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A BOA FÉ OBJETIVA NO CONTEXTO DE UM PROCESSO CIVIL COOPERATIVO À LUZ DO CPC BRASILEIRO E PORTUGUÊS. HAROLDO LOURENÇO Advogado e consultor jurídico no RJ. Sócio-Administrador do escritório Lourenço Advogados. Membro da Academia Brasileira de Direito Processual Civil (ABDPC) e ICPC (Instituto Carioca de Processo Civil). Mestre e Doutorando em Direito na UNESA. Mestre na Universidad de Jaén (Espanha). Pós-graduado em Direito Processual Civil (UFF). Pós-graduado em Processo Constitucional (UERJ). Professor de Direito Processual Civil na Pós-Graduação e na EMERJ, FEMPERJ, EMERJ e FESUDEPERJ. Sumário: 1. Introdução. 2. Algumas considerações sobre o neoprocessualismo e as novas dogmáticas interpretativas. 3. Algumas premissas sobre o princípio da boa fé objetiva processual. 3.1. Boa fé, cooperação e direito obrigacional. 3.2. Algumas aplicações da boa fé objetiva no processo civil brasileiro. 4. Sobre o princípio da cooperação. 4.1. Princípio da Cooperação no Direito Português. 4.1.1. Algumas considerações sobre a doutrina de Teixeira de Souza. 4.1.2. Algumas considerações sobre a doutrina de Paula Costa e Silva. 4.1.3. Algumas considerações sobre a doutrina de Lebre de Freitas. 4.1.4. Algumas considerações sobre a doutrina de Mariana França Gouveia e Luis Correia de Mendonça. 4.2. Considerações na doutrina nacional sobre o princípio da cooperação. 4.2.1. Um novo modelo de direito processual. 4.2.2. Eficácia normativa do princípio da cooperação. 4.2.3. Princípio da cooperação como uma cláusula geral. 4.2.4. Cláusulas gerais processuais. 4.2.5. Princípio da Cooperação e o Devido Processo Legal. 5. Algumas aplicações da cooperação no processo civil brasileiro. 6. Conclusão. 7. Referências bibliográficas. Resumo: O presente artigo, elaborado no curso de mestrado da UNESA, para conclusão da disciplina grupo institucional de pesquisa em Direito Processual Civil Comparado (Brasil-Portugal), propõe uma reflexão acerca do impacto do princípio da cooperação na atividade jurisdicional e no processo civil. O princípio da cooperação não encontra previsão expressa no processo civil brasileiro, diferentemente do processo civil português, tem sua origem na conjugação dos princípios da boa-fé objetiva e do contraditório, pois, no processo, sempre deve haver um diálogo à luz da boa-fé. O dever de cooperação não é apenas das partes, mas, também, e no mesmo nível de importância, incide sobre o juiz. No presente estudo se analisa a doutrina nacional e portuguesa sobre o tema, os precedentes brasileiros existentes sobre a boa fé objetiva, questionando a extensão do dever de cooperação do juiz no processo, sobretudo, acerca dos seus deveres de esclarecimento, de consulta, de proteção ou prevenção e de auxílio. Palavras-chave: Princípio boa fé processual. Princípio Cooperação. Processo civil brasileiro e português.

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A BOA FÉ OBJETIVA NO CONTEXTO DE UM PROCESSO CIVIL COOPERATIVO À LUZ DO CPC BRASILEIRO E PORTUGUÊS.

HAROLDO LOURENÇO Advogado e consultor jurídico no RJ.

Sócio-Administrador do escritório Lourenço Advogados. Membro da Academia Brasileira de Direito Processual Civil (ABDPC) e ICPC

(Instituto Carioca de Processo Civil). Mestre e Doutorando em Direito na UNESA.

Mestre na Universidad de Jaén (Espanha). Pós-graduado em Direito Processual Civil (UFF).

Pós-graduado em Processo Constitucional (UERJ). Professor de Direito Processual Civil na Pós-Graduação e na EMERJ, FEMPERJ,

EMERJ e FESUDEPERJ.

Sumário: 1. Introdução. 2. Algumas considerações sobre o neoprocessualismo e as novas dogmáticas interpretativas. 3. Algumas premissas sobre o princípio da boa fé

objetiva processual. 3.1. Boa fé, cooperação e direito obrigacional. 3.2. Algumas aplicações da boa fé objetiva no processo civil brasileiro. 4. Sobre o princípio da cooperação. 4.1. Princípio da Cooperação no Direito Português. 4.1.1. Algumas

considerações sobre a doutrina de Teixeira de Souza. 4.1.2. Algumas considerações sobre a doutrina de Paula Costa e Silva. 4.1.3. Algumas considerações sobre a doutrina de Lebre de Freitas. 4.1.4. Algumas considerações sobre a doutrina de Mariana França Gouveia e Luis Correia de Mendonça. 4.2. Considerações na doutrina nacional sobre o princípio da cooperação. 4.2.1. Um novo modelo de direito processual. 4.2.2. Eficácia

normativa do princípio da cooperação. 4.2.3. Princípio da cooperação como uma cláusula geral. 4.2.4. Cláusulas gerais processuais. 4.2.5. Princípio da Cooperação e o

Devido Processo Legal. 5. Algumas aplicações da cooperação no processo civil brasileiro. 6. Conclusão. 7. Referências bibliográficas.

Resumo: O presente artigo, elaborado no curso de mestrado da UNESA, para conclusão da disciplina grupo institucional de pesquisa em Direito Processual Civil Comparado (Brasil-Portugal), propõe uma reflexão acerca do impacto do princípio da cooperação na atividade jurisdicional e no processo civil. O princípio da cooperação não encontra previsão expressa no processo civil brasileiro, diferentemente do processo civil português, tem sua origem na conjugação dos princípios da boa-fé objetiva e do contraditório, pois, no processo, sempre deve haver um diálogo à luz da boa-fé. O dever de cooperação não é apenas das partes, mas, também, e no mesmo nível de importância, incide sobre o juiz. No presente estudo se analisa a doutrina nacional e portuguesa sobre o tema, os precedentes brasileiros existentes sobre a boa fé objetiva, questionando a extensão do dever de cooperação do juiz no processo, sobretudo, acerca dos seus deveres de esclarecimento, de consulta, de proteção ou prevenção e de auxílio. Palavras-chave: Princípio boa fé processual. Princípio Cooperação. Processo civil brasileiro e português.

1. Introdução.

O sistema processual civil, principalmente no que se refere à

instrumentalização do direito privado, qualifica-se a partir da profundidade e da

extensão conferida ao princípio da autonomia privada, identificando-se pela articulação

dos princípios do dispositivo e do inquisitório e, consequente, em última instância ao

princípio da cooperação.

Costuma-se identificar dois modelos de estruturação do processo: um

modelo adversarial e um inquisitorial. No primeiro há a marca da disputa, um conflito

entre dois adversários diante de um órgão jurisdicional relativamente passivo, com

função principal de decidir. No segundo há uma pesquisa oficial, sendo o órgão

jurisdicional grande protagonista do processo. No primeiro, os protagonistas são as

partes (princípio dispositivo), no segundo o protragonista é o órgão jurisdicional

(princípio inquisitivo).

Não há sistema totalmente dispositivo ou totalmente inquisitivo, há uma

predominância, fruto da combinação dos dois sistemas. O modelo dispositivo reflete

regimes não autoritários, politicamente mais liberais, o modelo inquisitivo reflete

regimes autoritários, intervencionistas, contudo, isso nem sempre corresponde à

realidade, eis que é possível um processo dispositivo que não seja democrático.

Ocorre, contudo, que atualmente a doutrina afirma existir um terceiro

modelo, denominado de cooperativo, bem como tal modelo, pelo menos no plano

legislativo, teria sido consagrado no art. 266°, 1 do CPC Português, in verbis:

“ARTIGO 266º - Princípio da cooperação (alterado pelo Decreto-Lei n.º

180/96, de 25 de Setembro) 1 - Na condução e intervenção no processo,

devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes

cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a

justa composição do litígio.”

Como se percebe foi consagrado expressamente o princípio da cooperação,

que seria um consectário da boa fé processual, na acepção objetiva, não havendo em

solo brasileiro diploma, ao menos, semelhante.

No campo doutrinário português, na pouca doutrina que discute o tema,

questiona-se a amplitude e extensão de tal princípio, como de abordará, pois pode ser

analisado como uma cláusula geral com eficácia perceptiva direta, gerando situações

jurídicas atípicas ou princípio, cujas reflexões dependem de concretização positivada,

excluindo posições jurídicas sem previsão legal expressa.

Na doutrina nacional, que também escreveu muito pouco sobre o tema, há

àqueles que entendem que haveria um novo modelo, que redimensionaria inúmeros

princípios constitucionais, como o contraditório, devido processo legal e a

solidariedade. Nesse contexto, há autores que discutem a fonte normativa do sub-

princípio da boa fé objetiva e da cooperação.

Outro ponto que abordaremos é a inclusão do órgão jurisdicional no rol dos

sujeitos de diálogo processual, não mais com um mero espectador do duelo das partes,

portanto, como subordinado à boa fé objetiva e à cooperação, tema muito polêmico no

campo doutrinário nacional e internacional, bem como na jurisprudência nacional.

Em todo esse contexto, cumpre ainda registrar que no Brasil estamos em um

período de transição, em pleno debate sobre um Novo CPC e, nesse sentido, a proposta

de um direito processual civil contemporâneo deve ser compreendido da relação entre o

direito processual e a teoria do direito (eficácia normativa dos princípios e cláusulas

gerais), o direito constitucional (direito fundamental a um processo equitativo) e o

direito privado (boa fé e cooperação obrigacional), o que se buscará analisar.

2. Algumas considerações sobre o neoprocessualismo e as novas dogmáticas

interpretativas.

Gradualmente, a lei deixou de ser o centro do ordenamento jurídico e

algumas mudanças fundamentais podem ser apontadas: (i) ênfase ao princípios em vez

de regras; (ii) ponderação no lugar de subsunção; (iii) justiça particular em vez de

justiça geral; (iv) Poder Judiciário em vez de Poder Executivo ou Legislativo; (v)

Constituição em substituição à lei.1

Nesse contexto, a Constituição passou a ser o ponto de partida para a

interpretação e a argumentação jurídica, assumindo um caráter fundamental na

construção de um neoprocessualismo.2 A partir do momento em que se contemplaram

amplos direitos e garantias, tornaram-se constitucionais os mais importantes

fundamentos dos direitos material e processual, criando a denominada

constitucionalização do direito infraconstitucional. Desse modo, alterou-se,

radicalmente, o modo de construção (exegese) da norma jurídica.

A lei (e sua visão codificada do século XIX) perdeu sua posição central

como fonte do direito e passou a ser subordinada à Constituição, não valendo, por si só,

mas somente se em conformidade com a Constituição e, especialmente, se adequada aos

direitos fundamentais. A função dos juízes, pois, ao contrário do que desenvolvia

Giuseppe Chiovenda, no início do século XX, deixou de ser apenas atuar (declarar) a

vontade concreta da lei e assumiu o caráter constitucional, possibilitando, a partir da

judicial review, o controle da constitucionalidade das leis e dos atos normativos.

Atualmente, já se fala que a jurisdição é uma atividade criativa da norma

jurídica no caso concreto, bem como se cria, muitas vezes, a própria regra abstrata que

deve regular o caso concreto.3 Deve-se deixar de lado a opinião de que o Poder

Judiciário só exerce a função de legislador negativo, para compreender que ele

concretiza o ordenamento jurídico diante do caso concreto.4-5

                                                                                                                         1 ÁVILA, Humberto. “Neoconstitucionalismo”: entre a “ciência do direito” e o “direito da ciência”. Revista Eletrônica de Direito de Estado (REDE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, n. 17, jan.-mar. 2009. Disponível em: <www.direitodoestado.com.br/rede.asp>. Acesso em. 26 abr. 2010. 2 CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo... cit., p. 1-44; MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria geral do processo. São Paulo: RT, 2006; OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. O processo civil na perspectiva dos direitos fundamentais cit. 3 DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. 11. ed. Salvador: JusPodivm, 2009. v. I. p. 70. 4 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios – Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 34. 5 No mesmo sentido, imprescindível leitura de: MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de direito constitucional. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 94-97, o qual clama para que o estudioso, com serenidade, discuta o problema da criação judicial do direito, enumerando várias proposições em sua defesa.

O direito fundamental de acesso à justiça, previsto no art. 5º, inciso XXXV,

da CF, significa o direito à ordem jurídica justa.6 Assim, a designação “acesso à justiça”

não se limita apenas à mera admissão ao processo ou à possibilidade de ingresso em

juízo, mas, ao contrário, essa expressão deve ser interpretada extensivamente,

compreendendo a noção ampla do acesso à ordem jurídica justa, que abrange: (i) o

ingresso em juízo; (ii) a observância das garantias compreendidas na cláusula do devido

processo legal; (iii) a participação dialética na formação do convencimento do juiz, que

irá julgar a causa (efetividade do contraditório); (iv) a adequada e tempestiva análise,

pelo juiz, natural e imparcial, das questões discutidas no processo (decisão justa e

motivada); (v) a construção de técnicas processuais adequadas à tutela dos direitos

materiais (instrumentalidade do processo e efetividade dos direitos).7

Assim, para uma perfeita compreensão de acesso à ordem jurídica justa, faz-

se necessário o conjunto de garantias e dos princípios constitucionais fundamentais ao

direito processual, o qual se insere no denominado direito fundamental ao processo

justo.

