Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade...

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FACULDADE TRÊS PONTAS - FATEPS DIREITO DIMITRI ANDRADE BARBOSA A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MODALIDADE CULPOSA DOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Três Pontas 2013

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FACULDADE TRÊS PONTAS - FATEPS

DIREITO

DIMITRI ANDRADE BARBOSA

A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MODALIDADE CULPOSA DOS ATOS DE

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Três Pontas

2013

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DIMITRI ANDRADE BARBOSA

A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MODALIDADE CULPOSA DOS ATOS DE

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Monografia apresentada ao curso de Direito da

Faculdade Três Pontas - FATEPS como pré-requisito

para obtenção do grau de bacharel, sob orientação do

Prof. Esp. Marcelo Figueiredo.

Três Pontas

2013

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DIMITRI ANDRADE BARBOSA

A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MODALIDADE CULPOSA DOS ATOS DE

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Monografia apresentada ao curso de Direito da

Faculdade Três Pontas, como pré-requisito para

obtenção do grau de bacharel pela Banca Examinadora

composta pelos membros:

Aprovado em 28 / 11 / 2013.

___________________________________________________________

Prof. Esp. Marcelo Figueiredo

___________________________________________________________

Prof. Me. Evandro Marcelo dos Santos

___________________________________________________________

Prof. Me. João Victor Mendes de Gomes e Mendonça

OBS.:

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Dedico este trabalho aos meus avós Sebastião

e Imaculada. A ele, por ser o grande Mestre

que me acompanha, ensinando-me a

importância do bom senso e da racionalidade,

do amor pelo debate, da busca incessante do

conhecimento, do valor da honra, da família e

do desenvolvimento de um espírito público. A

ela, por mostrar a força imensurável que se

pode encontrar no Sagrado e sempre interceder

por mim junto a Deus.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos os professores que nos

últimos cinco anos me acompanharam nessa

jornada, em especial a três deles: ao Prof.

Marco Antônio Azze, por mostrar que é

necessário libertar nosso pensamento das

amarras que o mundo nos impõe; ao Prof.

Leiner Marchetti Pereira, por me iniciar nos

estudos do direito público e por me confiar a

responsabilidade de ser seu estagiário, desafio

sem o qual minha preparação profissional não

seria a mesma; e, por último mas não menos

importante, ao Prof. Marcelo Figueiredo, pelo

significativo apoio e orientação na construção

desse trabalho acadêmico, resultado de estudo

e reflexão conjunta.

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“Sei que quem rouba um, é moleque

Aos dez, promovido a ladrão

Se rouba 100 já passou de doutor

E 10 mil, é figura nacional

E se rouba 80 milhões...

É a diplomacia internacional”

Tom Zé

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RESUMO

Este trabalho apresenta um estudo sobre a constitucionalidade dos atos de improbidade

administrativa praticados na modalidade culposa. A pesquisa inicia-se pela busca do conceito

jurídico de improbidade administrativa, relacionando o tema a assuntos correlatos como a

corrupção, a probidade e a moralidade administrativa, e a má gestão pública. Perpassa por

uma análise histórica do tratamento legislativo conferido à improbidade administrativa, até o

advento da Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992. O núcleo da pesquisa encontra-se no estudo

dos artigos 5º e 10 da Lei de Improbidade Administrativa, com o estudo de posicionamentos

doutrinários e jurisprudenciais sobre a constitucionalidade dos atos de improbidade praticados

na modalidade culposa que causam lesão ao erário. Propõe-se a solução da controvérsia por

meio dos instrumentos de controle de constitucionalidade das normas jurídicas, como a Ação

Direta de Inconstitucionalidade, a Ação Declaratória de Constitucionalidade, bem como pelo

uso da interpretação conforme a Constituição. Por fim, afirma-se que a pacificação do tema é

de extrema relevância para a correta aplicação da Lei de Improbidade Administrativa,

trazendo, assim, avanços para a afirmação de uma ética no setor público.

Palavras-chave: Direito Público. Improbidade administrativa. Modalidade culposa. Controle

de constitucionalidade.

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ABSTRACT

This paper presents a study of the constitutionality of acts of administrative

misconduct committed in guilty modality. The research begins by seeking the legal concept of

administrative misconduct, relating to the subject matters related to corruption,

administrative probity and morality, and public mismanagement. Permeates a historical

analysis of legislative treatment given to administrative misconduct, until the enactment of

Law nº 8.429 of 02 June 1992. The core of the research is the study of Articles 5 and 10 of the

Law on Administrative Misconduct with the study of doctrinal and jurisprudential positions

on the constitutionality of the acts of misconduct committed in guilty modality that cause

injury to the public treasury. It is proposed to settle the dispute by means of the control of

constitutionality of legal norms, such as the direct action of unconstitutionality, the Direct

Action of Constitutionality, as well as the use of interpretation according to the Constitution.

Finally, it is stated that the pacification of the subject is very important for the correct

application of the Law of Administrative Misconduct, thus bringing advances to the statement

of ethics in the public sector.

Keywords: Public Law. Administrative misconduct. Guilty modality. Control of

constitutionality.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 09

2 CONCEITO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ............................................. 11

2.1 O fenômeno da corrupção ............................................................................................ 12

2.2 Probidade e moralidade administrativa ...................................................................... 17

2.3 Má gestão pública e improbidade ................................................................................ 21

2.4 Definição de improbidade administrativa ................................................................... 24

3 EVOLUÇÃO NORMATIVA DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA .................. 26

3.1 As Constituições de 1824 a 1969. ................................................................................. 26

3.2 A Lei nº 3.164, de 01 de junho de 1957 – Lei Pitombo-Godói Ilha. ............................ 29

3.3 A Lei nº 3.502, de 21 de dezembro de 1958 – Lei Bilac Pinto. .................................... 29

3.4 A Constituição de 1988 - Artigo 37, parágrafo 4º. ...................................................... 31

3.5 A Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992 – Lei de Improbidade Administrativa.......... 32

4 ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ........................................................ 34

4.1 Aspectos gerais ............................................................................................................. 34

4.1.1 Bem jurídico protegido ................................................................................................ 34

4.1.2 Sujeito ativo ................................................................................................................ 34

4.1.3 Sujeito passivo ............................................................................................................ 36

4.1.4 Conduta e nexo de causalidade .................................................................................... 37

4.1.5 Elemento subjetivo ...................................................................................................... 38

4.2 Atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito .............. 40

4.3 Atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário ........................ 41

4.4 Atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da

Administração Pública ....................................................................................................... 41

5 A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MODALIDADE CULPOSA DOS ATOS DE

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ............................................................................ 44

5.1 Distinções entre dolo e culpa ........................................................................................ 44

5.2 Posicionamentos doutrinários ...................................................................................... 46

5.3 Posicionamentos jurisprudenciais ............................................................................... 51

6 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOBRE OS ARTIGOS 5º E 10 DA

LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA .............................................................. 57

7 CONCLUSÃO ................................................................................................................. 60

REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 62

ANEXO A – Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992 ............................................................ 68

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1 INTRODUÇÃO

A sociedade brasileira, em seus diversos segmentos, vive um momento de intensa

discussão e preocupação com a ética pública, tão visivelmente abalada por casos de corrupção

deflagrados por indivíduos e empresas, na maioria das vezes em conluio com agentes

públicos, que se utilizam da máquina pública para satisfazer interesses próprios e, assim,

enriquecer-se ilicitamente à custa do erário. Nesse cenário conturbado surge a figura jurídica

da improbidade administrativa, que, embora de difícil conceituação, pode ser entendida, em

síntese, como uma conduta desonesta, corrupta, norteada pela má-fé e com a finalidade de

utilizar o patrimônio público em benefício próprio ou de terceiros, sempre de forma escusa e

ilícita, o que termina por lesar o erário e violar os princípios constitucionais regentes da

Administração Pública. O constituinte de 1988, atento aos seus malefícios e à imperiosa

necessidade de combatê-la, cuidou de inserir na Constituição Cidadã, no § 4º do artigo 37, a

previsão de que a prática de atos de improbidade administrativa importaria na suspensão dos

direitos políticos, na perda da função pública, na indisponibilidade dos bens e no

ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal

cabível. Nessa esteira, para dar eficácia ao comando constitucional e regulamentar a matéria

em seus diversos aspectos, foi elaborada a Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992, denominada

Lei de Improbidade Administrativa.

Esse diploma normativo, porém, não esteve imune à críticas, colocando-se em xeque

até mesmo a constitucionalidade de alguns de seus dispositivos, dentre os quais retira-se o

objeto de pesquisa do presente trabalho, qual seja, a constitucionalidade da modalidade

culposa dos atos de improbidade administrativa. Prevista em seus artigos 5º e 10, a Lei de

Improbidade Administrativa permite que o agente causador de lesão ao patrimônio público

seja responsabilizado a título de dolo ou culpa. A controvérsia instala-se a partir do momento

em que se questiona a possibilidade de ser tratado como ímprobo aquele agente público que

age por negligência, imprudência ou imperícia no trato da coisa pública. A partir disso, a

pesquisa ora desenvolvida inicia-se com a discussão sobre o conceito de improbidade

administrativa e suas relações com temas afetos, tal qual a corrupção, a probidade e a

moralidade administrativa, e a má gestão pública. O segundo capítulo ocupa-se do estudo da

evolução normativa da improbidade administrativa no ordenamento jurídico pátrio,

analisando a proteção jurídica conferida à probidade desde a Constituição do Império até a

presente data. Por sua vez, o terceiro capítulo cuida da análise geral dos atos de improbidade

administrativa descritos na Lei nº 8.429/1992, a saber: atos que importam enriquecimento

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ilícito, atos que causam prejuízo ao erário e os atos que atentam contra os princípios da

administração pública. Na quarta parte do estudo, atinge-se o núcleo do debate, voltando as

atenções aos artigos 5º e 10 da Lei de Improbidade Administrativa, dispositivo que traz

expressamente a previsão de responsabilização do agente mediante a modalidade culposa.

Com vistas aos diversos posicionamentos trazidos pela doutrina e ao entendimento externado

pela jurisprudência, será feita uma análise constitucional do referido artigo para se concluir

pela constitucionalidade, ou não, da tipificação de atos culposos. Por fim, será feito um estudo

sobre as alternativas de solução para o problema, abordando a possibilidade e as formas de

controle de constitucionalidade que podem ser utilizadas para o seu deslinde.

Destarte, espera-se ao final do trabalho proporcionar um intenso debate sobre o tema

escolhido, contribuindo para a pesquisa jurídica e para o avanço do combate à improbidade

administrativa que assola o ambiente público.

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2 CONCEITO DE IMPROBIDADE ADMISTRATIVA

Definir um conceito jurídico para o fenômeno da improbidade administrativa é tarefa

primordial para identificar o objeto da presente pesquisa, tracejando as características

principais do instituto. De início, ressalta-se que o tema ora estudado pode ser entendido

como a face oposta de outro instituto: a probidade administrativa.

Nesse sentido, probidade e improbidade são institutos reversos, sendo o segundo a

violação do primeiro (SOUZA, 2012), daí porque definir o que é probidade administrativa é

igualmente relevante para compreensão da matéria.

O que é certo, e já se pode afirmar desde logo, é que ambas as expressões referem-se à

ética institucional do setor público, referindo-se aos princípios e deveres primordiais que

devem ser observados por aqueles que se relacionam com a Administração Pública.

Para Fábio Medina Osório (2012, p. 2), “o conceito de improbidade administrativa de

improbidade administrativa está ligado a dois pilares fundamentais da ética pública na pós-

modernidade: as noções de grave ineficiência funcional e grave desonestidade”. Partindo das

duas premissas lançadas pelo autor, denota-se que o fenômeno da improbidade emerge do

seio da Administração Pública a partir do mau comportamento dos agentes públicos

responsáveis pela eficiência do aparelho estatal, bem como da inobservância dos deveres de

honestidade e lealdade com as instituições públicas.

Nessa linha, a definição do que seja improbidade administrativa deverá relacionar-se

ao conceito de probidade administrativa, e com outros temas de igual importância para

conclusão deste trabalho, quais sejam: a) presença da corrupção nas relações sociais e

políticas, buscando analisar o fenômeno da corrupção, qual o seu estado na sociedade atual e,

principalmente, qual o grau de semelhança entre os conceitos de corrupção e improbidade; b)

as relações entre a probidade administrativa e o princípio da moralidade administrativa,

apresentando, neste ponto, lições doutrinárias sobre ambos os institutos e o debate sobre qual

deles estaria abrangido pelo outro, bem como a presença destes na Constituição Federal e na

Lei nº 8.429/1992 - Lei de Improbidade Administrativa; c) por fim, apresentar as necessárias

relações entre probidade administrativa e má gestão pública, de modo a evidenciar que a

construção de uma sociedade onde o interesse público é preservado depende da proteção que

o Direito confere ao patrimônio público, por meio de sua boa administração e observância

contínua de seus princípios e regras, sendo a improbidade administrativa um dos resultados

nocivos gerados pela ineficiência funcional dos gestores públicos.

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2.1 O fenômeno da corrupção

A corrupção é, hodiernamente, um dos temas mais debatidos pela sociedade,

considerando a relevância do assunto no contexto estatal, bem como pelos efeitos nocivos por

ela produzidos no tecido social. Numa definição léxica, pode-se conceituar corrupção como

a) adulteração das características originais de algo, desvirtuação, deturpação; b)

ato ou efeito de subornar, vender e comprar vantagens, desviar recursos, fraudar,

furtar em benefício próprio e em prejuízo do Estado ou do bem público; aliciação;

d) degeneração moral; depravação; imoralidade; perversão (IDICIONÁRIO AULETE, 2013).

É certo que a corrupção não é fenômeno recente, estando presente em todas as

sociedades humanas, sendo difícil tarefa precisar em qual época ou local ela se fortaleceu.

Nesse sentido:

Há um caso considerado mais antigo e documentado por alguns historiadores, em

que mencionam o longínquo ano de 271 a.C., em Roma. A informação é a de que um grupo de empresários ao adquirirem navios para uma guerra de Roma contra

Cartago, resolveram, os adquirentes das embarcações, incendiá-las, no meio do Mar

Mediterrâneo, e exigiram do Estado o pagamento do seguro (SOUZA, 2012, p. 40).

Sempre foi uma cultura nefasta em nosso país, como nos países da América do Sul,

ver os homens públicos rompendo a coletividade pelos seus maus tratos à coisa

pública. Ora, a corrupção atrasou muitos povos do nosso continente, que obtiveram

dos políticos o retrocesso e a conduta desleal, em vez de zelarem pela boa e pura

intenção dos seus atos (MATTOS, 2010, p. 27).

No atual quadro global, interessante destacar que o Brasil é considerado como 69º país

menos corrupto, entre 178 países analisados pela Transparência Internacional, respeitável

Organização Não Governamental, resultado que compõe o Índice de Percepção de Corrupção

(IPC) divulgado anualmente pela entidade. Em uma escala de 0 (zero) a 100 (cem) pontos,

onde quanto maior a pontuação, menor índice de corrupção, o Brasil obteve apenas 43

(quarenta e três) pontos no ano de 2012, igualando-se à África do Sul e à República da

Macedônia. Tal situação não é animadora, nem, portanto, confortável (SOUZA, 2012).1

1 Por outro lado, interessante destacar a observação feita por Fábio Medina Osório (2010, p.31), embora sem ignorar a importância e idoneidade dos dados levantados pela Transparência Internacional, afirma que “a

exposição intensa e mercadológica dos fenômenos ligados à corrupção pode projetar efeitos nas pesquisas de

opinião de entidades como a Transparência Internacional, que se baseiam em percepções subjetivas dos

representantes de entidades oficiais e não governamentais, públicas e privadas, situação a ensejar cautelas quanto

à dimensão científica desses levantamentos”.

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Segundo Naira Senna (2010, p. 7-8), o tema comporta uma análise sob dois prismas,

sendo possível estudar a corrupção segundo a visão dos antigos e dos modernos. Nessa linha,

o significado de corrupção nas sociedades antigas estaria associado, no mais das vezes, à

depravação moral, à degeneração dos costumes, mudanças inerentes a qualquer sociedade em

virtude do decurso do tempo; ao passo que a corrupção sob a óptica moderna surge como atos

de violação ao interesse público, mediante a promoção de condutas ilícitas para benefício

próprio.

É certo que o desenvolvimento da corrupção entrelaça-se ao exercício do poder, na

acepção política do termo, vale dizer, poder entendido como relação entre indivíduos

integrantes de uma comunidade, onde esta elege um de seus membros, ou um pequeno grupo,

para representar seus desejos e coordenar seus interesses, a fim de se atingir um ideal maior,

um bem comum (SIMÃO, 2011, p. 32).

Entretanto, em virtude da aparente e ilusória posição de supremacia ocupada pelo

indivíduo ou pelo grupo, esta liderança passa a ser utilizada em benefício próprio,

desvirtuando os poderes a eles outorgados pela comunidade política. Interessante trazer à

colação os comentários tecidos por Naira Senna, ao analisar a questão do poder nas

comunidades políticas segundo a obra “A Política”, de Aristóteles:

Em “A Política”, tem-se a explicação de que existem formas ideais (monarquia,

aristocracia e democracia) nas quais, embora sejam governadas por um, alguns ou

muitos, o bem comum é realizado. As formas deturpadas (tirania, oligarquia e demagogia/oclocracia), por sua vez, não possui o desígnio de satisfazer o bem

comum, mas sim o interesse do tirano, de um pequeno grupo ou da massa (SENNA,

2010, p. 8).

Outra forma de se analisar o fenômeno da corrupção é por meio da relação Estado-

cidadão, partindo do pressuposto que o primeiro só existe enquanto entidade abstrata

construída pelos indivíduos de uma sociedade.

Nessa linha, tem-se que o Estado só se faz presente por meio dos indivíduos investidos

na condição de agente público, vale dizer, pessoas que dão forma concreta ao Estado, por

meio dos atos administrativos. Sendo assim, as raízes da corrupção estariam presentes, num

primeiro plano, nos indivíduos que compõe a sociedade, e, ao adentrarem na Administração

Pública, contaminam a máquina pública com seus vícios, apropriando-se indevidamente dos

bens públicos, fraudando a lei e deturpando o interesse público. Essa ideia já foi apresentada

pela doutrina, a saber:

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Podemos afirmar, dessa forma, que primeiro os membros da sociedade se

corrompem, para, a partir daí, corromperem o Estado. A corrupção do Estado nada

mais é do que a corrupção de cada um dos indivíduos dele integrante. Isso quer dizer

que só teremos um Estado corrupto se nele existir uma sociedade igualmente

corrupta. Corrupto, portanto, não é nem poderia ser o Estado. Corrupta são as

pessoas. Um Estado corrupto apenas reflete a degradação dos valores morais dos

membros da sociedade que o integram (SIMÃO, 2011, p. 35).

O que num primeiro momento pode parecer uma visão pessimista a respeito da

sociedade e de seus membros pode, no entanto, ajudar a entender as vicissitudes causadas pela

corrupção, haja vista que a partir do momento em que ela brota dos indivíduos e se instala no

âmago do Estado, a prática de atos de corrupção torna-se ainda maior, aumentando os casos

de violação aos princípios regentes da Administração Pública e, por conseguinte, o nível de

improbidade também cresce.

Nesse ponto, para melhor compreensão da matéria, necessário esclarecer sobre a

similitude e as diferenças primordiais entre os fenômenos da corrupção e da improbidade.

