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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI Deborah Kemmer Futlik Mariani AÇÕES PROJETUAIS COM LIXO COMPUTACIONAL EM SÃO PAULO: UMA QUESTÃO DE DESIGN DISSERTAÇÃO DE MESTRADO MESTRADO EM DESIGN PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU SÃO PAULO Janeiro/2012

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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI

Deborah Kemmer Futlik Mariani

AÇÕES PROJETUAIS COM LIXO COMPUTACIONAL EM SÃO PAULO:

UMA QUESTÃO DE DESIGN

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

MESTRADO EM DESIGN

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU

SÃO PAULO

Janeiro/2012

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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI

Deborah Kemmer Futlik Mariani

AÇÕES PROJETUAIS COM LIXO COMPUTACIONAL EM SÃO PAULO:

UMA QUESTÃO DE DESIGN

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Design – Mestrado, da Universidade Anhembi Morumbi, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Design.

Orientadora: Profa. Dra. Gisela Belluzzo de Campos.

São Paulo

Janeiro/2012

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Todos os direitos reservados. É proibida a

reprodução total ou parcial do trabalho sem

autorização da Universidade, do autor e do

orientador.

M286a Mariani, Deborah Kemmer Futlik Ações projetuais com lixo computacional em São Paulo: uma questão de design / Deborah Kemmer Futlik Mariani. – 2012. 143f.: il.; 30 cm.

Orientadora: Profa. Dra. Gisela Belluzzo de Campos. Dissertação (Mestrado em Design) – Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, 2012. Bibliografia: f.104-110.

1. Design. 2. Lixo computacional. 3. Sustentabilidade. 4. Ações sociais. I. Título.

CDD 741.6

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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI

Deborah Kemmer Futlik Mariani

AÇÕES PROJETUAIS COM LIXO COMPUTACIONAL EM SÃO PAULO:

UMA QUESTÃO DE DESIGN

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Design – Mestrado, da Universidade Anhembi Morumbi, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Design.

______________________________________ Prof. Dra. Gisela Belluzzo de Campos Orientadora Mestrado em Design Anhembi Morumbi

______________________________________ Prof. Dra. Rachel Zuanon Examinadora Interna Universidade Anhembi Morumbi

______________________________________ Prof. Dra. Nara Silvia Marcondes Martins Examinadora Externa Universidade Presbiteriana Machenzie

DEBORAH KEMMER FUTLIK MARIANI Pós-Graduada no Ensino da Arte SOET – MGÁ

Graduada e Licenciada em Pedagogia e Educação artística (Artes Visuais) pela UEM – MGÁ e Claretiano – Ctba

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Dedico este trabalho ao meu pai Jayme

Futlik in memoriam, fonte inspiradora. E à

minha família, marido, filhos que sempre me

apoiam e incentivam.

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AGRADECIMENTOS

O primeiro agradecimento vai para a Coordenação do Mestrado em Design da

Universidade Anhembi Morumbi, configurada no Prof. Dr. Jofre Silva, pela confiança

e carinho dispensados. Gostaria de registrar minha satisfação em trabalhar sob a

orientação da Profa. Dra. Gisela Belluzzo de Campos que acolheu este projeto com

esmero, apontou a bibliografia teórica que fundamentou as questões propostas no

trabalho e ajudou a construir a rede sobre a qual minhas ideias puderam se mover

livremente. Agradeço imensamente ao Prof. Dr Marcus Bastos, que me auxiliou com

orientação em um período de trabalho. Muito obrigada pela oportunidade de

conhecer materiais e ações diferentes que antes não tinha contato.

Durante a realização deste Mestrado, convivi com pessoas interessantes que

atuam em áreas, muitas vezes desconhecidas para mim, que enriqueceram meu

repertório cultural. Aos colegas da Turma 2009/10, deixo o meu sincero voto de

felicidade a cada um. Quero externar, também, minha gratidão à professora Rachel

Zuanon pelas referências importantes e dicas fundamentais pertinentes a esta

pesquisa, desde o contato da qualificação. Agradeço por ter me auxiliado com seu

conhecimento na área de tecnologia e sustentabilidade, indicando bibliografia e

direcionando ao caminho percorrido. Foi de extrema importância a contribuição da

mesma.

Agradeço às boas amigas de Maringá - PR, sempre presentes comigo no meu

trabalho na universidade. À querida Rachel de Maya Brotherhood, a qual não mediu

esforços para ler e emitir opinião de um assunto completamente divergente da sua

área, quando leu em um domingo minha dissertação. À Maria Cristina de Brito

Cunha e à Sandra de Cássia Franchini, que sempre me animaram e deram apoio. À

Vera Lúcia Scortecci Hilst, que chegou a pouco na instituição, agradeço a

compreensão dos momentos difíceis de tribulação. Todas sempre me apoiaram com

palavras e ações de conforto, compartilhando dificuldades no mundo do trabalho ao

qual vivemos e amparando umas às outras de todas as formas, nos momentos

difíceis, sobretudo os quais vivi nestes últimos dois anos, quando meu filho fez

cirurgia e tive momentos de preocupação, também por ocasião da morte do meu pai

e sua doença durante todo ano de 2011.

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Um agradecimento especial ao Magnifico Reitor do Centro Universitário de

Maringá (Cesumar), Wilson de Matos Silva, que apoiou financeiramente o mestrado

e o incentivou, proporcionando-me a ganhar mais conhecimento. Quero lembrar aqui

outra ação da mesma instituição que teve extrema importância para os estudos de

casos, que foi o projeto de pesquisa e implantação de uma sede de um Centro de

Reaproveitamento e Reciclagem de Equipamentos de Informática, o chamado

RECICLATEC. Uma iniciativa do Cesumar Empresarial em parceria com a

Associação de Municípios do Setentrião Paranaense o AMUSEP, com apoio da

Fundação Araucária. Como eles estavam em processo de investigação para

implantação de um centro de reciclagem, viajamos a São Paulo e visitamos quatro

dos estudos de casos apresentados aqui, o que oportunizou e engrandeceu a minha

pesquisa. Nominando: obrigada Sr. Freud Oliveira, Maria Antônia da Silva ambos

Cesumar empresarial e Sr. Claudecir da Silva, representante AMUSEP.

Faço um agradecimento especial à minha filha Beatriz Mariani, uma futura

designer e uma benção na minha vida. Ajudou-me com tradução no livro Cradle to

Cradle, fez a leitura da dissertação durante o período de escrita aproximadamente

dois anos, emitindo opiniões e revisão. Sei que perdeu horas de sua vida lendo, o

que talvez não quisesse, mas, para me ajudar, fez tal esforço. Ela é pequena de

tamanho, mas valente, uma gigante no que faz! Ao meu filho Bruno Mariani, que de

sua forma, me ajudou, respeitando os momentos nos quais me sentava diante de

meu Notebook, e ao meu marido Arnaldo Mariani, por respeitar minhas opções de

lutas e objetivos e aguentar tantas horas de leitura e estudo, viagens, gastos,

chatice, mau humor e tensão. Obrigada pelo apoio. Agradeço à minha mãe Leonor

Kemmer e irmãs Denise Kemmer e Miriam Kemmer por me ajudarem com

compreensão nos momentos difíceis que passamos com a doença de meu pai até

sua morte. Foram momentos complicados nos quais acreditava que não iria dar

conta, com tantos compromissos assumidos, problemas particulares por entremeio,

o que me deixou muito doente, mas graças a Deus superei e tenho certeza de que

meu pai ficaria orgulhoso pelo que conquistei! Na verdade, quero fazer uma menção

ao meu pai que foi a grande inspiração de quando comecei a minha pesquisa.

Quando escutei em aulas sobre a dinâmica do “efeito Gambiarra em trabalhos

artísticos”, logo me lembrei dele. Sempre foi um “gambiarrista” de primeira e por isso

tive vontade de iniciar a pesquisa, a qual não ficou só nesse assunto, acabou sendo

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ampliada. Mas vale lembrar que por isso comecei a investigação, para ter

conhecimento desta forma de trabalho, a qual sempre considerei ser “uma arte do

improviso”, pois, ele sempre transformava tudo com sucatas que achava, minha mãe

é que não gostava muito! Meu pai chegou até a montar uma indústria de invenções,

quando eu era pequena, por isso ele sempre foi minha inspiração, muito criativo.

Agradeço à Antônia, assistente do Mestrado em Design, que sempre me

atendeu com gentileza e me ajudou no que precisei. Deixo um abraço cordial final

aos amigos de mestrado que me fizeram companhia durante este período solitário,

angustiante e sedentário da escrita, acompanhando minhas aflições, pensamentos,

lendo, curtindo, comentando, trocando informações importantes, inspirando,

torcendo, elogiando e criticando.

Deborah Kemmer

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O cérebro não começa o dia como uma tábua rasa. O cérebro está animado desde o início da sua vida com um enorme repertório de sabedoria que diz respeito à forma como o organismo deve ser gerido, isto é, à forma como a vida deve ser organizada e como o organismo deve responder a certos acontecimentos exteriores. Uma enorme variedade de locais de mapeamento e das respectivas ligações neuronais está presente à hora do nascimento.

(DAMÁSIO, 2004, p. 217)

“Assim se faz a vida, cérebros conectados, pessoas criativas e envolvidas em ações. Vale acreditar e pesquisar ideias que transformam o mundo.”

(DEBORAH KEMMER)

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RESUMO

O termo design sustentável foi largamente difundido nas últimas décadas concomitante à demasiada quantidade de resíduos com a possibilidade de reaproveitamento. Esse índice é ainda mais crescente no tocante ao lixo computacional, tendo em vista a obsolescência programada desse tipo de produto. O presente trabalho trata essencialmente do problema do lixo computacional e das suas possíveis soluções, considerando os adventos tecnológicos crescentes e as suas consequências. Sob o prisma da sustentabilidade, são discutidas ações que tratam de minimizar o problema do lixo computacional, considerando aspectos sociais e econômicos. Com isso, a pesquisa identifica espaços no mundo contemporâneo que transformam suas vivências em ações capazes de dar um novo rumo à atividade projetual no design e aponta as metodologias utilizadas pela sociedade civil reinventora e criadora de espaços que favorecem e ativam novas formas de coexistir e de habitar, contribuindo de forma positiva para o problema do lixo computacional.

Palavras-chave: Lixo computacional. Sustentabilidade. Ações sociais. Metodologias. Design.

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ABSTRACT

The term sustainable design has been largely disseminated over the last decades concomitant of the exceeding raise of residues with the possibility of reuse. This index is even more crescent when related to the computational garbage, considering the scheduled obsolescence of this kind of product. The present work treats essentially with the problem of the computational garbage and its possible solutions, considering the growing technological advents and its consequences. Under the prism of sustainability, actions that treats of minimizing the problem of the computational garbage are discussed, considering social and economic aspects. Herewith, the research identifies spaces in the contemporary world that transform their living into actions that are able of giving a new way to the project activity and points the methodologies used by the civil society that reinvents and creates spaces that favors and activates new ways of coexisting and living, contributing in a positive way to the problem of the computational garbage.

Key-words: Computational garbage. Sustainability. Social actions. Methodologies. Design

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Vertentes do desenvolvimento sustentável ............................................22

Figura 2: Modelo linear de produção .....................................................................24

Figura 3: Modelo circular de produção ..................................................................25

Figura 4: Diagrama do design ...............................................................................29

Figura 5: Lixo acumulado no depósito de Guiyu....................................................35

Figura 6: Computadores em uso no Brasil ............................................................36

Figura 7: Sacola biodegradável 60 Bag.................................................................46

Figura 8: Modelo disponível da sacola biodegradável 60 Bag...............................46

Figura 9: Vasos feitos com casca de ovo ..............................................................47

Figura 10: Vasos feitos com casca de ovo – detalhe ...........................................47

Figura 11: Desempenho dos ventos em diferentes ambientes..............................50

Figura 12: Teoria transdisciplinar do design..........................................................56

Figura 13: Foto do interior do CEDIR-1 .................................................................72

Figura 14: Foto do interior do CEDIR-2 .................................................................72

Figura 15: Foto do interior do CEDIR-3 .................................................................73

Figura 16: Foto do interior do CEDIR-4 .................................................................73 Figura 17: Fluxograma da gestão de resíduos eletrônicos do CEDIR-USP ..........74

Figura 18: Foto do centro de descarte...................................................................78

Figura 19: Lista de discussão Projeto Metáfora.....................................................88

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Figura 20: Foto do coletivo de designer fazendo gambiologia em uma caixa de charutos ...............................................................................................91

Figura 21: Foto de espaço do movimento MetaReciclagem que transforma doações de computadores sem uso em novas máquinas, robôs ou peças de artesanato e de arte..............................................................92

Figura 22: Imagem de cartaz do MetaReciclagem ................................................95

Figura 23: Página do site Reciclo Metais ..............................................................98

Figura 24: Carta do segundo Natal da Eletrorreciclagem......................................99

Figura 25: Vista da Área de Reciclagem em Jundiaí.............................................137

Figura 26: Coletores seletivos instalados em área externa da empresa ...............137

Figura 27: Vista interna da Área de Reciclagem. Ao lado esquerdo as prensas enfardadeiras .......................................................................................138

Figura 28: Foto de fardos de papelão....................................................................138

Figura 29: Geração de resíduos recicláveis e não recicláveis em tonelada ..........139

Figura 30: Percentual de resíduos recicláveis e não recicláveis ...........................139

Figura 31: Porcentagem mensal da geração de resíduos recicláveis e não recicláveis.............................................................................................140

Figura 32: Classificação dos resíduos recicláveis gerados na empresa ...............140

Figura 33: Resíduos recicláveis gerados na produção (kg/produto produzido).....141

Figura 34: Ciclo de descaracterização de um desktop ..........................................142

Figura 35: Resíduos gerados são colocados separadamente em caixas coletoras .. 143

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Características do Sistema produto-serviço...........................................60

Tabela 2: Comparação entre a metodologia e o estudo de caso...........................67

Tabela 3: Total de empréstimo de equipamentos tratados pelo CEDIR-USP em 2010..70

Tabela 4: Comparação entre a metodologia e o estudo de caso...........................71

Tabela 5: Comparação entre a metodologia e o estudo de caso...........................85

Tabela 6: Comparação entre a metodologia e o estudo de caso...........................90

Tabela 7: Comparação entre a metodologia e o estudo de caso...........................93

Tabela 8: Comparação entre a metodologia e o estudo de caso...........................97

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................15

1 O LIXO COMPUTACIONAL E O DESIGN NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA..20

1.1 O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, O HOMEM E A INDÚSTRIA.........20

1.2 A PRODUÇÃO E O DESIGN ...........................................................................28

1.3 A OBSOLESCÊNCIA TECNOLÓGICA ............................................................32

1.4 O LIXO COMPUTACIONAL, UM PROBLEMA AMBIENTAL............................38

1.5 O DESIGN COMO ATIVIDADE PROJETUAL..................................................41

2 DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO PROJETUAL PARA UM DESIGN

SUSTENTÁVEL..................................................................................................44

2.1 ATIVIDADES E ELEMENTOS PROJETUAIS NO DESIGN .............................44

2.2 METODOLOGIAS PROJETUAIS PARA O DESIGN SUSTENTÁVEL.............54

2.2.1 Sistema produto-serviço ............................................................................57

2.2.2 Comunidades criativas ...............................................................................60

2.2.3 Inteligências coletivas e auto-organização...............................................62

3 O DESIGN EM ESTUDOS DE CASOS SOBRE AÇÕES DE LIXO

COMPUTACIONAL EM SÃO PAULO................................................................66

3.1 A EXPERIÊNCIA DA USP: CEDIR ..................................................................69

3.2 CONHECENDO A REALIDADE DA INDÚSTRIA ITAUTEC EM JUNDIAÍ .......79

3.2.1 Caso de descarte e reciclagem: logística reversa....................................82

3.3 CASO METARECICLAGEM.............................................................................86

3.4 CASO EMPRESA PARTICULAR: RECICLO METAIS.....................................96

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................101

REFERÊNCIAS......................................................................................................104

APÊNDICES ..........................................................................................................111

ANEXOS ...............................................................................................................131

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INTRODUÇÃO

O homem está inserido em uma sociedade repleta de anseios e

necessidades. Para saná-los, é necessário que se interfira na natureza (LOBACH,

2001). Frutos dessa interferência desenfreada são, por exemplo, as demasiadas

catástrofes ambientais, que, segundo Manzini e Vezzoli (2008), formaram o contexto

para o surgimento do termo “sustentabilidade ambiental”. É nesse sentido que

atualmente se considera imprescindível pensar acerca da questão da

sustentabilidade. Embora, no início da pesquisa, a intenção fosse pesquisar

assuntos concernentes à arte com sucata, a sustentabilidade demonstrou sua

relevância, principalmente a partir do estudo da obra de Mcdonough e Braungart, no

livro Cradle to Cradle (2002). Para abordar essa questão, foram analisadas ações

que estão sendo implantadas visando um design inventivo e transformador, em que

a sociedade demonstra que é colaborativa e tem aprimorado soluções inovadoras

para novos modos de vida, a partir da recombinação de elementos existentes – o

que pode ser considerado criativo1.

O lixo computacional é alvo de frequente obsolescência devido à grande

atualização tecnológica da indústria que estimula a substituição constante de

equipamentos. Devido a essa obsolescência, esse tipo de lixo é escopo de muitas

ações sociais que levaram, portanto, a ser este o assunto principal desta pesquisa.

Analisar as ações que a sociedade tem buscado diante do problema do lixo

computacional é de extrema importância, já que se tratam de estratégias

metodológicas que têm resolvido, pelo menos parcialmente, o problema da

obsolescência.

É imprescindível atualmente discutir e avaliar a viabilidade desse modo de

produção que gera constantemente lixo, bem como a questão de outros destinos

apresentados como possíveis ao lixo computacional. Segundo Jacobi e Teixeira

(1998), o design precisa ser pensado em relação à ideia de responsabilidade, ou

seja, buscando agir com sustentabilidade e desempenhando um papel articulador

entre discursos e práticas. Essa responsabilidade do design leva em conta os modos

1 De acordo com Manzini e Vezzoli (2008), a sociedade se organiza de forma colaborativa e essa

capacidade de reorganização de novas e significativas combinações é uma das possíveis definições de criatividade.

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de produção e o fato de terem gerado crises ambientais, econômicas e também

sociais, o que, sem dúvida qualifica a necessidade de refletir e encontrar ações que

revertam esses problemas instaurados na sociedade. Sendo assim, um dos grandes

pontos de relevância desta pesquisa é avaliar quais as destinações possíveis desse

tipo de lixo, além de verificar sua validade e formas de utilização na sociedade.

Essas ações fazem com que esta pesquisa auxilie a reunir o escasso conhecimento

existente sobre este assunto.

É importante ressaltar que o design, além de projetar um produto, tem a

responsabilidade de pensar no ciclo de vida do mesmo. Deve considerar, ainda, os

produtos já instaurados na dinâmica da sociedade, entendendo quais metodologias

podem ser buscadas para resolver o problema da obsolescência, que é um fato

crucial diante da grande quantidade de produtos inseridos no mercado. As

metodologias sustentáveis vem ao encontro de tais responsabilidades na concepção

dos produtos, dentre elas convém destacar como exemplo o sistema produto-

serviço; as comunidades criativas. as inteligências coletivas; e a auto-organização.

Tais metodologias são desenvolvidas pela sociedade – pessoas físicas e jurídicas –

bem como por entidades com fins sociais que encontram formas de lidar com o lixo

computacional na sociedade. Essas metodologias estão desenvolvidas no corpo

deste trabalho e, apesar de serem limitadas e não resolverem completamente o

problema ambiental, são válidas e atuais, até porque os estudos de casos são de

brasileiros que relatam como a sociedade contemporânea tem tratado o problema da

obsolescência do lixo computacional. Por isso, entende-se que essas ações sejam

muito bem-vindas à sociedade, por estarem cuidando do problema ambiental,

mesmo que algumas delas não ajam plenamente com esse intuito.

A fim de analisar a fundo essas ações, este trabalho optou pela pesquisa de

campo por sua relação à observação de ações e fenômenos reais e atuais, à coleta

de dados referentes aos mesmos e, finalmente, à análise e interpretação desses

dados. Para atingir esse objetivo, a investigação dos casos partiu dos seguintes

materiais: publicações em sites relacionadas às ações referentes ao problema

pesquisado; publicações de redes (como MetaReciclagem); entrevistas com

pessoas envolvidas e interessadas no assunto.

A partir da pesquisa de campo buscou-se uma fundamentação teórica que

priorizasse as metodologias projetuais que objetivam compreender e explicar o

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problema pesquisado. Da relação entre a pesquisa de campo e a fundamentação

foram geradas discussões a fim de desenvolver conteúdos para essa área – tão

carente de material bibliográfico específico e condizente com a realidade do nosso

país. O que se verificou é que muitas das publicações disponíveis concentram-se

em aspectos conceituais do processo ou mesmo no produto final resultante.

Contudo, o processo em si – a atividade processual e as metodologias encontradas

pelas pessoas interessadas no assunto – ainda é pouco explorado.

Essas metodologias encontradas pela sociedade civil, entre outras situações,

geram ações projetuais capazes de minimizar o problema do lixo. Por isso,

primeiramente será abordada a questão do consumo do homem e do descarte na

natureza como uma ação de interesse global que deve buscar soluções locais, pois

o desenvolvimento sustentável é um processo contínuo de melhoria das condições

de vida. Dessa forma, será discutido como o design deve estar voltado à

sustentabilidade e como carece encontrar um equilíbrio entre o homem e a natureza.

Por isso, a pesquisa levou a entender que diversas faces da sociedade devem ser

movimentadas em razão de ações sustentáveis e mobilizadas com a questão da

obsolescência, pois os avanços tecnológicos fazem parte do desenvolvimento atual

da sociedade e exigem inovação e organização em metodologias. Esta deve ser a

visão contemporânea de um designer – o que reforça a importância da atividade

projetual – sobretudo, em sua busca de maneiras de compor, criar e organizar

ambientalmente seus projetos de forma correta.

Após essa discussão, o enfoque é a situação do produto após o descarte,

quando se torna lixo, e a busca de compreender quais são as metodologias

desenvolvidas com o objetivo de resolver a obsolescência programada, usando

resíduos como recursos, como indicam Mcdonough e Braungart (2002). Serão

analisadas atividades que se relacionem com as metodologias: sistema de produtos

e serviços; comunidades criativas e a cooperação entre grupos que interagem com

atividades culturais; formas organizadas e modelos econômicos que intercedem

entre dimensões locais e globais. É perceptível que para resolver parte do problema

da destinação do descarte, a sociedade pode intervir junto ao designer,

apresentando formas de minimizar o lixo, adotando soluções sustentáveis e

indicando metodologias, o que poderá ser observado nos estudos de caso

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analisados em seguida. Estas ações isoladas, mas organizadas, são formas

contemporâneas de a sociedade auxiliar o designer.

A disposição do homem para criar respostas e resolver problemas, diante do

acúmulo de lixo computacional, é de extrema importância. São soluções criadas e

disseminadas que encontram formas de desenvolvimento sustentável, que, embora

fossem responsabilidade da indústria, estão sendo desenvolvidas pela sociedade

civil. Essas soluções foram analisadas em estudos de casos, que podem se apoiar

numa orientação teórica, como também seguir uma perspectiva interpretativa,

procurando compreender como é o mundo do ponto de vista dos participantes. Esta

foi a forma escolhida para a pesquisa, objetivando proporcionar uma perspectiva ao

mesmo tempo local e global, completa e coerente do objeto de estudo.

Entre os estudos de casos, encontram-se naturalmente ações com

características muito semelhantes à forma de pensar no desenvolvimento

sustentável, desenvolvendo atividades projetuais. Um dos estudos apresentados

relata as experiências da Indústria Itautec de Jundiaí que tem encontrado formas de

minimizar a situação do lixo computacional por meio de um centro de descarte e de

normas estabelecidas. A Indústria Itautec enquadra-se na metodologia de Ciclo de

Vida de Produtos por se preocupar com a fabricação dos mesmos e atentar ao

problema do descarte, que são encaminhados a centros adequados para sua

reutilização. Também é analisado o caso do CEDIR (centro de descarte organizado

pela Universidade de São Paulo), o qual, sentindo o problema da obsolescência

computacional, buscou uma posição diante do fato, adotando a metodologia de

Sistema produto-serviço. O centro arrecada, separa e encaminha a centros de

Reciclagem e fornece empréstimo a grupos necessitados por tempo determinado.

Outro caso analisado de grupo social, que busca ações para solucionar o problema

do lixo computacional, foi o da MetaReciclagem. Trata-se de um coletivo de pessoas

que trocam informações on-line em todo o Brasil, compartilhando experiências como

apropriação, remontagem de computadores, gambiarra, entre outras ações. A

MetaReciclagem se encaixa na metodologia de comunidades criativas, de

inteligências coletivas e de auto-organização de sociedades que intervêm em todo o

processo. O estudo avançou também para um caso da Reciclo Metais, empresa

particular que, embora vise o lucro por meio do lixo computacional, respeita a

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questão ambiental, seguindo normas que resolvem, em parte, a obsolescência

computacional, obtendo sucesso com a metodologia de ciclo de vida de produtos.

O que se observa é que a sociedade tem buscado formas de minimizar a

situação do lixo existente. A posição dos design diante dessas novas ações se

alterou, não ficando apenas na responsabilidade de executar o projeto do produto,

mas, sim, analisar todo o processo, desde o nascimento até a morte do produto, ou

seja, desde a extração de matérias-primas até o descarte. Desta forma, o design

assume direções distintas na contemporaneidade, as quais se confrontam com a

complexidade da sociedade organizada que intervém e desenvolve fenômenos de

criatividade inseridos no contexto de vida atual. Assim, o resultado global acontece

por meio de ações elaboradas em sociedades locais inseridas no mundo e o design

torna-se parte ativa nos processos de transformação em ação e naqueles que estão

por vir, diante de tantos e complexos desafios que o futuro nos reserva. No entanto,

é necessária uma transformação não só na esfera tecnológica, mas, sobretudo, na

social – nos comportamentos, hábitos e modos de viver.

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1 O LIXO COMPUTACIONAL E O DESIGN NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

1.1 O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, O HOMEM E A INDÚSTRIA

O homem tem buscado soluções para o problema ambiental, mas somente

reconhecer e compreender não são atitudes suficientes para esgotar e solucionar os

problemas existentes. É necessário buscar ações que revertam o quadro de crise

ambiental instaurado na sociedade. Por esta razão, atualmente se debate o termo

desenvolvimento sustentável2. Este conceito surgiu a partir de estudos da

Organização das Nações Unidas (ONU)3 sobre as mudanças climáticas, como um

retorno para a humanidade perante a crise social e ambiental pela qual o mundo

começou a passar na segunda metade do século XX. Na conferência das Nações

2 O conceito de desenvolvimento sustentável, segundo Jacobi (1999), surgiu com a publicação do

relatório “Nosso Futuro Comum” em 1987, e ganhou, ao longo dos anos, crescente importância nas políticas nacionais, internacionais e corporativas.

3 A Organização das Nações Unidas, também conhecida pela sigla ONU, é uma organização internacional formada por países que se reuniram voluntariamente para trabalhar pela paz e o desenvolvimento mundial. <http://www.suapesquisa.com/geografia/onu.htm>. Acesso em: 15 nov. 2011.

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Unidas – também chamada de Eco Rio 924 – foi desenvolvido um relatório que se

tornou conhecido como “Nosso Futuro Comum”5. Neste relatório, difundiu-se o

conceito de desenvolvimento sustentável que Jacobi (1999) aponta como: “aquele

que atende às necessidades do presente sem comprometer as possibilidades das

gerações futuras atendendo suas próprias necessidades”. Manzini e Vezzoli (2008)

enfatizam que no sistema local e global em que as atividades humanas acontecem,

o homem não deve interferir nos ciclos naturais, promovendo e permitindo o

equilíbrio do planeta, sem destruir o que será delegado às gerações futuras. A partir

dessa visão de desenvolvimento sustentável, é importante ressaltar que nenhuma

ação isolada é capaz de resolver uma situação tão complexa como essa, que

envolve desenvolvimento econômico, produção, consumo e descarte na natureza,

ocasionado pela troca de um bem por outro mais atualizado. Diversas faces da

sociedade devem ser movimentadas em prol de ações sustentáveis e mobilizadas

com a questão da obsolescência. Nesse sentindo, Jacobi e Teixeira (1998, p. 60),

sugerem uma solução:

O momento atual exige que a sociedade esteja mais motivada e mobilizada para assumir um caráter mais propositivo, para questionar de forma concreta a falta de iniciativa dos governos em programar políticas pautadas no binômio de sustentabilidade e desenvolvimento.