Nesse conjunto de garantias e princípios constitucionais processuais se

incluem o direito de ação, a ampla defesa, a igualdade e o contraditório efetivo, o juiz

natural, a publicidade dos atos processuais, da independência e imparcialidade do juiz, a

motivação das decisões judiciais, a possibilidade de controle recursal das decisões etc.

Desse modo, pode-se afirmar que o direito ao processo justo é sinônimo do direito

fundamental à tutela jurisdicional efetiva, célere e adequada.

Essa constitucionalização dos direitos e garantias processuais se torna

relevante, pois, além de retirar o Código de Processo da centralidade do ordenamento

processual, fenômeno designado de descodificação, ressalta o caráter publicístico do

processo. O Direito processual está, atualmente, divorciado da visão privatista,

deixando de ser um mecanismo de utilização pessoal, para ser visto como um meio de

realização da justiça.

                                                                                                                         6 WATANABE, Kazuo. Acesso à justiça e sociedade moderna. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel; WATANABE, Kazuo (Coord.). Participação e processo. São Paulo: RT, 1988. p. 135. 7CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo... cit., p. 25.

Nessa linha, sobressai o neoprocessualimo, termo polissêmico, como

interessante função didática de remeter imediatamente ao neoconstitucionalismo. Sendo

a tutela jurisdicional um direito fundamental (art. 5°, XXXV, da CF/1988), devendo ser

prestada de modo efetivo, célere e adequado (art. 5°, LXXVIII, da CF/1988), há uma

vinculação do legislador, do administrador e do juiz, pois os direitos fundamentais

possuem uma dimensão objetiva, constituindo um conjunto de valores básicos e

diretivos da ação positiva do Estado.8 Como cediço, os direitos fundamentais geram

influência sobre todo o ordenamento, servindo de norte para a ação de todos os poderes

constituídos.9

Assim, a construção de técnicas processuais hábeis a tutelar direitos

materiais tornou-se o grande desafio do legislador e do juiz na concretização do direito à

tutela jurisdicional adequada. Aquilo que depender do processo civil, da técnica

processual, deve ser solucionado de modo adequado.

Nesse contexto, alguns pontos assumem grande relevância: o princípio da

adequação do procedimento à causa; pensar na tutela de interesses coletivos, pois o

CPC foi idealizado em uma visão individualista, bastando consultar o seu art. 6° (que

disciplina que a regra é ir a juízo em nome próprio, na defesa de direito próprio) e art.

472 (limites subjetivos da coisa julgada material); a melhor distribuição do tempo como

um ônus a ser dosado de forma isonômica entre as partes; a aproximação da cognição à

execução, incentivando poderes de efetivação da decisão, como o previsto no art. 461, §

5°, do CPC (princípio da atipicidade dos meios executivos);10 a ampliação das

chamadas cláusulas gerais ou conceitos jurídicos indeterminados, superando o princípio

da congruência (art. 128 c/c o art. 460), permitindo-se, mesmo sem pedido expresso,

que o juiz aplique o meio necessário à efetividade da tutela jurisdicional.

Nesse sentido, o neoconstitucionalismo e o neoprocessualismo servem de

suporte crítico para a construção não somente de “novas” teorias e práticas, mas,

                                                                                                                         8 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria dos Advogados, 1998. p. 140. 9 MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso... cit., p. 266. 10 Tais poderes, por óbvio não podem ser desmedidos, para não gerar arbitrariedade, devendo ser controlado pela proporcionalidade: (i) deve ser adequado (compatibilizando-se com o ordenamento); (i) deve ser necessário (deve ser indagado se há outro meio menos oneroso); (iii) as vantagens da adoção do meio executivo devem se sobrepor às desvantagens (cf. MARINONI, Luiz Guilherme. Controle do poder executivo do juiz. Revista de Processo, v. 127, p. 54-74.

sobretudo para a construção de técnicas que torne mais efetiva, rápida e adequada a

prestação jurisdicional.

3. Algumas premissas sobre o princípio da boa fé objetiva processual.

Os sujeitos do processo, compreendendo todos aqueles que de qualquer

forma participam do processo, inclusive o órgão jurisdicional, devem comportar-se de

acordo com a boa fé, entendida de forma objetiva, como uma norma de conduta,

consagrando a boa fé processual, essa, contudo, não costuma ser a análise realizada pelo

processualistas, incluindo somente as partes nesse rol.11

A vinculação do Estado-juiz ao dever de boa fé seria um reflexo do

princípio que o Estado, tout court, deve agir de acordo com a boa fé e, pois, de maneira

leal e com proteção à confiança.

O princípio da boa fé extrai-se de uma cláusula geral processual12, diante da

infinidade de situações que podem surgir ao longo do processo, tornando pouco eficaz

qualquer enumeração legal exaustiva das hipóteses de comportamento desleal.

Não se pode confundir princípio (norma) da boa fé com a exigência de boa

fé (elemento subjetivo) para a configuração de alguns atos ilícitos processuais. A boa fé

subjetiva é o elemento do suporte fático de alguns fatos jurídicos; é fato, portanto. A

boa fé objetiva é uma norma de conduta: impõe e proíbe condutas, além de criar

situações jurídicas ativas e passivas. Distingue-se princípio da boa fé e o estado ou

situação de boa fé. Não existe princípio da boa fé subjetiva.

                                                                                                                         11 Nesse sentido, incluído somente as partes, procuradores e todos aqueles que, de qualquer forma, intervêm no processo, como o Ministério Público, os advogados privados e públicos o perito etc., contudo, não se refere ao órgão jurisdicional: NERY Jr., NELSON ANDRADE NERY, Rosa Maria de. Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 10. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 207. 12 Sobre cláusulas gerais processuais: DIDIER Jr., Fredie. Cláusulas Gerais Processuais. Fonte: www.frediedidier.com.br, acessado em 24.06.2012.

A consagração do princípio da boa-fé processual foi resultado de uma

expansão da exigência de boa-fé do direito privado para o direito público. Na verdade, a

boa-fé objetiva expandiu-se para todos os ramos do Direito, mesmo os “não civis”.13-14

A boa-fé objetiva é norma de conduta, impondo e proibindo

comportamentos, além de criar situações jurídicas ativas e passivas. Relaciona-se com a

honestidade, lealdade e probidade com a qual a pessoa condiciona o seu modo de agir. É

uma regra ética, um dever de guardar fidelidade à palavra dada ou ao comportamento

praticado, no sentido de não fraudar ou abusar da confiança alheia. Não se opõe à má-fé,

tampouco guarda qualquer relação no fato da ciência que o sujeito possui da realidade.

A boa fé processual é resultado da expansão da exigência de boa fé do

direito privado ao direito público. A jurisprudência alemã entendeu aplicável o §242 do

Código Civil Alemão (BGB) também ao direito processual civil e penal. O STF15 já

decidiu que o processo penal também é regido pelo princípio da boa fé, como forma de

impedir comportamentos abusivos.

Assim, sempre que exista vínculo jurídico, as pessoas envolvidas estão

obrigadas a não frustrar a confiança razoável do outro, devendo comportar-se como se

pode esperar de uma pessoa de boa fé, não podendo ser diferente nas relações

processuais.

Na Alemanha, no inicio do século XX, já se chegou a dizer que o direito

processual impede qualquer apelo à boa fé ou lealdade e os comportamentos processuais

são “livres da moralidade”.

A boa fé atuaria mediante a aplicação de dois subprincípios ou princípios

mediantes: a) proteção da confiança, pelo qual se protege ao sujeito que foi levado a

acreditar em certo estado de coisas; b) prevalência da materialidade subjacente, em

combate ao formalismo, para resolver problemas concretos.

                                                                                                                         13 DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil cit., p. 46-47. 14 O STF já admitiu que o processo penal também é regido pelo princípio da boa-fé objetiva: STF, HC 92.012/SP, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j.10.06.2008. 15 STF, 2ª T., HC 92.012/SP, Rel. Min. Ellen Gracie, julgado 10.06.2008.

A doutrina alemã agrupou quatro casos de aplicação da boa fé ao processo:

a) proibição de criar dolosamente posições processuais, agindo de má fé; b) proibição

do venire contra factum proprium; c) proibição ao abuso de poderes processuais; d)

supressio, perda de poderes processuais em razão do seu não-exercício por tempo

suficiente para incutir no outro sujeito a confiança legítima de que esse poder não mais

seria exercido.

A proteção da boa-fé objetiva é um valor importantíssimo, também

conteúdo do interesse público, que, no caso concreto, deve ser ponderado com o valor

segurança jurídica, a que servem as formas processuais.

Há, assim, uma fonte normativa da proibição do exercício inadmissível de

posições jurídicas processuais, que podem ser reunidas sob a rubrica do “abuso do

direito” processual, desrespeito a boa fé objetiva, que se caracteriza independentemente

de a atuação do sujeito processual estar fundada na má fé. Implica, portanto, o dever do

sujeito processual não atuar imbuído de má fé, considerada como fato que compõe o

suporte fático de alguns ilícitos processuais; eis a relação existente entre a boa fé

processual objetiva e subjetiva. O princípio da boa fé processual, que, além de mais

amplo, é a fonte dos demais deveres, inclusive o de não agir com má fé.

O princípio da boa fé é fonte do princípio da cooperação, impondo deveres

de cooperação entre os sujeitos do processo. Mesmo se não houvesse previsão expressa

na legislação infraconstitucional, o princípio da boa fé processual poderia ser extraído

de outros princípios constitucionais, encarada como conteúdo de outros direitos

fundamentais.

Há quem veja o princípio da solidariedade (art. 3°, I da CF/88), como

BRUNELA VINCENZI16 e CRISTIANO CHAVES DE FARIAS17, onde haveria um

dever de não quebrar a confiança e de não agir com deslealdade. Há, ainda, quem veja

como um desdobramento da dignidade da pessoa humana, como NELSON

ROSENVALD.18

                                                                                                                         16 VICENZI, Brunela Vieira de. A boa fé no processo civil. São Paulo: Atjas, 2003, p. 163. 17 Assim, também, FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito civil – teoria geral. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 475. 18 ROSENVALD, Nelson. Dignidade humana e boa fé no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 186 e segs.

Já para MENEZES CORDEIRO19, decorreria da igualdade, pois a pessoa

que confie, legitimamente, num certo estado de coisas não pode ser vista se não tivesse

confiado: seria tratar o diferente de modo igual.

ANTONIO CABRAL20 entende que o fundamento seria o contraditório,

que não é apenas fonte de direitos processuais, mas também de deveres, pois

proporciona aos litigantes o direito de influenciar na decisão, mas também tem uma

finalidade de colaboração com o exercício da jurisdição, bem como não pode ser

exercido ilimitadamente: o respeito a boa fé objetiva é justamente um desses limites.

Por fim, JOAN PICO21 afirma que a boa fé compõe a cláusula do devido processo legal,

limitando o exercício do direito de defesa, como forma de proteção do direito à tutela

efetiva, do próprio direito de defesa da parte contrária e do direito a um processo com

todas as garantias, na eloquente expressão “devido processo leal”.

GILMAR MENDES22, já afirmou, em alguns julgados, que a cláusula do

devido processo legal exige um processo leal e pautado na boa fé, afirmando que a boa

fé atinge a todos os sujeitos processuais, não apenas as partes. Posição adotada por

DIDIER23, justamente por ser o devido processo legal uma cláusula geral, garantia do

fair trial, due process of law e frequente nos países do common law, até porque, as

garantias de um processo devido, são garantias contra abuso de direitos/poderes

processuais.

Continua o mestre baiano, afirmando ser mais fácil a argumentação da

existência de um dever geral de boa fé como conteúdo do devido processo legal, pois,

para um processo ser devido, giusto, como dizem os italianos, equitativo, como dizem

os portugueses, precisa ser ético e leal, não podendo ser aceito um processo pautado em

comportamentos desleais ou antiéticos.

                                                                                                                         19 CORDEIRO, Antonio Manuel da Rocha e Menezes. Litigância de má fé, abuso de direito de acção e culpa “in agendo”. Coimbra: Almedina, 2006, p. 51. 20 CABRAL, Antonio do Passo. O contraditório como dever e a boa fé processual objetiva. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2005, n. 126, p. 63. 21 JUNOY, Joan Pico i. El debido processo leal. Revista Peruana de Derecho Procesal. Lima: Palestra, 2006, v. 9, p. 346. 22 STF, 2ª T., RE 464.963-2/GO, rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 14.02.2006. 23 DIDIER Jr., Fredie. Fundamento do Princípio da Cooperação no Direito Processual Civil Português. Coimbra Editora, 1ª Ed., p. 88.

ANTONIO CABRAL, afirma não ser necessária a remissão à cláusula geral

da boa fé para a solução dos problemas decorrentes dos comportamentos processuais

antiéticos, pois o contraditório, igualdade e o direito ao fair trial já seriam suficientes,

rebatido por DIDIER, afirmando que a consagração expressa nas constituições brasileira

e portuguesa do devido processo legal/processo equitativo é um indicativo de que a

experiência do common law, no particular do desenvolvimento do princípio da boa fé

processual a partir do devido processo legal, pode ser extremamente útil.

