A INTEGRAÇÃO CAPITALISTA NA EUROPA E A … de vários países da Europa, como “uma grande marcha...

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DISTRIBUIÇÃO GRATUITA NOVEMBRO . 2017 . N.º74 A INTEGRAÇÃO CAPITALISTA NA EUROPA E A EXTREMA-DIREITA AS CAUSAS DE FUNDO E OS COMBATES NECESSÁRIOS

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DISTRIBUIÇÃO GRATUITANOVEMBRO . 2017 . N.º74

A INTEGRAÇÃO CAPITALISTANA EUROPA E A EXTREMA-DIREITAAS CAUSAS DE FUNDO E OS COMBATES NECESSÁRIOS

OS DEPUTADOS DO PCP NO PARLAMENTO EUROPEU

PARLAMENTO EUROPEU | DELEGAÇÃO PORTUGUESA DO PCP NO GRUPO CONFEDERAL GUE/NGL43 Rue Wiertz PHS 5 C 67 – 1047 Bruxelas – BélgicaTelefone: 00 32 2 284 31 47 | Fax: 00 32 2 284 69 21Durante as sessões plenárias em Estrasburgo: Telefone – 00 33 3 88 17 35 36

JOÃOFERREIRAVice-presidente da Delegação *Assembleia Parlamentar Paritária ACP-UE

Membro efectivo e coordenador para o GUE/NGL da Comissão das Pescas

Membro suplente da Comissão da Indústria, da Investigação e da Energia

e-mail: [email protected]

JOÃO PIMENTA LOPESVice-presidente da Comissão dos Direitos da Mulher e da Igualdade dos Géneros

Membro da Comissão do Emprego e dos Assuntos Sociais

Membro da Delegação para as relações com a República Federativa do Brasil

Vice-presidente da Delegação à Assembleia ParlamentarEuro-Latino-Americana

Membro suplente da Comissãodos Transportes e Turismo

Membro suplente da Delegação para as relações com o Mercosul

e-mail: [email protected]

MIGUELVIEGASMembro efectivo da Comissão dos Assuntos Económicos

Membro da Delegação à Assembleia Parlamentar da União para o Mediterrâneo

Membro suplente da Comissão da Agricultura e do Desenvolvimento Rural

Membro suplente da delegação para as relações com os países do Marraquexe

e-mail: [email protected]

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SUMÁRIO

06.A UNIÃO EUROPEIA, OS ATAQUES À SOBERANIA NACIONALE OS NACIONALISMOS REACCIONÁRIOS

A EXTREMA-DIREITA E O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO CAPITALISTA

ABERTURA

14.AUMENTO DA EXPLORAÇÃO, DA POBREZAE DAS DESIGUALDADES SOCIAIS– CALDO ONDE SE ALIMENTAO POPULISMO E A EXTREMA-DIREITA

02.ÂNGELO ALVES

JOÃO FERREIRA

JOÃO PIMENTA LOPES

24.O DOMÍNIO ECONÓMICO DO GRANDE CAPITAL: A EXTREMA-DIREITA E A SUANATUREZA DE CLASSE

32.O ESTADO POLICIAL INVADE A EUROPA

MIGUEL VIEGAS

JOSÉ GOULÃO

38.UE: MILITARISMO, EXPLORAÇÃOE EXTREMA-DIREITAJORGE CADIMA

44.UM BREVE OLHAR SOBREOS PROCESSOS ELEITORAIS NA EUROPAPAULO COSTA

50.BREVES

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ABERTURA

Dedicamos este número da Revista “Portu-gal e a UE” a um tema que pela sua crescente

dimensão e perigos obriga a uma profunda re-flexão a partir de uma perspetiva de classe e de de-

fesa da liberdade e democracia, bem como a umaacção que combata as suas causas reais e a instru-mentalização que a seu propósito visa aprofundar al-gumas dessas mesmas causas.Certamente que o leitor terá presente na memória odesfile de cerca de 60.000 membros de forças fascis-tas, racistas e xenófobas, que teve lugar na Polónia nopassado dia 11 de Novembro. Sob um manto de fachosde fogo foram brandidas faixas e gritadas palavras deordem de violento ódio racial, xenófobas e de defesade uma “Europa branca”, “pura”, de “sangue limpo”. A

ÂNGELO ALVES

A EXTREMA-DIREITA E O PROCESSO DE INTEGRAÇÃOCAPITALISTA

Em mais de uma dezena de paísesas forças populistas e de extrema-direita, diferentes entre si consoante as particularidadesnacionais, crescem eleitoralmente,seja no Leste europeu, no Norte da Europa ou em países como Itália,França, Grécia, Austria, Bélgica, etc.Assiste-se a uma “institucionalização”de algumas destas forças, comoseja o caso da Frente Nacional de Le Pen na França, o ODP na Austria ou o UKIP no ReinoUnido.

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televisão pública da Polónia classificaria esta marcha,em que participaram dirigentes de forças de extrema-direita de vários países da Europa, como “uma grandemarcha de patriotas”. O Ministro do Interior polaco afir-mou estar “orgulhoso” da participação de tantos pola-cos “numa celebração do dia da Independência”.O relato choca todos aqueles que defendem a liberda-de, a democracia e os direitos humanos, e suscita maisdo que justas inquietações em todos aqueles que con-servam e preservam a memória do horror nazi-fascis-ta que dilacerou a Europa no Século XX. Quer pelo con-teúdo da acção, quer pela forma como o poder políticoa apadrinhou. Mas se o exemplo atrás referido é, pelasua brutalidade, alvo de repulsa e da mais viva condena-ção, ele está longe de ser um caso isolado na Europa.Manifestações similares tiveram lugar em vários outrospaíses, com destaque para a principal potência capi-talista na Europa – a Alemanha. Em mais de uma de-zena de países as forças populistas e de extrema-direi-ta, diferentes entre si consoante as particularidades na-cionais, crescem eleitoralmente, seja no Leste euro-peu, no Norte da Europa ou em países como Itália, Fran-ça, Grécia, Austria, Bélgica, etc. Assiste-se a uma “ins-titucionalização” de algumas destas forças, como sejao caso da Frente Nacional de Le Pen na França, o ODPna Austria ou o UKIP no Reino Unido, apenas para dartrês exemplos. A União Europeia alimenta e apoia regi-mes de natureza fascista como é o caso da Ucrânia.Em “democracias” como a Espanhola são aprovadasleis como a da “mordaça”, prendem-se dirigentes elei-tos e reprimem-se violentamente manifestações e actospolíticos. A própria União Europeia estuda e discute for-mas de condicionamento da livre expressão, nomeada-mente na internet. Não poucas vezes, em aparente opo-sição à extrema-direita, criam-se e alimentam-se “no-

vas” forças políticas “respeitáveis”, de carácter aparen-temente “apartidário”, “sem ideologia”, mas que na suanatureza são populistas, defendem e praticam políti-cas económicas ultra-liberais e impõem medidas quevisam restringir cada vez mais os direitos, liberdade egarantias dos cidadãos. As eleições em França e na Re-pública Checa são dois exemplos desta realidade.Muito se tem dito sobre esta tendência, em declara-ções que vão desde preocupações e chamadas de aten-ção, algumas das quais defendendo uma espécie defrente que abdica de uma visão de classe deste proble-ma, até hipócritas instrumentalizações emanadas dosprincipais centros de poder da União Europeia que maisnão visam que fortalecer o papel supranacional de con-trolo político nos Estados membros e preservar as po-líticas e o sistema de poder associados à União Euro-peia. Umas e outras raramente vão ao cerne da questão.Esses são os caminhos errados. Perante uma tendên-cia desta gravidade, e com os perigos que acarreta, aHistória ensina-nos que qualquer decidido combate àmais violenta forma de exploração e opressão conhe-cida da história contemporânea tem de ir às suas cau-sas e analisar esse fenómeno à luz do movimento dassociedades e das classes em que se divide. É para essedesafio que esta edição da Revista “Portugal e a UE”tenta dar um modesto contributo.Contrariamente ao que possa parecer a emergênciade forças desta natureza não é uma tendência exclu-siva do continente Europeu. A História ensina-nos queo fascismo é uma arma de recurso à qual as classes do-minantes deitam mão no quadro de crises do sistemadominante – o capitalismo. A base ideológica destetipo de forças é a mesma da ideologia dominante. Elanão representa uma alternativa ao estado de coisas vi-gente em capitalismo. É antes um violento aprofunda-

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mento das características inerentes à natureza declasse do sistema dominante, que visa, por uma acen-tuada concentração de poder, pela divisão e opressãoracial dos povos, pela alimentação do nacionalismo rea-ccionário, e por uma acentuada repressão dos movi-mentos dos trabalhadores e populares, manter de for-ma férrea o domínio do grande capital e impedir, em mo-mentos de maior conflito de classe, conter a tomadade consciência política, e em última análise, a tomadado poder pelas classes exploradas.A emergência do fascismo está também historicamen-te ligada ao aprofundamento das contradições entresectores do grande capital, e entre potências imperia-listas no quadro das crises cíclicas do capitalismo, bemcomo à opção das classes dominantes de apostar naviolência, na opressão e na guerra como forma de man-ter ou intensificar o seu poder e dominação.Ao olharmos hoje para realidades como a da principalpotência imperialista – os EUA –; para a natureza po-lítica das forças que ascendem ao poder na AméricaLatina em função de golpes patrocinados pelo imperia-lismo; para a ideologia política das forças e grupos ter-roristas armados e financiados pelas principais potên-cias imperialistas no Médio Oriente ou dos Estados da-quela região, umbilicalmente ligados ao imperialismo(como Israel e a Arábia Saudita); para o papel e acçãocriminosa de forças nacionalistas na Ásia (como o na-cionalismo Hindu); ou para as forças que em países afri-canos se implantam na sequência de acções de desesta-bilizarão imperialista (veja-se o caso da Líbia), compreen-deremos melhor o papel que as forças de natureza fas-cista têm no desenvolvimento da ofensiva imperialista.Assim, e retornando ao continente europeu, é um erro,ou uma descarada manipulação, olhar para o cresci-mento das forças de extrema-direita e de movimentos

fascistas na Europa como um elemento “exterior” aofuncionamento do capitalismo, às suas estruturas dedomínio e às políticas que promove e implementa. Épor isso que esta edição da “Portugal e a UE” tenta irao cerne de uma questão que para vários sectores é umTabu: a ligação entre a natureza de classe, os pilarese as políticas da União Europeia e o crescimento das for-ças de extrema-direita.O caldo que alimenta o crescimento de forças destanatureza está há muito estudado, e na actual fase dedesenvolvimento do capitalismo pode ser resumidoem 7 items: 1) o aprofundamento da crise do capitalis-mo e das suas estruturas (como a UE), para a qual asclasses dominantes não conseguem encontrar solu-ções dentro do status quo vigente; 2) o aprofundamen-to da crise social, com brutais ataques aos direitos so-ciais e laborais, aumento do desemprego e rápida de-gradação das condições de vida dos trabalhadores edas massas populares; 3) alterações de fundo nas re-lações internacionais com potências “tradicionais” emdeclínio e o crescimento de novas potências económicas;4) a crescente concentração e centralização de capitalnos monopólios transnacionais e grandes corporações,com a corrrespondente concentração de poder políticoem estruturas supranacionais à custa da soberania na-cional e independência dos Estados 5) uma maior visi-bilidade do carácter corrupto e criminoso do sistema,em função do aprofundamento da crise económica, como alastramento e visibilidade de casos de corrupção, frau-de e ligações do mundo do crime organizado aos “res-peitáveis” centros económicos e de poder político; 6) aintensificação do uso do militarismo e da guerra comoforma de domínio económico e político no quadro decomplexos processos de rearrumação de forças no pla-no internacional ; 7) a progressiva erosão de influência

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das forças políticas “tradicionais” que representam osinteresses da classe dominante.Ao olharmos para estes 7 items é relativamente fácilidentificar, como se verá nos artigos desta edição da“Portugal e a UE”, tendências características da evo-lução da situação no espaço da União Europeia e daprópria evolução do processo de integração capitalistana Europa. O aumento da exploração; a afirmação im-perialista da União Europeia como bloco político-mili-tar; a concentração de poder no diretório de potênciascomandado pela Alemanha; a arrogância das institui-ções europeias e os ataques à soberania que tão bemconhecemos no nosso País; a adopção de políticas re-pressivas e do conceito de estado policial, a começarpelo eixo-franco alemão; a crise da social-democraciae a guinada à direita do arco político responsável peloprocesso de integração capitalista; o carácter cada vezmais reacccionário da política das instituições da UniãoEuropeia; a ofensiva ideológica de alimentação de for-ças neo-populistas (como Macron) e a doutrina oficialanti-comunista da União Europeia; o conceito de “euro-pa fortaleza” e uma política dita “externa” da UE de natu-reza marcadamente militarista, xenófoba e racista, sãoalguns dos muitos possíveis exemplos que compro-vam que o crescimento das forças de extrema-direitaé alimentado pela própria dinâmica do processo de in-tegração capitalista. Algumas das forças que agora selevantam em discursos inflamados contra a extrema-direita são exactamente algumas daquelas que têmas maiores responsabilidades no seu ascenso.A história e o marxismo-leninismo ensinam-nos quepara combater um fenómeno político é necessário eli-minar as suas causas sócio-económicas e ideológicas.É por isso que a campanha política e ideológica em cur-so, resumida na ideia da necessidade de mais União

Europeia para derrotar os nacionalismos e a extrema-direita é um gigantesco embuste. Contrariamente à pro-paganda oficial, mais União Europeia não significa maisEuropa. Pelo contrário, o aprofundamento do processode integração capitalista é um dos principais factoresde regressão social, de aumento da pobreza e do desem-prego em massa que, nas últimas décadas, fez regres-sar ao continente europeu a guerra, o terrorismo, o racis-mo, a xenofobia, os nacionalismos, o fascismo e a perse-guição política aos comunistas. «Salvar a Europa» signi-fica derrotar a União Europeia e os interesses que elaprotege e defender a soberania nacional é a melhor for-ma de travar o passo aos nacionalismos reaccionários.Como é afirmado num dos artigos da nossa publicação,partimos do princípio de que os processos de integra-ção não são neutros nem do ponto de vista de classe,nem do ponto de vista do entendimento do papel do Es-tado-nação. A articulação entre a questão de classe ea questão nacional, a defesa de um processo de coope-ração entre Estados soberanos na Europa é um elemen-to central na luta contra o ascenso da extrema-direitae do fascismo na Europa. Tal como o é o papel do movi-mento sindical de classe e dos Partidos comunistas eprogressistas na resposta aos gravíssimos problemascom que os trabalhadores e os povos estão confrontados.É essa linha que os deputados do PCP no ParlamentoEuropeu prosseguem, ligando a luta diária pela reso-lução dos problemas do povo português, à defesa dasoberania e do interesse nacional, construindo assimas forças necessárias para a adopção de uma políticapatriótica e de esquerda que, pela sua natureza declasse, imporá as ruturas necessárias que contribuam,a partir da nossa luta, para abrir caminho a uma outraEuropa dos trabalhadores e dos povos, livre da explo-ração, da opressão, da guerra e do fascismo.

