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PLANEAR O LOCAL

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Ficha Técnica

DirecçãoTeresa Sá Marques

Secretariado de redacçãoRui d’Alte

Conselho de redacçãoÁlvaro DominguesAna Ramos Pereira

Emília Sande LemosFernanda Cravidão

João FerrãoJosé Manuel Simões

João SarmentoJosé Alberto Rio Fernandes

José António TenedórioLúcio Cunha

Maria José RoxoMaria Leal Monteiro

Maria Lucinda FonsecaMário Vale

Teresa Pinto CorreiaTeresa Barata Salgueiro

Propriedade do títuloAssociação Portuguesa de Geógrafos

CorrespondênciaAvenida Professor Aníbal Bettencourt, 9 – 1600-189 Lisboa

www.apgeo.pt

EdiçãoEdições Afrontamento / Rua Costa Cabral, 859 – 4200-225 Porto

ISSN0872-6825-20

ImpressãoRainho & Neves, Lda. / Santa Maria da Feira

Impressa em 2009

Depósito Legal109329/97

Revista de distribuição gratuita para sócio da APGTiragem: 800 exemplares

A opinião expressa nos artigos é da exclusiva responsabilidade dos autores

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Inforgeo, 2009

Teresa Sá Marques – Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Ana C. Catita, «A situação actual do sistema de planeamento e gestão territorial: Uma novaera, novas responsabilidades» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Rui Pedro Julião, «Intervenções recentes no SNIG e desafios para o mercado de IG» . . . . . . . .

José Rio Fernandes, Pedro Chamusca, «Governância, planeamento e estratégias de desen-volvimento territorial: Reflexões a propósito da teoria e da prática» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Gonçalo de Sousa Santinha, Carlos Rodrigues, Adélia Almeida, «Rumo a um novo ciclo deapoio comunitário: Que impactos na definição de políticas territoriais de desenvolvimentolocal? O caso do Município de Arouca» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Fátima Bacharel, «Planos Regionais de Ordenamento do Território e Planos DirectoresMunicipais: O território como denominador comum» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Fernando da Fonseca Cruz, «Contributo Metodológico para a Delimitação da REN comRecurso à Tecnologia SIG» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Luis Ramos, Ricardo Bento, Nuno Azevedo, «Acessibilidade aos serviços de urgência emTrás-os-Montes e Alto Douro» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Deolinda Costa, Adélia Silva, «Carta Educativa – Dinâmica e percurso para uma trajectóriade sucesso no reordenamento da rede educativa» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

João António Rapazote, «O lugar do “outro” e outros lugares» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Carlos Moreira da Cruz, «A importância do cadastro no processo de desenvolvimentourbano português» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Jorge Gonçalves, «Colmatar a deriva urbanística do Planeamento Municipal: remediação ouoportunidade?» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Filipe Batista e Silva, «O mapeamento de distribuições populacionais: Breve resenha histó-rica e os novos rumos» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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Teresa Sá Marques

Inforgeo, 2009, 5-7

Este número surge da decisão tomada pela Associação Portuguesa de Geógrafos de consa-grar uma edição às problemáticas do desenvolvimento e do planeamento local. Reconhece-se,por um lado, a importância científica do tema e, por outro lado, a sua importância política,dadas as iniciativas legislativas nomeadamente em matéria de ordenamento territorial.

Ana Cristina Catita faz uma reflexão em torno das alterações recentes no sistema de pla-neamento e gestão territorial em Portugal. Analisa a descentralização operada no sistema e aredistribuição de competências, sobretudo ao nível da decisão, implicando responsabilidadesacrescidas tanto no âmbito municipal como em todos os níveis de intervenção. A reflexão iden-tifica ainda acções que é necessário desenvolver e que constituem os desafios a enfrentar nofuturo pelas diversas entidades que operam nos vários níveis de intervenção do sistema de pla-neamento e gestão territorial.

Rui Pedro Julião descreve as principais intervenções realizadas pelo Instituto GeográficoPortuguês (IGP), enquadrando-as na estratégia nacional para a Informação Geográfica. Coma entrada em vigor da Directiva INSPIRE (2007) tem vindo a consolidar-se a importância dasinfra-estruturas de dados espaciais (IDE) enquanto elementos de suporte à formulação e ges-tão de políticas de âmbito europeu. A criação da futura infra-estrutura europeia passa pelodesenvolvimento e articulação das várias iniciativas de infra-estruturas nacionais, cujo desen-volvimento está a cargo dos respectivos estados membros.

José Alberto Rio Fernandes e Pedro Chamusca abordam a transição do governo tradicio-nal para um sistema de governância territorial. A governância implica processos de aprendi-zagem e um forte respeito pelas especificidades locais que tornam cada experiência de pla-neamento e desenvolvimento local um processo único. Sem esquecer a dimensão conceptual e

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metodológica, abordam o relacionamento entre políticas e estratégias de desenvolvimento ter-ritorial, considerando em especial o planeamento e a sua relação com a governância territo-rial, numa abordagem com incidência no Norte de Portugal.

Gonçalo Santinha, Carlos Rodrigues e Adélia Almeida descrevem e avaliam os impactos nadefinição de políticas territoriais de desenvolvimento local do novo ciclo de apoio comunitá-rio. A nova agenda da Política Regional e de Coesão da União Europeia evidencia uma rele-vância especial à definição de políticas públicas a nível regional e local. Embora a diminuiçãodas assimetrias regionais continue a constituir um dos seus objectivos fundamentais, as orien-tações que emanam desta política assumem contornos diferentes neste novo ciclo de apoiocomunitário. Tendo como suporte a análise de um município português de baixa densidade, osautores analisam as alterações decorrentes de processos globais ou europeus e os efeitos des-sas alterações na definição de políticas locais de desenvolvimento territorial.

Fátima Bacharel evidencia a importância dos Planos Regionais de Ordenamento do Terri-tório e dos Planos Directores Municipais enquanto instrumentos de construção de um territó-rio adequadamente planeado, consequentemente ordenado e responsavelmente gerido. Salientao papel da Administração, em todos os seus níveis, na ponderação das opções estratégicas, emrespeito pelo princípio da subsidiariedade, para que o processo de ordenamento do territórioseja consequente nos instrumentos de planeamento e na gestão responsável e partilhada, atra-vés de uma governância eficaz e mobilizadora.

Luís Ramos, Ricardo Bento e Nuno Azevedo reflectem a igualdade de oportunidades noacesso aos serviços públicos enquanto indicador crucial da qualidade de vida das populaçõese um dos objectivos da política de ordenamento do território. Neste âmbito, fazem uma abor-dagem aos serviços de urgência na região de Trás-os-Montes e Alto Douro, tendo calculado aacessibilidade a estes serviços em três situações distintas: a situação pré-reordenamento, asituação com a proposta de reordenamento preconizada pelo Ministério da Saúde e a situaçãoproposta com as novas acessibilidades viárias.

Deolinda Costa aborda o papel da Carta Educativa enquanto instrumento de planeamentoao nível local. O Município está num lugar central de todo o processo, pelas atribuições e com-petências que lhe são conferidas. Esta situação faz com que a Carta Educativa ocupe uma posi-ção de referência na actividade dos serviços de planeamento e de educação das autarquias.Partindo de um instrumento de planeamento sectorial, que se pretende dinâmico, participativo,democrático, implicando o envolvimento e a cooperação de todos os agentes educativos, desdea administração central, regional à local (comunidade escolar e educativa), faz-se uma refle-xão crítica de uma trajectória de reordenamento da rede educativa.

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Fernando da Fonseca Cruz dá-nos um contributo metodológico para a delimitação da REN.Considera que a REN, numa perspectiva nacional, funcionou como um importante travão àocupação difusa sobretudo em determinados territórios classificados ou com maior valor eco-lógico, promovendo a defesa da biodiversidade dos ecossistemas mais representativos. Aten-dendo ao novo regime jurídico da REN, discute e propõe uma metodologia para a delimitaçãoda REN com recurso à tecnologia SIG, aplicada ao caso do Concelho de Oeiras.

João Rapazote traz-nos uma reflexão conceptual sobre o «lugar». Relembra-nos como aGeografia sempre se fez com um olhar atento a outros saberes, nomeadamente àqueles quereflectem sobre o território e dele dão uma outra perspectiva. Neste artigo dá-se uma especialênfase à visão da Antropologia, fornecendo pistas de teorização do território como conceitocada vez mais complexo e emergente.

Carlos Moreira Cruz problematiza o efectivo papel do cadastro no processo de planea-mento local português, através de exemplos concretos de iniciativa pública e privada. Combase na análise realizada considera que o cadastro é relativamente pouco importante quandoos agentes privados e sobretudo os agentes públicos assumem papéis activos em prole da qua-lidade dos processos de desenvolvimento urbano.

Jorge Gonçalves faz uma reflexão sobre a «deriva urbanística» do Planeamento Municipal.Os municípios portugueses têm vindo a desenvolver um leque diversificado de instrumentospara o desenvolvimento, hoje na posse de municípios e associações de municípios (CartaSocial, Programa Local de Habitação, Carta Desportiva, Carta Educativa, Carta do Patrimó-nio, Projecto de Urbanismo Comercial, Plano de mobilidade sustentável, Agenda local XXI,Projecto de regeneração urbana, Plano estratégico de cidade, Guia de marketing urbano,Plano de protecção civil, entre muitos outros). Assim, a actual deriva do planeamento localpode ser uma consequência do desenvolvimento local ou a sua própria justificação.

Por fim, Filipe Baptista Silva realça a necessidade de se popularizar a produção, difusão eutilização, quer para efeitos da simples visualização, quer para efeitos de análise mais avan-çada, de cartografia dasimétrica aplicada às distribuições demográficas. Os desenvolvimentosocorridos na última década em cartografia dasimétrica foram impulsionados pelos novosmeios computacionais (hardware e software) e pela disponibilização crescente de informaçãogeográfica digital. Neste sentido, é de estimular o desenvolvimento teórico e/ou aplicado destatécnica cartográfica.

Pensamos que se trata de um número pertinente, abordando sobretudo uma escala geográ-fica – local – em diversos focos temáticos. Esta escala tem ocupado um número crescente degeógrafos que têm colocado o seu conhecimento em prol de um país melhor ordenado.

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Introdução

A situação actual do sistema de planea-mento e gestão territorial em Portugal mereceuma reflexão em torno das alterações recentesque resultaram, para os municípios, no reforçoda sua autonomia em matéria de ordenamentodo território. A desconcentração e descentrali-zação operadas no sistema e a consequenteredistribuição de competências, sobretudo aonível da decisão, implicam responsabilidadesacrescidas não apenas no âmbito municipalmas a todos os níveis de intervenção.

As alterações introduzidas globalmente nosistema correspondem a uma evolução no sen-tido da sua consolidação. Pretende-se aquianalisar o que significa esta evolução, sobre-tudo na perspectiva dos municípios, e as res-ponsabilidades e os desafios que daí resultam.Procura-se, no entanto, nunca perder de vista ainserção dos municípios num sistema maisvasto, de âmbito regional e nacional, no qualresidem elementos fundamentais para o bomdesempenho da actuação municipal em maté-ria de ordenamento do território e urbanismo.

A presente reflexão conduz, naturalmente,à identificação de acções que importa aindadesenvolver e que constituem os desafios queterão de enfrentar no futuro próximo as diver-sas entidades que operam aos vários níveis deintervenção do sistema de planeamento e ges-tão territorial.

1. Evolução recente

Ao longo dos seus 10 anos de existência, osistema de planeamento e gestão do territórioexistente em Portugal tem revelado algumasimperfeições reconhecidas por todos os quenele se envolvem e que, de um modo geral,afectam negativamente a credibilidade doexercício de ordenamento do território. Efecti-vamente, o sistema consagrado na Lei deBases da Política de Ordenamento do Territó-rio e Urbanismo (LBPOTU)1 e regulamentadoatravés do Regime Jurídico dos Instrumentosde Gestão Territorial (RJIGT)2, consiste num

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AAAA SSSSIIIITTTTUUUUAAAAÇÇÇÇÃÃÃÃOOOO AAAACCCCTTTTUUUUAAAALLLL DDDDOOOO SSSSIIIISSSSTTTTEEEEMMMMAAAA DDDDEEEE PPPPLLLLAAAANNNNEEEEAAAAMMMMEEEENNNNTTTTOOOO EEEE GGGGEEEESSSSTTTTÃÃÃÃOOOO

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Ana C. Catita*

Inforgeo, 2009, 9-15

* Geó[email protected]

1 Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto, com as alteraçõesintroduzidas pela Lei n.º 56/2007, de 31 de Agosto.

2 Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, comas alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º53/2000, de 7 de Abril, pelo Decreto-Lei n.º 310/2003,

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quadro conceptual muito completo, teorica-mente articulado e abrangente, mas que, naprática, se revela pouco eficiente e demasiadorígido.

O contexto em que surgiu o actual quadrojurídico, marcado pela necessidade de promo-ver um planeamento sistemático e pela limi-tada experiência nesta matéria, quer ao nívelda administração pública quer por parte dosoperadores privados, pode justificar a ênfasena regulação dos procedimentos, bem comoum normativo excessivamente detalhado emcertos aspectos. Por outro lado, a prática temincidido mais na componente da elaboração deplanos de ordenamento e muito menos na suaimplementação e controlo de execução, resul-tando numa fraca gestão territorial.

Cerca de 8 anos mais tarde e com o territó-rio nacional quase totalmente abrangido porplanos directores municipais, o contexto ini-cial é significativamente diferente. Aumen-taram as pressões sobre o território, surgiramnovos padrões de ocupação do solo, evoluí-ram, em termos de formação e experiência, osdiversos intervenientes nos processos de pla-neamento territorial e, por estas razões mastambém pelo intensificar das preocupaçõesambientais, acentuou-se a consciência socialno que respeita ao ordenamento do território.

Neste novo contexto, as imperfeições e asdisfunções do sistema de planeamento torna-ram-se mais evidentes. São consensuais ascríticas sobre o tempo de elaboração e apro-vação de planos, a descoordenação das diver-sas entidades envolvidas, a desadequação dosconteúdos obrigatórios dos planos face àssuas diversas finalidades e, sobretudo, a rigi-dez dos planos, que os torna muito poucoresistentes a mudanças no contexto socioeco-nómico.

Tendo por base um diagnóstico quase uni-versalmente consensualizado e aproveitando adinâmica gerada pela conjugação temporal denovos instrumentos de planeamento – conclu-são do Programa Nacional da Política de

Ordenamento do Território (PNPOT)3; elabo-ração, em simultâneo, de planos regionais deordenamento do território (PROT) para todasas regiões do Continente; abertura de um novociclo de planos directores municipais (PDM) –o actual quadro jurídico foi objecto de umesforço de aperfeiçoamento nos últimos anos,que visou, fundamentalmente, a simplificaçãoe a eficiência do sistema de planeamento egestão territorial.

Às recentes alterações do RJIGT4 acresce aregulamentação complementar5 que se encon-trava em falta desde a entrada em vigordaquele diploma legal, concretamente, a defi-nição de critérios de classificação e qualifica-ção do solo, o estabelecimento de conceitostécnicos de ordenamento do território e urba-nismo e a definição da cartografia a utilizarnos planos de ordenamento. Acresce ainda arevisão de outros regimes territoriais conexos,com destaque para a alteração do regime daReserva Ecológica Nacional (REN)6.

A par do desenvolvimento do quadro legal,foram elaborados novos instrumentos de pla-neamento territorial de âmbitos nacional(PNPOT) e regional (PROT) que enquadramos planos municipais de ordenamento do terri-tório (PMOT). Assistiu-se também a umgrande incremento no número de planos emvigor, tanto de âmbito municipal como noâmbito dos planos especiais (planos de orde-namento de albufeiras, de áreas protegidas ede orla costeira).

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de 10 de Dezembro, pela Lei n.º 58/2005, de 29 deDezembro, pela Lei n.º 56/2007, de 31 de Agosto, peloDecreto-Lei n.º 316/2007, de 19 de Setembro, e peloDecreto-Lei n.º 46/2009, de 20 de Fevereiro.

3 Publicado pela Lei n.º 58/2007, de 4 de Setembro.4 Alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º

316/2007, de 19 de Setembro, e pelo Decreto-Lei n.º46/2009, de 20 de Fevereiro.

5 Decreto Regulamentar n.º 9/2009, de 29 de Maio,Decreto Regulamentar n.º 10/2009, de 29 de Maio eDecreto Regulamentar n.º 11/2009, de 29 de Maio.

6 Decreto-Lei n.º 166/2008, de 22 de Agosto.

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Por outro lado, o desenvolvimento doSNIT (Sistema Nacional de Informação Terri-torial) tornou mais eficiente o acesso aos ins-trumentos de planeamento territorial em vigore, de um modo geral, à informação relevantepara o planeamento e gestão territorial. A cria-ção do SNIT constituiu um passo importantena operacionalização do sistema, contribuindoainda para o incremento da sua visibilidade ecredibilidade.

Associando a toda esta dinâmica a expe-riência acumulada pela prática de uma décadade vigência do RJIGT, há que admitir umagrande evolução do sistema de planeamento egestão territorial português no sentido do seuamadurecimento, do seu aperfeiçoamento e,mesmo, da sua consolidação. O ordenamentodo território encontra-se, definitivamente,numa nova era, a qual acarreta responsabilida-des acrescidas para os vários agentes, implicao desenvolvimento de novas competências e,sobretudo, exige a correcção das disfunçõesque ainda persistem.

2. Redistribuição de competências

Nos últimos anos, a actuação no planolegislativo foi orientada por objectivos de efi-ciência dos processos de planeamento e dequalificação das práticas técnicas e adminis-trativas, tendo como principal preocupaçãodireccionar o sistema de planeamento e gestãoterritorial a favor das pessoas, da sua quali-dade de vida e da sustentabilidade dos proces-sos de desenvolvimento.

As alterações introduzidas no RJIGT em2007 e 2009 visaram a desconcentração, des-centralização, responsabilização, participaçãoe coordenação intersectorial. Houve uma preo-cupação de repartir de forma clara e diferen-ciadora as atribuições e competências entre oEstado e as Autarquias Locais, de introduzirmecanismos de coordenação intersectorial (de

que é exemplo a figura de «conferência de ser-viços») e de agilizar os processos de decisão.

No que afecta directamente a esfera dasresponsabilidades municipais, observam-sedois tipos de alterações: (a) as que transferemobjectivamente para os municípios determina-das decisões no âmbito dos procedimentos deelaboração, alteração e revisão dos planos e(b) as que se inserem num novo quadro derelacionamento entre os municípios e ascomissões de coordenação e desenvolvimentoregional (CCDR).

No primeiro grupo, destacam-se:

i. A atribuição de excepcionalidade à rati-ficação de PDM pelo Conselho deMinistros e a eliminação da ratificaçãodas restantes figuras de PMOT;

ii. A eliminação da ratificação da suspen-são de PMOT;

iii. A decisão de submeter planos de urba-nização e de pormenor a avaliaçãoambiental;

iv. A substituição do registo de planos naDirecção-Geral de Ordenamento doTerritório e Desenvolvimento Urbano(DGOTDU) pelo simples depósito semobjectivos de controlo da legalidade,passando a ser a câmara municipal aenviar o plano directamente para publi-cação em Diário da República.

Estas alterações implicam que a Autarquiapasse a assumir toda a responsabilidade pelocumprimento das disposições legais que oPMOT tem de respeitar, incluindo a verifica-ção que estava anteriormente a cargo dasCCDR e da DGOTDU relativa à conformi-dade e compatibilidade do plano com osoutros instrumentos de gestão territorial emvigor e com outros regimes territoriais espe-ciais (REN, RAN, domínio hídrico, etc.).

Este incremento da responsabilizaçãomunicipal não significa, no entanto, que oEstado se demita das tarefas que lhe são cons-

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titucionalmente cometidas em matéria deordenamento do território. Aliás, nesse sentidofoi reorientada a intervenção das CCDR emdiversos procedimentos, resultando num rela-cionamento diferente com os municípios.

Às CCDR cabe, agora, um papel menoscontrolador, mais consultivo e, simultanea-mente, mais fiscalizador no processo de pla-neamento e na execução dos planos. Verifica--se ainda a reafirmação das suas funções decoordenação intersectorial. Evidência destenovo posicionamento das CCDR encontra-sena explicitação do carácter facultativo doacompanhamento dos planos de urbanização ede pormenor, na introdução da conferência deserviços no processo de decisão, na naturezanão vinculativa do parecer final da CCDRsobre a versão final do PDM a apresentar àAssembleia Municipal e, ainda, na previsão daemissão de pareceres nos procedimentos desuspensão de planos e no estabelecimento demedidas preventivas.

O novo quadro legal clarifica assim as res-ponsabilidades entre os níveis central e localda administração pública, procurando simpli-ficar procedimentos e tornar mais céleres emais eficientes os processos de planeamento egestão territorial.

3. Novos conteúdos

A evolução registada no quadro legal con-templou também ajustamentos no conteúdodos planos e nas metodologias de elaboração.Num primeiro momento, as alterações doRJIGT vieram:

i. Reforçar o papel enquadrador que osPDM desempenham face aos demaisPMOT e no estabelecimento de progra-mas de acção territorial (PAT), o queacentua a natureza estratégica dos PDMe a necessidade de os municípios assu-

mirem de forma mais sistemática osplanos de urbanização e de pormenor,mais operativos e mais adequados àgestão urbanística7.

ii. Introduzir uma perspectiva de «flexibili-dade» no conteúdo material dos planosde urbanização e de pormenor, que pas-sam a ser ajustados às condições da áreade intervenção (dimensão, inserção geo-gráfica, articulação com outros territó-rios, etc.) e às finalidades do plano.

iii. Converter o plano de urbanização numinstrumento estruturante do território,procedendo à articulação de funções eredes, à definição de regimes de uso dosolo e de critérios de transformação do usoe à programação da ocupação do solo.

iv. Reafirmar a vocação do plano de por-menor como instrumento de planea-mento para a execução urbanística,podendo assumir efeitos registais.

Em 2009, a publicação dos três decretosregulamentares referentes aos critérios de clas-sificação e qualificação do solo, aos conceitostécnicos e à cartografia, além de suprirem umalacuna que existia no regime jurídico desde asua criação em 1999, constituem uma rele-vante contribuição para a clarificação de con-ceitos, para a uniformização de critérios e paraa harmonização dos conteúdos dos planos. Noentanto, estes diplomas determinam tambémmudanças no conteúdo dos planos, no próprioprocesso de planeamento municipal e até naforma como os municípios têm encarado odesenvolvimento urbano.

Reafirmando o princípio da programação

7 As vantagens de uma abordagem sistemática aoplaneamento de maior escala não são apenas umaquestão de precisão e detalhe do plano, passandoessencialmente pelo controle de execução do plano epela perequação, aspectos que não podem ser eficaz-mente tratados ao nível dos PDM. (Cfr. IsabelMoraes Cardoso, 2005)

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Planear o Local

da urbanização e da edificação, o novodiploma da classificação e qualificação dosolo explicita claramente a responsabilidadedos municípios no processo de urbanização8, oque, aliás, decorre da Constituição da Repú-blica Portuguesa. Neste sentido, os municípiosnão podem deixar os processos de urbanizaçãodependentes da iniciativa privada, mas têmque definir uma estratégia de desenvolvimentourbano para o seu território, programar aimplementação dessa estratégia e adoptar umaatitude proactiva na promoção das áreas aurbanizar. Não sendo esta abordagem umainovação9, só neste diploma é apresentada deforma explícita e operativa.

Esta abordagem não coloca de parte ospromotores privados, que podem contratuali-zar com o município a concretização das acti-vidades de urbanização, no quadro estratégicoque este definiu para o desenvolvimentourbano do seu território10. Determina, noentanto, a imprescindibilidade da existência deuma estratégia municipal de ordenamento doterritório, e em particular de desenvolvimentourbano, a qual encontra no PDM um instru-mento privilegiado.

A operacionalização dos programas deacção territorial (PAT) previstos no RJIGT e arecente regulação dos contratos para planea-mento vêm precisamente reforçar os mecanis-mos de participação privada nos processos deplaneamento territorial, clarificando responsa-

bilidades, direitos e deveres de cada parte aenvolver, num quadro de maior transparênciados processos.

4. Importância dos PROT

Neste novo contexto de autonomia e res-ponsabilização municipal, ganha acrescidaimportância o estabelecimento de um referen-cial regional através dos planos regionais deordenamento do território (PROT), instrumen-tos fundamentais para o exercício das compe-tências do Estado em matéria de ordenamentodo território.

Sendo os PROT, por natureza, instrumen-tos de planeamento estratégico, devem contertodos os elementos que permitam enquadrar,de forma objectiva, o planeamento territorialde âmbito municipal. É no PROT que se esta-belece o quadro face ao qual os municípiosirão aferir da legalidade e da adequação dassuas estratégias de ordenamento municipais.É, portanto, no âmbito da articulação doPROT com as estratégias municipais que setem que estabelecer o equilíbrio necessáriopara a efectiva responsabilização dos municí-pios pelas suas opções em matéria de ordena-mento do território.

Isto confere uma importância fundamentalnão só ao conteúdo do PROT, mas também aoseu processo de elaboração, à forma comoresolve as questões de coordenação intersecto-rial e como determina o que é realmente rele-vante para a região. Nenhum outro instru-mento de gestão territorial enfrenta os desafioscom que o PROT se depara pela sua posiçãode charneira no sistema de planeamento terri-torial.

5. Ajustar a Prática

Para a efectiva consolidação do sistema deplaneamento e gestão territorial não basta o

8 Decreto Regulamentar n.º 11/2009, de 29 deMaio, artigo 8.º, n.º 2 e artigo 22.º n.º 3.

9 Cfr. Correia, 2001.10 Como refere Josué Caldeira (2008) na inter-

venção feita na Conferência da Ad Urbem que assi-nalou os 10 anos da LBOTDU,»… a coordenação eprogramação dos instrumentos de planeamento terri-torial determina para os particulares o dever de con-cretizar e adequar as suas pretensões às metas eprioridades estabelecidas nos planos(LBOTU, art.º16, §3). Pretende-se, desta forma, realçar a naturezapública do ordenamento do território e impor o prin-cípio do desenvolvimento urbanístico em conformi-dade com o plano».

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aperfeiçoamento do quadro legal nem o com-pletamento do edifício constituído pelos dife-rentes âmbitos territoriais do planeamento(nacional, regional, municipal). Mais que isso,requer a evolução das práticas de planeamentoe de gestão do território, num processo dedesenvolvimento de competências e de capaci-tação técnica, tanto no seio da administraçãopública como na esfera privada em que assentaa elaboração dos planos e a execução da urba-nização.

Este processo avança mais lentamente doque a reformulação do quadro jurídico, querporque envolve um universo muito alargadode agentes quer porque enfrenta a inércia dasrotinas instaladas. Daqui resulta algum desfa-samento entre as expectativas que o sistemapode criar em teoria e o planeamento que,efectivamente, é praticado. Suprir este desfa-samento compete a todas as entidades comresponsabilidades nos processos de planea-mento, embora haja algumas que têm atribui-ções específicas na área formativa, na dissemi-nação de boas práticas e na promoção doconhecimento técnico e científico aplicado.Nesta situação estão, naturalmente, as institui-ções de ensino superior mas, ao nível doEstado, a autoridade nacional de ordenamentodo território e urbanismo tem aqui um impor-tante papel a desempenhar11.

A responsabilidade dos municípios nestamatéria também não pode ser ignorada. São osmunicípios que «estão no terreno». É noâmbito municipal que se concretizam as estra-tégias de desenvolvimento e ordenamento, quese viabilizam as localizações das actividades edos equipamentos, que se garante a qualidadede vida dos cidadãos e a sustentabilidade terri-torial. Isto confere aos municípios uma res-ponsabilidade acrescida no que respeita à boacondução dos processos de planeamento.

6. Futuro próximo

A evolução registada no sistema de planea-mento e gestão territorial, especialmente acen-tuada nos últimos 4 anos, acarreta novas exi-gências para os diversos intervenientes nos pro-cessos de ordenamento do território, desde ostécnicos e decisores da administração públicaaté aos cidadãos em geral, passando pelos pro-motores urbanísticos, projectistas e especialis-tas sectoriais. Estas exigências traduzem-se naqualidade do trabalho que têm que desenvolvere na responsabilização perante deveres e direi-tos que se tornaram mais claros e objectivos. Éum desafio que todos enfrentam.

Da parte do Estado e das Autarquias Locaishá que dar continuação a este processo de con-solidação. Por diversas razões, a LBPOTUainda se encontra por cumprir, pelo que há uma«agenda de trabalhos a desenvolver, envol-vendo as diversas entidades públicas com atri-buições no capítulo do ordenamento do territó-rio e do urbanismo, tendo como objectivo aimplementação plena da LBPOTU.» (Caldeira,2008). No documento em referência, a estrutu-ração desta agenda por âmbitos territoriais deintervenção permite facilmente identificar asentidades a envolver na sua concretização.

No entanto, a montante desta agenda, noplano jurídico-administrativo, importa criarcondições para um desempenho eficaz das res-ponsabilidades inerentes ao ordenamento doterritório.

Em primeiro lugar, está ainda por definirem Portugal o estatuto jurídico do solo asso-ciado aos direitos e deveres dos respectivostitulares ou proprietários, dos cidadãos emgeral e da administração pública. Um quadrojurídico seguro e estável sobre os estatutosurbanísticos do solo, materializado numa novaLei dos Solos,é fundamental para a definiçãode políticas de solos eficazes quer no âmbitolocal quer a nível nacional, e para suporte dasdiversas políticas territoriais, nomeadamente:políticas de cidades (nos planos da expansão

11 Lei orgânica da DGOTDU: Decreto Regula-mentar n.º 54/2007, de 27 de Abril.

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urbana, da habitação, da reabilitação urbana eda relação entre os espaços públicos e os pri-vados), políticas de preservação ambiental econservação da natureza e políticas de ordena-mento e valorização dos espaços rurais.

No mesmo plano jurídico-administrativo, oreforço da acção fiscalizadora do Estado é umaconsequência directa da consolidação da auto-nomia municipal em matéria de ordenamentodo território. A componente fiscalizadora dasentidades da administração central nesta maté-ria é ainda incipiente. Apesar de algum desen-volvimento recente da componente de ordena-mento do território no seio da Inspecção Geraldo Ambiente e do Ordenamento do Território(IGAOT), há ainda que incrementar competên-cias e sistematizar a actuação.

Para finalizar, justifica-se uma referênciamais genérica à necessidade de recentrar o sis-tema de planeamento e gestão territorial naexecução dos planos, como forma não só deaproximar o ordenamento do território e ourbanismo dos cidadãos, mas sobretudo paratornar mais eficazes as políticas territoriais.Isto implica ajustar as figuras de planeamentoexistentes e operacionalizar os mecanismos deintervenção pública. Significa, também, valo-rizar o planeamento estratégico e flexibilizaros instrumentos de planeamento e gestão terri-torial de âmbito municipal.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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CARDOSO, Isabel Morais (2005). Défice de Planosde Urbanização e de Planos de Pormenor, inArquitecturas, 7, Dezembro 2005, pp. 41 e 42.

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IIIINNNNTTTTEEEERRRRVVVVEEEENNNNÇÇÇÇÕÕÕÕEEEESSSS RRRREEEECCCCEEEENNNNTTTTEEEESSSS NNNNOOOO SSSSNNNNIIIIGGGG EEEE DDDDEEEESSSSAAAAFFFFIIIIOOOOSSSS PPPPAAAARRRRAAAA OOOO MMMMEEEERRRRCCCCAAAADDDDOOOO DDDDEEEE IIIIGGGG

Rui Pedro Julião*

Inforgeo, 2009, 17-25

Resumo

Com a entrada em vigor da Directiva INS-PIRE em Maio de 2007 veio consolidar-se aimportância das infra-estruturas de dadosespaciais (IDE) enquanto elementos desuporte à formulação e gestão de políticas deâmbito europeu. A criação da futura infra--estrutura europeia passa pelo desenvolvimentoe articulação das várias iniciativas de infra--estruturas nacionais, cujo desenvolvimentoestá a cargo dos respectivos estados membros.

Portugal foi e continua a ser um País pio-neiro neste sector e tem vindo a promoverdiversas iniciativas para a reformulação doSistema Nacional de Informação Geográfica(SNIG), bem como para a dinamização domercado nacional de informação geográfica.

As intervenções do IGP nos últimos anostêm vindo a permitir um número acrescido defuncionalidades do espaço do SNIG e culmi-naram recentemente com a substituição inte-gral da plataforma operacional do site. Tam-bém foram lançados novos desafios para a uti-lização da informação geográfica através dosacordos celebrados com vários parceirosnacionais e internacionais.

Nesta apresentação irá efectuar-se umadescrição das principais intervenções realiza-das pelo IGP, enquadrando-as na estratégianacional para a Informação Geográfica.

Palavras-chave: SNIG; Infra-estruturasde Dados Espaciais; IGP

1. Enquadramento e antecedentes

A infra-estrutura de dados espaciais nacio-nal, o SNIG (http://snig.igeo.pt/), foi criada há18 anos através do Decreto-Lei nº 53/90 de 13de Fevereiro, tendo sido a primeira a serdesenvolvida na Europa e a primeira a ser dis-ponibilizada na Internet em 1995.

Desde então, e sobretudo já nesta década,houve um substancial acréscimo do interessepor estas infra-estruturas, reconhecendo-se opapel vital que podem desempenhar no apoioà formulação, implementação e gestão de polí-ticas e acções de âmbito territorial, quer porparte de agentes públicos, quer por parte dosprivados.

Hoje, muito mais do que a representação car-tográfica do espaço, importa a informação quesobre ele se consegue coligir, organizar, aceder eexplorar, numa perspectiva pragmática e dinâ-mica. Mais do que simples repositórios de dados,* Instituto Geográfico Português. Subdirector-Geral.

[email protected]

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é imprescindível abrir e fazer uso da informaçãoexistente, através das infra-estruturas da Socie-dade da Informação e do Conhecimento.

Em Maio de 2007, após 6 anos de intensapreparação, entrou finalmente em vigor aDirectiva INSPIRE a qual vem criar um qua-dro de desenvolvimento para as IDE naEuropa e atribuir grandes responsabilidadesaos Estados Membros e produtores de Infor-mação Geográfica.

O surgimento desta directiva veio dar umimpulso determinante para a consolidação destandardsde dados e serviços, no sentido de segarantir uma eficaz interoperabilidade dos sis-temas e um maior potencial para as IDE.

Também se verifica uma crescente sensibi-lização dos cidadãos para a utilização de dadosgeográficos, primeiro pela introdução e poste-rior banalização do GPS nos veículos automó-

veis e depois pelo surgimento em 2005 do key-hole, posteriormente massificado como Goo-gle Earth.

Este movimento tem sido acompanhadopor uma democratização no acesso aos dadosgeográficos, fomentada pela disponibilizaçãode serviços de dados de acordo com os stan-dards do Open Geospatial Consortium (OGC),pelo crescente aparecimento de ferramentasopensourcecom funcionalidades cada vezmais completas e também por alguns movi-mentos livres de criação e disponibilização deestruturas de dados (openstreetmap.org).

É neste contexto que se têm pensado eimplementado as alterações ao SNIG. Atéagora as intervenções centraram-se namudança de visual e reorganização de conteú-dos existentes, bem como no desenvolvimentode aplicações para os utilizadores.

A lógica subjacente à intervenção em cursoé a de consolidar uma infra-estrutura que per-mita identificar, visualizar e explorar informa-ção geográfica, bem como aceder a bases dedados temáticas, a partir de componentesinterligadas (Metadados, Produtos, Serviços eMercado) suportadas por uma estrutura dedados harmonizada disponibilizada a partirdos seus respectivos produtores e acessívelatravés do geoPORTAL.

O SNIG resulta de um esforço nacional(pioneiro a nível europeu e mesmo mundial) esó poderá permanecer como Sistema Nacional

se houver uma participação activa e empenhadade todos, produtores e utilizadores de informa-ção geográfica. Compete ao Instituto Geográ-fico Português (IGP) a coordenação e dinami-zação do processo o que, importa frisar, não sedeve confundir com a titularidade sobre osdados e informação disponibilizada pelo SNIG.

2. GeoPORTAL

Hoje o SNIG é uma das primeiras infra-estru-turas de dados espaciais que possui um portal no

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Figura 1 – A evolução do Portal do SNIG

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Figura 2 – A estrutura do SNIG

Figura 3 – Exemplos de visualizadores de IDE

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qual se encontram implementadas as principaisfuncionalidades. Com efeito, o geoPORTAL doSNIG possui como componentes básicas:

• Catálogo• Visualizador• Aplicações• Espaço Geocomunidade

Em muitos casos a face visível das infra--estruturas existentes corresponde ao seuvisualizador, mas é importante que se percebaque esta é apenas uma das componentes e nempor isso a mais relevante.

Em cada uma das quatro componentes doSNIG, anteriormente identificadas, estão dis-poníveis dados, aplicações e serviços deacesso livre e gratuito sobre a informação geo-gráfica existente em Portugal.

O catálogo de metadados do SNIG contahoje com mais de 9000 registos, referentes a

dados, serviços de dados e aplicações. Estesregistos têm vindo a crescer em número signi-ficativo, sobretudo depois da aposta que foifeita na criação de uma aplicação específicapara a sua criação, o MIG, e da realização devárias acções de formação.

O IGP, enquanto entidade coordenadora edinamizadora do SNIG, reconhecendo que umdos pontos nevrálgicos de uma IDE é o seucatálogo de metadados, fez um esforço para acriação de uma ferramenta de edição de meta-dados em língua portuguesa e de acordo com opreconizado pelas normas ISO, designada-mente as ISO 19115, ISO 19119 e ISO 19139.Surgiu assim o editor de Metadados de Infor-mação Geográfica, conhecido pelo acrónimoMIG, que vai hoje na versão 2.2.

Este editor está disponível na página doSNIG para downloade é compatível com outrasaplicações de gestão de metadados que obede-cem às normas e recomendações do OGC.

Figura 4 – Interface do MIG

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Através desta aplicação é possível docu-mentar de forma estruturada todos os dados eserviços de dados da responsabilidade dasdiferentes entidades.

Para aceder aos dados recorre-se à inter-face do catálogo que permite criar um con-junto de pesquisas com base em várias solu-ções. Podem ser efectuadas pesquisas por

palavras, por tipo de dados, por tipo de dispo-nibilização, por períodos temporais e tambémcom recurso a topónimos ou definindo interac-tivamente a área de interesse.

Com base neste vasto conjunto de possibi-lidades é fácil efectuar a conjugação que nospermite identificar os dados mais relevantespara as nossas necessidades.

Figura 5 – Interface do Catálogo

Figura 6 – Interface do visualizador

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Em termos de visualização de dados é hojepossível aceder a todos os serviços de dadosque existam no SNIG e em outros servidoresque cumpram os requisitos do OGC, forne-cendo dados em serviços standard, comosejam os WCS, WFS e WMS.

Os serviços base do SNIG permitem hojeaceder de imediato aos dados disponibilizadospelo IGP, sejam os que se referem à CartaAdministrativa Oficial de Portugal (CAOP),sejam aos compilados aquando da execuçãodo Atlas de Portugal.

Figura 7 – Interacção entre o SNIG e a IDEE

Figura 8 – Componente de Geocomunidade do SNIG

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Há actualmente uma forte colaboração com oInstituto Geográfico Nacional (IGN) de Espanhano sentido de incrementar a colaboração entre asduas infra-estruturas nacionais de dados espa-ciais: o SNIG e a IDEE. Na sequência desseesforço é hoje possível aceder de imediato aosservidores da IDEE a partir do SNIG e vice-versa.

De acordo com os princípios subjacentes àcriação e dinamização do SNIG aqui fica o reptode se utilizar esta infra-estrutura para conhecer evalorizar a nossa riqueza geográfica. Para alémdos serviços de visualização de dados geográfi-cos, da criação e exploração de metadados, dodescarregar de produtos, há um espaço abertopara a troca de experiências e debate centrado natemática da informação geográfica.

A componente de Geocomunidade doSNIG é precisamente o ponto de encontro paraaprender e partilhar experiências através doFórum SNIG, das redes temáticas (como aRISE e o SNIG Educação).

3. Próximos passos e desafios

O IGP no seu papel de entidade coordena-dora e dinamizadora do SNIG vai continuar a

acompanhar de perto a evolução da DirectivaINSPIRE, promovendo a divulgação nacionalde toda a informação a que tenha acesso e aler-tando as restantes entidades e comunidade deIG para os passos fulcrais que tenham de serdados.

Este trabalho iniciou-se com a transposi-ção da Directiva para a lei nacional, efectuadaatravés do Decreto-Lei n.º 180/2009, de 7 deAgosto, que também fez a revisão do Decreto--Lei fundador do SNIG e a criação do RegistoNacional de Dados Geográficos.

Outro aspecto chave para a promoção doSNIG é o da capacitação de todos os agentesenvolvidos. O IGP já realizou várias iniciati-vas de formação sobre metadados e utilizaçãodo MIG e pretende iniciar já em 2008 umaabordagem similar no que diz respeito aos ser-viços de dados. Para além da formação, serátambém assegurado o apoio e suporte às enti-dades que dele necessitarem e na medida daspossibilidades do Instituto.

Ao nível internacional, para além doacompanhamento directo da Directiva INS-PIRE, será dada particular atenção à colabora-ção com a IDEE.

Mas há novos desafios que surgiram no sen-

Figura 9 – Qualidade geométrica das imagens

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tido de aproveitar a dinâmica gerada pelos prin-cipais visualizadores de dados geográficos.

Com efeito Portugal é um dos primeirospaíses a disponibilizar nas plataformas GoogleEarth (Google) e Virtual Earth (Microsoft)uma cobertura homogénea e de qualidade, per-mitindo uma equidade no acesso aos dadosrepresentativos do território.

A questão da qualidade coloca-se ao níveldo rigor geométrico, traduzido na resoluçãodas imagens disponibilizadas. Na Figura 9 ébem patente essa diferença entre o que atéagora estava disponível e o que hoje podemosencontrar. Mas, como podemos observar pelaFigura 10, também é necessário ter em atençãorigor temporal.

Como se pode verificar, nesta imagem daregião da Albufeira de Alqueva, é bem patenteo desfasamento temporal da imagem até agoradisponibilizada.

Através do acordo com a Microsoft foi-semais longe, garantindo o acesso sem custos aAPI (Application Programming Interface) doVirtual Earth. Ora isto vem permitir que os servi-ços da administração pública possam tirar todo opotencial da sua utilização incorporado a infor-mação geográfica oficial nas suas aplicações.

Surge aquilo que foi apelidado de VirtualEarth PT, no sentido de enfatizar os benefíciosderivados desta colaboração e que podem seraproveitados pelos organismos da Administra-ção Pública.

Figura 10 – Qualidade temporal das imagens

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Muitos dos processos que envolvem váriosorganismos da administração estão relacionadoscom algo que se pretende desenvolver em deter-minado local como é o caso de vários os tipos delicenciamento (construção, industrial, turístico,agrícola, inertes, etc.). Através do desenvolvi-mento de aplicações específicas sobre esta pla-taforma, será possível garantir que todas as enti-dades têm acesso à mesma informação, redu-zindo tempos de resposta e eventuais erros dedecisão. Mais, para além do mecanismo de

comunicação interno, é possível dar aos promo-tores acesso imediato e transparente a informa-ção relevante sobre o estado das suas pretensões.

Para finalizar importa referir que estes desa-fios surgem enquadrados numa estratégia doIGP em potenciar a utilização da InformaçãoGeográfica de qualidade, baseando a sua inter-venção em alguns aspectos-chave, como sejam:

• Criar informação de contexto e desuporte à aquisição de elementos vecto-riais de elevada qualidade

• Promover a disseminação e utilização daInformação Geográfica

• Incrementar o crescimento do mercadode serviços associados à InformaçãoGeográfica

• Fomentar a incorporação da InformaçãoGeográfica nos processos de gestão daAdministração Pública

É neste contexto que se utilizam como ins-trumentos a produção de ortofotocartografiadigital, a disseminação de dados através doserviço m@pas on-line, a consolidação doSNIG e o estabelecimento de parcerias comvários agentes relevantes. Aliás, neste sentido,acabou de ficar concluída e já se encontra dis-ponível a primeira cobertura nacional de car-tografia de risco de incêndio florestal.

Esta cobertura será agora actualizadaanualmente.

As linhas estão traçadas e os desafiosestão lançados.

Figura 11 – Cartografia de Risco de IncêndioFlorestal – Série2006/2008

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GGGGOOOOVVVVEEEERRRRNNNNÂÂÂÂNNNNCCCCIIIIAAAA,,,, PPPPLLLLAAAANNNNEEEEAAAAMMMMEEEENNNNTTTTOOOO EEEE EEEESSSSTTTTRRRRAAAATTTTÉÉÉÉGGGGIIIIAAAASSSS DDDDEEEE DDDDEEEESSSSEEEENNNNVVVVOOOOLLLLVVVVIIIIMMMMEEEENNNNTTTTOOOO

TTTTEEEERRRRRRRRIIIITTTTOOOORRRRIIIIAAAALLLL :::: RRRReeee ffff llll eeeexxxxõõõõeeeessss aaaa pppprrrrooooppppóóóóssss iiii ttttoooo ddddaaaatttteeeeoooorrrr iiii aaaa eeee ddddaaaa pppprrrráááátttt iiii ccccaaaa1111

José Rio Fernandes*; Pedro Chamusca**

Inforgeo, 2009, 27-43

Resumo

A abordagem ao desenvolvimento territo-rial tem estado muito ligada às transforma-ções recentes que alteraram as lógicas degoverno, verificando-se que o planeamentoligado ao ordenamento aparece cada vez maisrelacionado com a transição do governo tradi-cional para um sistema de governância terri-torial. A consideração da governância – que éhoje vista como essencial para o desenvolvi-mento – ultrapassa a mera dimensão do pla-neamento ou apenas a valorização da partici-pação, pelo que implica de aprendizagem,sendo que a sua implementação implica con-siderar a dimensão teórica e o conhecimentode situações muito variadas mas, sobretudo, orespeito pelas especificidades que tornamcada experiência única.

Nessa linha, sem esquecer a dimensãomais abstracta, associada a conceitos e meto-dologias, abordamos algumas situações derelacionamento entre políticas e estratégias de

desenvolvimento territorial, considerando emespecial o planeamento e a sua relação com agovernância territorial, numa abordagem comincidência no Norte de Portugal e especialreferência ao Plano Estratégico de Desenvol-vimento de Ponte da Barca – e ao processo aque este deu lugar –, onde se cruzam planea-mento físico, estratégico e participado, com ofortalecimento do sistema de governância ter-ritorial e capacitação da comunidade local,orientados para o desenvolvimento.

Palavras-chave: Desenvolvimento; Gover-nância; Planeamento; Participação.

* CEGOT.** FLUP.

1 O presente texto resulta da releitura e desenvol-vimento da comunicação apresentada na conferência«City Futures» (Madrid, Junho de 2009) sob o títulode «From strategic planning to participated processesof territorial governance», disponível em http://www.cityfutures2009.com/PDF/56_P_Chamusca.pdf

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1. Desenvolvimento, governância, planeamento e participação

1.1. Território e desenvolvimento

O desenvolvimento é um conceito asso-ciado a sistemas complexos, relacionados comos valores e preferências dos indivíduos, com asnecessidades e anseios das sociedades, com umconjunto de componentes económicas, tecnoló-gicas, sociais, políticas e ambientais (designa-damente) e um leque de agentes com interessesespecíficos e natureza diversa: pública (entida-des e organizações internacionais, estados esuas instituições, poderes públicos regionais elocais), privada (empresas e suas organizações,famílias, indivíduos e suas organizações), mista(parcerias e associações entre agentes públicose privados) e representantes do terceiro sector,ou associações não-governamentais.

Reconhecendo o espaço como mais que ummero suporte para as pessoas, actividades e flu-xos de bens e informação, vários autores e docu-mentos de natureza política tendem a valorizar adimensão territorial do desenvolvimento e aconsiderar três domínios: económico, social eambiental, geralmente traduzidos em objectivosde competitividade, coesão e sustentabilidade.

Para uma intervenção eficaz nestes trêsdomínios (que outros dirão de sustentabilidadeeconómica, social e ambiental), a administra-ção e a participação são entendidas como essen-ciais, mais ainda se associadas a uma visão deplaneamento flexível e participado. A necessi-dade de planear (e de certa forma «controlar»)a transformação dos territórios, com políticas einstrumentos de intervenção variados, não é dehoje, é bem sabido. De há muito que a admi-nistração, às escalas nacional, regional e local,optaram pela utilização de políticas de planea-mento e ordenamento do território que permi-tissem fomentar e orientar os processos dedesenvolvimento, seja no sentido de produzir

riqueza, ou em nome da melhoria da qualidadede vida e do bem-estar social, da preservação(e/ou potenciação) dos valores naturais, cultu-rais e humanos e crescimento das actividadeseconómicas, entre outros objectivos maiscomummente enunciados.

No entanto, ao tratamento da dimensãoespacial vista como a base de uma necessidadede ser planeada/ordenada, em nome de lógicasde crescimento regional ou de regulações tec-nocratas convencidas da capacidade de coman-dar o futuro, têm sucedido várias outras. Taldeve-se, em boa parte, à expansão e aprofun-damento das dinâmicas de globalização e aoaumento do número e da complexidade dasrelações e interdependências entre diferentesactores e escalas; além disso, o território passacada vez mais a ser entendido como realidadeeconómica, social e identitária, directamenterelacionada com a capacidade e o tipo dedesenvolvimento das cidades, das regiões, dospaíses ou até de conjuntos de países (ver LivroVerde sobre Coesão Territorial Europeia).Numa outra perspectiva, importa considerarque as alterações na organização económicapodem ser observadas também na sua associa-ção com «a emergência de uma economiainformacional e global» (Castells, 1996 p. 32),fruto dos processos de globalização, da revolu-ção tecnológica e das novas formas de organi-zação das empresas (em rede). As transforma-ções conduzem ao aparecimento de um novoespaço de economia e à valorização do territó-rio, donde uma progressiva transição de ummodo de organização da actividade económicamaioritariamente estruturado em torno derecursos e capacidades locais (frequentementereferenciados ao espaço do Estado-Nação) paraum outro onde se assiste ao extravasar doslimites anteriormente fixados por razões geo-gráficas, políticas, históricas e/ou técnicas.

Em Portugal, como noutros países, os fun-damentos destas transformações parecem estarrelacionados essencialmente com duas variá-veis, fortemente interligadas: um processo de

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globalização que foi acompanhado por dinâmi-cas de redefinição territorial, integração euro-peia, descentralização e perda de poder doEstado (Badie, 1995; Governa e Salone, 2005)e, por outro lado, por terem emergido novas for-mas e padrões de acção colectiva, que permiti-ram o aparecimento e a consolidação de formasde parceria, de cooperação institucional, de pla-neamento estratégico e gestão territorial.

Na sequência de outros trabalhos (Andersene Von Kempen, 2003), podem identificar-secinco tendências associadas à emergência denovas políticas e estratégias de desenvolvi-mento territorial, designadamente a transiçãodo governo para a governância, a valorizaçãoda capacitação dos habitantes e das comunida-des locais, o desenvolvimento de políticas maisselectivas, a construção de projectos integradoscom acções de natureza diversa e a utilização demecanismos de contratualização, dimensõesque serão consideradas de seguida, na aborda-gem a alguns exemplos de planeamento e ges-tão territorial no Norte de Portugal, com espe-cial incidência no município de Ponte da Barcae no seu plano e processo estratégico.

1.2. Do governo à governância

Nas últimas três décadas, a Europa conhe-ceu alterações institucionais muito importan-tes que mudaram progressivamente e de formasignificativa a organização política e adminis-trativa das cidades, das regiões e dos países,num processo que está associado à mudançade escalas políticas e territoriais (ou alteraçãoda sua importância relativa), em que o Estadodeixa de representar o único campo da acçãocolectiva no contexto da globalização (LeGalès, 2002), assim como a mudanças políti-cas e ideológicas, designadamente as que fica-ram associadas ao colapso dos países domina-dos pelo planeamento central e pela concen-tração do poder decisório.

Estes elementos, combinados com as

características demográficas e as necessidadessociais cada vez mais sofisticadas e dispendio-sas, forçam a transição de um modelo tradicio-nal de Estado Social e do Bem-Estar e aborda-gens top-down, focadas nos princípios tradi-cionais de «Governo», para um modelo de«Governância», assente em redes de parceriase múltiplos agentes, na privatização e regula-ção e numa multiplicidade de relações, comaumento das abordagens bottom-upe o Estadocada vez mais relegado a um papel de regula-dor e mediador do processo de desenvolvi-mento. Apesar de um certo reforço do Estadocom a crise actual, as mudanças continuamevidentes e não deverão retroceder, já quemesmo nas situações onde o Estado conseguiumanter muito do controlo que exercia (ou orecuperou em parte), não deixou de ocorreruma transição para um processo de controlo einfluência menos hierárquico, mais variado,fragmentado e multifacetado (Jouve, 2005).

De um modo geral, as limitações e as debili-dades do sistema de governo tradicional, foramcolocadas a descoberto pela multiplicação dasformas de comunicação e interacção entre osdiferentes agentes com interesse no desenvolvi-mento de um determinado espaço e cada vezmais envolvidos na gestão dos territórios (Álva-rez et al., 2006). Por isso, para lá de questõesideológicas e de uma maior ou menor confiançano Estado, a governância parece resultar, antesde mais, da necessidade de resolver problemasde uma forma mais eficaz, eficiente e democrati-camente responsável, num contexto de crescentecomplexidade e fragmentação em que a inabili-dade do governo central e dos instrumentos doEstado para fazer face aos desafios se torna evi-dente, os quais serão melhor enfrentados e resol-vidos através de uma atitude que considere osprincípios de abertura, participação, estratégia,responsabilidade e eficiência (Narender, 2004).

O conceito de governância2 emerge na

2 Se o conceito é compreensível, mais difícil é aintrodução da palavra, já que governanceé de uso

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década de oitenta do século passado, traduzindoa evolução do conceito de «government» ou«governing». O conceito e os princípios que lheestão associados tiveram grande aceitação, oque pode ser entendido como resultado da asso-ciação da governância à resposta para dois pro-blemas fundamentais: é difícil (impossível?)prever o futuro e não se pode considerar quealguns (eleitos ou técnicos) saibam o que émelhor para todos; é importante agir e intervirno território de uma forma sustentada, procu-rando a coordenação de esforços e sinergias(porque o espaço é uma dimensão essencial dosistema de construção do desenvolvimento).

