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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL DO ESTADO DE PERNAMBUCO
EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO ESTADO DE PERNAMBUCO
Processo n.º : 8666 – Recurso Eleitoral – Recife/PERecorrente : Ministério Público Eleitoral
Recorrente : João da Costa Bezerra Filho
Advogados : Virgínia Augusta Pimentel Rodrigues, Ricardo Pedrosa Soriano de
Oliveira e Stênio José de Sousa Neiva Coelho
Recorrido : João da Costa Bezerra Filho
Recorrido : João Paulo Lima e Silva
Recorrido : Ministério Público Eleitoral
Relatora : Desembargadora Eleitoral Margarida Cantarelli
PARECER N.º /2008/GAB/PRE/PE
RECURSO ELEITORAL. INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DE PODER POLÍTICO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ELEITORAL. IDENTIDADE DE AÇÕES. INOCORRÊNCIA. PETIÇÃO INICIAL APTA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. VALIDADE DA PERÍCIA. CONDUTA VEDADA. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE MEIO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL. POTENCIALIDADE. MULTA. PROPORCIONALIDADE.- A doutrina majoritária e jurisprudência eleitoral apontam para a possibilidade de a AIJE versar sobre fatos que sejam anteriores ao dia 05 de julho.- Investigação judicial eleitoral e ação civil pública não se confundem, possuem escopos diferentes e fundamentos jurídicos diversos. As condutas vedadas no art. 73, da Lei nº 9.504/97 caracterizam, também, atos de improbidade, inteligência do § 7º, do artigo referido.- Não há que se falar em inépcia da inicial, vez que a ação de investigação judicial eleitoral proposta pelo MPE teve por base fatos certos e determinados.- Ausência de cerceamento de defesa ou ofensa ao princípio do contraditório e nulidade de perícia. Acesso às partes de todo o conteúdo probatório produzido no incidente processual.- As sanções devem ser cominadas com proporcionalidade. Se a aplicação da multa prevista no art. 73, § 4º, da Lei n. 9.504/97 é proporcional à gravidade do ilícito eleitoral, não se aplica a pena de cassação.- Parecer pelo provimento parcial do recurso do Ministério Público Eleitoral e pelo provimento do recurso do candidato.
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I. RELATÓRIO
Trata-se de recursos eleitorais interpostos pelo Ministério
Público Eleitoral e João da Costa contra sentença que declarou a ilegitimidade
passiva do investigado João Paulo Lima e Silva e cassou o registro de
candidatura de João da Costa ao tempo em que declarou sua inelegibilidade
por 3 (três) anos contados destas eleições.
Em seu inconformismo, pugna o candidato pela reforma total do
julgado. Aduz, em sede preliminar, a incompetência da Justiça Eleitoral;
identidade com ação civil pública por improbidade administrativa; inépcia da
inicial, sob o fundamento de que a investigação se assenta em fatos incertos;
cerceamento de defesa; nulidade da perícia; ausência de interesse de agir e
inadequação da via eleita. No mérito da demanda, alega inexistência de abuso
do poder político, de promoção pessoal e que a publicação da revista foi ato
típico de gestão. Argüiu, ainda, que não houve utilização de agentes públicos
(servidores e delegados do orçamento participativo) em campanha eleitoral. Por
fim, defende que não houve abuso do poder político pela cooptação de agentes
públicos.
O Ministério Público Eleitoral, por seu turno, alega ser inegável
que o Prefeito João Paulo permitiu a distribuição de bens e serviços de caráter
social custeados pela Prefeitura em favor do candidato João da Costa. Destaca
que a conduta omissa do prefeito ao permitir o uso da máquina para fins
eleitorais e o lançamento da revista no Teatro Santa Isabel não dão margens a
dúvidas quanto ao conhecimento do prefeito sobre o abuso.
Apresentadas as contra-razões, vieram os autos para parecer.
É o que importa relatar, passo à análise.
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II. DAS PRELIMINARES
II.1. Da competência da Justiça Eleitoral para investigar abuso do poder político antes do requerimento do registro de candidatura
Não merece qualquer guarida a tese de incompetência da Justiça
Eleitoral para processar e julgar condutas vedadas ocorridas antes do registro
de candidatura. Os precedentes colacionados pelo recorrente não guardam
relação com o tema debatido nestes autos; ao contrário do que ele defende, a
doutrina majoritária e jurisprudência eleitoral apontam para a possibilidade de
a AIJE versar sobre fatos que sejam anteriores ao dia 05 de julho.
RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL. ART. 22, LEI COMPLEMENTAR 64/90.Extinção do processo, com fundamento no art. 267, inciso IV, do CPC. Há óbice ao ajuizamento da AIJE antes da convenção e registro do candidato, no entanto, o pré-candidato e/ou qualquer pessoa que cometerem ilícito eleitoral respondem perante a Justiça Eleitoral nos termos do art. 22 da LC 64/90 a fatos perpetrados antes da candidatura e que estejam relacionados com a eleição vindoura.Recurso a que se nega provimento.(Recurso Eleitoral nº 10162004 (1143), TRE/MG, Mariana, Rel. Weliton Militão dos Santos. j. 15.07.2004).
RECURSO. INVESTIGAÇÃO JUDICIAL. REPRESENTAÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. Preliminares afastadas. Fato caraterizador de abuso tendente a influir no pleito, mesmo ocorrido antes do registro da candidatura, deve ser objeto de investigação. A letigimidade passiva da coligação não é ponto passível de discussão, mas fruto de imposição legal (art. 6º, § 1º, da Lei nº 9.504/97). Alegado uso de bens, serviços e material públicos para a obtenção de votos e divulgação de campanha com abuso de autoridade.Inexistência de prova suficiente para fundamentar juízo condenatório. Não caracterizada a ocorrência das condutas tipificadas nos arts. 41-A, 73, I, II, III e IV, da Lei nº 9.504/97; e 22 da Lei Complementar 64/90. Provimento negado.(TRE – RS. AIJE 422004/Triunfo – RS. Des. Roque Miguel Fank, DJE - Diário de Justiça Estadual, Volume 105, Tomo 021, Data 04/02/2005, p. 103)
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O TRE-AL, no acórdão 3905 da lavra do desembargador eleitoral
Humberto Eustáquio Soares Martins, publicado no Diário Oficial do Estado em
18/05/2006, p. 59/60, entendeu que “é possível a propositura da Ação de
Investigação Judicial Eleitoral antes do registro de candidatura”. Logo, também
não há qualquer empecilho para que se ajuíze essa ação a fim de investigar
fatos anteriores ao registro.
Assim, é estreme de dúvida que a Justiça Eleitoral é competente
para apreciar os fatos articulados na exordial.
II.2. Da alegação de identidade entre a ação de investigação judicial eleitoral e a ação civil pública por ato de improbidade administrativa
Também não prospera a alegação de que a presente ação de
investigação judicial eleitoral é idêntica à ação civil pública por ato de
improbidade administrativa. Identidade de ações ocorre quando coincidirem
partes, pedidos e causa de pedir, ex vi art. 301, § 2º, CPC.
