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20 2 Revisão Bibliográfica 2.1 Aços utilizados na Indústria Automotiva Os aços automotivos podem ser classificados de três formas diferentes: 1) por denominação metalúrgica; 2) pela resistência do aço e 3) por outras propriedades mecânicas. As denominações metalúrgicas usuais incluem: • Aços de baixa resistência: Livre de Intersticiais e aço-carbono; • Aços convencionais de alta resistência (High Strength Steel - HSS): C-Mn, Livre de Intersticiais de alta resistência e HSLA; • Aços avançados de alta resistência (Advanced High Strength Steel – AHSS): Dual Phase, Ferrítico-Bainíticos, Complex Phase, martensíticos e de Plasticidade Induzida por Transformação (Transformation-Induced Plasticity - TRIP). Uma segunda classificação é pela resistência do aço. Por isso, muitos autores usam os termos HSS e AHSS para denominar todos os aços de alta resistência. Contrariamente, outras usam limites definidos para classificar diferentes níveis de resistência. Um sistema define os aços convencionais de alta resistência (HSS) como os que possuem limite de escoamento entre 210 e 550 MPa e limite de resistência entre 270 e 700 MPa, enquanto os aços avançados de alta resistência (AHSS) possuem limite de escoamento maior que 550 MPa e limite de resistência maior que 700 MPa. 1 A terceira classificação é feita por outras propriedades mecânicas, como alongamento total, expoente de encruamento (n) e outros. Como exemplo, a Figura 1 compara o alongamento total, que é uma propriedade relacionada com a conformabilidade, para os diferentes tipos de aços. Os aços de baixa resistência

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2 Revisão Bibliográfica

2.1 Aços utilizados na Indústria Automotiva

Os aços automotivos podem ser classificados de três formas diferentes: 1)

por denominação metalúrgica; 2) pela resistência do aço e 3) por outras

propriedades mecânicas. As denominações metalúrgicas usuais incluem:

• Aços de baixa resistência: Livre de Intersticiais e aço-carbono;

• Aços convencionais de alta resistência (High Strength Steel - HSS): C-Mn,

Livre de Intersticiais de alta resistência e HSLA;

• Aços avançados de alta resistência (Advanced High Strength Steel –

AHSS): Dual Phase, Ferrítico-Bainíticos, Complex Phase, martensíticos e de

Plasticidade Induzida por Transformação (Transformation-Induced Plasticity -

TRIP).

Uma segunda classificação é pela resistência do aço. Por isso, muitos

autores usam os termos HSS e AHSS para denominar todos os aços de alta

resistência. Contrariamente, outras usam limites definidos para classificar

diferentes níveis de resistência. Um sistema define os aços convencionais de alta

resistência (HSS) como os que possuem limite de escoamento entre 210 e 550

MPa e limite de resistência entre 270 e 700 MPa, enquanto os aços avançados de

alta resistência (AHSS) possuem limite de escoamento maior que 550 MPa e

limite de resistência maior que 700 MPa.1

A terceira classificação é feita por outras propriedades mecânicas, como

alongamento total, expoente de encruamento (n) e outros. Como exemplo, a

Figura 1 compara o alongamento total, que é uma propriedade relacionada com a

conformabilidade, para os diferentes tipos de aços. Os aços de baixa resistência

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são mostrados em cinza escuro, os HSS são mostrados em cinza claro e alguns

AHSS em cores.

Figura 1 – Gráfico esquemático comparando os aços AHSS, HSS e de baixa

resistência.1

Nas duas últimas décadas, as organizações regulamentadoras de veículos

automotivos européias e norte americanas vêm emitindo regulamentos com ênfase

na redução do peso dos veículos a fim de reduzir o consumo de combustíveis e,

portanto, a emissão de gases, contribuindo para a preservação ambiental. Além

disso, a preocupação crescente com a segurança do passageiro e requisitos de

resistência ao impacto fazem parte de um novo projeto de veículo a ser

desenvolvido nos próximos anos.2,3

O desafio a ser enfrentado para otimizar o peso da estrutura do veículo é o

desenvolvimento de aços com elevada resistência mecânica sem

comprometimento de sua conformabilidade. Portanto, uma das soluções

encontradas foi o desenvolvimento de uma nova geração de aços de alta

resistência, os chamados aços avançados de alta resistência (AHSS).

