A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais - Eduardo Pimenta (2002)

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A JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA NOS DIREITOS AUTORAIS

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A JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIANOS DIREITOS AUTORAIS

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A JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIANOS DIREITOS AUTORAIS

EDUARDO PIMENTA

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Copyright © 2002 by Eduardo Pimenta

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e-mail: [email protected]

P644jPimenta, Eduardo

A jurisdição voluntária nos direitos autorais /Eduardo Pimenta. � Rio de Janeiro: Freitas Bastos,2002.

144p.; 21cm

ISBN 85-353-0235-2

1. Jurisdição voluntária � Brasil. I. Título.

CDD: 347.81012

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Pax est quaerendaet tetum aequilibrium

O aequilibrium et ab tranquillitateconscientia cum harmonia cor

A paz deve ser procurada e então terá o equilíbrio.O equilíbrio é a tranqüilidade de consciência com

harmonia no coração.

Dedico este trabalho àquelesque se retiram do convívio deseus entes, em contempla-ções, e escrevem suas refle-xões, para benefício de todose em prol da evolução inte-lectual e espiritual.

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Sumário○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

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Nota do Autor .................................................................. ix

Nota Explicativa ............................................................. xi

Apresentação ................................................................ xiii

1 � Introdução ................................................................ 11.1 � O Ordenamento Jurídico Brasileiro ............ 31.2 � Os Princípios Constitucionais de Processo

Civil ............................................................... 61.2.1 � A legitimação "ad causam"......... 10

2 � Jurisdição Voluntária .......................................... 122.1 � Nomenclatura ............................................... 122.2 � Preliminares ................................................. 152.3 � As Partes ....................................................... 222.4 � Natureza Jurídica da Jurisdição

Voluntária .................................................. 232.5 � Entendimento dos Doutrinadores .............. 25

2.5.1 � Piero Calamandrei ...................... 252.5.2 � Francesco Carnelutti .................. 262.5.3 � Giuseppe Chiovenda ................... 272.5.4 � José Frederico Marques ............. 272.5.5 � Moacyr Amaral Santos ............... 282.5.6 � Antônio Carlos Marcato ............. 292.5.7 � Arruda Alvim ............................... 292.5.8 � Lopes da Costa ............................ 30

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos AutoraisVIII○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

2.5.9 � Luiz Fux ....................................... 302.5.10 � Cândido Rangel Dinamarco ..... 302.5.11 � Humberto Theodoro Júnior ..... 312.5.12 � Edson Prata ............................... 31

2.6 � Distinção entre Jurisdição Voluntária eContenciosa ................................................ 38

2.7 � O Litígio Incidental na JurisdiçãoVoluntária .................................................. 49

2.8 � A Intervenção de Terceiros na JurisdiçãoVoluntária .................................................. 50

2.9 � No Código Processual Civil ......................... 512.10 � Procedimentos Cautelares de Jurisdição

Voluntária .................................................. 572.11 � Procedimentos Executórios de Jurisdição

Voluntária .................................................. 59

3 � Direitos Autorais .................................................. 613.1 � Autor e Titular ............................................. 673.2 � Direitos Autorais � Moral ......................... 69

3.2.1 � Direito moral dos artistasintérpretes e executantes, produtoresfonográficos e organismosde radiodifusão...................................... 96

3.3 � Direitos Autorais � Patrimonial ............... 983.3.1 � Internet* ....................................100

4 � A Jurisdição Voluntária na Lei de DireitosAutorais ................................................................1064.1 � A Intervenção de Terceiros na Jurisdição

Voluntária, Segundo a Lei de DireitosAutorais ....................................................120

4.2 � A Jurisdição Voluntária Exercida peloMinistério Público Federal ....................120

5 � Conclusão ..............................................................122

6 � Bibliografia ...........................................................126

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Nota do Autor○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Motivado pela busca da aplicação do princípio daproporcionalidade, causa do equilíbrio no direito, epela eficácia da norma legal na proteção do direitosautorais, enveredamos no estudo de critérios proce-dimentares para tentar visualizar a harmonia dos di-reitos autorais, no direito substantivo e no direitoadjetivo.

E por que nos determos nos direitos autorais?O objeto dos direitos autorais é a criação � a obra

intelectual. Daí, o primeiro interesse que objetivou aprevisão da proteção legal, foi o econômico. O segundo,o respeito às prerrogativas pessoais, do denominadodireito moral do autor. Em terceiro, é a identidadesocial, que advém após a publicidade, que normalmen-te ocorre com a criação folclórica. Aqui perceberá valo-res de etnia, pois pensamos que, na arte, o que interes-sa é o reflexo exterior dos valores sociais predominan-tes, por isso, a arte não pode ser concebida como um fimque valha para si só. Por fim, a quarta, a identificaçãoindividual, que é distinta da identidade artística doautor. A identificação individual que se tem com a obraintelectual, é percebida quando o espectador identificadetalhes de seu mundo interior no mundo exterior.Onde a sensação da alma é assimilada pela mente,proporcionando a emoção � movimento de alma. Eis ovinculo dos sentidos do corpo com a emoção, e da mentecom o equilíbrio humano.

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Ao que HEGEL, em sua contemplação, afirmou:�Todas as paixões, o amor, a alegria, a cólera, o ódio, apiedade, a angústia, o medo, o respeito, a admiração, osentimento da honra, o amor da gloria etc. que podeminvadir a nossa alma por força das representações querecebemos da arte.�(...). Utiliza a arte a grande riquezado seu conteúdo no sentido, por um lado, de completara experiência que possuímos da vida exterior, e poroutro, evocar de um modo geral os sentimentos e pai-xões que há pouco enumeramos, a fim de que as expe-riências da vida não nos apanhem insensíveis e a nossasensibilidade permaneça aberta a tudo quanto ocorrefora de nós�.1

Neste interesse contemplativo, voltado para fa-culdade processual, que única, contida na Lei de Direi-tos Autorais � o procedimento de jurisdição voluntá-ria, é que aqui expomos estas reflexões. Tendo emmente que �antes de pensarmos no valor intrínseco dasnormas, temos que cuidar do próprio sistema, pois sóseu funcionamento adequado garante a segurança in-dispensável à sobrevivência da coletividade�.2

Belo HorizonteAgosto/ 2001

A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autoraisx○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

1. p.33 � O Belo na Arte, Ed. Martins Fontes, São Paulo, 1996.

2. p.45 � Andanças e Caminhadas, Condorcet Rezende, S/ed, Rio, S/data.

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O Código de Processo Civil prevê a jurisdiçãocontenciosa e voluntária, sendo que aquela, doutrina-riamente, é caracterizada por ter partes e contraditó-rio, dentre outros fatos, esta por não ter partes, nãohaver contraditório e consubstanciar mero ato jurisdi-cional de homologação, aprovação e autorização. OCódigo de Processo Civil, no Livro III: Processo Caute-lar (art. 786), capitula os procedimentos cautelaresespecíficos (Cap. III), dentre eles os meros procedi-mentos de jurisdição voluntária (protestos, notifica-ções e interpelações arts. 867 a 873). Sem embargo, alei adjetiva civil fixa para os meros procedimentos dejurisdição voluntária a citação dos interessados, per-mitindo o contraditório. Destarte que, o que é objetivado,é a dedução de se não houver a controvérsia, a jurisdi-ção é voluntária. Em contrário será contenciosa. Taisdiretrizes emergem em consonância aos princípios cons-titucionais da ampla defesa e do contraditório (art. 5º,LV, da CF), inclusive na jurisdição voluntária, o quecaracteriza o evolutivo princípio da coerência do orde-namento jurídico brasileiro. Na Lei de Direitos Auto-rais (9.610/98) está previsto o procedimento de jurisdi-ção voluntária para tutela dos direitos morais (art. 24,VI), outorgando ao autor o direito de retirar de circula-ção ou de suspender o uso de obra intelectual já auto-rizado, desde que dentro do poder cognitivo afronte asua reputação e sua imagem.

Nota Explicativa○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

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Muito embora extremamente honrado pelo convi-te feito, não se pode dizer que apresentar uma obra, oumesmo dedicar algumas palavras ao seu autor, possaser considerado tarefa fácil.

Muito pelo contrário, quando nos deparamos comum trabalho pioneiro no vasto campo autoral e sendoesse trabalho de autoria do jovem jurista e advogadoDr. Eduardo Pimenta, a responsabilidade é ainda maior.

Conhecedor da literatura de autoria do Dr. Eduar-do Pimenta, e inclusive do seu trabalho, profissional �e aqui não nos cabe falar a respeito, mesmo porque deconhecimento público daqueles que amam o direito deautor �, não nos surpreende a qualidade desta análiseprocessual de um dos dispositivos da vigente lei auto-ral, mais especificamente o art. 24, inciso VI, em que olegislador outorgou ao autor o direito de retirar suaobra de circulação ou suspender qualquer forma de suautilização mesmo autorizada, quando elas implicaremem afronta à sua imagem.

E no contexto dessa disposição, o ilustre autorinserindo-a no título referente aos procedimentos espe-ciais de jurisdição voluntária, nos apresenta toda atrama processual decorrente, primeiramente trazendoampla doutrina diferenciando as jurisdições voluntá-ria e contenciosa, e por derradeiro demonstrando asdificuldades eventualmente advindas, quando v.g. o

Apresentação○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

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enfoque de uma situação inserida como de jurisdiçãovoluntária pode, eventualmente, transformar-se emjurisdição contenciosa.

Autoralista renomado, Dr. Eduardo Pimenta umavez mais presta sua contribuição a esse ramo do direitotão bonito e desafiador, que regula em última análisesui generis, personalíssimas, próprias e inerentes aodireito do autor, e que vasculham a alma do seu criadorou mesmo do titular do direito diante de uma criação dointelecto.

Assim, não temos dúvidas que o presente trabalhoalcançará seu objetivo, propiciando a todos aqueles queamam o direito de autor, e dele fazem o seu mister,como juízes, advogados e estudiosos, um manancial deestudo e aplicação do direito diante da situação con-creta.

LUIZ FERNANDO GAMA PELLEGRINI

Juiz do Segundo Tribunal de Alçada Civildo Estado de São Paulo.

A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autoraisxiv○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

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Introdução 1○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

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1 Introdução○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

A análise da jurisdição voluntária nos direitosautorais, que é o objeto central deste estudo, nos indicaa fazer uma análise adjacente do direito correlacionadoao tema. Passaremos a ver, tendo em primeiro plano ajurisdição voluntária, quanto a sua natureza jurídica,suas características, sua distinção da jurisdição con-tenciosa. Por conseguinte, demonstrar a adoção doprocedimento de jurisdição voluntária ante os princí-pios constitucionais de processo civil, e os termos doCódigo de Processo Civil e na Lei de Direitos Autorais� LDA 9.610/98.

Não temos o fito de esgotar o tema, mas de de-monstrar que na defesa dos direitos autorais, ante asprerrogativas fixadas pela lei especial de direitos auto-rais, em harmonia com as disposições procedimentaresenunciadas no Código de Processo Civil, podem serexercidas por mero procedimento de jurisdição volun-tária.

Arruda Alvim cita a observação de Ramiro Podetti:�Todo el derecho procesal gira al rededor de tresinstituciones básicas: la jurisdición, la acción y elproceso�.3

3. p. 41 � Direito Processual Civil, Vol. 1, Arruda Alvim, Ed. RT,São Paulo, 1972. (p. 35 � do cit. inclui o mero procedimento)

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais2○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Para tanto, um melhor deslinde deste trabalho, éelementar colocarmos as definições de jurisdição, açãoe processo.

A jurisdição é a atividade desenvolvida pelo Esta-do, através do Poder Judiciário, visando compor osconflitos de interesses ocorrentes, observado o direitoobjetivo a uma pretensão regularmente deduzida, man-tendo a ordem jurídica mediante a atuação da lei.

A ação, conforme leciona Eduardo Couture, é umato formal que concretiza o exercício do pedido.4

O Processo, conforme definido por Couture,5 sãoos atos de exercício da ação e da defesa, que no sentirprático de Luiz Fux �representava a soma de atosrealizados para a composição do litígio�.6 �O Processo,se forma pelas partes e o juiz�, onde a causa final é asentença. Ressalta-se a reflexão de Luiz Fux: �Anote-se, ainda, em sede desse tema, que, para grande parteda doutrina, o Processo é exclusivo da jurisdição con-tenciosa, comportando a jurisdição voluntária, apenas,a concepção de um �mero procedimento�,7 o que, nodecorrer do trabalho, veremos com maior especificida-de.

Lançamos mão da lição de Arruda Alvim, que,considerando a parte contenciosa e a de jurisdiçãovoluntária, nos define Direito Processual Civil comosendo: �o sistema de princípios e normas que regulamo funcionamento da jurisdição civil, tendo em vista oexercício do direito à ação, que contenha lide civil e o dedefesa, bem como a estruturação infraconstitucional

4. p.17 � Fundamentos do Direito Processual Civil, Ed. Red Livros,Campinas, 1999.

5. p. 17 � ob. cit.

6. p. 29 � Tutela de Segurança e Tutela da Evidência, Ed. Saraiva,São Paulo,1996).

7. p. 29 � ob. cit.

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Introdução 3○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

dos órgãos do Poder Judiciário e seus auxiliares �exceto o que respeita à organização judiciária � e,ainda, a disciplina de todos os casos de jurisdiçãovoluntária�.8

Assim, como afirma Luiz Fux: �O Judiciário, atra-vés da cognição, aplica a lei a um caso concreto, impon-do a sua vontade, exteriorizada no ato final, com coer-ção e autoridade�.9

Por isso, lembramos o ensinamento de FrancescoCarnelutti, em que afirma: �o juiz não é somente o quejulga, como também o que manda�.10

Demonstraremos, neste trabalho com ótica volta-da para a jurisdição voluntária frente à correntelegalista (positivista) e a corrente doutrinária (a quedenominamos de alternativista), como meio alcançar aJustiça, que emerge dos Tribunais (jurisdição), atravésda atividade do interessado (ação) precisamente atra-vés do instrumento especifico � o procedimento.

1.1 � O Ordenamento Jurídico Brasileiro

Na formulação legal, o direito manifesta-se naforma de leis, resultando daí o princípio da legalidade.No sistema legal, o direito deve ser aplicado a um casoconcreto (art. 126 do CPC).

Assim, por termos diversas leis (gerais e especiais),temos os Princípios Gerais de Direito, enunciados naLei de Introdução ao Código Civil, que procura harmo-nizar o sistema jurídico.

8. pp. 4/5 � Manual de direito Processual Civil, Vol. I, Parte Geral,ed. RT, São Paulo, 1979.

9. p. 7 � ob. cit.

10. p.119 � Instituição de Processo Civil, Vol. I, Ed. Servanda.Campinas. 1999.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais4○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Entendemos que os princípios gerais do direitosão os valores de um procedimento para harmonizaçãodo ordenamento jurídico (conjunto de normas), quedisposto como normas, mas com o caráter determinan-te de linhas diretoras para orientar o ordenamentojurídico.

Emana daí o respeito ao princípio da especialida-de das leis, que tem como pressuposto o que NorbertoBobbio chamou de o �dever de coerência�, onde enfati-za: Num ordenamento jurídico não devem existirantinomias11 ou seja, num ordenamento jurídico nãodeve existir a incompatibilidade entre normas.

Partindo desta premissa, prevalecerá sempre odisposto na lei especial, se outra lei posterior nãodispuser em contrário.

Outra não é a lição de Vicente Ráo: �A disposiçãoespecial não revoga a geral, nem a geral revoga aespecial, senão quando a ela, ou ao seu assunto, sereferir, alterando-a explícita ou implicitamente. Emconseqüência, a lei nova que estabeleça disposiçõesgerais ou especiais, a par das já existentes, não revoganem modifica a lei anterior. Não é pelo fato de serespecial que a lei nova revoga a lei antiga de naturezageral; e reciprocamente, não é apenas por ser geral quea disposição superveniente revoga a disposição parti-cular e anterior. Para que a revogação se verifique,preciso é que a disposição nova geral ou especial altereexplicitamente (revogação expressa) ou implicitamen-te (revogação tácita) a disposição antiga, referindo-se aesta, ou ao seu assunto, isto é, dispondo sobre a mesmamatéria. Se as disposições nova e antiga (gerais ouespeciais) não forem incompatíveis, podendo prevale-

11. p. 110 � Teoria do ordenamento jurídico. Norberto Bobbio, 10ªed, Trad. Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos, Ed. UNB,Brasília, 1982.

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Introdução 5○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

cer umas e outras, umas a par de outras, não ocorrerárevogação alguma. Quando, porém, a lei nova regularpor inteiro a mesma matéria contemplada por lei ouleis anteriores, gerais ou particulares, visando substi-tuir um sistema por outro, uma disciplina total poroutra, então todas as leis anteriores sobre a mesmamatéria devem considerar-se revogadas�.12

Neste sentido, a lei especial que dispuser normasdistintas das preexistentes terá prevalência sobre asleis existentes, para os casos especificados na lei espe-cial. É o que se extrai da interpretação do disposto noart. 2º, § 2º, da LICC.

Maria Helena Diniz ensina: �Uma norma é espe-cial se possuir em sua definição legal todos os elemen-tos típicos da norma geral e mais alguns de naturezaobjetiva ou subjetiva, denominados especializantes�.13

A par dos Princípios Gerais de Direito, que visamà harmonização do ordenamento jurídico, temos aindaos Princípios Constitucionais, ao que Bobbio denominaPrincípios Gerais, que consistem em análises descriti-vas da Ciência Jurídica, do conteúdo, que ocorrem deforma sintética, sobre preceitos e suas tendências,sendo eles informadores dos valores (bons costumes,ordem pública, boa-fé objetiva, qualidade de vida).

Norberto Bobbio entende que os princípios geraisnada mais são do que normas mais gerais, onde usa-sena nomenclatura a palavra princípios levando o opera-dor do direito a engano. E sustenta, sob o argumento deque: �se são normas aquelas das quais os princípiosgerais são extraídos, através de um procedimento degeneralização sucessiva, não se vê por que não devam

12. pp. 342/343 � O Direito e a Vida dos Direitos, 10ª ed., Ed. RT, SãoPaulo, 1999.

13. p. 74 � Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretado,Ed. Saraiva, São Paulo, 1997.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais6○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

ser normas também eles�, e em segundo porque �afunção para a qual são extraídos e empregados é amesma cumprida por todas as normas, isto é, a funçãode regular um caso. E com que finalidade são extraídosem caso de lacuna? Para regular um comportamentonão regulamentado: mas então servem ao mesmo esco-po a que servem as normas expressas. E por que nãodeveriam ser normas?�14

Dentro destes princípios preconizados pela Cons-tituição, está a equivalência principiológica dos atosinternacionais assegurada pelo art. 5º, § 2º. Que infor-ma: �Os direitos e garantias expressos nesta Consti-tuição não excluem outros decorrentes do regime e dosprincípios por ela adotados, ou dos tratados interna-cionais em que a República Federativa do Brasil sejaparte�.

1.2 � Os Princípios Constitucionais deProcesso Civil

Os princípios processuais fixados pela Constitui-ção são aqueles que, conservadores dos valores prima-zes do procedimento, consistem nos princípios de gene-ralidade. A par destes, estão os de especificidade, quedeterminam os valores processuais de natureza infra-constitucional. Princípios estes adotados pelo cidadãopara reivindicar a prestação jurisdicional, quandoconstatada a violação de seu direito.

Em seu trabalho intitulado Princípios do Civil naConstituição Federal, o jurista Nélson Nery Júnioraponta, como princípio fundamental do processo civil,o insculpido no art. 5º, LIV, da CF: �ninguém será

14. pp. 158/159 � ob.cit.

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Introdução 7○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

privado da liberdade ou de seus bens sem o devidoprocesso legal�.15

Beatriz Catarina Dias declina como princípiosconstitucionais do processo civil: o da legalidade (art.5º, II, da CF), o da inafastabilidade da jurisdição (art.5º, XXXV, da CF), o devido processo legal e a ampladefesa (art. 5º, LIV, da CF), o contraditório e ampladefesa (art. 5º, LV da CF), o da igualdade processual ouisonomia (art. 5º, caput, da CF), e o Princípio da publi-cidade dos atos processuais (art. 5º, LX, e art. 93, IX,ambos da CF). Quanto aos de natureza processualinfraconstitucional: Princípio de Demanda e Dispositi-vo, Princípio da Verossimilhança, Princípio da Lealda-de Processual, Princípio do Livre Convencimento doJuiz.16

Agregamos um princípio que entendemos ser degeneralidade para o processo � o princípio da gratui-dade da justiça (art. 5º , LXXIV, da CF).

O ordenamento jurídico é uma conseqüência danecessidade de equilibrar a sociedade, coibindo a pre-dominância dos fortes sobre os fracos, em âmbito geral(sociopolítico-econômico-humano).

Desta forma, qualquer um que se sentir lesado noseu direito poderá requerer ao Judiciário a apreciaçãodo fato � surge então a necessidade de prova do direitoà ação (a comprovação de que o requerente é o lesado)� , com o fim de obter um ressarcimento ou a efetivaçãoda pretensão punitiva, que numa ótica sociológica con-siste na forma coercitiva e exemplificativa para todosos membros da sociedade, almejando a harmonia hu-mana e social. O pleito, por seu curso, deverá ser

15. p. 30 � ob. cit., Ed. RT, 5ª ed., São Paulo, 1990.

16. pp. 12-24 � A Jurisdição na Tutela Antecipada, Ed. Saraiva, SãoPaulo, 1999.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais8○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

formalizado pelo devido processo legal (art. 5º, LIV, eart. 5º, II da CF), para reivindicar a prestação jurisdi-cional, em que haja igualdade (art. 5º, caput, da CF) eisonomia, através da garantia da ampla defesa e docontraditório.

O processo legal é presidido pelo juiz natural (art.5º, XXXVII e LIII, da CF) que exerce a jurisdição noterritório, evitando o exercício arbitrário pelo Estado,em criar tribunais para julgar determinado fato, disse-minando a noção da predominância do Estado �forte�sobre a população fraca. Razão pela qual é fixada, aobrigatoriedade do julgamento pela autoridade compe-tente.

Com a publicidade dos atos processuais, tem-se anotoriedade e sua idoneidade, demonstrando sê-lo isentode interferências. Além do que, traz como fundamentosocial a confiabilidade e a crença de que a justiça puneo atos violadores do direito alheio.

O teor do valor basilar contido no art. 93, IX, daCF, que refere a publicidade dos atos processuais, émais abrangente do que o teor do art. 5º, IX. Contudo,o art. 60, § 4º, IV, da CF nos leva à conclusão de que osdireitos e garantias individuais são intocáveis, logopressupõe sê-los princípios primazes. Porém, há outrosvalores, principiológicos, além daqueles valoresbasilares contidos no art. 5º, como por exemplo o enun-ciado no art. 93, IX, da CF.

A meu ver, deve ser visto como princípio de gene-ralidade o valor basilar que fixa a gratuidade da justi-ça, para vigir em uma sociedade desigual economica-mente. Objetando a prerrogativa de todos os membrosda sociedade em recorrer à prestação jurisdicional.Portanto, está previsto na Constituição (art. 5º, LXXIV),como pressuposto da isonomia de que o estado de direi-to almeja ter, e não prever só em lei infraconstitucio-nal.

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Introdução 9○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Estes princípios, ora expostos, genericamente sãonormas pétreas, que perfeitamente gerenciam os prin-cípios processuais civis infraconstitucionais.

Sérgio Bermudes, por seu turno, aponta � �latosensu� � que �as regras de direito fundamentais aoexercício da jurisdição encontram-se na ConstituiçãoFederal, que estrutura o Poder Judiciário, enumeran-do órgãos, definindo composição e atuação de algunsdeles, assim como estabelece os principais direitos edeveres do seus integrantes (arts. 92 a 126 da CF) (...)As normas de exercício da jurisdição estão na Consti-tuição� ou disciplinadas no Código Civil.17

Por fim, destacamos os princípios norteadores dajurisdição � �stricto sensu�, e �lato sensu� � queveremos à frente:

Por Luiz Orione Neto: Princípio do Juiz Natural,Principio da Indeclinabilidade (Juiz não pode deixar dejulgar), Princípio da Territorialidade da Jurisdição,Princípio da Publicidade dos atos.18

Por Rui Portanova: Enfatiza que o princípio degeneralidade de jurisdição é o Princípio do Juiz Natu-ral, tendo como princípios informativos: Princípio Inér-cia da Jurisdição, Princípio da Independência, Princí-pio da Imparcialidade, Princípio da Inafastabilidade,Princípio da Gratuidade Judiciária, Princípio da In-vestidura, Princípio de Aderência ao Território, Princí-pio de Indelegabilidade, Princípio de Indeclinabilidade,Princípio da Inevitabilidade, Princípio de Independên-cia da Jurisdição Civil da Criminal, Princípio da Perpe-tuação da Jurisdição e Princípio da Recursividade.19

17. pp. 25/26, Introdução ao Processo Civil, 2ª ed., Ed. Forense, Rio,1996.

18. pp. 8/9 � Tratado das Medidas Cautelares, vol. III, tomo I, Ed.Lejus, São Paulo, 2000.

19. p. 62 a 106 � Princípios do Processo Civil, Ed. Livraria doAdvogado, 3ª ed., Porto Alegre, 1999.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais10○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Por Marcos Afonso Borges: Princípio da investi-dura, Princípio da indeclinabilidade, Princípio daIndelegabilidade e Princípio da Aderência Territorial.20

1.2.1 � A legitimação �ad causam�

O Código de Processo Civil, em seu art. 6º, enun-cia: �Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direi-to alheio, salvo quando autorizado por lei�.

Fica enfatizada a personalização de defesa dopróprio direito, porém a lei permite exceções. São oscasos denominados de substituição processual, em quese postula em nome próprio, ou seja, defende em nomepróprio direito ou interesse alheio (ex: arts. 99, § 2º, e24, § 2º, da Lei de Direitos Autorais � 9.610/98).

A este respeito leciona Amaral Santos: �Dá-se afigura da substituição processual quando alguém estálegitimado para agir em juízo, em nome próprio, comoautor ou réu, na defesa de direito alheio. Quem litiga,como autor ou réu, é o substituto processual; fá-lo emnome próprio, na defesa de direito de outrem, que é osubstituído�.21

O que difere da representação, na qual se postulaem nome alheio o direito ou interesse alheio.

