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A PRÁTICA DOCENTE EM RELAÇÃO AO ENSINO DE CIÊNCIAS BASEADA NUMA CONCEPÇÃO CONSTRUTIVISTA O presente trabalho tem como objetivo principal analisar a prática docente em relação ao ensino de ciências nas séries iniciais, fundamentadas numa abordagem construtivista, visando à utilização de experimentos nesta abordagem. Para tanto nos fundamentamos, principalmente, na proposta de Moraes (1998), Borges (1998) e Bizzo (2007). Tendo em vista que, estas propostas se completam, estabelecemos um diálogo entre as referidas propostas com a realidade que encontramos em nosso campo de estágio. No mundo globalizado no qual nos encontramos hoje inseridos existe grande facilidade no que diz respeito ao acesso a informação. A televisão, a mídia como um todo e principalmente a internet tem aproximado nossos alunos de conhecimentos científicos e tecnológicos. Isso tem deixado os professores inseguros em trabalhar esses conteúdos em sala de aula, alegando que os alunos sabem mais que os próprios professores. Por esse e também por uma série de outros motivos, os professores fogem das aulas de ciências priorizando outras disciplinas como português e matemática ou se fecham em práticas pedagógicas tradicionais, limitando o conhecimento cientifico a mera aquisição de terminologia científica e priorizando memorização de questionários com o objetivo principal de responder as provas. Numa sociedade em que cada vez mais os saberes científicos e tecnológicos fazem parte do dia-a-dia das pessoas e que tanto se discute sobre transformações pelas quais a educação necessita passar, como então conceber práticas pedagógicas tradicionalmente estabelecidas fazendo parte do cotidiano escolar atual? Partindo da compreensão que essas práticas dão sinais de esgotamento e apresentam-se insuficientes para formação do cidadão crítico, reflexivo, investigativo e questionador, desenvolvemos nosso trabalho visando nortear ações pedagógicas em relação ao ensino de ciências nas séries iniciais fundamentadas numa abordagem construtivista, tendo em vista que a mesma contribui para a formação plena do indivíduo. Para tanto faremos um breve resgate histórico a fim de buscar uma melhor compreensão do que embasa práticas tradicionais de ensino presentes ainda hoje no cotidiano escolar. Posteriormente apresentamos uma concepção de

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A PRÁTICA DOCENTE EM RELAÇÃO AO ENSINO DE CIÊNCIAS

BASEADA NUMA CONCEPÇÃO CONSTRUTIVISTA

O presente trabalho tem como objetivo principal analisar a prática

docente em relação ao ensino de ciências nas séries iniciais, fundamentadas

numa abordagem construtivista, visando à utilização de experimentos nesta

abordagem. Para tanto nos fundamentamos, principalmente, na proposta de

Moraes (1998), Borges (1998) e Bizzo (2007). Tendo em vista que, estas

propostas se completam, estabelecemos um diálogo entre as referidas

propostas com a realidade que encontramos em nosso campo de estágio.

No mundo globalizado no qual nos encontramos hoje inseridos existe

grande facilidade no que diz respeito ao acesso a informação. A televisão, a

mídia como um todo e principalmente a internet tem aproximado nossos alunos

de conhecimentos científicos e tecnológicos. Isso tem deixado os professores

inseguros em trabalhar esses conteúdos em sala de aula, alegando que os

alunos sabem mais que os próprios professores. Por esse e também por uma

série de outros motivos, os professores fogem das aulas de ciências

priorizando outras disciplinas como português e matemática ou se fecham em

práticas pedagógicas tradicionais, limitando o conhecimento cientifico a mera

aquisição de terminologia científica e priorizando memorização de

questionários com o objetivo principal de responder as provas.

Numa sociedade em que cada vez mais os saberes científicos e

tecnológicos fazem parte do dia-a-dia das pessoas e que tanto se discute sobre

transformações pelas quais a educação necessita passar, como então

conceber práticas pedagógicas tradicionalmente estabelecidas fazendo parte

do cotidiano escolar atual? Partindo da compreensão que essas práticas dão

sinais de esgotamento e apresentam-se insuficientes para formação do

cidadão crítico, reflexivo, investigativo e questionador, desenvolvemos nosso

trabalho visando nortear ações pedagógicas em relação ao ensino de ciências

nas séries iniciais fundamentadas numa abordagem construtivista, tendo em

vista que a mesma contribui para a formação plena do indivíduo.