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A UNIÃO EUROPEIA, OS ATAQUES À SOBERANIA NACIONAL E OS NACIONALISMOS REACCIONÁRIOS

I.Os processos de integração não são neutros e

a União Europeia (UE) é um processo de integra-ção capitalista.

Descontados os grandiloquentes princípios e as procla-mações com que ao longo dos anos o processo foi sendoadornado (e bem assim os tratados que do ponto devista institucional lhe dão forma), ele constituiu-se edesenvolveu-se com um objectivo primordial: o de con-solidar, alargar e aprofundar na Europa as relações deprodução capitalistas.Será oportuno recordar (até porque alguns fazem poresquecer) que a conformação dos Estados, nas suas for-mas de organização política e económica, à dita «econo-mia de mercado», na sua matriz neoliberal, e à livre con-corrência capitalista no mercado único europeu, cons-titui um princípio basilar da UE, imposto aos seus Es-tados-membros.A integração capitalista europeia corresponde a umanecessidade do grande capital europeu, dos grandes

JOÃO FERREIRA

As multinacionais europeias, os monopólios europeus, que foramconquistando mercados do centro àsperiferias da UE, em vagas sucessivascoincidentes com os sucessivosalargamentos, e que se lançammundo fora nessa mesma demandacom a sua conhecida e natural avidez,precisam do superestado europeu – determinado e dirigido pelas suasgrande potências – para defenderos seus interesses, a sua pulsão imperialista, a sua taxa de lucro.Assim se compreendem as trêsfacetas que caracterizam a integração capitalista europeia,que se foram aprofundando numprocesso ainda não concluído – neoliberalismo, federalismo e militarismo.

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grupos económicos e financeiros e das multinacionaisque têm como base nacional as principais potênciaseuropeias. São estes – o capital transnacional e as po-tências que defendem os seus interesses – quem co-manda o processo de integração, quem lhe determinao rumo, as opções fundamentais e o conteúdo das po-líticas. Tudo isto num contexto que pode ir variando emfunção da correlação de forças sociais e políticas (declasse) que em cada momento se verifica em cada paíse no plano europeu, mas sem pôr em causa em nenhummomento a natureza de classe da integração.

II.O processo de concentração e de centralização do ca-pital, que marca a dinâmica da acumulação capitalista,há muito extravasou as fronteiras nacionais. O seu de-senvolvimento coloca novas necessidades e exigên-cias. As próprias relações de produção deixaram de po-der ser contidas dentro dessas fronteiras. Neste pro-cesso, a crescente associação e dependência do gran-de capital em cada um dos países face ao grande capi-tal transnacional, e de fusão do poder dos grandes mo-nopólios transnacionais com o poder político dos prin-

cipais Estados imperialistas e das instituições suprana-cionais que estes determinam, sugerem novos desen-volvimentos sobre o capitalismo monopolista de Esta-do, designadamente na sua expressão concreta emcada país.As multinacionais europeias, os monopólios europeus,que foram conquistando mercados do centro às peri-ferias da UE, em vagas sucessivas coincidentes comos sucessivos alargamentos, e que se lançam mundofora nessa mesma demanda com a sua conhecida e na-tural avidez, precisam do superestado europeu – de-terminado e dirigido pelas suas grande potências – paradefender os seus interesses, a sua pulsão imperialista,a sua taxa de lucro.Assim se compreendem as três facetas que caracteri-zam a integração capitalista europeia, que se foramaprofundando num processo ainda não concluído – neo-liberalismo, federalismo e militarismo.Nas costas dos povos, afrontando a sua vontade – deMaastricht ao Tratado de Lisboa e a tudo o que lhe so-breveio, passando pelo Acto Único, por Amesterdão,Nice e pela moeda única – o neoliberalismo foi-se incrus-tando nas políticas e na legislação da UE. Os seus efei-tos, a sua natureza anti-social, conduziram não à pro-metida harmonização no progresso mas, pelo contrá-rio, ao progressivo nivelamento por baixo das condi-ções de vida e de trabalho. O federalismo, que aumen-tou o poder concentrado nas principais potências, ata-cando a soberania nacional dos Estados menos podero-sos e periféricos, serviu a mais fácil imposição destaspolíticas e orientações anti-sociais – assim como à de-pendência económica de uns e ao domínio económicode outros. O militarismo, sempre que necessário, e ca-da vez mais frequentemente, assegura pelo poder dasarmas e da guerra a imposição dos interesses do gran-

A profunda ligação entre o ataque à soberania nacional e o ataque a direitos sociais, entre a abdicaçãonacional e a exploração e opressãode classe, constitui um dado decisivo do nosso tempo, que alguns (mesmo afirmando-se à esquerda) teimam ainda hoje emnão ver ou não querer ver.

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de capital europeu e das grandes potências da UE,mundo fora, onde quer que seja necessário, na imposi-ção do domínio imperialista sobre matérias-primas,mercados e zonas de influência.Perante as dificuldades de realização de mais-valia,confirmando a lei da baixa tendencial da taxa de lucro,o grande capital precisa de ter ao seu serviço o poder deEstado, nas suas múltiplas vertentes, de forma a criaras condições para forçar a clássica saída perante a cri-se: o aumento da exploração.Estamos perante um processo de integração em queas grandes potências impõem os interesses do capitaltransnacional (que representam) através de institui-ções supranacionais que determinam e controlam, tor-nadas necessárias desde logo em face do inaudito pro-cesso de concentração e centralização do capital. Esta

forma de domínio monopolista não nega nem esvaziade conteúdo o capitalismo monopolista de Estado aonível nacional. No caso de Portugal, décadas de políti-ca de direita e o processo de integração na União Eu-ropeia, interligados, conduziram o País a uma situaçãoque apresenta características típicas do capitalismomonopolista de Estado, num quadro em que o Estadoportuguês é cada vez mais subalternizado, dominadoe colonizado no âmbito da União Europeia, e em geralpelo imperialismo e as suas estruturas.. De resto, per-sistem e tendem a agravar-se tensões, contradições edivergências entre monopólios transnacionais de ori-gem nacional diversa. Tensões, contradições e divergên-cias que se estendem aos respectivos Estados, que de-fendem os seus interesses, sendo porventura o “Brexit”o mais recente e expressivo exemplo deste fenómeno.

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Mas o que continua a prevalecer, estando bem patenteno debate em curso sobre o «futuro da UE», é a con-certação em prol da necessidade mais premente desalvaguardar o domínio de classe do capital.É em nome deste domínio de classe que as classesdominantes de países tornados subordinados e peri-féricos, como Portugal, a partir duma posição de depen-dência e de inserção subordinada, apendicular e perifé-rica, nas cadeias de comando do grande capital trans-nacional e no processo de divisão europeia do trabalho,continuam comprometidas com a integração capitalis-ta europeia e empenhadas em assegurar a sua sobrevi-vência e aprofundamento. Assumindo o papel de autên-ticos vende-pátrias, em nome dos seus superiores in-teresses de classe, continuam a promover activamen-te uma política de abdicação nacional, de ataque à so-berania e independência nacionais, pilar fundamentalda política de direita que há mais de quatro décadasimpõem aos trabalhadores e ao povo português.A profunda ligação entre o ataque à soberania nacio-nal e o ataque a direitos sociais, entre a abdicação nacio-nal e a exploração e opressão de classe, constitui umdado decisivo do nosso tempo, que alguns (mesmo afir-

mando-se à esquerda) teimam ainda hoje em não verou não querer ver.

III.Os desenvolvimentos do processo de integração capi-talista europeu ao longo dos últimos anos – e aquilo quealguns perspectivam para os próximos anos – tradu-zem esta dinâmica de concentração de poder políticoe económico no seio da UE. A legislação da Governa-ção Económica, o Semestre Europeu, o Tratado Orça-mental, a União Bancária, os demais passos de apro-fundamento da União Económica e Monetária, os pro-gramas de intervenção UE-FMI e a perspectiva do seuredesenho futuro com a eventual criação de um FundoMonetário Europeu, constituem um cortejo de medidase de legislação que convergem no objectivo de criar umquadro de constrangimento absoluto ao desenvolvi-mento de políticas autónomas e soberanas no planonacional, sobretudo se essas políticas forem ao encon-tro dos interesses dos trabalhadores e dos povos epuserem em causa os interesses do grande capital.Estamos perante um inaudito ataque à soberania dospovos, que envolve o esvaziamento das estruturas depoder dos Estados, que lhes são próximas e que (me-lhor) podem controlar, com a transferência desse poderpara estruturas supranacionais, que difundem um pen-samento único, definem uma política única e coorde-nam e fiscalizam a aplicação prática das directrizes quedela emanam, tendo em vista o aumento da explora-ção, o ataque aos direitos, rendimentos e condições devida dos trabalhadores e dos povos, em função dos in-teresses das transnacionais e dos ditames das gran-des potências que as representam.Em última instância, esta é a razão fundamental pelaqual se procura privar os povos de instrumentos funda-

Cada perda de soberania nacional,com a respectiva deslocação dos centros de decisão para a UE,representou um degrau mais na escalada de confronto com a Constituição da República e comos princípios e o projecto nela consagrados, um degrau mais no empobrecimento e desfiguraçãodo regime democrático.

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mentais (como o é a soberania nacional e as institui-ções que a asseguram) para a (auto-) determinação doseu colectivo devir: para aumentar a exploração. De ca-minho, são postas em causa regras elementares da de-mocracia, até já mesmo no plano meramente formal.

IV.Olhemos a experiência portuguesa e as ilações quedela podemos retirar para a compreensão de um pro-cesso mais geral.Cada perda de soberania nacional – nos planos político eeconómico (monetário, orçamental, comercial, entre outros)– representou um avanço para o grande capital (nacio-nal e transnacional) e um recuo para os trabalha- dorese o povo, no plano dos direitos e das condições de vida.Cada perda de soberania nacional, com a respectivadeslocação dos centros de decisão para a UE, repre-sentou um degrau mais na escalada de confronto coma Constituição da República e com os princípios e oprojecto nela consagrados, um degrau mais no empo-brecimento e desfiguração do regime democrático.Experiência, de resto, confirmada noutras partes do mun-do, onde os níveis geográficos do confronto de classes

foram diferentemente favoráveis ao capital ou aos tra-balhadores e aos povos. Não por acaso, os processosde transformação progressista e revolucionária na Amé-rica Latina têm na base a ruptura com o imperialismoe seus instrumentos de dominação regional e a afirma-ção da soberania nacional. Afirmação da soberania quenão é contraditória, bem pelo contrário, com o encetarde novos caminhos no plano da cooperação e integra-ção económica.

V.Na UE, é com o pano de fundo anteriormente descritoque ressurgem e vão ganhando força os nacionalismosreaccionários e as forças de extrema-direita, racistas exenófobas, que os protagonizam. Em resumo: ataque adireitos, rendimentos e condições de vida dos trabalha-dores e dos povos; ataque à soberania nacional e des-locação dos centros de decisão para instâncias suprana-cionais imunes ao controlo e escrutínio populares; aque podemos acrescentar os efeitos das operações dedesestabilização e de guerra levadas a cabo pela UE,NATO e EUA em várias partes do mundo e especialmen-te na vizinhança da Europa, com consequências visí-

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veis na chamada crise migratória e dos refugiados.Se os dois primeiros factores criam o caldo de culturapara a irrupção de justos sentimentos de indignação ede revolta entre as massas populares, já o terceiro fac-tor (com origem nas mesmas políticas e no mesmo sis-tema que os dois anteriores) oferece às classes domi-nantes o pretexto para manipularem esses sentimen-tos, procurando encaminhá-los para falsas soluções,de cariz retrógrado e reaccionário, ressuscitando visõese concepções que marcaram os períodos mais negrosda História do continente europeu.Importa não esquecer, além disso, que, conforme an-teriormente aflorado, o desenvolvimento da crise docapitalismo é susceptível de acirrar contradições e riva-lidades entre fracções do grande capital, sejam de ba-se nacional distinta, mais ou menos vincada, mais ou me-nos globalizada, sejam ligadas ao predomínio de diferen-tes sectores do próprio capital. Estas contradições erivalidades tendem a ganhar expressão organizada noplano político, como ficou evidente em processos elei-torais mais recentes, nos EUA, em França ou mesmono referendo britânico sobre o “Brexit”.

