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AMANDA LEMOS MUNIZ COUTO A INFLUÊNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM. UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES 2008

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AMANDA LEMOS MUNIZ COUTO

A INFLUÊNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM.

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

2008

SUMÁRIO INTRODUÇÃO............................................................................... 3 CAPÍTULO 1: Contribuições da Orientação Educacional ao processo pedagógico........................................................................ 9 CAPÍTULO 2: Emoção e afetividade: sua importância no processo de escolarização .............................................................. 16 CAPÍTULO 3: A família, a escola e a sociedade.......................... 24 CAPÍTULO 4: Falando sobre indisciplina, avaliação e fracasso escolar............................................................................................... 36 CAPÍTULO 5: A afetividade como propulsora da aprendizagem: enfocando a relação professor e aluno.......................................... 41 CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................... 46 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................... 50

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INTRODUÇÃO

Uma pesquisa acadêmica com o tema afetividade torna-se relevante por

ser o aspecto emocional um elemento importante que envolve a ação educativa.

É fato que as relações afetivas estabelecidas, principalmente nas esferas

familiar e escolar, influenciam significativamente o desenvolvimento e o

processo de ensino-aprendizagem das crianças e adolescentes.

Sendo assim, a escola, enquanto co-participante na formação dessas

crianças e adolescentes, pode e deve contribuir grandemente, à medida que

procura compreender e refletir sobre todo o contexto de vida do aluno, não mais

o culpabilizando pelo seu ‘fracasso escolar’. É justamente neste sentido que o

Orientador Educacional auxilia educadores e educandos.

Nesta perspectiva, o professor, em função de sua proximidade com os

alunos, é a pessoa mais indicada para detectar as principais causas que geram

problemas de aprendizagem, incluindo-se no processo.

Certamente, o que mais vemos hoje nas escolas são discussões em torno

dos possíveis culpados do ‘caos da educação’, sem a preocupação em analisar

minuciosamente as causas reais deste fato.

As relações humanas que se estabelecem dentro e fora da sala de aula são

muito importantes para a formação do ser humano. No ambiente escolar, a

maioria dos alunos que apresentam dificuldades de aprendizagem tem

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problemas emocionais. Tais problemas emocionais podem ter origem na família

e de alguma forma ser reforçado na escola ou vice-versa.

O tema central desta pesquisa é a afetividade e a partir dele surgiu a

seguinte problematização: “Como o professor, auxiliado pela Orientação

Educacional, pode ajudar o aluno que não aprende por questões emocionais

a evoluir e ampliar seus conhecimentos, deixando de ser excluído dentro do

espaço escolar?”.

Relatos de professores que trabalham na rede pública de ensino apontam,

dentre muitas dificuldades, a triste realidade da multirepetência. Muitos alunos

chegam ao final do ensino fundamental I sem saber ler e escrever. Já com idade

avançada, sentem-se muitas vezes inferiorizados e incapazes de aprender e

acompanhar o ritmo do grupo. Alguns chegam a desistir dos estudos e partem à

procura de emprego, gerando a conhecida evasão escolar, enquanto outros

permanecem na escola sem grandes expectativas.

E, nas ruas, qual o destino destas crianças e adolescentes? Sem dúvida

essa questão gera outros possíveis desdobramentos, nos quais esse trabalho não

tem a pretensão de abordar. Faz-se urgente e necessário voltar o olhar para a

realidade do espaço escolar, uma vez que mantê-los na escola em tal situação

também é bastante comprometedor.

O aluno que não consegue aprender, sejam quais forem as causas de sua

dificuldade, são excluídos pelos próprios alunos e também por alguns

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professores. Uma experiência negativa como esta pode gerar sérios problemas

emocionais, os quais muitas vezes se tornam graves patologias.

Refletir sobre este assunto é muito importante, pois a escola pode estar

reforçando a exclusão social, tão comum em uma sociedade capitalista, mas sem

dúvida alguma não é este o seu papel.

Acreditando que a educação é um dos caminhos para a transformação da

sociedade, a exclusão não pode fazer parte do seu cotidiano. Como educadores,

temos como objetivo formar alunos capazes de exercer sua cidadania,

construindo essa base dentro do espaço que nos é concedido, a sala de aula.

Pensando nas relações que se estabelecem dentro deste espaço, a

afetividade é vista como um fio condutor dos relacionamentos humanos e por

meio dela é que se estabelece um desenvolvimento saudável.

A pretensão deste trabalho é promover uma reflexão acerca do assunto de

modo que se torne possível à inserção social destes alunos com dificuldades de

aprendizagem, os quais atualmente vêm sendo excluídos, mesmo que

implicitamente, dentro do próprio ambiente escolar, em especial, na sala de aula.

Para Wallon, não é possível separar o indivíduo em afetivo e cognitivo,

pois ele deve ser considerado em sua totalidade. Baseada nesta abordagem,

Izabel Galvão (2004) também contribui com este trabalho à medida que entende

as emoções como um meio de comunicação e estuda o cotidiano escolar para

compreender como se dão as práticas, relações e situações que ocorrem no dia-

a-dia de uma instituição de educação.

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Em virtude do que foi apresentado até aqui, esta pesquisa tem como

objetivo: auxiliar os alunos com problemas emocionais e, conseqüentemente,

dificuldades de aprendizagem a progredir em seus conhecimentos, contribuindo

para a diminuição da evasão escolar.

Para isso, é relevante caracterizar as emoções como um dos aspectos

primordiais no processo ensino-aprendizagem, ressaltando a importância em

conhecer e compreender melhor o contexto extra-escolar vivido pelos alunos

(familiar, social, cultural, econômico) a fim de instrumentalizar os professores,

por meio da teoria, a ter um olhar mais sensível a realidade vivida pelos

mesmos. Dentro deste contexto, também é importante esclarecer o papel da

escola, do educador e do Orientador Educacional dentro do tema afetividade.

A cada ano surgem novos desafios para nós, educadores. Durante

discussões em grupo, os professores de escola pública pensam na formação de

salas para o próximo ano letivo e inevitavelmente surgem inúmeras angústias e

expectativas acerca de tais desafios, principalmente porque é muito comum

ouvirmos comentários sobre determinados alunos, nos quais estão embutidos

alguns ‘rótulos’. Dentre tais ‘rótulos’, normalmente encontramos dois bastante

freqüentes: “o aluno indisciplinado e o aluno que não aprende mesmo”, mas

esses alunos ‘estereotipados’ evoluem quando encontram no professor um

parceiro em sua caminhada escolar.

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É fundamental que o professor mantenha um bom relacionamento com os

alunos, bem como fazer da sala de aula um ambiente ao mesmo tempo

prazeroso, acolhedor e desafiador.

Faz-se urgente e necessária uma reflexão sobre os tipos de

relacionamentos que vêm sendo desenvolvidos na sala de aula, pois é evidente

que os alunos indisciplinados ou com dificuldades de aprendizagem encontram

menores possibilidades nas salas onde o professor ainda exerce uma relação de

superioridade, poder e autoritarismo.

Temos constatado que aqueles professores que se propõem a compreender

os motivos que levam os alunos a tais problemas, por meio de uma maior

proximidade, conquistam (ainda que mínimos) resultados positivos.

Um grande número de dificuldades intelectuais e escolares tem como

origem bloqueios emocionais, principalmente quando os pais ou professores

negam a manifestação dos sentimentos, recusando dar atenção a eles e

ridicularizam as emoções.

Com relação à escola, vale ressaltar que a criança tem necessidade de ser

entendida em suas dificuldades, de sentir-se apoiada, incentivada. Por trás da

angústia das notas, a criança pode estar com receio do professor, de seu olhar, de

suas observações e do seu julgamento. Um grande número de professores

recorre à desvalorização, à humilhação como ‘método pedagógico’ e isso é

muito prejudicial para a saúde psíquica. O Orientador Educacional pode e deve

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auxiliar sua equipe a realizar constantemente uma auto-avaliação do seu trabalho

e postura frente aos alunos.

O fracasso escolar é muito doloroso para a criança, ainda que ela

demonstre não ligar para isso, talvez ainda mais doloroso quanto menos ela

demonstrar. Torna-se necessário descobrir o que a inibe em sua aprendizagem.