Consoante exposto até aqui, a corrupção caracteriza-se por ser um fator social e político

responsável pela degeneração dos costumes, que se manifesta por meio de atos desonestos

promovidos pelas pessoas. Esse desvirtuamento ético pode influenciar tanto as relações

particulares dos membros de uma comunidade, como as relações sociais travadas na esfera

pública.

A improbidade administrativa, por sua vez, refere-se essencialmente ao

comportamento desonesto dos agentes públicos no exercício de suas atividades funcionais,

utilizando-se do cargo que ocupa para enriquecer-se ilicitamente, favorecer terceiros ou

causar dano ao erário. Veja que a improbidade, portanto, representa uma das diversas formas

de corrupção, qualificada pelo fato de que se desenvolve no seio da Administração Pública e

que importa em desrespeito aos princípios jurídicos regentes do Estado (SIMÃO, 2011). São,

portanto, conceitos similares, onde a improbidade representa uma forma específica de

corrupção, estando, pois, contida nesta última.

A separação entre corrupção e improbidade administrativa também pode ser observada

a partir de uma análise sobre a proteção jurídica conferida aos institutos.

A repressão à prática de atos de corrupção dá-se primordialmente por meio da

legislação penal, havendo o Código Penal Brasileiro tipificado como crime os atos de

corrupção ativa (artigo 333)2 e corrupção passiva (artigo 317)3, ambos inclusos em seu Título

XI – Dos Crimes contra a Administração Pública.

2 “Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir

ou retardar ato de ofício:

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15

O crime de corrupção ativa consiste em oferecer ou prometer vantagem indevida a

funcionário público, a fim de determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício. O

sujeito ativo é o particular que realiza a proposta indevida, enquanto o Estado é o sujeito

passivo do crime. O ilícito penal é classificado como crime formal, ou seja, sua configuração

não depende da produção efetiva de resultado (GRECO, 2012).

Lado outro, a corrupção passiva emerge quando o funcionário público solicitar,

receber, ou aceitar promessa de vantagem indevida, para si ou para outrem, em razão da

função pública que exerce. O sujeito passivo é o Estado, e também o particular, caso este

último seja prejudicado pelo ato de corrupção. O elemento subjetivo desse tipo penal é o dolo,

uma vez que o sujeito ativo deve agir de modo voluntário e consciente, não havendo previsão

de modalidade culposa (SENNA, 2010).

Os atos de improbidade administrativa, por sua vez, possuem regramento normativo

específico, havendo previsão constitucional a respeito da matéria, conforme se verifica no

artigo 37, § 4º, da Carta Magna. O precitado dispositivo determina como consequência da

prática de condutas ímprobas a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a

indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei,

sem prejuízo da ação penal cabível4. Em sede infraconstitucional, a Lei nº 8.429/1992,

verdadeiro Código Geral de Conduta dos agentes públicos (OSÓRIO, 2012), criou um

microssistema para o sancionamento dos atos de improbidade administrativa, apartando a

matéria, de modo definitivo, dos demais atos de corrupção.

Ademais, partindo das lições do jurista Fábio Medina Osório (2012), pode-se afirmar

que os atos que resultam em grave ineficiência funcional da Administração Pública estão

sujeitos à pecha da improbidade administrativa, embora estes mesmos atos nem sempre serão

classificados como corruptos. Nesse sentido:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)

Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda

ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional”. 3 “Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou

antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)

§ 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou

deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.

§ 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:

Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa”. 4 Ao ressalvar a autonomia da esfera penal na parte final do § 4º do artigo 37, a Constituição reconheceu

expressamente a independência entre as instâncias jurídicas, caso o ato de improbidade administrativa cause

reflexos além da esfera administrativa.

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A lei não pune tão somente os atos desonestos “stricto sensu”. No plano

infraconstitucional, desde o Decreto número 30, de 08 de janeiro de 1892 a

improbidade, na categoria de crime de responsabilidade, abarcava, além de uma

série de desonestidades, a inaptidão notória ou desídia habitual no exercício das

funções (Id., 2012, p. 6).

Outrossim, vale lembrar que a Lei de Improbidade Administrativa, do modo como foi

elaborada, incide sobre os atos que causam prejuízo ao erário praticados na modalidade

culposa, e não só a título de dolo, como nos casos de corrupção ativa e passiva.

Por fim, merece destaque a recente inovação legislativa advinda por meio da Lei nº

12.846, de 01 de agosto de 2013. Denominada como Lei Anticorrupção, a norma insere no

ordenamento jurídico novas sanções para os atos de corrupção praticados por pessoas

jurídicas contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira.

Além de permitir a responsabilização nas esferas cível e administrativa, a Lei nº

12.846/2013 não excluiu a responsabilidade pessoal dos dirigentes e administradores da

pessoa jurídica, ou de qualquer pessoa natural que colaborar para a prática do ilícito. Numa

análise preliminar, percebe-se que o novo diploma legal acaba por estreitar os limites entre

corrupção e improbidade administrativa, haja vista que a responsabilização das pessoas

jurídicas já era possível mediante aplicação da Lei nº 8.429/1992, nos termos dos tipos legais

ali presentes. Ao comentar sobre o tema, ressalta Fábio Medina Osório:

A lei 12.846/13, conhecida por lei anticorrupção, deve impactar o funcionamento, a

dinâmica e a cultura empresariais no Brasil. Fortalece a ética empresarial e a lógica

da probidade administrativa. No entanto, forçoso anotar que antes mesmo da

vigência desta Lei já seria possível enquadrar pessoas jurídicas em atos de corrupção ou de improbidade por força da Lei 8.429/92, legislação que remanesce aplicável à

matéria, como autêntico Código Geral de Conduta das pessoas físicas e jurídicas. E

a nova legislação pode trazer preocupações adicionais quanto à segurança jurídica e

à razoabilidade da atuação de autoridades fiscalizadoras (Id., 2013, p. 1).

Certamente a doutrina e a jurisprudência, a seu tempo e modo, definirão o sentido e o

alcance dos novos tipo trazidos pela Lei Anticorrupção, a fim de evitar sua aplicação indevida

e harmonizá-la com as demais normas de combate à corrupção no setor público,

especialmente em relação à Lei de Improbidade Administrativa.5

O que deve ficar assentado no presente momento é que os conceitos de corrupção e

improbidade administrativa apresentam diferenças relevantes, sendo a esta última categoria

5 É importante registrar que a Lei nº 12.846/2013 foi sancionada com um período de vacatio legis de 180 (cento

e oitenta) dias, conforme descrito em seu artigo 31. Desse modo, considerando que sua publicação data de 02 de

agosto de 2013, suas disposições entrarão em vigor somente em 29 de janeiro de 2014.

Page 18: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

17

específica da primeira.6 A lei confere tratamento particular a cada um dos institutos, embora

em certos casos o mesmo fato possa ser tipificado como ato corrupto e ímprobo, podendo ser

sancionado, cumulativamente, na esfera cível, penal e administrativa. Logo, a improbidade

administrativa é espécie de corrupção praticada no seio da Administração Pública, devido a

um comportamento desonesto do agente público no exercício de suas funções administrativas.

Para se contrapor à corrupção, surge o princípio da moralidade administrativa,

intimamente ligado à probidade administrativa, objeto que será abordado no próximo tópico.

2.2 Probidade e moralidade administrativa

Antes de determinar o conceito de improbidade administrativa, é importante proceder

à análise de seu antônimo, qual seja, a probidade administrativa, bem como do princípio da

moralidade administrativa, diretriz estabelecida constitucionalmente como pilar fundamental à

Administração Pública. Ao estabelecer esses conceitos, aproximar-se-á, por via reversa, da

definição de improbidade administrativa.

Apesar de útil aos fins deste trabalho, separar os conceitos de probidade e moralidade

revela-se como tarefa de difícil solução, haja vista que estes institutos sempre se relacionam e

se misturam, pois ambos referem-se ao dever do agente público, e dos cidadãos em geral, em

agir com respeito à coisa pública, para preservação e alcance do interesse público, para muito

além da legalidade formal (DI PIETRO, 2009, p. 803). Desde já se adianta que o debate está

longe de terminar, pois a própria doutrina não é unânime sobre o tema, conforme se verá a

frente.

O primeiro deles, a probidade administrativa, é tratado pela doutrina como um dever

inerente a todo agente público, obrigando-o a agir honestamente no cumprimento de suas

funções (MELLO, 2011, p. 120). A definição deriva da própria etimologia e do significado

semântico da palavra probidade, a saber:

Do latim probitas, de probus (probo, honesto, honrado), entende-se a honestidade de

proceder ou a maneira criteriosa de cumprir todos os deveres, que são atribuídos ou

cometidos à pessoa. Assinala, portanto, o caráter ou a qualidade de probo. Revela a

integridade de caráter, o procedimento justo (SILVA, 2008, p. 589-590).

6 Essa orientação encontra posicionamentos contrários, a exemplo do já citado Fábio Medina Osório (2012, p.

28), que afirma: “[...] A improbidade é espécie do gênero „má gestão pública‟. A corrupção é espécie do gênero

„improbidade‟. A compreensão desses fenômenos a partir dessas relações é fundamental para perceber suas

características e peculiaridades”. Diante dos argumentos expostos nesse capítulo, adota-se o entendimento

reverso ao esposado pelo eminente jurista.

Page 19: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

18

Wallace Paiva Martins Júnior (2001, p. 110-111) traz importante dado histórico sobre

a tramitação do Projeto de Lei nº 1.446/1991, posteriormente convertido na Lei nº

8.429/1992, no qual o Senador Pedro Simon apresentou substitutivo (aprovado no Senado,

mas rejeitado na revisão da Câmara dos Deputados) que estabelecia um conceito legal para a

probidade administrativa, nos seguintes termos:

Art. 5º. O dever de probidade dos agentes públicos compreende a obrigação de

exercício do mandato, cargo, emprego, função ou atividade com o exclusivo

propósito de realizar o interesse coletivo, preservando a dignidade das instituições e

a incolumidade do patrimônio público.

Logo, a probidade administrativa determina àqueles que servem à Administração

Pública o dever de observância ao conjunto de princípios e regras que dão suporte à atividade

administrativa, principalmente os descritos no artigo 37 da Constituição Federal (legalidade,

impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência). Em síntese, pode-se afirmar que

O dever de probidade impõe assim ao funcionário uma conduta de absoluta isenção,

de modo a que não seja suspeito de prevaricar, de deixar-se corromper ou de por

outro modo ser infiel à entidade servida aos interesses gerais que lhe cumpre realizar

e defender (CAETANO, 1997 apud MARTINS JUNIOR, 2001, p. 106).

O seu descumprimento reclama as sanções previstas no artigo 37, § 4º, da Constituição

Federal, ao preceituar que os atos de improbidade administrativa importarão em suspensão

dos direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade dos bens e o ressarcimento

ao erário.

Por dar origem a pesadas sanções, a probidade administrativa também estaria limitada

pelo princípio da legalidade, pois a definição de atos ímprobos precisa contar com elementos

específicos, definidos em lei, de modo a legitimar o direito sancionador a ser aplicado (DI

PIETRO, 2011, p. 804).

Importante não confundir os conceitos de probidade com legalidade: ainda que esta

última seja cumprida, poderá haver violação à probidade administrativa, pois ela ultrapassa a

mera ilegalidade justamente por ser qualificada pelo elemento subjetivo do agente voltado a

corromper os princípios administrativos ou lesar o patrimônio público (SIMÃO, 2011, p. 89-

90). Neste ponto, impende destacar trecho do Recurso Especial nº 480.387/SP, tendo como

relator o atual Ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux:

[...] 6. É cediço que a má-fé é premissa do ato ilegal e ímprobo. Consectariamente, a

ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os

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19

princípios constitucionais da Administração Pública coadjuvados pela má-fé do

administrador. A improbidade administrativa, mais que um ato ilegal, deve traduzir,

necessariamente, a falta de boa-fé, a desonestidade, o que não restou comprovado

nos autos pelas informações disponíveis no acórdão recorrido, calcadas, inclusive,

nas conclusões da Comissão de Inquérito (Superior Tribunal de Justiça, Primeira

Turma, Relator Ministro Luiz Fux, julgado em 16 março 2004, publicado em 24

maio 2004).

Quanto à moralidade administrativa, Diego de Figueiredo Moreira Neto (2005, p. 96-

97) ensina que este instituto difere da moral comum, haja vista que, para além das

preocupações éticas em torno da matéria, a moral administrativa é orientada pelo binômio boa

e má administração7. É certo que a moralidade administrativa consubstancia verdadeiro

princípio, estando expressamente definida no caput do artigo 37 da Constituição Federal,

considerando a preocupação do constituinte originário em constituir um espaço estatal regido

pela ética pública, ou seja, formado por ações voltadas ao interesse público, sem interesses

escusos de seus agentes, ou que possuam mecanismos eficientes no combate à corrupção.

Desse modo, pode-se dizer que o princípio da moralidade compreende o dever de

lealdade às instituições democráticas por meio de ações orientadas pela boa-fé, que toda

sociedade deve observar no trato da coisa pública, mormente aqueles agentes que representam

a vontade popular (MARTINS JÚNIOR, 2001). Nesse panorama, afirma-se que:

Segundo os cânones da lealdade e boa-fé, a Administração haverá de proceder em

relação aos seus administrados com sinceridade e lhaneza, sendo-lhe interdito

qualquer comportamento astucioso, eivado de malícia, produzido de maneira à

confundir, dificultar ou minimizar o exercício de direitos por parte do cidadão

(MELLO, 2011, p.119-120).

Assim como a probidade administrativa, a violação ao princípio da moralidade está

sujeita às sanções por prática de ato de improbidade administrativa, considerando o disposto

no artigo 11 da Lei nº 8.492, de 02 de junho de 1992, bastando que o desrespeito da

moralidade, por ação ou omissão, viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade

e lealdade às instituições.

Importante ressaltar que a Constituição Federal ainda elenca outro meio de proteção à

moralidade administrativa, pois em seu artigo 5º, inciso LXXIII, dispôs sobre a possibilidade

de qualquer cidadão propor ação popular que vise anular ato lesivo ao patrimônio público ou à

moralidade, legitimando este instrumento processual que já se encontrava normatizado pela

Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965.

7 O referido autor ainda cita as lições do jurista francês Maurice Hauriou, responsável por elaborar, há mais de

70 (setenta) anos, o conceito inicial de moralidade administrativa, para quem esta seria, em síntese, o “conjunto

de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração”.

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20

Em suma, a moralidade administrativa se evidencia pelo comportamento honesto, em

respeito à lei, e pelo regular cumprimento das funções atribuídas ao agente. Resume-se,

portanto, no respeito a todos os demais princípios constitucionais e as regras aplicáveis à

Administração Pública, sempre tendo em vista a realização do interesse público.

Ainda assim, a separação entre o princípio da moralidade e a probidade administrativa

não se torna clara, visto que esses conceitos estão intrinsecamente relacionados e buscam

resguardar de forma semelhante os valores institucionais da Administração Pública

(MARTINS JÚNIOR, 2001). Parcela da doutrina entende que a probidade seria um

subprincípio da moralidade administrativa (SENNA, 2010), sendo enquadrado como um

dever decorrente daquele princípio constitucional, vale dizer, uma das formas de manifestação

da moralidade aplicável à Administração Pública (LOPES, 1993 apud MARTINS JÚNIOR,

2001, p. 108). Nessa esteira, ensina Marcelo Figueiredo:

Entendemos que a probidade é espécie do gênero „moralidade administrativa‟ a que alude, v. g., o art. 37, caput e seu § 4º da CF. O núcleo da probidade está associado

(deflui) ao princípio maior da moralidade administrativa, verdadeiro norte à

administração em todas as suas manifestações. Se correta estiver a análise, podemos

associar, como o faz a moderna doutrina do direito administrativo, os atos

atentatórios à probidade como também atentatórios à moralidade administrativa.

Não estamos a afirmar que ambos os conceitos são idênticos. Ao contrário, a

probidade é peculiar e específico aspecto da moralidade administrativa

(FIGUEIREDO, 1995 apud FERNANDES, 1997, p. 2).

Em sentido harmônico, José Afonso da Silva compreende que o princípio da

moralidade alcança um âmbito maior do que a probidade administrativa, sendo esta uma

forma qualificada de violação à primeira (2004, p. 650).

Não obstante os argumentos acima, adota-se nesse trabalho a ideia de que a

improbidade administrativa abrange não só os atos violadores da moralidade administrativa,

mas também as demais condutas que desrespeitam outros princípios regentes da

Administração Pública, especialmente a impessoalidade e a eficiência. Isso porque a Lei de

Improbidade Administrativa, notadamente em seu artigo 11, estende sua tutela a todos os

princípios administrativos descrito no artigo 37 da Constituição Federal, e, de um modo geral,

também procura sancionar as condutas que importam em grave ineficiência funcional.

Outrossim, na visão de Calil Simão (2011, p. 190) a imoralidade simples pode ser

fruto de culpa, enquanto a improbidade demanda sempre a atuação dolosa do agente, vale

dizer, sua ação ou omissão dever ser consciente e voluntária, norteada pela má-fé e

direcionada à lesão da Administração Pública.

Page 22: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

21

Em síntese, pode-se afirmar que toda violação à moralidade administrativa merece ser

tratada como ato ímprobo. A recíproca, no entanto, não é verdadeira, na medida em que nem

todo ato de improbidade administrativa representa ato contrário à moralidade administrativa

(FERNANDES, 1997).

Para sedimentar o que foi dito acima, traz-se à baila os seguintes posicionamentos

doutrinários:

[...] o ato imoral afronta a honestidade, a boa-fé, o respeito à igualdade. As normas

de conduta aceitas pelos administrados, o dever de lealdade, a dignidade humana e

outros postulados éticos e morais, enquanto o ato ímprobo significa a má qualidade

de uma administração pela prática de atos que implicam enriquecimento ilícito do

agente ou prejuízo ao erário ou ainda, violação dos princípios que orientam a

administração pública, sendo que todo ato contrário à moralidade administrativa é

ato configurador de improbidade. Porém nem todo ato de improbidade administrativa representa violação à moralidade administrativa (MARTINS

JÚNIOR, 2009 apud SENNA, 2010, p. 22).

Em que pese ser a observância ao princípio da moralidade um elemento de vital

importância para a aferição da probidade, não é ele o único. Todos os atos dos

agentes públicos devem observar a normatização existente, o que inclui toda a

ordem de princípios, e não apenas o princípio da moralidade. Assim, quando muito, será possível dizer que a probidade absorve a moralidade, mas jamais terá sua

amplitude delimitada por esta (GARCIA et al, 2002, p. 18).

Indo além da divergência conceitual acima exposta, preleciona Naira Senna (2010, p.

22) que a preocupação primordial deve ser a consolidação de uma Administração Pública

honesta, objetivo que consubstancia verdadeiro direito público subjetivo da sociedade. Para

tanto, os agentes públicos devem desenvolver suas atividades administrativas em sintonia com

os princípios constitucionais, e atentos aos deveres de honestidade, boa-fé, legalidade,

impessoalidade e transparência.

Assim, o que deve restar claro é que tanto o desrespeito à probidade quanto à

moralidade ensejarão a prática de um ato de improbidade administrativa, embora nem todas as

espécies deste último decorram do desrespeito da moralidade. Conforme nos ensina Celso

Bandeira de Mello (2011, p. 54) “violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma

norma”, pois implica em desrespeito a todo sistema jurídico, corrompendo sua estrutura e se

revelando como a forma mais grave de ilegalidade e inconstitucionalidade.

