FACULDADE TRÊS PONTAS - FATEPS
DIREITO
DIMITRI ANDRADE BARBOSA
A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MODALIDADE CULPOSA DOS ATOS DE
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Três Pontas
2013
DIMITRI ANDRADE BARBOSA
A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MODALIDADE CULPOSA DOS ATOS DE
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Monografia apresentada ao curso de Direito da
Faculdade Três Pontas - FATEPS como pré-requisito
para obtenção do grau de bacharel, sob orientação do
Prof. Esp. Marcelo Figueiredo.
Três Pontas
2013
DIMITRI ANDRADE BARBOSA
A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MODALIDADE CULPOSA DOS ATOS DE
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Monografia apresentada ao curso de Direito da
Faculdade Três Pontas, como pré-requisito para
obtenção do grau de bacharel pela Banca Examinadora
composta pelos membros:
Aprovado em 28 / 11 / 2013.
___________________________________________________________
Prof. Esp. Marcelo Figueiredo
___________________________________________________________
Prof. Me. Evandro Marcelo dos Santos
___________________________________________________________
Prof. Me. João Victor Mendes de Gomes e Mendonça
OBS.:
Dedico este trabalho aos meus avós Sebastião
e Imaculada. A ele, por ser o grande Mestre
que me acompanha, ensinando-me a
importância do bom senso e da racionalidade,
do amor pelo debate, da busca incessante do
conhecimento, do valor da honra, da família e
do desenvolvimento de um espírito público. A
ela, por mostrar a força imensurável que se
pode encontrar no Sagrado e sempre interceder
por mim junto a Deus.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos os professores que nos
últimos cinco anos me acompanharam nessa
jornada, em especial a três deles: ao Prof.
Marco Antônio Azze, por mostrar que é
necessário libertar nosso pensamento das
amarras que o mundo nos impõe; ao Prof.
Leiner Marchetti Pereira, por me iniciar nos
estudos do direito público e por me confiar a
responsabilidade de ser seu estagiário, desafio
sem o qual minha preparação profissional não
seria a mesma; e, por último mas não menos
importante, ao Prof. Marcelo Figueiredo, pelo
significativo apoio e orientação na construção
desse trabalho acadêmico, resultado de estudo
e reflexão conjunta.
“Sei que quem rouba um, é moleque
Aos dez, promovido a ladrão
Se rouba 100 já passou de doutor
E 10 mil, é figura nacional
E se rouba 80 milhões...
É a diplomacia internacional”
Tom Zé
RESUMO
Este trabalho apresenta um estudo sobre a constitucionalidade dos atos de improbidade
administrativa praticados na modalidade culposa. A pesquisa inicia-se pela busca do conceito
jurídico de improbidade administrativa, relacionando o tema a assuntos correlatos como a
corrupção, a probidade e a moralidade administrativa, e a má gestão pública. Perpassa por
uma análise histórica do tratamento legislativo conferido à improbidade administrativa, até o
advento da Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992. O núcleo da pesquisa encontra-se no estudo
dos artigos 5º e 10 da Lei de Improbidade Administrativa, com o estudo de posicionamentos
doutrinários e jurisprudenciais sobre a constitucionalidade dos atos de improbidade praticados
na modalidade culposa que causam lesão ao erário. Propõe-se a solução da controvérsia por
meio dos instrumentos de controle de constitucionalidade das normas jurídicas, como a Ação
Direta de Inconstitucionalidade, a Ação Declaratória de Constitucionalidade, bem como pelo
uso da interpretação conforme a Constituição. Por fim, afirma-se que a pacificação do tema é
de extrema relevância para a correta aplicação da Lei de Improbidade Administrativa,
trazendo, assim, avanços para a afirmação de uma ética no setor público.
Palavras-chave: Direito Público. Improbidade administrativa. Modalidade culposa. Controle
de constitucionalidade.
ABSTRACT
This paper presents a study of the constitutionality of acts of administrative
misconduct committed in guilty modality. The research begins by seeking the legal concept of
administrative misconduct, relating to the subject matters related to corruption,
administrative probity and morality, and public mismanagement. Permeates a historical
analysis of legislative treatment given to administrative misconduct, until the enactment of
Law nº 8.429 of 02 June 1992. The core of the research is the study of Articles 5 and 10 of the
Law on Administrative Misconduct with the study of doctrinal and jurisprudential positions
on the constitutionality of the acts of misconduct committed in guilty modality that cause
injury to the public treasury. It is proposed to settle the dispute by means of the control of
constitutionality of legal norms, such as the direct action of unconstitutionality, the Direct
Action of Constitutionality, as well as the use of interpretation according to the Constitution.
Finally, it is stated that the pacification of the subject is very important for the correct
application of the Law of Administrative Misconduct, thus bringing advances to the statement
of ethics in the public sector.
Keywords: Public Law. Administrative misconduct. Guilty modality. Control of
constitutionality.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 09
2 CONCEITO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ............................................. 11
2.1 O fenômeno da corrupção ............................................................................................ 12
2.2 Probidade e moralidade administrativa ...................................................................... 17
2.3 Má gestão pública e improbidade ................................................................................ 21
2.4 Definição de improbidade administrativa ................................................................... 24
3 EVOLUÇÃO NORMATIVA DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA .................. 26
3.1 As Constituições de 1824 a 1969. ................................................................................. 26
3.2 A Lei nº 3.164, de 01 de junho de 1957 – Lei Pitombo-Godói Ilha. ............................ 29
3.3 A Lei nº 3.502, de 21 de dezembro de 1958 – Lei Bilac Pinto. .................................... 29
3.4 A Constituição de 1988 - Artigo 37, parágrafo 4º. ...................................................... 31
3.5 A Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992 – Lei de Improbidade Administrativa.......... 32
4 ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ........................................................ 34
4.1 Aspectos gerais ............................................................................................................. 34
4.1.1 Bem jurídico protegido ................................................................................................ 34
4.1.2 Sujeito ativo ................................................................................................................ 34
4.1.3 Sujeito passivo ............................................................................................................ 36
4.1.4 Conduta e nexo de causalidade .................................................................................... 37
4.1.5 Elemento subjetivo ...................................................................................................... 38
4.2 Atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito .............. 40
4.3 Atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário ........................ 41
4.4 Atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da
Administração Pública ....................................................................................................... 41
5 A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MODALIDADE CULPOSA DOS ATOS DE
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ............................................................................ 44
5.1 Distinções entre dolo e culpa ........................................................................................ 44
5.2 Posicionamentos doutrinários ...................................................................................... 46
5.3 Posicionamentos jurisprudenciais ............................................................................... 51
6 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOBRE OS ARTIGOS 5º E 10 DA
LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA .............................................................. 57
7 CONCLUSÃO ................................................................................................................. 60
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 62
ANEXO A – Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992 ............................................................ 68
9
1 INTRODUÇÃO
A sociedade brasileira, em seus diversos segmentos, vive um momento de intensa
discussão e preocupação com a ética pública, tão visivelmente abalada por casos de corrupção
deflagrados por indivíduos e empresas, na maioria das vezes em conluio com agentes
públicos, que se utilizam da máquina pública para satisfazer interesses próprios e, assim,
enriquecer-se ilicitamente à custa do erário. Nesse cenário conturbado surge a figura jurídica
da improbidade administrativa, que, embora de difícil conceituação, pode ser entendida, em
síntese, como uma conduta desonesta, corrupta, norteada pela má-fé e com a finalidade de
utilizar o patrimônio público em benefício próprio ou de terceiros, sempre de forma escusa e
ilícita, o que termina por lesar o erário e violar os princípios constitucionais regentes da
Administração Pública. O constituinte de 1988, atento aos seus malefícios e à imperiosa
necessidade de combatê-la, cuidou de inserir na Constituição Cidadã, no § 4º do artigo 37, a
previsão de que a prática de atos de improbidade administrativa importaria na suspensão dos
direitos políticos, na perda da função pública, na indisponibilidade dos bens e no
ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal
cabível. Nessa esteira, para dar eficácia ao comando constitucional e regulamentar a matéria
em seus diversos aspectos, foi elaborada a Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992, denominada
Lei de Improbidade Administrativa.
Esse diploma normativo, porém, não esteve imune à críticas, colocando-se em xeque
até mesmo a constitucionalidade de alguns de seus dispositivos, dentre os quais retira-se o
objeto de pesquisa do presente trabalho, qual seja, a constitucionalidade da modalidade
culposa dos atos de improbidade administrativa. Prevista em seus artigos 5º e 10, a Lei de
Improbidade Administrativa permite que o agente causador de lesão ao patrimônio público
seja responsabilizado a título de dolo ou culpa. A controvérsia instala-se a partir do momento
em que se questiona a possibilidade de ser tratado como ímprobo aquele agente público que
age por negligência, imprudência ou imperícia no trato da coisa pública. A partir disso, a
pesquisa ora desenvolvida inicia-se com a discussão sobre o conceito de improbidade
administrativa e suas relações com temas afetos, tal qual a corrupção, a probidade e a
moralidade administrativa, e a má gestão pública. O segundo capítulo ocupa-se do estudo da
evolução normativa da improbidade administrativa no ordenamento jurídico pátrio,
analisando a proteção jurídica conferida à probidade desde a Constituição do Império até a
presente data. Por sua vez, o terceiro capítulo cuida da análise geral dos atos de improbidade
administrativa descritos na Lei nº 8.429/1992, a saber: atos que importam enriquecimento
10
ilícito, atos que causam prejuízo ao erário e os atos que atentam contra os princípios da
administração pública. Na quarta parte do estudo, atinge-se o núcleo do debate, voltando as
atenções aos artigos 5º e 10 da Lei de Improbidade Administrativa, dispositivo que traz
expressamente a previsão de responsabilização do agente mediante a modalidade culposa.
Com vistas aos diversos posicionamentos trazidos pela doutrina e ao entendimento externado
pela jurisprudência, será feita uma análise constitucional do referido artigo para se concluir
pela constitucionalidade, ou não, da tipificação de atos culposos. Por fim, será feito um estudo
sobre as alternativas de solução para o problema, abordando a possibilidade e as formas de
controle de constitucionalidade que podem ser utilizadas para o seu deslinde.
Destarte, espera-se ao final do trabalho proporcionar um intenso debate sobre o tema
escolhido, contribuindo para a pesquisa jurídica e para o avanço do combate à improbidade
administrativa que assola o ambiente público.
11
2 CONCEITO DE IMPROBIDADE ADMISTRATIVA
Definir um conceito jurídico para o fenômeno da improbidade administrativa é tarefa
primordial para identificar o objeto da presente pesquisa, tracejando as características
principais do instituto. De início, ressalta-se que o tema ora estudado pode ser entendido
como a face oposta de outro instituto: a probidade administrativa.
Nesse sentido, probidade e improbidade são institutos reversos, sendo o segundo a
violação do primeiro (SOUZA, 2012), daí porque definir o que é probidade administrativa é
igualmente relevante para compreensão da matéria.
O que é certo, e já se pode afirmar desde logo, é que ambas as expressões referem-se à
ética institucional do setor público, referindo-se aos princípios e deveres primordiais que
devem ser observados por aqueles que se relacionam com a Administração Pública.
Para Fábio Medina Osório (2012, p. 2), “o conceito de improbidade administrativa de
improbidade administrativa está ligado a dois pilares fundamentais da ética pública na pós-
modernidade: as noções de grave ineficiência funcional e grave desonestidade”. Partindo das
duas premissas lançadas pelo autor, denota-se que o fenômeno da improbidade emerge do
seio da Administração Pública a partir do mau comportamento dos agentes públicos
responsáveis pela eficiência do aparelho estatal, bem como da inobservância dos deveres de
honestidade e lealdade com as instituições públicas.
Nessa linha, a definição do que seja improbidade administrativa deverá relacionar-se
ao conceito de probidade administrativa, e com outros temas de igual importância para
conclusão deste trabalho, quais sejam: a) presença da corrupção nas relações sociais e
políticas, buscando analisar o fenômeno da corrupção, qual o seu estado na sociedade atual e,
principalmente, qual o grau de semelhança entre os conceitos de corrupção e improbidade; b)
as relações entre a probidade administrativa e o princípio da moralidade administrativa,
apresentando, neste ponto, lições doutrinárias sobre ambos os institutos e o debate sobre qual
deles estaria abrangido pelo outro, bem como a presença destes na Constituição Federal e na
Lei nº 8.429/1992 - Lei de Improbidade Administrativa; c) por fim, apresentar as necessárias
relações entre probidade administrativa e má gestão pública, de modo a evidenciar que a
construção de uma sociedade onde o interesse público é preservado depende da proteção que
o Direito confere ao patrimônio público, por meio de sua boa administração e observância
contínua de seus princípios e regras, sendo a improbidade administrativa um dos resultados
nocivos gerados pela ineficiência funcional dos gestores públicos.
12
2.1 O fenômeno da corrupção
A corrupção é, hodiernamente, um dos temas mais debatidos pela sociedade,
considerando a relevância do assunto no contexto estatal, bem como pelos efeitos nocivos por
ela produzidos no tecido social. Numa definição léxica, pode-se conceituar corrupção como
a) adulteração das características originais de algo, desvirtuação, deturpação; b)
ato ou efeito de subornar, vender e comprar vantagens, desviar recursos, fraudar,
furtar em benefício próprio e em prejuízo do Estado ou do bem público; aliciação;
d) degeneração moral; depravação; imoralidade; perversão (IDICIONÁRIO AULETE, 2013).
É certo que a corrupção não é fenômeno recente, estando presente em todas as
sociedades humanas, sendo difícil tarefa precisar em qual época ou local ela se fortaleceu.
Nesse sentido:
Há um caso considerado mais antigo e documentado por alguns historiadores, em
que mencionam o longínquo ano de 271 a.C., em Roma. A informação é a de que um grupo de empresários ao adquirirem navios para uma guerra de Roma contra
Cartago, resolveram, os adquirentes das embarcações, incendiá-las, no meio do Mar
Mediterrâneo, e exigiram do Estado o pagamento do seguro (SOUZA, 2012, p. 40).
Sempre foi uma cultura nefasta em nosso país, como nos países da América do Sul,
ver os homens públicos rompendo a coletividade pelos seus maus tratos à coisa
pública. Ora, a corrupção atrasou muitos povos do nosso continente, que obtiveram
dos políticos o retrocesso e a conduta desleal, em vez de zelarem pela boa e pura
intenção dos seus atos (MATTOS, 2010, p. 27).
No atual quadro global, interessante destacar que o Brasil é considerado como 69º país
menos corrupto, entre 178 países analisados pela Transparência Internacional, respeitável
Organização Não Governamental, resultado que compõe o Índice de Percepção de Corrupção
(IPC) divulgado anualmente pela entidade. Em uma escala de 0 (zero) a 100 (cem) pontos,
onde quanto maior a pontuação, menor índice de corrupção, o Brasil obteve apenas 43
(quarenta e três) pontos no ano de 2012, igualando-se à África do Sul e à República da
Macedônia. Tal situação não é animadora, nem, portanto, confortável (SOUZA, 2012).1
1 Por outro lado, interessante destacar a observação feita por Fábio Medina Osório (2010, p.31), embora sem ignorar a importância e idoneidade dos dados levantados pela Transparência Internacional, afirma que “a
exposição intensa e mercadológica dos fenômenos ligados à corrupção pode projetar efeitos nas pesquisas de
opinião de entidades como a Transparência Internacional, que se baseiam em percepções subjetivas dos
representantes de entidades oficiais e não governamentais, públicas e privadas, situação a ensejar cautelas quanto
à dimensão científica desses levantamentos”.
13
Segundo Naira Senna (2010, p. 7-8), o tema comporta uma análise sob dois prismas,
sendo possível estudar a corrupção segundo a visão dos antigos e dos modernos. Nessa linha,
o significado de corrupção nas sociedades antigas estaria associado, no mais das vezes, à
depravação moral, à degeneração dos costumes, mudanças inerentes a qualquer sociedade em
virtude do decurso do tempo; ao passo que a corrupção sob a óptica moderna surge como atos
de violação ao interesse público, mediante a promoção de condutas ilícitas para benefício
próprio.
É certo que o desenvolvimento da corrupção entrelaça-se ao exercício do poder, na
acepção política do termo, vale dizer, poder entendido como relação entre indivíduos
integrantes de uma comunidade, onde esta elege um de seus membros, ou um pequeno grupo,
para representar seus desejos e coordenar seus interesses, a fim de se atingir um ideal maior,
um bem comum (SIMÃO, 2011, p. 32).
Entretanto, em virtude da aparente e ilusória posição de supremacia ocupada pelo
indivíduo ou pelo grupo, esta liderança passa a ser utilizada em benefício próprio,
desvirtuando os poderes a eles outorgados pela comunidade política. Interessante trazer à
colação os comentários tecidos por Naira Senna, ao analisar a questão do poder nas
comunidades políticas segundo a obra “A Política”, de Aristóteles:
Em “A Política”, tem-se a explicação de que existem formas ideais (monarquia,
aristocracia e democracia) nas quais, embora sejam governadas por um, alguns ou
muitos, o bem comum é realizado. As formas deturpadas (tirania, oligarquia e demagogia/oclocracia), por sua vez, não possui o desígnio de satisfazer o bem
comum, mas sim o interesse do tirano, de um pequeno grupo ou da massa (SENNA,
2010, p. 8).
Outra forma de se analisar o fenômeno da corrupção é por meio da relação Estado-
cidadão, partindo do pressuposto que o primeiro só existe enquanto entidade abstrata
construída pelos indivíduos de uma sociedade.
Nessa linha, tem-se que o Estado só se faz presente por meio dos indivíduos investidos
na condição de agente público, vale dizer, pessoas que dão forma concreta ao Estado, por
meio dos atos administrativos. Sendo assim, as raízes da corrupção estariam presentes, num
primeiro plano, nos indivíduos que compõe a sociedade, e, ao adentrarem na Administração
Pública, contaminam a máquina pública com seus vícios, apropriando-se indevidamente dos
bens públicos, fraudando a lei e deturpando o interesse público. Essa ideia já foi apresentada
pela doutrina, a saber:
14
Podemos afirmar, dessa forma, que primeiro os membros da sociedade se
corrompem, para, a partir daí, corromperem o Estado. A corrupção do Estado nada
mais é do que a corrupção de cada um dos indivíduos dele integrante. Isso quer dizer
que só teremos um Estado corrupto se nele existir uma sociedade igualmente
corrupta. Corrupto, portanto, não é nem poderia ser o Estado. Corrupta são as
pessoas. Um Estado corrupto apenas reflete a degradação dos valores morais dos
membros da sociedade que o integram (SIMÃO, 2011, p. 35).
O que num primeiro momento pode parecer uma visão pessimista a respeito da
sociedade e de seus membros pode, no entanto, ajudar a entender as vicissitudes causadas pela
corrupção, haja vista que a partir do momento em que ela brota dos indivíduos e se instala no
âmago do Estado, a prática de atos de corrupção torna-se ainda maior, aumentando os casos
de violação aos princípios regentes da Administração Pública e, por conseguinte, o nível de
improbidade também cresce.
Nesse ponto, para melhor compreensão da matéria, necessário esclarecer sobre a
similitude e as diferenças primordiais entre os fenômenos da corrupção e da improbidade.