Os AHSS são uma classe de aços que oferecem uma relação resistência –

conformabilidade superior, sem afetar a ductilidade e o aumento da absorção de

energia, melhorando a resistência ao impacto.4 Dentre esta classe de aços,

destacam-se os aços multifásicos como, por exemplo, Dual Phase e os assistidos

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pelo efeito TRIP, os quais são empregados como componentes estruturais na

indústria automotiva.5,6

2.2 Aços Avançados de Alta Resistência (AHSS)

Nesta seção, os aços avançados de alta resistência mencionados acima serão

descritos. O aço TRIP é o material utilizado no presente estudo, portanto sua

descrição será mais detalhada do que as dos outros aços.

2.2.1 Aços Dual Phase (DP)

Os aços bifásicos ou comumente conhecidos como “Dual Phase” (DP) tem

uma microestrutura composta de uma matriz ferrítica e ilhas de martensita

dispersas como segunda fase. As propriedades mecânicas deste grupo de aços são

controladas pela fração volumétrica de martensita e o tamanho de grão da ferrita.7

A fase ferrítica é geralmente contínua, conferindo excelente ductilidade a

estes aços. Quando estes aços deformam, a deformação é concentrada na fase

ferrítica de menor resistência envolvendo as ilhas de martensita, criando uma taxa

de encruamento excepcional. A taxa de encruamento somada a um excelente

alongamento confere aos aços DP um limite de resistência à tração maior quando

comparado a aços convencionais com limite de elasticidade semelhante.1,8

Os aços DP e outros AHSS também têm efeito de endurecimento por

cozimento (bake hardening) que é uma vantagem importante em comparação com

aços convencionais. O efeito de endurecimento por cozimento é o aumento do

limite de elasticidade resultante de envelhecimento na temperatura de cura dos

fornos de cozimento para vitrificação e aumento de resistência da pintura, depois

de pré-tensão ou pré-deformação (gerada por encruamento devido à deformação

durante estampagem ou outro processo de fabricação).

Os aços DP podem ser produzidos de duas formas:

• Em produtos laminados à quente, pelo resfriamento controlado da fase

austenítica;

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• Para produtos laminados a frio e continuamente recozidos, a partir do

campo bifásico (ferrita + austenita), pela transformação de uma parte da austenita

em ferrita antes que um resfriamento rápido transforme a austenita restante em

martensita.

2.2.2 Aços Ferrítico-Bainíticos (FB)

Os aços ferrítico-bainíticos são laminados a quente e possuem uma

microestrutura refinada de ferrita e bainita como segunda fase. O reforço é obtido

por refino de grão e endurecimento da segunda fase. Estes aços são caracterizados

por boas propriedades de resistência a fadiga, boa soldabilidade e bom

desempenho em termos de impacto.

2.2.3 Aços Complex Phase (CP)

Os aços de fase complexa, referidos na literatura como “Complex Phase”,

são caracterizados por uma microestrutura muito fina de matriz ferrítica e uma

fração volumétrica alta de fases mais duras, como martensita e bainita, com um

reforço adicional de precipitados de nióbio, titânio ou vanádio.

Esta classe de aços é caracterizada por alta capacidade de absorção de

energia e de deformação.

2.2.4 Aços Martensíticos

Os aços martensíticos possuem uma microestrutura com praticamente 100%

de martensita e pouca quantidade de ferrita e/ou bainita. É adicionado carbono a

este aço para aumentar o endurecimento e a resistência. Manganês, silício, cromo,

molibdênio, boro, vanádio e níquel também são usados em várias combinações

para aumentar o endurecimento.1

2.2.5 Aços TRIP

Em 1967, Zackay et al.9 descreveram que o aumento de resistência e

ductilidade de um aço austenítico poderia ser realizado a partir de uma

transformação martensítica induzida por uma carga aplicada, ou seja, a partir de

uma deformação plástica, a austenita retida se transformaria em martensita. Os

autores sugeriram então, que a classe de aços que apresentasse esta característica

fosse chamada de “TRansformation Induced Plasticity – TRIP”.

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Muitas pesquisas sobre o efeito TRIP foram realizadas nos anos 70, focadas

principalmente em aços inoxidáveis austeníticos. Na década de 80, foi sugerido

que este efeito poderia ocorrer em aços de baixa liga, desde que houvesse certa

quantidade de austenita retida em sua microestrutura.