Quanto às exceções, quer em substituição proces-sual, quer em representação, referente a direitos auto-rais estão previstas na lei especial de regência damatéria (9.610/98), na lei que regula a ação popular(4.717/65), e no Código Civil (arts. 454 e 251).

Destacamos a figura da sucessão, como outorgada substituição processual, disposta no art. 24, § 1º, da

20. pp. 69/70 � Princípios de Direito Processual: Civil e Agrário, Ed.AB, 2ª ed., Goiânia, 1999.

21. RTFR 121/18 � nota 3 do art. 6º do CPC, Teotônio Negrão.

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Introdução 11○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Lei 9.610/98, em que os herdeiros sucedem os direitosmorais do autor.

No magistério de Frederico Marques tem-se que:�Aquele que sucede a outrem na demanda passa a atuarem nome próprio por um interesse que lhe é próprio,enquanto que o substituto processual está em juízo emnome próprio para defender direito de outrem. (...) Nasucessão, como bem esclarece Liebmam, �o sucessorcomparece como sujeito da relação jurídica de que setornou titular�, ao revés do que se dá na substituiçãoprocessual em que o substituto sempre atua na defesade direito de outrem, embora em nome próprio�.22

Neste sentir, o herdeiro que atua na defesa dedireitos morais do autor, dos direitos herdados, atuaem nome próprio, caso em que não se enquadra naexceção, mas na regra.

22. p. 211 � Instituições de Direito Processual Civil, vol. 2, Ed.Millennium, Campinas, 2000.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais12○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

12

2 Jurisdição Voluntária○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

2.1 � Nomenclatura

Giuseppe Chiovenda enfatiza que a nomenclaturajurisdição voluntária vem do nome romano �iurisdictiovoluntaria�, para indicar os atos realizados pelos ór-gãos judiciais, em face de um único interessado.23

João Bonumá cita Chiovenda, que afirma: �o nomede jurisdição voluntária proveio do complexo dos atosque, no processo medieval italiano, os órgãos juris-dicionais praticavam em face de um só interessado, ouem razão do acordo de interessados diversos � �inter-volentes�. E o nome designava também os atos que,mediante processos simulados, se praticavam peranteos �judices chartularii� para a constituição de instru-mentos autênticos ou garantidos, competência que dos�judices chartularii� passou aos juízos ordinários e,depois, aos notários. Daí o encontrar-se entre os velhospraxistas, como Cujaccio, Heinécio e Donelo, a afirma-ção de que a jurisdição voluntária �inter volentes etsine causae cognitione exercetur�, ao passo que jurisdi-ção contenciosa �inter invitos et litigantes cum causaecognitione explicatur�.24

23. p. 23 � Instituições de Direito Processual Civil, Vol. 2, Ed.Bookseller, Campinas,1998.

24. p. 73 � Jurisdição Voluntária, Edson Prata, Ed. Leud, São Paulo,1979.

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Jurisdição Voluntária 13○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Francisco Carnelutti, em Instituições do ProcessoCivil, afirma: o nome de jurisdição voluntária provémde o juiz não decidir entre dois litigantes e, portanto,contra um deles (�contra noletem�), e sim em relação aum só, que lhe pede que proveja (�adversus volentem�);neste sentido, a denominação, se não é muito expressi-va, também não é incorreta, e, embora somente sejapela dificuldade de encontrar outra melhor, merece serconservada�.25

Ressalta Alfredo de Araújo Lopes da Costa, que �otermo �jurisdição voluntária� não está ali empregadoem seu sentido próprio e estrito, mas no significadogeral de �administração da justiça�. Depois porqueaquela voluntariedade não se pode referir nem ao juiznem à parte. Ao juiz, porque sua atividade não é livre,mas salvo os casos de atuação �ex officio�, uma vezprovocado, é obrigado a agir. À parte, porque tambémna jurisdição contenciosa, excetuadas as �provocationesad agendum�, é voluntário o ingresso do autor emjuízo�.26

Comenta Moacyr Amaral Santos, em PrimeirasLinhas de Direito Processual Civil, que a jurisdiçãovoluntária é também denominada graciosa ou admi-nistrativa.27

Lopes da Costa também não concorda com o uso dotermo Jurisdição Graciosa, termo também apontadopor Pontes de Miranda. E justifica aquele Jurista: �Aprestação da atividade do Juiz na jurisdição voluntárianão é uma liberalidade, uma graça, uma mercê. É atode ofício�.28 Noticia, ainda, a nomenclatura de �jurisdi-

25. p. 100 � ob. cit.

26. p. 21 � A Administração Pública e a Ordem Jurídica Privada(Jurisdição Voluntária), Ed. Bernardo Álvares, Belo Horizonte,1961.

27. p. 76 � ob. cit., Vol. I, 20ª ed., Ed. Saraiva, São Paulo, 1998.

28. p. 23 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais14○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

ção honorária, para designar os atos em que o juizintervém apenas �ad solemnitatem�, para atestação,como abertura de testamento cerrado�.

Antônio Carlos Marcato, contemplando acerca dadenominação da jurisdição voluntária, afirma: �A juris-dição graciosa não tem, segundo preconiza a doutrinatradicional � e cuja orientação vem refletida nos dis-positivos do Código que tratam do assunto �, qualquercaracterística jurisdicional, recebendo tal denominaçãotão-somente em virtude da inexistência de outra de-signação mais adequada�.29

Destaca Chiovenda: �Ainda hoje verificamos quegrande parte de atos de jurisdição voluntária são con-fiados aos juízes. É o que não obsta a que tais atos desimples administração; tratando-se, porém, de atosque exigem especial disposição e especiais garantias deautoridade nos órgãos a que competem, é natural que oEstado utilize, para corresponder a essas exigências, amesma hierarquia judiciária comum�.30

Razão pela qual, outrora, ainda usava-se a nomen-clatura, jurisdição administrativa, por força do dispos-to no Código de Processo Civil de Minas Gerais � aépoca dos Códigos Estaduais. Termo com que Lopes daCosta também não concordava, ao argumento de quepossibilitava a confusão com a �jurisdição administra-tiva, no sentido próprio, estrito, do termo jurisdição:contencioso administrativo, que tivemos nos tempos doImpério e que a República aboliu�.31

O termo jurisdição voluntária (�JurisdictionVolontaire�, �Giurisdizione Volontaire�, �JurisdicciónVoluntaria�, �Freiwillige Gerischtsbarkeit�) é o quetem prevalecido pelos tempos.

29. p. 20 � Procedimentos Especiais, 8ª ed., Ed. Malheiros, SãoPaulo, 1999.

30. p. 23 � ob. cit.

31. p. 24 � ob. cit.

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Jurisdição Voluntária 15○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

2.2 � Preliminares

A lei, ao fixar os direitos substantivos (materiaise objetivos), que são específicos, faculta ao autor agirante a sua vontade em termos enunciados pela lei, paraa reivindicação de tutela jurídica de seu direito. Rei-vindicação que é requerida ao Estado, que diz qual é odireito do requerente, ante o pedido, sendo esta funçãoo exercício da jurisdição (dicção do direito, isto é,�jurisdictio� � jurisdição). Normalmente, a reivindica-ção da tutela ocorre por via de processo, que tem seusprocedimentos específicos. Normalmente, porque exce-tua, os casos de jurisdição voluntária que ocorre porprocedimento.

Para tanto, cumpre distinguir Processo e Procedi-mento.

À luz dos ensinamentos de Celso Agrícola Barbi,�os casos de jurisdição voluntária não ensejam a utili-zação do processo, que é especifico da jurisdição con-tenciosa, mas de simples procedimento, ou expedien-te�.32

No mesmo sentido, posiciona-se Luiz Fux, sinteti-zando a distinção de processo e procedimento: �o pro-cesso representava a soma de atos realizados para acomposição do litígio e o procedimento a ordem desucessão desses mesmos atos�. Contudo ressalta o ju-rista: �Anote-se, ainda, em sede desse tema, que, paragrande parte da doutrina, o processo é exclusivo dajurisdição contenciosa, comportando a jurisdição vo-luntária, apenas, a concepção de um �mero procedi-mento�.33 Ao que justificamos, a adoção da concepção demero procedimento, por não haver duas partes (autor e

32. p. 13 � Comentários ao Código Processo Civil, vol. I, 10ª ed., Ed.Forense, Rio, 1999.

33. p. 29 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais16○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

réu), e por conseqüência, não existir processo, muitomenos sem controvérsia, debates, que no caso da juris-dição voluntária é característico.

Francesco Carnelutti ressalta que �a palavra pro-cesso serve, pois, para indicar um método para a forma-ção ou para aplicação do direito�.34 Concluindo que oprocesso serve ao direito. Ao argumento de que o pró-prio processo é regulado pelo direito.

Em suma, o conjunto de atos são os procedimentosque formam o todo � o processo. Objetivamente, oprocedimento é o meio, e o processo é o fim.

A jurisdição é função do Estado (função jurisdicio-nal), que culmina no julgamento, consiste no poder deaplicar o direito objetivo (a lei), como função especifica,em relação a uma pretensão, para compor os conflitosde interesse ocorrentes.

O Código de Processo Civil, em seu art. 1º, dispõe:�A jurisdição civil, contenciosa e voluntária é exercidapelos juízes, em todo o território nacional, conforme asdisposições que este Código estabelece�. Sendo que acontenciosa caracteriza-se pela lide � conflito de inte-resses ante uma pretensão, por conseqüência ter-se-áduas partes: autor e réu. Já a voluntária tem por fimassegurar a ordem jurídica, caracteriza pela unilate-ralidade, por conseqüência trata de interesses unilate-rais, onde não há partes, mas interessados, que consis-te na administração pública de interesses privados.

Quem primeiro definiu a jurisdição foi GiuseppeChiovenda: �A jurisdição pode ser definida como afunção do Estado que tem por fim a atuação da vontadeconcreta da lei mediante a substituição, pela atividadedos órgãos públicos, da atividade dos particulares oude outros órgãos públicos, seja ao afirmar a existência

34. p. 72 � ob. cit.

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Jurisdição Voluntária 17○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

da vontade da lei, seja ao fazê-la, praticamente, efeti-va� 35

Ramiro Podetti define a jurisdição como �o poderpúblico, que um ramo do governo exercita, de ofício oua pedido de interessado, instruindo um processo, paraesclarecer a verdade dos fatos que afetem a ordempública, atuando a lei na sentença e fazendo que estaseja cumprida�. Os quais estão assentados em quatroelementos que a compõem:

� Natureza do órgão e da função jurisdicional,� Fins da função jurisdicional,� Impulso necessário para o exercício da função

jurisdicional,� Forma que assume o exercício dessa função

jurisdicional.36

Amílcar de Castro é taxativo no entendimento deque a jurisdição é uma e una, não variando de natureza.E argumenta: �Todas as vezes que a autoridade juris-dicional possa e deva fazer o que está proibido aosjurisdicionados, encontra-se a mesma jurisdição, nadaimportando que o assunto seja penal, ou civil; nãotenha havido defesa; seja esta, ou aquela, a forma doprocesso; com ou sem lide; seja ou não a sentençadotada do efeito de coisa julgada substancial; ou devao próprio requerente, que não foi vencido, pagar ascustas. Numa palavra: a jurisdição, como poder dejulgar, é função unitária. Tem sempre a mesma forma;a mesma natureza; e precisamente por isso, a não sercomo expressão figurada, é indivisível pela essência dodividendo�.37

35. p. 65 � ob. cit.

36. p. 64 � ob. cit.

37. pp. 85/86 � Enciclopédia Saraiva do Direito, Coord. R. LimongiFrança, vol. 47, Ed. Saraiva, São Paulo, 1977).

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais18○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Edson Prata enfatiza: �a jurisdição é o elementoprimeiro e principal do direito processual�.38

Moacyr Amaral Santos comenta: �por motivos deordem prática, resultantes do princípio da divisão dotrabalho, costuma-se distinguir as atividades jurisdi-cionais segundo vários critérios.(...).

a) Quanto à matéria a que se refere, a jurisdiçãose distingue em dois ramos: jurisdição penal ejurisdição civil. (...)

b) Quanto à graduação dos órgãos jurisdicionais,isto é, quanto à categoria desses órgãos, a juris-dição pode ser inferior ou superior.(...)

c) Há quem distinga a jurisdição, quanto à prove-niência, ou origem, em legal e convencional:aquela seria a exercida pelos juízes e tribunais,esta pelos árbitros.(...)

d) Costuma-se, enfim, distinguir a jurisdição quan-to ao objeto em jurisdição contenciosa e volun-tária, esta também chamada graciosa ou admi-nistrativa (Cód. Proc. Civil, art. 1º). Trata-sede espécies da jurisdição civil�.39

João Bonumá, que acrescenta à divisão das espé-cies de jurisdição o item: �Quanto à extensão: plena oulimitada, ordinária ou extraordinária�.40

Tem-se como princípios da Jurisdição: inevitabi-lidade, indeclinabilidade (inafastabilidade), investi-dura, indelegabilidade, inércia, aderência e unicidade.A inevitabilidade é a obrigatoriedade das partes emaceitarem os resultados do processo. A indeclinabilidadeconsiste na apreciação pelo Juízo de uma pretensão

38. p. 64 � Ed. Leud, São Paulo, 1979.

39. pp. 75/76 � ob. cit.

40. p. 73 � ob. cit.

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Jurisdição Voluntária 19○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

fundada no direito e solucioná-la. A investidura corres-ponde à idéia de que a jurisdição só será exercida porquem tenha sido regularmente investido na autoridadede juiz. A indelegabilidade impede ao juiz delegarfunções a outro órgão. A inércia é o princípio ao qualdita a necessidade de provocação das partes para havera jurisdição, não podendo ser exercida de oficio. Aaderência consiste na limitação da territorialidade daautoridade do juiz. E por fim, a unicidade, o poderjurisdicional do Estado é um poder uno e indivisível,admitindo as divisões administrativas apenas para afuncionalidade da justiça.

Sérgio Bermudes, em reflexão, comenta: �A juris-dição só o Estado pode exercê-la. Trata-se de um atri-buto da sua soberania (...) A jurisdição contenciosa(como indicam o substantivo contenda e o verbocontender) visa à composição da lide, pois exerce paraevitar ou solucionar os conflitos sociais. A jurisdiçãovoluntária se destina, como dito e repetido, à adminis-tração de interesses sociais relevantes, integrada, porrazões de ordem publica, no âmbito da atividade juris-dicional, como poderia ser daí desviada�.41

José Frederico Marques afirma sobre a jurisdiçãovoluntária: "os atos de jurisdição voluntária são atosde direito público, praticados a pedido dos interessa-dos, que o Poder Judiciário realiza para reconhecer,verificar, autorizar, aprovar, constituir ou modificarsituações jurídicas�.42

A finalidade da jurisdição é o esclarecimento daverdade dos fatos que afetam a ordem jurídica.

Enfatiza Sérgio Bermudes que a jurisdição atuacom dupla finalidade: a de prevenir a ocorrência de

41. pp. 19/21 � ob. cit.

42. p. 88 � Manual de Direito Processual Civil, vol. I, 13ª ed., Ed.Saraiva, São Paulo, 1986.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais20○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

lides e a de compor as lides ocorrentes. Na primeirahipótese, através da jurisdição voluntária; na segunda,pela jurisdição contenciosa.43

A finalidade da jurisdição voluntária, segundoEdson Prata, �assenta-se na necessidade de resguar-dar a constituição e a modificação válida de determina-das relações jurídicas, evitando-se futuros litígios en-tre os interessados. Não se pede ao juiz o julgamento deuma lide, com a necessária composição, condenando-seuma parte e determinado a observância do direito daoutra. Pede-se o amparo do magistrado para constitui-ção ou modificação, simplesmente, de uma relação jurí-dica, que, do contrário, poderia formar-se de maneiraviciosa. Assim, a jurisdição voluntária não somenteatende à formação de estados jurídicos novos comocolabora para a existência ou desenvolvimento de esta-dos jurídicos já existentes. A jurisdição contenciosa, aocontrário, visa à atuação de relações existentes�.44

Na jurisdição voluntária, há interessados � apessoa que tem legitimidade para requerer a providên-cia judicial � nela não se pede o julgamento de umalide ou situação litigiosa, o que se requer é a interven-ção do juiz nos casos previstos no Código, e em outrasleis especiais, a fim de obter-se a produção do efeitojurídico buscado.

Humberto Theodoro Júnior cita Alcalá-Zamora,para quem: �na jurisdição voluntária não há litígio,mas negócio jurídico; não há partes, mas simples par-ticipantes; nem há ação, mas apenas pedido�.45

Pontes de Miranda, em Tratado das Ações, ensi-na: �Seja como for, a distinção entre jurisdição volun-

43. p. 67 � ob. cit.

44. pp. 67/68 � ob. cit.

45. p. 74 � Humberto Theodoro Júnior, A Insolvência Civil, 4ª ed.,Ed. Forense, Rio, 1998.

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Jurisdição Voluntária 21○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

tária e jurisdição contenciosa não pode ser feita dentroda lei de processo, porque os dois conceitos não são dedireito processual; são pré-processuais; são mesmo �da-dos�, e não �construídos�; estão antes das leis de orga-nização judiciária e das leis de processo. Daí a dificul-dade de serem tratados como conceitos de direito pro-cessual�. E o Mestre completa o ensinamento: �O me-lhor método prático para se descobrir se a ação ou asentença é de jurisdição contenciosa ou voluntária é ode se começar por indagar se não pode ser voluntá-ria�.46

Por seu turno, Edson Prata ensina: �Em jurisdi-ção voluntária os direitos são sempre indisponíveis�.47

Concluímos, portanto, que os direitos substanti-vos indisponíveis podem estar submetidos a mero pro-cedimento � a jurisdição voluntária.

Cita ainda o mestre Edson Prata, em trabalhoúnico na literatura jurídica brasileira e especifico so-bre a jurisdição voluntária, as características funda-mentais da jurisdição voluntária: a constituição deatos jurídicos novos e desenvolvimento de atos jurídi-cos existentes.48

Sem a perda das características da jurisdiçãovoluntária, citamos o indicativo De Plácido e Silva,quanto à natureza, �o processo de jurisdição graciosapermite a intervenção de outrem, transformar-se-á emcontenciosa, para que se possa formar o juízo, que é desua essência. Não é da praxe permitir-se semelhantetransformação. E quando no processo de jurisdiçãograciosa se queira discutir matéria que lhe é imprópriaou impertinente, manda-se que os contendores formem

46. pp. 312/313 � ob. cit.

47. p. 218 � ob. cit.

48. p. 87 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais22○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

o juízo próprio, por ação que seja legalmente indica-da�.49

2.3 � As Partes

Enfatiza, José Frederico Marques: �o contraditó-rio entre as partes é traço exterior da jurisdição con-tenciosa. No procedimento de jurisdição voluntária, oque pode surgir é uma controvérsia ou dissenso deopiniões, que não se confunde, como esclareceCarnelutti, como situação contenciosa ou lide. Inexis-tindo lide, a jurisdição voluntária é, por isso mesmo,um procedimento que se desenvolve sem partes.50 Ano-te-se a decisão:

Acórdão CC 17970/SC; CONFLITO DE COMPETÊN-CIA (1996/0048027-3) / Fonte DJ, DATA: 22.3.1999 /P: 00035Relator(a) Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR (1110)Data da Decisão 9.12.1998 / Órgão Julgador S 1 �PRIMEIRA SEÇÃOEmenta : PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATI-VO DE COMPETÊNCIA. ALVARÁ JUDICIAL PARALEVANTAMENTO DO FGTS E PIS POR MOTIVO DEFALECIMENTO DO TITULAR DA CONTA. PROCES-SO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. CEF. AUSÊN-CIA DE INTERESSE PROCESSUAL. COMPETÊN-CIA À JUSTIÇA ESTADUAL. SÚMULA Nº 161 � STJ.

I. Para que se configure o interesse da CaixaEconômica Federal em relação a pedido de levantamen-to de FGTS e PIS por motivo de falecimento do titularda conta, faz-se necessária a configuração de litígio em

49. p. 31 � Vocábulo Jurídico, vol III, 11ª ed, Ed. Forense, Rio, 1991.

50. p. 83 � ob. cit.

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Jurisdição Voluntária 23○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

que a empresa pública participe na qualidade de auto-ra, ré, assistente ou opoente, condição inexistente nocaso dos autos, de mero processo de jurisdição voluntá-ria.

II. Súmula nº 161 do Superior Tribunal de Justi-ça.

III. Conflito conhecido, para declarar competenteo Juízo de Direito do Juizado Especial da Comarca deLages, Estado de Santa Catarina. Decisão: Por unani-midade, conhecer do conflito e declarar competente oJuízo de Direito do Juizado Especial de Lages � SC,suscitado.

Assim a previsão legal de citação contida no art.1.105 do CPC, obriga a citação do Ministério Público,facultando aos demais interessados, e no art. 1.108 doCPC, a oitiva da Fazenda Pública é apenas para infor-mar o juiz, instruí-lo, auxiliando-o no cumprimento dodever, e não para contestar o direito do requerente.

Existe procedimento na jurisdição voluntária quecomeça de ofício, ou seja, por impulso espontâneo dojuiz (ex.: nomeação de tutor). Daí, o dizer de Lopes daCosta que: �o conceito de parte não é formal, masmaterial. Não assenta no direito processual, mas nodireito substantivo�.51 Na jurisdição voluntária o autorcorresponde ao requerente, solicitante, interessado.Distinto da denominação que a parte tem na jurisdiçãocontenciosa.

2.4 � Natureza Jurídica da JurisdiçãoVoluntária

O centro da questão, quanto à natureza jurídicada Jurisdição Voluntária, é o de enquadrá-la na ativi-

51. p. 30 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais24○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

dade administrativa ou jurisdicional. Para tanto, énecessário basear-se no objeto, na forma e sua eficácia.

Entende Edson Prata �que os atos de jurisdiçãovoluntária não se enquadram nos atos de administra-ção, de forma alguma; e que às vezes não se enquadramperfeitamente no que entendemos por atos de jurisdi-ção. Por não se enquadrarem perfeitamente nestes,entretanto, não devemos repudiá-los pronta e ilogica-mente�.52

Entendimento que se funda na seguinte reflexão:�Importa à ordem social não só reprimir a desobediên-cia, mas, também, preveni-la. Compreende-se igual-mente que a prevenção ajuda todas as práticas, que sepoderiam denominar de higiene social. Entre outrascoisas, e em primeiro lugar, quando se trata de obede-cer às leis do direito, a cultura jurídica dos súditos oua disponibilidade de consultores expertos e sábios, quepodem guiá-los na condução dos negócios. Tudo isto,entretanto, não basta, em vista da falibilidade do juízo:quem pode negar que, com toda boa-vontade destemundo, ainda o mais autorizado dos consultores jurídi-cos dê um conselho equivocado? O perigo não é somenteo da desobediência consciente. Também a desobediên-cia inconsciente, e, portanto, involuntária, é um ele-mento de desordem, contra o qual as exigências deordem impõem reação�.53

Cândido Rangel Dinamarco cita Fazzalari, que�propõe a descoberta da natureza da jurisdição volun-tária, a partir da determinação das características dajurisdição (violação de direito, juiz estranho ao litígio,princípios da demanda e do contraditório, inércia,irrevocabilidade, as quais �devem ser consideradas em

52. p. 58 � ob. cit.

53. p. 57 � ob. cit.

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Jurisdição Voluntária 25○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

conjunto, no sentido de que todas e cada uma sãoindispensáveis para constância da categoria� (cfr. Lagiurisdizione volontaria, pp. 159-161). E conclui: �ajurisdição voluntária não é jurisdição, nem adminis-tração � , mas uma categoria unitária e autônoma�.54

Em nosso sentir a natureza jurídica da jurisdiçãovoluntária não é administrativa, mas sim uma ativida-de jurisdicional, em razão do juiz declarar a �vontadeda lei�, a qual lhe faculta a investigação pessoal dosfatos (art. 1.107 do CPC), permitindo-lhe, por conse-qüência, o exercício do poder de discricionariedade,característico de todo ato decisório, proporcionando ajustiça.

2.5 � Entendimento dos Doutrinadores

2.5.1 � Piero Calamandrei

Enfatiza o Jurista: �A jurisdição voluntária en-tra, por conseguinte, na atividade social, não na ativi-dade jurídica do Estado.55

E afirma: �que só a jurisdição chamada contencio-sa é jurisdição, enquanto que a jurisdição chamadavoluntária não é jurisdição, senão que é administraçãoexercida por órgãos judiciais. Por seu conteúdo, a juris-dição voluntária entra no ramo vasto da função admi-nistrativa que costuma ser chamado de administraçãopública do direito privado e que compreende � A juris-dição voluntária como administração pública do direito

54. p. 122 � Instrumentalidade do Processo, 8ª ed., São Paulo, Ed.Malheiros, 2000.

55. p. 158 � Direito Processual Civil, Vol. I, Ed. Bookseller, Campi-nas, 1999.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais26○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

privado � todas aquelas atividades com as quais, emformas múltiplas e através de órgãos variados, o Esta-do intervém para integrar a atividade dos particularesdirigida à satisfação de seus interesses mediante odesenvolvimento das relações jurídicas�.56 E conclui oautor, dizendo que o ato de jurisdição voluntária podeperfilar-se como um caso de controle preventivo delegalidade.

2.5.2 � Francesco Carnelutti

Carnelutti, em Instituições do Processo Civil, ex-terna entendimento igual ao de Calamandrei, quantoao fim especifico da jurisdição voluntária: a prevençãoda lide.57

O autor enfatiza que a jurisdição voluntária tempor função o caráter preventivo, enquanto a jurisdiçãocontenciosa tem por função repressiva.58 E afirma: �oprocesso voluntário age, não em presença, mas emprevenção da lide, permanece por saber qual é a reali-dade atual que constitui a matéria dele. O conceitodessa realidade pode ser proveitosamente indicado pormeio da palavra negócio.(...) Negócio é, então, um inte-resse ou um grupo de interesses a respeito do qual, noconflito com um ou mais interesses alheios, se coloca aexigência do cumprimento de um ato para sua tutelaconforme o direito (�negotium, de nec otium�).59

Concluindo, que o objeto do negócio é sempre uminteresse.60

56. p. 156 � ob. cit.

57. p. 95 � ob. cit.

58. p. 76 � ob. cit.

59. p. 97 � ob. cit.

60. p. 99 � ob. cit.

