denúncia não se afere qualquer elemento ou indícios mínimos de que o recorrido teria agido com intenção de causar prejuízo à Administração e que o procedimento administrativo irregular tenha gerado dano aos cofres públicos. III – Dessa feita, acolher a pretensão recursal, para infirmar a ausência de requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, qual seja ‘a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias’, implicaria necessário revolvimento do acervo probatório. Precedentes da Corte Especial e de ambas as Turmas que compõem a Terceira Seção. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.611.855 – (2016/0174672-5) – 5ª T. – Rel. Min. Felix Fischer – DJe 18.12.2017)

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organização criMinosa – prisão preventiva decretada na sentença

– art. 312 do cpp – periculuM liBertatis – possiBilidade

32061 – “Habeas corpus. Organização criminosa. Prisão preventiva decretada na sentença. Art. 312 do CPP. Periculum libertatis. Fundamentação concreta e idônea. Estatuto da Pri-meira Infância. Prisão domiciliar. Possibilidade. Ordem concedida. 1. A Lei nº 13.257/2016 estabelece o conjunto de ações prioritárias a ser observado na primeira infância (0 a 6 anos de idade), mediante ‘princípios e diretrizes para a formulação e implementação de políti-cas públicas [...] em atenção à especificidade e à relevância dos primeiros anos de vida no desenvolvimento infantil e no desenvolvimento do ser humano’ (art. 1º), em consonância com o Estatuto da Criança e do Adolescente. 2. A novel legislação teve reflexos no Código de Processo Penal e imprimiu nova redação ao inciso IV do seu art. 318, além de acrescer--lhe os incisos V e VI. Tais mudanças encontram suporte no próprio fundamento que subjaz à Lei nº 13.257/2016, notadamente a garantia do desenvolvimento infantil integral, com o ‘fortalecimento da família no exercício de sua função de cuidado e educação de seus filhos na primeira infância’ (art. 14, § 1º). 3. Apesar da motivação concreta lançada para embasar a prisão preventiva, não há notícias de eventual existência de antecedentes por parte da paciente, que comprovou possuir duas filhas e um filho menores, os quais, segundo relatório médico, estariam passando por problemas de saúde – segundo a defesa, devido à ausência da mãe. 4. Ordem concedida para substituir a custódia preventiva da ré por prisão domiciliar, caso não esteja presa por outro motivo. Fica a cargo do Juízo mono-crático a fiscalização do cumprimento do benefício.” (STJ – HC 417.823 – (2017/0247124-5) – 6ª T. – Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz – DJe 15.12.2017)

pena – dosiMetria – constrangiMento ilegal

– iMpossiBilidade32062 – “Agravo regimental. Habeas corpus. Fundamentação per relationem. Dosimetria. Pretensão de simples reforma. Decisão denegatória mantida por seus próprios fundamen-tos. Recurso a que se nega provimento. 1. A jurisprudência tem admitido que decisões judiciais louvem-se em excertos do édito condenatório e das manifestações do proces-so, desde que haja um mínimo de fundamentos, com transcrição de trechos das peças às quais há indicação (per relationem), o que ocorreu na espécie. 2. Em se tratando de roubo circunstanciado, diante do disposto no § 2º do art. 157 do Código Penal e no parágrafo único do art. 68 do mesmo Codex, a majoração da pena na terceira fase da dosimetria acima do mínimo legal requer devida fundamentação, com referência a circunstâncias concretas que justifiquem um acréscimo mais expressivo. In casu, observa-se que, na ter-ceira fase dosimétrica, houve um só aumento, evidenciado na exasperação da pena pela fração de 3/8, tendo em vista não apenas a presença de duas majorantes, mas o destaque

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de elementos concretos para tanto (a prática dos crimes se deu com o emprego de mais de uma faca e um canivete contra vítima adolescente), o que não revela constrangimento ilegal. 3. Mantidos os fundamentos da decisão agravada, porquanto não infirmados por razões eficientes, é de ser negada simples pretensão de reforma. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-HC 416.956 – (2017/0240963-1) – 6ª T. – Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJe 15.12.2017)

porte ilegal de arMa de Fogo de uso perMitido e posse ilegal de arMa de

Fogo de uso restrito – regiMe inicial FecHado – possiBilidade – pena-Base

FiXada aciMa do MíniMo legal – eXistÊncia de circunstÂncia Judicial

desFavorÁvel – constrangiMento ilegal não veriFicado

32063 – “Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Não cabimento. Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido e posse ilegal de arma de fogo de uso restrito. Regime inicial fechado. Possibilidade. Pena-base fixada acima do mínimo legal. Existência de cir-cunstância judicial desfavorável. Constrangimento ilegal não verificado. Habeas corpus não conhecido. 1. Diante da hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impe-tração não deve ser conhecida, segundo Orientação Jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal – STF e do próprio Superior Tribunal de Justiça – STJ. Contudo, considerando as alegações expostas na inicial, razoável a análise do feito para verificar a existência de eventual constrangimento ilegal que justifique a concessão da ordem de ofício. 2. É pacífi-ca nesta Corte Superior a orientação segundo a qual a fixação de regime mais gravoso do que o imposto em razão da pena deve ser feita com base em fundamentação concreta, a partir das circunstâncias judiciais dispostas no art. 59 do Código Penal – CP ou de outro dado concreto que demonstre a extrapolação da normalidade do tipo. No mesmo sentido, são os Enunciados nºs 440 da Súmula desta Corte e 718 e 719 da Súmula do STF. No caso dos autos, a pena-base foi fixada acima do mínimo legal em razão de serem consideradas desfavoráveis as circunstâncias judiciais, o que justifica a segregação inicial em regime mais gravoso, consoante dispõe o art. 33, § 2º, alínea b, e § 3º, do CP. Inaplicável, portan-to, os Enunciados nºs 440 da Súmula do STJ e 718 da Súmula do STF. Habeas corpus não conhecido.” (STJ – HC 379.514 – (2016/0305650-3) – 5ª T. – Rel. Min. Joel Ilan Paciornik – DJe 18.12.2017)

posse ilegal de arMa de Fogo – dosiMetria – conFissão parcial

utilizada coMo eleMento de

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convicção pelo Magistrado – súMula nº 545/stJ – incidÊncia

32064 – “Habeas corpus substitutivo de recurso. Descabimento. Posse ilegal de arma de fogo. Dosimetria. Confissão parcial utilizada como elemento de convicção pelo magistra-do. Súmula nº 545/STJ. Writ não conhecido. Ordem concedida de ofício. 1. Em consonân-cia com a Orientação Jurisprudencial da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal – STF, esta Corte não admite habeas corpus substitutivo de recurso próprio, sem prejuízo da concessão da ordem, de ofício, se existir flagrante ilegalidade na liberdade de locomo-ção do paciente. 2. A confissão parcial do réu configura a atenuante do art. 65, III, d, do Código Penal quando utilizada na formação da convicção do Magistrado. Nesse sentido: HC 337.662/RJ, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., DJe 01.08.2016. Súmula nº 545 do Superior Tribunal de Justiça – STJ. Habeas corpus não conhecido, mas concedida a ordem, de ofício, para reconhecer a incidência da atenuante decorrente da confissão espontânea, reduzindo a reprimenda do paciente.” (STJ – HC 399.195 – (2017/0107299-8) – 5ª T. – Rel. Min. Joel Ilan Paciornik – DJe 18.12.2017)

prova – estado civil do rÉu – dúvida suscitada pela deFesa – restrição

32065 – “Agravo regimental no habeas corpus. Agravante do art. 61, II, e, do CP. Estado civil do réu. Dúvida suscitada pela defesa. Restrição à prova. Art. 155, parágrafo único, do CPP. Agravo regimental não provido. 1. Este Superior Tribunal já externou a compreen-são de que a agravante do art. 61, II, e, do Código Penal não incide nas hipóteses de crime praticado contra companheiro(a), pois, na seara criminal, não é admitida a analogia em prejuízo do réu. 2. Suscitada, pela defesa, dúvida relevante sobre o estado civil do acusa-do, fazia-se necessária a juntada aos autos da certidão do respectivo registro do casamento (ou outro documento público equivalente), nos termos do art. 155, parágrafo único, do CPP. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-HC 365.358 – (2016/0203461-0) – 6ª T. – Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz – DJe 15.12.2017)

recurso – inconstitucionalidade do art. 305 do ctB – incidente incoMpatível coM o rito do HaBeas corpus – Meio inÁBil

