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5 Tratados Internacionais e Medidas de Cooperação A cooperação internacional não depende da celebração de tratados para que possa ocorrer, porém não é possível negar a utilidade dos pactos formais de cooperação internacional em matéria penal. Esses pactos servem para delimitar o escopo da cooperação, deixando conhecido de antemão quais os limites que devem ser respeitados na prestação da ajuda, adaptam o ordenamento interno dos países signatários aos objetivos assumidos pelos Estados, padronizam os requerimentos e a forma de execução dos pedidos de auxílio, regulam o custeio das medidas de cooperação e, muitas vezes, velam pelos direitos das vítimas e dos suspeitos. Em 1985, o crescimento da criminalidade organizada transnacional fez com que o Sétimo Congresso da Organização da Nações Unidas para a Prevenção do Crime e Tratamento dos Criminosos adotasse, dentre as suas conclusões o “Plano de Ação de Milão”. 411 Junto com uma série de outras recomendações, o plano determina a tomada de uma série de providências, dentre as quais a criação de novos instrumentos internacionais dedicados ao combate à criminalidade transnacional e ao incremento da cooperação internacional em matéria penal. A partir de então, o número de tratados adotando e regulando medidas, novas e antigas, de cooperação internacional em matéria penal, vem crescendo de forma exponencial. Este capítulo se limitará a descrever, brevemente, os principais acordos internacionais que regem a matéria. As medidas de cooperação previstas nesses acordos serão examinadas no capítulo seguinte. 411 United Nations Department of International Economic and Social Affairs “Seventh United Nations Congress on The Prevention of Crime and the Treatment of Offenders. Milan 26 August – 6 September 1985 – Report prepared by the Secretariat”, p.63-68.

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5 Tratados Internacionais e Medidas de Cooperação

A cooperação internacional não depende da celebração de tratados para

que possa ocorrer, porém não é possível negar a utilidade dos pactos formais de

cooperação internacional em matéria penal. Esses pactos servem para delimitar o

escopo da cooperação, deixando conhecido de antemão quais os limites que

devem ser respeitados na prestação da ajuda, adaptam o ordenamento interno dos

países signatários aos objetivos assumidos pelos Estados, padronizam os

requerimentos e a forma de execução dos pedidos de auxílio, regulam o custeio

das medidas de cooperação e, muitas vezes, velam pelos direitos das vítimas e dos

suspeitos.

Em 1985, o crescimento da criminalidade organizada transnacional fez

com que o Sétimo Congresso da Organização da Nações Unidas para a Prevenção

do Crime e Tratamento dos Criminosos adotasse, dentre as suas conclusões o

“Plano de Ação de Milão”.411 Junto com uma série de outras recomendações, o

plano determina a tomada de uma série de providências, dentre as quais a criação

de novos instrumentos internacionais dedicados ao combate à criminalidade

transnacional e ao incremento da cooperação internacional em matéria penal. A

partir de então, o número de tratados adotando e regulando medidas, novas e

antigas, de cooperação internacional em matéria penal, vem crescendo de forma

exponencial.

Este capítulo se limitará a descrever, brevemente, os principais acordos

internacionais que regem a matéria. As medidas de cooperação previstas nesses

acordos serão examinadas no capítulo seguinte.

411 United Nations Department of International Economic and Social Affairs “Seventh United

Nations Congress on The Prevention of Crime and the Treatment of Offenders. Milan 26 August – 6 September 1985 – Report prepared by the Secretariat”, p.63-68.

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5.1 As Convenções da Organização das Nações Unidas

Tratados multilaterais destinados ao combate à criminalidade

transnacional não são novidades.412 Já sob a égide da Ligas das Nações, em 1933

foi firmada a Convenção Internacional para a Repressão do Tráfico de Mulheres

e Crianças. A partir de então, o número de pactos internacionais foi contra a

criminalidade foi crescendo, culminando com a Convenção das Nações Unidas

contra o Crime Organizado Transnacional de 2000, firmado em Palermo. A

Convenção de Palermo é o instrumento multilateral que maior atenção deu às

medidas de cooperação, indireta e direta, a serem empregados no combate à

criminalidade transnacional. A Convenção de Palermo foi construída sobre as

fundações lançadas com a Convenção de Viena Contra o Tráfico Ilícito de

Entorpecentes, de 1988, aumentando as medidas de cooperação nesta previstas,

bem como ampliando o alcance da cooperação em matéria penal.413

A Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias

Psicotrópicas veio fortalecer e complementar a Convenção Única de 1961 sobre

Entorpecentes, emendada pelo Protocolo de 1972 e a Convenção sobre

Substâncias Psicotrópicas de 1971, ambas da ONU. A Convenção de Palermo,

na sua estrutura, segue o modelo da Convenção de Viena contra o Tráfico de

Entorpecentes, expandindo o seu alcance para abranger a cooperação contra todos

os delitos praticados por organizações criminosas que tenha repercussão

internacional.

Os dispositivos convencionais mostram uma preocupação não só com a

persecução penal, na fase de investigação e na fase processual, mas na tipificação

412 *O Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional não regula a cooperação horizontal

entre Estados para o combate à criminalidade transnacional, mas a cooperação vertical no combate a delitos internacionais, razão pela qual não será analisado, a não ser eventualmente durante o curso do trabalho.*

413 * Sete outras convenções e protocolos adicionais, firmados sob a égide da ONU, prevêem a cooperação internacional em matéria penal, seja por meio de extradição, seja mediante assistência jurídica mútua, sem contudo especificar ou regular essas medidas: a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais; a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção; a Convenção Internacional para Supressão do Financiamento do Terrorismo; o Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança referente à venda de crianças, à prostituição infantil e à pornografia infantil; a Convenção Internacional sobre a Supressão de Atentados Terroristas com Bombas; a Convenção sobre a Proteção Física do Material Nuclear; da Convenção para a Repressão aos Atos ilícitos Contra a Segurança da Aviação Civil; e a Convenção Internacional Contra a Tomada de Reféns.