As emoções são as ferramentas de que fomos dotados pela natureza para

enfrentar as dificuldades da vida, portanto, compreendê-las no contexto escolar

também é nosso papel e se faz importante!

O foco central desta pesquisa é conscientizar todos os envolvidos no

processo de ensino-aprendizagem, principalmente os professores, do seu

importante papel na formação de seus alunos, bem como explicitar a

importância da afetividade nas relações humanas e para isso contamos com a

importante figura do Orientador Educacional dentro do ambiente escolar.

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CAPÍTULO 1 CONTRIBUIÇÕES DA ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL AO PROCESSO PEDAGÓGICO

As relações humanas que se estabelecem dentro e fora da sala de aula são

muito importantes, pois por meio delas é possível observar a estreita relação da

aprendizagem com o aspecto emocional das crianças. Por isso, pesquisar como

o professor, auxiliado pela Orientação Educacional, pode ajudar seu aluno, que

não aprende por questões emocionais, a evoluir e ampliar seus conhecimentos e

deixar de ser excluído dentro do próprio espaço escolar é a proposta deste

capítulo.

O Orientador Educacional pode contribuir de forma significativa ao

contexto educacional, no sentido de buscar maiores e melhores

encaminhamentos das problemáticas que envolvem: o fracasso escolar, a

atuação do professor e os processos de avaliação utilizados entre outros.

É preciso romper com as explicações pseudocientíficas que buscam situar

a origem dos problemas educacionais no aluno ou em sua família, ao invés de

refletir criticamente sobre as práticas sociais e escolares que os produzem

(Tanamachi, 2000).

Na ação do Orientador Educacional acredita-se ser fundamental uma

proposta de trabalho que vise à transformação e para isso é preciso ter plena

convicção do quanto a sua atuação também pode contribuir para que a escola

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cumpra sua função social. Sendo assim entende-se que sua preocupação deve ser

com a melhoria das práticas pedagógicas entre outras coisas, buscando resgatar

o sentido do conhecimento enquanto instrumento de transformação da realidade

social. Deve priorizar a educação como objeto de reflexão e ação.

Faz-se necessário e urgente uma tomada de consciência dos nossos

próprios valores e dos valores sociais que estão envolvidos na amplitude do

atual sistema educacional.

A escola está inserida numa sociedade que busca padrões

supervalorizados culturalmente e por tal motivo sente-se impotente frente a esta

demanda. Sabemos que um indivíduo além de ter suas necessidades básicas

vitais satisfeitas, também necessita ser aceito, produtivo e integrado socialmente,

conforme Silva (2002). A seu ver a sociedade contemporânea vive uma “crise de

valores” que influencia diretamente o sistema educacional. Sua posição é a de

que o consumo capitalista ocasiona tal crise que se abate, principalmente, sobre

as sociedades ocidentais.

Carl Rogers escreveu em “Tornar-se pessoa”, que a educação tende a nos

tornar indivíduos conformados e estereotipados cuja instrução é ‘completada’,

em vez de pensadores livres, criativos e originais (Branden, 2002, p.255).

Dentro da perspectiva ideológica desta sociedade apresentada por Rogers,

Galvão (2003) considera que o papel da escola restringe-se a: “proteger” o aluno

das “corrupções sociais”; tentar “ajustar” o aluno ao modelo valorizado.

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Para a autora, a própria escola não se considera como reprodutora das

práticas e ideologias sociais. Segundo Wallon:

Entre o regime político de determinada sociedade e o sistema educacional nela vigente a relação não é de mera casualidade. Mesmo que não seja colocada explicitamente, a educação tem sempre um papel político (op.cit Galvão, 2003, p.93) .

É fundamental que o indivíduo seja visto em sua totalidade, não

desconectando sua vida escolar de sua vida familiar, social, emocional etc.

Segundo Galvão (2003), o projeto teórico de Wallon pode ser definido como

uma psicogênese da pessoa completa:

recusando-se a selecionar um único aspecto do ser humano e isolá-lo do conjunto, Wallon propõe o estudo integrado do desenvolvimento, ou seja, que este abarque os vários campos funcionais nos quais se distribui a atividade infantil (afetividade, motricidade, inteligência) (Galvão, 2003, p.32).

Seguindo esta linha de raciocínio ressalta-se que as pessoas só adotam

para si as idéias ou conceitos que estão intimamente relacionados com suas

necessidades individuais e sociais.

Assim busca-se o envolvimento das emoções e sentimentos junto às

atividades cognitivas. Para isso é preciso integrar pensamento, afetividade e

ação. Nossos alunos precisam vivenciar seus sentimentos, refletir sobre eles,

ressignificar seus conhecimentos e valores e perceber as possibilidades de

mudanças. Promover transformação e mudança deve ser o foco da educação, ou

seja, um olhar para a pessoa!

Os sentimentos podem ser facilitadores ou constituírem-se em obstáculos

para os pensamentos e escolhas. Atitudes e comportamentos em relação a

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quaisquer temas ou fatos da vida estão sempre associados aos conjuntos de

valores, crenças, concepções, cognições e emoções que cada pessoa desenvolve

em função de sua educação, ambiente familiar, cultural, nível sócio-cultural e

econômico (Silva, 2002). Por isso, na concepção de Silva (2002) podemos dizer

que a visão do professor acerca da aprendizagem do aluno e da sua própria

maneira de ensinar determina se ele percebe e como percebe a aprendizagem do

aluno e daquilo que é ensinado.

Provocar reflexão, análise e argumentação acerca de como se dá a

construção do conhecimento dentro do ambiente escolar é o ponto de partida em

direção a possíveis mudanças e isso pode ser direcionado pelo Orientador

Educacional. Para refletir sobre como se processa a construção do

conhecimento, convém que retomemos as contribuições de Wallon acerca da

relação de interação entre o homem e a cultura.

Segundo Galvão (2003), Wallon considera que o sujeito constrói-se nas

suas interações com o meio, por isso ao falar da criança, o autor busca

compreender o sistema de relações estabelecidas entre a criança e seu ambiente.

A autora afirma que Wallon propõe o estudo da criança contextualizada, isto é,

nas suas relações com o meio. A seu ver:

é a cultura e a linguagem que fornecem ao pensamento os instrumentos para sua evolução. O simples amadurecimento do sistema nervoso não garante o desenvolvimento das habilidades intelectuais mais complexas. Para que se desenvolvam, precisam interagir com o “alimento cultura”, isto é, linguagem e conhecimento (Galvão, 2003, p.41).

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Com base na perspectiva Walloniana, Galvão (2003) afirma que é na

interação e no confronto com o outro que se forma o indivíduo, portanto, não há

lugar para imposições de padrões de comportamento dentro da sala de aula.

Infelizmente não fomos educados para expressar de maneira clara e calma o que

realmente pensamos e desejamos. Aqueles que ousam são vistos como

indesejados ou mesmo fora do padrão.

De acordo com Galvão (2003), Wallon considera que a educação deve

integrar, à sua prática e aos seus objetivos, a dimensão social e a individual,

atendendo simultaneamente à formação do indivíduo e à da sociedade.

Na escola, a falta de compreensão das necessidades do aluno e

importância da expressão de seus sentimentos, pode levá-lo à sensação de

impotência pessoal, o que muitas vezes leva ao prejuízo do processo

pedagógico.

O espaço para expressão dos sentimentos pode facilitar a construção de

uma auto-imagem mais positiva e aumento da auto-estima, conforme Del Prette

(1999).

Tanto a auto-imagem quanto à auto-estima, a seu ver, influenciam

diretamente na auto-eficácia (confiança) que o sujeito tem de si. Atribui tal

aspecto, pois indivíduos confiantes são persistentes e acabam criando mais

ocasiões de obterem conseqüências positivas para seus comportamentos,

fortalecendo suas habilidades interpessoais (Del Prette, 1999).

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Branden (2002) afirma que dentre todos os grupos profissionais, são os

professores que têm mais receptividade para a importância da auto-estima. A

seu ver, as crianças que acreditam mais em si mesmas e cujos professores têm

uma visão positiva de seu potencial vão melhor na escola.

