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ABRE ASPAS VIRGÍNIA SABACK CONSULTORA DE MODA
«Inspiraçãoé coisa paraamador»Texto PEDRO FERNANDES [email protected] MARCO AURÉLIO MARTINS [email protected]
No mês em que Salvador sedia o I Seminário Nacional de Moda
(de 16 a 18/9) e as semanas dos shoppings Iguatemi (de 15/9 a
1º/10) e Barra (21 a 26/9), fica clara nossa vontade de discutir
o assunto. O que falta é traduzir esse desejo em uma siste-
matização e fortalecimento da indústria local. É dessa for-
ma que pensa Virgínia Saback, coordenadora do curso de
graduação tecnológica em design de moda da Univer-
sidade Salvador (Unifacs), que completa em 2010
uma década de existência. Virgínia, que atua na área
há 27 anos, partiu da prática para a teoria ao deixar
para trás a fábrica de roupas Ursa Maior e resolver
estudar moda em Milão, em 1990. “Sentia que
faltava algo para desenvolver o nosso trabalho,
queria experimentar outras coisas, saber de
onde vinha aquilo”, explica. Hoje, além dos
compromissos acadêmicos, entre eles a Co-
missão Científica do Colóquio Nacional de
Moda, da qual é membro, Virgínia presta
consultoria para grandes empresas na-
cionais de vestuário na área de plane-
jamento estratégico.
Há uma dificuldade das pessoas em entender moda como um
conceito maior que o do vestuário?
As pessoas associam em primeiro lugar à roupa. Mas a mo-
da é um fenômeno que traduz valores históricos, sociais,
ambientais. A roupa passa a ser um produto da moda. A
gente fala modas. Modos e modas. Se não, a gente não
falava “estar na moda”, como em “está na moda comer isso
ou aquilo”. Se a palavra moda se aplica a tantos eventos, dá
para perceber o quanto ela é poderosa. Então, ela não pode
ser associada apenas ao vestuário, que sofre influências de
várias áreas, de eventos acontecidos no entorno dele. A
gente entende que, como os estudos de moda no País são
recentes, a gente ainda está caminhando e construindo um
novo discurso de pensar moda nos aspectos psicológicos,
sociais, culturais. Hoje, temos diversos profissionais de di-
versas disciplinas, até médicos, pesquisando essa área.
O século 20 conheceu diversas revoluções comportamentais.
Em nossos dias, essas mudanças se dão num nível mais restrito,
dentro de pequenos grupos. Como isso se expressa na moda?
Há um tempo, você tinha grupos maiores, hoje você tem
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grupos menores com fragmenta-
ções ideológicas e comportamen-
tais. Se você pega o movimento
punk,porexemplo,vaiperceberque
dentro dele há quem pense como
punk, mas não adota a estética, e
aqueles que adotam a estética, mas
não a ideologia. E cada dia surgem
novos grupos. As pessoas começam
a se vestir como personagens. As
meninas se vestem como princesas
do século 19 e saem às ruas. Mas ho-
je acho que a nova forma de pensar
virá da juventude que vem aí, dos
meninos que têm 10 anos. Eles
já nasceram tecnologicamente
incluídos. São crianças que têm ou-
tra consciência, bem diferente do
século passado. Eles vão represen-
tar um novo tipo de consumo, e as
empresas do século 21 não vão
mais poder ter um comportamento
irresponsável. Elas vão ter de mudar
sua estrutura, embora não possam
fazer esse ajuste da noite para o dia.
Empresas que trabalham com pro-
dutos que agridem a natureza nos
aspectos ecológicos e sociais não
vão sobreviver.
A revolução comportamental pela qual
vamos passar então seria essa?
Não tenho a pretensão de dizer isso
de modo científico, mas, pela minha
pouca experiência, percebo que
sim. Já tem empresas preocupadas
nesse sentido. Hoje os bancos come-
çam a mudar o discurso e, em vez de
vender dinheiro, querem comprar
boas ideias. É o processo inverso. É
um consumo espiritual, emocional.
Acho que as grandes empresas já es-
tão conectadas com isso. Urgente-
mente a indústria do vestuário pre-
cisa se adequar. A gente não pode
mais mentir. As empresas têm de ter
a ficha limpa dos políticos.
Dá para desvincular moda como vestuá-
rio de consumo desenfreado?