Entende-se que os espaços são demasiadoimportantes para poderem ser geridos apenaspelos eleitos, os quais representam apenas umaparte dos interesses (designadamente os inte-resses públicos, com competências reduzidas,face ao poder regional, central e europeu oumundial), de uma parte dos cidadãos (os elei-tores, ou seja os que residem num determinadoterritório e se preocupam com o dever devotar). Assim, o «governo» é visto como umencontro de agentes e escalas, considerando ovasto conjunto das instituições e as suas inte-racções bem como as dimensões multiescala-res e as dinâmicas espaciais. Ora, a construçãode estratégias orientadas para o desenvolvi-mento (qualidade de vida nas dimensões eco-nómica, social, cultural e ambiental) obriga aentendimentos orientados por lógicas de con-certação e não de domínio hierárquico, o quefavorece a descentralização e o aparecimentode soluções híbridas e inovadoras (Atkinson,1998; Coaffee e Healey, 2003; Masson-Vin-cent, 2008; Tandon, 2002).

Desta forma, a governância pode ser com-preendida como uma rede de relações não hie-rárquicas, policêntricas e mutuamente depen-

dentes, estabelecida entre actores públicos enão-públicos, que se distingue da convencionale hierárquica redistribuição de recursos orça-mentais que caracteriza o Estado-Providência(Cars et al., 2002; Covas, 2007; Healey, 1998).Compreende um conjunto de regras, processose práticas que dizem respeito à qualidade doexercício do poder e que orientam uma cor-recta gestão do território a diferentes escalas ena sua articulação. Actualmente, estas regrasdizem respeito a um conjunto de princípios degovernância (ou bom governo), aceites pelageneralidade da comunidade científica, e quevão de encontro às orientações e princípios doPrograma de Desenvolvimento das NaçõesUnidas e da Declaração Universal dos Direitosdo Homem (Graham et al., 2003):

• Legitimação e participação – todos oshomens e mulheres devem ser livres paraparticipar, de forma construtiva, no pro-cesso do desenvolvimento e os interessesdiferentes devem ser mediados paraalcançar o consenso que melhor sirva ointeresse dos grupos e das políticas.Assim, a legitimação e participação pas-sam pela consideração das necessidadesde participação, orientação e consenso.

• Visão estratégica – uma visão de futurodeve estabelecer a direcção e o sentido doprocesso de desenvolvimento. Esta visãoestratégica deve ser reconhecida portodos os agentes e considerar as comple-xidades históricas, culturais e sociais emque a prospectiva se fundamenta e o queestabelece como necessário para alcançarum futuro que seja considerado comodesejado;

• Desempenho – todos os agentes envolvi-dos devem estar comprometidos com umaperspectiva de longo prazo, alicerçando oseu desempenho em princípios de respon-sabilidade, eficácia e eficiência, servindotoda a comunidade e fazendo o melhoruso dos meios e recursos disponíveis;

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mais fácil no inglês (e foi vulgarizado por Blair eagora por Obama), enquanto no português, para evi-tar o neologismo, se refere por vezes como «bomgoverno», o que pressupõe a alteração de paradigma.

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• Responsabilidade, confiança e transparên-cia – considerando o conceito de accoun-tability percebe-se que a governância secaracteriza por processos transparentes,com grande circulação de informação quepermita compreender, monitorizar e imple-mentar os processos de planeamento e ges-tão do território. Na prática, tal consiste emtornar o processo decisório conhecido, nosentido que todos os agentes e a comuni-dade saibam quais são as responsabilida-des de cada actor e se revejam no processo.

• Equidade e justiça – as estruturas legaisdevem ser justas e reforçadas de formaimparcial e equitativa, para que todos oshomens e mulheres tenham oportunida-des de melhorar ou manter o bem-estar(adaptado de UNDP, 1997).

Apesar de um amplo reconhecimento eapropriação destes princípios, esta transição(ou mudança paradigmática) para a governân-cia permanece incompleta, o que é normalatendendo aos objectivos filosóficos e nãoquantificáveis que lhe estão subjacentes. Mui-tas vezes – como tanto parece ocorrer em Por-tugal – a transição manifesta-se essencial-mente na dimensão teórica e no discurso polí-tico, de forma a justificar a preservação dashierarquias, o que é explicado por dois facto-res. Em primeiro lugar, a abertura do processodecisório à sociedade civil fez-se através deum processo de institucionalização da partici-pação pública, o que condiciona a capacidadereal de influência na definição de estratégiascolectivas por parte de alguns sectores dasociedade (ou mesmo algumas pessoas emconcreto), já que os mecanismos de aberturaobedecem a regras claras na negociação dasescolhas colectivas, previamente definidaspelas estruturas políticas (Jouve e Booth,2005). Depois, porque este processo de insti-tucionalização estabeleceu diferenças entre osgrupos de actores locais, favorecendo regrageral os grupos económicos, pela sua ligação

privilegiada aos campos decisórios, os quaisprocuram manter a capacidade instalada.

1.3. Planeamento estratégico e prospectivo

A necessidade de prever e antecipar ofuturo conduziu a modelos quantitativos sofis-ticados, que, em muitos casos, alguns anosmais tarde provaram estar errados. Esta evi-dência não pretende contradizer a importânciado planeamento, nem a necessidade de abor-dagens quantificadas, mas apenas apontar paraa necessidade de adoptar e implementar novosmétodos de planeamento e gestão territorial(pelo menos complementares) que promovamuma conciliação dos objectivos de curto prazocom as orientações estratégicas de longo prazoe o desenvolvimento de novas estratégias deacção, que incluam mecanismos eficazes decooperação e colaboração (Bock, 2006; Jessop,1999). Em consequência, verificou-se umaprogressiva transição do planeamento físico epositivista para uma abordagem mais estraté-gica e participada ao planeamento e gestão ter-ritorial, considerando que a abrangência doplaneamento estratégico pode ajudar a orientaras decisões públicas (Laquian, 2002).

É comum considerar-se que o planeamentoestratégico3 apareceu na década de 80 doséculo passado como alternativa ao modeloracional4, caracterizado por planeamento deta-

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3 O conceito não é consensual. Por exemplo,Mintzberg (1992) propõe a utilização da expressão«pensamento estratégico» porque, segundo o autor, aestratégia faz parte do processo de planeamento eeste deve servir para clarificar e definir a estratégia.

4 O planeamento estratégico não foi a única aborda-gem ao planeamento que apareceu em oposição ao pla-neamento racional e detalhado que vigorava. Muitos auto-res consideram como modelos alternativos, o planea-mento dito incremental, advocatório, equitativo e comu-nicativo e que são muito importantes e no papel quedesempenharam enquanto causa e efeito da governância.

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lhado baseado em «metas e objectivos de difí-cil concretização» (Campbell e Fainstein,2001 p. 169), e como resposta à importânciacrescente dos agentes privados e da sociedadecivil, derivando do pensamento militar e dagestão empresarial (Fernandes e Ramos,2007). Foi uma resposta à alteração das fun-ções do Estado e às novas articulações entre opúblico, o privado e o terceiro sector,ganhando destaque a sua associação aos prin-cípios do desenvolvimento sustentável esaindo reforçado com as leis comunitáriassobre avaliação ambiental estratégica (Direc-tiva SEA 2001/42/EC, regulada em Portugalpelo Decreto-Lei n.º 232/2007).

Em linha com este paradigma, o planea-mento estratégico tem vindo a derivar de umaassociação à simples competição ou marketingdas cidades e regiões (dominante nos anosoitenta), para abordagens do desenvolvimentoe planeamento territorial que priorizam a equi-dade no acesso de todos os cidadãos aos bens,serviços e oportunidades, numa perspectivatransgeracional que promova o respeito pelosvalores humanos, culturais e ambientais e sal-vaguarde a satisfação das necessidades dasgerações vindouras, bem como o direito edever de participação efectiva dos cidadãosnos processos de tomada de decisão(WNWCED, 1987). Assim, um território bemplaneado não é, apenas, um espaço no qual oscidadãos e as actividades se distribuem e orga-nizam de forma que se entende como ade-quada, já que a intervenção deve ser combi-nada com uma abordagem estratégica ao pla-neamento que assegure a qualidade de vida,com participação dos cidadãos num processodemocrático e partilhado de tomada de decisão(Merlin e Choay, 2009; Soh e Yuen, 2006).

Considera-se pois que o desenvolvimentodas cidades e das regiões está cada vez maisrelacionado com estratégias que resultam deprocessos participados de diagnóstico e pros-pectiva, reforçando sinergias (com competi-ção, complementaridade e solidariedade) entre

diferentes pessoas, espaços e instituições.Neste contexto, o planeamento estratégicodeve ser visto como um processo contínuo,cíclico e flexível, orientado para a acção, coma construção de planos, sua implementação emonitorização; considera os valores e as mis-sões das diferentes instituições, bem como osfactores externos que afectam a concretizaçãodos objectivos propostos; assume a evoluçãodos territórios como descontínua e selectiva(por saltos, ciclos ou rupturas), correspon-dendo simultaneamente a um processo proac-tivo, contingencial e de aprendizagem colec-tiva e introduz a lógica prospectiva, associadaà construção de visões de futuro, num contextopolítica, técnica e socialmente descentralizado(Asher, 1991; Faludi e Van Der Valk, 1994;Friedmann, 1993; Sposito, 1993).

O planeamento estratégico é entendidocomo um processo instrutivo e exploratórioque procura ajudar a comunidade local na reso-lução dos seus problemas, apresentando váriaspossibilidades, fazendo recomendações, exa-minando todas as alternativas, antecipandoconsequências, desenhando cenários e criandocondições para o envolvimento de todos oscidadãos (Hall, 2002). No entanto, o planea-mento estratégico não substitui o planeamentoracional. Complementa-o, introduzindo novasvalências e uma componente operacional quese traduz especialmente na criação de um qua-dro conceptual de referência, relativamenteabstracto, mas que dá coesão a um conjunto deprojectos articulados e interligados, numa certadirecção, para atingir determinados objectivos,ao qual se devem adaptar as novas iniciativas(Faludi e Van Der Valk, 1994). Rejeita osobjectivos sociais vagos e a ineficiência domodelo racional, propondo um modelo de pla-neamento com orientações claras e que consi-dere as limitações do espaço (Fainstein, 2001).

O plano estratégico, incluindo um pro-cesso aberto de diálogo entre as entidadespúblicas e os agentes económicos, sociais eculturais de um espaço, pode ser uma oportu-

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nidade de reflexão partilhada sobre os futurosdesejáveis e possíveis, bem como dos cami-nhos (estratégias e acções) para os atingir.Assim, o planeamento estratégico tem umplano, mas não é apenas um plano, no sentidotradicional do termo, uma vez que deve incluirum processo que se pode caracterizar deacordo com Ferreira (2007), por:

• Integração – engloba as diferentes com-ponentes do planeamento, designada-mente as vertentes económica, social,cultural, urbanística e ambiental;

• Flexibilidade – adapta-se à especifici-dade de cada situação e à evolução contí-nua dos contextos;

• Selectividade – considera a priorizaçãode acções, privilegiando as medidasindutoras de mudança, com cariz prático,clarificando o que fazer e como fazer;

• Participação – a legitimidade do processode desenvolvimento é normalmente asso-ciada à participação, que deve ser enten-dida como um pretexto para o diálogo,persuasão, concertação e contratualizaçãoe nunca estar associada a novos mecanis-mos de referendo. O contributo do pro-cesso estratégico para a abertura e demo-cratização da sociedade, segundo lógicasde transparência e potenciando contextosde governância, deve ser destacado;

• Prospectiva – a decisão fundamenta-senas hipóteses construídas para o futuro enão no prolongamento dos dados do pas-sado (Delamerre et Malhome, 2002).Assim, o plano estratégico é um processode reflexão prospectiva, considerandotendências, ameaças, oportunidades eactores, e construindo objectivos, estraté-gias, acções e recursos para o concretizar,como base para a discussão e para a cons-trução do desenvolvimento;

• Continuidade – enquanto processo, o pla-neamento estratégico exige continuidade.O plano é apenas o princípio, uma das

fases. Mais importante que a sua elabora-ção é a sua implementação, execução emonitorização, fases que também devemser participadas, flexíveis e sujeitas aconstante avaliação, de forma a permitiradaptação aos desafios que constante-mente se colocam.

1.4. Capital social, participação e legitimação do processo de desenvolvimento

A ideia de capital social está intimamenteassociada aos princípios de confiança e reci-procidade. É articulado por redes e criado ereforçado pela interacção, com contactos ereferências cruzadas que originam múltiplasrelações mútuas e sistemas mais ou menoscomplexos de confiança partilhada entre pes-soas e instituições.

O capital social é particularmente impor-tante num contexto em que as dinâmicas queafectam os territórios e as sociedades que oshabitam se manifestam em outras dimensõesque não as relacionadas com a organizaçãopolítica e administrativa do Estado, agora comgeometrias complexas, fragmentação temáticae um número crescente de agentes, ou com agestão partilhada das regiões. A organizaçãoeconómica, ou as rotinas diárias da população,são bons exemplos de como as dinâmicastranscendem as fronteiras e as capacidadesadministrativas, num «… espaço complexo denós e redes, lugares e fluxos, no qual múltiplasrelações e actividades coexistem, interagem,combinam, conflituam, oprimem e geramsinergias criativas (Healey, 2007, p. 1).

As transformações no quotidiano das popu-lações são especialmente importantes, namedida em que assistimos a um aprofunda-mento dos processos de individualização e dediferenciação dos modos de vida, associadossobretudo a mudanças no emprego, consumo emobilidade. O espaço onde as pessoas vivem

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torna-se diversificado, dissociado, fragmentadoe, por vezes, conflituoso e desconfortável (Hea-ley, 2002); com a multiplicidade de identidadesa contribuir para a definição e criação de váriosespaços e temporalidades dentro do mesmopaís, região ou cidade (Bridge e Watson, 2000).

Esta crescente complexidade da vida socialtornou a governação dos espaços mais difícil,na medida em que a ligação entre as pessoas eos lugares é mais difusa do que em períodospassados (Healey, 1996), de tal forma que oespaço pode ser visto como um local de sobre-posição de redes de relações, em diversasescalas espaciais (Cars et al, 2002), ondeexiste uma dinâmica de diferenciação socialmais complexa, uma vez que as pessoas vivemde modos diferentes, viajam em direcções dis-tintas e fazem compras em momentos diferen-tes, entre si e cada uma em diferentes momen-tos. Como consequência, nas nossas cidades eregiões, a divisão social é cada vez mais com-plexa, ultrapassando as tradicionais oposiçõesentre ricos e pobres, naturais e imigrantes, ouentre intelectuais e analfabetos (que aindaexistem), colocando um novo desafio à criaçãoe gestão de espaços de partilha. Por isso, atri-bui-se uma importância crescente ao capitalsocial nos processos de desenvolvimento e aênfase é colocada na capacitação das institui-ções e comunidades locais5, uma vez que seconsidera que a densidade institucional (Amine Thrift, 1994) pode desempenhar um papeldecisivo na redução de incerteza e na promo-ção do processo de aprendizagem colectiva earticulação das estratégias dos diferentes acto-res locais, uma vez que se impõe a ideia que«os territórios são construídos pelas acções epelos projectos dos actores» (Meunier-Cha-bert, 2001, p. 33).

Neste quadro, a emergência da sociedadecivil enquanto força política é vista como umadas alterações mais importantes dos últimosanos, contribuindo para a legitimação dos prin-cípios de participação, responsabilidade e con-fiança pública (Laquian, 2002). Por outro lado,nesta sociedade heterogénea e complexa, o pla-neamento estratégico aumenta a sua relevância eimplica a consideração da multiplicidade devisões presentes em cada território, com a com-plexidade e diversidade do quotidiano e os seusmúltiplos espaços e temporalidades a requere-rem uma abordagem que considere os princípiosda governância e a mobilização das várias iden-tidades territoriais, como recursos num processocolectivo de desenvolvimento. Neste sentido, aacção colectiva terá tanta mais capacidade dereforçar a governância e de legitimar o processode desenvolvimento, quanto mais for capaz deconsiderar as formas distintas de vivência, isto éo modo como cada indivíduo interpreta e«sente» o seu quotidiano (Healey, 2002), dondea necessidade de envolver uma gama diversifi-cada de actores na gestão estratégica do territó-rio, sem esquecer a importância de uma lide-rança institucional para um processo de enormecomplexidade e exigência (Godet, 1993).

2. Experiências no Norte de Portugal

2.1. Introdução

Actualmente, não precisamos de prever ofuturo, mas deve-se estar, se possível, quandopossível e na medida do possível, preparadopara o que este pode trazer. Face à necessidadede acompanhar as mudanças e à dificuldade dearticular diferentes agentes e de intervir emdiferentes temas e escalas na base de previ-sões, o planeamento estratégico e a governân-cia devem apostar e confiar numa visão de umfuturo desejado e, quando for adequado e pos-sível, na possibilidade de o antecipar.

5 Por comunidades locais não se entende apenasa população residente, mas todas as instituições epessoas que têm uma relação forte com determinadoterritório, com uma ligação afectiva e um sentimentode «pertença».

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Em Portugal, como na Europa e noMundo, os processos de planeamento e gestãoterritorial são actualmente influenciados pelaemergência do conceito de governância queprogressivamente se foi consolidando comoobjectivo da administração do território ecomo novo paradigma de gestão democrática.Contudo, a situação da administração do terri-tório português é muito particular, o que tornao desenvolvimento territorial um desafio espe-cialmente difícil e a governância especial-mente necessária.

É certo que as últimas décadas foram mar-cadas pela implementação e difusão de políti-cas e práticas de ordenamento do território,com ampla difusão das metodologias do pla-neamento estratégico. No entanto, à medidaque os mais variados instrumentos de planea-mento e gestão territorial (planos directoresmunicipais, planos de urbanização, planos depormenor, etc.) se espalharam pelo país (comritmos irregulares e de formas distintas), assis-timos também a um aumento do descontenta-mento e das críticas, o que resulta na constata-ção de um país desordenado, com ameaças eproblemas que evidenciam a ineficácia dosplanos (Fernandes e Ramos, 2007).

No Norte de Portugal, são vários os desa-fios que se colocam à governação do território.Em primeiro lugar, observam-se conflitos avárias escalas em parte resultantes de umduplo centralismo que dificulta a participaçãoe a resolução de problemas complexos queadquirem maior pertinência na dimensão sub-nacional e supramunicipal, seja em face dosproblemas de concentração metropolitana,seja no quadro dos territórios de baixa densi-dade (Fernandes, 2007).

Apesar de terem sido introduzidas signifi-cativas melhorias nas últimas décadas (e deoutras que se perspectivam) nas redes de aces-sibilidade, na mobilidade das pessoas e nacompetitividade de base territorial – e tam-bém por isso –, as diferenças dentro do paísaumentaram, numa tradução que pode ser

vista em várias dimensões de oposição sim-plificadora (Lisboa e o resto, litoral – interior,cidades v rural, …), o que, em parte, resultaráda ineficácia da articulação espacial das polí-ticas sectoriais, o que está especialmente sen-tido por se verificar que os concelhos deixa-ram de ter a dimensão pertinente (e as câma-ras municipais as competências capazes) depromover o desenvolvimento e planeamentopartilhado. De facto, não apenas a complexi-dade dos problemas, como o aumento damobilidade das pessoas e de empresas, obrigaà consideração de outra escala, o que numpaís sem regiões administrativas, nem boaarticulação intermunicipal e que desconfia dadescentralização, coloca problemas especial-mente evidentes, em evidente contraste comoutros países, como em França, onde o pro-blema parece ser o da dificuldade de coorde-nação entre um aparentemente excessivonúmero de níveis e uma vontade descentrali-zadora do Estado para a qual nem sempre sesentem preparadas as estruturas regionais,provinciais, departamentais, metropolitanas edas associações de comunas.

Face ao duplo centralismo, os princípiosda governância podem ajudar a encontraralternativas numa ligação entre planeamento ea gestão territorial, orientada para o desenvol-vimento.

Um caso com potencialidades, mesmo noquadro da União Europeia, onde o planea-mento estratégico serve de mote à cooperaçãoé o que se centra no Plano Estratégico Norte dePortugal-Galiza, que define as prioridadespara o período do quarto quadro comunitáriode apoio (2007-2013) e pode de facto favore-cer a recuperação de uma euroregião que seencontra entra as menos desenvolvidas daUnião Europeia, favorecendo a sua afirmaçãotambém face aos grandes centros de comandoibérico (Madrid, Barcelona e Lisboa). Estarelação é por certo facilitada pela proximidadegeográfica e linguística e pelo envolvimentocrescente e de há muito entre especialistas

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universitários e autoridades locais6, que defi-niu como prioritários: o impulso aos sistemasde transportes e acessibilidades; a cooperaçãono âmbito do mar; a competitividade daspequenas e médias empresas; a protecçãoambiental e o fomento da cooperação social einstitucional7.

As ligações entre o planeamento estraté-gico e o reforço dos sistemas de governânciadão os seus primeiros passos nas CIM (Comu-nidades Intermunicipais) constituídas com aLei Cabrita (que revogou a chamada Lei Rel-vas)8 e são também evidentes em diversoscasos de cooperação entre cidades, nalgunscasos reforçada por candidatura aos projectosdo POLIS XXI «Redes urbanas para a compe-titividade e inovação», como ocorre como«Douro Alliance – Eixo Urbano do Douro»9,que exemplifica a articulação de diferentesescalas e grupos de actores, ao serviço de umprojecto comum: a criação de uma plataformade diálogo, partilha e cooperação, onde ponti-ficam os municípios de Vila Real, Peso daRégua e Lamego, a Universidade de Trás-os--Montes e Alto Douro, as associações comer-

ciais e industriais do Peso da Régua e VilaReal e as associações empresariais de Lamegoe Vila Real. Além da criação de um planoestratégico que oriente a acção, a associaçãopretende manter e alargar o envolvimento eparticipação dos diferentes actores na execu-ção de um conjunto concreto de acções e nagestão partilhada do território, potenciando ascomplementaridades e interdependências,assim como a cooperação activa e duradoura.

2.2. O caso de Ponte da Barca

No caso do Município de Ponte da Barca,o Plano Estratégico de Desenvolvimento(PEDPB) e o processo estratégico participadoligado à sua elaboração, criaram as bases paraum sistema de participação e cooperação, queprocurou estar em linha com os princípios degovernância. Nesse sentido, o PEDPB foiencarado desde o início como um processodinâmico, participado e criador, baseado nareflexão e no debate, onde o plano foi vistocomo um mecanismo em construção, orienta-dor da mudança e responsável pela definiçãode uma visão, traduzida em objectivos, projec-tos e medidas concretas que seriam contratua-lizadas pelos diferentes agentes com interessese intervenção no território.

Assim, a metodologia adoptada procurouassegurar a promoção de um planeamento inte-grado e multiescalar, capaz de gerar continui-dade e produzir uma lógica de processo estra-tégico, reforçando sinergias (com reconheci-mento de relações de competição, complemen-taridade e solidariedade) entre diferentes pes-soas, espaços e instituições, que se prolonga-ram para lá das fases de diagnóstico e prospec-tiva, num envolvimento real na implementaçãoe monitorização das propostas construídas parao «futuro desejado». Na prática, o plano/pro-cesso de Ponte da Barca pretende (re)construiro município como um «recurso colectivo»(Healey, 2002), no sentido de resolver proble-

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6 Em 2007 foi criado um Centro para os Estudosna Euro-região (CEER), englobando 6 universidades(3 no Norte de Portugal e 3 na Galiza) e outras insti-tuições regionais. Constitui um exemplo único naEuropa de cooperação permanente entre especialistasuniversitários e autoridades locais. Por outro lado, oEixo Atlântico, é uma associação de 34 municípios dosdois lados da fronteira, presidida actualmente pelo Pre-sidente da Câmara de Gaia e dirigida desde a fundaçãopor um técnico galego, a qual tem trabalho desenvol-vido em vários domínios (ver Álvarez, J., Salgado, A.,Fernandes, J. A. R., and Marques, T. S., 2006)

7 Mais recentemente, um plano estratégico decooperação entre a região Norte de Portugal e outraregião espanhola, Castela e Leão, foi concluído tam-bém, igualmente com o horizonte temporal de 2013,apresentando como principal prioridade a promoçãodas actividades e relações comerciais e económicasinter-regionais.

8 Leis n.º 10/2003 e 11/2003, diplomas conheci-dos como «Lei Relvas».

9 Disponível em http://www.douroalliance.org

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mas e orientar a construção do futuro em tornode potencialidades, oportunidades e anseios.

Tendo por base os princípios de governân-cia, o processo estratégico de Ponte da Barca(projectado para o período 2007-2013), procu-rou seguir as orientações do Livro Brancosobre a Governância: abertura, participação,responsabilidade, eficácia, coerência, propor-cionalidade e subsidiariedade.

AberturaEm linha com o que antes se disse sobre a

relação teoria e prática, entre abstracções eespecificidades, importa todavia esclarecerque se considera que a implementação desteplano/processo dependeu muito da criação deum clima de confiança entre todos os interve-nientes no processo e da persistente afirmaçãode uma liderança. Para tal, apostou-se numaestratégia de comunicação caracterizada poruma linguagem acessível e pela valorizaçãoefectiva da participação dos cidadãos, emespecial os representantes de instituições asmais diversas.

Por isso, desde o seu arranque, o plano/pro-cesso de Ponte da Barca desenvolveu mecanis-mos e instrumentos que permitiram uma ampladivulgação, debate e reflexão sobre temas, pro-blemas e soluções para o município, o que foifacilitado pela publicação de textos e entrevistasnos jornais e na rádio local, com a realização deconferências nas escolas e através de contactospessoais do coordenador do plano com todos osque eram identificados como líderes locais.

Além disso, foram realizadas diversas reu-niões formais e informais, como as duas edi-ções da iniciativa «Quintas da Barca», onde emciclos de seis sessões abertas, realizadas emquintas-feiras sucessivas, trinta a quarenta pes-soas (a maior parte das quais variavam de reu-nião para reunião, conforme o tema) debateramquestões importantes para o futuro de Ponte daBarca, com convidados de perfil técnico e polí-tico (pensados também em função das oportu-nidades que o contacto poderia propiciar).

ParticipaçãoAbertura e transparência cruzam-se com

participação, a qual pode gerar mais confiançanos resultados finais, no percurso a percorrer enos outros actores envolvidos, donde a suaenorme importância para a criação de umambiente de partilha e construção colectiva.No caso de Ponte da Barca, o sentimento dosresponsáveis técnicos e políticos era, desde omomento de arranque, que a qualidade e eficá-cia das políticas e estratégias de desenvolvi-mento dependeriam em larga medida da capa-cidade de assegurar uma participação alargadadurante todas as fases do processo: desde aconcepção até à execução.

Assim, a dinâmica do plano/processo dedesenvolvimento procurou associar-se àsmelhores práticas no domínio da participaçãocívica, respeitando as especificidades locais eenfatizando o valor e a utilidade de cadaagente ou cidadão, numa lógica de parceria emáxima exigência em termos de responsabili-dade, transparência e participação.

A valorização dos processos de participaçãofez com que, após a aprovação do plano, o pro-cesso de discussão partilhada e de envolvimentona sua execução começasse como algo quasenatural, beneficiando também da existência dedois grupos de natureza informal, constituídosimediatamente após a aprovação do plano.

O primeiro é a Comissão Municipal deDesenvolvimento (CMD), estrutura que reúnetrimestralmente com os elementos da coordena-ção técnica e política, para avaliar o progressodo processo estratégico, designadamente a con-cretização das medidas propostas, e influenciara implementação das acções para o desenvolvi-mento do município, na base da disponibiliza-ção de informação actualizada. Reúne membrosdas principais instituições e associações locais,como presidentes e directores das escolas, bom-beiros, jornais, associações ambientais, sociaise culturais, representantes de todas as forçaspolíticas e investigadores relevantes da históriae cultura local. As principais funções da CMD

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(em encontros por vezes alargados a Presiden-tes de Junta de Freguesia) são a monitorizaçãoe acompanhamento do processo estratégico (econsideração do grau de cumprimento das 115acções concretas a concretizar até 2013), a par-ticipação em sessões de debate sobre planea-mento local (com destaque para o acompanha-mento da revisão de PDM) e a colaboração emprojectos ou iniciativas específicos, comoexemplifica o seu envolvimento na concretiza-ção do orçamento participativo em 2008, deonde resultaram três investimentos colectivosincorporados pela Câmara Municipal no seuorçamento, escolhidos de uma lista de novepropostos pelo Núcleo de Monitorização doDesenvolvimento (NMD). Este segundo grupode acompanhamento do PEDPB, é um grupomais restrito, nomeado pela Comissão Munici-pal de Desenvolvimento. Inicialmente era com-posto por cinco elementos, mas, assim quegarantida a coesão do grupo restrito, o reforçodas tarefas e a vantagem em reforçar o equilí-brio de orientação político-partidária, área deformação, origem geográfica, idade e género,levou ao seu alargamento para oito elementosapós completar o primeiro aniversário. O NMDassegura a monitorização e acompanhamentodo processo estratégico de desenvolvimento,através de encontros mensais e de uma colabo-ração muito forte e próxima no apoio à concre-tização das 115 medidas definidas no PEDPB,com debate e reflexão, donde emanam críticas,sugestões e disponibilidades que facilitam a suaconcretização.

A regularidade dos encontros e a crescentevalorização e promoção dos mecanismos departicipação e monitorização permitiram criarum ambiente de transparência e confiançamútua, o que se revelou decisivo para obterganhos de eficácia, mais ainda quando o dis-tanciamento com a Câmara Municipal (eoutras instituições) é o suficiente para garantirindependência, mas existe uma proximidadesuficiente para se conseguir obter efeitos sópossíveis com o apoio da autarquia.

Responsabilidade A responsabilidade implica que os proces-

sos e os instrumentos utilizados são claros. Porisso, além de construir um processo aberto eparticipado, o PEDPB procurou partilhar res-ponsabilidades e envolver vários agentes nasua execução.

Um bom exemplo é o orçamento participa-tivo, enquanto iniciativa que permitiu consoli-dar o envolvimento no planeamento, fazendocom que todos os actores (no NMD e na CMD,assim como na Câmara e Assembleia Munici-pal) se revejam e se sintam responsáveis pormedidas que construíram e desenvolveram emconjunto. Outros exemplos passam pela elabo-ração de candidaturas a programas comunitá-rios, pelo desenvolvimento de iniciativas decariz cultural ou pela criação de prémios econcursos locais. Em todos eles foi privile-giada uma abordagem em parceria, em quetodas as instituições e indivíduos envolvidossabiam o seu papel e se responsabilizavampela sua parte da execução.

Entre as candidaturas aos fundos comunitá-rios devemos destacar o envolvimento doNMD na preparação e monitorização (em par-ceria) do projecto «Qualidade ao Centro»,aprovado no âmbito das «Parcerias para aRegeneração Urbana» do POLIS XXI10, o qualcombina intervenções no espaço público, namobilidade, na eficiência energética e na iden-tidade urbana. Neste projecto, o envolvimentoestendeu-se à realização de uma das compo-nentes, sobre toponímia e identidade urbana,onde estão envolvidos o NMD e a Adapenha11.O NMD esteve e está também directamenteenvolvido no «Programa Integrado de Salva-guarda, Valorização e Animação do PatrimónioCultural de Ponte da Barca»12, onde se combi-nam acções de inventariação, investigação,

10 Aprovado em Fevereiro de 2009 e distinguidocomo um dos 19 melhores projectos na Região Norte.

11 Associação dos Amigos da Penha.12 Apresentado em Maio de 2009.

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valorização e promoção de personalidades ilus-tres, lendas, tradições e monumentos de ele-vado valor patrimonial e cultural.

O NMD foi também responsável pela dina-mização de actividades de informação, debate evalorização cultural. A título de exemplo, refira--se o seu envolvimento na criação de um eventodenominado «Encontros do dia 2», que levou aPonte da Barca especialistas com reconheci-mento nacional para discutir temas como a edu-cação e a conservação do património, assimcomo em várias tarefas ligadas à concepção edivulgação de um «Percurso da Hidroelectrici-dade» que conta muito da história do concelhona sua relação com o Rio Lima e em particularde uma das suas freguesias (Britelo) e procurapotenciar o turismo cultural assim como reforçara ligação do concelho com as energias limpas.

Em parceria com as escolas e as juntas defreguesia, o Núcleo de Monitorização doDesenvolvimento concebeu e concretizouvários prémios/concursos, procurando envol-ver e sensibilizar a população. Um dos pré-mios, «Pintor António Cruz» (do nome de umartista muito ligado a Ponte da Barca), premeiaanualmente o melhor caso de reabilitaçãoarquitectónica, apelando para a valorização dopatrimónio edificado; nas escolas desenvol-veu-se o concurso para projectos escolares«(Em)Barca no Futuro», favorecendo o inte-resse dos estudantes e professores pela suaterra e a criatividade e empreendedorismo elançou-se ainda as bases para a «Olimpíadados Talentos» que permitirá identificar eapoiar habilidades especiais.

Eficácia O princípio da eficácia é considerado de

forma especial. Por um lado, a criação de umaatmosfera de partilha e responsabilizaçãocomum aumenta a eficiência do plano/pro-cesso, o que é reforçado por uma calendariza-ção precisa e pelos ganhos de tempo na elabo-ração do plano (concluído em 14 meses). Alémdisso, a visão de futuro construída e partilhada

procurou ser o mais eficaz e oportuna possívelna base de orientações estratégicas, de objecti-vos claros e de uma avaliação do impactofuturo e, quando possível, da experiência pas-sada. Além disso, na sua concretização, execu-taram-se nos primeiros meses as acções quecombinavam o mais fácil êxito com a maiornotoriedade, de forma a mais facilmente credi-bilizar o processo e fazer ver da viabilidade deum projecto considerado pela maioria comomuito ambicioso.

Além disso, a consciência que o planea-mento e o desenvolvimento se processam adiferentes escalas, levou a um esforço inicial (epersistente) de conciliação de agentes e escalasterritoriais, reforçando-se a cooperação e pro-movendo-se ganhos de eficácia significativos.Desde logo, não sem polémica, a articulaçãoterritorial passou a dar prioridade ao reforço dacooperação com o município vizinho e rival deArcos de Valdevez, no respeito pela autonomiade cada um e pela capacidade instalada a Nortedo Rio Lima. Além de jantares mensais entreos presidentes e outros membros dos executi-vos camarários, foi possível atingir resultadosconcretos, como a co-realização de um planode urbanização para a área contígua e densa-mente povoada dos dois concelhos e o acordoem torno do estabelecimento de um transporteintermunicipal, em circuito, ligando os princi-pais equipamentos junto às vilas e ao espaço defronteira entre os municípios.

A procura de um planeamento e gestão ter-ritorial a diferentes escalas favoreceu o reco-nhecimento no Plano Regional de Ordena-mento do Território do pólo Arcos-Barca comoum dos quatro mais fortes do Minho-Lima(com Viana, Valença e Ponte de Lima) e pro-duziu melhorias na cooperação no contexto daComunidade Intermunicipal, com reforço dacomunicação e desenvolvimento de projectoscomuns, assim como um diálogo fácil comconcelhos da Galiza, especialmente os vizi-nhos a nascente (Lobios e Entrimo), inseridosno Parque do Xures.

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A existência de um horizonte (visão defuturo com objectivos claros) e de um cami-nho (percurso para atingir o futuro desejado)permitiu criar e fortalecer em Ponte da Barcauma rede de articulações institucionais, emque a Câmara Municipal assumiu a conduçãoe onde se destaca a colaboração com a Comis-são de Coordenação e DesenvolvimentoRegional do Norte (CCDRN), o Parque Nacio-nal da Peneda-Gerês, vários ministérios eempresas públicas, com destaque para asEstradas de Portugal (EP) e para a Energias dePortugal (ex.EDP), estabelecendo-se tambémprotocolos de colaboração com parceiros pri-vados de mérito reconhecido, para a colabora-ção em projectos específicos no domínio daenergia (Instituto de Engenharia de Sistemas eComputadores/FEUP e SmartWatt), floresta-ção (Logística Florestal) e turismo (Engenhei-ros Associados).

Coerência A estratégia e as acções do plano-processo

estratégico de Ponte da Barca são considera-das como coerentes (mesmo que ousadas, mui-tas delas), o que permitiu uma rápida (e fácil)compreensão e assimilação. Atendendo à mul-tiplicidade de escalas, à complexidade de rela-ções e aos muitos desafios que se colocam aodesenvolvimento do concelho, procurou-seassegurar uma forte articulação com as autori-dades regionais e nacionais (eficácia da inter-venção), associando-se à liderança técnica epolítica um forte envolvimento e capacitaçãoda população e dos agentes locais (participa-ção e responsabilidade) e abrindo-se o pro-cesso à comunidade desde a concepção até àexecução (abertura), para que a estratégia cor-responda aos anseios e expectativas de todos.

Proporcionalidade e subsidiariedade A procura de participação, responsabili-

dade, eficácia e coerência, contribui parareforçar a proporcionalidade e subsidiariedadedo plano/processo de Ponte da Barca.

Além disso, a definição e implementaçãoda estratégia de desenvolvimento de Ponte daBarca procuraram considerar a multiplicidadede visões presentes, assumindo a necessidadede envolvimento de uma gama diversificadade agentes na gestão estratégica do desenvol-vimento territorial, tendo especialmente ematenção a importância da construção de repre-sentações colectivas do desenvolvimento do«seu» território. Daí que, desde a concepçãodas acções à sua execução, se tenha procuradoque a escolha da escala e dos instrumentos erecursos fosse adequada aos objectivos defini-dos e hierarquizados de forma proporcionalaos interesses de todos os envolvidos, mesmoque necessariamente imperfeita para cada umindividualmente.

3. Conclusão

O desenvolvimento é muito mais que aadopção e implementação de planos e projec-tos, uma vez que está relacionado com «pro-dutos sociais», como a liderança local, a cul-tura empresarial e a acção inovadora, resultadoessencialmente das pessoas actuarem e tiraremproveito das oportunidades (Willis, 2005).Geralmente, as acções de desenvolvimentoimplicam uma abordagem multidimensional emultissectorial, o que cria as melhores condi-ções para o aparecimento de iniciativas bottom--up, com uma ampla participação no processode planeamento, essencial para o bom planea-mento e para a boa governância (Stewart, 2006).

Os processos de desenvolvimento devemser orientados pelos princípios de abertura (asinstituições devem trabalhar de forma aberta eutilizar linguagem acessível ao público emgeral); participação (a qualidade, relevância eeficiência das políticas dependem da capaci-dade de assegurar uma ampla participação,desde a concepção à implementação); respon-sabilidade, confiança e transparência (os papéis

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nos processos legislativos e executivos devemser mais claros); eficiência (as políticas devemser efectivas e oportunas, e as acções devemser implementadas na escala mais apropriada)e coerência (as acções e políticas devem sercoerentes e facilmente perceptíveis).

Como se viu para o caso de Ponte da Barca,o planeamento estratégico pode ser um bomponto de partida para processos participados dedesenvolvimento integrado que contribuampara a governância, considerando que, a qual-quer escala, o planeamento territorial tem opotencial de sugerir as direcções desejadas(Hall, 2002) e para criar as bases para a conver-gência de múltiplos agentes. Em função da cres-cente complexidade dos sistemas de governo,imprevisibilidade das dinâmicas espaciais eheterogeneidade das sociedades, uma gestãoadequada do território depende cada vez maisdo envolvimento das pessoas e instituições.

O desenvolvimento de formas inovadorase plurais de governação (em linha com o con-ceito de governância) exige metodologias deplaneamento e gestão territorial mais inclusi-vas e democráticas, o que é essencial para acompetitividade, coesão e sustentabilidade dosterritórios. Assim, a governância territorialdeve ser considerada em relação com osmodos de coordenação e articulação da acçãocolectiva, centrados na escala local ou regional(mas sempre com uma abordagem multinível),reconhecendo a necessidade de um processopara a gestão correcta e desejada de um sis-tema complexo, onde se devem construir con-vergências de instituições com escala variada,de sectores diversos e de natureza pública, pri-vada ou outra.

A governância deve ser entendida comoalgo positivo e unificador, relacionada com o«bom governo», não se devendo admitir a «mágovernância». É uma forma de se unirem osdiferentes actores que interagem numa socie-dade, ajudando-se na resolução de problemasindividuais e colectivos, bem como na cons-trução de um futuro comum.

Embora não existam receitas milagrosas,desde a concepção do plano ao reforço do sis-tema de governância, a escala de acção (euro-peia, nacional, regional ou local) e a selecçãodos instrumentos a utilizar deve ser proporcio-nal aos objectivos que se perseguem, sendo emtodos os casos essencial a avaliação prévia dasformas de participação pública, da escala maisadequada e das acções mais correctas face aosobjectivos propostos.

No Norte de Portugal, o planeamentoestratégico vem contribuindo para o desenvol-vimento de uma cultura de participação, emlinha com os princípios de governância. Esse éo caso do plano/processo de Ponte da Barca,aqui abordado sumariamente, onde, desde oinício da realização do plano (Maio de 2005) esobretudo após a sua conclusão (Setembro de2006), se tem vindo a desenvolver e consolidaruma cultura de abertura, participação, respon-sabilidade, eficiência e coerência.

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OOOO ccccaaaassssoooo ddddoooo MMMMuuuunnnniiii cccc íííípppp iiiioooo ddddeeee AAAArrrroooouuuuccccaaaa

Gonçalo de Sousa Santinha*; Carlos Rodrigues**; Adélia Almeida***

Inforgeo, 2009, 45-65

Resumo

A nova agenda da Política Regional e deCoesão da União Europeia assume hoje umarelevância particularmente decisiva no querespeita à definição de políticas públicas anível regional e local. Embora a diminuiçãodas assimetrias regionais constitua ainda umdos seus objectivos base, as directrizes queemanam desta política assumem contornosdiferentes neste novo ciclo de apoio comunitá-rio. Por um lado, as assimetrias tardam emdiminuir. Por outro, preocupações associadasao fenómeno da globalização, às alteraçõesclimáticas e demográficas e a inclusão de

novos países implicam uma revisão da distri-buição de fundos. Tendo como suporte a aná-lise de um município português de baixa den-sidade, é justamente sobre o efeito destas alte-rações na definição de políticas locais dedesenvolvimento territorial que se debruçaeste texto, identificando-se alguns dos cami-nhos que poderão contribuir para um melhorposicionamento do poder local para fazer facea este novo desafio.

Palavras-chave: Política Regional e deCoesão; Estratégia de Lisboa; Coesão Social,Económica e Territorial

1. Introdução

O quadro de definição de políticas territo-riais de desenvolvimento da União Europeia(em geral) e de Portugal (em particular) para operíodo de programação 2007-2013 encontra--se marcado por significativas transformaçõesrelativamente a períodos anteriores. Seguindoatentamente o discurso político que balizaessas transformações, verifica-se que há um

* Secção Autónoma de Ciências Sociais, Jurídi-cas e Políticas.Universidade de Aveiro. Campus deSantiago. 3810-193 Aveiro. Portugal.

E-mail: [email protected]** Secção Autónoma de Ciências Sociais, Jurídi-

cas e Políticas Universidade de Aveiro. Campus deSantiago. 3810-193 Aveiro. Portugal

E-mail: [email protected]*** Município de Arouca. Praça do Município.

4540-001 Arouca. PortugalE-mail: [email protected]

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conjunto de dinâmicas sociais, económicas eterritoriais que se relacionam (CEC, 2008a;2008b; 2009; Hubner, 2007b; 2009a): pri-meiro, com os novos desafios com que actual-mente a sociedade se depara, associados desig-nadamente ao fenómeno da globalização e dacompetitividade económica, ao envelheci-mento demográfico, às alterações climáticas eà eficiência energética, à crescente importân-cia das cidades (enquanto actores globais) erespectivas dinâmicas vivenciais; segundo,com o alargamento da União Europeia (UE)aos países de Leste, o que para estados--membros como Portugal representa um desa-fio acrescido; terceiro, com os novos patama-res de exigência que representam a Agenda deLisboa e a Política Regional e de Coesão;quarto, e no que a Portugal concerne, com onovo quadro comunitário de apoio – Quadrode Referência Estratégico Nacional (QREN2007-2013) –, o qual evidencia uma clara rup-tura com o passado em termos de filosofia epráticas de afectação de fundos comunitários.

A este novo contexto encontra-se asso-ciado um conjunto de exigências de significa-tivas reformas com vista ao desenvolvimento emodernização de Portugal, a sua coesão eco-nómica, social e territorial e à recuperação doseu atraso em relação à média da UE. É atra-vés deste novo quadro comunitário que aUnião Europeia, até 2013, vai transferir paraPortugal 21,5 mil milhões de euros (QREN2007-2013: 96). Uma verba avultada, quepoderá constituir-se na última oportunidade dea economia portuguesa poder enfrentar comsucesso os novos desafios e atingir os objecti-vos expressos na Estratégia de Lisboa, já queno próximo futuro a nova Europa dos 27 iráexercer uma pressão acrescida sobre os recur-sos em matéria de coesão.

Surgem, neste âmbito, novas reflexões eteorias sobre as assimetrias regionais e a suaarticulação com as questões de sustentabili-dade ambiental, inovação e competitividade,especialização e conhecimento. Da leitura de

um conjunto de documentos, designadamentedas directrizes expressas na Estratégia de Lis-boa (mais crescimento, mais emprego), dasorientações para a nova Política Regional e deCoesão, do Quarto Relatório sobre a CoesãoEconómica e Social (2007), da percepção denovos desafios com que actualmente a socie-dade se depara e, ainda, das orientaçõesexpressas no novo quadro comunitário deapoio, decorre um novo discurso e novaslinhas de orientação que agora apontam sobre-tudo para:

a) Uma renovada agenda para a PolíticaRegional e de Coesão, que deixa de ser decarácter distributivo e de natureza essen-cialmente assistencialista para passar acapacitar as regiões, tornando-as capazesde valorizar os seus recursos endógenos;

a) Uma maior ênfase nas acções imateriais(from opening roads to opening minds,nas palavras da Comissária Europeiapara a Política Regional Danuta Hub-ner) e na concepção de projectos dedesenvolvimento de carácter integradoque extravasam o âmbito local, funda-dos no conhecimento e na inovação;

a) A necessidade de reforçar a cooperaçãoterritorial inter-regional, o que, por umlado, permite o reforço do princípio dasubsidiariedade e da territorializaçãodas políticas públicas numa lógica dediminuição das disparidades e, poroutro, promove o funcionamento emrede de actores e territórios, fomentandotrocas de experiências e conhecimento,assim se prosseguindo o caminho dereforço das redes entre territórios, pes-soas e actividades, aprofundando emelhorando os mecanismos de bench-marking(Nunes Correia, 2007);

a) Uma maior liberdade dos actores locais eregionais para definir instrumentos adap-tados aos circunstancialismos locais eregionais, atribuindo-lhes maior autono-

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mia na definição das suas políticas terri-toriais de desenvolvimento, embora cla-ramente referenciadas à agenda da polí-tica Regional e de Coesão em estreitarelação com os objectivos da Estratégiade Lisboa;

a) A promoção de parcerias interinstitucio-nais, apostando num sistema de gover-nança multinível;

a) O desenho de programas de acção estra-tégicos com clara definição de metas eresultados mensuráveis, o que pressu-põe maior priorização e selectividade deprojectos;

a) A necessidade de avaliação do modocomo os recursos da nova Política Regio-nal e de Coesão estão a ser mobilizadospara a Estratégica de Lisboa renovada(earmarking) (Nunes Correia, 2007).

O novo quadro comunitário de apoio(QREN 2007-2013) vem, deste modo, rompercom o modelo de financiamento assente numalistagem de acções ou projectos a desenvolver,com montantes previamente fixados e reserva-dos, premiando, por oposição, estratégiasregionais que integrem projectos verdadeira-mente estruturantes, de elevada qualidade, quecriem sinergias através do envolvimento deparceiros regionais, tendo como núcleo duroas instituições de ensino e investigação, asassociações empresariais e as autarquiaslocais, em prol de uma região mais competi-tiva e dinâmica (Madureira Pires, 2005). Énesse sentido que se aponta quando se afirmaque «é preciso atribuir um peso cada vezmaior aos recursos locais, aos centros deinvestigação, aos núcleos empresariais, àsempresas inovadoras e às competências daforça de trabalho. O princípio de ligar a efi-cácia económica à subsidiariedade e à des-centralização e de envolver os intervenienteslocais e regionais na concepção e implemen-tação das estratégicas de desenvolvimentosairá, pois, reforçado»(CEC, 2007: iii). Privi-

legia-se, assim, a parceria como elementoessencial de uma boa aplicação dos fundos.

Sendo inegável que os fundos comunitá-rios são absolutamente essenciais para odesenvolvimento dos municípios, das regiõese, portanto, do país, as autoridades locais, facea estes desígnios, deparam-se actualmentecom dificuldades acrescidas para a eles aceder,dada a incertezaque os novos procedimentosgeram em relação ao que ocorreria com osprocedimentos dos quadros comunitários ante-riores, à dúvida sobre o posicionamento aadoptar e à opção estratégicaa abraçar face àdistribuição dos novos pacotes financeiros,que canalizam os fundos estruturais muitomais para uma lógica de inovação, competiti-vidade e conhecimento.

Tais pressupostos parecem induzir uma ati-tude diferente por parte do poder local, exi-gindo uma maior capacitação organizacional,mobilizando recursos humanos aptos à percep-ção destas novas orientações e a definição, emarticulação com outros agentes, de objectivospolíticos estratégicos e respectivos meios paraos atingir, de forma a contribuir para quesejam concretizadas as orientações da políticapública nacional e europeia. Orientações quese revestem de importância acrescida se tiver-mos em consideração os baixos níveis dedesempenho, expostos no Quarto Relatóriosobre a Coesão Económica e Social (2007),relativos a Portugal e comparativamente comos demais estados-membros da UE que seencontram a receber fundos durante o mesmoperíodo de tempo. Torna-se evidente que osníveis de concretização das grandes orienta-ções da política pública têm sido baixos de ummodo geral em todas as regiões portuguesas.Parece, portanto, haver um problema latenteque poderá estar associado a alguma relativaincapacidade das autarquias de levar à práticaas grandes orientações da política pública.

O QREN 2007-2013 coloca novas exigên-cias e, por isso mesmo, novos desafios aosmunicípios portugueses, que consubstanciam

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na necessidade de cumprimento dos objectivosexpressos na Estratégia de Lisboa e nas orien-tações estratégicas para a nova Política Regio-nal e de Coesão 2007-2013. É sobre esta temá-tica que se debruça o texto que se segue, pro-curando averiguar e lançar pistas sobre como éque uma autarquia local se pode preparar parafazer face a essas novas exigências, ou seja,como é que a partir do local se podem cons-truir condições para aumentar os níveis deconcretização das grandes orientações da polí-tica pública.

Com este objectivo presente, este textoganha particular relevância essencialmente portrês motivos. Primeiro, porque um dos autorestem desenvolvido a sua actividade profissionalnuma autarquia local (Município de Arouca,que aqui se apresenta como estudo de caso),tendo estado envolvido de forma activa na ela-boração de candidaturas aos Quadros Comuni-tários de Apoio anteriores, procurando actual-mente auxiliar a autarquia na definição depolíticas territoriais de desenvolvimento deacordo com as novas exigências. Esta particu-laridade permite, não só percepcionar de pertoo modus operandide uma autarquia local,como também aferir de que forma poderá alte-rar a sua actuação como resposta a estes novosdesafios. Segundo, porque os outros autores,no âmbito da investigação universitária quetêm desenvolvido, têm procurado, com este eoutros municípios da região, exercer um papelessencial de capacitação e interface entre asmúltiplas instituições locais/regionais e osrecursos que estas necessitam (conhecimento,competências…) para o desenvolvimentosocial e económico dos territórios. Nesteâmbito, a questão que se coloca é se esta posi-ção de interface terá repercussões na definiçãode políticas territoriais de desenvolvimentopor parte das autarquias. Por fim, porque já seiniciou o estabelecimento do novo enquadra-mento estratégico para o apoio estruturalcomunitário no horizonte 2013, no qual seintegram as opções estratégicas de desenvolvi-

mento que as regiões e as autarquias definirempara este período temporal. Constitui, por issomesmo, uma temática essencial para este iní-cio de período de programação, o que aconse-lha a existência de ideias claras sobre o cami-nho mais adequado a percorrer.

O texto inicia com uma breve panorâmicada nova Política Regional e de Coesão com ointuito de demonstrar os principais desafiosque a nova agenda desta política suscita. Nasecção seguinte efectua-se a passagem doplano europeu (políticas comunitárias) para oplano nacional, que se reflecte em Portugal aonível do novo quadro comunitário de apoio:QREN 2007-2013. Incorporando do mesmomodo os desafios e directrizes da nova PolíticaRegional e de Coesão, este instrumento dedesenvolvimento social, económico e territo-rial difere em grande medida dos anterioresquadros comunitários de apoio e coloca umconjunto de desafios ao poder local. Nesteenquadramento teórico procura, pois, perce-ber-se quais as implicações do ponto de vistada definição de políticas territoriais de desen-volvimento. A estrutura teórica exposta nasegunda e terceira secções constituem a basepara a análise empírica efectuada na quartasecção. O seu grande objectivo consiste emperceber como é que uma autarquia local,neste caso o Município de Arouca, se posi-ciona face a esta transição. Por fim, na últimasecção apresenta-se uma síntese e um comen-tário final ao exercício efectuado.

2. Os desafios subjacentes à nova Política Regional e de Coesão

A Política Regional e de Coesão visa a pro-moção do desenvolvimento das regiões maisdesfavorecidas da UE de forma a suprimir oudiminuir, tanto quanto possível, as assimetriasregionais, em processo sustentado, com forte

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incidência na valorização das questões ambien-tais (CEC, 2006a). O acto único europeu abriucaminho a uma política regional da UE commarcada vertente económica e social, conse-guida através de uma mais adequada e eficazarticulação dos fundos estruturais1.

Sem alterar a base e os objectivos da suagénese, com o passar do tempo esta política, noentanto, foi sendo redesenhada. Antes, a suaconcretização na procura da diminuição dasassimetrias regionais efectuava-se com basenuma distribuição equitativa dos fundos comu-nitários, procurando dotar as regiões menosdesenvolvidas de um conjunto de infraestrutu-ras e equipamentos, que se tinham como neces-sários e bastantes para atrair a instalação deactividades produtivas, com subsequente cria-ção de emprego e de riqueza que, o mais célerepossível, libertassem essas regiões da necessi-dade dos apoios comunitários (CEC, 2008c).Contudo, com o decorrer do tempo constatou--se que nem sempre isso aconteceu. A título deexemplo, o trabalho desenvolvido por Martin(2003) evidencia para a década de 90 que,embora as desigualdades entre estados-mem-bros tenham diminuído (em valores de PIB percapita), as disparidades entre regiões NUTS IIdentro de cada estado membro aumentaram.Em jeito de conclusão, o autor afirma que «(…)the majority of regional inequalities in Europeare explained by inequalities within the coun-tries. Thus, Europe is experiencing a process ofconvergence among countries at the same timeas a process of divergence among the coun-tries’own regions»(Martin, 2003: 21-23), con-trariando, assim, os objectivos de base para osquais a Política Regional e de Coesão foi dese-

nhada. Nesta linha de raciocínio, mais recente-mente a própria Comissão Europeia confirma oagravamento das disparidades regionais: «Eco-nomic and social disparities in Europe aresubstantial and they have significantly deepe-ned with recent enlargements. Luxembourg, thewealthiest Member State in terms of per-capitaincome, is now seven times richer than the poo-rest one, Romania. At the regional level, thedifference is even bigger: the richest region isInner London with 290% of EU-27’s averagegross domestic product (GDP) per capita,while the poorest region is Nord-East in Roma-nia with 23% of the EU average. AlthoughGDP is not a completely accurate reflection ofliving standards as it does not factor in therelative cost of living, it gives an indication ofthe differences that exist»(CEC, 2008e: 2).