2.3 Má gestão pública e improbidade

Como anteriormente explicitado, vê-se que os atos de improbidade administrativa,

entendidos como derivações da violação à moralidade administrativa e da prática da

Page 23: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

22

corrupção, emanam, precipuamente, da conduta de agentes públicos desonestos que se

utilizam de suas atribuições para lesar a Administração Pública, em benefício próprio ou de

terceiro.

Nessa linha, a doutrina vem percebendo íntimas ligações entre a ocorrência da

improbidade no seio da poder público e a má gestão pública, ou seja, a administração

inadequada dos recursos que integram a estrutura estatal, gerando um alto índice de

ineficiência funcional (OSÓRIO, 2010). O alcance da probidade, portanto, reclamaria a

observância de outro preceito: a eficiência administrativa.

Elencada como princípio regente da Administração Pública por força da Emenda

Constitucional nº 19, de 04 de junho de 1998, a eficiência administrativa pode ser conceituada

como o dever do administrador público em gerir o patrimônio coletivo de forma racional,

aplicando a lei para alcançar resultados verdadeiramente úteis e produtivos, atendendo da

melhor forma possível as necessidades da sociedade e de seus membros. Trata-se, na visão de

Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2009, p. 89), do dever do agente público em buscar o melhor

desempenho possível de suas atribuições, e também em organizar, estruturar e disciplinar a

Administração Pública com a finalidade de obter o máximo de resultados na prestação do

serviço público.

Ainda sobre seu conceito, Celso Antônio Bandeira de Mello (2011, p. 122-123) afirma

que tal princípio se trata basicamente do clássico princípio da “boa administração”, de há

muito desenvolvido pela doutrina italiana, consistente na ideia de desenvolver a atividade

administrativa da forma mais adequada aos fins a serem alcançados, com a ressalva de que a

busca pela eficiência deve estar compreendida no princípio da legalidade, não podendo

ultrapassar seus limites, e, nos casos em que haja discricionariedade do gestor público,

presume-se que a norma já impõe a necessidade de se buscar a melhor solução para o caso.

O descumprimento do dever de eficiência poderá resultar na prática de ato de

improbidade administrativa por violação a princípio constitucional, à luz do referido artigo 11

da Lei nº 8.429/1992. Ademais, considerando que a má gestão pública certamente resultará

em algum dano patrimonial em prejuízo ao erário, o caso também poderá reclamar a

incidência do artigo 10 do precitado diploma, que em seu caput dispõe que constitui ato de

improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou

culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação

dos bens ou haveres da Administração Pública direta e indireta.

Como este artigo é o principal foco do presente trabalho, sua análise detalhada se dará

em momento posterior, ressaltando no momento que a inobservância à eficiência

Page 24: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

23

administrativa que está apta a configurar um ato de improbidade administrativa é aquela que

decorre da conduta do agente público direcionada à escolha da opção menos eficiente com a

deliberada intenção (dolo) de se enriquecer ilicitamente, causar prejuízo ao erário ou

simplesmente violar os princípios norteadores da Administração Pública (SIMÃO, 2011, p.

191).

Cumpre, todavia, afirmar que não será todo deslize praticado pelo administrador

público que poderá ser tipificado como ato de improbidade administrativa. A partir do

momento em que decide agir, o ser humano está sujeito ao erro, não sendo diferente para

aqueles que atuam como agentes do Estado. As questões inerentes à gestão pública muitas

vezes envolvem vários fatores, que podem dificultar a identificação pelo administrador sobre

qual é a melhor alternativa que atenderá ao interesse público, podendo até mesmo surgir mais

de uma possibilidade de ação. Sobre o erro na gestão pública, afirma Fábio Medina Osório:

Ainda que se admitam modalidades culposas de improbidade, imperioso reconhecer que os agentes públicos tem direito ao erro juridicamente tolerável. Não se pode

aniquilar com o direito ao erro, que fomenta, indiretamente, a boa gestão pública

pela assunção responsável de riscos, pela ousadia e pela complexidade que a

Administração Pública exige na tomada de decisões.

Para além do reconhecimento do direito ao erro, também é importante assinalar que

existe um catálogo hierárquico de transgressões, desde aquelas juridicamente

toleráveis até outras que simplesmente são absorvidas por outras categorias

jurídicas. Nem toda ilegalidade configura improbidade e as infrações devem ser

classificadas de acordo com critérios hierárquicos (OSÓRIO, 2012, p. 07).

Logo, segundo a linha exposta pelo autor, o erro torna-se parte da atividade do

administrador público, que mesmo adotando as cautelas necessárias ao cumprimento do

princípio da eficiência, poderá, vez ou outra, incidir em erro, ocasionando danos ao

patrimônio público. O importante, entretanto, é saber qual foi o nível de diligência empregado

pelo agente, ou seja, se agiu de boa fé e com a prudência necessária, e se o erro cometido é

juridicamente tolerado, tendo em vista os danos causados e a legislação aplicável à espécie.

Destarte, vê-se que o estudo da má gestão pública revela-se como de fundamental

importância para definição do conceito de improbidade, considerando que o agente público

desonesto e corrupto termina por utilizar toda estrutura administrativa para direcionar suas

ações desleais, ou até mesmo adotando um nível intolerável de negligência perante a coisa

pública, comprometendo a realização do interesse público.

Nessa linha, o que inicialmente pode apresentar-se como uma forma de maior proteção

ao erário, pode revelar-se como um instrumento de combate à corrupção que excede os limites

da razoabilidade, possibilitando que o agente inábil, que agiu por erro, mas sem intenção

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24

fraudulenta, receba as pesadas sanções da Lei de Improbidade Administrativa da mesma

forma que o agente orientado pela má-fé, o corrupto, o que não destoa dos fins buscados pelo

§ 4º do artigo 37 da Constituição Federal.

2.4 Definição de improbidade administrativa

Diante das elucidações desenvolvidas a respeito do fenômeno da corrupção, do

conceito de probidade e moralidade administrativa e das relações entre má gestão pública e

improbidade, torna-se possível, à luz da melhor doutrina, aproximar-se de um conceito de

improbidade administrativa.

Malgrado a Lei nº 8.429/1992 apresente conceitos abertos e contornos imprecisos

(OSÓRIO, 2012), e a doutrina também revele divergências sobre o alcance de sua definição, é

pacífico o posicionamento de que a improbidade deriva daqueles atos marcados pela

desonestidade, imbuídos pela má-fé e direcionados a prática da corrupção, e, no campo do

direito administrativo, verifica-se a partir dos atos que desrespeitem a ética pública, praticados

com a intenção clara e consciente em enriquecer-se ilicitamente, violar o erário ou os

princípios da Administração Pública.

Segundo Mauro Roberto Gomes de Mattos (2010, p. 577), “[...] improbidade tem

características de desonestidade, daquele que rompe a moralidade e age indignamente, por

não ter decência”.

Buscando uma definição etimológica para o termo, improbidade origina-se do latim

improbitas, designativo de má qualidade, imoralidade, malícia, desonestidade (SILVA, 2008,

p. 408), transformando a improbidade em uma característica do sujeito, um atributo negativo

daquele que desrespeita a ética pública e viola os princípios norteadores da Administração,

devido à sua falta de idoneidade (SIMÃO, 2011, p. 40).

Em síntese ao que se expôs, colhe-se da doutrina os seguintes entendimentos quanto à

definição de improbidade administrativa:

Improbidade administrativa, em linhas gerais, significa servir-se da função pública

para angariar ou distribuir, em proveito pessoal ou para outrem, vantagem ilegal ou

imoral, de qualquer natureza, e por qualquer modo, com violação aos princípios e

regras presidentes das atividades na Administração Pública, menosprezando os

deveres do cargo e a relevância dos bens, direitos, interesses e valores confiados à

sua guarda, inclusive por omissão, com ou sem prejuízo patrimonial (MARTINS

JÚNIOR, 2001, p. 113).

Page 26: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

25

Numa primeira aproximação, improbidade administrativa, que sob diversas formas

promove o desvirtuamento da Administração Pública e afronta os princípios

nucleares da ordem jurídica (Estado de Direito Democrático e Republicano),

revelando-se pela obtenção de vantagens patrimoniais indevidas às expensas do

erário, pelo exercício nocivo das funções e empregos públicos, pelo „tráfico de

influência‟ nas esferas da Administração Pública e pelo favorecimento de poucos em

detrimento dos interessados da sociedade, mediante a concessão de obséquios e

privilégios ilícitos (PAZZAGLINI FILHO et al, 1998 apud MATTOS, 2010, p. 31)

Ademais, pode-se afirmar, que a definição de ato ímprobo não se confunde com o

conceito de ato ilícito ou danoso, posto que aquele possui um alcance muito mais abrangente,

enquanto estes últimos, embora possam estar em desacordo com a lei ou resultarem em

prejuízo à Administração Pública, são executados sem a marca da desonestidade ou apenas

derivam de erros toleráveis na prática de atos administrativos (SIMÃO, 2011).

Logo, entende-se que a improbidade administrativa é a qualidade de que se reveste

uma ação, comissiva ou omissiva, praticada por agente público imoral e corrupto, de forma

voluntária e consciente, ou por negligência intolerável, com o objetivo de lesionar os

princípios administrativos, causar danos ao patrimônio público ou obter enriquecimento

indevido, constituindo-se como uma forma qualificada de violação à legalidade, à moralidade

e à eficiência administrativa.

Diante disso, cabe averiguar qual o tratamento legal dispensado à improbidade

administrativa no decorrer da história, à luz do conceito ora estabelecido, com enfoque

especial sobre a Lei nº 8.429/1992 e sobre o artigo 37, § 4º, da Constituição Federal.

Page 27: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

26

3 EVOLUÇÃO NORMATIVA DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Passo fundamental para o desenvolvimento da pesquisa é a realização de uma análise

histórica sobre as normas relacionadas à improbidade administrativa, contextualizando-as ao

período temporal em que foram editadas.

O desenvolvimento deste capítulo dependerá, inicialmente, de uma análise

constitucional sobre o assunto, averiguando de que forma a improbidade administrativa foi

abordada no texto constitucional, desde a Constituição do Império (1824) – que previa, em

seu artigo 133, incisos I, III e IV, a possibilidade de responsabilização dos Ministros de

Estado – até a atual Constituição de 1988, ao dispor, em seu artigo 37, § 4º, que os atos de

improbidade administrativa importarão na suspensão dos direitos políticos, a perda da função

pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação

previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. Quanto ao tratamento

infraconstitucional, será analisada a Lei nº 3.164, de 1º junho de 1957 (Lei Pitombo-Godoy

Ilha), a Lei nº 3.502, de 21 de dezembro de 1958 (Lei Bilac Pinto), e, por fim, a atual Lei nº

8.429, de 02 de junho de 1992, diploma que tipifica os atos de improbidade administrativa,

estabelece as sanções aplicáveis à espécie e dispõe sobre normas processuais aplicáveis à

espécie.

Busca-se, com a conclusão desta parte do trabalho, entender de que forma a

improbidade administrativa era e ainda é combatida, colaborando para a pesquisa sobre a

questão da constitucionalidade dos atos de improbidade praticados na modalidade culposa.

3.1 As Constituições de 1824 a 1969

O primeiro diploma constitucional brasileiro surge nos idos de 1824, ainda na época

do Brasil Império. Passados dois anos da Proclamação da Independência, era necessário

estabelecer uma nova ordem jurídica para o Estado que acabara de nascer. Fábio Medina

Osório (2012, p. 04), ressalta a existência de uma estreita ligação entre os crimes de

responsabilidade e o dever de probidade imposto, principalmente, aos membros do Poder

Executivo. Por oportuno, destacam-se as disposições do artigo 133 daquela Carta, in verbis:

Art. 133. Os Ministros de Estado serão responsáveis:

I. Por traição.

II. Por peita, suborno, ou concussão.

III. Por abuso do Poder.

IV. Pela falta de observancia da Lei.

Page 28: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

27

V. Pelo que obrarem contra a Liberdade, segurança, ou propriedade dos Cidadãos.

VI. Por qualquer dissipação dos bens publicos.

Interessante notar, ademais, que a figura do Imperador era inviolável e sagrada, o que

se explica facilmente em razão do modelo político adotado à época, não estando sua pessoa

sujeita a responsabilidade alguma, nos termos artigo 99 da Constituição de 1824.

Vale ressaltar que esta Carta Política trouxe interessante instrumento de combate à

corrupção em seu artigo 1578, qual seja, a clássica ação popular, hoje estampada no artigo 5º,

inciso LXXIII, da Constituição de 1988 e disciplinada pela Lei nº 4.717, de 29 de junho de

1965. Segundo Calil Simão (2011, p. 45), esta ação deriva da chamada actio popularis,

instituto criado pelos romanos com a finalidade de controlar os atos do pretor. Ao assumir o

cargo, o pretor emitia uma declaração explicitando de que maneira conduziria sua

administração nos termos da lei e da justiça, e, caso descumprisse tais premissas, estaria

sujeito a actio popularis, por meio da qual lhe seria aplicada uma multa.

O segundo diploma constitucional surge em 1891, logo após Proclamação da

República em 1889, estabelecendo, em seu artigo 54, que constituíam crimes de

responsabilidade do Presidente os atos que atentassem contra a probidade administrativa. Este

dispositivo foi repetido pelas demais Constituições (1934 – artigo 57, alínea “f”; 1937 – artigo

85, alínea “d”; 1946 – artigo 89, V; 1967 – artigo 84, V; e 1988 – artigo 85, V), consolidando,

pois, a responsabilidade do Presidente da República em virtude da violação do dever de

probidade (SIMÃO, 2011, p. 45-46).

A Constituição de 1934 trouxe importante inovação, pois conferiu legitimidade a todos

os cidadãos para pleitear a nulidade de atos lesivos ao patrimônio público da União, dos

Estados ou dos Municípios (artigo 113, 38).

Por sua vez, a Carta Política de 1946 inova ao estabelecer em seu arcabouço

normativo as sanções decorrentes da prática de ato de improbidade administrativa por

enriquecimento ilícito, permitindo o sequestro e perda dos bens acrescidos indevidamente.

Assim, preceituava o artigo 141, § 31, in verbis:

Art. 141 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no

País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança

individual e à propriedade, nos termos seguintes: [...]

§ 31 - Não haverá pena de morte, de banimento, de confisco nem de caráter

perpétuo. São ressalvadas, quanto à pena de morte, as disposições da legislação

8 “Art. 157. Por suborno, peita, peculato, e concussão haverá contra elles acção popular, que poderá ser intentada

dentro de anno, e dia pelo proprio queixoso, ou por qualquer do Povo, guardada a ordem do Processo

estabelecida na Lei”.

Page 29: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

28

militar em tempo de guerra com país estrangeiro. A lei disporá sobre o seqüestro e

o perdimento de bens, no caso de enriquecimento ilícito, por influência ou com

abuso de cargo ou função pública, ou de emprego em entidade autárquica (grifo

nosso).

Adianta-se que tal dispositivo seria repetido na atual Lei de Improbidade

Administrativa (Lei nº 8.249/1992), constituindo importante medida cautelar para assegurar a

reparação dos danos causados ao erário.

Por sua vez, a Constituição de 1967 em nada inovou, apenas ocupando-se de repetir o

dispositivo retro transcrito, em seu artigo 150, § 11.

Ponto interessante é a previsão trazida pelo Ato Institucional nº 5, editado em 13 de

dezembro de 1968, marco do início de uma rigorosa fase do período ditatorial brasileiro.

Refletindo as grandes arbitrariedades daquele regime, o artigo 8º do ato político concedia ao

Presidente da República o poder de decretar o confisco de bens daqueles que, no exercício de

cargo ou função pública, se enriquecessem ilicitamente9. A medida configurava sanção

administrativa, independente e complementar às sanções penas cabíveis (SIMÃO, 2011, p.

46). Com o advento do Ato Institucional nº 14, de 05 de setembro de 1969, reeditou-se o § 11

do artigo 150 da Carta de 1967, estabelecendo uma vedação genérica ao confisco, deixando

que a legislação infraconstitucional previsse as hipóteses excepcionais.

Por fim, destaca-se que a Constituição de 1969, surgida a partir da Emenda

Constitucional nº 01, de 17 de outubro de 1969, promoveu inúmeras alterações no texto

constitucional anterior, inovando no trato da matéria de improbidade ao ser a primeira a

prever, em seu artigo 154, a sanção de suspensão dos diretos políticos, podendo ser aplicada a

todos os detentores de mandato eletivo, independente de autorização da Câmara a que

pertencesse (SIMÃO, 2011, p. 48). Nos termos do dispositivo:

Art. 154. O abuso de direito individual ou político, com o propósito de subversão do

regime democrático ou de corrupção, importará a suspensão daqueles direitos de

dois a dez anos, a qual será declarada pelo Supremo Tribunal Federal, mediante

representação do Procurador Geral da República, sem prejuízo da ação cível ou

penal que couber, assegurada ao paciente ampla defesa.

Parágrafo único. Quando se tratar de titular de mandato eletivo, o processo não

dependerá de licença da Câmara a que pertencer.

Segundo Calil Simão (2011, p. 51), da análise dos diplomas constitucionais anteriores

a Carta de 1988 é possível observar uma preocupação com o enriquecimento ilícito, sendo

9 “Art. 8º - O Presidente da República poderá, após investigação, decretar o confisco de bens de todos quantos

tenham enriquecido, ilicitamente, no exercício de cargo ou função pública, inclusive de autarquias, empresas

públicas e sociedades de economia mista, sem prejuízo das sanções penais cabíveis”.

Page 30: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

29

esta, entre as falhas cometidas pelos agentes público no exercício de suas funções, a mais

repudiada pela sociedade, o que explicaria a presença constante do termo.

3.2 A Lei nº 3.164, de 01 de junho de 1957 – Lei Pitombo-Godói Ilha

Onze anos após a edição da Constituição de 1946, surge a Lei nº 3.164, de 01 de junho

de 1957, conhecida como Lei Pitombo-Godói Ilha, com o objetivo de regulamentar o

procedimento da perda dos bens acrescidos ilicitamente ao patrimônio do agente público,

conforme previsto no artigo 141, § 31, da respectiva Carta Política.

Segundo esta lei, os bens perdidos seriam revertidos em favor da Fazenda Pública,

sem prejuízo das sanções penais cabíveis. Nos termos de seu artigo 1º, as medidas podiam ser

acionadas pelo Ministério Público ou por qualquer pessoa do povo (parágrafo 2º) e correriam

pelo juízo cível (parágrafo 1º).

Também havia previsão de que a extinção da respectiva ação penal ou absolvição do

réu pela prática de crimes funcionais, não excluiria a incorporação à Fazenda Pública dos bens

acrescidos ilicitamente, ressalvado o direito de terceiros de boa-fé (artigo 2º).

Por fim, importante ressaltar que a Lei Pitombo-Godói Ilha previu em seu artigo 3º a

obrigatoriedade de registro público dos valores e bens pertencentes ao patrimônio privado de

todos que exercessem cargos ou funções públicas da União e entidades autárquicas, eletivas

ou não10.

3.3 A Lei nº 3.502, de 21 de dezembro de 1958 – Lei Bilac Pinto

No ano seguinte a Lei Pitombo-Godói Ilha, aparece em nosso ordenamento jurídico a

Lei nº 3.502, de 21 de dezembro de 1958, denominada Lei Bilac Pinto, contendo previsão

para o sequestro de bens nos casos de enriquecimento ilícito, por influência ou abuso de cargo

10 “Art. 3º - É instituído o registro público obrigatório dos valores e bens pertencentes ao patrimônio privado de

quantos exerçam cargos ou funções públicas da União e entidades autárquicas, eletivas ou não.