Segundo o autor é um grande desafio promover a auto-estima nas

crianças, pois muitas vezes chegam à escola numa condição de esgotamento

emocional tão grave que a concentração nos estudos pode ser muito difícil.

Branden (2002) acredita que a escola não terá soluções para todos os problemas

da vida dos alunos, mas os professores podem fazer uma enorme diferença.

Esta mudança de pensamento começa a emergir mais concretamente a

partir de 1980, então passou a se pensar nos reais “problemas da escola” e o eixo

de discussão passa a não ser mais o aluno e nem somente o professor e sim todo

seu funcionamento, o que realmente acontece lá dentro, enfim o processo de

escolarização.

A forma como a instituição se articula influencia todo o contexto escolar,

por isso é importante compreender as diferentes versões do processo educativo

(família, aluno, escola).

As contribuições da Orientação Educacional dentro do espaço escolar são

inúmeras. Descobrir o que leva a criança a não aprender, envolve uma amplitude

do olhar, aumentando por sua vez a possibilidade de compreender a

complexidade do problema. É também importante recapitular e reconstruir a

história de escolarização da criança em questão, pois ela é fruto do coletivo.

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Entender a relação da escola com o entorno é fundamental para o processo

pedagógico e o Orientador Educacional pode colaborar neste sentido.

Segundo Galvão (2003), a teoria walloniana, se utilizada como

instrumento para a reflexão pedagógica, implica uma prática que atenda as

necessidades da criança nos aspectos afetivos, cognitivos e motor, por isso não

considera o desenvolvimento intelectual como objetivo principal da educação.

Na psicogenética walloniana, a afetividade e a cognição constroem-se reciprocamente ao longo do processo de desenvolvimento humano, ora predominado uma, ora outra. A afetividade necessita, para evoluir, de conquistas realizadas no plano da inteligência; da mesma forma, as atividades cognitivas necessitam de afetividade equilibrada para progredir (Pinheiro, 1995, p.73).

Com esta passagem vemos que inteligência e afetividade se constroem

reciprocamente. Também não podemos ignorar, portanto, que os alunos são

sujeitos concretos e contextualizados que têm na família, na escola e na

sociedade, meios nos quais se constituem nessa relação de reciprocidade.

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CAPÍTULO 2 EMOÇÃO E AFETIVIDADE: SUA IMPORTÂNCIA NO PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO.

Nos últimos estudos realizados na área educacional, a afetividade tem

aparecido como um fator essencial para o desenvolvimento humano, porém, por

muitos anos, isto não era considerado importante para os profissionais da

educação que priorizavam os estudos ligados à cognição dos educandos.

Conforme Almeida (1999):

(...) estudar a afetividade é antes de tudo acrescentar mais pesquisas sobre um fator componente da personalidade que tem sido esquecido pela literatura. Respaldados no fato de que o compromisso da escola é com o desenvolvimento da personalidade infantil, não se pode considerar que estamos promovendo-a, se apenas cuidamos do aprendizado intelectual. Acreditamos que tratar a afetividade e a inteligência como domínios funcionais estanques é desconsiderar o indivíduo em sua completude (p.154)

Para Azevedo (2003), em nossa sociedade os aspectos relacionados às

emoções foram delegados a um ambiente clínico, sendo responsabilidade dos

profissionais da área da Psicologia. Isto fez com que os professores se

distanciassem dos alunos considerando-os apenas “seres cognitivos”.

Estudos realizados por Henri Wallon podem trazer à área educacional a

possibilidade de compreender o ser humano como um ser integral, e assim,

considerar suas emoções dentro do processo de escolarização.

Wallon (1995) com sua proposta teórica contribuiu muito com o

pensamento sobre o desenvolvimento humano que vigorava até o momento.

Enquanto outros pensadores disputavam o que era mais importante para o

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desenvolvimento deste ser humano, Wallon (1995) aparece com sua idéia de que

somos seres integrados, ou seja, biopsicossocial, respeitando nossa dimensão

biológica, psicológica e social, e por isso, devemos ser considerados em nossa

totalidade, já que, segundo ele, a fragmentação do ser humano não é suficiente

para compreendê-lo. Assim,

baseia-se numa visão não fragmentada do desenvolvimento humano, buscando compreendê-lo do ponto de vista do ato motor, da afetividade e da inteligência, assim como do ponto de vista das relações que o indivíduo estabelece com o meio (Galvão, 2003, p.71).

Contrário à visão clássica sobre as emoções que eram consideradas como

expressões tumultuadas e desagregadoras, Wallon, segundo estudos de Galvão

(1995) defende que as emoções são reações organizadas e construtoras.

O tema que deu origem a esta nova perspectiva relata, entre outras coisas,

a importância da emoção, pois Wallon (1995) percebeu que no início da vida a

emoção tinha papel predominante e determinante para a sobrevivência, que

permite ao indivíduo adaptar-se ao meio ou modificá-lo.

Logo de início, por meio de seus gestos impulsivos, contorções ou espasmos corporais, bem como das mais primitivas expressões emocionais, como o choro ou o sorriso, o bebê humano mobiliza as pessoas do seu entorno numa espécie de contágio afetivo. O adulto interpreta, conforme seus valores, desejos e suas expectativas, o significado das expressões emocionais do bebê, sendo levado a agir de acordo com seus parâmetros culturais, desejos e suas crenças individuais, envolto no clima de contágio próprio a essas manifestações. (Galvão, 2003, p.74)

Azevedo (2003) busca em outros pesquisadores, como Crespo (1986), a

definição para emoção, que trás consigo o conceito de ser algo intenso e breve,

pois motivado pelo biológico surgem reações momentâneas, que vêm e vão

conforme o estado emocional de cada indivíduo.

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Para Filliozat (2000), a palavra emoção vem do latim que significa a

junção de outras duas existentes: E – moção. Assim, “E” (do latim ex) = para

fora; “moção” = movimento. A emoção é o movimento da vida em cada um de

nós. É esse movimento que nasce dentro do ser humano e se exterioriza

mostrando quem somos aos outros e a nós mesmos.

Para Camargo (1997) a emoção é a primeira forma de comunicação, pois

é através dela que o bebê se expressa para saciar suas necessidades. A seu ver,

ela vai se modificando conforme a maturação do sistema nervoso e passando a

relacionar-se diferentemente com o meio social. Se antes havia a necessidade da

sobrevivência, com o passar do tempo há a necessidade de interagir-se

socialmente e desenvolver-se enquanto um ser único e com personalidade

própria.

Segundo Wallon (1995) a emoção tem sua importância de ser já que é

capaz de mobilizar o outro modificando assim a situação em beneficio próprio.

(...) no homem as emoções entram em conflito com as duas formas de atividade que o colocam em relação com o meio, permitindo-lhe adaptar-se a ele ou modificá-lo em proveito próprio: a capacidade para reagir às circunstâncias exteriores através de movimentos adequados e a capacidade de visualizar as realidades do mundo exterior. (Wallon, 1995, p.82)

Para melhor compreendermos a emoção há a necessidade de diferenciá-la

do sentimento. Entre outros motivos está o fato dela ser transitória e orgânica. O

sentimento é um processo mais estável e não está ligado ao orgânico, podendo

ser controlado e ele é, segundo Pinheiro (2000), a explicação racional da

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emoção. Tanto a emoção como o sentimento fazem parte da mais complexa

atividade humana que é a afetividade.

Na linguagem popular confunde-se emoção com afetividade como se um

fosse sinônimo do outro, na verdade não são. A afetividade é mais complexa,

pois significa a relação em si. Já a emoção possui características específicas por

ser biológica.

A afetividade, segundo Almeida (2004) que cita estudos de Wallon,

acontece anterior à inteligência e manifesta-se no comportamento da criança. O

bebê, logo que nasce, centra-se em si mesmo para desenvolver determinadas

habilidades que lhe darão condições de interagir com o mundo físico. A seu ver,

a afetividade também passa por um processo de evolução que primeiramente

ocorre de acordo com o estado de bem-estar ou mal-estar da criança. Sendo

assim, afeta e interfere também em suas condições orgânicas.

Esse primeiro passo da evolução da afetividade se dá no estágio que

Wallon (1995) denominou de impulsivo - emocional que compreende o primeiro

ano de vida da criança em que ainda é pura emoção.