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e sanção de delitos, na formação de quadros, na organização e análise de dados

estatísticos e de estudos acadêmicos sobre a criminalidade organizada e no

desenvolvimento econômico e social dos países assolados pelas organizações

criminosas transnacionais, dentre outras medidas. Trata-se de uma abordagem

compreensiva, que busca estudar, entender e combater o fenômeno do crime

organizado transnacional com o auxílio de toda a sociedade internacional, indo

além da preocupação com a simples eficácia processual. Muitos dos dispositivos

relativos à cooperação internacional previstos na Convenção de Palermo são

reproduções ou ampliações de normas veiculadas pela Convenção de Viena.

Cumpre notar que as duas convenções são explícitas em reconhecer a sua

complementaridade a outros tratados sobre a assistência jurídica mútua em

assuntos criminais, inclusive os que ainda não tenham sido celebrados, bilaterais

ou multilaterais.

5.2 As Convenções Européias

O sistema regional europeu de combate á criminalidade transnacional conta

com uma série de tratados firmados sob á égide do Conselho da Europa e da

União Européia e organizações que a antecederam, como, por exemplo, a

Comunidade Econômica Européia e o Benelux. Cabe esclarecer que União

Européia e Conselho Europeu não se confundem. O Conselho Europeu é uma

organização internacional regional que antecede à União Européia e com ela

coexiste. O Conselho foi criado em 1949, com a celebração do Tratado de

Londres pelo Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte e pelos Reinos da

Bélgica, Dinamarca, Holanda, Noruega e da Suécia, além das Repúblicas

Francesa, Irlandesa, Italiana e o Grão Ducado de Luxemburgo. Hoje em dia o

Conselho é formado dia por 47 Estados, dele participando Estados que não

integram a União Européia. A União Européia, conta com 27 Estados e tem

origem na Comunidade Econômica Européia, fundada pelo Tratado de Roma, de

1957, e posteriormente, transformada em União Européia pelo Tratado de

Maastricht, de 1992. Ambas as instituições tem objetivos assemelhados e buscam

a integração da Europa, econômica, social e politicamente. Os pactos

internacionais multilaterais adotados pelos integrantes do Conselho da Europa

tendem a ter uma abrangência territorial maior do que aqueles firmados pelos

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integrantes da União Européia. Por outro lado como a maioria, senão todos, dos

integrantes da União Européia integram o Conselho da Europa, os pactos firmados

no âmbito dessa organização internacional acabam valendo dentro da União

Européia.

Os Estados europeus firmaram uma série de acordos internacionais sobre o

tema, como a Convenção Européia sobre Extradição, de 1957, o Tratado Benelux

de 1962, que regula a cooperação em matéria criminal entre Bélgica, Holanda e

Luxemburgo e o Acordo de Schengen de 1985 e a respectiva Convenção de

aplicação de 1990, adotado para eliminar barreiras alfandegárias, policiais e de

imigração dentro da União Européia. Apesar disso, é a Convenção Sobre

Assistência Mútua em Matéria Criminal do Conselho Europeu, firmada em

Estrasburgo, em 1959, o principal documento sobre o tema. A Convenção

Européia regula o trâmite de pedidos de auxílio em matéria criminal pelos Estados

Partes, estabelecendo as hipóteses de solicitação via carta rogatória ou por via

direta, entre autoridades judiciais de Estados europeus, para o fim de produção de

prova em processo criminal e na fase pré-processual. Talvez o aspecto mais

importante da Convenção de 1959 é que os modelos da ONU e da Comunidade

Britânica foram construídos sobre a experiência dos Estados Partes da Convenção

na aplicação desse instrumento convencional.414

Ao disposto pela Convenção de 1959, foram acrescidos dois Protocolos

Adicionais sobre Assistência Mútua em Matéria Criminal, o primeiro de 1978

que, além de estabelecer novas regras sobre reservas ao disposto pela Convenção

e dar uma nova redação ao artigo 22 da mesma, estendeu o alcance das medidas

de cooperação previstas originalmente na Convenção para abranger a interrupção

e suspensão de execução de sentenças e decisões judiciais e a persecução de

delitos fiscais. Entre esse primeiro Protocolo Adicional e o segundo, de 2001, foi

adotado pelos Estados que compõem a União Européia a Convenção Sobre

Assistência Mútua em Matéria Criminal de 2000.

Essa convenção acresceu ao disposto pelos pactos anteriores, adaptando-os

às necessidades atuais da justiça criminal. A cooperação direta entre autoridades

não-judiciais, inclusive por meio de medidas de informação espontânea, passou a

ser regulada de forma expressa pela Convenção de 2000. A Convenção da U.E.,

414 MCCLEAN, David. International Co-operation in Civil and Criminal Matters, p. 196 e 214.

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foi além da regulação do mero auxílio indireto ao tratar instrumentos processuais

e de combate direto à criminalidade transnacional, como a tomada de depoimentos

via videoconferência ou conferência por telefone ou a utilização de agentes

disfarçados em de investigações criminais.