§ 1º - O registro far-se-á no Serviço do Pessoal competente, mediante declaração do servidor público, incidindo na pena de demissão do serviço público o que fizer falsa declaração.

§ 2º - O registro compreenderá, móveis, imóveis, semoventes, dinheiro, títulos e ações e qualquer outra espécie

de bens e valores patrimoniais, excluídos os objetos e utensílios de uso doméstico cuja soma não exceda de Cz$

100.000,00 (cem mil cruzeiros).

§ 3º - A declaração será atualizada bienalmente, podendo a autoridade a que estiver subordinado o servidor

exigir a comprovação da legitimidade da procedência dos bens acrescidos ao patrimônio do servidor.

§ 4º - O registro prévio é condição indispensável à posse do servidor público e deverá ser obrigatòriamente

atualizado antes do seu afastamento do cargo ou função.

§ 5º - A declaração de que trata êste artigo compreende os bens do casal”.

Page 31: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

30

ou função, sem, no entanto, revogar a lei que a precedeu (DI PIETRO, 2009, p. 806). Fábio

Medina Osório (2012, p. 7), ressaltando os aspectos inovadores da norma, afirma a Lei Bilac

Pinto é seguramente o embrião mais direto da Lei nº 8.429/1992.

Segundo Calil Simão (2011, p. 53), esta lei preocupou-se em tratar a matéria com

maior clareza, haja vista a dificuldade até então presente de se estabelecer o núcleo do tipo

legal, necessário a efetivação da medida de sequestro de bens, definindo, ademais, o conceito

de servidor público para aplicação da lei (artigo 1º, §1º)11.

Importante inovação foi a definição de enriquecimento ilícito, para fins de sequestro

de bens, mediante rol de condutas expressas no artigo 2º e 3º, quais sejam: a) a incorporação

ao patrimônio privado, sem as formalidades previstas em leis, regulamentos, estatutos ou em

normas gerais e sem a indenização correspondente, de bens ou valores do patrimônio de

qualquer das entidades mencionadas no art. 1º e seus parágrafos; b) a doação de valores ou

bens do patrimônio das entidades mencionadas no art. 1º e seus parágrafos a indivíduos ou

instituições privadas, ainda que de fins assistenciais ou educativos, desde que feita sem

publicidade e sem autorização prévia do órgão que tenha competência expressa para deliberar

a esse respeito; c) o recebimento de dinheiro, de bem móvel ou imóvel, ou de qualquer outra

vantagem econômica, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente; d) a

percepção de vantagem econômica por meio de alienação de bem móvel ou imóvel, por valor

sensivelmente superior ao corrente no mercado ou ao seu valor real; e) a obtenção de

vantagem econômica por meio da aquisição de bem móvel ou imóvel por preço sensivelmente

inferior ao corrente no mercado ou ao seu valor real; f) a utilização em obras ou serviços de

natureza privada de veículos, máquinas e materiais de qualquer natureza de propriedade da

União, Estado, Município, entidade autárquica, sociedade de economia mista, fundação de

direito público, empresa incorporada ao patrimônio da União ou entidade que receba e aplique

contribuições parafiscais e, bem assim, a dos serviços de servidores públicos, ou de

empregados e operários de qualquer dessas entidades; e g) o enriquecimento ilícito, por

qualquer dos fatos mencionados nas letras c e e, quando praticado por quem, em razão de

influência política funcional ou pessoal, intervenha junto às pessoas indicadas no art. 1º e seus

parágrafos, para delas obter a, prática de algum dos atos funcionais citados em favor de

terceiro.

11“[...] § 1º A expressão „servidor público‟ compreende todas as pessoas que exercem na União, nos Estados, nos

Territórios, no Distrito Federal e nos municípios, quaisquer cargos, funções ou empregos, civis ou militares, quer

sejam eletivos quer de nomeação ou contrato, nos órgãos dos Poderes Executivo, Legislativo ou Judiciário”.

Page 32: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

31

Vê-se, pois, que esta legislação não deixou de ser um marco no combate à

improbidade, considerando o rigor como tratava o tema se comparada às normas que a

precederam, além de proporcionar maior segurança jurídica ao definir precisamente os atos

sujeitos a aplicação da lei.

3.4 A Constituição de 1988 - Artigo 37, parágrafo 4º

Na esteira das demais Constituições, a Carta Magna de 1988 trouxe previsão em seu

texto quanto à improbidade administrativa, conquanto trazendo uma pequena inovação, pois

inclui o tema no capítulo concernente a Administração Pública, a saber, no § 4º do artigo 37,

determinando que os atos de improbidade administrativa importarão na suspensão dos direitos

políticos, na perda da função pública, na indisponibilidade dos bens e no ressarcimento ao

erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Ao comentar sobre a importância do tema na Constituição de 1988, destaca, com

propriedade, Fábio Medina Osório:

Novidade histórica constitui, portanto, como é sabido, o tratamento da improbidade

no art.37, parágrafo 4, da CF, a qual prevê que os atos de improbidade poderão

configurar-se independentemente das responsabilidades civis, penais e

administrativas. A Lei 8.429/92 regulamentou esse dispositivo, 04 anos depois, sob

o influxo de importantes contribuições de lideranças do Ministério Público brasileiro

e tendo por parâmetro Lei 3.502, de 21.12.1958, cuja estrutura se reproduz aqui. Por

certo que uma previsão inovadora como esta causaria enormes perplexidades, mas

não deixa de ser curioso o fato de que, mesmo passados 20 (vinte) anos de vigência,

permaneçam obscuros aspectos essenciais à sua compreensão, especialmente no Supremo Tribunal Federal (OSÓRIO, 2012, p. 4-5).

Ademais, observa-se, pois, que o constituinte ainda inseriu a medida de

indisponibilidade de bens como meio para assegurar o efetivo ressarcimento do erário,

juntamente com as demais sanções aplicáveis.

A par disso, constata-se que a improbidade não impede a aplicação das demais sanções

de natureza civil, penal ou administrativa, bem como fica evidente a necessidade de norma

infraconstitucional para regulamentar a forma de aplicação desses comandos.

Destarte, a fim de concretizar o comando constitucional contido no § 4º do artigo 37,

surgiu no ordenamento jurídico a Lei nº 8.429/1992.

Page 33: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

32

3.5 A Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992 – Lei de Improbidade Administrativa.

Quatro anos após a promulgação, o ordenamento recebeu a Lei nº 8.429, de 02 de

junho de 1992 – Lei de Improbidade Administrativa, de modo a regulamentar as sanções

previstas na Constituição para os atos cometidos por agentes públicos.

Entre suas disposições, o novo diploma seguiu a técnica legislativa adotada pela Lei nº

3.502/1958, trazendo exemplos de condutas que poderiam ser consideradas como ímprobas

para fins de aplicação da lei, apresentando as seguintes modalidades: a) atos que importam

enriquecimento ilícito, descritos no artigo 9º; b) atos que causam prejuízo ao erário,

constantes no artigo 10; e c) atos que atentam contra os princípios da administração pública,

apresentados pelo artigo 11.

A indisponibilidade de bens afigura-se como medida cautelar que poderá ser

requisitada pelo autor da ação a qualquer momento, havendo previsão expressa no artigo 7º.

Também foi inserida no artigo 16 a medida cautelar de sequestro dos bens ilicitamente

acrescidos ao patrimônio do agente ímprobo, bem como a possibilidade de afastamento do

agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, para

resguardar à instrução processual (artigo 20).

Ressalta-se que a nova Lei de Improbidade também inovou ao regulamentar o

procedimento administrativo e judicial para apuração da prática de ato ímprobo, em seus

artigos 14 a 18, trazendo importantes disposições processuais aplicáveis à espécie, como a

existência de um procedimento preliminar, anterior ao recebimento da petição inicial, onde os

demandados na ação de improbidade administrativa poderão oferecer razões que comprovem

a inexistência do ato de improbidade administrativa, a improcedência da ação ou a

inadequação da via eleita (SIMÃO, 2011, p. 500).

Sobre o atual diploma legislativo, que em 2012 completou 20 anos de vigência, mister

trazer à baila os comentários de Mauro Roberto Gomes de Mattos sobre o marco histórico da

Lei nº 8.249/1992:

Sempre foi uma cultura nefasta em nosso país, como nos países da América do Sul,

ver os homens públicos rompendo a coletividade pelos seus maus tratos à coisa

pública. Ora, a corrupção atrasou muitos povos do nosso continente, que obtiveram

dos políticos o retrocesso e a conduta desleal, em vez de zelarem pela boa e pura

intenção dos seus atos. Portanto, a Lei de Improbidade veio ao cenário jurídico com

a finalidade de combater atos que afetem a moralidade e maltratem a coisa pública,

regulamentando o disposto no artigo 39, § 4º da Constituição Federal (MATTOS,

2012, p. 1-2).

Page 34: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

33

Todavia, a Lei de Improbidade também trouxe consigo inúmeros questionamentos, em

razão do caráter aberto de suas normas, causando dúvidas sobre o conceito de ato ímprobo

para fins de aplicação das sanções previstas. As normas de caráter aberto, ou normas

sancionadoras em branco, são tipos legais que necessitam de complementação por outras

normas ou conceitos jurídicos, para que se obtenha o seu significado semântico12. Esse

aspecto suscita diversas preocupações na doutrina, haja vista que tal característica confere

certa dose de discricionariedade aqueles que manejam a Lei de Improbidade Administrativa, o

que pode gerar interpretações errôneas dos tipos sancionadores, causando insegurança jurídica

e o ajuizamento indiscriminado de ações de improbidade administrativa (OSÓRIO, 2012, p.

10).

Sobre o tema, mais uma vez merecem destaque as lições de Mauro Roberto Gomes de

Mattos, para quem

a definição de improbidade administrativa não pode ser um „cheque em branco‟ ou ato de prepotência do membro do Ministério Público, pois a segurança jurídica que

permeia um Estado Democrático de Direito como o nosso não permite essa

indefinição jurídica (MATTOS, 2010, p. 28).

Além da discussão alhures exposta, ressalta-se o debate acerca da modalidade culposa

dos atos de improbidade administrativa, constante em seu artigo 5º e 10, assunto que será

explorado detidamente nos próximos capítulos.

12 Cite-se, a título de exemplo, o inciso VIII do artigo 10 da Lei nº 8.429/1992, que tipifica como ato de

improbidade administrativa que causa lesão ao erário o ato de frustrar a licitude de processo licitatório ou

dispensá-lo indevidamente. Para que se compreenda o sentido da norma, é imprescindível conhecer os princípios

e regras aplicáveis às licitações públicas, notadamente a Lei nº 8.666/1993.

Page 35: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

34

4 ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

4.1 Aspectos gerais

A Lei Federal nº 8.429/1992 – Lei de Improbidade Administrativa traz em seu bojo

três espécies de atos ímprobos, classificados de acordo com o seu resultado, havendo: a)

aqueles que importam em enriquecimento ilícito (artigo 9º); b) aqueles que causam prejuízo

ao erário (artigo 10); e c) aqueles atentam contra os princípios da Administração Pública

(artigo 11).

Antes, porém, de se expor as principais características de cada uma das modalidades

acima, é importante trazer a lume os caracteres essenciais à formação do ato ímprobo, para

que se compreenda o processo de concretização da improbidade no mundo fático e a

qualificação jurídica atribuída pela norma a cada hipótese, distinguindo tais condutas entre si

e perante demais espécies de ato ilícito existentes no ordenamento jurídico.

Para tanto, percorrer-se-á tal trajeto a partir dos principais elementos: a) bem jurídico

protegido pela norma; b) sujeito ativo; c) sujeito passivo; d) conduta e nexo de causalidade; e

e) elemento subjetivo.

4.1.1 Bem jurídico protegido

O primeiro deles está em saber qual é o bem jurídico tutelado pelo § 4º do artigo 37 da

Constituição Federal, e, em sede infraconstitucional, pela Lei nº 8.429/1992. Interessante aqui

ressaltar o posicionamento adotado por Calil Simão (2011, p. 75), ao dizer que o principal

objeto de proteção da norma constitucional em epígrafe seria a probidade administrativa,

figurando, em segundo plano, o patrimônio material da Administração Pública. Haveria,

portanto, duplicidade de bens jurídicos tutelados. Todavia, possíveis violações ao erário

público só adquiririam o status da improbidade administrativa quando decorrente do

descumprimento do dever de probidade (conceito exposto no primeiro capítulo desse

trabalho).

4.1.2 Sujeito ativo

No que tange ao sujeito ativo, pratica ato de improbidade qualquer agente público que

atue no sentido de violar o dever de probidade administrativa e/ou lesar o erário, podendo

Page 36: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

35

conceituá-lo, nos dizeres de Calil Simão (2011, p. 79), como “[...] todas as pessoas físicas que

mantêm ligação com o Estado, manifestando, com fundamento nesse vínculo jurídico, a sua

vontade”.

Lado outro, nos termos do artigo 2º da Lei nº 8.429/1992, entende-se como agente

público todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição,

nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo,

mandato, cargo, emprego ou função nas entidades da qual decorra o vínculo estatal. A partir

disso, pode-se notar a abrangência do conceito de agente público trazido pela Lei de

Improbidade Administrativa, que transborda a mera condição de servidor público para

alcançar todo aquele que mantém vínculo com o Estado13, certamente no intuito de conceder

elasticidade à incidência da norma e tonificar o combate à impunidade (COPOLA, 2011).

Quanto à participação de terceiros, ainda que o artigo 3º da Lei nº 8.429/1992 abarque

sua atuação, mediante induzimento ou concorrência para prática do ato ímprobo, ou, ainda, na

condição de beneficiário dos efeitos destes, somente será possível a aplicação das disposições

do citado diploma se este terceiro atuar em conjunto com o agente público, nunca

isoladamente, vale dizer, o seu papel será, sempre, o de partícipe ou coautor. Nesse sentido:

É importante frisar, uma vez mais, que somente será possível falar em punição de terceiros em tendo sido o ato de improbidade praticado por um agente público,

requisito este indispensável à incidência da Lei n. 8.429/92. Não sendo divisada a

participação do agente público, estará o extraneus sujeito a sanções outras que não

aquelas previstas nesse diploma legal (GARCIA et al, 2006 apud SIMÃO, 2011, p.

80-81).

Em síntese, a noção de sujeito ativo na Lei de Improbidade Administrativa pode ser

assim apresentada:

Acompanhando a evolução jurídica a respeito do tema, a Lei Federal n. 8.429/92

dedicou científica atenção na atribuição da sujeição do dever de probidade

administrativa ao agente público, que se reflete internamente na relação estabelecida

entre ele e a Administração Pública, superando a noção de servidor público, com

uma visão mais dilatada do que o conceito de funcionário público contido no Código

Penal (art. 327). Desse modo, são sujeitos ou titulares do dever de probidade administrativa o agente público, qualquer que seja a fórmula de seu vínculo com a

13 Nesse sentido, cite-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “ADMINISTRATIVO – AÇÃO

CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – RECEBIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL –

BANCO DO BRASIL – SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA – LEI 8.429/92. 1. Os sujeitos ativos dos atos

de improbidade administrativa não são apenas os servidores públicos, mas todos aqueles que estejam abarcados

no conceito de agente público, previsto nos arts. 1º, 2º e 3º da Lei 8.429/1992. Precedentes do STJ. 2. Recurso

especial provido. (Recurso Especial nº 1.138.523/DF, Segunda Turma, Relatora Ministra Eliana Calmon.

Julgado em 23 fev 2010. Publicado em 04 mar 2010)”.

Page 37: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

36

Administração Pública, além de terceiros estranhos (particulares), como o

beneficiário ou partícipe (MARTINS JÚNIOR, 2001, p. 240).

Nessa lógica, pode-se afirmar que a presença do agente público é requisito

imprescindível para formação do ato ímprobo, posto que somente por meio de sua atuação

será possível realizar o núcleo dos tipos legais trazidos pela Lei nº 8.429/1992 (SIMÃO,

2011).

4.1.3 Sujeito passivo

A Administração Pública será o sujeito passivo no intricado mosaico da improbidade

administrativa, haja vista que, no mais das vezes, o erário é o alvo central das condutas

ímprobas, movimentadas por aqueles que desejam se enriquecer às custas do patrimônio

público ou promover a dilapidação e o malbaratamento dos bens pertencentes às entidades

integrantes do Poder Público.

Ademais, o ato de improbidade administrativa termina, inevitavelmente, por violar os

princípios constitucionais administrativos insculpidos no caput do artigo 37 da Carta Magna,

consumando o dano à moralidade estatal, o que por si só já é razão suficiente para aplicação

da Lei de Improbidade Administrativa.

Nesse sentido, por meio do artigo 1º da Lei nº 8.429/1992 pode-se observar as

entidades que estão sujeitas à proteção da norma, punindo-se todos os atos cometidos contra a

administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados,

do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio

público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário tenha concorrido ou concorra com

mais de 50% (cinquenta por cento) do patrimônio ou da receita anual.

Ainda, o mesmo dispositivo abarca em seu parágrafo único demais entidades que,

embora não integrem a estrutura da Administração Pública, recebam subvenção, benefício ou

incentivos fiscais ou creditícios de órgão público, bem como aquelas para cuja criação ou

custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de 50% (cinquenta por cento) do

patrimônio ou da receita anual. Todavia, a proteção estendida ao patrimônio dessas entidades

estará limitada a parcela de recursos públicos transferidos, vale dizer, havendo sanção

patrimonial decorrente da aplicação da Lei de Improbidade Administrativa, esta poderá recair

somente sobre o montante da contribuição oriunda dos cofres públicos. Sobre a limitação em

comento, ressalta a doutrina:

Page 38: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

37

[...] Quando o caput e o par.ún. do artigo 1º estabelecem que configura ato de

improbidade administrativa o ato de improbidade voltado a entidade cuja criação ou

custeio o erário haja concorrido ou concorra com o patrimônio ou com a receita

anual, devemos entender que a aplicação da LIA [Lei de Improbidade

Administrativa], nesses casos, busca tutelar a destinação do recurso público

transferido pelo Estado à iniciativa privada, alvo de um ato de improbidade. É,

portanto, a transferência patrimonial de caráter público, impregnada de um

interesse público específico, que faz nascer o vínculo que a submete à LIA (SIMÃO, 2011, p. 75, grifo nosso).

Portanto, é possível notar que o intuito do legislador foi o de conferir a máxima

proteção o patrimônio público integrante das entidades e órgãos em que haja parcela do

erário, a fim de salvaguardá-lo das condutas ímprobas combatidas pela Lei de Improbidade

Administrativa e, por via reflexa, assegurar a boa gestão dos recursos públicos.

4.1.4 Conduta e nexo de causalidade

A própria Lei nº 8.429/1992 deixa claro que dos atos de improbidade administrativa

pode nascer de uma conduta comissa ou omissa, a exemplo do disposto no artigo 5º14. Uma

ação comissiva significa uma conduta ativa, um fazer. Por outro lado, a omissão ocorre

quando o agente deixa de praticar algum ato, permanecendo inerte ou indiferente à situação a

ele apresentada.

Os atos de improbidade administrativa manifestam-se por meio de ações consistentes

em receber vantagens patrimoniais indevidas, utilizar bens públicos em proveito próprio ou de

terceiros, frustrar a licitude de procedimento licitatório, deixar de prestar contas quando

exigido, negligenciar a arrecadação de tributos, e demais condutas citadas nos tipos legais.