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Jurisdição Voluntária 27○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

2.5.3 � Giuseppe Chiovenda

A seu turno, Chiovenda, em Instituições de Direi-to Processual Civil, afirma: �É inexato dizer-se que oescopo dos atos de jurisdição contenciosa é a repressão;e o dos atos da jurisdição voluntária a prevenção. Háformas processuais de tutela preventiva; e vice-versa,muitos atos de jurisdição voluntária carecem de fimpreventivo (tutela). Substancialmente exato se me afi-gura, ao contrário, o conceito de quem surpreende ocaráter diferencial da jurisdição voluntária em seuescopo constitutivo; os atos de jurisdição voluntáriatendem sempre à constituição de estados jurídicos no-vos, ou cooperam no desenvolvimento de relações exis-tentes�.61 Caracterizando a jurisdição voluntária, omestre nos diz: �não há aqui duas partes; não há umbem garantido contra outros, uma norma de lei poratuar contra o outro, mas um estado jurídico, impossí-vel, sem a intervenção do Estado, de nascer ou desen-volver-se ou só possível de se desenvolver imperfeita-mente�.62

2.5.4 � José Frederico Marques

Em seu magistério, afirma: �Todo procedimentode jurisdição voluntária é procedimento especial, por-que nele o juiz não atua jurisdicionalmente, e os atosque se sucedem, devidamente coordenados, nãoexteriorizam tipo algum de processo, mas se destinamapenas a compor o �modus faciendi� de atividade admi-nistrativa que o Judiciário exerce�.63

61. p. 26 � ob. cit.

62. p. 27 � ob. cit.

63. p. 595 � Manual de Direito Processual Civil, vol. I, 2ª ed.,Campinas, 2000.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais28○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Inobstante, arremata o mestre: �O órgão judiciá-rio presta sua assistência, integrando um negócio jurí-dico, e isto porque o Estado, apesar de tratar-se derelações de interesse privado, entende dever tutelá-lasa fim de garantir melhor os preceitos legais que regemessas relações de vida�.64

2.5.5 � Moacyr Amaral Santos

Amaral Santos cita o entendimento de Cristofolini,aceito por Luiz Eulálio de Bueno Vidigal, para quem �ajurisdição voluntária tem por objeto interesses não emconflito, seu objetivo é tutelar determinado interesse,protegendo o respectivo interessado: sua finalidadeimediata é a proteção do interessado�.65

O jurista ainda classifica os atos de JurisdiçãoVoluntária em cinco categorias: 1) os atos de formaçãodos sujeitos jurídicos, que no direito brasileiro não seexige a participação dos órgãos juridicionais; 2) os atosde integração da capacidade jurídica das pessoas (tuto-res e curadores) e a fiscalização de suas atividades; 3)os atos intervencionistas no estado das pessoas �separação consensual, emancipação; 4) os atos de par-ticipação no comércio jurídico (vistos em balanços,despachos do juiz na notificação ou interpelação; e 5) ojuízo de conciliação.66

64. p. 76, § 5º � Ensaio de Jurisdição Voluntária, 2ª ed., São Paulo,1959.

65. p. 82 � ob. cit.

66. p. 80 � ob. cit.

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Jurisdição Voluntária 29○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

2.5.6 � Antônio Carlos Marcato

Analisando a jurisdição voluntária, enfatiza quea �função é eminentemente administrativa (e não juris-dicional), que tem por pressuposto básico um negócioou ato jurídico, dando origem a um procedimento (e nãoa um processo) que se desenvolve entre os interessados(e não entre partes), gerando um ato final (homologa-ção, aprovação, autorização) que pode ser livrementemodificado, caso sobrevenha fato superveniente, postonão estar coberto pela coisa julgada (CPC, art. 1.111)�.67

E conclui: �finalmente, como nos procedimentosde jurisdição voluntária, não há, em verdade, exercícioda função jurisdicional, as decisões neles proferidasnão ficam acobertadas pela coisa julgada�.68

2.5.7 � Arruda Alvim

Ensina Arruda Alvim que: �A jurisdição voluntá-ria constitui-se em atividade intrinsecamente admi-nistrativa e não jurisdicional. Trata-se da administra-ção pública de interesses particulares, deferida ao Po-der Judiciário, o que já ocorre, há muito tempo, nosdiversos povos e que subsiste, com essa função, nodireito comparado.

A jurisdição voluntária, por sua vez, é uma ano-malia no quadro sistemático das funções estatais, atri-buída que tem sido tarefa administrativa ao Judiciá-rio; isto porque a administração, num Estado de Direi-to, cabe primordialmente ao Poder Executivo. Nestecaso, porém, a jurisdição voluntária cabe privativa-mente ao Poder Judiciário�.69

67. p. 20 � ob. cit.

68. p. 21 � ob. cit.

69. p. 4 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais30○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

2.5.8 � Lopes da Costa

Ressalta Lopes da Costa que a administraçãopública, no Estado Moderno, é a administração legal.Afirma, ainda que: �A Administração pública, como ajurisdição, é execução da lei�. E conclui: �A chamadajurisdição voluntária abrange pois os atos de adminis-tração de interesses privados, qualquer que seja oórgão que o pratique, autoridade administrativa ouautoridade judiciária�.70

2.5.9 � Luiz Fux

Entende que com malgrado a lei denominou juris-dição voluntária, �revelando um fenômeno peculiar deacesso obrigatório à justiça em casos de situações jurí-dicas �inter volentes�, nas quais a chancela do Judi-ciário é requisito de validade, entrevisto pelo legisla-dor como necessário, decerto por vislumbrar no juiz ummagnânimo �administrador da conveniência e oportu-nidade� de determinadas providências adotáveis atra-vés da integração da vontade das partes e do Estado-juiz�.71

2.5.10 � Cândido Rangel Dinamarco

�A jurisdição aproxima-se da contenciosa em ra-zão da semelhança das formas do seu exercício e dacompetência do juiz, como agente estatal independentee necessariamente imparcial. Mais ainda: tanto quanto

70. pp. 37 e 70 � ob. cit.

71. p. 6 � ob. cit.

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Jurisdição Voluntária 31○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

a contenciosa, a jurisdição voluntária exerce-se comvistas a alguma concreta situação de conflito a resolvere é endereçada ao objetivo social último de participação(e esse é o mais relevante dos escopos da jurisdição)�.72

2.5.11 � Humberto Theodoro Júnior

Por seu turno, entende que há medidas cautelaresem procedimento de jurisdição voluntária. É o que seextrai da afirmativa: �As medidas cautelares podem,também, acontecer em clima isento de qualquerlitigiosidade entre as partes, no plano da tutela deprevenção. Diz-se, por isso, que há medidas cautelaresde cunho administrativo ou voluntário e medidas cau-telares realmente contenciosas ou jurisdicionais�.73

2.5.12 � Edson Prata

Conclui o eminente Jurista, após ter deparadocom diversas concepções doutrinárias, quanto à juris-dição voluntária: �Há tanta confusão doutrinária emtorno deste tema, que dificulta sua compreensão atémesmo pelos doutos. O certo é que se alguém tentardeslindar o emaranhado doutrinário e jurisprudencialque se formou nos últimos tempos, terá que começarpor definir sua própria linguagem, para depois subme-ter as exposições dos escritores a uma verdadeira cami-sa-de-força, senão jamais escreverá obra harmônica einteligível�.

72. p. 122 � ob. cit.

73. p. 88 � Processo Cautelar, 17ª ed., São Paulo, Ed. Leud, SãoPaulo, 1998.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais32○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Classificação dos procedimentos de jurisdição, segundo diver-sos autores

� 1. FIX ZAMÚDIO: por razão da matéria:1. civis2. mercantis3. laborais4. administrativos

� 2. GELSI BIDARTa. processos contenciososb. processos mistosc. autônomos

� 3. GURVICH:a. ordinário (contencioso �stricto sensu�)b. especiais

� 4. KRALIK:a. que culminam com decisãob. que se reduzem a uma atividade de documentação,

com mera força probatória

� 5. VAN REPINGHEN:a. de índole notarialb. de dação da féc. de aprovação

� 6. FRITZ BAUR:a. pertencentes ao domínio clássico da jurisdição vo-

luntária: os juízes não decidem nenhum litígio,porém constituem questões referentes ao �status�da pessoa ou aos seus direitos privados (tutela,sucessões, registro);

b. autênticos litígios substanciados em via voluntá-ria, por motivo de conveniência.

Os efeitos das decisões voluntárias dependem de três fatores(SINISA TRIVA)

� 1. Possibilidade de que cheguem a ser executórias

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Jurisdição Voluntária 33○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

� 2. Perspectivas de utilizar a cláusula de imutabilidade

� 3. Medida em que se permita sua execução

Momento em que adquirem eficácia as providências de jurisdi-ção voluntária

� 1. BAURa. a partir da notificação aos interessados, ou, em

alguns casos,b. desde o surgimento da coisa julgada formal

� 2. VOCINOVaria o direito italiano, conforme se trata de decreto,sentença ou ordenança:a. decreto: após o transcurso do prazo para recurso;b. sentença: após a coisa julgada formal;c. ordenança: depende do recurso cabível.

Coisa julgada e a doutrina� 1. FIX ZAMÚDIO � Não é possível falar em coisa julga-

da, nem mesmo formal, em jurisdição voluntária, pos-to inexistir litígio e não se julgar coisa nenhuma emjurisdição voluntária.

� 2. GELSI BIDART � É pacífico o princípio de que asprovidências honorárias não ganham autoridade decoisa julgada.

� 3. GEORGE T. RAMMOS � No âmbito da jurisdiçãovoluntária não se outorga proteção jurídica alguma.

� 4. VAN REEPINGHEN � As decisões graciosas nãopossuem força, ou seja: inimpugnabilidade nem auto-ridade, originadora de coisa julgada.

� 5. CORRADO VOCINO � As providências de jurisdiçãovoluntária são incapazes de produzir coisa julgada,

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais34○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

mas quando surgem através de sentença, admite-seque em tal caso se opere a coisa julgada formal.

� 6. CARRERAS LLANSANA � Na jurisdição voluntárianão há margem para a coisa julgada material, mas simpara a formal.

� 7. JODLOWSKY Reconhecem nas decisões de� 8. KRALIK jurisdição voluntária o atributo de� 9. TRIVA coisa julgada em dupla direção:

formal e material

Admitem que as resoluções dejurisdição voluntária originam umefeito �sui generis� em substituição

� 10. C. LLANSANA à coisa julgada.� 11. FIX ZAMÚDIO Carreras: Trata-se de efeito� 12. G.RAMMOS vinculante.

Fix: Trata-se de eficácia preclusiva.Rammos: Trata-se de efeitoanálogo.

� 13. ZAMORA � Não é possível o conceito de coisa julga-da material, visto que em jurisdição voluntária não sedecide acerca de uma controvérsia entre as partes.

Limites subjetivos das decisões em� 1. BIDAR � As providências de jurisdição voluntária se

projetam tanto sobre as partes quanto sobre terceiros.

� 2. JODLOWSKY � Em jurisdição voluntária a coisajulgada vincula não somente as partes como o julgadorque decidiu a respeito, mas também os demais tribu-nais ou órgãos estatais.

� 3. VOCINO � Corolário da ausência de coisa julgada najurisdição voluntária está em que falta a base paradeslinde entre partes e terceiros, em que pese ser

{

{

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Jurisdição Voluntária 35○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

fundamental para o emprego de certos remédios (porexemplo: a ação de nulidade permitida a terceirosprejudicados)

� 4. FIX ZAMUDIO � Não há coisa julgada no quadro dejurisdição voluntária.a. Para as partes do procedimento, o acordo definitivo

produz efeito positivo, tida como certa e imutável asituação jurídica declarada ou constituída, enquantonão impugnada ou controvertida;

b. Para os terceiros: não pode ser-lhes oposta aimutabilidade da resolução emitida em um procedi-mento voluntário em que não intervierem, podendodiscuti-lo em procedimento contencioso.

Por sua índole e conteúdo, asprovidências constitutivas que

� 5. BAUR representam a regra em jurisdi-� 6. KRALIK ção voluntária e a única classe� 7. JODLOWSKY que alguns aceitam, surte efeito� 8. RAMMOS �erga omnes�, enquanto as

declarativas se circunscrevem�inter partes�.

Recursos em jurisdição voluntária� 1. VAN REEPINGHEN � A via recursal deveria ser

proibida na jurisdição voluntária, porque, não existin-do coisa julgada, podem ser modificadas pelo juiz queemitiu o pronunciamento.

A jurisprudência rechaça a apelação.

� 2. GELSI BIDART � As providências em jurisdiçãovoluntária são recorríveis por disposição expressa dalei ou por analogia com as da jurisdição contenciosa.

� 3. CARRERAS LLANSANA � Cabem apelação e cassa-ção, se o negócio é civil; e só apelação, quando mercan-til.

{

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais36○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

� 4. FIX ZAMÚDIO � Cabe apelação com efeito devolutivoou suspensivo.

� 5. NA ÁUSTRIA � As decisões em jurisdição voluntáriasão atacáveis mediante recursos ordinários.

A doutrina não aceita o recurso extraordinário.

Kralik entende, todavia, que quando estão fechadas asportas ao recurso ordinário, como o ajuizamento deprocesso contencioso, deverá consentir-se, por analo-gia, na revisão do procedimento, ou melhor,na propo-situra de uma demanda de nulidade.

Modificações das providências de� 1. JODLOWSKY � Em princípio, não se pode modificar

uma providência de jurisdição contenciosa, salvo odireito do terceiro não interveniente de propor proces-so civil posterior.

� 2. KRALIK � A possibilidade de que uma decisão dejurisdição voluntária seja modificada dependerá daexistência de recurso.

Se se trata de resolução de trâmite, pode variar aqualquer tempo.

Proclamam a inalterabilidade dosautos definitivos no expedienteem que se ditou a providência.Seriam variáveis os autos provi-sionais e as suas providências em

� 3. C. LLANSANA sentido estrito, ou seja, resolu-� 4. FIX ZAMUDIO ções de categoria mínima.

Mas se as circunstâncias se mo-dificam, os próprios autores po-deriam ser modificados por quemfaz o pronunciamento, visto que{

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Jurisdição Voluntária 37○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

não gozam de modificações decoisa julgada material e, sim, so-mente de simples eficáciapreclusiva.

� 5. FRITZ BAUR � A vida da decisão em jurisdiçãovoluntária não é eterna, visto que em ocasiões prefixa-das pelo direito material, as decisões são modificáveis.

Exemplo do direito material: o menor tutelado queatingiu a maioridade.

� 6. GELSI BIDART fixa quatro perspectivas:1. Transformação do procedimento voluntário em con-

tencioso.2. Dilucidação do problema proposto, em forma con-

tenciosa incidental. Exemplo: a oposição do MP àaprovação de acordo referente à situação dos filhosmenores em caso de divórcio voluntário.

3. Revisão total ou parcial, em ulterior processo, doautuado em procedimento voluntário que chegouao fim.

4. Possibilidade, no quadro dos procedimentos mis-tos, de que o decidido na etapa voluntária seja,revisto em outra contenciosa, para continuar comesta ou volver àquela; nesta hipótese, prevalece oprocesso contencioso sobre o voluntário.

� 7. TRIVA � Tanto no processo contencioso como noprocesso voluntário existe a oportunidade de novojuízo, sempre que surgirem fatos novos, porque, fal-tando a identidade dos feitos, não haveria o �ne bis inidem�.74

74. pp. 300/305 � ob. cit.

{

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais38○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

2.6 � Distinção entre Jurisdição Voluntária eContenciosa

De forma sintética, as Cortes Italianas distingui-ram a jurisdição voluntária da jurisdição contenciosa:

1 � A jurisdição voluntária (honorária, diz aCorte) não é convocada para resolver uma controvérsiaentre partes em litígio, mas para atender uma funçãode tutela e ingerência no interesse alheio;

2 � Na jurisdição voluntária inexiste uma normalegal para atuar em favor de uma parte contra a outra;

3 � Não existe na jurisdição voluntária a garan-tia de um bem de uma parte contra a outra, porque nãohá partes em litígio;

4 � Há aqui uma atividade desenvolvida em favordo interesse de um só sujeito e da coletividade;

5 � Na jurisdição contenciosa existe um concretoconflito em atuação, enquanto que na jurisdição volun-tária o conflito não é atual nem eventual, mas apenaspotencial;

6 � Em jurisdição voluntária há um decreto,enquanto na contenciosa há uma sentença�.75

Assim conclui Edson Prata: �Os elementos carac-terísticos e identificadores dos atos de jurisdição vo-luntária são, dentre outros, a ausência de lide; a faltade pretensão (em sentido carneluttiano); a inexistênciade pedido de atuação da norma legal, formulado por umsujeito contra o outro; a falta de disputa de um bemjurídico; a existência de um conflito mediato, porémnão imediato�.76

75. p. 196 � ob. cit.

76. p. 196 � ob. cit.

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Jurisdição Voluntária 39○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

E apresenta a seguinte distinção:�I � Na jurisdição contenciosa há ação, na

voluntária há simples pedido de um interessado;II � A jurisdição contenciosa produz coisa

julgada, a voluntária não;III � Na jurisdição contenciosa há partes,

na voluntária há interessados ou participantes. AduzChiovenda que o caráter da jurisdição voluntária não éa ausência do contraditório, mas a ausência de duaspartes. Por outro lado, pode haver processo sem contro-vérsia, como se dá na revelia;

IV � Na jurisdição contenciosa há proces-so, na voluntária há procedimento apenas;

V � Na jurisdição contenciosa há tutelade direitos em conflito, na voluntária pode haver nomáximo dissensões;

VI � Pressuposto da jurisdição contencio-sa é o litígio, pressupostos da voluntária é o negócio ouo ato;

VII � Na contenciosa uma parte pede aintervenção judicial à custa da outra parte; na voluntá-ria, pede à sua própria custa;

VIII � A jurisdição contenciosa é substi-tutiva; a voluntária é administrativa, pois o juiz nãosubstitui a atividade do interessado, apenas integra-seno negócio ou ato jurídico;

IX � Na contenciosa o juiz compõe a lide;na voluntária apenas constitui legalmente o negócio ouato jurídico;

X � Há contraditório na contenciosa econtrovérsia na voluntária;

XI � Na contenciosa existe a pugna devontade das partes, na voluntária, não; pode haverpugna de interesses;

XII � Enquanto na jurisdição contenciosa oórgão jurisdicional atua para a composição do conflito

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais40○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

de interesse, na voluntária somente age para melhortutelar o interesse em conflito;

XIII � Em geral, na jurisdição voluntárianão se dá a realização de um direito objetivo, senão doexercício de um direito subjetivo;

XIV � A jurisdição voluntária não exclui oexercício posterior da contenciosa sobre o mesmo as-sunto;

XV � Na jurisdição contenciosa há ação epretensão, na voluntária, não há ação nem pretensão;

XVI � A jurisdição voluntária tem caráterde função anômala, de vez que o ato por ela praticado,do ponto de vista material, tem uma natureza, mas, doponto de vista orgânico, diverso é o seu aspecto, porqueatribuído a um órgão que normalmente não o pratica; acontenciosa é normal, porque atribuída a órgão quenormalmente a pratica;

XVII � Os atos praticado pela magistratura,são genericamente denominados �atos judiciários�, di-vidindo-se estes em atos judiciários propriamente di-tos e atos jurisdicionais. Os atos jurisdicionais enten-dem-se com uma situação contenciosa; os judiciáriospropriamente ditos não são contenciosos, como se veri-fica na impropriamente chamada jurisdição voluntá-ria, as atribuições judiciárias referem-se, também, àadministração dos serviços da justiça, ao poder regula-mentador dos tribunais, ao poder de policia dos juízesnas audiências, etc.;

XVIII � A jurisdição voluntária visa a consti-tuir relações jurídicas novas, enquanto a contenciosaobjetiva realizar relações jurídicas existentes;

XIX � A jurisdição voluntária é constitutivae não contém duas partes, a contenciosa, embora possaser constitutiva em alguns casos, nunca funciona semduas partes (Chiovenda);

XX � Na jurisdição contenciosa pede-se au-torização, homologação ou aprovação;

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Jurisdição Voluntária 41○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

XXI � Ao contrário da jurisdição exercidaem face de contendores, esta outra tem lugar quando asvontades das partes convergem para o mesmo fim. Daío nome: jurisdição voluntária;

XXII � A distinção entre jurisdição conten-ciosa e voluntária assenta neste ponto: a jurisdiçãocontenciosa tem por fim a composição de litígios; agraciosa tem por fim a regulamentação de situaçõesanômalas de interesses, mas que não são litígios;

XXIII � Na jurisdição voluntária, há proces-sos que se iniciam de ofício. Na jurisdição contenciosaimpera o princípio �ne procedat jus ex officio�;

XXIV � Em jurisdição contenciosa somentepode ser parte o absolutamente capaz, ou o incapaz,completamente ou suprida a sua incapacidade por umrepresentante legal.

Não assim em processo de jurisdição voluntária;XXV � Não há processo à revelia, no sentido

que lhe dá o processo contencioso. Não há pois confis-são ficta. O fato alegado por um interessado, quando ooutro não contesta, não obriga o juiz a aceitá-lo comoverdadeiro.

Na jurisdição contenciosa ocorre o contrário;XXVI � Na jurisdição voluntária, busca-se,

tanto quanto o permitem as forças humanas, encontrara verdade real.

Em ação de cobrança, o autor cobra dívida já paga.O réu não alega ou não prova a quitação. O juiz, mesmoque particularmente saiba que esta se fez, fica adstritoao que consta dos autos. Decide pela verdade formal;

XXVII � No processo contencioso, o juiz nãopode auxiliar a parte, sob pena de perder a sua impar-cialidade.

Na jurisdição voluntária, o juiz assiste aos inte-ressados, suprindo lhes as deficiências de atuação;

XXVIII � Na jurisdição contenciosa, o pedido,além de ser caracterizado por objeto, também se

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais42○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

individua por seu fundamento. Se, por exemplo, o autorfunda o seu domínio num ato entre vivos, o juiz nadecisão não pode atender a outro fundamento que emer-ge do processo � a sucessão hereditária.

Qualquer cousa de semelhante na jurisdição vo-luntária, com os requerimentos que devem ser motiva-dos.

Para alienar, por exemplo, bens de incapaz, orequerente deve indicar os fatos em que assente autilidade ou a necessidade do negócio. Alega, por exem-plo, a distância entre a situação do imóvel e a sede datutela. O juiz não aceita esse motivo. Mas da provacolhida no processo resulta que o imóvel é de terreno demá qualidade e paludoso. O juiz pode decidir por esseúltimo motivo, embora não alegado.

XXIX � Na voluntária, o processo é sempreescrito. Quando o interessado intervém oralmente, emaudiência, intervém como fonte de prova, como nodepoimento pessoal. Não em debate oral.

Em conseqüência de sua natureza escrita, o pro-cesso também não é regido pelo princípio do imedia-tismo. Um juiz pode colher a prova testemunhal. Outropode proferir a decisão.

XXX � Também vigora o princípio da publi-cidade na jurisdição voluntária. As audiências nãoprecisam ser públicas. A sentença é escrita e intimadaem cartório.

XXXI � Nos processos de jurisdição voluntá-ria, salvo o recurso, não há preclusões. O juiz soberana-mente o dirige. Neles domina o princípio da soberaniado juiz;

XXXII � Na jurisdição voluntária não há ação.Não pode assim haver ação preventiva;

XXXIII � Na jurisdição voluntária não há de-poimento pessoal, no sentido técnico do Código deProcesso Civil;

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Jurisdição Voluntária 43○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

XXXIV � Na jurisdição contenciosa, como navoluntária, o fato confessado por uma parte é dispensa-do de prova. Na jurisdição contenciosa, porém, o juizfica inibido de continuar a pesquisa da verdade. Domi-na o princípio dispositivo. Na jurisdição voluntária, ojuiz pode livremente prosseguir na coleta de mais pro-vas, se assim entender.

Da mesma maneira, a confissão do pedido (sub-missão), vincula o juiz, na jurisdição contenciosa, salvose o direito é indisponível, pois a confissão equivale àrenuncia. O juiz, sem mais necessidade de provas, devecondenar de preceito.

Na jurisdição voluntária, o juiz, fundado na expe-riência comum, pode dar valor probatório à submissão.Mas não é obrigado a dar-lhe a força que tem emprocesso de ação;

XXXV � Na jurisdição voluntária a decisão dojuiz é a mais conveniente à finalidade do processo.

Suponha-se o caso de um expediente de remoçãode tutor. O juiz recebeu uma representação contra ele.mandou autuá-la e iniciou a instrução. O tutor estavaexercendo regularmente as suas funções. Quer, entre-tanto, livrar-se delas. Os fatos alegados na representa-ção não são verdadeiros. Se o juiz, por efeito da submis-são, os der como verdadeiros e remover o tutor, estariadando uma solução inconveniente aos interesses doincapaz;

XXXVI � O Código Civil não admite que osmenores de 16 anos deponham.

Na jurisdição voluntária, as informações de inca-pazes são admitidas como elementos de convicção dojuiz;

XXXVII � No processo de ação, o autor nãopode, contestada a ação, fazer novo pedido, nem variardo pedido feito.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais44○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Na jurisdição voluntária, o requerente que porexemplo pediu para vender o imóvel A, pode depoissubstituí-lo pelo imóvel B.

XXXVIII � É pressuposto desses procedimentosque existe controvérsia entre as partes, e, por isso,assinalavam os antigos praxistas que �voluntariajurisdictio transit in contenciosam interventu justiadversarii�.

Não é, entretanto, a circunstância de não interviradversário que caracteriza, isoladamente, o processovoluntário. Assim é o que o processo contumacial é dejurisdição contenciosa, embora não apareça a contra-posição à postulação inicial, ao passo que os processosde tutela e curatela não perdem seu caráter de volun-tário não obstante sobrevenha disputa em torno dopedido�.77

Lopes da Costa distingue a jurisdição nos princí-pios: �Na jurisdição contenciosa, o autor deve alegar eprovar os fatos preexistentes, origem do pedido (�origopetitionis�) e o réu os que impediam ou extinguiramaquele direito. Pouco importa que tenha havido fatosque a parte desconhecesse ou que existiam, mas que elanão provou. (...) Isso é justificado pelo princípio disposi-tivo�.

