A Avaliação Psicológica Na Prática Dos Psicólogos - As Provas Psicológicas Usadas Em Portugal

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A avaliação psicológica na prática dos psicólogos: As provas psicológicas usadas em Portugal 1 Leandro S. Almeida, António M. Diniz, Lúcia G. Pais & M. Adelina Guisande 2 (Universidade do Minho, Instituto Superior de Psicologia Aplicada & Universidade de Santiago de Compostela) Introdução A avaliação psicológica acompanha a prática da psicologia nas suas várias especialidades ou campos de aplicação, seja na psicologia clínica (Bénony, 2002; Emmanuelli, 2004; Maarse, Mulder, Brand, & Akkerman, 2003), seja na psicologia forense (Heilbrun, 2001; Pinard & Pagani, 2001; Rogers & Schuman, 2000), seja na psicologia da educação (Andrews, Saklosfski, & Janzen, 2001; Leitão, 2004), ou na psicologia organizacional (Edenborough, 2005; Thomas, 2003), aceitando-se a sua generalização a todos os contextos da psicologia aplicada (Fernández-Ballesteros, 1999; Suzuki, Ponterotto, & Meller, 2001). Quer pelas provas usadas e 1 Estudo resultante do projecto Contextos profissionais, tarefas de avaliação psicológica e utilização de provas psicológicas numa amostra de psicólogos portugueses, financiado pelo Centro de Investigação e Intervenção (CII) do ISPA – Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Lisboa, Portugal. 2 Financiada pelo Ministerio de Educación y Ciencia (Espanha) 1

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A avaliação psicológica na prática dos psicólogos: As provas psicológicas usadas em Portugal1

Leandro S. Almeida, António M. Diniz, Lúcia G. Pais & M. Adelina Guisande2

(Universidade do Minho, Instituto Superior de Psicologia Aplicada & Universidade de Santiago de Compostela)

Introdução

A avaliação psicológica acompanha a prática da psicologia nas suas várias

especialidades ou campos de aplicação, seja na psicologia clínica (Bénony, 2002;

Emmanuelli, 2004; Maarse, Mulder, Brand, & Akkerman, 2003), seja na

psicologia forense (Heilbrun, 2001; Pinard & Pagani, 2001; Rogers & Schuman,

2000), seja na psicologia da educação (Andrews, Saklosfski, & Janzen, 2001;

Leitão, 2004), ou na psicologia organizacional (Edenborough, 2005; Thomas,

2003), aceitando-se a sua generalização a todos os contextos da psicologia

aplicada (Fernández-Ballesteros, 1999; Suzuki, Ponterotto, & Meller, 2001). Quer

pelas provas usadas e diagnósticos produzidos, quer pelos fundamentos técnicos

ou pelos referenciais teóricos inerentes às provas e aos constructos avaliados,

importa não menosprezar esta componente identitária dos psicólogos (Simões,

2005).

Ao se assumir que a avaliação psicológica integra a definição do perfil

profissional dos psicólogos, vários compromissos e responsabilidades são

partilhados. Não se podendo reduzir a avaliação psicológica às provas e à sua

utilização, mesmo assim importa cuidar da objectividade, precisão e validade dos

resultados com elas obtidos. Por norma, muitas das críticas à avaliação

1 Estudo resultante do projecto Contextos profissionais, tarefas de avaliação psicológica e utilização de provas psicológicas numa amostra de psicólogos portugueses, financiado pelo Centro de Investigação e Intervenção (CII) do ISPA – Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Lisboa, Portugal.2 Financiada pelo Ministerio de Educación y Ciencia (Espanha)

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psicológica confundem-se com críticas ao método dos testes. São sobretudo

apontados os problemas de falta de equivalência transcultural nos constructos

avaliados através de provas importadas de outros países (Dana, 2005; Hambleton,

Merenda, & Spielberger, 2005; Poortinga, 1989, 1993; Poortinga & Van De

Vijver, 1987), a fraca inovação nas provas disponíveis (Sternberg & Kaufman,

1996) e, nomeadamente em Portugal, a falta de dados normativos ou de outros

referentes interpretativos devidamente actualizados para os resultados nas provas

(Almeida, Simões, & Gonçalves, 1995; Simões, 1993). Se o primeiro problema

exige mais cuidados na adaptação das provas psicológicas a novas populações, o

segundo apela a estudos cíclicos de normalização mais consistentes e

representativos, assim como a análises mais aturadas a propósito da rentabilização

informativa dos resultados nas provas para as diferentes decisões em que o seu

uso aparece sugerido.

