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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS NO CASAMENTO BRASILEIRO SIMONE AMORIM Itajaí (SC), outubro de 2006

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A POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS NO CASAMENTO BRASILEIRO

SIMONE AMORIM

Itajaí (SC), outubro de 2006

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

A POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS NO CASAMENTO BRASILEIRO

SIMONE AMORIM

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientadora: Professora MSc. Ana Lúcia Pedroni

Itajaí, (SC) outubro de 2006

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente à Deus, minha fortaleza, meu guia e meu conforto nas horas difíceis.

A minha família, por todo amor, carinho e respeito, que sempre me deram, por toda

confiança que sempre me depositaram.

A minha orientadora, Ana Lúcia Pedroni, que prontamente aceitou a tarefa de me auxiliar na

realização desta monografia, me acolhendo com dedicação e paciência, agradeço todo apoio e

disponibilidade despendida, que com sabedoria conduziu o rumo deste trabalho.

A Valdir Blasios Júnior, que me acompanhou desde o início do curso, incentivando o meu

crescimento intelectual, auxiliando-me a superar os obstáculos, sempre torcendo e acreditando no

meu sucesso profissional, agradeço por me ajudar a concretizar meus planos.

Aos amigos que conquistei nestes cinco anos de graduação, que sempre estiveram ao meu lado

nos momentos alegres, bem como nos momentos difíceis em que eu mais precisei deles, agradeço

a alegria, solidariedade, incentivo, carinho e compreensão que me proporcionaram.

E, finalmente a todos aqueles, que de alguma forma, foram especiais para mim, que até mesmo à distância, não mediram esforços para me ajudar

em todos os momentos, dando forças para enfrentar os desafios, acreditando no meu

potencial e me apoiando sempre, mostrando que com dedicação e confiança, tudo se torna

possível de realizar. A vocês minha eterna gratidão.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho monográfico aos meus pais, Clausio Amorim e Sueli Neide Amorim, que com muito sacrifício, luta, dedicação e principalmente

amor, abdicaram de seus sonhos para que eu pudesse realizar os meus; que mesmo perante as

dificuldades foram perseverantes para me proporcionar o estudo, incentivando e apostando

na minha carreira. Agradeço aos meus amados pais por sempre acreditarem em mim.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, 08 de novembro de 2006

Simone Amorim Graduanda

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Simone Amorim, sob o título A

POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS NO CASAMENTO

BRASILEIRO, foi submetida em oito de novembro de 2006 à banca examinadora

composta pelos seguintes professores: Msc. Ana Lúcia Pedroni (Orientadora e

Presidente da Banca), Msc. Andrietta Kretz (membro examinador), Msc. Marta

Elisaberh Deligdisch (membro examinador), e aprovada com a nota 10 (dez).

Itajaí, 08 de novembro de 2006

Msc. Ana Lúcia Pedroni Orientadora e Presidente da Banca

Msc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias1 que a Autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais2.

Casamento

“Casamento é o contrato de direito de família que tem por fim promover a união

do homem e da mulher, de conformidade com a lei, a fim de regularem suas

relações sexuais, cuidarem da prole comum e se prestarem mútua assistência”.3

Família

“(...) é a base da sociedade, tem especial proteção do Estado. Família é tanto a

que se origina pelo Casamento, como aquela que nasce da União Estável entre

um homem e uma mulher, que passa a ser protegida, como a formada por

quaisquer dos pais e sés descendentes, nos termos do artigo 226, da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988”.4

Mutabilidade do Regime de Bens

“(...) alteração do regime de bens, mediante autorização judicial requerida por

ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvado o

direito de terceiros”.5

1 “Categoria é a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia”.

PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 8 ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2003. p. 40.

2 “Conceito operacional [=cop] é uma definição para uma palavra e/ou expressão, com desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. P. 56.

3 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. v. 6. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 19.

4 LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil: direito de família e das sucessões. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 46.

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Pacto Antenupcial

“O pacto antenupcial é um contrato solene firmado entre os nubentes, com o

objetivo de escolher o regime de bens que vigorará durante o casamento”.6

Princípios

“A palavra princípio designa a estruturação de um sistema de idéias,

pensamentos ou normas por conceito mestre, de onde todos os demais

pensamentos derivam e se subordinam”. 7

Regimes Matrimoniais de Bens

“É o conjunto de normas aplicáveis às relações e interesses econômicos

resultantes do casamento. É o constituído, portanto, por normas que regem as

relações patrimoniais entre o marido e a mulher, durante o matrimônio”.8

Regime da Comunhão Universal de Bens

“É aquele em que se tornam comuns tanto os bens que os cônjuges já possuíam

antes do casamento, como aqueles que foram posteriormente adquiridos”. 9

Regime da Comunhão Parcial de Bens

“Regime da comunhão parcial é aquele em que, basicamente, se excluem da

comunhão os bens que os cônjuges possuem ao casar ou que venham a adquirir

por causa anterior e alheia ao casamento, como as doações e sucessões; e em

que entram na comunhão os bens adquiridos posteriormente. Trata-se de um

regime de separação quanto ao passado e de comunhão quanto ao futuro” .10

5 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. v. 6. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p.

42. 6 FIUZA, Ricardo. Novo Código Civil Comentado. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p.1512. 7 ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1998. p.47-48. 8 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. v. 5. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p.

145. 9 WALD, Arnold. O novo direito de família: curso de direito civil brasileiro. 14. ed. São Paulo:

Saraiva, 2002 . p.115. 10 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. p.206.

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Regime da Separação de Bens

“Regime da separação é aquele em que os cônjuges conservam não apenas o

domínio e a administração de seus bens presentes e futuros, como também a

responsabilidade pelas dívidas anteriores e posteriores ao casamento”. 11

Regime de Bens Legal Cogente ou Obrigatório

“Apesar de haver liberdade dos nubentes na escolha do regime de bens que lhes

aprouver, a lei, por precaução ou para puni-los, impõe, em certos casos, um

regime obrigatório. Entre nós, o regime obrigatório é o da separação de bens sem

a comunhão dos aqüestos, necessário em hipóteses excepcionais”.12

Regimes de Bens Convencional

“O regime de bens convencional é aquele que é estipulado pela vontade das

partes, por meio de pacto antenupcial”. 13

Regime da Participação Final nos Aqüestos

“Participação final nos aqüestos é o regime em que cada cônjuge possui o seu

patrimônio próprio, submetendo-se os bens adquiridos posteriormente à data do

matrimônio à partilha no caso de dissolução da sociedade conjugal”.14

11 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. p.215. 12 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. p.149. 13 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense,

2004. p.188. 14 LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil: direito de família e das sucessões. p.163.

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SUMÁRIO

RESUMO ............................................................................................ XI

INTRODUÇÃO..................................................................................... 1

CAPÍTULO 1........................................................................................ 4

DO CASAMENTO................................................................................ 4 1.1 BREVE RELATO HISTÓRICO DO CASAMENTO NO BRASIL ......................4 1.2 CONCEITO DE CASAMENTO .........................................................................9 1.2.1 CARACTERES DO CASAMENTO ..............................................................12 1.2.2 FINALIDADES DO CASAMENTO ...............................................................15 1.3 NATUREZA JURÍDICA...................................................................................17 1.4 EFEITOS.........................................................................................................22 1.4.1 PESSOAIS ......................................................................................................23 1.4.2 SOCIAIS .........................................................................................................23 1.4.3 PATRIMONIAIS ................................................................................................24

CAPÍTULO 2...................................................................................... 25 2.1 PRINCÍPIOS GERAIS DOS REGIMES DE BENS..........................................25 2.1.1 PRINCÍPIO DA VARIEDADE DOS REGIMES DE BENS.............................................26 2.1.2 PRINCÍPIO DA LIBERDADE DOS PACTOS ANTENUPCIAIS......................................27 2.1.3 PRINCÍPIO DA MUTABILIDADE JUSTIFICADA DO REGIME DE BENS........................29 2.2 PACTO ANTENUPCIAL E SEUS REQUISITOS............................................30 2.3 REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS.......................................32 2.4 REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS............................................34 2.5 SEPARAÇÃO DE BENS ................................................................................38 2.5.1 SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA ....................................................................42 2.5.2 SEPARAÇÃO NÃO OBRIGATÓRIA............................................................43 2.6 REGIME DE PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQÜESTOS...............................44

CAPÍTULO 3...................................................................................... 49 3.1 ASPECTOS GERAIS......................................................................................49 3.2 A EVOLUÇÃO DA MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS........................50 3.3 REQUISITOS PARA A MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS.................53 3.3.1 AUTORIZAÇÃO JUDICIAL ..................................................................................53 3.3.2 PEDIDO CONJUNTO DOS CÔNJUGES..................................................................54 3.3.3 MOTIVAÇÃO RELEVANTE DO PEDIDO – INTERESSE PROCESSUAL.........................55 3.3.4 COMPROVAÇÃO, PERANTE O JUIZ, DA VERACIDADE DAS RAZÕES ........................58 3.3.5 DIREITOS DE TERCEIROS.................................................................................59 3.4 EFEITOS DA ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS.....................................60 3.5 ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS PARA CASAMENTOS CONTRAÍDOS NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916........................................................61

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x

3.6 A MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS E A JURISPRUDÊNCIA ...........67

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................... 70

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS........................................... 74

ANEXOS............................................................................................ 82

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RESUMO

O presente trabalho monográfico versa sobre a mutabilidade

do regime de bens no Casamento frente ao atual Código Civil Brasileiro. Entende-

se por mutabilidade do regime de bens a faculdade que os cônjuges possuem,

mediante pedido conjunto com as devidas motivações e ressalvados os direitos

de terceiros de requer ao juiz a modificação do regime de bens adotado quando

da celebração do matrimônio, durante a constância do casamento. Seu objetivo

geral é verificar, com base principalmente, na doutrina e legislação brasileira,

quais são os requisitos necessários e o procedimento a ser adotado para a efetiva

alteração do regime de bens, bem como seus efeitos. Para identificação dos

objetivos específicos, a pesquisa realizou-se a partir da doutrina, legislação e

jurisprudência brasileira, na busca de dados atuais a respeito da real possibilidade

de alteração do regime de bens para os casamentos contraídos antes de 11 de

janeiro de 2003, data esta em que passou a vigorar o atual Código Civil. Quanto

à metodologia empregada, registra-se que nas Fases de Investigação e do

Relatório dos Resultados foi utilizado o Método Indutivo e acionadas as Técnicas

do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica.

Observou-se que, a possibilidade de alteração do regime de bens, durante a

constância do casamento, surgida com advento do Código Civil de 2002,

oportunizou aos cônjuges modificar o regime de bens adotado quando realizado o

casamento, para o que melhor atender aos seus interesses.

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1

INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto A Possibilidade de

Alteração do Regime de Bens no Casamento Brasileiro e como objetivo

institucional a elaboração do presente trabalho científico para obtenção do Título

de Bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

O objetivo geral do trabalho é pesquisar sobre a

possibilidade de alteração do regime matrimonial na constância do casamento.

Os objetivos específicos foram : destacar os aspectos legais,

bem como a interpretação jurisprudencial sobre a possibilidade de alteração do

regime matrimonial; identificar quais são os requisitos necessários e os

procedimentos a serem adotados para a efetiva alteração do regime de bens;

verificar a possibilidade de alteração do regime de bens aos casamentos

contraídos antes de 11 de janeiro de 2003, data esta em que passou a vigorar o

atual Código Civil.

A escolha do tema deu-se em decorrência do interesse da

acadêmica pelo Direito de Família Brasileiro, levando-a a aprofundar seu

conhecimento acerca da mutabilidade do regime de bens, em razão de ser uma

inovação surgida com o advento do atual Código Civil, suas polêmicas e

principalmente a grande importância que tem perante as sociedades conjugais, e

discussões surgidas a respeito da aplicabilidade aos casamentos contraídos sob

a vigência do Código Civil de 1916.

A monografia, ora apresentada, encontra-se dividida em três

capítulos. No Capítulo 1, abordar-se-á o instituto do casamento no Brasil,

delineando um panorama histórico desde a Colonização, Império e Período

Republicano até os dias atuais. Também neste capítulo será efetuada uma

abordagem a respeito das características, natureza jurídica, conceitos, fins e

efeitos do Casamento, no Direito Brasileiro.

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No Capítulo 2, realizar-se-á um estudo sobre os regimes

matrimoniais de bens no Direito Brasileiro, desde os princípios norteadores até o

pacto antenupcial e seus requisitos. Demonstrar-se-ão, também os conceitos e as

principais características de todos os regimes de bens existentes na atual

legislação brasileira e em tópicos separados, o regime da comunhão universal de

bens, o regime da comunhão parcial de bens, o regime da separação de bens, o

regime de participação final nos aqüestos.

No Capítulo 3, tratar-se-á de ressaltar especificamente o

tema central do presente trabalho, informando acerca da real possibilidade de

alteração do regime de bens no direito brasileiro, destacar-se-ão os aspectos

gerais e a evolução no ordenamento jurídico brasileiro sobre a mutabilidade do

regime de bens. Estudar-se-ão ainda, os requisitos necessários para o pedido de

alteração do regime de bens e os efeitos produzidos pela sentença procedente.

Para finalizar o capítulo, será feito um breve destaque da possibilidade de

alteração do regime de bens para casamentos contraídos na vigência do Código

Civil de 1916, através da doutrina, legislação e a título ilustrativo através dos

entendimentos dos Tribunais, destacando entre eles o Superior Tribunal de

Justiça, os Tribunais de Justiça dos Estados do Rio Grande do Sul e Santa

Catarina.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais serão apresentados os pontos conclusivos da

pesquisa, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões

sobre A Possibilidade de Alteração do Regime de Bens no Direito Brasileiro.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

O Código Civil de 2002 modificou as disposições relativas à imutabilidade dos regimes de bens, possibilitando sua alteração mesmo que o casamento tenha se realizado sob a égide do Código Civil de 1916.

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3

Os efeitos da sentença que altera do regime de bens podem ser ex tunc ou ex nunc, contudo deverá constar expressamente do pedido.

O pedido de alteração do regime de bens adotado deve, sem exceções, ser formulado por ambos os cônjuges e é possível em qualquer tipo de regime.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase

de Investigação foi utilizado o Método Indutivo15.

Em virtude da existência de elevado número de categorias e

conceitos operacionais, importantes para a melhor compreensão deste trabalho,

optou-se pela elaboração de um rol específico.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as

Técnicas, do Referente16, da Categoria17, do Conceito Operacional18 e da

Pesquisa Bibliográfica.

15 “pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção

ou conclusão geral”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. p. 85.

16 “É a explicação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. p. 63.

17 “É a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. p. 37.

18 “É uma definição para uma palavra e expressão, com o desejo de qu tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. p. 51.

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CAPÍTULO 1

DO CASAMENTO

1.1 BREVE RELATO HISTÓRICO DO CASAMENTO NO BRASIL

Para adentra-se no estudo sobre o instituto do Casamento,

faz-se necessário tecer um breve relato acerca de sua origem no ordenamento

jurídico brasileiro.

As normas, no Brasil, em geral, desde seu descobrimento,

não surgiram dos costumes locais, porém, de um ordenamento imposto pelo

colonizador, pois segundo Demo19: “(...) foi a legislação portuguesa que governou

o Brasil até a instalação do império pátrio, em 1822, e continuou produzindo

efeitos até sua total revogação (...).”

Trazendo-se, então, a influência da legislação de Portugal

para o âmbito do Casamento, Pedroni20 explica que:

Portugal adotava as formalidades do Casamento romano cristão e introduziu, nos costumes brasileiros, as mesmas solenidades. Nesse sentido, durante séculos a Igreja dominou os direitos sobre a instituição do Casamento.

19 DEMO, Wilson. Manual de história do direito. 2 ed. Florianópolis: OAB/SC, 2000. p. 127. 20 PEDRONI, Ana Lúcia. Dissolução do vínculo matrimonial: (Des) necessidade da separação

judicial ou de fato como requisito prévio para obtenção do divórcio no direito brasileiro. Florianópolis: OAB/SC, 2005. p.30.

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Ainda nesse sentido, Cahali21 destaca que somente o

casamento religioso era reconhecido e celebrado de acordo com o Código

Canônico, obedecia às disposições do Concílio de Trento e também da

Constituição do Arcebispado da Bahia, e seus efeitos continuaram a ser

produzidos até mesmo com a proclamação da independência do Brasil.

Lima23 leciona que: “a evolução histórica da legislação

matrimonial brasileira passou por dois estágios: o período colonial e o período

republicano”.

Assevera o referido autor, que no Brasil-Império, em

princípio, se conheceu apenas o Casamento católico, que era considerado pela

Igreja como sacramento instituído por Jesus Cristo. Com o passar do tempo,

devido ao crescimento populacional, o número de acatólicos aumentou, gerando

assim um drama de consciência: absterem-se do Casamento ou realizar

contradições com suas convicções espirituais.

Instituiu-se, a partir daí, pela Lei de 11 de Setembro de

1861, regulamentada pelo decreto de 17 de Abril de 1863, contiguamente com o

Casamento eclesiástico, considerado como o único regulado pela lei, o

Matrimônio acatólico, pelo qual poderiam se unir às pessoas pertencentes a

seitas dissidentes24.

Assim, três modalidades de Casamento passaram a ser

praticadas, destacadas por Pereira25

21 CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. 9 ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2000. p.

40. 5 LIMA, Domingos Sávio Brandão. A nova lei do divórcio comentada. São Paulo: O, Dip.

Editores Ltda, 1978. p. 42-44. 24 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. v. 5. 11 ed. Rio de Janeiro:

Forense, 1999. p. 40. 25 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 41.

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1° casamento católico, celebrado segundo as normas do Concílio de Trento, de 1563, e das Constituições do Arcebispado da Bahia;

2° casamento misto, entre católico e acatólico, realizado sob a disciplina do Direito Canônico;

3° casamento que unia membros de seitas dissidentes, em obediência às prescrições religiosas respectivas.

Denota-se que várias foram as tentativas de retirar o

Casamento da seara da Igreja e levá-lo ao âmbito civil. Um dos projetos que

surgiram foi do Visconde de Ouro Preto, ocorrendo em 7 de Junho de 1.889 uma

breve apresentação sobre o Casamento Civil, contudo, somente com a

Proclamação da República veio a ser realizado.26

No tocante, acrescenta Cahali27:

Várias tentativas visaram a secularização do Casamento, mas somente com a República, mercê da laicização do Estado, veio o instituto a perder o caráter confessional, através do Decreto 119 – A, de 07.01.1980.

E por esta razão, o Casamento durante todo o período

Imperial, foi regido pelas normas do Direito Canônico, sob o total domínio da

Igreja Católica, sendo o Casamento religioso a única forma legítima de união,

ressaltando a Constituição Imperial de 1824 previa a Religião Católica como

oficial, não sendo um Estado laico.

No período republicano, o Casamento civil foi instituído no

Brasil pelo Decreto n. 181, de 24 de janeiro de 1890, o qual introduziu no

Ordenamento Jurídico Brasileiro o Casamento Civil. A partir dessa data, o Estado

não mais atribuía valor jurídico ao Casamento religioso, passando a ser um ato de

interesse da consciência individual adstrito à religião.

26 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 41. 27 CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. p. 41.

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A Constituição da República dos Estados Unidos do Brazil28,

de 24 de Fevereiro de 1891, estabeleceu a obrigatoriedade do casamento civil,

onde somente o casamento civil seria reconhecido pela República, através do art.

72, § 4°, que prescrevia:

Art. 72. A Constituição assegurava a brazileiros, e estrangeiros residentes no Paíz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade nos termos seguintes:

(...)

§ 4° A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita.

Oportuna é a colocação de Pedroni29:

A partir dessa época, o Casamento Civil foi generalizado no Brasil, passando o Casamento Religioso a ser um interesse da consciência individual, consolidando-se o hábito de celebrar o Casamento Civil paralelamente ao religioso, duplicidade ainda cultivada pelos hábitos atuais.

O Código Civil de 191630 consolidou e regulamentou o

casamento exclusivamente civil, não fazendo nenhuma menção ao Casamento

Religioso, isto porque o a partir de 1891 o Brasil tornou-se um Estado laico, pois

não mais estabelecia nenhuma religião como oficial.

Contudo, ressalta Pereira31, “sob o fundamento de serem

desaconselháveis as duplas núpcias, medrou a idéia de se atribuírem efeitos civis

28 BRASIL, Constituições do Brasil: 1824, 1891, 1934, 1937, 1946 e 1967 e suas alterações. p.

768. 29 PEDRONI, Ana Lúcia. Dissolução do vínculo matrimonial: (Des) necessidade da separação

judicial ou de fato como requisito prévio para obtenção do divórcio no direito brasileiro. p.35. 30 BRASIL, Código Civil. Lei n° 3.071, de 01 de Janeiro de 1916. 31 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil. p. 41.

