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1
UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC
UNIDADE ACADÊMICA DE HUMANIDADES, CIÊNCIAS E
EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
DANUBIA SEBASTIÃO
TEORIA DA ATIVIDADE E LOUSA DIGITAL NO ENSINO
SUPERIOR: PERSPECTIVAS PARA APRENDIZAGEM DOS
CONCEITOS MATEMÁTICOS
Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade do
Extremo Sul Catarinense - UNESC,
como requisito parcial para a
obtenção do título de Mestre em
Educação.
Orientador: Profª. Drª. Graziela
Fatima Giacomazzo.
CRICIÚMA
2017
1
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
S443t Sebastião, Danubia.
Teoria da atividade e lousa digital no ensino superior:
perspectivas para aprendizagem dos conceitos matemáticos /
Danubia Sebastião. – 2017.
160 p: il. ; 21 cm.
Dissertação (Mestrado) - Universidade do Extremo Sul
Catarinense, Programa de Pós-Graduação em Educação,
Criciúma, SC, 2017.
Orientador: Graziela Fatima Giacomazzo.
1. Teoria da atividade. 2. Medida de tendência central. 3.
Ensino da matemática. 4. Ensino – Meios auxiliares. 5. Lousa
digital. I. Título.
CDD. 22ª ed. 371.33
Bibliotecária Rosângela Westrupp – CRB 14º/364
Biblioteca Central Prof. Eurico Back - UNESC
1
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos que contribuíram para este estudo:
- A Prof.ª Dr.ª Graziela Fatima Giacomazzo pela paciência,
eficiência e compreensão na orientação da presente pesquisa.
- Ao Prof. Dr. Ademir Damazio pela semente plantada na
graduação.
- Ao Prof. Dr. Kristian Madeira pelo incentivo em cursar o
mestrado.
- Aos colegas, Lucas Sid Moneretto Búrigo e Daiane de Freitas,
por todo esforço, pelas horas de estudo, por não desistirem e acreditarem
na possibilidade de um trabalho promissor.
- Aos colegas de turma por colaborarem com as discussões no
decorrer das disciplinas, em especial a Michele Mezari Oliveira pelo elo
criado para além do programa. Estendido a Erica Vieira Marques, Maria
Emília da Silva de Bona Freitas e Sonia Regina Silveira Gonçalves pela
amizade construída.
- A todos que frequentam o laboratório de matemática pela
agradável convivência e ao Bruno por sempre estar disposto a ajudar e
servir cafezinho.
- Aos professores que participaram da banca de qualificação Prof.
Dr. Ademir Damazio e Prof.ª Dr.ª Cibele Beirith Figueiredo Freitas pelas
contribuições e reflexões apontadas.
- Aos componentes da banca de defesa Prof.ª Dr.ª Josélia Euzébio
da Rosa e Prof. Dr. Ademir Damazio.
- Ao meu esposo, Cleiton, pelo companheirismo, apoio,
compreensão e dedicação em todos os momentos, principalmente nos
ausentes.
- Aos meus pais, Dilnei e Dirce, pela educação e respeito que me
proporcionaram e pelo incessante incentivo aos estudos.
- Ao meu irmão, Diego, minha cunhada, Suzana, minhas sobrinhas,
Yasmin e Isabella, pelo carinho e apoio.
- Aos meus sogros, Odair e Natalia, e a Marieli pelo auxílio em
todos os momentos em que o relógio não andava a favor.
1
- Aos demais familiares e amigos que nos momentos de cansaço
acolhem e reforçam as energias.
- Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Educação da
UNESC, pelas reflexões levantadas nas disciplinas cursadas, e a Vanessa
pela dedicação no atendimento na secretaria.
- A UNESC pela disponibilização de seu espaço para o
desenvolvimento do estudo.
- Ao Fundo de Apoio à Manutenção e ao Desenvolvimento da
Educação Superior – FUMDES, pelo auxílio no financiamento desta
pesquisa.
1
“Tenho a impressão de ter sido uma
criança brincando à beira-mar, divertindo-me em descobrir uma
pedrinha mais lisa ou uma concha
mais bonita que as outras, enquanto o imenso oceano da verdade
continua misterioso diante de meus
olhos”.
Isaac Newton
1
RESUMO
A presente pesquisa aborda um modo de organização de ensino para o
conceito de Medida de Tendência Central, constituído por um sistema de
tarefas em que a resolução de cada uma delas adota como uma das
operações o uso da Lousa Digital. Como fundamentação adota a Teoria
da Atividade. Tem como pressuposto que o ensino organizado com base
na Teoria da Atividade promove a aprendizagem de conceitos científicos,
condição para o desenvolvimento do pensamento conceitual teórico dos
estudantes que, no presente estudo, trata-se do ensino superior. Atrelado
essa premissa surge a seguinte questão de pesquisa: que conjunto de
tarefas, elaboradas a partir de um olhar de pressupostos da Teoria da
Atividade (TA), pode indicar – ainda que teoricamente – uma
possibilidade para a organização de ensino do conceito de medida de
Tendência Central, para o ensino superior, tendo como uma operação o
uso da lousa digital? Portanto, essa problemática se insere num contexto
de organização do ensino, na perspectiva da Teoria da Atividade, como
indicação promissora para o processo de apropriação, pelos estudantes do
ensino superior, do conceito científico de Medidas de Tendência Central,
em que se adota como operação necessária o uso da Lousa Digital. Para
tanto, suscitou conceituação dos diferentes entendimentos acerca da
Tecnologia, na visão de Álvaro Vieira Pinto, o que permitiu o
esclarecimento de que se trata de uma produção humana. E, como tal, está
imersa de relações de dominação e manipulação de determinados grupos
sociais sobre outros. Essa compreensão permite, no entanto, a adoção da
Lousa Digital como uma elaboração mais atual da humanidade que,
conforme Davídov (1988), sua apropriação e uso é direito de todos os
indivíduos. A adoção de tal postura se respalda na abordagem
sociotécnica de uso tecnologias no processo de ensino e aprendizagem do
conceito científico de Medidas de Tendência Central. Nesse âmbito, o
presente estudo se caracteriza como uma pesquisa qualitativa do tipo
propositiva, uma vez que se dedica à elaboração de um conjunto de tarefas
guiado pelo pressuposto de que desenvolva o pensamento teórico dos
estudos. Na elaboração das tarefas, levou-se em consideração a
necessidade de análise que explicite o modo geral, isto é, a tradução da
relação essencial do conceito de medida central, vinculado ao à medição
de grandezas. Para tanto, inicialmente, se reproduz tarefas referentes ao
modo de organização de Davýdov sobre os conceitos de divisão e
multiplicação, suas relações e transformações que, entendeu-se como
fundamental para o estudo de Medidas de Tendência Central.
Posteriormente, desenvolveu-se uma sequência de tarefas para o conceito
1
de Medida de Tendência Central, com foco para o análise identificadora
da relação essencial do conceito de média e mediana, bem como a sua
modelação. Dessa forma, constata-se que os três conceitos apresentam a
mesma finalidade – busca de um valor que tende a um centro, porém, têm
suas particularidades conceituais. Nesse processo, a Lousa Digital se
apresenta como uma operação que contribui para o processo de resolução
das tarefas e apreensão conceitual em nível teórico.
Palavras-chave: Teoria da Atividade. Conceito de Medida de Tendência
Central. Lousa Digital.
1
ABSTRACT
This present research aims a way of teaching organization for the concept
of Measure of Central Tendency, consisting of a system of tasks in which
the resolution of each of them adopts as one of the operations used in the
interactive whiteboard. As reasoning, the study adopts the theory of
activity. It is assumed that organized education based on the theory of
activity promotes learning of scientific concepts, condition for the
development of theoretical conceptual thinking of higher education
students specifically in this study. Linked to this premise arises the
following question: what are the set of tasks, elaborated from the
assumptions of the theory of activity (TA) can indicate – even though
theoretically – a possibility for the teaching organization of the concept
of measure of central tendency, for higher education, having as an
operation the use of the interactive whiteboard? Therefore, this problem
is inserted into a context of educational organization, in the theory of
activity perspective, as a promising indication for the appropriation
processes, by students of higher education, the scientific concept measure
of central tendency, in which the use of the interactive whiteboard is
adopted as necessary. For this, it has aroused the conceptualization of the
different understanding of the technology based in the Álvaro Vieira Pinto
point of view, which explains that technology is a human production.
Thus, it is immersed in relations of domination and manipulation of
certain social groups on others. So, this understanding allows the adoption
of the interactive whiteboard as an updated elaboration of humanity that,
according to Davídov (1988), its appropriation and usage is the right of
all individuals. The adoption of such a posture supports the social tech
approach the use of technologies in the teaching and learning process of
the scientific concept of central trend measures. In this context, the
present study is characterized as a qualitative research of the proposition
type, as it is dedicated to the elaboration of a set of tasks guided by the
assumption that it develops theoretical thinking of studies. In the
elaboration of these tasks, the need for analysis which clarifies the general
way, i.e. the translation of the essential relationship of the concept of
central measurement, linked to the measurement of quantities. For this,
initially, it reproduces tasks related to the way of Davýdov´s organization
on the concepts of division and multiplication, its relationships and
transformations that, it was understood as fundamental to the study of
central trend measures. Subsequently, a sequence of tasks was developed
for the concept of the central trend measurement, focusing on the
identifier analysis of the essential relationship of the mean and medium
1
concept, as well as its modeling. Thus, it is noted that the three concepts
present the same purpose - seeking a value that tends to a center, however,
has its conceptual peculiarities. In this process, the interactive whiteboard
is presented as an operation that contributes to the process of solving tasks
and conceptual apprehension at a theoretical level.
Keywords: Theory of Activity. Concept of Central Tendency
Measurement. Interactive whiteboard.
3
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Visão inicial do software ActivInspire ..................... 94
Figura 2: Interface do software ActivInspire ........................... 95
Figura 3: Menu Ferramentas e Gravador de Tela ................... 95
Figura 4: 1ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa 99
Figura 5: 1ª tarefa, unidade de medida básica ....................... 100
Figura 6: 1ª tarefa, unidade de medida básica e intermediária
............................................................................................... 100
Figura 7: 1ª Tarefa: relação entre unidade de medida básica e
intermediária .......................................................................... 101
Figura 8: 1ª Tarefa: relação quantitativa entre unidade de medida
básica e intermediária ............................................................ 101
Figura 9: 1ª Tarefa: transferência de líquido usando unidade
intermediária .......................................................................... 102
Figura 10: 1ª Tarefa: representação da unidade intermediária
utilizada na transferência ....................................................... 102
Figura 11: 1ª Tarefa: representação da transferência de líquido
(forma objetal e segmentos) .................................................. 102
Figura 12: 1ª Tarefa: representação da multiplicação no esquema
............................................................................................... 103
Figura 13: 1ª Tarefa: relação de multiplicação ...................... 104
Figura 14: 1ª Tarefa: substituição das medidas no esquema . 104
Figura 15: 1ª Tarefa: resultado da operação de multiplicação no
esquema ................................................................................. 104
Figura 16: 2ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa
............................................................................................... 105
Figura 17: 2ª Tarefa: formação de agrupamentos (objetal e
esquema parcial) .................................................................... 105
Figura 18: 2ª Tarefa: formação de agrupamentos (reta e
esquema) ................................................................................ 106
Figura 19: 3ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa
............................................................................................... 107
5
Figura 20: 3ª Tarefa: unidades de medida básica e intermediária
............................................................................................... 107
Figura 21: 3ª Tarefa: representação das unidades básicas no
esquema ................................................................................. 107
Figura 22: 3ª Tarefa: relação quantitativa entre as unidades
básica e intermediária e representação da unidade intermediária
no esquema ............................................................................ 108
Figura 23: 3ª Tarefa: operação de divisão no esquema ......... 109
Figura 24: 3ª Tarefa: Operação de divisão na reta numérica 109
Figura 25: 3ª Tarefa: resultado da operação de divisão no
esquema ................................................................................. 109
Figura 26: 3ª Tarefa: modelo objetal, gráfico e literal .......... 111
Figura 27: 4ª Tarefa: representação gráfica da operação de
divisão ................................................................................... 112
Figura 28: 4ª Tarefa: transformação do modelo .................... 113
Figura 29: 4ª Tarefa: resultado da operação de divisão no
esquema ................................................................................. 113
Figura 30: 4ª Tarefa: resultado da operação de divisão na reta
numérica ................................................................................ 113
Figura 31: Gravador de Tela ................................................. 116
Figura 32: Salvar Gravação de Tela ...................................... 116
Figura 33: Parar Gravação de Tela ........................................ 117
Figura 34: 5ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa
na Lousa Digital .................................................................... 118
Figura 35: 5ª Tarefa, desigualdade de volumes (c e d) expressa
por segmentos ........................................................................ 119
Figura 36: 5ª Tarefa, volume (c e d) representado na reta e por
segmentos .............................................................................. 119
Figura 37: 5ª Tarefa - Igualdade de volumes representados
objetal e graficamente - Grupo 1 ........................................... 120
Figura 38: 5ª Tarefa - Igualdade de volumes (reta numérica) -
Grupo 1 .................................................................................. 121
7
Figura 39: 5ª Tarefa - Igualdade de volumes representados
objetal e graficamente - Grupo 2 ........................................... 122
Figura 40: 5ª Tarefa: igualdade de volumes (reta numérica) -
Grupo 2 .................................................................................. 122
Figura 41: 6ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa
na Lousa Digital .................................................................... 124
Figura 42: 6ª Tarefa: transferência de líquido para um recipiente
maior ...................................................................................... 126
Figura 43: 6ª Tarefa: representação dos dados na reta numérica
............................................................................................... 126
Figura 44: 6ª Tarefa: unidade básica ..................................... 127
Figura 45: 6ª Tarefa: representação da unidade básica no
esquema ................................................................................. 127
Figura 46: 6ª Tarefa: representação da igualdade de volume na
reta numérica (parcial) .......................................................... 128
Figura 47: 6ª Tarefa: representação da igualdade de volume na
reta numérica ......................................................................... 129
Figura 48: 6ª Tarefa: unidade intermediária .......................... 129
Figura 49: 6ª Tarefa: relação quantitativa entre as unidades
básica e intermediária no esquema ........................................ 130
Figura 50: 6ª Tarefa: representação da unidade intermediária no
esquema ................................................................................. 130
Figura 51: 6ª Tarefa: representação da média no esquema e no
modelo literal ......................................................................... 131
Figura 52: 6ª Tarefa: representação da igualdade de volume na
forma objetal ......................................................................... 132
Figura 53: 6ª Tarefa: representação da média segundo Tiboni
............................................................................................... 132
Figura 54: 7ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa
............................................................................................... 134
Figura 55: 7ª Tarefa - Representação da desigualdade de
volumes, na reta numérica e por segmentos .......................... 134
9
Figura 56: 7ª Tarefa: representação da média (esquema e modelo
literal) .................................................................................... 135
Figura 57: 7ª Tarefa - Representação do cálculo da média (forma
literal e esquema) .................................................................. 135
Figura 58: 7ª Tarefa: representação da igualdade (objetal e por
segmentos) ............................................................................. 136
Figura 59: 7ª Tarefa: representação da igualdade na reta
numérica ................................................................................ 137
Figura 60: 7ª Tarefa, representação da média localizada na
posição central ....................................................................... 137
Figura 61: Síntese da relação essencial de média e sua
modelação .............................................................................. 139
Figura 62: 8ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa
............................................................................................... 140
Figura 63: 8ª Tarefa, ordenação dos dados da tarefa Fonte:
Elaborado pela autora (2017). ............................................... 141
Figura 64: 8ª Tarefa, representação dos dados ordenados na reta
numérica ................................................................................ 142
Figura 65: 8ª Tarefa, representação da mediana (n=par) no
esquema ................................................................................. 144
Figura 66: 8ª Tarefa, dados da tarefa para um conjunto com
número ímpar de elementos .................................................. 144
Figura 67: 8ª Tarefa, representação da mediana (n=ímpar) no
esquema ................................................................................. 145
11
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior
FUNDES Fundo de apoio à Manutenção e ao Desenvolvimento da
Educação Superior
GPEMAHC Grupo de Pesquisa em Educação Matemática: Uma
Abordagem Histórico - Cultural
SBEM Sociedade Brasileira de Educação
UNESC Universidade do Extremo Sul Catarinense
15
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................ 33
2 METODOLOGIA ............................................................................ 39
3 TEORIA DA ATIVIDADE.............................................................. 43
3.1 ATIVIDADE E FORMAÇÃO HUMANA: O JOGO, O ESTUDO E
O TRABALHO ..................................................................................... 47
3.2 ATIVIDADE DE ENSINO ............................................................. 51
3.3 TEORIA DA ATIVIDADE E ORGANIZAÇÃO DO ENSINO ..... 54
4 TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NA
EDUCAÇÃO ........................................................................................ 64
4.1 CONCEITO DE TECNOLOGIA POR ÁLVARO VIEIRA
PINTO ................................................................................................... 64
4.2 ABORDAGEM SOCIOTÉCNICA ................................................. 71
4.3 OS ESTUDOS CONTEMPORÂNEOS SOBRE O USO DE
TECNOLOGIAS NO ENSINO............................................................. 76
4.3.1 Lousa Digital ............................................................................... 86
5 MEDIDAS DE TENDÊNCIA CENTRAL: UM MODO DE ORGANIZAÇÃO DO SEU ENSINO ................................................ 96
5.1 APRESENTAÇÃO DOS CONCEITOS DE MULTIPLICAÇÃO E
DIVISÃO .............................................................................................. 98
5.2 INTRODUÇÃO DE MÉDIA E MEDIANA COM USO DA LOUSA
DIGITAL............................................................................................. 114
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................ 153
33
1 INTRODUÇÃO
O interesse por esta temática foi se compondo em diferentes
períodos, acadêmico e profissional. Durante o curso de Licenciatura em
Matemática na Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC,
iniciado em 2008, o uso pedagógico das Tecnologias da Informação e
Comunicação (TIC) ocorreu de forma pontual em algumas disciplinas
destinadas para tal finalidade. O uso da tecnologia, em tais disciplinas,
promulgava uma compatível a uma visão instrumentalista.
Ainda, no contexto acadêmico, algumas disciplinas provocaram
inquietações sobre o modo de organização do ensino que vinha-se
adotando. As principais disciplinas causadoras de reflexões acerca do
ensino, e também da aprendizagem, foram: Didática da Matemática e
Estágio Supervisionado no Ensino Fundamental I e II. Essas disciplinas
proporcionaram os primeiros contatos com a psicologia Histórico-
Cultural.
Outro momento que despertou reflexões sobre o ensino de
matemática deu-se no I Seminário de Estágios Supervisionados do Curso
de Matemática da UNESC: Reflexões e Aprendizagens, durante a VI
Semana Acadêmica de Matemática. Nesse momento, foram apresentados
diversos trabalhos, desenvolvidos pelos acadêmicos nas disciplinas de
estágio, fundamentados na Teoria Histórico-Cultural.
Após o término da graduação, o ingresso no ambiente profissional,
no ano de 2013, como professora de escola municipal e docente do ensino
superior, retomou as reflexões a respeito da organização do ensino. Tais
reflexões se evidenciaram pela fragilidade que se encontrava durante o
ensino dos conceitos matemáticos nas disciplinas de Cálculo Numérico e
Estatística lecionadas pela pesquisadora. Essa percepção acarretava em
angústias tanto por parte da docente quanto dos estudantes. Estes
almejavam a compreensão do que estudavam, questionavam e não se
limitavam as primeiras informações que chegavam a eles. Do mesmo
modo, a docente tinha a preocupação de provocar o interesse, nos
estudantes, por outras formas de contato com o conhecimento. Tal
situação tinha por objetivo desenvolver nos estudantes a destreza de
questionar mais os ensinamentos que eram abordados.
Além disso, as aulas ministradas na graduação promoveram uma
familiarização com a Lousa Digital. Durante alguns semestres as aulas
foram desenvolvidas a partir do instrumento disponível na universidade.
Fato este que colaborou na escolha de uma temática de pesquisa
relacionada a referida tecnologia.
34
Pouco tempo depois, ao trabalhar com um curso na modalidade a
distância, as inquietações surgidas em cada período se vincularam
fortemente. O desafio de ministrar a disciplina de Estatística numa nova
modalidade, com uso de recursos diferentes e, ainda, a preocupação em
organizar o ensino que proporcionasse, aos discentes, uma aprendizagem
significativa, levou a pesquisadora ao processo de problematização do
presente estudo.
As inquietações cada vez mais frequentes levaram a pesquisadora
participar, como aluna especial, da disciplina Teoria da Atividade e
Propostas de Ensino no curso de Mestrado em Educação da UNESC.
Nesse momento, algumas respostas começaram a aparecer, bem como o
interesse por cursar o mestrado da instituição. O desejo se constituiu no
semestre seguinte com a aprovação no processo seletivo para a linha de
pesquisa Educação e Produção do Conhecimento nos Processos
Pedagógicos. Cada disciplina oferecida pelo curso forneceu subsídios
para a escolha e formulação do problema de pesquisa.
A disciplina Educação e Cultura Digital promoveu discussões
acerca das inter-relações entre Educação e Tecnologias de Informação e
Comunicação (TIC), numa perspectiva histórico-crítica. Foram
abordados os contextos educacionais digitais formais e informais, além
da cultura e produção do conhecimento em redes sociais digitais, com
evidência para os modos de produção do conhecimento e os processos
educativos.
Outra cadeira que forneceu grande contribuição para o desenrolar
do problema foi a disciplina Teoria da Atividade e Psicologia Histórico-
Cultural. Ela confirmou o interesse em pesquisar como a organização de
ensino é entendida por pesquisadores e seguidores dessa teoria.
Entre os principais momentos que contribuíram na definição dos
fundamentos a serem adotados no trabalho, está a realização de um estudo
orientado com enfoque nas Perspectivas Atuais em Educação
Matemática. A investigação realizada teve por objetivo a compreensão e
a reflexão sobre as diferentes correntes teóricas que fundamentam a
educação matemática no Brasil, e suas implicações para a pesquisa em
Educação Matemática (EM). A partir das pesquisas, pode-se observar que
diversas tendências apareceram no Brasil, e que os estudos sobre elas se
consolidaram com o surgimento da Sociedade Brasileira de Educação
Matemática (SBEM), por volta de 1988. Com a sua criação, ampliou-se
as pesquisas sobre as tendências que norteiam a EM. O estudo realizado
proporcionou a compreensão de que algumas dessas tendências
emergiram da pedagogia (como histórico-cultural e didática da
matemática francesa) e outras da própria matemática (modelagem
35
matemática, resolução de problemas, tecnologia na educação matemática
e outras).
Para Fiorentini (1995), a Educação Matemática é uma área
interdisciplinar que envolve matemática, pedagogia e outras disciplinas.
Dessa forma, para ser um educador matemático tem que saber matemática
e, ainda, organizar o ensino que propicie o aprender, ou seja, possibilite o
aluno compreender a realidade.
Tem-se a compreensão de educação como o elemento mediador da
apropriação do conhecimento elaborado historicamente, com vistas a
transformação da sociedade. Desse modo, se faz necessário pensar em
algumas perguntas: Para que educar? O que educar? Educar para formar
o que? Educar para Libertar ou Oprimir? Educar para transformar ou
conservar?
As teorias que se tem encontrado na EM, nos últimos tempos,
compreendem o seu surgimento pela perspectiva mudança na forma de
ensino e de aprendizagem. Segundo Fiorentini (1995), a forma de
organizar o ensino pelo professor depende dos seus pressupostos teóricos
mesmo que o ele não se de conta de fato. E, ainda, a concepção de
aprendizagem, de pesquisa e finalidade do ensino de matemática, bem
como a relação entre professor – aluno – saber matemática, se
conjunturam de forma diferente a cada tendência. As tendências
abordadas no estudo orientado foram: Formalista Clássica, Empírico-
ativista, Formalista Moderna, Tecnicista, Construtivista, Tecnologia na
Educação Matemática, Didática da Matematica Francesa e Histórico-
Cultural.
No entendimento da pesquisadora, dentre as tendências em
Educação Matemática discutidas durante o estudo orientado, a que se
apresenta com mais condições de modificar a forma com que vem
ocorrendo o ensino e a aprendizagem é a perspectiva Histórico Cultural.
Em oposição as teorias atuais, ela se preocupa não apenas com o ensino
do conhecimento elaborado historicamente, mas com a formação de ser
humano e desenvolvimento do pensamento. A todo momento “o ensino
escolarizado precisa ser organizado de modo que desenvolva o
pensamento dos estudantes, sendo condizente com o que de mais atual a
humanidade atingiu” (DAMAZIO; MOURA; ROSA, 2014, p. 3).
Por decorrência desse processo pelo qual passou a pesquisadora
emerge o objeto de pesquisa: a busca de um modo de organização do
ensino de Matemática, fundamentado na perspectiva Histórico-Cultural e
com adoção de um recurso de TIC (Tecnologias de Informação e
Comunicação) numa abordagem sociotécnica.
36
Contudo, não se perde de vista que o contexto educativo é
complexo frente aos desafios da sociedade contemporânea, entre eles,
destaca-se a dinâmica das TIC no âmbito da cultura digital. Nesse sentido,
parte-se do pressuposto de que no âmbito da organização do ensino ainda
necessita de incorporação e apropriação qualitativa das potencialidades
das TIC. Sendo assim, no campo da Educação Matemática, torna-se
fundamental a atualização das práticas em consonância com o novo perfil
dos estudantes dessa geração ‘conectada’. São muitas as tentativas em
elucidar e significar o lugar das TIC no ensino. No entanto, ainda há
muitos interrogantes e dúvidas sobre os resultados efetivos na
aprendizagem. Por isso, a pretensão de contribuir com essa tarefa na
medida em que busca a articulação entre a organização do ensino e a
tecnologia.
Dada a abrangência da investigação para o campo do ensino da
matemática, delimitou-se para o estudo do conceito de Medidas de
Tendência Central, por se apresentar, no ensino atual, no modelo que
Davídov (1988) considera tradicional. Em contrapartida, se estudará a
organização do ensino com base na Teoria da Atividade, com o intento de
que possibilite à apropriação do conceito teórico de Medida de Tendência
Central. A Teoria da Atividade tem como matriz teórica o materialismo
histórico dialético que, segundo Triviños (1987), é capaz de aprofundar
as causas e as consequências do problema e suas contradições. Também,
atende a necessidade de pensar o problema em estudo de forma
multidimensional.
Portanto, o desafio que se apresenta é a elaboração de uma
sequência de ensino que coloque os estudantes de Ensino Superior em
processo de resolução de tarefas com a adoção de TIC, mais
especificamente a Lousa Digital. Tem-se a pressuposição que a
organização do ensino fundamentado na Teoria da Atividade propicia a
aprendizagem de conceitos científicos e as condições para o
desenvolvimento do pensamento conceitual.
Desta forma, surge o problema de pesquisa: que conjunto de
tarefas, elaboradas a partir de um olhar de pressupostos da Teoria da
Atividade (TA), pode indicar – ainda que teoricamente – uma
possibilidade para a organização de ensino do conceito de Medida de
Tendência Central, para o ensino superior, tendo como uma operação o uso da lousa digital?
A partir dessa problemática, o objetivo geral desta pesquisa é
investigar a proposição de um conjunto de tarefas, a partir de um olhar de
pressupostos da Teoria da Atividade (TA), como indicador de
possibilidade para a organização de ensino do conceito de medida de
37
tendência central, para o ensino superior, tendo como uma operação o uso
da Lousa Digital.
Do problema de pesquisa, advém outras questões: Quais as
orientações da Teoria da Atividade para a organização o ensino? Que
contribuições a Lousa Digital apresenta para o desenvolvimento das
tarefas organizadas para o ensino do conceito de Medidas de Tendência
Central?
Por decorrência das questões norteadoras, os objetivos específicos
consistem no estudo:
a) das orientações da Teoria da Atividade para a organização do ensino;
b) da elaboração de um conjunto de tarefas para a apropriação dos
conceitos teóricos de média e mediana com a adoção da Lousa Digital;
c) do papel e suas inter-relações da Lousa Digital no desenvolvimento
das tarefas organizadas para o ensino dos referidos conceitos, em nível
científico.
A partir do problema e as questões dele decorrente requerem que
em capítulos posteriores se explicite as bases teóricas. Uma delas diz
respeito à Teoria da Atividade na perspectiva Histórico-Cultural, tendo
como referência os seguintes autores: Lev Semenovitch Vigotsky, Alexis
Nikolaevich Leontiev e Vasili Vasilievich Davýdov. Também, traz-se a
concepção de Tecnologia por Álvaro Vieira Pinto, como fundamento para
o uso da TIC no ensino. Ainda, recorre-se a outros autores: Jóse Manuel
Moran, Maria Luiza Belloni, Pierre Lévy, Juana Sancho, Laura Liguori e
Edith Litwin. Além disso, visitou-se os estudos sobre TIC no ensino da
matemática e abordagem sociotécnica, a partir dos autores Joana Peixoto,
David Buckingham e Brigitte Albero. À medida em que foi necessário,
incorporou-se outros teóricos.
Este trabalho está organizado em seis capítulos. O primeiro
contempla essa introdução a qual justifica o estudo, contextualiza o
problema de pesquisa e seus objetivos. No segundo capítulo apresenta-se
os procedimentos metodológicos adotados para o estudo, explicitando os
caminhos percorridos para a realização da pesquisa. O terceiro capítulo
aborda a Teoria da Atividade, a partir de Vygotsky, Rubinstein, Leontiev
e Davýdov. Além disso, foca no modo davydoviano de organização do
ensino.
O quarto capítulo intitulado “Tecnologias da Informação e
Comunicação na Educação”, traz discussões sobre as TIC na educação.
Inicialmente, a partir do filósofo brasileiro Álvaro Vieira Pinto,
apresenta-se os diferentes entendimentos referentes ao conceito de
38
tecnologia. Na sequência, o texto trata da abordagem sociotécnica como
possibilidade de mudança na relação TIC e educação. O capítulo discute,
ainda, o cenário das TIC na contemporaneidade e o recurso estabelecido
para este estudo, a Lousa Digital.
O quinto capítulo trata do conceito matemático escolhido para fins
de investigação: Medidas de Tendência Central. Inicialmente,
contextualiza-se o que autores entendem por tendência central. Em
seguida, introduz as tarefas elaboradas para apropriação do referido
conceito matemático. As tarefas abordam a tendência central por meio da
medidas mais conhecidas: média e mediana.
O último capítulo é a conclusão do estudo, que se refere às
considerações levantadas para o problema de pesquisa.
39
2 METODOLOGIA
Neste capítulo, apresentam-se os procedimentos metodológicos
adotados para realização da pesquisa. Nesse sentido, fundamenta-se
primeiramente o tipo de pesquisa, a partir de autores, posteriormente, se
descreve o processo investigativo.
Trata-se de um estudo teórico com teor propositivo, uma vez que
se propõe à elaboração de um conjunto de tarefas referentes ao ensino dos
conceitos de Medidas de Tendência Central, numa perspectiva Histórico-
Cultural, que tem como matriz teórica o materialismo histórico dialético.
Tal concepção, segundo Triviños (1987), proporciona que se aprofunde
tanto nas causas como nas consequências do problema e suas
contradições.
Os procedimento metodológicos orientadores do desenvolvimento
dessa pesquisa visam à compreensão de todos os aspectos que emergem
do problema levantado. Trata-se de uma pesquisa propositiva, numa
abordagem qualitativa por ser, segundo Triviños (1987), um método que
não assume um modelo único de investigação e, ainda, possibilita, se
preciso for, analisar o problema por outro viés.