�Ora, na jurisdição voluntária, o princípio quepredomina é outro e diametralmente oposto � o prin-cípio oficioso ou inquisitório. Agindo no interesse pú-blico, o juiz pesquisa livremente a prova, pronto sem-pre a retratar a decisão sempre que se convencer de queela não se ajustou à realidade�.78

Celso Agrícola Barbi, no mesmo sentido da distin-ção principiológica de Lopes da Costa acrescenta: �Alémdessas características diferenciais, a atividade de ju-risdição voluntária tem natureza constitutiva e finali-

77. pp. 101/106 � ob. cit.

78. p. 149 � ob. cit.

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Jurisdição Voluntária 45○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

dade preventiva. A atividade da jurisdição voluntáriatem natureza constitutiva, porque serve para consti-tuir relações jurídicas, ou para modificar ou desenvol-ver as já existentes. Além disto, a moderna doutrinaacentua a finalidade preventiva dessa jurisdição, queintervém em certos atos jurídicos, dando-lhes maiorgarantia de legalidade, de modo a evitar futuros lití-gios�.79 Enfatiza, ainda, que �a decisão definitiva des-ses procedimentos não alcança a força de coisa julgadamaterial, que só pode ocorrer nas sentenças de méritoproferidas em atividade de jurisdição contenciosa�.80

Athos Gusmão Carneiro, em Jurisdição e Compe-tência, esboça o seguinte quadro comparativo:

Quanto à atividade:� Jurisdição Contenciosa: Jurisdicional;� Jurisdição Voluntária: Administrativa.

Quanto à causa:� Jurisdição Contenciosa: conflito de interesses,

uma LIDE;� Jurisdição Voluntária: Um negócio, ato ou pro-

vidência jurídica.

Quanto aos aspectos subjetivos:� Jurisdição Contenciosa: partes contrapostas

(�inter nolentes�);� Jurisdição Voluntária: �Interessados� (art.

1.104) na tutela de um mesmo interesse (�intervolentes�).

Quanto à iniciativa:� Jurisdição Contenciosa: por meio de �AÇÃO�,

em que se formula o pedido do autor contra oréu;

79. p. 14 � ob. cit.

80. p. 13 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais46○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

� Jurisdição Voluntária: Por meio de simples�requerimento�, em que se indica a �providên-cia judicial� postulada. Essa providência não é�contra� ninguém, mas apenas em favor dorequerente.

Quanto à maneira de proceder:� Jurisdição Contenciosa: mediante um �proces-

so�, sob o princípio do �contraditório�;� Jurisdição Voluntária: Embora a citação do

Ministério Público e de eventuais interessados,há um simples �procedimento administrativo,facultada eventual �controvérsia� quanto à me-lhor maneira de administrar o �negócio� emjogo.

Quanto à Sentença:� Jurisdição Contenciosa: produz �coisa julgada

material�;� Jurisdição Voluntária: Não produz a �coisa jul-

gada material�, podendo ser modificada emface de circunstâncias supervenientes (art.1.111).

Quanto ao Critério de Julgamento:� Jurisdição Contenciosa: o da legalidade, com a

aplicação do direito objetivo para a eliminaçãodo conflito;

� Jurisdição Voluntária: Não é obrigatória a �le-galidade estrita�, podendo o juiz ater-se a crité-rios de conveniência e oportunidade (art.1.109).81

Por seu turno, Waldemar Mariz de Oliveira Juniorapresenta a seguinte distinção:

81. pp. 35/36 � Jurisdição e Competência, Athos Gusmão Carneiro,9 ª ed., Ed. Saraiva, São Paulo, 1999.

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Jurisdição Voluntária 47○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Pressuposto:� Jurisdição Contenciosa: Um litígio;� Jurisdição Voluntária: Um negocio ou ato jurí-

dico.

Atividade:� Jurisdição Contenciosa: Substitutiva;� Jurisdição Voluntária: Administrativa. Não é

substitutiva, pois o juiz não substitui a ativida-de do interessado embora integrado o negocioou ato jurídico.

Sentença:� Jurisdição Contenciosa: Produz a coisa julgada;� Jurisdição Voluntária: Não produz a coisa, pois

pode ser modificada ou revogada a qualquertempo.

Aspecto Subjetivo:� Jurisdição Contenciosa: Partes;� Jurisdição Voluntária: Participantes ou inte-

ressados e, não, partes.

Aspecto Objetivo:� Jurisdição Contenciosa: Existe ação e um pedi-

do de uma parte contra ou em relação à outra.Há sempre possibilidade de contraditório;

� Jurisdição Voluntária: Não há ação, mas sim-ples pedido de um interessado ou participante.Não havendo duas partes, mas sim, um interes-sado, o pedido não se dirige contra ou em rela-ção a outrem. Logo, não há possibilidade decontraditório.

Finalidade:� Jurisdição Contenciosa: Composição de um con-

flito de interesses, mediante a providência ju-

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais48○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

risdicional. Visa uma relação jurídica já exis-tente.

�Modus Procedenti�.� Jurisdição Voluntária: tem finalidade consti-

tutiva, pois objetiva a constituição de estadosjurídicos novos; coopera para desenvolvimentode estados jurídicos existentes.

�Modus procedendi":� Jurisdição Contenciosa: há processo;� Jurisdição Voluntária: só há procedimento.82

Cintra, Grinover e Dinamarco, em análise sobre adistinção, terminam por convergir as característicasprocessuais da jurisdição voluntária e contenciosa:�Há uma petição inicial, que deverá ser acompanhadade documentos (art. 1.104), como na jurisdição conten-ciosa; há a citação dos demandados (art. 1.105), respos-ta destes (art. 1.106), principio do contraditório, pro-vas (art. 1.107), fala-se em sentença e em apelação (art.1.110). Por isso, na doutrina moderna surgem vozes nosentido de afirmar a natureza jurisdicional da jurisdi-ção voluntária. Não há por que restringir à jurisdiçãocontenciosa os conceitos de parte e de processo (mesmoporque este, em teoria geral, vale até para funções não-jurisdicionais e mesmo não-estatais). A relação do art.1º do Código de Processo Civil deixa claro o entendi-mento de que a jurisdição comporta duas espécies, asaber, contenciosa e voluntária�.83

82. p. 109 � ob. cit.

83. p. 155 � Teoria Geral do Processo, 16ª ed., Ed. Malheiros, SãoPaulo, 2000.

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Jurisdição Voluntária 49○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

O mestre lusitano José Alberto dos Reis, citadopor Fernando Soares, afirma: �A delimitação entre ajurisdição voluntária e a contenciosa é ainda umaquestão em aberto; não há uma base segura, um crité-rio preciso que habilitem a discriminar os processosque pertencem a uma e a outra classe�.84

Contudo, anotamos que a reflexão de José Albertodos Reis, conforme citado por José Frederico Marques,é sobre o aspecto externo, posto que sob o aspectointrínseco, Reis encontra a razão e o fundamento dadiferenciação externa: �o ato gracioso cria direitos e oato contencioso declara direitos�.85

Concluímos que o divisor distintivo das ações dejurisdição voluntária para as ações de jurisdição con-tenciosa é a morfologia e o conteúdo da ação (tratar dedireitos indisponíveis) que lhes define e caracteriza anatureza.

2.7 � O Litígio Incidental na JurisdiçãoVoluntária

Na Jurisdição Voluntária, como demonstramos,não há litígio, entretanto pode ocorrer um litígio inci-dental durante o procedimento voluntário. JoséFrederico Marques86 entende que o procedimento nãopossa se transformar em processo. E justifica: �Nesseincidente, se houver elementos, o juiz pode exercer aatividade processualmente, o litígio pode resolver-se

84. p. 45 � O Processo Penal como Jurisdição Voluntária, LivrariaAlmedina, Coimbra, 1981.

85. p. 201 � Ensaio sobre a Jurisdição Voluntária, Ed. Millennium,Campinas, 2000.

86. p. 228 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais50○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

no próprio procedimento voluntário, em que se abriráeste parêntese contencioso�. O jurista repugna afirma-tiva de Chiovenda de que, se o ato do juiz for impugna-do, a jurisdição voluntária se transformará em conten-ciosa. Ao que argumenta: �Os casos de jurisdição volun-tária não se transformam em contenciosos porque hajacontrovérsia ou recurso�.

2.8 � A Intervenção de Terceiros na JurisdiçãoVoluntária

Relembrando, na jurisdição voluntária não hácontencioso, pois não há litígio. Portanto, a interven-ção de terceiros no procedimento de jurisdição voluntá-ria só ocorrerá na forma de assistência, posto que nasdemais formas haverá sempre o litígio, como: na Opo-sição em que o terceiro será opoente ao autor do proce-dimento de jurisdição voluntária, instaurando um pro-cedimento contencioso, o que o torna inadmissível noprocedimento de jurisdição voluntária; na Nomeação aAutoria � o terceiro substitui o réu, denotando haverum litígio, portando procedimento contencioso; naDenunciação da Lide � uma das partes, mais comu-mente o réu, promove no mesmo processo uma açãoregressiva contra o terceiro, denotando também haverum litígio, no Chamamento do processo � o réu chamaterceiro como seu litisconsorte, demonstrando tambémo litígio.

Cumpre-nos inicialmente definir terceiros. Ter-ceiros são pessoas estranhas à relação processual jáconstituída ou estranhas ao direito material deduzidaem juízo. Todavia, se terceiros intervêm no processo,sobre a mesma relação preconstituída em juízo, paradefenderem interesse próprio, está caracterizada aintervenção de terceiros.

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Jurisdição Voluntária 51○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Esta intervenção poderá ocorrer como assistên-cia, oposição, nomeação à autoria, denunciação à lide,chamamento ao processo. Sendo que na assistência ena oposição, o terceiro intervém espontaneamente, pornova ação. Já na nomeação à autoria, na denunciaçãoda lide e no chamamento ao processo, o terceiro inter-vém por provocação de uma das partes, compondo a lidequer como litisconsorte, quer como substituto, caso danomeação à autoria.

2.9 � No Código Processual Civil

A Lei enuncia procedimentos de formalidade paraa evolução da causas civil. Quanto ao procedimento, oCódigo de Processo Civil prevê que a todas as causasaplica-se o procedimento comum, excetuando-se as dis-posições em contrário (art. 271). Destes, podem serordinário ou sumário (art. 272). Estando a par doprocedimento ordinário, o especial e o procedimentosumário, que regem por disposições próprias, na au-sência, subsidiariamente as disposições gerais do pro-cedimento ordinário. Quanto à jurisdição, a causa, háde estar enquadrada na contenciosa ou voluntária.

Na tripartição das ações (conhecimento, a quetransforma o fato em direito � Livro I: art. 1º ao art.565; executiva, a que transforma o direito do fato realem comando sentencial � Livro II: art. 566 ao art. 795;e cautelares, que tem a um tempo as funções do proces-so de conhecimento e de execução e tendo por elementoespecífico a prevenção.87 Livro III: art. 796 ao art. 889),também desenvolvem-se os procedimentos de jurisdi-ção voluntária.

87. p. 43 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais52○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Nos procedimentos especiais (Livros IV e V), alémda jurisdição contenciosa (arts. 890 a 1.102), tem-se avoluntária (arts. 1.103 a 1.210).

�Os atos de jurisdição voluntária nem sempre sãotipicamente e exclusivamente de jurisdição voluntá-ria�, afirma Edson Prata, que contempla: �Misturam-se às vezes aos do processo cautelar, do processo deconhecimento e até do processo de execução�.88

Para Jônatas Milhomens as regras do processo dajurisdição voluntária preconizam um procedimento su-mário, que se distancia do procedimento ordinário enão se confunde com o sumaríssimo.89

Aplica-se aos procedimentos de jurisdição volun-tária, as disposições gerais do procedimento ordinário.Desta forma, os procedimentos de jurisdição voluntá-ria90 iniciam por provocação do interessado, que formu-la o pedido, endereçado ao juiz com os documentosnecessários e com a indicação da providência judicial.(art. 1.104 do CPC), após o despacho citatório (art. 213do CPC) e a citação dos interessados necessários (arts.1.105 e 1.108 do CPC) e outros indicados pelo requeren-te, os quais prestarão as informações necessárias em(10) dez dias (art. 1.106 do CPC). Não havendo produ-

88. p. 125 � ob. cit.

89. p. 517 � Manual de Prática Forense, Ed. Forense, Rio, 1984.

90. O STF distinguiu entre �atos de jurisdição voluntária� e �proce-dimentos de jurisdição voluntária�, para sustentar que estesúltimos não correm durante as férias. A decisão objetivou execu-ção de sentença que deferiu a alienação de coisa comum, enten-dendo o STF que ela se processava durante as férias (RTJ 91/567)� nota do art. 174: 2 do CPC por Teotônio Negrão. �Na jurisdiçãovoluntária, a intervenção do juiz para aprovar, homologar ouautorizar atos jurídicos partidos da iniciativa particular tem porobjetivo acautelar os interesses de pessoas às quais o Estado queroutorgar particular proteção� (AC do TJRS na Apel. nº 32.358, de24.7.79, Rel. Des. Athos Gusmão Carneiro; RT 535/156)

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Jurisdição Voluntária 53○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

ção de provas o juiz decidirá em (10) dez dias (art. 1.109do CPC). O CPC, entretanto, admite, na jurisdiçãovoluntária, a iniciativa do juiz (arts. 1.113, 1.129,1.142, 1.160, 1.171 e 1.190 do CPC).

Sendo citados os interessados, o Ministério Públi-co91 e a Fazenda Pública (arts. 1.105 e 1.108 do CPC),estes quando tiverem interesse; devendo os demais,interessados responder em 10 dias, e o Ministério Pú-blico e a Fazenda em quádruplo (arts. 1.106 e 188 doCPC). Após deverá ser proferida a sentença92 no prazo

91. Acórdão Resp 46770/RJ; Recurso Especial (1994/0010749-8) fon-te DJ data: 17.3.1997 p: 07505Relator(a) Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira (1088) Data daDecisão 18.2.1997 Órgão Julgador T4 � Quarta TurmaEmenta Processo civil � procedimentos especiais de jurisdiçãovoluntária. Extinção de condomínio pela venda de coisas comuns.Não obrigatoriedade da intervenção do Ministério Público. Art.1.105, CPC. Interpretação lógico-sistemática com o art. 82. CPC.Precedente da Turma. Recurso provido.I � interpretação lógico-sistemática recomenda que se dê ao art.1.105, CPC, inteligência que o compatibilize com as normas queregem a atuação do Ministério Público, especialmente as contem-pladas no art. 82 do diploma codificado.II � a presença da instituição nos procedimentos de jurisdiçãovoluntária somente se dá nas hipóteses explicitadas no respecti-vo titulo e no mencionado art. 82.Decisão : Por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provi-mento.

92. Art. 128 CPC: �O Juiz decidirá a lide nos limites em que foiproposta, sendo-lhe defeso conhecer questões, não suscitadas, acujo respeito a lei exige iniciativa da parte.Harmonicamente a este preceito está o disposto no art. 460 doCPC: �É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, denatureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quan-tidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado�Ao que o Superior Tribunal de Justiça decidiu:�Processo Civil. Julgamento �extra petita�.Reconhecimento de direitos conexos de artistas e intérpretes quedesbordou dos limites do pedido, com afronta ao art. 460 do CPC,que determina a adstrição da sentença ao pedido.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais54○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

de dez dias, não estando o juiz adstrito ao critério dalegalidade processual, podendo adotar critério maisconveniente ou oportuno, observada a sua licitude (art.1.109 do CPC). No procedimento de jurisdição voluntá-ria, dizia Giuseppe Chiovenda, �como ato de pura admi-nistração, não produz coisa julgada; assiste, sempre,ao interessado obter a revogação de um decreto positi-vo, volvendo ao próprio órgão de onde emanou e conven-cendo-o de haver errado. Pode ainda o interessadopreferir o recurso à autoridade superior; mas estedireito de recurso não atribui nenhum caráter jurisdi-cional ao provimento emanado ou por emanar-se; nãotem sequer a importância do recurso hierárquico docampo administrativo, porque no campo da jurisdiçãovoluntária a ausência de recurso não converte em defi-nitivo o provimento da autoridade inferior. Ademaisem qualquer caso é possível impugnar judicialmenteum decreto de jurisdição voluntária, por defeito decondições�.93 Nesta esteira, também entendemos que,por haver um direito material que justifique a decisãono provimento de jurisdição voluntária, não se admitea sua cassação.

Pontes de Miranda leciona: �As resoluções, sen-tenças ou decisões, proferidas em jurisdição voluntáriaou graciosa, não têm força material de coisa julgada,94

Recursos dos réus conhecidos e providos, julgando-se prejudicadoo dos autores.Decisão: Por unanimidade, conhecer e dar provimento ao segundorecurso e julgar prejudicado o primeiro recurso.(RESP 58338/ SP � (1994/0040268-6 � DJ: 8.3.1999 � Rel. Min.Paulo Costa Leite � Decisão: 1.12.1998 � Terceira Turma)

93. p. 24 � ob. cit.

94. (RT 516/82)�A coisa julgada formal subsiste na jurisdição voluntária, salvo aocorrência de circunstâncias supervenientes� (interpretação dosarts. 1.109 e 1.111 do CPC). RT 551/97.

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Jurisdição Voluntária 55○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

porque a coisa julgada material se liga à segurançaextrínseca, ao evitamento de litígios futuros. Uma dasconseqüências é a de que a Justiça, proferindo-as, nãofica tolhida de conhecer do mesmo objeto, achando-aposteriormente, noutro processo, injusta�.95

Autonomamente, os procedimentos de jurisdiçãovoluntária têm sempre por finalidade proteger os inte-resses de pessoas às quais a lei quer outorgar particu-lar proteção. Haja vista que é função exclusiva doEstado e garantia do Direito Positivo. Desta forma,entendemos que os procedimentos de jurisdição volun-tária têm uma função cautelatória, na medida em quenão produz coisa julgada, pois visa assegurar, protegertais direitos, o que é feito no exercício da função juris-dicional do Estado.

Nas medidas de jurisdição voluntária � sob aótica do mero procedimento autônomo � são semprepara a proteção de um direito substantivo indisponível,em consonância aos fatos, fundada na plausibilidadeda certeza.

Razão pela qual ao juiz é lícito investigar os fatose ordenar de ofício a realização de quaisquer provas(art. 1.107 do CPC).

No entender de Lopes da Costa, o procedimento dejustificação, característico da Jurisdição Voluntária,tem o fito de prova na cognição do judicante, �trazendonão a declaração de certeza, mas a plausibilidade, umgrau mais forte do que a simples verossimilhança�.96

De forma que a inteligência do juiz se incline paraaceitar a alegação.

Neste sentir, como leciona Miranda Guimarães:�Quando o valor-verdade cede ao valor-probabilidade

95. p. 310 � Tratado das Ações, tomo I, 1ª ed., atualizada por VílsonRodrigues Alves, Ed. Bookseller, Campinas, 1998.

96. p. 333 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais56○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

em combinação com os fatos, ordena um juízo conclu-dente: é a justificação dos fatos. Calcula-se o valorverdade, como objetivo abstrato (va), com o valor pro-babilidade (p), donde subtrai-se a certeza (c), chegandoao valor �fatos justificados� (fj): �fj = (p + va) � c�.

À valoração destes fatos justificados a incógnitada equação é a justificação, que dependerá do grau deprobalidade, variável conforme o caso. Sempre que avaloração da probalidade for inferior à �verdade abstra-ta� os fatos não estarão justificados: �p < va => f ñ j�.

O valor matemático de �j� é (zero). Sendo o valorda probalidade (p) inferior à verdade abstrata (va),sobrará, além da certeza (c), a abstração da verdade, ouseja, o direito em abstrato. Assim, não necessita daprova de certeza. O valor quantitativo da variável �p�dependerá da analise de fatos e fundamentos�.97

O procedimento voluntário, pode por vezes tor-nar-se subsidiário ao procedimento contencioso, namedida em que seja preventivo ou incidental do princi-pal contencioso, como a justificação nas concessões demedida liminar nas ações cautelares em geral (art. 804do CPC). A qual é o pressuposto para a concessão de umprovimento liminar não definitivo, mas corresponden-te a uma situação de fato que torne plausível a preten-são da parte.

Tendo dentre os meros procedimentos acautela-tórios de jurisdição contenciosa, aqueles de jurisdiçãovoluntária de prerrogativas preventivas, como a ante-cipação da prova.

Todavia, o código processual, por força do art.1.109 do CPC, outorga ao judicante prerrogativa alter-nativista, de forma que o juiz avalie a adoção de medi-

97. pp. 86/87 � Ação Cautelar Inominada, Ed. Livraria do Advogado,Porto Alegre, 1996)

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Jurisdição Voluntária 57○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

das de urgência.98 Tal fato decorre do princípio inqui-sitivo, que rege a jurisdição voluntária, ao qual aojudicante é permitido investigar livremente os fatos eordenar de ofício a realização de quaisquer provas,portanto o exercício da fase probatória esta também acargo do juiz, que pode agir de oficio, sem esperar ainiciativa do interessado, impulsionando o processoaté o fim.

2.10 � Procedimentos Cautelares deJurisdição Voluntária

O Código de Processo Civil prevê, no Livro III: oProcesso Cautelar, dentre os quais os procedimentosde jurisdição voluntária, como a justificação (arts. 861a 866), os protestos, notificações e interpelações (arts.867 a 873).

Quanto à justificação, ressalta Humberto Theo-doro Júnior: �justificação não é ação cautelar, pois nãovisa assegurar prova, mas sim constituir prova, e nãose funda no �periculum in mora�. Não se lhe devem,pois, aplicar os princípios gerais do procedimento cau-telar. (...) Na realidade, na justificação o juiz nãodecide coisa alguma e limita-se a aferir, extrin-secamente, a observância das formalidade legais semqualquer pronunciamento sobre o mérito da prova�. Econclui, por tratar de: �Mero procedimento de jurisdi-ção voluntária, portanto, como bem a classifica Lopesda Costa�.99

98. �O art. 1.109 do CPC. autoriza a inobservância do critério dalegalidade estrita relativamente à atividade processual nos pro-cedimentos de jurisdição voluntária, não podendo, porém, alcan-çar o direito material (RJTAMG 51/126).

99. pp. 318/319 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais58○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Quanto à Notificação, define José Frederico Mar-ques: �é a cientificação de um preceito para a prática ounão-prática de um ato, ou o conhecimento obrigatoria-mente imposto por lei da prática de um ato para efetivaformação de uma situação jurídica�.100

Quanto à Interpelação, conceitua o jurista: �é oato pelo qual o credor cientifica o devedor de quepretende ver cumprida a obrigação�.101

Enfatiza Edson Prata que os atos de jurisdiçãovoluntária têm a mais estreita relação com o processocautelar, �fazendo com que o juiz, em determinadoscasos, primeiramente emita seu pronunciamento deurgência, cautelar, antes da decisão requerida pelointeressado. Geralmente a cautela surge como medidade urgência, temporária, vigorando enquanto a autori-dade jurisdicional não última o processo, sentenciado�.E conclui: �o princípio inquisitivo, que domina todos osprocedimentos de jurisdição voluntária, permite que ojuiz avalie sempre a necessidade de serem tomadasmedidas de urgência, sejam estas definitivas, ou sim-plesmente provisórias�.102

Leciona Humberto Theodoro Junior: �Mas as me-didas cautelares podem, também, acontecer em climaisento de qualquer litigiosidade entre as partes, noplano da tutela de prevenção. Diz-se, por isso, que hámedidas cautelares de cunho administrativo ou volun-tário e medidas cautelares realmente contenciosas oujurisdicionais�.103

100. p. 299 � ob. cit.

101. p. 299 � idem.

102. p. 125 � ob. cit.

103. p. 88 � ob. cit.

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Jurisdição Voluntária 59○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

2.11 � Procedimentos Executórios deJurisdição Voluntária

A execução pressupõe a existência de uma preten-são inadimplinda, quer por título executivo judicial �criado pelo processo de conhecimento, ou extra judicial� formado pelas partes nas negociações do comércio, aqual faz com que o credor recorra ao Poder Judiciáriopara que exerça a Jurisdição, intervindo no patrimôniodo devedor, de forma coativa, para dele retirar os bensquanto necessário para saldar o seu débito. Uma vezque é proibida a atuação direta do credor sobre opatrimônio do devedor. Lembrando, contudo que nãohá coação sobre pessoas para assegurar prestações dedireito civil.

Tendo em vista que a concepção doutrinária deque no processo de conhecimento o juiz decide e noprocesso de execução o juiz realiza, ao qual para decidiré preciso julgar, exercício cognitivo de jurisdição con-tenciosa; e que para realizar é preciso homologar ouobter a autorização do órgão judiciário. Por certo mo-mento a doutrina admitiu o caráter administrativistada execução, como pressuposto mantenedor da ordemjurídica e pela atividade homologatória do pleito fun-dada em direito substantivo. Entretanto, percebeu-sea possibilidade de existir um conflito de interesses � alide, e por conseqüência a sua oposição (Embargos àExecução).

Decerto que com a faculdade de nomeação de bensa penhora, dada ao devedor, caracteriza um contencio-so, do contrário seria a execução forçada, que seriahomologada.

Ademais, se o devedor for revel, a sentença terá aforça de coisa julgada formal. À sentença transitadaem julgado só poderá ser revista pelo instituto da AçãoRescisória.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais60○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Eduardo J. Couture, ao analisar a natureza daexecução, comentou: �a primeira questão que se apre-senta ao espírito consiste em saber se as vias executi-vas constituem ou não uma forma da atividade jurisdi-cional: se os juízes, ao se transformar a sua atividadedecisória em coativa, não passam do terreno da jurisdi-ção para o da administração: do Poder Judiciário aoPoder Executivo. À medida que se aprofunda a reflexãosobre este problema, verifica-se a existência de umoutro, que vem a ser como que o seu antecedentenecessário: o de saber se a coação é, ou não, direito�104.

Outro fato doutrinário, que ressalta a reflexão dolusitano Alberto dos Reis, �que fala em títulos excutivosoriundos de processo de conhecimento terminado porconciliação, homologada esta pelo juiz de paz. Nestecaso, o título executivo não é propriamente jurisdicio-nal, mas administrativo, porque originário de autori-dade sem poderes jurisdicionais. Teríamos, então, nãoum título jurisdicional, porém um título negocial, comonos procedimentos de jurisdição voluntária. A execu-ção dele, contudo, não seria jamais de jurisdição volun-tária, tanto que houve o descumprimento do acordoefetuado com a presença da autoridade, demonstrando,com isto, que o acordante agora já resiste à pretensãoda outra parte�.105

104. p. 377 � ob. cit.