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ao casamento religioso (Constituição de 1.934, art. 146)”. Considerando essa

idéia, a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil32 promulgada a

16 de Julho de 1934, reconheceu esses efeitos em seu art. 146, que assim

preceituava:

Art. 146 O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casamento perante ministro de qualquer confissão religiosa, cujo rito não contrarie a ordem pública ou dos bons costumes, produzirá, todavia, os mesmos effeitos que o casamento civil desde que, perante a autoridade civil, na habilitação dos nubentes, na verificação dos impedimentos e no processo da opposição, sejam observados as disposições da lei civil e seja elle inscripto no Registro Civil. O registro civil será gratuito e obrigatório. (...).

A lei n. 1.110, de 23 de Maio de 195033, regulamentou o

reconhecimento dos efeitos civis ao Casamento religioso, desde que os nubentes

requeressem sua inscrição perante o Oficial de registro civil após sua realização.

Atualmente o Casamento religioso está previsto no art. 226,

§ 2° da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que assim dispõe:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

(...)

§ 2° O casamento religioso tem efeitos civis nos termos da lei.

E, no código Civil34 atual, disciplina a matéria em seu artigo

1. 515, o qual prevê:

32 BRASIL, Constituições do Brasil: 1824, 1891, 1934, 1937, 1946 e 1967 e suas alterações. p.

175. 33 BRASIL, Lei 1.110, de 23 de Maio de 1950. Regula o reconhecimento dos efeitos civis do

casamento religioso.

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Art. 1.515. O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração.

E mesmo com as grandes transformações em relação ao

Casamento, a sociedade continua por manter o Casamento civil e o religioso,

assim ressalta Pereira35: “a população brasileira continua com os dois

casamentos – civil e religioso – sendo crescente, em números relativos, a parcela

dos que se utilizam apenas do religioso nos dois efeitos, eclesiástico e civil”.

Após este breve histórico sobre casamento no Brasil, faz-se

necessário o estudo mais aprofundado do instituto do Casamento.

1.2 CONCEITO DE CASAMENTO

O casamento, como todas as instituições sociais, varia com

o tempo e com os povos. Provavelmente, não existe, em todo o direito privado

instituto mais discutido.

Pedroni36 entende que, “por tratar-se de um dos mais

antigos e consagrados institutos da sociedade, o Casamento sempre esteve

envolto a polêmicas relativas a sua natureza jurídica, conceitos, características e

finalidades”.

Em decorrência disto, é improvável encontrar um conceito

universal para a palavra Casamento. Diante dessa dificuldade, Gomes37 destaca

que: “o conceito de casamento é geralmente dado com referência a elementos

espirituais ou morais que uma noção jurídica verdadeiramente não comporta”.

34 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Novo código civil e legislação correlatada da família. Porto

Alegre: Síntese, 2003. p. 21. 35 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 42. 36 PEDRONI, Ana Lúcia. Dissolução do vínculo matrimonial: (Des) necessidade da separação

judicial ou de fato como requisito prévio para obtenção do divórcio no direito brasileiro. p. 43. 37 GOMES, Orlando. Direito de família. 14 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 55.

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Os conceitos mais remotos de casamento podem ser

localizados nas fontes romanas, suas bases se fundaram no affectio maritalis,

apresentando duas definições, as quais Lima38 cita:

A primeira é a de Modestino (Dig. 23, 2, 1), segundo o qual nuptiae sunt, conjuctio maris et feminae et consortium omnis vitae, divini et humani júris communicatio – a união do homem e da mulher, o consórcio para toda a vida, a comunhão de direito divino e humano. Guarda relação com ela a que se encontra nos institutos de Justiano (Ins. 1, 9, pr.), atribuía a Ulpiano, caracterizando-o como a união do homem e da mulher que implica identidade de condição na vida – vivi et mulieris conjunctive, individuam consuetudinem vitae continens.

Do dispositivo inaugural do Livro Especial destinado ao

Direito da Família, artigo 1.511 do atual Código Civil39, extrai-se que casamento

tem o fim: “de estabelecer comunhão plena de vida, com base na igualdade de

direitos e deveres dos cônjuges”, pois o legislador expressamente define o que

seja casamento e quais são os seus pressupostos de existência e de validade,

intrinsecamente.

Ainda sobre conceituação jurídica do casamento, dispõe o

atual Código Civil40, em seu artigo 1.565 “ homem e mulher assumem

mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos

encargos da família.”

Diversos são os conceitos dados pelos doutrinadores a

instituição Casamento. Para Rizzardo41:

O casamento vem a ser um contrato solene pelo qual duas pessoas de sexo diferente se unem para constituir uma família e viver em plena comunhão de vida. Na celebração do ato,

38 LIMA, Domingos Sávio Brandão. A nova lei do divórcio comentada. p. 20. 39 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Novo código civil e legislação correlata da família. p. 19. 40 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Novo código civil e legislação correlata da família. p. 53. 41 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. 3 ed. Rio de Janeiro. Forense, 2005. p. 17.

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prometem elas mútua felicidade, assistência recíproca, e a criação e educação dos filhos.

Cahali42 define que é:

Através do matrimônio que duas pessoas de sexo diferente adquirem o estado familiar de cônjuges, que por sua vez é fonte de direitos e obrigações recíprocas, representados principalmente pela comunhão moral, espiritual, objetiva e material, o que não coincide necessariamente com os efeitos que resultam das relações pessoais entre companheiros.

No direito brasileiro, duas definições são consideradas

clássicas. A primeira é a de Pereira43: “(...) o casamento é o ato solene pelo qual

duas pessoas de sexo diferente se unem para sempre, sob a promessa recíproca

de fidelidade no amor e da mais estreita comunhão da vida”.

A segunda definição referida é a de Beviláqua44, que

apresenta um conceito clássico, contratualista:

O casamento é um contrato bilateral e solene, pelo qual um homem e uma mulher, se unem indissoluvelmente, legalizando por ele suas relações sexuais, estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de interesses, e comprometendo-se a criar e educar a prole, que de ambos nascer.

Todavia outros doutrinadores conceituam o casamento,

sendo que para Diniz45, “o casamento é o vínculo jurídico entre o homem e a

mulher que visa auxílio mútuo material e espiritual, de modo que haja uma

integração fisiopsíquica e a constituição de uma família legítima”.

42 CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. p. 23. 43 PEREIRA, Lafayette Rodrigues. Direitos e família. Campinas: Russell editores, 2003. p. 47. 44 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito de família. São Paulo: Red Livros, 2001. p. 46. 45 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, v. 5. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p.

29.

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Já para Pereira46, mesmo entendendo que não existe

uniformidade na caracterização do casamento, define-o como sendo “a união de

duas pessoas de sexo diferente, realizando uma integração fisiopsíquica

permanente”.

E nessa temática, Rodrigues47 define:

Casamento é o contrato de direito de família que tem por fim promover a união do homem e da mulher, de conformidade com a lei, a fim de regularem suas relações sexuais, cuidarem da prole comum e se prestarem mútua assistência.

Conforme constatou-se, cada doutrinador apresenta sua

definição própria de Casamento, inexistindo a mais ou menos exata. Porém, a

doutrina assinala alguns pontos em comum entre elas, constituindo, assim,

verdadeiros pressupostos da existência jurídica do casamento, que são: a

diversidade de sexo, a celebração do Casamento em conformidade com a lei e o

consentimento dos nubentes.

Oliveira48 considera casamento:

O negócio jurídico de Direito de família por meio do qual um homem e uma mulher se vinculam através de uma relação jurídica típica, que é a relação matrimonial. Esta é uma relação personalíssima e permanente, que traduz ampla e duradoura comunhão e vida.

Esclarece o doutrinador que o casamento é negócio jurídico

bilateral e que não utilizou a expressão “contrato” pela circunstância de que, no

Brasil, a palavra “contrato” tem, de regra, aplicação restrita aos negócios

patrimoniais e os negócios jurídicos bilaterais de direito das obrigações.

46 PEREIRA, Caio Márcio da Silva. Instituições de direito civil. p. 33. 47 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 19. 48 OLIVEIRA, José Leamartine Correa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de

família. 4 ed. Curitiba: Juru, 2002. p. 121.

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Ante os conceitos supra mencionados, verifica-se que o

Casamento pode ser conceituado como a união entre homem e mulher, em

conformidade com a lei, com o fim de regularem suas relações sexuais, ajudarem

mutuamente e de cuidarem dos seus filhos.

1.2.1 CARACTERES DO CASAMENTO

O casamento reveste-se de diversos caracteres. Os quais

são destacados por Rizzardo50

a) Trata-se de uma instituição de ordem pública, dada a legislação existente, à qual devem-se subordinar-se as convenções particulares.

b) Importa em uma união exclusiva, e isto principalmente em razão da natureza do próprio ser humano, que não comporta uma tolerância de compartilhamento nesta ordem.

c) Determina uma comunidade de vida para os cônjuges não somente nos interesses patrimoniais, mas em especial nos sentimentos, desejos e intenções.

d) Não admite termo ou condição para a contratação. Ninguém celebra um casamento condicional, possível.

e) Constitui um ato pessoal, da exclusiva decisão dos nubentes, indo já distantes os tempos quando os pais decidiam sobre o consorte do filho ou da filha.

f) Reveste-se o ato da solenidade, com a observância de uma série de requisitos e inscrição no registro civil.

50 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. p. 24.

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Quando se diz que o casamento é um ato solene, significa

que sua realização está sujeita a algumas normas fixadas por lei, cujo não

atendimento poderá ensejar a nulidade.

A lei o reveste de formalidades destinadas não só à sua

publicidade, mas também à garantia da manifestação do consentimento dos

nubentes. Destinando-se elas a dar maior segurança e enfatizando sua

seriedade. Sendo assim solenizando o matrimônio com a celebração, a lei civil irá

dispor as formalidades necessárias à sua validade.

Para Pereira51, as características do casamento se resumem

em três, sendo as seguintes: a) Solenidade, o Casamento é ato solene, cuja

formalidade o difere dos contratos em geral, não podendo abdicar dos requisitos

formais, para sua validade; b) diversidade de sexos. O Casamento tem em vista a

união de duas pessoas de sexo oposto, sendo este um elemento natural de

matrimônio, pois a ordem jurídica não admite o casamento entre pessoas do

mesmo sexo. C) Dissolubilidade. Destaca o autor que esta característica não tem

cunho universal, pois os sistemas jurídicos se dividem, contudo predominam os

que a consagram. Historicamente, todos os povos da antiguidade, que direta ou

indiretamente influíram em nosso Direito de Família, admitiram o divórcio, porém,

desde os primeiros tempos a Igreja o combateu.

Diniz52 enumera as características do casamento, na

seguinte ordem:

a) A liberdade na escolha do nubente, por ser matrimônio um ato pessoal. A liberdade de escolher pessoa de sexo oposto é elemento natural do leito nupcial, que requer diversidade de sexos. A interferência da família restringe-se tão-somente à orientação, mediante conselhos, salvo nos casos em que a legislação exige o consentimento dos pais.

51 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 37-39. 52 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 46.

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b) A solenidade do ato nupcial, uma vez que a norma jurídica reveste-o de formalidades que garantem a manifestação de consentimento dos nubentes, a sua publicidade e validade. Não basta a simples união do homem e da mulher, com a intenção de permanecer juntos e gerarem filhos; é imprescindível que o casamento tenha sido celebrado, conforme a lei que o ampara e rege.

c) O fato de ser a legislação matrimonial de ordem pública, por estar acima das convenções dos nubentes.

d) A união permanente; a qual transmite a idéia de plena comunidade de vida, indispensável para a realização dos valores básicos da Sociedade civilizada, e, mesmo que os cônjuges venham a separar-se e divorciar-se e tornem a se casar novamente existe sempre, em regra, um desejo íntimo de perpetuidade, ou seja, de permanência da ordem conjugal e familiar.

e) A união exclusiva, se fortalece como característica, pois a fidelidade conjugal é exigida por lei, por ser o mais importante dos deveres conjugais, e, neste sentido, proibida está qualquer relação sexual fora do casamento.

Sendo assim, observa-se que o casamento possui diversas

características, que deverão ser seguidas para a sua validade, destinando-se a

sua publicidade, a garantia na manifestação do consentimento dos nubentes,

segurança e seriedade.

1.2.2 FINALIDADES DO CASAMENTO

Antes de tratar da natureza jurídica e os efeitos jurídicos do

casamento, se faz necessário analisar as suas finalidades.

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Diversas são as finalidades do casamento, e como observa

Gonçalves53: “(...) variam conforme a visão filosófica, sociológica, jurídica ou

religiosa como são encaradas”.

Segundo a concepção canônica, Gonçalves54 os divide em

dois grupos:

Matrimonii finis primorius est procreatio atque educatio prolis; secundarius muttum adiutorium et remedium concupiscentiae, ou seja, o fim principal do matrimônio consiste na procriação e educação da proli, e o secundário, na mútua assistência e satisfação sexual.

No mesmo sentido, Venosa55 explica que as múltiplas

finalidades do casamento situam-se muito mais no plano sociológico do que no

jurídico, pois “conforme estabelecido tradicionalmente pelo Direito Canônico, o

casamento tem por finalidade a procriação e educação da prole, bem como mútua

assistência e satisfação sexual, tudo se resumindo na comunhão de vida e de

interesses”.

Essa visão histórica das finalidades do casamento,

estabelecidas pelo Direito Canônico, é severamente criticada por Lima56, que

assim registra:

Nunca partilhamos nem participamos da dicotomia canonista de que o casamento tem um fim primário, procriação e educação da prole, um fim secundário, a ajuda mútua e o remédio da concupiscência. Não devemos, por pieguismo religioso, afastar desta matéria o sadio e racional interesse pessoal dos cônjuges, taxando-o e individualismo, para imergirmos nos anseios do casal, sufocando-lhe a liberdade de agir, para transformá-los em verdadeiros autômatos controlados pelos interesses comunitários.

53 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. v. 6. São Paulo:

Saraiva, 2005. p. 29. 54 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p. 30. 55 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 42. 56 LIMA, Domingos Sávio Brandão. A nova lei do divórcio comentada. p. 32.

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Outrossim, dentre as finalidades do casamento, Diniz57

destaca os seguintes: a) A instituição da família matrimonial; b) A procriação dos

filhos, que é uma conseqüência lógico-natural e não essencial do matrimônio

(CF/88, art. 226, § 79, lei n. 9.263/96); c) A legalização das relações sexuais entre

os cônjuges; d) A prestação de auxílio mútuo, que é corolário do convívio entre os

cônjuges; e) O estabelecimento de deveres patrimoniais ou não entre os

cônjuges, como conseqüência necessária desse auxílio mútuo e recíproco; f) A

educação da prole, pois o matrimônio não exige apenas o dever de gerar os

filhos, mas também de criá-los e educá-los; g) A atribuição do nome ao cônjuge

(CG, art. 1.565, § 1) e aos filhos; a reparação de erros do passado recente ou

não; a regularização e relações econômicas; a legislação estados de fato.

Impulsionado pelo amor e afeição existente entre o casal e

com fulcro na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges e mútua assistência.

Gonçalves58 explica que: “ a principal finalidade do casamento é estabelecer uma

comunhão plena de vida, como prevê o art. 1.511 do Código Civil de 2002.

Expõe Filomusi - Gueffi59 sobre o assunto:

O matrimônio é a plena e íntima união do homem e da mulher (...). Logo, não é a procriação dos filhos a única finalidade do casamento, nem mesmo a purificação dos prazeres sexuais, mas a realização da união mais perfeita entre um homem e mulher em todas as várias esferas dentro das quais se cumpre o destino humano.

Em que pese as demais finalidades, embora importantes,

são secundárias, pois o que identifica a família é um afeto especial, constituindo-

se a diferença específica que define a identidade familiar.

Assim, será analisada a seguir acerca da natureza jurídica

do Casamento.

57 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 40-41. 58 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p. 30. 59 GUEFFI – FILOMUSI. Enciclopédia jurídica. 7 ed. 1971. Apud Calogero Gangi, Il matrimônio,

cit., p. 5, n. 4, nota 1.

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1.3 NATUREZA JURÍDICA

A natureza jurídica do casamento desdobra-se em três

correntes doutrinárias controvertem-se, uma é a doutrina contratualista, a outra é

a corrente institucionalista e a eclética ou mista.

A corrente doutrinária contratualista defende o casamento

como sendo um contrato, já a segunda o considera uma instituição e a terceira

corrente entende o casamento como um ato complexo, ao mesmo tempo contrato

e instituição.

Outro questionamento que surge, é a respeito da

qualificação do Casamento como sendo uma instituição de direito público ou

privado.

Gomes60 enumera duas razões principais, para qualificar o

casamento como sendo uma instituição de direito público:

A primeira, a de que o instituto esta dominado por interesses públicos, dado que a família se encontra sob a proteção do estado. A segunda, mais importante sobre o ponto de vista técnico, a de que o vínculo matrimonial se forma com o concurso da autoridade do estado.

No tocante, Pereira61 preleciona que alguns defendem a tese

de ser o casamento um instituto caracterizado por interesses públicos, tendo em

conta que a família se encontra sob a proteção do Estado e o vínculo matrimonial

se forma com a intervenção da autoridade estatal.

Por sua vez Gomes62 afirma que tais argumentos são

improcedentes, pois entende que, para formação do vínculo, faz-se necessário o

elemento essencial, que é o consentimento dos nubentes, ficando o

pronunciamento do juiz em segundo plano, tendo em vista que tem a função de

60 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 57. 61 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 35. 62 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 57.

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simplesmente completar o ato de vontade dos nubentes. E tal fato não retira a

natureza privada do ato, combatendo a idéia oposta, destacando que o fato de ser

presidido por interesses transcendentes da conveniência individual, determinantes

da imperatividade dos seus preceitos, não é o suficiente para situá-lo no campo

do direito público, nem aceitável a suposição de que esses interesses hajam

levado o Estado a regular o estado matrimonial em termos de assimilação de

suas obrigações aos deveres de direito público.

Com relação à polêmica sobre a natureza jurídica do

casamento ser um contrato ou instituição.

A concepção contratual do matrimônio provém do direito

canônico, que para Gomes63 “valoriza o consentimento dos nubentes relegando o

plano secundário, na formação do vínculo, a intervenção do sacerdote. Na sua

origem, como na sua existência, o casamento é, para a igreja, um contrato”.

Assim, leciona Diniz64 que a teoria contratualista:

(...) foi aceita pelo racionalismo jusnaturalista do século XVIII e penetrou, com o advento da Revolução Francesa, no código francês de 1804, influenciando a Escola Exegética do século XIX e sobrevivendo até nossos dias na doutrina civilista.

Manifesta Venosa65 que, no direito canônico, o casamento

apresenta-se como um contrato natural e um sacramento, decorrente da natureza

humana, em que os direitos e deveres decorrentes dele estão fixados na natureza

e não podem ser alterados nem pelas autoridades nem pelas partes, sendo

perpétuo e indissolúvel.

Registra Rodrigues66 que:

63 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 57. 64 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 42. 65 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 40. 66 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 19.

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O casamento é o contrato de direito de família que tem por fim promover a união do homem e da mulher, de conformidade com a lei, afim de regularem suas relações sexuais, cuidarem da prole em comum e se prestarem mútua assistência.

Observa, ainda, o autor, se o casamento representava mero

contrato, ele necessariamente poderia dissolver-se por um distrato. Assim, sua

dissolução ficaria na dependência do mútuo consentimento.

Adaptando a teoria contratual às peculiaridades do

casamento, Pereira67 entende:

(...) que se trata de um contrato especial dotado de conseqüências peculiares, mais profundas e extensas do que as convenções de efeitos puramente econômicos, ou contrato de direito de família, em razão das relações específicas por ele criadas.

Manifesta Silva69 que quase se poderia dizer que o

casamento é um contrato de adesão, pois efeitos e formas estão previamente

estabelecidos na lei, não havendo espaço para a vontade dos noivos, que se

limitam a dizer “sim” diante da autoridade civil, o que tem o alcance da

concordância com os deveres do casamento.

Seguindo também a teoria contratualista, afirma Gomes70: “o

casamento resulta do livre acordo de vontades dos que o contraem, assim como

se sucede com os negócios contratuais”. No entanto, o autor observa, ainda, a

natureza sui generis do contrato matrimonial em razão de sua feição especial,

diferindo-o das disposições legais dos negócios que envolvem direito

patrimoniais.

67 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 36. 69 SILVA, Paulo Leins. O casamento como contrato de adesão e o regime legal da separação

de bens. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (coord.). Anais do III Congresso Brasileiro de Direito de Família. Família e Cidadania. O novo CCB e a Vocatio Legis. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 44.

70 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 50.

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Nesse sentido Diniz71 leciona que:

Os pressupostos dos contratos de direito privado não são suficientes para explicar a sua natureza. O casamento é um negócio jurídico bilateral que não está afeito à teoria dos atos jurídicos. É regido pelo direito de família. assim, talvez, a idéia de negócio de direito de família seja a expressão que melhor sirva para diferenciar o casamento dos demais negócios de direito privado. Ainda que o casamento não faça seguir apenas direitos e obrigações de caráter patrimonial ou econômico, não se pode negar que decorre de um acordo de vontade.