A partir da década de 90, várias pesquisas verificaram o efeito TRIP a partir

da metaestabilidade da austenita retida, em aços multifásicos de baixa liga

contendo concentrações mais altas de Si e Mn.10,11,12 Na maioria destes trabalhos a

denominação mais utilizada foi “Aços Assistidos pelo Efeito TRIP” – TRIP-

assisted steels ou “Aços TRIP”.

O efeito TRIP é reconhecido como um método útil para o desenvolvimento

de novas classes de aços com propriedades de alta resistência e boa

conformabilidade. Estas propriedades em aços TRIP e outros multifásicos não são

resultado apenas do endurecimento por solução sólida, refino de grão e

endurecimento por precipitação, mas também devido à existência de fases duras e

macias em diferentes tamanhos de grão. Estas propriedades são controladas pelo

ajuste do tipo, tamanho, fração volumétrica e distribuição espacial das diferentes

fases, que também possuem uma função importante no mecanismo de fratura

destes materiais.13,14,15

Os aços TRIP oferecem ótimas propriedades de resistência e ductilidade

devido à sua microestrutura complexa, que associa ferrita pró-eutetóide, bainita e

frações significativas de austenita retida, gerada ao final de um esquema de

tratamento térmico específico, que será detalhado em seguida. A exploração do

efeito TRIP como um mecanismo particular de deformação constitui um dos

aspectos chave do processamento destes materiais. O efeito TRIP resulta da

transformação martensítica induzida por deformação a partir da austenita

metaestável. Esta transformação constitui um mecanismo de endurecimento por

deformação que evita a ocorrência de deformações localizadas, aumentando o

alongamento uniforme e a taxa de encruamento.

Em particular, a austenita retida desempenha um importante papel no

aumento da absorção de energia nestes aços multifásicos. Porém, é necessário que

durante a fabricação da chapa ou componente nem toda a austenita retida seja

transformada, deixando uma quantidade significativa para a transformação e

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conseqüente absorção de energia durante o uso, como no caso do impacto de um

automóvel em uma eventual colisão.

2.2.5.1 Processamento

Atualmente, inúmeras rotas de processamento vêm sendo projetadas

dependendo do produto final ser laminado (a quente ou a frio) e/ou galvanizado.

A produção de aços TRIP laminados a quente ainda é um problema de pesquisa.

Até o momento, as pesquisas se concentraram em estudar os efeitos do tratamento

térmico após a laminação a frio, de modo a obter uma microestrutura final

multifásica contendo fração volumétrica de austenita retida suficiente para

garantir o efeito TRIP posterior.12,16

O tratamento térmico após a laminação a frio é constituído de 2 etapas,

como mostra a Figura 2. Primeiramente, o aço sofre um recozimento intercrítico

na faixa de temperatura entre 780 e 880°C, seguido de um resfriamento

controlado, onde a austenita transforma-se primeiramente em ferrita e na etapa

subseqüente, de tratamento isotérmico bainítico a 400°C, decompõe-se em bainita.

O tratamento térmico é finalizado por um resfriamento ao ar.17

Figura 2 – Tratamento térmico sofrido pelo aço TRIP após laminação a frio.

Como mostrado na Figura 2, a transformação bainítica que ocorre durante o

tratamento isotérmico é incompleta, por isso, a austenita é retida na microestrutura

final. Portanto, a microestrutura deste aço após o tratamento térmico é constituída

de bainita e austenita retida dispersas em matriz ferrítica, como mostra a Figura 3.

A porcentagem de ferrita é determinada principalmente durante a laminação e o

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recozimento intercrítico, já as quantidades de austenita retida e bainita dependem

da cinética da transformação bainítica do processo térmico ou termomecânico

realizado e da estabilidade da austenita retida. A escolha do tempo de reação

bainítica depende da combinação de muitos fatores como, por exemplo, a

composição química, a temperatura de tratamento utilizada e o tamanho de grão

da austenita de partida.

Figura 3 – Microestrutura do aço TRIP 800 a ser estudado. Ataque: Nital

1%.

Durante o resfriamento controlado até a temperatura ambiente, a austenita

pode se transformar espontaneamente em martensita caso não seja suficientemente

enriquecida em carbono, sem necessidade de deformação.