105. p. 127 � ob. cit.

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Direitos Autorais 61○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

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3 DireitosAutorais

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

A terminologia jurídica Direitos Autorais identi-fica os direitos concedidos aos criadores de obras lite-rárias e artísticas. Os direitos autorais são tuteladospela Lei 9.610/98, e sobretudo pelos princípios dasConvenções Internacionais (Berna, Roma, Genebra,Universal, Interamericana, TRIP�s dentre outras).Enfatizando que estes atos internacionais foram todosratificados pelo Brasil e regulamentados por decreto.Neste sentir, por força constitucional, ante o dispostono capitulo �Dos Direitos e Garantias Individuais�,especificamente no artigo 5º, parágrafo segundo, osprincípios constantes destes atos internacionais equi-param-se aos princípios constitucionais. O que peloenunciado do art. 60, parágrafo 4º, os direitos e garan-tias individuais não podem ser objeto de deliberação ouproposta de emenda tendente a abolir os direitos egarantias individuais, portanto são imutáveis.

A Lei 9.610/98, assim como a que a antecedeu, a5.988/73, dispõe em seu art. 1º: �Esta lei regula osdireitos autorais entendendo-se sob esta denominaçãoos direitos de autor e os que lhe são conexos�.

Tendo a Lei especial 9.610/98 especificado a suaespecialidade, ela também não renunciou a aplicaçãodas regras do direito comum que proíbem o enriqueci-mento sem causa, o dano injusto, a concorrência desleale outras medidas que podem ser adotadas para fazervaler os direitos autorais.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais62○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Os direitos autorais, em nosso entendimento, sãoum conjunto de prerrogativas jurídicas atribuídas nãosó aos autores de obras intelectuais (literárias, artísti-cas e científicas), como, também, aos titulares dosdireitos conexos (intérpretes ou executantes) aos direi-tos de autor, aos quais, para efeitos legais, aplicar-se-ão as normas relativas aos direitos de autor (art. 89 daLei 9.610/98).

Walter Moraes fala-nos da definição do conteúdodo direito do autor, dada pela lei alemã de 1965 � art.11: �O direito do autor protege o autor nos seus interes-ses espirituais e pessoais na relação com a obra e suautilização�.106

O direito de autor consiste no direito que o criadortem sobre sua criação, que corporifica em um bemmaterial (quadro, escultura, planta, arquitetônica, li-vro, �software� etc.), enfim num �corpus mecanicum�.

Elementar é distinguir a criação do bem que acorporifica; enquanto daquele é abstrato, este é concre-to; enquanto daquele não se pode apropriar, este épossível de apropriar-se; enquanto aquele cria, este éadquirido.

Já a obra intelectual é uma criação humana exte-riorizada, cujos elementos que determinam sua indivi-dualização, segundo opinião dominante, estão contidosno binômio �forma-idéia�, de onde deriva a originalida-de. Porém, o direito autoral só protege a forma, pois aidéia não é a expressão. Cumpre ressaltar que a idéiaé o objeto da mente ao pensar, sendo sinônimo dapalavra pensamento, que quando exteriorizado torna-se uma criação, quer literária (escrita ou oral ), querartística.

A lei de regência de direitos autorais em seu art.7º, define obra intelectual: �São obras intelectuais pro-

106. p. 119 � RIDI, nº 1, vol. 2, julho a dezembro.

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Direitos Autorais 63○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

tegidas as criações do espírito expressas por qualquermeio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou in-tangível, conhecido ou que se invente no futuro�.

A obra intelectual é o objeto do direito autoral,cujo conteúdo é a faculdade de utilizá-la. Os critériospara a sua proteção são determinados pela Lei nº 9.610/98 e as Convenções Internacionais � dentre elas , a deBerna.

A Lei 9.610/98 assegura em seu art. 18, que: �Aproteção aos direitos de que trata esta lei independe deregistro�. Inobstante, faculta ao autor a possibilidadedele registrar sua obra (art. 19). Todavia, o registro emtermos práticos não é condição �sine qua non� para aproteção da obra, pode indicar a autoria, o que é feitocom a publicidade da obra intelectual, entretanto oregistro inverte o ônus da prova e garante o respeito adois critérios necessários de proteção à criação intelec-tual: a originalidade e a novidade. Contudo, o registro,pela data de sua efetivação, demonstra a! anteriorida-de, aos fatos posteriores.

A respeito da proteção e da publicidade da obraintelectual, a Convenção de Berna, regulamentada peloBrasil pelo Decreto nº 75.699, de 6 de maio de 1975,cujos princípios, nos termos do art. 5º, § 2º, da Consti-tuição, equiparam aos princípios constitucionais, dis-põe sobre as obras protegidas pela Convenção, estejampublicadas ou não.107

107. Artigo 3

1) São protegidos por força da presente convenção:a) os autores nacionais de um dos países unionistas, quanto àssuas obras, publicadas ou não;b) os autores não nacionais de um dos países unionistas, quantoàs obras que publicarem pela primeira vez num desses países ousimultaneamente em um país estranho à União e num país daUnião.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais64○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Quanto à natureza da obra intelectual temos aobra originária ou primígena e a obra derivada.

Quanto à forma de expressão, a lei de direitosautorais exemplifica: obras literárias, tais como:

2) Os autores não nacionais de um dos países da União mas quetêm sua residência habitual num deles são, para a aplicação dapresente convenção, assimilados aos autores nacionais do referi-do país.3) Por �obras publicadas� devem-se entender as obras editadascom o consentimento de seus autores, seja qual for o modo defabricação dos exemplares, contanto que sejam postos à disposi-ção do público em quantidade suficiente para satisfazer-lhe asnecessidades, levando em conta a natureza da obra. Não consti-tuem publicação a representação de obras dramáticas, dramáti-co-musicais ou cinematográficas, a execução de obras musicais, arecitação pública de obras literárias, a transmissão ou a radiodi-fusão de obras literárias ou artísticas, a exposição de uma obra dearte e a construção de obras de arquitetura.4) Considera-se publicada simultaneamente em vários paísestoda e qualquer obra publicada em dois ou mais países dentro detrinta dias a contar de sua primeira publicação.Artigo 4Por força da presente convenção, são protegidos, mesmo se ascondições previstas no artigo 3 não forem preenchidas:a) os autores das obras cinematográficas cujo produtor tenha suasede ou sua residência habitual em num dos países da União;b) os autores das obras de arquitetura edificadas num país daUnião ou de obras de arte gráfica ou plástica incorporadas em umimóvel situado em um país da União.Artigo 51) Os autores gozam, no que concerne às obras quanto às quais sãoprotegidos por força da presente convenção, nos países da União,exceto o de origem da obra, dos direitos que as respectivas leisconcedem atualmente ou venham a conceder no futuro aos nacio-nais, assim como dos direitos especialmente concedidos pelapresente convenção.2) O gozo e o exercício desses direitos não estão subordinados aqualquer formalidade; esse gozo e esse exercício independem daexistência da proteção no país de origem das obras. Por conse-guinte, afora as estipulações da presente convenção, a extensãoda proteção e os meios processuais garantidos ao autor para

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Direitos Autorais 65○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

os escritos (termo genérico indicativo das obras orais eescritas, também indicado por esta terminologia naConvenção de Berna � art. 2º), poemas, novelas, basesde dados, �software�, sermões, alocuções. Obras artís-ticas, tais como pinturas, desenhos, fotografias e escul-turas, obras arquitetônicas, mapas, desenhos técnicos,dentre outras.

Os direitos autorais no Brasil foram consolidadospor lei desde de 1898 � a primeira lei especial dedireitos autorais; 1916 � com o Código Civil, lei gerale a segunda lei, sendo a matéria regulamentada pelosartigos 649 a 673, revogando a Lei de 1898; 1973 � coma lei especial que regula os direitos autorais � Lei5.988/73, revogando os arts. 649 a 673 do Código Civil,

salvaguardar os seus direitos regulam-se exclusivamente pelalegislação do país onde a proteção é reclamada.3) A proteção no pais de origem é regulada pela legislação nacio-nal. Entretanto, quando o autor não pertence ao país de origem daobra quanto à qual é protegido pela presente convenção, ele teránesse país os mesmos direitos que os autores nacionais.4) Considera-se país de origem:a) quanto às obras publicadas pela primeira vez num dos paísesda União, este último país; entretanto, se se tratar de obraspublicadas simultaneamente em vários países da União que con-cedam prazos de proteção diferentes, aquele dentre eles cuja leiconceda prazo de proteção menos extenso;b) quanto às obras publicadas simultaneamente num país estra-nho à União e num país da União, este último país;c) quanto às obras não publicadas ou quanto às obras publicadaspela primeira vez num país estranho à União, sem publicaçãosimultânea num país da União, aquele a que pertence o autor;entretanto:i) se se tratar de obras cinematográficas cujo produtor tenha suasede ou sua residência habitual num país da União, o país deorigem será este último; eii) se se tratar de obras de arquitetura edificadas num país daUnião ou de obras das de artes gráficas e plásticas incorporadasnum imóvel situado em um país da União, o país de origem seráeste último país.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais66○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

em razão do disposto na Lei de Introdução ao CódigoCivil, art. 2º,§ 1º, que dispõe: �A lei posterior revoga aanterior quando regule inteiramente a matéria de quetratava a lei anterior�. Por último a matéria é regula-mentada pela lei especial nº 9.610/98 � LDA.

Assim, a lei (9.610/98) divide os direitos autorais:

Direitos Autorais� Direitos de autor

� Direitos conexos� direito dos artistas (direitos de imagem e voz)� intérpretes e executantes� direitos dos produtores fonográficos� direitos da empresa de radiodifusão

� Gestão coletiva dos Direito de Autor e dos Di-reitos Conexos

Os direitos autorais, conforme a teoria dualista,têm dupla característica ao mesmo tempo, uma dedireito pessoal (moral) e a outra de direito real (patri-monial). Na prática o direito moral para existir, requerapenas a exteriozação da criação. O direito patrimonialexige além disso, a vontade de dar essa criação aoconhecimento do público.

O que o leva, segundo a doutrina, a ser um direito�sui generis� pela dupla característica ao mesmo tem-po. Os doutrinadores brasileiros tendem para a concep-ção pluralista, a qual permite aos direitos patrimoniaisa diversificação de vários direitos, que podem ser nego-ciados separadamente; é a conclusão que se extrai danorma do art. 31 da Lei 9.610/98.

Esta natureza jurídica �sui generis� inadmite asprerrogativas de defesa dos bens de direito real, paraos direitos autorais. Como o interdito proibitório, nostermos já sumulados pelo Superior Tribunal de Justiça

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Direitos Autorais 67○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

(Súm. 228). Tendo o diploma de regência fixado osmeios específicos para a defesa adequada.

3.1 � Autor e Titular

Autor é sempre a pessoa física que cria a obra,enfatiza o art. 11 da Lei 9.610/98, por isso somente ele,à primeira vista, pode fazer a defesa dos seus direitosautorais de caráter moral, dentre eles o de suspenderou retirar a obra de circulação já autorizada, desde queafronte a moral e imagem. O que caracteriza a legiti-mação �ad causam� para tal pleito, lembrando que éilegal a transferência por ato �inter vivos� de direitoautoral moral (art. 27 da LDA). Todavia, há quatrocasos isolados em que, aquele que não é autor, pode�lato sensu�, exercer os direitos autorais de carátermoral: o primeiro caso é o dos herdeiros (art. 24, § 1º, daLei 9.610/98), o segundo caso é o do Estado, quando aobra cair em domínio público (art. 24, § 2º, da Lei 9.610/98), o terceiro é o Escritório Central de Arrecadação eDistribuição � ECAD ou qualquer Associação de ges-tão de direitos autorais (art. 99, § 2º, da Lei 9.610/98),e quarto é o titular quando autorizado a representar oautor, nos casos previstos em lei.

Daí por que devemos fazer algumas consideraçõesquanto à natureza jurídica do autor da obra intelectuale do titular de direitos autorais.

Isidro Satanowsky, em sua obra Derecho Intelec-tual, leciona: �es autor de una obra intelectual el quedirectamente realiza una actividad tendiente a elabo-rar una obra intelectual, una creación completa e inde-pendiente, que revela una personalidad, pues pone enella su talento artístico y su esfuerzo creador�.108

108. p. 53 � Propiedad Intelectual, Derechos de Autor, Dina HerreraSierpe, 2ª ed., Editorial Jurídica de Chile, Chile, 1999.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais68○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Já a obra em co-autoria, ou como denominadaanteriormente em colaboração, passa a ter diversosautores. Os quais mutuamente têm os seguintes direi-tos: 1 � Igualdade de direitos sobre a obra; 2 �unanimidade do consentimento sobre a utilização daobra; e 3 � unidade da obra.

O Glossário da OMPI fixa que o titular do direitode autor �é a pessoa a quem pertence o direito de autorsobre uma obra�. Destes, temos o titular originário e otitular secundário. O originário é o autor da obra; e osecundário é aquele que adquire do autor o exercíciodos direitos autorais patrimoniais (cônjuge, herdeiros,legatários e cessionários). A Convenção de Berna dis-põe em seu art. 2º, 6, a extensão de proteção aoslegítimos representantes.

�As obras acima designadas gozam de proteção emtodos os países unionistas. A proteção exerce-se embenefício dos autores e de seus legítimos representan-tes.�

Dina Herrera Sierpe comenta que é mais amplo oconceito de titular de direito de autor do que o conceitode autor e justifica �titular del derecho de autor puedeserlo no solamente el autor, sino todas aquellas personasnaturales o jurídicas que de algún modo hayan adqui-rido los derechos de autor sobre una obra intelectual,bien sea por acto entre vivos o por causa de muerte�.109

Ao falar em titularidade de direitos autorais,devemos sobretudo enfocar o ato que gera a transferên-cia de titularidade � os contratos de direitos autorais.

A transferência, por ato �inter vivos�, só operapara os direitos patrimoniais, por força legal (art. 27 daLDA). A transferência dos direitos autorais patrimo-niais poderá ocorrer para um único uso, por meio de

109. p. 53 � idem.

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Direitos Autorais 69○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

licença; para alguns usos, por meio de concessão; e peloexercício ilimitado, por meio de cessão.

Sem embargo, o ato de transferência deve tersempre o caráter oneroso (art. 50 da LDA), podendo sertotal, ou universal, ou específico, ou ainda com territó-rio limitado, é o que se desprende dos arts. 49/31/50, §2º, da LDA.

Porém, o ato de transferência dos referidos direi-tos autorais, para valer perante terceiros, deve sesubmeter ao princípio �erga omnes�, que é fixado noart. 50, § 1º, da LDA, que faculta a sua averbação ondea obra estiver registrada, ou o registro no Cartório deTítulos e Documentos.

3.2 � Direitos Autorais � Moral

A Pré-História do direito moral, como enfatiza oProf. Bruno Jorge Hammes, consiste em �manifesta-ções de repúdio sem a profunda convicção social ou anoção do direito e do errado que fizesse nascer normasjurídicas�.110

Ao que exemplifica o mestre: �A literatura gregafornece o exemplo de Hermodoro. Este havia assistidoconferência de Platão, feito apontamentos dos discur-sos do Mestre e levado à Sicília para vender. Seuprocedimento teria sido condenado por muitos autoresantigos. Kohler interpreta este repúdio como expres-são da idéia de que era considerado moral comercializara propriedade literária de outrem sem o seu consenti-mento. Em Roma, Cícero censurou o seu amigo e editorÁtico por haver permitido a Balbus de fazer uma cópiade uma obra sobre a qual não havia dado o �bon à tirer�

110. p. 101 � RIDI nº 1 vol. 2, julho a dezembro.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais70○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

(�imprimatur�). O poeta Virgílio teria ordenado emtestamento a dois dos seus amigos a que destruíssem omanuscrito da Eneida, que por falta de tempo nãopudera aperfeiçoar segundo os seus planos. O Impera-dor Augusto interveio para salvar o manuscrito�.111

Lembra-nos, ainda, o maestro, que Kafka deseja-va que, após a sua morte, sua obra fosse destruída,desejo que não foi cumprido pelo seu testamenteiroMax Brod.

Henry Jessen acrescenta que �o grande precursor,aliás, do movimento que reformularia, em termos to-talmente novos, os alicerces doutrinários do direito deautor, foi Immanuel Kant. Este filósofo insurgiu-secontra a publicação de traduções espúrias de suasobras que, ademais de lesá-lo pecuniariamente pornada perceber sobre estas edições, desgostavam-nopela incorreção dos textos, que não refletiam o seupensamento com exatidão. Da análise da matéria, infe-riu que ao autor correspondem os direitos de naturezapessoal, que se não coadunam com os rígidos princípiosque regem os direitos reais. Vislumbrou ele, então oscontornos daquela que passou posteriormente a consti-tuir o chamado �direito moral�.112

Noticia ainda o advogado lusitano Ary dos Santoso caso do processo Camoin-Carco: �O pintor Camoin,tendo procedido a uma revisão de suas obras, chegou àconclusão de que algumas delas eram inferiores, peloque as rasgou, deitando-as depois para o lixo. Na ma-nhã seguinte, um trapeiro apanhou os pedaços, ven-deu-os e depois de pacientemente colados foi a telareconstituída parar às mãos de Francis Carco. Camoin,alegando que ninguém tinha o direito de recompor uma

111. p. 101 � ob. cit.

112. p. 85 � ob. cit.

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Direitos Autorais 71○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

obra que havia destruído por achar inferior, perseguiuCarco e os vendedores do quadro. O Tribunal do Sena,achando procedentes as razões invocadas, consagrou odireito formal do artista sobre a sua obra e ponderou:�l�intangibilité de sa volonté unique de la produire �ou, au contraire, de l�abolir�, declarando que �les auteursde la reconstituition, s�ils etaient bien, par suite del �abandon des toiles coupées, propriétaires desmorceaux trouvés dans la poubell e, n�avaient pas ledroit de reconstituer l�oeuvre que le peintre avait vouludétruire. (...)� �A Terceira Câmara do Tribunal Civil doSena, condenando Francis Carco numa indenizaçãopor perdas e danos e mandando que as telas fossem denovo rasgadas na presença do seu autor e do legítimoadquirente dos pedaços em que anteriormente tinhasido feita�.113

Evidente é a subjetividade do atributo moral queo criador tem sobre sua criação. Atributo este queconsiste na prerrogativa personalíssima de carátermoral exclusiva do autor. Porém a nomenclatura usualé direito moral, que foi usada a primeira vez por AndréMorillot, na França, em 1872, para indicar as prerroga-tivas que tem a personalidade do autor, sobre suacriação intelectual � a obra. O que fez no livro intitu-lado: De la Personnalité du Droit de Copie qui Appartientà un Auteur Vivant.

Morillot entendia que: �o direito moral origina-seantes do direito natural que do direito positivo. Na suaopinião, o direito moral não tem necessidade de serespecialmente consagrado por nenhum texto�.114

A terminologia adotada universalmente é a deDireito Moral, entretanto alguns juristas, como Stolfi,

113. pp. 198/199-203; Nós os Advogados; s/ed.; Lisboa 1934.

114. p. 13 � Direito Moral do Autor Literário, Maria das GraçasRibeiro, Tese de Mestrado/UFMG, Belo Horizonte, 1988.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais72○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Pugliatti, Henry Jessen, dentre outros, defendiam otermo direito pessoal, por entenderem sê-lo um direitoda pessoa do autor�.115

A expressão direito moral veio para sanar a con-fusão entre a expressão direito de paternidade e direitopessoal, conforme reporta Ricardo Antequera Parilli.116

Contudo, �A denominação de direito moral � dizSalvatore Pugliatti � não me é muito simpática porvários motivos. Primeiro, porque é constituída por doistermos em recíproca função de substantivo e adjectivo,entre os quais, considerados como substantivos, cor-rem relações que a ciência jurídica e a filosofia tenta-ram e tentam precisar: a fusão ou a confusão dos doistermos pode produzir equívocos. Por outro lado, a qua-lificação de moral, junta ao substantivo direito, longede especificar uma dada categoria de direitos, põe emdúvida o caráter ético dos direitos em jogo, ou, se talcaráter deve ser pressuposto resolve-se num simplespleonasmo e diminui a própria função: ou tendo direitomoral temos direitos não morais, ou o direito moral éum direito como qualquer outro.

Quanto ao epíteto de moral, junto à palavra direi-to � objeta por sua vez D�Argoeuves � não deveespantar os juristas modernos. A jurisprudência admi-te demandas em reparação dum prejuízo moral. Olegislador edita leis para salvaguardar a moralidadepública. Mas é evidente que ainda nestes casos nãohouve uma moralização do direito (sob pena de deixarde ser direito) mas, se assim podemos exprimir-nos,uma �jurisdicização� de certos imperativos éticos. Porisso, é de certo modo justificada a estranheza dos

115. p. 82 � Código de Direitos Autorais, Eduardo Pimenta, Ed.Legus, São Paulo, 1998.

116. p. 210 � El Nuevo Regime de Derecho de Autor, Ed. Autoralex,Venezuela, 1994.

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Direitos Autorais 73○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

especialistas na matéria, como aliás do simples juristaou até do próprio leigo, que em seu espírito se habituoua dissociar os dois momentos, que agora surgem naposição de uma coisa e a sua qualidade.

Assim, Piola Caselli acha a designação inexataliteralmente incorrecta e ilógica e imprópria. AmadeoGianini, imprópria mas rápida; Jean Rault, declaranão encontrar outra menos viciosa. Entre nós, o Vis-conde de Carnaxide, considera-a uma neologia poucocorrecta nas locuções jurídicas, Cunha Gonçalves pre-fere a expressão direito de paternidade intelectual.Outrora, chegou-se a indagar se os outros direitos sãoIMORAIS.117

Eduardo Vieira Manso entendia que a expressão�direito moral� não tem qualquer conotação ética, ape-nas visa indicar que não é patrimonial. Permitindo aoautor exercer o direito autoral sem uma vantagemeconômica.118

Entretanto a expressão direito moral, veio a serconsagrada no texto da Convenção de Berna (1928).

No Brasil, Milton Fernandes apontou o desacertoda expressão usada pelo legislador: direitos morais �no plural, pois é um direito uno, composto de diversoselementos.

Historicamente, um dos primeiros atos, que reco-nheceu o direito moral ao autor, de que se tem notícia,data de 1º de setembro de 1486, concedido por privilé-gio a Marc-Antoine Sabellico, autor dos �rerum Vene-tarum libri XXXIII�, editados por André de Torresaniou Torregiani d�Asola. O referido privilegio caracteri-zava, segundo Stolfi, por:

117. pp. 97/98 � Ensaio sobre o Direito de Autor, Antônio A. Santos,Ed. Coimbra, Coimbra, 1956.

118. p. 3 � A Tutela Jurídica do Direito de Autor, Ed. Saraiva, SãoPaulo.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais74○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

� É concedido a um autor, mas de maneiraparticular, pois parece que apenas os interesses doimpressor são protegidos;

� A obra é ainda inédita;� O privilégio podia produzir seus efeitos em

Veneza e em todo o território da República;� Os contrafatores estavam ameaçados com uma

multa de 500 ducados e com a indignação da Repúblicade Veneza;

� Contrariamente ao privilegio de Jean de Spire,editor que recebeu privilégios em 18 de setembro de1469, que teve fixada uma duração de cinco anos, paraeste Sabellico, nenhuma duração foi estabelecida�.119

Bruno Jorge Hammes noticia que no período de1800 � 1880 os tribunais teriam começado a tomarconhecimento dos interesses morais do autor.120

Em 14 de junho de 1844, a Corte de Bourgesversou pela primeira vez de um direito moral e abstra-to.

No Brasil, a Lei 496/1898 previu a proteção aodireito moral, não sobre esta nomenclatura, mas sobreos atributos que hoje também são enunciados pela Leiatual (9.610/98). Assim estava fixado na Lei 496/1898:

DIREITO À INTEGRIDADE E À MODIFICAÇÃO

ART. 4º � Os direitos de autor são móveis, cessíveis etransmissíveis no todo ou em parte e passam aos herdei-ros, segundo as regras do direito.

§ 1º � A cessão entre vivos não valerá por mais de 30anos findos os quais o autor recobrará seus direitos, se,ainda existir.

119. pp. 23 e 25 � Traité Théorique et Pratique de la PropriétéLitteraire et Artistique, Trad. Louis Suret, Tomo 1 , MarcelGerard Librairie Editeur, 1925.

120. p. 101 � ob. cit.

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Direitos Autorais 75○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

§ 2º � Fica sempre salvo ao autor, por ocasião de cadanova edição, emendar ou reformar sua obra, ou reaverseus direitos sobre ela, contanto que restitua ao cessioná-rio o que dele houver recebido em pagamento metade dovalor líquido da edição anterior.

(...OMISSIS...)

ART. 5º � A cessão ou herança, quer dos direitos deautor, quer do objeto que materializa a obra de arte,literatura ou ciência, não dá o direito de a modificar, sejapara vendê-la, seja para explorá-la por qualquer forma.

(...OMISSIS...)

ART. 21 � Consideram-se igualmente contrafações:(...OMISSIS...)

2) as reproduções, traduções, execuções ou representa-ções quer tenham sido autorizadas, quer o não tenhamsido, por se tratar de obras que não gozam de proteçãolegal ou já caídas no domínio público, em que se fizeramalterações, acréscimos ou supressões sem o formal consen-timento do autor.

DIREITO À INDICAÇÃO DO NOME

ART. 24 � A aplicação fraudulenta ou de má-fé sobreuma obra literária, científica ou artística, do nome de umautor ou de qualquer sinal por ele adotado para designarsuas obras, será punida com a prisão celular de seis mesesa um ano e multa de 500$, sendo também a obra apreen-dida.

