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A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO OLHAR DE SEUS ALUNOS E PROFESSORES Professora PDE: Luzia Bernardete Medeiros Orientadora UEPG: Ms.Ione da Silva Jovino RESUMO Este artigo apresenta o relato da experiência da implementação pedagógica numa escola de Educação de Jovens e Adultos no município de Jaguariaíva, Paraná. Para a efetivação da implementação utilizou-se a metodologia da pesquisa-ação com coleta de dados através de questionários a alunos e professores. Constituiu-se um Grupo de Apoio à Implementação do Projeto PDE na escola, com a participação do diretor, equipe pedagógica e professores para discussão das bases teórico-metodológicas que orientam o projeto de intervenção pedagógica e para auxílio no acompanhamento, desenvolvimento e programação das atividades. Aos alunos proporcionou-se em parceria com os professores colaboradores, míni-oficinas para discussões de temas sobre afetividade, auto-estima e cooperação. Os resultados da implementação apontam a importância da EJA na vida de seus envolvidos e a necessidade de práticas educativas mais afetivas por parte dos professores desta modalidade de ensino. Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos. Afetividade. Alunos. ABSTRACT This article presents an account of the implementation experience of teaching in a school of education of Youth and Adults in the city of Jaguariaíva, Paraná. For effective implementation used the methodology of action research with data collection through questionnaires to students and teachers. Constituted a Group of Support to implementation of the PDE project in school, with the participation of the director, teaching staff and teachers to discuss the methodological foundations underlying the design of education intervention and for assistance in monitoring, development and programming activities. The students provided in partnership with teachers staff, mini-workshops for discussion of topics on affectivity, self-esteem and cooperation. The implementation results show the importance of adults education in the life of this stakeholders and the need for more affective educational practices for teachers of this modality of education. Keywords: Youth and Adults. Affectivity. Students.

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A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO OLHAR DE SEUS ALUNOS E PROFESSORES

Professora PDE: Luzia Bernardete MedeirosOrientadora UEPG: Ms.Ione da Silva Jovino

RESUMO

Este artigo apresenta o relato da experiência da implementação pedagógica numa escola de Educação de Jovens e Adultos no município de Jaguariaíva, Paraná. Para a efetivação da implementação utilizou-se a metodologia da pesquisa-ação com coleta de dados através de questionários a alunos e professores. Constituiu-se um Grupo de Apoio à Implementação do Projeto PDE na escola, com a participação do diretor, equipe pedagógica e professores para discussão das bases teórico-metodológicas que orientam o projeto de intervenção pedagógica e para auxílio no acompanhamento, desenvolvimento e programação das atividades. Aos alunos proporcionou-se em parceria com os professores colaboradores, míni-oficinas para discussões de temas sobre afetividade, auto-estima e cooperação. Os resultados da implementação apontam a importância da EJA na vida de seus envolvidos e a necessidade de práticas educativas mais afetivas por parte dos professores desta modalidade de ensino.

Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos. Afetividade. Alunos.

ABSTRACT

This article presents an account of the implementation experience of teaching in a school of education of Youth and Adults in the city of Jaguariaíva, Paraná. For effective implementation used the methodology of action research with data collection through questionnaires to students and teachers. Constituted a Group of Support to implementation of the PDE project in school, with the participation of the director, teaching staff and teachers to discuss the methodological foundations underlying the design of education intervention and for assistance in monitoring, development and programming activities. The students provided in partnership with teachers staff, mini-workshops for discussion of topics on affectivity, self-esteem and cooperation. The implementation results show the importance of adults education in the life of this stakeholders and the need for more affective educational practices for teachers of this modality of education.

Keywords: Youth and Adults. Affectivity. Students.

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1 INTRODUÇÃO

O Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, implantado pela

Secretaria de Estado da Educação, apresenta uma nova concepção de

Formação Continuada em serviço, com a valorização dos professores que

atuam na rede pública estadual de ensino do Estado do Paraná na busca da

superação da dicotomia entre a teoria e prática na formação continuada dos

professores da educação básica.

Esse novo modelo de formação continuada busca proporcionar aos

professores selecionados para participar do programa o retorno presencial às

atividades acadêmicas de sua área de formação inicial e o contato com os

demais colegas da rede de ensino para o desenvolvimento de atividade

colaborativa numa dinâmica permanente de reflexão, discussão e construção

do conhecimento. Para tanto, o professor deve elaborar um plano de trabalho

em conjunto com o professor orientador da instituição de ensino superior, que

consta de uma proposta de intervenção na realidade escolar, a elaboração de

um material didático-pedagógico para auxiliar na sua implementação e a

coordenação de um grupo de trabalho em rede.

O presente artigo relata a experiência da implementação pedagógica

realizada no CEEBJA “Professor Ignácio Alves de Souza Filho” – Ensino

Fundamental e Médio, na cidade de Jaguariaíva - Paraná. A implementação

teve lugar no primeiro semestre letivo de 2009 e contou com a aplicação de

questionários a alunos e professores da referida escola de EJA – Educação de

Jovens e Adultos, formação de um grupo de estudos com os docentes para

discussões a respeito de temas específicos desta modalidade de ensino e

oferta de oficinas aos discentes, para propiciar momentos de interação, trocas

de experiências, socialização e criação de vínculos afetivos reforçando o

sentimento de pertencimento dos alunos ao ambiente escolar.

De forma geral, a implementação teve como objetivo a sensibilização da

comunidade escolar para o uso de práticas de motivação e desenvolvimento da

afetividade, com o propósito de evitar a evasão e a rotatividade de matrículas a

cada início de ano na escola. É também uma forma de buscar respostas para

a inquietante indagação do que pensam os alunos da Educação de Jovens e

Adultos sobre esta modalidade de ensino.