O pacto somente tem validade entre os Estado que integram a União

Européia, o que justificou a adoção, pelos Estados que integram o Conselho da

Europa, do Protocolo Adicional de 2001 à Convenção Sobre Assistência Mútua

em Matéria Criminal do Conselho Europeu de 1959, que reformou o instrumento

original, adotando, com pequenas modificações, as inovações trazidas pela

Convenção da União Européia de 2000. Como as convenções da ONU os pactos

europeus ressaltam o seu caráter suplementar aos demais acordos em vigor ou que

venham a ser firmados sobre o tema, sejam estes bilaterais ou multilaterais.

5.3 As Convenções Americanas

A Organização dos Estados Americanos, seguindo o modelo das Nações

Unidas, patrocinou a celebração de quatorze convenções multilaterais sobre

assuntos penais, dessas convenções, somente as convenções sobre Extradição,

Carta Rogatória, Produção de Prova e Assistência Mútua regulam, de forma

específica, medidas de cooperação internacional 415 As demais convenções

abordam temas que vão além da cooperação internacional em matéria criminal. A

Convenção de Assistência Mútua o principal instrumento a regular a cooperação

direta entre os Estados que compõem a OEA.

A Convenção Interamericana sobre Assistência Mútua em Matéria Penal

conta 40 artigos divididos em seis capítulos. Além disso, a Convenção conta com

um Protocolo Facultativo, que cuida da possibilidade de cooperação em delitos

considerados de natureza fiscal. A Convenção foi celebrada em 1992, e o

415 * São elas as Convenções Interamericanas sobre Assistência Mútua em Matéria Penal e o

respectivo protocolo adicional; sobre o Cumprimento de Sentenças Penais no Exterior; contra a Corrupção; a Convenção Interamericana contra o Terrorismo; contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito de Armas de Fogo, Munições, Explosivos e outros Materiais Correlatos; para Prevenir e Punir os Atos de Terrorismo Configurados em Delitos contra as Pessoas e a Extorsão Conexa; sobre o Tráfico Internacional de Menores; sobre Prova e Informação sobre Direito Estrangeiro; sobre a Validade Extraterritorial de Sentenças Estrangeiros e Decisões Arbitrais; sobre a Produção de Prova no Exterior e o respectivo protocolo adicional; sobre Extradição; sobre Medidas Preventivas; sobre Cartas Rogatórias e o respectivo Protocolo Adicional; e sobre Jurisdição na Esfera Internacional para a Validade Extraterritorial de Sentenças Estrangeiras.

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Protocolo em 1993, antecedendo a Convenção de Palermo e as modificações

feitas na Convenção do Conselho Europeu sobre Auxílio Mútuo em pelo menos

uma década. O texto convencional expressamente veda aos particulares o uso dos

instrumentos previstos pelo acordo.

A Convenção Interamericana sobre Extradição é uma consolidação dos

princípios e regras consagrados pelo Direito Internacional sobre o tema. A

convenção regula, dentre outras, as hipóteses em que a extradição pode ser

requerida, as causas do seu indeferimento, as formalidades inerentes à solicitação

de entrega do acusado, os direitos e garantias do extraditando, bem como as

hipóteses em que a entrega pode ser condicionada. O texto da convenção difere

muito pouco do que já era estipulado pelo Estatuto do Estrangeiro, pela

Constituição e pela jurisprudência do STF. O mais importante, talvez, seja o fato

de que a convenção consagra, em seu artigo 8°, a cláusula aut dedere aut

judicare.

A OEA, também celebrou uma convenção sobre cartas rogatórias que se

destina à instrução de processos civis e comerciais mas que, por vontade expressa

dos Estados que a integram pode ser estendida para abranger causas criminais e

trabalhistas. Pelo artigo 2° da convenção, as rogatórias expedidas sob o escopo da

convenção são limitadas à prática de atos formais, como a intimação e citação, ou

a tomada de depoimentos e obtenção de provas e informações, sendo lícito aos

Estados ressalvarem essa última hipótese.

5.4 O Brasil e os Acordos Internacionais de Cooperação Internacional em Matéria Penal

A Organização das Nações Unidas assenta que “Todos os Estados e

entidade devem cooperar por meio das Nações Unidas ou de qualquer outra forma

na prevenção e controle do crime como um elemento indispensável para a

promoção da paz e segurança da humanidade...”416 já que o “...crime se tornou

um problema com dimensões nacionais e internacionais, prejudicando o

desenvolvimento político, cultural, econômico, social e cultura, e ameaçando a

416 United Nations, Department of International Economic and Social Affairs “Seventh United

Nations Congress on The Prevention of Crime and the Treatment of Offenders. Milan, 26 August – 6 September 1985 – Report prepared by the Secretariat”

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segurança interna e a estabilidade de Estados soberanos.”417 Para o Brasil, o

dever de cooperar internacionalmente é um princípio fundamental que rege a sua

atuação nas relações internacionais, como determina o artigo 4°, IX, da

Constituição.418

Considerando os objetivos e causas da cooperação internacional em

matéria penal indicados pela ONU, o preceito constitucional impõe aos órgãos

nacionais o máximo esforço na cooperação com os Estados estrangeiros para o

no combate à criminalidade internacional. A cooperação internacional impede que

regimes democráticos sejam desestabilizados por criminosos que, pela força ou

pelo dinheiro, se apropriam dos processos e instrumentos democráticos,

usurpando a vontade popular e impedindo a autodeterminação dos povos, a

independência dos Estados e a segurança e paz mundiais. Não existe progresso ou

desenvolvimento econômico sem segurança.

A cooperação internacional em matéria criminal não é um fenômeno novo.