O CPC brasileiro consagra uma norma geral que impõe o comportamento de

acordo com a boa fé (art. 14, II do CPC), norma extraída de uma cláusula geral

dispositivo que não se relaciona com a boa fé subjetiva, ou seja, independe de boas ou

más intenções.

À época do CPC de 1973, não havia domínio doutrinário sobre a boa fé,

assim, a evolução do pensamento jurídico brasileiro, permite que se encare o texto

normativo sob o enfoque da boa fé no processo, afinal texto não se confunde com

norma.

ÁVILA24 já demonstrava que é possível texto sem norma, bem como norma

sem texto. Norma é o produto da interpretação do sistema normativo, o sentido

construído a partir da interpretação sistemática dos textos normativos. Os textos são o

objeto da interpretação, a norma o seu resultado. Não há, por exemplo, dispositivo que

preveja o princípio da segurança jurídica, bem como a proteção de Deus não gera

nenhuma norma, por fim, um dispositivo pode produzir mais de uma norma, como a

exigência de lei, que consagra o princípio da legalidade, tipicidade, proibição

regulamentos independentes etc. Exemplo da “proibição de biquíni”, proibir biquínis

pequenos ou nudismo.

No CPC português há texto que serve de suporte ao princípio da boa fé, art.

266°-A, afirmando que “As partes devem agir de boa fé e observar os deveres de

cooperação resultantes do preceituado no artigo anterior.” O artigo seria um pouco

estranho, pois pode gerar a conclusão de que o órgão jurisdicional não tem o dever de

                                                                                                                         24 ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios – da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 7ª ed. São Paulo: Malheiros ED, 2007, p. 30.

observar a boa fé, não obstante ser a sequência do artigo que consagra a cooperação,

expressamente previsto aos magistrados. Assim, se todos tem o dever de cooperar, é

porque todos têm o dever de comprotar-se de acordo com a boa fé.

De igual modo, a Constituição Portuguesa, coincidentemente no art. 266°, 2,

afirma que todos os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à boa fé. De

igual modo, o art. 8° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos portugueses

consagra, expressamente, o princípio da cooperação e da boa fé processual.

No art. 37 da CRFB/88, a boa fé poderia ser extraída da moralidade

administrativa.

Assim, no processo cooperativo, modelo de processo do Direito português,

impõe-se a observância do princípio da boa fé por todos os sujeitos do processo,

inclusive o órgão jurisdicional, que devem agir com lealdade e em observância a

confiança legítima.

3.1. Boa fé, cooperação e direito obrigacional.

A boa fé incide nas relações jurídicas principalmente do surgimento de

deveres diversos do dever principal de cumprir a obrigação. No direito das obrigações,

pois essa deve ser encarada como um complexo de situações jurídicas, não como uma

simples relação entre credor e devedor. A obrigação é um processo.

Há deveres principais (ou primários) e deveres acidentais (ou secundários).

O dever principal é o adimplemento, contudo, no seu entorno surgem deveres

secundários, que se dividem em autônomos e anexos.

Os deveres autônomos podem ser o dever de indenizar pelo inadimplemento

absoluto, que é substituto do principal, e o dever de indenizar pela mora, que é paralelo.

Os deveres anexos podem ser de prestação (visa gerar condições para que o dever

principal seja adimplido, como transportar a coisa com segurança, no contrato de

compra e venda) ou de cooperação (funda-se na boa fé e serve para garantir uma

efetivação leal e correta da prestação, independentemente da vontade dos negociantes,

não gerando danos ao credor ou excessivo sacrifício ao devedor).

O dever de cooperação visa assegurar o adimplemento leal da obrigação, de

forma transparente e cooperativa, não cabendo enumeração ou descrição definitiva, pois

assumem contornos que o desenrolar da vida venha se manifestar. Tal dever pode ser

imputado ao credor. Divide-se em dever de esclarecimento, lealdade e proteção.

Assim, convém que a doutrina processual não ignore que o direito

processual não prescinde do desenvolvimento do direito obrigacional. No âmbito

obrigacional os deveres de cooperação orbitam o cumprimento da prestação, já no

ambito processual, giram em torno da solução do objeto litigioso, com justiça e

brevidade, como disposto no art. 266°, 1 do CPC português.

A influência do direito civil é nítida, exigindo um conhecimento da

evolução da teoria do abuso de direito, a qual reflete de maneira intrínseca no direito

processual civil, principalmente no que se refere aos seguintes institutos:

a) Venire contra factum proprium: Nesse caso, o contratante assume determinado

comportamento o qual é posteriormente contrariado por outro comportamento seu. A

locução venire contra factum proprium traduz o exercício de uma posição jurídica em

contradição com o comportamento assumido anteriormente pelo exercente. A proibição

de comportamento contraditório (nemo potest venire contra factum proprium) é

modalidade de abuso de direito que surge da violação ao princípio da confiança,

decorrente da função integrativa da boa-fé objetiva (CC, art. 422).25 Há farta aplicação

jurisprudencial do instituto no STJ.26

“Na proibição do venire incorre quem exerce posição jurídica em

contradição com o comportamento exercido anteriormente, verificando-se a

                                                                                                                         25 FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito civil – teoria geral. 3ª ed., cit., p. 474. Além de outros autores citados no texto, ver, também, relacionando o “venire” com a cláusula geral de da boa-fé objetiva, CORDEIRO, Antonio Manuel da Rocha e Menezes. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2001, p. 742-770; PINHEIRO, Rosalice Fidalgo. O abuso do direito e as relações contratuais. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 267-269. 26 STJ, REsp 1.175.675/RS, 4ª T., rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 09.08.2011. Precedentes citados: REsp 765.105-TO, DJ 30.10.2006, e REsp 1.117.633-RO, DJe 26.03.2010.

ocorrência de dois comportamentos de uma mesma pessoa, diferidos no

tempo, sendo o primeiro (o factum proprium) contrariado pelo segundo.

Consiste, pois, numa vedação genérica à deslealdade...”.27

A ideia de preclusão lógica é a tradução, no campo do direito processual,

do princípio do nemo potest venire contra factum proprium28.

b) Supressio ou verwirkung, da doutrina alemã, consiste na redução do conteúdo

obrigacional pela inércia de uma das partes em exercer direito ou faculdades, gerando

na outra legítima expectativa. A inércia qualificada de uma das partes gera na outra a

expectativa legítima (diante das circunstâncias) de que a faculdade ou direito não será

exercido. Assim, se uma das partes vem se comportando ao longo da vida contratual de

determinada maneira, certas atitudes que poderiam ser exigidas originalmente não mais

poderão o ser, justamente por ter se criado uma expectativa de que aquelas disposições

iniciais não mais poderiam ser exigidas daquela forma inicialmente prevista;

c) Surrectio:   ao contrário da supressio, representa uma ampliação do conteúdo

obrigacional. Aqui, a atitude de uma das partes gera na outra a expectativa de direito ou

faculdade não pactuada. Geralmente, exige-se certo lapso de tempo, que pode variar

caso a caso, durante o qual se atua uma situação jurídica em tudo semelhante ao direito

subjetivo que vai surgir; requer-se uma conjunção objetiva de fatores que constituem

novo direito; impõe-se a ausência de previsões negativas que impeçam a surrectio;

d) Tu quoque:  A locução significa “tu também” e representa as situações nas quais

a parte vem a exigir algo que também foi por ela descumprido ou negligenciado. Em

síntese, a parte não pode exigir de outrem comportamento que ela própria não observou;

e) Teoria do adimplemento substancial: Em certos casos, se o contrato já foi

adimplido substancialmente, não se permite a resolução, com a perda do que foi

realizado pelo devedor, mas se atribui um direito de indenização ao credor etc.                                                                                                                          27 “A ilicitude derivada do exercício contraditório de um direito: o renascer do venire contra factum proprium”. Revista Forense. Rio de Janeiro: Forense, 2004, n. 376, p. 110. A autora identifica, didaticamente, os cinco pressupostos para a caracterização do “comportamento contraditório”: “Além da existência de duas condutas (ou comportamentos concludentes) de uma mesma pessoa (ou de quem a represente ou suceda), a segunda contrariando a primeira, é preciso que: a) haja identidade de partes, ainda que por vínculo de sucessão ou representação; b) a situação contraditória se produza em uma mesma situação jurídica ou entre situações jurídicas estreitamente coligadas; c) a primeira conduta (factum proprium) tenha um significado social minimamente unívoco, a ser averiguado segundo as circunstâncias; d) que o factum proprium seja suscetível de criar fundada confiança na parte que alega o prejuízo, confiança essa a ser averiguada segundo as circunstâncias, os usos aceitos pelo comércio jurídico, a boa-fé, os bons costumes ou o fim econômico-social do negócio. É ainda requerido: e) o caráter ‘vinculante’ do factum proprium, no sentido de ser um comportamento ocorrido no âmbito de determinada situação jurídica que afete uma esfera de interesse alheia, de tal modo que tenha induzido (ou possa ter induzido) a outra parte a confiar que tal conduta fosse índice ou definição de uma certa atitude do seu parceiro frente a essa mesma situação jurídica”. (cit., p. 121.) “O venire contra factum proprium pode derivar de um comportamento comissivo ou omissivo”, lembra Cristiano Chaves de Farias (Direito civil – teoria geral. 3ª ed., cit., p. 476.) 28 MARTINS-COSTA, Judith. “A ilicitude derivada do exercício contraditório de um direito: o renascer do venire contra factum proprium”, cit., p. 119-120.

Cumpre registrar que, nos termos do Enunciado 412 e 414 da V Jornada do

CJF, todos esses institutos são concreções da boa-fé objetiva, extraídos do art. 187 do

CC/2002:

“Enunciado 412 da V Jornada do CJF: Art. 187. As diversas hipóteses de

exercício inadmissível de uma situação jurídica subjetiva, tais como

supressio, tu quoque, surrectio e venire contra factum proprium, são

concreções da boa-fé objetiva.”

“Enunciado 414 da V Jornada CJF: Art. 187. A cláusula geral do art. 187 do

Código Civil tem fundamento constitucional nos princípios da

solidariedade, devido processo legal e proteção da confiança e aplica-se a

todos os ramos do direito.”

3.2. Algumas aplicações da boa fé objetiva no processo civil brasileiro.

Uma boa aplicação do princípio da boa-fé objetiva está na sanção processual

aplicada ao recorrente, ainda que este seja o vencedor da demanda, pois o réu também

tem interesse no deslinde do feito.29

De igual modo, em nome da lealdade e da boa-fé, deverá o juiz impedir

genericamente a fraude processual, com a criação dolosa de posições processuais como

o requerimento doloso de citação por edital, a atuação dolosa do órgão jurisdicional (art.

133, II, do CPC) ou, nas hipóteses do art. 17, I, II, III e IV do CPC, que se traduzem na

litigância de má-fé com a presença do elemento subjetivo. Há, contudo, hipóteses em

que há o elemento objetivo: incisos V, VI, e VII do mesmo artigo.30

Outro caso é a aplicação do princípio da menor onerosidade. O art. 620 do

CPC protege a boa-fé objetiva e não, somente, a dignidade do executado, impedindo o                                                                                                                          29 STJ, EDcl nos EDcl no REsp 764.735, 4ª T., rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 04.02.2011. 30 Nesse sentido, MOREIRA, José Carlos Barbosa. A responsabilidade das partes por dano processual no direito brasileiro. Temas de direito processual. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 26.

abuso do direito pelo credor que, sem qualquer vantagem, se vale de meio executivo

mais danoso ao executado. É uma cláusula geral, que serve para impedir o abuso do

direito pelo exequente.

O STF já reconheceu abuso do direito de recorrer por qualificar-se como

conduta incompatível com o postulado ético-jurídico da lealdade processual,

conduzindo a aplicação da multa do art. 538, parágrafo único, do CPC.31

A proibição do venire contra factum proprium,32 como no caso da parte que

vem a juízo pedindo a homologação de sua desistência em recorrer e, no prazo recursal,

interpõe recurso (art. 503, parágrafo único, do CPC), bem como a invalidação do ato

cujo defeito deu causa (art. 243 do CPC), busca o direito de produzir a prova do fato

confessado (ao confessar, a parte perde o direito de produzir prova do fato confessado).

Também há preclusão lógica em relação ao magistrado33. Dá-se, por

exemplo, quando o juiz concede uma tutela antecipada com base em abuso do direito de

defesa, o que é incompatível com uma recusa em condenar o réu por litigância de má fé

com base no mesmo comportamento tido por abusivo. Também não se permite que o

magistrado, no julgamento antecipado da lide, conclua pela improcedência, sob o

fundamento de que o autor não provou o alegado. Se o magistrado convoca os autos

para julgamento antecipado, é porque entende provados os fatos alegados. A sentença

de improcedência por falta de prova, em julgamento antecipado da lide, além de violar o

dever de lealdade processual, a boa-fé objetiva, que orienta a relação entre os sujeitos

processuais, e o princípio da cooperação, poderá ser invalidada por ofensa à garantia do

contraditório, em sua dimensão de direito à prova34.