32066 – “Penal e processo penal. Recurso em habeas corpus. 1. Inconstitucionalidade do art. 305 do CTB suscitada na origem. Incidente incompatível com o rito do habeas corpus. 2. Arguição rejeitada pelo órgão fracionário. Art. 949, I, do CPC. 3. Recurso em habeas cor-pus improvido. 1. Pretende o recorrente, em síntese, que o Tribunal de origem aprecie o in-cidente de inconstitucionalidade suscitado com relação ao art. 305 do Código de Trânsito

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Brasileiro, no habeas corpus manejado na origem. De início, esclareço que ‘a instauração do incidente de inconstitucionalidade é incompatível com a via célere do habeas corpus porque a celeridade exigida ficaria comprometida com a suspensão do feito e a afetação do tema à Corte Especial para exame do pedido’ (HC 244.374/SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, 5ª T., DJe 01.08.2014). 2. Ainda que assim não fosse, tem-se que o incidente de inconstitucionalidade, previsto no art. 949 do Código de Processo Civil, deve ser utilizado quando efetivamente se vislumbrar a existência de norma inconstitucional no sistema normativo. Contudo, na hipótese dos autos, o órgão fracionário considerou não haver dúvidas sobre a constitu-cionalidade da norma impugnada, não havendo qualquer inclinação em se reconhecer sua inconstitucionalidade, o que denota a rejeição da arguição pelo órgão fracionário, nos termos do art. 949, inciso I, do Código de Processo Civil. 3. Recurso em habeas corpus im-provido.” (STJ – Rec-HC 89.931 – (2017/0249811-0) – 5ª T. – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – DJe 18.12.2017)

rouBo de carga e caMinHão, eM concurso de pessoas e Mediante

uso de arMa de Fogo – quadrilHa arMada – prisão preventiva – FundaMentação idÔnea –

gravidade concreta dos delitos – risco de reiteração delitiva – periculosidade evidenciada

32067 – “Habeas corpus substitutivo de recurso ordinário. Inadmissibilidade. Roubo de carga e caminhão, em concurso de pessoas e mediante uso de arma de fogo. Quadrilha armada. Prisão preventiva. Fundamentação idônea. Gravidade concreta dos delitos. Risco de reiteração delitiva. Periculosidade evidenciada. Excesso de prazo. Feito complexo. Ins-trução encerrada. Súmula nº 52/STJ. Habeas corpus não conhecido. 1. O Superior Tribunal de Justiça, seguindo entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, passou a não admitir o conhecimento de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário. No entanto, deve-se analisar o pedido formulado na inicial, tendo em vista a possibilidade de se con-ceder a ordem de ofício, em razão da existência de eventual coação ilegal. 2. A privação antecipada da liberdade do cidadão acusado de crime reveste-se de caráter excepcional em nosso ordenamento jurídico, e a medida deve estar embasada em decisão judicial fun-damentada (art. 93, IX, da CF), que demonstre a existência da prova da materialidade do crime e a presença de indícios suficientes da autoria, bem como a ocorrência de um ou mais pressupostos do art. 312 do Código de Processo Penal, vedadas considerações abstratas sobre a gravidade do crime. 3. Dos elementos constantes dos autos, a similitude entre a situação do paciente e a do corréu beneficiado com a liberdade provisória, de for-ma que é inadmissível o pedido de extensão formulado com fundamento no art. 580 do CPP. Dos elementos constantes dos autos, a similitude entre a situação do paciente e a do corréu beneficiado com a liberdade provisória, de forma que é inadmissível o pedido de

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extensão formulado com fundamento no art. 580 do CPP. Na hipótese, havendo prova da materialidade e indícios suficientes de autoria, a prisão preventiva foi determinada para garantia da ordem pública, em razão da gravidade concreta das condutas, sendo certo que o paciente é acusado de fazer parte de quadrilha armada voltada para a prática de roubos de cargas, ostentando processos criminais em outros Estados, sendo concreto, portanto, o risco de reiteração criminosa. 4. A jurisprudência desta Corte tem admitido a prisão preventiva com finalidade de impedir ou diminuir a atuação de organização criminosa, como no caso destes autos. 5. Encerrada a instrução criminal, fica prejudicada a alegação de excesso de prazo. Súmula nº 52/STJ. 6. Dos elementos constantes dos autos não ressai a similitude entre a situação do paciente e a do corréu beneficiado com a liberdade provi-sória, de forma que é inadmissível o pedido de extensão formulado com fundamento no art. 580 do CPP. 7. Habeas corpus não conhecido.” (STJ – HC 423.637 – (2017/0288274-0) – 5ª T. – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – DJe 18.12.2017)

rouBo MaJorado – arMa de Fogo – perícia – ausÊncia

32068 – “Penal. Agravo regimental no recurso especial. Roubo majorado. Arma de fogo. Perícia. Ausência. Utilização comprovada por outros meios. Agravo regimental não pro-vido. 1. São prescindíveis a apreensão e a perícia na arma de fogo, para a incidência da majorante do § 2º, I, do art. 157 do CP, quando existirem nos autos outros elementos de prova que comprovem a sua utilização no roubo. Precedentes. 2. O Magistrado de primei-ra instância destacou haver sido comprovada, por outros meios, a utilização da arma de fogo apreendida. A simples ausência do laudo pericial, no caso, não é suficiente para afas-tar a majorante do art. 157, § 2º, I, do Código Penal. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.615.050 – (2016/0190194-3) – 6ª T. – Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz – DJe 15.12.2017)

rouBo MaJorado – pedido de prisão doMiciliar – MatÉria não analisada pelo triBunal local – supressão de

instÂncia – regiMe prisional FecHado estaBelecido coM Base na gravidade aBstrata do delito – iMpossiBilidade

32069 – “Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Inadequação da via eleita. Roubo majorado. Pedido de prisão domiciliar. Matéria não analisada pelo Tribunal local. Supres-são de instância. Regime prisional fechado estabelecido com base na gravidade abstrata do delito. Impossibilidade. Circunstâncias judiciais favoráveis. Pena-base no mínimo. Sú-mulas nºs 440/STJ, 718/STF e 719/STF. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício. O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção deste

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Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impug-nação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade. O pedido de cumprimento de prisão domiciliar não foi objeto de debate no acórdão impugnado, de forma que a análise do tema por este Tribunal Superior configuraria supressão de instância. Os Enunciados nºs 718 e 719 da Súmula do Supremo Tribunal Federal e 440 do Superior Tribunal de Justiça refutam a im-posição do regime mais gravoso que aquele previsto em lei em razão do quantum de pena, quando fundamentado apenas na gravidade abstrata do delito. No caso dos autos, fixada a pena-base no mínimo legal, a determinação de regime inicial mais gravoso não está lastreada em fundamentação concreta e idônea, a atrair ao caso a incidência dos referidos Enunciados de Súmula e a aplicação do disposto no art. 33, § 2º, b, do Código Penal. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para fixar o regime inicial semiaberto.” (STJ – HC 419.107 – (2017/0256844-3) – 5ª T. – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – DJe 18.12.2017)

trÁFico de drogas – aplicação da causa especial de diMinuição

prevista no art. 33, § 4º, da lei nº 11.343/2006 – iMpossiBilidade

32070 – “Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Não cabimento. Tráfico de drogas. Aplicação da causa especial de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006. Impossibilidade. Dedicação a atividades criminosas. Reexame de provas. Regime inicial fechado. Possibilidade. Quantidade e natureza das drogas apreendidas. Fundamentação idônea. Constrangimento ilegal não evidenciado. Habeas corpus não conhecido. 1. Dian-te da hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impetração não deve ser conhecida, segundo Orientação Jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal – STF e do próprio Superior Tribunal de Justiça – STJ. Contudo, considerando as alegações ex-postas na inicial, razoável a análise do feito para verificar a existência de eventual cons-trangimento ilegal. 2. A aplicação da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 depende do convencimento do Magistrado de que o apenado, primário e de bons antecedentes, não se dedique a atividades delituosas nem integre organização criminosa. O entendimento registrado pelo Tribunal de origem está em consonância com a jurisprudência desta Corte Superior, firmada no sentido de que a considerável quanti-dade, variedade e a natureza das drogas apreendidas, aliadas às circunstâncias do delito, uma vez que foi encontrada papeleta com anotações relativas ao tráfico, evidenciam a dedicação à atividade criminosa, revelando-se suficiente a afastar a aplicação da redutora prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006. 3. A reforma do entendimento das instân-cias ordinárias quanto à dedicação do paciente às atividades criminosas constitui matéria que refoge ao restrito escopo do habeas corpus, porquanto demanda percuciente reexame de fatos e provas, inviável no rito eleito. 4. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do