O aumento da criminalidade transnacional e o incremento do comércio humano

no plano global tornaram premente a tomada de medidas concretas aptas a dar

uma resposta à criminalidade. Detectada essa necessidade, o que se verificou foi

um aumento, em progressão geométrica, das convenções e tratados sobre auxílio

mútuo em matéria criminal. O histórico da participação do Brasil em tratados

sobre cooperação em matéria criminal demonstra que a sua participação nesse

embate somente ganhou vulto a partir do final do século XX, quando foram

incorporados ao ordenamento jurídico pátrio dezenas de convenções, acordos e

tratados internacionais sobre o tema.

5.4.1 Convenções Internacionais sobre Cooperação Penal Celebradas Pelo Brasil

O Brasil faz parte de da maioria das convenções mundiais e regionais que

regulam a cooperação internacional em matéria penal. Esses pactos foram

celebrados sob a égide da Liga das Nações, da Organização das Nações Unidas -

ONU e da Organização dos Estados Americanos – OEA. Dentro do MERCOSUL

417 United Nations, Department of International Economic and Social Affairs “Ninth United

Nations Congress on The Prevention of Crime and the Treatment of Offenders. Cairo, 29 April – 8 May 1995 – Report prepared by the Secretariat”.

418 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, art. 4°, IX.

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a cooperação internacional em matéria penal é matéria de um tratado específico.

O Brasil integra, também, da Convenção de Auxílio Judiciário em Matéria Penal

da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Esse acordo, ainda não vige

internamente, eis que até 23/04/2009, não havia sido ainda aprovado pelo

Congresso Nacional.

Seguindo o exortado pela Convenção de Palermo, o Brasil também é parte

de inúmeros acordos bilaterais sobre o tema. Os acordos bilaterais, em sua

maioria, servem para regular as prestações assumidas quando da celebração das

convenções internacionais, especificando a forma pela qual as modalidades de

auxílio previstas nos tratados multilaterais será prestado entre o Brasil e os co-

signatários.

Embora o primeiro tratado sobre cooperação date do início do século XX, a

maioria dos pactos integrados pelo Brasil foram introduzidos no ordenamento

jurídico a partir da última década do século passado, mais precisamente, a partir

de 1996. Somente entre 2000 e 2008, dez tratados multilaterais internacionais e

dois protocolos adicionais foram incorporados ao ordenamento jurídico, mais do

que dobrando o número de instrumentos internacionais até então incorporados ao

ordenamento pátrio.

Como se pode observar dos quadros abaixo, os acordos de cooperação em

sua maioria regulam problemas que parecem ser perenes, como o tráfico e

exploração de mulheres e crianças e o tráfico de entorpecentes. A partir da década

de 70 do século passado nota-se uma preocupação crescente com o terrorismo,

sendo a virada do século marcada por tratados contra a corrupção e o crime

organizado transnacional. Sintomaticamente, em 1948, é firmado um tratado

contra o genocídio e em 1998 o Estatuto do TPI é celebrado.

Quadro I Convenções em Matéria Penal Promulgadas pelo Brasil sob o Regime da Liga das Nações

Título

Data Decreto Data da promulgação

Acordo para a Repressão do Tráfico de Mulheres Brancas 18/05/1904 5.591 13/07/1905

Convenção Internacional para a Repressão do Tráfico de Mulheres Brancas

04/05/1910 16.572 27/08/1924

Acordo sobre a Repressão da Circulação de Publicações Obscenas.

04/05/1910 16.571 27/08/1924

Convenção Internacional do Ópio. 23/01/1912 11.481 10/02/1915 Convenção Internacional para a 30/09/1921 23.812 30/01/1934

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Repressão do Tráfico de Mulheres e de Crianças. Convenção Internacional para a Repressão de Moeda Falsa, e Protocolo.

20/04/1929 3.074 14/09/1938

Convenção sobre Repressão do Contrabando.

19/06/1935 2.646 05/05/1938

Convenção para Repressão do Tráfico Ilícito das Drogas Nocivas

26/06/1936

2.994

17/08/1938

Quadro - II Convenções em Matéria Penal Promulgadas pelo Brasil no Âmbito da

Organização das Nações Unidas entre 1955 e 1961.

Título Data da Conclusão

Decreto de Promulgação

Data da Promulgação

Protocolo de Emenda da Convenção para

Repressão da Circulação e do Tráfico

das Publicações Obscenas, concluída em Genebra a 12 de Setembro de 1923

12/11/1947 37.100 25/03/1955

Protocolo de Emenda da Convenção para a Repressão do Tráfico

de Mulheres e de Crianças, de 30 de

Setembro de 1921, e da Convenção para a Repressão do Tráfico de Mulheres Maiores, de 11 de Outubro de

1933

12/11/1947 37.176 15/04/1955

Convenção para a Prevenção do Crime de

Genocídio 09/12/1948 30.822 06/05/1952

Convenção para a Repressão do Tráfico

de Pessoas e do Lenocínio e respectivo

Protocolo Final.

21/03/1950 46.981 08/10/1959

Convenção Única sobre Entorpecentes.

30/03/1961 54.216 27/08/1964

Convenção Relativa às Infrações e a Certos

Outros Atos Cometidos a Bordo de Aeronaves

14/09/1963 66.520 30/04/1970

Quadro - III Convenções em Matéria Penal Promulgadas pelo Brasil no Âmbito da

Organização das Nações Unidas entre 1970 e 1988.

Título Data de Conclusão Decreto de Promulgação

Data da Promulgação

Convenção para a Repressão ao

16/12/1970 70.201 24/02/1972

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Apoderamento Ilícito de Aeronaves.

Convenção sobre Substâncias

Psicotrópicas. 21/02/1971 79.383 14/03/1977

Convenção para a Repressão de Atos

Ilícitos Contra a Segurança da Aviação

Civil.