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2 DESENVOLVIMENTO

No universo escolar, o tema afetividade tem uma dimensão pouco

destacada nas práticas pedagógicas, pois geralmente se privilegia o aspecto

cognitivo passando a figurar a dimensão afetiva como um tema transversal ao

currículo. Essa visão dualista, que leva o indivíduo a ser visto como um ser

dividido entre a razão e a emoção, entre afeto e cognição, impede uma

compreensão do ser humano em sua totalidade. No entanto, a inclusão da

dimensão afetiva nas discussões educacionais é relevante, já que a educação

é um processo no qual todos os envolvidos se afetam e são afetados como

sujeitos sociais. Alguns autores apontam a importância da afetividade na

aprendizagem, entre eles: Freire (2003), Leite (2006) e Wallon, citado por

Mahoney e Almeida (2005) .

2.1 Os autores e a afetividade

Paulo Freire, renomado educador brasileiro, defende que a educação vai

além dos métodos, técnicas, currículos e metodologias. Dá ênfase as

dimensões e relações essencialmente humanas, que estão implicadas na

educação e nos processos educacionais ao afirmar que “não há docência sem

discência” (FREIRE, 2003, p.13-20), ou seja, “quem ensina aprende ao ensinar

e quem aprende ensina ao aprender” (FREIRE, 2003 - p.25). Ensinar um aluno,

segundo ele, é muito mais que simplesmente transmitir conhecimentos, é criar

possibilidades para os alunos construírem seu conhecimento, de forma

autônoma e crítica (FREIRE, 2003).

Quando a afetividade não está presente nas relações professor - aluno,

o professor se vê como o centro do processo educativo e o aluno como o seu

objeto a ser formado. Nessa relação, ocorre o que Freire (2004) critica como

“educação bancária”, um tipo de educação passiva e acrítica imposta aos

alunos, na qual a prática pedagógica se reduz ao ato de depositar, transferir e

transmitir valores e conhecimentos.

Diferentemente do modelo de educação bancária, Paulo Freire afirma

que a relação professor-aluno em sala de aula deve estar em um mesmo

patamar de igualdade, numa relação dialógica, onde ambos aprendem e

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crescem um com o outro, onde o pensar do aluno não pode ser inibido pelo

pensar do professor, mas ser complementado por este. A afetividade permite o

fortalecimento do processo dialógico desfazendo a relação de dominação de

saberes e o bom senso do professor diminui a distância entre o discurso e a

prática, deixando transparecer verdades em seus ensinamentos (FREIRE,

2003 , p.61).

A dimensão afetiva está presente em todas as interações sociais; com

isso é possível afirmar que também ocorrem no ambiente escolar influenciando

o processo de desenvolvimento cognitivo. Alguns autores: Leite (2006),

Tassoni (2006), Silva (2006), Tagliaferro (2006) e Falcin (2006) apresentam

estudos sobre a relação da afetividade e as práticas pedagógicas,

especialmente na relação professor-aluno.

Leite (2006), alerta para que a palavra “afetividade” seja interpretada

corretamente, relacionado-a com as atitudes do professor preocupado com

sua prática pedagógica. Muito mais do que contato físico, a dimensão afetiva

deve estar presente em todos os momentos e etapas do trabalho pedagógico

na sala de aula podendo ser percebida de várias formas, como na escolha dos

objetivos de ensino, na organização dos conteúdos, procedimentos e formas de

avaliação. Assim, as decisões que o professor toma no planejamento e

desenvolvimento de sua aula tem implicações não só cognitivas, mas também

afetivas que interferem nas relações professor- aluno - objeto do conhecimento.

Assim como Freire, Leite (2006) afirma a importância da relação

professor – aluno. A linguagem (verbal e não-verbal) adotada pelo professor

deve afetar positivamente os estudantes inspirando confiança e motivação,

facilitando a relação como objeto de estudo. A confiança que se estabelece em

sala de aula proporciona o fluir da criatividade, o desembaraço em atividades

de expressão e um clima agradável para o aprendizado. Laços de afetividade,

no entanto, não se estabelecem imediatamente ou de maneira forçada ou

imposta, mas são construídos gradativamente, de maneira espontânea, pela

interação e respeito à individualidade de cada um.

Estendendo um olhar para o campo da Psicologia, destaca-se o

psicólogo Henri Wallon, citado por Mahoney e Almeida (2005), que embora não

sendo pedagogo, demonstra preocupação com as questões educacionais ao

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apresentar uma teoria sobre o desenvolvimento humano, onde destaca a

integração entre o organismo humano e o meio e entre as dimensões cognitiva,

afetiva e motora no desenvolvimento da pessoa. De acordo com as autoras, o

conjunto afetivo na teoria walloniana oferece as funções responsáveis pelas

emoções, sentimentos e paixão. Já o conjunto motor oferece a possibilidade de

deslocamento do organismo no tempo e espaço, sendo também o local onde

as emoções e sentimentos se manifestam. O conjunto cognitivo permite a

aquisição e a manutenção do conhecimento por meio de imagens, noções,

ideias e representações. Permite também rever o passado, fixar e analisar o

presente e projetar futuros. Da integração desses três conjuntos resulta “a

pessoa” (MAHONEY; ALMEIDA, 2005, p.18).

Com base na teoria de Wallon, as autoras defendem que o

desenvolvimento humano é um processo social e que a dimensão afetiva nas

relações sociais acaba influenciando o cognitivo e vice-versa. O processo de

desenvolvimento de uma pessoa é contínuo por toda sua vida, apenas em

ritmos e tempos diferenciados entre crianças e adultos (MAHONEY e ALMEIDA

2005, p.18). Toda aprendizagem passa pelas etapas do sincretismo à

competência. A imitação e o acolhimento são processos importantes para a

aprendizagem em qualquer idade, sendo que a emoção é contagiante (positiva

ou negativamente) na dinâmica da classe. Assim, relacionando ao universo da

EJA, é possível perceber que não existe idade “certa” para aprender, pois o ser

humano está em constante desenvolvimento. A volta aos bancos escolares em

idade adulta é, pois, muito mais que uma atitude compensatória de recuperar o

tempo perdido na infância, mas uma oportunidade da EJA mostrar o seu

potencial de educação permanente e indispensável ao desenvolvimento do

indivíduo.

