A POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS NO ...siaibib01.univali.br/pdf/Simone...
Transcript of A POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS NO ...siaibib01.univali.br/pdf/Simone...
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS NO CASAMENTO BRASILEIRO
SIMONE AMORIM
Itajaí (SC), outubro de 2006
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS NO CASAMENTO BRASILEIRO
SIMONE AMORIM
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientadora: Professora MSc. Ana Lúcia Pedroni
Itajaí, (SC) outubro de 2006
AGRADECIMENTOS
Primeiramente à Deus, minha fortaleza, meu guia e meu conforto nas horas difíceis.
A minha família, por todo amor, carinho e respeito, que sempre me deram, por toda
confiança que sempre me depositaram.
A minha orientadora, Ana Lúcia Pedroni, que prontamente aceitou a tarefa de me auxiliar na
realização desta monografia, me acolhendo com dedicação e paciência, agradeço todo apoio e
disponibilidade despendida, que com sabedoria conduziu o rumo deste trabalho.
A Valdir Blasios Júnior, que me acompanhou desde o início do curso, incentivando o meu
crescimento intelectual, auxiliando-me a superar os obstáculos, sempre torcendo e acreditando no
meu sucesso profissional, agradeço por me ajudar a concretizar meus planos.
Aos amigos que conquistei nestes cinco anos de graduação, que sempre estiveram ao meu lado
nos momentos alegres, bem como nos momentos difíceis em que eu mais precisei deles, agradeço
a alegria, solidariedade, incentivo, carinho e compreensão que me proporcionaram.
E, finalmente a todos aqueles, que de alguma forma, foram especiais para mim, que até mesmo à distância, não mediram esforços para me ajudar
em todos os momentos, dando forças para enfrentar os desafios, acreditando no meu
potencial e me apoiando sempre, mostrando que com dedicação e confiança, tudo se torna
possível de realizar. A vocês minha eterna gratidão.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho monográfico aos meus pais, Clausio Amorim e Sueli Neide Amorim, que com muito sacrifício, luta, dedicação e principalmente
amor, abdicaram de seus sonhos para que eu pudesse realizar os meus; que mesmo perante as
dificuldades foram perseverantes para me proporcionar o estudo, incentivando e apostando
na minha carreira. Agradeço aos meus amados pais por sempre acreditarem em mim.
4
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí, 08 de novembro de 2006
Simone Amorim Graduanda
5
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Simone Amorim, sob o título A
POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS NO CASAMENTO
BRASILEIRO, foi submetida em oito de novembro de 2006 à banca examinadora
composta pelos seguintes professores: Msc. Ana Lúcia Pedroni (Orientadora e
Presidente da Banca), Msc. Andrietta Kretz (membro examinador), Msc. Marta
Elisaberh Deligdisch (membro examinador), e aprovada com a nota 10 (dez).
Itajaí, 08 de novembro de 2006
Msc. Ana Lúcia Pedroni Orientadora e Presidente da Banca
Msc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias1 que a Autora considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais2.
Casamento
“Casamento é o contrato de direito de família que tem por fim promover a união
do homem e da mulher, de conformidade com a lei, a fim de regularem suas
relações sexuais, cuidarem da prole comum e se prestarem mútua assistência”.3
Família
“(...) é a base da sociedade, tem especial proteção do Estado. Família é tanto a
que se origina pelo Casamento, como aquela que nasce da União Estável entre
um homem e uma mulher, que passa a ser protegida, como a formada por
quaisquer dos pais e sés descendentes, nos termos do artigo 226, da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988”.4
Mutabilidade do Regime de Bens
“(...) alteração do regime de bens, mediante autorização judicial requerida por
ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvado o
direito de terceiros”.5
1 “Categoria é a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia”.
PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 8 ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2003. p. 40.
2 “Conceito operacional [=cop] é uma definição para uma palavra e/ou expressão, com desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. P. 56.
3 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. v. 6. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 19.
4 LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil: direito de família e das sucessões. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 46.
vii
Pacto Antenupcial
“O pacto antenupcial é um contrato solene firmado entre os nubentes, com o
objetivo de escolher o regime de bens que vigorará durante o casamento”.6
Princípios
“A palavra princípio designa a estruturação de um sistema de idéias,
pensamentos ou normas por conceito mestre, de onde todos os demais
pensamentos derivam e se subordinam”. 7
Regimes Matrimoniais de Bens
“É o conjunto de normas aplicáveis às relações e interesses econômicos
resultantes do casamento. É o constituído, portanto, por normas que regem as
relações patrimoniais entre o marido e a mulher, durante o matrimônio”.8
Regime da Comunhão Universal de Bens
“É aquele em que se tornam comuns tanto os bens que os cônjuges já possuíam
antes do casamento, como aqueles que foram posteriormente adquiridos”. 9
Regime da Comunhão Parcial de Bens
“Regime da comunhão parcial é aquele em que, basicamente, se excluem da
comunhão os bens que os cônjuges possuem ao casar ou que venham a adquirir
por causa anterior e alheia ao casamento, como as doações e sucessões; e em
que entram na comunhão os bens adquiridos posteriormente. Trata-se de um
regime de separação quanto ao passado e de comunhão quanto ao futuro” .10
5 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. v. 6. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p.
42. 6 FIUZA, Ricardo. Novo Código Civil Comentado. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p.1512. 7 ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1998. p.47-48. 8 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. v. 5. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p.
145. 9 WALD, Arnold. O novo direito de família: curso de direito civil brasileiro. 14. ed. São Paulo:
Saraiva, 2002 . p.115. 10 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. p.206.
viii
Regime da Separação de Bens
“Regime da separação é aquele em que os cônjuges conservam não apenas o
domínio e a administração de seus bens presentes e futuros, como também a
responsabilidade pelas dívidas anteriores e posteriores ao casamento”. 11
Regime de Bens Legal Cogente ou Obrigatório
“Apesar de haver liberdade dos nubentes na escolha do regime de bens que lhes
aprouver, a lei, por precaução ou para puni-los, impõe, em certos casos, um
regime obrigatório. Entre nós, o regime obrigatório é o da separação de bens sem
a comunhão dos aqüestos, necessário em hipóteses excepcionais”.12
Regimes de Bens Convencional
“O regime de bens convencional é aquele que é estipulado pela vontade das
partes, por meio de pacto antenupcial”. 13
Regime da Participação Final nos Aqüestos
“Participação final nos aqüestos é o regime em que cada cônjuge possui o seu
patrimônio próprio, submetendo-se os bens adquiridos posteriormente à data do
matrimônio à partilha no caso de dissolução da sociedade conjugal”.14
11 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. p.215. 12 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. p.149. 13 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2004. p.188. 14 LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil: direito de família e das sucessões. p.163.
ix
SUMÁRIO
RESUMO ............................................................................................ XI
INTRODUÇÃO..................................................................................... 1
CAPÍTULO 1........................................................................................ 4
DO CASAMENTO................................................................................ 4 1.1 BREVE RELATO HISTÓRICO DO CASAMENTO NO BRASIL ......................4 1.2 CONCEITO DE CASAMENTO .........................................................................9 1.2.1 CARACTERES DO CASAMENTO ..............................................................12 1.2.2 FINALIDADES DO CASAMENTO ...............................................................15 1.3 NATUREZA JURÍDICA...................................................................................17 1.4 EFEITOS.........................................................................................................22 1.4.1 PESSOAIS ......................................................................................................23 1.4.2 SOCIAIS .........................................................................................................23 1.4.3 PATRIMONIAIS ................................................................................................24
CAPÍTULO 2...................................................................................... 25 2.1 PRINCÍPIOS GERAIS DOS REGIMES DE BENS..........................................25 2.1.1 PRINCÍPIO DA VARIEDADE DOS REGIMES DE BENS.............................................26 2.1.2 PRINCÍPIO DA LIBERDADE DOS PACTOS ANTENUPCIAIS......................................27 2.1.3 PRINCÍPIO DA MUTABILIDADE JUSTIFICADA DO REGIME DE BENS........................29 2.2 PACTO ANTENUPCIAL E SEUS REQUISITOS............................................30 2.3 REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS.......................................32 2.4 REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS............................................34 2.5 SEPARAÇÃO DE BENS ................................................................................38 2.5.1 SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA ....................................................................42 2.5.2 SEPARAÇÃO NÃO OBRIGATÓRIA............................................................43 2.6 REGIME DE PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQÜESTOS...............................44
CAPÍTULO 3...................................................................................... 49 3.1 ASPECTOS GERAIS......................................................................................49 3.2 A EVOLUÇÃO DA MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS........................50 3.3 REQUISITOS PARA A MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS.................53 3.3.1 AUTORIZAÇÃO JUDICIAL ..................................................................................53 3.3.2 PEDIDO CONJUNTO DOS CÔNJUGES..................................................................54 3.3.3 MOTIVAÇÃO RELEVANTE DO PEDIDO – INTERESSE PROCESSUAL.........................55 3.3.4 COMPROVAÇÃO, PERANTE O JUIZ, DA VERACIDADE DAS RAZÕES ........................58 3.3.5 DIREITOS DE TERCEIROS.................................................................................59 3.4 EFEITOS DA ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS.....................................60 3.5 ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS PARA CASAMENTOS CONTRAÍDOS NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916........................................................61
x
3.6 A MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS E A JURISPRUDÊNCIA ...........67
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................... 70
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS........................................... 74
ANEXOS............................................................................................ 82
RESUMO
O presente trabalho monográfico versa sobre a mutabilidade
do regime de bens no Casamento frente ao atual Código Civil Brasileiro. Entende-
se por mutabilidade do regime de bens a faculdade que os cônjuges possuem,
mediante pedido conjunto com as devidas motivações e ressalvados os direitos
de terceiros de requer ao juiz a modificação do regime de bens adotado quando
da celebração do matrimônio, durante a constância do casamento. Seu objetivo
geral é verificar, com base principalmente, na doutrina e legislação brasileira,
quais são os requisitos necessários e o procedimento a ser adotado para a efetiva
alteração do regime de bens, bem como seus efeitos. Para identificação dos
objetivos específicos, a pesquisa realizou-se a partir da doutrina, legislação e
jurisprudência brasileira, na busca de dados atuais a respeito da real possibilidade
de alteração do regime de bens para os casamentos contraídos antes de 11 de
janeiro de 2003, data esta em que passou a vigorar o atual Código Civil. Quanto
à metodologia empregada, registra-se que nas Fases de Investigação e do
Relatório dos Resultados foi utilizado o Método Indutivo e acionadas as Técnicas
do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica.
Observou-se que, a possibilidade de alteração do regime de bens, durante a
constância do casamento, surgida com advento do Código Civil de 2002,
oportunizou aos cônjuges modificar o regime de bens adotado quando realizado o
casamento, para o que melhor atender aos seus interesses.
1
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto A Possibilidade de
Alteração do Regime de Bens no Casamento Brasileiro e como objetivo
institucional a elaboração do presente trabalho científico para obtenção do Título
de Bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
O objetivo geral do trabalho é pesquisar sobre a
possibilidade de alteração do regime matrimonial na constância do casamento.
Os objetivos específicos foram : destacar os aspectos legais,
bem como a interpretação jurisprudencial sobre a possibilidade de alteração do
regime matrimonial; identificar quais são os requisitos necessários e os
procedimentos a serem adotados para a efetiva alteração do regime de bens;
verificar a possibilidade de alteração do regime de bens aos casamentos
contraídos antes de 11 de janeiro de 2003, data esta em que passou a vigorar o
atual Código Civil.
A escolha do tema deu-se em decorrência do interesse da
acadêmica pelo Direito de Família Brasileiro, levando-a a aprofundar seu
conhecimento acerca da mutabilidade do regime de bens, em razão de ser uma
inovação surgida com o advento do atual Código Civil, suas polêmicas e
principalmente a grande importância que tem perante as sociedades conjugais, e
discussões surgidas a respeito da aplicabilidade aos casamentos contraídos sob
a vigência do Código Civil de 1916.
A monografia, ora apresentada, encontra-se dividida em três
capítulos. No Capítulo 1, abordar-se-á o instituto do casamento no Brasil,
delineando um panorama histórico desde a Colonização, Império e Período
Republicano até os dias atuais. Também neste capítulo será efetuada uma
abordagem a respeito das características, natureza jurídica, conceitos, fins e
efeitos do Casamento, no Direito Brasileiro.
2
No Capítulo 2, realizar-se-á um estudo sobre os regimes
matrimoniais de bens no Direito Brasileiro, desde os princípios norteadores até o
pacto antenupcial e seus requisitos. Demonstrar-se-ão, também os conceitos e as
principais características de todos os regimes de bens existentes na atual
legislação brasileira e em tópicos separados, o regime da comunhão universal de
bens, o regime da comunhão parcial de bens, o regime da separação de bens, o
regime de participação final nos aqüestos.
No Capítulo 3, tratar-se-á de ressaltar especificamente o
tema central do presente trabalho, informando acerca da real possibilidade de
alteração do regime de bens no direito brasileiro, destacar-se-ão os aspectos
gerais e a evolução no ordenamento jurídico brasileiro sobre a mutabilidade do
regime de bens. Estudar-se-ão ainda, os requisitos necessários para o pedido de
alteração do regime de bens e os efeitos produzidos pela sentença procedente.
Para finalizar o capítulo, será feito um breve destaque da possibilidade de
alteração do regime de bens para casamentos contraídos na vigência do Código
Civil de 1916, através da doutrina, legislação e a título ilustrativo através dos
entendimentos dos Tribunais, destacando entre eles o Superior Tribunal de
Justiça, os Tribunais de Justiça dos Estados do Rio Grande do Sul e Santa
Catarina.
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais serão apresentados os pontos conclusivos da
pesquisa, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre A Possibilidade de Alteração do Regime de Bens no Direito Brasileiro.
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses:
O Código Civil de 2002 modificou as disposições relativas à imutabilidade dos regimes de bens, possibilitando sua alteração mesmo que o casamento tenha se realizado sob a égide do Código Civil de 1916.
3
Os efeitos da sentença que altera do regime de bens podem ser ex tunc ou ex nunc, contudo deverá constar expressamente do pedido.
O pedido de alteração do regime de bens adotado deve, sem exceções, ser formulado por ambos os cônjuges e é possível em qualquer tipo de regime.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo15.
Em virtude da existência de elevado número de categorias e
conceitos operacionais, importantes para a melhor compreensão deste trabalho,
optou-se pela elaboração de um rol específico.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas, do Referente16, da Categoria17, do Conceito Operacional18 e da
Pesquisa Bibliográfica.
15 “pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção
ou conclusão geral”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. p. 85.
16 “É a explicação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. p. 63.
17 “É a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. p. 37.
18 “É uma definição para uma palavra e expressão, com o desejo de qu tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. p. 51.
4
CAPÍTULO 1
DO CASAMENTO
1.1 BREVE RELATO HISTÓRICO DO CASAMENTO NO BRASIL
Para adentra-se no estudo sobre o instituto do Casamento,
faz-se necessário tecer um breve relato acerca de sua origem no ordenamento
jurídico brasileiro.
As normas, no Brasil, em geral, desde seu descobrimento,
não surgiram dos costumes locais, porém, de um ordenamento imposto pelo
colonizador, pois segundo Demo19: “(...) foi a legislação portuguesa que governou
o Brasil até a instalação do império pátrio, em 1822, e continuou produzindo
efeitos até sua total revogação (...).”
Trazendo-se, então, a influência da legislação de Portugal
para o âmbito do Casamento, Pedroni20 explica que:
Portugal adotava as formalidades do Casamento romano cristão e introduziu, nos costumes brasileiros, as mesmas solenidades. Nesse sentido, durante séculos a Igreja dominou os direitos sobre a instituição do Casamento.
19 DEMO, Wilson. Manual de história do direito. 2 ed. Florianópolis: OAB/SC, 2000. p. 127. 20 PEDRONI, Ana Lúcia. Dissolução do vínculo matrimonial: (Des) necessidade da separação
judicial ou de fato como requisito prévio para obtenção do divórcio no direito brasileiro. Florianópolis: OAB/SC, 2005. p.30.
5
Ainda nesse sentido, Cahali21 destaca que somente o
casamento religioso era reconhecido e celebrado de acordo com o Código
Canônico, obedecia às disposições do Concílio de Trento e também da
Constituição do Arcebispado da Bahia, e seus efeitos continuaram a ser
produzidos até mesmo com a proclamação da independência do Brasil.
Lima23 leciona que: “a evolução histórica da legislação
matrimonial brasileira passou por dois estágios: o período colonial e o período
republicano”.
Assevera o referido autor, que no Brasil-Império, em
princípio, se conheceu apenas o Casamento católico, que era considerado pela
Igreja como sacramento instituído por Jesus Cristo. Com o passar do tempo,
devido ao crescimento populacional, o número de acatólicos aumentou, gerando
assim um drama de consciência: absterem-se do Casamento ou realizar
contradições com suas convicções espirituais.
Instituiu-se, a partir daí, pela Lei de 11 de Setembro de
1861, regulamentada pelo decreto de 17 de Abril de 1863, contiguamente com o
Casamento eclesiástico, considerado como o único regulado pela lei, o
Matrimônio acatólico, pelo qual poderiam se unir às pessoas pertencentes a
seitas dissidentes24.
Assim, três modalidades de Casamento passaram a ser
praticadas, destacadas por Pereira25
21 CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. 9 ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2000. p.
40. 5 LIMA, Domingos Sávio Brandão. A nova lei do divórcio comentada. São Paulo: O, Dip.
Editores Ltda, 1978. p. 42-44. 24 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. v. 5. 11 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1999. p. 40. 25 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 41.
6
1° casamento católico, celebrado segundo as normas do Concílio de Trento, de 1563, e das Constituições do Arcebispado da Bahia;
2° casamento misto, entre católico e acatólico, realizado sob a disciplina do Direito Canônico;
3° casamento que unia membros de seitas dissidentes, em obediência às prescrições religiosas respectivas.
Denota-se que várias foram as tentativas de retirar o
Casamento da seara da Igreja e levá-lo ao âmbito civil. Um dos projetos que
surgiram foi do Visconde de Ouro Preto, ocorrendo em 7 de Junho de 1.889 uma
breve apresentação sobre o Casamento Civil, contudo, somente com a
Proclamação da República veio a ser realizado.26
No tocante, acrescenta Cahali27:
Várias tentativas visaram a secularização do Casamento, mas somente com a República, mercê da laicização do Estado, veio o instituto a perder o caráter confessional, através do Decreto 119 – A, de 07.01.1980.
E por esta razão, o Casamento durante todo o período
Imperial, foi regido pelas normas do Direito Canônico, sob o total domínio da
Igreja Católica, sendo o Casamento religioso a única forma legítima de união,
ressaltando a Constituição Imperial de 1824 previa a Religião Católica como
oficial, não sendo um Estado laico.
No período republicano, o Casamento civil foi instituído no
Brasil pelo Decreto n. 181, de 24 de janeiro de 1890, o qual introduziu no
Ordenamento Jurídico Brasileiro o Casamento Civil. A partir dessa data, o Estado
não mais atribuía valor jurídico ao Casamento religioso, passando a ser um ato de
interesse da consciência individual adstrito à religião.
26 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 41. 27 CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. p. 41.
7
A Constituição da República dos Estados Unidos do Brazil28,
de 24 de Fevereiro de 1891, estabeleceu a obrigatoriedade do casamento civil,
onde somente o casamento civil seria reconhecido pela República, através do art.
72, § 4°, que prescrevia:
Art. 72. A Constituição assegurava a brazileiros, e estrangeiros residentes no Paíz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade nos termos seguintes:
(...)
§ 4° A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita.
Oportuna é a colocação de Pedroni29:
A partir dessa época, o Casamento Civil foi generalizado no Brasil, passando o Casamento Religioso a ser um interesse da consciência individual, consolidando-se o hábito de celebrar o Casamento Civil paralelamente ao religioso, duplicidade ainda cultivada pelos hábitos atuais.
O Código Civil de 191630 consolidou e regulamentou o
casamento exclusivamente civil, não fazendo nenhuma menção ao Casamento
Religioso, isto porque o a partir de 1891 o Brasil tornou-se um Estado laico, pois
não mais estabelecia nenhuma religião como oficial.
Contudo, ressalta Pereira31, “sob o fundamento de serem
desaconselháveis as duplas núpcias, medrou a idéia de se atribuírem efeitos civis
28 BRASIL, Constituições do Brasil: 1824, 1891, 1934, 1937, 1946 e 1967 e suas alterações. p.
768. 29 PEDRONI, Ana Lúcia. Dissolução do vínculo matrimonial: (Des) necessidade da separação
judicial ou de fato como requisito prévio para obtenção do divórcio no direito brasileiro. p.35. 30 BRASIL, Código Civil. Lei n° 3.071, de 01 de Janeiro de 1916. 31 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil. p. 41.
8
ao casamento religioso (Constituição de 1.934, art. 146)”. Considerando essa
idéia, a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil32 promulgada a
16 de Julho de 1934, reconheceu esses efeitos em seu art. 146, que assim
preceituava:
Art. 146 O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casamento perante ministro de qualquer confissão religiosa, cujo rito não contrarie a ordem pública ou dos bons costumes, produzirá, todavia, os mesmos effeitos que o casamento civil desde que, perante a autoridade civil, na habilitação dos nubentes, na verificação dos impedimentos e no processo da opposição, sejam observados as disposições da lei civil e seja elle inscripto no Registro Civil. O registro civil será gratuito e obrigatório. (...).
A lei n. 1.110, de 23 de Maio de 195033, regulamentou o
reconhecimento dos efeitos civis ao Casamento religioso, desde que os nubentes
requeressem sua inscrição perante o Oficial de registro civil após sua realização.
Atualmente o Casamento religioso está previsto no art. 226,
§ 2° da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que assim dispõe:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
(...)
§ 2° O casamento religioso tem efeitos civis nos termos da lei.