Consoante exposto até aqui, a corrupção caracteriza-se por ser um fator social e político
responsável pela degeneração dos costumes, que se manifesta por meio de atos desonestos
promovidos pelas pessoas. Esse desvirtuamento ético pode influenciar tanto as relações
particulares dos membros de uma comunidade, como as relações sociais travadas na esfera
pública.
A improbidade administrativa, por sua vez, refere-se essencialmente ao
comportamento desonesto dos agentes públicos no exercício de suas atividades funcionais,
utilizando-se do cargo que ocupa para enriquecer-se ilicitamente, favorecer terceiros ou
causar dano ao erário. Veja que a improbidade, portanto, representa uma das diversas formas
de corrupção, qualificada pelo fato de que se desenvolve no seio da Administração Pública e
que importa em desrespeito aos princípios jurídicos regentes do Estado (SIMÃO, 2011). São,
portanto, conceitos similares, onde a improbidade representa uma forma específica de
corrupção, estando, pois, contida nesta última.
A separação entre corrupção e improbidade administrativa também pode ser observada
a partir de uma análise sobre a proteção jurídica conferida aos institutos.
A repressão à prática de atos de corrupção dá-se primordialmente por meio da
legislação penal, havendo o Código Penal Brasileiro tipificado como crime os atos de
corrupção ativa (artigo 333)2 e corrupção passiva (artigo 317)3, ambos inclusos em seu Título
XI – Dos Crimes contra a Administração Pública.
2 “Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir
ou retardar ato de ofício:
15
O crime de corrupção ativa consiste em oferecer ou prometer vantagem indevida a
funcionário público, a fim de determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício. O
sujeito ativo é o particular que realiza a proposta indevida, enquanto o Estado é o sujeito
passivo do crime. O ilícito penal é classificado como crime formal, ou seja, sua configuração
não depende da produção efetiva de resultado (GRECO, 2012).
Lado outro, a corrupção passiva emerge quando o funcionário público solicitar,
receber, ou aceitar promessa de vantagem indevida, para si ou para outrem, em razão da
função pública que exerce. O sujeito passivo é o Estado, e também o particular, caso este
último seja prejudicado pelo ato de corrupção. O elemento subjetivo desse tipo penal é o dolo,
uma vez que o sujeito ativo deve agir de modo voluntário e consciente, não havendo previsão
de modalidade culposa (SENNA, 2010).
Os atos de improbidade administrativa, por sua vez, possuem regramento normativo
específico, havendo previsão constitucional a respeito da matéria, conforme se verifica no
artigo 37, § 4º, da Carta Magna. O precitado dispositivo determina como consequência da
prática de condutas ímprobas a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a
indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei,
sem prejuízo da ação penal cabível4. Em sede infraconstitucional, a Lei nº 8.429/1992,
verdadeiro Código Geral de Conduta dos agentes públicos (OSÓRIO, 2012), criou um
microssistema para o sancionamento dos atos de improbidade administrativa, apartando a
matéria, de modo definitivo, dos demais atos de corrupção.
Ademais, partindo das lições do jurista Fábio Medina Osório (2012), pode-se afirmar
que os atos que resultam em grave ineficiência funcional da Administração Pública estão
sujeitos à pecha da improbidade administrativa, embora estes mesmos atos nem sempre serão
classificados como corruptos. Nesse sentido:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)
Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda
ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional”. 3 “Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou
antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)
§ 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou
deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.
§ 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa”. 4 Ao ressalvar a autonomia da esfera penal na parte final do § 4º do artigo 37, a Constituição reconheceu
expressamente a independência entre as instâncias jurídicas, caso o ato de improbidade administrativa cause
reflexos além da esfera administrativa.
16
A lei não pune tão somente os atos desonestos “stricto sensu”. No plano
infraconstitucional, desde o Decreto número 30, de 08 de janeiro de 1892 a
improbidade, na categoria de crime de responsabilidade, abarcava, além de uma
série de desonestidades, a inaptidão notória ou desídia habitual no exercício das
funções (Id., 2012, p. 6).
Outrossim, vale lembrar que a Lei de Improbidade Administrativa, do modo como foi
elaborada, incide sobre os atos que causam prejuízo ao erário praticados na modalidade
culposa, e não só a título de dolo, como nos casos de corrupção ativa e passiva.
Por fim, merece destaque a recente inovação legislativa advinda por meio da Lei nº
12.846, de 01 de agosto de 2013. Denominada como Lei Anticorrupção, a norma insere no
ordenamento jurídico novas sanções para os atos de corrupção praticados por pessoas
jurídicas contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira.
Além de permitir a responsabilização nas esferas cível e administrativa, a Lei nº
12.846/2013 não excluiu a responsabilidade pessoal dos dirigentes e administradores da
pessoa jurídica, ou de qualquer pessoa natural que colaborar para a prática do ilícito. Numa
análise preliminar, percebe-se que o novo diploma legal acaba por estreitar os limites entre
corrupção e improbidade administrativa, haja vista que a responsabilização das pessoas
jurídicas já era possível mediante aplicação da Lei nº 8.429/1992, nos termos dos tipos legais
ali presentes. Ao comentar sobre o tema, ressalta Fábio Medina Osório:
A lei 12.846/13, conhecida por lei anticorrupção, deve impactar o funcionamento, a
dinâmica e a cultura empresariais no Brasil. Fortalece a ética empresarial e a lógica
da probidade administrativa. No entanto, forçoso anotar que antes mesmo da
vigência desta Lei já seria possível enquadrar pessoas jurídicas em atos de corrupção ou de improbidade por força da Lei 8.429/92, legislação que remanesce aplicável à
matéria, como autêntico Código Geral de Conduta das pessoas físicas e jurídicas. E
a nova legislação pode trazer preocupações adicionais quanto à segurança jurídica e
à razoabilidade da atuação de autoridades fiscalizadoras (Id., 2013, p. 1).
Certamente a doutrina e a jurisprudência, a seu tempo e modo, definirão o sentido e o
alcance dos novos tipo trazidos pela Lei Anticorrupção, a fim de evitar sua aplicação indevida
e harmonizá-la com as demais normas de combate à corrupção no setor público,
especialmente em relação à Lei de Improbidade Administrativa.5
O que deve ficar assentado no presente momento é que os conceitos de corrupção e
improbidade administrativa apresentam diferenças relevantes, sendo a esta última categoria
5 É importante registrar que a Lei nº 12.846/2013 foi sancionada com um período de vacatio legis de 180 (cento
e oitenta) dias, conforme descrito em seu artigo 31. Desse modo, considerando que sua publicação data de 02 de
agosto de 2013, suas disposições entrarão em vigor somente em 29 de janeiro de 2014.
17
específica da primeira.6 A lei confere tratamento particular a cada um dos institutos, embora
em certos casos o mesmo fato possa ser tipificado como ato corrupto e ímprobo, podendo ser
sancionado, cumulativamente, na esfera cível, penal e administrativa. Logo, a improbidade
administrativa é espécie de corrupção praticada no seio da Administração Pública, devido a
um comportamento desonesto do agente público no exercício de suas funções administrativas.
Para se contrapor à corrupção, surge o princípio da moralidade administrativa,
intimamente ligado à probidade administrativa, objeto que será abordado no próximo tópico.
2.2 Probidade e moralidade administrativa
Antes de determinar o conceito de improbidade administrativa, é importante proceder
à análise de seu antônimo, qual seja, a probidade administrativa, bem como do princípio da
moralidade administrativa, diretriz estabelecida constitucionalmente como pilar fundamental à
Administração Pública. Ao estabelecer esses conceitos, aproximar-se-á, por via reversa, da
definição de improbidade administrativa.
Apesar de útil aos fins deste trabalho, separar os conceitos de probidade e moralidade
revela-se como tarefa de difícil solução, haja vista que estes institutos sempre se relacionam e
se misturam, pois ambos referem-se ao dever do agente público, e dos cidadãos em geral, em
agir com respeito à coisa pública, para preservação e alcance do interesse público, para muito
além da legalidade formal (DI PIETRO, 2009, p. 803). Desde já se adianta que o debate está
longe de terminar, pois a própria doutrina não é unânime sobre o tema, conforme se verá a
frente.
O primeiro deles, a probidade administrativa, é tratado pela doutrina como um dever
inerente a todo agente público, obrigando-o a agir honestamente no cumprimento de suas
funções (MELLO, 2011, p. 120). A definição deriva da própria etimologia e do significado
semântico da palavra probidade, a saber:
Do latim probitas, de probus (probo, honesto, honrado), entende-se a honestidade de
proceder ou a maneira criteriosa de cumprir todos os deveres, que são atribuídos ou
cometidos à pessoa. Assinala, portanto, o caráter ou a qualidade de probo. Revela a
integridade de caráter, o procedimento justo (SILVA, 2008, p. 589-590).
6 Essa orientação encontra posicionamentos contrários, a exemplo do já citado Fábio Medina Osório (2012, p.
28), que afirma: “[...] A improbidade é espécie do gênero „má gestão pública‟. A corrupção é espécie do gênero
„improbidade‟. A compreensão desses fenômenos a partir dessas relações é fundamental para perceber suas
características e peculiaridades”. Diante dos argumentos expostos nesse capítulo, adota-se o entendimento
reverso ao esposado pelo eminente jurista.
18
Wallace Paiva Martins Júnior (2001, p. 110-111) traz importante dado histórico sobre
a tramitação do Projeto de Lei nº 1.446/1991, posteriormente convertido na Lei nº
8.429/1992, no qual o Senador Pedro Simon apresentou substitutivo (aprovado no Senado,
mas rejeitado na revisão da Câmara dos Deputados) que estabelecia um conceito legal para a
probidade administrativa, nos seguintes termos:
Art. 5º. O dever de probidade dos agentes públicos compreende a obrigação de
exercício do mandato, cargo, emprego, função ou atividade com o exclusivo
propósito de realizar o interesse coletivo, preservando a dignidade das instituições e
a incolumidade do patrimônio público.
Logo, a probidade administrativa determina àqueles que servem à Administração
Pública o dever de observância ao conjunto de princípios e regras que dão suporte à atividade
administrativa, principalmente os descritos no artigo 37 da Constituição Federal (legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência). Em síntese, pode-se afirmar que
O dever de probidade impõe assim ao funcionário uma conduta de absoluta isenção,
de modo a que não seja suspeito de prevaricar, de deixar-se corromper ou de por
outro modo ser infiel à entidade servida aos interesses gerais que lhe cumpre realizar
e defender (CAETANO, 1997 apud MARTINS JUNIOR, 2001, p. 106).
O seu descumprimento reclama as sanções previstas no artigo 37, § 4º, da Constituição
Federal, ao preceituar que os atos de improbidade administrativa importarão em suspensão
dos direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade dos bens e o ressarcimento
ao erário.
Por dar origem a pesadas sanções, a probidade administrativa também estaria limitada
pelo princípio da legalidade, pois a definição de atos ímprobos precisa contar com elementos
específicos, definidos em lei, de modo a legitimar o direito sancionador a ser aplicado (DI
PIETRO, 2011, p. 804).
Importante não confundir os conceitos de probidade com legalidade: ainda que esta
última seja cumprida, poderá haver violação à probidade administrativa, pois ela ultrapassa a
mera ilegalidade justamente por ser qualificada pelo elemento subjetivo do agente voltado a
corromper os princípios administrativos ou lesar o patrimônio público (SIMÃO, 2011, p. 89-
90). Neste ponto, impende destacar trecho do Recurso Especial nº 480.387/SP, tendo como
relator o atual Ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux:
[...] 6. É cediço que a má-fé é premissa do ato ilegal e ímprobo. Consectariamente, a
ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os
19
princípios constitucionais da Administração Pública coadjuvados pela má-fé do
administrador. A improbidade administrativa, mais que um ato ilegal, deve traduzir,
necessariamente, a falta de boa-fé, a desonestidade, o que não restou comprovado
nos autos pelas informações disponíveis no acórdão recorrido, calcadas, inclusive,
nas conclusões da Comissão de Inquérito (Superior Tribunal de Justiça, Primeira
Turma, Relator Ministro Luiz Fux, julgado em 16 março 2004, publicado em 24
maio 2004).
Quanto à moralidade administrativa, Diego de Figueiredo Moreira Neto (2005, p. 96-
97) ensina que este instituto difere da moral comum, haja vista que, para além das
preocupações éticas em torno da matéria, a moral administrativa é orientada pelo binômio boa
e má administração7. É certo que a moralidade administrativa consubstancia verdadeiro
princípio, estando expressamente definida no caput do artigo 37 da Constituição Federal,
considerando a preocupação do constituinte originário em constituir um espaço estatal regido
pela ética pública, ou seja, formado por ações voltadas ao interesse público, sem interesses
escusos de seus agentes, ou que possuam mecanismos eficientes no combate à corrupção.
Desse modo, pode-se dizer que o princípio da moralidade compreende o dever de
lealdade às instituições democráticas por meio de ações orientadas pela boa-fé, que toda
sociedade deve observar no trato da coisa pública, mormente aqueles agentes que representam
a vontade popular (MARTINS JÚNIOR, 2001). Nesse panorama, afirma-se que:
Segundo os cânones da lealdade e boa-fé, a Administração haverá de proceder em
relação aos seus administrados com sinceridade e lhaneza, sendo-lhe interdito
qualquer comportamento astucioso, eivado de malícia, produzido de maneira à
confundir, dificultar ou minimizar o exercício de direitos por parte do cidadão
(MELLO, 2011, p.119-120).
Assim como a probidade administrativa, a violação ao princípio da moralidade está
sujeita às sanções por prática de ato de improbidade administrativa, considerando o disposto
no artigo 11 da Lei nº 8.492, de 02 de junho de 1992, bastando que o desrespeito da
moralidade, por ação ou omissão, viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade
e lealdade às instituições.
Importante ressaltar que a Constituição Federal ainda elenca outro meio de proteção à
moralidade administrativa, pois em seu artigo 5º, inciso LXXIII, dispôs sobre a possibilidade
de qualquer cidadão propor ação popular que vise anular ato lesivo ao patrimônio público ou à
moralidade, legitimando este instrumento processual que já se encontrava normatizado pela
Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965.
7 O referido autor ainda cita as lições do jurista francês Maurice Hauriou, responsável por elaborar, há mais de
70 (setenta) anos, o conceito inicial de moralidade administrativa, para quem esta seria, em síntese, o “conjunto
de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração”.
20
Em suma, a moralidade administrativa se evidencia pelo comportamento honesto, em
respeito à lei, e pelo regular cumprimento das funções atribuídas ao agente. Resume-se,
portanto, no respeito a todos os demais princípios constitucionais e as regras aplicáveis à
Administração Pública, sempre tendo em vista a realização do interesse público.
Ainda assim, a separação entre o princípio da moralidade e a probidade administrativa
não se torna clara, visto que esses conceitos estão intrinsecamente relacionados e buscam
resguardar de forma semelhante os valores institucionais da Administração Pública
(MARTINS JÚNIOR, 2001). Parcela da doutrina entende que a probidade seria um
subprincípio da moralidade administrativa (SENNA, 2010), sendo enquadrado como um
dever decorrente daquele princípio constitucional, vale dizer, uma das formas de manifestação
da moralidade aplicável à Administração Pública (LOPES, 1993 apud MARTINS JÚNIOR,
2001, p. 108). Nessa esteira, ensina Marcelo Figueiredo:
Entendemos que a probidade é espécie do gênero „moralidade administrativa‟ a que alude, v. g., o art. 37, caput e seu § 4º da CF. O núcleo da probidade está associado
(deflui) ao princípio maior da moralidade administrativa, verdadeiro norte à
administração em todas as suas manifestações. Se correta estiver a análise, podemos
associar, como o faz a moderna doutrina do direito administrativo, os atos
atentatórios à probidade como também atentatórios à moralidade administrativa.
Não estamos a afirmar que ambos os conceitos são idênticos. Ao contrário, a
probidade é peculiar e específico aspecto da moralidade administrativa
(FIGUEIREDO, 1995 apud FERNANDES, 1997, p. 2).
Em sentido harmônico, José Afonso da Silva compreende que o princípio da
moralidade alcança um âmbito maior do que a probidade administrativa, sendo esta uma
forma qualificada de violação à primeira (2004, p. 650).
Não obstante os argumentos acima, adota-se nesse trabalho a ideia de que a
improbidade administrativa abrange não só os atos violadores da moralidade administrativa,
mas também as demais condutas que desrespeitam outros princípios regentes da
Administração Pública, especialmente a impessoalidade e a eficiência. Isso porque a Lei de
Improbidade Administrativa, notadamente em seu artigo 11, estende sua tutela a todos os
princípios administrativos descrito no artigo 37 da Constituição Federal, e, de um modo geral,
também procura sancionar as condutas que importam em grave ineficiência funcional.
Outrossim, na visão de Calil Simão (2011, p. 190) a imoralidade simples pode ser
fruto de culpa, enquanto a improbidade demanda sempre a atuação dolosa do agente, vale
dizer, sua ação ou omissão dever ser consciente e voluntária, norteada pela má-fé e
direcionada à lesão da Administração Pública.
21
Em síntese, pode-se afirmar que toda violação à moralidade administrativa merece ser
tratada como ato ímprobo. A recíproca, no entanto, não é verdadeira, na medida em que nem
todo ato de improbidade administrativa representa ato contrário à moralidade administrativa
(FERNANDES, 1997).
Para sedimentar o que foi dito acima, traz-se à baila os seguintes posicionamentos
doutrinários:
[...] o ato imoral afronta a honestidade, a boa-fé, o respeito à igualdade. As normas
de conduta aceitas pelos administrados, o dever de lealdade, a dignidade humana e
outros postulados éticos e morais, enquanto o ato ímprobo significa a má qualidade
de uma administração pela prática de atos que implicam enriquecimento ilícito do
agente ou prejuízo ao erário ou ainda, violação dos princípios que orientam a
administração pública, sendo que todo ato contrário à moralidade administrativa é
ato configurador de improbidade. Porém nem todo ato de improbidade administrativa representa violação à moralidade administrativa (MARTINS
JÚNIOR, 2009 apud SENNA, 2010, p. 22).
Em que pese ser a observância ao princípio da moralidade um elemento de vital
importância para a aferição da probidade, não é ele o único. Todos os atos dos
agentes públicos devem observar a normatização existente, o que inclui toda a
ordem de princípios, e não apenas o princípio da moralidade. Assim, quando muito, será possível dizer que a probidade absorve a moralidade, mas jamais terá sua
amplitude delimitada por esta (GARCIA et al, 2002, p. 18).
Indo além da divergência conceitual acima exposta, preleciona Naira Senna (2010, p.
22) que a preocupação primordial deve ser a consolidação de uma Administração Pública
honesta, objetivo que consubstancia verdadeiro direito público subjetivo da sociedade. Para
tanto, os agentes públicos devem desenvolver suas atividades administrativas em sintonia com
os princípios constitucionais, e atentos aos deveres de honestidade, boa-fé, legalidade,
impessoalidade e transparência.
Assim, o que deve restar claro é que tanto o desrespeito à probidade quanto à
moralidade ensejarão a prática de um ato de improbidade administrativa, embora nem todas as
espécies deste último decorram do desrespeito da moralidade. Conforme nos ensina Celso
Bandeira de Mello (2011, p. 54) “violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma
norma”, pois implica em desrespeito a todo sistema jurídico, corrompendo sua estrutura e se
revelando como a forma mais grave de ilegalidade e inconstitucionalidade.