2.2 O saber ouvir na educação

Nas relações escolares, a forma como o professor se relaciona com o

aluno reflete nas relações deste com o conhecimento e com os demais

colegas, pois mesmo que não queira, o professor passa a ser um modelo

seguido pelos alunos. Outra forma de demonstrar a afetividade nas relações

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pedagógicas é saber ouvir os alunos, estando aberto ao outro e

proporcionando momentos de diálogo. Escutar significa estar disponível à fala

do outro, respeitando as suas diferenças, dialogando e discordando, se for o

caso. Paulo Freire (2003, p.113-116) afirma que somente quem sabe escutar é

que aprende a falar com os alunos, pois só quando o professor escuta paciente

e criticamente seus alunos é que aprende a falar com eles.

Para saber o que pensam os alunos de EJA sobre a própria escola, para

entender os anseios e pontos de vista dos jovens e adultos que retornam ao

ambiente escolar após tempos de afastamento, é preciso dar espaço ao

diálogo democrático, dar vez a sua voz, que não é valorizada suficientemente

no espaço escolar, pois do contrário, uma fala autoritária silencia e dificulta o

diálogo.

Para Freire (2003, p. 137-139), saber ouvir o aluno é respeitar e valorizar

a sua história, seus conhecimentos de mundo que traz consigo em sua

bagagem cultural e discutir com eles a razão desses saberes em relação aos

conteúdos ensinados. É ter humildade frente às diferenças e incompletudes

dos alunos, seres em constante aprendizagem. É ter humildade para aceitar e

saber dialogar com aquele que fala e /ou escreve de uma maneira diferente

das normas padrões da gramática. Ao reconhecer a leitura de mundo do aluno,

o professor está valorizando o seu saber cotidiano.

Segundo as Diretrizes Curriculares da Educação de Jovens e Adultos do

Estado do Paraná (DCEs), este legado cultural trazido pelos alunos representa

significativas experiências de vida adquiridas a partir do senso comum, do

saber popular, no cotidiano em suas relações sociais, pois a escola não é o

único lugar onde há produção e socialização dos conhecimentos. Este

conhecimento empírico deve ser levado em consideração na elaboração do

currículo escolar, sendo o ponto de partida para as práticas educativas para

transformá-los em conhecimentos científicos. Segundo Freire, (2003, p.38) a

educação emancipatória valoriza o “saber de experiência feito”, o saber

popular, e parte dele para a construção de um saber que ajude homens e

mulheres na formação de sua consciência política.

Espera-se que o saber escolar adquirido na escola oportunize aos

alunos condições de exercer a cidadania, valorizando a sua cultura de

referência e ampliando-a com conhecimentos científicos para formar indivíduos

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“autônomos intelectual e moralmente, capazes de interpretar as condições

histórico-culturais da sociedade em que vivem de forma crítica e reflexiva,

impondo autonomia às próprias ações” (DCEs, 2005, p.50). Para que se

valorize a história de vida do aluno jovem ou adulto, as DCEs recomendam

alguns critérios que devem ser levados em consideração no momento da

seleção dos conteúdos e das práticas escolares para a EJA, a saber: a

importância dos conteúdos escolares frente à experiência social construída

historicamente; a necessidade que processos de ensino-aprendizagem

privilegiem o pensar, a reflexão entre os saberes empíricos e científicos na

busca de conteúdos significativos, atividades que permitam integração entre os

diferentes saberes e a possibilidade dos conteúdos e práticas escolares

articularem singularidade e totalidade no processo de conhecimento vivenciado

na escola (DCEs, 2005, p.50-51)

Volta-se novamente a destacar a importância do professor nas relações

pedagógicas, seja diretamente, através da afetividade nas relações professor-

aluno, como também nas dinâmicas da sala de aula promovendo o debate e o

diálogo ou com ações que valorizem sua cultura na escolha dos conteúdos de

ensino. Imprescindível também, para saber o que pensam os alunos, é ouvi-

los, no sentido exato da palavra: escutá-los a sós, em grupos, informalmente,

nas rodas de conversas do corredor ou por escrito, através de questionários,

como foi realizado para a coleta de dados para implementação, do qual resulta

este artigo.

2.3 A metodologia utilizada

Ao se implementar a proposta pedagógica na escola procurou-se utilizar

os métodos e aportes da pesquisa-ação, uma modalidade de pesquisa social

que permite compreender a realidade estudada enquanto se opera uma

intervenção a fim de modificá-la. A pesquisa-ação é assim definida por Thiollent

(2008):

... a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação

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com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo (THIOLLENT, 2008, p.16).

Procurou-se levar em consideração a voz dos sujeitos investigados e

suas perspectivas como parte da investigação, procurando estabelecer um

diálogo entre o professor PDE e a comunidade escolar na busca de solução

para o problema detectado. A investigação teve a intenção de encontrar

respostas às questões na prática, de modo ativo e interativo e com a

participação de todos os envolvidos. Também permitiu a tomada de

consciência das transformações que foram ocorrendo no processo da

intervenção. No caso específico do processo de implementação, permitiu ouvir

os alunos e professores do CEEBJA no ambiente de convivência escolar e

acompanhar as mudanças de atitudes com relação aos seus pensares por

ocasião das atividades aplicadas à realidade escolar.

A aplicação da implementação seguiu alguns passos, não rígidos, mas

que se alternavam entre si: uma fase exploratória, fase principal, de ação e

avaliação dos resultados.

Na fase inicial exploratória é feito um diagnóstico da situação inicial a

partir de informações coletadas através da pesquisa de campo. Os dados

sobre o universo da EJA foram coletados através de conversas informais nos

corredores da escola e de questionários destinados a alunos e professores do

CEEBJA “Professor Ignácio Alves de Souza Filho” – Ensino Fundamental e

Médio, em Jaguariaíva - Paraná.