23/09/1971 72.383 20/06/1973

Protocolo de Emendas à Convenção Única

sobre Entorpecentes, 1961.

25/03/1972 76.248 12/09/1975

Convenção Internacional contra a

Tomada de Reféns 18/12/1979 3.517 20/06/2000

Convenção para a Repressão aos Atos

Ilícitos Contra a Segurança da Aviação

Civil

24/02/1988 2.611 2/06/1998

Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e

Substâncias Psicotrópicas.

20/12/1988 154 26/06/1991

Quadro - IV Convenções em Matéria Penal Promulgadas pelo Brasil no Âmbito da

Organização das Nações Unidas entre 1997 e a presente data.

Título Data da Celebração Decreto de Promulgação

Data da Promulgação

Convenção Internacional sobre a

Supressão de Atentados Terroristas

com Bombas (com reserva ao parágrafo 1

do art. 20)

15/12/1997 4.394 26/09/2002

Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais. (Paris)

17/12/1997 3.678 30/11/2000

Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional

17/07/1998 4.388 25/09/2002

Convenção Internacional para a Supressão do Financiamento do Terrorismo

09/12/1999 5.640 26/12/2005

Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança referente à venda de crianças, à prostituição infantil e à pornografia

20/05/2000 5.007 8/03/2004

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infantil Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Palermo)

15/11/2000 5.015 12/03/2004

Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, relativo ao Combate ao Tráfico de Migrantes por via terrestre, marítima e aérea

15/11/2000 5.016 12/03/2004

Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças

15/11/2000 5.017 12/03/2004

Protocolo contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito de Armas de Fogo, suas Peças e Componentes e Munições, complementando a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional

31/5/2001 5.941 26/10/2006

Convenção das Nações Unidas contra Corrupção

31/10/2003 5.687 31/01/2006

No âmbito das Américas, tratados regulando a cooperação internacional em

matéria penal na América antecedem a própria fundação do MERCOSUL. O

Brasil foi signatário da Convenção Internacional de Direito Privado de Havana,

firmada por vários Estados americanos, e que foi internalizada no direito

Brasileiro por meio do Decreto nº 18.871, de 13 de agosto de 1929. A

Convenção teve por escopo a aprovação do Código de Direito Internacional

Privado conhecido como Código Bustamante em homenagem ao jurista cubano

Antonio Sánchez de Bustamante y Sirvén, chefe da delegação cubana encarregada

das negociações e idealizador do projeto de codificação.

O Código Bustamante, em seu Livro III (artigos 296 e seguintes),

intitulado "Direito Penal Internacional" não cuida de cooperação internacional,

mas, antes, dos princípios de aplicação territorial da lei penal acima abordados.

Somente a partir do capítulo III, do título II do Livro IV, que cuida do "Direito

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Processual Internacional" (art. 340 e seguintes) é que o Código se ocupa das

regras de cooperação internacional em matéria penal. Mais precisamente, a

extradição é tratada nos artigos 344 usque 381, cabendo aos artigos 388 a 393

regulamentam as cartas rogatórias. O Código veda a execução de sentenças

penais, salvo no que concerne os seus efeitos civis (art.437). O modelo adotado

pelo Código reflete o modelo internacional clássico que, consagrando o princípio

da territorialidade, prevê a cooperação internacional em matéria penal como

tarefa de competência do Poder Judiciário, que a exerce por meio de cartas

rogatórias e pedidos de extradição.

Além do Código de Bustamante, o Brasil, na qualidade de integrante da

Organização dos Estados Americanos, também participa de uma série de pactos

internacionais, de aplicação restrita aos continentes americanos, que versam sobre

a cooperação internacional em matéria criminal. Uma comparação entre o quadro

abaixo e os quadros acima revela que os tratados sobre cooperação, tanto de

âmbito mundial, quanto regional, vêm sendo incorporados no mesmo ritmo, a

notável exceção sendo a Convenção Interamericana Sobre Assistência Mútua em

Matéria Penal, que demorou cerca de 15 anos da data de sua celebração para ser

internalizado, enquanto a Convenção de Palermo contra o Crime Organizado, que

contém uma série de dispositivos sobre auxílio jurídico recíproco, demorou menos

de quatro anos.

Quadro V Convenções em Matéria Penal Promulgadas pelo Brasil no Âmbito da

Organização dos Estados Americanos.

Título Data da Celebração Decreto de Promulgação

Data de Promulgação

Convenção Internacional de Direito Privado de Havana – Código Bustamante

20/02/1928 18.871 13/08/1929

Convenção para Prevenir e Punir os Atos de Terrorismo Configurados em Delitos Contra as

Pessoas e a Extorsão Conexa,

Quando Tiverem eles Transcendência

Internacional.

02/02/1971 3.018 06/04/1999

Convenção Interamericana sobre Prova e Informação

08/05/1979 1.925

10/06/1996

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Acerca do Direito Estrangeiro

Convenção Interamericana sobre o Cumprimento de Sentenças Penais no Exterior

09/06/1993 5.919 03/10/2006

Convenção Interamericana sobre Assistência Mútua em Matéria Penal e respectivo Protocolo Facultativo. Promulgada, de

11/06/1993 6.340 3/01/2008

Convenção Interamericana sobre o Tráfico Internacional de Menores

18/03/1994 2.740 20/08/1998

Convenção Interamericana contra a Corrupção

29/03/1996 4.410 07/10/2002

Convenção Interamericana contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito de Armas de Fogo, Munições, Explosivos e outros Materiais Correlatos

14/11/1997 3.229 29/10/1999

Convenção Interamericana contra o Terrorismo

03/06/2002 5.639 26/12/2005

Note-se que o Brasil assinou, mas não ratificou, as seguintes convenções

da OEA: a Convenção Interamericana Sobre a Validade de Provas Colhidas no

Estrangeiro (30/01/1975) e o respectivo Protocolo Adicional (05/24/84); a

Convenção Interamericana Sobre Competência na Esfera Internacional Para a

Eficácia Extraterritorial das Sentenças Estrangeiras (05/24/84); a Convenção

Interamericana Sobre Extradição (25/02/81); e a Convenção Interamericana

Sobre o Cumprimento de Medidas Cautelares (05/08/79).

