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Universidade do Sul de Santa Catarina
Palhoça
UnisulVirtual
2007
Psicologia e EducaçãoDisciplina na modalidade a distância
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CréditosUnisul - Universidade do Sul de Santa CatarinaUnisulVirtual - Educação Superior a Distância
Campus UnisulVirtualAvenida dos Lagos, 41 Cidade Universitária Pedra BrancaPalhoça – SC - 88137-100Fone/fax: (48) 3279-1242 e3279-1271E-mail: cursovirtual@unisul.brSite: www.virtual.unisul.br
Reitor UnisulGerson Luiz Joner da Silveira
Vice-Reitor e Pró-Reitor AcadêmicoSebastião Salésio Heerdt
Chefe de Gabinete da ReitoriaFabian Martins de Castro
Pró-Reitor AdministrativoMarcus Vinícius Anátoles da Silva Ferreira
Campus SulDiretor: Valter Alves Schmitz NetoDiretora adjunta: Alexandra Orsoni
Campus NorteDiretor: Ailton Nazareno SoaresDiretora adjunta: Cibele Schuelter
Campus UnisulVirtualDiretor: João VianneyDiretora adjunta: Jucimara Roesler
Equipe UnisulVirtual
AdministraçãoRenato André LuzValmir Venício Inácio
Avaliação InstitucionalDênia Falcão de Bittencourt
BibliotecaSoraya Arruda Waltrick
Capacitação e Apoio Pedagógico à TutoriaAngelita Marçal Flores (Coordenadora)Caroline BatistaEnzo de Oliveira MoreiraPatrícia MeneghelVanessa Francine Corrêa
Coordenação dos CursosAdriano Sérgio da CunhaAloísio José RodriguesAna Luisa MülbertAna Paula Reusing PachecoCharles CesconettoDiva Marília FlemmingFabiano CerettaItamar Pedro BevilaquaJanete Elza FelisbinoJucimara RoeslerLauro José BallockLívia da Cruz (Auxiliar)Luiz Guilherme Buchmann FigueiredoLuiz Otávio Botelho LentoMarcelo CavalcantiMaria da Graça PoyerMaria de Fátima Martins (Auxiliar)Mauro Faccioni FilhoMichelle D. Durieux Lopes DestriMoacir FogaçaMoacir HeerdtNélio HerzmannOnei Tadeu DutraPatrícia AlbertonRaulino Jacó BrüningRodrigo Nunes LunardelliSimone Andréa de Castilho (Auxiliar)
Criação e Reconhecimento de CursosDiane Dal MagoVanderlei Brasil
Desenho EducacionalDesign InstrucionalDaniela Erani Monteiro Will (Coordenadora)Carmen Maria Cipriani PandiniCarolina Hoeller da Silva BoeingFlávia Lumi MatuzawaKarla Leonora Dahse NunesLeandro Kingeski PachecoLigia Maria Soufen TumoloMárcia LochViviane BastosViviani Poyer
AcessibilidadeVanessa de Andrade Manoel
Avaliação da AprendizagemMárcia Loch (Coordenadora)Cristina Klipp de OliveiraSilvana Denise Guimarães
Design Gráfi coCristiano Neri Gonçalves Ribeiro (Coordenador) Adriana Ferreira dos SantosAlex Sandro XavierEvandro Guedes MachadoFernando Roberto Dias ZimmermannHigor Ghisi LucianoPedro Paulo Alves TeixeiraRafael PessiVilson Martins Filho
Disciplinas a DistânciaTade-Ane de AmorimCátia Melissa Rodrigues
Gerência AcadêmicaPatrícia Alberton
Gerência de EnsinoAna Paula Reusing Pacheco
Logística de Encontros PresenciaisMárcia Luz de Oliveira (Coordenadora) Aracelli AraldiGraciele Marinês LindenmayrLetícia Cristina BarbosaKênia Alexandra Costa HermannPriscila Santos Alves
Formatura e EventosJackson Schuelter Wiggers
Logística de MateriaisJeferson Cassiano Almeida da Costa (Coordenador)José Carlos TeixeiraEduardo Kraus
Monitoria e SuporteRafael da Cunha Lara (Coordenador)Adriana SilveiraAndréia DrewesCaroline MendonçaCristiano DalazenDyego RachadelEdison Rodrigo ValimFrancielle ArrudaGabriela Malinverni BarbieriJonatas Collaço de SouzaJosiane Conceição LealMaria Eugênia Ferreira CeleghinRachel Lopes C. PintoVinícius Maykot Serafi m
Produção Industrial e SuporteArthur Emmanuel F. Silveira (Coordenador)Francisco Asp
Relacionamento com o MercadoWalter Félix Cardoso Júnior
Secretaria de Ensino a DistânciaKarine Augusta Zanoni Albuquerque(Secretária de ensino)Ana Paula Pereira Andréa Luci MandiraCarla Cristina SbardellaDeise Marcelo AntunesDjeime Sammer Bortolotti Franciele da Silva BruchadoGrasiela MartinsJames Marcel Silva RibeiroJenniff er CamargoLamuniê SouzaLauana de Lima BezerraLiana Pamplona Marcelo José SoaresMarcos Alcides Medeiros JuniorMaria Isabel AragonOlavo LajúsPriscilla Geovana PaganiRosângela Mara SiegelSilvana Henrique SilvaVanilda Liordina HeerdtVilmar Isaurino Vidal
Secretária ExecutivaViviane Schalata Martins
TecnologiaOsmar de Oliveira Braz Júnior(Coordenador)Jeff erson Amorin OliveiraRicardo Alexandre Bianchini
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Apresentação
Este livro didático corresponde à disciplina Psicologia e
Educação.
O material foi elaborado visando a uma aprendizagem autônoma,
abordando conteúdos especialmente selecionados e adotando uma
linguagem que facilite seu estudo a distância.
Por falar em distância, isto não signifi ca que você estará sozinho.
Não esqueça que sua caminhada nesta disciplina também
será acompanhada constantemente pelo Sistema Tutorial da
UnisulVirtual. Entre em contato sempre que sentir necessidade.
Nossa equipe terá o maior prazer em atendê-lo, pois sua
aprendizagem é o nosso principal objetivo.
Bom estudo e sucesso!
Equipe UnisulVirtual.
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Maria da Glória Silva e Silva
Palhoça
UnisulVirtual
2007
Design instrucional
Carolina Hoeller da Silva Boeing
Karla Leonora Dahse Nunes
Psicologia e EducaçãoLivro didático
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370.15S58 Silva, Maria da Glória Silva e
Psicologia e educação : livro didático / Maria da Glória Silva e Silva ; design instrucional Carolina Hoeller da Silva Boeing, Karla Leonora Dahse Nunes. – Palhoça : UnisulVirtual, 2007.
166 p. : il. ; 28 cm.
Inclui bibliografi a. 1. Psicologia educacional. 2. Educação. 3. Psicologia. I. Boeing, Carolina Hoeller
da Silva. II. Nunes, Karla Leonora Dahse. III. Título.
Edição – Livro Didático
Professor ConteudistaMaria da Glória Silva e Silva
Design InstrucionalCarolina Hoeller da Silva Boeing
Karla Leonora Dahse Nunes
Projeto Gráfi co e CapaEquipe UnisulVirtual
DiagramaçãoRafael PessiAlex Xavier
Vilson Martins
Revisão Ortográfi caB2B
Ficha catalográfi ca elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul
Copyright © UnisulVirtual 2007
Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição.
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Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .3Palavras da professora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .9Plano de estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Unidade 1 – A Psicologia em suas relações com a Educação . . . . . . . . . . . . 15Unidade 2 – A Psicologia e as tendências pedagógicas liberais . . . . . . . . . 53Unidade 3 – O construtivismo no Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75Unidade 4 – A Psicologia sócio-histórica e a educação . . . . . . . . . . . . . . . . 103Unidade 5 – Os mitos sobre o fracasso escolar e as
difi culdades de aprendizagem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135
Para concluir o estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157Referências bibliográfi cas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 159Sobre a professora conteudista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 161Comentários e respostas das atividades de auto-avaliação . . . . . . . . . . . . 163
Sumário
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Palavras da professora
Caro aluno,
Seja bem-vindo à disciplina de Psicologia e Educação!
Cada teoria psicológica eleita como referência traz em seu bojo
uma série de implicações para o entendimento das relações
estabelecidas entre o professor e os alunos e dos alunos entre si
na realidade escolar.
Para compreender melhor tudo isto é necessário conhecer
como as teorias da Psicologia vêm abordando esse assunto
ao longo da história desta ciência. Os conteúdos estudados
na disciplina Psicologia e Educação são fundamentais
para compreender o papel da educação na promoção do
desenvolvimento humano e da aprendizagem, dentro e fora da
escola, e para entender o modo como a Psicologia se relaciona
com as tendências e as propostas pedagógicas que norteiam as
ações dos profi ssionais de educação no Brasil.
Ingresse no conteúdo da Psicologia e Educação e bons estudos!
Profa. Maria da Glória Silva e Silva
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Plano de estudo
O plano de estudos visa a orientá-lo no desenvolvimento da
disciplina. Ele possui elementos que o ajudarão a conhecer o
contexto da disciplina e a organizar o seu tempo de estudos.
O processo de ensino e aprendizagem na UnisulVirtual leva
em conta instrumentos que se articulam e se complementam.
Portanto, a construção de competências se dá com a
articulação de metodologias e por meio das diversas formas de
ação/mediação.
São elementos desse processo:
o livro didático;
o Espaço UnisulVirtual de Aprendizagem (EVA);
as atividades de avaliação (a distância, presenciais e de auto-avaliação);
o Sistema Tutorial.
Ementa
Aspectos históricos e conceituais da interface Psicologia e
Educação. Fenômenos educacionais contemporâneos. Políticas
públicas e Educação. Intervenções socioeducacionais e
Psicologia. O processo ensino-aprendizagem no universo das
escolas.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Objetivos:
Identifi car as relações historicamente estabelecidas entre a Psicologia e a Educação, bem como suas implicações para a compreensão do processo de ensino e aprendizagem na realidade escolar brasileira.
Descrever as características das concepções de desenvolvimento e aprendizagem inatista, comportamentalista e interacionista, relacionando-as com diferentes práticas pedagógicas.
Desenvolver projetos de prática na realidade escolar com fundamentos teóricos e metodológicos da Psicologia.
Carga horária
A carga horária total da disciplina é 60 horas-aula.
Conteúdo programático/objetivos
Veja, a seguir, as unidades que compõem o livro didático desta
disciplina.
Unidades de estudo: 5
Unidade 1 – A Psicologia em suas relações com a Educação
Nesta unidade, você estudará como a escola tornou-se uma
escola de massas e como a Psicologia participou desse processo.
Você conhecerá as idéias psicológicas que fundamentaram o
movimento escolanovista, que muito infl uenciou o pensamento
educacional brasileiro. Estudará também os conceitos
fundamentais do behaviorismo e da psicologia da Gestalt.
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Nome da disciplina
Unidade 2 - A Psicologia e as tendências pedagógicas liberais
Nesta unidade, você estudará os principais conceitos da
psicanálise, do humanismo e do cognitivismo, importantes linhas
da Psicologia. Você também conhecerá as tendências pedagógicas
liberais tradicional, renovada e tecnicista, relacionando as teorias
estudadas até então com essas tendências pedagógicas.
Unidade 3 - O construtivismo no Brasil
A unidade 3 trata dos principais conceitos da Epistemologia
Genética de Jean Piaget e das características dos estágios de
desenvolvimento propostos por este pesquisador. Permite saber
como o construtivismo esteve presente na educação no Brasil, as
implicações pedagógicas e as críticas sofridas por esta concepção
de aprendizagem e desenvolvimento.
Unidade 4 - A Psicologia sócio-histórica e a educação
Nesta unidade, você estudará as idéias de dois famosos autores
da Psicologia, L. S. Vygotsky e H. Wallon, que têm em comum
a utilização do materialismo histórico e dialético de Karl Marx
como fundamento medodológico para compreensão do papel da
educação no desenvolvimento humano.
Unidade 5 – Os mitos sobre o fracasso escolar e as difi culdades de aprendizagem
Nesta unidade, serão abordadas as teorias da carência e da
diferença cultural como explicações para o fracasso escolar das
classes populares. Você estudará também o conceito de distúrbio
de aprendizagem e a abordagem psicopedagógica das difi culdades
de aprendizagem. Por fi m, serão discutidas as noções de erro
construtivo e de zona de desenvolvimento proximal na avaliação
da aprendizagem escolar.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Agenda de atividades/ Cronograma
Verifi que com atenção o EVA, organize-se para acessar periodicamente a sala da disciplina. O sucesso nos seus estudos depende da priorização do tempo para a leitura, da realização de análises e sínteses do conteúdo e da interação com os seus colegas e tutor.
Não perca os prazos das atividades. Registre no espaço a seguir as datas com base no cronograma da disciplina disponibilizado no EVA.
Use o quadro para agendar e programar as atividades relativas ao desenvolvimento da disciplina.
Atividades de Avaliação
Demais atividades (registro pessoal)
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1UNIDADE 1
A Psicologia em suas relações com a Educação
Objetivos de aprendizagem
Identifi car marcos importantes da história da Psicologia e da Educação no Brasil.
Defi nir os principais conceitos elaborados por algumas escolas psicológicas que fundaram a Psicologia como ciência.
Identifi car implicações dos conceitos psicológicos estudados para o pensamento educacional.
Seções de estudo
Seção 1 Como a escola se tornou o que é hoje?
Seção 2 A concepção de desenvolvimento inatista
Seção 3 A psicologia da Gestalt
Seção 4 O pensamento escolanovista
Seção 5 O behaviorismo na educação
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de estudo
Para que você dê início ao seu percurso nesta disciplina, é
importante conhecer ou recordar as características dos estudos da
Psicologia relacionados à Educação. Estudar a história de uma
disciplina é importante, porque os conceitos que a constituem não
nascem “do nada”.
Toda idéia tem relação com idéias que a antecederam. O
conhecimento dessa origem pode ser um importante subsídio
para a compreensão dos caminhos pelos quais seguiram as
pesquisas e as intervenções sobre o processo de desenvolvimento e
de aprendizagem de crianças, adolescentes e adultos na escola.
Nesta unidade, você estudará como a Psicologia tem se
relacionado com a Educação na realidade brasileira. No Brasil,
esta relação estreitou-se nas primeiras décadas do século XX,
mais precisamente nas décadas de 1920 e 1930, momento em
que a sociedade brasileira via-se às voltas com as exigências
da modernidade capitalista. À Psicologia, com suas técnicas
inovadoras, era atribuído o papel de ciência e disciplina
coadjuvante na construção de um novo homem, especialmente
por sua contribuição aos aspectos metodológicos do ensino, ou
seja, o como ensinar.
Como o principal aqui é compreender de que maneira o
conhecimento e a prática da Psicologia gerou implicações para o
que acontece em espaços de educação, não serão abordadas todas
as teorias e práticas existentes, mas apenas as que apresentam
infl uências relevantes para o pensamento e no cotidiano
pedagógico.
Você terá contato com muitos nomes, fatos e conceitos que,
possivelmente, lhes serão novos.
E então, você se sente preparado para esta jornada? Respire fundo, concentre-se e dê o próximo passo para este novo desafi o!
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Psicologia e Educação
Unidade 1
SEÇÃO 1 – Como a escola se tornou o que é hoje?
As escolas antecederam o capitalismo e continuaram a se desenvolver
por muito tempo sob os auspícios da igreja antes que as necessidades
provocadas pelo processo de industrialização, em termos de mão-de-
obra, gerassem transformações no sistema escolar.
Enguita (1989), contando a história da escola de massas, mostra
que foi o desenvolvimento da manufatura que impulsionou a
escolarização de crianças órfãs em casas de trabalho e outros
estabelecimentos similares, nos quais serviam de mão-de-obra
barata. O século XVIII foi aquele em que mais se incentivou
o internamento e disciplinamento das crianças órfãs. Muitos
autores expressaram seu desejo de ver universalmente internadas
as crianças pobres, e “escolarizadas”, o que fundamentalmente
signifi cava muitas horas de trabalho e alguma instrução.
Na Europa, os projetos de lei que pretendiam assegurar um
mínimo de instrução literária às crianças foram sistematicamente
rejeitados durante grande parte do século XIX. Nessa época,
temia-se as conseqüências de letrar demasiadamente aqueles que,
no fi nal, deveriam continuar ocupando os níveis mais baixos
da sociedade. A educação poderia alimentar neles ambições
indesejáveis e os conhecimentos do povo não deviam se estender
além de suas ocupações.
Por outro lado, o monopólio da educação pela igreja difi cultava a modelagem da infância às necessidades da nova ordem capitalista e industrial, na qual já não bastava que o sujeito se desenvolvesse resignado e piedoso. Sob pressão da burguesia em ascensão, a escola foi se transformando de espaço da educação religiosa e doutrinamento ideológico para o local da disciplina.
A experiência escolar passou a ser organizada de modo a gerar
nos jovens novos hábitos, mais adequados para a indústria. A
questão não era, de modo algum, ensinar um certo montante
de conhecimentos no menor tempo possível, mas ter os alunos
entre as paredes da sala de aula submetidos ao olhar vigilante
do professor o tempo sufi ciente para dar a forma adequada
ao seu comportamento. Logo se percebeu que os empregados
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escolarizados mostravam-se mais pontuais, precisos, obedientes,
respeitosos, ordenados, dóceis, entre outras qualidades para a
produção. Essa ênfase na disciplina converteu as escolas em algo
parecido com quartéis ou conventos. Na Europa e nos Estados
Unidos, o ensino ou a instrução fi cava em segundo plano, atrás
da obsessão pela ordem e compostura.
No processo de industrialização dos Estados Unidos, a escola foi
o agente de “americanização” dos imigrantes e de assimilação
da população às novas relações produtivas. Buscando erradicar
os hábitos irregulares de trabalho das populações imigrantes e
substituí-los por formas de comportamento e traços de caráter
requeridos pela indústria em crescimento, fundou-se uma rede
de escolas tão rudimentares quanto os processos produtivos do
século XIX.
Nessa época, a produção fabril foi submetida a uma revisão
baseada, principalmente, nas idéias de gestão científi ca do
trabalho de F. W. Taylor. Ele propôs para a indústria um sistema
de organização baseado no controle absoluto dos produtos e
processos pelo empresário ou seus representantes que se traduzia
na padronização e rotinização máxima de suas tarefas. Além
disso, no taylorismo havia uma preocupação em contabilizar
cada dólar gasto ou ganho e aquilatar com exatidão os custos de
produção. Essa organização foi se estendendo às escolas e, com
isso, desenvolveu-se a pedagogia científi ca.
Nas escolas, era progressivamente inserida a fi gura do especialista em educação, que deveria estudar todas as fases do processo educacional, as necessidades da sociedade e da indústria, o estado do aluno nas distintas fases, a efi cácia dos distintos métodos, a relação entre custos e efi ciência etc., e fornecer, com base nisso, os dados e as conclusões pertinentes às instituições escolares e ao público.
Procurou-se, assim, desenvolver propostas metodológicas para
conhecer a estrutura e o funcionamento dos processos mentais e
o comportamento dos seres humanos. Além disso, o estudo da
Psicologia infantil e da Psicologia em sua relação com a educação
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Psicologia e Educação
Unidade 1
desenvolveu-se signifi cativamente. Os laboratórios de Psicologia
instalados nas universidades passaram a não ser os únicos espaços
em que os estudos dessa ciência se realizavam, criando-se cada
vez mais laboratórios anexos às escolas, bem como institutos
cujos objetivos centravam-se no estudo do desenvolvimento das
diferenças individuais entre as crianças.
O especialista auxiliaria a organização escolar a:
1) fi xar as especifi cações e os padrões do produto fi nal
desejado (aluno egresso);
2) fi xar as especifi cações e os padrões para cada fase de
elaboração do produto (matérias, anos acadêmicos,
trimestres, dias ou unidades letivas);
3) encontrar os métodos mais efi cazes a respeito e
assegurar que fossem seguidos pelos professores;
4) determinar, em função disso, as qualifi cações
padronizadas exigidas dos professores;
5) capacitá-los, em consonância com isso, ou colocar
requisitos de acesso tais que forçassem as instituições
encarregadas disso a fazê-lo;
6) exigir uma formação permanente que mantivesse
o professor à altura de suas tarefas durante sua
permanência no trabalho;
7) dar-lhe instruções detalhadas sobre como realizar seu
trabalho;
8) selecionar os meios materiais mais adequados;
9) traduzir todas as tarefas e realizar em
responsabilidades individuais e exigíveis;
10)estimular sua produtividade mediante um sistema de
incentivos;
11)controlar permanentemente o aluno.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para cumprir todas estas tarefas, faziam-se necessários também
conhecimentos psicológicos que permitissem ao especialista em
educação controlar o processo educativo de modo a gastar apenas
o tanto necessário para promover o desenvolvimento satisfatório
do maior número de ingressantes no sistema de ensino.
Destaca-se, entre os conhecimentos e práticas da Psicologia
requeridos pela educação, aqueles que envolviam testes de
inteligência. Alfred Binet (1857-1911), juntamente com seu
colega Th éodore Simon, foi responsável pelo desenvolvimento
dos primeiros testes de inteligência na Europa. Foram esses
pesquisadores que criaram a primeira escala métrica de
inteligência, que permite medir o Quociente de Inteligência (Q.I.).
Certamente você já ouviu falar do Q.I.. Este índice, utilizado para medida da inteligência, foi desenvolvido a partir da submissão a testes compostos por questões de raciocínio lógico. Aplicando esses testes a um grande número de pessoas, verifi cou-se que, para cada idade, há uma quantidade de acertos médios. Desta forma, podia se determinar o que foi chamado de idade mental. A idade mental era transposta para uma escala para estabelecimento do quociente de inteligência. Assim, se o sujeito acerta um número de questões correspondente à média para a sua idade, o índice de Q.I. obtido denota uma inteligência mediana. Se o indivíduo acerta menos questões do que a média para a sua idade, considera-se que seu Q.I. é mais baixo do que o dos demais, e assim por diante.
O quadro a seguir pode ilustrar a distribuição das faixas de Q.I.
em relação à classifi cação da inteligência.
Classifi cação geral dos níveis de QI
Faixa de QI Classifi cação
< 74 Infradotado
75-89 Abaixo da média
90-110 Mediano
111-125 Acima da média
> 126 Superdotado
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Psicologia e Educação
Unidade 1
Com a ampla divulgação dos trabalhos de Binet e Simon, e
a necessidade de se desenvolverem métodos efi cientes para a
escolarização, a psicometria, utilização de testes psicológicos para
mensurar as capacidades humanas e, em especial, a inteligência,
desenvolveu-se fortemente.
A perspectiva de medir a inteligência instituiu a prática de submeter a diagnósticos médicos e psicológicos as crianças, especialmente aquelas que não respondiam ao esperado pela escola. Criou-se, com isto, uma verdadeira fábrica de rótulos, reproduzidos no interior das escolas. As classes passaram a ser divididas conforme o desempenho dos alunos nas avaliações psicológicas. Desde essa época, as difi culdades de aprendizagem escolar passaram a ser associadas ao défi cit intelectual e à baixa inteligência, ou ao baixo Q.I.
Enquanto isso, você sabe o que acontecia no Brasil?
Nesse período, o Brasil começava a industrializar-se e urbanizar-
se. A partir da Proclamação da República, pretendeu-se a
transformação do cenário nacional e a construção da “nova
nação”. O ideário de modernização do país dominava os meios
intelectuais e apontava para a urgência de transformações tanto
econômicas quanto na mentalidade da sociedade (CUNHA,
2001), e este processo deveria passar pela educação.
A educação passava a ser vista como grande promotora das mudanças necessárias para a manutenção do capitalismo no mundo e, no Brasil, era considerada uma via importante para a modernização do país.
Com base no ideário funcionalista, as reformas educacionais do
período do governo de Getúlio Vargas trouxeram a introdução
progressiva da Sociologia e da Psicologia nos programas de
ensino voltados à formação docente. A introdução de conteúdos
da Psicologia deveu-se à necessidade sentida naquele momento
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Universidade do Sul de Santa Catarina
histórico de se repensar a formação docente em bases científi cas.
No momento em que o acesso à escola se ampliava, estudar a
inteligência, a aprendizagem e as diferenças individuais assumiu
grande importância.
A Psicologia se apresentava como disciplina fundamental para o entendimento da criança que chegava à escola e para o dimensionamento do cidadão que se pretendia que ela se tornasse. As informações obtidas nesses estudos formariam os futuros professores.
A pedagogia seria desenvolvida com base na ciência, tornando-
se experimental, mediante avaliações precisas baseadas
em critérios científi cos e impessoais. Pretendia-se que o
conhecimento e as técnicas científi cas trouxessem para o campo
educacional a compreensão das mentes infantis e avaliações
mais precisas do trabalho dos professores. Pesquisas sobre
inteligência, personalidade e capacidade começaram a ser feitas
para classifi car as crianças.
Compreender o processo de aprendizagem da criança como algo
delimitado por seu quociente de inteligência é manter uma visão
inatista do processo de desenvolvimento. Nesta perspectiva, a
capacidade cognitiva, a capacidade de conhecer o mundo estaria
determinada desde o nascimento. A educação, esta sim, é que
deveria se organizar para receber os alunos com diferentes
capacidades, que não mudariam com a educação.
Na próxima seção, você irá conhecer mais sobre a concepção
inatista do desenvolvimento e da aprendizagem.
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Psicologia e Educação
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SEÇÃO 2 – A concepção de desenvolvimento inatista
A concepção inatista relaciona-se à crença em que as características de cada indivíduo, sua personalidade, suas aptidões, o desenvolvimento dos seus valores, seus modos de compreender a realidade, entre outros aspectos, já se apresentam praticamente prontos desde o nascimento. O que não está pronto desenvolve-se com o tempo, amadurecendo ou desabrochando, como ocorre com os vegetais, em cuja semente está a previsão de todas as características a serem desenvolvidas no futuro.
Comentários como “ele é uma criança de boa índole”, “eu sei que
está tudo na cabecinha dele, e a qualquer hora ele vai mostrar
o que sabe”, “quem é bom já nasce feito” e “pau que nasce torto
morre torto” ilustram essa concepção de sujeito que “nasce
pronto” e pode ser somente aprimorado pela qualidade das
experiências externas, mas nunca modifi cado.
Segundo essa concepção, a aprendizagem decorre da maturação e do desenvolvimento das capacidades que estavam potencialmente dadas ao indivíduo, e não da intervenção do professor no processo de ensino. Segundo o inatismo, a difi culdade para aprender é relacionada à imaturidade ou à falta de “prontidão” para a aprendizagem.
Os testes de inteligência, as idéias funcionalistas
provenientes da Europa e dos Estados Unidos com
os intelectuais da Escola Nova e o apriorismo da
Psicologia da Gestalt formam um arcabouço de
conhecimentos científi cos que tiveram infl uência
sobre a realidade escolar em situações práticas
como, por exemplo, a busca de enquadramento das
crianças em classes distintas em função de suas
características individuais, tidas como inatas.
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A função do professor, conforme o inatismo, centra-se em
respeitar os dons, interesses ou as capacidades individuais
exibidos pelas crianças espontaneamente. O professor perde seu
papel social de formador, já que a situação escolar não alteraria ou
ampliaria as determinações psicológicas inatas.
Partindo dessa concepção, o sistema escolar não se responsabiliza
pelo desempenho das crianças na escola, pois serão bem-
sucedidas as crianças que, dotadas naturalmente de potencial
para aprender, aproveitarem as oportunidades educativas. Assim,
a responsabilidade pelo aprendizado é quase exclusivamente
do aluno, e o papel das interações sociais no desenvolvimento
humano, fora e dentro da dinâmica escolar, é desconsiderado.
Os pressupostos que fundamentam essa concepção se revelam
nas práticas pedagógicas de infl uência escolanovista que se
multiplicaram no Brasil a partir dos anos 1930. Elas tendem a
subordinar a aprendizagem ao ritmo individual e à “maturação”
da criança. Você poderá perceber este ponto de vista revisando as
idéias de Edouard Claparède, que serão estudadas na seção 4.
A Psicologia da Gestalt é outra linha de estudo que faz parte da
história da Psicologia que realizou pesquisas que fundamentariam
uma visão inatista, ou apriorista, do mundo psicológico. Autores
posteriores que não concordavam com o ponto de vista inatista
do desenvolvimento e da aprendizagem citaram as idéias da
Psicologia da Gestalt a fi m de criticá-las, situando seu próprio
ponto de vista.
Mas você sabe o que discute a Psicologia da Gestalt? Para que você se oriente nesta discussão, que tal retomar algumas idéias?
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SEÇÃO 3 – A Psicologia da Gestalt
A escola gestaltista da Psicologia deu grande relevo ao estudo
sistemático da percepção. Contribuiu para aprofundar o conhecimento
sobre o papel da percepção na organização da aprendizagem. Foi uma
reação à visão associacionista, presente no estruturalismo e, de outro
modo, no funcionalismo e no behaviorismo.
As teorias associacionistas vêem os fenômenos psicológicos como resultantes da soma de pequenas sensações, reações, percepções, enfi m, de um somatório de partes que se combinam de maneira mecânica.
Para os psicólogos da Gestalt, não se pode analisar os fenômenos
mentais e comportamentais em elementos pré-determinados
arbitrariamente, pois o todo psicológico é mais do que a soma
de suas partes. Assim, os fenômenos psicológicos merecem ser
compreendidos em sua totalidade.
O conceito de Gestalt, forma ou estrutura foi expresso
como um conjunto de coisas que se prendem, se apóiam
e se determinam reciprocamente.(...) Gestalt signifi ca um
padrão ou todo organizado, ao invés de uma soma de partes.
A maneira de ser de cada parte depende da estrutura do
conjunto e das leis que o regem (CAMPOS, 1997, p. 32).
A Psicologia da Gestalt é representada historicamente pelos
pesquisadores Wertheimer, Kohler e Koff ka. Wertheimer pesquisou
os processos de percepção visual. Ele demonstrou a idéia de que o
todo é mais do que a soma das partes nos fenômenos psicológicos por
meio de experimentos como o que segue.
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1. Observe a fi gura.
Figura 1.1 – Experimento 1
Fonte: http://www.ufrgs.br/faced/slomp/
Você pode interpretá-la como um triângulo. No entanto, não há
nada em cada um dos pontos que remeta a tal fi gura geométrica.
É a relação entre os pontos, estabelecida pelo observador, que
leva a essa percepção total.
Wolfgang Kohler (1887-1967) concentrou-se no estudo do
desenvolvimento da inteligência e da aprendizagem. Estudou
chimpanzés em situações de resolução de problemas práticos e
dos resultados obtidos com esses animais derivou idéias sobre a
aprendizagem humana.
Em um de seus experimentos, Kohler colocava do lado de fora
da gaiola de um macaco um pedaço de uma vara que podia
ser encaixado a outro pedaço, colocado dentro da jaula. Era
colocado ainda um cacho de bananas a uma altura inacessível
para o macaco, além de um caixote. A tarefa do macaco era
pegar o cacho de bananas e, para isso, ele precisaria estabelecer
as relações certas entre os objetos disponíveis, dando-se conta da
solução a partir destas conexões.
Kohler percebeu que todos os elementos envolvidos na solução
do problema necessitavam estar dentro do campo de visão do
macaco para que ele percebesse as relações possíveis, reunindo os
objetos do modo adequado para alcançar suas bananas.
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Figura 1.2 - Foto de experimento de Kohler com macacos
Fonte: http://www.ufrgs.br/faced/slomp/edu01135/chimpanze3.jpg
Deriva-se deste experimento que a aprendizagem se expressa
no estabelecimento de relações entre os elementos envolvidos
em uma situação problema, formando uma percepção que
aproxima o sujeito da solução. Observa-se também que a forma
de apresentação desses elementos em um campo pode favorecer a
organização cognitiva.