Os questionários foram aplicados aos alunos do Ensino Fundamental –

Fase II e do Ensino Médio, matriculados nas diversas disciplinas da

organização coletiva e individual, que se encontravam presentes nas aulas em

um determinado dia e horário (14 h e 19 h) e que concordaram em participar

voluntariamente da pesquisa. Para garantir maior fidelidade nas respostas e

evitar que os alunos se sentissem constrangidos em falar a verdade sobre o

que pensam, foi solicitado que os questionários fossem preenchidos sem a

necessidade de identificação do pesquisado. As respostas também foram

individuais e sem ajuda do professor e/ou colegas. Dos questionários aplicados

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aos alunos e que foram devolvidos, uma grande parte foi descartada por conter

inúmeros campos em branco, sem preenchimento de resposta. O mesmo

ocorreu com os questionários destinados aos docentes. Ao final, ficou por

amostragem um total de 30 questionários de alunos e 10 questionários de

docentes.

A dificuldade de preenchimento satisfatório dos questionários pode estar

associada a diversos fatores, como a não familiaridade com o modelo dos

mesmos, a falta de clareza na proposição da atividade ou a dificuldade de

interpretação das mensagens contidas. Nos questionários dos professores e

dos alunos constava uma tabela, no formato de escalas de Likert, onde os

pesquisados deveriam informar o grau de concordância com as afirmações,

escolhendo e assinalando a opção que informava a melhor representação do

seu pensamento. As opções de respostas consistiam em escolher entre:

“concordo totalmente”, “concordo em parte”, “discordo em parte” e “discordo

totalmente”, informando uma única resposta a cada afirmação. As afirmações,

positivas e negativas versavam sobre auto-estima, auto-imagem, a relação

professor-aluno e a importância do estudo e do trabalho do professor. Os

questionários também apresentavam questões de múltipla escolha com mais

de uma resposta e perguntas abertas com respostas pessoais.

Os dados coletados informalmente foram através de bate-papos

descontraídos em momentos de intervalos, em conversas na sala dos

professores e no dia-a-dia da rotina da escola.

Os quadros a seguir mostram uma síntese dos resultados dos

questionários aplicados aos alunos.

A primeira parte contava com perguntas de múltiplas alternativas para a

escolha de uma única resposta, com o intuito de definir o perfil dos alunos

pesquisados:

Sou do sexo( 11) masculino

(19) feminino

Estudo(12) Ensino Fundamental (11) período da tarde

(18) Ensino Médio (19) período da noiteSou (10) solteiro(a)

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(12) casado(a)

( 3) separado(a)

( 2) viúvo(a)

( 2) vive com companheiro(a)

Minha idade

( 3) de 15 a 20 anos

(12) de 21 a 30 anos

(12) de 31 a 40 anos

( 2) de 41 a 50 anos

( 1) com mais de 51 anosAtualmente

trabalho

(18) sim

(12) não

Para a coleta de dados sobre questões referentes à auto-estima dos

alunos, a relação professor/aluno e a importância do estudo e da escola na

vida dos pesquisados, foi utilizado um quadro com escalas de Likert, onde é

preciso identificar a sua concordância ou não a respeito de cada afirmação. Os

resultados estão representados no quadro a seguir:

.

Assinale a resposta que melhor expressa o seu

pensamento

Con

cord

o to

talm

ente

Con

cord

o e

m p

arte

Dis

cord

o e

m p

arte

Dis

cord

o t

otal

men

te

COM RELAÇÃO À AUTO-ESTIMA E AUTO-IMAGEMSinto-me feliz por estar estudando. 25 5 - -Apesar das dificuldades, consigo vencer e aprender. 21 9 - -Na escola, sinto que meus conhecimentos são valorizados.

22 5 1 2

Não me sinto capaz de acompanhar o ritmo de estudos. 5 4 5 16Penso em desistir de estudar. 4 2 1 23

RELAÇÃO COM OS PROFESSORES (AS)Os professores são importantes para minha aprendizagem.

29 1 - -

Os professores entendem minhas dificuldades e me ajudam a superá-las.

18 2 - -

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Eles me incentivam a prosseguir estudando. 27 3 - -Os professores demonstram impaciência quando demoro entender a matéria.

4 5 - 21

Gostaria de ter mais atenção dos professores. 12 5 1 12

IMPORTÂNCIA DA ESCOLA E DO ESTUDOA escola pode me ajudar a realizar meus sonhos. 24 5 - 1Considero o estudo necessário para melhorar de vida. 29 1 - -Estudar me faz sentir capaz e realizado. 26 4 - -Detesto a escola, só voltei a estudar por necessidade. 2 2 1 25Sinto vergonha de não ter estudado antes. 8 7 6 9

Com relação aos dados que mostram a auto-estima e auto-imagem dos

alunos, é possível notar que, diferentemente do que se ouve comentar com

base em senso comum, os alunos do CEEBJA não apresentam baixa auto-

estima, tendo a maioria, uma auto-imagem positiva. A relação com os

professores é cordial, pois reconhecem a importância destes no processo de

aprendizagem e pelo estímulo que recebem para continuarem estudando. Em

resposta a uma pergunta aberta sobre os professores, as palavras mais

utilizadas para descrevê-los foram:

Em poucas palavras, como você descreve os professores desta escola?

“Legais, atenciosos, ótimos/excelentes professores, compreensivos, bons

amigos, capacitados para a profissão, pacienciosos, esforçados, competentes,

ensinam bem, dedicados, nos incentivam, iguais aos da escola regular, somos

uma família, alguns não são tão bons”.

No entanto, a relação professor/aluno poderia ser ainda mais intensa,

pois os alunos deixaram transparecer a carência da afetividade, nos itens

paciência e atenção às dificuldades individuais.