Da análise das orientações estratégicascomunitárias em matéria de coesão para operíodo 2007-2013, podem inferir-se dois objec-tivos macro do novo ciclo da Política Regional ede Coesão (CEC, 2006b). Por um lado, garantiruma maior apropriação da política de coesãopelos agentes regionais e locais, o que se traduznum maior envolvimento destes ao nível de par-cerias e no reforço do diálogo entre os interve-nientes regionais e locais em diversos níveis,designadamente em domínios como a inovação,a economia baseada no conhecimento, as novastecnologias de informação e comunicação, oemprego e o empreendedorismo. Por outro lado,adequar os programas nacionais de modo a con-ceder prioridade às áreas de investimento referi-das, estimulando o potencial de crescimentopara atingir e manter taxas de crescimento ele-vadas. As prioridades de investimento devem terem conta, tanto as zonas mais urbanas, como asrurais, em função dos respectivos papeis nodesenvolvimento regional, que deve ser equili-brado e sustentado, tendo sempre presente anecessidade da inclusão social.

A definição de tais objectivos sustenta oargumento atrás referido, consequência, nãosó das novas necessidades decorrentes dos

1 O Tratado de Roma (firmado em 1957 porFrança, Alemanha, Itália, Bélgica, Holanda e Luxem-burgo) não previa uma política regional, mas apenasmecanismos de solidariedade. A política regionalsurge após o primeiro alargamento (1973) com insti-tuição do Fundo Europeu de DesenvolvimentoRegional (FEDER) em 1975 (Fonseca, 2004).

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sucessivos alargamentos da União Europeia (aentrada de novos estados-membros, com ele-vadas assimetrias internas, geraram mais dese-quilíbrios no território da UE aumentando asfunções e o espaço de actuação da PolíticaRegional e de Coesão), mas também do factodo modelo de financiamento existente nãoestar a atingir os resultados esperados. A esterespeito, o debate não é recente mas, generica-mente, aponta para a ausência de uma estraté-gia clara na alocação de fundos. A título deexemplo, Funck et al. (2003:13) afirmam«what is clear, however, is that simply injec-ting resources is not sufficient to fuel sustaina-ble regional growth. What counts is the policyframework into which those resources areinjected and the strategy applied in deployingthem». É, de resto, nesse sentido que apontamos comissários europeus Hubner e Sˇpidla(CEC, 2008d) quando, ao se debruçarem sobreo estudo de cerca de 450 programas, concluí-ram que os estados-membros e as regiõesteriam de redefinir radicalmente as respectivasprioridades, destinando os investimentos maisexpressivos para a competitividade, oemprego e o crescimento, em sintonia com aEstratégia de Lisboa, renovada em 2005.

Referindo-se a este novo ciclo 2007-2013,a comissária Hubner declarou que «a Políticade Coesão apoiará projectos emblemáticoscapazes de levar por diante a estratégia decrescimento e emprego na União, em comple-mentaridade com outras políticas comunitá-rias. Todos os Estados-Membros inscreveramnos seus programas os objectivos da Estraté-gia de Lisboa e passarão a abordar os novosdesafios ligados à crescente globalização, àsalterações climáticas emergentes, ao envelhe-cimento demográfico da Europa e aos fenóme-nos migratórios» (CEC, 2008d). Estamudança de orientação na Política Regional ede Coesão assenta, pois, no pressuposto de quea coesão não decorrerá somente da concentra-ção de recursos comunitários nas regiõesmenos desenvolvidas, postura tradicional de

uma política redistributiva como resposta aassimetrias regionais de desenvolvimento. Amelhoria destas regiões exige investimentoselectivo, qualificador e capaz de valorizar osseus recursos endógenos.

Foi neste sentido que, no âmbito das orien-tações estratégicas para a Política Regional e deCoesão, foram definidas três novas áreas priori-tárias para a afectação de recursos: i) reforço daatractividade e competitividade das regiões edas cidades melhorando a acessibilidade, pres-tando serviços de qualidade e preservando opotencial ambiental; ii) promoção da inovação,do espírito empreendedor e do crescimento daeconomia do conhecimento, através do desen-volvimento das tecnologias da informação e dacomunicação; iii) criação de mais e melhoremprego, atraindo mais pessoas para o mercadode trabalho, melhorando a capacidade de adap-tação dos trabalhadores e das empresas eaumentando o investimento no capital humano.

Estas três prioridades representam uma novaagenda da Política Regional e de Coesão, comimplicações, quer do ponto de vista temático(apontando para o facto de existirem áreas deactuação bem definidas que em muito irão bene-ficiar da afectação de recursos neste período),quer ao nível da metodologiaa adoptar na defi-nição de estratégias e no desenho de projectos.

No que respeita à agenda temática, uma lei-tura atenta das directrizes comunitárias permitedistinguir áreas de actuação concretas às quaisse associa um conjunto de desafios que a socie-dade contemporânea enfrenta de forma trans-versal (com maior ou menor enfoque) aos paí-ses da UE (CEC, 2006c; 2007; 2008b; 2008c;2008e; Hubner, 2007a; 2007b; 2009a; 2009b):

a) Globalização e competitividade econó-micaÉ um facto que as questões económicastêm assumido um papel de crescenterelevo no contexto político e mediático.Factores associados à competitividade, àconcorrência global, à inovação ou

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mesmo à polarização social encontram--se na ordem do dia, induzindo o desen-volvimento de uma economia dinâmicacapaz de criar mais e melhores empre-gos. Neste sentido, a política regionalcomunitária aponta fundamentalmentepara a necessidade das economias dasregiões se internacionalizarem, projec-tando-se no exterior através da potencia-ção dos seus recursos endógenos, desig-nadamente ao nível da sua capacidadeinovadora e da transferência de conheci-mento, do empreendedorismo e da qua-lidade dos recursos humanos. Ficam,assim, criadas condições para incremen-tar o potencial de desenvolvimento demédio e longo prazo das regiões maisdesfavorecidas e, consequentemente,para o aumento da coesão social, econó-mica e territorial da UE.

b) Alterações demográficasÉ comummente aceite que a Europaenfrenta um desafio do ponto de vistademográfico, em grande medida asso-ciado ao envelhecimento da população.As questões encontram-se quase semprenos aspectos negativos relacionadoscom o sistema de segurança social, cui-dados de saúde, mercado de trabalho ecom a economia em geral. Ora, transfor-mar esta visão problemática numa opor-tunidade conduziu à elaboração de umconjunto de recomendações por parte daComissão, assentes na Estratégia de Lis-boa, que pretendem, não só tirar partidode uma vida mais longa, como tambéminiciar a renovação demográfica. Comesta nova perspectiva emergem poten-cialmente, não só novos serviços e pro-dutos (como, por exemplo, o turismosénior), como também novas formas deempreendedorismo (associadas à cria-ção de novas empresas por parte dojovemreformado) e de cidadania (comoseja o trabalho voluntário comunitário, o

apoio a associações locais e a institui-ções de solidariedade).

c) Alterações climáticas e eficiência ener-géticaAs alterações climáticas, associadas à uti-lização indiscriminada de combustíveisfósseis e à gestão ineficiente de recursosnaturais, estão entre os maiores desafiosambientais, sociais e económicos queactualmente a sociedade enfrenta. Estu-dos demonstram que muitas regiões naEuropa serão crescentemente confronta-das com o impacto assimétrico destasalterações, sendo que do seu impactocombinado decorrerão implicações parao turismo, a agricultura e a qualidade devida das comunidades dessas regiões.Embora o debate assente numa perspec-tiva global, o desenvolvimento de medi-das que mitiguem tais problemas, pode edeve ser efectivado a nível regional emesmo local. É neste contexto que surge,em grande medida, a eficiência energé-tica, apontada como uma das soluçõespara diminuir o consumo de energia e osproblemas de poluição associados e, con-sequentemente, contribuir para a minora-ção dos problemas decorrentes das altera-ções climáticas.

d) Aglomerados urbanos e dinâmicasvivenciaisNa perspectiva da CE, um outro factorcapaz de influenciar a Europa, quer aonível da sua competitividade numa eco-nomia globalizada, quer do ponto devista da sua coesão territorial, relaciona--se com a capacidade dos territóriosatraírem ou reterem investimento produ-tivo qualificador e recursos humanosqualificados. A Política de Coesãoaponta para reforço desta atractividadeatravés, por um lado, da construção deinfraestruturas de qualidade (factordeterminante para a maior ou menorcapacidade de atracção económica e

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social de um território, designadamentepara as regiões menos desenvolvidas e,por isso mesmo, de convergência) e, poroutro, da promoção da singularidade eidentidade dos locais, sejam estes denatureza mais urbana ou rural, mas emambos os casos capazes de proporcionarvivências e experiências únicas, comqualidade ambiental e com perspectivasde criar oportunidades de crescimento ede geração de emprego.

e) Educação e formaçãoConsiderada a «criação de mais emelhor emprego» uma das prioridadesda Estratégia de Lisboa, torna-se con-sensual que a qualificação dos recursoshumanos constitua um dos pilares fun-damentais para a concretização de talestratégia e, consequentemente, assumaum papel preponderante no contexto daPolítica de Coesão. Reconhece-se, noplano social, que a falta de qualificaçãoé geradora de exclusão social – o desem-prego afecta mais fortemente as popula-ções menos escolarizadas. Analoga-mente, no plano económico, verifica-seque as empresas mais competitivas estãoassociadas a sectores tecnológicos maisevoluídos e que utilizam recursos huma-nos com níveis de conhecimentos maiselevados. É neste sentido que as orienta-ções comunitárias apontam essencial-mente em investimentos nos sistemas deeducação (do pré-escolar ao ensinosuperior, do ensino e aprendizagem àinvestigação) e formação (fomentando aaprendizagem ao longo da vida).

f) Governação e Tecnologias de Informa-ção e ComunicaçãoCada vez mais se reconhece que políti-cas públicas eficazes requerem umaadministração competente e eficiente. Éneste sentido que aponta o discurso dacomissária Hubner (2007c) e que conti-nua a a ser uma das principais preocupa-

ções da Política de Coesão – «we cannotomit the contribution Cohesion policyhas made to the modernization of publicservices in the Member States. It hasimproved their management and controlsystems and harmonized their procedu-res in a European context». Num con-texto de uma sociedade caracterizadapela importância crescente dos recursoscognitivos, pelo avanço constante doque se designa por Tecnologias de Infor-mação e Comunicação (TIC) – compu-tadores, telecomunicações, Internet – epela consequente alteração da vivênciadas pessoas e das próprias instituições(Santinha e Castro, 2008), compreende--se que uma das apostas da nova Políticade Coesão resida no desenvolvimentodas condições necessárias ao desenvol-vimento de uma sociedade baseada nainformação e no conhecimento, comimplicações sociais (aposta centrada nasnecessidades do indivíduo), económicas(aposta centrada nas necessidades dasempresas) e na eficiência da administra-ção pública (aposta no governo electró-nico), através de uma relação equili-brada de oferta e procura de serviços.

Do ponto de vista metodológico, a mesmaleitura evidencia que a nova Política Regionale de Coesão introduziu um conjunto de altera-ções susceptíveis de melhorar a sua eficácia.Por um lado, tenta evoluir no sentido de maxi-mizar/priorizar investimentos mais intangí-veis, associados à inovação e ao desenvolvi-mento sustentável, e diminuir a afectação derecursos em investimentos mais tradicionais,ou seja, em projectos de carácter eminente-mente infraestrutural. O acento tónico nesteperíodo transita do carácter físico para o ras-gar de ideias: «from focus on opening roads toopening minds»(Hubner, 2007a). A ideia pre-dominante centra-se na definição de umaabordagem mais estratégica, que destaque

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áreas mais avançadas como a formação e cul-tura, envolvendo o ambiente urbano e os espa-ços públicos, o conhecimento e a tecnologia,assentes numa economia baseada no conheci-mento. Por outro lado, procura encorajar umaabordagem mais estratégica(e, por issomesmo, mais proactiva e menos reactiva) emultissectorial, não dissociando as questõessociais das económicas e ambientais, inte-grando as perspectivas de base territorial emquestões socioeconómicas, visto que tambémos próprios problemas inerentes à sociedadesão transversais. Uma terceira alteração con-siste em pretender promover a cooperação ter-ritorial , na medida em que, por um lado, osdesafios que as regiões europeias enfrentamrequerem capacidades cujo desenvolvimentopode beneficiar do intercâmbio de experiên-cias e competências entre regiões e, por outro,há o potencial de acrescentar valor às acçõesde política pública, através da criação de redesentre regiões que assegurem o acesso a boaspráticas. Por fim, ambiciona provocar a coo-peração interinstitucional, enfatizando o diá-logo e a cooperação entre actores locais/regio-nais no processo de definição de estratégias eimplementação de projectos. Tal permite, porum lado, reunir sinergias essenciais para a suacompetitividade (gerando mais valias paracada actor) e, por outro, a dinamização de pro-cessos de aprendizagem colectiva, essenciaispara criar um limiar institucional sustentadono tempo, assegurando assim as condiçõesnecessárias para evitar a efemeridade dasintervenções.

O impacto destes desafios «far-se-á sentircom menor ou maior intensidade em toda asregiões da União. Em algumas regiões essesdesafios imporão novas restrições ao desen-volvimento económico, noutras criarão novasoportunidades de emprego e crescimento»(CEC, 2007). A questão coloca-se agora nacapacidade que cada estado membro ou regiãopossa ter para definir políticas capazes deantecipar e gerir essas mudanças, por um lado,

e no modo de fomentar o desenvolvimentoregional e a convergência, por outro, face àsalterações sociais e políticas que se adivinham.Importa retirar daqui as necessárias ilaçõespara a condução da política pública nos próxi-mos anos de modo a conseguir fazer face a taisdesafios.

3. QREN 2007-2013: um desafiopara o poder local

Seguindo as directrizes da nova PolíticaRegional e de Coesão, este ciclo de programa-ção caracteriza-se por alterações significativasno modelo de implementação dos apoioscomunitários. Por um lado, ao nível da racio-nalização das acções e, por outro, ao nível dasua plena consonância com os desígnios estra-tégicos da União. De facto, segundo Mateus(2007) a análise da evolução da programaçãoestrutural em Portugal permite dividi-la emdois ciclos: os três primeiros Quadros Comu-nitários de Apoio (1989-2006) e o QREN(2007-2013). O primeiro período caracterizatodo o país dominado pelo objectivo coesão(uniformidade das situações regionais), refe-renciado a Programas Nacionais (sectoriais),que desconcentrados em Programas Regionaisdavam origem a projectos e iniciativas locaisautónomos. A primazia neste período era cla-ramente municipal, sendo as tipologias de pro-jectos preferidas as infraestruturas, o capitalfísico e a formação. A estratégia adoptada era,assim, preferencialmente de natureza cat-ching-up defensivo, ou seja, centrava-se nasfraquezas, sendo por isso mesmo essencial-mente reactiva. Por oposição, e ainda deacordo com o mesmo autor, o QREN 2007--2013 é formatado para o país diferenciadoregionalmente: a Região de Lisboa no objec-tivo competitividade regional e emprego, asRegiões da Madeira e do Algarve em transi-ção e as restantes Regiões em objectivo con-vergência. Caracteriza-se por Programas Ope-

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racionais Temáticos (designadamente o POPotencial Humano, o PO Factores de Compe-titividade e o PO Valorização do Território)que se desenrolam em Programas Operacio-nais Regionais aumentados e integrados dandoorigem a projectos e iniciativas locais em rede.Neste caso, a primazia é claramente de dimen-são regional e intermunicipal, onde as tipolo-gias de projectos preferidos são as redes deacesso e qualidade territorial, a inovação, oconhecimento e o capital humano. Conti-nuando a seguir a linha de pensamento domesmo autor, dir-se-á que a estratégia exigidadesta vez é do tipo convergência ofensiva, aqual visando a competitividade se concentrana valorização e procura de oportunidades.

Este processo de transição acarreta impli-cações no âmbito da definição de políticaspúblicas por parte do poder local. De facto,este, não só representa o nível de governaçãoem que as políticas podem ser implementadascom maior sucesso2, dada a sua maior proxi-midade ao cidadão, como também ocupa umpapel chave na prossecução dos objectivos,quer da Estratégia de Lisboa, quer da PolíticaRegional e de Coesão3 (Jhas, 2005; Lambrou,2006). Contudo, o papel das autarquias locaisna prossecução de uma agenda de desenvolvi-mento tão diversificada e até ambiciosa como

esta é, sem dúvida, difícil. A agenda é nova, asformas de a pensar e abordar são forçosamentenovas, as necessidades de interacção geradorae disseminadora de conhecimento são signifi-cativamente acrescidas. Trata-se de um con-texto de actuação que, embora reconheça opapel fulcral que os poderes públicos munici-pais desempenham na prossecução dos objec-tivos que se perseguem, exige igualmente quese ultrapasse a inércia decorrente da falta detradição e experiência na abordarem à diversi-dade de temas que perfazem essa agenda.

O caso português é paradigmático no querespeita a estas limitações. De forma generali-zada, ainda persiste uma cultura institucionalcéptica em relação a mudanças na definição depolíticas públicas de base territorial ao nívellocal. Segundo Rosa Pires (2001), esta relutân-cia em adoptar novas posturas está associada aolegado histórico que ainda persiste do regimepolítico ditatorial (pré-1974)4, combinado coma descrença que muitos ainda têm em relação àesfera política e à sua vontade em responder defacto às necessidades sociais e económicas dascomunidades. Neste contexto, são notórias asbarreiras existentes para responder de formaeficaz aos desafios que a sociedade contempo-rânea coloca na definição de políticas territo-riais de desenvolvimento, designadamenteneste novo período de programação. Barreirasque se traduzem numa reduzida visão estraté-gica e numa capacidade circunscrita de criaçãode redes e trabalho em parceria, alimentadaspela inexistência de recursos humanos prepara-dos e uma capacidade organizativa adequadapara se afastarem de uma agenda mais tradicio-nal5. A próxima secção procura ilustrar o caso

4 Sobre este assunto, é interessante verificar quecertos autores (e.g. Sonne, 2004) afirmam que deter-minadas ideias e práticas da actividade de planea-mento do território tendem a prevalecer durante maistempo que os próprios sistemas políticos.

5 O estudo recentemente apresentado por Oli-veira e Pinho (2008) vem reforçar este argumento.Efectuando uma análise crítica das principais políticas

2 Sobre esta questão, Morgan (2004) diferencia opoder de decidir(i.e. o poder de definir as políticaspúblicas) do poder de transformar(i.e. o poder deimplementar as mesmas políticas), argumentando que,embora o primeiro se situe essencialmente à escalanacional ou mesmo supranacional, já a cooperaçãoactiva à escala subnacional é condição necessária paratraduzir o poder de decisãono poder de transformaçãoe, assim, ultrapassar as barreiras tradicionalmente asso-ciadas à falta de implementação das políticas públicas.

3 Sublinhando a importância do local e das suasinstituições na prossecução dos objectivos da PolíticaRegional e de Coesão, a Comissão Europeia tem vindoa promover a realização de sessões de debate e escla-recimento em diversos municípios da União Europeia.Veja-se, a título de exemplo, o relatório publicadopelos organizadores do sixth OPEN DAYS – EuropeanWeek of Regions and Cities(CEC, 2008f).

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prático de um Município português, de forma ase poder aferir como, perante tais limitações,poderá uma autarquia local se preparar parafazer face a essas novas exigências.

4. Rumo a um novo ciclo de apoiocomunitário: apresentaçãode um estudo de caso

4.1. Município de Arouca: Breveenquadramento territorial

O concelho de Arouca situa-se no extremoNE do distrito de Aveiro e está integrado naNUTS III do Entre Douro e Vouga, da regiãoNorte de Portugal, juntamente com os conce-lhos de Sta. Maria da Feira, Oliveira de Aze-méis, Vale de Cambra e S. João da Madeira.Integrado na Área Metropolitana do Porto é,de todos os municípios que a constituem, oque possui maior área. Com uma moderadaexpressão demográfica, a sua população temvindo a estabilizar-se em torno dos 24 000habitantes, o que pode ser encarado como umfactor positivo se for considerado o contextoregional em que este município se posiciona(CMA e Quaternaire Portugal, 2008).

A cerca de 30 Km do litoral (em linha recta),situa-se numa zona de fronteira entre as regiõesNorte e Centro de Portugal, entre os distritos deAveiro (a que pertence), Viseu e Porto. Não obs-tante a sua relativa curta distância ao litoralsofre, ainda, de marcadas características de inte-rioridade, facto a que não é estranha a insufi-

ciência e deficiência das acessibilidades para oexterior, como aliás sucessivamente têm refe-rido os relatórios, quer do Plano de Desenvolvi-mento Estratégico para o Município de Arouca,quer dos Planos de Ordenamento Municipais. É,contudo, um município cuja individualidadesurge fortemente marcada pela história e pelasua ligação próxima à corte, desde os primór-dios da nacionalidade e a intensa vida culturaldo seu imponente Mosteiro.

4.2. O processo de actuação da autarquia no âmbito do anterior QuadroComunitário de Apoio (QCA III)

Do ponto de vista metodológico, os resulta-dos do trabalho que aqui se apresentam resulta-ram, em larga medida, quer do conhecimentoadquirido por um dos autores no processo deelaboração de candidaturas ao quadro comuni-tário anterior por parte do Município de Arouca,cujo envolvimento se traduziu numa participa-ção activa nesses processos junto do executivoautárquico, quer da análise dos seus diversosdocumentos de suporte e instrumentos de ges-tão, designadamente as Grandes Opções doPlano (GOP), os planos municipais de ordena-mento do território e os estudos e planos deíndole intermunicipal da sub-região do EntreDouro e Vouga. Esse conhecimento e análisepermitiram recolher e analisar informação,tanto em termos quantitativos, como do pontode vista qualitativo, conduzindo à compreensãodo modo de actuação (postura) da autarquiadurante o período em causa: 2000-2006.

De um modo mais esquemático, para melhorpercepcionar essa postura importou aferir:

a) O quadro geral de preocupações daautarquia no âmbito do QCA III, isto é,que prioridades de agenda temática seencontraram no centro das políticas ter-ritoriais de desenvolvimento definidaspela autarquia?

territoriais de desenvolvimento com implicações nasformas urbanas das duas principais cidades portugue-sas (Lisboa e Porto), os autores concluem que, no casoda cidade do Porto, os impactos das políticas forambem menos significativos, resultando em grandemedida, quer da falta de visão estratégica, quer daescassez de recursos técnicos e financeiros adequa-dos. Ora, se estas debilidades são palco de um grandecentro urbano como o Porto, o retrato dos restantesmunicípios portugueses não se afigura animador.

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b) A natureza e a abrangência dos projectosfinanciados, na procura de resposta paraas seguintes questões: serão os projectosdesenvolvidos predominantemente denatureza material ou, pelo contrário, veri-fica-se uma preocupação com a vertentemais imaterial? Serão os projectos abor-dados numa perspectiva essencialmentesectorial ou compreendem uma aborda-gem integrada e multissectorial?

c) O processo de elaboração dos projec-tos, ou seja, foram os projectos elabora-dos segundo uma lógica territorial e ins-titucionalmente atomista ou, pelo con-trário, perspectivaram uma abordageminterterritorial e interinstitucional, nãose fechando a autarquia em si própria?

A resposta a estas questões torna-se essen-cial para compreender como tornar operacionalo quadro conceptual e orientador definido pelanova Política Regional e de Coesão para a ela-boração de políticas territoriais de desenvolvi-mento. Por outras palavras, percebendo as fra-gilidades e potencialidades do modus faciendida autarquia nesse período temporal, melhor sepodem definir as mudanças necessárias parauma melhor adequação às exigências queactualmente se colocam na definição de políti-cas públicas de promoção de trajectórias dedesenvolvimento sustentadas no tempo.

4.2.1. Quadro geral de preocupaçõesda autarquia

Para melhor se entenderem as prioridadesde actuação neste período, fez-se a análise porgrandes áreas temáticas: funções económicas,ambiente social e urbano, educação e governa-ção (em que as TIC assumem papel funda-mental).

No que respeita às funções económicas, queincluem a agricultura, indústria e energia, trans-portes e comunicações, comércio e turismo,

verificamos que neste domínio o peso atribuídoao sector dos transportes (sendo a rubrica quelidera quase sempre a tabela ao longo dos anos)é preponderante, ficando a dever-se designada-mente aos custos com transportes escolares(situação típica de territórios de baixa densi-dade onde impera, na generalidade, uma inefi-ciência dos transportes públicos). Os projectosdesenvolvidos no âmbito do fomento industrialdestinaram-se à infra-estruturação das zonasindustriais. Já no sector do turismo, os projectosprenderam-se, na sua maioria, com a constru-ção de equipamentos, a requalificação de espa-ços e a realização de alguns eventos que sãotransversais ao domínio da cultura.

Em relação ao ambiente social e urbano,não obstante o valor dos investimentos serdiminuto no que se refere à acção social pro-priamente dita, o investimento nesta área deactuação é dos mais elevados, em muito justi-ficado pelas obras efectuados no âmbito doabastecimento público de água, do sanea-mento, da habitação e do ordenamento do ter-ritório. Destaca-se ainda aqui o peso atribuídoao sector da cultura, que se mantém franca-mente constante e de modo geral elevado aolongo dos anos, atingindo um pico em 2005,sendo mesmo o segundo maior de toda a acti-vidade autárquica.

No que concerne ao domínio da educação(ou melhor, qualificação dos recursos huma-nos), é de assinalar o recente e crescente pesoque lhe tem sido atribuído. Poderá inferir-seque esta prioridade crescente decorrerá doreordenamento do parque escolar do Municí-pio, consequência também da transferênciapara as autarquias locais de novas competên-cias e da conformidade com as políticas nacio-nais, definidas para esse sector. É assim deassinalar que o peso deste sector no ano de2007 (ano em que os fundos do QCA III aindase encontravam a ser utilizados) mais queduplicou relativamente ao ano de 2005.

Importa fazer aqui uma breve alusão aoinvestimento no sector dos serviços gerais da

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administração públicanos anos de 2002 a2004. Neste âmbito houve algum investimentono domínio da informatização dos serviços emodernização do edifício dos Paços do Con-celho, em prol de uma boa governação, queatingiram o seu expoente máximo no ano de2004, notando-se porém, a partir daí, umdecréscimo constante, que culmina no ano de2007 com um investimento ínfimo.

Articulando a informação disponível denatureza quantitativa com o conhecimentoadquirido durante o desenvolvimento dos pro-jectos, constata-se que as prioridades de inves-timento da autarquia pautaram-se por umaactuação típica da generalidade das autarquiaslocais do país, dirigindo-se essencialmentepara a execução de infraestruturas (seja denatureza industrial, seja do foro viário ou deáguas e saneamento), necessárias mas nãosuficientes para fazer frente aos desafios daglobalização e à entrada de novas economiasemergentes, não considerando igualmente osdesafios decorrentes das alterações demográfi-cas ou climáticas. No entanto, no que concerneaos desafios relacionados com a qualificaçãode recursos humanos ou as dinâmicas viven-ciais, denota-se já o surto de projectos emáreas que em tudo poderão beneficiar o muni-cípio a médio e longo prazo.

4.2.2. Natureza e abrangência dos projectos financiados

A análise efectuada dos projectos desen-volvidos pela autarquia no âmbito do QCA IIIdemonstra que estes são predominantementede natureza física (96%), traduzindo-se na rea-lização de grandes equipamentos municipais,infraestruturas de abastecimento de águas esaneamento, contemplando ainda a infra--estruturação de zonas industriais. Os restantesprojectos, com componente maioritariamenteimaterial, traduziram-se em eventos realizadosnos domínios da cultura e do turismo. Para

além do número reduzido de projectos destanatureza, os investimentos a eles associadossão igualmente baixos, com excepção de umprojecto denominado «Arouca e o seu Mos-teiro 300 anos atrás», relacionado com a pro-moção do património cultural construído.

No que se refere à sua abrangência, ogrosso dos investimentos da autarquia versasobre projectos sectoriais que abordam cadaum dos seus temas isoladamente, excepçãofeita aos (poucos) projectos de índole imate-rial, nos quais se encontrou maior relaciona-mento transversal em diferentes sectores,abrangendo áreas como a cultura, o turismo, omarketing e comunicação social, envolvendopara o efeito diversos actores locais, regionaise mesmo internacionais.

Refira-se, contudo, que, sendo certo que ogrosso dos investimentos tenha visado o domí-nio de acções materializadas, limitando atomada de outras opções de carácter mais ima-terial de suporte e complemento às primeiras,também não deixa de ser verdade que o factoda região ter necessidades prementes eminfraestruturas básicas ao seu desenvolvi-mento social e económico conduziu ao dese-nho e implementação deste tipo de projectos.

4.2.3. Processo de elaboração dos projectos

Na elaboração de projectos para enformarcandidaturas que recorreram a financiamentoscomunitários, o Município de Arouca teveuma abrangência claramente diferenciada: i)concepção de projectos de carácter intermuni-cipal, realizados em conjunto com os demaismunicípios da sub-região do Entre Douro eVouga (EDV) e ii) concepção de projectos deenfoque municipal elaborados e geridos pelaprópria autarquia.

No plano de intervenção intermunicipal,denota-se um conjunto de preocupaçõescomuns baseadas em necessidades semelhan-

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tes, para as quais foram criadas sinergias noseio de uma Associação de Municípios doEDV. Ora com recurso a técnicos municipais eda administração central, ora com recurso aempresas externas de consultoria, foramdesenvolvidos projectos de intervenção inter-municipal com a intenção de obter melhorescondições para aceder às verbas comunitáriasem áreas que se entendiam como sendo asmais carenciadas da região. Contudo, refira-seque a lógica de cooperação assentava na pro-cura de um determinado financiamento quetinha como condição prévia a candidatura porparte de regiões NUTS III. Portanto, a criaçãode redes interterritoriais surge, não como veí-culo de promoção de coesão territorial e porvontade colectiva de trabalhar de forma articu-lada, mas antes como via obrigatória para aaquisição de fundos.

No que diz respeito ao relacionamentointerinstitucional, diversos parceiros (paraalém da esfera política) participaram nos pro-jectos candidatados, designadamente associa-ções representativas de interesses locais eregionais. Contudo, a sua participação nodesenho das propostas foi, na generalidade,ténue, dificultando por isso a criação de condi-ções de sustentabilidade no tempo, quer para aimplementação conjunta dos projectos, querpara o desenvolvimento de bases para futurasparticipações conjuntas no desenho de outrasiniciativas.

A nível local, a estratégia de desenvolvi-mento territorial baseou-se de um modo geralnas orientações expressas e nas medidas eacções preconizadas nos diversos instrumen-tos de gestão territorial, designadamente oPlano Director Municipal e o Plano Estraté-gico do Município. Este último (aprovado em1995) foi mandado elaborar com o intuito pri-mordial de ser um documento orientador naviabilização à formalização de candidaturasaos fundos estruturais, com uma estratégia dedesenvolvimento e uma visão para o municí-pio para os anos seguintes. Não obstante a

existência de planeamento físico e estratégicointegrado (explícita nos instrumentos referi-dos), os diversos projectos desenvolvidos, nasmais diversas áreas, seguiram uma lógica ter-ritorialmente atomista, não se perspectivandoqualquer articulação com os territórios circun-dantes, dificultando consequentemente a inte-racção ou complementaridade por exemplo nodomínio das intervenções físicas. Situaçãosimilar verificou-se ao nível do relaciona-mento interinstitucional, em que os projectoseram desenhados pelos recursos humanos daprópria autarquia ou, por vezes, contratandoequipas de consultoria externas.

Resumindo, no âmbito da definição depolíticas territoriais de desenvolvimento e,consequentemente, do desenho de projectoscom recurso a apoio comunitário para operíodo anterior (2000-2006) verificou-seuma postura por parte da autarquia de Aroucaque revela, por um lado, um reduzido relacio-namento territorial e interinstitucional e, poroutro, uma abordagem essencialmente secto-rial e predominantemente de natureza mate-rial. Se é verdade que esta postura obteveresultados positivos para o desenvolvimentodo município face às necessidades mais pre-mentes (principalmente associadas às infraes-truturas) e dotou a autarquia de experiência naangariação de fundos para a realização de pro-jectos, não é menos certo que esta forma deactuação poderá tornar-se numa forte debili-dade face à dimensão dos desafios colocadospela globalização, pelo surto de países emer-gentes com economias competitivas, pelasalterações demográficas e climáticas e pelanecessidade de gerar e atrair recursos huma-nos cada vez mais qualificados. Tal implicaque as rotinas adoptadas durante esse ciclo definanciamento comunitário deverão ser redi-reccionadas, procurando adquirir uma posturamais adequada para fazer face às novas exi-gências, construindo-se assim condições paraaumentar os níveis de concretização da polí-tica pública.

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4.3. Perspectivar um programa de intervenção diferente noâmbito do QREN 2007-2013

4.3.1. Princípios conceptuais

Tendo presentes os desafios, as exigênciase as principais directrizes que emanam danova Política Regional e de Coesão e que secolocam, actualmente, no novo ciclo de apoiocomunitário (QREN 2007-2013), importa per-ceber como se poderão definir políticas públi-cas capazes de promover um território e umacomunidade com maiores níveis de coesão(através da qualificação dos factores determi-nantes da qualidade de vida da população), decompetitividade (através do reforço da atracti-vidade dos aglomerados urbanos) e de cidada-nia (através do reforço das formas de gover-nança fomentando mecanismos de cooperaçãoentre os diversos actores locais/regionais).

A leitura das dinâmicas sociais, económi-cas e territoriais que actualmente se verificamde forma transversal na sociedade contempo-rânea, por um lado, conjugada com as orienta-ções expressas na Estratégia de Lisboa, naPolítica Regional e de Coesão (âmbitoexterno) e no QREN 2007-2013 (âmbitointerno), por outro, permite afirmar que umprograma de intervenção neste novo períododeverá ser desenhado tendo em consideraçãoum conjunto de desafios que ganham particu-lar relevância na implementação das políticaspúblicas. Por um lado, deverá considerar-seum leque amplo e renovado de áreas de actua-ção da política pública, incorporando activa-mente as novas preocupações e orientações,quer da Estratégia de Lisboa, quer da PolíticaRegional e de Coesão, procurando articular asdinâmicas locais/regionais com as agendaseuropeias através da utilização racional dosfundos comunitários e, por isso mesmo, dapromoção da inovação como base de coesão ecompetitividade. Aliás, a nova agenda políticairá influenciar a afectação de fundos neste

novo período de programação, pelo que odesafio que se coloca ao município consisteem compreender que oportunidades essaagenda levanta e, consequentemente, tirar omelhor partido dela para a prossecução dosseus objectivos. Questões como a globalizaçãoe a competitividade económica, a qualificaçãode recursos humanos, as alterações climáticase a eficiência energética, o envelhecimentodemográfico, a promoção de dinâmicas viven-ciais ou a valorização dos recursos endógenos,são alguns exemplos amplamente divulgados,quer no âmbito da agenda europeia, quer pelodiscurso nacional, assumindo-os como desa-fios do desenvolvimento social, económico eterritorial. A Política de Cidade Polis XXI éum bom exemplo nacional que integra e pro-cura dar resposta a esses desafios (Campos,2007), tendo como objectivos: qualificar eintegrar os distintos espaços de cada cidade,fortalecer e diferenciar o capital humano, ins-titucional, cultural e económico de cadacidade, qualificar e intensificar a integração dacidade na região envolvente e, finalmente, ino-var nas soluções para a qualificação urbana.

Por outro lado, importa encarar a afecta-ção de recursos de forma diferente da praticacomum, quer em relação à sua natureza (defi-nição de projectos com maior ênfase imateriale numa perspectiva integrada e multissecto-rial), quer no que respeita à sua abrangência(maior cooperação territorial e institucional),quer ainda quanto à criação de redes (locais//regionais e internacionais) e ao fomento dodiálogo com e entre os diversos actores locais.A nível nacional, tal conceito consubstancia-se, mais uma vez, na Politica de Cidades PolisXXI, e a resposta ao mesmo concretiza-se nosseguintes quatro instrumentos da Política: i)Parcerias para a Regeneração Urbana (atravésdos Programas Operacionais Regionais), ii)Redes Urbanas para a Competitividade e aInovação (através Programas OperacionaisRegionais), iii) Acções Inovadoras para oDesenvolvimento Urbano (através do Pro-

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grama Operacional Valorização do Território)e iv) Equipamentos Estruturantes do SistemaUrbano Nacional (através do Programa Opera-cional Valorização do Território). Ainda noâmbito deste princípio orientador interessaadoptar uma abordagem mais estratégica àprogramação das políticas públicas, seleccio-nando para o efeito um número reduzido dequestões centrais para o desenvolvimento domunicípio, em torno das quais se desenhamestratégias de intervenção e projectos mobili-zadores, perspectivados como uma ilustraçãode formas inovadoras de abordar os proble-mas, enfatizando a importância de uma inter-venção colectiva. A acção em torno destas ini-ciativas estratégicas pode ser determinantepara impelir a promoção de outros projectostambém relevantes para o futuro do município.

Por fim, interessa identificar e concretizarsoluções organizacionais adequadas, do pontode vista técnico, humano e financeiro, capazesde, primeiro, introduzir novos objectos enovas preocupações no cerne das políticaspúblicas, segundo, dinamizar novas formas deconstrução dessas políticas e, por fim, garantira implementação e a adequada monitorizaçãodas acções a concretizar (consolidando umprocesso de aprendizagem consequente). Por-que as dinâmicas sociais que sustentam anecessidade de adoptar uma visão supralocal euma capacidade de diálogo interinstitucional ede mobilização de actores locais/regionais nãoemergem de forma espontânea, há uma claranecessidade de identificar, trabalhar e concre-tizar soluções organizativas adequadas porforma a responder mais eficientemente às exi-gências que se colocam neste novo ciclo, porum lado, e tornar as acções eficazes e duráveisno tempo, por outro. Acresce que a introduçãodestas novas preocupações é mais robusta napresença de conhecimento sobre o que outrosterritórios fizeram com sucesso, pelo que ocontacto e/ou o estabelecimento de redes comoutras instituições internacionais revela-sefundamental. Esta inserção em grupos com

interesses específicos, e consequente comuta-ção e cumulação de conhecimento e de infor-mação, ganha maior relevância na medida emque, cada vez mais, há um enquadramentofavorável à troca de experiências transnacio-nais no âmbito da União Europeia.

A questão que agora se coloca é como con-textualizar estes desafios ao Município deArouca, tendo por base a postura adoptada noâmbito do quadro comunitário anterior? Deforma a balizar-se a abrangência da análise,optou-se por uma temática específica – aglome-rados urbanos e dinâmicas vivenciais–, umadas grandes áreas de actuação que se julgapoder expressar melhor os objectivos da políticapública consagrados, quer nas orientações daEstratégia de Lisboa, quer da nova Política deCoesão, particularizando o domínio da requali-ficação do espaço físico do centro urbano, deforma a torná-lo mais atractivo e apto a melho-rar a qualidade de vida das populações.

4.3.2. Aplicação dos princípios à luz de um caso concreto:reflexões sobre uma candidatura recente

O município de Arouca apresentou no finalde 2008 uma candidatura para a RegeneraçãoUrbana do centro Histórico de Aroucano qua-dro da Política de Cidades – Parcerias para aRegeneração Urbana(MAOTDR, 2008). Ofoco desta candidatura centrou-se na revitaliza-ção e requalificação de funções, espaços eequipamentos na envolvente próxima do pró-prio Mosteiro de Arouca e no próprio Mosteiro.Dadas as características do concelho e, conse-quentemente, a pequena dimensão do centrourbano, Arouca teve acesso a um instrumentorelativamente limitado do ponto de vista finan-ceiro. Mesmo assim, procurou conceber umaintervenção para a qual mobilizou diversosparceiros, abrangendo efeitos directos e induzi-dos aos níveis urbanístico, ambiental, social,

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cultural e económico. Conta, desde a concep-ção da candidatura, com o envolvimento efec-tivo de outras instituições (Direcção Regionalde Cultura do Norte e Real Irmandade RainhaSanta Mafalda), estando indirectamente rela-cionada com processos de investimento pri-vado subsequentes (uma lógica de Estratégiade Eficiência Colectiva para modernização dosector da restauração e comércio no centro daVila e, sobretudo, a instalação de uma unidadehoteleira no Mosteiro).

A motivação para esta candidatura residiuna vontade de qualificar o centro histórico deArouca, procurando requalificá-lo, enquantoespaço patrimonial classificado, cultural earquitectónico, conferindo-lhe maior quali-dade urbana e capacidade de atracção (de acti-vidades e de pessoas). Pretende qualificar-seum pólo urbano, e por via dele um município,os quais mais ordenados, mais atractivos, maiscompetitivos, mais desenvolvidos, estarão cer-tamente mais aptos a responder aos desafiosdo futuro e às necessidades dos que os visitam.Com esta ambição em mente, o plano de acçãoapresentado em sede de candidatura contem-pla um conjunto de intervenções físicas com-plementadas com acções imateriais. As denatureza material abrangem a requalificaçãodos espaços públicos envolventes ao Mosteirode Arouca e a reafectação do espaço a novosusos (instalação do centro de documentação evalências específicas da biblioteca municipal)de áreas devolutas do Mosteiro de Arouca. Asacções imateriais consubstanciam-se na exe-cução de programas de visita e no desenvolvi-mento de novos conteúdos para o circuito devisita ao Mosteiro, bem como na animaçãopara dinamização do conjunto monástico eainda na dinamização do Museu Municipalcom a introdução de uma nova valência deno-minada «oficina de ciência viva» incluindoacções de vária ordem (palestras e debates,jornadas de reflexão temática, exposições, ate-liers, oficinas e workshops). Prevê-se aindauma intervenção destinada a apoiar a mobili-

dade com a introdução de veículos eléctricospara operar em diversos circuitos no centrourbano: um transporte ecológico pensado paraas pessoas com mobilidade reduzida.

Para a elaboração do plano de acção, aautarquia reuniu uma equipa externa de con-sultores, que frequentemente colaboram com aCâmara, e que, também por isso, detêm jáconhecimento sobre o Município (em geral) eo Mosteiro (em particular), consultores essesque, em conjunto com a equipa técnica doMunicípio, reuniram competências para for-mulação da referida candidatura. Paralela-mente, desencadearam-se conversações comos responsáveis e intervenientes nos espaçosdo Mosteiro de Arouca para prossecução deuma estratégia mais abrangente.

É verdade que a postura adoptada pelaautarquia no processo de elaboração desta can-didatura se revela diferente da prática generali-zada no ciclo de financiamento comunitárioanterior. Por um lado, integra intervençõesmateriais complementadas com acções de natu-reza imaterial, reconhecendo que as primeirasapenas têm um real valor de uso se forem acom-panhados por acções de animação, de âmbitocultural, social e/ou económico, que lhes confi-gurem vida e pertinência. Por outro lado, consi-dera uma visão mais abrangente (multi-secto-rial) do que uma perspectiva mais clássica dourbanismo, conciliando questões de desenhourbano com a promoção da inclusão social, arevitalização económica de espaços degradadose mesmo a procura de soluções ambientalmenteamigáveis. Por fim, mobiliza diversos actorespara integrarem a candidatura, procurandoassim a apropriação colectiva do projecto e,consequentemente, uma maior capacidade deimplementação das intervenções.

Mas também é certo que tal mudança depostura ainda não resulta de um reconhecimentoefectivo de que um modus operandidiferentepromoverá consequências a médio e longoprazo do ponto de vista do desenvolvimentosocial e económico do município e de uma

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maior sustentabilidade no tempo das acçõesdelineadas. Resulta antes de uma leitura dascondições de elegibilidade das propostas e doscritérios de avaliação patentes nos regulamentosde candidatura, que exigiam acções de naturezaimaterial e uma visão multissectorial (um pro-grama de acção integrando as dimensões física,económica, social e cultural) e, ainda, a mobili-zação de diversos actores locais/regionais6. Adiferença é relevante, senão vejamos:

a) Qual a relação entre as intervençõespropostas e as dinâmicas já existentesno concelho no duplo ponto de vista cul-tural (articulação com projectos já exis-tentes numa óptica de programação cul-tural em rede) e económico (promoçãodo empreendedorismo e ligação aacções de formação em áreas relaciona-das com a temática em causa)?

b) Qual o público-alvo das acções propos-tas, quer ao nível da requalificaçãofísica (perspectiva de inclusão), quer aonível das iniciativas imateriais (perspec-tiva de diferenciação)?

c) De que forma as preocupações ambien-tais (exemplo da eficiência energética),demográficas (exemplo do envelheci-mento) e tecnológicas (exploração dasoportunidades oferecidas pelas TIC)estão patentes na proposta?

d) Qual a ligação da proposta a projectosde âmbito cultural, social e/ou econó-

mico de municípios vizinhos numalógica de estabelecimento de redes decooperação capazes de alavancar as ini-ciativas do ponto de vista económico e,paralelamente, contribuir para umamaior coesão territorial?

Qual o processo de aprendizagem efectuadojunto de exemplos de referência nacionais e inter-nacionais procurando, por um lado, percebercomo comunidades internacionais se encontrama lidar com temáticas similares, por outro, trocarexperiências e, por fim, fazer parcerias/redes?

Qual o grau de mobilização dos actoreslocais/regionais na elaboração da proposta:informados e, por isso mesmo, conhecedoresdos seus contornos ou, pelo contrário, partici-pantes activos na sua concepção (consoli-dando, deste modo, relações mutuamentebenéficas e de natureza sinergética)?

Enunciadas em formato de questão, estaspreocupações correspondem, na globalidade,ao reconhecimento da necessidade de transfor-mar acções ainda isoladas e desarticuladasem intervenções que visem um funcionamentoglobalmente coerente e sustentável (territoriale institucionalmente). É neste sentido queganha particular relevo o terceiro desafio apre-sentado no ponto anterior: a forma como aautarquia se organiza de modo a responder efi-cientemente a estas questões revela-se funda-mental para a obtenção de resultados positivose duradouros no tempo. E tal mudança organi-zacional ainda não se verificou no seio doMunicípio de Arouca, o que tendencialmentepromove a continuação da praxisdominante edificulta a construção de condições paraaumentar os níveis de concretização das gran-des orientações da política pública.

4. Comentário final

Conscientes de que se está perante umanova geração de políticas públicas, com foco

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6 As orientações emanadas da recentementecriada Política de Cidades POLIS XXI, bem como oscritérios de selecção definidos nos respectivos regu-lamentos de candidatura a financiamento, vão aoencontro da linha de actuação que outros países seencontram presentemente a desenvolver (designada-mente a França e a Holanda) valorizando o reforço dopapel das autarquias no âmbito das políticas urbanase exigindo, quer o desenvolvimento de um programaestratégico e uma abordagem territorializada e multi-sectorial, quer o estabelecimento de parcerias activas(Verhage, 2005).

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principal em prioridades direccionadas paraimpulsionar o crescimento económico, oemprego e a competitividade, procurou efec-tuar-se neste trabalho uma reflexão sobrecomo é que a partir do local se podem cons-truir condições para aumentar os níveis deconcretização das grandes orientações da polí-tica pública. Se é verdade que as respostas e oscaminhos a explorar podem ser múltiplos, já apreocupação está bem identificada: procurarultrapassar o problema latente de baixos níveisde desempenho de Portugal, quando compa-rado com os outros membros da UE, associadoem grande medida à incapacidade das autar-quias locais levarem à prática as grandesorientações da política pública, problemaacrescido perante os desafios globais que hojeafectam, ainda que de modo diferente, asdiversas regiões.

Foi neste sentido que, numa primeira parte,se procurou perceber o alcance das orientaçõesdecorrentes das novas políticas comunitárias enacionais, os desafios que de forma mais pre-mente se colocam actualmente à sociedade e,consequentemente, as exigências que se colo-cam aos municípios para responder de forma(mais) eficiente neste contexto. No segui-mento desta incursão conceptual, efectuou-sea análise de um caso – Município de Arouca –com o intuito de perceber como se pode estaautarquia posicionar face a esta transição.

Que ensinamentos se podem retirar destaexperiência? Sem esgotar as possíveis ilações,sublinha-se a percepção de que novos procedi-mentos na definição de políticas territoriais dedesenvolvimento ao nível local implicam, emprimeiro lugar, reflectir sobre as orientaçõescomunitárias e nacionais no que se refere apolíticas públicas, prestando atenção contínuae assídua às directrizes da Comissão Europeiae enquadrando as opções tomadas para o terri-tório local e regional em orientações formula-das para o espaço europeu. Implica, emsegundo lugar, confiar nas vantagens competi-tivas que serão geradas num processo mais

participado, que reúna um maior número deparceiros públicos e privados, que seja multis-sectorial, supramunicipal e que contribua acti-vamente para a construção de redes de traba-lho e de cooperação. Implica, igualmente, sercapaz, quer de investir de forma selectiva,qualificadora e capaz de valorizar os seusrecursos endógenos, quer de antecipar mudan-ças e desafios globais, construindo cenáriosnuma atitude de prospectiva territorial.

Torna-se evidente que tal mudança de pos-tura envolve um elevado grau de exigênciacom repercussões ao nível da organização dopróprio poder local e da qualificação dosrecursos humanos aí existentes. Por outrolado, a alteração de rotinas instaladas não seefectua num curto espaço de tempo. Envolve,antes, um processo moroso de experimentaçãoe aprendizagem, com mecanismos de monito-rização determinantes para assegurar, nofuturo, um bom nível de definição e execuçãodas políticas territoriais de desenvolvimento.E tal implica começar, desde já, a perspectivaro pós-2013, encarando o período actual comoum processo de transição e de tomada de cons-ciência de que é necessário trabalhar afincada-mente para conseguir responder de forma sus-tentada aos desafios globais cujas tendênciastenderão a acentuar-se no próximo período.

O exercício aqui efectuado e os resultadosalcançados fornecem um primeiro contributode respostas às questões que aqui se levanta-ram. A necessidade existe e o debate está lan-çado, mas a tarefa, necessariamente colectivae dirigida à generalidade dos municípios por-tugueses, ainda está por fazer.

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PPPPLLLLAAAANNNNOOOOSSSS RRRREEEEGGGGIIIIOOOONNNNAAAAIIIISSSS DDDDEEEE OOOORRRRDDDDEEEENNNNAAAAMMMMEEEENNNNTTTTOOOO DDDDOOOO TTTTEEEERRRRRRRRIIIITTTTÓÓÓÓRRRRIIIIOOOO EEEE PPPPLLLLAAAANNNNOOOOSSSS DDDDIIIIRRRREEEECCCCTTTTOOOORRRREEEESSSS MMMMUUUUNNNNIIIICCCCIIIIPPPPAAAAIIIISSSS :::: OOOO tttt eeeerrrr rrrr iiii ttttóóóórrrr iiii oooo ccccoooommmmoooo ddddeeeennnnoooommmmiiiinnnnaaaaddddoooorrrr ccccoooommmmuuuummmm

Fátima Bacharel*

Inforgeo, 2007/2008, 67-75

1. Enquadramento da abordagemterritorial no presente

O território é o reflexo da organização dasactividades humanas num suporte biofísico,mais ou menos facilitador, que determinouuma ocupação humana, inicialmente degénese empírica para uma forma cada vezmais interventiva e que se consubstancia,actualmente, no processo de ordenamento doterritório e subsequentes instrumentos de pla-neamento que o concretizam.

Este processo, com uma dinâmica asso-ciada à resultante de contextos políticos,sociais, económicos e ambientais, conduz àelaboração de instrumentos de planeamentoespecíficos e circunstanciados no tempo e noespaço e ocorre, com efeitos marcantes, no seudenominador comum – o território.

O ritmo da mudança dos referidos contex-tos e das problemáticas associadas é, frequen-temente, de difícil gestão obrigando a recen-

trar os problemas a nível global, solicitando àciência, à política e à governança soluçõessimples para problemas complexos.

Da ciência poder-se-ão esperar os contri-butos da investigação para as soluções queusem os recursos de forma mais eficiente, istoé, com menos impacto nos ciclos da matéria emelhor desempenho nos indicadores de sus-tentabilidade, ou ainda, a explicação da reali-dade no sentido causal mas frequentementesustentada em conhecimentos parcelares (porexemplo, o melhoramento na produção, deacordo com a opinião de vários especialistas,não terá muito mais espaço de manobra àsemelhança das possibilidades já atingidas, àescala humana, para o melhoramento doscereais).

É à História que compete «dissecar» orelacionamento sequencial dos processos, per-mitindo compreender, com o necessário dis-tanciamento, a sua globalidade.

Também o grande avanço nas Tecnologiasde Informação e Comunicação constitui umaferramenta fundamental, capaz de, em tempo,interligar, divulgar, conhecer, tratar informa-ção científica e técnica.

Da política, haverá a esperar normativos

* Directora de Serviços de Ordenamento do Terri-tório da Comissão de Coordenação e Desenvolvi-mento Regional do Alentejo.

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orientadores de qualidade, que concretizemprogramas com efeitos práticos nas políticassectoriais e tradução tanto nos instrumentosde planeamento, como nos instrumentos degestão territorial. No entanto, há que nãoesquecer que esta é uma equação complexacom multi-actores, multiobjectivos e multi-escalas. Mais uma vez só o uso das Tecnolo-gias de Informação e Comunicação, tirandopartido das suas reais capacidades, poderá darcorpo ao pensamento global e à visão estraté-gica, permitindo o redimensionamento erecentralização das problemáticas, a antecipa-ção de prováveis efeitos na construção decenários, e eventuais medidas de minimizaçãonuma atitude proactiva.

Neste quadro há que introduzir, ainda, agovernança – o modo como nos organizamospara resolver a gestão do território com os ins-trumentos de que dispomos e garantir a suacoesão, a par de indicadores ambientais,sociais e económicos favoráveis ao desenvol-vimento.

2. Desenvolvimento e coesãoterritorial

O domínio da ciência, da comunicação//divulgação do conhecimento, a política e agovernança, em actuação sobre o denomina-dor comum do território, têm vindo a determi-nar o que se convenciona pela «riqueza» dasnações.

Este conceito, muito associado a umaambição de «homogeneização» do desenvolvi-mento para consubstanciar a «riqueza», temvindo a traduzir, entre outros indicadores, acoesão territorial e social. No entanto, a afir-mação dos conceitos de desenvolvimento sus-tentável e competitividade entre territórios,materializada nas suas vantagens comparati-vas, que pressupõe a geração de diferentesdinâmicas de acordo com valorização das

capacidades intrínsecas respectivas, demons-tram que a coesão territorial e social poderánão reflectir um equilíbrio «matemático» dedensidades populacionais e de distribuição deactividades. O que está em causa então é a pro-moção da sua inserção num novo paradigmade economia/«riqueza» e não o perpetuar dasua sobrevivência fictícia, nos padrões quetendencialmente se têm afirmado.

