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A ESTRATÉGIA DE FLEXIBILIZAÇÃO DE PROJETOS NA CONSTRUÇÃO E SEUS IMPACTOS NA GESTÃO DA PRODUÇÃO LOURIVAL JUNIO FONSECA DIAS (UFG) [email protected] NAYME TALYANE DA SILVA (UFG) [email protected] Maria Carolina Gomes de Oliveira Brandstetter (UFG) [email protected] Este trabalho trata dos impactos gerados na gestão da produção de empreendimentos residenciais multipavimentos, devido à estratégia de personalização dos apartamentos. Para que o objetivo da flexibilização do projeto seja alcançado, uma série de etapas devem ser cumpridas, gerando um notório impacto nas obras, como conseqüência da quebra de padronização dos serviços. Um estudo de caso em um empreendimento residencial de alto padrão localizado no Estado de Goiás foi conduzido. A metodologia abrange a caracterização do processo de flexibilização do projeto em uma empresa construtora de grande porte e o levantamento de fatores que impactaram o cronograma físico da obra. Entre os instrumentos de coleta dos dados, foram utilizados entrevistas com o corpo gerencial da empresa, registros fotográficos, pesquisa documental com formulários e registros do sistema de gestão da empresa. Entre os resultados encontrados, verificou-se um tempo médio de execução de alvenaria em apartamentos modificados cerca de seis vezes maior em relação a apartamentos sem modificação. A pesquisa também apontou a entrega de materiais por parte dos clientes como um dos fatores mais fortemente relacionados com o atraso da obra. Palavras-chave: Projetos, Flexibilização, Construção Civil, Edificações XXXV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Perspectivas Globais para a Engenharia de Produção Fortaleza, CE, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2015.

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A ESTRATÉGIA DE FLEXIBILIZAÇÃO

DE PROJETOS NA CONSTRUÇÃO E

SEUS IMPACTOS NA GESTÃO DA

PRODUÇÃO

LOURIVAL JUNIO FONSECA DIAS (UFG)

[email protected]

NAYME TALYANE DA SILVA (UFG)

[email protected]

Maria Carolina Gomes de Oliveira Brandstetter (UFG)

[email protected]

Este trabalho trata dos impactos gerados na gestão da produção de empreendimentos

residenciais multipavimentos, devido à estratégia de personalização dos

apartamentos. Para que o objetivo da flexibilização do projeto seja alcançado, uma

série de etapas devem ser cumpridas, gerando um notório impacto nas obras, como

conseqüência da quebra de padronização dos serviços. Um estudo de caso em um

empreendimento residencial de alto padrão localizado no Estado de Goiás foi

conduzido. A metodologia abrange a caracterização do processo de flexibilização do

projeto em uma empresa construtora de grande porte e o levantamento de fatores que

impactaram o cronograma físico da obra. Entre os instrumentos de coleta dos dados,

foram utilizados entrevistas com o corpo gerencial da empresa, registros

fotográficos, pesquisa documental com formulários e registros do sistema de gestão

da empresa. Entre os resultados encontrados, verificou-se um tempo médio de

execução de alvenaria em apartamentos modificados cerca de seis vezes maior em

relação a apartamentos sem modificação. A pesquisa também apontou a entrega de

materiais por parte dos clientes como um dos fatores mais fortemente relacionados

com o atraso da obra.

Palavras-chave: Projetos, Flexibilização, Construção Civil, Edificações

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1. Introdução

A estratégia da flexibilização dos projetos residenciais há mais de uma década tem sido adotada com sucesso por

grandes construtoras e incorporadoras. Esta tendência em flexibilizar os projetos de suas edificações residenciais

e comerciais de médio e alto padrão possui o intuito de garantir a satisfação do cliente, impulsionando o mercado

imobiliário. Segundo Brandão e Heineck (2007), a flexibilidade pode ser descrita como a liberdade de reformular

a organização do espaço interno. Sendo assim, o cliente tem a possibilidade de alterar o projeto inicial, desde o

projeto arquitetônico, passando pelo projeto elétrico e hidrossanitário, podendo até mesmo alterar e/ou criar um

projeto específico de acabamentos.

No Brasil a procura por este diferencial de serviço tem se tornado alta, em virtude principalmente de um

conjunto de transformações sócio demográficas, quer sejam relacionadas às mudanças dos estágios do ciclo de

vida familiar ou como conseqüências das mobilidades relacionadas ao âmbito profissional (LI; CHEN, 2011;

MAN HUI et al., 2012; SMITH; ARCHER; LING, 2010).