Se é verdade que estas contradições e rivalidades nãoescondem que, do ponto de vista da essência do regi-me económico-social, as partes em questão defendemum mesmo sistema – o capitalismo –, não será menosverdade que a esse mesmo regime podem correspon-der formas políticas distintas de governo, mais ou me-nos democráticas, mais ou menos autoritárias e re-pressivas, mais ou menos violentas.Olhando à situação actual, não pode deixar de consti-tuir motivo de viva apreensão e de funda preocupaçãoo facto de, historicamente, no período que mediou aPrimeira e a Segunda Guerra Mundial, perante a agu-dização de contradições inter-imperialistas, peranteuma profunda crise do capitalismo e perante a corres-pondente luta dos trabalhadores e dos povos (insepa-rável da afirmação de uma nova formação económico-social, o socialismo), as classes dominantes europeiasterem lançado mão da mais brutal forma política degoverno que o capitalismo conheceu: o fascismo e onazi-fascismo.Na actualidade, para as classes dominantes que orien-tam e levam a cabo o ataque a direitos dos trabalha-

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dores importa conter o inevitável descontentamentoe revolta social que este ataque é susceptível de cau-sar dentro de limites considerados admissíveis, quenão façam perigar a sobrevivência do sistema.Encaminhar o descontentamento para soluções incon-sequentes, do ponto de vista da modificação das condi-ções e do regime que engendram os factores de des-contentamento; e criar soluções para, se necessário,assegurar por via autoritária e repressiva, a manuten-ção da iníqua ordem social capitalista: eis as motiva-ções das classes dominantes que as levaram, no pas-sado, e podem levar novamente, no futuro, a lançarmão da cartada nacionalista reaccionária e xenófoba.

VI.Importa sublinhar que as concepções da extrema-di-reita vão fazendo o seu caminho não apenas pela mãodas forças de extrema-direita mas também através dasua assimilação pelo discurso e pela prática política deoutras forças, da direita à social-democracia. A UE,para além da criação do caldo de cultura apropriado àemergência do discurso nacionalista reaccionário, as-sume também aqui um papel destacado. Veja-se, a títu-lo de exemplo, a abordagem da Comissão Europeia edo Conselho à problemática dos refugiados. Nem no dis-curso (no qual que se defendem «soluções pragmáti-cas» de expulsão de migrantes) nem na prática políti-ca (em que se destaca o vergonhoso Acordo UE-Turquia,através do qual, ao arrepio do direito internacional, sepaga a este país para manter em degradantes camposde detenção os migrantes expulsos da UE), há diferen-ças de monta face ao preconizado pelas forças racis-tas e xenófobas.É neste quadro que se tem vindo a registar em vários paí-ses europeus a ascensão de forças de extrema-direita.

VII.Perante este quadro, a defesa da soberania nacional,da ruptura com a submissão à União Europeia e aoEURO e com os constrangimentos por esta impostosao desenvolvimento soberano dos povos, e a afirmaçãode uma política patriótica e de esquerda afiguram-seda maior importância.Se os processos de submissão e de espoliação nacio-nal em curso estão intimamente associados a formasde opressão de classe, então também a luta pela so-berania e independência nacionais é, no actual períodohistórico, indissociável da luta pela emancipação daclasse operária e dos trabalhadores, contra a explora-ção e a opressão.Aos que confundem patriotismo e nacionalismo, im-porta deixar claro que o patriotismo não se ergue con-tra outras pátrias e que, tal como o concebemos, temuma raiz de classe. Traduz um sentimento de identifi-cação com um povo (e o seu núcleo duro, a classe ope-rária) na sua luta contra o grande capital transnacionale contra as classes dominantes nacionais (o grandecapital nacional). Uma luta que, na sua actual etapa,requer a convergência das classes, camadas e sec-tores da sociedade cujos interesses objectivamente seopõem aos do capital monopolista e à integração cap-italista europeia por este determinada, e reclamam aafirmação de uma política soberana.Desertar do campo da luta pela soberania nacional,deixar a bandeira do patriotismo nas mãos da extre-ma-direita e dos nacionalismos reaccionários, deixan-do campo aberto à manipulação de justos sentimentosde revolta dos povos, constituiria um erro colossal porparte dos que lutam pela democracia, pelo progressoe pela justiça social, pela paz, contra a exploração e aopressão.

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AUMENTO DA EXPLORAÇÃO, DA POBREZA E DAS DESIGUALDADES SOCIAIS – CALDO ONDE SE ALIMENTA O POPULISMO E A EXTREMA-DIREITA

A União Europeia, se vista como um blocoeconómico, foi, em 2016, a segunda maior eco-

nomia do mundo logo atrás da China e à frentedos EUA.

Seria de supor, fazendo fé na profusão de elementosde propaganda que desde longa data embrulham o pro-jecto de integração capitalista europeu, que 60 anos apóso Tratado de Roma as desigualdades económicas, sociais,territoriais, se fossem esbatendo. Essa propaganda,que ao longo de décadas a UE e os governantes à es-cala nacional têm promovido, afirma-se assim: políticasque dizem promover a coesão territorial, a produção erespectivos apoios nos mais diversos sectores, o com-bate à pobreza e à exclusão, a criação de emprego e aredução do desemprego, a elevação das condições sociais.É disso exemplo a chamada estratégia Europa 2020,que previa, em 2010, reduzir em 20 milhões o número depessoas em pobreza e em exclusão social até 2020, ealcançar no mesmo período uma taxa de emprego, nasidades entre os 20-64 anos, de 75% para o conjunto daUE28. Quer um, quer outro objectivo estão longe de se-rem alcançados e não o serão, seguramente, em 2020.

JOÃO PIMENTA LOPES

O aumento e a permanência da exploração, da pobreza, das desigualdades sociais, não éuma mera constatação “filosófica”.Tem expressão estatística, que enquadra, de forma redutora, as condições de incerteza, dedegradação da condição humana,de sofrimento, de miséria, a queestão remetidos dezenas de milhões de homens e mulheresnos países que integram a UE.Os dados que o EUROSTAT disponibiliza (e que devem ser lidoscom a devida cautela) possibilitamrevelar algumas imagens da realidade, que aqui procuraremostraduzir em três dimensões: UE a 28, zona Euro e Portugal. Analisemos alguns desses dados,que traduzem essa realidade, porvezes de forma violenta.

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A realidade, contudo, apresenta-se rude, incontornávele contraria tal discurso. Décadas de políticas de direita,promovidas ou mesmo impostas pela UE, implemen-tadas em países como Portugal por governantes ser-vis ao directório de potências e ao capital transnacio-nal, traduzem-se em retrocessos sociais, económicose de desenvolvimento. São essas mesmas políticas que,impondo o aumento da exploração, travam e contrariamo progresso social e a superação das desigualdades.O aumento e a permanência da exploração, da pobre-za, das desigualdades sociais, não é uma mera consta-tação “filosófica”. Tem expressão estatística, que en-quadra, de forma redutora, as condições de incerteza,de degradação da condição humana, de sofrimento, demiséria, a que estão remetidos dezenas de milhões dehomens e mulheres nos países que integram a UE.Os dados que o EUROSTAT disponibiliza (e que devemser lidos com a devida cautela) possibilitam revelar al-gumas imagens da realidade, que aqui procuraremostraduzir em três dimensões: UE a 28, zona Euro e Por-tugal. Analisemos alguns desses dados, que traduzemessa realidade, por vezes de forma violenta.

DA EXPLORAÇÃOA soma da população dos Estados-membros que com-põe a UE a 28 ronda os 508 milhões de pessoas, com umapopulação activa, em 2015, de 242 milhões de pessoas.Quando olhamos para a qualidade do trabalho, os valo-res e as tendências são esclarecedores. As estatísticasapontam para um aumento do trabalho a tempo par-cial na população activa no intervalo 15-64 anos, entre2006 e 2016. Na UE a 28, um aumento de 17,4%, em2006, para 19,5% em 2016. Na Zona Euro, de 18,5%para 21,6%. Em Portugal, de 8,2% para 9,5%. Este tipode relação laboral tem particular expressão na juven-

tude, sendo os aumentos ainda mais expressivos. Nointervalo 15-24 anos, verifica-se, para os mesmos anos,um aumento na UE a 28 de 25,2% para 32,4%. Na ZonaEuro as taxas sobem de 23,9% para 32,8%, sendo queem Portugal essa progressão é ainda mais acentuada,passando de 8,5% para 22,9%.O peso do trabalho temporário tem, igualmente, umasignificativa expressão no total da população activa. Seem 2006, na UE28, representava 12,1%, em 2016 fe-chava nos 12,0%. Na Zona Euro essa variação traduzia-se numa redução, de 13,9% para 13,3%. Já em Portugal,verifica-se uma progressão do trabalho temporário, de16,3%, em 2006, para 19,1% em 2016. Nas faixas etá-rias mais jovens, entre os 15-24 anos, verifica-se ummaior peso do trabalho temporário, que tende a aumen-tar. No mesmo período, o trabalho temporário naquelafaixa etária aumentou, na UE a 28, de 37,8% para 40,8%.Na Zona Euro, onde essa expressão já era maior, ovalor aumenta dos 46,6% para os 50,2%. Em Portugala subida é ainda mais acentuada, passando de 46,7%para os 62,8%. Significativa é, igualmente, a expressãodo trabalho temporário involuntário, que aumentou noperíodo 2006-2016 entre a massa trabalhadora. NaUE a 28 passou de 7,5% para 7,8%, na Zona Euro de8,2% para 8,5%, e em Portugal de 16,5% para 18,8%.Já o desemprego mantém-se em níveis muito eleva-dos. Em 2016, na UE a 28, o desemprego fechava em8,6% (cerca de 21 milhões de pessoas), quando, em2008, se situava nos 7,0% tendo como pico 2013, comuma taxa de 10,9%. Na Zona Euro essa variação é maisexpressiva, fechando 2016 com 10% (cerca de 16,2milhões de pessoas), quando, em 2008, se situava nos7,6%. Teria como valor mais elevado 12%, em 2013. JáPortugal fecharia 2016 com um valor de desempregode 11,2%, um valor superior ao de 2008, que se situou

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nos 8,8%. Teria como valor mais elevado, 16,4% de de-semprego, em 2013. De referir sobre a taxa de desem-prego oficial, que entre 1990 e 2004, Portugal teve ní-veis de desemprego sempre inferiores a 8% (só em1996 fecharia em 8,0%). Em 2001, ano que precedeua entrada em circulação do Euro, Portugal teria umataxa de desemprego de 5,1%. Em 2002 subiria para6,2%; 7,4% em 2003, valor abaixo do qual jamais os ní-veis de desemprego baixariam desde então no nosso país.A evolução do desemprego reflecte uma outra reali-dade, o agravamento do desemprego de longa dura-ção, considerado sobre a população activa como umperíodo superior a 12 meses. Na UE28, para o período2008-2016, passou de 2,6% para 4,0%. Na Zona Euro,de 2,9% para 5,0%. Em Portugal, essa evolução foi de3,6% para 6,2%. Ou seja, grosso modo, o desemprego

de longa duração é hoje cerca de metade do total dodesemprego, em Portugal até um pouco mais, o quenão deixará de reflectir a baixa dinâmica e oferta deemprego no mercado de trabalho.Em qualquer dos parâmetros anteriores são, sistema-ticamente, as mulheres que são as mais afectadas.Nalguns desses parâmetros as diferenças são eviden-tes e expressivas. Na UE a 28, em 2016, 30,7% dasmulheres em idade activa estão em condição de inac-tividade por prestação de cuidados em casa a criançase adultos. A expressão de desigualdade entre homense mulheres ganha também uma dramática dimensãoquando se compara a diferença salarial. Na UE28, em2015, essa diferença salarial situava-se em 16,3%, o va-lor percentual que as mulheres auferem menos que oshomens, e na Zona Euro em 16,8%. Já em Portugal,

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registava-se uma diferença, no mesmo ano, de 17,8%,sendo de assinalar que em 2006 esse valor se situavanos 8,4%. Significa isto que em cada 100 dias de tra-balho, cada mulher oferece gratuitamente 17,8 dias detrabalho ao patrão.