De facto, o Livro Verde para a Coesão Ter-ritorial (reconhecida como a terceira dimensãoda Política Europeia de Coesão) elege comomatérias estruturantes a perspectiva territorialda coesão económica e social, as questões dacompetitividade e a abordagem e cooperaçãointegradas, identificando as políticas públicascomo motor para as soluções de conjunto.

Como principais frentes de acção apon-tam-se a concentração como forma de ultra-passar a existência de realidades muito distin-tas de densidades demográficas; a interligaçãocomo forma de eliminar as distâncias; a coo-peração como instrumento para anular divi-sões e, ainda, o reconhecimento de regiõescom características específicas, como regiõesmontanhosas, ilhas e 18 regiões europeias debaixa densidade populacional.

O desafio lançado à sociedade civil para oseu debate estabeleceu como questões fulcrais:

– Definição e comparação/medição dacoesão territorial,

– Escala e âmbito de acção territorial,– Os Instrumentos de Gestão Territorial

garantem a coesão territorial com onecessário grau de flexibilidade e con-cretização?

– Como se coordenam melhor as políticase governança territoriais?

A resposta e soluções esperadas terão queatender tanto aos contextos em que são dados,como à abordagem global, já que agora énecessário compreender a multidimensionali-dade das componentes em análise.

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3. Os planos regionais de ordenamento do território(PROT) como quadro de referência territorial – O Caso do PROT Alentejo

O Plano Regional de Ordenamento do Ter-ritório do Alentejo é um documento com natu-reza estratégica, que define as opções estraté-gicas de organização, de desenvolvimento egestão do território regional.

Resultou de um processo de diálogo e deconcertação institucional e constitui uma pla-taforma de articulação de opções estratégicasde desenvolvimento regional com opções dedesenvolvimento sectorial e opções de desen-volvimento municipal, traduzindo-se num instrumento fundamental na condução da polí-tica de ordenamento do território e de urba-nismo, nomeadamente, na articulação de polí-ticas nacionais e no enquadramento de opçõesmunicipais.

A importância da existência de um PlanoRegional de Ordenamento do Território mate-rializa-se nos seguintes aspectos:

– Na definição e clarificação das opçõesestratégicas de desenvolvimento do terri-tório regional no quadro de uma visãointegrada de toda a região e da sua arti-culação com o exterior;

– No quadro de referência para a definiçãoe implementação de políticas nacionaisgerais e sectoriais e para a implementa-ção de projectos de investimento e deinfra-estruturas com forte impacte naorganização e desenvolvimento do terri-tório;

– E, ainda, no quadro global de referênciapara a definição das grandes opções dedesenvolvimento local e de ordenamentoe gestão do território municipal.

3.1. PROT Alentejo – Síntese dasprincipais linhas de referência

O PROT Alentejo estabelece como VISÃOpara a região:

A região do Alentejo afirma-se como terri-tório sustentável e de forte identidade regio-nal, sustentada por um sistema urbano poli-cêntrico, garantindo adequados níveis de coe-são territorial e afirmando uma reforçada inte-gração com outros espaços nacionais e inter-nacionais, valorizando o seu posicionamentogeoestratégico.

Enquanto espaço de baixa densidadeaposta em nichos de oportunidade ligados aactividades emergentes potenciadores dos seusactivos naturais e patrimoniais.

A sustentabilidade territorial assenta navalorização dos recursos endógenos, designa-damente, dos valores naturais e paisagísticos eno desenvolvimento de níveis acrescidos deconcertação estratégica e cooperação funcio-nal, capazes de gerar novas oportunidades eresponder eficazmente aos potenciais riscosambientais e sociais.

O Modelo Territorial Regional reflecte aemergência de uma nova organização territo-rial do Alentejo que se consubstancia numnovo quadro de relações territoriais dentro daregião e da região com a sua evolvente nacio-nal, ibérica e europeia.

Este Modelo oferece uma configuraçãoespacial prospectiva da região, integrandocomo componentes territoriais estruturantes aEstrutura Regional de Protecção e ValorizaçãoAmbiental, as Actividades Económicas, o Sis-tema Urbano e as Infra-estruturas e principaisRedes de Conectividade Regional e sublinha:

– o posicionamento da região no contextodas relações inter regionais no espaçonacional e, particularmente, no contextodas relações económicas com a AML ecom Espanha;

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– o modelo policêntrico do sistema urbanocom o respectivo o papel dos CentrosUrbanos Regionais e dos Centros Urba-nos Locais como âncoras de desenvolvi-mento, coesão e de sustentabilidaderegional;

– o papel estruturante das grandes infra-estruturas de acessibilidade e conectivi-dade nacional e internacional;

– a emergente organização territorial dabase económica protagonizada peloespaço Alqueva e o Litoral Alentejano, apar da continuação da ligação da econo-mia tradicional aos recursos naturais,destacando as fileiras extractivas, agroflorestais e do potencial de moderniza-ção de um novo modelo agrícola;

– a valorização da defesa da biodiversi-dade e da paisagem e do património cul-tural regional como elemento emblemá-tico de desenvolvimento e de identidade.

Tem como DESÍGNIOS:

1 – Uma região com um posicionamentoreforçado no contexto da economianacional através da ampliação da suabase económica regional, afirmando assuas potencialidades geoeconómicasno contexto ibérico e europeu, consoli-dando os sectores e funções económi-cas emergentes com uma valênciaestratégica e apostando na inovação ena competitividade das actividadesprodutivas tradicionais;

2 – Uma região funcionalmente maisaberta e articulada com os territóriosenvolventes, com particular relevânciapara o reforço das relações com a ÁreaMetropolitana de Lisboa (AML) e comEspanha, dotada de uma qualificadaorganização territorial de suporte àsactividades económicas e de atracçãode empresas e de população em idadeactiva;

3 – Uma região com adequados níveis decoesão territorial, sustentada pelopapel do sistema urbano regional comoinfra-estrutura privilegiada de suporteaos equilíbrios socioeconómicos inter-nos, à sustentabilidade dos espaçosrurais, a uma maior integração territo-rial regional e a uma mais elevada qua-lidade de vida e de bem-estar social;

4 – Uma região com marcada identidade dosespaços rurais sustentada pela valoriza-ção de sistemas multifuncionais medi-terrâneos e, simultaneamente, pela capa-cidade de adaptação do sistema produ-tivo face às oportunidades de mercado;

5 – Uma região com um relevante patrimó-nio natural, paisagístico e cultural,assente na protecção e valorizaçãoambiental, manifestando resultados efi-cazes no combate ao processo de deser-tificação, e na valorização e preserva-ção dos recursos históricos e culturais.

3.2. PROT Alentejo – A organizaçãodo território no futuro

Numa região como o Alentejo, com o refe-rido carácter marcadamente rural, o que oPROT vinca como uma mais-valia territorial,sem descurar o desempenho estruturante dosistema urbano e da base económica regional,é relevante a observação dos desígnios quetêm vindo a marcar o espaço rural.

O cenário de abundância alimentar dasúltimas décadas do século passado, determi-nou a alteração do paradigma «espaço rural =produção agrícola, silvo pastoril ou florestal»,para «um novo pacto para o espaço rural». Avida económica dos espaços rurais deixou,assim, de ser apenas determinada pelas activi-dades agrícolas, florestais ou pastoris tendocomo referencial o mercado, o qual também sealterou significativamente em dimensão, dinâ-mica e «anulação» de distâncias.

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Esta alteração influenciou a tendência paraa intensificação ou a extensificação das produ-ções com a consequente retracção, confinadaaos espaços mais produtivos e ao acentuar dosproblemas do desenvolvimento rural na equa-ção «permanência da população (acesso a bense serviços)/viabilidade da valorização dasamenidades» (conservação e defesa de valoresnaturais, paisagísticos e patrimoniais propicia-dores de um determinado segmento de turismodiferenciado dos destinos mundiais afirmadosde interesse histórico/cultural).

A perspectiva de desenvolvimento (em quese revê a Associação Portuguesa para o Desen-volvimento Regional) terá que reencarar aacessibilidade a bens e serviços numa ópticarelacional, isto é, mais que a proximidadefísica é preciso melhorar o nível de conheci-mento para usar os bens e serviços, confe-rindo-lhes eficácia na utilidade.

Neste sentido, a escala de medida da coe-são terá que ser repensada, não se limitandocomo até agora quase exclusivamente aosaspectos económicos que têm fundamentado aavaliação do desenvolvimento, com o resul-tado de fortes assimetrias. De facto com a suaaplicação, os territórios apresentam-se dupla-mente desequilibrados com congestionamentode uns e despovoamento de outros. O cresci-mento de algumas regiões, mesmo quando àcusta de outras, não deixa de ser crescimento,eventualmente com grandes desempenhos nosrespectivos indicadores, mas não contribuipara a coesão territorial. Há ainda a acrescen-tar que muito poucos indicadores têm emconta as externalidades negativas, como ocitado fenómeno do congestionamento territo-rial e outros custos ambientais, incluindoemissões de carbono e grande vulnerabilidadeás alterações climáticas.

O PROT Alentejo é determinante comodocumento de referência para o ordenamento edesenvolvimento da região nos próximos anos– a própria aplicação dos Fundos Estruturaisno âmbito do Quadro de Referência Estraté-

gica Nacional e respectiva RegulamentaçãoEspecífica do Programa Operacional Alentejo2007-2013, condiciona o enquadramento dasiniciativas dos vários Eixos de intervenção nasorientações e prioridades daquele instrumento.(Efectivamente, os seguintes RegulamentosEspecíficos dos Eixos 1 – Competitividade,Inovação e Conhecimento, 2 – Desenvolvi-mento Urbano, 3 – Conectividade e Articula-ção Territorial, 4 – Qualificação Ambiental eValorização do Espaço Rural fazem referênciaao PROTA, como instrumento orientador).

O PROT Alentejo será gerido por um Pro-grama de Execução que contém, de acordocom o Regime Jurídico dos Instrumentos deGestão Territorial, as disposições indicativassobre a realização das obras públicas a efectuarna região, bem como de outros objectivos eacções de interesse regional indicando as enti-dades responsáveis pela respectiva concretiza-ção; é acompanhado por um Sistema de Gestãoe Monitorização suportado por um Sistema deIndicadores, de forma a garantir uma concor-dância, às diferentes escalas territoriais, entreacções de desenvolvimento e ordenamento ter-ritorial Local/Regional e Regional/Nacional.

O sistema de gestão e monitorização pro-posto tem como missão contribuir para amelhoria dos processos decisórios da adminis-tração com impactes no ordenamento do terri-tório e reforçar o conhecimento sobre a natu-reza das dinâmicas territoriais em curso. Ogrande objectivo é que constitua, no âmbitoregional, a plataforma de interlocução com osvários agentes públicos em matéria de ordena-mento do território e urbanismo contribuindopara a coerência dos vários níveis territoriaisdo sistema nacional de gestão territorial.

Constitui, assim, um sistema interactivo, aalimentar e ser alimentado pelo Observatóriodo Território e do Urbanismo, da responsabili-dade da Direcção Geral de Ordenamento doTerritório e Desenvolvimento Urbano, e pelosSistemas Locais de Monitorização da respon-sabilidade das Câmaras Municipais.

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Salienta-se, ainda, que os indicadores estãoorganizados a partir dos Sistemas que supor-tam o Modelo Territorial, as Normas Orienta-doras e o Programa de Execução, que forneceinformação pertinente e determinante parauma real avaliação do grau de concretizaçãodos desígnios e das opções estratégicas debase territorial do PROT.

Neste âmbito, cada indicador é descrito portemáticas de monitorização, formas e métodosde cálculo, unidades de medida, unidades míni-mas de análise territorial, periodicidade delevantamento e instituição responsável pelo for-necimento/cálculo da informação (fonte). Istosignifica que cada instituição no âmbito destePROT se compromete a contribuir, dentro dassuas competências, para a construção do Sis-tema de Monitorização Regional.

Este compromisso representa, igualmente,que a CCDR, responsável pelo Sistema Regio-nal organizará uma estrutura eficiente, trans-parente e aberta de monitorização, de partilhamútua de informação e conhecimento sobre oordenamento do território e o urbanismo, con-tribuindo desta forma para reforçar a capacita-ção institucional, de âmbito sectorial e local.

O referido Sistema e estrutura associada,desempenhará ainda um papel essencial para oapuramento dos processos e dinâmicas dedesenvolvimento económico, social e territorialda região e constituirá uma das formas defomentar práticas de cooperação na governaçãoregional, a par da promoção da aprendizagemcontínua através da monitorização e avaliação.

4. A complementaridade dasabordagens territoriais comogarantia de uma visão global

O exemplo já atrás referido, como de par-ticular actualidade e relevância para a proble-mática do espaço rural, da abordagem inicialda dimensão única do factor carência alimen-

tar como problema da agricultura, é uma visãomuito local da Europa que hoje, como no pas-sado (apesar de em circunstâncias substancial-mente diferentes), volta a contrapor-se numcenário de eminente «insegurança alimentar,ecológica e energética» resultante da aborda-gem actual à escala mundial.

A «falência» destas questões tomadas poradquiridas, que geraram um «falso» modelo deorganização territorial, social e económica,criou expectativas ilusórias de um uso ilimi-tado de recursos e despoletou mercados e con-sumidores muito acima das reais capacidadesfinanceiras existentes. Estes, por sua vez, gera-ram toda uma estrutura de produção e presta-ção de serviços «pesada» e desadequada, porser sobredimensionada, numa mudança decenário global de recessão.

É neste quadro que as Opções estratégicasde Base Territorial têm vindo a ser estudadas eponderadas a diversas escalas temporais eespaciais (Programa Nacional da Política deOrdenamento do Território, Planos e Estraté-gias Sectoriais, Planos Regionais de Ordena-mento do Território), bem como em documen-tos de reflexão, como o desenvolvido peloDepartamento de Prospectiva e Planeamentodo Ministério do Ambiente, Ordenamento doTerritório e Desenvolvimento Regional «Terri-tórios em Transformação – Alentejo 2030 –Pensar e agir sobre o futuro da região», quepermitem perspectivar as tendências evoluti-vas e o quadro de referência para impor a res-pectiva coerência, sobretudo das acções maisestruturantes da Administração Central.

Uma relação fluida nos dois sentidos entreos níveis local e nacional, permite usar osargumentos e o conhecimento local (incluindoeventuais externalidades negativas e positivasresultantes das respectivas políticas), paraapoiar o melhoramento da coordenação entreníveis de governança, na procura de umaescala relevante para afectar os recursos e res-ponsabilidades públicas em articulação com osaspectos económicos.

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A cada vez maior responsabilização atri-buída ás autarquias na gestão territorial, dotou-as dos respectivos mecanismos de actuação noâmbito do Regime Jurídico dos Instrumentosde Gestão Territorial, conferindo-lhes umpapel determinante tanto no estabelecimentoda estratégia municipal como na necessáriavisão supra municipal.

Esta visão terá que garantir a flexibilidadede abordagem como forma de atenuar umadivisão administrativa desadequada à reali-dade actual, resultante ainda sobretudo do con-texto de mobilidade conferida pelas infra-estruturas e meios de deslocação do séculoXIX, e conseguir o indispensável ganho deescala das intervenções com a respectivamassa crítica associada.

Paralelamente, é o nível autárquico, ao defi-nir a fronteira entre a escala do planeamento edo projecto – o desenho urbano – que deverápromover uma imagem capaz de conferir dis-tinção e condições de afirmação à escala supra-regional, nacional ou internacional.

No entanto, se uma área urbana será, comoentidade individual suficiente para melhorar, porexemplo, a eficiência energética na habitaçãotendo em conta a situação existente, só numaabordagem territorial mais abrangente poderáser possível considerar estratégias de planea-mento urbanístico que terão resultados não sónum padrão de arquitectura de maior eficiênciaenergética, mas também na localização prefe-rencial da construção tendo em conta a sua rela-ção com a envolvente e os factores ambientais.

No contexto de criação de amenidades einfra-estruturas em que se tem vindo a centraro conceito de atractividade dos territórios,constata-se, porém, a necessidade, identificadapela Política de Cidades, de uma visão maisholística que defina a atractividade como acapacidade de concretizar, conjuntamente,uma maior diversidade de elementos que con-ferem competitividade a um território e, sobre-tudo, de enquadrar os elementos estratégicosque servem de motor aos restantes.

De facto, as condições de vida de um terri-tório dependem, em grande medida, da suacapacidade de inovar e das possibilidades detrabalho que oferecem, isto é, da capacidadedo seu tecido empresarial e outras instituiçõesgeradoras de conhecimento e emprego (desig-nadamente o qualificado) criarem desenvolvi-mento económico/riqueza e não apenas dasamenidades e infra-estruturas, determinadas//potenciadas pelos efeitos dos instrumentos deordenamento e planeamento.

Sem uma base empresarial e institucionalsuficiente para gerar perspectivas profissionais,um território não será atractivo para a fixação,com carácter duradouro, dos quadros qualifica-dos e criativos para a sua afirmação, com o refe-rido ganho de escala, na competição global.

A relação causa-efeito que se pretendealcançar entre uma base empresarial inovadoracom recursos humanos qualificados, propi-ciando economias de rede que compensem as«deseconomias» de escala e variedade quecada território não consegue isoladamente,encontra nas políticas públicas os instrumen-tos que lhe permite reunir sinergias essenciaispara a sua competitividade.

É o caso das Redes Urbanas para a Com-petitividade e Inovação, no âmbito da Políticade Cidades, que demonstram a vantagem deconcertar a cooperação entre cidades, ou den-tro de uma cidade e da sua região, a vantagemde um relacionamento proactivo entre agentespúblicos e privados devido ao carácter intrin-secamente transversal de grande número deprojectos de desenvolvimento e a necessáriareunião de competências e de meios financei-ros em contextos de forte necessidade dediversificação de fontes de financiamento.

O estabelecimento de redes é fundamentaltanto para as pequenas e médias cidades, comopara as grandes cidades entre si e com outrasde menor dimensão, assegurando funçõescomplementares com mais eficiência, aumen-tando a competitividade através de ganhos dedimensão (sobretudo das pequenas) e da defi-

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nição da especialização de cada membro commáxima eficiência no uso dos seus recursos,contribuindo para a diversificação da econo-mia em escala e variedade. Representa aindasignificativos ganhos organizacionais, dilui-ção de riscos e custos e permite a melhoria dosprocessos de aprendizagem conjuntos, tirandopartido da partilha de informação técnica ecientífica e acesso a novas tecnologias.

O mesmo princípio se tem vindo a aplicaraos territórios transfronteiriços, os mais direc-tamente afectados pela «construção» Euro-peia, onde muitas fronteiras eram encaradascomo «cicatrizes» da história. No presente,como territórios vividos geram importantesfluxos de trabalhadores e consumidores talcomo diferentes formas de cooperação nasáreas da economia, cultura e ambiente, mesmoquando em posições periféricas.

À referida cooperação, que pode mesmoconsubstanciar a constituição de euro-cidadese euro-regiões, dispondo até de um mecanismoque lhes confere personalidade jurídica(AECT – Agrupamento Europeu de Coopera-ção Territorial), não está subjacente a ideia deencurtar fronteiras administrativas ou formaráreas extraterritoriais.

O objectivo não é a sua administração mas,sim, a coordenação de políticas das autorida-des a todos os níveis, desenvolvendo numdeterminado território programas de acção quesatisfaçam, com grande racionalidade, as aspi-rações e necessidades dos habitantes dasregiões /cidades transfronteiriças. A coopera-ção transfronteiriça transformou-se, aliás,numa área de aprendizagem, experimentação einovação já que a sua implementação atravésde acções concretas, pôs em relevo a necessi-dade de articulação de normativos nacionaisda aplicação dos fundos públicos, entre outros.

São reconhecidos como princípios, ou cri-térios para boas práticas aplicados nos traba-lhos preparatórios da OCDE nas áreas da polí-tica ambiental e de desenvolvimento regionale urbano que abordam a governança a vários

níveis, no sentido de testar a respectiva utili-dade (sendo certo que uns podem ser mais sig-nificativos para as decisões do nível local doque para os decisores nacionais) os seguintes:

– Planeamento estratégico a escala rele-vante e governança participada;

– Forte fundamentação técnica para o pla-neamento de curto e longo prazo;

– Eficiência económica;– Equidade;– Coerência política;– Monitorização, divulgação e avaliação;– Exequibilidade das políticas e progra-

mas de acção.

5. Conclusão

Em síntese, a(s) política(s), a ciência, a(s)Tecnologia(s) de Informação e Comunicação,a investigação aplicada, os instrumentos deplaneamento e gestão têm um denominador eum alvo comum – o território e a população.Hipotecar as potencialidades e funções do pri-meiro, tendo em conta as tendências de enve-lhecimento populacional a par da concentra-ção traduzida no crescimento das cidades, quese tem vindo a verificar num ritmo muito ace-lerado nos países em desenvolvimento, podevir a pôr em causa o frágil equilíbrio mundialem termos de conflitualidade social, face acenários de vulnerabilidade alimentar (ououtras) e às questões energéticas.

O papel da Administração em todos osseus níveis é, assim, fundamental na pondera-ção das opções estratégicas, em respeito peloprincípio da subsidiariedade, para que o pro-cesso de ordenamento do território seja conse-quente nos instrumentos de planeamento e nagestão responsável e partilhada através de umagovernança eficaz e mobilizadora.

De acordo com a Avaliação e Recomenda-ções da OCDE (Estudos Territoriais da OCDEPortugal, 2008) os anos mais próximos virão a

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determinar o futuro de Portugal na economiaglobalizada. Portugal lançou um programaambicioso para a competitividade e defronta-seagora com uma estreita janela de oportunidadepara o implementar. O investimento em recur-sos de longo prazo para a competitividade deveprosseguir através de estratégias diferenciadasbaseadas no potencial específico de cadaregião, variando desde capacidades em altatecnologia até às paisagens e à biodiversidade.

O momento presente é particularmentepropício, completo que está o «edifício» legis-lativo – Programa Nacional da Política deOrdenamento do Território, Leis de Bases,Planos e Programas Sectoriais, EstratégiasNacionais, Planos Regionais de Ordenamentodo Território, Planos Especiais de Ordena-mento do Território e Planos Municipais deOrdenamento do Território e adoptado o pri-meiro Programa de Acção para a Implementa-ção da Agenda Territorial da União Europeia –e face às Tecnologias de Informação e Comu-nicação disponíveis.

A mensagem é clara: não há futuro sem umterritório adequadamente ordenado, consequen-temente planeado e responsavelmente gerido.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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CCDR Alentejo (2009) – Plano Regional de Orde-namento do Território do Alentejo (versão paraDiscussão Pública).

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LANDES, David S. (1999). A Riqueza e a Pobrezadas Nações – Por que são algumas tão ricas eoutras tão pobres. Trajectos.

MAOTDR, IFDR, OCDE. (2008). ConferênciaInternacional «Regional Policy around theWorld» (Edifício da Alfândega do Porto, 29 deSetembro).

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Programa Operacional Alentejo 2007-2013.

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CCCCOOOONNNNTTTTRRRRIIIIBBBBUUUUTTTTOOOO MMMMEEEETTTTOOOODDDDOOOOLLLLÓÓÓÓGGGGIIIICCCCOOOO PPPPAAAARRRRAAAA AAAA DDDDEEEELLLLIIIIMMMMIIIITTTTAAAAÇÇÇÇÃÃÃÃOOOO DDDDAAAA RRRREEEENNNN

CCCCOOOOMMMM RRRREEEECCCCUUUURRRRSSSSOOOO ÀÀÀÀ TTTTEEEECCCCNNNNOOOOLLLLOOOOGGGGIIIIAAAA SSSSIIIIGGGG

Fernando da Fonseca Cruz*

Inforgeo, 2009, 77-88

Resumo

O crescimento demográfico e o desenvolvi-mento urbanístico são os principais inimigos doambiente e dos seus recursos. Ao ordenamentodo território, no sentido lato, compete criar asregras de ocupação humana tendo em vista adefesa do ambiente; ao planeamento as solu-ções de compromisso que possibilitem a coexis-tência pacífica entre o Homem e a Natureza.

Os Instrumentos de Gestão Territorialmaterializam as premissas e as orientações deocupação do território distinguindo zonashabilitadas, interditas ou condicionadas à ocu-pação humana como forma de garantir a sus-tentabilidade da ocupação e uso do solo. Ascondicionantes ao desenvolvimento urbanís-tico têm por finalidade proteger os recursos doterritório garantindo a sustentabilidade gera-cional dos mesmos e um ordenamento funcio-nal do espaço.

A REN – Reserva Ecológica Nacional foicriada como instrumento urbanístico com oobjectivo de preservar áreas de interesse eco-lógico e paisagístico e tem desempenhado um

papel preponderante como condicionante àocupação desregrada do território, impedindo,por um lado, o povoamento disperso e, poroutro, promovendo a defesa da biodiversidadedos ecossistemas mais representativos.

Contudo, as condições de utilização desteinstrumento não tem sido pacíficas no meioprofissional ou académico, tendo sido alvo dediversas críticas. Mas uma avaliação sumária,numa perspectiva nacional, permite concluirque esta funcionou como travão à ocupaçãodifusa de territórios mais valiosos ou mesmoclassificados e preservou áreas de enormevalor ecológico. Se mesmo assim houve viola-ções à REN que seria da paisagem natural seesta não existisse?

Sem assumir uma posição ecológica radi-cal entendemos que este instrumento tem con-tribuído de forma positiva para a manutençãoda sustentabilidade geracional do meio natu-ral, embora existam críticas que apontam radi-calismos, injustiças, expropriações indirectas eprejuízos aos proprietários de terrenos no qua-dro da REN, sem a justa reparação.

Fazendo jus ao contributo incontornávelque esta figura pretende dar a um ordenamentoequilibrado do território e, à luz do seu novoregime jurídico, discutimos e propomos nesteartigo uma metodologia para a delimitação da

* Técnico Superior Municipal. Doutor em Geo-grafia e Planeamento Regional.

[email protected]

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REN com recurso à tecnologia SIG, aplicadaao caso do Concelho de Oeiras.

1. Delimitação dos cursos de água e zonas ameaçadaspor cheias

O ciclo da água é porventura o mais impor-tante para a vida na Terra. A manutenção dosecossistemas depende da presença de água.Por esse motivo a preservação das áreas natu-rais tem como preocupação central os recursoshídricos, com especial destaque para os cursose planos de água.

Com este propósito a metodologia pro-posta começa por tratar primordialmente osrecursos hídricos no âmbito dos trabalhos pre-paratórios para a delimitação da Reserva Eco-lógica Nacional à escala municipal.

Os trabalhos realizados tiveram por base autilização de tecnologias de informação geo-gráfica, na aquisição dos dados, no pré-pro-cessamento e na exploração dos mesmos.

A cartografia de base topográfica, naescala 1:1000, ortofotos na escala 1:2000, ocadastro dos cursos de água, todos em suportedigital e a cartografia constante dos processosde regularização constituem os suportes prin-cipais na aquisição dos dados. Acresce ainda anecessidade de utilização de cartografia prove-niente do INAG com o registo das zonasameaçadas pelas cheias, na escala 1:2000.

Os critérios de delimitação foram baseadosnos da CCDRLVT.

Todas as acções de gabinete foram com-plementadas com trabalhos de campo, possibi-litando o esclarecimento integral das dúvidas.

1.1. Cursos de água

A identificação e o registo cartográfico dosistema hídrico representam o primeiro passo

antes da delimitação da REN. O objectivoprende-se com a identificação dos cursos deágua, em toda a sua extensão, a caracterizaçãodas margens e das tipologias de escorrênciapermitindo a garantia de sustentabilidade dociclo hidrológico.

Foram representados os cursos de águapelas suas margens, em escala de pormenor. Nocaso destes possuírem largura inferior a 2 m asua representação é feita pela linha de talvegue.

De forma a garantir a continuidade espa-cial dos cursos de água, estes foram identifica-dos em toda a sua extensão de acordo com oregime de escorrência em curso de água a céuaberto e curso de água canalizado.

Os leitos dos cursos de água compreendema superfície de terreno coberto pela água emsituação normal. As margens compreendem afaixa de terreno contígua ou sobranceira aocurso de água que limita o leito.

Quanto à caracterização das margens foiidentificada a existência de muros de suporte,de vertentes em talude e de galeria ripícola.

A representação da continuidade dos cur-sos de água foi assegurada pela acção combi-nada entre os trabalhos de campo e o uso decartografia geo-referenciada proveniente dosprojectos de intervenção nos cursos de água,existentes em arquivo, e o recurso ao cadastrode águas e saneamento para a representaçãodas ribeiras canalizadas.

1.2. Zonas ameaçadas pelas cheias

Segundo a Lei da Titularidade dos Recur-sos Hídricos as zonas ameaçadas por cheias,em terrenos não classificados como zonasadjacentes, compreendem a área contígua àmargem de um curso de água que se estendeaté à linha alcançada pela cheia com períodode retorno de 100 anos ou pela maior cheiaconhecida. Em perímetros urbanos ou emáreas com actividades económicas esta delimi-tação deve ser baseada em estudo hidrológico.

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Noutras áreas sem risco para as populações adelimitação pode basear-se na cota da maiorcheia conhecida.

No caso de estudo, as zonas ameaçadaspelas cheias foram delimitadas tendo por baseas maiores cheias conhecidas para as ribeirasda Laje, Porto Salvo, Barcarena, Algés e RioJamor, uma vez que havia cartografia nosarquivos do INAG.

2. Delimitação da REN

2.1. Enquadramento legal

A REN foi criada pelo DL 321/83, de 5.07,com o objectivo da protecção dos recursos natu-rais, em especial a água e o solo, favorecendo aconservação da natureza e da biodiversidade.

A primeira revisão é feita pelo DL 93/90, de19.03. Segundo este diploma, a REN é a «estru-tura biofísica e diversificada que (...) garante aprotecção de ecossistemas e a permanência eintensificação dos processos biológicos indis-pensáveis ao enquadramento equilibrado dasactividades humanas». Pertencem à REN asáreas costeiras e ribeirinhas, águas interiores,áreas de infiltração máxima e zonas declivosas.Nas áreas incluídas na REN são proibidas asacções de iniciativa pública ou privada que setraduzam em operações de loteamento, obras deurbanização, construção de edifícios, obrashidráulicas, vias de comunicação, aterros, esca-vações e destruição do coberto vegetal. Consti-tuem excepção ao disposto anterior, as acçõesde reconhecido interesse público ou militar paraas quais seja demonstrado não haver alternativaeconómica aceitável para a sua realização.

A revisão da REN pelo DL 93/90 tevecomo objectivos: reforçar a importância estra-tégica da REN para a protecção dos recursosnaturais e para a preservação da estrutura bio-física como meios de sustentabilidade do terri-tório; manter a REN como restrição de utili-dade pública; promover a articulação da REN

como os instrumentos de política de ambientee de ordenamento do território; simplificar osprocedimentos de delimitação e gestão daREN e identificação dos usos compatíveiscom cada categoria e área integrada na REN.

O novo regime da REN, entretanto publi-cado pelo DL 180/2006, de 6.09, tem comonovidades a revisão das alterações das acçõesinsusceptíveis de prejudicar o equilíbrio ecoló-gico e as actualizações de remissão para legis-lação revogada e, ainda, a actualização dasentidades com competência em matéria deREN. Introduz a novidade na delimitação daREN em suporte papel e informático para asua disponibilização através Internet. Obrigatambém à necessidade de demarcação da RENem todos os PEOT e PMOT.

Os trabalhos relevantes para a delimitaçãoda REN dividem-se em três fases:

• Delimitação da REN Bruta• Determinação da REN Exclusões• Delimitação da REN Final.

O presente texto incide com especial deta-lhe na determinação da REN exclusões pro-pondo uma metodologia de exclusões baseadaem SIG, tal como veremos adiante.

2.2. Delimitação da REN bruta

A delimitação da REN Bruta, para o estudode caso, obedeceu às regras impostas pelalegislação em vigor segundo o DL 166/2008.

Segundo o artigo 4.º do mesmo diplomaintegram a REN:

i) As áreas de protecção do litoral (faixamarítima de protecção costeira, aspraias, restingas e ilhas barreira, tôm-bolos, sapais, ilhéus e rochedos no mar,dunas costeiras e dunas fósseis, arribase respectivas faixas de protecção, faixaterrestre de protecção costeira. Águas

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Dunas litorais primárias e secundárias

Arribas e falésias e faixas de protecção de 200 m

Estuários, sapais, lagunas, lagoas costeiras e zonas húmidas adjacentes euma faixa de protecção de 200 m

Ilhéus e rochedos emersos no mar

Restingas, ilhas-barreira e tômbolos

Lagos, lagoas e albufeiras e uma faixa de protecção de 100 m

Encostas com declives superiores a 30%

Áreas de máxima Infiltração

Escarpas e abruptos de erosão com desnível superior a 15 m e uma faixa deprotecção com largura superior a 1.5 da altura do desnível

de transição e respectivos leitos e zonasde protecção das águas de transição);

ii) As áreas relevantes para a sustentabili-dade do ciclo hidrológico (cursos deágua, leitos e margens, lagos e lagoas,margens e faixas de protecção, áreas,albufeiras e áreas estratégicas de pro-tecção e recarga de aquíferos);

iii) As áreas de prevenção de riscos naturais(zonas adjacentes, zonas ameaçadas pelomar não classificadas como zonas adja-centes nos termos da Lei da Titularidadedos Recursos Hídricos, zonas ameaçadaspor cheias não classificadas como zonasadjacentes nos termos da Lei da Titulari-dade dos Recursos Hídricos, áreas deelevado risco de erosão hídrica do solo eáreas de instabilidade de vertentes).

Os critérios de delimitação constam doanexo I do referido diploma.

No caso de não existência de delimitaçãomunicipal ao abrigo do anterior regime daREN (DL 93/90, de 19.03), fazem parte daREN as áreas definida no Anexo III do novoregime jurídico:

i) Praias;ii) Dunas litorais primárias e secundárias;iii) Arribas e falésias e faixas de protec-

ção de 200 m;iv) Faixa de 500 m no caso de não exis-

tência de dunas ou arribas;v) Estuários, sapais, lagunas, lagoas cos-

teiras e zonas húmidas adjacentes euma faixa de protecção de 200 m;

vi) Ilhéus e rochedos emersos no mar;vii) Restingas, ilhas-barreira e tômbolos;viii) Lagos, lagoas e albufeiras e uma faixa

de protecção de 100 m;ix) Encostas com declives superiores a

30%;x) Escarpas e abruptos de erosão com des-

nível superior a 15 m e uma faixa deprotecção com largura superior a 1.5 daaltura do desnível.

O anexo IV faz a correspondências entre asáreas definidas nos antigo e actual regimes.

Para o nosso caso de estudo, foi aplicado oanexo III, como referimos anteriormente, umavez que não tinha sido publicada a RENaquando da ratificação do PDM em 1994.

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Quadro 1 – Fontes de informação para a delimitação de cada uma das áreas a integrar na REN

Área a delimitar Fonte FormatoEscala

Resolução Dataespacial

Ortofotos

Carta GeológicaOrtofotos

OrtofotosCarta Topográfica

OrtofotosCarta Topográfica

OrtofotosCarta Topográfica

MNA/MDT

Carta de SolosCarta Geológica

OrtofotosCarta Topográfica

MNA/MDT

SHP

SHP

MrSid

MrSid

TIN/SHP

SHP

MrSid TIN/SHP

--

--

2 cm

2 cm

--

--

2 cm

1:25000

1:25000

1:2000

1:2000

1:1000

1:25000

1:20001:1000

2008

2008

2009

2009

2009

2009

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Planear o Local

Figura1 – Caracterização dos cursos de água

Figura 2 – Extracto de uma zona ameaçada por cheias

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Como resultado da digitalização das áreasdefinidas no quadro anterior foi possível indi-vidualizar cada tema constituinte da REN. Autilização de uma função de análise espacial«União» permitiu a integração da informaçãonum único tema, pela sobreposição de todas asáreas em causa, e gerar um novo tema desig-nado «REN Bruta».

É então sobre o tema REN Bruta que serãorealizadas todas as operações de exclusão dasáreas segundo critérios estabelecidos de seguida.

2.3. Delimitação da REN final

Para efeitos de exclusão de áreas, conside-rámos os seguintes critérios:

C1 – Reduzida Dimensão espacial – Arbi-trou-se que a área mínima para efeitosde integração na REN seria de 1 ha.

C2 – Descontinuidade Espacial – A des-continuidade espacial é determinadapela existência de pequenas áreascom dimensões reduzidas originandofiguras geométricas irregulares comilhas ou estruturas de forma alongacuja configuração desconexa com-prometeria a gestão desses espaços.

C3. Ocupação Urbana – A ocupaçãourbana já existente ou comprometidacom usos habitacionais, industriais,comércio e serviços

C4 – Incompatibilidade com PMOT emVigor – Considerou-se que a incom-patibilidade com plano é determinadaquando há sobreposição com a RENBruta para as áreas urbanas ou pro-gramas de desenvolvimento urbanís-tico estratégico.

C5 – Área desafectada por despachoministerial – Exemplo desta área é

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Figura 3 – Extracto da REN Bruta

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frente ribeirinha de Algés que foiexcluída da REN, por despachoministerial, a favor da APL.

C6 – Ocupado com Indústria Extractiva.C7 – Índice de Forma2 – Também desig-

nado por índice de compacticidade,faz a relação entre a dimensão espa-cial da superfície ocupada S e a áreade uma circunferência de raior, con-tendo a superfície S. Permite avaliar

a forma física de determinada restri-ção espacial. É-nos dado pela seguinteexpressão matemática:

SIf = –––– .100, 0 ≤ If ≤ 100%π.r2

Se • If = 0%: a estrutura territorial alongada;• If = 41%: estrutura territorial em forma

de triângulo isósceles;• If = 50%: estrutura territorial em forma

de semicírculo;• If = 51%: estrutura territorial em forma

de rectângulo;• If = 64%: estrutura territorial em forma

de quadrado;

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Planear o Local

Figura 4 – Operação de União de áreas com recurso ao «Model Builder»

2 Cruz, Fernando Fonseca, (2008), Tecnologias deInformação Geográfica, Análise e Monitorização deSistemas Territoriais de Nível Municipal, Dissertaçãopara a Obtenção de Grau de Doutor em Geografia ePlaneamento Regional, FCSH/UNL, pp. 107-108.

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• If =82%: estrutura territorial em forma dehexágono;

• If =100%: estrutura territorial em formade círculo perfeito.

Para efeitos de aplicabilidade do critérioforam excluídas as áreas com configuraçãoirregular, com índice de forma inferior 41%.

2.3.1. Exemplos de aplicação dos critérios anteriormentereferidos

C1 – Reduzida Dimensão espacial

Select * from REN_Exclusoes WhereShape_Area <= 10000;

C2 – Descontinuidade Espacial

Critério aplicado pela visualização da con-figuração espacial das áreas em écran (VerFigura 6).

C7 – Índice de Forma

Select * from REN_Exclusoes Where C7<= 41;

Considerámos excluídas as áreas comestrutura tentacular ou alongada, cujo índicede forma é inferior a 41%.

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Figura 5 – Exemplo da aplicação do Critério (selecção a cor verde)

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Figura 6 – Exemplo da aplicação do Critério Descontinuidade Espacial (selecção a cor verde).

Figura 7 – Aplicação do índice de forma. IF=11% – Estrutura alongada (selecção a cor verde)

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2.3.2. Expressões para a exclusões

Nesta secção analisaremos algumas expres-sões e condições impostas para a definição deum campo agregador dos critérios aplicados.

O primeiro passo foi o de concatenar nocampo «Critério de Exclusão» os campos C1 aC6 da seguinte forma:

Field CalculatorCriterios Exclusao= [C1] & “+” & [C2] &

“+” & [C3] & “+” & [C4] & “+” & [C5] & “+”& [C6] “+” & [C7]

O segundo passo consiste na criação deuma mapa temático com a visualização doscritérios em causa (ver Figura 8).

O passo final consistiu na criação de um

«layout» com os temas em questão, comsobreposição dos polígonos da REN Final.

Conclusões

A REN tem sido mal amada enquanto ins-trumento de planeamento pelas restrições queimpõe ao crescimento urbanístico. Se na pri-meira geração de PDM’s havia limitações téc-

nicas para a sua correcta delimitação, devido àindisponibilidade de cartografia actualizada ede pormenor e pela inacessibilidade de instru-mentos tecnológicos, na actual geração dePDM’s, o cenário é marcado por algumas revi-sões do regime jurídico da REN e ainda pelaintrodução de uma nova política de cartografia,o que permite melhor concretizar as propostas.

Os meios actuais de que os municípios dis-põem, embora não os ideais, são consideravel-

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Figura 8 – Exemplo da aplicação dos critérios de exclusão

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mente melhores dos de há uma década. Poroutro lado, a actual tutela do planeamento doterritório adquiriu uma outra sensibilidadepara o problema e tem disponibilizado e pro-duzido mais estudos, informação e regulamen-tação e as universidades estão a formar técni-cos mais bem preparados para lidar com estasmatérias.

É, porventura, nos critérios de exclusãoque existe um deficit de informação. A meto-dologia proposta e aplicada a um caso con-creto, para além de contribuir para a delimita-ção dos recursos hídricos e da REN, comrecurso à tecnologia SIG, propõe e ensaiaorientações de trabalho para a demarcação daREN Exclusões com base em critérios suscep-tíveis de aplicação rigorosa, expedita e con-creta, a um município predominantementeurbano. A metodologia proposta tem em vista

contribuir para uma maior eficácia da práticade planeamento municipal, através da reduçãodos factores de indecisão, promovendo aobjectividade de análise e interpretação doTerritório.

Formatos de dados

A informação produzida encontra-se emformato Geodatabase-Access para ArcGIS,versão 9.3. A cartografia raster das zonasameaçadas pelas cheias está disponível emGeoTIFF.

Os orfototos estão no formato MrSid. O sistema de referência adoptado é Hay-

ford-Gauss, datum de 73, com origem dascoordenadas no Ponto Central.

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Figura 9 – REN Final versusREN Exclusões

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CCDRLVT/DOT (2009). Reserva Ecológica Nacio-nal, Documento de Apoio à sua Delimitação,Lisboa: Fichas Técnicas.

CRUZ, Fernando Fonseca (2008). Tecnologias deInformação Geográfica, Análise e Monitoriza-ção de Sistemas de Territoriais de Nível Muni-cipal, Dissertação para a Obtenção de Grau de

Doutor em Geografia e Planeamento Regional,FCSH/UNL.

INCM (varias datas). Diplomas Legais: DL 93/90,DL 213/92, DL 79/95, DL 203/2003, DL180/2006, DL 166/2008, Port. 1356/2008.

Ministério da Habitação e Obras Públicas (1981).Índice Hidrográfico e Classificação Decimaldos Cursos de Água de Portugal, M.H.O.P.

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AAAACCCCEEEESSSSSSSSIIIIBBBBIIIILLLLIIIIDDDDAAAADDDDEEEE AAAAOOOOSSSS SSSSEEEERRRRVVVVIIIIÇÇÇÇOOOOSSSS DDDDEEEE UUUURRRRGGGGÊÊÊÊNNNNCCCCIIIIAAAA EEEEMMMM TTTTRRRRÁÁÁÁSSSS----OOOOSSSS----MMMMOOOONNNNTTTTEEEESSSS

EEEE AAAALLLLTTTTOOOO DDDDOOOOUUUURRRROOOO

Luis Ramos*, Ricardo Bento**, Nuno Azevedo***

Inforgeo, 2009, 89-107

Resumo

A igualdade de oportunidades no acessoaos serviços públicos constitui um indicadorcrucial da qualidade de vida das populações,encontrando-se consagrada como um direitoconstitucional e um dos fins da política deordenamento do território. Ora, esta igualdadede oportunidades está, na grande maioria doscasos, e em particular nas áreas predominante-mente rurais do Interior, longe de ser assegu-rada, sendo a acessibilidade diferencial a umserviço público um revelador das disparidadese das assimetrias em matéria de (sub)desen-volvimento territorial.

Trata-se, como é óbvio, de uma temáticaampla e complexa, que não poderíamos abor-dar de forma sistemática e global num textocom os objectivos e as características deste.Por essa razão, seleccionamos o sector que nos

parece melhor ilustrar a situação com que seconfrontam actualmente as populações daszonas rurais do Interior: os serviços de urgên-cia. Muito embora se tenha assistido, ao longodas últimas décadas, a uma melhoria em ter-mos das dotações, da cobertura e da acessibili-dade física a esses equipamentos, a verdade éque em muitas regiões do país, e em particularno Interior, os tempos médios de acesso estãoainda longe de corresponder aos padrõesmédios estabelecidos e usuais nos paísesdesenvolvidos. Acresce ainda que as recentespolíticas e medidas de racionalização e rees-truturação das redes de infra-estruturas e deequipamentos vieram colocar na ordem do diaesta problemática, realçando-se o facto demuitas decisões não estarem suficientementefundamentadas em estudos técnicos e metodo-logias adequadas.

Este trabalho é o resultado de uma aborda-gem aos serviços de urgência na região deTrás-os-Montes e Alto Douro, tendo sido cal-culada a acessibilidade a estes serviços em trêssituações distintas: a situação pré-reordena-mento, a situação com a proposta de reordena-mento preconizada pelo Ministério da Saúde ea situação proposta com as novas acessibilida-des viárias.

* Professor Associado da UTAD, [email protected] ** Assistente Convidado da UTAD, [email protected]***Bolseiro de Doutoramento da Fundação para

a Ciência e a Tecnologia (referência FCT: SFRH/BD//27717/2006), [email protected]

Grupo de Estudos Territoriais da Universidade deTrás-os-Montes e Alto Douro, UTAD, Vila Real.

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Do ponto de vista empírico a região deTrás-os-Montes e Alto Douro, e grande partedo interior de Portugal, representam um espaçoapropriado para apresentar os desafios da ade-quada acessibilidade da população aos serviçospúblicos, estando a opção relacionada com ocontexto socioterritorial marcado por dispersãoe concentração da procura, por um progressivoenvelhecimento da população e pela diminui-ção dos investimentos públicos em alguns sec-tores básicos para a população. Os resultadosobtidos põem em evidência as desigualdades edesequilíbrios territoriais, mais acentuados nosespaços marginais e/ou fronteiriços e abremcaminho para novas investigações sobre estaimportante problemática.

Palavras-chave:Rede de Urgências; Aces-sibilidade; SIG; PRN2000.

1. Introdução

A igualdade de oportunidades e a quali-dade o acesso razoável aos vários serviçospúblicos constitui um indicador crucial daqualidade de vida das populações, nomeada-mente das populações das áreas rurais, encon-trando-se consagrada como um direito consti-tucional e um dos fins da política de ordena-mento do território. Ora, nas áreas predomi-nantemente rurais do Interior esta igualdade deoportunidades está, na grande maioria doscasos, longe de ser assegurada, sendo a acessi-bilidade diferencial a um serviço público umrevelador das disparidades e das assimetriasem matéria de (sub)desenvolvimento territo-rial. A este nível são numerosas as evidênciasda relação entre a não dotação e desigualdadede oportunidades de acesso e as dinâmicas dedespovoamento e de declínio da maioria des-ses territórios rurais do interior (Azevedo eRamos, 2006). Nos últimos trinta anos verifi-cou-se um declínio de tais serviços dissemina-dos nas vilas e pequenas cidades, sendo neces-

sário reconhecer o impacto causado nas áreasrurais, particularmente às pessoas idosas, àscrianças e àquelas sem transporte privado, pelaretirada dos serviços. Deve-se notar que astentativas de poupar dinheiro num serviçopodem simplesmente causar custos em outrosserviços, pelo que as estratégias de planea-mento e reajustamento dos serviços públicosdevem ser imaginativas e flexíveis em servi-ços sustentáveis (Ecovast, 1994).

Em grande parte das investigações sobre aprovisão de serviços públicos pelo Estado,tem-se constatado a dificuldade em estabelecero equilíbrio entre a oferta e a procura pelapopulação de um território, nomeadamente emregiões periféricas que não têm recuperado osêxodos migratórios que as marcaram durantedécadas do século passado, que apresentamelevados índices de envelhecimento e conti-nuam com baixos níveis de acessibilidade,sobretudo ao nível dos transportes colectivosde passageiros. Deste modo, do ponto de vistaempírico a região de Trás-os-Montes e AltoDouro, e grande parte do interior de Portugal,representam um espaço apropriado para apre-sentar os desafios da adequada acessibilidadeda população aos serviços públicos, estando aopção relacionada com o contexto socioterrito-rial marcado por dispersão e concentração daprocura, por um progressivo envelhecimentoda população e pela diminuição dos investi-mentos públicos em alguns sectores básicospara a população, nomeadamente no que res-peita a infra-estruturas rodoviárias de nívelsuperior (vias com perfil de auto-estrada).

No caso dos serviços públicos implica fun-damentalmente a oferta dos mesmos por partedo Estado, podendo ser abordados quer naperspectiva territorial, em que se dá particularênfase à localização e distribuição, quer naperspectiva social que aponta que essa distri-buição dos serviços prestados pelo estado deveser equitativa garantindo a qualidade de vidadas populações (Azevedo e Ramos, 2006).Porém, continua a ser usual encontrar alusões

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Planear o Local

às carências de serviços e à persistência sobreo papel do poder público na melhor provisãodos mesmos, referindo-se a União Europeia ànecessidade das administrações públicas«adoptarem medidas concomitantes» paramelhor garantir a provisão dos mesmos(Comissão Europeia, 2001).

Vários autores têm estabelecido critérios deplaneamento no que se refere à localização edistribuição dos serviços de carácter público,nomeadamente: eficiência espacial; justiça ouequidade espacial; eficácia; e gestão (Sendra eMaass, 1995; Vuori, 1996). Contudo, em ter-mos prática, eficiência e equidade podementrar em conflito, pois admitir ou aconselhar aeficiência óptima de um serviço num determi-nado lugar pode representar uma resolução dis-tributiva que não seja equitativa (Azevedo eRamos, 2006), embora se insista permanente-mente na procura desse equilíbrio que permitaà população aceder de semelhante forma aosserviços públicos (Sendra e Ramirez, 2001).Tem sido diversas vezes referenciado que aacessibilidade aos pontos (nós) de satisfação denecessidades, como é o caso dos serviços deurgência, constitui para as populações umaforma de «renda real» (Smith, 1980), que vul-garmente se designa de qualidade de vida.Desta forma, em particular o acesso aos servi-ços de urgência, mas também aos restantes ser-viços públicos, deve-se realizar em condiçõesde igualdade efectiva1. Pela sua estreita relação

com a acessibilidade geográfica da populaçãorefira-se que a distribuição espacial dos servi-ços públicos nas áreas rurais se ajusta à regrada relação entre o nível de serviço e a sua loca-lização. Esta regra estabelece que quanto maiscomplexo e especializado é o serviço, maior éa probabilidade de se localizar apenas nos luga-res de maior importância. Apesar da simplici-dade dos pressupostos e das críticas que consi-deram que as teorias têm falta de poder expli-cativo (Krugman, 1995, FUJITA, et al., 2000),as evidências empíricas confirmam a sua utili-dade para descobrir o padrão espacial dos ser-viços públicos à população em áreas rurais. Aoferta de serviços nos lugares de nível hierar-quicamente superiores incorpora a disponibili-dade nos aglomerados de nível inferior, masisto não ocorre na situação inversa, estando osmodelos espaciais de oferta, e sobretudo, a suaevolução no tempo, condicionados por diver-sos factores, nomeadamente o isolamento geo-gráfico, que coloca dificuldades na manuten-ção e abastecimento dos próprios serviços.Quer seja pela aplicação de critérios de eficiên-cia ou pela adopção de soluções de compro-misso no dilema eficiência/equidade, as evi-dências empíricas relativa à evolução a médioe longo prazo dos serviços nas áreas rurais têmtido duas pautas evolutivas básicas (Moreno,1990; Furuseth, 1998): o desaparecimento pro-gressivo ou simples diminuição da dotação dosserviços cuja manutenção requer um mínimode utilizadores; o «scale back ou a concentra-ção funcional e espacial dos serviços nos aglo-merados de certa importância para diminuir oscustos de provisão.

Resultante da evolução da distribuição dosserviços, na realidade, existem graves desequi-líbrios territoriais em termos de acessibilidadea equipamentos e serviços públicos, existindoterritórios melhor localizados, desfrutando dasvantagens, ou pior, acentuando as desvanta-gens (Orcao e Cornago, 2003). A decisão delocalização e atribuição espacial dos recursosdeve ser tomada com cuidado se for intenção

1 Da mesma forma, LEURQUIN (2003, p. 15),afirma que [la] répartition de tout ce que l’ondénomme communément les services publics, ou, pouremployer une dénomination plus conforme à notresociété partenariale moderne: des services d’intérêtgénéral, l’accessibilité équitable à des prestations desservices de qualité, constituent donc l’une des piècesmaîtresses de l’aménagement et développement duterritoire. Corriger les inégalités territoriales, garan-tir l’égalité des chances entre tous les citoyens quelque soit leur lieu de résidence, c’est d’abord garantirun égal accès de tous à un certain nombre des servi-ces de base, avec une obligation de qualité.

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distribuir os benefícios e os inconvenientes napopulação de um modo eficiente e equitativo(Smith, 1980), pois estas estruturas envolvemelevados montantes de dinheiros públicos.Assim se explica a atenção que a comunidadecientífica de distintas áreas vem dedicando aoassunto particularmente desde o início dosanos 60. O esforço de investigação realizadolevou à constituição de um importante acervode modelos para apoiar os complexos proces-sos de decisão, contudo têm sido efectuadossob uma abordagem sectorial.

O anunciado reordenamento dos serviçospúblicos de saúde, nomeadamente o relativoaos serviços de urgência define 3 níveis deurgência: Polivalente, médico-cirúrgico ebásico. Na proposta foram identificados comoobjectivos centrais da definição da rede deurgências: a redução da percentagem de popu-lação a mais de 60 minutos de um serviço deurgência; a aproximação da realidade nacionalao nível europeu; e a melhoria e qualificaçãodos serviços. A proposta da nova rede deurgências considera conceitos como: equi-dade; acessibilidade; segurança; qualificação;rentabilização; e verdade. Na abordagem ape-nas é tido em linha de conta os conceitos deequidade (melhoria da resposta às necessida-des da maioria da população) e acessibilidade(acessibilidade em tempo útil aos cuidadosnecessários), procurando perceber de queforma a nova proposta de rede de urgênciapara a região de Trás-os-Montes e Alto Dourocumpre os critérios definidos a nível nacional,ou seja que o tempo de trajecto ao serviço deurgência para 90% da população deve ser infe-rior a 30 minutos para o serviço de urgência(SUB, SUMC e SUP) e inferior a 45 minutospara acesso a Urgência Médico-Cirúrgica(SUMC) ou Polivalente (SUP). Considera-setambém a rede viária futura dado que a redeproposta tem em consideração que irão havermelhorias nas acessibilidades, nomeadamenteatravés da construção das vias previstas noPRN2000.