Desde que a sociedade resolveu discutir a questão desenvolvimento

sustentável, o design passou a ser repensado, segundo Jacobi e Teixeira (1998),

como uma ideia de força integradora, ou seja, o designer é responsável pelo produto

de maneira totalizadora. Dessa forma, nesse novo enfoque da busca pela

sustentabilidade, ele tem um papel articulador de discursos e de práticas e segue

uma matriz única originada pela existência de uma crise ambiental, econômica e

também social o que qualifica a necessidade de refletir e encontrar ações que

revertam o problema instaurado na sociedade. É importante lembrar que o

4 O Eco Rio92 foi uma Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento

(CNUMAD), realizada entre 3 e 14 de junho de 1992, no Rio de Janeiro. O seu objetivo principal era buscar meios de conciliar o desenvolvimento sócioeconômico com a conservação e proteção dos ecossistemas da Terra. Foi nessa conferência que surgiu o termo desenvolvimento sustentável. <http://pt.wikipedia.org/wiki/ECO-92>. Acesso em: 15 nov. 2011.

5 Segundo Jacobi (1999), o relatório Nosso Futuro Comum é o resultado de uma comissão da ONU e parte da abordagem da complexidade das causas que originam os problemas sociais e econômicos da sociedade global.

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desenvolvimento sustentável não se opõe ao desenvolvimento econômico6, até

porque o fator econômico é indispensável para o atendimento das necessidades da

sociedade. O desenvolvimento sustentável deve surgir como um facilitador de

integração de valor a novos produtos e serviços no momento em que reduz o

consumo de recursos e de energia. Assim, ele aparece como uma forma de

equilibrar ganhos econômicos, sociais e ambientais da sociedade. Na figura 1, ICLEI7

e IDRC8 (1996) desenvolveram o gráfico dos três processos de desenvolvimento

sustentáveis necessários às reais necessidades da sociedade e suas atribuições, o

que gera a conexão entre sociedade, economia e o meio ambiente.

Figura 1: Vertentes do desenvolvimento sustentável Fonte: ICLEI e IDRC (1996 – adaptado).

O que se percebe ao analisar esse diagrama é que a relação entre o

desenvolvimento nos âmbitos econômico, social e ambiental é essencial para o

desenvolvimento sustentável. Manter as engrenagens do capitalismo funcionando,

6 Segundo Souza (2005), o desenvolvimento econômico envolve, além da melhoria de indicadores

econômicos e sociais, a questão da preservação do meio ambiente. 7 ICLEI – Conselho Internacional de Iniciativas Internacionais Locais promove encontros e formas

sustentáveis. O ICLEI desenvolveu uma estrutura para orientar os governos e as comunidades locais nos seus planos de ação para o desenvolvimento sustentável, de acordo com resultados de projetos-piloto criados e aplicados pelo próprio ICLEI. <http://www.agenda21local.com.br/nap2.htm>. Acesso em: 15 nov. 2011.

8 IDRC – Modelo comunidade programada, uma espécie de supervisor das ações que envolvem a sustentabilidade. <http://www.agenda21local.com.br/nap2.htm>. Acesso em: 15 nov. 2011.

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concomitante ao respeito à natureza e ao bem-estar social é o que caracteriza o

desenvolvimento sustentável. É imprescindível, portanto, que todos os fatores sejam

considerados, até porque o desenvolvimento econômico sustenta a economia,

maximiza o lucro, expande mercados e revê custos. Já o desenvolvimento social,

além de satisfazer as necessidades humanas e aumentar a autoconfiança do

indivíduo, oferece um aumento de equidade, garantia de participação,

responsabilidade e uso de tecnologias apropriadas.

Por outro lado, o desenvolvimento ambiental está relacionado ao respeito pela

qualidade de carga, conservação e reciclagem de recursos e redução da produção

de resíduos. A ausência de qualquer um desses fatores é fatal para o sistema em

termos de sustentabilidade – basta recordar a Revolução Industrial em que somente

o fator econômico foi priorizado. É impossível imaginar, porém, uma sociedade que

não seja movida por fatores econômicos. Nesse sentido, o diagrama demonstra que

um sistema que não considere o fator econômico é uma utopia. Assim, ao

considerar esses três fatores, o sistema pode funcionar de forma sincronizada e

interligada rumo à sustentabilidade. Convém destacar que o avanço das tecnologias

e dos meios de comunicação é parte essencial do contexto da busca pela

sustentabilidade, Essas tecnologias envolvem as pessoas e alteram traços de

comportamento profissional e pessoal, responsáveis por aumentar experiências de

colaboração, interatividade e autonomia na participação ativa da construção de

conhecimentos e projetos. O designer está inserido nessas mudanças já que é o

criador dos produtos adquiridos pelas pessoas – os consumidores – e, nesse sentido,

pode agir aproximando o homem do consumo consciente, ético, responsável e

sustentável.

A sociedade necessita de um consumo mais responsável9 e que respeite o

meio ambiente. Para isso, precisa estar consciente do impacto que o consumo diário

provoca no ambiente e saber qual é a sua responsabilidade tanto individual quanto

social na preservação dos recursos naturais. Para saber o que está consumindo de

forma correta, o homem pode exigir garantias em relação ao produto adquirido.

Entre elas: a verificação da procedência; da forma de produção; e o selo de garantia

9 Segundo Della Giustina (2004, p. 160) fala-se muito em consumo mais sustentável, mas o autor

acredita não ser o meio ambiente natural que se encontra em crise. Hoje o homem vive uma crise de valores, que gera outras crises em diferentes setores de nossa sociedade, como o consumo que gera ameaça ao meio ambiente.

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e qualidade final. Para isso, a ABNT ISO 14020 (2002) explicita que rótulos e

declarações ambientais fornecem informações sobre um produto ou serviço em

termos de suas características ambientais gerais, ou de um ou mais aspectos

ambientais específicos. Além disso, o homem deve questionar sobre o destino de

descarte do produto quando não for mais útil, informação que poderia estar no rótulo

no momento da compra. Essa atitude para com a conservação dos recursos naturais

e minimização de impactos ambientais deve ser discutida e exigida pelo consumidor

e faz parte da nova dinâmica que a contemporaneidade propõe sobre o

desenvolvimento sustentável, como demostrou o diagrama da Figura 1.

Segundo Rolim (2003), o assunto meio ambiente vem se tornando uma

preocupação crescente da sociedade que visa o desenvolvimento sustentável –

principalmente o setor empresarial. Nesse sentido, é necessário que a empresa

adote medidas que alterem o seu comportamento e que sejam estabelecidas, como

sugere Barata (1995), por metas e produtividade, acompanhadas de indicadores de

qualidade no processo produtivo, na prestação de serviço, no produto e nas

condições ambientais. Esse desenvolvimento sustentável buscado pela sociedade e

pelas empresas deve seguir o modelo não-linear. Para Giacomini Filho (2008, p. 6),

é preciso “disseminar um sistema econômico que saia do modelo linear,

fundamentado no consumo e descarte, para circular do berço ao berço (Cradle to

Cradle), baseado no reaproveitamento”. Entende-se o modelo linear de produção

errado por sua insustentabilidade e é representado pela Figura 2:

Figura 2: Modelo linear de produção Fonte: Kazazian (2005, p. 52).

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Esse modelo linear é também chamado de Cradle to Grave (do berço à

sepultura) pelos autores Mcdonough e Braungart (2002), já que o destino final dos

produtos é o aterro sanitário e suas potencialidades não são aproveitadas. Esse é o

modelo atual empregado, de forma linear, que começa com um esgotamento de

recursos da natureza e termina no aumento de resíduos a serem descartados, o que

demonstra ser insustentável. Atualmente, refletir a situação do mercado global

quanto à questão ambiental torna-se fundamental em termos de design, buscando

uma nova geração de produtos e serviços baseados em novos valores e novos

padrões de qualidade. Kazazian (2005) aponta que o modelo sustentável que deve

ser adotado atualmente é o circular, representado pela Figura 3:

Figura 3: Modelo circular de produção Fonte: Kazazian (2005, p. 53).

Conforme aponta o autor na Figura 3, o desenvolvimento de produtos é

sustentável quando gera um ciclo de vida para os mesmos e que não inclua o

descarte. Os autores Mcdonough e Braungart (2002) nomeiam esse ciclo de vida

como Cradle to Cradle (do berço ao berço), já que as matérias-primas oriundas do

“berço” serão reutilizadas ao fim de um ciclo de vida, como se saíssem do “berço”

outra vez. Os autores consideram esse modelo imprescindível à sociedade10. Este

modelo, se seguido, passa a ser um exemplo de sustentabilidade em design, e, se

implantado, pode provocar uma mudança de paradigma na sociedade. Atualmente, 10 William McDonough, arquiteto e designer, e Michael Braungart, químico e ex-ativista do

Greenpeace, autores do livro Cradle to Cradle (2002), o qual defende que os resíduos não podem ser considerados lixo e trazem outra forma de pensar os resíduos, qualificada por eles como “berço ao berço”.

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criou-se uma cultura ambiental quanto ao descarte, que acredita no potencial da

reciclagem. Apesar da geração de empregos benéfica à sociedade, em termos

ambientais, a reciclagem é equivocada, por demandar mais energia e não retirar as

matérias-primas de circulação. Porém, até que se adotem tecnologias que

recuperem resíduos e que sejam capazes de aproveitar ao máximo a matéria-prima

(obtendo ganhos ambientais e econômicos, evitando o descarte), a reciclagem será

usada como solução temporária. De qualquer forma, convém ressaltar que é mais

eficiente diminuir a geração de resíduos. Para isso, a indústria deve ser reformulada,

o que não é uma tarefa simples.

Os autores Mcdonough e Braungart (2002, p. 20)11 enfatizam a complexidade

necessária para a reformulação da indústria e afirmam: “como qualquer mudança de

paradigma12, essa encontrou resistência”. Eles relatam que: “os projetos do berço ao

túmulo (Cradle to Grave) dominam a manufatura moderna” (MCDONOUGH;

BRAUNGART, 2002, p. 27)13, e apontam que isso é característico do modo de

produção atual: “de fato, muitos produtos são feitos já predestinados a ficarem

obsoletos, para durarem apenas certo período de tempo, para permitir e encorajar o

cliente a ficar longe dele, e comprar um modelo novo” (MCDONOUGH;

BRAUNGART, 2002, p. 28)14. Manzini e Vezzoli (2008, p. 182) reiteram a ideia do

problema da geração de novos produtos seguida da necessidade da obsolescência

dos produtos antigos:

Um produto que é mais durável que outro, exercendo a mesma função, determina geralmente um impacto ambiental menor. Se um produto dura menos, ele de fato não só gera precocemente mais lixo, mas determina também outros impactos indiretos, como a necessidade de ter que substituí-lo.

Essa questão do consumo e descarte na natureza tem sido discutida, além de

haver um interesse global pela busca de soluções. Rattner (1994, p. 4) enfatiza que

11 Tradução nossa a partir de: As it happens in any change of paradigm, the one foun resistance. 12 Segundo Kuhn (1975), “paradigmas são realizações científicas universalmente reconhecidas que,

durante algum tempo, oferecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência”.

13 Traduzido nossa a partir de: Cradle-to-grave designs dominate modern manufacturing. 14 Tradução nossa a partir de: In fact, many products are designed with “built-in obsolescence”, to last

only for a certain period of time, to allow – to encourage – the costumer to get rid of the thing and buy a new model.

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o entendimento do “desenvolvimento sustentável não é uma finalidade a se

alcançar, mas um processo contínuo de melhoria das condições de vida”. Desta

forma, o design, para a sustentabilidade atual, assim como outras vertentes da

sociedade, deve encontrar um equilíbrio entre o homem e a natureza. Segundo

Manzini (2008, p. 27):

A transição rumo à sustentabilidade é um processo de aprendizagem a que seremos, gradualmente, submetidos e que consiste em viver melhor consumindo menos e regenerando a qualidade do ecossistema global e dos contextos locais em que estamos inseridos.

Embora de épocas diferentes, Rattner (1994) e Manzini (2008) entendem a

sustentabilidade como uma continuidade, uma aprendizagem constante, que

objetiva a melhoria de qualidade de vida. Manzini e Vezzoli (2008, p. 27) a definem

da seguinte forma:

O conceito de sustentabilidade ambiental refere-se às condições sistêmicas segundo as quais, em nível regional e planetário, as atividades humanas não devem interferir nos ciclos naturais em que se baseia tudo o que a resiliência do planeta permite e, ao mesmo tempo, não devem empobrecer seu capital natural, que será transmitido às gerações futuras.

Hoje o designer não trabalha mais sozinho, são diversos atores envolvidos no

processo. Segundo Manzini (2004, p. 17), é necessário pensar “o design em um

mundo fluido”. O que significa que os designers têm que se transformar em

profissionais que atuam dentro de uma organização, assumindo o papel de fornecer

um processo de inovação. “[...] Ao tratar de soluções sustentáveis, a atividade de

design que impulsiona o processo de inovação deve ser facilitada pelos designers,

ao invés de ser diretamente realizada por eles” (MANZINI, 2004, p. 20). Essa

afirmação do autor enfatiza a função projetual do designer – esse profissional deve

desenvolver ideias por meio de projetos que devem ser realizados por outros

profissionais dedicados à produção. Neste sentido, é fato que o design é uma

atividade que envolve diversos atores, e Niemeyer (2000, p. 22) confirma essa

questão dizendo que: “projeto é o meio profissional, equacionando, de forma

sistêmica, dados da natureza ergonômica, tecnológica, econômica, social, cultural e

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estética e respondendo concreta e racionalmente às necessidades humanas”. O

design, portanto, deve atuar na produção como uma atividade projetual focada no

desenvolvimento sustentável, como forma de equilibrar a natureza e os aspectos

econômicos, sociais e ambientais, buscando, portanto, ações sustentáveis para

resolver o problema da obsolescência.

1.2 A PRODUÇÃO E O DESIGN

O modelo em série que a indústria vem utilizando desde o século XIX trouxe

impactos positivos e negativos para a estrutura da sociedade. Gerou

desenvolvimento, porém acabou visando exclusivamente o aspecto econômico

deixando a preocupação ambiental em segundo plano. Isso causou danos que se

refletem na atualidade. Desde o início da Revolução Industrial, a produção cresceu

com a quantidade de produtos diversificados em sua composição que não foram

devidamente planejados, o que evitaria o descarte. Nesse aspecto, Margolin e

Margolin (2004, p. 43) afirmam que “desde a Revolução Industrial, o paradigma do

design dominante tem sido o de desenhar para o mercado”, isto é, são

considerados, sobretudo os fatores econômicos e não os ambientais na geração de

produtos.

Diferentemente do que se pensou naquele período, o design enquanto área

de conhecimento e também de produção atualmente deve levar em conta diversos

fatores além dos econômicos, entre eles, os fatores ambientais. Papanek (1997,

p. 31) afirma que o design deve servir de “ponte entre as necessidades humanas, a

cultura e a ecologia”15 (o termo ecologia tratado nesse momento, diz respeito ao

aspecto ambiental). O design enquanto área de conhecimento, é formado por

saberes de outras áreas – tais como: arte, ciência e filosofia. Niemeyer (2000, p. 23)

corrobora esta opinião revelando que o design é a “[...] atividade científica de

projetar, integrando várias áreas de conhecimento, estabelecendo relações múltiplas

para a solução de produção de objetos que tem por alvo final atender às

necessidades do homem e da comunidade”. Monat, Campos e Lima (2008) apontam

esta ideia no esquema da Figura 4:

15 Tradução nossa a partir de: puente entre las necesidades humanas, la cultura y la ecología.

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Figura 4: Diagrama do design Fonte: Monat, Campos e Lima (2008).

O diagrama revela o objetivo do design em compreender os conhecimentos

específicos gerados por outras áreas de conhecimento e fundi-los de modo a

modelá-los para construir um conhecimento específico em design. É possível, dessa

forma, criar objetos de uso para a sociedade e observar que a produção não

acontece de forma isolada – são considerados outros fatores. Parte-se de um

contexto social e não apenas de um contexto econômico, como aconteceu na

Revolução Industrial. As diversas áreas do conhecimento podem, portanto, contribuir

atualmente para a função inovadora que o design possui, evitando o descarte. Além

disso, Verganti (2009) enfatiza que se o homem fizer a fusão de conhecimentos

específicos gerados por outras áreas do saber, pode proporcionar uma inovação

dirigida pelo design, baseada na capacidade do designer de atuar em organizações

na sociedade, revendo materiais, tecnologias, significados e linguagens. Se isto

acontecer, provocará mudanças na sociedade e não só a produção será focada,

como todo o processo do produto no mercado será revisto para que não ocorram

resíduos na natureza. Segundo Manzini (1986, p. 2), o desenvolvimento das

diferentes áreas da sociedade e o acelerado progresso de novos materiais vieram

contribuir para que o designer “compreendesse cada vez menos a matéria-prima em

todos os seus aspectos possíveis, técnicos e sensoriais”. Sob esta afirmação,

entende-se que o homem planeja e executa, pensando no fator econômico, sem

contabilizar os efeitos que o material utilizado pode causar à natureza no futuro,

quando descartado. Esse é o modelo usado atualmente, o que é um erro. O

designer tem a responsabilidade de pensar em projetos que visem o ciclo de vida de

um produto, para evitar a geração de lixo, afinal, de acordo com Papanek (1997,

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p. 17), “[...] o design está diretamente ligado às questões ambientais”16, e o designer

não pode se esquecer disso, pois é o gerador de produtos e o responsável direto

pelo futuro deles. Pensar na matéria-prima e seu subsequente descarte são funções

imprescindíveis do design. Almeida et al. (1999, p. 95) enfatizam a necessidade dos

designers repensarem os produtos, desenvolvendo ações pautadas nos aspectos

ambientais, para que os danos ocorridos no passado não se repitam. Além disso,

destacam que:

Enfeitiçados pela ilusão do progresso, deixamo-nos enganar pelo aumento indiscriminado da produção econômica, que prometeu trazer a felicidade e o bem-estar coletivo. Durante as quatro últimas décadas, entretanto, a degradação ambiental em macro escala e os efeitos cumulativos decorrentes da perda de 24 bilhões de toneladas de solo fértil, foram mais do que evidências suficientes para o esclarecimento de que tudo não passou de um grande engano.

Atualmente, considerar uma fábrica desenvolvida pelos seus feitos de

produção, não é o suficiente. Os autores ressaltam a necessidade de considerar o

meio-ambiente: “os modelos de desenvolvimento que não contemplam o meio

ambiente nas suas diretrizes e metas, provaram a sua insustentabilidade” (ALMEIDA

et al., 1999, p. 80). A insustentabilidade, no entanto, é reflexo de um período

histórico, já que, desde o primeiro período da Revolução Industrial, o meio ambiente

era visto como acessório do desenvolvimento e não como parte intrínseca a ele.

Jacobi (1997) afirma que, para haver a sustentabilidade, é necessário uma inter-

relação necessária de justiça social, qualidade de vida, equilíbrio ambiental e a

ruptura com o atual padrão de desenvolvimento. Acredita-se que esse fator esteja

sendo implantado aos poucos pelo homem, mas ainda caminha a curtos passos.

Observa-se que os recursos naturais são extraídos atualmente sem nenhum

planejamento com relação à sustentabilidade e sem um pensamento futuro sobre a

continuidade desses recursos em longo prazo. Este ainda é, porém, um desafio no

presente que está sendo implantado aos poucos e o designer tem o papel de pensar

em maneiras de projetar que visem todo processo de produção e a vida útil do

produto. Da mesma forma, não deve considerar apenas o produto que sai da fábrica,

16 Tradução nossa a partir de: “[...] el diseño está directamente relacionado con las cuestiones

ambientales”.

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mas também adotar ações que resolvam a obsolescência dos produtos que hoje se

encontram sem solução no mercado. Bezerra (2008, p. 42) confirma este aspecto:

O que antes era percebido como um processo para se chegar a uma única solução, agora é percebido como dependente do contexto e capaz de produzir múltiplas soluções. O que entendíamos como problemas técnicos, são agora entendidos como problemas éticos, ambientais e até políticos. O processo que antes estava centrado em apenas um agente, na maioria das vezes o criador ou designer, tem agora foco em um complexo sistema de agentes adaptativos, tais como os usuários, o meio ambiente, a cultura, a tecnologia, os mercados e outros.

O design deve atuar, considerando aspectos éticos, ambientais e políticos.

Dessa forma, é imprescindível avaliar o mercado que atingirá o tipo de cultura em

que ele está inserido e o tipo de descarte que o produto terá. Nesse sentido,

Mcdonough e Braungart (2002, p. 18-19) chamam a atenção para o modelo

utilizado, desde a Revolução Industrial:

Na verdade, a Revolução Industrial num todo não foi realmente projetada. Ela tomou forma gradualmente, enquanto os industriais, engenheiros e designers tentavam resolver problemas e tirar vantagem imediatamente do que eles consideravam ser a oportunidade em um período sem precedentes de mudança rápida e massiva.17

Os autores Mcdonough e Braungart (2002) revelam a fragilidade com que a

Revolução Industrial foi constituída. Segundo eles, o berço (cradle) está nas

matérias-primas extraídas do ambiente terrestre e a sepultura (grave) são lixeiras,

aterros, incineradoras que ainda ocorrem até nossos dias e que acumulam lixo no

meio ambiente. Essa é a forma de desenvolvimento de produção atual, os materiais

produzidos saem do berço e seguem até a sepultura, no modelo “Cradle to Grave”.

O designer tem uma responsabilidade com relação a isso e deve tomar

providências. Carson (1964, p. 8) afirma: “Afinal a escolha é nossa [...] Não podemos

mais aceitar os conselhos daqueles que dizem que deveríamos atulhar nosso 17 Tradução nossa a partir de: In fact, the Industrial Revolution as a whole was not really designed. It

took shape gradually, as industrialists, engineers, and designers tried to solve problems and to take immediate advantage of what they considered to be opportunities in an unprecedented period of massive and rapid change.

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mundo com produtos químicos venenosos, temos que olhar à nossa volta e procurar

um novo caminho”. O principal alerta é para que a sociedade desperte e desenvolva

atitudes ambientais que busquem um novo caminho diferente daquele adotado de

forma equivocada. Desta forma, o design deve trabalhar no processo enquanto

projeto para estabelecer metas, conceitos e desenvolver metodologias capazes de

mudar os rumos do desenvolvimento sustentável. A indústria deve rever seus

métodos de produção, primando para que o produto desenvolvido tenha vida útil e

destinação pós-vida, ou seja, preocupando-se com o descarte de lixo depositado na

natureza, mas enquanto isso não ocorre, ações sustentáveis e mobilizadas com a

questão da obsolescência é o caminho para o design. Bonsiepe (1997, p. 141)

confirma esse pensamento relatando que: “Um país que pretenda ser um ator e não

um espectador marginalizado terá que fazer do design um pilar para suas atividades

tecnológicas e comerciais”. Esta citação ordena uma reorganização urgente do

sistema atual, tendo o design a responsabilidade de encontrar soluções ao

desenvolvimento de produtos evitando problemas ambientais na sociedade.

Atualmente, deve-se entender como o design pode agir e desenvolver

projetos pautados na realidade em que se vive. O design deve colaborar para que se

evite ou que se desenvolva alguma ação com o descarte e não prime apenas pela

estrutura estética como referencial, mas que vise atividades processuais revendo

fatores econômicos, tecnológicos, ambientais e humanos em busca da

sustentabilidade. O avanço tecnológico será discutido a seguir, pois é de suma

importância entender a obsolescência de produtos industriais colocados no

mercado, inclusive no âmbito do lixo computacional que é o foco da pesquisa, visto

que foram analisados estudos de caso de ações da sociedade com lixo

computacional como um problema ambiental para o design.

1.3 A OBSOLESCÊNCIA TECNOLÓGICA

A tecnologia vem se desenvolvendo em níveis incomparáveis. Um exemplo

disso é um dado da ABINEE 18, referente ao aumento da venda de notebooks, que

apresentou um crescimento de 186% no primeiro semestre de 2008, resultando em 18 Dados da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (ABINEE). Avaliação Setorial - 2º

Trimestre 2008. Disponível em: <http://www.abinee.org.br/abinee/decon/decon11.htm>. Acesso em: 2 dez. 2011.

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1,09 milhões de notebooks vendidos. Este fenômeno por meio do crescimento

positivo da economia brasileira (através de emprego e renda) e a queda dos preços

desta tecnologia em relação aos computadores. Em 2010, o mercado de

computadores no Brasil atingiu 14 milhões de unidades, superando em 17% o

observado no ano anterior (12 milhões).

Observa-se que o computador, como um bem tecnológico, passa por

constantes inovações, o que proporciona ao mercado novas máquinas mais

potentes que surgem diariamente para consumo. Porém, esse é um grande

problema para o meio ambiente. Com novos produtos tecnológicos, aquilo que não é

mais novidade, torna-se obsoleto e é descartado pelo homem. Sendo assim,

discorrer sobre o lixo gerado pela tecnologia, em específico o computador,

considerado um dos mais representativos avanços da sociedade contemporânea, é

de suma importância visto que o designer é também gerador de produtos para o

mercado. Esta obsolescência gerada é constante. A indústria se esforça para criar,

gerando cada vez mais produtos atualizados e oferece ao consumidor possibilidades

de ampliação de opções, o que faz com que, em um espaço curto de tempo, o

homem troque a máquina usada por tecnologias mais avançadas.

Atualmente, é necessário pensar o design como uma atividade processual –

responsável por projetar, nesse caso, o objeto de pesquisa: computadores. O

designer deve buscar uma matéria-prima que respeite os impactos ambientais e que

complete o ciclo de vida19, inclusive, prevendo quando este artefato não mais servir

ao consumidor. Barros (1993) afirma que a indiferença com esse fato, de produção e

descarte, gera o lixo computacional. O autor explica que sempre há perda de

materiais e energia na produção o que acarreta descarte na natureza, isto já é hábito

nos processos desenvolvidos desde a fábrica. Por isso é relevante entender o que

fazer com a sobra existente de lixo computacional no mercado. Nesse sentido, a

indústria e os designers devem pensar no descarte do produto e, já que é do homem

o poder de compra, deve pensar no bem adquirido e no bem descartado e se é

viável fazer a reciclagem. Muitas vezes há perda durante o processo, por isso deve-

se compreender quais são as possibilidades oferecidas pelos materiais, para

compreender se a reciclagem é importante e benéfica à questão ambiental. O 19 Ciclo de vida do produto compreende desde a extração dos recursos naturais ou matérias-primas,

necessários à sua produção, até a disposição final do produto ao fim de sua vida útil (VALLE, 2004, p. 145).

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homem e a tecnologia andam juntos num processo cada vez mais dinâmico. Leite

(2003, p. 21) afirma que ações com relação a questões ambientais, estão sendo

repensadas por empresas e governos que visam minimizar problemas ambientais:

O crescimento da sensibilidade ecológica tem sido acompanhado por ações de empresas e governos, de maneira reativa ou proativa e com visão estratégica variada, visando amenizar os efeitos mais visíveis dos diversos tipos de impacto ao meio ambiente, protegendo a sociedade e seus próprios interesses.

Essas ações devem ser implantadas gradativamente, e, segundo Mcdonough

e Braungart (2002, p. 27-28), ainda há muito que desenvolver, já que a dinâmica da

indústria é ampliar produtos. Os autores acreditam que se deve pensar de outra

forma o design, com uma preocupação na minimização do lixo, além de entenderem

que o modelo adotado pela sociedade atualmente não funciona nesse sentido:

De acordo com algumas contas, mais de 90 por cento dos materiais extraídos para fazer bens duráveis nos EUA são gastos quase imediatamente. Às vezes, o próprio produto dificilmente dura muito. É geralmente mais barato comprar uma nova versão do produto mais caro que contratar alguém para consertar o item que você tinha.20

Com o exemplo dos Estados Unidos, os autores afirmam que os produtos são

criados predestinados à obsolescência já no momento de produção, e, conforme

isso vai acontecendo, novos produtos são comprados e um ciclo se instala, gerando

o lixo, mas vale ressaltar que se trata de algo que ocorre em todo o mundo.

Segundo a ONU21, atualmente, o planeta descarta por ano 50 milhões de toneladas

de resíduos de produtos tecnológicos no ambiente. Isso é um desastre. Materiais

que levam séculos para se decompor na natureza, como metais tóxicos e pesados,

20 Tradução nossa a partir de: According to some accounts more than 90 percent of materials

extracted to make durable goods in the United States become waste almost immediately. Sometimes the product itself scarcely lasts longer. It is often cheaper to buy a new version of even the most expensive appliance than to track down someone to repair the original item.