Contrapondo a teoria contratualista, encontra-se a corrente

institucionalista que classifica o casamento como uma instituição, que destaca o

conjunto de normas imperativas a que aderem os nubentes.

A respeito, Diniz72, adepta à concepção institucionalista

afirma:

Com o casamento, os nubentes aderem a uma estrutura jurídica cogente. Em face do elevado número de regras e imposições que surgem a partir da celebração do matrimônio, por determinação legal e não por livre manifestação do par, o casamento é considerado por muitos uma instituição.

Nesse contexto, Rodrigues73 afirma que atribuir caráter de

instituição ao casamento seria afirmar que o instituto se constituiu de um conjunto

de regras impostas pelo Estado, sendo que os cônjuges têm apenas a faculdade

de aderir, “pois, uma vez dada referida adesão, a vontade dos cônjuges se torna

importante e os efeitos da instituição se produzem automaticamente”.

Monteiro74, também assim entende, ao afirmar que o

casamento constitui uma grande instituição social que, de fato, nasce da vontade

71 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 145. 72 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 145. 73 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 20. 74 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil direito de família. 34. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 13.

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dos contraentes, mas que, da imutável autoridade da lei, recebe sua forma, suas

normas e seus efeitos.

Observa, ainda, o referido autor, as críticas efetuadas pelos

partidários da corrente institucionalista em relação à corrente contratualista,

fundando-se em duas questões “a primeira refere-se à impossibilidade de regular

o casamento por modo diverso do estabelecido, ou seja, não há como consumar

o ato sem a intervenção estatal ou religiosa para sancionar e homologar a

manifestação de vontade dos contraentes”.

Nessa polêmica, surgiu uma terceira concepção, de

natureza eclética ou mista, que considera o casamento ato complexo, ao mesmo

tempo contrato e instituição. Trata-se de um contrato especial, um contrato de

direito de família.

A respeito Venosa77 leciona, que trata de negócio jurídico e

de instituição, ressaltando que a conceituação simples de contrato reduz por

demais sua compreensão e conclui por uma síntese das doutrinas que: “pode-se

afirmar que o casamento – ato é um negócio jurídico; o casamento – estado é

uma instituição”.

Observa-se que a Constituição da República Federativa do

Brasil não define a natureza jurídica do casamento.

Verifica-se, assim, na concepção contratualista: o

Casamento é um contrato, visto que é estabelecido através de acordo entre os

cônjuges, e por ser este o elemento essencial da sua existência.

Contudo, os institucionalistas consideram o casamento uma

instituição social, pois nasce da vontade dos contraentes, no entanto a sua forma,

normas e efeitos são recebidos da autoridade da lei.

77 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 40 – 41.

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Para os ecléticos o Casamento é um ato complexo, ou seja,

é a fusão dessas duas naturezas, ao mesmo tempo um contrato, quando da

formação, e instituição, no seu conteúdo.

1.4 EFEITOS

Destacam-se os principais efeitos jurídicos do Casamento

em três classes: de âmbito pessoal, social e econômico.

Diniz78 assim o conceitua:

São conseqüências que se projetam no ambiente social, nas relações pessoais e econômicas dos cônjuges, nas relações pessoais e patrimoniais entre pais e filhos, dando origem a direitos e deveres que são disciplinados por normas jurídicas.

Para complementar este estudo faz-se uma breve e sintética

abordagem a respeito de cada efeito citado.

1.4.1 Pessoais

Resulta do casamento, uma série de direitos e deveres

comuns e recíprocos entre os consortes e que a lei os concebe como condição de

sobrevivência da família conjugal.

O Código Civil79, no artigo 1566, enumera os principais

deveres:

Art. 1566. São deveres de ambos os cônjuges

I – fidelidade recíproca;

II – vida comum, no domicílio conjugal;

78 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 122. 79 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Novo código civil e legislação correlatada da família. p. 55.

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III – mútua assistência;

IV – sustento, guarda e educação dos filhos;

V – respeito e consideração mútuos.

Entre esses, há também a igualdade de direitos e

obrigações entre marido e mulher, estabelecida no artigo 226, § 5° da

Constituição da República Federativa do Brasil.

1.4.2 Sociais

O Casamento gera efeitos que atingem toda a sociedade.

Decorre do artigo 226, § § 1° e 2° da Constituição da República Federativa do

Brasil a constituição da família matrimonial. Considerado como principal efeito

social.

No entanto, o matrimônio produz, também, a emancipação

do cônjuge menor de idade, tornando-o plenamente capaz, conforme disposto no

artigo 5°, parágrafo único, inciso II do Código Civil.

E ainda, estabelece o artigo 1595, § § 1° e 2° do Código

Civil, o vínculo de afinidade entre cada consorte e os parentes do outro.

Além de o casamento gerar um fato de identificação aos

cônjuges na sociedade, que é o status, o estado de casados.

1.4.3 Patrimoniais

Verificou-se que, com o matrimônio, surgem direitos e

obrigações em relação à pessoa e aos bens patrimoniais dos cônjuges.

Nesse contexto, Diniz80 manifesta que “a essência das

relações econômicas entre os consortes reside, indubitavelmente, no regime

80 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 144.

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matrimonial de bens, que está submetido a normas especiais disciplinadoras de

seus efeitos”.

Assim sendo, o regime matrimonial de bens é o conjunto de

normas aplicáveis às relações e interesses econômicos resultantes do

matrimônio.

No ordenamento jurídico brasileiro existem quatro tipos de

regimes matrimoniais: o regime da comunhão universal de bens, o regime da

comunhão parcial de bens, o regime da separação de bens e o regime de

participação final nos aqüestos.

Após deflagrar consideração sobre o conceito, caracteres,

finalidade, natureza jurídica e os efeitos do Casamento, apresentar-se, no

próximo capítulo, os Regimes de Bens insertos no Direito Brasileiro.

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CAPÍTULO 2

DOS REGIMES DE BENS

2.1 PRINCÍPIOS GERAIS DOS REGIMES DE BENS

Além das relações pessoais, o Casamento regula a situação

jurídica dos bens dos cônjuges, tanto os que lhes pertençam à data do

matrimônio, quanto os adquiridos na constância deste.

Para definir a situação jurídica dos bens, os cônjuges

elegem o Regime de Bens, que irá reger o patrimônio do casal.

Gonçalves81 define que:

Regime matrimonial é o conjunto de regras aplicáveis a sociedade conjugal considerada sob aspecto dos seus interesses patrimoniais. Em síntese, o estatuto patrimonial dos cônjuges, quer entre si, quer no tocante a terceiros, durante o casamento. Regula especialmente o domínio e a administração de ambos ou de cada um sobre os bens anteriores e os adquiridos na constância da união conjugal.

No mesmo sentido, Rodrigues82 entende que: “regime de

bens é o estatuto que regula os interesses patrimoniais dos cônjuges durante o

matrimônio”.

Atualmente os regimes de bens obedecem, à três princípios

fundamentais que são: Princípio da Variedade dos Regimes de Bens; Princípio da

Liberdade dos Pactos Antenupcial e Princípio da Mutabilidade Justificada do

Regime de Bens.

81 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.382. 82 RODRIGUES, Silvio. Direito civil brasileiro. p. 382. 84 ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais. p.47-48.

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Salienta Espíndola84 que: “a palavra princípio designa a

estruturação de um sistema de idéias, pensamentos ou normas por conceito

mestre, de onde todos os demais pensamentos derivam e se subordinam”.

Analisar-se a seguir, os princípios fundamentais do Regime

de Bens.

2.1.1 Princípio da Variedade dos Regimes de Bens

Tem-se neste princípio, a possibilidade de os nubentes

optarem, por um dos quatro tipos de regimes existentes no Código Civil: o regime

da comunhão universal de bens, o regime da comunhão parcial de bens, o regime

da separação de bens e o regime de participação final nos aqüestos. Não estando

limitados a escolher apenas um determinado regime.

Gonçalves86 pondera que:

A lei coloca a disposição dos nubentes não apenas um modelo de regime de bens, mas quatro. Como o regime dotal previsto no diploma de 1916 não vingou, assumiu a sua vaga, no novo Código, o regime de participação final nos aquestos (...), sendo mantido os de comunhão parcial, comunhão universal e separação convencional ou legal.

No mesmo sentido Gomes87 aduz: “(...) significa que a lei

não impõe um regime matrimonial, mas, ao contrário, oferece a escolha dos

nubentes diversos, que define em linhas gerais”.

Trata-se este princípio, como sendo o de livre escolha entre

os nubentes, dispondo atualmente de quatro tipos, nos termos do Código Civil:

86 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p. 116. 87 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 173. 89 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 173.

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Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.

Art. 1.667. O regime de comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte.

Art. 1.672. No regime de participação final nos aqüestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio, consoante disposto no artigo seguinte, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento.

Tem-se então que a variedade dos regimes de bens,

constitui-se pelo fato de que a lei oferece a existência de mais de um regime

matrimonial de bens, possibilitando aos nubentes optar por um deles.

2.1.2 Princípio da Liberdade dos Pactos Antenupciais

O princípio da liberdade dos pactos antenupciais está

previsto no caput do artigo 1.639 do Código Civil Brasileiro, onde, segundo este,

podem os nubentes, antes da celebração do casamento, estipular sobre seus

bens, e o que acharem mais conveniente.

Ao abordar o assunto, explica Gomes89:

Os nubentes podem escolher, em princípio, o regime que lhes convenha, não estando adstritos, sequer, à adoção de um dos tipos, tal como se acham definidos em lei, eis que podem combiná-los, formando regime misto, uma vez respeitadas as disposições legais de ordem públicas. Necessário que estipulem, mediante pacto antenupcial, o regime que escolherem.

Neste princípio permita-se aos nubentes a liberalidade de

escolher um dos regimes definidos em lei, propiciando ainda a possibilidade de

combinar um regime com outro, formando um regime matrimonial de bens misto,

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porém, respeitando as disposições legais de ordem pública, com a finalidade

especificamente de suprir às expectativas de ordem econômica.

Nesse contexto, estabelece ainda o parágrafo único do

artigo 1.640 do Código Civil:

Art. 1640. Não havendo convenção, ou sendo nula ou ineficaz, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime da comunhão parcial.

Parágrafo único. Poderão os nubentes, no processo de habilitação, optar por qualquer dos regimes que este código regula. Quanto à forma, reduzir-se-á a termo a opção pela comunhão parcial, fazendo-se o pacto antenupcial por escritura pública, nas demais escolhas.

Em suma, conforme prescreve o artigo citado, a liberdade na

confecção do pacto antenupcial é livre, mas deverá se restringir apenas às

relações patrimoniais.

Lembra Fiúza90 que: “Prevalece à regra da liberdade das

convenções nos pactos antenupciais, relativamente às questões patrimoniais,

desde que não contrarie disposição absoluta de lei”.

Oliveira declara91 que:

Os nubentes podem, dentro dos limites da lei, regular o regime de bens do casamento, celebrando convenções ou pacto antenupcial. Eles não só podem escolher um dos regimes-modelo previstos na lei ou introduzir-lhe alterações, adaptando-os às suas necessidades, como eleger um novo regime.

Observa-se que esse princípio, proporciona aos nubentes a

liberdade na escolha do tipo de regime matrimonial de bens, de acordo com suas

90 FIUZA, Ricardo. Novo código civil comentado. p. 1512. 91 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 173.

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necessidades, no entanto, não é absoluto, pois há casos específicos, em que a

própria lei impõe, o tipo de regime de bens, que deverá viger entre os cônjuges.

2.1.3 Princípio da Mutabilidade Justificada do Regime de Bens

O princípio da mutabilidade justificada do regime de bens,

está previsto no artigo 1.639, parágrafo 2° do Código Civil, o qual prevê a

possibilidade de alteração do regime matrimonial de bens na constância do

casamento, mediante autorização judicial, é uma inovação trazida no atual

Código, o que antes era vedado pelo Código Civil de 1916.

No tocante, Venosa92 afirma que:

(...) A nova lei não estabelece um prazo mínimo para possibilitar esse requerimento. Verificamos, portanto, tendência geral de modificação do princípio que entre nós era mantido como dogmático desde antes da promulgação do Código Civil de 1916.

Ressalta-se que o regime de bens era inalterável, antes da

entrada em vigor do atual Código Civil, e com a nova legislação brasileira, poderá

ser modificado, mediante ordem judicial e a requerimento do casal.

Gomes93 entende que:

(...) a mudança somente deve ser autorizada se requerida por ambos os cônjuges, justificadamente. Seu acolhimento deverá depender de decisão judicial, verificando o juiz se o pedido foi manifestado livremente e se motivos plausíveis aconselham seu deferimento. Finalmente, só é de ser acolhido se não foi feito com o propósito de prejudicar terceiros, cujos interesses, em qualquer hipótese, se ressalvam da obrigação de transcrever a sentença no registro próprio.

O princípio da mutabilidade justificada do regime de bens,

veio substituindo o princípio da imutabilidade do regime de bens, o qual proibia

92 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 173. 93 GOMES, Orlando. Direito de família. p.174.

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qualquer tipo de alteração do regime matrimonial de bens no decorrer do

matrimônio.

Nesta senda, Diniz94 leciona que: “O regime de bens que era

inalterável, afora pequenas exceções introduzidas jurisprudencialmente, pode

hoje ser modificado mediante decisão judicial, a requerimento de ambos os

consortes”.

Destacam-se, os pressupostos básicos para a mutabilidade

do regime matrimonial de bens na constância do matrimônio, tendo como

requisitos a provocação judicial consensual, a apresentação dos motivos do

pedido de alteração do regime e a prova de que tal pretensão não acarretará

prejuízo de qualquer espécie a terceiros, o qual será tratado no terceiro capítulo

desta pesquisa.

2.2 PACTO ANTENUPCIAL E SEUS REQUISITOS

O pacto antenupcial, também denominado como pacto

anteunião, está regulamentado nos artigos 1653 ao 1657 do atual Código Civil

brasileiro.

Segundo o entendimento de Gomes95: “é a convenção

solene na qual (os nubentes) grifou-se – declaram adotar um dos regimes

definidos na lei ou estipulam regime misto”.

Oliveira96 conceitua pacto antenupcial como sendo “(...) o ato

pelo qual os nubentes organizam suas relações patrimoniais e suas relações com

terceiros (...)”.

Observa, ainda, Dias97: “Podem os nubentes, antes de

celebrado o casamento, estipular o regime que lhes aprouver, embora existam

casos em que a lei vigente (...) impõe o regime obrigatório da separação de bens”.

94 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 152. 95 GOMES, Orlando. Direito de família. p.177. 96 OLIVEIRA, José Leamartine Correa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de

família. p. 359.

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Nesse contexto, Fiúza98 descreve que:

O pacto antenupcial é um contrato solene firmado entre os nubentes, com o objetivo de escolher o regime de bens que vigorará durante o casamento. (...) É obrigatório quando os nubentes optam por regime que não seja o legal.

Contudo, não tem validade o pacto antenupcial, se não for

feito por escritura pública em cartório, sendo ineficaz se não lhe seguir o

casamento, conforme prevê o artigo 1653 do Código Civil.

Complementando o entendimento, trazem-se as palavras de

Diniz99: “É, portanto, da substância do ato a escritura pública nos pactos

antenupciais, logo, a inobservância desse preceito acarreta sua nulidade”.

Contudo, na elaboração do pacto nupcial deverão ser

respeitados os princípios de ordem pública, bem como os fins e a natureza do

matrimônio, neste sentido dispõe Monteiro100:

(...) disposições absolutas de lei são as de ordem pública, as rigorosamente obrigatórias, que têm caráter proibitivo e cuja aplicação não pode ser afastada ou excluída pelas partes. O Código não se refere às cláusulas ofensivas dos bons costumes, mas fora de dúvida que a defesa da ordem pública, a defesa dos interesses gerais da sociedade, abrange também a dos costumes.

Finalmente, conforme preceitua o artigo 1.653 do Código

Civil, o pacto antenupcial é solene, ou seja, não pode ser realizado por um

simples instrumento particular, terá de ser estipulado em cartório e lavrado por

escritura pública, observando-se que se tornará ineficaz, se não seguir-lhe o

casamento. As cláusulas permitidas no pacto antenupcial são as de caráter

econômico, não sendo válidas as que excluírem os cônjuges do dever de

97 DIAS, Maria Berenice; PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.). direito de família e o novo

código civil. 3.ed. Belo Horizonte: Rev. Atual, 2003. p. 207. 98 FIUZA, Ricardo. Novo código civil comentado. p. 1512. 99 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.147. 100 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito de família. p. 193-194.

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coabitação, mútua assistência, sustento e educação dos filhos e o exercício do

poder familiar.

2.3 REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS

O Regime da Comunhão Universal de Bens está previsto no

Código Civil, no artigo 1.667, que assim dispõe:

Art. 1.667. O regime da comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte.

Wald101 conceitua o regime da comunhão universal de bens,

como sendo “aquele que se tornam comuns tanto os bens que os cônjuges já

possuíam antes do casamento, como aqueles que foram posteriormente

adquiridos”.

O regime da comunhão universal de bens, importa na

comunicação de todos os bens presentes e futuros, até mesmo as dívidas do

casal.

Nesta mesma linha, Diniz104 assevera que a comunhão

universal de bens deve ser estipulada por meio de pacto antenupcial, nele os

nubentes podem estipular não só os bens presentes e futuros, bem como, os

adquiridos antes ou após o casamento, tornando-se as dívidas passivas comuns,

constituindo uma só massa. Passando cada cônjuge a ter direito à metade ideal

do patrimônio comum, não podendo formar sociedade entre si.

Sendo assim, a regra geral na comunhão universal de bens,

é a comunicabilidade dos bens presentes e futuros de cada cônjuge, sejam eles

móveis ou imóveis. Porém, há exceções impostas pela Lei, pois, alguns deles

101 WALD, Arnold. O novo direito de família: curso de direito civil brasileiro. p. 115. 104 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p.157.

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ficam fora dessa comunhão, ou seja, não há comunicação de todos os bens,

estando essas exceções enumeradas no artigo 1.668 do Código Civil.

A respeito, Gomes105 explica:

A incomunicabilidade de certos bens resulta do regime jurídico a que se acham submetidos, como é o caso dos que são gravados de fideicomisso. Outros não se comunicam em virtude de sua destinação, como as pensões, meios-soldos, montepios, tenças, roupas de uso pessoal, jóias esponsalícias, livros, instrumentos da profissão, retratos de família. Outros, finalmente, por determinação de quem os doou ou legou. Os últimos não se comunicam porque são declarados incomunicáveis no título de transmissão a um dos cônjuges, enquanto os outros são excluídos da comunhão por determinação legal.

Cumpre ressaltar que os bens doados ou herdados com a

cláusula de incomunicabilidade e os bens sub-rogados, não se comunicam no

regime da comunhão universal de bens.

Para complementar o entendimento, Gonçalves106

manifesta:

Não só são excluídos os bens doados em vida, os deixados em testamento, com cláusula de incomunicabilidade, como também os sub-rogados em seu lugar, ou seja, os que substituem os bens incomunicáveis. Assim, se o dono de um terreno recebido em doação com cláusula de incomunicabilidade resolver vendê-lo para, com o produto da venda, adquirir um veículo, este se sub-rogará no lugar do terreno e será também incomunicável.

São também, bens livres da comunicação, antes de realizar

a condição suspensiva, os bens gravados de fideicomisso e os direitos do

herdeiro fideicomissário, previsto no inciso II do artigo 1.668 do Código Civil.

105 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 197. 106 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p. 126-127.

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No tocante o inciso III do artigo 1.668 do Código Civil,

prescreve que as dívidas anteriores ao casamento não se comunicam, exceto se

tiverem relação com as despesas de seus aprestos, ou se reverterem em proveito

comum.

Convém ainda anotar que o inciso IV do artigo 1.668 do

Código Civil dispõe que as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao

outro com a cláusula de incomucabilidade, não se comunicam. Ressalta

Pereira107 que: “Não cabem doações propter núpcias na constância do casamento

ou que envolvam fraude ao regime de separação obrigatória”.

No regime da comunhão universal de bens, a posse e a

propriedade dos bens pertencem a ambos os cônjuges, outrossim, a

administração dos bens dar-se-á por ambos, formando assim uma só massa

conjugal, e deverá ser feita com fulcro nos artigos 1.663 e 1.664 do Código Civil.

2.4 REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS

Com o advento da Lei do Divórcio n° 6.515/77, regime da

comunhão parcial de bens, é também, denominado, de regime legal, é chamado

assim, por ser aplicável na falta, nulidade, ou ineficácia do pacto antenupcial.

Com relação à conceituação do Regime da Comunhão

Parcial de Bens, preleciona o artigo 1.658 do Código Civil:

Art. 1658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.