Pela teoria walloniana, a afetividade é o início do desenvolvimento, pois

propicia o contato entre mãe e filho que é tão necessário para a individualização

do bebê, que no primeiro ano de vida, não se diferencia nem mesmo da mãe,

confundindo o seu corpo e o seu psíquico.

Assim, já desde o início a família ocupa um papel fundamental. Ela exerce

influência na formação do indivíduo, pois é ela o primeiro contato que a criança

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tem com o mundo. É a família quem vai criar ou não boas condições para o

desenvolvimento da personalidade do indivíduo.

As relações humanas, comprovadamente fazem parte da história das

civilizações. Sem essa interação entre indivíduos não haveriam sido construídos

os valores das diferentes sociedades, pois somente o orgânico não dá conta de

construir a evolução humana. Pinheiro (2003) defende a posição apresentada por

Wallon (1975) em que o grupo (...) é indispensável à criança, não só para

aquisição de certas regras, mas para tomada de consciência das suas próprias

capacidades (p.22). Segundo Almeida (1999), Wallon apresentou isto muito

bem, defendendo que o mundo físico e humano são essenciais para o

desenvolvimento orgânico, tornando-os igualmente importantes na constituição

do indivíduo.

Pinheiro (2000) afirma em sua pesquisa que a criança nasce com

propensão a interação com o outro, da qual depende sua existência e

continuidade (p.22). A seu ver é na relação com o outro que a pessoa constitui

seu próprio ser, pois o outro é referência, um espelho, que ajuda a pessoa a

encontrar o seu lugar no mundo, seu papel, tarefas que deve assumir e que são

esperadas, conforme seus méritos e sanções que venha a receber (p.22).

Wallon (1995) também defendeu que a inteligência e a afetividade estão

ligadas em uma relação de interdependência. Ambas não são prontas e

intocáveis, pelo contrário, passam constantemente por transformações que as

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fazem evoluir, pois, à medida que o indivíduo se desenvolve, as necessidades

afetivas se tornam cognitivas (Almeida, 1999, p.149)

A atividade intelectual ao mesmo tempo que é interdependente da

emoção, pode apresentar-se como oposição, já que nos momentos de surtos

emocionais não conseguimos raciocinar, ficando este bem distante do campo

emocional.

A emoção, por ser contagiosa, tem sua fundamental importância nas

relações humanas, pois é capaz de mobilizar o outro através de sua própria

expressão. Segundo Wallon (1995) a emoção tem a necessidade de suscitar

reações similares ou recíprocas em outrem e, inversamente, tem sobre o outro

uma grande força de contágio (p.99)

Almeida (2004) afirma que a emoção modifica todo sistema postural, já

que altera o indivíduo tanto externamente, através do riso, das lágrimas, das

expressões faciais, como internamente através dos batimentos cardíacos e as

alterações vasculares. As emoções, a seu ver, não são controláveis e se

manifestam repentinamente conforme a ação provocada pelo outro. Daí a

importância do contágio.

Para Azevedo (2003), o contágio ocorre devido ao tônus postural que

nada mais é que a expressão que o corpo dá no momento em que a emoção se

propaga.

Sendo assim, a emoção dá tom ao corpo, já que, muitas vezes, não

conseguimos expressar verbalmente aquilo que nosso corpo (tônus postural)

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demonstra. Portanto, conforme afirma Galvão (2003), o contágio é uma das

características expressas na emoção, pois a sensibilidade das pessoas faz com

que envolvam-se com o sentimento ocorrido no outro. Um dos aspectos mais

importantes da emoção para o desenvolvimento da própria humanidade é o fato

dela ser contagiosa, o que faz com que as pessoas se integrem e saibam viver em

comunidade.

A família, por ser o primeiro meio social em que a criança está inserida,

possui importância fundamental no seu desenvolvimento, que nos primeiros

anos de vida dependem de um outro mais experiente. Geralmente a família é

quem assume os cuidados básicos do bebê e participa de todo seu

desenvolvimento podendo auxiliá-lo ou não em seus progressos.

A educação escolar sempre foi repressora das emoções, já que considera

como “bom aluno” aquele que não se expressa, não perturba a aula, mantendo a

ordem ditada pelo professor. A escola costuma ignorar as emoções, entendendo

que seu papel é ensinar a criança a se controlar. Para o adulto, isso é muito

natural, pois a própria sociedade vai regulando suas emoções, tornando-o uma

pessoa que se esconde, e talvez, por isso, o número de pessoas que não

conseguem resolver seus conflitos aumenta a cada geração.

Em síntese, para construirmos a autoconfiança há a necessidade de nos

aceitarmos como somos, e, para nos conhecermos melhor precisamos nos

permitir sentir nossas próprias emoções. Muitos de nós adultos, deixamos de

expressar nossas emoções, pelo controle que a própria sociedade faz, e por isso,

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muitos de nós, deixamos também de sermos felizes, já que esta também é uma

emoção que nos transforma.

Desta forma atribui-se à emoção um papel fundamental em nossas vidas,

como por exemplo, o medo que ajuda-nos a nos proteger, e a raiva que ajuda-

nos a ter limites.

Conhecendo melhor os conceitos que envolvem a afetividade podemos

pensar formas mais humanas de acolhermos as crianças em nossas escolas. Ao

pensar sobre a educação afetiva pode-se considerar a criança como um ser

repleto de emoções. As mesmas nos são fundamentais desde criança, pois

favorecem o desenvolvimento e promove a nossa expressão com o mundo e no

mundo.

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CAPÍTULO 3

A FAMÍLIA, A ESCOLA E A SOCIEDADE

O que se pretende neste momento é falar sobre a constituição dos sujeitos

(alunos) em seus diferentes ambientes sociais: família, escola e sociedade.

A estrutura familiar tem se modificado com o passar dos anos,

principalmente no que diz respeito ao papel do pai e da mãe. É importante

ressaltar que a condição sócio-econômica de uma família influencia e determina

a educação do(s) filho(s) entre outras coisas.

O contexto onde vive, as pessoas com quem convive, suas experiências de

vida e recursos contribui para seu modo de ser e para a formação de sua

personalidade. Maldonado (2004) afirma que há uma multiplicidade de fatores

que influem na construção do modo de ser da criança e a família é um deles.

Segundo Maldonado (2004), na relação entre pais e filhos é importante

transmitir amor e respeito mesmo em momentos de brigas e desacordos, pois a

“filosofia de vida” dos pais é um fator importante na construção da visão de

mundo da criança. A seu ver, a criança é muito sensível e capta tudo o que está

acontecendo à sua volta, por isso quanto menos organizado é o núcleo familiar

mais insegura ela pode se tornar. A seu ver, a criança normalmente buscará essa

segurança fora de casa: escola, amigos, comunidades. A autora complementa

que a criança sente-se mais segura e tranqüila quando é informada sobre o que

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está acontecendo e quando pode expressar seus sentimentos e dúvidas.

Acrescenta que conversas e brincadeiras são meios muito utilizados pelas

crianças para entenderem e lidarem com seus sentimentos e emoções.

É justamente esta criança que chega à escola. Será que a criança que

apresenta alguma dificuldade não está revelando algo?

Pode-se dizer, portanto, que brincar é essencial, pois para a criança não é

apenas distração. Por meio da brincadeira a criança aprende a conviver com os

outros, desenvolve sua criatividade, expressa suas emoções, elabora os

acontecimentos importantes de seu cotidiano, vivencia papéis etc.

É freqüente as crianças ‘pobres’ não disporem de tempo para brincar, pois

são lançadas ao trabalho desde muito cedo. Isso ocorre porque é atribuída a ela a

função de contribuir de algum modo para a renda familiar, ou seja, com o

sustento da casa. As crianças de classes mais favorecidas também não dispõem

de tempo para brincar devido ao excesso de atividades que lhes são incumbidas.

Será que a escola dispõe de momentos para brincadeiras, uma vez que são

tão importantes para o desenvolvimento?

Além desse aspecto, o fato da mulher estar inserida no mercado de

trabalho, contribui com o aumento do número de crianças que entram na escola

precocemente já que a mãe não dispõe de tempo para cuidar delas.