Insta ressaltar que na hipótese de enriquecimento ilícito, modalidade prevista no artigo

9º da Lei nº 8.429/1992, o ato de improbidade administrativa só se aperfeiçoará mediante uma

ação comissa, haja vista que o agente público necessariamente precisa auferir ou aceitar a

incorporação da vantagem indevida ao seu patrimônio.

Quanto ao nexo de causalidade, para que se configure um ato de improbidade

administrativa é essencial que esteja comprovada a vinculação entre o exercício da função

pública e a prática do ato ímprobo (SIMÃO, 2011, p. 101). Somente os atos relacionados ao

comportamento do agente público, praticados em razão de seu cargo, terão relevância para a

existência da improbidade, nascendo daí o nexo causal.

14 “Art. 5°. Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente ou de

terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano”.

Page 39: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

38

Segundo Calil Simão, o nexo causal é capaz de até mesmo surtir efeitos processuais,

uma vez que

Tal requisito deve vir descrito na inicial e bem delimitado pelo autor, sob pena de

indeferimento da inicial [...]. O magistrado também está obrigado a demonstrar o

nexo de causalidade na fundamentação de sua decisão, sob pena de nulidade do

decisório (Id., 2011, p. 102).

Destarte, a desonestidade praticada fora do âmbito da Administração Pública, no seio

das relações privadas do indivíduo, não interessa ao direito para fins de aplicação da Lei nº

8.429/1992, afastando a existência do nexo de causalidade.

4.1.5 Elemento subjetivo

O elemento subjetivo compreende a intenção do agente ao agir ou deixar de fazê-lo,

representando sua vontade interna. Conforme exposto no primeiro capítulo, os atos de

improbidade administrativa são condutas motivadas pela má-fé, pela desonestidade, no intuito

de corromper a patrimônio público (material e imaterial), e, sendo assim, é certo que as ações

ou omissões submetidas à Lei nº 8.429/1992 devem contar, necessariamente, com o elemento

subjetivo do agente.

Assim, todas as infrações capituladas na Lei de Improbidade Administrativa exigem a

presença do dolo (enriquecimento ilícito, lesão ao erário e violação aos princípios

contitucionais-administrativos), ou pelo menos da culpa, no caso das condutas que causam

prejuízo ao erário. Não há que se falar, portanto, em responsabilidade objetiva do agente para

aplicação das sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa, sob pena de grave

ofensa ao § 4º do artigo 37 da Constituição Federal (MATTOS, 2010). Em consonância ao

que foi dito, preleciona Emerso Garcia:

No direito moderno, assume ares de dogma a concepção de que não é admissível a

imputatio juris de um resultado danoso sem um elo de ligação psíquica que a ele

vincule o agente.

Ressalvados os casos em que a responsabilidade objetiva esteja expressamente

prevista no ordenamento jurídico, é insuficiente a mera demonstração do vínculo causal objetivo entre a conduta do agente e o resultado lesivo. [...] O elemento

subjetivo que deflagará este elo de encadeamento lógico entre a vontade, conduta e

resultado, com a consequente demonstração da culpabilidade do agente, poderá

apresentar-se sob duas únicas formas: o dolo e a culpa (GARCIA et al, 2002, p. 214-

215).

Page 40: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

39

Nessa esteira, merece trazer à baila a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça,

que já pacificou o entendimento quanto à matéria, no exato sentido aqui aventado:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO

CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ARTIGO 11 DA

LEI N. 8.429⁄92. CONTRATAÇÃO DIRETA DE SERVIDORES TEMPORÁRIOS.

ACÓRDÃO RECORRIDO QUE DEIXA DE SINDICAR SOBRE ATUAÇÃO

DOLOSA DO RECORRENTE. AUSÊNCIA DE SUBSUNÇÃO DO ATO

REPUTADO ÍMPROBO AO TIPO PREVISTO INDIGITADO DISPOSITIVO.

CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA ARRIMADA NA LEI MUNICIPAL N. 1.130⁄97. NECESSIDADE EXCEPCIONAL DO INTERESSE PÚBLICO.

1. Inexiste afronta ao artigo 535 do CPC quando o Tribunal de origem,

embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta

nos autos. Saliente-se, ademais, que o magistrado não está obrigado a rebater, um a

um, os argumentos deduzidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados

tenham sido suficientes para embasar o decisum.

2. O STJ ostenta entendimento uníssono segundo o qual, para que seja

reconhecida a tipificação da conduta do réu como incurso nas previsões da Lei

de Improbidade Administrativa, é necessária a demonstração do elemento

subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9º e 11

e, ao menos, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10. Precedentes: AgRg no

AREsp 20.747⁄SP, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe

23⁄11⁄2011; REsp 1.130.198⁄RR, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma,

DJe 15⁄12⁄2010; EREsp 479.812⁄SP, Relator Ministro Teori Albino Zavascki,

Primeira Seção, DJe 27⁄9⁄2010; REsp 1.149.427⁄SC, Relator Ministro Luiz Fux,

Primeira Turma, DJe 9⁄9⁄2010; e EREsp 875.163⁄RS, Relator Ministro Mauro

Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 30⁄6⁄2010 [...] (Recurso Especial

1.291.994, Primeira Turma, Relator Ministro Benedito Gonçalves, julgado em 10

abril 2012, publicado em 13 abril 2012, grifo nosso).

AGRAVOS REGIMENTAIS EM RECURSO ESPECIAL.

DIREITO ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. ELEMENTO

SUBJETIVO NÃO DEVIDAMENTE DEMONSTRADO. INEXISTÊNCIA

DE DOLO APTO A CARACTERIZAR A IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

1. O juízo acerca da ilegalidade do ato tido como ímprobo, sem a

devida demonstração do elemento subjetivo dos agentes públicos, não é suficiente

para a condenação por improbidade administrativa (precedentes idênticos). 2. "É razoável presumir vício de conduta do agente público que pratica um ato

contrário ao que foi recomendado pelos órgãos técnicos, por pareceres jurídicos ou

pelo Tribunal de Contas. Mas não é razoável que se reconheça ou presuma esse

vício justamente na conduta oposta: de ter agido segundo aquelas manifestações, ou

de não ter promovido a revisão de atos praticados como nelas recomendado, ainda

mais se não há dúvida quanto à lisura dos pareceres ou à idoneidade de quem os

prolatou. Nesses casos, não tendo havido conduta movida por imprudência,

imperícia ou negligência, não há culpa e muito menos improbidade. A ilegitimidade

do ato, se houver, estará sujeita a sanção de outra natureza, estranha ao âmbito da

ação de improbidade." (REsp nº 827.445⁄SP, Relator Ministro Luiz Fux, Relator p⁄

acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, in DJe 8⁄3⁄2010).

3. "A jurisprudência desta Corte já se manifestou no sentido de que se

faz necessária a comprovação dos elementos subjetivos para que se repute

uma conduta como ímproba (dolo, nos casos dos artigos 11 e 9º e, ao menos,

culpa, nos casos do artigo 10), afastando-se a possibilidade de punição com base

tão somente na atuação do mal administrador ou em supostas contrariedades

aos ditames legais referentes à licitação, visto que nosso ordenamento

jurídico não admite a responsabilização objetiva dos agentes públicos." (REsp

nº997.564⁄SP, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, in DJe

25⁄3⁄2010).

Page 41: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

40

4. Agravos regimentais providos (Agravos Regimentais no Recuso Especial nº

1.065.588, 1ª Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 08

fevereiro 2011, publicado em 21 fevereiro 2011, grifo nosso).

A problemática, no entanto, reside nos artigos 5º e 10 da Lei nº 8.429/199215 que

possibilitam a responsabilização do agente público, ou de terceiro, nos atos que causarem

prejuízo ao erário, por meio da comprovação de dolo ou culpa. Isso porque, considerando que

a prática de um ato ímprobo pressupõe a consciência e a voluntariedade de agir em desacordo

com os preceitos éticos e normativos da Administração Pública, seria juridicamente

impossível imputar a responsabilidade a um sujeito que agiu por negligência, imprudência ou

imperícia, pois não existiria ato ímprobo por descuido do agente público (SIMÃO, 2011).

Afora a controvérsia instalada, importa no presente momento ressaltar a necessidade

de comprovação do elemento subjetivo para tipificação das condutas inseridas na Lei de

Improbidade Administrativa, não sendo possível a responsabilidade objetiva do agente. A

viabilidade e constitucionalidade da modalidade culposa serão abordadas em capítulo próprio.

4.2 Atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito

Entre os nefastos efeitos causados pela corrupção e, por sua vez, pelos atos de

improbidade administrativa, o enriquecimento ilícito certamente é o mais combatido. Como se

viu no capítulo anterior, todos os dispositivos constitucionais e legislações sobre a matéria de

improbidade procuraram meios para combater o enriquecimento ilícito dos agentes violadores

do patrimônio público. Não seria diferente, portanto, quanto à Lei nº 8.429/1992, que

determinou em seu artigo 6º que no caso de enriquecimento ilícito, perderá o agente público

ou terceiro beneficiário bens ou valores acrescidos ao seu patrimônio.

Quanto ao conceito de enriquecimento ilícito, entende-se que é o resultado advindo do

aumento patrimonial do agente público ou de terceiro sem justa causa, em decorrência da

prática de um ato de improbidade administrativa (GARCIA et al, 2002). Nos dizeres de

Marcelo Figueiredo:

[...] enriquecimento ilícito é o acréscimo de bens ou valores que ocorre no

patrimônio do agente público ou de terceiros a ele vinculados, por ação ou omissão, mediante condutas ilícitas, em detrimento da administração pública nas suas mais

variadas manifestações. Manifesta-se preponderantemente através do acréscimo

(proveito) patrimonial. Contudo, pratica ainda ato de enriquecimento ilícito o agente

15 A Lei de Improbidade Administrativa ainda traz previsão expressa nesse sentido em seu artigo 5º, ao

preceituar: “Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente ou de

terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano” (grifo nosso).

Page 42: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

41

que causa dano moral à administração (FIGUEIREDO, 1995 apud COPOLA, 2011,

p. 66).

As hipóteses abrangidas pela Lei de Improbidade Administrativa estão descritas no

artigo 9º, sendo que tal rol é meramente exemplificativo, conforme se denota da expressão

“notadamente”, inserta no caput daquele dispositivo16.

Por fim, cabe ressaltar que aplicação das sanções decorrentes das hipóteses previstas

no artigo 9º dependem da efetiva comprovação do dolo do agente público ou de terceiro em se

beneficiar por meio do ato de improbidade, não havendo que se falar em culpa quanto a este

dispositivo, pois somente aquele que possui vontade livre e consciente em lesar o erário em

proveito próprio poderá se enriquecer ilicitamente (COPOLA, 2011, p. 82).

4.3 Atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário

O artigo 10 da Lei de Improbidade Administrativa ocupou-se em encampar hipóteses

em que a conduta do agente público resulta em prejuízo ao erário, seja por meio de ação ou

omissão, dolosa ou culposa. Por prejuízo ou dano ao erário, compreende-se aqueles atos

passíveis de causar perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação

dos bens ou haveres integrantes do patrimônio da Administração Pública e demais entidades

que possam assumir a condição de sujeito passivo (SIMÃO, 2011). Também nesse caso o rol

de condutas trazido pela norma é exemplificativo17.

A finalidade precípua do dispositivo em tela é buscar o ressarcimento dos cofres

públicos em virtude da redução patrimonial sofrida. Acrescenta ainda Gina Copola (2011, p.

97), a impossibilidade prática de se configurar um ato de improbidade administrativa sem que

exista dano aos cofres públicos, ou, de outra forma, enriquecimento ilícito do agente.

4.4 Atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da

Administração Pública

A terceira espécie de ato de improbidade administrativa, trazida pelo artigo 11 da Lei

nº 8.429/1992, refere-se às condutas que atentam contra os princípios constitucionais-

administrativos, insculpidos, precipuamente, no artigo 37, caput, da Constituição da

16 A leitura dos tipos legais pode ser feita por meio do Anexo A da presente monografia, no qual consta a íntegra

da Lei nº 8.429/1992. 17 Ver nota de rodapé anterior.

Page 43: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

42

República, quais sejam, legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Ademais, a redação do dispositivo em comento permite a incidência da norma sobre qualquer

ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade e lealdade às

instituições, apresentando o seguinte rol exemplificativo de condutas: a) praticar ato visando

fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência; b)

retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício; c) revelar fato ou circunstância de

que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo; d) negar

publicidade aos atos oficiais; e) frustrar a licitude de concurso público; f) deixar de prestar

contas quando esteja obrigado a fazê-lo; e g) revelar ou permitir que chegue ao conhecimento

de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz

de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço.

Interessante colacionar a crítica feita por Mauro Roberto Gomes de Mattos sobre o

caráter aberto desse dispositivo, a fim de se evitar exageros na aplicação da Lei de

Improbidade:

Há que se ter temperamentos ao interpretar a presente norma, pois seu caráter é

muito aberto, devendo, por esta razão, sofrer a devida dosagem de bom senso para que mera irregularidade formal, que não se subsuma como devassidão ou ato

ímprobo, não seja enquadrado na presente lei, com severas punições (MATTOS,

2010, p. 365).

Quanto ao elemento subjetivo necessário a configuração do tipo previsto no artigo 11,

doutrina e jurisprudência já assentaram o entendimento de que somente por meio do dolo é

possível a prática do ato de improbidade administrativa nele tipificado. Nesse sentido:

Diz-se que os ilícitos previstos nos arts. 9º e 11 não admitem a culpa em razão de

dois fatores. [...] No que concerne ao segundo, tem-se um fator lógico-sistemático de

exclusão, pois tendo sido a culpa prevista unicamente no art. 10, afigura-se evidente

que a mens legis é restringi-la a tais hipóteses, excluindo-a das demais (GARCIA et

al, 2002, p. 216).

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. CONTRATAÇÃO SEM CONCURSO

PÚBLICO. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO GENÉRICO. REVISÃO DE

PROVA. INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ.

1. A caracterização dos atos de improbidade previstos no artigo 11 da Lei

8.429/92 está a depender da existência de dolo genérico na conduta do agente.

Precedentes.

2. A contratação irregular sem a realização de concurso público pode se

caracterizar como ato de improbidade administrativa, mas, para tanto, é

imprescindível a demonstração de dolo, ao menos genérico, do agente.

3. Para desconstituir a decisão do Tribunal de origem e acatar os argumentos do

agravante seria necessário adentrar no contexto fático-probatório, o que não se

mostra cabível no âmbito do recurso especial.

Page 44: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

43

4. Agravo regimental não provido (Superior Tribunal de Justiça, Agravo Regimental

no Recurso Especial nº 1.274.682/PB, Segunda Turma, Relator Ministro Castro

Meira, julgado em 06 dezembro 2012, publicado em 04 fevereiro 2013, grifo nosso).

Logo, tem-se que para configuração do ato de improbidade elencado no artigo 11 da

Lei de Improbidade Administrativa, torna-se imprescindível a presença do dolo, sendo

insuficiente a culpa do agente público, pois a existência de um ato ilegal não conduz a

conclusão de que ele será ímprobo, havendo necessidade de se evidenciar a má-fé ou

desonestidade do sujeito ativo (SIMÃO, 2011, p. 193).

Page 45: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

44

5 A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MODALIDADE CULPOSA DOS ATOS DE

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

O presente capítulo será desenvolvido a partir da análise realizada no quarto capítulo

sobre a inclusão do elemento subjetivo culpa na tipificação do artigo 5º e 10 da Lei de

Improbidade Administrativa, em especial quanto à modalidade denominada como culpa

grave, abordagem trazida pela doutrina, numa tentativa de conferir legitimidade ao precitado

artigo. Neste ponto, entretanto, a discussão centraliza-se em pesquisar se a responsabilização

de agentes públicos, ou de terceiros, por meio da culpa encontra-se em conformidade com a

Constituição Federal. A matéria demanda análise cuidadosa, especialmente, repita-se, no que

tange ao conceito de culpa tratado durante o trabalho. A relevância do tema foi muito bem

exposta por Naira Senna, ao preceituar que:

O problema central [...] é que as escolhas públicas e as sanções não se encontram claramente definidas na improbidade culposa, como revela uma jurisprudência

conflitante entre as Turmas do Superior Tribunal de Justiça e uma doutrina

permeada por quatro correntes doutrinárias diferentes a respeito do tema. Diante de

tamanho desacordo, a aplicação uniforme do instituto pelo Judiciário e a repressão

da improbidade administrativa ficam fragilizadas (SENNA, 2010, p. 32).

Objetiva-se, assim, distinguir os conceitos de culpa grave e dolo, sendo este, em linhas

gerais, representado pela vontade deliberada e consciente em atingir um fim ilícito e imoral,

ou seja, aquele que pratica o ato norteia-se pela má-fé, é o agente corrupto, desonesto.

5.1 Distinções entre dolo e culpa

Antes de adentrar na discussão quanto à constitucionalidade da modalidade culposa

dos atos de improbidade administrativa, precedendo a abordagem dos posicionamentos

doutrinários e jurisprudenciais a respeito do tema, torna-se necessário divisar os conceitos de

dolo e culpa, exercício que muito facilitará a elucidação do tema.

Em primeiro lugar, ressalta-se que dolo e culpa são institutos jurídicos presentes em

todas as discussões relacionadas à responsabilidade do sujeito de direito, justamente por

envolver a consciência e a voluntariedade de seu agir. É certo que na seara do direito penal

sempre foi maior a preocupação e o desenvolvimento científico dedicado a tais categorias, por

envolver o problema da tipificação dos ilícitos penais, bem como para definir o grau de

Page 46: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

45

responsabilização do agente. Pode-se dizer, portanto, que aplicação desses institutos no

campo da improbidade administrativa ocorre de forma análoga (SENNA, 2010).

O dolo é o elemento subjetivo informado pela vontade livre e consciente do agente

público em causar um resultado ilícito. Rogério Greco expõe de forma detalhada o conceito

de dolo, nos seguintes termos:

Dolo é a vontade e a consciência dirigidas a realizar a conduta prevista no tipo penal

incriminador. Conforme preleciona Welzel, “toda ação consciente é conduzida pela

decisão da ação, quer dizer, pela consciência do que se quer – o momento intelectual

– e pela decisão a respeito de querer realizá-lo – o momento volitivo. Ambos os momentos, conjuntamente, como fatores configuradores de uma ação típica real,

formam o dolo (= dolo do tipo)” [...]. Assim, podemos perceber que o dolo é

formado por um elemento intelectual e um elemento volitivo (GRECO, 2012, p. 60-

61).

Vale lembrar que a definição acima refere-se à modalidade do dolo direto, havendo,

ainda, a categoria do dolo eventual. Este último estará presente sempre que o sujeito ativo não

desejar atingir, num primeiro momento, o resultado vedado por lei, e, não obstante, assumir o

risco de produzi-lo, aceitando a probabilidade de sua efetiva concretização (JUNQUEIRA,

2010, p. 70).

Para ilustrar o que foi dito acima, imagine-se a seguinte situação: determinado agente

público, responsável pelo Setor de Licitações do Município “X”, resolve contratar os serviços

da Empresa “Y”, por manter amizade íntima com um de seus sócios, sem realizar

procedimento licitatório prévio e fora das hipóteses legais de dispensa. Ocorre que, no mesmo

Município, existem outras empresas que oferecem o mesmo serviço, com igual qualidade e a

custo mais baixo. Caso o servidor esteja consciente de que sua conduta irá causar prejuízo ao

erário, estar-se-á diante do dolo direto. Lado outro, se o referido agente público não soubesse

da existência de outras empresas, e mesmo assim não importasse em descobrir a existência de

outros fornecedores, assumindo o risco de realizar a contratação mais cara ao erário, estaria

configurado o dolo eventual.