Philadelpho Azevedo afirma que a primeira leique reconheceu o direito moral foi a romena, em 28 dejunho de 1923. Desta lei o citado jurista destaca, o art.3º que dispõe: �Le droit moral de contrôle ne peut êtrecedé. Il ne peut faire l�objet d�aucune transation. Toutesclauses contraires sont nulles de droit�. O citado artigo�desenvolve o direito de controle, mantido, mesmo,

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais76○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

após a cessão ou venda, em favor do autor e seusherdeiros, que poderão retirar a cessão, em qualquermomento e, nos casos de modificações, desnaturação daobra e à reprodução contrária ao contrato e à reputaçãodo autor, invocar a proteção judiciária, além da compo-sição dos prejuízos�.121

Sucessivamente vieram outras leis a reconhecer odireito moral do autor, como a lei da Finlândia, quedata de 3 de junho de 1927: �O cessionário não temfaculdade de publicar a obra modificada, salvo autori-zado pelo autor, mas, em tal caso, tem este o direito deexigir que a obra não seja publicada com seu nome ouque o seja com formal indicação de que a mudança nãolhe é imputável (art. 22)�.122

Nos atos internacionais, �Isidro Satanowsky, porexemplo, refere-se a tratados bilaterais firmados desde1827. Marco A. Viana, por outro lado, informa que �aprimeira referência concreta, que se encontra, é o tra-tado celebrado em 6 de setembro de 1832, entre Esta-dos da Confederação Germânica�. Oswaldo Santiagorefere-se ao ano de 1840 como o que testemunhou umacontecimento da mais viva importância. Nele, pelaprimeira vez, celebrou-se uma Convenção Internacio-nal para a proteção do direito autoral, entre as altaspartes contratantes do Reino da Sardenha e do Impérioda Áustria, a qual recebeu a assinatura do Príncipe deMetternich, na cidade de Viena, em 22 de maio. Poste-riormente, aderiram a essa Convenção os Ducados deParma, de Modena, de Lucca, o Grão-Ducado de Toscana,o Reino das Duas Sicílias e o Estado Pontifício�.123

121. p. 104 � Direito Moral do Escriptor, Ed.Alba, Rio 1930.

122. p. 114 � ob. cit.

123. p. 48 � ob. cit.

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Direitos Autorais 77○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

A Convenção de Berna (1886) só veio contemplartextualmente o direito moral na revisão de Roma (1928),através do art. 6º bis, que no Brasil veio a ser promul-gada através do Decreto nº 23.270 de 24 outubro de1933:

Artigo 6 bis

1) Independentemente dos direitos patrimoniais doautor, e mesmo depois da cessão dos citados direitos, oautor conserva o direito de reivindicar a paternidade daobra e de se opor a toda deformação, mutilação ou outramodificação dessa obra, ou a qualquer dano à mesmaobra, prejudiciais à sua honra ou a sua reputação.

2) Os direitos reconhecidos ao autor por força do pará-grafo 1 antecedente mantêm-se, depois de sua morte, pelomenos até à extinção dos direitos patrimoniais e sãoexercidos pelas pessoas físicas ou jurídicas a que a citadalegislação reconhece qualidade para isso. Entretanto, ospaíses cuja legislação, em vigor no momento da ratifica-ção do presente ato ou da adesão a ele, não contenhadisposições assegurando a proteção, depois da morte doautor, de todos os direitos reconhecidos por força doparágrafo 1 acima, reservam-se a faculdade de estipularque alguns desses direitos não serão mantidos depois damorte do autor.

3) Os meios processuais destinados a salvaguardar osdireitos reconhecidos no presente artigo regulam-se pelalegislação do país onde a proteção é reclamada.

Exceção ao reconhecimento, e por sua vez de re-serva à Convenção de Berna, é feita pelos países queadotam o sistema de �Copyright�. Posto que, no siste-ma de �copyright�, que possuem os países anglo-saxônicos, regulam apenas a reprodução da obra publi-cada, onde é resguardado o interesse econômico doautor, distanciando do direito moral do autor, relegan-do-o quando muito a segundo plano.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais78○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Outras convenções internacionais foram firma-das mas não explicitaram qualquer menção tutelar aodireito moral como a Convenção Universal (1952), asConvenções Americanas de Montevidéu (1889), México(1902), Rio de Janeiro (1906), Buenos Aires (1910).

Em 1928, após a Revisão de Roma, da Convençãode Berna, a Convenção Americana de Buenos Aires,teve seu texto revisto em Havana, ao qual foi acrescidoo art. 13 bis:

�Quando um autor de obras literárias ou artísticascede suas obras com pleno exercício de seu direito depropriedade, apenas cede o direito de fruição e de reprodu-ção. Conserva sobre elas um direito moral de controleinalienável, que lhe permitirá opor-se a toda reproduçãoou exibição pública das obras alteradas, mutiladas oumodificadas�.

O Brasil não ratificou o referido texto. AssinalouStig Stromholm, o art. 13 bis é superior ao art. 6 bis daConvenção de Berna, visto que aquele difere o direitode gozo do direito moral, além de declarar que o direitomoral é inalienável.

Já em 1946, a Convenção de Washington delineouo direito moral do autor no art. XI:

�O autor de qualquer obra protegida conserva, logo quedispõe de seus direitos através da venda, cessão ou outramaneira, a faculdade de reivindicar a paternidade de suaobra e de se opor a qualquer modificação ou utilização quepossa ser prejudicial à sua reputação, a menos que, porconsentimento anterior, contemporâneo ou posterior, te-nha cedido essa faculdade ou tenha renunciado a ela, deconformidade com as disposições da lei do Estado no qualo contrato foi concluído�.

Na atualidade, a doutrina tem assim definido odireito moral do autor:

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Direitos Autorais 79○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Pouilet foi o primeiro autor a tentar uma defini-ção. Eis que sugeriu �o direito é o que emana da perso-nalidade do autor de criar e fazer respeitar esta perso-nalidade manifestada na obra artística ou literária�.D'Argoeuves considera imprecisa, porque não indica osujeito passivo do direito moral, antes sugere tratar deuma relação entre o autor e a própria obra. Todavia,uma relação de ordem jurídica não pode existir entreuma pessoa e uma coisa. Por definição todo o direito éuma relação entre pessoas. Osterrieth, por seu turno,definiu como a proteção do autor contra todo o atentadolevado a efeito sobre a obra sem o seu consentimento,com exclusão da sua exploração material. Piola Casellidefine como direito de tutelar a representação da pró-pria personalidade intelectual na obra citada.

Dina Herrera Sierpe124 cita Isidro Satanowskyque assim define direito moral: �Derechos Morales sonlos que permiten al autor crear la obra y hacer larespetar, defender su integridad en la forma y en elfondo. En este aspecto, el derecho intelectual aparececomo una manifestación, prolongación o emanación dela personalidad pués recae directamente sobre unaobra en si misma. Es el que expresa mejor el monopoliodiscrecional del autor. Se dice tambien que es la faz delderecho intelectual que concierne a la tutela de lafacultad creadora del individuo autor, iniciador de laobra como entidad propia. Pertenesse a la familia delos derechos que protegen la personalidad humana, decarácter extrapatrimonial, como el dercho a la vida, alhonor, la imagen, ao respecto del secreto. Por eso sedice que la protección del derecho de autor es el amparode la libertad individual o de actividad del honor y dela reputación del autor�.125

124. pp. 94/95 � ob. cit.

125. pp. 64/65 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais80○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Ante a doutrina, �direito moral é o aspecto dodireito intelectual que diz respeito à tutela da obracomo entidade própria, assentado em um duplo funda-mento: respeito à personalidade do autor e defesa daobra considerada em si mesma como um bem, comabstração do seu criador. A definição prática: �o direitomoral é aquele que, dentro do regime do direito deautor, se ocupa em salvaguardar a boa fama dos auto-res e compreende a faculdade do autor para exigir, emtodo caso, que seu nome seja mencionado e que asreproduções, representações, exibições e execuções desuas obras se façam sem menoscabo de sua honra e desua reputação� � Definição proferida na IV Conferên-cia Interamericana de Advogados.126

Stig Ströhmholm, citado por Hammes, define di-reito moral como sendo: �O princípio segundo o qual osautores podem a todo tempo requerer a proteção dodireito em favor de seus legítimos interesses de ordemnão patrimonial�.127

O Glossário da OMPI � Organização Mundial daPropriedade Intelectual lança o seguinte comentáriono verbete Direito Moral: �Entre estos derechos seincluye el derecho a decidir sobre la divulgación de laobra; el derecho a reivindicar la paternidad de la obra(hacer que el nombre del autor y el título de la obra seciten en relación con la utilización de la obra); elderecho a impedir la mención del nombre del autor si elautor de la obra desea permanecer anónimo; el derechoa elegir un seudónimo en relación con la utilización dela obra; el derecho a oponerse a toda modificación noautorizada de la obra, a la mutilación de ésta y acualquier atentado a ella; el derecho a la retirada de laobra, a la circulación pública previo abono de

126. p. 122 � ob. cit.

127. p. 100 � ob. cit.

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Direitos Autorais 81○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

compensación por los daños ocasionado a toda personaque haya recibido anteriormente una autorización vá-lida para utilizar la obra. En la mayoría de las legis-laciones de derecho de autor se reconocen los derechosmorales como parte inalienable del derecho de autor,distinta de los llamados derechos patrimoniales. Enalgunas legislaciones se estipulan derechos morales delos artistas intépretes o ejecutantes para protegerloscontra toda distorsión de sus representaciones oejecuciones, y se les concede el derecho a reinvidicar lamención de su nombre en relación con su representacióno ejecución.128

Confrontando a referida disposição com o enun-ciado do texto da Convenção Americana, revista emHavana, percebe-se que textualmente é nominado odireito à paternidade, a faculdade de renúncia, e àinalienabilidade do direito moral.

O fundamento do direito moral do autor está bemassentado na citação de Philadelpho Azevedo, ao desta-car as contemplações de Vincenzo Miceli, prof. da Uni-versidade de Pisa (1922), que demonstram o traço dosdireitos morais com a personalidade: �a personalidadeé apenas a condição fundamental para a posse de todoe qualquer direito, é a capacidade genérica, é o direitode ser tratado como sujeito�. Porém, pondera que nemtodos os direitos são inatos, alguns são constitutivos dapersonalidade, como os elementos do seu ser, aspectosde sua atividade, condições de adaptação entre a fun-ção e o sujeito � fisiológicas, psicológicas, sociais epolíticas. Distingue assim o direito de personalidade,�de ser o homem reconhecido como sujeito, de ser tra-tado como pessoa e não como coisa mero valor de fim enão de meio, independente de condições e qualidade,dos direitos da personalidade, que todo homem pode

128. p. 158 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais82○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

pretender em respeito às suas especificas qualidades eà sua especifica atividade�. �Divide estes direitos, se-gundo implicam ato de reconhecimento � a capacida-de, ou atos de respeito, a saber: à vida e saúde, àincolumidade espiritual, à natural liberdade, à indi-viduação, à honra, fama e reputação, ao segredo, àigualdade e à esfera econômica.� E conclui: �o direitomoral do autor inclui-se no de incolumidade espiritual,na categoria dos direito de respeito à honra, estima,etc.�.129

O direito moral provém do reconhecimento dafaculdade criativa, que não dissocia da personalidadedo autor eis o princípio do referido direito.Basicamentecaracterizado pela: Pessoalidade; Inalienabilidade; Per-petuidade; Imprescritibilidade; Impenhorabilidade eInsensibilidade.

Quanto à pessoalidade: o direito moral por suanatureza é estritamente pessoal, figurando como umaproteção à personalidade do autor, sendo irrenunciável.

Já a inalienabilidade se sustenta por ser o direitomoral personalíssimo, o que impede a sua cessão oualienação. Depois comenta que o autor não pode renun-ciar à defesa de sua personalidade, sob pena de haverum suicídio moral do autor. Carlos Alberto Bittar afir-ma que o direito moral não pode ingressar no comérciojurídico, mesmo que se queria o criador, pois dele nãopode dispor.130

A perpetuidade se caracteriza por ser o direitomoral de duração indefinida, posto que é irrenunciável.Tendo o seu exercício, quanto ao exeqüente da tutela,dividido em três momentos: o primeiro exercido pelopróprio autor, o segundo pelo herdeiros e o terceiro peloEstado, através do Ministério Publico Federal.

129. p. 63 � ob. cit.

130. p. 45 � Direito de Autor, 2ª ed., Ed. Forense Universitária, Rio,1997.

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Direitos Autorais 83○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

O princípio da imprescritibilidade fixa na deriva-ção constativa de que, se é perpétuo, não pode serprescritivo. O que permite ao autor conservar sua aqualidade de autor de uma obra, por toda a eternidade� característica de perpetuidade da personalidadehumana. Bem como a reivindicar a paternidade a qual-quer tempo.

Sobre a impenhorabilidade, Maria das GraçasRibeiro enfatiza: Do caráter inalienável resulta, comoconseqüência necessária para o direito moral, a suaimpenhorabilidade. Alcides Darras sustenta que a impe-nhorabilidade da obra resulta do direito que o autorpossui de modificá-la e de retirá-la de circulação.

A insensibilidade implica no impedimento de ces-são dos direitos morais, que procura basicamente con-servar a designação de exercício destes direitos aocriador. Prerrogativa esta que é personalíssima docriador, por conseqüência inadmite o exercício de direi-to moral pelo cessionário.

A expressão direito moral do autor é originária dadoutrina francesa do século XIX. Como demonstramos,no indicativo da natureza jurídica dos direitos auto-rais, o direito moral é tutelado implicitamente desde aprimeira lei autoral brasileira � 1898, Contudo, so-mente em 1973, com a Lei 5.988, foi feita referência aodenominado direito moral do autor, sob a nomenclatu-ra direitos morais (arts. 25 a 28).

Ao longo dos anos assim foram os enunciadoslegislativos, que previam os direitos morais do autor:

Lei 9.610/98:Art. 24. São direitos morais do autor:

I � o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria daobra;

II � o de ter seu nome, pseudônimo ou sinalconvencional indicado ou anunciado, como sendo o doautor, na utilização de sua obra;

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais84○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

III � o de conservar a obra inédita;IV � o de assegurar a integridade, opondo-se a quais-

quer modificações ou à prática de atos que, de qualquerforma, possam prejudicá-la, ou atingi-lo, como autor, emsua reputação ou honra;

V � o de modificar a obra, antes ou depois de utiliza-da;

VI � o de retirar de circulação a obra ou de suspenderqualquer forma de utilização já autorizada, quando acirculação ou utilização implicarem afronta à sua reputa-ção e imagem.

VII � o de ter acesso a exemplar único e raro da obra,quando se encontre legitimamente em poder de outrem,para o fim de, por meio de processo fotográfico ou asseme-lhado, ou audiovisual, preservar sua memória, de formaque cause o menor inconveniente possível a seu detentor,que, em todo caso, será indenizado de qualquer dano ouprejuízo que lhe seja causado.

§ 1º. Por morte do autor, transmitem-se a seus herdei-ros os direitos a que se referem os incisos I a IV

§ 2º. Compete ao Estado a defesa da integridade daobra caída em domínio público.

§ 3º. Nos casos dos incisos V e VI, ressalvam-se asprévias indenizações a terceiros, quando couberem".

Lei 5.988/73:�Art. 25. São direitos morais do autor.

I � o de reivindicar, a qualquer tempo, a paternida-de da obra;

II � o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal conven-cional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, nautilização de sua obra;

III � o de conservá-la inédita;IV � o de assegurar-lhe a integridade, opondo-se a

quaisquer modificações, ou à prática de atos que, dequalquer forma, possam prejudicá-la, ou atingi-lo, comoautor, em sua reputação ou honra;

V � o de modificá-la, antes ou depois de utilizada;

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Direitos Autorais 85○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

VI � o de retirá-la de circulação, ou de lhe suspenderqualquer forma de utilização já autorizada.

§ 1º. Por morte do autor, transmitem-se a seus herdei-ros os direitos a que se referem os incisos I a IV desteartigo.

§ 2º. Compete ao Estado, que a exercerá através doConselho Nacional de Direito Autoral, a defesa da integri-dade da obra caída em domínio público.

§ 3º. Nos casos dos incisos V e VI deste artigo, ressal-vam-se as indenizações a terceiros, quando couberem�.

O Código Civil:�Artigo 649: Ao autor de obra literária, científica ou

artística pertence o direito exclusivo de reproduzi-la.§ 1 Os herdeiros e sucessores do autor gozarão desse

direito pelo tempo de 60 (sessenta) anos, a contar do dia deseu falecimento.

§ 2 Se morrer o autor, sem herdeiros ou sucessores atéo 2º grau, o obra cairá no domínio comum.

§ 3 No caso de caber a sucessão aos filhos, aos pais ouao cônjuge do autor, não prevalecerá o prazo do § 1 e odireito só se extinguirá com a morte do sucessor�.

(...)

�Artigo 667: É suscetível de cessão o direito, que assisteao autor, de ligar o nome a todos os seus produtos intelec-tuais�.

(...)

�Artigo 659: A cessão ou a herança, quer dos direitos deautor, quer da obra de arte, literatura ou ciência, nãotransmite o direito de modificá-la. Mas este poderá serexercido pelo autor, em cada edição sucessiva, respeitadosos do editor.� ... omissis.

(...)�Artigo 1.357: �O editor não pode fazer abreviações, adi-ções ou modificações na obra, sem permissão de autor�.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais86○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Lei nº 496, de 1 de agosto de 1898:�ART. 5. � A cessão ou herança, quer dos direitos de

autor, quer do objeto que materializa a obra de arte,literatura ou sciencia, não dá o direito de a modificar, sejapara vendel-a, seja para exploral-a por qualquer for-ma�.131

Na Lei 496/1898 era reconhecido o direito depublicação (art. 1º), o direito de reconhecimento dapaternidade (art. 11), o direito ao respeito à integrida-de da obra (art. 5º), não contemplava apenas o direitoao arrependimento.

Observa-se que o princípio da inalienabilidade doDireito Autoral Moral só veio a ser previsto no CódigoCivil, de forma relativa, na medida que permitia acessão do direito de paternidade (art. 657), o que nãoocorreu em nenhum outro diploma.

Ainda no Código Civil, era reconhecido o direitode publicação (art. 649 � �caput� � por interpretaçãodedutiva, visto que só se reproduz aquela obra que nãoé inédita, ou seja, já foi publicada), o direito de pater-nidade (art. 667, §§ 1 e 2), o direito ao respeito (arts.659 e 1.357), o direito ao arrependimento também nãoestava contemplado.

Durante a vigência das disposições referentes aosdireitos autorais, constantes no Código Civil, sobre anomenclatura de propriedade literária, cientifica e ar-tística, passou a vigir no Brasil a Convenção de Berna,que, revista em Roma, gerou antinomia entre o tratadointernacional e o Código Civil.

Pedro Orlando indicava estes pontos que necessi-taram de reforma na legislação, quanto ao direito mo-ral:

131. Extrato retirado do livro: Princípios de Direitos Autorais, Eduar-do Pimenta, prelo.

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Direitos Autorais 87○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

�1 � revogar o parágrafo primeiro do art. 667 doCód. Civil, proibindo, ao revés, a cessão do nome literá-rio;

2 � precisar o direito de correção, no seu duploaspecto, positivo e negativo;

3 � determinar o regresso ao autor dos direitossobre a obra, no caso de perempção dos do cessionário;

4 � regular a transmissão �post mortem� do direi-to moral, inalienável e irrenunciável;

5 � restabelecer sua impenhorabilidade;6 � determinar expressamente a indenização do

dano moral, ao menos nessa matéria�.132

Na Lei 5.988/73, reconhecia-se o direito de publi-cação (art. 25, III), o direito de paternidade (art. 25, I),o direito ao respeito (art. 25, IV), e previu pela primeiravez o direito de arrependimento (art. 25, VI).

O Mestre mineiro Mílton Fernandes comentouquando da Lei 5.988/73: �Maior foi o desacerto do nossolegislador ao optar, no título do capítulo II, que encimaas normas mencionadas, pelo uso do plural: direitosmorais do autor. Embora composto de quatro elemen-tos, é uno o direito moral. O uso do singular é, por isto,generalizado�.133

Os quatro elementos a que se refere o jurista são:Direito ao Inédito, Direito a Paternidade, Direito aoRespeito, Direito de Arrependimento e pela nova leiacresce-se o Direito de Acesso a Exemplar Único.

Na Lei 9.610/98, todos os atributos foram reco-nhecidos, respectivamente, arts. 24, III; 24, I; 24, IV;24, VI; inovando com o Direito de Acesso a ÚnicoExemplar (art. 24, VII).

132. Direitos Autorais � Ed. Nova Jerusalém Ltda., São Paulo, s/data.

133. p. 7 � Direito de autor e a nova legislação Brasileira, in Rev.Jurídica Lemi, nº 101/ abril de 1976.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais88○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Conclusivamente, o direito moral do autor é abso-luto, oponível �erga omnes�, inalienável, irrenunciá-vel, inexpropriável, imprescritivel, e transferível porcausa morte e perpétuo.

Caracteristicamente, assinalava Pedro Orlando,ante a concepção doutrinária de plena autonomia dodireito autoral moral:

�a) funda-se no respeito à personalidade humana,em sua alta manifestação criadora de arte e ciência,universalmente reconhecido pela lei e pelo direito;

b) apresenta-se com caráter absoluto, perpétuo,intransmissível e irrenunciável;

c) consiste:1 � na segurança da paternidade da obra;2 � na defesa do inédito;3 � no arrependimento, primando sobre a cessão,

máxime no caso de inércia do cessionário na publica-ção, e até sobre a desapropriação;

4 � na faculdade imanente de correção, a despei-to de quaisquer convenções em contrário, salvo a inde-nização, se couber, qualquer que seja o grau de solva-bilidade do autor;

5 � no direito ao respeito, seu aspecto negativo,impedindo quaisquer modificações feitas por outrem,salvo autorização concedida �a posteriori�, indicadas,neste caso a data e o autor daquelas;

6 � na sua impenhorabilidade;d) transmite-se concorrentemente:1 � a executores individuais ou coletivos, desig-

nados especialmente;2 � aos herdeiros legítimos ou testamentários;3 � ao Estado, que o exercitará pelo órgão do

Ministério Público;4 � às associações literárias e artísticas;5 � a qualquer que vele pela intangibilidade da

obra e pela reputação do autor.

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Direitos Autorais 89○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

No aspecto positivo, a transmissão é restrita,limitando-se, salvo desejo em contrário do autor, àcorreção do que possa prejudicar à memória do morto.

e) dá lugar à indenização pelo simples dano moral,além do reflexo patrimonial, se houver, e exige meiosjudiciais hábeis para estancar imediatamente sua ofen-sa�.134

Fábio Maria de Matia cita um novo atributo dodireito moral: �O direito moral do autor permitirá opor-se ao emprego do título para designar uma obra nova�.135

Hermano Duval enfatiza que a proteção do direitomoral �deve ser entendida como a proteção da honra ereputação do autor considerado como autor e não comohomem�.136

Para Henry Jessen, o direito moral consiste:a) no direito ao inédito;b) no direito à integridade;c) no direito à paternidade;d) no direito ao repúdio;e) no direito ao arrependimento;f) no direito, em geral, a salvaguarda de sua honra

e reputação como autor�.137

Eduardo Vieira Manso, por seu turno, classificaos direitos morais, �de conformidade com sua inerênciaao sujeito titular, em direitos morais de natureza pes-soal e direitos morais de natureza personalíssima. Do

134. pp. 114/115 � ob. cit.

135. p. 321 � O autor e o editor na obra gráfica, Ed. Saraiva, São Paulo1975.

136. p. 12 � Direitos Autorais nas Invenções Modernas, Ed Andes, Rio1956.

137. pp. 33/34 � Direitos Intelectuais, Ed. Itaipu, Rio, 1967.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais90○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

primeiro grupo são aqueles modos de exercer o direitoautoral suscetíveis de transmissão, especialmente porcausa da morte do autor; do segundo são aqueles modosde exercer o direito autoral que não são suscetíveis detransmissão sequer �causa mortis�.138 São direitos mo-rais de natureza pessoal: direito ao inédito; direito denominação, direito de paternidade da obra e o direitosobre a integridade da obra. Já quanto aos direitosmorais de natureza personalíssima: o direito de modi-ficação da obra e o direito ao arrependimento.

Debois apontou as seguintes prerrogativas do di-reito moral:

� o direito de divulgação de publicar a obra;� o direito de arrependimento de revogação;� o direito de respeito à obra e� o direito à paternidade da obra.

Michaélides-Nouaros fixa as seguintes:� o direito de criar e de comunicar a obra ao

público;� o direito à paternidade da obra;� o direito de modificar a obra e exigir respeito

por terceiros;� o direito de revogação, por motivos pessoais dos

direitos cedidos;� o direito de destruir a obra como interditar a

destruição;� o direito de interditar à critica excessiva;� o direito de interditar todo atentado à persona-

lidade do autor.

A doutrina francesa indica outros atributos :� liberdade de pensar e criar;

138. p. 7 � ob. cit.

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Direitos Autorais 91○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

� direito de arrepender-se antes da publicação;� liberdade de publicação;� direito de arrepender-se depois da publicação;� direito ao respeito à integridade da obra como

ao título e ao nome do autor;� direito ao renome;� direito de intervir contra as reproduções im-

perfeitas;� direito contra a contrafação;� direito de resposta;� direito de interditar a destruição.

Stig Ströhmholm cita que outros doutrinadoresfranceses apontam novos atributos:

� o direito de autor com relação aos bens do casal;� o direito de acesso indireto;� o direito ao direito moral nas representações;� o consentimento pessoal do autor do contrato

de edição;� a obrigação do editor de proteger a obra;� a proteção dos interesses do autor na alienação

da empresa editorial.

Já a doutrina alemã enumera as seguintes prerro-gativas:

� o direito de publicação;� o direito ao reconhecimento da paternidade;� o direito de proibir a mutilação da obra;� o direito de arrependimento por mudança de

convicção;� o direito de acesso a obra de arte cedida;� o direito de proibir alterações a utilizar;� a intransferibilidade fundamental do direito

de autor.139

139. pp. 102/103 � RIDI-1(2), apud Bruno Jorge Hammes.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais92○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Contemplando sobre as afirmações dos citadosjuristas, podemos afirmar:

O atributo primeiro do direito moral sobre a cria-ção intelectual facultado ao autor é o direito ao inédito.A criação intelectual enquanto não for dado à publici-dade de forma a disponibilizá-la ao conhecimento pú-blico, não fica susceptível de sofrer qualquer desrespei-to ao direito moral do autor.

A respeito do direito ao inédito, destacamos umadas primeiras opiniões publicadas pela doutrina brasi-leira, a de Astholpho Rezende: �Inédito, quer philologi-camente, quer juridicamente, é o que ainda não foipublicado ou divulgado. A �forma� em que foi vasado oescripto inédito não influe sobre a definição, tanto podeser a manuscripta, como a resultante do emprego dequalquer processo mechanico, como é a machina deescrever (dactylographia) ou a machina de impressão(typographia, linotypia, etc)�.140

O direito ao inedito é reconhecimento ao autor doexercício da faculdade da primeira publicação. Porém,destaca-se que uma mera leitura de outrem não implicana publicação, mas certifica a autoria, e se necessário,a anterioridade.