Nesta temática, a literatura internacional aponta os trabalhos sobre customização em massa, tratando de ações

empregadas na gestão do processo construtivo, sob a perspectiva da filosofia da Construção Enxuta (CUPERUS,

2003; KEMMER et al, 2010; ROCHA, 2011).

Neste contexto as empresas cada vez mais procuram se adequar às exigências dos mais variados clientes, criando

departamentos específicos para tratar de assuntos relacionados à chamada personalização, os quais elaboram

procedimentos e padronizações, visando facilitar a execução dos serviços, sem que o interesse dos clientes seja

afetado.

O planejamento da obra é um dos principais aspectos do gerenciamento, conjunto de amplo espectro, que

envolve também orçamento, compras, gestão de pessoas e comunicações (SALAHELDIN, 2009; MATTOS,

2010). Logo, como a flexibilização gera impactos em prazos e custos, a mesma deve ser considerada no

planejamento inicial da obra, evitando assim problemas para o usuário e o executor, tais como alteração de

prazos, má execução do serviço, aumento de custos e atraso na execução das atividades, devido principalmente à

quebra de padronização dos serviços.

Diante deste cenário, onde a flexibilização e o planejamento devem apresentar uma relação mútua, é importante

ressaltar que o cumprimento de prazos, qualidade do produto final e baixos custos são de suma importância para

garantir o planejamento da obra e, consequentemente, a satisfação do cliente.

Este trabalho busca apresentar falhas no contexto da gestão da produção de edificações residenciais relacionadas

ao descumprimento do cronograma físico da obra, geradas a partir da adoção da estratégia de flexibilização de

projetos. Busca-se identificar os principais agentes envolvidos nestes processos, ressaltando a importância de ter

um maior controle dos mesmos e propondo diretrizes para a produção de modo a minimizar tais problemas em

edificações futuras.

O tema relacionado à flexibilização de projetos já foi discutido em alguns trabalhos, entre os quais: Hertzberger

(1999) investigou a necessidade de se fazer interpretações individuais dos padrões coletivos possíveis; Brandão

(2002) desenvolveu métodos para identificar, classificar e avaliar arranjos espaciais de apartamentos brasileiros,

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estabelecendo uma discussão quanto à estrutura espacial predominante no cenário nacional e à necessidade de

desenhos alternativos de modo a atender as mudanças sócio-demográficas; Duarte (2006) e Lobo (2010)

concluíram pelo aumento da satisfação dos usuários devido ao uso da personalização e adaptação de seus

apartamentos, contribuindo com a decisão pela aquisição dos imóveis; Araújo Filho (2009) estabeleceu o sistema

de personalização como uma estratégia de negócio; Barros e Pina (2009) concluem que a racionalidade

construtiva pode ajudar na flexibilidade dos espaços desde que usada como um meio, tal como o exemplo no

trabalho de Fernandes (2008), cujo emprego da racionalidade levou à qualidade ambiental da moradia social e

Villá (2008) estabeleceu a flexibilidade em arquitetura como a configuração construtiva e formal que permite a

diversidade de formas de uso, ocupação e organização do espaço ao longo da vida útil da edificação.

2. Método de pesquisa

A pesquisa realizada, de acordo com as categorias estabelecidas pelo método científico, consiste em um estudo

de caso, sendo a coleta de dados baseada na utilização de instrumentos que visam identificar as falhas relativas à

flexibilização de projeto que afetam diretamente o cronograma da obra. As análises possuíram caráter

quantitativo, para exame de indicadores que subsidiaram a identitificação de falhas no processo produtivo, além

do caráter qualitativo, quanto à análise de causas das falhas que afetaram o planejamento e controle do caso

estudado.

2.1 Escolha do caso

Para este estudo de caso, foi escolhida uma empresa que atua no ramo da construção civil há mais de 30 anos em

todo o Brasil, tendo como foco a construção de empreendimentos de médio e alto padrão, oferecendo ainda a

personalização das unidades de suas edificações.

Cinco empreendimentos foram avaliados e analisados ao longo do estudo, alguns deles já foram entregues, e

outros estão em processo final de execução dos serviços. O que torna viável o estudo nessas edificações é a fase

de execução das atividades, e principalmente o fato de apresentarem a personalização como um dos serviços

prestados.