A criança, desde bebê apresenta características singulares, reações

peculiares e maneiras próprias de solicitar atenção e atendimento às suas

necessidades. Por isso é importante percebê-la como uma pessoa individualizada

26

e única, com peculiaridades, recursos e limitações. Tais limitações são muitas

vezes evidenciadas no contexto escolar. Não é fácil, no convívio escolar, lidar

com as diferenças individuais, com as diferentes necessidades, com os diversos

modos de pensar e agir dos alunos. Ao professor, cabe o papel de conhecer

como se dá o desenvolvimento do seu aluno, respeitar o seu ritmo individual e

relacionar todos esses aspectos ao conteúdo escolar que pretende trabalhar,

acompanhando o desenvolvimento da criança na escola.

Segundo Maldonado (2004) negar as dificuldades ou fugir dos problemas

não faz com que eles desapareçam. A seu ver, devemos criar um clima de

confiança e liberdade de expressão, em que a pessoa sinta-se acolhida, aceita,

compreendida, respeitada. Infelizmente, o processo educacional ensina a

sufocar, suprimir, disfarçar ou negar as necessidades, as diferentes buscas dos

alunos etc. Para Maldonado (2004), o grande problema do nosso sistema de

educação é que somos condicionados, desde a infância, a sentir medo de sentir,

por isso temos a tendência de esconder ou transformar os sentimentos em vez de

reconhecê-los e explicitá-los.

Devemos refletir sobre este grande desafio!

Sugere a autora, a utilização da reflexão de sentimentos, uma vez que esta

beneficia o desenvolvimento emocional saudável, pois ajuda a criança a

identificar o que sente em determinadas situações. Portanto, acredita-se que

tanto a família quanto à escola precisam aprender a ouvir, entender e aceitar os

sentimentos expressos sem julgar, criticar ou ameaçar. Para ela, a crítica

27

freqüente intensifica as dificuldades, prejudicando o desempenho da criança.

Além disso, o excesso de críticas interfere na construção da auto-imagem,

passando a sentir-se inferior, insegura, desvalorizada.

Muitas vezes fazemos ameaças porque tememos perder o controle da

situação ou porque queremos tentar modificar comportamentos que

consideramos indesejáveis. Para Maldonado (2004), o excesso de ordens e

ameaças desgasta o convívio e dificulta o desenvolvimento da responsabilidade.

Assim, pode-se dizer que o exercício da autoridade na família e na escola

quando visa o temor da perda do controle pode levar ao desgaste do

relacionamento com a criança, sendo muito mais ameaçador do que

possibilitador de autonomia. Conforme Maldonado (2004, p.132), muitos temem

a idéia de que, se forem flexíveis, carinhosos afetuosos, os filhos não lhes terão

respeito. Confundem afetividade com “moleza” e carranca com firmeza.

Assim, como respeito é fundamental nas relações estabelecidas na família

e na escola, valores como cooperação, solidariedade e responsabilidade

precisam ser transmitidos às crianças. Atos e atitudes transmitem de modo muito

claro tais conceitos. As mensagens que comunicamos são compostas por

palavras, posturas, expressões corporais e atos, por isso o tom e a atitude com

que nos comunicamos é fundamental, conforme Maldonado (2004).

Sendo assim, para entendermos o que se passa com a criança, sua maneira

de gerenciar seus sentimentos etc, convém conforme Galvão (2003) que

entendamos as atitudes da criança e sua dinâmica no ambiente no qual está

28

inserida. Daí a importância da observação e do olhar atento daqueles que estão

ao seu redor, portanto, também do professor.

O olhar da família também é muito importante. Tal idéia é confirmada por

Weil (2003), pois a seu ver, a educação recebida pela família influencia nossos

hábitos de vida, nossas crenças, costumes etc. Weil (2003) acredita que o

temperamento dos pais tem grande influência sobre os hábitos e atitudes dos

filhos. Para ele, o ambiente familiar tem grande influência sobre o

desenvolvimento da criança, assim como o olhar da escola também é muito

importante.

Galvão (2003) sustentando-se na teoria walloniana, afirma que há

necessidade de se planejar a estrutura do ambiente escolar, a fim de promover o

desenvolvimento da criança, além de refletir sobre as oportunidades de

interações sociais ali oferecidas. Reforça a idéia de Wallon ao dizer que a escola

deve possibilitar uma vivência diferente do grupo familiar, pois assim estará

desempenhando um importante papel na formação da personalidade da criança.

Neste sentido, Weil (2003) reforça o quanto o ambiente deve promover

confiança mútua e respeito. Para ele é fundamental criar um clima de calma,

compreensão e cooperação.

A escola, a seu ver, deve buscar aperfeiçoamento da prática pedagógica:

inadequações e equívocos, conteúdos de ensino, atitudes do professor,

organização da sala de aula ou do tempo das atividades visando atender

verdadeiramente as necessidades e possibilidades dos alunos. Portanto, há

29

detalhes importantes que compõem o processo pedagógico, que merecem

atenção e o Orientador Educacional deve contribuir neste sentido.

Em síntese, cabe à família e à escola rever seus conceitos, crenças, valores

e sua atuação junto aos seus filhos buscando maior envolvimento e

entendimento em cada uma das fases de desenvolvimento dos filhos.

Se quisermos uma sociedade mais justa devemos, por meio da educação,

desenvolver valores vinculados à construção da cidadania e de relações

interpessoais mais solidárias. Como diz Maldonado (2004), educar para a

autonomia implica em dar responsabilidades à criança, deixando de fazer por ela

ou mesmo intervir em situações em que ela pode resolver por conta própria.

Assim, a partir do que foi apresentado, pode-se dizer que devemos ensinar

a criança a desenvolver responsabilidade desde pequena e nas pequenas coisas.

Devemos incentivá-la a desenvolver a capacidade de fazer escolhas e tomar

decisões. Pensando no espaço escolar, como possibilitar tais ações?

Para Pinheiro (1995), a sala de aula é o espaço onde se dá a formação

básica do aluno, por meio do relacionamento com o ser humano e com o

conhecimento. Sabemos que essa troca implicará em conflitos, os quais são

fundamentais para o desenvolvimento.

Os conflitos surgem também porque, segundo Aquino (2000), as salas de

aula não comportam a pluralidade que caracteriza a clientela escolar. Para o

autor, a sala de aula é encontro entre movimento e diversidade, por isso o

30

professor deve administrar as divergências, negociando e propondo ajustes

necessários.

Segundo Galvão (2004), o conflito é a sociedade em movimento, é a não

conformidade com alguns acontecimentos e ações, é uma forma de

reivindicação, de contestação. Conflito, a seu ver, significa oposição entre duas

tendências inconciliáveis.

Para a autora, ao contrário do que se pensa, os relacionamentos saudáveis

não são aqueles em que não há conflitos. Normalmente o conflito é encarado

como algo negativo, mas é necessário à vida. Sua não explicitação pode levar à

violência. Tem, portanto, importante papel no desenvolvimento psicológico.

Galvão (2004) define o cotidiano escolar como o conjunto de práticas,

relações e situações que ocorrem no dia-a-dia de uma instituição de educação.

Afirma que o estudo do cotidiano busca compreender como se dão às práticas e

as relações dentro do contexto escolar, já que este é um universo complexo onde

se encontram crianças, adolescentes, adultos, profissionais, familiares,

indivíduos com referenciais culturais e valores distintos. Sendo assim, os

conflitos são inevitáveis.

Para a autora, os conflitos se dão de diferentes formas e são movidos por

diferentes razões. Afirma ainda que, para compreendê-los, é preciso fazer a

caracterização do universo escolar, portanto: analisar a proposta pedagógica, a

organização das atividades no tempo e no espaço, as propostas feitas em sala de

31

aula e as exigências posturais a elas vinculadas, assim como a ação das crianças,

o clima das interações entre alunos e professores são importantes.

Vale ressaltar que do ponto de vista da postura que se espera do aluno,

normalmente as atividades propostas em sala de aula, solicitam imobilidade em

posição sentada e atenção concentrada e imóvel. São raras as exceções em que

as atividades envolvem o movimento como finalidade.

Muitas vezes não se entende porque as crianças resistem em atender à

exigência de permanecer na posição sentada e atenção concentrada na atividade

proposta pelo professor. O conflito vem assim expressar através da agitação uma

contraposição às condutas de contenção motora do professor.