Para Kohler, não é o treino ou o hábito, como proposto pelo
funcionalismo de William James, nem o condicionamento, como
proposto pelo behaviorismo, que explica a aprendizagem, mas
sim o fenômeno do insight.
O insight é o momento em que o campo perceptivo se reorganiza frente a um conhecimento novo. Nesse fenômeno, o animal compreende as relações entre as partes da situação-problema que lhe é apresentada, ao dar-se conta do todo, e age em conformidade com as relações percebidas. Nos seres humanos, o insight provoca a sensação agradável da descoberta repentina da solução de um problema: Eureka! Agora eu entendi!
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Mas será que essa idéia se relaciona com a forma de apresentação dos
materiais didáticos ao aluno?
Veja as fi guras a seguir. Cada uma pode ser percebida de mais de um
modo. Mais do que os traços das próprias fi guras, o que determina a
interpretação que será dada a elas é o olhar do observador.
Figura 1.3 – Jovem e Idosa
Fonte: http://www.ufrgs.br/faced/slomp/edu01135/idosa-jovem2.gif
Figura 1.4 - Cálice e perfi l
Fonte: http://www.ufrgs.br/faced/slomp/edu01135/perfi s-taca1.gif
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Figura 1.5 – Pato e coelho
Fonte: http://www.ufrgs.br/faced/slomp/edu01135/patocoelho1.gif
Você conseguiu ver mais de uma possibilidade de interpretação para cada uma das fi guras apresentadas? Como você se sentiu ao descobrir a segunda possibilidade, que você não viu logo no primeiro olhar? Esta é a sensação do insight.
A Psicologia da Gestalt defende que o funcionamento psicológico
apresenta propriedades semelhantes às do funcionamento cerebral.
Qualquer estado de consciência tem propriedades
estruturais semelhantes no córtex. Se vemos um
quadrado, haveria uma parte topologicamente
igual formada de quatro lados no córtex visual.
(ENGELMANN, 1978, p. 17).
Para os gestaltistas, os estímulos não atingem o córtex cerebral
de modo isolado. Pelo contrário, o cérebro é que os organiza em
formas que os inter-relacionam, sendo que a forma a ser percebida
depende das características do cérebro em questão e não dos
estímulos recebidos.
O olhar do observador, neste
caso, é mais importante do que as
características do estímulo. Assim,
quando falamos em percepção ou
compreensão de uma situação-
problema, haveria uma propensão do
sujeito para perceber as fi guras ou
situações desta ou daquela forma.
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É por isso que a Psicologia da Gestalt é apontada como apriorista, ou inatista, na medida em que características inatas do cérebro determinariam as diferenças individuais de percepção, de aprendizagem e de resolução de problemas.
Os autores da Psicologia que pesquisam as teorias da
aprendizagem na atualidade citam as idéias da Psicologia da
Gestalt para situar seu próprio ponto de vista. Ela é apresentada
como apriorista, pois, para esta linha de pesquisa, os aspectos
mais importantes para que ocorra a aprendizagem pré-existem no
sujeito e se manifestarão quando acontecer o insight.
SEÇÃO 4 – O pensamento escolanovista
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova foi um marco
histórico da busca por transformações educacionais. Publicado
em 1932, trazia idéias de intelectuais brasileiros inspiradas no
pensamento de escolanovistas como John Dewey, dos Estados
Unidos, e Edouard Claparède, da Europa.
O movimento de implementação da Escola Nova durou de 1925
até a década de 1950. O escolanovismo não se propôs a refl etir
sobre a aprendizagem no contexto das relações em que ela se
realiza, naturalizando o ser humano e dando ênfase às diferenças
individuais.
Os testes foram amplamente usados nas décadas de 1930 e 1940.
Aplicados na escola, eles se prestaram à divisão entre o normal
e o anormal, divisão das turmas e aos prognósticos sobre o
sucesso escolar. Os testes eram utilizados para o diagnóstico da
inteligência, para a sondagem de aptidões e para a avaliação de
interesses. De posse dos resultados dos testes, o ensino poderia
ser moldado às idades e fases do aprendizado.
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Destaca-se, nesse contexto, a contribuição de Lourenço Filho.
Este foi um importante intelectual da educação brasileira,
estudioso da Psicologia que trabalhou pela fundamentação
científi ca da intervenção didático-pedagógica. Lourenço Filho
assumiu cargos estaduais e na administração pública federal,
tendo sido diretor geral do Departamento Nacional de Educação
(nomeado por Gustavo Capanema, em 1937) e diretor do
Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos – INEP, de 1938 a
1946. Por infl uência de Lourenço Filho, a estrutura inicial do
INEP incluiu uma Divisão de Psicologia Aplicada.
O Teste ABC, criado por Lourenço Filho a partir de pesquisas realizadas na escola-modelo anexa à Escola Normal de Piracicaba em 1925, foi o principal instrumento usado para selecionar alunos aptos a freqüentar a escola, tendo sido amplamente aplicado em escolas do Rio de Janeiro e São Paulo a partir de 1928 e por décadas a seguir (DÁVILA, 2003, p. 141-142).
O teste tinha por objetivo medir a maturidade para a aprendizagem da leitura e escrita. Os alunos que se mostrassem capazes de identifi car e escrever palavras contidas em um determinado grupo de objetos e tivessem habilidade motora para realizar desenhos geométricos eram classifi cados como maduros.
As primeiras relações mais signifi cativas estabelecidas entre
a Psicologia e a Educação no ensino escolar ocorreram com o
movimento da Escola Nova. Lourenço Filho e outros intelectuais
da educação brasileira foram entusiastas desse movimento, o que
foi fundamental para a constituição da Psicologia da Educação
como campo de estudo em nosso país.
O movimento da Escola Nova buscou renovar a educação
em um tempo em que a aprendizagem escolar era vista como
a capacidade de repetir e memorizar conteúdos acadêmicos
geralmente distantes da experiência de vida das crianças. O bom
professor era aquele que dominava os conteúdos, e o bom aluno
era aquele que os decorava. Defendeu que o ensino deveria tomar
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como ponto de partida a ação do aluno. A educação deveria
oportunizar às crianças condições de experimentar, produzir,
fazer, manipular e refl etir sobre os resultados obtidos.
John Dewey e Edouard Claparède foram importantes expoentes
do pensamento escolanovista na Psicologia da Educação. Você
pode perceber que, apesar de ambos teóricos serem identifi cados
com o movimento da Escola Nova, existem algumas diferenças
em seus modos de compreender o desenvolvimento humano e
o papel da educação. Enquanto John Dewey enfatiza o papel
da educação para o desenvolvimento do sujeito, dando ao
professor um lugar de destaque como organizador das fontes e
metodologias de pesquisa a serem utilizadas pelos aprendizes,
Edouard Claparéde, por sua vez, dá muito mais ênfase às
aptidões tidas como naturais das crianças. Para ele, é a educação
que deve se adaptar às características naturais apresentadas por
cada aluno.
Que tal conhecer um pouco mais sobre as idéias desses pesquisadores?
A escola democrática de John Dewey
John Dewey (1859-1952), fi lósofo, educador e participante da
vertente funcionalista da Psicologia, cunhou uma proposta
de como deveria funcionar uma escola que rompesse com os
métodos de ensino tradicionais e educasse para a democracia. Seu
trabalho nos Estados Unidos repercutiu no mundo todo e tem,
até hoje, implicações para o pensamento pedagógico.
A noção de movimento é central no pensamento de Dewey. Para
ele, a sociedade está em constante transformação.
Para Dewey, a Filosofi a não deve pretender se colocar como
o “farol da sabedoria”, impondo dogmas imutáveis e verdades
absolutas que conduzam a humanidade. Pelo contrário,
É interessante perceber que a difusão do tema transformação constante da realidade, que assumiu posição de centralidade no discurso pedagógico nessa primeira metade do século XX, estava relacionada à necessidade de aceitação das mudanças tecnológicas e das mudanças sociais atreladas ao processo de modernização e industrialização. Era necessário que as pessoas estivessem dispostas a viver com otimismo essas mudanças.
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a Filosofi a deve se colocar sempre na
transitoriedade em que se encontra a realidade,
norteando a busca dos homens para soluções
dos problemas vividos em sua experiência
cotidiana. O ponto de vista de Dewey confere
um caráter essencialmente pragmático e
instrumental à Filosofi a.
Para os seguidores de Dewey, aceitar a mudança, a transitoriedade, a alteração das coisas signifi cava colocar a produção de conhecimento à disposição do bem-estar coletivo. A busca do modo de vida cooperativo em benefício de todos era o que daria signifi cado à democracia.
A educação proposta por Dewey tinha como princípios a iniciativa,
a originalidade e a cooperação. Deveria liberar as potencialidades
dos indivíduos rumo a uma ordem social que, por sua vez,
deveria ser progressivamente aperfeiçoada (mas não totalmente
transformada). Seria um processo de reconstrução da experiência
da realidade, para torná-la melhor, e um processo de melhoria
permanente da efi ciência individual segundo os próprios interesses.
Além disso, a proposta de John Dewey pode se caracterizar,
ainda, pelas seguintes oposições:
À imposição de cima para baixo opõe-se a expressão e
cultivo da individualidade;
à disciplina externa opõe-se a atividade livre;
a aprender por livros e professores, aprender por experiência;
à aquisição por exercício e treino de habilidades técnicas
isoladas, a sua aquisição como meios de atingir fi ns que
respondam a apelos diretos e vitais do aluno;
à preparação para um futuro mais ou menos remoto opõe-
se aproveitar ao máximo as oportunidades do presente;
a fi ns e conhecimentos estáticos opõe-se a tomada de
contato com o mundo em mudança. (DEWEY apud
GADOTTI, 1999, p.150.)
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Para Dewey (apud GADOTTI, 1999), o ato de pensar ocorre
sempre que estamos diante de um problema. Nesta situação, o
pensamento passa por cinco estágios:
1) uma necessidade sentida que coloque o sujeito em uma
situação de experiência real e atividade contínua que o
interesse por si mesmo;
2) a análise da difi culdade do problema por meio do
pensamento;
3) as alternativas de solução do problema – nesse momento
é necessário buscar informações para agir na situação,
fazendo as observações necessárias para este fi m;
4)a experimentação de várias soluções, desenvolvendo-as
de modo bem ordenado até que o teste mental aprove
uma delas;
5) a ação como prova fi nal para a solução proposta, que
deve ser verifi cada de maneira científi ca. Pondo à
prova as próprias idéias, aplicando-as e tornando clara
sua signifi cação, o sujeito descobre por si mesmo o
valor das soluções desenvolvidas.
A vida real e as experiências que nela vivemos estão repletas
de problemas a serem resolvidos. A educação proposta por
Dewey deveria se aproximar da realidade e defrontar-se com os
problemas que os homens nela encontram, desencadeando o ato
de pensar na busca de soluções.
No funcionalismo de John Dewey, “o ensino não é uma tarefa
do acaso ou da rotina, e deve-se considerá-lo uma atividade
consciente, intencional, com método e processo defi nidos”
(CARVALHO, 2002, p. 53). O professor e o conteúdo, nessa
perspectiva, assumem grande importância para a formação
mental e moral da criança, pois o pensamento depende de fontes
informativas e de alguém que as organize adequadamente, sem
oferecer soluções prontas para os problemas, pois o aspecto ativo
de aprendizagem não pode ser esquecido.
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Carvalho (2002, p. 53) mostra que a escola de John Dewey teria
três funções:
a) proporcionar um ambiente simplifi cado, selecionando
experiências úteis e estabelecendo uma progressão, com
o objetivo de conduzir os alunos à compreensão real das
coisas mais complexas;
b) eliminar os aspectos desvantajosos do meio ambiente que
exercem infl uência sobre os hábitos mentais;
c) coordenar, na vida mental de cada indivíduo, as diversas
infl uências dos vários meios sociais em que vive.
Ao partir da idéia de que o conhecimento verdadeiro a ser
aprendido é o que funciona como solução na vida prática,
Dewey traz uma concepção utilitária da educação. “À escola é
atribuído um papel fundamental de selecionar as experiências
úteis realizadas pela humanidade para construir os conteúdos
cognitivos necessários a uma sociedade futura mais perfeita, uma
sociedade democrática” (CARVALHO, 2002, p. 53).
A cooperação na resolução de problemas práticos no contexto escolar ensinaria sobre a convivência democrática, sem questionar as desigualdades sociais, naturalizando-as. A busca de soluções contribuiria tanto para a formação dos alunos quanto para o desenvolvimento da sociedade. Assim, Dewey traduzia para o campo da educação a ideologia liberal dos Estados Unidos.
William Kilpatrick (1871-1965) foi um dos principais discípulos
de John Dewey. Ele desenvolveu o “método dos projetos”, que era
centrado na atividade prática dos alunos, de preferência, manual.
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Os projetos poderiam ser: manuais, como a produção de uma maquete; de descoberta, como a realização de um passeio; de competição, como um jogo; de comunicação, como contar uma história; entre outros.
As etapas de execução do projeto envolveriam a determinação
do objetivo, a preparação do projeto, a execução e a apreciação
do resultado. Os projetos poderiam envolver a produção de algo,
a aprendizagem sobre como utilizar algo que já foi produzido, a
resolução de algum problema ou o aperfeiçoamento de alguma
técnica.
De preferência, o projeto deveria ser realizado em um ambiente
natural, próximo da situação real em que a prática em questão
ocorre na sociedade.
A educação funcional de Edouard Claparède
O médico Edouard Claparède (1873-1940) nasceu em Genebra,
na Suíça. Em 1912, fundou o Instituto Jean-Jacques Rousseau
naquela cidade. A instituição voltava-se para o desenvolvimento
de estudos na área da Psicologia Infantil e suas aplicações na
educação. Da mesma forma que John Dewey fez nos Estados
Unidos, Edouard Claparède procurou defender uma nova escola,
diferente da tradicional, no contexto europeu.
Enquanto Dewey ingressou nas questões educacionais por meio
da Filosofi a, Claparède o fez por meio de estudos em Biologia, o
que faz diferença na constituição de seus pontos de vista.
As idéias de Edouard Claparede são consideradas inatistas, ou organicistas, pois priorizam a maturação biológica na análise do desenvolvimento do sujeito, a qual é determinada pelo pertencimento à espécie humana. As características humanas teriam, assim, determinações inatas, e não históricas e sociais.
Jean Piaget veio a ser chefe de trabalhos deste instituto a convite de Edouard Claparède e lá realizou a maior parte de suas pesquisas.
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Assim como outros contemporâneos, Claparède via a Psicologia
como a única ciência que poderia de fato trazer informações
úteis para o direcionamento da educação. Esta deveria adaptar-
se às aptidões naturais do aluno e estimular seus interesses para
a busca de resolução de problemas da vida prática nos conteúdos
escolares. Nessa perspectiva, o interesse do sujeito tem muito
mais peso do que os conteúdos escolares em si, ainda que estes
sejam organizados a partir dos problemas que a vida coloca.
Claparède defendia que se conhecessem as características
“naturais” da criança, por meio da pesquisa experimental
psicológica, em uma visão claramente organicista.
Para Claparède, assim como para os demais representantes do movimento da Escola Nova infl uenciados pelo funcionalismo, o desenvolvimento de cada ser humano e de toda a espécie signifi ca uma luta ou uma procura pela conservação da vida, o que ocorre pela interação com o ambiente.
A vida corresponde a um processo de adaptação
contínuo, guiado pela lógica da utilidade e da efi ciência.
O pensamento seria uma atividade biológica a serviço
do organismo humano, que ocorre para confrontar
situações com as quais não se pode lidar por meio de
comportamento aprendido, automático ou simples
refl exo característico dos animais. Quando a pessoa se
defronta com uma situação nova, a tensão resultante a
leva a proceder por tentativa e erro, refi nando a experimentação
da situação. Este processo seria o pensamento.
Se a infância tem uma signifi cação biológica, é necessário estudar
as manifestações naturais das crianças e ajustar a ação educativa
a elas. Os métodos e programas devem girar em torno das
crianças, e não as crianças girar em torno de um programa.
De acordo com Claparède, a atividade educacional deveria
ser individualizada, correspondendo sempre à função vital do
homem, à expressão natural de sua atividade e desenvolvimento.
São chamadas organicistas as teorias que, ainda que não considerem a maturação biológica como sendo o único fator responsável pelas mudanças que ocorrem no ciclo vital, valorizam mais o desenvolvimento orgânico do que outros fatores como explicação para o desenvolvimento em geral.
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A escola deve estimular a independência intelectual da criança, fazendo-a atuar sobre o que aprende, diferentemente da postura passiva exigida do aluno na educação tradicional.
Claparède acusou a escola de não saber tirar o máximo rendimento
das inteligências, desperdiçando o capital intelectual das nações,
em um contexto no qual o investimento em educação vinha sendo
alto na Europa. Valorizava os testes de inteligência e o diagnóstico
psicológico como meios para conhecer as aptidões naturais dos
sujeitos e direcioná-los para uma educação mais adequada.
Para ele, as melhores inteligências seriam pouco desenvolvidas na
escola por se verem obrigadas a adaptarem-se ao ritmo do grande
número de alunos medianos. Recomendava a criação de classes
diferentes para os estudantes mais inteligentes e para aqueles
com maior difi culdade de aprendizado. Assim, os estudantes que
se revelassem mais aptos poderiam ser submetidos a exigências
maiores em classes constituídas apenas de bons alunos.
Ao defender uma escola sob medida, Claparède dizia que na
impossibilidade de haver uma escola para cada criança ou para
cada tipo de inteligência o sistema mais próximo disto seria o
que permitisse a cada aluno reagrupar o mais livremente possível
os elementos favoráveis ao desenvolvimento de suas condutas
pessoais. Para isso, pregava a redução do currículo obrigatório a
conteúdos sufi cientes para a transmissão de um conhecimento
que constituísse uma espécie de legado espiritual de uma mesma
geração, deixando a maior parte do período letivo para atividades
escolhidas pelo próprio aluno.
Claparède propôs ainda que um mesmo aluno pudesse acompanhar diferentes disciplinas em ritmos diferentes, mais acelerados ou mais lentos, de acordo com suas aptidões.
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Outra contribuição importante de Claparède é a defesa que fez
da atividade pedagógica como atividade lúdica. O jogo é uma
das principais necessidades da criança. Por isso, serviria como um
meio para despertar o seu interesse pelo conhecimento escolar.
Assim, seja qual for a atividade que se queira realizar na sala
de aula, deve-se encontrar um meio de apresentá-la como um
jogo, partindo da necessidade da criança de brincar. Conforme
a criança cresce, a idéia de jogo vai sendo substituída pela de
trabalho, seu complemento natural.
De acordo com Claparède, são as necessidades que movimentam
os indivíduos. Toda atividade desenvolvida pela criança é sempre
suscitada por uma necessidade a ser satisfeita e pela qual ela
está disposta a mobilizar energias. É isso que se pode notar em
todo lugar e sempre, exceto, é verdade, nas escolas, porque estas
estão fora da vida, dizia Claparède. Para fazer um indivíduo agir
devemos colocá-lo nas condições próprias ao aparecimento da
necessidade, em que a ação que se deseja despertar tem a função
de satisfazer. Cabe então ao professor colocar o aluno na situação
adequada para que seu interesse seja despertado e permitir que
ele adquira o conhecimento que vá ao encontro do que procura.
Desta forma, está se aproximando à escola da vida.
O educador, segundo Claparède (apud CARVALHO, 2002, p. 55):
Em vez de tornar-se um plasmador de espíritos, tornar-
se-á um estimulador de interesses; em vez de fi car
no meio do palco (onde muitas vezes pontifi ca, sem
outros resultados tangíveis, a não ser a satisfação de
suas tendências autoritárias), deverá, daí em diante,
permanecer nos bastidores, de onde disporá e organizará
o meio da maneira mais favorável ao despertar das
necessidades intelectuais e sociais da criança.
A escola, assim, deve promover a atividade como um laboratório,
e não a passividade, como um auditório. E, se o interesse é o
motor da educação, não são necessários castigos ou recompensas,
bastando a adequação entre o que se há de fazer e o sujeito que
fará. Nesta perspectiva, a disciplina vem de dentro do sujeito e
não de fora dele.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
A criação de faculdades de Filosofi a e de cursos de Pedagogia
no Brasil nas décadas de 1940 e 1950 dava novo impulso à
Psicologia. Ocorreu aumento na importação de livros e o envio de
professores aos Estados Unidos para aperfeiçoamento, conforme
acordos estabelecidos entre os dois governos. Em seu retorno, os
estudantes traziam conhecimentos sobre a Psicologia experimental
do behaviorista J. B. Watson. Ela passou a ser estudada e
ensinada em disciplinas universitárias, preparando terreno para a
tecnologia educacional que foi amplamente aceita nos anos 1960,
fundamentada principalmente nos trabalhos de B. F. Skinner.
SEÇÃO 5 – O behaviorismo na educação
Nos anos 1960 e 1970, os interesses econômicos do Brasil
voltavam-se para a exportação de produtos industrializados. A
educação seria um fator de incremento da produtividade, pois a
mão-de-obra escolarizada se tornaria mais qualifi cada.
Na intenção de qualifi car a mão-de-obra especializada que
trabalharia nas indústrias e de garantir a rapidez e a efi ciência da
escolarização, o tecnicismo passou a dominar o campo educacional.
As técnicas educacionais valorizadas neste período basearam-se
no comportamentalismo e nas estratégias de ensino propostas
por Skinner. As máquinas de ensinar e a instrução programada
conquistaram prestígio. O condicionamento operante na escola
foi largamente utilizado e o planejamento do ensino levava em
consideração os estímulos a serem aplicados no alunado para
atingir objetivos determinados Nesta seção, você vai conhecer mais
sobre as idéias da Psicologia que fundamentaram essas práticas.
Os behavioristas procuram estudar os aspectos objetivos, observáveis e mensuráveis da atividade psicológica, deixando de lado aspectos subjetivos, considerados não mensuráveis. Por isso, seus partidários deixaram de lado o estudo da mente e voltaram-se para o estudo do comportamento.
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Psicologia e Educação
Unidade 1
O estudo do comportamento animal é parte
importante do behaviorismo. O comportamento
dos animais não pode ser pesquisado por
introspecção, já que os animais, naturalmente,
não podem narrar o que estão sentindo se
questionados sobre isso. Para conhecer a
psicologia animal, o método da observação,
defendido pelos behavioristas, acabou sendo o
caminho possível. Tal método foi também usado
pelos pesquisadores para o estudo dos seres humanos.
Para conhecer esta escola da Psicologia, é interessante
evidenciar que, desde 1860, pesquisadores russos chamados de
refl exologistas, como I. M. Sechenov (1829-1905), Ivan P. Pavlov
(1849-1936) e Vladimir Bechterev (1857-1927), já sustentavam
que o caminho adequado para estudar a aprendizagem era a
investigação fi siológica dos refl exos. Desses pesquisadores, o que
fi cou mais conhecido foi Ivan Pavlov.
Você já ouviu falar de Pavlov?
Estudando secreções digestivas em seu laboratório, Pavlov
observou eventos interessantes que ocorriam com a salivação dos
cães utilizados em seus experimentos e, a partir disso, passou a
pesquisar o que chamou de refl exos condicionados.
Em seu experimento mais famoso, demonstrou que um estímulo
inicialmente neutro, como o som de uma campainha, que não
está associado à salivação dos cães, poderia passar a produzir
esta resposta se a campainha fosse tocada juntamente com a
apresentação do alimento por repetidas vezes.
O processo de associação da campainha (estímulo - S) à salivação (resposta - R) foi denominado condicionamento.
Refl exo é o nome dado a comportamentos que disparam quando o indivíduo se encontra em determinadas situações. No bebê, por exemplo, o desconforto dispara o choro. Nos animais em geral, a presença do alimento dispara a salivação.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
John B. Watson (1878-1958) foi o principal divulgador do
behaviorismo. Ele entendia que se a observação objetiva era um
método adequado para conhecer o comportamento animal, por
que não utilizá-la com seres humanos?
Para Watson, o processo de condicionamento, isto é, a associação
de um estímulo inicialmente neutro a uma resposta, por meio
do treinamento ou repetição, era a chave para a compreensão do
comportamento. A afi rmação a seguir é famosa, e foi feita por
este pesquisador em um de seus livros – O behaviorismo (1925):
Dêem-me uma dúzia de crianças sadias e bem formadas
e o mundo por mim especifi cado dentro do qual criá-las,
e garanto que tomarei uma delas ao acaso e treiná-la-ei
para que se torne um especialista em qualquer tipo que
eu escolha – médico, advogado, dentista, comerciante,
bem como mendigo ou ladrão, - quaisquer que sejam
seus talentos, tendências, capacidade ou vocação. (apud
WERTHEIMER, 1989, p. 154).
Burrhus Frederic Skinner (1904-1990) foi o pesquisador
behaviorista mais conhecido. Suas idéias, originadas no
Behaviorismo clássico de Watson e nas pesquisas sobre
condicionamento de Pavlov, aprimoraram o estudo do
comportamento b, e estão vivas até hoje.
Figura 1.6 - Burrhus Frederic Skinner
Fonte: www.psychology.uiowa.edu
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Psicologia e Educação
Unidade 1
Skinner ultrapassou o condicionamento clássico, desenvolvendo o
que chamou de condicionamento operante.
O condicionamento clássico, como você pôde verifi car estudando
as idéias de Pavlov e de Watson, diz respeito à reprodução
de respostas naturais, como salivação ou medo, em situações
que antes não produziam estas reações. A associação é feita
diretamente entre estímulos e respostas, e nenhuma outra
variável é incluída.
No condicionamento operante, o comportamento do sujeito é modelado por suas conseqüências, que se constituem numa terceira variável, além do estímulo e da resposta.
Você compreenderá melhor isso se entender o conceito de reforço.
Reforço é tudo aquilo que aumenta a probabilidade de uma resposta associada anteriormente a um estímulo acontecer novamente. É a conseqüência dos comportamentos, como as recompensas, por exemplo, que costuma fazer com que eles se repitam.
Quando desejamos que um organismo tenha um
comportamento que não lhe é peculiar, começamos por
reforçar o desempenho que se aproxime do esperado,
premiando-o. Posteriormente, premiam-se somente
respostas mais específi cas e relacionadas ao objetivo,
deixando de lado as respostas próximas, porém não exatas.
A premiação tende a funcionar muito bem. Prêmios são
denominados, na teoria, de reforços positivos.
Comportamentos indesejáveis tendem a extinguir-se quando não
são premiados ou quando a conseqüência deles se apresenta como
um estímulo aversivo, isto é, um castigo ou punição.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
No condicionamento operante de Skinner, é possível também
reforçar um comportamento pela retirada de um estímulo aversivo
da situação em questão. A retirada de estímulos aversivos é
chamada de reforço negativo. Esta retirada também aumenta a
probabilidade de a resposta desejada ocorrer.
Para chegar a estes conceitos, Skinner utilizou-se de experimentos
que fi caram famosos, realizados com ratos de laboratório em um
equipamento que ganhou o nome de Caixa de Skinner. Cada rato
era colocado sozinho no interior da caixa, a qual era equipada com
um bebedouro acionável pelo experimentador ou pelo próprio rato,
na medida em que pressionasse numa pequena barra existente no
interior do equipamento.
Figura 1.7 – Caixa de Skinner
Fonte: http://www.str.com.br
Mas como ensinar o rato a pressionar a barra?
A estratégia era deixá-lo privado de água, isto é, com sede, antes
da realização do experimento. Em seguida, buscava-se treinar
o rato para pressionar a barra. A água lhe era oferecida cada
vez que este realizava comportamentos que se aproximavam
da pressão à barra. Mais adiante, a água era oferecida ao rato
somente se ele pressionasse a barra de fato. Observando as
conseqüências de seus comportamentos anteriores, o rato passava
a pressionar a barra com mais freqüência do que antes.
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Psicologia e Educação
Unidade 1
Este tipo de método, chamado de reforçamento, é muito usado
com os alunos na educação.
Aliás, dentre os behavioristas, o trabalho de Skinner é o que tem mais implicações educacionais.
Bazzo e Carvalho Neto (2003, p. 7) escrevem que, para Skinner:
as raízes dos problemas humanos mais relevantes e
desafi adores estariam na forma equivocada, inefi ciente e
amadora com que o comportamento humano é tratado
por aqueles que teriam a função de compreender e regular
as relações humanas. Desse modo, ter à disposição uma
tecnologia biológica efi caz de controle da natalidade
(uma pílula anticoncepcional, por exemplo), permitindo
potencialmente um planejamento familiar racional, seria
inútil se não houvesse uma tecnologia comportamental
equivalente para tornar mais provável que as pessoas
adotassem tais controles e passassem efetivamente a se
planejar para ter fi lhos. Para criar um espaço de refl exão
dessa natureza (pensando as possibilidades, a natureza
e as conseqüências de uma ciência do comportamento),
Skinner criou uma fi losofi a de uma ciência do
comportamento, conhecida como Behaviorismo.
A abordagem de Skinner teve profundo impacto nas tecnologias
de ensino, especialmente no que se refere à instrução
programada. O sujeito que se submete a este tipo de instrução
vai passando por etapas curtas de exposição a conteúdos com grau
de difi culdade crescente. Recebe o conteúdo, responde exercícios
e verifi ca os resultados obtidos com suas respostas para, só então,
passar à etapa seguinte. O resultado das respostas, positivo ou
negativo, funciona como incentivo para continuar o estudo, isto
é, um reforço positivo. O objetivo é levar o aluno a acumular o
maior número possível de respostas corretas em seu “repertório”.
É o material instrucional que orienta todo o processo de
aprendizagem, e não o interesse ou a atividade do aluno, ou as
características do conteúdo, entre tantas outras possibilidades.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Os professores costumam, tradicionalmente, utilizar punições para modelar o comportamento dos sujeitos. Com a instrução programada, vai se tornando desnecessário utilizar estímulos aversivos ou punições para levar o aluno a desenvolver o comportamento desejado, pois ele mesmo vai modelando suas respostas de acordo com o que é solicitado pelo material instrucional. O planejamento do professor torna-se fundamental para o sucesso do processo de ensino e aprendizagem.
A instrução programada pode ser realizada por meio das
chamadas máquinas de ensinar. Nelas, são apresentadas fi chas
com sentenças que contêm lacunas a serem preenchidas com a
resposta correta. O conteúdo das fi chas pode ser apresentado
também em programas de computador.
Acesse o site http://www.ufrgs.br/faced/slomp/maquina %2Dde%2Densinar/ e observe um exemplo dessa tecnologia.
Em entrevista dada a uma revista brasileira, em 1974, Skinner
defi niu sua máquina de ensinar da seguinte maneira:
Minha “máquina de ensinar” consiste, muito
simplesmente, em programar o material didático de
maneira que o estudante seja recompensado pelos seus
esforços não no fi m do curso ou de seus estudos – o que
é causa de baixa produtividade –, mas em cada uma das
etapas de sua aprendizagem. Isto é, ao aprender uma
lição, o aluno não é recompensado pelos seus esforços um
mês depois, quando recebe a nota X, mas enquanto está
trabalhando na lição. Se um aluno pode ver a resposta
de um problema matemático apenas quando terminou
de resolvê-lo, ele é estimulado por vários fatores: o
triunfo de ter resolvido o problema corretamente ou o
descobrimento da resposta correta. Se ele fi ca esperando
a nota do professor, que deve ter um valor punitivo, ele
não tem verdadeiras razões positivas para se interessas por
problemas matemáticos. É fundamental entender que o
organismo humano, em relação com o seu comportamento,
é reforçado pela sua capacidade de efetividade.