A contribuição de cada microconstituinte ainda não é totalmente clara no

comportamento mecânico desses aços, por isso recentemente, tem sido enfocada a

contribuição de cada fase e a influência do tratamento termomecânico na intenção

de otimizar suas propriedades mecânicas sem comprometimento de sua

conformabilidade.18

2.2.5.2 Elementos de liga

Os elementos de liga são adicionados aos aços TRIP pelos seguintes

motivos:

• otimizar a fração de austenita retida;

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• evitar a precipitação de cementita;

• aumentar a temperabilidade para evitar a formação de perlita.19

Uma composição da liga apropriada consiste em um conteúdo de carbono

suficientemente alto (0.1–0.2 % em peso) e pequenas adições de Si, Al e Mn (na

faixa de 0–2 % em peso cada). Pequena quantidade de fósforo (100 ppm) também

pode ser adicionada.20

Carbono

O carbono é o principal elemento de liga pelo qual todas as transformações

de fase são afetadas e por meio do qual a microestrutura final e as propriedades

mecânicas são controladas. A concentração de carbono é o fator de maior

importância na estabilidade da austenita, pois este torna possível a presença de

austenita retida na temperatura ambiente.

A estabilidade da austenita retida pode ser determinada principalmente pelo

tamanho de grão da austenita prévia e pela composição, especialmente pelo teor

de carbono.3,21,22,23 Para baixos teores de carbono, a austenita retida começa a se

transformar quase imediatamente após a deformação. Para altos teores de carbono,

a austenita retida é mais estável e começa a se transformar apenas a níveis de

deformação acima dos níveis usuais de conformação. Nestes teores de carbono, a

austenita retida persiste até o final do processamento térmico e no futuro,

mediante deformação plástica, a austenita retida transforma-se em martensita.

A demanda por aços TRIP de maior resistência (800 – 1200 MPa) para

aplicações na indústria automotiva pode ser alcançada aumentando o teor de

carbono para 0,4%, porém altos teores deste elemento implicam sérios problemas

na soldabilidade por processos de fusão. Portanto, uma alternativa seria a adição

de elementos de liga como Ti, Nb e V, por exemplo.24

Manganês

O manganês é adicionado porque além de aumentar a resistência do material

através do endurecimento por solução sólida, é um elemento estabilizador de

austenita que diminui a temperatura de início de transformação AR3 e aumenta a

solubilidade do carbono na austenita, possibilitando o enriquecimento em carbono

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desta fase. Além disso, deve-se considerar o efeito inibidor do Mn na formação da

ferrita durante o resfriamento, uma vez que este minimiza um possível

enriquecimento de carbono desta fase.

O Mn também diminui a temperatura na qual a cementita começa a

precipitar e retarda a formação de perlita.

Silício

Assim como o Mn, o silício também aumenta a resistência do material

através do endurecimento por solução sólida. Além disso, o Si é um elemento

pouco solúvel na cementita, retardando ou prevenindo completamente a

precipitação desta durante a formação da bainita.

Entretanto, o Si é um elemento que pode ser oxidado durante o recozimento,

comprometendo a qualidade superficial de produtos planos laminados a quente e a

qualidade do revestimento do aço laminado a frio. Para resolver este problema,

alguns pesquisadores começaram a utilizar aços TRIP que substituíssem

parcialmente o Si pelo alumínio, que se comporta de maneira similar ao Si

retardando a formação de cementita.4,25

Alumínio

O alumínio pode substituir o Si por ter o efeito de retardar a formação da

cementita, porém apresenta este efeito mais fraco quando comparado ao Si. Além

disso, o Al aumenta a cinética de formação da bainita, resultando em aumento de

ductilidade. Porém, pode-se mencionar como desvantagem do uso do Al o

aumento acentuado da temperatura Ms e a capacidade de endurecimento por

solução sólida que é significantemente menor que a do Si. Esta pode ser

compensada pela adição de fósforo.

Fósforo

O fósforo é usado quando a adição de Al e Si precisam ser limitadas. Baixas

concentrações do elemento (< 0,1%) são suficientes para inibir a formação de

cementita e aumentar a resistência do material, pois se trata de um elemento com

alta capacidade de endurecimento por solução sólida.