DA POBREZAA pobreza no território da UE tem uma significativa epreocupante expressão que é persistente. O risco depobreza e exclusão social, após pensões, sitou-se naUE, em 2015, nos 23,5% da população, qualquer coisacomo 118 milhões de pessoas. Já na Zona Euro, fechouem 23,1% (77 milhões de pessoas) e em Portugal nos25,1% (2,6 milhões de pessoas). Números que não sealteraram substancialmente dos valores de 2008, como início da crise, e que tiveram expressão máxima de,respectivamente, 24,7% (2012) na UE28, 23,3% (2012)na Zona Euro e 27,5% (2013) em Portugal.O risco de pobreza persistente situou-se em 2015, naUE a 28, nos 10,9%, uma subida desde os dados maisantigos disponíveis, que são de 2010 e se situavam em10%. Já na Zona Euro, 2015 fechava com um risco de11,5%, contra 9,0% em 2008, e em Portugal 13,6% contra13,1% em 2008. Dado interessante é o facto de este ín-dice ter descido para os 11,5% no nosso país em 2016,valor ainda assim muito pesado e acima da média na UE.Mas as tendências de aumento ou estagnação dos ní-veis de pobreza têm sido acompanhados de uma situa-ção perversa. O aumento da pobreza no trabalho. Em2015 este valor situava-se na UE a 28 nos 9,5% dapopulação activa, contra 8,3% em 2010. Na Zona Euro,o índice fechava em 9,4%, contra 8,1% em 2008. EmPortugal, essa realidade representou 10,9%, contra11,8% em 2008. Esta dura realidade tem particular inci-dência nos trabalhadores a tempo parcial, afectando

em 2015, na UE a 28, 15,3% dos trabalhadores nessacondição. Na Zona Euro, esse valor fechou nos 14,7%,mais 3% do que em 2008 e mais 5% do que em 2006!Em Portugal os valores são ainda mais dramáticos, re-presentando 29,5%, uma subida em comparação com2008, em que o valor se situava nos 27,8%. Não foi pos-sível encontrar dados, que seriam certamente interes-santes e reveladores, da pobreza no trabalho para ostrabalhadores com trabalhos precários e temporários.A situação de pobreza traduz-se não apenas nos rendi-mentos mas, obviamente, na qualidade de vida. Em2015, na UE a 28, 29,6% pessoas em situação de pobre-za viviam em lares sobrelotados. Um valor que emPortugal se situa nos 21%. Fora da condição de pobre-za, essa realidade tem, ainda assim, uma substantivaexpressão, já que 14% da população na UE a 28 vivenessa condição, 10% em Portugal. Uma situação quereflecte a divergência entre os padrões estabelecidosde pobreza e a capacidade real das famílias em satisfa-zerem as suas necessidades. Os custos da habitação nãose desligam daquela imagem. Em 2016, 39% das pes-soas na UE a 28 em risco de pobreza tiveram gastos coma habitação superiores a 40% dos seus rendimentos,um valor que em Portugal se situa nos 29%. A questãoda habitação liga-se com outro tipo de flagelo, a chama-da pobreza energética. Os dados apontam para que apercentagem da população que não consegue mantera casa aquecida se tenha situado, em 2015, na UE a28 e na Zona Euro, nos 9,4%. Esse valor tem, natural-mente, particular expressão na fatia da população emrisco de pobreza, subindo para os 22,7% e 23% respecti-vamente. Em Portugal, os valores reflectem uma durarealidade. Quase um quarto da população portuguesa,23,8% da população, não pôde manter a sua casa aque-cida em 2015, um valor que sobe para 43,3% entre a

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população que se encontra em risco de pobreza e exclu-são social.Estas situações reflectem uma realidade por demaisóbvia mas que, por isso mesmo, talvez mereça ser evi-denciada: são os que têm menos rendimentos que maisdificuldades têm para fazer face às suas despesas e cus-to de vida, ditado pelo mercado e não pela realidadeeconómica de cada indivíduo ou família.Entretanto, a razão entre os rendimentos dos 20% maisricos sobre os rendimentos dos 20% mais pobres, per-maneceu em 2015, quer na UE a 28, quer na Zona Euro,em 5,1, ou seja, o número de vezes que o rendimentodos primeiros é superior aos dos segundos. Em Portu-gal, essa expressão de desigualdades económicas, e

Assim se tem protagonizado umataque à capacidade produtiva de países como Portugal, que em30 anos de integração europeiaperdeu cerca de metade da capacidade produtiva nacional, nos sectores agrícola, pesqueiro e industrial, em benefício,nomeadamente, dos interesses e da capacidade produtiva dasgrandes potências europeias.

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por arrasto, sociais, é mais significativa, com uma ra-zão de 5,9. Reflexo de que a distribuição da riqueza éhoje cada vez mais desigual.

DA OFENSIVA E DA RESIGNAÇÃOAs últimas décadas têm sido pautadas por um cres-cente ataque à soberania dos Estados, com transferên-cia de competências para a esfera supranacional, asubmissão às políticas comuns, ao mercado interno, aoEuro, ou ao dogma do “défice”. As orientações e impo-sições da União Europeia, a que cedem, submissos, su-cessivos governos, da direita à social-democracia, cas-traram a definição de políticas assentes no controlo pú-blico de sectores estratégicos, no investimento público.Assim se tem protagonizado um ataque à capacidadeprodutiva de países como Portugal, que em 30 anosde integração europeia perdeu cerca de metade da ca-pacidade produtiva nacional, nos sectores agrícola, pes-queiro e industrial, em benefício, nomeadamente, dosinteresses e da capacidade produtiva das grandes po-tências europeias.Foi com esta política, em nome da concorrência e domercado liberalizado, que se promoveram fortes dinâmi-cas de privatização, entregando ao desbarato sectoresestratégicos como a banca, os transportes, a energia,ou as comunicações. Foi em seu nome que se financioudirectamente a destruição de capacidade produtiva,que se facilitaram deslocalizações, quantas vezes comapoios comunitários à instalação no país de destino.Assim se promoveu a terciarização da economia empaíses como o nosso, periféricos, transformando-se,paulatinamente, em países prestadores de serviços.Uma política que promoveu e agravou os ciclos de de-semprego, fez aumentar o desemprego de longa dura-ção. Simultaneamente, impôs em toda a Europa políti-

cas que se agravaram com a «austeridade», reformaslaborais que promoveram a desregulação laboral e dohorário de trabalho, que atacaram a contratação co-lectiva e as estruturas representativas dos trabalha-dores, que comprometeram a capacidade das autori-dades do trabalho, que promoveu a precarização dasrelações de trabalho e as políticas de baixos salários,que congelou salários e carreiras.Uma política que minou os instrumentos de protecçãosocial, nomeadamente desferindo rudes ataques aos sis-temas de segurança social universal e solidária, comprome-

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tendo a sua sustentabilidade e promovendo a sua priva-tização, limitando o acesso e reduzindo prestações so-ciais e que promoveu o aumento da idade da reforma.Uma política que promoveu brutais ataques às fun-ções sociais do estado, desbaratando e atacando os ser-viços públicos, numa senda privatizadora que atingiuamplos sectores, dos transportes, às comunicações,da gestão da água à gestão de resíduos, da educaçãoà saúde, do notariado ao registo, reduzindo o investi-mento, comprimindo a disponibilidade de muitos des-tes serviços às populações, com particular impacto no

interior, contribuindo para o agravamento do abandonoe desertificação de territórios já muito deprimidos.O ensino tem custos cada vez mais elevados para asfamílias, estando cada vez mais elitizado, limitando aprogressão e acesso às camadas mais desfavorecidas.O sistema nacional de saúde tem sido alvo de fortíssi-mos ataques, degradando a oferta ou mesmo elimi-nando serviços, de que são exemplo as maternidadesou os serviços de atendimento permanente, promo-vendo um cada vez maior papel da iniciativa privada edos seguros na resposta à saúde.

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Estes dados traduzem uma realidade que assenta nasistémica degradação e precarização das relações labo-rais, de que é expressão, o aumento do peso do traba-lho a tempo parcial ou temporário. Tal como temos de-nunciado, a redução do desemprego, que tem sido tãopropalada no nosso país nos anos mais recentes, alémde resultar de um fenómeno migratório que só encon-tra paralelo na década de 60 e que diminui a popula-ção activa, tem sido feita à conta da criação de postosde trabalho precários e de baixos salários. As políticasque valorizam o trabalho precário e baixos salários, a quesomam a desregulação do trabalho e dos horários ouo ataque à contratação colectiva, têm sido implemen-tadas pela direita e social-democracia em toda a Euro-pa, promovidas, caucionadas, ou mesmo impostas pelaUE através dos seus instrumentos de governação eco-nómica, de que é exemplo o Semestre Europeu e as suasrecomendações específicas por país, enquadradas naUnião Económica e Monetária e nos demais instrumen-tos de governação económica.O desemprego mantém-se em valores muito elevados,fruto de opções políticas de fundo, que não passam sópela externalização da produção, como da incessanteprocura do capital em reduzir os custos com o traba-

lho, e de ser estratégico a manutenção de um exércitode desempregados, debilitando as estruturas organiza-das de trabalhadores, facilitando a imposição da desre-gulamentação do trabalho.Os dados estatísticos, com a frieza que lhes é caracte-rística de serem meros números que muitas vezes seesgrimem à décima nalguma discussão política, tradu-zem, contudo, uma realidade, também fria, dura, violen-ta, com que se deparam milhões de pessoas todos osdias. No seu dia-a-dia, a profundidade da análise políti-ca que permita a identificação das causas da sua condi-ção perde-se para a dramática condição em que, indivi-dualmente, milhões de homens e mulheres se confron-tam. O aumento do custo de vida. O salário que não che-ga ao fim do mês. A prestação da casa que vai vencer,a renda da luz, da água. A pressão do patrão para quese produza mais, para que se façam horas extraordi-nárias sem compensação de tempo ou remuneratória.A incerteza da manutenção do posto de trabalho e aameaça constante de que lá fora «há centenas à espe-ra». A perda real de rendimentos. O desemprego real,quantas vezes afectando ambos os membros do casal.São dezenas de milhões de homens e mulheres que seconfrontam diariamente com esta penosa realidade eque são alvo, ao mesmo tempo, de intensas campanhasde propaganda e maquilhagem da UE e que agora se in-tensificam. Compreendem que «isto vai de mal a pior»,mas não conseguem, ainda, identificar, de forma clarae consciente, que está na UE e nas políticas de direitaa origem, a razão, a causa dos graves problemas comque se defrontam. A agenda mediática trata de toldarconsciências, turvando a realidade. O descontentamen-to com os partidos da direita e social-democracia queprotagonizam as políticas da UE cresce, e é neste caldoque o populismo se alimenta, instrumentalizando a po-

O descontentamento com os partidos da direita e social-democracia que protagonizam as políticas da UE cresce, e é neste caldo que o populismo se alimenta, instrumentalizando a pobreza e a miséria.

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breza e a miséria. A «culpa» da situação não é apre-sentada como sendo do capitalismo, como efectiva-mente se verifica, mas como se fosse do imigrante,que é apresentado, simultaneamente, numa visão de-turpante, como o que rouba trabalho e como um para-sita do sistema. Instrumentalizam-se legítimos senti-mentos de abandono e resignação, para, como no pas-sado, conquistar as camadas mais desfavorecidas, semque percebam que são atraídas para um logro que de-fende o mesmo sistema capitalista, numa vertente na-cionalista ainda mais reaccionária e xenófoba: o domí-nio do grande capital, assente em políticas de explo-ração, com maior repressão e controlo dos trabalhado-res e dos povos. Escamoteia-se que na dinâmica me-

diática que alimenta a extrema-direita e um seu su-posto combate, se lhes omite, simultaneamente, osreais objectivos daquelas forças e os objectivos dasagora maquilhadas políticas da UE, através das quaisa direita e a social-democracia se tentam ilibar e con-ter a sua erosão eleitoral. Mas, sobretudo, que se lhesomite os que coerentemente se levantam contra aspolíticas da UE, defendendo os direitos sociais e a so-berania, e apresentando objectivas propostas de ruptu-ra, assentes no desenvolvimento soberano, no controlepúblico de sectores estratégicos, no trabalho com di-reitos e numa justa distribuição da riqueza, mas tam-bém nos valores da liberdade, da democracia, do pro-gresso social, da solidariedade e da paz.

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O aumento de fenómenos e organizaçõesde extrema-direita é uma realidade que se po-

de constatar nos vários continentes, com expres-sões de índole diversa. Na Europa, e em particular

na União Europeia, são vários os movimentos e par-tidos políticos que defendem na proposta e no discursotodo um ideário de extrema-direita, com traços fasci-zantes, e que vão consolidando a sua influência eleito-ral. São disso exemplo uma já longa lista de partidoscomo a Aurora Dourada na Grécia, a Liga Norte na Itá-lia, a Frente Nacional em França, a Alternativa para aAlemanha (AfD), o Partido da Liberdade na Áustria, oUKIP no Reino Unido, o Partido da Liberdade na Holanda,o Partido Popular Dinamarquês, ou a coligação actual-mente no poder na Hungria.

MIGUEL VIEGAS

Sem querer simplificar uma realidade que é profundamentecomplexa e multifacetada emfunção de cada realidade nacional,existem, contudo, algumas tendências que importa identificar e compreender por forma a caracterizar uma realidade que é suficientemente abrangentepara deixar de poder ser considerada como um fenómenoisolado.

O DOMÍNIO ECONÓMICO DO GRANDE CAPITAL: A EXTREMA-DIREITA E A SUA NATUREZA DE CLASSE

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Sem querer simplificar uma realidade que é profunda-mente complexa e multifacetada em função de cadarealidade nacional, existem, contudo, algumas tendên-cias que importa identificar e compreender por formaa caracterizar uma realidade que é suficientementeabrangente para deixar de poder ser considerada comoum fenómeno isolado. Neste sentido é útil estudar aspropostas concretas destes partidos, designadamenteao nível do campo social e económico. Através deste es-tudo sumário que nos propomos fazer, desmonta-seassim um gigantesco embuste que tem levado muitostrabalhadores a apoiar estas forças políticas, e identi-fica-se o seu carácter de classe ao serviço, mais umavez, dos interesses dos grandes grupos económicos edo capital nacional, neste actual quadro de crise estru-tural do capitalismo.