(SKINNER, 1974)
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Psicologia e Educação
Unidade 1
Estudando o conteúdo desta seção, você pôde concluir que, para
o behaviorismo, a aprendizagem se refere a mudanças observáveis
no comportamento das pessoas, causadas unilateralmente pela
ação sobre elas do ambiente material e social. São as mudanças
de comportamento, ou aprendizagens acumuladas, que
correspondem ao desenvolvimento do sujeito. Assim, nesta teoria,
aprendizagem e desenvolvimento são termos sinônimos, pois se
referem ao mesmo processo coordenado por agentes externos ao
sujeito, estudante ou aprendiz.
Skinner é criticado até hoje por sua visão ambientalista da aprendizagem. As críticas tomam a proposta de Skinner de modelagem do comportamento como algo autoritário, que desconsidera o que se passa na mente do aprendiz, impondo a ele o desenvolvimento dos comportamentos socialmente valorizados. Isto retiraria do sujeito a sua liberdade de escolha.
Aos críticos, em um texto muito importante publicado em
1971, Skinner responde que a liberdade é um mito, e que cabe
à sociedade planejar, controlar e conduzir o comportamento,
como alternativa para manutenção da qualidade de vida. Por
causa destas idéias e da contribuição que elas deram para o ensino
tecnicista no Brasil, Skinner fi cou associado ao posicionamento
político de direita.
A concepção comportamentalista do desenvolvimento e da
aprendizagem está muito ligada à teoria behaviorista, pois
compreende a aprendizagem como um processo pelo qual o
comportamento dos indivíduos é modifi cado pelos estímulos
recebidos do meio em que está inserido. Este passa a produzir
respostas, isto é, a se comportar, de acordo com os incentivos
que recebe, os quais podem ser planejados a fi m de reforçar o
comportamento considerado adequado para cada situação.
Para o behaviorismo, é a organização das condições externas que determina o comportamento dos sujeitos.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Entre as tantas frases ouvidas no cotidiano que podem ilustrar
esse pensamento, podemos pinçar as seguintes: “é de pequenino
que se torce o pepino”, “o conteúdo entrou (ou não entrou) na
cabecinha dele”, “você vai escrever esta palavra repetidas vezes
até aprender”, entre outras. Lendo estas frases, você percebe
que nelas é dada uma grande importância ao ambiente
externo, e nenhuma importância à atividade do sujeito, para a
modifi cação do seu comportamento.
Nas práticas pedagógicas comportamentalistas, a ênfase é dada
ao planejamento e à organização das condições em que se dará
a aprendizagem, sendo estes os aspectos centrais do processo.
O papel do professor é organizar a seqüência do ensino,
programando-o de modo a atender aos objetivos que almeja
alcançar em termos de respostas dos alunos. O objetivo das
situações de aprendizagem, nesta concepção, é fazer com que
os alunos reproduzam respostas consideradas corretas para as
questões apresentadas pelos professores. O professor deve escolher
os reforçadores positivos e negativos que serão utilizados com o
objetivo de estimular os alunos a produzirem respostas adequadas.
E hoje, será que a Psicologia continua se relacionando com a Educação? Entre no portal da Secretaria da Educação do seu município ou estado e verifi que se este disponibiliza o documento que traz a proposta curricular norteadora das ações educativas em sua região. Nesta proposta, verifi que se são citados conceitos de teorias psicológicas que você já estudou ou sabe que irá estudar. Você poderá observar como o conhecimento psicológico vem sendo usado atualmente (ou não) nas políticas educacionais existentes em nosso país.
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Psicologia e Educação
Unidade 1
Atividades de auto-avaliação
Efetue as atividades de auto-avaliação e, a seguir, acompanhe as respostas e comentários. Para melhor aproveitamento do seu estudo, confi ra suas respostas somente depois de fazer as atividades propostas.
1 – Na seção 1, abordamos a transformação da escola numa instituição de massas. Você observou que os especialistas em educação foram tornando sua atuação cada vez mais minuciosa, e utilizaram, neste processo, conhecimentos da psicologia. Segundo o que foi trabalhado na seção 1, quais eram os objetivos destes especialistas?
2 - Para Claparède, os conceitos de necessidade e de interesse aparecem relacionados no contexto da prática pedagógica. Defi na e estabeleça relações entre estes conceitos, procurando ser fi el ao pensamento do pesquisador.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
3 – Você estudou o funcionalismo na seção 1. Explique por que Edouard Claparède e John Dewey são tidos como funcionalistas.
4 – Existem diferenças sutis entre o ponto de vista de John Dewey e o de Edouard Claparède sobre o papel da educação e do trabalho docente para o desenvolvimento humano. Você identifi cou essas diferenças? Procure caracterizá-las, indo além do exposto na síntese da unidade.
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Psicologia e Educação
Unidade 1
5 - Verifi que se você captou os conceitos apresentados na descrição da Psicologia da Gestalt e do Behaviorismo! Que tal sistematizar o seu conhecimento com a ajuda do quadro a seguir?
ESCOLA OU TEORIA PALAVRAS-CHAVE
PSICOLOGIA DA FORMA/GESTALT
BEHAVIORISMO
Síntese
Nesta unidade, você estudou como a escola se desenvolveu e se tornou
uma “escola de massas”. Você conheceu também o Funcionalismo de
John Dewey e de Edouard Claparède, representantes do movimento
escolanovista, que muito infl uenciou o pensamento educacional
brasileiro. Estudou também as características gerais, os conceitos
fundamentais e as implicações para o estudo do desenvolvimento e
da aprendizagem de certas teorias psicológicas. Entre elas, estão o
Behaviorismo e a Psicologia da Gestalt. Desta forma, você percorreu a
primeira parte da historia das relações entre a psicologia e a educação na
realidade brasileira, correspondente ao período de 1920 aos anos 1970.
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2UNIDADE 2
A Psicologia e as tendências pedagógicas liberais
Objetivos de aprendizagem
Conhecer os principais conceitos da psicanálise, do humanismo e do cognitivismo.
Relacionar conteúdos estudados na unidades 1 com as tendências pedagógicas liberais que infl uenciaram a educação brasileira.
Seções de estudo
Seção 1 A psicanálise
Seção 2 O humanismo e a tendência pedagógica não-diretiva
Seção 3 O cognitivismo
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de estudo
Percorrendo a história das relações entre Psicologia e Educação,
você conheceu um conjunto de teorias a partir das quais a
compreensão sobre o processo de ensino e de aprendizagem nas
escolas foi sendo construída.
Há outras teorias que fazem parte da história da Psicologia
como ciência que trazem implicações tanto para as tendências
pedagógicas quanto para a compreensão do relacionamento
professor-aluno e das difi culdades de aprendizagem. Essas teorias
são a psicanálise, o humanismo e o cognitivismo.
Nesta unidade, você conhecerá os conceitos básicos destas três
teorias e estabelecerá relações entre os conteúdos estudados
nas seções seguintes e na unidade anterior com as tendências
pedagógicas liberais que infl uenciaram a educação brasileira.
Você verá que diferente da psicanálise, que é utilizada na
educação mais para a compreensão do relacionamento entre o
professor, o aluno e o conhecimento, principalmente no que
diz respeito às difi culdades de aprendizagem, o humanismo e
o cognitivismo, por sua vez, relacionam-se com as tendências
pedagógicas de uma forma mais próxima.
SEÇÃO 1 – A psicanálise
A psicanálise desenvolveu-se a partir do trabalho de Sigmund
Freud (1856-1939). Este médico propôs a psicanálise, com suas
técnicas de hipnose, expressão e associação livre de idéias pelos
pacientes, como uma proposta terapêutica para os distúrbios
emocionais e também como uma via de investigação dos
processos mentais.
Sigmund Freud distinguiu três zonas do funcionamento mental:
o consciente, o subconsciente e o inconsciente.
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Psicologia e Educação
Unidade 2
No inconsciente, situam-se as representações inacessíveis
voluntariamente. Os seus conteúdos aparecem disfarçados nos
sonhos, nos atos falhos, nos sintomas, mas nunca aparecem em
forma pura. Os conteúdos do inconsciente estão relacionados ao
que foi denominado por Freud de Id.
O consciente e o subconsciente estão reunidos em uma região psíquica denominada Ego.
O ego administra a relação do indivíduo com o meio,
coordenando os seus processos mentais e dando-lhe a unidade de
uma identidade. Os conteúdos conscientes e subconscientes são
acessíveis voluntariamente pelo sujeito. É possível para o sujeito
saber razoavelmente o que está pensando ou sentindo a respeito
dos conteúdos que estão em sua consciência.
A instância psíquica responsável pela censura gratuita aos
conteúdos do id é o Superego. Esta instância é constituída a
partir do moralismo e das repressões da sociedade.
A psicanálise preocupa-se com o funcionamento do inconsciente, diferentemente de outras linhas psicológicas que se debruçam sobre o funcionamento da mente tomando-a exclusivamente como consciência.
Freud apontou a existência de instintos inatos no
ser humano quando do seu nascimento, que o
estimulam internamente a buscar a satisfação de
necessidades como fome, sede e liberação de energia
sexual. Os instintos são os propulsores da dinâmica
de desenvolvimento da personalidade. Como Freud
identifi ca o termo instinto com as características
animais, prefere usar os termos impulso ou pulsão
para tratar desses estímulos internos quando se refere
aos seres humanos.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Devido ao funcionamento do id, os seres humanos estariam
sempre em busca de satisfação para seus impulsos, pois o id
ignora juízos de valor, a moral, o bem e o mal, sendo regido pelo
princípio do prazer.
O ego desempenha o papel de mediador entre o id e o mundo
exterior, sendo regido pelo princípio da realidade. Toda vez que
o ego se sente ameaçado pelas exigências de satisfação imediata
do id, este produz a sensação de angústia. Tanto o id quanto o ego
confl itam com o superego, a instância moralista que já foi citada.
Para não sucumbir à sensação de angústia provocada pela pressão
das pulsões, o ego utiliza certos mecanismos de defesa que
acabam por constituir em grande parte a personalidade.
São exemplos desses mecanismos: a negação, a fantasia, a
projeção, a racionalização, a regressão, entre outros.
Procure saber mais sobre os mecanismos de defesa. Pesquise na internet o signifi cado de cada um desses termos e procure criar exemplos que os ilustrem, discutindo os exemplos com seus colegas no EVA.
Estágios do desenvolvimento psicossexual
De acordo com a teoria psicanalítica, o desenvolvimento da
personalidade passa pelos seguintes estágios psicossexuais:
estágio oral – estende-se do nascimento até o segundo ano de vida. Neste estágio, a estimulação da boca é a fonte primária de satisfação erótica.
estágio anal – coincide com o período de treinamento para aprender a ir ao banheiro autonomamente e de desenvolvimento de competências para a higiene pessoal.
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Psicologia e Educação
Unidade 2
estágio fálico – acontece por volta do quarto ano de idade. A satisfação erótica está relacionada à região genital e surge muita curiosidade em torno das diferenças entre os sexos e sobre, por exemplo, a origem dos bebês. É quando costuma ocorrer o chamado Complexo de Édipo, que consiste na identifi cação com o genitor do sexo oposto. É também o estágio em que se desenvolve o superego, que infl ige à criança vergonha e culpa.
período de latência – dos 5 aos 10 anos, aproximadamente. Caracteriza-se por maior interesse em questões intelectuais e pela sublimação do interesse por questões sexuais que caracterizava o estágio anterior. A sublimação também é um mecanismo de defesa.
estágio genital – preparação para a formação de família, início dos relacionamentos amorosos e da heterossexualidade.
A partir desta estrutura teórica proposta por Freud, muitos
trabalhos vêm se desenvolvendo até hoje no sentido da
compreensão do ser humano. No campo da educação, os
conceitos propostos por Freud são largamente utilizados para a
compreensão e intervenção sobre as difi culdades de aprendizagem
pela psicopedagogia clínica.
A psicopedagogia clínica, ao inspirar-se na psicanálise, entende as difi culdades de aprendizagem como sintomas. Como vimos, os sintomas são uma das formas de expressão dos conteúdos do Id, conteúdos estes que não são conscientes e, portanto, não podem ser controlados pelo sujeito.
A psicanálise também é acionada para a compreensão
das questões subjetivas que envolvem o relacionamento
professor-aluno. O conceito de transferência, tomado da
psicoterapia psicanalítica, costuma ser utilizado para tratar
dessa relação. A transferência é entendida como uma
repetição pelo sujeito, em suas relações atuais, de modalidades de
relacionamento vividas por ele com outras fi guras signifi cativas e
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Universidade do Sul de Santa Catarina
outros espaços. Pelo processo de transferência, relações infantis
carregadas de afetividade podem ser revividas no relacionamento
com outras pessoas, mesmo muito tempo depois ou em um
contexto completamente diferente.
Assim, um professor pode ser um suporte dos
investimentos de seu aluno, porque é objeto de uma
transferência. Então, mais além da fi gura pessoal do
professor, o educador vai representar, para o aluno, uma
função, substituindo, nesse momento, as fi guras parentais
e/ou pessoas que lhe foram importantes, representando
então esse lugar de ‘saber’, de idealização, de poder
(NUNES, 2004).
O professor que conhece o conceito de transferência pode
compreender atitudes agressivas ou despropositadamente
amorosas que partam de um aluno para com ele. Nem sempre
essas atitudes são realmente pessoais para com o professor, mas
sim correspondentes a um estilo de relacionamento que o aluno
está repetindo, resgatado de relações passadas, vividas em outros
espaços ou, ainda, que o aluno gostaria de viver e não consegue
na relação com outras pessoas. Desta forma, seus desejos
inconscientes projetam-se na fi gura do professor. É interessante
lembrar que tal processo também pode se dar da parte do
professor em relação ao aluno.
A psicanálise é uma abordagem muito interessante da subjetividade, com diversas implicações ainda não exploradas. Desde a década de 1950, no entanto, ela enfrenta a oposição do humanismo.
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Psicologia e Educação
Unidade 2
SEÇÃO 2 – O humanismo e a tendência pedagógica não-diretiva
O humanismo surgiu na década
de 50 como uma reação tanto ao
behaviorismo quanto à psicanálise.
A psicologia humanista concentra-
se no conceito de pessoa e não
no de comportamento, como o
behaviorismo, e enfatiza a liberdade
em oposição ao controle.
O humanismo rejeita a psicanálise pela ênfase excessiva que dá ao
inconsciente. Acredita que as pessoas são seres conscientes, capazes
de dirigir a própria vida. Enfatiza a espontaneidade e o poder criador
do ser humano.
O mais famoso representante desse movimento é Carl Rogers. Para
ele, o principal fator promotor do desenvolvimento da personalidade
é uma tendência inata dos seres humanos para a auto-realização.
As pessoas que vivem todo o seu potencial são aquelas que vivem
plenamente cada momento, deixando-se guiar por seus próprios
instintos, em lugar de levar em consideração opiniões alheias. São
pessoas de pensamento livre e alta criatividade. O pensamento
de Carl Rogers infl uenciou a educação centrada no aluno e
espontaneísta, sendo mais uma contribuição da psicologia à busca por
uma escola renovada.
Libâneo (1989), ao analisar as tendências pedagógicas que tiveram
aplicações no contexto brasileiro, situa o humanismo, na educação,
como relacionado a uma das tendências pedagógicas liberais.
Entender por que o Humanismo se relaciona à tendência liberal
auxilia a compreender como ele, apesar de ser interessante pelo valor
que dá ao aspecto de desenvolvimento humano presente na educação
e às questões atitudinais e de postura do sujeito frente à vida, tem um
aspecto bastante individualista e desconectado da crítica às relações
sociais que caracterizam o capitalismo.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
A pedagogia liberal, conforme Libâneo (1989), sustenta a idéia
de que a escola tem por função preparar os indivíduos para o
desempenho de papéis sociais, de acordo com as aptidões individuais.
Esta visão pressupõe o desenvolvimento da cultura individual
para que o sujeito possa adaptar-se aos valores e normas vigentes
na sociedade capitalista. As diferenças entre as classes sociais não
são discutidas, pois embora a pedagogia liberal difunda a idéia de
igualdade de oportunidades, não leva em conta a desigualdade de
condições existente no capitalismo.
O humanismo está relacionado a um tipo específi co de tendência
pedagógica liberal, denominado por Libâneo de ‘Tendência
Liberal Renovada Não-diretiva’. Acompanhe a seguir a descrição
das características desta tendência.
Tendência Liberal Renovada Não-diretiva
Na tendência liberal renovada näo-diretiva ganha evidência o
papel da escola na formação de atitudes. Todo o esforço da escola
deve visar a uma mudança dentro do indivíduo, ou seja, a uma
adequação pessoal às solicitações do ambiente.
Aprender é modifi car suas próprias percepções. Apenas se
aprende o que estiver signifi cativamente relacionado com essas
percepções. A retenção se dá pela relevância do aprendido em
relação ao “eu”, o que torna a avaliação escolar sem sentido,
privilegiando-se a auto-avaliação. Trata-se de um ensino centrado
no aluno, sendo o professor apenas um facilitador.
Conforme Libâneo, entre as tendências liberais que infl uenciaram
a educação brasileira, além da tendência liberal “renovada
não-diretiva”, podemos identifi car a tendência “tradicional”, a
tendência “renovada progressivista” e a tendência “tecnicista”.
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Psicologia e Educação
Unidade 2
Tendência Liberal Tradicional
A tendência liberal tradicional se caracteriza por acentuar o ensino
humanístico, de cultura geral. Na escola tradicional, o aluno é
educado para atingir sua plena realização por meio de seu próprio
esforço. Sendo assim, como caracteriza a pedagogia liberal, as
diferenças de classe social não são consideradas na avaliação do
processo de ensino-aprendizagem. Além disso, não há preocupação
em relacionar a prática escolar com o cotidiano do aluno.
Quanto aos pressupostos de aprendizagem, há a idéia de que o
ensino consiste em repassar os conhecimentos para o espírito da
criança e de que a capacidade de assimilação da criança é idêntica
à do adulto, sem levar em conta as características próprias de
cada idade. A criança é vista, desta forma, como um adulto em
miniatura, porém, menos desenvolvida.
Na tendência tradicional, a atividade pedagógica está centrada no
professor, diferentemente do que propõe o humanismo.
Tendência Liberal Tecnicista
A escola liberal tecnicista, segundo Libâneo (1989), atua no
aperfeiçoamento da ordem social vigente e do sistema capitalista,
articulando-se diretamente com o sistema produtivo. Para isto,
emprega o behaviorismo, que você estudou na unidade 1. Como
visto, o behaviorismo se considera uma ciência de mudança do
comportamento por meio de tecnologias de ensino.
No tecnicismo, o principal interesse é produzir indivíduos
capacitados para o mercado de trabalho. Não há preocupação em
promover mudanças sociais que tornem o trabalho mais adequado
às necessidades dos grupos sociais.
A reforma do ensino que ocorreu no Brasil com a LDB de
1971 implantou a escola tecnicista no Brasil. Ao basear-se no
behaviorismo, a escola tecnicista vê o aluno como depositário
passivo dos conhecimentos, que devem ser acumulados na mente
por meio de associações. Como você já sabe, Skinner foi o expoente
principal dessa corrente psicológica em que se preconizou uma
educação programada.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Tendência Liberal Renovada Progressivista
A tendência liberal renovada progressivista, também chamada
de pragmatista, conforme Libâneo, acentua o sentido da cultura
como desenvolvimento das aptidões individuais.
A escola continua, dessa forma, a preparar o aluno para assumir
seu papel na sociedade, adaptando as necessidades do educando
ao meio social. Deve reproduzir características da realidade
social, para que o sujeito vivencie as situações que o prepararão
para o papel que assumirá na sociedade do futuro. Por isso, nesta
tendência, a escola deve imitar a vida.
Na escola renovada progressivista, defende-se a idéia de aprender
fazendo. A atividade pedagógica está centrada no aluno,
valorizando as tentativas experimentais, a pesquisa, a descoberta
e o estudo do meio natural e social. Os interesses do aluno são
colocados em evidencia e devem ser o ponto de partida do ensino.
Na unidade 1, você estudou as idéias dos funcionalistas da
Escola Nova. As idéias de John Dewey compõem a tendência
liberal renovada progressivista. Se você voltar a esse conteúdo
na unidade 1, perceberá como os valores democráticos presentes
nas idéias desse pensador valorizam por demais os interesses
individuais (o que as situa como liberal), propõem uma escola
nova em relação à escola tradicional (o que a situa como
renovada) e compactuam com a visão de progresso difundida
pelos defensores das relações de trabalho capitalistas.
As relações de trabalho capitalistas, como defendeu Karl
Marx, podem ser consideradas relações de assalariamento e de
exploração da força de trabalho dos trabalhadores pelos donos
dos meios de produção. O “progresso”, nas relações capitalistas,
segundo Marx, benefi cia somente os capitalistas, e não os
trabalhadores.
A tendência liberal renovada progressivista foi reforçada, ao longo
do século XX, pelas idéias cognitivistas sobre a aprendizagem.
Ainda de acordo com essa tendência pedagógica, identifi camos
como pressupostos de aprendizagem os seguintes aspectos:
aprender se torna uma atividade de descoberta;
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Psicologia e Educação
Unidade 2
a aprendizagem é mais uma auto-aprendizagem do que algo que dependa do ensino e das relações com sujeitos mediadores, como o professor;
o ambiente é apenas um meio estimulador.
Para a tendência renovada progressista, só é retido aquilo que se
incorpora à atividade do aluno por meio da descoberta pessoal.
O que é incorporado passa a compor a estrutura cognitiva
para ser empregado em novas situações. Estudar mais sobre o
cognitivismo, linha de estudos da psicologia que reforça essas
idéias, pode ajudar você a compreender melhor o que estamos
referenciando.
SEÇÃO 3 – O cognitivismo
A psicologia cognitivista é um dos mais recentes ramos
da investigação da mente e do comportamento humano.
Desenvolveu-se como uma área separada desde os fi ns dos anos
1950 e princípios dos anos 1960. O pesquisador americano
Ulrich Neisser, nascido em 1928, foi um importante expoente
desta linha da psicologia.
O cognitivismo estuda os artifícios de processamento da
informação e de organização do conhecimento pelo ser
humano. Busca compreender os diferentes estilos de pensamento
e estilos de aprendizagem.
As investigações dos cognitivistas se baseiam na análise do
funcionamento dos processos psicológicos cognitivos. Nesta seção,
vamos conhecer um pouco mais sobre cada um desses processos
psicológicos, que também são chamados de processos mentais.
Você sabe o que são processos mentais?
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Universidade do Sul de Santa Catarina
De certa forma, mesmo que nunca tenha ouvido falar deste termo,
você sabe o que são processos mentais. Sabe por que você os vive e,
muitas vezes, refl ete sobre o seu funcionamento em seu cotidiano.
Quando dizemos para nós mesmos: “Hum, minha memória não
anda boa! Esqueci de buscar meu fi lho na escola!” ou “Puxa,
não posso me distrair, este assunto é importante! Vou concentrar
minha atenção na leitura desta seção deste livro!”, estamos
falando de nossos próprios processos mentais.
No cognitivismo, os processos mentais são comparáveis aos
softwares executados em um computador que, neste caso, seria
o cérebro. Os processos mentais são responsáveis pelo conjunto
de competências cognitivas que diferenciam o ser humano dos
outros animais. As capacidades cognitivas permitem que os
humanos acessem e conheçam as características da realidade que
os cerca, obtendo, armazenando e utilizando, de modo mais ou
menos inteligente, a informação sobre essa realidade.
Os processos mentais, combinados e desenvolvidos de modo
singular em cada ser humano, nos tornam capazes de resolver
problemas de lógica, de lembrar de nossos entes queridos e de
nossa história pregressa, de perceber diferenças sutis entre dois
aromas ou dois padrões de cores. Entre esses processos estão a
atenção, a percepção, a memória, o pensamento, a linguagem e a
imaginação.
O controle consciente do funcionamento de nossos próprios processos mentais e a refl exão sobre eles é chamada de metacognição. A capacidade de metacognição é fundamental para que o sujeito seja capaz de resolver os problemas que se apresentam a ele na realidade e para realizar muitas das tarefas que se impõem no cotidiano.
A atenção é um processo mental de grande importância para a
aquisição de conhecimento. É este processo que confere ao sujeito
a capacidade de concentrar o esforço mental em um estímulo
específi co, deixando de lado outros estímulos que não merecem
ser considerados para a realização da tarefa em questão. Esses
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Psicologia e Educação
Unidade 2
estímulos desconsiderados costumam permanecer como um “pano
de fundo”. Os psicólogos da Gestalt, que você estudou na unidade 1,
foram precursores do cognitivismo e estudaram a fundo os processos
mentais de atenção e de percepção.
Os pesquisadores cognitivistas buscam compreender que fatores
infl uenciam na concentração dos sujeitos. O tempo de concentração
possível em cada fase da vida e em diferentes situações é um dos
fatores pesquisados. As crianças da educação infantil, por exemplo,
podem concentrar a atenção em um determinado estímulo por menos
tempo do que as crianças que já freqüentam o último ano das séries
iniciais. A motivação para aprender sobre aquele estímulo, no entanto,
faz diferença para a defi nição do tempo de concentração.
A memória é outro processo mental, responsável por armazenar e
recuperar no momento certo as nossas representações das experiências
vividas ou transmitidas por outras pessoas. Isto pode acontecer de
diferentes maneiras, por muito ou pouco tempo, o que depende da
relevância da informação, do contexto em que foi aprendida, do
signifi cado atribuído à informação, entre outros fatores.
Os estudos dos cognitivistas sobre o processo mental da memória chegaram à formulação de diferentes conceitos: memória de curto e de longo prazo, memória episódica, memória semântica, memória autobiográfi ca, entre outros.
O processo mental de memória já foi muito mais valorizado pela
educação. “Decorar” um conteúdo já foi mais importante do que
o é hoje. Atualmente, processos como pensamento, linguagem e
imaginação têm assumido maior relevância nos estudos realizados
pelas teorias psicológicas que fundamentam práticas pedagógicas.
De qualquer modo, sem a memória não saberíamos nem mesmo quem
somos, como se evidencia nas situações de sujeitos que sofrem lesões
e tornam-se vítimas de amnésia. Assim, atenção e memória nunca
perderão sua relevância para que ocorra a aprendizagem.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
O pensamento é o processo mental compreendido pelo
cognitivismo como responsável pela capacidade de comparar
objetos e conceitos, generalizar o que vale em uma situação para
outras situações semelhantes, abstrair elementos em comum de
diferentes experiências, relacionar diferentes situações, analisar
um determinado contexto, entre outras operações. É um processo
mental bastante complexo, que depende dos demais e se desenvolve
mais tarde do que a atenção voluntária e a memória na criança.
Aprender a pensar e resolver problemas, e não somente a dar as respostas consideradas corretas, constituiu-se como um dos grandes objetivos da educação por infl uência do cognitivismo.
Os processos mentais cujas características foram esboçadas aqui
de modo introdutório são estudados pelas teorias psicológicas
em geral. O cognitivismo, no entanto, é uma linha da Psicologia
que se caracteriza por destacar esses processos e estudá-los,
isoladamente e em sua inter-relação.
Jerome Bruner e Jean Piaget são citados como cognitivistas, mas
muitos estudiosos entendem que a concepção de aprendizagem
nutrida por eles transcende o mero cognitivismo, por valorizar
aspectos que vão além do funcionamento dos processos mentais
para que o conhecimento seja construído, em especial, as
interações sociocognitivas.
Nas próximas páginas, você conhecerá mais sobre as idéias de
Jerome Bruner.
Jerome Bruner é conhecido por ter desafi ado o behaviorismo e
sustentado a proposta cognitivista, tornando-a conhecida como
forma de compreender o processo de aprendizagem.
Aprendizagem e compreensão são sinônimos na teoria de
Bruner, e a compreensão é um processo interno ao sujeito, que
depende de seus processos cognitivos e de sua ação sobre o
objeto de conhecimento. Deste modo, Bruner diverge da posição
behaviorista, segundo a qual a aprendizagem é a aquisição de
respostas a partir da ação do meio externo sobre o sujeito.
Jerome Bruner é um autor cognitivista cujas idéias acerca da aprendizagem foram infl uenciadas pela psicologia da Gestalt e divulgadas em duas obras de garnde impacto no mundo da educação: The process of education (1962) e Toward a theory of instruction (1966).
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Psicologia e Educação
Unidade 2
Para Bruner, a proposta behaviorista de uma instrução
programada, envolvendo o controle por meio de recompensas, não
é capaz de provocar uma verdadeira motivação para o trabalho,
como defendia Skinner. Os conteúdos aprendidos por descoberta,
estes sim, teriam o potencial de serem generalizados para as mais
variadas situações, favorecendo a recuperação de informações pela
memória, já que tais informações passaram a compor a estrutura
cognitiva por uma construção do próprio aprendiz.
Os conceitos básicos utilizados por Bruner para explicar como
ocorre o processo de aprendizagem são: motivação, estrutura,
seqüência e reforço.
A motivação é a vontade de aprender que aparece na criança
na forma de curiosidade, competência e reciprocidade. A
curiosidade é um impulso vital que deve ser orientado pelo
professor. A competência é inata e responsável por nosso interesse
em atividades nas quais nos saímos bem. A reciprocidade é a
necessidade de trabalhar em grupo.
O conceito de estrutura corresponde à organização do
conteúdo a ser ensinado. É a atividade do professor organizar
o assunto a ser tratado com atenção ao modo de apresentação,
à economia de apresentação e ao poder de apresentação. O
modo de apresentação deve ajustar-se à experiência da criança
e ao tipo de assunto. A informação a ser fornecida ao aluno
deve ser econômica, quantifi cada de acordo com a necessidade
para avançar à próxima etapa da aprendizagem. O poder
da apresentação está em levar o aluno a estabelecer novas
relações entre os conteúdos estudados e destes com os outros
conhecimentos que já possui.
A seqüência diz respeito à idéia de Bruner de que, embora não
exista um ordenamento único no qual o conhecimento deve ser
apresentado ao aprendiz, sendo a melhor seqüência variável de
acordo com quem aprende, ainda assim, o grau de complexidade
da compreensão poderia ser indicado para a formulação da
seqüência de conteúdos a ensinar. Para Bruner, a compreensão
inicia com a representação motora do objeto de conhecimento,
passando pela representação icônica ou imagética e chegando
à representação simbólica, seqüência que o currículo de ensino
também poderia seguir.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
O conceito de reforço é apresentado por Bruner de modo diferente
de como o behaviorismo o apresenta. O reforço é o conhecimento
sobre os próprios resultados. É a informação que o sujeito recebe
sobre seus resultados no processo de aprendizagem e sobre o valor
de tê-los atingido para o avanço aos próximos objetivos.
Bruner compartilha com outros pesquisadores cognitivistas
a idéia de que o sujeito que aprende é ativo e, a partir de seus
conhecimentos prévios, pode construir, por meio de sua própria
ação, novos conceitos. Para ele, o aprendiz seleciona e transforma
a informação, compondo a sua estrutura cognitiva.
Desta forma, para Bruner, a aprendizagem implica a realização
de um conjunto de ações cognitivas que põem em movimento
todos os processos mentais para compreender a realidade.
O autor valoriza duas idéias: a de aprendizagem por descoberta, da qual já tratamos na seção anterior, e a de currículo em espiral.
Falar em currículo em espiral signifi ca dizer que o currículo
deve organizar-se de modo que o aluno possa ter acesso e
trabalhar de forma periódica os mesmos conteúdos, sendo que,
a cada nova oportunidade, eles são trabalhados com maior
profundidade. Desta forma, o aluno pode qualifi car cada vez
mais as categorias que vem construindo. Isto mostra que Bruner
não valoriza apenas a descoberta de conceitos novos, mas também
o aprofundamento dos conceitos já aprendidos.