Importante que se perceba que a preclusão lógica está intimamente ligada à

vedação ao venire contra factum proprium (regra que proíbe o comportamento

contraditório), inerente à cláusula geral de proteção da boa-fé. Considera-se ilícito o

                                                                                                                         31 STF, 2ª T., AI AgR ED ED 586710/RJ, rel. Min. Celso de Mello, j. 21.11.2006. 32 “A proibição de comportamento contraditório (nemo potest venire contra factum proprium) é modalidade de abuso de direito que surge da violação ao princípio da confiança – decorrente da função integrativa da boa-fé objetiva (CC, art. 422)” (FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito civil – Teoria geral. 3. ed., cit., p. 474). 33 Admitindo a preclusão lógica para o juiz, corretamente, NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Preclusões para o juiz. São Paulo: Método, 2005, p. 42-46. 34 Neste sentido, no STJ, 3a T., REsp 649.191/SC, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. Em 19.08.2004, publicado no DJ de 13.09.2004, p. 241; 1a T., REsp n. 443.171/SC, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 10.02.2004, publicado no DJ de 25.02.2004, p. 101.

comportamento contraditório, por ofender os princípios da lealdade processual

(princípio da confiança ou proteção) e da boa-fé objetiva.

Quando a parte ou o magistrado adota um comportamento que contrarie

comportamento anterior, atua de forma desleal, frustrando expectativas legítimas de

outros sujeitos processuais. Comportando-se o sujeito em um sentido, cria fundada

confiança na contraparte — confiança essa a ser averiguada segundo as circunstâncias,

os usos aceitos pelo comércio jurídico, a boa-fé, os bons costumes ou o fim econômico-

social do negócio —, não podendo, depois, adotar um comportamento totalmente

contraditório, o que quebra a confiança gerada e revela ardil, deslealdade, evasão. Trata-

se de lição velha, embora aplicada, aqui, com outros termos.

A preclusão não é efeito do comportamento contraditório (ilícito); a

preclusão incide sobre o comportamento contraditório, impedindo que ele produza

qualquer efeito. A prática de um ato processual implica a impossibilidade de praticar um

outro ato com ele logicamente incompatível. A preclusão lógica, então, é consequência

da prática do primeiro ato, e não do ato contraditório.35

Um bom precedente do STJ,36 em que se aplicou a vedação à prática de atos

contraditórios, admitiu como válida a citação de pessoa jurídica encaminhada para sua

caixa postal. A relatora apontou que é pacífico no STJ que a citação pelo correio de

pessoa jurídica é válida, mesmo que o funcionário que receba a correspondência não

tenha poderes expressos para isso. Ponderou, ainda, que se a ré não informa em suas

correspondências aos clientes o seu endereço, disponibilizando apenas telefones das

centrais de atendimento e a caixa postal para a qual foi remetido o aviso de recebimento

(AR), provavelmente para dificultar o recebimento de citações e tornar inválidas as

realizadas em outros endereços, mostra-se suficiente tal comunicação para eventuais

reclamações do consumidor.

Outra decisão que aplicou o venire no processo civil, inclusive para o órgão

jurisdicional, foi o caso de decisão publicada durante a suspensão do feito homologada

judicial, não se podendo cogitar, por conseguinte, do início da contagem do prazo                                                                                                                          35 DIDIER Jr., Fredie. Alguns aspectos da aplicação da proibição do venire contra factum proprium no processo civil. Fonte: www.frediedidier.com.br, acessado em 24 de junho de 2012. 36 STJ, REsp 981.887/RS, 3ª T., rel. Min. Nancy Andrighi, j. 23.03.2010.

recursal enquanto paralisada a marcha do processo.   Ademais, ao homologar a

convenção pela suspensão do processo, o Judiciário criou nos jurisdicionados a legítima

expectativa de que o processo só voltaria a tramitar após o termo final do prazo

convencionado, portanto, não se mostraria razoável que, logo em seguida, fosse

praticado ato processual de ofício – publicação de decisão – e ele fosse considerado

termo inicial do prazo recursal, pois se caracterizaria a prática de atos contraditórios,

havendo violação da máxima nemo potest venire contra factum proprium.37

Relevante hipótese legal de aplicação da proibição em comento encontra-se

no art. 745-A do CPC, como um estímulo ao cumprimento espontâneo da obrigação.

Caso o executado opte pelo parcelamento, depositando no mínimo 30% do montante

executado, inclusive custas e honorários advocatícios, o restante da dívida poderá ser

pago em parcelas mensais sucessivas, em número não superior a seis, acrescidas de

juros e correção monetária. O não pagamento implica o vencimento antecipado de todas

as demais, além de multa de 10% sobre o valor das prestações não pagas. A opção do

executado pelo exercício deste direito é comportamento que impede o ajuizamento de

futuros embargos à execução, para a discussão de qualquer fato até aquele momento

ocorrido, pois seria comportamento contraditório.

A proibição de abuso de poderes processuais, como na decisão que autorizar

a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, em virtude do abuso do direito de

defesa (art. 273, II) ou do abuso do direito de recorrer (art. 17, VII, do CPC).

A proibição da supressio pode ser extraída do poder do juiz de controlar a

admissibilidade do processo, se não o fez durante certo tempo, que levasse os demais

sujeitos do processo a acreditar que o processo estava regular.

Vemos nessa hipótese a adoção da teoria da asserção, a qual assegura que

depois de admitida a demanda, não é recomendável uma extinção do processo sem

resolução de mérito, pois haveria um desserviço ao Judiciário, bem como ao

jurisdicionado, como será abordado mais detalhadamente no capítulo sobre a teoria da

ação.

                                                                                                                         37 STJ, 1ª T., REsp 1.306.463-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 4/9/2012. Precedentes citados: REsp 1.116.574-ES, DJe 27/4/2011, e RMS 29.356-RJ, DJe 13/10/2009. REsp 1.306.463-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 4/9/2012.

Há, ainda, quem sustente existir supressio em relação ao direito do cônjuge,

ascendente ou descendente de remir o bem (resgate), na hipótese de um bem hipotecado

ser transferido a terceiro ou ao exequente, diante da contradição existente entre a

revogação do art.787 do CPC e a manutenção da vigência do art. 1.482. O não-exercício

do direito de adjudicar é conduta que implica a perda do direito de remir, até como

forma de proteger a boa-fé do terceiro adquirente, que tem a expectativa de não ser

surpreendido com o resgate do bem que acabara de adquirir. É uma espécie de

supressio38 (Verwirkung, para os alemães) de direito processual, por ser interpretação

que visa tutelar a confiança e, portanto, a boa-fé objetiva. O direito do membro da

família, doravante, deverá ser exercido nos moldes do art. 685-A, CPC.39

A teoria do adimplemento substancial pode ser aplicada no âmbito do

direito processual, como na hipótese do § 2º do art. 511 do CPC, pois preparo

insuficiente é preparo feito. O legislador atentou que interposto o recurso e feito o

preparo em valor menor do que o devido, a inadmissibilidade é sanção drástica demais.

A invalidação do recurso, no caso, é um caso típico de exercício inadmissível de um

poder jurídico processual. Mais consentânea com a boa-fé é a necessária intimação do

recorrente para proceder ao complemento do valor devido.

Protege-se, aqui, ainda que em outro contexto, situação semelhante àquela

protegida pela teoria do adimplemento substancial. O poder de invalidar (situação

jurídica ativa) o recurso com preparo insuficiente é, aqui, limitado pela boa-fé.

De igual modo, o inadimplemento é um dos pressupostos para a instauração

do procedimento executivo (art. 580 do CPC), porém, constatado o inadimplemento

mínimo pode o órgão jurisdicional recusar a tomada de medidas executivas mais

                                                                                                                         38 Sobre o tema, amplamente, CORDEIRO, António Manuel da Rocha e Menezes. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2001, p. 797-836. É especialmente importante a consulta à nota 571, na p. 803, em que o autor examina a supressio no Processo Civil, fazendo uma resenha da bibliografia e da jurisprudência alemã em derredor do assunto. No final da nota, o autor conclui: “Mas no Direito Português, e dada a existência de toda uma teia rígida de prazos processuais, dobrada por um prazo supletivo geral – art. 153.o CPC – não é de introduzir a ideia de supressio processual: os poderes das partes vão sendo precludidos ao longo do processo e o recurso é sempre via indicada para apreciar as irregularidades do tribunal”. Conforme se pode perceber do nosso texto, admitimos a possibilidade de existência de supressio processual. É possível, imaginar, também, a possibilidade de supressio de um poder jurisdicional. Por exemplo: será que o magistrado que admitiu a demanda, no saneador, determinou e colheu inúmeras provas, pode, tempos depois, entender que falta ao procedimento um requisito de admissibilidade? Não haveria, aí, em razão do lapso de tempo, uma supressio do poder de controlar a regularidade do processo, em homenagem à confiança, à cooperação e à boa-fé objetiva? Parece-nos que sim. Só que esse tema deve ser objeto de outro ensaio. 39 DIDIER Jr., Fredie. Direito de adjudicar e direito de remir: confronto do art. 685-A, § 2º, Código de Processo Civil, com o art. 1.482 do Código Civil. Fonte: www.frediedidier.com.br, acessado em 09.05.2011.

drásticas, como a busca e apreensão do bem, por exemplo. Neste sentido, já decidiu o

STJ que, em execução de contrato de alienação fiduciária em garantia, entendeu correta

a decisão judicial que se recusou a determinar a busca e apreensão liminar do bem

alienado, tendo em vista a insignificância do inadimplemento. Em sentido semelhante,

já se impediu a decretação de falência, em razão da pequena monta da dívida. O

entendimento jurisprudencial repercutiu na nova Lei de Falências (art. 94, I, da Lei

11.101/2005).

Outro ponto, considerando-se substancialmente adimplida a prestação, o

direito à resolução converte-se em outra situação jurídica ativa (direito à indenização, p.

ex.), de modo a garantir a permanência do negócio jurídico. Assim, não apenas a

resolução do negócio pode ser impedida pela aplicação dessa teoria, derivada da

aplicação do princípio da boa-fé, pode-se, por exemplo, cogitar da extinção da exceção

substancial de contrato não cumprido (outra situação jurídica ativa): a parte não poderia

negar-se a cumprir a sua prestação, se a contraprestação tiver sido substancialmente

adimplida.

O princípio de atuação de acordo com a boa-fé é a fonte normativa da

proibição do exercício inadmissível de posições jurídicas processuais. A cláusula geral

de boa-fé objetiva processual impede que o sujeito atue no processo imbuído de má-fé.

Nesse sentido, por exemplo, o STJ40 acolheu ação rescisória em um caso de

nítida violação à boa-fé objetiva, pois as partes haviam feito um acordo extrajudicial,

em que uma delas se comprometeu a desistir de uma demanda se a outra parte doasse

um imóvel a alguém. Não obstante a prestação de doação tenha sido substancialmente

adimplida, a parte autora não desistiu do processo. A parte ré do processo originário,

aquela que se comprometera a doar o imóvel, deixou de defender-se no processo, na

crença de que o acordo já tinha sido cumprido. Foi reconhecida a sua revelia e

decretados todos os seus efeitos. Houve sentença de procedência de todos os pedidos

formulados, não obstante o acordo.

Destarte, o STJ entendeu que a sentença fora resultado de um

comportamento indevido da parte autora, que injustificadamente não cumpriu a sua                                                                                                                          40 STJ, 4ª T., REsp 656.103/DF, rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 12.12.2006, DJ 26.02.2007, p. 595.

prestação: desistir do processo. Aplicou-se a teoria do adimplemento substancial, que é

manifestação da boa-fé objetiva, pois, no caso, considerou-se que a obrigação de doar

fora substancialmente adimplida, o que impediria a alegação de exceção de contrato não

cumprido pela parte autora, que se comprometera a desistir do processo.

Não se exigiu a demonstração de qualquer elemento subjetivo, como a má-

fé ou o dolo para a configuração da hipótese de rescindibilidade; houve um

comportamento objetivamente reprovável da parte autora, contrário aos padrões de

comportamento ético impostos pelo princípio da boa-fé processual.

Conforme analisado, percebemos que o abuso do direito e, especificamente,

o abuso processual, é situação que admite ao magistrado atuar de ofício, em qualquer

tempo ou grau de jurisdição, não necessitando de requerimento da parte ou do

Ministério Público, já que se trata de matéria de ordem pública.

Por fim, atualmente muito se questiona se o órgão jurisdicional estaria

sujeito à boa fé objetiva e os seus efeitos anexos, redefinindo inclusive o modelo de

processo, passando a ser adotado um modelo cooperativo41, havendo precedentes no

STJ aplicando, expressamente, o venire contra factum proprium no processo civil, bem

como ao órgão jurisdicionais, como na hipótese de se ter homologado uma convenção

para suspensão do processo e, posteriormente, a serventia publicar decisão iniciando um

prazo recursal.42

4. Sobre o princípio da cooperação.

A partir do momento que se adota a boa fé objetiva como uma cláusula

geral aplicável a diversos ramos do direito, entre eles o processo civil, por

consequência, seus deveres anexos (como o venire contra factum proprium, supressio

etc) também são aplicáveis como demonstrado acima. Cremos, contudo, que não

                                                                                                                         41 DIDIER Jr., Fredie. Fundamentos do Princípio da Cooperação no Direito Processual Civil Português. Coimbra Editora, 1ª ed., 2010. 42 STJ, 1ª T., REsp 1.306.463/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 4/9/2012 (Informativo 503). Precedentes citados: REsp 1.116.574-ES, DJe 27/4/2011, e RMS 29.356-RJ, DJe 13/10/2009.

somente esses deveres anexos são aplicáveis, mas subprincípios decorrente da boa fé

objetiva, como o da cooperação, gera inúmeras e fortes influências no processo.