Os países que integram o Mercado Comum do Sul – MERCOSUL

também vêm adotando medidas para reforçar a cooperação internacional em

matéria penal. O MERCOSUL foi formado por meio do Tratado de Assunção,

firmado pela República Argentina, a República Federativa do Brasil, a República

do Paraguai e a República Oriental do Uruguai em 26 de março de 1991 e têm

por principal objetivo o fomento da livre circulação de bens serviços e fatores

produtivos entre os países, através de medidas políticas, comerciais e tributárias

destinadas a eliminar a circulação de mercadorias. O Tratado é complementado

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133

pelo Protocolo de Outro Preto, firmado em 17 de dezembro de 1994. O Protocolo

cria e organiza as atribuições dos órgãos de execução da integração do Cone Sul.

O MERCOSUL não é uma entidade supra-estatal, mas, antes, uma entidade

intergovernamental dotada de personalidade jurídica, exercida pelo Conselho do

Mercado Comum,419 sem competência superposta às competências constitucionais

dos Estados Partes.

Dentro do âmbito do MERCOSUL não existe, como ocorre na União

Européia, uma delegação de poderes dos Estados ao órgão internacional, sendo

que as três funções clássicas do Estado são exercidas privativamente pelos órgãos

nacionais. Assim, a prevenção e repressão de crimes, o seu julgamento e a

imposição de penas competem às autoridades nacionais, reforçando-se a

necessidade de cooperação internacional judicial penal entre os diversos Estados.

A mesma conclusão se aplica àquelas medidas de cooperação judiciária ou

administrativa ao cargo dos órgãos de persecução penal cuja consecução não

carece do exercício da jurisdição.

Os Estados que integram o MERCOSUL fazem parte da Convenção das

Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de

Palermo), a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos

Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais e do Estatuto de Roma do

Tribunal Penal, bem como da Convenção Interamericana sobre Assistência

Mútua. Logo, independentemente dos acordos internacionais que venham a ser

pactuados no MERCOSUL, os Estados que o integram têm há muito se orientado

na direção de uma cooperação em matéria criminal cada vez mais abrangente. O

principal acordo em vigor no MERCOSUL sobre cooperação penal é o Protocolo

de São Luis, firmado em 25 de junho de 1996, sendo que existem outros pactos

que lhes são complementares, inclusive o Protocolo de Las Lenãs que cuida da

cooperação civil.

Quadro VI Convenções e Acordos em Matéria Penal Promulgadas pelo Brasil no Âmbito do

MERCOSUL.420

Título Data da Celebração

Decreto de Promulgação

Data de Promulgação

419 Artigos 8, III, 34 e 40 do Protocolo de Ouro Preto. 420 O protocolo sobre medidas cautelares não foi incluído por se tratar de acordo que regra a

cooperação por meio de concessão de cautelares destinadas a assegurar a reparação patrimoniais decorrente de sentença penal.

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Protocolo de Assistência Jurídica Mútua em Assuntos Penais. (MERCOSUL)

25/06/1996 3.468 17/05/2000

Acordo complementar ao acordo de assistência jurídica mútua em assuntos penais entre os Estados Partes do MERCOSUL

5/12/2002

Acordo de Extradição entre os Estados Partes do MERCOSUL

10/12/1998 4.975 30/01/2004

Protocolo de Las

Leñas 27/06/1992 2.626 15/06/1998

Acordo de

Assistência Jurídica

Mútua em Assuntos

Penais entre os

Estados Partes do

MERCOSUL, Bolívia

e Chile

18/02/2002

Acordo

Complementar ao

Acordo de

Assistência Jurídica

Mútua em Assuntos

Penais entre os

Estados Partes do

MERCOSUL, Bolívia

e Chile

20/12/2001

Acordo-Quadro Inter-

regional de

Cooperação entre as

Comunidades

Européias e seus

Membros e o

Mercado Comum do

Sul e seus Estados

Partes

15/12/1995

Além dos acordos que regulam a cooperação em matéria penal entre os

países que integram o MERCOSUL, existe um Acordo-Quadro entre o

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MERCOSUL e a Comunidade Européia. Esse acordo têm um escopo amplo e

visa fornecer um modelo ou marco inicial da cooperação inter-regional com a

então CE. O Acordo-Quadro é um conjunto de promessas e normas

programáticas que busca pavimentar o caminho para uma cooperação inter-

regional efetiva. Em relação à matéria penal, o principal objetivo do acordo é

fomentar a cooperação no combate ao narcotráfico. O fato é que esse acordo tem

um papel menor, no que concerne à cooperação criminal, já que as convenções da

ONU e os tratados bilaterais entre o Brasil e os Estados europeus regulam, de

forma mais compreensiva, a cooperação penal internacional.

5.4.2 Tratados Bilaterais sobre Cooperação Internacional.

O Brasil também faz parte de vários acordos bilaterais sobre cooperação em

matéria penal. A maioria regula a assistência jurídica recíproca entre os

signatários. Outros tratam de temas diversos, como assistência gratuita ou

medidas de cooperação direta como a transferência de apenados.