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Jurisprudência penalrevista Jurídica 483

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HC 111.840/ES, declarou inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/1990, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 11.464/2007, afastando, dessa forma, a obrigatorie-dade do regime inicial fechado para os condenados por crimes hediondos e equiparados. 5. Sedimentou-se, nesta Corte Superior, o entendimento segundo o qual, nos delitos pre-vistos na Lei de Drogas, a fixação do regime prisional deve observar a regra imposta no art. 33, § 2º do Código Penal em conjunto com o art. 42 da Lei nº 11.343/2006, que determi-na a consideração, preponderantemente, da natureza e quantidade da droga. 6. Na hipó-tese dos autos, embora as circunstâncias judiciais tenham sido consideradas favoráveis e o paciente seja primário, a natureza e a quantidade das drogas apreendidas – 147 eppendor de cocaína, com peso aproximado de 2.635,77 gramas, e 28 papelotes e 2 tijolos de maco-nha, com peso aproximado de 121,64 gramas –, utilizadas na terceira fase da dosimetria para afastar a aplicação do redutor previsto no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, justificam a fixação do regime prisional mais gravoso. Habeas corpus não conhecido.” (STJ – HC 422.436 – (2017/0279815-7) – 5ª T. – Rel. Min. Joel Ilan Paciornik – DJe 18.12.2017)

trÁFico de drogas – prisão cautelar – ausÊncia de Motivação

idÔnea – ocorrÊncia32071 – “Processo penal. Habeas corpus. Tráfico de drogas. Prisão cautelar. Ausência de motivação idônea. Ocorrência. Falta de indicação de elementos concretos a justificar a me-dida. Ordem concedida. 1. A prisão processual deve ser configurada no caso de situações extremas, em meio a dados sopesados da experiência concreta, porquanto o instrumento posto a cargo da jurisdição reclama, antes de tudo, o respeito à liberdade. 2. In casu, a cus-tódia provisória, medida extrema cujo traço marcante é a excepcionalidade, foi decretada sem respaldo em quaisquer circunstâncias colhidas da situação concreta. Pelo contrário, limitou-se a magistrada a tecer considerações genéricas e apontar a gravidade abstrata do delito de tráfico de drogas, em evidente afronta ao dever constitucional de motivação das decisões judiciais. 3. Ordem concedida, confirmada a liminar, para que o paciente possa aguardar em liberdade o julgamento da ação penal, se por outro motivo não estiver preso, sem prejuízo de que o juízo a quo, de maneira fundamentada, examine se é caso de aplicar uma das medidas cautelares implementadas pela Lei nº 12.403/2011, ressalvada, inclu-sive, a possibilidade de decretação de nova prisão, caso demonstrada sua necessidade.” (STJ – HC 416.067 – (2017/0233577-2) – 6ª T. – Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJe 15.12.2017)

trÁFico de drogas – receptação – prisão cautelar – deFiciÊncia

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Revista JuRídica 483JuRispRudência penal

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do laudo toXicológico provisório – questão superada

32072 – “Processo penal. Recurso em habeas corpus. Tráfico de drogas. Receptação. Prisão cautelar. Deficiência do laudo toxicológico provisório. Questão superada. Ausência de motivação idônea. Ocorrência. Falta de indicação de elementos concretos a justificar a medida. Recurso provido. 1. A alegação de ausência de materialidade delitiva, devido à deficiência do laudo toxicológico provisório, está superada, uma vez que, consoante in-formações prestadas pelo juiz de primeiro grau, em 11.07.2017, adveio aos autos o laudo definitivo. 2. A prisão processual deve ser configurada no caso de situações extremas, em meio a dados sopesados da experiência concreta, porquanto o instrumento posto a cargo da jurisdição reclama, antes de tudo, o respeito à liberdade. 3. In casu, custódia provisória que não se justifica ante a fundamentação inidônea, pautando-se apenas na gravidade genérica do delito, nas consequências do crime para a sociedade e na quantidade de en-torpecente, que não se afigura relevante – 0,79 gramas de crack e 7,9 gramas de maco-nha –, estando ausentes os requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal, uma vez que não se declinou qualquer elemento concreto dos autos a amparar a medida constritiva. 4. Recurso provido a fim de que o recorrente possa aguardar em liberdade a prolação de sentença no processo criminal, se por outro motivo não estiver preso, sem prejuízo de que o Juízo a quo, de maneira fundamentada, examine se é caso de aplicar uma das medidas cautelares implementadas pela Lei nº 12.403/2011, ressalvada, inclusive, a possibilidade de decretação de nova prisão, caso demonstrada sua necessidade.” (STJ – Rec-HC 89.460 – (2017/0240284-8) – 6ª T. – Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJe 15.12.2017)

trÁFico de drogas – súMula nº 691/stF – FundaMentação

concreta – ausÊncia32073 – “Processual penal. Habeas corpus. Flagrante ilegalidade. Afastamento da Súmula nº 691/STF. Tráfico de drogas. Prisão preventiva. Ausência de fundamentação concreta do decreto prisional. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício. I – Embora não se admita, em princípio, a impetração de habeas corpus contra decisão que denega pedido liminar em sede de writ impetrado na origem, sob pena de se configurar indevida supressão de instância, a teor da Súmula nº 691/STF, uma vez evidenciada teratologia ou deficiência de fundamentação na decisão impugnada, é possível a mitigação do men-cionado óbice (precedentes). II – A segregação cautelar deve ser considerada exceção, já que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do art. 312 do Código de Processo Penal. III – In casu, a decisão que Decretou a prisão preven-tiva do paciente, não apresenta devida fundamentação, uma vez que a simples invocação da gravidade genérica do delito, nem mesmo a quantidade de droga apreendida (0,6 g de cocaína), não se revelam suficientes para autorizar a segregação cautelar com fundamen-

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to na garantia da ordem pública (HC 114.661/MG/STF, 1ª T., Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 01.08.2014). IV – Parecer do Ministério Público Federal pela concessão da ordem, tendo em vista a ausência de fundamentação concreta do Decreto de prisão preventiva. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício para revogar a prisão preventi-va do paciente, salvo se por outro motivo estiver preso, e sem prejuízo da decretação de nova prisão, desde que concretamente fundamentada, ou de outras medidas cautelares diversas da prisão, previstas no art. 319 do Código de Processo Penal.” (STJ – HC 426.208 – (2017/0305084-8) – 5ª T. – Rel. Min. Felix Fischer – DJe 18.12.2017)

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Índice AlfAbético e Remissivo cÍvel e PenAl

Doutrina

Civil, ProCessual Civil e ComerCial

assunto

Defesa Do consumiDor

• a Necessidade de informação sobre a Presença de Glúten nos Produtos e a Forma de sua veiculação (andré Boccuzzide souza) ........................................................................................ 71

DesconsiDeração Da personaliDaDe juríDica

• Hipóteses de Desconsideração da Personalidade Jurídica: requisitos à luz do Direito material e do Novo Código deProcesso Civil (Felipe Cunha de almeida) ........................................ 9

obrigação De fazer

• Panorama do Cumprimento das Prestações de Fazer e NãoFazer (marcel Piterman) .................................................................. 41

autor

anDré boccuzzi De souza

• a Necessidade de informação sobre a Presença de Glúten nos Produtos e a Forma de sua veiculação ................................... 71

felipe cunha De almeiDa

• Hipóteses de Desconsideração da Personalidade Jurídica: requisitos à luz do Direito material e do Novo Código deProcesso Civil .................................................................................... 9

marcel piterman

• Panorama do Cumprimento das Prestações de Fazer e Não Fazer ................................................................................................ 41