Investigação judicial eleitoral e ação civil pública não se
confundem, possuem escopos diferentes e fundamentos jurídicos diversos. É
certo que um mesmo fato pode ensejar sanções de naturezas diversas, assim
como não há qualquer incompatibilidade. Ao contrário, as condutas vedadas
no art. 73, da Lei nº 9.504/97 caracterizam, também, atos de improbidade,
inteligência do § 7º, do artigo referido, vejamos:
§ 7º As condutas enumeradas no caput caracterizam, ainda, atos de improbidade administrativa, a que se refere o art. 11, inciso I, da Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, e sujeitam-se às disposições daquele diploma legal, em especial às cominações do art. 12, inciso III. (Destaque nosso)
São ações diversas, cujos pedidos são inconfundíveis e exigem
veículo próprio para serem impostas. Embora tanto na esfera eleitoral quanto
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na de improbidade haja cominação de multa, enquanto a investigação judicial
eleitoral busca a cassação do registro ou diploma e a decretação de
inelegibilidade, a ação civil pública por improbidade administrativa visa à
suspensão dos direitos políticos e ressarcimento ao erário.
II.3. Da alegação de petição inicial inepta
Alega, ainda, o recorrente a inépcia da petição inicial por
instaurar investigação judicial eleitoral para apuração de fatos incertos.
Sustenta que a petição inicial indicou como fatos a serem
apurados na presente investigação judicial eleitoral o lançamento da revista do
orçamento participativo e utilização de delegados do referido programa em
campanha política. Entretanto, outros fatos foram inseridos no bojo da ação,
sem que fosse garantido em sua plenitude o direito de defesa, pelo que requer o
indeferimento da petição inicial, com a conseqüente extinção da presente ação.
Os argumentos do recorrente, do mesmo modo, não devem
prosperar, pois a ação de investigação judicial eleitoral proposta pelo MPE teve
por base fatos certos e determinados, quais sejam:
- publicação e divulgação da revista do orçamento público, com
a finalidade de promover o recorrente, candidato a prefeito do
município do Recife;
- cooptação de servidores para utilização em campanha
eleitoral.
A ação de investigação judicial eleitoral foi proposta pelos fatos e
fundamentos acima mencionados que restaram caracterizados como condutas
vedadas, previstas no art. 73, da Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições), a fim de
que fosse julgada procedente e declarada a inelegibilidade dos demandados,
com a conseqüente cassação do registro de candidatura a prefeito municipal de
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João da Costa Bezerra Filho, ora recorrente.
Foi com base nesses fatos articulados na inicial que o julgador
de primeira instância, considerando os contornos do abuso do poder
econômico e político por parte do candidato à prefeitura do Recife, ora
recorrente, declarou sua inelegibilidade pelo prazo de três anos, cassando
ainda seu registro de candidatura.
Ademais, a petição inicial foi proposta baseada em farta
documentação, especialmente, procedimento de investigação preliminar
instaurado no âmbito do Ministério Público Estadual, que comprovam sua tese
contra o ora recorrente. Para além disso, na fase instrutória, foi produzido
grande lastro probatório, nos termos do art. 22, da Lei das Inelegibilidades.
O parágrafo único do art. 295 do Código de Processo Civil
dispõe:
"Considera-se inepta a petição inicial quando:I - Ihe faltar pedido ou causa de pedir;II - da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;III - o pedido for juridicamente impossível;IV - contiver pedidos incompatíveis entre si."
Facilmente, constata-se não ser essa a situação dos autos,
existindo, como afirmado acima, pedido certo, pelo que não há razão para
acolher tal alegação e extinguir o processo.
A respeito do tema, Emerson Garcia, em seu livro Abuso de
Poder nas Eleições – Meios de Coibição, assim nos ensina:
“Os fatos caracterizadores do abuso de poder devem ser relatados na representação, sendo despiciendo que a inicial traga consigo lastro probatório, pois não tendo a investigação judicial natureza penal, não há que se falar em ausência de justa causa para a sua deflagração quando todas as provas houverem de ser produzidas no decorrer da instrução processual. Caberá ao representante, com a inicial, apenas indicar ‘provas, indícios e circunstâncias que comprovarão a prática
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abusiva.1
Importante ainda salientar que toda a prova produzida em juízo
foi submetida ao contraditório e à ampla defesa.
II.4. Da alegação de cerceamento de defesa
Como decorrência dos argumentos acima relatados, o recorrente
aduz violação ao direito de ampla defesa, por entender que os limites propostos
na petição inicial foram ultrapassados, em razão da apresentação de novos
fatos trazidos ao processo após o oferecimento da contestação.
Afirma o recorrente que após apresentação de sua defesa, restou
deferida nos autos produção de provas, por meio de busca e apreensão de
CPUs, sem delimitação de fatos certos e ampliando-os.
A petição inicial ajuizada pelo Parquet contém os requisitos
previstos na legislação processual civil, de modo que não merece prosperar a
alegação de cerceamento de defesa levantado pelo recorrente, pois a inicial foi
instruída com farto material probatório, além de conter pedido certo.
No tocante aos novos documentos produzidos após a
apresentação da contestação, observa-se que os representados de tudo foram
intimados.
Demais disso, a ação de investigação judicial eleitoral tem rito
próprio e não segue as limitações inerentes ao rito ordinário, pois a Lei das
Inelegibilidades, em seu art. 23, confere ao julgador poderes maiores de
investigação, assim como ampla liberdade na formação do seu convencimento,
nos seguintes termos:
Art. 23. O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida,
1 GARCIA, Emerson. Abuso de Poder nas Eleições – Meios de Coibição. Editora Lumen Juris: São Paulo, 3ª Ed. , 2006, p. 146-147.
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atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.
A respeito do tema, Joel Cândido:
Mediante investigações jurisdicionais. Já tivemos ocasião de mostrar que a ‘investigação judicial’, que aqui a lei chama de 1investigações jurisdicionais’, não é só ‘investigação’, mas processo; e que o ‘processo’, na verdade, não é só processo, mas também ‘investigação’. Ali, não só se investiga ou apura, mas também se demonstra e se julga fato concreto. Alguns destes se conhece desde logo; outros se descobre no curso da instrução, o que vem a ressaltar o caráter e natureza híbrida da medida e sua atipicidade em relação aos feitos tradicionais de nossa processualística, eleitoral ou ordinária.
Delongas à parte, verdade é que o autor não deixará de requerer tanto a apuração dos fatos como o julgamento deles, com a aplicação das sanções da espécie (a serem vistas no art. 22, XIV e XV), complementos que tornarão imune sua petição de indeferimento sumário.2
Assim sendo, não há que se falar no caso em testilha em
qualquer cerceamento de defesa.
II.5. Da alegação de nulidade da prova pericial
Pretende o recorrente a nulidade dos laudos periciais, sob o
fundamento de não ter participado de sua produção.
Afirma que a oportunidade de falar sobre tais laudos não elide a
nulidade apontada, pois deveria ter avaliado a metodologia utilizada na
formulação da perícia, indicar assistente técnico, bem assim formular quesitos.
Além disso, sustenta que a importação de prova produzida em processo que
fora produzida entre uma das partes e terceiros não tem eficácia em relação à
parte contrária, que não participou de sua produção, juntando aos autos
citações doutrinárias e jurisprudenciais.
O Ministério Público Eleitoral formulou na presente investigação,
pedido cautelar de busca e apreensão cumulada com pedido de quebra de
2 CÂNDIDO, Joel J. Inelegibilidades no Direito Brasileiro. São Paulo: EDIPRO, 2ª ed., ver. ampl., 2003, p. 342.
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sigilo e perícia.
Em síntese, o Ministério Público Eleitoral, à primeira instância,
noticiou em seu pedido cautelar que havia recebido correspondência anônima,
a qual relatava que “pessoas pertencentes à Secretaria de Educação, Esporte e
Lazer do município do Recife eram ‘convocadas’ a participar da campanha do
candidato João da Costa. Afirma ainda que “havia verdadeiro loteamento de
funções entre servidores, distribuição de tarefas feitas de forma organizada e
premeditada, como se fosse um memorando interno circulando por meio
eletrônico’’.