2.3 Má gestão pública e improbidade
Como anteriormente explicitado, vê-se que os atos de improbidade administrativa,
entendidos como derivações da violação à moralidade administrativa e da prática da
22
corrupção, emanam, precipuamente, da conduta de agentes públicos desonestos que se
utilizam de suas atribuições para lesar a Administração Pública, em benefício próprio ou de
terceiro.
Nessa linha, a doutrina vem percebendo íntimas ligações entre a ocorrência da
improbidade no seio da poder público e a má gestão pública, ou seja, a administração
inadequada dos recursos que integram a estrutura estatal, gerando um alto índice de
ineficiência funcional (OSÓRIO, 2010). O alcance da probidade, portanto, reclamaria a
observância de outro preceito: a eficiência administrativa.
Elencada como princípio regente da Administração Pública por força da Emenda
Constitucional nº 19, de 04 de junho de 1998, a eficiência administrativa pode ser conceituada
como o dever do administrador público em gerir o patrimônio coletivo de forma racional,
aplicando a lei para alcançar resultados verdadeiramente úteis e produtivos, atendendo da
melhor forma possível as necessidades da sociedade e de seus membros. Trata-se, na visão de
Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2009, p. 89), do dever do agente público em buscar o melhor
desempenho possível de suas atribuições, e também em organizar, estruturar e disciplinar a
Administração Pública com a finalidade de obter o máximo de resultados na prestação do
serviço público.
Ainda sobre seu conceito, Celso Antônio Bandeira de Mello (2011, p. 122-123) afirma
que tal princípio se trata basicamente do clássico princípio da “boa administração”, de há
muito desenvolvido pela doutrina italiana, consistente na ideia de desenvolver a atividade
administrativa da forma mais adequada aos fins a serem alcançados, com a ressalva de que a
busca pela eficiência deve estar compreendida no princípio da legalidade, não podendo
ultrapassar seus limites, e, nos casos em que haja discricionariedade do gestor público,
presume-se que a norma já impõe a necessidade de se buscar a melhor solução para o caso.
O descumprimento do dever de eficiência poderá resultar na prática de ato de
improbidade administrativa por violação a princípio constitucional, à luz do referido artigo 11
da Lei nº 8.429/1992. Ademais, considerando que a má gestão pública certamente resultará
em algum dano patrimonial em prejuízo ao erário, o caso também poderá reclamar a
incidência do artigo 10 do precitado diploma, que em seu caput dispõe que constitui ato de
improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou
culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação
dos bens ou haveres da Administração Pública direta e indireta.
Como este artigo é o principal foco do presente trabalho, sua análise detalhada se dará
em momento posterior, ressaltando no momento que a inobservância à eficiência
23
administrativa que está apta a configurar um ato de improbidade administrativa é aquela que
decorre da conduta do agente público direcionada à escolha da opção menos eficiente com a
deliberada intenção (dolo) de se enriquecer ilicitamente, causar prejuízo ao erário ou
simplesmente violar os princípios norteadores da Administração Pública (SIMÃO, 2011, p.
191).
Cumpre, todavia, afirmar que não será todo deslize praticado pelo administrador
público que poderá ser tipificado como ato de improbidade administrativa. A partir do
momento em que decide agir, o ser humano está sujeito ao erro, não sendo diferente para
aqueles que atuam como agentes do Estado. As questões inerentes à gestão pública muitas
vezes envolvem vários fatores, que podem dificultar a identificação pelo administrador sobre
qual é a melhor alternativa que atenderá ao interesse público, podendo até mesmo surgir mais
de uma possibilidade de ação. Sobre o erro na gestão pública, afirma Fábio Medina Osório:
Ainda que se admitam modalidades culposas de improbidade, imperioso reconhecer que os agentes públicos tem direito ao erro juridicamente tolerável. Não se pode
aniquilar com o direito ao erro, que fomenta, indiretamente, a boa gestão pública
pela assunção responsável de riscos, pela ousadia e pela complexidade que a
Administração Pública exige na tomada de decisões.
Para além do reconhecimento do direito ao erro, também é importante assinalar que
existe um catálogo hierárquico de transgressões, desde aquelas juridicamente
toleráveis até outras que simplesmente são absorvidas por outras categorias
jurídicas. Nem toda ilegalidade configura improbidade e as infrações devem ser
classificadas de acordo com critérios hierárquicos (OSÓRIO, 2012, p. 07).
Logo, segundo a linha exposta pelo autor, o erro torna-se parte da atividade do
administrador público, que mesmo adotando as cautelas necessárias ao cumprimento do
princípio da eficiência, poderá, vez ou outra, incidir em erro, ocasionando danos ao
patrimônio público. O importante, entretanto, é saber qual foi o nível de diligência empregado
pelo agente, ou seja, se agiu de boa fé e com a prudência necessária, e se o erro cometido é
juridicamente tolerado, tendo em vista os danos causados e a legislação aplicável à espécie.
Destarte, vê-se que o estudo da má gestão pública revela-se como de fundamental
importância para definição do conceito de improbidade, considerando que o agente público
desonesto e corrupto termina por utilizar toda estrutura administrativa para direcionar suas
ações desleais, ou até mesmo adotando um nível intolerável de negligência perante a coisa
pública, comprometendo a realização do interesse público.
Nessa linha, o que inicialmente pode apresentar-se como uma forma de maior proteção
ao erário, pode revelar-se como um instrumento de combate à corrupção que excede os limites
da razoabilidade, possibilitando que o agente inábil, que agiu por erro, mas sem intenção
24
fraudulenta, receba as pesadas sanções da Lei de Improbidade Administrativa da mesma
forma que o agente orientado pela má-fé, o corrupto, o que não destoa dos fins buscados pelo
§ 4º do artigo 37 da Constituição Federal.
2.4 Definição de improbidade administrativa
Diante das elucidações desenvolvidas a respeito do fenômeno da corrupção, do
conceito de probidade e moralidade administrativa e das relações entre má gestão pública e
improbidade, torna-se possível, à luz da melhor doutrina, aproximar-se de um conceito de
improbidade administrativa.
Malgrado a Lei nº 8.429/1992 apresente conceitos abertos e contornos imprecisos
(OSÓRIO, 2012), e a doutrina também revele divergências sobre o alcance de sua definição, é
pacífico o posicionamento de que a improbidade deriva daqueles atos marcados pela
desonestidade, imbuídos pela má-fé e direcionados a prática da corrupção, e, no campo do
direito administrativo, verifica-se a partir dos atos que desrespeitem a ética pública, praticados
com a intenção clara e consciente em enriquecer-se ilicitamente, violar o erário ou os
princípios da Administração Pública.
Segundo Mauro Roberto Gomes de Mattos (2010, p. 577), “[...] improbidade tem
características de desonestidade, daquele que rompe a moralidade e age indignamente, por
não ter decência”.
Buscando uma definição etimológica para o termo, improbidade origina-se do latim
improbitas, designativo de má qualidade, imoralidade, malícia, desonestidade (SILVA, 2008,
p. 408), transformando a improbidade em uma característica do sujeito, um atributo negativo
daquele que desrespeita a ética pública e viola os princípios norteadores da Administração,
devido à sua falta de idoneidade (SIMÃO, 2011, p. 40).
Em síntese ao que se expôs, colhe-se da doutrina os seguintes entendimentos quanto à
definição de improbidade administrativa:
Improbidade administrativa, em linhas gerais, significa servir-se da função pública
para angariar ou distribuir, em proveito pessoal ou para outrem, vantagem ilegal ou
imoral, de qualquer natureza, e por qualquer modo, com violação aos princípios e
regras presidentes das atividades na Administração Pública, menosprezando os
deveres do cargo e a relevância dos bens, direitos, interesses e valores confiados à
sua guarda, inclusive por omissão, com ou sem prejuízo patrimonial (MARTINS
JÚNIOR, 2001, p. 113).
25
Numa primeira aproximação, improbidade administrativa, que sob diversas formas
promove o desvirtuamento da Administração Pública e afronta os princípios
nucleares da ordem jurídica (Estado de Direito Democrático e Republicano),
revelando-se pela obtenção de vantagens patrimoniais indevidas às expensas do
erário, pelo exercício nocivo das funções e empregos públicos, pelo „tráfico de
influência‟ nas esferas da Administração Pública e pelo favorecimento de poucos em
detrimento dos interessados da sociedade, mediante a concessão de obséquios e
privilégios ilícitos (PAZZAGLINI FILHO et al, 1998 apud MATTOS, 2010, p. 31)
Ademais, pode-se afirmar, que a definição de ato ímprobo não se confunde com o
conceito de ato ilícito ou danoso, posto que aquele possui um alcance muito mais abrangente,
enquanto estes últimos, embora possam estar em desacordo com a lei ou resultarem em
prejuízo à Administração Pública, são executados sem a marca da desonestidade ou apenas
derivam de erros toleráveis na prática de atos administrativos (SIMÃO, 2011).
Logo, entende-se que a improbidade administrativa é a qualidade de que se reveste
uma ação, comissiva ou omissiva, praticada por agente público imoral e corrupto, de forma
voluntária e consciente, ou por negligência intolerável, com o objetivo de lesionar os
princípios administrativos, causar danos ao patrimônio público ou obter enriquecimento
indevido, constituindo-se como uma forma qualificada de violação à legalidade, à moralidade
e à eficiência administrativa.
Diante disso, cabe averiguar qual o tratamento legal dispensado à improbidade
administrativa no decorrer da história, à luz do conceito ora estabelecido, com enfoque
especial sobre a Lei nº 8.429/1992 e sobre o artigo 37, § 4º, da Constituição Federal.
26
3 EVOLUÇÃO NORMATIVA DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Passo fundamental para o desenvolvimento da pesquisa é a realização de uma análise
histórica sobre as normas relacionadas à improbidade administrativa, contextualizando-as ao
período temporal em que foram editadas.
O desenvolvimento deste capítulo dependerá, inicialmente, de uma análise
constitucional sobre o assunto, averiguando de que forma a improbidade administrativa foi
abordada no texto constitucional, desde a Constituição do Império (1824) – que previa, em
seu artigo 133, incisos I, III e IV, a possibilidade de responsabilização dos Ministros de
Estado – até a atual Constituição de 1988, ao dispor, em seu artigo 37, § 4º, que os atos de
improbidade administrativa importarão na suspensão dos direitos políticos, a perda da função
pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação
previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. Quanto ao tratamento
infraconstitucional, será analisada a Lei nº 3.164, de 1º junho de 1957 (Lei Pitombo-Godoy
Ilha), a Lei nº 3.502, de 21 de dezembro de 1958 (Lei Bilac Pinto), e, por fim, a atual Lei nº
8.429, de 02 de junho de 1992, diploma que tipifica os atos de improbidade administrativa,
estabelece as sanções aplicáveis à espécie e dispõe sobre normas processuais aplicáveis à
espécie.
Busca-se, com a conclusão desta parte do trabalho, entender de que forma a
improbidade administrativa era e ainda é combatida, colaborando para a pesquisa sobre a
questão da constitucionalidade dos atos de improbidade praticados na modalidade culposa.
3.1 As Constituições de 1824 a 1969
O primeiro diploma constitucional brasileiro surge nos idos de 1824, ainda na época
do Brasil Império. Passados dois anos da Proclamação da Independência, era necessário
estabelecer uma nova ordem jurídica para o Estado que acabara de nascer. Fábio Medina
Osório (2012, p. 04), ressalta a existência de uma estreita ligação entre os crimes de
responsabilidade e o dever de probidade imposto, principalmente, aos membros do Poder
Executivo. Por oportuno, destacam-se as disposições do artigo 133 daquela Carta, in verbis:
Art. 133. Os Ministros de Estado serão responsáveis:
I. Por traição.
II. Por peita, suborno, ou concussão.
III. Por abuso do Poder.
IV. Pela falta de observancia da Lei.
27
V. Pelo que obrarem contra a Liberdade, segurança, ou propriedade dos Cidadãos.
VI. Por qualquer dissipação dos bens publicos.
Interessante notar, ademais, que a figura do Imperador era inviolável e sagrada, o que
se explica facilmente em razão do modelo político adotado à época, não estando sua pessoa
sujeita a responsabilidade alguma, nos termos artigo 99 da Constituição de 1824.
Vale ressaltar que esta Carta Política trouxe interessante instrumento de combate à
corrupção em seu artigo 1578, qual seja, a clássica ação popular, hoje estampada no artigo 5º,
inciso LXXIII, da Constituição de 1988 e disciplinada pela Lei nº 4.717, de 29 de junho de
1965. Segundo Calil Simão (2011, p. 45), esta ação deriva da chamada actio popularis,
instituto criado pelos romanos com a finalidade de controlar os atos do pretor. Ao assumir o
cargo, o pretor emitia uma declaração explicitando de que maneira conduziria sua
administração nos termos da lei e da justiça, e, caso descumprisse tais premissas, estaria
sujeito a actio popularis, por meio da qual lhe seria aplicada uma multa.
O segundo diploma constitucional surge em 1891, logo após Proclamação da
República em 1889, estabelecendo, em seu artigo 54, que constituíam crimes de
responsabilidade do Presidente os atos que atentassem contra a probidade administrativa. Este
dispositivo foi repetido pelas demais Constituições (1934 – artigo 57, alínea “f”; 1937 – artigo
85, alínea “d”; 1946 – artigo 89, V; 1967 – artigo 84, V; e 1988 – artigo 85, V), consolidando,
pois, a responsabilidade do Presidente da República em virtude da violação do dever de
probidade (SIMÃO, 2011, p. 45-46).
A Constituição de 1934 trouxe importante inovação, pois conferiu legitimidade a todos
os cidadãos para pleitear a nulidade de atos lesivos ao patrimônio público da União, dos
Estados ou dos Municípios (artigo 113, 38).
Por sua vez, a Carta Política de 1946 inova ao estabelecer em seu arcabouço
normativo as sanções decorrentes da prática de ato de improbidade administrativa por
enriquecimento ilícito, permitindo o sequestro e perda dos bens acrescidos indevidamente.
Assim, preceituava o artigo 141, § 31, in verbis:
Art. 141 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança
individual e à propriedade, nos termos seguintes: [...]
§ 31 - Não haverá pena de morte, de banimento, de confisco nem de caráter
perpétuo. São ressalvadas, quanto à pena de morte, as disposições da legislação
8 “Art. 157. Por suborno, peita, peculato, e concussão haverá contra elles acção popular, que poderá ser intentada
dentro de anno, e dia pelo proprio queixoso, ou por qualquer do Povo, guardada a ordem do Processo
estabelecida na Lei”.
28
militar em tempo de guerra com país estrangeiro. A lei disporá sobre o seqüestro e
o perdimento de bens, no caso de enriquecimento ilícito, por influência ou com
abuso de cargo ou função pública, ou de emprego em entidade autárquica (grifo
nosso).
Adianta-se que tal dispositivo seria repetido na atual Lei de Improbidade
Administrativa (Lei nº 8.249/1992), constituindo importante medida cautelar para assegurar a
reparação dos danos causados ao erário.
Por sua vez, a Constituição de 1967 em nada inovou, apenas ocupando-se de repetir o
dispositivo retro transcrito, em seu artigo 150, § 11.
Ponto interessante é a previsão trazida pelo Ato Institucional nº 5, editado em 13 de
dezembro de 1968, marco do início de uma rigorosa fase do período ditatorial brasileiro.
Refletindo as grandes arbitrariedades daquele regime, o artigo 8º do ato político concedia ao
Presidente da República o poder de decretar o confisco de bens daqueles que, no exercício de
cargo ou função pública, se enriquecessem ilicitamente9. A medida configurava sanção
administrativa, independente e complementar às sanções penas cabíveis (SIMÃO, 2011, p.
46). Com o advento do Ato Institucional nº 14, de 05 de setembro de 1969, reeditou-se o § 11
do artigo 150 da Carta de 1967, estabelecendo uma vedação genérica ao confisco, deixando
que a legislação infraconstitucional previsse as hipóteses excepcionais.
Por fim, destaca-se que a Constituição de 1969, surgida a partir da Emenda
Constitucional nº 01, de 17 de outubro de 1969, promoveu inúmeras alterações no texto
constitucional anterior, inovando no trato da matéria de improbidade ao ser a primeira a
prever, em seu artigo 154, a sanção de suspensão dos diretos políticos, podendo ser aplicada a
todos os detentores de mandato eletivo, independente de autorização da Câmara a que
pertencesse (SIMÃO, 2011, p. 48). Nos termos do dispositivo:
Art. 154. O abuso de direito individual ou político, com o propósito de subversão do
regime democrático ou de corrupção, importará a suspensão daqueles direitos de
dois a dez anos, a qual será declarada pelo Supremo Tribunal Federal, mediante
representação do Procurador Geral da República, sem prejuízo da ação cível ou
penal que couber, assegurada ao paciente ampla defesa.
Parágrafo único. Quando se tratar de titular de mandato eletivo, o processo não
dependerá de licença da Câmara a que pertencer.
Segundo Calil Simão (2011, p. 51), da análise dos diplomas constitucionais anteriores
a Carta de 1988 é possível observar uma preocupação com o enriquecimento ilícito, sendo
9 “Art. 8º - O Presidente da República poderá, após investigação, decretar o confisco de bens de todos quantos
tenham enriquecido, ilicitamente, no exercício de cargo ou função pública, inclusive de autarquias, empresas
públicas e sociedades de economia mista, sem prejuízo das sanções penais cabíveis”.
29
esta, entre as falhas cometidas pelos agentes público no exercício de suas funções, a mais
repudiada pela sociedade, o que explicaria a presença constante do termo.
3.2 A Lei nº 3.164, de 01 de junho de 1957 – Lei Pitombo-Godói Ilha
Onze anos após a edição da Constituição de 1946, surge a Lei nº 3.164, de 01 de junho
de 1957, conhecida como Lei Pitombo-Godói Ilha, com o objetivo de regulamentar o
procedimento da perda dos bens acrescidos ilicitamente ao patrimônio do agente público,
conforme previsto no artigo 141, § 31, da respectiva Carta Política.
Segundo esta lei, os bens perdidos seriam revertidos em favor da Fazenda Pública,
sem prejuízo das sanções penais cabíveis. Nos termos de seu artigo 1º, as medidas podiam ser
acionadas pelo Ministério Público ou por qualquer pessoa do povo (parágrafo 2º) e correriam
pelo juízo cível (parágrafo 1º).
Também havia previsão de que a extinção da respectiva ação penal ou absolvição do
réu pela prática de crimes funcionais, não excluiria a incorporação à Fazenda Pública dos bens
acrescidos ilicitamente, ressalvado o direito de terceiros de boa-fé (artigo 2º).
Por fim, importante ressaltar que a Lei Pitombo-Godói Ilha previu em seu artigo 3º a
obrigatoriedade de registro público dos valores e bens pertencentes ao patrimônio privado de
todos que exercessem cargos ou funções públicas da União e entidades autárquicas, eletivas
ou não10.
3.3 A Lei nº 3.502, de 21 de dezembro de 1958 – Lei Bilac Pinto
No ano seguinte a Lei Pitombo-Godói Ilha, aparece em nosso ordenamento jurídico a
Lei nº 3.502, de 21 de dezembro de 1958, denominada Lei Bilac Pinto, contendo previsão
para o sequestro de bens nos casos de enriquecimento ilícito, por influência ou abuso de cargo
10 “Art. 3º - É instituído o registro público obrigatório dos valores e bens pertencentes ao patrimônio privado de
quantos exerçam cargos ou funções públicas da União e entidades autárquicas, eletivas ou não.