PeNal e ProCessual PeNal

assunto

Direito intertemporal

• Crimes militares e a lei nº 13.491/2017 em relação ao Direi-to intertemporal (eduardo luiz santos Cabette) ............................. 85

autor

eDuarDo luiz santos cabette

• Crimes militares e a lei nº 13.491/2017 em relação ao Direi-to intertemporal ................................................................................ 85

jurispruDência

Civil, ProCessual Civil e ComerCial

assunto

locação

• Tributário – internalização irregular de mercadorias estran-geiras – locação do veículo transportador, responsabilidadeda proprietária – Pena de perdimento (TrF 4ª r.) .........................111

menor

• Previdenciário – menor sob guarda (§ 2º do art. 16 da lei nº 8.213/1991, na redação original) – Óbito do segurado ocorrido na vigência da lei nº 9.528/1997, que excluiu a pessoa do menor sob guarda, por determinação judicial, do rol de dependentes da previdência social – inconstitucionalidade – Termo inicial – Correção monetária – Juros de mora – antecipação de tutela: requisitos preenchidos – sentença mantida (TrF 1ª r.)................. 99

sucessão

• recurso especial – sucessão – Bens à colação – valor dos bens doados – aplicação da lei vigente à época da abertura da sucessão – aplicação da regra do art. 2.004 do CC/2002 – valor atribuído no ato de liberalidade com correção monetáriaaté a data da sucessão – recurso especial improvido (sTJ) ........... 91

PeNal, ProCessual PeNal

assunto

estelionato

• Penal e processo penal – revisão criminal fundada no art. 621, i, CPP – estelionato previdenciário (art. 171, § 3º, CP) praticado por terceiro não beneficiário da fraude – Crime instantâneo de efeitos permanentes – entendimento jurisprudencial do sTF superveniente à condenação – Prescrição do ius puniendi re-conhecida – inexistência de erro judiciário – impossibilidade de concessão de indenização (art. 630, CPP) – Devolução dosvalores pagos a título de pena de multa: possibilidade (sTJ) ....... 161

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Revista JuRídica 483índice cível e Penal

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frauDe

• Penal e processual penal – recurso em sentido estrito – in-dícios de fraude na concessão de benefício previdenciário – aplicação do princípio in dubio pro societate – recebimentoda denúncia (TrF 2ª r.) ................................................................ 193

prisão

• recurso ordinário em habeas corpus – Prisão cautelar – Trá-fico de drogas, receptação e adulteração de sinal de veículo automotor – excesso de prazo na instrução processual – inocor-rência – Princípio da razoabilidade – Complexidade da causa – Pluralidade de crimes – Diversas perícias – incidente de depen-dência toxicológica – instrução processual encerrada – súmulanº 52 do sTJ – ausência de constrangimento ilegal (sTJ) ............ 177

recurso

• Direito penal militar e processual penal militar – recurso extra-ordinário interposto sob a égide do CPC/1973 – Negativa de prestação jurisdicional – art. 93, iX, da Constituição da repú-blica – Nulidade – inocorrência – razões de decidir explicita-das pelo órgão jurisdicional – alegação de ofensa ao art. 5º, liv e lv, da Constituição da república – Contraditório e ampla defesa – Devido processo legal – inafastabilidade da jurisdi-ção – ausência de repercussão geral – recurso extraordinário que não merece trânsito – agravo manejado sob a vigência doCPC/2015 (sTF) ............................................................................ 147

emeNTário Cível

assunto

ação De cobrança

• ação de cobrança de seguro obrigatório. DPvaT. sentença de procedência. apelo da seguradora. inovação recursal. impossi-bilidade. argumentação de pagamento integral sem comprova-ção. Preclusão consumativa. Não é dada a parte apelante opor-tunidade de inovar na apelação e deduzir fatos não alegados no primeiro grau. Correção monetária incidente desde a data do evento danoso. Juros moratórios computados da citação.sentença mantida. recurso conhecido e improvido ..........35318, 119

ação De interDição • agravo de instrumento. ação de interdição. Curatela provisória.

impossibilidade. Demonstração da lucidez e capacidade de dis-cernimento da agravada. ausência dos requisitos. 1. É possível a nomeação de curador para aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida civil (art. 1.767, inciso i, do Código Civil). a concessão de curatela provisória é perfeitamente admissível, com fulcro na legislação processual civil. Contudo, não havendo provas de que a curatelanda não possui discernimento para os atos da vida civil ou é pródiga, descabe a interdição. 3. recurso não provido. v.v. agravo de instrumento. ação de interdição. Tutela antecipada. Curatela provisória. CC, art. 1.766. risco de grave e iminente dilapidação do patrimônio. Demonstração. requisitos do art. 300 do CPC/2015. Presença. Bloqueio judi-cial de transações bancárias. recurso parcialmente provido. Diante de risco de grave e iminente dilapidação patrimonial, o bloqueio de transações bancárias é medida que se impõe. requisitos do art. 300 do CPC/2015 presentes. recurso parcial-mente provido .....................................................................35319, 119

ação De obrigação De fazer • agravo de instrumento. ação de obrigação de fazer. Direito à

saúde e à vida. Cumulação de pedidos. réus distintos. Possi-bilidade. existência de conexão entre os pedidos. Precedentes dos Tribunais pátrios. Preliminar de inépcia da inicial rejeitada. Tratamento de saúde domiciliar. menor portador de encefalo-patia crônica não especificada. Demonstração da necessidade de utilização contínua de aparelhos hospitalares em sua resi-dência que lhe garantem melhores condições de vida. aumento substancial no consumo de energia elétrica. ausência de con-dições financeira para o custeio do serviço de energia elétrica. responsabilidade dos entes públicos. agravo de instrumentoconhecido e desprovido ..................................................... 35320, 120

• Processual civil. agravo interno no recurso especial. ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por dano mate-rial e compensação por dano moral. embargos de declaração. omissão, contradição ou obscuridade. Não ocorrência. reexa-me de fatos e provas. inadmissibilidade. Dissídio jurispruden-cial prejudicado. ausentes os vícios do art. 535 do CPC/1973, rejeitam-se os embargos de declaração. o reexame de fatos e provas em recurso especial é inadmissível. a incidência da súmula nº 7/sTJ prejudica a análise do dissídio jurispruden-cial pretendido. Precedentes desta Corte. agravo interno nãoprovido ............................................................................... 35321, 120

ação De restituição • apelação cível. ação de restituição de importâncias pagas e in-

denização por danos materiais e morais. obra inacabada. Cul-pa exclusiva do réu contratado para reformar a casa da autora. reembolso em dobro dos valores pagos. má-fé. Configurada. Compensação das despesas realizadas para a execução da obra. inovação recursal. Dano moral. evidenciado. Quantum minorado. litigância de má-fé. Não configuração. Ônus su-cumbenciais. manutenção. i – verificado o inadimplemento contratual, por parte do réu/ora apelante, que se comprometeu a reformar a casa da autora, no prazo de 12 (doze) semanas, e não o fez, abandonando a obra, na fase de demolição, deixando o imóvel, inclusive, sem portas, conforme se verifica pelos do-cumentos juntados aos autos, obrigando a recorrida a contratar outros profissionais para terminar o serviço, é cabível a devolu-ção, em dobro, da quantia paga, haja vista a irresponsabilidade por parte dele, que descumpriu o encargo. ii – Não se conhece de pedido formulado somente em sede de recurso, atinente à compensação, pelo réu/Construtor, dos valores gastos na obra, porque não foi submetido à apreciação do juiz a quo, sendo vedada a inovação recursal, sob pena de supressão de instân-cia e abalo à segurança jurídica. iii – o abandono injustificado da obra no imóvel caracteriza dano moral, uma vez que tal dissabor ultrapassa a esfera do mero aborrecimento, causan-do a sensação de impunidade e de impotência do consumidor. iv – mitiga-se o valor arbitrado a título de dano moral se sope-sadas as especificidades do caso, bem como as circunstâncias dos autos, que, na espécie, mostra-se exagerado, de modo que o instituto cumpra sua função, sem que se revele fonte de enriquecimento ilícito. v – Não merece acolhida o pedido de condenação do recorrente por litigância de má-fé, haja vista que o recurso é o meio adequado para as partes manifesta-rem seu inconformismo com as decisões judiciais, não mere-cendo qualquer reprimenda quando veiculado de acordo com as determinações legais, como ocorre, in casu. vi – Quanto à verba sucumbencial, tendo a autora decaído em parte mínima do pedido, deve a parte ré arcar integralmente com os ônus sucumbenciais, como fixado na sentença. apelação cível co-nhecida e parcialmente provida ......................................... 35322, 120