Quanto à aprendizagem por descoberta, o autor a defende porque
acredita que esta pode liberar o estudante de expectativas quanto
à existência de uma única resposta correta, havendo sempre uma
nova abordagem para o conhecimento e a possibilidade de que
o aluno coloque em ação toda a sua capacidade cognitiva para
buscar conhecer. A aprendizagem por descoberta, de acordo
com Bruner, é sempre mais duradoura do que outras formas de
aprendizagem.
A estrutura cognitiva corresponde aos esquemas ou modelos mentais constituídos pela inter-relação dos conceitos aprendidos, que se organizam na forma de uma rede.
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Psicologia e Educação
Unidade 2
Para a aprendizagem signifi cativa, o autor recomendou que
o professor utilizasse perguntas como método educativo. As
questões deveriam ser colocadas de modo a levar o aluno a
descobrir por ele mesmo as soluções para os problemas.
Quanto ao aprendiz, se o processo de ensino está ocorrendo
adequadamente, aquele deverá:
ter clareza sobre o objetivo da aprendizagem;
vivenciar o processo em um clima de constante desafi o, sem sentir nem demasiada difi culdade nem demasiada facilidade;
sentir-se capaz de realizar a tarefa;
contar com a ajuda dos colegas;
explorar ativamente alternativas para a solução do problema; e
contar com a orientação do professor, que coloca questões que possam levar à descoberta de soluções.
As idéias do cognitivista Jerome Bruner, assim como
as idéias do escolanovista John Dewey, estudadas na
unidade 1, infl uenciaram a pedagogia de projetos, muito
utilizada nos dias de hoje na educação em todos os níveis,
e principalmente na educação infantil, para ampliar as
possibilidades de aprendizagem.
Estudando as idéias de Jerome Bruner é possível perceber
que, para os cognitivistas, o papel do ensino é aumentar o
número de conhecimentos dos alunos. A aprendizagem é vista
como um processo ativo do aprendiz. Este é visto como um
sujeito que recolhe, seleciona, processa e armazena a informação
por meio de seus próprios processos mentais. O modelo de
processamento de informação, ao comparar o cérebro a um
sistema computacional, coloca o indivíduo e seus processos
mentais como centrais para que a aprendizagem ocorra.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para o cognitivismo, é condição básica para que ocorra a
aprendizagem a intenção do sujeito, mesmo que involuntária,
de tornar coerente aquilo que lhe surge como incoerente. É esta
aparente incoerência que o levará a ter o insight que transforma
em um todo coerente o que antes era ilógico. No processo de
aprendizagem, assim, há uma reestruturação do sistema cognitivo
do sujeito para atender à nova percepção da realidade.
Aprender é compreender e resulta da capacidade humana de
adquirir, transformar e avaliar informações que obtemos da nossa
experiência com o mundo. Para os cognitivistas, os estímulos
não infl uenciam mecanicamente o indivíduo e sua aprendizagem.
Esta acontece pela ação do sujeito, e não pela infl uência do meio.
O importante não é levar o aluno a executar uma seqüência de
comportamentos adequados, como propunha o behaviorismo,
mas sim promover a sua compreensão da estrutura da matéria em
questão. A estrutura da matéria é a inter-relação dos signifi cados
que a compõem.
A aprendizagem, para os cognitivistas, é algo que o aluno faz que aconteça ao manejar a informação recebida de modo organizado para que o conhecimento seja mais duradouro e resistente ao esquecimento. O principal objetivo da escola, nesta perspectiva, é o desenvolvimento intelectual do aluno, proporcionando-lhe conhecimentos signifi cativos e relevantes.
Os trabalhos dos cognitivistas permitiram à Psicologia da
Educação desenvolver métodos pedagógicos para ensinar a
pensar, para desenvolver estratégias de resolução de problemas e
ajudar o aluno a aprender a aprender. No entanto, os cognitivistas
deixaram de lado as implicações do ambiente sociocultural e das
interações sociais sobre o processo de aprendizagem.
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Psicologia e Educação
Unidade 2
Atividades de auto-avaliação
1 – Ao estudar a psicanálise, você observou que o ego se utiliza de mecanismos de defesa para fazer frente a impulsos inconscientes. Retome os conceitos de ego, de inconsciente e de mecanismos de defesa estudados na seção 1. Busque na internet ou em livros de Psicologia uma relação de mecanismos de defesa identifi cados por Sigmund Freud. Procure criar um exemplo de um dos mecanismos de defesa identifi cados.
Exemplo:
2 – Para avaliar se você realmente compreendeu as características das tendências pedagógicas liberais, relacione cada tendência com a teoria psicológica correspondente, numerando:
(1) Tendência pedagógica liberal renovada progressivista
(2) Tendência pedagógica liberal renovada não-diretiva
(3) Tendência pedagógica liberal tecnicista
( ) Humanismo de Carl Rogers
( ) Funcionalismo de John Dewey e de Edouard Claparede
( ) Behaviorismo
( ) Cognitivismo
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Universidade do Sul de Santa Catarina
3 – Para Bruner, o currículo ideal seria organizado em espiral, em uma seqüência que fosse capaz de levar o aluno à compreensão dos conteúdos. A partir desta idéia, relacione o conceito de SEQÜÊNCIA com o conceito de CURRÍCULO ESPIRAL.
Síntese
Nesta unidade, você estudou os principais conceitos da
psicanálise, do humanismo e do cognitivismo, importantes
linhas da Psicologia. A partir das idéias de Libâneo sobre as
tendências pedagógicas que tiveram infl uência na educação
brasileira, você situou o humanismo e aspectos do cognitivismo
na tendência pedagógica liberal renovada, da qual fazem parte
também os conhecimentos produzidos pelos escolanovistas
John Dewey e Edouard Claparède, estudados na unidade 1. De
acordo com o quadro teórico de Libâneo, você observou que as
tendências pedagógicas liberais, ou seja, a tradicional, a renovada
e a tecnicista, por se declararem neutras, nunca assumiram
compromisso com as transformações da sociedade, embora, na
prática, procurassem legitimar a ordem econômica e social do
sistema capitalista.
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Psicologia e Educação
Unidade 2
Saiba mais
Para aprofundar possíveis relações entre a psicanálise e a
educação, uma referência interessante é o livro intitulado Freud e
a educação.
Para saber mais sobre os processos psicológicos e sobre o
cognitivismo, você poderá consultar o manual intitulado
Psicologia Cognitiva, desenvolvido pelos americanos Eysenck e
Keane, ou o livro Introdução à Psicologia, de Rita Davidoff .
Você encontra a referência completa ao fi nal do livro didático.
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UNIDADE 3
O construtivismo no Brasil
Objetivos de aprendizagem
Descrever os principais conceitos da Epistemologia Genética de Jean Piaget e o desenvolvimento do construtivismo no Brasil.
Avaliar criticamente as implicações pedagógicas do construtivismo.
Seções de estudo
Seção 1 A Epistemologia Genética de Jean Piaget
Seção 2 Os estágios de desenvolvimento da inteligência
Seção 3 As idéias construtivistas no Brasil
Seção 4 As implicações pedagógicas do construtivismo
3
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de conversa
Estudando as tendências pedagógicas liberais, na unidade 2,
você percebeu que a psicologia progrediu no Brasil porque
desenvolveu um discurso que contribuía para justifi car e preservar
as desigualdades sociais.
Em função da história das relações estabelecidas entre Psicologia
e educação no Brasil, a apropriação dessa ciência para a refl exão
sobre o processo educativo foi alvo de críticas que partiram de
outras ciências da educação.
Novas tendências pedagógicas, caracterizadas por Libâneo (1989)
como progressistas, entre as quais se destacam a pedagogia
libertadora de Paulo Freire e a pedagogia crítico-social dos
conteúdos, ganharam força. A principal característica das
tendências pedagógicas progressistas, que não estão ligadas à
Psicologia, foi a critica ao sistema capitalista. A idéia de que as
teorias da Psicologia trazem todos os subsídios para a teoria e a
prática educativa passou a ser mal vista pelos educadores críticos.
Ainda assim, nos anos 1980, após a ditadura militar, em um
período de abertura política no Brasil, outra teoria da psicologia
começou a ser identifi cada nas propostas educacionais: a
Psicologia Genética de Jean Piaget.
Nesta unidade, você estudará as idéias de Jean Piaget e alguns
aspectos do construtivismo no Brasil.
SEÇÃO 1 – A Epistemologia Genética de Jean Piaget
Algumas teorias sobre o desenvolvimento e a aprendizagem
produzidas no último século, mesmo contando já com mais de
oitenta anos, ainda geram tantas questões para a pesquisa que
podem ser consideradas atuais.
Muitas dessas teorias utilizam a abordagem genética. Isto quer
dizer que procuram compreender os processos cognitivos, afetivos
e de relacionamento social que se desenvolvem nos seres humanos
a partir da identifi cação, descrição e explicação de sua gênese, de
seu início, de sua origem.
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Psicologia e Educação
Unidade 3
A Epistemologia Genética de Jean Piaget é considerada uma
teoria genética porque o objetivo do autor é compreender como
inicia e se desenvolve a capacidade de conhecer a realidade na
criança.
Certamente você já ouviu falar de Jean Piaget associado à
Psicologia infantil ou à educação. Jean Piaget nasceu em
Neuchâtel, na Suíça, no ano de 1896. Após a conclusão de seu
doutorado em Biologia, ele passou a dedicar-se à Psicologia.
Que tal retomar esta história, para que você possa compreender as implicações de buscar aplicar essa teoria na educação?
Para saber mais sobre Psicologia, Piaget buscou associar-se a
pesquisadores dessa área em atividade na Europa. Acompanhou,
inicialmente, os atendimentos realizados em clínicas psicológicas
em Zurique. Das entrevistas psiquiátricas que observou, tomou
algumas características para o desenvolvimento de seu método
de investigação do raciocínio da criança, que chamou de método
clínico.
O método clínico é um método inspirado naquele praticado
pelos psiquiatras como meio de diagnóstico e de investigação.
É um método de conversação livre com a criança sobre um
tema dirigido pelo interrogador, que acompanha as suas
respostas, pede-lhe que justifi que o que diz, que explique,
que diga o porquê, que lhe faz contra-sugestões, etc.
Inicialmente, Piaget utilizou-se da observação pura.
Posteriormente, passou a utilizar-se de conversas com
crianças, até, fi nalmente, passar a utilizar as conhecidas
provas piagetianas, nas quais se realizam diante da criança
algumas pequenas experiências, perguntando o porquê de cada
evento. Por meio deste método, Piaget entendeu ser possível
conhecer o nível de inteligência da criança.
Saiba mais
Para saber mais sobre o método clínico, consulte: <http://educadi.psico.ufrgs.br/cursos/ppg/textos/txisolda1.htm>.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Depois desse breve período de incursão pela psicologia clínica,
Piaget foi para Paris e passou a trabalhar com crianças em um
laboratório de Psicologia. Nesse laboratório, era realizada a
validação de testes de inteligência. Validar um teste é repeti-lo
tantas vezes quantas forem necessárias, com um grande número
de sujeitos, até poder estabelecer o tipo de resposta esperada do
sujeito em cada faixa etária ou nível de desenvolvimento.
Você lembra do teste de Q.I., desenvolvido por Binet e Simon?
No laboratório de Psicologia destes pesquisadores, em Paris,
Piaget trabalhava sob a supervisão do próprio Dr. Simon.
Realizando seu trabalho, interessou-se por investigar os motivos
pelos quais as crianças davam respostas erradas a certas questões
que compunham os testes. Preocupou-se, assim, com o estudo
qualitativo das repostas, em lugar de tomar em consideração
somente a quantidade de respostas certas ou erradas, como
faziam os outros pesquisadores.
Reunindo resultados de suas primeiras investigações, Piaget
os enviou a Edouard Claparède, escolanovista e estudioso do
desenvolvimento infantil que você conheceu por meio da leitura
da unidade 1. Como você estudou, Claparède havia fundado o
Instituto Jean-Jacques Rousseau, em Genebra, na Suíça.
A partir de 1921, trabalhando no Instituto Jean-Jacques
Rousseau, Piaget tinha uma estrutura acadêmica à sua disposição
que lhe permitiu investigar intensamente o desenvolvimento
do raciocínio da criança, publicando numerosos livros e
constituindo um produtivo programa de pesquisas nas décadas
que sucederam.
Jean Piaget casou com uma companheira de pesquisa e teve
três fi lhos: Jacqueline, Lucienne e Laurent, nascidos entre
1925 e 1931. A observação do processo de desenvolvimento de
seus fi lhos desde o nascimento rendeu a produção da obra O
nascimento da inteligência na criança (1936), que trata do período
sensório-motor do desenvolvimento da inteligência (zero a dois
anos). Algumas das obras de Jean Piaget foram escritas em
colaboração com colegas como Ana Szeminska e Barbel Inhelder.
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Psicologia e Educação
Unidade 3
De 1952 a 1963, Piaget lecionou Psicologia Genética na
Sorbonne. Como você já leu quando iniciava o estudo desta
unidade, a Psicologia Genética estuda o desenvolvimento
humano desde a sua origem, buscando as manifestações mais
simples de comportamentos que se tornam complexos nas fases
ulteriores que culminam na idade adulta. Esta foi justamente a
abordagem escolhida por ele para compreender o conhecimento,
de modo que a teoria sobre o conhecimento que desenvolveu
recebeu o nome de Epistemologia Genética.
Em 1955, Jean Piaget criou o Centro Internacional de Estudos
em Epistemologia Genética, na Faculdade de Ciências de
Genebra, com o objetivo de possibilitar a realização de pesquisas
interdisciplinares. Para isto, contou com a colaboração de
especialistas de várias áreas interessados em questões relacionadas
ao desenvolvimento do conhecimento pelo homem. Piaget
lecionou até 1973, quando passou a dedicar-se exclusivamente à
pesquisa, à escrita e à participação em eventos científi cos até sua
morte, em 1980, com 84 anos.
O biólogo suíço Jean Piaget e os colaboradores que a ele se
uniram no desenvolvimento de pesquisas sobre o processo de
desenvolvimento do conhecimento forneceram base para uma
abordagem bastante inovadora da aprendizagem.
De acordo com a Epistemologia Genética, a aprendizagem é a construção de novos conhecimentos a partir da ação do sujeito sobre a realidade.
Afastando-se do inatismo e do empirismo, Jean Piaget
desenvolveu uma visão interacionista do desenvolvimento, na qual
o sujeito é protagonista, agindo sobre seu meio para construir
conhecimento.
Veja que estamos falando de construção, pois o conhecimento,
para Jean Piaget, nunca é uma cópia da realidade produzida
pela exposição aos estímulos do ambiente, como propõem os
empiristas, entre os quais estão os behavioristas, nem preexiste no
sujeito desde o seu nascimento, como defenderam os inatistas, ou
aprioristas, entre os quais estão os psicólogos da Gestalt.
A Epistemologia é uma área da Filosofi a que estuda o desenvolvimento do conhecimento científi co.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Os novos conhecimentos são construídos pelos sujeitos para que
a sua relação com a realidade permaneça equilibrada. Construir
conhecimento, nesta perspectiva é a forma que os seres humanos
têm de adaptarem-se biologicamente às mudanças percebidas no
meio para a manutenção do equilíbrio.
A origem desta idéia está nas pesquisas realizadas por Piaget com
moluscos desde a infância. A concha dos moluscos se modifi ca
ao longo das gerações quando estes, por exemplo, são removidos
de águas calmas para águas agitadas. Conchas alongadas podem
tornar-se arredondadas a partir de mudanças no ambiente. Isto
permite ao molusco que enfrenta a mudança aderir melhor às
rochas e não se deixar levar pela correnteza. Se os organismos
vivos não fossem capazes de modifi car sua estrutura para manter
o equilíbrio em sua relação com o meio, pereceriam.
A estrutura que mais se modifi ca no ser humano para que
este possa manter a sua relação com o meio equilibrada é
a estrutura cognitiva. Ela é feita de todo o conhecimento
produzido pelo sujeito. Esses conhecimentos se organizam
na forma de esquemas. A estrutura cognitiva não pode
ser vista, pois não é material, mas simbólica. Ela está em
constante reorganização para dar conta das demandas do
ambiente. Os esquemas que compõem a estrutura cognitiva
podem ser esquemas de ação ou esquemas conceituais.
Os esquemas de ação são predominantes nos primeiros anos de
vida e correspondem à combinação das ações sobre o mundo
que a criança aprendeu a realizar até então. Essa combinação
de ações é colocada em prática automaticamente sempre que há
oportunidade, sem que haja necessidade de a criança refl etir a
respeito do que está fazendo ou planejar.
Para sacudir o chocalho, a criança combina as ações mais simples de olhar, pegar, balançar e escutar, desenvolvidas anteriormente, em uma ação mais complexa que pode ser estendida a outros objetos e se constitui em um esquema de ação.
Os esquemas conceituais são aqueles que combinam
representações mentais. Estas são imagens da realidade
construídas internamente pelos sujeitos a partir de sua ação sobre
o mundo. As representações mentais começam a se desenvolver
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a partir do segundo ano de vida, de modo que os esquemas
conceituais, que as combinam, não podem se desenvolver antes
disso.
Os esquemas conceituais são utilizados para operar
mentalmente sobre a realidade, em lugar de agir diretamente
sobre ela. Começam a aparecer em suas formas rudimentares
no terceiro ano de vida, mas atingem a sua “maturidade”
somente ao fi nal da adolescência, quando tornam-se
mais complexos e precisos, e permitem a operação sobre
realidades virtuais ou hipotéticas.
Para responder a uma simples pergunta como “Você quer uma fruta?”, a criança precisa lançar mão do esquema conceitual que defi ne o que é fruta. Tal esquema foi construído a partir de suas experiências anteriores com maçãs, laranjas, bananas e outras frutas, cujas imagens a criança construiu e armazenou.
O desenvolvimento cognitivo é o que possibilita a passagem da
simples ação sobre os objetos da realidade para a operação com
conceitos mais complexos. Para que esse desenvolvimento ocorra
normalmente, quatro fatores são considerados importantes:
1. a maturação do sistema nervoso,
2. a experimentação ativa da realidade,
3. as transmissões sociais,
4. o processo de equilibração.
Este último fator é o de maior relevância, segundo a perspectiva
piagetiana.
A equilibração é a passagem do desequilíbrio para o equilíbrio. Quando entramos em contato com uma situação nova, que não conhecemos, fi camos em desvantagem, em desequilíbrio com a realidade. Para que possamos recuperar o equilíbrio nessa relação, necessitamos apreender as características da situação nova e nos adaptarmos a ela e é a este processo que o conceito de equilibração se refere. Quando esse processo é concluído, nossa estrutura cognitiva está mais desenvolvida, pois incluiu novos conhecimentos e modifi cou-se qualitativamente, permitindo-nos lidar com situações mais complexas.
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Enquanto outras teorias acreditam que nenhum conhecimento
pode ser construído sem a ajuda de outras pessoas, direta ou
indireta, formal ou informal, para Jean Piaget o conhecimento
socialmente transmitido é importante somente para a
construção de um certo tipo de conhecimento, o conhecimento
social. Os demais poderiam ser descobertos pelo sujeito a partir
de sua própria ação sobre o mundo e pela construção de suas
próprias hipóteses.
Você sabe o que é conhecimento social para Piaget?
O conhecimento social é aquele relacionado aos costumes, às regras de convivência, às leis e à língua de cada povo. Dentre os tipos de conhecimentos, conhecimento físico, conhecimento lógico-matemático e conhecimento social, este último é o único que, para ser desenvolvido, precisa ser ensinado por outras pessoas na visão piagetiana.
Piaget e seus colaboradores criaram certas provas para avaliar
os níveis infantis de desenvolvimento cognitivo. A partir
dessas provas, procuraram mostrar como a passagem da não-
conservação para a conservação de quantidades é um processo
gradual que caracteriza a passagem do estágio pré-operatório
para o operatório-concreto, em torno dos seis ou sete anos de
idade.
Conservação refere-se ao conceito de que a quantidade de
uma matéria permanece a mesma independentemente de
quaisquer mudanças em uma dimensão irrelevante. Por
exemplo, se temos uma fi leira de 8 moedas e se mudamos
as moedas abrindo espaço maior entre elas, nós ainda
temos 8 moedas. Isto é, o número de moedas não muda
quando se introduz uma mudança em outra dimensão
irrelevante (neste caso, o comprimento da fi leira)
(WADSWORTH, 1996, p. 66).
De acordo com Piaget, as estruturas de conservação não podem
ser ensinadas. Seu desenvolvimento depende da experimentação
ativa. Segundo ele, na maioria das culturas, as crianças tendem
a atingir a capacidade de resolver os problemas de conservação
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Unidade 3
ao fi nal do estágio pré-operatório, com ou sem educação escolar,
sendo que a conservação de volume costuma ser a última a ser
desenvolvida.
Estágio pré-operatório? Estágio operatório-concreto? Que tal você conhecer mais sobre os estágios de desenvolvimento propostos por Jean Piaget, para que possa compreender o que estamos falando?
SECAO 2 – Os estágios de desenvolvimento da inteligência
Os estágios de desenvolvimento da inteligência propostos por
Jean Piaget são: sensório-motor (zero a dois anos), pré-operatório
(dois a sete anos), operatório-concreto (sete a doze anos) e
operatório-formal (doze a dezesseis anos).
Estágio sensório-motor (zero a dois anos)Este estágio se caracteriza pela ausência da capacidade de
representar mentalmente os objetos da realidade. A criança
aprende por meio de suas sensações e dos atos motores, que
permitem a interação com a realidade. Ela explora os objetos
e pode chegar a resolver problemas utilizando-se de meios
práticos baseados em esquemas de ação, mas ainda não “pensa”
conceitualmente.
O bebê desenvolve conhecimento físico,
descobrindo as propriedades físicas dos objetos
de seu entorno por meio da manipulação e do
conhecimento lógico-matemático, expresso
nas noções de objeto e de causalidade que se
constituem com base no estabelecimento de
relações espaciais e temporais. Para Piaget,
o bebê não é um ser social, pois não realiza
trocas signifi cativas com as outras pessoas ao nascer, sendo que ao
completar dois anos e desenvolver a função simbólica, encontra-se
mais preparado para tais interações.
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Veja agora como as mudanças dos dois primeiros anos de vida
acontecem. O período sensório motor é sub-dividido em seis
etapas:
Etapa 1 - zero a um mês – Refl exo
Nesta fase, o bebê se relaciona com o mundo principalmente por
meio de refl exos como o choro, a preensão palmar (fechar a mão
em torno do que lhe toca a palma da mão) e o sugar (o seio, as
mãos ou a própria boca). Desde os primeiros dias de vida, inicia-
se a transformação desses refl exos em outras formas de ação sobre
o mundo. Ainda não se construiu noção alguma de espaço. O
bebê não se diferencia do mundo e das outras pessoas.
Etapa 2 - um a quatro meses – Reações circulares primárias
Os refl exos vão se modifi cando e diferenciando na relação
com o meio e novos comportamentos surgem. Esta é a fase
da construção dos primeiros hábitos. As reações circulares
primárias são ações que se repetem envolvendo o bebê e seu
corpo, como chupar o dedo, tocar ou mover o rosto e pegar o
pé. O movimento dos objetos passa a ser acompanhado com os
olhos e a criança vira a cabeça em direção aos sons que escuta,
demonstrando coordenação entre visão e audição.
Assim, o bebê pode associar a face do adulto aos sons que emite
ao aproximar-se dele. Os objetos parecem já ser percebidos
como externos ao bebê, mas ele ainda não tem noção de que este
permanece o mesmo quando o vê por um ângulo diferente e não
parece sentir sua falta quando ele sai de seu campo de visão.
Etapa 3 - quatro a oito meses – Reações circulares secundárias
O bebê passa a orientar-se cada vez mais para objetos externos
ao seu corpo, pegando e manipulando o que pode alcançar,
demonstrando coordenação entre visão e tato e entre visão e
preensão (pegar).
As reações circulares secundárias são justamente a ocorrência de
comportamentos que se repetem, mas que não mais envolvem
somente o corpo do bebê, como as reações primárias, mas
também objetos.
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A intencionalidade começa a aparecer em comportamentos, como
a tentativa de repetição de eventos interessantes que acontecem,
pela primeira vez, acidentalmente, como, por exemplo, tocar no
móbile sobre o berço e este balançar. A noção de permanência do
objeto desenvolve-se, de modo que a criança consegue perceber
que o objeto é o mesmo ainda que mude de posição e pode, até
mesmo, antecipar as posições pelas quais o objeto poderá passar
quando movimentado. Assim pode, por exemplo, procurar no
chão algo que viu cair.
Etapa 4 - oito a doze meses – Coordenação de esquemas de ação
Surge a utilização de meios para alcançar fi ns, isto é, de combinar
comportamentos já construídos anteriormente como forma de
atingir objetivos. “As crianças podem ser vistas afastando um
objeto (meio) para alcançar um outro objeto (fi m)”. Isto demonstra
um rudimento de planejamento da ação e uma separação entre
meios e fi ns. “Há uma seleção intencional dos meios antes de
iniciar o comportamento”, sendo que o fi m já está estabelecido
desde o início da ação (WADSWORTH, 1996, p. 37).
Neste período igualmente é construída a noção de que os objetos
mantêm sua forma e tamanho, independentemente de estarem
perto ou longe, ou de estarem sendo vistos pela frente ou por trás.
A criança também começa a procurar objetos que desaparecem
de seu campo de visão, diferentemente do que ocorria aos quatro
meses, quando parecia que entendia que não existiam mais após o
seu desaparecimento.
A noção de causalidade aparece nesta fase, pois a criança
demonstra perceber que os objetos ou as outras pessoas também
podem ser causadores de atividades e não somente ela mesma em
sua ação sobre o mundo.
Etapa 5 - doze a dezoito meses – Invenção de novos meios para atingir fi ns
A criança passa a utilizar mais a experimentação de meios
para atingir fi ns do que a repetição de comportamentos que já
construiu anteriormente, demonstrando a capacidade de criar
novos meios, acomodando-se às situações novas, demonstrando,
fi nalmente, comportamentos genuinamente inteligentes.
Lembre-se de que a acomodação é a modifi cação dos esquemas existentes para a adaptação a uma situação nova.
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A criança ainda não demonstra capacidade de
resolver problemas que envolvem deslocamentos
invisíveis dos objetos, como procurar no
lugar certo uma bola que rolou por baixo da
cama e foi parar do outro lado do ambiente.
A criança procura onde viu o objeto entrar,
mas não imagina onde ele foi parar após seu
deslocamento por não poder mais ser visto.
Esta capacidade se desenvolverá somente com o
advento da capacidade de representação mental, que caracteriza a
última etapa do período sensório-motor.
Etapa 6 - dezoitoa 24 meses – Representação
Nesta etapa, a criança também inventa novos meios para atingir
determinados fi ns, mas não apenas por meio da experimentação,
contando também com a representação mental. Isto signifi ca
que se torna capaz de parar por um instante o que está fazendo
e imaginar uma possível solução, por meio de representações
mentais, colocada em prática a seguir. O pensamento, assim, vai
se “descolando” da ação e tornando-se independente.
Período pré-operatório (dois a sete anos)O período pré-operatório é caracterizado pelo desenvolvimento
da capacidade simbólica, que se expressa na fala e em outras
formas de representação, como o desenho e a brincadeira. Pela
ordem como aparecem no processo de desenvolvimento da
criança, geralmente a partir dos dois anos de idade, as formas
de representação características deste estágio são: a imitação
diferida, o jogo simbólico, o desenho, a imagem mental e a
linguagem falada.
A imitação diferida é uma imitação que acontece na ausência do
modelo.
Uma garotinha de 16 meses, que vê um companheiro zangar-se, chorar e bater os pés (espetáculos novos para ela), mas somente uma ou duas horas após a sua partida, imita a cena a rir (PIAGET e INHELDER,1998, p. 49).
psicologia_e_educacao.indb 86psicologia_e_educacao.indb 86 19/7/2007 15:22:0719/7/2007 15:22:07
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O jogo simbólico também pode ser chamado de jogo de fi cção
ou de faz-de-conta. Envolve imitação e se faz acompanhar de
objetos que entram em cena representando outros objetos.
A mesma garotinha inventou o primeiro jogo simbólico ao fi ngir dormir, sentada e sorrindo largamente, mas de olhos fechados, cabeça inclinada, polegar na boca e segurando um canto de pano, que simula o canto do travesseiro, consoante o ritual costumeiro que observa ao adormecer; pouco depois, faz dormir o seu urso de pelúcia, enfi a uma conchinha numa caixa dizendo ‘miau’ (acaba de ver um gato num muro), etc. (PIAGET e INHELDER, 1998, p. 49).
O desenho ou imagem gráfi ca, nos seus primórdios, é
intermediário entre o jogo simbólico e a imagem mental e,
segundo Piaget, quase não aparece entre os dois anos e dois anos
e meio. A imagem mental é a imitação interiorizada.
A linguagem falada permite a evocação verbal de acontecimentos
não atuais, que já aparece mesmo que o uso adequado do idioma
ainda não se faça presente, em função de estar em processo de
aprendizagem.
Quando a garotinha há pouco citada diz ‘miau’, já sem ver o gato, há representação verbal além de imitação. Quando, algum tempo depois, diz ‘panéné pati’ (=grand papa parti = vovô foi embora) mostrando o caminho em declive que ele seguiu ao deixá-la, a representação apóia-se exclusivamente (ou fazendo-se acompanhar de uma imagem mental) no
signifi cante diferençado constituído pelos sinais da língua em vias de aprendizagem (PIAGET e INHELDER, 1998, p. 49).
Além de caracterizar-se pelo desenvolvimento da função
simbólica, o estágio pré- operatório caracteriza-se ainda por uma
forma de pensamento denominada egocêntrica.
Signifi cante = coisa usada para representar objetos e eventos (signifi cado).
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Pensamento egocêntrico O pensamento egocêntrico é uma forma de pensamento centrada
em um só aspecto das situações observadas, que corresponde ao
ponto de vista do próprio sujeito. Esta forma de pensamento faz
com que a criança:
desconsidere o ponto de vista de outros, pois não o
percebe como diferente do seu próprio;
centre-se em características aparentes das situações
observadas ao analisá-las;
tome partes das situações, as partes imediatamente
percebidas, como representantes do todo;
não acompanhe movimentos quadro a quadro, todo o
processo de uma transformação, registrando apenas,
geralmente, o quadro inicial e o quadro fi nal;
não seja plenamente capaz de inverter mentalmente ou
compensar mentalmente transformações observadas nas
características dos objetos, capacidade esta denominada
de reversibilidade;
demonstre difi culdade ou incapacidade de conservar
quantidades.
Conservação de quantidadesOs problemas de conservação foram criados por Piaget e os seus
colaboradores para avaliar os níveis infantis de desenvolvimento
cognitivo. A passagem da não-conservação para a conservação é
um processo gradual que caracteriza a passagem do estágio pré-
operatório para o operatório-concreto, em torno dos seis ou sete
anos de idade.
Conservação refere-se ao conceito de que a quantidade de
uma matéria permanece a mesma independentemente de
quaisquer mudanças em uma dimensão irrelevante. Por
exemplo, se temos uma fi leira de 8 moedas e se mudamos
as moedas abrindo espaço maior entre elas, nós ainda
temos 8 moedas. Isto é, o número de moedas não muda
quando se introduz uma mudança em outra dimensão
irrelevante (neste caso, o comprimento da fi leira)
(WADSWORTH, 1996, p. 66).