Nióbio

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O nióbio atua como refinador de grão por ser um elemento fortemente

formador de carbonetos. Por outro lado, a presença do Nb em solução sólida pode

favorecer o enriquecimento de carbono da austenita remanescente, contribuindo

com a estabilidade da mesma. Isso leva a uma maior conformabilidade, devido ao

aumento do efeito TRIP associado à austenita remanescente.26,27

Cobre

Assim como o Si, o cobre aumenta a resistência do material por

endurecimento por solução solida e endurecimento por precipitação. Sendo um

estabilizador de austenita, este elemento ajuda a reter austenita. Assim, pode-se

pensar em substituir Si por Cu por dois motivos: retenção de austenita e aumento

de resistência. Além disso, o cobre também retarda a precipitação de cementita e

aumenta a resistência à corrosão.

2.3 Soldagem por fricção e mistura mecânica

A dificuldade de executar soldas de alta resistência, resistentes a fadiga e

fratura, em ligas de alumínio para a indústria aeroespacial, tais como as séries

2XXX e 7XXX hiperligadas, inibiu por muito tempo a utilização ampla de

soldagem para união de estruturas aeroespaciais. Estas ligas de alumínio são

geralmente classificadas como não-soldáveis devido a microestrutura de

solidificação deficiente, a porosidade na zona de fusão e o superenvelhecimento

na zona termicamente afetada. Além disto, a perda em termos de propriedades

mecânicas é muito significativa em comparação com o metal de base. Estes

fatores desestimulam a união destas ligas por processos de soldagem

convencionais. Algumas ligas de alumínio podem ser soldadas por resistência,

mas o preparo da superfície é dispendioso, constituindo o óxido na superfície um

problema sério.

A soldagem por fricção e mistura mecânica, conhecida na literatura por

Friction Stir Welding (FSW) foi inventada e patenteada em 1991 pelo The

Welding Institute (TWI) na Inglaterra como uma técnica de soldagem no estado

sólido e foi inicialmente aplicada às ligas de alumínio.28

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O processo consiste em uma ferramenta giratória não-consumível com pino

e ombro especialmente projetados que são inseridos entre as chapas, que serão

unidas em configuração de junta de topo, avançando transversalmente ao longo da

linha da junta. A Figura 4 ilustra o processo descrito.

Figura 4 – Ilustração esquemática do processo FSW. Adaptada de 28

O processo FSW envolve deformação plástica e movimentação do material

complexa. Os parâmetros de soldagem, a geometria da ferramenta e a

configuração da junta exercem um efeito significante no modelo do fluxo de

material e na distribuição de temperatura, e conseqüentemente, influencia a

evolução microestrutural do material.

A geometria da ferramenta é o aspecto que mais influencia no

desenvolvimento do processo. Desempenha um papel importante no fluxo de

material e resulta no controle da taxa de movimentação lateral, na qual o FSW

pode ser executado.

A ferramenta exerce duas funções fundamentais: (a) aquecimento

localizado, e (b) movimento do material para produzir a união. O aquecimento

resulta inicialmente do atrito entre o pino e a peça a soldar na etapa inicial de

penetração da ferramenta. Um aquecimento adicional é gerado da deformação do

material. A ferramenta penetra na peça até que o ombro toque-a. O atrito entre o

ombro e a peça resulta na maior componente de aquecimento. No aspecto térmico,

o tamanho relativo ao ombro e pino é muito importante. O ombro também

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estabelece um confinamento para o volume de material aquecido. Geralmente usa-

se um ombro côncavo e um pino cilíndrico rosqueado.

A segunda função da ferramenta é misturar e movimentar o material. O

aquecimento localizado amolece o material ao redor do pino e a combinação da

rotação e translação da ferramenta conduz o movimento do material da frente do

pino para trás e de trás para frente, como mostra a Figura 5. Como resultado deste

processo a junção é produzida no estado sólido.

Durante o processo, o material sofre deformação plástica intensa a

temperaturas elevadas, resultando na geração de grãos equiaxiais recristalizados e

refinados. A microestrutura refinada deste processo de soldagem produz boas

propriedades mecânicas.

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Figura 5 – Fluxo de material no processo FSW.

FSW é um processo de soldagem no estado sólido que tem algumas

vantagens sobre os processos convencionais de soldagem por fusão. O FSW

consome consideravelmente menos energia e não utiliza gás de proteção, fazendo

com que o processo seja “ambientalmente correto”. A junção não envolve nenhum

metal de adição e por isso, qualquer liga de alumínio pode ser unida sem a

preocupação da compatibilidade de composição, o que é um problema nos

processos de soldagem por fusão. Quando desejado, ligas de alumínio dissimilares

e compósitos podem ser unidos com a mesma facilidade. A energia gerada

durante o processo de junção não é suficiente para fundir o material que está

sendo unido, assim, a zona termicamente afetada (ZTA) no processo por atrito

atinge menores temperaturas máximas e tende a ter propriedades melhores do que

a mesma zona nos processos de soldagem por fusão. Outra vantagem é que há um

refino de grão no ponto de solda comparado com a microestrutura fundida que se

forma nos processos convencionais.29 Alguns benefícios relevantes do FSW em

relação à solda por resistência são resumidos e apresentados na Tabela 1.