A EXTREMA-DIREITA TRAVESTIDA DE POPULISTAApesar dos discursos, das declarações e até de referên-cias claras a linhas que são inequivocamente do domí-nio da ideologia fascista, todos estes partidos políticosnão se assumem como tal, pelo menos de forma explí-cita. A designação de cada uma destas formações po-líticas é por isso propositadamente ambígua, tendocomo objectivo claro evitar uma reacção alérgica doeleitorado que ainda tem presente os horrores do fas-cismo. O capitalismo, que na primeira metade do sé-culo XX se serviu do fascismo no combate às dinâmi-cas transformadoras na Europa inspiradas na Revolu-ção de Outubro, o mesmo capitalismo que tem pro-movido organizações terroristas e movimentos reaccio-nários e fascistas em vários pontos do globo, travesteagora estes movimentos com a designação de popu-lismo para facilitar a inserção destes partidos no siste-

ma, branqueando a sua natureza de classe e facilitan-do a sua aceitação pelos povos. Este conceito de popu-lismo, fortemente mediatizado, não passa na verdadede um útil guarda-chuva sob o qual o capitalismo pro-cura abrigar não apenas todos estes partidos de extre-ma-direita, mas também o conjunto dos movimentos epartidos progressistas, comunistas e outras forças deesquerda, metendo tudo no mesmo saco, branquean-do a história e procurando criar a confusão entre asmassas e ilibar o capitalismo. Não faltam, de resto, par-tidos e movimentos ditos de esquerda que não enjei-tam e integram mesmo esta nova taxonomia, que vaifazendo o seu caminho numa lógica de mitigação dosantagonismos de classe e de perpetuação do sistema.A extrema-direita, travestida de ditas forças populis-

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tas, alimenta-se, tal como no passado, da crise sociale económica. Cresce à mesma razão da taxa de de-semprego, instrumentalizando assim o descontenta-mento popular que resulta da natureza neoliberal daspolíticas de austeridade impostas pelo processo de in-tegração capitalista europeu, a União Europeia. Procu-ra assim representar as vítimas da globalização capi-talista, recorrendo, no entanto, a um discurso engana-dor que acusa falsos inimigos e desvia os trabalhado-res das questões fundamentais pelas quais é necessá-rio lutar. Curiosamente (ou talvez não...), estas organizações deextrema-direita, tal como outras formações ditas «po-pulistas de esquerda», convergem com a direita e asocial-democracia nesta ideia tão cara ao grande capi-

tal que é o fim da luta de classes. Assim, a luta declasse, considerada e apresentada como caduca e va-zia de sentido, deve ser substituída pela luta do povocontra as elites, esta casta que é responsável pelocrescimento das desigualdades sociais e económicas.Contudo, com a sua alergia congénita à organização,expressa no ódio visceral aos sindicatos e aos partidoscomunistas, a extrema-direita promove activamente adivisão entre a classe trabalhadora, processo a quemuitas vezes não são alheias ditas forças de «popu-lismo de esquerda», para gáudio do grande patronato.Neste sentido, o padrão geral que pode ser associadoa estas formações políticas passa, na maioria dos ca-sos, pela mobilização do eleitorado à volta de uma fi-gura carismática e de um programa de cariz liberal

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que, contendo algumas bandeiras que procuram ir aoencontro de reivindicações populares, não questiona osistema antes promove a sua continuidade e até o seureforço, conforme iremos ver.

UM OLHAR SOBRE AS PROPOSTAS DA EXTREMA-DIREITAComo é evidente, as diversas propostas desta miríadede partidos de extrema-direita que estão a irromperpelos parlamentos nacionais, havendo já casos em queestão considerados para soluções governativas (à horaem que são escritas estas palavras ultima-se um acor-

A Frente Nacional, tão «amiga» dos trabalhadores, propõe umadiminuição do IRS de 10% nosprimeiros três escalões, mas defende ao mesmo tempo umaquebra de 24% no IRC das empresas. Recorrente é também o ataque aos sindicatos, com estaideia bem conhecida da abolição do monopólio sindical e a promoçãodos sindicatos livres.

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do entre conservadores e o Partido da Liberdade daÁustria para a constituição de um governo), reflectemespecificidades nacionais que escapam a este exercí-cio de análise, cujo objectivo se circunscreve àquelesque são aspectos recorrentes no programa políticodestes movimentos. Desta forma, a procura de um ini-migo externo, seja no terrorismo, nos fluxos migra-tórios, ou na concorrência desleal dos países em de-senvolvimento (com especial destaque para a China),fomentada por um capitalismo selvagem personifica-do ou não pela União Europeia, constitui na grande maio-ria dos casos a narrativa que sustenta o discurso e as

propostas mais emblemáticas com que a extrema-di-reita procura arvorar-se como defensora do povo e dasclasses trabalhadoras.As medidas proteccionistas que avançam represen-tam assim a proposta destinada a combater a concor-rência externa, protegendo as empresas e os postosde trabalho, numa versão actualizada de um capitalis-mo nacionalista. Procurando actualizar o seu discurso,fala-se num proteccionismo inteligente, em contra-ponto à fúria neoliberal das instituições da União Eu-ropeia que procuram esbater as fronteiras entre Esta-dos e diluir as soberanias nacionais. Na frente interna

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atacam-se os imigrantes, sejam ou não refugiados,omitindo de forma deliberada as evidências sobre oimpacto positivo desta camada da população no saldoda segurança social. Atacando os imigrantes, equipara-dos a turistas da protecção social, ataca-se pela mes-ma medida todos aqueles que beneficiam de presta-ções sociais e por extensão as organizações que lutampela sua valorização, ou seja, os sindicatos e os parti-dos da esquerda consequente.Para lá das propostas em torno da questão da pro-tecção do mercado interno e até, em alguns casos, doabandono da moeda única – proposta que avançamnão ao serviço de um política patriótica e de esquerdamas apenas para acomodar uma política cambial ao ser-viço das empresas –, vejamos outras propostas concre-tas que se encontram em diversos programas destesmovimentos. Para além de medidas de dissuasão daentrada, ou mesmo de expulsão de trabalhadores es-trangeiros, colocando supostamente os nacionais emprimeiro lugar, identificamos um sem número de outras

medidas que falam por si em matéria dos interessesde classe que são defendidos. Uns propõem o fim doimposto de sucessão. Outros propõem a diminuiçãodas cotizações das empresas para a segurança social,argumentando que a medida pode ser compensadacom as taxas aduaneiras. A Frente Nacional, tão «ami-ga» dos trabalhadores, propõe uma diminuição do IRSde 10% nos primeiros três escalões, mas defende aomesmo tempo uma quebra de 24% no IRC das empre-sas. Recorrente é também o ataque aos sindicatos,com esta ideia bem conhecida da abolição do mono-pólio sindical e a promoção dos sindicatos livres. Ouseja, a extrema-direita, beneficiando da auréola pop-ulista com que o sistema procura branquear a sua ver-dadeira natureza, diz defender o povo e os trabalhado-res, mas na prática faz exactamente o contrário, avan-çando propostas que convergem com objectivos da di-reita e da social-democracia. Ao mesmo tempo que érecebida à mesa do grande capital, fomenta a divisãoentre trabalhadores estrangeiros e nacionais, entreempregados e desempregados, entre precários e tra-balhadores com contrato sem termo. Aumentar o salá-rio mínimo? Nem pensar, pois «constituiria um encar-go suplementar para as empresas que já estão numasituação difícil», segundo Marine Le Pen em discursodirecto. Limitar o preço das rendas? Nem pensar, tra-ta-se de uma medida «dirigista, quase comunista», se-gundo a mesma dirigente da Frente Nacional.

QUE FAZER PERANTE ESTE EMBUSTEMuitas das propostas destes partidos são manipu-ladas pela direita e social-democracia e pela comuni-cação social dominante, misturando deliberadamenteextrema-direita e extrema-esquerda, explorando pontosque podem convergir na forma mas que divergem pro-

As responsabilidades da UE peloactual descalabro social e económico são uma constante no discurso adoptado pela extrema-direita, que procura assimresponder a anseios legítimos das classes trabalhadores. Contudo, o programa político queavançam propõe falsas soluçõesque transformam a propostapolítica num verdadeiro embustepara os trabalhadores e o povo.

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fundamente na análise ideológica e nos objectivos subja-centes. As responsabilidades da UE pelo actual desca-labro social e económico são uma constante no discur-so adoptado pela extrema-direita, que procura assimresponder a anseios legítimos das classes trabalhado-res. Contudo, o programa político que avançam propõefalsas soluções que transformam a proposta políticanum verdadeiro embuste para os trabalhadores e o povo.Neste sentido, é de grande relevância conhecermos aproposta destes partidos por forma a denunciar estafalácia e apontar a sua verdadeira natureza de classe,

já que, emergindo da crise, não visam mais do que con-ter o descontentamento e desviar os trabalhadores daluta que importa travar em prol da sua verdadeiraemancipação. Conhecer e rebater as propostas da extre-ma-direita permite-nos igualmente combater aquelesque procuram, através de uma leitura simplista, masnão inocente, de votações em plenário, colar os depu-tados do PCP e de outras forças progressistas à extre-ma-direita, como se houvesse qualquer semelhança,seja na proposta política concreta seja na natureza dosobjectivos que defendemos.

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Na Europa comunitária, e em países sob ainfluência directa dos seus mecanismos, avolu-

mam-se os indícios graves de que a mentalidadepolicial e securitária se vai sobrepondo à salvaguar-

da dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.A «vaga terrorista» é pretexto e justificação para quealguns países introduzam na legislação comum as me-didas de excepção impostas na sequência de picos deviolência. Consuma-se, desta forma, a máxima profe-rida em Dezembro de 2015 pelo então primeiro-minis-tro francês, Manuel Valls: «o estado de excepção é o es-tado de direito»; um conceito que o porta-voz do gover-no francês de Emmanuel Macron elaborou agora atra-vés da ideia de que «o estado de excepção é transitório

O ESTADO POLICIAL INVADE A EUROPA

JOSÉ GOULÃO

Os governos podem combater os surtos de violência através de duas opções totalmente opostasem termos de bem-estar dos cidadãos: proteger a sociedadede maneira a assegurar que as pessoas vivam os seus quotidianos em paz e liberdade; ou estabelecendo supostos mecanismos de segurança à custada supressão de direitos e liberdades dos cidadãos, do próprio Estado de direito.

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enquanto a ameaça terrorista é permanente,» expli-cando assim a assimilação das medidas excepcionaispelo direito comum e a génese da lei liberticida quepassou a vigorar em França.A multiplicação de «leis antiterroristas» em numero-sos Estados da União Europeia – França, Polónia, Hungria,Bulgária, Espanha, Reino Unido, Holanda – é um dos ca-minhos mais consistentes percorridos em direcção à ins-tauração de Estados policiais; com menos visibilida-de, mas de maneira ainda mais insidiosa, alguns paísesconseguem atingir os mesmos objectivos contra os di-reitos e as liberdades dos cidadãos contaminando o di-reito comum através da adopção de medidas pontuaisaté agora excepcionais. São os casos da Alemanha, Bél-gica, Dinamarca, Áustria (ainda no anterior governo decoligação dos conservadores com os sociais-democra-tas), Grécia e outros, designadamente a Leste.Os governos podem combater os surtos de violênciaatravés de duas opções totalmente opostas em termosde bem-estar dos cidadãos: proteger a sociedade de ma-neira a assegurar que as pessoas vivam os seus quotidia-nos em paz e liberdade; ou estabelecendo supostos me-canismos de segurança à custa da supressão de direitose liberdades dos cidadãos, do próprio Estado de direito.

A tendência dominante entre as nações mais podero-sas da União Europeia, seguindo o exemplo da «loco-motiva» franco-alemã, é a de sacrificar os direitos tãoduramente conquistados pelos cidadãos às supostasnecessidades da segurança «antiterrorista». É a men-talidade de Estado policial dominando os princípios doEstado de direito, percorrendo o caminho assustadorda instauração do estado de excepção permanente,como teorizava a administração de Hollande e praticaa administração de Macron, convergindo, afinal, na apli-cação de pontos estratégicos da agenda fascista deMarine Le Pen.No quadro de «leis antiterroristas», ou através de me-didas avulsas, a invasão das políticas governativaspelas mentalidades policiescas caracteriza-se por umconjunto de actuações convergentes e comuns a todosos países onde as leis que formatam a sociedade re-flectem agora uma espécie de paranóia terrorista, fa-bricada com recurso a evoluídos artifícios de propa-ganda e manipulação.As novas medidas legislativas repressivas que inva-dem grande parte da Europa assentam, essencialmen-te, em conceitos vagos e deliberadamente indefinidosde terrorismo, nos quais podem caber desde os atenta-dos até aos simples contactos com indivíduos suspei-tos de vir a ter associações com suspeitos de terroris-mo; ou mesmo à participação em manifestações pací-ficas contra eventos como cimeiras do G7, da NATO ousobre as alterações climáticas.Essas leis são aprovadas em processos acelerados,com discussões incipientes nos Parlamentos – quandoas há – e caracterizam-se, regra geral, pela suprema-cia do poder policial e administrativo sobre o poder judi-cial, ausência de mecanismos independentes de con-trolo e fiscalização dos processos, medidas abusivas

Alguns países devem ser destacados por estarem na vanguarda desses trajectos,sem que as instâncias da União Europeia manifestem disponibilidade concreta para travar actos que espezinham a democracia.

