2. História do Direito Internacional Privado

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Universidade Estadual de LondrinaCurso de Direito Departamento de Direito Privado Disciplina: Direito Internacional Privado 5PRI028 Prof Maria de Ftima Garbuio [email protected]

I - Direito Internacional Privado Noes Introdutrias Bibliografia: ARAUJO, Nadia de. Direito Internacional Privado Teoria e Prtica Brasileira. 3 Ed. So Paulo: Ed. Renonar, 2006 BRASIL, Constituio da Repblica Federativa do Brasil, promulgada em 05.10.1998, BRASIL, Cdigo Civil Brasileiro de 1916 e de 2002 DEL OLMO, Florisbal de Souza. Direito Internacional Privado Abordagens Fundamentais Legislao e Jurisprudncia. 6 Ed. Rio de Janeiro: Ed.Forense, 2008 DINIZ, Maria Helena. Lei de Introduo ao Cdigo Civil Brasileiro Interpretada, 15 Ed. So Paulo: Ed. Saraiva, 2010. DOLINGER, Jacob. Direito Internacional Privado. Parte Geral. 9 Ed. So Paulo: Ed. Renovar, 2008 MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 4 Ed. So Paulo: RT, 2010 RECHESTEINER, Beat Walter. Direito Internacional Privado teoria e prtica. 12 Ed. So Paulo: Editora Saraiva, 2009

SumrioHistrico do Direito Internacional Privado Antiguidade Grcia Roma Feudalismo Glosadores e ps-glosadores Escolas Estatutrias Escola Estatutria Italiana Bartolo Escola Estatutria Francesa Escola Estaturia Holandesa Codificao modernas: Cdigo Civil da Frana (1804); Cdigo Civil do Chile (1855); Cdigo Civil da Itlia (1865) e da Alemanha (1896) Cdigo Civil do Chile Doutrinas Modernas Joseph Story Friedrich Carl Von Savigny Pasquale Mancini Direito Internacional Privado no Brasil Antes da Independncia Teixeira de Freitas Pimenta Bueno Clvis Bevilqua

Histrico do Direito Internacional Privado - AntiguidadeNo existiam normas de DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO (DIP) O Estrangeiro era considerado inimigo. No inspirava confiana e no praticava a mesma religio (fonte garantidora das leis e do direito) Fustel de Coulanges A Cidade Antiga - o estrangeiro, nem em Roma, nem em Atenas, tinha direito algum O Estrangeiro no tinha direitos: no podia casar, herdar, contratar ou praticar o comercio

Desenvolvimento social e necessidade de sistema jurdico para os estrangeirosVrias circunstncias passam a ensejar relaes entre os povos (expedies militares, guerras e intercmbio comercial) e isto impunha o surgimento de algum tipo de justia para os estrangeiros.

Histrico do Direito Internacional Privado - GrciaO estrangeiro em Atenas chamado meteco no tinha status de cidado O meteco que podia ter certos direitos polticos e civis denominado istele. Pagava uma taxa especial para poder exercer atividades comerciais Judicatura prpria Polemarca (proteo famlia e bens) Prxeno que orienta o estrangeiro em negcios e interesses Asilia tratado entre as cidades, origem dos atuais tratados de DIP

Histrico do Direito Internacional Privado - RomaO estrangeiro, a princpio vendido como escravo tinha seus bens seqestradosReconhecimento de alguns direitos no Jus Gentium surge a denominao PEREGRINO para o estrangeiro Judicatura prpria Pretor Peregrino para solucionar as questes entre os romanos e estrangeiros, ou entre estes somente, desde que residentes em Roma. Podia criar ou transformar o direito se tal exigissem as necessidades da prtica.

Histrico do Direito Internacional Privado - RomaHavia absoluta territorialidade das leis. Posteriormente, com a Invaso Povos Brbaros passam a viver no mesmo territrio, pessoas de diferentes origens, adotado o Princpio da Personalidade das Leis: na soluo da lide o julgador aplica a lei de cada um (visigodo, lombardo, romano etc...)