Tema muito pouco debatido na doutrina nacional e internacional, surgido da

junção dos princípios do contraditório e da boa fé objetiva, o princípio da cooperação

determina que todos têm o dever de cooperar para a justa composição do litígio. O

magistrado deve adotar uma postura de diálogo com as partes e com os demais sujeitos

do processo, esclarecendo suas dúvidas, solicitando esclarecimentos, dando orientações.

O processo deve ser um produto de atividade cooperativa, cada qual com as suas

funções, mas todos com o objetivo comum que é a solução do objeto litigioso43.

Sua aplicação impede ou dificulta a declaração de nulidades, bem como a

prolação de juízos de inadmissibilidade gerando, portanto, deveres para o magistrado,

como o de consulta, esclarecimento e prevenção, contudo o tema não é pacífico e

merece uma investigação profunda da doutrina nacional e internacional.

Uma das principais consequências da adoção deste princípio é a

revalorização da lealdade processual (e, portanto, da boa-fé objetiva), que passa a ser

atributo inerente ao diálogo do contraditório. Além disso, o princípio da cooperação

impõe que o magistrado também deve comportar-se de acordo com a boa-fé objetiva,

inserindo-se no contraditório.

O princípio da cooperação e o princípio que veda o venire contra factum

proprium relacionam-se na medida em que compõe o conteúdo da cláusula geral da

proteção da boa-fé objetiva na relação jurídica processual. A boa-fé objetiva é norma de

conduta que colore e qualifica o contraditório. A proibição de comportar-se

contrariamente a comportamento anterior é uma de suas nuances.44

4.1. Princípio da Cooperação no Direito Português.

                                                                                                                         43 DIDIER Jr., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Editora Jus Podivm. 11ª Ed. v. I. p. 50-51. 44 DIDIER Jr., Fredie. Alguns aspectos da aplicação da proibição do venire contra factum proprium no processo civil. Fonte: www.frediedidier.com.br, acessado em 24 de junho de 2012.

O CPC português é reconhecidamente um dos mais importantes diplomas

legislativos, segundo a tradição romana-germânica (civil law).

Poucos doutrinadores portugueses se debruçaram sobre o texto do art. 266°,

1 do CPC Português, não obstante ter sido introduzido em setembro de 1996, não

havendo monografias publicadas sobre o tema. As abordagens mais relevantes foram

realizadas, em obras sistemáticas de Miguel Teixeira de Souza e Lebre de Freitas, ou

incidentalmente a outros trabalhos, como o de Ana Paula Costa e Silva.

4.1.1. Algumas considerações sobre a doutrina de Teixeira de Souza.

Miguel Teixeira de Sousa45, talvez a doutrina mais influente sobre o

assunto, afirma que o princípio da cooperação seria para coadunar a “estrutura e os fins

do processo civil com os princípios do Estado Social de direito e garantir a legitimação

externa às decisões”, compondo, assim, uma linha essencial do processo civil de cunho

social.

No que se refere às partes, a cooperação assenta-se no dever de litigância de

boa fé (art. 266°-A), onde sua infração pode decorrer tanto de um comportamento de má

fé, como de uma infração à boa fé objetiva, bem como se estenderia ao direito

probatório.

Incluíndo o órgão jurisdicional no contexto da cooperação, afirma o autor

que o processo se tornaria uma “comunidade de trabalho”, onde as partes e o tribunal

são responsáveis pelo resultado do processo. Nesse contexto, haveria quatro aspectos,

que não seriam extraídos diretamente do art. 266°, 1, mas da incidência de regras

específicas: (i) dever de esclarecimento; (ii) dever de consulta; (iii) dever de prevenção;

(iv) dever de auxílio.

                                                                                                                         45 SOUSA, Miguel Teixeira de. Estudos sobre o novo processo civil. 2ª ed. Lisboa: Lex, 1997, p. 62.

O dever de esclarecimento consiste no dever do tribunal esclarecer junto das

partes quanto às dúvidas que tenha sobre suas alegações, pedidos ou posições em

juízo46, evitando decisões equivocadas ou apressadas. Assim, por exemplo, eventual

dúvida sobre o preenchimento de um requisito processual de validade, não deve ser

determinando imediatamente a consequência processual para esse ilícito processual,

bem como não se deve indeferir de imediato a petição inicial, sem antes pedir

esclarecimentos.

Cremos que o dever de esclarecimento, quando concretizado, favorece a

igualdade de armas no processo civil, pois diante de fatos não esclarecidos não pode o

magistrado adotar o cômodo entendimento de aplicação do ônus da prova, inclusive

determinando a produção probatória de ofício.

A concepção moderna do processo civil exige um juiz ativo e participativo,

tendo o magistrado o poder-dever de proceder ao esclarecimento de fatos e alegações

ambíguas, de consultar as partes e, até mesmo, de preveni-las acerca dos riscos do seu

comportamento. O juiz tem, pois, o dever de esclarecer os fatos do litígio e de provocar

as partes a trazerem para os autos as informações e provas necessárias à solução do

conflito.47

DIDIER48 afirma, além das explanações de TEIXERA DE SOUSA, que o

dever de esclarecimento incide, ainda, na necessidade de esclarecer o pronunciamento

para as partes, como se extrairia da necessidade de motivação. Assim, a motivação seria

uma concretização da cooperação já há muito positivada.

O art. 511°, 2 do CPC Português permite às partes reclamarem contra

decisão que de modo obscuro selecione a matéria de fato a ser objeto de atividade

instrutória, bem como o 653°, 4, permite reclamar de decisões colegiadas obscuras. Há,

ainda, o 669°, 1, a, que autoriza a qualquer das partes requerer o esclarecimento de

                                                                                                                         46 GRASSI, Lúcio. Cognição processual civil: atividade dialética e cooperação intersubjetiva na busca da verdade real. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo: Dialética, 2003, n. 06, p. 50, afirmando ser possível extrai esse dever dos arts. 130, 131, 339, 340, I do CPC. 47 Lúcio Grassi de Gouvea. Cognição Processual Civil: Atividade Dialética e Cooperação Intersubjetiva na Busca da Verdade Real. In: Fredie Didier Jr. (Org.). Leituras Complementares de Processo Civil. 2007, p. 183. 48 DIDIER Jr., Fredie. Fundamento do Princípio da Cooperação no Direito Processual Civil Português. Coimbra Editora, 1ª Ed., p. 16.

obscuridades ou ambiguidades, algo semelhante aos embargos de declaração brasileiro,

previsto no art. 535, I do nosso CPC.

Pelo dever de consulta, que teria um cunho assistencial, não pode o

magistrado decidir com base em questão de fato ou de direito sem que as partes sobre

elas se manifestem, ainda que seja possível sua análise de ofício.

Embora TEIXERA DE SOUSA não faça essa abordagem, é imprescindível

relacionar o dever em comento com o princípio do contraditório49, pois a concretização

do princípio da cooperação é também uma concretização do princípio do contraditório,

assegurando aos litigantes o poder de influenciar a solução da controvérsia.

No que se refere à prevenção teria o magistrado a incumbência de apontar as

deficiências das postulações das partes, convidando ao aperfeiçoamento dos seus

articulados (arts. 508°, 1, “b” e 508°-A, 1, “c”) ou das conclusões das suas alegações de

recurso (arts. 690°, 4, e 701°, 1).

Para TEIXERA DE SOUSA o dever de prevenção tem um âmbito mais

amplo, valendo para todas as situações em que o êxito da ação a favor de qualquer das

partes possa ser frustrado pelo uso inadequado do processo. Seriam quatro áreas de

atuação do dever de prevenção: (i) explicitação de pedidos pouco claros; (ii) o caráter

lacunar da exposição dos fatos relevantes; (iii) a necessidade de adequar o pedido

formulado à situação concreta; (iv) sugestão de uma certa atuação pela parte. Assim,

seria possível sugerir a especificação de um pedido indeterminado, de parcelas de um

montante que só é globalmente indicado, de lacunas na descrição de um fato,

esclarecimento se a parte desistiu do depoimento de uma testemunha ou apenas

esqueceu, provocar a intervenção de um terceiro.

                                                                                                                         49 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. Poderes do juiz e visão cooperativa do processo. Revista de Direito Processual Civil. Curitiba: Gênesis, 2003, n. 27, p. 28-29. DIDIER Jr., Fredie. Princípio do contraditório: aspectos práticos. Revista de Direito Processual Civil. Curitiba: Gêneses, 2003, n. 29, p. 510. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Os elementos objetivos da demanda examinados à luz do contraditório. Causa de pedir e pedido no processo civil (questões polêmicas). José Roberto dos Santos Bedaque e José Rogério Cruz e Tucci (coord.). São Paulo: RT, 2002, p. 39-42. GRECO, Leonardo. O princípio do contraditório. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo: Dialética, 2005, n. 24, p. 76-77.

TEIXERA DE SOUSA adota a compreensão do dever de prevenção do

Direito alemão, destoando do restante de sua análise, identificando um dever geral de

prevenção, o que é aderido por DIDIER.50

No Brasil a prevenção é consagrada no art. 284 e 616 do CPC, não

permitindo o indeferimento liminar, bem como sucessivas emendas, constituíndo-se em

verdadeiro direito subjetivo do autor,51 bem como o art. 295, V do CPC, permitindo

adaptar o procedimento, na hipótese da escolha equivocada.

Como se percebe, o deve de consulta evita decisões precipitadas ou

equivocadas, bem como decisões surpresas, eis que as partes irão discutir acerca das

possibilidades de solução.

Por fim, há o dever de auxílio, onde o tribunal deve auxiliar as partes na

superação de eventuais dificuldades que impeçam o exercício de direitos ou faculdades

ou o cumprimento de ônus ou deveres processuais, cabendo ao magistrado, sempre que

possível, remover o obstáculo, como na forma dos arts. 266°, 4 (remover obstáculo à

obtenção de um documento ou informação), 519°-A, 1 (superação da confidencialidade

de dados para apuração de situação economica) e 837°,1 do CPC português (agente de

execução).

No que se refere às consequências do desrespeito às regras que concretizam

o princípio da cooperação, haveria previsões “fechadas”, que não deixariam qualquer

margem de apreciação à sua verificação, e as “abertas”, que conferem ao tribunal certa

dose de discricionariedade, como na utilização de conceitos jurídicos indeterminados

(“manifesta desnecessidade”, prevista no n° 3, do art. 3° do CPC português).

Havendo desrespeito a regras consagradas em tipos abertos fechados haverá

invalidade processual, do contrário, havendo ofensa a regras consagradas em tipos

abertos, não haverá qualquer sanção.

                                                                                                                         50 DIDIER Jr., Fredie. Fundamento do Princípio da Cooperação no Direito Processual Civil Português. Coimbra Editora, 1ª Ed., p. 20. 51 STJ, REsp 951.040/RS (DJ de 07.02.2008); REsp 901.695/PR (DJ de 02.03.2007); REsp 866.388/RS (DJ de 14.12.2006); REsp 827.289/RS (DJ de 26.06.2006).

DIDIER52 critica TEIXERA DE SOUSA quando esse último afirma que por

serem previsões “fechadas”, não deixariam qualquer margem de apreciação à sua

verificação, não haveria discrionariedade judicial.

Não haveria discricionariedade judicial nos casos onde o enunciado

normativo é composto por conceitos jurídicos indeterminados, mas a consequência

jurídica é predeterminada pelo legislador, pois não se conferem opções ao juiz. Cabe,

contudo, falar em discricionariedade judicial nos casos de cláusula geral e,

especificadamente em razão do princípio da cooperação, parece que se pode falar em

discricionariedade judicial se ele for compreendido como uma cláusula geral, posição de

DIDIER.

Teresa Wambier53 afirma que não há discricionariedade nos casos de

aplicação de normas que contêm conceitos vagos, tampouco nos casos de cláusulas

gerais, pois não seria possível o controle judicial. Para a autora a discricionariedade é

insuscetível de controle, do que discorda DIDIER54, pois haveria controle sob aspectos

formais, como falta de motivação ou competência, ou aspectos substanciais, como

irrazoabilidade.

4.1.2. Algumas considerações sobre a doutrina de Paula Costa e Silva.

O art. 266°, 1 do CPC português foi analisado pela autora55 em sua tese de

doutoramento, apesar da analise ter sido incidental, merecendo destaque a sua

interpretação sobre a eficácia normativa do princípio da cooperação, afirmando que

“reflete-se nas imputações de situações jurídicas aos diversos intervenientes

processuais, que visam uma atuação colaborante ao longo do processo”, portanto,

aplicável ao juiz.