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Índice cÍvel e PenalRevista JuRÍdica 483

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ação Declaratória • agravo interno no recurso especial. ação declaratória de nuli-

dade de protesto cumulada com indenizatória. Não indicação do dispositivo de lei federal supostamente violado ou objeto de interpretação divergente pelos tribunais. incidência da súmula nº 284/sTF. agravo interno desprovido. 1. a não individualiza-ção e a não indicação, na petição de recurso especial, do dis-positivo legal cuja interpretação tenha sido divergente, atraem a incidência do verbete nº 284 da súmula do supremo Tribunal Federal. 2. agravo interno desprovido ............................... 35323, 121

ação Demolitória • agravo interno no agravo em recurso especial. ação demolitória

c/c pedido de antecipação de tutela. violação ao art. 535 do CPC. Não caracterizada. 1. Não há que falar em violação do art. 535, ii, do CPC, haja vista que o Tribunal de origem ma-nifestou acerca da matéria tida como omissão pelo recorrente. 2. agravo interno não provido ............................................ 35324, 122

ação monitória • agravo de instrumento. ação monitória. interdição. Curadoria.

Gratuidade da justiça. Desnecessidade. indeferimento. De-cisão mantida. Não obstante a alegação do autor de que não possui condições financeiras, para arcar com as custas ini-ciais do processo, estas no valor aproximado de r$ 5.085,60 (cinco mil, oitenta e cinco reais e sessenta centavos), ele não conseguiu comprovar sua condição de hipossuficiência fi-nanceira, e é embaixador aposentado da república, com um valor patrimonial no montante de r$ 1.124.869,29 (um mi-lhão, cento e vinte e quatro mil, oitocentos e sessenta e nove reais e vinte e nove centavos). agravo de instrumento conhe-cido e desprovido ............................................................... 35325, 122

ação negatória De paterniDaDe • apelação. ação negatória de paternidade. Filiação. sentença

extra petita. reconhecimento de vínculo socioafetivo. indepen-dente de ter sido pedido pela requerida. ausência de prova de inexistência do vínculo. DNa. ausência de paternidade biológi-ca. retificação do registro civil. impossibilidade. Prevalência da paternidade socioafetiva. sentença mantida. Preliminar afasta-da. recurso não provido. Não é razoável excluir a paternidade de menor em razão de exame de DNa que afastou a paternida-de biológica, negando-lhe a condição de filho de que sempre desfrutou desde o seu nascimento, visto que o menor tem o autor como pai e seu grupo familiar como referência de família, caracterizando-se, no presente caso, a paternidade socioafe-tiva. Não estando afastada, nos autos, a filiação socioafetiva, esta relação impera sobre a verdade biológica. incabível, assim, alteração no registro civil e qualquer repercussão patrimonial decorrentes da paternidade biológica. Preliminar afastada.recurso não provido .......................................................... 35326, 122

alimentos • recurso especial. civil e processual civil. Direito de família.

alimentos compensatórios. Negativa de prestação jurisdicional. Não realização da audiência de conciliação. Julgamento ante-cipado da lide. Demanda extinta por impossibilidade jurídica do pedido e ausência de interesse processual. 1. Pretensão da demandante, ora recorrente, de recebimento de alimentos compensatórios. 2. inocorrência de violação do art. 535, ii, do CPC/1973 pelo acórdão recorrido. 3. Desnecessidade de reali-zação de audiência inicial de tentativa de conciliação, tendo sido o processo extinto sem resolução do mérito (impossibilidade jurídica do pedido e falta de interesse processual). 4. entendi-

mento prevalente no superior Tribunal de Justiça no sentido da natureza excepcional dos alimentos compensatórios no ordena-mento jurídico brasileiro, em razão de seu caráter indenizatório. 5. ausência de interesse processual, na espécie, pois não fina-lizada a partilha de bens, tendo a demandante, em seu nome, diversos bens que integravam o patrimônio comum. 6. recursoespecial desprovido ........................................................... 35327, 123

Dano moral • Direito civil. Processual civil. apelações cíveis. ação de inde-

nização por danos morais. inscrição indevida em cadastro restritivo de crédito. Preliminar de litispendência ou conexão re-jeitada. serviços não contratados pelo autor. relação consume-rista. responsabilidade do prestador de serviço independente da existência de culpa. inteligência do art. 14 do CDC. Fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do recorrido(art. 333, ii, do CPC). ausência de comprovação. ............ 35328, 123

• Direito civil e processual civil. apelação cível. ação de indeni-zação por danos materiais e morais. Contrato de empréstimo consignado. relação consumerista. Fraude. responsabilida-de objetiva da instituição financeira. inteligência da súmula nº 479, do sTJ. anulação do instrumento contratual. ausência de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor (art. 333, ii, do CPC). Dano moral in re ipsa. Quantum indenizatório mantido. valores indevidamente descontados. restituição na forma simples. Danos materiais. ausência de im-pugnação ........................................................................... 35329, 125

Defesa Do consumiDor • Direito civil e processual civil. Código de Defesa do Consumi-

dor. apelação cível. ação de restituição c/c indenização por danos morais e materiais. Preliminar de ilegitimidade passiva ad causam. rejeitada. Compra de aparelho celular. Defeito apre-sentado no prazo da garantia. Falha não sanada no período de 30 (trinta) dias. Direito do consumidor de exigir a restitui-ção do valor pago pelo produto. inteligência do art. 18, § 1º, ii, do CDC. Devolução das parcelas pagas pelo serviço de telefonia no período em que não pode utilizá-lo. manutenção do montante reparatório arbitrado a título de danos materiais. Danos morais configurados. .............................................. 35330, 128

• Direito do consumidor. Programa luz da Terra. rede de ele-trificação rural. Prescrição. Termo inicial. revisão do contexto fático-probatório. súmula nº 7/sTJ. ausência de prequestio-namento. súmula nº 211/sTJ ............................................ 35331, 132

Desapropriação • Processual civil e administrativo. Declaração de nulidade da de-

sapropriação por interesse social para fins de reforma agrária. ofensa ao art. 535 do CPC/1973 caracterizada em parte. 1. Tra-ta-se na origem de ação declaratória de nulidade dos atos prati-cados visando à desapropriação para fins de reforma agrária da Fazenda sapituva, localizada no município de itapetininga/sP, com área total de 503,80 ha, inscrito no sistema Nacional de Cadastro rural sob o nº 6360610244490. 2. em primeiro grau o pedido foi julgado procedente, sendo tal decisão mantida pelo Tribunal de origem. 3. Há omissão apenas quanto à análise da alegada ilegitimidade ativa do espólio de Clovis scripilliti e side-rúrgica Barra mansa s/a por não serem titulares de direito real sobre imóvel rural afetado pela desapropriação. 4. apesar de tal matéria de ordem pública ter sido rechaçada em primeiro grau, o pedido de seu exame foi feito pelo recorrente nos embargos de Declaração opostos contra o aresto proferido pelo Tribunal de origem. Contudo, a Corte local não enfrentou a matéria no julgamento da apelação e da remessa oficial, que devolvera

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Revista JuRídica 483índice cível e Penal

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amplamente todos os temas em que sucumbente a Fazenda Pública. 5. recurso especial parcialmente provido para anular o aresto proferido nos embargos de Declaração e determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que profira novo julgamento e aborde a matéria omitida ............................. 35332, 133

Despejo • Direito civil e processual civil. apelação cível. ação de despejo.