21 Organização das Nações Unidas (ONU), ou simplesmente Nações Unidas (NU), é uma organização internacional cujo objetivo declarado é facilitar a cooperação em matéria de direito internacional, segurança internacional, desenvolvimento econômico, progresso social, direitos humanos e a realização da paz mundial. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Organiza% C3%A7%C3%A3o_das_Na%C3%A7%C3%B5es_Unidas>. Acesso em: 17 jan.2012.

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acabam comprometendo o solo e a saúde do meio ambiente. Produtos tecnológicos

possuem vida média muito curta, de dois a cinco anos, e depois viram lixo. Os

metais neles empregados, em geral tóxicos, precisam de aproximadamente 500

anos para serem absorvidos pela natureza, conforme a Secretaria do Meio

Ambiente22.

Uma reportagem da revista Veja (Agosto, 2007)23 ressalta a periculosidade

das toxinas presentes nos metais do lixo computacional, ao citar o exemplo da

cidade de Guiyu ─ situada no litoral chinês e que está completamente contaminada

– só é possível encontrar água potável a 50 quilômetros. A razão disso é que em

média 70% desse tipo de resíduo, proveniente dos EUA e Europa, são depositadas

naquela cidade. A Figura 5, a seguir, mostra o lixo eletrônico acumulado em um

depósito da cidade que tem seu problema agravado pelo fato de que 80% da

população depende dessa atividade para sobreviver:

Figura 5: Lixo acumulado no depósito de Guiyu Fonte: Revista Veja (ago. 2007).

A produção ─ cada vez mais crescente ─ de componentes eletrônicos a

preços mais acessíveis, proporciona o crescimento da demanda por novas

tecnologias. Com a inovação tecnológica, a vida média de um computador passa a

ser de menos de dois anos. Contudo, o que se pretende questionar é a destinação

dos diferentes tipos de materiais que um computador possui. Atualmente, menos de

22 Disponível em: <http://www.ambiente.sp.gov.br/>. Acesso em: 21 dez. 2011. 23 Disponível em: <http://veja.abril.com.br/especiais/tecnologia_2007/p_074.html>. Acesso em: 21

dez. 2011.

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um terço de tudo que é produzido é reaproveitado, como se afirmou anteriormente é

mais barato comprar um computador novo do que fazer um upgrade24. A fim de

ilustrar o crescimento do consumo de computadores, dados da 20ª Pesquisa anual

realizada pela FGV25, demonstram que em maio de 2009 a sociedade possuía 60

milhões de computadores em uso no Brasil, uma proporção de um computador para

cada três habitantes. Já em 2012, conforme projeção do gráfico espera-se 100

milhões de computadores em uso, o que significará uma proporção de um

computador para cada dois habitantes. A seguir, esse crescimento pode ser

constatado no gráfico (Figura 6):

Figura 6: Computadores em uso no Brasil Fonte: Meirelles (2009).

Esse fenômeno ilustra a crescente obsolescência de computadores

ocasionada pela compra excessiva de modelos mais recentes. Essa situação é

oriunda das necessidades do homem de adquirir novos produtos. Plaza (1986, p. 17)

enfatiza essa relação do homem com o objeto tecnológico:

24 Upgrade é um termo em inglês para se referir à troca de algumas peças do computador para

melhorar o seu desempenho. 25 Segundo dados da 20ª Pesquisa anual realizada pelo Centro de Tecnologia de Informação

Aplicada da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV). Disponível em: <http://disciplinas.dcc.ufba.br/pub/MATA67/TrabalhosSemestre 20091/Monografia_Jader_Macedo_20091.pdf>. Acesso em: 21 dez. 2011.

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Nenhuma tecnologia nasce impunemente, muito pelo contrário, cada invenção tecnológica aparece quase sempre como produto de novos fatores e das novas condições materiais de produção e, sobretudo, pela inter-relação e entrecruzamento dos diversos sistemas ou canais existentes.

Este fato retratado por Plaza (1986) reitera que a tecnologia surge como uma

mediadora de processos que, com formas diferenciadas de utilização, faz parte do

modo de desenvolvimento da própria necessidade do homem contemporâneo. Essa

intermediação de diversos sistemas e canais existentes geram novas tecnologias –

novos computadores prestes a serem descartados em curto intervalo de tempo, o

que aumenta o problema relacionado ao lixo computacional. É necessário

compreender que o computador é, atualmente, essencial à sociedade, porém seu

descarte não pode existir de modo irresponsável. Manzini (1986, p. 91) 26 afirma que

“o design assume um papel de interface entre a tecnologia e a sociedade, e meio

ambiente”, indo além, ainda relata que:

O design é um instrumento para a conexão do que é tecnicamente possível no campo das tecnologias limpas com aquilo que é culturalmente desejável no campo da crescente preocupação com o meio ambiente. Com essa capacidade de perceber e interpretar potenciais técnicos e expectativas sociais e projetá-los em novas soluções, o design pode, por conseguinte, acelerar positivamente a mudança nos processos de produção e consumo.

O autor destaca a importância do design para o desenvolvimento adequado

de produtos e processos, possibilitando à sociedade utilizar de forma consciente os

artefatos, compreendendo as inovações tecnológicas nela inseridas e encontrando

formas ou metodologias que foquem o lixo computacional no meio ambiente.

Margolin (1998, p. 47) corrobora e complementa essa argumentação, afirmando que:

“O design é a atividade que gera planos, projetos e produtos. É uma atividade que

produz resultados tangíveis, os quais podem funcionar como demonstrações ou

como discussões dos modos de vida”. Dessa forma, a indústria da informática

26 Ezio Manzini (1991) analisa amplamente e de forma muito clara e objetiva a questão da

sustentabilidade e dos processos produtivos, sob o ponto de vista de um designer. Para o autor, o ciclo de vida de um produto se refere às trocas que acontecem entre o próprio produto e todo o ambiente a sua volta e deve ser interpretado em relação à movimentação dos fluxos de matéria, energia e emissões, durante toda sua vida.

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necessita pensar sobre o que fazer com a realidade do lixo computacional presente

nas residências, escolas, comércio e nas próprias indústrias tendo em vista o peso

da responsabilidade no destino daquilo que produz de forma compulsória. Nesse

sentido, a indústria carece de medidas que enfoquem a pesquisa de ações e

alternativas como um novo caminho para o design sustentável do século XXI,

facilitando a busca da sustentabilidade e investimentos em profissionais capacitados

e da instauração de metodologias capazes de evitar que o resíduo transforme-se em

lixo na natureza.

1.4 LIXO COMPUTACIONAL, UM PROBLEMA AMBIENTAL

Os problemas com relação ao lixo, embora sempre tenham existido no

cotidiano da sociedade, são fruto tanto das atividades residenciais quanto das

públicas e industriais. E, conforme explicitado anteriormente, Magera (2005), afirma

que o acúmulo de lixo é um processo histórico – o homem sempre o produziu.

Apesar disso, os problemas relacionados ao descarte são recentes e estão

relacionados com o processo de industrialização. Com o desenvolvimento advindo

da primeira Revolução Industrial, a produção aumentou e, consequentemente, a

quantidade de produtos descartados também. Magera (2005) enfatiza que, nesse

contexto, o crescimento populacional e a forte industrialização ocasionaram mais

opções de consumo, o que gerou mais resíduo, e, portanto criou sérias dificuldades

à sociedade no aspecto do descarte do lixo na natureza. Além disso, segundo este

autor, o desenvolvimento e a crescente industrialização estão acompanhados da

oferta de produtos com aspectos estéticos diversificados que, em longo prazo, são o

ponto de partida para a obsolescência principalmente nos itens tecnológicos

descartados rapidamente. O computador se encaixa nessa definição, já que é um

grande exemplo de item tecnológico frequentemente descartado. A geração de lixo

computacional é crescente e a maior razão disso é o fato de que o computador

respeita regras e também atende a determinados formatos. Segundo Laudon e

Laudon (1998), são incessantemente gerados pela indústria novos softwares que,

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por vezes, são mais desenvolvidos que o próprio hardware. Este artefato27 torna-se,

portanto, obsoleto devido às necessidades humanas de se adequar às inovações.

Sendo assim, o velho computador – o hardware ─ não mais serve para o homem

devido à existência de tecnologias mais atuais, e, será inevitavelmente descartado.

Com isso, um problema ambiental é gerado e repetido constantemente, o que

acelera o processo de uso e desuso caracterizado pela troca veloz de artefatos. Isso

pode ser observado no cotidiano, na dinâmica do ser humano de adquirir e adequar-

se ao produto – como, no caso, o computador – e às suas necessidades.

Diante dessa situação, a sociedade começa a questionar-se sobre o que fazer

com o lixo computacional. A chave para esse questionamento faz parte do design e

isso é refletido por Ryn e Cown (1996, p. 4), ao afirmarem que: “nós estamos

tardiamente tendo conhecimento de que a crise ambiental é também uma crise do

design”28, afinal, o design, como atividade com foco no planejamento e

desenvolvimento de produtos tem contribuído para a aceleração do processo de

obsolescência ao projetar sem prever o ciclo de vida· do produto, gerando o

descarte. Dessa forma, o design deve servir como intercessor do lixo existente a

caminho do seu destino final, com projetos de reaproveitamento ou, então, deve

projetar produtos de forma planejada para serem reaproveitados após sua primeira

fase de uso. Corroborando a necessidade de planejamento, Papaneck29 faz um

alerta à sociedade revelando que o design deve abordar métodos e ideias que visem

a questão ambiental. É importante lembrar que este autor já alertava a sociedade

sobre a relação entre meio ambiente e design em 1970.

Tendo em vista os aspectos levantados, é possível perceber que o lixo é um

grande problema na atualidade, já que o homem o descarta na natureza gerando

acúmulo. Jardim e Wells (1995, p. 23) definem lixo como: “[...] restos das atividades

humanas, considerados pelos geradores como inúteis, indesejáveis, ou

descartáveis”. A sociedade atualmente objetiva o consumo que é seguido do

descarte. No entanto, o destino dos produtos poderia ser outro, ou seja, as

27 “Artefatos são agentes especiais produzidos por necessidades culturais” (KAPTELININ; NARDI,

2006, p. 248). 28 Tradução nossa a partir de: “We have been late to acknowledge that the environmental crisis is

also a crisis of design”. 29 Victor Papaneck (1985) escreveu o livro "Design for the real world", onde já expressava

desesperadamente essa preocupação com a relação homem-natureza e o papel do design em essa relação como produtor de artefatos.

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empresas poderiam reduzir a quantidade de lixo gerado, utilizando produtos

fabricados com planejamento do seu ciclo de vida30, ou ainda pensando em

prolongar o tempo de vida útil do produto por meio da reciclagem31.

Com relação ao planejamento, os autores Clark e Fujimoto (1991) chamam a

atenção para o fato de que o ciclo de vida do produto deve ser planejado nas fases

iniciais do projeto, pois se forem formuladas alterações após esse período, pode

restar lixo que acabará em um aterro ou, no máximo, revivido em processos da

supracitada reciclagem que, embora seja uma forma de solução, não é a mais

eficaz. Nesse sentido, os autores Mcdonough e Braungart (2002)32 confirmam que a

fim de evitar o lixo, as sobras na produção não devem existir e, por isso, não

aprovam o reaproveitamento, ou seja, a reciclagem como solução, e indicam a

implantação do modelo berço ao berço (Cradle to Cradle), que consiste na

elaboração de produtos visando a continuação do seu ciclo de vida ou sua volta à

natureza, sem prejudicá-la. Esses teóricos enfatizam, portanto, que a reciclagem é

uma atitude equivocada do homem, pelo fato de que somente adia o destino dos

produtos em um ou dois ciclos de vida. Além disso, apontam que o processo de

reciclagem pode produzir ainda mais aditivos prejudiciais do que aconteceria no

processo de produção de um produto convencional, assim como pode liberar uma

maior quantidade de gases – o que envolve mais poluição ambiental. Para

exemplificar essa situação, Mcdonough e Braungart (2002, p. 4) citam um tapete

feito de garrafa pet e comentam que o consumidor pensa estar agindo corretamente

ao comprá-lo, porém, explicam a validade dessa aquisição: “Seu tapete é feito de

coisas que nunca foram planejadas para este fim [...]” e, portanto, foi gasta uma

quantidade de energia superior à de produção de um tapete comum. Além disso,

segundo Mcdonough e Braungart (2002, p. 4.), “o tapete continua a caminho do

aterro, sua casa é apenas uma parada”33. Tomando o exemplo como ponto de

30 De acordo com Fiksel (1997, p. 73), ciclo de vida é uma sequência de fases relacionadas com um

produto é uma sequência de atividades na qual se incluem a concepção do produto, seu desenvolvimento, lançamento, fabricação, manutenção, reavaliação e renovação que implica uma nova geração do produto.

31 Eigenheer et al. (2005) a reciclagem é hoje um procedimento industrial de reaproveitamento da matéria-prima para a produção de novos produtos.

32 William McDonough e Michael Braungart (2002), o primeiro arquiteto e o segundo químico, que instituíram o conceito “Berço ao Berço” (Cradle to Cradle). Eles defendem a ideia de se fazer um design que respeite a natureza.

33 Tradução nossa a partir de: The rug is still on its way to a landfill; Your house is just a stop off on the route.

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partida, os autores afirmam que buscar ações que minimizem o problema não é a

solução.

Diante disso, é possível perceber a dimensão do problema ambiental em

tempos modernos. Hobsbawn (1995) enfatiza que hoje se vive um momento de crise

histórica e há necessidade de mudança em relação ao modo de produção e seus

efeitos contra o meio ambiente. O autor acredita que o futuro não pode ser uma

continuidade dos erros do passado e alerta que o mundo pode explodir ou implodir,

se o homem não atentar para os problemas existentes. Além disso (e felizmente), o

que se percebe é que existe um anseio de mudança no comportamento da

sociedade em geral com relação ao meio ambiente que pode ser visto em ações

isoladas e coletivas realizadas pela sociedade. Essa mudança será melhor abordada

no terceiro capítulo nos estudos de caso.

No contexto do design, o processo de produção deve estar alerta à crise

ambiental e histórica que vem se arrastando há algum tempo e deve tomar atitudes

sustentáveis34. Assim, é necessária uma reorganização quanto ao que fazer com as

sobras do lixo, principalmente computacional, bem como a questão da

sustentabilidade em toda a sua complexidade.

1.5 DESIGN COMO ATIVIDADE PROJETUAL

Hoje o foco projetual do design é alcançar uma perspectiva organizada e

global, não apenas de forma local, individual ou isolada. O resultado global é um

reflexo das tendências e escolhas feitas em sociedades locais no mundo. O

desenvolvimento sustentável deve partir da tarefa de ações ao projetar. Este deve

ser o foco da economia global para um país sustentável. No caso do Brasil, são

necessárias melhorias para seu crescimento, pois como cita Denis (2000, p. 223) “O

país está carente de sistemas de organização coletiva, de clareza na difusão de

informações, de planejamento estratégico da produção, de soluções criativas para

problemas aparentemente insuperáveis”. Nesse sentido, a aliada do crescimento

34 Atitudes sustentáveis referem-se às condições sistêmicas segundo as quais, em nível regional e

planetário, as atividades humanas não devem interferir nos ciclos naturais em que se baseia tudo o que a resiliência do planeta permite e, ao mesmo tempo, não devem empobrecer seu capital natural, que será transmitido às gerações futuras” (MANZINI; VEZZOLI, 2004, p. 18).

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econômico e sustentável é a atividade de projetar do designer. Magalhães (1998,

p. 12) afirma, ainda, que a atividade projetual está intrinsecamente ligada ao

contexto em que se encontra a sociedade:

Assim, da postura inicial de uma visão imediatista e inevitavelmente consumista de produzir novos bens de consumo, o desenhista industrial passa a ter, nos países em desenvolvimento, o seu horizonte alargado pela presença de problemas que recuam desde situações, formas de fazer e de usar basicamente primitivas e pré-industriais, até a convivência com tecnologias mais sofisticadas e ditas ‘de ponta’. Já não há mais lugar para o velho conceito de forma e função do produto como tarefa prioritária da atividade.

A globalização e os avanços da tecnologia fazem parte do desenvolvimento

atual da sociedade que, ao buscar abranger necessidades e padrões de produção e

consumo sustentável, exige uma maior capacidade de abstração, de inovação e de

flexibilidade nos projetos entre o meio ambiente e o usuário. E, segundo Denis

(2000, p. 223), o papel do designer é fundamental nesse contexto: “O design tem

tudo para realizar uma contribuição importante para a construção de um país e um

mundo melhor”. Hoje o design tem a função de mediar o projeto atendendo a

necessidades como produção e consumo, como também deve entender como esses

produtos se comportam durante seu ciclo de vida. Esta deve ser a visão

contemporânea de um designer e, por isso, a importância da atividade projetual.

Maldonado (1997, p. 16) reitera a relevância e a conexão do design com diversas

tarefas e revela que o designer hoje deve “mediar dialeticamente entre necessidades

e objetos, entre produção e consumo”. Nesse sentido, Bonsiepe (1997, p. 31) aponta

que:

O design industrial é uma atividade projetual que consiste em determinar as características formais de produtos fabricados com métodos industriais. Características formais não são só os atributos externos, mas sim e sobretudo as relações funcionais e estruturais que dão coerência a um objeto tanto do ponto de vista do produto quanto do usuário.

Desta forma, o design deve agir como condutor da mudança em curso e da

quebra do paradigma da extração e conservação de recursos naturais. Ele deve ser

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norteador de processos mais evoluídos e sustentáveis, que busquem o equilíbrio

ambiental em todas as esferas da sociedade. É necessário tratar o design de forma

ampla, ao mesmo tempo analisando de forma minuciosa e sustentável, que envolva

diferentes faces e ações relacionadas aos problemas ambientais. Na atualidade, as

indústrias têm a responsabilidade de gerar produtos para serem consumidos,

objetivando a sustentabilidade ambiental e a conservação de recursos naturais na

produção de produtos ecologicamente corretos, levantando a capacidade de

reciclagem, uso, reuso, ciclo de vida dos materiais, escolha de materiais e técnicas

de confecção que tenham princípios ambientais e, por fim, uma normatização na

identificação dos diversos tipos de materiais, a fim de facilitar sua identificação. Essa

deveria ser uma forma de buscar a sustentabilidade. O que acontece é que

atualmente a sociedade tem buscado outras formas de ações colaborativas, e o

design tem surgido como ferramenta para mover o processo de inovação social

rumo à sustentabilidade.

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2 DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO PROJETUAL PARA UM DESIGN

SUSTENTÁVEL

2.1 ATIVIDADES E ELEMENTOS PROJETUAIS NO DESIGN

A atividade projetual em design implica no compromisso do desenvolvimento

de um produto visando os seus impactos na sociedade, no que diz respeito à

produção, consumo e descarte. Além disso, como enfatiza Bonsiepe (1997), o

design é uma atividade processual que determina funções, estruturas estéticas e

sistemas de produtos, que estabelece exigências técnicas funcionais e econômicas.

Segundo este autor, o design ainda tem o compromisso de orientar seus atos

projetuais para as necessidades do homem. E, embora essa atividade possa

parecer inédita, não é. Os homens projetavam artefatos, moradias e cidades muito

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antes das Revoluções Industriais35. Sabe-se que hoje o campo do design é muito

mais exigente, já que as ações de produção, consumo e descarte devem estar no

pensamento projetual do designer concomitantemente à questão ambiental.

Complementando o sentido da atividade projetual, Maldonado (apud BONFIM, 1995,

p. 10) afirma que esta:

Consiste em determinar as propriedades formais dos objetos produzidos industrialmente. Por propriedades formais não se entende apenas as características exteriores, senão, sobretudo, as relações funcionais e estruturais que fazem com que um produto tenha uma unidade coerente do ponto de vista, tanto do produtor, como do consumidor.

Nesse sentido, um projeto deve se preocupar prioritariamente com questões

de função e estrutura unindo as intenções do produtor e os anseios de quem vai

consumir. Isso define o design como uma atividade de planejamento em que,

consumidor e produtor, reveem e delineiam a forma de minimizar perdas e prejuízos

para ambos os lados – o que se relaciona também à questão ambiental. A ideia de

que o homem é a única espécie que produz lixo e que, na natureza, o que é sujeira

para uma espécie, para outra serve de alimento. Um exemplo dessa ideia na prática,

é a sacola 60Bag, que é biodegradável, naturalmente decomposta em

aproximadamente dois meses (60 dias). Ela é elaborada de um material resistente o

que a torna eficaz no dia-a-dia e também foi testada cientificamente para que possa

servir de adubo tão logo perca o uso. A Figura 7 ilustra a referida sacola:

35 Há muitas cronologias para as Revoluções Industriais. Segundo Tunzelmann (2003), a primeira

Revolução Industrial foi na Inglaterra, aproximadamente entre 1750 e 1815; a segunda Revolução Industrial foi nos Estados Unidos e na Alemanha, por volta de 1870 e 1914; a terceira Revolução Industrial se deu no Extremo Oriente e nos Estados Unidos, a partir do início dos anos 1970.

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Figura 7: Sacola biodegradável 60 Bag Fonte: Disponível em: <http://www.60bag.com>. Acesso em: 15 jan. 2012.

A sacola ainda apresenta mais uma vantagem: além do modelo apresentado

acima, são oferecidos outros três que podem satisfazer de diferentes formas as

necessidades do consumidor. São dois modelos com alças que podem ser

colocadas nos ombros e dois feitos para serem levados nas mãos, conforme ilustra

a Figura 8.

Figura 8: Modelos disponíveis da Sacola Biodegradável 60 Bag Fonte: Disponível em: <http://www.60bag.com>. Acesso em: 15 jan. 2012.

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Outro exemplo de ação sustentável foi criado por Hatch Nosigner, de acordo

com Schleifer (2010). O designer japonês desenvolveu vasos naturais, como

apresenta a figura abaixo, feitos com cascas de ovo, conforme ilustram as Figuras 9

e 10:

Figura 9: Vasos feitos com casca de ovo Fonte: Schleifer (2010).

Figura 10: Vasos feitos com casca de ovo – detalhe Fonte: Schleifer (2010).

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Nesse exemplo, enquanto as plantas crescem elas recebem os nutrientes das

cascas de ovos que, podem ser enterradas com a planta quando for transferida ao

vaso e, além disso, se degradam com o tempo. Outro ponto é que o produto é

interessante esteticamente uma vez que Nosigner passa a impressão de que as

plantas estão nascendo dos próprios ovos. Os modelos acima apresentados

demonstram que esta forma de desenvolvimento de produtos, não deixam resíduos

na natureza, o que seria ideal, mas nem sempre isso acontece, os produtos são

desenvolvidos gerando o descarte. Para produzir produtos que atendam a essas

novas exigências, é necessário que o designer possua conhecimento teórico e

técnico voltado à questão ambiental, que esteja preparado para a criação de

produtos, que considere aspectos ambientais e ainda assim atenda às necessidades

almejadas. Nesse sentido, Manzini (1993, p. 17) afirma que “todos os objetos feitos

pelo homem são a personificação do que é ao mesmo tempo pensável e possível.”

De forma mais abrangente, o designer deve entender qual deve ser o tratamento e o

destino do lixo, compreender qual é o papel do design nesta tarefa de tornar o

descarte menos nocivo e mais reaproveitável (não no sentido de reciclagem, mas,

sim, de continuar o ciclo de vida).

O futuro do produto após o descarte, quando se torna resíduo, deve ser

considerado prioridade. Afinal, a disponibilidade de matérias-primas futuras para o

desenvolvimento de produtos depende desse tipo de pensamento, já que é

impossível imaginar uma sociedade futura que não seja também sustentável,

conforme endossam Manzini e Vezzoli (2008). Além disso, uma parcela dos

consumidores, preocupada com os problemas ambientais, busca produtos

sustentáveis. Sob este aspecto, Mcdonough e Braungart (2002) sugerem que se

faça um design focado no homem e na natureza, que respeite a diversidade, utilize

resíduos como recursos e aproveite a energia solar da natureza. Para demonstrar

como utilizar o modelo de recursos e energia solar, os autores relatam a experiência

da construção de uma casa aquecida por sol na Irlanda. Na época, encontraram

dificuldades em aplicar soluções universais a circunstâncias locais. Entre as

estratégias para construção e pesquisa com moradores locais, Mcdonough e

Braungart (2002, p. 8) fizeram algumas descobertas:

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[...] experts sugeriram construir uma rocha gigante, um silo de armazenamento para reter calor. Eu descobri – depois de arrastar toneladas de rochas – que isso seria redundante numa casa Irlandesa, feita de grossas paredes de alvenaria.36

Mesmo após o mal-entendido na Irlanda, sabe-se que essa é uma solução

local sustentável que pode ser transformada e ganhar novas formas de ação do

homem em relação ao meio ambiente, mantendo uma harmonia entre o

desempenho econômico e ambiental. Independentemente da abrangência em que

são abordadas as questões, sejam locais ou globais, é necessário entender que

existem alternativas desejáveis, diante da degradação ambiental. Por meio deste

modelo, como o exemplo da Irlanda, entende-se que é possível aproveitar recursos

da natureza, o que tem sido estudado e experimentado em vários locais do mundo.

Um exemplo é a energia eólica37, considerada uma das mais promissoras fontes

naturais de energia, principalmente por ser renovável, isto é, não se esgota. Ela é

originada pela radiação solar, porque os ventos são gerados devido ao aquecimento

não uniforme da superfície terrestre, como altura, obstáculos, rugosidade do terreno

e relevo que acabam influenciando no escoamento do ar, causando aceleração ou

desaceleração, é como demostra a Figura 11, o desempenho do vento com os

aspectos que acabaram de ser considerados.

36 Tradução nossa a partir de: Experts suggested building a giant rock, a storage silo for holding heat.

I found out – after dragging tons of rocks – that it would be redundant in an Irish house, which is made of thick masonry walls.

37 Segundo Camargo (2005), a Energia Eólica origina-se a partir do vento, atmosfera em movimento, e é considerada como uma fonte inesgotável. É fruto da associação entre a energia solar e a rotação planetária. A circulação atmosférica constitui-se de um mecanismo solar-planetário permanente. Sua duração é da ordem de bilhões de anos.

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50

Figura 11: Desempenho dos ventos em diferentes ambientes Fonte: Atlas Eólico do Brasil (1998 apud DUTRA, 2001).

As turbinas eólicas são máquinas que utilizam a energia dos ventos e

conseguem convertê-las em energia mecânica. Uma turbina eólica encaixada a um

gerador por meio de um eixo transforma a energia mecânica em energia elétrica.

Segundo a Companhia Paranaense de Energia Elétrica (COPEL), a utilização mais

antiga da força dos ventos aconteceu em meados de 3500 a.C., com as

embarcações com velas feitas de tecido que transportavam mercadorias ao longo do

rio Nilo, no antigo Egito. Foram também, há 2.200 anos, utilizados moinhos de vento

na China e moinhos de vento de eixo vertical para a moagem de grão na Pérsia, por

volta do ano 200 a.C. O que significa que a ideia dos autores de usar os recursos

naturais – como o vento – não é uma atitude inovadora e sim muito antiga, mas

ainda válida. Em países como o Brasil, a utilização de recursos naturais para a

geração de energias tem sido possível. Contudo, o impacto ambiental gerado

durante a obtenção de energia é um problema que vem sendo discutido

mundialmente, mediante a conscientização da gravidade da questão. A busca da

sustentabilidade requer planejamento e inserção de novas fontes de energia, que

sejam renováveis e impactem o mínimo possível no meio ambiente.

Outra solução local, que pode ser global, apontada pelos autores Mcdonough

e Braungart (2002) é a utilização de resíduos como recursos, a fim de gerar menos

impacto na natureza. Manzini e Vezzoli (2008) pensam da mesma forma e criam o

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termo “Ciclo de vida” de um produto ─ Life Cycle Design38 ─ por meio do qual,

buscam desenvolver ambientalmente produtos que visem todas as fases de

produção, tanto acerca do uso quanto do descarte. Essa linha de desenvolvimento

aproxima-se dos biociclos, que se entendem à produção e ao consumo integrado a

ciclos naturais, seja em termos de materiais e energia empregados, seja no que se

refere à capacidade do ecossistema de absorver e biodegradar os resíduos e lixos.

O processo não interfere nos tecnociclos que são ações incutidas de um sistema de

produção e consumo fechado em si mesmos, pois reutilizam e reciclam materiais,

formando assim ciclos tecnológicos, que buscam formas de reduzir a zero as

entradas e saídas entre o sistema tecnológico e o sistema natural. Isso significa

acreditar que a produção e consumo devem partir de ciclos naturais e se houver

resíduo, que sejam encontradas formas de reutilizá-lo a fim de não se alterarem as

leis da natureza. Uma alternativa que tem sido aplicada, e que hoje em dia é

considerada por leigos a melhor forma de reaproveitar o lixo, é a reciclagem. Apesar

de ser considerada pelo INMETRO (2002)39 como capaz de reduzir o consumo de

recursos naturais, energia e o volume do lixo, Mcdonough e Braungart (2002) a

repudiam como forma de reaproveitamento, nomeando-a como downcycling40 por

não proporcionar tantos benefícios quanto o esperado. McDonough e Braungart

(2002, p. 42) ainda enfatizam que, apesar dos benefícios econômicos, há problemas

com o processo industrial no qual a reciclagem está incluída e afirmam: “A infra-

estrutura industrial atual é projetada para seguir o crescimento econômico. Isso é

feito a custo de outras preocupações vitais, particularmente a saúde humana e

ambiental, a riqueza cultural e natural, e até mesmo de divertimento e prazer”41.