As pesquisas de cunho qualitativo possibilitam a interpretação
resultados, pois observam todo o contexto que envolvem o fenômeno
estudado, bem como como se constitui o processo de investigação,
conforme explica Triviños (1987, p. 129):
A pesquisa qualitativa de tipo histórico-estrutural,
dialética, parte também da descrição que intenta
captar não só a aparência do fenômeno, como
também sua essência. Busca, porém, as causas da
existência dele, procurando explicar sua origem,
suas relações, suas mudanças e se esforça por intuir
as consequências que terão para a vida humana.
A pesquisa, dado seu objeto, propôs algumas ações: 1) busca dos
fundamentos teóricos; 2) mesmo que não dedique um capítulo, reporta-se
ao que os autores trazem sobre Medida de Tendência Central,
basicamente, as suas definições, subsidiaram a terceira ação da pesquisa;
3) organização de um conjunto de tarefas que pressupõe-se um modo de
organização do ensino que contribui para que os estudantes do ensino
superior se coloque em processo de apropriação do conceito de Medida
de Tendência Central com conteúdo teórico; 4) desenvolvimento e análise
das tarefas para identificação dos elementos que compõem a relação
40
universal do conceito em correspondência com primeira e segunda ação
de estudo proposta por Davídov (1988); 5) verificação do papel e suas
inter-relações com o proposto da Lousa Digital; 6) discussão sobre a
análise realizada em consonância com os pressupostos e objetivos da
pesquisa.
A terceira ação constitui-se pela intenção de não adotar os
procedimentos convencionais dos livros de Estatística que, via de regra,
se baseiam em: a) Definição de Medidas de Tendência Central (média,
mediana e moda); b) Exemplos, a partir de um conjunto de dados,
correspondentes a uma situação real ou imaginária; c) Resolução de
exercícios, que se poderia sintetizar por anunciado do tipo: Calcular a
média e mediana de um determinado conjunto de dados.
No processo de elaboração das tarefas particulares, um dos focos
do presente estudo, recorreu-se ao apoio e discussão com membros do
GPEMAHC (Grupo de Pesquisa em Educação Matemática: Uma
Abordagem Histórico-Cultural) que têm se debruçado na pesquisa sobre
o modo davydoviano de organização do ensino de Matemática. Além
disso, nesse processo, percebemos que o conceito de Média e Mediana
vinculam-se ao conceito de divisão, o que nos levou aos estudos de
pesquisadores do referido grupo que tratam não só desse conceito, mas
também de multiplicação, uma vez que na proposição davydoviana eles
aparecem inter-realicionados.
Por se tratar da proposição de uma organização de ensino,
necessário se fez o estudo das bases teóricas, no caso, da Teoria da
Atividade e do modo davydoviano de organização do ensino. Nesse
sentido, destaca-se a estrutura da Teoria da Atividade e seus elementos de
contribuição para o desenvolvimento da formação humana, a partir dos
pressupostos de Leontiev, Vigotsky e Davýdov. A compreensão de
atividade dentro dessa perspectiva é imprescindível, uma vez que visa-se
à elaboração de uma proposta de tarefas, ainda que não
experimentalmente, pressupõe-se que oportunize, aos estudantes de nível
superior, entrarem em processo de apropriação do conceito matemático
de Medidas de Tendência Central. Considera-se que, no desenvolvimento
das tarefas, adote-se como operação dessa atividade de estudo o uso da
Lousa Digital, de modo que articule as tecnologias mais atuais com a
organização do ensino. Essa organização das tarefas traz a preocupação
de colocar o estudante em processo de desenvolvimento, o que requer o
entendimento, pelo professor, da estrutura de sua atividade principal, o
ensino e do aluno o estudo. Nessa teoria, o ensino anseia pelo
desenvolvimento do pensamento teórico. Nesse sentido, recorre-se aos
argumentos teóricos de Davýdov, José Carlos Libâneo e Manoel
41
Oriosvaldo de Moura, que indicam elementos necessários à organização
do ensino para o referido fim. Reafirma-se que a adoção desse
entendimento surge do intuito desta pesquisa de propor o que na
proposição davydoviana denomina tarefas particulares, com o
pressuposto de levem os sujeitos à aprendizagem do conceito matemático
de Medidas de Tendência Central.
Como indicado anteriormente, a definição pelo conceito estatístico
de Medida de Tendencia Central surgiu a partir das observações da
pesquisadora sobre a abordagem dada ao conceito pelos livros didáticos1.
Nas obras mencionadas, apresenta-se o referido conceito, a partir da
exposição das Medidas de Tendência Central mais comuns (média
aritmética, mediana e moda), com elucidação das fórmulas matemáticas
prontas, que possibilitam encontrar o “centro dos valores” a serem
analisados. Dessa forma, dispersam a real compreensão do significado de
medidas que tendem a um “centro de uma distribuição2”.
Para a elaboração da sequência de ensino inspirou-se, de um modo
geral, no modo davydoviano de organização de ensino. Para tanto, com
base em Davídov (1988), estabeleceu-se a seguinte tarefa: formar nos
estudantes de ensino superior uma concepção circunstanciada e válida de
Medidas de Tendência Central, no âmbito do número real, isto é, em nível
teórico, com relações entre grandezas.
A fim de cumprir tal tarefa, adota-se como referência a primeira
ação de estudo (DAVÍDOV, 1988) que consiste em colocar o estudante
em processo de análise para identificação da relação geral e essencial do
conceito de Medida de Tendência Central. Articuladamente com a
primeira ação, é proposto a segunda ação de estudo que é a modelação
(DAVÍDOV, 1988) da relação essencial dos conceitos de média e
mediana.
Reafirma-se que tal organização se fundamenta na perspectiva da
Teoria da Atividade e no modo davydoviano de organização de ensino.
Além disso, parte-se do pressuposto de Davýdov (1982) de que se tem
que colocar o estudante diante daquilo que de mais atual a humanidade já
produziu. Nesse âmbito, adota-se como uma operação básica na resolução
1 (SPIEGEL; STEPHENS, 2009); (ELIAN; FARHAT, 2006); (LARSON;
FARBER, 2010); (PINHEIRO, J.D. et al., 2009); (HAINAUT, L., 1997);
(COSTA NETO, 2002); (MORETTIN; BUSSAB, 2012).
2 Forma como os dados estão organizados, geralmente em grupos ou
categorias/classes indicando a frequência do acontecimento (MORETTIN;
BUSSAB, 2012).
42
das tarefas particulares o uso da Lousa Digital, aliada ao software
ActivInspire, ao invés do uso de quadro de giz. A escolha pela Lousa
Digital deu-se por ser o recurso mais recente adquirido pela Universidade
para uso em salas de aulas, onde a pesquisadora faz parte do quadro de
professores. Outro motivo que contribuiu para a escolha foi as
ferramentas que o software disponibiliza ao professor e aos estudantes,
principalmente, de propiciar a observação do procedimento na execução
da tarefa, que pode ser no coletivo e/ou individualmente.
Além da definição pela Lousa Digital também deu-se pela
compreensão de que é uma das tecnologias mais atuais produzida pela
humanidade na esfera educacional. Além disso, a escolha se articula e,
também se justifica, com a compreensão filosófica de tecnologia de
Álvaro Vieira Pinto e a abordagem sociotécnica de Joana Peixoto. Isso
porque, para esses autores, a centralidade está nas relações que,
historicamente, os sujeitos estabelecem com a tecnologia. Ela é o
resultado de um processo social e de pensamento do homem, ou seja, uma
produção cultural do homem. Em outras palavras, resulta das relações
sociais estabelecidas no processo de formação humana que se constitui
das transformações instituídas nas operações de modificar a natureza
(VIEIRA PINTO, 2005; PEIXOTO, 2016).
A exploração dos recursos da Lousa Digital propiciou, além de
alguns já conhecidos pela experiência da pesquisadora no Ensino
Superior, a apropriação de outros que se apresentaram durante o processo.
Dentre os diversos recursos testados, foram selecionados aqueles que
apresentaram as melhores condições de representar o movimento de
pensamento.
Em todo o processo de elaboração e análise das tarefas, a
preocupação foi com a consonância com os pressupostos da Teoria da
Atividade e os elementos que compõem a relação universal do conceito a
partir das ações estabelecidas para o estudo. Também, centrou-se nas
inter-relações com o uso da Lousa Digital como uma operação da
organização de ensino proposta.
Depois da exposição e análise das tarefas, realiza-se as sínteses e
considerações pertinentes ao estudo.
43
3 TEORIA DA ATIVIDADE
A psicologia científica histórico-cultural tem por base o
materialismo histórico dialético. Converge no contexto da Revolução
Russa, em 1917, em seu projeto de formar um novo homem, para uma
nova sociedade, isto é, de relações de produção socialista. Vários
pesquisadores, como Vygotsky, Rubinstein, Leontiev, entre outros,
desenvolveram estudos nos mais variados temas.
De início, formularam suas teses a respeito do desenvolvimento do
psiquismo e de apropriação da cultura humana, que se constituíram em
referência para investigações sobre pensamento, emoções, consciência e
atividade. Posteriormente, alguns estudos se direcionaram para a
atividade humana que expressaram suas concepções para o ensino, com
base na “Teoria da Atividade”, elaborada por Leontiev.
A partir do exposto, o objetivo do presente texto é realizar um
estudo sobre a estrutura e os elementos dessa teoria relacionada à
organização do ensino, pelo docente. Para tal, apresentam-se os elementos
constituintes da Teoria da Atividade que se fundamenta nas escritas de
Vygotsky, Rubinstein e Leontiev. Em seguida, contextualiza-se como se
organiza o ensino, para esses pesquisadores que se fundamentam nessa
teoria, apresentando alguns aspectos da atividade como a formação
humana. Dentre os autores pesquisados para esse estudo estão Libâneo
(2004) e Moura (1996).
O conceito de atividade é o objeto de estudo de todos os
pesquisadores dessa corrente, contudo, foi Leontiev quem tratou de
elencar como a atividade se apresenta.
É característico dessa teoria buscar a compreensão do processo de
gênese e desenvolvimento da existência humana em sua relação com a
natureza. O que move o homem na sua relação com o mundo é a atividade.
Segundo Leontiev (2004), entende-se por atividade aquela que tenha
sentido para o indivíduo ou que realizada de forma consciente. Sua
estrutura se apresenta, primeiramente, pelo surgimento de uma
necessidade que, no processo de objetivação, determinam um motivo, que
coloca o homem em atividade e liga ao objeto. Para o pesquisador, não há
atividade sem motivos e necessidades (LEONTIEV, 2004).
No entanto, para que a concepção de atividade seja compreendida
é de suma importância diferenciar a atividade humana da atividade
natural. Segundo Vygotsky (2001), o desenvolvimento humano é
consequência das relações entre o homem e a natureza, que permite um
modificar o outro, fazendo com que o homem forme funções psicológicas
superiores, diferente dos animais.
44
A tese principal da Teoria da Atividade está na compreensão da
atividade do homem como consequência indicadora do seu
desenvolvimento. De acordo com o modo que as relações acontecem
surgem necessidades diferentes, o que obriga o homem buscar novas
formas de satisfazê-las. É, pois, por meio da atividade que o homem
satisfaz suas necessidades, consequentemente, se desenvolve.
Para Leontiev (2004), a atividade é composta, além do motivo e do
objeto, por elementos que possibilitem seu acontecimento: as ações e
operações. As ações são processos pelos quais atingem o objeto (fim),
sem se relacionar ao mesmo motivo diretamente. A ação é o componente
básico da atividade, pois, por meio dela satisfaz-se o motivo por orientar-
se sempre para um objetivo. É o processo consciente do resultado que
deve ser atingido. Desse modo, o conceito de motivo está correlacionado
com o conceito de atividade e o conceito de objeto correlacionado com o
de ação (LEONTIEV, 2004).
A execução das ações requer um conjunto de operações específicas
que possibilita seu acontecimento, dadas as condições objetivas, sejam
ambientais ou psíquicas. Uma mesma operação pode executar diversas
ações, assim como para que aconteça uma ação seja necessário realizar
várias operações. Estas necessitam de instrumentos, objetos, signos ou
símbolos que possibilitem suas respectivas execuções.
A atividade é constantemente modificada durante seu processo de
desenvolvimento, pois produz algo novo. Ela pode se tornar uma ação se
o motivo que a impulsiona for modificado. Do mesmo modo, a ação se
transforma em atividade, como surge-lhe um motivo específico. A ação,
ainda, se constituirá em uma operação na medida em que se recorra a ela
para atingir um determinado fim que não esteja relacionado com seu
motivo.
Portanto, a atividade implica sempre a presença de um indivíduo,
com seus motivos e necessidades, e inserido no mundo efetivamente
conhecido. Por conseguinte, ela é estritamente social. Por isso, representa
o momento inicial para todas as mudanças que ocorrem no
desenvolvimento do homem.
La actividad del sujeto - exterior e interna - está
mediatizada y regulada por el reflejo psíquico de la
realidad. Aquello que para el sujeto aparece en el
mundo objetivo como motivos, finalidades y
condiciones de su actividade, debe ser percibido,
representado, comprendido, retenido y
reproducido, de uno u otro modo, en su memoria;
45
esto también se refiere a los procesos de su
actividade y a él mismo, es decir, a sus estados,
propiedades y características (LEONTIEV,1978, p.
98).
O decorrer da história da humanidade foi acompanhado pelo
aparecimento de novos modos de percepção, pensamento e memória.
Essas transformações psíquicas resultaram numa forma de psiquismo
superior, a consciência. Desse modo, a consciência não representa
exclusivamente o pensamento, suas representações e os conceitos, pois
possui suas próprias características psicológicas. De acordo com
Leontiev:
Para descobrir estas características psicológicas da
consciência, devemos absolutamente rejeitar as
concepções metafisicas que isolam a consciência
da vida real. Devemos, pelo contrário, estudar
como a consciência do homem depende do seu
modo de vida humano, da sua existência. Isto
significa que devemos estudar como se formam as
relações vitais do homem em tais ou tais condições
sociais históricas e que estrutura particular
engendra dadas relações. Devemos em seguida
estudar como a estrutura da consciência do homem
se transforma com a estrutura da sua atividade
(LEONTIEV, 2004, p. 98).
Nessa perspectiva, atividade e consciência estabelecem uma
relação dialética pois as transformações sofridas pela consciência no
processo de desenvolvimento humano são conduzidas pelas atividades
exercidas pelo homem. A consciência se constitui e se modifica a partir
do reflexo do ser humano sobre o mundo, na percepção do
desenvolvimento das relações econômicas e de uma reflexão sobre a
realidade objetiva. Para Leontiev (2004, p. 96), a consciência humana se
constitui conforme o desenvolvimento histórico, ou seja, por meio das
“modificações de caráter geral da consciência humana, engendradas pelas
transformações do modo de vida”. O autor, ressalta, que a principal
modificação do reflexo psíquico do homem, durante a passagem da
humanidade,
46
[...] residia no fato de a realidade se mostrar ao
homem em sua estabilidade objetiva das suas
propriedades, na sua autonomia, na sua
independência para com a relação subjetiva que o
homem mantém com ela e para com as
necessidades efetivas deste último; de qualquer
maneira ela apresenta-se a ele, como se diz
corretamente. Esta mesma apresentação é a tomada
de consciência propriamente dita, é a
transformação do reflexo psíquico inconsciente em
reflexo consciente (LEONTIEV, 2004, p. 98-99).
O reflexo consciente caracteriza-se pela relação entre sentido e
significação. Conforme Leontiev (2004), a significação é a percepção da
realidade, dos fenômenos históricos fixados na linguagem. Portanto, é a
assimilação das produções históricas antecedentes. Elas existem de modo
distinto para cada sujeito diferenciadas pelo particular e pelo geral, pois,
cada indivíduo internaliza um conceito do modo que realmente se
expressa. Nem por isso, deixa de ser conceito, apenas se torna o ‘conceito
de um indivíduo’. As significações mediatizam o reflexo do mundo no
momento em que o homem tem consciência dele e o internaliza. A
produção dos significados ocorrem coletivamente e expressam o processo
de formação do conhecimento e como, historicamente, as ideologias
sociais foram sendo impostas por grupos sociais. O indivíduo interioriza
o significado no momento que aprende as culturas. “O homem encontra
um sistema de significações pronto, elaborado historicamente, e apropria-
se dele tal como se apropria de um instrumento” (LEONTIEV, 2004, p.
102).
Em atividade, ao realizar ações conscientes de seus objetivos, o
indivíduo se apropria de seu significado. Contudo, o sentido que elas têm
ao indivíduo se relacionam do motivo da atividade. Para que a atividade
gere o desenvolvimento do sujeito é importante que o sentido dado aquela
ação esteja correlacionado com a sua significação. O grau de assimilação
de significação vai depender do sentido que o indivíduo der a ação. Dessa
forma, as ações passam a ter significações devido à inserção, nelas, de
uma intencionalidade. Para Leontiev (2004, p. 85), ao decompor uma
ação, no processo de sua execução, “o sujeito que age tem a possibilidade de refletir psiquicamente a relação que existe entre o motivo, objetivo da
relação, e o seu objeto. Senão a ação é impossível, é vazia de sentido para
o sujeito”.
A partir da significação, o homem entra em atividade que, no
decorrer do seu processo, ocorre transformação como garantia da
47
formação e do desenvolvimento humano. Leontiev (1978) formula um
esquema cíclico fundamentado na concepção marxista das necessidades:
atividade necessidade atividade. Isso significa que toda atividade,
que promove o desenvolvimento desperta no sujeito a necessidade de algo
novo, uma nova atividade. Desse modo, os seus componentes,
necessidade, motivo, finalidade, ação e operação não são estáticos, mas
em constante movimento de transformação/deslocamento.
A atividade com todas as suas relações leva o homem a conhecer
a gênese de sua existência humana e da natureza, torna-se consciente. Por
consequência, proporciona a aprendizagem dos conhecimentos teóricos,
com vistas à formação social.
3.1 ATIVIDADE E FORMAÇÃO HUMANA: O JOGO, O ESTUDO E
O TRABALHO
O conceito de atividade carrega sempre a ideia de situação social
de desenvolvimento, que representa o momento inicial para todas as
mudanças que ocorrem na formação humana, que impulsiona a
transformação da sociedade e da natureza. A aprendizagem é um
componente da atividade humana que visa a aquisição de todo o processo
de produção humana, bem como o desenvolvimento cognitivo.
A aprendizagem conduz ao desenvolvimento
através da atividade, tendo-se em conta o papel dos
fatores externos do desenvolvimento, com
destaque especial à incorporação da cultura vista
em sua formação histórica, não como cultura dada
(LIBÂNEO, 2004, p.8).
A aprendizagem ocorre em qualquer ambiente, em qualquer
momento. Contudo, como atividade que promova o desenvolvimento,
ocorre essencialmente no ambiente escolar. Aprender e conhecimento se
configuram em processo unificado. É preciso conhecer para superar uma
dada condição. Assim, o ser humano se forma e se desenvolve durante
esse processo.
A compreensão dos períodos do desenvolvimento humano é
realizada por suas atividades desenvolvidas. O ser humano realiza
inúmeras atividades durante a vida. Contudo, os pesquisadores da teoria
histórico-cultural tomam como atividades principais de formação humana
o jogo, o estudo e o trabalho. Essas atividades se desenvolvem em
48
períodos diferentes para cada sujeito. Na infância, pré-escolar, a atividade
principal é a do jogo. Quando ela não satisfaz mais os desejos da criança,
aparecem novas necessidades concernentes a ocupação de outro lugar nas
relações sociais, é substituída pela atividade de estudo. A próxima
atividade principal é o trabalho, na fase adulta. Todas elas fazem parte do
desenvolvimento do sujeito, contudo, num determinado momento da vida
e do lugar social ocupado, há sempre uma que se torna a principal
(LEONTIEV, 2004).
A atividade do jogo é considerada a formadora de características
indispensáveis para a aprendizagem, bem como constituinte da
personalidade, do caráter. Ela deriva do trabalho, porém caracterizada por
um interesse imediato e não necessariamente útil, pois não há, nesse
momento, uma finalidade orientadora.
Numa palavra, no jogo recolhem-se como num
centro todos os aspectos da vida psíquica da
personalidade; formam-se e expressam-se aqui
através do jogo. Graças às funções que a criança
adapta no jogo a personalidade infantil amplia-se,
enriquece-se e aprofunda-se. No jogo formam-se
já, de modos diferentes, as características
necessárias para a aprendizagem na escola e nas
quais se origina a disposição para o estudo
(RUBINSTEIN, 1977, p. 122).
Para o autor citado, é no decorrer dessa atividade, mais
especificadamente pela brincadeira, que a criança se apropria da realidade
ao resolver a contradição entre real e o faz de conta, que a coloca em
desenvolvimento. À medida em que avançam a idade e seu
desenvolvimento, o conteúdo do jogo passa a ganhar complexidades
diferentes (RUBINSTEIN, 1977).
Segundo Leontiev (2004) e Rubinstein (1977), durante o período
em que a atividade predominante é o jogo, as necessidades vitais são
satisfeitas por um adulto. A criança não joga para se preparar para vida,
ela acaba aprendendo isso porque o adulto direciona seu jogo para este
fim. A partir do momento que isso se altera, a atividade do jogo passa a
gerar a necessidade do estudo. Nesse momento, há um período de
transição. A criança entra na escola e começa a ter sua atividade
direcionada para função de proporcionar princípios éticos, sociais, morais
e papéis sociais.
49
Nesse contexto, o estudo se caracteriza tanto pela apropriação dos
conceitos quanto dos métodos de execução. É ele que possibilita a
aprendizagem dos conhecimentos teóricos. Em suas produções sobre a
atividade de estudo, Rubinstein (1977) descreve que se trata do processo
de apropriação dos resultados das produções humanas, com o intuito de
preparar para a atividade do trabalho, cuja necessidade é produzida pelo
processo educativo.
Na atividade de estudo, o professor tem a função de organizar o
ensino de modo que gere o desenvolvimento, por consequência da
apropriação de conceitos e significações elaborados historicamente pela
humanidade. Para Rubinstein (1977, p. 131), o “estudo é um aspecto do
processo educativo social pelo seu carácter, de processo bilateral da
transmissão e da apropriação de conhecimentos. Este processo efetua-se
sob a orientação do mestre e orienta-se para o desabrochar das atividades
criadoras do discípulo”. O aluno só entra em atividade de estudo por
consequência das interações com o professor e o colega, mediados pelos
conceitos em processo de apropriação das disciplinas curriculares. É
preciso que o aluno desenvolva a atividade de estudo de forma autônoma,
gerando o processo de assimilação, como sujeito de apropriação e
reprodução.
Quanto ao trabalho, caracteriza-se como atividade pela qual o
homem pode transformar a intenção em produto material, ser criador e
formador, realizá-lo coletivamente, com utilização de instrumentos que,
de acordo com Vigotsky (2001), medeiam a relação entre homem e
natureza. Os instrumentos, utilizados pelo trabalhador, ampliam as
possibilidades de transformar a natureza, sendo assim, é um objeto criador
da cultura e da história do homem. O trabalho tem o objetivo de satisfazer
as necessidades humanas, atrelado à modificação/transformação dos
elementos encontrados na natureza, de acordo com sua vontade.
Conforme Rubinstein,
O trabalho orienta-se para a produção, para a
criação de um determinado produto. No entanto,
ele é simultaneamente o meio mais importante para
a formação da personalidade. No processo do
trabalho não somente se cria um determinado
produto da atividade de trabalho do sujeito, como é
ele mesmo que se forma com o trabalho. Na
atividade do trabalho desenvolvem-se as aptidões
do ser humano, forma-se o seu caráter, forjam-se
os seus princípios ideológicos e muda-se a sua
50
atitude para com a atuação prática (RUBINSTEIN,
1977, p.80).
Para Marx (1993), o trabalho atual se apresenta de forma
simplesmente para gerar lucro a quem se apropria da mão de obra. Tudo
que o trabalhador produz não lhe pertence, mas sim a outro homem, o
capitalista. Por isso, o seu produto não tem sentido para o trabalhador,
pois não lhe é útil ou não tem acesso ao mesmo e, também, não pensa em
sua função social. Dessa forma, torna-se um sujeito alienado, sem
compreender as relações existentes no trabalho realizado. Ele apenas
produz para ter em troca um valor monetário sobre sua mão de obra. Marx
se reporta sobre este trabalho alienado em sua obra Manuscritos
Econômicos-Filosóficos, na qual acrescenta que:
O trabalhador torna-se tanto mais pobre quanto
mais riqueza produz, quanto mais a sua produção
aumenta em poder e em extensão. O trabalhador
torna-se uma mercadoria tanto mais barata, quanto
maior número de bens produz. Com a valorização
do mundo das coisas aumenta em proporção direta
a desvalorização do mundo dos homens. O trabalho
não produz apenas mercadorias; produz-se também
a si mesmo e ao trabalhador como uma mercadoria,
e justamente na mesma proporção com que produz
bens (MARX, 1993, p.159).
O trabalhador perdeu a autonomia, o poder de decisões e agora só
se sente livre fora da atividade de trabalho, "uma vez que o homem,
enquanto ser consciente, transforma a sua atividade vital, o seu ser, em
simples meio de sua existência" (MARX, 1993, p. 165). A compreensão
desse sistema, proporciona o homem encontrar no trabalho a sua fonte de
existência.
Uma, entre tantas possibilidades de transformação dessa situação
se encontra, justamente, na educação, desde que voltada para a
compreensão da formação histórica do sistema social, do seu papel na
comunidade e da evolução social humana.
Vale salientar que, no presente estudo, o esforço é para contemplar
uma articulação entre os pressupostos da Teoria da Atividade em um
possível modo de organização do ensino do conceito de Medida de
Tendência Central para o ensino superior. Para tanto, adota como
operação de todas as ações dessa atividade, algo que demais atual a
humanidade produziu, a Lousa Digital. Por se tratar de um curso de
51
graduação – portanto, de formação profissional – o pressuposto é de que
estudo e trabalho se apresentam, como atividade principal ou sendo uma
ação da outra. Para alguns acadêmicos, o estudo é atividade principal, pois
é ele que movimento todas as atenções, pois se trata atividade que
colocará, depois da conclusão do curso, em atividade de trabalho. Para
outros estudantes, o estudo é uma ação – de aperfeiçoamento e
qualificação – da atividade de trabalho, pois eles já exercem uma
profissão, que dão as condições financeiras para suprir suas necessidades
sociais.
3.2 ATIVIDADE DE ENSINO
Parte-se do princípio da psicologia histórico-cultural e, também,
pelos pressupostos da Teoria da Atividade, na qual o homem se humaniza
ao se apropriar da cultura e, nesse mesmo processo, constitui a
humanidade. Sendo assim, o ensino deve pressupor que a aprendizagem
adquirida no ambiente escolar proporcione, ao sujeito, o seu
desenvolvimento psíquico, sua constituição como ser humano em sua
plenitude. A partir dessas relações, no processo de atividade, o trabalho
do professor se objetiva na organização do ensino que promova tal
desenvolvimento.
O ensino propicia a apropriação da cultura e o
desenvolvimento do pensamento, dois processos
articulados entre si, formando uma unidade.
Podemos expressar essa idéia de duas maneiras: a)
enquanto o aluno forma conceitos científicos,
incorpora processos de pensamento e vice-versa; b)
enquanto forma o pensamento teórico, desenvolve
ações mentais, mediante a solução de problemas
que suscitam a atividade mental do aluno. Com
isso, o aluno assimila o conhecimento teórico e as
capacidades e habilidades relacionadas a esse
conhecimento (LIBÂNEO, 2004, p.14).
Segundo Libâneo (2004), o ensino deve ser organizado de forma
que o sujeito possa se apropriar de todo o processo histórico objetivado
na cultura. Seu objetivo é introduzir e proporcionar mudanças no
desenvolvimento do pensamento teórico do sujeito. Para tal, apoiado nas
ideias de Davydov, apresenta alguns apontamentos que elenca serem
importantes ao ensino desenvolvente:
52
a) A educação e o ensino são fatores determinantes
do desenvolvimento mental, inclusive por poder ir
adiante do desenvolvimento real da criança. b)
Deve-se levar em consideração as origens sociais
do processo de desenvolvimento, ou seja, o
desenvolvimento individual depende do
desenvolvimento do coletivo. [...] c) A educação é
componente da atividade humana orientada para o
desenvolvimento do pensamento através da
atividade de aprendizagem dos alunos (formação
de conceitos teóricos, generalização, análise,
síntese, raciocínio teórico, pensamento lógico),
desde a escola elementar. d) A referência básica do
processo de ensino são os objetos científicos (os
conteúdos), que precisam ser apropriados pelos
alunos mediante a descoberta de um princípio
interno do objeto e, daí, reconstruído sob forma de
conceito teórico na atividade conjunta entre
professor e alunos (LIBÂNEO, 2004, p.15).
Para que ocorra a internalização (apropriação) dos conceitos
teóricos, o ensino se utiliza de sistemas simbólicos (signos) culturais e
científicos que promovam a interação entre o sujeito e o objeto e que
possibilita o seu desenvolvimento. Isso requer que o professor conheça
todo processo de sua atividade, o que lhe permite organizar o ensino de
forma consciente e, respeitada as condições dadas a ele, assegurar o
desenvolvimento do sujeito. Para Moura (1996, p.30), a atividade de
ensino “deve levar a uma metodologia de formação de professor que
assegure a apreensão de vários elementos que a constituem como ação
educativa: os aspectos psicológicos, sociológicos, curriculares, didáticos
e pedagógicos”. Consciente da importância de todos esses elementos, o
professor tem a possibilidade de colocar o aprendiz em processo de
aprendizagem.
O professor, de posse dos objetivos, dos conteúdos
e conhecendo as possibilidades de aprendizagem
de seus alunos, está munido de dados que lhe
permitem a elaboração da atividade que possa
colocar o pensamento da criança em ação, partindo
de situações-problema que sejam significativas.
Estas são o que chamamos de problemas
53
desencadeadores de aprendizagem (MOURA,
1996, p.35).
Como toda atividade, o ensino surge de uma necessidade do
sujeito, geradora do motivo que desencadeia uma série de ações que leva
o sujeito a buscar determinadas operações. Para Moura (1996, p.31) um
modo de colocar o professor em atividade de ensino é partir de uma
situação-problema, com atenção para algumas perguntas: “a quem
ensinar, para quem ensinar, o que ensinar e como ensinar”. O autor
ressalta, ainda, que esta atividade se apresenta em duas vias de formação:
o professor e o aluno. “Ambas têm elementos comuns: a situação-
problema, uma dinâmica de solução e uma possibilidade de avaliação. A
situação-problema do aluno é a aprendizagem, e a do professor, o ensino”
(MOURA,1996, p.32).
Para que a organização do ensino tenha sucesso, ou seja, promova
a aprendizagem, precisa ser antes de tudo discutida previamente no
ambiente escolar. Adotando o princípio de que toda atividade é coletiva,
presume-se que o ensino se estruture na intenção de resolver uma
situação, de acordo com a diversidade de aprendizagens dos sujeitos. É
nesse âmbito que Moura (1996) apresenta o conceito de Atividade
Orientadora de Ensino (AOE).
A atividade de ensino que respeita os diferentes
níveis dos indivíduos e que define um objetivo de
formação como problema coletivo é o que
chamamos de atividade orientadora de ensino. Ela
orienta o conjunto de ações em sala de aula a partir
de objetivos, conteúdos e estratégias de ensino
negociado e definido por um projeto pedagógico.