§ 1º - O registro far-se-á no Serviço do Pessoal competente, mediante declaração do servidor público, incidindo na pena de demissão do serviço público o que fizer falsa declaração.
§ 2º - O registro compreenderá, móveis, imóveis, semoventes, dinheiro, títulos e ações e qualquer outra espécie
de bens e valores patrimoniais, excluídos os objetos e utensílios de uso doméstico cuja soma não exceda de Cz$
100.000,00 (cem mil cruzeiros).
§ 3º - A declaração será atualizada bienalmente, podendo a autoridade a que estiver subordinado o servidor
exigir a comprovação da legitimidade da procedência dos bens acrescidos ao patrimônio do servidor.
§ 4º - O registro prévio é condição indispensável à posse do servidor público e deverá ser obrigatòriamente
atualizado antes do seu afastamento do cargo ou função.
§ 5º - A declaração de que trata êste artigo compreende os bens do casal”.
30
ou função, sem, no entanto, revogar a lei que a precedeu (DI PIETRO, 2009, p. 806). Fábio
Medina Osório (2012, p. 7), ressaltando os aspectos inovadores da norma, afirma a Lei Bilac
Pinto é seguramente o embrião mais direto da Lei nº 8.429/1992.
Segundo Calil Simão (2011, p. 53), esta lei preocupou-se em tratar a matéria com
maior clareza, haja vista a dificuldade até então presente de se estabelecer o núcleo do tipo
legal, necessário a efetivação da medida de sequestro de bens, definindo, ademais, o conceito
de servidor público para aplicação da lei (artigo 1º, §1º)11.
Importante inovação foi a definição de enriquecimento ilícito, para fins de sequestro
de bens, mediante rol de condutas expressas no artigo 2º e 3º, quais sejam: a) a incorporação
ao patrimônio privado, sem as formalidades previstas em leis, regulamentos, estatutos ou em
normas gerais e sem a indenização correspondente, de bens ou valores do patrimônio de
qualquer das entidades mencionadas no art. 1º e seus parágrafos; b) a doação de valores ou
bens do patrimônio das entidades mencionadas no art. 1º e seus parágrafos a indivíduos ou
instituições privadas, ainda que de fins assistenciais ou educativos, desde que feita sem
publicidade e sem autorização prévia do órgão que tenha competência expressa para deliberar
a esse respeito; c) o recebimento de dinheiro, de bem móvel ou imóvel, ou de qualquer outra
vantagem econômica, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente; d) a
percepção de vantagem econômica por meio de alienação de bem móvel ou imóvel, por valor
sensivelmente superior ao corrente no mercado ou ao seu valor real; e) a obtenção de
vantagem econômica por meio da aquisição de bem móvel ou imóvel por preço sensivelmente
inferior ao corrente no mercado ou ao seu valor real; f) a utilização em obras ou serviços de
natureza privada de veículos, máquinas e materiais de qualquer natureza de propriedade da
União, Estado, Município, entidade autárquica, sociedade de economia mista, fundação de
direito público, empresa incorporada ao patrimônio da União ou entidade que receba e aplique
contribuições parafiscais e, bem assim, a dos serviços de servidores públicos, ou de
empregados e operários de qualquer dessas entidades; e g) o enriquecimento ilícito, por
qualquer dos fatos mencionados nas letras c e e, quando praticado por quem, em razão de
influência política funcional ou pessoal, intervenha junto às pessoas indicadas no art. 1º e seus
parágrafos, para delas obter a, prática de algum dos atos funcionais citados em favor de
terceiro.
11“[...] § 1º A expressão „servidor público‟ compreende todas as pessoas que exercem na União, nos Estados, nos
Territórios, no Distrito Federal e nos municípios, quaisquer cargos, funções ou empregos, civis ou militares, quer
sejam eletivos quer de nomeação ou contrato, nos órgãos dos Poderes Executivo, Legislativo ou Judiciário”.
31
Vê-se, pois, que esta legislação não deixou de ser um marco no combate à
improbidade, considerando o rigor como tratava o tema se comparada às normas que a
precederam, além de proporcionar maior segurança jurídica ao definir precisamente os atos
sujeitos a aplicação da lei.
3.4 A Constituição de 1988 - Artigo 37, parágrafo 4º
Na esteira das demais Constituições, a Carta Magna de 1988 trouxe previsão em seu
texto quanto à improbidade administrativa, conquanto trazendo uma pequena inovação, pois
inclui o tema no capítulo concernente a Administração Pública, a saber, no § 4º do artigo 37,
determinando que os atos de improbidade administrativa importarão na suspensão dos direitos
políticos, na perda da função pública, na indisponibilidade dos bens e no ressarcimento ao
erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
Ao comentar sobre a importância do tema na Constituição de 1988, destaca, com
propriedade, Fábio Medina Osório:
Novidade histórica constitui, portanto, como é sabido, o tratamento da improbidade
no art.37, parágrafo 4, da CF, a qual prevê que os atos de improbidade poderão
configurar-se independentemente das responsabilidades civis, penais e
administrativas. A Lei 8.429/92 regulamentou esse dispositivo, 04 anos depois, sob
o influxo de importantes contribuições de lideranças do Ministério Público brasileiro
e tendo por parâmetro Lei 3.502, de 21.12.1958, cuja estrutura se reproduz aqui. Por
certo que uma previsão inovadora como esta causaria enormes perplexidades, mas
não deixa de ser curioso o fato de que, mesmo passados 20 (vinte) anos de vigência,
permaneçam obscuros aspectos essenciais à sua compreensão, especialmente no Supremo Tribunal Federal (OSÓRIO, 2012, p. 4-5).
Ademais, observa-se, pois, que o constituinte ainda inseriu a medida de
indisponibilidade de bens como meio para assegurar o efetivo ressarcimento do erário,
juntamente com as demais sanções aplicáveis.
A par disso, constata-se que a improbidade não impede a aplicação das demais sanções
de natureza civil, penal ou administrativa, bem como fica evidente a necessidade de norma
infraconstitucional para regulamentar a forma de aplicação desses comandos.
Destarte, a fim de concretizar o comando constitucional contido no § 4º do artigo 37,
surgiu no ordenamento jurídico a Lei nº 8.429/1992.
32
3.5 A Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992 – Lei de Improbidade Administrativa.
Quatro anos após a promulgação, o ordenamento recebeu a Lei nº 8.429, de 02 de
junho de 1992 – Lei de Improbidade Administrativa, de modo a regulamentar as sanções
previstas na Constituição para os atos cometidos por agentes públicos.
Entre suas disposições, o novo diploma seguiu a técnica legislativa adotada pela Lei nº
3.502/1958, trazendo exemplos de condutas que poderiam ser consideradas como ímprobas
para fins de aplicação da lei, apresentando as seguintes modalidades: a) atos que importam
enriquecimento ilícito, descritos no artigo 9º; b) atos que causam prejuízo ao erário,
constantes no artigo 10; e c) atos que atentam contra os princípios da administração pública,
apresentados pelo artigo 11.
A indisponibilidade de bens afigura-se como medida cautelar que poderá ser
requisitada pelo autor da ação a qualquer momento, havendo previsão expressa no artigo 7º.
Também foi inserida no artigo 16 a medida cautelar de sequestro dos bens ilicitamente
acrescidos ao patrimônio do agente ímprobo, bem como a possibilidade de afastamento do
agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, para
resguardar à instrução processual (artigo 20).
Ressalta-se que a nova Lei de Improbidade também inovou ao regulamentar o
procedimento administrativo e judicial para apuração da prática de ato ímprobo, em seus
artigos 14 a 18, trazendo importantes disposições processuais aplicáveis à espécie, como a
existência de um procedimento preliminar, anterior ao recebimento da petição inicial, onde os
demandados na ação de improbidade administrativa poderão oferecer razões que comprovem
a inexistência do ato de improbidade administrativa, a improcedência da ação ou a
inadequação da via eleita (SIMÃO, 2011, p. 500).
Sobre o atual diploma legislativo, que em 2012 completou 20 anos de vigência, mister
trazer à baila os comentários de Mauro Roberto Gomes de Mattos sobre o marco histórico da
Lei nº 8.249/1992:
Sempre foi uma cultura nefasta em nosso país, como nos países da América do Sul,
ver os homens públicos rompendo a coletividade pelos seus maus tratos à coisa
pública. Ora, a corrupção atrasou muitos povos do nosso continente, que obtiveram
dos políticos o retrocesso e a conduta desleal, em vez de zelarem pela boa e pura
intenção dos seus atos. Portanto, a Lei de Improbidade veio ao cenário jurídico com
a finalidade de combater atos que afetem a moralidade e maltratem a coisa pública,
regulamentando o disposto no artigo 39, § 4º da Constituição Federal (MATTOS,
2012, p. 1-2).
33
Todavia, a Lei de Improbidade também trouxe consigo inúmeros questionamentos, em
razão do caráter aberto de suas normas, causando dúvidas sobre o conceito de ato ímprobo
para fins de aplicação das sanções previstas. As normas de caráter aberto, ou normas
sancionadoras em branco, são tipos legais que necessitam de complementação por outras
normas ou conceitos jurídicos, para que se obtenha o seu significado semântico12. Esse
aspecto suscita diversas preocupações na doutrina, haja vista que tal característica confere
certa dose de discricionariedade aqueles que manejam a Lei de Improbidade Administrativa, o
que pode gerar interpretações errôneas dos tipos sancionadores, causando insegurança jurídica
e o ajuizamento indiscriminado de ações de improbidade administrativa (OSÓRIO, 2012, p.
10).
Sobre o tema, mais uma vez merecem destaque as lições de Mauro Roberto Gomes de
Mattos, para quem
a definição de improbidade administrativa não pode ser um „cheque em branco‟ ou ato de prepotência do membro do Ministério Público, pois a segurança jurídica que
permeia um Estado Democrático de Direito como o nosso não permite essa
indefinição jurídica (MATTOS, 2010, p. 28).
Além da discussão alhures exposta, ressalta-se o debate acerca da modalidade culposa
dos atos de improbidade administrativa, constante em seu artigo 5º e 10, assunto que será
explorado detidamente nos próximos capítulos.
12 Cite-se, a título de exemplo, o inciso VIII do artigo 10 da Lei nº 8.429/1992, que tipifica como ato de
improbidade administrativa que causa lesão ao erário o ato de frustrar a licitude de processo licitatório ou
dispensá-lo indevidamente. Para que se compreenda o sentido da norma, é imprescindível conhecer os princípios
e regras aplicáveis às licitações públicas, notadamente a Lei nº 8.666/1993.
34
4 ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
4.1 Aspectos gerais
A Lei Federal nº 8.429/1992 – Lei de Improbidade Administrativa traz em seu bojo
três espécies de atos ímprobos, classificados de acordo com o seu resultado, havendo: a)
aqueles que importam em enriquecimento ilícito (artigo 9º); b) aqueles que causam prejuízo
ao erário (artigo 10); e c) aqueles atentam contra os princípios da Administração Pública
(artigo 11).
Antes, porém, de se expor as principais características de cada uma das modalidades
acima, é importante trazer a lume os caracteres essenciais à formação do ato ímprobo, para
que se compreenda o processo de concretização da improbidade no mundo fático e a
qualificação jurídica atribuída pela norma a cada hipótese, distinguindo tais condutas entre si
e perante demais espécies de ato ilícito existentes no ordenamento jurídico.
Para tanto, percorrer-se-á tal trajeto a partir dos principais elementos: a) bem jurídico
protegido pela norma; b) sujeito ativo; c) sujeito passivo; d) conduta e nexo de causalidade; e
e) elemento subjetivo.
4.1.1 Bem jurídico protegido
O primeiro deles está em saber qual é o bem jurídico tutelado pelo § 4º do artigo 37 da
Constituição Federal, e, em sede infraconstitucional, pela Lei nº 8.429/1992. Interessante aqui
ressaltar o posicionamento adotado por Calil Simão (2011, p. 75), ao dizer que o principal
objeto de proteção da norma constitucional em epígrafe seria a probidade administrativa,
figurando, em segundo plano, o patrimônio material da Administração Pública. Haveria,
portanto, duplicidade de bens jurídicos tutelados. Todavia, possíveis violações ao erário
público só adquiririam o status da improbidade administrativa quando decorrente do
descumprimento do dever de probidade (conceito exposto no primeiro capítulo desse
trabalho).
4.1.2 Sujeito ativo
No que tange ao sujeito ativo, pratica ato de improbidade qualquer agente público que
atue no sentido de violar o dever de probidade administrativa e/ou lesar o erário, podendo
35
conceituá-lo, nos dizeres de Calil Simão (2011, p. 79), como “[...] todas as pessoas físicas que
mantêm ligação com o Estado, manifestando, com fundamento nesse vínculo jurídico, a sua
vontade”.
Lado outro, nos termos do artigo 2º da Lei nº 8.429/1992, entende-se como agente
público todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição,
nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo,
mandato, cargo, emprego ou função nas entidades da qual decorra o vínculo estatal. A partir
disso, pode-se notar a abrangência do conceito de agente público trazido pela Lei de
Improbidade Administrativa, que transborda a mera condição de servidor público para
alcançar todo aquele que mantém vínculo com o Estado13, certamente no intuito de conceder
elasticidade à incidência da norma e tonificar o combate à impunidade (COPOLA, 2011).
Quanto à participação de terceiros, ainda que o artigo 3º da Lei nº 8.429/1992 abarque
sua atuação, mediante induzimento ou concorrência para prática do ato ímprobo, ou, ainda, na
condição de beneficiário dos efeitos destes, somente será possível a aplicação das disposições
do citado diploma se este terceiro atuar em conjunto com o agente público, nunca
isoladamente, vale dizer, o seu papel será, sempre, o de partícipe ou coautor. Nesse sentido:
É importante frisar, uma vez mais, que somente será possível falar em punição de terceiros em tendo sido o ato de improbidade praticado por um agente público,
requisito este indispensável à incidência da Lei n. 8.429/92. Não sendo divisada a
participação do agente público, estará o extraneus sujeito a sanções outras que não
aquelas previstas nesse diploma legal (GARCIA et al, 2006 apud SIMÃO, 2011, p.
80-81).
Em síntese, a noção de sujeito ativo na Lei de Improbidade Administrativa pode ser
assim apresentada:
Acompanhando a evolução jurídica a respeito do tema, a Lei Federal n. 8.429/92
dedicou científica atenção na atribuição da sujeição do dever de probidade
administrativa ao agente público, que se reflete internamente na relação estabelecida
entre ele e a Administração Pública, superando a noção de servidor público, com
uma visão mais dilatada do que o conceito de funcionário público contido no Código
Penal (art. 327). Desse modo, são sujeitos ou titulares do dever de probidade administrativa o agente público, qualquer que seja a fórmula de seu vínculo com a
13 Nesse sentido, cite-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “ADMINISTRATIVO – AÇÃO
CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – RECEBIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL –
BANCO DO BRASIL – SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA – LEI 8.429/92. 1. Os sujeitos ativos dos atos
de improbidade administrativa não são apenas os servidores públicos, mas todos aqueles que estejam abarcados
no conceito de agente público, previsto nos arts. 1º, 2º e 3º da Lei 8.429/1992. Precedentes do STJ. 2. Recurso
especial provido. (Recurso Especial nº 1.138.523/DF, Segunda Turma, Relatora Ministra Eliana Calmon.
Julgado em 23 fev 2010. Publicado em 04 mar 2010)”.
36
Administração Pública, além de terceiros estranhos (particulares), como o
beneficiário ou partícipe (MARTINS JÚNIOR, 2001, p. 240).
Nessa lógica, pode-se afirmar que a presença do agente público é requisito
imprescindível para formação do ato ímprobo, posto que somente por meio de sua atuação
será possível realizar o núcleo dos tipos legais trazidos pela Lei nº 8.429/1992 (SIMÃO,
2011).
4.1.3 Sujeito passivo
A Administração Pública será o sujeito passivo no intricado mosaico da improbidade
administrativa, haja vista que, no mais das vezes, o erário é o alvo central das condutas
ímprobas, movimentadas por aqueles que desejam se enriquecer às custas do patrimônio
público ou promover a dilapidação e o malbaratamento dos bens pertencentes às entidades
integrantes do Poder Público.
Ademais, o ato de improbidade administrativa termina, inevitavelmente, por violar os
princípios constitucionais administrativos insculpidos no caput do artigo 37 da Carta Magna,
consumando o dano à moralidade estatal, o que por si só já é razão suficiente para aplicação
da Lei de Improbidade Administrativa.
Nesse sentido, por meio do artigo 1º da Lei nº 8.429/1992 pode-se observar as
entidades que estão sujeitas à proteção da norma, punindo-se todos os atos cometidos contra a
administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados,
do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio
público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário tenha concorrido ou concorra com
mais de 50% (cinquenta por cento) do patrimônio ou da receita anual.
Ainda, o mesmo dispositivo abarca em seu parágrafo único demais entidades que,
embora não integrem a estrutura da Administração Pública, recebam subvenção, benefício ou
incentivos fiscais ou creditícios de órgão público, bem como aquelas para cuja criação ou
custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de 50% (cinquenta por cento) do
patrimônio ou da receita anual. Todavia, a proteção estendida ao patrimônio dessas entidades
estará limitada a parcela de recursos públicos transferidos, vale dizer, havendo sanção
patrimonial decorrente da aplicação da Lei de Improbidade Administrativa, esta poderá recair
somente sobre o montante da contribuição oriunda dos cofres públicos. Sobre a limitação em
comento, ressalta a doutrina:
37
[...] Quando o caput e o par.ún. do artigo 1º estabelecem que configura ato de
improbidade administrativa o ato de improbidade voltado a entidade cuja criação ou
custeio o erário haja concorrido ou concorra com o patrimônio ou com a receita
anual, devemos entender que a aplicação da LIA [Lei de Improbidade
Administrativa], nesses casos, busca tutelar a destinação do recurso público
transferido pelo Estado à iniciativa privada, alvo de um ato de improbidade. É,
portanto, a transferência patrimonial de caráter público, impregnada de um
interesse público específico, que faz nascer o vínculo que a submete à LIA (SIMÃO, 2011, p. 75, grifo nosso).
Portanto, é possível notar que o intuito do legislador foi o de conferir a máxima
proteção o patrimônio público integrante das entidades e órgãos em que haja parcela do
erário, a fim de salvaguardá-lo das condutas ímprobas combatidas pela Lei de Improbidade
Administrativa e, por via reflexa, assegurar a boa gestão dos recursos públicos.
4.1.4 Conduta e nexo de causalidade
A própria Lei nº 8.429/1992 deixa claro que dos atos de improbidade administrativa
pode nascer de uma conduta comissa ou omissa, a exemplo do disposto no artigo 5º14. Uma
ação comissiva significa uma conduta ativa, um fazer. Por outro lado, a omissão ocorre
quando o agente deixa de praticar algum ato, permanecendo inerte ou indiferente à situação a
ele apresentada.