Já a escola e os estudos em si são declarados importantes para o

desenvolvimento individual e econômico dos alunos, pois muitas vezes, o

reingresso à escola se dá por motivos relacionados ao trabalho – falta deste ou

busca de melhores colocações. A EJA é apontada como uma escola de melhor

qualidade de ensino se comparada às escolas regulares, pois atende às

expectativas e necessidades dos alunos que a procuram como apontado nas

justificativas para a pergunta com resposta aberta.

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Penso que o

ensino na EJA é:

( 0) pior que nas escolas de ensino regular

( 5) igual às escolas de ensino regular

(25) melhor que as escolas de ensino regular

Justifique sua resposta:

• Devido ao horário flexível – 8 respostas

• Respeita o ritmo do aluno - 6

• O ambiente é bom – 4

• Os professores são atenciosos e ajudam- 4

• Na EJA não tem preconceito de idade – 2

• A EJA dá oportunidades a todos – 2

• Tem menos alunos por turma – 2

• Não sabem responder o motivo - 2

O trabalho é um dos fatores apontados como causador do abandono dos

estudos, uma das principais dificuldades em prosseguir estudando, mas

também motivo de retorno aos bancos escolares, como é possível ver nos

quadros a seguir:

Há quanto tempo estava sem estudar? Por quê?

( 7) até 5 anos

(12) de 6 a 10 anos

( 5) de 11 a 20 anos

( 6) mais de 20 anos

• Dificuldade em conciliar os horários de estudo e trabalho – 9 respostas

• Proibição por parte do companheiro - 4

• Preguiça, descuido, falta de interesse - 4

• Falta de tempo devido a outras responsabilidades - 2

• Outros: dificuldade em aprender, distância grande da escola, mudança,

nascimento dos filhos, viajava muito ... – 11

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O que fez você procurar a Educação de Jovens e Adultos?

• Para conseguir um emprego melhor - 6

• Por exigência do trabalho - 6

• Para concluir o Ensino Médio - 4

• Para fazer outros cursos ou curso superior - 4

• Vontade de vencer na vida e dar um futuro melhor aos filhos - 4

• Outros: por incentivo de outras pessoas, por ser mais fácil e flexível,

vontade própria... - 6

Quais as principais dificuldades que você enfrenta para continuar estudando?

• Problemas familiares – 8

• Nenhuma - 8

• O trabalho – 5

• A inadequação dos horários de trabalho e estudo – 5

• Distância da escola – 3

• Cansaço - 1

O resultado dos questionários aplicados ao professores aponta uma

expectativa favorável em relação à aprendizagem:

.

Assinale a resposta que melhor expressa o seu

pensamento

Con

cord

o

tota

lmen

te

Co

ncor

do e

m p

arte

Dis

cord

o em

par

te

Dis

cord

o to

talm

ente

COM RELAÇÃO OS ALUNOS DE EJASão batalhadores e vencedores. 10 - - -Apesar das dificuldades, são capazes de aprender. 6 4 - -Sentem orgulho de ter voltado a estudar. 8 2 - -É mais difícil trabalhar com alunos da EJA devido as suas dificuldades.

- 2 1 7

Os alunos sentem vergonha de estar na EJA. - 2 - 8

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IMPORTÂNCIA DO TRABALHO NA EJAMeu trabalho faz a diferença na vida dos alunos. 9 1 - -Sinto satisfação ao ver o resultado do meu trabalho com alunos da EJA.

10 - - -

Sinto-me feliz e realizado por fazer parte desta escola. 10 - - -Não gosto de trabalhar na EJA. Faço-o por falta de opção.

- - - 20

Considero a qualidade do ensino na EJA inferior às escolas regulares.

- 2 - 8

No olhar dos professores, a EJA não é uma escola com ensino inferior

às demais, pois têm satisfação em trabalhar com essa modalidade de ensino e

confiam no resultado de seu trabalho. A qualidade de ensino na EJA é reflexo

da prática cotidiana dos educadores e formação continuada, já que a formação

inicial na graduação não privilegia essa modalidade de ensino. A reflexão

constante das ações pedagógicas, da discussão e aplicação de novos métodos

possibilita uma participação mais ativa no universo da profissão, com reflexos

na sala de aula. Apenas recentemente, os cursos de Pedagogia vêm

oferecendo em sua grade curricular disciplinas que contemplam o ensino-

aprendizagem na EJA.

A experiência profissional dos dez docentes pesquisados é variada,

alguns trabalham há mais tempo com a EJA, outros começaram recentemente.

Os números que ilustram as respostas são:

Há quanto tempo atua na EJA?

( 3) há menos de um ano

( 2) 2 anos

( 2) 3 anos

( 3) 5 anos

A rotatividade de docentes no CEEBJA se deve especialmente ao fato

de que poucos docentes conseguem a fixação da lotação de seu padrão de

trabalhos neste estabelecimento de ensino, pois as vagas disponíveis são

variáveis de acordo com o porte da escola em quantidade de alunos.

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As perguntas abertas que admitiam respostas variadas versavam sobre

as especificidades percebidas na EJA com relação à escola regular e opinião

pessoal sobre seu olhar sobre esta modalidade de ensino.

Com relação à aprendizagem, quais as diferenças percebidas entre alunos do

ensino regular e os de modalidade EJA?

• São mais interessados, dedicados, com vontade de aprender – 5

• Tem defasagem de aprendizagem por ter ficado muito tempo sem

estudar - 3

• São mais responsáveis - 2

• Aproveitam o tempo na escola pela necessidade do estudo.

• A aprendizagem é mais rápida pela condição de adultos.

• Os alunos têm menos tempo para estudar.

Em sua opinião, que fatores influenciam para que os alunos de EJA se

evadam e retornem a escola por sucessivas vezes?

• Devido ao trabalho – 9 respostas

• Baixa auto-estima, vergonha, desinteresse - 4

• Cansaço, após rotina de trabalho – 3

• Dificuldade em conciliar horários – 2

• Dificuldades de aprendizagem, problemas familiares, doenças,

desemprego.