Um outro problema na avaliação psicológica, e consequente área de

compromisso, passa pelos próprios psicólogos. Pela relevância das provas

psicológicas na prática dos psicólogos e na vida das pessoas e instituições –

enquanto seus clientes – importa um treino aturado por parte dos psicólogos no

seu manuseio (Almeida, 1994; Bartram, 2001; Eignor, 2001). Ninguém, pelo

simples facto de ser psicólogo, pode considerar-se automaticamente preparado

para usar e rentabilizar, de forma eficiente e eticamente responsável, os testes

psicológicos. Como qualquer instrumento, apela-se a “mãos preparadas” para a

sua utilização adequada. O psicólogo tem que ser melhor do que os testes que usa,

ou seja, tem que saber utilizar inteligentemente os instrumentos de que necessita

na sua prática.

Escolas e associações científicas e profissionais, a par das editoras e

distribuidoras das provas, têm particulares responsabilidades na qualificação da

avaliação psicológica. Vários organismos definiram, e mantêm actualizadas,

directrizes acerca da construção, validação e utilização de testes (American

Psychological Association, 1999; International Test Commission, 2001; Turner,

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DeMers, Fox, & Reed, 2001). Registe-se a tradução e adaptação para língua

portuguesa das Directrizes Internacionais para a construção, validação e utilização

de testes psicológicos, da autoria da International Test Commission (2001), a

cargo de um grupo alargado de psicólogos portugueses (International Test

Commission, 2003). A avaliação psicológica, com efeito, remete para um

processo complexo de tomada de decisão, envolvendo tarefas de escolha, de

inferência e de formulação de juízos clínicos, e de integração dos resultados no

quadro de um conjunto alargado de informação de natureza e origem diversa

(Diniz, 2004; Krishnamurthy et al., 2004; Simões, 1993). Em nossa opinião, é

essa complexidade do processo de análise e decisão do psicólogo que permite que

os relatórios psicológicos ultrapassem as meras tabelas e as sínteses propostas por

programas informáticos de tratamento dos resultados associados à avaliação

assistida por computador.

Neste estudo e artigo, na sequência de investigações nacionais anteriores

(Almeida & Cruz, 1985, 1988; Cruz & Almeida, 1987; Muñiz, Prieto, Almeida, &

Bartram, 1999), analisamos alguns aspectos referentes à prática da avaliação

psicológica pelos psicólogos portugueses. No caso concreto deste artigo, o

enfoque são as provas psicológicas mais usadas em Portugal, e em que medida

essa utilização assenta em estudos de validação e normalização que suportem o

seu uso.

Método

Amostra

Participaram neste estudo 265 psicólogos portugueses, com idades

compreendidas entre os 25 e os 67 anos (M=39 anos) e na sua maioria do sexo

feminino (78,9%). Em termos de área de graduação ou de área de pré-

especialização da sua licenciatura, a maioria dos respondentes reporta-se à

psicologia clínica (64,3%), seguindo-se a psicologia educacional (22,1%), a

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psicologia social/organizacional (11,2%) e a psicologia forense (2,3%). O valor

residual que esta última apresenta poderá dever-se à sua recente criação como

área de diferenciação da formação dos psicólogos, ao mesmo tempo que não se

encontra generalizada, como as outras três áreas, nos vários cursos de psicologia

disponíveis em Portugal. Por exigência do próprio estudo, todos os psicólogos

considerados tinham, pelo menos, três anos de prática profissional como

psicólogos.