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Tabela 1 – Benefícios relevantes do processo FSW em comparação com os

processos convencionais.28

Benefícios Metalúrgicos Benefícios Ambientais

Excelentes propriedades metalúrgicas na área da junta.

Não requer gás de proteção .

Microestrutura refinada. Baixa emissão de ruídos.

Boa estabilidade dimensional e repetibilidade.

Economia de materiais consumíveis.

Não emite luz e fumos.

O rápido desenvolvimento do processo FSW em ligas de alumínio e sua

implementação bem sucedida em aplicações comerciais motivou a aplicação do

processo em outros materiais não-ferrosos (Mg, Cu, Ti, bem como seus

compósitos), aços e até mesmo termoplásticos. Além disso, FSW de ligas ou

metais diferentes atrai o interesse dos pesquisadores devido à importância

potencial na engenharia e os problemas associados com a soldagem convencional.

Entretanto, um possível obstáculo para o sucesso comercial do FSW em materiais

de alta temperatura como o titânio e o aço é na identificação e/ou

desenvolvimento de materiais apropriados para a ferramenta e vantagens sobre os

métodos convencionais de soldagem.

2.3.1 Soldagem por fricção e mistura mecânica em aços

Embora o maior desenvolvimento do processo tenha sido com ligas de

alumínio, há um interesse considerável em estender a tecnologia para outros

materiais, como aços, por exemplo.28,30

As pesquisas de viabilidade do processo FSW em aços têm demonstrado

perspectivas promissoras para a aplicação do processo para junção de várias

classes de aços. Além de esforços para otimizar os parâmetros do processo e

entender a evolução microestrutural durante o processo FSW, um problema crítico

é identificar o material mais conveniente para a ferramenta. Uma exigência

essencial para o FSW é manter um diferencial adequado entre a dureza e as

propriedades a temperaturas elevadas da ferramenta e do material a ser trabalhado.

Como os aços possuem elevadas dureza e propriedades mecânicas mesmo a

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temperaturas muito altas, é importante selecionar materiais para ferramenta com

boa resistência a abrasão e tenacidade a temperaturas superiores a 1000 ºC.

Os materiais mais utilizados na soldagem por de FSW de aços são as ligas

de tungstênio31, ligas de molibdênio e o nitreto de boro cúbico PCBN

(Polycrystalline Cubic Boron Nitride). O PCBN é um material resistente ao

desgaste e super abrasivo, usado principalmente na soldagem por fricção de aços

de alta resistência, como os aços alta resistência baixa liga (ARBL)32 e AHSS.

Lienert e Gould 30 e Lienert et al.33 relataram que a maioria das ferramentas

desgastaram durante o período inicial de penetração, no início de cada solda.

Além disso, Thomas et al.34 sugeriram que o pré-aquecimento das peças a soldar

pode ser benéfico para aumentar a velocidade de soldagem e minimizar o desgaste

da ferramenta.

Em 1999, Thomas et al.34 publicaram o primeiro trabalho sobre FSW em

aços na literatura aberta. O trabalho versa sobre a viabilidade da soldagem de aços

baixo carbono, liga de aço contendo 12% de cromo e combinações de aços

dissimilares (aço 12% cromo – aço carbono) pelo processo FSW. Estas soldas

dissimilares foram usadas para indicar características do fluxo de material

associado com o processo. O trabalho também descreve vantagens e limitações do

processo e conclui que é necessário o desenvolvimento do processo, mas que este

já se mostrou viável.

Konkol et al.31 desenvolveram parâmetros preliminares para a soldagem de

aços alta resistência baixa liga do tipo ARBL-65 pelo processo FSW utilizando

ferramenta de tungstênio, que foi publicado em 2001. Os aços ARBL-65 estão

sendo considerados pela marinha americana uma boa aplicação estrutural para

embarcações. Em 2003, publicaram outro trabalho 32 caracterizando este mesmo

aço quando soldado pelo processo FSW, mas desta vez utilizaram a ferramenta de

PCBN devido ao desgaste ocorrido na ferramenta de tungstênio utilizado no

trabalho anterior. Os resultados mostraram que o processo é viável para unir uma

variedade de aços de aplicação estrutural.