Por tais motivos expendidos, foi requerida a busca e apreensão
das CPUs operadas pelos servidores da Secretaria de Educação Elcyene
Carvalho, Ângela Oliveira, Antônio Tadeu de Oliveira, Ana Cristina Silva e
Alzendra Dantas (fls. 03/11 – apenso).
Em ato processual contínuo, o juízo a quo deferiu a diligência
reqüestada, sob o fundamento de existirem indícios da utilização das
dependências, provedores e equipamentos públicos com o fito de se proceder à
arregimentação de servidores públicos para participação de campanha do
candidato João da Costa (fls. 34/35 – apenso).
Após a produção das provas, foi determinado o pronunciamento
das partes sobre os laudos periciais, fotografias e documentos juntados aos
autos, tendo sido realizado às fls. 217/220, 221/230 e 231/243.
O procedimento de busca e apreensão, de acordo com o que
consta nos autos, teve a finalidade apenas de apurar eventual cometimento de
práticas infracionais de cunho eleitoral em benefício do candidato João da
Costa, ora recorrente. Não se tratou, dessa forma, de ação autônoma, conforme
decidido pelo próprio julgador de primeira instância (fl. 251 – Apenso)
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(...) Dado tudo isso, atentando ao fato de que esta medida apreensória
não configura ação autônoma, mas mera providência de caráter
probatório, com o fito de capitanear e roborar a instrução da AIJE
269/08, outra alternativa não resta senão declarar sua acessoriedade
e obliterar-lhe a numeração própria, a fim de que seja autuada,
rotulada e processada como INCIDENTE PROCESSUAL, atribuindo-se-
lhe o número 269/2008-01.
Assim sendo, não se trata de utilização de prova emprestada de
processo em que a parte contrária não participou de sua produção, pois o
incidente de busca e apreensão não configura processo autônomo, tendo,
inclusive, a mesma numeração que os autos principais.
Além disso, não há que se falar em cerceamento de defesa ou
ofensa ao princípio do contraditório. A parte recorrente foi intimada para se
pronunciar sobre a medida incidental de perícia, cujo objeto era apuração de
notícias a respeito das trocas de mensagens eletrônicas e o uso da máquina
pública por servidores da Secretaria Municipal de Educação da prefeitura do
Recife. Em sendo assim, não houve ausência de oportunidade para se
manifestar acerca dos fatos articulados na medida incidental.
Nesse sentido, acórdão do TRE/RN:
RECURSO ELEITORAL - AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL - PREJUDICIAL, SUSCITADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, DE NÃO CONHECIMENTO DAS DUAS PRIMEIRAS PRELIMINARES DEFENDIDAS PELOS PRIMEIROS RECORRENTES - NÃO ACOLHIMENTO - PRELIMINARES SUSCITADAS NO PRIMEIRO RECURSO - CONHECIMENTO E REJEIÇÃO - PRÁTICA DE ABUSO DO PODER ECONÔMICO E POLÍTICO EM BENEFÍCIO DE CANDIDATURA NAS ELEIÇÕES DE 2004, COM DECRETAÇÃO DA INELEGIBILIDADE DOS PRIMEIROS RECORRENTES, POR 3 (TRÊS) ANOS, E APLICAÇÃO DE MULTA, NOS TERMOS DO ART. 73, IV E §§ 4º E 5º DA LEI 9.504/97 C/C O ART. 22, XIV DA LC 64/90 - CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO PRATICADA PELA PREFEITA E VICE-PREFEITO, COM A DECLARAÇÃO DA NULIDADE DOS VOTOS CONFERIDOS À COLIGAÇÃO BENEFICIADA, NOS TERMOS DO ART.
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41-A DA LEI 9.504/97, C/C O ART. 22 DA LC 64/90, E ARTIGOS 222 E 224 DO CÓDIGO ELEITORAL - DETERMINAÇÃO DO DESTRANCAMENTO DA AIME DE Nº 716/04, PARA A RETOMADA DO SEU CURSO NORMAL NA PRIMEIRA INSTÂNCIA - ENCAMINHAMENTO DE CÓPIA DO PRESENTE PROCESSO AO MINISTÉRIO PÚBLICO, PARA AS PROVIDÊNCIAS CABÍVEIS, NOS TERMOS DOS INCISOS XIV E XV DO ART. 22, DA LC 64/90 - CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DO PRIMEIRO RECURSO - CONHECIMENTO E PROVIMENTO PARCIAL DO SEGUNDO RECURSO. No Direito Eleitoral, em regra, toda matéria discutida em primeira instância pode ser impugnada no recurso, sendo desnecessário a impetração de agravo retido, não se operando, portanto, a preclusão. Rejeição da prejudicial suscitada pelo Ministério Público. Rejeita-se a preliminar de nulidade do feito por cerceamento de defesa e de ofensa ao devido processo legal, em razão da admissão da habilitação, uma vez não se tratar de litisconsórcio facultativo ulterior, motivo pelo qual o juiz de primeira instância determinou a reunião dos processos, por conexão.Preliminar de nulidade do feito por cerceamento de defesa e ofensa ao devido processo legal, por alegação de oitiva de testemunhas intempestivamente arroladas. Igualmente rejeitada, tendo em vista a prerrogativa do juiz de determinar, ex officio, as provas necessárias à instrução do processo, nos termos do art. 130 do Código de Processo Civil.Preliminar de nulidade do feito por cerceamento de defesa e ofensa ao devido processo legal, em face da ausência de citação na Ação Cautelar de Busca e Apreensão. Rejeição, em virtude de referida ação não exigir a aplicação do art. 802 do CPC, por ser medida incidental no processo principal, de caráter satisfativo, a fim de se obter provas para subsidiar a investigação judicial eleitoral.Também rejeita-se a preliminar de nulidade, por cerceamento de defesa e ofensa ao devido processo legal, em razão da alegação de falta de intimação quanto à feitura das perícias determinadas, haja vista ter sido dado oportunidade às partes para se manifestarem sobre as provas produzidas, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa. [...]Conhecimento e improvimento do primeiro recurso.Conhecimento e provimento parcial do segundo recurso. (TRE/RN. Acórdão 6396. Relator Desembargador Dubél Ferreira Cosme. Publicação: Diário de Justiça do Estado do RN – DJ. Data: 06/07/2005, página 31)
Desta feita, não há que se falar em nulidade dos laudos
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periciais, tendo em vista que a medida cautelar visou à apuração de dados
constantes nas unidades de mesa dos agentes públicos indicados na inicial,
diante de possíveis indícios de utilização da máquina pública em benefício da
campanha eleitoral de João Da Costa.
Além disso, em respeito ao princípio do contraditório e da ampla
defesa, foi facultado acesso às partes da ação de investigação judicial eleitoral
de todo o conteúdo das providências realizadas no incidente cautelar.
II.6. Do interesse de agir e da adequação da via eleita
Falece de razão o argumento da ausência de interesse de agir,
em face de não haver a representação sido proposta no prazo de cinco dias
contados do conhecimento provado ou presumido do ato repudiado. Observe-se
que esse entendimento aplica-se quando se tratar de exclusiva representação
por violação ao art. 73, da Lei n.º 9.504/97 que segue o rito do art. 96 desse
mesmo diploma legal. In casu, está também configurado o abuso do poder
político, cujo rito a ser seguido está previsto no art. 22, da Lei Complementar
n.º 64/90.