Por sua vez, a culpa denota um grau de descuido em relação ao bem jurídico protegido

pela norma, seja por negligência, imprudência ou imperícia (GOMES, 2005 apud SIMÃO,

2011, p. 81). Cite-se, por exemplo, o inciso X do artigo 10 da Lei nº 8.429/1992, que tipifica

como ato ímprobo a conduta de agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, ou

no que diz respeito à conservação do patrimônio público. Segundo Cezar Roberto Bitencourt

(2009, p. 297), “culpa é a inobservância do dever objetivo de cuidado manifestada numa

conduta produtora de um resultado não querido, objetivamente previsível”.

Page 47: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

46

No intuito de apartar o dolo da culpa, Naira Senna ressalta os traços que diferenciam

esses institutos, nos seguintes termos:

Na culpa, o agente não dirige a sua conduta a um resultado ilícito, mas este é

alcançado, pois sua ação foi descuidada. Não houve em seu agir a diligência,

prudência ou perícia que devem ser observadas pela sociedade. Na culpa, diferente

do dolo, não há previsão, pelo sujeito ativo, do resultado (Id., 2010, p. 31).

Fábio Medina Osório esclarece que a culpa capaz de qualificar determinado ato como

ímprobo é a culpa grave, entendida esta como uma violação intolerável ao dever de probidade

e aos cânones da boa administração, implicando em grave ineficiência funcional da

Administração Pública. Em suas palavras:

Culpa é a inobservância de deveres objetivos de cuidado em relação a evitar certos

comportamentos considerados nocivos aos bens jurídicos protegidos. Culpa grave,

erro grosseiro, são requisitos da improbidade culposa. Gravidade da intolerável

ineficiência funcional é outra espécie de patologia, mas igualmente implicada na

improbidade. Incisos dos arts.10 e 1118, dependendo da estrutura redacional

específica, comportam, ao nosso ver, enquadramento na categoria da culpa grave

(OSÓRIO, 2012, p. 25).

Isso posto, avança-se no trabalho para expor as correntes doutrinárias e o

posicionamento jurisprudencial a respeito da constitucionalidade da modalidade culposa.

5.2 Posicionamentos doutrinários

De início, torna-se imperioso relembrar algumas considerações sobre o conceito de

improbidade administrativa, na linha do que foi dito no capítulo primeiro. Não obstante a Lei

nº 8.429/1992 apresente tipos legais abertos e contornos imprecisos, e não haver um conceito

permanente do que seja improbidade administrativa, é firme o posicionamento de que ela

nasce de atos marcados pela desonestidade, imbuídos pela má-fé e direcionados à prática da

corrupção, e, no campo do direito administrativo, pode ser encontrada a partir dos atos que

desrespeitem a ética pública, praticados com a intenção clara e consciente em violar o erário

ou os princípios da Administração Pública (notadamente, a moralidade, a impessoalidade e a

eficiência).

18 Consoante exposto no capítulo anterior, os atos de improbidade administrativa que violam os princípios da

Administração Pública, sancionados pelo artigo 11 da Lei nº 8.429/1992, só admitem a modalidade dolosa,

conforme posição pacificada na doutrina e na jurisprudência. A posição de Fábio Medina Osório, embora digna

de estudo, integra corrente minoritária sobre o tema.

Page 48: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

47

Ademais, pode-se afirmar que a definição de ato ímprobo não se confunde com o

conceito de ato ilícito ou danoso, uma vez que o primeiro apresenta um alcance muito mais

amplo, ao passo que os segundos, embora possam estar em desacordo com a lei ou resultarem

em prejuízo à Administração Pública, são executados sem a marca da desonestidade ou

apenas derivam de erros toleráveis na prática dos atos administrativos (SIMÃO, 2011).

É de fundamental importância estabelecer tais distinções para que se compreenda que

tipo de conduta poderá ser objeto da Lei de Improbidade Administrativa. Se houve a prática

de um ato ilegal que resultou em dano ao erário, porém sem que o agente tenha procedido de

má-fé ou culpa grave, ou, ainda, sem que estivesse consciente da desonestidade de seu

comportamento, não se pode tipificar tal conduta mediante aplicação dos dispositivos da Lei

nº 8.429/92. Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

[...] o enquadramento na lei de improbidade administrativa exige culpa ou dolo por

parte do sujeito ativo. Mesmo quando algum ato ilegal seja praticado é preciso

verificar se houve culpa ou dolo, se houve um mínimo de má-fé que revele

realmente a presença de um comportamento desonesto (DI PIETRO, 2009, p. 823).

Ainda no campo doutrinário, mister ressaltar as lições de Hely Lopes Meirelles, em

obra atualizada por Arnoldo Wald e pelo Ministro Gilmar Mendes:

Embora haja quem defenda a responsabilidade civil objetiva dos agentes públicos

em matéria de ação de improbidade administrativa, parece-nos que o mais acertado é

reconhecer a responsabilidade apenas na modalidade subjetiva. Nem sempre um

ato ilegal será um ato ímprobo. Um agente público incompetente, atabalhoado

ou negligente não é necessariamente um corrupto ou desonesto. O ato ilegal,

para ser caracterizado com ato de improbidade administrativa, há de ser

doloso ou, pelo menos, de culpa gravíssima (MEIRELLES, 2004, p. 210-2011,

grifo nosso).

A forma dolosa caracteriza-se pela vontade deliberada e consciente em atingir um fim

ilícito e imoral, ou seja, aquele que pratica o ato norteia-se pela má-fé, é o agente corrupto,

desonesto. Na situação prevista pelo inciso VIII, do artigo 10, por exemplo, o dolo revelar-se-

á sempre que o agente público frustrar a licitação ou dispensá-la indevidamente, sabendo que

sua conduta causará prejuízos ao erário, ou, pelo menos, assumindo o risco de produzir tal

resultado. Nesse sentido:

[...] ímproba é a conduta consciente do agente público em atentar contra a

moralidade, demonstrada pela vontade específica de violar a lei. A intenção de

fraudar a lei é condição subjetiva indispensável para o presente enquadramento, sob

pena de vulgarização do que venha a ser o ato de improbidade administrativa, que,

Page 49: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

48

como visto, não se caracteriza como toda conduta ilegal, tem que estar presente a

devassidão (MATTOS, 2004, p. 04).

Lado outro, o termo culpa constante no caput do artigo 10 deve ser interpretado como

o grau de comprometimento do agente em relação ao bem jurídico protegido – neste caso, o

erário –, significa dizer que somente serão punidos atos afetados pela famigerada culpa grave,

onde o agente menospreza, deliberadamente, as formalidades indispensáveis à proteção da

coisa pública, incidindo em erro intolerável e extremamente lesivo ao interesse público.

Em termos práticos, dolo e culpa grave estão intimamente ligados. Ambos os casos

necessitam de provas substanciais quanto à desonestidade ou desídia do agente, a ponto de

justificar uma condenação por improbidade administrativa, isto porque, à luz da consagrada

expressão, “a lei alcança o administrador desonesto, não o inábil”19. Meros equívocos formais

ou inabilidade do agente público são insuficientes para justificar a possibilidade jurídica da

ação de improbidade. Interessante expor os comentários de Mauro Roberto Gomes de Mattos

sobre o tema:

Como muito bem diz José Afonso da Silva, o „ímprobo administrador é o devasso da

Administração Pública‟. A devassidão a que se refere José Afonso da Silva, caracterizadora da improbidade administrativa, deverá vir contida na índole da

conduta do agente público ou na vontade de lesar ao erário, pois do contrário faltará

tipicidade para enquadrar o ato culposo em ímprobo. Nem toda lesão ao patrimônio

público pode ser considerada como reveladora de um ato de improbidade

administrativa, pelo fato de a conduta do agente público ser o elemento

caracterizador do ilícito (MATTOS, 2010, p. 577).

Para solucionar o problema da constitucionalidade da modalidade culposa, a doutrina

apresenta basicamente três posicionamentos, cada qual com suas próprias razões, a saber: I - a

modalidade culposa é constitucional, independente da forma de culpa; II – é inconstitucional a

modalidade culposa dos atos de improbidade administrativa, sancionando-se apenas os atos

dolosos; e III – é constitucional a modalidade culposa, mas desde que os atos sejam praticados

mediante culpa grave ou gravíssima.

A primeira corrente sustenta que o legislador teria sido bem claro ao definir a

possibilidade de tal modalidade no texto da Lei nº 8.429/1992, sendo que somente as condutas

previstas pelos artigos 9º e 11 aceitaram somente a modalidade dolosa. Nesse sentido:

19 A expressão aparece pela primeira vez no acórdão do Recurso Especial nº 213.994-0/MG, julgado pela 1ª

Turma do Superior Tribunal de Justiça em 17 de agosto de 1999. Sendo assim, sua autoria deve ser creditada ao

relator do caso, Excelentíssimo Senhor Ministro Jacy Garcia Vieira.

Page 50: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

49

O elemento subjetivo é o dolo ou culpa, como consta do caput do dispositivo. Neste

ponto o legislador adotou critério diverso em relação ao enriquecimento ilícito. É

verdade que há autores que excluem a culpa, chegando mesmo a considerar

inconstitucional tal referência no mandamento legal. Não lhes assiste razão,

entretanto. O legislador teve realmente o desiderato de punir condutas culposas

de agentes, que causem danos ao erário. Aliás, para não deixar dúvida, referiu-

se ao dolo e à culpa também no art.5º, que, da mesma forma, dispõe sobre

prejuízos ao erário. Em nosso entender, não colhe o argumento de que a conduta

culposa não tem gravidade suficiente para propiciar a aplicação de penalidade. Com

toda a certeza, há comportamentos culposos que, pela repercussão que acarretam,

têm maior densidade que algumas condutas dolosas. Além disso, o princípio da proporcionalidade permite a perfeita adequação da sanção à maior ou menor

gravidade do ato de improbidade. O que se exige, isto sim, é que haja comprovada

demonstração do elemento subjetivo e também do dano causado ao erário. Tanto

quanto na improbidade que importa em enriquecimento ilícito, não há ensejo para a

tentativa (CARVALHO FILHO, 2009 apud SENNA, 2010, p. 40-41, grifo nosso).

No mesmo sentido, Emerson Garcia (2002, p. 216) argumenta que o artigo 10 da Lei

de Improbidade Administrativa não faz distinção entre os diversos graus de culpa. Assim, seja

ela classificada como leve, grave ou gravíssima, tal fato não influenciaria na configuração do

ato de improbidade administrativa. Ademais, o parágrafo § 4º do artigo 37 da Constituição

Federal não elege o dolo como único elemento subjetivo possível, assim como o artigo 5º da

Lei nº 8.429/1992 apenas indica a modalidade genérica da culpa, inexistindo ressalvas.

Por sua vez, a parcela da doutrina que entende pela inconstitucionalidade da

modalidade culposa sustenta que tal orientação permitiria a aplicação desregrada da Lei de

Improbidade Administrativa, pois todo agente que cometesse erros, ainda que desprovido de

má-fé, estaria sujeito às graves sanções daquele Diploma. Filia-se a essa corrente o jurista

Mauro Roberto Gomes de Mattos, defendendo seu posicionamento nas seguintes palavras:

Partindo-se da premissa de que o elemento subjetivo da desonestidade, que deságua

na improbidade administrativa, é o dolo, não há como estender tal princípio para a

culpa, eis que o divórcio entre uma e outra situação é insuperável. Não pode o

legislador querer desnaturar a figura da boa-fé ou da falta de intenção de lesar o ente

público, para considerá-la, em igualdade de condições, com aquelas situações

caracterizadoras da devassidão do agente público desonesto que traz no seu espírito

intenções impuras e imorais reveladas pela vontade de fraudar o erário (Id., 2010, p.

269).

Reforçando o posicionamento acima, Calil Simão (2011, p. 81-83) explica que o

instituto da culpa é incompatível com o conceito de improbidade administrativa, não

aceitando nem mesmo a ideia de culpa grave. Segundo o autor, seria impossível entender que

um agente desonesto e corrupto provocasse um resultado lesivo à Administração Pública por

mero descuido. Argumenta, ainda, que o conceito de culpa grave foi erroneamente importado

do direito penal, uma vez que neste ramo jurídico ela estaria inserida como elemento de

Page 51: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

50

culpabilidade do agente, vale dizer, a culpa grave não serviria para tipificação do ato ilícito,

mas sim para determinar o grau de violação do bem jurídico tutelado pela norma. Em suas

palavras:

[...] podemos concluir que o elemento subjetivo do agente ímprobo é sempre o dolo.

O dolo nas suas mais variadas formas (direto ou eventual). A infração dolosa só

existe quando o elemento culpabilidade está impregnado de culpa grave ou

gravíssima. Tudo isso quer dizer que a culpa interessa tanto para a tipicidade quanto

para a culpabilidade; em cada uma delas, entretanto, com funções distintas. Aliás, o

próprio termo culpa indica um erro cometido por inadvertência ou por imprudência

(Id., 2011, p.82-83).

Sendo assim, a interpretação do artigo 10 deve estar adstrita aos limites semânticos do

conceito de ato ímprobo, notadamente quanto à expressão culpa inserida em seu texto, sob

pena de violação ao princípio da razoabilidade e inconstitucionalidade do dispositivo frente ao

§ 4º do artigo 37 da Carta Magna.

A terceira corrente doutrinária, por sua vez, vincula-se a tese de constitucionalidade da

modalidade culposa, todavia, se diferenciando da primeira corrente ao condicionar a

existência do ato de improbidade administrativa à gravidade da culpa.

Consoante afirmado na subseção 2.3 do capítulo primeiro deste trabalho, não se pode

admitir que todo e qualquer erro cometido pelo agente público no exercício de suas funções

seja tomado como ato ímprobo. Com efeito, o administrador público tem direito ao erro

juridicamente tolerável (OSÓRIO, 2012), havendo que se falar em improbidade

administrativa somente quando houver ato eivado de culpa grave ou gravíssima, que

comprometa os postulados de eficiência aplicáveis ao setor público (SENNA, 2010, p. 42).

No entanto, os atos culposos merecem especial atenção no momento de aplicação das

sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa, haja vista que representam condutas

menos lesivas do que aquelas praticadas sob a forma dolosa, fato que reclama a incidência do

princípio da proporcionalidade na fase de dosimetria das sanções (OSÓRIO, 2000, p.200).

Destaca-se entre os defensores dessa corrente o jurista Fábio Medina Osório, ao

argumentar que a improbidade administrativa não estaria restrita à ideia de desonestidade,

aplicando-se também aos casos de grave ineficiência na gestão pública. Sintetizando o

pensamento esposado pelos adeptos a esta terceira via, o autor afirma que

Os tipos culposos da improbidade administrativa descendem já da própria

Constituição Federal. Nesta, não há restrição alguma à improbidade culposa. Ao

contrário, há reforço no sentido da necessária proteção dos valores “eficiência” ou

“economicidade”, ao abrigo da moral administrativa e de princípios expressos nos

arts. 37 ou 70 da CF. Forte no princípio democrático, a LGIA [Lei Geral de

Page 52: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

51

Improbidade Administrativa] optou pela eleição da improbidade culposa como

modalidade de ilícito. Não desrespeitou o comando do art. 37, § 4º, da CF, que prevê

uma série de sanções aos atos ímprobos, porque o castigo reservado ao ilícito

culposo haverá, como ocorre nos demais tipos de ilícitos de ser balanceado e

ponderado, em consonância com o postulado ou princípio da proporcionalidade (Id.,

2010, p. 231).

Adota-se, no desenvolvimento deste trabalho, a tese apresentada pela terceira corrente,

onde a modalidade culposa é considerada como constitucional, mas desde que condicionada à

gravidade da culpa. Essa escolha é motivada, essencialmente, pelos argumentos apresentados

por Naira Senna (2010, p. 50), para quem a adoção da primeira corrente (constitucionalidade

irrestrita dos atos culposos) poderia desaguar na violação do princípio da proibição de

excesso20, ao deixar de estabelecer parâmetros confiáveis para definição da culpa. Por outro

lado, tomar por inconstitucional a modalidade culposa extrapola os limites semânticos do

artigo 37, § 4º, da Constituição, uma vez que dele não se extrai qualquer vedação ao

sancionamento dos atos ímprobos culposos.

Logo, não somente é possível, como é constitucional a previsão da modalidade

culposa para os atos de improbidade administrativa inseridos no artigo 10 da Lei nº

8.429/1992, desde que se esteja diante de uma conduta derivada de culpa grave ou gravíssima

do agente público no exercício de suas funções.

5.3 Posicionamentos jurisprudenciais

Os tribunais pátrios, em especial o Superior Tribunal de Justiça, têm se manifestado de

modo divergente a respeito da possibilidade de responsabilização do agente público por meio

da modalidade culposa, dependendo, inclusive, da modalidade de ato ímprobo que se está

diante (SENNA, 2010).

No Superior Tribunal de Justiça, a Primeira Turma assentou o entendimento de que o

elemento subjetivo é essencial a configuração do ato ímprobo, sinalizando que somente em

caso de culpa grave haveria subsunção ao artigo 10. Vejam-se os seguintes julgados:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA. OS AGENTES POLÍTICOS PODEM SER PROCESSADOS POR SEUS ATOS PELA LEI 8.429/92. ENTENDIMENTO FIRMADO PELA

20 A autora explica que o postulado da proibição de excesso foi desenvolvido pelo jurista Humberto Ávila, para

quem “[...] a promoção das finalidades constitucionalmente postas possui, porém, um limite. Esse limite é

fornecido pelo postulado da proibição de excesso. Muitas vezes denominado pelo Supremo Tribunal Federal

como uma das facetas do princípio da proporcionalidade, o postulado da proibição de excesso proíbe a restrição

excessiva de qualquer direito fundamental. [...] O postulado da proibição de excesso depende, unicamente, de

estar um direito fundamental sendo excessivamente restringido” (ÁVILA, 2007 apud SENNA, 2010, p. 51).

Page 53: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

52

CORTE ESPECIAL/STJ (RCL 2.790/SC, REL. MIN. TEORI ALBINO

ZAVASCKI, DJE 4.3.2010). RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO

RELATOR. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE

PROCEDIMENTO PRÉVIO PARA A APROVAÇÃO DO TERMO DE

DISPENSA DE LICITAÇÃO. ART. 10, VIII DA LEI 8.429/92.

INDISPENSABILIDADE DE COMPROVAÇÃO DO EFETIVO PREJUÍZO AO

ERÁRIO E DO DOLO DO AGENTE. PREVISÃO DE RESPONSABILIZAÇÃO

DO SERVIDOR POR CONDUTA CULPOSA. IRRAZOABILIDADE. AGRAVO

REGIMENTAL DESPROVIDO.

(...)

3. As Turmas que compõem a Primeira Seção desta Corte já firmaram a orientação de que a configuração dos atos de improbidade administrativa previstos no art. 10 da

Lei de Improbidade Administrativa exige a presença do efetivo dano ao erário.

4. As instâncias de origem reconheceram que o pagamento da verba honorária ao

Escritório Advocatício não se materializou, em razão do ajuizamento de ação

judicial própria, tendo o Tribunal de origem expressamente consignado a ausência

de danos ao Erário.