Rodrigues108 conceitua o Regime da Comunhão Parcial de

Bens, como:

107 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 226. 108 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 206.

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Aquele em que, basicamente, se excluem da comunhão os bens que os cônjuges possuem ao casar ou que venham a adquirir por causa anterior e alheia ao casamento, como as doações e sucessões; e em que entram na comunhão os bens adquiridos posteriormente. Trata-se de um regime de separação quanto ao passado e de comunhão quanto ao futuro.

No regime da comunhão parcial de bens, pode-se dizer que

há três massas patrimoniais: a) o patrimônio do casal decorrente do matrimônio;

b) o patrimônio exclusivo do marido e c) o patrimônio exclusivo da mulher.

Neste tipo de regime, basicamente, comunicam-se todos os

bens adquiridos na constância do casamento, de forma onerosa, conforme

preceitua o artigo 1.660 do Código Civil brasileiro:

Art. 1660. Entram na Comunhão:

I – os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges;

II – os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior;

III – os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;

IV – as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;

V – os frutos dos bens comuns, ou dos bens particulares de cada cônjuge, percebido na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.

Os bens incomunicáveis no Regime da Comunhão Parcial

de Bens estão previstos no artigo 1659 do Código Civil:

Art.1659. Excluem-se da comunhão:

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I – os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobreviverem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;

II – os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;

III – as obrigações anteriores ao casamento;

IV – as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;

V – os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;

VI – os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;

VII – as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.

A respeito da responsabilidade dos cônjuges em relação às

dívidas subseqüentes ao matrimônio, ressalta Diniz109 que, “(...), contraídas no

exercício da administração do patrimônio comum, obrigam aos bens comuns e

aos particulares do cônjuge que o administra e aos do outro na proporção do

proveito que houver auferido, (...)”.

Os artigos 1663 e 1666, ambos do Código Civil, dizem

respeito sobre as dívidas e assim dispõem:

Art. 1663. A administração do patrimônio comum compete a qualquer dos cônjuges.

109DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 156.

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§ 1° - As dívidas contraídas no exercício da administração obrigam os bens comuns e particulares do cônjuge que os administra, e os do outro na razão do proveito que houver auferido.

§ 2° - A anuência de ambos os cônjuges é necessária para os atos, a título gratuito, que impliquem cessão do uso ou gozo dos bens comuns.

§ 3° - Em caso de malversação dos bens, o juiz poderá atribuir a administração a apenas um dos cônjuges.

(...)

Art. 1666. As dívidas, contraídas por qualquer dos cônjuges na administração de seus bens particulares e em benefício destes, não obrigam os bens comuns.

Finalmente, as dívidas contraídas exclusivamente por um

dos cônjuges, sem que o conjunto familiar tire proveito, será somente dele a

responsabilidade, e por essas dívidas só responderão seus bens particulares e os

comuns até a meação.

Quanto à administração do patrimônio na comunhão parcial

de bens, Venosa110 leciona que:

O art. 1663 do CC estabelece que a administração do patrimônio comum compete a qualquer dos cônjuges. O código de 1916 estabelecia que essa administração competia ao marido, o que não mais podia vigorar após a Constituição Federal de 1988.

Neste contexto, Oliveira111 preleciona que: “ambos os

cônjuges podem praticar todos os atos de gestão sobre os bens comuns”.

110 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 1991-1992. 111 OLIVEIRA, José Leamartine Correa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de

família. p. 368.

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Ainda, a respeito da administração do patrimônio, o artigo

1.665 do Código Civil dita que:

Art. 1.665. A administração e a disposição dos bens constitutivos do patrimônio particular competem ao cônjuge proprietário, salvo convenção diversa em pacto antenupcial.

E nessa temática, explícita é a visão de Pereira112:

O art. 1.665 inova ao declarar que “a administração e a disposição dos bens constitutivos do patrimônio particular competem ao cônjuge proprietário, salvo convenção diversa ao contrário”. É da natureza do regime da comunhão parcial a separação dos patrimônios. Cada um dos cônjuges tem a administração e a disposição dos bens que lhe pertencem. Ressalvam-se as disposições em contrário do pacto antenupcial, bem como as restrições estabelecidas no Código.

Verifica-se no Regime da Comunhão Parcial de Bens a

comunicação dos bens adequados a título oneroso durante o Casamento e a

incomunicabilidade dos bens cuja aquisição, tiver uma causa anterior ao

matrimônio. Sendo da natureza do regime a administração de cada bem que

pertence ao cônjuge com exclusividade.

2.5 REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS

Existem duas espécies de regime de separação de bens no

Direito Brasileiro, uma é a separação de bens obrigatória, imposta em

determinadas condições, e a outra é a separação de bens optativa ou não

obrigatória, supletivo da vontade dos interessados.

Wald113 define o Regime da Separação de Bens como

sendo:

112 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 219-220. 113 WALD, Arnold. O novo direito de família: curso de direito civil brasileiro. p. 128.

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(...) um regime de estrutura simples, em que subsistem com inteira independência dois patrimônios distintos: o do marido e o da mulher. Tanto os bens anteriores como os posteriores à celebração do casamento são da propriedade individual de um dos cônjuges, o mesmo acontecendo com a responsabilidade pelas obrigações assumidas, que recaem sobre os cônjuges que praticou o ato (...).

Nesta temática, Venosa114 explica que a característica

principal do Regime da Separação de Bens é a completa distinção do patrimônio

de ambos os cônjuges; e por conseqüência não se comunicam os frutos e as

aquisições, em que cada cônjuge permanece na propriedade, posse e

administração de seus bens.

Segundo Pereira115:

No regime de separação de bens, cada um dos cônjuges conserva a posse e a propriedade dos bens que trouxe para o casamento, bem como dos que forem a eles sub-rogados, e dos que cada um adquirir a qualquer título na constância do matrimônio, atendidos as condições do pacto antenupcial.

Discorrendo sobre o tema, Rodrigues116 explica que:

“Regime da separação é aquele em que os cônjuges conservam não apenas o

domínio e a administração de seus bens presentes e futuros, como também a

responsabilidade pelas dívidas anteriores e posteriores ao casamento”.

A respeito da comunicação dos bens no regime de

separação de bens, os nubentes poderão dispor de cláusula em pacto antenupcial

quanto à comunicabilidade dos bens que desejarem advindos do matrimônio.

Para Gomes117:

114 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 203. 115 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 237. 116 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 215. 117 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 201.

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O regime da separação de bens caracteriza-se pela incomunicabilidade dos bens presentes e futuros dos cônjuges. Os patrimônios permanecem separados quanto à propriedade dos bens que os constituem, na administração e gozo, assim como as dívidas passivas.

Leciona Oliveira118 que no “regime de separação de bens,

em princípio, tudo é separado, bem como o ativo, o passivo e a gestão desses

bens”.

No que tange às responsabilidade dos cônjuges em relação

as dívidas, Pereira119 esclarece:

As dívidas anteriores ao casamento não se comunicam e, pelas contraídas na vigência deste, responde cada um individualmente. Em caráter excepcional, pesam sobre bens de um e de outro os encargos: a) provindos de obrigações por ato ilícito em que forem co-autores, ou praticado este pelos filhos do casal; b)mantença do lar ou da família, na proporção das quotas respectivas de contribuição; c) relativos aos atos que envolvam compromissos de um ou de outro, praticados com autorização e a outorga do consorte, respectivamente.

Contudo, no entendimento de Monteiro120: “as dívidas

contraídas pelo cônjuge para a aquisição das utilidades necessárias à economia

doméstica, ou empréstimo para esse fim, se comunicam, nos termos do artigo

1.644 do Código Civil de 2002”.

Acrescenta Rodrigues121 que: “(...) também não se

comunicam as obrigações concernentes à indústria ou profissão que qualquer dos

cônjuges exercer”.

118 OLIVEIRA, José Leamartine Correa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de

família. p. 404. 119 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 239. 120 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil direito de família. p. 224. 121 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 216.

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Pereira122 aduz que: “Dissolvida a sociedade conjugal, a

cada um dos cônjuges cabe o que era seu patrimônio separado (...)”.

Outrossim, importante ressaltar-se que há uma diferenciação

quanto à sucessão, no regime de separação obrigatória de bens, que está

prevista no artigo 1.829 do Código Civil, assim preconiza:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou na separação obrigatória de bens (art. 1.641); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III – ao cônjuge sobrevivente;

IV – aos colaterais.

Observa-se que, no regime de separação de bens

obrigatória, o cônjuge sobrevivente não concorre nos bens do cônjuge falecido,

enquanto que no Regime de Separação de Bens optativo sim.

Por fim, analisando-se a conceituação trazida pelos

doutrinadores acima citados, constata-se que o Regime da Separação de Bens

possibilita que os cônjuges tragam para o casamento, com exclusividade e sem

comunicação entre eles, o domínio, posse e administração de seus bens

presentes e futuros, tanto as dívidas anteriores, como posteriores ao matrimônio,

salvo nas exceções acima mencionados. Dissolvida a sociedade conjugal, cada

qual ficará com os bens que estiver em seu nome, quer tenha sido adquirido

antes ou durante o matrimônio.

122 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 238.

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2.5.1 REGIME DE SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA

Com relação à obrigatoriedade do regime da separação de

bens, prevista no artigo 1.641 do Código Civil, o qual determina que se casarão

neste regime, sem qualquer comunicação dos bens ou dívidas:

Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:

I – das pessoas que contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;

II – da pessoa maior de 60 anos;

III – de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

O legislador obriga tais pessoas a contraírem núpcias sob a

égide deste regime, e por ser imposta às partes por força de preceito legal, não

há necessidade de pacto antenupcial. Gonçalves124 justifica tal fato por tratar-se

de regime imposto por lei e, em alguns casos, esse é elaborado por ter havido

contravenção ao dispositivo legal de causas suspensivas da celebração do

casamento.

Ainda sobre a separação obrigatória, Diniz125 manifesta-se:

Deveras, em certas circunstâncias a lei o impõe, caso em que esse regime é obrigatório por razões de ordem pública ou por ser exigido como sanção. É assim, em virtude do Código Civil, art. 1.641, o regime obrigatório do casamento: 1) Das pessoas que celebrarem o casamento com infração das causas suspensivas, ou seja, do viúvo ou viúva que tiver filho do cônjuge falecido,

124 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p. 121-122. 125 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 167-168-169.

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enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros; (...) 2) Da pessoa maior de 60 anos; porém, se, nessa hipótese, suceder união estável de mais de dez anos consecutivos ou da qual tenham nascido filho, não se aplica a regra, podendo os nubentes, de acordo com o art. 45 da Lei n. 6.515/77, escolher livremente o regime matrimonial de bens (...) 3) De todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

Em síntese, o regime de separação obrigatória de bens é

estabelecido por lei, possuindo diversas finalidades, depende da hipótese

retratada am alguns casos tem por fim proteger direitos de terceiros, “como do

viúvo que, sem fazer partilha de bens de casamento anterior, tendo filhos, casa-se

novamente, e, ao cônjuge que está presente no casamento celebrado com

suprimento judicial, bem como daquele realizado além do limite de idade”.126

2.5.2 SEPARAÇÃO NÃO OBRIGATÓRIA

O regime de separação de bens também pode ser optativo,

ou seja, adquirido de forma convencional entre as partes, nele os nubentes

dispõem livremente sobre seus bens e os administram com exclusividade,

conforme preceitua o artigo 1.687 do Código Civil:

Art. 1.687. Estipulada a separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva da cada um dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real.

Como se pode observar, o regime de separação de bens

não obrigatória, é decorrente de uma escolha entre os nubentes, da vontade dos

126 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito de família. p. 213. 136 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 198.

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mesmos, não lhes sendo imposto por lei. Assim sendo, os noivos podem optar

pelo regime de separação de bens, estipulando-o por pacto antenupcial, que

passará a vigorar após a realização do casamento.

2.6 REGIME DE PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQÜESTOS

O regime da participação final nos aqüestos é uma das

inovações do Código Civil de 2002, veio substituir o regime dotal, previsto no

Código Civil de 1916.

Para Venosa136:

Trata-se de inovação do Código de 2002, que suprimiu o regime dotal e introduziu, nos arts. 1.672 a 1.686, o regime de participação final nos aqüestos. Trata-se de um regime híbrido, no qual se aplicam regras da separação de bens e da comunhão de aqüestos.

Espínola137 conceitua aqüestos como: “bens que cada um

dos cônjuges ou ambos adquirirem na constância do casamento por qualquer

título, que não seja o de doação, herança, ou legado”.

Nery Júnior138 entende que:

A eficácia desse regime de bens quanto à efetiva participação final dos aqüestos só surge com o fato jurídico da dissolução da sociedade conjugal. Antes disso, o casal vive sob o regime da separação de bens. Na constância da sociedade conjugal, tudo o que os cônjuges adquiriram integrará, respectivamente, a massa do patrimônio de cada um. No momento da dissolução da sociedade conjugal, serão apurados os bens adquiridos na constância da sociedade conjugal, a título oneroso, e divididos pela metade para cada um dos cônjuges.

137 ESPÍNOLA, Eduardo. A família no direito brasileiro. Atual. Por Ricardo Rodrigues Gama.

Campinas: Brookseller, 2000. p. 362. 138 NERY JR. Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil anotado e legislação

extravagante. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 743.

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Lisboa139 expõe que:

Participação final nos aqüestos é o regime em que cada cônjuge possui o seu patrimônio próprio, submetendo-se os bens adquiridos posteriormente à data do matrimônio á partilha no caso de dissolução da sociedade conjugal.

A respeito do assunto, Gonçalves140 ensina que: “Trata-se

de um regime misto, pois durante o casamento aplicam-se as regras de

separação total e, após a sua dissolução, as da comunhão parcial”.

Rodrigues141 entende por regime da participação final nos

aqüestos como sendo aquele que:

Representa um regime híbrido, ou misto, ao prever a separação de bens na constância do casamento, preservando, cada cônjuge, seu patrimônio pessoal, como a livre administração de seus bens, embora só se possam vender os imóveis com a autorização do outro, ou mediante expressa convenção no pacto dispensando a anuência (...). Mas com a dissolução, fica estabelecido o direito à metade dos bens adquiridos a título oneroso pelo casal na constância do casamento.

A comunicação dos bens, no regime de participação final

nos aqüestos, dá-se somente no momento da dissolução do casamento, pois

durante a sua constância, não há comunicação dos bens que cada cônjuge

possui.

Contudo, surgem algumas controvérsias quanto à

comunicação dos bens móveis. Para Diniz142 a comunicação dos bens no regime

de participação final dos aqüestos, dá-se:

139 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: direito de família e das sucessões. p. 163. 140 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 128. 141 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 218. 142 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 163.

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Com a dissolução da sociedade conjugal, apurar-se-á o montante dos aqüestos, excluindo-se da soma dos patrimônios próprios: os bens anteriores ao casamento e os sub-rogados em seu lugar; os obtidos por cada cônjuge por herança, legado ou doação; e os débitos relativos a esses bens vencidos e a vencer (...) Mas os frutos dos bens particulares e os que forem com eles obtidos formarão o monte partível.

Já Gonçalves143 afirma que:

Em relação aos próprios cônjuges, portanto, os bens móveis pertencem àquele que os adquirir na Constancia do casamento. Em relação a terceiros, presumem-se salvo se comprovada a aquisição pelo outro. Excluem-se da presunção os bens de uso pessoal.

No que concerne à incomunicabilidade de bens, esclarece

Diniz144 que, neste novo regime de bens, não há formação de massas de bens

particulares incomunicáveis durante o matrimônio, mas que se tornam comuns no

momento da dissolução do casamento.

Assim sendo, sobre a temática, Nery Júnior145 esclarece

que:

São incomunicáveis os bens e direitos levados para o casamento pelos cônjuges, que compõem o patrimônio de cada um, juntamente com os bens e direitos por eles adquiridos a título gratuito durante a constância do casamento. Em decorrência disso, ao término da sociedade conjugal, hão de ser apuradas três massas patrimoniais distintas: a) o patrimônio exclusivo do varão; b) o patrimônio exclusivo da mulher; c) o patrimônio autônomo comum, que será apurado no momento da dissolução do casamento, pra permitir a entrega da meação de cada um.

143 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. p. 430. 144 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p.162. 145 NERY JR. Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil anotado e legislação

extravagante. p. 743.

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Outrossim, verifica-se que excluem-se dos aqüestos, os

bens próprios dos cônjuges, não entrando na partilha após dissolvida a sociedade

conjugal.

Quanto à responsabilidade dos cônjuges em relação as

dívidas, o artigo 1.677 do Código Civil, estabelece:

Art. 1677. Pelas dívidas posteriores ao casamento, contraídas por um dos cônjuges, somente este responderá, salvo prova de terem revertido, parcial ou totalmente, em benefício do outro.

Ainda com relação às dívidas, o artigo 1.678 do Código Civil

prevê:

Art. 1.678. Se um dos cônjuges solveu uma dívida do outro com bens do seu patrimônio, o valor do pagamento deve ser atualizado e imputado, na data da dissolução, à meação do outro cônjuge.

Com relação aos artigos supramencionados, Diniz146 assevera

que:

Quanto aos débitos posteriores ao casamento, contraídos por um dos consortes, apenas este responderá por eles, a não ser que haja prova cabal de que revertem, total ou parcialmente, em proveito do outro (CC, art. 1.677). Se um dos cônjuges vier a pagar dívida do outro, utilizando bens de seu patrimônio, o valor desse pagamento deverá ser atualizado e imputado, na data da dissolução, à meação do outro consorte (CC, art. 1.678). As dívidas de um dos cônjuges, quando superiores à sua meação, não obrigam o outro, ou a seus herdeiros (CC, art. 1.686).

No sistema jurídico brasileiro, os nubentes têm a liberalidade

de optarem por um dos regimes de bens existentes no Código Civil, os quais

foram devidamente analisados nos subtítulos acima. Contudo, também podem

combiná-los entre si, desde que não contrariem normas de ordem pública,

formando assim outros regimes.

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Neste capítulo foi abordado a respeito dos Regimes de Bens

existentes e vigentes atualmente. Verificaram-se ainda as regras e entendimentos

doutrinários predominantes sobre os conceitos, comunicabilidade e

incomunicabilidade dos bens dos cônjuges, a responsabilidade em relação as

dívidas subseqüentes ao matrimônio e a administração do patrimônio em cada

regime. No próximo capítulo será apresentado o resultado da investigação

científica sobre a alteração do regime de bens no direito brasileiro, considerando

as mudanças impostas pela Lei n° 10.406 de 2002.

146 DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 163.

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CAPÍTULO 3

DA MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS NO DIREITO

BRASILEIRO

3.1 ASPECTOS GERAIS

É de grande repercussão a mudança introduzida pelo

Código Civil de 2002, no § 2° do artigo 1.639, que regulamenta a possibilidade de

alteração do regime de bens no curso do casamento, o qual possui a seguinte

redação:

Art. 1.639 – É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.

(...)

§ 2°. É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.

A faculdade que os cônjuges possuem, mediante pedido

conjunto com as motivações e ressalvados os direitos de terceiros, requererem ao

juiz que lhes concedam a modificação do regime de bens adotado quando da

celebração do casamento, durante sua constância, consubstancia-se, pois, no

princípio da mutabilidade do regime de bens.

Este instituto substituiu o princípio da imutabilidade do

regime matrimonial, previsto no artigo 230 do Código Civil de 1916, até a

dissolução da sociedade conjugal, não era permitido aos cônjuges adotar outro ou

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alterar total ou parcialmente o regime que tinham adotado. Uma vez escolhido

pelos nubentes, tornava-se irrevogável.

O princípio da mutabilidade do regime de bens teve uma

positiva recepção por parte da doutrina. Manfré147, dispondo sobre a facilidade

deste novo sistema, assevera que:

Trata-se do sistema que melhor atende ao interesse dos consortes e o mais ajustado às nossas tendências morais, além de ser de nossa tradição jurídica. Melhor que a lei, cada casal escolhendo o regime matrimonial da preferência, regulará de modo soberano, os respectivos interesses.

O Código Civil não prevê prazo mínimo, depois de realizado

o casamento, para que se possa requerer a mudança do regime. No direito

brasileiro, não há regra semelhante à do art. 1.397 do Código Civil francês, em

sua redação atual, que estabelece um prazo de dois anos após a celebração do

casamento ou após a homologação da última mudança de regime148.

Sendo assim, neste capítulo serão abordadas todas as

questões referentes à possibilidade da modificação do regime de bens no direito

brasileiro, objeto da presente monografia.

3.2 A EVOLUÇÃO DA MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS

A tradição do direito brasileiro foi a da irrevogabilidade e

inalterabilidade do regime escolhido, no entanto, exceções existiam no Brasil,

principalmente por força da jurisprudência.

A legislação brasileira no artigo 7°, § 5°, do Decreto-Lei n.