Contém também elementos que permitem à criança
apropriar-se do conhecimento como um problema.
E isto significa assumir o ato de aprender como
significativo tanto do ponto vista psicológico
quanto de sua utilidade (MOURA, 1996, p.32).
Durante a atividade de ensino, mediada pela AOE, na solução dos
problemas, podem surgir novos elementos devido aos diferentes níveis de
conhecimentos dos indivíduos, o que não implica na modificação dos
objetivos a todo momento do ensino. A interação se torna importante para
revelar os conceitos contidos no problema. Segundo o autor,
54
Ela deverá permitir tornar coletivo aqueles
conhecimentos adquiridos pelos vários sujeitos em
suas realidades sociais específicas, de modo que
todos possam perceber o conhecimento como um
bem comum e mais útil quando assumido
coletivamente como conjunto de saberes que
permite leitura e intervenção objetiva nas naturezas
física e social (MOURA, 1996, p.33).
Para Libâneo (2004), a organização do ensino precisa incluir
tarefas, ações de aprendizagem, de acompanhamento e avaliação, com
vistas ao desenvolvimento do pensamento teórico em relação ao objeto
de estudo. O ensino é de fundamental importância no processo de
assimilação de conceitos, por parte do estudante, e na generalização do
conhecimento para outras situações. Assim como qualquer atividade, o
ensino tem função de criar no sujeito a necessidade de uma nova tarefa,
de buscar um conhecimento novo. E, ainda, propiciar ao aluno o
desenvolvimento da autonomia na ação de estudo. Ou seja, a capacidade
de realizar a tarefa de estudo de maneira independente, ascendendo o
processo de assimilação. Assim sendo, o aluno torna-se capaz de se
apropriar, reproduzir e recriar conhecimentos. O domínio, de modo ativo,
dos conhecimentos elaborados historicamente, supera a condição na qual
o estudante se encontra, gera seu desenvolvimento e forma-o ser humano.
3.3 TEORIA DA ATIVIDADE E ORGANIZAÇÃO DO ENSINO
As formulações da Teoria da Atividade, elaboradas por Leontiev,
desencadearam investigações sobre a organização do ensino com vistas
ao desenvolvimento do pensamento teórico. O momento histórico vivido
pelo ensino tem refletido o pensamento de sociedade que vem sendo
promulgado entre gerações. Compreende-se que o cenário educacional do
Brasil assemelha-se com o ensino tradicional promovido durante muito
tempo nas escolas soviéticas. Estas, por muitos anos, tiveram o propósito
de ensinar aos filhos dos trabalhadores somente aqueles conhecimentos e
habilidades – escrever, contar, ler - indispensáveis para o exercício da
profissão que atendesse aos modos de produção capitalista (DAVÍDOV,
1987).
Nesse sentido, o ensino propicia aos estudantes o desenvolvimento
do pensamento empírico que consiste em formar um conceito definindo
suas características imediatas, a partir de um “conjunto de traços e
55
atributos do objeto que permitem compreendê-lo somente em sua
aparência, não revelando suas conexões internas e essenciais”
(LIBÂNEO E FREITAS, 2013, p. 336).
Nesse âmbito, Davídov (1988) destaca que a organização do
ensino necessita estar formulada de modo que possibilite a apropriação
dos conhecimentos científicos. Para ele, o conhecimento teórico é o
conteúdo da atividade de estudo que é apropriado durante a resolução de
tarefas por meio de ações especiais (DAVÍDOV, 1988).
Seguindo alguns preceitos de Leontiev, Davídov (1988, p. 11)
entende a atividade humana formada por uma estrutura complexa,
composta por elementos que se apresentam em constantes relações e
transformações: “as necessidades, os motivos, as finalidades, as tarefas,
as ações e as operações”. Em sua concepção, são as necessidades e os
motivos que impulsionam os alunos para a apropriação do conhecimento
teórico, que é a base da atividade de estudo.
Desse modo, Libâneo e Freitas (2013, p. 332-333) indicam que, na
percepção de Davídov, o alcance do conhecimento teórico prevê a
organização e estruturação da atividade de estudo do aluno, pelo
professor, “de modo que ele realize abstrações e generalizações
conceituais, sendo capaz de utilizá-las na análise e solução de problemas
específicos da realidade envolvendo o objeto”. Para tal, o princípio geral
do objeto do conhecimento, tomado como conteúdo, deve ser expresso.
Mas, que princípios Davídov questiona por não levarem os
estudantes ao desenvolvimento do pensamento teórico? Quais aqueles
que ele estabelece para atingir tal finalidade? Nesse sentido, apresenta-se
as indicações do autor, em que expõe os princípios pertinentes ao ensino
tradicional e, em contrapartida, estabelece aqueles peculiares ao ensino
desenvolvimental.
Davídov (1987) e Davídov e Slobódchikov (1991) apresentam os
quatro princípios didáticos da escola tradicional: o caráter sucessivo da aprendizagem, a acessibilidade, o caráter consciente e o caráter visual,
direto ou intuitivo do ensino.
O caráter sucessivo, de acordo com Davídov (1987, 1991),
expressa a conservação dos conteúdos da pré-escola na escola primária.
Para ele, os conhecimentos tratados na escola nesses períodos se
aproximam daqueles recebidos pelos estudantes antes de entrar na escola
- os conhecimentos cotidianos – levando a não diferenciação entre os
conceitos científicos e cotidianos.
A crítica de Davídov a esse princípio incide por não apresentar
mudanças internas do conteúdo e da forma de ensino, na passagem de um
56
nível de instrução a outro, uma vez que há somente alterações no volume
de conhecimentos recebidos pelos estudantes (DAVÍDOV, 1987).
O princípio da acessibilidade consiste na organização das
disciplinas de acordo com aquilo que os estudantes são capazes de se
apropriar em determinada idade. No entanto, Davídov (1987) questiona
quem e como se pode definir com precisão a medida desta capacidade.
Para ele, a verificação das capacidades considera apenas as condições
espontâneas das crianças. Em outras palavras, a organização desse ensino
utiliza somente as possibilidades psíquicas já formadas e presentes na
criança, o que limita os conteúdos do ensino e as exigências que se criam
em correspondência com o nível real (DAVÍDOV, 1987; DAVÍDOV E
SLOBÓDCHIKOV, 1991).
Pelo princípio de caráter consciente, o conhecimento apresenta-se
em forma de abstrações verbais que carecem de correlações com uma
imagem sensorial. As ilustrações são utilizadas para medir a compreensão
do conhecimento do estudante. Os conhecimentos adquiridos pelos
estudantes são reduzidos à relação de significados das palavras com suas
respectivas imagens sensoriais. Esse movimento constitui um dos
mecanismos internos do pensamento empírico (DAVÍDOV, 1987).
O último princípio, caráter visual, direto ou intuitivo, apresenta
características que, segundo Davídov, refletem propriedades externas
dadas sensorialmente. Tais características são:
1) na base do conceito se encontra a comparação
da multiplicidade sensorial das coisas; 2) tal
comparação leva a separar os traços parecidos,
comuns destas coisas; 3) a fixação desse comum
por meio da palavra leva à abstração como
conteúdo do conceito (as representações sensoriais
sobre estes traços externos constituem o verdadeiro
significado da palavra); 4) o estabelecimento das
dependências de gênero e espécie de tais
conceitos (segundo o grau de generalidade dos
traços) constitui a tarefa fundamental do
pensamento, o que interage regularmente com a
sensibilidade como sua fonte (DAVÍDOV, 1987, p.
148-149, grifos do autor. Tradução nossa)3.
3 1) en la base del concepto se encuentra la comparación de la multiplicidad
sensorial de las cosas; 2) tal comparación lleva a separar los rasgos parecido,
comunes de estas cosas; 3) la lijación de eso común por médio de la palavra
lleva a la abstracción como contenido del concepto (las representaciones
57
Para o autor, esse princípio é consequência da orientação da escola
tradicional que, com sua estrutura, conteúdo e método, proporciona aos
estudantes somente o desenvolvimento do pensamento empírico
(DAVÍDOV, 1987).
Os princípios assinalados anteriormente, nas visões de Davídov
(1987) e Davídov e Slobódchikov (1991), não atendiam as expectativas
da nova sociedade formada na URSS. Essa verificação deu-se mediante
constatação de que “a orientação unilateral para o pensamento empírico
faz com que muitas crianças não recebam na escola os meios e
procedimentos do pensamento científico, teórico” (DAVÍDOV, 1987, p.
149).
Assim como outras esferas, o sistema de ensino público vivia um
momento de renovação/reconstrução. O ensino começa a atuar como fator
essencial para o progresso econômico, social e de renovação espiritual.
Nesse âmbito, Davídov e Slobódchikov (1991) indicam que a essência e
a finalidade do novo ensino estão no desenvolvimento das capacidades
gerais e na aquisição dos procedimentos universais da atividade.
A constituição dos objetivos para a nova organização do ensino
visa o desenvolvimento da personalidade do homem. Esses se
concretizam, de acordo com DAVÍDOV E SLOBÓDCHIKOV (1991, p.
118), pela aquisição de características como “uma posição cívica
consciente, a preparação para a vida, o trabalho, a criatividade social a
participação na autogestão democrática e a responsabilidade pelos
destinos do país e da civilização”4.
Os autores argumentam que:
O ganho de tais objetivos está relacionado com a
fundamentação filosófica-metodológica,
científico-metodológica, tecnológica e
organizativa do ensino ininterrupto, da sucessão e
inter-relação de todos seus nexos. Isto pressupõe o
cultivo do novo pensamento pedagógico, com sua
orientação é possível determinar a problemática
sensoriales sobre estos rasgos externos cosntituyen el verdadeiro significado de
la palavra); 4) el estabelecimento de las dependecias de género y espécie de
tales conceptos (según el grado de generalidade de los rasgos) constituye la
tarefa fundamental del pensamento, el que interactúa regularmente com la
sensibilidade como su fuente. 4 Una posición cívica consciente, la preparación para la vida, el trabajo, a
creatividad social la participación em la autogestión democrática y a
responsabilidade por los destinos del país y de la civilización.
58
das investigações psicopedagógicas
contemporâneas, estruturar projetos, programas e
tecnologias de novos sistemas didático-educativos,
utilizar rapidamente os resultados obtidos na
prática escolar (DAVÍDOV; SLOBÓDCHIKOV,
1991, p. 118)5.
Davídov (1987) anuncia que o ensino com vistas ao
desenvolvimento do pensamento teórico precisa atender o princípio da
cientificidade ou de caráter científico, que é é compreendido, na escola
tradicional, de forma “estreitamente empírica e não em sua verdadeira
significação dialética; ou seja, não como procedimento especial de reflexo
mental da realidade” DAVÍDOV, 1987, p. 149). Assim, esse princípio
apenas se declara, mas não traduz o movimento do pensamento de
ascensão do abstrato ao concreto. Tal movimento, se constitui por meio
de abstrações e generalizações teóricas, que “não se apoiam na
comparação de coisas formalmente iguais, mas na análise da relação
essencial do sistema estudado e sua função dentro do sistema”
(DAVÍDOV, 1987, p. 149).
Segundo Davídov (1988), a revelação da relação essencial se dá
mediante a um procedimento analítico que caracteriza o movimento de
redução do concreto ao abstrato6. Isso significa dizer, que no processo de
análise o pensamento busca separar, dentro das relações peculiares, o que
tem caráter universal, que expressa a base genética do todo estudado.
Nesse âmbito, para que o princípio do caráter científico seja
atingido e para que seja possível a formação de abstrações e
generalizações teóricas, o ingresso na escola deve apresentar novidades
quanto ao conteúdo, agora científico, como também, as formas de operar,
que precisam ser diferentes das vividas no nível escolar anterior
(DAVÍDOV, 1987).
5 El logro de tales objetivos está relacionado com la fundamentación filosófico-
metodológica, científico-metodológica, tecnológica y organizativa de la
ensenãnza ininterrompida, de la sucessión e interrelación de todos sus
eslabones. Esto presupone el cultivo del nuevo pensamento pedagógico,
orientándose por el cual es posible determinar la problemática de las
investigaciones psicopedagógicas contemporâneas, estructurar proyectos,
programas y tecnologias de nuevos sistemas didáctico-educativos, utilizar
rapidamente los resultados obtenidos en la prática escolar. 6 Para aprofundamentos indica-se os estudos de: Freitas (2016); Matos (2017) e
Santos (2017).
59
Diante do exposto, Davídov (1987) e Davídov e Slobódchikov
(1991) propõem novos princípios para a estruturação do conteúdo do
ensino escolar. Inicialmente, orientam a transformar o princípio da acessibilidade em princípio da educação capaz de desenvolver. Trata
de estruturar o ensino com a finalidade de criar nos estudantes as
condições e premissas do desenvolvimento psíquico, pertinentes às
exigências da escola futura (DAVÍDOV; SLOBÓDCHIKOV, 1991).
O princípio de caráter consciente tem sua oposição retratada pelo
princípio da atividade. O argumento se dá mediante o entendimento de
que o caráter consciente é concretizado se o estudante não receber os
conhecimentos prontos. O processo de atividade permite a transformação
dos objetos, com o intuito de modelar e recriar as propriedades internas
que se convertem em conteúdo do conceito. Nesse sentido, a nova
organização do ensino possibilita revelar as condições de origem dos
conceitos, e não suas determinações (DAVÍDOV; SLOBÓDCHIKOV,
1991).
O princípio do caráter visual, direto ou intuitivo, é contraposto
pelo princípio do caráter objetal. Esse princípio indica as ações
específicas que serão necessárias para realizar com os objetos a fim de
revelar o conteúdo do futuro conceito e de representá-lo em forma de
modelos materiais, gráficos e verbais (DAVÍDOV; SLOBÓDCHIKOV,
1991).
Os dois princípios distinguem-se pela relação entre o particular e o
geral. Enquanto o caráter visual parte de casos particulares para encontrar
o geral, o princípio do caráter objetal possibilita que os estudantes
descubram o conteúdo geral do conceito para, na sequência, identificar as
suas manifestações particulares. Em outras palavras, há o movimento do
universal para o particular (DAVÍDOV; SLOBÓDCHIKOV, 1991).
Os princípios propostos por Davídov, para o ensino, possibilitam
o indivíduo se apropriar do conhecimento científico mais elaborado,
produzido pela humanidade. Em outras palavras, possibilitam o
desenvolvimento do pensamento teórico. Vale relembrar que o
pensamento teórico é tido por Davídov como conteúdo da atividade de
estudo (DAVÍDOV, 1988, 1987).
Para tanto, faz-se necessária a organização da atividade de estudo
dos estudantes de modo que contemple a finalidade de desenvolvimento
do pensamento teórico por vias de investigação. Tal atividade se estrutura
“em correspondência com o procedimento de exposição dos
conhecimentos científicos, com o procedimento de ascensão do abstrato
ao concreto” (DAVÍDOV, 1988, p. 173).
60
Para o autor, a organização da atividade de estudo se constitui de:
tarefas de estudo, ações de estudo e tarefas particulares. As tarefas de
estudo demandam a busca de algo, de uma finalidade. Por exemplo,
Davídov (1988) propõe como tarefa de estudo para o primeiro ano escolar
a apropriação consubstanciada do conceito teórico de número como
relação entre grandezas, por parte dos estudantes.
Nesse sentido, a necessidade da atividade de estudo instiga os
estudantes a apropriação dos conhecimentos teóricos, assim como os
motivos levam a apropriação dos “procedimentos de reprodução dos
conhecimentos por meio de ações de estudo, dirigidas a resolver as tarefas
de estudo” (DAVÍDOV, 1988, p. 178).
Davídov (1988, p. 178) define tarefa como “unidade do objetivo
da ação e as condições para alcança-lo”. Ele indica as exigências da tarefa
de estudo aos estudantes:
1) a análise do material fático com o fim de
descobrir nele certa relação geral que apresenta
uma vinculação sujeita à lei com as diferentes
manifestações deste material, ou seja, a construção
da abstração e da generalização substanciais; 2) a
dedução, sobre a base da abstração e da
generalização, das relações particulares do material
dado e sua união (síntese) em certo objeto integral,
ou seja, a construção de sua ‘célula’ e do objeto
mental concreto; 3) o domínio, neste processo
analítico-sintético, do procedimento geral da
construção do objeto estudado7.
Ao conceituar tarefa de estudo, Davídov (1988) apresenta que o
objetivo principal da Matemática escolar é compreensão do conceito de
número real, cuja base é a relação entre grandezas. Para tanto, o ponto de
partida é o “[...] domínio do conceito de grandeza e do estudo de suas
principais propriedades” (DAVÍDOV, 1988, p. 208). Tais propriedades -
7 1) el análisis del material fáctico con el fin de descubrir en él cierta relación
general que presenta una vinculación sujeta a ley con las diferentes
manifestaciones de este material, es decir, la construcción de la abstracción y
de la generalización sustanciales; 2) la deducción, sobre la base de la
abstracción y la generalización, de las relaciones particulares del material dado
y su unión (síntesis) en cierto objeto integral, es decir, la construcción de su
“célula” y del objeto mental concreto; 3) el dominio, en este proceso analítico-
sintético, del procedimiento general de construcción del objeto estudiado
(DAVÍDOV, 1988, p. 178-179).
61
igual, maior e menor - se revelam por meio da relação entre as grandezas:
comprimento, volumes, massa, intervalo de tempo, etc.
Para Davídov (1988), durante a resolução da tarefa de estudo, os
estudantes se apropriam dos conhecimentos e com isso desenvolvem o
pensamento teórico. Para tanto, o desenvolvimento de uma tarefa de
estudo consiste em sua resolução, pelos alunos, por meio de seis ações de
estudo:
transformação dos dados da tarefa a fim de revelar
a relação universal do objeto estudado;
modelação da relação universal na unidade das
formas objetal, gráfica ou por meio de letras;
transformação do modelo da relação para estudar
suas propriedades em “forma pura”;
construção do sistema de tarefas particulares para
resolver por um procedimento geral; controle sobre
o cumprimento das ações anteriores;
avaliação da assimilação do procedimento geral
como resultado da solução da tarefa de estudo dada
(DAVÍDOV, 1988, p. 181)8.
Cada ação de estudo é desenvolvida por um conjunto operações e
de tarefas particulares que se modificam mediante as condições concretas
de resolução de uma ou outra tarefa de estudo. Incialmente, os estudantes
não realizam as ações para resolver as tarefas de forma autônoma. Aqui
se apresenta a importância do direcionamento do professor durante a
resolução (DAVÍDOV, 1988).
Davídov esclarece cada uma das seis ações propostas para o
desenvolvimento da tarefa de estudo. A primeira, considerada por ele
como a principal, corresponde a transformação dos dados da tarefa de
estudo, que tem a finalidade de revelar/descobrir “certa relação universal
do objeto dado, o que deve ser refletido no correspondente conceito
teórico” (DAVÍDOV, 1988, p. 182).
8 tranformación de los datos de la tarea con el fin de poner al descubierto la
relación universal del objeto estudiado; modelación de la relación diferenciada
en forma objetal, gráfica ou por medio de letras [literal]; transformación del
modelo de la relación para estudiar sus propriedades en “forma pura”;
construcción del sistema de tareas particulares a resolver por un procedimento
general; controle sobre el cumplimiento de las acciones anteriores; evaluación
de la asimilación del procedimiento general como resultado de la solución de
la tarea de estudio dada (DAVÍDOV, 1988, p. 181).
62
A segunda ação de estudo é a constituição de um modelo gráfico,
objetal e com letras da relação universal revelada. O conteúdo do modelo
deve refletir as características internas do objeto, não observáveis de
maneira direta, de modo que permita sua análise posterior (DAVÍDOV,
1988).
A terceira ação consiste em transformar/reconstruir o modelo com
a finalidade dos alunos estudarem as propriedades da relação universal do
objeto que havia sido revelada. As transformações do modelo se
apresentam como processo pelo qual se estudam as propriedades da
abstração substancial da relação universal (DAVÍDOV, 1988).
Na quarta tarefa, os estudantes concretizam a tarefa de estudo
inicial, convertendo-a a um sistema de tarefas particulares resolvidos por
um procedimento único, assimilado nas ações de estudo anteriores. Nessa
ação os estudantes separam em cada tarefa a relação geral e as resolvem
pelo procedimento geral (DAVÍDOV, 1988).
A quinta ação corresponde ao controle, que consiste em determinar
relações com outras ações de estudo para que a execução das tarefas
ocorram de forma correta. Rosa (2012, p. 63) aponta que a função
principal da ação de controle é “assegurar que este procedimento geral da
ação tenha todas as operações indispensáveis para que o estudante resolva
exitosamente a diversidade de tarefas concretas particulares”.
A sexta ação de estudo – avaliação da assimilação do procedimento
geral como resultado da solução da tarefa de estudo dada – consiste em
determinar se o procedimento geral de solução da tarefa de estudo dada
está sendo apropriado e em que medida e, ainda, se as ações de estudo
correspondem com o objetivo final (DAVÍDOV, 1988).
Os pressupostos da Teoria da Atividade e os princípios referentes
à organização do ensino que gera o desenvolvimento do pensamento
teórico se constituíram em fundamentos para a organização e análise de
uma sequência de tarefas – para o ensino do conceito de Medidas de
Tendência Central – que segue a primeira e a segunda ação de estudo
propostas por Davídov (1988), explicitadas anteriormente. Na efetivação
dessas ações, atendendo o chamamento de Davídov (1988) de que
devemos colocar o estudante diante das produções mais atuais da
humanidade, adota-se como operação essencial na resolução das tarefas
particulares o uso da Lousa Digital.
A partir das considerações apresentadas sobre o modo
davydoviano de organização do ensino, parte-se para o terceiro capítulo
da dissertação. Como a preocupação no presente estudo é adoção da
Lousa Digital na organização do ensino de Medida de Tendência Central,
uma questão se apresenta: Que concepção de Tecnologia é pertinente com
63
a Teoria Histórico Cultural? Para tanto, no próximo capítulo, essa questão
será alvo de explicitações.
64
4 TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NA
EDUCAÇÃO
Neste capítulo abordam-se aspectos das Tecnologias da
Informação e Comunicação (TIC) que se relacionam com o interesse e as
necessidades deste estudo. Para tanto, o capítulo divide-se em quatro
seções. A primeira, trata do conceito de Tecnologia na visão do filósofo
brasileiro Álvaro Vieira Pinto, considerada a que mais se aproxima das
pretensões teóricas do presente estudo. A segunda seção, em consonância
com a concepção anterior, apresenta os pressupostos da abordagem
sociotécnica, com contribuições teóricas de Joana Peixoto e Brigitte
Albero. Na terceira, explicita-se o cenário das tecnologias no contexto
contemporâneo, cujos autores relacionam suas análises com os processos
educativos. Para este estudo, a opção foi pelo recurso tecnológico da
Lousa Digital (LD), por isso pontua-se suas funcionalidades e aplicações
audiovisuais. Nesse caso, a LD se apresenta como uma operação para o
desenvolvimento das tarefas de estudo sobre Medidas de Tendência
Central.
4.1 CONCEITO DE TECNOLOGIA POR ÁLVARO VIEIRA PINTO
Para discutir a questão das TIC na educação faz-se necessário
conhecer as formas de compreensão do conceito de Tecnologia. Para tal,
buscou-se um autor que trata este conceito de forma dialética que, para
essa pesquisadora, se aproxima das perspectivas da Teoria da Atividade.
Por isso, o autor elencado foi o filósofo brasileiro Álvaro Vieira Pinto. A
escolha deu-se pelo seu vasto estudo feito pelo autor acerca das visões
encontradas em diferentes períodos sobre Tecnologia. Contudo, em suas
ênfases de determinados pressupostos sinaliza-se para aqueles pertinentes
a Teoria da Atividade. Um deles, que vale explicitação é de que a técnica
ou qualquer produção humana vincula-se à realidade objetiva.
Em seu livro “O Conceito de Tecnologia”, ele analisa quatro
significados frequentemente encontrados sobre o termo: tecnologia como
ciência da técnica; tecnologia equivalente a técnica; tecnologia como
conjunto de técnicas e ideologia da técnica. O quarto sentido tem
fundamental importância para ele pois aborda o conceito como forma de
dominação pelo capital.
O primeiro sentido de tecnologia abordado por Vieira Pinto (2005)
traz a terminologia como ciência que estuda a técnica. Ou seja, a
65
possibilidade de discutir os vários entendimentos de técnica, sejam as
habilidades do fazer, as profissões do homem, as noções das artes, e como
ele enfatiza, das formas de produzir algo. Salienta que, se a técnica é um
ato produtivo humano, então, requer reflexões e análises teóricas,
conforme se verifica na seguinte citação:
Se a técnica configura um dado da realidade
objetiva, um produto da percepção humana que
retorna ao mundo em forma de ação, materializado
em instrumentos e máquinas, e entregue a
transmissão cultural, compreende-se tenha
obrigatoriamente de haver ciência que o abrange e
explora, dando em resultado um conjunto de
formulações teóricas, recheadas de complexo e rico
conteúdo epistemológico (VIEIRA PINTO, 2005,
p. 221).
Na concepção de Viera Pinto (2005), a tecnologia como ciência
articula as várias reflexões sobre a técnica que está, para ele, dispersa em
vários campos, estabelecendo um foco de estudos para evitar a
fragmentação. O autor apresenta alguns tópicos indispensáveis para
elaboração da teoria geral da técnica:
(a) a classificação das técnicas; (b) a história das
técnicas; (c) a rentabilidade das técnicas, ou seja, o
exame da contribuição trazida para o aumento
quantitativo e qualitativo dos bens que originam;
(d) o papel das técnicas na organização das relações
entre os homens, ou seja, a função social da técnica
e sua direção, inclusive agora por meios
cibernéticos, com o fim de melhores condições de
vida para a humanidade (VIEIRA PINTO, 2005, p.
236).
Evidencia que, ao estudar esses tópicos, o pesquisador deve se ater
na investigação dos interesses a quem obedecem e aos propósitos que
estão vinculados. Sendo assim, essa análise não pode ser de forma
ingênua, mas com consciência crítica. E, ainda, salienta que é preciso se
atentar às produções já elaboradas sobre o tema, pois mesmo que tenham
grande contribuição, podem ser reflexões de autores que concebem a
técnica como coisa em si, refletindo o pensamento dos dominantes
66
(VIEIRA PINTO, 2005). Para o autor, quando os estudos são elaborados
por quem tem o entendimento típico de dominação:
A teoria ou não chega a ser cogitada ou, quando há
tentativas de esboçá-la, não se desentranha dos
objetos, fica colada a eles, e jamais se eleva ao grau
de abstração requerido para ganhar universalidade
da verdade. E sobretudo não se inclui na teorização
a relação entre técnica, ou ato graças ao qual o
homem fabrica um objeto exterior a si, e o efeito
exercido na constituição do homem (VIEIRA
PINTO, 2005, p. 237).
Para ele, a origem da técnica não é algo imediato, pois deriva da
relação produtiva do homem com a natureza. É a mediação das ações
humanas, diretas ou por instrumentos, na concretização da finalidade
concebida para com a natureza. Trata-se do ato de produzir ou preparar
os meios necessários para atingir a finalidade de solucionar problemas.
A importância da criação dessa ciência se dá pela possibilidade da
técnica libertar o ser humano da servidão à classe dominante. Quando
eram poucos os recursos tecnológicos, escravizavam a massa
trabalhadora, com uso da sua força muscular para realização de trabalhos
penosos.
A técnica tende a desempenhar necessariamente,
na perspectiva do processo histórico global,
embora por meio de numerosas situações
momentâneas e tópicas regressivas, um papel
libertador do homem, sendo cada vez menor a
possibilidade de emprego dela como arma de
opressão das massas (VIEIRA PINTO, 2005, p.
170).
Segundo Vieira Pinto (2005, p. 171), essa libertação não ocorre
quando se imagina e se descreve “situações como se não houvessem
regime social de produção e as máquinas subsistissem por si,
funcionassem sozinhas, produzindo para ninguém”. Se assim for, trata-se de uma intencional armadilha ideológica, pois modifica-se o ponto final
para os bens produzidos, ao invés de suscitar a reflexão sobre os
destinatários de tais bens (VIEIRA PINTO, 2005).
Em suma, para o autor (2005, p. 243), sua “libertação seria
conquistada por meio do desenvolvimento da consciência crítica do ser
67
humano, que por sua vez seria proporcionada pela epistemologia da
técnica”. Dessa forma, “a compreensão da tecnologia só pode ser verídica
quando se funda sobre a noção da historicidade constitutiva do homem, e
consequentemente do trabalho” (VIEIRA PINTO, 2005, p 243).
Na abordagem do segundo significado, o autor menciona a
tecnologia entendida como sinônimo da técnica ou, ainda, a própria
técnica, sendo este o sentido comumente utilizado, em que os termos são
equivalentes em seus significados. Vieira Pinto (2005) faz menção ao fato
de que o termo tecnologia é usado pelos detentores do poder. Muitas
vezes, os próprios executores de atos técnicos, para atribuir prestígio a
técnica, ligam somente ao ato de executar.
Sob o nome da ‘técnica’, as atividades profissionais
tradicionalmente se apresentam a título de
exercício de atos produtivo úteis, mas esta maneira
de falar não encontra favoravelmente acolhimento
por parte de certos especialistas, principalmente
diretores, desses misteres, que desejam mantê-los
com suficiente frouxidão de limites para acolherem
qualquer indivíduo, mesmo sob a mais vaga das
qualificações (VIEIRA PINTO, 2005, p.254).
De acordo com Vieira Pinto (2005), todos somos técnicos em
alguma coisa, com atribuição para si de supostos títulos profissionais.
Esta situação alia-se à complacência de cargos superiores, que veem na
situação a oportunidade de expressar, mesmo que falsamente, “a
impressão de estar melhorando sua ‘tecnologia’, isto é, atualizando os
processos de trabalho, racionalizando os serviços ou a produção”
(VIEIRA PINTO, 2005, p. 255).
O autor observa que, ao igualar a tecnologia à técnica, acaba por
associar ao termo inglês know how. Contudo, essa equivalência é
entendida por Vieira Pinto (2005, p. 256) como “a porta aberta para a
alienação cultural”. Isso porque se o termo tecnologia se confunde com a
representação da técnica estrangeira, surge a necessidade de equiparação
com a tecnologia encontrada externamente que seria superior a nacional,
o que desencadeia problemas no desenvolvimento do país.
O terceiro significado, a tecnologia como conjunto de técnicas,
segundo o autor, é entendida como o conjunto de todas as técnicas
produzidas historicamente pelo homem, que estariam ligadas ao grau de
avanço de uma sociedade. Para Vieira Pinto (2005), não há uniformidade
do progresso tecnológico nas sociedades. Existe sempre aqueles que
68
possuem predomínio das técnicas de etapas passadas (às vezes, arcaicas),
outras que estariam no centro da escala evolutiva e as que constituem o
mais alto grau de avanço tecnológico.
Para ele, uma sociedade é considerada desenvolvida de acordo com
o seu grau de progresso tecnológico. Dessa forma, regiões não
tecnológicas se veem obrigadas a buscarem o mesmo progresso daquelas
com o desenvolvimento considerado elevado. Para tanto, compram do
mercado internacional, pois não podem, por meios próprios, “criar a
tecnologia superior” (VIEIRA PINTO, 2005, p. 332).