E, no código Civil34 atual, disciplina a matéria em seu artigo
1. 515, o qual prevê:
32 BRASIL, Constituições do Brasil: 1824, 1891, 1934, 1937, 1946 e 1967 e suas alterações. p.
175. 33 BRASIL, Lei 1.110, de 23 de Maio de 1950. Regula o reconhecimento dos efeitos civis do
casamento religioso.
9
Art. 1.515. O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração.
E mesmo com as grandes transformações em relação ao
Casamento, a sociedade continua por manter o Casamento civil e o religioso,
assim ressalta Pereira35: “a população brasileira continua com os dois
casamentos – civil e religioso – sendo crescente, em números relativos, a parcela
dos que se utilizam apenas do religioso nos dois efeitos, eclesiástico e civil”.
Após este breve histórico sobre casamento no Brasil, faz-se
necessário o estudo mais aprofundado do instituto do Casamento.
1.2 CONCEITO DE CASAMENTO
O casamento, como todas as instituições sociais, varia com
o tempo e com os povos. Provavelmente, não existe, em todo o direito privado
instituto mais discutido.
Pedroni36 entende que, “por tratar-se de um dos mais
antigos e consagrados institutos da sociedade, o Casamento sempre esteve
envolto a polêmicas relativas a sua natureza jurídica, conceitos, características e
finalidades”.
Em decorrência disto, é improvável encontrar um conceito
universal para a palavra Casamento. Diante dessa dificuldade, Gomes37 destaca
que: “o conceito de casamento é geralmente dado com referência a elementos
espirituais ou morais que uma noção jurídica verdadeiramente não comporta”.
34 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Novo código civil e legislação correlatada da família. Porto
Alegre: Síntese, 2003. p. 21. 35 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 42. 36 PEDRONI, Ana Lúcia. Dissolução do vínculo matrimonial: (Des) necessidade da separação
judicial ou de fato como requisito prévio para obtenção do divórcio no direito brasileiro. p. 43. 37 GOMES, Orlando. Direito de família. 14 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 55.
10
Os conceitos mais remotos de casamento podem ser
localizados nas fontes romanas, suas bases se fundaram no affectio maritalis,
apresentando duas definições, as quais Lima38 cita:
A primeira é a de Modestino (Dig. 23, 2, 1), segundo o qual nuptiae sunt, conjuctio maris et feminae et consortium omnis vitae, divini et humani júris communicatio – a união do homem e da mulher, o consórcio para toda a vida, a comunhão de direito divino e humano. Guarda relação com ela a que se encontra nos institutos de Justiano (Ins. 1, 9, pr.), atribuía a Ulpiano, caracterizando-o como a união do homem e da mulher que implica identidade de condição na vida – vivi et mulieris conjunctive, individuam consuetudinem vitae continens.
Do dispositivo inaugural do Livro Especial destinado ao
Direito da Família, artigo 1.511 do atual Código Civil39, extrai-se que casamento
tem o fim: “de estabelecer comunhão plena de vida, com base na igualdade de
direitos e deveres dos cônjuges”, pois o legislador expressamente define o que
seja casamento e quais são os seus pressupostos de existência e de validade,
intrinsecamente.
Ainda sobre conceituação jurídica do casamento, dispõe o
atual Código Civil40, em seu artigo 1.565 “ homem e mulher assumem
mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos
encargos da família.”
Diversos são os conceitos dados pelos doutrinadores a
instituição Casamento. Para Rizzardo41:
O casamento vem a ser um contrato solene pelo qual duas pessoas de sexo diferente se unem para constituir uma família e viver em plena comunhão de vida. Na celebração do ato,
38 LIMA, Domingos Sávio Brandão. A nova lei do divórcio comentada. p. 20. 39 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Novo código civil e legislação correlata da família. p. 19. 40 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Novo código civil e legislação correlata da família. p. 53. 41 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. 3 ed. Rio de Janeiro. Forense, 2005. p. 17.
11
prometem elas mútua felicidade, assistência recíproca, e a criação e educação dos filhos.
Cahali42 define que é:
Através do matrimônio que duas pessoas de sexo diferente adquirem o estado familiar de cônjuges, que por sua vez é fonte de direitos e obrigações recíprocas, representados principalmente pela comunhão moral, espiritual, objetiva e material, o que não coincide necessariamente com os efeitos que resultam das relações pessoais entre companheiros.
No direito brasileiro, duas definições são consideradas
clássicas. A primeira é a de Pereira43: “(...) o casamento é o ato solene pelo qual
duas pessoas de sexo diferente se unem para sempre, sob a promessa recíproca
de fidelidade no amor e da mais estreita comunhão da vida”.
A segunda definição referida é a de Beviláqua44, que
apresenta um conceito clássico, contratualista:
O casamento é um contrato bilateral e solene, pelo qual um homem e uma mulher, se unem indissoluvelmente, legalizando por ele suas relações sexuais, estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de interesses, e comprometendo-se a criar e educar a prole, que de ambos nascer.
Todavia outros doutrinadores conceituam o casamento,
sendo que para Diniz45, “o casamento é o vínculo jurídico entre o homem e a
mulher que visa auxílio mútuo material e espiritual, de modo que haja uma
integração fisiopsíquica e a constituição de uma família legítima”.
42 CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. p. 23. 43 PEREIRA, Lafayette Rodrigues. Direitos e família. Campinas: Russell editores, 2003. p. 47. 44 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito de família. São Paulo: Red Livros, 2001. p. 46. 45 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, v. 5. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p.
29.
12
Já para Pereira46, mesmo entendendo que não existe
uniformidade na caracterização do casamento, define-o como sendo “a união de
duas pessoas de sexo diferente, realizando uma integração fisiopsíquica
permanente”.
E nessa temática, Rodrigues47 define:
Casamento é o contrato de direito de família que tem por fim promover a união do homem e da mulher, de conformidade com a lei, a fim de regularem suas relações sexuais, cuidarem da prole comum e se prestarem mútua assistência.
Conforme constatou-se, cada doutrinador apresenta sua
definição própria de Casamento, inexistindo a mais ou menos exata. Porém, a
doutrina assinala alguns pontos em comum entre elas, constituindo, assim,
verdadeiros pressupostos da existência jurídica do casamento, que são: a
diversidade de sexo, a celebração do Casamento em conformidade com a lei e o
consentimento dos nubentes.
Oliveira48 considera casamento:
O negócio jurídico de Direito de família por meio do qual um homem e uma mulher se vinculam através de uma relação jurídica típica, que é a relação matrimonial. Esta é uma relação personalíssima e permanente, que traduz ampla e duradoura comunhão e vida.
Esclarece o doutrinador que o casamento é negócio jurídico
bilateral e que não utilizou a expressão “contrato” pela circunstância de que, no
Brasil, a palavra “contrato” tem, de regra, aplicação restrita aos negócios
patrimoniais e os negócios jurídicos bilaterais de direito das obrigações.
46 PEREIRA, Caio Márcio da Silva. Instituições de direito civil. p. 33. 47 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 19. 48 OLIVEIRA, José Leamartine Correa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de
família. 4 ed. Curitiba: Juru, 2002. p. 121.
13
Ante os conceitos supra mencionados, verifica-se que o
Casamento pode ser conceituado como a união entre homem e mulher, em
conformidade com a lei, com o fim de regularem suas relações sexuais, ajudarem
mutuamente e de cuidarem dos seus filhos.
1.2.1 CARACTERES DO CASAMENTO
O casamento reveste-se de diversos caracteres. Os quais
são destacados por Rizzardo50
a) Trata-se de uma instituição de ordem pública, dada a legislação existente, à qual devem-se subordinar-se as convenções particulares.
b) Importa em uma união exclusiva, e isto principalmente em razão da natureza do próprio ser humano, que não comporta uma tolerância de compartilhamento nesta ordem.
c) Determina uma comunidade de vida para os cônjuges não somente nos interesses patrimoniais, mas em especial nos sentimentos, desejos e intenções.
d) Não admite termo ou condição para a contratação. Ninguém celebra um casamento condicional, possível.
e) Constitui um ato pessoal, da exclusiva decisão dos nubentes, indo já distantes os tempos quando os pais decidiam sobre o consorte do filho ou da filha.
f) Reveste-se o ato da solenidade, com a observância de uma série de requisitos e inscrição no registro civil.
50 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. p. 24.
14
Quando se diz que o casamento é um ato solene, significa
que sua realização está sujeita a algumas normas fixadas por lei, cujo não
atendimento poderá ensejar a nulidade.
A lei o reveste de formalidades destinadas não só à sua
publicidade, mas também à garantia da manifestação do consentimento dos
nubentes. Destinando-se elas a dar maior segurança e enfatizando sua
seriedade. Sendo assim solenizando o matrimônio com a celebração, a lei civil irá
dispor as formalidades necessárias à sua validade.
Para Pereira51, as características do casamento se resumem
em três, sendo as seguintes: a) Solenidade, o Casamento é ato solene, cuja
formalidade o difere dos contratos em geral, não podendo abdicar dos requisitos
formais, para sua validade; b) diversidade de sexos. O Casamento tem em vista a
união de duas pessoas de sexo oposto, sendo este um elemento natural de
matrimônio, pois a ordem jurídica não admite o casamento entre pessoas do
mesmo sexo. C) Dissolubilidade. Destaca o autor que esta característica não tem
cunho universal, pois os sistemas jurídicos se dividem, contudo predominam os
que a consagram. Historicamente, todos os povos da antiguidade, que direta ou
indiretamente influíram em nosso Direito de Família, admitiram o divórcio, porém,
desde os primeiros tempos a Igreja o combateu.
Diniz52 enumera as características do casamento, na
seguinte ordem:
a) A liberdade na escolha do nubente, por ser matrimônio um ato pessoal. A liberdade de escolher pessoa de sexo oposto é elemento natural do leito nupcial, que requer diversidade de sexos. A interferência da família restringe-se tão-somente à orientação, mediante conselhos, salvo nos casos em que a legislação exige o consentimento dos pais.
51 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 37-39. 52 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 46.
15
b) A solenidade do ato nupcial, uma vez que a norma jurídica reveste-o de formalidades que garantem a manifestação de consentimento dos nubentes, a sua publicidade e validade. Não basta a simples união do homem e da mulher, com a intenção de permanecer juntos e gerarem filhos; é imprescindível que o casamento tenha sido celebrado, conforme a lei que o ampara e rege.
c) O fato de ser a legislação matrimonial de ordem pública, por estar acima das convenções dos nubentes.
d) A união permanente; a qual transmite a idéia de plena comunidade de vida, indispensável para a realização dos valores básicos da Sociedade civilizada, e, mesmo que os cônjuges venham a separar-se e divorciar-se e tornem a se casar novamente existe sempre, em regra, um desejo íntimo de perpetuidade, ou seja, de permanência da ordem conjugal e familiar.
e) A união exclusiva, se fortalece como característica, pois a fidelidade conjugal é exigida por lei, por ser o mais importante dos deveres conjugais, e, neste sentido, proibida está qualquer relação sexual fora do casamento.
Sendo assim, observa-se que o casamento possui diversas
características, que deverão ser seguidas para a sua validade, destinando-se a
sua publicidade, a garantia na manifestação do consentimento dos nubentes,
segurança e seriedade.
1.2.2 FINALIDADES DO CASAMENTO
Antes de tratar da natureza jurídica e os efeitos jurídicos do
casamento, se faz necessário analisar as suas finalidades.
16
Diversas são as finalidades do casamento, e como observa
Gonçalves53: “(...) variam conforme a visão filosófica, sociológica, jurídica ou
religiosa como são encaradas”.
Segundo a concepção canônica, Gonçalves54 os divide em
dois grupos:
Matrimonii finis primorius est procreatio atque educatio prolis; secundarius muttum adiutorium et remedium concupiscentiae, ou seja, o fim principal do matrimônio consiste na procriação e educação da proli, e o secundário, na mútua assistência e satisfação sexual.
No mesmo sentido, Venosa55 explica que as múltiplas
finalidades do casamento situam-se muito mais no plano sociológico do que no
jurídico, pois “conforme estabelecido tradicionalmente pelo Direito Canônico, o
casamento tem por finalidade a procriação e educação da prole, bem como mútua
assistência e satisfação sexual, tudo se resumindo na comunhão de vida e de
interesses”.
Essa visão histórica das finalidades do casamento,
estabelecidas pelo Direito Canônico, é severamente criticada por Lima56, que
assim registra:
Nunca partilhamos nem participamos da dicotomia canonista de que o casamento tem um fim primário, procriação e educação da prole, um fim secundário, a ajuda mútua e o remédio da concupiscência. Não devemos, por pieguismo religioso, afastar desta matéria o sadio e racional interesse pessoal dos cônjuges, taxando-o e individualismo, para imergirmos nos anseios do casal, sufocando-lhe a liberdade de agir, para transformá-los em verdadeiros autômatos controlados pelos interesses comunitários.
53 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. v. 6. São Paulo:
Saraiva, 2005. p. 29. 54 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p. 30. 55 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 42. 56 LIMA, Domingos Sávio Brandão. A nova lei do divórcio comentada. p. 32.
17
Outrossim, dentre as finalidades do casamento, Diniz57
destaca os seguintes: a) A instituição da família matrimonial; b) A procriação dos
filhos, que é uma conseqüência lógico-natural e não essencial do matrimônio
(CF/88, art. 226, § 79, lei n. 9.263/96); c) A legalização das relações sexuais entre
os cônjuges; d) A prestação de auxílio mútuo, que é corolário do convívio entre os
cônjuges; e) O estabelecimento de deveres patrimoniais ou não entre os
cônjuges, como conseqüência necessária desse auxílio mútuo e recíproco; f) A
educação da prole, pois o matrimônio não exige apenas o dever de gerar os
filhos, mas também de criá-los e educá-los; g) A atribuição do nome ao cônjuge
(CG, art. 1.565, § 1) e aos filhos; a reparação de erros do passado recente ou
não; a regularização e relações econômicas; a legislação estados de fato.
Impulsionado pelo amor e afeição existente entre o casal e
com fulcro na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges e mútua assistência.
Gonçalves58 explica que: “ a principal finalidade do casamento é estabelecer uma
comunhão plena de vida, como prevê o art. 1.511 do Código Civil de 2002.
Expõe Filomusi - Gueffi59 sobre o assunto:
O matrimônio é a plena e íntima união do homem e da mulher (...). Logo, não é a procriação dos filhos a única finalidade do casamento, nem mesmo a purificação dos prazeres sexuais, mas a realização da união mais perfeita entre um homem e mulher em todas as várias esferas dentro das quais se cumpre o destino humano.
Em que pese as demais finalidades, embora importantes,
são secundárias, pois o que identifica a família é um afeto especial, constituindo-
se a diferença específica que define a identidade familiar.
Assim, será analisada a seguir acerca da natureza jurídica
do Casamento.
57 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 40-41. 58 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p. 30. 59 GUEFFI – FILOMUSI. Enciclopédia jurídica. 7 ed. 1971. Apud Calogero Gangi, Il matrimônio,
cit., p. 5, n. 4, nota 1.
18
1.3 NATUREZA JURÍDICA
A natureza jurídica do casamento desdobra-se em três
correntes doutrinárias controvertem-se, uma é a doutrina contratualista, a outra é
a corrente institucionalista e a eclética ou mista.
A corrente doutrinária contratualista defende o casamento
como sendo um contrato, já a segunda o considera uma instituição e a terceira
corrente entende o casamento como um ato complexo, ao mesmo tempo contrato
e instituição.
Outro questionamento que surge, é a respeito da
qualificação do Casamento como sendo uma instituição de direito público ou
privado.
Gomes60 enumera duas razões principais, para qualificar o
casamento como sendo uma instituição de direito público:
A primeira, a de que o instituto esta dominado por interesses públicos, dado que a família se encontra sob a proteção do estado. A segunda, mais importante sobre o ponto de vista técnico, a de que o vínculo matrimonial se forma com o concurso da autoridade do estado.
No tocante, Pereira61 preleciona que alguns defendem a tese
de ser o casamento um instituto caracterizado por interesses públicos, tendo em
conta que a família se encontra sob a proteção do Estado e o vínculo matrimonial
se forma com a intervenção da autoridade estatal.
Por sua vez Gomes62 afirma que tais argumentos são
improcedentes, pois entende que, para formação do vínculo, faz-se necessário o
elemento essencial, que é o consentimento dos nubentes, ficando o
pronunciamento do juiz em segundo plano, tendo em vista que tem a função de
60 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 57. 61 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 35. 62 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 57.
19
simplesmente completar o ato de vontade dos nubentes. E tal fato não retira a
natureza privada do ato, combatendo a idéia oposta, destacando que o fato de ser
presidido por interesses transcendentes da conveniência individual, determinantes
da imperatividade dos seus preceitos, não é o suficiente para situá-lo no campo
do direito público, nem aceitável a suposição de que esses interesses hajam
levado o Estado a regular o estado matrimonial em termos de assimilação de
suas obrigações aos deveres de direito público.
Com relação à polêmica sobre a natureza jurídica do
casamento ser um contrato ou instituição.
A concepção contratual do matrimônio provém do direito
canônico, que para Gomes63 “valoriza o consentimento dos nubentes relegando o
plano secundário, na formação do vínculo, a intervenção do sacerdote. Na sua
origem, como na sua existência, o casamento é, para a igreja, um contrato”.
Assim, leciona Diniz64 que a teoria contratualista:
(...) foi aceita pelo racionalismo jusnaturalista do século XVIII e penetrou, com o advento da Revolução Francesa, no código francês de 1804, influenciando a Escola Exegética do século XIX e sobrevivendo até nossos dias na doutrina civilista.
Manifesta Venosa65 que, no direito canônico, o casamento
apresenta-se como um contrato natural e um sacramento, decorrente da natureza
humana, em que os direitos e deveres decorrentes dele estão fixados na natureza
e não podem ser alterados nem pelas autoridades nem pelas partes, sendo
perpétuo e indissolúvel.
Registra Rodrigues66 que:
63 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 57. 64 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 42. 65 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 40. 66 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 19.
20
O casamento é o contrato de direito de família que tem por fim promover a união do homem e da mulher, de conformidade com a lei, afim de regularem suas relações sexuais, cuidarem da prole em comum e se prestarem mútua assistência.
Observa, ainda, o autor, se o casamento representava mero
contrato, ele necessariamente poderia dissolver-se por um distrato. Assim, sua
dissolução ficaria na dependência do mútuo consentimento.
Adaptando a teoria contratual às peculiaridades do
casamento, Pereira67 entende:
(...) que se trata de um contrato especial dotado de conseqüências peculiares, mais profundas e extensas do que as convenções de efeitos puramente econômicos, ou contrato de direito de família, em razão das relações específicas por ele criadas.
Manifesta Silva69 que quase se poderia dizer que o
casamento é um contrato de adesão, pois efeitos e formas estão previamente
estabelecidos na lei, não havendo espaço para a vontade dos noivos, que se
limitam a dizer “sim” diante da autoridade civil, o que tem o alcance da
concordância com os deveres do casamento.
Seguindo também a teoria contratualista, afirma Gomes70: “o
casamento resulta do livre acordo de vontades dos que o contraem, assim como
se sucede com os negócios contratuais”. No entanto, o autor observa, ainda, a
natureza sui generis do contrato matrimonial em razão de sua feição especial,
diferindo-o das disposições legais dos negócios que envolvem direito
patrimoniais.
67 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 36. 69 SILVA, Paulo Leins. O casamento como contrato de adesão e o regime legal da separação
de bens. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (coord.). Anais do III Congresso Brasileiro de Direito de Família. Família e Cidadania. O novo CCB e a Vocatio Legis. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 44.
70 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 50.
21
Nesse sentido Diniz71 leciona que:
Os pressupostos dos contratos de direito privado não são suficientes para explicar a sua natureza. O casamento é um negócio jurídico bilateral que não está afeito à teoria dos atos jurídicos. É regido pelo direito de família. assim, talvez, a idéia de negócio de direito de família seja a expressão que melhor sirva para diferenciar o casamento dos demais negócios de direito privado. Ainda que o casamento não faça seguir apenas direitos e obrigações de caráter patrimonial ou econômico, não se pode negar que decorre de um acordo de vontade.
Contrapondo a teoria contratualista, encontra-se a corrente
institucionalista que classifica o casamento como uma instituição, que destaca o
conjunto de normas imperativas a que aderem os nubentes.
A respeito, Diniz72, adepta à concepção institucionalista
afirma:
Com o casamento, os nubentes aderem a uma estrutura jurídica cogente. Em face do elevado número de regras e imposições que surgem a partir da celebração do matrimônio, por determinação legal e não por livre manifestação do par, o casamento é considerado por muitos uma instituição.
Nesse contexto, Rodrigues73 afirma que atribuir caráter de
instituição ao casamento seria afirmar que o instituto se constituiu de um conjunto
de regras impostas pelo Estado, sendo que os cônjuges têm apenas a faculdade
de aderir, “pois, uma vez dada referida adesão, a vontade dos cônjuges se torna
importante e os efeitos da instituição se produzem automaticamente”.
Monteiro74, também assim entende, ao afirmar que o
casamento constitui uma grande instituição social que, de fato, nasce da vontade
71 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 145. 72 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 145. 73 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 20. 74 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil direito de família. 34. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 13.
22
dos contraentes, mas que, da imutável autoridade da lei, recebe sua forma, suas
normas e seus efeitos.
Observa, ainda, o referido autor, as críticas efetuadas pelos
partidários da corrente institucionalista em relação à corrente contratualista,
fundando-se em duas questões “a primeira refere-se à impossibilidade de regular
o casamento por modo diverso do estabelecido, ou seja, não há como consumar
o ato sem a intervenção estatal ou religiosa para sancionar e homologar a
manifestação de vontade dos contraentes”.