Histrico do Direito Internacional Privado - FeudalismoFormao de grandes feudos O Senhor Feudal agia como rei em seu territrio determinando o modo de viver de seus sditos Dentro de suas domnios o senhor feudal admitia apenas a sua lei. a territorialidade da lei, o jus soli. As relaes entre as pessoas so regidas pela lei da localidade em que se encontram, no importando a sua nacionalidade (se estrangeira ou no)

Histrico do Direito Internacional Privado Norte da Itlia - EstatutosO feudalismo no se firma nas cidades do norte da Itlia, onde era grande o intercmbio comercial e industrial entre as cidades de Florena, Veneza, Piza, Perusa, Milo, Bolonha e Mdena. Estas eram verdadeiras repblicas autnomas, com direito prprio, o Statuta, resumo do antigo direito costumeiro das cidades e dos comerciantes, em oposio LEX, direito romano, que era o direito comum, geral, aplicvel quando omisso o direito particular da cidade. Os estatutos continham prescries administrativas, penais, civis e comerciais ( Gnova - 1145, Pisa 1161, Ferrara 1208, Milo 1216, Mdena 1218, Verona 1228, Veneza 1242). O intercmbio entre as cidades comeou a defrontar-se com fatos que requeriam solues jurdicas, no dirimidas da mesma forma em seus estatutos. No havia at esse momento normas de DIP para disciplinar tais relaes.

Escolas dos Glosadores e PsGlosadoresIrnerius - (1100) - instituiu o ensino do direito romano na Escola de Bolonha (onde surge a escola dos glosadores) O trabalho dos glosadores foi uma espcie de colheita de tudo existente no Direito Romano relacionado ao convvio de Roma com os estrangeiros. Sculos XIII e XIV Escola dos ps-glosadores, comentaristas ou bartolistas, em Perusa, Pisa e Pvia. Bartolo (1314-1357) de Saxoferrato, considerado o pai do Direito Internacional Privado. Os ps-glosadores no se limitavam a notas explicativas, redigiam, sobre as glosas, comentrios prprios, buscando e criando um direito novo, comum de possvel aplicao s situaes de seu tempo.

Escolas EstatutriasAs cidades do norte da Itlia, que se caracterizavam por sua soberania, dispunham de legislao prpria, independentemente do direito romano e do direito germnico: Estas leis municipais ou provinciais eram conhecidas como Estatutos, contendo normas sobre os mais variados campos do direito, incluindo prescries administrativas, de Direito Penal, Direito Civil e Direito Comercial.

Escola Estatutria Italiana - Sc.XI a XIIIBartolo criador da escola estatutria italiana dividiu os estatutos: - direitos reais (lei da situao da coisa) - e direitos pessoais (ligados pessoa) Bens imveis: lei da localizao da coisa

Sucesso: domicilio do falecido.Formalidade na sucesso: lugar da elaborao do ato. Contratos e seus efeitos: lugar da celebrao (para as obrigaes) e da execuo (para negligncia e mora) Delitos: lei do lugar do ato. Norma hoje adotada no Direito Internacional Privado como regra bsica no s no campo do Direito Penal, como tambm para a responsabilidade civil.

Escola Estatutria Francesa sc. XVICharles Dumoulin (1500-1566) - criador da teoria da autonomia da vontade, faculdade de as partes estabelecerem a lei que deve reger a validade de um contrato. E se no indicada a lei, j a escolha do local para a realizao do contrato indica a vontade dos contratantes.

Escola Estatutria Francesa sc. XVIBernard d Argentr (1519-1590) criador do territorialismo as leis estrangeiras no deveriam ser aplicadas na Bretanha, de maneira que todos os bens imveis sitos em seu territrio e todas as pessoas nele domiciliadas deveriam ser regidas pelas leis locais, restringindo-se ao mximo a aplicao da lei estrangeira.Era dogmtico e punha acima de tudo a sua lei; o normal, dizia ele, que o juiz aplique sua prpria lei, e s excepcionalmente admite invocar lei estrangeira.

Escola Estatutria Francesa sc. XVISistematiza a distino entre: - o estatuto real (concernente aos bens), de carter territorial,

- e o estatuto pessoal (concernente estritamente a questes da personalidade.

pessoa),

- estatuto misto em que integrou os estatuto que concernem s pessoas conjuntamente, aplicando a esta categoria as mesmas regras que aplicava aos estatutos reais.

Escola Estatutria Francesa sc. XVIAdmitiam que os bens mveis seguissem a pessoa. Todas as instituies reais e mistas seriam regidas pela lei territorial e as instituies pessoais pela lei pessoal, adotado o critrio do domiclio da pessoa (e no de sua nacionalidade), opo esta tambm de carter territorialista.

Na dvida sobre a natureza de um estatuto ou costume, deveria ser considerado real.

Escola Estatutria Holandesa, sc. XVIIPaul e Jena Voet, Ulrich Huber Christian Rodenburd e

Evoluram para um territorialismo mais acentuado visto que submetiam os mveis ao estatuto real, e no ao pessoal como no estatuto francs.