Instrumento

Partindo de questionários similares (Almeida & Cruz, 1985; Muñiz et

al.,1999; Poortinga et al., 1982), o questionário usado neste estudo inclui questões

reportadas à formação e à prática profissional dos inquiridos, dando-se particular

destaque aos aspectos da sua prática na avaliação psicológica e uso de provas

psicológicas para esse efeito (neste artigo o enfoque são as provas psicológicas

mais utilizadas). Assim, inclui um primeiro grupo de questões descritivas dos

respondentes (e.g., percurso de formação). O segundo agrupamento de questões

versava aspectos relativos à actividade profissional propriamente dita (e.g.,

contexto de exercício). O terceiro agrupamento de questões versava aspectos

relativos à avaliação psicológica no contexto da actividade profissional (e.g.,

utilização de técnicas/instrumentos). Finalmente, o quarto agrupamento de

questões destinava-se às opiniões e necessidades dos respondentes relacionadas

com a utilização de provas psicológicas (e.g., marca distintiva/identitária da

prática psicológica). Como referimos atrás, este artigo reporta-se às provas

psicológicas mais utilizadas pelos respondentes.

Procedimento

Foram expedidos por carta (com envelope de porte pago para resposta)

1312 questionários, havendo pouco mais de 50 que não chegaram aos seus

destinatários, nomeadamente por problemas nos endereços. Responderam ao

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inquérito e devolveram 289 psicólogos, o que corresponde a uma taxa de resposta

de 23%. Foram anulados 24 questionários porque respondidos por psicólogos com

menos de três anos de prática profissional. Os dados foram inseridos e tratados

estatisticamente através da versão 14.0 para windows do SPSS.

Resultados

Tomando as questões que nos permitem descrever os respondentes em

termos de formação e de práticas, verifica-se que o seu exercício da psicologia

oscila entre 3 e 34 anos de prática profissional (29,1% com seis anos ou menos e

33,1% com quinze anos ou mais). Por outro lado, a maioria considera como

adequada a sua formação académica na área da avaliação psicológica (61,3%),

registando-se 20,7% que a considera pouco ou nada adequada e 18% que a

considera muito adequada. De acrescentar que 65,6% dos sujeitos menciona ter

recebido supervisão no início da sua prática profissional. Entretanto, um quinto

(20,5%) dos respondentes fez um curso de especialização em termos de pós-

graduação, 23,6% realizou mestrado e 9,5% doutoramento (havendo ainda 16%

que mencionam estar a frequentar estudos pós-graduados).

Quanto aos contextos de actividade profissional, a maioria dos

respondentes trabalha em contexto escolar (22,3%) e hospitalar (19,1%). Registe-

se, ainda, 15,2% no Ensino Superior e 10,5% nas instituições da administração da

justiça. Um menor número de psicólogos encontra-se a trabalhar noutras

instituições, como empresas (5,9%) e instituições militares/policiais (7,8%). De

salientar, também, a reduzida percentagem de respondentes que centram a sua

principal actividade profissional na consulta privada (9,4%). Por último, um

número ainda mais escasso de respondentes trabalha em Instituições Particulares

de Solidariedade Social para crianças e jovens (3,1%), autarquias (2%),

instituições de ensino especial (2,3%), centros para toxicodependentes (1,2%),

centros de reabilitação profissional (0,8%) e lares idosos (0,4%).

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Quanto à idade da população-alvo de intervenção dos respondentes, 43,8%

afirmaram trabalhar com adultos, 35% com crianças e adolescentes e 21,2% com

várias combinações destas faixas etárias. De referir, ainda, que 47,3% dos

respondentes desenvolvem a sua intervenção exclusivamente ao nível individual.

Por último, cerca de um terço dos respondentes (30,6%) afirmaram ter uma

segunda actividade profissional como psicólogos, complementar à actividade

principal assinalada, embora tomemos aqui apenas a informação relativa à

actividade principal.

Nos quadros 1 e 2 listamos as provas psicológicas mais mencionadas pelos

psicólogos quando lhes foi pedido para referir, por ordem decrescente, as cinco

que mais utilizavam. As provas que tiveram ocorrências residuais e que foram

listadas nas últimas posições (utilização relativa menos dominante) não constam

nas tabelas. No quadro 1 a listagem reporta-se às provas de inteligência, enquanto

no quadro 2 essa listagem considera as provas psicológicas da área da

personalidade. De referir que acrescentamos um asterisco sempre que a prova se

encontra devidamente aferida para a população portuguesa (dois asteriscos

quando essa aferição está em curso), alertando desde já para várias dificuldades e

para possíveis imperfeições nesta classificação.