Nesse âmbito, conforme Vieira Pinto (2005), as regiões
subdesenvolvidas, ao realizar a importação da tecnologia superior,
tornam-se financiadores do avanço da tecnologia de países desenvolvidos
que, por consequência, sempre avançam nas pesquisas, descobertas e
invenções. Por sua vez, nos países pobres, a tecnologia importada não
produz ‘resultados históricos’, o que acarreta em prejuízos internos, pois
deixa de observar suas peculiaridades e suas condições objetivas que não
incorporam ao processo produtivo. Seria o mesmo que tentar resolver
“por enxerto o que teria de ser resultado de uma semeadura” (VIEIRA
PINTO, 2005, p. 332).
O filósofo considera que a questão para resolver esse cenário
estaria no processo de produção. Vieira Pinto (2005, p. 335) argumenta:
“o que se tem de dar às massas trabalhadoras não é o resultado da
tecnologia, mas a própria tecnologia”, pois é no seu conhecimento que
cria consciência do próprio trabalho.
O autor chama a atenção de que toda sociedade possui diversidade
de tecnologia. Também, alerta que a definição de tecnologia como
conjunto das técnicas expõem o conceito a duas interpretações.
Uma, legítima, quando o conceito retrata a gama de
variedades diferentes de operações e concepções
tecnológicas existentes de fato na sociedade
subdesenvolvida. Outra, ingênua e por isso nociva,
a que desconhece a diversidade da realidade
tecnológica do mundo pobre e o define
unilateralmente, sinal infalível de ausência de
compreensão dialética, ou pela lamentada
rarefação dos estágios altos, e consequentemente
exigência exclusiva deles, ou pelo excessivo peso
atribuído aos níveis mais baixos, ignorando que se
estes existem com tal qualidade é porque, mesmo
nessa faixa, há outros relativamente superiores
(VIEIRA PINTO, 2005, p. 339).
69
Para Vieira Pinto (2005, p. 339), deve-se observar a
“multiplicidade dos graus de avanço tecnológico do país” para, então,
compreender os problemas e apresentar qualquer proposta para solucioná-
los. Ainda, destaca que a falta de consciência crítica pelo sujeito sobre a
natureza da tecnologia e sobre o papel que deveria exercer, cria
possibilidades de entender a técnica como uma ‘ideologia social’. Para o
autor, “O trabalhador sabe que a técnica da qual se utiliza tem por
finalidade a produção de bens”. Entretanto, a ideologização da técnica
acontece ao desligar suas bases materiais, que afasta “à compreensão da
natureza dialética da produção e à descoberta da função do homem como
único agente real de todo o processo” (VIEIRA PINTO, 2005, p. 290).
Assim, a técnica torna-se algo aparentemente divino sem causas
nem relações que leva os sujeitos a ignorem seus conhecimentos e
práticas. Por extensão, cria uma espécie de falsa consciência, ou seja, não
reconhece como um instrumento de transformação.
Em vez de se capacitarem de seu papel de obreiros
das necessárias transformações a imprimir à
sociedade a que pertencem, aceitam passivamente
a profissão de zeladores do conhecimento que não
criaram, de guardiões do instrumental e instalações
a eles não pertencentes, contentando-se em
constituir a legião de adeptos (VIEIRA PINTO,
2005, p. 291).
A partir desse momento, Vieira Pinto (2005) vê o homem, ao se
perder do papel de produtor de suas obras, passar a ter uma visão de
tecnologia como transformadora por si própria, como algo que explicaria
a realidade por si. Assim, tornam-se cada vez mais incapazes de
compreender a ideia de que
A técnica representa o nome dado à mediação
exercida pelas ações humanas, diretas ou armadas
de instrumentos, na consecução das finalidades que
o homem concebe para lutar contra as resistências
da natureza e a instituição nacional de relações
sociais de convivência (VIEIRA PINTO, 2005, p.
292).
Com a perda da consciência crítica, passa-se a reconhecer que as
ideias vindas de fora seriam a salvação para os problemas encontrados.
70
Supostamente, a tecnologia avançada seria um instrumento ilusório de
conquista da felicidade. Dessa forma, acomete-se novamente a busca pela
tecnologia estrangeira.
Essa ideologia cria a falsa consciência de busca do
desenvolvimento. Assim, permite o seu uso como arma para impor
determinados interesses políticos e econômicos. Como os países centrais
possuem mais recursos para pesquisa, eles estariam sempre a frente e
sendo os responsáveis pela única teoria tecnológica existente.
Dessa forma, seria uma espécie de legitimação de poder, pois eles
seriam uma sociedade superior em relação as demais, uma vez que
alcançou o mais alto grau de desenvolvimento. Isso gera, um círculo
vicioso de dominação, uma vez que a concentração do capital e do
conhecimento fica nas regiões centrais, que também transferem a
tecnologia para regiões menos desenvolvidas, como a periferia. Como foi
dito, os menos desenvolvidos continuam comprando para se equipararem
aos estrangeiros, que gera um consumo alienado. Por sua vez, os países
desenvolvidos usam o capital para gerar nova tecnologia, com o falso
propósito de solucionar o problema de todos.
Nesse sentido, toda oposição ao desenvolvimento tecnológico seria
considerada uma visão retrógada, pois a sociedade atual seria considerada
a melhor dos mundos, conhecida como “era tecnológica”, vista como uma
benção para a humanidade, principalmente, para as mais pobres.
Contudo, Vieira Pinto (2005, p. 298) frisa que os problemas dos
países subdesenvolvidos não se resolverão pela simples incorporação da
tecnologia, e com a extinção das antepassadas, “é preciso conservar,
dialeticamente falando, os fatores de atraso para fazê-los desaparecer,
substituindo por outros”. O autor afirma que a tecnologia tem um caráter
ideológico, mas sem um teor subjetivo, ou seja, sem a compreensão das
realidades e dos sujeitos que a utilizam, impondo verdades dos seus
criadores, dando-lhes um carácter existencial dominador, assim definido:
Daí o caráter existencial que lhe é inerente e ao qual
tem-se frequentemente aludido. A melhor prova
disso, encontramo-la justamente nas concepções
alienadas da tecnologia, unicamente merecedoras
deste qualificativo com relação ao pensamento do
país subjugado, porquanto para o outro, aquele que
originariamente as enuncia, nada mais são do que a
expressão correta da prática existencial do
dominador (VIEIRA PINTO, 2005, p. 322).
71
Ainda, sobre a transferência tecnológica, o autor considera que
todo avanço tecnológico de um centro, de nada valeriam se fossem
inseridos em outro meio e contexto histórico, talvez não fariam sentido
algum. Vieira Pinto (2005) chama atenção para as facilidades em, pelo
domínio das tecnologias, manipular grupos sociais que são considerados
‘atrasados’ em relação ao desenvolvimento tecnológico. Essa realidade
coexiste na sociedade contemporânea bem como anunciou o autor:
A ideia escolhida, com muita sagacidade, para
envolver a consciência despreparada ou cândida
dos personagens semiletrados, dos técnicos de
ofício e mesmo das camadas capacitadas das
massas trabalhadoras, foi a tecnologia (VIEIRA
PINTO, 2005, p. 305).
Em contrapartida, Vieira Pinto (2005) esclarece que uma
consciência crítica não resiste à existência das tecnologias e seus usos, ela
acolhe e promove o seu desenvolvimento, compreendendo as
transformações benéficas que ocorrem ao homem. Porém, não se
equivoca convertendo-a em ideologia.
O entendimento do termo ‘tecnologia’ permite compreender a
escolha da abordagem sociotécnica como referência para este estudo. A
seção seguinte consiste na apresentação das investigações realizadas da
referida abordagem.
4.2 ABORDAGEM SOCIOTÉCNICA
Nos tempos mais recentes, quando se trata de Tecnologias da
Informação e Comunicação ocorre a antagonização entre aspectos
técnicos e socioculturais. Essa separação impossibilita a compreensão da
relação estabelecida entre os sujeitos e o artefato, ao utilizá-lo como
instrumento para atingir suas finalidades. Para Peixoto (2015), é preciso
se embasar teoricamente sobre os fundamentos da aprendizagem para
compreender a relação entre tecnologia e educação.
Peixoto apresenta duas abordagens que permeiam o uso das TIC
na educação: a determinista e a instrumentalista. A primeira é considerada
como o determinismo tecnológico. Nesse caso, a tecnologia é entendida
como um sistema autônomo que estabelece os efeitos positivos ou
negativos na sociedade, ou seja, é considerada fator provocador de
72
mudanças sociais. Nessa visão, o sujeito não tem ação sobre as
tecnologias que surgem, pois elas já nascem configuradas para uma única
forma de operação, uma vez que condiciona à sociedade a qual está
inserida (PEIXOTO, 2015).
A autora completa que, nessa abordagem, “a tecnologia é vista
como um objeto cristalizado, como um conjunto de estruturas, de usos e
de práticas que se originam em sua própria concepção” (PEIXOTO, 2015,
p.321). Peixoto (2015) explica que essa visão entende as tecnologias
como instrumentos carregados de potencialidades próprias, o que basta
apenas utilizá-las para produzirem os efeitos desejados. Sendo assim,
tendem a culpar os sujeitos, no caso os professores, pela falta de interação
e dos resultados não serem satisfatórios ao desenvolver atividades com o
uso de TIC.
Para essa concepção, segundo Peixoto (2015), os avanços
tecnológicos serão garantia de justiça e democracia, pois desconsiderarão
as condições materiais e objetivas do modelo econômico vigente.
Contudo, Peixoto alerta que:
As tecnologias não são neutras. Elas exercem
efeitos sobre o meio social no qual foram
desenvolvidas, mas essa relação linear de causa e
efeito pode ser colocada em questão, uma vez que
as novas práticas estão ligadas a um passado,
baseadas em experiências que perduram e
continuam a se transmitir. Além disso, o sujeito que
utiliza tecnologias, por mais submisso que seja,
nunca é inteiramente passivo e imprime marcas de
sua condição material e subjetiva aos tipos de uso
que desenvolve individual e socialmente
(PEIXOTO, 2015, p. 322).
Na segunda abordagem, apresentada por Peixoto (2015), a
instrumental, a tecnologia é vista como instrumentos e recursos a serviço
dos sujeitos, que provocam diversos efeitos diferentes, dependendo da
forma de sua utilização. Essa concepção considera que os instrumentos
são neutros, pois corresponderão às situações em que forem impostas. E,
novamente o professor é colocado como responsável pelas consequências aos usos das TIC.
Diante da polarização sobre o uso das tecnologias, uma abordagem
considerada como sociotécnica é proposta por alguns autores, sobretudo
por Albero (2011) e Peixoto (2015). Essa abordagem “sugere uma
dialética constante entre técnica e lógica social, indicando que os limites
73
próprios das ferramentas não existem em si, mas só existem e se
manifestam por meio de sua utilização pelos sujeitos sociais” (PEIXOTO,
2015, p. 329).
Para Albero (2011), a abordagem sociotécnica funcionaria como
uma espécie de acoplamento entre técnica e atividade humana. Os estudos
dessa abordagem centram-se tanto nos objetos técnicos (artefatos),
considerados como suportes ou meios para atingir uma finalidade, quanto
na atividade e suas relações sociais, sem distinção entre suas funções e
seus usos. Os objetos técnicos fazem parte do corpo social, desde a sua
produção e seus usos, até mesmo os símbolos que eles carregam.
Nessa abordagem, os objetos técnicos são percebidos como
instrumentos cognitivos que “materializam modelos epistêmicos e
ideológicos particulares”, cuja análise ocorre mediante sua interação com
os sujeitos (ALBERO, 2011, p.232). Dessa forma, estabelecem conexões
entre as suas ações, seus contextos culturais e institucionais, com foco na
interação entre os elementos da atividade, da técnica e do ambiente, e não
em suas características individuais.
Os estudos recentes de Peixoto sobre tal abordagem propiciam a
compreensão de aspectos antes distintivos entre objetos e
conhecimento/aprendizagem. A autora considera que os objetos técnicos
são construtos sociais, portanto se desenvolvem nas interações entre
recursos e grupos sociais. Segundo Albero (2011, p. 235), “o instrumento
está ao mesmo tempo envolvido com o sujeito e com o objeto e, pela
atividade que os liga, com o ambiente natural e social dos usuários”.
Essa redefinição do instrumento possibilita observar não somente
materiais ou símbolos que compõem a atividade, mas também as suas
interações. Assim, as mídias, tecnologias, materiais didáticos e
pedagógicos, ferramentas metodológicas e técnicas profissionais tornam-
se significativos na ação do sujeito. Dessa forma, os recursos tecnológicos
constituem-se instrumentos ao serem apropriados e ou interiorizados
pelos sujeitos, isto se relaciona diretamente com seus esquemas internos
e as experiências culturais anteriores. Para tal, o instrumento converte-se
a componente funcional da ação ao invés de um recurso auxiliar
(ALBERO, 2011).
Peixoto conclui que,
Um artefato torna-se instrumento assim que se
torna mediador da ação para o sujeito. O artefato
não é, em si, um instrumento ou componente de um
instrumento; ele é instituído como instrumento pelo
sujeito, que lhe atribui status de meio para atingir
74
as finalidades de sua ação. E a apropriação é o
processo pelo qual o sujeito reconstrói, por si
mesmo, os esquemas de utilização de um artefato,
no decorrer de uma atividade significativa para ele
(PEIXOTO, 2011, p. 32).
Albero (2011) aponta para a necessidade de diferenciar os
conceitos de midiatização e de mediação. A midiatização diz respeito as
formas simbólicas ou procedimentos técnicos utilizados para tratar o
mesmo tipo de saber, ou seja, mudam-se os artefatos continuam os
métodos. Estes artefatos, como o papel, áudio, vídeo, Lousa Digital, não
traduzem aspectos, modos de apresentação ou estruturação da percepção
e do raciocínio. “A midiatização é, assim, específica ao tratamento
técnico das mensagens e dos processos cognitivos que ele provoca no
usuário” (ALBERO, 2011, p. 236). Para Peixoto (2011), essa
midiatização se refere a escolha das formas de comunicação, mídias e
ambientes técnicos mais adequados e adaptáveis ao processo pedagógico.
Por sua vez, o conceito de mediação, na visão de Albero (2011),
seria compreendido como a intervenção humana que considera o sentido
das mensagens e suas condições de produção: “interlocutores, contextos,
situações e múltiplos desafios da comunicação (diferenças
interindividuais, dificuldades cognitivas, sociais e relacionais, acidentes
e imprevistos, etc.)” (ALBERO, 2011, p. 236).
Para Albero (2011, p. 237), o ato de instrumentar não fica reduzido
à disponibilização de ferramentas técnicas, mas oferece, igualmente, aos
estudantes “meios para construir as ferramentas cognitivas (sensório-
motoras, perceptivas e conceituais) e a dinâmica psicológica de
autodesenvolvimento por meio da qual eles podem ser colocados em
posição de sucesso”. Dessa forma, o conceito de instrumentação torna-se
operatório, em conformidade com as perspectivas vigotskianas ao pensar
o objeto técnico como um artefato que ao mesmo tempo “midiatiza certos
processos cognitivos do sujeito, materializando-os, e os media,
facilitando-lhes” (p. 237).
Peixoto (2016) recorre aos estudos, especialmente de Marx e
Vigotsky, de base materialista-dialética, no intuito de esclarecer um
pouco mais o conceito de mediação. A autora apresenta que diversas
pesquisas vêm sendo realizadas com base na categoria mediação. No
entanto, ressalta que a apropriação do termo traz um certo esvaziamento
epistemológico. Expõe, ainda, alguns aspectos que referenciam a relação
das tecnologias com a educação, que foram levantados por meio das
revisões de literatura em pesquisas no período de 1996 até 2014. Entre
75
eles: maior referência a conceitos e categorias oriundos de teorias do
campo da comunicação; ênfase no recurso adotado em detrimento da
metodologia de ensino praticada; a crítica ao papel normatizador das
tecnologias, e ao mesmo tempo, favorável ao papel das tecnologias nas
questões de ordem didático-pedagógicas; associação automática entre a
utilização de tecnologias digitais em rede e a mudança da prática
pedagógica; atribuição à tecnologia do papel facilitador do trabalho
pedagógico.
A mediação, numa perspectiva dialética, segundo Peixoto (2016),
não sustenta a separação entre sujeito e objeto, entre teoria e prática, nem
se refere a algo que faz a ligação entre o sujeito e o objeto. Trata-se do
processo que envolve todos estes elementos e, ainda, o contexto
determinado: “A mediação é processo, não é o ato em que alguma coisa
se interpõe; mediação não está entre dois termos que estabelecem uma
relação. É a própria relação” (MOLON, 2000 apud PEIXOTO, 2016, p.
371). Completa que, para esta perspectiva,
A mediação é processo e não produto, envolve a
contradição como motor explicativo e afasta-se de
um dualismo fixo e estabilizado. [...] Nesse caso, o
objeto da mediação não é o saber ou aluno, mas as
relações entre sujeitos e objetos de conhecimento
(PEIXOTO, 2016, p. 373).
A autora salienta a importância de se libertar da racionalidade
instrumental que privilegia a tecnologia como fonte da solução dos
problemas humanos. Nesse sentido, explica a mediação em sua
complexidade:
O sujeito, o objeto, o intervalo entre um e outro e o
contexto no qual se estabelecem as múltiplas
relações entre estes elementos. Dito de outra forma,
a mediação inclui a linguagem, a tecnologia, o
professor, o aluno, o momento histórico. Todos
esses elementos compõem a mediação, mas não é a
coisa que media (PEIXOTO, 2016, p. 373).
Para Peixoto, essa abordagem trata a mediação como relação e
não como coisa ou objeto. Nesse sentido, é preciso compreender o que
“os alunos, como sujeitos sócio-históricos, fazem com as tecnologias no
processo de superação de conhecimentos imediatos para o alcance de
conhecimentos mais sistematizados” (PEIXOTO, 2016, p. 374). E, ainda,
76
compreender o que esse processo ocasiona no desenvolvimento das
funções mentais superiores.
4.3 OS ESTUDOS CONTEMPORÂNEOS SOBRE O USO DE
TECNOLOGIAS NO ENSINO
A sociedade, em todos os tempos, utiliza-se de meios tecnológicos
para satisfazer as necessidades que surgem no passar dos dias. Para
Sancho (1998), os modos de interação entre os indivíduos se modificam
constantemente, pois passam por processos de transformação na forma de
comunicação e de se manter informado, no que diz respeito as mais
diversas esferas sociais. Esse cenário se modifica, ao longo dos tempos,
devido ao contato direto com as mais diversas tecnologias criadas pelo
homem.
De acordo com a Liguori (1997), a forma que a informação é
tratada e transmitida se modifica ao longo da história da humanidade. Isso
ocorre desde o processo manual, passando pelo mecânico até chegar ao
automático. Ao tratamento manual, vincula-se uso de “marcas gravadoras
em madeira, tabuinhas e escrita alfabética” (LIGUORI,1997, p. 79). O
tratamento mecânico está associado com o surgimento da imprensa, no
ano de 1439, no Ocidente. O tratamento automático na atualidade com o
surgimento dos computadores (LIGUORI, 1997).
No século XVIII, na Europa, ocorrem transformações econômicas,
sociais e políticas que estimularam o desenvolvimento científico, que
alavancaram a produção tecnológica, caracterizadora da modernidade. De
acordo com Liguori (1997, p.80), nesse momento histórico, o saber
começa a responder de forma racionalmente técnica ou instrumental, de
modo que “o desenvolvimento e a utilização da tecnologia são o fator
determinante do progresso e da evolução da humanidade”.
No começo do século XX, com as máquinas a vapor que
possibilitaram o aumento da produção de bens e serviços e permitiram
seu rápido transporte, tornou-se possível a produção massiva e sistemática
de informação, tecnologia e conhecimento, com a função principal de
substituir e amplificar o trabalho mental do homem (LIGUORI, 1997).
Em todos os tempos, ocorreram diversas concepções e discussões
acerca da tecnologia. O termo Tecnologia Educativa tem suas origens em
torno de 1940, entendido como todo processo que envolve o ensino, desde
sua concepção até o desenvolvimento e avaliação de aprendizagem com
uso de instrumentos tecnológicos (MIRANDA, 2007; SANCHO, 1998).
77
Os estudos sobre Tecnologia Educativa perpetuaram-se, também
na década de 1950, que, segundo Maggio (1997) e De Pablos Pons (1998),
caracterizou-se pelo seu desenvolvimento centrado em modelos
instrutivos, com noções de estímulo e reforço, pois a referência era os
estudos sobre o ensino programado, de Skinner. Peres Gomes (1983 apud
MAGGIO, 1997, p.14) situa que, nesse momento histórico, fazia-se
comparação entre aparelhos e instrumentos aplicados a “todo ensino, a
todo aluno, a qualquer grau, para qualquer matéria e com qualquer
objetivo” para determinar qual meio era mais eficaz.
Na década de 1960, a psicologia torna-se meio para comprovar a
“incidência de diferentes métodos ou meios no processo de
aprendizagem” (MAGGIO, 1997, p.14). Para De Pablos Pons (1998),
nessa década, o desenvolvimento dos meios de comunicação de massas
(principalmente rádio e televisão) exerceram grande influência no meio
social. Logo, o meio educacional se inclui nesse processo. No fim dessa
década e início da década seguinte, constituiu-se uma visão ampla de
tecnologia educacional que, segundo Maggio (1997, p. 15) é
“caracterizada como conjunto de procedimentos, princípios e lógicas para
atender os problemas da educação”.
Essa visão supõe que a utilização de instrumentos melhorará o
ambiente educacional, possibilitando a substituição do professor,
aparecendo implicitamente o conceito de ensino como mera transmissão
de informação (MAGGIO, 1997). No entanto, a partir das palavras da
autora entende-se que, essa visão ampla não comprova a efetividade na
melhoria do sistema educacional, por intermédio da inclusão de meios
tecnológicos e, “persiste em sua intenção de controlar o processo de
ensino e aprendizagem” (MAGGIO, 1997, p. 15). Esse sistema, ao
conceber que os processos de aprendizagem precisam ser controlados,
geridos ou regulados, tem como objetivo único e exclusivo a regularidade,
a fim de eliminar a busca pela contradição como o modo de avançar no
conhecimento.
Para Liguori (1997), o meio educativo tem incorporado de forma
acrítica meios e métodos tecnológicos derivados de outros campos, como
o empresarial e o militar. Os conceitos e as valorizações da racionalidade
técnica ou instrumental, trazidos nessa importação, alastram a ideia
forçada de que a modernização da escola e a melhoria de seu ensino seria alcançada se baseada na inovação tecnológica. Para De Pablos Pons
(1998), o ensino assistido por computador é um exemplo dessa
importação, já que a informática é externa ao mundo educacional.
A função da escola, entendida por diferentes correntes teóricas, é
preparar as novas gerações para a incorporação no mundo do trabalho
78
(LIGUORI, 1997). Na percepção de Liguori (1997, p. 85), uma forma de
contribuir com essa preparação estaria em incorporar as novas tecnologias
como “conteúdos básicos comuns, proporcionando maior relação entre os
contextos de ensino e as culturas externas no ambiente escolar”.
Assim, as novas tecnologias da informação e comunicação
proporcionam um desenvolvimento acelerado do conhecimento. Para
Liguori (1997), nesse caso, o trabalho adquire novas formas de
organização. Pode-se observar mudanças na forma empregatícia, nas
condições de trabalho e exigências de qualificação profissional. Na nova
conjectura se faz necessário:
- a imprescindível especialização dos saberes,
dando lugar a figura do especialista;
- a colaboração transdisciplinar e interdisciplinar;
- o fácil acesso à informação (arquivos, bancos de
dados, etc.);
- considerar o conhecimento como valor precioso,
quantificável em termos de obtenção, de custo, de
utilidade, de produtividade e de transação na vida
econômica, etc. (LIGUORI, 1997, p. 83).
Para Lion, no tocante aos impactos sociais causados pela
incorporação das tecnologias, duas posturas divergentes se apresentam:
“existe quem defina a tecnologia como um elemento de controle e de
poder social, e existe quem lhe atribua força de transformar a mente
humana e a sociedade em seu conjunto” (1997, p. 29). Para a autora, o
primeiro vê a tecnologia como autônoma que substitui, gradativamente,
os sujeitos sendo necessário cada vez menos conhecimento e qualificação.
O segundo pensa que só pelo fato de incorporar a tecnologia já se tem
processo de inovação, pois, ao incorporar o novo, ocorre as
transformações.
Na mesma linha de pensamento, Miranda (2007) entende que a
primeira postura, a qual conceitua como ‘pessimista’, afirma que o
progresso tecnológico só beneficia uma minoria, pois gera desemprego,
reproduz a sociedade existente. A segunda postura, que avalia como
‘otimista’, vê surgir um novo tipo de sociedade, tendo o seu progresso
baseado na inovação tecnológica, que estimula a maior qualificação do
ensino para todos.
Lion (1997) explica que a tecnologia tem se tornado, para a
sociedade atual, um meio de dominação, de poder e controle social não
somente entre países, mas no interior das próprias escolas. Por intermédio
79
dos meios de comunicação tudo está a seu alcance sem precisar sair de
casa, o que reduz a atividade social e crítica.
Para Lévy (2000), a sociedade está condicionada às técnicas,
produzidas culturalmente. As novas invenções, que surgem meio a era
tecnológica, possibilitam que diferentes relações culturais se conectem e
desencadeiam transformações sociais inimagináveis, que não estão
limitadas à tecnologia. Estas oportunizam que mecanismos de mudanças
aconteçam, mas não promovem mudanças sociais, e sim os atores que
desfrutaram do processo técnico que criaram, produziram, consumiram.
Miranda (2007) completa ainda, que um fator importante a ser observado
é que as mudanças ocorridas socialmente, por meio das novas tecnologias,
não são provocadas por elas e sim pela própria sociedade. Porém, a
própria tecnologia é uma opção social. Dessa maneira, os problemas que
as envolvem, tanto na sociedade quanto na educação, não devem centrar-
se somente nas vantagens e desvantagens do seu uso (os problemas
técnicos), mas levar em consideração as questões ideológicas, políticas e
éticas que proporcionam.
Esses problemas agravam com a globalização, Lion (1997) ressalta
que as culturas têm se constituído de maneiras diferentes, com a criação
da falsa ideia de mundo sem fronteiras, interconectado. Entretanto, afirma
que o mundo não segue essa premissa, não há unificação de economias e
culturas.
A tecnologia acentua, antes, a barreira entre os que
podem e os que não podem ter acesso a ela,
especialmente produzi-la. Isto é uma coisa diária
para nós que trabalhamos em educação. Não
educamos na homogeneidade, mas na diversidade.
Sabemos que as crianças estão informadas, não
desconhecemos o poder dos meios de
comunicação, mas relativizamos sua influência. Os
“apocalípticos” proporcionam um ponto de vista
interessante. Colocam um freio num otimismo
desmesurado (LION, 1997, p.30).
Levando em consideração que as culturas são determinadas pelo
espaço, tempo e condições políticas, é preciso repensar o sentido de
tecnologia encontrado, pois ela “pertence ao acervo cultural de um povo"
e está em constante produção (LION, 1997, p.31). Para autora, essas
produções incluem significado e sentido cognitivo e completa que, para
Vygotsky, as Tecnologias da Comunicação são utensílios utilizados para
80
mediar as interações entre os sujeitos e com o ambiente, assim como os
signos e instrumentos culturais (LION, 1997).
A frequência de pessoas que usufruem dos benefícios das TIC, no
dia a dia, tem crescido em passos largos. Buckingham (2010) apresenta
que o primeiro contato com a tecnologia não acontece mais no âmbito
escolar como ocorreu por décadas. Assim como seus alunos, o docente
tem a necessidade de estar conectado com os mais novos e úteis
instrumentos tecnológicos.
De acordo com Miranda (2007), os sujeitos que trabalham com a
Tecnologia Educativa têm se preocupado, além dos recursos e avanços
tecnológicos, com os processos que determinam e melhoram a
aprendizagem. Alguns recursos técnicos têm sido inseridos nas práticas
das instituições para fins educativos, como é o caso das Tecnologia de
Informação e Comunicação (TIC).
O termo TIC tem origem na junção das tecnologias
computacionais e informáticas com as tecnologias telecomunicativas.
Pode ser considerado como um subdomínio da Tecnologia Educativa,
devido à utilização desses recursos técnicos serem direcionados à
melhoria da aprendizagem e ao desenvolvimento de ambientes. Entre
outras, o computador e a internet são os recursos com maior incidência de
utilização.
Para Litwin (1997), a TV e a informática na escola, por décadas
dão conta das discussões de integrar tecnologias as salas de aula. No
entanto, a sua introdução pode não ter sido qualitativa se não
proporcionou novas formas de abordagens reflexiva. Por vezes, a
melhoria da qualidade de ensino está relacionada ao conceito de inovação,
que propõe a utilização de novas tecnologias no processo educativo, ou
seja, uma nova proposta de ensino.
No entanto, há preocupação em se observar qual concepção de
ensinar e de aprender está contida nessa inovação. O mesmo ocorre em
outros estudos, como o de Miranda (2007), que tem refletido sobre a ideia,
encontrada atualmente, de que a introdução dos novos meios tecnológicos
mudará o modo dos professores ensinarem e dos alunos aprenderem, com
efeitos positivos na aprendizagem.
Para Lion (1997), usualmente, associou-se à modernização escolar
à incorporação de novas tecnologias, produzidas recentemente pelo
mercado, como, por exemplo: a informática, correio eletrônico,
hipertextos, multimídia, realidade virtual, entre outros. Na visão de
Liguori (1997), uma das ideias e estratégias mais utilizadas e aceitas,
atualmente, na docência, tem sido acrescentar à tecnologia as atividades
já existentes, por entender que o ambiente educacional se moderniza ao
81
incorporar as últimas produções tecnológicas. Esse contexto não tem
apresentado resultados positivos na aprendizagem dos estudantes.
Buckingham (2010) compreende que a educação tem se tornado
uma forma de entretenimento. Na tentativa de conquistar a atenção dos
estudantes, o investimento feito em softwares e jogos e a criação de
materiais educacionais tem aumentado consideravelmente. Contudo,
ressalta que, não é enfeitando os materiais de ensino que será atingido seu
objetivo. Esses atrativos não refletem o interesse dos sujeitos. Eles têm
sido desenvolvidos apenas para tornar a aprendizagem dos sujeitos mais
agradável.
As tecnologias móveis, segundo Moran (2013), trazem desafios de
organizar o processo de ensino e aprendizagem de forma interessante,
atraente e eficiente, com o aproveitamento de cada ambiente, presencial
e digital. Há um processo de interligação que ocorre, do mundo físico com
o digital, que proporciona novas formas de interação e possibilidades de
escolhas. “As tecnologias digitais facilitam a pesquisa, a comunicação e
divulgação em rede”, pois combinam os mais diferentes ambientes e
multiplicam os espaços (MORAN, 2013, p. 31).
Segundo Lévy (2000), a emergência do ciberespaço trouxe novas
ferramentas que promovem a quebra de limites entre gerações e,
constroem diferentes formas de interações entre indivíduos. Tal realidade
manifesta a necessidade de a escola integrar o uso das tecnologias ao seu
espaço, ao passo que as TIC são consideradas instrumentos de grande
valia no processo ensino aprendizagem.