O que percebo é que as pessoas es-
tão consumindo com mais consciên-
cia. Produtos mais caros, que são
mais duráveis, estão sendo mais
vendidos que há um tempo. As pes-
soas estão buscando esses bens me-
nos descartáveis, porque o não-des-
carte é a lei do século 21.
Em que contexto o curso da Unifacs sur-
giu e o que mudou no mercado de moda
na Bahia depois desses quase dez anos?
Quando o curso foi montado, era al-
go inédito em Salvador e veio da ex-
periência mercadológica das coor-
denações. Não é que o mercado mu-
dou. Acho que os industriais, todos
eles vêm de um histórico não siste-
matizado pela teoria, vinham de for-
ma empírica, e com sucesso, porque
tinhaavercomasdemandasdaépo-
ca, só que o mundo mudou e as exi-
gências dos consumidores passam a
ser extremas, por conta do acesso às
informações. Hoje você aperta um
botão e vai para o mundo. Essa in-
dústria oriunda dos anos 1980,
1990 não estava preparada e houve
uma retenção. A cidade tem uma
abertura muito grande em relação
ao varejo, com muitos shoppings,
que são muito bem-vindos, mas é
preciso fomentar o lado da indús-
tria. Como universidade, nossa in-
tenção é colaborar com o crescimen-
to do Estado e a abertura de novas
indústrias.Estamosformandomeni-
nospreparadosparaenfrentaressas
exigências do século 21.
Moda é mais criação ou mais negócio?
Não acreditamos em design sem ne-
gócio e em negócio sem design. Ob-
viamente as duas áreas estão liga-
das. Para o design, tem que ter o pla-
nejamento de marketing. Para o re-
sultado final ser bem elaborado, ele
tem que estar ambientado em diver-
sas áreas. O gênio criativo é coisa do
século passado. Os designers hoje
precisam estar munidos de informa-
ção não só em sua área. Procuramos
orientar nossos alunos para ter uma
visão mais multidisciplinar e menos
pessoal. Eles precisam pensar com a
cabeça do consumidor.
Qual o nosso ponto fraco?
Não há criação sem um negócio ao
lado. A criação em nosso Estado res-
pira em todas as áreas, mas acredito
que elas precisam de uma orienta-
ção. O design autoral, por exemplo,
é mais difícil de comunicar para o pú-
blico, porque é muito para ele mes-
mo. Tem que conceber, pesquisar,
entender o que o público quer, para
depois sentar e desenhar o produto.
Ainda falta essa visão estratégica
por parte dos designers, mas acho
que estamos no caminho, que esta-
mos num momento de transição.
Falta mão-de-obra qualificada, costurei-
ras para as fábricas?
É uma profissão que está pratica-
mente em extinção. Há muitos pos-
tos de trabalho abertos no Estado,
embora elas estejam ganhando um
pouco mais. Mas é preciso trabalhar
numa esfera mais humanística, por-
que ninguém faz nada só. Acho que
os empresários precisam acolher
as costureiras e deixar claro que elas
fazem parte do processo, que elas
não são apenas uma peça na cadeia
produtiva.
Você acharia estranho que os criadores
baianos investissem no que se chama de
moda inverno? E no que diz respeito à
moda verão, os cariocas estão à frente.
Que nicho sobra para a Bahia competir?
Éóbvioqueháqueserespeitarosas-
pectos locais, climáticos, regionais,
as interferênciasdoartesanato.Mas
não acredito numa moda local. A
moda é universalizada. As escolhas
desses produtos é que são adequa-
das aos seus desejos, seus jeitos e
trejeitos. Vejo que os baianos esco-
lhem produtos que têm a ver com
seus aspectos culturais. Mas a gente
tem marcas que podem vender em
qualquer lugar do mundo.
Que novos criadores baianos você
destacaria?
Tem o Yuri Sarmento, que é muito
bom, a Úrsula Félix, a Luciana Ga-
leão. Sem desmerecer ninguém,
acho que eles estão associando o
vestuário a um negócio. Eles estão
complanejamento, fazendoumatri-
lha de empresário. O gênio criativo,
para se fixar, precisa se torna viável
para o mercado.
«O que percebo é que as pessoas estãoconsumindo com mais consciência.Produtos mais caros, mais duráveis, estãosendo mais vendidos que há um tempo»
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Como você vê o reconhecimento da mo-
da como área da cultura pelo Ministério
da Cultura?
Acho maravilhoso. É muito impor-
tanteparaosetor.Sesoubermosuti-
lizar isso,seráumaalavancaenorme
para a indústria do nosso Estado. A
gentesócrescena indústria, comno-
vos postos de trabalho.