Diante das manifestações de agitação a atitude freqüente do professor é a

de pedir aos alunos que se mantenham sentados e quietos. O professor, não

percebe muitas vezes que a tarefa proposta foi desinteressante ao aluno, não

oferecendo uma atividade alternativa. Tal postura exige, em muitos momentos,

um único ritmo de trabalho para todas as crianças: que devem estar fazendo

sempre o mesmo tipo de atividade e ao mesmo tempo.

Percebe-se no cotidiano escolar que há um grande desencontro entre a

atitude dos alunos e a expectativa do professor, o que também gera inúmeros

conflitos. Levantar-se do lugar, andar pela sala, mexer-se na cadeira, são

atitudes transgressivas e objeto de repreensão. Qualquer gesto ou movimento

que escape à postura de contenção exigida é tratado como bagunça. Os alunos

32

que assim se comportam são então chamados de: agressivos, desobedientes,

indisciplinados.

Segundo Galvão (2004) é possível diminuir as atitudes agressivas e de

impulsividade mediante propostas que contemplem o objetivo de expansão de

movimento. A seu ver, as características do espaço repercutem sobre a atividade

e dinâmica do grupo. Atividades interessantes e atrativas, conforme a autora,

tendem a facilitar o envolvimento dos alunos.

Galvão (2004), com base em sua pesquisa, constatou que a intensa

cobrança de atenção concentrada e imobilidade baseia-se na idéia de que delas

depende a aprendizagem, ou seja, a concentração é um pré-requisito para a

aprendizagem (ex: se o aluno ficar atento à explicação não terá dificuldades para

realizar a tarefa). Conseqüentemente, os alunos que atendem às exigências

posturais têm seu comportamento aprovado e valorizado pelos professores.

O fato é que a possibilidade de prestar atenção depende da postura

corporal. A criança tem sua capacidade de atenção ampliada quando pode variar

de posição, deslocar-se, interagir com outro colega.

A intensidade com que se cobra a contenção deve ser revista. Não se trata

de abolir a solicitação dessas atitudes, mas de dosar melhor as situações durante

as quais elas são exigidas.

De acordo com Maldonado (2004), a desorganização do comportamento é

a reação mais comum para canalizar a energia que não está sendo descarregada

em atividades mais apropriadas. Por tal motivo, vemos nas escolas que o número

33

de brigas entre os alunos na hora do recreio é elevado em função do forte

controle exercido pelo professor em sala de aula. O recreio funciona assim,

como uma compensação, uma válvula de escape.

Segundo Galvão (2004), a possibilidade de controle voluntário sobre as

próprias ações é lenta e de difícil consolidação. A seu ver, a vivência de

situações em que o aluno dirige a própria ação é condição necessária para que se

desenvolva a capacidade de controlá-la, promovendo assim seu autocontrole e

independência.

A autora afirma que o movimento, portanto, tem um papel fundamental na

afetividade e também na cognição, por isso, as variações tônicas refletem no

curso do pensamento. A seu ver há necessidade de encontrar diferentes

alternativas posturais para a realização das tarefas escolares, pois o movimento é

um instrumento para a expressão do pensamento.

O que significa expressar o pensamento? Significa trabalhar a reflexão, ou

seja, a autonomia. Percebe-se que a palavra autonomia é tão valorizada no

discurso pedagógico, mas na concretude do cotidiano escolar, poucas

oportunidades são oferecidas para seu desenvolvimento. Portanto, há uma

contradição entre a idéia que se defende sobre a autonomia e o exercício desta

em sala de aula. A escola simplesmente “esquece” das necessidades

psicomotoras da criança propondo atividades em que a contenção do movimento

é uma exigência constante. Como vimos o movimento faz parte do

desenvolvimento da autonomia, da independência etc.

34

Segundo Maldonado (2004) os conflitos jamais poderão ser inteiramente

eliminados dos relacionamentos, pois a existência deles não é necessariamente

ruim. A seu ver, a maneira de lidar e encarar os conflitos é um dos pontos

determinantes da qualidade do relacionamento.

Galvão (2004) acrescenta ainda que o movimento interfere ativamente no

funcionamento intelectual, portanto, a imposição da imobilidade por parte da

escola pode ter efeito contrário sobre a aprendizagem, funcionando como

obstáculo.

Galvão (2004), embasada na teoria Walloniana, acredita que o conflito

tem papel decisivo no processo de construção da consciência de si, portanto, tais

condutas de oposição são muito importantes para o desenvolvimento humano, à

vida psíquica e social.

Ao citar Wallon, Galvão (2004) afirma que há uma estreita relação entre

conflito e as emoções porque há expressividade das emoções, além de se fazer

presente no tom e melodia da voz, manifesta-se nas expressões faciais, gestos e

movimentos.

Complementando esta idéia, Maldonado (2004) afirma que quando a

criança solicita demais o adulto ou está excessivamente irrequieta e agressiva,

ela está comunicando sentimentos importantes. A seu ver, essa modificação de

comportamento ocorre porque as crianças precisam de atenção, disponibilidade

e presença das pessoas importantes para ela.

35

Professores que adotam essa posição rígida e cristalizada costumam

sempre atribuir a um outro a responsabilidade, não olhando para suas próprias

incoerências, necessitando urgentemente reverem seus olhares restritivos sobre o

movimento, o modo como organizam o espaço físico e conduzem as atividades,

assim como o descompasso entre o seu discurso e sua prática.

Por mais coerente que sejam as práticas pedagógicas, os conflitos sempre

ocorrerão, porém com um sentido mais positivo para o processo de

desenvolvimento e aprendizagem se assim os professores puderem percebê-los.

Podemos olhar o conflito e o movimento como transgressões e fontes de

transtorno, não necessariamente como violência ou falta de respeito, buscando

enxergar neles suas dimensões e significados.

36

CAPÍTULO 4

FALANDO SOBRE INDISCIPLINA, AVALIAÇÃO E FRACASSO ESCOLAR

Segundo Aquino (2000) se o aluno aprende é porque o professor ensina;

se não aprende é porque apresenta algum distúrbio ou bloqueio (p. 25).

Esta frase é ouvida com freqüência no contexto escolar e dela surge à

figura do aluno-problema que é aquele que apresenta distúrbios de ordem

cognitiva (problemas de aprendizagem) ou de ordem comportamental

(problemas de indisciplina). Sem considerar a totalidade do cotidiano escolar, o

aluno-problema acaba sendo considerado o grande obstáculo do trabalho

pedagógico.

O baixo rendimento e a indisciplina dos alunos devem ser considerados

como efeitos das práticas escolares e não causa, conforme afirma Aquino

(2000). A seu ver, professores culpam os alunos, que culpam os professores, que

culpam os pais, que culpam os professores, formando um círculo vicioso de

atribuição de responsabilidade. Aquino (2000) acredita que o aluno é o maior

prejudicado desta história, pois é ele quem marca com o peso da exclusão. É

pensando em tais questões que Aquino (2000) faz uma argumentação muito

importante para a reflexão proposta:

37

Mas nessa imagem-conceito dos supostos “alunos-problema” passamos a ter um problema ao mesmo tempo conceitual e ético, que é o seguinte: é no mínimo estranho, e até mesmo contraditório, que nós, na qualidade de profissionais da educação, aleguemos que a própria clientela escolar constitua o impeditivo maior da escolarização nos dias de hoje. Vejamos o por quê. O problema do médico não é o doente, o do advogado não é seu cliente, o do jornalista não é seu leitor, e assim por diante. Pelo contrário. Essas profissões só existem para fornecer algum tipo de resposta às demandas de sua clientela, que pode ser doente, de clientes, de leitores, ou de alunos. E, por estranho que possa nos parecer, para as outras profissões quanto mais espinhoso for o “caso”, maiores parecem ser o regozijo profissional, o prazer de suplantar os obstáculos e o reconhecimento social do seu trabalho (AQUINO, 2000, p.43).

O fato é que os educadores brasileiros têm considerado seus alunos como

empecilhos em sua atuação, causadores do seu mal-estar, sendo os problemas

disciplinares um dos obstáculos do seu trabalho.