lei do inquilinato nº 8.245/1991. Preliminares de cerceamento de defesa e ilegitimidade ativa. Não configuração. Benfeito-rias necessárias e úteis. indenização. Compensação. Des-cabimento. renúncia expressa. Cláusula contratual. súmula nº 335, sTJ. aplicação de juros e multa estabelecida no con-trato de locação. Cabimento. recurso conhecido e improvido.sentença mantida .............................................................. 35333, 134

execução • apelação. ação de execução. Cédula de crédito bancário ga-

rantida por aval em nota promissória. instrumento passível de circulação mediante endosso em preto. Necessidade de apresentação do título original. Honorários. Fixação em âm-bito recursal. Possibilidade. Cláusula de barreira. i – a cédula de crédito bancário é título executivo extrajudicial e representa dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, conforme estabe-lece o caput do art. 28 da lei nº 10.931/2004, podendo, inclu-sive, ser transferida mediante endosso, nos termos do § 1º do art. 29 da mesma norma ............................................... 35334, 135

honorários De aDvogaDo • Processual civil. revisão de honorários advocatícios sucum-

benciais. Não conhecimento do agravo em recurso especial que não ataca os fundamentos da decisão recorrida. agravo interno improvido. Não demonstração da alegada divergência jurisprudencial. embargos de divergência liminarmente indefe-ridos ................................................................................... 35335, 136

juros • Cabimento de juros de mora no período compreendido en-

tre a data da conta de liquidação e da expedição da requisi-ção de pequeno valor ou do precatório. repercussão geral. re 579.431/rs. Juízo de retratação. art. 1.030, ii, do CPC/2015 ........................................................................................... 35336, 137

• embargos de declaração. ofensa ao art. 1.022 do CPC não con-figurada. intuito de rediscutir o mérito do julgado. inviabilidade. Processual civil. Juros de mora. incidência no período compre-endido entre a data da elaboração dos cálculos e a expedição da rPv ou do precatório. Juízo de retratação. art. 1.030, ii,do CPC/2015 ..................................................................... 35337, 137

meDiDa cautelar • medida cautelar. Julgamento da ação principal. Perda de objeto

do recurso. 1. recurso de apelação contra sentença proferida em medida cautelar antecipatória. 2. em consulta à ação Princi-pal nº 0026586-90.2009.4.02.5101, observa-se a que já se en-contra sentenciada. Conforme reiterada jurisprudência do sTJ, a ação cautelar perde o objeto após o julgamento da ação prin-cipal, considerando a relação acessória existente entre ambas. Perda de objeto da presente ação cautelar e do respectivo recur-so de apelação (sTJ, Corte especial, aGrms 20494, rel. min. Humberto martins, DJe 22.04.2014; sTJ, 1ª T., airesp 1246939, rel. min. Napoleão Nunes maia Filho, DJe 06.02.2017). 3. re-curso de apelação prejudicado .......................................... 35338, 138

penhora • agravo de instrumento. execução fiscal. Penhora de bens.

aceitação pela Fazenda. Pedido de substituição posterior. Penhora on line. ausência de justificativa. substituição indevi-da. recurso provido. o pedido de substituição de bens objeto de penhora e depósito deve vir acompanhado de justificativa, nos moldes previstos no art. 848 do NCPC/2015. recurso provido. v.v. ementa. agravo de instrumento. execução fis-cal. Penhora de bens móveis. substituição por penhora on line. medida já deferida anteriormente, sem insurgência da devedora em tempo e modo. manutenção do contexto fático. Decisão que autoriza novamente a substituição. alegação de ausência de justificativa. Preclusão ................................... 35339, 138

penhora • apelação cível. embargos de terceiro. Penhora on line. sistema

BacenJud. Conta corrente conjunta. ausência de solidariedade em relação a terceiros. Precedente do sTJ. Comprovação de titularidade integral do valor constrito. Desbloqueio. Procedên-cia do pedido inicial. sentença reformada. “Na conta corrente conjunta solidária, existe solidariedade ativa e passiva entre os correntistas apenas em relação à instituição financeira man-tenedora da conta corrente, de forma que os atos praticados por qualquer dos titulares não afeta os demais correntistas em suas relações com terceiros”. “aos titulares da conta corrente conjunta é permitida a comprovação dos valores que integram o patrimônio de cada um, sendo certo que, na ausência de provas nesse sentido, presume-se a divisão do saldo em par-tes iguais” ......................................................................... 35340, 139

posse • apelação cível. ação de manutenção de posse c/c indenização

por danos morais e materiais. Conversão em indenização por desapropriação indireta. Possibilidade. Prescrição afastada. Dano moral. Não comprovado. Correção monetária pelo iNPC. alteração de ofício. Juros Compensatórios. incidência da sú-mula nº 618 do sTF. Juros moratórios de 6% (seis por cento) ao ano, devidos conforme o art. 100 da Constituição Federal. Não cumulativos. Precedentes jurisprudenciais. Prequestiona-mento. impossibilidade. ..................................................... 35341, 140

prescrição • agravo de instrumento. execução de sentença. suspensão

da execução em razão da inércia do exequente em dar regu-lar andamento ao feito. Prescrição intercorrente. verificada. súmula nº 150 do sTF. Condenação do exequente ao paga-mento de custas e honorários advocatícios. Prequestionamen-to. recurso conhecido e provido. ocorrido o arquivamento da execução pelo prazo prescricional previsto em lei, em razão da desídia do exequente em dar regular andamento ao fei-to, após a penhora de bens do executado e a realização de praças cujo resultado foi negativo, verifica-se a concretização da prescrição intercorrente, nos termos da súmula nº 150 dosupremo Tribunal Federal ................................................. 35342, 141

proprieDaDe • Processual civil e tributário. iPTu. isenção. reconhecimento

dos requisitos em relação ao filho da proprietária do imóvel. Conceito de possuidor para efeito de exclusão do crédito tribu-tário. interpretação literal. violação do art. 111, ii, do CTN con-figurada .............................................................................. 35343, 142

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Índice cÍvel e PenalRevista JuRÍdica 483

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registro • apelação cível. alteração de registro civil. Transexualidade.

alteração do nome. Possibilidade. exposição a situações ve-xatórias e humilhantes. inexistência no ordenamento jurídico de previsão que torne o pedido inviável. Princípios da dignidade da pessoa humana e da inviolabilidade da intimidade. sentença mantida. o reconhecimento judicial do direito dos transexuais à alteração de seu prenome, conforme o sentimento que eles tenham de si mesmos, ainda que não submetido à cirurgia de transgenitalização, é medida que se revela em consonância com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. se não existe no ordenamento jurídico qualquer vedação à al-teração de registro de pessoa transexual, deve-se ressaltar os princípios e valores que a Constituição da república sobreleva. o princípio da dignidade da pessoa humana, enquanto princípio fundamental da república Federativa do Brasil constitui diretriz que deve nortear a alteração de registro civil de transexual. Justifica-se a alteração pretendida ante as particularidades do caso, em que o nome de registro masculino está dissonante com a identidade social, o que leva a parte a situações vexa-tórias ou embaraçosas. recurso não provido ................... 35344, 143

sfh • administrativo. CeF. sistema Financeiro de Habitação – FCvs.

Quitação do saldo devedor. Carteira hipotecária e imobiliá-ria do clube naval. Honorários advocatícios ...................... 35345, 143

• agravo de instrumento. Direito civil. sistema financeiro de habitação. Necessidade de depósito judicial de valores in-controversos. recurso não provido. 1. agravo de instrumento interposto em face de decisão que, nos autos de ação ordiná-ria objetivando, a título de tutela de urgência, a manutenção na posse do imóvel, indeferiu o pedido por ausência de pro-babilidade do direito invocado. 2. a diretriz traçada no art. 50, da lei nº 10.931/2004 dispôs que a parte demandante deve efetuar o depósito, em juízo, do valor controvertido das pres-tações, repassando diretamente à credora os valores incon-troversos, apenas com a finalidade de suspender os efeitos da inadimplência, nas ações em que se discutem cláusulas de financiamento habitacional. Precedentes: TrF 2ª r., 5ª T.esp., ag 00066863020114020000, e-DJF2r 02.08.2017; TrF 2ª r., 5ª T.esp., rel. Des. Fed. aluisio Gonçalves de Castro Nunes, e-DJF2r 28.08.2013. 3. Não comprovado, nos autos, o de-pósito da parcela controvertida. 4. agravo de instrumento nãoprovido ............................................................................... 35346, 144

título executivo • apelação. Título executivo judicial. Coisa julgada. Comple-

mentação de aposentadoria. rFFsa. Prescrição não reconhe-cida. Honorários. CPC/2015 .............................................. 35347, 144