Nessa polêmica, surgiu uma terceira concepção, de
natureza eclética ou mista, que considera o casamento ato complexo, ao mesmo
tempo contrato e instituição. Trata-se de um contrato especial, um contrato de
direito de família.
A respeito Venosa77 leciona, que trata de negócio jurídico e
de instituição, ressaltando que a conceituação simples de contrato reduz por
demais sua compreensão e conclui por uma síntese das doutrinas que: “pode-se
afirmar que o casamento – ato é um negócio jurídico; o casamento – estado é
uma instituição”.
Observa-se que a Constituição da República Federativa do
Brasil não define a natureza jurídica do casamento.
Verifica-se, assim, na concepção contratualista: o
Casamento é um contrato, visto que é estabelecido através de acordo entre os
cônjuges, e por ser este o elemento essencial da sua existência.
Contudo, os institucionalistas consideram o casamento uma
instituição social, pois nasce da vontade dos contraentes, no entanto a sua forma,
normas e efeitos são recebidos da autoridade da lei.
77 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 40 – 41.
23
Para os ecléticos o Casamento é um ato complexo, ou seja,
é a fusão dessas duas naturezas, ao mesmo tempo um contrato, quando da
formação, e instituição, no seu conteúdo.
1.4 EFEITOS
Destacam-se os principais efeitos jurídicos do Casamento
em três classes: de âmbito pessoal, social e econômico.
Diniz78 assim o conceitua:
São conseqüências que se projetam no ambiente social, nas relações pessoais e econômicas dos cônjuges, nas relações pessoais e patrimoniais entre pais e filhos, dando origem a direitos e deveres que são disciplinados por normas jurídicas.
Para complementar este estudo faz-se uma breve e sintética
abordagem a respeito de cada efeito citado.
1.4.1 Pessoais
Resulta do casamento, uma série de direitos e deveres
comuns e recíprocos entre os consortes e que a lei os concebe como condição de
sobrevivência da família conjugal.
O Código Civil79, no artigo 1566, enumera os principais
deveres:
Art. 1566. São deveres de ambos os cônjuges
I – fidelidade recíproca;
II – vida comum, no domicílio conjugal;
78 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 122. 79 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Novo código civil e legislação correlatada da família. p. 55.
24
III – mútua assistência;
IV – sustento, guarda e educação dos filhos;
V – respeito e consideração mútuos.
Entre esses, há também a igualdade de direitos e
obrigações entre marido e mulher, estabelecida no artigo 226, § 5° da
Constituição da República Federativa do Brasil.
1.4.2 Sociais
O Casamento gera efeitos que atingem toda a sociedade.
Decorre do artigo 226, § § 1° e 2° da Constituição da República Federativa do
Brasil a constituição da família matrimonial. Considerado como principal efeito
social.
No entanto, o matrimônio produz, também, a emancipação
do cônjuge menor de idade, tornando-o plenamente capaz, conforme disposto no
artigo 5°, parágrafo único, inciso II do Código Civil.
E ainda, estabelece o artigo 1595, § § 1° e 2° do Código
Civil, o vínculo de afinidade entre cada consorte e os parentes do outro.
Além de o casamento gerar um fato de identificação aos
cônjuges na sociedade, que é o status, o estado de casados.
1.4.3 Patrimoniais
Verificou-se que, com o matrimônio, surgem direitos e
obrigações em relação à pessoa e aos bens patrimoniais dos cônjuges.
Nesse contexto, Diniz80 manifesta que “a essência das
relações econômicas entre os consortes reside, indubitavelmente, no regime
80 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 144.
25
matrimonial de bens, que está submetido a normas especiais disciplinadoras de
seus efeitos”.
Assim sendo, o regime matrimonial de bens é o conjunto de
normas aplicáveis às relações e interesses econômicos resultantes do
matrimônio.
No ordenamento jurídico brasileiro existem quatro tipos de
regimes matrimoniais: o regime da comunhão universal de bens, o regime da
comunhão parcial de bens, o regime da separação de bens e o regime de
participação final nos aqüestos.
Após deflagrar consideração sobre o conceito, caracteres,
finalidade, natureza jurídica e os efeitos do Casamento, apresentar-se, no
próximo capítulo, os Regimes de Bens insertos no Direito Brasileiro.
26
CAPÍTULO 2
DOS REGIMES DE BENS
2.1 PRINCÍPIOS GERAIS DOS REGIMES DE BENS
Além das relações pessoais, o Casamento regula a situação
jurídica dos bens dos cônjuges, tanto os que lhes pertençam à data do
matrimônio, quanto os adquiridos na constância deste.
Para definir a situação jurídica dos bens, os cônjuges
elegem o Regime de Bens, que irá reger o patrimônio do casal.
Gonçalves81 define que:
Regime matrimonial é o conjunto de regras aplicáveis a sociedade conjugal considerada sob aspecto dos seus interesses patrimoniais. Em síntese, o estatuto patrimonial dos cônjuges, quer entre si, quer no tocante a terceiros, durante o casamento. Regula especialmente o domínio e a administração de ambos ou de cada um sobre os bens anteriores e os adquiridos na constância da união conjugal.
No mesmo sentido, Rodrigues82 entende que: “regime de
bens é o estatuto que regula os interesses patrimoniais dos cônjuges durante o
matrimônio”.
Atualmente os regimes de bens obedecem, à três princípios
fundamentais que são: Princípio da Variedade dos Regimes de Bens; Princípio da
Liberdade dos Pactos Antenupcial e Princípio da Mutabilidade Justificada do
Regime de Bens.
81 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.382. 82 RODRIGUES, Silvio. Direito civil brasileiro. p. 382. 84 ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais. p.47-48.
27
Salienta Espíndola84 que: “a palavra princípio designa a
estruturação de um sistema de idéias, pensamentos ou normas por conceito
mestre, de onde todos os demais pensamentos derivam e se subordinam”.
Analisar-se a seguir, os princípios fundamentais do Regime
de Bens.
2.1.1 Princípio da Variedade dos Regimes de Bens
Tem-se neste princípio, a possibilidade de os nubentes
optarem, por um dos quatro tipos de regimes existentes no Código Civil: o regime
da comunhão universal de bens, o regime da comunhão parcial de bens, o regime
da separação de bens e o regime de participação final nos aqüestos. Não estando
limitados a escolher apenas um determinado regime.
Gonçalves86 pondera que:
A lei coloca a disposição dos nubentes não apenas um modelo de regime de bens, mas quatro. Como o regime dotal previsto no diploma de 1916 não vingou, assumiu a sua vaga, no novo Código, o regime de participação final nos aquestos (...), sendo mantido os de comunhão parcial, comunhão universal e separação convencional ou legal.
No mesmo sentido Gomes87 aduz: “(...) significa que a lei
não impõe um regime matrimonial, mas, ao contrário, oferece a escolha dos
nubentes diversos, que define em linhas gerais”.
Trata-se este princípio, como sendo o de livre escolha entre
os nubentes, dispondo atualmente de quatro tipos, nos termos do Código Civil:
86 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p. 116. 87 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 173. 89 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 173.
28
Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.
Art. 1.667. O regime de comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte.
Art. 1.672. No regime de participação final nos aqüestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio, consoante disposto no artigo seguinte, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento.
Tem-se então que a variedade dos regimes de bens,
constitui-se pelo fato de que a lei oferece a existência de mais de um regime
matrimonial de bens, possibilitando aos nubentes optar por um deles.
2.1.2 Princípio da Liberdade dos Pactos Antenupciais
O princípio da liberdade dos pactos antenupciais está
previsto no caput do artigo 1.639 do Código Civil Brasileiro, onde, segundo este,
podem os nubentes, antes da celebração do casamento, estipular sobre seus
bens, e o que acharem mais conveniente.
Ao abordar o assunto, explica Gomes89:
Os nubentes podem escolher, em princípio, o regime que lhes convenha, não estando adstritos, sequer, à adoção de um dos tipos, tal como se acham definidos em lei, eis que podem combiná-los, formando regime misto, uma vez respeitadas as disposições legais de ordem públicas. Necessário que estipulem, mediante pacto antenupcial, o regime que escolherem.
Neste princípio permita-se aos nubentes a liberalidade de
escolher um dos regimes definidos em lei, propiciando ainda a possibilidade de
combinar um regime com outro, formando um regime matrimonial de bens misto,
29
porém, respeitando as disposições legais de ordem pública, com a finalidade
especificamente de suprir às expectativas de ordem econômica.
Nesse contexto, estabelece ainda o parágrafo único do
artigo 1.640 do Código Civil:
Art. 1640. Não havendo convenção, ou sendo nula ou ineficaz, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime da comunhão parcial.
Parágrafo único. Poderão os nubentes, no processo de habilitação, optar por qualquer dos regimes que este código regula. Quanto à forma, reduzir-se-á a termo a opção pela comunhão parcial, fazendo-se o pacto antenupcial por escritura pública, nas demais escolhas.
Em suma, conforme prescreve o artigo citado, a liberdade na
confecção do pacto antenupcial é livre, mas deverá se restringir apenas às
relações patrimoniais.
Lembra Fiúza90 que: “Prevalece à regra da liberdade das
convenções nos pactos antenupciais, relativamente às questões patrimoniais,
desde que não contrarie disposição absoluta de lei”.
Oliveira declara91 que:
Os nubentes podem, dentro dos limites da lei, regular o regime de bens do casamento, celebrando convenções ou pacto antenupcial. Eles não só podem escolher um dos regimes-modelo previstos na lei ou introduzir-lhe alterações, adaptando-os às suas necessidades, como eleger um novo regime.
Observa-se que esse princípio, proporciona aos nubentes a
liberdade na escolha do tipo de regime matrimonial de bens, de acordo com suas
90 FIUZA, Ricardo. Novo código civil comentado. p. 1512. 91 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 173.
30
necessidades, no entanto, não é absoluto, pois há casos específicos, em que a
própria lei impõe, o tipo de regime de bens, que deverá viger entre os cônjuges.
2.1.3 Princípio da Mutabilidade Justificada do Regime de Bens
O princípio da mutabilidade justificada do regime de bens,
está previsto no artigo 1.639, parágrafo 2° do Código Civil, o qual prevê a
possibilidade de alteração do regime matrimonial de bens na constância do
casamento, mediante autorização judicial, é uma inovação trazida no atual
Código, o que antes era vedado pelo Código Civil de 1916.
No tocante, Venosa92 afirma que:
(...) A nova lei não estabelece um prazo mínimo para possibilitar esse requerimento. Verificamos, portanto, tendência geral de modificação do princípio que entre nós era mantido como dogmático desde antes da promulgação do Código Civil de 1916.
Ressalta-se que o regime de bens era inalterável, antes da
entrada em vigor do atual Código Civil, e com a nova legislação brasileira, poderá
ser modificado, mediante ordem judicial e a requerimento do casal.
Gomes93 entende que:
(...) a mudança somente deve ser autorizada se requerida por ambos os cônjuges, justificadamente. Seu acolhimento deverá depender de decisão judicial, verificando o juiz se o pedido foi manifestado livremente e se motivos plausíveis aconselham seu deferimento. Finalmente, só é de ser acolhido se não foi feito com o propósito de prejudicar terceiros, cujos interesses, em qualquer hipótese, se ressalvam da obrigação de transcrever a sentença no registro próprio.
O princípio da mutabilidade justificada do regime de bens,
veio substituindo o princípio da imutabilidade do regime de bens, o qual proibia
92 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 173. 93 GOMES, Orlando. Direito de família. p.174.
31
qualquer tipo de alteração do regime matrimonial de bens no decorrer do
matrimônio.
Nesta senda, Diniz94 leciona que: “O regime de bens que era
inalterável, afora pequenas exceções introduzidas jurisprudencialmente, pode
hoje ser modificado mediante decisão judicial, a requerimento de ambos os
consortes”.
Destacam-se, os pressupostos básicos para a mutabilidade
do regime matrimonial de bens na constância do matrimônio, tendo como
requisitos a provocação judicial consensual, a apresentação dos motivos do
pedido de alteração do regime e a prova de que tal pretensão não acarretará
prejuízo de qualquer espécie a terceiros, o qual será tratado no terceiro capítulo
desta pesquisa.
2.2 PACTO ANTENUPCIAL E SEUS REQUISITOS
O pacto antenupcial, também denominado como pacto
anteunião, está regulamentado nos artigos 1653 ao 1657 do atual Código Civil
brasileiro.
Segundo o entendimento de Gomes95: “é a convenção
solene na qual (os nubentes) grifou-se – declaram adotar um dos regimes
definidos na lei ou estipulam regime misto”.
Oliveira96 conceitua pacto antenupcial como sendo “(...) o ato
pelo qual os nubentes organizam suas relações patrimoniais e suas relações com
terceiros (...)”.
Observa, ainda, Dias97: “Podem os nubentes, antes de
celebrado o casamento, estipular o regime que lhes aprouver, embora existam
casos em que a lei vigente (...) impõe o regime obrigatório da separação de bens”.
94 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 152. 95 GOMES, Orlando. Direito de família. p.177. 96 OLIVEIRA, José Leamartine Correa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de
família. p. 359.
32
Nesse contexto, Fiúza98 descreve que:
O pacto antenupcial é um contrato solene firmado entre os nubentes, com o objetivo de escolher o regime de bens que vigorará durante o casamento. (...) É obrigatório quando os nubentes optam por regime que não seja o legal.
Contudo, não tem validade o pacto antenupcial, se não for
feito por escritura pública em cartório, sendo ineficaz se não lhe seguir o
casamento, conforme prevê o artigo 1653 do Código Civil.
Complementando o entendimento, trazem-se as palavras de
Diniz99: “É, portanto, da substância do ato a escritura pública nos pactos
antenupciais, logo, a inobservância desse preceito acarreta sua nulidade”.
Contudo, na elaboração do pacto nupcial deverão ser
respeitados os princípios de ordem pública, bem como os fins e a natureza do
matrimônio, neste sentido dispõe Monteiro100:
(...) disposições absolutas de lei são as de ordem pública, as rigorosamente obrigatórias, que têm caráter proibitivo e cuja aplicação não pode ser afastada ou excluída pelas partes. O Código não se refere às cláusulas ofensivas dos bons costumes, mas fora de dúvida que a defesa da ordem pública, a defesa dos interesses gerais da sociedade, abrange também a dos costumes.
Finalmente, conforme preceitua o artigo 1.653 do Código
Civil, o pacto antenupcial é solene, ou seja, não pode ser realizado por um
simples instrumento particular, terá de ser estipulado em cartório e lavrado por
escritura pública, observando-se que se tornará ineficaz, se não seguir-lhe o
casamento. As cláusulas permitidas no pacto antenupcial são as de caráter
econômico, não sendo válidas as que excluírem os cônjuges do dever de
97 DIAS, Maria Berenice; PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.). direito de família e o novo
código civil. 3.ed. Belo Horizonte: Rev. Atual, 2003. p. 207. 98 FIUZA, Ricardo. Novo código civil comentado. p. 1512. 99 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.147. 100 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito de família. p. 193-194.
33
coabitação, mútua assistência, sustento e educação dos filhos e o exercício do
poder familiar.
2.3 REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS
O Regime da Comunhão Universal de Bens está previsto no
Código Civil, no artigo 1.667, que assim dispõe:
Art. 1.667. O regime da comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte.
Wald101 conceitua o regime da comunhão universal de bens,
como sendo “aquele que se tornam comuns tanto os bens que os cônjuges já
possuíam antes do casamento, como aqueles que foram posteriormente
adquiridos”.
O regime da comunhão universal de bens, importa na
comunicação de todos os bens presentes e futuros, até mesmo as dívidas do
casal.
Nesta mesma linha, Diniz104 assevera que a comunhão
universal de bens deve ser estipulada por meio de pacto antenupcial, nele os
nubentes podem estipular não só os bens presentes e futuros, bem como, os
adquiridos antes ou após o casamento, tornando-se as dívidas passivas comuns,
constituindo uma só massa. Passando cada cônjuge a ter direito à metade ideal
do patrimônio comum, não podendo formar sociedade entre si.
Sendo assim, a regra geral na comunhão universal de bens,
é a comunicabilidade dos bens presentes e futuros de cada cônjuge, sejam eles
móveis ou imóveis. Porém, há exceções impostas pela Lei, pois, alguns deles
101 WALD, Arnold. O novo direito de família: curso de direito civil brasileiro. p. 115. 104 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p.157.
34
ficam fora dessa comunhão, ou seja, não há comunicação de todos os bens,
estando essas exceções enumeradas no artigo 1.668 do Código Civil.
A respeito, Gomes105 explica:
A incomunicabilidade de certos bens resulta do regime jurídico a que se acham submetidos, como é o caso dos que são gravados de fideicomisso. Outros não se comunicam em virtude de sua destinação, como as pensões, meios-soldos, montepios, tenças, roupas de uso pessoal, jóias esponsalícias, livros, instrumentos da profissão, retratos de família. Outros, finalmente, por determinação de quem os doou ou legou. Os últimos não se comunicam porque são declarados incomunicáveis no título de transmissão a um dos cônjuges, enquanto os outros são excluídos da comunhão por determinação legal.
Cumpre ressaltar que os bens doados ou herdados com a
cláusula de incomunicabilidade e os bens sub-rogados, não se comunicam no
regime da comunhão universal de bens.
Para complementar o entendimento, Gonçalves106
manifesta:
Não só são excluídos os bens doados em vida, os deixados em testamento, com cláusula de incomunicabilidade, como também os sub-rogados em seu lugar, ou seja, os que substituem os bens incomunicáveis. Assim, se o dono de um terreno recebido em doação com cláusula de incomunicabilidade resolver vendê-lo para, com o produto da venda, adquirir um veículo, este se sub-rogará no lugar do terreno e será também incomunicável.
São também, bens livres da comunicação, antes de realizar
a condição suspensiva, os bens gravados de fideicomisso e os direitos do
herdeiro fideicomissário, previsto no inciso II do artigo 1.668 do Código Civil.
105 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 197. 106 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p. 126-127.
35
No tocante o inciso III do artigo 1.668 do Código Civil,
prescreve que as dívidas anteriores ao casamento não se comunicam, exceto se
tiverem relação com as despesas de seus aprestos, ou se reverterem em proveito
comum.
Convém ainda anotar que o inciso IV do artigo 1.668 do
Código Civil dispõe que as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao
outro com a cláusula de incomucabilidade, não se comunicam. Ressalta
Pereira107 que: “Não cabem doações propter núpcias na constância do casamento
ou que envolvam fraude ao regime de separação obrigatória”.
No regime da comunhão universal de bens, a posse e a
propriedade dos bens pertencem a ambos os cônjuges, outrossim, a
administração dos bens dar-se-á por ambos, formando assim uma só massa
conjugal, e deverá ser feita com fulcro nos artigos 1.663 e 1.664 do Código Civil.
2.4 REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS
Com o advento da Lei do Divórcio n° 6.515/77, regime da
comunhão parcial de bens, é também, denominado, de regime legal, é chamado
assim, por ser aplicável na falta, nulidade, ou ineficácia do pacto antenupcial.
Com relação à conceituação do Regime da Comunhão
Parcial de Bens, preleciona o artigo 1.658 do Código Civil:
Art. 1658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.
Rodrigues108 conceitua o Regime da Comunhão Parcial de
Bens, como:
107 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 226. 108 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 206.
36
Aquele em que, basicamente, se excluem da comunhão os bens que os cônjuges possuem ao casar ou que venham a adquirir por causa anterior e alheia ao casamento, como as doações e sucessões; e em que entram na comunhão os bens adquiridos posteriormente. Trata-se de um regime de separação quanto ao passado e de comunhão quanto ao futuro.
No regime da comunhão parcial de bens, pode-se dizer que
há três massas patrimoniais: a) o patrimônio do casal decorrente do matrimônio;
b) o patrimônio exclusivo do marido e c) o patrimônio exclusivo da mulher.
Neste tipo de regime, basicamente, comunicam-se todos os
bens adquiridos na constância do casamento, de forma onerosa, conforme
preceitua o artigo 1.660 do Código Civil brasileiro:
Art. 1660. Entram na Comunhão:
I – os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges;
II – os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior;
III – os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;
IV – as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;
V – os frutos dos bens comuns, ou dos bens particulares de cada cônjuge, percebido na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.
Os bens incomunicáveis no Regime da Comunhão Parcial
de Bens estão previstos no artigo 1659 do Código Civil:
Art.1659. Excluem-se da comunhão:
37
I – os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobreviverem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;
II – os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;
III – as obrigações anteriores ao casamento;
IV – as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;
V – os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;
VI – os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
VII – as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.
A respeito da responsabilidade dos cônjuges em relação às
dívidas subseqüentes ao matrimônio, ressalta Diniz109 que, “(...), contraídas no
exercício da administração do patrimônio comum, obrigam aos bens comuns e
aos particulares do cônjuge que o administra e aos do outro na proporção do
proveito que houver auferido, (...)”.
Os artigos 1663 e 1666, ambos do Código Civil, dizem
respeito sobre as dívidas e assim dispõem:
Art. 1663. A administração do patrimônio comum compete a qualquer dos cônjuges.
109DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 156.
38
§ 1° - As dívidas contraídas no exercício da administração obrigam os bens comuns e particulares do cônjuge que os administra, e os do outro na razão do proveito que houver auferido.
§ 2° - A anuência de ambos os cônjuges é necessária para os atos, a título gratuito, que impliquem cessão do uso ou gozo dos bens comuns.
§ 3° - Em caso de malversação dos bens, o juiz poderá atribuir a administração a apenas um dos cônjuges.
(...)
Art. 1666. As dívidas, contraídas por qualquer dos cônjuges na administração de seus bens particulares e em benefício destes, não obrigam os bens comuns.
Finalmente, as dívidas contraídas exclusivamente por um
dos cônjuges, sem que o conjunto familiar tire proveito, será somente dele a
responsabilidade, e por essas dívidas só responderão seus bens particulares e os
comuns até a meação.