Os atos de improbidade administrativa manifestam-se por meio de ações consistentes
em receber vantagens patrimoniais indevidas, utilizar bens públicos em proveito próprio ou de
terceiros, frustrar a licitude de procedimento licitatório, deixar de prestar contas quando
exigido, negligenciar a arrecadação de tributos, e demais condutas citadas nos tipos legais.
Insta ressaltar que na hipótese de enriquecimento ilícito, modalidade prevista no artigo
9º da Lei nº 8.429/1992, o ato de improbidade administrativa só se aperfeiçoará mediante uma
ação comissa, haja vista que o agente público necessariamente precisa auferir ou aceitar a
incorporação da vantagem indevida ao seu patrimônio.
Quanto ao nexo de causalidade, para que se configure um ato de improbidade
administrativa é essencial que esteja comprovada a vinculação entre o exercício da função
pública e a prática do ato ímprobo (SIMÃO, 2011, p. 101). Somente os atos relacionados ao
comportamento do agente público, praticados em razão de seu cargo, terão relevância para a
existência da improbidade, nascendo daí o nexo causal.
14 “Art. 5°. Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente ou de
terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano”.
38
Segundo Calil Simão, o nexo causal é capaz de até mesmo surtir efeitos processuais,
uma vez que
Tal requisito deve vir descrito na inicial e bem delimitado pelo autor, sob pena de
indeferimento da inicial [...]. O magistrado também está obrigado a demonstrar o
nexo de causalidade na fundamentação de sua decisão, sob pena de nulidade do
decisório (Id., 2011, p. 102).
Destarte, a desonestidade praticada fora do âmbito da Administração Pública, no seio
das relações privadas do indivíduo, não interessa ao direito para fins de aplicação da Lei nº
8.429/1992, afastando a existência do nexo de causalidade.
4.1.5 Elemento subjetivo
O elemento subjetivo compreende a intenção do agente ao agir ou deixar de fazê-lo,
representando sua vontade interna. Conforme exposto no primeiro capítulo, os atos de
improbidade administrativa são condutas motivadas pela má-fé, pela desonestidade, no intuito
de corromper a patrimônio público (material e imaterial), e, sendo assim, é certo que as ações
ou omissões submetidas à Lei nº 8.429/1992 devem contar, necessariamente, com o elemento
subjetivo do agente.
Assim, todas as infrações capituladas na Lei de Improbidade Administrativa exigem a
presença do dolo (enriquecimento ilícito, lesão ao erário e violação aos princípios
contitucionais-administrativos), ou pelo menos da culpa, no caso das condutas que causam
prejuízo ao erário. Não há que se falar, portanto, em responsabilidade objetiva do agente para
aplicação das sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa, sob pena de grave
ofensa ao § 4º do artigo 37 da Constituição Federal (MATTOS, 2010). Em consonância ao
que foi dito, preleciona Emerso Garcia:
No direito moderno, assume ares de dogma a concepção de que não é admissível a
imputatio juris de um resultado danoso sem um elo de ligação psíquica que a ele
vincule o agente.
Ressalvados os casos em que a responsabilidade objetiva esteja expressamente
prevista no ordenamento jurídico, é insuficiente a mera demonstração do vínculo causal objetivo entre a conduta do agente e o resultado lesivo. [...] O elemento
subjetivo que deflagará este elo de encadeamento lógico entre a vontade, conduta e
resultado, com a consequente demonstração da culpabilidade do agente, poderá
apresentar-se sob duas únicas formas: o dolo e a culpa (GARCIA et al, 2002, p. 214-
215).
39
Nessa esteira, merece trazer à baila a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça,
que já pacificou o entendimento quanto à matéria, no exato sentido aqui aventado:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO
CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ARTIGO 11 DA
LEI N. 8.429⁄92. CONTRATAÇÃO DIRETA DE SERVIDORES TEMPORÁRIOS.
ACÓRDÃO RECORRIDO QUE DEIXA DE SINDICAR SOBRE ATUAÇÃO
DOLOSA DO RECORRENTE. AUSÊNCIA DE SUBSUNÇÃO DO ATO
REPUTADO ÍMPROBO AO TIPO PREVISTO INDIGITADO DISPOSITIVO.
CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA ARRIMADA NA LEI MUNICIPAL N. 1.130⁄97. NECESSIDADE EXCEPCIONAL DO INTERESSE PÚBLICO.
1. Inexiste afronta ao artigo 535 do CPC quando o Tribunal de origem,
embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta
nos autos. Saliente-se, ademais, que o magistrado não está obrigado a rebater, um a
um, os argumentos deduzidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados
tenham sido suficientes para embasar o decisum.
2. O STJ ostenta entendimento uníssono segundo o qual, para que seja
reconhecida a tipificação da conduta do réu como incurso nas previsões da Lei
de Improbidade Administrativa, é necessária a demonstração do elemento
subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9º e 11
e, ao menos, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10. Precedentes: AgRg no
AREsp 20.747⁄SP, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe
23⁄11⁄2011; REsp 1.130.198⁄RR, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma,
DJe 15⁄12⁄2010; EREsp 479.812⁄SP, Relator Ministro Teori Albino Zavascki,
Primeira Seção, DJe 27⁄9⁄2010; REsp 1.149.427⁄SC, Relator Ministro Luiz Fux,
Primeira Turma, DJe 9⁄9⁄2010; e EREsp 875.163⁄RS, Relator Ministro Mauro
Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 30⁄6⁄2010 [...] (Recurso Especial
1.291.994, Primeira Turma, Relator Ministro Benedito Gonçalves, julgado em 10
abril 2012, publicado em 13 abril 2012, grifo nosso).
AGRAVOS REGIMENTAIS EM RECURSO ESPECIAL.
DIREITO ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. ELEMENTO
SUBJETIVO NÃO DEVIDAMENTE DEMONSTRADO. INEXISTÊNCIA
DE DOLO APTO A CARACTERIZAR A IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
1. O juízo acerca da ilegalidade do ato tido como ímprobo, sem a
devida demonstração do elemento subjetivo dos agentes públicos, não é suficiente
para a condenação por improbidade administrativa (precedentes idênticos). 2. "É razoável presumir vício de conduta do agente público que pratica um ato
contrário ao que foi recomendado pelos órgãos técnicos, por pareceres jurídicos ou
pelo Tribunal de Contas. Mas não é razoável que se reconheça ou presuma esse
vício justamente na conduta oposta: de ter agido segundo aquelas manifestações, ou
de não ter promovido a revisão de atos praticados como nelas recomendado, ainda
mais se não há dúvida quanto à lisura dos pareceres ou à idoneidade de quem os
prolatou. Nesses casos, não tendo havido conduta movida por imprudência,
imperícia ou negligência, não há culpa e muito menos improbidade. A ilegitimidade
do ato, se houver, estará sujeita a sanção de outra natureza, estranha ao âmbito da
ação de improbidade." (REsp nº 827.445⁄SP, Relator Ministro Luiz Fux, Relator p⁄
acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, in DJe 8⁄3⁄2010).
3. "A jurisprudência desta Corte já se manifestou no sentido de que se
faz necessária a comprovação dos elementos subjetivos para que se repute
uma conduta como ímproba (dolo, nos casos dos artigos 11 e 9º e, ao menos,
culpa, nos casos do artigo 10), afastando-se a possibilidade de punição com base
tão somente na atuação do mal administrador ou em supostas contrariedades
aos ditames legais referentes à licitação, visto que nosso ordenamento
jurídico não admite a responsabilização objetiva dos agentes públicos." (REsp
nº997.564⁄SP, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, in DJe
25⁄3⁄2010).
40
4. Agravos regimentais providos (Agravos Regimentais no Recuso Especial nº
1.065.588, 1ª Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 08
fevereiro 2011, publicado em 21 fevereiro 2011, grifo nosso).
A problemática, no entanto, reside nos artigos 5º e 10 da Lei nº 8.429/199215 que
possibilitam a responsabilização do agente público, ou de terceiro, nos atos que causarem
prejuízo ao erário, por meio da comprovação de dolo ou culpa. Isso porque, considerando que
a prática de um ato ímprobo pressupõe a consciência e a voluntariedade de agir em desacordo
com os preceitos éticos e normativos da Administração Pública, seria juridicamente
impossível imputar a responsabilidade a um sujeito que agiu por negligência, imprudência ou
imperícia, pois não existiria ato ímprobo por descuido do agente público (SIMÃO, 2011).
Afora a controvérsia instalada, importa no presente momento ressaltar a necessidade
de comprovação do elemento subjetivo para tipificação das condutas inseridas na Lei de
Improbidade Administrativa, não sendo possível a responsabilidade objetiva do agente. A
viabilidade e constitucionalidade da modalidade culposa serão abordadas em capítulo próprio.
4.2 Atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito
Entre os nefastos efeitos causados pela corrupção e, por sua vez, pelos atos de
improbidade administrativa, o enriquecimento ilícito certamente é o mais combatido. Como se
viu no capítulo anterior, todos os dispositivos constitucionais e legislações sobre a matéria de
improbidade procuraram meios para combater o enriquecimento ilícito dos agentes violadores
do patrimônio público. Não seria diferente, portanto, quanto à Lei nº 8.429/1992, que
determinou em seu artigo 6º que no caso de enriquecimento ilícito, perderá o agente público
ou terceiro beneficiário bens ou valores acrescidos ao seu patrimônio.
Quanto ao conceito de enriquecimento ilícito, entende-se que é o resultado advindo do
aumento patrimonial do agente público ou de terceiro sem justa causa, em decorrência da
prática de um ato de improbidade administrativa (GARCIA et al, 2002). Nos dizeres de
Marcelo Figueiredo:
[...] enriquecimento ilícito é o acréscimo de bens ou valores que ocorre no
patrimônio do agente público ou de terceiros a ele vinculados, por ação ou omissão, mediante condutas ilícitas, em detrimento da administração pública nas suas mais
variadas manifestações. Manifesta-se preponderantemente através do acréscimo
(proveito) patrimonial. Contudo, pratica ainda ato de enriquecimento ilícito o agente
15 A Lei de Improbidade Administrativa ainda traz previsão expressa nesse sentido em seu artigo 5º, ao
preceituar: “Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente ou de
terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano” (grifo nosso).
41
que causa dano moral à administração (FIGUEIREDO, 1995 apud COPOLA, 2011,
p. 66).
As hipóteses abrangidas pela Lei de Improbidade Administrativa estão descritas no
artigo 9º, sendo que tal rol é meramente exemplificativo, conforme se denota da expressão
“notadamente”, inserta no caput daquele dispositivo16.
Por fim, cabe ressaltar que aplicação das sanções decorrentes das hipóteses previstas
no artigo 9º dependem da efetiva comprovação do dolo do agente público ou de terceiro em se
beneficiar por meio do ato de improbidade, não havendo que se falar em culpa quanto a este
dispositivo, pois somente aquele que possui vontade livre e consciente em lesar o erário em
proveito próprio poderá se enriquecer ilicitamente (COPOLA, 2011, p. 82).
4.3 Atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário
O artigo 10 da Lei de Improbidade Administrativa ocupou-se em encampar hipóteses
em que a conduta do agente público resulta em prejuízo ao erário, seja por meio de ação ou
omissão, dolosa ou culposa. Por prejuízo ou dano ao erário, compreende-se aqueles atos
passíveis de causar perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação
dos bens ou haveres integrantes do patrimônio da Administração Pública e demais entidades
que possam assumir a condição de sujeito passivo (SIMÃO, 2011). Também nesse caso o rol
de condutas trazido pela norma é exemplificativo17.
A finalidade precípua do dispositivo em tela é buscar o ressarcimento dos cofres
públicos em virtude da redução patrimonial sofrida. Acrescenta ainda Gina Copola (2011, p.
97), a impossibilidade prática de se configurar um ato de improbidade administrativa sem que
exista dano aos cofres públicos, ou, de outra forma, enriquecimento ilícito do agente.
4.4 Atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da
Administração Pública
A terceira espécie de ato de improbidade administrativa, trazida pelo artigo 11 da Lei
nº 8.429/1992, refere-se às condutas que atentam contra os princípios constitucionais-
administrativos, insculpidos, precipuamente, no artigo 37, caput, da Constituição da
16 A leitura dos tipos legais pode ser feita por meio do Anexo A da presente monografia, no qual consta a íntegra
da Lei nº 8.429/1992. 17 Ver nota de rodapé anterior.
42
República, quais sejam, legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Ademais, a redação do dispositivo em comento permite a incidência da norma sobre qualquer
ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade e lealdade às
instituições, apresentando o seguinte rol exemplificativo de condutas: a) praticar ato visando
fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência; b)
retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício; c) revelar fato ou circunstância de
que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo; d) negar
publicidade aos atos oficiais; e) frustrar a licitude de concurso público; f) deixar de prestar
contas quando esteja obrigado a fazê-lo; e g) revelar ou permitir que chegue ao conhecimento
de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz
de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço.
Interessante colacionar a crítica feita por Mauro Roberto Gomes de Mattos sobre o
caráter aberto desse dispositivo, a fim de se evitar exageros na aplicação da Lei de
Improbidade:
Há que se ter temperamentos ao interpretar a presente norma, pois seu caráter é
muito aberto, devendo, por esta razão, sofrer a devida dosagem de bom senso para que mera irregularidade formal, que não se subsuma como devassidão ou ato
ímprobo, não seja enquadrado na presente lei, com severas punições (MATTOS,
2010, p. 365).
Quanto ao elemento subjetivo necessário a configuração do tipo previsto no artigo 11,
doutrina e jurisprudência já assentaram o entendimento de que somente por meio do dolo é
possível a prática do ato de improbidade administrativa nele tipificado. Nesse sentido:
Diz-se que os ilícitos previstos nos arts. 9º e 11 não admitem a culpa em razão de
dois fatores. [...] No que concerne ao segundo, tem-se um fator lógico-sistemático de
exclusão, pois tendo sido a culpa prevista unicamente no art. 10, afigura-se evidente
que a mens legis é restringi-la a tais hipóteses, excluindo-a das demais (GARCIA et
al, 2002, p. 216).
ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. CONTRATAÇÃO SEM CONCURSO
PÚBLICO. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO GENÉRICO. REVISÃO DE
PROVA. INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ.
1. A caracterização dos atos de improbidade previstos no artigo 11 da Lei
8.429/92 está a depender da existência de dolo genérico na conduta do agente.
Precedentes.
2. A contratação irregular sem a realização de concurso público pode se
caracterizar como ato de improbidade administrativa, mas, para tanto, é
imprescindível a demonstração de dolo, ao menos genérico, do agente.
3. Para desconstituir a decisão do Tribunal de origem e acatar os argumentos do
agravante seria necessário adentrar no contexto fático-probatório, o que não se
mostra cabível no âmbito do recurso especial.
43
4. Agravo regimental não provido (Superior Tribunal de Justiça, Agravo Regimental
no Recurso Especial nº 1.274.682/PB, Segunda Turma, Relator Ministro Castro
Meira, julgado em 06 dezembro 2012, publicado em 04 fevereiro 2013, grifo nosso).
Logo, tem-se que para configuração do ato de improbidade elencado no artigo 11 da
Lei de Improbidade Administrativa, torna-se imprescindível a presença do dolo, sendo
insuficiente a culpa do agente público, pois a existência de um ato ilegal não conduz a
conclusão de que ele será ímprobo, havendo necessidade de se evidenciar a má-fé ou
desonestidade do sujeito ativo (SIMÃO, 2011, p. 193).
44
5 A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MODALIDADE CULPOSA DOS ATOS DE
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
O presente capítulo será desenvolvido a partir da análise realizada no quarto capítulo
sobre a inclusão do elemento subjetivo culpa na tipificação do artigo 5º e 10 da Lei de
Improbidade Administrativa, em especial quanto à modalidade denominada como culpa
grave, abordagem trazida pela doutrina, numa tentativa de conferir legitimidade ao precitado
artigo. Neste ponto, entretanto, a discussão centraliza-se em pesquisar se a responsabilização
de agentes públicos, ou de terceiros, por meio da culpa encontra-se em conformidade com a
Constituição Federal. A matéria demanda análise cuidadosa, especialmente, repita-se, no que
tange ao conceito de culpa tratado durante o trabalho. A relevância do tema foi muito bem
exposta por Naira Senna, ao preceituar que:
O problema central [...] é que as escolhas públicas e as sanções não se encontram claramente definidas na improbidade culposa, como revela uma jurisprudência
conflitante entre as Turmas do Superior Tribunal de Justiça e uma doutrina
permeada por quatro correntes doutrinárias diferentes a respeito do tema. Diante de
tamanho desacordo, a aplicação uniforme do instituto pelo Judiciário e a repressão
da improbidade administrativa ficam fragilizadas (SENNA, 2010, p. 32).
Objetiva-se, assim, distinguir os conceitos de culpa grave e dolo, sendo este, em linhas
gerais, representado pela vontade deliberada e consciente em atingir um fim ilícito e imoral,
ou seja, aquele que pratica o ato norteia-se pela má-fé, é o agente corrupto, desonesto.
5.1 Distinções entre dolo e culpa
Antes de adentrar na discussão quanto à constitucionalidade da modalidade culposa
dos atos de improbidade administrativa, precedendo a abordagem dos posicionamentos
doutrinários e jurisprudenciais a respeito do tema, torna-se necessário divisar os conceitos de
dolo e culpa, exercício que muito facilitará a elucidação do tema.
Em primeiro lugar, ressalta-se que dolo e culpa são institutos jurídicos presentes em
todas as discussões relacionadas à responsabilidade do sujeito de direito, justamente por
envolver a consciência e a voluntariedade de seu agir. É certo que na seara do direito penal
sempre foi maior a preocupação e o desenvolvimento científico dedicado a tais categorias, por
envolver o problema da tipificação dos ilícitos penais, bem como para definir o grau de
45
responsabilização do agente. Pode-se dizer, portanto, que aplicação desses institutos no
campo da improbidade administrativa ocorre de forma análoga (SENNA, 2010).
O dolo é o elemento subjetivo informado pela vontade livre e consciente do agente
público em causar um resultado ilícito. Rogério Greco expõe de forma detalhada o conceito
de dolo, nos seguintes termos:
Dolo é a vontade e a consciência dirigidas a realizar a conduta prevista no tipo penal
incriminador. Conforme preleciona Welzel, “toda ação consciente é conduzida pela
decisão da ação, quer dizer, pela consciência do que se quer – o momento intelectual
– e pela decisão a respeito de querer realizá-lo – o momento volitivo. Ambos os momentos, conjuntamente, como fatores configuradores de uma ação típica real,
formam o dolo (= dolo do tipo)” [...]. Assim, podemos perceber que o dolo é
formado por um elemento intelectual e um elemento volitivo (GRECO, 2012, p. 60-
61).
Vale lembrar que a definição acima refere-se à modalidade do dolo direto, havendo,
ainda, a categoria do dolo eventual. Este último estará presente sempre que o sujeito ativo não
desejar atingir, num primeiro momento, o resultado vedado por lei, e, não obstante, assumir o
risco de produzi-lo, aceitando a probabilidade de sua efetiva concretização (JUNQUEIRA,
2010, p. 70).