Segundo Roaf (2006), só há coerência em reciclar, no sentido ambiental, se isso

puder ser feito naturalmente, sem que seja necessário o dispêndio de muita energia,

pois quanto maior o número de processos pelos quais um material ou um conjunto

de componentes tiver que passar, maior será a energia incorporada e o número de

38 Segundo Manzini e Vezzoli (2002, p. 91) “em Life Cycle Design considera-se o produto desde a

extração dos recursos necessários para a produção dos materiais que o compõem (nascimento) até o último tratamento (morte) desses materiais após o uso do produto”.

39 Instituto nacional de meteorologia, normatização e qualidade industrial–INMETRO. 40 Segundo Roaf (2006) downcycling é o processo de recuperação de um material para reuso em um

produto com menor valor, ou seja, a integridade do material é de certa forma comprometida com o processo de recuperação.

41 Tradução nossa a partir de: The current infra-structure is designed to follow the economic growth. This is made in place of other vital concerns, particularly human and environmental health, the cultural and natural wealth, and even entertainment and pleasure.

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resíduos associados. Desta forma, o design assume um papel fundamental na

sociedade contemporânea, tendo como responsabilidade criar, desenvolver e

colocar produtos no mercado atual, de uma forma que o mesmo não seja um novo

problema de descarte e poluição do meio ambiente, como tem ocorrido atualmente.

A sustentabilidade aplicada ao desenvolvimento de produtos deve ser,

portanto, plena e não um remedeio, como acontece no caso da reciclagem. Uma

sugestão para as empresas é dar ênfase à Eco eficiência, ou, como sugerem

Mcdonough e Braungart (2002, p. 51), “fazer mais com menos”42. Eles afirmam que

esse termo foi cunhado no encontro Nosso Futuro Comum43 já referido:

[...] Nosso futuro comum alertou que se o controle da poluição não fosse intensificado, a saúde humana, os bens e os ecossistemas seriam seriamente ameaçados, e a existência urbana se tornaria intolerável. As indústrias e as operações industriais deveriam ser incentivadas a serem mais eficientes em termos de uso de recursos, a gerar menos poluição e gasto, a serem baseadas no uso de recursos renováveis ao invés de não renováveis e a minimizar impactos prejudiciais irreversíveis na saúde humana e no meio ambiente.44

Desde esse encontro, o conceito de ecoeficiência45 vem sendo intensamente

estudado e debatido. Essa nova postura, voltada para a defesa ambiental, requer

empenho, inovação e, acima de tudo, mudança. É neste sentido que os designers

precisam pensar projetualmente, rever modelos de produção, buscando outras

maneiras de constituir e criar ambientalmente de forma correta. Com esse objetivo,

Mcdonough e Braunguart (2002) desenvolveram princípios relacionados ao

42 Tradução nossa a partir de: Doing more with less.

43 Nosso futuro comum também conhecido como Relatório Brundtland. ONU. Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 1988.

44 Tradução nossa a partir de: Our common future alerted that if the pollution control weren’t intensified, the human health, the goods and the ecosystems would be seriously threatened, and the urban existence would get unbearable. The industries and the industrial operations should be encouraged to be more efficient in terms of resources using, to generate less pollution and waste, to be based on the use of renewable resources in stead of not renewable and to minimize harmful impacts.

45 A ecoeficiência é alcançada mediante o fornecimento de bens e serviços a preços competitivos que satisfaçam as necessidades humanas e tragam qualidade de vida, ao mesmo tempo em que reduzam progressivamente o impacto ambiental e o consumo de recursos ao longo do ciclo de vida, a um nível, no mínimo, equivalente à capacidade de sustentação estimada da Terra” (World Business Council for Sustainable Development – WBCSD, 1992). Disponível em: <http//www. wbcsd.org/>. Acesso em: 15 jan. 2012.

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pensamento e à criação de produtos e processos dentro do conceito berço ao berço,

pontuando possíveis soluções para o planeta, tais como: assegurar que todo o

material e energia utilizados ou produzidos não gerem riscos ambientais e nem

resíduos; planejar operações de separação e purificação que minimizem o consumo

de energia e uso de materiais renováveis e não descartáveis. Em linhas gerais, essa

é a proposta da ecoeficiência, que deve considerar metas de durabilidade e não de

mortalidade. Os projetos não devem possuir atributos ou capacidades

desnecessários visando o término de seu ciclo de vida útil “afterlife”. Com esses

princípios, os autores ressaltam que, concomitante à preocupação ambiental, deve

haver respeito por quem cria, desenvolve e projeta, isto é, pelo o designer, bem

como por quem produz – a indústria. É importante respeitar também quem vive no

entorno da fábrica, as pessoas que transportam os produtos e, por fim, os

consumidores.

O pensar sustentável hoje atende a uma necessidade de sobrevivência do

mundo. Para que isso aconteça, Bonsiepe (2011) sugere investir na pesquisa em

design para gerar conhecimentos e, então, melhorar a prática projetual atual que,

com planejamento, pode garantir a continuidade de matérias-primas e da produção.

A razão disso é que no processo de busca e descoberta são levantados dados que

se transformam em informação, o que resulta em conhecimento que pode buscar

novas relações entre conhecimentos pré-existentes para determinado fim. Contudo,

sabe-se que a pesquisa tem um custo elevado para qualquer empresa que busque

investir em um produto. De qualquer forma, não é possível desconsiderar a extrema

relevância das pesquisas. Nesse sentido, segundo Bürdek (2006), a complexidade

dos problemas de projeto, percebidas com o produto instaurado no mercado,

provocou a necessidade da pesquisa e da inserção de metodologias de projeto na

área do design. Isso fez com que os problemas deixassem de ser tratados

intuitivamente ou de ser baseados apenas na experiência anterior do designer que

gerenciava sozinho o processo todo. Com isso, a escolha da técnica ou metodologia

ideal para cada situação passou a ser definida diante do objeto proposto, como será

aprofundado a seguir com exemplos de metodologias projetuais que surgiram para

tratar o problema da obsolescência de produtos existentes na contemporaneidade.

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2.2 METODOLOGIAS PROJETUAIS PARA O DESIGN SUSTENTÁVEL

Com a produção industrial, a atividade projetual se torna cada vez mais

necessária, já que o número de variáveis exigidas é crescente para o

desenvolvimento de produtos. Para organizar e aperfeiçoar o desenvolvimento de

produtos, surgiram diversas metodologias de projeto, que procuram delinear de

forma específica diferentes maneiras mais convenientes de desenvolvimento dos

projetos, de forma a facilitar o controle de suas diversas variáveis. Medeiros (1981)

destaca que estas metodologias podem ser definidas como sistemáticas ou

intuitivas, sendo utilizadas de acordo com o nível de complexidade do problema a

ser resolvido. O autor enfatiza o fato de que soluções podem ser encontradas,

considerando-se a experiência de um maior número de pessoas, inclusive pessoas

não pertencentes à equipe de projeto, acelerando-se assim as soluções e o tempo

gasto à procura de soluções de problemas.

Bonfim (1994) declara que as metodologias não devem ser confundidas como

regras para se chegar a um resultado, mas como o encontro de caminhos e

soluções. Para cada situação há um procedimento de solução, logo entende-se que

não existe um método geral que se aplique a qualquer tipo de solução de problema,

seja na atividade projetual ou na atividade diária. Pensar em Metodologias

subentende-se estabelecer normas e procedimentos para abordar uma questão e

buscar respostas a elas. O design, como organizador do processo projetual, deve

apontar propostas de solução, além de outros aspectos mais sustentáveis

dependentes de técnicas que desacelerem, com eficiência, a deterioração do meio

ambiente. É inegável que são muitas as preocupações que têm ocorrido com

relação à produção e o descarte no meio ambiente. No entanto, se o problema da

escolha de uma metodologia for abordado e tratado sob um único ponto de vista,

qualquer solução revelar-se-á insuficiente para sustentar o quadro de ocorrências

negativas que se sucedem com vários produtos no mercado, no caso específico

deste trabalho, o material computacional. Analisar métodos e técnicas que ajudem o

designer a desenvolver conhecimentos capazes de solucionar problemas, é

fundamental para o desenvolvimento de produtos – até mesmo para aqueles já

implantados no mercado. Bonfim (1995) e Munari (1998) concordam ao ponderar

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que métodos e técnicas são instrumentos de ordenação e organização e,

consequentemente, suportes lógicos ao desenvolvimento de um projeto.

Hoje é necessário realizar pesquisa em design a fim de desenvolvê-lo de

forma organizada e fundamentada. Contudo, é muito comum que ações aleatórias

realizadas por atores capazes de criar suas próprias metodologias assumam o título

de design. Convém destacar que a sociedade civil organizada, indústrias, governo e

consumidores de uma maneira informal realizam ações também consideradas como

válidas, mesmo que não sejam sistematizadas. É nesse sentido que se configura o

foco a ser pesquisado: diferentes metodologias que a sociedade tem encontrado

como soluções para o problema ambiental existente e quanto à produção do lixo

computacional. A ampla contribuição desta pesquisa é entender a prática e a teoria

adotadas por esses diferentes atores buscando inovações, técnicas e metodologias

criadas, muitas vezes em caráter experimental, mas que podem estar resolvendo o

problema da obsolescência na sociedade, inclusive a do lixo computacional – outro

foco da pesquisa. Bonsiepe (1984, p. 32) afirma que “a metodologia não tem

finalidade em si mesma, é só uma ajuda no processo projetual, dando uma

orientação no procedimento do processo e oferecendo técnicas e métodos que

podem ser usados em certas etapas”. Dessa forma, ele diz que o designer deve ter

o controle e a decisão de inovar, escolher e também compartilhar qual a melhor

alternativa a ser investida. Esses atores têm sido capazes de, além de criar,

compartilhar as metodologias criadas, tendo em vista sua eficiência e validade.

Nas últimas décadas do Século XX, as transformações econômicas, aliadas

aos avanços tecnológicos, mudaram as profissões ligadas à inovação. Segundo

Manzini e Vezzoli (2008), o design passou a assumir a responsabilidade como

projeto do ciclo de vida dos produtos, passando a ter que pensar em ações voltadas

à sustentabilidade ambiental. O que significa, segundo a ABNT (2001)46, analisar o

CVP (Ciclo de Vida dos Produtos) – como uma técnica para a compilação e a

avaliação das entradas, saídas e impactos ambientais de um sistema de produto,

entendendo as necessidades e estruturas produtivas – a produção, os produtos e os

serviços, bem como a interação com o meio natural e a possibilidade de degradação

46

O sistema de produto é o conjunto de unidades de processo, conectadas, material e energeticamente, que realiza uma ou mais funções definidas. O termo “produto” usado isoladamente não inclui somente sistemas de produto, mas pode incluir sistemas de serviço (ABNT, 2001).

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ambiental. Esta é uma forma de o designer pensar projetualmente. Existem

diferentes ações que o designer pode trabalhar, inclusive dentro da abordagem

transdisciplinar, pois, de acordo com Bonfim (2002, p. 15), “o design não é um

campo estável de saberes”, e sim gira em torno de diferentes disciplinas,

dependendo da natureza do problema tratado, como ilustra o seguinte a Figura 12:

Figura 12: Teoria transdisciplinar do design Fonte: Bonfim (2002, p. 15).

Moura (2003) corrobora o conteúdo deste gráfico afirmando que o design faz

parte de uma esfera multidisciplinar47 que se desenvolveu para a esfera

interdisciplinar48 cuja ampliação leva à transdisciplinaridade49. Desta forma, esse

campo de ampliação que transpõe barreiras é enriquecedor não só para o

profissional designer, mas para a sociedade como um todo. É importante ressaltar

que o design não apenas analisa o ciclo de vida de um produto, mas, também,

considera aspectos mais abrangentes para que se entendam os problemas, entre

eles, o da geração do lixo e, mais especificamente, do lixo computacional. Segundo

Brown (2008, p. 88), a inserção de várias atividades à atividade projetual é

imprescindível:

47

Moran et al. (2000) destaca que a multidisciplinaridade é o método que envolve integração de conteúdos. O método apresenta uma concepção unitária e não mais fragmentada do conhecimento, ponderando sobre o estudo e a pesquisa.

48 Moran et al. (2000) afirma que a multidisciplinaridade são disciplinas a serem simultaneamente trabalhadas.

49 Moran et al. (2000) propõe a transdisciplinaridade como uma espera, na qual a humildade, o respeito, a coerência e o desapego tornam real o sentido de encontro da educação voltada à transdisciplinaridade.

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O processo de design é mais bem descrito metaforicamente como um sistema de espaço do que como uma série pré-definida de passos ordenados. Os espaços demarcam diferentes tipos de atividades relacionadas que conjuntamente formam o continuo da inovação. O pensamento projetual pode parecer caótico para aqueles que o experimentam pela primeira vez. Mas, ao longo de um projeto, os participantes percebem [...] que o processo faz sentido e alcança resultados.

O envolvimento de diversas atividades e a consideração de vários aspectos

no desenvolvimento de produtos é uma característica da ação projetual, a qual

permite as ações informais, ou, sem uma sistematização pré-definida, mas capazes

de minimizar o problema do lixo. Esses aspectos serão abordados nos próximos

tópicos como Sistema produto-serviço, comunidades criativas e a cooperação entre

pares que inventam atividades culturais, formas de organização e modelos

econômicos que intercedem entre duas estratégias: a interação equilibrada entre as

dimensões local e global e o crescimento sustentável de recursos locais (físico e

sociocultural). Para isso, a sociedade pode intervir junto ao designer, apresentando

formas de minimizar o lixo e adotando soluções sustentáveis, práticas que foram

observadas nos estudos de caso e que serão desenvolvidas no terceiro capítulo.

Estas ações são isoladas, mas ocorrem organizadamente, e se configuram como

maneiras atuais encontradas pela sociedade para perpetrar o design.

2.2.1 Sistema produto-serviço

O design deve atuar sobre processos, produtos, serviços e diversos modelos

de consumo, a fim de intervir de forma preventiva na questão da sustentabilidade.

Papaneck (1995) corrobora essa ideia afirmando que o papel do designer também é

direcionar o desenvolvimento industrial para a sustentabilidade ambiental, já que

cabe a ele a função de definir as interações entre o produto, o homem e o ambiente.

O design deve buscar soluções originais de função, de uso de materiais e

tecnologias, de produtividade e sustentabilidade. A UNEP (2002)50 demonstra uma

metodologia que aponta a troca da venda de produtos para a de sistemas de

50

UNEP. Product-Service Systems and Sustainability. Opportunities for Sustainable Solutions. Paris: UNEP, 2002.

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produtos e serviços, desestabilizando o consumo exacerbado do homem. A ideia

pauta-se no problema da obsolescência e, para buscar solucioná-lo, é sugerida a

compra de um produto por horas pré-determinadas – como se fosse um aluguel –

que terminam quando esse produto se tornar ultrapassado. Nesse momento, ele

deve retornar à empresa que o irá reformular para voltar ao mercado, sob o mesmo

sistema, mas de forma atualizada. Para tanto, a UNEP (2002) acredita que a

empresa que vende o serviço deve assegurar que o usuário não adquira o produto,

mas o serviço. Dessa forma, a relação com o consumidor é caracterizada por uma

contínua interação na fase de uso por meio da aquisição e entrega de suprimentos,

manutenção e qualidade de serviço. Soma-se a isso, o potencial da companhia a

desempenhar um papel específico no fim da vida do produto a fim de reutilizar seus

materiais, economizando recursos. Esse modelo é capaz de atender às

necessidades dos clientes, minimizando os problemas ambientais.

Partindo-se desta definição, o Sistema produto-serviço é uma tendência para

soluções direcionadas ao consumo sustentável de recursos. A International Council

of Societies of Industrial Design (ICSID)51 acredita que o design é uma atividade

criativa com o propósito de estabelecer as qualidades multifacetadas de objetos,

processos, serviços e seus sistemas, compreendendo todo seu ciclo de vida. Isso

pode ser seguido por meio das propostas de Mcdonough e Braungart (2002), já

anteriormente citadas e que foram estudadas pela UNEP. Mais detalhadamente, a

ideia é que a indústria, ou as lojas afiliadas aluguem dez, 50 ou 100 mil horas, de um

serviço de televisão, computador entre outros. Ao final das horas de uso, a fábrica

retira o produto do consumidor, desmonta, reaproveita as mesmas peças e atribui a

outro produto, reinventando-o e modernizando, essa é uma solução atual para o lixo

computacional existente. Desta forma, não ocorreriam perdas nem insatisfação entre

as partes.

Outros autores que apontam a mesma ideia de design de produtos e serviços

são Manzini e Vezzoli (2008) os quais acreditam que produtos não mais precisam

ser projetados para serem possuídos pelos consumidores, mas que é importante

vigorar o Sistema produto-serviço rumo à sustentabilidade. Essa forma de entender

o design de serviços vem, então, integrar produtos, processos e pontos de contato, a

uma abordagem centrada nas pessoas, essa também é uma forma metodológica de 51

Disponível em: <http://www.icsid.org>. Acesso em: 27 set. 2011.

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se fazer design. Após essa integração, segue o projeto conceitual, que se inicia no

processo de criação efetiva do produto para o Sistema Produto-Serviço. Nessa

etapa, é importante considerar a ligação direta com o futuro usuário, o qual deve

participar da criação do produto, assim como todos os envolvidos no negócio, para

que todos apresentem suas viabilidades de desenvolvimento e estejam envolvidos

no projeto durante todo o seu ciclo de vida. Segundo a UNEP (2002), o Sistema

produto-serviço, se implantado, possibilita ganhos para produtores/fornecedores,

usuários e meio ambiente, de três formas. A primeira fornece adição de valor ao

ciclo de vida do produto, a indústria fornece serviços adicionais a fim de garantir a

funcionalidade e a duração da vida do produto. Um contrato de serviço pode incluir

manutenção, reparo, atualização e substituição durante um determinado período.

Quando o contrato expirar, o fornecedor recolhe o produto reinventando-o para outro

consumidor. A segunda fornece resultados finais aos clientes, ou seja, cria uma

gama de serviços customizados, substituindo a compra e uso de produtos. Os

serviços criados para o cliente deixam o produtor sendo o mantenedor do mesmo e

o consumidor pagando apenas pelos resultados combinados. A terceira possibilita

plataformas aos consumidores. A indústria oferece acesso a produtos, ferramentas e

oportunidades que possibilitam ao consumidor alcançar os resultados pretendidos. O

cliente paga apenas o tempo que realmente utilizou o equipamento.

O designer passa, a partir das propostas, a se envolver no projeto do

processo de entrega de valor para os usuários. Essa é uma forma inovadora de

fazer design. Muda-se o foco da produção e consumo de produtos para a venda de

serviços onde se vende resultados e soluções ao invés de um produto físico. O

percurso apontado por Manzini (2002) acerca do design de serviços indica

investimentos na mudança de curso, o que faz com que a demanda acabe sendo

atendida pela venda da satisfação ao invés de um produto. A Tabela 1 exemplifica

tais características segundo a visão de Sistema produto-serviço, sugerindo como

tratar o lixo computacional.

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Tabela 1: Características do Sistema produto-serviço Venda de um bem: produto.

Ex.: computador Alternativas inovadoras:

Sistemas produto-serviço

O consumidor compra um computador para a residência ou escritório.

O consumidor aluga um computador que atenda às suas necessidades para uso em sua casa ou escritório. A empresa determina os melhores equipamentos e métodos baseados nas necessidades dos consumidores.

O consumidor possui, usa e detém seu próprio computador. O consumidor é responsável pela manutenção e pela qualidade da limpeza e zelo pelo equipamento.

A empresa possui a propriedade do computador e é responsável pela manutenção. O consumidor é responsável pelo uso e pela qualidade da conservação. A empresa possui, mantêm e estoca peças de computador para reposição e remontagem. A empresa é também responsável pela qualidade.

Investimento inicial pelo consumidor pode ser considerável.

Os custos do consumidor são diluídos ao longo do tempo.

Consumidores descartam o computador e renovam com uma opção mais potente para atender às suas necessidades.

As empresas são responsáveis pelo descarte e têm incentivos para prolongar o uso e a reutilização do equipamento.

Fonte: UNEP (2002 – adaptado e baseado).

O que se observa nessa visão de Sistema produto-serviço é que, com a

inversão das funções dos produtores e consumidores, o fabricante é o proprietário

do produto e, assim, tem responsabilidades e obrigações durante toda a vida do

mesmo. Com isso, a questão do lixo computacional é minimizada e fases de vida do

produto de uso e descarte são respeitadas. Dessa forma, é reduzido o consumo de

energia por meio da adoção da remanufatura, o que também reduz os custos

relacionados à produção. Essa é uma solução sustentável.

2.2.2 Comunidades criativas

Existem outras formas metodológicas no processo do produto que visam a

inovação social como um motor sustentável para a inovação tecnológica e de

produção. Manzini (2007) aponta o que vem acontecendo naturalmente na

sociedade e denomina esse fenômeno como comunidades criativas. Esta

denominação é fortalecida pela era tecnológica em que a sociedade civil organizada

inova em serviços fundamentados no apoio mútuo, auto-organização, confiança e

interação, em que as principais características são as qualidades interpessoais,

sociais e ambientais. Indivíduos ou comunidades agem para resolver problemas ou

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criar oportunidades. Como afirma Manzini (2008), tais inovações, se guiadas antes

por mudanças de comportamento do que por mudanças tecnológicas ou de

mercado, geralmente emergem através de processos organizacionais como bottom-

up, que significa de baixo para cima, no qual as pessoas interessadas participam. Já

inovar de cima para baixo, ou seja, top down significa que instituições externas estão

intervindo. Há ainda o peer-to-peer, expressão usada para qualificar a ação entre

pares, ou seja, é a troca de elementos entre organizações parecidas. Esta, segundo

o autor, é uma forma que a sociedade encontra para lidar não só com o lixo

computacional, mas também com outras interações que agregam valores

econômicos, sociais e ambientais. O que chama atenção é que esses fenômenos,

com características que se fundem e se auto-organizam, são comunidades criativas.

Bonsiepe (1997) aponta que fazer design é desenvolver um potencial ao qual cada

um desenvolve, adquire, busca novas práticas da vida cotidiana. Dessa forma, o

design contribui para diferentes objetivos em diversos contextos. Assim, de acordo

com Manzini (2008, p. 96), a sociedade se mostra:

[...] Como uma trama de redes projetuais: um complexo e entrelaçado sistema de processos de design que envolve indivíduos, empreendimentos, organizações não lucrativas, instituições locais e globais que imaginam e colocam em prática soluções para uma variedade de problemas sociais e individuais.

A afirmação do autor abre a possibilidade para entender quais processos do

design envolvem atores e coletivos organizados, podendo estabelecer benefícios

sociais, como é o caso de ONGs, ativistas que defendem causas, entre outros

grupos da sociedade, como empresas e sociedade civil que se auto-organizam.

Manzini (2008) aponta que essa forma espontânea pode ser uma solução para o

problema do lixo computacional existente, pois estas inovações – as metodologias

inovadoras – surgem espontaneamente e podem mudar o rumo de acontecimentos

que tendem a conduzir o planeta a fins catastróficos. O autor vê esse fenômeno das

comunidades criativas como um molde de trabalho para atitudes de vida mais

sustentáveis geradas por indivíduos inventivos. Práticas desse tipo tornaram-se

comuns, como relata Kranenburg (2008), que usou o termo Bricolabs52 para

52

Bricolabs é real, um laboratório com o espírito de rede (BASTOS, 2009).

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significar narrativas colaborativas que podem ser escritas por muitas vozes. Sobre

isto, Bastos (2009, p. 29) revela “são experiências que serviram como inspiração

para a política de criação de pontos de cultura do governo brasileiro, tornando-se

parte da equação uma demanda quantitativa”.

Ações como essas de ativismo, inclusão e sustentabilidade trabalhadas e

criadas por coletivos, são classificadas como metodologia de comunidades criativas.

Caracterizam-se como ações voltadas a uma forma de design de reapropriação

tecnológica para transformação social e se relacionam ao lixo computacional,

estudado neste trabalho. Grupos que estabelecem experiências partilham conversas

e programas em laboratórios experimentais de tecnologias espalhados pelo Brasil.

Eles têm assumido um papel de destaque, em especial pelo uso e suporte a

tecnologias livres e abertas. Essas experiências indicam que laboratórios são de fato

desejáveis – menos por uma suposta carência de acesso a tecnologias do que pela

necessidade de socialização, o que dinamiza a criatividade aplicada. Ou seja, o mais

importante é que os laboratórios experimentais espalhados pelo mundo possibilitam

a troca de conhecimento e oportunidades, fomentando o aprendizado e distribuindo-

o, incentivando a descoberta e até mesmo o erro, parte fundamental e inerente ao

processo. Um laboratório experimental deve estar baseado na disponibilização de

metodologias, materiais e produtos com licenças livres. Deve buscar o

desenvolvimento de economias baseadas na abundância e na generosidade do

conhecimento livre. Deve incentivar a circulação e o enredamento, bem como buscar

maneiras de financiar a criatividade aplicada que se alimenta da experimentação.

2.2.3 Inteligências coletivas e auto-organização

O termo em inglês “swarm intelligence”53, que significa inteligência coletiva

(IC), foi introduzido em 1989 e se caracteriza pelo estudo de coletivos organizados

de animais, que se formam sem um líder e se comportam de forma a aumentar suas

chances de sobrevivência. Este tipo de comportamento em grupo é atualmente

estudado em sistemas naturais de espécies como: colônias de formigas e abelhas,

bando de pássaros, crescimento de bactérias ou amebas, cardumes ou mesmo 53

Swarm intelligence significa inteligência coletiva (IC) (BONABEAU et al., 1999, p. 1).

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multidões de seres humanos. Conforme Johnson (2003, p. 10), um estudo feito por

pesquisadores da área de matemática aplicada, com “Dictyostelium discoideum”54,

organismo semelhante a uma ameba, contribuíram para “transformar a nossa

compreensão não apenas da evolução biológica, mas também de mundos tão

diversos como a ciência do cérebro, o design de software e os estudos urbanos”.

Percebeu-se que o discoideum tem uma vida, ora ele é um, ora ele é muitos,

dependendo das condições ambientais favoráveis ou desfavoráveis que se lhe

apresentem. Segundo o mesmo autor, “quando o ambiente é mais hostil, o

discoideum age como um organismo único; quando o clima refresca e existe uma

oferta maior de alimento, ‘ele’ se transforma em ‘eles’. O discoideum oscila entre ser

uma criatura única e uma multidão” (JOHNSON, 2003, p. 10). Trata-se de um

comportamento de grupo coordenado, pois se costuma pensar em termos top-

down55, sempre com a existência de um líder. Assim, a resposta predominante foi,

durante longo tempo, a de que células líderes liberariam efeitos de ondas no ar, a

fim de fazerem as outras células se agregarem.

O processo observado acerca do discóide um acontece com os seres

humanos, grupos se organizam, trocam experiências, muitas vezes sem que haja

um líder, todos emitem opiniões, trocam experiências. No pensamento de Lévy

(1999, p. 28)56, vê-se com clareza que inteligência coletiva “é uma inteligência

distribuída por toda parte, incessantemente valorizada, coordenada em tempo real,

que resulta uma mobilização efetiva das competências”. O autor enfatiza que uma

inteligência, quando distribuída por toda parte, é significativa da existência de

pessoas com diferentes níveis de conhecimento. Por isso, ainda de acordo com o

autor, não existe um conhecimento pronto, acabado, que seja o único a ser correto,

pois em todas as partes, e em cada uma das pessoas, concentra-se algum tipo de

54

Dictyostelium discoideum é um organismo semelhante a uma ameba. Ora ele é um, ora ele é muitos. Tudo dependendo das condições ambientais favoráveis ou desfavoráveis que se lhe apresentem Johnson (2003).

55 Top-down é uma metodologia que começa no nível mais alto de um conceito de design e prossegue em direção ao nível mais baixo. Começa com a especificação ampla de projeto em mente e coloca informações em um local centralizado. Então você progride a partir dessas informações para as partes individuais. Isto torna mais fácil projetar e gerenciar conjuntos de produtos de grande porte. Você pode fazer alterações a partir de uma localização central, que vai propagar a todos os níveis do design, segundo Johnson (2003).