Ao todo cinco edificações foram estudadas, sendo que em uma delas, foi realizado um estudo mais detalhado,

buscando informações mais precisas e análises mais profundas frente aos objetivos traçados. Esta escolha se deu

devido à facilidade de acesso aos dados, já que houve uma abertura maior por parte dos colaboradores da obra.

Outro fator que influenciou nesta escolha está relacionado a personalização oferecida pelo empreendimento, já

que esta é a primeira obra que concede ao cliente dois tipos de modificação: planejada e permitida. A

flexibilidade planejada ocorre nos casos em que a empresa ou projetista fornece aos clientes mais de uma opção,

seja no arranjo espacial, seja nos acabamentos e instalações. A flexibilidade permitida ocorre quando o cliente

define um arranjo físico, acabamento ou instalações fora do padrão estabelecido (BRANDÃO, 2002). Para o

presente trabalho, apenas o estudo de caso será apresentado.

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2.2 Instrumentos de coleta e análise dos dados

A coleta de dados foi realizada com base em visitas feitas à obra, onde foi possível obter informações do

processo de modificações referentes à parte executiva, e ainda foram realizadas entrevistas com os gestores e

colaboradores envolvidos nas etapas. Na obra visitada foram feitos também registros fotográficos que

caracterizavam fatos a serem estudados e posteriormente analisados, e ainda obtidos formulários e planilhas

contendo informações que auxiliaram na elaboração da pesquisa.

Os formulários e termos padronizados obtidos para auxiliar na coleta de dados para posterior análise foram:

Termo de recebimento de material; Formulário de solicitação de personalização e Cronograma quanto aos prazos

limites para entrega de material.

Como recursos de coleta de dados, ainda foram feitas entrevistas semi-estruturadas com os principais

colaboradores envolvidos no processo de desenvolvimento e execução das personalizações. Estas entrevistas

consistiam em perguntas e questionamentos a respeito de problemas e impactos já ocorridos e posteriores

soluções aos mesmos, e ainda o esclarecimento de dúvidas quanto à padronização elaborada para a realização de

modificações nos empreendimentos. Foram obtidos ainda dados por meio de visitas periódicas a obra e pelo

sistema da empresa, onde haviam informações relacionadas a execução dos serviços, desde o início da obra. Para

a análise dos impactos causados pela personalização na gestão da produção do empreendimento, também foram

coletados por meio de planilhas de medição da produção dos serviços executados em cada apartamento. Os

serviços analisados na comparação entre apartamentos modificados e apartamentos sem modificação foram a

alvenaria e o revestimento interno.

Os dados foram analisados considerando o desenvolvimento de personalização a partir dos procedimentos

padronizados da empresa, caracterização do processo de personalização no canteiro de obra e o levantamento de

impactos no processo produtivo em consequência da adoção da estratégia de flexibilização do projeto.

3. ANÁLISE DOS DADOS

3.1 Caracterização do estudo de caso

O empreendimento escolhido encontrava-se em processo de execução, em fase de acabamento e instalações, o

que permitiu analisar de maneira mais precisa os problemas e impactos gerados pela flexibilização de projetos, já

que a obra estava em um momento de execução das personalizações requeridas.

Esta edificação corresponde à primeira da empresa a implantar de maneira elaborada não só a personalização

permitida, mas também a planejada, o que torna o estudo de caso mais preciso e abrangente, já que, diferente dos

outros casos estudados, há uma nova prestação de serviços que, como consequência, apresenta novos e diferentes

problemas e impactos ao planejamento da obra.

A edificação escolhida é localizada em um setor nobre da cidade de Goiânia, constituída por 34 pavimentos,

tendo 4 unidades por andar e apartamentos que variam de 130 a 149 m², sendo considerado um empreendimento

de médio padrão. O número total de unidades do empreendimento é de 108. Todas as unidades podem, de acordo

com a padronização prevista, serem modificadas pelo proprietário. O início das obras ocorreu em janeiro de

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2011, com término em junho de 2013. A Figura 1 ilustra as plantas dos apartamentos tipo, sujeitas às

modificações requeridas pelo cliente.

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Figura 1 - Plantas dos apartamentos tipo do empreendimento escolhido

3.2 Padronizações do processo

A personalização oferecida pela empresa consiste em uma prestação de serviços que possibilita ao cliente alterar

as plantas e os acabamentos padrões de sua unidade. A empresa oferece dois tipos de personalização: planejada e

permitida.