Quanto à administração do patrimônio na comunhão parcial
de bens, Venosa110 leciona que:
O art. 1663 do CC estabelece que a administração do patrimônio comum compete a qualquer dos cônjuges. O código de 1916 estabelecia que essa administração competia ao marido, o que não mais podia vigorar após a Constituição Federal de 1988.
Neste contexto, Oliveira111 preleciona que: “ambos os
cônjuges podem praticar todos os atos de gestão sobre os bens comuns”.
110 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 1991-1992. 111 OLIVEIRA, José Leamartine Correa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de
família. p. 368.
39
Ainda, a respeito da administração do patrimônio, o artigo
1.665 do Código Civil dita que:
Art. 1.665. A administração e a disposição dos bens constitutivos do patrimônio particular competem ao cônjuge proprietário, salvo convenção diversa em pacto antenupcial.
E nessa temática, explícita é a visão de Pereira112:
O art. 1.665 inova ao declarar que “a administração e a disposição dos bens constitutivos do patrimônio particular competem ao cônjuge proprietário, salvo convenção diversa ao contrário”. É da natureza do regime da comunhão parcial a separação dos patrimônios. Cada um dos cônjuges tem a administração e a disposição dos bens que lhe pertencem. Ressalvam-se as disposições em contrário do pacto antenupcial, bem como as restrições estabelecidas no Código.
Verifica-se no Regime da Comunhão Parcial de Bens a
comunicação dos bens adequados a título oneroso durante o Casamento e a
incomunicabilidade dos bens cuja aquisição, tiver uma causa anterior ao
matrimônio. Sendo da natureza do regime a administração de cada bem que
pertence ao cônjuge com exclusividade.
2.5 REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS
Existem duas espécies de regime de separação de bens no
Direito Brasileiro, uma é a separação de bens obrigatória, imposta em
determinadas condições, e a outra é a separação de bens optativa ou não
obrigatória, supletivo da vontade dos interessados.
Wald113 define o Regime da Separação de Bens como
sendo:
112 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 219-220. 113 WALD, Arnold. O novo direito de família: curso de direito civil brasileiro. p. 128.
40
(...) um regime de estrutura simples, em que subsistem com inteira independência dois patrimônios distintos: o do marido e o da mulher. Tanto os bens anteriores como os posteriores à celebração do casamento são da propriedade individual de um dos cônjuges, o mesmo acontecendo com a responsabilidade pelas obrigações assumidas, que recaem sobre os cônjuges que praticou o ato (...).
Nesta temática, Venosa114 explica que a característica
principal do Regime da Separação de Bens é a completa distinção do patrimônio
de ambos os cônjuges; e por conseqüência não se comunicam os frutos e as
aquisições, em que cada cônjuge permanece na propriedade, posse e
administração de seus bens.
Segundo Pereira115:
No regime de separação de bens, cada um dos cônjuges conserva a posse e a propriedade dos bens que trouxe para o casamento, bem como dos que forem a eles sub-rogados, e dos que cada um adquirir a qualquer título na constância do matrimônio, atendidos as condições do pacto antenupcial.
Discorrendo sobre o tema, Rodrigues116 explica que:
“Regime da separação é aquele em que os cônjuges conservam não apenas o
domínio e a administração de seus bens presentes e futuros, como também a
responsabilidade pelas dívidas anteriores e posteriores ao casamento”.
A respeito da comunicação dos bens no regime de
separação de bens, os nubentes poderão dispor de cláusula em pacto antenupcial
quanto à comunicabilidade dos bens que desejarem advindos do matrimônio.
Para Gomes117:
114 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 203. 115 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 237. 116 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 215. 117 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 201.
41
O regime da separação de bens caracteriza-se pela incomunicabilidade dos bens presentes e futuros dos cônjuges. Os patrimônios permanecem separados quanto à propriedade dos bens que os constituem, na administração e gozo, assim como as dívidas passivas.
Leciona Oliveira118 que no “regime de separação de bens,
em princípio, tudo é separado, bem como o ativo, o passivo e a gestão desses
bens”.
No que tange às responsabilidade dos cônjuges em relação
as dívidas, Pereira119 esclarece:
As dívidas anteriores ao casamento não se comunicam e, pelas contraídas na vigência deste, responde cada um individualmente. Em caráter excepcional, pesam sobre bens de um e de outro os encargos: a) provindos de obrigações por ato ilícito em que forem co-autores, ou praticado este pelos filhos do casal; b)mantença do lar ou da família, na proporção das quotas respectivas de contribuição; c) relativos aos atos que envolvam compromissos de um ou de outro, praticados com autorização e a outorga do consorte, respectivamente.
Contudo, no entendimento de Monteiro120: “as dívidas
contraídas pelo cônjuge para a aquisição das utilidades necessárias à economia
doméstica, ou empréstimo para esse fim, se comunicam, nos termos do artigo
1.644 do Código Civil de 2002”.
Acrescenta Rodrigues121 que: “(...) também não se
comunicam as obrigações concernentes à indústria ou profissão que qualquer dos
cônjuges exercer”.
118 OLIVEIRA, José Leamartine Correa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de
família. p. 404. 119 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 239. 120 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil direito de família. p. 224. 121 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 216.
42
Pereira122 aduz que: “Dissolvida a sociedade conjugal, a
cada um dos cônjuges cabe o que era seu patrimônio separado (...)”.
Outrossim, importante ressaltar-se que há uma diferenciação
quanto à sucessão, no regime de separação obrigatória de bens, que está
prevista no artigo 1.829 do Código Civil, assim preconiza:
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou na separação obrigatória de bens (art. 1.641); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III – ao cônjuge sobrevivente;
IV – aos colaterais.
Observa-se que, no regime de separação de bens
obrigatória, o cônjuge sobrevivente não concorre nos bens do cônjuge falecido,
enquanto que no Regime de Separação de Bens optativo sim.
Por fim, analisando-se a conceituação trazida pelos
doutrinadores acima citados, constata-se que o Regime da Separação de Bens
possibilita que os cônjuges tragam para o casamento, com exclusividade e sem
comunicação entre eles, o domínio, posse e administração de seus bens
presentes e futuros, tanto as dívidas anteriores, como posteriores ao matrimônio,
salvo nas exceções acima mencionados. Dissolvida a sociedade conjugal, cada
qual ficará com os bens que estiver em seu nome, quer tenha sido adquirido
antes ou durante o matrimônio.
122 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 238.
43
2.5.1 REGIME DE SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA
Com relação à obrigatoriedade do regime da separação de
bens, prevista no artigo 1.641 do Código Civil, o qual determina que se casarão
neste regime, sem qualquer comunicação dos bens ou dívidas:
Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:
I – das pessoas que contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;
II – da pessoa maior de 60 anos;
III – de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.
O legislador obriga tais pessoas a contraírem núpcias sob a
égide deste regime, e por ser imposta às partes por força de preceito legal, não
há necessidade de pacto antenupcial. Gonçalves124 justifica tal fato por tratar-se
de regime imposto por lei e, em alguns casos, esse é elaborado por ter havido
contravenção ao dispositivo legal de causas suspensivas da celebração do
casamento.
Ainda sobre a separação obrigatória, Diniz125 manifesta-se:
Deveras, em certas circunstâncias a lei o impõe, caso em que esse regime é obrigatório por razões de ordem pública ou por ser exigido como sanção. É assim, em virtude do Código Civil, art. 1.641, o regime obrigatório do casamento: 1) Das pessoas que celebrarem o casamento com infração das causas suspensivas, ou seja, do viúvo ou viúva que tiver filho do cônjuge falecido,
124 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p. 121-122. 125 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 167-168-169.
44
enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros; (...) 2) Da pessoa maior de 60 anos; porém, se, nessa hipótese, suceder união estável de mais de dez anos consecutivos ou da qual tenham nascido filho, não se aplica a regra, podendo os nubentes, de acordo com o art. 45 da Lei n. 6.515/77, escolher livremente o regime matrimonial de bens (...) 3) De todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.
Em síntese, o regime de separação obrigatória de bens é
estabelecido por lei, possuindo diversas finalidades, depende da hipótese
retratada am alguns casos tem por fim proteger direitos de terceiros, “como do
viúvo que, sem fazer partilha de bens de casamento anterior, tendo filhos, casa-se
novamente, e, ao cônjuge que está presente no casamento celebrado com
suprimento judicial, bem como daquele realizado além do limite de idade”.126
2.5.2 SEPARAÇÃO NÃO OBRIGATÓRIA
O regime de separação de bens também pode ser optativo,
ou seja, adquirido de forma convencional entre as partes, nele os nubentes
dispõem livremente sobre seus bens e os administram com exclusividade,
conforme preceitua o artigo 1.687 do Código Civil:
Art. 1.687. Estipulada a separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva da cada um dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real.
Como se pode observar, o regime de separação de bens
não obrigatória, é decorrente de uma escolha entre os nubentes, da vontade dos
126 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito de família. p. 213. 136 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 198.
45
mesmos, não lhes sendo imposto por lei. Assim sendo, os noivos podem optar
pelo regime de separação de bens, estipulando-o por pacto antenupcial, que
passará a vigorar após a realização do casamento.
2.6 REGIME DE PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQÜESTOS
O regime da participação final nos aqüestos é uma das
inovações do Código Civil de 2002, veio substituir o regime dotal, previsto no
Código Civil de 1916.
Para Venosa136:
Trata-se de inovação do Código de 2002, que suprimiu o regime dotal e introduziu, nos arts. 1.672 a 1.686, o regime de participação final nos aqüestos. Trata-se de um regime híbrido, no qual se aplicam regras da separação de bens e da comunhão de aqüestos.
Espínola137 conceitua aqüestos como: “bens que cada um
dos cônjuges ou ambos adquirirem na constância do casamento por qualquer
título, que não seja o de doação, herança, ou legado”.
Nery Júnior138 entende que:
A eficácia desse regime de bens quanto à efetiva participação final dos aqüestos só surge com o fato jurídico da dissolução da sociedade conjugal. Antes disso, o casal vive sob o regime da separação de bens. Na constância da sociedade conjugal, tudo o que os cônjuges adquiriram integrará, respectivamente, a massa do patrimônio de cada um. No momento da dissolução da sociedade conjugal, serão apurados os bens adquiridos na constância da sociedade conjugal, a título oneroso, e divididos pela metade para cada um dos cônjuges.
137 ESPÍNOLA, Eduardo. A família no direito brasileiro. Atual. Por Ricardo Rodrigues Gama.
Campinas: Brookseller, 2000. p. 362. 138 NERY JR. Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil anotado e legislação
extravagante. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 743.
46
Lisboa139 expõe que:
Participação final nos aqüestos é o regime em que cada cônjuge possui o seu patrimônio próprio, submetendo-se os bens adquiridos posteriormente à data do matrimônio á partilha no caso de dissolução da sociedade conjugal.
A respeito do assunto, Gonçalves140 ensina que: “Trata-se
de um regime misto, pois durante o casamento aplicam-se as regras de
separação total e, após a sua dissolução, as da comunhão parcial”.
Rodrigues141 entende por regime da participação final nos
aqüestos como sendo aquele que:
Representa um regime híbrido, ou misto, ao prever a separação de bens na constância do casamento, preservando, cada cônjuge, seu patrimônio pessoal, como a livre administração de seus bens, embora só se possam vender os imóveis com a autorização do outro, ou mediante expressa convenção no pacto dispensando a anuência (...). Mas com a dissolução, fica estabelecido o direito à metade dos bens adquiridos a título oneroso pelo casal na constância do casamento.
A comunicação dos bens, no regime de participação final
nos aqüestos, dá-se somente no momento da dissolução do casamento, pois
durante a sua constância, não há comunicação dos bens que cada cônjuge
possui.
Contudo, surgem algumas controvérsias quanto à
comunicação dos bens móveis. Para Diniz142 a comunicação dos bens no regime
de participação final dos aqüestos, dá-se:
139 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: direito de família e das sucessões. p. 163. 140 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 128. 141 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 218. 142 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 163.
47
Com a dissolução da sociedade conjugal, apurar-se-á o montante dos aqüestos, excluindo-se da soma dos patrimônios próprios: os bens anteriores ao casamento e os sub-rogados em seu lugar; os obtidos por cada cônjuge por herança, legado ou doação; e os débitos relativos a esses bens vencidos e a vencer (...) Mas os frutos dos bens particulares e os que forem com eles obtidos formarão o monte partível.
Já Gonçalves143 afirma que:
Em relação aos próprios cônjuges, portanto, os bens móveis pertencem àquele que os adquirir na Constancia do casamento. Em relação a terceiros, presumem-se salvo se comprovada a aquisição pelo outro. Excluem-se da presunção os bens de uso pessoal.
No que concerne à incomunicabilidade de bens, esclarece
Diniz144 que, neste novo regime de bens, não há formação de massas de bens
particulares incomunicáveis durante o matrimônio, mas que se tornam comuns no
momento da dissolução do casamento.
Assim sendo, sobre a temática, Nery Júnior145 esclarece
que:
São incomunicáveis os bens e direitos levados para o casamento pelos cônjuges, que compõem o patrimônio de cada um, juntamente com os bens e direitos por eles adquiridos a título gratuito durante a constância do casamento. Em decorrência disso, ao término da sociedade conjugal, hão de ser apuradas três massas patrimoniais distintas: a) o patrimônio exclusivo do varão; b) o patrimônio exclusivo da mulher; c) o patrimônio autônomo comum, que será apurado no momento da dissolução do casamento, pra permitir a entrega da meação de cada um.
143 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. p. 430. 144 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p.162. 145 NERY JR. Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil anotado e legislação
extravagante. p. 743.
48
Outrossim, verifica-se que excluem-se dos aqüestos, os
bens próprios dos cônjuges, não entrando na partilha após dissolvida a sociedade
conjugal.
Quanto à responsabilidade dos cônjuges em relação as
dívidas, o artigo 1.677 do Código Civil, estabelece:
Art. 1677. Pelas dívidas posteriores ao casamento, contraídas por um dos cônjuges, somente este responderá, salvo prova de terem revertido, parcial ou totalmente, em benefício do outro.
Ainda com relação às dívidas, o artigo 1.678 do Código Civil
prevê:
Art. 1.678. Se um dos cônjuges solveu uma dívida do outro com bens do seu patrimônio, o valor do pagamento deve ser atualizado e imputado, na data da dissolução, à meação do outro cônjuge.
Com relação aos artigos supramencionados, Diniz146 assevera
que:
Quanto aos débitos posteriores ao casamento, contraídos por um dos consortes, apenas este responderá por eles, a não ser que haja prova cabal de que revertem, total ou parcialmente, em proveito do outro (CC, art. 1.677). Se um dos cônjuges vier a pagar dívida do outro, utilizando bens de seu patrimônio, o valor desse pagamento deverá ser atualizado e imputado, na data da dissolução, à meação do outro consorte (CC, art. 1.678). As dívidas de um dos cônjuges, quando superiores à sua meação, não obrigam o outro, ou a seus herdeiros (CC, art. 1.686).
No sistema jurídico brasileiro, os nubentes têm a liberalidade
de optarem por um dos regimes de bens existentes no Código Civil, os quais
foram devidamente analisados nos subtítulos acima. Contudo, também podem
combiná-los entre si, desde que não contrariem normas de ordem pública,
formando assim outros regimes.
49
Neste capítulo foi abordado a respeito dos Regimes de Bens
existentes e vigentes atualmente. Verificaram-se ainda as regras e entendimentos
doutrinários predominantes sobre os conceitos, comunicabilidade e
incomunicabilidade dos bens dos cônjuges, a responsabilidade em relação as
dívidas subseqüentes ao matrimônio e a administração do patrimônio em cada
regime. No próximo capítulo será apresentado o resultado da investigação
científica sobre a alteração do regime de bens no direito brasileiro, considerando
as mudanças impostas pela Lei n° 10.406 de 2002.
146 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 163.
50
CAPÍTULO 3
DA MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS NO DIREITO
BRASILEIRO
3.1 ASPECTOS GERAIS
É de grande repercussão a mudança introduzida pelo
Código Civil de 2002, no § 2° do artigo 1.639, que regulamenta a possibilidade de
alteração do regime de bens no curso do casamento, o qual possui a seguinte
redação:
Art. 1.639 – É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.
(...)
§ 2°. É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.
A faculdade que os cônjuges possuem, mediante pedido
conjunto com as motivações e ressalvados os direitos de terceiros, requererem ao
juiz que lhes concedam a modificação do regime de bens adotado quando da
celebração do casamento, durante sua constância, consubstancia-se, pois, no
princípio da mutabilidade do regime de bens.
Este instituto substituiu o princípio da imutabilidade do
regime matrimonial, previsto no artigo 230 do Código Civil de 1916, até a
dissolução da sociedade conjugal, não era permitido aos cônjuges adotar outro ou
51
alterar total ou parcialmente o regime que tinham adotado. Uma vez escolhido
pelos nubentes, tornava-se irrevogável.
O princípio da mutabilidade do regime de bens teve uma
positiva recepção por parte da doutrina. Manfré147, dispondo sobre a facilidade
deste novo sistema, assevera que:
Trata-se do sistema que melhor atende ao interesse dos consortes e o mais ajustado às nossas tendências morais, além de ser de nossa tradição jurídica. Melhor que a lei, cada casal escolhendo o regime matrimonial da preferência, regulará de modo soberano, os respectivos interesses.
O Código Civil não prevê prazo mínimo, depois de realizado
o casamento, para que se possa requerer a mudança do regime. No direito
brasileiro, não há regra semelhante à do art. 1.397 do Código Civil francês, em
sua redação atual, que estabelece um prazo de dois anos após a celebração do
casamento ou após a homologação da última mudança de regime148.
Sendo assim, neste capítulo serão abordadas todas as
questões referentes à possibilidade da modificação do regime de bens no direito
brasileiro, objeto da presente monografia.
3.2 A EVOLUÇÃO DA MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS
A tradição do direito brasileiro foi a da irrevogabilidade e
inalterabilidade do regime escolhido, no entanto, exceções existiam no Brasil,
principalmente por força da jurisprudência.
A legislação brasileira no artigo 7°, § 5°, do Decreto-Lei n.
4.657/42 (a Lei de Introdução ao Código Civil de 1916), com a redação que lhe
deu a Lei n. 6.515/77, também previa uma exceção ao princípio da imutabilidade
do regime adotado, permitindo ao estrangeiro naturalizado brasileiro a adoção da
147 MANFRÈ, José Antonio Encinas. Regime matrimonial de bens no novo código civil. São
Paulo: Juarez de Oliveira, 2003. p. 31.
52
comunhão parcial de bens, que é o regime matrimonial legal, resguardados os
direitos de terceiros e anteriores à concessão da naturalização, que ficaram
inalterados, como se o regime não tivesse sofrido qualquer mudança.149
Nesse sentido o Supremo Tribunal Federal (RF, 124:105)
passou a entender que o princípio da inalterabilidade do regime matrimonial de
bens não era ofendido por pacto antenupcial que estipulasse que, na hipótese de
superveniência de filhos, o casamento sob o regime de separação de bens se
convertesse em comunhão150.
Não bastassem essas raras hipóteses, a Súmula 377,
admitindo a comunicação de bens adquiridos na constância do casamento pelo
esforço comum, mesmo que pelo regime obrigatório da separação de bens,
impedindo enriquecimento indevido, com a dissolução do matrimônio.
Gomes151 sempre defendeu a alterabilidade dos regimes:
Por que proibir que modifiquem cláusulas do contrato que celebraram, mesmo quando o acordo de vontades é presumido pela lei? Que mal há na decisão de cônjuges casados pelo regime de separação de substituírem-no pelo da comunhão? Necessário, apenas, que o exercício desse direito seja controlado a fim de impedir a prática de abusos, subordinando-o a certas exigências.
Seguindo as razões expostas pelo autor acima citado, o
legislador do atual Código Civil permitiu a alteração do regime de bens na
constância da sociedade conjugal, porém, impondo sendo todas as suas cautelas
contempladas no artigo sob comento, a fim de coibir abusos.
Justificando, ainda, a necessidade e importância do princípio
da mutabilidade do regime de bens, Gozzo152 afirma que:
148 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Código civil comentado: direito de família, relações de parentesco,
direito patrimonial: arts. 1.591 a 1.693. São Paulo: Atlas, 2003. p. 235. 149 DINIZ, Maria Helena. Lei de introdução ao código civil brasileiro interpretada. São Paulo:
Saraiva, 1994. p. 229. 150 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 160. 151 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 174.
53
(...) a maioria dos nubentes sente-se constrangida para discutir questões de cunho patrimonial antes do casamento, entendendo que essa natural inibição inicial poderia levar a escolhas erradas quanto ao regime, além de instalar um clima mais propício para os casamentos por interesse. Seria certo então deduzir que com o passar do tempo, quanto mais sedimentado o relacionamento conjugal, quanto maior a intimidade dos cônjuges, quanto mais fortalecidos os seus vínculos familiares e as suas certezas afetivas, mais autorizada estaria a modificação de seu regime patrimonial no curso do casamento, facilitando a correção dos rumos escolhidos por jovens e inexperientes.
No mesmo sentido, Farrula Júnior153 introduz o fato de:
(...) existirem pessoas que nem sempre têm inteiro conhecimento das regras pertinentes ao regime de bens e daquilo que lhes revela ser mais benéfico, e que só após o casamento e com a convivência diária, vai sendo oportunizado aos esposos aferirem quanto ao acerto ou adequação da sua escolha.
Diniz154 é enfática a respeito, destacando que:
Louvável foi essa medida legislativa, pois os nubentes poderão, com sua inexperiência, escolher mal o regime e depois, com o tempo e a convivência conjugal, vão percebendo que outro seria mais adequado aos seus interesses.