56 Pierre Lévy foi um filosofo que estudou especialmente na área da cibernética e da inteligência artificial. Disponível em: <http://www.infoescola.com/biografias/pierre-levy/>. Acesso em: 15 jan. 2012.

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saber. Existe uma inteligência distribuída por toda parte e há troca de informações e

saberes. Lévy (1999, p. 167) ainda afirma “[...] mas sim a inteligência coletiva, a

saber, a valorização, a utilização otimizada e a criação de sinergia entre as

competências, as imaginações e as energias intelectuais, qualquer que seja sua

diversidade qualitativa e onde quer que esta se situe”. É relevante destacar que

inteligências coletivas e auto-organização são distintas em relação às comunidades

criativas. Todavia, em um determinado momento de ação elas podem compartilhar e

fundir experiências entre pares. Este autor propõe a construção de inteligências

organizadas pela própria coletividade, isto é, pelos próprios homens. Assim, nessa

interação, o acúmulo de experiências e de diversos conhecimentos pode

desenvolver a criatividade do indivíduo, o que pode ser aumentando pelo trabalho

coletivo e pela própria interação com os outros. O que demonstra que o processo

opinativo e as trocas entre pares, são essenciais para o design. A conexão entre

pessoas de forma colaborativa constitui as comunidades colaborativas. Por sua vez,

tais comunidades devem adotar a inovação social que, segundo Manzini (2008,

p. 61), “refere-se à mudança no modo como indivíduos ou comunidades agem para

resolver seus problemas ou criar oportunidades”. Essas comunidades têm tido o

desprendimento de inventar, aprimorar e gerenciar soluções de forma criativa,

focadas nos novos modos de vida. Manzini (2008) reforça que essas ações são

realizadas por comunidades criativas. O designer pode, a partir de experiências

sociais como estas, compreender as necessidades dos consumidores e convertê-las

em valores para consumidores e oportunidades para o mercado. Além do que essa

socialização pode ser classificada como inteligência coletiva, auto-organização e

colaboração.

Ainda segundo Manzini (2008), essa forma de organização coletiva não pode

ser imposta, pois é formada geralmente por sujeitos que possuem valores e culturas

comuns e que qualquer intervenção externa de agrupamento, coloca em risco a

harmonia das relações interpessoais. Pode-se afirmar, a partir dessas

considerações, que os homens se reúnem e se auto-organizam espontaneamente

por meio de um contexto cultural específico, capitalizam as capacidades dos

membros da equipe de forma eficaz, num fluido conjunto interdependente, que

ocorre por meio da rede de equipe, no sentido da organização, que reforça a

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responsabilidade de cada um pelo todo, para criar estruturas, culturas e práticas

participativas com objetivo comum (BEYERLEIN et al., 2003).

Manzini (2008) reforça a importância do designer como agente facilitador da

inovação social, através de sua aproximação com os problemas reais do usuário e

seu contato com os agentes locais. O termo inovação social, segundo Manzini

(2008), refere-se a mudanças no modo como indivíduos ou comunidades agem para

resolver seus problemas ou criar novas oportunidades e são guiadas mais por

mudanças de comportamento do que por mudanças tecnológicas ou de mercado,

geralmente através de processos organizacionais “de baixo para cima”, em vez

daqueles “de cima para baixo”, como já abordado anteriormente. O autor enfoca

ainda que a inovação social deve encontrar energia dentro das iniciativas locais e

que o papel do designer reside em construir uma ponte entre as condições internas

e as condições externas da mudança para criar experiências locais que mostrem

conhecimentos e possibilidades inovadoras. Esse é um papel estratégico do

designer. O acúmulo de diferentes experiências tem como resultado a multiplicação

de resultados, as fontes de ideias multiplicam-se, o medo de falhar é partilhado, a

motivação é maior e o processo criativo instigado pela coletividade.

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3 O DESIGN EM ESTUDOS DE CASOS SOBRE AÇÕES DE LIXO

COMPUTACIONAL EM SÃO PAULO

Este capítulo aborda os estudos de casos relacionados a ações de descarte,

bem como as metodologias aplicadas por grupos sociais que criam respostas para

resolver problemas relacionados ao descarte de lixo computacional na sociedade.

No que concerne à implicação das pessoas nas ações de descarte o que é

normalmente esperado desta pesquisa é que as ações e os resultados investigados

tivessem como foco a questão ambiental. Contudo, é preciso referir que algumas

ações acontecem naturalmente sem objetivo ambiental. O que não significa que não

contribuam para a questão da sustentabilidade da atividade projetual. Isso é

demonstrado em um trecho da entrevista feita com Felipe Fonseca do

MetaReciclagem:

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[...] nossos contextos são específicos para os problemas que precisamos resolver. As formas do mutirão, como sociabilidade dinâmica de rede e da gambiarra como criatividade cotidiana, surgiram como respostas. Não sei se se aplicam a outros campos.

Nesse caso especifico, Fonseca deixa claro que nem tem ideia se as ações

deles se aplicam a outros campos como o ambiental. Essas respostas são buscadas

nos estudos de casos, com a definição de cada metodologia ou atividade projetual

utilizada por cada um. Esse problema é atual, entender as atividades de pessoas

que se auto-organizam em busca de um mesmo fim significa perceber os diferentes

modos de ação isolados que o fazer humano encontra para problema lixo

computacional. Segundo Manzini: “Pessoas que, de forma colaborativa, inventam,

aprimoraram e gerenciam soluções inovadoras para novos modos de vida, a partir

da recombinação de elementos existentes, considerando que a capacidade de

reorganizar estes elementos em novas e significativas combinações, seria uma das

possíveis definições de criatividade” (MANZINI, 2008, p. 64).

A disposição do homem para criar respostas e resolver problemas diante do

acúmulo de lixo computacional são soluções pensadas isoladamente ou

disseminadas por determinados grupos sociais, cujo objetivo é encontrar

possibilidades de desenvolvimento sustentável. A indústria não tem dado conta do

lixo, tampouco do desenvolvimento sustentável diante da enorme obsolescência

existente, o que causa um problema ambiental. A Tabela 2 demostra as ações

investigadas que serão discorridas nesse capítulo se encaixam nas seguintes

metodologias:

Tabela 2: Comparação entre a metodologia e o estudo de caso Ações investigadas Realidade individual Metodologia utilizada

CEDIR Universidade Sistema produto-serviço

MetaReciclagem Sociedade Civil Comunidades Criativas,

inteligências coletivas e auto-organização

Itautec Indústria Ciclo de vida do produto

Reciclo Metais Empresa particular Ciclo de vida do produto

Fonte: A autora.

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Cada caso será abordado por meio das experiências. Dentre eles, a Indústria

Itautec de Jundiaí, que tem encontrado formas de minimizar a situação do lixo

computacional com centro de descarte e normas estabelecidas. O CEDIR que é um

centro de descarte organizado pela USP57, que sentiu o problema da obsolescência

computacional e tomou posição diante deste fato. Um caso específico de grupo

social que se mobilizou em prol do lixo computacional é o MetaReciclagem, seus

integrantes trocam informações on-line, mobilizando-se por todo Brasil, trocando

experiências. Finalmente o caso da empresa particular Reciclo Metais, cujo

proprietário é um empreendedor que trata a questão ambiental como normas a

seguir, resolvendo em parte a obsolescência computacional e visando o lucro por

meio do lixo computacional. Em todos os casos, o que se observa é que a sociedade

tem buscado formas de minimizar a situação do lixo existente. Logo, a posição dos

designers, diante dessas novas ações, mudou, não ficando apenas na

responsabilidade de criar e sim em executar todo o processo, desde o nascimento

até a morte do produto ou a não morte do mesmo. Segundo o autor Manzini (2008,

p. 28):

[...] para os designers,..., a possibilidade de ação recai na capacidade de dar uma orientação estratégica às próprias atividades [...], o que implica numa considerável habilidade de design: habilidade de gerar visões de um sistema sócio técnico sustentável, organizá-las num sistema coerente de produtos e serviços regenerativos, e comunicar tais visões e sistemas, adequadamente, para que sejam reconhecidos e avaliados por um público suficientemente amplo, capaz de aplicá-las efetivamente.

Essa preocupação e a interação do designer à questão ambiental e ao

problema existente requerem atitude, inovação e empenho de tempo, compreensão

da dinâmica empregada, além de esforço em muitos sentidos. Para isso, é

necessário que o designer sinalize sua intenção no sentido de que as

transformações não se manifestem apenas fisicamente, com novos produtos e

serviços. Mas, ao contrário, ele deve buscar a interação entre as diferentes

manifestações de valores da sociedade, pois tais manifestações preocupam-se com

as ações propostas para solucionar o problema existente. É importante que o

57 USP. Universidade de São Paulo. Disponível em: <http://www5.usp.br/>. Acesso em: 15 jan. 2012.

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designer pense em ideias e reformule projetos que atendam às necessidades da

sociedade e que respeite e dê apoio a ações que o homem tem proporcionado ao

problema, pois assim ele pode melhorar a qualidade de vida. É necessário pensar

em estratégias projetuais que solucionem o lixo computacional existente. Essa é a

motivação pessoal da pesquisadora.

3.1 A EXPERIÊNCIA DA USP: CEDIR

A experiência da USP serve como estudo de caso e exemplificação, por tratar

de lixo eletrônico, no qual o computacional se encaixa. A Universidade de São Paulo

(USP) instaurou o Centro de Descarte e Reuso de Resíduos de Informática,

denominado de CEDIR58, que atua desde 2009 e garante que resíduos de

informática da própria universidade passem por processos que impeçam o seu

descarte na natureza e possibilitem o seu reaproveitamento na cadeia produtiva59.

Neste projeto organizado pela USP, os equipamentos e peças que ainda estiverem

em condições de uso são avaliados e enviados para projetos sociais, atendendo,

assim, à população carente, no acesso à informação e educação, através do blog

<http://stoa.usp.br/neucib/weblog/90500.html> (entrevista Nelci Bicov – CEDIR), o

qual permite acesso e cadastro dos interessados.

Constatou-se no estudo uma preocupação evidente para o estímulo às

relações sociais e atividades fora da universidade visando à conscientização

ambiental da sociedade. De acordo com os depoimentos das entrevistas, não só o

CEDIR, mas outras ações investigadas focam esse ponto:

[...] Os equipamentos e peças que ainda estiverem em condições de uso serão avaliados e enviados para projetos sociais. (Entrevista Nelci Bicov – CEDIR)

58 Os equipamentos e peças que tenham condições de uso são encaminhados para projetos sociais,

atendendo, assim, a população carente no acesso à informação e educação. No final de sua vida útil, tais equipamentos deverão ser devolvidos pelos projetos sociais à USP, para que possam lhes dar uma destinação sustentável (CEDIR, 2001).

59 Cadeia produtiva é um conjunto de etapas consecutivas, ao longo das quais os diversos insumos sofrem algum tipo de transformação, até a constituição de um produto final (bem ou serviço) e sua colocação no mercado. Trata-se, portanto, de uma sucessão de operações (ou de estágios técnicos de produção e de distribuição) integradas, realizadas por diversas unidades interligadas como uma corrente, desde a extração e manuseio da matéria-prima até a distribuição do produto. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Cadeia_produtiva>. Acesso em: 15 jan. 2012.

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[...] Damos suporte a projetos sociais, maior conscientização da população, sensibilização da área política e oportunidade de emprego e renda. (Entrevista Marcus Oliveira – Reciclo Metais)

[...] A empresa tem sempre grande preocupação em estabelecer programas de conscientização e comunicação com boas práticas ambientais, não só para funcionários, mas também para a comunidade. (Entrevista Andréia Maffeis – Itautec Jundiaí)

O processamento do material eletroeletrônico pelo CEDIR-USP, ao longo de

2010, resultou no remanufaturamento de equipamentos que beneficiaram 25

entidades externas à USP (ONGs) e 20 unidades da própria USP com equipamentos

emprestados. Esses dados constam na Tabela 3 e foram extraídos do ano de 2010

(a entrevista se fez no ano de 2011 e os dados do ano não estavam terminados).

Tabela 3: Total de empréstimo de equipamentos tratados pelo CEDIR-USP em 2010 Equipamentos emprestados

Ano Monitores CPUs Impressoras Scanners Outros* Total

2010 141 129 11 3 45 339

*Outros: dispositivos acessórios: mouses, autofalantes, cabos etc. Fonte: Autora em visita in loco – CEDIR-USP, 2011.

A reciclagem que o CEDIR executa, no sentido de desmonte e reuso do

material, encaixa-se na metodologia de Sistema produto-serviço. De uma forma

geral, a universidade tem uma filosofia comum de atuação quanto ao

reaproveitamento e empréstimo, o que é uma solução adequada para o

enfrentamento da problemática do excesso de lixo existente dentro da USP e que

pode ser uma solução ambiental que sirva como exemplo a outras empresas. O

Centro de Descarte e Reuso de Resíduos de Informática da Universidade de São

Paulo (CEDIR-USP) é uma iniciativa responsável, alinhando a universidade com os

interesses da sociedade na gestão adequada dos resíduos eletroeletrônicos,

colaborando, assim, para a sustentabilidade. Não se deve deixar de ressaltar que a

visão deles, além de ambiental ao evitar o descarte indevido, é assistencialista,

visando proporcionar às classes menos desfavorecidas a oportunidade de manusear

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o instrumento tecnológico advindo do lixo computacional arrecadado e remontado

para novo uso. A dinâmica é emprestar durante um tempo, com data para

devolução, o que reforça a metodologia de Sistema produto-serviço utilizada pelo

CEDIR. A Tabela 4 mostra como o CEDIR se enquadra nesta metodologia:

Tabela 4: Comparação entre a metodologia e o estudo de caso Sistemas produto-serviço Por que se aplica ao CEDIR (USP)

Aluguel do produto (em substituição à compra)

Os computadores remontados no centro são emprestados a comunidades carentes por tempo determinado.

A empresa dona do produto fornece a manutenção necessária

O centro está disponível para possíveis reparos.

O produto retorna à empresa para a reinvenção

Após o tempo determinado, o produto retorna à empresa e pode ser reformulado para atender outras pessoas carentes, com fins solidários. As peças que não forem válidas na montagem dos computadores são encaminhadas a outros centros de reutilização.

Fonte: A autora.

Sobre essa atividade projetual de empréstimo e montagem é necessário

considerar a ligação direta com o futuro usuário, ou seja, o mesmo participa da

montagem do computador, para que indique suas viabilidades de desenvolvimento e

futura utilização. Para os itens que não forem reaproveitáveis por projetos sociais, a

destinação é a reciclagem e envio dos mesmos a centros de descarte específicos

para cada material, situados no Brasil e no exterior. No entanto, isso não resolve o

problema totalmente, pois não existem centros de descarte que aproveitem todas as

peças sem desperdício, o que acarreta em sobras de materiais no próprio CEDIR na

USP. No local, existem pilhas de materiais sem destino, aguardando solução, como

registra a foto tirada em visita:

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Figura 13: Foto do interior do CEDIR-1 Fonte: Autora em Visita ao CEDIR- USP.

Figura 14: Foto do interior do CEDIR-2 Fonte: Autora em Visita ao CEDIR- USP

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Figura 15: Foto do interior do CEDIR-3 Fonte: Autora em Visita ao CEDIR- USP

Figura 16: Foto do interior do CEDIR-4 Fonte: Autora em Visita ao CEDIR- USP

O CEDIR também executa um papel de segregação e envio de diferentes

itens, dependendo de suas especializações, a outros centros de reciclagem que

descartam o restante dos componentes. De acordo com Manzini (2008, p. 28), “os

desafios com os quais se depara o design que busca contribuir para a

sustentabilidade do planeta, ancoram-se, fundamentalmente, na geração,

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organização e comunicação de visões de mundo mais sustentáveis”. Essa é a visão

do CEDIR, organizar e sistematizar uma forma de trabalho que programe a

metodologia Sistema produto-serviço no sentido de resolver o problema do lixo

computacional, oferecendo benefícios tanto aos usuários quanto às empresas, e

ainda ao meio ambiente, no que diz respeito ao desenvolvimento sustentável, pois

todos devem se conscientizar a fim de não esgotar os recursos naturais.

A dinâmica do CEDIR (2001) funciona com uma infraestrutura construída de

400m², instalada em um galpão com acesso para carga e descarga de resíduos,

área com depósito para categorização, triagem e destinação de 500 a 1000

equipamentos por mês. O projeto tem como conclusão a melhoria no uso

sustentável do lixo eletrônico gerado pelo corpo docente, discente e profissional da

Universidade. No local, observou-se que o enfoque é arrecadar, sistematizar,

separar enviar a projetos sociais ou enviar a centros de descarte, dando um fim ao

problema lixo computacional, como se observa no fluxograma organizado pela USP,

representado na Figura 17:

Figura 17: Fluxograma da gestão de resíduos eletrônicos do CEDIR-USP Fonte: Autora no CEDIR-USP, 2011 – Visita em loco.

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O centro de descarte, no qual trabalham integrantes da USP, adota

metodologias projetuais, como arrecadar, separar e remontar novos computadores

com velhas peças doando de forma consignada a entidades, como pode ser

observado no fluxograma. As ONGs obedecem a uma fila de doação, com adendo

de empréstimo retornável. É uma atitude sustentável que lida com a obsolescência

do lixo computacional, já que a demanda da própria universidade é imensa. A

repórter Valéria Dias, da Agência USP60, relata:

Apenas entre janeiro e junho de 2011, o Centro de Descarte e Reuso de Resíduos de Informática (CEDIR) da USP recebeu quase 42 toneladas de equipamentos descartados pela comunidade uspiana e por pessoas físicas, como CPUs, monitores, teclados, mouses, estabilizadores, no-breaks, impressoras, telefones, celulares, fios e cabos, CDs, DVDs, além de pequenos objetos como câmeras fotográficas, pilhas, baterias e cartuchos. Somente neste período, foram descartados 1439 monitores, 1202 CPUs e 511 impressoras.

A principal contribuição do CEDIR para a sociedade é garantir que os

equipamentos eletroeletrônicos da USP tenham destinação correta e que a maioria

do material descartado possa retornar à cadeia produtiva. A forma como trabalham

envolve projetos sociais que organizam e remontam equipamentos e os emprestam

às ONG’s ou a projetos educativos cadastrados. Com esse projeto, a USP acredita

que contribui para que os equipamentos reaproveitados tenham outro destino

diferente de um aterro sanitário. Mcdonough e Braungart (2002, p. 25) chamam a

atenção para o fato de que esta atitude é decorrente com relação ao meio ambiente

desde o século XIX:

[...] no século XIX, quando essas práticas começaram, a natureza e suas características não traziam nenhuma preocupação. Os recursos pareciam inacabáveis. A natureza era vista como uma “mãe terra” que, eternamente de forma regenerativa, iria absorver todas as coisas e continuar a crescer. 61

60 Disponível em: <http://www5.usp.br/de-janeiro-a-junho-CEDIR-recebeu-quase-42-toneladas-de-

descarte-de-eletronico/>. Acesso em: 9 dez. 2011. 61 Tradução nossa a partir de: In the nineteenth century, when these practices began, the subtle

qualities of the environment were not a widespread concern. Resources seemed immeasurably vast. Nature itself was perceived as a “mother” who, perpetually regenerative, would absord all things and continue to grow.

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Enquanto no século XIX os recursos pareciam inesgotáveis, em contrapartida,

hoje, a preservação e a preocupação com o meio ambiente é considerada uma

primazia de toda nação e também um grande desafio que o mundo todo enfrenta.

Mcdonough e Braungart (2002, p. 26) afirmam que:

[...] o entendimento da natureza mudou drasticamente. Novos estudos indicam que os oceanos, o ar, as montanhas e as plantas e animais que os habitam são mais vulneráveis do que se pensava. As indústrias modernas, no entanto, ainda operam de acordo com paradigmas que se desenvolveram quando a visão de mundo humana era bem diferente.62

Um fato recorrente é que a indústria tem colocado uma enorme quantidade de

produtos no mercado e que o consumidor não sabe onde descartar. O modelo de

descarte de produtos e materiais é adotado atualmente. Com o surgimento de

atitudes como a observada na da Universidade de São Paulo, que organiza e

estabelece uma metodologia atuando sobre Sistema de produtos-serviços, ocorre o

direcionamento do desenvolvimento para a sustentabilidade ambiental, já que cabe

ao design a função de definir as interações entre o produto, o homem e o ambiente.

A Universidade de São Paulo é um exemplo de IES a outras instituições que

desejem tornar-se mais proativas na redução ambiental, pois respeita e define a

destinação de grandes quantidades de e-lixo63, proporcionando possibilidades para

um mundo mais sustentável.

3.2 CONHECENDO A REALIDADE DA INDÚSTRIA ITAUTEC EM JUNDIAÍ

O Centro de Reciclagem da Itautec do Grupo Itautec – Jundiaí é

especializado na prestação de serviços de gestão e reciclagem de eletrônicos e de

62 Tradução nossa a partir de: understanding of nature has dramatically changed. New studies

indicate that the oceans, the air, the mountains, and the plants and animals that inhabit them are more vulnerable than early innovators ever imagined. But modern industries still operate according to paradigms that developed when humans had a very different sense of the world.

63 E-lixo inclui metais pesados como chumbo, cádmio e mercúrio, além de outros elementos tóxicos. Por este motivo, esses resíduos precisam de tratamento adequado para não causar danos à saúde e ao meio ambiente. Disponível em: <http://www.institutogea.org.br/elixo.html>. Acesso em: 15 jan. 2012.

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produtos gerados pelo mercado corporativo, buscando, com isso, ser referência

ambiental em seu segmento, de forma sustentável. Observou-se, neste estudo de

caso, uma preocupação com a preservação do meio ambiente, evidenciada pelo

aumento da rigidez das leis e fiscalização ambiental, bem como pela adesão às

normas ISO 14.00064 de gestão ambiental. A entrevistada Andréia Maffeis, da

Itautec, pronuncia-se acerca desta conquista e da adesão às normas:

[...] buscando excelência ambiental, levou a implementar um Sistema de Gestão Ambiental em conformidade com a Norma ISO 14001, primeiro na unidade de São Paulo. A conquista da certificação aconteceu em novembro de 2003. Em 2007 migramos o nosso sistema para nova planta construída e instalada em Jundiaí, e conseguimos manter a nossa certificação ambiental e de qualidade.

[...] As boas práticas ambientais fazem parte da política interna da empresa, e a certificação é o reconhecimento desse ideal e do trabalho realizado por todos os colaboradores, que se comprometeram de fato com a redução dos impactos ambientais em suas atividades. A adoção das práticas ambientais proporciona às equipes uma reflexão quanto ao desperdício e racionamento de recursos. A empresa ganha, então, a otimização dos recursos e a economia em setores produtivos e de apoio (Case cedido pela Itautec).

Contudo, ficou claro em entrevista que é extremamente importante que todos

os agentes estejam envolvidos na estrutura e nos cuidados sobre todas as áreas da

empresa. Somente com o comprometimento num processo responsável, com

normas e regras a serem cumpridas, alinhados à filosofia da organização, foi

possível a conquista da certificação.

A partir de tecnologias voltadas à remediação, reaproveitamento, redução e

monitoramento de resíduos foi montado um centro de descarte na própria indústria.

É o que se observa na Figura 18, retirada do case desenvolvido pela Itautec,

fornecido por Andréia Maffeis, uma das responsáveis pelo projeto: 64 ISO 14.000 é um conjunto de normas que definem parâmetros e diretrizes para a gestão ambiental

para as empresas (privadas e públicas). Estas normas foram definidas pela International Organization for Standardization – ISO (Organização Internacional para Padronização). Para conseguir e manter o certificado, a empresa precisa seguir a legislação ambiental do país, treinar e qualificar os funcionários para seguirem as normas, diagnosticar os impactos ambientais que está causando e aplicar procedimentos para diminuir os danos ao meio ambiente. Disponível em: <http://www.suapesquisa.com/o_que_e/iso_14000.htm>. Acesso em: 15 jan. 2012.

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Figura 18: Foto do centro de descarte Fonte: Case cedido em visita à Itautec – Jundiaí.

Conforme a entrevistada, neste centro de descarte, montado em Jundiaí, há

vários equipamentos específicos para a linha de desmonte, triagem e

encaminhamento, organizados pelo próprio sistema fabril da Itautec:

[...] todo equipamento eletrônico descartado das próprias empresas que a Itautec fornece, ou mesmo usa em seus domínios, são enviados para a Área de Reciclagem. É descaracterizado, separado e enviado para destino ambientalmente adequado. Os equipamentos recebidos pela área são desktops, notebooks, servidores e caixas eletrônicas. Quando o equipamento chega, é desmontado e colocado em separado a caixas coletoras com destinos a reciclagem.

Deste modo, é extremamente importante observar que a indústria é

preocupada com ciclo de vida do produto, elaborando um Sistema de Gestão

Ambiental (SGA) dentro da própria empresa. A utilização de tecnologia proporcionou

ganhos significativos e fortaleceu os compromissos ambientais, como relatou a

entrevistada. Entre os pontos considerados relevantes, são enumerados os

seguintes, segundo o resultado do case cedido por Andréia Maffeis da Itautec:

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• Diminuição de resíduos em aterros;

• Destinação correta de resíduos;

• Emprego de colaboradores (próprios e terceiros) para descaracterização

dos equipamentos e separação dos resíduos;

• Fomento, direto e indireto, da cadeia de empresas recicladores;

• Geração de receita.

Neste case, a empresa demonstra atitude no segmento de negócios em que

atua, resolvendo problemas ambientais por meio de ações e reciclagem de resíduo,

cuidando do ciclo de vida do produto e tendo como referência o compromisso com a

sustentabilidade. Verificou-se em visita ao local que a indústria instaurou ações

simples, porém sustentáveis, como por exemplo, a substituição de equipamentos

obsoletos por modernos com menor consumo de energia, objetivando alcançar

metas de redução do consumo tanto de energia quanto de água. Para isso, houve

participação dos colaboradores com ações simples, como desligar os computadores

e a iluminação quando estiverem ausentes ou no final de cada expediente. A

indústria também desenvolveu ações de homologação e qualificação de

fornecedores, o que proporcionou um processo facilitador da qualidade e

produtividade nas organizações, reduzindo custos com inspeção, maior segurança e

confiabilidade nos fornecimentos. No SGA não basta à busca de fornecedores de

produtos e/ou serviços, mas de parceiros que busquem soluções criativas que

possam oferecer vantagens competitivas e melhoria ambiental para ambas as

partes.

Uma vez que a Indústria desenvolve um SGA e adota a certificação como

meta, a intervenção neste domínio deve basear-se no respeito pela organização

desde a produção, tendo como ponto de partida essencial produzir de acordo com a

diretiva europeia, que restringe o uso de chumbo e outras substâncias tóxicas na

produção de equipamentos, o que é um ganho ambiental. Apesar de não haver

legislações específicas no Brasil acerca do tema, as diretrizes europeias já

influenciaram a forma de produção das empresas. Aquelas que vendem seus

produtos na Europa devem seguir normas técnicas de produção para a diminuição

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do impacto ambiental dos produtos eletrônicos. Segundo depoimento de Andréia

Maffeis, a Itautec além de preocupar-se com todas essas questões, ainda investe

em ações de economia de energia, matéria-prima e diminuição da produção de

resíduos gerados na sua fábrica, bem como se preocupa com diferentes

componentes, dado à preciosidade de alguns deles, contidos em seus

equipamentos, separando-os por item:

[...] No barracão é feita uma triagem daquilo que ainda funciona, além de separar os diferentes tipos de cabos, plásticos e metais, entre outros elementos que compõem um computador. As placas têm diferentes quantidades de metais (alguns deles preciosos), o que torna seu valor de mercado variável, por isso, são exportados. Já os cabos podem conter cobre zinco, alumínio e até vidro, dependendo da função para a qual foram fabricados. [...] Após a descaracterização do equipamento, os resíduos gerados são colocados separadamente em caixas coletoras e destinados a centros de descarte com fornecimento de certificado de destinação.

Constatou-se no local que, das peças separadas, algumas são enviadas ou

negociadas com firmas específicas que as reciclam. O que não é reciclado, como

placas de computador, é enviado para Cingapura e Bélgica. A indústria toma o

cuidado de moer as placas dos computadores para envio ao exterior onde são

recicladas. A fase da descaracterização é realizada pelo temor de que produtos

obsoletos, mas ainda em condições de uso, sejam encaminhados para o chamado

“mercado cinza” – o mercado paralelo. Essas vendas a centros de reciclagem geram

uma excelente receita para a indústria, segundo os dados mostrados na entrevista

Andréia Maffeis da Itautec:

[...] A receita no ano de estudo gerada pela venda resíduos recicláveis foi de R$ 179.552,00. Este valor refere-se à diferença entre a venda de resíduos e a despesa para tratamento de alguns resíduos.