Cumpre observar que a Lei Complementar n.º 64/90 não fixa o
prazo para que seja ajuizada a representação para fins de instaurar
investigação judicial eleitoral. No entanto, segundo a jurisprudência do
Tribunal Superior Eleitoral, a propositura de tal ação é até a data da
diplomação dos candidatos3.
Convém trazer julgado recente proferido pela Corte Superior
Eleitoral:
REPRESENTAÇÃO. INVESTIGAÇÃO JUDICIAL. ALEGAÇÃO. ABUSO DO PODER POLÍTICO E DE AUTORIDADE. ATOS DE CAMPANHA EM
3 A esse respeito citam-se os seguintes precedentes: Ac 15.099, de 07/05/1998; REspe nº 15.263, de 25/05/1999; REspe 12.676, de 18/06/1996; REspe nº 12.531, de 18/05/1995,; REspe 11.994, de 12.12.1995; TSE, Acórdão 168, de 17.12.2002
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EVENTO OFICIAL. INFRAÇÃO AOS ARTS. 73, I E IV, E 74 DA LEI No 9.504/97. PRELIMINARES. AUSÊNCIA DE CONCESSÃO. PODERES ESPECIAIS. INSTRUMENTO DE PROCURAÇÃO. AUSÊNCIA DE CANDIDATURA FORMALIZADA. INTEMPESTIVIDADE. APRESENTAÇÃO. ROL DE TESTEMUNHAS. DOCUMENTAÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. REJEIÇÃO. FALTA DE COMPROVAÇÃO. POTENCIALIDADE. DESEQUILÍBRIO. RESULTADO DO PLEITO. IMPROCEDÊNCIA. ARQUIVAMENTO.A representação para apurar o abuso de autoridade previsto no art. 74 da Lei no 9.504/97 pode ser ajuizada até a diplomação dos eleitos. Na hipótese de procedência da investigação judicial eleitoral, a sanção de inelegibilidade alcança tanto o candidato beneficiado como a todos os que hajam contribuído para a prática do ato abusivo, nos termos do inciso XIV do art. 22 da Lei Complementar no 64/90.É assente a orientação deste Tribunal no sentido de que a ação de investigação judicial pode ter como objeto fato ocorrido em momento anterior ao da escolha e registro do candidato.O abuso do poder apenado pelo art. 22 da Lei das Inelegibilidades se configura quando há a comprovação da efetiva potencialidade do ato irregular para influir no resultado da eleição. (TSE. Representação 929. Relator Ministro Cesar Asfor Rocha. Publicado em Diário de Justiça – DJ. Data: 27/02/2007, página 140)
Demais disso, alguns doutrinadores, como Marcos Ramayana4 e
Alexandre Issa Kimura5 defendem este mesmo posicionamento, isto é, o prazo
para a representação prevista no art. 22 da LC n.º 64/90 vai até a data da
diplomação dos candidatos eleitos.
Deve-se perfilhar tal entendimento, não apenas levando em
conta a jurisprudência cristalizada pelo egrégio TSE, mas também
considerando o objetivo da investigação judicial eleitoral que é apurar o abuso
de poder.
Assim sendo, entende-se que o prazo para ajuizar a investigação
judicial eleitoral finda na data da diplomação dos candidatos eleitos.
Considera-se, pois, equivocada a premissa que o recorrente tomou como base
4RAMAYANA, Marcos. Direito Eleitoral. 4 ed, rev e atual até EC 46/2005. Niterói: Editora Impetus, 2005, p.242 e p. 244.5 KIMURA, Alexandre Issa. Manual de Direito Eleitoral. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2006, p. 168.
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para alegar a intempestividade da presente ação de investigação judicial.
No tocante à alegação de inadequação da via processual eleita,
afirma o recorrente que não era candidato na época da edição da revista, objeto
da presente ação, assim como não havia ocorrido convenção partidária para
escolha de candidato. Dessa forma, aduz que o termo candidato contido na LC
64/90, art. 22, figura como condição.
A argumentação aqui ora expendida se coaduna com o que
restou dito no item 1 - Da competência da Justiça Eleitoral para investigar
abuso do poder político antes do requerimento do registro de candidatura.
É admitido o oferecimento de investigação judicial eleitoral para
apurar fatos anteriores ao registro. Entretanto, o Tribunal Superior Eleitoral
admite apenas na hipótese em que haja projeção de tais condutas no pleito.
Assim, é cabível a investigação judicial eleitoral para apurar fatos ocorridos
anteriormente ao pedido de registro de candidatura, desde que aqueles atos
tenham reflexo no processo eleitoral.
O doutrinador Emerson Garcia, sobre o tema, assim discorre:
Os prosélitos da ilicitude, como demonstram as regras de experiência, raramente aguardarão a deflagração do procedimento eletivo para iniciar as práticas que comprometam a sua normalidade e legitimidade. Olvidando a legalidade e norteados pela idéia de que a antecipação lhes possibilitará subjugar os concorrentes em potencial, é prática comum que muitos dos futuros candidatos iniciem sua campanha antes mesmo da realização das convenções partidárias. Nestas, em muitos casos, não há propriamente disputa, tendo a função única de ratificar a já conhecida vontade dos correligionários.6
Assim, ainda que os fatos tenham ocorrido antes do pedido de
registro de candidatura, é possível o ajuizamento da investigação judicial
eleitoral para sua apuração.
6 GARCIA, Emerson. Abuso de Poder nas Eleições – Meios de Coibição. Editora Lumen Juris: São Paulo, 3ª Ed. , 2006, p. 137-138.
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III. DO MÉRITO: ABUSO DO PODER POLÍTICO EM BENEFÍCIO DA CAMPANHA ELEITORAL DE JOÃO DA COSTA
Ab initio, destaco o importante papel do Ministério Público
Eleitoral, de primeira instância, presentado pelas Promotoras Eleitorais Andrea
Fernandes Nunes Padilha e Patrícia Carneiro Tavares, que tiveram uma
exemplar atuação funcional na condução da presente investigação judicial
eleitoral.
Ficou constatado o empenho dos membros do Parquet na
apuração dos desvios de conduta dos agentes políticos ora destacados, a fim de
se buscar um processo eleitoral sem vícios, visando à preservação da
legitimidade popular nas urnas.
A soberania popular, exercida pelo sufrágio universal, consiste
na base sobre a qual foi edificado nosso Estado. Todos os Direitos e Garantias
Fundamentais previstos na Constituição Federal guardam estreita relação com
o Estado Democrático de Direito, que não pode existir sem conferir ao povo o
direito de escolher livremente seus representantes.
Em decorrência da inexorável conexão entre a livre escolha dos
representantes pelo povo e a própria existência da democracia, todos temos o
dever de lutar para que as eleições ocorram com lisura. É imperioso que a
sociedade, os três poderes e o Ministério Público adotem as medidas
necessárias e suficientes para que a representatividade popular se dê sem
mácula.
Não se podem tolerar atos que causem desequilíbrio ao pleito e
comprometam a legitimidade do representante eleito. Por essa razão, é
inaceitável que agentes públicos abusem do poder político em detrimento do
processo eleitoral. Por outro lado, deve haver proporcionalidade na sanção
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imposta a quem praticou alguma conduta vedada pela Lei nº 9.504/97 e
abusou do poder político e/ou econômico; deve ser levada em conta a
potencialidade desse ilícito para influir no pleito.
O art. 73, da Lei das Eleições (Lei n. 9.504/97), elenca as
condutas vedadas no período eleitoral, nos termos seguintes:
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais: (destaque nosso)
O § 4º, desse mesmo dispositivo, fixa multa para aqueles que
realizarem quaisquer das condutas proibidas, in verbis:
O descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor de cinco a cem mil UFIR.