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de controlo administrativo, invasões domiciliárias ar-bitrárias, invocações gratuitas de «segredo de Estado»e «ameaça terrorista», desprezo pelos direitos de gru-pos particulares como refugiados, migrantes, minoriasétnicas. As provas suficientes para incriminar pessoassão cada vez mais ténues e insustentadas – deixou deser considerado, por exemplo em França, o conceito de«suspeita razoável».No limite extremo do recurso a estes mecanismos pro-cessuais passam a ser ignorados vários direitos huma-nos definidos como inalienáveis à luz do direito inter-nacional, como são o direito à vida, a proibição da tor-tura, tratamentos cruéis, desumanos e degradantes, odireito a uma defesa equitativa e equilibrada e o princí-pio da não-discriminação. Percorrem-se, deste modo,

caminhos para a imposição do Estado policial e de au-tênticas ditaduras políticas.Alguns países devem ser destacados por estarem navanguarda desses trajectos, sem que as instâncias daUnião Europeia manifestem disponibilidade concretapara travar actos que espezinham a democracia.Os refugiados, os migrantes, as minorias étnicas e reli-giosas, até os veículos independentes de comunicaçãosocial que resistem à opinião que se pretende única, sãovítimas preferenciais da instauração de Estados policiais.A Polónia e a Espanha não hesitaram em estabelecermecanismos de censura em nome da «segurança na-cional» e da «luta contra o terrorismo»; A França cul-tiva a vigilância física e electrónica contra jornalistasno mesmo patamar das fiscalizações contra a fuga de

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informações relativas à política externa e da luta con-tra o crime organizado e o terrorismo.A Áustria, através do governo cessante, aprovou umalei «de protecção do Estado pela polícia» que permitea recolha massiva de dados, incluindo junto de opera-dores privados de telecomunicações, e a vigilância se-creta de cidadãos sem autorização judicial.A Bélgica decretou a vigilância contra os cidadãos «quetenham o perfil de terrorista estrangeiro». As novas ba-ses de dados, que uma nova lei veio autorizar, não têmde se submeter ao direito à vida privada nem às autori-zações dos cidadãos para obtenção e arquivo de infor-mações. A teia de serviços e mecanismos para recolhaindiscriminada de dados pessoais tem agora um novofilão, por iniciativa dos fascistas flamengos: «as célu-las locais de segurança integral». Trata-se da recolhaindiscriminada de informações de cidadãos através damiríade de serviços municipais, policiais e civis, cujodestino e tratamento permanecem na indefinição e nosecretismo cultivados pelo Estado central.A Holanda, por seu turno, apurou este tipo de invasão davida privada encarregando os serviços de informações esegurança, incluindo os militares, a fazer triagens atravésde grupos de pessoas com determinadas afinidades, asquais permanecem no segredo dos operacionais e po-dem, por isso, ter uma amplitude em banda muito larga.A mente policial dos dirigentes políticos europeus queassim procedem reproduz um elemento doutrinárioque, como muitos neste processo continental, encon-tra raízes em França, país que acaba de transformar oestado de emergência em legislação comum. É ao an-tigo ministro do Interior e primeiro-ministro de Hollande,o «socialista» Bernard Cazeneuve, que cabe a formu-lação deste princípio: «o direito à vida privada não éum direito humano».

Na Alemanha, os alvos preferenciais das tendênciaspoliciais dos governos Merkel – além da fiscalização dosorçamentos e dos défices alheios – são os cidadãos es-trangeiros, cumprindo-se assim as exigências do novofascismo germânico; o qual, em vez de perder terrenocontinua a conquistá-lo, contrariando a tese que vigoraimplicitamente dentro do eixo franco-alemão e segun-do a qual o respeito pela agenda fascista retira terrenoà extrema-direita. Seria ingenuidade deduzir que estaabordagem é fruto de uma ilusão política. A maior partedas novas medidas «antiterroristas» de Berlim atingeos estrangeiros, tratados discriminatoriamente por umEstado que lhes retirou a maioria das salvaguardas queasseguram o respeito pelos direitos humanos. O queacontece em áreas como a equidade judicial, o direitode expressão, a vigilância secreta física e electrónica.Neste inquietante cenário transeuropeu, com poucasapreciáveis excepções, dois aspectos perversos põemprofundamente em causa o pretexto «antiterrorista»,associado malevolamente a minorias étnicas e, sobre-tudo, aos refugiados.Um deles é o efeito boomerang do terrorismo e da suaperenidade, sempre escondido pelo discurso oficial epela comunicação que o serve, quando se analisa o fe-nómeno da violência em sociedades europeias.Um efeito de boomerang porque os principais paíseseuropeus são vítimas do terrorismo que eles própriosplantam no mundo através das guerras fabricadas combase no aparelho da NATO. E são alvos, igualmente –o que é apenas um segredo de polichinelo –, de gruposde mercenários terroristas que ajudaram a criar, finan-ciaram e treinaram para alimentar conflitos sangrentose intermináveis em regiões do Médio Oriente, Eurásiae Norte de África.Analisando estes factos inserindo-os numa linha tem-

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poral, não é difícil deduzir que a «vaga terrorista» naEuropa ganhou alento a partir da crise financeira de2008/2009 e que, apesar de todos os exercícios de op-timismo, resiste e continua a travar a satisfação plenada ganância neoliberal.O «terrorismo» e o seu efeito de boomerang emergemassim como um pretexto cuja perversidade custa mi-lhares de vidas humanas. Quando poderosos Estadosconfiscam direitos elementares dos cidadãos no qua-dro de uma crescente operacionalidade policial, como alegado objectivo de proteger a sociedade, fica claroque os alvos preferenciais não são os terroristas mas

as pessoas comuns, os seus movimentos cívicos eigualitários, as suas estruturas verdadeiramente repre-sentativas.Amarrado a uma crise contumaz, o neoliberalismo écada vez mais incompatível com a democracia e os di-reitos humanos. A «luta contra o terrorismo», os avan-ços do Estado policial, a ascensão do fascismo são ex-pressões convergentes do ataque cerrado aos direitoselementares dos cidadãos, tornando-os cada vez maisindefesos perante a máquina de extorsão neoliberal –objectivo principal da sistemática supressão de direi-tos humanos.

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UE: MILITARISMO, EXPLORAÇÃO E EXTREMA-DIREITA

É frequente ouvir os dirigentes e propagan-distas da União Europeia afirmar que a UE tem

sido essencial para a defesa da paz na Europa.Trata-se duma afirmação falsa e desmentida pelos

factos. E a realidade evidencia que, no actual contextode profunda crise do capitalismo, o rumo de ‘constru-ção europeia’ assente no combate aos direitos sociaise baseado no empobrecimento dos povos, bem comona negação dos direitos soberanos dos povos, alimentaos factores conducentes à violência e à guerra. É o no-vo salto militarista em curso na União Europeia (Coope-ração Estruturada Permanente, União Europeia de Se-gurança e Defesa, Fundo Europeu de Defesa), insepa-rável da sua natureza de polo imperialista e da suaagressividade externa e interna, que reforça os perigosde conflito e guerra, na Europa e fora dela.

JORGE CADIMA

A ausência da guerra no solo europeu, nas décadas após o finalda II Guerra Mundial, não se deveu à existência da União Europeia (quedava ainda os primeiros passos),mas à existência da URSS e à suapolítica de paz, à correlação deforças que resultou da derrotado nazi-fascismo (em que a UniãoSoviética desempenhou o papel decisivo) e à força e influência, no continente europeu, dos comunistas, do movimento operário, e de outras forçasamantes da paz.

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O REGRESSO DA GUERRA AO SOLO EUROPEUO militarismo foi sempre uma componente das ‘políti-cas europeias’, embora encoberta sob a sigla da NATOou das forças armadas de grandes potências da UE. Aausência da guerra no solo europeu, nas décadas apóso final da II Guerra Mundial, não se deveu à existên-cia da União Europeia (que dava ainda os primeirospassos), mas à existência da URSS e à sua política depaz, à correlação de forças que resultou da derrota donazi-fascismo (em que a União Soviética desempenhouo papel decisivo) e à força e influência, no continenteeuropeu, dos comunistas, do movimento operário, e deoutras forças amantes da paz.A comprová-lo estão os factos históricos: foi com o desa-parecimento da União Soviética e do sistema socialistamundial e o enfraquecimento dos comunistas e das for-ças da paz no final do Século XX, que a guerra regres-sou ao continente europeu, acompanhando o alarga-mento e aprofundamento da chamada ‘integração euro-peia’. O regresso da guerra ao solo europeu, primeira-mente nos Balcãs e mais recentemente na Geórgia eUcrânia, deu-se pela mão das principais potências daNATO, incluindo as potências da UE. O momento maissaliente deste processo foi a guerra da NATO na Jugos-lávia em 1999, uma guerra que desrespeitou todas asnormas do Direito Internacional, a ONU e a sua Carta,e na qual tiveram papel destacado os governos maiori-tariamente social-democratas que então governavamos principais países da União Europeia: Alemanha, ReinoUnido, França, Itália (e também Portugal). Foi umaguerra que, não por acaso, coincidiu com o primeiroalargamento da NATO a países ex-socialistas do Lesteda Europa (Hungria, Polónia e República Checa) e coma aprovação, na Cimeira de Washington que assinalouo 50º aniversário da fundação desse agressivo pacto

militar, do novo Conceito Estratégico da NATO, alar-gando o seu âmbito e pretextos de intervenção.

UM QUARTO DE SÉCULO DE MILITARISMO E GUERRANão foi apenas no continente europeu que se acentua-ram as políticas de militarismo e de guerra, após a pro-funda alteração da correlação de forças mundial dofinal do Século XX. Os últimos 25 anos ficaram marca-dos por uma fase de brutais e quase permanentes guer-ras de agressão imperialista, sempre com a participa-ção das principais potências da União Europeia. Foramguerras que devastaram grande parte do Médio Orien-te e regiões importantes na Ásia Central, Norte de Áfri-ca e Europa Oriental, ou seja, que promoveram o caosnas fronteiras da UE. Guerras que espalharam a des-truição e morte, e provocaram milhões de refugiados,transformando o Mediterrâneo num mar de morte, de-sestabilizando vários países do Sul da Europa (Itália,Grécia) e alimentando a xenofobia, o fascismo e o racis-mo (como na Polónia, onde as expressões fascizantesda manifestação do ‘Dia da Independência’ de 2017foram por demais evidentes).Nalgumas dessas guerras o papel de potências da UEfoi central: foi o caso da Líbia, um país que foi destruídoe fragmentado, transformado em placa giratória detráficos de seres humanos e onde segundo a CNN(14.11.17) leilões de escravos negros são prática corren-te. Em todas as guerras, foi central o papel da NATO, daqual a União Europeia se considera o ‘pilar europeu’. Napromoção destas guerras de agressão (em particularna Líbia e Síria) as potências imperialistas alimenta-ram, armaram e financiaram criminosos bandos terro-ristas responsáveis pelos maiores crimes e atrocida-des contra as populações locais. Os mesmos bandos

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terroristas que as autoridades europeias informamestarem por detrás de ataques terroristas que têm en-sanguentado vários países europeus. É de uma totalhipocrisia pretender agora justificar (como fez Juncker,

no seu discurso do ‘Estado da União’ de Setembro de2016) a necessidade do reforço da componente militarda UE, invocando como pretexto o terrorismo e asguerras nas fronteiras do continente. É inverter causase consequências, e procurar nas tragédias resultantesduma determinada política os pretextos para levarmais longe essa mesma política.

AS POLÍTICAS ANTI-SOCIAIS E A CRISE DO CAPITALISMONão é coincidência que este último quarto de séculode crescente militarismo da União Europeia tenha coin-cidido com a brutal ofensiva, a que é frequente asso-ciar a designação ‘neoliberal’, contra os direitos sociais elaborais e os níveis de vida dos povos da UE. Uma ofen-

O militarismo sempre foi intrínsecoao capitalismo, sobretudo na suafase imperialista. Sempre acompanhou a necessidade de expansão do capital para novosmercados, na procura de novasfontes de matérias primas e novasáreas de expansão da exploração do trabalho e da natureza.

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siva que fustigou os trabalhadores e povos de vários paí-ses, nomeadamente de Portugal, e cuja expressão maisbrutal foram as políticas da ‘Troika’ que, importa lem-brar, era em dois terços constituida por instituições daUnião Europeia (Comissão e BCE). O actual processo de‘integração europeia’ foi, desde a primeira hora, uma cons-trução do grande capital europeu. Se numa fase inicialesse processo foi condicionado por uma correlação deforças historicamente resultante de décadas de luta domovimento operário e, em particular, da influência dasconquistas do socialismo, obrigando-o a mascarar os seusobjectivos debaixo duma capa ‘social’ e de ‘direitos’ (e ‘fun-dos’), a nova correlação de forças dos últimos 25 anos per-mitiu à UE assumir cada vez mais a sua verdadeira natureza.

O militarismo sempre foi intrínseco ao capitalismo, so-bretudo na sua fase imperialista. Sempre acompanhoua necessidade de expansão do capital para novos mer-cados, na procura de novas fontes de matérias primase novas áreas de expansão da exploração do trabalhoe da natureza. O militarismo ganha nova expressão naactual fase de crise sistémica do capitalismo, onde asdificuldades cada vez maiores em ultrapassar a crisee em assegurar lucros satisfatórios, bem como o ascen-so de novas potências económicas, acirram rivalidadesentre as potências imperialistas. A capacidade de cadapolo imperialista afirmar os respectivos interesses pelavia da força torna-se uma necessidade premente. Essanecessidade é sentida mais intensamente pela Ale-

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manha, a grande potência económica da UE, mas umapotência sem a força militar correspondente, como re-sultado do seu papel nas Guerras Mundiais do SéculoXX. As rivalidades crescentes entre EUA e UE são evi-dentes e foram já expressas de forma aberta em nu-merosas ocasiões (dos dois lados do Atlântico), sobre-tudo após a vitória de Trump nos EUA. Mas foi aindaantes das eleições presidenciais nos EUA que a UE selançou na via do reforço do militarismo e no caminhoque visa chegar à constituição de forças armadas sobo comando directo do núcleo condutor do processo deintegração capitalista na Europa. O já referido discursodo ‘Estado da União’ de Jean-Claude Juncker, doismeses antes da (em grande medida inesperada) vitóriade Trump, afirmava: «A Europa precisa de se tornarmais dura. E não há aspecto onde isto seja mais ver-dade do que na nossa política de Defesa. A Europa nãopode continuar a depender do poderio militar de outros,nem deixar a França sozinha a defender a sua honra noMali. Temos de assumir a responsabilidade de protegeros nosso interesses e o modo de vida europeu [Euro-pean way of life]». Troque-se «honra» e «modo de vidaeuropeu» por «lucros», e a frase é esclarecedora: in-tervencionismo e afirmação de poder são o objectivo.Mas o reforço da vertente militarista da UE é tambémuma reacção aos seus problemas internos, à crise ‘na’e ‘da’ União Europeia. Ao longo da História, o uso da for-ça no plano externo andou sempre de mão dada como reforço do autoritarismo e reaccionarismo no planointerno. Até porque (e os planos proclamados aí estãopara o demonstrar), a militarização da UE exige um

grande complexo militar-industrial, a militarização dasUniversidades, da investigação científica1 e outros secto-res. Num contexto de promoção dos interesses priva-dos, também neste campo, está aberta a porta parauma degradação ainda maior da democracia e até damoral pública nos assuntos de Estado. Basta olhar paraos EUA para antever as suas consequências.