Contudo, impõe-se uma criteriosa aferição acerca de
possível lesão à família, ao direito de terceiros, de credores de um ou de ambos
os cônjuges e, enfim, em relação à ratio summa do pedido de mudança do regime
de bens, como, por exemplo, se há propósito obscuro decorrente da convivência
íntima, de temor de mal injusto e grave etc155.
152 GOZZO, Débora. Pacto antenupcial. São Paulo: Saraiva, 1992. p. 126. 153 FARRULA JÚNIOR, Leônidas Filippone. Do regime de bens entre os cônjuges. In: LEITE,
Heloisa Maria Daltro (Coord). O novo código civil, do direito de família. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2002. p. 314.
154 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 162. 155 PEDROTTI, Irineu; PEDROTTI, Willian. Comentários às principais alterações – novo código
civil. Campinas: LZN Editora, 2003. p. 302.
54
Observa-se, assim, que esse princípio introduzido pelo Atual
Código Civil, em seu artigo 1639, § 2º, proporciona aos cônjuges a possibilidade
de modificar o regime de bens adotado, na constância do casamento, desde que
preenchidos os seus requisitos.
3.3 REQUISITOS PARA MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS
Conforme se depreende da leitura do § 2° do artigo 1.639 do
Código Civil, para que os cônjuges possam alterar o regime de bens, após o
casamento, são necessários o preenchimento de alguns requisitos cumulativos:
a) autorização judicial;
b) pedido conjunto dos cônjuges;
c) motivação relevante;
d) comprovação, perante o juiz, da veracidade das razões;
e) ressalva dos direitos de terceiros.
Os quais serão abordados nos próximos itens.
3.3.1 Autorização Judicial
Não basta a mera postulação encaminhada pelos cônjuges
ao oficial do registro civil. Há que se considerar que o pedido deve ser aforado
judicialmente, por profissional habilitado, ou seja, advogado, pois, conforme o
artigo 36, do Código de Processo Civil, "A parte será representada em juízo por
advogado legalmente habilitado. (...)". A procuração conferida ao causídico deve
conter poderes especiais, pois o pedido não comporta a simples procuração geral
para o foro.
Prossegue Lôbo Netto156 que:
156 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Código civil comentado: direito de família, relações de parentesco,
direito patrimonial: arts. 1.591 a 1.693. p. 234.
55
O pedido deve ser dirigido ao juiz competente, segundo a respectiva organização judiciária, em ação própria, postulada por advogado comum. Somente será possível o seguimento do pedido se ambos os cônjuges forem autores do pedido; a recusa ou reserva de qualquer deles impedirá o deferimento. A falta de anuência do cônjuge recalcitrante não poderá ser suprimida pelo juiz. A alteração produzirá efeitos entre as partes com base na decisão judicial.
Verifica-se nesse requisito que o pedido deve ser dirigido ao
juiz competente, segundo a respectiva organização judiciária, em ação própria,
postulada por advogado comum.
3.3.2 Pedido conjunto dos cônjuges
Observa-se que a lei refere-se a pedido de “ambos os
cônjuges”, e não somente a um deles, o que torna impossível o ingresso somente
por um dos cônjuges, pedindo a citação do outro. Portanto, não há jurisdição
contenciosa, mas jurisdição voluntária, delineado nos arts. 1.103 e seguintes do
Código de Processo Civil.
Ambos devem ser interessados, tendo que haver consenso
quanto à modificação. Cumpre o pedido, desta forma, somente aos cônjuges, os
quais detêm legitimidade exclusiva. Os parentes próximos, como descendentes
ou ascendentes, e mesmo eventuais credores, não participarão do processo, não
se ordenando sua citação. Unicamente o Ministério Público será chamado ao
processo, que intervirá como guardião da lei.
Destaca Barbosa157:
Admitir o pedido formulado por um só dos cônjuges seria impor ao outro um novo regime, o que não seria razoável: o acorde de vontades que orientou a escolha original deve orientar a alteração, visto que apenas a lei pode impor um regime, e o faz por causas entendidas justas pelo legislador.
157 BARBOZA, Heloisa Helena. Alteração do regime de bens e o art. 2.039 do código civil. In:
PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord) Afeto, ética, família e o novo código civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 327-328.
56
A interdição de um dos cônjuges posterior ao casamento
não deve impedir, por si só, a alteração do regime, já que sequer impede a
dissolução da sociedade conjugal, conforme dispõe o art. 1.576, Parágrafo único
do Código Civil. Contudo, extrai-se, na explanação de Barbosa158:
(...) forte deve ser a motivação, a demonstrar, de modo cabal, benefício para o incapaz, sob pena de contrariar o espírito do instituto da interdição, ou seja, o de proteger o incapaz. A aferição dos motivos deve ser feita de modo diferenciado, posto que indispensável atender os interesses soberanos daquele que não pode manifestar pessoalmente sua vontade.
Conforme mencionado, a mudança judicial do regime de
bens não comporta a via unilateral, compulsória, eis que a lei exige que o pedido
seja formulado por ambos os cônjuges, a alteração refletirá o desejo mútuo, ou
uma conveniência em favor dos dois.
3.3.3 Motivação relevante do pedido – interesse processual
Outra exigência legal é a motivação relevante do pedido,
este requisito expõe o interesse jurídico dos cônjuges partes para a propositura
do pedido, bem como sua legitimidade, ou seja, devem os cônjuges apresentar as
razões pelas quais desejam alterar o regime de bens adotado quando da
celebração do casamento, que não se radique apenas no desejo dos cônjuges.
As causas para o pedido de modificação do regime de bens
não podem ser para situações hipotéticas, mas situações ocorrentes de fato.
Alguns doutrinadores afirmam que aí está a grande
dificuldade, pois algum fato deve justificar o pedido. Não basta a simples vontade
dos cônjuges.
158 BARBOZA, Heloisa Helena. Alteração do regime de bens e o art. 2.039 do código civil. In:
PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord) Afeto, ética, família e o novo código civil. p. 328.
57
A doutrina traz como exemplo algumas hipóteses nas quais
a aplicação da modificação do Regime Matrimonial de Bens na vigência do
casamento se torna possível.
Rizzardo159 expõe como motivo relevante na alteração do
regime de separação de bens para o de comunhão, é que os bens são frutos da
atividade de ambos os cônjuges, embora se encontrem registrados somente em
nome de um. Já na mudança do regime de comunhão parcial de bens para a
universal, deve-se alegar o favorecimento de um deles com o patrimônio formado
antes do casamento em razão de um sentimento de gratidão, ou de lhe fornecer
uma futura segurança econômica. Na pretensão de mudar de comunhão universal
para a parcial, objetivará os bens adquiridos antes do casamento disponíveis para
o atendimento de obrigações contraídas anteriormente do casamento, sem
envolver aqueles adquiridos pelo esforço comum.
Ronconi160 enumera outros motivos que sustentam o pedido
de alteração, os quais serão descritos a seguir:
As pessoas casadas com os impedimentos decorrentes das causas suspensivas do casamento:
O parágrafo único do artigo 1.523 possibilita o casamento nos moldes do regime desejado pelos nubentes se houver prova da inexistência de prejuízo para as pessoas ali designadas, regra esta que difere do Código Civil de 1916, no qual não havia possibilidade de prova da inexistência do prejuízo, até mesmo porque o regime de bens era irrevogável.
Se o casamento, porém, foi realizado sob a égide do regime da Separação Obrigatória de Bens com fundamento nesta hipótese, caso devidamente demonstrado pelos cônjuges a inexistência dos
159 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. p. 629-630. 160 RONCONI, Diego Richard. Algumas aplicações da mudança do regime de bens do casamento. Jus Navegandi, Teresina, a. 8, n. 392, 3 ago. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5518>. Acesso em: 16 out. 2006, p. 01-02.
58
prejuízos que tais impedimentos poderiam ocasionar, ocorrida após o casamento, não haveria impedimento algum para o pleito da modificação do regime de bens pretendido.
Todos os que dependerem de suprimento judicial para casar
Dependem de suprimento judicial para casar:
a) os menores de 18 (dezoito) anos, havendo denegação do consentimento por parte de um ou ambos os pais (art. 1.519, do Código Civil);
b) os menores cuja idade núbil ainda não se alcançou, a fim de evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez (art. 1.520).
Nestas hipóteses, observa-se que as duas situações buscam o referido regime antecipando a iminência da dissolução da sociedade, haja vista a imaturidade do casal para assumir um relacionamento conjugal.
Em ambas as hipóteses, se, passado algum tempo da convivência conjugal e, principalmente, da estabilidade do relacionamento familiar, não se vislumbra qualquer impedimento no pedido de modificação do regime de bens por parte dos cônjuges casados diante de tais circunstâncias. No entanto, importa uma análise, com interveniência de Assistente Social, a fim de se configurar a estabilidade do relacionamento do casal.
O restabelecimento da sociedade conjugal dissolvida pela separação judicial
Outra situação que pode demandar a modificação do regime matrimonial de bens consiste na possibilidade de restabelecimento da sociedade conjugal dissolvida pela separação judicial. Estabelece o artigo 1.577, do Código Civil, que "Seja qual
59
for a causa da separação judicial e o modo como esta se faça, é lícito aos cônjuges restabelecer, a todo tempo, a sociedade conjugal, por ato regular em juízo.", ordenando, adiante, que "A reconciliação em nada prejudicará o direito de terceiros, adquirido antes e durante o estado de separado, seja qual for o regime de bens." (art. 1.577, parágrafo único).
Como se trata de pedido de ambos os cônjuges, o pedido de Modificação do Regime de Bens se baseia, antes de tudo, na confiança dos cônjuges entre si e no sentido ético que une o casal diante da Sociedade, a fim de não prejudicar terceiros que com este casal tenham algum interesse jurídico ou econômico.
Para Lôbo Netto161 “o juiz deve levar em conta as idades e a
natural imaturidade dos cônjuges ao se casarem, quando as pessoas não
dispõem de elementos de informações suficientes para a tomada de decisão que
determina tão fortemente o futuro do casal”.
A alteração do regime de bens pode significar a retirada de
considerável obstáculo ao entendimento dos cônjuges, garantindo a permanência
de sua convivência. Contudo, faz-se necessário um especial cuidado, quando
apenas um dos cônjuges tiver vida econômica própria, ou quando forem muito
diferentes os níveis de renda de cada um.
Observa-se então que a modificação do regime de bens
dever ser motivada, indicando que o juiz deve considerar as razões apresentadas
pelos cônjuges, podendo, ou mesmo devendo, indeferir o pedido se não
preenchido esse requisito legal.
3.3.4 Comprovação, perante o juiz, da veracidade das razões
Ingressado o pedido por profissional habilitado, e em pedido
motivado de ambos os cônjuges, há a necessidade de autorização judicial. O
161 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Código civil comentado: direito de família, relações de parentesco, direito patrimonial: arts. 1.591 a 1.693. p. 234.
60
magistrado proferirá sentença homologatória. Caso não autorize o pedido, da
sentença caberá apelação162.
Quanto à procedência das razões invocadas, ligam-se estas
razões com a motivação do pedido realizado pelos cônjuges, onde o pedido deve
ser baseado em um motivo plausível, altera-se porque se objetiva salvar o
patrimônio, ou da necessidade de garantir segurança econômica ao outro
cônjuge, se um deles vier a falecer, e transferir-se hereditariamente o patrimônio
para parentes que jamais prestaram auxílio ao cônjuge que sobrevirá, ou
totalmente desligados dele.
3.3.5 Direitos de Terceiros
O pedido de alteração do regime de bens somente será
acolhido se não houver escopo de prejudicar terceiros, inclusive entes públicos,
cujos direitos e interesses sempre serão resguardados. Permanecerão garantidos
os direitos de eventuais credores, não podendo subtrair ou diminuir as suas
garantias. Assim como os titulares de direitos sobre os bens, que passam para a
titularidade de um dos cônjuges, com a mudança.
A esse respeito, impõe-se publicidade consistente no
registro da sentença no órgão próprio. Protegendo assim, o interesse de quem
tenha direito contra qualquer dos cônjuges, cujo título anteceda ao registro da
mudança de regime163.
Lôbo Netto164 preleciona que a regra a ser observada é a
seguinte:
(...) a mudança de regime de bens apenas valerá para o futuro, não prejudicando os atos jurídicos perfeitos; a mudança poderá alcançar os atos passados se o regime adotado (exemplo:
162 RONCONI, Diego Richard. Algumas aplicações da mudança do regime de bens do
casamento. Jus Navegandi, Teresina, a. 8, n. 392, 3 ago. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5518>. Acesso em: 16 out. 2006, p. 01.
163 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 174. 164 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Código civil comentado: direito de família, relações de parentesco,
direito patrimonial: arts. 1.591 a 1.693. p. 235.
61
substituição de separação convencional por comunhão parcial ou universal) beneficiar terceiro credor, pela ampliação das garantias patrimoniais. Em relação aos terceiros, especialmente os credores, aplica-se o princípio geral fraus omnia corrupit, não podendo a mudança de regime permitir aos cônjuges que ajam fraudulentamente contra os interesses daqueles.
No que concerne à sentença que consubstancie deferimento
do pedido de alteração do regime, Manfré165 ensina que: “(...) se impõe previsão
para registro do Ofício de Registro Civil, bem ainda autorização, a fim de que o
tabelião ou notário lavre escritura pública correspondente, nela constando
ressalva a direito de terceiros”.
3.4 EFEITOS DA ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS
Destaca-se ainda que o Código Civil não explica se os
efeitos da alteração do regime de bens serão “ex tunc” ou “ex nunc”, embora
alguns doutrinadores aduzam que contra terceiros não há como retroagir,
principalmente na mudança de regime mais benéfico para mais gravoso, e, em
relação ao casal, a mudança retroage.166
Farrula Júnior167 entende que a produção de efeitos da
alteração do regime de bens se dá: entre os cônjuges, após o trânsito em julgado
da decisão que deferir o pedido; perante terceiros: após a averbação da sentença
nos cartórios do Registro Civil das Pessoas Naturais e do Registro de Imóveis.
Para Manfré168:
(...) à falta de óbice da lei, ser possível a retroação dos efeitos dessa sentença à data da celebração do casamento, desde que, conjuntamente, os interessados requeiram nesse sentido ao juiz. Caso contrário, ou seja, inexistindo pedido expresso nessa
165 MANFRÉ, José Antonio Encinas. Regime matrimonial de bens no novo código civil. p. 48. 166 PHILLIPS, Douglas. Curso de direito de família. Florianópolis: Vox Legem, 2004. p. 65. 167 FARRULA JÚNIOR, Leônidas Filippone. Do regime de bens entre os cônjuges. In: LEITE,
Heloisa Maria Daltro (Coord). O novo código civil, do direito de família. p. 329-330. 168 MANFRÉ, José Antonio Encinas. Regime matrimonial de bens no novo código civil. p. 48.
62
conformidade, os efeitos contar-se-ão da data da autorização judicial. Em qualquer dessas hipóteses, haverá ressalva de direitos de terceiros, como impõe o art.1.639, § 2°.
Observa-se que a sentença que proferir a alteração do
regime de bens, poderá ter efeitos “ex tunc” ou “ex nunc”. Em relação aos
cônjuges dependerá do pedido expresso nesse sentido, e em relação a terceiros
normalmente se operará o efeito “ex nunc”, para a ressalva de seus direitos.
3.5 ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS PARA CASAMENTOS CONTRAÍDOS NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916
O artigo 2.039 do atual Código Civil Brasileiro assim dispõe:
Art. 2.039. O regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei n. 3.071, de 1° de janeiro de 1916, é por ele estabelecido.
Trata-se de regra intertemporal, está previsto no livro próprio
e complementar do Código, nas disposições finais e transitórias.
Em razão de conhecer-se a natureza intertemporal desse
artigo, muito tem-se discutido a respeito da possibilidade de alteração do regime
de bens durante o casamento, contraídos na vigência do Código Civil de 1.916,
quando, por força do seu artigo 230, imperava a norma da irrevogabilidade do
regime adotado.
A corrente doutrinária que afirma que a alteração do regime
de bens,só será possível àqueles que se casaram após 11 de janeiro de 2003,
data esta em que passou a vigorar o atual Código Civil, fundamentam no ato
jurídico-perfeito, sufragado pelo artigo 5°, inciso XXXVI, da Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988169 e pelo artigo 6°, § 1°, da Lei de
169 Art. 5°. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;.
63
Introdução ao Código Civil, Decreto-Lei n. 4,657/42170, o qual consagra o princípio
da irretroatividade das leis.
Dessa maneira, o Código Civil de 1916, embora revogado,
permanecerá eficaz, produzindo, assim, efeitos jurídicos para disciplinar acerca
do regime de bens nos casamentos celebrados na respectiva vigência.
Contudo, há entendimento em contrário, em que é válida a
explicação trazida por Pacheco171, se “tal alteração é possível, doravante, em
relação às escolhas feitas, após a entrada em vigor do novo Código, nada impede
também que se admita a mudança, em relação ao regime escolhido
anteriormente”.
Ainda, justifica Madaleno172 que o legislador poderia ter sido
suficientemente claro e pontual, e ditar no art. 2.039 do atual Código Civil, que os
casamentos celebrados sob a vigência do Código Civil de 1916, seguiriam com
seu regime de bens imutável, contudo não faz essa ressalva e não permite
concluir assim. Ademais, o próprio § 2°, do artigo 1.639, do atual Código Civil não
restringe a alteração do regime de bens somente aos casamentos celebrados a
contar da sua vigência.
Continuando assim a sua fundamentação, Madaleno173
ressalta que o atual Código Civil, no seu art. 1.045 revoga inteiramente o Código
Civil de 1916, não havendo, portanto, como imigrar para o art. 230 ab-rogado, a
partir da ressalva extraída do artigo 2.039 do atual Código Civil, quando diz que
os regimes anteriores continuarão sendo respeitados e regulados pelos princípios
170 Art. 6°. A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito
adquirido e a coisa julgada. - § 1° Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.
171 PACHECO, José da Silva. Ligeiras anotações de direito intertemporal relativas ao novo código civil. Rio de Janeiro: Revista da Academia Brasileira de Letras Jurídicas. N. 21. 1º semestre de 2002. p. 66.
172 MADALENO, Rolf. Do regime de bens entre os cônjuges. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha; DIAS, Maria Berenice (Coord.). Direito de família e o novo código civil. Belo Horizonte: Ed. Del Rey, 2004. p. 204.
173 MADALENO, Rolf. Do regime de bens entre os cônjuges. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha; DIAS, Maria Berenice (Coord.). Direito de família e o novo código civil. p. 204.
64
da legislação passada, mas nada impede que possam ser modificados pela
legislação presente.
Partilha deste entendimento Oliveira174, aduzindo que:
A alteração se admite para todos os casos de regime de bens, não importando a data da celebração do casamento, antes a abrangência do permissivo legal e porque exigível pedido de ambos os cônjuges, sem que afetado o ato jurídico perfeito, entre a continuidade de seus efeitos, de trato tipicamente sucessivo. Não se aplica à espécie o disposto no artigo 2.039 do Código Civil, por restringir-se-á incidência do direito anterior na estrutura dos regimes de bens de casamentos celebrados na sua vigência, considerada a hipótese de permanência do regime escolhido, mas sem vedação da regra geral de sua alterabilidade. Torna-se impositivo interpretar a referida norma legal dentro do princípio igualitário, sem diferenciação de casamentos por sua data e tendo em vista a ampla possibilidade de mudança do regime de bens na entidade familiar formada pela união estável. Ademais, a exegese dos dispositivos legais em confronto deve ser feita à luz do fim social da norma jurídica, propiciando, no caso, atendimento equânime aos interesses das pessoas casadas na preservação da unidade familiar pelo regime de bens que lhes seja de efetivo interesse e utilidade.
É nesse sentido o ensinamento ditado por Régis175, aduz
que as disposições gerais sobre regimes de bens previstas nos arts. 1.639 a
1.657 seriam aplicáveis a todos os casos, inclusive para os casamentos
celebrados anteriormente a 11 de janeiro de 2003. Alegando que o art. 2.039
parece referir-se a regras específicas de cada regime, e não às disposições
gerais comuns a todos os regimes. As disposições constantes dos arts. 1.639 a
1.657 são distintas e independentes daquelas que compõem os regimes de bens
propriamente ditos. Integram o chamado regime matrimonial primário e
prescrevem os princípios aplicáveis à sociedade conjugal, do ponto de vista dos
174 OLIVEIRA, Euclides de. Novo código civil: questões controvertidas. Série grandes temas de
direito privado. Coord. DELGADO, Mário Luiz e ALVES, Jones Figueiredo. São Paulo: Método, 2003. p. 404.
175 RÉGIS, Mário Luiz Delgado. Problemas de direito intertemporal no código civil: doutrina & jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 131-132.
65
seus interesses patrimoniais. Disciplinam, no âmbito da sociedade conjugal, a
propriedade, a administração, o gozo e a disponibilidade dos bens e obrigações
que os cônjuges podem ou não assumir, qualquer que seja o regime de bens.
Concluindo assim, que a norma transitória do art. 2.039 não poderia estar se
referindo senão aos arts. 1.658 a 1688 do atual Código Civil, excluindo do seu
campo de incidência as chamadas disposições gerais previstas no arts. 1.639 a
1.657 do atual Código Civil, por esta razão, essas regras são aplicáveis até
mesmo aos casamentos celebrados antes de 11 de janeiro de 2003.
Ademais a atual disposição sobre a mutabilidade do regime
de bens trata de norma cogente, editada na esteira da evolução da própria vida
social, assim como em 1977 o divórcio foi promulgado com o mesmo propósito e
ninguém poderia afirmar que a dissolução da sociedade conjugal só estaria ao
alcance daqueles que cassassem após a vigência da lei divorcista, pois se fosse
essa a vontade do legislador, certamente teria formulado expressamente a
ressalva.176
Importante ressaltar que até os doutrinadores que se
posicionam no sentido da impossibilidade dessa aplicação retroativa, entendem
ser admissível, excepcionalmente, a alteração do regime de bens para os
casamentos contraídos na vigência do Código Civil de 1916. Nesse sentido aduz
Diniz177:
Nada obsta a que se aplique o artigo 1.639, § 2°, do novo Código Civil, excepcionalmente, se o magistrado assim entender, aplicando o art. 5° da Lei de Introdução ao Código Civil, para sanar lacuna axiológica que, provavelmente, se instaura por gerar uma situação em que se teria a não correspondência da norma do Código Civil de 1916 com os valores vigentes na sociedade, acarretando injustiça.