O fluxograma apresentado na Figura 2, representa o desenvolvimento da personalização tipo planejada o qual

envolvem uma série de departamentos, que juntos criam os pacotes, a serem oferecidos aos clientes, de acordo

com padrão do empreendimento.

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Figura 2 - Fluxograma de desenvolvimento da personalização planejada (adaptado a partir da padronização da

empresa)

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O fluxograma apresentado na Figura 3 representa o desenvolvimento da personalização tipo permitida o qual o

cliente idealiza seus projetos de modificação e a empresa executa conforme projeto apresentado e negociado.

Figura 3 - Fluxograma de desenvolvimento da personalização permitida (adaptado a partir da padronização da

empresa)

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3.3 O processo de personalização

Na edificação a maioria dos proprietários optaram pelo serviço de personalização. E como atualmente o mercado

tem cada vez mais aderido a este diferencial e ainda a empresa optou por criar mais uma forma de incentivar a

aquisição deste serviço, o número de unidades modificadas é elevado, sendo que 59% das unidades optaram pela

personalização.

É possível notar que a porcentagem de unidades modificadas é alta, sendo que do total de unidades do

empreendimento, 64 apartamentos adquiriam as personalizações oferecidas pela empresa.

A personalização planejada, corresponde ao serviço mais requerido se comparado à personalização permitida,

sendo que dentre as 64 unidades, 39 adquiriram os kits oferecidos pela flexibilidade planejada, o que equivale a

cerca de 36% do total de unidades e 61% se comparado às modificações totais.

Já com relação à personalização permitida, um total de 24 unidades optaram por executar o serviço de acordo

com um projeto contratado de modificação. Este valor corresponde a cerca de 22% do total de unidades e 39% se

comparado às modificações totais.

Na personalização permitida, a maioria dos projetos elaborados contempla modificações em alvenarias, o que

permite a retirada ou troca de ambientes, ampliando ou criando novos cômodos nos apartamentos. O que

acontece, porém, é que esta alteração de alvenaria também exige mudanças com relação ao projeto elétrico e

hidráulico, principalmente. E ainda, muitas vezes, o proprietário opta por diferentes revestimentos, havendo

também a necessidade de elaborar projetos de forro e paginação de piso, em geral.

Na personalização planejada, um dos fatores que levaram ao aumento no número de contratação de modificações

neste empreendimento ocorreu devido à oferta desta personalização, pois ela isenta o cliente da procura por um

arquiteto ou projetista, estimulando assim a compra pelos kits oferecidos.

Foram ofertados aos clientes um total de 6 kits, cujas definições e características estão divididas em: Arquitetura,

Revestimento Plus e Bancadas.

3.4 Impactos e problemas de personalização no estudo de caso

3.4.1 Relato de casos

Para auxiliar nos serviços prestados, a obra tem à disposição um engenheiro júnior, que realiza todo o

acompanhamento frente às etapas do processo, controlando os projetos, analisando os problemas que surgem ao

longo da execução, efetuando uma comunicação direta com a arquiteta analista de personalização. Este assistente

também é responsável por acompanhar o recebimento de materiais, auxiliando na verificação dos mesmos. O

corpo gerencial responsável pela gestão dos serviços de personalização relatou problemas detectados e a forma

como os mesmos foram tratados, perante a adoção desta estratégia. Seguem alguns destes casos relatados.

Foi notado que um dos kits oferecia como revestimento nos banheiros, filetes de mármore, porém não

foi encontrada nenhuma descrição da paginação e instalação deste material, estando o projeto obsoleto.

Houve um impacto no andamento dos serviços, para aguardar a adequação do projeto.

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Para as unidades final 3 e 4, o projeto elétrico, referente aos pacotes oferecidos dos kits 1 e 2 não foi

enviado à obra, com isso, o serviço de instalações foi impedido de ser realizado, novamente impactando

o cumprimento do cronograma da obra.

Percebeu-se a ausência de pontos de água e esgoto, devido a falta do projeto específico para o

assentamento de bancadas nas varandas, que sao previstas nos kits 5 e 6.

Não foram entregues os projetos contendo os novos posicionamentos dos pontos hidráulicos nos casos

em que a bancada é prevista mais baixa para o kit 3.