Para tanto faremos um breve resgate histórico a fim de buscar uma melhor

compreensão do que embasa práticas tradicionais de ensino presentes ainda

hoje no cotidiano escolar. Posteriormente apresentamos uma concepção de

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ensino de ciências baseada no construtivismo que deve se refletir nas práticas

docentes. Discutiremos o que é construtivismo, o significado de

experimentação e suas características numa abordagem construtivista, com o

objetivo de situar o professor nessa perspectiva, ou seja, como ele pode se

portar ao realizar experimentos embasados numa abordagem construtivista.

Em um terceiro momento relataremos à intervenção que aplicamos no

campo de estágio na qual colocamos em prática saberes em relação à postura

pedagógica que defendemos teoricamente como adequados para o ensino de

ciências nas séries iniciais.

Por fim traremos nossas considerações finais em relação ao presente

estudo.

O ensino de ciências naturais passou a configurar o cenário escolar por

volta do século XIX embasado em práticas docentes tradicionais, uma vez que

era essa a tendência pedagógica dominante da época. Nesta prática levar os

conteúdos para sala de aula implica em transmitir conteúdos de forma

hierárquica.

O referido ensino vem passando ao longo do tempo por várias

mudanças, porém o trabalho em questão não pretende deter-se no histórico do

ensino de ciências, mas sim na prática docente adotada durante toda sua

trajetória.

O professor na perspectiva tradicional assume uma postura de detentor

do saber. O aluno, por sua vez, é visto como mero receptor de informações as

quais são tomadas como verdades absolutas e inquestionáveis. Como recurso

metodológico o questionário protagonizou as aulas de ciências e, ainda hoje

podemos observar sua presença em sala de aula.

Analisando toda prática em relação ao ensino de ciências, percebemos

uma trajetória de ensino que tem, ao longo de sua história, todo um movimento

de perspectiva de mudança. Porém o que se pode observar é que as

mudanças permanecem restritas apenas a mudança de material didático:

questionários, atividades práticas, métodos científicos, pois a postura do

professor permanece a mesma diante do uso de todos esses recursos.

Atualmente há uma grande tendência em utilizar experimentos visando

uma aprendizagem cientifica mais concreta. No entanto o que se pode

observar é que mesmo diante da utilização desses recursos o professor ainda

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vem perpetuando uma postura tradicional de ensino, utilizando práticas

docentes apoiadas em perspectivas tradicionais.

Contrapondo-se principalmente ao ensino tradicional, todo um

movimento social histórico vem desenvolvendo uma abordagem: Construtivista,

que ao longo do tempo vem conquistando cada vez mais status social, uma vez

que atende as mudanças que estamos passando em todo um contexto social.

A referida abordagem compreende o conhecimento como algo em constante

construção. O professor, nesta abordagem é o mediador entre o aluno e o

conhecimento e, compreende o seu caráter de permanente aprendiz. De

acordo com Mizukami (1986, p. 77) “Sua função consiste em provocar

desequilíbrios, fazer desafios.” O aluno por sua vez assume um papel ativo no

processo de ensino-aprendizagem, e suas atividades básicas são: observar,

experimentar, comparar, relacionar, analisar, justapor, compor, encaixar,

levantar hipóteses, argumentar, etc. (Mizukami, 1986).

Assim, no que se refere ao ensino de ciências nas séries iniciais, Moraes

e Borges (1998) discutem uma educação numa visão construtivista nos

apontando a importância da experimentação e de atividades práticas.

É importante ressaltar que o uso de experimentos por si só, como

podemos observar no inicio do presente texto e apoiadas em Bizzo (2007,

p.75) “[...] não garante um bom aprendizado”. Junto com o uso de tal

instrumento o professor precisa assumir uma postura diferente da postura

tradicional já citada anteriormente. O uso de experimentos como recurso

metodológico precisa levar o aluno a uma reflexão, a construir o conhecimento,

pois, “Cabe ao professor propor problemas aos alunos, sem ensinar-lhes as

soluções” (Mizukami, 1986, p. 77).