Sendo assim, constata-se que se a intenção do legislador
fosse na vedação do direito a mutabilidade do regime de bens para os
176 MADALENO, Rolf. Do regime de bens entre os cônjuges. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha;
DIAS, Maria Berenice (Coord.). Direito de família e o novo código civil. p. 205. 177 DINIZ, Maria Helena. Comentários ao código civil. v. 22. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 320.
66
casamentos celebrados antes de 11 de janeiro de 2003, o teria feito de modo
expresso, o que não fez. A ressalva do artigo 2.039, é, tão-somente, a aplicação
das regras anteriores para os casamentos contraídos na sua vigência, supondo
que permaneça o regime, caso não alterado.
Válidas as ponderações de Santos178:
Penso, no entanto, que esse dispositivo, constante nas Disposições Finais e Transitórias, não tem o significado que lhe está sendo emprestado. Ao dispor que “o regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior (...) é o por ele estabelecido”, claramente objetiva a regra resguardar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito. Isso porque ocorreram diversas modificações nas regras próprias de cada um dos regimes de bens normatizados no Código de 2002 em relação aos mesmos regimes no Código de 1916.
O referido autor traz como exemplo no caso do regime da
separação de bens, que não há mais necessidade de autorização do cônjuge
para a prática dos atos enumerados no artigo 1.647; bem como no regime da
comunhão universal, não estão mais excluídos da comunhão os bens antes
relacionados nos incisos IV, V, VI, X e XII do artigo 263 do CC/16; e no regime da
comunhão parcial, não mais se excluem os bens relacionados no inciso III do
artigo 269 do CC/16, contudo os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge
não se comunicam mais (inc. VI do art. 1.659), expressamente excluídos antes
pelo inciso VI do art. 271, sob a denominação de “frutos civis do trabalho, ou
indústria de cada cônjuge, ou de ambos”. Verifica-se que alterações houve na
estruturação interna de cada um dos regimes de bens e, não fosse a regra do
artigo 2.039, a incidência das novas regras sobre os casamentos anteriormente
realizados caracterizaria ofensa ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito, uma
vez que operaria alteração “ex lege”, independentemente da vontade das partes,
no regime antes escolhido, expressa ou tacitamente, pelo casal. Observa-se que,
em decorrência, os casamentos pré-existentes ao novo Código, regem-se pelas
178 SANTOS, Luis Felipe Brasil. A mutabilidade dos regimes de bens. Disponível em: <
http://www.migalhas.com.br/mostra_noticia_articuladas.aspx?cod=2295>. Acesso em 18 de outubro de 2006.
67
normas do respectivo regime de bens conforme regrado na lei vigente à época da
celebração.
Não obstante essas doutrinas, há decisões judiciárias nesse
sentido, a exemplo da citada por Manfré179, o Juiz Luís Francisco Aguilar Cortez,
da 1ª Vara da Família e das Sucessões Central de São Paulo, autorizou essa
modificação (processo n. 03.013779-9), considerando, em síntese, a partir das
redações dos arts. 6°, § 1°, da Lei de Introdução ao Código Civil e 2.035 do
Código Civil, que, para o diploma ora vigente, ato já consumado é aquele cujos
efeitos se exauriram sob vigência da lei antiga. Quando esses efeitos se protejam
sob vigência da lei posterior, o ato jurídico se sujeita à nova disciplina, pois não se
trata de ato jurídico perfeito, não se tem ato jurídico consumado.
Assim, concluiu possível a aplicação da lei atual, aliás, em
tese aperfeiçoada ou mais adaptada à situação hoje existente, evitando-se que
situações novas permaneçam disciplinadas por lei antiga e estejam sujeitas às
conqüentes distorções.
Manfré180 destacou também a sentença do Juiz João Batista
Silvério da Silva, da 12ª Vara da Família e das Sucessões Central de São Paulo,
em sentença relativa ao processo 000.03.026973-3, deferiu pedido de alteração
de regime relativo a casamento celebrado na vigência do Código Civil de 1.916,
considerando, entre mais, o seguinte: como as normas jurídicas a respeito de
regime de bens, estes a consubstanciar relações meramente patrimoniais, não
são de ordem pública, somente a excepcionalidade justificaria a intervenção do
Estado; o art. 2.039 não encerra proibição à retroatividade e nem tampouco
expressa serem irrevogáveis os regimes relativos aos enlaces anteriores, como
seria necessário para a não-aplicação em pauta; esse dispositivo, como no caso
do regime dotal, extinto, assegura seja respeitada a escolha feita na vigência do
diploma precedente; direitos de terceiros não são impedientes a essa aplicação,
posto por lei ressalvados; e não pode existir desigualdade de tratamento entre as
pessoas que se casaram antes e após 11 de janeiro de 2003.
179 MANFRÉ, José Antonio Encinas. Regime matrimonial de bens no novo código civil. p. 191 180 MANFRÉ, José Antonio Encinas. Regime matrimonial de bens no novo código civil. p. 192.
68
Frente ao exposto, constata-se que presentes os requisitos
legais que informam a justa pretensão da alteração do regime de bens, a recusa
de aplicação do artigo 1.639, § 2°, do Código Civil aos casamentos contraídos na
constância do Código Civil de 1916, considerar-se-á uma afronta ao princípio da
isonomia no tratamento jurídico dispensável a pessoas que se encontrem em
idêntica situação de casadas. Para assegurar a observância desse princípio, faz-
se imprescindível a aplicação desse artigo aos casamentos realizados a qualquer
tempo, sem distinção.
Por fim, ante todas as razões descritas, pode-se admitir a
aplicação retroativa, pois não há, nem pode haver, óbice para a alteração do
regime de bens para casamentos contraídos na vigência do Código Civil de 1916,
quando do interesse do casal e desde que atendidas as exigências estipuladas no
art. 1.639, § 2º, e não se evidenciar, nos autos, prejuízo a qualquer das partes e a
terceiro.
3.6 A MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS E A JURISPRUDÊNCIA
Somente a título ilustrativo serão apresentados alguns
entendimentos da jurisprudência, a qual tem-se manifestado no sentido da plena
incidência do artigo 1.639, § 2°, os tribunais brasileiros manifestam-se acerca da
aplicação da norma legal da alteração do regime de bens aos casamentos
celebrados sob a égide do Código Civil de 1916.
Do Superior Tribunal de Justiça colhe-se o acórdão proferido
pelo Relator Ministro Jorge Scartezzini no Recurso Especial n° 730.546 – MG
(2005/0036263-0), na data de 23 de agosto de 2005, no qual se decidiu que:
CIVIL - REGIME MATRIMONIAL DE BENS – ALTERAÇÃO JUDICIAL - CASAMENTO OCORRIDO SOB A ÉGIDE DO CC/1916 (LEI Nº 3.071) - POSSIBILIDADE - ART. 2.039 DO CC/2002 (LEI Nº 10.406) – CORRENTES DOUTRINÁRIAS - ART.
69
1.639, § 2º, C/C ART. 2.035 DO CC/2002 – NORMA GERAL DE APLICAÇÃO IMEDIATA.181
O Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina segue o
mesmo entendimento. Para o nosso tribunal, a alteração do regime de bens
também é possível para casamentos realizados antes de 11 de janeiro de 2003:
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESTABELECIMENTO DE SOCIEDADE CONJUGAL CUMULADA COM MUDANÇA DE REGIME DE BENS – CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 – POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO –RECURSO PROVIDO. A regra estabelecida pelo art. 2.039 do novo Código Civil não impede a mudança do regime de bens para casamentos celebrados sob a égide do Código Civil de 1916. O regime de bens dos casamentos contraídos pela antiga lei é o por ele estabelecido, mas somente enquanto não se aplicar a regra geral do art. 1.639, § 2.º, ou seja, enquanto não optarem os cônjuges pela sua alteração, até porque, o art. 2.039 não estabelece que o regime do casamento contraído na vigência do código revogado é imutável ou irrevogável.182
No Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul tem-se
decidido no mesmo sentido:
APELAÇÃO. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. VIABILIDADE. Viável a alteração do regime de bens dos casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916. Precedentes jurisprudenciais. Preenchidas as condições para, no caso concreto, permitir aos apelantes que alterem o regime de bens pelo qual casaram. DERAM PROVIMENTO.183
181 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 730.546. TJMG. Rel. Min. Jorge Scartezzini. 23. ago. 2005. 182 FLORIANÓPOLIS. Tribunal de Justiça de SC. Apelação Cível n° 2005.006289-2, de Lages.
Relator Desembargador Mazoni Ferreira, julgado em 07.07.2005. Publicação DJSC n. 11.726, edição de 04.08.2005, p. 38.
183 PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Apelação Cível Nº 70012999900, Oitava Câmara Cível, Relator Desembargador Rui Portanova, julgado em 05/10/2006.
70
REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. REQUISITOS. CASAMENTO CELEBRADO SOB A ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE PARTILHA DOS BENS COMUNS. O art. 2.039 não impede a mudança do regime de bens para casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916 desde que preenchidos os requisitos legais e feita a partilha dos bens comuns existentes. DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME.184
REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. A possibilidade de alteração do regime matrimonial de bens conferida aos cônjuges pelo Código Civil não afronta o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Houve uma otimização do princípio da autonomia da vontade do casal, consagrado no princípio da livre estipulação do pacto (art. 1.639 do Código Civil), de forma que se revela descabido afastar tal ampliação de direitos dos casamentos celebrados sob a égide do antigo estatuto civil. Apelo provido. (SEGREDO DE JUSTIÇA)185
Assim, finalizando a presente pesquisa, observa-se que
tanto a doutrina quanto a jurisprudência, especialmente das ementas acima
citadas, têm entendido que o pedido de alteração do regime de bens para os
casamentos contraídos na vigência do Código Civil de 1916, é juridicamente
possível, pois o artigo 2.039 inserido nas Disposições Finais e Transitórias do
Código Civil em vigor, não impede a modificação.
184 PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Apelação Cível n° 70011766243. Sétima Câmara
Cível. Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, julgado em 17.07.2005.
71
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente monografia buscou analisar a Possibilidade de
Alteração do Regime de Bens no Casamento Brasileiro, com o propósito geral de
se verificar quais são os requisitos necessários e o procedimento a ser adotado
para a efetiva alteração do regime de bens, bem como seus efeitos, cuja pesquisa
também abordou a real possibilidade de alteração do regime de bens aos
casamentos contraídos sob a vigência do Código Civil de 1916, com especial
enfoque na legislação doutrina e jurisprudência brasileiras.
Através dos estudos realizados no primeiro capítulo, deu-se
enfoque principal à evolução histórica do Casamento no Brasil, passando pelos
períodos colonial e imperial, em cujos períodos as regras, em matéria de união
conjugal, eram todas ditadas pela Igreja e também pelo período Republicano,
uma vez que com o advento da Proclamação da República, ocorreu a separação
entre o Estado e a Igreja, instituindo-se o Casamento Civil e tornando-o
obrigatório, para sua validade perante a legislação brasileira.
Com relação à natureza jurídica do Casamento foram
abordadas as três correntes que discutem o assunto, quais sejam: a
institucionalista, que considera o Casamento como uma instituição de direito
público, tendo em conta que para validade do ato é obrigatória a intervenção do
Estado; a contratualista, a qual entende que o Casamento é estabelecido através
do acordo de vontade entre os cônjuges e a eclética ou mista, que considera o
Casamento como um ato complexo, ou seja, um contrato de ordem privada,
quando da sua formação e institucional, no seu conteúdo.
Destacaram-se, também, os conceitos do Casamento, desde
as fontes romanas, através de Modestino e Ulpiano, até as mais recentes, que
muito embora não resultem da unanimidade, entendem o Casamento como um
ato solene, que tem por fim promover a união de duas pessoas, de sexo diferente,
185 PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Apelação Cível n° 70011082997. Sétima Câmara
Cível. Relator: Maria Berenice Dias, julgado em 01.06.2005. 188 Autonomia da vontade e os regimes matrimoniais de bens, p. 214.
72
que se unem, em conformidade com a lei, para estreita comunhão de vida.
No tocante as características do Casamento, destacaram-se
aquelas utilizadas pela doutrina, tais como: solenidade, liberdade de escolha dos
nubentes diversidade de sexos, dissolubilidade, legislação matrimonial de ordem
pública, união permanente e exclusiva.
Com relação as finalidades do Casamento, no Direito
Brasileiro, verificou-se que variam conforme a visão filosófica, sociológica, jurídica
ou religiosa.
Quanto aos efeitos jurídicos do Casamento, observou-se que
encontram-se divididos em três espécies: sociais, aqueles que alcançam toda a
Sociedade, razão de sua grande relevância no contexto social; pessoais, aqueles
que dizem respeito diretamente aos direitos e deveres dos cônjuges, no exercício
da Sociedade Conjugal e patrimonial, aqueles que decorrem das questões
econômicas que envolvem os cônjuges, cujas normas disciplinadoras destes
efeitos, estão contidas no regime de bens escolhido pelos cônjuges.
No Capítulo 2, realizou-se um estudo sobre os regimes
matrimoniais de bens no Direito Brasileiro, sendo os seus princípios norteadores o
da Variedade do Regimes de Bens, possibilitando aos nubentes a escolha por um
dos quatro tipos de regimes existentes no Código Civil; o da Liberdade dos Pactos
Antenupciais, onde os nubentes podem, antes da celebração do casamento,
estipular sobre seus bens da forma que acharem mais conveniente e por fim
abordou-se brevemente a respeito do Princípio da Mutabilidade Justificada do
Regime de Bens, por ser o objeto de estudo do terceiro capítulo da presente
pesquisa.
No tocante ao pacto antenupcial e seus requisitos,
constatou-se que é um ato pelo qual os nubentes organizam suas relações
patrimoniais e com terceiros.
E finalizando, destacaram-se todos os regimes de bens
existentes na atual legislação brasileira em tópicos separados, o regime da
73
comunhão universal de bens, o regime da comunhão parcial de bens, o regime da
separação de bens, o regime de participação final nos aqüestos.
O Capítulo 3, a abordagem foi dedicada a Mutabilidade do
Regime de Bens no Direito Brasileiro, observando-se os aspectos gerais e a sua
evolução no ordenamento jurídico brasileiro, bem como os requisitos necessários
para procedência da alteração. Verificou-se também, da possibilidade de
alteração do regime de bens para casamentos contraídos na vigência do Código
Civil de 1916.
Finalizando-se o capítulo, destacou-se a título ilustrativo
como a jurisprudência tem-se manifestado a respeito do tema, através das
decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça, Tribunal de Justiça de
Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Retomam-se, portanto, as hipóteses levantadas, quais
sejam:
O Código Civil de 2002 modificou as disposições relativas a
imutabilidade dos regimes de bens, possibilitando a sua alteração mesmo que o
casamento tenha se realizado sob a égide do Código Civil de 1916;
Os efeitos da sentença que altera do regime de bens podem
ser ex tunc ou ex nunc, contudo deverá constar expressamente do pedido;
O pedido de alteração do regime de bens adotado deve,
sem exceções, ser formulado por ambos os cônjuges e é possível em qualquer
tipo de regime.
Verificou-se que a primeira hipótese foi confirmada, uma vez
que o artigo 2.039 inserido nas Disposições Finais e Transitórias do Código Civil
em vigor, não impede a alteração do regime dos bens nos casamentos
celebrados na vigência do Código Civil de 1916. Pois a ordem emanada deste
dispositivo tem por principal objetivo resguardar o direito adquirido e o ato jurídico
perfeito. O que se pretende é assegurar aos cônjuges a aplicação do regime por
eles escolhidos por ocasião do casamento. Ressalta-se que a mutabilidade do
74
regime de bens em nada afronta os direitos que se pretende assegurar pelo art.
2.039 do Código Civil em vigor, mormente se considerada a consensualidade do
pedido e o amparo a direitos de terceiros. Muito pelo contrário, em verdade,
houve uma otimização do princípio da autonomia da vontade do casal,
consagrado no princípio da livre estipulação do pacto, de forma que se revela
descabido afastar tal ampliação de direitos aos casamentos celebrados sob a
égide do Código Civil revogado.
A segunda hipótese também restou confirmada, visto que o
atual Código Civil expressamente não dispõe quais são os efeitos da sentença
que altera o regime de bens, a doutrina e a jurisprudência têm-se consolidado no
sentido de que os efeitos da mudança de regime de bens poderá ter efeitos “ex
tunc” ou ”ex nunc” onde em relação aos cônjuges a produção do efeito “ex nunc”
dependerá do pedido expresso nessa conformidade, caso contrário, os efeitos
serão “ex tunc”, e em qualquer dessas hipóteses, haverá ressalva de direito de
terceiros, como impõe o art. 1.639, § 2°.
E por fim, a terceira hipótese também restou confirmada, pois
realmente a mudança judicial do regime de bens não comporta via unilateral,
contenciosa, eis que a lei exige que o pedido seja formulado por ambos os
cônjuges e a alteração refletirá o desejo mútuo. Sendo possível em qualquer tipo
de regime, até mesmo nos casos da separação de bens obrigatória, conforme as
três espécies previstas no art. 1.641 do Código Civil, desde que as pessoas
casadas com os impedimentos descritos no artigo 1.523, do Código Civil,
demonstrem a inexistência dos prejuízos que tais impedimentos poderiam
ocasionar, ocorrida após o casamento. No caso dos que dependeram de
suprimento judicial para casar, decorrido algum tempo da conivência conjugal,
havendo estabilidade familiar, também poderão requerer a modificação do regime,
todavia neste caso faz-se necessária uma análise, com interveniência de
Assistente Social, a fim de se configurar a estabilidade do relacionamento do
casal.
A presente pesquisa, não se esgota com a realização deste
trabalho, porém, com toda certeza, serviu de estímulo para futuros estudos sobre
75
o tema e também para aplicação no exercício da profissão após a conclusão do
curso de direito.
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS
BARBOZA, Heloisa Helena. Alteração do regime de bens e o art. 2.039 do código civil. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord) Afeto, ética, família e o novo código civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.
BEVILÁQUA, Clóvis. Direito de família. São Paulo: Red Livros, 2001.
BRASIL, Código Civil. Lei n° 3.071, de 01 de Janeiro de 1916.
BRASIL, Lei 1.110, de 23 de Maio de 1950. Regula o reconhecimento dos efeitos
civis do casamento religioso.
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 730.546. TJMG. Rel.
Min. Jorge Scartezzini. 23. ago. 2005.
CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. 9 ed. São Paulo: Revistas dos
Tribunais, 2000.
DEMO, Wilson. Manual de história do direito. 2 ed. Florianópolis: OAB/SC,
2000.
DIAS, Maria Berenice; PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.). direito de família e o novo código civil. 3.ed. Belo Horizonte: Rev. Atual, 2003.
DINIZ, Maria Helena. Comentários ao código civil. v. 22. São Paulo: Saraiva,
2003.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, v. 5. 14 ed. São Paulo:
Saraiva, 1999.
77
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. v. 5. 18 ed. São Paulo:
Saraiva, 2002.
DINIZ, Maria Helena. Lei de introdução ao código civil brasileiro interpretada.
São Paulo: Saraiva, 1994.
ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1998.
ESPÍNOLA, Eduardo. A família no direito brasileiro. Atual. Por Ricardo
Rodrigues Gama. Campinas: Brookseller, 2000.
FARRULA JÚNIOR, Leônidas Filippone. Do regime de bens entre os cônjuges. In: LEITE, Heloisa Maria Daltro (Coord). O novo código civil, do direito de família. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2002.
FIUZA, Ricardo. Novo Código Civil Comentado. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2004.
FLORIANÓPOLIS. Tribunal de Justiça de SC. Apelação Cível n° 2005.006289-2,
de Lages. Relator Desembargador Mazoni Ferreira, julgado em 07.07.2005.
Publicação DJSC n. 11.726, edição de 04.08.2005, p. 38.
GOMES, Orlando. Direito de família. 14 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. v. 6.
São Paulo: Saraiva, 2005.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. 9. ed. São Paulo: Saraiva,
2003.
78
GOZZO, Débora. Pacto antenupcial. São Paulo: Saraiva, 1992.
GUEFFI – FILOMUSI. Enciclopédia jurídica. 7 ed. 1971. Apud Calogero Gangi, Il
matrimônio, cit., p. 5, n. 4, nota 1.
LIMA, Domingos Sávio Brandão. A nova lei do divórcio comentada. São Paulo:
O, Dip. Editores Ltda, 1978.
LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil: direito de família e das
sucessões. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
LÔBO, Paulo Luiz Netto. Código civil comentado: direito de família, relações de
parentesco, direito patrimonial: arts. 1.591 a 1.693. São Paulo: Atlas, 2003.
MADALENO, Rolf. Do regime de bens entre os cônjuges. In: PEREIRA, Rodrigo
da Cunha; DIAS, Maria Berenice (Coord.). Direito de família e o novo código civil. Belo Horizonte: Ed. Del Rey, 2004.
MANFRÈ, José Antonio Encinas. Regime matrimonial de bens no novo código civil. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003.
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito de família. 34.
ed. São Paulo: Saraiva, 1997.
NERY JR. Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil anotado e legislação extravagante. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
OLIVEIRA, Euclides de. Novo código civil: questões controvertidas. Série
grandes temas de direito privado. Coord. DELGADO, Mário Luiz e ALVES, Jones
Figueiredo. São Paulo: Método, 2003.