Sobre o tema, entendeu o TSE ao julgar o REspe nº 25.358, em
de 6.6.2006, que:
O art. 73 refere-se a condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidade entre candidatos, por isso submete-se ao princípio da proporcionalidade.
Se, por outro lado, a cominação de multa for insuficiente para
sancionar o agente que realizou quaisquer das condutas mais graves – as dos
incisos I, II, III, IV ou VI –, isto é, se houver potencialidade para se influir no
pleito e torne ilegítimido o resultado das eleições, o candidato beneficiado
estará sujeito à cassação do registro ou do diploma, além da decretação de sua
inelegibilidade por 3 (três) anos contados das eleições em que ocorreu o ilícito.
É o que diz o art. 73, § 5º, in verbis:
Nos casos de descumprimento do disposto nos incisos I, II, III, IV e VI do caput, sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior, o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará sujeito à cassação do registro ou do diploma. (Destaque nosso).
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Todavia, a cassação do registro ou do diploma não é uma
conseqüência automática da prática das condutas previstas nos incisos I, II,
III. IV e VI, do art. 73, da Lei das Eleições. Não se pode fazer uma interpretação
literal do dispositivo, ao contrário, é preciso vê-lo a luz do que nos informa a
Constituição Federal, sob pena de criar situações extremamente injustas. Sem
dúvida, a aplicação de qualquer sanção exige que ela seja proporcional ao
ilícito. Outro não é o entendimento acolhido pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Nesse sentido:
Eleições 2006. Deputado estadual. Atuação parlamentar. Divulgação. Internet. Sítio da Assembléia Legislativa do Estado de Rondônia. Propaganda Institucional. Conduta Vedada (art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/97). Reconhecimento pela Corte regional. Aplicação de multa. Cassação do registro de candidatura. Ausência. Juiz Auxiliar. Competência.- A prática da conduta vedada do art. 73 da Lei das Eleições não conduz, necessariamente, à cassação do registro ou do diploma, cabendo ao magistrado realizar o juízo de proporcionalidade na aplicação da pena prevista no parágrafo 5º do mesmo dispositivo legal. Precedentes.- "Se a multa cominada no § 4º é proporcional à gravidade do ilícito eleitoral, não se aplica a pena de cassação" (Ac. nº 5.343/RJ, rel. Min. Gomes de Barros). - O juiz auxiliar é competente para julgar as representações e reclamações por descumprimento da Lei nº 9.504/97, e aplicar as sanções correspondentes (art. 96, § 3º, da Lei das Eleições).- Recursos desprovidos.(TSE. REspe nº 26.905. Rel. José Gerardo Grossi, DJ - Diário de justiça, Data 19/12/2006, p. 225). (Destaque nosso).
Recurso especial. Conduta vedada. Aplicação de multa. Pena de cassação de registro ou diploma. Princípio da proporcionalidade. Precedentes. Agravo regimental improvido. A aplicação da pena de cassação de registro ou diploma é orientada pelo princípio constitucional da proporcionalidade.(TSE. REspe. 26.060. Rel. Antônio Cesar Peluso, DJ - Diário de justiça, Data 12/2/2008, p. 9). (Destaque nosso).
Ainda sobre o tema, destacou o Ministro Gilmar Mendes no
REspe 24.883/PR que “pressupõe toda a base da idéia do estado de direito que
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a responsabilidade há de ser proporcional à culpa. E esse é um sistema que se
transpõe para todo o modelo sancionatório, não apenas para o Direito Penal”.
Tecidas essas considerações, cabe-nos analisar os fatos
imputados ao recorrente João da Costa. A ação de investigação judicial
eleitoral em tela se deu em face do disposto no art. 73, III e IV, da Lei n.
9.504/97:
III - ceder servidor público ou empregado da administração direta ou indireta federal, estadual ou municipal do Poder Executivo, ou usar de seus serviços, para comitês de campanha eleitoral de candidato, partido político ou coligação, durante o horário de expediente normal, salvo se o servidor ou empregado estiver licenciado;
IV - fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público;
III.1. Do abuso do Poder Político pela cooptação de agentes públicos em prol da campanha eleitoral de João da Costa
No caso em análise, servidores públicos da Prefeitura do Recife
se mobilizaram em benefício da campanha eleitoral de João da Costa. Os
mesmos trocaram e-mails, repassando a agenda de campanha do candidato
para o fim de fazer panfletagem no final da tarde na avenida Agamenon
Magalhães, principalmente aqueles que são detentores de cargos
comissionados. Demais disso, foi encontrado armazenado material de
campanha do candidato em cinco computadores da Prefeitura do Recife.
Delegados do programa orçamento participativo trabalhando em benefício da
campanha eleitoral.
Esses fatos se amoldam ao art. 73, I e III, da Lei n. 9.504/97,
que segundo valorosa lição de Joel Cândido, é preciso aferir se houve o binômio
“prejuízo-benefício concreto”: o primeiro (prejuízo), para o serviço público e
demais partidos e, o segundo (benefício concreto), para o partido. Coligação ou
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candidato que se quis ajudar com a ilegalidade. A não ser assim, a regra se
prestará não para os elevados escopos a que se propõe, mas sim a injustas
perseguições7.
E mais, consoante nos ensina Adriano Soares:
(...) não se pode, em toda e qualquer hipótese de infração de alguma norma do art. 73, aplicar-se a pena capital de cassação do diploma, sem a análise do caso concreto e a ponderação da gravidade do ato para modificar o resultado do pleito”8.
Vejamos ainda os depoimentos testemunhais colhidos em juízo,
a testemunha Niedja Queiroz – coordenadora Geral do Orçamento Participativo
– assim se manifestou (fls. 275/277):
“Quem tem tomado parte, com assiduidade da campanha política do candidato João da Costa.Que não conhece nenhum funcionário que tenha sido punido por participar da campanha do candidato João da Costa.Que se declara contribuidora da campanha do candidato João da Costa, a qual doou a quantia de R$ 4.700,00 (quatro mil e setecentos reais).Que não vê impedimento de os delegados do OP terem comportamento ativo nas campanhas políticas como ocorreu em relação ao candidato João da Costa, porquanto se comportam como cidadãos, não enxergando qualquer óbice ético, eleitoral ou jurídico.” (Destaque nosso).
Seguindo audiência de inquirição de testemunha, passou-se a
ouvir Maurílio Muniz da Silva – coordenador da Região Político-administrativa
03 (fl. 277):
“Que não é filiado ao Partido dos Trabalhadores, mas mesmo assim já tomou parte em passeatas do candidato João da Costa e que ele mesmo procura saber com colegas de trabalho os eventos e passeatas que estão sendo realizadas, e deles participa.”
Foram colhidas ainda as declarações de Flávio José da Silva –
líder comunitário do bairro de Campo Grande e delegado do orçamento
7 CÂNDIDO, Joel J. Direito Eleitoral Brasileiro, 12ª ed. São Paulo: Edipro, 2006, p. 566.8 COSTA, Adriano Soares da. Instituições de Direito Eleitoral, 6ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2006, 865.
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participativo (fls. 278):
“que declara que, ao ser ouvido no Ministério Público, em 10.06.2008 (termo de fl. 128 dos autos), fez-se acompanhado da advogada Drª Viviane Santa Cruz Lago. Tendo-lhe sido lido todo o termo de declaração ante referido, confirma-o ipsis litteris, inclusive que em seu discurso mencionou a necessidade de que o então Secretário João da Costa tinha de continuar pela continuidade do Orçamento Participativo.” (Destaque nosso).