Ulrich Huber : De conflictu legum diversarum in diversis imperis, em que enunciou trs princpios:As leis de cada Estado imperam dentro das suas fronteiras e obrigam a todos os sditos deste Estado, mas no produzem efeitos alm desses limites; Sditos de cada Estado so todos aqueles que se encontram no seu territrio; Os soberanos conduzem-se de modo a tornar possvel que as leis de cada pais, depois de terem sido aplicadas dentro das suas fronteiras, conservem sua fora e eficcia alm das fronteiras, o que ocorre pela teoria da comitas gentium, cortesia internacional, que permite aplicao extraterritorial das leis internas.

Ulrich Huber e o Princpio do Territorialismo

Huber, com seu territorialismo e sua teoria de que s se admite aplicar a norma jurdica estrangeira na medida em que ela tenha criado direitos adquiridos, teve enorme influncia no direito angloamericano.

Codificaes ModernasA cincia jurdica inaugura o sculo XIX, regras bsicas sobre a soluo dos conflitos de leis: Cdigo Civil de Napoleo (1804) Cdigo Civil italiano (1865) Cdigo Civil alemo (1896)

Codificaes ModernasCdigo Civil do Chile - Andrs Bello primeiro autor de obra sobre direito internacional privado na Amrica. Este cdigo estabeleceu em seu artigo 57, que: a lei no reconhece diferena entre o chileno e o estrangeiro quanto aquisio e gozo dos direitos civis que regra este cdigo. Era um princpio novo, no estabelecido ainda em nenhuma codificao civil do mundo, nem mesmo a francesa, que exigia, rigorosamente, reciprocidade diplomtica e legislativa para reconhecimento desses direitos.

Doutrinas ModernasNo sculo XIX doutrinadores: Story, Savigny e Mancinitais doutrinas tiveram retumbante influncia nas leis, na jurisprudncia, nas convenes e nos tratados de Direito Internacional Privado, nos sculos XIX e XX.

Joseph Story:EUA, 1834 Harvard Conflict of LawsEquidade dos conflitos de leis e criou a expresso direito internacional privado ensinou Europa uma concepo baseada na equidade dos conflitos de leis, livre da estreiteza da diviso estatutria Story substituiu a gentileza internacional, a cortesia, pelo princpio - busca da boa justia na aplicao do direito estrangeiro.

Private International Law.

Joseph Story:EUA - Estabeleceu regras sobre a lei a ser utilizada para cada setor do direito:estado e capacidade das pessoas: fixou a regra geral do domicilio, excetuada a capacidade de contratar, para a qual adotava a lei do local do contrato; para o casamento sujeitava a capacidade, a forma e a validade lei do lugar da celebrao; em matria de regime de bens, havendo contrato, respeitar-se-ia o que tivesse sido pactuado, e inexistindo pacto, os mveis se regeriam pela lei do domicilio conjugal, os imveis, pela lei do lugar da sua situao.

Joseph Story:EUA - Estabeleceu regras sobre a lei a ser utilizada para cada setor do direito:

para os contratos, a lei do lugar de sua feitura, com ressalvas para a lei do lugar de sua execuo; os bens mveis, pela lei do domicilio do proprietrio, e os imveis, pela lei do local; sucesses, a mesma distino entre mveis e imveis.

A obra de Story influenciou a consolidao das regras de D.I.P. norte americanas, elaboradas em 1934 elo Instituto do Direito Americano.

Friedrich Carl Von Savigny: Berlim,1839 Sistema de Direito Romano Atual

Aventa a mesma soluo para o conflito de leis entre os diferentes povos. Defende o domicilio como o principal elemento de conexo.

Friedrich Carl Von Savigny: Berlim,1839 Sistema de Direito Romano Atual Pensamento de Savigny: O interesse dos povos e dos indivduos exige igualdade de tratamento das questes jurdicas, de forma que, em caso de coliso de leis, a soluo venha a ser a mesma, seja em que pais se realizar o julgamento.

Pasquale Mancini: Itlia Instituto de Direito InternacionalPrope a nacionalidade como elemento de conexo, como critrio determinador da lei a ser aplicada pessoa em todas as matrias atinentes a seu estado e sua capacidade, contrariamente ao princpio de Saviny, que optara pelo domiclio.A igualdade dos estrangeiros foi consagrada no art.3 do Cdigo Civil Italiano de 1865, e o princpio da nacionalidade como critrio determinador da lei pessoal esta, atualmente, estabelecido no art. 20 da lei sobre o Direito Internacional Privado, de 1995.