Ao desenvolver os pacotes de arquitetura, foi definida uma abertura para as portas dos ambientes, esta

determinação foi enviada junto ao projeto para a obra. O que ocorreu, no entanto, foi que diante de um

questionamento de um dos clientes, notou-se que o projeto encaminhado à obra estava diferente daquele

apresentado ao proprietário.

Por meio de um cliente, notou-se que o projeto encaminhado à obra estava diferente do apresentado ao

proprietário em relação à abertura das portas dos ambientes. A solução foi a troca de todos batentes,

cujas portas estavam com a abertura incorreta.

Em uma das unidades, o projeto elaborado pela arquiteta do cliente definia uma paginação de maneira

incorreta, considerando o assentamento de peças inteiras em locais onde seriam erguidas paredes

divisórias de ambientes.

Houve um caso em que o cliente escolheu o assentamento de uma pastilha de madeira, porém a mão de

obra contratada não tinha conhecimento quanto à instalação deste material, sendo necessária a

contratação de uma mão de obra especializada.

A partir dos exemplos expostos, é possível concluir que parte dos problemas e impactos gerados pelas

modificações é em função da personalização tipo planejada. Nesta obra, especificamente, este fator ocorre por

tratar-se do primeiro empreendimento a fornecer este tipo de serviço, logo, o surgimento de problemas é

inevitável.

Mesmo diante deste cenário, os gestores da obra afirmaram que apesar de haver muitos problemas, a solução

com relação à personalização planejada é obtida de maneira mais rápida, porque os problemas são resolvidos

entre os departamentos da própria empresa, facilitando o acesso às informações necessárias para garantir que

todas as falhas e questionamentos sejam sanados.

Com relação à personalização permitida, mesmo tendo um número de contratempos menor, a solução surge de

forma mais demorada, pois a mesma é obtida somente com uma consulta ao cliente e seu arquiteto. Segundo

relatos da assistente, existem unidades cujos problemas ainda não foram resolvidos, devido à dificuldade de

entrar em contato com os responsáveis, há situações onde nem o próprio cliente consegue encaminhar o

problema ao arquiteto responsável, sendo assim, muitas decisões acabam sendo tomadas entre a obra e o

departamento de personalização, a partir de uma autorização prévia do proprietário.

Os projetos elétricos e luminotécnicos são tidos como aqueles que apresentam o maior número de problemas,

isto ocorre, principalmente, em função da falta de detalhes. Segundo relatos, todas as alterações reivindicadas

acabam por gerar novos problemas, isto quer dizer que, a resolução do que foi questionado cria novas falhas e

dúvidas, dificultando a execução correta do serviço.

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3.4.2 Entrega de materiais

O material fornecido pelo cliente é capaz de gerar uma série de situações desfavoráveis ao planejamento da obra,

no caso do atraso na entrega, a consequência se dá na execução do serviço, pois muitas vezes o serviço é

paralisado pela falta de material, esta situação se repete quando o mesmo é fornecido em quantidade insuficiente,

o que também pode gerar problemas nas revisões das unidades, pois se torna inviável a troca de peças quebradas

ou danificadas.

A entrega de materiais por parte do cliente é a causadora dos impactos mais visíveis no planejamento da obra,

pois mesmo diante de prazos a serem cumpridos, muitos proprietários atrasam essas entregas, impedindo que as

atividades em sua unidade sejam desenvolvidas. Há situações em que foram feitas 3 reprogramações quanto à

entrega, em outros casos, os clientes entregaram os materiais em quantidade insuficiente, não repondo o mesmo

de maneira imediata.

A empresa é responsável por estabelecer datas, conforme o andamento da obra, para que todos os materiais

sejam fornecidos, próximo a estes prazos. Além disso, os colaboradores são responsáveis por entrar em contato

com o cliente, mas mesmo diante deste cenário, o atraso foi notório, praticamente em todas.

3.4.3 Tempo de execução dos serviços

A personalização acrescenta serviços a serem realizados em cada unidade modificada pois, por exemplo, nos

apartamento padrão não há revestimentos em todos os ambientes, apenas nas áreas molhadas, e a partir das

solicitações, alguns imóveis passam a ser inteiramente revestidos.