As análises de processos antigos tendo como premissa critérios ambientais

atuais podem levar a ganhos operacionais significativos, e essa dinâmica de atitudes

alinhadas com a estratégia corporativa apresenta-se como um caminho sustentável

para os negócios. A adoção de pequenas práticas ambientais prova que a indústria

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ganha com a otimização de recursos e economia diminuindo o desperdício, o que é

importante para a questão ambiental. Vale constatar que Itautec tem procurado

formas de atenuar o problema da obsolescência atual. A empresa mostra-se

preocupada com a preservação do meio ambiente, uma prova disso é que não

somente os produtos produzidos por ela são reciclados, mas também todo o lixo

interno gerado, como papelão, plástico, papel etc. Até o momento, a empresa

obedeceu à sua função: produzir. Mas opta pela resolução de problemas, ao

observar os equipamentos obsoletos expostos no meio ambiente, devido a designs

de fabricação cada dia mais novos e mais atuais, criados diariamente pelo mercado.

Segundo Sudjic (2010, p. 49)65, “o design, em todas as suas manifestações, é

o DNA de uma sociedade industrial – ou pós-industrial, se isso é o que temos hoje.

É o código que precisamos explorar se quisermos ter uma chance de entender a

natureza do mundo moderno”. Conforme o autor, explorar valores emocionais e

culturais com relação ao produto, torna a visão do design imprescindível. Por outro

lado, o que não pode ser esquecido é onde descartar os produtos quando não mais

tiverem utilidade ao consumidor. Essa é a grande preocupação. Uma sugestão ao

problema é que as indústrias e também o poder público elaborem uma legislação

específica que cubra o ciclo de vida completo – da fabricação de computadores ao

descarte – com postos de coletas de lixo eletrônico, em todas as cidades. Além

disso, seria necessário que a indústria se responsabilizasse em dar uma destinação

definitiva, ou reaproveitar tais produtos, pois esse deve ser seu compromisso:

responsabilizar-se pelo que põe no mercado.

Fechar o ciclo de vida de um produto ou parte dele dentro da própria indústria

é um processo de logística reversa ─ um ideal que deve ser perseguido com

responsabilidade, por trazer benefícios socioambientais e por reduzir a necessidade

de aquisição de matérias-primas. Sendo o lixo uma das questões mais complexas

quando se fala em sustentabilidade, gerir resíduos de forma adequada e inseri-los

novamente no processo produtivo tornou-se uma solução eficiente e inovadora.

Neste cenário, pode-se constatar a relevância que a logística reversa assume. Essa

modalidade de logística é entendida como o processo de planejamento e controle da

65 Sudjic (2010) aponta para o quão paradoxal essa aproximação se revela num primeiro momento,

pois o design se configurou em torno da ideia de fornecer respostas para problemas apresentados, vinculando-se a noções de funcionalidade e de seriação.

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eficiência, do custo efetivo do fluxo de matérias-primas, estoques em processo,

produtos acabados e estabelecimento do ponto de consumo ao ponto de origem

com objetivo de reagregar valor ou efetuar o descarte adequadamente.

A indústria Itautec chamou atenção por se preocupar com essa questão do

ciclo de vida do produto, detectada como uma metodologia adotada e ao qual será

abordado no próximo tópico (ciclo de vida do produto), que trata de um exemplo

constatado em visita ao local, no caso, o do processo do barro de solda executado

pela empresa. Existem outros equipamentos que a empresa procura encaminhar

para todo o ciclo e se observa a dificuldade de locomoção para logística reversa,

como veremos no caso dos monitores à espera de reciclagem.

3.2.1 Caso de descarte e reciclagem: logística reversa

Nos últimos anos, os temas logística reversa66, meio ambiente e sustentabilidade

ganharam visibilidade e vem sendo divulgados pelo Programa das Nações Unidas

para o Meio Ambiente (Pnuma). O programa classifica o Brasil como o maior produtor

de lixo eletrônico do mundo. Em 2010, houve aprovação e sanção da lei presidencial

que cria a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) com a Lei nº 12.305, de 2 de

agosto. Essa lei veio alterar a dinâmica de fabricantes, importadores, distribuidores e

comerciantes responsabilizando-os pelo descarte e reciclagem correta. O processo

logístico envolvido no ciclo reverso é a chamada logística reversa que precisa ser

entendida como uma oportunidade de adicionar valor, quer pela imagem da empresa

junto à sociedade com relação aos aspectos ambientais e a sua responsabilidade

social, quer pela oportunidade de agregar serviços criando diferenciais competitivos,

e pela gestão integrada do ciclo do produto e dos custos envolvidos ao longo da vida

do mesmo, possibilitando a redução de custos e gerando vantagem competitiva.

66 Logística reversa define-se como uma área que planeja, opera e controla o fluxo, e as informações

logísticas correspondentes ao retorno dos bens de pós-venda e de pós-consumo ao ciclo de negócios ou ao ciclo produtivo, através dos Canais de Distribuição Reversos, agregando-lhes valor de diversas naturezas: econômico, ecológico, legal, competitivo, de imagem corporativa, dentre outros segundo, Rogers e Tibem-Lembke (1999).

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Mcdonough e Braungart (2002, p. 42) trazem a questão da “infra-estrutura

industrial atual, projetada para seguir o crescimento econômico”67, pois é possível

perceber que a maioria da produção industrial, projeta um produto no mercado sem

se preocupar com a logística reversa. Muitos produtos terminam sua vida de uso e

assim o consumidor compra outro, levando a mais consumo. Contudo, nesse

processo, não há planejamento acerca do que fazer com o descarte do produto não

utilizado. Segundo Mcdonough e Braungart (2002), o saldo de detritos é erro de

design e não deveria existir. A partir do momento em que pessoas compram um

produto, o que querem é o contato ou a utilidade que aquele produto proporciona e

não pensar o que fazer com o mesmo quando este não mais servir.

A preocupação da logística reversa (LR) é fazer com que o material, sem

condições de ser reutilizado, retorne ao seu ciclo produtivo ou para o de outra

indústria como insumo, evitando uma nova busca por recursos na natureza e

permitindo um descarte ambientalmente correto, ação que foi observada na indústria

Itautec. Parece simples e inteligente, mas o processo ainda não está bem elaborado,

tendo muito a avançar. Em visita à Itautec, em Jundiaí, detectou-se que os barros de

solda, um método altamente eficaz para a remoção dos óxidos, como estanho e

chumbo, dos equipamentos eletrônicos, aumentam a viscosidade da solda e é

realizado como uma forma de logística reversa, fazendo com que o produto volte a

seu ciclo sem ser descartado. Os equipamentos entram na máquina, que derrete o

chumbo e outros componentes da peça, produzindo novamente a barra e o produto

novo, devolvendo-os à indústria, configurando-se um ciclo produtivo. As indústrias

chamam esta forma de ciclo fechado e a Itautec tem feito isso de maneira

satisfatória.

Observou-se que a Itautec tem o barro de solda, como uma ação isolada e

correta, que atende à proposta de Mcdonough e Braungart (2002) de criar um

produto que volte ao seu ciclo para que não ocorra o descarte. Geralmente, esse

processo não acontece desde a indústria, o produto não é elaborado para ser

reaproveitado. Mcdonough e Braungart (2002, p. 27) ainda afirmam que a indústria

projeta sem pensar no destino final do produto e consumidores devem ter claro onde

descartar o mesmo quando esse não mais servir. Nesse sentido, os autores

defendem a ideia de que: 67 Tradução nossa a partir de: Today’s industrial infrastructure is designed to chase economic growth.

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Eles são os produtos finais de um sistema industrial projetado de forma linear, de “mão única”, de um modo do berço à sepultura (Cradle to Grave). Recursos são extraídos, transformados em produtos, vendidos e eventualmente dispostos em um “túmulo” de algum tipo, geralmente um aterro ou incinerador. Você provavelmente está familiarizado com o fim desse processo, por que você, consumidor, é responsável por lidar com esses detritos.68

Percebe-se a responsabilidade não só da indústria, mas também do

consumidor ao adquirir um produto. Em entrevista, Andréia Maffeis revelou que a

indústria está sofrendo as consequências, como demonstra o dado da Itautec que:

[...] Mantém um estoque de quase mil monitores à espera de reciclagem[...] No passado, a indústria possuía um acordo com a produtora dos monitores, LG Philips, através do qual um cinescópio velho era transformado em um cinescópio novo graças a uma metodologia que moía o vidro e o transformava em matéria-prima novamente. Porém, quando a LG Philips mudou sua planta para Manaus, a Itautec perdeu sua parceira, pois os custos de transporte desses materiais até Manaus inviabilizariam o projeto.

Até hoje a empresa aguarda o desenvolvimento de um novo projeto para que

seja possível reciclar esses monitores armazenados. Uma das formas para que

essas situações não aconteçam mais é que a logística reversa realmente fosse

utilizada, pois se trata de uma importante ferramenta para a atividade econômica.

Desta forma, a Itautec está inserida na metodologia de ciclo de vida dos produtos,

conforme mostra a Tabela 5 a seguir:

68 Tradução nossa a partir de: They are the ultimate products of an industrial system that is designed

on a linear, one-way cradle-to-cradle model. Resources are extracted, shaped into products, sold, and eventually disposed of in a grave of some kind, usually a landfill or incinerator. You are probably familiar with the end of this process because you, the customer, are responsible for dealing with its detritus.

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Tabela 5: Comparação entre a metodologia e o estudo de caso Ciclo de vida dos produtos (CVP) Por que se aplica à Itautec

Recolhimento de matérias-primas

A Itautec utiliza diversos tipos de matérias-primas para o desenvolvimento de produtos (exceto chumbo e outras substâncias tóxicas, de acordo com a diretiva europeia).

Fabricação Após o recolhimento das matérias-primas, elas passam pela linha de produção - que é monitorada para o gasto consciente de energia.

Distribuição Quando prontos, os produtos vão para as lojas à disposição da compra do consumidor, acompanhados de uma cartilha de auxílio.

Utilização O usuário utiliza o produto até que lhe seja útil.

Valorização

Após o uso, a empresa oferece a possibilidade de recolher o produto para a reutilização adequada. Além disso, o barro de solda é um exemplo ímpar do CVP, pois os resíduos são completamente reutilizados na forma de logística reversa.

Fonte: A autora.

Observou-se que a Itautec reconhece sua responsabilidade ao longo do ciclo

de vida do produto e se compromete a reduzir ou evitar o impacto ambiental de seus

produtos e embalagens, em suas diversas etapas, a saber: projeto, fabricação,

utilização e disposição final. Vale ressaltar que a indústria tem que repensar sua

produção a partir de um design bem estudado no projeto, não só vendo a estética do

produto como também o seu ciclo final. Nota-se que existe uma preocupação com

as questões ambientais que englobam a geração de resíduos, porém pouco se

discute sobre a sustentabilidade de um empreendimento voltado totalmente ao

conceito de logística reversa. Enquanto os resíduos não forem entendidos como

materiais em potencial e a sua utilização como negócio rentável, ações de

reaproveitamento, descarte e reposição final serão vistas sempre como paliativas.

No entanto, é importante ressaltar que ações tomadas que levem à metodologia do

ciclo de vida de produtos na indústria já são bem-vindas e são um começo promissor

que pode ser desenvolvido com mais pesquisas sobre assunto.

Vale lembrar que não há mais como se pensar que apenas tecnologias

ambientalmente corretas possam vir a garantir a sustentabilidade pretendida. Faz-se

necessário agora a presença de uma forma de equilibrar ganhos econômicos,

sociais e ambientais.

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Segundo Andréia Maffeis, a Itautec atua desta forma:

[...] Foi criado um sistema Triple Bottom Line envolvendo os aspectos econômico e social, com a função de armazenar resíduos que recebíamos da coleta seletiva e a descaracterização e segregação de equipamentos eletrônicos.

Assim, o desafio torna-se bem mais amplo. A sustentabilidade é formalmente

aberta de modo a incluir não somente as dimensões econômicas e ambientais, mas

também as sociais, sendo este o chamado Triple Bottom Line do desenvolvimento

sustentável no qual a Itautec está inserida. Assim, denota-se a existência de uma

filosofia de gestão humanista, e de profundo respeito pela questão ambiental levado

a cabo pelos funcionários e pela indústria, configurando um trabalho coletivo. Em

suma, verifica-se um modelo de gestão que promove a iniciativa, reconhecendo

objetivos ambientais e princípios da empresa, que valorizam e respeitam também as

pessoas que constituem a equipe.

3.3 CASO METARECICLAGEM

Certas indústrias, como observado no estudo de caso anterior, trabalham

coletivamente em razão de um objetivo comum. A MetaReciclagem se encaixa

nesse aspecto já que se trata de um metodologia que envolve pessoas com

atividades comuns, que interagem, trocando ideias em prol da formulação de uma

tecnologia.

Vale afirmar que estas formas ocorrem espontaneamente, como sugere

Manzini (2008) revelando que ações de grupos como essas são comunidades

criativas que se relacionam, formando blocos construtores para uma nova visão: a

de uma sociedade sustentável que pode ser definida como uma sociedade multi-

local. Um exemplo é a rede de comunidades interconectadas e locais que é, ao

mesmo tempo, aberta e localizada. Esse é o caso averiguado na MetaReciclagem,

que não se configura como uma organização, tampouco como uma ONG, mas um

coletivo organizado de ativistas e pessoas interessadas, que se organizam e trocam

experiências. Esse processo a diferencia do exemplo do CEDIR (que são ações

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ocorridas em uma universidade, promovendo o descarte ecologicamente correto dos

resíduos eletrônicos, prestando e locando serviços com cuidado ambiental e com

fins sociais) ou da Itautec (uma indústria preocupada com a sua imagem,

certificações e metas a serem cumpridas ambientalmente). Nesse sentido, o

MetaReciclagem instaurou-se como um movimento de apropriação de tecnologia

social69 que teve início em 2002 através de uma lista de discussão na Internet e que

envolveu a participação de programadores, ativistas, filósofos, designers, mas,

principalmente, de pessoas comuns interessadas em aprender e discutir a inclusão

digital no Brasil. A questão ambiental nunca foi o foco das conversas,

compartilhamento de experiências e discussões. Mas, ao desenvolver uma

metodologia que tinha como finalidade a troca, o grupo, de certa forma, resolveu o

problema da obsolescência programada de lixo computacional. Na verdade,

começaram trocando conhecimento através do Projeto Metáfora70, como se observa

na lista de discussão a seguir:

69 Apropriação da tecnologia social: termo comum quando se fala em inclusão digital que significa

apropriar-se de produtos, técnicas e/ou metodologias reaplicáveis, desenvolvidas na interação com a comunidade e que representem efetivas soluções de transformação social (FONSECA, 2009).

70 O projeto Metáfora começou com uma simples lista de discussão e muita vontade de compartilhar o conhecimento. Um grupo de pessoas, numa conversa descompromissada na Internet, com o objetivo de criar de um canal de pesquisa sobre comunicação, Internet, filosofia e cibercultura. Um projeto aberto. Baseado nos conceitos do software livre e dos códigos abertos. Disponível em: http://www.marketinghacker.com.br/index.php?itemid=2367 Acesso em: 12 dez. 2011.

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Figura 19: Lista de discussão Projeto Metáfora Fonte: Disponível em: <http://rede.metareciclagem.org/wiki/ProjetoMetaFora->. Acesso em: 15 jan. 2012.

Com essa lista, estabeleceram-se tópicos para discussão, como a própria

mensagem se refere. A ideia era atrair pessoas que, trocassem experiências num

ambiente de interação em torno de ideias que contextualizassem as novas

tecnologias, seus efeitos e impactos sociais, uma forma coletiva de tradução e

interpretação de novas ideias e possibilidades. Fonseca do MetaReciclagem afirma

em entrevista:

Nós tínhamos noção de quem eram as pessoas que participavam da lista de discussão do projeto Metáfora, onde essas ideias surgiram. É uma distinção importante: a MetaReciclagem não é anônima, é coletiva. No começo, nós chegamos a nos chamar de coletivo, mas com o tempo evoluímos para uma rede – com laços mais fracos, mas muito mais aberta. [...] o surgimento das pessoas se deu de forma espontânea e por isso utilizavam o nome MetaReciclagem sem pedir permissão para ninguém.

Essa forma de pensar para o grupo não era um problema e sim justamente

uma das intenções, por isso a chamam de aberta. Iniciava-se, dessa forma, o projeto

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Metáfora e dele veio a ideia da MetaReciclagem, como relata Fonseca em uma

entrevista na revista Cultura Digital:

Em 2002 tinha um grupo rede chamado projeto Metáfora onde tinha gente do Brasil inteiro que se juntaram para trabalhar com tecnologia, comunicação, cultura, arte e educação, daí começamos a bolar uns projetos de eventos, de sites que tinham a ver com tecnologia e cultura, e passamos a ter a necessidade de termos equipamentos, queríamos fazer redes wi-fi isso em 2002 quando esse assunto era totalmente abstrato, ninguém nem tinha internet sem fio, nem equipamento e nós pensávamos em fazer redes livres para a comunidade usando hardwares metareciclados. [...] pedimos para as empresas do Brasil, e começamos a instalar software livre e fazer usos experimentais e sociais, em uma das conversas falei, ora o nome disso que estamos fazendo é Metareciclagem!

E em entrevista, ele revela:

[...] Na verdade, a MetaReciclagem veio como uma forma de reinventar e recriar utilizando de tecnologia, criando arte, realizando uma metodologia aberta, elaborada por diferentes pessoas imbuídas do mesmo intuito de reapropriar tecnologia como meio de desenvolvimento e criação, uma alternativa para utilizar o lixo computacional existente.

Contudo é importante entender como isso acontece. Fonseca (2009)71 afirma

que a MetaReciclagem, formou-se a partir de “[...] um movimento coletivo, que

começou com a descoberta, estruturou-se numa prática, depois virou capacitação e

mais tarde começou a brincar com experimentação” (FONSECA, 2009, p. 8)72. No

Brasil, esse movimento surgiu com a ideia de reciclagem de lixo eletrônico para a

transformação social. O grupo originou-se em São Paulo e atualmente está presente

em todo o Brasil, de forma descentralizada e auto-organizada, inclusive tendo uma

71 Felipe Fonseca Pesquisador e articulador de projetos de cultura digital, tecnologias livres de

produção cultural, redes colaborativas de inovação e mídia independente. É um dos fundadores (2002) e integrante chave da MetaReciclagem que atua na apropriação crítica de tecnologias com centenas de pessoas e organizações em todo o Brasil. Disponível em: <http://rede. metareciclagem.org>. Acesso em: 15 jan. 2012.

72 Histórias de MetaReciclagem, Histórias de Meta Reciclagem. Disponível em: <http://mutgamb.org/ livro/Hist%C3%B3ria-da-MetaReciclagem-Hist%C3%B3rias-de-MetaReciclagem>. Acesso em: 15 jan. 2012.

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forte atuação no Ministério da Cultura e Ciência e Tecnologia com questões

pertinentes a tudo que perpasse pelo computador, redes, equipamentos

tecnológicos, cibercultura e sociedade. Eles conseguiram se desenvolver, ganhar

prêmios de Mídias Livres do Ministério da Cultura, além de terem recebido menção

honrosa no Prix Ars Electronica 2006 (Áustria) e no Prêmio APC Betinho de

Comunicações 2005 (Uruguai). Na verdade, a ação voluntária destes integrantes é

apenas para proporcionar a aplicação das ideias planejadas. É como afirma Freire et

al. (2005), as pessoas se organizaram sem qualquer comprometimento com o

governo, apenas por um esforço coletivo e por suas ideologias, o que não significa

que não considerem o projeto como essencialmente de natureza política e até

revolucionária, mas agem como uma invasão hacker dentro do sistema, com gestão

própria e objetivos bem definidos. Segundo Fonseca, em entrevista:

[...] O projeto funciona como pontos de cultura organizados em rede, autônomos e sustentáveis, distribuídos pelo país, colaborando e compartilhando sua produção cultural livre.

Este movimento, tratado então nesta pesquisa como comunidade criativa,

pode ser definido pela Tabela 6 a seguir:

Tabela 6: Comparação entre a metodologia e o estudo de caso Comunidades criativas Por que se aplica à MetaReciclagem

Reunião de pessoas interessadas em prol de um objetivo comum

É um coletivo de pessoas que, por meio de uma metodologia aberta, buscam reinventar e recriar utilizando-se de tecnologia e criando arte como forma de reaproveitar o lixo ambiental existente.

Tomada de ações que possam ser efetivas para alcançar esse objetivo

A ideia do problema do lixo computacional é propagada por meio de redes sociais, blogs, softwares livres e movimentos sociais. Além disso, as peças inutilizadas são reinventadas para outros fins que não computacionais, por exemplo, artísticos.

Fonte: A autora.

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Compreende-se que essa forma de trabalho é instituída por um grupo e é

chamada nesta pesquisa de comunidades criativas ou também de inteligências

coletivas e auto-organização, conforme relata o integrante da Rede

MetaReciclagem, Felipe Fonseca:

[...] tem representações de ações humanas, como a tecnologia social e a inclusão digital, gerando e criando com o efeito gambiarra, utilizando-se de reconstrução de peças descartadas, fazendo apropriações tecnológicas.

É como registra as fotos em eventos produzidos pelo grupo:

Figura 20: Foto do coletivo de designer fazendo Gambiologia em uma caixa de charutos Fonte: Nascimento (2010).

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Figura 21: Foto de espaço do movimento MetaReciclagem que transforma doações de computadores sem uso em novas máquinas, robôs ou peças de artesanato e de arte Fonte: Nascimento (2010).

Os exemplos demonstram que o material agrega conceitos e práticas da

gambiarra e suas implicações na tecnologia e no design. Além disso, de certa forma,

caracteriza o improviso e a impermanência não como atraso, mas como habilidade

essencial para o mundo contemporâneo. Ou seja, a vontade de transformar

criativamente o que se quer ou precisa, explorando quaisquer recursos disponíveis.

Segundo Borges e Etlin (2004 apud BRUNET, 2008, p. 117), “[...] da reciclagem, da

reutilização de práticas e conceitos estão em todos os planos da vida cotidiana e se

faz muito importantes para os processos imersivos dessa rede específica e de tudo

o mais”. Segundo Manzini (2008), pessoas que, de forma colaborativa, inventam,

aprimoram e gerenciam soluções inovadoras para novos modos de vida, a partir da

recombinação de elementos existentes, considerando a capacidade de reorganizar

estes elementos em novas e significativas combinações, seria uma das possíveis

definições de criatividade.

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É com afirma Fonseca em entrevista:

A troca de saberes na rede reforça, enquanto comunidade coletiva, o compartilhamento de arquivos multimídia, as colagens e remixes, apropriações, reinvenção de máquinas como robôs.

Na verdade, são inúmeras práticas que esses pares organizam e promovem.

O que fica como resultado é que o desejo por mudança social está lançado na rede

pelo uso criativo na produção de um trabalho imaterial, cuja importância se deve ao

compartilhamento, que só fortalece a rede enquanto um rizoma, um conjunto de

multiplicidades. Essa união de pessoas, em prol do projeto, também o enquadra na

metodologia de inteligências coletivas e auto-organização, conforme a Tabela 7 a

seguir:

Tabela 7: Comparação entre a metodologia e o estudo de caso Inteligências coletivas e auto-organização Por que se aplica à MetaReciclagem

Não há imposições

Não há líderes. Todas as pessoas envolvidas colaboram da mesma forma e se organizam naturalmente sem a ajuda de outra instituição.

Os saberes são múltiplos e individuais

Cada integrante contribui com um tipo de conhecimento, há uma troca de informações e saberes e capacidade de reorganizar e recombinar elementos existentes.

Fonte: A autora.

Essa é a ideia da MetaReciclagem, troca de experiências em todos os

lugares, por meio tecnológico e inteligências coletivas, que são inteligências

distribuídas por toda a parte, valorizadas e coordenadas em tempo real, o que

resulta em uma mobilização efetiva de competências. Essa conversas em grupos,

segundo Mattozo e Specialski (2000):

As redes, além de servir como via de discussões formais, logo se transformam em canais de interação social, para diversão e bate-papo informal. Toda comunicação implica um laço mínimo de entendimento; logo, além das informações, que circulam pelo ciberespaço, são atos de linguagem, que propiciam a formação

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metafórica de comunidades virtuais, grupos de pessoas que, por afinidade ou interesses comuns, desenvolvem laços de sociabilidade, sob restrições e as possibilidades a que estão expostos.

Na verdade, a sociedade e a rede são conceitos indissociáveis. As pessoas

vêm se organizando em redes colaborativas permitindo que sejamos capazes de

transformar o mundo ao nosso redor, criando conhecimento e cultura de maneira

coletiva. Não há sociedade, se não houver redes, seja de amigos, famílias, tios,

primas, sobrinhos por pessoas com afinidades que se conectam por um algum fator

que combina os anseios, interesses e desejos das pessoas. Entretanto, as redes

não são novidades, a tecnologia fornece novas formas de acesso à informação

através da navegação, pesquisas e trocas. Essa integração são formas que a

sociedade encontrou de sociabilizar conversas em rede, o que se enquadra na

atividade projetual da Rede MetaReciclagem, pois foi por meio dessas redes

interconectadas que esse grupo se formou e se autogestou. Desta forma, trocavam

e encontravam formas de lidar com a obsolescência programada, aguçando a

inventividade e criando condições favoráveis para diversos processos criativos. O

coletivo MetaReciclagem, segundo Fonseca em entrevista a autora:

[...] é uma rede que troca saberes entre pessoas que favorecem processos artísticos colaborativos – que se fundamentam no Software Livre na produção de experiências artísticas, criando diálogos entre arte, ciência e tecnologia e como elas sensibilizam para vivências mais construtivas e colaborativas.

Buscar estruturas e modelos para operar na fronteira entre arte, ciência,

tecnologia e educação é a forma de inovação que a MetaReciclagem utiliza. O

Grupo acredita que enquanto ficarmos limitados à inovação industrial, orientada

somente por critérios de geração e exploração comercial, estamos desperdiçando

um potencial criativo enorme. É importante estimular a inovação que tenha

relevância social e educacional, para que, por meio de experimentação, agentes

criativos incorporarem descobertas. Desta forma, a MetaReciclagem autogerida com

experiências da sociedade civil (as pessoas que compõe o grupo) aparece como

uma alternativa aberta aos problemas sociais e à reelaboração de novas formas

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coletivas de pensar em problemas e construir soluções, como observa-se nas ações

contidas no cartaz:

Figura 22: Imagem de cartaz do MetaReciclagem Fonte: Cartaz elaborado pelo grupo do projeto Metareciclagem (adaptado do Manual do

Oficineiro da Casa Brasil.

Na verdade, com a cultura do desperdício, a sociedade está se

movimentando e encontrando novas formas de lidar com a obsolescência que faz

parte deste tempo, e a sociedade deve ser despertada e repensar fazer com que

essa idéia retroceda. Sudjic (2010, p. 5) afirma: “[...] nunca possuímos tantas coisas

como hoje, mesmo que as utilizemos cada vez menos” e ainda relata que cada casa

possui muitos objetos e exemplifica “[...] temos uma tela de plasma em cada

aposento, substituindo televisores de raios catódicos que há cinco anos eram de

última geração” (SUDJIC, 2010, p. 5). Ou ainda “[...] a classe média tem cozinhas

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repletas de aparelhos elétricos comprados na esperança de que nos tragam a

sonhada realização doméstica”. A ideia de que tudo que se possui reflete o nosso

tempo é real. Existe uma relação de vazio com o novo bem possuído. Ao comprar, a

atração se esvai tão logo o objeto adquirido fique velho. E o que fazer com esse

objeto velho, talvez devolvê-lo à indústria, ou doá-lo para um centro de descarte?

Talvez montar outro fazendo gambiarra de equipamentos, como é o caso de muitos

integrantes da MetaReciclagem seja uma possibilidade. Essa é a grande questão da

atualidade: a obsolescência de objetos é fato. O descarte computacional e as ações

em prol do que fazer são muitas, tanto de empresas, como de pessoas físicas.

Discussões e iniciativas em rede, como o caso da MetaReciclagem, que adota

metodologias projetuais, como soluções criativas ao problema do lixo computacional

revelam o espaço que essa questão vem ganhando.

3.4 CASO EMPRESA PARTICULAR: RECICLO METAIS

Outra visita in loco serviu para o estudo de caso da empresa particular

Reciclo Metais em São Paulo que faz reciclagem de lixo eletrônico com foco em

peças computacionais. Analisa-se esta outra ação, agora na visão de um

empreendedor. No local, foi obtida a informação de que Marcus Wilian M. de

Oliveira, um analista ambiental, é o sócio-proprietário da empresa e fez dela o seu

negócio. O mesmo afirmou em entrevista:

[...] sou uma constituição jurídica de empresa com finalidades lucrativas. Possuo licenciamento ambiental fornecido pela CETESB ao qual descaracterizo equipamentos atendendo ao processo de logística reversa, de acordo com o especificado em legislação nacional e internacional.

