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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ FERNANDO VINICIUS DOMAKOSKI MARCANTE A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR FURTOS DE VEÍCULOS AUTOMOTORES ESTACIONADOS EM VAGAS DE ESTACIONAMENTO ROTATIVO CURITIBA 2016

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

FERNANDO VINICIUS DOMAKOSKI MARCANTE

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR FURTOS DE

VEÍCULOS AUTOMOTORES ESTACIONADOS EM VAGAS DE

ESTACIONAMENTO ROTATIVO

CURITIBA

2016

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FERNANDO VINICIUS DOMAKOSKI MARCANTE

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR FURTOS DE

VEÍCULOS AUTOMOTORES ESTACIONADOS EM VAGAS DE

ESTACIONAMENTO ROTATIVO

Projeto de pesquisa apresentado como requisito para aprovação na disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito. Professor orientador: Jorge de Oliveira Vargas

CURITIBA

2016

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TERMO DE APROVAÇÃO

FERNANDO VINICIUS DOMAKOSKI MARCANTE

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR FURTOS DE

VEÍCULOS AUTOMOTORES ESTACIONADOS EM VAGAS DE

ESTACIONAMENTO ROTATIVO

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado e aprovado para obtenção do

título de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, ____de________de2016.

____________________________________

Prof. Doutor Eduardo de Oliveira Leite

Coordenador do Núcleo de Monografias

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador:________________________________

Prof. Jorge de Oliveira Vargas

Faculdade de Ciências Jurídicas

Universidade Tuiuti do Paraná

Prof. ____________________________________

Faculdade de Ciências Jurídicas

Universidade Tuiuti do Paraná

Prof.____________________________________

Faculdade de Ciências Jurídicas

Universidade Tuiuti do Paraná

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

Art. - Artigo

CC - Código Civil

CDC – Código de Defesa do Consumidor

CFRB - Constituição Federal da República Federativa do Brasil

CP - Código Penal

CTB - Código de Trânsito Brasileiro

DIRETRAN - Diretoria de Trânsito de Curitiba

ESTAR - Estacionamento Regulamentado

SETRAN – Secretaria Municipal de Trânsito

STF - Supremo Tribunal Federal

STJ - Superior Tribunal de Justiça

TJ – Tribunal de Justiça

TRF – Tribunal Regional Federal

URBS - Urbanização de Curitiba S/A

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RESUMO

Este estudo tem como pretensão analisar os desdobramentos da responsabilidade civil do Estado diante de furtos de veículos automotores estacionados em vagas de estacionamento rotativo com cobrança de EstaR. A presente monografia é uma pesquisa bibliográfica que se concentrou em livros, artigos e publicações de direito delimitando-se à possibilidade de indenização estatal ao motorista que estaciona na área supracitada. Objetiva-se apontar a responsabilidade civil objetiva e subjetiva; elencar os pressupostos da responsabilidade civil: dano, nexo causal, culpa e dolo; relatar os aspectos históricos da cobrança em estacionamentos de vias públicas; dispor sobre a natureza jurídica desta cobrança; descrever as formas de arrecadação do Estado e a possibilidade de configuração da relação de consumo com a cobrança de EstaR; por fim, argumentar sobre a possibilidade de indenização ao motorista devido a dano ou furto do veículo estacionado nestas áreas. Percebe-se, portanto, que este é um tema bastante polêmico e de grande demanda devido à sua atualidade e proximidade com o cotidiano dos cidadãos. Palavras-chave: Responsabilidade Civil. Estacionamentos rotativos. EstaR.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 6

2 DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO ...................................................... 8

2.1 CONCEITO ........................................................................................................... 8

2.2 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA ................................................ 9

2.3 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL .......................................... 10

2.3.1 Ação ou omissão .............................................................................................. 10

2.3.2 Dano ................................................................................................................. 12

2.3.3 Nexo causal ...................................................................................................... 12

2.3.4 Culpa e dolo ..................................................................................................... 13

3 DOS ESTACIONAMENTOS ROTATIVOS EM VIAS PÚBLICAS ......................... 15

3.1 ASPECTOS HISTÓRICOS .................................................................................. 15

3.2 NATUREZA JURÍDICA........................................................................................ 16

3.3 FORMAS DE ARRECADAÇÃO DO ESTADO .................................................... 18

3.4 A CONFIGURAÇÃO DA RELAÇÃO DE CONSUMO .......................................... 20

4 HIPÓTESES DE DANOS OU FURTOS AOS VEÍCULOS .................................... 22

4.1 O MUNICÍPIO COMO PESSOA JURÍDICA RESPONSÁVEL ............................. 22

4.2 DESDOBRAMENTOS E POSSIBILIDADES DE INDENIZAÇÕES ..................... 23

4.3 POSICIONAMENTOS JURISPRUDENCIAIS ..................................................... 25

4.4 DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ESTAR ..................................................... 27

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 29

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 31

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1 INTRODUÇÃO

O presente estudo visa analisar a responsabilidade civil do Estado por furtos

de veículos automotores estacionados em vagas de estacionamento rotativo.

Verifica-se que as significativas mudanças que os avanços tecnológicos vêm

imputando aos seus usuários são indispensáveis para ilustrar o quão presente está

na sociedade atual o tema aqui proposto.

Estacionamentos são arduamente disputados, enquanto os veículos tornam-

se essenciais para o normal funcionamento das atividades fundamentais. Cada vez

mais, portanto, os automóveis tornam-se parte da vida do ser humano,

proporcionando, juntamente com suas conhecidas benesses, alguns frequentes

contratempos.

O ponto central que o presente trabalho pretende abordar decorre,

justamente, de um desses transtornos ocasionados pela grande monta de veículos

que circulam nas cidades. Isso porque o Poder Público de Curitiba, ao perceber que

os lugares disponíveis nas ruas para o estacionamento dos automóveis vinham se

tornando cada vez mais escassos, viu-se obrigado a regular tais áreas através da

Lei Municipal n° 3.979/71, e Decretos n° 569/80 e 934/97 que criou o EstaRR

(Estacionamento Regulamentado).

Porém, a proposta primordial do instituto era de democratizar o espaço

público da cidade, promovendo a rotatividade no uso da vagas e, ao mesmo tempo,

auxiliado na fluidez do tráfego, outras delicadas situações emergiram como a

indagação de quais as implicações que os furtos dos automóveis ali estacionados

acarretariam aos responsáveis pelo EstaR.

Para tal questionamento, não há uma única resposta, tendo em vista a grande

divergência doutrinária que prevalece. Aproveitando-se dessa situação incerta,

muitos munícipes ao verem-se como vítimas de infortúnios como os citados,

recorrem ao Judiciário a fim de pleitear o ressarcimento por seu prejuízo. Assim,

flagrante a importância do tema.

No entanto, a pesquisa ora elaborada pretende focar seu estudo na maneira

em como a referida situação desenvolve-se no Estado do Paraná, mais

especificamente, na sua capital, o Município de Curitiba.