5. Não se deve admitir que a conduta culposa renda ensejo à responsabilização

do Agente por improbidade administrativa; com efeito, a negligência, a

imprudência ou a imperícia, embora possam ser consideradas condutas

irregulares e, portanto, passíveis de sanção, não são suficientes para ensejar a

punição por improbidade administrativa. O elemento culpabilidade, no interior

do ato de improbidade, se apurará sempre a título de dolo, embora o art. 10 da

Lei 8.429/92 aluda efetivamente à sua ocorrência de forma culposa; parece

certo que tal alusão tendeu apenas a fechar por completo a sancionabilidade

das ações ímprobas dos agentes públicos, mas se mostra mesmo impossível,

qualquer das condutas descritas nesse item normativo, na qual não esteja

presente o dolo.

(...)

8. Agravo Regimental desprovido (Agravo Regimental no Recurso Especial nº

1.199.582, Primeira Turma, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, julgado

em 15.12.2011, publicado em 09.02.2012, grifo nosso).

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO

CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11 DA LEI

N. 8.429⁄92. CONTRATAÇÃO DIRETA DE SERVIDORES TEMPORÁRIOS.

ACÓRDÃO RECORRIDO QUE DEIXA DE SINDICAR SOBRE ATUAÇÃO

DOLOSA DO RECORRENTE. AUSÊNCIA DE SUBSUNÇÃO DO ATO

REPUTADO ÍMPROBO AO TIPO PREVISTO INDIGITADO DISPOSITIVO.

CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA ARRIMADA NA LEI MUNICIPAL N.

1.130⁄97. NECESSIDADE EXCEPCIONAL DO INTERESSE PÚBLICO.

1. Inexiste afronta ao art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem,

embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta

nos autos. Saliente-se, ademais, que o magistrado não está obrigado a rebater, um a

um, os argumentos deduzidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar o decisum.

2. O STJ ostenta entendimento uníssono segundo o qual, para que seja

reconhecida a tipificação da conduta do réu como incurso nas previsões da Lei

de Improbidade Administrativa, é necessária a demonstração do elemento

subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9º e 11

e, ao menos, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10. Precedentes: AgRg no

AREsp 20.747⁄SP, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe

23⁄11⁄2011; REsp 1.130.198⁄RR, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma,

DJe 15⁄12⁄2010; EREsp 479.812⁄SP, Relator Ministro Teori Albino Zavascki,

Primeira Seção, DJe 27⁄9⁄2010; REsp 1.149.427⁄SC, Relator Ministro Luiz Fux,

Primeira Turma, DJe 9⁄9⁄2010; e EREsp 875.163⁄RS, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 30⁄6⁄2010. [...] (Recurso Especial

1.291.994, Primeira Turma, Relator Ministro Benedito Gonçalves, julgado em 10

abr 2012, publicado em 13 abr 2012, grifo nosso).

Page 54: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

53

AGRAVOS REGIMENTAIS EM RECURSO ESPECIAL.

DIREITO ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. ELEMENTO

SUBJETIVO NÃO DEVIDAMENTE DEMONSTRADO. INEXISTÊNCIA

DE DOLO APTO A CARACTERIZAR A IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

1. O juízo acerca da ilegalidade do ato tido como ímprobo, sem a

devida demonstração do elemento subjetivo dos agentes públicos, não é suficiente

para a condenação por improbidade administrativa (precedentes idênticos).

2. "É razoável presumir vício de conduta do agente público que pratica um ato

contrário ao que foi recomendado pelos órgãos técnicos, por pareceres jurídicos ou

pelo Tribunal de Contas. Mas não é razoável que se reconheça ou presuma esse

vício justamente na conduta oposta: de ter agido segundo aquelas manifestações, ou de não ter promovido a revisão de atos praticados como nelas recomendado, ainda

mais se não há dúvida quanto à lisura dos pareceres ou à idoneidade de quem os

prolatou. Nesses casos, não tendo havido conduta movida por imprudência,

imperícia ou negligência, não há culpa e muito menos improbidade. A ilegitimidade

do ato, se houver, estará sujeita a sanção de outra natureza, estranha ao âmbito da

ação de improbidade." (REsp nº 827.445⁄SP, Relator Ministro Luiz Fux, Relator p⁄

acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, in DJe 8⁄3⁄2010).

3. "A jurisprudência desta Corte já se manifestou no sentido de que se

faz necessária a comprovação dos elementos subjetivos para que se repute

uma conduta como ímproba (dolo, nos casos dos artigos 11 e 9º e, ao menos,

culpa, nos casos do artigo 10), afastando-se a possibilidade de punição com base

tão somente na atuação do mal administrador ou em supostas contrariedades

aos ditames legais referentes à licitação, visto que nosso ordenamento

jurídico não admite a responsabilização objetiva dos agentes públicos." (REsp

nº997.564⁄SP, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, in DJe

25⁄3⁄2010).

4. Agravos regimentais providos (Agravos Regimentais no Recuso Especial nº

1.065.588, Primeira Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 08

fevereiro 2011, publicado em 21 fev 2011, grifo nosso).

Lado outro, a orientação da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça é no

sentido de que a modalidade culposa é perfeitamente admissível nos casos tipificados pelo

artigo 10 da Lei de Improbidade Administrativa, não havendo divergência sobre o tema, ou

aprofundamento da discussão quanto à constitucionalidade dos atos culposos. Nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ATO DE IMPROBIDADE. EX-

PREFEITO. ATOS QUE ATENTEM CONTRA OS PRINCÍPIOS

ADMINISTRATIVOS. DOLO GENÉRICO. PREJUÍZO AO ERÁRIO

RECONHECIDO PELO TRIBUNAL A QUO. REEXAME FÁTICO.

IMPOSSIBILIDADE.

[...]

2. A jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que o art. 10 da Lei

8.429/1992 admite a modalidade culposa e o art. 11 dispensa a comprovação de

intenção específica de violar princípios administrativos, sendo suficiente o dolo genérico.

3. No tocante ao prejuízo ao Erário, a Corte local entendeu que este decorreu

de ato da recorrente, que procedeu de forma negligente na arrecadação de

tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio

público. Assim, não há como rever tal entendimento, sob pena de esbarrar-se no

óbice da Súmula 7/STJ.

4. In casu, a petição de Agravo Regimental não impugna tais fundamentos.

5. Agravo Regimental não conhecido (Agravo Regimental nos Embargos de

Declaração no Agravo em Recurso Especial nº 58.172/ES, Segunda Turma, Relator

Ministro Herman Benjamin, julgado em 14 agosto 2012, publicado em 27 agosto

2012, grifos nosso).

Page 55: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

54

ADMINISTRATIVO. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10,

DA LEI 8.429/92. DANO AO ERÁRIO. MODALIDADE CULPOSA.

POSSIBILIDADE. FAVORECIMENTO PESSOAL. TERCEIRO BENEFICIADO.

REQUISITOS CONFIGURADOS. INCURSÃO NAS PREVISÕES DA LEI DE

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

1. O ato de improbidade administrativa previsto no art. 10 da Lei 8.429/92

exige a comprovação do dano ao erário e a existência de dolo ou culpa do

agente. Precedentes.

[...]

3. A conduta culposa está presente quando, apesar de o agente não pretender o

resultado, atua com negligência, imprudência ou imperícia. Nessa modalidade,

há um defeito inescusável de diligência, no qual se comete um erro sobre a

condição do agir ou sobre a consequência da conduta. A punição dessa prática

justifica-se pela criação de um risco proibido ao bem jurídico tutelado.

4. Na hipótese, além do dano ao erário, a descrição dos elementos fáticos

realizada na origem evidencia a negligência da autoridade municipal, pois: a)

realizou o pagamento da nota de empenho sem adotar qualquer providência para

aferir a entrega da mercadoria, seja por meio da verificação do processo

administrativo que ensejou a contratação, seja pela provocação da empresa

contratada para comprovar a entrega do bem; b) deixou transcorrer praticamente três

anos entre o pagamento integral do débito e a entrega parcial da mercadoria, sem ter adotado qualquer medida ou cobrança do particular; c) após todo esse tempo, sequer

a totalidade da quantia contratada foi entregue.

[...]

6. Recurso especial provido em parte (Recurso Especial nº 1.127.143/RS, Segunda

Turma, Relator Ministro Castro Meira, julgado em 22 junho 2010, publicado em 03

agosto 2010, grifos nosso).

Veja-se, portanto, que Corte Especial mantém divergência entre suas Turmas sobre o

tratamento conferido à culpa como elemento subjetivo dos atos de improbidade

administrativa. Não obstante a Segunda Turma tenha sedimentado a orientação em relação à

constitucionalidade dos atos ímprobos culposos, não houve um enfrentamento direto da

questão, tarefa que poderia realizar-se por meio de controle difuso de constitucionalidade.

Em outro plano, insta ressaltar a jurisprudência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais

que admite a responsabilização por culpa, mas mantém o entendimento de que é

imprescindível a comprovação do elemento subjetivo e da má-fé do agente público. Assim,

traz-se à colação os seguintes julgados:

DIREITO CONSTITUCIONAL - DIREITO ADMINISTRATIVO - APELAÇÃO -

ATAQUE DE PARTE DA SENTENÇA NAS CONTRA-RAZÕES - IMPOSSIBILIDADE - AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - EX-

PREFEITO - RESTITUIÇÃO DE VALORES DO IMPOSTO DE RENDA

RETIDO NA FONTE AOS SERVIDORES DO EXECUTIVO MUNICIPAL -

CONDUTA AUTORIZADA PELA LEI MUNICIPAL 2.789/91 - PRESUNÇÃO

DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS - NÃO DEMONSTRAÇÃO DA MÁ-

FÉ DO ADMINISTRADOR - RECURSO DESPROVIDO. - Para a configuração

dos atos de improbidade administrativa descritos nos artigos 10 e 11 da lei

8.429/92, é imprescindível que se comprove o elemento subjetivo no

comportamento do agente público, ou seja, a existência de dolo, ou de culpa no

caso do artigo 10, com a finalidade de atingir fim ilícito. - Se o ex-Prefeito do

Município de Pará de Minas autorizou a restituição do valor do imposto de renda

Page 56: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

55

retido na fonte aos servidores públicos, com base em lei municipal, ainda que

presente vício de inconstitucionalidade, não há como afirmar que o Administrador

tenha agido com má-fé, pois as leis têm em seu favor a presunção de

constitucionalidade (Apelação Cível nº 1.0471.04.036498-9/003, 4ª Câmara Cível,

Relator Desembargador Moreira Diniz, julgado em 16 abril 2009, publicado em 28

abril 2009, grifo nosso).

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA - MUNICÍPIO DE PRESIDENTE KUBITSCHEK-

CUMULAÇÃO DE CARGO DE PREFEITO COM MÉDICO CONTRATADO DE

OUTRO MUNICÍPIO - PERCEPÇÃO APENAS DOS VENCIMENTOS DO

CARGO DE PROFISSIONAL DA SAÚDE - ILEGALIDADE CONFIGURADA -

CONTRATO NULO - SANÇÕES - PROPORCIONALIDADE - AUSÊNCIA DE

DOLO E DANO AO ERÁRIO - CRITÉRIO DISCRICIONÁRIO DO JULGADOR - PRECEDENTES.

- O ato de improbidade administrativa se caracteriza pela lesão a bens e valores

jurídicos protegidos pela ordem jurídica, de modo a resguardar a moralidade, a

honestidade e a legalidade da atuação dos agentes da Administração Pública.

- Demonstrada a prática do ato de improbidade administrativa, em razão da

cumulação indevida de cargos públicos, mas sem a percepção de remuneração em

um deles, cabe ao Magistrado, observando a proporcionalidade, a fixação isolada ou

cumulativa das penas previstas no art. 12 da Lei 8492/92, adequando-as à finalidade

da norma.

- Restando comprovado que o réu prestou serviços de maneira efetiva e diante

da inexistência de culpa grave, dolo ou má-fé, frente ao princípio constitucional

da proporcionalidade, no caso concreto, deve-se rejeitar o pedido de

condenação de ressarcimento ao erário.

- Precedentes do STJ.

- Recurso não provido (Apelação Cível nº 1.0216.09.061470-4/001, 4ª Câmara

Cível, Relatora Desembargadora Heloisa Combat, julgado 30 agosto 2012,

publicado em 04 de setembro de 2012, grifo nosso).

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE

IMPROBIDADE - MAGISTRADO - ATUAÇÃO NEGLIGENTE - LESÃO AO

ERÁRIO - ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL - DECISÃO

CRIMINAL QUE CONCLUIU PELA NEGATIVA DE AUTORIA, AFASTANDO

A NEGLIGÊNCIA IMPUTADA AO AGENTE - COISA JULGADA -

VINCULAÇÃO DO JUÍZO CÍVEL - ART. 935 DO CC/02 - MERO DESCUIDO -

INOCORRÊNCIA DE CULPA GRAVE - IMPROBIDADE INEXISTENTE -

REJEIÇÃO DA DENÚNCIA QUANTO AO SEGUNDO RÉU - RECURSO NÃO

PROVIDO. 1. O procedimento previsto no art. 17, § 8º, da Lei 8.429/92, introduzido pela

Medida Provisória n. 2.225/2001, inovou a Lei de Improbidade Administrativa,

possibilitando a rejeição de plano do pedido inicial, não apenas quando o Juiz

verificar a ausência de condição da ação ou a ocorrência de pressuposto processual

negativo, mas também quando se convencer da inexistência do ato de improbidade

ou da improcedência da ação.

2. O julgamento proferido pelo Órgão Especial no inquérito policial de n.

1.0000.09.502432-9/000, ao impedir o prosseguimento das investigações por

peculato culposo em relação ao segundo réu, decidiu pela ausência de autoria,

vinculando, por conseguinte, o juízo cível, nos termos do art. 935 do CC/02.

3. Ainda que se admita a figura culposa nos atos que impliquem lesão ao erário,

em virtude da gravidade das sanções impostas pela Lei n. 8.429/92, a culpa do

agente deve evidenciar-se como grave, demonstrando sua inabilitação para o

exercício da função pública.

4. Simples descuido não configura improbidade administrativa, mormente

quando escusável pelas circunstâncias em que se desenrolaram os fatos. 5. Não sendo atribuída conduta culposa grave ao recorrido, capaz de tipificar ato

ímprobo, deve ser mantida a rejeição da inicial quanto ao mesmo.

Page 57: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

56

6. Recurso não provido (Agravo de Instrumento 1.0525.10.012171-0/003, 5ª Câmara

Cível, julgado em 25 abril 2013, publicado em 13 maio 2013, grifo nosso).

Por fim, insta ressaltar que na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal não se

encontra nenhum julgado onde a referida matéria tenha sido debatida, permanecendo a Corte

Constitucional silente quanto à constitucionalidade da modalidade culposa. Naira Senna

(2010, p. 36) registra que em determinada decisão, o Ministro Cezar Peluso haveria sinalizado

no sentido de que o dolo ou a má-fé constitui requisito básico para configuração do ato

ímprobo. No caso, discutia-se a incidência do artigo 11 da Lei nº 8.429/1992, assim constando

no acórdão:

[...] In casu, não restou comprovado nos autos que o apelado teve a intenção e

vontade consciente em violar os princípios básicos da administração pública citados

pelo apelante (legalidade, moralidade e impessoalidade). Ao contrário, não verifico a

ocorrência de violação a nenhum princípio da administração (Recurso

Extraordinário nº 589.784/MS, Relator Ministro Cezar Peluso, julgado em 23 janeiro

2010, publicado em 18 fevereiro 2010 apud SENNA, 2010, p. 27).

No entanto, considerando que os atos de improbidade previstos no artigo 11 da Lei nº

8.429/1992 só admitem a modalidade dolosa, conforme já exposto nesse trabalho, entende-se

que o julgado acima é insuficiente para descobrir qual orientação o Supremo Tribunal Federal

está mais inclinado a adotar, no que se refere à modalidade culposa dos atos ímprobos.

Uma vez expostos os posicionamentos jurisprudenciais sobre a matéria, cumpre

averiguar quais as alternativas possíveis no ordenamento jurídico pátrio para que seja

uniformizado o entendimento quanto à constitucionalidade da modalidade culposa nos atos de

improbidade administrativa, a fim de proporcionar maior segurança jurídica ao aplicador da

Lei nº 8.429/1992, e principalmente aos agentes públicos, evitando que sejam demandados em

ações visivelmente improcedentes somente por existir previsão normativa para

responsabilização a título de culpa.

Page 58: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

57

6 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOBRE OS ARTIGOS 5º E 10 DA

LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Como última tarefa a ser realizada neste trabalho, está a propositura de soluções para o

deslinde do problema da constitucionalidade da modalidade culposa dos atos de improbidade

administrativa. Nesse ponto, importante descrever o texto normativo dos artigos 5º e 10,

caput, da Lei nº 8.429/1992, in verbis:

Art. 5° Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou

culposa, do agente ou de terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano.

Art. 10 Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário

qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio,

apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades

referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: [...].

O processo de aferição da constitucionalidade de uma norma jurídica consiste em

verificar sua adequação às regras e princípios previstos na Constituição Federal (LENZA,

2008, p. 117). O Ministro Gilmar Ferreira Mendes, além de ressaltar que os conceitos de

constitucionalidade ou inconstitucionalidade aplicam-se somente aos atos ou omissões dos

Poderes Públicos, afirma que a questão não se reduz a ideia de conformidade ou

inconformidade com a Lei Maior, manifestando o seguinte pensamento:

Destarte, os conceitos de constitucionalidade ou inconstitucionalidade não traduzem,

tão-somente, a idéia de conformidade ou inconformidade com a Constituição. Assim, tomando de empréstimo a expressão de Bittar, dir-se-á que constitucional

será o ato que não incorrer em sanção, por ter sido criado por autoridade

constitucionalmente competente e sob a forma que a Constituição prescreve para sua

perfeita integração; inconstitucional será o ato que a incorrer em sanção – de

nulidade ou anulabilidade – por desconformidade com o ordenamento constitucional

(MENDES et al, 2009, p. 1054).

O controle de constitucionalidade poderá ocorrer de forma concentrada ou difusa. O

controle concentrado se dá mediante a provocação direta de um tribunal específico, no caso o

Supremo Tribunal Federal, para que se manifeste sobre a constitucionalidade de lei ou ato

normativo (LENZA, 2008, p. 157). Por sua vez, o controle difuso, também conhecido como

controle aberto ou incidental, dar-se-á na apreciação de um caso concreto, onde a discussão

sobre constitucionalidade é acessória ao mérito da lide, vale dizer, não é o exame da

constitucionalidade o objeto primordial da ação, surgindo como uma questão prejudicial que

Page 59: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

58

deve ser deve ser decidida (MENDES et al, 2009, p. 1055) para definir o direito das partes.

Além disso, o controle difuso pode ser realizado por qualquer juízo ou tribunal.

A partir disso, a primeira alternativa para definir a constitucionalidade modalidade

culposa dos atos de improbidade administrativa dar-se-á por meio do uso do controle

concentrado, mediante o ajuizamento de uma ação direta de inconstitucionalidade ou uma

ação declaratória de constitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal, suscitando a

controvérsia doutrinária e a instabilidade das decisões jurisprudenciais acerca do tema. A

diferença entre elas está no fato que na primeira o objetivo do autor é obter a invalidação da

lei em razão de sua inconstitucionalidade, ao passo que na segunda a finalidade é afirmar a

constitucionalidade da norma, no intuito de afastar a insegurança jurídica ou o estado de

dúvida sobre a validade da lei (MORAES, 2010, p. 737-779). Representam, portanto, dois

lados de uma mesma moeda, sendo o procedimento de ambas disciplinado pela Lei nº

9.868/1999.