No mesmo ano, Lienert et al. 33 fizeram um estudo de viabilidade do FSW

utilizando aço doce. Para este estudo foram utilizadas ferramentas feitas com ligas

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a base de molibdênio e tungstênio, que desgastaram provavelmente durante o

estágio de penetração da ferramenta. Porém, o processo se mostrou viável para o

material utilizado. Ainda em 2003, Reynolds et al.35 estudaram a soldagem por

FSW em aços DH36 utilizando ferramenta de tungstênio.

Desde então muitos outros artigos tem sido publicados sobre este processo,

inclusive para aços inoxidáveis.

2.4 Soldagem a ponto

Atualmente, a indústria automotiva tem um grande interesse na aplicação de

aços AHSS resultando no aumento da demanda de processos de soldagem a

ponto.36 A soldagem por resistência elétrica (conhecido na literatura de língua

inglesa por Resistance Spot Welding – RSW) é o processo de soldagem mais usado

atualmente na indústria automotiva.37 Entretanto, o principal problema deste

processo é a taxa de resfriamento extremamente alta, que provoca a formação de

martensita no ponto da solda, resultando em uma fratura frágil.38 Outro problema

na soldagem de aços AHSS galvanizados pelo processo de RSW é o curto tempo

de vida útil do eletrodo, devido à reação química entre o eletrodo de cobre e o

recobrimento de zinco.

Todavia, o sucesso do processo de FSSW em algumas ligas de alumínio,

como a primeira aplicação do processo utilizando liga de alumínio em um carro

de produção em massa, o RX-8 modelo 2003 da Mazda,39 motivou a pesquisa

dessa tecnologia para aços AHSS.40

2.5 Soldagem a ponto por fricção e mistura mecânica

Soldagem a ponto por fricção e mistura mecânica, conhecida na literatura de

língua inglesa como “Friction Stir Spot Welding” (FSSW), é uma nova variante

do processo FSW capaz de ser aplicada nas indústrias automotiva e aeroespaciais.

É um processo no estado sólido que vem sendo estudado pela indústria

automotiva com a tendência de ser econômico para ligas estruturais de baixo peso,

como o alumínio.41

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36

Os processos FSSW podem ser classificados em duas categorias distintas. A

primeira categoria foi patenteada pela Mazda42 e nomeada de “Spot Friction

Welding” (SFW), mas é freqüentemente denominada por FSSW. A segunda

categoria foi nomeada de “Friction Spot Welding” (FSpW) e patenteada pelo

Instituto Alemão GKSS.43 A diferença básica entre as duas categorias é a

ferramenta utilizada na junção das chapas que deixa o furo característico ou

preenche-o, respectivamente.

No processo SFW, denominado neste documento como FSSW, a ferramenta

é uma peça única que consiste de um pino e um ombro, similar à ferramenta

utilizada no processo FSW. O processo FSSW consiste em três etapas, como

mostra a Figura 6: Penetração, mistura e retração.

Figura 6 – As etapas do processo FSSW.44

Durante a etapa de penetração, a ferramenta giratória penetra nas chapas a

serem soldadas até que o ombro atinja a superfície de topo da chapa superior e a

profundidade de penetração especificada seja alcançada. Na segunda etapa, a

rotação do ombro e do pino da ferramenta deforma o material plasticamente.

Finalmente, a terceira etapa consiste na retração da ferramenta, que deixa o furo

característico no meio da junta, como mostra a Figura 7.

Penetração Mistura Retração

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Figura 7 – O furo característico deixado pela retração da ferramenta.

O aquecimento gerado pelo atrito na interface da ferramenta e da peça a

soldar e a mistura do material plastificado na peça lideram o desenvolvimento da

solda. O processo é muito rápido e o ciclo da solda pode ser concluído dentro de

poucos segundos.45

É reportado na literatura que o fluxo de material no processo comporta-se

como é mostrado na Figura 8.