2. Metodologia

Uma análise do tempo de acesso a determi-nados funções centrais permite verificar a dis-tribuição no território regional de tais funções eperceber os principais territórios que não seencontram devidamente servidos. A este res-peito são numerosas as evidências da relaçãoentre a não dotação e desigualdade de oportu-nidades de acesso e as dinâmicas de despovoa-mento e de declínio da maioria desses territó-rios. Este tipo de avaliação da acessibilidade aum determinado serviço/equipamento pressu-põe a utilização de modelos simplificados darealidade e o recurso a técnicas e ferramentasde análise espacial nomeadamente Sistemas deInformação Geográfica (SIG). Um problemadesta natureza pode ser visto como uma redecomposta por nós e arcos; os nós são consti-tuídos pelo conjunto de centros de procuraonde a população se encontra concentrada epelo conjunto de sítios de oferta de determi-nado serviço/equipamento disponibilizado. Osarcos representam a rede viária que garante aligação entre todos os nós da rede. Para estetrabalho em concreto foi desenvolvido um SIGpara a região de TMAD onde foram carregadostodos os dados necessários à análise.

2.1. Centros de procura e de oferta

Face à escala regional de análise os centrosde procura considerados foram os centrosurbanos das freguesias. Para cada uma das 705freguesias da região de TMAD foi georrefe-renciado o seu respectivo centro urbano comrecurso a ortofotomapas de alta resolução, for-necidos pelo Instituto Geográfico Português(IGP) e acedidos através da ArcGIS UserCommunitydisponibilizada pela ESRI e asso-ciados os dados relativos a população resi-dente dos Censos 2001 (Figura 1). Com adesagregação espacial da procura ao nível dasfreguesias é possível observar as disparidades

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intra-regionais, e mesmo intraconcelhias daregião. Para efeitos de análise os serviços desaúde considerados foram georreferenciadosaos centróides de freguesia onde se encontraminstaladas as respectivas instalações.

2.2. Rede viária

A rede viária encontra-se desagregada em7 níveis de hierárquicos em função das veloci-

dades de circulação consideradas e permite ainterligação entre todos os centróides de fre-guesia da região. Foi considerada a rede viáriaactual (Figura 2) e a rede viária futura (Figura3) prevista no PRN2000 bem como as respec-tivas alterações que foram entretanto realiza-das, nomeadamente o prolongamento da A4entre Amarante e Bragança. A definição davelocidade média a atribuir a cada via, em fun-ção da sua tipologia, tem variado de acordocom diferentes autores e estudos2; conside-

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Planear o Local

Figura 1 – Georeferenciação dos centróides das freguesias e da rede viária

Fonte: IGP (acedido via ArcGIS User Community)

2 DONNAY, J. P. e LEDENT, Ph. – 1995:«Modelling of Accessibility Fields», in JEC-GI’95Proceedings, JEC-GI, The Hague, pp. 489-494.

JAE – 1994 – Normas de TraçadoGUTIÉRREZ e URBANO – 1996: «Accessibility

in the European Union: the impact of the trans-Euro-pean road network», in Journal of Transport Geo-graphy, Vol. 4, n.º 1, Pergamon, London, pp. 15-25.

NAER – 1999: Estudo Preliminar de ImpacteAmbiental do Novo Aeroporto de Lisboa – Ota,NAER, Lisboa.

SCHÜRMANN; SPIEKERMANN e WEGE-NER – 1999: Accessibility Indicators, Institut fürRaumplanung – Universität Dortmund, Dortmund

JULIÃO – 2001: «Tecnologias de InformaçãoGeográfica e Ciência Regional. Contributos Metodo-lógicos para a Definição de Modelos de Apoio àDecisão em Desenvolvimento Regional», Disserta-ção de Doutoramento apresentada à Faculdade deCiências Sociais e Humanas da Universidade Novade Lisboa.

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Figura 2 – Rede viária actual

Fonte: Elaboração própria.

Figura 3 – Rede viária futura

Fonte: Elaboração própria.

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rando a tipologia das infra-estruturas rodoviá-rias portuguesas, e a especificidade da regiãoem estudo, nomeadamente no que se refere aotipo de traçado das vias, e ao relevo acidentadoda região, as velocidades médias consideradaspor tipo de via, para veículos em transporteparticular, foi a utilizada em Azevedo e Ramos(2006)3, dado que se reporta à mesma regiãoem estudo.

Foram calculados os tempos de acesso acada serviço de urgência independentementeda freguesia ou do município em que seencontra o mais próximo. Importa referir queo problema da acessibilidade aos serviços deurgência é agravado pela inexistência de umarede de transporte público capaz de assegurarregularidade e cobertura eficaz em toda aregião.

3. Rede de serviços de urgênciana região de TMAD

A região de Trás-os-Montes e Alto Douro(TMAD) compreende 34 municípios, perten-centes a 4 distritos (Bragança, Vila Real, Viseue Guarda)4. Trata-se de um território heterogé-neo, com realidades e dinâmicas diferencia-das, essencialmente rural, dependente das acti-vidades agrícolas, que empregam parte signifi-cativa da população activa, revelando sinaisclaros de desvitalização (declínio demográficoe despovoamento). As dinâmicas territoriaisapontam para uma progressiva estruturação aolongo dos principais corredores rodoviários(IP4 e IP3), onde se localizam os principaisnós da malha urbana constituída por pequenos

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Planear o Local

Figura 4 – Densidade populacional por freguesia

Fonte: INE, RGP, 2001

3 Auto-Estradas – 120 km/h;IP e IC – 90 km/h;EN e ER – 60 km/h; EM – 50 km/h; OE – 40 km/h

4 Incluem os municípios das NUTS III Douro eAlto Trás-os-Montes e o município de Ribeira dePena da NUT III Tâmega.

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e médios centros urbanos com um perfil deserviços e actividades económicas marcadopela dependência do emprego público admi-nistrativo e de um sector terciário básico deabrangência local (Figura 4).

Destaca-se o processo de despovoamentoprogressivo da região, cujas consequênciassão inúmeras, agravando os problemas sociaise económicos. O declínio, e mesmo abandono,dos aglomerados rurais de menor dimensãotende a prosseguir a ritmo intenso, comprome-tendo a viabilidade das respectivas comunida-des humanas e das actividades por elas desen-volvidas, tornando o combate à desertificaçãohumana uma das prioridades para o desenvol-vimento desta região.

Na Rede de Referenciação de Urgência//Emergência de 2001 estavam definidos 39pontos de rede para todo o país, sendo três na

região (um serviço de urgência polivalente emVila Real, um serviço de urgência Médico-Cirúrgica em Chaves e Bragança). Contudoexistiam vários hospitais com Serviço deUrgência, que não estavam formalmente previs-tos nessa rede de referenciação, totalizando 73pontos de rede a nível nacional, dos quais qua-tro se localizam na região de Trás-os-Montes eAlto Douro (Hospitais de Lamego, Macedo deCavaleiros, Mirandela e Peso da Régua). Naproposta final do processo de requalificação darede de urgências definida pelo Ministério daSaúde5, relativamente à região de TMAD, estãoprevistos 10 pontos de rede de urgência, dosquais 6 serão Serviço de Urgência-Básica(SUB), três serão Serviço de Urgência Médico-cirúrgica (SUMC) e 1 será Serviço de UrgênciaPolivalente (SUP) (Figura 5).

São considerados quatro novos pontos de

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5 Ministério da Saúde (2007), Proposta da Redede Urgências, Relatório Final, Comissão Técnica deApoio ao Processo de Requalificação das Urgências.

Figura 5 – Rede de urgências proposta

Fonte: Ministério da Saúde, 2007.

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rede (Moimenta da Beira, Mogadouro, Monta-legre e Vila Nova de Foz Côa), sendo aindaconsiderados mais três pontos de rede que,apesar de já estarem em funcionamento, nãoestavam formalmente previstos em 2001(Lamego, Macedo de Cavaleiros e Mirandela),e, para além destes, manter-se-ão com serviçode urgência os pontos de rede formalmentedefinidos em 2001 (Hospitais de Bragança,Chaves e Vila Real). Refira-se ainda que háum ponto de rede, nomeadamente o HospitalPeso da Régua, que, apesar de estar em fun-cionamento não estava formalmente previstona rede de referenciação de 2001, na propostasurge como ponto de rede a não consignarcomo urgência.

4. Acessibilidade aos serviços de urgência pré-reordenamento

São muitas as variáveis que influenciamcom que os serviços de urgência se encontremacessíveis à população, sendo, a acessibili-dade entendida como a facilidade de utiliza-ção por parte dos usuários dos serviços que,como é sabido, estão situados em pontos fixosdo espaço.

A obtenção dos valores de acessibilidadeaos serviços de urgência baseou-se no uso doSIG vectorial criado, com base na aplicaçãode análise de redes, tendo por objectivo calcu-lar o tempo necessário a percorrer para acederao serviço. A acessibilidade espacial ou geo-gráfica foi entendida como o total de distân-cias percorridas entre cada nó da oferta doserviço e o nó da procura, distância essa queconsidera o caminho mínimo que liga doispontos, tendo sido utilizada a extensão NET-WORK ANALYST, do ARCGIS 9.3 da ESRI,que fornece uma série de ferramentas paracriar, manter e executar a análise de dados emséries de rede, nomeadamente a função «Clo-sest Facility».

4.1. Acessibilidade aos serviços deurgência Pré-reordenamento

Analisando a acessibilidade aos serviços deurgência existentes antes do processo de reor-denamento (Figura 6), verifica-se que as fre-guesias da região se encontram a uma média de33 minutos de um serviço de urgência,enquanto a média de acesso ponderada pelapopulação é de 24 minutos, sendo o tempomáximo registado de 96 minutos. Cerca de 67%da população encontra-se a menos de 30 minu-tos do serviço mais próximo, estando 17% amais de 45 minutos do serviço mais próximo.

Analisando os tempos médios de acesso ea média de acesso ponderada pela populaçãodas freguesias de cada concelho verificam-segrandes disparidades, tendo 19 concelhosmédia de acesso superior a 30 minutos. Nosconcelhos de Freixo de Espada à Cinta,Miranda do Douro e Vila Nova de Foz Côa amédia de acesso é superior a 60 minutos.

4.2. Acessibilidade aos serviços de urgência pós-reordenamento

4.2.1. Acessibilidade aos serviçosde urgência básica (SUB)

Analisando a acessibilidade aos serviçosde urgência pós-reordenamento com a redeviária actual (Figura 7), ou seja, aos 10 pontosde rede com serviço de urgência (SUP, SUMCe SUB), verifica-se que as freguesias da regiãose encontrarão a um tempo de acesso médio de24 minutos de um serviço de urgência e amédia de acesso ponderada pela população éde 19 minutos. O valor máximo registadonuma freguesia é 68 minutos. Verifica-se que77% da população se encontra com o reorde-namento a menos de 30 minutos do serviçomais próximo, 6% da população permanece amais de 45 minutos, permanecendo cerca de

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Figura 6 – Acessibilidade à actual rede de urgências

Figura 7 – Acessibilidade à rede de urgências proposta com a rede viária actual

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2000 residentes a mais uma hora do serviço deurgência mais próximo.

A nível concelhio denotam-se algumasdiferenças entre os vários concelhos, existindo13 municípios com tempos médios de acessodas freguesias superiores a 30 minutos, sendoem 11 municípios a média de acesso ponderadapela população superior a 30 minutos. Verifica-se que, com esta rede de urgência, nenhummunicípio terá média de acesso superior a 60minutos, contudo nos municípios de Mirandado Douro, Ribeira de Pena e Vimioso a médiade acesso ainda é superior a 45 minutos.

Considerando a rede pós reordenamento e arede viária futura (Figura 8) verifica-se que otempo médio de acesso das freguesias da regiãoao serviço de urgência mais próximo é 24 minu-tos, sendo 18 minutos se considerarmos a médiade acesso ponderada pela população. O tempomáximo de acesso é 68 minutos na freguesia deAvelanoso, concelho de Vinhais.

Com a rede de urgências pós reordena-mento (SUB, SUMC e SUP) e com a rede viá-ria futura mais de 80% da população ficará amenos de 30 minutos do serviço de urgênciamais próximo, ficando apenas cerca de 3% dosresidentes a mais de 45 minutos. Em 12 muni-cípios os tempos médios de acesso serão supe-riores a 30 minutos (9 município considerandoa média ponderada pela população), tendoapenas o município de Vimioso médias deacesso superiores a 45 minutos (48 minutos).

4.2.2. Acessibilidade aos serviçosde urgência médico--cirúrgica (SUMC) e polivalente (SUP)

Analisando a acessibilidade aos serviçosde urgência médico-cirúrgicos (SUMC) e ser-viços de urgência polivalentes (SUP) pós reor-

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Figura 8 – Acessibilidade à rede de urgências proposta com a rede viária futura

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denamento com a rede viária actual (Figura 9),ou seja, aos 4 pontos de rede SUMC/SUP,verifica-se que as freguesias da região seencontram a um tempo médio de acesso de 39minutos de um serviço de urgência e a médiade acesso ponderada pela população é de 31minutos. O máximo registado numa freguesiaé de 1hora e 11minutos, nomeadamente emCabril (Montalegre), Póvoa (Miranda doDouro) e Azinhoso (Mogadouro). Verifica-seque cerca de 55% da população se encontra amenos de 30 minutos do SUMC/SUP maispróximo, estando 25% a mais de 45 minutos e12% a mais de 60 minutos.

A nível concelhio denotam-se grandes dis-paridades, estando 13 municípios a mais de 45minutos (média das freguesias e média ponde-rada pela população), sendo que, com estarede de SUMC/SUP, em 6 municípios a médiade acesso é superior a 60 minutos (54 conside-rando a ponderação pela população), sendo

superior a 75 minutos em Freixo de Espada àCinta, Miranda do Douro e Mogadouro.

Analisando a rede de SUMC/SUP propostacom a rede viária futura (Figura 10) verifica-seque o tempo médio de acesso das freguesias daregião ao serviço de urgência mais próximoserá, no futuro, de 36 minutos, sendo 28 minu-tos a média de acesso ponderada pela popula-ção. O tempo máximo de acesso será 89 minu-tos na freguesia de Vila Chã da Braciosa(Miranda do Douro).

Verifica-se que 59% da população ficará amenos de 30 minutos do SUMC/SUP maispróximo, enquanto 19% da população perma-necerá a mais de 45 minutos e 7% da popula-ção a mais de 60 minutos. Em 11 municípios,as médias de acesso das freguesias serão supe-riores a 45 minutos e em 10 municípios, asmédias ponderadas pela população, serãosuperiores a 45 minutos. Em 5 municípios amédia de acesso será superior a 60 minutos (4

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Figura 9 – Acessibilidade à rede de SUMC e SUP proposta com a rede viária actual

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considerando a ponderação pela população),sendo em Freixo de Espada à Cinta e Mirandado Douro superior a 70 minutos.

4.2.3. Acessibilidade aos Serviçosde Urgência Polivalentes(SUP)

Analisando a acessibilidade aos serviçosde urgência polivalente (SUP) pós reordena-mento com a rede rodoviária actual (Figura11), ou seja, ao SUP de Vila Real e aos SUP deBraga e de Viseu, verifica-se que as freguesiasda região se encontram a um tempo médio deacesso de 70 minutos, sendo a média ponde-rada pela população de 58 minutos. O valormáximo registado numa freguesia é de 151minutos, na freguesia de Vila Chã da Braciosa(Miranda do Douro). Apenas 23% da popula-ção se encontra a menos de 30 minutos do

SUP mais próximo, estando 63% da populaçãoa mais de 45 minutos, 49% a mais de 1 hora,enquanto que cerca de 16% da população seencontra a mais de 90 minutos.

A situação em termos concelhios indicaelevadas disparidades, existindo 18 municí-pios com tempos médios de acesso (das fre-guesias e ponderando a população) superioresa 60 minutos. Com a rede de SUP e a rede viá-ria actual, 8 municípios encontram-se a umamédia de acesso superior a 90 minutos (7 con-siderando a ponderação da população), sendoem Miranda do Douro e Freixo de Espada aCinta mesmo superior a 120 minutos.

Tendo em conta a rede de SUP proposta ea rede viária futura (Figura 12) verifica-se queo tempo médio de acesso das freguesias daregião ao serviço de urgência mais próximoserá de 59 minutos, sendo 49 minutos se forconsiderada a média de acesso ponderada pelapopulação, enquanto o tempo máximo será de

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Figura 10 – Acessibilidade à rede de SUMC e SUP proposta com a rede viária futura

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Figura 11 – Acessibilidade a SUP proposta com a rede viária actual

Figura 12 – Acessibilidade a SUP proposta com a rede viária futura

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126 minutos nas freguesias de Paradela e S.Martinho de Angueira, concelho de Mirandado Douro. Verifica-se que 26% da populaçãoficará a menos de 30 minutos do SUP maispróximo, ficando 54% a mais de 45 minutos,33% a mais de 60 minutos, enquanto 7% dapopulação ficará a mais de 90 minutos.

Em 14 municípios, os tempos médios deacesso das freguesias manter-se-á superior a60 minutos, sendo que em 13 municípios amédia de acesso ponderada pela populaçãoserá superior a 60 minutos. Com esta rede deserviços de urgência polivalente e a rede viáriafutura, 5 municípios terão uma média deacesso ponderada pela população superior a 90minutos (4 considerando a ponderação pelapopulação), sendo em Miranda do Douro EVimioso superior a 100 minutos.

5. Discussão de resultados

Considerando a rede de urgências pré-reor-denamento e a rede pós reordenamento com arede viária existente actualmente verifica-seuma melhoria significativa dos tempos deacesso aos serviços de urgência, quer notempo médio de acesso das freguesias (de 33minutos para 24 minutos), quer no tempomédio de acesso ponderado pela população(de 24 minutos para 19 minutos), quer notempo máximo registado numa freguesia (de96 minutos para 70 minutos). Se for conside-rada a rede viária futura, as melhorias sãoainda mais significativas, sobretudo, no tempomédio de acesso das freguesias e no tempomáximo registado (Quadro 1).

Apesar das melhorias serem significativascom a rede de urgências proposta, continua-sea verificar que não se encontra 90% da popula-ção da região a menos de 30 minutos de umserviço de urgência básica, tal como foi defi-nido nas metas a nível nacional, estando apenas77% e 80%, com a rede viária actual e a redeviária futura, respectivamente (Quadro 2 e 3).

Também na proposta de rede de SUMC ouSUP, com a implementação da rede viáriafutura face à rede viária actual, verificam-sediminuições dos tempos de acesso (Quadro 2),ficando no entanto algo aquém dos valores

indicativos a nível nacional (90% da popula-ção a menos de 45 minutos), dado que apenas81% da população ficará abaixo do limiarindicado.

Apesar de não estarem indicados valoresde tempo de acesso máximos exclusivamentepara os SUP, importa, contudo, referir que naregião estes são elevados, tendo em conta quemesmo com a rede viária futura cerca de 1/3da população estará a mais de uma hora doSUP mais próximo.

O reordenamento efectuado introduziu alte-rações substanciais nas áreas de influência dos

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Planear o Local

Quadro 1 – Tempos de acesso médios e máximos em minutos a serviços de urgência

Média de acesso Média de acesso ponderada Máximo dasdas freguesias pela população freguesias

Rede Actual 32,9 24,3 96

SUB, SUMC e SUP Rede viária actual 25,2 19,4 70

Rede viária futura 23,9 18,3 68

SUMC e SUP Rede viária actual 38,9 30,7 98

Rede viária futura 36,2 28,3 89

SUP Rede viária actual 69,5 58,1 151

Rede viária futura 59,1 49,1 126

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serviços de urgência. O aumento e a relocaliza-ção dos SUB asseguraram uma mais estreitaarticulação territorial, prevalecendo uma maiorproximidade das populações aos serviços comparticular destaque para os municípios do dis-trito de Bragança (Figuras 13 e 14).

O Quadro 4 apresenta em termos sintéticosos ganhos em termos de acessibilidade globalregistados na região de TMAD em função dasevoluções quer da rede de serviços de urgên-cia, quer da rede rodoviária, avaliados em ter-mos do tempo agregado6 de acesso aos vários

níveis dos serviços de urgência. O reordena-mento na rede de urgências efectuado impli-cou uma redução significativa no tempo agre-gado de acesso que poderá ainda ser melho-rado através na concretização das acessibilida-des rodoviárias. Comparando os resultadosobtidos para a nova rede urgências na situaçãopresente e futura, ocorrem melhorias em ter-mos de acesso em todos os níveis de urgência,com particular destaque para o acesso aos SUPonde a melhoria atinge quase 16%.

Desagregando territorialmente os resultadosobtidos é possível observar melhorias significa-tivas nos tempos médios de acesso a cada ser-

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Quadro 2 – População residente por tempos de acesso a serviços de urgência

Tempo de acesso

Rede PropostaRede

Acutal

SUMC e SUP SUP

Rede viária Rede viária Rede viária Rede viária Rede viária Rede viáriaactual futura actual futura actual futura

Menos de 15 minutos 183629 189731 192010 120157 120157 44120 44120

Entre 15 e 30 minutos 119620 158988 172063 129409 147348 58715 75939

Entre 30 e 45 minutos 73644 77366 75631 92562 97763 64905 86883

Entre 45 e 60 minutos 44361 25077 12569 58486 55671 65578 95637

Entre 60 e 75 minutos 23101 2188 1077 36836 20652 91944 83407

Entre 75 e 90 minutos 8488 0 0 11404 11759 57305 35765

Mais de 90 minutos 507 0 0 4496 0 70783 31599

Quadro 3 – Percentagem de população residente por tempos de acesso a serviços de urgência

Tempo de acesso

Rede Pós-OrdenamentoRede Pré--Ordena-

mento

SUMC e SUP SUP

Rede viária Rede viária Rede viária Rede viária Rede viária Rede viáriaactual futura actual futura actual futura

Menos de 15 minutos66,9% 76,9% 80,3% 75,5% 80,6% 51,5% 66,7%

Entre 15 e 30 minutos

Entre 30 e 45 minutos 26% 22,6% 19,5%

Entre 45 e 60 minutos 21% 16,8%

Entre 60 e 75 minutos32,9% 26,3%

Entre 75 e 90 minutos 7,1% 0,5% 0,2% 3,5% 2,6%

Mais de 90 minutos 15,6% 7ª%

6 O tempo agregado é obtido para cada nível deserviços de urgência através da seguinte fórmula:

TA = Σn

iUi*t ij . sendo:

TA – Tempo Agregado

Uj – População residente na freguesia tij – tempo entre o centróide da freguesia e o ser-

viço de urgência mais próximo considerado.

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Planear o Local

Figuras 13 e 14 – Áreas de influência dos SUB pré e pós reordenamento da rede respectivamente

Quadro 4 – Freguesias abrangidas e tempo máximo e médio de acesso a cada serviço de urgência

Configuração da rede de serviços de urgência

Tempo agregado(horas)

SUB+SUMC+SUP SUMC+SUP SUP

Pré-reordenamento 183156,6 - - - - -

Pós-reordenamento (2009) 146602,7 -20,0% 232136,7 - 439008,8 -

Pós-reordenamento

(Rede viária futura) 137843,0 -6,0% 213621,0 -8,0% 370892,3 -15,5%

Tempo agregado(horas)

∆Tempo agregado

(horas)∆

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viço de urgência, dado que apenas no serviçolocalizado em Mogadouro o tempo de acessodas várias freguesias será superior a 30 minutos,contrariamente ao que sucedia com a rede antesdo reordenamento. Contudo, apesar das melho-rias serem significativas, com a rede de urgên-cias reordenada o tempo médio de acesso aosvários serviços é ainda superior a 20 minutos,existindo em todos os serviços freguesias a maisde 45 minutos, com excepção de Moimenta daBeira onde a freguesia mais distante se encontraa 41 minutos. Com a implementação da redeviária futura face à rede viária actual, verificam-se diminuições dos tempos médios de acesso(Quadro 5), contudo em Mogadouro o tempomédio de acesso será ainda de 29 minutos.

Também na proposta de rede de SUMC eSUP, com a implementação da rede viáriafutura face à rede viária actual, se verificamdiminuições dos tempos de acesso aos váriospontos de rede, contudo os valores médioscontinuam a ser elevados (superiores a 30minutos), registando-se uma diminuição dotempo de acesso da freguesia mais distante doserviço (de 98 minutos passa para 89 minutos).Ao nível do SUP a diminuição do tempo deacesso ao único serviço existente na região(Vila Real) é relevante passando de um tempomédio de 70 minutos para 59 minutos, dimi-nuindo em cerca de 25 minutos o tempomáximo registado.

6. Conclusões

Recentemente têm existido decisões políti-cas, ora de abertura ora de encerramento deserviços, segundo uma lógica de ajuste à pro-cura/necessidades dos territórios. No sistemade saúde, e em particular no serviço de urgên-cia, é necessário implementar ajustamentos naorganização actual de modo a garantir o acessoem condições de equidade à generalidade da

população, contribuindo para uma melhoria daqualidade de vida das populações.

O envelhecimento da população, a disper-são dos cidadãos e a desarticulação da redeviária, sobretudo nos municípios interiores,desaconselhava a concentração de serviçosnos hospitais da região e uma escassez no res-tante território, onde as condições de acessibi-lidade não permitem aceder de forma equita-tiva, nem satisfatória aos serviços de urgência

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Quadro 5 – Freguesias abrangidas e tempo máximo e médio de acesso a cada serviço de urgência

Serviço de Urgência Freguesias Abrangidas

Tempomáximo

Tempomédio

Com rede viária actual Com rede viária futura

Bragança 74 70 30 71 64 28

Chaves 88 54 22 80 43 20

Lamego 79 48 20 77 44 19

Macedo de Cavaleiros 66 53 23 60 53 21

Mirandela 99 59 28 95 59 16

Mogadouro 59 68 32 69 68 29

Moimenta da Beira 75 41 21 75 41 20

Montalegre 45 56 24 44 47 23

Vila Nova de Foz Côa 43 52 29 46 51 28

Vila Real 77 62 26 88 51 25

Freguesias Abrangidas

Tempomáximo

Tempomédio

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básica. Considerando a proposta de serviçosde urgência, comparativamente à situaçãoactual, verificam-se melhorias nos temposmédios de acesso, contudo a população daregião que ficará a menos de 30 minutos(77%) continuará a ser inferior à meta definidaa nível nacional (90% da população). Verifica-se, contudo, que para que a melhoria da aces-sibilidade aos serviços de urgência seja consi-derável é de facto fundamental o processo deexecução das vias definidas no PRN2000actualmente em curso, que permitirá garantirum acesso mais rápido de grande parte dapopulação, nomeadamente ao nível da rede deurgências médico-cirúrgicas e polivalentes.

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Resumo

Este artigo, pretende abordar o papel daCarta Educativa e a sua importância como uminstrumento de planeamento ao nível local,que assegura simultaneamente a expansão e odesenvolvimento do sistema educativo e ondese consideram como factores o tempo, oespaço e a relação.

Alicerçada no enquadramento legal doDecreto-lei n.º 7/2003 de 15 de Janeiro, colocao Município num lugar central de todo o pro-cesso, pelas atribuições e competências que lhesão conferidas nas fases de elaboração, gestãoe monitorização. Esta situação faz com que aCarta Educativa ocupe uma posição de referên-cia na actividade dos serviços de planeamentoe de educação das respectivas autarquias.

Este instrumento foi ainda em muitos

municípios precedido da Carta Escolar que, nasequência da aprovação dos planos directoresmunicipais de primeira geração, procurouaprofundar o estudo dos equipamentos educa-tivos, contribuindo sobretudo para reserva deterrenos necessários.

Partindo assim de um instrumento de pla-neamento sectorial, que se pretende dinâmico,participativo, democrático, implicando oenvolvimento e a cooperação de todos osagentes educativos, desde a administraçãocentral, regional à local (comunidade escolar eeducativa), procuraremos abordá-lo em duasperspectivas – a dinâmica e o percurso – coma finalidade de alcançar o sucesso no reorde-namento de uma rede, pautada por princípios eobjectivos definidos pela política territorial eeducativa, e reflectida na concepção e naimplantação de uma rede de estabelecimentosde educação e de ensino de qualidade.

Palavras-Chave: Carta Educativa, Dinâ-mica, Percurso, Política Territorial, PolíticaEducativa, Qualidade, Rede Educativa.

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CCCCAAAARRRRTTTTAAAA EEEEDDDDUUUUCCCCAAAATTTTIIIIVVVVAAAA –––– DDDDIIIINNNNÂÂÂÂMMMMIIIICCCCAAAA EEEE PPPPEEEERRRRCCCCUUUURRRRSSSSOOOOPPPPAAAARRRRAAAA UUUUMMMMAAAA TTTTRRRRAAAAJJJJEEEECCCCTTTTÓÓÓÓRRRRIIIIAAAA

DDDDEEEE SSSSUUUUCCCCEEEESSSSSSSSOOOO NNNNOOOO RRRREEEEOOOORRRRDDDDEEEENNNNAAAAMMMMEEEENNNNTTTTOOOO DDDDAAAA RRRREEEEDDDDEEEE EEEEDDDDUUUUCCCCAAAATTTTIIIIVVVVAAAA

Deolinda Costa*; Adélia Silva**

Inforgeo, 2009, 109-118

* Geó[email protected] * Técnica [email protected]

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Iniciaremos o nosso artigo com a aborda-gem de dois conceitos: percursos e dinâmicasrelativamente à Carta Educativa. Urge anecessidade de compreendermos o que seentende por cada um deles, de forma a cir-cunscrevermos a nossa opção sobre a aborda-gem ao tema.

Recorrendo à raiz etimológica das pala-vras, especificamente ao dicionário de línguaportuguesa (1998) definimos a palavra «per-curso» como «acto ou efeito de percorrer,espaço percorrido; do lat. percursu-, «id.»,part. pass. de percurrère, «percorrer». A pala-vra «dinâmica» deriva do grego dynamis, esignifica força. Em física a dinâmica é umramo da mecânica que estuda as relações entreas forças e os movimentos que são produzidospor estas.

Optando por direccionar o nosso artigonestas duas dimensões: uma sobre o percursoe outra sobre a dinâmica desenvolvida, per-cepcionamos dois conceitos interligados, namedida em que a dinâmica implica o desen-volvimento de determinadas trajectórias poracção de forças impulsionadoras desses movi-mentos. Considerámos trajectória como o per-curso descrito por qualquer ponto de um corpoem movimento, sendo que existe um ponto departida e um ponto de chegada. Nesse movi-mento serão considerados como factores: otempo, o espaço e a relação.

O tempo está presente no horizonte tempo-ral da Carta Educativa e simultaneamente nocarácter de continuidade que a sua execução emonitorização exigem (Figura 1, p. 117).

O espaço corresponde ao «local» ondetudo se concretiza – a dimensão local da terri-torialização – ainda que obedecendo a opçõespolíticas de âmbito nacional, regional e local.

A relação pressupõe a interdependênciaentre a educação e o território e traduz-se naactual conectividade entre os equipamentos,na lógica da rede existente, quer do ponto devista funcional quer do ponto de vista do pro-jecto educativo.

1. Política territorial e políticaeducativa – dinâmicas paraum percurso

Impulsionadoras das dinâmicas na trajectó-ria para a elaboração, construção e operaciona-lização da Carta Educativa destacamos a polí-tica territorial e a política educativa, que consti-tuem forças orientadoras para a expansão edesenvolvimento do sistema educativo em fun-ção do desenvolvimento económico, sociocul-tural e urbanístico do território. Esta influênciaconvergente está presente na Carta Educativa,quer enquanto documento, quer enquanto pro-cesso pelo facto de ser um projecto contínuo degestão da rede educativa ao nível municipal.

Em Portugal, o processo de elaboração eaprovação das Cartas Educativas conheceu umforte impulso após ter sido legislada a obrigato-riedade da sua elaboração. A celeridade da suaexecução fez-se sentir a partir da publicação doDecreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro e ofacto da sua homologação constituir uma dascondições de elegibilidade de projectos ao Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN), estimulou decisivamente este processo.

Constata-se ainda a coerência deste instru-mento no quadro da política de ordenamentodo território, dada a integração/relação no seusistema de gestão nos níveis nacional, regionale local. O PNPOT1, no seu programa de acção– eixo 4 – estipula o seguinte:

«Assegurar a equidade territorial no provi-mento de infra-estruturas e de equipamentos colec-tivos e a universalidade no acesso aos serviços de interesse geral, promovendo a coesão social/

4.1 Promover o ordenamento das redes deeducação pré-escolar, do ensino básico e dosecundário, da formação tecnológico /profissio-nalizante e da educação e formação de adultos…»

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1 PNPOT – Plano Nacional da Política do Ordena-mento do Território. Lei n.º 58/2007, de 4 de Setembro

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Planear o Local

O PROT-AML2, na sua Prioridade 3, refere:

«Coesão socioterritorial através de umamelhoria sustentada das condições de vida e daqualidade urbana para a população residente naÁrea Metropolitana de Lisboa /…a implemen-tação de uma política urbana de equidade terri-torial, garantindo a igualdade de oportunidadesno acesso aos equipamentos …a valorizaçãodos recursos humanos…»

O PDM3 – considerando um dos seusobjectivos tipo, evidencia frequentemente

«melhorar o padrão de vida / garantir um bomnível de equipamentos, de serviços públicos deapoio à comunidade e infra-estruturas urbanas».

A Carta Educativa concretiza no localopções de desenvolvimento de nível hierár-quico superior, ao permitir de forma integrada,a programação das necessidades das diversastipologias de equipamentos educativos e a suarespectiva localização, que correspondem àprocura determinada para um horizonte tem-poral respectivo.

1.1. A Carta Educativa – um ConceitoEmergente no Universo da Política Educativa

A Carta Educativa, elaborada pelas autar-quias4, norteia-se pelos princípios consagradosna Lei de Bases do Sistema Educativo5 quedefine as grandes linhas orientadoras do pla-

neamento da rede educativa, num conjunto dediplomas que na sua sequência foram sur-gindo, nos Critérios de Planeamento da RedeEscolar6, bem como nos normativos sobre osnovos programas de espaços7.

De acordo com o Decreto-lei n.º 7/2003 de15 de Janeiro, art.º 10.º, o conceito de CartaEducativa apresenta-se de seguinte forma:

«A Carta Educativa é, a nível municipal, oinstrumento de planeamento e ordenamentoprospectivo de edifícios e equipamentos educa-tivos a localizar no concelho, de acordo com asofertas de educação e formação que seja neces-sário satisfazer, tendo em vista a melhor utiliza-ção dos recursos educativos, no quadro dodesenvolvimento demográfico e socioeconó-mico de cada município».

Este conceito adoptado traduz-se numaconcepção dinâmica de planeamento, nãoconstituindo um documento acabado, apresen-tando-se como uma prática sistemática e con-tinuada de análise e intervenção na realidadeeducativa. Desenvolve-se baseado na partici-pação de diferentes entidades envolvidas noprocesso educativo, as quais, a cada momento,se deverão disponibilizar para que a CartaEducativa se mantenha como instrumento per-manentemente operacional de desenvolvi-mento da política educativa.

No mesmo Diploma atrás referido, no seuart.º 11, definem-se cinco objectivos para aCarta Educativa, dos quais salientamos:

1 – Assegurar a adequação da rede de esta-belecimentos de educação pré-escolar e deensino básico e secundário, por forma que, emcada momento, as ofertas educativas disponíveis2 PROT-AML – Plano Regional de Ordenamento do

Território da Área Metropolitana de Lisboa. Resoluçãode Conselho de Ministros n.º 68/2002, de 8 de Abril.

3 PDM-Plano Director Municipal. DL n.º 380/99, de22.09, alterado pelo DL nº. 316/2007, de 19 de Setembro

4 Lei N.º 159/99 de 14 de Setembro e Decreto-Lei N.º 7/2003 de 15 de Janeiro.

5 Lei N.º 46/86 de 14 de Outubro.

6 Departamento de Avaliação Prospectiva e Pla-neamento/ME, Fevereiro 2000. Direcção Geral doOrdenamento do Território e DesenvolvimentoUrbano. Colecção Divulgação n.º 9, 1997

7 Direcção Geral da Administração Escolar/ME

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a nível municipal respondam à oferta efectivaque ao mesmo nível se manifestar (ponto 1).

2 – Promover o desenvolvimento do pro-cesso de agrupamento de escolas, com vista àcriação nestas das condições mais favoráveis nodesenvolvimento de centros de excelência e decompetências educativas, bem como as condi-ções para a gestão eficiente e eficaz dos recur-sos educativos disponíveis (ponto 3).

A questão do ordenamento da rede educa-tiva tem como um dos seus três princípios aexpressão territorial:

«entendida como a distribuição dos estabeleci-mentos dos diferentes níveis de educação e deensino, de acordo com a divisão administrativado País, tendo em atenção factores resultantesdas características geográficas do território, dadensidade e da idade da população a escolarizar,do nível de educação e de ensino em questão eda necessidade de assegurar a racionalidade ecomplementaridade das ofertas» (Decreto-lein.º 7/2003, de 15 de Janeiro, art.º 15, alínea C).

Neste âmbito emerge o conceito de Terri-tório Educativo, como o espaço geográficoque assegura o cumprimento da escolaridadeobrigatória.

A dinâmica da política educativa na defini-ção e estimulação da Carta Educativa perfila-acomo um imprescendível instrumento de pla-neamento sustentado num diagnóstico localexigente. É com o Ministério da Educação,através dos seus organismos central e regio-nais, que se desenvolvem orientações para adefinição das estratégias processuais de acom-panhamento à elaboração e à avaliação daCarta Educativa, que culminam com a suahomologação.

Foi ainda necessário criar os mecanismosfinanceiros de apoio à sua concretização bemcomo para as propostas decorrentes do pro-grama de execução. Para esta fase, os Municí-pios com a sua Carta Educativa homologada

ficaram aptos para o acesso ao concurso definanciamento no âmbito dos Programas Ope-racionais inseridos no Quadro de ReferênciaEstratégico Nacional (QREN), que constitui oenquadramento para a aplicação da políticacomunitária de coesão económica e social emPortugal para 2007-2013.

1.2. Enquadramento do Programa aosCentros Escolares – Um percursode continuidade

O Programa Nacional de Requalificaçãoda Rede do 1.º Ciclo do Ensino Básico e daEducação Pré-escolar visa garantir a igualdadede oportunidade de acesso a espaços educati-vos de dimensão e recursos adequados aosucesso educativo. Privilegia-se assim a reor-ganização da rede de escolas, identificando,num trabalho de proximidade com as autar-quias as acções de recuperação, reconversãoou construção de estabelecimentos de educa-ção e de ensino.

Neste contexto, foram mobilizados signifi-cativos recursos financeiros, disponibilizadospelo QREN, de forma a possibilitar o cumpri-mento deste objectivo de política educativa.Todavia, não podemos descurar o facto de terhavido municípios que avançaram com o seuplano de execução sem recurso ao Programa,mobilizando para tal recursos e estratégias,tendentes a prosseguir os objectivos consigna-dos na sua política educativa local.

A intervenção na rede escolar do ensinobásico e da educação pré-escolar a efectuar,quer em zonas rurais, quer em zonas urbanasengloba dois tipos de acções8:

8 M.E. (2007). Pressupostos de Enquadramentodo Programa Nacional para o Reordenamento daRede Escolar do Ensino Básico e da Educação Pré-escolar. http://www.centroescolar.miedu.pt/np4/file/9/programa_i.pdf

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1. Nas zonas de baixa densidade, a inter-venção deverá contemplar a construçãode raíz de uma ou mais escolas com 1.ºciclo ou na requalificação de escolas jáexistentes em áreas geograficamentecentrais em relação a outras escolas de1.º Ciclo de reduzida dimensão. Após aconstrução dos centros escolares ficarãoreunidas as condições necessárias parapromover a suspensão do funciona-mento das escolas com 1.º Ciclo depequenas dimensões.

2. A criação de novas condições de funcio-namento nas escolas com 1.º ciclo situa-das em zonas urbanas caracterizadas emmuitos casos por uma elevada taxa desobreocupação, passa, necessariamente,pela opção estratégica de, em determi-nadas localidades, apostar na construçãode novas escolas que integrem o 1º cicloe a educação pré-escolar, sempre naperspectiva de Centro Escolar, bemcomo, pela requalificação dos espaçosescolares já existentes.

Qualquer uma das possibilidades de inter-venção concorrerá para que venha a ser alcan-çado o desejável descongestionamento doregime de funcionamento das escolas com 1.ºciclo sobrelotadas, bem como a criação deespaços escolares requalificados e destinadosa outras actividades importantes e necessáriaspara a educação e formação dos alunos. OCentro Escolar aparece-nos definido nos regu-lamentos específicos dos programas operacio-nais das regiões NUT II:

«Entende-se por Centro Escolar, nos termosdo previsto na alínea a) do n.º 2, um equipa-mento escolar que inclua:

• Mais do que um grau de ensino, com vistaà rentabilização de infra-estruturas comuns.

• O exemplo mais comum será o da integra-ção, no mesmo espaço ou contíguo, dos estabe-lecimentos de 1.º ciclo e de Pré-escolar, mas

poderá haver integração também com outrosgraus de ensino;

• Valências de utilização comum ou poliva-lente como sejam biblioteca/sala de informá-tica, cantina/espaço polivalente para reuniões//actividades culturais e de educação física, salade professores/recepção de pais, entre outros;

• Modernização das salas de aulas para uti-lização informática e actividades experimen-tais;

• Espaços exteriores com introdução devedações e segurança, espaços cobertos e espa-ços desportivos quando possível, entre outros.

Estas valências deverão ser adaptadas à rea-lidade socioeconómica da zona e, em particular,à envolvente rural ou urbana» (RegulamentoEspecífico, 2009, art.º 1, ponto 3.)

O início do processo de candidaturas efec-tuou-se a partir de 1 de Dezembro de 2007,com a criação de uma plataforma online«www.centroescolar.min-edu.pt».

Cada município regista as suas candidatu-ras, enviando simultaneamente ou posterior-mente à sua Direcção Regional de Educaçãoas plantas de espaços para a emissão dos pare-ceres técnicos.

O trabalho da elaboração do parecer prévioda Direcção Regional de Educação referente acada candidatura submetida e no estado de«completa»9 enquadra-se nas condições deadmissibilidade e de aceitabilidade das opera-ções previstas no Regulamento Específico –Requalificação da Rede escolar do 1.º Ciclo doEnsino Básico e da Educação Pré-escolar (art.º5.º). No mesmo articulado (ponto 3, alínea b)é referida a intervenção da Direcção Regionalde Educação na análise, como primeira activi-dade do processo, tendo em conta dois aspec-tos: (1) estar contemplada em sede de CartaEducativa Municipal e (2) a análise em termosda evolução demográfica da população esco-

9 A candidatura encontra-se no estado de «com-pleta»

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lar. O processo é finalizado com o parecerfinal dado pelo Gabinete de Estatística e Pla-neamento da Educação (GEPE).

Resumidamente, a Figura 2, p. 117, repre-senta os intervenientes no processo mencio-nado e as suas respectivas acções.

Actualmente existem 704 estabelecimen-tos de educação e de ensino cujas candidaturasao Programa Nacional de Requalificação daRede do 1º Ciclo do Ensino Básico e da Edu-cação Pré-escolar obtiveram parecer favoráveldo Ministério da Educação10.

2. O percurso da autarquia na construção da políticalocal da educação

«A intervenção do poder local em matériaeducativa surge, hoje, como fundamental noprocesso de territorialização educativa» (Prata,2003)

Falámos da dinâmica do poder político aonível macro, num dos domínios da Educação.Todavia no que concerne à Carta Educativaesta é um dos percursos do município na polí-tica de territorialização educativa local. Numquadro de alargamento de competências11,fruto de um código descentralizador iniciadologo após a restauração do poder local, a CartaEducativa é assim o reconhecimento da impor-tância da desconcentração da política educa-tiva, dando aos municípios um papel funda-mental no reconhecimento do que são asdiversas realidades que os caracterizam.

De acordo com Martins (2000) estes têmtido um papel relevante no desenvolvimento

de todo o sistema educativo. Todavia, cadapercurso configura-se diferenciado, apesar dadinâmica instituida pela política educativanacional, sendo visível o esforço desenvolvidono sentido da procura da qualidade e dosucesso na construção da rede educativa local.De acordo com Prata (2003:21):

«estamos, no entanto, conscientes que, com oaumento de competências dos municípios naárea da Educação há uma consciência quecomeça a ganhar caminho entre os actores;«este reforço de competências, obriga a admi-nistração a mudar, obriga a mudar as escolas etambém obriga a mudar os municípios»(Alpoim, 2000:57)».

Quase a totalidade dos muncípios do Paíspossuem a sua Carta Educativa já homologada.De acordo com a informação do Ministério daEducação, através do seu Gabinete de Estatís-tica e Planeamento da Educação12, 275 municí-pios têm a sua Carta Educativa homologada.Dois municípios têm o seu processo concluído,estando o documento em fase de avaliação paraposterior homologação e apenas um municípiotem sua Carta Educativa em elaboração. Emsíntese, o processo de elaboração das CartasEducativas, no momento actual, tem umacobertura de 98,92%, face à totalidade dosmunicípios portugueses do continente.

Podemos, em forma de conclusão, verifi-car que a resposta dada pelos municípios, foifaseada no tempo, levando um período decerca de seis anos entre as normas emitidaspelo poder central e as iniciativas e práticasassumidas ao nível local, no que respeita à ela-boração dos respectivos estudos. Sabemostambém que os diplomas legais preconizam

10 Quando após submissão na plataforma dosCentros Escolares tem como anexos as respectivasplantas de espaços.

11 Fonte: http://www.centroescolar.min-edu.pt/np4mappositivos.

12 Lei n.º 159/99 de 14 de Setembro procurouestabelecer um quadro de transferências de atribui-ções e competências para sa autarquias locais, deter-minando que a concretização dessas transferências seefectivasse através de diplomas específicos.

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Planear o Local

mudanças estruturais com vista à transferênciade decisões para o nível local mas e de acordocom Barroso (1996:109) «apesar dos contex-tos políticos mais ou menos favoráveis, a prá-tica dos actores locais envolvidos é determi-nante para o bom êxito de iniciativas», semdescuidar a importância do impacto do podercentral como dinâmica do processo.

3. Dinâmica e percurso interligados na expectativade um caminho de sucesso – a inter-relação entre a expansão e o desenvolvimento da qualidade da rede educativa

O processo de planeamento dos equipa-mentos de educação e ensino necessita, ajusante, de uma atitude de reflexão e avaliaçãoprospectiva, isto é, deve conhecer as grandestendências e oportunidades preconizadas emestudos estratégicos centrados nos processosde educação e aprendizagem

«onde a escola e os sistemas educativos sejampensados não apenas num plano de resposta aoimpacte das mutações tecnológicas, das tendên-cias demográficas ou das dinâmicas de globali-zação, mas enquanto protagonistas centrais des-tas mutações, (…) participem na construção dasSociedades do Conhecimento e de Educação»(Carneiro, 2000: 5).

No domínio da articulação das políticas daeducação e do ordenamento do território, oEstudo das «Dinâmicas de Contexto – Desen-volvimento Sustentável: as Pessoas, o Espaço,o Ambiente» inserido em «O Futuro da Edu-cação em Portugal – Tendências e Oportunida-des» disponibilizado pelo Departamento deAvaliação Prospectiva e Planeamento do

Ministério da Educação, em 2000, introduz donosso ponto de vista a questão da qualidade noUrbanismo Escolar/Cidades Aprendentes, aorealçar as seguintes condições:

1. As cidades encontrarão hipóteses deregeneração, de se re-urbanizarem e sãoum meio prioritariamente estruturadordas actividades de formação e educação.

2. A sociedade educativa constrói-se a par-tir de cada centro educativo, enquantocomunidade de actores e de agentes demudança que convergem no projectoeducativo.

3. Os espaços escolares deverão ocuparposições centrais no tecido urbano e deve-rão estar bem enquadrados na paisagem edo ponto de vista arquitectónico deverãoser referências na imagem da cidade.

4. Os espaços escolares deverão articular-se com outros espaços cívicos, jardins,pavilhões desportivos e simultanea-mente servir em horários diferenciadosdiferentes grupos etários de população ecom diversas finalidades: formativas,educativas ou cívicas.

5. Existem sinergias entre a imagem daescola e da cidade: escola poderá ser umelemento estruturador no fenómeno deapropriação da nova cidade e ao mesmotempo um instrumento de reabilitaçãodos centros tradicionais das cidadesmais antigas.

6. As redes de comunicação são hoje umaimportante infra-estrutura na construçãodas cidades de aprendizagem, não só porpermitirem a difusão de informação,como por estimularem a aquisição deconhecimentos.

7. A escola deve constituir um ponto con-vergente de cada comunidade, com oqual se podem articular outros espaços:

7.1.) Espaços de trabalho: espaço onde édesejável uma nova atitude por partedos empregados e dos empregadores

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face à necessidade de participaremnum processo de aprendizagem contí-nua. No desenvolvimento deste pro-cesso poderão estreitar-se as ligaçõesentre o território e as empresas, combenefícios para ambas as partes;

7.2.) Espaços de habitar: onde se habita,mas se conhece também o quarteirão,o bairro, a freguesia, etc., se usa oespaço público e se reconhece a Escolaenquanto espaço público de referência;

7.3.) Espaços de lazer: que se articulamcom os espaços anteriores. A aprendi-zagem e o lazer são o binómio – chaveda origem da própria escola, hojeampliado através das actividades extracurriculares, da componente de apoioà família, do desporto escolar, das via-gens, dos consumos culturais, etc.

Considerámos assim pertinente aliar o con-ceito de qualidade a esta temática pela suaimportância, nomeadamente como uma dasprincipais metas a alcançar, quer na perspec-tiva do poder político central quer local, comimplicação na vida futura das suas populações.

Este é um conceito que nos aparece deforma subjectiva e pessoal. Todavia, optámospelo de Pascal & Bertram (1996) citado no«Manual: desenvolvendo a Qualidade em Par-ceria» (2009) como sendo um conceito dinâ-mico e subjectivo, suportado por valores quevariam em função do tempo e do espaço. Aavaliação da qualidade aparece-nos ligada ajuízos de valor, pelo que para que esta se possarealizar melhor, será necessário o envolvi-mento de todos os participantes no processo.

Especificamente no que concerne à CartaEducativa, o planeamento de uma rede educa-tiva participativa aponta para um quadro dequalidade que será validada por todos, nomea-damente crianças, alunos, pais, profissionais ecomunidade.

No quadro teórico para a qualidade, dePascal & Bertram (1996), apresentado pelo

Projecto EEL/DQP13 surgem-nos dez dimen-sões, das quais destacamos a do Espaço Edu-cativo.

«Esta dimensão observa o contexto em quedecorre o processo de aprendizagem. Deve serconsiderado o espaço interior e exterior, tendoem conta as suas potencialidades como ambien-tes de aprendizagem. São recolhidas informa-ções sobre tudo o que diz respeito à disponibili-dade, estado de conservação e adequação dosrecursos, equipamento e materiais educativos.»

Relativamente a esta dimensão e que direc-tamente aparece interligada, numa primeira faseda operacionalização da Carta educativa – cria-ção e/ou requalificação dos espaços escolares,surgem as seguintes questões de investigação:

Qual a área existente? Como é utilizado o espaço?Que recursos e equipamentos existem?Qual o estado de conservação? Como são utilizados? As instalações e materiais são adequados a

todas as crianças incluindo crianças com NEE’s(necessidades educativas especiais)?

Embora este processo de avaliação edesenvolvimento da qualidade seja circuns-crito à educação pré-escolar, consideramosque as perguntas têm pertinência e importân-cia para serem extensíveis aos outros níveis deensino, ministrados em estabelecimentos inte-grados – os centros escolares.

Este é um percurso de continuidade aimplementar pelo poder político central, regio-nal e local, integrado no processo da avaliaçãoda Carta Educativa, o qual deverá reverter afavor da qualidade do sistema educativo.

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13 Fonte : http://w3.gepe.min-edu.pt/CartasPub/

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Planear o Local

Figura 1 – O tempo face à dinâmica e ao percurso da Carta Educativa

Inic

io P

roce

sso

Elaboração Homologação Execução

Monitorização(Avaliação in continuum)

Participação

T1 T2 T3 T4 T5

Figura 2 – Intervenientes no processo das candidaturas ao Programa da Requalificação do1.º Ciclo do Ensino Básico e da Educação Pré-escolar

MUNICÍPIOCandidata-se DRE

Emite Parecer

GEPEEmite Parecer

Candidaturas M.E. Candidaturas POR Conclusão

1. Análise:Caracterização SocioeconómicaCaracterização e evoluçãodo Sistema Educativo

2. Diagnóstico3. Propostas de Reconfiguração/Reordenamento da Rede Educativa

Integra-ção naRede

T6

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Lei nº41/2003, de 22/08 – primeira alteração aoDecreto-Lei que regulamenta os ConselhosMunicipais de Educação e elaboração de CartasEducativas

Lei 54/2007, de 31/08 – 1.ª alteração à Lei 48/98, de11/08

Lei 58/2007, de 4/09 – aprova o Programa Nacionalda Política de Ordenamento do Território

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««««OOOO LLLLUUUUGGGGAAAARRRR DDDDOOOO ““““OOOOUUUUTTTTRRRROOOO”””” EEEE OOOOUUUUTTTTRRRROOOOSSSS LLLLUUUUGGGGAAAARRRREEEESSSS»»»»

João António de Oliveira Gonçalves Rapazote*

Inforgeo, 2009, 119-134

«Como é ser Morcego? A única forma de o saber é ser-se morcego»

Thomas Nagel

«Não há fronteiras para a imaginação compreensiva»J. M. Coetzee

Em Geografia, o espaço (a superfície ter-restre) está presente na etimologia da ciência ena própria definição da disciplina, cuja especi-ficidade sempre se fundamentou num olharatento sobre o território. Em Antropologia,isso foi claro para mim quando iniciei o Mes-trado em Antropologia do Espaço, a expecta-tiva de encontrar outras abordagens ao con-ceito de espaço foi rapidamente concretizadanum outro termo, o Lugar, cuja importânciapara esta ciência me pareceu encantatória.

Se, na Geografia, o conhecimento impera-tivo da inter-relação entre o espaço e a socie-dade que o habita/constrói sempre se confron-

tou com a dificuldade em estabelecer frontei-ras físicas ou conceptuais precisas entre, porexemplo, as dicotomias (clássicas) de espaçonatural/espaço geográfico ou espaço rural/espaço urbano, já na Antropologia é o Lugar,definido como identitário, relacional e histó-rico que se mostra relevante para a sua constru-ção como ciência, Lugar esse que também setorna difícil de circunscrever e conceptualizar.