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Psicologia e Educação
Unidade 3
De acordo com Piaget, as estruturas de conservação não podem
ser ensinadas. Seu desenvolvimento depende da experimentação
ativa. Segundo ele, na maioria das culturas, as crianças tendem
a atingir a capacidade de resolver os problemas de conservação
ao fi nal do estágio pré-operatório, com ou sem educação escolar,
sendo que a conservação de volume costuma ser a última a ser
desenvolvida.
A noção de númeroA construção da noção de número toma por base os
mecanismos sensório-motores, pois o contato com
quantidades acontece na experiência da criança desde
os seus primeiros meses de vida. No período pré-
operatório, estão em elaboração duas relações básicas
para o desenvolvimento do conceito de número: a
seriação e a inclusão de classes, relações estas que são
completamente elaboradas somente no próximo período,
no qual o conceito de número propriamente dito é conquistado,
juntamente com a capacidade de operar.
Veja no que consistem as duas relações citadas.
A seriação consiste em ordenar objetos tomando de acordo
com um determinado critério (tamanho, por exemplo).
A inclusão hierárquica de classes consiste na formação de
grupos de objetos utilizando como critério uma característica
dos mesmos e a eleição de outra característica para a formação
de agrupamentos internos a este grupo. Exemplo: no grupo
das fl ores, as rosas formam um sub-grupo e as rosas vermelhas
formam outro sub-grupo dentro do sub-grupo das rosas.
O número reúne em um só todo a classifi cação e a seriação,
porque os termos enumerados são, ao mesmo tempo, equivalentes
entre si e diferentes uns dos outros por ordem de enumeração.
Cinco balas são todas balas, mas uma pode ser considerada a
número um, outra a número dois, outra a número três e assim por
diante. Para a criança do período pré-operatório, estas relações
não são simples de compreender: “Professor, como um só número
cinco pode ser cinco balas?”.
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Ao fi nal da seção, você conhecerá um pouco mais sobre o estágio
pré-operatório quando estiver estudando o desenvolvimento do
julgamento moral na criança segundo Jean Piaget.
Período operatório-concreto (sete a doze anos)É a superação do egocentrismo do pensamento infantil e a
construção da noção de reversibilidade que dá a característica de
operatória à estrutura cognitiva e indica a entrada neste período
do desenvolvimento. O pensamento ganha mais mobilidade do
que no estágio anterior, quando estava submetido às percepções
imediatas da criança.
Operar signifi ca estabelecer relações, comparar, agrupar, entre
outras ações mentais.
Operação é tudo aquilo que transforma um estado
A em um estado B, deixando pelo menos uma
propriedade invariante no decurso da transformação
e com retorno possível, a partir dessa invariante,
de B para A, anulando a transformação. Ocorre
operação quando a ação do sujeito ou a transformação
observada no objeto pode ser anulada em pensamento
(reversibilidade) por uma ação orientada em sentido
inverso (inversão) ou compensada por uma ação recíproca
(compensação).
A reversibilidade é a característica das operações que permite
que as ações mentais sejam realizadas em dois sentidos
sem alterar suas propriedades. Com isto, é possível somar
mentalmente objetos e também inverter a soma, subtraindo.
No período operatório-concreto, torna-se possível conservar
as propriedades de um objeto mesmo que este passe por
transformações em sua aparência (conservação). Piaget buscou
conhecer a conservação de número, área e volume.
No quadro a seguir, veja os tipos de conservação e as idades
aproximadas em que se desenvolvem, de acordo com os estudos
de Piaget.
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Psicologia e Educação
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CONSERVAÇÃO IDADE
Número
Substância (massa)
Área
Volume líquido
Peso
Volume sólido
5-6
7-8
7-8
7-8
9-10
11-12
Fonte: WADSWORTH, B. J. Inteligência e afetividade da criança na teoria de Piaget, 2001, p.71.
No estágio operatório-concreto, a criança torna-se capaz, ainda, de:
representar grafi camente um dado concreto por meio de
símbolos e signos;
realizar a seriação ou ordenação de objetos a partir de
uma propriedade (tamanho, por exemplo);
proceder à inclusão de classes;
realizar agrupamentos multiplicativos, progredindo desde
a correspondência termo a termo até as classifi cações
multiplicativas.
As operações mentais, nesse período, necessitam apoiar-se em
situações concretas, não estando completamente livres.
Período operatório-formal (doze a dezesseis anos)As operações formais são aquelas que libertam o
sujeito das limitações ao raciocínio impostas pela
realidade concreta. As crianças que se encontram
no estágio operatório-concreto raciocinam somente
sobre problemas isolados, não estabelecendo
relações entre eles, e fi cam muito presas ao
conteúdo real, não sendo capazes de raciocinar
sobre premissas falsas.
O adolescente do estágio operatório-formal, por sua vez,
raciocina sobre proposições, sobre hipóteses e mesmo sobre o
futuro de uma situação imaginada. Isto permite a realização de
relações entre proposições que formam as teorias e a dedução de
implicações práticas ou aplicações delas.
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No estágio das operações formais, desenvolvem-se as noções
de probabilidade, de proporção e de chance. O conceito de
‘probabilidade’ abrange os conceitos de proporção e de chance.
‘Proporção’ implica saber que as probabilidades 3/9 e 2/6 são
equivalentes. ‘Chance’ diz respeito a levar em consideração todas
as combinações possíveis entre os objetos dados por meio de uma
combinatória.
O problema do líquido químico incolor – Cinco frascos contêm diferentes líquidos incolores que parecem exatamente iguais. O frasco 5 contém iodeto de potássio e está equipado com um conta-gotas. Quando este é acrescentado à água oxigenada (frasco 3), esta o oxida, produzindo uma cor amarela. São apresentados à criança dois frascos, um com água e outro com uma mistura de ácido sulfúrico (frasco 1) com água oxigenada (frasco 3). O frasco 2 contém água, que é neutra, e o frasco 4 contém um descolorante. O experimentador coloca algumas gotas do frasco 5 em cada um dos dois recipientes, cujo líquido fi ca amarelo. Pede à criança que procure reproduzir o amarelo utilizando livremente os líquidos contidos nos cinco frascos. Vinte e cinco combinações de dois ou mais líquidos são possíveis, mas apenas duas podem produzir a cor amarela. Que combinações são essas? Procure resolver este problema e veja a solução ao fi nal do livro didático.
Os adolescentes e adultos são os únicos capazes de chegar
às combinações possíveis entre os líquidos dos frascos, pois
aplicam métodos sistemáticos para chegar ao resultado, como
experimentar as combinações e anotar o que já foi feito,
procurando tirar conclusões sobre o conteúdo dos frascos a partir
da análise das combinações.
SEÇÃO 3 – As idéias construtivistas no Brasil
A Epistemologia Genética de Jean Piaget não era propriamente
uma novidade para os brasileiros quando começou a aparecer com
mais força nas propostas educacionais ao fi nal dos anos 1980. Os
brasileiros já a relacionavam com a pedagogia da Escola Nova.
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Psicologia e Educação
Unidade 3
As idéias de Jean Piaget foram introduzidas no Brasil a partir da
década de 1920, na mesma época em que era difundido o ideário
da Escola Nova. Considerando que a primeira obra na área da
Psicologia publicada por Jean Piaget data de 1923, podemos dizer
que a chegada de suas idéias ao Brasil foi bastante rápida para a
época.
Nesse período, as idéias de Edouard Claparède, como você
estudou nesta disciplina, estavam sendo muito requisitadas para
aplicação pedagógica. Jean Piaget era seu assistente no Instituto
Jean-Jacques Rosseau. Helena Antipoff era colega de trabalho de
Jean Piaget naquele Instituto. Esta pesquisadora foi convidada a
participar do projeto de reforma educacional em Minas Gerais,
em 1927, quando passou a divulgar no país as idéias piagetianas
em nosso país.
Lauro de Oliveira Lima foi outro intelectual que se destacou por
sua importância para a difusão das idéias de Jean Piaget em nosso
país, trabalhando na proposta pedagógica do Ceará e divulgando
o seu trabalho em outros estados brasileiros.
O próprio Piaget esteve no Brasil em 1949, representando a
UNESCO, organismo internacional no qual foi assessor para
a área educacional. Nessa ocasião, recebeu o titulo de Professor
Honoris Causa da Universidade do Brasil.
A partir da década de 1950, as obras de Piaget começaram a ser
publicadas em português, o que contribuiu para a difusão de suas
idéias em nosso meio. Nos anos 1960, com a criação de cursos de
graduação em Psicologia nas universidades brasileiras, pesquisas
utilizando a Epistemologia Genética como referencial teórico
começaram a se proliferar, constituindo-se alguns núcleos de
pesquisa nessa linha no país.
A partir dos anos 1980, as idéias desenvolvidas por Emília
Ferreiro, que estudou com Jean Piaget no Centro de Estudos de
Epistemologia Genética, em Genebra, foram muito utilizadas
para procurar determinar o que as crianças já sabem sobre a
leitura e a escrita, a fi m de planejar o processo de alfabetização.
Segundo Ferreiro & Teberosky (1999), a criança desenvolve
algumas hipóteses sobre como se lê e sobre como se escreve
antes mesmo de aprender a ler e escrever. Nas culturas letradas,
As hipóteses sobre como se lê e escreve nestas duas fases são consideradas pré-silábicas, pois a criança ainda não estabelece relação entre as partes das palavras e os sons correspondentes.
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estas hipóteses costumam evoluir em uma seqüência semelhante,
descrita pelas pesquisadoras da seguinte maneira.
1. Escrita indiferenciada: o desenho é diferenciado da
escrita, mas ainda há confusão entre um e outro. São
usados grafi smos mais longos ou mais curtos para
representar objetos grandes ou pequenos. A criança não
demonstra intenção de analisar os grafi smos em suas
partes, associando-os ao que se pretendia escrever. A
associação e feita em relação ao todo.
2. Diferenciação da escrita: nesta fase, a criança passa
a apresentar grafi smos diferentes para representar
signifi cados diferentes. Para escrever e para ler, segundo
as crianças desta fase, é necessário que o grafi smo
apresente duas características: variedade e quantidade
mínima de caracteres (geralmente três). Nesta fase, a
criança começa a se apropriar do modo de escrita de
seu nome e de palavras vistas diariamente, como as que
aparecem em rótulos.
3. Hipótese silábica – nesta fase, as crianças procuram
estabelecer relações entre os sons e as partes das palavras.
Na escrita, a criança começa a utilizar uma letra para
cada sílaba. Na leitura surgem confl itos cognitivos,
pois as palavras têm mais letras do que as contempladas
ao realizar as associações. Ao ler seu nome e procurar
utilizar a hipótese silábica, a criança percebe que sobram
letras e demonstra certa confusão. Além disso, a leitura
de certas palavras pelos adultos não fecha com suas
hipóteses sobre o que pode ser lido.
4. Hipótese silábico-alfabética – a partir desta
compreensão, a criança começa a tentar reproduzir cada
sílaba com mais de uma letra, e tem sucesso em algumas
situações, misturando a escrita silábica com a alfabética,
na qual letras e sons estabelecem total correspondência.
5. Hipótese alfabética – com o estabelecimento desta
hipótese, letras e sons passam a demonstrar total
correspondência. Alcançar a hipótese alfabética não é
tudo para que se domine a escrita em sua forma culta.
Difi culdades ortográfi cas dependem do ensino para
Lembre-se de que, para Piaget, o confl ito cognitivo é o que motiva a construção de conhecimento.
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Psicologia e Educação
Unidade 3
serem resolvidas e podem perdurar mesmo após todo o
processo de alfabetização.
A difusão das idéias de Jean Piaget e os trabalhos de Emília
Ferreiro permitiram que se desenvolvesse a concepção de erro
construtivo, uma visão mais positiva do erro, que passa a ser
considerado um caminho para o acerto e um indicativo sobre o
estágio de desenvolvimento em que a criança se encontra.
As idéias desenvolvidas por Emília Ferreiro e Ana Teberosky
foram muito utilizadas para procurar determinar o que as
crianças já sabem sobre a leitura e a escrita, a fi m de planejar o
processo de alfabetização. Os estágios de desenvolvimento das
hipóteses infantis sobre a leitura e a escrita, considerados pelos
piagetianos como universais nas culturas letradas, acabaram
por ser utilizados para dividir as crianças em grupos, em uma
apropriação tradicional de um conhecimento inovador.
A crítica à aplicação das idéias de Emília Ferreiro e Ana
Teberosky ao processo de alfabetização centram-se na
não-concordância com a perspectiva de que as etapas de
desenvolvimento da leitura e da escrita sejam semelhantes para
todos. Para os críticos, tais capacidades são singulares, vinculadas
às mediações encontradas pelo sujeito em seu meio social, e suas
etapas não podem ser universalizadas.
SEÇÃO 4 – As implicações pedagógicas do construtivismo
Para compreender as implicações pedagógicas do pensamento
construtivista piagetiano, é importante retomar as diferenças
entre a abordagem de Jean Piaget para a aprendizagem, a
abordagem inatista e a abordagem empirista ou ambientalista.
Você estudou na unidade 1 que a corrente empirista ou
ambientalista, representada na Psicologia pelo behaviorismo,
compreende o processo ensino-aprendizagem como sendo
centrado no professor, que organiza as informações do meio
externo que deverão ser recebidas pelos alunos. A aprendizagem
é compreendida como mudança de comportamento resultante
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do treino ou da experiência. Há uma preocupação excessiva
em organizar o ensino, baseando-se na idéia de que “ensinando
bem” o aluno aprende. Todo o conhecimento está fora do sujeito,
no professor e nos livros, e o aluno é visto como um recipiente
vazio em que é necessário “despejar” o conhecimento
(DARSIE, 1999).
Becker (1993) aponta que, na aula fundada nessa
concepção epistemológica, o professor fala e o aluno
escuta; o professor dita e o aluno copia; o professor
decide o que fazer e o aluno executa; o professor ensina
e o aluno aprende. Mas por que o professor age assim?
Porque ele acredita que o conhecimento pode ser
transmitido para o aluno. A capacidade de conhecer a
realidade viria de fora para dentro, de modo que o sujeito é
totalmente determinado pelos objetos que incidem sobre ele no
meio físico e social.
Na concepção inatista, por sua vez, o professor interfere o
mínimo possível, pois acredita que o aluno aprende por si
mesmo e o máximo que ele pode fazer é auxiliar a aprendizagem
do aluno, despertando o conhecimento que nele já existe. A
epistemologia que sustenta este modelo pedagógico é também
denominada apriorista, palavra derivada da expressão a priori,
que signifi ca “aquilo que é posto antes”, neste caso, a bagagem
genética/hereditária. Esta concepção, portanto, acredita que o
ser humano nasce com o conhecimento já programado na sua
herança genética. Para essa corrente, as interações socioculturais
são excluídas na formação das estruturas comportamentais
e cognitivas da pessoa. Assim, o entendimento é o de que a
educação pouco ou quase nada altera as determinações inatas.
Em geral, as idéias sobre como o sujeito aprende e o pensamento
pedagógico do professor tendem a se debater entre estas duas
concepções de aprendizagem: inatismo e ambientalismo. Por
vezes, é difícil identifi car se o ensino está fundado numa teoria
ou noutra. Isto ocorre porque o tratamento dado à aprendizagem
pelas duas correntes em foco é, antes de tudo, reducionista: o
ambientalismo reduz o sujeito ao objeto, enquanto o inatismo
sugere que a realidade se resume ao ponto de vista do sujeito.
Essas duas concepções, com bases epistemológicas tão diferentes,
podem levar a práticas e efeitos semelhantes do ponto de vista
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Psicologia e Educação
Unidade 3
pedagógico. No inatismo, não há nada que a atividade do sujeito
ou o processo educativo possam fazer para modifi car o que já
está dado desde o nascimento. No ambientalismo, por sua vez,
não é a atividade do sujeito que lhe permitirá aprender. Ambas
as perspectivas vêem o sujeito como um ser passivo frente ao
conhecimento. De acordo com Giusta (1985) a separação entre
subjetividade e objetividade apresentada nessas duas
concepções é um refl exo da divisão social do trabalho
no capitalismo: da separação entre o fazer e o pensar, da
prática e da teoria.
O interacionismo, como proposto por Jean Piaget, é uma
síntese do inatismo e do ambientalismo. O autor não
concorda que o conhecimento nasça com o indivíduo,
nem acredita que este seja dado pelo meio social. Afi rma
que o sujeito constrói o conhecimento na interação com o
meio físico e social, e essa construção vai depender tanto das
condições do indivíduo como das condições apresentadas pelo
meio em que está inserido.
Segundo Becker (1993), na pedagogia derivada da concepção
interacionista, o professor acredita que o aluno só aprenderá,
isto é, só construirá algum conhecimento novo se agir sobre a
realidade material e social e problematizar a sua ação por meio
da refl exão. Aprendizagem, nessa perspectiva, é ação e tomada
de consciência da relação entre as ações. Assim, não se pode
exagerar na importância dada à bagagem hereditária, nem na
importância do meio social.
Quando buscamos as implicações pedagógicas da teoria de
Jean Piaget, primeiramente, é interessante apontar que, para
esta teoria, a aprendizagem ou construção de conhecimento
ocorre somente se o conhecimento que o indivíduo já possui
em sua estrutura cognitiva lhe dá condições para assimilar as
características essenciais do conhecimento novo.
De acordo com o proposto por Piaget, certas categorias, como
as noções de objeto, espaço, tempo e causalidade, por exemplo,
necessitam ser construídas nos primeiros anos de vida para
que o sujeito possa compreender grande parte das relações que
observa no meio em que vive sem fi car perdido. Assim, é preciso
que alguns ciclos de desenvolvimento já tenham sido completados
para que se possa aprender os conteúdos novos.
Kant também preconizava que certas categorias devem estar dadas a priori no sujeito para que este possa conhecer o mundo. A diferença entre Kant e Piaget neste aspecto é que Kant acreditava que já nascemos com essas categorias prontas, enquanto que Piaget descreve o processo de construção dessas categorias a partir do nascimento, como podemos ver no livro “A construção do real na criança”.
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Há, ainda, outras implicações a destacar. Entre elas, a idéia de que:
O conhecimento exato não pode ser derivado diretamente
da leitura ou de ouvir dizer (por exemplo, os professores).
Antes do desenvolvimento das operações formais, o
conhecimento exato só pode ser construído a partir da
experiência de objetos signifi cativos; ele não pode ser
adquirido de representações (por exemplo, palavras faladas
e escritas) de objetos e eventos (WADSWORTH, 1996, p.
15).
Além disso, é possível destacar os seguintes aspectos da teoria
piagetiana que trazem implicações para a educação.
A aprendizagem envolve sempre construção e
compreensão, de modo que a aprendizagem mecânica
(aquela que se baseia na decoração das defi nições dos
conceitos) não poderia ser considerada uma aprendizagem.
O professor deve encorajar o desequilíbrio cognitivo, pois
é este que produz motivação para a resolução de problemas
e construção de conhecimento na escola.
O professor deve também promover o confl ito cognitivo,
fazendo com que o aluno coloque suas próprias idéias em
confronto e tenha dúvidas, questionando o seu próprio
posicionamento e pesquisando.
As interações sociais na escola são importantes para que
as crianças possam, tendo superado o egocentrismo do
pensamento, dialogar em busca da assimilação do ponto de
vista do outro e construir o conhecimento social.
Interpretações equivocadas da teoria de Jean Piaget levaram
professores a aplicar provas piagetianas aos alunos no contexto
escolar, procurando, com isto, levá-los a perceber relações que não
haviam percebido espontaneamente, como forma de acelerar o
seu desenvolvimento cognitivo. Tal abordagem é equivocada, na
medida em que as provas piagetianas foram criadas para fi ns de
pesquisa e não de ensino.
Outro equívoco foi o de interpretar a teoria piagetiana como uma
teoria espontaneísta, o que traria como implicação pedagógica
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Psicologia e Educação
Unidade 3
que o aluno fosse deixado por sua própria conta nas atividades
escolares e o professor não teria intervenção alguma em sua
aprendizagem e desenvolvimento.
O fato é que na teoria de Jean Piaget é papel do
professor observar o processo de desenvolvimento do
aluno e planejar atividades que tragam os desafi os
apropriados para provocar os confl itos cognitivos
necessários ao avanço do conhecimento. É a busca
por adaptação à adversidade, como estar frente a
uma situação nova e não saber exatamente como
resolvê-la, precisando criar estratégias, o que levará
o aluno ao desenvolvimento cognitivo. O professor
deverá planejar, então, tais situações novas, como forma de levar
o aluno a aprender os conhecimentos próprios para o seu estágio
de desenvolvimento.
As idéias liberais da Escola Nova, já identifi cadas na teoria
piagetiana, em um contexto brasileiro de política econômica
neoliberal, precisariam de uma nova roupagem. A aproximação
da Epistemologia Genética com as idéias cognitivistas que
você conheceu na unidade 2 conferiu a esta teoria um viés mais
moderno e o pensamento de Jean Piaget serviu como uma
luva para que a escola pudesse preparar o trabalhador para as
exigências de um novo contexto produtivo. Neste novo contexto,
a capacidade de construir novos conhecimentos permanentemente
é condição necessária para a adaptação às mudanças no mercado
de trabalho.
O construtivismo é relacionado ao discurso neoliberal quando
fundamenta a preparação do aluno para um mercado de trabalho
que exige cada fez mais “fl exibilidade” do trabalhador no
exercício de várias funções e para lidar com situações inesperadas,
buscando soluções imediatas para situações enfrentadas no
atual sistema produtivo. Daí a importância do aprendiz não só
aprender mais, mas, sobretudo, aprender a aprender.
A revalorização das idéias de interacionistas como Jean Piaget e
a aplicação dessa teoria à educação brasileira está relacionada às
novas características exigidas do trabalhador com a globalização,
as novas tecnologias e as novas exigências dos sistemas
produtivos.
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O construtivismo é criticado por valorizar mais o que o sujeito
aprende sozinho do que as aprendizagens originadas por
transmissões sociais. É criticado também por valorizar mais
a capacidade criativa do sujeito para desenvolver métodos de
resolução de problemas do que o conhecimento que já está
pronto e foi produzido por outras pessoas que nos antecederam
no processo histórico. Outra crítica é a que mostra o lugar
assumido pelas relações sociais na teoria piagetiana: estas
oferecem a mesma qualidade de desafi o à inteligência que a
oferecida pelo ambiente físico, levando o sujeito ao desequilíbrio
e à reequilibração em seu processo individual de construção de
conhecimento. O conhecimento, assim, é sempre visto como
individual e desconectado das relações intersubjetivas.
Duarte (2001), autor que tem se dedicado à análise do lema
pedagógico de “aprender a aprender”, presente hoje nos relatórios
que fundamentam as políticas internacionais na área da educação,
as quais infl uenciam diretamente as políticas educacionais
brasileiras, aponta que desconsidera especifi cidades do psiquismo
como um fenômeno histórico-social, abordando o psiquismo
humano de forma biológica.
Quando o critério é a historicização ou não do psiquismo, Piaget,
Skinner e Freud, autores estudados nesta disciplina, segundo
Duarte, estariam muito mais próximos um do outro do que da
Psicologia sócio-histórica de Vygotsky, também presente na
Psicologia de Wallon.
Estes estudiosos procuraram trabalhar tomando o materialismo
histórico e dialético de Karl Marx como fundamento e método.
Você compreenderá o que isto signifi ca e identifi cará as
implicações dessas teorias para a educação na próxima unidade.
SínteseNesta unidade, você conheceu os principais conceitos da
Epistemologia Genética de Jean Piaget e as características dos
estágios de desenvolvimento propostos por este pesquisador. Você
identifi cou como o construtivismo esteve presente na educação no
Brasil, as implicações pedagógicas e as críticas sofridas por esta
concepção de aprendizagem e desenvolvimento.
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Psicologia e Educação
Unidade 3
Atividades de auto-avaliação
1 - Os conceitos de egocentrismo e de reversibilidade do pensamento permitem, dentro da teoria piagetiana, estabelecer uma linha divisória entre as capacidades características do estágio pré-operatório e aquelas que já se identifi cam no estágio operatório-concreto. Identifi que esses conceitos e estabeleça relação entre eles.
2 - Assinale a alternativa correta. Quanto ao construtivismo, é possível afi rmar que:
(a) coloca o professor no centro do processo pedagógico.
(b) enfatiza questões históricas e políticas na compreensão do desenvolvimento humano e do processo de ensino-aprendizagem.valoriza mais a descoberta do que a recepção de conhecimentos.
(c) defende a origem social das funções psicológicas.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
3 - A visão construtivista do erro é diferente da visão da pedagogia tradicional. Como o erro é concebido de acordo com o construtivismo?
Saiba mais
Para saber mais sobre a teoria piagetiana, sua descrição dos
estágios de desenvolvimento e as implicações educacionais do
construtivismo, busque o livro de Barry J. Wadswoth cujo título
é Inteligência e afetividade na teoria de Jean Piaget. Esses
temas são tratados, nesta obra em uma linguagem bastante
acessível.
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UNIDADE 4
A Psicologia sócio-histórica e a educação
Objetivos de aprendizagem
Descrever o signifi cado dos principais conceitos da teoria histórico-cultural de L. S. Vygotsky, identifi cando também as infl uências desta fundamentação teórica no trabalho do professor na educação básica.
Compreender os princípios que regem o desenvolvimento de crianças e adolescentes na escola segundo a perspectiva desenvolvida por Henri Wallon.
Seções de estudo
Seção 1 A teoria histórico-cultural de L. S. Vygotsky
Seção 2 A teoria da emoção Henri Wallon
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de conversa
Nesta unidade, você conhecerá outras duas teorias consideradas
genéticas: a histórico-cultural, de Lev Semenovitch Vigotski, e a
da emoção, de Henri Wallon.
Estas teorias são genéticas porque se preocupam com o modo
como o ser humano se diferencia dos outros animais pelo
desenvolvimento de capacidades que se originam nas relações
sociais. O arcabouço teórico produzido por Vygotsky e
Wallon nos permite compreender a emoção, o movimento e as
mediações sociais como dimensões humanas que se contrapõem
e, ao mesmo tempo, trabalham em conjunto para originar a
personalidade e desenvolver a pessoa em todos os sentidos.
Ao valorizar a contradição como “motor” das transformações
que acontecem com os humanos desde o seu nascimento, as duas
teorias aqui abordadas se fundamentam nas idéias de Karl Marx,
cujo ponto de vista de Marx, seguido por Vygotsky e Wallon, é
chamado de materialismo histórico e dialético.
Você saberá mais sobre tão complexo tema estudando esta
unidade.
SEÇÃO 1 – A teoria histórico-cultural de L. S. Vygotsky
Antes de conhecer os principais conceitos da teoria histórico-
cultural, iniciaremos esta etapa do nosso percurso pela biografi a
de L. S. Vygotsky, o responsável pela sistematização de conceitos
que têm tantas implicações para a educação.
Lev Semionovitch Vygotsky nasceu em 1896, no mesmo ano
de nascimento de Jean Piaget, porém, em um contexto social e
geográfi co completamente diferente. Sua cidade de nascimento
foi Orsha, mas cresceu em Gomel, ambas as cidades localizadas
na Bielo-Rússia, país que se tornou uma das Repúblicas
Socialistas Soviéticas após a Revolução Russa, ocorrida em 1917.
Vygotsky estudou Medicina e Direito na Universidade de
Moscou, formando-se em Direito em 1917. Estudou também
Filosofi a e Literatura na Universidade Popular Shayavsky,
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Psicologia e Educação
Unidade 4
aprofundando-se no pensamento de Karl Marx e de fi lósofos
como Spinoza. Nos seus primeiros anos de estudo, dedicou-se ao
estudo da criação artística.
De 1917 até 1924, Vygotsky deixou Moscou e permaneceu em
Gomel, onde se casou com Roza Smekhova e teve duas fi lhas.
Trabalhou como professor de Literatura e Psicologia.
Como se sabe, a revolução russa mudou o regime político da
Rússia para o comunismo, sob o comando de Lênin, sucedido,
posteriormente, por Stalin.
Até 1936, viveu-se um período de relativa liberdade acadêmica na
antiga União Soviética.
Nessa época, “a psicologia de cunho mecanicista tinha
um espaço muito grande no cenário científi co soviético
devido aos avanços da fi siologia que, já no século XIX,
pesquisava a base material da atividade nervosa superior”
(ZANELLA, 2001, p. 64).
Na unidade 1, ao estudar o behaviorismo, você tomou
conhecimento do trabalho de Ivan Pavlov com cães, que deu
início ao estudo do refl exo condicionado, mecanismo pelo qual
comportamentos podem ser desencadeados no sujeito por meio
da associação a determinados estímulos. A valorização deste
trabalho para a compreensão do funcionamento psicológico
é um exemplo da compreensão mecanicista assumida pela
Psicologia da então U.R.S.S..
Em 1924, após apresentar um aclamado artigo no II Congresso
Pan-Russo de Psiconeurologia, Vigostski foi convidado e
passou a trabalhar no Instituto de Psicologia da Universidade
de Moscou. Juntamente com Aleksandr Luria (1902-1977) e
Aleksei Leontiev (1904 - 1979), incumbiu-se de construir uma
nova Psicologia fundamentada nos princípios do materialismo
histórico e dialético desenvolvidos por Karl Marx.
A nova Psicologia deveria investigar “como as características
singulares humanas, os processos psicológicos, são produzidos
a partir das relações sociais, isto é, do convívio com outros
indivíduos da espécie humana, capazes de elaborar cultura e fazer
história” (ZANELLA, 2001, p. 74). Este tornou-se o projeto de
vida daqueles jovens pesquisadores.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Vygotsky teve dez anos de trabalho muito intenso em Moscou até
sua morte por tuberculose em 1934, aos 37 anos.
Após sua morte, já no ano de 1936, a publicação de seus livros foi
proibida na U.R.S.S. pelo governo de Stalin, que os acusava de
‘idealistas’. Suas obras foram publicadas no Ocidente somente na
década de 1960.
Para conhecer a teoria histórico-cultural, você percorrerá um
caminho composto de alguns conceitos básicos que estão inter-
relacionados. Os conceitos são:
1. atividade humana;
2. mediação (mediação instrumental, mediação social,
mediação pedagógica)
3. internalização;
4. funções psicológicas superiores; e
5. zona de desenvolvimento proximal.
1. Atividade humanaDe acordo com a perspectiva desenvolvida por Karl Marx,
o trabalho propriamente dito é uma atividade tipicamente
humana. Os outros animais que realizam ações produtivas
semelhantes ao trabalho humano o fazem apenas por
instinto. O ser humano idealiza o objeto que pretende
produzir muito antes de tê-lo concretamente, por meio da
representação mental, planejando o que será executado para
alcançar o objetivo a que se propôs.
Ao vislumbrar o resultado de sua atividade, identifi ca-se
como alguém de valor, reconhecendo algo de si mesmo no
que foi produzido.
Do conceito de trabalho de Marx e de suas implicações para o
desenvolvimento da espécie humana em geral e de cada sujeito
em particular, Vygotsky tomou as características que defi niriam a
atividade humana.
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Psicologia e Educação
Unidade 4
São características da atividade humana:
estar conscientemente direcionada para uma fi nalidade.
Quem trabalha ou entra em atividade produz em si uma
imagem mental do que pretende realizar ou produzir.
utilizar instrumentos mediadores para realizar a
atividade (no próximo item abordaremos o conceito de
instrumentos mediadores).
produzir algo. O produto do trabalho sempre é um
bem material ou simbólico componente da cultura.
Esse produto objetiva o imaginado pelo sujeito. No
processo de produção de bens materiais ou simbólicos
componentes da cultura, o ser humano também produz a
sua própria subjetividade, isto é, o seu jeito de ser.