Para Moran (2013), o mundo digital afeta todos os setores da
sociedade, desde produção, venda, até comunicação e aprendizagem. As
mudanças sociais proporcionam inúmeras possibilidades metodológicas
para o ensino e a aprendizagem, o que desencadeiam diferentes formas de
ensinar e aprender, desde formas novas até convencionais. Entretanto,
desconhece a real expressividade de aprendizagem com o uso constante
de tecnologias digitais. O autor complementa que há:
[...] escolas com poucos recursos tecnológicos e
bons resultados, assim como outras que se utilizam
mais de tecnologias. E o contrário também
acontece. Não são os recursos que definem a
aprendizagem, são as pessoas, o projeto
pedagógico, as interações, a gestão (MORAN,
2013, p. 11-12).
82
Para Buckingham (2010), o uso das tecnologias se apresentam
como um desafio para grande parte dos professores, no desenvolvimento
do seu trabalho docente. O cinema, o rádio, a televisão foram vistos como
revolucionários pelos defensores da tecnologia, com o argumento de que
trariam novas formas de aprendizado, que torna, por vezes, desnecessário
até o professor. Apesar disso, pesquisas críticas mostram a não evidência
de que os métodos de ensino, considerados como não Tecnológicos
Informativos e Comunicativos, sejam inferiores aos considerados como
tal.
De acordo com o autor, essa situação contribui para que
professores, depois de certo tempo em contato com essas ferramentas,
deixem as novas mídias de lado. Isso contraria as falas repetitivas de
defensores da tecnologia de que novas formas de aprendizagem passariam
a existir em sala de aula por meio dessas mídias (BUCKINGHAM, 2010).
Um dos motivos que também precisa ser levado em consideração
para as tecnologias não apresentarem bons resultados é, segundo Liguori
(1997), o fato de ela exigir reflexão e mudanças em suas concepções e
práticas de ensino. Pelo fato dessas reflexões exigirem certo esforço e
dedicação, grande parte dos docentes resistem em integrar as TIC ao seu
processo de ensino.
Litwin (1997, p. 9) acrescenta que o problema das inovações está
em desconhecer “a cultura da instituição, as características de seus
docentes e alunos, suas histórias, acertos e recusas”. Para a autora, no
início, as inovações pretendem substituir as práticas atuais por outras
novas e interessantes. Contudo, não provocam mudança substancial em
relação às práticas habituais, sendo contraditória com a cultura de sua
instituição e ainda difícil de implantar.
Na hora de pensar nas inovações, é importante
reconhecer a necessidade de criá-las nos contextos
educacionais específicos, a fim de que sua
implantação seja significativa, admitir sua
significação como proposta pedagógica, avaliá-las
como atrativas, mas reconhecer a concepção que
trazem para o ensino e a aprendizagem (LITWIN,
1997, p. 9).
Sancho (2006) afirma que o processo de incorporação das TIC não
deve ser desencadeado de cima para baixo. Há a necessidade do
envolvimento de todos os atores que fazem parte do processo educativo,
para evitar que se sintam usuários finais, ou seja, meros executores de
83
ideias alheias. Assim, cada escola propõe resoluções e alternativas de
acordo com seus próprios problemas.
Para Buckingham (2010), há outra preocupação, quanto o papel de
bloqueador exercido pelo professor. Além de permanecer conectado
apenas às tecnologias que lhe é conveniente, por estar familiarizado e que
não promovam qualquer tipo de perigo ao seu processo de ensino,
determinam como e onde seus alunos buscarão informações sobre o que
está sendo abordado em aula.
A maioria das aulas formais de ICT abrange apenas
rudimentos de recuperação de informações, junto
com processamento de texto e planilhas eletrônicas
simples. Alguns professores dão temas de casa
relacionados à web, mas estes, no geral, são
restritos à visitação de sites sugeridos. É claro que
há boas razões para tais limitações, mas não é de se
surpreender que muitas crianças considerem
maçante e frustrante este uso das ICTs nas escolas
(Levin; Arafeh, 2002; Selwyn, 2006). [...] Os
alunos com internet em casa têm a tendência, como
usuários dessa tecnologia, de desenvolver um forte
senso de autonomia e autoridade, e é exatamente
isso que lhes é negado na escola (BUCKINGHAM,
2010, p. 44).
Acrescenta: “as crianças estão hoje imersas numa cultura de
consumo que as situa como ativas e autônomas; mas na escola uma grande
quantidade de seu aprendizado é passiva e dirigida pelo professor”
(BUCKINGHAM, 2010, p. 44).
Nessa mesma perspectiva, Lion (1997) ressalta a importância de
discutir sobre o consumo e a produção tecnológica. Para a autora, inovar
não está em ser ‘consumidores’ das últimas produções, até porque os
sujeitos também são ‘produtores’ (criam filmagens, analisam vídeos,
publicidades, propagandas de TV, entre outros), mas está em repensar,
discutir, refletir e implantar propostas de ensino com real potencial de
transformação.
Para tal, torna-se necessário ampliar a visão do uso das TIC na
escola levando em consideração:
- O impacto dos desenvolvimentos tecnológicos
nas aulas ̠ por exemplo, como influem a linguagem
dos videoclips e a lógica das redes de
84
computadores nas aprendizagens dos alunos e nas
estratégias didáticas que os docentes empregam;
- A tecnologia feita especialmente para as aulas -
por exemplo, como se utilizam, se recriam e se
analisam os softwares educativo, os livros-texto, o
giz e o quadro-negro, etc.
- A recomendação crítica do que sucede nas aulas
com a produção e o consumo de tecnologia
(LION,1997, p. 28).
De acordo com Buckingham (2010), os alunos produzem seus
próprios textos multimídia, com utilização de imagens, animação, áudio,
vídeo, entre outros recursos. Eles pensam sobre a forma que diferentes
usuários interpretam suas produções. Todavia, elas, geralmente são
caracterizadas pelo enfoque na cultura popular, ou seja não apresentam
tentativas de uso para o fim educacional. O objetivo não é o
estabelecimento de habilidades técnicas, mas a estimulação da
compreensão do funcionamento das mídias para, então, refletir seu uso.
Para Miranda, as mudanças do modo de aprender não se dão de
forma imediata, mas processos lentos que interferem no cognitivo. Nessa
visão construtivista, para que ocorra uma aprendizagem significativa, “é
necessário ter em consideração que a aprendizagem é um processo
(re)construtivo, cumulativo, auto-regulado, intencional e também situado
e colaborativo” (2007, p.45). Isso significa dizer que o conhecimento é
construído, a partir das estruturas anteriormente elaboradas, conectadas
as novas informações. O conhecimento deve ser organizado a partir de
situações, problemas e exercícios que conduzam os alunos a níveis
superiores de conhecimentos. Em alguns momentos, surgem problemas
no processo de aprendizagem devido à dificuldade de mudar o
conhecimento empírico, do senso comum, pelos alunos.
Segundo Buckingham (2010), um dos motivos que obstaculizam a
criação de situações que desencadeariam na aprendizagem do sujeito é a
falta de investimento em softwares bem estruturados e acessíveis. O que
se tem encontrado são equipamentos desatualizados, muitas vezes,
defeituosos e, providencialmente, com custo efetivo que interessam
apenas ao lucro, sem preocupar-se com a forma que seu uso pode gerar
aprendizagem. Mediante a disponibilidade de tais recursos, sem nenhum
impedimento quanto ao seu funcionamento, há outra causa que contribui
com tal realidade: o despreparo do professor quanto ao manuseio dessas
inestimáveis ferramentas. Mesmo com os mais variados aportes
85
midiáticos, tidos como modernos, os professores têm resistido ao seu uso,
pois não veem formas efetivas de aprendizagem.
Para Miranda (2007, p. 44), os efeitos positivos somente serão
atingidos quando os professores se dedicarem à compreensão de seu
funcionamento. Isso requer o desenvolvimento de “atividades
desafiadoras e criativas, que explorem ao máximo as possibilidades
oferecidas pelas tecnologias”. Em sua visão empirista, há necessidade dos
professores explorarem as tecnologias a fim de não acrescentar, mas de
integrá-las ao currículo e como nova forma de representar e tratar
informações.
Não é suficiente introduzir os computadores e a
internet nas escolas para se começarem a obterem
resultados positivos na aprendizagem dos alunos. É
ainda necessário refletir sobre o que a torna efetiva
e modificar a organização dos espaços e das
atividades curriculares de modo a que estas novas
ferramentas possam apoiar a aquisição de
conhecimento disciplinar significativo
(MIRANDA, 2007, p.46).
De acordo com a autora, as tecnologias, quando integradas e não
somente acrescentadas as atividades curriculares, contribuem para uma
maior literacia dos estudantes e docentes. Eles geram novas motivações e
relações que não devem ser descartadas do processo de ensino e
aprendizagem. Contudo, a aprendizagem continua sendo o aspecto mais
importante a ser levado em consideração, na integração de tecnologias ao
ensino (MIRANDA, 2007). Em contrapartida a essa afirmativa, chama-
se a atenção para o desconhecimento de estudos que abordem a
preocupação com o desenvolvimento do pensamento.
Segundo Sancho e Hernández (2006), a dificuldade em
transformar essa situação está basicamente na contradição encontrada no
ambiente educacional. De um lado, organismos internacionais advogam
sobre a importância de formar um sujeito com características essenciais
(crítico, autônomo, colaborativo, solucionador de problemas e que
domine o uso de TIC) para viver na denominada ‘sociedade do
conhecimento’. Por outro, há concepções educativas que seguem padrões
tradicionalmente estabelecidos e com pouco incentivo à criação e à
construção de conhecimento.
Buckingham (2010) questiona a polaridade no debate sobre essas
tecnologias e a educação. Enquanto a discussão centrar-se nos sujeitos
86
que rejeitam as tecnologias e naqueles que a idealizam, questões
fundamentais sobre como eles podem usar as TIC e o que precisa saber
sobre elas ficam à margem no esquecimento.
Para o autor, a história das TIC na Educação pode ser entendida
como uma Revolução Tecnológica que não vingou. Entretanto, o
movimento da inserção das TIC continua crescendo com o propósito de
atender a sociedade da informação. Continua, também, a visão
determinista de que, independente do sujeito ou contexto social que ele
está inserido, a tecnologia produzirá efeitos positivos. As tecnologias por
si mesmas não são suficientes para que as escolas melhorem o ensino.
Contudo, a escola pode ajudar o sujeito a refletir criticamente sobre o uso
das mídias nos contextos atuais (BUCKINGHAM, 2010).
Buckingham desfaz a crença de que a escola esteja ultrapassada ao
afirmar que:
A ideia de que a tecnologia em si mesma
transformaria radicalmente a educação - e até
mesmo resultaria no fim da escola- não passou de
ilusão. A escola, provavelmente, continue, pois
serve a funções sociais (e de fato econômicas) que
não se limitam ao seu papel com o ensino
(BUCKINGHAM, 2010, p.53).
Os questionamentos não têm a pretensão de fazer com que as
tecnologias sejam abandonadas e retomadas às formas mais naturais de
aprendizagem. Servem para ressaltar a importância de repensar que o
papel da escola não é servir o mercado, mas criar possibilidades ao sujeito
para aprender e, com isso, ver o real sentido do mundo.
4.3.1 Lousa Digital
Diversos trabalhos, teses e dissertações tem apresentado a Lousa
Digital como tema de pesquisa. Fez-se necessário revisar o que se tem
produzido acerca dessa temática para identificar o que de novo o estudo
poderia abordar. Para tal, inicialmente, recorreu-se a periódicos
qualificados pela CAPES com Qualis A1, A2, B1 e B2, na busca por
trabalhos que envolvessem a temática Lousa Digital. No entanto, a
procura não se tornou satisfatória, pois encontrou somente quatro
trabalhos que se aproximavam da temática desta pesquisa. Dessa forma,
optou-se por realizar a pesquisa de trabalhos no Google Acadêmico.
87
Essa, por sua vez, apresentou um número expressivo de publicações.
Assim, fez-se necessário selecionar os estudos que se relacionavam com
os assuntos de interesse. Desses, 26 trabalhos foram selecionados e alguns
tomados de referência para a escrita desta seção. A análise dos trabalhos
deu-se pelos seguintes aspectos: identificação de entendimento de
tecnologia; fundamentação teórica e entendimento a respeito do
instrumento. No decorrer do texto, apresenta-se algumas considerações
encontradas em alguns trabalhos.
Almeida e Pinto Neto (2015) realizaram uma pesquisa com
professores de um município do interior do Estado de São Paulo, no ano
de 2008, em escolas onde foram instaladas LDIs nas salas de aula do
Ensino Fundamental II. O estudo de título A Lousa Digital interativa: táticas e astúcias de professores consumidores de novas tecnologias teve
por intenção investigar como os professores lidam com o novo recurso
implantado no ambiente escolar. Segundo eles, as Lousas Digitais
Interativas se apresentam numa escala crescente, aliada ao sinônimo de
modernidade. A partir da implantação das lousas surge a necessidade de
avaliar sua contribuição no processo de ensino-aprendizagem. Essa
preocupação emerge da constatação de que muitas das tarefas realizadas
por meio das LDI podem ser realizadas por meio de recursos por vezes
mais baratos (ALMEIDA; PINTO NETO, 2015).
O estudo revelou algo que é comum em pesquisas na área de
tecnologia: professores que afirmam ser o processo de implementação das
LDI realizado sem diálogo entre direção pedagógica e professores. Esse
processo faz com que os profissionais incorporem, em suas aulas, uma
ferramenta ao qual não tiveram oportunidade de escolha. Todavia, os
professores consideram os recursos que se apresentam na Lousa Digital
interessantes para serem utilizados nas aulas. Os autores da pesquisa
mostram preocupação quanto à discussão de sua implementação. Para
eles, o estudo “revela a ausência de reflexão sobre o papel
pedagógico/didático da LDI. Afinal de contas, por que foram colocadas
na sala de aula?” (ALMEIDA; PINTO NETO, 2015, p. 412).
Embora não se trata de um trabalho voltado ao ensino superior, A Lousa Digital no fundamental I: formas de utilização no ensino da
matemática, escrito por Ribeiro (2015), indica que os docentes devem
modificar suas práticas pedagógicas, adaptando-se a mudanças. Para a
autora, as TIC modificam os processos de ensino e aprendizagem, pois,
criam novas possibilidades que favorecem a construção do conhecimento.
Dentre as TIC, a Lousa Digital mostrou-se uma ferramenta aliada do
professor nos processos educativos, com grande aceitação dos alunos.
88
Ainda, segundo a autora, a Lousa Digital evidência a interação e a
interatividade, além do trabalho colaborativo.
Especificamente ao se pensar em ensino da Matemática, o estudo
de Carvalho (2014) sobre As potencialidades do uso da Lousa Digital no
ensino de matemática indica que é preciso inovar, investir, capacitar
profissionais, além de agregar dispositivos e técnicas que propiciem
aprimoramento e apropriação do conhecimento.
Para a autora, a evolução no ensino da Matemática passa pelo
acesso aos mais diferentes dispositivos eletrônicos. A Lousa Digital não
se apresenta como um recurso salvador dos problemas no processo de
aprendizagem. Porém, ao ser utilizada como um dispositivo auxiliar,
mediante capacitação do profissional, pode contribuir para uma melhoria
do ensino/aprendizagem, pois mudanças significativas têm sido relatadas
por professores que a utilizam em suas aulas. Cita-se, por exemplo,
melhorias dê atenção, interação e assiduidade. No entanto, a autora chama
atenção para a realidade da educação brasileira de que, mesmo com todo
o conhecimento do professor e disponibilidade de recursos, a
aprendizagem só acontecerá se quem estiver a sua frente se disponibiliza
a aprender (CARVALHO, 2014).
Completa ainda, que a Lousa Digital, juntamente com outros
dispositivos, permite apresentar ao aluno, aulas mais abrangentes, mais
próximas da turma, com maior qualidade e envolvimento e participação
deles, o que proporciona crescimento mútuo (CARVALHO, 2014).
A partir da leitura dos trabalhos pesquisados, percebeu-se que o
foco de estudo estava nas possibilidades de recursos disponíveis na Lousa
Digital, com exploração das ferramentas e abordagem de formas que
poderiam ser trabalhados os conceitos matemáticos. Contudo, dentre eles,
haviam estudos que se preocuparam, além da tecnologia mencionada, em
fundamentar o uso Lousa Digital em uma corrente teórica.
O trabalho intitulado Desafios do ensinar e aprender matemática:
uma experiência com o uso de Lousa Digital e Applet no estudo de
produtos notáveis, apresentam resultados acerca da utilização da Lousa
Digital no ensino de conceitos matemáticos. No estudo, as autoras
afirmam que, o uso de tecnologias digitais, no ensino de matemática, é
necessário para retirar os professores da ‘zona de conforto’ com objetivo
de criar uma concepção de aprendizagem que priorize a construção do
conhecimento do aluno. Elas perceberam que a experiência contribuiu
para repensar o ensino de produtos notáveis, articulando o conteúdo com
registros nos campos algébrico e geométrico. Quanto ao uso da Lousa
Digital, este contribuiu para debates, reflexões e aprendizagem por parte
dos alunos do grupo (GONÇALVES E SCHERER, 2012).
89
A diferença, segundo elas, foi percebida ao comparar com aulas
sem o uso de recursos e estabelecida a transmissão de informação. Nessas
aulas o aluno resolvia, primeiramente, no caderno, corrigia com o
professor para depois se dirigir ao quadro. Nas aulas desenvolvidas com
o uso da Lousa Digital, os alunos não evidenciaram preocupação com o
erro, como afirmam:
Ao convidarmos um aluno voluntário, vários
alunos se manifestavam, sem muitas vezes ter
entendido direito a atividade proposta e
apresentando, às vezes, solução incorreta. Esse
movimento contribuiu para que pudéssemos
entender o que estes alunos estavam
compreendendo, para, então, desafiá-los a novas
aprendizagens a partir de seus erros
(GONÇALVES E SCHERER, 2012, p. 40).
As autoras salientam ainda que a interação e o trabalho em
colaboração desenvolvido entre os alunos, com o uso da Lousa Digital e
Applets possibilitaram a reflexão sobre o ensino de outros conceitos
matemáticos como: resolução de equações do 1º grau, de funções e
ângulos, desde que a escolha dos recursos favoreça a abordagem
construcionista nas aulas de Matemática. Para elas, essa abordagem
contribuiu na reflexão do papel dos professores ao realizar a mediação
entre os alunos e os objetos do conhecimento.
Em outro trabalho, intitulado A Lousa Digital e o uso do maple no
cálculo diferencial e integral: potencialidades mediativas, os autores
Kaiber e Vecchia (2013) apresentam a Lousa Digital como um
instrumento mediador do uso do software Maple, sendo consideradas as
concepções de Design Instrucional e construcionista. Os autores, em seu
breve estudo, constataram que a lousa permite o uso de recursos visuais
que promove uma relação diferente daquela encontrada entre aluno,
professor e computador. O ambiente virtual criado pelo uso da lousa
adquire nova configuração, além de atualizar o modo de fazer do
professor, pois possibilita uma interação com os aspectos gráficos
construídos do mesmo modo que, normalmente, utiliza quadro e giz.
Carli (2014), em seu estudo Reflexões sobre a Lousa Digital como
recurso pedagógico a partir da abordagem sociointeracionista,
pesquisou o contexto de utilização da Lousa Digital. Sua intenção foi
investigar se ela está sendo utilizada no sentido de proporcionar o
desenvolvimento cognitivo do aluno nos processos de ensino e
90
aprendizagem. No estudo, entrevistou 4 professores de uma escola
municipal do Rio Grande do Sul.
Utilizou, segundo ele, a abordagem sociointeracionista de
Vygotsky como base teórica, especificamente conceitos de interação,
mediação e Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) como norteadores
de análise. O autor apresenta algumas categorias emergentes do processo
pesquisa realizado: uso enraizado na transmissão de conteúdo; interesse
em explorar os recursos interativos; necessidade do desafio e a
ressignificação no papel dos envolvidos (CARLI, 2014).
No uso da Lousa Digital nos processos de ensino e aprendizagem,
Carli (2014) afirma que, ainda, está enraizado a forma tradicional de
ensinar, baseada na transmissão de conteúdos ao aluno. Em seu
entendimento, isso decorre na “não consideração do desenvolvimento
cognitivo pré-adquirido do aluno como referência de atuação pedagógica,
e, na possível inibição da criatividade e da autonomia ligadas à produção
e emissão da informação” (CARLI, 2014, p. 6).
O autor entende que a oportunidade de participação dos alunos nas
atividades pedagógicas com o uso de Lousa Digital minimiza os
problemas anteriormente apontados. Além disso, possibilita a observação
do conhecimento do nível de desenvolvimento real do aluno. Dessa
forma, o professor assume a função de mediador, intervindo com
problematizações que se adiantem ao desenvolvimento do aluno.
Carli (2014) identificou, em algumas das atividades trabalhadas
pelo uso da Lousa Digital, a ressignificação no papel dos envolvidos, em
que o professor proporcionou ao aluno, a oportunidade de trabalhar a
atividade diretamente na Lousa Digital. Foi percebida a participação mais
efetiva do aluno e o surgimento de interações coletivas sob orientação do
professor. A atividade provocava o aluno a pensar e a representar na
Lousa Digital formas alternativas de resposta, pois a regra era não repetir
a resposta apresentada anteriormente. A Lousa Digital, nesse caso,
desempenhou papel de mediador da interação do aluno com o conteúdo,
ampliando o número de possibilidades por meio da capacidade de
criatividade e de exploração dos recursos da Lousa Digital com a
orientação do professor. Contudo, percebeu-se que a ressignificação dos
papéis não foi adotada como estratégia pedagógica. Ela resultou da
oportunidade dada ao aluno de trabalhar a atividade na Lousa Digital e do
momento em que o professor assume o papel de mediador (CARLI,
2014). A duplicidade apresentada por quem desempenha o papel de
mediador mostra a fragilidade da pesquisa de Carli.
Em sua visão empírica, a ressignificação de papéis apresentou
elementos indispensáveis para a promoção do desenvolvimento cognitivo
91
do aluno com o uso pedagógico da Lousa Digital, considerados
indispensáveis no contexto sociointeracionista. O autor percebeu, ainda,
o interesse dos professores em explorar os recursos interativos da Lousa
Digital com o intuito de elaborar atividades pedagógicas mais
interessantes e desafiadoras, e que contenham imagens, a linguagem
audiovisual, jogos, entre outros (CARLI, 2014).
E, conclui em seu trabalho que, discussões acerca do uso de
Tecnologias Digitais trazem bons resultados para o processo de ensino e
aprendizagem. Tais discussões, segundo ele, permitem a reflexão sobre o
fazer educacional, e defende que se forem bem fundamentadas em teorias
dos estilos de aprendizagem e direcionadas às práticas de uso das TDs,
possivelmente, “colocarão a escola no caminho mais indicado para que a
sua pedagogia realmente encontre uma identidade que corresponda aos
anseios dessa nova sociedade” (CARLI, 2014, p. 8). Em seu estudo não é
refletido sobre esses anseios e o que eles promovem na humanidade.
Entende-se que essa visão vai de encontro ao que Vieira Pinto (2005)
chama de ideologização da técnica, pois apresenta a tecnologia como
forma de engrandecimento, de salvação dos problemas educacionais.
Entre os estudos selecionados, o único trabalho abordando o uso
das Lousas Digitais com o olhar da Teoria da Atividade encontrou-se em
Melo e Gitirana (2014). Em seu trabalho intitulado A Lousa Digital no
ensino de matemática: análise das interações docentes, a qual discutem
a atividade docente com uso de Lousa Digital no ensino de matemática
com o foco para a análise das interações docentes. Os autores realizaram
a pesquisa por meio de um estudo de caso. Toma como referência a
observação da aula de um professor ao ensinar os conceitos de razão e
proporção. O estudo pretendia investigar os tipos de interações que os
recursos da Lousa Digital proporcionavam no ensino dos referidos
conceitos com observação para quais objetivos a lousa era utilizada.
Além disso, tinha o propósito de compreender como os recursos da lousa
interferem nas mediações didáticas, como elas ocorrem e como o seu uso
pode ajudar ou prejudicar as interações (MELO E GITIRANA, 2014).
A hipótese levantada era de que o uso da Lousa Digital no ensino
da matemática favorece as mediações didáticas por agregar, as aulas, as
potencialidades desenvolvidas em softwares educacionais e nas mais
variadas mídias.
O foco principal de análise centrou em investigar quais interações
são mais ou menos estimuladas/favorecidas com o uso da Lousa Digital.
Além disso, verificaou quais artifícios didáticos e ferramentas tem
destaque ou não com o seu uso. E, ainda, investigar como se articula a
interação professor-lousa com conteúdo trabalhado. Para tal, buscaram
92
contribuição na Teoria da Atividade de Leontiev, a fim de “investigar
entraves, limitações potencialidades no uso das Ferramentas da Lousa
Digital” (MELO; GITIRANA, 2014, p. 114). Além das interações,
buscaram compreender os meios e os motivos que colaboram ou não para
que elas aconteçam.
Como resultado, Melo e Gitirana (2014), observaram uma
variedade de recursos empregados na aula, como o uso de tabelas, textos
digitalizados, imagens e animações para motivar, esclarecer e apresentar
o conteúdo, com utilização de páginas em branco para fins de registros e
comentários. Além disso, a possibilidade de escrever sobre a
apresentação, preparada previamente, permitiu utilizar o tempo na
explicação do conteúdo.
Melo e Gitirana (2014) concluem que o uso da lousa favoreceu o
ensino da matemática ao potencializar metodologias de ensino na
apresentação dos conteúdos e no uso de recursos digitais. No entanto, não
foram propostas situações em que os alunos interagem diretamente com
a Lousa Digital.
Boa parte das pesquisas citadas apontam para questões relativas às
qualidades da Lousa Digital e a possibilidade de ganho na apresentação
de conteúdo. Porém, todas convergem para a ideia de que a ferramenta
não apresenta garantia de ‘melhor ensino’. Desse modo, faz-se necessário
analisar a preferência da ferramenta da Lousa Digital, ao quadro estático,
a fim de verificar as possibilidades que se apresentam no ensino da
matemática e seus diferenciais.
Atualmente, a linguagem digital tem sido fortemente utilizada
devido à diversidade, rapidez e eficiência com que trabalha a informação,
sem excluir as linguagens oral e escrita, que são as bases dos processos
comunicativos (NAKASHIMA, 2008). Constantemente, novas invenções
surgem com a finalidade de facilitar a vida do ser humano ou
simplesmente contribuir para o consumismo, como MP3, celulares,
câmeras fotográficas, dentre outros. Algumas destas tecnologias, como o
computador e a internet, já estão presentes na escola (NAKASHIMA;
AMARAL, 2006).
A Lousa Digital Interativa é uma TIC que se apresenta como uma
possibilidade de aproximar a linguagem digital das práticas educativas.
Dessa forma, optou-se pelo uso da referida ferramenta na pesquisa, pois
o grande número de seus recursos auxiliam em diversas ações propostas.
O fato de a universidade, onde a pesquisadora leciona, possuir salas
equipadas com Lousas Digitais Interativa que oportunizam o uso por
diversas vezes em suas aulas, foi outro motivo que desencadeou na
escolha da mesma.
93
A Lousa Digital é uma ferramenta sensível ao toque, que permite
a interação dos professores e estudantes com o quadro. Ela é ligada a um
computador e permite manusear diretamente na ferramenta todas as
opções disponíveis nos computadores conectados. Para seu
funcionamento, é necessário um software específico de gerenciamento do
quadro iterativo, para que a aula seja armazenada e, dessa forma, utilizada
posteriormente (NAKASHIMA, 2008).
Esses softwares disponibilizam múltiplos recursos para auxiliar o
professor na elaboração de suas aulas, como: desenhos, inserção de
imagens, formas geométricas, áudio, gravação de telas e inúmeras outras
opções de ações. A Lousa Digital Interativa pode auxiliar o professor em
suas práticas pedagógicas por meio de diferentes opções e ferramentas.
Geralmente, tem a praticidade de ser instalada na sala de aula, o que evita
a necessidade de deslocamento a laboratórios de informática.
(NAKASHIMA, 2008; ESTEVES; FISCARELLI; SOUZA, 2013).
Zanette et al. acrescenta que,
Uma Lousa Digital Interativa (LDI) é tipicamente
equipada com várias ferramentas para auxiliar o
professor na sua ação educativa. É um recurso que
possibilita o acesso a materiais pré-organizados e à
internet. Por meio da LDI é possível ainda interagir
com arquivos multimídia, salvar anotações feitas
durante uma aula e até promover atividades com a
participação dos alunos em grupos ou
individualmente (ZANETTE et al., 2010, p. 3).
A Lousa Digital possui semelhanças com o quadro tradicional.
Contudo, Nakashima (2008) explica que a ferramenta permite a inserção
da linguagem áudio visual, o que leva o professor a pensar em novas
possibilidades de organizar as aulas.
O benefício da Lousa Digital, em relação às outras tecnologias,
está na possibilidade de incorporação de funções de outros recursos como
computador, retroprojetor, televisão e, até mesmo, o rádio. Logo, torna-
se uma ferramenta mais flexível, com a possibilidade de atualizar as
informações (NAKASHIMA, BARROS e AMARAL, 2009).
Os estudos de Zanette et al. (2010, p. 3), observaram que o nível
de interação entre conteúdo, professor e acadêmico por meio da Lousa
Digital Interativa é determinado pelo planejamento da aula, com a
inserção de objetos ou ferramentas já organizados. A investigação mostra
que há um ganho de tempo, disponível para os docentes e acadêmicos
94
focarem nas dúvidas e questionamentos. Contudo, julgam necessário
propor, por meio da Lousa Digital, ações que favoreçam a construção do
conhecimento, pelo aluno.
Segundo Esteves, Fiscarelli e Souza (2013), pesquisas têm
apresentado que a utilização da Lousa Digital Interativa modifica o
comportamento dos estudantes em sala. Eles participam mais das aulas,
interagem diretamente com materiais e conteúdo. No entanto, em “grande
parte das evidências sobre a melhoria do desempenho dos alunos se
apresenta mais em termos de aprendizado afetivo e em menor grau sobre
domínio cognitivo” (p. 189).
Como todo processo de formação docente no uso de tecnologia
nem sempre é fácil a introdução de lousas digitais. Por isso, sugere-se a
atenção a pesquisas que demonstrem as potencialidades para o processo
de ensino aprendizagem (ESTEVES; FISCARELLI; SOUZA, 2013;
CARVALHO; SCHERER, 2014).
Para a realização das tarefas propostas para o desenvolvimento do
conceito de Medidas de Tendência Central, será utilizado o software
disponível na universidade para funcionamento das lousas, o
ActivInspire9. Ele pode ser instalado nos sistemas operacionais Microsoft
Windows, Mac e Linux (32-bit). Entre os recursos apresentados pelo
ActivInspire estão: interface dupla, equações matemáticas, navegador
web embutido, importação de arquivos e conteúdo de vários formatos
(.pptx, .docs, .pdf, .xbk), gravação de tela, câmera, ActivExpression
(anotar respostas de alunos).
Abaixo apresenta-se a interface e visão inicial do software:
Figura 1: Visão inicial do software ActivInspire
Fonte: ActivInspire (v.8, 2016)
9 De propriedade da Promethean, este software tem uma versão demo disponível
para download, que pode ser encontrada no site
https://support.prometheanworld.com/download/activinspire.html?custom_lan
g=pt_BR. Acesso em: 10 de jan. de 2017.
95
Figura 2: Interface do software ActivInspire
Fonte: ActivInspire (v.8, 2016).