Sendo assim, por intermédio da ação direta de inconstitucionalidade o pedido será a

declaração de que a modalidade culposa dos atos ímprobos viola o artigo 37, § 4º, da

Constituição Federal, sob o argumento principal de que a improbidade administrativa só se

verifica na conduta praticada com dolo, qualificada pela má-fé ou desonestidade do agente

público, havendo o legislador infraconstitucional desrespeitado o princípio da proibição de

excesso ao prever a culpa como elemento subjetivo dos atos tipificados no artigo 10 da Lei nº

8.429/1992.

Por sua vez, a ação declaratória de constitucionalidade seria formulada sobre a

premissa de que o sancionamento dos atos ímprobos culposos não encontra óbice na

Constituição Federal, bastando que a modalidade culposa refira-se à espécie culpa grave ou

gravíssima, incidindo os efeitos da Lei nº 8.429/1992 nos comportamentos que importam em

ineficiência funcional intolerável e que causem lesão ao erário.

Nessa lógica, o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o pedido de qualquer das duas

ações, deve conferir interpretação conforme a Constituição aos artigos 5º e 10 da Lei de

Improbidade Administrativa, para assentar a constitucionalidade ou inconstitucionalidade

desses dispositivos. O instituto da interpretação conforme é tanto um princípio hermenêutico,

como uma técnica de controle de constitucionalidade, descrito nas lições de Luís Roberto

Barroso nas seguintes palavras:

A interpretação conforme a Constituição pode ser apreciada como um princípio de

interpretação e como uma técnica de controle de constitucionalidade. Como

princípio de interpretação, decorre ele da confluência dos dois princípios anteriores:

Page 60: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

59

o da supremacia da Constituição e o do presunção de constitucionalidade. Com base

na interpretação conforme a Constituição, o aplicador da norma infraconstitucional,

dentre mais de uma interpretação possível, deverá buscar aquela que a compatibilize

com a Constituição, ainda que não seja a que mais obviamente decorra do seu texto.

Como técnica de controle de constitucionalidade, a interpretação conforme a

Constituição consiste na expressa exclusão de uma determinada interpretação da

norma, uma ação “corretiva” que importa em declaração de inconstitucionalidade

sem redução de texto (Id., 2004, p. 371-372).

Há que se ressaltar que a interpretação conforme a Constituição não está livre de

limitações, sendo admissível somente quando respeitar os limites semânticos do texto, não

resultando em afronta à expressão literal do texto ou alteração do seu significado, fatos que

modificariam substancialmente a concepção original do legislador infraconstitucional

(MENDES et al, 2009, p. 1307).

A segunda alternativa para solucionar o problema ora apresentado, seria a apreciação

da constitucionalidade dos artigos 5º e 10 da Lei nº 8.429/1992 em sede de controle difuso,

possibilidade que permitiria ao próprio Superior Tribunal de Justiça elidir a divergência

jurisprudencial nele existente, bem como aos demais Tribunais de Justiça dos Estados onde

haja controvérsia sobre o tema da modalidade culposa. Para tanto, é igualmente válido e

necessário o uso do instituto da interpretação conforme a Constituição, nos termos acima

apresentado.

Como visto, o ordenamento jurídico confere instrumentos adequados para por fim ao

debate sobre a constitucionalidade da modalidade culposa dos atos de improbidade

administrativa, não havendo motivos para postergar a solução da questão, haja vista a

insegurança jurídica e a aplicação desarrazoada dos artigos 5º e 10 da Lei nº 8.429/1992 são

fatores que prejudicam a eficácia da Lei de Improbidade Administrativa.

Page 61: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

60

6 CONCLUSÃO

Extrai-se do desenvolvimento desse trabalho a conclusão de que o combate à

improbidade administrativa, por meio da proteção conferida pela Lei nº 8.249/1992, não pode

destoar dos limites implícitos na própria Constituição Federal. Isso significa dizer que,

embora a nova ordem jurídica inaugurada com a Carta de 1988 seja incisiva quanto à

necessidade de se coibir qualquer abuso do erário público, prevendo graves sanções para os

atos de improbidade (art. 37, § 4º), tal desiderato não pode se transformar numa sombra a

pairar sobre os agentes públicos, que certamente ficarão acuados de adotar decisões

inovadoras na gestão pública, com medo de que, caso venham a ocasionar resultados

insatisfatórios, sejam taxados de ímprobos.

Para tanto, primeiramente é necessário que se estabeleça limites ao conceito de ato

ímprobo, mas é claro, sem a pretensão de abarcar nesse conceito todas as hipóteses que

podem ocorrer no mundo dos fatos. Esse objetivo deve ser buscado, essencialmente pela

doutrina administrativista, com o auxílio da jurisprudência dos tribunais pátrios sobre a

matéria.

Nessa lógica, o presente trabalho procurou desenvolver uma pesquisa séria a respeito

da interpretação dada aos artigos 5º e 10 da Lei nº 8.429/1992, procurando averiguar se a

modalidade culposa dos atos de improbidade seria constitucional. O precitado problema ainda

não foi pacificado pelos tribunais superiores, e a doutrina ainda apresenta divergências sobre

o assunto, sendo que nessa monografia filia-se ao entendimento de que só haverá improbidade

culposa quando o agente público incidir em culpa grave ou gravíssima no exercício de suas

atribuições, somados os elementos da má-fé e da desonestidade, combinação que deságua na

violação dos princípios da Administração Pública, no dano ao erário e no intolerável grau de

ineficiência funcional. Logo, será possível sustentar a punição do agente público a título de

culpa, mas desde que se estabeleça uma escala dessas atividades culposas, não estando

qualquer tipo de negligência, imprudência ou imperícia sujeitas à Lei de Improbidade

Administrativa, e, ainda, devendo-se observar o princípio da proporcionalidade no momento

de aplicação das sanções.

É certo que o controle de constitucionalidade sobre os referidos dispositivos legais

poderia solucionar de vez a questão, seja por meio do ajuizamento de uma Ação Direta de

Inconstitucionalidade ou de uma Ação Declaratória de Constitucionalidade, ou, ainda, em

sede de controle difuso, utilizando-se, em qualquer dessas hipóteses, o instituto da

interpretação conforme a Constituição.

Page 62: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

61

Urge que o Judiciário se manifeste sobre a matéria, haja vista a necessidade de

segurança jurídica quanto à interpretação conferida aos atos culposos previstos na Lei de

Improbidade Administrativa. Afinal, não obstante a tutela da probidade administrativa revele-

se como principal instrumento para a construção de uma Administração Pública ética e

eficiente, verdadeiro direito subjetivo de toda a sociedade, o combate às práticas desonestas e

desidiosas não pode sobrepor-se aos direitos fundamentais dos agentes públicos sujeitos às

disposições da Lei nº 8.429/1992, devendo-se harmonizar ambas as finalidades visadas pela

Constituição Federal, para que não se cometa abusos na luta contra a improbidade

administrativa, empreitada de extrema relevância para a consolidação do Estado de

Democrático de Direito.

Page 63: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

62

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Page 69: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

68

ANEXO A – Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992.

LEI Nº 8.429, DE 2 DE JUNHO DE 1992.

Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes

públicos nos casos de enriquecimento ilícito no

exercício de mandato, cargo, emprego ou função

na administração pública direta, indireta ou

fundacional e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu

sanciono a seguinte lei:

CAPÍTULO I

Das Disposições Gerais

Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não,

contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos

Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao

patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou

concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos

na forma desta lei.

Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade

praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo,

fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário

haja concorrido ou concorra com menos de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita

anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a

contribuição dos cofres públicos.

Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda

que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou

qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas

entidades mencionadas no artigo anterior.

Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não

sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se

beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.

Page 70: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

69

Art. 4° Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela

estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no

trato dos assuntos que lhe são afetos.

Art. 5° Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa,

do agente ou de terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano.

Art. 6° No caso de enriquecimento ilícito, perderá o agente público ou terceiro

beneficiário os bens ou valores acrescidos ao seu patrimônio.

Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar

enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito

representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.

Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre

bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial

resultante do enriquecimento ilícito.

Art. 8° O sucessor daquele que causar lesão ao patrimônio público ou se enriquecer

ilicitamente está sujeito às cominações desta lei até o limite do valor da herança.

CAPÍTULO II

Dos Atos de Improbidade Administrativa

Seção I

Dos Atos de Improbidade Administrativa que Importam Enriquecimento Ilícito

Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito

auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo,

mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e

notadamente:

I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra

vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou

presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por

ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público;

II - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a aquisição, permuta

ou locação de bem móvel ou imóvel, ou a contratação de serviços pelas entidades referidas no

art. 1° por preço superior ao valor de mercado;

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70

III - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a alienação, permuta

ou locação de bem público ou o fornecimento de serviço por ente estatal por preço inferior ao

valor de mercado;

IV - utilizar, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou

material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades

mencionadas no art. 1° desta lei, bem como o trabalho de servidores públicos, empregados ou

terceiros contratados por essas entidades;

V - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para tolerar a

exploração ou a prática de jogos de azar, de lenocínio, de narcotráfico, de contrabando, de

usura ou de qualquer outra atividade ilícita, ou aceitar promessa de tal vantagem;

VI - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer

declaração falsa sobre medição ou avaliação em obras públicas ou qualquer outro serviço, ou

sobre quantidade, peso, medida, qualidade ou característica de mercadorias ou bens

fornecidos a qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;

VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou

função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do

patrimônio ou à renda do agente público;

VIII - aceitar emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria ou assessoramento

para pessoa física ou jurídica que tenha interesse suscetível de ser atingido ou amparado por

ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público, durante a atividade;

IX - perceber vantagem econômica para intermediar a liberação ou aplicação de verba

pública de qualquer natureza;

X - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indiretamente, para

omitir ato de ofício, providência ou declaração a que esteja obrigado;

XI - incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores

integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei;

XII - usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo

patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei.

Seção II

Dos Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuízo ao Erário

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer

ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação,

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71

malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta

lei, e notadamente:

I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio

particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do

acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;

II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas,

verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º

desta lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;

III - doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de

fins educativos ou assistências, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de qualquer das

entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das formalidades legais e

regulamentares aplicáveis à espécie;

IV - permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem integrante do

patrimônio de qualquer das entidades referidas no art. 1º desta lei, ou ainda a prestação de

serviço por parte delas, por preço inferior ao de mercado;

V - permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço

superior ao de mercado;

VI - realizar operação financeira sem observância das normas legais e regulamentares ou

aceitar garantia insuficiente ou inidônea;

VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades

legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;

VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;

IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento;

X - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz

respeito à conservação do patrimônio público;

XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de

qualquer forma para a sua aplicação irregular;

XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente;

XIII - permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas,

equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer

das entidades mencionadas no art. 1° desta lei, bem como o trabalho de servidor público,

empregados ou terceiros contratados por essas entidades.

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72

XIV – celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a prestação de

serviços públicos por meio da gestão associada sem observar as formalidades previstas na

lei; (Incluído pela Lei nº 11.107, de 2005)

XV – celebrar contrato de rateio de consórcio público sem suficiente e prévia dotação

orçamentária, ou sem observar as formalidades previstas na lei. (Incluído pela Lei nº 11.107,

de 2005)

Seção III

Dos Atos de Improbidade Administrativa que Atentam Contra os Princípios da Administração

Pública

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da

administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade,

imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto,

na regra de competência;

II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;

III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva

permanecer em segredo;

IV - negar publicidade aos atos oficiais;

V - frustrar a licitude de concurso público;

VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;

VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva

divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de

mercadoria, bem ou serviço.

CAPÍTULO III

Das Penas

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na

legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes

cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade

do fato: (Redação dada pela Lei nº 12.120, de 2009).

Page 74: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

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I - na hipótese do art. 9°, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao

patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública,

suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes

o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber

benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por

intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;

II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores

acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função

pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até

duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber

benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por

intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função

pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até

cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder

Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente,

ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três

anos.

Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a

extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.

CAPÍTULO IV

Da Declaração de Bens

Art. 13. A posse e o exercício de agente público ficam condicionados à apresentação de

declaração dos bens e valores que compõem o seu patrimônio privado, a fim de ser arquivada

no serviço de pessoal competente. (Regulamento) (Regulamento)

§ 1° A declaração compreenderá imóveis, móveis, semoventes, dinheiro, títulos, ações, e

qualquer outra espécie de bens e valores patrimoniais, localizado no País ou no exterior, e,

quando for o caso, abrangerá os bens e valores patrimoniais do cônjuge ou companheiro, dos

filhos e de outras pessoas que vivam sob a dependência econômica do declarante, excluídos

apenas os objetos e utensílios de uso doméstico.

§ 2º A declaração de bens será anualmente atualizada e na data em que o agente público

deixar o exercício do mandato, cargo, emprego ou função.

Page 75: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

74

§ 3º Será punido com a pena de demissão, a bem do serviço público, sem prejuízo de

outras sanções cabíveis, o agente público que se recusar a prestar declaração dos bens, dentro

do prazo determinado, ou que a prestar falsa.

§ 4º O declarante, a seu critério, poderá entregar cópia da declaração anual de bens

apresentada à Delegacia da Receita Federal na conformidade da legislação do Imposto sobre a

Renda e proventos de qualquer natureza, com as necessárias atualizações, para suprir a

exigência contida no caput e no § 2° deste artigo .

CAPÍTULO V

Do Procedimento Administrativo e do Processo Judicial

Art. 14. Qualquer pessoa poderá representar à autoridade administrativa competente para

que seja instaurada investigação destinada a apurar a prática de ato de improbidade.

§ 1º A representação, que será escrita ou reduzida a termo e assinada, conterá a

qualificação do representante, as informações sobre o fato e sua autoria e a indicação das

provas de que tenha conhecimento.

§ 2º A autoridade administrativa rejeitará a representação, em despacho fundamentado,

se esta não contiver as formalidades estabelecidas no § 1º deste artigo. A rejeição não impede

a representação ao Ministério Público, nos termos do art. 22 desta lei.

§ 3º Atendidos os requisitos da representação, a autoridade determinará a imediata

apuração dos fatos que, em se tratando de servidores federais, será processada na forma

prevista nos arts. 148 a 182 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990 e, em se tratando de

servidor militar, de acordo com os respectivos regulamentos disciplinares.

Art. 15. A comissão processante dará conhecimento ao Ministério Público e ao Tribunal

ou Conselho de Contas da existência de procedimento administrativo para apurar a prática de

ato de improbidade.

Parágrafo único. O Ministério Público ou Tribunal ou Conselho de Contas poderá, a

requerimento, designar representante para acompanhar o procedimento administrativo.

Art. 16. Havendo fundados indícios de responsabilidade, a comissão representará ao

Ministério Público ou à procuradoria do órgão para que requeira ao juízo competente a

decretação do seqüestro dos bens do agente ou terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou

causado dano ao patrimônio público.

§ 1º O pedido de seqüestro será processado de acordo com o disposto nos arts. 822 e 825

do Código de Processo Civil.

Page 76: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

75

§ 2° Quando for o caso, o pedido incluirá a investigação, o exame e o bloqueio de bens,

contas bancárias e aplicações financeiras mantidas pelo indiciado no exterior, nos termos da

lei e dos tratados internacionais.

Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público

ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.

§ 1º É vedada a transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput.

§ 2º A Fazenda Pública, quando for o caso, promoverá as ações necessárias à

complementação do ressarcimento do patrimônio público.

§ 3o No caso de a ação principal ter sido proposta pelo Ministério Público, aplica-se, no

que couber, o disposto no § 3o do art. 6

o da Lei n

o 4.717, de 29 de junho de 1965.(Redação

dada pela Lei nº 9.366, de 1996)

§ 4º O Ministério Público, se não intervir no processo como parte, atuará

obrigatoriamente, como fiscal da lei, sob pena de nulidade.

§ 5o A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações

posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto. (Incluído

pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)

§ 6o A ação será instruída com documentos ou justificação que contenham indícios

suficientes da existência do ato de improbidade ou com razões fundamentadas da

impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas, observada a legislação vigente,

inclusive as disposições inscritas nos arts. 16 a 18 do Código de Processo Civil. (Incluído pela

Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)

§ 7o Estando a inicial em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação

do requerido, para oferecer manifestação por escrito, que poderá ser instruída com

documentos e justificações, dentro do prazo de quinze dias. (Incluído pela Medida Provisória

nº 2.225-45, de 2001)

§ 8o Recebida a manifestação, o juiz, no prazo de trinta dias, em decisão fundamentada,

rejeitará a ação, se convencido da inexistência do ato de improbidade, da improcedência da

ação ou da inadequação da via eleita. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)

§ 9o Recebida a petição inicial, será o réu citado para apresentar contestação. (Incluído

pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)

§ 10. Da decisão que receber a petição inicial, caberá agravo de instrumento. (Incluído

pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)

Page 77: Monografia Dimitri - A (in)Constitucionalidade Da Modalidade Culposa Dos Atos de Improbidade Administrativa

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§ 11. Em qualquer fase do processo, reconhecida a inadequação da ação de improbidade,

o juiz extinguirá o processo sem julgamento do mérito. (Incluído pela Medida Provisória nº

2.225-45, de 2001)

§ 12. Aplica-se aos depoimentos ou inquirições realizadas nos processos regidos por

esta Lei o disposto no art. 221, caput e § 1o, do Código de Processo Penal. (Incluído pela

Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)

Art. 18. A sentença que julgar procedente ação civil de reparação de dano ou decretar a

perda dos bens havidos ilicitamente determinará o pagamento ou a reversão dos bens,

conforme o caso, em favor da pessoa jurídica prejudicada pelo ilícito.

CAPÍTULO VI

Das Disposições Penais

Art. 19. Constitui crime a representação por ato de improbidade contra agente público ou

terceiro beneficiário, quando o autor da denúncia o sabe inocente.

Pena: detenção de seis a dez meses e multa.

Parágrafo único. Além da sanção penal, o denunciante está sujeito a indenizar o

denunciado pelos danos materiais, morais ou à imagem que houver provocado.

Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam

com o trânsito em julgado da sentença condenatória.

Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o

afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da

remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual.

Art. 21. A aplicação das sanções previstas nesta lei independe:

I - da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público, salvo quanto à pena de

ressarcimento; (Redação dada pela Lei nº 12.120, de 2009).

II - da aprovação ou rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal

ou Conselho de Contas.

Art. 22. Para apurar qualquer ilícito previsto nesta lei, o Ministério Público, de ofício, a

requerimento de autoridade administrativa ou mediante representação formulada de acordo

com o disposto no art. 14, poderá requisitar a instauração de inquérito policial ou

procedimento administrativo.

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CAPÍTULO VII

Da Prescrição

Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser

propostas:

I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de

função de confiança;

II - dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares

puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou

emprego.

CAPÍTULO VIII

Das Disposições Finais

Art. 24. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 25. Ficam revogadas as Leis n°s 3.164, de 1° de junho de 1957, e 3.502, de 21 de

dezembro de 1958 e demais disposições em contrário.

Rio de Janeiro, 2 de junho de 1992; 171° da Independência e 104° da República.

FERNANDO COLLOR

Célio Borja

Este texto não substitui o publicado no DOU de 3.6.1992