Quadro VII - Acordos Bilaterais sobre Cooperação em Matéria Penal Promulgados Pelo Brasil.

País ou Organismo

Título ou Objeto Assinado em Decreto nº Data

Argentina Convenção sobre Assistência Judiciária Gratuita.

15/11/1961 6.2978 11/07/1968

Argentina Tratado sobre Transferência de presos

11/09/1998 3.875 23/07/2001

Alemanha Acordo de Garantia de Reciprocidade na Transmissão de Informações do Registro Penal.

15/05/1957

Bélgica Convenção sobre Assistência Judiciária Gratuita.

10/01/1955 41.908 29/07/1957

Canadá Tratado sobre Transferência de Presos.

15/07/1992 2.547 14/04/1998

Coréia do Sul Acordo de Cooperação Judiciária e Assistência Mútua em Matéria Penal

13/12/2002 5.721 13/03/2006

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Chile Tratado sobre Transferência de Presos Condenados

29/04/1998 3.002 26/03/1999

China Acordo de Cooperação Judiciária em Matéria Penal.

24/05/2004 6.282 3/12/2007

Colômbia Acordo de Cooperação Judiciária e Assistência Mútua em Matéria Penal

07/11/1997 3.895 23/08/2001

Cuba Acordo de Cooperação Judiciária e Assistência Mútua em Matéria Penal

24/09/2002 6.462 21/05/2008

Espanha Tratado sobre Transferência de Presos.

07/11/1996 2.576 30/04/1998

Espanha Acordo de Cooperação Judiciária e Assistência Mútua em Matéria Penal

22/05/2006 6.681 08/12/2008

Estados Unidos da América do Norte

Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal.

14/10/1997 3.810 02/05/2001

França Acordo de Cooperação Judiciária em Matéria Penal.

28/05/1996 3.324 30/12/1999

Itália Tratado sobre Cooperação Judiciária em Matéria Penal.

17/10/1989 862 09/07/1993

ILANUD Acordo de Cooperação para a Prevenção do Crime e o Tratamento do Criminoso.

30/11/1989 2.151 19/03/1997

Japão Acordo sobre Assistência Judiciária.

23/09/1940 Troca de notas

Países baixos Convenção sobre Assistência Judiciária Gratuita.

16/03/1959 53.923 20/05/1964

República do México

Tratado de Cooperação Jurídica Internacional em Matéria Penal.

06/0802007 Decreto Legislativo n

°6.006

Ainda não foi promulgado

pelo Presidente da

República

Países Baixos (Válido apenas para as Antilhas Neerlandesas e Aruba )

Acordo para a Extensão ao Suriname e às Antilhas Neerlandesas da Convenção Relativa à Assistência Judiciária Gratuita de 1959.

16/11/1964 6.2978

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Paraguai Acordo para Restituição de Veículos Automotores Roubados ou Furtados.

01/09/1994 18/11/1996 2.131

Paraguai Tratado sobre Transferência de Pessoas Condenadas e de Menores sob Tratamento Especial.

10/02/2000 09/10/2002 4.443

Peru Acordo de Assistência Jurídica em Matéria Penal

21/07/1999 3.988 29/08/2001

Portugal Tratado de Auxílio Mútuo em Matéria Penal.

07/05/1991 1.320 30/11/1994

Portugal Tratado Sobre a Transferência de Pessoas Condenadas

05/09/2001 5.767 02/05/2006

Portugal Acordo Sobre Assistência Judiciária Gratuita

Troca de Notas

Reino unido Acordo sobre Transferência de Presos

20/08/1998 4.107 28/01/2002

Ucrânia Acordo de Cooperação Jurídica em Matéria Penal

16/01/2002 5.984 12/12/2006

Estão em vigor no Brasil 11 acordos sobre auxílio jurídico recíproco, os

MLAT’s, sendo que outros seis estão no Congresso Nacional esperando

aprovação, e três outros já foram firmados, mas, ainda não foram remetidos à

aprovação do legislativo. Além disso, o Brasil negocia novos acordos de

assistência recíproca com cerca de outros cinqüenta e três países.

Quadro VIII – Acordos sobre Auxílio Jurídico Recíproco já negociados.

Em Vigor Submetidos ao Congresso para Aprovação

Assinados Negociados sem Assinatura

Colômbia Angola Nigéria Bahamas Coréia do Sul

Canadá Hong Kong

China Grã-Bretanha Cuba Líbano Estados Unidos

México (aprovado pelo congresso)

Espanha Suíça França Suriname Itália Peru Portugal Ucrânia

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Quadro IX – Acordos de Auxílio Recíproco em Matéria Penal em negociação

Em Negociação Propostas de Tratados Recebidas Pelo Brasil

Propostas de Tratados Enviadas Pelo Brasil

África do Sul Albânia Áustria Alemanha Argélia Bélgica Austrália Grécia Bolívia Israel Índia Bulgária Romênia Moçambique Chile Turquia Moldava Cingapura Costa Rica Dinamarca Egito El Salvador Emirados Árabes Unidos Equador Federação Russa Filipinas Guatemala Honduras Hungria Ilhas Cayman Ilhas Jersey Ilhas Virgens (Reino Unido) Indonésia Irlanda Japão Liechtenstein Luxemburgo Macau Malásia Marrocos Mônaco Nicarágua Nova Zelândia Países Baixos Panamá Polônia República Tcheca Síria Suécia Tailândia Tunísia Venezuela