O setor vem se gerindo sem necessitar de
políticas públicas. Elas são necessárias?
Os grandes empresários precisam
de apoio para continuar. Mas o cres-
cimento não depende apenas do
mega, mas também dos pequenos
artesãos, dos pequenos empresá-
rios, que vão colaborar de forma in-
cisiva para a cadeia produtiva.
Você acha que para o mercado baiano é
importantequehajaumasemanademo-
daforteouémais interessanteexibirnos-
soprodutoemsemanasdemodamais fa-
mosas, como São Paulo Fashion Week?
Acho que se expor em outras feiras
mais famosas é interessante por
conta do apoio e do apelo das outras
marcas que são conhecidas, dessa
competição colaborativa, que é o
que se pratica hoje. Entretanto, é
muito importante que a gente faça
aqui. Mas não pode ser um evento
passional, tem que pensar no cres-
cimento do Estado. Acho de muito
bom grado o Iguatemi, o Barra e o
Paralela fazerem. Mas não pode
pensar apenas em si. É preciso pen-
sar de forma macro. Se não fortifi-
carmos a indústria, não vai para lu-
gar nenhum.
Salvador recebe cada vez mais marcas fa-
mosas. Somos uma cidade bastante po-
bre. Isso tem condição de se sustentar?
São muitas marcas internacionais
que estão chegando, e não sei com
que dinheiro as pessoas estão com-
prando. Não sei que pesquisa de
mercado foi essa. Eu fico um pouco
chateada que a gente está sendo
passivo. Cadê a gente que não está
fazendo alguma coisa. As pessoas
acham que para abrir um negócio de
confecção é preciso muito dinheiro.
A gente precisa de uma nova boa
ideia. Basta. Inspiração, como diz
César Romero, é coisa para amador.
Ela tem que ser sistêmica. E isso não
vem do nada, vem da cultura, do
nosso acervo. Ainda há diversos ni-
chosdomercadovirgensaseremex-
plorados.Masaspessoassóquerem
trabalhar na esfera do glamour.
Nem sempre o nome no jornal sig-
nifica sucesso. «
«A gente precisa de uma nova boa ideia.Há diversos nichos do mercado a seremexplorados. Mas as pessoas só queremtrabalhar na esfera do glamour»
SATÉLITE APARADOS DA SERRA RIO GRANDE DO SUL
Turismo surpreendenteno Rio Grande do Sul
Texto PAULO TADEU [email protected]
ELISA STECCA / DIVULGAÇÃO
DESTAQUENo restauranteCasarão, provetruta comamêndoas,queijo frito,polenta assadae suco de uvabranca. Fica naRua Padre JoãoFrancisco Ritter,969, Cambarádo Sul (RS)
Paulo Tadeu édono da MatrixEditora
QuandoagenteouvequeoBrasilnãoexploradireitoseupotencial
turístico,nãoestásereferindoapenasàfaltadeinfraestrutura,mas
à falta de conhecimento sobre lugares maravilhosos. Aparados da
Serraéumdeles,comumadaspaisagensmaisdeslumbrantesque
a natureza pode proporcionar, no interior do Rio Grande do Sul,
esperando acontecer para o turismo mundial. O nome vem da pla-
nície perfeita, reta, com vegetação uniforme, como se tivesse sido
aparada. E, no meio dela, uma sucessão de cânions de tirar o fô-
lego, alguns com até mil metros de profundidade. Para ter uma
ideia do desconhecimento, até pouco mais de dez anos, nem a
população local sabia que aquilo podia ser fonte de renda. Nem
nome de cânion tinha. Era o chamado “pe-
rau”. Se alguém falar para você que visitou
um perau, você vai ficar perdido. Se disser
que viu um cânion, a coisa muda. A partir
de Cambará do Sul, você pode conhecer os
diversos cânions, como os dois mais im-
pressionantes, o Fortaleza e o Itaimbezi-
nho. Cambará ainda tem clima de cidade
pequena e agradáveis surpresas, como a
pizzaria em frente à igreja, com decoração
de discos de vinil. Na Estalagem da Colina
está a melhor opção de hospedagem e,
nospasseios,atéasexplicaçõesgeológicas
dos guias tornam-se interessantes. Apara-
dos é uma aula do quanto nós temos que
descobrir sobre o nosso País. « »M
AN
DE
SUA
DIC
AD
EU
MLU
GA
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OM
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PAR
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GR
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M.B
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