Usar experimentos em forma de problema, levando o aluno a buscar

soluções, apresenta-se como de extrema significância para a construção do

conhecimento por parte do aluno.

Em relação aos experimentos construtivistas, Moraes (1998) nos

apresenta os principais atributos para o uso deste recurso:

Uso do conhecimento prévio dos alunos;

Uso intensivo de diálogo e reflexão;

Proposição de atividades interdisciplinares relacionadas ao cotidiano;

Proposição de atividades em forma de problema.

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Para que o uso de experimentos em sala de aula tenha uma concepção

construtivista esses atributos precisam estar intrínsecos ao fazer pedagógico

do professor.

Utilizando-se do diálogo entre professor-aluno e aluno-aluno, o professor

apropria-se do conhecimento prévio dos alunos. Cabe ao professor, a partir

disso, problematizar as atividades, levando os alunos a refletirem em busca de

soluções, propondo atividades que aproximem o conhecimento científico do

cotidiano dos alunos.

Aproximar esses conhecimentos da vivência dos alunos implica trabalhar

de maneira interdisciplinar, uma vez que a realidade apresenta-se de forma

complexa, envolvendo várias áreas do conhecimento. Fragmentar essas

atividades em disciplinas distintas descaracterizaria a abordagem em questão.

O diálogo fundamentando a ação, apontando para uma reflexão, visando à

compreensão, se apresenta como de extrema significância durante todo o

processo de ensino-aprendizagem. Em especial, o diálogo também apresenta

utilidade no que diz respeito ao processo de avaliação e ao acompanhamento

do desenvolvimento dos educandos por parte do professor. A reflexão também

se mostra importante no que diz respeito à evolução conceitual por parte dos

alunos, ou seja, um dos objetivos das aulas de ciências é a superação de

conhecimentos prévios.

Para estruturação de atividades, Moraes (1998) apresenta um conjunto de

valores e atitudes necessários ao professor que deseja realizar experimentos

com seus alunos: Valorizar a compreensão do aluno, promover atitudes de

pesquisa, valorizar a cooperação e o trabalho em grupo, promover a autonomia

dos alunos e incentivar atitudes questionadoras. Consoante com Moraes (1998,

p. 44) “O professor assume muito mais a função de questionar do que de dar

respostas”. Ou seja, assume o papel de mediador da aprendizagem. De acordo

com o referido autor, o professor precisa saber auxiliar o aluno na sua

construção durante todo o processo de aprendizagem.

Em reposta ao questionamento Como desenvolver a educação em ciências

nas séries iniciais?

Moraes e Borges (1998) apresentam suas idéias em relação ao

desenvolvimento das aulas de ciências nas séries iniciais dando ênfase aos

seguintes pontos: Definição do tema/questionamentos iniciais; exploração do

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conhecimento prévio; definição do plano de trabalho com os alunos; realização

de atividades concretas; exploração dos resultados: reflexão e discussão;

complementação: consultas a livros e especialistas; síntese: relato e

apresentação dos resultados. É importante ressaltar que estas orientações não

se dão como uma receita de bolo que se deve seguir linearmente. Como os

referidos autores colocam, são sós idéias para uma orientação. Entendendo

toda a dinâmica existente em sala de aula, essas orientações são flexíveis e

abertas a adaptações dependendo da necessidade que o dia-a-dia de sala de

aula apresentar.

Como perspectivas para atuação do professor Bizzo (2007) nos traz uma

série de perspectivas, dentre as quais utilizamos com maior ênfase em nosso

trabalho: Entender a prática cotidiana como objeto de pesquisa; encaminhar

atividades sem se apresentar como fonte inesgotável de conhecimento;

proporcionar oportunidades de troca de idéias entre os alunos; procurar

explicações e sua comprovação; progredir conceitualmente; Pesquisar e

implementar formas inovadoras de avaliação. Todas essas perspectivas

fundamentaram nosso fazer pedagógico uma vez que compreendemos essas,

dentre outras, como de fundamental importância para desenvolver praticas

construtivistas em relação ao ensino de ciências.