Nessa visão de empresa, o lixo computacional não está mais servindo como

agregador social, como foi visto no CEDIR, e sim, visa o lucro do empreendedor. A

visita técnica serviu para entender o conhecimento sobre os procedimentos

empresariais de recebimento de compra e venda interna e externa de sucatas de

equipamentos eletrônicos. Além disso, a empresa usa a consultoria como suporte

empresarial. Marcus Wilian M. de Oliveira afirma:

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[...] sou biomédico, mestre em Toxicologia e Análises Toxicológicas pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo, trabalhei como pesquisador na School of Biochemistry and Immunology e Institute of Neuroscience na Universidade de Dublin, Trinity College, portanto tenho conhecimento na área, por isso presto consultorias. A questão ambiental é muito delicada, existe grande estoque de material com componentes sem aproveitamento para a reciclagem, devem-se tomar cuidados com rejeitos tóxicos e descartar da maneira correta.

O que acontece muitas vezes, na perspectiva do entrevistado responsável

pela Reciclo Metais, é que a formação do mesmo facilita e traz mais conhecimento

para lidar com os problemas da área. A empresa oferece pacote para o

gerenciamento e destinação social e ambiental de resíduos eletrônicos (faz isso com

finalidades lucrativas), possui licenciamento ambiental fornecido pela CETESB 73,

realiza a descaracterização dos equipamentos atendendo ao processo de logística

reversa, de acordo com o especificado em legislação nacional e internacional. Isso

faz com que a metodologia utilizada pela empresa, de certa forma, relacione-se ao

ciclo de vida dos produtos, conforme comprova a Tabela 8 a seguir:

Tabela 8: Comparação entre a metodologia e o estudo de caso Ciclo de vida dos produtos (CVP) Por que se aplica à Reciclo Metais*

Recolhimento de matérias-primas / Fabricação / Distribuição / Utilização

Nem todas essas fases não são realizadas pela empresa. Os produtos chegam à ela após terem passado pelo processo de fabricação e utilização de diferentes usuários.

Valorização

Os produtos chegam à empresa, onde são descaracterizados, desmontados e destinados de forma ecologicamente responsável a empresas nacionais e estrangeiras para a reutilização. Essa empresa foi enquadrada na metodologia CVP por ser uma alternativa ao retorno dos resíduos à natureza.

Fonte: A autora.

73 CETESB. Companhia Ambiental do Estado de São Paulo. Disponível em: <http://www.cetesb.

sp.gov.br/institucional/institucional/1-A-Nova-CETESB>. Acesso em: 15 jan. 2012.

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No que foi possivel constatar, a empresa Reciclo metais é responsavel na

questão ambiental, enquadrando-se na metodologia do ciclo de vida do produto e

trabalhando de forma reversa, evitando assim danos ambientais. De acordo com

Manzini e Vezzoli (2008), as atividades humanas trazem impactos sobre a natureza

que podem determinar efeitos positivos ou negativos sobre o meio ambiente. Desta

forma, a empresa trabalha com ações positivas, como é o caso do site da empresa,

destinado à orientação para o descarte de resíduos da forma correta, como

demonstra a Figura 23:

Figura 23: Página do site Reciclo Metais Fonte: Disponível em: <http://www.reciclometais.com.br>. Acesso em: 15 jan. 2012.

Existe uma área específica no site dedicada a eletroeletrônicos, indicando

todas as peças que a empresa recicla. A Reciclo Metais disponibiliza um blog com

endereço do Twiter e Facebook para contato com as pessoas que demonstrem

interesse em utilizar seus serviços. No blog, verificaram-se ações implementadas de

caráter educativo e ambientalmente corretas, como se verifica no cartaz a seguir:

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Figura 24: Carta do segundo Natal da Eletrorreciclagem Fonte: Disponível em: <http://reciclandoconceitos.blogspot.com/2011_12_01_archive.

html>. Acesso em: 15 jan. 2012.

Essa ação da empresa em parceria entre o Governo do Estado do Rio de

Janeiro, a Reciclo Ambiental, a Reciclo Metais e a Tetrapack no Natal da

Eletroreciclagem tem como meta coletar lixo eletrônico da população do Rio de

Janeiro e demonstra a importância da reciclagem correta, da destinação dos

equipamentos e onde os mesmos podem ser entregues, o que é de suma

importância para a sociedade poder lidar com o problema. Além disso demonstra o

demonstra o que Marcus Wilian M. de Oliveira relatou em entrevista:

[...] damos suporte a projetos sociais, maior conscientização da população, sensibilização da área política e oportunidade de emprego e renda.

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A visão desta empresa efetivamente demonstra uma preocupação também

em valorizar e conscientizar a população, dando suporte a projetos sociais. Essa é

uma forma de trabalhar a conscientização ambiental. Manzini e Vezzoli (2008)

dividem o ato de refugar em duas categorias: pré-consumo e o pós-consumo. O pré-

consumo está ligado ao processo produtivo, são mais limpos e podem ser chamados

de refugos do ciclo produtivo, reciclados dentro do mesmo processo. É o que a

empresa Reciclo Metais faz, executa o produto ate o final do seu ciclo, só que de

forma empresarial, vendendo e repassando tais resíduos. Os materiais de pós-

consumo estão relacionados àqueles eliminados pelo consumidor final, por isso é

importante o fato da empresa Reciclo Metais trabalhar a conscientização com

projetos que envolvam e conscientizem as pessoas da importância de não descartar

na natureza.

Segundo Andrade (2002), o potencial de reaproveitamento que os resíduos

representam, somado a um fator de interesse mundial que é a preservação

ambiental, impulsiona a necessidade de reverter essa situação. Desta forma, a

empresa Reciclo Metais trabalha o ciclo de vida do produto, recolhendo a matéria-

prima do mercado e a vende a centros de descarte específicos que reaproveitam os

resíduos. Observou-se que a empresa está trabalhando corretamente do ponto de

vista legar. Empregam com registro em carteira cerca de sete trabalhadores em seu

quadro de pessoal, todos passaram por treinamento para o desempenho de suas

funções. O proprietário tem experiência nacional e internacional no setor de

reciclagem de resíduos eletrônicos e demonstra preocupação com a questão

ambiental.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa demonstra a importância do design, como o reconhecimento de

metodologias projetuais. Essas atividades projetuais encontradas pela sociedade

civil, indústria, universidade geram ações projetuais sustentáveis que são capazes

de minimizar o problema obsolescência de lixo computacional. Acredita-se que

atualmente há uma tendência de as empresas se tornarem ou se mostrarem cada

vez mais responsáveis por todo o ciclo de vida do produto. Além disso, buscam

manter uma logística apurada, considerando o consumidor final, pensando assim no

impacto causado ao meio ambiente. Isso foi visto na indústria Itautec, com a

preocupação em estabelecer um centro de reciclagem para encaminhamento correto

das peças descartadas e também de criar uma cartilha para situar o consumidor

antes da compra. Vimos ainda a Empresa Reciclo Metais, que mesmo tendo a visão

do lucro, de certa forma, proporciona e evita que esse lixo seja descartado na

natureza. Estas ações se dão basicamente por dois motivos: as empresas estão

cada dia mais preocupadas com a imagem que seus clientes tem de seus produtos

e estão preocupadas com a sobrevivência e longevidade do negócio e, portanto,

passa a existir uma preocupação com o fortalecimento da cadeia de suprimentos a

que pertencem.

O CEDIR, centro de descarte da USP, demonstra uma preocupação social em

informar e realizar ações, como publicação de boletins educativos, periódicos que

tratam sobre as melhores práticas sustentáveis, promoção de eventos voltados para

educação ambiental, adotam, ainda, a atividade projetual Sistema Produto-Serviço o

que proporciona à sociedade, entidades e pessoas afins, uma maior comodidade,

emprestando o computador montado, evitando o desperdício de materiais

descartados na natureza. Isso está relacionado à responsabilidade social que,

conforme Donaire (1999) comenta, implica um sentido de obrigação para com a

sociedade. Esta forma responsável tem o caráter de atingir diversos âmbitos como:

a proteção ambiental, projetos filantrópicos e educacionais, planejamento da

comunidade, equidade nas oportunidades de emprego, serviços sociais em geral,

em conformidade com o interesse público. A empresa pode atuar de diferentes

formas, no que diz respeito à responsabilidade social. Ficou claro que também

existem outras metodologias utilizadas pela sociedade como: comunidades criativas

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ou inteligências coletivas e auto-organizadas, como é o caso da MetaReciclagem.

Essas ações da sociedade civil são bem-vindas à sociedade porque, além

contribuírem criativamente, são formas de evitar que o lixo computacional termine

em aterros prejudicando o meio ambiente.

Percorrendo o itinerário proposto na introdução, foi possível primeiro delinear

o problema do lixo computacional e suas possíveis soluções já existentes.

Reconhecer a natureza como um patrimônio de toda a humanidade e perceber que

uso de recursos naturais deve estar sujeito a formas de respeito às condições

básicas da vida no planeta, dentre elas a qualidade de vida dos seres vivos que

dependem desses bens e também do meio do qual são extraídos ou processados.

Esse reconhecimento foi imprescindível para a definição de conceitos, tais como

sustentabilidade e design sustentável, norteadores dessa pesquisa. Esses termos

foram abordados no contexto do lixo computacional, que tem sido um problema

ambiental para a sociedade, consequência dos padrões de produção e consumo

desenfreados da sociedade atual.

Assim, a busca por metodologias projetuais em ações identificadas como

sustentáveis no âmbito de produtos já existentes, tem sido uma solução, mesmo que

temporária, para o problema da obsolescência. Isso vem avançando, chegando a

níveis de desmaterialização da propriedade e do bem material em si para o

fornecimento de resultados e soluções baseados em ações que a sociedade civil e

algumas instituições têm tomado como soluções momentâneas para o problema. O

que se percebeu é que os profissionais da área do design devem estar envolvidos

nesta mudança de foco comercial e projetual, desenvolvendo estudos e criando

mecanismos favoráveis e sustentáveis para sua concretização, de forma que os

impactos ambientais provenientes de suas atividades sejam reduzidos.

A questão de pesquisa, portanto, permanece válida e atual, já que, implica em

como lidar com produtos já existentes de maneira correta, sem gerar maiores

problemas ambientais, por meio de formas sustentáveis e criativas desenvolvidas

pela sociedade, e que tratem do assunto da obsolescência. Este ainda é um tema

que deve ser discutido e pesquisado, exigindo a elaboração de novos paradigmas,

pois esta pesquisa apontou algumas metodologias projetuais que a sociedade tem

encontrado para resolver o problema ambiental. A pesquisa enfatiza a necessidade

de se criar novas soluções sustentáveis para o século XXI e indica a necessidade de

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se pensar na diversidade de sociedades sustentáveis, com opções econômicas e

tecnológicas diferenciadas, voltadas principalmente para o desenvolvimento

harmonioso das pessoas e de suas relações com o conjunto do mundo natural.

Diante deste problema de degradação ambiental, principalmente na questão

do lixo computacional, a sociedade deve intervir de modo engajado em ideias

coletivas, repensando a relação com a natureza. Representando esse tipo de

pensamento, McDonough e Braungart (2002, p. 1) citam uma frase de Oren Lyons,

Guardião da fé de Onondaga, “o que o seu povo chama de recursos naturais, o

nosso povo chama de parentes”74. Esta é na verdade uma sugestão fundamental

dos autores que chamam atenção para um novo paradigma no design, evocando a

mudança, a reinvenção da indústria, a articulação da sociedade para um futuro de

prosperidade sustentável. Desta forma, o design merece ser pensado sob as lentes

da simplicidade e da inovação. E é esse o grande ponto: fazer design com conceitos

de sustentabilidade de processos, respeitando o ciclo de vida e adotando a ideia do

“berço ao berço”, unindo a economia à questão ambiental.

A alteração no modo de ver e compreender os problemas do lixo advindos da

produção na sociedade transforma o projeto de design na reformulação da

tradicional abordagem de projeto na busca por novas maneiras de conceber e

analisar metodologias projetuais. Dessa forma, é importante indicar possibilidades

de expansão para esta pesquisa como: entender as formas possíveis de uso de

metodologias projetuais em ações locais entendendo que podem ser compartilhadas

para ampliar o conhecimento sobre a relação entre design e sustentabilidade em um

contexto global. Segundo Manzini (2004), a sustentabilidade é uma revolução. O

designer será mais um ator dentro desse grande plano, conduzindo a sociedade na

direção correta, no seu papel de facilitar as inovações sociais. A partir dessa visão,

acredita-se no poder dessas inovações que surgem para amenizar o problema do

lixo computacional existente.

74 Tradução nossa a partir de: What you people call your natural resources our people call our

relatives.

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APÊNDICES

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Aplicada ao integrante do MetaReciclagem - Felipe Fonseca.

Objetivo: Detectar metodologia projetual empregada na ação da MetaReciclagem.

1. O que é a MetaReciclagem e como a enquadra em seu aspecto: “união de pessoas”?

2. Como precursor da MetaReciclagem, vê a evolução da mesma de que maneira?

3. O que é a MetaReciclagem?

4. A MetaReciclagem não é do governo, são de pessoas físicas com o mesmo propósito. Como fica a relação com o governo?

5. Como você vê outros movimentos com tecnologias?

6. Qual é o sentido de movimentos como a MetaReciclagem?

7. A MetaReciclagem visa a inclusão digital?

8. Como vê a gambiarra a apropriação tecnológica dentro do MetaReciclagem?

9. Na atualidade, a MetaReciclgem é uma solução para o problema ambiental?

10. Trabalhos artísticos de apropriação e de experimentação coletiva se parecem com ações da MetaReciclagem?

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Aplicada a gestora ambiental da ITAUTEC – Jundiaí-SP – Andréia Maffeis Campbell.

Objetivo: Detectar metodologia projetual empregada na ação da empresa.

1. Você trabalha na empresa Itautec as, do Grupo Itautec, desde que época e qual sua formação acadêmica?

2. Desde 2004, você trabalha na Itautec como supervisora Gestão Ambiental, quais as atribuições da sua função?

3. Como aconteceu o sistema de Certificação e programa ambiental da empresa?

4. Como se dá o processo de um Sistema de Gestão Ambiental (SGA)?

5. Sobre a implantação do SGA na empresa. De que forma a utilização da tecnologia é importante?

6. Qual a relação da empresa com boas práticas ambientais e material humano?

7. Quais as medidas que vocês construíram para resolver o problema da obsolescência ocasionada pela empresa?

8. Na área de reciclagem muitos resíduos são gerados. Tem dados de quanto se arrecada?

9. Os equipamentos eletrônicos são descaracterizados e enviados a centros de reciclagem. Você concorda que a empresa tem a preocupação com o ciclo de vida do produto?

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Aplicada ao responsável técnica pelos trabalhos desenvolvidos na reciclagem, reuso e logística reversa dos equipamentos inservíveis da USP- CEDIR- Neuci Bicov.

Objetivo: Detectar metodologia projetual empregada na ação da Universidade.

1. Qual o objetivo do CEDIR em uma universidade como a USP ?

2. Qual é a capacidade de caracterização e triagem que o CEDIR suporta ao mês?

3. Vocês têm uma organização no processo de gestão do lixo eletrônico/digital?

4. Existe algum tipo de modelo e exigência para cadastramento de entidades?

5. Qual o comprometimento das indústrias em relação ao lixo tecnológico?

6. Existe alguma vantagem para a indústria, fora, é lógico, a questão ambiental da mesma aceitar seu produto de volta? Como vê esta questão?

7. Qual é a relação do CEDIR enquanto Universidade primando com a questão ambiental em relação a Industria?

8. Qual é o comprometimento do CEDIR com o Sistema produto-serviço?

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Aplicada ao proprietário da Reciclo Metais – Diretor de Sustentabilidade –

Marcus Willian Oliveira.

Objetivo: Detectar metodologia projetual empregada na ação da empresa particular.

1. O que a Empresa Reciclo Metais faz?

2. Qual é o objetivo de uma empresa que comercializa lixo eletrônico?

3. Qual é a estrutura que uma empresa necessita ter para tratar de os descartes de forma ambientalmente correta?

4. E quanto ao retorno ciclo produtivo, econômico e ambiental?

5. E vocês desempenham projetos sociais, inclusivos visando a questão ambiental?

6. Quais os riscos que uma empresa tem em lidar com esse lixo específico?

7. Sua formação é nesta área específica? Pergunto, pois tem a questão ambiental que necessita ter conhecimento.

8. Você tem licenciamento ambiental?

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Entrevista com Felipe Fonseca - MetaReciclagem Dia 24 de maio de 2011. Duração: 1 hora e 57 minutos. Local: na cidade de São Paulo, na Universidade Anhembi Morumbi - Av. Roque Petroni Jr., 630 – Morumbi, e questionamentos e respostas por e-mail. Elementos presentes: Entrevistadora e Prof. Marcus Bastos, Felipe Fonseca.

Entrevista com Felipe Fonseca, ativista de mídia brasileiro e pesquisador independente, que trabalha nos domínios da apropriação tecnológica, de experimentação de baixa tecnologia, free (livre) e software de multimídia de código aberto, licenciamento aberto, distribuídos de aprendizagem e colaboração online. Ele é articulador em projetos como MetaReciclagem.org, um movimento emergente brasileiro sobre laboratórios de baixa tecnologia e projetos ligados a obsolescência computacional, ao qual, nos interessa nessa entrevista.

1. O que é a MetaReciclagem e como a enquadra em seu aspecto: “união de pessoas”?

Felipe Fonseca: Eu não diria que a MetaReciclagem se desenvolveu “sem perceber quem eram as pessoas”. Na verdade, foi uma ideia desenvolvida coletivamente, por muitas pessoas. Nós tínhamos noção de quem eram as pessoas que participavam da lista de discussão do projeto MetáFora, onde essas ideias surgiram. É uma distinção importante: a MetaReciclagem não é anônima, é coletiva. No começo, nós chegamos a nos chamar de coletivo, mas com o tempo evoluímos para uma rede – com laços mais fracos, mas muito mais aberta. Nesse sentido, o surgimento espontâneo de pessoas que usam o nome MetaReciclagem (sem pedir permissão para ninguém) não é um problema, mas justamente uma de nossas intenções.

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2. Como precursor da MetaReciclagem, vê a evolução da mesma, de que maneira?

F.F: A MetaReciclagem nasceu sem muita pretensão: pessoas que queriam fazer coisas juntas. Estávamos, dentro do projeto MetáFora, debatendo possibilidades de projetos colaborativos envolvendo tecnologias. Em determinado momento surgiu à demanda por equipamentos para colocar esses projetos em prática. Daí a articular uma ação que recebesse doações de computadores usados e os recondicionasse foi um passo natural.

3. O que é a MetaReciclagem?

F.F: Faz parte da metodologia, sim. E não se trata somente de “reutilizar” computadores – fazendo-os funcionar novamente como computadores. Temos também diversas linhas de pesquisa que tratam da transformação de computadores em outras coisas – kits de robótica educacional, suporte para artes plásticas, material para artesanato etc. O mais importante não é o reuso em si, mas a apropriação crítica, o incentivo ao desenvolvimento da sensibilidade associada ao ato de abrir as tecnologias. Quebrar as caixas pretas, propor novos usos e significados para elas.

4. A MetaReciclagem não é do governo, são de pessoas físicas com o mesmo propósito. Como fica a relação com o governo?

F.F: O governo, em especial durante o mandato do presidente Lula, deu bastante apoio ao uso de software livre – com programas de migração, implementação de novos projetos, bastante apoio conceitual e até um nível sem precedentes no mundo de debate sobre o papel cultural das tecnologias livres. Faltou dar um passo adiante, e investir também no desenvolvimento efetivo dessas tecnologias. O Brasil despontou como usuário de softwares livres no setor público e em projetos de cunho social, mas ainda está longe de ser significativo em termos de desenvolvimento.

5. Como você vê outros movimentos com tecnologias?

F.F: O tema “cultura digital” entrou no Ministério da Cultura por dois caminhos: diretamente pelo Gilberto Gil, a partir de sua aproximação com teóricos envolvidos com as tecnologias de informação como John Perry Barlow e Hermano Vianna; e através de Claudio Prado, que reuniu dezenas de ativistas e pesquisadores que tinham um trabalho de vanguarda em coletivos e redes brasileiras para elaborar um plano de cultura digital para projetos do Minc. Inicialmente, essa ação do Claudio Prado se dirigia às BACs, projeto que foi abortado ainda em 2003. Posteriormente, a perspectiva de cultura digital baseada na apropriação de tecnologias, na generosidade intelectual com tecnologias livres e do uso da rede como ferramenta de organização e mobilização foi incorporada pelo projeto Pontos de Cultura, coordenado por Celio Turino. Eu fui uma das pessoas arregimentadas por Claudio Prado para elaborar, planejar e implementar as ações de cultura digital dentro do cenário dos Pontos de Cultura.

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6. Qual é o sentido de outros movimentos com a MetaReciclagem?

F.F: Não sei se diria que a MetaReciclagem e a plataforma Rede//Labs têm o mesmo sentido, mas certamente têm algumas coisas em comum. Em essência, tratam da tentativa de promover o diálogo entre referências de novas tecnologias do mundo inteiro com as realidades brasileiras. Mas se a MetaReciclagem busca o diálogo com comunidades, projetos sociais e as ideias de sustentabilidade e participação, a Rede//Labs investe mais no desenvolvimento de novas tecnologias e a articulação delas com o imaginário coletivo, em termos mais simbólicos. A MetaReciclagem está mais ligada ao uso efetivo de tecnologias para transformar a realidade cotidiana – a Rede//Labs quer saber quais são as maneiras de desenvolver as tecnologias do futuro, dialogando com as artes, a ciência, as comunicações, a pesquisa.

7. A MetaReciclagem visa a Inclusão digital?

F.F: A MetaReciclagem não tem foco definido ou objetivos claros. É uma rede emergente de pessoas que compartilham algumas referências e interesses, mas de maneira muito mais solta. A inclusão digital é um dos muitos campos com os quais os projetos de MetaReciclagem se relacionam. Eu, pessoalmente, tenho uma visão crítica sobre isso: http://mutgamb.org/livro/O-fantasma-da-inclus%C3%A3o-digital

8. Como vê a gambiarra e a apropriação tecnológica dentro do MetaReciclagem?

F.F: A partir das nossas vivências de laboratórios, em que muitas vezes a precariedade impõe limites, apelamos frequentemente para o improviso, para o desvio de função de objetos e ferramentas, aos processos de tentativa e erro para solucionar problemas. A gambiarra emergiu nesse contexto, como uma linguagem em si, muito presente nas culturas brasileiras, e que tem o potencial de se transformar em vantagem competitiva em um mundo tomado pela comercialização de saberes cotidianos.

9. Na atualidade, a MetaReciclgem é uma solução para o problema ambiental?

F.F: Não sei sobre atualidade. Não acredito em soluções abrangentes e hegemônicas. Nos nossos contextos específicos, para os problemas que precisamos resolver, as formas do mutirão como sociabilidade dinâmica de rede e da gambiarra como criatividade cotidiana surgiram como respostas. Não sei se se aplicam a outros campos.

10. Trabalhos artísticos de apropriação e de experimentação coletiva se parecem com ações do MetaReciclagem?

F.F: Concordo. Muito do que a gente faz pode parecer “reinventar a roda”, se analisado em termos objetivos. Mas nos interessam muito mais os processos, a descoberta, o estímulo à imaginação e a exploração da indeterminação das tecnologias. Alguns dos nossos experimentos não têm nenhum valor artístico ou prático, mas as pessoas envolvidas aprendem muito com eles, e daí vem o valor deles.

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Entrevista com Andréia Maffeis Campbell, Gestora Ambiental – Grupo Itautec – Jundiaí, São Paulo. Dia: 4 de Novembro de 2010. Duração: 4 horas e 33 minutos de entrevista. Local: na Rua Wlhelm Winter, 301- Dist. Industrial – Jundiai-SP – Sede Itautec e Centro de Reciclagem. Elementos presentes: Entrevistadora, Andréia Maffeis Campbell e integrantes do Cesumar Empresarial Maringá75 e Amusep.76

1. Você trabalha na empresa Itautec, do Grupo Itautec, desde que época e qual sua formação acadêmica?

Andréia Maffeis Campbell: Estou no grupo Itautec desde 2004. Formei-me em Graduação em Engenharia Florestal pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” / USP, depois fiz Especialização em Gestão Ambiental pela Faculdade de Saúde Pública, Mestrado em Tecnologia Ambiental pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas – IPT / USP e MBA em Gestão da Sustentabilidade pela FGV.

75

Cesumar empresarial o Cesumar Empresarial é um programa integrante da política de Extensão Universitária do Cesumar, que promove o fortalecimento da relação Academia-Mercado. Disponivel em: <http://www.cesumar.br/empresarial/index.php>. Acesso em: 15 jan. 2012.

76 A Associação de Municípios do Setentrião Paranaense (Amusep) iniciou o projeto em parceria com o Cesumar empresarial pesquisando a possibilidade para a criação de um centro de reaproveitamento e reciclagem de equipamentos de informática nos municípios da região de Maringá. Disponível em: <http://Www.Gazetamaringa.Com.Br/Online/Conteudo.Phtml?Id= 1029452>. Acesso em: 15 jan.; 2012.

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2. Desde 2004, você trabalha na Itautec como supervisora Gestão Ambiental, quais as atribuições da sua função?

A.M.C: Sou Responsável pelo desenvolvimento de projetos ligados a sustentabilidade, em consonância com o triple botton line. Responsável, em conjunto com a área de desenvolvimento, pela implementação de melhorias ambientais nos produtos Itautec. Responsável, em conjunto com a Gerência de Sustentabilidade do Grupo Itau S/A Industrial, pela implementação da logística reversa de produtos Itautec; pela operacionalização da ISO 14001 na empresa; Responsável pela área operacional de reciclagem/segregação de resíduos; pela homologação, contratação e controle de documentos (Licença de Operação Cetesb, Cadastro Ibama, Cadris, etc.) de empresas recicladoras; pelo licenciamento ambiental da Itautec perante órgãos ambientais municipais, estaduais e federais.

3. Como aconteceu o sistema de certificação e programa ambiental da empresa?

A.M.C: A empresa possui um sistema de qualidade, implantado e certificado com base na norma ISO9001, desde 1993 e Sistema de Gestão Ambiental (SGA) norma ISO14001 certificado desde 2003. A empresa adotou como estratégia a adoção dos sistemas de gestão e certificações. Estes sistemas se baseiam na visão de processos internos, com estratégias de crescimento sustentável, equilibrando as necessidades econômicas, sociais e ambientais. Esta forma de ver da empresa veio contribuir para um trabalho alinhado com práticas do mercado na gestão de processos e melhoria contínua das atividades nos diversos níveis de atuação, buscando principalmente a excelência ambiental, o que a levou a implementar um Sistema de Gestão Ambiental em conformidade com a Norma ISO 14001 primeiro na unidade de São Paulo. A conquista da certificação aconteceu em novembro de 2003. Em 2007 migramos o nosso sistema para nova planta construída e instalada em Jundiaí, e conseguimos manter a nossa certificação ambiental e de qualidade.

4. Você falou programar um Sistema de Gestão Ambiental (SGA). Como se dá esse processo?

A.M.C: Não foi uma tarefa fácil. A empresa investiu em um período de dois anos, no ponto material financeiro, em torno de R$ 1,2 milhão, dos quais cerca de 75% foi repassado para os setores de infra-estrutura operacional da unidade. Além do pensamento de investimento material, foi preciso investimento no material humano, a fim de desenvolver trabalhos de treinamento e conscientização dos colaboradores. Em outro momento, ter um plano de continuidade pós-certificação é importante, pois a melhoria contínua em cada atividade da empresa torna-se uma exigência. Além do que, outros aspectos influenciam como verificar a questão da embalagem de forma econômica, sem desperdício, redução do consumo energia e água, bem como, substituir processos que gerem menos resíduos. Tudo engloba o processo.

5, Você falou sobre a implantação do SGA na empresa. De que forma a utilização da tecnologia foi importante?