Visando desvendar qual o posicionamento dominante adotado no momento

de solucionar tais lides, torna-se imperiosa a análise do entendimento

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jurisprudencial, enfatizando, principalmente, as decisões proferidas pelo Tribunal de

Justiça do Paraná.

Propõe-se abordar temas em voga na comunidade jurídica nacional, como

quais seriam os limites da responsabilidade civil do Estado; o papel do cidadão

como consumidor frente ao Estado; a importância do sistema regulador da

rotatividade dos automóveis e a debatida responsabilidade civil por omissão.

O problema que surge é o seguinte: Os municípios são responsáveis pelos

veículos que estacionam nas áreas denominadas de EstaR?

A hipótese de resposta provisória ao citado problema é de que, apesar do

constante no art. 37, §6º da Constituição Federal da República Brasileira, seria

inviável responsabilizar o Estado por tais furtos, visto que a situação decorre de uma

omissão estatal e, portanto, deve ser aplicada a responsabilidade civil subjetiva para

a resolução de suas lides.

Porém, outras diversas questões serão levantadas, contra o Estado e contra a

administradora, as quais serão devidamente analisadas, objetivando a resolução do

caso em pauta.

O trabalho terá como enfoque principal, como já dito, a responsabilidade civil

do estado por furtos e danos aos veículos automotores estacionados em vagas de

estacionamento rotativo, contudo, caso necessário, haverá modificação no titulo

descrito.

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2 DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

No presente capítulo analisa-se a responsabilidade civil do Estado, seus

conceitos e desdobramentos da responsabilidade subjetiva e objetiva. Elencam-se

os pressupostos da responsabilidade civil: ação ou omissão, dano, nexo de

causalidade, culpa e dolo apontando o posicionamento doutrinário e jurisprudencial

sobre este tema.

2.1 CONCEITO

Pode-se utilizar a origem etimológica das palavras para chegar a um conceito,

como Stoco (2007) denomina res (palavra latina que significa “coisa, bem”); pondere

(palavra latina que se refere a “equilibrar ou ponderar”); idade (sufixo latino de ação).

Sendo assim, responsabilidade tem a ver com reparar o dano, retornar ao status quo

anterior ao dano e preservar uma relação ética equilibrada.

A responsabilidade civil, de acordo com Diniz (2005, p. 23): “a aplicação de

sanções ou medidas que obrigue uma pessoa a reparar um dano moral ou

patrimonial causado a um terceiro por ato pratico por ela”. Essa sanção pode ser

aplicada tanto em razão do ato desta pessoa, como também por ato de pessoa por

quem ela responda.

Mas a responsabilidade civil também pode ser aplicada ao Estado? A doutrina

afirma que sim. A responsabilidade, de acordo com Lopes (2013, p.2): “é a

obrigação legal que é imposta ao Estado no sentido deste ressarcir os danos

causados a terceiros por atos lícitos e ilícitos, omissos ou comissivos por ele

praticado em virtude de suas atividades”.

Ainda em sede conceitual, a responsabilidade civil do Estado pode ocorrer

sobre duas bases: a) quanto ao fato gerador; b) quanto ao agente. No que diz

respeito ao fato gerador Lopes (2013, p. 2), classifica: “responsabilidade contratual:

proveniente de conduta violadora de norma. Pode ser extracontratual: resultante de

violação de um dever geral de abstenção, respeito aos direitos alheios”.

No que concerne ao agente a responsabilidade do Estado poder ser: a) direta;

b) indireta. Segundo Lopes (2013, p.2): “responsabilidade direta quando for

proveniente de ato do próprio responsável; e responsabilidade indireta quando

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oriunda de ato de terceiro, vinculado ao agente ou de fato de animal ou coisa

inanimada sob sua guarda”.

Após dispor sobre os aspectos conceituais da responsabilidade civil do

Estado e seus desdobramentos gerais faz-se necessária uma análise mais

pormenorizada sobre a responsabilidade subjetiva e objetiva do Estado, elencando-

se os aspectos legais e doutrinários para a caracterização desta, conforme se faz a

seguir.

2.2 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA

A responsabilidade civil do Estado pode ser tanto subjetiva como objetiva. De

acordo com Di Pietro (2013), a responsabilidade civil pode decorrer ou não do

elemento subjetivo da culpa. Assim, a responsabilidade civil subjetiva (com culpa); e

a responsabilidade civil objetiva (sem culpa). Sendo assim, a responsabilidade

subjetiva necessita de quatro elementos e a objetiva de apenas três.

Seguindo na mesma linha, Lopes (2013) afirma que a responsabilidade

subjetiva necessita dos elementos: conduta humana; nexo de causalidade; dano;

culpa. E a responsabilidade objetiva: conduta humana; nexo de causalidade; e dano.

Deste modo, é notório a elemento determinante da culpa na caracterização da

responsabilidade subjetiva, o que não ocorre na responsabilidade objetiva.

No que concerne a culpa, Meirelles (2009) afirma que este elemento possui

duas formas: 1) baseada na reprovação social e o animus agendi; 2) baseada na

previsibilidade entre o resultado obtido e o ato praticado. A responsabilidade civil

encontra-se prevista em pelo menos três artigos do Código Civil: art. 186, art. 187 e

art. 927:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (artigos 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

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Retornando aos elementos, o fato pode ser considerado como um

pressuposto de caráter material oriundo da existência do direito. De acordo com

Lopes (2013, p. 3): “os fatos podem ser naturais ou jurídicos. Fato natural é um

acontecimento qualquer, abrangendo os fatos dependentes e não dependentes da

conduta humana, ou seja, que contam ou não com a participação humana”.

Na responsabilização este elemento é utilizado de forma abrangente,

abarcando também o dolo. Lopes (2013, p. 3), acrescenta: “todas as espécies de

comportamentos contrários ao direito, sejam intencionais ou não, mas que sempre

são imputáveis ao causador do dano”. No que se refere a responsabilidade objetiva,

Lopes (2013, p. 4), argumenta:

A responsabilidade do Estado obedece a um regime próprio, compatível com sua situação jurídica, pois potencialmente tem o condão de proporcionar prejuízos macroscópicos. Ademais, os administrados não têm poderes para diminuir a atuação do Estado, no âmbito de seus direitos individuais.

A legislação pátria com finalidade de proteger criou algumas situações de

exceções. Segundo Lopes (2013, p. 4): “aplicou-se em determinados casos a

responsabilidade objetiva, que elimina de seu conceito o elemento culpa. Haverá

responsabilidade pela reparação do dano quando presentes a conduta, o dano e o

nexo de causalidade”.

2.3 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

A responsabilidade civil está assentada sobre alguns pressupostos

específicos: ação ou omissão, dano, nexo de causalidade, culpa ou dolo. Verifica-se

que as condutas que geram algum dano a terceiro são dizem respeito a um fazer.