Outro exemplo está relacionado às modificações em alvenarias, com a tendência de uma execução mais onerosa,

diminuindo a produtividade dos operários. Este aumento já é algo previsto no cronograma da obra, porém não

deixa de ser um impacto, pois ao agregar os problemas imprevistos ocorridos, tais como os casos relatados

anteriormente, este tempo tende a aumentar, tornando o planejamento ainda mais instável, elevando a duração

total da obra.

Ao comparar a execução de alvenaria, entre as unidades padrão (P) e modificadas (M), é visível que nos

apartamentos M o número de horas de serviço é maior que nos apartamentos P. A amostra de apartamentos da

Figura 4 corresponde às unidades em execução no período da coleta dos dados. O comparativo considerando

todos os apartamentos do empreendimento, incluindo o período anterior à coleta dos dados, desde o início do

empreendimento, está expresso na Figura 5.

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Figura 4 - Tempo de execução de alvenaria

Figura 5 - Comparativo entre o tempo de execução de alvenaria

Com relação ao serviço de revestimento, o comparativo entre as horas de execução em apartamento P e M está

ilustrado nas Figuras 6 e 7.

Figura 6 - Tempo de execução de revestimento

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Figura 7 - Comparativo entre o tempo de execução de revestimento

Tendo em vista os problemas e impactos citados, é notória a necessidade de criar mecanismos para a melhoria

dos procedimentos existentes, tendo como objetivo eliminar os erros decorrentes, impedindo que o planejamento

da obra seja direta ou indiretamente afetado. Dentre as principais sugestões elaboradas podem ser citadas:

Criação de uma equipe treinada para atuar na obra, controlando as etapas de execução relacionadas à

personalização. Esta equipe deverá estar no empreendimento desde o início do mesmo até o seu

término, sendo responsável por estabelecer uma conexão mais direta e precisa entre a obra e o

departamento de personalização.

Eliminar a etapa de entrega de materiais por parte do cliente, transferindo esta responsabilidade à

empresa, excluindo então o não cumprimento de prazos, a aquisição de materiais em quantidade e

qualidade inferior, permitindo que os serviços sejam executados sem paralisações frequentes.

Promover visitas mensais, principalmente, do analista de personalização acompanhando o que está

sendo realizado e esclarecendo os questionamentos.

4. Conclusões

Apesar de se tratar de um diferencial, atualmente indispensável tanto à empresa quanto ao cliente, existe uma

série de problemas que surgem ao longo do processo como todo, causando impactos diretamente no

planejamento e andamento da obra. Em uma tentativa de minimizar os erros referentes a esse serviço, as

empresas buscam criar uma série de padronizações a serem cumpridas tanto pelos colaboradores, entre os

departamentos envolvidos no processo, quanto pelos clientes requerentes do serviço.

No caso estudado, dentre os problemas encontrados, se destacam aqueles relacionados à entrega de materiais, à

ausência de compatibilidade entre projetos, à falta de detalhamentos, à carência no controle da execução dos

serviços e à ausência no cumprimento dos prazos estabelecidos. Parte desses problemas ocorre devido a uma

quebra de procedimentos e padrões, não permitindo a correta continuidade do processo, influenciando

diretamente o cronograma de prazos a serem cumpridos.

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Há outros impactos ocorridos, como o aumento no volume de serviços a serem realizados, o que gera também

um crescimento no número de dias de execução dos mesmos, ou seja, como haverá mais serviços a serem feitos,

haverá também uma duração maior na execução dos mesmos, se comparados às unidades não modificadas. Uma

vez que a personalização foi definida como estratégia da empresa, tais impactos podem e devem ser previamente

integrados no planejamento do empreendimento. Dos resultados observados no estudo de caso, destaca-se o

aumento em seis vezes do tempo médio para executar as alvenarias nos apartamentos modificados em

comparação aos apartamentos não modificados. O tempo médio de execução dos revestimentos também

aumentou para o dobro no caso de apartamentos onde ocorreu a modificação do projeto padrão.

Mesmo diante deste quadro de problemáticas apresentadas, é inevitável que se realize a flexibilização de

projetos, pois o mercado criou uma dependência por esse serviço, principalmente em empreendimentos de médio

e alto padrão. Torna-se, portanto, necessário que se tenha um maior controle do que é desenvolvido e executado,

obedecendo aos critérios técnicos, não prejudicando o tempo de execução dos serviços e o desempenho da obra,

podendo, por exemplo, fazer algumas adaptações às padronizações existentes ou criar novos mecanismos que

auxiliem o processo.

REFERÊNCIAS

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