Conforme Aquino (2000), o professor se queixa da conduta desordenada

dos alunos, traduzida como: “bagunça”, “tumulto”, “descontrole”, “falta de

limites” etc, pois para ele o bom aluno é aquele calado, imóvel, obediente. Será

que este é realmente um bom aluno? Será que a indisciplina não estaria

indicando a necessidade de transformações na sala de aula e principalmente na

relação professor-aluno?

Para Aquino (2000), a indisciplina do aluno é um termômetro da atuação

docente, é efeito do trabalho cotidiano na sala de aula. A seu ver, é um engano

considerar a disciplina como um pré-requisito para a ação pedagógica e a

conseqüente aprendizagem.

Se nós professores considerarmos a indisciplina como um termômetro,

descobriremos que as expectativas dos alunos não estão sendo atendidas de

maneira satisfatória. Conforme Aquino (2000), o aluno indisciplinado pergunta

38

a ele mesmo o tempo todo: para que aprender? qual a relevância e o sentido do

estudo, do conhecimento? No que ele me transforma? E qual é meu ganho, de

fato, com ele? (Aquino, 2000, p.119).

Se o aluno não encontrar na educação a chave para seu crescimento e

desenvolvimento social, para exercer efetivamente sua cidadania, não fará

sentido para ele a escola. Será que em nossos dias a escola tem cumprido seu

papel social?

Faz-se necessário e urgente uma revisão do conceito de indisciplina e de

aluno ideal. Aquino (2000) sugere o estabelecimento de um contrato

pedagógico no qual professor e aluno, juntos, estabeleçam e compartilhem as

regras de funcionamento da sala de aula, onde é dever do professor ensinar,

assim como é direito do aluno aprender (Aquino, 2000, p.120).

Quando o professor não consegue trabalhar nesta perspectiva, não

mantendo o ‘domínio’ sobre seus alunos, utiliza-se das estratégias de avaliação

como forma de punição, submissão e medo.

Provas individuais com ou sem consulta; provas grupais com ou sem consulta; provas orais individuais ou em grupo; provas práticas ou situacionais; testes de múltipla escolha; desempenho individual ou grupal em seminários; relatórios/ fichamentos/ resumos de textos teóricos e/ ou de atividades práticas; trabalhos escritos individuais ou em grupo; exercícios e mini-trabalhos em aula ou fora dela; atividades práticas e/ ou vivências realizadas em aula ou fora dela; participação nas atividades de sala de aula; assiduidade às aulas; auto-avaliação etc. etc. etc. (Aquino, 2000, p.153)

39

Este leque de formas de avaliação apresentadas por Aquino (2000)

confirmam o instrumento de poder utilizado pelo professor com o objetivo final

de aprovar ou reprovar o aluno. O discurso que ouvimos a todo instante no meio

escolar de ‘avaliar o aluno como um todo’ fica a desejar.

Conforme afirma Luckesi (2000), a avaliação da aprendizagem escolar é

uma prática ameaçadora, autoritária e seletiva (p.168), que exercita o processo

de exclusão do aluno. A seu ver, a prática de avaliação que conhecemos exclui

uma parte dos alunos e admite, como aceitos a outra parte.

A avaliação deveria ser uma prática de acompanhamento do processo de

crescimento do educando, pois como bem colocado por Luckesi (2000) provas

implicam julgamento, com conseqüente exclusão; avaliação pressupõe

acolhimento, tendo em vista a transformação (p.171).

A seu ver, o acolhimento integra, o julgamento afasta, por isso vê a

avaliação como um ato amoroso, acolhedor, integrativo, inclusivo. Acrescenta o

autor que a avaliação diagnóstica tem por objetivo a inclusão e não a exclusão; a

inclusão e não a seleção.

A avaliação tem por objetivo diagnosticar e incluir o educando, pelos mais variados meios, no curso da aprendizagem satisfatória, que integra todas as suas experiências de vida. (Luckesi, 2000, p.173).

Sabemos que a avaliação nos moldes em que tem sido apresentada aos

alunos é desmotivadora. Contudo pode e deve ser motivadora, pelo

reconhecimento de onde está e pela visualização das possibilidades do que se

pretende atingir. Na avaliação permitimos ao aluno que expresse seu modo de

40

pensar, seu modo de entender, de viver, de agir, etc e muitas vezes não

respeitando e não aceitando aquilo que ele nos apresenta.

Com isso temos contra nós uma evidência factual apontada por Aquino:

Grande parte do contingente de crianças que ingressam nas escolas não consegue atravessar impunemente o ensino fundamental, sedimentando a célebre “pirâmide” educacional brasileira. Isto é, a repetência renitente, a evasão e a baixíssima qualidade do ensino brasileiro findaram por sedimentar aquilo que alguns teóricos, com propriedade denominaram “cultura do fracasso escolar” (Aquino, 2000, p.24).

Se concordarmos com Luckesi (2000) que o processo de avaliação tem

sido excludente, confirmamos a idéia do fracasso escolar abordada por Aquino

(2000). Há uma estreita relação de reciprocidade entre avaliação e fracasso

escolar. O fato é que não podemos apenas justificar o fracasso com os métodos

de ‘exclusão’, mas alterar os rumos e os efeitos da ação escolar.

Aquino (2000) afirma que ou o seu problema é de comportamento

(indisciplina) ou é de aprendizagem (baixo rendimento nas avaliações): a

indisciplina e o baixo aproveitamento passam a constituir duas faces de uma

mesma moeda o ‘fracasso escolar’ (p.103).

Independente das causas desta ‘crise’ devemos refletir sobre condutas que

gerem possíveis e urgentes mudanças. Já não importa descobrir a causa, o que

importa é fazer valer uma educação de qualidade!

41

CAPÍTULO 5 A AFETIVIDADE COMO PROPULSORA DA APRENDIZAGEM: ENFOCANDO A RELAÇÃO PROFESSOR E ALUNO

A partir do que foi apresentado nos capítulos anteriores há um consenso

no fato de que a afetividade influencia o desenvolvimento cognitivo. Para tal

desenvolvimento a afetividade torna-se importante aliada, além da motivação,

do tempo e do espaço, que também fazem parte deste universo em debate. Sabe-

se que a afetividade tem aspectos fundamentais, pois pode promover ou não a

confiança na relação pedagógica permitindo ao aluno tornar-se sujeito seguro,

aberto ou não para a aprendizagem.

Como já visto, a afetividade é a relação que se estabelece com as pessoas

nos diferentes meios sociais. Aqui será analisada, como se dá a relação entre

professor e aluno pensando ser esta fundamental para o desenvolvimento

cognitivo. Atribui-se ao professor neste sentido, importante papel que é o de

mediar as relações entre o sujeito e o conhecimento.

Quando uma criança inicia seu processo de escolarização traz consigo

uma gama de expectativas em relação a tudo que ocorrerá naquele novo

ambiente. O medo do novo fará parte desta nova vivência, bem como o prazer

proporcionado pelas descobertas. Neste momento, o sentimento da criança

oscilará entre o conforto e o desconforto proporcionado pelas emoções.

42

No início da escolarização é perceptível a alegria com que as crianças vão

para escola que considera um período lúdico de grandes aprendizagens, porém

conforme o tempo passa, a escola parece passar rapidamente a ignorar a infância

e considerar que o aluno é apenas um ser cognitivo. A impressão que se tem é

que a escola parece deixar de lado a ludicidade e a importância do movimento

que hoje sabemos ser tão essencial para o pleno desenvolvimento.

Tudo isso ocorre devido às concepções que os próprios professores trazem

sobre o que é educação. Perdura ainda a antiga idéia de que a função da

educação é apenas transmitir conhecimentos. Para essa simples teoria parece

bastar que o professor seja uma autoridade dentro de sala de aula e os alunos o

respeite ficando todos imobilizados para aprender. Segundo Correia (2004) o

professor como autoridade em sala de aula idealiza alunos, que na maioria da

vezes, não são reais e assim acabam por preferir aqueles que mais se aproximam

da sua idealização. A seu ver, é muito comum professores conduzirem seu

trabalho pelas preferências que se estabelecem em relação a certos alunos,

através da empatia. Esse sentimento, se contrapõe quando um aluno que não

corresponde às expectativas do professor é rejeitado, estando explícita aí, uma

condição de empatia e antipatia.