Figura 8 – Fluxo de Material FSSW.42

Gendo et al.46 estudaram a viabilidade do emprego do processo FSSW

utilizando materiais dissimilares, no caso alumínio e aço. A caracterização

microestrutural da interface aço/Al mostrou que o zinco presente no recobrimento

do aço foi incorporado ao ponto de costura e foram encontrados alguns óxidos Al-

Zn nesta interface. Este resultado sugere que fases intermetálicas podem ter sido

formadas em camadas descontínuas, obtendo uma boa resistência da junta.

O FSpW, é um processo de preenchimento do furo devido a ferramenta

utilizada, que consiste em três partes: pino, ombro (em verde na Figura 9) e

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braçadeira (em vermelho na mesma figura). Apesar de terem a mesma velocidade

angular, o pino e o ombro têm movimentos independentes. Por isso, o processo

FSSW é considerado mais rápido que o processo FSpW.

O processo FSpW tem duas variantes: a penetração do pino e a penetração

do ombro. Inicialmente, as duas chapas que serão soldadas são fixadas para

restringir as deformações causadas pelo processo de soldagem.

Na Figura 9 são mostradas as quatro etapas do processo com a variante de

penetração independente do pino.47 Na primeira etapa (a), o pino e o ombro giram

com a mesma velocidade angular e com a mesma taxa de penetração. Durante a

segunda etapa (b), o pino penetra nas chapas até que a profundidade de penetração

especificada seja atingida e desloca o material para a lacuna entre o ombro, a

braçadeira e as chapas. Durante a terceira etapa (c), o pino retrai enquanto o

ombro desce na direção das chapas empurrando o material da lacuna de volta para

a chapa. Finalmente, na quarta etapa (d), quando o pino e o ombro alcançam

juntos a superfície da chapa, o pino, o ombro e a braçadeira são retraídos de volta.

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Figura 9 – Etapas do processo FSpW com a variante de penetração do pino.47

Na Figura 10 são mostradas as quatro etapas do processo com a variante de

penetração do ombro, que é muito similar à variante de penetração do pino.

Ombro

Braçadeira

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Figura 10 – Etapas do processo FSpW com a variante de penetração do

ombro.47

Até a presente data, a maioria das pesquisas sobre o processo FSSW foi

realizada em ligas de alumínio. Apesar dos problemas de soldabilidade do

alumínio pelos processos convencionais, estas ligas são relativamente fáceis de

soldar por FSSW devido à facilidade de deformação a baixas temperaturas (<

550ºC).48

2.5.1 Soldagem a ponto por fricção e mistura mecânica em aços

AHSS

Em 2005, Feng et al.48 publicaram um estudo de viabilidade do processo em

aços da classe AHSS, DP600 e martensíticos (M190), utilizando ferramenta de

PCBN.

Em 2006, Kyffin et al.49 avaliaram o desempenho em relação à resistência ao

desgaste de alguns materiais para fabricação da ferramenta, como PCBN, nitreto

de silício (Si3N4), carbeto de silício (SiC) e tungstênio rênio (W-Re) em FSSW de

aços DP800. O desempenho da ferramenta de SiC foi insatisfatório, ocorrendo

falha catastrófica após o primeiro ponto de solda. A resistência ao desgaste dos

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pinos utilizando estes materiais seguiu a seguinte hierarquia: PCBN > W-Re >

Si3N4> SiC.

Ainda no mesmo ano, Kyffin et al.50 compararam o efeito de parâmetros

principais do processo FSSW como a velocidade de rotação da ferramenta e o

tempo de espera em soldas utilizando a ferramenta de Si3N4 com aços DP800.

A viabilidade da junção de aços de alta resistência usando FSSW está sendo

estudada, porém, o desempenho de juntas soldadas ainda é desconhecido devido à

falta de normas para o processo recém inventado. A utilização crescente de aços

da classe AHSS no projeto de automóveis vem enfatizando a necessidade de se

verificar de que maneira a união mediante FSSW admite comparação direta com o

processo convencional, por resistência elétrica.37

No entanto, como explicado anteriormente, a soldagem por resistência

elétrica apresenta muitos problemas, como por exemplo, taxa de resfriamento

extremamente alta, curto tempo de vida útil do eletrodo – devido à reação química

entre o eletrodo de cobre e o recobrimento de zinco.51

Além dos recentes estudos do processo em alguns aços AHSS, como DP e

M190, em 2007, Hovanski et al.40 avaliaram o processo para aços AHSS mais

problemáticos, como os aços martensíticos ao boro estampados a quente (“hot-

stamped boron steel” -HSBS).

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