Além do trabalho, outras atividades podem ser incluídas
nesse conceito: a atividade escolar é uma delas, muito
importante na teoria histórico-cultural, pois Vygotsky e seus
colaboradores responsabilizam o processo de escolarização pelo
desenvolvimento de funções psicológicas superiores avançadas.
A atividade mental do sujeito, a sua consciência, é um refl exo
modifi cado de sua atividade objetiva no mundo. A boa qualidade
das atividades realizadas pelo sujeito é muito importante para que
o funcionamento psicológico nelas desencadeado contribua para
o desenvolvimento global do sujeito. Daí a importância de que
os professores sejam capazes de inserir seus alunos em atividades
bem planejadas no contexto escolar, já que do seu envolvimento
nas atividades coletivas resultará o modo de funcionamento de
seus processos psicológicos.
O que confere qualidade a uma atividade?
As mediações nela utilizadas são um item fundamental. Veja
agora o que se denomina mediação.
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2. Mediação Podemos dizer que toda mediação é um meio para realizar
uma atividade. É algo que ajuda a ter mais efi cácia e rapidez no
processo que culmina com a produção de algo que se idealizou
no princípio da atividade. Existem diferentes tipos de mediação.
Neste item, você conhecerá a mediação instrumental, a social e a
pedagógica, ação para a qual você está se preparando neste curso.
A mediação instrumental é a utilização de instrumentos
mediadores materiais ou simbólicos na atividade humana.
Toda atividade humana acontece com a ajuda de
instrumentos mediadores. Estes auxiliam o sujeito que
realiza a atividade a alcançar o seu objetivo.
Os instrumentos mediadores materiais são aqueles
artefatos que foram produzidos na atividade humana
ao longo da história e que auxiliam os seres humanos em
outras de suas atividades cotidianas.
São exemplos de instrumentos mediadores materiais objetos
como as ferramentas de trabalho, existindo uma para cada
função.
Os assentos, que nos auxiliam em atividades como a de
nos acomodar para ler, assistir às aulas, descansar.
Os óculos, que nos auxiliam a enxergar; entre outros
objetos.
Um lenhador que corta uma árvore precisa de um
machado, de um serrote ou de uma serra elétrica para
chegar ao fi nal da atividade.
Todos esses artefatos são instrumentos mediadores materiais.
Cada artefato que nos auxilia em nossa atividade tem a sua
própria história. Foi produto da atividade de alguém e carrega
um pouco da subjetividade de quem o produziu.
Os instrumentos mediadores simbólicos que auxiliam os seres
humanos em suas atividades são os signos. Eles compõem a
linguagem. As palavras são instrumentos mediadores simbólicos
porque auxiliam no processo de comunicação, facilitando
a interação social. Cada palavra nos remete a um conceito,
científi co ou não, o qual auxilia os sujeitos na atividade de
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interpretação do mundo e de organização dos próprios processos
psicológicos (pensamento, memória, imaginação, entre outros).
É interessante perceber que todo instrumento mediador
material também carrega uma dimensão simbólica, pois tem um
nome e um signifi cado que acabamos por conhecer ao aprender
a utilizá-lo.
Os instrumentos mediadores simbólicos podem ser bastante
simples, como um ícone na porta do banheiro, que
indica se ele é masculino ou feminino, facilitando a sua
utilização de acordo com as normas da cultura.
Os instrumentos mediadores simbólicos também podem
ser bastante complexos, como uma teoria que nos
auxilia a compreender melhor uma situação observada
na realidade escolar. As teorias são mediações simbólicas
para a compreensão da realidade e, por sua vez, são
produtos da atividade de outras pessoas que, muitas vezes,
nem existem mais.
As mediações simbólicas vão sendo apropriadas pelos sujeitos
na medida em que vivenciam atividades coletivas de interação
social, passando do nível interpsicológico ou interpessoal para o
nível intrapsicológico ou intrapessoal. Com isto, vão se tornando
parte do nosso funcionamento mental. Ao estudar o conceito de
internalização, você compreenderá melhor como esse processo
acontece.
A mediação social é a ação na qual um sujeito auxilia outros
sujeitos a se apropriarem dos instrumentos materiais e simbólicos
necessários para alcançar a fi nalidade das atividades que
realizam. Quando acompanhamos e auxiliamos um bebê que
está aprendendo a usar a colher para se alimentar ou uma criança
que está aprendendo a andar de bicicleta, estamos realizando
mediação social.
A mediação pedagógica é um tipo especial de mediação social
sistematizada e intencional que tem por fi nalidade levar o
aprendiz à apropriação dos instrumentos mediadores necessários
para realizar atividades acadêmicas e cotidianas, o que pode
contribuir diretamente para a qualidade de sua formação
humana, profi ssional e intelectual.
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O auxílio que o professor oferece ao aluno para que este se
aproprie dos instrumentos materiais e simbólicos existentes em
sua cultura para a realização das atividades próprias da vida
em sociedade é a mediação pedagógica. Este tipo de mediação
acontece quando o professor ou um colega mais experiente
contribui para que o aluno vá além do que ele já sabe na
realização de uma determinada atividade.
A intervenção do professor no processo de aprendizagem
do aluno deve ocorrer em uma zona de capacidades que
está em desenvolvimento no aluno, denominada zona de
desenvolvimento proximal. Você identifi cará e se apropriará
deste conceito nas próximas páginas. Fique atento!
3. Internalização A internalização é a reconstrução interna de uma operação
realizada externamente na atividade do sujeito. É por meio desse
processo que os sujeitos desenvolvem as funções psicológicas
superiores. Estas possibilitam o estabelecimento de relações
entre objetos e eventos e a formação de conceitos, bem como o
desenvolvimento de modos planejados de conduta.
Em sua obra A formação social da mente, Vygotsky utiliza-se de
um exemplo para explicar o que signifi ca a internalização. Esse
exemplo tornou-se muito famoso. Refere-se ao desenvolvimento
da atividade de apontar o dedo. Um bebê tenta pegar um
determinado objeto, realizando uma atividade externa na qual
ele e o objeto interagem. Um adulto vê que o bebê está tentando
alcançar o objeto e o entrega a ele. Fica estabelecida uma relação
entre a mão estendida do bebê e a ação de pedir ao adulto que
alcance o objeto.
Esta relação se estabeleceu porque o adulto compreendeu o que
o bebê queria, atribuindo um signifi cado para a sua ação de
estender a mão. Quando os outros compreendem a tentativa de
pegar o objeto como um ato de apontar para ele e o alcançam
para o bebê estão atribuindo signifi cado à ação do bebê.
Compreendendo o signifi cado atribuído para a sua ação, o ato
que, anteriormente, era uma tentativa de pegar, torna-se um gesto
de apontar dotado de signifi cado compreensível por outrem.
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Durante as atividades posteriores da criança e entre ela e
o adulto, o ato de apontar irá se tornando cada vez mais
preciso e freqüente. Com isso, o processo interpessoal de
atribuição de signifi cado para a ação do bebê torna-se um
processo interno do bebê, um processo intrapessoal.
A internalização é a transformação de um processo
interpessoal em um processo intrapessoal. Isto não é
imediato, mas é conseqüência de uma série de eventos
ocorridos ao longo do desenvolvimento.
A ação, existindo e sendo transformada, continua em
processo de transformação até a sua completa internalização.
Assim, a internalização das atividades socialmente realizadas
e historicamente desenvolvidas constitui a consciência e é
característica da psicologia humana.
Para a Psicologia histórico-cultural, a aprendizagem ocorre nas atividades desenvolvidas coletivamente e dá-se necessariamente por meio de outras pessoas. Quando a criança imita a forma pela qual o adulto utiliza instrumentos e manipula objetos, ela está dominando o verdadeiro princípio envolvido em uma atividade particular. Compreender uma realidade signifi ca apropriar-se dos signifi cados atribuídos a essa realidade por outras pessoas, confrontando com as próprias interpretações que, por sua vez, são fruto de apropriações anteriores de signifi cados culturalmente produzidos.
4. Funções psicológicas superioresExiste uma vertente de funções psicológicas que aparece
naturalmente no ser humano com o amadurecimento do sistema
nervoso central em condições ambientais favoráveis.
Essas funções costumam estar presentes também em outros
animais e são chamadas de funções psicológicas elementares.
São exemplos delas a atenção involuntária e a inteligência prática.
Com o desenvolvimento do ser humano nas interações sociais,
uma nova vertente de funções se desenvolve. As funções
psicológicas superiores (FPS) são aquelas funções psicológicas
tipicamente humanas, mediadas pela linguagem internalizada
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nas relações interpessoais. São exemplos de FPS a memória e a
atenção voluntárias e a imaginação.
O desenvolvimento das funções psicológicas superiores relaciona-
se ao processo de internalização das mediações características da
cultura. Você viu que esse processo de internalização acontece
nas relações interpsicológicas que acontecem entre as pessoas. Na
medida em que a criança internaliza os signifi cados atribuídos
à realidade pelos outros membros de sua cultura - que servem
como mediação para a sua compreensão do mundo -, amplia a
sua consciência de si e da realidade em que está inserida.
O desenvolvimento das funções psicológicas superiores é
determinado, assim, pelas relações que vão se estabelecendo entre
o pensamento e a linguagem.
A fala como mediação do pensamento e o desenvolvimento das funções psicológicas superiores
A partir de seus estudos, Vygotsky defendeu a idéia de que o
sistema de atividade da criança é determinado, em cada estágio
específi co, tanto por seu grau de desenvolvimento orgânico
quanto por seu grau de domínio no uso de instrumentos materiais
e simbólicos.
Vygotsky lembra os experimentos que Kohler, o psicólogo da
Gestalt, realizou com antropóides para mostrar que o início
da inteligência prática da criança, o “raciocínio técnico”, é
independente da fala, como ocorre com os macacos, que utilizam
instrumentos para resolver tarefas simples, independentemente da
atividade simbólica, bastando que os identifi quem e relacionem
em seu campo de visão.
Ao longo do desenvolvimento da criança, no entanto,
progressivamente, fala e raciocínio prático vão se integrando um
ao outro. As operações de uma criança que sabe falar são menos
impulsivas e espontâneas do que as dos macacos ao resolver
um problema prático. Por meio da fala, a criança planeja como
resolver o problema e só então entra em ação.
Vygotsky atribui à atividade simbólica uma função organizadora
específi ca que invade o processo de uso de instrumentos e produz
formas fundamentalmente novas de comportamento.
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Antes de controlar o próprio comportamento, a criança começa
a controlar o ambiente com a ajuda da fala. Falando, a criança
vai além do que está contido no seu campo visual, desenvolvendo
planos de ação. Assim, a fala torna-se tão importante quanto o
cérebro e as mãos para a resolução de um problema prático. Além
de facilitar a manipulação de objetos, a fala ajuda a controlar o
próprio comportamento da criança, que adquire a possibilidade
de ser tanto sujeito como objeto de sua própria ação.
Você já observou crianças em situação de fala egocêntrica?
A fala egocêntrica aparece quando as crianças do terceiro
ano de vida em diante falam em voz alta, mas não se
encontram conversando com ninguém, exceto consigo mesmas.
Acompanham a atividade de desenhar por falas do tipo: “Estou
desenhando o sol. Essas são as nuvens. Agora vou fazer uma
casa...”
A fala se desloca associada à ação da criança: no início, ocorre
durante a execução da tarefa, de forma dispersa e caótica,
passando, pouco a pouco, a preceder a ação. Assim, as palavras
podem moldar uma atividade e mesmo modifi car a estrutura
desta atividade quando as crianças adquirem o domínio da
linguagem e de sua função planejadora.
A fala egocêntrica deve ser vista como forma de transição entre a
fala exterior, que aparece nas relações das crianças com as outras
pessoas, e a fala interior, mediadora dos processos psicológicos
– aquela fala que organiza nossos pensamentos e que só nós
mesmos podemos “escutar”.
Na medida em que a fala utilizada nas relações com as outras
pessoas vai se tornando uma fala que permite à criança
relacionar-se consigo mesma, vão se desenvolvendo os processos
metacognitivos.
A metacognição é a capacidade de regular o próprio funcionamento psicológico e a própria atividade por meio da fala interior. Esta capacidade é fundamental para a resolução de problemas complexos.
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A qualidade do desenvolvimento da metacognição depende
da qualidade das relações estabelecidas entre as crianças e os
demais sujeitos que as cercam. Os processos metacognitivos
permitem que você perceba o quanto está aprendendo, perceba
se compreendeu ou não o conteúdo de uma frase lida no texto,
auxiliando você a retornar aos pontos que não fi caram claros na
leitura.
A metacognição permite que você redirecione a sua atividade
quando percebe que os resultados que está obtendo estão aquém
do planejado, criando novos meios para alcançar os fi ns a que se
propõe.
5. A zona de desenvolvimento proximal
Para conhecer o processo de desenvolvimento humano, o que é mais importante?
É saber o que já está desenvolvido no sujeito, podendo ser prontamente observado em suas ações? Ou é saber o que ainda está em desenvolvimento e poderá ser consolidado se houver mediação social?
Uma das contribuições mais signifi cativas de Vygotsky para
a educação está relacionada a essas questões e diz respeito ao
conceito de zona de desenvolvimento proximal.
Para compreender o signifi cado deste conceito, é importante
conhecer outros dois : o de nível de desenvolvimento real e o de
nível de desenvolvimento potencial.
O nível de desenvolvimento real corresponde à medida
proposta por Vygotsky para verifi car as capacidades que já estão
plenamente desenvolvidas na pessoa. Nesse nível estão todos
aqueles conhecimentos, capacidades e habilidades que o sujeito já
desenvolveu e é capaz de realizar sozinho, sem ajuda.
O nível de desenvolvimento potencial é a medida
correspondente ao máximo que a pessoa está conseguindo
realizar em um determinado campo de atividade contando com
a ajuda de outras pessoas. Você pode fi car surpreso ao observar
o quanto um sujeito pode ir além do que realiza sozinho quando
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encontra cooperação. Não é à toa que existem certos ditos
populares como “A união faz a força” ou “Duas cabeças pensam
melhor do que uma”.
A zona de desenvolvimento proximal corresponde a todas aquelas capacidades que ainda estão em desenvolvimento no sujeito e aparecem na sua atividade somente quando o sujeito conta com a ajuda de alguém.
Quando o sujeito está sozinho e não conta com nenhum tipo
de auxílio, ainda encontra difi culdade em demonstrar esse
aprendizado, que não está completamente consolidado. Assim,
a zona de desenvolvimento proximal contém as capacidades que
vão além do nível de desenvolvimento real, sendo que o seu limite
é demarcado pelo nível de desenvolvimento potencial.
A zona de desenvolvimento proximal é dinâmica, está sempre em movimento. O que é potencial hoje pode tornar-se real amanhã. Tudo depende da qualidade das mediações encontradas pelo sujeito na realização da atividade.
A mediação pedagógica acontece nas capacidades que se
encontram na zona de desenvolvimento proximal. São essas as
capacidades ainda em desenvolvimento que o professor deve
auxiliar o aluno a consolidar.
Para isso, vale ensinar fórmulas e conceitos com os quais o
aluno poderá contar para realizar atividades cujo sentido tem
claro. Vale também chamar a atenção do aluno para os aspectos
signifi cativos do problema em questão a serem levados em
consideração no processo de resolução, aspectos importantes que,
sozinho, o sujeito ainda não consegue perceber. A internalização
dos signifi cados atribuídos pelo professor aos aspectos envolvidos
na atividade é que levará ao desenvolvimento do aluno.
O jogo no processo de desenvolvimento
Em suas pesquisas, Vygotsky observou
a importância das atividades lúdicas
para o desenvolvimento. O pesquisador
percebeu que essas atividades, além de
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dar prazer, cumprem uma função signifi cativa no processo
de desenvolvimento, pois costumam ampliar a zona de
desenvolvimento proximal de quem as realiza. Na atividade
lúdica, os sujeitos envolvidos vivenciam as interações sociais
de uma forma diferente do modo como podem vivenciá-las na
realidade.
A brincadeira de “faz-de-conta” na qual se envolvem as crianças
é um exemplo disso. Ao desempenhar papéis sociais diferentes
dos que desempenham na vida real, as crianças vão tomando
consciência de aspectos da realidade social que, de outra forma,
lhes passariam despercebidos.
É o caso de duas crianças que brincam de boneca, o “papai” e a
“mamãe”, e se vêem premidos a debater questões complexas como
o modo para conciliar o trabalho com a criação dos fi lhos ao
precisarem decidir, na brincadeira, quem sairá para trabalhar e
quem cuidará da boneca, que representa um bebê. Observe que,
nesta brincadeira, entra em questão até mesmo a divisão sexual
do trabalho!
Fig. 4.1 – O desenvolvimento do pensamento matemáticoFonte: Extraída do site: <http://ouri.ccems.pt/jogo/ouri.htm>
Adolescentes, jovens e adultos também se envolvem em atividades
lúdicas. Os esportes e a arte são exemplos dessas atividades
nas quais é possível viver interações que não são diretamente
identifi cadas, mas existem na realidade.
Participando de atividades como jogos de equipe ou grupos
musicais, participando do processo de produção de obras de arte
ou discutindo com os colegas as suas diferentes interpretações, os
sujeitos podem viver situações de interação interpessoal aliadas ao
conhecimento enriquecedor do processo de desenvolvimento.
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É interessante perceber, no entanto, que as atividades
profi ssionais e as discussões políticas e ideológicas são outras
atividades que absorvem adultos tanto quanto a brincadeira pode
absorver uma criança. Trazer tais atividades para o contexto
escolar é promover o desenvolvimento humano.
O processo de formação de conceitos e a escolarizaçãoConceito é o nome dado à generalização que é feita por meio
da palavra. A palavra cadeira, por exemplo, não alude apenas a
uma cadeira específi ca, mas diz respeito às cadeiras em geral, que
existem, existiram e existirão na realidade ou na imaginação. O
conceito corresponde à reunião das características relevantes e
defi nidoras de objetos ou situações.
Estas características foram selecionadas pelos grupos culturais
no processo histórico para a separação das coisas em categorias
e para a defi nição das relações existentes entre elas. Uma das
tarefas da criança consiste em apropriar-se desses conceitos.
Para isto, precisa desenvolver ações intelectuais adequadas a essa
tarefa.
O processo de formação de conceitos envolve uma intensa
atividade mental, integrando processos psicológicos superiores
como a atenção, a memória e o pensamento, exigindo a realização
de operações como a comparação e a diferenciação, a abstração e
a generalização e a análise e a síntese.
Os conceitos espontâneos ou não-científi cos são aqueles que
se desenvolvem nas interações sociais não-sistematizadas que
ocorrem no cotidiano da criança. O desenvolvimento dos
conceitos científi cos, por sua vez, depende de processos de
transmissão organizada do conhecimento que, geralmente,
ocorrem na escola.
No processo de aquisição de conceitos científi cos, a criança
vai desenvolvendo a capacidade de pensar sobre o modo de
funcionamento de seus próprios processos psicológicos e ações
intelectuais. A capacidade de pensar sobre os próprios processos
cognitivos, como você já viu anteriormente, é chamada de
metacognição. O fato de tomarmos consciência das operações
intelectuais que realizamos nos torna capazes de controlá-las
deliberadamente.
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É interessante que você perceba que a aprendizagem de
conceitos científi cos contribui para a reorganização dos conceitos
espontâneos desenvolvidos pelo sujeito nas interações sociais
para lidar com a realidade. Enquanto os conceitos espontâneos
tornam-se mais complexos e organizados, os científi cos, por sua
vez, na medida em que vão sendo internalizados pelo sujeito
e relacionados com os conhecimentos que este já possui e
com suas realidades de aplicação, vão se tornando mais e mais
“espontâneos” e automáticos.
Ao estudar o papel da escolarização no desenvolvimento
psicológico, Vygotsky (2000) mostra que a atenção da criança,
que antes da escolarização costumava ser predominantemente
involuntária, vai sendo complementada pela atenção
voluntária e dependendo cada vez mais do pensamento. A
memória mecânica, associada ao ato de decorar, vai sendo
complementada pela memória lógica, orientada pelo
signifi cado do que é memorizado. Você pode perceber,
assim, que a criança passa por importantes mudanças em seus
processos psicológicos superiores na escola.
De acordo com Vygotsky, passar pelo sistema escolar faz
com que o indivíduo classifi que, conceitue e compreenda
o mundo de modo diferente, porque aprende a lidar com
conceitos teóricos, que permitem formas de generalização
mais complexas e independentes da experiência prática
e direta da realidade. Tal afi rmação está pautada por sua
compreensão do papel da cultura no desenvolvimento do
psiquismo: a cultura origina formas especiais de conduta,
modifi ca a atividade das funções psíquicas, edifi ca
novos níveis no sistema do comportamento humano em
desenvolvimento. (CARVALHO, 2002)
Com base nisto, é possível dividir os processos psicológicos
superiores em rudimentares e avançados. Os processos
psicológicos superiores rudimentares são aqueles desenvolvidos
durante a formação de conceitos espontâneos na atividade
cotidiana. Os processos psicológicos superiores avançados, no
entanto, costumam desenvolver-se somente com a passagem do
sujeito por processos de ensino-aprendizagem sistematizados.
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A contribuição de Vygotsky para a compreensão da educação de sujeitos portadores de defi ciênciaVygotsky distingue dois tipos de defi ciência: primária e
secundária.
A defi ciência primária é aquela de ordem biológica. Diz respeito
às lesões propriamente ditas sobre as quais se constrói a relação
com o portador de defi ciência, isto é, as suas características
físicas.
A defi ciência secundária está localizada nas interações sociais
que o sujeito portador de defi ciência tem a oportunidade de
estabelecer com os outros sujeitos. Garcia (1999, p. 43), estudiosa
desta questão em Vygotsky, aponta que, para o autor:
a forma como o sujeito que apresenta uma lesão
orgânica ou uma alteração cromossômica desenvolve-
se está intimamente relacionada ao modo como vive,
às interações sociais com as quais está envolvido (...). A
defi ciência primária converte-se em secundária em certas
condições sociais.
Que condições sociais seriam essas? Segundo Vygotsky, a
criança que tem o seu desenvolvimento complicado por uma
lesão física não se desenvolve menos ou mais do que uma criança
que não a tem, mas sim desenvolve-se de um modo diferente.
Seu desenvolvimento estará comprometido tão somente se as
interações sociais que com ela são estabelecidas levarem a esta
situação.
Assim como o corpo compensa suas próprias lesões
desenvolvendo outras características que, em outras
condições, não se desenvolveriam e dão mobilidade ao
portador de defi ciência, a sociedade também deve criar
meios de compensação social. Compensação social,
neste sentido, consiste em “criar condições e estabelecer
interações que possibilitem aos sujeitos considerados
portadores de defi ciência apropriarem-se da cultura” (GARCIA,
p. 45).
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Embora os diversos tipos de defi ciências sejam também
circunstâncias biológicas, a educação deve estar voltada para
as suas conseqüências sociais. Se acreditarmos que os sujeitos
portadores de defi ciência devem acessar um ensino por demais
simplifi cado e carente de abstrações, diferente do oferecido
aos sujeitos ditos normais, estaremos contribuindo para o
desenvolvimento da chamada defi ciência secundária. Ainda
que o ensino necessite de algumas adaptações de acordo com
o tipo de defi ciência primária apresentada pelos sujeitos, como
o oferecimento de material didático ampliado para alunos
com baixa visão, por exemplo, tais sujeitos podem e devem ter
acesso à mesma qualidade nas interações promotoras de seu
desenvolvimento.
Implicações educacionaisVygotsky morreu jovem e seus escritos não deixaram muitas
informações sobre o modo como realizou suas pesquisas. Como
você leu em sua biografi a, o Ocidente conheceu a obra de
Vygotsky somente a partir dos anos 1960. Sendo assim, a teoria
histórico-cultural apresenta potencial para fundamentar uma
ampla gama de investigações de uma diversidade de situações
ainda inexploradas. Como esta teoria concebe a educação como
parte integrante do processo de desenvolvimento humano,
o contexto educacional é privilegiado pelas pesquisas nela
fundamentadas.
Relacionar a investigação científi ca diretamente com o contexto
escolar é uma prática carregada de difi culdades e contradições.
Ainda assim, nesta seção, procuramos a todo momento destacar
os aspectos conceituais de signifi cado pedagógico presentes na
teoria histórico-cultural.
Neste fi nal de seção, que tal retomarmos algumas destas contribuições, apenas para sistematizá-las?
Vamos destacar, então, três contribuições fundamentais da teoria
histórico-cultural para a educação, que estão inter-relacionadas.
A importância da mediação social e da mediação pedagógica
para que ocorra o processo de internalização das mediações
culturais, o que signifi ca que o sujeito não constrói nenhum tipo
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de conhecimento sozinho, mas sempre necessita se apropriar dos
signifi cados atribuídos aos objetos de conhecimento pelo seu
grupo cultural para se desenvolver.
A precedência da aprendizagem em relação ao
desenvolvimento das funções psicológicas superiores,
o que signifi ca que o processo de ensino não necessita
aguardar a conclusão de etapas de desenvolvimento
para ocorrer, pois não é posterior a este, mas sim seu
promotor.
A relevância da intervenção do professor mediador na
zona de desenvolvimento proximal do aluno, o que
signifi ca que retomar ou treinar operações já conhecidas
não amplia as perspectivas de desenvolvimento tanto
quanto levar o aluno a trabalhar com conceitos que ainda
não domina completamente.
Se as idéias de Vygotsky fi zeram sentido para você, estudar a
próxima seção ampliará o seu entendimento do signifi cado da
visão contextualista-interacionista do desenvolvimento, pois
nela trataremos de outra teoria que toma por base o pensamento
de Karl Marx: a teoria do desenvolvimento criada pelo médico
francês Henri Wallon.
SEÇÃO 2 – A teoria da emoção de Henri Wallon
Henri Wallon se diferenciou dos pesquisadores de seu tempo
pela atenção explícita que deu à emoção e ao movimento corporal
ao elaborar sua concepção de desenvolvimento psicológico. Sua
teoria, voltada para a compreensão da pessoa completa, parte de
princípios do materialismo histórico dialético para afi rmar que
a contradição leva à transformação.
A contradição explica as mudanças que ocorrem nos seres
humanos em seu processo de desenvolvimento: entre afetividade e
racionalidade, entre orgânico e social, entre o eu e os outros. Em
sua teoria, Wallon mostra como, em um processo descontínuo
marcado por crises, a pessoa vai se construindo na relação com
os outros e consigo mesma. Para iniciar o estudo das idéias de
Para conhecer um pouco mais sobre o materialismo histórico Dialético você poderá ler, entre tantos textos disponíveis na internet, o de autoria de Marília Freitas de Campos Pires, intitulado O materialismo histórico e dialético e a educação, disponível no site: <www.interface.org.br/revista1/ensaio5.pdf>
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Wallon, vamos conhecer alguns princípios que regem a sua
concepção de desenvolvimento humano: os princípios funcionais.
Henri Wallon nasceu em 1879 em Paris, França. De 1899 a 1902, freqüentou a Escola Normal
Superior, em sua cidade de nascimento, onde formou-se em Filosofi a. Desde essa época já se interessava por questões psicológicas. Realizou estudos em medicina e trabalhou em hospitais de 1908 a 1931, parando somente durante a
Primeira Guerra, quando foi mobilizado como médico do exército francês. A partir
de 1920, concomitantemente ao seu trabalho como médico, já ministrava conferências sobre
Psicologia da Criança na Sorbonne, importante universidade francesa. Em 1925, defendeu sua tese de doutorado e criou o Laboratório de Psicobiologia da Criança, em atividade até os dias atuais. Foi presidente das Sociedades Francesas de Psicologia e de Pedagogia, sendo simpatizante do movimento escolanovista. De 1937 a 1949, foi professor de Psicologia e Educação da Criança no College de France, instituição de estudos avançados. Participou ativamente do movimento de resistência francês à ocupação alemã na Segunda Guerra Mundial. Ao fi nal desta, passou a ocupar cargos políticos na França, tendo apresentado à Assembléia Nacional daquele país um projeto inovador de reforma do ensino baseado em seus estudos. Morreu em 1962.
Os princípios funcionaisWallon desenvolveu alguns princípios dos quais parte para
explicar a evolução psicológica da criança. Esses princípios são: a
predominância, a alternância e a integração funcional.
O princípio da predominância funcional indica que certos
estágios do desenvolvimento são predominantemente afetivos e
subjetivos. São estágios de acúmulo de energia e de preparação
interna para o estágio subseqüente. Outros estágios são
predominantemente de busca de conhecimento sobre o mundo,
são cognitivos. Logo, são mais objetivos e estão ligados ao
dispêndio da energia interior acumulada no estágio precedente.
Assim, a cada estágio, há a predominância de um campo
funcional, que se evidencia mais do que os outros: o campo da
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Psicologia e Educação
Unidade 4
emoção, o campo da cognição, o campo do corpo ou o campo da
pessoa.
O princípio da alternância funcional pressupõe que a cada novo
estágio vivido pela criança modifi ca-se o seu foco de interesse,
retomando-se o foco que havia sido deixado de lado no estágio
anterior. As atividades preponderantes em cada fase se
orientam ou para o eu; ou para o mundo; ou para as
pessoas; ou para os objetos, alternando-se de estágio para
estágio do desenvolvimento.
Ao longo do seu desenvolvimento, a pessoa pode
estar mais voltada para o seu mundo interno e para
crises a este relacionadas, como é o caso do estágio
da adolescência, por exemplo, ou, por outro lado, pode
voltar-se mais para o seu mundo externo e para as contradições
nele presentes, como ocorre nos estágios em que predomina o
desenvolvimento cognitivo, como o estágio sensório-motor e
projetivo, correspondente ao segundo ano de vida, e o estágio
categorial, que corresponde ao período vivido nos anos escolares
das séries iniciais do ensino fundamental.
O princípio da integração funcional signifi ca que cada
nova atividade desenvolvida em um novo estágio incorpora a
atividade desenvolvida no estágio anterior, em um processo
de integração e de diferenciação semelhante ao que ocorre no
amadurecimento do sistema nervoso, quando cada função nova
não elimina a função desenvolvida anteriormente, mas a submete
ao seu funcionamento, integrando-a e tornando-a parte de um
funcionamento mais complexo.
A integração funcional não é imediata e nem defi nitiva. Uma
função nova pode ser exercida de modo desintegrado por algum
tempo, repetindo-se sem um sentido claro na atividade do sujeito.
Como exemplo, podemos citar o bebê que aprende a fi car em pé.
Ele pode segurar-se na parede para se levantar apenas para, no
momento seguinte, cair sentado novamente. Faz isto repetidas
vezes e a atividade, nesse momento do desenvolvimento, tem um
fi m em si mesma, estando desintegrada do funcionamento global
da criança e desorientada em relação a qualquer objetivo evidente.
Em um estágio posterior, a atividade de se levantar e fi car em pé
fará parte de comportamentos mais complexos e orientados para
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objetivos mais defi nidos, como caminhar até outro ambiente ao
encontro de um adulto, por exemplo.
Por outro lado, depois de ocorrida a integração funcional, podem
ocorrer desintegrações provisórias. Isto explica os freqüentes
retrocessos que marcam o desenvolvimento na perspectiva
dialética defendida por Wallon. Ainda que já tenhamos
desenvolvido modos de agir mais complexos, pode ocorrer de
nos apresentarmos com ações próprias de momentos anteriores
de nosso processo evolutivo, principalmente quando enfrentamos
situações de estresse.
Os campos funcionaisEm busca da psicogênese da pessoa completa, Henri Wallon
estuda o ser humano em, pelo menos, quatro campos funcionais
que se misturam e participam da produção uns dos outros.