É NECESSÁRIO RESISTIRO crescente descontentamento provocado pela brutalofensiva contra os direitos e níveis de vida dos povosda UE (e que tem hoje particular destaque na ofensivade Macron contra os direitos dos trabalhadores emFrança) conduz os círculos dirigentes da ‘construção eu-ropeia’ a reforçar a deriva securitária e repressiva. Osrepetidos ataques terroristas dos últimos meses emsolo europeu alimentam esse processo. E o ascenso daextrema-direita, da xenofobia, de velhos e novos fas-cismos também. O fascismo dos anos 20 e 30 do Sécu-lo XX foi uma arma do grande capital e dos latifun-diários para impôr pela força o seu poder, esmagandoo movimento operário num tempo de quase perma-nente crise do capitalismo. Há quem alimente hoje umaperspectiva análoga, apadrinhando o surgimento dofascismo (velho e novo). Nalguns casos, com destaquepara a Ucrânia e outros países do Leste europeu, tem sidoabertamente promovido pelas políticas oficiais da UE.Neste quadro, o reforço do pilar militarista da UE as-sume contornos particularmente preocupantes. É ur-gente e necessário cortar o passo a este perigoso saltono escuro.

1 Veja-se o quadro dos projectos de investigação com ligações militares nos estabelecimentos de ensino italianos emhttp://www.marx21.it/index.php/italia/scuola-e-universita/28565-e-gli-atenei-italiani-tutti-in-marcia-verso-la-guerra

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Em França realizaram-se eleiçõesPresidenciais e Legislativas. Ambaseleições realizaram-se num quadrode estado de excepção, de grandepressão e condicionamento político,de profunda frustração popularface às repetidas promessas demudança em França e na UE. Osresultados nas eleições presidenciaisexpressaram uma derrota dos partidosque foram responsáveis pela execuçãodas políticas e orientações da UE.

“O ano de 2017 foi marcado pela realização

de diversos processos eleitorais em Estados-membros da União Europeia (UE). Este artigo pro-

cederá a uma breve leitura dos processos eleitoraisdecorridos em França, na Alemanha, no Reino Unido,na Holanda, na Áustria e na República Checa e, demaneira sucinta, procura apontar as principais ilações,tendências que se retiram dos seus resultados e a suarelação com a política da UE. A Holanda foi um dos primeiros Estados-membros arealizar eleições. As eleições legislativas holandesasderam uma vitória ao Partido Popular para a Liberdade eDemocracia (VVD, direita), que no entanto perdeu 8 lu-

PAULO COSTA

UM BREVE OLHAR SOBRE OS PROCESSOS ELEITORAIS NA EUROPA

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gares no Parlamento. A extrema-direita tornou-se asegunda força política, aumentando a sua representa-tividade, ganhando mais cinco lugares. A social-demo-cracia, os trabalhistas do PvdA, que estiveram coliga-dos com a direita no governo, seriam um dos principaisderrotados, perdendo 29 lugares no Parlamento. OPartido Socialista, SP, tornou-se a principal força deesquerda, apesar de ter perdido um lugar, provindo oseu eleitorado dos holandeses com menores rendi-mentos e que não se reveêm na extrema-direita. As elei-ções holandesas foram marcadas por uma discussãoem torno da UE e das políticas de “austeridade”. As per-das que tiveram os partidos responsáveis pela apli-cação de políticas de “austeridade” no país (nomeada-mente o VVD e o PvdA) provaram uma crescente insa-tisfação dos holandeses para com essa política e umavontade de mudança.Em França realizaram-se eleições presidenciais e le-gislativas. Ambas eleições realizaram-se num quadrode estado de excepção, de grande pressão e condicio-namento político, de profunda frustração popular face

às repetidas promessas de mudança em França e naUE. Os resultados nas eleições presidenciais expres-saram uma derrota dos partidos que foram respon-sáveis pela execução das políticas e orientações da UEe dos interesses do grande capital em França, nomea-damente os Governos de Nicolas Sarkozy e FrançoisHollande, direita e social-democracia respectivamen-te. A segunda volta das eleições presidenciais em Fran-ça foi uma disputa entre um candidato ultra-liberal euma candidata de extrema-direita. O resultado dessasegunda volta expressou a rejeição do povo francêsdas políticas racistas e xenófobas defendidas pela ex-trema-direita. No entanto, a vitória de Emanuel Macronnas presidenciais e do seu movimento nas eleições le-gislativas já estão a ter efeitos negativos, nomeadamen-te com o aprofundamento de políticas neoliberais e deataque aos direitos sociais e dos trabalhadores, que sãocausa da actual crise económica e social em França eque servem de alimento para o crescimento da extre-ma-direita neste país.No Reino Unido realizaram-se eleições legislativas an-tecipadas. O Governo conservador pretendia com essaseleições reforçar as suas posições no Parlamento deforma a ter um mandato reforçado para prosseguir asua ofensiva contra os direitos sociais e laborais dostrabalhadores e do povo britânico, e acentuar a sua po-lítica neoliberal, militarista e de afirmação imperialista.As eleições traduziram-se numa derrota política doPartido Conservador. Bem como numa derrota daque-les que, não conformados com a decisão do povo britâ-nico sobre a saída do Reino Unido da UE, tentaram as-sociar essa decisão a uma visão racista, xenófoba e na-cionalista, lançando um injusto e manipulador estigmasobre aquele povo. O aumento significativo da votaçãodo Partido Trabalhista, a implosão da extrema-direita

Na Alemanha as eleições ficariammarcadas por uma significativaderrota da coligaçãoCDU/CSU/SPD, que governou o país nos últimos quatro anos e foi responsável pelo aumento da precariedade laboral, da pobrezae das desigualdades sociais na Alemanha. O SPD (social-democrata) teve o pior resultado desde a Segunda GrandeGuerra Mundial.

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e a perda de maioria do Partido Conservador, reflecti-ram uma vontade de adopção de políticas favoráveisaos trabalhadores e ao povo. Estes resultados contra-riaram ainda a visão daqueles que queriam deslegiti-mar a decisão soberana do povo britânico de saída daUE bem como aqueles que pretendiam impor um vio-lento ataque aos direitos e aspirações dos trabalhado-res e de outras camadas populares.Na Alemanha as eleições ficariam marcadas por umasignificativa derrota da coligação CDU/CSU/SPD, quegovernou o país nos últimos quatro anos e foi respon-

sável pelo aumento da precariedade laboral, da po-breza e das desigualdades sociais na Alemanha. OSPD (social-democrata) teve o pior resultado desde aSegunda Grande Guerra Mundial. A CDU/CSU obteveum dos piores resultados da sua história. A extrema-direita alemã alcançou uma expressiva representaçãoparlamentar. Os liberais saíram reforçados. A Esquer-da e os Verdes reforçaram igualmente as suas vota-ções. Os resultados destas eleições ilustram o profun-do descontentamento dos alemães para com as políti-cas da direita e da social-democracia de promoção da

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concentração e centralização da riqueza, de intensifica-ção da exploração, de ataque a direitos laborais e so-ciais, de desrespeito da soberania nacional e da vontadee anseios dos povos, e de incremento do militarismo.Duas breves notas quer para a Áustria, quer para a Re-pública Checa, cujas eleições tiveram lugar recente-mente. Em ambos os países se verificou um avanço dasforças da extrema-direita, sendo que na República

Destes processos eleitorais conclui-se que, ao contrário do quealguns políticos e comentadorestêm dito, não é a afirmação do projecto de integração capitalista da UE.“

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Checa, em particular, o recuo da social-democracia foiparticularmente acentuado. Na Áustria, o avanço daextrema-direita e a nova correlação de forças abriucaminho à possibilidade da integração no governo da-quela força.Que pontos de contacto, apesar de diferenças, apre-sentam estes processos eleitorais de países distintos,com realidades e problemas diferentes, mas todos fa-

zendo parte da UE? O primeiro é o crescimento e o re-forço das forças mais conservadoras de direita e ex-trema-direita. O segundo é o recuo da social-demo-cracia comprometida com políticas anti-sociais e ne-oliberais. O terceiro é o descontentamento crescentedas populações com a política neoliberal prosseguidapor governos de direita e da social-democracia. O quar-to é a insatisfação crescente com o projecto de inte-gração capitalista europeu, a UE, apesar de todos osesforços para ter candidatos que lhe deêm um novoimpulso. O quinto é a vontade de mudança e de ruptu-ra dos povos e dos trabalhadores com a actual situa-ção e política de direita.Por isso, destes processos eleitorais conclui-se que,ao contrário do que alguns políticos e comentadorestêm dito, não é a afirmação do projecto de integraçãocapitalista da UE, nomeadamente o aprofundamentonos seus pilares fundamentais neoliberal, federalistae militarista, a solução dos problemas dos povos da Eu-ropa. Mais UE significará apenas e só o agravamento dascausas e dos factores que têm feito forças conser-vadoras e de extrema-direita prosperar na Europa eameaçar o futuro dos povos. É o aprofundamento do pro-jecto de integração capitalista o principal factor paraa regressão social, o aumento da pobreza e do desem-prego em massa, aquele que fez regressar à Europa aguerra, o terrorismo, o racismo, a xenofobia, os nacio-nalismos, o fascismo, a perseguição aos comunistas.Como tal, não pode haver quaisquer dúvidas e hesi-tações junto dos progressistas, dos democratas, dosamantes da paz quanto ao caminho para salvar a Eu-ropa. Salvar a Europa e os seus povos apenas é possí-vel com a derrota da UE, do seu projecto e dos seus in-teresses.

DEPUTADOS DO PCP NO PE SOLIDÁRIOSCOM A LUTA DOS TRABALHADORES E DO POVO BRASILEIRO

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BREVES

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Dilma Rousseff, afastada da Presidente da RepúblicaFederativa do Brasil por uma operação golpista, deslo-cou-se ao Parlamento Europeu (PE) em Estrasburgo,nos dias 15 e 16 de Novembro.O programa da visita de Dilma Rousseff incluiu diversasreuniões e encontros, entre os quais, a participação na Assembleia Parlamentar Euro-Latino-Americana(EUROLAT) e numa reunião do Grupo Confederal daEsquerda Unitária/Esquerda Verde Nórdica (GUE/NGL).Os deputados do PCP no PE reiteraram a Dilma Roussefa solidariedade dos comunistas portugueses para coma luta do povo brasileiro e a sua intenção de prosseguira denúncia contra o golpe de Estado institucional quelevou à sua ilegítima destituição da Presidência doBrasil. Golpe de Estado institucional que, no seu desen-volvimento, se confirma como um processo revanchitaque visa o retrocesso e destruição de importantes con-quistas alcançadas no quadro do processo progressistae de afirmação soberana que teve lugar no Brasil a par-

tir de 2003, com a eleição do Presidente Lula da Silva.Os deputados do PCP no PE tiveram a oportunidade derealizar um encontro bilateral com Dilma Rousseff ondelhe transmitiram o apoio do PCP à luta pela defesa dademocracia no Brasil e contra as manobras que visamcondicionar a livre expressão do povo brasileiro.Expressaram ainda a solidariedade para com os traba-lhadores brasileiros e as suas organizações, para comos democratas, patriotas e o povo que nas ruas têm re-sistido à ofensiva conduzida pelo governo golpista deMichel Temer.Os deputados do PCP no PE sublinham que o apoio à lu-ta do povo brasileiro em defesa dos direitos sociais e la-borais, da democracia e da soberania do Brasil adquireainda maior importância quando se desenvolve noutrospaíses da América Latina uma ofensiva do grande capi-tal e do imperialismo que tenta pôr em causa a soberaniados povos da região, os seus direitos e o sentido progressis-ta das transformações alcançadas na última década e meia.

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salvadorenho estão empenhados, como seja o desen-volvimento de políticas sociais, nomeadamente nocampo da educação e da saúde, de recuperação da so-berania económica e monetária, ou de combate à crim-inalidade organizada.Realizou-se também uma reunião entre deputadosprogressistas e de esquerda de dez países integrantesda UE e da região da América Latina. Nesta reunião ana-lisou-se a situação política e social de ambas as partese de cada um dos países dos deputados aí presentes.Denunciou-se a ofensiva do imperialismo e a necessida-de de, com a luta, lhe resistir e fazer frente, tendo-seacordado uma declaração política comum.João Pimenta Lopes teve ainda a oportunidade de ex-pressar a solidariedade dos deputados do PCP no Parla-mento Europeu para com a FMLN e o povo salvadorenho.

O deputado do PCP no Parlamento Europeu, João Pi-menta Lopes, Vice-presidente da delegação da Assem-bleia Parlamentar Euro-Latino-Americana (EUROLAT),participou na Décima Sessão Plenária Ordinária destaAssembleia em San Salvador, El Salvador, nos dias 18a 21 de Setembro, integrando a delegação do Grupo Con-federal da Esquerda Unitária/Esquerda Verde Nórdica(GUE/NGL).Em San Salvador, para além da Sessão Plenária da As-sembleia, participou em diversas reuniões de trabalho.A delegação do GUE/NGL teve ainda a oportunidadede reunir com Óscar Ortiz, Vice-presidente da Repúbli-ca de El Salvador, e de ter um encontro com a Comis-são Política da Frente Farabundo Martí de LibertaçãoNacional (FMLN), de El Salvador. Nestas reuniões foipossível conhecer as tarefas em que o Governo e o povo

PRESENÇA NA EUROLAT, EM EL SALVADOR

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dos instrumentos financeiros em detrimento dos subsí-dios ao investimento.Neste sentido, a posição dos deputados do PCP no Par-lamento Europeu tem sido muito clara, clamando porum novo modelo de produção assente na pequena emédia agricultura familiar, única forma de garantir umaprodução sustentável seja do ponto de vista social eambiental. Nesta medida, uma nova política agrícoladeve conter instrumentos sólidos de gestão da oferta,assim como meios que garantam uma justa distribui-ção das ajudas e que imponham preços justos à produ-ção e liberte o sector do domínio do agronegócio e dagrande distribuição.