Quadro 1 – Provas de inteligência mais utilizadas pelos psicólogos

Designação Ocorrências

WPPSI (6) + WPPSI-R* (3) 9

WISC* (59) + WISC-R (20) + WISC-III* (32) 111

WAIS (39) + WAIS-R (9) + WAIS-III** (3) 51

Matrizes de Raven: Standard (53) + Coloridas* (11) 64

Desenho da Figura Humana (Goodenough) 13

Bateria de Provas de Raciocínio/BPRD* (32) 32

DAT* (6) + PMA* (4) + GATB* (8) 18

Barragem de Atenção TP* 21

Figura Complexa de Rey** 42

Bender (16) + Benton (5) 24

Legenda: * = aferida; ** = aferição em curso; (n)

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Observando o Quadro 1, destacam-se, como mais frequentemente

utilizadas, as provas de Wechsler, principalmente a WISC (listada em primeiro

lugar 35,7% das vezes e 23,2% em segundo). Ainda que com menor expressão, é

também assinalável a utilização da WAIS (listada quer em primeiro quer em

segundo lugar 28,2% das vezes), embora nenhuma das suas versões se encontre

aferida para Portugal. Também o testes das Matrizes Progressivas de Raven

(listado em primeiro lugar 11,5% das vezes e 23,1% em segundo), aparece

bastante utilizado, seja na sua versão standard seja na versão colorida (apenas

esta última versão está devidamente aferida em Portugal). De referir, ainda, a

Bateria de Provas de Raciocínio/Bateria de Provas de Raciocínio Diferencial

(listada em primeiro lugar 11,5% das vezes e 37,1% em segundo) e a Figura

Complexa de Rey (listada em primeiro lugar 4,8% das vezes e 14,3% em

segundo), cuja aferição se encontra em curso. Por último, aparecem menos usados

os testes de aptidões diferenciadas (DAT, PMA e GATB) e outras tantas provas

para avaliação de processos cognitivos básicos (TP, Bender e Benton).

Como podemos reconhecer, tendencialmente são mais usadas as provas

previamente aferidas para Portugal, muito embora não pode deixar de se apontar

um uso bastante substancial da escala de Wechsler para adultos (WAIS) quando

não se encontra devidamente aferida, por contraste com a baixa utilização da

escala pré-escolar deste mesmo autor (WPPSI-R) já aferida.

Quadro 2 – Provas de personalidade mais utilizadas pelos psicólogos

Designação Ocorrências

Rorschach 71

TAT (43) + CAT (45) 88

MMPI (26) + MMPI-II (3) + MMPI-R (1) + Mini-Mult (12) 42

MCMI (10) + MCMI-II (7) (Multiaxial de Millon) 17

CPI (California) 10

NEO-PI-R* (12) 12

Inventários de Depressão: Beck* (13) + IACLIDE* (3) + Hamilton (2) 18

Desenho da Família (20) + Livre (8) + HTP (3) + Árvore (2) 33

Legenda: * = aferida; ** = aferição em curso; (n)

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As técnicas projectivas, nomeadamente o Rorschach (listado em primeiro

lugar 36,6% das vezes e 19,7% em segundo), aparecem amplamente usadas. O

seu uso suplanta claramente a utilização dos questionários de personalidade,

sendo certo que vários destes não se encontram aferidos para a população

portuguesa. Também o MMPI (listado em primeiro lugar 34,6% das vezes e

15,4% em segundo) aparece bastante usado entre os respondentes, mesmo que

ainda não aferido. Assiste-se, ainda, a uma certa utilização das técnicas de

desenho, em particular do Desenho da Família (listada em segundo e terceiro

lugar 29,4% das vezes). Como em relação a alguns contrastes feitos a propósito

das provas de inteligência aferidas e não aferidas, verifica-se uma menor

utilização do questionário NEO-PI-R face às versões do MMPI, quando estas

últimas – ao contrário do primeiro – não se encontram aferidas para Portugal.