O software possui menus que possibilitam encontrar facilmente os
recursos desejados. A opção Gravador de tela é um recurso interessante,
pois permite registrar todos os procedimentos a serem realizados pelo
professor e pelos acadêmicos, quando da implementação do conjunto de
tarefas. Isso ocorrerá em estudo futuro.
Figura 3: Menu Ferramentas e Gravador de Tela
Fonte: ActivInspire (v.8, 2016).
Em casos em que os ambientes não possuam o software instalado
o professor pode preparar a aula diretamente no software instalado em seu
computador pessoal e converter para outros formatos.
96
5 MEDIDAS DE TENDÊNCIA CENTRAL: UM MODO DE
ORGANIZAÇÃO DO SEU ENSINO
Neste capítulo é apresentado as tarefas elaboradas, que se
pressupõe como necessária para a apropriação do conceito teórico de
Medida de Tendência Central. Constantemente, somos obrigados a
interpretar dados sobre as mais variadas situações. Os exemplos mais
conhecidos são os que tratam de relacionar estatística com natalidade,
mortalidade, estatura, pesquisas eleitorais e mercadológicas. Por vezes, a
interpretação de dados pode não ocorrer de forma segura, devido à falta
de compreensão de conceitos estatísticos ou sua aplicação de maneira
incorreta.
De acordo com Bruni (2007) e Tiboni (2010), a Estatística
possibilita, por meio de técnicas ou medidas, analisar e interpretar
informações contidas em diferentes conjuntos de dados coletados. A
análise deles permite a indicação de como os elementos estão
distribuídos, seus padrões, concentrações e dispersões, entre outros. Uma
distribuição de dados pode ser interpretada por diferentes medidas, sendo
que em cada uma delas verifica-se características diferentes do fenômeno
em análise. Em outras palavras, essas medidas verificam o
comportamento ou a tendência dos elementos.
Ao analisar dados, muitas vezes, necessita-se tomar um valor como
referência para todos os outros, mais especificamente, é identificado um
valor que represente a situação como um todo, que expresse o ocorrido
naquela determinada situação. Para analisar um conjunto de dados,
existem medidas específicas dispostas para esse fim. Dentre elas
encontram-se: Medidas de Posição; Medidas de Variabilidade ou
Dispersão; Medidas de Assimetria; e Medidas de Curtose.
A partir de um grupo de dados, uma Medida de Posição é um valor
que descreve ou representa os dados de acordo com sua localização.
“Normalmente, desejamos que o valor seja representativo do grupo de
valores, e algum tipo de média é desejado” (KAZMIER, 2007, p.51).
Existem dois tipos de Medidas de Posição: as Medidas de Posição
de Tendência Central e as Medidas de Posição Separatrizes. Para fins
deste estudo, estabeleceu-se, dentre as Medidas de Posição, a que tem por
característica a Tendência Central.
Para Bruni (2007), as Medidas de Tendência Central representam
um conjunto de dados pelos seus valores médios, em torno dos quais
tendem a concentrar-se os dados. Essas medidas resumem o
comportamento central dos dados, que caracterizam os grupos como um
97
todo, por os descreverem de forma mais compacta do que as tabelas e
gráficos.
Uma maneira conveniente de descrever um grupo
como um todo é achar o número único que
represente o que é médio, ou típico, daquele
conjunto de dados. Na pesquisa social, esse valor é
chamado medida de tendência central, porque em
geral ele está localizado mais para o meio, ou
centro, de uma distribuição, onde a maior parte dos
dados tende a concentrar-se (LEVIN E FOX, 2004,
p.79).
Tiboni (2010) indica outra nomenclatura para as Medidas de
Tendência Central: promédios. Para o autor, tal denominação ocorre
porque os dados observados tendem a se agrupar em torno do meio da
distribuição.
Há diferentes medidas para encontrar um valor central capaz de
representar o que aconteceu na situação como um todo, tais como: média
aritmética10, mediana e moda. A escolha pela medida a ser utilizada para
encontrar o valor que representa uma distribuição depende de cada
situação.
Numa distribuição, uma Medida de Tendência Central refletirá o
comportamento dos dados, ao ponto que outras poderão estar
equivocadas. Da mesma forma, pode acontecer de as três medidas
indicarem o mesmo valor como típico da distribuição. O que direciona a
escolha da medida a ser adotada é a finalidade atribuída pelo sujeito que
analisa os dados. Normalmente, a utilização da média aritmética, ou
simplesmente média, é a mais utilizada para indicar o padrão de uma
distribuição. No entanto, há situações em que seu emprego não é
apropriado ou impossível de ser realizado, sendo necessário o uso de
outras Medidas de Tendência Central.
A análise de dados precisa ser feita com cuidado, pois essas
medidas “focalizam a atenção na posição do centro dos dados medidos,
implicando, muitas vezes, na perda de informações” (BRUNI, 2007, p.
43).
Para realizar a introdução do conceito de Medidas de Tendência
Central (média, mediana e moda), a ser explorado nas próximas seções,
10 Para Tiboni (2010), outras médias menos utilizadas são a média geométrica,
média harmônica, média quadrática, média cúbica, etc.
98
buscou-se referência em trabalhos desenvolvidos a partir das proposições
de ensino davydovianas. A deliberação de estudos com base nesse autor,
ocorreram pelo pressuposto de que o modo de organização de ensino,
promovido por Davídov propicia que os estudantes o desenvolvam o
pensamento teórico.
Para Davídov (1988, p. 125),
O conteúdo do pensamento teórico é a existência
mediatizada, refletida, essencial. O pensamento
teórico é o processo de idealização de um dos
aspectos da atividade objetivo-prática, a
reprodução, nela, das formas universais das coisas.
Tal reprodução tem lugar na atividade laboral das
pessoas como peculiar experimento objetivo-
sensorial. Logo, este experimento adquire, cada
vez mais, um caráter cognoscitivo, permitindo às
pessoas passarem, com o tempo, a realizar os
experimentos mentalmente.
Por isso, antes de discutir a proposição de tarefas particulares
referente aos conceitos de Medidas de Tendência Central, na próxima
seção, apresenta-se algumas tarefas sínteses de estudos feitos por Crestani
(2016) e Madeira (2012) referentes à relações de entre grandezas,
segundo Davídov (1987) base de todos os conceitos teóricos de
matemática. Os estudos são pertinentes ao conceito de multiplicação e
divisão da proposta de organização do ensino davydoviano. Tais
conceitos são entendidos como essenciais para a introdução do conceito
de Medidas de Tendência Central.
5.1 APRESENTAÇÃO DOS CONCEITOS DE MULTIPLICAÇÃO E
DIVISÃO
No desenvolvimento da proposição para o ensino de Medida de
Tendência Central, constatou-se que tanto o conceito de divisão quanto o
de multiplicação são indispensáveis para a sua apropriação. Isso porque
ambos conceitos possibilitam expressar os resultados da comparação de
várias medidas, a fim de se estabelecer a relação de igualdade entre elas.
Tal igualdade se apresenta como aspecto essencial para a introdução do
sistema conceitual de Medida de Tendência Central (média aritmética e
mediana), uma vez que, diante de uma variedade de dados (medidas),
busca-se encontrar um valor que possa representar todos os demais.
99
Assim sendo, inicialmente, houve a necessidade de nos
apropriamos do processo de constituição dos respectivos conceitos –
multiplicação e divisão –, para que, em seguida ocorresse a apresentação
e discussão das tarefas que introduzem o conceito de Medidas de
Tendência Central. Para tanto, realizamos os estudos de ambos conceitos,
o que nos possibilitou a elaboração de algumas sínteses com base nos
estudos de Crestani (2016); Rosa, Damazio e Crestani (2014) e Madeira
(2012).
Nesse âmbito, apresenta-se algumas tarefas que foram adaptadas
a partir dos estudos dos autores em referência sobre os conceitos de
divisão e multiplicação da proposição de ensino proposta por Davýdov e
colaboradores. As duas primeiras tarefas tratam do conceito de
multiplicação. No entanto, vale adiantar que em ambas são tomadas
distintas grandezas ao abordar a multiplicação, isto é, na tarefa 1 é feito o
uso da grandeza contínua volume e na tarefa 2 é utilizada a grandeza
discreta, quantidade, conforme veremos a seguir. Nas tarefas 3 e 4
ocorrem a introdução e discussão de um novo conceito matemático, a
divisão.
No que se refere às grandezas, vale destacar que Davídov (1987)
considera que os conceitos matemáticos são decorrentes das relações
entre elas.
Tarefa 1:
O professor solicita aos alunos que verifiquem quanto de volume
K há num recipiente que será transferido para outro que está vazio,
conforme figura 1. Cada recipiente está sobre uma mesa que se encontram
distantes uma da outra. Em relação aos recipientes, inexiste a
possibilidade de os movimentar (CRESTANI, 2016)11.
Figura 4: 1ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa
11 A tarefa 1 tem por finalidade a introdução da unidade de medida intermediária,
característica fundamental para a apropriação dos conceitos de multiplicação e
divisão (MADEIRA, 2012; CRESTANI, 2016).
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016). K
100
Para a realização do procedimento, o professor apresenta um
recipiente auxiliar de volume B.
Na transferência do volume K para o recipiente que estava vazio,
os alunos deverão utilizar o recipiente de volume B como unidade básica.
Contudo, durante a transferência de líquido, constatarão que o processo é
lento, o que torna a unidade básica incômoda para execução da situação
proposta. Nesse caso, para agilizar o processo de medição, surge a
necessidade de adotar uma outra unidade de medida, porém maior que a
básica e menor que o volume a ser transferido. A mesma é chamada
unidade intermediária D, como mostra a figura 6 (CRESTANI, 2016).
A unidade intermediária será tomada apenas para agilizar o
processo de medição do volume K. Contudo, este será representado por
meio da unidade básica com o auxílio da intermediária. Dessa forma,
verifica-se quantas vezes a unidade básica cabe na intermediária. A
representação da quantidade de vezes que uma unidade cabe na grandeza
(a ser medida) pode ser expressa na forma objetal, gráfica e literal,
conforme a figura 7.
B
Figura 5: 1ª tarefa, unidade de medida básica
Figura 6: 1ª tarefa, unidade de medida básica e intermediária
B
D
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
101
Figura 7: 1ª Tarefa: relação entre unidade de medida básica e
intermediária
Isso significa dizer que, a unidade básica B cabe a vezes na unidade
intermediária D (D = aB) e também se representa no esquema de seta, o
qual indica quantas vezes o volume B coube no recipiente D, ou seja, a
vezes (Figura 7).
Na tarefa em desenvolvimento é feita a identificação do número
que representa quantas vezes a unidade básica cabe na intermediária,
conforme a figura 8, a seguir.
Figura 8: 1ª Tarefa: relação quantitativa entre unidade de medida básica
e intermediária
A partir da determinação da medida intermediaria, inicia-se a
transferência de líquidos a fim de verificar quantas medidas desta, serão
necessárias para realizar a transferência do volume K para o recipiente vazio (Figura 9).
B D a B
D
...
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
B D 4
B
D
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
102
Figura 9: 1ª Tarefa: transferência de líquido usando unidade intermediária
Ao terminar a transferência, os alunos verificarão que a unidade
intermediária foi usada seis vezes para transpor o volume K. Assim,
substituindo n por 6, obtém-se K = 6D (Figura 10).
Figura 10: 1ª Tarefa: representação da unidade intermediária utilizada na
transferência
A adoção – no processo de medição – das unidades básica e
intermediária, propiciam a identificação, exata, do volume K (Figura 11).
Figura 11: 1ª Tarefa: representação da transferência de líquido (forma
objetal e segmentos)
D K 6
K
K
B
D
B D
K
D K n D
K
Fonte: Elaboração conforme Madeira (2012).
Fonte: Elaboração conforme Madeira (2012).
Fonte: Elaboração conforme Madeira (2012).
103
Vale enfatizar que a unidade D, corresponde a quatro unidades
básicas (4B), na qual se repete por seis vezes em K, obtendo-se 24
unidades básicas (K=24B). O esquema a seguir, figura 10, expressa a
relação estabelecida entre essas medidas (MADEIRA, 2012).
Figura 12: 1ª Tarefa: representação da multiplicação no esquema
A seta traçada da esquerda para baixo indica a quantidade de vezes
(a) que a medida básica (B) cabe em D, sendo representada por D = aB.
A seta traçada de baixo para cima indica a quantidade de vezes (n) que D
cabe em K. Por fim, a seta com extremidades B e K informa a quantidade
de vezes que a unidade básica coube em K.
De acordo com Madeira (2012), na proposição davydoviana, o
conceito de multiplicação é uma extensão da ideia de número12 como
relação entre grandezas.
O modelo universal de número (A/c = n, A= c.n) se
pauta por princípios multiplicativos. No momento
em que a multiplicação se constitui na centralidade
do ensino, o procedimento é: resolução de Tarefas
particulares em que se toma uma unidade de
medida inicial pequena, depois cria-se uma
necessidade para uma unidade intermediária, com
esta se processa a medição da grandeza que se
apresentou para tal (MADEIRA, 2012, p. 109).
Fazendo a relação do modelo universal de número com
representação da multiplicação no esquema (Figura 12), tem-se:
12 Ao leitor interessado em aprofundar seus estudos sobre o conceito de número
real, indica-se a leitura da tese de doutorado de Rosa (2012).
B
D
K
n a
?
Fonte: Elaboração conforme Madeira (2012).
104
Figura 13: 1ª Tarefa: relação de multiplicação
Em seguida, substituindo no esquema as medidas obtidas:
Figura 14: 1ª Tarefa: substituição das medidas no esquema
Na figura 14, é identificado que o volume K, medido com o auxílio
da unidade intermediária, resulta em m, a qual indica a quantidade de
vezes que a unidade básica coube em K. Pelo conceito de multiplicação
tem-se m ao multiplicar quatro por seis (Figura 15).
Figura 15: 1ª Tarefa: resultado da operação de multiplicação no esquema
Isso significa dizer que a medida intermediária (4B) foi tomada por
seis vezes obtendo-se o total de medidas básicas (24B). Em síntese, a
Tarefa 1, tem por finalidade revelar o total de medidas básicas (n)
mediante a adoção de uma nova unidade de medida, a intermediária.
A próxima tarefa envolve aspectos similares àqueles apresentados
na anterior, isto é, toma por base as relações de multiplicidade e
divisibilidade entre as unidades básica e intermediária. Porém, o que as
B
D
K
6 4
m
B
D
K
6 4
24
Fonte: Elaboração conforme Madeira (2012).
?
a = n e ? = a ∙ n
Fonte: Elaboração conforme Madeira (2012).
Fonte: Elaboração conforme Madeira (2012).
4 ∙ 6 = 24
105
diferem uma da outra é o tipo de grandeza considerada no processo de
medição. Em outras palavras, antes a grandeza considerada era a contínua
(volume), agora passa a ser considerada a discreta (quantidade de
recipientes). Desse modo, a tarefa propõe encontrar o total de medidas
básicas por meio de agrupamentos.
Tarefa 2:
O professor apresenta uma figura (Figura 16) com K recipientes e
solicita aos alunos a identificação de quantos recipientes existem, porém
com a condição de que eles não podem ser contados um a um.
Figura 16: 2ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa
Diante da impossibilidade de contá-los de um a um, surge a
necessidade de formar agrupamentos para verificar quantos recipientes
existem na figura. Os alunos em discussão identificarão duas
possibilidades de formar os agrupamentos: 1) contar de três em três; 2)
contar de sete em sete, pois as demais opções não permitem formar
agrupamentos completos.
Supondo que um aluno demonstrou a resolução dessa tarefa ao
professor, em que agrupou os recipientes de três em três. Em outras
palavras, o aluno tomou como unidade de medida intermediária três
recipientes representada por E. O esquema a seguir explicita o processo
de contagem feito pelo aluno.
Figura 17: 2ª Tarefa: formação de agrupamentos (objetal e esquema
parcial)
B
E
K
7 3
?
Fonte: Elaboração conforme Madeira (2012).
Fonte: Elaboração conforme Madeira (2012).
106
Ao agrupar os recipientes de três em três, o aluno constatou a
formação de sete grupos completos, resultando em 21 recipientes. Em
seguida, o professor representou a resolução na reta numérica e no
esquema, conforme a figura 18.
Figura 18: 2ª Tarefa: formação de agrupamentos (reta e esquema)
De acordo com Madeira (2012), depois de realizada a
representação do total de medidas básicas em conexão com as unidades –
básica e intermediária – no esquema e na reta numérica, o professor
apresenta a síntese do procedimento adotado, refletindo na expressão
numérica multiplicativa: 3 ∙ 7 = 21, ou seja, toma-se o 3 por 7 vezes que
resulta em 21.
A relação feita entre medida básica e intermediária, remete ao
modelo universal de multiplicação: a ∙ n = m. No modelo, m é o total de
medidas básicas, que resulta da multiplicação do valor da unidade
intermediária (a) pelo número de agrupamentos (n) que podem ser
formados.
Nas tarefas 1 e 2, a centralidade está na elaboração do pensamento
multiplicativo para a produção do referido modelo. As duas próximas
tarefas o foco é para outro conceito matemático, a divisão. No entanto,
cabe dizer que nesse novo conceito permanecerá a relação entre o total de
medida básica e as unidades: básica e intermediária conforme consta na
multiplicação.
Tarefa 3:
O professor, novamente, quer transferir o volume (K) de um
recipiente para outro vazio. Ambos estão sobre duas mesas distantes uma
da outra, sem a possibilidade de movimentá-los (CRESTANI, 2016).
B
E
K
7 3
21
Fonte: Elaboração conforme Madeira (2012).
107
Figura 19: 3ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa
A seguir, o professor apresentará as duas unidades de medidas (B
e D) que estão disponíveis para serem utilizadas.
Figura 20: 3ª Tarefa: unidades de medida básica e intermediária
Ele informará que, em outro momento, fez a transferência
utilizando a unidade B e precisou repetir o procedimento por 28 vezes,
expondo o resultado obtido por meio do esquema, a seguir:
Figura 21: 3ª Tarefa: representação das unidades básicas no esquema
No entanto, o professor informa aos alunos que achou o
procedimento demorado. De acordo com Rosa, Damazio e Crestani
(2014), a sugestão é que o professor realize a seguinte pergunta: há outra
possibilidade de transferir o líquido de forma mais rápida sem abandonar
a unidade de medida B?
K
B
D
B K 28
Fonte: Elaborado por Rosa, Damazio e Crestani (2014).
Fonte: Elaborado por Rosa, Damazio e Crestani (2014).
Fonte: Elaborado por Rosa, Damazio e Crestani (2014).
108
Após realizar essa pergunta, o professor discute com os alunos
acerca da utilização de um recipiente de volume maior para agilizar o
processo de transferência do líquido. Nesse caso, o recipiente de volume
D será tomado como unidade intermediária.
A partir das discussões, caberá ao professor perguntar: quantas
vezes será utilizada a unidade de medida D para a transferência de todo o
líquido?
O professor fica na expectativa de que os alunos realizem a
comparação entre os volumes B e D com objetivo de verificar quantas
vezes B cabe em D. Caso não ocorra à comparação mencionada, cumpre
ao professor direcioná-los à identificação de quantas vezes a unidade
básica B cabe na unidade intermediária D (Figura 22).
Figura 22: 3ª Tarefa: relação quantitativa entre as unidades básica e
intermediária e representação da unidade intermediária no esquema
A verificação de que o volume D consiste na unidade básica
tomada por sete vezes (D = 7B), possibilita determinar quantas vezes o
volume D cabe no volume K. Isso é possível porque sabe-se o total de
medidas básicas (28B) e o valor da medida intermediária (7B). Mas, como
determinar por quantas unidades de medidas intermediárias é composto o
volume K?
De acordo com Rosa, Damazio e Crestani (2014), a partir do
esquema inicial (Figura 21), que representa o total de medidas básicas, o
professor traça uma seta da esquerda para baixo colocando o número sete,
que corresponde ao valor da medida intermediária (Figura 22). “Na
sequência, acrescenta uma seta à esquerda do esquema, e escreve um
ponto de interrogação, que representa o valor desconhecido, referente ao
total de medidas intermediárias” (ROSA; DAMAZIO; CRESTANI,
2014, p. 172). Isso se explicita na representação a seguir.
B D 7
B
D
Fonte: Elaborado por Rosa, Damazio e Crestani (2014).
109
Figura 23: 3ª Tarefa: operação de divisão no esquema
Nesse o momento, é essencial que novamente o professor
questione sobre a quantidade de medidas D que será utilizada na
transferência, além de sugerir que os alunos representem esse movimento
operacional na reta numérica.
Figura 24: 3ª Tarefa: Operação de divisão na reta numérica
A representação na reta evidencia as discussões acerca do total de
medidas intermediárias que compõem o volume K. Por meio do valor da
unidade intermediária (composta de sete unidades básicas) são formados
agrupamentos (arcos) de sete em sete na reta numérica até atingir vinte e
oito que representa o total de unidades básicas.
A reta numérica, figura 24, explicita o processo de transferência de
líquidos de um recipiente a outro, o que permite a constatação da
quantidade de arcos formados, quatro, que indicam a quantidade de vezes
que a unidade intermediária foi utilizada para transferir de todo o líquido
de um recipiente a outro.
Constata-se que as vinte e oito unidades básicas (cabíveis no
volume K), foram agrupadas de sete em sete, formando quatro
agrupamentos (ROSA; DAMAZIO; CRESTANI, 2014). Por fim é feito o
registro do resultado no esquema, conforme figura a seguir.
Figura 25: 3ª Tarefa: resultado da operação de divisão no esquema
B
D
K
? 7
28
B
D
K
4 7
28
Fonte: Elaborado por Rosa, Damazio e Crestani (2014).
Fonte: Elaborado por Rosa, Damazio e Crestani (2014).
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
110
O desenvolvimento dessa tarefa propicia a identificação de quantas
medidas intermediárias – quatro (4) – foram suficientes para a
transferência de líquido (volume K) de um recipiente a outro, sabendo
que a quantidade de medidas básicas composta na intermediária eram sete
(7). Por fim, “o professor informa que o procedimento de determinar a
quantidade de unidades de medidas intermediárias chama-se divisão”
(ROSA; DAMAZIO; CRESTANI, 2014, p. 173).
Em outras palavras, a quantidade de unidades de medidas
intermediárias é obtida dividindo o total de medidas básicas, vinte e oito
(28), pelo valor da unidade intermediaria, sete (7), obtendo quatro (4)
como resultado, ou seja, 28 ÷ 7 = 4.
De acordo com Crestani (2016), o conceito de divisão se expressa
por meio da relação entre: unidade básica, unidade intermediária e total
de unidades básicas e intermediárias. Conforme mencionamos no
decorrer deste estudo, as medidas intermediárias surgiram a partir da
dificuldade de contar grandes quantidades. Com isso, começou-se a usar
os agrupamentos como forma de agilizar o processo de contagem, antes
feito de um a um (unidades básicas) e agora agrupado de dois a dois, três
a três, quatro a quatro, e assim sucessivamente (unidades intermediárias).
Para a autora,
A formação do sistema conceitual formado pela
multiplicação e divisão só foi possível com a
criação da unidade de medida intermediária
(multiplicando e divisor, respectivamente). Do
contrário, o homem ainda estaria realizando a
contagem um a um e, consequentemente, não teria
atingido o alto nível de elaboração conceitual e os
avanços científicos alcançados até nossos dias
(CRESTANI, 2016, p. 41).
Para Crestani (2016), as relações expressas entre as unidades de
medidas, modeladas por meio da reta numérica, esquema de setas e letras,
permitem diferentes representações da relação universal do conceito de
divisão. São elas: a forma objetal, a forma gráfica e a literal, conforme a
figura a seguir.
111
Figura 26: 3ª Tarefa: modelo objetal, gráfico e literal
Fonte: Elaborado por Crestani (2016).
Crestani complementa que:
A representação objetal da relação entre grandezas
(volume com volume, comprimento com
comprimento, ...), geradora do conceito de divisão,
gradativamente é reproduzida na reta e no
esquema. Cada representação objetal é válida para
uma grandeza específica. A reta e o esquema, por
sua vez, expressam de modo mais amplo a
interconexão válida para qualquer grandeza, na
qual se revela a essência do conceito de divisão. Ou
seja, a relação entre grandezas particulares, com
medidas singulares, é substituída pela relação
válida para qualquer grandeza, na reta numérica e
no esquema, portanto, universal (CRESTANI,
2016, p. 51).
Após a superação da forma objetal para a gráfica, o proposto é que
seja representado pela forma literal. De acordo com Crestani (2016), com
base em Davýdov, nesse movimento de transformação permanece a
relação essencial do conceito de divisão.
A tarefa tinha o propósito de introduzir o conceito de divisão e de
verificar a sua procedência na relação do total de medidas básicas com as
unidades: básica e intermediária. A tarefa seguinte tem a finalidade de
m a
Total de
unidades de
Medida básica e
intermediária
Unidade
de Medida
básica
Unidade de
Medida
Intermediária
Modelo
objetal
m
n n a
m
Modelo
gráfico
n = m ÷ a
Modelo
literal
a
a
112
mostrar que a divisão também pode expressar outra relação do total de
medidas básicas com as unidades: básica e intermediária.
Tarefa 4:
Na transferência de líquido de um recipiente para outro, vazio,
verificou-se que a medida intermediária foi utilizada 38 vezes para
deslocar o volume K, composto por 342 unidades básicas. Tal
procedimento foi representado pelo esquema (Figura 27).
Figura 27: 4ª Tarefa: representação gráfica da operação de divisão
Com base no esquema, representar a transferência de líquido na
reta numérica. Mediante a análise do esquema é possível verificar a
impossibilidade de representação – transferência de líquido – na reta
numérica, uma vez que o valor da unidade intermediária é desconhecido.
Sendo assim, surge a necessidade de encontrar o quanto vale essa unidade
para realizar a representação da transferência na reta numérica.
O surgimento de tal necessidade propicia que o professor indague:
como se obter o valor da unidade intermediária?
Para Crestani (2016), a partir da revelação do modelo gráfico e
literal de divisão (Figura 26) novas relações se estabelem por meio do
estudo de suas propriedades13. Ao se conhecer o total de medidas básicas
(m) e quanto mede a unidade intermediária (a) (tarefa 03), o valor a ser
identificado corresponde à quantidade de unidades intermediárias
presente no total de medidas básicas (?), isto é, m ÷ a = ? (Figura 28).
Uma nova relação é estabelecida quando se conhece o total de medidas
básicas (m) e a quantidade de unidades intermediárias (n), mas será
necessário saber quanto mede a unidade intermediária (a), ou seja, m ÷ n
= ? (Figura 28).
13 Ao leitor interessado em aprofundar seus estudos sobre o estudo das
propriedades da divisão, indica-se a leitura da dissertação de Crestani (2016).
B
D
K
38 ?
342
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
113
Figura 28: 4ª Tarefa: transformação do modelo
A nova relação acima estabelecida para o conceito de divisão
possibilita a identificação do valor da unidade intermediária, por isso, ela
é tomada para a resolução da presente tarefa. Sendo assim, as 342
unidades básicas dividas em 38 unidades intermediárias iguais (na reta
numérica esse valor consiste na quantidade de agrupamentos iguais)
resulta em nove (9) como o valor (medida) da unidade intermediária (na
reta numérica esse valor indica o tamanho de cada agrupamento),
conforme a figura 29.
Figura 29: 4ª Tarefa: resultado da operação de divisão no esquema
Com a constatação do valor da unidade intermediária é feita a
representação do processo de transferência de líquido na reta numérica.
Figura 30: 4ª Tarefa: resultado da operação de divisão na reta numérica
B
D
K
? a
m B
D
K
n ?
m
B
D
K
38 9
342
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
114
Na reta numérica (Figura 30), o arco azul indica o total de medidas
básicas, trezentos e quarenta e dois (342), o arco tracejado indica a
quantidade de unidades intermediárias (agrupamentos), trinta e oito (38),
e os arcos menores representam a medida da unidade intermediária, nove
(9), o tamanho de cada agrupamento.
As tarefas 3 e 4 explicitam que a operação de divisão se realiza nas
duas seguintes situações: 1) tem-se o total de medidas básicas, o valor da
unidade intermediária e está ausente o número de vezes que a unidades
intermediária (quantidade de agrupamentos) se repete; 2) sabe-se o total
de medidas básicas, a quantidade de vezes que a unidade intermediária se
repete e é desconhecido o valor da unidade intermediária (tamanho do
agrupamento).
No que se refere à operação de divisão, no contexto da relação
entre o total de medidas básicas, o valor da medida intermediária e a
quantidade de vezes que a unidade intermediária se repete, vale destacar
que para essa operação seja realizada é necessário ter o total de medidas
básicas e apenas o valor da medida intermediária ou a quantidade de vezes
ela se repete.
A partir da verificação de como ocorre a introdução dos conceitos
de multiplicação e divisão na proposição davydoviana – tratados nas
tarefas 1, 2, 3 e 4 – daremos continuidade a elaboração das tarefas
particulares. Porém, agora, com o foco para a compreensão do conceito
de Medidas de Tendência Central.
As tarefas abordadas na seção seguinte, tratam de introduzir os
conceitos de média e mediana, conforme os princípios da Teoria
Histórico-Cultural. Elas por sua vez, se diferenciam do ensino tradicional
por não iniciar o ensino desses conceitos por suas definições, mas em
revelá-los durante o desenvolvimento das tarefas. Procura, pois superar o
ensino que se tem em sala de aula, baseado na apresentação de dados
isolados e/ou no estabelecimento da média e da mediana deslocado de
suas relações essenciais.
5.2 INTRODUÇÃO DE MÉDIA E MEDIANA COM USO DA LOUSA
DIGITAL
Nesta seção, apresentam-se tarefas desenvolvidas para o conceito
de Medidas de Tendência Central. Essencialmente, o pressuposto é que
essa sequência de tarefas proporcione a apropriação dos conceitos
teóricos de média e mediana. Vale antecipar que elas estão organizadas
de modo que possibilite aos alunos o entendimento de que a média e a
115
mediana são medidas que expressam uma igualdade ou uma aproximação
entre os dados. Propõe-se uma impossibilidade na resolução das tarefas
para que elas não sejam resolvidas de forma imediata, com a possibilidade
de colocar o aluno em ação investigativa.
Davídov (1988) estabelece que a tarefa de estudo, desde o primeiro
ano escolar está vinculada à finalidade de que os estudantes e apropriem
do conceito de número como relação entre grandezas. Analogamente, as
tarefas estabelecidas para o presente estudo trazem como finalidade a
apropriação, por parte dos acadêmicos do curso superior, do conceito
teórico de média e mediana como medidas com tendência ao centro. Para
tal finalidade, propõe-se o conjunto de tarefas a seguir.
O desenvolvimento das tarefas propostas para o ensino de Medida
de Tendência Central traz como operação básica a adoção da Lousa
Digital.
A tarefas propostas para o ensino de Medida de Tendência Central
foram elaboradas, a partir de reflexões com membros do grupo
GPEMAC, com a possibilidade de terem suas operações desenvolvidas
com o uso da Lousa Digital na prática docente do ensino superior.
O primeiro recurso, disponível no software ActivInspire, a ser
explorado é a gravação de tela, cuja escolha, deu-se pelo entendimento de
que se trata de ferramenta importante para realizar acompanhamento do
desenvolvimento das tarefas. A “Gravação de Tela” captura todos os
movimentos realizados, desde a escrita, a navegação por telas e o áudio.
Esse recurso permite analisar, num momento posterior, os processos
desenvolvidos para a resolução da tarefa proposta.