Qual seria sua atitude caso seus filhos decidissem estudar na EJA? Por quê?

• Apoiaria, pois os conteúdos são iguais à escola regular – 3 respostas

• Apoiaria, caso não estivesse em idade ideal para a escola regular – 2

• Apoiaria, mas preferiria que estudasse em escola regular - 1

• Apoiaria, pois estimula a continuar estudando -1

• Apoiaria, pela seriedade e competência dos professores de EJA – 1

• Apoiaria, mas deve se dedicar a aprender algo a mais que na escola – 1

• Depende da situação - 1

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Embora a EJA seja considerada uma escola de qualidade igual às

demais e os professores estar cientes da importância do seu trabalho de

educador, as opiniões se dividem ao fato de seus filhos estudarem nesta

modalidade de ensino. Tal fato ainda revela certo olhar de inferioridade para a

EJA como uma educação compensatória e uma escola de “segunda

oportunidade” a quem perdeu a chance de completar seus estudos em tempo

hábil. Bem diferentemente do olhar dos alunos, é vista pelos professores como

escola ideal para “os outros” que não cultivam grandes ambições, apenas a

certificação para o trabalho e a conclusão do Ensino Médio.

Num segundo momento da implementação, passou-se a fase principal,

onde após ter um diagnóstico elaborado sobre a realidade estudada, foi

iniciado o planejamento das ações. No caso do CEEBJA foi constituído um

Grupo de Apoio à Implementação do Projeto PDE na Escola, denominado

“Novos Olhares para a Educação de Jovens e Adultos”, que contou com a

participação do diretor, da equipe pedagógica e professores das diversas

disciplinas da Educação de Jovens e Adultos, num total de dezesseis

participantes.

O Grupo de Apoio teve como objetivos: a) criar condições concretas

para que o professor PDE e os participantes discutissem as bases teórico-

metodológicas que orientam o projeto de intervenção pedagógica na escola, b)

analisar a pertinência e a adequação das atividades propostas, auxiliando no

acompanhamento, desenvolvimento e programação das atividades e c) realizar

a avaliação das atividades realizadas ao longo do processo, apresentando

sugestões para ser incorporadas ao artigo final de conclusão do PDE.

As oito etapas do Grupo de Apoio ocorreram no período de abril a junho

de 2008, sempre às sextas-feiras, em horário de contra-turno de trabalho de

alguns professores e horário destinado à hora-atividade de outros, perfazendo

um total de 32 horas, com certificação da SEED. Em cada etapa houve leitura,

reflexão e discussão acalorada sobre assuntos pertinentes à realidade da EJA.

Para a fundamentação, foram utilizados textos integrantes do caderno

pedagógico “Um olhar para a Educação de Jovens e Adultos” - material

didático-pedagógico elaborado para auxiliar na implementação na escola, que

aborda temas como o perfil dos estudantes de EJA e os aspectos mais

marcantes nos alunos desta modalidade de ensino: a família, o trabalho e a

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relação professor-aluno, a auto-estima, afetividade e cooperação. Além destes

temas, foram discutidos as Diretrizes Curriculares de EJA e os cadernos

temáticos Trabalhando com a Educação de Jovens e Adultos, da Secretaria de

Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD). Além das

discussões, estabeleceu-se uma parceria entre o pesquisador e professores

colaboradores das disciplinas de História, Língua Portuguesa e Educação

Física para ofertar aos alunos três míni-oficinas para discutir os temas:

afetividade, auto-estima e cooperação. O professor colaborador seria o

responsável pela aplicação das dinâmicas, questionamentos e atividades aos

alunos, contando com a ajuda do pesquisador. Os temas e o planejamento das

ações foram decididos em conjunto no decorrer dos encontros, assim também

se decidiu pela realização de uma festa junina na escola, como espaço de

confraternização e promoção de auto-estima, pelo seu caráter lúdico e

cooperativo.

No oitavo encontro, os participantes do Grupo de Apoio avaliaram de

maneira satisfatória a qualidade dos mesmos justificando que “... foram

proveitosos, dinâmicos e com abordagens acessíveis, inerentes à prática.”

Na fase da ação, um terceiro momento da implementação, as atividades

que foram decididas no Grupo de Apoio, as míni-oficinas foram colocadas em

prática. A míni-oficina sobre cooperação foi destinada a alunos matriculados na

disciplina de Educação Física, que na EJA é essencialmente teórica, e foi bem

aceita pela maioria destes, mas contou também com alunos resistentes com

vergonha de participar e expor-se. Muitas alunas, mães de família, que trazem

seus filhos junto com elas para a escola por não ter onde deixá-los,

participaram das atividades cooperativas com os pequenos. No final da

atividade relataram “ter se divertido muito” e este ser “um espaço para brincar

com as crianças”. O tema da cooperação foi sugerido para a míni-oficina por

ser um contraponto ao espírito competitivo da atual sociedade, que segundo

Brotto (1999, p.65), evidencia-se em lugares e momentos onde não seria

necessária a busca desenfreada em ser o melhor e vencer sempre. Nas

atividades cooperativas, pelo contrário, há o favorecimento da auto-estima e o

reforço aos valores e atitudes positivas, como a solidariedade, a confiança e o

respeito mútuo. Trabalha também o respeito à diversidade e o reconhecimento

de que uma atividade só é possível se levar em conta a coletividade. Para os

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alunos de EJA permite reforçar o companheirismo e os laços de afetividade

entre professores e alunos. Pelos motivos acima mencionados, ficou acertado

entre alunos e o professor de Educação Física que, uma vez ao mês, as aulas

de Educação física seriam práticas, privilegiando a forma cooperativa ao invés

da competição na realização das atividades, especialmente para o turno

vespertino onde há um local na vizinhança da escola para as práticas

esportivas, mas que não conta com iluminação para atividades à noite.