emeNTário PeNal

assunto

concussão • Penal. Habeas corpus. Concussão. Corrupção passiva. alega-

ção de pena-base excessiva. Não ocorrência. Fundamentação concreta quanto à culpabilidade, motivo e circunstâncias. Tran-camento da ação penal prejudicado. sentença de condenação já proferida. execução provisória. Possibilidade. Julgamento da apelação. Pedido de prisão domiciliar. ausência de com-provação quanto à necessidade ........................................ 32046, 199

crime sexual • Penal e processo penal. recurso em habeas corpus. 1. Cri-

me sexual. art. 217-a c/c art. 226, ii, do CP. Trancamento da ação penal. inépcia da denúncia. ausência de justa causa. superveniência de sentença condenatória. 2. ausência de data específica. Desnecessidade. lapso temporal. Crime cometido em ambiente familiar contra criança. 3. Prisão provisória. réu reincidente específico. Pai/avô da vítima. Gravidade concreta da conduta. Necessidade de resguardo da ordem pública. 4. recurso em habeas corpus improvido .......................... 32047, 199

execução penal • agravo regimental. Habeas corpus. execução penal. Progres-

são de regime. exame criminológico. imposição pelo Tribunal sem fundamentação idônea. Constrangimento ilegal. ocorrên-cia. Pretensão de simples reforma. Decisão mantida por seus próprios fundamentos. 1. mantidos os fundamentos da decisão agravada, porquanto não infirmados por razões eficientes, é de ser negada simples pretensão de reforma. 2. agravo regimen-tal a que se nega provimento ............................................ 32049, 201

• embargos de declaração recebidos como agravo regimental. Habeas corpus. execução penal. remição da pena. Pretendi-do cômputo fictício dos dias de trabalho ou estudo (“remição ficta”). impossibilidade. ausência de previsão legal. 1. Nos termos do art. 33 c/c art. 126 da lei de execução Penal, a re-missão da pena exige a efetiva realização de atividade laboral ou de estudo por parte do reeducando, “o qual deve compro-var, de modo inequívoco, seu real envolvimento no processo ressocializador, razão por que não existe a denominada re-mição ficta ou virtual” (rHC 124.775-agr, DJe 19.12.2014). 2. embargos de declaração recebidos como agravo regimen-tal, ao qual se nega provimento ......................................... 32050, 201

• execução penal. Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. inadequação da via eleita. livramento condicional. indeferi-mento. Faltas graves. ausência de requisito subjetivo. inexis-tência de constrangimento ilegal. Habeas corpus não conhe-cido .................................................................................... 32048, 200

execução provisória De pena • agravo regimental em habeas corpus. execução provisória de

pena restritiva de direitos. art. 147 da lei de execução Penal. impossibilidade. 1. a Terceira seção desta Corte, no julgamen-to do eresp 1.619.087/sC, dirimiu a controvérsia acerca da possibilidade da execução provisória da pena restritiva de di-reitos, ao entendimento de que o supremo Tribunal Federal, ao modificar sua jurisprudência no julgamento do HC 126.292/sP, não considerou a possibilidade de se executar provisoriamen-te a pena restritiva de direitos antes do trânsito em julgado da condenação, dispondo tão somente sobre a prisão do acusado condenado à pena privativa de liberdade em segundo grau, an-tes do trânsito em julgado, a teor do disposto no art. 147 da lei de execução Penal. 2. agravo regimental improvido ........ 32051, 201

extorsão • Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Não cabimento.

extorsão. Pena-base acima do mínimo legal. idoneidade da fundamentação judicial na valoração negativa da culpabilida-de. motivação adequada. regime inicial fechado. Pena-base acima do mínimo legal. Fundamentação concreta. Constrangi-mento ilegal não evidenciado. Habeas corpus não conhecido ........................................................................................... 32052, 202

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Revista JuRídica 483índice cível e Penal

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furto • Penal. Habeas corpus. Furto (1) Princípio da insignificância.

atipicidade material. Não reconhecimento (2) valor da res fur-tiva equivalente a mais de um salário mínimo vigente à época dos fatos (3) ordem denegada .......................................... 32053, 203

• Penal e processo penal. Habeas corpus substitutivo de re-curso próprio. Descabimento. Tentativa de furto de 1 (uma) peça de carne bovina, no valor total de r$ 118,06, (cento e dezoito reais e seis centavos). restituição dos bens à vítima. reincidência x aplicação do princípio da insignificância. excep-cionalidade do caso concreto. atipicidade material da condu-ta. ordem concedida de ofício ........................................... 32054, 203

• Habeas corpus. Furto qualificado e roubo qualificado (latro-cínio). Prisão cautelar. excesso de prazo. inexistência de desídia do Judiciário. instrução encerrada. Fundamentos da preventiva. motivação idônea. Gravidade concreta da conduta ........................................................................................... 32055, 205

• recurso em habeas corpus. Furto qualificado tentado. Parti-cipação em organização criminosa. Falsidade ideológica. uso de documento falso. Nulidade no decreto da prisão preventiva. supressão de instância. Tribunal de origem não conheceu do writ pela ausência do decreto prisional. inexistência de fla-grante ilegalidade. instrução deficiente. excesso de prazo na formação da culpa. inocorrência. ausência de desídia do ma-gistrado. Complexidade do feito. Pluralidade de réus e delitos. expedição de cartas precatórias. marcha processual regular. recurso em habeas corpus parcialmente conhecido e, nessaextensão, desprovido. ........................................................ 32056, 206

homicíDio • recurso em habeas corpus. Homicídio tentado. Prisão preven-

tiva. Pretensão de reconhecimento de ausência de fundamen-tação da custódia. indicação de elemento concreto consistente na periculosidade do agente. Constrangimento ilegal manifesto. ausência. 1. Diz a jurisprudência do superior Tribunal de Jus-tiça que toda prisão imposta ou mantida antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória, por ser medida de índole excepcional, deve vir sempre baseada em fundamen-tação concreta, isto é, em elementos vinculados à realidade. 2. No caso, a segregação cautelar do recorrente se encontra consubstanciada na periculosidade do agente, dando conta da eventual reincidência do acusado e da gravidade em con-creto do delito cometido. Precedente. 3. recurso em habeascorpus improvido ............................................................... 32057, 206

injúria • Civil e processo civil. responsabilidade civil. Dano moral. in-

júria religiosa e racial. ação penal. Causa impeditiva da pres-crição. art. 200 do CC/2002. ocorrência. 1. ação ajuizada em 29.05.2013. recurso especial interposto em 20.05.2015 e atri-buído a este Gabinete em 25.08.2016. 2. o propósito recursal consiste em determinar a legalidade na decretação da prescri-ção da pretensão de reparação dos danos morais suportados pelas recorrentes, considerando que o mesmo evento danoso pode ser compreendido como um fato típico e, portanto, crime, o que interromperia o prazo prescricional, nos termos do disposto no art. 200 do CC/2002. 3. o comando do art. 200 do CC/2002 incide quando houver relação de prejudicialidade entre as esfe-ras cível e penal, isto é, quando a conduta originar-se de fato também a ser apurado no juízo criminal, sendo fundamental a existência de ação penal em curso ou ao menos inquérito poli-cial em trâmite. 4. Não é possível afastar a aplicação do art. 200 do CC/2002 em hipóteses que envolvam, além do pedido de

indenização, discussões relacionadas à existência de responsa-bilidade solidária entre o autor da ofensa e aquele que consta no polo passivo da controvérsia, em razão da relação de preposto. 5. recurso especial conhecido e provido .......................... 32058, 207

interceptação telefônica • Processual penal e penal. recurso especial. art. 33 C/C art. 35,

ambos da lei nº 11.343/2006. interceptação telefônica. Deci-sões de prorrogação e novas quebras. ausência de indicação de elementos concretos a justificar o deferimento da medidaexcepcional. ilegalidade reconhecida. Provimento ............ 32059, 207

licitação • Penal. art. 89 da lei nº 8.666/1993. Fraude à licitação. Prefeito.