1) O campo funcional da emoção
Longe de signifi car somente perturbação, as emoções
são reações organizadas comandadas pelo sistema
nervoso e com utilidade específi ca. Para Wallon, a
emoção é uma possibilidade natural desenvolvida pela
espécie humana para auxiliar na sobrevivência desde
o nascimento. Os bebês necessitam da assistência dos
adultos para atender às suas necessidades e prover a sua
existência. A expressão da emoção no corpo é defi nida
por Wallon como uma pré-linguagem que possibilita a
comunicação entre o bebê e os seus ‘cuidadores’ desde
o nascimento. A expressão da emoção, principalmente
por meio do choro, mobiliza os adultos para o cuidado e
a proximidade com o bebê.
A emoção se expressa no tônus muscular e nos movimentos do
nosso corpo. As sensações corporais, por sua vez, podem acalmar
ou infl amar as emoções. Isto signifi ca que emoção e movimento
estão intimamente relacionados. A mediação dos outros também
é fundamental para as transformações que ocorrem no modo
como as pessoas expressam suas emoções. Podemos dizer que
as reações das pessoas à expressão da emoção lhe dá forma,
equalizando-a.
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Psicologia e Educação
Unidade 4
Você sabia que emoções e sentimentos não são a mesma coisa?
A emoção tende a se expressar mais diretamente no corpo
(suar frio, sentir o coração bater mais forte, fi car com a boca
seca, encolher os ombros) e de modo mais impulsivo do que os
sentimentos. Estes são mais duradouros. Expressam-se de modo
mais controlado e tranqüilo e estão ligados às aprendizagens que
ocorrem desde o nascimento nas relações sociais.
2) O campo funcional do corpo
Você já compreendeu que a motricidade está ligada à
expressão de emoções. É importante saber ainda que o
movimento dá origem também à capacidade de conhecer o
mundo: a cognição. Inicialmente, conhecemos os objetos que
nos cercam apalpando-os, levando-os à boca, deslocando-
nos em torno deles. Posteriormente, passamos a buscar
representar as situações que vivemos e os objetos que nos
cercam, assim como seus atributos, com a ajuda do corpo,
por meio dos gestos e da imitação.
Observe como as crianças, por volta do segundo e
do terceiro ano de vida, fazem suas narrativas ou canções
serem acompanhadas por gestos amplos que as ajudam a
expressar as características dos objetos citados substituindo,
geralmente, palavras por movimentos: o elefante caminha
assim... e é grande assim, ó! A expressão das idéias com o corpo
é denominada projeção, a qual torna possível a internalização
das representações, contribuindo, assim, para a organização do
pensamento.
O pensamento nos permite estudar os passos que daremos
para realizar uma tarefa. Sua origem está nos movimentos que
realmente foram dados nos estágios iniciais do desenvolvimento
para alcançar certos objetivos. Estes movimentos foram
internalizados e tornaram-se representações, permitindo a
previsão das etapas do movimento sem que seja necessária a sua
execução.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Assim, a criança torna-se capaz, por exemplo, de imaginar o
conteúdo de um desenho antes de iniciá-lo, fazendo com que a
cognição comande os seus movimentos para alcançar o resultado
esperado, quando antes movimentava intensamente os lápis no
papel e só depois atribuía um signifi cado ao produzido.
Os músculos do corpo apresentam uma função cinética e
uma função tônica. A cinética diz respeito ao movimento,
ao deslocamento do corpo no espaço. A tônica relaciona-se à
postura, à tensão e ao relaxamento dos músculos. Da mesma
forma que a expressão da emoção se transforma de acordo
com o signifi cado a ela atribuído pelos outros, o modo como
nos movimentamos tem relação com as nossas interações com
as outras pessoas. Os movimentos do corpo se tornam mais
retraídos ou mais expansivos, por exemplo, de acordo com o
modo como as pessoas os interpretam, controlam, incitam,
valorizam, desaprovam, entre outras reações.
3) O campo funcional da cognição
Você já sabe que o pensamento tem sua origem nos movimentos
do corpo. A internalização das ações sobre os objetos permite
o desenvolvimento das representações mentais, as quais. são
imagens internas que desenvolvemos para as coisas do mundo a
partir da interação com elas. Na medida em que internalizamos
as características dos objetos, vamos aprendendo a dividi-los em
categorias.
Organizar o mundo que nos cerca em categorias ou conceitos
é o grande desafi o enfrentado pela capacidade de conhecer.
Categorias são grupos nos quais podemos incluir as coisas
do mundo ou as idéias existentes sobre essas coisas. Cada
grupo de coisas tem um nome específi co que se expressa em
uma palavra. Quanto melhor utilizamos as palavras, melhor
damos conta de separar adequadamente as coisas do mundo
nos grupos a que pertencem, o que torna mais fácil operar
sobre elas com o pensamento, defi nindo-as e explicando-as.
Wallon observou em suas pesquisas que as crianças entre três
e sete anos apresentam modos particulares de lidar com as
categorias que, aos olhos de um adulto, podem parecer bastante
confusas. O pensamento da criança nessa fase foi denominado
por Wallon de sincrético. A palavra sincretismo se relaciona à
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Unidade 4
mistura de dois elementos diferentes em um só, formando um
amalgamado indissociável. O pensamento da criança, na fase do
sincretismo, costuma formar pseudo-categorias.
Exemplo: A origem do pensamento na criança
4) O campo funcional da pessoa e os grupos
Para Wallon, a pessoa completa integra os três campos funcionais
citados até aqui, sendo, ela própria, um campo funcional pleno
de contradições. Os grupos também podem ser entendidos como
campos funcionais. Assim, quando duas pessoas interagem,
diversos campos funcionais estão em jogo.
Os estágios do desenvolvimento segundo Henri WallonO desenvolvimento é entendido por Wallon como processo de
mudanças resultantes de confl itos: confl ito entre o corpo e a
sociedade, entre a emoção e a razão, entre a emoção e o corpo,
entre a razão e a sociedade. Os confl itos pelos quais passamos
para nos tornarmos quem somos se expressam mais visivelmente
em momentos críticos do desenvolvimento, descritos por Wallon
em estágios. São eles:
I. estágio impulsivo-emocional.
II. estágio sensório-motor e projetivo.
III. estágio do personalismo.
IV. estágio categorial.
V. estágio da adolescência.
I. Estágio impulsivo-emocional - primeiro ano de vida
Este primeiro estágio é entendido como predominantemente
afetivo. O bebê está mais orientado para relacionar-se com as
pessoas do que para interagir com o mundo físico. A tarefa
evolutiva do bebê nesta fase é conhecer os limites do seu próprio
corpo, diferenciando-o do corpo das outras pessoas.
O bebê se comunica afetivamente com os adultos por meio
do choro, do balbuciar, do movimento e da rigidez ou
relaxamento do tônus muscular. Os movimentos das pernas e
dos braços principiam sem objetivos defi nidos, desorientados
e descoordenados, expressando impulsivamente e sem controle
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as sensações e a emoção do bebê. A reação dos adultos a essas
expressões se tornará parte do modo particular como cada bebê
expressa as diversas sensações que experimenta em seus primeiros
meses de vida: dor, saciedade, sono, desconforto, bem-estar, entre
outras.
II. Estágio sensório-motor e projetivo – segundo e terceiro anos de vida
Enquanto que para Piaget o período sensório-motor corresponde
aos dois primeiros anos de vida, para Wallon, este se inicia
somente ao fi nal do primeiro ano, com os primeiros passos do
bebê.
Durante o estágio anterior, ocorreram importantes
conquistas no estabelecimento de vínculos entre o bebê
e seus cuidadores. Neste estágio, o foco está no campo
funcional cognitivo. Ao fi nal do primeiro ano, com a
aquisição da preensão e da marcha, a criança encontra-se
capacitada para a exploração direta da realidade material.
Para isto, experimenta os objetos de seu entorno,
empurrando-os, jogando-os, puxando-os, arrastando-os
e observando os resultados de suas experiências. A estes
movimentos, Wallon deu o nome de praxias. Futuramente, cada
um desses movimentos virá a compor comportamentos mais
complexos e dotados de intencionalidade, mas, por ora, é a sua
repetição que caracteriza a atividade do bebê.
Ao fi nal do segundo ano de vida, o bebê demonstra estar
desenvolvendo a capacidade de representação mental, mas ainda
utiliza muito o seu próprio corpo como apoio para expressar-se
e para atribuir signifi cado aos objetos e situações com os quais
toma contato. Aparecem, então, os gestos e a imitação como
recurso representacional.
O ato mental passa a projetar-se nos atos motores, como forma
de auxiliar a exteriorização do pensamento e a internalização da
linguagem.
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Unidade 4
III. Estágio do personalismo – dos três aos seis anos de idade
Tendo sido o estágio anterior predominantemente cognitivo,
seguindo o princípio da alternância funcional, neste estágio, a
criança volta-se novamente para si mesma e para as suas relações
afetivas com as outras pessoas.
Você leu que no estágio impulsivo-emocional uma das tarefas de
desenvolvimento estava na construção da noção de independência
do próprio corpo em relação aos outros corpos.
Esta noção permitiu à criança experimentar
movimentos que a levaram a explorar o mundo
circundante no estágio sensório-motor e projetivo.
No estágio do personalismo, o desafi o da criança
não é mais apenas o de identifi car-se como corpo
separado dos outros corpos, cujos movimentos
podem ser controlados. A tarefa evolutiva do
estágio do personalismo é a de identifi car-se como
pessoa, como eu psicológico independente. Para
isto, a criança passa a experimentar seus próprios limites nas
relações com os demais.
Inicialmente, são percebidas mudanças de comportamento como
a utilização freqüente dos pronomes “eu” e “meu”. Pouco antes,
ao referir-se a si mesma, a criança ainda utilizava somente o seu
próprio nome, o que dava impressão de estar se referindo a uma
terceira pessoa: “Marina quer bolo”. Aparecem também atitudes
de “teimosia” e de negação: “Não quero!”. Estes comportamentos
demonstram a busca por auto-afi rmação.
Nos anos seguintes, vão aparecendo ainda os comportamentos de
imitação e de sedução. A criança procura incessantemente imitar
as pessoas que admira, como se pudesse tomar um pouco delas
para si. Busca, ainda, atrair a admiração das pessoas que a cercam
apresentando o que aprende a fazer. Desta forma, por meio do
confl ito com os demais e da incorporação das características
admiradas, a criança vai se construindo como indivíduo
independente, em um movimento dialético.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
IV. Estágio categorial – dos sete aos onze anos de idade, aproximadamente
Novamente, neste estágio, o foco de interesse da criança se
volta para o conhecimento do mundo. Anteriormente, esse
conhecimento foi prático, na exploração direta do ambiente e, em
seguida, simbólico, com a utilização dos gestos e a imitação das
características de situações e de objetos.
Neste estágio, a tarefa da criança é tornar-se capaz de
defi nir e de explicar as coisas do mundo, categorizando-as
e estabelecendo relações entre elas. Antes de desenvolver o
pensamento categorial propriamente dito, você aprendeu que
podemos identifi car na criança o pensamento sincrético.
Você estudou as características do pensamento sincrético
nas páginas anteriores, quando leu sobre o campo funcional
da cognição. O desenvolvimento do pensamento categorial
promoverá um salto qualitativo na relação da criança com
o conhecimento e permitirá que esta esteja preparada para
enfrentar os desafi os próprios da adolescência.
V. Estágio da adolescência
Neste estágio, a emoção fi ca “à fl or da pele” e os movimentos do
corpo tendem a ser excessivamente expansivos ou retraídos. As
crises típicas do estágio do personalismo são retomadas, mas as
conquistas obtidas ao longo do estágio categorial fazem com que
o adolescente possa ir muito mais longe na atividade de se auto-
afi rmar em relação aos outros.
Agora, o adolescente é capaz de se afi liar a certos grupos
ideológicos, a partidos políticos, a movimentos sociais ou
culturais, pois pode compreender e admirar, por vezes
ardorosamente, o que é defendido por tais grupos. É
capaz também de se manifestar contra as idéias de outros
grupos e tende a fazê-lo com radicalismo. Você pode
perceber, ainda, que o adolescente procura assemelhar-se
aos membros dos novos grupos a que se afi lia, à turma de amigos
e, geralmente, entra em confl ito de idéias com os pais. Tudo isto
mostra que o indivíduo está buscando posicionar-se em relação à
sociedade e encontrar nela um lugar para si.
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Psicologia e Educação
Unidade 4
Relações entre a Psicologia de Henri Wallon e a educação
Para Wallon, o papel do professor não se restringe a acompanhar
as etapas de desenvolvimento do raciocínio da criança, como
sugere a teoria piagetiana. Ao contrário, o professor interfere em
todos os aspectos do processo de desenvolvimento por meio da
aprendizagem proporcionada à criança nas relações que estabelece
com ela.
Na realização de seu trabalho, de acordo com Wallon, o professor deve estar atento a dois aspectos:
1. as disposições da criança, dependentes da idade e do seu temperamento individual, e
2. as aptidões exigidas e exercidas pelos conteúdos de cada disciplina, pois é a partir das características desses conteúdos que o professor poderá investigar e defi nir os melhores meios para torná-los assimiláveis pelas crianças.
Wallon deu especial atenção à formação docente. Para ele, a
formação de professores deve estar relacionada às experiências
vividas por eles em seu contexto de atuação e “o ponto de partida
da investigação psicológica deve ser a ação dos professores, suas
facilidades, difi culdades e necessidades no processo de ensinar”.
Nesta perspectiva teórica, a ênfase da investigação
sobre a criança é colocada no exame da realidade e
não em princípios teóricos abstratos que a expliquem
desvinculada do seu meio ou que tratem dos conteúdos
específi cos de cada disciplina como capazes de, pela
sua própria natureza, desenvolver habilidades mentais.
(GALVÃO, 2001)
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Universidade do Sul de Santa Catarina
SínteseNesta unidade, você conheceu três importantes teorias
psicogenéticas do desenvolvimento humano e suas implicações
para a compreensão da aprendizagem na realidade escolar.
Você viu que a teoria de Jean Piaget considera o processo de
equilibração, que ocorre em função da tendência inata do ser
humano para a busca de adaptação ao meio, o principal fator
responsável pelo desenvolvimento humano.
Ao buscar equilíbrio em sua relação com o meio, o sujeito
constrói esquemas que ampliam e reorganizam a sua estrutura
cognitiva, tornando a sua ação no mundo mais qualifi cada e
complexa.
Nesta perspectiva, certos esquemas conceituais necessitam
ter sido desenvolvidos previamente para que o sujeito possa
assimilar grande parte dos conteúdos escolares. Além disso, o
desenvolvimento cognitivo é entendido como condição para que
ocorra a socialização.
Você estudou também a teoria histórico-cultural de
Vygotsky, na qual toda forma de conhecimento só pode ser
construída contando com a mediação social, e os conceitos são
compreendidos como mediações simbólicas para a interpretação e
intervenção sobre a realidade na atividade humana.
Neste estudo, você viu que a mediação do professor, dos colegas
e de outros sujeitos na zona de desenvolvimento proximal do
aluno é responsável pelas transformações que ocorrem em seu
funcionamento mental nos anos de escolarização.
Por fi m, ao conhecer a teoria de Henri Wallon, você se apropriou
de uma outra abordagem para os estágios de desenvolvimento
humano diferente da proposta por Jean Piaget e que enfatiza
as contradições e as relações entre o corpo e a mente, entre a
emoção, o movimento e a cognição, nas relações sociais nas quais
se constitui a pessoa completa.
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Psicologia e Educação
Unidade 4
Atividades de auto-avaliação
1 - Identifi que a alternativa que apresenta os estágios do desenvolvimento nos quais o campo funcional da cognição predomina em relação aos demais campos funcionais.
(a) Estágio impulsivo-emocional e estágio do personalismo
(b) Estágio sensório-motor e projetivo e estágio categorial
(c) Estágio do personalismo e estágio da adolescência
(d) Estágio categorial e estágio da adolescência
(e) Estágio sensório-motor e projetivo e estágio do personalismo
2 - Sistematize os princípios básicos e as principais implicações pedagógicas das teorias estudadas na unidade e preencha o quadro a seguir.
TEORIAS PRINCÍPIOS BÁSICOS IMPLICAÇÕES PEDAGÓGICAS
A teoria histórico-cultural de L. S. Vygotsky
A teoria da emoção de Henri Wallon
Saiba mais
Para saber mais sobre as teorias estudadas nesta unidade, é
interessante que você leia os livros que indicamos a seguir. A
relação das obras é longa, mas os textos de cada uma delas são
compactos e de fácil leitura, escritos especialmente para leitores
iniciantes. Você os encontrará na biblioteca da Universidade, mas
também poderá comprá-los por valores bastante acessíveis nas
livrarias de sua cidade ou mesmo pela internet.
psicologia_e_educacao.indb 133psicologia_e_educacao.indb 133 19/7/2007 15:22:2019/7/2007 15:22:20
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Universidade do Sul de Santa Catarina
O livro de Marta Kohl de Oliveira intitulado Piaget,
Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em
discussão, tornou-se um clássico para quem está dando
os seus primeiros passos na teoria histórico-cultural.
Para saber mais sobre o contexto histórico em que
Vygotsky desenvolveu a sua teoria e sobre o conceito
de zona de desenvolvimento proximal, é fundamental
a leitura do livro de Andrea Vieira Zanella intitulado
Vygotsky: contexto, contribuições à psicologia e o
conceito de zona de desenvolvimento proximal.
O livro Henri Wallon: uma concepção dialética do
desenvolvimento infantil, de Izabel Galvão, aborda
resumidamente os aspectos mais relevantes da teoria
walloniana.
Piaget, Vygotsky e Wallon: teorias psicogenéticas em
discussão é um livro que traz textos de Yves La Taille,
pesquisador da teoria piagetiana, de Marta Kohl de
Oliveira, pesquisadora da teoria histórico-cultural, e
de Heloisa Dantas, pesquisadora da teoria de Henri
Wallon.
Para comparar a concepção de desenvolvimento da
inteligência de Jean Piaget com o modo como Henri
Wallon trata dessa mesma questão, nada melhor do que
a leitura do livro de Heloisa Dantas cujo título é A
infância da razão.
As referências completas dos livros aqui sugeridos
encontram-se no fi nal do livro didático.
Vale a pena também verifi car os textos disponibilizados
no Espaço UnisulVirtual de Aprendizagem sobre os
teóricos estudados nesta unidade.v
psicologia_e_educacao.indb 134psicologia_e_educacao.indb 134 19/7/2007 15:22:2119/7/2007 15:22:21
UNIDADE 5
Os mitos sobre o fracasso escolar e as difi culdades de aprendizagem
Objetivos de aprendizagem
Descrever os pressupostos de teorias sobre o fracasso escolar das classes populares.
Defi nir difi culdade e distúrbio de aprendizagem.
Compreender a abordagem da psicopedagogia clínica para as difi culdades de aprendizagem.
Relacionar os conceitos de erro construtivo e de zona de desenvolvimento proximal com o processo de planejamento e de avaliação do desempenho escolar.
Seções de estudo
Seção 1 As teorias sobre o fracasso escolar das classes populares
Seção 2 As difi culdades de aprendizagem
Seção 3 A psicopedagogia
Seção 4 O erro construtivo e a zona de desenvolvimento proximal
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de estudo
Durante o estudo desta disciplina, você conheceu diferentes
teorias e observou como elas se sucederam e tiveram maior ou
menor importância para a compreensão das relações de ensino e
de aprendizagem, estudando as suas implicações educacionais.
Nesta unidade, abordaremos questões às quais a Psicologia
sempre esteve associada e foi solicitada a dar respostas em sua
relação com a educação: o fracasso escolar, as difi culdades de
aprendizagem e a avaliação do desempenho do aluno.
Serão discutidos os conceitos de carência e diferença cultural,
bem como os conceitos de erro construtivo e de zona de
desenvolvimento proximal.
Os conhecimentos que você reuniu até aqui serão muito
importantes para compreender o que vem por aí!
Seção 1 – As teorias sobre o fracasso escolar das classes populares
O fracasso escolar não existiu sempre, posto que o acesso à escola
é recente para grande parte da população. Nos anos 1960 e 1970,
no auge da disseminação do modelo de escola de massas da
sociedade industrial, com o controle do desempenho escolar por
especialistas, o desempenho dos alunos das classes populares em
relação ao desempenho geral dos alunos da classe média e alta
tornou-se objeto de análise.
As teorias sobre o fracasso escolar sustentadas em pressupostos
inatistas subestimaram a capacidade intelectual do indivíduo,
na medida em que defendem que o sucesso ou fracasso
dependem quase exclusivamente de talento, aptidão, dom ou
maturidade do aluno.Como o fracasso é mais comum entre
as camadas sociais mais desfavorecidas: os mal-nutridos, os
pobres, os marginalizados, as teorias inatistas sugerem que
lhes falta bagagem genética adequada à aprendizagem dos
conteúdos escolares. No nascimento, já estaria ‘determinado’
quem seria ou não inteligente.
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Psicologia e Educação
Unidade 5
Por outro lado, vimos nesta disciplina que na abordagem
ambientalista da aprendizagem o papel do ensino é
supervalorizado, já que o aluno é considerado um receptáculo
vazio. O compromisso da escola é com a transmissão da cultura,
a modelagem do comportamento dos alunos e a transmissão
de um grande número de conteúdos. As teorias ambientalistas
propõem que o ambiente de origem do aluno é que traz os
requisitos indispensáveis ao processo de aprendizagem. Essas
teorias valorizam o ambiente como principal responsável pelo seu
sucesso ou fracasso na escola.
Entre as teorias ambientalistas sobre o fracasso escolar, encontramos aquelas que propõem que o ambiente de origem do aluno varia de acordo com a sua classe social. São a Teoria da Carência Cultural e a Teoria da Diferença Cultural.
A teoria da carência cultural diz respeito ao discurso da
psicologia educacional norte-americana que surgiu nos anos
sessenta e setenta para explicar o problema das desigualdades
sociais da educação. Nesta teoria, “a infl uência dos fatores
extra-escolares no rendimento escolar ocupava o primeiro
plano. Características dos alunos e de seu ambiente familiar
eram relacionadas com o desempenho na escola, em busca dos
determinantes do baixo rendimento” (PATTO, 1993, p. 111).
Segundo a análise de Patto (1993), no momento em que minorias
raciais reivindicavam igualdade de oportunidades, a ciência foi
acionada pela classe dominante para buscar respostas para a
questão: por que os negros não conseguem ser bem-sucedidos
socialmente? Argumentava-se, então, pela teoria da carência
cultural, que os negros viviam em contextos menos estimulantes,
pois o ambiente de pobreza desenvolve menos as capacidades
cognitivas. Afi rmava-se que as pessoas pobres são pouco
estimuladas e, conseqüentemente, menos inteligentes, e
sustentava-se que a linguagem que desenvolve a inteligência
é a culta e esta é característica da classe alta.
A literatura também atribuía as virtudes às classes altas e os
defeitos e problemas às classes baixas. Segundo este discurso,
valores, crenças, normas, hábitos e habilidades tidos como
típicos da classe dominante são os mais adequados para a
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Universidade do Sul de Santa Catarina
promoção de um desenvolvimento psicológico sadio. Os adultos
das classes subalternas são referidos como ‘agressivos’, ‘relapsos’
e ‘desinteressados’ pelos fi lhos. Em seu ambiente, as crianças
pobres teriam contato somente com um código lingüístico
restrito, caracterizado por frases curtas e erradas.
Além disso, os objetos com os quais interagiriam, por sua
pobreza, não possibilitariam realizar o treinamento visual e
auditivo necessário para conquistar a prontidão para aprender.
Assim, o ambiente do qual as crianças da classe dominante são
oriundas seria, naturalmente, mais adequado para oferecer as
condições necessárias para a aprendizagem.
Para fazer frente a isso, segundo esta linha de raciocínio, seria
interessante oferecer programas de compensação cultural às
crianças pobres, que lhes fornecessem a base para atingir o
desempenho escolar esperado. O impacto dessa abordagem
ambientalista na educação, assim, pode ser verifi cado nos
programas educacionais elaborados com o objetivo de estimular
e intervir no desenvolvimento das crianças provenientes das
camadas populares ou compensar, de forma assistencialista, as
carências sociais dos indivíduos.
A teoria da diferença cultural, por sua vez, não concorda com
a proposição de existência de uma cultura padrão, à qual estão
submetidas outras culturas inferiores. O problema do fracasso
escolar das crianças pobres não estaria na falta de pré-requisitos
para aprendizado, mas sim em terem uma base cultural diferente
daquela das crianças da classe dominante.
A escola não estaria preparada para receber essa população
de bagagem cultural diferente, surgindo, assim, difi culdade
de comunicação entre professores e alunos pobres, o que
difi cultaria o processo de ensino-aprendizagem a ponto de
produzir fracasso escolar.
A proposta para intervir sobre a situação seria a de preparar os
professores para partir do que os alunos sabem e, aos poucos,
“aculturá-los”, com vistas a propiciar-lhes condições de ascensão
social. A crítica de Patto (1993) a esta visão é a de que o objetivo
dos defensores da teoria da diferença cultural não seria garantir
às classes subalternas a apropriação do saber escolar como forma
de propiciar a transformação social, mas somente possibilitar uma
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Unidade 5
improvável melhoria no nível social e econômico dos indivíduos,
por meio da transmissão de conhecimentos que resultasse na
elevação do seu grau de instrução.
A conclusão do estudo de Patto (1996) em A produção do fracasso escolar foi de que o professor, enquanto portador da cultura da “classe média”, foi preparado pedagogicamente para receber o aluno ideal, isto é, o aluno limpo, inteligente, sadio e disciplinado e, principalmente, que já vinha para a escola preparado para assimilar uma grande quantidade de informações sistematizadas no contexto escolar.
Observa-se assim que em um primeiro momento, desenvolveu-
se uma teoria denominada a teoria da carência ou defi ciência
cultural. Esta foi amplamente divulgada e aceita, e atribuía as
causas do fracasso escolar ao indivíduo, veiculando uma imagem
negativa da criança pobre. Em um segundo momento, propôs-
se que a criança pobre não é defi ciente, mas apenas diferente da
criança de classe média ou alta, em uma teoria denominada teoria
da diferença cultural. Esta não questionava as desigualdades
sociais, mas apenas constatava que as crianças pobres precisariam
de outro tipo de atendimento pela escola, por apresentarem
características culturais diferentes das crianças de classe alta.
Apenas em um terceiro momento o foco não estará mais no
ambiente de origem da criança, mas nas práticas escolares, que
passam a ser investigadas em busca da origem, ou das formas
de produção, do fracasso escolar. Discutiremos esse enfoque na
última seção desta unidade. Antes disso, nas próximas seções,
você conhecerá a abordagem das difi culdades de aprendizagem
como distúrbios e o ponto de vista da psicopedagogia clínica.
Seção 2 - As difi culdades de aprendizagem
As difi culdades de aprendizagem dizem respeito a um
conjunto de manifestações muito amplo e passível de diferentes
interpretações. Uma dessas interpretações associa toda a
difi culdade de aprendizagem a um distúrbio de origem orgânica
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que se relaciona unicamente ao aluno, a uma doença da qual este
seria portador, que mereceria tratamento médico individual. Essa
perspectiva responsabiliza exclusivamente o aluno por seu sucesso
ou fracasso na aprendizagem e vê a difi culdade de aprendizagem
como sinônimo de distúrbio.
Segundo o conceito de distúrbio de aprendizagem mais
divulgado e aceito atualmente, o do Interagency Comitee of
Learning Disabilities (ICLD) dos Estados Unidos, cunhado em
1987,
Distúrbios de Aprendizagem é um termo genérico que se
refere a um grupo heterogêneo de alterações manifestas
por difi culdades signifi cativas na aquisição e uso da
audição, fala, leitura, escrita, raciocínio ou habilidades
matemáticas. Estas alterações são intrínsecas ao indivíduo
e presumivelmente devidas a disfunções no sistema
nervoso central. Apesar de o distúrbio de aprendizagem
poder ocorrer concomitantemente com outras condições
desfavoráveis (por exemplo, alteração sensorial, retardo
mental, distúrbio social ou emocional) ou infl uências
ambientais (por exemplo, diferenças culturais, instrução
insufi ciente/inadequada, fatores psicogênicos), não é o
resultado direto destas condições ou infl uências.
Veja que, de acordo com este conceito, apenas podem ser
excluídas do termo distúrbios as difi culdades para acompanhar
o programa escolar que não possam ser devidas a disfunções
no sistema nervoso central. Ainda que o termo tenha sua
abrangência bastante restrita nesse conceito, excluindo infl uências
ambientais, distúrbios emocionais e problemas de instrução
inadequada, por exemplo, é comum que toda a difi culdade de
aprendizagem seja compreendida como distúrbio, ignorando-se
as tantas outras possibilidades.
Um dos distúrbios de aprendizagem diagnosticado a partir
dessa abordagem é a discalculia. A primeira vez que se utilizou
este termo foi em 1920, por Henschen. A discalculia seria
um transtorno estrutural de desenvolvimento das habilidades
matemáticas que se manifestaria em erros na compreensão dos
números, habilidade de contagem, habilidades computacionais e
solução de problemas. Identifi cada principalmente em crianças,
poderia ser diagnosticada em adultos, desde que não estivesse
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Psicologia e Educação
Unidade 5
relacionada a lesões cerebrais comprovadas, mas sim a disfunções
presumidas no sistema nervoso central.
Os pesquisadores que criticam essa abordagem biológica
entendem que a “biologização” das difi culdades de aprendizagem
serve para escamotear os determinantes do fracasso escolar,
que seriam sociais, políticos e pedagógicos. O objetivo da
interpretação biológica seria tão somente o de isentar o
sistema social vigente e a instituição escolar neste inserida de
responsabilidades sobre o desempenho dos alunos.
Propondo-se a contar a “história não contada” dos distúrbios
de aprendizagem, recuperando a história real, as pesquisadoras
Maria Aparecida Moyses e Cecília Collares (1992) defendem
que os distúrbios de aprendizagem são apenas uma construção
do pensamento médico. Para sustentar este argumento, retomam
a história das pesquisas em torno da dislexia, difi culdade
signifi cativa na aquisição da leitura, mostrando que o conceito
foi contestado por outros pesquisadores desde o início, e que
não há provas científi cas sufi cientes para atribuir as difi culdades
de leitura e outras difi culdades consideradas distúrbios a uma
origem orgânica e genética.
Seção 3 – A psicopedagogia
A psicopedagogia é uma área de conhecimento que nasce da
união entre a Psicologia e a Pedagogia e estuda o processo de
ensino e aprendizagem na busca de soluções para a questão dos
problemas de aprendizagem. Quando falamos em problemas
de aprendizagem não estamos falando, necessariamente, de
difi culdades de aprendizagem.
As difi culdades de aprendizagem são a expressão, no aluno, de
relações de ensino e aprendizagem que se dão dentro e fora da
escola. Estas relações, quando trazem complicações, podem
resultar ou não em difi culdades de aprendizagem. O conceito de
problemas de aprendizagem, assim, amplia o foco de análise, que
deixa de estar no indivíduo e se situa nas relações estabelecidas
no processo de ensino e de aprendizagem.
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A psicopedagogia clínica é representada pela psicopedagoga
Alicia Fernandez. Esta pesquisadora divulgou a abordagem
multidisciplinar e a entrevista familiar como forma de
compreender e intervir sobre as difi culdades de aprendizagem.
O modo como o sujeito lida com o conhecimento é analisado
pela autora a partir dos conhecimentos da psicanálise e da
Epistemologia Genética.
Para Alicia Fernandez, as questões emocionais trabalhadas
no inconsciente e as questões cognitivas estão profundamente
relacionadas na produção de difi culdades de aprendizagem.