Na história da Antropologia coube à críticapós-moderna a «desconstrução» da concepçãodo Lugar e da disciplina, quando pretendeudemonstrar a existência de uma metodologiaassente na dupla ilusão da neutralidade doobservador e do fenómeno social observável,ou ainda quando salientou, numa dimensãohistórica mais profunda, a preocupação da cul-tura moderna ocidental com o sentido dotempo, patente no fascínio pelo primitivo e nabusca das origens reflectidos nos conhecimen-tos desenvolvidos por Darwin (a evolução bio-lógica), Nietzsche (a genealogia) ou Freud (oinconsciente) e organizados em volta daarqueologia da história natural e humana.

O Lugar, contudo, não perdeu a sua rele-vância. Instalada a desconfiança sobre a ques-tão das origens, as narrativas fundadas emsequências de desenvolvimento no tempo sãosubstituídas por sequências de relações espa-ciais. Então, o Espaço revela-se na sua exten-

* Técnico Superior de Geografia na Câmara Muni-cipal de Lisboa.

[email protected] Artigo elaborado no âmbito da dissertação de

mestrado em Antropologia do Espaço, intitulada «Ter-ritórios Contemporâneos do Documentário: O CinemaDocumental em Portugal de 1996 à Actualidade»(UNL/FCSH), defendida em Fevereiro de 2007.

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são, consubstancia-se na forma de relações decolocação e desdobra-se numa constelação deconhecimentos, assim rememorando a infini-dade da(s) realidade(s) e a impossibilidade dea(s) explicar na sua totalidade – modéstiaintroduzida nas Ciências Sociais por MaxWeber –, e apontando mesmo para a utopia daunificação da leis fundamentais da natureza oude qualquer outro projecto de conhecimentouniversal.

A curiosidade de outras disciplinas, inclu-sive a Filosofia e as Artes, dirige-se assim paraa «ciência dos Lugares» que é a Geografia,onde pretendem indagar alguns conhecimen-tos e conceitos. É por isso importante relem-brar como também a sua história se fez comum olhar atento a outros saberes, nomeada-mente àqueles que reflectem sobre o territórioe dele dão uma outra perspectiva. Neste artigodá-se um especial realce à visão da Antropolo-gia, assim procurando fornecer pistas de teori-zação do território como conceito cada vezmais complexo e desafiante.

1. Antropologia do Lugar

No célebre conto «A Carta Roubada»2,aquele que é considerado um dos percursoresdo romance policial, Edgar Allan Poe, cria um«enredo» de uma surpreendente e aparentesimplicidade. Passado no lugar de todas asconspirações e «jogos» de poder, a Corte, trêspersonagens circulam em volta de uma cartaque, ao expor-se, se torna transparente. Estacarta possui uma revelação supostamentecomprometedora para uma das personagens,pelo que é capaz de perturbar as relações exis-tentes ao fornecer um forte ascendente noexercício do poder a quem dela se apodere. As

personagens desta narrativa posicionam-se notopo da hierarquia da Corte e definem-se peloseu relacionamento com a dita carta: o rei, quea desconhece e não a vê; a rainha, que a deixaem cima de uma secretária, entre outra corres-pondência e à vista de todos, julgando assimtê-la escondido; e o ministro, que se apercebedo embaraço da rainha, da sua atitude dissi-mulada e furta a carta. O ministro, bem comoo «detective» que ajuda o comissário da polí-cia a desvendar o caso são os elos de ligação àsegunda «série» (virtual) do enredo, «repeti-ção» do mesmo, agora com o comissário no«lugar» do rei, o ministro no da rainha e o«detective» no do ministro, terminando oconto abruptamente com os «lugares» preen-chidos pelas novas personagens.

Jacques Lacan utilizou este conto paraexemplificar o conceito de estrutura e deEstruturalismo, a primazia do significante emrelação ao significado, no qual há uma afirma-ção dos sítios como «primeiros em relação àscoisas e aos seres reais que os vêm ocupar,[mas também em relação aos] papéis e aosacontecimentos que surgem quando eles sãoocupados» (Deleuze, 1995: 262). Este conto éexemplo disso quer porque Poe nunca nosrevela o conteúdo da carta nem nenhuma per-sonagem toma a iniciativa de a ler, quer por-que o enredo, a rede ou estrutura com os seus«lugares» (envelopes a serem preenchidos),existe independentemente das personagensque os ocupam, podendo repetir-se em série e«divergentemente».

Nos anos 1980, Arjun Appadurai fez refe-rência ao conto de Poe, agora justaposto àinterpretação lacaniana, para denunciar a «pre-sença invisível» do conceito de Lugar emAntropologia e a lacuna sintomática do seuquestionamento, frisando que a «importância[do lugar] é dada como garantida e as suasimplicações não foram sistematicamenteexploradas» (1986a: 356), pois o Lugar,objecto perfeitamente paradoxal e deslocadoem relação a si mesmo, sempre circulou pelas

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2 «The Purloined Letter», no original, foi publi-cado pela primeira vez por volta de 1844. A versãoportuguesa consultada pertence a Histórias Extraor-dinárias Vol. II, Publicações Europa-América, 1998.

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diferentes correntes teóricas da disciplina.Esta reflexão crítica do Lugar surge no âmagodo movimento teórico que teve o seu apogeunos anos 1980, movimento que repensou aAntropologia ao ponto de alguns terem detec-tado a sua desagregação em campos e sub-campos sem contacto uns com os outros oucom o todo. A outros, no entanto, essa confu-são de categorias e expressão de caos pareceu-lhes serem somente «os clássicos sintomas dolimiar de uma provável e talvez melhor novaordem» (Ortner, 1984: 127).

Subjacente a essa atitude resignada emrelação à presença do Lugar na consciênciaantropológica estava uma generalização daconcepção de cultura como dimensão local docomportamento humano, assim como a cons-trução de um conhecimento antropológicoligado à ideia de culturas e sociedades depequena dimensão, estáveis, coerentes, fecha-das, a-históricas e localizadas. É certo que avelocidade e a dimensão global em que hoje seprocessam as mudanças e os movimentos decoisas, pessoas e informação, bem como osproblemas que estes fluxos levantam, põemem causa este tipo de conhecimento. Noentanto, o questionamento do Lugar feitopelos teóricos desse movimento também pre-tende revelar a forma como essa asserção estáimbuída de posicionamento político e ideoló-gico, e assim demonstrar a conivência daAntropologia com a história do Ocidente.

De facto, a origem da Antropologia comoramo da história natural que estudava a huma-nidade primitiva no seu estado natural reflec-tiu-se numa naturalização do conceito de cul-tura que permitiu a segmentação conceptualdo mundo em várias culturas, cujas diferençaseram adquiridas em diferentes locais geográfi-cos. Ora, se a construção da Antropologiapassa pelo Lugar onde se adquire outra expe-riência cultural, onde se é Outro, o encontroentre o estudioso do «outro» com o «outro»começa por se dar precisamente aí, nesse lugargeográfica, social e moralmente distante, evi-

dentemente relacionado com a história daexpansão europeia e com o colonialismo. Essacolagem da antropologia aos interesses dedomínio da metrópole, associada ao apelo ini-cial pelo pequeno e pelo elementar, criaram ascondições para o fortalecimento da disciplinaatravés da constituição de temáticas de prestí-gio (a honra nas culturas mediterrâneas, amagia nos ameríndios, as castas na Índia) que,ligadas ao Lugar, rapidamente se transforma-ram no que Appadurai denomina de conceitosgatekeeping, ou seja, na redução metonímicada complexidade de toda uma civilização auma ideia ou imagem que, por sua vez, setorna a quinta-essência desse lugar.

O outro lado desta moeda (a sua cara) é o«nativo» ou «indígena», aquele que mais doque pertencer a um lugar, está encarcerado ouconfinado a esse lugar, quer no sentido físicode imobilidade, quer no sentido ecológico, umavez que a sua ligação ao lugar provém da adap-tação do indígena ao meio envolvente. Mais,esse encarceramento tem uma dimensão psico-lógica, pois «[os indígenas] estão confinadospelo que sabem, sentem e acreditam» (Appa-durai, 1986b: 38), ou seja, o pensamento quelimita os «nativos» é ele próprio ligado aolugar e por ele circunscrito. Claro que os «indí-genas», essas pessoas confinadas pelos lugarese aos lugares a que pertencem, sem contacto econtaminação pelo mundo mais vasto, nuncaexistiram, sendo antes uma construção da ima-ginação dos antropólogos, que tornaram esseslugares em «prisões» ao associarem-lhes ideiase imagens capazes de ofuscar outros aspectosou diferenças e ao simplificarem a sua comple-xidade e abolirem quaisquer tipo de fluxos coma envolvente exterior.

AAntropologia formatou-se, assim, como aciência de um Outro mais Outro que outros,aquele que está longe e de cuja cultura se real-çam os rituais indígenas e os fenómenos deinversão de valores, ou seja, o exótico, igno-rando-se os contactos da cultura estudada como exterior e as realidades translocais ou fami-

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liares ao antropólogo, como é o caso dos efei-tos do colonialismo. Na realidade, quando estu-dar uma cultura passava por evidenciar as suasdiferenças, a sociedade de origem ou os fenó-menos com ela relacionados passavam desper-cebidos ao antropólogo, eram demasiado trans-parentes para se revelarem como objecto deestudo, nisso se equiparando à mencionada«carta roubada». Para o olhar antropológico o«mesmo» era invisível ou, na sua terminologia,«sem cultura», o que permitia a ocorrência tal-vez absurda de homens «sem cultura» andarema estudar homens «sem história».

Mas o que esta invisibilidade do «mesmo»denotava era a percepção duma sociedadehomogénea, «totalizante» e de certa forma«acabada», que não concebia a Alteridade noseu interior, pelo que as diferenças interiores eo carácter problemático duma cultura só foramevidenciados com o aprofundamento da noçãode cultura e a introdução do par norma/desvio,trazendo à superfície o facto de todas as cultu-ras reconhecerem várias formas de desvio elhe atribuírem diferentes estatutos.

Ora, se a visibilidade interior da transgres-são ou mesmo da inversão tornaram relativa anoção de cultura ou sociedade como totalidadeconsumada, um dos primeiros efeitos da refle-xão sobre o papel do Lugar na Antropologiafoi o combate à antologia de imagens cons-truídas que associam um grupo e um lugar aum conceito, que depois se torna a sua quinta-essência, em especial em contraste com outrosgrupos ou lugares. Consciente da mudança deparadigma aqui implícita, Appadurai tratou declarificar a sua posição, assumindo que nãoestava em causa destituir a Antropologia doLugar, antes havendo a necessidade da teoriaantropológica ser transformada no local e como Lugar, partindo assim para uma concepçãorenovada deste.

Dito de outro modo, o que a crítica deAppadurai ao papel (de carta) do Lugar naAntropologia revela, em termos de conceito eteoria, é alargado ao método e à prática antro-

pológica com a denúncia da concepção de«trabalho-de-campo» desenvolvida nos princí-pios do século XX por Bronislaw Malinowskye pelo Funcionalismo, cuja suposta eficáciainstrumental tornou-se preponderante nestaciência durante várias décadas.

O contributo de Akhil Gupta e James Fer-guson3 vem precisamente do seu posiciona-mento mais pragmático em relação ao Lugarem Antropologia. Para estes autores, a aborda-gem Funcionalista da naturalização da cultura,em que os elementos constitutivos pretendemresponder à satisfação das necessidades essen-ciais do Homem, reforçou a já referida segmen-tação conceptual do mundo em várias culturas.No entanto, lembram, se esta foi uma correntedominante na Antropologia, na sua históriahouve outras que desde cedo encararam a pos-sibilidade de um Lugar e de um Outro mais pró-ximos ou diferentes dos do «método»4. Entreessas correntes mais heterodoxas de observar o«Lugar», Gupta e Ferguson (1997) apontampela atenção que davam ao contacto entre cul-turas, ao movimento e às mudanças – aquiloque o «método» recusava ver – o caso do Difu-sionismo (contra o qual se ergueu justamente otrabalho-de-campo malinowskiano) e dos Estu-dos de Aculturação. Ambos punham em causaos limites claros do espaço do Outro, do estarem «casa» e do deslocar-se ao «campo»: nocaso do Difusionismo, pelo facto de mostrarinteresse por contextos políticos e económicosmais vastos e por sequências históricas dinâmi-cas; no caso dos Estudos de Aculturação, por sepreocuparem com as culturas crioulas.

Na sua abordagem, estes dois antropólogosrecordam ainda que o vocábulo «campo» asso-ciado à expressão «trabalho-de-campo» man-tém a ligação às suas origens na história natural

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3 Uma dupla de Antropólogos revelada já nadécada de 90.

4 Sintomaticamente, no jargão antropológico ométodo de trabalho de campo etnográfico de Mali-nowsky é referido apenas como «o método».

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através do seu duplo sentido conotativo, sejacomo lugar agrário (um lugar cultivado masnão muito longe da natureza, todavia separadodo urbano e do industrial), seja como ramo teó-rico da Antropologia (onde se estabelecem rela-ções entre certos temas e certas áreas culturais).As consequências desta ligação atávica acaba-ram por persistir nas práticas da disciplina, querpela manutenção do estabelecimento da separa-ção entre «casa» e «campo» e, por conseguinte,da demarcação de tarefas entre uma (a escritaanalítica, reflexiva, teórica e intertextual feitana academia) e outro (a escrita crua, fragmentá-ria, repleta de reacções subjectivas, feita isola-damente, perto da experiência, em condiçõesdifíceis); quer pela insistência em valorizar cer-tos conhecimentos em detrimento de outros,nomeadamente daqueles derivados da expe-riência no terreno, da relação face-a-face doobservador-participante com os seus informa-dores, em oposição ao conhecimento de fenó-menos menos «localizados», como os translo-cais ou familiares ao antropólogo; quer até,mesmo que paralelamente, pela obstinação naconstrução de um sujeito/antropólogo norma-tivo, masculino e Ocidental.

2. Outros Lugares: Heterotopias e Não-Lugares

Apresentado o contexto mais recente dacomplexificação da noção de Cultura e da con-sequente problematização do conceito deLugar, é possível a aproximação ao que, aindanos anos 1960, Michel Foucault designou porHeterotopia e ao que mais tarde, já nos anos1990, Marc Augé classificou por Não-Lugares.

2.1. As Heterotopias

No texto em que ficaram inscritas as pala-vras ditas numa conferência realizada em1967, Foucault (1984) começa por salientar a

diferença de paradigma entre o século XIX (oséculo do tempo, da história, da extensão, doprogresso linear) e o século XX (interpoladopelo espaço, o lugar, a posição, o simultâneo,a rede e a justaposição), a qual muito deve aoEstruturalismo e às ligações que este estabe-lece entre elementos dispersos no tempo, numespaço que faz dos indivíduos encruzilhadas.Ao contrário do tempo, aparentemente já des-sacralizado, a presença oculta do sagrado per-mite ao espaço onde se vive, e na prática5, sercarregado de qualidades distintivas dadascomo adquiridas e afirmar-se por binómio ouoposição – espaço público/espaço privado,espaço de lazer/espaço de trabalho –, consti-tuindo-se assim em sítios passíveis de seremdefinidos pelas «séries» ou grelhas de relaçõesque os delineiam.

O realce, todavia, vai para essa nova confi-guração do espaço que joga a sua definiçãocom a Utopia, um espaço irreal na medida emque é uma localização sem lugar real, com aqual tem em comum a «propriedade de estarem relação com os outros espaços de umaforma que suspende, neutraliza ou inverte asrelações que os definem» (1984: 6). Nesta«nova» configuração espacial todos os outrosespaços existentes na cultura em causa são, àsua vez, representados, contestados ou inverti-dos, mas, ao contrário das utopias, são espaçoslocalizáveis – fora de todos os lugares mas loca-lizáveis. As heterotopias são, portanto, uma«espécie de utopias realizadas efectivamente»(Foucault, 1984: 6), tornadas «visíveis» numcontexto em que o quadro unitário de referênciada história universal é posto em causa por uma«explosão do sistema», consequente à tomadada palavra por «culturas diversas – com a pes-quisa antropológica, a descolonização – e por«subsistemas» internos à própria cultura oci-dental» (Vatimo, 1992: 72). É possível entãodizer que as heterotopias surgem duma «preci-

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5 «Segundo Foucault, tudo é prática» (Deleuze,1998: 103).

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pitação» quase química da Utopia, quando estaperde a capacidade de estar suspensa no sentidode progresso que pressupõe e se deposita nosolo numa multiplicação de lugares diferentes.

Trata-se, pois, de um neologismo para oqual Foucault cria uma espécie de ciência,uma «descrição sistemática» que estabelecealguns princípios que as heterotopias assu-mem, o primeiro dos quais refere que todas asculturas criam este tipo de espaços absoluta-mente outros. Nas sociedades ditas primitivas,as «heterotopias de crise» são locais reserva-dos aos ritos de passagem, aos indivíduos emtransição de classe etária, de estatuto social,sendo substituídas nos nossos dias pelas «hete-rotopias de desvio», ou seja, pelos sítios «ondese colocam os indivíduos cujo comportamentoé desviante em relação à média ou à normaexigida» (Foucault, 1984: 7).

As heterotopias também têm uma funçãoem relação ao espaço envolvente e possuemum funcionamento específico e determinado.A função pode ir da criação de um local de ilu-são, que se contrapõe ao ilusório espaço real,até à criação de um local de compensação, umoutro espaço real tão perfeito e meticulosocomo o envolvente é imperfeito e desorde-nado, o que faz recordar as tentativas de con-cretização de utopias de raiz política e ainfluência das suas propostas nas soluções daarquitectura e do urbanismo modernos6, ou atentativa «exemplar» de ocupação dos territó-rios colonizados. Já o funcionamento das hete-rotopias ao longo do tempo pode exigir umacapacidade de adaptação às circunstâncias his-tóricas, de que o exemplo da prisão adianteapresentado é sintomático. Antes, contudo,prossiga-se com a característica «heterotó-pica» que é a capacidade de certo tipo de espa-ços justaporem num mesmo local real várioslugares incompatíveis, nisso quase se pare-

cendo com a configuração espacial borgesianado Aleph7, onde cada coisa é infinitas coisasporque vista de todos os pontos do universo.Mas é quando as heterotopias instalam ruptu-ras temporais que se revelam na sua plenitude,num percurso que vai da acumulação dotempo (a eternidade) ao efémero (o presenteabsoluto).

Portanto, encontra-se sempre uma Hetero-topia no local de passagem, de desvio, que temuma função ilusória, de compensação, um fun-cionamento próprio, adaptável, uma capaci-dade de justaposição de espaços, de tempo, eque por tudo isso possui um sistema de aber-tura que a torna penetrável, bem como um deencerramento que a isola, que faz com que ouse vá para lá compulsivamente ou só se entrecom permissão ou submissão a qualquergénero de rito.

Esta configuração espacial é complexa emesmo inconsistente quando se pretendeaplicá-la, como ela exige que se faça, sem cairna tentação de vulgarizar estes «espaços dife-rentes» – o que no limite faria do espaço dasnossas sociedades um conjunto de heteroto-pias. Embora a sua instituição ou construçãoemane do poder vigente, o Estado e a socie-dade dominante8, ou de grupos e subculturasmais ou menos «marginais», elas não deixamde ser «minoritárias» no sentido deleuziano dotermo, pois ao exigirem o tipo de «ligaçãoestranha» estabelecida aquando da formaçãode uma «atmosfera», «que aproxima os cor-pos, que envolve, enleia, obriga a entrar numoutro mundo» (Gil, 2002: 26), também impli-cam um devir, dado que o contacto com essaatmosfera «des-loca» e faz com que os indiví-duos percam as referências espaciais e tempo-rais do momento anterior.

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6 Como é o caso dos socialistas utópicos doséculo XIX, com o Paralelograma de Owen ou oFalanstério de Fourier.

7 «Lugar onde estão, sem se confundirem, todosos lugares do mundo, vistos de todos os ângulos»,segundo a versão portuguesa em I Obras Completas,1923-1949, Editorial Teorema, 1998.

8 Para Foucault esta distinção é uma limitação.

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Os exemplos concretos de heterotopiasfornecidos por Foucault são o Colégio, o Com-boio, o Hotel, a Clínica Psiquiátrica, a Casa deRepouso ou de Retiro (Lar de Idosos), a Pri-são, o Cemitério, o Teatro, o Cinema, o Jar-dim, o Museu, a Biblioteca, a Feira, a Aldeiade Férias/Turística, o Bordel, a Sauna/BanhoTurco e o Motel, mas é ao Navio que Foucaultdá o lugar de paradigma de Heterotopia.

Os casos em que a ideia de ilusão, conso-lação ou desvio «heterotópico» mais se evi-dencia, em que mais se efectiva o seu carácter«rugoso» e dobrado, são precisamente o Colé-gio, a Clínica e a Prisão. No primeiro é mesmopossível encontrar vestígios dos «lugares decrise» sacralizados ou interditos de transiçãodos jovens para a idade adulta, podendo-seassociar-lhe o Quartel militar; a «lua-de-mel»(sempre deslocada para «outro lugar» que nãoo espaço da vida quotidiana), ou as Universi-dades, em particular com a (re)introdução daspraxes académicas, todos exemplares na suainiciação à ordem e à hierarquia estabelecidas.

O Teatro e o Cinema, por outro lado, dis-tinguem-se pelo poder de justapor num lugarreal espaços incompatíveis, quer entre a sala (oespectador) e o palco ou o ecrã, janelas para omundo da representação, quer, já em cena oupor efeito da montagem, entre os espaços ondese passam as diferentes acções do enredo.Também se sujeitam a este princípio o Jardim,a Estufa, o Zoo ou o Aquário/Oceanário, ten-tativas de reproduzir «aqui» o éden perdido ouos diferentes biótopos da terra e do mar.

Já o Museu e a Biblioteca ou a Feira (dediversões) e o Mercado ambulantes são exem-plos de «heterocronias», pois implicam umaruptura com o tempo tradicional, acumuladonos primeiros e anulado nos últimos. Mas tam-bém o são, na sua forma efémera, os grandesconcertos ou festivais de música pop/rock e asfestas ravede música de dança/electrónica quese organizam quase espontaneamente e decor-rem apenas durante um ou dois dias num lugarmais ou menos inesperado, em meio rural, em

espaços industriais abandonados ou criadospara outras actividades. São-no ainda aquelesespaços ligados a esse outro espaço-tempo queé a noite, onde o consumo, o entretenimento eas artes mais variadas se «hibridizam», quan-tas vezes propondo estéticas, éticas e compor-tamentos capazes de «os isolar ou torná-lospenetráveis (...) com uma certa permissão euma vez cumpridos e aceites um certo númerode gestos», justapondo à sua vertente fugaz a«reminiscência espelhada do ilusório» (Fou-cault, 1984: 8). Estes exemplos, contudo, tam-bém podem ser considerados como «heteroto-pias de crise» actuais, locais «distantes» doespaço social de referência quotidiana onde osjovens se deslocam normalmente em grupos eexperimentam(-se) relações autónomas e comoutros em situação idêntica.

Todavia, foi sobre a Heterotopia da prisãoque Foucault (1987) se debruçou com o intuitode analisar a sua transformação entre os sécu-los XVIII e XIX, a qual levou à supressão doespectáculo punitivo – a confissão, o cerimo-nial da pena e a execução públicas –, à separa-ção da justiça da parte violenta do seu exercí-cio e à sua institucionalização e difusão emrede. Foi nesse período que o corpo humano setornou objecto e alvo do poder, nomeadamenteatravés da acção da «disciplina», que separa,analisa e diferencia o que lhe está submetido,que usa um método de controlo minucioso dasoperações do corpo e realiza a sujeição cons-tante das suas forças com vista a torná-lo tantomais obediente quanto mais útil, que o fazoperar como se quer, com as técnicas, segundoa rapidez e a eficácia que se determina.

Assistiu-se, então, à instalação de umaepistemeque prenunciou o regime de produçãoda sociedade industrial, com a sua valorizaçãoda força de trabalho e, portanto, do corpohumano, um fenómeno que provém de umamultiplicidade de processos que se repetem,circulam e se apoiam, formando gradualmenteum método geral que impregna mais ou menosdiscretamente o exército, o colégio, a escola

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primária, o hospital e a fábrica, e em relação acujos mecanismos não pode deixar de se veri-ficar o paralelismo com o processo de «encar-ceramento» de «indígenas» noutros lugares.

Com este exemplo da Prisão pode vislum-brar-se a adaptação de uma Heterotopia aostempos contemporâneos, na medida em quenas sociedades pós-industriais já não é forçosodisciplinar, medir, marcar, segregar e exploraros corpos, apenas se torna necessário controlá-los. Ao perder a função de «reeducar» os reclu-sos, resta à prisão a função punitiva e de con-trolo das massas desempregadas capazes deforçarem a «tolerância zero» das regras domi-nantes, e mesmo essas são cada vez maismediadas pela tecnologia que prolonga os cor-pos ou os incorpora, acabando de qualquermaneira por afastá-los uns dos outros9. A prisãocomo lugar onde se colocam os indivíduos comcomportamentos de desvio torna-se lugar derepresentação dos outros espaços existentes,tão perfeitamente organizado que compensa aimperfeição e desorganização do espaço realenvolvente, sendo por isso delimitada pormuros ou outras barreiras e meticulosamentedesenhada sob alçada do sistema panóptico10.A Prisão passa a ter um sistema de abertura ede encerramento que a isola e faz com que sóse vá para lá sob coacção, capturado. A Prisãopassa a existir «para fazer-nos crer que não étoda a sociedade que é carcerária» (Baudril-lard, 1991: 21), ou seja, torna-se a materializa-ção espacial da forma como as sociedades con-temporâneas lidam com o desvio.

Indo para além do desvio, as heterotopiassão então o lugar do Outro ou o lugar para oOutro, uma pura constatação do Outro aquimesmo, aquela minoria que irrompe de novaspossibilidades de vida que derivam dos pontosde intersecção, das encruzilhadas da geometriaestabelecida pelo espaço social e cultural. Emresultado desta visibilidade, a sociedade oucultura não pode mais ser vista como totali-zante e produtora de «homens médios» – senela existem espaços de fuga, diga-se assim,mesmo que sejam de exclusão, existe Alteri-dade. Com esta tipologia de espaços, o lugardo Outro já não é distante, lá longe, e quandoele está aqui, por perto, torna-se difícil con-finá-lo e, portanto, incapacitá-lo de comunica-ção, de contacto, de captura.

2.2. Os Não-Lugares

Já na década de 1990, Marc Augé (1994)introduziu a noção de «Não-Lugar», que tempontos em comum com as heterotopias mastambém delas diverge. Desde logo porque oNão-Lugar aparenta ser um produto dos tem-pos actuais, expressão máxima daquilo queAugé apelida de «Sobremodernidade» e quecaracteriza pela figura do excesso resultantedas transformações aceleradas do mundo con-temporâneo: i) o excesso de tempo, que resultada multiplicação de acontecimentos que é pos-sível presenciar e/ou observar e da aceleraçãoconsequente da história; ii) o excesso deespaço, que provém das mudanças de escala eda justaposição de espaços decorrentes davelocidade dos tempos contemporâneos; iii) oexcesso de indivíduo, que como receptor detodas essas referências procura interpretá-las,posicionando-se.

Se estas três características da Sobremo-dernidade ajudam a compreender a constitui-ção do conceito de Não-Lugar, este afirma-se,como a própria palavra indicia, pela oposiçãoao Lugar – em particular ao Lugar antropoló-

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9 O cenário delineado aponta a passagem da«sociedade disciplinar» foucaultiana para a «socie-dade de controlo» deleuziana.

10 O Panóptico tem a capacidade de dissociar opar «ver/ser visto» e induzir no indivíduo um estadoconsciente permanente de visibilidade que assegura ofuncionamento automático do poder. Hoje, com ascâmaras de vigilância espalhadas por edifícios detoda a espécie, em alguns casos mesmo nas ruas, jánão é necessária a arquitectura especial de JeremyBentham.

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gico, derivado da «concepção de Mauss dacultura como algo localizado no tempo e noespaço» (Silvano, 2001b: 78) – e define-sepela negativa em relação a ele. Ou seja, se oLugar é «um local cuja forma, função e signi-ficado são independentes dentro das fronteirasda continuidade física», onde, mesmo nãosendo necessariamente uma comunidade, «avida dos respectivos habitantes é marcadapelas suas características» (Castells, 2002:549, 551), já o Não-Lugar, espaço «votado àindividualidade solitária, à passagem, ao pro-visório e ao efémero» (Augé, 1994: 84), «nãoé» um espaço identitário, relacional ou histó-rico e simbolizado.

Onde, pela permanência, o lugar antropo-lógico é produtor de social orgânico, da iden-tidade de uns e de outros, o Não-Lugar cria aidentidade partilhada, provisória, onde aactualidade e a urgência do presente reinam ea história não tem lugar, tudo se passando«como se o espaço fosse ultrapassado pelotempo» (Augé, 1994: 109), onde o indivíduose encontra consigo mesmo numa solidão quepode ser sentida como individualidade oulibertação dos condicionalismos habituais,mas nisso se igualando a todos os outros fre-quentadores desses mesmos espaços.

É nestes espaços de fluxos constituídoscom certos fins ou funções, como o lazer, ocomércio e serviços ou o trânsito, que se vêcom mais evidência o tipo de relacionamentoque os indivíduos estabelecem com e nos não-lugares. Aí é suposto os indivíduos não intera-girem entre si, pelo que a mediação com omeio envolvente é garantida pelos esporádicosagentes investidos de autoridade para «inter-mediar» e/ou estão patentes nos conselhos,comentários e mensagens transmitidas pelosinúmeros suportes audiovisuais que são parteintegrante da paisagem contemporânea. Daíque os limites de um Não-Lugar muitas vezesse materializem no check-in/out, na portagem,na caixa registadora e traduzam a naturezacontratual inequívoca da relação do indivíduo

com o Não-Lugar, sendo à entrada que o indi-víduo adquire o anonimato ou, pelo contrário,sendo à saída, depois de fornecida uma qual-quer prova de identidade, que é identificado,socializado, localizado, podendo portantoaproximar-se dos outros e criar o social.

O Não-Lugar é, portanto, um território dacontemporaneidade com limites definidos,onde os indivíduos vão ou estão em circulaçãoou estada provisória mas que lhes permiteatingir um propósito. Nesse sentido, preen-chem uma função que é exercida na condiçãode permitir ao indivíduo a perda provisória dasua identidade e atingir o anonimato, de per-mitir suspender o jogo social, a história e ascaracterísticas dos lugares que o circundam ouele atravessa, mas acabando sempre por os«mediar», fazendo do antigo, dos exotismos edas particularidades locais um espectáculoespecífico.

Os não-lugares materializam-se, assim,nos meios de transporte e nas instalaçõesnecessárias à circulação acelerada de pessoas ebens (aeroportos, gares), em particular as auto--estradas, viadutos e linhas de comboio de altavelocidade que, destoando da proximidadeentre as «velhas» estradas nacionais ou linhasde comboio inter-regionais e o território queestas atravessam, afastam a paisagem (que setorna no referido espectáculo) e dão aquelaimpressão de passagem de «um filme intimistapara os grandes horizontes dos western»(Augé, 1994: 102).

Os não-lugares incluem ainda os grandescentros comerciais, o hospital, o hotel, o clubede férias e os parques de lazer. Mas é quandoAugé refere que o arquétipo de Não-Lugar é oespaço do viajante, o espaço onde o «indiví-duo se sente espectador sem, verdadeiramente,se importar com a natureza do espectáculo»(Augé, 1994: 92) e o viajante «a figurahumana dessa nova configuração espacial»(Silvano, 2001a: 81), que se vislumbra o enrai-zamento histórico destes espaços na moderni-dade e no seu sujeito modelar, o flâneur, essa

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figura burguesa e masculina erguida por Char-les Baudelaire e Walter Benjamin.

2.3. Territórios da alteridade

As semelhanças – mas também as disseme-lhanças – entre heterotopias e não-lugares sãoinsofismáveis, a fronteira é flexível e porosa,mas para além delas há irredutibilidades quenão serão alheias ao «espírito do tempo», aepistemeem que cada um destes conceitos foiproduzido. Primeiro, as palavras que os desig-nam, ambas provenientes de uma «precipita-ção» da utopia e pretendendo-a «realizada».Mas enquanto a Heterotopia é a sua concreti-zação literal, pela multiplicação dos lugaresdiferentes, daí o significado e a necessidade doneologismo, o Não-Lugar é o seu étimo lite-ral11 mas invertido, na medida em que existe enão alberga nenhuma sociedade orgânica. Háassim uma radicalidade na Heterotopia queexistindo se opõe à utopia e que o Não-Lugarapenas concebe por objecção ao Lugar.

Prosseguindo nesta descrição pendular,tem-se ainda para ambos o carácter provisório,de passagem, a função ou propósito, os limitesassinalados por um sistema de entrada/saídamais ou menos ritual (mas profana) e a per-cepção da alteração do espaço e do tempo.Todavia, o que a Heterotopia pode ser ou terde desvio, de compulsivo, de funcionamentopróprio e adaptável, de permanência histórica,de universalidade, de espessura social e identi-tária (a diferença é identidade), de acumulaçãoou anulação espacio-temporal, o Não-Lugartem de arbitrário (é com alguma iniciativa pró-pria que se lhe acede), de homogéneo (inde-pendentemente da função, há característicascomuns), de contemporâneo, de vazio social,de anonimato e de suspensão espacio-tempo-ral, ou seja, de espe(cta)cular.

Considerando os espaços concretos sugeri-dos como exemplo pelos respectivos autores, asobreposição entre heterotopias e não-lugares énotória nos casos do hotel, do clube ou aldeiade férias e dos meios de transportes – em parti-cular do navio, que para Foucault é a maiorreserva de imaginação e para Augé é o ponto devista ideal do viajante. Mas se o arquétipo doNão-Lugar é o espaço do viajante e nele sepodem englobar as infra-estruturas de trans-porte (vias de comunicação, aeroportos,gares...), as grandes superfícies comerciais e osparques de lazer, não deixa de ser com algumaperplexidade que nele se incluem o campo derefugiados, o «bairro de lata», o hospital, aSauna, o Cemitério, o Colégio ou a Prisão, paracitar alguns exemplos de heterotopias. É quesão precisamente estes os casos em que a ideiaradical da Heterotopia mais se evidencia e oseu carácter «espesso» e dobrado se revela, emcontraste com o que não deixa de se percepcio-nar como uma certa «lisura» do Não-Lugar.

O que o percurso feito até aqui permite tor-nar claro é o deslocamento e interiorização dolugar da Alteridade, já não nos locais distantesdas ex-colónias mas aqui onde afinal o«outro» também sempre esteve. Quando nestemundo globalizado se coloca o problema cadavez mais veemente do lugar dos imigrantes –em «casa», lá na sua terra de onde nunca deve-riam ter saído; ou nos bairros degradados,mais centrais ou periféricos, concentrados emguetos – é pertinente ter em consideração «anecessidade de pensar a identidade e a relação,o si-mesmo e o outro» (Augé, 1999: 138), ouseja, a Alteridade, que é uma questão queinterpela a sociedade como sistema de diferen-ças instituídas (o lugar do «outro outro»), masque também interroga o Sujeito, ele próprioconstruído no discurso e na diferença (o lugardo «outro no próprio») e sobejamente disse-cado pelo pensamento moderno e contemporâ-neo. Lugar que é território para a sociedade eé corpo para o indivíduo, uma possibilidade de(trans)figuração da abordagem ao Lugar

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11 Utopia provém da palavra grega que significa«não lugar», lugar inexistente.

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«como se» fosse corpo, pois ambos são espa-ços habitados «onde as relações de identidadee de alteridade não cessam de actuar» (Augé,1999: 141), recorrendo a esse «como se»(Marcos, 2001) que não esconde nem cria dis-tância, antes medeia toda a possibilidade depercepção do mundo, de apreensão do real eque estrutura toda a relação com as coisas.

Foucault tornou visíveis as heterotopiasquando as enunciou em 1967, ele que afirmavater cada época a sua episteme, os seus enun-ciados e as suas visibilidades, só podendodizê-los ou vê-los em função das suas respec-tivas condições ou na medida em que deles jáestivesse impregnada – qual círculo herme-nêutico. Com a sua pesquisa «arqueológica» ea relevância dada às ciências não estabeleci-das, pôs em prática a prospecção do «saberlocal, marginal, alternativo que deriva a suaforça da dureza com que se opõe a tudo o queo rodeia» (Habermas, 1990: 263), bebendo nopensamento grego a admissão de que «cadadomínio de experiência seja resolvido porprincípios diversos» (Marcos, 2001: 129).Estava-se em vésperas de 1968 e do seu Maioeruptivo e é conhecido o seu posterior inte-resse por novas formas de comunidade, por-ventura em relação com os movimentos dacontracultura americana. As heterotopias,essas «realizações imprevistas, e talvez distor-cidas, da utopia» (Vatimo, 1992: 74), sãoassim o(s) espaço(s) desses saberes, pois todoo conhecimento provém de um lugar, é sobreum lugar (literal ou figurado) e o lugar é posi-ção, «canto» nietzscheano da «completa insta-lação da possibilidade» (Marques, 1989: 44),que é habitado quando frequentado ou queidentifica quando é frequentado.

Na senda do pensamento Estruturalista12

que seguiu a ideia durkheimiana de as ciências

sociais não terem de se preocupar com os indi-víduos, Foucault deu espaço e fez ver os luga-res de manifestação das correntes «desvian-tes» dos indivíduos, conferindo-lhes a capaci-dade de serem preenchidos e de, independen-temente de quem os ocupasse, se repetirem emsérie. Com isso contaminou a pós-moderni-dade com a ideia de um Outro irredutível, deque «o outro não pode ser absolutamente tra-duzível» (Marcos, 2001: 35), esse Outro cujadistinção radical implica o desfazer da noçãoetnográfica de que essa diferença pode serconsumida, ou seja, da Antropologia como«tradutora» de outra experiência cultural.

Este Outro, estrangeiro ou estranho, sendoperturbador por suscitar uma certa impossibi-lidade de relação ou comunicação e conduzir aalguns mal entendidos patentes na questão domulticulturalismo, encontra, todavia, um trata-mento positivo em algumas correntes do pen-samento contemporâneo. Para o filósofoEmmanuel Lévinas, por exemplo, «a estra-nheza do Outro é a sua própria liberdade (...)na medida em que só quando o Outro estáinteiramente em relação consigo próprio é quepode relacionar-se comigo» (Marcos, 2001:178), pelo que o encontro com o Outro é, para-doxalmente, separação – para que não haja(re)apropriação pelo «mesmo» – e isto coloca-o na posição radical de falar da subjectividade«não do lugar do «eu» ou da «relação» mas dolugar do «outro»» (Marcos, 2001: 255). Esteposicionamento acaba por não ser totalmenteestranho a Foucault, ainda que de outro modoe mesmo sem esquecer que as identidades(individuais ou colectivas) são sempre umpouco mais etéreas e voláteis, mais «imagina-das»13 do que uma qualquer sua defesa exa-cerbada possa pretender.

Por tudo isto, admite-se ainda um outroenfoque ao contributo de Foucault para o

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12 Sabe-se que Foucault se auto-excluía de per-tencer a qualquer movimento ou escola de pensa-mento, e no caso do Estruturalismo mostrou mesmoas suas divergências com Claude Lévi-Strauss.

13 Recorde-se o estudo de Benedict Anderson,Imagined Communities: Reflections on the Originand Spread of Nationalism, 1983, Verso.

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movimento de transformação das ciênciassociais e humanas registado nas últimas déca-das. Refira-se, em particular, a apropriação porestas disciplinas das novas percepções do con-ceito de Espaço (e de Tempo) proveniente daFísica e da sua teoria da Mecânica Quântica,surgida nos inícios de 1900, cujo Princípio daIncerteza, relacionado com a localização e omovimento, estabelece a interacção do binó-mio observador/observado, figurado de formafascinante naquele «gato confuso e maluco»(Barrow, 1998: 213) de Schrödinger. Nessateoria, a «Interpretação de Copenhaga»14 dáum estatuto especial ao observador na concre-tização do real, para que faça sentido dizer queo mundo existe, o que em última instânciaimplica a existência de «um «observadorfinal» no fundo do mundo ou no exterior douniverso» (Barrow, 1998: 220).

Mas em 1957 irrompe uma outra versãoQuântica um pouco mais determinista e algohesitante em relação à necessidade dessa«consciência», conhecida como a «Interpreta-ção de Everett»15, afirmando que tudo o quelogicamente pode acontecer acontece, nãoneste mundo mas numa multiplicidade ilimi-tada de mundos reais e paralelos. Não é, por-tanto, possível falar em Universo mas sim emMultiverso, e se à partida os seres humanosparecem estar «confinados a vaguear ao longode um único ramo da nossa realidade esquizo-frénica em divisão contínua» (Barrow, 1998:219), fica em aberto a sua capacidade de inte-ragir com a totalidade da realidade quântica.

Neste sentido, parece plausível interpretaras heterotopias de Foucault «como se» fossema concretização desses universos múltiplosaqui na Terra, dependendo então a possibili-dade de com eles interagir de uma constante

libertação das formas constituídas de expe-riência, da adopção de uma «estética de exis-tência» fundamentada no conhecimento adqui-rido no «lugar». E se esta asserção aparentaremeter para outra que se expôs no início desteestudo, que enunciava a importância do localna aquisição das diferenças culturais, não podecom ela ser confundida, pois se essa partia deum conceito universal de cultura e pressupu-nha um raciocínio dedutivo, esta fica-se peloparticular, sem ambição generalista de qual-quer tipo de conhecimento.

A peculiaridade «foucaultiana» passa,assim, por uma recusa coerente da generaliza-ção da análise, atendendo antes às formas espe-cíficas de experiência continuamente adopta-das e transformadas no Lugar, e que a Antro-pologia acabou por seguir. Como então seexpôs, o ‘indígena’ foi a figura humana que seconstituiu como reflexo em tudo semelhante –numa «série» que se diria «repetida» – aos pro-cessos de subjectivização a que se é sujeito porconceitos gatekeeping, ««individuando-nos»de acordo com as exigências do poder (...) eprendendo cada indivíduo a uma identidadesabida e conhecida bem determinada»16.

A figura possível de constituir em coerên-cia com a análise de Foucault, a haver, irrompedaqueles outros «“processos de subjectivação”que nenhuma sociedade pode banir por com-pleto e desligam os “eus” constituídos emdirecção a “outros espaços”» (Rajchman:2002: 107). Estabelecidas estas condições«estruturais», ter-se-iam então «figuras» (noplural) resistentes a qualquer natureza humanapostulada, capazes de «rebelarem-se contraaqueles métodos pelos quais já estamos defini-dos, categorizados e classificados» (Rajch-man, 1987: 56) e através dos quais as pessoasse tornam governáveis. Estar-se-ia então empresença de figuras «da vida enquanto porta-dora de singularidades, enquanto “plenitude

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14Assim designada e correspondendo à versão dofísico dinamarquês Niels Bohr, o «pai» da MecânicaQuântica.

15 Cujo nome provém do seu autor, o americanoHugh Everett III.

16 Como Emídio Rosa de Oliveira refere numtexto introdutório (Deleuze, 1998: 10).

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do possível”» (Deleuze, 1998: 123), figurasestas pertença de um «“povo por vir”, nascidode uma “desterritorialização absoluta”» (Raj-chman, 2002: 105).

Aqui não há lugar para a unidade sistemá-tica do conhecimento ou do processo histórico;não há lugar para a u(dis)topia ou para a alter-nativa global, que exigem a irreversibilidade daflecha do tempo; não há reformas ou revolu-ções a recomendar, pois tudo é disperso, parti-cular e vem de baixo, do Lugar ou do saberresistente praticado nesse lugar. O «futuro nãoexiste»17 de forma «iluminada» e é já heterotó-pico. Nesse sentido, as heterotopias, opondo-seàs utopias por existirem e se precipitarem emcondições práticas derivadas, não exclusivas,são aqueles «outros espaços» ou «infra-espa-ços» que surgem nas linhas de fuga das inter-secções das coordenadas cartesianas dumespaço social e podem ser encaradas como«contraterritórios relativos ou estratégicos nosentido de uma terra leve que os preceda»(Rajchman, 2002: 105), propiciando uma des-territorialização relativa, provisória, talveznecessária antes da desterritorialização abso-luta de «individuações», etnias e nações.

3. Dos cativos do lugar aos multi-situados

Depois do advento do barco, do comboio,do automóvel, do avião, do telefone, dacâmara fotográfica e do ecrã (de televisão,cinema ou computador), a intensidade e ogénero das interacções daí decorrentes con-frontam todos os indivíduos e todos os povoscom a condição conjunta de vizinhança. Cada

vez mais pessoas ou grupos lidam com a reali-dade de terem de se mover ou de se fixar nou-tros locais – emigrantes, turistas, viajantes denegócios ou em trabalho temporário – ou coma fantasia de se quererem deslocar. Nessaderiva, real ou imaginária, dá-se o confrontocom a Alteridade. O Lugar deixa de ser o«mesmo», aqui ou além. O «mesmo» muda delugar, sendo então outro. E esta instabilidadedo «outro» perturba a identidade. As culturas,como as ideias e as inovações são cada vezmenos passíveis de localização, de fixação, deautenticação. Houve essa intenção enquanto sepensou um sentido para a história, mas a afir-mação de diferentes enunciados e visibilidadespuseram-na em causa.

Quando estuda o Lugar, a Antropologiatambém estuda o espaço «onde esse lugar seinscreve e de onde provêem as influências quetêm efeito no jogo interno das relações locais»(Augé, 1994: 122), uma quase inversão deposição relativamente ao Difusionismo. Guptae Ferguson propõem a transformação da teoriano e pelo Lugar (de Appadurai) por intermédiode um novo método de trabalho que parte deuma visão mais flexível e complexa do Outro,adaptada a «um mundo interconectado, ondenunca se está realmente “fora do [trabalho de]campo”» (1997: 35), onde o significado e adinâmica dos lugares que se habitam se encon-tram em profunda alteração devido ao domínioe à lógica dos espaços de fluxos, aqueles onde«a função e o poder das nossas sociedades seorganizam» (Castells, 2002: 555). A estratégiadesta dupla implica o reconhecimento da inter-venção política da Antropologia, pois mesmoquando esta se situa ou se localiza para estudarum lugar, não pretende uma busca da verdadeao serviço de um conhecimento universal,antes deriva por entre os diferentes posiciona-mentos sociais ou políticos disponíveis, porentre os diferentes tipos de conhecimento(s) nabusca de possíveis alianças e propósitoscomuns. É esta possibilidade de substituição docomprometimento da disciplina com a «locali-

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17 Relembrando o célebre aforismo ‘punk’ (nofuture), movimento (sócio)musical de tendênciasanarquistas que se rebelou contra as sonoridades esta-belecidas do Pop/Rock, ele mesmo uma forma devida, uma estética de existência que criou os seuspróprios espaços.

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zação» por um factor distintivo – baseado naatenção aos assuntos epistemológicos e políti-cos da «posição», do conhecimento, do conhe-cedor e do conhecido – que instala o disposi-tivo necessário às etnografias «Multi-Situa-das», uma justaposição de discursos que soltamamarras e adoptam mesmo a «noção de conhe-cimento comparativo produzido através de umitinerário» (Clifford, 1997: 31).

No seu modelo dos fluxos da cultura glo-bal, Appadurai designou de ethnoscape«a pai-sagem de pessoas que constituem o mundo emmudança em que vivemos: turistas, imigran-tes, refugiados, exilados, trabalhadores convi-dados e outros indivíduos e grupos em movi-mento (...) que parecem afectar fortemente aspolíticas das e entre nações» (1996: 33). Appa-durai refere a ambiguidade do conceito subli-nhando a forma como a percepção, a perspec-tiva e a situação do observador afectam os pro-cessos e a produção de representação, numesquema análogo ao da teoria física da Mecâ-nica Quântica, atrás referida, e afim ao das pai-sagens (landscapes) nas artes visuais ou da«fuga» nas composições musicais18, fazendotambém notar a qualidade não localizada daraiz «etno» – agora rizoma – na «etnografia».

Se os não-lugares de Augé, como espaçosde fluxos e variados trânsitos, podem ser oslocais ideais de observação – mais que deencontro – dos ethnoscapesde Appadurai19, jáas heterotopias de Foucault são os lugares dos«outros» aqui, ou talvez os «outros lugares»por excelência, da Alteridade na Mesmidade.Por isso, ao contrário dos não-lugares, onde aabertura do indivíduo à presença dos outrossurge paradoxal e simultaneamente à reduçãoa si mesmo, é possível ver nas heterotopias a

configuração de lugares antropológicos, bas-tando para tal considerar o jogo social (outro),a afirmação de identidades (a diferença é iden-tidade) e a ligação entre indivíduos (outras)por criação de «atmosferas» que as heteroto-pias proporcionam. Ou pelo menos é possívelconstatar – não sem alguma perplexidade –como algumas parecem oferecer-se, agoranuma perspectiva mais sociológica, comoespaços de afirmação do conceito de habitus20,tornando-se lugares de distinção social.

Por ora, realce-se a intenção notória de Fou-cault em manter o conceito de Heterotopiaaberto a novas apropriações e transfigurações,adaptáveis aos tempos que correm, bem como anoção que o autor tinha da constante praticabi-lidade de ocorrência desta configuração espa-cial. Foi isso que se pretendeu enfatizar quandose deu o exemplo histórico de ajustamentosucessivo da prisão, quando se incluíram nasheterotopias os festivais de música Pop, e tam-bém quando se foi buscar a noção de Não--Lugar. A estes exemplos podem-se ainda asso-ciar as transformações mais recentes ocorridasnos espaços museológicos, onde a componentearquivista, de acumulação perpétua de tempo,rivaliza agora com o efémero do lazer e do con-sumo, ou mesmo fazer referência, nestes tem-pos da desterritorilização da cultura e do desva-necer da identidade (a relação, contudo e comojá se aludiu, é-lhe anterior), àqueles que vêem osurgimento de novas heterotopias no ciberes-paço, chamando a atenção para a «experimenta-ção de novos modos de sociabilidade verificá-veis nos Chats, nos Fóruns e nos e-mail» (Mou-rão, 2002: 76), formalizados em rede e acessí-veis em diversos sites. Resta saber se essa mul-tiplicação de personasremete para a proposta«deleuziana» de um «afastamento do entendi-mento de nós próprios em termos de identidadee identificação» (Rajchman, 2002: 88), que,definitivamente, não é o mesmo que imaginar

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18 É aí que se deve ir buscar o sentido do sufixoscape.

19 Em Lisboa, qualquer ida aos armazéns ElCorte Inglés ou viagem no comboio Metropolitano,em especial aos fins-de-semana, é um deslumbrantetestemunho disso.

20 Conforme definido pelo sociólogo Pierre Bor-dieu.

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ter muitas identidades ou «eus» distintos, pois ofacto é que se assiste nesta Era a um assomorevigorado dos «localismos» e a um apegoexpressivo do indivíduo ao seu corpo, lugar porexcelência de investimento do «eu».

No final dessa célebre intervenção de 1967,Foucault deixou as heterotopias abertas aoimaginário e declarou o Navio a Heterotopiapor excelência. O navio, «rugosidade» do mare clausura à deriva que se liga e desliga aoporto, tem sido lugar de projecção de sonhos eaventuras, de busca de tesouros recônditos, deentre os quais não é de esquecer a «descoberta»de outros Outro21. Hoje, não é difícil observaras heterotopias e os não-lugares como territó-rios da Alteridade que continuam a prestar-se àprojecção do imaginário, em particular do ima-ginário sobre o Outro, seja por serem espaçospassíveis de fácil delimitação, com os seus«mecanismos» de encerramento e abertura;seja por serem lugares suspensos, «terras deninguém»; seja ainda por serem lugares para láde uma zona fronteiriça, onde o «eu» pressenteuma perturbação na comunicação e, comorefere Augé (1994), já não reconhece total-mente os códigos, as condutas, as linguagens,que são de outros. Em todos os casos, a suaexistência real, na superfície terrestre, traz umdesafio à Geografia, que deles se deve ocuparcom conhecimento destas reflexões.

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Planear o Local

21 A duplicidade dos primeiros relatos dos povos«indígenas» dos «novos mundos» de quinhentos, pre-nhes da ideologia do «mesmo», são curiosos quando,segundo Baudrillard (1991), reflectem o dilema daexistência de humanos desconhecedores da palavrade Cristo implicar a «falha» do criador – inaceitável– ou a eliminação da prova dessa perturbação – o seuextermínio.

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AAAA IIIIMMMMPPPPOOOORRRRTTTTÂÂÂÂNNNNCCCCIIIIAAAA DDDDOOOO CCCCAAAADDDDAAAASSSSTTTTRRRROOOO NNNNOOOO PPPPRRRROOOOCCCCEEEESSSSSSSSOOOO DDDDEEEE DDDDEEEESSSSEEEENNNNVVVVOOOOLLLLVVVVIIIIMMMMEEEENNNNTTTTOOOO

UUUURRRRBBBBAAAANNNNOOOO PPPPOOOORRRRTTTTUUUUGGGGUUUUÊÊÊÊSSSS

Carlos Moreira da Cruz*

Inforgeo, 2009, 135-145

Resumo

É ainda vulgar ouvir-se dos agentes ligadosao processo de desenvolvimento urbano portu-guês que o cadastro original é o principal ou umdos principais problemas que se colocam naconstrução de ambientes urbanos de qualidade.

Este artigo tem como objectivo problema-tizar o efectivo papel do cadastro no processode planeamento local português, através deexemplos concretos de iniciativa pública e pri-vada, considerados como significativos nocontexto do sistema de planeamento e deordenamento do território nacional.

Com base na análise feita sugerimos que ocadastro em si mesmo é relativamente poucoimportante quando os agentes privados, esobretudo os públicos, assumem comporta-mentos activos e de qualidade no âmbito doprocesso de desenvolvimento urbano.

1. Introdução

Os objectivos deste artigo são os seguintes:1) analisar os problemas que na prática o

cadastro pode introduzir no processo de desen-volvimento urbano, 2) analisar os constrangi-mentos que provoca no processo de planea-mento, 3) identificar acções do sistema de pla-neamento que permitam ultrapassar os proble-mas identificados, e 4) relacionar a existênciadestes problemas com a qualidade ambientalurbana resultante de diferentes processos dedesenvolvimento urbano.

A metodologia usada parte da investigaçãodocumental sobre o tema para problematizaras questões associadas com recurso a modelosde desenvolvimento urbano, urban develop-ment models, (para uma revisão dos mesmosveja-se Gore, 1991; e Healey, 1991). Apresen-tam-se de seguida estudos de caso de proces-sos de desenvolvimento urbano nos bairrosFeijó (Almada) e Massamá (Sintra) que rela-cionam a importância do cadastro com outrascaracterísticas essenciais dos referidos proces-sos, nomeadamente as variáveis comporta-mento dos diferentes agentes, do planeamentoe do controlo do desenvolvimento.