Quadro X - Acordos Bilaterais sobre Extradição Promulgados Pelo Brasil

País Data da Celebração Decreto de Promulgação

Data da Promulgação

Argentina 15/11/1961 62.979 11/07/1968 Austrália 22/08/1994 2.010 25/09/1996 Bélgica 06/05/1963 41.909 29/07/1957 Bolívia 25/02/1938 9.920 8/07/ 1942 Chile 08/11/1935 1.888 17/08/1937 Colômbia 28/12/1938 6.330 25/09/ 1940 Coréia do Sul 01/09/1995 4.152 7/03/ 2002 Equador 04/03/1937 2.950 8/08/1938 Espanha 02/02/1988 99.340 22/06/1990 Estados Unidos – Tratado de

13/01/1961 18/06/1962

55.750 11/02/ 1965

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Extradição e o respectivo Protocolo Adicional França 28/05/1996 5.258 27/10/2004 Itália 17/10/1988 863 9/07/1993 Lituânia 28/09/1937 4.528 16/08/1939 México – Tratado de Extradição e Respectivo Protocolo Adicional

28/12/1933 18/09/1938

2.535 22/03/1938

Paraguai 24/02/1922 16.925 27/05/1925 Peru 13/02/1919 15.506 31/05/ 1922 Portugal 28/05/1996 1.325 2/12/1994 Reino Unido 18/07/1995 2.347 10/10/1997 Suíça 23/07/1932 23.997 13/03/1934 Uruguai 27/12/1916 13.414 15/01/1919 Venezuela 07/12/1938 5.362 1/03/ 1940

Quadro XI - Acordos Bilaterais sobre Cartas Rogatórias Promulgados Pelo Brasil

País Data da Celebração

Decreto de Promulgação

Data da Promulgação

Argentina 14/02/1880 7.871 03/11/ 1880 Argentina -Protocolo que modifica o Acordo para

Execução de Cartas Rogatórias

16/09/1912 40.998 22/02/1957

Acordo, por troca de notas, sobre Simplificação de

Legalizações em Documentos Públicos

23/10/2003 Troca de Notas 23/03/2004

Bolívia 22/12/1879 7.857 15/10/1880 Chile - Acordo, por troca

de notas, para dispensa de legalização

10/02/1970 Troca de Notas Data da Assinatura

Estados Unidos - Ajuste para a Dispensa de

legalização Consular

22/04/1969 Data da Assinatura

França Acordo, por troca de Notas, sobre a

Gratuidade Parcial da Execução das Cartas

Rogatórias em Matéria Penal

05/10/1978 585 26/06/1992

Peru 29/09/1879 7.582 27/12/1879 Peru - Acordo Ampliativo 08/06/1891 1.395 18/05/1893

Portugal 31/08/1895 Data da Assinatura

Uruguai -Protocolo Relativo à Execução de

Cartas Rogatórias, Modificativo do Artigo 4º do Acordo de 14 de fevereiro

de 1879

12/12/1906 9.169 30/11/1911

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5.4.3 Evolução da Incorporação de Pactos sobre Cooperação Internacional em Matéria Penal Pelo Brasil.

Os quadros acima evidenciam que do final do Século XIX até, pelo menos,

a metade século passado, a maioria dos tratados celebrados pelo Brasil sobre

cooperação internacional, regula procedimentos relativos à extradição ou ao

cumprimento de cartas rogatórias. Somente a partir das últimas duas décadas do

Século XX é que o Brasil passou a celebrar tratados bilaterais versando sobre

medidas de cooperação jurídica direta, regulando a prestação de auxílio jurídico

mútuo ou a transferência de apenados. Isso reforça a conclusão de que somente há

algumas décadas é que a comunidade internacional vem sentindo a necessidade de

incrementar a cooperação direta em matéria penal, necessidade diretamente ligada

ao aumento da criminalidade transnacional.

Gráfico I - Evolução da Incorporação ao Ordenamento Jurídico Brasileiro dos Tratados sobre Cooperação Internacional em Matéria Penal.

0

2

4

6

8

10

12

14

16

1900-1929 1930-1959 1960-1989 1990-2008

Tratados multilaterais

ONU

Tratados multilaterais

OEA

Tratados multilaterais

MERCOSUL

Tratados bilaterais

Tratados de extradição

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Gráfico II - Evolução da Incorporação ao Ordenamento Jurídico Brasileiro dos Tratados

Bilaterais sobre Cooperação Internacional em Matéria Penal.

0

10

20

30

40

50

60

70

1900-1989 2009-2015

(estimativa)

Cooperação

Judiciária

Auxílio Jurídico

Recíproco

Transferência de

Apenados

Assistência Jurídica

Gratuira

Extradição

Rogatórias

Outros de

cooperação direta

Os gráficos acima, feitos com base nas informações prestadas neste

capítulo, demonstram de forma precisa que o Brasil, forçado pela globalização,

incorporou ao seu ordenamento jurídico a maior parte dos tratados sobre

cooperação em matéria penal que integra na última década do Século XX. A

maioria dos tratados bilaterais versa sobre alguma forma de cooperação direta, via

de regra, sobre assistência jurídica recíproca. O segundo gráfico, deixa claro,

ainda, que até a última década do Século XX, o Brasil, seguindo a tendência

mundial, dava preferência aos tratados sobre extradição e cartas rogatórias, o

que muda de forma significativa a partir dos anos 90. O marco dessa viragem é,

sem dúvida, o Plano de Milão adotado pelo Sétimo Congresso da Organização

das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e Tratamento dos Criminosos,

ocorrido em 1985. A última coluna do gráfico representa o número de tratados de

auxílio jurídico recíproco a serem incorporados pelo ordenamento pátrio se

aprovados os acordos submetidos ao Congresso Nacional, os já negociados, e

aqueles em negociação. Somente a aprovação dos dois primeiro grupos

representaria a quase duplicação dos MLAT’s em vigor no país.

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