Para o tema afetividade, foi desenvolvida uma míni-oficina nas aulas de

História, onde o professor trabalhou com o resgate da trajetória da construção

da identidade pessoal e social do aluno, com temas como a casa da infância,

objetos do passado e sabores. Para tanto, foram utilizados textos para reflexão

e dinâmicas quebra-gelo para socialização e construção de um ambiente

favorável onde todos se sentissem confortáveis em participar e emitir opiniões.

Cada participante, em uma atitude de “escavação mental” foi estimulado a

buscar na memória, coisas significativas para socializar com os colegas. Cada

objeto, lugar, emoção, foi contextualizado para o grupo, com ênfase nas

sensações despertadas, na sua origem, nas suas características. Conforme

coloca Fox (1984):

... Rever o passado permite colocar o presente numa situação crítica e mesmo mudar o futuro. Pela rememoração, na linguagem e na narrativa, resgata-se o poder de ser no presente, no passado e no futuro, tecendo a história, não mais como cronologia, mas como processo de recriação de significado (FOX, 1984 p.155).

Com a míni-oficina sobre afetividade foi possível refletir sobre a importância da

linguagem no resgate no resgate de sensações que compõem a memória, bem

como a necessidade da interação social para a constituição da linguagem, da

identidade pessoal e das emoções. Também permitiu a articulação do passado

no presente, como algo inacabado e em constante ressignificação. No final da

oficina, houve produção de textos individuais que foram socializados com o

grupo. Analisando os textos produzidos pelos alunos participantes, foi possível

perceber que o objetivo de resgate das sensações que compõe a memória

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proposto pelo professor-colaborador foi satisfatoriamente atingido, como

mostra o texto abaixo:

A geleia de jabuticaba da madrinhaQuando eu era criança, certa vez, fui passear na casa da minha madrinha que morava no sítio. Eu quase nunca via ia lá, por isso adorava esses passeios com meus pais porque eu passava um dia diferente junto com outras crianças.Neste dia, minha madrinha serviu limonada e pão com geléia de jabuticaba caseira para a criançada do sítio. Eu comi um pedação, sentada com os outros, embaixo das árvores do pomar. Foi a melhor coisa que eu comi na vida, o pão caseiro macio e a geleia pretinha e doce. Só de pensar minha boca se enche de água... De lá pra cá, tenho paixão por geléia de jabuticaba e compro todas as marcas que eu encontro. Mas nunca mais senti o sabor da geleia de jabuticaba da madrinha, aliás, nunca mais voltei ao sítio, pois logo depois ela morreu e o sítio foi vendido para estranhos. Continuo procurando o sabor daquela geleia em especial, mas acho que nunca mais vou encontrar, pois ela ficou só na memória e no passado, assim como minha infância e outras lembranças felizes.

(M. A. S , aluna do Ensino Fundamental – 37 anos)

A etapa final da implementação constitui-se na fase da avaliação dos

objetivos propostos e os resultados alcançados. Das atividades desenvolvidas

no decorrer da implementação, algumas foram avaliadas satisfatoriamente,

enquanto outras atingiram parcialmente ou não atingiram os resultados

esperados.

Das três oficinas idealizadas aos alunos, somente duas foram ofertadas

devido a inúmeros fatores que dificultaram a sua execução, como: acomodação

e resistência por parte de alguns alunos e professores em experimentar algo

novo diferente da rotina, falta de um tempo específico no calendário escolar

para essas atividades, pois no decorrer das aulas há um conteúdo a ser

vencido, inadequação do espaço físico, com salas pequenas e

compartilhamento de turmas em um mesmo ambiente e também a suspensão

das aulas como medida de prevenção da Gripe Influenza AH1N1. Este último

motivo também resultou no cancelamento da festa junina programada para o

dia 31 de julho, causando a frustração das expectativas. Apesar de a

realização da festa junina não ser uma ação inovadora na escola, a sua

realização justifica-se, pois, a mesma tem um caráter pedagógico e

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cooperativo. Para a sua realização depende o envolvimento, a aceitação de

todos e o respeito às diferenças, além disso, promove a diversão, o

compartilhar de sentimentos, alto nível de aceitação mútua, a participação

coletiva e o desenvolvimento da auto-estima.

Com o Grupo de Apoio formado pelo diretor, equipe pedagógica e

professores, os objetivos esperados foram plenamente alcançados, pois

constituiu-se de momentos produtivos de leituras, trocas e discussões a

respeito da temática da EJA, para crescimento profissional, pois embora os

professores desta modalidade de ensino já tenham se apropriado de algumas

qualificações inerentes à docência, ainda assim, há necessidade de formação

continuada em razão da subjetividade que os alunos apresentam. Dos

dezesseis participantes inscritos para o Grupo de Apoio houve apenas duas

desistências, uma motivada por afastamento devido a doença e a outra, devido

ao fato do professor desistir da carreira, optando por outra profissão. Os

demais, no último encontro avaliaram de forma positiva a formação do Grupo

de Apoio, como demonstra o texto escrito produzido pelos participantes:

O Grupo de Apoio ao PDE 2008 possibilitou aos professores participantes momentos importantes para a discussão, interação e reflexão sobre a prática. Trata-se de um trabalho que acrescentou informações e estimulou questionamentos que contribuíram para enfatizar que a Educação de Jovens e Adultos deve ser entendida como um espaço significativo do conhecimento, que contempla as mudanças da sociedade e atende à diversidade cultural, respeitando as diferenças e individualidades. Praticar a afetividade e o diálogo são questões essenciais nesse contexto, sendo que todos esses fatores foram debatidos e analisados, contribuindo para o aperfeiçoamento do trabalho pedagógico dos cursistas.