79
OLIVEIRA, José Leamartine Correa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de família. 4 ed. Curitiba: Juru, 2002.
PACHECO, José da Silva. Ligeiras anotações de direito intertemporal relativas ao novo código civil. Rio de Janeiro: Revista da Academia Brasileira
de Letras Jurídicas. N. 21. 1º semestre de 2002.
PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis
para o pesquisador do direito. 8 ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2003.
PEDRONI, Ana Lucia. Dissolução do vínculo matrimonial: (Des) necessidade
da separação judicial ou de fato como requisito prévio para obtenção do divórcio
no direito brasileiro. Florianópolis: OAB/SC, 2005.
PEDROTTI, Irineu; PEDROTTI, Willian. Comentários às principais alterações – novo código civil. Campinas: LZN Editora, 2003.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 14. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2004.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. v. 5. 11 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1999.
PEREIRA, Lafayette Rodrigues. Direitos e família. Campinas: Russell editores,
2003.
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Novo código civil e legislação correlatada da família. Porto Alegre: Síntese, 2003.
PHILLIPS, Douglas. Curso de direito de família. Florianópolis: Vox Legem,
2004.
80
PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Apelação Cível Nº 70012999900,
Oitava Câmara Cível, Relator Desembargador Rui Portanova, julgado em
05/10/2006.
PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Apelação Cível n° 70011766243.
Sétima Câmara Cível. Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, julgado em 17.07.2005.
PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Apelação Cível n° 70011082997.
Sétima Câmara Cível. Relator: Maria Berenice Dias, julgado em 01.06.2005.
RÉGIS, Mário Luiz Delgado. Problemas de direito intertemporal no código civil: doutrina & jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2004.
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. 3 ed. Rio de Janeiro. Forense, 2005.
RONCONI, Diego Richard. Algumas aplicações da mudança do regime de bens do casamento. Jus Navegandi, Teresina, a. 8, n. 392, 3 ago. 2004.
Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5518>. Acesso em:
16 out. 2006.
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. v. 6. 27. ed. São Paulo:
Saraiva, 2002.
SANTOS, Luis Felipe Brasil. A mutabilidade dos regimes de bens. Disponível
em: < http://www.migalhas.com.br/mostra_noticia_articuladas.aspx?cod=2295>.
Acesso em 18 de outubro de 2006.
SILVA, Paulo Leins. O casamento como contrato de adesão e o regime legal da separação de bens. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (coord.). Anais do III
Congresso Brasileiro de Direito de Família. Família e Cidadania. O novo CCB e a
Vocatio Legis. Belo Horizonte: Del Rey, 2002.
81
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. v. 6. 3 ed. São Paulo:
Atlas, 2003.
WALD, Arnold. O novo direito de família: curso de direito civil brasileiro. 14. ed.
São Paulo: Saraiva, 2002.
ANEXOS
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 730.546 - MG (2005/0036263-0)
RELATOR : MINISTRO JORGE SCARTEZZINI
RECORRENTE : P V B B A E CÔNJUGE
ADVOGADO : LINDA MIRTES MALUF AFONSO E OUTROS
EMENTA
CIVIL - REGIME MATRIMONIAL DE BENS - ALTERAÇÃO
JUDICIAL - CASAMENTO OCORRIDO SOB A ÉGIDE DO CC/1916 (LEI Nº 3.071)
- POSSIBILIDADE - ART. 2.039 DO CC/2002 (LEI Nº 10.406) - CORRENTES
DOUTRINÁRIAS - ART. 1.639, § 2º, C/C ART. 2.035 DO CC/2002 - NORMA
GERAL DE APLICAÇÃO IMEDIATA.
1 - Apresenta-se razoável, in casu, não considerar o art. 2.039 do CC/2002 como
óbice à aplicação de norma geral, constante do art. 1.639, § 2º, do CC/2002, concernente à
alteração incidental de regime de bens nos casamentos ocorridos sob a égide do CC/1916, desde
que ressalvados os direitos de terceiros e apuradas as razões invocadas pelos cônjuges para tal
pedido, não havendo que se falar em retroatividade legal, vedada nos termos do art. 5º, XXXVI,
da CF/88, mas, ao revés, nos termos do art. 2.035 do CC/2002, em aplicação de norma geral com
83
efeitos imediatos.
2 - Recurso conhecido e provido pela alínea "a" para, admitindo-se a possibilidade
de alteração do regime de bens adotado por ocasião de matrimônio realizado sob o pálio do
CC/1916, determinar o retorno dos autos às instâncias ordinárias a fim de que procedam à análise
do pedido, nos termos do art. 1.639, § 2º, do CC/2002.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a
seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa parte, lhe dar provimento, nos
termos do voto do Sr. Ministro Relator, com quem votaram de acordo os Srs. Ministros
BARROS MONTEIRO, CÉSAR ASFOR ROCHA, FERNANDO GONÇALVES e ALDIR
PASSARINHO JÚNIOR.
Brasília, DF, 23 de agosto de 2005(data do julgamento).
MINISTRO JORGE SCARTEZZINI , Relator
Documento: 1855343 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 03/10/2005 Página 1 de 1
84
Acórdão: Apelação Cível n. 2005.006289-2, de Lages.
Relator: Des. Mazoni Ferreira.
Data da decisão: 07.07.2005.
Publicação: DJSC n. 11.726, edição de 04.08.2005, p. 38.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESTABELECIMENTO DE
SOCIEDADE CONJUGAL CUMULADA COM MUDANÇA DE REGIME DE BENS
– CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 –
POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO – RECURSO PROVIDO.
A regra estabelecida pelo art. 2.039 do novo Código Civil não impede a mudança
do regime de bens para casamentos celebrados sob a égide do Código Civil de
1916. O regime de bens dos casamentos contraídos pela antiga lei é o por ele
estabelecido, mas somente enquanto não se aplicar a regra geral do art. 1.639, §
2.º, ou seja, enquanto não optarem os cônjuges pela sua alteração, até porque, o
art. 2.039 não estabelece que o regime do casamento contraído na vigência do
código revogado é imutável ou irrevogável.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2005.006289-2, da
comarca de Lages, em que são apelantes W. B. de S. e S. A. B. de S.:
ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Civil, por decisão unânime, dar
provimento ao recurso.
Custas na forma da lei.
W. B. de S. e S. A. B. de S.. ajuizaram, em 27-10-04, ação de restabelecimento
de sociedade conjugal cumulada com mudança de regime de bens, alegando, em
suma, que estavam separados judicialmente desde o dia 19-5-97 e voltaram a ter
uma convivência de fato e por isso resolveram restabelecer a sociedade conjugal.
Requereram o restabelecimento da sociedade conjugal e a alteração do regime
de bens para o da comunhão parcial.
À inicial foram acostados os documentos de fls. 5 a 9.
O Dr. Promotor de Justiça opinou pela procedência do pedido.
Sentenciando o feito, o MM. Juiz de Direito julgou parcialmente procedente o
85
pedido para homologar o pedido de reconciliação do casal, declarando
restabelecida a sociedade conjugal em que fora anteriormente constituída pelo
casamento e indeferiu o pedido de alteração de regime de bens na forma
pretendida.
Irresignados com a decisão proferida, os autores apelaram tempestivamente,
sustentando em suas razões recursais que o pedido formulado foi devidamente
motivado, preenchendo pois os requisitos exigidos em lei para a sua concessão.
Alegam ainda que não restam motivos para que os cônjuges não possam se valer
da prerrogativa de invocar a retroatividade da lei, haja vista que a medida não irá
prejudicar direito de terceiros. Ao final, pugnam pela reforma da decisão
hostilizada a fim de que seja modificado o regime de bens dos apelantes de
comunhão universal para comunhão parcial.
O representante do Ministério Público, com espeque no ato PGJ/CGMP/n.
0178/2001, deixou de manifestar-se (fls. 27 a 30).
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Dr. Jobél
Braga de Araújo, manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso.
É o relatório.
O recurso é conhecido porque próprio e tempestivo.
O atual Código Civil ao disciplinar o direito patrimonial no casamento, alterou
profundamente determinadas regras, ao dispor no art. 1.639, § 2º a possibilidade
de “alteração do regime de bens, no curso do casamento, mediante autorização
judicial, em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das
razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.”
Apesar da matéria em apreço gerar polêmica e debates acalourados na doutrina,
aos poucos, vem se firmando o entendimento nos tribunais pátrios de que o art.
2.039 inserido nas Disposições Finais e Transitórias do Código Civil em vigor, não
impede a alteração do regime dos bens nos casamentos celebrados na vigência
do Código Civil de 1916.
Comentando o novel dispositivo, o doutrinador Rolf Madaleno ressalta:
“Entre os dispositivos mais polêmicos do texto aprovado, figura o artigo 1639 com
seus §§ 1º e 2º, insertos no capítulo das disposições gerais. Especialmente no
86
respeitante ao seu § 2º, que regulamenta a possibilidade de alteração do regime
de bens no curso do casamento.
O caput desse artigo 1639 é reprodução literal do artigo 256 do CC, enquanto o
seu § 1º reproduz parcialmente o artigo 230. Parcialmente, porque o regime de
bens sempre foi irrevogável depois de celebradas as justas núpcias e isto vem
inquestionavelmente assentado no artigo 230 do CC, em sua parte final, e não é
reproduzido no artigo 1639. Exatamente porque o legislador permitiu a
modificação do regime matrimonial em pleno casamento, sempre mediante
autorização judicial motivada por ambos os cônjuges, ressalvado os direitos de
terceiros.
A imutabilidade do regime de bens prescrita pelo Código Civil (artigo 230) sempre
teve em mira as eventuais influências e solicitações. Escreve Caio Mário da Silva
Pereira, que na constância do casamento poderiam conduzir um dos consortes a
alterar o regime econômico do matrimônio, com grave risco para os próprios
créditos e provável prejuízo para terceiros. Eventuais credores que tinham na
meação de uma comunhão universal, ou mesmo na partilha apenas dos aqüestos
(no regime da comunhão parcial), a expectativa de recebimento do seu crédito,
podem ver frustrada a quitação de seus haveres pela maliciosa migração dos
cônjuges para o regime da completa separação de bens. Silvio Salvo Venosa
enfatiza ter sido erigido o princípio da imutabilidade do regime de bens como
garantia aos próprios cônjuges e para resguardo do direito de terceiros. Ressalva
apenas que a irrevogabilidade do regime tendia, em regra, a proteger a mulher
casada, pois noutra esfera cultural brasileira ela era tida como dotada de menor
experiência no trato das riquezas econômicas do casamento, quase sempre
administradas pelo marido.
Por certo convencido pela argumentação jurídica defendida principalmente por
Orlando Gomes, com o advento do Novo Código Civil o legislador brasileiro
abandonou o princípio da imutabilidade do regime de bens. Já em 1984
questionava o saudoso jurista baiano as razões que ainda justificavam manter a
imutabilidade do regime patrimonial, quando a própria lei punha a escolha dos
nubentes diversos regimes matrimoniais e não impedia que mesclassem
disposições próprias de cada um dos regimes. Aconselhava apenas que fossem
adotadas as devidas cautelas, subordinando a mudança do regime à autorização
87
judicial, por requerimento de ambos os cônjuges, os quais deveriam justificar a
pretensão, e verificando o juiz a plausibilidade do deferimento, e cuidando para
terceiros não serem prejudicados, ressalvando essa hipótese em qualquer caso,
com ampla publicidade da sentença, a qual deveria ser transcrita no registro
próprio” (in Direito de Família e o Novo Código Civil, coord. Maria Berenice Dias et
al, Del Rey, p. 159 e160).
No caso sub examen verifica-se que embora o casamento tenha sido celebrado
sob a égide do Código Civil de 1916, é perfeitamente possível a alteração do
regime de bens conforme interpretação sistemática dos artigos 2.039 e 1.639, § 2º
do Código Civil em vigor, que assim prescrevem respectivamente:
O regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil
anterior, Lei 3.071, de 1º de janeiro de 1916, é o por ele estabelecido.
É admissível a alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em
pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões
invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.
Embora a leitura conjunta e açodada dos dispositivos supracitados possa
aparentar a existência de conflito entre ambos, tal conclusão não pode
preponderar.
A ordem emanada do primeiro dispositivo acima transcrito tem por principal
objetivo resguardar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito, ou seja, a
segurança das relações jurídicas, em face das alterações promovidas pelo Código
Civil relativamente ao regramento específico de cada regime de bens. Logo, o que
se pretende assegurar aos consortes é a aplicação do regime por eles escolhidos
por ocasião da celebração do casamento, nos exatos termos da lei em vigor na
ocasião.
No entanto, como já referido, o art. 1.639, § 2º, do novo diploma civil estabeleceu
novidade no ordenamento jurídico, pois, diversamente da imutabilidade do regime
de bens prevista no Código Civil de 1916, possibilita aos cônjuges a alteração
desse pacto, mediante autorização judicial e pedido motivado de ambos os
consortes, com o resguardo de eventuais direitos de terceiros.
Ressalta-se, que essa faculdade conferida aos cônjuges em nada afronta os
direitos que se pretende assegurar pelo art. 2.039 do Código Civil em vigor,
mormente se considerada a consensualidade do pedido e o amparo a direitos de
88
terceiros. Muito pelo contrário, em verdade, houve uma otimização do princípio da
autonomia da vontade do casal, consagrado no princípio da livre estipulação do
pacto (art. 1.639 do Código Civil), de forma que se revela descabido afastar tal
ampliação de direitos dos casamentos celebrados sob a égide do Código Civil
revogado.
Outrossim, cumpre observar a dinâmica da vida moderna que, muitas vezes, vem
a interferir nas relações patrimoniais dos consortes, fazendo com que o
regramento escolhido não mais atenda aos anseios do par.
Ademais, estando as partes envolvidas de acordo entre si e com o ordenamento
jurídico atual, não existe razão para negar seguimento ao pedido.
Raciocínio contrário traria uma situação curiosa: ao não permitirmos a mudança
do regime sob o argumento de impossibilidade jurídica, os cônjuges poderiam
adotar a saída de divorciarem-se (preenchidos os requisitos) para, casando
novamente, mudar o regime que a atual lei permite para os laços posteriores ao
CC/02.
A interpretação não pode levar a incoerências lógicas.
Acerca do tema, com muita propriedade, a Desembargadora gaúcha, Maria
Berenice Dias, leciona:
“A faculdade de alteração do regime foi introduzida no atual Código Civil, que
entrou em vigor em 11 de janeiro de 2003. Tem sido amplamente debatido se tal
direito pode ser buscado por quem casou sob a égide da legislação pretérita, que
vedava a mudança do regime matrimonial adotado quando do casamento. O
debate ganha mais significado, em face do que dizem as disposições finais e
transitórias (2.039): o regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do
código Civil anterior é o por ele estabelecido. Ainda assim, é mister reconhecer
que não existe qualquer restrição legal à mudança, independente da época em
que foi celebrado o matrimônio. É imposto respeito ao regime de bens, e não à
sua imodificabilidade. Não há que se falar em direito adquirido para a restrição de
direito. Conseqüentemente, se a lei concede um benefício mais amplo, não há por
que limitar a liberdade de buscar sua concessão. Cabe ser invocado o princípio
da lei mais benéfica. Ao depois, a norma que instituiu a possibilidade de alteração
não faz qualquer ressalva quanto à data de celebração do casamento. Portanto, o
Código Civil de 1916 segue regulando os matrimônios celebrados ao seu tempo,
89
sem haver qualquer impedimento à alteração do regime matrimonial.” (in Manual
de Direito das Famílias, 1ª ed., Livraria do Advogado: Porto Alegre, 2005, págs.
217/218).
Corroborando esse entendimento, traz-se à colação artigo do professor de Direito
Civil na Universidade Federal da Bahia e Juiz de Direito no mesmo Estado, Dr.
Pablo Stolze Gagliano:
“Subvertendo o tradicional princípio da imutabilidade do regime de bens, o Código
de 2002, em seu art. 1639, § 2°, admite a alteração do regime, no curso do
casamento, mediante autorização judicial, em pedido motivado de ambos os
cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas, e ressalvados os direitos
de terceiros.
Não cabendo aqui a análise pormenorizada deste dispositivo, ressaltamos apenas
que tal pleito deverá ser formulado no bojo de procedimento de jurisdição
graciosa, com a necessária intervenção do Ministério Público, a fim de que o juiz
da Vara de Família avalie a conveniência e a razoabilidade da mudança, que se
efetivará mediante a concessão de alvará de autorização, seguindo-se a
necessária expedição de mandado de averbação.
Entretanto, feitas tais ponderações, uma indagação se impõe: terão direito à
alteração de regime as pessoas casadas antes do Código de 2002?
Essa indagação reveste-se ainda de maior importância, quando consideramos o
princípio da irretroatividade das leis, e, sobretudo, o fato de o próprio Código Novo
estabelecer, em seu art. 2.039, que: “o regime de bens nos casamentos
celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei n. 3.071, de 1° Janeiro de
1916, é por ele estabelecido”. (grifos nossos)
Uma primeira interpretação conduz-nos à conclusão de que os matrimônios
contraídos na vigência do Código de 1916 não admitiriam a incidência da lei nova,
razão por que esses consortes não poderiam pleitear a modificação do regime.
Não concordamos, todavia, com este entendimento.
Em nossa opinião, o regime de bens consiste em uma instituição patrimonial de
eficácia continuada, gerando efeitos durante todo o tempo de subsistência da
sociedade conjugal, até a sua dissolução. Dessa forma, mesmo casados antes de
11 de janeiro de 2002 – data da entrada em vigor do Novo Código -, os cônjuges
poderiam pleitear a modificação do regime, eis que os seus efeitos jurídico-
90
patrimoniais adentrariam a incidência do novo diploma, submetendo-se às suas
normas.
Raciocínio contrário coroaria a injustiça de admitir a modificação do regime de
bens de pessoas que se uniram matrimonialmente um dia após a vigência da lei,
negando-se o mesmo direito aos casais que hajam se unido um dia antes.” (artigo
entitulado “O Impacto do Novo Código Civil no Regime de Bens do Casamento”,
extraído do site http:
//www.juspodivm.com.br/novodireitocivil/Artigos/pablo/impacto_codcivil_bens_cas
amento.pdf). O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em recentes julgados,
decidiu:
“ALTERAÇÃO DE REGIME DE BENS DO CASAMENTO. POSSIBILIDADE
JURÍDICA DO PEDIDO. 1. A alteração do regime de bens é possível
juridicamente, consoante estabelece o art. 1.639, §2º, do NCCB e as razões
postas pelas partes evidenciam a conveniência para eles, constituindo o pedido
motivado de que trata a lei, devendo ser apreciado pela autoridade judicial. 2. A
alteração do regime de bens pode ser promovida a qualquer tempo, de regra com
efeito ex tunc, ressalvados direitos de terceiros, inexistindo qualquer obstáculo
legal à alteração de regime de bens de casamentos anteriores à vigência do
Código Civil de 2002. Inteligência do artigo 2.039, do NCCB. Recurso provido.
(TJRS – Apelação Cível n. 70011516366, Sétima Câmara Cível, rel. Des. Sérgio
Fernando de Vasconcellos Chaves, j. 1º-6-2005).
“REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. REQUISISTOS.
CASAMENTO CELEBRADO SOB A ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL DE 1916.
POSSIBILIDADE. A regra do art. 2039 do CC/02 não fere o ato jurídico perfeito.
Assim, mesmo diante do novo regramento trazido pelo atual código civil que
modificou as regras dos regimes de bens, existe a possibilidade jurídica de alterar
o regime de bens para matrimônios realizados sob a égide do CC/16. APELO
PROVIDO.” (TJRS – Apelação Cível n. 70010447043, Sétima Câmara Cível, rel.
Des. José Carlos Teixeira Giorgis, j. 30-3-2005).
“REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. CASAMENTO
CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. A possibilidade de
alteração do regime matrimonial de bens conferida aos cônjuges pelo Código Civil
não afronta o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Houve uma otimização do
91
princípio da autonomia da vontade do casal, consagrado no princípio da livre
estipulação do pacto (art. 1.639 do Código Civil), de forma que se revela
descabido afastar tal ampliação de direitos dos casamentos celebrados sob a
égide do antigo estatuto civil. Apelo provido. (TJRS – Apelação Cível n.
70011082997, Sétima Câmara Cível, rela. Des. Maria Berenice Dias, j. 1-6-2005) .
No mesmo sentido já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo:
“CASAMENTO. Alteração do regime de bens. Da comunhão universal de bens
para o de separação. Admissível é a alteração do regime de bens de casamento
celebrado na regência do Código Civil de 1916, não obstante o disposto no artigo
2.039 do Código Civil de 2002, desde que atendidas as exigências estipuladas no
art. 1.639, § 2º, e não se evidenciar, nos autos, prejuízo a qualquer das partes e a
terceiro. Ação improcedente. Decisão que não se mantém. Recurso provido.”
(TJSP – AC 332.192-4/6-00 – 7ª C. D. Priv. – Rel. Des. Oswaldo Breviglieri – j. 28-
4-2004).
Destarte, estando o pedido dos apelantes em conformidade com os
entendimentos atuais da doutrina e jurisprudência, e não havendo prejuízo a
qualquer das partes e a terceiros, a reforma da sentença é medida que se impõe.
Isso posto, decide a Segunda Câmara de Direito Civil, por votação unânime, dar
provimento ao recurso.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Exmos. Srs. Des. Monteiro
Rocha e Jorge Schaefer Martins. Lavrou parecer, pela douta Procuradoria-Geral
de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Jobél Braga de Araújo.
Florianópolis, 7 de julho de 2005.
Mazoni Ferreira
PRESIDENTE E RELATOR
92
APELAÇÃO. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. VIABILIDADE.
Viável a alteração do regime de bens dos casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916. Precedentes jurisprudenciais.