lei nº 8.038/1990. Denúncia. rejeição. ausência de demons-tração do especial fim de agir e do prejuízo ao erário. ele-mentos imprescindíveis à configuração do delito. violação dos arts. 41 e 395, iii, do CPP. súmula nº 07/sTJ ................... 32060, 210

organização criminosa • Habeas corpus. organização criminosa. Prisão preventiva

decretada na sentença. art. 312 do CPP. Periculum liberta-tis. Fundamentação concreta e idônea. estatuto da Primeira infância. Prisão domiciliar. Possibilidade. ordem concedida ............................................................................................32061, 211

pena • agravo regimental. Habeas corpus. Fundamentação per

relationem. Dosimetria. Pretensão de simples reforma. Decisão denegatória mantida por seus próprios fundamentos. recurso a que se nega provimento. 1. a jurisprudência tem admitido que decisões judiciais louvem-se em excertos do édito condenatório e das manifestações do processo, desde que haja um mínimo de fundamentos, com transcrição de trechos das peças às quais há indicação (per relationem), o que ocorreu na espécie. 2. em se tratando de roubo circunstanciado, diante do disposto no § 2º do art. 157 do Código Penal e no parágrafo único do art. 68 do mesmo Codex, a majoração da pena na terceira fase da do-simetria acima do mínimo legal requer devida fundamentação, com referência a circunstâncias concretas que justifiquem um acréscimo mais expressivo. in casu, observa-se que, na terceira fase dosimétrica, houve um só aumento, evidenciado na exas-peração da pena pela fração de 3/8, tendo em vista não apenas a presença de duas majorantes, mas o destaque de elementos concretos para tanto (a prática dos crimes se deu com o em-prego de mais de uma faca e um canivete contra vítima adoles-cente), o que não revela constrangimento ilegal. 3. mantidos os fundamentos da decisão agravada, porquanto não infirmados por razões eficientes, é de ser negada simples pretensão de reforma. 4. agravo regimental não provido .........................32062, 211

porte ilegal De arma De fogo • Habeas corpus substitutivo de recurso. Descabimento. Posse ile-

gal de arma de fogo. Dosimetria. Confissão parcial utilizada como elemento de convicção pelo magistrado. súmula nº 545/sTJ. Writ não conhecido. ordem concedida de ofício. 1. em conso-nância com a orientação Jurisprudencial da Primeira Turma do supremo Tribunal Federal – sTF, esta Corte não admite habeas corpus substitutivo de recurso próprio, sem prejuízo da concessão da ordem, de ofício, se existir flagrante ilega-lidade na liberdade de locomoção do paciente. 2. a confis-são parcial do réu configura a atenuante do art. 65, iii, d, do

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Índice cÍvel e PenalRevista JuRÍdica 483

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Código Penal quando utilizada na formação da convicção do magistrado. Nesse sentido: HC 337.662/rJ, rel. min. Felix Fischer, 5ª T., DJe 01.08.2016. súmula nº 545 do superior Tribunal de Justiça – sTJ. Habeas corpus não conhecido, mas concedida a ordem, de ofício, para reconhecer a incidência da atenuante decorrente da confissão espontânea, reduzin-do a reprimenda do paciente ............................................. 32064, 213

• Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Não cabimento. Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido e posse ilegal de arma de fogo de uso restrito. regime inicial fechado. Pos-sibilidade. Pena-base fixada acima do mínimo legal. existên-cia de circunstância judicial desfavorável. Constrangimentoilegal não verificado. Habeas corpus não conhecido ........ 32063, 212

prova • agravo regimental no habeas corpus. agravante do art. 61, ii, e,

do CP. estado civil do réu. Dúvida suscitada pela defesa. restri-ção à prova. art. 155, parágrafo único, do CPP. agravo regimen-tal não provido. 1. este superior Tribunal já externou a compre-ensão de que a agravante do art. 61, ii, e, do Código Penal não incide nas hipóteses de crime praticado contra companheiro(a), pois, na seara criminal, não é admitida a analogia em prejuízo do réu. 2. suscitada, pela defesa, dúvida relevante sobre o es-tado civil do acusado, fazia-se necessária a juntada aos autos da certidão do respectivo registro do casamento (ou outro docu-mento público equivalente), nos termos do art. 155, parágrafoúnico, do CPP. 3. agravo regimental não provido ............. 32065, 213

recurso • Penal e processo penal. recurso em habeas corpus. 1. incons-

titucionalidade do art. 305 do CTB suscitada na origem. inci-dente incompatível com o rito do habeas corpus. 2. arguição rejeitada pelo órgão fracionário. art. 949, i, do CPC. 3. recurso em habeas corpus improvido. 1. Pretende o recorrente, em sín-tese, que o Tribunal de origem aprecie o incidente de inconsti-tucionalidade suscitado com relação ao art. 305 do Código de Trânsito Brasileiro, no habeas corpus manejado na origem. De início, esclareço que ‘a instauração do incidente de inconstitu-cionalidade é incompatível com a via célere do habeas corpus porque a celeridade exigida ficaria comprometida com a sus-pensão do feito e a afetação do tema à Corte especial para exame do pedido’ (HC 244.374/sP, rel. min. moura ribeiro, 5ª T., DJe 01.08.2014). 2. ainda que assim não fosse, tem-se que o incidente de inconstitucionalidade, previsto no art. 949 do Código de Processo Civil, deve ser utilizado quando efeti-vamente se vislumbrar a existência de norma inconstitucional no sistema normativo. Contudo, na hipótese dos autos, o ór-gão fracionário considerou não haver dúvidas sobre a consti-tucionalidade da norma impugnada, não havendo qualquer inclinação em se reconhecer sua inconstitucionalidade, o que denota a rejeição da arguição pelo órgão fracionário, nos termos do art. 949, inciso i, do Código de Processo Civil. 3. recurso em habeas corpus improvido ............................................. 32066, 213

roubo • Habeas corpus substitutivo de recurso ordinário. inadmissibili-

dade. roubo de carga e caminhão, em concurso de pessoas e mediante uso de arma de fogo. Quadrilha armada. Prisão preventiva. Fundamentação idônea. Gravidade concreta dos delitos. risco de reiteração delitiva. Periculosidade evidencia-da. excesso de prazo. Feito complexo. instrução encerrada.súmula nº 52/sTJ. Habeas corpus não conhecido ........... 32067, 214

• Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. inadequação da via eleita. roubo majorado. Pedido de prisão domiciliar. matéria não analisada pelo Tribunal local. supressão de instância. regime prisional fechado estabelecido com base na gravidade abstrata do delito. impossibilidade. Circuns-tâncias judiciais favoráveis. Pena-base no mínimo. súmulas nºs 440/sTJ, 718/sTF e 719/sTF. Habeas corpus não conhecido. ordem concedida de ofício ................................................ 32069, 215

• Penal. agravo regimental no recurso especial. roubo majorado. arma de fogo. Perícia. ausência. utilização comprovada por outros meios. agravo regimental não provido. 1. são prescindí-veis a apreensão e a perícia na arma de fogo, para a incidência da majorante do § 2º, i, do art. 157 do CP, quando existirem nos autos outros elementos de prova que comprovem a sua utilização no roubo. Precedentes. 2. o magistrado de primeira instância destacou haver sido comprovada, por outros meios, a utilização da arma de fogo apreendida. a simples ausên-cia do laudo pericial, no caso, não é suficiente para afastar a majorante do art. 157, § 2º, i, do Código Penal. 3. agravoregimental não provido ...................................................... 32068, 215

tráfico De Drogas • Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Não cabimento.

Tráfico de drogas. aplicação da causa especial de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da lei nº 11.343/2006. impossibilida-de. Dedicação a atividades criminosas. reexame de provas. regime inicial fechado. Possibilidade. Quantidade e natureza das drogas apreendidas. Fundamentação idônea. Constran-gimento ilegal não evidenciado. Habeas corpus não conhe-cido .................................................................................... 32070, 216

• Processo penal. Habeas corpus. Tráfico de drogas. Prisão cautelar. ausência de motivação idônea. ocorrência. Falta de indicação de elementos concretos a justificar a medida. ordemconcedida .......................................................................... 30071, 217

• Processo penal. recurso em habeas corpus. Tráfico de drogas. receptação. Prisão cautelar. Deficiência do laudo toxicológico provisório. Questão superada. ausência de motivação idônea. ocorrência. Falta de indicação de elementos concretos a justifi-car a medida. recurso provido .......................................... 32072, 218

• Processual penal. Habeas corpus. Flagrante ilegalidade. afastamento da súmula nº 691/sTF. Tráfico de drogas. Pri-são preventiva. ausência de fundamentação concreta do decreto prisional. Habeas corpus não conhecido. ordem concedida de ofício ............................................................ 32073, 218