Diferentemente na omissão há um não fazer, uma pessoa não age e acaba gerando

dano ou perigo de dano a terceiros.

2.3.1 Ação ou omissão

Um dos pressupostos da responsabilidade civil é a conduta. Neste ponto leva-

se em consideração a ação ou omissão do causador do dano. De acordo com Stoco

(2007, p. 157): “havia uma necessidade de proteger a vítima. Desse modo nasceu a

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culpa presumida, para inverter o ônus da prova e solucionar a dificuldade de quem

sofreu o dano em demonstrar culpa do responsável pela ação ou omissão”.

Quando se trata da responsabilidade civil do Estado é importante pontuar que

a Constituição Federal no parágrafo 6º do art. 37 dispôs sobre a responsabilidade de

agentes particulares, mas que são prestadores de serviços públicos:

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Dessa maneira, a Constituição Federal estabeleceu a responsabilidade da

Administração Pública diante dos atos danos provocados por seus agentes a

terceiros. De acordo com Tavares (2003, p. 128), a responsabilidade do Estado não

está apenas disposta na Constituição, mas também diversas decisões judiciais têm

fundamentado esse direito do cidadão diante das ações danosas do Estado.

Tem-se aceitado a responsabilidade civil objetiva do Estado, mas a muito se

discute quanto a aplicação desse entendimento quanto há omissão do Estado.

Segundo Tavares (2003, p. 129): “há aqueles que defendem a aplicação da teoria

subjetiva para esses casos, contrariando a regra do nosso ordenamento, e os que

adotam a teoria objetiva da responsabilidade estatal”.

Nesse contexto de debates sobre a responsabilidade do Estado por omissão,

Quadros (1995), argumenta que se um buraco recente se abre numa estrada,

provocado por alguma intempérie da natureza, e provoca algum dano ao cidadão, o

Estado pode ser responsabilizado porque ele tem o dever de manter as estradas em

boas condições de uso.

Por outro lado, Quadros (1995) afirma que se for utilizado a teoria subjetiva o

Estado só poderia ser responsabilizado se tivesse conhecimento do buraco na

estrada e não tomou nenhuma providência. Deste modo, o Estado teria se

comportado de modo negligente e deveria ser responsabilizado civilmente sob o

aspecto da culpa.

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2.3.2 Dano

O dano é o elemento fundamental da responsabilidade civil. Se o indivíduo ou

a administração pública não causasse dano a terceiros não se podia falar em

responsabilidade ou reparação. De acordo com Cavalieri (2012, p. 70): “indenização

sem a existência do dano seria enriquecimento ilícito; enriquecimento sem causa

para quem recebesse e pena para quem a pagasse”.

Deste modo, pode-se afirmar que o fundamento da indenização é a reparação

do prejuízo causado à vítima devido a uma conduta. Cavalieri (2012, p. 71),

prossegue: “o dano é não somente o fato constitutivo, mas, também, determinante

para o dever de indenizar”. O dano pode ser entendido como uma redução ou

destruição do bem ou do direito de terceiros devido a uma determinada conduta.

Existem alguns requisitos para que o dano possa ser indenizado. Segundo

Santos (2010, p.1): “primeiramente é preciso que haja violação de um interesse

jurídico patrimonial ou extrapatrimonial de uma pessoa física ou jurídica”.

Depreende-se que o dano deve violar o interesse jurídico patrimonial que pode ser

tanto patrimonial como extrapatrimonial.

O dano patrimonial de acordo com Santos (2010, p.1) é: “conhecido como

aquele que causa destruição ou diminuição de um bem de valor econômico”. Por

outro lado, o dano extrapatrimonial está relacionado com os direitos fundamentais,

direitos da personalidade do indivíduo, tais como: direito à vida, direito à integridade

física etc.

Sendo assim, o dano é o fundamento da responsabilidade civil. Tanto no

âmbito da responsabilidade civil do cidadão comum como na responsabilidade civil

da Administração Pública é necessária a existência de um dano, seja ele patrimonial

ou extrapatrimonial, para que se configure a responsabilidade e, consequentemente,

tenha-se o dever de indenizar.

2.3.3 Nexo causal

O nexo de causalidade é aquele elemento que liga a conduta com o dano a

terceiros. Existem várias teorias sobre o nexo de causalidade, citam-se as principais

teorias: a) teoria da equivalência das condições; b) teoria da causalidade adequada;

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c) teoria dos danos diretos e imediatos. Cada teoria observa o nexo causal sob uma

ótica diferente.

A teoria da equivalência das condições também é chamada como a condição

sine qua non, de acordo com Vargas dos Santos (2014, p. 1): “essa teoria propõe

que todos os elementos que concorreram para a realização são visto como causas,

sem necessidade de provar qual deles pode ser apontado como o provocador do

prejuízo”.

Já a teoria da causalidade adequada, segundo Vargas dos Santos (2014,

p.1): “não basta que um fato seja condição de um resultado para que o agente possa

ser considerado autor desse evento, todas as vezes que as condições forem

equivalentes”. Por fim, a teoria dos danos diretos e imediatos sustenta que nem

todos os fatores que geram um evento danoso será a causa do dano.

As teorias supracitadas são relevantes principalmente do ponto de vista da

responsabilidade civil do Estado, pois, conforme aponta Vargas dos Santos (2014,

p.1): “as discussões acerca da existência do nexo causal entre a conduta estatal e o

dano assumem aspecto central em qualquer demanda indenizatória movida contra o

Estado”.

Em linhas gerais, o nexo de causalidade é necessário para estabelecer a

relação entre a causa e o dano juridicamente relevante, conforme aponta Cavalieri

Filho (2012). Segundo Oliveira (1995, p. 34): “no tocante à responsabilidade do

Estado, importa saber qual a relação causal existente entre os danos sofridos por

terceiros, imputáveis a uma conduta comissiva ou omissiva do Estado”.

Outro ponto relevante da responsabilidade civil do Estado é a existência de

culpa ou dolo. É importante frisar que nem sempre a existência de nexo de

causalidade pode ser interpretada com a culpa. Porque, às vezes, pode existir a

ligação entre o ato e o dano sem que necessariamente haja culpa. No tópico

seguinte analisa-se a culpa e o dolo em ações do Estado.

2.3.4 Culpa e dolo

É importante pontuar que a culpa não está conceituada pela legislação

brasileira. Geralmente, entende-se o ato ilícito materializado através do ato culposo,

conforme leitura do artigo 186 do Código Civil. Neste sentido, Santos (2010, p.1),

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acrescenta: “no art. 186 está presente a culpa lato sensu, que abranda tanto o dolo

como a culpa em sentido estrito”.

Por outro lado, o dolo pode-se ser entendido como: “a conduta intencional, na

qual o agente atua conscientemente de forma que deseja que ocorra o resultado

antijurídico ou assume o risco de produzi-lo” (SANTOS: 2010, p. 1). Isso difere da

conduta em sentido estrito que não existe o elemento “vontade” de lesar, o resultado

difere da intenção do agente.