(Grupo de Apoio ao PDE 2008)

No entanto, a reaplicação dos questionários aos alunos e professores,

para constatar a mudança de opinião após o final do processo de

implementação, não permitiu verificar se o objetivo acima descrito foi

alcançado. Isso ocorreu devido a uma falha de estratégia na previsão da

atividade, ao não se levar em conta as especificidades desta modalidade de

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ensino em que as matrículas dos alunos são por disciplinas e com horários

flexíveis, onde a cada dia há uma quantidade variável de pessoas por turma e

turno de aula. Como não houve a necessidade de identificação para responder

aos questionários e foram distribuídos apenas aos alunos que estavam

presentes em um determinado dia e horário; não foi possível identificar se os

mesmos participaram das atividades das míni-oficinas e mais tarde, da

reaplicação dos questionários. Outro fator que teve influência no resultado da

pesquisa foi o tempo decorrido entre a aplicação inicial e a reaplicação final dos

questionários – nesse meio tempo houve matrículas de novos alunos, evasão

de alguns e conclusão de estudos por parte de outros. Assim, os dados

coletados com a reaplicação dos questionários aos alunos não puderam ser

usados a fim de comparação entre o antes e o depois da implementação, pois

se constituíram em novos dados iniciais, que poderão servir a questionamentos

futuros... Com relação aos questionários destinados aos professores, algo

semelhante ocorreu, mas isso devido à rotatividade de docentes a cada ano,

pois, como dito anteriormente, poucos deles têm a fixação da lotação do

padrão de trabalho em estabelecimentos que ofertam a EJA. Assim também,

alguns professores que responderam ao questionário inicial não se

encontravam mais trabalhando no CEEBJA na ocasião da reaplicação dos

questionários. Os poucos que participaram de todas as etapas da

implementação demonstraram interesse em participar futuramente de novas

atividades de reflexão sobre a EJA para aprofundamento dos conhecimentos

sobre esta modalidade tão particular de educação.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo de implementação pedagógica na escola possibilitou aos

envolvidos uma reflexão aprofundada sobre a prática pedagógica no universo

da EJA, reflexão a partir da qual é possível tecer algumas considerações finais.

Para que o indivíduo possa exercer a sua cidadania através da

educação, é preciso que ele atenda a seus anseios e expectativas. A educação

de Jovens e Adultos deve estar direcionada a um público específico: jovens,

adultos ou idosos que não tiveram acesso a escola em idade própria ou não

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tiveram a oportunidade de prosseguir os estudos devido aos mais variados

fatores, alheios ou não a sua vontade. Embora tragam consigo uma vasta

bagagem de conhecimentos adquiridos como experiência de vida, ao buscar a

escola procuram obter a educação formal que garanta oportunidades de

emprego. No entanto, não deve ser vista como educação compensatória pela

falta de estudo na infância, mas como uma oportunidade de responder às

necessidades formativas dos alunos que a procuram.

Um sentimento frequentemente associado ao universo da EJA é a baixa

auto-estima dos alunos, resultante das situações de fracasso vivenciadas

anteriormente, como exclusão social e repetência escolar. Outro sentimento é a

vergonha de sua condição de iletrado, pois a falta de leitura e escrita prejudica

a qualidade de vida dificultando as oportunidades no mundo do trabalho. No

entanto, estas afirmações podem estar mais relacionadas a turmas de

Alfabetização e séries iniciais de EJA, pois no CEEBJA pesquisado que oferta

os anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio, as afirmações acima

não se aplicam. Foi possível perceber que, embora alguns alunos, ainda sintam

vergonha de não ter voltado estudar antes, agora demonstram orgulho da

condição de estudantes e confiança na sua capacidade de aprender e superar

as dificuldades, não pensando em evadir-se da escola.

Para tanto, os alunos apontam a importância da relação professor-aluno,

que deve agir como um mediador no processo de aquisição do conhecimento

formal. As relações afetivas não podem ser ignoradas e precisam ser levadas

em conta no planejamento das atividades escolares, pois as decisões

assumidas pelo professor podem ser o diferencial entre o sucesso ou o

fracasso na experiência da aprendizagem. Os alunos esperam que a relação

professor-aluno continue sendo amigável, mas que haja mais afetividade, aqui

traduzida como o uso de uma linguagem adequada por parte do professor, o

respeito pela individualidade do ritmo de cada aluno, tolerância pela condição

de aprendizes, a prática do diálogo e oferta de conteúdos significativos a suas

vidas. O aluno de EJA quer ser visto como um indivíduo com possibilidades de

mudanças e potencial para aprendizagem e não apenas como uma pessoa que

retorna aos bancos escolares em busca do “tempo perdido” na infância.

Outro ponto a se considerar é o paradoxo professor-aluno X preconceito

de EJA. Enquanto os alunos veem a EJA como uma escola ideal, adequada às

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suas expectativas; alguns professores ainda revelam preconceito a respeito da

EJA. Os professores afirmam que a qualidade da educação ali praticada é

comparável às escolas regulares, mas se desdizem ao vê-la com um olhar de

inferioridade, não a querendo para seus filhos. Se este fato fosse analisado

pela questão da lógica, o resultado deveria apontar o contrário: os professores

- que possuem um maior grau de formação que os alunos e que são os

profissionais desta modalidade de ensino deveriam valorizar o seu trabalho,

acreditando e defendendo a educação ali praticada; já os alunos – que ainda

buscam a educação formal – poderiam ver a EJA como a “última chance” de

completar os estudos, independente da qualidade do mesmo.

Importante também ressaltar a necessidade da formação continuada

para os profissionais da EJA. A participação em grupos de estudos contribui

para a formação, pois são oportunidades de trocas de ideias com seus pares

na busca de soluções para as dúvidas que afligem os profissionais que

trabalham com a modalidade EJA.

Por fim, pode-se concluir que a experiência da implementação na escola

atingiu parcialmente os seus objetivos na aplicação de ações na realidade

escolar com a finalidade de minimizar os problemas ali detectados. No entanto,

possibilitou a reflexão sobre a prática pedagógica, identificando e acertos os

erros no processo de implementação, que devem ser levados em consideração

em caso de repetição da experiência.

4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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