A primeira relação que se estabelecerá na escola será entre professor e

aluno e, já com uma grande carga emocional. Para Almeida (2004) o professor

apresenta, no geral, muitas dificuldades em lidar com as emoções, tanto as suas

43

como as de seus alunos. Por não conhecer a necessidade dos conflitos e o

desencadeamento das emoções, ele entra a seu ver, em combate direto com o

aluno. Neste sentido acaba muitas vezes desprezando suas emoções, tentando

impedi-las de se manifestar. Conforme Almeida (2004), o professor é capaz de

demonstrar total inabilidade na resolução de conflitos quando, ao invés de

ignorar racionalmente um estado emotivo que vá prejudicar a relação, passa para

um jogo de “bate-rebate” com o aluno, querendo provar sua superioridade,

através de autoritarismo.

Primeiramente o professor precisa reconhecer suas próprias emoções, para

assim conhecer como se dá as emoções nos indivíduos e compreendê-los da

melhor forma possível, ajudando os alunos a resolver seus conflitos e evoluir

enquanto indivíduo. Conhecer e identificar as emoções é fundamental para saber

como lidar com elas. Seguindo este raciocínio, Wallon (1995) nos aponta que o

indivíduo deve ser considerado como um ser completo, portanto, um ser que tem

sentimentos, emoções e que também se manifestam no contexto escolar. Tal

aspecto merece nossa atenção, já que conforme o autor, muitas vezes a escola

reduz, através da ênfase no cognitivismo, o ser humano lá presente.

A Psicanálise, outra vertente importante, nos apresenta que o centro da

educação deve ser o aluno (Correia, 2004). O aluno é assim sujeito de seu

próprio aprendizado, não apenas como sujeito físico, mas sim como sujeito que

interfere com consciência em sua ação. Na concepção da Psicanálise, no aluno,

sujeito, existe a necessidade do outro, que seria o professor fazendo as

44

significações da aprendizagem. Neste sentido percebe-se que mais uma vez a

relação pedagógica se faz importante, atribuindo-se aos professores um

importante papel.

Infelizmente, hoje é comum vermos a escola permeada pela

desmotivação, tanto de alunos como de professores, já que o próprio espaço

tradicional e o medo das mudanças acabam criando um ambiente estático. Não

vemos mais os famosos tablados na frente da sala, onde o professor ficava mais

alto do que todos os alunos, impondo sua autoridade, porém, o conceito de

superioridade do professor ainda impera. Agora, não como sendo um sujeito de

maior experiência, mas sim, como sendo um ser já pronto, acabado e dono de

grande conhecimento.

Esse sentimento de superioridade afasta o aluno e impede o

fortalecimento de uma relação saudável tão importante para a aprendizagem.

Segundo Snyders, citado por Correia (2004) a aprendizagem só ocorre porque há

afetividade. O aluno aprende aquilo que é prazeroso e importante para si,

fazendo uma leitura do seu mundo real. Quando o ambiente é seguro e a relação

com o professor é dialética, ou seja, ambos estão dispostos a aprenderem juntos,

o aluno se sente amparado para estar a vontade com o conhecimento e então,

interessar-se por aprender. Já o professor percebe essa função da afetividade,

quando é conhecedor de si mesmo e seguro no desempenho de sua função

tendo-a explícita.

45

Para o aluno, o professor precisa demonstrar prazer no que faz para que

assim este, sinta como exemplo, a importância no ato de aprender.

Quando analisamos o que pode interferir no desempenho escolar a partir

do momento que a criança entra na escola, Correia (2004) percebe que fatores

como a alegria, o sentimento de transferência, a aprendizagem significativa, as

relações interpessoais e a aceitação de si, são elementos fundamentais para que

ocorra a aprendizagem.

46

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste estudo foi refletir sobre a afetividade no contexto da sala

de aula. Baseando-se na teoria de Henri Wallon, a pretensão foi a de apresentar

possíveis direções para um ensino mais humanizador.

Ao exercer sua função social, a escola precisa considerar os componentes

afetivo-emocional presentes no processo de construção de conhecimento de seus

alunos.

Percebeu-se no decorrer deste trabalho, apoiando-se em diferentes

autores, que a afetividade e cognição interagem de forma integrada no

desenvolvimento do ser humano. Por tal motivo, a Psicologia Walloniana

ressalta a importância da relação entre afetividade e educação.

Para Wallon (1971), a comunicação emocional representa a própria

condição da vida cognitiva. Portanto, é preciso alimentar a afetividade, a fim de

permitir o desenvolvimento da inteligência.

Em busca de possíveis direções, percebeu-se a necessidade de incluir o

estudo da emoção e da afetividade na formação do professor, a fim de

instrumentalizar sua ação pedagógica e torná-la mais eficiente. A sua saúde e o

seu prazer pela profissão poderão ser recuperados se ele tiver maior apoio e

conhecimento sobre o assunto (daí o importante papel do Orientador

Educacional). Conforme Aquino (2000), os educadores brasileiros têm a grande

47

tarefa de fazer com que os alunos permaneçam na escola e progridam em seus

conhecimentos.

Segundo Pinheiro (1995), no ato de ensinar e aprender, é preciso

considerar a afetividade do aluno como inseparável da sua inteligência. O

estabelecimento de laços afetivos contribui para a fluência da aprendizagem do

aluno. Por isso, a relação afetiva na ação educativa pode facilitar ou dificultar o

processo de aprendizagem.

Considerando a escola que o aprender é apenas uma atividade cognitiva,

acaba por não discutir a questão da afetividade no âmbito escolar, ignorando ou

mesmo desconhecendo que condições afetivas favoráveis facilitam a

aprendizagem. Conforme Pinheiro (1995), se não se estabelecerem vínculos

afetivos positivos, a criança não aprenderá ou terá sua aprendizagem

prejudicada.

Se a criança passa a apresentar problemas de aprendizagem, o caminho é

encaminhá-la a algum especialista, solicitando desta forma que um profissional

externo ao contexto e às relações escolares, se responsabilize ou mesmo

solucione algo que se remete ao cotidiano escolar. Ao diagnosticar o aluno, tanto

os educadores quanto os especialistas, tratam a criança ou jovem com um ser

isolado, esquecendo-se de que é estudante de uma determinada escola, aluno de

certo professor, filho de uma família específica, integrante de uma classe social,

morador de certa comunidade etc.

48

É justamente neste sentido que o Orientador Educacional deve nos

auxiliar, ajudando a enxergar o aluno em sua totalidade. À procura de um

culpado pela crise da educação brasileira tem-se perdido o foco de interesse.

Nem a família, nem o aluno, nem o professor em seu mais profundo

desgaste, nenhum deles é sozinho culpado pelo fracasso escolar, mas pode

contribuir para melhorar ou agravar este quadro.

Repensando a verdadeira função social da escola, o real papel do

professor, as profundas mudanças e responsabilidades da família, chegaremos ao

nosso objetivo principal: ajudar o aluno a evoluir em seus conhecimentos apesar

dos impedimentos ou imprevistos.

Percebe-se que a educação enfrenta uma crise: boa parte das crianças que

ingressam nas escolas não conseguem concluir sua jornada escolar e muitas

acabam desistindo. É justamente isso o que chamamos e conhecemos como

fracasso escolar.

O professor necessita ter clareza acerca de suas tarefas em sala de aula

para que o aluno também possa ter clareza das dele, reconhecendo que a ação do

aluno é, muitas vezes, reflexo de sua própria ação. Portanto, conforme Aquino

(2000), se há fracasso, o fracasso é de todos!

Normalmente o fracasso é atribuído ao aluno, aos seus distúrbios, a sua

família, à sua classe social e ao seu contexto sócio-cultural, deslocando o eixo

de uma discussão político-pedagógica para causas e soluções extra-escolares.

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Neste sentido, poder-se-ia afirmar com certa segurança que a biologização e a

psicologização das causas do fracasso discente findaram por instaurar um amplo

processo de patologização do cotidiano escolar – ultrapassando o domínio

discente, diga-se de passagem (Aquino, 2000, p.142).

Como educadores devemos buscar novos rumos para a educação!

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