4.657/42 (a Lei de Introdução ao Código Civil de 1916), com a redação que lhe

deu a Lei n. 6.515/77, também previa uma exceção ao princípio da imutabilidade

do regime adotado, permitindo ao estrangeiro naturalizado brasileiro a adoção da

147 MANFRÈ, José Antonio Encinas. Regime matrimonial de bens no novo código civil. São

Paulo: Juarez de Oliveira, 2003. p. 31.

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comunhão parcial de bens, que é o regime matrimonial legal, resguardados os

direitos de terceiros e anteriores à concessão da naturalização, que ficaram

inalterados, como se o regime não tivesse sofrido qualquer mudança.149

Nesse sentido o Supremo Tribunal Federal (RF, 124:105)

passou a entender que o princípio da inalterabilidade do regime matrimonial de

bens não era ofendido por pacto antenupcial que estipulasse que, na hipótese de

superveniência de filhos, o casamento sob o regime de separação de bens se

convertesse em comunhão150.

Não bastassem essas raras hipóteses, a Súmula 377,

admitindo a comunicação de bens adquiridos na constância do casamento pelo

esforço comum, mesmo que pelo regime obrigatório da separação de bens,

impedindo enriquecimento indevido, com a dissolução do matrimônio.

Gomes151 sempre defendeu a alterabilidade dos regimes:

Por que proibir que modifiquem cláusulas do contrato que celebraram, mesmo quando o acordo de vontades é presumido pela lei? Que mal há na decisão de cônjuges casados pelo regime de separação de substituírem-no pelo da comunhão? Necessário, apenas, que o exercício desse direito seja controlado a fim de impedir a prática de abusos, subordinando-o a certas exigências.

Seguindo as razões expostas pelo autor acima citado, o

legislador do atual Código Civil permitiu a alteração do regime de bens na

constância da sociedade conjugal, porém, impondo sendo todas as suas cautelas

contempladas no artigo sob comento, a fim de coibir abusos.

Justificando, ainda, a necessidade e importância do princípio

da mutabilidade do regime de bens, Gozzo152 afirma que:

148 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Código civil comentado: direito de família, relações de parentesco,

direito patrimonial: arts. 1.591 a 1.693. São Paulo: Atlas, 2003. p. 235. 149 DINIZ, Maria Helena. Lei de introdução ao código civil brasileiro interpretada. São Paulo:

Saraiva, 1994. p. 229. 150 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 160. 151 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 174.

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(...) a maioria dos nubentes sente-se constrangida para discutir questões de cunho patrimonial antes do casamento, entendendo que essa natural inibição inicial poderia levar a escolhas erradas quanto ao regime, além de instalar um clima mais propício para os casamentos por interesse. Seria certo então deduzir que com o passar do tempo, quanto mais sedimentado o relacionamento conjugal, quanto maior a intimidade dos cônjuges, quanto mais fortalecidos os seus vínculos familiares e as suas certezas afetivas, mais autorizada estaria a modificação de seu regime patrimonial no curso do casamento, facilitando a correção dos rumos escolhidos por jovens e inexperientes.

No mesmo sentido, Farrula Júnior153 introduz o fato de:

(...) existirem pessoas que nem sempre têm inteiro conhecimento das regras pertinentes ao regime de bens e daquilo que lhes revela ser mais benéfico, e que só após o casamento e com a convivência diária, vai sendo oportunizado aos esposos aferirem quanto ao acerto ou adequação da sua escolha.

Diniz154 é enfática a respeito, destacando que:

Louvável foi essa medida legislativa, pois os nubentes poderão, com sua inexperiência, escolher mal o regime e depois, com o tempo e a convivência conjugal, vão percebendo que outro seria mais adequado aos seus interesses.

Contudo, impõe-se uma criteriosa aferição acerca de

possível lesão à família, ao direito de terceiros, de credores de um ou de ambos

os cônjuges e, enfim, em relação à ratio summa do pedido de mudança do regime

de bens, como, por exemplo, se há propósito obscuro decorrente da convivência

íntima, de temor de mal injusto e grave etc155.

152 GOZZO, Débora. Pacto antenupcial. São Paulo: Saraiva, 1992. p. 126. 153 FARRULA JÚNIOR, Leônidas Filippone. Do regime de bens entre os cônjuges. In: LEITE,

Heloisa Maria Daltro (Coord). O novo código civil, do direito de família. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2002. p. 314.

154 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 162. 155 PEDROTTI, Irineu; PEDROTTI, Willian. Comentários às principais alterações – novo código

civil. Campinas: LZN Editora, 2003. p. 302.

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Observa-se, assim, que esse princípio introduzido pelo Atual

Código Civil, em seu artigo 1639, § 2º, proporciona aos cônjuges a possibilidade

de modificar o regime de bens adotado, na constância do casamento, desde que

preenchidos os seus requisitos.

3.3 REQUISITOS PARA MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS

Conforme se depreende da leitura do § 2° do artigo 1.639 do

Código Civil, para que os cônjuges possam alterar o regime de bens, após o

casamento, são necessários o preenchimento de alguns requisitos cumulativos:

a) autorização judicial;

b) pedido conjunto dos cônjuges;

c) motivação relevante;

d) comprovação, perante o juiz, da veracidade das razões;

e) ressalva dos direitos de terceiros.

Os quais serão abordados nos próximos itens.

3.3.1 Autorização Judicial

Não basta a mera postulação encaminhada pelos cônjuges

ao oficial do registro civil. Há que se considerar que o pedido deve ser aforado

judicialmente, por profissional habilitado, ou seja, advogado, pois, conforme o

artigo 36, do Código de Processo Civil, "A parte será representada em juízo por

advogado legalmente habilitado. (...)". A procuração conferida ao causídico deve

conter poderes especiais, pois o pedido não comporta a simples procuração geral

para o foro.

Prossegue Lôbo Netto156 que:

156 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Código civil comentado: direito de família, relações de parentesco,

direito patrimonial: arts. 1.591 a 1.693. p. 234.

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O pedido deve ser dirigido ao juiz competente, segundo a respectiva organização judiciária, em ação própria, postulada por advogado comum. Somente será possível o seguimento do pedido se ambos os cônjuges forem autores do pedido; a recusa ou reserva de qualquer deles impedirá o deferimento. A falta de anuência do cônjuge recalcitrante não poderá ser suprimida pelo juiz. A alteração produzirá efeitos entre as partes com base na decisão judicial.

Verifica-se nesse requisito que o pedido deve ser dirigido ao

juiz competente, segundo a respectiva organização judiciária, em ação própria,

postulada por advogado comum.

3.3.2 Pedido conjunto dos cônjuges

Observa-se que a lei refere-se a pedido de “ambos os

cônjuges”, e não somente a um deles, o que torna impossível o ingresso somente

por um dos cônjuges, pedindo a citação do outro. Portanto, não há jurisdição

contenciosa, mas jurisdição voluntária, delineado nos arts. 1.103 e seguintes do

Código de Processo Civil.

Ambos devem ser interessados, tendo que haver consenso

quanto à modificação. Cumpre o pedido, desta forma, somente aos cônjuges, os

quais detêm legitimidade exclusiva. Os parentes próximos, como descendentes

ou ascendentes, e mesmo eventuais credores, não participarão do processo, não

se ordenando sua citação. Unicamente o Ministério Público será chamado ao

processo, que intervirá como guardião da lei.

Destaca Barbosa157:

Admitir o pedido formulado por um só dos cônjuges seria impor ao outro um novo regime, o que não seria razoável: o acorde de vontades que orientou a escolha original deve orientar a alteração, visto que apenas a lei pode impor um regime, e o faz por causas entendidas justas pelo legislador.

157 BARBOZA, Heloisa Helena. Alteração do regime de bens e o art. 2.039 do código civil. In:

PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord) Afeto, ética, família e o novo código civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 327-328.

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A interdição de um dos cônjuges posterior ao casamento

não deve impedir, por si só, a alteração do regime, já que sequer impede a

dissolução da sociedade conjugal, conforme dispõe o art. 1.576, Parágrafo único

do Código Civil. Contudo, extrai-se, na explanação de Barbosa158:

(...) forte deve ser a motivação, a demonstrar, de modo cabal, benefício para o incapaz, sob pena de contrariar o espírito do instituto da interdição, ou seja, o de proteger o incapaz. A aferição dos motivos deve ser feita de modo diferenciado, posto que indispensável atender os interesses soberanos daquele que não pode manifestar pessoalmente sua vontade.

Conforme mencionado, a mudança judicial do regime de

bens não comporta a via unilateral, compulsória, eis que a lei exige que o pedido

seja formulado por ambos os cônjuges, a alteração refletirá o desejo mútuo, ou

uma conveniência em favor dos dois.

3.3.3 Motivação relevante do pedido – interesse processual

Outra exigência legal é a motivação relevante do pedido,

este requisito expõe o interesse jurídico dos cônjuges partes para a propositura

do pedido, bem como sua legitimidade, ou seja, devem os cônjuges apresentar as

razões pelas quais desejam alterar o regime de bens adotado quando da

celebração do casamento, que não se radique apenas no desejo dos cônjuges.

As causas para o pedido de modificação do regime de bens

não podem ser para situações hipotéticas, mas situações ocorrentes de fato.

Alguns doutrinadores afirmam que aí está a grande

dificuldade, pois algum fato deve justificar o pedido. Não basta a simples vontade

dos cônjuges.

158 BARBOZA, Heloisa Helena. Alteração do regime de bens e o art. 2.039 do código civil. In:

PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord) Afeto, ética, família e o novo código civil. p. 328.

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A doutrina traz como exemplo algumas hipóteses nas quais

a aplicação da modificação do Regime Matrimonial de Bens na vigência do

casamento se torna possível.

Rizzardo159 expõe como motivo relevante na alteração do

regime de separação de bens para o de comunhão, é que os bens são frutos da

atividade de ambos os cônjuges, embora se encontrem registrados somente em

nome de um. Já na mudança do regime de comunhão parcial de bens para a

universal, deve-se alegar o favorecimento de um deles com o patrimônio formado

antes do casamento em razão de um sentimento de gratidão, ou de lhe fornecer

uma futura segurança econômica. Na pretensão de mudar de comunhão universal

para a parcial, objetivará os bens adquiridos antes do casamento disponíveis para

o atendimento de obrigações contraídas anteriormente do casamento, sem

envolver aqueles adquiridos pelo esforço comum.

Ronconi160 enumera outros motivos que sustentam o pedido

de alteração, os quais serão descritos a seguir:

As pessoas casadas com os impedimentos decorrentes das causas suspensivas do casamento:

O parágrafo único do artigo 1.523 possibilita o casamento nos moldes do regime desejado pelos nubentes se houver prova da inexistência de prejuízo para as pessoas ali designadas, regra esta que difere do Código Civil de 1916, no qual não havia possibilidade de prova da inexistência do prejuízo, até mesmo porque o regime de bens era irrevogável.

Se o casamento, porém, foi realizado sob a égide do regime da Separação Obrigatória de Bens com fundamento nesta hipótese, caso devidamente demonstrado pelos cônjuges a inexistência dos

159 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. p. 629-630. 160 RONCONI, Diego Richard. Algumas aplicações da mudança do regime de bens do casamento. Jus Navegandi, Teresina, a. 8, n. 392, 3 ago. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5518>. Acesso em: 16 out. 2006, p. 01-02.

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prejuízos que tais impedimentos poderiam ocasionar, ocorrida após o casamento, não haveria impedimento algum para o pleito da modificação do regime de bens pretendido.

Todos os que dependerem de suprimento judicial para casar

Dependem de suprimento judicial para casar:

a) os menores de 18 (dezoito) anos, havendo denegação do consentimento por parte de um ou ambos os pais (art. 1.519, do Código Civil);

b) os menores cuja idade núbil ainda não se alcançou, a fim de evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez (art. 1.520).

Nestas hipóteses, observa-se que as duas situações buscam o referido regime antecipando a iminência da dissolução da sociedade, haja vista a imaturidade do casal para assumir um relacionamento conjugal.

Em ambas as hipóteses, se, passado algum tempo da convivência conjugal e, principalmente, da estabilidade do relacionamento familiar, não se vislumbra qualquer impedimento no pedido de modificação do regime de bens por parte dos cônjuges casados diante de tais circunstâncias. No entanto, importa uma análise, com interveniência de Assistente Social, a fim de se configurar a estabilidade do relacionamento do casal.

O restabelecimento da sociedade conjugal dissolvida pela separação judicial

Outra situação que pode demandar a modificação do regime matrimonial de bens consiste na possibilidade de restabelecimento da sociedade conjugal dissolvida pela separação judicial. Estabelece o artigo 1.577, do Código Civil, que "Seja qual

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for a causa da separação judicial e o modo como esta se faça, é lícito aos cônjuges restabelecer, a todo tempo, a sociedade conjugal, por ato regular em juízo.", ordenando, adiante, que "A reconciliação em nada prejudicará o direito de terceiros, adquirido antes e durante o estado de separado, seja qual for o regime de bens." (art. 1.577, parágrafo único).

Como se trata de pedido de ambos os cônjuges, o pedido de Modificação do Regime de Bens se baseia, antes de tudo, na confiança dos cônjuges entre si e no sentido ético que une o casal diante da Sociedade, a fim de não prejudicar terceiros que com este casal tenham algum interesse jurídico ou econômico.

Para Lôbo Netto161 “o juiz deve levar em conta as idades e a

natural imaturidade dos cônjuges ao se casarem, quando as pessoas não

dispõem de elementos de informações suficientes para a tomada de decisão que

determina tão fortemente o futuro do casal”.

A alteração do regime de bens pode significar a retirada de

considerável obstáculo ao entendimento dos cônjuges, garantindo a permanência

de sua convivência. Contudo, faz-se necessário um especial cuidado, quando

apenas um dos cônjuges tiver vida econômica própria, ou quando forem muito

diferentes os níveis de renda de cada um.

Observa-se então que a modificação do regime de bens

dever ser motivada, indicando que o juiz deve considerar as razões apresentadas

pelos cônjuges, podendo, ou mesmo devendo, indeferir o pedido se não

preenchido esse requisito legal.

3.3.4 Comprovação, perante o juiz, da veracidade das razões

Ingressado o pedido por profissional habilitado, e em pedido

motivado de ambos os cônjuges, há a necessidade de autorização judicial. O

161 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Código civil comentado: direito de família, relações de parentesco, direito patrimonial: arts. 1.591 a 1.693. p. 234.

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magistrado proferirá sentença homologatória. Caso não autorize o pedido, da

sentença caberá apelação162.

Quanto à procedência das razões invocadas, ligam-se estas

razões com a motivação do pedido realizado pelos cônjuges, onde o pedido deve

ser baseado em um motivo plausível, altera-se porque se objetiva salvar o

patrimônio, ou da necessidade de garantir segurança econômica ao outro

cônjuge, se um deles vier a falecer, e transferir-se hereditariamente o patrimônio

para parentes que jamais prestaram auxílio ao cônjuge que sobrevirá, ou

totalmente desligados dele.

3.3.5 Direitos de Terceiros

O pedido de alteração do regime de bens somente será

acolhido se não houver escopo de prejudicar terceiros, inclusive entes públicos,

cujos direitos e interesses sempre serão resguardados. Permanecerão garantidos

os direitos de eventuais credores, não podendo subtrair ou diminuir as suas

garantias. Assim como os titulares de direitos sobre os bens, que passam para a

titularidade de um dos cônjuges, com a mudança.

A esse respeito, impõe-se publicidade consistente no

registro da sentença no órgão próprio. Protegendo assim, o interesse de quem

tenha direito contra qualquer dos cônjuges, cujo título anteceda ao registro da

mudança de regime163.

Lôbo Netto164 preleciona que a regra a ser observada é a

seguinte:

(...) a mudança de regime de bens apenas valerá para o futuro, não prejudicando os atos jurídicos perfeitos; a mudança poderá alcançar os atos passados se o regime adotado (exemplo:

162 RONCONI, Diego Richard. Algumas aplicações da mudança do regime de bens do

casamento. Jus Navegandi, Teresina, a. 8, n. 392, 3 ago. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5518>. Acesso em: 16 out. 2006, p. 01.

163 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 174. 164 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Código civil comentado: direito de família, relações de parentesco,

direito patrimonial: arts. 1.591 a 1.693. p. 235.

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substituição de separação convencional por comunhão parcial ou universal) beneficiar terceiro credor, pela ampliação das garantias patrimoniais. Em relação aos terceiros, especialmente os credores, aplica-se o princípio geral fraus omnia corrupit, não podendo a mudança de regime permitir aos cônjuges que ajam fraudulentamente contra os interesses daqueles.

No que concerne à sentença que consubstancie deferimento

do pedido de alteração do regime, Manfré165 ensina que: “(...) se impõe previsão

para registro do Ofício de Registro Civil, bem ainda autorização, a fim de que o

tabelião ou notário lavre escritura pública correspondente, nela constando

ressalva a direito de terceiros”.

3.4 EFEITOS DA ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS

Destaca-se ainda que o Código Civil não explica se os

efeitos da alteração do regime de bens serão “ex tunc” ou “ex nunc”, embora

alguns doutrinadores aduzam que contra terceiros não há como retroagir,

principalmente na mudança de regime mais benéfico para mais gravoso, e, em

relação ao casal, a mudança retroage.166

Farrula Júnior167 entende que a produção de efeitos da

alteração do regime de bens se dá: entre os cônjuges, após o trânsito em julgado

da decisão que deferir o pedido; perante terceiros: após a averbação da sentença

nos cartórios do Registro Civil das Pessoas Naturais e do Registro de Imóveis.

Para Manfré168:

(...) à falta de óbice da lei, ser possível a retroação dos efeitos dessa sentença à data da celebração do casamento, desde que, conjuntamente, os interessados requeiram nesse sentido ao juiz. Caso contrário, ou seja, inexistindo pedido expresso nessa

165 MANFRÉ, José Antonio Encinas. Regime matrimonial de bens no novo código civil. p. 48. 166 PHILLIPS, Douglas. Curso de direito de família. Florianópolis: Vox Legem, 2004. p. 65. 167 FARRULA JÚNIOR, Leônidas Filippone. Do regime de bens entre os cônjuges. In: LEITE,

Heloisa Maria Daltro (Coord). O novo código civil, do direito de família. p. 329-330. 168 MANFRÉ, José Antonio Encinas. Regime matrimonial de bens no novo código civil. p. 48.

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conformidade, os efeitos contar-se-ão da data da autorização judicial. Em qualquer dessas hipóteses, haverá ressalva de direitos de terceiros, como impõe o art.1.639, § 2°.

Observa-se que a sentença que proferir a alteração do

regime de bens, poderá ter efeitos “ex tunc” ou “ex nunc”. Em relação aos

cônjuges dependerá do pedido expresso nesse sentido, e em relação a terceiros

normalmente se operará o efeito “ex nunc”, para a ressalva de seus direitos.

3.5 ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS PARA CASAMENTOS CONTRAÍDOS NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916

O artigo 2.039 do atual Código Civil Brasileiro assim dispõe:

Art. 2.039. O regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei n. 3.071, de 1° de janeiro de 1916, é por ele estabelecido.

Trata-se de regra intertemporal, está previsto no livro próprio

e complementar do Código, nas disposições finais e transitórias.

Em razão de conhecer-se a natureza intertemporal desse

artigo, muito tem-se discutido a respeito da possibilidade de alteração do regime

de bens durante o casamento, contraídos na vigência do Código Civil de 1.916,

quando, por força do seu artigo 230, imperava a norma da irrevogabilidade do

regime adotado.

A corrente doutrinária que afirma que a alteração do regime

de bens,só será possível àqueles que se casaram após 11 de janeiro de 2003,

data esta em que passou a vigorar o atual Código Civil, fundamentam no ato

jurídico-perfeito, sufragado pelo artigo 5°, inciso XXXVI, da Constituição da

República Federativa do Brasil de 1988169 e pelo artigo 6°, § 1°, da Lei de

169 Art. 5°. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;.

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Introdução ao Código Civil, Decreto-Lei n. 4,657/42170, o qual consagra o princípio

da irretroatividade das leis.

Dessa maneira, o Código Civil de 1916, embora revogado,

permanecerá eficaz, produzindo, assim, efeitos jurídicos para disciplinar acerca

do regime de bens nos casamentos celebrados na respectiva vigência.

Contudo, há entendimento em contrário, em que é válida a

explicação trazida por Pacheco171, se “tal alteração é possível, doravante, em

relação às escolhas feitas, após a entrada em vigor do novo Código, nada impede

também que se admita a mudança, em relação ao regime escolhido

anteriormente”.

Ainda, justifica Madaleno172 que o legislador poderia ter sido

suficientemente claro e pontual, e ditar no art. 2.039 do atual Código Civil, que os

casamentos celebrados sob a vigência do Código Civil de 1916, seguiriam com

seu regime de bens imutável, contudo não faz essa ressalva e não permite

concluir assim. Ademais, o próprio § 2°, do artigo 1.639, do atual Código Civil não

restringe a alteração do regime de bens somente aos casamentos celebrados a

contar da sua vigência.