                                                                                                                         52 DIDIER Jr., Fredie. Fundamento do Princípio da Cooperação no Direito Processual Civil Português. Coimbra Editora, 1ª Ed., p. 21. 53 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. A desvinculação da ideia de discricionariedade administrativa e liberdade do juiz. Teoria do Processo – panorana doutrinário mundial. Fredie Didier Jr. e Eduardo Jordão (coord.) Salvador: Editora Jus Podium, 2008, p. 947-960. 54 DIDIER Jr., Fredie. Fundamento do Princípio da Cooperação no Direito Processual Civil Português. Coimbra Editora, 1ª Ed., p. 22, nota 19. 55 SILVA, Paula Costa e. Acto e processo – o dogma da irrelevância da vontade na interpretação e nos vícios do acto postulativo. Coimbra: Coimbra Editora, 2003, n. 410-418, p. 590 e segs.

Haveria no princípio da cooperação um modelo processual relativamente à

realização da justiça, ou seja, seria um elemento definidor do modelo processual civil

português. Cumpre, contudo, registrar que a autora não admite a aplicação direta do

aludido princípio, pois seriam necessárias manifestações tópicas do legislador que

concretizasse o seu conteúdo.

A autora vale-se da concepção teórica de CLAUS-WILHELM CANARIS56,

para o qual os princípios não seriam normas e, assim, necessitariam para a sua

realização de concretização através de subprincípios e de valorações singulares com

conteúdo material próprio. Enfim, não seria suscetível de aplicação imediata.

Assim, o dever de prevenção, corolário do princípio da cooperação, poderia,

em tese, justificar a existência de um dever de o tribunal indicar à parte o erro na

qualificação jurídica dos fatos, à semelhança do direito alemão, contudo, no CPC

português, não haveria essa abrangência, pois não teria sido consagrado como cláusula

geral, tendo sido previsto para uma situação específica: a complementação ou

clarificação na exposição da matéria de fato (art. 508°, 1, b).

Por fim, a autora analisa a consequência pela violação do princípio da

cooperação, exposto no ilícito processual delimitado no art. 456°, 2, c do CPC

português:

4.1.3. Algumas considerações sobre a doutrina de Lebre de Freitas.

Para o autor57 o princípio da cooperação é uma “trave mestra do processo

civil moderno”, que geraria uma comunidade de trabalho entre as partes e o tribunal

para a realização das funções processuais.

                                                                                                                         56 CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito. 3ª ed. Antonio Menezes Cordeiro (trad.). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002, p. 96. 57 FREITAS, José Lebre. Introdução ao processo civil – conceito e princípios gerais. 2ª ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2006, p. 168.

Haveria duas consequências: indenização e multa. A violação por ato

culposo, que torne impossível a produção da prova pela contraparte que tenha o

respecttivo ônus, resulta a inversão do ônus da prova (art. 519°, 2 do CPC português).

Defende o autor uma dimensão material e formal. Na primeira hipótese a

cooperação apontaria para a verdade sobre a matéria fática e, assim, facilitaria a

obtenção da justa composição do litígio, seriam exemplos o art. 519°, 1 que afirma ser

dever da parte e do terceiro de colaborar na descoberta da verdade, ressalvados os

direitos fundamentais, integridade, intimidade e sigilo, bem como o 266°, 2 e 3, onde há

o dever de esclarecimento, imputando ao juiz o poder de ouvir as partes e seus

representantes e o dever das partes de colaborar e prestar esclarecimentos. Em Portugal

haveria poderes do juiz e deveres das partes, diferentemente da Alemanha, onde haveria

deveres do juiz.

Como se percebe tal tese não é adotada por DIDIER e MIGUEL

TEIXEIRA, pois afirmam que os magistrados possuem o dever de cooperação.

Na segunda hipótese, a cooperação serve para a justa composição do litígio

seja realizar no menor tempo possível, sem dilações indevidas. O art. 266°, 4, o

magistrado deve providenciar a remoção de obstáculo ao cumprimento de um ônus

processual. O autor não analisa o art. 266°, 1, não extraíndo suas consequências

normativas.

4.1.4. Algumas considerações sobre a doutrina de Mariana França Gouveia e Luis

Correia de Mendonça.

MARIANA FRANÇA58 reputa difícil definir o modelo processual civil de

Portugal, em razão do princípio da cooperação, pois pode refletir um processo

autoritário (inquisitivo) ou seria um novo arquétipo de processo civil, concluindo ser a

cooperação um novo modelo. A cooperação acentuaria os deveres das partes,

                                                                                                                         58 GOUVEIA, Marina França. Os poderes do juiz cível na acção declarativa. Julgar. Lisboa: Associação sindical dos juízes portugueses, 2007, n. 1, p. 51.

reforçando o aspecto autoritário do processo, contudo, quando se acentua os deveres do

juiz, mitiga-se essa concepção. No que se refere aos deveres das partes, afirma que o seu

desrespeito caracteriza litigancia de má fé, apenável com multa (art. 456°, 2, c),

realçando a íntima relação entre boa fé e cooperação. No que se refere ao órgão

jurisdicional, afirma gerar um feixe de deveres, sem, contudo, distrincha-los, como

igualdades com as partes, séria preocupação com o litígio, intelegibilidade de suas

decisões.

MENDONÇA59, em contraponto, entende que seria a consagração de um

processo civil autoritário, justamente por seguir a linha do garantismo processual,

chegando a ironizar como que as partes irão cooperar entre si dentro de um processo,

onde as mesmas estão em posições extremadas, com estratégias distintas e, aplicar a

cooperação, seria imaginar que o juiz iria levar as partes para passear de mãos dadas em

um jardim.

O autor segue a linha de JUAN MONTERO AROCA (Espanha),

denominado no Brasil por BARBOSA MOREIRA60 de neoprivatismo processual, pois a

própria discussão da boa fé no processo seria um traço do autoritarismo. Segundo

AROCA, adotar a cooperação seria negar ao cidadão o direito de “pelear” pelo que

acreditam com as armas criadas pelo ordenamento.

DIDIER61 critica, pois o dever de cooperação tem um sentido dogmático,

não tendo nada a ver com a transformação o processo em um diálogo de lordes ingleses,

pelo contrário, busca tonar o processo mais leal ou menos bárbaro luta por tais

interesses.

De igual modo, ratifica seus argumentos, sustentando que até na guerra a

proteção da boa fé objetiva se impõe, pois o Estatuto de Roma, que criou o Tribunal

Penal Internacional, reputa crime de guerra (art. 8°, 2, “b”, vi e vii, adotado no Brasil

por meio do Decreto n° 4.388/02, vi) a “Matar ou ferir um combatente que tenha

                                                                                                                         59 MENDONÇA, Luis Correia de. O virus autoritário. Julgar. Lisboa: Associação sindical dos juizes portugueses, 2007, n. 1, p. 86 e segs. 60 MOREIRA, José Carlos Barbosa. O neoprivatismo no processo civil. Leituras complementares de Processo civil. 7ª ed. Salvador: Editora Jus Podium, 2009, p. 309-320. 61 DIDIER Jr., Fredie. Fundamento do Princípio da Cooperação no Direito Processual Civil Português. Coimbra Editora, 1ª Ed., p. 33-34.

deposto armas ou que, não tendo mais meios para se defender, se tenha

incondicionalmente rendido;” e “Utilizar indevidamente uma bandeira de trégua, a

bandeira nacional, as insígnias militares ou o uniforme do inimigo ou das Nações

Unidas, assim como os emblemas distintivos das Convenções de Genebra, causando

deste modo a morte ou ferimentos graves;”.

Observe-se que condutas abusivas, que ferem a ética da guerra, como

hastear bandeira branca, incentivando o avanço das tropas adversárias para emboscada,

nada mais é do que venire contra factum proprium, intolerável mesmo na guerra.

LEONARDO GRECO62 afirma que, bem aplicado, a cooperação serve

adequadamente a um processo civil liberal, por proteger direitos subjetivos dos

litigantes.

4.2. Considerações na doutrina nacional sobre o princípio da cooperação.

4.2.1. Um novo modelo de direito processual.

Segundo DIDIER o art. 266°, 1 do CPC português depende de uma nova

postura metodológica, com a redefinição de algumas premissas e a utilização de outros

repositórios teóricos. Há nesse artigo um novo modelo de direito processual, que deve

ser analisado a luz da eficácia normativa das normas-princípios, bem como da adoção

das cláusulas gerais, do devido processo legal (processo equitativo), boa fé, inclusive

nas relações obrigacionais, o que não é abordado pela doutrina portuguesa.

O processo é organizado através da distribuição de funções aos sujeitos

processuais, onde cada um exerce um papel, mais ou menos relevante, na instauração,

desenvolvimento e conclusão do processo. Como mencionado, geralmente o processo se

estrutura no modelo adversarial e inquisitorial, onde no primeiro prevalece a disputa das

partes, diante do órgão jurisdicional relativamente passivo, com função precípua de                                                                                                                          62 GRECO, Leonardo. Publicismo e privatismo no processo civil. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2008, n. 164, p. 49.

decidir, no segundo o órgão jurisdicional grande protagonista do processo, exercendo

atividade investigativa e de pesquisa. No primeiro, os protagonistas são as partes

(princípio dispositivo), no segundo o protragonista é o órgão jurisdicional (princípio

inquisittivo), ostentando maiores poderes.

BARBOSA MOREIRA63 já dismitificou a distinção que se pretendeu

estabelecer entre o processo penal e o processo civil no que concerne ao conjunto de

poderes atribuídos ao juiz, que seria mais intenso naquele do que nesse, o que não se

justifica mais. De igual modo, há quem relacione o processo adversarial ao common law

e o processo inquisitivo ao civil law, o que é correto, contudo, não se pode ignorar as

profundas influências recíprocas que esses sistemas vêm causando um no outro, o que

torna mais difícil a diferenciação64.

A dispositividade e a inquisitoriedade podem se manisfestar vários temas:

instauração do processo; produção das provas; delimitação do objeto litigioso; análise

das questões de fato e de direito; recursos etc. Nada impede que em um momento o

legislador adote o dispositivo, como na fixação do objeto litigioso (art. 128, 263, 460 do

CPC) ou do efeito devolutivo na horizontal (art. 515 do CPC), e em outro adote o

inquisitivo, como na produção probatória (art. 130 do CPC).

Nesse sentido, percebe-se que não há um sistema puramente inquisitorial ou

adversarial, há uma predominância, fruto da combinação dos dois sistemas. É fato que o

sistema dispositivo, onde prevalece à atividade das partes, reflete regimes não

autoritários, politicamente mais liberais, o modelo inquisitivo reflete regimes

autoritários, intervencionistas, contudo, isso nem sempre corresponde à realidade, eis

que é possível um processo dispositivo que não seja democrático.

DANIEL MITIDIERO65 afirma haver um terceiro modelo de processo civil:

o cooperativo e o CPC português consagraria um novo modelo de direito processual,

justamente por não existir texto normativo no direito estrangeiro, o que não é uma

                                                                                                                         63 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Processo civil e processo penal: mão e contramão?. Temas de direito processual – sétima série. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 201-215. 64 Sobre as influências do sistema de precedentes no ordenamento nacional: LOURENÇO, Haroldo. Precedente Judicial como Fonte do Direito: algumas considerações sob a ótica do Novo CPC. Revista Eletrônica - ISSN 2236-8981 - Volume 1. N. 6. DEZEMBRO DE 2011 – Temas atuais de processo civil, p. 38-65. 65 MITIDIERO, Daniel. Colaboração no processo civil. São Paulo: RT, 2009, p. 81.

coincidência. Esse modelo seria um redimensionamento do princípio do contraditório,

com a inclusão do órgão jurisdicional no rol dos sujeitos de diálogo processual, não

mais com um mero espectador do duelo das partes. O contraditório volta a ser

valorizado como instrumento indispensável ao aprimoramento da decisão judicial, não

como regra formal para que a decisão seja válida.

A condução do processo não é determinada pela vontade das partes,

tampouco inquisitorial pelo órgão jurisdicional, em posição assimétrica em relação às

partes. Busca-se uma condução cooperativa do processo, sem protagonismos66.

Assimetria, aqui, é usada no sentido de que a posição do juiz não é

composta apenas por poderes processuais, distinta das partes que é recheada de ônus e

deveres. O devido processo legal e o Estado de Direito imputam ao juiz uma séria de

deveres (deveres-poderes), que o fazem também sujeito do contraditório. Assimetria

significa, apenas, que o órgão jurisdicional tem uma função exclusiva: decidir, o poder

jurisdicional.

Nos sistemas clássicos prevalece a boa fé subjetiva, exigida exclusivamente

das partes, chegando ao ponto do Estado iludir as partes a fim de obter a verdade. No

sistema novo o processo é equitativo, justo e devido, tendo a legislação portuguesa dado

enorme passo na consolidação dessa nova fase, inclusive a frente da legislação alemã,

de onde inegavelmente buscou inspiração.