As limitações deste artigo são grandesdada a quase ausência de estudos sobre a com-partimentação do cadastro urbano e rural e asua influência na produção de espaço urbanosde qualidade. Os estudos encontrados, àexcepção dos realizados por juristas, funda-

* Professor Adjunto da Escola Superior de Edu-cação de Setúbal. [email protected]

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mentalmente sobre os problemas da posse dosolo, incidem no controlo do desenvolvimentourbano. Os dados apresentados referentes aosestudos de caso dos bairros de Feijó e Mas-samá não estão totalmente actualizados, repor-tando-se ao ano de 2008. Contudo esta limita-ção não é muito significativa, sobretudo nocaso de Massamá, porque as alterações ocorri-das são absolutamente insignificantes já queapenas faltava construir um pequeno númerode vivendas. No caso do Feijó, bairro aindarelativamente longe da sua consolidação físicae social, as alterações podem ter sido maiores,mas ainda assim não muito importantes por-que as negociações se encontravam termina-das à excepção de um único alvará de lotea-mento ainda em fase de apreciação.

2. O problema do cadastro: de que falamos quando falamos de cadastro?

Na bibliografia existente sobre o planea-mento em Portugal e sobretudo na prática doplaneamento continua a fazer-se referência àimportância do cadastro no processo de desen-volvimento urbano português. A referência ésempre negativa mas tem múltiplos significa-dos. É preciso então dilucidar o conceito.

O cadastro geométrico e o cadastromultifuncional

De facto do ponto de vista do ordenamentodo território há duas questões relevantesquando se fala de cadastro. Uma tem que vercom a inexistência de um cadastro rigoroso eactualizado do território nacional; a outraconstitui-se em torno dos problemas que arepartição, dimensão, posse e comportamentodos proprietários das parcelas que constituemo território nacional podem ter no contexto do

processo de desenvolvimento urbano. É este otema desta comunicação.

São dois problemas muito diferentes,embora com algumas ligações, uma vez que oconhecimento da posse do solo é fundamentalpara o planeamento e ordenamento do territó-rio. Este problema é fundamentalmente deacesso à informação, ainda assim uma questãorelevante na definição de soluções territoriais.Na prática, cerca de 1/5 do território portuguêsnão tem dono ou a sua posse é desconhecida1.

Na inexistência de informação disponívelactualizada sobre o cadastro, de forma siste-mática, o que se verifica na prática é a neces-sidade de proceder a levantamentos cadastraiscaso a caso para a realização de planos, o queencarece o processo de planeamento, torna asdecisões menos transparentes e o planeamentomais moroso.

De facto a história do planeamento (sobre-tudo do planeamento urbano) e do cadastrotem tido em Portugal uma evolução separada.Porque o desenvolvimento urbano foi excluídoda jurisdição do cadastro geométrico, o quequer dizer que em geral os solos urbanos esti-veram excluídos da jurisdição do antigo Insti-tuto Geográfico e Cadastral e logo não foramfeitas actualizações nos territórios urbanizadosou em processos de desenvolvimento urbano(Borges, 1994: 25). Para além disso, a inicia-tiva de realização do chamado cadastro geo-métrico da propriedade rústica, que decorreuentre 1930 e 1995 foi apenas realizada emcerca de metade do território nacional, e deforma actualizada em apenas 15 % deste.

Assim, e na prática, tal situação deu origema dificuldades acrescidas de gestão territorialpara os municípios, quer para os «urbanos»

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1 Informação prestada em entrevista ao JornalDiário de Notícias pelo Secretário de Estado deOrdenamento do Território, Prof. João Ferrão, querefere a propósito: «É impossível gerir um territórioque não se conhece». Diário de Notícias. 20 de Maiode 2006, p. 29.

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quer para os «rurais», uma vez que não dispu-seram na grande maioria dos casos de informa-ção cadastral actualizada e correcta. Alémdisso os registos actualizados da posse de pré-dios rústicos e urbanos são realizados para efei-tos fiscais nas repartições de finanças e paraefeitos da titularidade da sua posse nas conser-vatórias de registo predial. Em nenhum doscasos é obrigatória a sua representação espacialaquando dos diversos actos de aquisição, peloque a actualização cadastral se faz por inicia-tiva do próprio Instituto. A informação rele-vante para a criação de espaços urbanos apre-senta-se assim fragmentada e de difícil acesso.

Para ultrapassar este problema a Lei deBases de Política de Ordenamento do Territórioe de Urbanismo2 (LBPOTU) e o Regime Jurí-dico dos Instrumentos de Gestão Territorial3

(RJIGT), previram a criação de um sistemanacional de dados sobre o território, articuladoaos níveis regional e local. Esse sistema, desig-nado Sistema Nacional de Exploração e Gestãode Informação Cadastral (SiNEerGIC) foi lan-çado em 2007 em regime experimental4, estaráem princípio concluído em 2016, e espera-seque consiga beneficiar da aprendizagem entre-tanto realizada com a actualização do cadastrogeométrico bem como das iniciativas decorren-tes da aplicação do «malogrado» Decreto-Lein.º 172/95 que apenas cobriu cerca de 1,5% doterritório nacional mas que garantiu o carácterintegrador e multifuncional do cadastro. Trata-se de uma verdadeira revolução que «casará» oplaneamento e ordenamento do território com ocadastro, pela interoperabilidade da informa-ção, e cujo retorno se estima, a 30 anos, em 3,8vezes o investimento a realizar, estimado emcerca de 700 milhões de euros5.

O cadastro no processo de desenvolvimento urbano

Do ponto de vista do processo de desenvol-vimento urbano os problemas que o cadastronormalmente levanta, para além do acesso àinformação são muito diversificados. Entende-mos aqui este processo como sendo a formata-ção do espaço rural e sua passagem a urbanoatravés de diversas fases que envolvem váriosagentes e actores e que termina com a consoli-dação física e social do espaço urbano, no casoportuguês e na actualidade, através do actoadministrativo de recepção das obras no espaçopúblico e devolução das quantias caucionadasem alvarás de loteamento ou licenças de edifi-cação aos promotores e/ou construtores.

Considerar o cadastro implica ter em conta(Figura 1) a posse do solo, a sua dimensão, osusos do solo que são permitidos e as suas con-dicionantes. Implica ainda considerar a acçãodos diferentes agentes no processo, nomeada-mente o Estado (local e central) e os proprie-tários, promotores, urbanizadores e demaisagentes envolvidos. Por isso quando falamosde cadastro estamos a falar também de rela-ções de poder relativamente ao uso do solo.Essas relações também são variáveis em fun-ção da dimensão das parcelas. De certa forma,como numa peça de teatro, do cadastro poderesultar o elenco, a cenografia e parte da ence-nação e do argumento.

Assim o cadastro, de acordo com ascaracterísticas variáveis do sistema de pla-neamento nacional e da procura de espaçosurbanizados que determina sua construçãotem sido apresentado como problema porvários motivos. Pode bloquear a iniciativa deurbanização, arrastar negociações, provocar aurbanização extensiva, promover urbaniza-

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Planear o Local

2 Lei n.º 48/98, artigo 29.º.3 Decreto-Lei n.º 380/99, artigo 147.º.4 Decreto-Lei n.º 224/2007, mas com base na

anterior resolução do Conselho de Ministros n.º45/2006 de 4 de Maio, que lançou as linhas orienta-doras do sistema.

5 Augusto Mateus & Associados, Pricewater-house Coopers (2007) – Conceptualização e concre-tização de uma avaliação económico-financeira ex-ante da implemtação do projecto SINERGIC. 72 p.

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ções com graves carências de equipamentos ede infraestruturas.

Em geral é convicção que, quanto maisfraccionada aparece a propriedade privada,mais difícil é encontrarem-se espaços urbanos

de qualidade porque à dimensão reduzida dasparcelas corresponde um número elevado deproprietários o que dificulta aos promotores eao Estado a realização de planos e projectos.

Relativamente ao tema, em Portugal, a pro-

blemática mais antiga e marcante parece-nos sera que defende a imprescindibilidade de uma ini-ciativa pública forte, envolvendo a posse dosolo. Aposse do solo por parte do Estado resolvede facto o problema da multiplicidade de agen-tes envolvidos, torna mais rápido o processo deconstrução de espaços urbanos, e permite defen-der o interesse público e melhorar a qualidadedos ambientes urbanos através de planos.

Esta corrente radica, pelo menos, na tradi-ção da nossa urbanística formal (Lamas, 1993:p. 281-292) que alia planos de diversos tipos àposse do solo. Muito especialmente a desig-nada «urbanística à Duarte Pacheco» (Gonçal-ves, 1981) que deixou escola em Portugal e nagestão fundiária da cidade de Lisboa, alvo deexpropriações sistemáticas dos anos 30 aosanos 60. De entre as realizações paradigmáti-cas desta corrente podemos destacar os bairrosde Alvalade dos anos 40 e o bairro de Olivais-Sul dos anos 50 e 60. Outro elemento destacorrente é a assumpção do plano formal comoelemento-chave da política urbanística (Sal-gueiro, 1992: 243).

Também na produção de alojamento sãoexemplos que envolvem a posse total do solo arealização e implementação dos Planos Inte-grados do decénio de 70 (Almada, Setúbal eZambujal – Amadora) (Pereira, 1986: p. 74-79)contudo, dado o seu carácter sectorial, não sepode considerar que sejam exemplos «puros»desta convicção, embora ela esteja presente.

Contudo quer a evolução contextual histó-rica do desenvolvimento urbano quer a dourbanismo, tanto em Portugal como na grandemaioria dos países estrangeiros, acabaram porimpor que o modelo de intervenção dos muni-cípios na política de solos através da posse dosolo, obtida por expropriação ou aquisição nomercado fosse progressivamente abandonado.

Neste contexto assumem progressiva-mente maior relevância no processo de urbani-zação outros instrumentos de política de solosque não implicam a posse pública do solo,nomeadamente o planeamento local e regio-nal, os instrumentos de controlo fiscal deescala nacional e local, incluindo-se aqui ospor vezes esquecidos regulamentos de taxas

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Figura 1 – O cadastro como problema, pressupondo-se a iniciativa de urbanização

Parcela Problemas

Posse: número proprietários e seu comportamento,problemas de registo e de limites…

Dimensão: pequena, grande, suficiente ou insufi-ciente para construir…

Uso do solo e condicionantes: urbano, rural, RAN,REN, admissibilidade construtiva…

Estado: planeamento, controlo des. Urbano…

Promotor(es): número, comportamento…

Parcelas

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tarifas, licenças e preços municipais (RTTLP)e as parcerias e iniciativas mistas entre os sec-tores público e privado de que a EmpresaPública de Urbanização de Lisboa continua aser um bom exemplo.

Assim a questão do cadastro no paradigmade posse privada do solo é fundamentalmenteuma questão de qualidade do planeamento ede controlo do desenvolvimento urbano,entendendo-se o planeamento como umatarefa de «síntese possível» das dinâmicas ter-ritoriais, sociais e económicas, e dos seusagentes.

Quanto ao funcionamento do sistema deplaneamento podemos aqui distinguir o pla-neamento propriamente dito consubstanciadoatravés de planos aprovados, e o controlo dodesenvolvimento urbano, definido enquantoprática de gestão quotidiana do uso do solo nomunicípio (Ratcliffe, 1996: p. 29-34).

No essencial, em Portugal e relativamenteàs características do desenvolvimento urbanoassistimos a três tendências diferentes dosanos 60 até à actualidade. A progressiva dimi-

nuição da pressão para urbanizar e a instalaçãode um sistema de planeamento que dotou opaís em meados dos anos 90 de Planos Direc-tores Municipais (PDM) definidores do uso dosolo, e do crescimento do número de Planos dePormenor (PP) e de Planos de Urbanização(PU), ainda assim com uma cobertura muitoinsuficiente do «mapa do sim» (das áreasurbanizáveis). Ao mesmo tempo verifica-se oquase desaparecimento de iniciativas de urba-nização do Estado (local e central).

3. O cadastro no processo de desenvolvimento urbano

Propomos a densificação da questão docadastro relativamente ao processo de desen-volvimento urbano através da utilização de ummodelo síntese de desenvolvimento urbano(Tabela I), de entre os modelos que permitemanalisar o comportamento dos diversos actoresno processo de desenvolvimento urbano.

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Planear o Local

Fases do desenvolvimento urbano

1.ª fase:Pressões para a sua realização

2.ª fase:Avaliação da suaviabilidade

3.ª fase:Implementação

Tabela 1 – Principais variáveis consideradas no processo de desenvolvimento urbano

Variáveis

Situação económica e socialPosse do soloCompartimentação do cadastroIniciativa do desenvolvimento urbanoAgentes envolvidos e seus interesses e objectivosExistência de planeamento prévio enquadrador do desenvolvimento urbanoTipo de planeamento

Política fundiária existenteReacção das autoridades de planeamento e controlo do desenvolvimento urbanoNegociação do desenvolvimento urbanoGrau de controlo do desenvolvimento urbano nas componentes de desenho urbano, redeviária e cedência de solo para a colectividadeAplicação da legislação sobre áreas de cedênciasAgentes envolvidos

Controlo do desenvolvimento urbanoMonitorização do planeamentoNegociação do desenvolvimento urbanoTempo de conclusão das obras de urbanizaçãoAgentes envolvidos

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Este modelo tem a vantagem de destacar asprincipais variáveis no decurso do processo dedesenvolvimento urbano. Algumas são variá-veis contextuais ou de provisão (Gore, 1991)como a iniciativa de urbanizar ligada à procurade espaços urbanos, a posse do solo e sua com-partimentação ligada naturalmente à estruturaeconómica e social local ou regional e a situa-ção económica e social geradora de dinâmicasterritoriais. As outras resultam fundamental-mente do comportamento dos diferentes agen-tes, nomeadamente do Estado (local e central)como principal responsável pela definição doquadro normativo enquadrador do processo, edos agentes envolvidos.

Por outro lado este modelo apresentadiversas fases que permitem problematizar opapel que as várias variáveis consideradas

assumem no decurso de todo o processo dedesenvolvimento urbano.

A questão do cadastro é sobretudo rele-vante durante as primeira e segunda fases umavez que o cadastro pode determinar o númerode agentes envolvidos e o processo negocial. Aúltima fase, da implementação, deriva funda-mentalmente das características da administra-ção urbanística e do seu comportamento face aeventuais mudanças ocorridas nos parâmetrosde edificabilidade, nas tipologias permitidas ena localização das áreas de cedência.

A Figura 2 apresenta um esboço tipológicodas questões que o cadastro pode levantar nummunicípio com PDM aprovado, mas no qualapenas parte desse território se apresentacoberto por PP’s ou PU’s, em contexto deposse privada do solo.

Assume-se ainda, numa perspectiva deactualidade, o que é comum à grande maioriados municípios portugueses com PDM apro-vado. Isto é, que as áreas urbanizadas sãomuito superiores às necessárias de acordo como prospectivado e que não existem instrumen-tos capazes de direccionar ou priorizar as áreasa urbanizar, que em princípio, neste caso deve-rão ser as que têm PU ou PP aprovado.

De facto e pressupondo-se a iniciativa pri-vada de urbanização o problema do bloqueioda iniciativa de urbanização pode existir pelofacto de determinadas parcelas não terem

dono, de existirem conflitos entre os proprietá-rios, como partilhas judiciais ou ajustamentosde limites entre parcelas. Todas estas ocorrên-cias podem fazer aumentar muito o número deanos de preparação das iniciativas de urbani-zação e atrasá-las enormemente. De resto e emcontexto de quase inoperância dos instrumen-tos de política fiscal, a inércia e entesoura-mento passivo podem ser estratégias muitointeressantes e recompensadoras a equacionarno comportamento dos proprietários.

É evidente que para as ultrapassar existesempre a possibilidade de utilizar a figura da

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Figura 2 – Problemas provocados pelo cadastro com posse privada do solo

Controlo do desenvolvimento urbano PU/PP

– Urbanização extensiva– Bloqueio da iniciativa– Morosidade negocial– Diminuição poder negocial– Visibilidade do cadastro no desenho

urbano

– Bloqueio da iniciativa– Morosidade negocial– Difícil gestão da perequação

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expropriação. Hoje essa utilização não é tãolimitada como foi no passado em que ou nãoeram dados aos municípios os meios financei-ros ou os instrumentos legais para tal (Gonçal-ves, 1974) mas continua praticamente a não seraplicada para a produção de espaços urbanospor motivos não apenas financeiros mas tam-bém culturais e políticos (Carvalho, 2003: 400).

As negociações entre proprietários, pro-motores e as autoridades podem também serprolongadas no tempo pela existência de umgrande número de agentes e/ou por teremobjectivos e estratégias diferentes, quer exis-tam PP’s e PU’s aprovados ou não, embora,em princípio, a realização destes planos jádeva ter dirimido o essencial das tensões ouconflitos existentes entre os participantes. Emqualquer dos casos a existência de numerososproprietários traz um esforço acrescido àsautoridades de planeamento em todas as fasesde desenvolvimento urbano.

Outra questão particularmente relevante éa do poder negocial nas diferentes fases dedesenvolvimento urbano. De facto a concen-tração da propriedade na posse de apenasalguns promotores pode trazer dificuldades denegociação acrescidas para as autoridades deplaneamento uma vez que, para realizarespaço urbano, estão mais permeáveis aos seusargumentos. Neste caso e contrariamente aoque a prática habitualmente demonstra o pro-blema não reside na pulverização da posse dosolo mas sim na sua concentração.

O problema da urbanização extensiva noactual contexto em que se procura conter oespaço periurbano, está quase limitado aos ter-ritórios não cobertos por PP’s e PU’s. Estefenómeno acontece dada a atitude permissivados municípios face aos pedidos de lotea-mento não incluídos em planos aprovados(Carvalho, 2003: p. 371-378). Neste caso ocarácter casuístico do planeamento acentua operigo de urbanização extensiva.

Ainda relativamente à urbanização exten-siva há a referir a prática da aplicação da

Reserva Agrícola Nacional (RAN) que conduztambém muitas vezes à criação de espaçosurbanos deste tipo, dependentemente docadastro (Pardal, 2002: 109). O mesmo ocorreem algumas áreas protegidas com parâmetrosde edificabilidade muito baixos. Nestes casoso que acontece muitas vezes é o nem semprediscreto reparcelamento cadastral de formaatingir as áreas necessárias para alcançar a edi-ficabilidade permitida. O mesmo pode aconte-cer em áreas urbanas com edificabilidademuito baixa, nas quais o cadastro muda, emconformidade. Nestes casos está bem patente anecessidade de monitorização e de acesso àsinformações cadastrais para travar dinâmicasdeste tipo. Acesso que, como já se viu, não éfácil atendendo à desactualização do cadastro.

A gestão «dos encargos e benefícios» daurbanização, designada por perequação6 é uminstrumento justo e equitativo que permite queos proprietários de terrenos urbanizáveis nãosejam prejudicados pelo desenho urbano. Masela também pode ser muito dificultada pelonúmero e comportamento dos proprietários epromotores. Porque a perequação implica aredistribuição, pelo menos à escala do PP7, énecessária que as áreas a construir no plano osejam na sua quase totalidade para que haja oque redistribuir. Se parcelas importantes doplano não forem urbanizadas essa tarefaimplica o recurso a meios financeiros ou desolos dos municípios que nem sempre existemou estão disponíveis.

Por último é importante referir os impactesna paisagem do cadastro, que se torna muitasvezes visível não só pelas descontinuidadesestruturais do tecido urbano (estradas, vias decirculação), mas também pelas característicasarquitectónicas e paramétricas, como sejam acontiguidade aleatória de estilos diferentes,

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Planear o Local

6 Introduzida no sistema de planeamento peloDecreto-Lei n.º 380/99.

7 Relativamente à polémica sobre a escala deaplicação da perequação veja-se Carvalho (2007).

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soluções de desenho urbano desintegradas,volumetrias muito diferentes sem transições… Essa situação em princípio só é susceptívelde ocorrer na ausência de PP ou de PU.

4. Dois estudos de caso de iniciativa privada

Foi feita uma análise processual do desen-volvimento urbano de dois bairros da ÁreaMetropolitana de Lisboa, o Plano Parcial 9 (PP-9) (Figura 3), em Almada, iniciado em 1974 eMassamá (Fig. 4), em Sintra, iniciado em 1977.Ambos os processos decorrem em contexto deposse privada do solo e com grande comparti-mentação do cadastro, mas com diferenças mui-tos significativas noutras variáveis designada-mente na atitude do planeamento e no controlodo desenvolvimento urbano.

No Feijó a situação inicial era a seguinte:«Almada foi, nos últimos anos antes do 25 deAbril uma das áreas de Lisboa onde mais se fezsentir o investimento imobiliário, desenca-deando-se um processo de especulação, desviossistemáticos ao cumprimento da legislaçãosobre loteamento urbano, negócios marginais,derrogação das licenças camarárias com suces-siva densificação e ocupação do solo (…) umadesorganização quase total dos processos deloteamento, a referência a compromissos poranteriores administrações não formalizadas nosprocessos ou, pelo menos, indefinidos, o ultra-passar sistemático dos valores fixados nos pla-nos, quando da passagem do loteamento para olicenciamento dos edifícios. Daí que a Câmaranão disponha de um conhecimento rigoroso doscompromissos jurídico-administrativos assumi-dos pelo município, e que o inventariar da situa-ção se torne hoje uma operação difícil e extre-mamente morosa» (CIPRO, 1978: p. 6).

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Figura 3 – PP-9: Divisão cadastral e identificação dos processos de loteamento

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Neste contexto a Câmara Municipal deAlmada (CMA) decide adjudicar a realizaçãode um Plano Parcial de Urbanização assu-mindo assim um comportamento proactivo.Esse plano, embora nunca tenha sido formal-mente aprovado, propôs um desenho unitáriopara todo o território em estudo dessa área deexpansão da recente cidade de Almada e foium dos primeiros do país a aplicar a «pere-quação dos encargos e benefícios». Para oefeito estabeleceu um índice 0.7 de área deconstrução para a totalidade da área do plano.Como resultado e independentemente do dese-nho urbano todos os proprietários tiveramdireito ao mesmo benefício médio.

No caso de Massamá a administração urba-nística foi confrontada sucessivamente comvários estudos de loteamento que, no essencial,pertenciam a dois únicos urbanizadores. Umprimeiro, em parcelas de grandes dimensões(ver Figura 4 n.º 7) daria origem ao alvará 9/77,com uma proposta de reduzidas densidades ecom generosas cedências de terrenos grossomodo correspondentes aos terrenos da futuracidade desportiva e do alvará 45/82. Posterior-mente a câmara viria a receber um Estudo Pré-vio de Urbanização da empresa Pimenta e Ren-deirocom uma planta de zonamento da área cor-respondente aos alvarás dessa urbanização, queavançaria por fases, da primeira à sexta.

Inicialmente a análise processual sugeriaque a repartição das diferentes fases da urbani-zação Pimenta e Rendeiro se fazia de acordocom a divisão cadastral. Parecia assim existiruma espécie de pré-planeamento cadastral, umavez que, embora de forma grosseira, as diferen-tes fases correspondiam a parcelas diferentesdetidas pelo promotor/construtor. É claro queeste caso demonstra que o cadastro não constitui

qualquer pré-planeamento, uma vez que estandotodas as parcelas na posse do mesmo urbaniza-dor ele poderia ter efectuado um plano geralcom um desenho urbano unitário e coerente eum programa de urbanização. Tal não sucedeu.

Contudo, posterior consulta aos mapas1:2000 do cadastro de Massamá, que não seapresenta por não terem leitura a esta escala,deram conta da existência de uma divisão cadas-

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Figura 4 – Massamá: Divisão cadastral principal e identificação do licenciamento municipal

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Feijó – PP 9 Massamá

N.º de fogos 3810 8920*Superfície total (m2) 409513 931372Área de construção (m2) 388497 954284Variação total do n.º fogos entre a 1.ª aprovação e a alteração do alvará (%) -8,17 +29,5*Densidade habitacional (hab/ha) 334 320*Área cedência total/fogo (m2) 131,8 77,4Área cedência equipamentos/fogo (m2) 40,0 12,7

tral original muito maior do que se poderia suportendo como base a análise dos alvarás de lotea-mento, e documentos conexos. De facto o que sepassou foi uma estratégia de emparcelamentopor parte do principal urbanizador da área.

Essa estratégia eliminou os problemas nor-malmente associados ao cadastro, e que naprática urbanística corrente são conotados coma fragmentação da posse do solo, e deu origema um problema diferente.

De facto, apesar dos esforços da administra-ção urbanística de Sintra na análise e crítica àspropostas do principal promotor, as variáveis decontrolo do desenvolvimento urbano eviden-ciam uma aplicação insuficiente das áreas decedência para equipamentos, arruamentos eoutras infraestruturas, bem como a desintegra-ção e incoerência do desenho urbano final. Nasequência de urbanização de Massamá verifica-se a densificação progressiva da primeira para asexta fase, o que também sugere que a concen-tração da posse do solo enfraqueceu o podernegocial da administração.

Por comparação com o caso do Feijó quefuncionou como se existisse um plano apro-vado, ressalta a importância de uma atitude deplaneamento proactiva para assegurar a existên-cia de infraestruturas e equipamentos necessá-rios para a urbanização. De resto uma primeiraavaliação ambiental feita a ambos os bairros(Cruz, 1997) através da utilização de índices eindicadores urbanísticos8 nas componentes de

equipamentos e de espaços públicos evidenciouclaramente a existência de um melhor ambienteurbano no bairro do Feijó (PP-9).

5. Conclusões

Contrariamente à ideia corrente de que ocadastro constitui, ainda hoje, uma espécie depré-planeamento do espaço urbano sugeri-mos que em áreas com densidades médias ealtas tal não se verifica. E isto acontece por-que: a) a pressão para urbanizar e as dinâmi-cas territoriais se alteraram; b) o sistema deplaneamento português é muito mais proac-tivo com tendência por isso a utilizar PP’s (esucedâneos); c) existem instrumentos novos,como a perequação dos encargos e benefíciose as parcerias para urbanizar (Carvalho,2007) que; d) aliados às características decomportamento dos promotores/urbanizado-res facilitam a construção de propostas demaior qualidade.

Quanto à existência desse pré-planeamentonas urbanizações mais antigas, ocorridas num

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Tabela 2 – Síntese dos indicadores urbanísticos e da sua variação no decurso do processo de desenvolvimento urbano

* Incluindo os valores resultantes do licenciamento municipal e dos artigos únicos

8 Veja-se Partidário (1990) para uma primeira apli-cação em Portugal da avaliação do ambiente urbano.

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contexto de deslocalização da população e deintensa urbanização periférica como as deMassamá e Feijó, não existem estudos sufi-cientes para contradizer essa convicção nemtão pouco apoiá-la. No entanto a análise dodesenvolvimento urbano de Massamá, que àpartida sugeria a importância do cadastrocomo estruturante no resultado final, visívelaté na incoerência do desenho urbano e da pai-sagem urbana resultante, demonstrou afinal airrelevância do mesmo, uma vez que a quasetotalidade das parcelas pertenciam a um únicopromotor/construtor.

Neste caso o que se vê, na paisagem, não éo cadastro inicial, à partida muito mais frag-mentado, mas antes um cadastro «privado»resultado do emparcelamento pelo urbaniza-dor que, por motivos atinentes aos seus inte-resses fraccionou e apresentou as suas propos-tas urbanísticas, no essencial como se se tra-tasse de iniciativas dispersas de vários promo-tores e não de um único.

Por último a tipologia apresentada de pro-blemas ligados à questão do cadastro no pre-sente momento sugere a importância na prá-tica do planeamento da existência de um efec-tivo cadastro multifuncional, sobretudo emáreas de baixa densidade, para se poderemalterar regulamentos e soluções em função dealterações na estrutura cadastral. Sugere tam-bém a importância do planeamento activo eproactivo e da consideração atenta do grau derepartição da posse do solo, tanto em contextode controlo do desenvolvimento urbano comono de PP aprovado, uma vez que concentraçãoda posse do solo pode ser mais problemáticaque a sua dispersão, ao contrário do que geral-mente se supõe.

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CCCCOOOOLLLLMMMMAAAATTTTAAAARRRR AAAA DDDDEEEERRRRIIIIVVVVAAAA UUUURRRRBBBBAAAANNNNÍÍÍÍSSSSTTTTIIIICCCCAAAA DDDDOOOO PPPPLLLLAAAANNNNEEEEAAAAMMMMEEEENNNNTTTTOOOO MMMMUUUUNNNNIIIICCCCIIIIPPPPAAAALLLL ::::

RRRReeeemmmmeeeedddd iiii aaaaççççããããoooo oooouuuu ooooppppoooorrrr ttttuuuunnnniiiiddddaaaaddddeeee????1111

Jorge Gonçalves*

Inforgeo, 2009, 147-157

1. Lendo os sinais

Longe vão os tempos dos primeiros planosdirectores municipais – Évora, Ponte de Sor,Vila Real de Santo António, Mora, Moita, … –nos idos anos 70 e princípios dos 80. Semlegislação que os enquadrasse foram sendoarquitectados em profunda interacção com arealidade sobre a qual se debruçavam. As solu-ções concebidas eram dirigidas para as pessoase só depois para os lugares. É interessanterelembrar aqui um artigo2 que veio a afirmar-secomo um contributo central para a crítica doplaneamento em Portugal onde Gonçalves(1986) sublinhava a natural tendência do poderpara utilizar o urbanismo ora de forma mais

policial, com regulamentos rígidos que esparti-lham a prática urbanística ora de forma maisdoce e invisível, através de uma incoerentedefinição de atribuições e competências dasautarquias face aos financiamentos que lhessão proporcionados ou, ainda, através do braçoda Banca, um dos grandes playersno mercadoimobiliário e, por isso, muito interessado noarranjo dos usos e vocações territoriais.

Veio o esforço legislativo buscando anecessária normalização de metodologias,conteúdos, de modalidades e regras de gestão,formalizando a ideia do Plano Director Muni-cipal (DL 208/82, 26 de Maio), ainda impreg-nado pelos ideais do desenvolvimento social eeconómicos saídos da Revolução de Abril.

Com a sua revisão em 1990 surge, de formacrua, o PDM como regulamento administrativoe urbanístico, traço que até hoje nunca mais oabandonou (apesar dos discursos mais oumenos elaborados apontarem para a estratégia epara o desenvolvimento). É isso mesmo queafirma Galvão (2008) quando escreve QUE «oPlano Director Municipal perdeu o pendorestratégico que lhe havia sido atribuído em1982, e foi reduzido a um conjunto de normasconformadoras da realidade física do território,ao ponto de se chegar a entender que, agora, setratava de um Plano de Pormenor à escala

* Instituto Superior Técnico – [email protected] Este texto retoma, adapta e amplia um primeiro

exercício de reflexão sobre o tema desenvolvido paraa Conferência organizada pela Ad Urbem «Os DezAnos da Lei de Bases da Política de Ordenamento doTerritório e de Urbanismo – Génese e Evolução doSistema de Gestão Territorial 1998-2008», Lisboa,LNEC, 12 Dezembro 2008.

2 GONÇALVES, Fernando (1986), «A propósitodos Planos de Urbanização do Estado Novo: Projec-tos Urbanísticos ou regulamentos policiais?», Socie-dade e Território, 4, Porto, pp. 92-115.

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1/10.000. Assim, aquilo que parecia ser umplano de estrutura, de definição de classes deespaços, de reservas, dos grandes canais deinfra-estruturação, passou a ser utilizado comoum plano de gestão urbanística de grande rigi-dez»3. É, obviamente, desnecessário relembrarque o n.º 1 do art.º 86.º do DL 316/2007, de 19de Julho, dispõe que: «O plano director munici-pal é constituído por:a) Regulamento;b) Plantade ordenamento, que representa que representao modelo de organização espacial do territóriomunicipal, de acordo com os sistemas estrutu-rantes e a classificação e qualificação dos solose ainda as unidades operativas de planeamentoe gestão definidas;c) Planta de condicionantesque identifica as servidões e restrições de utili-dade pública em vigor que possam constituirlimitações ou impedimentos a qualquer formaespecífica de aproveitamento». Tudo o demaisserá olvidado, o plano depositado do departa-mento do planeamento urbanístico da Câmaramunicipal e será manuseado unicamente comvista a realizações de carácter material, infra-estrutural e edificatório.

Este instrumento, como a generalidade quehoje se designa por PMOT’s eram centrais navida de uma comunidade, pois eram escassas asoportunidades para reflectir o território, as suasaspirações, o seu futuro e viabilidade. Mas eramtambém centrais num tempo em que a anomiados actores (e isto quando o queriam ser…) eraquase absoluta, a autarquia cumpria só o papelde pilotagem e realizador, de gestor e fiscaliza-dor, de dinamizador e promotor. Os cidadãosassistiam, passivos e até desinteressados, a algocomplexo e facilmente corrompível4.

Esse tempo mudou. Com ele mudou a cen-tralidade dos Instrumentos de Gestão territo-rial, hoje demasiado aninhados numa comuni-dade técnica/científica que tem dificuldade emreconhecer-se num registo de crescente afasta-mento face às expectativas das comunidades.Continua mais próximo de um planeamentoque proíbe e constrange que de um planea-mento pela positiva, que aproveite e integre asoportunidades, que fomente a eficiência colec-tiva na gestão dos recursos territoriais e que jáemerge noutros domínios (cultura, mundoempresarial, rede social, etc.)

A multiplicação dos actores presentes, assuas estratégias, eficácia e eficiência, designa-damente, social e económica mostra bemcomo o tempo da Câmara Municipal, enquantoagente único, acabou. Um outro sinal de fimde ciclo respeita à propensão e complexidadedas «ferramentas» disponíveis localmente parao desenvolvimento, quase sempre com acessoa financiamentos municipais, mas tambémbeneficiando de apoios regionais e comunitá-rios, cuja incorporação nos instrumentos degestão territorial, com os de natureza munici-pal se torna mais difícil.

Os desafios vão ganhando, nesta fronteiraentre planeamento e desenvolvimento, umadimensão nem sempre bem avaliada ou, se sequiser, ainda nem sequer devidamente ponde-rada o que faz com que aquele se tenha vindo aafastar do cerne da vida colectiva, sendo convo-cado apenas para dirimir os processos urbanísti-cos. Estes são, porém, mais o resultado das dinâ-micas do desenvolvimento que o seu catalisador.

Esse desafio é ampliado porque o actualmomento é ainda especialmente complexo jáque a par da intensa competitividade que afectaos territórios (regiões, concelhos, cidades,áreas protegidas) na busca por atenção, investi-mentos, utilizadores, residentes, emprego sur-gem, como em nenhum outro período, dinâmi-cas associativas «oportunistas» procurandoganhar escala e relevância na promoção e valo-rização de domínios concretos.

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3 GALVÃO, Sofia (2008), «Repensar o planea-mento local: Que soluções para a rigidez das normasdos planos municipais?», Comunicação apresentadano Encontro Anual da Ad Urbem – 2008, LNEC,Lisboa (disponível em http://www.adurbem.pt/ima-ges/stories/ficheiros/encontro/SGALVAO.pdf).

4 GONÇALVES, Jorge (2003), ReciproCidade:Apropriação e Exclusão em Urbanismo», Arquitec-tura , nº 2, 2003, Lisboa, pp. 171-312.

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Para além destes movimentos há ainda amarcar a realidade interna de cidades e conce-lhos processos de planeamento do desenvolvi-mento, de responsabilidade municipal mastambém de outras entidades públicas, associa-tivas e privadas, consubstanciadas em Planos eEstudos Estratégicos, de Urbanismo Comer-cial, de Revitalização Urbana, de MarketingTerritorial, Carta Educativa, Plano de Desen-volvimento Social, Plano de acção, Plano deDesenvolvimento Económico, Estudo deOportunidades Económicas, ...

Assim, acção, competitividade e parce-rias/sinergias, são processos muito explícitosno quadro actual do planeamento do desenvol-vimento em Portugal e que suscita interroga-ções face à capacidade do sistema de gestãoterritorial em os integrar e de com eles convi-ver na manutenção da oposição clássica entreo planeamento normativo (apesar dos quadrosnormativos reforçarem agora a ideia de estra-tégia) e planeamento das oportunidades. Éaqui que se incluem os múltiplos trabalhos decarácter operativo, visando a acção, a mobili-zação e o apoio à decisão.

A discussão deve centrar-se, então, emtorno da capacidade ou mesmo do interesse dosistema de gestão territorial em alimentarproactivamente o desenvolvimento ou na suacontinuação num mundo à parte, anichando-seem definitivo no mundo do planeamento terri-torial, deixando os esforços objectivos de reso-lução de bloqueios ou disfunção que afectamas comunidades para outros instrumentos epráticas.

2. Quando o Desenvolvimentodeixou de se pronunciar Planeamento

O planeamento do território é uma activi-dade que se exerce sobre a globalidade dosusos territoriais possíveis sejam eles urbanos

ou rurais e visa uma racionalização no seuconsumo ao mesmo tempo que se preocupacom a compatibilização das diversas voca-ções. O resultado deveria ser a qualificaçãodas áreas envolvidas.

Até 1977, vigorou em Portugal uma legis-lação que, através do Plano Geral de Urbani-zação, apenas incidia sobre áreas urbanaslegando sobretudo muitos ante-planos geraisde urbanização.

Com a entrada em vigor da Lei 79/77, de 25de Outubro surge então um quadro legal quesuscita a atenção para o planeamento muni-cipal. Com efeito, avança-se com a responsabi-lização da autarquia face ao novo modelo desociedade que se estava a desenhar à data. Nãosendo uma lei sobre o planeamento territorialnão se alheou dele propondo que a assembleiamunicipal pudesse, se o entendesse, deliberarsobre o Plano Director (Art. 48.º, alínea i):«Deliberar sobre o plano director do municípioe, se necessário, ordenar a sua elaboração».

Não estando descrito em nenhum outrodocumento legal, na realidade o Plano Direc-tor Municipal nasce juridicamente com oDecreto-Lei 208/82, de 26 de Maio, nasequência da regulamentação da referida Lei79/77. Esta primeira luz sobre o planeamentode escala municipal operou uma revolução nãosó porque veio ocupar um espaço vazio comopela ambição que nele estava contido acercado desenvolvimento social e económico.

Com efeito, logo no seu artigo 1.º, dispõeque «as metas a alcançar nos domínios dodesenvolvimento económico e social domunicípio nas suas relações com o ordena-mento do território, são um instrumento deplaneamento de ocupação, uso e transfor-mação do território do município». Estedesígnio era reforçado logo no artigo 3.º, alí-nea a): «Traduzir as metas programáticasnos domínios do desenvolvimento econó-mico e social, do planeamento territorial eurbano, do fomento das actividades, dasinfra-estruturas e dos equipamentos».

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Já a necessária operacionalização não foitão clarividente propondo-se que fossem con-siderados 12 tipos de espaços e 6 disposiçõesobrigatórias. Esta densidade de exigênciasexplica que no final dessa década de 80 ape-nas 5 municípios5 tenham levado a bom termoa tarefa de elaborar os seus PDM. Terêncio(s/d) adianta mais algumas justificações perti-nentes para este insucesso: «A escassez deinformação de base, insuficiência e desactuali-zação da cartografia e ausência de meios infor-máticos; longo e complexo faseamento (estu-dos sumários, programa preliminar, estudosprévios, programa base, projecto de plano,plano); pouca capacidade das estruturas técni-cas municipais para acompanhar a elaboraçãoe, posteriormente, a implementação dos Pla-nos; reduzida experiência dos gabinetes técni-cos privados aos quais foi adjudicada a elabo-ração dos PDM; falta de preparação da Admi-nistração Regional e Central para coordenartão grande número de PDM; ausência de objec-tivos de desenvolvimento e de ordenamentosupra-municipal e regional; limitado esclareci-mento dos objectivos e âmbito dos PDM».

Justifica-se então que se apresente umanova legislação que simplifique e acelere oprocesso de elaboração do PDM, o que veioa suceder com o Decreto-Lei 69/90, de 2 deMarço, através da eliminação de fases, com-pressão dos estudos de diagnóstico e supressãoda programação de investimentos, agora tor-nada facultativa. Surge o Regulamento Admi-nistrativo, cai a ideia de estratégia e desenvol-vimento socioeconómico.

A aceleração aconteceu de facto permi-tindo chegar ao final da década de 90 com272 PDM aprovados. Mas ela deu-se à contade uma simplificação que também atingiu osanteriores desígnios no campo social e econó-mico. Com se afirmava no preâmbulo do DL69/90, «Urge, (...), proceder à revisão dessa

legislação, de forma que ela constitua um todocoerente e claro, liberte, o mais possível, desubjectivismos a elaboração, apreciação eaprovação dos planos, garanta às populações adevida consideração dos seus anseios e vonta-des e ao Governo a sua adequação ao interessenacional».

Assim, o que se torna relevante para o casopresente é que a dimensão económica e socialque o anterior quadro legal consagrava aoPDM (entendível num contexto de inexistên-cia de quaisquer outros instrumentos depolítica) foi deixada cair focalizada que ficoua lei no PDM como instrumento orientado paraa regulação da ocupação do solo remetendopara montante e para uma putativa flexibili-dade as exigências dali resultantes.

Os objectivos gerais constantes do artigo5.º, ponto 2 mostram bem como agora o pla-neamento territorial, mais que definir metas,servirá sobretudo para apoiar esse desenvolvi-mento estabelecendo um quadro territorialapropriado:

«a) Definir e estabelecer os princípios eregras para a ocupação, uso e transfor-mação do solo;

b) Apoiar uma política de desenvolvi-mento económico e social;

c) Determinar as carências habitacionais,enquadrando as orientações e soluçõesadequadas no âmbito da política dehabitação;

d) Compatibilizar as diversas intervençõessectoriais;

e) Desenvolver e pormenorizar regras edirectivas estabelecidas em planos denível superior;

f) Fornecer indicadores para o planea-mento, designadamente para a elabora-ção de outros planos municipais ou deplanos de carácter sub-regional, regio-nal ou nacional;

g) Servir de enquadramento à elaboraçãode planos de actividade do município».

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5 Évora, Mora, Ponte de Sor, Moita e Oliveira doBairro.

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Apesar de em 2003 a cobertura total doplaneamento concelhio se ter concretizadoatravés dos PDM e não obstante a expurga departe substancial dos conteúdos originais aslimitações continuaram a verificar-se comovolta a sublinhar Terêncio (s/d): «(...) os muni-cípios não ganharam clara autonomia face apareceres e decisões externas, permanecendouma forte tutela de inúmeras entidades, sobreo território; os PDM, se por um lado condicio-nam administrativamente as decisões e inter-venções municipais e do sector privado, poroutro não vinculam a Administração Central àexecução dos investimentos e programas pre-vistos nos planos; o território, como resultadode um sobredimensionamento generalizado dosolo urbano/urbanizável necessário para o pro-cesso de urbanização na vigência do PDM,continua fragmentado, mantém-se a dispersãourbana e a dificuldade em implementar, comeste «modelo» de ocupação, um sistema racio-nal de transportes e infra-estruturas».

Foi criado, neste contexto, a Lei de Basesde Ordenamento do Território e do Urba-nismo (Lei 48/98, de 11 de Agosto) que seriaregulamentada em grande parte pelo Decreto-Lei 380/99, de 22 de Setembro.

Os seus objectivos, no que respeita aoplaneamento municipal, mais uma vezsublinhavam que aqui se trata apenas daconcretização espacial das estratégias dedesenvolvimento de âmbito nacional, regio-nal e local. O artigo 70..º (Objectivos) «a) Atradução, no âmbito local, do quadro de desen-volvimento do território estabelecido nos ins-trumentos de natureza estratégica de âmbitonacional e regional; b) A expressão territorialda estratégia de desenvolvimento local; c) Aarticulação das políticas sectoriais com inci-dência local; (...) h) Os critérios de localizaçãoe distribuição das actividades industriais,turísticas, comerciais e de serviços; (...) i) Osparâmetros de uso do solo; (...)».

Mais uma vez se identifica que o PDMcontinua a não ser produtor de política eco-

nómica e social de base local mas sim o seutradutor espacial. Todavia, como quase sem-pre sucede, a ausência destas orientações obri-gam à realização de estudos de base quesuportem as decisões de planeamento.

Os sucessivos ajustamentos ao DL 380/99,concretizados pelo DL 310/2003 e DL 316/2007foram sendo enriquecidos com alguns novosolhares sobretudo neste último onde, para oPlano Director Municipal, se exige no domíniodo seu conteúdo material (artigo 85.º) «a) Acaracterização económica, social e biofísica,incluindo da estrutura fundiária da área deintervenção;b) A definição e caracterizaçãoda área de intervenção, identificando asredes urbana, viária, de transportes e de equi-pamentos de educação, de saúde, de abasteci-mento público e de segurança, bem como ossistemas de telecomunicações, de abasteci-mento de energia, de captação, de tratamento eabastecimento de água, de drenagem e trata-mento de efluentes e de recolha, depósito e tra-tamento de resíduos;d) Os objectivos dedesenvolvimento estratégico a prosseguir eos critérios de sustentabilidade a adoptar,bem como os meios disponíveis e as acçõespropostas; f) A identificação das áreas e adefinição de estratégias de localização, dis-tribuição e desenvolvimento das actividadesindustriais, turísticas, comerciais e de servi-ços; g) A definição de estratégias para oespaço rural, identificando aptidões, poten-cialidades e referências aos usos múltiplospossíveis;i) A definição de programas na áreahabitacional».

A introdução destas alterações visam darresposta às críticas de ausência de linhas pro-gramáticas suficientemente sólidas que apoias-sem as decisões em matéria territorial. Mas asmúltiplas referências à estratégia não fazeme nunca poderiam fazer dele um plano estra-tégico e, deste modo, tornam inconsequentesestes objectivos. Nem as metodologias adopta-das, nem a análise prévia ou ainda o desenvol-vimento de práticas de participação comuns ao

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planeamento estratégico visando a construçãode um futuro partilhado e consensualizado, sãomobilizadas para os PMOT.

3. Identificar as limitações

As ausências e os equívocos na relaçãoentre o planeamento local e o desenvolvi-mento local fez com que na larga generali-dade estes IGT continuem a ser apenas umregulamento e um zonamento (como aliásconsta do artigo 86.º do DL 316/2007).Aobrigatoriedade de regular um território frag-mentado por vocações muito rígidas deixapouco espaço para um estatuto mais estraté-gico e flexível destes documentos.É a conhe-cida clivagem entre o planeamento norma-tivo e o planeamento de oportunidades, quecontinua por resolver.

As insuficiências enunciadasquanto àsnecessidades do desenvolvimento estão umpouco por todo o lado mas talvez seja útilrelembrar algumas delas:

– O volume das decisões de suspensão ealteração dos PDM é revelador da inca-pacidade destes instrumentos em con-duzir o processo de desenvolvimentoousequer de se ajustar a ele de forma ade-quada. Numa avaliação recente a Quer-cus, identificou entre Setembro de 2007 eOutubro de 2008, 27 suspensões parciais,quase sempre por dois anos e com umaargumentação recorrente, sublinhando a«alteração significativa das perspectivasde desenvolvimento social para o local,incompatíveis com as opções contidas noactual PDM». Aqui cabem razões ligadasa projectos PIN, áreas industriais e empre-sariais ou projectos turísticos. Só residual-mente surgem justificações associadas aequipamentos dirigidos para respostassociais. A revisão e republicação do 380/99 de 22

de Setembro pelo DL 316/2007 de 19 deSetembro não deixa margem para dúvidasquanto à intenção de limitar o acesso àsuspensão e promover a figura da altera-ção: «Procede-se, assim, à reclamadadelimitação conceptual das figuras darevisão e da alteração dos instrumentosde gestão territorial, autonomizando-seprocedimentos específicos de alteraçãoquanto aos instrumentos de gestão territo-rial vinculativos dos particulares. Reser-vando o conceito de revisão para as situa-ções mais estruturais de mutabilidade doplaneamento, pretende-se flexibilizar eagilizar os procedimentos de alteraçãoem função das dinâmicas de desenvolvi-mento económico, social e ambiental,obviando ao recurso sistemático à figurada suspensão do plano» (Preâmbulo);

– Ainda neste levantamento genérico dasinsuficiências demonstradas pelos IGTestão por exemplo, as decisões quelevam a um consumo crescente deáreas de REN para usos urbanos. Maisuma vez a implantação empresarial,turística ou até mesmo urbanística,foram as motivações para esse consumode espaço protegido.

– Mesmo no que de mais profundo havianos objectivos dos PMOT, como o con-trole da dispersão edificada, até aí serevelou a sua incapacidadecomo temsido amplamente revelada e comentadapor alguns dos principais actores do pla-neamento6.

– Se se recuar aos anos 80 e até meadosdos anos 90 observa-se a centralidadeque os instrumentos de gestão territo-rial possuíam no quadro do desenvol-

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6 Cf. SOARES, Luís Bruno (2002), «A reali-dade incontornável da dispersão», Sociedade e terri-tório , 33, Porto, Afrontamento, pp.123-129 e traba-lhos de Jorge Carvalho na Universidade de Aveirorelativos à Ocupação Dispersa do território.

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vimento local sendo quase em exclu-sivo os documentos sobre o qual recaíaa estratégia concelhia, coerente de restocom a primeira moldura legal dos PDM(DL 208/82).

Despojados que ficaram os IGT destasobrigações restava socorrerem-se de outrosdocumentos que podiam ou não existir. Maisuma vez se relembra que mesmo quando osIGT, num assomo de coragem procuram irmais além, encontram dificuldades sériasou mesmo intransponíveis de concretizaçãodas ideias veiculadas porque os seus docu-mentos operacionais não deixam de ser, nocaso dos PMOT, a carta de ordenamento e oregulamento e nos restantes IGT a diferençanão é significativa (mesmo naqueles conside-rados estratégicos).

Refira-se, a título exemplificativo, o caso doPROT-AML onde as consequências da delimita-ção, no modelo territorial, dos espaços motores,

espaços emergentes, espaços problemas, entreoutros, foram escassos apesar do interesse ine-quívoco das propostas que então foram feitas.

4. Os verdadeiros motores dodesenvolvimento local

O vazio que foi ficando quer do empobre-cimento do conteúdo dos IGT em nome deuma maior eficácia e celeridade de elaboraçãoquer de instrumentos que conduzam ao desen-volvimento social e económico, quer de umagradual exigência colocada na gestão dosrecursos financeiros próprios ou disponibiliza-dos por outras instâncias (administração cen-tral, instituições comunitárias, financiamentobancário,...), foi sendo colmatado com progra-mas sectoriais agrupados ou não em sede deplaneamento estratégico.

Muitos destes documentos que foramsendo produzidos no âmbito municipal ou

Figura 1 – Modelo territorial do PROT AML

Fonte: CCDR de Lisboa e Vale do Tejo.

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mesmo regional e sub-regional podem inte-grar-se no que se poderia designar como pla-neamento informal (cf. Gonçalves, 2003) jáque incidem sobre o território mas não deacordo com a matriz de planos formais. Éassim com os planos de mobilidade, acessibi-lidade e estacionamento, com os estudos deurbanismo comercial, com os projectos deespaços públicos, verdes ou mineralizados,estudos de revitalização urbana, etc.

A multiplicação deste esforço deu origem aum leque quase infinito de instrumentos hojena posse de municípios e associações de muni-cípios, cujo levantamento aqui se propõe(embora se saiba já das limitações de uma listadesta natureza):

Social• Carta Social• Programa Local de Habitação• Programa local de emprego/para a empre-

gabilidade• Guia de marketing social• Carta Desportiva• Contrato local de segurança

Educação• Carta Educativa

Saúde• Carta de Recursos para a Saúde

Cultura• Carta Cultural• Plano de desenvolvimento cultural• Carta do Património

Economia• Projecto de Urbanismo Comercial• Estudo de ordenamento das actividades

comerciais • Plano sectorial (turismo, restauração, etc.)

Acessibilidades• Plano de acessibilidade

• Plano de estacionamento• Plano de mobilidade sustentável

Ambiente• Plano verde• Agenda local XXI• Plano de sustentabilidade

Desenvolvimento urbano/territorial• Estudo de enquadramento urbanístico• Estudo estratégico de desenvolvimento

urbano• Estudo de revitalização urbana• Estudo de reabilitação urbana• Plano estratégico de cidade/concelho/sub-

-região• Estudo de enquadramento estratégico• Carta estratégica• Guia de marketing urbano• Estudo de enquadramento a candidaturas

polis XXI• Plano de acção• Plano de protecção civil• Plano de Desenvolvimento Local

Cada um destes documentos encerram emsi próprios metodologias, acções, tempos,financiamentos, parceiros e formas de gover-nação, entre outros recursos, que configuramnovos universos e novas especializações que oplaneamento (estruturas, técnicos, instrumen-tos,…) têm dificuldade em compreender querpor inércia quer por incapacidade de facto.

Para a Carta Educativa percebeu-se cedoque a lógica de programa de equipamentoscolectivos adoptada nos instrumentos de ges-tão territorial poderia metodologicamenteestar correcta para a determinação de carên-cias mas o universo da eficiência necessáriapara o seu funcionamento exigia um outroentendimento que as regras para a elaboraçãoda Carta Educativa vieram permitir. Sugere-se,a título de exemplo, a metodologia seguidapara a elaboração da Carta Educativa daCidade do Porto:

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Para quase todos estes instrumentos seráde imediato possível o seu acesso em temporeal o que faz deles exercícios de excelência aonível do envolvimento e mobilização de von-tades e atitudes mas prolonga o seu efeito paralá do momento da sua elaboração ao ficaremexpostos de modo contínuo ao escrutínio dacomunidade.

A abrangência deste novo planeamentodo desenvolvimento é revelador de uma rea-lidade complexa mas que interessa, paraeste caso, relevar sobretudo:

• o aprofundamento e qualificação dosesforços em domínios não exclusiva-mente territoriais possibilitando a obten-ção e a validação de resultados cujosefeitos nesses campos se têm manifes-tado como nucleares. O território surge

mais como uma matriz de acolhimentodestes esforços e é nessa medida que lheé solicitado o seu contributo;

• a sectorialização desses esforços, amobilização dos actores e da participa-ção pública tem sido uma garantia dosucesso observado para este planea-mento do desenvolvimento com a parti-cularidade dos domínios abordados seterem vindo a multiplicar. Essa preocu-pação de dar resposta a públicos cadavez mais especializados revelou-se ade-quada para seduzir cada vez mais actorese interessados em geral para um exercí-cio activo da cidadania;

• o planeamento territorial não consegueincorporar nos seus instrumentos todaesta riqueza, optando por responder ape-nas às exigências materiais que lhe são

Figura 2 – Metodologia da Carta Educativa para a Cidade do Porto

Fonte: Câmara Municipal do Porto

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colocadas (equipamentos, infra-estrutu-ras, densidades, qualidade ambiental, ...)e, em casos excepcionais, sugerir deacordo com as expectativas manifestadaspelos actores, novas frentes urbanas ou areorganização e requalificação das exis-tentes disponibilizando-as para novosusos.