Para ilustrar o que foi dito acima, imagine-se a seguinte situação: determinado agente
público, responsável pelo Setor de Licitações do Município “X”, resolve contratar os serviços
da Empresa “Y”, por manter amizade íntima com um de seus sócios, sem realizar
procedimento licitatório prévio e fora das hipóteses legais de dispensa. Ocorre que, no mesmo
Município, existem outras empresas que oferecem o mesmo serviço, com igual qualidade e a
custo mais baixo. Caso o servidor esteja consciente de que sua conduta irá causar prejuízo ao
erário, estar-se-á diante do dolo direto. Lado outro, se o referido agente público não soubesse
da existência de outras empresas, e mesmo assim não importasse em descobrir a existência de
outros fornecedores, assumindo o risco de realizar a contratação mais cara ao erário, estaria
configurado o dolo eventual.
Por sua vez, a culpa denota um grau de descuido em relação ao bem jurídico protegido
pela norma, seja por negligência, imprudência ou imperícia (GOMES, 2005 apud SIMÃO,
2011, p. 81). Cite-se, por exemplo, o inciso X do artigo 10 da Lei nº 8.429/1992, que tipifica
como ato ímprobo a conduta de agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, ou
no que diz respeito à conservação do patrimônio público. Segundo Cezar Roberto Bitencourt
(2009, p. 297), “culpa é a inobservância do dever objetivo de cuidado manifestada numa
conduta produtora de um resultado não querido, objetivamente previsível”.
46
No intuito de apartar o dolo da culpa, Naira Senna ressalta os traços que diferenciam
esses institutos, nos seguintes termos:
Na culpa, o agente não dirige a sua conduta a um resultado ilícito, mas este é
alcançado, pois sua ação foi descuidada. Não houve em seu agir a diligência,
prudência ou perícia que devem ser observadas pela sociedade. Na culpa, diferente
do dolo, não há previsão, pelo sujeito ativo, do resultado (Id., 2010, p. 31).
Fábio Medina Osório esclarece que a culpa capaz de qualificar determinado ato como
ímprobo é a culpa grave, entendida esta como uma violação intolerável ao dever de probidade
e aos cânones da boa administração, implicando em grave ineficiência funcional da
Administração Pública. Em suas palavras:
Culpa é a inobservância de deveres objetivos de cuidado em relação a evitar certos
comportamentos considerados nocivos aos bens jurídicos protegidos. Culpa grave,
erro grosseiro, são requisitos da improbidade culposa. Gravidade da intolerável
ineficiência funcional é outra espécie de patologia, mas igualmente implicada na
improbidade. Incisos dos arts.10 e 1118, dependendo da estrutura redacional
específica, comportam, ao nosso ver, enquadramento na categoria da culpa grave
(OSÓRIO, 2012, p. 25).
Isso posto, avança-se no trabalho para expor as correntes doutrinárias e o
posicionamento jurisprudencial a respeito da constitucionalidade da modalidade culposa.
5.2 Posicionamentos doutrinários
De início, torna-se imperioso relembrar algumas considerações sobre o conceito de
improbidade administrativa, na linha do que foi dito no capítulo primeiro. Não obstante a Lei
nº 8.429/1992 apresente tipos legais abertos e contornos imprecisos, e não haver um conceito
permanente do que seja improbidade administrativa, é firme o posicionamento de que ela
nasce de atos marcados pela desonestidade, imbuídos pela má-fé e direcionados à prática da
corrupção, e, no campo do direito administrativo, pode ser encontrada a partir dos atos que
desrespeitem a ética pública, praticados com a intenção clara e consciente em violar o erário
ou os princípios da Administração Pública (notadamente, a moralidade, a impessoalidade e a
eficiência).
18 Consoante exposto no capítulo anterior, os atos de improbidade administrativa que violam os princípios da
Administração Pública, sancionados pelo artigo 11 da Lei nº 8.429/1992, só admitem a modalidade dolosa,
conforme posição pacificada na doutrina e na jurisprudência. A posição de Fábio Medina Osório, embora digna
de estudo, integra corrente minoritária sobre o tema.
47
Ademais, pode-se afirmar que a definição de ato ímprobo não se confunde com o
conceito de ato ilícito ou danoso, uma vez que o primeiro apresenta um alcance muito mais
amplo, ao passo que os segundos, embora possam estar em desacordo com a lei ou resultarem
em prejuízo à Administração Pública, são executados sem a marca da desonestidade ou
apenas derivam de erros toleráveis na prática dos atos administrativos (SIMÃO, 2011).
É de fundamental importância estabelecer tais distinções para que se compreenda que
tipo de conduta poderá ser objeto da Lei de Improbidade Administrativa. Se houve a prática
de um ato ilegal que resultou em dano ao erário, porém sem que o agente tenha procedido de
má-fé ou culpa grave, ou, ainda, sem que estivesse consciente da desonestidade de seu
comportamento, não se pode tipificar tal conduta mediante aplicação dos dispositivos da Lei
nº 8.429/92. Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
[...] o enquadramento na lei de improbidade administrativa exige culpa ou dolo por
parte do sujeito ativo. Mesmo quando algum ato ilegal seja praticado é preciso
verificar se houve culpa ou dolo, se houve um mínimo de má-fé que revele
realmente a presença de um comportamento desonesto (DI PIETRO, 2009, p. 823).
Ainda no campo doutrinário, mister ressaltar as lições de Hely Lopes Meirelles, em
obra atualizada por Arnoldo Wald e pelo Ministro Gilmar Mendes:
Embora haja quem defenda a responsabilidade civil objetiva dos agentes públicos
em matéria de ação de improbidade administrativa, parece-nos que o mais acertado é
reconhecer a responsabilidade apenas na modalidade subjetiva. Nem sempre um
ato ilegal será um ato ímprobo. Um agente público incompetente, atabalhoado
ou negligente não é necessariamente um corrupto ou desonesto. O ato ilegal,
para ser caracterizado com ato de improbidade administrativa, há de ser
doloso ou, pelo menos, de culpa gravíssima (MEIRELLES, 2004, p. 210-2011,
grifo nosso).
A forma dolosa caracteriza-se pela vontade deliberada e consciente em atingir um fim
ilícito e imoral, ou seja, aquele que pratica o ato norteia-se pela má-fé, é o agente corrupto,
desonesto. Na situação prevista pelo inciso VIII, do artigo 10, por exemplo, o dolo revelar-se-
á sempre que o agente público frustrar a licitação ou dispensá-la indevidamente, sabendo que
sua conduta causará prejuízos ao erário, ou, pelo menos, assumindo o risco de produzir tal
resultado. Nesse sentido:
[...] ímproba é a conduta consciente do agente público em atentar contra a
moralidade, demonstrada pela vontade específica de violar a lei. A intenção de
fraudar a lei é condição subjetiva indispensável para o presente enquadramento, sob
pena de vulgarização do que venha a ser o ato de improbidade administrativa, que,
48
como visto, não se caracteriza como toda conduta ilegal, tem que estar presente a
devassidão (MATTOS, 2004, p. 04).
Lado outro, o termo culpa constante no caput do artigo 10 deve ser interpretado como
o grau de comprometimento do agente em relação ao bem jurídico protegido – neste caso, o
erário –, significa dizer que somente serão punidos atos afetados pela famigerada culpa grave,
onde o agente menospreza, deliberadamente, as formalidades indispensáveis à proteção da
coisa pública, incidindo em erro intolerável e extremamente lesivo ao interesse público.
Em termos práticos, dolo e culpa grave estão intimamente ligados. Ambos os casos
necessitam de provas substanciais quanto à desonestidade ou desídia do agente, a ponto de
justificar uma condenação por improbidade administrativa, isto porque, à luz da consagrada
expressão, “a lei alcança o administrador desonesto, não o inábil”19. Meros equívocos formais
ou inabilidade do agente público são insuficientes para justificar a possibilidade jurídica da
ação de improbidade. Interessante expor os comentários de Mauro Roberto Gomes de Mattos
sobre o tema:
Como muito bem diz José Afonso da Silva, o „ímprobo administrador é o devasso da
Administração Pública‟. A devassidão a que se refere José Afonso da Silva, caracterizadora da improbidade administrativa, deverá vir contida na índole da
conduta do agente público ou na vontade de lesar ao erário, pois do contrário faltará
tipicidade para enquadrar o ato culposo em ímprobo. Nem toda lesão ao patrimônio
público pode ser considerada como reveladora de um ato de improbidade
administrativa, pelo fato de a conduta do agente público ser o elemento
caracterizador do ilícito (MATTOS, 2010, p. 577).
Para solucionar o problema da constitucionalidade da modalidade culposa, a doutrina
apresenta basicamente três posicionamentos, cada qual com suas próprias razões, a saber: I - a
modalidade culposa é constitucional, independente da forma de culpa; II – é inconstitucional a
modalidade culposa dos atos de improbidade administrativa, sancionando-se apenas os atos
dolosos; e III – é constitucional a modalidade culposa, mas desde que os atos sejam praticados
mediante culpa grave ou gravíssima.
A primeira corrente sustenta que o legislador teria sido bem claro ao definir a
possibilidade de tal modalidade no texto da Lei nº 8.429/1992, sendo que somente as condutas
previstas pelos artigos 9º e 11 aceitaram somente a modalidade dolosa. Nesse sentido:
19 A expressão aparece pela primeira vez no acórdão do Recurso Especial nº 213.994-0/MG, julgado pela 1ª
Turma do Superior Tribunal de Justiça em 17 de agosto de 1999. Sendo assim, sua autoria deve ser creditada ao
relator do caso, Excelentíssimo Senhor Ministro Jacy Garcia Vieira.
49
O elemento subjetivo é o dolo ou culpa, como consta do caput do dispositivo. Neste
ponto o legislador adotou critério diverso em relação ao enriquecimento ilícito. É
verdade que há autores que excluem a culpa, chegando mesmo a considerar
inconstitucional tal referência no mandamento legal. Não lhes assiste razão,
entretanto. O legislador teve realmente o desiderato de punir condutas culposas
de agentes, que causem danos ao erário. Aliás, para não deixar dúvida, referiu-
se ao dolo e à culpa também no art.5º, que, da mesma forma, dispõe sobre
prejuízos ao erário. Em nosso entender, não colhe o argumento de que a conduta
culposa não tem gravidade suficiente para propiciar a aplicação de penalidade. Com
toda a certeza, há comportamentos culposos que, pela repercussão que acarretam,
têm maior densidade que algumas condutas dolosas. Além disso, o princípio da proporcionalidade permite a perfeita adequação da sanção à maior ou menor
gravidade do ato de improbidade. O que se exige, isto sim, é que haja comprovada
demonstração do elemento subjetivo e também do dano causado ao erário. Tanto
quanto na improbidade que importa em enriquecimento ilícito, não há ensejo para a
tentativa (CARVALHO FILHO, 2009 apud SENNA, 2010, p. 40-41, grifo nosso).
No mesmo sentido, Emerson Garcia (2002, p. 216) argumenta que o artigo 10 da Lei
de Improbidade Administrativa não faz distinção entre os diversos graus de culpa. Assim, seja
ela classificada como leve, grave ou gravíssima, tal fato não influenciaria na configuração do
ato de improbidade administrativa. Ademais, o parágrafo § 4º do artigo 37 da Constituição
Federal não elege o dolo como único elemento subjetivo possível, assim como o artigo 5º da
Lei nº 8.429/1992 apenas indica a modalidade genérica da culpa, inexistindo ressalvas.
Por sua vez, a parcela da doutrina que entende pela inconstitucionalidade da
modalidade culposa sustenta que tal orientação permitiria a aplicação desregrada da Lei de
Improbidade Administrativa, pois todo agente que cometesse erros, ainda que desprovido de
má-fé, estaria sujeito às graves sanções daquele Diploma. Filia-se a essa corrente o jurista
Mauro Roberto Gomes de Mattos, defendendo seu posicionamento nas seguintes palavras:
Partindo-se da premissa de que o elemento subjetivo da desonestidade, que deságua
na improbidade administrativa, é o dolo, não há como estender tal princípio para a
culpa, eis que o divórcio entre uma e outra situação é insuperável. Não pode o
legislador querer desnaturar a figura da boa-fé ou da falta de intenção de lesar o ente
público, para considerá-la, em igualdade de condições, com aquelas situações
caracterizadoras da devassidão do agente público desonesto que traz no seu espírito
intenções impuras e imorais reveladas pela vontade de fraudar o erário (Id., 2010, p.
269).
Reforçando o posicionamento acima, Calil Simão (2011, p. 81-83) explica que o
instituto da culpa é incompatível com o conceito de improbidade administrativa, não
aceitando nem mesmo a ideia de culpa grave. Segundo o autor, seria impossível entender que
um agente desonesto e corrupto provocasse um resultado lesivo à Administração Pública por
mero descuido. Argumenta, ainda, que o conceito de culpa grave foi erroneamente importado
do direito penal, uma vez que neste ramo jurídico ela estaria inserida como elemento de
50
culpabilidade do agente, vale dizer, a culpa grave não serviria para tipificação do ato ilícito,
mas sim para determinar o grau de violação do bem jurídico tutelado pela norma. Em suas
palavras:
[...] podemos concluir que o elemento subjetivo do agente ímprobo é sempre o dolo.
O dolo nas suas mais variadas formas (direto ou eventual). A infração dolosa só
existe quando o elemento culpabilidade está impregnado de culpa grave ou
gravíssima. Tudo isso quer dizer que a culpa interessa tanto para a tipicidade quanto
para a culpabilidade; em cada uma delas, entretanto, com funções distintas. Aliás, o
próprio termo culpa indica um erro cometido por inadvertência ou por imprudência
(Id., 2011, p.82-83).
Sendo assim, a interpretação do artigo 10 deve estar adstrita aos limites semânticos do
conceito de ato ímprobo, notadamente quanto à expressão culpa inserida em seu texto, sob
pena de violação ao princípio da razoabilidade e inconstitucionalidade do dispositivo frente ao
§ 4º do artigo 37 da Carta Magna.
A terceira corrente doutrinária, por sua vez, vincula-se a tese de constitucionalidade da
modalidade culposa, todavia, se diferenciando da primeira corrente ao condicionar a
existência do ato de improbidade administrativa à gravidade da culpa.
Consoante afirmado na subseção 2.3 do capítulo primeiro deste trabalho, não se pode
admitir que todo e qualquer erro cometido pelo agente público no exercício de suas funções
seja tomado como ato ímprobo. Com efeito, o administrador público tem direito ao erro
juridicamente tolerável (OSÓRIO, 2012), havendo que se falar em improbidade
administrativa somente quando houver ato eivado de culpa grave ou gravíssima, que
comprometa os postulados de eficiência aplicáveis ao setor público (SENNA, 2010, p. 42).
No entanto, os atos culposos merecem especial atenção no momento de aplicação das
sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa, haja vista que representam condutas
menos lesivas do que aquelas praticadas sob a forma dolosa, fato que reclama a incidência do
princípio da proporcionalidade na fase de dosimetria das sanções (OSÓRIO, 2000, p.200).
Destaca-se entre os defensores dessa corrente o jurista Fábio Medina Osório, ao
argumentar que a improbidade administrativa não estaria restrita à ideia de desonestidade,
aplicando-se também aos casos de grave ineficiência na gestão pública. Sintetizando o
pensamento esposado pelos adeptos a esta terceira via, o autor afirma que
Os tipos culposos da improbidade administrativa descendem já da própria
Constituição Federal. Nesta, não há restrição alguma à improbidade culposa. Ao
contrário, há reforço no sentido da necessária proteção dos valores “eficiência” ou
“economicidade”, ao abrigo da moral administrativa e de princípios expressos nos
arts. 37 ou 70 da CF. Forte no princípio democrático, a LGIA [Lei Geral de
51
Improbidade Administrativa] optou pela eleição da improbidade culposa como
modalidade de ilícito. Não desrespeitou o comando do art. 37, § 4º, da CF, que prevê
uma série de sanções aos atos ímprobos, porque o castigo reservado ao ilícito
culposo haverá, como ocorre nos demais tipos de ilícitos de ser balanceado e
ponderado, em consonância com o postulado ou princípio da proporcionalidade (Id.,
2010, p. 231).
Adota-se, no desenvolvimento deste trabalho, a tese apresentada pela terceira corrente,
onde a modalidade culposa é considerada como constitucional, mas desde que condicionada à
gravidade da culpa. Essa escolha é motivada, essencialmente, pelos argumentos apresentados
por Naira Senna (2010, p. 50), para quem a adoção da primeira corrente (constitucionalidade
irrestrita dos atos culposos) poderia desaguar na violação do princípio da proibição de
excesso20, ao deixar de estabelecer parâmetros confiáveis para definição da culpa. Por outro
lado, tomar por inconstitucional a modalidade culposa extrapola os limites semânticos do
artigo 37, § 4º, da Constituição, uma vez que dele não se extrai qualquer vedação ao
sancionamento dos atos ímprobos culposos.
Logo, não somente é possível, como é constitucional a previsão da modalidade
culposa para os atos de improbidade administrativa inseridos no artigo 10 da Lei nº
8.429/1992, desde que se esteja diante de uma conduta derivada de culpa grave ou gravíssima
do agente público no exercício de suas funções.
5.3 Posicionamentos jurisprudenciais
Os tribunais pátrios, em especial o Superior Tribunal de Justiça, têm se manifestado de
modo divergente a respeito da possibilidade de responsabilização do agente público por meio
da modalidade culposa, dependendo, inclusive, da modalidade de ato ímprobo que se está
diante (SENNA, 2010).
No Superior Tribunal de Justiça, a Primeira Turma assentou o entendimento de que o
elemento subjetivo é essencial a configuração do ato ímprobo, sinalizando que somente em
caso de culpa grave haveria subsunção ao artigo 10. Vejam-se os seguintes julgados:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. OS AGENTES POLÍTICOS PODEM SER PROCESSADOS POR SEUS ATOS PELA LEI 8.429/92. ENTENDIMENTO FIRMADO PELA
20 A autora explica que o postulado da proibição de excesso foi desenvolvido pelo jurista Humberto Ávila, para
quem “[...] a promoção das finalidades constitucionalmente postas possui, porém, um limite. Esse limite é
fornecido pelo postulado da proibição de excesso. Muitas vezes denominado pelo Supremo Tribunal Federal
como uma das facetas do princípio da proporcionalidade, o postulado da proibição de excesso proíbe a restrição
excessiva de qualquer direito fundamental. [...] O postulado da proibição de excesso depende, unicamente, de
estar um direito fundamental sendo excessivamente restringido” (ÁVILA, 2007 apud SENNA, 2010, p. 51).
52
CORTE ESPECIAL/STJ (RCL 2.790/SC, REL. MIN. TEORI ALBINO
ZAVASCKI, DJE 4.3.2010). RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO
RELATOR. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE
PROCEDIMENTO PRÉVIO PARA A APROVAÇÃO DO TERMO DE
DISPENSA DE LICITAÇÃO. ART. 10, VIII DA LEI 8.429/92.
INDISPENSABILIDADE DE COMPROVAÇÃO DO EFETIVO PREJUÍZO AO
ERÁRIO E DO DOLO DO AGENTE. PREVISÃO DE RESPONSABILIZAÇÃO
DO SERVIDOR POR CONDUTA CULPOSA. IRRAZOABILIDADE. AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO.
(...)
3. As Turmas que compõem a Primeira Seção desta Corte já firmaram a orientação de que a configuração dos atos de improbidade administrativa previstos no art. 10 da
Lei de Improbidade Administrativa exige a presença do efetivo dano ao erário.