Aos dias 10 de setembro do corrente ano, foi ouvida a
testemunha Elcyene Vasconcelos de Carvalho, que assim declarou (fl. 359):
“Que a participação dela depoente na campanha do candidato João da Costa é classificada, por ela depoente, como a participação de qualquer cidadão no processo político. Que passava e-mails para seus amigos dando conta das atividades que ocorriam em relação à campanha do candidato João da Costa. Que chegou a formar grupo de discussão na internet com o mesmo objetivo. Que não lembra quem lhe passou a agenda de campanha do candidato João da Costa, mas que a retransmitiu aos seus amigos. Que não lembra ter passado os e-mails no seu local de trabalho utilizando equipamentos da Secretaria de Educação ou do Programa Escola Aberta, mas ressalva que pode ser que tenha acontecido, não afirmando com certeza. Que não recebeu nenhuma punição nem advertência por ter utilizado computadores da prefeitura para convocar amigos e conhecidos a tomarem parte de atos de campanha em prol do candidato João da Costa. Que quanto aos registros existentes dando conta de que a depoente utilizada computador da Prefeitura para mandar mensagens, afirma que provavelmente não estaria de folga nesses dias, porquanto não costuma passar suas folgas no local de trabalho.
A respeito da prova pericial produzida no incidente processual
instaurado, tem-se o laudo nº 908/2008-SETEC/SR/DPF/PE, que respondeu
aos quesitos da seguinte forma (fls. 108-109):
Sim. Foram encontradas mensagens de cunho político eleitoral, no material descrito em I – MATERIAL EXAMINADO, alusivas à candidatura de João da Costa. Além disso, foram encontradas mensagens alusivas à candidatura de Múcio Magalhães.
(...)
O disco rígido enviado a exames utilizava um usuário/senha comum a
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todos e por isso não é possível afirmar quem utilizava regularmente a estação. Entretanto foram encontrados vestígios com o nome Gibson Trindade Torres, sugerindo que o mesmo em algum momento utilizou a estação.
(...)
Foi encontrado o seguinte endereço de correio eletrônico pertencente ao poder público: gibson@recife.pe.gov.br.
(...)
Não foram encontrados vestígios no disco rígido enviado a exames que pudessem indicar os cargos públicos ocupados pelos remetentes ou destinatários das mensagens eletrônicas identificas.
Percebe-se, da análise da prova testemunhal e do material
periciado, que realmente houve a participação de agentes públicos na
campanha eleitoral de João da Costa. Contudo, não foi possível identificar uma
larga estrutura de servidores organizados da Secretaria de Educação Municipal
voltados ao uso da máquina pública em benefício da campanha do candidato,
ora recorrente, assim como não foi possível determinar os cargos públicos das
pessoas que enviaram ou receberam as mensagens.
Além disso, os endereços eletrônicos encontrados nos discos
rígidos enviados para exame da Polícia Federal eram pertencentes,
principalmente, a serviços gratuitos de webmail da internet, tais como, Yahoo,
Gmail, Hotmail, etc. Houve apenas referência a dois e-mails institucionais,
quais sejam: gibson@recife.pe.gov.br e mariliarodrigues@recife.pe.gov.br
(Laudos 908 e 911/2008-SETEC/SR/DPF/PE).
Frise-se, ainda, não foram encontrados vestígios no disco rígido
enviado a exames que pudessem indicar os cargos públicos ocupados pelos
remetentes ou destinatários das mensagens eletrônicas identificadas (Laudo
908/2008-SETEC/SR/DPF/PE, fl. 119).
É inquestionável que as condutas apuradas no incidente
cautelar instaurado com a finalidade de apurar a utilização dos computadores
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da Prefeitura do Recife em benefício da campanha eleitoral de João da Costa
são censuráveis e suscetíveis de acarretar uma reprimenda por parte dessa
Justiça Eleitoral.
Urge moralizar o processo eleitoral, expurgando-o das
malsinadas práticas de abuso de poder político ou econômico. Como se vê, no
presente caso, a própria população tem colaborado para a apuração de tais
ilícitos, cabendo às instituições democráticas, mormente ao Ministério Público
e ao Poder Judiciário, dar ao clamor popular a feição jurídica que requer o
Estado Democrático de Direito.
No caso em análise, o conteúdo probatório constante nos autos é
convincente, sendo possível tipificar as condutas referidas como abuso de
poder político. Entretanto, os fatos apurados não tiveram o condão de
demonstrar elemento que a jurisprudência e a doutrina classificam como
imprescindível à desconstituição do mandato oriundo da vontade popular, qual
seja, a capacidade de influir no resultado pleito.
É certo, que as condutas descritas na inicial de investigação
judicial indicam a existência de atos nocivos à campanha eleitoral,
configuradores de abuso de poder político. Todavia, as provas colhidas não
demonstram que esses ilícitos tiveram potencialidade de comprometer o
resultado das eleições.
Destarte, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral oscilou
até meados de 2006, ora exigindo, ora dispensando o exame de potencialidade
lesiva da conduta vedada. Porém, hoje, é firme o entendimento desse Tribunal
Superior no sentido de que a existência de potencialidade para desequilibrar o
resultado do pleito é condição indispensável para cassação do registro ou de
diploma e para decretação da inelegibilidade de candidato.
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Como cediço, houve a participação de agentes públicos em
campanha eleitoral do candidato à época, eleito prefeito do município do Recife,
João da Costa. Além disso, estima-se que vários eleitores tenham sido
atingidos por essa propaganda eleitoral em prol do recorrente.
Todavia, saliente-se que, na eleição majoritária do corrente ano,
foram registrados no município de Recife 839.587 votos válidos, tendo a chapa
do recorrente recebido 432.707, enquanto seu concorrente melhor classificado
obteve 206.827 votos, uma diferença de 225.880, bem significante para um
eleitorado desse porte.
Cumpre colacionar julgado do Tribunal Superior Eleitoral sobre
o tema:
“1. Agravos regimentais. Recurso especial. Provimento. Decisão monocrática. Art. 36, § 7º, do Regimento Interno do TSE. Ampla defesa. Violação. Inexistência. O provimento de recurso especial, via decisão monocrática, nos termos do art. 36, § 7º, do RITSE, não implica violação ao princípio constitucional da ampla defesa. 2. Representação. Conduta vedada. Art. 73 da Lei nº 9.504/97. Potencialidade de a conduta comprometer o resultado do pleito. Condição indispensável para configuração do ilícito eleitoral. Precedentes. A potencialidade de a conduta interferir no resultado das eleições, segundo posicionamento atual e dominante do TSE, é requisito essencial à caracterização do ilícito eleitoral previsto no art. 73 da Lei nº 9.504/97. 3. Conduta vedada. Captação ilícita de sufrágio. Pressupostos de configuração. Equiparação. Impossibilidade. É inviável equiparar os pressupostos de configuração dos ilícitos previstos nos arts. 41-A e 73 da Lei Eleitoral, pois a vedação à captação de sufrágio visa a proteger o voto livre do eleitor, e não o equilíbrio entre os candidatos no pleito. 4. Conduta vedada. Art. 73, I, da Lei nº 9.504/97. Uso de automóvel pertencente à prefeitura municipal. Distribuição de 40 (quarenta) camisetas alusivas à campanha de candidatos. Apreensão do veículo antes da efetivação da conduta. Ilegalidade não caracterizada. A utilização de veículo público para promover a campanha de candidatos não configura infração ao art. 73, I, da Lei nº 9.504/97, se a distribuição do material publicitário, em número reduzido e insuficiente para influir nas eleições, não se concretiza. 5. Prova. Reexame. Desnecessidade. Fato incontroverso. Reenquadramento jurídico. Possibilidade. Exame da potencialidade no
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TSE. Permissibilidade. Agravos regimentais do Ministério Público Eleitoral e do segundo colocado nas eleições de 2004 desprovidos. Diante de fato incontroverso, é permitido a esta Corte proceder ao seu devido enquadramento jurídico e avaliar a sua capacidade de macular, ou não, a lisura do pleito. 6. Multa. Condenação. Afastamento. Agravo regimental do candidato eleito no pleito de 2004 provido. Não deve remanescer a condenação ao pagamento de multa se a incidência do art. 73 da Lei Eleitoral foi afastada.” (TSE. Acórdão 27.197. Min. Rel. Joaquim Benedito Barbosa Gomes, DJ - Diário de Justiça, Volume 1, Tomo -, Data 11/09/2008, Página 8)
Portanto, embora as práticas ora descritas estejam devidamente
comprovadas e mereçam censura, não há como provar sua potencialidade de
influir no resultado e na lisura das eleições. Assim, não houve
comprometimento da higidez da formação da vontade do conjunto do
eleitorado, o que seria imprescindível para declaração de inelegibilidade e
cassação do registro de candidatura.