5. Remediação ou oportunidade?

Não pretendendo esgotar a discussão con-sideramos ser tempo, no entanto, de retomara questão inicial. A constatação do percursoque está a ser feito, de modo generalizado,pelos municípios portugueses (mas inscritonuma dinâmica visível a outras escalas) per-mitindo-lhes munir-se de um leque diversifi-cado de instrumentos para o desenvolvi-mento, com uma qualidade que é observadana sua capacidade propositiva e na sua dimen-são operativa coloca uma primeira questão deimportância prática relativa: a deriva urbanís-tica do planeamento municipal foi uma con-sequência do desenvolvimento local ou a suajustificação?

Parece ficar claro que a resposta não temum sentido único identificando-se contributosimportantes em cada uma das perspectivas.Com efeito, a incapacidade que, em termosgerais, a gestão territorial revelou para darresposta aos imperativos do desenvolvimentolocal seja por limitação do quadro legal sejapela insuficiência do corpo técnico e políticoé visível a olho nú um pouco por todo o lado.Ao mesmo assistiu-se a uma complexificaçãodos mecanismos visando a operacionalizaçãodos processos transformação territorial, bus-cando uma maior celeridade, justiça finan-ceira e fiscal, equilíbrio de custos e receitas ea possibilidade de constituição de parceriaspúblico-privadas.

Mas, por outro lado, existiu um amadure-cimento generalizado no domínio do desen-volvimento, estimulado pelas obrigaçõesresultantes da integração do país na UniãoEuropeia e noutras esferas supra-nacionais, evisível na delimitação dos diagnósticos pros-pectivos, na constituição de parcerias e mobi-lização de recursos ou ainda na montagem deestruturas operacionais e de monitorização.

Esse amadurecimento permitiu algo quenunca foi possível antes: trabalhar em redequer para alcançar níveis mais elevados de efi-ciência quer para ser mais preciso nos resulta-dos aproveitando as mais-valias de cada umdos actores e recursos adoptados.

Se fosse possível estabelecer uma sequên-cia temporal acreditamos que, num primeiromomento, esta divergência de trajecto foi maisuma estratégia de remediação saí da da difi-culdade de dar resposta a problemas comple-xos mas, num segundo momento, o que foiencarado como um problema revelou-se comouma oportunidade essencial para a teia deapoio ao desenvolvimento que se foi tecendo ealastrando a todos os territórios por mais espe-cíficos que sejam e se calhar até mais intensa-mente nesses.

Confirmando-se estes percursos divergen-tes à escala local (e cuja explicação procurou-se sinteticamente demonstrar) a reflexão afazer deve centrar-se na atitude a assumirperante esta realidade antevendo-se, para já,três possibilidades:

• Manutenção do actual distanciamento,penalizando ambos os domínios;

• Condução do esforço para uma maiorintegração, na lógica preexistente mascuja dificuldade se prenuncia dado o graude maturação que ambos os domíniostêm vindo a revelar;

• Estabelecer um quadro de relação queformaliza a distinção mas que garanta aarticulação proveitosa e que ainda estápor fazer.

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OOOO MMMMAAAAPPPPEEEEAAAAMMMMEEEENNNNTTTTOOOO DDDDEEEE DDDDIIIISSSSTTTTRRRRIIIIBBBBUUUUIIIIÇÇÇÇÕÕÕÕEEEESSSSPPPPOOOOPPPPUUUULLLLAAAACCCCIIIIOOOONNNNAAAAIIIISSSS :::: BBBBrrrreeeevvvveeee rrrreeeesssseeeennnnhhhhaaaa

hhhh iiii ssss ttttóóóórrrr iiii ccccaaaa eeee oooossss nnnnoooovvvvoooossss rrrruuuummmmoooossss1111

Filipe Batista e Silva*

Inforgeo, 2009, 159-180

1. Introdução

Um mapa da distribuição populacional deum dado território, para um dado momento tem-poral, deverá ser capaz de representar e comu-nicar ao utilizador uma imagem global quecombine, preferencialmente, os aspectos relati-vos à sua disposição geográfica, aos valoresabsolutos existentes em cada localização e àsdiferenças internas de densidade de ocupação.

A representação cartográfica da distribui-ção do povoamento é um problema que ocupageógrafos e cartógrafos desde há vários sécu-los. Em Portugal, os primeiros mapas conheci-dos do conjunto do território continental portu-

guês são datados de finais do século XVI. Nãose pode afirmar que, nestes mapas, figurasseuma verdadeira e completa representação dadistribuição populacional, pelo menos deacordo com as premissas acima referidas. Mas,numa concepção mais abrangente – condescen-dente até – pode ser admissível considerar quea cartografia da localização das povoações(lugares e cidades) era já uma forma muito ele-mentar de representação populacional.

Com efeito, a cartografia do território por-tuguês dos séculos XVI a XVIII permitia járesponder à questão «onde se localiza a popu-lação?», mas não permitia ainda responder àquestão «qual a quantidade de população resi-dente nos diferentes locais?». O mapa deÁlvaro Seco, usualmente datado de 1561, «é aprimeira representação conhecida do conjuntodo território continental português». Nestemapa são figurados «inúmeros lugares, repor-tados com os seus nomes, umas vezes indica-dos por pequenos círculos, pela sua menorimportância, outras por figurações expressi-vas, no caso das cidades e sedes do poder polí-tico ou eclesiástico» (Dias 2006: 3-4).

É atribuído ao início do século XIX o sur-gimento de uma cartografia temática autó-noma que, a par dos primeiros desenvolvimen-tos da semiologia gráfica, começa a permitir a

* Departamento de Geografia, Faculdade de Letrasda Universidade do Porto.

[email protected] O presente texto foi produzido com base numa

primeira versão, menos completa e coesa, já apresen-tada ao longo da dissertação de mestrado ModelaçãoCartográfica e Ordenamento do Território – UmEnsaio Metodológico de Cartografia DasimétricaAplicado à Região Oeste e Vale do Tejo, de Fevereirode 2009, do mesmo autor. A actual versão beneficioudos comentários e contributos do professor DoutorMário Gonçalves Fernandes, do Departamento deGeografia da Universidade do Porto, pelos quais seexpressa o devido agradecimento.

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ilustração de informações estatísticas de natu-reza demográfica, social e económica (Palsky1996). Com efeito, desde o primeiro mapacoropleto conhecido, a Carte figurative del’instruction populaire de la France(1826),do Barão Pierre Charles Dupin, todo o séculoXIX foi testemunha de um enorme desenvol-vimento e difusão da cartografia temática.Dois outros factos oitocentistas criaram asbases para o arranque da cartografia temáticaem Portugal. O surgimento dos primeirosrecenseamentos modernos à população e odesenvolvimento de cartografia de base degrande rigor científico.

Ainda que tardiamente implementadas emPortugal, as evoluções científicas em geodesiae topografia permitiram, após esforços demo-rados e inconstantes no tempo (cf. Dias 2006:15-22), a conclusão daquele que é consideradoo primeiro mapa moderno do conjunto de Por-tugal Continental – a Carta Geográfica dePortugal, de 1865, à escala 1:500.000. Entreas múltiplas utilidades desta nova base carto-gráfica, conhecem-se a realização de levanta-mentos e representações geológicos e a con-cessão de explorações mineiras, a reforma doscírculos eleitorais, a estimativa mais rigorosada extensão de Portugal Continental e, final-mente, o impulsionamento da restante «carto-grafia temática, como suporte de novas e maisrigorosas representações» (Dias 2006: 21-22).«É a partir de 1863-65, quando se conclui edifunde a Carta Geográfica de Portugal, em 2folhas, na escala 1:500.000 (…), que a carto-grafia temática ganha fôlego no País» (Dias1995: 163-164).

Porque a cartografia de base fornece à car-tografia temática as informações para a cor-recta referenciação espacial dos fenómenos oupadrões temáticos a representar, este ramo dacartografia conheceu um período de grandeexpansão justamente após os desenvolvimen-tos modernos em cartografia de base. Como severá adiante, a par da restante cartografiatemática, a cartografia da distribuição popula-

cional teve as suas primeiras expressõesmodernas em finais do século XIX. Foi, con-tudo, na primeira metade do século XX queocorreu uma muito maior produção deste tipode representações.

Mais recentemente, com o advento e vul-garização das Tecnologias de Informação Geo-gráfica (TIG) a partir das décadas de 70 e 80do mesmo século, e com a sucessiva produçãoe disponibilização de informação geográficaem formato digital, foi possível reinventar asformas de produção da cartografia temática,aperfeiçoar as técnicas e os métodos e gerarprodutos inovadores e de grande utilidade parainúmeras áreas do saber.

Todavia, as necessidades são, hoje em dia,novas e mais exigentes. Produzir uma imagemglobal da distribuição populacional por meiode cartografia, por mais expressiva que seja, econhecer o número de habitantes existentesnuma dada área, num dado momento, não ésuficiente. Para as aplicações mais exigentes eactuais, e no actual contexto das TIG, é neces-sário que a informação sobre população sejacartografada com maior conformidade relati-vamente à realidade geográfica, possua umadequado nível de desagregação espacial, sejasuficientemente detalhada e o formato dedados permita uma fácil integração com outrasbases digitais de informação geográfica.Domínios tão diversos como o planeamento deequipamentos e infra-estruturas, a análise devulnerabilidades a riscos naturais e tecnológi-cos, urbanismo e geomarketingpodem benefi-ciar de novas formas de representar a popula-ção com maior detalhe e qualidade.

Focando muito em particular as expressõescartográficas representativas da distribuiçãoda população em Portugal, este texto percorre,de forma concisa, a evolução das técnicas emetodologias usadas neste domínio da carto-grafia temática, e expõe e discute as tendên-cias técnicas e metodológicas que ganham ter-reno na actualidade, com foco na cartografiadasimétrica.

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2. O mapeamento de distribuições populacionais: breve resenha histórica

Tipicamente, os mapas coropletos e osmapas de símbolos pontuais (como os de pontose os de figuras geométricas proporcionais) têmsido usados para representar distribuições popu-lacionais. Segundo as práticas mais aceites emcartografia temática, os mapas de símbolos pro-porcionais e os mapas de pontos são particular-mente vocacionados para representar valoresabsolutos, ao passo que os mapas coropletos sãomais indicados para representar dados quantita-tivos normalizados, como índices ou percenta-gens (Slocum 2009: 85-89). Por conseguinte,enquanto os primeiros representam valoresabsolutos da população, os mapas coropletossão geralmente usados para representar o índicede densidade populacional, isto é, o númeromédio de habitantes por unidade de área.

Sem a ambição de os fixar de forma defini-tiva, procurou-se propor quatro grandes perío-dos representativos das fases evolutivas da car-tografia da distribuição populacional em Portu-gal. Sublinhe-se que os intervalos propostosnão devem ser interpretados como limites tem-porais rígidos, mas destinam-se, tão-somente,ao balizamento das grandes tendências quemarcaram a evolução deste tipo de cartografiatemática. Como principal critério para a defini-ção dos quatro períodos, tomou-se o predomí-nio de uma ou outra técnica cartográfica.

2.1. O período 1878-1900: o arranquedos mapas coropletos

Um dos primeiros esforços de representar adistribuição do povoamento em Portugal foilevado a cabo pelo engenheiro silvicultor Ber-nardino Barros Gomes, através de um mapacoropleto publicado em 1878. «Também direc-tamente derivado da Carta Geográfica de

1865» (Dias 1995: 165), a Carta da povoaçãoconcelhia de Portugal(Figura 1) pertence auma colectânea de mapas intitulada Cartas ele-mentares de Portugal para uso das escolas2, erepresenta, para o ano de 1876 o índice númerode hectares por habitante. O mapa apresenta-se a cores e as classes distinguem-se através davariável visual valor, numa gradação de tons decastanho. Apesar do índice ter como leituradirecta o número médio de hectares por cadahabitante por concelho, na realidade, este nãodeixa também de ser um indicador de densi-dade de povoamento. Quanto menor o valormédio de área por habitante num dado conce-lho, maior será a densidade de povoamento. Dereferir ainda que a elaboração desta carta só foipossível a partir da determinação, ainda quegrosseira, dos limites concelhios3.

Além dos limites concelhios e respectivatoponímia, este mapa inclui como informaçãode base os principais traços da rede hidrográ-fica, da topografia e das vias de comunicação.Concorda-se com a opinião de Devy-Vareta etal. (1990), segundo a qual «a imagem de con-junto não é feliz», quer pela «sobrecarga desímbolos e cores», quer pelas classes e coresescolhidas para representar o fenómeno, resul-

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2 Para um enquadramento e descrição detalhadosdesta obra de Bernardino Barros Gomes, ver artigo deDevy-Vareta et al. (1990) inserto na publicação fac-similada da mesma.

3 Pela riqueza textual, visão e clarividência, valea pena citar Barros Gomes que, na introdução à publi-cação, já aludia à importância da carta administrativado país: «Conhecer os concelhos, a natureza políticadestes pequenos grupos sociais, mais velhos algunsque a mesma monarquia, a sua actual defrontação, oseu relevo, o seu clima, a sua vegetação, a qualidadedas suas terras, a densidade da sua povoação, a suacapacidade tributária, como origem de recursossociais; numa palavra o que melhor contribui para oscaracterizar como elementos vitais da nação – serásem dúvida possuir noções elementares de verdadeirovalor, coordenas por forma prática. Por isso, a pri-meira destas cartas elementares teve de ser uma cartaconcelhia, e representa este género de divisão talcomo existia em 1870».

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tando uma imagem com pouco contraste masexcessivo ruído.

É preciso avançar mais de 20 anos notempo para encontrar uma nova representaçãoda distribuição da população portuguesa. OPortugal au point de vue agricolefoi publi-cado em 1900 e teve Cincinnato da Costa e D.Luiz de Castro como coordenadores. Trata-sede uma colectânea de textos de vários autores econtém «o primeiro atlas temático oficial, naescala de 1:2.000.000. Elaborado com recursostécnicos e financeiros demasiados, face ao des-conhecimento cartográfico revelado pelos inú-meros erros de opção cartográfica e de simbo-lização que a maioria dos catorze mapas con-têm, constituiu, apesar disso, uma referênciarecorrentemente referida por historiadores,mas também por geógrafos. Ambos, as CartasElementarese o Portugal au point de vue agri-cole, constituir-se-iam como fontes para algunsmanuais escolares» (Fernandes 2008b: 9).

Entre os catorze mapas publicados, cons-tava o Quote part de Territoire par Habitant,referente ao ano de 1900, e construído sob adirecção de Anselmo de Andrade. O mapa apre-senta, tal como a sua epígrafe indica, a porçãode território por habitante, expressa em ares ouhectares por distrito, tendo por isso uma leituraidêntica ao mapa de Barros Gomes. Apresenta-se a preto e branco e a variável foi classificadae representada em 6 classes. Para a distinçãoentre classes, é utilizada a variável visual espa-çamento. A diferenciação de distritos de classeigual é feita através da orientação. Como infor-mação geográfica auxiliar são apresentados osprincipais topónimos, hidrografia e vias decomunicação fundamentais.

2.2. A primeira metade do século XX:predomínio dos mapas de pontos

Após aqueles mapas precursores, a maioriados seus sucessores foram construídos atravésda técnica de pontos para representar a distri-

buição populacional. Com efeito, firmou-seuma certa tradição entre geógrafos portuguesesno uso da técnica de pontos para mapear a dis-tribuição da população. Amorim Girão, Her-mann Lautensach, Fernandes Martins, OrlandoRibeiro e, mais recentemente, Maria HelenaDias, todos eles recorreram à técnica dos pon-tos para mapear distribuições populacionais.«A prática cartográfica consagrou os mapas depontos na representação das populações, quais-quer que estas sejam» (Dias 1991: 34).

Foi durante os anos 20 a 50 do século XXque se vulgarizaram as representações da distri-buição da população portuguesa através de sim-bologia pontual com valores absolutos. Em1932, H. Lautensach publicou o primeiro mapadeste tipo reportado a todo o país, representandoa população residente nas freguesias em 1920, àescala 1:1.500.000. No entanto, Amorim Girãotinha sido o pioneiro da técnica no nosso país,através do mapa da população da Bacia doVouga, à escala de 1:750.000, produzido noâmbito da sua dissertação de doutoramento(1922). Este mesmo geógrafo, na primeira edi-ção do Atlas de Portugal(1941) publica a distri-buição da população para o ano de 1930 à escala1:1.500.000, com base nos censos desse ano.Em 1951, Orlando Ribeiro publica o mapa dadistribuição da população portuguesa em 1940,à escala 1:500.000. Posteriormente, os dadosfornecidos pelo censo de 1950 foram cartografa-dos por Amorim Girão, na segunda edição doAtlas de Portugal(1958), para o conjunto dopaís e à mesma escala do seu primeiro mapanacional (Figura 2). Foram ainda publicados, noâmbito de estudos regionais, mapas da distribui-ção populacional da Serra de Montemuro (Amo-rim Girão 1940), da Bacia do Mondego (Fer-nandes Martins 1940), da Serra da Estrela(Orlando Ribeiro 1941), da ilha da Madeira(Orlando Ribeiro 1949), da ilha de São Miguel(Soeiro de Brito 1955) e da ilha de São Tomé(Francisco Tenreiro 1961).

Apesar da predominância da técnica dospontos no mapeamento da variável populacio-

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Figura 1 – Carta da povoação concelhia de Portugal em 1976 (B. Barros Gomes (1878) – Cartas elementares de Portugal para uso das escolas. Lallement Fréres Typ. Lisboa)

Fonte: Extraído de Biblioteca Nacional Digital, http://purl.pt/760 [consulta: Fevereiro 2009]

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nal, mapas coropletos de densidade populacio-nal para os anos de 1940 e 1950 foram elabo-rados e publicados por Amorim Girão (1948 e1958, respectivamente), partindo da determi-nação grosseira dos limites dos concelhos, nãoobstante a inexistência, nessa altura, de umacarta administrativa do oficial país, que sódécadas mais tarde veio a ser publicada noâmbito do Atlas do Ambiente.

Os mapas de implantação pontual previa-mente referidos possuíam certamente muitasdiferenças, quer de escala, quer de metodologiae de representação, mas tinham em comum autilização de símbolos pontuais, de valor fixo(ex.: 1 ponto equivalente a 100 habitantes) oude tamanho proporcional ao valor. Em algunscasos eram combinados os dois tipos de repre-sentação num mesmo mapa: pontos de valorfixo para lugares/freguesias/cidades depequena ou média dimensão populacional, ecírculos de tamanho proporcional ao valor paralocalidades ou cidades de grande dimensãopopulacional. Nestes casos, o somatório dovalor dos pontos/círculos permite reconstruir ovolume populacional, parcial e total.

O mapa incluído na primeira edição doAtlas de Portugal(Amorim Girão 1941) dis-tingue-se daquela tipologia mais comum, poisnele combinaram-se dez tamanhos de círculossem relação de proporcionalidade com osdados representados e com uma variação daproporção preto/branco no interior dos mes-mos, combinada com a opção de atribuir acada símbolo uma classe de valores de ampli-tude variável. A opção por esta simbolizaçãoresultou talvez no mapa com a imagem finalmais complexa e de difícil leitura (Dias 1991).

As principais dificuldades de elaboraçãodestes mapas podem ser agrupadas em duastipologias: problemas de simbolização e pro-blemas de referenciação da informação.

No que respeita ao problema da simboliza-ção, foi desde sempre relatada uma certa dificul-dade em conciliar a escala dos mapas com otamanho dos símbolos e seu respectivo valor.

Escolhas adequadas devem ter em conta as situa-ções mais extremas, desde as áreas mais densa-mente povoadas às menos densamente povoa-das, de forma a ajustar as variáveis gráficas auma leitura adequada e à obtenção de uma ima-gem globalmente eficaz na representação da dis-tribuição. Assim, se por um lado se deve evitar aexcessiva compactação e sobreposição de sím-bolos nas áreas densamente povoadas, por outro,deve igualmente acautelar-se a quase inexistên-cia de símbolos em áreas parcamente povoadas:«Poucos pontos (correspondentes à atribuição deum valor demasiado elevado) diluem a reparti-ção da população, enquanto se eles forem muitonumerosos se fornece uma impressão de grandedensidade de ocupação. Para que o mapa sugiraa realidade o melhor possível, são necessáriasvárias tentativas em áreas bem escolhidas, sobre-tudo nas de população mais densa», podendorecorrer-se ao ábaco de Mackay «que estabelecea relação entre o tamanho e a densidade dos pon-tos». No entanto, «o valor unitário a atribuir aoponto deve ser o menor possível para quesobressaiam as variações espaciais significati-vas» (Dias 1991: 36-37).

As duas principais fontes de informaçãopara a elaboração destes mapas são os recen-seamentos e a cartografia de base, que fornecea localização dos povoamentos e respectivatoponímia. Só desde 1864 existem, no nossopaís, censos com regularidade temporal. Toda-via, a informação ao lugar4 só existe nos censosde 1911, 1940, 1960, e o censo de 1981 forneceinformação apenas para os lugares com mais de500 habitantes, «o que é manifestamente insufi-ciente para este tipo de representação» (Dias1991: 32). Por outro lado, a inexistência, atéfinais dos anos 1970, de uma carta administra-tiva com os limites das freguesias, impõe que areferenciação das cifras populacionais seja feitana localização das sedes de freguesia, devendorecorrer-se à cartografia de base disponível.Mas nem sempre esta possuía o rigor e/ou a

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4 Nível de desagregação inferior à freguesia.

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Figura 2 – Distribuição da população em 1950 (Amorim Girão (1958) – Atlas de Portugal. 2ª ed. Instituto de Estudos Geográficos)

Fonte: Extraído de GeoZone, http://www.ci.uc.pt/ihti/proj/geozone/atlas1.htm [consulta: Outubro 2008].

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actualização desejáveis, pelo que a contempora-neidade entre a cartografia e os dados a repre-sentar era difícil de alcançar.

Importa, portanto, referir, sem ambiguida-des, que a opção pela técnica dos pontos – quepredominou desde as décadas de 20 a 50 doséculo XX – tem muito que ver com a grande

deficiência e lacuna de informação relativa aoslimites administrativos. As excepções a estaregra verificaram-se na cartografia produzidae publicada no âmbito dos manuais escolaresde geografia5. Vários exemplos revelam o pre-domínio dos mapas de distribuição das densi-dades populacionais, por distrito (Figura 3).

2.3. O período 1960-1991: a transiçãopara os mapas coropletos e as primeiras experiências de cartografia automática

Assim que se começam a conhecer comalgum rigor os limites aproximados das fre-guesias e suas respectivas dimensões – para o

que a divulgação (1979 e 1982) de cartasadministrativas do país surgidas no âmbito doAtlas do Ambiente, pela extinta ComissãoNacional do Ambiente, muito veio a contribuir

Figura 3 – Mapas da distribuição da densidade populacional presentes em manuais escolares de geografia. À esquerda, mapa do manual de Mário de Vasconcelos e Sá, de 1921. Ao centro,

mapa do manual de Eduardo Alves de Moura, de 1951. À direita, um interessante mapa de isopletas,do manual de Amílcar Patrício, de 1966.

Imagens gentilmente cedidas pelo professor Doutor Mário Gonçalves Fernandes.

5 Para uma análise sobre a evolução dos manuaisescolares e da sua ilustração e cartografia, dos sécu-los XIX e XX, ver Fernandes (2008b).

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– começam também a vulgarizar-se os mapascoropletos de densidade populacional. Umatransição que, segundo M. H. Dias, teria já ini-ciado em finais da década de 1950:

«Em suma, (…) após um período que pode-remos situar entre os anos 20 e 40 [do séculoXX], os mapas de pontos da população portu-guesa começaram a ganhar a sua expressãomais perfeita, sobretudo com as tentativas deOrlando Ribeiro que conduziram, já na décadade 50, à publicação de um mapa de conjunto doPaís. Mas, neste período de apogeu, a técnicados pontos deixa de ser utilizada, passando-se arepresentar as densidades da população, emmancha, e os maiores aglomerados urbanos, porcírculos proporcionais ou figuras volumétricas»(Dias 1991: 25).

Apesar da mudança de rumo na práticacartográfica, Maria Helena Dias retoma a téc-nica dos pontos, elaborando e publicando, em1991, o Mapa da distribuição da populaçãoportuguesa em 1981, adoptando igual escala(1:500.000) e seguindo princípios metodológi-cos idênticos aos utilizados por OrlandoRibeiro no seu mapa da população em 1940,tornando possível a comparação entre os doismomentos temporais.

Dias (1991) salienta, como principais van-tagens destes mapas, a clareza e a expressivi-dade da representação, a percepção dos traçosgerais da distribuição e a sugestão das densi-dades relativas, a representação das principaispovoações, assim como a facilidade de leitura,mesmo por pessoas com pouca preparaçãocartográfica. Em contrapartida, reconhececomo principais limitações o facto de nãopoderem ser usados senão para apreciaçõesqualitativas, bem como a morosidade e difi-culdade de elaboração, sobretudo quando nãoera ainda comum, entre geógrafos portugue-ses, a utilização de meios informáticos e decartografia automática para a sua execução.

Contudo, em países como os EUA, a «car-

tografia analítica», auxiliada por tecnologiasinformáticas, começava a dar os primeirospassos já nas décadas de 60 e 70 do séculoXX, com Waldo Tobler como um dos seusprincipais precursores.

«Analytical cartography includes the topicsof cartographic data models, digital cartogra-phic data-collection methods and standards,coordinate transformations and map projec-tions, geographic data interpolation, analyticalgeneralization, and numerical map analysis andinterpretation» (Slocum et al. 2009: 31).

Neste período é ainda conhecida umaexperiência cartográfica muito distinta dasacima referidas: a produção de mapas dapopulação residente por quadrícula quilomé-trica regular (1 x 1 Km) para Portugal conti-nental. Esta abordagem foi feita, pela primeiravez, para representar a população residente em1970, com base no censo do mesmo ano, cons-tituindo, assim, a primeira aplicação de meiosinformáticos e dos primórdios tecnológicosdos SIG (cartografia automática6) ao mapea-mento da distribuição populacional. O pro-duto, concebido em cooperação entre o INE eo CNIG (Machado 1998), foi impresso emforma de mapa à escala 1:500.000 (Grancho2003). Os trabalhos conduzidos na década de1970 foram continuados, tendo sido criadauma base geográfica com a georreferenciaçãoa uma quadrícula quilométrica de 57 variáveisreferentes ao censo de 1981 e de 80 variáveispara o censo de 1991, compilando informaçãosocioeconómica sobre indivíduos, alojamentose edifícios (Machado 1998).

A metodologia consistia em associar a cadalugar7 dos censos um ponto no espaço, de coor-denadas x,y, referente ao canto inferior esquerdo

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6 Que permitia já a associação automática entrebases gráficas e bases alfanuméricas.

7 A unidade geográfica utilizada como base atodo o trabalho.

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da respectiva quadrícula, e estabelecendo umaligação entre a base gráfica e a base alfanumé-rica, permitindo que cada atributo do lugar fosseassociado a uma quadrícula. «A inexistência deuma delimitação geográfica digital das zonascensitárias determinou que a informação alfanu-mérica do INE (que contém 4 identificadoresgeográficos: Distrito, Concelho, Freguesia eLugar) fosse georreferenciada a ‘um pontorepresentativo’» (Néry et al. 2007). Foi aindaefectuado um trabalho de identificação e delimi-tação de zonas com povoamento disperso ou nasquais os aglomerados populacionais não tinhamdimensão suficiente para justificar a delimitaçãode um lugar (Néry et al.2007), o que, segundoMachado (1998), exigiu um trabalho de campo,levado a cabo de norte a sul do país, que permi-tisse a actualização das listas de lugares existen-tes, identificando novos lugares e topónimos.Outra dificuldade esteve relacionada com o pró-prio conceito de lugar do INE. Este abrangia (eainda abrange na actualidade) desde pequenospovoados a grandes cidades, tornando poucocorrecta a referenciação de um lugar de grandedimensão (ex.: cidade do Porto) a uma só qua-drícula quilométrica da base gráfica, o que teráexigido operações de correcção8.

Os mapas que resultam desta metodologiabaseada em SIG são muito distintos dos mapasde pontos. O mapa da distribuição da popula-ção residente em 1981 por quadrícula de 1Km2, a que se teve acesso, tem como unidadegeográfica de base a referida célula, sendo uti-lizada uma gradação colorida para representaruma classificação dos dados: a cada quadrí-cula corresponde um intervalo de populaçãoresidente, ao qual se associa uma determinadacoloração. A sua classificação, no conjunto detécnicas convencionais da cartografia temá-tica, é um pouco ambígua, tratando-se, talvez,de um tipo de mapa situado entre o coropleto

e o de pontos, mas mais próximo deste. A uni-dade geográfica de base é um polígono e arepresentação faz-se em mancha (por colora-ção da quadrícula). No entanto, a sua repre-sentação no espaço não é contínua, referindo-se, antes, a uma localização/ponto no espaço(representativo do lugar), ao qual é atribuídoum valor populacional absoluto.

2.4. O período pós 1991: o predomíniodos mapas coropletos

Não obstante o grande desenvolvimento edifusão das TIG, as técnicas cartográficas derepresentação da distribuição populacionalnão sofreram desenvolvimentos relevantesquando comparadas com os períodos anterio-res. Houve, isso sim, uma maior automatiza-ção dos processos de elaboração de cartogra-fia, extremamente facilitados, quer pelas ferra-mentas disponíveis nos pacotes de softwaredecartografia automática e de SIG, quer pelacrescente produção e disponibilização debases de informação geográfica e alfanumé-rica digitais. Caiu em relativo desuso a produ-ção de mapas de pontos de valores absolutos,para passar a ser mais comum a produção demapas coropletos representativos da densidadepopulacional.

Com a crescente digitalização de basesgeográficas e a disponibilização de cartasadministrativas de Portugal – sucessivamentemelhoradas –, passaram a ser mais comuns osmapas de densidade populacional usandocomo unidade de base geográfica a freguesia.Passou a ser frequente encontrar mapas temá-ticos do tipo coropleto representando todo otipo de variáveis relacionadas com a popula-ção, habitação, emprego e actividade econó-mica, demografia, afinal, toda uma miríade devariáveis socioeconómicas.

A maioria das variáveis socioeconómicas éobservada ou reportada sob a forma de inte-grais ou médias espaciais sobre uma dada

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8 Lamentavelmente, a forma como este problemafoi ultrapassado tecnicamente não é abordado nabibliografia consultada.

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extensão finita no espaço, isto é, sobre unida-des espaciais poligonais constituintes de umatesselação9 do espaço (Néry et al.2007), o queconfigura um dos princípios metodológicosdos mapas coropletos. Estes mapas são utiliza-dos para representar variáveis agregadas aáreas, como concelhos, freguesias ou outrotipo de circunscrição administrativa, ou tam-bém limites fisiográficos (ex.: bacias hidrográ-ficas). Os mapas coropletos são adequadospara ilustrar a distribuição de dados relativos,tais como densidades em função da área (ex.:número de habitantes por km2), percentagens(ex.: taxa de analfabetismo) ou índices (ex.:número de polícias por mil habitantes).

Os mapas coropletos são criados através dacoloração de unidades de área (as unidades deagregação dos dados) consoante o valor a elasassociado, representando assim a respectivamagnitude ou intensidade do fenómeno. Estetipo de representação apresenta algumas van-tagens evidentes e imediatas que, no seu con-junto, explicam a popularidade e a rapidez dasua difusão:

• A facilidade da leitura para o consumi-dor, quer pelas gradações de cores/tonali-dades utilizadas (que permitem percep-cionar facilmente o comportamento davariável no espaço), quer pela agregaçãodos dados a unidades político-administra-tivas amplamente conhecidas e comimportante relevância para a decisão;

• A sua adequação a um vastíssimo con-junto de variáveis e indicadores, dasmais diversas temáticas humanas (demo-gráficas, socioeconómicas), mas tambémfísicas;

• A rapidez de elaboração. Mesmo quandonão se dispunha de meios de cartografiaautomática, quando comparados com osmapas de símbolos proporcionais, de flu-xos, pontos ou isolinhas, os mapas coro-pletos eram tecnicamente mais simplesde construir. Com a introdução e ampladifusão de softwarede cartografia auto-mática e SIG, a produção de alguns tiposde cartografia temática, em particular osmapas coropletos, tem sido cada vezmais numerosa. Com efeito, num SistemaGestor de Informação Geográfica(SGIG), dispondo apenas de uma basegráfica/geográfica correspondente aoslimites das áreas de agregação e de dadosalfanuméricos, o software, oferecendoum vasto conjunto de preferências, clas-sifica e agrupa os dados, associando acada classe uma simbologia (cor outrama). Dispondo das bases previamentepreparadas, em escassos minutos é possí-vel produzir um simples mapa coropletorecorrendo a softwareapropriado10.

Dir-se-ia que, em quase todos os instrumen-tos de ordenamento territorial, em particular noscapítulos dedicados ao diagnóstico, é possívelencontrar mapas de densidades populacionais.

Mesmo em edições tão recentes como oAtlas de Portugal, do Instituto GeográficoPortuguês (2005), foram publicados mapasque quase só se diferenciam dos de meados doséculo XX por terem sido elaborados comrecurso aos modernos SGIG, o que evidenciauma certa estagnação no desenvolvimento denovas formas de representação das distribui-ções e densidades populacionais (Figura 4).

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9 Partição de um espaço num conjunto de subes-paços contíguos tendo a mesma dimensão do espaçoparticionado. Definição extraída do Glossário de Ter-mos Geográficos disponível em http://snig.igeo.pt/Portal/docs/glossario_ v07w/ GloTerGeo.htm [con-sulta: Julho 2008].

10 Se, por um lado, esta relativa facilidade – tam-bém progressivamente alargada a outras técnicas car-tográficas – permitiu a democratização da cartogra-fia, por outro, como bem assinalou Slocum (2009: 8),não oferece a garantia de que os mapas resultantessejam correctamente concebidos.

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No entanto, não se pode desprezar nem oaumento da qualidade gráfica dos novos pro-dutos cartográficos, nem o maior nível dedesagregação das unidades espaciais, introdu-zido sobretudo com o Censo de 2001, cominformação gráfica e alfanumérica disponívela dois níveis de desagregação inferiores à fre-

guesia, a secção e a subsecção (unidade decolecta de dados mais elementar). Em 2001,existiam em Portugal continental 4037 fregue-sias, 15.536 secções e 170.145 subsecções,com áreas médias respectivas de 22 km2, 5,73km2 e 0,52 km2.

Evidentemente, a dimensão média destas

Figura 4 – Densidade populacional por freguesia em Portugal, 2001

Fonte: Extraído de IGP (2005)

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unidades sofre mudanças significativas deregião para região. Por exemplo, no Alentejo asunidades de área são em média bastante supe-riores às de qualquer outra região no país (sub-secções com área média de quase 2 km2).Igualmente se verifica uma diferenciaçãourbano/rural, pelo que as secções e subsecçõesde áreas rurais, em geral parcamente povoadas,são de maior dimensão do que as unidades emespaço intra-urbano, densamente povoado,geralmente correspondentes a quarteirões. Estadiferenciação deve-se ao facto das unidadesterem sido concebidas sobretudo para efeitosde planificação da colecta de dados no terreno.

Estes novos níveis de tesselação do espaçopermitem, no que respeita aos mapas corople-tos, uma representação mais detalhada e pró-xima da realidade. Contudo, o uso de limitesadministrativos e/ou censitários (zonamentosnormativos) como base para a representaçãode distribuições (populacionais ou outras)imporá, sempre, um conjunto de limitaçõesque se listam de seguida:

• As fronteiras administrativas têm origenshistóricas, políticas e administrativas epodem não reflectir uma homogeneidadeinterna de variáveis;

• As unidades censitárias são definidas pormotivos de conveniência de recolha deinformação, não estando directamenterelacionadas com a distribuição espacialdas variáveis (criando polígonos de gran-des dimensões para áreas com menospopulação e de menores dimensões paraáreas com mais população);

• Assumem-se a homogeneidade interna davariável – média espacial – isto é, a assun-ção de que a variável se distribui unifor-memente dentro da unidade espacial;

• A média espacial que é criada no interiordas unidades espaciais discretas genera-liza os valores internos altos e baixos,mascarando a real distribuição do fenó-meno;

• As fronteiras alteram com o passar dotempo, dificultando a comparação tem-poral de variáveis;

• Dados provenientes de diferentes fontespodem encontrar-se referenciados azonamentos espaciais incompatíveis;

• Cruzamento de informação provenientede diferentes zonamentos não é directo;

• Não permite a diferenciação de entidadesfisiográficas, tais como superfícies deágua, reservas naturais, praias e outrasáreas não povoadas onde geralmente cer-tos fenómenos socioeconómicos não ocor-rem. Com efeito, os mapas coropletos dedados demográficos e socioeconómicospor unidades administrativas, amplamentevulgarizados, causam a impressão de queos indicadores se distribuem homogenea-mente por cada unidade de área, mesmoquando porções significativas dessas uni-dades são totalmente desabitadas;

• A construção de indicadores normaliza-dos (ex.: densidade populacional) combase na área das unidades é demasiadodependente da sua dimensão, levando acriar falsas percepções da realidadedevido à grande heterogeneidade areal11;

• Existência de efeitos do Modified ArealUnit Problem (MAUP), em português,Problema das Unidades de Área Modifi-cáveis (Openshaw 1984)12.

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11 Sobre este tópico, ver a experiência levada acabo por Gallego, F. J. (s. d.) – Mapping rural/urbanareas from population density grids. Disponível emhttp://www.ec-gis.org/docs/F11116/RURAL%20URBAN%20%20POP DENS.PDF

12 Os efeitos do MAUP são inerentes aos dadoscolectados, armazenados ou representados em unida-des de área poligonais, em particular os zonamentosnormativos, onde não se cumpre a homogeneidade davariável no interior das unidades. O MAUP consideraa existência de problemas de transformação dos dadosoriginais e individuais, quando as unidades de área sãoagregadas ou agrupadas em diferentes combinações.Isto é, a modificação das fronteiras e a agregação dezonas afecta a informação resultante (Mennis 2003).

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Não se referindo a ele directamente, M. H.Dias (1991: 32) acabava por se referir a umadas características do MAUP e tomava inequi-vocamente partido pela opção técnica de car-tografar a distribuição da população através desímbolos pontuais (de valor uniforme) e decírculos de tamanho proporcional ao valorrepresentado, em detrimento dos mapas coro-pletos, sobre os quais lançava a dúvida depoderem ser considerados verdadeiros mapasde distribuição populacional:

«Representar as densidades não constituiuma alternativa equivalente [aos mapas de pon-tos], visto que os mapas assentam numa certabase espacial [administrativa] e as manchas grá-ficas correspondentes, no geral de dimensãomuito desigual, mascaram forçosamente a ver-dadeira distribuição espacial dos habitantes.

Exprimindo um valor médio por unidade desuperfície13, e na maior parte dos casos diluídosnum certo intervalo de variação (ou classe), osmapas da densidade não se podem considerarverdadeiros mapas de distribuição da popula-ção, mesmo com recurso a uma base espacial demalha suficientemente fina que permita mostraras cambiantes dessa distribuição».

3. Novos rumos para a representação das distribuições populacionais:A cartografia dasimétrica

Já foi referido que os métodos de cartogra-fia temática convencional, por usarem fre-quentemente como suporte espacial um zona-mento normativo, estão sujeitos a um largoespectro de limitações. Viu-se ainda que osmapas coropletos de densidade populacionalnão podem ser considerados verdadeiros

mapas de distribuição da população. Isto por-que a ocupação humana do território se fazindependentemente dos limites administrati-vos e censitários e a realidade geográfica nãopode ser cartografada com rigor se forem usa-dos limites artificiais pouco correlacionadoscom a distribuição dos residentes.

Neste contexto, é pertinente enunciar acartografia dasimétrica como uma técnica quepermite superar as limitações já discutidas.

Embora já tenham sido encontradas brevesreferências, como por exemplo em Fernandes(2008a: 89-90), o termo e o conceito de «car-tografia dasimétrica»14 têm muito pouca tradi-ção teórica e prática na Geografia e na carto-grafia portuguesas. No entanto, qualquer bommanual anglo-saxónico de cartografia temáticapermite um esclarecimento. Segundo Slocum(1999: 168), o mapa dasimétrico é uma evolu-ção do mapa coropleto e distingue-se funda-mentalmente por utilizar informação auxiliarpara aperfeiçoar a representação de uma distri-buição ou de uma densidade espacial, qualquerque ela seja.

No caso de um mapa da distribuiçãopopulacional, o recurso a informação geográ-fica auxiliar que indique a localização deáreas não habitadas, como grandes superfí-cies de água, extensas áreas florestais e agrí-colas, permite aprimorar razoavelmente acartografia final, impedindo que estas áreassejam utilizadas para representar a manchahabitada e que o seu valor de área seja utili-zado para o cálculo da densidade. A utiliza-ção desta informação auxiliar na produção domapa de distribuição populacional permiteduas melhorias óbvias relativamente ao tradi-cional mapa coropleto:

• Representar com maior rigor geográficoa localização do fenómeno (número deresidentes);

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13 Média espacial.

14 Por vezes também referida como cartografiadensimétrica (a discussão está em aberto!).

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• Adequar o índice de densidade popula-cional em função da área potencialmenteocupada.

• Em síntese, no processo produtivo de ummapa dasimétrico recorre-se a informação

geográfica auxiliar, fortemente correlacio-nada com a variável a representar, deforma a melhorar a sua representação car-tográfica, limitando a distribuição às áreasem que de facto ela ocorre (Figura 5).

A cartografia dasimétrica tem uma históriaque remonta, tanto quanto se sabe, ao iníciodo século XX. As primeiras referências a estetipo de cartografia são originárias da Rússia.O seu alegado criador, Semenov-Tian-Shansky publicou, na década de 1920, ummapa da população da Rússia europeia (Bie-lecka 2005; Mennis e Hultgren 2006). Noentanto, J. K. Wright foi quem popularizou,nos Estados Unidos da América, a cartografiadasimétrica, com a publicação, em 1936, de Amethod of mapping densities of populationwith Cape Cod as an example, na Geographi-cal Review.

Com base em informação sobre áreas habi-tadas e desabitadas, derivada de cartografiatopográfica da United States Geological Sur-vey (USGS), Wright redistribuiu as contagenspopulacionais originais pelas áreas habitadas.Posteriormente, dividiu as áreas habitadas emparcelas mais pequenas e, usando padrões de

ocupação também deduzidos da cartografia debase, Wright recalculou das densidades popu-lacionais (Mennis 2003: 32).

Apesar das vantagens da técnica dasimé-trica já há muito terem sido demonstradas, asua produção, sem o auxílio dos meios com-putacionais actuais, é uma tarefa muitíssimomorosa e complexa, o que terá desmotivado asua maior difusão durante décadas.

Mais recentemente, a cartografia dasimé-trica ganhou novo fôlego. A publicação de umcrescente número de trabalhos em revistasinternacionais de cartografia nos últimos anosé uma evidência disso mesmo. Outro factointeressante é a publicação, na terceira ediçãodo manual Cartography and Geovisualization(Slocum et al. 2009), de um capítulo exclusi-vamente dedicado à cartografia dasimétrica.Em edições anteriores do mesmo manual(1999 e 2005), a cartografia dasimétrica parti-lhava um capítulo com os mapas de pontos.

Figura 5 – Modelo dasimétrico

(a) População igualmente distribuída pela unidade de enumeração (zona de origem); (b) Informação auxiliar, com áreas povoadas a cinzento (zonas de destino) e despovoadas a branco; (c) População redistribuída nas zonas de destino.

Fonte: Extraído de Langford (2007: 21)

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Vários motivos poderão explicar o cres-cente interesse na cartografia dasimétrica:

• O aumento do poder de processamentodos sistemas computacionais, capazes deprocessar grande volume de informaçãomais rapidamente;

• A disponibilização de ferramentas cadavez mais avançadas de análise espacialintegradas em pacotes de softwarecomerciais;

• O aumento da oferta de informação geo-gráfica digital proveniente de diferentesfontes, passível de ser usada como infor-mação auxiliar para a interpolação dasi-métrica;

• No contexto da produção de superfíciespopulacionais, a cartografia dasimétrica éum método comprovadamente mais rigo-roso do que qualquer outro que nãorecorra a informação auxiliar para infor-mar o processo de interpolação (Wu et al.2005).

A cartografia dasimétrica é um tipo especí-fico de interpolação zonal. Interpolação zonalrefere-se ao processo de transformação dedados agregados a um zonamento de origemnum zonamento de destino, de diferente geo-metria. Numa abordagem a dados populacio-nais, a interpolação zonal recorre a dados cen-sitários, agregados a um zonamento original(zonas de origem), e aplica uma desagregaçãopara estimar a população num zonamento dediferente geometria (zonas de destino)15. Nocontexto da interpolação zonal, a especifici-dade da cartografia dasimétrica reside na utili-zação de informação auxiliar que informa ainterpolação sobre a forma como as variáveisoriginais devem ser redistribuídas nas zonasde destino. Requisito também indispensável

da interpolação zonal dasimétrica é a preser-vação do volume original dos dados por zonade origem (propriedade picnofilática).

Diferentes tipos de informação auxiliarpodem ser utilizados nos métodos dasimétri-cos aplicados à distribuição populacional. Osmais referenciados na literatura são as áreasurbanas obtidas por meio de detecção remotaou cartografia da ocupação/uso do solo(Eicher e Brewer 2001; Mennis 2003; Wu et al2005; Slocum 2009). Têm sido tambémencontradas referências à utilização de parce-las usadas por serviços fiscais (Sleeter e Wood2006), estradas ou vias públicas (Voss et al.1999; Reibel e Bufalino 2005; Freire 2007b),edifícios (Langford 2007) ou mesmo a intensi-dade da luz emitida à noite, obtida por meiosde detecção remota (Dobson et al.2000).

A utilização de informação auxiliar é umaspecto tão marcante na cartografia dasimé-trica que Martin et al. (2000) não hesitaramem afirmar que a qualidade da informaçãoauxiliar é mais importante do que a escolha doalgoritmo de desagregação.

A cartografia dasimétrica pode ser classifi-cada como binária ou «inteligente»16 con-soante o tipo de desagregação que é feita a par-tir dos dados originais. A desagregação bináriaé a mais simples forma de cartografia dasimé-trica e distribui a população pelas zonas dedestino de forma proporcional à área. Estemétodo assume a distribuição homogénea nozonamento de destino, pois não considera adiferenciação da informação auxiliar em clas-ses de diferente densidade populacional. Con-sidera apenas a diferenciação simples entreáreas povoadas e não povoadas, distribuindo apopulação de forma proporcional à áreapovoada.

O método «inteligente», por sua vez,incorpora informação relativa a classes de

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15 Para uma revisão mais completa das diferentestécnicas de interpolação zonal, ver Rase (2001), Wuet al. (2005) e Silva (2009).

16 Outros autores (Rase 2001; Gallego 2001; Bie-lecka 2005) utilizam o termo «Modified ArealWeighting Method».

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diferente densidade populacional. Por exem-plo, se for usada informação relativa à ocupa-ção do solo, é presumível que as classes agrí-colas tenham uma densidade de ocupaçãohumana inferior a classes urbanas. A pondera-ção das áreas ocupadas pelas densidades rela-tivas da informação auxiliar torna o processodasimétrico mais robusto e realista. A formacomo a densidade de cada classe é determi-nada tem sido um tema de investigação da car-tografia dasimétrica.

Eicher e Brewer (2001) usaram três classesde ocupação do solo: urbano, agrícola e flores-tal. A cada classe atribuíram uma percentagemde ocupação humana arbitrária, 70%, 20% e10%. No entanto, além da subjectividade do cri-tério, o método não considerava o valor de áreadas três classes dentro de cada zona de origem.

Mennis (2003) e Mennis e Hultgren (2006)propõem um método bastante mais robustoque usa a área das classes de ocupação do soloponderada por uma densidade populacionaldiferenciada entre elas. A densidade de umadeterminada classe é calculada com base numprocesso de amostragem, que selecciona uni-dades do zonamento de origem representativasda classe em causa (ex.: unidades total ou par-cialmente contidas numa classe de ocupaçãodo solo). Outros autores (Gallego e Peedell2001; Néry et al. 2007) utilizam algoritmositerativos para estimar as densidades relativasentre classes de ocupação do solo.

A Figura 6 mostra como uma unidade deenumeração é desagregada num modelo matri-cial mais refinado com base em informaçãosobre a ocupação do solo.

Enquanto os métodos «inteligentes» reco-nhecem a existência de diferenças de densi-dade entre classes da informação auxiliar, nãoprevêem, contudo, a existência de diferençasde densidade dentro de cada uma dessas clas-

ses (Wu et al 2005). Por isso, Harvey (2002)adoptou uma abordagem completamente dife-rente. As densidades não são estimadas aonível de classes de informação auxiliar mas aonível dos próprios pixéis de destino. O pro-

Figura 6 – Modelo dasimétrico inteligente implementado em suporte matricial

(a) Unidade de enumeração, com população homogeneamente distribuída no espaço (zona de origem). (b) Informação auxiliar em categorias de uso do solo (vermelho: urbano denso; rosa: urbano disperso; ama-relo: agrícola; azul: água) (zonas de destino); (c) População redistribuída em pixéis, assumindo densidades de povoamento diferentes por classe de usodo solo.

Fonte: Adaptado de Sleeter e Wood (2006).

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cesso é feito por um algoritmo iterativo quevai modificando o valor da população atri-buída a cada pixel através do seu ajustamentoem relação a regressões globais para a áreamodelada. A primeira regressão é obtida entreos valores iniciais da população, distribuídapor pixéis através de um modelo dasimétrico

binário, e informação espectral de cada pixelobtida em imagens de satélite.

Os modelos de distribuição da populaçãoem formato matricial, produzidos com basenos métodos e técnicas acima revistos, podemser definidos como uma matriz regular decélulas (ou pixéis) georreferenciada, que con-

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Figura 7 – Representações coropleta (A) e dasimétrica (B) da densidade populacional na área dePeniche, 2001

Fonte: Extraído de Silva (2009).

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tém informação relativa à quantidade de pes-soas que reside em cada pixel (Figura 5, c). Opixel funciona como uma unidade de partiçãodo espaço geográfico.

A criação de superfícies matriciais popula-cionais é um caso especial da interpolaçãozonal, porque o destino da informação é o con-junto de células que constituem a imagem matri-cial, procurando aproximar-se de uma superfí-cie contínua (Mennis 2003). Na realidade, assuperfícies matriciais resultantes da modelaçãodasimétrica devem ser consideradas superfíciessemicontínuas, dado existirem espaços onde avariável não ocorre e, por conseguinte, o valordos respectivos pixéis é zero ou nulo.

3.1. Trabalhos recentes de cartografiadasimétrica em Portugal

Ao contrário do que já acontece noutrospaíses, a cartografia dasimétrica não encon-trou ainda, em Portugal, terreno de grandedesenvolvimento e difusão. Até à data, sãoconhecidos apenas três trabalhos recentes, deautores portugueses, que utilizam a cartografiadasimétrica para produzir mapas de distribui-ção populacional.

Néry et al. (2007) produziram, para o terri-tório de Portugal Continental, um modelo dadistribuição espacial da população residente em1991, utilizando um zonamento regular quadri-culado de 1 x 1 km2, baseando-se num métodode interpolação dasimétrico inteligente queredistribuiu a população com base em diferentesdensidades de ocupação por tipologia de ocupa-ção do solo (COS 90). Freire (2007b) desagre-gou, para os concelhos de Cascais e Oeiras, apopulação diurna e nocturna, utilizando umainterpolação dasimétrica binária e tendo comosuporte espacial uma malha com resolução de25 m correspondente aos eixos de via17.

Por último, no trabalho de Silva (2009), apopulação residente da região Oeste e Vale doTejo, para um total de 33 concelhos, foi desa-gregada e estimada ao nível de pixéis de 30metros de resolução (ver extracto na Figura7). No ensaio metodológico foram testadasduas técnicas de mapeamento dasimétrico(binária e inteligente) assim como diferentesfontes de informação auxiliar, dando origem aseis diferentes modelos de distribuição popu-lacional, cada qual com diferente grau de qua-lidade. A avaliação e comparação dos mode-los produzidos, feita através do recurso aconhecidos instrumentos estatísticos, permitiuprovar que, para as escalas em análise (muni-cipal e regional), o método dasimétrico inteli-gente, conjugado com informação auxiliar doedificado residencial, extraído de cartografiatopográfica, permite obter as melhores esti-mações.

O modelo populacional final foi utilizadoem três exercícios aplicados ao ordenamento doterritório (população em risco, população ser-vida por equipamentos e urbanismo), demons-trando a utilidade e aplicabilidade do produtoem diferentes contextos temáticos. Foram des-tacadas as seguintes vantagens do modelopopulacional produzido:

• A grande desagregação e resolução espa-cial da variável, modelada em superfíciesemi-contínua matricial, com a resoluçãode 30 metros, totalmente independente delimites administrativos e/ou censitários;

• A localização do fenómeno cartografadoàs áreas em que ele realmente ocorre, per-mitindo uma leitura consideravelmentemais realista da distribuição (Figura 7);

• A sua fácil integração com outras basesdigitais de informação geográfica, recor-rendo a técnicas simples disponíveis emSGIG comerciais, que possibilitam quera reagregação dos dados para os maisdiversos zonamentos, quer as operaçõesde álgebra de mapas.

17 Para uma revisão mais detalhada destes traba-lhos, ver Silva (2009).

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4. Conclusão

Os desenvolvimentos ocorridos na últimadécada em cartografia dasimétrica foramimpulsionados pelos novos meios computacio-nais (hardwaree software) e pela disponibili-zação crescente, em quantidade e qualidade,de informação geográfica digital. O aumentodo número de trabalhos deste ramo da carto-grafia, desenvolvidos tanto por cartógrafosestrangeiros como nacionais, permite jádemonstrar, sem qualquer dúvida, as vanta-gens da abordagem dasimétrica à produção demapas, ou produtos cartográficos em sentidolato, da distribuição populacional.

Pode dizer-se que os desenvolvimentosactuais e futuros passarão por três eixos fun-damentais: 1) o refinamento e a automatizaçãodas já conhecidas técnicas de mapeamentodasimétrico; 2) a produção melhorada de esti-mações populacionais diurnas e sazonais, dereconhecida utilidade para domínios como ogeomarketing, a análise de vulnerabilidades ea gestão de situações de emergência; 3) a inte-gração de dados provenientes de detecçãoremota no mapeamento dasimétrico da distri-buição populacional, o que inclui a estimação(projecção) de população em anos intercensi-tários, de particular pertinência para áreasurbanas de franco crescimento18.

Duas notas finais que escolhemos pararematar esta discussão: Em primeiro lugar,será de esperar que, nos próximos anos, sevenha a popularizar entre nós a produção,difusão e utilização, quer para efeitos da sim-ples visualização, quer para efeitos de análisemais avançada, de cartografia dasimétricaaplicada às distribuições demográficas. Emsegundo lugar, é de estimular que outros geó-grafos e cartógrafos portugueses contribuam

para o desenvolvimento teórico e/ou aplicadodesta técnica cartográfica.

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18 A existência do painel Population EstimationUsing Remote Sensing and GIS Technologiesnoencontro anual da Associação Americana de Geógra-fos de 2009 é disso uma evidência.

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