Pelas características demonstradas, entendemosque o direito à paternidade da obra subdivide-se em:

1 � direito ao nome sobre a obra;2 � direito ao reconhecimento da condição de

autor;3 � direito de ter seu nome e sua obra menciona-

dos quando citado como fonte;4 � direito de ocultar o nome na obra.

140. p. 4 � Revista de Jurisprudência Brasileira , vol. XV, Ed. Marcelloe Cia, Rio, abril/1932.

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Direitos Autorais 93○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Quanto à integridade, temos aqui inseridos trêstermos que refletem a mesma característica: respeito,à integridade e à inviolabilidade.

Sobretudo, muito se versou sobre o objetivo dodireito moral do autor, se era com o fim de tutelar o bomnome cívico do autor, ou se era para proteger a reputa-ção literária e artística do autor. Entendemos que emanalise interpretativa, fundada no princípio de propor-cionalidade, o seu objetivo é o de proteger a honra ereputação literária e artística do autor.

Luiz Fernando Gama Pellegrini entende que asviolações de direito moral do autor ocorrem basicamen-te no que diz respeito à paternidade, integridade e àpublicação da obra.141

Adiciona José Carlos Costa Netto: �uma das ques-tões mais importantes seja reprimir o uso depreciativoda obra intelectual em todas as nuances que possaresultar. A respeito, a decisão do Superior Tribunal de!Justiça que condenou uma galeria de arte a indenizaro artista plástico pela realização de exposição de suasobras em detrimento do respeito ao seu autor�.

�Embora não se possa negar ao adquirente de umaobra de arte, especialmente em se tratando de galeriade arte, o direito de expô-la, não se pode deixar semproteção outros direitos decorrentes da produção artís-tica ou intelectual, tais como o da titularidade daautoria e o da intangibilidade da obra.

A teleologia da Lei 5.988/73, ao garantir a integri-dade da obra artística ou intelectual, veda a utilizaçãodesta em detrimento do respeito ao seu autor, ensejan-do reparação do dano causado� (R. Esp. 7.550-SP(91.0001018-9) � 4ª Turma, Rel. Sálvio de FigueiredoTeixeira, V.V).142

141. p. 32 � Direito Autoral do Artista Plástico, Ed. Oliveira Mendes,São Paulo, 1998.

142. p. 74 � Direito Autoral no Brasil, Ed. FTD, São Paulo, 1998.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais94○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

A esse pensamento associado à responsabilidadecivil pela violação de direito autoral moral, comentouHenry Jessen: �O atentado contra o direito moral só éressarcível pela correção e pela retratação. Nunca pelaindenização. Ou a alteração feita à obra é incompatívelcom a honra e a reputação do autor e unicamente a suaretirada do comércio e a cessação das execuções eexibições o deixarão satisfeito, ou a citada alteraçãonão constitui ofensa grave a seus sentimentos e, porconseguinte, não deverá servir de pretexto para extor-quir dinheiro a título de compensação pela injúriasofrida pela sua personalidade�.143

Todavia, enfatizamos que a responsabilidade ci-vil enunciada pela norma legal se submete aos seguin-tes critérios doutrinários: ato ilícito � comportamentovoluntário que infringe o dever jurídico, violativo doprincípio geral da ordem social: o de respeitar o alheioe não prejudicar os outros; nexo de causalidade � queaquele fato seja gerar do dano; e dano � prejuízo aopatrimônio econômico ou moral de alguém, �in casu� doautor.

Antônio Jeová Santos lembra: �O que determina odano moral indenizável é a conseqüência, o resultadoque do ato dimana. Não é o dano em si que dirá se eleé ressarcível, mas os efeitos que o dano provoca�.144

Portanto, por uma concepção moderna, onde odireito moral do autor é reconhecidamente um atributoda personalidade humana, destacamos o ensinamentode Carlos Alberto Bittar, que fixa quatro premissasbásicas e fundamentais, para medir-se o dano moral: �aprimeira, consiste em que os danos morais são compo-nentes afetivos e valorativos da personalidade huma-na; a segunda, é que o dano existe em si mesmo,

143. p. 37 � ob. cit.

144. p. 94 � Dano Moral Indenizável, ed. LEJUS, São Paulo, 1999.

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Direitos Autorais 95○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

independentemente de qualquer cogitação de prova, ouseja, trata-se de �damnum in re ipsa�; por terceiro, ovalor da indenização do dano moral deve representaruma sanção ao lesante, dentro da orientação que vigorahoje de que a reparação do dano moral para o lesanteconstitui um sancionamento; sendo que a quarta eúltima diz respeito à efetividade do processo, para quepossa o lesado, portanto, ter a real compensação pelosdanos sofridos�.145

Decerto que não é o cunho desta trabalho versarsobre a responsabilidade civil pela violação de direitoautoral moral, mas apenas não esquecer que ele podeser objeto de dano moral indenizável.

Neste sentir, é nítido que o direito autoral moraltem característica completamente diversa do direitopatrimonial. Algumas fixadas na lei, como enunciadono art. 27: Os direitos morais do autor são inalienáveise irrenunciáveis. Portanto os direitos morais não po-dem ser objeto de cessão, isto é a alienação. Todavia,não se tratando de alienação, e por dedução interpre-tativa o direito moral de autor pode ser objeto delicença ou concessão, uma vez que não há o impedimen-to legal de aplicabilidade destes institutos ao direitoautoral moral. O que admitimos, porque no ordena-mento jurídico existe a permissibilidade de represen-tatividade do autor na defesa do direito autoral moral(ex. art. 99, § 2º, 24, § 1º, e 2º da Lei 9.610/98).

145. Palestra proferida no II Ciclo de Estudos de Direito Econômico,patrocinado pela Escola Nacional da Magistratura, pelo Institutodos Advogados de São Paulo, e organizado pelo IBCB � InstitutoBrasileiro de Ciência Bancária.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais96○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

3.2.1 � Direito moral dos artistas intérpretes eexecutantes, produtores fonográficos eorganismos de radiodifusão

Quanto ao direito moral dos autores das criaçõesintelectuais tuteladas pelo direito conexo, conformeenunciado na Lei de Direitos Autorais, no art. 89 � quemanda aplicar as normas relativas aos direitos deautor, no que couber, tem-se por assimilação inter-pretativa analógica, �mutatis mutandis�, que os atri-butos enunciados do art. 24 da LDA aplicam-se no quecouber aos artistas intérpretes e executantes, produto-res fonográficos e organismos de radiodifusão, ou seja:

� direito à paternidade;� direito ao inédito;� direito ao arrependimento, respeitados os limi-

tes das indenizações a terceiros.

Além destes atributos, ressalta-se aqueles especí-ficos aos artistas intérpretes e executantes:

� direito ao respeito a imagem e voz do artista

Bem como, há atributos específicos às empresasde radiodifusão e aos produtores fonográficos:

� direito ao respeito ao �corpus mecanicum�.

Tais atributos morais são outorgados aos intér-pretes pelo art. 92 da LDA: a integridade; a paternida-de.

No âmbito do �stricto sensu�, Antônio Chavesaponta como primeiro direito moral do artista �a liber-dade de interpretação. Ao que comenta, ser �a liberda-de de interpretação, a marca, timbre, característica dodesempenho pessoal de cada um a distingui-lo dosdemais, e que caracteriza justamente a sua criação,

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Direitos Autorais 97○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

elemento fundamental de comunicação da outra cria-ção que é a do autor�.146

O jurista, enumera os seguintes atributos moraisdos artistas intérpretes e executantes:

� direito ao desempenho;� liberdade de interpretação;� direito à nominação;� direito à divulgação e à notoriedade.147

Walter Moraes aponta os seguintes atributos:� direito de ligar o nome à interpretação,� direito à integridade da execução, referindo-se

ao aspecto personalíssimo do direito do intér-prete, que divide em:1 � a faculdade de opor-se a uma divulgação

que acarrete prejuízos aos interesses artísti-cos do intérprete;

2 � a proibição de colocar a obra ao alcance dopúblico, de tal modo que este fato lese apersonalidade do artista;

3 � dever de respeito.

Tendo as leis apontado outros subatributos:4 � a faculdade de impedir a deformação da

obra;5 � a faculdade de impedir a modificação da

obra;6 � a faculdade de impedir a transposição de

uma interpretação fixada para outro suportefísico;

� direito de divulgar, ao que ressalta o Mestre:�Em princípio, porém, deve admitir-se, o �ius

146. p. 265 � Direitos Conexos, Ed. Ltr, São Paulo, 1999.

147. p. 264 a 278 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais98○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

disponendi� do artista não pode ser exercidonas mesmas condições do direito de autor. Citatrês subatributos indicados por LEHMAN:1 � de representação e execução;2 � de edição ou reprodução;3 � o direito de seqüela;

� direito de reproduzir, que subdivide em:1 � a reprodução da fixação de uma execução

direta;2 � a reprodução da fixação de uma execução

transmitida;3 � a reprodução de uma fixação já reproduzida;4 � distribuição dos exemplares reproduzidos;

� direito de transmitir, como atributo de direitomoral, por condições inadequadas a atuação doartista.148

3.3 � Direitos Autorais � Patrimonial

A nomenclatura da espécie adotada pela ciênciajurídica autoral, para expressar genericamente a prer-rogativa do autor sobre a utilização de sua obra intelec-tual, foi direito patrimonial � (que indubitavelmenteestá atrelada ao respeito do direito moral).

É o que passaremos a versar, em sentido �latosensu�.

Doutrinariamente, o direito patrimonial: É o as-pecto do direito intelectual que tem o autor, durantesua vida, de exclusivamente utilizar, fluir, dispor e de

148. p. 189 a 207 � Artistas Intérpretes e Executantes, Ed. RT, SãoPaulo, 1976.

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Direitos Autorais 99○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

autorizar sua utilização ou fruição por terceiros, notodo ou em parte, e obter dela um proveito pecuniário.Já na prática, direito autoral é a faculdade exclusivaque tem o autor, de explorar por qualquer processo suaobra, fixando o preço e as condições e as condições deexploração.

A definição de direito patrimonial dada por MarcoAurélio da Silva Viana é: �o direito exclusivo que tem oautor de explorar a obra intelectual, observados oslimites impostos por lei�.149 Dentre estes limites está orespeito ao direito moral.

O Glossário da OMPI lança o seguinte comentáriopara direitos patrimoniais: �En relación con las obras,son los derechos de los autores que integran el elemen-to pecuniario del derecho de autor, en contraposicióncon los derechos morales. Los derechos patrimonialessuponen, en general, que dentro de las limitacionesimpuestas por la legislación de derecho de autor, eltitular del derecho de autor puede hacer toda clase deutilizaciones públicas de la obra previo abono de unaremuneración. En particular, los derechos patrimo-niales comprenden la facultad para hacer o autorizarque se haga lo siguiente: publicar o reproducir de otromodo la obra para su transmisión (distribución) alpúblico: comunicarla al público mediante represen-tación o ejecución mediante radiodifusión o por hilo;hacer traducciones o cualquier tipo de adaptaciones dela obra y utilizarlas en público, etc.150

Walter Moraes assinala: Dentre os �modos deatuação do direito patrimonial � o desfrute, a explora-ção econômica do bem intelectual, ocorre ordinaria-mente mediante a publicação da obra: a publicação e o

149. p. 244 � Direitos Patrimoniais do Autor, Ed. UFMG, Belo Hori-zonte 1979.

150. p. 95 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais100○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

processo normal de explorar-lhe o valor patrimonial�.151

E completa suas reflexões: Publicar ou divulgar a obraé o mesmo que levá-la ao reconhecimento do público. Etornar o seu teor acessível a qualquer um�152 exempli-ficadamente como ocorre na internet.

3.3.1 � Internet*

A internet é um meio virtual de interação, instan-tânea e global. Por esta razão interpessoal, traz diver-sas preocupações para autores de obras intelectuais etitulares de direitos autorais, na medida em que elatambém é um meio de utilização da obra intelectual,sendo muito difícil a identificação do usuário. Contudo,esta utilização, dentro dos limites legais, deve serprecedida de uma autorização, com o respectivo paga-mento de �royalties�. Todavia, a grande celeuma que selevanta em torno da internet, no plano jurídico, resideno fato dela ser um veículo, onde os atos e fatos seremintangíveis. No qual a intangibilidade dos atos e fatosdificultam sua absorção no mundo jurídico, em razãoda eficácia probatória � o que se supera com o dispostono art. 332 c/c 131 do CPC, bem co!mo a definiçãoprocessual, quanto à competência � o que também sesupera com o disposto no art. 9º, par. 2º da LICC, queindica o local de residência do proponente.

A internet é apenas um veículo de comunicação aopúblico, de informações, de uso de obras intelectuaisetc. aos quais é permitido o acesso aos internautas.Nesta forma de utilização, intangível, primeiramente,

151. p. 120 � RIDI, nº 1, vol. 2

152. p. 121 � ob. cit.

* Extratos retirados do artigo publicado na Tribuna do Advogado /julho de 2001, em co-autoria com Dr. Campello de Oliveira.

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Direitos Autorais 101○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

no plano dos direitos autorais, deve tratar da autoriza-ção de uso da obra intelectual, por conseqüência deverespeitar os direitos patrimoniais e morais do autor.

A especialidade de sua normatização está maisafeta ao direito informático, direito este que é definidocomo sendo o conjunto de normas, princípios e institui-ções que regulam as relações jurídicas resultantes daatividade informática. Tal concepção doutrinária é umatendência internacional para a classificação normativada internet.

Dentre as ações a serem normatizadas tem-seaquelas praticadas contra a idoneidade das práticas narede, como a violação de e-mails (acesso indevido e ainterceptação), a invasão de �whinchester� alheio, aalteração de dados. Há também aquelas em que ainformática é o veículo ou o meio para a prática delitiva,como adulteração de cartões de crédito, o furto decentavos em conta bancária etc.

Reflexivamente, Ângela Bittencourt Brasil afir-ma: �Tudo, portanto, que diz respeito aos particulares,às relações entre os homens, constitui objeto do DireitoCivil. Assim também será no direito que se avizinha, ouno direito que poderá chegar, o Direito da Informática,onde a especialidade virá em primeiro lugar para dei-xar ao Direito Civil com a incumbência do que não lhecouber�.153

Daí a competência da jurisdição civil dos atoscivis praticados na internet estar definida na legisla-ção civil (art. 9º, § 2º da LICC � que indica a competên-cia legal do lugar onde residir o proponente; e o art.1.087do CC � que reputa-se competente o lugar onde foi ocontrato proposto).

153. p. 54 � A Informática Jurídica, o cyber direito, S/ed, Rio, 2000.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais102○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Todavia, dentre as ações praticadas na internet,estão normatizadas as que se referem à utilização dasobras intelectuais. A LDA � Lei de Direitos Autorais(9.610/98), em seu artigo 29, inciso X, dispõe: Art. 29 �Depende de autorização prévia e expressa do autor autilização da obra, por quaisquer modalidade, taiscomo: (...)

X � quaisquer outras modalidades de utilizaçãoexistentes ou que venham a ser inventadas.

Percebe-se que o disposto no inciso citado é umvalor de caráter genérico, o qual pode perfeitamenteagasalhar o uso de obras intelectuais feitas na inter-net. Porém, tendo em vista, o disposto no art. 31 daLDA, em que fixa que as diversas modalidades deutilização da obra intelectual são independentes entresi, a autorização para o uso de obras intelectuais deveter especificado o veículo �in casu� a internet.

Gustavo Testa Corrêa define internet como sen-do: �um sistema global de rede de computadores quepossibilita a comunicação e a transferência de arquivosde uma máquina a qualquer outra máquina conectadana rede, possibilitando, assim, um intercâmbio de in-formações sem precedentes na História, de maneirarápida, eficiente e sem a limitação de fronteiras, culmi-nando na criação de novos mecanismos de relaciona-mento�.154

O citado jurista versa ainda sobre o funcionamen-to de um dos serviços da internet, que é o WWW ( WorldWide Web), que consiste �numa convergência de con-cepções relativas à Grande Rede, a utilização de qual-quer computador ligado à Rede ao hipertexto, procuran-do relacionar toda a informação dispersa nela� (p. 11 �

154. p. 8 � Aspectos Jurídicos da Internet, São Paulo, Ed. Saraiva,2000.

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Direitos Autorais 103○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

ob. cit.). Em suma, é uma linguagem de padrão univer-sal, utilizada por um computador ligado à Rede.

A evolução do funcionamento entre computadoresda Grande Rede passa por quatro fases, segundo Gus-tavo Testa Corrêa, obedecendo ao protocolo de transfe-rência de hipertexto (�hypertext transfer protocol�, ouHTTP). São elas:

� �Conexão: nesta fase o navegador (web client)tenta relacionar-se com o servidor endereçado;

� Requerimento: nesta fase o navegador (�webclient�) especifica o protocolo, ou seja, define otipo de servidor selecionado;

� Resposta: esta é a fase da transação de infor-mações entre o navegador e o servidor;

� Fechamento: é a fase em que a conexão com oservidor é terminada�.155

Neste sentir, a internet é um sistema de comu-nicação ao público de informações, em hipermídia,dispersas no �cyberespaço�. Visto que para acessá-las énecessário o usuário contratar um provedor, quedisponibilizará o acesso à internet, proporcionando atransmissão de dados digitais, e permitindo o acesso àsinformações dispersas no �cyberespaço�.

Enfatizamos que o provedor, ao proporcionar acomunicação de qualquer dado digital (músicas, obrasde arte plásticas, etc.) , está fazendo a sua publicidade.Daí entendermos que a responsabilidade do provedorpara a publicidade de qualquer dado digital na inter-net, analogicamente, é aquela que tem o editor ao darpublicidade a uma música, ou um livro.

Ressaltamos o comentário de Joshua Eddings,citado por Maria Helena Junqueira Reis, que afirma: �a

155. p. 14 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais104○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

internet é uma sociedade de milhares de organizaçõese redes que trabalham cooperativamente sem um go-verno ou administração central. Funciona como umaanarquia porque não existe nenhum escritório ou gru-po que tenha autoridade sobre toda a rede. Ao contrá-rio, cada organização membro gerência e sustenta suaprópria rede e trabalha voluntariamente com seusvizinhos para direcionar o tráfego da Internet de umlado a outro.156

Neste sentir, também é o comentário de GeorgesLamazière � porta-voz da Presidência da República,ao comentar a atividade dos �hackers�: �A internet tempapel incontrolável na vida do cidadão e a segurançanessa área é fundamental�.157

Com suas características multifuncionais, a in-ternet permitiu um anonimato relativo (vide a impuni-dade dos �HACKERS�), com excessiva liberdade, a parde ter globalizado o direito, as relações de consumo, aefetivação da comunicação em tempo real independen-te da distância, modificando a competência jurisdicio-nal � em consonância com a teoria finalista, posto quepode ser acessado em qualquer lugar do planeta, enfimcaracterizando a universalização, ou melhor, fazendonascer uma nova classe na classificação romana dosdireitos civis, a dos DIREITOS UNIVERSAIS.

Daí, entendermos, que esta nova idéia está sujei-ta a grandes embates, que pode vir a estar revestida deerro ou exagero, mas que o tempo a porá em seu lugar,a começar pela diversificação das políticas especificasformuladas por cada um dos países do mundo.

156. p. 52 � Computer Crimes, Ed. Del Rey, Belo Horizonte, 1997.

157. p. 145 � Internet e Segurança são Compatíveis, Artur JoséConcerino: Direito & Internet, Coord. Newton de Lucca e AdalbertSimão Filho, Ed. Edipro, São Paulo, 2000.

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Direitos Autorais 105○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Quanto à natureza jurídica da internet, ela seadequa ao que Edmond Picard denominou de DIREI-TOS UNIVERSAIS � jura in Re universali, resultadode um mosaico de características de direitos pessoais,obrigacionais, reais e intelectuais, dentro de um novopadrão perceptível, porém intangível, unidos por vín-culos totalmente abstratos e intelectuais, portanto umregime único. Percebe-se que seus objetos jurídicos têmnatureza contraditória � os contratos eletrônicos nãotêm a formalidade necessária, a constatação da capaci-dade dos contratantes, a presença real como pressu-posto de manifestação e veracidade, da parte, em serquem diz que é. Tudo ocorrendo em um mundo virtual,sem fronteiras, podendo estar ali ou acolá, cuja distân-cia entre estes pontos pode ser de milhares de quilôme-tros, sem a obrigatoriedade, ou com a necessidade.

Ante todo o exposto, a internet é apenas mais umveículo de comunicação ao público no qual o uso da obraintelectual deve ser precedida de autorização exce-tuando os limites fixados pela LDA, portanto pode serretirada de circulação ou ter suspenso o seu uso, desdeque afronte a reputação e imagem do autor.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais106○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

106

4 A Jurisdição Voluntária naLei de Direitos Autorais

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

A Lei de Direitos Autorais (9.610/98), em suaespecialidade, além de fixar procedimentos processuaisde cautelares de jurisdição contenciosa,158 como o art.102, contempla medidas preventivas, de busca e apre-ensão ou a suspensão de divulgação, quer com objeto deassegurar ou conservar provas, enfim adquirir preven-tivamente dados probatórios, que com o correr do tem-po seria impossível obter, para a instrução do processoprincipal. O citado dispositivo prevê apenas a faculda-de do titular de direitos autorais, em pleitear tal medi-da, porém, por omissão, coloca a sua concessão deforma facultativa ao judicante. Já o artigo 105 prevê aconcessão de tutela antecipada, como uma faculdadecognitiva do judicante, em razão do poder analítico. Éo que se percebe, pelo uso do verbo na frase: �deverão

158. Piero Calamandrei já opinava pela exclusão de algumas medidasreferentes a direitos autorais, do âmbito das medidas cautelares:�creo que deben excluirse del número de las medidas cautelareslas providencias siguientes, no obstante que su denominaciónpueda inducir a engaño. (...)e) Lo mismo se puede decir con respecto al secuestro de las obrasque constituyen violación del derecho de autor y del derecho deexclusiva (arts. 65-66 de la ley de 7 de noviembre de 1925, nº 1950;art. 115 del R.D. de 13 de septiembre de 1934, nº 1602) a travesdel cual el autor o el inventor satisfacen su derecho de impedir eluso de àquellas mientras dura a su favor la protección de la ley(ejecución forzada de una obligación de no hacer) (p. 116 �Introducción al Estudio Sistemático de las Providencias Cautela-res � Ed. Librería �El Foro� � Buenos Aires � 1996).

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A Jurisdição Voluntária na Lei de Direitos Autorais 107○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

ser imediatamente suspensas ou interrompidas pelaautoridade judicial�. Bastando para tanto, o preenchi-mento de dois quesitos básicos, a ser avaliado pelojudicante: que seja feita a prova de ser o requerente:autor ou detentor dos direitos autorais, e a comprova-ção de utilização da obra intelectual, sem a devidaautorização � ou seja, prova inequívoca (a comprova-ção de que o requerente é autor ou detentor de direitosautorais) e a verossimilhança da alegação (a meraalegação do autor ou do detentor dos direitos autoraisde que a obra está sendo utilizada sem autorização).Também, pela especialidade da lei (9.610/98), tem-seimpedido o procedimento cautelar de penhora da recei-ta bruta (art.76), admitindo a penhora de parte dareceita o que se refere à parte do empresário. Previu,também, procedimentos de jurisdição voluntária paraa tutela dos direitos autorais. Assim, a LDA � 9.610/98, definiu alguns direitos processuais específicos paraa tutela dos direitos autorais.

A fixação de procedimentos para tutelar os direi-tos autorais, pela LDA, tornou-se necessária, não sópela especialidade da lei, como pela natureza �suigeneris� dos direitos autorais, bem como por relevânciados valores constitucionais, em especial o art. 5º, XXVII,da CF, que assegura ao autor ou detentor de direitosautorais o direito de exclusividade. Portanto, somenteo autor ou detentor de direitos autorais pode impedir ouso da obra intelectual.

Estas disposições legais procedimentares da LDAprevalecem sobre os demais diplomas legais sanciona-dos anteriormente, que vigem a par da lei especial deregência dos direitos autorais, cabendo porém a forma-lidade as disposições fixadas no Código de ProcessoCivil.

Tal contemplação é um reflexo do dever de coerên-cia do ordenamento jurídico, a ser observado pelo ope-

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais108○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

rador do direito, pois a lei de direitos autorais nãoprevê todos os procedimentos processuais, apenas indi-ca alguns.

Estas faculdades vêm de encontro com os enuncia-dos dos atos internacionais dos quais o Brasil e signa-tário. A Convenção de Berna � ratificada pelo Decreto75.699/75 � prevê em seu art. 6 bis, que trata dosdireitos morais, no nº 3:

3) Os meios processuais destinados a salvaguardar osdireitos reconhecidos no presente artigo regulam-se pelalegislação do país onde a proteção é reclamada.

A Lei de Direitos Autorais (LDA) previu um únicoprocedimento de jurisdição voluntária, que está enun-ciado no art. 24, VI, onde prevê o direito ao arrependi-mento, em que outorga a faculdade exclusiva do autorem retirar de circulação ou de suspender a utilizaçãode obra já autorizada, outorgando ao autor o podercognitivo analítico do que afronta a sua reputação eimagem.

Elementar destacar as características identifi-catórias do procedimento enunciado no art. 24, VI, daLDA como sendo de jurisdição voluntária.

Para tanto, citamos o enunciado:

�Art. 24. São direitos morais do autor:VI � o de retirar de circulação a obra ou suspender

qualquer forma de utilização já autorizada, quando acirculação ou a utilização implicarem em afronta à suareputação e imagem�.

Percebe-se que a outorga de exercício do direitomoral do autor em retirar de circulação a obra oususpender qualquer forma de utilização é subjetiva.

Tal subjetividade não admite contestação, ou con-trariedade da contestação, de quem quer que seja, no

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A Jurisdição Voluntária na Lei de Direitos Autorais 109○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

máximo admite dissenso, o que caracteriza ser pleitode jurisdição voluntária, não há partes por não havercontestação, há interessados, é o que afirmam JoséFrederico Marques, Lopes da Costa, Celso AgrícolaBarbi e Edson Prata.