O deputado do PCP no Parlamento Europeu, MiguelViegas, promoveu no passado dia 13 de Outubro umaaudição pública sobre o sector leiteiro na freguesia deBonitos de Amorim, concelho da Póvoa do Varzim, na-quela que é umas das mais importantes bacias leitei-ras do País. Mereceu destaque a revisão em curso daPAC pós-2020 que procura, no essencial, aprofundaruma tendência de completa liberalização das políticasagrícolas encetadas nas revisões anteriores. Uma di-minuição do orçamento da PAC, justificada com o pro-cesso do “Brexit”, que poderá igualmente abrir portasa mais uma tentativa de renacionalizar os custos da PACà custa dos Estados-membros ou ainda à prioridade

AUDIÇÃO SOBRE O SECTOR LEITEIRO

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SEMINÁRIO «PROSTITUIÇÃO: UMA GRAVEFORMA DE VIOLÊNCIA E EXPLORAÇÃO»

mulheres e crianças nas redes de tráfico de seres hu-manos e, também, aprisiona mulheres na prostituição,que alguns apelidam de «consentida», «voluntária», «poropção», quando se trata de igual modo de uma avil-tante exploração.Legalizar a prostituição seria o caminho para favorecere legitimar a perpetuação dos mecanismos de explora-ção e violência que continuam a pesar sobre as mulhe-res das classes trabalhadoras e populares, impedindo-asde concretizarem os seus projectos e aspirações, por-que a igualdade está muito longe de ter plena concre-tização nas suas vidas.O combate à prostituição enquanto grave forma de vio-lência e exploração das mulheres ganhará tanto maisforça quanto mais força tiver a luta organizada das mu-lheres que exigem a liberdade de decidir a sua vida emigualdade no trabalho, na família, na vida social, políticae cultural. Um combate que se inscreve na luta dos tra-balhadores e do povo português pela emancipação social.

Realizou-se no dia 20 de Outubro o Seminário «Pros-tituição, uma grave forma de violência e exploração – asituação na Europa e em Portugal», organizado pelosdeputados do PCP no Parlamento Europeu, em colabo-ração com o Grupo Confederal da Esquerda UnitáriaEuropeia/Esquerda Verde Nórdica. Participaram diver-sas personalidades convidadas, nacionais e estrangei-ras, que produziram um conjunto de intervenções querepresentam um importante contributo para a reflexãosobre a problemática da prostituição, nos seus múlti-plos aspectos, renovando os argumentos para a desmon-tagem dos falsos fundamentos utilizados em Portugalpelos que pretendem a alteração do quadro legal comvista à legalização/regulamentação da prostituição.A gravidade da evolução da prostituição em Portugal,na Europa e no Mundo, exige que se aprofunde, de for-ma continuada, o estudo da realidade da prostituiçãoe se promovam as medidas de combate e prevençãodeste grave flagelo, que escraviza muitos milhões de

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EUCOCO, SOLIDARIEDADE COM A LUTA DO POVO SAHARAUÍ

Contudo, parte do seu território está ocupado ilegal-mente pelo Reino de Marrocos. O acórdão do Tribunalde Justiça da UE, emitido em Dezembro de 2016 e quenão reconhece a validade da aplicação do acordo deassociação entre a UE e o Reino de Marrocos ao níveldos recursos do povo Saharauí, veio reafirmar a razão daluta que vai continuar e que contará sempre com a soli-dariedade activa dos deputados do PCP no ParlamentoEuropeu.

O deputado do PCP no Parlamento Europeu, MiguelViegas, marcou presença na 42 Conferência Eucoco,em Vitry, França, que decorreu de 20 a 22 de Outubro de2017. As conferências Eucoco são encontros de solida-riedade com a luta do povo saharauí pelo seu direito à suaauto-determinação, reconhecido pelas Nações Unidas.A República Árabe Saharauí Democrática, proclamadapela Frente Polisário em 1976, é hoje reconhecida pormais de 80 Estados e tem assento na União Africana.

AUDIÇÃO SOBRE O SECTOR VITIVINÍCOLA EM VISEU

produtores e uma autêntica bomba-relógio que podecolocar em risco parte significativa do sector. Este fimdo regime de direitos de plantio deve ser inserido no qua-dro de uma liberalização da Política Agrícola Comum,que procura acabar com os instrumentos públicos deregulação da produção e promover a liberalização docomércio ao nível mundial, fomentando a concorrên-cia. Só em 2016 Portugal perdeu 9000 hectares devinha. Uma realidade que torna evidente e necessárioromper com estas políticas em prol de um novo modelode desenvolvimento.

Decorreu no dia 3 de Novembro, na União das Coope-rativas das Adegas Cooperativas do Dão, uma audiên-cia promovida pelos deputados do PCP no ParlamentoEuropeu sobre o sector da vinha em Portugal, em queparticipou o deputado Miguel Viegas.O fim do regime de direitos de plantio e a sua transiçãoaté 2030 estiveram no centro do debate. A substitui-ção de direitos de plantio por um regime de autorização,que permite aumentos anuais de um por cento dasáreas de vinha até à sua completa liberalização a par-tir de 2030, representa uma perda patrimonial para os

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MISSÃO DA COMISSÃO DOS DIREITOSDAS MULHERES E DA IGUALDADE DE GÉNERO DO PE A PORTUGAL

traduzem de forma muito clara uma realidade muitopreocupante, evidenciando um aumento das desigual-dades entre mulheres e homens, mas também o au-mento da violência de diversa ordem, com particular in-cidência sobre as mulheres. Transversal às comunica-ções, o sublinhar de uma relação evidente entre o agra-vamento das condições sócio-económicas da popula-ção, o aumento do desemprego, o aumento da precarie-dade, o aumento da pobreza e exclusão social e o aumen-to dos abusos e da violência nas relações laborais, maisuma vez com impacto acrescido sobre as mulheres.Uma violência que não é só física, ou moral. A pobreza,a exploração, a limitação dos direitos, nomeadamenteo direito à maternidade, são outras formas de violênciasobre a mulher (mas também sobre o homem) que urgecontrariar e dar combate com medidas concretas, me-didas que passam pela elevação da condição económi-ca da mulher, pelo aumento de salários, a defesa da con-tratação colectiva como um instrumento de igualdade,o acesso a serviços públicos na saúde, na educação,para além de serviços de apoio às crianças e idosos,como uma rede pública de creches, pré-escolares, cen-tros de dia e lares.

Sob proposta dos deputados do PCP no ParlamentoEuropeu, a Comissão dos Direitos das Mulheres e daIgualdade de Género organizou uma delegação que vi-sitou Portugal nos dias 30 e 31 de Outubro, com o intui-to de aferir a situação das mulheres no nosso país no quediz respeito às questões da igualdade. Outro aspectodefinido como objectivo constava em perceber a situa-ção da violência sobre as mulheres e perceber tambéma situação da prostituição no país.A visita, de dois dias, em que participou o deputado doPCP no Parlamento Europeu, João Pimenta Lopes, Vi-ce-presidente da FEMM, decorreu primeiro no Funchal,onde foi possível reunir com a UMAR-Madeira, a Presen-ça Feminina, o Sindicato dos Trabalhadores na Hotela-ria, Turismo, Alimentação, Serviços e Similares da Re-gião Autónoma da Madeira, e com a Câmara Municipaldo Funchal. O segundo dia decorreu em Lisboa, tendoa delegação reunido com o Sindicato dos Trabalhado-res Têxteis, Lanifícios, Vestuário, Calçado e Curtumesdo Sul e as trabalhadoras da Gramax (ex Triumph), oMDM, O Ninho e a Comissão para a Igualdade entre Mu-lheres e Homens da CGTP.Os relatos e testemunhos que foi possível recolher

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DELEGAÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU AO LÍBANO

tórios da Palestina, e da agressão dos EUA e seus alia-dos, que se desenvolveu abertamente desde 2012 con-tra a República Árabe da Síria e o seu povo.A União Europeia, com responsabilidades claras nos con-flitos que assolam o Médio Oriente, tem um acordo deassociação com o Líbano que implica as habituais «re-formas estruturais», sinónimo, como bem se sabe, depressão sobre o papel central do Estado no desenvol-vimento sócio-económico e garantia dos direitos sociais,abrindo espaço às privatizações, às parcerias público-privadas e à flexibilização das leis laborais.

O deputado do PCP no Parlamento Europeu, MiguelViegas, integrou uma delegação do PE que visitou oLíbano, nos dias 30 de Outubro a 2 de Novembro, paísque enfrenta neste momento uma crise política quedecorre dos frágeis equilíbrios entre cristãos maroni-tas, xiitas e sunitas, uma artificial divisão que tem vin-do a gerar profundas e negativas consequências paraa unidade nacional do povo libanês.Encontram-se refugiados no Líbano milhões de pales-tinianos e sírios em consequência da política colonia-lista de Israel, que há décadas ocupa ilegalmente terri-

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EXPOSIÇÃO «CENTENÁRIO DA REVOLUÇÃO DE OUTUBRO»

cessidade de uma nova sociedade, do socialismo comouma exigência da actualidade e do futuro.Num deplorável acto de censura, instâncias do Parla-

Por iniciativa dos deputados do PCP no Parlamento Eu-ropeu foi inaugurada, no dia 8 de Novembro, uma expo-sição sobre o «Centenário da Revolução de Outubro».Com esta iniciativa os deputados do PCP no Parla-mento Europeu assinalaram o centenário da Revolu-ção de Outubro, a primeira revolução vitoriosa na his-tória da humanidade que apontou a construção deuma nova sociedade livre da exploração e da opressão.Revolução cujo ideal, projecto e realizações tiveramum profundo impacto na conquista de direitos demo-cráticos, políticos, sociais, económicos e culturais, navitória sobre o nazi-fascismo e na defesa da paz mun-dial, na conquista da libertação nacional e na derroca-da dos impérios coloniais – no imenso avanço da eman-cipação social e nacional dos trabalhadores e dos po-vos alcançado no século XX.O impacto e significado histórico e universal da Revo-lução de Outubro, mesmo após o desaparecimento daURSS, sobressai ainda mais no tempo em que vivemos.Um tempo que evidencia a natureza exploradora, opres-sora, agressiva e predadora do sistema capitalista, queé atravessado pelo agravamento da sua crise estrutu-ral. Um tempo que evidencia que o capitalismo é umsistema que está permanentemente em confrontocom os direitos e as aspirações dos trabalhadores e dospovos e que é responsável pelos crescentes proble-mas e perigos que a humanidade enfrenta. A realidadedo mundo de hoje comprova a importância e alcancedos objectivos da Revolução de Outubro e afirma a ne-

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mento Europeu tentaram impedir a realização da ex-posição organizada pelos deputados do PCP no PE so-bre o centenário da Revolução de Outubro. Tentarammas não conseguiram. A atitude do Parlamento Euro-peu – que não se limita a reescrever a História, procu-rando atacar e restringir a liberdade de expressão e o

pluralismo para impedir que qualquer outra visão sejaexpressa – não é inédita.Os deputados do PCP no PE consideram que nenhuminaceitável e injustificável acto de censura apagará oprojecto, as realizações e o ideal da Revolução de Outu-bro e a comemoração do seu centenário.

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GRUPOS DE VISITANTES 2017

No âmbito da sua actividade no Parlamento Europeu os deputados têm a possibilidade de convidar grupos de visi-tantes para aí se deslocarem.Assim, de 16 a 21 de Outubro deslocaram-se a Bruxelas trabalhadores reformados do Porto e jovens do Orfeãode São Pedro da Cova.De 5 a 10 de Novembro foi a vez da visita de formandos do Centro de Formação de Santarém (CENFIM) e trabalha-dores estudantes dos cursos nocturnos (EFA) da Escola Secundária da Amora no Seixal.Além da visita ao Parlamento Europeu, os grupos de visitantes tiveram a possibilidade de usufruir de um diversi-ficado programa cultural, realçando-se o convívio e o bom ambiente gerado entre os participantes.

REVISTA“PORTUGAL E A UE”

DIRECTORJoão Pimenta Lopes

EDIÇÃOGrupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica do Parlamento EuropeuDelegação Portuguesa do PCP

CONTACTOSBruxelas: 43 Rue Wiertz PHS 5 C 67 – 1047 Bruxelas – BélgicaTelefone: 00 32 2 284 31 47Portugal: Deputados do PCP no Parlamento EuropeuRua Soeiro Pereira Gomes, n.º 31600-196 LisboaTelefone: (00 351) 217 813 800e-mail: [email protected]

COLABORADORESAna Regina Vieira, João Brinquete, Luís Capucha Pereira,Paulo Costa, Rita Magalhães, Sofia Silva, Elizabete Santos, Vitor Martins, Filipe Ferreira, José Pereira, Mário Claro e Maria do Rosário Amador

DESIGN E IMPRESSÃORegiset – Comunicação e Artes Gráficas, S.A.Estrada Baixa de PalmelaQuinta Gonçalo José – CCI 46202900-392 Setúbal

TIRAGEM44 000 exemplares