Preenchidas as condições para, no caso concreto, permitir aos apelantes que alterem o regime de bens pelo qual casaram. DERAM PROVIMENTO.
APELAÇÃO CÍVEL
OITAVA CÂMARA CÍVEL
Nº 70012999900
COMARCA DE NOVA PRATA
P.A.B. F.S.B. .
APELANTES; .J. . APELADA.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Cível
do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes
Senhores DES. LUIZ ARI AZAMBUJA RAMOS (PRESIDENTE) E DES. CLAUDIR FIDÉLIS FACCENDA.
Porto Alegre, 05 de outubro de 2006.
DES. RUI PORTANOVA, RELATOR.
R E L A T Ó R I O
DES. RUI PORTANOVA (RELATOR)
93
PASCOAL e MARIA DE FÁTIMA interpõem apelação contra
sentença prolatada nos autos da ação de alteração de regime de bens movida
pelos apelantes.
A sentença julgou improcedente o pedido.
Os apelantes alegam que o fato dos bens ficarem com a cônjuge-
mulher não impede a alteração do regime de bens. Aduzem inexistir prejuízos a
terceiros.
O parecer do Ministério Público de primeiro grau foi pelo
improvimento. A Procuradoria de Justiça foi pela anulação da sentença.
Em sessão realizada em 22/12/2005, esta 8ª Câmara Cível
desconstituiu a sentença e reabriu a instrução.
Sobreveio nova sentença julgando improcedente a ação (fls. 78/81).
Em seu apelo, PASCOAL e MARIA DE FÁTIMA pedem a
procedência de seu pedido de alteração de regime de bens.
O Ministério Público, neste grau de jurisdição manifesta-se pelo
provimento do apelo.
É o relatório.
V O T O S
DES. RUI PORTANOVA (RELATOR)
Adoto como razões de decidir o bem lançado parecer da lavra do
Procurador de Justiça, Dr. Ricardo Moreira Lins Pastl, verbis:
No mérito, entende-se que as alegações recursais são fundadas, merecendo reforma a decisão monocrática, a
94
fim de possibilitar a alteração do regime de bens pretendida. Com efeito, com a vênia da compreensão diversa, a regra do artigo 2.039 do Código Civil de 2002 não impede a alteração do regime dos casamentos mesmo quando celebrados ao abrigo da lei antiga, como no caso, desde que, nos termos do § 2º do artigo 1.639 daquele diploma, exista motivação para tanto e não haja possibilidade de redundar prejuízos a terceiros. O referido artigo 2.039 estabelece que a regulação do regime de bens dos casamentos celebrados anteriormente à vigência do novo Código deve se dar pelas regras do Código Civil de 1916, tendo por objetivo unicamente proteger os regimes estabelecidos em antigos matrimônios das alterações ocorridas nas regras próprias havidas no novo diploma civil, resguardando o direito adquirido e o ato jurídico perfeito. Tal conclusão, contudo, não se repete quanto à possibilidade de, na constância do casamento, vir a ser alterado o regime de bens originalmente estabelecido. Assim, aos casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916, a regra permite a transformação do regime de bens na constância da união, prevista no § 2º do artigo 1.639 do diploma civil de 2002, valendo nesse sentido ilustrar:
“APELAÇÃO CÍVEL. ALTERAÇÃO DE REGIME DE BENS DE CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO ANTERIOR CÓDIGO CIVIL. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. 1. A alteração do regime de bens está autorizada pelo o art. 1.639, § 2º, do atual CCB. 2. A alteração do regime de bens pode ser promovida a qualquer tempo, inexistindo obstáculo nos casos de casamentos anteriores à vigência do Código Civil de 2002. 3. Inteligência do artigo 2.039 do CCB e do Enunciado nº 260 da I JORNADA DE DIREITO CIVIL, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal. Recurso provido” (Apelação Cível nº 70012446126, Sétima Câmara Cível, TJRS, Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, 31/08/2005).
95
“APELAÇÃO CÍVEL. CASAMENTO CELEBRADO SOB A VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS. POSSIBILIDADE. O art. 2.039 das Disposições Finais e Transitórias do Código Civil em vigor não impede a alteração do regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916. O regime de bens dos casamentos pela antiga lei é o por ele estabelecido, mas somente enquanto não se aplicar a regra geral do art. 1.639, § 2.º, CC/02, ou seja, enquanto não optarem os cônjuges pela sua alteração, até porque, o art. 2.039 não diz que o regime do casamento contraído pelo CC/16 é imutável ou irrevogável. Precedentes doutrinários e jurisprudenciais. Apelação do Ministério Público desprovida” (Apelação Cível nº 70011592110, 8ª Câmara Cível, TJRS, Rel. Des. José Ataídes Siqueira Trindade, 09/06/2005).
Ainda defendendo esse entendimento, vale referir o lúcido artigo do Des. Luiz Felipe Brasil Santos, publicado no SITE do Instituto Brasileiro de Direito de Família, e transcrito quando do julgamento da Apelação Cível nº 70006423891, da 7ª Câmara Cível desse Tribunal de Justiça, assim como a tradução esposada por este Órgão na Apelação Cível nº 70009817073. Afirmada a possibilidade de alteração do regime patrimonial de casamentos celebrados ao abrigo do Código Civil de 1916, vislumbra-se que, no caso em exame, se encontram presentes os requisitos necessários para o deferimento do pedido. Primeiro, porque a adoção do regime da comunhão universal de bens em regiões de colonização italiana, por uma questão cultural, era quase que uma regra adotada pelas famílias ao tempo do casamento (e ainda hoje é, embora minimizada), vendo-se ser plausível a versão de que o casal, antes de manifestar seu real intento a respeito do regime de bens matrimonial a adotar, apenas aderiram ao que era costume. Em segundo, porque a nubente era menor quando da celebração do matrimônio, restando suficientemente demonstrada a sua alegação de que anuiu à vontade
96
paterna, que exigia o pacto comunitário universal para consentir com o casamento, como ressaltado pela testemunha Elemar Lourdes Xavier (fl. 79). Em terceiro, porque não se constata exista risco de redundar prejuízos a terceiros com a alteração pretendida, observando-se que o par não tem pendência alguma, como retratam as certidões negativas de processos criminais e cíveis (fls. 08-11), de débitos de tributos e contribuições federais (fls. 15-16) e municipal (fl. 21) e de protestos de títulos (fls. 22-23), estando os imóveis partilhados livres de quaisquer ônus reais (fls. 19-20). O pedido deve ser deferido, por derradeiro, por não ser obstáculo à alteração postulada o fato de as partes pretenderem aquinhoar a esposa com a totalidade do patrimônio (esboço apresentado na fl. 04), visto que, nessa seara, as partes podem dispor livremente do acervo, não fugindo à razoabilidade a partilha, sobretudo por se tratar de imóveis de pequeno valor (dois lotes urbanos, matrículas em fls. 17-18), o que, de resto, já havia apontado o ilustre Des. Rui Portanova no acórdão das fls. 59-62. Dessa forma, não se vislumbra qualquer óbice para a alteração do regime de bens, valendo acrescentar que ambos são pessoas independentes, ele engenheiro, ela diretora de escola (qualificação apresentada na inicial, fl. 02, e confirmada pela testemunha Gustavo Bodanese Prates, fl. 78), não havendo razão para que não se observe a autonomia de suas vontades.
ANTE O EXPOSTO, dou provimento ao apelo, para o fim
de determinar a alteração do regime de casamento dos apelantes, de
comunhão universal para separação total de bens.
DES. CLAUDIR FIDÉLIS FACCENDA (REVISOR) - De acordo.
DES. LUIZ ARI AZAMBUJA RAMOS (PRESIDENTE) - De acordo.
DES. LUIZ ARI AZAMBUJA RAMOS - Presidente - Apelação Cível nº
70012999900, Comarca de Nova Prata: "DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME."
Julgador(a) de 1º Grau: GILBERTO PINTO FONTOURA
97
REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. REQUISITOS. CASAMENTO CELEBRADO SOB A ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE PARTILHA DOS BENS COMUNS. O art. 2.039 não impede a mudança do regime de bens para casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916 desde que preenchidos os requisitos legais e feita a partilha dos bens comuns existentes. DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME.
APELAÇÃO CÍVEL
SÉTIMA CÂMARA CÍVEL
Nº 70011766243
COMARCA DE LAJEADO
PAULO PERUGURIA DOS SANTOS
APELANTE
CARMEN ROZANI MARTINS PEREIRA
APELANTE
A JUSTICA
APELADO
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Cível
do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes
Senhores DESA. MARIA BERENICE DIAS (PRESIDENTE E REVISORA) E DES. JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS.
Porto Alegre, 13 de julho de 2005.
DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, RELATOR.
R E L A T Ó R I O
DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS (RELATOR)
98
Trata-se de recurso de apelação interposto por Paulo P.S. e
Carmem R.M.P., irresignados com sentença que julgou improcedente ação de
retificação de registro civil em que buscava a retificação do regime de bens.
Sustentam que (1) ao casarem, no ano de 1985, optaram pelo
regime da separação total de bens, como consta na certidão; (2) por omissão do
cartório, que não os informou da necessidade de escritura pública, esta não foi
lavrada; (3) a ausência de escritura pública causou uma série de problemas
quando realização de atos simples da vida civil, como financiamento bancário, em
que era sempre exigida, por vezes obstando a realização de negócios; (4) sempre
mantiveram a intenção de adotar o regime da separação total de bens, o que foi
reconhecido pelo parecer ministerial, que foi adotado como razões de decidir pela
sentença; (5) não é justo que lhe seja negada a correção pretendida e sejam
prejudicados por uma omissão do tabelião, que não os informou da necessidade
de lavrar escritura pública de pacto antenupcial; (6) com o advento do Novo
Código Civil torna-se possível a alteração, de modo a prevalecer a vontade das
partes. Pedem provimento.
O Ministério Público, nesta instância, opina pelo conhecimento e
provimento do apelo.
Foi atendido o disposto nos arts. 549, 551 e 552 do CPC.
É o relatório.
V O T O S
DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS (RELATOR)
99
Inicialmente cumpre consignar que a petição inicial fundamenta
equivocadamente a pretensão como retificação de registro civil quando, na
verdade, pretende alterar o regime de bens.
Não há o que retificar na medida em que os apelantes desejam
manter e validar o que está consignado no assento de casamento – regime da
separação total de bens – e não retificá-lo.
A questão há de ser tratada como alteração de regime de bens
perfeitamente possível depois que o Código Civil em vigor derrubou a
imutabilidade do regime de bens.
O fato de a ausência de escritura pública tornar ineficaz a opção dos
cônjuges pelo regime da separação total de bens não elide a possibilidade jurídica
do pedido formulado, pois, como já dito, a pretensão de fundo é de alteração de
regime de bens.
Sob a égide do atual Código Civil, em relação ao regime matrimonial
de bens, vige o princípio da mutabilidade controlada. Como já tive oportunidade
de consignar em artigo publicado no livro Direitos Fundamentais do Direito de
Família, obra coletiva coordenada por Belmiro Pedro Welter e Rolf Hanssen
Madaleno188, “para que se viabilize a modificação diversos requisitos estão postos
na lei, objetivando afastar riscos à segurança de terceiros e dos próprios cônjuges
entre si, quais sejam: a) exigência de processo judicial; b) consensualidade na
postulação; c) motivação; d) ressalva do direito de terceiros”.
Preenchidos tais requisitos, como no caso dos autos, há de ser
deferida a alteração do regime de bens, mesmo que o casamento tenha sido
celebrado sob a égide do Código Civil de 1916.
100
A alteração está sendo postulada judicialmente, com o consenso das
partes, espelhando a vontade manifestada já ao tempo do casamento. A
motivação é relevante: não bastasse a vontade das partes, a relação patrimonial
do casal foi construída ao longo dos anos sob o paradigma da separação total de
bens.
Atendendo ao último requisito, os apelantes juntaram certidões
negativas que afastam a possibilidade de lesão a direito de terceiros.
Não há razão, portanto, para lhes negar a alteração que, em
verdade, apenas ratifica a vontade manifestada desde sempre pelos apelantes.
O art. 2.039, constante das disposições finais e transitórias do
Código Civil em vigor, não impede a mudança do regime de bens para
casamentos celebrados antes da vigência do Código Civil de 2002.
Ao dispor que o regime de bens nos casamentos celebrados na
vigência do Código Civil anterior (...) é o por ele estabelecido, claramente visa a
norma resguardar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito. Isso porque
ocorreram diversas modificações nas regras próprias de cada um dos regimes de
bens normatizados no Código de 2002 em relação aos mesmos regimes no
Código de 1916, e, assim, a alteração decorrente de lei posterior viria a malferir
esses cânones constitucionais.
Procedente a alteração, deverá ser averbada no assento de
casamento, sem necessidade de escritura pública, apenas à vista do mandado,
como determina o Provimento Nº 24/04-CGJ, que acrescentou o art. 161-A à
Consolidação Normativa Notarial e Registral:
Art. 161A - averbar-se-á, ainda, no assento de casamento, a alteração do regime de bens, à vista de mandado judicial.
101
Ao contrário do que sustenta o apelante, é imperiosa a partilha dos
bens adquiridos até então, uma vez que, em razão ausência da escritura pública,
em todo o período de casamento dos apelantes vigorou a comunhão parcial de
bens, como regime legal.
No artigo antes referido189 sustentei que sempre que o novo regime
adotado determinar uma comunicação mais restritiva que o estatuído até então,
em relação aos bens já integrantes, imperiosa será a divisão do ativo e do
passivo, uma vez que, a partir daí, cessa a responsabilidade de cada cônjuge em
relação aos credores do outro (art. 1671, CC).
Consolida, portanto, a propriedade dos bens elencados na inicial (fl.
4 e 5) na forma lá descrita.
Como se trata de partilha, devem ser avaliados os bens e eventual
excesso de meação deve ser devidamente tributado.
Feitas essas considerações, dou provimento ao apelo.
DESA. MARIA BERENICE DIAS (PRESIDENTE E REVISORA) - De acordo.
DES. JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS - De acordo.
DESA. MARIA BERENICE DIAS - Presidente - Apelação Cível nº 70011766243,
Comarca de Lajeado: "DERAM PROVIMENTO. UNÃNIME"
Julgador(a) de 1º Grau: CARMEN LUIZA ROSA CONSTANTE BARGHOUTI
189 Op. cit. p. 218
102
REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. A possibilidade de alteração do regime matrimonial de bens conferida aos cônjuges pelo Código Civil não afronta o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Houve uma otimização do princípio da autonomia da vontade do casal, consagrado no princípio da livre estipulação do pacto (art. 1.639 do Código Civil), de forma que se revela descabido afastar tal ampliação de direitos dos casamentos celebrados sob a égide do antigo estatuto civil. Apelo provido.
APELAÇÃO CÍVEL
SÉTIMA CÂMARA CÍVEL
Nº 70011082997
COMARCA DE VACARIA
PAULO ROBERTO FERREIRA DE LIMA
APELANTE
EDUARDA DENISE SCHWARTZ
APELANTE
A JUSTIÇA
APELADA
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Cível
do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, prover o apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os
eminentes Senhores DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS E DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES.
Porto Alegre, 01 de junho de 2005.
DESA. MARIA BERENICE DIAS, RELATORA-PRESIDENTE.
R E L A T Ó R I O
DESA. MARIA BERENICE DIAS (RELATORA-PRESIDENTE)
103
P. R. F. L. e E. D. S. interpõem pedido de autorização judicial para
alteração do regime de bens do casamento, noticiando terem casado pelo regime
da separação total de bens. No entanto, ao longo dos treze anos de matrimônio,
construíram, mediante esforço comum, uma empresa, mas que, por força do
regime de bens contratado, constituirá bem incomunicável. E, por força do art.
977 do Código Civil, os cônjuges casados pelo regime da separação obrigatória
de bens estão impedidos de contratar entre si. Requerem o deferimento do
postulado (fls. 2/3).
O Ministério Público manifestou-se pelo deferimento da pretensão
(fls. 22/24).
Sentenciando, o magistrado julgou improcedente o pedido formulado
pelos requerentes (fls. 33/34).
Os autores interpuseram embargos de declaração, os quais foram
julgados improcedentes pelo juízo a quo (fls. 36/49).
Inconformados, apelam os requerentes, asseverando serem
casados pelo regime da separação total de bens, sendo que, ao longo do
casamento, constituíram uma empresa com o esforço comum. Assim, com o
advento do Novo Código Civil, necessitam adequar a empresa à nova legislação.
Sustentam a possibilidade de aplicação do art. 1.639, §2º, do Código Civil aos
casamentos celebrados anteriormente à vigência desse estatuto legal. Requerem
o provimento do recurso (fls. 53/62).
O Ministério Público opinou pelo provimento do apelo (fls. 66/71).
Subiram os autos a esta Corte, tendo a Procuradoria de Justiça
manifestado-se pelo conhecimento e provimento do apelo (fls. 74/78).
Foi observado o disposto no art. 551, §2º, do Código de Processo
Civil.
É o relatório.
V O T O S
DESA. MARIA BERENICE DIAS (RELATORA-PRESIDENTE)
Trata-se de pedido de alteração de regime de bens de casamento
celebrado em 21 de novembro de 1989, portanto, antes da vigência do Código
104
Civil, Lei 10.406/2002 (fls. 8/9). Os apelantes convencionaram o regime da
separação total e pretendem alterá-lo para o da comunhão parcial de bens, sob o
argumento de terem constituído, em comunidade de esforços, uma empresa,
tendo que se adaptar à nova legislação (artigos 977 e 2.031 do Código Civil).
Merece acolhida a irresignação.
Dispõem os artigos 2.039 e 1.639, §2º, do Código Civil,
respectivamente:
O regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei 3.071, de 1º de janeiro de 1916, é o por ele estabelecido. É admissível a alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.
Ainda que uma leitura conjunta e açodada dos dispositivos supra -
referidos possa aparentar a existência de conflito entre ambos, tal conclusão não
deve prevalecer.
O preceito do primeiro artigo acima transcrito tem por objetivo
resguardar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito, logo, a segurança das
relações jurídicas, em face das alterações promovidas pelo Código Civil
relativamente ao regramento específico de cada regime de bens. Logo, o que se
pretende assegurar aos consortes é a aplicação da legislação por eles escolhida
por ocasião da celebração do matrimônio, nos exatos termos da lei então em
vigor.
Por outro lado, a redação do art. 1.639, §2º, do diploma civil institui
novidade no ordenamento jurídico, porquanto, diversamente da imutabilidade do
regime de bens prevista no antigo Código Civil, possibilita aos cônjuges a
alteração desse pacto, mediante autorização judicial e pedido motivado de ambos
os consortes, com o resguardo de eventuais direitos de terceiros.
Portanto, essa faculdade conferida aos cônjuges em nada afronta os
direitos que se pretende assegurar pelo art. 2.039 da Lei 10.406/2002, mormente
se considerada a consensualidade do pedido e o amparo a direitos de terceiros.
Muito pelo contrário: em verdade, houve uma otimização do princípio da
105
autonomia da vontade do casal, consagrado no princípio da livre estipulação do
pacto (art. 1.639 do Código Civil), de forma que se revela descabido afastar tal
ampliação de direitos dos casamentos celebrados sob a égide do antigo estatuto
civil.
Outrossim, cumpre observar a dinâmica da vida moderna que,
muitas vezes, vem a interferir nas relações patrimoniais dos consortes, fazendo
com que o regramento escolhido não mais atenda aos anseios do par.
In casu, o regime estabelecido foi o da separação total de bens. No
entanto, na constância do matrimônio, o casal constituiu uma empresa em
conjunto, referindo a comunhão de esforços na concretização desse objetivo.
Assim, ainda que não se aplique ao caso em tela o art. 977 do
diploma civil, diversamente do referido pelos recorrentes, pois não se trata de
separação obrigatória de bens, tem-se que a justificativa apresentada relativa à
criação em conjunto da sociedade comercial apresenta-se suficiente para o
deferimento do pedido.
Outrossim, o entendimento desta Câmara já está pacificado no
sentido da possibilidade de aplicação do artigo 1.639, §2º, do Código Civil aos
casamentos celebrados antes da vigência desse estatuto legal.
Nesse sentido, colacionam-se os seguintes precedentes desta
Corte:
REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. REQUISISTOS. CASAMENTO CELEBRADO SOB A ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. POSSIBILIDADE. A regra do art. 2039 do CC/02 não fere o ato jurídico perfeito. Assim, mesmo diante do novo regramento trazido pelo atual código civil que modificou as regras dos regimes de bens, existe a possibilidade jurídica de alterar o regime de bens para matrimônios realizados sob a égide do CC/16. APELO PROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70010447043, SÉTIMA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS, JULGADO EM 30/03/2005) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS ENTRE OS CÔNJUGES. Casamento celebrado sob a égide do antigo Código Civil. Alteração. Possibilidade. Sociedade comercial entre cônjuges. Art. 1.639, § 2º. O art. 2.039, constante das disposições finais e transitórias do Código Civil em vigor não impede a mudança do regime de bens para casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916. RECURSO PROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70009777947, OITAVA
106
CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: ALFREDO GUILHERME ENGLERT, JULGADO EM 10/03/2005)
Por tais fundamentos, provê-se ao apelo, conferindo ao presente
pedido efeitos ex tunc, ressalvados direitos de terceiros, e observando-se, após o
trânsito em julgado, as determinações do Provimento da Corregedoria Geral de
Justiça nº 024/03, com as alterações realizadas pelo Provimento de nº 024/04. As
custas deverão ser rateadas entre os interessados.
DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS (REVISOR) - De acordo.
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES - De acordo.
DESA. MARIA BERENICE DIAS - Presidente - Apelação Cível nº 70011082997,
Comarca de Vacaria: "PROVERAM O APELO. UNÂNIME."
Julgador(a) de 1º Grau: SILVIO TADEU DE AVILA