Todavia, o legislador previu a possibilidade doautor arcar com os danos, quando pleitear com má-fé.Para tanto, assegurou na lei especial � LDA a devidaindenização a terceiros, quando cabível � art. 24, § 3º,cuja leitura interpretativa é; houver má-fé, mesmo jáestando definido em regra geral o princípio da respon-sabilidade por dano, contido no art. 159 Código Civil.

Onde tal faculdade é exercida pelo autor para aproteção de um determinado interesse: à sua reputaçãoe imagem. Neste sentir, é o indicativo característico dajurisdição voluntária dada por Moacyr Amaral Santos.

Em cujo procedimento de retirada de suspensãodo uso da obra visa prevenir futuros litígios pelaafronta à sua reputação e imagem. A prevenção defuturos litígios ou prevenção de ocorrência de lides sãocaracterísticas da jurisdição voluntária identificadapelos processual istas da lavra de Carnelutt i ,Calamandrei, Chiovenda, Edson Prata e SérgioBermudes.

Como já demonstramos, o direito moral do autor éinalienável, portanto indisponível. Ao que no sentidomaterial, já identifica com as concepções doutrináriasprocessualistas, como citamos por Edson Prata, que najurisdição voluntária os direitos versados são sempreindisponíveis.

Destaca-se que por força do disposto no art. 89 daLDA, tal prerrogativa de adoção de procedimento dejurisdição voluntária é extensiva aos autores de direi-tos conexos aos direitos de autor, como os intérpretes,executantes, produtores fonográficos e organismos deradiodifusão.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais110○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

O preceito (art. 24, VI, da LDA) visa tutelar odireito autoral moral, todavia pode a afronta tipificadano enunciado não só atingir o atributo moral, pode seestender ao atributo do direito patrimonial. Se o uso daobra intelectual é uma prerrogativa de direito autoralpatrimonial, devem ser respeitados os atributos dedireito autoral moral.O que constata-se a submissãodos direitos patrimoniais do autor aos direitos moraisdo autor. Neste sentido, o recurso de tutela previsto noart. 24, VI, da LDA, pode também ser usado para tutelados direitos autorais patrimoniais desde que atrelado àproteção dos direitos autorais morais, cujo núcleo dopreceito é: afronta à reputação e imagem do autor,mesmo que o uso tenha sido autorizado.

Eduardo Vieira Manso foi mais longe em suascontemplações, afirmou que tais prerrogativas abran-gem também as utilizações liberadas pela própria lei,como as limitações aos direitos autorais.159

O direito de retirada e o direito de arrependimen-to são originários do direito de autor francês (droit deretrait e droit repentir). O direito de retirada consistena vontade do autor de introduzir modificações na obradivulgada retirando-a de circulação e após modificadaretornando-a ao comércio. Já o direito de arrependi-mento consiste na suspensão da exploração econômicada obra, mesmo que decorrente de obrigação contra-tual. Ambos têm o mesmo objeto, mas causa que subje-tiva, difere.

O exercício do direito ao arrependimento pela viaprocessual do procedimento de jurisdição voluntáriapode derrogar o pleno exercício do direito do titular dosdireitos autorais, quando este não é o autor, mas ape-nas cessionário. Imaginativamente, na transferência

159. p. 9 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária na Lei de Direitos Autorais 111○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

de direitos autorais a figura de um cessionário, queteve a obra retirada de circulação pelo cedente, por serem seu juízo uma afronta a sua reputação e imagem douso feito.

Quanto à legitimidade, para adoção do procedi-mento de jurisdição voluntária no exercício da faculda-de do art. 24, VI, da LDA, tem-se a �prima facie�, sê-laexclusiva do autor por força do �caput� do referido art.24. Respeitando assim o enunciado da norma geral, oCódigo de Processo Civil, que tem como pré-requisitonecessário ao desenvolvimento regular do processo alegitimidade da parte (art. 6º do CPC). Entretanto, aLDA também outorgou o exercício do direito enunciadono art. 24, VI, ao ECAD � Escritório de Arrecadação eDistribuição de Direitos Autorais e às Associações deGestão de Direitos, que são distantes das AssociaçõesProfissionais (art. 99, § 2º c/c art. 97, § 1º, da LDA �9.610/98) Adiciona-se, ainda, que a Lei 5.988/73 permi-tia a autoria a pessoa jurídica. Desta forma, as obrascriadas pelas pessoas jurídicas sob a exegese dapermissibilidade da 5.988/73, outorgou-lhes o direitoadquirido de, pela lei atual (9.610/98), adotarem legiti-mamente os procedimentos da jurisdição voluntária,enunciada, no art. 24, VI, da LDA. Há ainda a faculda-de dada ao cônjuge, por força do Código Civil � arts.454 e 251, na incapacidade do cônjuge autor, em plei-tear a defesa dos seus direitos autorais.

Assim, podem requerer a retirada da obra decirculação ou suspender a sua utilização, por afronta àreputação e imagem, enfim por violação aos direitosmorais:

1 � o autor;2 � o cônjuge;3 � a pessoa jurídica, se autora, portanto a obra

deve ter sido criada, e/ou dada publicidade antes da lei1998;

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais112○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

4 � o ECAD � Escritório de Arrecadação eDistribuição de Direitos Autorais;

5 � as Associações de Gestão de Direitos;6 � o Estado, através do Ministério Público, para

as obras caídas em domínio público;7 � qualquer cidadão, para defesa da obra de

valor artístico ou estético, que esteja em domínio públi-co, compondo por sua vez o patrimônio público (art.1º §1º, da Lei 4.717/65).

8 � O editor � aquele que deu publicidade à obra� desde que a obra seja anônima. (art. 15, 3 da Conven-ção de Berna � Dec. 75.699/75.

Quanto ao objeto do enunciado direito, José Oli-veira de Ascensão observa que tal faculdade é denomi-nada de arrependimento, noutras ordens jurídicas. Eelucida o entendimento sobre o enunciado: �refere-sepois a formas de utilização da obra e não aos exempla-res em si, que estão definitivamente adquiridos: oquadro, o livro, a obra de arquitetura ...etc.160

Maria das Graças Ribeiro de Souza comenta: �Seo autor tem a faculdade exclusiva de determinar quan-do sua criação está em condições de ser entregue aopúblico, tem igualmente a de retirá-la de circulaçãoquando considera que a mesma não se ajusta mais aoseu modo de pensar. A situação que se apresenta é aseguinte: Um autor fez com editor um contrato, no qualforam estabelecidas obrigações recíprocas. A obra foipublicada. O contrato está em vigor. Em dado momen-to, contudo, o autor percebe que as idéias por eleexpostas não correspondem mais ao seu modo de pen-sar. A permanência, portanto, de tal obra ao alcance dopúblico poderá prejudicar sua reputação, suas idéias�

160. p.135 � Direito Autoral, 2ª ed., Renovar, Rio.

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A Jurisdição Voluntária na Lei de Direitos Autorais 113○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

atuais, seu próprio nome, enfim. De outro lado, o editorfez gastos com a reprodução da obra tendo em vista aobtenção de lucro. Surge, portanto, um conflito entreinteresses pessoais do autor e os interesses econômicosdo editor. A solução inclinar-se-á em favor do autor,que por seu turno, se responsabilizará pela reparaçãodos danos e prejuízos causados. Assim, entre dois inte-resses conflitantes: o do autor que não quer mais publi-car e o editor que, baseado no contrato (de edição emexecução), quer dar prosseguimento à publicação, pre-valece o do primeiro, já que o prejuízo econômico sofri-do pelo explorador da obra poderá ser eliminado comuma indenização pelo dano sofrido, o mesmo não acon-tecendo com a personalidade do autor�.161

Antônio de Almeida Santos enfatiza: �compreen-de-se facilmente que o legislador tenha avançado naproteção de personalidade dos autores até ao ponto desaltar por cima da força executória dos contratossinalagmáticos e de sacrificar um porventura atendívelinteresse público no conhecimento da obra, tal comocircula. (...) Outros, mais razoáveis, aconselham posi-ções intermediárias. Embora achando razoável, emcertos casos, a concessão ao autor da faculdade deretirar as suas obras da circulação, entendem nessário,ou conveniente, evitar excessos de susceptilidade porparte dos autores, pois que, se é justo respeitar as suasefetivas razões, já o não seria respeitar os seus capri-chos.(...) O direito moral deve, quando possivel, serabsoluto. Mas já sob o ponto de vista economico o autornão merece ao direito mais consideração que o editor ouempresário. Salve-se a sua honra; mas responda o seupatrimônio por toda a lesão do patrimônio doutrem.162

161. p. 229 � ob. cit.

162. p. 223 a 228 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais114○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

A caracterização da disposição de direito mate-rial, do art. 24, VI, da Lei 9.610/98 é feita pela uni-lateralidade da pretensão, devendo observar-se a legi-timidade de interesse, e a certeza do fato, ou seja, o�fumus boni iuris�, que consiste na caracterização deser o interessado autor ou titular (herdeiros) da obraintelectual, e a certeza do alegado para requerer aprovidência judicial.

Tecnicamente, do dispositivo da Lei de DireitosAutorais exclui-se o �periculum in mora�, por ser umafaculdade cognitiva analítica do autor. Ao qual é refe-rendado para os procedimentos de jurisdição conten-ciosa, na tutela antecipada do processo de conhecimen-to e no processo cautelar (arts. 798 e 273 do CPC). Aoque é definido por Piero Calamandrei: El �periculum inmora� que constituye la base de las medidas cautelaresno es, pues, el peligro genérico de daño jurídico, al cualse puede, en ciertos casos, obviar con la tutela ordinaria;sino que es, específicamente, el peligro del ulteriordaño marginal que podería derivar del retardo de laprovidencia definitiva, inevitable a causa de la lentituddel procedimiento ordinario. Es la imposibilidadpráctica de acelerar la emanación de la providenciadefinitiva, la que hace surgir el interés por la emanaciónde una medida provisoria; es la mora de esta providen-cia definitiva, considerada en si misma como posiblecausa de ulterior daño, la que se trata de hacer preven-tivamente inocua con una medida cautelar, que anteci-pe provisoriamente los efectos de la providencia defini-tiva�.163

Destarte, que como disposto no art. 24, VI, da Leide Direitos Autorais, o ato de requerer a suspensão de

163. p. 42 � Introducción al Estudio Sistemático de las ProvidenciasCautelares, Ed. Librería �El Foro�, Buenos Aires, 1996.

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A Jurisdição Voluntária na Lei de Direitos Autorais 115○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

utilização da obra ou a sua retirada de circulação, é umato de interesse exclusivo do autor, fundado em juízopessoal, não admitindo juízos estranhos, consistindoem poder discricionário do autor, o que caracteriza sê-lo apenas homologatório, ou seja, um procedimento dejurisdição voluntária, onde não há o contraditório,somente a sua manifestação de vontade, resultante desua análise, que por conseqüência é subjetiva, quandoa utilização afrontar a sua imagem e reputação, poisassim assegura a lei. O exercício do poder discricioná-rio do autor de retirar ou suspender a circulação daobra, não está sujeito a um prazo prescricional oudecadencial, podendo exercer enquanto viver.

Lembramos que no pleito procedimental para sus-pensão de utilização da obra ou sua retirada de circu-lação pode haver dissenso, a qual é a lição de JoséFrederico Marques, que leciona: ...�o contraditório en-tre as partes é traço exterior da jurisdição contenciosa.No procedimento de jurisdição voluntária, o que podesurgir é uma controvérsia ou dissenso de opiniões, quenão se confunde, como esclarece Carnelutti, como situ-ação contenciosa ou lide. Inexistindo lide, a jurisdiçãovoluntária é, por isso mesmo, um procedimento que sedesenvolve sem partes�.164

O mandato outorgado ao autor pelo art. 24, VI, daLDA é sumário e satisfativo. Por este pensamentoafirmou Edson Prata: �O processo da jurisdição volun-tária é muito mais simples e, pois, de sua natureza,rápido. A verdade que nele se procura não é a formalcomo no processo da ação, mas real, tanto quantopossível�.165

Devendo ser pleiteado por escrito, em petiçãoinicial em que indicará (art. 282 do CPC):

164. p. 83 � ob. cit.

165. p. 285 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais116○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

I � o juiz a quem é dirigido;II � os nomes, prenomes, estado civil e profissão,

domicilio e residência do requerente e interessados;III � o fato e fundamento jurídico do pedido, com

os documentos necessários;IV � o pedido, com a especificação da providência

judicial solicitada;V � as outras provas em que o autor pretende

demonstrar a verdade dos fatos alegados;VI � o requerimento de citação dos interessados,

bem como do Ministério Público e a Fazenda Pública, sehouver interesse;

VII � valor da causa.

Portanto, o juiz só intervém no pleito do interes-sado para dar o caráter público ao pleito voluntário,que o decidirá em 10 dias � art. 1.106 do CPC.166

Entretanto, lhe é facultado a inobservância do critériode legalidade estrita, podendo adotar em cada caso asolução que reputar mais conveniente ou oportuna(art. 1.109 do CPC).

Observa-se que na faculdade fundada no art. 24,VI, da LDA, não há exercício do poder analítico dojudicante, sobre o direito material, visto que há subje-tividade do direito moral do autor.

O procedimento de jurisdição voluntária, diziaGiuseppe Chiovenda, �como ato de pura administra-ção, não produz coisa julgada; assiste, sempre, ao inte-

166. Art. 133, II, do CPC: �recusar, omitir ou retardar, sem justomotivo, providência que deva ordenar de ofício, ou a requerimen-to da parte�.O art. 1.109 do CPC autoriza a inobservância do critério dalegalidade estrita relativamente à atividade processual nos pro-cedimentos de jurisdição voluntária, não podendo, porém alcan-çar o direito material (RJTAMG 51/126).

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ressado obter a revogação de um decreto positivo, vol-vendo ao próprio órgão que o emanou e convencendo-ode haver errado. Pode ainda o interessado preferir orecurso à autoridade superior; mas este direito derecurso não atribui nenhum caráter jurisdicional aoprovimento emanado ou por emanar-se; não tem sequera importância do recurso hierárquico do campo admi-nistrativo, porque no campo da jurisdição voluntária aausência de recurso não converte em definitivo o provi-mento da autoridade inferior. Ademais em qualquercaso é possível impugnar judicialmente um decreto dejurisdição voluntária, por defeito de condições�.167

Na esteira de Giuseppe Chiovenda, assimilamos,que preenchido a legitimidade e a certeza do fato e alémda subjetividade do interesse e o fito homologatório portratar de um direito material que justifique a decisãono provimento de jurisdição voluntária, é inapropriadaa cassação da decisão, �in casu� denominada de decre-to.

Todavia, admitimos a retratação da decisão, den-tro de uma análise �mutatis mutantis� aos fatos gera-dos pelo decreto.

Devemos, pois, considerar que o pleito funda-seem direito subjetivo indisponível, além do que o proce-dimento de jurisdição voluntária não tem o cunho de-claratório de direito, assim o direito de recurso é aregra principiológica do direito processual, quer emjuízo monocrático, quer no colegiado, porém aquele ficaimpedido havendo a interposição de recurso à instân-cia superior. A retratação da decisão na jurisdiçãovoluntária, ou seja, a sua anulação ou modificação, éperfeitamente possível por não gerar coisa julgada, epela faculdade do judicante em investigar ou colher

167. p. 24 � ob. cit.

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provas (art. 1.107 do CPC), o que é distinto de suaalteração, na qual a reapreciação é motivada por merapetição, se ela for interlocutória, ou se definitiva, pelorecurso de Embargos Declaratórios, somente para sa-nar enganos ou inexatidões materiais, não alterando oseu conteúdo. Contudo, há decisões que não admitemsequer a sua retratabilidade, como: o consentimentodado a um requerente para casar e que tenha efetivadoo casamento, ou ainda a suspensão de publicidade deum site na internet, ou até mesmo a retirada de circu-lação de um CD das lojas de discos. Lembramos que, najurisdição contenciosa, a irretratabilidade da decisãotem o condão de restabelecer a ordem jurídica, anteuma situação de fato.

Ante todo demonstrativo, enfatizo que o procedi-mento de jurisdição voluntária especificado na LDApode ser incidental em sede de procedimento conten-cioso principal ou preparatório de procedimento con-tencioso principal, como também pode ser preparatóriode procedimento voluntário principal, ou incidental doprocedimento voluntário principal.

Conforme demonstramos na lição de Pontes deMiranda, em Tratado das Ações: �As resoluções, sen-tenças ou decisões, proferidas em jurisdição voluntáriaou graciosa, não têm força material de coisa julgada,168

porque a coisa julgada material se liga à segurançaextrínseca, ao evitamento de litígios futuros. Uma dasconseqüências é a de que a Justiça, proferindo-as, nãofica tolhida de conhecer do mesmo objeto, achando-aposteriormente, noutro processo, injusta�.169

168. RT 516/82.�A coisa julgada formal subsiste na jurisdição voluntária, salvo aocorrência de circunstâncias supervenientes.� (Interpretação dosarts. 1.109 e 1.111 do CPC). RT 551/97.

169. p. 310 � Tratado das Ações, tomo I, 1ª ed., atualizada por VílsonRodrigues Alves, Campinas, 1998.

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A Jurisdição Voluntária na Lei de Direitos Autorais 119○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Fora de dúvida, a Constituição corporificou talentendimento em sentido genérico, assegurando emseu artigo 5º, XXXV, que a lei não excluirá da aprecia-ção do Judiciário lesão a direito � propiciando a efeti-va e tempestiva proteção, por ação judicial, contraqualquer forma de lesão.

Tem-se, aqui, uma ampla interpretação e aplica-ção do citado princípio, que se estende a todo ramo dodireito, quer no procedimento de jurisdição contencio-sa, pela obtenção da antecipação de tutela, seja emsede preparatória, seja em ação principal, ou ainda noprocedimento de jurisdição voluntária, como especifi-cado na lei de direitos autorais (LDA), em seu art. 24,§ 3º, que prevê a indenização a terceiros, que se senti-rem lesados, pelo exercício das prerrogativas dadas aoautor previstas no inciso VI do mesmo art. 24.

O legislador contemplou o usuário da obra inte-lectual, devidamente autorizado, com a faculdade deinterpor ação de indenização (art. 24, § 3º, da Lei 9.610/98), quando exercida pelo autor, injustamente, a reti-rada de circulação da obra ou a suspensão da utilização(art. 24, VI , do mesmo diploma).

Daí por que os excessos cometido pelo autor, comoa má-fé, a irreversibilidade do procedimento antecipa-do, tem sua sanção prevista pelo art. 24, § 3º, da Lei deDireitos Autorais (9.610/98), que dá a prerrogativa aolesado, em sede autônoma, pela ação indenizatóriadiscutir a matéria.170

170. �Não cabe reconvenção nos processos de jurisdição voluntária�(RSTJ 59/288, RJTJESP 93/179, 103/309).

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais120○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

4.1 � A Intervenção de Terceiros naJurisdição Voluntária, Segundo a Lei deDireitos Autorais

Como já demonstramos, na jurisdição voluntáriaa intervenção de terceiros só ocorrerá na forma deassistência, posto que nas demais formas haverá sem-pre o litígio.

A forma prevista pela LDA para a intervenção deterceiros no procedimento de jurisdição voluntária éenunciada pelo artigo 32, § 3º, em que permite a um dosco-autores assistir o outro.

O clássico fato a se destacar é a obra em co-autoria, ao qual já pronunciou o Superior Tribunal deJustiça: �Qualquer dos colaboradores da obra indivisí-vel tem autonomia para defender seus direitos, aindaque visando à resilição do contrato de edição, sendodispensável, portanto, a formação de litisconsórcio ne-cessário ativo� (RSTJ 105/324).

4.2 � A Jurisdição Voluntária Exercida peloMinistério Público Federal

Carnelutti entende que a ação do Ministério Pú-blico está na jurisdição voluntária, onde sua funçãosocial aparece visivelmente.

Na jurisdição voluntária, o Ministério Públicoatua motivado da oportunidade e da conveniência, naexecução de uma função social do Estado. Diferente-mente da atuação na jurisdição contenciosa, em queage para manter o respeito à lei. Daí por que a neces-sidade de citá-lo, sob pena de nulidade (art. 1.105 doCPC).

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A Jurisdição Voluntária na Lei de Direitos Autorais 121○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

A Lei de Direitos Autorais enuncia no art. 24, § 2º,o dever do Estado de defender o integridade da obracaída em domínio público.

Isto posto, entendemos que por não haver impedi-mento textual no exercício das faculdades dos procedi-mentos de jurisdição voluntária para a defesa dosdireitos morais do autor, ao Estado também é outorga-da a prerrogativa de suspender o uso ou retirar decirculação, obra de domínio público utilizada, cuja au-torização tácita é dada pela lei, conforme enuncia o art.33.171

Carlos Alberto Bittar observa: �ante a posição doEstado, de um lado, verdadeiro direito-dever, na defesada obra, exatamente para a proteção de valores dacultura do País e, de outro, caso particular de exercíciode direitos morais, por quem não detém a titularidadesobre a criação�.172

171. �Art. 33. Ninguém pode reproduzir obra que não pertença aodomínio público, a pretexto de anotá-la, comentá-la, ou melhorá-la, sem permissão do autor.�

172. pp. 52/53 � ob. cit.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais122○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

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5 Conclusão○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Denotamos que, na jurisdição voluntária, trata-se de interesses que não estejam em conflito, sobretudoversa-se sobre direitos indisponíveis. Neste sentido,quando a lei outorga ao autor direitos unilaterais,somente ele tem a prerrogativa de exercê-los, como o deretirar de circulação a obra ou suspender sua utiliza-ção. A lei fixa prerrogativa de decisão apenas do autor,logo não há conflito.

Assim, todo direito fixado em lei, imperativamen-te de caráter personalíssimo, portanto de decisão uni-lateral de vontade, que estiver sendo violado, para suaproteção será sempre exercida sua defesa por meroprocedimento, por caracterizar a jurisdição voluntária.

Compete ao Estado, através dos órgãos judiciais,desempenhar a função administrativa de �tutelar aordem jurídica mediante a constituição, asseguramento,desenvolvimento e modificação de estados e relaçõesjurídicas com caráter geral, ou seja, frente a todos�.173

�O juiz, nos pleitos de jurisdição voluntária, devese ater à realidade fática, ditando suas decisões comeqüidade.

Exigências extremas, por parte do juiz, podemrepresentar virtual denegação de Justiça a quem a

173. p. 74 � A Insolvência Civil, Humberto Theodoro Junior, 4ª ed.,Ed. Forense, Rio, 1998.

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Conclusão 123○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

suplica, gerando desprestígio para o Poder Judiciário edesencanto para o jurisdicionado� (RT 677/106).

Ante o exposto, tendo em vista a respeitabilidadedos princípios constitucionais de processo civil, especial-mente o que assegura a ampla defesa e o contraditório,é que na Jurisdição Voluntária, segundo o art. 1.105 doCPC, impõe a citação do interessado.

E se este se opuser ao alegado, em respeito aoprincípio da livre investigação do juízo, inserido no art.1.107 do referido diploma processual, poderá o judicanteproceder a investigação, ou ainda se se instaurar acontrovérsia � o contraditório, poderá � em respeitoà aplicabilidade do princípio da razoabilidade emassociação com o princípio da liberdade de adoção decritério da legalidade processual na jurisdição volun-tária (art. 1.109 do CPC) � o judicante desclassificar opleito procedimental de jurisdição voluntária para umprocesso de jurisdição contenciosa.

Dando uma conotação não dedutiva, de obrigato-riedade ao preceito do art. 1.105 do CPC, para ojudicante que goza da faculdade enunciada no art.1.109 do CPC.

Constatamos que, na concepção processualpositivista, os atos de Jurisdição Voluntária admiteminformações controvertidas, o que, salvo melhor juízo,é uma das formas de contradizer. Enquanto na Jurisdi-ção Contenciosa há o contraditório, por haver obrigato-riamente o contraditório.

Contudo, se ao ser citado, o interessado nos ter-mos do art. 1.105 do CPC, não se opuser, não geraráuma controvérsia. Tendo, portanto uma conotaçãoindutiva de que é um mero procedimento de JurisdiçãoVoluntária.

Assim, o Código de Processo Civil prevê a jurisdi-ção contenciosa e voluntária, sendo que aquela, doutri-nariamente, é caracterizada por ter partes e contradi-

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais124○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

tório dentre outros fatos, esta por não ter partes, nãohaver contraditório e consubstanciar mero ato jurisdi-cional de homologação, aprovação e autorização. En-tretanto, o Código de Processo Civil capitula no Proces-so Cautelar (arts. 867 a 873) meros procedimentos dejurisdição voluntária, sendo que na gênese do ProcessoCautelar sempre há o contraditório. Destarte que, oque é objetivado é a dedução de se não houver a contro-vérsia, a jurisdição é voluntária. Em contrário serácontenciosa. Na lei de direitos autorais o art. 24, VI,faculta ao autor o exercício de prerrogativas proce-dimentares de jurisdição voluntária, quando o uso desua obra intelectual, por ele autorizado, puder gerarafronta a sua reputação ou imagem. Bem como desubstituí-lo como facultado ao ECAD � Escritório deArrecadação e Distribuição de Direitos Autorais e asAssociações de Gestão de Direitos (art. 99 § 2º c/c art.97 § 1º da LDA � 9.610/98); a pessoa jurídica, queéautora das obras criadas sob a exegese da 5.988/73; e ocônjuge, por força do Código Civil � arts. 454 e 251, naincapacidade do cônjuge autor, em pleitear a defesa dosseus direitos autorais.

A classificação da faculdade do art 24, VI, da Lei9.610, como procedimento de jurisdição voluntária,decorre das características ditadas pela doutrinaprocessualista:

� quanto ao direito material:� que seja indisponível.

� quanto ao direito formal:� que não admite contestação, posto que a

constatação de uma afronta a reputação ouimagem é subjetiva do autor;

� que vise à proteção de um interesse do autor;� que procure prevenir futuros litígios.

Tais diretrizes emergem em consonância aos prin-cípios constitucionais da ampla defesa e do contraditó-

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Conclusão 125○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

rio (art. 5º, LV, da CF), inclusive na jurisdição voluntá-ria, o que caracteriza o evolutivo princípio da coerênciado ordenamento jurídico brasileiro.

A justiça e a lei devem ser aplicadas aos casosconcretos e, entretanto, o legislador prevê o devidoprocesso legal e o qual deve ser observado sob penalida-de de nulidades.

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A Jurisdição Voluntária nos Direitos Autorais126○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

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