A respeito da aplicação das sanções de declaração de
inelegibilidade e cassação de registro, como dito alhures, não é uma imposição
automática. Ao julgador é conferido um juízo de proporcionalidade ao aplicar
as sanções decorrentes da violação ao art. 73 da Lei nº 9.504/97, de acordo
com a gravidade da conduta.
No caso em análise, a cassação do diploma de João da Costa por
ilícitos que não tiveram a potencialidade de comprometer o resultado final do
das eleições afrontaria o próprio regime democrático. O recorrente elegeu-se
com larga vantagem, o que demonstra que a vontade popular final não foi
conspurcada.
III.2. Da promoção pessoal de João da Costa por meio de revista custeada pelo Erário Municipal
Outro abuso cometido pelo recorrente João da Costa e desta vez
com apoio do Prefeito João Paulo consistiu na promoção pessoal do primeiro à
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custa do Erário. Foram confeccionadas 50.000 (cinqüenta mil) exemplares da
Revista do Orçamento Participativo “Obras que ficam para sempre”. Não
fossem as circunstâncias em que essa suposta “prestação de contas” ocorreu
não haveria reprimendas; todavia, tais circunstâncias apontam para o desvio
de finalidade consistente no uso eleitoreiro.
Em primeiro lugar, nenhuma outra Secretaria da Prefeitura
recebeu tantos recursos financeiros para publicidade nesse ano eleitoral como
recebeu a pasta do então Secretário do Planejamento Participativo, Obras e
Desenvolvimento Urbano e Ambiental, João da Costa. Segundo os documentos
de fls. 57/61, só com a publicação da referida revista foram gastos R$
110.000,00 (cento e dez mil reais)!
Ainda em relação aos gastos com publicidade, segundo os
documentos de fls. 70/72, uma simples comparação com os exercícios de
2005, 2006 e 2007 é bastante eloqüente para demonstrar a
desproporcionalidade com o que foi gasto recentemente. Em 2005, foi
registrado um gasto de R$ 23.450,00 (vinte e três mil e quatrocentos e cinco
reais) na divulgação do programa; de 2006 ao primeiro semestre de 2007, não
há registro de gastos. Todavia, de junho de 2007 a maio de 2008 foram gastos
R$ 627.337,77 (seiscentos e vinte e sente mil e trezentos e trinta e sete reais e
setenta e sete centavos) só com a publicidade do Orçamento Participativo da
Prefeitura do Recife. Se de 2005 a 2006 foi suficiente para a prestação de
contas do orçamento participativo pouco mais de vinte e três mil reais, por que
gastar mais de meio milhão de reais entre o segundo semestre de 2007 e o
primeiro semestre de ano eleitoral?
Outro dado relevante, ainda sobre os gastos com essa
publicidade, diz respeito à qualidade do material usado na confecção da
revista. Se em 2005 foi suficiente para a prestação de contas do Orçamento
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Participativo a impressão no jornal Folha de Pernambuco de 5 mil tablóides
com 8 (oito) páginas em papel jornal “full collor”, por que em período tão
próximo ao das eleições precisou-se confeccionar 50 mil luxuosas revistas com
direito a lançamento no Teatro Santa Isabel para 700 (setecentas) pessoas?
Sem sombra de dúvida, houve descaso com o dinheiro público,
houve desvio de finalidade – o que, nos termos do artigo 73, § 7º, da Lei n.º
9.504/97, também configura ato de improbidade administrativa, que deve ser
sancionado na via própria –; todavia, para se cassar o registro ou diploma do
candidato beneficiado, é imprescindível aferir se essa sanção guarda
proporcionalidade com o ilícito. Para isso, é importante um cotejo com outros
casos julgados pela Justiça Eleitoral, vejamos:
No caso do recurso especial n. 26.060, para o TSE foi suficiente
a aplicação de multa em face de “utilização de programas sociais
em proveito político-eleitoreiro”. O Ministério Público ajuizara
ação de investigação judicial eleitoral “sob a alegação de abuso
de poder político, mediante concessão de salário-escola em troca
de voto; concessão de benefícios a pessoas abastadas;
oferecimento de diversas benesses durante a campanha eleitoral;
e promessa de doação de casas em troca de votos”.
O TSE também em homenagem ao princípio da
proporcionalidade apenas aplicou a multa em face de o
Secretário Municipal de Educação e Cultura ter realizado
reunião-jantar com os professores da rede municipal de ensino
para pedir apoio a candidatos a Prefeito e à Câmara de
Vereadores9.
Assim, em que pese a configuração de conduta vedada pela lei
9 RESPE 24883, rel. Humberto Gomes de Barros, DJ - Diário de Justiça, Data 09/06/2006, Página 134.
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das eleições, a cassação do registro ou diploma e decretação de inelegibilidade
é sanção que não guarda proporção com uma conduta que não teve
potencialidade para influir no resultado das eleições. Não vejo como 50 mil
exemplares de uma revista que sequer fez menção às eleições e um evento para
700 (setecentas) pessoas possam influir nas eleições de uma capital com mais
de um milhão de eleitores.
III.3. Da omissão do Prefeito João Paulo ao permitir o uso da máquina pública em favor de candidato
Inicialmente, cumpre destacar que embora o juízo singular
tenha acolhido a tese de ilegitimidade passiva argüida por João Paulo em sua
contestação, fls. 193/233, o magistrado apreciou essa alegação quando da
análise do mérito na sentença.
Às fls. 236/238, asseverou o julgador que “a argüição de
impertinência subjetiva de João Paulo Lima e Silva confunde-se com o meritum
causae e deverá ser deduzida no momento próprio”. Essa mesma afirmação foi
repetida na sentença (fl. 452).
Assim, foi dado prosseguimento ao processo tendo o ora
recorrido participado de toda a instrução processual. Concluída toda ela, o ora
recorrido João Paulo apresentou alegações finais, fls. 412/433, pugnando pela
reconsideração das preliminares e, no mérito, pela improcedência do pedido.
Ao sentenciar, entendeu o magistrado que não havia provas de
que o Prefeito João Paulo houvesse participado dos ilícitos eleitorais apurados
nesta AIJE. O que fez o douto juiz a quo foi valorar as provas e julgar o pedido
improcedente em relação ao recorrido, tendo feito uma verdadeira análise de
mérito, embora tenha declarado a ilegitimidade passiva.