O princípio da cooperação exige, pois, um juiz mais ativo, situado no centro

da controvérsia, o que, ao invés de causar um distanciamento com as partes e entre elas,

vai buscar restabelecer o caráter isonômico do processo, ou, ao menos, conseguir um

ponto de equilíbrio. Impende ressaltar que esse objetivo, dentro de uma perspectiva não

autoritária do papel do juiz e mais contemporânea em relação à divisão do trabalho entre

o juiz e as partes, somente pode ser alcançado por meio do fortalecimento dos poderes

das partes, com sua participação mais ativa e leal no processo, de modo a contribuir

mais efetivamente à formação da decisão judicial, com ampla colaboração tanto na

pesquisa dos fatos como na valorização jurídica da causa.67

                                                                                                                         66 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. Poderes do juiz e visão cooperativa do processo. cit., p. 27. 67 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. Poderes do juiz e visão cooperativa do processo. cit., p. 253.

A faculdade de as partes pronunciarem-se ativamente no processo dificulta

o arbítrio judicial e exclui o tratamento da parte como simples objeto do processo,

garantindo o seu direito de atuar de modo crítico e construtivo com vistas ao escorreito

desenvolvimento do processo, apresentando antes da decisão a argumentação acerca de

suas razões. O contraditório desponta, aqui, como o concreto exercício do direito de

defesa para fins de formação do convencimento do juiz, atuando, assim, como anteparo

à lacunosidade ou insuficiência da sua cognição e demonstrando o inafastável caráter

dialético do processo.

4.2.2. Eficácia normativa do princípio da cooperação.

Como visto, na doutrina portuguesa prevalece o entendimento de que a

eficácia do princípio da cooperação depende de concretização legislativa, não tendo

aplicação direta, não sendo uma norma jurídica propriamente dita, não obstante de não

ser esse o entendimento prevalente no Brasil.

Princípio é espécie normativa68, estabelecendo um fim a ser atingido: no

caso, o processo cooperativo, dialógico e leal. Essa espécie normativa visa um

determinado “estado das coisas”, e esse fim somente pode ser alcançado com

determinados comportamentos, “esses comportamentos passam a constrituir

necessidades práticas sem cujos efeitos a progressiva promoção do fim não se realiza”.

Enfim, instituem o dever de efetivação de um estado de coisas pela adoção de

comportamentos a ele necessários.

O princípio pode atuar de forma direta ou indireta. Há a primeira na atuação

sem intermediação ou interposição de um outro (sub-)princípio ou regra. Nesse plano,

há uma função integrativa, permitindo agregar elementos não previstos em

subprincípios ou regras, pois, a despeito da ausência de previsão normativa expressa de

                                                                                                                         68 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios. 5ª ed. São Paulo: Malheiros Ed., 2006, p. 78-79. BARROSO, Luis Roberto (org.). A nova interpretação constitucional. Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. BARCELOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 59-102.

um comportamento necessário à obtenção do estado de coisas almejado, o princípio irá

garanti-lo.

A eficácia direta tem influência direta no presente estudo, pois, para a

transformação do processo em uma “comunidade de trabalho”, estado de coisas que o

princípio da cooperação busca promover, que deve ser buscando até por meios atípicos,

desde que conforme ao sistema jurídico. A inexistência de regras que delimitam e/ou

esclareça o conteúdo do princípio da cooperação não é obstáculo intransponível. Mesmo

não havendo regras que imputem ao órgão jurisdicional o dever de manter-se coerente

com os seus próprios comportamentos, protegendo as partes contra eventual venire

contra factum proprium do órgão julgador, o princípio da cooperação garante o meio

(imputação de uma situação jurídica passiva) necessário à obtenção do fim almejado (o

processo cooperativo).

ÁVILA69, exemplificando, afirma que na hipótese do legislador criar um

procedimento sem a previsão para que uma parte se manifeste sobre as alegações da

outra, deverá ser assegurado o direito de defesa, por força do princípio do devido

processo legal. A mesma lógica deve ser aplicada ao princípio da cooperação, pois a

ausência de regra legal não deve ser obstáculo à sua eficácia, preenchendo os vazios

normativos.

O princípio da cooperação torna devidos os comportamentos necessários à

obtenção de um processo leal e cooperativo, portanto, é possível se cogitar de situações

jurídicas processuais atípicas decorrentes da eficácia direta com função integrativa do

princípio da cooperação.

Podo ocorrer, ainda, de existir regras de intermediação, meios típicos,

determinados por subprincípios ou por regras jurídicas, que delimitam o exercício do

poder e, assim, conter a arbitrariedade da autoridade jurisdicional, na construção da

solução do caso que lhe for submetido. Nessas hipóteses haverá a eficácia indireta do

princípio e essas normas servem de ponte.

                                                                                                                         69 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios – Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 97.

O princípio da cooperação pode ser considerado sub-princípio, uma norma

menos ampla, que se relaciona com outro princípio mais amplo. Noutro giro, pode ser

considerado sobreprincípio, comparado com normas menos amplas.

Os subprincípios exercem função definitória em relação aos sobreprincípios,

criando uma maior precisão do comando estabelecido por esses últimos. O princípio da

cooperação é um subprincípio do devido processo legal, bem como da boa fé

processual. Cumpre registrar que os princípios não tem pretensão de exclusividade, pois

um processo cooperativo pode ser resultado de diversos princípios70.

De igual modo, a função definitória delimita o comportamento que deverá

ser adotado para concretizar as finalidades estabelecidas pelos princípios. Assim, o

órgão jurisdicional deve dar oportunidade para a manifestação sobre questão de fato ou

de direito relevante para o julgamento da causa, mesmo se de conhecimento oficioso.

Esclarece-se, assim, que o princípio da cooperação impõe o dever de consulta (art. 3°, 3

do CPC português).

Há, ainda, uma função interpretativa sobre as normas construídas a partir de

textos normativos expressos. As normas que delimitam expressamente o princípio da

cooperação, não tornam supérfluo ou anódino o art. 266°, 1 do CPC Português, pois

todos os demais textos devem ser interpretados conforme o princípio da cooperação,

não podendo impedí-lo ou dificultar a realização do fim almejado.

Por fim, há uma função bloqueadora, servindo para justificar a não

aplicação de textos expressamente previstos que sejam incompatíveis com o estado das

coisas que se busca promover. Assim, o princípio da cooperação serve para fundamentar

a não aplicação de dispositivos normativos que permitissem condutas não cooperativas,

como não esclarecer uma decisão.

O CPC brasileiro contém regras semelhantes a praticamente todas as regras

que concretizam o princípio da cooperação no direito protuguês. Há regras brasileiras

que não correspondem a regras portuguesas, assim como a recíproca é verdadeira. Não

                                                                                                                         70 Nessa linha, ratificando que os princípios não tem pretensão de exclusividade, a boa fé, visto como sobreprincípio, pode ser visto como subprincípio do devido processo legal ou da segurança jurídica ou da dignidade da pessoa humana.

há, porém, no direito brasileiro, um texto normativo que consagra expressamente o

princípio da cooperação, devendo ser extraído do devido processo legal, da boa fé, do

contraditório e da solidariedade.

O princípio da cooperação se sujeita a colisão com demais princípios,

devendo ser aplicada a razoabilidade e proporcionalidade.

4.2.3. Princípio da cooperação como uma cláusula geral.

Cláusula geral é espécie de texto normativo, cujo antecedente (hipótese

fática) é composto de termos vagos e o consequente (efeito jurídico) é indeterminado.

Há uma indeterminação em ambos os extremos da estrutura lógica normativa71. A

definição, contudo, não é unânime. CLÁUDIA LIMA MARQUES afirma que há

cláusula geral, ainda que haja determinação da consequência jurídica, como ocorre com

o art. 51, IV do CDC, em virtude da abertura do tipo normativo72.

A cláusula geral é uma técnica legislativa que, intencionalmente usa uma

linguagem aberta, com ampla extensão no campo semântico, dirigida ao juiz de modo a

conferir-lhe competência para que, à vista do caso concreto, crie, complemente ou

desenvolva normas jurídicas com elementos que podem estar fora do sistema, os quais

fundamentarão a decisão.

É uma técnica que permite a abertura do sistema jurídico a valores ainda não

expressamente protegidos legislativamente, permitindo a sistematização e permanente

ressistematização no ordenamento positivo, que se contropõe à técnica casuística. Não

há sistema totalmente estruturado em cláusulas gerais, pois haveria a perene sensação de

insegurança, tampouco sistema totalmente casuístico, pois seria rígido e fechado, não

adequado a vida contemporânea.

                                                                                                                         71 MARTINS-COSTA, Judith. A boa fé no direito privado: sistema e tópica no processo obrigacional. São Paulo: RT, 1999, p. 303-306. 72 MARQUES, Cláudia Lima. Boa fé nos serviços bancários, financeiros, de crédito e securitários e o Código de Defesa do Consumidor: informação, cooperação e renegociação?. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: RT, 2002, n. 43, p. 228-232.

A característica dos sistemas contemporâneos é a harmonização dos

enunciados normativos de ambas as espécies. O sistema de cláusulas gerais reforça o

poder criativo do juiz, tendo que participar ainda mais ativamente na construção do

ordenamento jurídico, a partir da solução de problemas concretos que lhe são

submetidos.

O método da subsunção do fato ao enunciado normativo, próprio de textos

normativos típicos e fechados, revela-se insuficiente para a aplicação de cláusulas

gerais, pois essas exigem concretização. O juiz não tem que generalizar o caso, tem que

individualizar até certo ponto o critério, não se esgotando na subsunção. O direito passa

a ser construído a posteriori, em uma mescla de indução e dedução, realizando justiça

no caso concreto, revelando-se como “pontos de erupção da equidade”.

As cláusulas gerais constitutíram uma concessão do positivismo à auto-

responsabilidade dos juízes e a uma ética social transpositiva. A sua introdução no

sistema de civil law aproximou-o ao commow law, pois a construção jurisprudencial do

direito é uma das princiapais marcas73.

Uma das técnicas de compreensão e aplicação das cláusulas gerais é o

“método grupo de casos”, desenvolvidos por juristas germânicos e aplicado na

arrumação das hipóteses de aplicação do princípio da boa fé processual, reforçando a

função do precedente judicial na concretização das normas gerais, inclusive das

cláusulas gerais. Assim, compara-se o caso a ser decidido com os casos isolados que

integram um grupo de casos já julgados sobre determinada norma, havendo identidade

fático-normativa entre os casos, será possível agregar o novo caso ao grupo já

consolidado e, no que toca a fundamentação, bastará à indicação de que pertence ao

grupo, em um reaproveitamento das razões já expendidas nas hipóteses assemelhadas.

Há, portanto, a reiteração da aplicação de uma mesma ratio decidendi

(núcleo do precedente judicial), dando especificidade ao conteúdo normativo de uma

cláusula geral, sem esvaziá-la. A cláusula geral se torna um elemento de conexão,

                                                                                                                         73 No sentido da aproximação do sistema da civil law ao sistema da common law: LOURENÇO, Haroldo. Precedente Judicial como Fonte do Direito: algumas considerações sob a ótica do Novo CPC. Revista Eletrônica - ISSN 2236-8981 - Volume 1. N. 6. DEZEMBRO DE 2011 – Temas atuais de processo civil, p. 38-65.

permitindo o magistrado fundamentar sua decisão em casos precedentemente julgados.

A vagueza normativa é esclarecida paulatinamente pelas decisões judiciais.

DIDIER74 afirma que o agrupamento de casos não é perfeito, obviamente.

Há casos julgados em época com contexto social muito diverso, pode ser que ainda não

haja casos passíveis de comparação e, por fim, pode gerar um retorno ao método da

subsunção exclusiva, impedindo o desenvolvimento social.

Há outros elementos que, ao lado dos precedentes, servem à concretização

das cláusulas gerais. A observância da finalidade concreta da norma é um dos elementos

imprescindíveis na concretização de uma clásula geral. O método teleológio de

compreensão das normas, não obstante tenha as suas dificuldades, não pode ser

ignorado.

Outro elemento é a pré-compreensão do aplicador a respeito dos elementos

do enunciado normativo, não podendo ignorar o consenso social estabelecido a respeito

de determinadas circunstâncias que devem ser examinadas. As práticas negociais de

agricultores de uma região, significa um comportamenteo socialmente havido como

honesto, um standard que serve de parâmetro para compreensão das cláusulas gerais.

Podem, ainda, ser controladas por razões formais (incompetência do órgão

julgador ou falta de fundamentação), quer por razões substanciais (má compreensão da

cláusula geral). As cláusulas gerais trazem consigo um sério risco de insegurança

jurídica, pois possibilita o juiz fazer valer a parcialidade, valorações pessoais,

arrebatamento jusnaturalista ou tendências moralizantes do mesmo gênero, contra letra

e contra o espírito na ordem jurídica. Por outro lado, o uso inadequado pelo legislador

atribui ao juiz uma responsabilidade social que não é a do seu ofício. Há o perigo da

“fuga para as cláusulas gerais”.

Por fim, cláusula geral é um texto jurídico, princípio é norma, sendo

institutos que operam em níveis diferentes do fenômeno normativo. A norma jurídica é

produto da interpretação do um texto jurídico, ou seja, interpretam-se textos jurídicos

                                                                                                                         74 DIDIER Jr., Fredie. Fundamento do Princípio da Cooperação no Direito Processual Civil Português. Coimbra Editora, 1ª Ed., p. 61.

para se verificar qual norma deles pode ser extraída. Um princípio pode ser extraído de

uma cláusula geral, o que costuma acontecer, mas a cláusula geral é texto que pode

servir de suporte para o surgimento de uma regra. Da cláusula geral do devido processo

legal é possível, por exemplo, se extrai a regra de que a decisão judicial deve ser

motivada.