Excluindo as provas passíveis de derivação teórica em termos de análise

dos resultados (Rorschach, TAT, CAT e Desenho da Família), é escassa a

percentagem de provas de personalidade devidamente validadas para a população

portuguesa utilizadas pelos respondentes. Esta situação, sem paralelo ao nível das

provas de inteligência, poderá significar uma utilização mais “liberal” destas

provas, por exemplo como guiões de entrevistas, ou então sérias dificuldades de

objectividade e validade dos relatórios produzidos através do recurso às provas

assinaladas. Com efeito, tomando os resultados obtidos neste inquérito, o recurso

em Portugal a provas psicológicas não validadas é especialmente evidente para os

inventários de personalidade (só o NEO-PI-R está validado).

A terminar, importa referir algumas outras provas psicológicas

mencionadas pelos respondentes. Em primeiro lugar, verifica-se uma certa

utilização da Escala de Desenvolvimento de Griffiths (23 ocorrências) que, muito

embora não aferida em termos nacionais, foi objecto de alguns estudos sectoriais

conhecidos e que provavelmente enquadram a sua utilização em situações

específicas (de referir tratar-se de uma escala que abarca diversas áreas do

desenvolvimento psicológico e desde idades bastantes precoces, o que poderá

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justificar um número bem superior de ocorrências face à WPPSI-R, embora esta

última se encontre devidamente aferida para Portugal). Em segundo lugar,

verificaram-se 12 ocorrências para um conjunto de provas psicológicas de

avaliação dos interesses (Kuder, CDI, Holland), nenhuma delas devidamente

aferida a nível nacional, e 10 ocorrências para escalas de auto-conceito (Piers-

Harris, Susan-Harter, Rosenberg), apenas com alguns estudos de validação

associados.

Discussão

Tomando os elementos de caracterização dos respondentes, podemos

referir a juventude dos profissionais de psicologia em Portugal (menos que um

terço destes profissionais com mais de 15 anos de prática). O aparecimento tardio

dos cursos de Psicologia nas universidades portuguesas (final da década de 1970)

e o aumento exponencial dos cursos de psicologia oferecidos em instituições

privadas do Ensino Superior em Portugal, nos últimos anos, justificam esta

juventude (aliás não se consideraram psicólogos com menos de 3 anos de prática

profissional). Como seria expectável, a larga maioria dos psicólogos trabalha em

contextos de clínica/saúde e de educação.

Descrevendo as percepções e as práticas dos psicólogos portugueses no

que diz respeito à avaliação psicológica, a larga maioria considera a sua formação

académica na área como adequada (apenas cerca de 20% aponta fragilidades

nessa formação). Mesmo assim, assiste-se a uma taxa bastante elevada de

utilização de provas psicológicas não devidamente validadas e aferidas na

população portuguesa. Esta situação é mais frequente na área da personalidade do

que na área da inteligência, mesmo que aqui se verifique, nalguns casos, uma

certa utilização de provas não aferidas (certos serviços, mormente serviços

públicos, recorrem a tal utilização na base de estudos próprios de validação). No

entanto, como dizíamos, a situação é particularmente grave na área da avaliação

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da personalidade seja ao nível das técnicas projectivas seja ao nível dos

questionários. Deverá ser objecto de maior preocupação a avaliação e

consequente relatório assente em provas apenas circunscritamente validadas na

área da personalidade.

Tudo isto torna clara a necessidade de sensibilizar os psicólogos

portugueses, nomeadamente os académicos, para a necessidade de mais estudos

de aferição para Portugal de provas psicológicas, especialmente na área da

personalidade. Os custos humanos e materiais envolvidos justificam que um

maior número de provas académicas, a nível de mestrado e de doutoramento,

possa ser dedicado a este tipo de estudos. Reclamando-se a avaliação psicológica

e seus relatórios para situações sociais bem específicas, acreditamos que só a

perícia do profissional não é suficiente para algumas das afirmações que,

certamente, integram os relatórios por si produzidos. A ausência de tais estudos

também acaba por condicionar, de forma negativa, a investigação e a prática da

psicologia no nosso País.

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