Em se tratando de responsabilizar o Estado, a culpa tem desdobramentos

específicos. De acordo com Lopes (2013, p. 6): “existem alguns pressupostos para a

caracterização da culpa: a) um dever violado (elemento objetivo); b) culpabilidade ou

imputabilidade do agente (elemento subjetivo)”. Se o Estado violou o dever de

cuidado e houve culpabilidade por parte do agente, então há dever de indenizar.

Ainda na caracterização da culpa ainda existe outro fator a ser acrescentado,

no elemento subjetivo da culpabilidade ou imputabilidade ainda existe mais dois

pontos, conforme Lopes (2013, p. 6): “a) a possibilidade, para o agente, de conhecer

o dever (discernimento); b) possibilidade de observá-lo (previsibilidade e

evitabilidade do ato ilícito)”.

Deste modo, se o agente do Estado tinha conhecimento (discernimento) do

dever de cuidado e o violou, tinha a possibilidade de observar esse dever

(previsibilidade do ato ilícito) e nada fez, caracteriza-se a culpa e,

consequentemente, a responsabilidade civil. Neste sentido, depreende-se que a

quebra no dever de vigilância (cuidado) de automóveis estacionados em áreas onde

há cobranças de EstaR, caracteriza-se na responsabilização do agente público,

conforme se analisa no capítulo a seguir.

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3 DOS ESTACIONAMENTOS ROTATIVOS EM VIAS PÚBLICAS

Neste capítulo analisam-se os desdobramentos da cobrança por parte do ente

público por estacionamento localizado em via pública, o denominado EstaR.

Relatam-se os aspectos históricos dessa prática; dispõe-se sobre a natureza jurídica

desta cobrança; elencam-se os elementos do EstaR cobrado no Município de

Curitiba; por fim, argumenta-se sobre a possibilidade configuração da relação de

consumo.

3.1 ASPECTOS HISTÓRICOS

Os estacionamentos rotativos em ruas públicas surgiram por volta do ano de

1974 no Município de São Paulo (SP). De acordo com Santo Filho (2013, p. 1):

“inicialmente essa modalidade de estacionamento regulava cerca de cinco mil vagas

no centro da cidade de São Paulo. Com o passar dos anos esse número foi

aumentando até chegar à marca de trinta e cinco mil vagas”.

Na cidade de Curitiba o EstaR (Estacionamento Regulamentado) teve sua

criação datada em 1º de julho de 1980 que foi regulamentado pelo Decreto nº

569/1980 e Decreto nº 934/1997. Observa-se que a cidade de Curitiba foi uma das

cidades pioneiras a implantar esse tipo de cobrança por estacionamento em via

pública no território brasileiro.

A criação do EstaR tinha regras e objetivos bastante definidos no momento da

sua entrada em vigor. Segundo a SETRAN (2016, p. 1): “a regulamentação das

áreas de estacionamento se deu com o objetivo de democratizar o espaço público

da cidade, promovendo a rotatividade no uso das vagas e, ao mesmo tempo,

auxiliando na fluidez do tráfego”.

Verifica-se que com no momento do advento do Decreto que regulamentou o

EstaR a cidade de Curitiba tinha apenas vinte e duas ruas dentro da área com este

tipo de serviço e a fiscalização era feita pelos chamados orientadores de trânsito.

Entretanto, com a imposição do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) pela

municipalização do trânsito, o EstaR foi regulado por órgão específico.

Inicialmente o controle do trânsito e dos estacionamentos rotativos na cidade

de Curitiba era feito pela URBS (Urbanização de Curitiba S/A). Posteriormente, esse

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órgão foi extinto pelo DIRETRAN (Diretoria de Trânsito de Curitiba) e a competência

para o cuidado das vias públicas municipais e os estacionamentos rotativos (com

EstaR), passou para a SETRAN (Secretaria Municipal de Trânsito).

Quando o cidadão estaciona seu automóvel em área regulamentada pelo órgão

supracitado é cobrada uma taxa. Segundo a SETRAN (2016), os cartões do EstaR

têm validade de uma hora, pode ser utilizados até três cartões de uma hora para o

veículo. Nos domingos não são cobradas nenhuma taxa, apenas de segunda à

sexta das 09h às 19h e das 09h às 13h aos sábados.

Entretanto, emergem alguns questionamentos quanto à validade desta taxa

cobrada pelo órgão público municipal; a competência e o dever de guarda do

município; e a possibilidade de poder ser enquadrado como uma relação de

consumo entre o órgão público municipal e o cidadão que estaciona seu veículo

nessas áreas com cobrança de taxas por hora.

3.2 NATUREZA JURÍDICA

Inicialmente, para tratar da natureza jurídica da cobrança de valores pelo

estacionamento rotativo em vias públicas é necessário abordar a competência dos

Municípios. De acordo com o art. 30, inciso VIII da CFRB: “compete aos Municípios:

promover, no que couber adequado ordenamento territorial, mediante planejamento

e controle de uso, do parcelamento e da ocupação do solo”.

Ao delegar essa competência para os Municípios a Carta Magna impôs uma

responsabilidade para os municípios de zelar pelas vias que passam dentro do

município. Há, ainda, disposição no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), no capítulo

II, seção II que trata da composição e da competência do Sistema Nacional de

Trânsito, no seu artigo 24 e incisos:

Art. 24. Compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição: I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de suas atribuições; II - planejar, projetar, regulamentar e operar o trânsito de veículos, de pedestres e de animais, e promover o desenvolvimento da circulação e da segurança de ciclistas; III - implantar, manter e operar o sistema de sinalização, os dispositivos e os equipamentos de controle viário; IV - coletar dados estatísticos e elaborar estudos sobre os acidentes de trânsito e suas causas;