O recurso precisa ser acionado antes do início da resolução e salvo
ao final. Para encontrar o “Gravador de Tela” percorre-se a guia
“ferramentas”, selecionando a opção “mais ferramentas”. Nela
encontram-se duas opções de gravação: “Gravador de tela inteira” ou
“Gravador de tela parcial”.
116
Figura 31: Gravador de Tela
Para iniciar a gravação, após selecionar uma das duas opções de
tela (inteira ou parcial), abre uma pequena janela. Nela, é preciso clicar
no botão vermelho e na, sequência, escolher um lugar no computador para
salvar o arquivo. A partir daí, a gravação inicia automaticamente,
conforme a figura a seguir.
Figura 32: Salvar Gravação de Tela
Para encerrar a gravação, seleciona-se, novamente, o “Gravador de
tela inteira” e clica-se em parar gravação (Figura 33). Após esse
procedimento, a gravação está disponível no local de salvamento
escolhido.
Fonte: ActivInspire (v.8, 2016).
Fonte: ActivInspire (v.8, 2016).
117
Figura 33: Parar Gravação de Tela
Após a programação da gravação, propõe-se o início do
desenvolvimento das tarefas. A primeira delas, tarefa 5, tem a pretensão
de gerar necessidade dos estudantes da busca de dados que conduzirão à
relação essencial do conceito de média. Em termos conceituais, traz ideia
de que os conceitos matemáticos tem como base essencial a grandeza e
suas relações (DAVÍDOV, 1988). A intenção é introduzir a necessidade
de comparação entre as grandezas (no caso volume), com o propósito de
desenvolver a ideia de igualdade. Leontiev (2004) entende que toda
atividade parte de uma necessidade e que sem ela a atividade não se
constitui.
Tarefa 5:
Sobre uma mesa, têm-se dois recipientes com volumes diferentes.
A sugestão é que o professor desenvolva um experimento com dois
grupos de alunos, cada qual use a mesma quantidade de água em ambos
os recipientes. Para tal, solicitou ao responsável pelo laboratório que
preparasse os dois recipientes. Contudo, ao chegar na sala, o professor
verificou que os volumes dispostos nos recipientes não estavam de acordo
com o estabelecido.
Por se tratar de uma proposição de Ensino Superior, pressupõe-se
que não se faz necessário presença física dos recipientes com água. Por
isso, recorre-se à Lousa Digital, por entender que as operações, em
determinados momentos, se automatizam, concretizando-se em formas
materiais desde a mais simples até as mais elaboradas, como:
instrumentos, calculadoras e computadores (LEONTIEV, 1978). No
presente estudo, a linguagem digital tem a pretensão de expressar
movimentos de pensamentos. Desse modo, tem-se o entendimento de que
Fonte: ActivInspire (v.8, 2016).
118
a Lousa Digital possibilita, de imediato, atender um dos tipos de
representação conceitual orientado por Davídov (1987), a objetal (Figura
34).
Figura 34: 5ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa na Lousa
Digital
Diante disso, o professor indica aos alunos que não poderá iniciar
o experimento, e questiona: o que está impedindo a sua realização?
Vale lembrá-los de que, para o desenvolvimento do experimentos
a condição necessária para sua realização consiste na igualdade de água
nos recipientes utilizados.
Supõe-se que, na primeira análise realizada (de ordem sensorial),
seja verificado que a quantidade de água do recipiente R1 é diferente da
quantidade de água de R2. Se a Lousa Digital permite a primeira
representação entre as grandezas, a objetal, assim também possibilita que
oriente os alunos para outro tipo de representação, a gráfica. Esta ocorre
por segmentos de reta, que expressam as seguintes relações de medida: 1)
se as grandezas, no caso volume, forem iguais, então, os dois segmentos
representativos terão o mesmo comprimento; 2) como os volumes são
diferentes, então, suas representações se dão por segmentos de
comprimentos desiguais (Figura 35).
Para essa representação, propõe-se que o professor indique que um
estudante vá até a Lousa Digital e realize as representações dos
segmentos. Nessa operação, os estudantes podem indicar modos
diferentes para representar na reta numérica: utilizar a opção ‘caneta’ ou
a partir da opção ‘ferramentas’. Cabe ao professor destacar que o uso da
‘caneta’ não permite edição dos objetos desenhados como em um quadro
comum. Sugere-se assim, a outra opção, ‘ferramentas’. Nela, seleciona-
se o item ‘forma’ que exibe uma série de formas geométricas que
Fonte: Elaboração conforme Rosa (2017).
119
possibilitam registrar os segmentos representativos dos volumes.
Enquanto o aluno está na Lousa, os demais podem registrar em seus
cadernos, ou ainda, em seus próprios computadores, pois há a
possibilidade de instalação do software em suas máquinas. O
estabelecimento da ida do estudante até a lousa é feito de forma
intencional para que a interação entre eles ocorra com o intuito de resolver
a tarefa juntos.
Figura 35: 5ª Tarefa, desigualdade de volumes (c e d) expressa por
segmentos
Tal análise permite, aos alunos, também verificarem que o volume
do recipiente R1 é menor que o volume do recipiente R2 ou o volume de
R2 é maior que R1. Essa constatação é representada na reta numérica,
novamente por segmentos e destacados por arcos, em que c representa a
quantidade de volume do recipiente R1 e d a quantidade recipiente R2
(Figura 36).
De acordo com Madeira (2012), no modo davydoviano de
organização do ensino de Matemática, essa representação indica que a
reta se constitui como elemento mediador no processo de apropriação dos
conceitos. Ela, pode ser construída na Lousa Digital pelo estudante
utilizando-se, novamente, da opção ‘formas’.
Figura 36: 5ª Tarefa, volume (c e d) representado na reta e por segmentos
Fonte: Elaboração conforme Rosa (2017).
Fonte: Elaboração conforme Alves (2013).
120
A partir dessa relação entre as duas quantidades de volume
expressas nos segmentos de reta constata-se que o volume c < d, ou d >
c. Essas representações das grandezas por meio de letras “[...] permitem
o estudo das propriedades entre relações de igualdade e desigualdade das
grandezas”, em outras palavras, derivam do estudo das relações de: maior,
menor, igual e diferente (ROSA, 2012, p. 128).
Diante da situação em análise, o professor lançará o
questionamento: como proceder para iniciar o experimento?
Considera-se, por exemplo, que os grupos apresentem soluções
diferentes para a situação e exponham na Lousa Digital.
Por exemplo, o Grupo 1 retira do recipiente R2 um volume x que
tem a mais que o volume c contido no recipiente R1.
Nesse momento, atribui-se ao professor o papel de discutir com os
estudantes a representação, nos segmentos, dos movimentos de retirada
de água do recipiente R2 para igualar ao volume de R1. Para tanto, se faz
necessário que o segmento maior sofra retirada para igualar-se ao
segmento representativo do volume de R1 (Figura 37).
Tal representação, conforme Rosa (2012), se constitui em uma
ação essencial do processo de desenvolvimento do pensamento conceitual
teórico. Trata-se de abstrações que desvincula o pensamento de
características externas do objeto, isto é, de dados empíricos que se
apresentam de imediato dos órgãos dos sentidos.
Figura 37: 5ª Tarefa - Igualdade de volumes representados objetal e
graficamente - Grupo 1
A igualdade de volume pode ser expressa também na reta numérica
(Figura 38). Ela possibilita o encaminhamento para uma nova
representação, uma abstração, a literal que, segundo Alves (2017), revela
a relação essencial do conceito de adição e subtração, que é a relação todo
– parte.
Fonte: Elaboração conforme Rosa (2012).
121
Figura 38: 5ª Tarefa - Igualdade de volumes (reta numérica) - Grupo 1
A figura 38 mostra o processo feito para igualar os volumes dos
recipientes com o auxílio da reta numérica. A movimento do pensamento
expressa-se pela representação da igualdade por meios dos arcos e
segmentos contidos na opção ‘formas’. Segundo Rosa,
Os arcos constituirão uma importante ferramenta
no processo de elaboração do esquema geral de
resolução de problemas de adição e subtração.
Além disso, subsidiarão a introdução de um novo
tipo de representação das relações entre grandezas,
a representação literal que, por sua vez,
possibilitará a expressão das relações entre
grandezas em sua forma abstrata (ROSA, 2012, p.
122).
O procedimento consiste em retirar do segmento d, a quantidade x expressa pelo arco, resultando em c. O segmento c corresponde ao volume
do primeiro recipiente, d representa a medida do volume do segundo
recipiente, e x a quantidade a ser retirada para tornar o volume de R2 igual
ao de R1. Genericamente, o referido procedimento é representado na
forma literal por: d – x = c. Davýdov (1982), considera esse tipo de representação e suas interconexões a consolidação das propriedades
fundamentais das grandezas.
Um procedimento oposto, em relação ao anterior, pode ser
apresentado pelo segundo grupo: ao invés de retirar o líquido, acrescenta-
se.
Fonte: Elaboração conforme Alves (2013).
122
O Grupo 2 acrescenta ao recipiente R1 um volume x para igualar
ao volume do recipiente de R2 (Figura 39). A adoção de procedimento,
distinto do Grupo 1, para a realização das representações (objetal e por
segmentos). No entanto, exige uma operação que requer o aumento dos
segmentos.
Figura 39: 5ª Tarefa - Igualdade de volumes representados objetal e
graficamente - Grupo 2
A figura 40 representa o processo de igualar o volume dos dois
recipientes na reta numérica. Novamente, o movimento de pensamento
para a representação da igualdade é proposto na Lousa Digital, expresso
com o uso dos arcos e segmentos disponíveis na opção ‘formas’. O arco
d indica o volume maior, o arco c o volume de R1 e arco x a quantidade a
ser adicionada para obter a igualdade entre os volumes dos dois
recipientes.
Figura 40: 5ª Tarefa: igualdade de volumes (reta numérica) - Grupo 2
Esse procedimento, realizado pelo Grupo 2 para igualar os
volumes de R1 e R2, é representado genericamente na forma literal por: c
Fonte: Elaboração conforme Rosa (2012).
Fonte: Elaboração conforme Alves (2013).
123
+ x = d. Trata-se, segundo Alves (2017), da relação aditiva, pois adiciona-
se uma parte a outra para formar o todo.
O desenvolvimento dessa tarefa teve a finalidade de partir da
desigualdade de volumes e alcançar a igualdade. Diante de duas possíveis
formas de apresentação de resolução da tarefa, pode-se verificar que tanto
o acréscimo quanto a retirada de líquido ocasionam a alteração do volume
contido inicialmente nos dois recipientes.
As duas possibilidades de resolução da tarefa trazem a ideia de
procedimentos para que ocorra a “igualdade” – entre grandeza volume,
de dois recipientes – peculiaridade dos conceitos de adição e subtração
(ALVES, 2017). Mas, por que uma tarefa com esse teor, de medidas de
tendências centrais, que poderá ser desenvolvida com estudantes do
ensino superior?
A explicação que tem-se se pauta pelo modo de que,
provavelmente, o sistema conceitual adição/subtração tenha sido
apropriado pelos estudantes que não corresponde ao que propôs-se nas
tarefas. Ou seja, diferem em sua essencialidade da relação todo/partes
(ALVES, 2017). Do mesmo modo, se pode dizer sobre o sistema
multiplicação/divisão. Em outras palavras, os dois sistemas conceituais –
base para o conceito de média – como apresentado, anteriormente, trazem
novas significações para os estudantes, mesmo em fase mais adiantadas
do sistema educacional brasileiro.
A tarefa tinha por finalidade iniciar a busca por dados que
conduzirão revelação da relação essencial do conceito de média. A
próxima tarefa trata-se de uma situação similar a anterior, contudo, a
necessidade de igualar a quantidade de volumes, recebe o impedimento
de alteração do volume inicial nos respectivos recipientes. O que entende-
se ser um elemento pertinente de reflexão para colocá-los em ação
investigativa.
Tarefa 6:
Para a realização do próximo experimento, o professor simula a
solicitação ao responsável do laboratório que colocasse uma certa
quantidade de água em n recipientes, pois não sabia exatamente a quantidade de alunos que viriam para fazer o experimento. Ele verifica
que a quantidade de água em cada recipiente é diferente, conforme mostra
a figura 41, preparada previamente pelo professor aproveitando as
funcionalidades que a Lousa oferece.
124
Figura 41: 6ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa na Lousa
Digital
A desigualdade apresentada pelos volumes nos recipientes, figura
41, gera um impasse na execução do experimento, uma vez que, almeja-
se que todos os alunos cheguem a um mesmo resultado. Após enfatizar a
desigualdade dos volumes, propõe-se um questionamento pelo professor:
diante de tal impasse, como proceder o experimento?
Para que todos os alunos cheguem a um mesmo resultado, todos os
recipientes deverão possuir a mesma quantidade de água. Sendo assim,
para dar continuidade ao experimento, a condição é que eles adotem um
procedimento que estabeleça a igualdade entre os volumes. Nesse
momento, cabe o professor orientá-los para que não seja alterado o total
de líquido distribuídos nos respectivos recipientes.
Pode ocorrer que os estudantes indiquem, para resolução do
impasse, a transferência de água de um recipiente para outro até que todos
tenham a mesma quantidade. No entanto, o professor, por meio de
discussões, levanta a hipótese de que tal procedimento se tornaria
demorado devido ao número de recipientes utilizados. Além disso,
durante a transferência de líquido, existe a possibilidade de seu
desperdício, o que implicaria na alteração do volume inicial de água. Vale
lembrar que, conforme estabelecido pelo professor, o volume total não
tolera modificação.
Outro aspecto a ser discutido é sobre o modo de disposição dos
recipientes. Diferentemente da escola tradicional, os objetos não estão
apresentados de forma direta, foram suprimidos alguns dos recipientes.
De acordo com Crestani (2016), essa condição carece de reflexão sobre
como atingir a representação total, o que coloca os estudantes em ação
investigativa. Isso significa que o estudante em processo de atividade de
estudo que o coloca em movimento de pensamento. Em outras palavras,
Fonte: Elaboração da autora com base em Crestani (2016).
125
está em processo de apropriação conceitual, isto é, de transformação da
atividade externa em interna, tomada de consciência (LEONTIEV, 1978).
A ação de análise dos dados da tarefa, que se estabelece
inicialmente constitui-se como essencial para a identificação da relação
universal do conceito. Para Davídov (1988), essa ação trata de uma
transformação orientada dos dados da tarefa para atingir sua finalidade.
Com a intensão de agilizar o processo de deixar os recipientes com
volumes iguais, o professor sugere transferir o líquido de todos os
recipientes para um recipiente maior, representando o volume encontrado
por meio de segmentos (Figura 42). Nesse âmbito, o professor apresenta
a Lousa Digital como um instrumento substitutivo do experimento objetal
propriamente dito, pois tem-se como pressuposto de que o nível escolar
dos estudantes carece de operações mais elaboradas de reprodução do
movimento do pensamento.
Entende-se que um instrumento apresentado como meio operatório
para atingir uma ação – nesse caso, de representação do pensamento -
distancia-se de uma visão determinista, pois não prioriza o uso da
tecnologia como fim, como centro do processo de aprendizagem.
Segundo Peixoto e Carvalho (2011) a utilização de instrumentos
tecnológicos, por professores e estudantes, só e possível se o intuito for o
auxílio na apropriação do conhecimento e desenvolvimento de suas
funções mentais. Ou, como diz Leontiev (1978), é uma operação que
caracteriza uma aprendizagem, pois houve um processo de uma ação
anterior, no caso era a apropriação do uso da Lousa Digital. Nesse
momento, é um meio, uma condição objetiva para a execução da ação –
no caso de análise dos dados da tarefa – para revelar a relação essencial
do conceito de média (DAVÌDOV, 1988). Ainda, conforme Vieira Pinto
(2005), é técnica que se configura em dado da realidade objetiva,
percepção humana, retornável ao mundo em forma de ação no processo
de transmissão cultural.
O professor, tem a opção de dirigir-se até a Lousa Digital ou,
preferencialmente, solicitar a um estudante que o faça, para, assim,
realizar a operação de representação da transferência de líquido para um
recipiente maior. Essa operação pode ser concretizada pela opção
‘formas’ disponíveis no software, ou ainda, desenhada manualmente
selecionando a opção ‘caneta’, na barra de ferramentas.
126
Figura 42: 6ª Tarefa: transferência de líquido para um recipiente maior
A transferência dos líquidos realizada para o recipiente B
possibilita a identificação do total de líquido (m) a ser utilizado no
experimento. Sugere-se ao estudante, que estiver na lousa, que represente
a referida transferência de líquidos na reta numérica (Figura 43). Isso é
proposital para que ele e os demais estudantes o auxiliem nessa síntese.
Figura 43: 6ª Tarefa: representação dos dados na reta numérica
Na figura 43, o total de volume é representado por m, cada arco
menor hi indica o volume de cada recipiente e n a quantidade dos
recipientes. A letra i, presente em hi, é utilizada para indicar quais volumes
serão adicionados.
Considerando que o total de volume (m) consiste na soma dos
volumes dos recipientes, esse total pode ser representado por Σ hi. A letra
grega maiúscula, sigma, significa somatório, e hi os volumes a serem
somados. Em matemática, somatório, consiste em somar as partes, em
outras palavras indica a totalidade (HOUAISS, 2001). Tal somatório é
representado por: Σ hi = h1 + h2 + h3 + ⋯ + hN-2 + hN-1 + hN.
Fonte: Elaboração da autora (2017).
Fonte: Elaboração da autora conforme Crestani (2016).
127
Após a identificação do total de volume, o professor questiona os
alunos: qual o volume a ser colocado em cada recipiente para que seja
possível iniciar o experimento?
Esse questionamento direciona para um componente conceitual
essencial: que os recipientes apresentem a mesma quantidade de líquido.
Há, pois, uma relação de igualdade a ser estabelecida por meio da
distribuição do total de volume (m) nos n recipientes em partes iguais.
Diante da necessidade de transferir todo o líquido de B para os n
recipientes, o professor introduz um novo recipiente, que será a base
material que trará o conceito de medida intermediária no âmbito do
conceito de média (Figura 44).
Figura 44: 6ª Tarefa: unidade básica
A partir da introdução do recipiente A é estabelecida a relação
entre ele e o total de volume em B. O recipiente A é tomado como unidade
de medida, o que permite determinar quantas vezes cabe na grandeza, em
outras palavras, indica que em B a unidade A cabe m vezes (Figura 45).
De acordo com Davídov (1988) a introdução de uma unidade de medida
é necessária para que se estabeleça relações entre as grandezas em
cumprimento a primeira ação de estudo: transformação dos dados da
tarefa.
Figura 45: 6ª Tarefa: representação da unidade básica no esquema
Contudo, surge outra necessidade conceitual: saber o quanto de
líquido será colocado em A para esvaziar B, de modo que garanta a
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
128
mesma quantidade de líquido em cada um dos n recipientes a ser usado
pelos alunos.
Sabendo que cada um dos n recipientes terá a mesma quantidade
de líquido, o professor faz a representação na reta numérica do total de
volume de água ( hi), da quantidade n de recipiente, bem como de cada
um dos n recipiente com a mesma quantidade de líquido. Tal
representação, auxilia os alunos na identificação do conceito, que se
constituirá ao encontrar o quanto de líquido será colocado em A para
esvaziar B (Figura 46).
Figura 46: 6ª Tarefa: representação da igualdade de volume na reta
numérica (parcial)
Para que os arcos fiquem todos iguais desenha-se apenas um arco
a partir da opção ‘formas’, seleciona-se o objeto e duplica-se n vezes a
partir do ‘menu de edição de objetos’. Esse movimento encontra-se,
também, em outros instrumentos não abordados nessa pesquisa. No
entanto, sua representação na lousa se apresenta de caráter imediato, por
reunir as funcionalidades de outros recursos tecnológicos num único
espaço.
A resolução remete ao conceito de divisão, pois sua representação
explicita o total de líquido, a quantidade de agrupamentos (n recipientes)
e falta a identificação do tamanho de cada agrupamento (quantidade de
líquido a ser colocado em cada recipiente). A questão a dirigir aos
estudantes é: Qual a operação matemática a adotar?
Na certa, sugestão e dúvidas se apresentarão no debate entre
professor e estudantes, que contribuirá na tomada de decisão que a
operação indicada é a divisão do total de volume de água ( hi) pela
quantidade n de recipientes. Por consequência, ter-se-á o quanto de
volume será colocado no recipiente A (unidade básica), representando por
a, para depois transferir essa quantidade de volume a cada um dos
Fonte: Elaboração da autora com base em Crestani (2016).
129
recipientes a serem usados pelos alunos no experimento. Novamente, o
professor retoma a representação na reta numérica para indicar o resultado
da divisão realizada (Figura 47).
Figura 47: 6ª Tarefa: representação da igualdade de volume na reta
numérica
Para Davídov e Slobódchikov (1991) a tarefa precisa manifestar
uma necessidade nos estudantes para que os movam, isto é, mantenha-os
em atividade de estudo. Nesse sentido, na transferência do líquido de B a
cada um dos n recipientes com o recipiente A, cabe ao professor discutir
com os alunos o quão lento pode ser o processo, pois o recipiente A é
pequeno. Para agilizar o processo de transferência, o professor introduz o
recipiente C, unidade intermediária, que é maior que o A (Figura 48).
Figura 48: 6ª Tarefa: unidade intermediária
Como os alunos sabem que em cada um dos n recipientes será
colocado a vezes o recipiente A cheio de líquido, eles colocam as a vezes em C e realizam uma marca para identificar o quanto de líquido será
colocado em cada um dos n recipientes. Tal marca é representada na
seguinte anotação feita na lousa (Figura 49).
Fonte: Elaboração da autora com base em Crestani (2016).
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
130
Figura 49: 6ª Tarefa: relação quantitativa entre as unidades básica e
intermediária no esquema
Cabe dizer que em C será colocado líquido por n vezes até atingir
a marca para esvaziar completamente o recipiente B (Figura 50).
Figura 50: 6ª Tarefa: representação da unidade intermediária no esquema
Como o recipiente C é o intermédio, durante o processo de
transferência de líquido do recipiente B para os n recipientes, permite que
se admita C como a unidade intermediária. Propõe-se, nesse momento,
uma síntese que indique a revelação dos dados pertinentes à primeira ação
de estudo de Davídov. Tem-se: a unidade de medida básica (volume
menor); mudança de unidade de medida para intermediária; total de
medidas (volume maior); e a quantidade de vezes que uma cabe na outra.
Tais dados se apresentam diante da necessidade de transferência de
líquido em partes iguais. Conforme Crestani (2016), nessa ação, a relação
objetal constituída entre as unidades de medida possibilita que a tarefa
seja resolvida no plano teórico.
A partir da revelação do dados da tarefa, encaminha-se para outra
ação de estudo, que consiste em modelar a relação universal do conceito
de média. Ela consiste em modelar da relação universal do conceito de
média. Isso se deve pelas abstrações realizadas por meio da reta numérica,
de esquema de setas e letras. De acordo com Davídov (1988, p. 182), o
modelo constitui “uma ligação interna imprescindível no processo de
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
Fonte: Elaboração conforme Crestani (2016).
131
assimilação dos conhecimentos teóricos e dos procedimentos gerais de
ação”.
Os dados apresentados na tarefa – unidade básica, intermediária e
total de unidades - compõem a relação universal do conceito de divisão
(CRESTANI, 2016). Este, por sua vez, mostra-se essencial para o
conceito de média, pois a partir dele se obtém a igualdade. Diante disso,
é proposto que se recorra ao mesmo esquema e das representações na reta
– referente ao conceito de divisão para que se estabeleça a relação
universal de média. O professor encaminha os estudantes para que
representem todo o processo no esquema, modelo literal (Figura 51).
Contudo, nessa representação traz dois componentes novos: 1) a
quantidade de unidade básica, na relação A B, do esquema (Figura 51)
requer a operação de adição, isto é um somatório de todos os dados (∑hi);
2) a composição da medida intermediária a também prescinde de uma
divisão (𝑎 =∑ℎ𝑖
𝑛 ). Isso significa que o esquema é o mesmo, mas seus
componentes numéricos assumem novos significados conceituais.
Portanto, ocorre um processo de complexificação que, numa leitura da
teoria da atividade (LEONTIEV, 1978), ocorre pela transformação da
ação de modelar a relação universal do conceito de divisão (ocorrida
anteriormente) em operação para a modelação no estudo do conceito de
média.
Figura 51: 6ª Tarefa: representação da média no esquema e no modelo
literal
Por meio dessa divisão, tem-se o valor do agrupamento (a) que
torna os recipientes com o mesmo volume.
Fonte: Elaboração da autora com base em Crestani (2016).
132
Figura 52: 6ª Tarefa: representação da igualdade de volume na forma
objetal
Ao dividir o total de água pelo número de agrupamentos formados
(n), obtém-se o valor a, que corresponde ao valor da unidade
intermediária. Em estatística, esse tipo de divisão é a síntese
representativa tem-se odo conceito de média. O pensamento desenvolvido
a partir desse movimento – representação objetal, gráfica e literal – é
entendido por Davýdov (1982) como uma manifestação do pensamento
teórico.
No entanto, a literatura que trata especificamente de Estatística
aborda o conceito de média, basicamente, com a indicação da divisão da
soma dos valores dos elementos pelo número de parcela. Tal modo de
apresentação – a tradicional – se apresenta como possibilidade de
confronto analítico ao que se propõe no presente estudo, pelos estudantes
do ensino superior. Para tanto, a Lousa dá a possibilidade de uso para que
eles busquem, via internet (no google acadêmico), o modo que alguns
autores de livros de Estatística tratam o conceito em pauta. O professor
sugere que eles busquem nas Referências Bibliográficas do Plano de
Ensino e faça a consulta. Nesse âmbito, por exemplo, os acadêmicos
encontrarão Tiboni (2010, p. 129) que indica, a média (�̅�) é como uma
medida de posição central, correspondente a um equilíbrio entre os dados
coletados. O seu cálculo é feito “por meio da divisão entre a soma dos
valores da série pelo número total de valores”. Em seguida, expõe a
fórmula de cálculo, conforme figura 53:
Figura 53: 6ª Tarefa: representação da média segundo Tiboni
Fonte: Elaboração de Tiboni (2010).
Fonte: Elaboração da autora (2017).
133
A partir dessa representação ocorreria um processo de reflexão,
entre professor e estudantes, em diálogo mediado pela fórmula de Tiboni
(2010) e o modelo da figura 51. Trata-se apenas de discutir com eles o
significado e a correlação das letras. Assim, o a do nosso modelo
corresponde ao x̅, pois ambos indicam ao valor da média, os termos x1, x2,
x3, ..., xn dados. O hi é o mesmo que xi, soma dos dados coletados até a
ordem n. Além disso, n, em ambas as representações, corresponde à
quantidade de dados coletados.
Vale salientar que a proposição nessa dissertação difere das
literaturas tradicionais. A apropriação do conceito de média requer um
processo de análise e síntese com a ideia central da relação entre
grandezas, o que requer a soma dos dados coletados e dividir pelo número
de agrupamentos, cujo o valor obtido significa uma unidade
intermediária. Essa é a relação universal do conceito de média. Essa
conjuntura de investigação do princípio interno do objeto, que reflete a
essência do conceito, segundo Libâneo (2014), é o que possibilita, aos
estudantes, o desenvolvimento do tipo de pensamento teórico. Este é
entendido, por Leontiev (1978) e Davídov (1988), como propulsor do
desenvolvimento humano.
A tarefa 6 proporcionou a revelação do conceito de média, num
processo em que a partir de valores diferentes (desiguais) foi obtido um
valor que representa uma igualdade. Sobre essa igualdade, vale destacar
que ela corresponde ao que Tiboni (2010) entende por média, isto é, uma
posição de equilíbrio entre os dados coletados.
A tarefa a seguir tem o propósito de verificar que o valor
responsável por tornar os recipientes com volumes iguais, localiza-se, na
reta numérica, entre os demais valores apresentados. Trata-se, agora de
uma situação singular.
Tarefa 7:
Uma empresa de tratamento de água realizará testes de três
produtos químicos de mesma finalidade A, B e C. Para os testes será
utilizado uma mesma quantidade de cada produto, que será dissolvido em
três reservatórios contendo água. Represente na reta numérica o volume que cada recipiente precisará conter para que o teste seja realizado de
forma adequada, sabendo ainda que se deve utilizar toda a água contida
nos reservatórios.
134
Figura 54: 7ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa
Para que o teste seja realizado de forma eficaz, a desigualdade de
volume em cada reservatório, representada por meio de segmentos
(Figura 55), não pode existir, pois haverá interferência no resultado dos
testes. Isso significa dizer que surge a necessidade da igualdade de
volume em todos os reservatórios. Novamente, surge a necessidade de
comparação entre grandezas, base dos conceitos matemáticos
(DAVÍDOV, 1988). Uma necessidade, segundo Leontiev (1978), é o que
move o homem para estar em atividade. Búrigo (2015) destaca que, na
proposição davydoviana, toda tarefa particular cria uma necessidade com
teor didático e conceitual matemático. Dito em outros termos, suscita a
elaboração e desenvolvimento de uma nova tarefa com um novo
componente conceitual. É essa confluência, gerada pela necessidade, que
coloca os alunos em permanente ação investigativa e, por consequência,
em atividade de estudo e desenvolvimento do pensamento conceitual.
No processo de resolução da tarefa 7, assim como nas anteriores,
o professor pode solicitar que um aluno se dirija à Lousa Digital a fim de
que proceda a representação por segmentos e, também, na reta numérica.
Figura 55: 7ª Tarefa - Representação da desigualdade de volumes, na reta
numérica e por segmentos
Fonte: Elaboração da autora (2017).
Fonte: Elaboração conforme Alves (2013).
135
A partir das quantidades de volume expressas nos
segmentos de reta, verifica-se as seguintes relação de
desigualdade entre os volumes: 50 < 60 < 100, ou 100 > 60 > 50.
Para que o experimento seja possível, os volumes dos recipientes
necessitam ser iguais. Os estudantes, serão estimulados para recorrerem
ao conceito de média para encontrar o resultado necessário, com a
condição é que cada recipiente deve conter volumes iguais. Ao somar o
volume dos três reservatórios, 100 + 50 + 60, tem-se o total de 210 litros
que corresponde ao hi, e n assume o valor três correspondente ao
número de agrupamentos que serão formados, conforme a figura a seguir.
Figura 56: 7ª Tarefa: representação da média (esquema e modelo literal)
Por meio do esquema, constata-se que a operação central a ser
realizada é a de divisão do total de volume pelo número de agrupamentos,
o que resulta em 70 (Figura 57). Esse valor indica o volume que cada
reservatório deve conter para que a igualdade seja estabelecida, isto é, a
medida intermediária. Em seguida completa-se o esquema.
Figura 57:7ª Tarefa - Representação do cálculo da média (forma literal e
esquema)
A definição do valor da unidade intermediária reflete a
representação do cálculo de média. Nesse momento, esse conceito torna-
Fonte: Elaboração da autora(2017).
Fonte: Elaboração da autora (2017).
136
se uma ação para atingir a finalidade da tarefa: definir o valor que cada
recipiente deve conter para a realização dos testes.
A figura 58 mostra a representação objetal da igualdade de volume nos
reservatórios com a redistribuição de líquido. Propõe-se a representação
objetal (Figura 54), com uso da Lousa Digital. Isso porque possibilita a
duplicação dos objetos e edição das regiões indicativas dos volumes, com
a evidenciação da alteração em relação ao original, indicada pela
coloração vermelha nos segmentos que representam os volumes contidos
inicialmente (Figura 58).