De toda sorte, a causa está devidamente madura para
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julgamento nessa Corte e o recurso do Ministério Público tem por escopo o
reconhecimento da legitimidade passiva de João Paulo e a reavaliação das
provas carreadas aos autos. Sem dúvida, não há que se falar em supressão de
instância, visto que o magistrado a quo já apreciou todos os elementos
probatórios acostados, sob o crivo do contraditório e ampla defesa.
Sem dúvida, no caso presente tem perfeita aplicação o disposto
no art. 515, § 3º, do CPC, segundo o qual
Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento
Sobre o tema assevera Nelson Nery que
Embora da norma conste a aditiva “e”, indicando que o tribunal só pode julgar o mérito se se tratar de matéria exclusivamente de direito e a causa estiver em condições de julgamento imediato, é possível o julgamento de mérito pelo tribunal, quando a causa estiver madura para tanto. Exemplo disso ocorre quando é feita toda a instrução mas o juiz extingue o processo por ilegitimidade de parte (CPC 267 VI). O tribunal, entendendo que as partes são legítimas, pode dar provimento à apelação, afastando a carência e julgando o mérito, pois essa matéria já terá sido amplamente debatida e discutida no processo. Esse é o sentido teleológico da norma: economia processual10.
No mesmo sentido:
Tendo em vista os escopos que nortearam a inserção do § 3º no art. 515 (celeridade, economia processual e efetividade do processo), sua aplicação prática não fica restrita às hipóteses de causas envolvendo unicamente questões de direito. Desde que tenha havido o exaurimento da fase instrutória na instância inferior, o julgamento do mérito diretamente pelo tribunal fica autorizado, mesmo que existam questões de fato. Assim, “estando a matéria fática já esclarecida pela matéria coletada, pode o Tribunal julgar o mérito da apelação mesmo que o processo tenha sido extinto sem julgamento do mérito, por ilegitimidade passiva do apelado” (STJ-4ª T., REsp 533.980-MG, rel. Min. Cesar Rocha, j. 21.8.03, não conheceram, v.u., DJU 13.10.03, P. 374). Também: STJ-RF 384/270 (3ª T., REspe 714.620). Logo, o pressuposto para a incidência do art. 515 § 3º é o de que a causa esteja madura
10 NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, 9 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 742.
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para o julgamento. No mesmo sentido: RT 829/21011.
É inconteste que o Prefeito João Paulo e o Secretário do
Planejamento Participativo João da Costa, ao efetuarem os gastos com a
elaboração da Revista do Orçamento participativo e participarem do evento de
lançamento da mesma, onde foram despendidos R$ 145.540,00 (cento e
quarenta e cinco mil e quinhentos e quarenta reais) nos meses de abril a maio
do ano eleitoral só com a produção gráfica da Revista e do Guia do OP (cf. doc.
de fl. 72), efetivamente usaram da máquina pública para favorecer o candidato.
Nos autos está evidenciado que a divulgação da Revista
“Orçamento Participativo. Obras que Ficam para Sempre” foi além de uma
simples prestação de contas. Nela, o prefeito João Paulo e o então Secretário de
Planejamento Participativo, Obras e Desenvolvimentos Urbano e Ambiental,
João da Costa (que têm seus nomes destacados às fls. 04 e 05 da mesma),
concentraram em período próximo às eleições a divulgação de tudo o que foi
feito ao longo de 7 (sete) anos mediante o programa governamental Orçamento
Participativo.
Consoante já dito neste parecer, as despesas com publicidade
das obras do orçamento participativo nos últimos 12 (doze) meses que
antecederam o período eleitoral superaram em muito as de outras Secretarias,
bem como as dos anos anteriores. É estreme de dúvida que houve desvio de
finalidade na publicidade dada às realizações das obras ligadas à pasta do
candidato João da Costa e, portanto, é certo que houve uso indevido de meio
de comunicação social.
O ato ilícito do prefeito se amolda, perfeitamente, ao disposto no
art. 73, IV, da Lei das Eleições, uma vez que ele permitiu o uso promocional em
11 NEGRÃO, Theotônio e GOUVÊIA, José Roberto F.; com as colaboração de BONDIOLI, Luiz Guilherme Aidar. Código de Processo Civil e legislação em vigor, 40ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 685-686.
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favor do candidato de distribuição gratuita da revista de caráter social
custeada pelo Poder Público.
Todavia, conforme restou pacificado pela Jurisprudência do TSE,
deve haver proporcionalidade entre a sanção prevista na lei das eleições e o
potencial lesivo da conduta vedada. Não me parece que o resultado das eleições
foi alterado pelas irregularidades apuradas nesta Ação de Investigação Judicial
Eleitoral; assim, com a devida vênia dos entendimentos contrários, não se pode
afirmar que a eleição do recorrente João da Costa tenha sido decorrência da
publicação e divulgação da revista do OP e da mobilização de servidores.
Por essa razão, não se justifica decretar a inelegibilidade do
recorrido João Paulo; no caso em análise, é bastante suficiente a aplicação da
sanção consubstanciada em multa. Demais disso, cabe ao Judiciário fazer a
subsunção do fato à norma; portanto, mesmo que as partes não tenham
mencionado a aplicação da multa em tela, não há qualquer barreira para o
Judiciário impô-la, pois decorre de aplicação da lei.
Nesta senda, merece relevo o disposto no art. 73, § 8º, da Lei das
Eleições:
§ 8º Aplicam-se as sanções do § 4º aos agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem. (Destaque nosso).
Ora, resta claro que a multa aplicada ao agente público João
Paulo se estende ao candidato João da Costa.
Por certo, a fixação do valor dessa pena pecuniária deve se
pautar pela proporcionalidade. Estabelece o art. 73, § 4º, da Lei n. 9.504/97
que o descumprimento do disposto no art. 73 sujeitará os responsáveis a multa
no valor de cinco a cem mil UFIR.
Além disso, na quantificação da multa, por analogia, pode-se
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lançar mão do disposto no art. 36, § 3º, in verbis:
Art. 36. A propaganda eleitoral somente é permitida após o dia 5 de
julho do ano da eleição.
[...]
§ 3º A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela
divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio
conhecimento, o beneficiário, à multa no valor de vinte mil a cinqüenta
mil UFIR ou equivalente ao custo da propaganda, se este for maior. (Sem destaque no original).
Assim, como no ano eleitoral gastou-se R$ 145.540,00 (cento e
quarenta e cinco mil e quinhentos e quarenta reais) só com a produção gráfica
da Revista e do Guia do OP (cf. doc. de fl. 72), entendo que cada um deve arcar
com aproximadamente metade desse valor.
Desta feita, a imposição de multa no importe de 70.000 (setenta
mil) UFIR para cada um é a sanção justa e suficiente para punir o agente
público e o candidato beneficiado.
IV. CONCLUSÃO
Por todo o exposto, requer esta Procuradoria Regional Eleitoral:
a) o provimento parcial do recurso do Ministério Público
Eleitoral para aplicação de multa ao prefeito, estendendo-a ao
candidato beneficiado;
b) o provimento do recurso de João da Costa, afastando sua
inelegibilidade e a cassação de seu registro;
c) outrossim, sejam extraídas cópias do presente processo e
remetidas ao Ministério Público Estadual para os fins
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previstos na Lei nº 8.429/92, em relação aos servidores
Elcyene Carvalho, Ângela Oliveira, Antônio Tadeu de Oliveira,
Ana Cristina Silva e Alzendra Dantas, dentre outros que
eventualmente venham a ser identificados.
Recife, 21 de outubro de 2008.
FERNANDO JOSÉ ARAÚJO FERREIRAProcurador Regional Eleitoral
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