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V - estabelecer, em conjunto com os órgãos de polícia ostensiva de trânsito, as diretrizes para o policiamento ostensivo de trânsito; VI - executar a fiscalização de trânsito em vias terrestres, edificações de uso público e edificações privadas de uso coletivo, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis e as penalidades de advertência por escrito e multa, por infrações de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, no exercício regular do poder de polícia de trânsito, notificando os infratores e arrecadando as multas que aplicar, exercendo iguais atribuições no âmbito de edificações privadas de uso coletivo, somente para infrações de uso de vagas reservadas em estacionamentos; (Redação do inciso VI dada pela Lei n. 13.281/16) VII - aplicar as penalidades de advertência por escrito e multa, por infrações de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, notificando os infratores e arrecadando as multas que aplicar; VIII - fiscalizar, autuar e aplicar as penalidades e medidas administrativas cabíveis relativas a infrações por excesso de peso, dimensões e lotação dos veículos, bem como notificar e arrecadar as multas que aplicar; IX - fiscalizar o cumprimento da norma contida no art. 95, aplicando as penalidades e arrecadando as multas nele previstas; X - implantar, manter e operar sistema de estacionamento rotativo pago nas vias; XI - arrecadar valores provenientes de estada e remoção de veículos e objetos, e escolta de veículos de cargas superdimensionadas ou perigosas; XII - credenciar os serviços de escolta, fiscalizar e adotar medidas de segurança relativas aos serviços de remoção de veículos escolta e transporte de carga indivisível; XIII - integrar-se a outros órgãos e entidades do Sistema Nacional de Trânsito para fins de arrecadação e compensação de multas impostas na área de sua competência, com vistas à unificação do licenciamento, à simplificação e à celeridade das transferências de veículos e de prontuários dos condutores de uma para outra unidade da Federação; XIV - implantar as medidas da Política Nacional de Trânsito e do Programa Nacional de Trânsito; XV - promover e participar de projetos e programas de educação e segurança de trânsito de acordo com as diretrizes estabelecidas pelo CONTRAN; XVI - planejar e implantar medidas para redução da circulação de veículos e reorientação do tráfego, com o objetivo de diminuir a emissão global de poluentes; XVII - registrar e licenciar, na forma da legislação, veículos de tração e propulsão humana e de tração animal, fiscalizando, autuando, aplicando penalidades e arrecadando multas decorrentes de infrações; (Redação dada pela Lei nº 13.154, de 2015) XVIII - conceder autorização para conduzir veículos de propulsão humana e de tração animal; XIX - articular-se com os demais órgãos do Sistema Nacional de Trânsito no Estado, sob coordenação do respectivo CETRAN; XX - fiscalizar o nível de emissão de poluentes e ruído produzidos pelos veículos automotores ou pela sua carga, de acordo com o estabelecido no art. 66, além de dar apoio às ações específicas de órgão ambiental local, quando solicitado; XXI - vistoriar veículos que necessitem de autorização especial para transitar e estabelecer os requisitos técnicos a serem observados para a circulação desses veículos. § 1º As competências relativas a órgão ou entidade municipal serão exercidas no Distrito Federal por seu órgão ou entidade executiva de trânsito. § 2º Para exercer as competências estabelecidas neste artigo, os Municípios deverão integrar-se ao Sistema Nacional de Trânsito, conforme previsto no art. 333 deste Código.

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Das atribuições do município na administração das vias públicas, destaca-se o

disposto no inciso II que aduz sobre o dever do município de planejar, projetar,

regulamentar e operar o trânsito de veículos. Observe-se ainda que o inciso VI do

artigo supracitado foi modificado pela Lei nº 13.281/2016 que entrará em vigor a

partir do mês de novembro do corrente ano.

O novo inciso VI disciplina que o município pode notificar os infratores e

arrecadar os valores das multas que aplicar. Acrescente-se ainda que o município

também exerce as mesmas atribuições nas edificações privadas que tenha uso

coletivo sobre as possíveis infrações no que tange à vagas reservadas em

estacionamentos.

Observa-se, portanto, que o município é o responsável pela manutenção das

vias e pela fluidez do trânsito, entre outras competências. Mas, no entanto, a lei não

dispõe sobre a guarda dos veículos que estacionem em áreas de parqueamento do

município pela cobrança de “EstaR” ou outro equivalente. Porém, entende-se que o

município é responsável por possíveis danos causados a estes veículos.

De acordo como entendimento de Costa (1994, p. 3): “qualquer uma das partes

pode figurar numa demanda jurídica por infligir o direito da outra ou simplesmente

quanto às responsabilidades, que no caso do Município é a prestação de serviço”. É

atribuição do município implantar, manter e operar os estacionamentos rotativos em

vias públicas. Portanto, ele torna-se responsável pela guarda dos mesmos.

3.3 FORMAS DE ARRECADAÇÃO DO ESTADO

O poder público tem algumas formas de captação de valores do cidadão.

Essa captação é posta de forma genérica como “tributo”. De acordo com o art. 3º do

Código Tributário Nacional: “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em

moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito,

instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”.

Depreende-se da conceituação supracitada que a contribuição do cidadão em

forma de tributo é obrigatória, instituída por lei e que tenha alguma atividade estatal

vinculada. Acrescente-se ainda o disposto no art. 5º do CTN: “os tributos são

impostos, taxas e contribuições de melhoria”. Dessa forma, pode-se dizer que o

tributo capta valores do cidadão em pelo menos três formas.

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A taxa é uma forma de captação de recursos coativa e bilateral. De acordo

com Gomes (2015, p. 1): “na taxa há uma contraprestação por parte do sujeito ativo,

que traduz numa vantagem ou utilidade para o sujeito passivo”. O sujeito passivo

nessa relação é o ente público e o sujeito ativo é o cidadão. Pode-se dizer que a

política fiscal no Brasil tem pelo menos três funções.

As três funções da política fiscal no contexto brasileiro, de acordo com

Giambiagi (2000), são: a) função alocativa – quando o Estado fornece bens públicos;

b) função distributiva – quando o Estado atua ajustando a distribuição de renda no

país; c) função estabilizadora – quando o Estado atua instituindo taxas

pretensamente para manter a regularidade econômica.

No presente texto, ao analisar os desdobramentos da cobrança de um valor

para estacionar em local administrado pelo município com imposição de “EstaR”,

percebe-se que quando o motorista não obedece aos ditames impostos pelo

município ele sofre sanção administrativa (multa). Essa multa por estacionar em

local com placa de “EstaR” ganhou o status de multa “grave” recentemente.

A sanção administrativa ao motorista infrator inicia-se com o chamado “aviso

de infração”. De acordo com a SETRAN (2016, p. 1): “o aviso de infração é emitido

pelo agente de trânsito quando se constata que no veículo estacionado, na área de

EstaR, não apresente o cartão no painel, dentro do horário exigido”. Também é

passível de multa quando o cartão encontra-se preenchido de forma incorreta.

Existem ainda outras formas que fundamentam a aplicação da multa pelo

agente de trânsito. Segundo a SETRAN (2016, p. 1): “a) esquecer de colocar o

cartão para o segundo ou terceiro horário estacionado; b) estacionar o veículo e

colocar cartões, mas esquecer de preencher ou errar marcações como: ano, mês,

dia, hora e minuto”.

Esta multa administrativa pode ser regularizada em até 05 (cinco) dias úteis

após o aviso de infração. Após este prazo não poderá o motorista quitar o valor

imposto pela sanção administrativa, ao contrário, a inadimplência tornou-se multa

grave com a punição de 5 (cinco) pontos na CNH e o pagamento de R$ 127,69

(cento e vinte e sete reais e sessenta e nove centavos).

Esta sanção administrativa pode tornar-se multa grave a partir do advento da

Lei nº 13.146/2015 que alterou o inciso XVII do art. 181 do CTB: “estacionar em

desacordo com as condições regulamentadas especificamente pela sinalização

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(placa – Estacionamento Regulamentado). Desta forma, percebe-se que as sanções

ao motorista infrator são graves.