Nesse sentido, em suma, não não há legislação composta apenas por

cláusulas gerais, bem como a aplicação de cláusulas gerais não dispensa sólida

fundamentação pelo órgão julgador, para um controle formal e substancial e o método

da concretização é o mais adequado para aplicação das cláusulas gerais, mesmo

necessitando de aprimoramento teórico, com observância dos precedentes judiciais, da

finalidade concreta da norma, da pré-compreensão, da valoração dos resultados da

decisão e do consenso como fundamento parcial da decisão.

4.2.4. Cláusulas gerais processuais.

As cláusulas gerais desenvolveram-se, inicialmente, no âmbito do Direito

Privado como, por exemplo, por meio da boa fé, função social da propriedade e função

social do contrato. Ultimamente, contudo, tais cláusulas têm sido adotadas no Direito

processual, em virtude da necessidade de normas flexíveis que permitam atender às

especiais circunstâncias do caso concreto. O devido processo legal ou processo

equitativo é o principal e mais vetusto exemplo de cláusula geral processual.

No CPC Brasileiro há uma série de exemplos de cláusulas gerais: (i) poder

geral de efetivação (art. 461 §5° do CPC); (ii) poder geral de cautela (art. 798 do CPC);

(iii) menor onerosidade da atividade executiva (art. 620 do CPC); (iv) dever geral de

boa fé (art. 14, II do CPC); (v) publicidade do edital de hasta pública (art. 687 §2° do

CPC); (vi) juízo de equidade na jurisdição voluntária (art. 1.109 do CPC) etc. No CPC

Português: (i) adequação formal (art. 265°-A); (ii) acesso à justiça efetiva, tempestiva e

adequada (art. 2°, 1 e 2); (iii) igualdade entre as partes (art. 266°, 1) etc. O art. 266°, 1

do CPC português, que consagra a cooperação, é outro exemplo de cláusula geral.

O CPC português está na vanguarda mundial, pois é estruturado em

cláusulas gerais, dispostas no início da codificação, formando o prólogo indispensável à

compreensão do direito processual, diferentemente do CPC brasileiro, onde as cláusulas

gerais aparecem soltas, sem preocupação sistemática, produto de inúmeras reformas

legislativas que desestruturam o sistema organizado por BUZAID.

A produção doutrinária e jurisprudencial sobre as cláusulas gerais são quase

que infinitas, notadamente na Alemanha. Assim, a compreensão do princípio da

cooperação do Direito português não pode prescindir de todas essas conquistas,

justamente para se perceber que o desrespeito do princípio da cooperação não precisam

ser típicas: pode-se construir o efeito jurídico mais adequado ao caso concreto, eis que é

possível gerar invalidade, preclusão (até mesmo supressio), dever de indenizar, direito a

tutela inibitória, sanção disciplinar etc.

A sanção ao abuso de direito, por exemplo, deverá ser feita em função e de

acordo com as circunstâncias específicas do comportamento concretamente assumido

pelo titular do direito.

4.2.5. Princípio da Cooperação e o Devido Processo Legal.

O Direito Processual está se constitucionalizando, características do Direito

contemporâneo, o que pode ser observados em duas dimensões.

Inicialmente houve uma incorporação aos textos constitucionais de normas

processuais, inclusive com direitos fundamentais, o que se percebem em praticamente

todas as constituições ocidentais posteriores à Segunda Guerra, bem como em tratados

internacionais de direitos humanos, como a Convenção Europeia de Direitos do Homem

(art. 6°, 1) e o Pacto de São José da Costa Rica (art. 8°). Os principais exemplos são os

direitos fundamentais ao processo jurisdicional devido ou equitativo e todos os seus

corolários (contraditório, juiz natural, proibição de prova ilícita etc.).

Noutro giro, a doutrina passou a examinar as normas processuais

infraconstitucionais como concretizadoras das disposições constitucionais, valendo-se

do repertório teórico desenvolvido pelos constitucionalistas, intensificando o diálogo

entre constitucionalistas e processualistas, com avanços recíprocos, como o ocorrido na

jurisdição constitucional.

O exame do princípio da cooperação enquadra-se nessa tendência, devendo

ser analisado junto com a Constituição da República portuguesa. O art. 20, n° 4, a

cooperação é definidora do modelo do “processo equitativo” português, onde assegura

uma decisão em prazo razoável e processo equitativo, em sintonia como o art. 266°, 1

do CPC Português, que é bem claro no objetivo de brevidade e eficácia a justa

composição do litígio.

O devido processo legal, cláusula geral, foi ampliado ao longo da história,

eis que existe há séculos (desde 1354 d.C., Eduardo III, rei da Inglaterra), bem como ao

Édito de Conrado II, Decreto Feudal Alemão de 1037 d.C., que inspirou a Carta Magna

de 1215. Óbvio que, o que se entendia como devido no século XIV não foi o que se

entendeu no século XX, tampouco o que se entende devido atualmente. Enfim,

inegavelmente há um acúmulo histórico a respeito da compreensão do devido processo

legal que não pode ser ignorado.

Assim, não se pode desconsiderar o contraditório ou a razoável duração do

processo, justamente por se proibir o retrocesso. Esse longo período não esvazia essa

cláusula geral, que permanece útil e em vigor, o que demonstra ser uma obra

eternamente em progresso, permitindo mobilidade e abertura do sistema jurídico. A sua

generalidade garante longevidade.

Nesse sentido, a estruturação de um processo leal e cooperativo parece ser

uma nova etapa na concretização do conteúdo do devido processo legal. A cooperação

obrigacional é corolário do princípio da boa fé, devendo aquele ser interpretado em uma

perspectiva sintática, relação entre as normas, tratando-se de um subprincípio derivado

do sobreprincípio da boa fé, que tem aptidão para gerar situações ativas e passivas

atípicas.

5. Algumas aplicações da cooperação no processo civil brasileiro.

Apesar de ainda ser incipiente, há vários momentos onde a legislação

processual civil consagra a cooperação, geralmente entre as partes, somente em alguns

momentos direcionando deveres ao órgão jurisdicional.

O magistrado tem o dever de consultar as partes sobre ponto relevante e que

até então havia sido ignorado, assegurando que as partes possam influenciar na solução

da controvérsia. Como cabe ao magistrado a investigação oficiosa dos requisitos de

admissibilidade do processo (art. 267 §3° do CPC), contudo, carecendo o processo de

algum dos seus requisitos, antes do magistrado extinguir o processo deverá ouvir as

partes, intimando-as. A possibilidade de conhecer uma matéria sem provocação não se

confunde com a possibilidade de conhecê-la sem o contraditório das partes.

De igual modo, antes do indeferimento da petição inicial, posto que foi

detectado um defeito na mesma, o magistrado deverá dar a parte a oportunidade de

corrigi-la, mesmo que depois do prazo para emenda (art. 295, V do CPC), o que

inclusive já é consagrado no STJ, afirmando que o prazo para emenda da petição inicial

é um dilatório, ou seja, admitindo a emenda extemporânea.75

O juiz tem o dever de esclarecer suas manifestações que porventura sejam

obscuras, bem como de pedir esclarecimento às partes ou outros participantes do

processo, sempre que necessário, seja por má formação das frases, má exposição das

ideias, ou mesmo por falha de impressão, para a formação segura de sua cognição.

Há, ainda, o dever de prevenção ou proteção, eis que se o juiz se deparar

com algum defeito processual, tem o dever de apontar a falha e a forma como deverá ser

corrigida ou sanada. O dever de prevenção encontra-se consagrado no art. 284 e 616 do

CPC, garantindo ao demandante o direito de emendar a petição inicial, ainda que várias

vezes, para a correção do defeito.

                                                                                                                         75 STJ, 2ª Sç., REsp 1.133.689/PE, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 28/3/2012. Precedentes citados: REsp 871.661-RS, DJ 11/6/2007, e REsp 827.242-DF, DJe 1º/12/2008.

Com a reforma do processo de execução (2005/2006), um preciso caso de

aplicação do princípio da cooperação foi inserido. Exige-se do credor, tanto na execução

extrajudicial (art. 614, II), como no cumprimento de sentença (art. 475-B), a

apresentação de uma memória atualizada e discriminada do cálculo e, simetricamente,

exige-se do executado, caso alegue em suas respectivas defesas excesso de execução,

que apresente, do mesmo modo, memória do cálculo, cooperando, assim, com o

julgamento (art. 475-L §2° e art. 739-A §5°).

No mesmo giro, percebe-se que o legislador reformista passa, expressa e

indubitavelmente, a exigir uma conduta de mais comprometimento e de colaboração do

executado para com a efetividade da prestação jurisdicional e celeridade do desfecho da

lide fixando, por outro lado, meios de reprimenda às atitudes que se mostrem contrárias

a tais interesses.

Com efeito, a nova norma segue a orientação ideológica, já disposta

anteriormente em outras leis que ultimamente alteraram o processo de conhecimento no

CPC, de exigir um comportamento leal e ético das partes, principalmente do

demandado, coibindo, ainda que pontualmente, atos que importem procrastinação ou

alongamento desarrazoado ou indevido do tempo do processo executivo, impedindo que

ele se torne, na prática, instrumento de tortura da parte que tem crédito a receber e de

desprestígio da própria atividade jurisdicional estatal.76

Nesse sentido, o art. 740, parágrafo único, quando passa a impor multa para

o caso de apresentação de embargos do executado com intuito manifestamente

protelatório. O art. 745-A §2° quando comina, no caso de inadimplência de pedido de

pagamento parcelado, multa sobre o valor das prestações não pagas, sem prejuízo de

vedação à oposição de embargos. De igual modo, o mencionado 745-A consagra um

nítido caso de venire contra factum proprium, eis que proposto o parcelamento se esta

praticando ato incompatível com a conduta de, posteriormente, se oferecer embargos do

executado.

                                                                                                                         76 Nesse sentido: CARPENA, Márcio Louzada. Da não apresentação de bens passíveis de penhora e das multas. Disponível em: <http://www.abdpc.org.br/artigos/artigo1071.htm>. Acesso em: 10 de maio de 2011.

Outro caso de dever de cooperação é encontrado nos arts. 652 §3°, 600, IV e

601, eis que se o executado não nomear bens, depois de intimado, suportará multa de

até vinte por cento sobre o valor do crédito, por afronta à dignidade da justiça.

6. Conclusão.

O desenvolvimento do princípio da cooperação depende da análise teórica e

jurisprudencial do common law e do civil law: devido processo legal e criatividade

judicial, temas intimamente relacionados ao primeiro; bem como princípio da boa fé e

cooperação obrigacional, construções do segundo, especialmente na Alemanha.

Os problemas da boa fé são solucionados nos EUA pela cláusula do devido

processo legal, na Alemanha, pela expansão do § 242 do BGB aos “dominíos não

civis”, e assim sucessivamente.

Muitas vezes a discussão doutrinária é meramente terminológica. A ilicitude

do comportamento contraditório na Alemanha foi resolvido pelo desenvolvimento do

venire contra factum proprium; na Espanha e na Argentina, pela doutrina de los actos

proprios; nos países do common law, pelo estoppel.

O sistema jurídico brasileiro tem um direito constitucional de inspiração

estadunidense, um direito infraconstitucional inspirado na família romano-germânica

(França, Alemanha e Itália, basicamente), controle de constitucionalidade difuso

(judicial review estadunidense) e concentrado (modelo austríaco), há inúmeras

codificações legislativas (civil law) e, simultaneamente, constrói-se um sistema de

valorização dos precedentes, inspirado no sistema da common law, temos um direito

privado estruturado de acordo com o modelo do direito romano, de cunho

individualista, temos um microssitema de direitos coletivos dos mais avançados e

complexos do mundo, que é uma marca do sistema common law; enfim, não há

preconceitos jurídicos no Brasil, busca inspiração nos mais variados modelos

estangeiros.

Existe farta produção doutrinária e jurisprudencial sobre devido processo

legal e boa fé objetiva, recentemente, boa produção sobre cláusulas gerais e eficácia

normativa dos princípios, proporcionando um lastro cultural que permite o

desenvolvimento do princípio da cooperação, contudo, tais institutos não são

aprofundados na análise processual.

Cremos, sinceramente, que o boa fé processual é aplicável a todos os que

participam da relação jurídica processual, bem como ao magistrado, exigindo uma

cooperação e um processo baseado no diálogo.

Em Portugal o direito privado é fortemente influenciado pela tradição

européia continental, mas a Constituição consagrou o processo equitativo, contudo, a

doutrina reputa o art. 266°, 1 uma norma programática, com reduzida eficácia

normativa.

Por fim, o princípio da cooperação consagrado no art. 266°, 1 do CPC

português: (i) é uma cláusula geral, que concretiza um novo modelo de processo

equitativo; (ii) é um subprincípio do devido processo legal e da boa fé processual; (iii)

independe de regras específicas para a sua concretização; (iv) é fonte direta de situações

jurídicas ativas e passivas, típicas e atípicas, para todos os sujeitos processuais,

inclusive para o órgão jurisdicional.

7. Bibliografia.

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