Figura 58:7ª Tarefa: representação da igualdade (objetal e por segmentos)
A figura 58, retoma a representação objetal, agora com outra
qualidade, pois explicita o quanto de líquido foi retirado ou acrescentado
a cada recipiente, a fim de se estabelecer a igualdade entre os volumes,
70 litros (R1 = R2 = R3= 70 litros). Após igualar a quantidade de volumes
nos recipientes – representação objetal – propõe-se, aos alunos, a
representação na reta que expresse tal igualdade. Nesse caso, parte-se do
princípio de que os alunos tenham se apropriado dos diversos modo de
representação gráfica – reta numérica e esquemas com setas e segmentos,
arcos, entre outros –, uma vez que, a mesma foi proposta em tarefas
anteriores. Assim sendo, a figura 59 consiste na representação na reta dos
volumes, conforme orientação de Davídov (1988).
Fonte: Elaboração conforme Rosa (2012).
137
Figura 59: 7ª Tarefa: representação da igualdade na reta numérica
A tarefa tem como peculiaridade explicitar a representação do
movimento ocorrido no processo de resolução da tarefa, porém com a
apresentação do que ocorrera em cada recipiente para que suas
quantidades se igualassem. Assim, R1 ocorre uma diminuição de 30 litros
(100-30) –por isso o movimento contrário na reta – o que será acrescido
em R2 em 20 unidades e, em R3, com 10 litros.
A 7ª tarefa também se caracteriza com outra operação de
representação, numa mesma reta numérica (Figura 60), do processo de
mudança dos volumes dos três reservatórios que, antes eram desiguais e,
agora são iguais para cumprir a finalidade da tarefa. A execução da
operação, na Lousa Digital, é sugerida em consonância a ideia de Vieira
Pinto (2005) de que a tecnologia se apresenta como elemento mediador
das ações humanas para atingir uma finalidade. Para tal, ela apresenta um
recurso que permite o acadêmico arrastar os objetos separadamente,
dispensando novas construções. Desse modo, transfere-se todas as
representações em uma única reta.
Figura 60: 7ª Tarefa, representação da média localizada na posição central
Fonte: Elaboração conforme Alves (2013).
60 50 0 100 70
R2
R1
R3
Fonte: Elaboração da autora conforme Alves (2013).
138
O arco em azul indica o volume inicial de cada reservatório. A
flecha vermelha representa a alteração de volume em cada reservatório
sofreu. Por sua vez, o arco tracejado em preto indica o volume de cada
reservatório após o processo de igualdade, ou seja, indica a média de
volume. O reservatório R1 alterou seu volume de 100 litros para 70 litros,
isto é, teve uma redução de 30 litros. O volume inicial do reservatório R2
foi acrescido em 20 litros, alterando de 50 litros para 70 litros. O terceiro
reservatório teve seu volume inicial aumentado em 10 litros.
A figura 60 mostra, por meio da reta numérica, que o reservatório
R1 foi o único a ter seu volume inicial diminuído, o que empiricamente
significa que tal quantidade foi distribuída aos outros reservatórios com
menor volume. Na reta numérica temos que as quantidades de todos os
reservatórios, ao sofrerem alteração, aproximam-se do mesmo valor, o 70.
Portanto, o valor encontrado está posicionado entre os três volumes
iniciais, o que caracteriza o valor que torna iguais o volume dos
reservatórios. A sobreposição das retas, em uma única, permitiu enfatizar
a aproximação dos volumes ao valor central definido pela média.
Ao buscar a igualdade de volumes sem alterar a quantidade total
de líquido disponível, toma-se como referência será um valor que está
localizado exatamente entre os valores coletados ou um valor que tende
ao meio. Vale enfatizar que a média corresponde a uma posição de
equilíbrio entre os dados coletados, porém é uma Medida de Tendência
Central que não, necessariamente, se encontra no centro de uma
distribuição (TIBONI, 2010). Isso se caracteriza pela média ser o
resultado de uma relação estabelecida entre todos os dados do conjunto.
Assim, quanto mais discrepâncias houver entre os dados, mais distantes
do centro do conjunto estará localizada a média.
A representação na reta numérica caracteriza a intensão de não
adotar os procedimentos convencionais para a indicação de uma
centralidade em conjunto de dados. Essa operação de representação na
reta, apresenta-se de modo que a verificação de uma tendência central não
se dê pela observação de suas propriedades externas, mas resultado de
uma comparação entre grandezas.
O processo desencadeado com as sete tarefas dá subsídios para a
seguinte síntese no que diz respeito ao desenvolvimento do conceito de
média: ela emerge das relações entre diversas grandezas, em que as
medidas apresentam valores iguais ou diferentes, cuja soma é dividida
pelo número de agrupamentos requerido por uma dada situação. O
quociente obtido, a média, corresponde a uma unidade intermediária. É
essa a relação universal do conceito de média, que sintetiza-se na figura
61, a seguir.
139
Figura 61: Síntese da relação essencial de média e sua modelação
Fonte: Elaboração da autora (2017).
Nessa síntese, vale chamar a atenção para o significado n
(agrupamentos) que não se refere à quantidade termos num determinado
conjunto de valores, mas o número de aglomerados que uma determinada
situação requer. Por exemplo, tem-se 8 bolsas de cimento com cinquenta
quilos cada e quer se fazer seis tubos de concreto de mesma massa e
mesmo volume, com a condição que não haja nenhuma sobra do referido
produto. Observa-se que, nessa situação, não se busca a média da
quantidade de cimento para n igual a 8 (bolsas), isto é, 50+50+50+50+50+50+50+50
8. Em vez disso, o n (tubos) assume o valor 6.
Elaborada essa síntese, encaminha-se para o estudo do conceito de
mediana, a partir da tarefa 8.
Tarefa 8
Para a realização de um novo experimento, o professor solicitou ao
responsável do laboratório que preparasse uma certa quantidade de
recipientes com água. Ele estabelece dois procedimentos: 1) todos
volumes deveriam ser diferentes; 2) a quantidade de recipientes precisaria
ser par. Após cumprir as indicações, o responsável envia ao professor a
representação, na Lousa Digital, de como organizou os recipientes
(Figura 62). Também, informa que entre os recipientes apresentados
existem diversos outros com volumes diferentes, cada qual com
quantidade superior ao situado a sua esquerda e inferior ao de sua direita.
Em outras palavras, conforme figura 62, não constam todos os recipientes
preparados, mas é necessário considerar que entre dois recipientes,
tomados em sequência, existem outros, cujos volumes estão entre os
adotados como referência.
140
Figura 62: 8ª Tarefa, representação objetal dos dados da tarefa
Fonte: Elaboração da autora (2017).
De posse das informações, o professor pretendia realizar um teste
antes de levá-los aos alunos. Como não dispunha de tempo e de
recipientes, que o auxiliasse na igualdade de todo o volume, deparou-se
com uma dificuldade: qual volume tomar como teste, a partir das
indicações da figura, para que ele se torne significativo/representativo,
visto que os demais volumes seriam utilizados nos experimentos.
Essa situação é levada aos estudantes com o seguinte
questionamento: Como proceder na escolha do volume? Qual a melhor
decisão?
No problema que se apresenta, a desigualdade, novamente,
aparece como obstáculo a ser superado para a realização do experimento.
Nesse momento, o professor alerta os estudantes de que a finalidade da
tarefa não é a igualdade – característica da média – mas o alcance de uma
‘medida mais próxima de todos os volumes’. Por isso, sua orientação é
para que se busque um procedimento para encontrar um volume que seja
o que mais se aproxima de um valor mediano, isto é, que se aproxima de
uma medida central.
O modo de apresentação da tarefa indica o caráter visual como
insuficiente por não ter sido indicada a quantidade exata de recipientes
presentes no conjunto de dados. Para tal, questiona-se: como fazer para
comparar os volumes dos recipientes, uma vez que não se tem o auxílio
de instrumentos?
É possível que os estudantes proponham várias alternativas de
identificação de tal volume. Dentre elas, aquele procedimento
característico do conceito de mediana, isto é, a reorganização dos
recipientes por ordem crescente ou decrescente do volume do líquido.
Novamente, o professor pode propor que um estudante, com a orientação
dos demais, se dirija à Lousa Digital e, a partir, dos recursos utilizados
nas tarefas anteriores, façam a representação objetal dos recipientes em
141
ordem crescente ou decrescente da quantidade de líquido (Figura 63).
Para tanto, a lousa apresenta recurso que possibilita o movimento dos
objetos para qualquer posição desejada.
Essa representação na lousa se transforma em componente de
mediação entre o professor e os estudantes, pois, é a partir dela que ocorre
o processo de análise para a apropriação do conceito de mediana. Mas
essa representação, por si só, não dá os elementos didáticos e pedagógicos
para que os estudantes elaborem o pensamento conceitual. Diante dessa
insuficiência, cabe ao professor dirigir, ao grupo de alunos, um
questionamento que levem à formação de ideias do conceito de mediana:
qual volume tomar para o teste, então?
Figura 63: 8ª Tarefa, ordenação dos dados da tarefa
Fonte: Elaboração da autora (2017).
O questionamento é propulsor para que os estudantes se coloquem
em ação de análise dos dados em busca da revelação da relação essencial
do conceito de mediana. Se a centralidade da análise for apenas ordenação
dos recipientes (Figura 63), corre-se o risco de os estudantes elaborarem
suas ideias em nível empírico (DAVÍDOV, 1988), isto é, olhar para os
recipientes e, aleatoriamente, indicar um dos recipientes que, para eles,
representaria a quantidade mais próxima da desejada para a realização do
experimento. Para evitar tal procedimento, sugere-se que um dos
estudantes use a lousa digital para a representação e comparação dos
volumes, na reta numérica, enquanto os demais trabalham em seus
próprios cadernos (ou notebook). Nesse caso, as operações na lousa
tornam-se referências e confronto com as produções individuais dos
estudantes, pois é com elas que o professor dialogará com conteúdo do
referido conceito estatístico. Por consequência, chega-se à representação
não mais com o volume do líquido, mas em outra na qual se manifesta,
segundo Rosa (2012), um teor aritmético e geométrico. Trata-se, pois da
reta considerada, pela referida autora, como o lugar geométrico do
número. Vale destacar que a representação na reta, nesse estágio de
142
desenvolvimento da tarefa se apresenta como uma operação, isto é, uma
ação desenvolvida em outros momentos do processo que se transformou
em procedimento (LEONTIEV, 1978). Por isso, a representação dos hi
volumes dos Rn recipientes (Figura 64) é algo possível, uma vez que é já
é algo familiar entre os estudantes.
Figura 64: 8ª Tarefa, representação dos dados ordenados na reta numérica
Fonte: Elaboração conforme Alves (2013).
Na reta numérica os arcos azuis representam a medida dos volumes
contidos em cada recipiente. O exposto, na figura 64, indica a
possibilidade de os estudantes elaborarem a seguinte comparação entre os
volumes: hg < he < ha < hf < hb < hd < hi < hc. Tal relação de desigualdade,
vale para a determinação do volume a ser utilizado, visto que ele é
indicador de uma possível aproximação, medida central. Novamente, o
professor alerta que não há a possibilidade de realizar a junção e a
disposição dos volumes de forma que os igualem, pois não se dispõem de
recipientes para este fim. Desse modo, o professor questiona: Qual
143
volume que mais se aproximaria de uma possível igualdade, de uma
disposição central?
Outra vez, diferentes volumes podem ser indicados pelos
estudantes. Contudo, por meio de questionamentos e orientação, levar-se-
ia à opção de que a melhor decisão seria de tomar os elementos – volumes
– que se encontram posicionados mais ao centro da ordenação, pois não
se correria o risco de tomar valores extremos, discrepantes. Em outros
termos, os valores centrais possuem as particularidades desejadas, isto é,
a característica de proximidade do volume a ser utilizado.
As interrogações e orientações do professor, promotoras das
análises, são base para admitir que os estudantes apontem três
possibilidades: 1) hf, 2) hb e 3) hf e hb. Nesse instante é que o professor
coloca em discussão a ocorrência de discrepâncias se a escolha for tanto
pela possibilidade 1, como a 2. No entanto, se a opção for a 3, cria-se um
impasse, uma vez que apresenta dois volumes e a exigência é de apenas
um. Aqui está a ideia essencial do conceito de mediana. Por isso, a
intervenção do professor é a de expressar que, em Estatística, essa medida
é denominada de ‘mediana’, sendo obtida pela média das duas medidas
centrais. Para esse momento, sugere-se o procedimento de uma síntese
que indica a revelação dos dados conforme primeira ação de Davídov
(1988). São revelados: os n elementos constituintes do conjunto; a
ordenação dos dados; os dados posicionadas no centro do conjunto. Vale
destacar que a determinação da mediana, a partir de duas medidas
centrais, ocorre devido o número de volumes apresentado na situação ser
par.
Diante da revelação dos dados, prossegue-se para a ação de
modelação da relação essencial para tal. Para tal, propõe-se a
interrogação: é possível que a representação da situação encontrada seja
feita adotando como referência, o esquema de média? Com o desenrolar
das discussões, é possível o esclarecimento do professor de que a adoção
do esquema da média não indica que as relações específicas de dois
conceitos são as mesmas. Por decorrência, é possível que surja, entre os
estudantes, diferentes indicações para a representação no esquema. Por
exemplo, uma possibilidade é: 1) representar, ao invés do total de
volumes, os n termos constantes no conjunto de dados; 2) indicar, para o
lugar dos n agrupamentos, a posição/localização (i) da medida central
que, como mencionado anteriormente, é um conjunto formado por um
número par de elementos, que permita a constatação de que, ao invés de
uma posição central, tem-se duas (2i), ou seja, duas medidas centrais; 3)
sugerir, para a seta correspondente a unidade intermediária (a), o valor
144
correspondente a mediana (hf+hb
2). Por consequência produz o esquema
com a possível alteração (Figura 65).
Figura 65: 8ª Tarefa, representação da mediana (n=par) no esquema
Fonte: Elaboração da autora (2017).
Na média, a operação de divisão se apresenta como elemento direto
para a geração da igualdade, ou seja, do valor central. Contudo, no
conceito de mediana, a relação estabelecida é outra: verificar dos n
elementos quais estão localizados no centro da distribuição, o que indica
o volume mediano para o conjunto de dados.
Tal situação, não apresenta um modelo gráfico único, pois é
preciso se ater a peculiaridade no número de elementos do conjunto.
Nesse caso, o modelo gráfico apresentado se refere a relação mediana
para um conjunto par. Por isso, propõe-se, aos estudantes, que analisem
uma nova situação, em que a quantidade de recipiente é ímpar: qual seria
o volume mediano se fossem excluídos todos os recipientes com volume
maior que o contido no recipiente R8 (Figura 96)?
Figura 66: 8ª Tarefa, dados da tarefa para um conjunto com número ímpar
de elementos
Fonte: Elaboração da autora (2017).
145
A orientação aos estudantes, para a escolha do volume, é que
partam da relação anteriormente estabelecida para a mediana: verificar
entre os n recipientes qual volume está localizado no centro do conjunto.
Desse modo, o professor alerta que a possibilidade de indicação de
diferentes volumes deve ser descartada, pois, há um único volume
posicionado ao centro. Essa medida também é denominada de mediana.
Sugere-se que eles indiquem, no esquema, como se apresentaria essa
relação (Figura 97).
Figura 67: 8ª Tarefa, representação da mediana (n=ímpar) no esquema
Fonte: Elaboração da autora (2017).
Conforme exposto na figura 97, a representação gráfica e literal
compõe-se por: n termos constantes no conjunto de dados; uma única
posição/localização (i) da medida central; o volume indicado pela
posição, que correspondente a mediana (hf). Essa representação
contempla a ideia cientifica do conceito apresentada por Levin e Fox
(2004), isto é, a mediana como ponto do meio de uma distribuição,
quando dados ordinais ou intervalares são dispostos em ordem de
tamanho. Vale destacar que o valor central estabelecido pela mediana não
leva em consideração todos os dados do conjunto, não sofre influência
dos demais dados do conjunto.
A tarefa revela que a relação essencial da mediana se apresenta,
num processo de investigação e identificação de forma direta de uma
medida central em um conjunto em que os dados estejam dispostos de
forma ordenada.
De modo geral, na presente seção, se explicita o modo geral da
relação essencial do conceito de medida central. A proposta para a
organização das tarefas para os conceitos de média e mediana se apresentou no contexto da primeira e segunda ação proposta por
Davýdov.
Primeiramente revela-se, de modo objetal, os elementos que
constituem a relação essencial de média e mediana. Neles, se
apresentaram necessidades diferentes: para o conceito de média,
146
apresenta-se a determinação da igualdade de volumes; para a mediana, é
estabelecida a obtenção da medida mais próxima de todos os volumes.
No desenvolvimento das tarefas de média revela-se os elementos
que compõem a relação essencial do conceito: total de medidas básicas
( hi); a quantidade de agrupamentos formados (n), o valor a, que
corresponde ao valor da unidade intermediária. Destaca-se que, o total de
medidas básicas se constitui ao somar as diferentes medidas apresentadas
no conjunto. A agilização de transferência de líquidos produz-se a
necessidade da unidade de medida intermediária.
A tarefa de mediana, aponta como componentes da relação
essencial do conceito os seguintes elementos: os n elementos constituintes
do conjunto; a posição central dos elementos (2i e/ou i); os dados que se
encontram nas posicionadas no centro do conjunto.
A partir da relação entre os volumes, por meio dos elementos
revelados na primeira ação, propôs-se a modelação da relação essencial
dos conceitos nas formas objetal, gráfica e literal, pertinentes a segunda
ação de estudo. A revelação da relação essencial dos conceitos de média
e mediana foi possível pela vinculação à medição de grandezas.
Pela análise das tarefas, constata-se que os conceitos de média e
mediana apresentam como finalidade a busca por um valor que tende ao
centro de um conjunto de dados. No entanto, apresentam algumas
peculiaridades: 1) a média indica um valor central por meio da
determinação da igualdade; a mediana apresenta um valor que mais se
aproxima dos demais; 2) a média é obtida levando em consideração todos
os dados do conjunto; a mediana se constitui apenas de um ou dois dados
centrais sem a influência dos demais.
A Lousa Digital se apresenta como uma operação para resolução
das tarefas, com a finalidade de colocar os estudantes diante de uma
recente elaboração humana para o campo educacional. Essa tecnologia
apresentou a possibilidade de representar os dados objetais e gráficos de
forma mais elaborada ao se comparar com o quadro tradicional. As
opções disponíveis no software permitem a execução das operações de
representação do pensamento desenvolvido de forma diferente do
tradicional: há formas geométricas para formar as representações objetais,
gráficas e até mesmo as literais. Esse feito permite buscar formas
alternativas de representação do movimento de pensamento como: duplicar um objeto anteriormente elaborado; alterar as representações ou
reposicionar objetos, sem descartar o que já produzido.
Também, possibilitou que arrastasse as representações na reta
numérica dispondo-as em uma única. Essa indicação, como sugestão do
professor, culminou no fortalecimento do processo de alteração de
147
líquido. Contudo, vale destacar que, por vezes, a impossibilidade de
movimentação torna-se essencial para que a tarefa se constitua. Assim,
cabe ao professor, em sua organização de ensino, verificar a viabilidade
do uso desse movimento ou, em outras palavras, analisar se o movimento
do objeto contribuirá para o desenvolvimento do pensamento teórico ou
não.
148
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste capítulo, apresentam-se as sínteses extraídas no processo de
desenvolvimento deste estudo. A presente pesquisa voltou-se para a
elaboração de uma resposta à sua pergunta norteadora: que conjunto de
tarefas, elaboradas a partir de um olhar de pressupostos da Teoria da
Atividade, pode indicar – ainda que teoricamente – uma possibilidade
para a organização de ensino do conceito de medida de Tendência
Central, para o ensino superior, tendo como uma operação o uso da lousa
digital? O desafio implícito nesse problema foi propulsor para que
efetivamente se elaborasse um conjunto de tarefas para o
desenvolvimento do conceito de Medida de Tendência Central, mais
especificamente, de média e mediana. Essa afirmação provavelmente
conduz ao leitor a perguntar: afinal, que característica apresenta o referido
conjunto de tarefa que o diferencia do convencional ensino de conceito
de média e mediana, galgado no procedimento didático de
definição/exemplo/exercícios?
De imediato, vale dizer que a diferença está na sua base teórica: a
Teoria da Atividade de base Histórico-Cultural, com ênfase para a análise
indicadora da relação essencial de cada um dos conceitos. O ensino
organizado na perspectiva da Teoria da Atividade pressupõe que a escola
tem a função de criar condições para que acorra a apropriação, pelos
estudantes, conceitos científicos com vistas ao desenvolvimento do
pensamento teórico (DAVÍDOV, 1988). Ou, como afirma Leontiev
(1978) propicia-se o desenvolvimento psíquico e, por extensão, a
formação da consciência.
A partir dessa concepção, no presente estudo, cumpriu-se o
pressuposto de que o professor tem por objetivo a organização do ensino,
de modo que proporcione o referido desenvolvimento, bem como da
apropriação da cultura produzida historicamente. Considerou-se,
também, que o ensino só é desenvolvente, se visar a apropriação de
conceitos teóricos, isto é, articule suas múltiplas relações. Enfim, que o
estudante desenvolva a capacidade de análise e síntese que promove ã
formação de generalização e abstrações teóricas (DAVÍDOV, 1988).
Na perspectiva dessa teoria, a apropriação dos conceitos teóricos
coloca em movimento a relação sujeito e o objeto pela mediação dos
símbolos culturais e científicos. A organização do ensino – com a
finalidade de desenvolver o sujeito na forma mais elevada atingida pela
humanidade – conclama por um nível de consciência do professor que lhe
permita o entendimento de todos os aspectos que envolvem o ato de
149
educar: psicológico, sociológico, curricular, didático e pedagógico
(MOURA, 1996).
A atividade do professor tem como uma ação essencial a
organização do ensino, que se volta para os conteúdos curriculares, o que
requisita: a definição dos objetivos a serem alcançados; identificação das
possibilidades dos alunos, isto é, a capacidade de aprendizagem de acordo
com as apropriações realizadas anteriormente. Enfim, há uma
preocupação tanto com o método como o conteúdo que se volte à
formação do pensamento conceitual teórico (DAVÍDOV, 1988).
Essa configuração teórica implica numa organização de ensino por
meio de tarefas de estudo, ações de estudo e tarefas particulares. Estas se
caracterizam como problemas significativos, desde que coloque os alunos
em ação investigativa em busca de sua solução. Portanto, elas propiciam
o surgimento de necessidade que coloca o pensamento em movimento,
em atividade de estudo (DAVÍDOV, 1988; LEONTIEV, 1978). A
resolução do problema ocorre num contexto de ações e operações que
conduzem a um determinado fim. As tarefas particulares são elaboradas
de modo tal para que a sua solução não ocorra por procedimentos
imediatos, mas sim mediados por relações conceituais, num processo
interativo entre alunos e professor. Nesse processo, emergirá a
necessidade de buscar um conhecimento novo e possível para solucionar
a situação. A incessante busca que leva à apropriação teórica do conceito
propicia que o estudante se desenvolva e se constitui como ser humano
atual.
Nesse âmbito teórico é que foi proposto uma organização de ensino
para o estudo do conceito matemático de Medida de Tendência Central.
Para tanto, sugerem-se tarefas caracterizadas por situações em que
grandezas (discretas e contínuas) são referência, pois segundo Davídov
(1987), constituem-se como relação essencial da Matemática. Decorrente
dessa relação, o intuito foi identificar a relação essencial, bem como a
modelação das Medidas de Tendência Central: média e mediana.
Para que a compreensão do conceito matemático de Medida de
Tendência Central fosse possível fez-se necessário abordar as relações de
multiplicação e divisão que serviram de base para a apropriação do
conceito de média. Tal conceito revela-se, durante o estudo, que tem por
essência a igualdade entre grandezas. Para tanto, as tarefas iniciam com
situações que envolvem desigualdade, mas que propõe a igualdade como
solução ao problema. A revelação da igualdade possibilita que se
identifique a localização do padrão ou da normalidade, que é essencial
para o entendimento do que seria uma medida que tende a um centro. Isso
150
porque o valor encontrado propende a se posicionar no meio do conjunto
de dados, caso possua uma certa homogeneidade.
O conjunto de tarefas subsidia a elaboração da síntese de que o
conceito de média tem sua base nas relações entre grandezas, em que as
medidas, com valores iguais ou diferentes, são somados e,
posteriormente, dividido pelo número de agrupamentos proposto situação
em referência. Aqui reside um achado importante do presente estudo: o
quociente obtido, a média, corresponde a uma unidade intermediária.
Nesse contexto, também, são apresentadas tarefas referentes ao
conceito de mediana, com a ideia de que ela é uma alternativa científica
para os casos em que não é possível adotar a média como medida para a
identificação do valor representativo do conjunto de dados. Para tanto, as
tarefas colocam os estudantes em duas situações. A primeira quando a
distribuição dos dados é composta por um número ímpar de elementos.
Nesse caso, a mediana tem a característica de representar o padrão do
conjunto, ao se tomar como referência o elemento localizado exatamente
no meio da distribuição. Isso requer que a ordenação dos dados de forma
crescente ou decrescente. A segunda situação ocorre quando a
distribuição é definida por um número par de elementos, em que a
mediana é definida como a média dos dois valores localizados no meio
da distribuição. Por considerar apenas os valores posicionados
exatamente no centro do conjunto de dados, a mediana pode, em algumas
circunstâncias, não indicar o comportamento dos elementos. Contudo,
diferentemente da média, ela não sofre influência de outros dados do
conjunto.
Vale destacar que outro aspecto importante e peculiaridade do
presente estudo foi que as tarefas propiciam diálogos do tipo:
aluno/professor, tarefa/tarefa, conceito/conceito. Dessa dialogicidade se
chega, por exemplo, à síntese de que é possível adotar o esquema
(representação da relação essencial) – oriundo da proposição davydoviana
para a modelação do conceito de multiplicação e divisão – para o conceito
de média e deste para o de mediana. Todo esse movimento, permite
anunciar, mesmo teoricamente, que há possibilidade para o ensino de
Medida de Tendência Central a partir da diferenciação dos conceitos de
média e mediana em nível teórico.
Outro destaque nesse processo, foi o uso da Lousa Digital, como
uma operação para o desenvolvimento das tarefas, como uma tecnologia
resultante de um processo de uma evolução/desenvolvimento humano.
Sendo assim, o entendimento é de que se trata de um recurso humano em
estado mais atual de evolução de registros humanos. Sua gênese remonta
às primeiras manifestações de escrita, entre os babilônios, em tabuleiros
151
de barro. Numa grande escala de tempo apareceram os primeiros quadros
de giz, que se perpetuaram, por muitos anos, como única fonte de
registros e meio didático em salas aulas. Em um intervalo de tempo menor
e, consideravelmente recente, aconteceu a inserção dos quadros de pincel.
Mais recentemente, num espaço curto de tempo em relação ao anterior,
aparece a Lousa Digital. Pensa-se que essa compreensão de gênese e
desenvolvimento evita a apologia à tecnologia como ocorre em alguns
estudos e à Lousa Digital em detrimento da centralidade conceitual, isto
é, como se elas, em si, movem-se toda a atividade de estudo.
No presente estudo, a Lousa Digital, se constituiu como uma
operação da atividade de estudo, adotada para resolver as tarefas
particulares das diversas ações. Seu uso traz o entendimento, conforme
Vieira Pinto (2005) e Davídov (1988), de produção mais atual do homem
que revela o seu estágio superior até então atingido.
No processo de análise, os registros – a partir da Lousa Digital –
suscitaram em grande parte o uso da opção ‘formas’, que permite o
desenho de linhas, setas, quadrados e outras elementos de teor
geométrico, que contribuíram para o entendimento de determinadas
relações e abstrações teóricas. Além disso, o instrumento admite, se
necessário, que as representações realizadas sejam modificadas, editadas,
ou movimentadas, o que diferencia a Lousa Digital do quadro estático.
Um exemplo mais pontual dessa contribuição, verifica-se na tarefa 7, em
que as representações na reta foram sobrepostas em uma única, o que
evidenciou a localização central da média. A possibilidade de arrastar os
objetos colabora, também, na ordenação de dados, sem o risco de cometer
esquecimento ou substituição de algum elemento.
Além disso, as resoluções das tarefas, salvas na lousa, possibilitam
o retorno a elas, a qualquer momento, para confronto e estabelecimento
de relações com produções posteriores. Entende-se que esse ir e vir
consubstancia o desenvolvimento de tarefas, uma vez que o foco estará
na resolução delas ao invés da necessidade de copiar os registros, que
estão disponíveis em qualquer momento.
No entanto, as operações para registrar o movimento de
pensamento, poderiam ter acontecido como no quadro tradicional, com a
utilização da opção ‘caneta’. Esta, retomaria as mesmas funções da escrita
com giz ou o pincel para quadro branco. Outras funções seriam passíveis
de adoção, mas que naquelas circunstâncias optou-se pela não inclusão.
Mesmo assim, na Lousa Digital, observou-se que as representações
ocorrem de forma imediata, pois engloba a funcionalidade de diversos
recursos, que propicia, ao estudante, o uso, no ambiente educacional, de
algo mais elaborado de produção do homem, que cumpre tal finalidade.
152
A relação entre a Lousa Digital e a finalidade do conjunto de
tarefas proposto – apropriação do conceito de Medida de Tendência
Central – não se apresentou de forma essencial/indispensável. Contudo,
apresentou-se como uma operação que teve sua incontestável
contribuição no desenvolvimento das tarefas, com o intuito de identificar
a relação essencial e sua modelação, no que diz respeito ao conceito de
média e mediana.
Além disso, vislumbra indícios de contribuição para processo
avaliativo, tanto de aprendizagem quanto metodológico, pela
possibilidade de retornar ao desenvolvimento das tarefas e rever possíveis
falhas ou novas configurações.
A trajetória da pesquisa desencadeou a necessidade, na
pesquisadora, em continuar o estudo com dois focos: a elaboração de
tarefas, também para o conceito de moda, bem como a elaboração de
tarefas pertinentes às demais ações propostas por Davýdov; e, além disso,
realizar o estudo experimental. Isso não foi possível, pelo esgotamento do
período regimental de conclusão do curso de mestrado, visto que a
pesquisadora recebia bolsa de auxílio financeiro.
A pesquisa, desde o momento da formulação do problema até a
síntese final, corroborou para além de uma proposição de tarefas a partir
dos fundamentos estabelecidos. O processo, como um todo, acarretou no
desenvolvimento pessoal e profissional da pesquisadora. Esse período se
constituiu de momentos intensos, complexos, dolorosos e, ao mesmo
tempo, prazerosos, pois cada obstáculo visto como difícil de superação
caminhava para um momento seguinte de entendimento de conceitos
matemáticos que antes eram fragmentados.
Portanto, a cada superação emergia o desejo de ampliar o estudo,
mas devido ao prazo foi sendo necessário barrar alguns aprofundamentos.
Nesse processo, constituiu-se o interesse em investigar como se
configuram e se relacionam as medidas de dispersão com o conceito de
média. Além disso, sente-se a necessidade de aprofundar os estudos no
modo de ensino davydoviano e na Teoria da Atividade, pois no processo
de investigação para a produção da dissertação – mesmo em um curto
espaço de tempo – a pesquisadora encontrou subsídio para repensar todo
seu planejamento e entendimento de ensino, bem como sua visão de
sociedade e formação humana.
153
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