Sendo assim, a sanção ao motorista infrator é bastante severa. No entanto,

não parece existir uma contraprestação adequada pelo Estado ou um benefício

efetivo ao motorista pelo pagamento das taxas de EstaR. Nesse sentido, argumenta-

se que o pagamento de EstaR em estacionamento regulamentado configura relação

de consumo e, portanto, gera para o ente público o dever de indenizar em caso de

dano.

3.4 A CONFIGURAÇÃO DA RELAÇÃO DE CONSUMO

Na configuração da relação de consumo existente entre o município e o

motorista que estaciona em áreas de estacionamento regulamentado tem aspectos

genéricos. No entanto, pode-se dizer que ao oferecer vagas em locais urbanos e

cobrar determinado valor pelo estacionamento já configura uma relação de consumo

(TAVARES, 2003).

Há, ainda, outro aspecto relevante para se verificar nesta relação de

consumo, a hipossuficiência do motorista. Neste sentido, Costa (2013, p. 14),

acrescenta: “o motorista pode ser considerado, nesta relação, como a parte

hipossuficiente, pois é a parte que absorve toda a carga onerosa da prestação de

serviço”.

A prestação de serviço oferecido pelo Município nos estacionamentos

públicos não possui garantias de que será um bom serviço prestado. Na realidade, o

que se há é apenas cobrança, não há uma guarda efetiva do bem móvel

estacionado. Entretanto, há aqui a forma denominada de “preço” ao serviço

explorado, serviço que está disposto no art.3°, § 2° do CDC:

Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. § 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

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Esta relação de consumo afronta aos princípios sociais, pois, ao que parece,

há apenas a existência de um “preço”, mas não há uma contraprestação ao

motorista. Argumenta-se, portanto, que da mesma maneira que o município é o ente

responsável pela cobrança e fiscalização dos veículos, ele também deve ser o

responsável em caso de dano, furto ou roubos. De acordo com art. 14 do CDC:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Ao negligenciar o dever de guarda do veículo em estacionamentos

regulamentados a prestação de serviço proposta pelo município incorre no disposto

no art. 14, § 1º, do CDC: “o serviço é defeituoso quando não fornece a segurança

que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias

relevantes”.

Acrescentem-se ainda os incisos do § 1º, do art. 14 do CDC que elencam as

circunstâncias relevantes: “I - o modo de seu fornecimento; II - o resultado e os

riscos que razoavelmente dele se esperam; III - a época em que foi fornecido”. Deste

modo, argumenta-se que há uma relação de consumo entre o município e o

motorista que estaciona nas áreas de parqueamento. No capítulo seguinte, avaliam-

se os desdobramentos dessa relação.

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4 HIPÓTESES DE DANOS OU FURTOS AOS VEÍCULOS

Neste capítulo analisam-se as hipóteses de danos materiais ou furtos dos

veículos estacionados em locais administrados pelo município. Sendo assim, avalia-

se o município como pessoa jurídica responsável; a competência municipal de zelar

pelas vias municipais; os desdobramentos desses casos e as possibilidades de

indenizações.

4.1 O MUNICÍPIO COMO PESSOA JURÍDICA RESPONSÁVEL

Conforme já dito acima no art. 24 do CTB há uma disposição que trata da

competência dos municípios no cuidado com o trânsito local e conservação das vias.

Conforme o art. 30 da CFRB, o município deve legislar de acordo com os interesses

locais. Segundo Tauil (2006, p. 6): “um exemplo seria o trânsito, conforme

estabelece o CTB, pelo qual competem aos Municípios os serviços locais, tipo,

estacionamento, circulação, sinalização etc.”

Percebe-se que as competências supracitadas estão intimamente ligadas com

o poder de polícia do município. Deste modo, trazendo a discussão para o âmbito da

cobrança de EstaR, o município tem o dever de guarda das vias municipais. Este

dever de guarda tem aspecto parecido com o poder de fiscalização do município, por

exemplo, da mesma forma que o agente de trânsito pode fiscalizar os veículos em

desconformidade com os cartões de EstaR, a guarda municipal poderia guardar os

veículos estacionados nestas áreas (TAUIL, 2006).

A Administração Pública é a responsável pela regularização da vida em

sociedade. De acordo com Silva (2011, p. 37): “tal atribuição visa proteger a

comunidade de qualquer conduta que lhe prejudique, até mesmo daquelas

cometidas pelo Estado”. Desse modo, pode-se dizer que da mesma forma que um

direito impõe uma obrigação, quem obtém vantagem por uma atividade deve arcar

com o ônus da mesma.

Sendo assim, o Município é a pessoa jurídica responsável pela guarda dos

veículos estacionados em área sob cobrança de EstaR e, portanto, eventual dano

sofrido pelo motorista deve ser o município responsabilizado. Segundo Silva (2011,

p. 37): “o direito à indenização estatal em prol daqueles que sofreram com os seus

atos possui caráter constitucional”. No entanto, percebe-se que mesmo identificando

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o município como pessoa jurídica responsável, é bastante complexa e controvertida

questão sobre sua responsabilização em casos de furtos dos veículos.

4.2 DESDOBRAMENTOS E POSSIBILIDADES DE INDENIZAÇÕES

Conforme dito anteriormente, a competência por zelar pelas vias que cortam

as áreas urbanas é do município, conforme dispõe o art. 24 e incisos do CTB. A

responsabilização do Município em casos de furtos ou danos ao veículo circula em

pelo menos duas linhas de argumentação: 1) a responsabilidade objetiva do Estado

devido ao fato de ser o ente responsável pela manutenção dos locais; 2) a

configuração da relação de consumo nas áreas sob cobrança de EstaR.

Inicialmente, conceitua-se consumidor como: “toda pessoa física ou jurídica

que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final” (Art. 2º, CDC).

Importante ainda a disposição do parágrafo único do art. 2º: “equipara-se a

consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja nas

relações de consumo”.

Deste modo, percebe-se a existência de três elementos no conceito de

consumidor: 1) o elemento subjetivo (pessoa); 2) o elemento objetivo (adquirir

produto ou utilizar serviço); 3) elemento teleológico (destino final do produto ou

serviço). Nesse sentido, ainda são importantes as considerações de Silva (2011, p.

38):

Ainda que assim não fosse, por si só o campo das relações de consumo é imenso, já que todo o destinatário final de bens ou serviços, pessoa natural ou jurídica, é consumidor, e todo aquele que desenvolve atividade de produção, criação, montagem ou negociação de produtos ou serviços é fornecedor.