Continuando assim a sua fundamentação, Madaleno173

ressalta que o atual Código Civil, no seu art. 1.045 revoga inteiramente o Código

Civil de 1916, não havendo, portanto, como imigrar para o art. 230 ab-rogado, a

partir da ressalva extraída do artigo 2.039 do atual Código Civil, quando diz que

os regimes anteriores continuarão sendo respeitados e regulados pelos princípios

170 Art. 6°. A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito

adquirido e a coisa julgada. - § 1° Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.

171 PACHECO, José da Silva. Ligeiras anotações de direito intertemporal relativas ao novo código civil. Rio de Janeiro: Revista da Academia Brasileira de Letras Jurídicas. N. 21. 1º semestre de 2002. p. 66.

172 MADALENO, Rolf. Do regime de bens entre os cônjuges. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha; DIAS, Maria Berenice (Coord.). Direito de família e o novo código civil. Belo Horizonte: Ed. Del Rey, 2004. p. 204.

173 MADALENO, Rolf. Do regime de bens entre os cônjuges. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha; DIAS, Maria Berenice (Coord.). Direito de família e o novo código civil. p. 204.

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da legislação passada, mas nada impede que possam ser modificados pela

legislação presente.

Partilha deste entendimento Oliveira174, aduzindo que:

A alteração se admite para todos os casos de regime de bens, não importando a data da celebração do casamento, antes a abrangência do permissivo legal e porque exigível pedido de ambos os cônjuges, sem que afetado o ato jurídico perfeito, entre a continuidade de seus efeitos, de trato tipicamente sucessivo. Não se aplica à espécie o disposto no artigo 2.039 do Código Civil, por restringir-se-á incidência do direito anterior na estrutura dos regimes de bens de casamentos celebrados na sua vigência, considerada a hipótese de permanência do regime escolhido, mas sem vedação da regra geral de sua alterabilidade. Torna-se impositivo interpretar a referida norma legal dentro do princípio igualitário, sem diferenciação de casamentos por sua data e tendo em vista a ampla possibilidade de mudança do regime de bens na entidade familiar formada pela união estável. Ademais, a exegese dos dispositivos legais em confronto deve ser feita à luz do fim social da norma jurídica, propiciando, no caso, atendimento equânime aos interesses das pessoas casadas na preservação da unidade familiar pelo regime de bens que lhes seja de efetivo interesse e utilidade.

É nesse sentido o ensinamento ditado por Régis175, aduz

que as disposições gerais sobre regimes de bens previstas nos arts. 1.639 a

1.657 seriam aplicáveis a todos os casos, inclusive para os casamentos

celebrados anteriormente a 11 de janeiro de 2003. Alegando que o art. 2.039

parece referir-se a regras específicas de cada regime, e não às disposições

gerais comuns a todos os regimes. As disposições constantes dos arts. 1.639 a

1.657 são distintas e independentes daquelas que compõem os regimes de bens

propriamente ditos. Integram o chamado regime matrimonial primário e

prescrevem os princípios aplicáveis à sociedade conjugal, do ponto de vista dos

174 OLIVEIRA, Euclides de. Novo código civil: questões controvertidas. Série grandes temas de

direito privado. Coord. DELGADO, Mário Luiz e ALVES, Jones Figueiredo. São Paulo: Método, 2003. p. 404.

175 RÉGIS, Mário Luiz Delgado. Problemas de direito intertemporal no código civil: doutrina & jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 131-132.

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seus interesses patrimoniais. Disciplinam, no âmbito da sociedade conjugal, a

propriedade, a administração, o gozo e a disponibilidade dos bens e obrigações

que os cônjuges podem ou não assumir, qualquer que seja o regime de bens.

Concluindo assim, que a norma transitória do art. 2.039 não poderia estar se

referindo senão aos arts. 1.658 a 1688 do atual Código Civil, excluindo do seu

campo de incidência as chamadas disposições gerais previstas no arts. 1.639 a

1.657 do atual Código Civil, por esta razão, essas regras são aplicáveis até

mesmo aos casamentos celebrados antes de 11 de janeiro de 2003.

Ademais a atual disposição sobre a mutabilidade do regime

de bens trata de norma cogente, editada na esteira da evolução da própria vida

social, assim como em 1977 o divórcio foi promulgado com o mesmo propósito e

ninguém poderia afirmar que a dissolução da sociedade conjugal só estaria ao

alcance daqueles que cassassem após a vigência da lei divorcista, pois se fosse

essa a vontade do legislador, certamente teria formulado expressamente a

ressalva.176

Importante ressaltar que até os doutrinadores que se

posicionam no sentido da impossibilidade dessa aplicação retroativa, entendem

ser admissível, excepcionalmente, a alteração do regime de bens para os

casamentos contraídos na vigência do Código Civil de 1916. Nesse sentido aduz

Diniz177:

Nada obsta a que se aplique o artigo 1.639, § 2°, do novo Código Civil, excepcionalmente, se o magistrado assim entender, aplicando o art. 5° da Lei de Introdução ao Código Civil, para sanar lacuna axiológica que, provavelmente, se instaura por gerar uma situação em que se teria a não correspondência da norma do Código Civil de 1916 com os valores vigentes na sociedade, acarretando injustiça.

Sendo assim, constata-se que se a intenção do legislador

fosse na vedação do direito a mutabilidade do regime de bens para os

176 MADALENO, Rolf. Do regime de bens entre os cônjuges. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha;

DIAS, Maria Berenice (Coord.). Direito de família e o novo código civil. p. 205. 177 DINIZ, Maria Helena. Comentários ao código civil. v. 22. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 320.

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casamentos celebrados antes de 11 de janeiro de 2003, o teria feito de modo

expresso, o que não fez. A ressalva do artigo 2.039, é, tão-somente, a aplicação

das regras anteriores para os casamentos contraídos na sua vigência, supondo

que permaneça o regime, caso não alterado.

Válidas as ponderações de Santos178:

Penso, no entanto, que esse dispositivo, constante nas Disposições Finais e Transitórias, não tem o significado que lhe está sendo emprestado. Ao dispor que “o regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior (...) é o por ele estabelecido”, claramente objetiva a regra resguardar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito. Isso porque ocorreram diversas modificações nas regras próprias de cada um dos regimes de bens normatizados no Código de 2002 em relação aos mesmos regimes no Código de 1916.

O referido autor traz como exemplo no caso do regime da

separação de bens, que não há mais necessidade de autorização do cônjuge

para a prática dos atos enumerados no artigo 1.647; bem como no regime da

comunhão universal, não estão mais excluídos da comunhão os bens antes

relacionados nos incisos IV, V, VI, X e XII do artigo 263 do CC/16; e no regime da

comunhão parcial, não mais se excluem os bens relacionados no inciso III do

artigo 269 do CC/16, contudo os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge

não se comunicam mais (inc. VI do art. 1.659), expressamente excluídos antes

pelo inciso VI do art. 271, sob a denominação de “frutos civis do trabalho, ou

indústria de cada cônjuge, ou de ambos”. Verifica-se que alterações houve na

estruturação interna de cada um dos regimes de bens e, não fosse a regra do

artigo 2.039, a incidência das novas regras sobre os casamentos anteriormente

realizados caracterizaria ofensa ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito, uma

vez que operaria alteração “ex lege”, independentemente da vontade das partes,

no regime antes escolhido, expressa ou tacitamente, pelo casal. Observa-se que,

em decorrência, os casamentos pré-existentes ao novo Código, regem-se pelas

178 SANTOS, Luis Felipe Brasil. A mutabilidade dos regimes de bens. Disponível em: <

http://www.migalhas.com.br/mostra_noticia_articuladas.aspx?cod=2295>. Acesso em 18 de outubro de 2006.

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normas do respectivo regime de bens conforme regrado na lei vigente à época da

celebração.

Não obstante essas doutrinas, há decisões judiciárias nesse

sentido, a exemplo da citada por Manfré179, o Juiz Luís Francisco Aguilar Cortez,

da 1ª Vara da Família e das Sucessões Central de São Paulo, autorizou essa

modificação (processo n. 03.013779-9), considerando, em síntese, a partir das

redações dos arts. 6°, § 1°, da Lei de Introdução ao Código Civil e 2.035 do

Código Civil, que, para o diploma ora vigente, ato já consumado é aquele cujos

efeitos se exauriram sob vigência da lei antiga. Quando esses efeitos se protejam

sob vigência da lei posterior, o ato jurídico se sujeita à nova disciplina, pois não se

trata de ato jurídico perfeito, não se tem ato jurídico consumado.

Assim, concluiu possível a aplicação da lei atual, aliás, em

tese aperfeiçoada ou mais adaptada à situação hoje existente, evitando-se que

situações novas permaneçam disciplinadas por lei antiga e estejam sujeitas às

conqüentes distorções.

Manfré180 destacou também a sentença do Juiz João Batista

Silvério da Silva, da 12ª Vara da Família e das Sucessões Central de São Paulo,

em sentença relativa ao processo 000.03.026973-3, deferiu pedido de alteração

de regime relativo a casamento celebrado na vigência do Código Civil de 1.916,

considerando, entre mais, o seguinte: como as normas jurídicas a respeito de

regime de bens, estes a consubstanciar relações meramente patrimoniais, não

são de ordem pública, somente a excepcionalidade justificaria a intervenção do

Estado; o art. 2.039 não encerra proibição à retroatividade e nem tampouco

expressa serem irrevogáveis os regimes relativos aos enlaces anteriores, como

seria necessário para a não-aplicação em pauta; esse dispositivo, como no caso

do regime dotal, extinto, assegura seja respeitada a escolha feita na vigência do

diploma precedente; direitos de terceiros não são impedientes a essa aplicação,

posto por lei ressalvados; e não pode existir desigualdade de tratamento entre as

pessoas que se casaram antes e após 11 de janeiro de 2003.

179 MANFRÉ, José Antonio Encinas. Regime matrimonial de bens no novo código civil. p. 191 180 MANFRÉ, José Antonio Encinas. Regime matrimonial de bens no novo código civil. p. 192.

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Frente ao exposto, constata-se que presentes os requisitos

legais que informam a justa pretensão da alteração do regime de bens, a recusa

de aplicação do artigo 1.639, § 2°, do Código Civil aos casamentos contraídos na

constância do Código Civil de 1916, considerar-se-á uma afronta ao princípio da

isonomia no tratamento jurídico dispensável a pessoas que se encontrem em

idêntica situação de casadas. Para assegurar a observância desse princípio, faz-

se imprescindível a aplicação desse artigo aos casamentos realizados a qualquer

tempo, sem distinção.

Por fim, ante todas as razões descritas, pode-se admitir a

aplicação retroativa, pois não há, nem pode haver, óbice para a alteração do

regime de bens para casamentos contraídos na vigência do Código Civil de 1916,

quando do interesse do casal e desde que atendidas as exigências estipuladas no

art. 1.639, § 2º, e não se evidenciar, nos autos, prejuízo a qualquer das partes e a

terceiro.

3.6 A MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS E A JURISPRUDÊNCIA

Somente a título ilustrativo serão apresentados alguns

entendimentos da jurisprudência, a qual tem-se manifestado no sentido da plena

incidência do artigo 1.639, § 2°, os tribunais brasileiros manifestam-se acerca da

aplicação da norma legal da alteração do regime de bens aos casamentos

celebrados sob a égide do Código Civil de 1916.

Do Superior Tribunal de Justiça colhe-se o acórdão proferido

pelo Relator Ministro Jorge Scartezzini no Recurso Especial n° 730.546 – MG

(2005/0036263-0), na data de 23 de agosto de 2005, no qual se decidiu que:

CIVIL - REGIME MATRIMONIAL DE BENS – ALTERAÇÃO JUDICIAL - CASAMENTO OCORRIDO SOB A ÉGIDE DO CC/1916 (LEI Nº 3.071) - POSSIBILIDADE - ART. 2.039 DO CC/2002 (LEI Nº 10.406) – CORRENTES DOUTRINÁRIAS - ART.

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1.639, § 2º, C/C ART. 2.035 DO CC/2002 – NORMA GERAL DE APLICAÇÃO IMEDIATA.181

O Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina segue o

mesmo entendimento. Para o nosso tribunal, a alteração do regime de bens

também é possível para casamentos realizados antes de 11 de janeiro de 2003:

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESTABELECIMENTO DE SOCIEDADE CONJUGAL CUMULADA COM MUDANÇA DE REGIME DE BENS – CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 – POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO –RECURSO PROVIDO. A regra estabelecida pelo art. 2.039 do novo Código Civil não impede a mudança do regime de bens para casamentos celebrados sob a égide do Código Civil de 1916. O regime de bens dos casamentos contraídos pela antiga lei é o por ele estabelecido, mas somente enquanto não se aplicar a regra geral do art. 1.639, § 2.º, ou seja, enquanto não optarem os cônjuges pela sua alteração, até porque, o art. 2.039 não estabelece que o regime do casamento contraído na vigência do código revogado é imutável ou irrevogável.182

No Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul tem-se

decidido no mesmo sentido:

APELAÇÃO. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. VIABILIDADE. Viável a alteração do regime de bens dos casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916. Precedentes jurisprudenciais. Preenchidas as condições para, no caso concreto, permitir aos apelantes que alterem o regime de bens pelo qual casaram. DERAM PROVIMENTO.183

181 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 730.546. TJMG. Rel. Min. Jorge Scartezzini. 23. ago. 2005. 182 FLORIANÓPOLIS. Tribunal de Justiça de SC. Apelação Cível n° 2005.006289-2, de Lages.

Relator Desembargador Mazoni Ferreira, julgado em 07.07.2005. Publicação DJSC n. 11.726, edição de 04.08.2005, p. 38.

183 PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Apelação Cível Nº 70012999900, Oitava Câmara Cível, Relator Desembargador Rui Portanova, julgado em 05/10/2006.

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REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. REQUISITOS. CASAMENTO CELEBRADO SOB A ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE PARTILHA DOS BENS COMUNS. O art. 2.039 não impede a mudança do regime de bens para casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916 desde que preenchidos os requisitos legais e feita a partilha dos bens comuns existentes. DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME.184

REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. A possibilidade de alteração do regime matrimonial de bens conferida aos cônjuges pelo Código Civil não afronta o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Houve uma otimização do princípio da autonomia da vontade do casal, consagrado no princípio da livre estipulação do pacto (art. 1.639 do Código Civil), de forma que se revela descabido afastar tal ampliação de direitos dos casamentos celebrados sob a égide do antigo estatuto civil. Apelo provido. (SEGREDO DE JUSTIÇA)185

Assim, finalizando a presente pesquisa, observa-se que

tanto a doutrina quanto a jurisprudência, especialmente das ementas acima

citadas, têm entendido que o pedido de alteração do regime de bens para os

casamentos contraídos na vigência do Código Civil de 1916, é juridicamente

possível, pois o artigo 2.039 inserido nas Disposições Finais e Transitórias do

Código Civil em vigor, não impede a modificação.

184 PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Apelação Cível n° 70011766243. Sétima Câmara

Cível. Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, julgado em 17.07.2005.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente monografia buscou analisar a Possibilidade de

Alteração do Regime de Bens no Casamento Brasileiro, com o propósito geral de

se verificar quais são os requisitos necessários e o procedimento a ser adotado

para a efetiva alteração do regime de bens, bem como seus efeitos, cuja pesquisa

também abordou a real possibilidade de alteração do regime de bens aos

casamentos contraídos sob a vigência do Código Civil de 1916, com especial

enfoque na legislação doutrina e jurisprudência brasileiras.

Através dos estudos realizados no primeiro capítulo, deu-se

enfoque principal à evolução histórica do Casamento no Brasil, passando pelos

períodos colonial e imperial, em cujos períodos as regras, em matéria de união

conjugal, eram todas ditadas pela Igreja e também pelo período Republicano,

uma vez que com o advento da Proclamação da República, ocorreu a separação

entre o Estado e a Igreja, instituindo-se o Casamento Civil e tornando-o

obrigatório, para sua validade perante a legislação brasileira.

Com relação à natureza jurídica do Casamento foram

abordadas as três correntes que discutem o assunto, quais sejam: a

institucionalista, que considera o Casamento como uma instituição de direito

público, tendo em conta que para validade do ato é obrigatória a intervenção do

Estado; a contratualista, a qual entende que o Casamento é estabelecido através

do acordo de vontade entre os cônjuges e a eclética ou mista, que considera o

Casamento como um ato complexo, ou seja, um contrato de ordem privada,

quando da sua formação e institucional, no seu conteúdo.

Destacaram-se, também, os conceitos do Casamento, desde

as fontes romanas, através de Modestino e Ulpiano, até as mais recentes, que

muito embora não resultem da unanimidade, entendem o Casamento como um

ato solene, que tem por fim promover a união de duas pessoas, de sexo diferente,

185 PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Apelação Cível n° 70011082997. Sétima Câmara

Cível. Relator: Maria Berenice Dias, julgado em 01.06.2005. 188 Autonomia da vontade e os regimes matrimoniais de bens, p. 214.

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que se unem, em conformidade com a lei, para estreita comunhão de vida.

No tocante as características do Casamento, destacaram-se

aquelas utilizadas pela doutrina, tais como: solenidade, liberdade de escolha dos

nubentes diversidade de sexos, dissolubilidade, legislação matrimonial de ordem

pública, união permanente e exclusiva.

Com relação as finalidades do Casamento, no Direito

Brasileiro, verificou-se que variam conforme a visão filosófica, sociológica, jurídica

ou religiosa.

Quanto aos efeitos jurídicos do Casamento, observou-se que

encontram-se divididos em três espécies: sociais, aqueles que alcançam toda a

Sociedade, razão de sua grande relevância no contexto social; pessoais, aqueles

que dizem respeito diretamente aos direitos e deveres dos cônjuges, no exercício

da Sociedade Conjugal e patrimonial, aqueles que decorrem das questões

econômicas que envolvem os cônjuges, cujas normas disciplinadoras destes

efeitos, estão contidas no regime de bens escolhido pelos cônjuges.

No Capítulo 2, realizou-se um estudo sobre os regimes

matrimoniais de bens no Direito Brasileiro, sendo os seus princípios norteadores o

da Variedade do Regimes de Bens, possibilitando aos nubentes a escolha por um

dos quatro tipos de regimes existentes no Código Civil; o da Liberdade dos Pactos

Antenupciais, onde os nubentes podem, antes da celebração do casamento,

estipular sobre seus bens da forma que acharem mais conveniente e por fim

abordou-se brevemente a respeito do Princípio da Mutabilidade Justificada do

Regime de Bens, por ser o objeto de estudo do terceiro capítulo da presente

pesquisa.

No tocante ao pacto antenupcial e seus requisitos,

constatou-se que é um ato pelo qual os nubentes organizam suas relações

patrimoniais e com terceiros.

E finalizando, destacaram-se todos os regimes de bens

existentes na atual legislação brasileira em tópicos separados, o regime da

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comunhão universal de bens, o regime da comunhão parcial de bens, o regime da

separação de bens, o regime de participação final nos aqüestos.

O Capítulo 3, a abordagem foi dedicada a Mutabilidade do

Regime de Bens no Direito Brasileiro, observando-se os aspectos gerais e a sua

evolução no ordenamento jurídico brasileiro, bem como os requisitos necessários

para procedência da alteração. Verificou-se também, da possibilidade de

alteração do regime de bens para casamentos contraídos na vigência do Código

Civil de 1916.

Finalizando-se o capítulo, destacou-se a título ilustrativo

como a jurisprudência tem-se manifestado a respeito do tema, através das

decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça, Tribunal de Justiça de

Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Retomam-se, portanto, as hipóteses levantadas, quais

sejam:

O Código Civil de 2002 modificou as disposições relativas a

imutabilidade dos regimes de bens, possibilitando a sua alteração mesmo que o

casamento tenha se realizado sob a égide do Código Civil de 1916;

Os efeitos da sentença que altera do regime de bens podem

ser ex tunc ou ex nunc, contudo deverá constar expressamente do pedido;

O pedido de alteração do regime de bens adotado deve,

sem exceções, ser formulado por ambos os cônjuges e é possível em qualquer

tipo de regime.

Verificou-se que a primeira hipótese foi confirmada, uma vez

que o artigo 2.039 inserido nas Disposições Finais e Transitórias do Código Civil

em vigor, não impede a alteração do regime dos bens nos casamentos

celebrados na vigência do Código Civil de 1916. Pois a ordem emanada deste

dispositivo tem por principal objetivo resguardar o direito adquirido e o ato jurídico

perfeito. O que se pretende é assegurar aos cônjuges a aplicação do regime por

eles escolhidos por ocasião do casamento. Ressalta-se que a mutabilidade do

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regime de bens em nada afronta os direitos que se pretende assegurar pelo art.

2.039 do Código Civil em vigor, mormente se considerada a consensualidade do

pedido e o amparo a direitos de terceiros. Muito pelo contrário, em verdade,

houve uma otimização do princípio da autonomia da vontade do casal,

consagrado no princípio da livre estipulação do pacto, de forma que se revela

descabido afastar tal ampliação de direitos aos casamentos celebrados sob a

égide do Código Civil revogado.