Pasquale Mancini: Itlia Instituto de Direito InternacionalPara Mancini certas questes sero sempre, necessariamente, regidas pela lei da nacionalidade da pessoa o estado e a capacidade, as relaes de famlia e as sucesses este o princpio da Nacionalidade. J as questes atinentes aos bens , assim como os contratos e demais obrigaes podem ser regidas pela lei que a pessoa escolher, so as leis supletivas, que compe o princpio da liberdade.

Pasquale Mancini: Itlia Instituto de Direito InternacionalE h um terceiro setor da vida humana em sociedade que submete forosamente s leis do foro: so as leis de direito pblico e certas leis privadas com forte conotao de ordem pblica, que as autoridades locais exigem sejam aplicadas indiferentemente para todos que se encontram sobre seu territrio. o princpio da Soberania.

Cdigo BustamantePrincpios Nacionalidade, Liberdade, Soberania esto claramente delineados no Cdigo Bustamante, art. 3, que assim dispe: Para o exerccio dos direitos civis e para o gozo das garantias individuais idnticas, as leis e regras vigentes em cada Estado contratante consideram-se divididas nas trs categorias seguintes:

Cdigo Bustamanteas que se aplicam s pessoas em virtude do seu domiclio ou da sua nacionalidade e as seguem, ainda que se mudem para outro pas, denominadas pessoais ou de ordem pblica interna (Nacionalidade);

Cdigo Bustamanteas que obrigam por igual a todos os que residem no territrio, sem ou no nacionais, denominadas territoriais, locais de ordem pblica internacional (Soberania);

Cdigo Bustamanteas que se aplicam somente mediante a expresso, a interpretao ou a presuno da vontade das partes ou de alguma delas, denominadas voluntrias, supletrias ou de ordem privada (Liberdade).

Cdigo BustamanteO critrio da nacionalidade foi aceito pela grande maioria das codificaes europias, pelo Instituto de Direito Internacional e pela Conferncia e Direito Internacional Privado da Haia, conforme vrias convenes por ela patrocinadas.

Direito Internacional Brasil (colonizao at a Independncia)Vigoraram no Brasil, do Descobrimento Independncia: Ordenaes Afonsinas Manuelinas e Filipinas Essas normas estavam impregnadas, no que se refere ao campo do direito internacional privado, da inspirao estatutria oriunda da Europa, tendo como base o princpio lcus regit actum para os contratos e a necessidade de prova do direito estrangeiro.

Teixeira de Freitas adotou o domiclio como principal elemento de conexo.O Regulamento 737 de 1850 completava o princpio lcus regit actum, determinando a lei do lugar da execuo para os contratos comerciais. Notvel influncia na codificao do direito sulamericano (Cdigo Civil Argentino). Escreveu Esboo do Cdigo Civil do Imprio, em 1860. Seguidor de Savigny. Defendeu o domicilio como o principal elemento de conexo.

Jos Antonio Pimenta Bueno adotou a nacionalidade como principal elemento de conexo.Em 1863 escreveu Direito Internacional Privado e Aplicao de seus Princpios com Referncia s Leis Particulares do Brasil.

Pimenta Bueno fez uma exposio sistematizada da matria. Inspirou-se na obra do alemo Foelix, radicado em Paris, e no Cdigo Napolenico, tornando-se intransigente defensor da nacionalidade como principal elemento de conexo.

Clvis BevilquaPublicou em 1906 Princpios de Direito Internacional Privado, reeditado em 1938. Defendeu o princpio da nacionalidade em alguns pontos, criticando-o em outros. Foi ele o principal autor do Cdigo Civil Brasileiro de 1916, em cuja Introduo consagrou-se a nacionalidade como o motivo de ligao mais importante no conflito das leis no espao.

Lei de Introduo ao Cdigo Civil BrasileiroA nossa vigente Lei de Introduo ao Cdigo Civil Brasileiro, LICC, de 1942, adotou o domicilio como principal elemento de conexo, dando ento razo a tese historicamente defendida por Teixeira de Freitas.Deve-se ressaltar que tal modificao ocorreu em plena II Guerra Mundial, perodo em que o nmero de alemes, italianos e japoneses residentes no Brasil era expressivo, podendo-se, pela legislao at ento vigente, verem-se aplicadas em nosso pais leis de naes tornadas inimigas.