Levando-se em considerações as peculiaridades das zonas sob cobrança de

EstaR no Município de Curitiba, pode-se dizer que o fato de ter cobrança de valores

dos motoristas parece configurar a relação de consumo entre o município e os

motoristas. Por outro lado, ainda têm-se os pontos de que o motorista pode ser

considerado hipossuficiente nessa relação de consumo, vez que ele é o consumidor

do serviço. Neste sentido, Silva (2011, p. 38), acrescenta:

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É característica fundamental do referido Código o seu intuito de proteger o consumidor, considerando o papel de hipossuficiente que esse exerce nas relações de consumo. Assim, o melhor diploma optou por adotar a responsabilidade objetiva nos casos que visam responsabilizar o fornecedor, a fim de isentar o lesado do ônus de comprovar a culpa daquele.

Seguindo esse entendimento de hipossuficiência do motorista, em caso de

furto do veículo nas áreas com cobrança de taxa de estacionamento em via pública

pelo município pode gerar dever de indenizar. Esse entendimento já foi acolhido por

alguns tribunais, como no caso do Tribunal de Santa Catarina que decidiu:

TJSC. Apelação Cível - RESPONSABILIDADE CIVIL - FURTO DE VEÍCULO EM VIA PÚBLICA - ZONA AZUL - ADMINISTRAÇÃO FEITA POR EMPRESA PERMISSIONÁRIA - PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO - REMUNERAÇÃO FEITA POR MEIO DE TARIFAS - PERMISSÃO BILATERAL - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - ARTIGO 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - PRESCINDIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE CULPA - DANO E NEXO CAUSAL CONFIGURADOS - DEVER DE RESSARCIR. Apelação Cível n. 2003.019568-8. Apelante: Soil Serviços Técnicos e Consultoria S/C Ltda. Apelado: Acácio Irineu Klemke. Relator Desembargador Dionízio Jenczak.

Na decisão supracitada, os desembargadores entenderam que no caso em

que o veículo foi furtado em via pública, mas em área da chamada “zona azul” onde

é cobrada taxa por empresa permissionária, gera dever de indenizar por parte da

permissionária ao proprietário do veículo.

Um trecho interessante da decisão supracitada foi “prescindibilidade de

demonstração de culpa”. Seguindo o disposto no art. 14º do CDC: “o fornecedor de

serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos

danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços,

bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.

Acrescente-se ainda o disposto no artigo 22 do Código de Defesa do

Consumidor: “os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias,

permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento são obrigados a

fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais,

contínuos”.

Entende-se, portanto, que os órgãos públicos ou as empresas permissionárias

que prestam serviços à população mediante o pagamento de taxas devem oferecer

serviços de qualidade, eficiência e segurança. Portanto, o roubo ou furto de veículo

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dentro de área sob cobrança de EstaR configura defeito na prestação de serviço e

gera dever de indenizar.

Entretanto, percebe-se que é controversa ainda a questão sobre a

responsabilidade do Município ou da empresa permissionária em casos de furtos de

veículos. Existem diversas decisões no sentido do dever de indenizar, como também

há inúmeras sentenças seguindo o entendimento de que não há responsabilidade do

Estado nestes casos.

4.3 POSICIONAMENTOS JURISPRUDENCIAIS

Neste tópico apontam-se algumas decisões judiciais sobre a possibilidade de

responsabilização do Município por furto de veículos em áreas públicas com

cobrança de taxas. Conforme segue:

RESPONSABILIDADE CIVIL - FURTO DE VEÍCULO ESTACIONADO EM ZONA AZUL - NATUREZA DA CONTRAPRESTAÇÃO - TAXA DE POLÍCIA - DEVER DE FISCALIZAR - OMISSÃO ESPECÍFICA - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO - NEXO CAUSAL - BOLETIM DE OCORRÊNCIA - APELO PROVIDO. Sendo o instituto da Zona Azul decorrência explícita do poder de polícia do Município, vez que, por meio de tal programa, são impostas medidas restritivas do direito individual em benefício do bem-EstaR social, configurada está a cobrança de uma taxa de polícia, regulada por regras de direito público. Ao controlar a Zona Azul, o IPUF, integrante da administração indireta, presta o serviço público oneroso, sendo aplicável à espécie a responsabilidade objetiva decorrente do art. 37, § 6º, da Constituição Federal (...) O Estado, neste caso, deverá provar a culpa do lesado ou a ocorrência de caso fortuito ou força maior para obter a exclusão ou atenuação da responsabilidade estatal. Inteligência do art. 37, § 6º, da Constituição Federal" (Ap. Cív. n. 51.986, da Capital). (TJ-SC - AC: 330681 SC 2007.033068-1, Relator: Francisco Oliveira Filho. Data de Julgamento: 06/02/2008, Segunda Câmara de Direito Público, Data de Publicação: Apelação Cível n. , da Capital)

O tribunal catarinense entendeu que o Estado deveria indenizar o motorista

pelo furto do veículo estacionado em área de “Zona Azul”, pela via da taxa de polícia

o Estado deveria manter a guarda dos veículos estacionados nesta área. Neste

caso, baseando-se na teoria do risco administrativo e encontrando-se o nexo de

causalidade, os desembargadores entenderam que não houve uma contraprestação

por parte do Estado ao pagamento da taxa pelo motorista e gerou, portanto, o dever

de indenizar.

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Entretanto, existem outras decisões em sentido diverso ao supracitado,

apontando a inexistência do dever de guarda do Município, conforme se demonstra

abaixo:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - ATO OMISSIVO - RESPONSABILIDADE SUBJETIVA - FURTO DE VEÍCULO ESTACIONADO EM "ZONA AZUL" - INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO POR PARTE DO PODER PÚBLICO PELA GUARDA E VIGILÂNCIA DO MESMO - NEXO DE CAUSALIDADE INDEMONSTRADO - INDENIZAÇÃO INDEVIDA - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. (TJ-SC - AC: 319522 SC 2007.031952-2, RELATOR: CLÁUDIO BARRETO DUTRA DATA DE JULGAMENTO: 16/12/2010, QUARTA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO, DATA DE PUBLICAÇÃO: APELAÇÃO CÍVEL N. , DA CAPITAL).