4. As instâncias de origem reconheceram que o pagamento da verba honorária ao
Escritório Advocatício não se materializou, em razão do ajuizamento de ação
judicial própria, tendo o Tribunal de origem expressamente consignado a ausência
de danos ao Erário.
5. Não se deve admitir que a conduta culposa renda ensejo à responsabilização
do Agente por improbidade administrativa; com efeito, a negligência, a
imprudência ou a imperícia, embora possam ser consideradas condutas
irregulares e, portanto, passíveis de sanção, não são suficientes para ensejar a
punição por improbidade administrativa. O elemento culpabilidade, no interior
do ato de improbidade, se apurará sempre a título de dolo, embora o art. 10 da
Lei 8.429/92 aluda efetivamente à sua ocorrência de forma culposa; parece
certo que tal alusão tendeu apenas a fechar por completo a sancionabilidade
das ações ímprobas dos agentes públicos, mas se mostra mesmo impossível,
qualquer das condutas descritas nesse item normativo, na qual não esteja
presente o dolo.
(...)
8. Agravo Regimental desprovido (Agravo Regimental no Recurso Especial nº
1.199.582, Primeira Turma, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, julgado
em 15.12.2011, publicado em 09.02.2012, grifo nosso).
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO
CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11 DA LEI
N. 8.429⁄92. CONTRATAÇÃO DIRETA DE SERVIDORES TEMPORÁRIOS.
ACÓRDÃO RECORRIDO QUE DEIXA DE SINDICAR SOBRE ATUAÇÃO
DOLOSA DO RECORRENTE. AUSÊNCIA DE SUBSUNÇÃO DO ATO
REPUTADO ÍMPROBO AO TIPO PREVISTO INDIGITADO DISPOSITIVO.
CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA ARRIMADA NA LEI MUNICIPAL N.
1.130⁄97. NECESSIDADE EXCEPCIONAL DO INTERESSE PÚBLICO.
1. Inexiste afronta ao art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem,
embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta
nos autos. Saliente-se, ademais, que o magistrado não está obrigado a rebater, um a
um, os argumentos deduzidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar o decisum.
2. O STJ ostenta entendimento uníssono segundo o qual, para que seja
reconhecida a tipificação da conduta do réu como incurso nas previsões da Lei
de Improbidade Administrativa, é necessária a demonstração do elemento
subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9º e 11
e, ao menos, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10. Precedentes: AgRg no
AREsp 20.747⁄SP, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe
23⁄11⁄2011; REsp 1.130.198⁄RR, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma,
DJe 15⁄12⁄2010; EREsp 479.812⁄SP, Relator Ministro Teori Albino Zavascki,
Primeira Seção, DJe 27⁄9⁄2010; REsp 1.149.427⁄SC, Relator Ministro Luiz Fux,
Primeira Turma, DJe 9⁄9⁄2010; e EREsp 875.163⁄RS, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 30⁄6⁄2010. [...] (Recurso Especial
1.291.994, Primeira Turma, Relator Ministro Benedito Gonçalves, julgado em 10
abr 2012, publicado em 13 abr 2012, grifo nosso).
53
AGRAVOS REGIMENTAIS EM RECURSO ESPECIAL.
DIREITO ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. ELEMENTO
SUBJETIVO NÃO DEVIDAMENTE DEMONSTRADO. INEXISTÊNCIA
DE DOLO APTO A CARACTERIZAR A IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
1. O juízo acerca da ilegalidade do ato tido como ímprobo, sem a
devida demonstração do elemento subjetivo dos agentes públicos, não é suficiente
para a condenação por improbidade administrativa (precedentes idênticos).
2. "É razoável presumir vício de conduta do agente público que pratica um ato
contrário ao que foi recomendado pelos órgãos técnicos, por pareceres jurídicos ou
pelo Tribunal de Contas. Mas não é razoável que se reconheça ou presuma esse
vício justamente na conduta oposta: de ter agido segundo aquelas manifestações, ou de não ter promovido a revisão de atos praticados como nelas recomendado, ainda
mais se não há dúvida quanto à lisura dos pareceres ou à idoneidade de quem os
prolatou. Nesses casos, não tendo havido conduta movida por imprudência,
imperícia ou negligência, não há culpa e muito menos improbidade. A ilegitimidade
do ato, se houver, estará sujeita a sanção de outra natureza, estranha ao âmbito da
ação de improbidade." (REsp nº 827.445⁄SP, Relator Ministro Luiz Fux, Relator p⁄
acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, in DJe 8⁄3⁄2010).
3. "A jurisprudência desta Corte já se manifestou no sentido de que se
faz necessária a comprovação dos elementos subjetivos para que se repute
uma conduta como ímproba (dolo, nos casos dos artigos 11 e 9º e, ao menos,
culpa, nos casos do artigo 10), afastando-se a possibilidade de punição com base
tão somente na atuação do mal administrador ou em supostas contrariedades
aos ditames legais referentes à licitação, visto que nosso ordenamento
jurídico não admite a responsabilização objetiva dos agentes públicos." (REsp
nº997.564⁄SP, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, in DJe
25⁄3⁄2010).
4. Agravos regimentais providos (Agravos Regimentais no Recuso Especial nº
1.065.588, Primeira Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 08
fevereiro 2011, publicado em 21 fev 2011, grifo nosso).
Lado outro, a orientação da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça é no
sentido de que a modalidade culposa é perfeitamente admissível nos casos tipificados pelo
artigo 10 da Lei de Improbidade Administrativa, não havendo divergência sobre o tema, ou
aprofundamento da discussão quanto à constitucionalidade dos atos culposos. Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ATO DE IMPROBIDADE. EX-
PREFEITO. ATOS QUE ATENTEM CONTRA OS PRINCÍPIOS
ADMINISTRATIVOS. DOLO GENÉRICO. PREJUÍZO AO ERÁRIO
RECONHECIDO PELO TRIBUNAL A QUO. REEXAME FÁTICO.
IMPOSSIBILIDADE.
[...]
2. A jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que o art. 10 da Lei
8.429/1992 admite a modalidade culposa e o art. 11 dispensa a comprovação de
intenção específica de violar princípios administrativos, sendo suficiente o dolo genérico.
3. No tocante ao prejuízo ao Erário, a Corte local entendeu que este decorreu
de ato da recorrente, que procedeu de forma negligente na arrecadação de
tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio
público. Assim, não há como rever tal entendimento, sob pena de esbarrar-se no
óbice da Súmula 7/STJ.
4. In casu, a petição de Agravo Regimental não impugna tais fundamentos.
5. Agravo Regimental não conhecido (Agravo Regimental nos Embargos de
Declaração no Agravo em Recurso Especial nº 58.172/ES, Segunda Turma, Relator
Ministro Herman Benjamin, julgado em 14 agosto 2012, publicado em 27 agosto
2012, grifos nosso).
54
ADMINISTRATIVO. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10,
DA LEI 8.429/92. DANO AO ERÁRIO. MODALIDADE CULPOSA.
POSSIBILIDADE. FAVORECIMENTO PESSOAL. TERCEIRO BENEFICIADO.
REQUISITOS CONFIGURADOS. INCURSÃO NAS PREVISÕES DA LEI DE
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
1. O ato de improbidade administrativa previsto no art. 10 da Lei 8.429/92
exige a comprovação do dano ao erário e a existência de dolo ou culpa do
agente. Precedentes.
[...]
3. A conduta culposa está presente quando, apesar de o agente não pretender o
resultado, atua com negligência, imprudência ou imperícia. Nessa modalidade,
há um defeito inescusável de diligência, no qual se comete um erro sobre a
condição do agir ou sobre a consequência da conduta. A punição dessa prática
justifica-se pela criação de um risco proibido ao bem jurídico tutelado.
4. Na hipótese, além do dano ao erário, a descrição dos elementos fáticos
realizada na origem evidencia a negligência da autoridade municipal, pois: a)
realizou o pagamento da nota de empenho sem adotar qualquer providência para
aferir a entrega da mercadoria, seja por meio da verificação do processo
administrativo que ensejou a contratação, seja pela provocação da empresa
contratada para comprovar a entrega do bem; b) deixou transcorrer praticamente três
anos entre o pagamento integral do débito e a entrega parcial da mercadoria, sem ter adotado qualquer medida ou cobrança do particular; c) após todo esse tempo, sequer
a totalidade da quantia contratada foi entregue.
[...]
6. Recurso especial provido em parte (Recurso Especial nº 1.127.143/RS, Segunda
Turma, Relator Ministro Castro Meira, julgado em 22 junho 2010, publicado em 03
agosto 2010, grifos nosso).
Veja-se, portanto, que Corte Especial mantém divergência entre suas Turmas sobre o
tratamento conferido à culpa como elemento subjetivo dos atos de improbidade
administrativa. Não obstante a Segunda Turma tenha sedimentado a orientação em relação à
constitucionalidade dos atos ímprobos culposos, não houve um enfrentamento direto da
questão, tarefa que poderia realizar-se por meio de controle difuso de constitucionalidade.
Em outro plano, insta ressaltar a jurisprudência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais
que admite a responsabilização por culpa, mas mantém o entendimento de que é
imprescindível a comprovação do elemento subjetivo e da má-fé do agente público. Assim,
traz-se à colação os seguintes julgados:
DIREITO CONSTITUCIONAL - DIREITO ADMINISTRATIVO - APELAÇÃO -
ATAQUE DE PARTE DA SENTENÇA NAS CONTRA-RAZÕES - IMPOSSIBILIDADE - AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - EX-
PREFEITO - RESTITUIÇÃO DE VALORES DO IMPOSTO DE RENDA
RETIDO NA FONTE AOS SERVIDORES DO EXECUTIVO MUNICIPAL -
CONDUTA AUTORIZADA PELA LEI MUNICIPAL 2.789/91 - PRESUNÇÃO
DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS - NÃO DEMONSTRAÇÃO DA MÁ-
FÉ DO ADMINISTRADOR - RECURSO DESPROVIDO. - Para a configuração
dos atos de improbidade administrativa descritos nos artigos 10 e 11 da lei
8.429/92, é imprescindível que se comprove o elemento subjetivo no
comportamento do agente público, ou seja, a existência de dolo, ou de culpa no
caso do artigo 10, com a finalidade de atingir fim ilícito. - Se o ex-Prefeito do
Município de Pará de Minas autorizou a restituição do valor do imposto de renda
55
retido na fonte aos servidores públicos, com base em lei municipal, ainda que
presente vício de inconstitucionalidade, não há como afirmar que o Administrador
tenha agido com má-fé, pois as leis têm em seu favor a presunção de
constitucionalidade (Apelação Cível nº 1.0471.04.036498-9/003, 4ª Câmara Cível,
Relator Desembargador Moreira Diniz, julgado em 16 abril 2009, publicado em 28
abril 2009, grifo nosso).
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA - MUNICÍPIO DE PRESIDENTE KUBITSCHEK-
CUMULAÇÃO DE CARGO DE PREFEITO COM MÉDICO CONTRATADO DE
OUTRO MUNICÍPIO - PERCEPÇÃO APENAS DOS VENCIMENTOS DO
CARGO DE PROFISSIONAL DA SAÚDE - ILEGALIDADE CONFIGURADA -
CONTRATO NULO - SANÇÕES - PROPORCIONALIDADE - AUSÊNCIA DE
DOLO E DANO AO ERÁRIO - CRITÉRIO DISCRICIONÁRIO DO JULGADOR - PRECEDENTES.
- O ato de improbidade administrativa se caracteriza pela lesão a bens e valores
jurídicos protegidos pela ordem jurídica, de modo a resguardar a moralidade, a
honestidade e a legalidade da atuação dos agentes da Administração Pública.
- Demonstrada a prática do ato de improbidade administrativa, em razão da
cumulação indevida de cargos públicos, mas sem a percepção de remuneração em
um deles, cabe ao Magistrado, observando a proporcionalidade, a fixação isolada ou
cumulativa das penas previstas no art. 12 da Lei 8492/92, adequando-as à finalidade
da norma.
- Restando comprovado que o réu prestou serviços de maneira efetiva e diante
da inexistência de culpa grave, dolo ou má-fé, frente ao princípio constitucional
da proporcionalidade, no caso concreto, deve-se rejeitar o pedido de
condenação de ressarcimento ao erário.
- Precedentes do STJ.
- Recurso não provido (Apelação Cível nº 1.0216.09.061470-4/001, 4ª Câmara
Cível, Relatora Desembargadora Heloisa Combat, julgado 30 agosto 2012,
publicado em 04 de setembro de 2012, grifo nosso).
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE
IMPROBIDADE - MAGISTRADO - ATUAÇÃO NEGLIGENTE - LESÃO AO
ERÁRIO - ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL - DECISÃO
CRIMINAL QUE CONCLUIU PELA NEGATIVA DE AUTORIA, AFASTANDO
A NEGLIGÊNCIA IMPUTADA AO AGENTE - COISA JULGADA -
VINCULAÇÃO DO JUÍZO CÍVEL - ART. 935 DO CC/02 - MERO DESCUIDO -
INOCORRÊNCIA DE CULPA GRAVE - IMPROBIDADE INEXISTENTE -
REJEIÇÃO DA DENÚNCIA QUANTO AO SEGUNDO RÉU - RECURSO NÃO
PROVIDO. 1. O procedimento previsto no art. 17, § 8º, da Lei 8.429/92, introduzido pela
Medida Provisória n. 2.225/2001, inovou a Lei de Improbidade Administrativa,
possibilitando a rejeição de plano do pedido inicial, não apenas quando o Juiz
verificar a ausência de condição da ação ou a ocorrência de pressuposto processual
negativo, mas também quando se convencer da inexistência do ato de improbidade
ou da improcedência da ação.
2. O julgamento proferido pelo Órgão Especial no inquérito policial de n.
1.0000.09.502432-9/000, ao impedir o prosseguimento das investigações por
peculato culposo em relação ao segundo réu, decidiu pela ausência de autoria,
vinculando, por conseguinte, o juízo cível, nos termos do art. 935 do CC/02.
3. Ainda que se admita a figura culposa nos atos que impliquem lesão ao erário,
em virtude da gravidade das sanções impostas pela Lei n. 8.429/92, a culpa do
agente deve evidenciar-se como grave, demonstrando sua inabilitação para o
exercício da função pública.
4. Simples descuido não configura improbidade administrativa, mormente
quando escusável pelas circunstâncias em que se desenrolaram os fatos. 5. Não sendo atribuída conduta culposa grave ao recorrido, capaz de tipificar ato
ímprobo, deve ser mantida a rejeição da inicial quanto ao mesmo.
56
6. Recurso não provido (Agravo de Instrumento 1.0525.10.012171-0/003, 5ª Câmara
Cível, julgado em 25 abril 2013, publicado em 13 maio 2013, grifo nosso).
Por fim, insta ressaltar que na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal não se
encontra nenhum julgado onde a referida matéria tenha sido debatida, permanecendo a Corte
Constitucional silente quanto à constitucionalidade da modalidade culposa. Naira Senna
(2010, p. 36) registra que em determinada decisão, o Ministro Cezar Peluso haveria sinalizado
no sentido de que o dolo ou a má-fé constitui requisito básico para configuração do ato
ímprobo. No caso, discutia-se a incidência do artigo 11 da Lei nº 8.429/1992, assim constando
no acórdão:
[...] In casu, não restou comprovado nos autos que o apelado teve a intenção e
vontade consciente em violar os princípios básicos da administração pública citados
pelo apelante (legalidade, moralidade e impessoalidade). Ao contrário, não verifico a
ocorrência de violação a nenhum princípio da administração (Recurso
Extraordinário nº 589.784/MS, Relator Ministro Cezar Peluso, julgado em 23 janeiro
2010, publicado em 18 fevereiro 2010 apud SENNA, 2010, p. 27).
No entanto, considerando que os atos de improbidade previstos no artigo 11 da Lei nº
8.429/1992 só admitem a modalidade dolosa, conforme já exposto nesse trabalho, entende-se
que o julgado acima é insuficiente para descobrir qual orientação o Supremo Tribunal Federal
está mais inclinado a adotar, no que se refere à modalidade culposa dos atos ímprobos.
Uma vez expostos os posicionamentos jurisprudenciais sobre a matéria, cumpre
averiguar quais as alternativas possíveis no ordenamento jurídico pátrio para que seja
uniformizado o entendimento quanto à constitucionalidade da modalidade culposa nos atos de
improbidade administrativa, a fim de proporcionar maior segurança jurídica ao aplicador da
Lei nº 8.429/1992, e principalmente aos agentes públicos, evitando que sejam demandados em
ações visivelmente improcedentes somente por existir previsão normativa para
responsabilização a título de culpa.
57
6 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOBRE OS ARTIGOS 5º E 10 DA
LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Como última tarefa a ser realizada neste trabalho, está a propositura de soluções para o
deslinde do problema da constitucionalidade da modalidade culposa dos atos de improbidade
administrativa. Nesse ponto, importante descrever o texto normativo dos artigos 5º e 10,
caput, da Lei nº 8.429/1992, in verbis:
Art. 5° Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou
culposa, do agente ou de terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano.
Art. 10 Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário
qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio,
apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades
referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: [...].
O processo de aferição da constitucionalidade de uma norma jurídica consiste em
verificar sua adequação às regras e princípios previstos na Constituição Federal (LENZA,
2008, p. 117). O Ministro Gilmar Ferreira Mendes, além de ressaltar que os conceitos de
constitucionalidade ou inconstitucionalidade aplicam-se somente aos atos ou omissões dos
Poderes Públicos, afirma que a questão não se reduz a ideia de conformidade ou
inconformidade com a Lei Maior, manifestando o seguinte pensamento:
Destarte, os conceitos de constitucionalidade ou inconstitucionalidade não traduzem,
tão-somente, a idéia de conformidade ou inconformidade com a Constituição. Assim, tomando de empréstimo a expressão de Bittar, dir-se-á que constitucional
será o ato que não incorrer em sanção, por ter sido criado por autoridade
constitucionalmente competente e sob a forma que a Constituição prescreve para sua
perfeita integração; inconstitucional será o ato que a incorrer em sanção – de
nulidade ou anulabilidade – por desconformidade com o ordenamento constitucional
(MENDES et al, 2009, p. 1054).
O controle de constitucionalidade poderá ocorrer de forma concentrada ou difusa. O
controle concentrado se dá mediante a provocação direta de um tribunal específico, no caso o
Supremo Tribunal Federal, para que se manifeste sobre a constitucionalidade de lei ou ato
normativo (LENZA, 2008, p. 157). Por sua vez, o controle difuso, também conhecido como
controle aberto ou incidental, dar-se-á na apreciação de um caso concreto, onde a discussão
sobre constitucionalidade é acessória ao mérito da lide, vale dizer, não é o exame da
constitucionalidade o objeto primordial da ação, surgindo como uma questão prejudicial que
58
deve ser deve ser decidida (MENDES et al, 2009, p. 1055) para definir o direito das partes.
Além disso, o controle difuso pode ser realizado por qualquer juízo ou tribunal.