As teorias que estudam o desenvolvimento humano
do ponto de vista cognitivo, como a teoria piagetiana,
que você estudou na unidade 3, não costumam fazer
referência às associações simbólicas que se produzem
no inconsciente dos indivíduos e à sua relação com a
aprendizagem. A psicanálise, por sua vez, na qual foram
cunhados os conceitos de inconsciente e de sintoma de
origem psicológica, raramente faz referência aos aspectos
do desenvolvimento da personalidade que dizem
respeito à construção de conhecimento. Desta forma,
as relações entre inconsciente e construção (ou não) de
conhecimento fi cam perdidas.
Alicia Fernandez escreveu um livro que já se tornou um
clássico dos estudos em psicopedagogia intitulado A inteligência
aprisionada. Nele, a autora mostra como a história singular de
cada sujeito, em sua família e na escola, pode explicar sua forma
de relação com o conhecimento.
Para uma melhor compreensão do que foi dito, acompanhe o
seguinte exemplo retirado de um caso clínico.
Você estudou na unidade 2 a psicanálise, que traz o conceito de inconsciente, de autoria de Sigmund Freud. Viu que o inconsciente diz respeito aos conteúdos da mente dos quais não temos consciência. Estes conteúdos são simbólicos, associam-se uns aos outros de modos particulares para cada sujeito e se expressam disfarçados nos sonhos, nos sintomas e nos enganos que cometemos no cotidiano, como trocar o nome de alguém ou esquecer de algo, por exemplo.
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Unidade 5
A criança, ao nascer, instala-se em uma constelação de signifi cações. Vem preencher muitos desejos, carências, objetos dos pais. É-lhe designado um nome, e a criança, sem que tenha consciência disso, terá que se inserir no lugar que o nome signifi que.
A Paulo Alfredo chamam Alfredo. Perguntamos por que o chamaram de Paulo: “Por que assim se chama o pai” e, em outro momento da entrevista familiar, perguntamos por que não o chamam de Paulo, e responde a mãe: “Porque assim se chama o pai”. Pelo mesmo motivo que lhe é dado o nome, lhe é também retirado. “Aprende – diz a mãe -, mas no dia seguinte esqueceu-se de tudo (FERNANDEZ, 1990, p. 41).
Você pode observar, assim, que, de acordo com o signifi cado
inconsciente assumido pelo conhecimento, originado nas relações
familiares, pode produzir-se o sintoma da não-aprendizagem.
Quando os produtos do inconsciente transformam-se em
sintomas, podem aprisionar a capacidade de aprender e de
ensinar de crianças e adultos, de alunos e de professores. A
intervenção clínica de uma equipe multidisciplinar, que escute a
criança e sua família, pode ser uma alternativa para lidar com a
difi culdade de aprendizagem assim produzida.
A difi culdade para aprender pode ocorrer como um sintoma
relacionado a desejos inconscientes de ser amado pelas pessoas
próximas, por exemplo, que leva a reproduzir comportamentos
que são nocivos ao sujeito, mas lhe parecem contribuir para ser
mais aceito, o que lhe dá um conforto a curto prazo.
Seção 4 – O erro construtivo e a zona de desenvolvimento proximal
Na educação, o erro costuma ser severamente combatido e é
entendido como algo que atrapalha a aprendizagem. Teme-se
o risco de que a resposta errada possa se fi xar na mente e no
Sintomas são formas geralmente dolorosas e incapacitantes de expressão dos conteúdos inconscientes dos sujeitos.
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comportamento do aluno. Respostas erradas até hoje são riscadas
com caneta vermelha, procurando-se provocar a sua eliminação.
A perspectiva de mudança na maneira de encarar o erro do aluno
nas tarefas escolares está entre as implicações educacionais de
maior destaque da Psicologia Genética de Jean Piaget. Para os
construtivistas, como você estudou na unidade 3, o erro é positivo
e seu papel precisa ser estudado, pois ele indica o progresso
conceitual que está sendo realizado pelo aluno. Conhecendo a
lógica do erro do aluno, o professor pode avaliar as estratégias a
serem utilizadas para o seu desenvolvimento e para a superação
de assimilações incompletas ou incorretas no processo de
construção do conhecimento.
Embora a compreensão do erro como construtivo seja um avanço
na compreensão das relações de ensino e de aprendizagem, esta
abordagem sofre algumas críticas dos partidários da perspectiva
histórico-cultural de Vygotsky. Eles consideram que a idéia
de erro construtivo mantém a visão de separação entre erro e
acerto e de valorização de um padrão universal que situa o que
é “certo”. Esses pesquisadores preferem, assim, lidar com o
desenvolvimento do aluno nas relações estabelecidas no contexto
escolar tomando como fundamento o conceito de zona de
desenvolvimento proximal.
Sustentam que, mais importante do que buscar problemas
individuais que possam acarretar desempenho ruim na
escola, para compreender os problemas de aprendizagem, é
necessário analisar a relação professor-aluno-conhecimento
e a intersubjetividade na sala de aula. Para esses autores, o
aparato biológico do aluno nunca poderia ser tomado como
único fator, nem mesmo como um fator importante para o
desempenho escolar.
Como você estudou na unidade 4, a Psicologia sócio-histórica
reúne os pesquisadores que concordam com os pressupostos do
materialismo histórico e dialético e que fundamentam suas idéias
sobre a pesquisa e a intervenção da Psicologia nas instituições na
Psicologia histórico-cultural.
Um dos pressupostos do materialismo histórico e dialético é o de
que é a contradição que provoca as transformações que ocorrem
nos sujeitos e na realidade. No texto Repensando o fracasso escolar,
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Psicologia e Educação
Unidade 5
Maria Teresa Esteban parte dessa perspectiva quando afi rma que
as contradições entre o saber e o não saber nas relações de ensino
e de aprendizagem na sala de aula devem ser tomadas como foco
de análise para que se avalie o desempenho escolar.
Observando a relação pedagógica que se dá na sala de
aula, é possível conhecer melhor as interações criança/
conhecimento, professor/aluno e professor/aluno/
conhecimento na construção do sucesso/fracasso escolar
(ESTEBAN, 1992, p. 75).
Esta pesquisadora conta que, no campo de pesquisa, encontrou
uma criança na sala de aula que chamou sua atenção: Vilmar.
Vejamos o caso de Vilmar a seguir.
Vilmar contava muitas histórias, ricas em detalhes e apoiadas por desenhos. Era considerado pela sua professora como alguém que atrapalhava as aulas, pois “falava demais”. De vez em quando, Vilmar procurava a pesquisadora para mostrar seus desenhos e contar suas historias. Ela dizia: “Vilmar, escreva a historia de seus desenhos”, e Vilmar, que vinha evoluindo em seus conhecimentos sobre a escrita, criando seus próprios símbolos, respondia: “Ah, isso tudo eu ainda não sei...”. Tendo estado afastada por um tempo da classe que observava, a pesquisadora surpreendeu-se, ao retornar com a afi rmação da nova professora de que Vilmar teria difi culdade de aprendizagem. A nova professora trabalhava com ditados, com separação de sílabas e com utilização de letras na formação de palavras “novas”. Vilmar não parecia interessado. Aproximou-se da pesquisadora e lhe propôs fazer um desenho. Como já fi zera por diversas vezes, a pesquisadora pediu a ele: “Vamos Vilmar, escreva a história do seu desenho. E Vilmar respondeu, cabisbaixo: “Eu não sei escrever”.
O que ocorreu com Vilmar? Será que Vilmar tem difi culdade
de aprendizagem? Como você, a escola e a professora poderiam
abordar o caso de Vilmar?
A partir do caso de Vilmar, Esteban busca apoio na
concepção de zona de desenvolvimento proximal para mostrar
como, entre o saber e o não saber, encontra-se o espaço do
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processo de produção do conhecimento. É nesse espaço que
a intersubjetividade, o diálogo e a atividade coletiva, com
professor(a) e colegas, acontece e intervém na qualidade do
conhecimento produzido. Desconsiderar a existência desta
zona, na qual o processo de produção do conhecimento se dá,
é avaliar o conhecimento como algo que se tem ou não tem,
difi cultando a possibilidade de sua produção.
Para compreender tal afi rmação, é importante revisitar o
conceito de zona de desenvolvimento proximal proposto por
Vygotsky. Este conceito carrega implicações pedagógicas no
planejamento e na avaliação da aprendizagem escolar que
merecem ser consideradas.
Para Vygotsky, a aprendizagem é condição necessária para que
o desenvolvimento ocorra, pois ser humano é apropriar-se das
características culturais da sociedade em que está inserido, as
quais são produtos de um processo histórico. O desenvolvimento
do sujeito é produto da internalizacão dessas características
histórico-culturais. O processo de internalização se dá em uma
zona de interação que foi chamada por Vygotsky de zona de
desenvolvimento proximal.
Hazin e Meira mostram que o conceito de ZDP passou por
mudanças durante o seu processo de elaboração que o deram
maior consistência e correspondência com os demais conceitos
que compõem a teoria de Vygotsky.
Ao longo de aproximadamente quinze meses, os últimos
da vida de Vygotsky, o conceito evoluiu do status de
oposição a noção de QI, para enfatizar relações entre
o ensino formal e o desenvolvimento de conceitos
científi cos, sendo, posteriormente, ampliado para o
domínio da interação social, imitação e mediação
semiótica em atividades tais como a brincadeira (HAZIN
e MEIRA).
Desta forma, é possível identifi car três momentos na evolução do
conceito de ZDP, que marcam diferentes ênfases de análise.
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Psicologia e Educação
Unidade 5
Ênfase no desempenhoEsta fase foi marcada pela crítica de Vygostky aos testes de QI.
Nela, era realizada a comparação do desempenho do sujeito
em atividade individual com o desempenho do indivíduo em
atividade colaborativa.
A idéia importante que está subjacente a esta visão do conceito
é a de que o que hoje é realizado com o auxílio de uma pessoa
mais competente, no futuro poderá ser realizado de forma
autônoma pelo sujeito. Como implicação educacional disto temos
a importância de o professor ajudar o aluno, e colocar os alunos
em situação de ajuda mútua, oferecendo pistas sobre como atingir
os objetivos a que se propuseram na atividade que realizam.
Devido à ênfase dada ao desenvolvimento da performance
individual nesta fase, a zona de desenvolvimento proximal
poderia parecer ser uma propriedade do sujeito. Ela seria mais ou
menos ampla conforme a riqueza das competências individuais e
o desenvolvimento no sujeito.
Branco = o que o sujeito já é capaz de realizar sozinho. Aquilo
que ele “já sabe”.
Cinza = o que o indivíduo é capaz de realizar com ajuda de outra
pessoa, mas ainda não é capaz de realizar sozinho. Aquilo que ele
“ainda não sabe”.
Fora desta zona, temos o que ainda não é possível realizar nem
com a ajuda de outros ou aquilo que o indivíduo “não sabe”.
Esta análise enfatiza o que ocorre com o indivíduo no processo
de desenvolvimento. As limitações teóricas e educacionais
desta visão de ZDP são parcialmente resolvidas na segunda
formulação do conceito, com ênfase na interação, que você
conhecerá a seguir.
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Ênfase na interação e na mediação socialEm um momento posterior, o conceito de ZDP passou a ser
analisado a partir de seus aspectos sociointeracionais, enfocando
o processo de colaboração em si e não tanto o desempenho
individual nele produzido.
A ZDP passa a ser compreendida como um espaço
compartilhado, constituído por indivíduos em interação.
Os resultados obtidos na atividade compartilhada vão além
do que poderia ser atingido por qualquer um dos sujeitos
envolvidos que realizasse a atividade individualmente. A zona
representada em vermelho na ilustração, que corresponde ao
que o indivíduo “ainda não sabe” na abordagem descrita acima,
é aquela na qual devem se dar as interações promotoras do
desenvolvimento, isto é, a mediação social.
Como implicação educacional, esta abordagem enfatiza a
produção compartilhada na sala de aula, com o emprego de
práticas didáticas que favoreçam a comunicação entre os alunos,
sem tanta ênfase na análise do conteúdo semiótico trocado nessas
interações.
Ênfase na mediação simbólicaNesta última fase de desenvolvimento do conceito de ZDP,
a ênfase recai sobre os aspectos simbólicos e discursivos que
perpassam as atividades dos indivíduos, ainda considerando a
sua dimensão interacional, mas evoluindo para uma concepção
dialógica do desenvolvimento que se afasta defi nitivamente
da avaliação de desempenho característica da primeira fase.
Não se trata mais de atingir resultados mais efi cazes, mas de
produzir e comunicar novos signifi cados e novos sentidos para o
conhecimento. A ênfase está, portanto, na linguagem.
A linguagem oferece ao sujeito que a vai dominando a
possibilidade de controlar e mediar seu próprio processo
de aprendizagem e resolução de problemas, como mostra o
desenvolvimento da fala na atividade da criança, estudado
na unidade 4.
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Psicologia e Educação
Unidade 5
Como implicação educacional, enfatiza-se o emprego de práticas
didáticas que proporcionem uma estrutura comunicativa,
favorecendo o discurso argumentativo e a produção
compartilhada de cultura na sala de aula.
Desta forma, voltando ao caso de Vilmar, é importante perceber
como a abordagem tradicional do ensino não dá espaço para
que a mediação social e simbólica ocorram, espaço este que
poderíamos denominar, informalmente, como o espaço que
Vilmar defi ne quando afi rma: “ainda não sei”. Esta afi rmação
mostra como o conhecimento está em processos de produção
e poderá ser produzido na medida em que se der a interação
e a troca simbólica, valorizando-se o que Vilmar não sabe e
acreditando em suas possibilidades de saber.
Esta seria uma alternativa ao modelo tradicional, que enfatiza
o “erro” como algo negativo e não vê nada entre o saber e o não
saber, em cuja relação contraditória produz-se o conhecimento.
Seção 5 - A Psicologia na escola e nos novos espaços socioeducativos
Como você pôde perceber durante o estudo da disciplina, os
psicólogos têm sentido necessidade de redimensionar o seu papel
na escola, visando menos os indivíduos isoladamente e mais os
fenômenos que se dão nas relações de ensino e aprendizagem.
Há muito tempo, o psicólogo educacional freqüentemente
tem atuado como um psicólogo clínico dentro da escola. A
ele caberia ocupar-se dos fenômenos individuais e afetivos dos
alunos, encaminhando-os para atendimento especializado
sempre que necessário. Comumente, a Psicologia na escola
vinha se restringindo aos serviços de orientação educacional
individualizada e orientação profi ssional em uma perspectiva de
encaminhamento ao mercado de trabalho de acordo com aptidões
tidas como naturais dos sujeitos.
Atualmente, a necessidade de uma visão mais contextualizada
dos indivíduos na realidade escolar e social faz-se necessária.
Para além da psicologia escolar tradicionalmente praticada, a
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psicologia da educação tem estudado os processos de mudança
nos sujeitos conseqüentes de sua participação em situações e
atividades educativas de diferentes naturezas.
Esse estudo vem assumindo como fi nalidades:
contribuir teoricamente para a melhor compreensão e
explicitação desses processos;
auxiliar na construção de procedimentos e estratégias
para planejar e intervir nesses processos a fi m de dar-lhes
uma determinada direção;
auxiliar no estabelecimento de práticas educativas mais
efi cazes, satisfatórias e enriquecedoras para os sujeitos
envolvidos.
Você já sabe, no entanto, que o conhecimento não é algo
neutro, e pode ser ideológico, na medida em que pode ser
tomado como verdade de acordo com os interesses dos grupos
que o defendem, como mostra a história das relações entre a
Psicologia e a educação.
Autores como Bock (2003), em uma perspectiva sócio-histórica
de atuação em Psicologia, vêm propondo que a instituição
escolar deve ser analisada em sua complexidade e historicidade,
começando por um recorte e partindo deste para compreender a
totalidade concreta dessa realidade. A observação empírica e o
pensamento teórico devem ser nossos instrumentos na busca das
contradições e determinações do espaço de relações sociais que
estamos analisando.
A escola como instituição fundamental do capitalismo tem como
função difundir normas, valores e conhecimentos que justifi quem
as relações sociais estabelecidas nesse sistema. Ela consegue tal
intento não só por meio dos conteúdos transmitidos, mas também
por meio de sua organização e pelas práticas cotidianas que a
constituem, encarnando as contradições sociais.
O professor, o pedagogo, o psicólogo educacional e todos aqueles que se interessam pelo que acontece dentro da sala de aula devem refl etir sobre como se constituem as relações didáticas e sociais, sob um ponto de vista mais abrangente, estabelecidas entre o professor e o grupo de alunos.
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Psicologia e Educação
Unidade 5
Para compreender melhor estas relações, cabe destacar os
conceitos de situação didática, a transposição didática e o
contrato didático, este último em especial, discutidos a partir das
idéias de Menezes e Araújo (2004).
Situação didática - é organizada com a fi nalidade de que um
saber constituído ou em vias de constituição seja negociado
no contexto de sala de aula e apropriado pelos alunos, sob a
coordenação/organização do professor.
Transposição didática - transformação que o saber
cientifi co sofre desde a comunidade científi ca até a sala de
aula. Nessa transformação, o saber científi co se transforma
em saber a ser ensinado.
Contrato didático - é considerado o fenômeno central que
aborda a relação professor-aluno-saber na construção do
conhecimento. Corresponde às expectativas e às regras que
balizam a relação didática entre professor e aluno. Estas são
explicitadas, em pequena parte, mas, em sua maior parte,
permanecem implícitas. Estabelecem-se entre o professor e o
aluno ou um grupo de alunos e o saber, defi nindo o papel de
cada um dos participantes da relação didática, bem como as
expectativas que cada um tem em relação ao outro.
Na dimensão implícita do contrato didático, a subjetividade do
professor e do aluno entram em jogo, trazendo as marcas de
outras relações e contratos didáticos vivenciados anteriormente.
O professor, com base em vivências anteriores, pode eleger alunos
que terão sucesso ou fracasso na escola, e essas escolhas tornam-
se determinantes para o seu real desempenho.
O aluno, também com base em suas próprias vivências, pode
estabelecer uma relação de transferência com o professor
que, por sua vez, também pode apresentar características
próprias, aparecendo como companheirismo, distanciamento,
desconforto, segurança, entre tantos outros sentimentos que
certamente são condicionantes do processo de ensino e de
aprendizagem.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
A relação do professor com o conhecimento a ser ensinado no contrato didático também merece consideração. Tanto o professor quanto o aluno tem sua própria relação com o conhecimento, mas aquele entra nessa relação em uma posição privilegiada, pois é ele quem conhece o que será ensinado e organizará as situações didáticas. Isto confere ao professor certo poder de mostrar, esconder ou promover a construção individual ou coletiva do conhecimento.
Enfrentamos o desafi o de conviver em novos espaços e tempos
educativos. Os meios para a difusão de conhecimento que vão
surgindo com a constante inovação tecnológica e a crise pela qual
passam instituições tradicionais apontam para a necessidade de
fortalecer a convivência e a interação humana.
Os novos espaços socioeducativos relacionam-se às novas
formas de organização familiar, às comunidades virtuais, aos
espaços comunitários de interação (junto aos serviços públicos
ou associações de bairro, por exemplo), aos movimentos
sociais e outros contextos em que a Psicologia e a educação se
fazem necessárias.
Porém, será que a constituição desses novos espaços e tempos educativos poderá viabilizar:
a auto-realização? o respeito às diferenças individuais? a conquista da autonomia na base da interdependência e não no individualismo? a ampliação dos vínculos sociais?a redistribuição do poder?
A constituição saudável da subjetividade, o jeito de ser
próprio de cada um nas relações com os outros depende
de cada um desses aspectos. Neste sentido, deixamos estas
questões para refl exão, pois apenas nossa atividade, na
constituição desses novos espaços e tempos, poderá trazer as
devidas respostas.
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Atividades de auto-avaliação
1) Caracterize três visões diferentes sobre como se produz o fracasso escolar das crianças pobres.
2) Na seção 2, você estudou a visão das difi culdades de aprendizagem que as toma como distúrbios neurológicos. Pense e responda: por que esta visão é criticada por muitos pesquisadores da área da Psicologia da Educação?
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Universidade do Sul de Santa Catarina
3) A psicopedagogia clínica, por infl uência da psicanálise, entende as difi culdades de aprendizagem como sintomas. Explique o que signifi ca compreender a difi culdade de aprendizagem como um sintoma. Para isto, você deverá explicar o que é um sintoma, de acordo com a psicanálise.
4) O conceito de zona de desenvolvimento proximal desenvolveu-se e foi se tornando mais coerente com a obra de Vygotsky como um todo durante seu processo de elaboração. Identifi que os momentos pelos quais passou a elaboração deste conceito e as implicações educacionais derivadas de cada um desses momentos.
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Psicologia e Educação
Unidade 5
Síntese
Nesta unidade, você conheceu diferentes pontos de vista
sobre o fracasso escolar das crianças pobres, e aprendeu mais
sobre o modo como as difi culdades de aprendizagem podem
ser analisadas de acordo com as pesquisas em Psicologia.
Você estudou o conceito de erro construtivo e o de zona de
desenvolvimento proximal, buscando as implicações destes para a
análise do ensino e da aprendizagem na escola.
Saiba mais
Para saber mais sobre os temas estudados nesta unidade, leia o
livro A produção do fracasso escolar, de Maria Helena Souza
Patto. Outra sugestão é a obra A inteligência aprisionada,
da psicopedagoga clínica Alicia Fernandez. Você encontra as
referências completas ao fi nal do livro didático.
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Para concluir o estudo
Chegamos ao fi nal de uma longa caminhada na
disciplina Psicologia e Educação. Pensando no seu
futuro como profi ssional da educação, acredito que
muitos dos conteúdos estudados já têm seu sentido
bem evidente para você hoje. Imagino também que
outros conteúdos poderão fi car mais claros somente na
medida em que você for identifi cando relações entre
esses conceitos e os novos conhecimentos a serem
construídos nas próximas disciplinas. Esta é a dinâmica
do desenvolvimento do conhecimento: organizado em
rede, este se amplia e se modifi ca, se automatiza e se
torna mais complexo, conforme agimos sobre ele com o
auxílio dos colegas, tutores e professores.
Como autora, estive ao mesmo tempo perto e longe de
você nesse período de estudo, pois procurei dialogar
com a sua imagem em minha mente ao escrever,
e você, ao ler, provavelmente fez o mesmo. Desta
forma, foi um prazer estar ao seu lado e acompanhar à
distância o seu progresso.
Resta então a despedida e a expectativa de que os
fundamentos psicológicos da educação sejam agora
menos misteriosos para você do que pode ter sido
antes da passagem por esta experiência de ensino-
aprendizagem.
Um grande abraço!
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Sobre a professora conteudista
Maria da Glória Silva e Silva é licenciada e mestre
em Psicologia pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS). Ministra disciplinas de
Psicologia da Educação, da Aprendizagem e do
Desenvolvimento e de Prática de Ensino em cursos
de formação de educadores em nível de graduação
e de pós-graduação, nas modalidades presencial e
a distância em diferentes universidades, entre as
quais estão a Universidade Estadual do Rio Grande
do Sul (UERGS), a Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC) e a Universidade do Estado de
Santa Catarina (UDESC), além da Universidade do
Sul de Santa Catarina (UNISUL). Atua também
como professora tutora e é autora de diversos livros
didáticos para educação a distância.
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Referências
BECKER, Fernando. A epistemologia do professor: o cotidiano da escola. 12. ed. Petrópolis: Vozes, 2006.
CAMPOS, Dinah Martins de Souza. Psicologia e desenvolvimento humano. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2001.
CARVALHO, Vânia Brina Corrêa Kima de. Desenvolvimento humano e psicologia: generalidades, conceitos e teorias. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1996. 240 p.
CARVALHO, Diana Carvalho de. A psicologia frente a educação e o trabalho docente. Psicologia em estudo, Maringá, v. 7, n. 1, p. 51-60, jan./jun. 2002.
COLL, Cesar; PALACIOS, Jesus; MARCHESI, Alvaro. (orgs.) Desenvolvimento psicológico e educação: psicologia evolutiva. Porto Alegre: Artmed, 1995.
CUNHA, Marcus Vinicius da. John Dewey e o pensamento educacional brasileiro: a centralidade da noção de movimento Revista Brasileira de Educação, n. 17, p. 86-99, mai./jun./jul./ago. 2001. Disponível em: < http://www.anped.org.br/rbe17/07artigo06.pdf>. Acesso em: 30 jun. 2006.
DAVIDOFF, Linda L. Introdução à Psicologia. São Paulo: MacGraw-Hill do Brasil, 1991.
ENGELMANN, Arno (org.). Wolfgang Köhler: psicologia. São Paulo: Ática, 1978.
ESTEBAN, Maria Tereza. Repensando o fracasso escolar. Cadernos CEDES, São Paulo, n. 28, p. , 1992.
EYSENCK, M. W.; KEANE, M. Psicologia cognitiva. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
FERNANDEZ, Alícia. A inteligência aprisionada: abordagem psicopedagógica clínica da criança e sua família. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991.
GADOTTI, Moacir. História das idéias pedagógicas. São Paulo: Ática, 1999.
GARCÍA, Jesus Nicasio. Manual de difi culdades de aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 1998.
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MOYSES, M. ª; COLLARES, C. A. L. A história não contada dos distúrbios de aprendizagem. Cadernos CEDES, n. 28, O sucesso escolar: um desafi o pedagógico, São Paulo, p. 31-47 , 1992.
NUNES, Marcia Regina Mendes. Psicanálise e educação: pensando a relação professor-aluno a partir do conceito de transferência. In: COLÓQUIO DO LEPSI IP/FE-USP, 5, 2006, São Paulo. Proceedings online... Disponível em: <http://www.proceedings.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=MSC00000000320 6000100040&lng=en&nrm=abn>. Acesso em: 09 abr. 2007.
PALACIOS, Jesus. Introdução à psicologia evolutiva: história, conceitos básicos e metodologia In: COLL, Cesar; PALACIOS, Jesus; MARCHESI, Alvaro. (orgs.) Desenvolvimento psicológico e educação: psicologia evolutiva. Porto Alegre: Artmed, 1995. p. 9-28.
PATTO, Maria Helena Souza. A produção do fracasso escolar. São Paulo: Queiroz, 1993.
WERTHEIMER, M. Pequena história da psicologia. São Paulo: Nacional 1989.
PIRES, Izabel Augusta Hazin; MEIRA, Luciano Rogerio de Lemos . Múltiplas interpretações para a Zona de Desenvolvimento Proximal na sala de aula. In: CORREIA, Mônica (Org.). Psicologia e escola: uma parceria que deveria funcionar. Campinas: Átomo, 2003, p. 45-59.
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Respostas e comentários das atividades de auto-avaliação
Unidade 1
1) É importante mostrar como os especialistas em educação buscaram mecanismos de controle do processo educativo a fi m de garantir que seria gasto apenas o necessário para produzir indivíduos adequados às necessidades do mercado de trabalho da época, caracterizado pela produção fabril nos moldes tayloristas.
2) Para desenvolver sua resposta lembre-se que, para Claparede, a necessidade é anterior ao interesse.
3) Estes pesquisadores são tidos como funcionalistas porque acreditam que o desenvolvimento humano relaciona-se à interação com o meio e à adaptação ao mesmo. O conhecimento que vale é o que funciona na prática para a adaptação e a resolução de problemas.
4) J. Dewey valoriza mais o conteúdo ensinado do que Claparede. Este último enfatiza mais o interesse e as aptidões do aluno para que a aprendizagem aconteça.
5)
ESCOLA OU TEORIA PALAVRAS-CHAVE
PSICOLOGIA DA FORMA/GESTALT
TodoInsigthPercepçãoAtenção
BEHAVIORISMOEstímuloRespostaReforço
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Unidade 2
1) Para desenvolver sua resposta, lembre-se que, para Claparède, a necessidade é anterior ao interesse.
2) Estes pesquisadores são tidos como funcionalistas porque acreditam que o desenvolvimento humano relaciona-se à interação com o meio e à adaptação ao mesmo. O conhecimento que vale é o que funciona na prática para a adaptação e a resolução de problemas.
3) J. Dewey valoriza mais o conteúdo ensinado do que Claparède. Este último enfatiza mais o interesse e as aptidões do aluno para que a aprendizagem aconteça.
Unidade 3
1) Os processos mentais são descritos na seção 1 da unidade 3. É possível pesquisar mais sobre eles em manuais de psicologia ou em sites da internet. O exemplo apresentado é pessoal do aluno e pode ser avaliado e comentado pelo professor tutor.
2) Os conceitos de aprendizagem por descoberta, aprendizagem por recepção, aprendizagem mecânica e aprendizagem signifi cativa constam na seção 2 da unidade 3. A partir das características desses conceitos, você deverá dar uma resposta pessoal, relacionada com sua própria experiência, que ilustre o que foi aprendido. Você deve mostrar como tanto a aprendizagem por descoberta quanto a aprendizagem por transmissão podem ser mecânicas ou signifi cativas, dependendo de como ocorre o processo de ensino e de aprendizagem.
3) Para Bruner, não existe um ordenamento único a ser empregado no ensino dos conteúdos. A ordenação deve considerar a experiência anterior do aluno. Ainda assim, apresentar o conteúdo proposto ao aluno - inicialmente, ações motoras sobre ele, em seguida, representações como imagens ou ícones e, fi nalmente, como representações simbólicas da ordem da linguagem -, seria um ordenamento interessante, por respeitar o processo de compreensão característico dos aprendizes. O currículo espiral, que retoma conteúdos já ensinados de tempos em tempos, tornando-os mais complexos conforme o desenvolvimento do aluno, pode ser organizado também seguindo essas etapas de compreensão.
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Psicologia e Educação
Unidade 4 1) (b)
2) Você pode citar oposições como organicismo X mecanicismo, atividade X passividade do sujeito, aspectos contextuais X características inatas. Após caracterizá-la, de acordo com o conteúdo do livro didático, os exemplos e comentários são pessoais e poderão ser avaliados pelo tutor.
Unidade 5
1) Os rótulos relacionam-se à utilização de um resultado isolado em um teste, avaliação ou tarefa para tirar uma conclusão sobre todas as perspectivas de desenvolvimento de um aluno. A partir de informações como essa, ou de informações como idade, tamanho, anos de repetência ou prontidão para aprender, por muito tempo as classes de alunos foram divididas, em busca de homogeneização. Você tem experiências que ilustram esta situação? Resposta pessoal.
2) Conforme o conteúdo estudado, a teoria da carência ou defi ciência cultural foi a primeira amplamente divulgada e aceita. Ela atribuía as causas do fracasso escolar ao indivíduo e veiculava uma imagem negativa da criança pobre, dizendo que esta teria menos condições para aprender do que as crianças ricas pela falta de estímulos em seu ambiente. Em um segundo momento, propõe-se que a criança pobre não é defi ciente, mas apenas diferente da de classe média ou alta, e a escola não estaria preparada para receber crianças de cultura diferente. Já em um terceiro momento, o foco não está mais no ambiente cultural de origem da criança, mas nas práticas escolares, que passam a ser investigadas em busca das formas de produção do fracasso escolar.
3) Esta visão é criticada porque responsabiliza unicamente características inatas do aluno por seu desempenho escolar, desconsiderando as relações em que este está inserido e o espaço pedagógico.
4) Sintomas são uma das formas que os conteúdos inconscientes têm para vir à tona, para se expressar. Geralmente, são dolorosos e incapacitantes, do ponto de vista emocional. A difi culdade para aprender pode ocorrer como um sintoma relacionado a desejos inconscientes de ser amado pelas pessoas próximas, por exemplo, que leva a reproduzir comportamentos que são nocivos ao sujeito, mas lhe parecem contribuir para ser mais aceito, o que lhe dá um conforto a curto prazo.
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