Na decisão acima, os desembargadores entenderam que era necessário a

comprovação da existência do nexo de causalidade entre o furto do veículo e a

omissão do dever de guarda por parte do poder público. Deste modo, decidiram que

não existia obrigação de guarda e vigilância do veículo e, portanto, não existiria

dever de indenização ao motorista furtado. Seguindo um posicionamento parecido

com o tribunal catarinense, o tribunal de São Paulo decidiu:

RESPOSABILIDADE CIVIL FURTO DE VEÍCULO EM VIA PÚBLICA AÇÃO AJUIZADA PELO PROPRIETÁRIO DEVER DE INDENIZAR POR CONDUTA OMISSIVA DOS AGENTES POLICIAIS INEXISTENTE O REGIME DE RESPONSABILIDADE CIVIL PRESSUPÕE NEXO DE IMPUTAÇÃO O FURTO DE VEÍCULO EM VIA PÚBLICA NÃO CONFIGURA, DE PER SE, MANIFESTAÇÃO DE DESVIO OMISSIVO DA VONTADE ESTATAL POR PARTE DOS AGENTES POLICIAIS O REGIME DE RESPONSABILIDADE CIVIL TAMBÉM PRESSUPÕE NEXO DE CAUSALIDADE AUSÊNCIA DE REGISTRO DE OCORRÊNCIA ANTERIOR NÃO É CAUSA IDÔNEA DO FURTO SE FORAM TOMADAS PROVIDÊNCIAS IMEDIATAS E ADEQUADAS PELOS POLICIAIS PARA IMPEDI-LO IMPOSSIBILIDADE DE CARACTERIZAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO RECURSO DESPROVIDO. (TJ-SP - APL: 00170553320078260320 SP 0017055-33.2007.8.26.0320, RELATOR: LUCIANA BRESCIANI, DATA DE JULGAMENTO: 18/11/2014, 1ª CÂMARA EXTRAORDINÁRIA DE DIREITO PÚBLICO, DATA DE PUBLICAÇÃO: 03/12/2014).

De acordo com o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo na

sentença supracitada não há que se falar em responsabilidade do poder público em

casos de furto de veículo por conduta omissiva de agentes policiais. Deste modo,

não ocorre a possibilidade de indenização por furto de veículo estacionado em via

pública baseando-se em conduta omissiva do Estado.

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Pode-se dizer, portanto, que é uma questão ainda bastante controversa a

possibilidade de indenização ao motorista que tem seu veículo furtado em áreas

públicas com cobrança de taxas. Mas existem possibilidades concretas de

indenização de entendidas a existência da relação de consumo e o defeito na

prestação de serviços por parte do Estado.

4.4 DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ESTAR

O EstaR é visto por alguns autores pela via da inconstitucionalidade.

Argumenta-se que ao aplicar multa de trânsito à motorista pelo não pagamento do

preço estipulado ou por ficar em tempo superior ao escrito na via, incorre-se em

inconstitucionalidade porque, de acordo com Grisa Júnior (2015, p. 7): “deste modo,

se aceita que os Municípios podem legislar sobre a matéria de trânsito, e isso fere

de morte a participação trazida na Carta Magna, em seu art. 22, XI e parágrafo

único”.

Acrescenta-se que não se deve entender que o art. 24, inciso X do CTB

delega competência para o Município impor estacionamento rotativo em via pública.

Grisa Júnior (2015, p. 7), afirma: “logo, jamais uma lei ordinária, como é o CTB,

poderia delegar competência privativa constitucional aos Municípios. A Constituição

veda, de forma cabal, que os municípios instituam legislação sobre o trânsito”. Na

mesma linha, são oportunas as considerações de Aloísio Surgik (1996, p. 10):

O problema chega a interferir até mesmo no direito de ir e vir. Pessoas residentes no perímetro central de Curitiba queixam-se de sofrer verdadeiro constrangimento em receber visitas. Porque além de ter que pagar o EstaR, tais pessoas permanecem em constante aflição e tensão no afã de controlar o tempo de estacionamento do veículo.

Esse transtorno enfrentado pelos curitibanos segue a mesma prática de

outras grandes cidades do Brasil. Entretanto, Aloísio Surgik (1996, p. 10),

argumenta:

O equivocado argumento de que a suposta finalidade de disciplinar o trânsito justificaria a cobrança de uma taxa, cujo fato gerador estaria no exercício do poder de polícia, esbarra no problema da bitributação, eis que já é obrigação do poder público, em face dos outros tributos que aufere. Sem dúvida, estender o conceito de fato gerador a amplitude ilimitada, por óbvio, significaria autorizar o poder público a criar tantas outras taxas quantas quisesse, sempre sob o pretexto de exercício do poder de polícia, o

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que seria um absurdo, vedado, aliás pelo artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, assim como pelo artigo 9º, inciso I, do CTN.

Neste caso, entraria em questão o princípio da exploração do bem público.

Nessa esteira, Aloísio Surgik (1996, p. 10), indaga: “como uma área pública,

destinada ao setor pública, pode ser explorada de forma mercantil”? Este princípio

liga ao mesmo questionamento sobre os pedágios que são repassados para a

iniciativa privada explorar de forma mercantil. No caso do EstaR, o Município explora

de forma monetária esse instituto, punindo o motorista.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Verifica-se que os municípios em diversas regiões do Brasil têm utilizado

estas modalidades de cobrança em estacionamentos de vias públicas com a

pretensa ideia de regular as vagas para os veículos que transitam nos grandes

centros. Por outro lado, não se observa uma contraprestação do município para o

motorista como, por exemplo, a guarda de seu veículo em eventual dano ou furto.

Desta forma, argumenta-se que da mesma maneira como incide a

responsabilidade civil sobre os estacionamentos privados deveria também ocorrer

nas vias sob cobrança de EstaR, pois, existe uma cobrança. Conforme dito acima,

entende-se que há uma relação de consumo entre o motorista e o município,

portanto, em caso de danos ou furtos deve-se responsabilizar o município por

omissão.

O município tem competência para legislar e organizar o trânsito e as vias

municipais e, consequentemente, cobra tarifas pelos estacionamentos supracitados.

O mesmo ente exerce o poder de polícia na fiscalização dos veículos que estão ou

não com o cartão de EstaR. Coloca-se, portanto, uma barreira para que o cidadão

usufrua das vias pelo tempo que desejar, impondo-lhe um valor.

Percebe-se que há um conflito de interpretações. De um lado sabe-se a

competência para se cobrar e criar tributos, por outro lado, dá-se outro nome para a

cobrança. Sendo assim, faz-se um malabarismo jurídico para que sejam driblados os

requisitos e validade constitucional dessa cobrança.

Nesse contexto, sabendo da competência pelas vias municipais e o poder de

polícia na cobrança desses valores, pergunta-se: porque o município não exerce a

guarda dos veículos estacionados nas áreas de EstaR? E, ainda, no caso de dano e

roubo poderia o município ser responsabilizado pela omissão na guarda deste

veículo?

Os questionamentos acima urgem por uma resposta legislativa. Entretanto, o

que se tem são decisões jurisprudenciais que são antagônicas. Por um lado,

algumas câmaras de alguns tribunais entendem que o município pode ser

responsabilizado e deveria indenizar o proprietário por danos no veículo estacionado

nestes estacionamentos; por outro lado, vários tribunais entendem que inexiste a

obrigação do Poder Público na guarda e vigilância do veículo, portanto, não existiria

um nexo de causalidade.

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Mas são oportunos os argumentos de pesquisadores como o do Prof. Aloísio

Surgik que argumenta que EstaR não pode ser entendido como uma

democratização do espaço público, uma vez que seria um vício grave desde a sua

origem. Na mesma linha, pergunta-se, se paga-se para estacionar em vias públicas,

qual será o impeditivo de cobrar, futuramente, para recolher o veículo em sua

residência?

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