A partir disso, a primeira alternativa para definir a constitucionalidade modalidade
culposa dos atos de improbidade administrativa dar-se-á por meio do uso do controle
concentrado, mediante o ajuizamento de uma ação direta de inconstitucionalidade ou uma
ação declaratória de constitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal, suscitando a
controvérsia doutrinária e a instabilidade das decisões jurisprudenciais acerca do tema. A
diferença entre elas está no fato que na primeira o objetivo do autor é obter a invalidação da
lei em razão de sua inconstitucionalidade, ao passo que na segunda a finalidade é afirmar a
constitucionalidade da norma, no intuito de afastar a insegurança jurídica ou o estado de
dúvida sobre a validade da lei (MORAES, 2010, p. 737-779). Representam, portanto, dois
lados de uma mesma moeda, sendo o procedimento de ambas disciplinado pela Lei nº
9.868/1999.
Sendo assim, por intermédio da ação direta de inconstitucionalidade o pedido será a
declaração de que a modalidade culposa dos atos ímprobos viola o artigo 37, § 4º, da
Constituição Federal, sob o argumento principal de que a improbidade administrativa só se
verifica na conduta praticada com dolo, qualificada pela má-fé ou desonestidade do agente
público, havendo o legislador infraconstitucional desrespeitado o princípio da proibição de
excesso ao prever a culpa como elemento subjetivo dos atos tipificados no artigo 10 da Lei nº
8.429/1992.
Por sua vez, a ação declaratória de constitucionalidade seria formulada sobre a
premissa de que o sancionamento dos atos ímprobos culposos não encontra óbice na
Constituição Federal, bastando que a modalidade culposa refira-se à espécie culpa grave ou
gravíssima, incidindo os efeitos da Lei nº 8.429/1992 nos comportamentos que importam em
ineficiência funcional intolerável e que causem lesão ao erário.
Nessa lógica, o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o pedido de qualquer das duas
ações, deve conferir interpretação conforme a Constituição aos artigos 5º e 10 da Lei de
Improbidade Administrativa, para assentar a constitucionalidade ou inconstitucionalidade
desses dispositivos. O instituto da interpretação conforme é tanto um princípio hermenêutico,
como uma técnica de controle de constitucionalidade, descrito nas lições de Luís Roberto
Barroso nas seguintes palavras:
A interpretação conforme a Constituição pode ser apreciada como um princípio de
interpretação e como uma técnica de controle de constitucionalidade. Como
princípio de interpretação, decorre ele da confluência dos dois princípios anteriores:
59
o da supremacia da Constituição e o do presunção de constitucionalidade. Com base
na interpretação conforme a Constituição, o aplicador da norma infraconstitucional,
dentre mais de uma interpretação possível, deverá buscar aquela que a compatibilize
com a Constituição, ainda que não seja a que mais obviamente decorra do seu texto.
Como técnica de controle de constitucionalidade, a interpretação conforme a
Constituição consiste na expressa exclusão de uma determinada interpretação da
norma, uma ação “corretiva” que importa em declaração de inconstitucionalidade
sem redução de texto (Id., 2004, p. 371-372).
Há que se ressaltar que a interpretação conforme a Constituição não está livre de
limitações, sendo admissível somente quando respeitar os limites semânticos do texto, não
resultando em afronta à expressão literal do texto ou alteração do seu significado, fatos que
modificariam substancialmente a concepção original do legislador infraconstitucional
(MENDES et al, 2009, p. 1307).
A segunda alternativa para solucionar o problema ora apresentado, seria a apreciação
da constitucionalidade dos artigos 5º e 10 da Lei nº 8.429/1992 em sede de controle difuso,
possibilidade que permitiria ao próprio Superior Tribunal de Justiça elidir a divergência
jurisprudencial nele existente, bem como aos demais Tribunais de Justiça dos Estados onde
haja controvérsia sobre o tema da modalidade culposa. Para tanto, é igualmente válido e
necessário o uso do instituto da interpretação conforme a Constituição, nos termos acima
apresentado.
Como visto, o ordenamento jurídico confere instrumentos adequados para por fim ao
debate sobre a constitucionalidade da modalidade culposa dos atos de improbidade
administrativa, não havendo motivos para postergar a solução da questão, haja vista a
insegurança jurídica e a aplicação desarrazoada dos artigos 5º e 10 da Lei nº 8.429/1992 são
fatores que prejudicam a eficácia da Lei de Improbidade Administrativa.
60
6 CONCLUSÃO
Extrai-se do desenvolvimento desse trabalho a conclusão de que o combate à
improbidade administrativa, por meio da proteção conferida pela Lei nº 8.249/1992, não pode
destoar dos limites implícitos na própria Constituição Federal. Isso significa dizer que,
embora a nova ordem jurídica inaugurada com a Carta de 1988 seja incisiva quanto à
necessidade de se coibir qualquer abuso do erário público, prevendo graves sanções para os
atos de improbidade (art. 37, § 4º), tal desiderato não pode se transformar numa sombra a
pairar sobre os agentes públicos, que certamente ficarão acuados de adotar decisões
inovadoras na gestão pública, com medo de que, caso venham a ocasionar resultados
insatisfatórios, sejam taxados de ímprobos.
Para tanto, primeiramente é necessário que se estabeleça limites ao conceito de ato
ímprobo, mas é claro, sem a pretensão de abarcar nesse conceito todas as hipóteses que
podem ocorrer no mundo dos fatos. Esse objetivo deve ser buscado, essencialmente pela
doutrina administrativista, com o auxílio da jurisprudência dos tribunais pátrios sobre a
matéria.
Nessa lógica, o presente trabalho procurou desenvolver uma pesquisa séria a respeito
da interpretação dada aos artigos 5º e 10 da Lei nº 8.429/1992, procurando averiguar se a
modalidade culposa dos atos de improbidade seria constitucional. O precitado problema ainda
não foi pacificado pelos tribunais superiores, e a doutrina ainda apresenta divergências sobre
o assunto, sendo que nessa monografia filia-se ao entendimento de que só haverá improbidade
culposa quando o agente público incidir em culpa grave ou gravíssima no exercício de suas
atribuições, somados os elementos da má-fé e da desonestidade, combinação que deságua na
violação dos princípios da Administração Pública, no dano ao erário e no intolerável grau de
ineficiência funcional. Logo, será possível sustentar a punição do agente público a título de
culpa, mas desde que se estabeleça uma escala dessas atividades culposas, não estando
qualquer tipo de negligência, imprudência ou imperícia sujeitas à Lei de Improbidade
Administrativa, e, ainda, devendo-se observar o princípio da proporcionalidade no momento
de aplicação das sanções.
É certo que o controle de constitucionalidade sobre os referidos dispositivos legais
poderia solucionar de vez a questão, seja por meio do ajuizamento de uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade ou de uma Ação Declaratória de Constitucionalidade, ou, ainda, em
sede de controle difuso, utilizando-se, em qualquer dessas hipóteses, o instituto da
interpretação conforme a Constituição.
61
Urge que o Judiciário se manifeste sobre a matéria, haja vista a necessidade de
segurança jurídica quanto à interpretação conferida aos atos culposos previstos na Lei de
Improbidade Administrativa. Afinal, não obstante a tutela da probidade administrativa revele-
se como principal instrumento para a construção de uma Administração Pública ética e
eficiente, verdadeiro direito subjetivo de toda a sociedade, o combate às práticas desonestas e
desidiosas não pode sobrepor-se aos direitos fundamentais dos agentes públicos sujeitos às
disposições da Lei nº 8.429/1992, devendo-se harmonizar ambas as finalidades visadas pela
Constituição Federal, para que não se cometa abusos na luta contra a improbidade
administrativa, empreitada de extrema relevância para a consolidação do Estado de
Democrático de Direito.
62
REFERÊNCIAS
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dogmática constitucional transformadora. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
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68
ANEXO A – Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992.
LEI Nº 8.429, DE 2 DE JUNHO DE 1992.
Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes
públicos nos casos de enriquecimento ilícito no
exercício de mandato, cargo, emprego ou função
na administração pública direta, indireta ou
fundacional e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu
sanciono a seguinte lei:
CAPÍTULO I
Das Disposições Gerais
Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não,
contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao
patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou
concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos
na forma desta lei.
Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade
praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo,
fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário
haja concorrido ou concorra com menos de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita
anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a
contribuição dos cofres públicos.
Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda
que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou
qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas
entidades mencionadas no artigo anterior.
Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não
sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se
beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.
69
Art. 4° Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela
estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no
trato dos assuntos que lhe são afetos.
Art. 5° Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa,
do agente ou de terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano.
Art. 6° No caso de enriquecimento ilícito, perderá o agente público ou terceiro
beneficiário os bens ou valores acrescidos ao seu patrimônio.
Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar
enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito
representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.
Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre
bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial
resultante do enriquecimento ilícito.
Art. 8° O sucessor daquele que causar lesão ao patrimônio público ou se enriquecer
ilicitamente está sujeito às cominações desta lei até o limite do valor da herança.
CAPÍTULO II
Dos Atos de Improbidade Administrativa
Seção I
Dos Atos de Improbidade Administrativa que Importam Enriquecimento Ilícito
Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito
auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo,
mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e
notadamente:
I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra
vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou
presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por
ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público;
II - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a aquisição, permuta
ou locação de bem móvel ou imóvel, ou a contratação de serviços pelas entidades referidas no
art. 1° por preço superior ao valor de mercado;
70
III - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a alienação, permuta
ou locação de bem público ou o fornecimento de serviço por ente estatal por preço inferior ao
valor de mercado;
IV - utilizar, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou
material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades
mencionadas no art. 1° desta lei, bem como o trabalho de servidores públicos, empregados ou
terceiros contratados por essas entidades;
V - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para tolerar a
exploração ou a prática de jogos de azar, de lenocínio, de narcotráfico, de contrabando, de
usura ou de qualquer outra atividade ilícita, ou aceitar promessa de tal vantagem;
VI - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer
declaração falsa sobre medição ou avaliação em obras públicas ou qualquer outro serviço, ou
sobre quantidade, peso, medida, qualidade ou característica de mercadorias ou bens
fornecidos a qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;
VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou
função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do
patrimônio ou à renda do agente público;
VIII - aceitar emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria ou assessoramento
para pessoa física ou jurídica que tenha interesse suscetível de ser atingido ou amparado por
ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público, durante a atividade;
IX - perceber vantagem econômica para intermediar a liberação ou aplicação de verba
pública de qualquer natureza;
X - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indiretamente, para
omitir ato de ofício, providência ou declaração a que esteja obrigado;
XI - incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores
integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei;
XII - usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo
patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei.
Seção II
Dos Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuízo ao Erário
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer
ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação,
71
malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta
lei, e notadamente:
I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio
particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do
acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;
II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas,
verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º
desta lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;
III - doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de
fins educativos ou assistências, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de qualquer das
entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das formalidades legais e
regulamentares aplicáveis à espécie;
IV - permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem integrante do
patrimônio de qualquer das entidades referidas no art. 1º desta lei, ou ainda a prestação de
serviço por parte delas, por preço inferior ao de mercado;
V - permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço
superior ao de mercado;
VI - realizar operação financeira sem observância das normas legais e regulamentares ou
aceitar garantia insuficiente ou inidônea;
VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades
legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;
VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;
IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento;
X - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz
respeito à conservação do patrimônio público;
XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de
qualquer forma para a sua aplicação irregular;
XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente;
XIII - permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas,
equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer
das entidades mencionadas no art. 1° desta lei, bem como o trabalho de servidor público,
empregados ou terceiros contratados por essas entidades.
72
XIV – celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a prestação de
serviços públicos por meio da gestão associada sem observar as formalidades previstas na
lei; (Incluído pela Lei nº 11.107, de 2005)
XV – celebrar contrato de rateio de consórcio público sem suficiente e prévia dotação
orçamentária, ou sem observar as formalidades previstas na lei. (Incluído pela Lei nº 11.107,
de 2005)
Seção III
Dos Atos de Improbidade Administrativa que Atentam Contra os Princípios da Administração
Pública
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da
administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade,
imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto,
na regra de competência;
II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva
permanecer em segredo;
IV - negar publicidade aos atos oficiais;
V - frustrar a licitude de concurso público;
VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;
VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva
divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de
mercadoria, bem ou serviço.
CAPÍTULO III
Das Penas
Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na
legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes
cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade
do fato: (Redação dada pela Lei nº 12.120, de 2009).
73
I - na hipótese do art. 9°, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao
patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública,
suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes
o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por
intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;
II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores
acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função
pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até
duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por
intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;
III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função
pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até
cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder
Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente,
ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três
anos.
Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a
extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.
CAPÍTULO IV
Da Declaração de Bens
Art. 13. A posse e o exercício de agente público ficam condicionados à apresentação de
declaração dos bens e valores que compõem o seu patrimônio privado, a fim de ser arquivada
no serviço de pessoal competente. (Regulamento) (Regulamento)
§ 1° A declaração compreenderá imóveis, móveis, semoventes, dinheiro, títulos, ações, e
qualquer outra espécie de bens e valores patrimoniais, localizado no País ou no exterior, e,
quando for o caso, abrangerá os bens e valores patrimoniais do cônjuge ou companheiro, dos
filhos e de outras pessoas que vivam sob a dependência econômica do declarante, excluídos
apenas os objetos e utensílios de uso doméstico.
§ 2º A declaração de bens será anualmente atualizada e na data em que o agente público
deixar o exercício do mandato, cargo, emprego ou função.
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§ 3º Será punido com a pena de demissão, a bem do serviço público, sem prejuízo de
outras sanções cabíveis, o agente público que se recusar a prestar declaração dos bens, dentro
do prazo determinado, ou que a prestar falsa.
§ 4º O declarante, a seu critério, poderá entregar cópia da declaração anual de bens
apresentada à Delegacia da Receita Federal na conformidade da legislação do Imposto sobre a
Renda e proventos de qualquer natureza, com as necessárias atualizações, para suprir a
exigência contida no caput e no § 2° deste artigo .
CAPÍTULO V
Do Procedimento Administrativo e do Processo Judicial
Art. 14. Qualquer pessoa poderá representar à autoridade administrativa competente para
que seja instaurada investigação destinada a apurar a prática de ato de improbidade.
§ 1º A representação, que será escrita ou reduzida a termo e assinada, conterá a
qualificação do representante, as informações sobre o fato e sua autoria e a indicação das
provas de que tenha conhecimento.
§ 2º A autoridade administrativa rejeitará a representação, em despacho fundamentado,
se esta não contiver as formalidades estabelecidas no § 1º deste artigo. A rejeição não impede
a representação ao Ministério Público, nos termos do art. 22 desta lei.
§ 3º Atendidos os requisitos da representação, a autoridade determinará a imediata
apuração dos fatos que, em se tratando de servidores federais, será processada na forma
prevista nos arts. 148 a 182 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990 e, em se tratando de
servidor militar, de acordo com os respectivos regulamentos disciplinares.
Art. 15. A comissão processante dará conhecimento ao Ministério Público e ao Tribunal
ou Conselho de Contas da existência de procedimento administrativo para apurar a prática de
ato de improbidade.
Parágrafo único. O Ministério Público ou Tribunal ou Conselho de Contas poderá, a
requerimento, designar representante para acompanhar o procedimento administrativo.
Art. 16. Havendo fundados indícios de responsabilidade, a comissão representará ao
Ministério Público ou à procuradoria do órgão para que requeira ao juízo competente a
decretação do seqüestro dos bens do agente ou terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou
causado dano ao patrimônio público.
§ 1º O pedido de seqüestro será processado de acordo com o disposto nos arts. 822 e 825
do Código de Processo Civil.
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§ 2° Quando for o caso, o pedido incluirá a investigação, o exame e o bloqueio de bens,
contas bancárias e aplicações financeiras mantidas pelo indiciado no exterior, nos termos da
lei e dos tratados internacionais.
Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público
ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.
§ 1º É vedada a transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput.
§ 2º A Fazenda Pública, quando for o caso, promoverá as ações necessárias à
complementação do ressarcimento do patrimônio público.
§ 3o No caso de a ação principal ter sido proposta pelo Ministério Público, aplica-se, no
que couber, o disposto no § 3o do art. 6
o da Lei n
o 4.717, de 29 de junho de 1965.(Redação
dada pela Lei nº 9.366, de 1996)
§ 4º O Ministério Público, se não intervir no processo como parte, atuará
obrigatoriamente, como fiscal da lei, sob pena de nulidade.
§ 5o A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações
posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto. (Incluído
pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)
§ 6o A ação será instruída com documentos ou justificação que contenham indícios
suficientes da existência do ato de improbidade ou com razões fundamentadas da
impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas, observada a legislação vigente,
inclusive as disposições inscritas nos arts. 16 a 18 do Código de Processo Civil. (Incluído pela
Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)
§ 7o Estando a inicial em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação
do requerido, para oferecer manifestação por escrito, que poderá ser instruída com
documentos e justificações, dentro do prazo de quinze dias. (Incluído pela Medida Provisória
nº 2.225-45, de 2001)
§ 8o Recebida a manifestação, o juiz, no prazo de trinta dias, em decisão fundamentada,
rejeitará a ação, se convencido da inexistência do ato de improbidade, da improcedência da
ação ou da inadequação da via eleita. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)
§ 9o Recebida a petição inicial, será o réu citado para apresentar contestação. (Incluído
pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)
§ 10. Da decisão que receber a petição inicial, caberá agravo de instrumento. (Incluído
pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)
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§ 11. Em qualquer fase do processo, reconhecida a inadequação da ação de improbidade,
o juiz extinguirá o processo sem julgamento do mérito. (Incluído pela Medida Provisória nº
2.225-45, de 2001)
§ 12. Aplica-se aos depoimentos ou inquirições realizadas nos processos regidos por
esta Lei o disposto no art. 221, caput e § 1o, do Código de Processo Penal. (Incluído pela
Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)
Art. 18. A sentença que julgar procedente ação civil de reparação de dano ou decretar a
perda dos bens havidos ilicitamente determinará o pagamento ou a reversão dos bens,
conforme o caso, em favor da pessoa jurídica prejudicada pelo ilícito.
CAPÍTULO VI
Das Disposições Penais
Art. 19. Constitui crime a representação por ato de improbidade contra agente público ou
terceiro beneficiário, quando o autor da denúncia o sabe inocente.
Pena: detenção de seis a dez meses e multa.
Parágrafo único. Além da sanção penal, o denunciante está sujeito a indenizar o
denunciado pelos danos materiais, morais ou à imagem que houver provocado.
Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam
com o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o
afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da
remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual.
Art. 21. A aplicação das sanções previstas nesta lei independe:
I - da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público, salvo quanto à pena de
ressarcimento; (Redação dada pela Lei nº 12.120, de 2009).
II - da aprovação ou rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal
ou Conselho de Contas.
Art. 22. Para apurar qualquer ilícito previsto nesta lei, o Ministério Público, de ofício, a
requerimento de autoridade administrativa ou mediante representação formulada de acordo
com o disposto no art. 14, poderá requisitar a instauração de inquérito policial ou
procedimento administrativo.
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CAPÍTULO VII
Da Prescrição
Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser
propostas:
I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de
função de confiança;
II - dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares
puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou
emprego.
CAPÍTULO VIII
Das Disposições Finais
Art. 24. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 25. Ficam revogadas as Leis n°s 3.164, de 1° de junho de 1957, e 3.502, de 21 de
dezembro de 1958 e demais disposições em contrário.
Rio de Janeiro, 2 de junho de 1992; 171° da Independência e 104° da República.
FERNANDO COLLOR
Célio Borja
Este texto não substitui o publicado no DOU de 3.6.1992
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