A.M.C: Em todo processo de comunicação, a internet teve valor essencial, pois foi por meio dela que desenvolvemos e disponibilizamos por meio virtual a todas as

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unidades as mudanças necessárias, como: documentação do SGA, legislações e normas aplicáveis. O que foi fundamental para a agilização, o controle e a atualização dos procedimentos e controles. Outro dado foi à substituição de equipamentos obsoletos por equipamentos modernos com menor consumo de energia. Isso também foi decisivo para alcançar as metas de redução do consumo de energia e água, o que veio acarretar, sobra de equipamentos descartados como um problema a ser resolvido. Sobre esse problema, houve o desenvolvimento e homologação de fornecedores e processos para a reciclagem de computadores obsoletos. Essa união de implantação de novos métodos de economia, como desligar a iluminação e computadores quando não estivessem mais presentes, foram ações que tiveram resultado.

6. Falamos sobre a implantação da SGA na empresa, e como se efetivou. Notamos que esse trabalho efetivado, começa também por boas práticas inseridas ao material humano. Esse fato teve real importância, você concorda?

A.M.C: A empresa tem sempre grande preocupação em estabelecer programas de conscientização e comunicação com boas práticas ambientais, não só para funcionários, mas também para a comunidade. Esse trabalho de comunicação é permanente, sendo proferido sempre, com temas diferentes sobre meio ambiente, que fica disponível a todos. Também possuímos um canal de interativo on-line que se estende a qualquer parte interessada, por meio de um e-mail e uma linha direta para o público interno. Essas práticas ambientais estão inseridas na política interna da empresa, e a certificação é o premio concedido ao ideal e o esforço realizado por todos no trabalho. Adotar boas práticas ambientais é importante, pois torna as pessoas uma reflexão na questão desperdício e racionamento de recursos. A empresa ganha, com redução de recursos e economias em setores produtivos e de apoio.

7. Voltando agora a questão do lixo eletrônico descartado, você afirmou a pouco, que a substituição de equipamentos obsoletos por equipamentos modernos com menor consumo de energia foi realizada, mas gostaríamos de saber quais as medidas que vocês construíram para resolver o problema da obsolescência ocasionada?

A.M.C: Foi criado um sistema triple bottom line que envolve aspecto econômico e social, com a função de armazenar resíduos que recebíamos da coleta seletiva e a descaracterização e segregação de equipamentos eletrônicos. Foi resolvido então, construir, em 2001, uma área de reciclagem com 700m². A empresa, especificamente a área de reciclagem, mudou-se para Jundiaí. Foi constituída como a estrutura original, construída na fábrica em São Paulo. Todos os resíduos levados para área de reciclagem é separado e armazenado para formação de carga. Passam por uma separação mais refinada, enfardamento e armazenamento para formação de carga, ou a serem incluídos na coleta seletiva.

8. Muitos resíduos devem ser gerados nessa área de reciclagem construída. Você tem uma noção de quanto se arrecada?

A.M.C: Um exemplo foi no ano de 2009. A geração de resíduos foi 1.299 toneladas, sendo 1.088 toneladas resíduos recicláveis. Os resíduos recicláveis são

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encaminhados para reciclagem, beneficiamento ou coprocessamento e representam 84% do total gerado.

9. E sobre a descaracterização de equipamentos eletrônicos e sua venda, pós-desmontagem?

A.M.C: Bom essa questão se caracteriza desta forma: todo equipamento eletrônico descartado das próprias empresas, que a Itautec fornece ou mesmo usa em seus domínios, são enviados para a Área de Reciclagem. É descaracterizado, separado e enviado para destino ambientalmente adequado. Os equipamentos recebidos pela área são desktops, notebooks, servidores e caixas eletrônicos. Quando o equipamento chega é desmontado e colocado em separado a caixas coletoras com destinos a reciclagem. Em 2009, por exemplo, tivemos uma receita gerada pela venda resíduos recicláveis de R$ 179.552,00. Este valor refere-se à diferença entre a venda de resíduos e a despesa para tratamento de alguns resíduos.

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Entrevista com Neuci Bicov, responsável técnico pelos trabalhos desenvolvidos na reciclagem, reuso e logística reversa dos equipamentos inservíveis da USP- CEDIR. Dia: 4 de Novembro de 2010. Duração: 2horas e 15 minutos de entrevista. Local: USP/SP Av. Profº. Luciano Gualberto, 71 TV3- Cidade Universitária Butantã-SP. Elementos presentes: Entrevistadora, Neuci Bicov, Irã Margarido e integrantes do Cesumar Empresarial Maringá.

1. Qual o objetivo do CEDIR em uma universidade como a USP ?

Neuci Bicov: O Centro de Descarte e Reuso de Lixo Eletrônico (CEDIR) da USP inaugurado em 17 de dezembro de 2009, é subordinado ao Centro de Computação Eletrônica (CCE) da universidade e tem como objetivo executar práticas de reuso, descarte e reciclagem de bens de informática e telecomunicações que ficam ultrapassados nas unidades da USP, em todos os seus campi, na capital e no interior.

2. Qual é a capacidade de caracterização e triagem que o CEDIR suporta ao mês?

N.B: O CEDIR faz caracterização, triagem e destinação de 500 a 1000 equipamentos por mês e está instalado em uma área de 400m² localizada no

Campus da Cidade Universitária, em São Paulo.

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3. Vocês têm uma organização no processo de gestão do lixo eletrônico/digital?

N.B: Vou lhe passar o modelo de fluxograma que utilizamos.

4. Existe algum tipo de modelo e exigência para cadastramento de entidades?

N.B: Tem um blog que as pessoas podem entrar e se cadastrar nesse endereço: <http://stoa.usp.br/neucib/weblog/90500.html>. Acesso em: 17 jan. 2012.

Como demonstra o registro a seguir:

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5. Qual o comprometimento das indústrias com o lixo tecnológico?

N.B: Atualmente, as empresas AOC (monitores), Philips (todos os equipamentos), 3M (fitas magnéticas e Xerox do Brasil (copiadoras e tonner) já fazem parte dos “Parceiros Ambientalmente Comprometidos” para onde o CEDIR/CCE já enviou equipamentos aos quais foram dados tratamento adequado. A Itautec já se comprometeu também em receber os equipamentos e fornecer certificado de destinação. Outras grandes empresas produtoras de eletro-eletrônicos que foram procuradas pelo CEDIR através de suas centrais de atendimento disseram não ter comprometimento com os equipamentos após o término da garantia e não irão recebê-los de volta de forma gratuita, a menos quando forem obrigados por lei regulamentada. Fato preocupante, pois com certeza estas não estarão comprometidas com a destinação adequada de resíduos, muitas vezes perigosos e contaminantes.

6. Existe alguma vantagem para a empresa, fora é lógico da questão ambiental da mesma aceitar seu produto de volta? Como vê esta questão?

N.B: A iniciativa de criar uma certificação de empresas parceiras do CEDIR, nos moldes do Selo Verde, que certifica as empresas que vendem equipamentos sustentáveis à USP, partiu do diretor do CEDIR Mauro Bernardes e está sendo desenvolvida por Irã Margarido, chefe da seção do CEDIR e Neuci Bicov, pós-graduada em Gestão Ambiental e por funcionários do CEDIR. Nossa intenção é alertar o consumidor quanto a necessidade de adquirir um produto pelo qual o fabricante se responsabilize desde a produção até o descarte final (logística

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reversa), pois somente aí ele irá realmente produzir equipamentos que não contaminem o meio ambiente, e investir em novas tecnologias de produção.

7. Qual é a relação do CEDIR enquanto Universidade com a indústria, por exemplo?

N.B: Excelente, estamos sempre abertos a conversas, basta querer trabalhar e fazer parcerias juntos. Um exemplo é a Itautec que entregou à USP o certificado de destinação para reciclagem dos 37 monitores encaminhados pela Universidade, em cerimônia que contou com a presença de representantes do CEDIR. Essa parceria foi formada com o apoio técnico fornecido pela Itautec e baseado no Centro de Reciclagem que a empresa mantém em Jundiaí. A reciclagem de monitores CRT (que usam tubos de raios catódicos) é mais trabalhosa do que outros resíduos eletrônicos pela dificuldade em dispor de processos de destinação sustentáveis do ponto de vista econômico. Esta dificuldade fez com um número elevado de monitores se acumulasse nas instalações do CEDIR, uma vez que os demais materiais já eram devidamente separados e destinados para reciclagem. Ao destinar os 37 monitores para destinação final, a Itautec firma seu compromisso com a reciclagem e com o apoio às atividades do CEDIR.

8. Qual é o comprometimento do CEDIR com o Sistema produto-serviço?

N.B: É total. Os equipamentos e peças que ainda estiverem em condições de uso serão avaliados e enviados para projetos sociais, atendendo, assim, a população carente no acesso à informação e educação. No final de sua vida útil, tais equipamentos deverão ser devolvidos pelos projetos sociais à USP, para que possamos lhes dar uma destinação sustentável, via CEDIR. Esta é a metodologia utilizada. Nosso projeto está alinhado com as diretrizes de sustentabilidade definidas pela ONU, satisfazendo requisitos ambientais, sociais e econômicos. Numa primeira etapa, atende apenas as escolas, faculdades e institutos dos diversos campi da Universidade de São Paulo e numa segunda etapa envia a centros de descarte.

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Entrevista com Marcus Wilian M. de Oliveira, sócio-proprietário da empresa, Analista Ambiental. Dia: 4 de Novembro de 2010. Duração: 1hora e 30minutos de entrevista. Local: Rua Serra das Divisões, 426- Jardim Bandeirante - SP. Elementos presentes: Entrevistadora, Marcus de Oliveira, e integrantes do Cesumar Empresarial Maringá.

1. O que faz a Empresa Reciclo Metais?

Marcus Wilian M. de Oliveira: Procedimentos empresariais, recebimento de compra e venda interna e externa de sucatas de equipamentos eletrônicos.

2. Qual é o objetivo de uma empresa que comercializa lixo eletrônico.

M.W.O: A empresa, como toda e qualquer empresa, visa lucro, mas oferece também pacote para o gerenciamento e destinação social e ambiental de resíduos eletrônicos.

3. Qual é a estrutura que uma empresa necessita ter para tratar ambientalmente correta de descartes?

M.W.O: Em primeiro lugar, infraestrutura, uma ampla área de armazenamento prévio para o desmonte e classificação do material por tipologia para a destinação, seja

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para reciclagem, seja para aterro sanitário e aquisição de vários equipamentos específicos, como: enfardadeira, carro hidráulico, balança mecânica, rodoviária, eletrônica e de plataforma, tesoura crocodilo, descascadora de fios, moinho para fios e cabos, compressor de ar, caminhões transportadores, ou seja, há um grande investimento.

4. E quanto ao retorno ciclo produtivo, econômico e ambiental?

M.W.O: É um investimento de aproximadamente cinco anos para haver retorno financeiro, ocorre retorno ao ciclo produtivo de matéria-prima já manufaturada e na questão ambiental contribuímos para redução do lixo-eletrônico encaminhado que antes não tinha um destino sustentável, bem como trabalhamos a redução de recursos extraídos do meio ambiente.

5. E vocês desempenham projetos sociais, inclusivos visando a questão ambiental?

M.W.O: Sim, damos suporte a projetos sociais, maior conscientização da população, sensibilização da área política e oportunidade de emprego e renda.

6. Quais os riscos que uma empresa tem em lidar com esse lixo específico?

M.W.O: Primeiro tem que ter um amplo espaço físico, a desgastes dos equipamentos encargos para a manutenção como aluguel, impostos, custos operacionais, água, energia, custos de mão de obra, encargos trabalhistas, custos pela aquisição dos eletrônicos em desuso, encargos sociais, tudo envolve custos, afinal é uma empresa. E tem também a questão econômica que é a flutuação de preços, mercado incerto, especulação dos vários setores como instituições, pessoas físicas e jurídicas etc.

7. Sua formação é nesta área especifica? Pergunto, pois tem a questão ambiental que necessita ter conhecimento.

M.W.O: Sim, sou biomédico, mestre em Toxicologia e Análises Toxicológicas pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo, trabalhei como pesquisador na School of Biochemistry and Immunology e Institute of Neuroscience na Universidade de Dublin, Trinity College, portanto tenho conhecimento na área, por isso presto consultorias. A questão ambiental é muito delicada, existe grande estoque de material com componentes sem aproveitamento para a reciclagem, devem-se tomar cuidados com rejeitos tóxicos e descartar da maneira correta.

8. Você tem licenciamento ambiental?

M.W.O: Sim, sou uma constituição jurídica de empresa com finalidades lucrativas. Possuo licenciamento ambiental fornecido pela CETESB ao qual descaracterizo equipamentos atendendo ao processo de logística reversa, de acordo com o especificado em legislação nacional e internacional.

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ANEXOS

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Case: reciclagem de eletrônicos – aspectos ambientais, sociais e econômicos. Material enviado via e-mail por: Andréia Maffeis Campbell, a autora, com autorização para publicação. Andréia é gestora ambiental do Grupo Itautec em Jundiaí, São Paulo.

1. Descrição da empresa

Empresa 100% brasileira, especializada no desenvolvimento de produtos e soluções em informática, automações e serviços. Atua nos mercado corporativo e doméstico por meio das seguintes áreas de negócios:

Informática - Microcomputadores, notebooks e servidores, comercializados com sua marca;

Automações - Bancária, com máquinas de auto-atendimento (ATMs) e terminais caixa; e Comercial, com terminais de ponto-de-venda (PDV), impressoras fiscais, terminais de auto-atendimento, e softwares, como Sistema de Automação Comercial (Siac), Soluções Completas para Pagamento Eletrônico (Scope) e Sistema de Gestão do Atendimento (Siga);

Serviços - Outsourcing, assistência técnica, infra-estrutura e instalações. Sua sede está localizada na cidade de São Paulo e sua unidade fabril foi transferida em 2007 para o município de Jundiaí, a 49 quilômetros da capital. Com a mudança, houve ampliação de 35% na capacidade de produção de microcomputadores e de 150% em equipamentos de automação, além do início da fabricação de cofres que equipam máquinas de auto-atendimento bancário.

A Empresa possui cinco subsidiárias no exterior (Argentina, Espanha, Estados Unidos, México e Portugal), para revenda de produtos e prestação de serviços de assistência técnica e suporte. Também atua por meio de suas

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subsidiárias localizadas no Brasil, na Argentina, no Chile, na Colômbia, no Equador, nos Estados Unidos, no México e na Venezuela, com capacidade para atender a toda a América Latina e países da Europa e África. A Empresa figura como a empresa brasileira de TI que mais investe no exterior, segundo o ranking das Transnacionais Brasileiras 2007, elaborado pela Fundação Dom Cabral e pela Columbia University.

Com mais 6.000 funcionários, 34 unidades de serviços e 7 laboratórios de suporte no Brasil, abrange 2,7 mil cidades brasileiras, capilaridade que assegura agilidade e eficiência na prestação de serviços. Para manter-se alinhada às mais avançadas tecnologias e atender com excelência às necessidades dos clientes, investe em Pesquisa e Desenvolvimento e na modernização de suas unidades e linhas de produção.

Detém as certificações de qualidade ISO 9001 e ambiental ISO 14001 e segue diretrizes internacionais na fabricação dos produtos, como as normas ambientais Restriction of Hazardous Substances (RoHS) e Waste Electrical and Electronic Equipment (Weee).

2. Descrição do Projeto

Em 2001 quando a empresa decidiu pela adoção do sistema de gestão ambiental baseado na NBR ISO 14001, houve, de fato, um longo período de desafios para realizar as mudanças que esse novo conceito exigia. Mudar processos sob o mais rigoroso controle é até possível, mas tornar as práticas naturais e sustentáveis é um desafio maior, pois afinal, é necessário mudar cultura e a peça-chave é o ser humano motivado para provocar mudanças.

Nesses nove anos de trabalho a empresa promoveu mudanças consideráveis e os benefícios foram percebidos pelo público interno e reconhecidos pelo público externo.

Um dos grandes desafios – sob a ótica do triple bottom line - da equipe que coordena as operações foi definir metas e promover as ações para alcançá-las.

• Tripé ambiental: meta principal é a redução de resíduos sólidos enviados para aterro sanitário. O aumento do percentual de resíduos recicláveis é objetivo principal deste tripé, com isto, novos fornecedores foram desenvolvidos e homologados para resíduos até então considerados não recicláveis.

• Tripé social: o emprego de colaboradores, forma indireta, na Área de Reciclagem que possuem idade acima de 40 anos e que possuíam dificuldade de recolocação no mercado de trabalho. A principal meta é o aumento de contratações – diretas e indiretas – relacionadas com o aumento da reciclagem de eletrônicos.

• Tripé Econômico: A geração de receita proveniente da venda de resíduos é ganho para a empresa, já que seu bussiness core é fabricação de eletrônicos. Em 2009, a Área de Reciclagem da empresa se manteve em 72% da receita versus despesa. A meta principal é o aumento do percentual de manutenção da área, ou seja, aumento da receita versus despesa.

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A operação produtiva, apesar de ser ambientalmente limpa, possui uma geração significativa de diversos resíduos, quer sejam metais, papéis, papelões, plásticos, etc., e grande parte desses resíduos são oriundos dos processos de proteção aos delicados componentes de alta tecnologia, que normalmente viajam milhares de quilômetros até o parque industrial.

Em 2009, a geração total de resíduos foi de 1.299 toneladas, sendo que 84% dos resíduos foram reciclados externamente por meio de empresas especializadas nos diversos materiais.

O case mostra o desempenho da equipe ambiental em conduzir esforços para aliar a responsabilidade social com a destinação adequada de resíduos e a obtenção de receita.

Certificações e programa ambiental - A empresa possui sistema de qualidade implantado e certificado com base na norma ISO9001 desde 1993 e Sistema de Gestão Ambiental (SGA) norma ISO14001 certificado desde 2003.

A definição estratégia da empresa para adoção dos sistemas de gestão e certificações está baseada na visão de aprimoramento contínuo de processos e sistemas internos, estando assim alinhados com a estratégia de crescimento sustentável, equilibrando as necessidades econômicas, sociais e ambientais.

Esta visão contribuiu para o desenvolvimento de um trabalho alinhado com as melhores práticas do mercado na gestão de processos e melhoria contínua de suas atividades nos diversos níveis de atuação, buscando principalmente a excelência ambiental, o que a levou a implementar um Sistema de Gestão Ambiental em conformidade com a Norma ISO 14001 na unidade de São Paulo e, recentemente, na nova planta no município de Jundiaí.

O processo de implantação da norma teve início em 2001, quando a empresa efetuou diversas reformas nas áreas de apoio e produção na unidade localizada em São Paulo. Em 2002, após o levantamento dos investimentos necessários, tiveram início as atividades de certificação, que envolveram cerca de cinco mil colaboradores e comunidades locais em diversos projetos de conscientização e boas práticas ambientais. Os trabalhos de adequação à norma foram realizados em um ano e oito meses, desconsiderando as obras de reforma e adequação. A conquista da certificação aconteceu em novembro de 2003. Em 2007 migramos o nosso sistema para nova planta instalada em Jundiaí, e conseguimos manter a nossa certificação ambiental e de qualidade.

Os investimentos voltados para a implementação do SGA, no período de dois anos, ficaram em torno de R$ 1,2 milhão, dos quais cerca de 75% foi repassado para os setores de infra-estrutura operacional da unidade, além dos trabalhos de treinamento e conscientização dos colaboradores. Num segundo momento, o plano de investimentos pós-certificação passou a considerar o trabalho de melhoria contínua que está presente em cada atividade da empresa, envolvendo o desenvolvimento de alternativas para embalagens recicláveis, soluções técnicas para redução do consumo de energia e água, bem como a substituição de processos por outros que gerem menos resíduos.

A utilização de tecnologia foi uma constante ao longo do processo de implantação do SGA na empresa. Entre os pontos considerados relevantes, são enumerados os seguintes:

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• Todo processo de comunicação foi desenvolvido em meio eletrônico e disponibilizado através da Intranet para todas as unidades. Nesse meio estão a documentação do SGA, as legislações e normas aplicáveis, o que foi fundamental para a agilização, o controle e a atualização dos procedimentos e controles;

• A substituição de equipamentos obsoletos por equipamentos modernos com menor consumo de energia também foi decisivo para alcançar as metas de redução do consumo de energia e água. Isso foi possível com a implantação de métodos e equipamentos de gerenciamento do consumo, além da participação dos colaboradores com ações simples, como desligar os computadores e a iluminação quando estiverem ausentes ou no final de cada expediente.

• Houve o desenvolvimento e homologação de fornecedores e processos para a reciclagem de computadores obsoletos.

Os programas de conscientização e comunicação das boas práticas ambientais exercidas pela empresa compreendem tanto a comunidade interna, quanto à comunidade que vive em torno da empresa. O trabalho de comunicação é contínuo, sendo que semanalmente é apresentado um tema diferente que fica disponível a todos. Nessa comunicação, são abordados temas como a preservação dos recursos naturais, a redução da geração de resíduos, os cuidados com o solo, água e ar e palestras para educação ambiental. Há um canal de comunicação que se estende a qualquer parte interessada por meio de um e-mail dedicado e uma linha direta para o público interno.

Para a empresa, o SGA agregou produtividade e racionamento nas atividades operacionais da fábrica e nas áreas de apoio. As boas práticas ambientais fazem parte da política interna da empresa, e a certificação é o reconhecimento desse ideal e do trabalho realizado por todos os colaboradores, que se comprometeram de fato com a redução dos impactos ambientais em suas atividades. A adoção das práticas ambientais proporciona às equipes uma reflexão quanto ao desperdício e racionamento de recursos. A empresa ganha então, a otimização dos recursos e economia em setores produtivos e de apoio.

3. Responsáveis

Abaixo seguem os dados dos profissionais que coordenaram os trabalhos:

Nome: Andréia Maffeis Campbell

Área: Gestão Ambiental

Nome: Mario Célio Lozano

Área: Gestão Ambiental

Nome: Ricardo Perez C. Oliveira

Área: Qualidade Industrial e Gestão Ambiental

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4. Duração do projeto

O objetivo do projeto foi desenvolver uma área de descaracterização e segregação de equipamentos eletrônicos na qual se aplicou o conceito do tripple bottom line.

Após o processo de segregação, os resíduos gerados são encaminhados para reciclagem, co-processamento ou beneficiamento. A receita gerada é revertida para pagamento das despesas da área.

O projeto não teve um período de duração específico, ele foi implantado em 2001 e se estende até os dias atuais.

Pesquisa para implantação da área: 90 dias

Fase importante para avaliação do investimento.

Desenvolvimento dos fornecedores: 120 dias

Avaliação na planta dos fornecedores, auditoria ambiental de 2ª parte e homologação.

Treinamentos internos: 90 dias

Treinamento dos colaboradores (próprios e terceiros) e ações de conscientização ambiental e social

Implantação: 120 dias

Efetivo início da operação e controle das documentações

5. Participação

Todas as áreas da empresa foram envolvidas direta ou indiretamente neste projeto, pois desenvolvemos as figuras de gestores e multiplicadores ambientais visando à disseminação das informações entre os colaboradores. Também, os gestores e multiplicadores ambientais foram os canais de sugestões e reclamações dos aspectos ambientais e sociais.

6. Continuidade

A referência são os compromissos formalizados para atender ao triplle bottom line, os quais estão mencionados no item Descrição do Projeto.

Todo o processo teve uma análise ambiental, social e econômica as quais foram inseridas em todas as etapas de desenvolvimento do projeto.

7. Resultados

A seguir são detalhados todos os resultados alcançados de forma a abordar os principais itens. Os critérios utilizados para a análise a seguir visam demonstrar que a sustentabilidade é um universo não linear e que é possível extrapolar os benefícios dependendo da ótica em que o tema é considerado.

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7.1 Construção Área de Reciclagem

Triple bottom line – aspectos econômico e social

Com o objetivo de armazenar os resíduos provenientes da coleta seletiva e a descaracterização e segregação de equipamentos eletrônicos, construiu-se, em 2001, a Área de Reciclagem com 700m². Com a mudança da empresa para Jundiaí a Área de Reciclagem foi replicada igual a estrutura original (construída na fábrica em São Paulo).

Figura 25: Vista da Área de Reciclagem em Jundiaí

7.2 Programa Coleta Seletiva

Triple bottom line – aspectos ambiental, social e econômico

O programa de coleta seletiva foi implantado na empresa em 2001 e os coletores foram instalados nas áreas internas e externas da empresa.

Figura 26: Coletores seletivos instalados em área externa da empresa

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Para a implantação da coleta seletiva investiu-se em treinamento e conscientização dos colaboradores, pois diretivas de educação ambiental foram inseridas no material de treinamento visando a conscientização e replicação das práticas ambientais.

7.3 Quantificação dos resíduos gerados

Triple Bottom Line – aspectos econômico

Todos os resíduos enviados para a Área de Reciclagem passam por uma separação mais refinada, enfardamendo e armazenamento para formação de carga.

Os resíduos eletrônicos são descaracterizados, na Área de Reciclagem, separados e incluídos com os resíduos de coleta seletiva.

Figura 27: Vista interna da Área de Reciclagem. Ao lado esquerdo as prensas enfardadeiras

Figura 28: Foto de fardos de papelão

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1088,10

210,88

0,00

200,00

400,00

600,00

800,00

1.000,00

1.200,00

Recicláveis Não Recicláveis

Geração de resíduos recicláveis x não recicláveis (toneladas)- 2009

Recicláveis x Não Recicláveis - 2009

84%

16%

Recicláveis Não Recicláveis

Em 2009, a geração de resíduos foi 1.299 toneladas, sendo 1.088 toneladas resíduos recicláveis. Os resíduos recicláveis são encaminhados para reciclagem, beneficiamento ou coprocessamento. Os resíduos recicláveis representou 84% do total gerado.

Figura 29: Geração de resíduos recicláveis e não recicláveis em tonelada

Figura 30: Percentual de resíduos recicláveis e não recicláveis

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80,5%

19,5%

75,5%

24,5%

94,1%

5,9%

90,7%

9,3%

85,6%

14,4%

81,2%

18,8%

81,4%

18,6%

93,6%

31,5%

83,7%

16,2%

83,7%

16,3%

83,9%

16,1%

85,8%

14,2%

0

20

40

60

80

100

120

140

To

nel

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Setem

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Novem

bro

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bro

Comparativo (total gerado) de resíduos recicláveis e não recicláveis - 2009

Reciclaveis Não Recicláveis

Resíduos recicláveis gerados em 2009

1% 2% 1%1% 2%

33%

0%12%

40%

2% 6%

Cinescópios Classe I Isopor/Espuma Fios e Cabos

Madeira Metais Ferrosos Metais Não Ferrosos Pallets madeira

Papelão Placas Eletrônicas Plásticos

Figura 31: Porcentagem mensal da geração de resíduos recicláveis e não recicláveis

Figura 32: Classificação dos resíduos recicláveis gerados na empresa

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0,00

0,50

1,00

1,50

2,00

2,50

3,00

3,50

Kg

/pro

du

to p

rod

uzi

do

Geração de resíduos recicláveis / produto produzido

recicláveis/produto 2,28 1,40 2,84 2,95 3,29 2,40 1,88 2,49 2,36 2,03 1,71 2,14

Jan Ferv Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

Figura 33: Resíduos recicláveis gerados na produção (kg/produto produzido)

7.4 Descaracterização de equipamentos eletrônicos

Triple bottom line: econômico, ambiental e social

Todo equipamento eletrônico enviado para a Área de Reciclagem é descaracterizado, separado e enviado para destino ambientalmente adequado. Os equipamentos recebidos pela Área são desktops, notebooks, servidores e caixas eletrônicos. A Figura 6 retrata o ciclo de descaracterização de um desktop.

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Figura 34: Ciclo de descaracterização de um desktop

Após a descaracterização do equipamento, os resíduos gerados são colocados separadamente em caixas coletoras e destinados para reciclagem.

Etapa 1:

equipamento a ser

descaracterizado

Etapa 2:

Desmontagem do

monitor

Etapa 3:

Desmontagem da CPU

Etapa 4:

Desmontagem do

teclado

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Figura 35: Resíduos gerados são colocados separadamente em caixas coletoras

7.5 Venda de resíduos

Triple bottom line: econômico

Em 2009 a receita gerada pela venda resíduos recicláveis foi de R$ 179.552,00. Este valor refere-se a diferença entre a venda de resíduos e a despesa para tratamento de alguns resíduos.

8. Recomendações / Conclusões

O trabalho de reciclagem dos resíduos é um fator significativo para empresa, que busca ser referência ambiental em seu segmento, de forma sustentável.

Os itens relacionados abaixo e detalhados anteriormente foram os que tiveram destaque neste case, com ganhos significativos e fortalecendo os compromissos ambientais:

� Diminuição de resíduos em aterros;

� Destinação correta de resíduos;

� Emprego de colaboradores (próprios e terceiros) para descaracterização dos equipamentos e separação dos resíduos;

� Fomento, direto e indireto, da cadeia de empresas recicladores;

� Geração de receita.

Neste case, a empresa reforça o objetivo de evoluir nos segmentos de negócios em que atua, tendo como referência o compromisso com a sustentabilidade.