A intervenção aplicada no 3º ano do 2º ciclo, projeto: Estudando Raízes

teve como ponto de partida o manuseio por parte dos alunos de várias fotos de

raízes, com a intenção de que os alunos identificassem quais eram raízes

justificando suas respostas. Foi identificado um conhecimento baseado no

senso comum, sem bases cientificas. Tivemos como respostas o “é por que é”.

Posteriormente trabalhamos com material concreto, encontrados no

cotidiano dos alunos – BETERRABA, CEBOLA, MACAXEIRA E BATATA-

DOCE. Essas raízes foram entregues para que os alunos pudessem manusear

e dizer como era a planta daquelas raízes já que eles tinham classificado-as

como raízes. Eles se confundiam nas suas explicações, colocando as raízes

como fruto, pareciam não acreditar que aqueles elementos ficavam embaixo da

terra.

Foi levado para que eles pudessem ver plantas com suas respectivas

raízes. Os alunos manusearam aquelas plantas e comparam todas aquelas

raízes com as plantas que ali completas. Depois que eles tinham fantasiado

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bastante de como seria o pé de cenoura, beterraba, etc. Foi levada uma foto de

um pé de cenoura e uma beterraba com sua planta e, a partir daí foi possível

construir com eles o conhecimento científico de como seria essas plantas e

como era e onde se localizava suas raízes.

Partindo do questionamento “para que serve a raiz de uma planta” e em

resposta das hipóteses que eles levantaram, foi mostrada uma planta aquática

para identificação de sua raiz e discussão de sua função, bem como da planta

aérea (foto).

Como atividade de desenho, pode ser avaliado o conhecimento

construído pelos alunos, uma vez que orientados para desenhar as raízes que

se encontravam na sala, um dos alunos desenha classificando-as: aérea,

terrestre, aquática. O que chama a atenção é que isso não foi uma coisa

cobrada, ele que mostra essa construção pela oportunidade criada: a

intervenção. Muitos alunos pediram as raízes para desenhar manuseando as

mesmas.

Com a intenção de discutir a importância das raízes tanto para as

plantas como para nós seres humanos, os alunos tiveram a oportunidade de

degustar suco de beterraba e cenoura e também degustar batata-doce e

macaxeira cozida. Foram também mostrados os procedimentos para coser

essas raízes. Os alunos descascaram a macaxeira manuseando suas cascas,

descobriram que após coser a batata-doce sua casca fica fácil de sair, etc. Foi

discutido em relação ao gosto daquelas raízes e seu valor nutricional para nós

seres humanos.

A proposta de levar experimento científico para sala de aula como

recurso didático foi surpreendida pela dúvida de uma das alunas que ao ver a

planta que foi arrancada do solo levantou o questionamento se a mesma

viveria na água. O questionamento voltou para ela e a mesma não sabia

responder. A mesma foi orientada a desenvolver o experimento cientifico em

sala de aula, fazendo todos os dias os registros do que aconteceria com

aquelas plantas.

Por fim concluiu-se a intervenção com uma roda de conversa onde pela

exposição oral os alunos relatavam o que aprenderam com todas aquelas

atividades. Assim foi avaliada também a didática utilizada naquela intervenção

de acordo com os propósitos que se esperavam alcançar.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concluímos que desenvolver uma prática de ensino que leve o aluno a

construir o conhecimento de forma crítica, reflexiva e questionadora apresenta-

se como um desafio, uma vez que requer um movimento constante de ação-

reflexão-ação. Assim, entendemos que toda prática é o reflexo de uma

concepção de ensino, que aqui se traduziu no ensino de ciências.

O experimento científico apresenta-se como recurso didático,

reforçamos, como já dissemos, a prática pedagógica diante do uso de tal

recurso, de fundamental importância no processo de ensino aprendizagem uma

vez que cria condições e facilita o processo de aprendizagem dos alunos

aproximando-os do conhecimento, do objeto de estudo.

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