A segunda hipótese também restou confirmada, visto que o

atual Código Civil expressamente não dispõe quais são os efeitos da sentença

que altera o regime de bens, a doutrina e a jurisprudência têm-se consolidado no

sentido de que os efeitos da mudança de regime de bens poderá ter efeitos “ex

tunc” ou ”ex nunc” onde em relação aos cônjuges a produção do efeito “ex nunc”

dependerá do pedido expresso nessa conformidade, caso contrário, os efeitos

serão “ex tunc”, e em qualquer dessas hipóteses, haverá ressalva de direito de

terceiros, como impõe o art. 1.639, § 2°.

E por fim, a terceira hipótese também restou confirmada, pois

realmente a mudança judicial do regime de bens não comporta via unilateral,

contenciosa, eis que a lei exige que o pedido seja formulado por ambos os

cônjuges e a alteração refletirá o desejo mútuo. Sendo possível em qualquer tipo

de regime, até mesmo nos casos da separação de bens obrigatória, conforme as

três espécies previstas no art. 1.641 do Código Civil, desde que as pessoas

casadas com os impedimentos descritos no artigo 1.523, do Código Civil,

demonstrem a inexistência dos prejuízos que tais impedimentos poderiam

ocasionar, ocorrida após o casamento. No caso dos que dependeram de

suprimento judicial para casar, decorrido algum tempo da conivência conjugal,

havendo estabilidade familiar, também poderão requerer a modificação do regime,

todavia neste caso faz-se necessária uma análise, com interveniência de

Assistente Social, a fim de se configurar a estabilidade do relacionamento do

casal.

A presente pesquisa, não se esgota com a realização deste

trabalho, porém, com toda certeza, serviu de estímulo para futuros estudos sobre

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o tema e também para aplicação no exercício da profissão após a conclusão do

curso de direito.

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PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Apelação Cível Nº 70012999900,

Oitava Câmara Cível, Relator Desembargador Rui Portanova, julgado em

05/10/2006.

PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Apelação Cível n° 70011766243.

Sétima Câmara Cível. Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, julgado em 17.07.2005.

PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Apelação Cível n° 70011082997.

Sétima Câmara Cível. Relator: Maria Berenice Dias, julgado em 01.06.2005.

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ANEXOS

Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 730.546 - MG (2005/0036263-0)

RELATOR : MINISTRO JORGE SCARTEZZINI

RECORRENTE : P V B B A E CÔNJUGE

ADVOGADO : LINDA MIRTES MALUF AFONSO E OUTROS

EMENTA

CIVIL - REGIME MATRIMONIAL DE BENS - ALTERAÇÃO

JUDICIAL - CASAMENTO OCORRIDO SOB A ÉGIDE DO CC/1916 (LEI Nº 3.071)

- POSSIBILIDADE - ART. 2.039 DO CC/2002 (LEI Nº 10.406) - CORRENTES

DOUTRINÁRIAS - ART. 1.639, § 2º, C/C ART. 2.035 DO CC/2002 - NORMA

GERAL DE APLICAÇÃO IMEDIATA.

1 - Apresenta-se razoável, in casu, não considerar o art. 2.039 do CC/2002 como

óbice à aplicação de norma geral, constante do art. 1.639, § 2º, do CC/2002, concernente à

alteração incidental de regime de bens nos casamentos ocorridos sob a égide do CC/1916, desde

que ressalvados os direitos de terceiros e apuradas as razões invocadas pelos cônjuges para tal

pedido, não havendo que se falar em retroatividade legal, vedada nos termos do art. 5º, XXXVI,

da CF/88, mas, ao revés, nos termos do art. 2.035 do CC/2002, em aplicação de norma geral com

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efeitos imediatos.

2 - Recurso conhecido e provido pela alínea "a" para, admitindo-se a possibilidade

de alteração do regime de bens adotado por ocasião de matrimônio realizado sob o pálio do

CC/1916, determinar o retorno dos autos às instâncias ordinárias a fim de que procedam à análise

do pedido, nos termos do art. 1.639, § 2º, do CC/2002.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta

Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a

seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa parte, lhe dar provimento, nos

termos do voto do Sr. Ministro Relator, com quem votaram de acordo os Srs. Ministros

BARROS MONTEIRO, CÉSAR ASFOR ROCHA, FERNANDO GONÇALVES e ALDIR

PASSARINHO JÚNIOR.

Brasília, DF, 23 de agosto de 2005(data do julgamento).

MINISTRO JORGE SCARTEZZINI , Relator

Documento: 1855343 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 03/10/2005 Página 1 de 1

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Acórdão: Apelação Cível n. 2005.006289-2, de Lages.

Relator: Des. Mazoni Ferreira.

Data da decisão: 07.07.2005.

Publicação: DJSC n. 11.726, edição de 04.08.2005, p. 38.

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESTABELECIMENTO DE

SOCIEDADE CONJUGAL CUMULADA COM MUDANÇA DE REGIME DE BENS

– CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 –

POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO – RECURSO PROVIDO.

A regra estabelecida pelo art. 2.039 do novo Código Civil não impede a mudança

do regime de bens para casamentos celebrados sob a égide do Código Civil de

1916. O regime de bens dos casamentos contraídos pela antiga lei é o por ele

estabelecido, mas somente enquanto não se aplicar a regra geral do art. 1.639, §

2.º, ou seja, enquanto não optarem os cônjuges pela sua alteração, até porque, o

art. 2.039 não estabelece que o regime do casamento contraído na vigência do

código revogado é imutável ou irrevogável.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2005.006289-2, da

comarca de Lages, em que são apelantes W. B. de S. e S. A. B. de S.:

ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Civil, por decisão unânime, dar

provimento ao recurso.

Custas na forma da lei.

W. B. de S. e S. A. B. de S.. ajuizaram, em 27-10-04, ação de restabelecimento

de sociedade conjugal cumulada com mudança de regime de bens, alegando, em

suma, que estavam separados judicialmente desde o dia 19-5-97 e voltaram a ter

uma convivência de fato e por isso resolveram restabelecer a sociedade conjugal.

Requereram o restabelecimento da sociedade conjugal e a alteração do regime

de bens para o da comunhão parcial.

À inicial foram acostados os documentos de fls. 5 a 9.

O Dr. Promotor de Justiça opinou pela procedência do pedido.

Sentenciando o feito, o MM. Juiz de Direito julgou parcialmente procedente o

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85

pedido para homologar o pedido de reconciliação do casal, declarando

restabelecida a sociedade conjugal em que fora anteriormente constituída pelo

casamento e indeferiu o pedido de alteração de regime de bens na forma

pretendida.

Irresignados com a decisão proferida, os autores apelaram tempestivamente,

sustentando em suas razões recursais que o pedido formulado foi devidamente

motivado, preenchendo pois os requisitos exigidos em lei para a sua concessão.

Alegam ainda que não restam motivos para que os cônjuges não possam se valer

da prerrogativa de invocar a retroatividade da lei, haja vista que a medida não irá

prejudicar direito de terceiros. Ao final, pugnam pela reforma da decisão

hostilizada a fim de que seja modificado o regime de bens dos apelantes de

comunhão universal para comunhão parcial.

O representante do Ministério Público, com espeque no ato PGJ/CGMP/n.

0178/2001, deixou de manifestar-se (fls. 27 a 30).

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Dr. Jobél

Braga de Araújo, manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso.

É o relatório.

O recurso é conhecido porque próprio e tempestivo.

O atual Código Civil ao disciplinar o direito patrimonial no casamento, alterou

profundamente determinadas regras, ao dispor no art. 1.639, § 2º a possibilidade

de “alteração do regime de bens, no curso do casamento, mediante autorização

judicial, em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das

razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.”

Apesar da matéria em apreço gerar polêmica e debates acalourados na doutrina,

aos poucos, vem se firmando o entendimento nos tribunais pátrios de que o art.

2.039 inserido nas Disposições Finais e Transitórias do Código Civil em vigor, não

impede a alteração do regime dos bens nos casamentos celebrados na vigência

do Código Civil de 1916.

Comentando o novel dispositivo, o doutrinador Rolf Madaleno ressalta:

“Entre os dispositivos mais polêmicos do texto aprovado, figura o artigo 1639 com

seus §§ 1º e 2º, insertos no capítulo das disposições gerais. Especialmente no

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respeitante ao seu § 2º, que regulamenta a possibilidade de alteração do regime

de bens no curso do casamento.

O caput desse artigo 1639 é reprodução literal do artigo 256 do CC, enquanto o

seu § 1º reproduz parcialmente o artigo 230. Parcialmente, porque o regime de

bens sempre foi irrevogável depois de celebradas as justas núpcias e isto vem

inquestionavelmente assentado no artigo 230 do CC, em sua parte final, e não é

reproduzido no artigo 1639. Exatamente porque o legislador permitiu a

modificação do regime matrimonial em pleno casamento, sempre mediante

autorização judicial motivada por ambos os cônjuges, ressalvado os direitos de

terceiros.

A imutabilidade do regime de bens prescrita pelo Código Civil (artigo 230) sempre

teve em mira as eventuais influências e solicitações. Escreve Caio Mário da Silva

Pereira, que na constância do casamento poderiam conduzir um dos consortes a

alterar o regime econômico do matrimônio, com grave risco para os próprios

créditos e provável prejuízo para terceiros. Eventuais credores que tinham na

meação de uma comunhão universal, ou mesmo na partilha apenas dos aqüestos

(no regime da comunhão parcial), a expectativa de recebimento do seu crédito,

podem ver frustrada a quitação de seus haveres pela maliciosa migração dos

cônjuges para o regime da completa separação de bens. Silvio Salvo Venosa

enfatiza ter sido erigido o princípio da imutabilidade do regime de bens como

garantia aos próprios cônjuges e para resguardo do direito de terceiros. Ressalva

apenas que a irrevogabilidade do regime tendia, em regra, a proteger a mulher

casada, pois noutra esfera cultural brasileira ela era tida como dotada de menor

experiência no trato das riquezas econômicas do casamento, quase sempre

administradas pelo marido.

Por certo convencido pela argumentação jurídica defendida principalmente por

Orlando Gomes, com o advento do Novo Código Civil o legislador brasileiro

abandonou o princípio da imutabilidade do regime de bens. Já em 1984

questionava o saudoso jurista baiano as razões que ainda justificavam manter a

imutabilidade do regime patrimonial, quando a própria lei punha a escolha dos

nubentes diversos regimes matrimoniais e não impedia que mesclassem

disposições próprias de cada um dos regimes. Aconselhava apenas que fossem

adotadas as devidas cautelas, subordinando a mudança do regime à autorização

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judicial, por requerimento de ambos os cônjuges, os quais deveriam justificar a

pretensão, e verificando o juiz a plausibilidade do deferimento, e cuidando para

terceiros não serem prejudicados, ressalvando essa hipótese em qualquer caso,

com ampla publicidade da sentença, a qual deveria ser transcrita no registro

próprio” (in Direito de Família e o Novo Código Civil, coord. Maria Berenice Dias et

al, Del Rey, p. 159 e160).

No caso sub examen verifica-se que embora o casamento tenha sido celebrado

sob a égide do Código Civil de 1916, é perfeitamente possível a alteração do

regime de bens conforme interpretação sistemática dos artigos 2.039 e 1.639, § 2º

do Código Civil em vigor, que assim prescrevem respectivamente:

O regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil

anterior, Lei 3.071, de 1º de janeiro de 1916, é o por ele estabelecido.

É admissível a alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em

pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões

invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.

Embora a leitura conjunta e açodada dos dispositivos supracitados possa

aparentar a existência de conflito entre ambos, tal conclusão não pode

preponderar.

A ordem emanada do primeiro dispositivo acima transcrito tem por principal

objetivo resguardar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito, ou seja, a

segurança das relações jurídicas, em face das alterações promovidas pelo Código

Civil relativamente ao regramento específico de cada regime de bens. Logo, o que

se pretende assegurar aos consortes é a aplicação do regime por eles escolhidos

por ocasião da celebração do casamento, nos exatos termos da lei em vigor na

ocasião.

No entanto, como já referido, o art. 1.639, § 2º, do novo diploma civil estabeleceu

novidade no ordenamento jurídico, pois, diversamente da imutabilidade do regime

de bens prevista no Código Civil de 1916, possibilita aos cônjuges a alteração

desse pacto, mediante autorização judicial e pedido motivado de ambos os

consortes, com o resguardo de eventuais direitos de terceiros.

Ressalta-se, que essa faculdade conferida aos cônjuges em nada afronta os

direitos que se pretende assegurar pelo art. 2.039 do Código Civil em vigor,

mormente se considerada a consensualidade do pedido e o amparo a direitos de

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terceiros. Muito pelo contrário, em verdade, houve uma otimização do princípio da

autonomia da vontade do casal, consagrado no princípio da livre estipulação do

pacto (art. 1.639 do Código Civil), de forma que se revela descabido afastar tal

ampliação de direitos dos casamentos celebrados sob a égide do Código Civil

revogado.

Outrossim, cumpre observar a dinâmica da vida moderna que, muitas vezes, vem

a interferir nas relações patrimoniais dos consortes, fazendo com que o

regramento escolhido não mais atenda aos anseios do par.

Ademais, estando as partes envolvidas de acordo entre si e com o ordenamento

jurídico atual, não existe razão para negar seguimento ao pedido.

Raciocínio contrário traria uma situação curiosa: ao não permitirmos a mudança

do regime sob o argumento de impossibilidade jurídica, os cônjuges poderiam

adotar a saída de divorciarem-se (preenchidos os requisitos) para, casando

novamente, mudar o regime que a atual lei permite para os laços posteriores ao

CC/02.

A interpretação não pode levar a incoerências lógicas.

Acerca do tema, com muita propriedade, a Desembargadora gaúcha, Maria

Berenice Dias, leciona:

“A faculdade de alteração do regime foi introduzida no atual Código Civil, que

entrou em vigor em 11 de janeiro de 2003. Tem sido amplamente debatido se tal

direito pode ser buscado por quem casou sob a égide da legislação pretérita, que

vedava a mudança do regime matrimonial adotado quando do casamento. O

debate ganha mais significado, em face do que dizem as disposições finais e

transitórias (2.039): o regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do

código Civil anterior é o por ele estabelecido. Ainda assim, é mister reconhecer

que não existe qualquer restrição legal à mudança, independente da época em

que foi celebrado o matrimônio. É imposto respeito ao regime de bens, e não à

sua imodificabilidade. Não há que se falar em direito adquirido para a restrição de

direito. Conseqüentemente, se a lei concede um benefício mais amplo, não há por

que limitar a liberdade de buscar sua concessão. Cabe ser invocado o princípio

da lei mais benéfica. Ao depois, a norma que instituiu a possibilidade de alteração

não faz qualquer ressalva quanto à data de celebração do casamento. Portanto, o

Código Civil de 1916 segue regulando os matrimônios celebrados ao seu tempo,

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sem haver qualquer impedimento à alteração do regime matrimonial.” (in Manual

de Direito das Famílias, 1ª ed., Livraria do Advogado: Porto Alegre, 2005, págs.

217/218).

Corroborando esse entendimento, traz-se à colação artigo do professor de Direito

Civil na Universidade Federal da Bahia e Juiz de Direito no mesmo Estado, Dr.

Pablo Stolze Gagliano:

“Subvertendo o tradicional princípio da imutabilidade do regime de bens, o Código

de 2002, em seu art. 1639, § 2°, admite a alteração do regime, no curso do

casamento, mediante autorização judicial, em pedido motivado de ambos os

cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas, e ressalvados os direitos

de terceiros.

Não cabendo aqui a análise pormenorizada deste dispositivo, ressaltamos apenas

que tal pleito deverá ser formulado no bojo de procedimento de jurisdição

graciosa, com a necessária intervenção do Ministério Público, a fim de que o juiz

da Vara de Família avalie a conveniência e a razoabilidade da mudança, que se

efetivará mediante a concessão de alvará de autorização, seguindo-se a

necessária expedição de mandado de averbação.

Entretanto, feitas tais ponderações, uma indagação se impõe: terão direito à

alteração de regime as pessoas casadas antes do Código de 2002?

Essa indagação reveste-se ainda de maior importância, quando consideramos o

princípio da irretroatividade das leis, e, sobretudo, o fato de o próprio Código Novo

estabelecer, em seu art. 2.039, que: “o regime de bens nos casamentos

celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei n. 3.071, de 1° Janeiro de

1916, é por ele estabelecido”. (grifos nossos)

Uma primeira interpretação conduz-nos à conclusão de que os matrimônios

contraídos na vigência do Código de 1916 não admitiriam a incidência da lei nova,

razão por que esses consortes não poderiam pleitear a modificação do regime.

Não concordamos, todavia, com este entendimento.

Em nossa opinião, o regime de bens consiste em uma instituição patrimonial de

eficácia continuada, gerando efeitos durante todo o tempo de subsistência da

sociedade conjugal, até a sua dissolução. Dessa forma, mesmo casados antes de

11 de janeiro de 2002 – data da entrada em vigor do Novo Código -, os cônjuges

poderiam pleitear a modificação do regime, eis que os seus efeitos jurídico-

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patrimoniais adentrariam a incidência do novo diploma, submetendo-se às suas

normas.

Raciocínio contrário coroaria a injustiça de admitir a modificação do regime de

bens de pessoas que se uniram matrimonialmente um dia após a vigência da lei,

negando-se o mesmo direito aos casais que hajam se unido um dia antes.” (artigo

entitulado “O Impacto do Novo Código Civil no Regime de Bens do Casamento”,

extraído do site http:

//www.juspodivm.com.br/novodireitocivil/Artigos/pablo/impacto_codcivil_bens_cas

amento.pdf). O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em recentes julgados,

decidiu:

“ALTERAÇÃO DE REGIME DE BENS DO CASAMENTO. POSSIBILIDADE

JURÍDICA DO PEDIDO. 1. A alteração do regime de bens é possível

juridicamente, consoante estabelece o art. 1.639, §2º, do NCCB e as razões

postas pelas partes evidenciam a conveniência para eles, constituindo o pedido

motivado de que trata a lei, devendo ser apreciado pela autoridade judicial. 2. A

alteração do regime de bens pode ser promovida a qualquer tempo, de regra com

efeito ex tunc, ressalvados direitos de terceiros, inexistindo qualquer obstáculo

legal à alteração de regime de bens de casamentos anteriores à vigência do

Código Civil de 2002. Inteligência do artigo 2.039, do NCCB. Recurso provido.

(TJRS – Apelação Cível n. 70011516366, Sétima Câmara Cível, rel. Des. Sérgio

Fernando de Vasconcellos Chaves, j. 1º-6-2005).

“REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. REQUISISTOS.

CASAMENTO CELEBRADO SOB A ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL DE 1916.

POSSIBILIDADE. A regra do art. 2039 do CC/02 não fere o ato jurídico perfeito.

Assim, mesmo diante do novo regramento trazido pelo atual código civil que

modificou as regras dos regimes de bens, existe a possibilidade jurídica de alterar

o regime de bens para matrimônios realizados sob a égide do CC/16. APELO

PROVIDO.” (TJRS – Apelação Cível n. 70010447043, Sétima Câmara Cível, rel.

Des. José Carlos Teixeira Giorgis, j. 30-3-2005).

“REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. CASAMENTO

CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. A possibilidade de

alteração do regime matrimonial de bens conferida aos cônjuges pelo Código Civil

não afronta o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Houve uma otimização do

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princípio da autonomia da vontade do casal, consagrado no princípio da livre

estipulação do pacto (art. 1.639 do Código Civil), de forma que se revela

descabido afastar tal ampliação de direitos dos casamentos celebrados sob a

égide do antigo estatuto civil. Apelo provido. (TJRS – Apelação Cível n.

70011082997, Sétima Câmara Cível, rela. Des. Maria Berenice Dias, j. 1-6-2005) .

No mesmo sentido já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo:

“CASAMENTO. Alteração do regime de bens. Da comunhão universal de bens

para o de separação. Admissível é a alteração do regime de bens de casamento

celebrado na regência do Código Civil de 1916, não obstante o disposto no artigo

2.039 do Código Civil de 2002, desde que atendidas as exigências estipuladas no

art. 1.639, § 2º, e não se evidenciar, nos autos, prejuízo a qualquer das partes e a

terceiro. Ação improcedente. Decisão que não se mantém. Recurso provido.”

(TJSP – AC 332.192-4/6-00 – 7ª C. D. Priv. – Rel. Des. Oswaldo Breviglieri – j. 28-

4-2004).

Destarte, estando o pedido dos apelantes em conformidade com os

entendimentos atuais da doutrina e jurisprudência, e não havendo prejuízo a

qualquer das partes e a terceiros, a reforma da sentença é medida que se impõe.

Isso posto, decide a Segunda Câmara de Direito Civil, por votação unânime, dar

provimento ao recurso.

Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Exmos. Srs. Des. Monteiro

Rocha e Jorge Schaefer Martins. Lavrou parecer, pela douta Procuradoria-Geral

de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Jobél Braga de Araújo.

Florianópolis, 7 de julho de 2005.

Mazoni Ferreira

PRESIDENTE E RELATOR

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APELAÇÃO. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. VIABILIDADE.

Viável a alteração do regime de bens dos casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916. Precedentes jurisprudenciais.

Preenchidas as condições para, no caso concreto, permitir aos apelantes que alterem o regime de bens pelo qual casaram. DERAM PROVIMENTO.

APELAÇÃO CÍVEL

OITAVA CÂMARA CÍVEL

Nº 70012999900

COMARCA DE NOVA PRATA

P.A.B. F.S.B. .

APELANTES; .J. . APELADA.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Cível

do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes

Senhores DES. LUIZ ARI AZAMBUJA RAMOS (PRESIDENTE) E DES. CLAUDIR FIDÉLIS FACCENDA.

Porto Alegre, 05 de outubro de 2006.

DES. RUI PORTANOVA, RELATOR.

R E L A T Ó R I O

DES. RUI PORTANOVA (RELATOR)

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PASCOAL e MARIA DE FÁTIMA interpõem apelação contra

sentença prolatada nos autos da ação de alteração de regime de bens movida

pelos apelantes.

A sentença julgou improcedente o pedido.

Os apelantes alegam que o fato dos bens ficarem com a cônjuge-

mulher não impede a alteração do regime de bens. Aduzem inexistir prejuízos a

terceiros.

O parecer do Ministério Público de primeiro grau foi pelo

improvimento. A Procuradoria de Justiça foi pela anulação da sentença.

Em sessão realizada em 22/12/2005, esta 8ª Câmara Cível

desconstituiu a sentença e reabriu a instrução.

Sobreveio nova sentença julgando improcedente a ação (fls. 78/81).

Em seu apelo, PASCOAL e MARIA DE FÁTIMA pedem a

procedência de seu pedido de alteração de regime de bens.

O Ministério Público, neste grau de jurisdição manifesta-se pelo

provimento do apelo.

É o relatório.

V O T O S

DES. RUI PORTANOVA (RELATOR)

Adoto como razões de decidir o bem lançado parecer da lavra do

Procurador de Justiça, Dr. Ricardo Moreira Lins Pastl, verbis:

No mérito, entende-se que as alegações recursais são fundadas, merecendo reforma a decisão monocrática, a

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fim de possibilitar a alteração do regime de bens pretendida. Com efeito, com a vênia da compreensão diversa, a regra do artigo 2.039 do Código Civil de 2002 não impede a alteração do regime dos casamentos mesmo quando celebrados ao abrigo da lei antiga, como no caso, desde que, nos termos do § 2º do artigo 1.639 daquele diploma, exista motivação para tanto e não haja possibilidade de redundar prejuízos a terceiros. O referido artigo 2.039 estabelece que a regulação do regime de bens dos casamentos celebrados anteriormente à vigência do novo Código deve se dar pelas regras do Código Civil de 1916, tendo por objetivo unicamente proteger os regimes estabelecidos em antigos matrimônios das alterações ocorridas nas regras próprias havidas no novo diploma civil, resguardando o direito adquirido e o ato jurídico perfeito. Tal conclusão, contudo, não se repete quanto à possibilidade de, na constância do casamento, vir a ser alterado o regime de bens originalmente estabelecido. Assim, aos casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916, a regra permite a transformação do regime de bens na constância da união, prevista no § 2º do artigo 1.639 do diploma civil de 2002, valendo nesse sentido ilustrar:

“APELAÇÃO CÍVEL. ALTERAÇÃO DE REGIME DE BENS DE CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO ANTERIOR CÓDIGO CIVIL. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. 1. A alteração do regime de bens está autorizada pelo o art. 1.639, § 2º, do atual CCB. 2. A alteração do regime de bens pode ser promovida a qualquer tempo, inexistindo obstáculo nos casos de casamentos anteriores à vigência do Código Civil de 2002. 3. Inteligência do artigo 2.039 do CCB e do Enunciado nº 260 da I JORNADA DE DIREITO CIVIL, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal. Recurso provido” (Apelação Cível nº 70012446126, Sétima Câmara Cível, TJRS, Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, 31/08/2005).

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“APELAÇÃO CÍVEL. CASAMENTO CELEBRADO SOB A VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS. POSSIBILIDADE. O art. 2.039 das Disposições Finais e Transitórias do Código Civil em vigor não impede a alteração do regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916. O regime de bens dos casamentos pela antiga lei é o por ele estabelecido, mas somente enquanto não se aplicar a regra geral do art. 1.639, § 2.º, CC/02, ou seja, enquanto não optarem os cônjuges pela sua alteração, até porque, o art. 2.039 não diz que o regime do casamento contraído pelo CC/16 é imutável ou irrevogável. Precedentes doutrinários e jurisprudenciais. Apelação do Ministério Público desprovida” (Apelação Cível nº 70011592110, 8ª Câmara Cível, TJRS, Rel. Des. José Ataídes Siqueira Trindade, 09/06/2005).

Ainda defendendo esse entendimento, vale referir o lúcido artigo do Des. Luiz Felipe Brasil Santos, publicado no SITE do Instituto Brasileiro de Direito de Família, e transcrito quando do julgamento da Apelação Cível nº 70006423891, da 7ª Câmara Cível desse Tribunal de Justiça, assim como a tradução esposada por este Órgão na Apelação Cível nº 70009817073. Afirmada a possibilidade de alteração do regime patrimonial de casamentos celebrados ao abrigo do Código Civil de 1916, vislumbra-se que, no caso em exame, se encontram presentes os requisitos necessários para o deferimento do pedido. Primeiro, porque a adoção do regime da comunhão universal de bens em regiões de colonização italiana, por uma questão cultural, era quase que uma regra adotada pelas famílias ao tempo do casamento (e ainda hoje é, embora minimizada), vendo-se ser plausível a versão de que o casal, antes de manifestar seu real intento a respeito do regime de bens matrimonial a adotar, apenas aderiram ao que era costume. Em segundo, porque a nubente era menor quando da celebração do matrimônio, restando suficientemente demonstrada a sua alegação de que anuiu à vontade

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paterna, que exigia o pacto comunitário universal para consentir com o casamento, como ressaltado pela testemunha Elemar Lourdes Xavier (fl. 79). Em terceiro, porque não se constata exista risco de redundar prejuízos a terceiros com a alteração pretendida, observando-se que o par não tem pendência alguma, como retratam as certidões negativas de processos criminais e cíveis (fls. 08-11), de débitos de tributos e contribuições federais (fls. 15-16) e municipal (fl. 21) e de protestos de títulos (fls. 22-23), estando os imóveis partilhados livres de quaisquer ônus reais (fls. 19-20). O pedido deve ser deferido, por derradeiro, por não ser obstáculo à alteração postulada o fato de as partes pretenderem aquinhoar a esposa com a totalidade do patrimônio (esboço apresentado na fl. 04), visto que, nessa seara, as partes podem dispor livremente do acervo, não fugindo à razoabilidade a partilha, sobretudo por se tratar de imóveis de pequeno valor (dois lotes urbanos, matrículas em fls. 17-18), o que, de resto, já havia apontado o ilustre Des. Rui Portanova no acórdão das fls. 59-62. Dessa forma, não se vislumbra qualquer óbice para a alteração do regime de bens, valendo acrescentar que ambos são pessoas independentes, ele engenheiro, ela diretora de escola (qualificação apresentada na inicial, fl. 02, e confirmada pela testemunha Gustavo Bodanese Prates, fl. 78), não havendo razão para que não se observe a autonomia de suas vontades.

ANTE O EXPOSTO, dou provimento ao apelo, para o fim

de determinar a alteração do regime de casamento dos apelantes, de

comunhão universal para separação total de bens.

DES. CLAUDIR FIDÉLIS FACCENDA (REVISOR) - De acordo.

DES. LUIZ ARI AZAMBUJA RAMOS (PRESIDENTE) - De acordo.

DES. LUIZ ARI AZAMBUJA RAMOS - Presidente - Apelação Cível nº

70012999900, Comarca de Nova Prata: "DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: GILBERTO PINTO FONTOURA

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REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. REQUISITOS. CASAMENTO CELEBRADO SOB A ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE PARTILHA DOS BENS COMUNS. O art. 2.039 não impede a mudança do regime de bens para casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916 desde que preenchidos os requisitos legais e feita a partilha dos bens comuns existentes. DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME.

APELAÇÃO CÍVEL

SÉTIMA CÂMARA CÍVEL

Nº 70011766243

COMARCA DE LAJEADO

PAULO PERUGURIA DOS SANTOS

APELANTE

CARMEN ROZANI MARTINS PEREIRA

APELANTE

A JUSTICA

APELADO

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Cível

do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes

Senhores DESA. MARIA BERENICE DIAS (PRESIDENTE E REVISORA) E DES. JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS.

Porto Alegre, 13 de julho de 2005.

DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, RELATOR.

R E L A T Ó R I O

DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS (RELATOR)

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Trata-se de recurso de apelação interposto por Paulo P.S. e

Carmem R.M.P., irresignados com sentença que julgou improcedente ação de

retificação de registro civil em que buscava a retificação do regime de bens.

Sustentam que (1) ao casarem, no ano de 1985, optaram pelo

regime da separação total de bens, como consta na certidão; (2) por omissão do

cartório, que não os informou da necessidade de escritura pública, esta não foi

lavrada; (3) a ausência de escritura pública causou uma série de problemas

quando realização de atos simples da vida civil, como financiamento bancário, em

que era sempre exigida, por vezes obstando a realização de negócios; (4) sempre

mantiveram a intenção de adotar o regime da separação total de bens, o que foi

reconhecido pelo parecer ministerial, que foi adotado como razões de decidir pela

sentença; (5) não é justo que lhe seja negada a correção pretendida e sejam

prejudicados por uma omissão do tabelião, que não os informou da necessidade

de lavrar escritura pública de pacto antenupcial; (6) com o advento do Novo

Código Civil torna-se possível a alteração, de modo a prevalecer a vontade das

partes. Pedem provimento.

O Ministério Público, nesta instância, opina pelo conhecimento e

provimento do apelo.

Foi atendido o disposto nos arts. 549, 551 e 552 do CPC.

É o relatório.

V O T O S

DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS (RELATOR)

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99

Inicialmente cumpre consignar que a petição inicial fundamenta

equivocadamente a pretensão como retificação de registro civil quando, na

verdade, pretende alterar o regime de bens.

Não há o que retificar na medida em que os apelantes desejam

manter e validar o que está consignado no assento de casamento – regime da

separação total de bens – e não retificá-lo.

A questão há de ser tratada como alteração de regime de bens

perfeitamente possível depois que o Código Civil em vigor derrubou a

imutabilidade do regime de bens.

O fato de a ausência de escritura pública tornar ineficaz a opção dos

cônjuges pelo regime da separação total de bens não elide a possibilidade jurídica

do pedido formulado, pois, como já dito, a pretensão de fundo é de alteração de

regime de bens.

Sob a égide do atual Código Civil, em relação ao regime matrimonial

de bens, vige o princípio da mutabilidade controlada. Como já tive oportunidade

de consignar em artigo publicado no livro Direitos Fundamentais do Direito de

Família, obra coletiva coordenada por Belmiro Pedro Welter e Rolf Hanssen

Madaleno188, “para que se viabilize a modificação diversos requisitos estão postos

na lei, objetivando afastar riscos à segurança de terceiros e dos próprios cônjuges

entre si, quais sejam: a) exigência de processo judicial; b) consensualidade na

postulação; c) motivação; d) ressalva do direito de terceiros”.

Preenchidos tais requisitos, como no caso dos autos, há de ser

deferida a alteração do regime de bens, mesmo que o casamento tenha sido

celebrado sob a égide do Código Civil de 1916.

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100

A alteração está sendo postulada judicialmente, com o consenso das

partes, espelhando a vontade manifestada já ao tempo do casamento. A

motivação é relevante: não bastasse a vontade das partes, a relação patrimonial

do casal foi construída ao longo dos anos sob o paradigma da separação total de

bens.

Atendendo ao último requisito, os apelantes juntaram certidões

negativas que afastam a possibilidade de lesão a direito de terceiros.

Não há razão, portanto, para lhes negar a alteração que, em

verdade, apenas ratifica a vontade manifestada desde sempre pelos apelantes.

O art. 2.039, constante das disposições finais e transitórias do

Código Civil em vigor, não impede a mudança do regime de bens para

casamentos celebrados antes da vigência do Código Civil de 2002.

Ao dispor que o regime de bens nos casamentos celebrados na

vigência do Código Civil anterior (...) é o por ele estabelecido, claramente visa a

norma resguardar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito. Isso porque

ocorreram diversas modificações nas regras próprias de cada um dos regimes de

bens normatizados no Código de 2002 em relação aos mesmos regimes no

Código de 1916, e, assim, a alteração decorrente de lei posterior viria a malferir

esses cânones constitucionais.

Procedente a alteração, deverá ser averbada no assento de

casamento, sem necessidade de escritura pública, apenas à vista do mandado,

como determina o Provimento Nº 24/04-CGJ, que acrescentou o art. 161-A à

Consolidação Normativa Notarial e Registral:

Art. 161A - averbar-se-á, ainda, no assento de casamento, a alteração do regime de bens, à vista de mandado judicial.

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101

Ao contrário do que sustenta o apelante, é imperiosa a partilha dos

bens adquiridos até então, uma vez que, em razão ausência da escritura pública,

em todo o período de casamento dos apelantes vigorou a comunhão parcial de

bens, como regime legal.

No artigo antes referido189 sustentei que sempre que o novo regime

adotado determinar uma comunicação mais restritiva que o estatuído até então,

em relação aos bens já integrantes, imperiosa será a divisão do ativo e do

passivo, uma vez que, a partir daí, cessa a responsabilidade de cada cônjuge em

relação aos credores do outro (art. 1671, CC).

Consolida, portanto, a propriedade dos bens elencados na inicial (fl.

4 e 5) na forma lá descrita.

Como se trata de partilha, devem ser avaliados os bens e eventual

excesso de meação deve ser devidamente tributado.

Feitas essas considerações, dou provimento ao apelo.

DESA. MARIA BERENICE DIAS (PRESIDENTE E REVISORA) - De acordo.

DES. JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS - De acordo.

DESA. MARIA BERENICE DIAS - Presidente - Apelação Cível nº 70011766243,

Comarca de Lajeado: "DERAM PROVIMENTO. UNÃNIME"

Julgador(a) de 1º Grau: CARMEN LUIZA ROSA CONSTANTE BARGHOUTI

189 Op. cit. p. 218

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REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. A possibilidade de alteração do regime matrimonial de bens conferida aos cônjuges pelo Código Civil não afronta o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Houve uma otimização do princípio da autonomia da vontade do casal, consagrado no princípio da livre estipulação do pacto (art. 1.639 do Código Civil), de forma que se revela descabido afastar tal ampliação de direitos dos casamentos celebrados sob a égide do antigo estatuto civil. Apelo provido.

APELAÇÃO CÍVEL

SÉTIMA CÂMARA CÍVEL

Nº 70011082997

COMARCA DE VACARIA

PAULO ROBERTO FERREIRA DE LIMA

APELANTE

EDUARDA DENISE SCHWARTZ

APELANTE

A JUSTIÇA

APELADA

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Cível

do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, prover o apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os

eminentes Senhores DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS E DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES.

Porto Alegre, 01 de junho de 2005.

DESA. MARIA BERENICE DIAS, RELATORA-PRESIDENTE.

R E L A T Ó R I O

DESA. MARIA BERENICE DIAS (RELATORA-PRESIDENTE)

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P. R. F. L. e E. D. S. interpõem pedido de autorização judicial para

alteração do regime de bens do casamento, noticiando terem casado pelo regime

da separação total de bens. No entanto, ao longo dos treze anos de matrimônio,

construíram, mediante esforço comum, uma empresa, mas que, por força do

regime de bens contratado, constituirá bem incomunicável. E, por força do art.

977 do Código Civil, os cônjuges casados pelo regime da separação obrigatória

de bens estão impedidos de contratar entre si. Requerem o deferimento do

postulado (fls. 2/3).

O Ministério Público manifestou-se pelo deferimento da pretensão

(fls. 22/24).

Sentenciando, o magistrado julgou improcedente o pedido formulado

pelos requerentes (fls. 33/34).

Os autores interpuseram embargos de declaração, os quais foram

julgados improcedentes pelo juízo a quo (fls. 36/49).

Inconformados, apelam os requerentes, asseverando serem

casados pelo regime da separação total de bens, sendo que, ao longo do

casamento, constituíram uma empresa com o esforço comum. Assim, com o

advento do Novo Código Civil, necessitam adequar a empresa à nova legislação.

Sustentam a possibilidade de aplicação do art. 1.639, §2º, do Código Civil aos

casamentos celebrados anteriormente à vigência desse estatuto legal. Requerem

o provimento do recurso (fls. 53/62).

O Ministério Público opinou pelo provimento do apelo (fls. 66/71).

Subiram os autos a esta Corte, tendo a Procuradoria de Justiça

manifestado-se pelo conhecimento e provimento do apelo (fls. 74/78).

Foi observado o disposto no art. 551, §2º, do Código de Processo

Civil.

É o relatório.

V O T O S

DESA. MARIA BERENICE DIAS (RELATORA-PRESIDENTE)

Trata-se de pedido de alteração de regime de bens de casamento

celebrado em 21 de novembro de 1989, portanto, antes da vigência do Código

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Civil, Lei 10.406/2002 (fls. 8/9). Os apelantes convencionaram o regime da

separação total e pretendem alterá-lo para o da comunhão parcial de bens, sob o

argumento de terem constituído, em comunidade de esforços, uma empresa,

tendo que se adaptar à nova legislação (artigos 977 e 2.031 do Código Civil).

Merece acolhida a irresignação.

Dispõem os artigos 2.039 e 1.639, §2º, do Código Civil,

respectivamente:

O regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei 3.071, de 1º de janeiro de 1916, é o por ele estabelecido. É admissível a alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.

Ainda que uma leitura conjunta e açodada dos dispositivos supra -

referidos possa aparentar a existência de conflito entre ambos, tal conclusão não

deve prevalecer.

O preceito do primeiro artigo acima transcrito tem por objetivo

resguardar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito, logo, a segurança das

relações jurídicas, em face das alterações promovidas pelo Código Civil

relativamente ao regramento específico de cada regime de bens. Logo, o que se

pretende assegurar aos consortes é a aplicação da legislação por eles escolhida

por ocasião da celebração do matrimônio, nos exatos termos da lei então em

vigor.

Por outro lado, a redação do art. 1.639, §2º, do diploma civil institui

novidade no ordenamento jurídico, porquanto, diversamente da imutabilidade do

regime de bens prevista no antigo Código Civil, possibilita aos cônjuges a

alteração desse pacto, mediante autorização judicial e pedido motivado de ambos

os consortes, com o resguardo de eventuais direitos de terceiros.

Portanto, essa faculdade conferida aos cônjuges em nada afronta os

direitos que se pretende assegurar pelo art. 2.039 da Lei 10.406/2002, mormente

se considerada a consensualidade do pedido e o amparo a direitos de terceiros.

Muito pelo contrário: em verdade, houve uma otimização do princípio da

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autonomia da vontade do casal, consagrado no princípio da livre estipulação do

pacto (art. 1.639 do Código Civil), de forma que se revela descabido afastar tal

ampliação de direitos dos casamentos celebrados sob a égide do antigo estatuto

civil.

Outrossim, cumpre observar a dinâmica da vida moderna que,

muitas vezes, vem a interferir nas relações patrimoniais dos consortes, fazendo

com que o regramento escolhido não mais atenda aos anseios do par.

In casu, o regime estabelecido foi o da separação total de bens. No

entanto, na constância do matrimônio, o casal constituiu uma empresa em

conjunto, referindo a comunhão de esforços na concretização desse objetivo.

Assim, ainda que não se aplique ao caso em tela o art. 977 do

diploma civil, diversamente do referido pelos recorrentes, pois não se trata de

separação obrigatória de bens, tem-se que a justificativa apresentada relativa à

criação em conjunto da sociedade comercial apresenta-se suficiente para o

deferimento do pedido.

Outrossim, o entendimento desta Câmara já está pacificado no

sentido da possibilidade de aplicação do artigo 1.639, §2º, do Código Civil aos

casamentos celebrados antes da vigência desse estatuto legal.

Nesse sentido, colacionam-se os seguintes precedentes desta

Corte:

REGISTRO CIVIL. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. REQUISISTOS. CASAMENTO CELEBRADO SOB A ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. POSSIBILIDADE. A regra do art. 2039 do CC/02 não fere o ato jurídico perfeito. Assim, mesmo diante do novo regramento trazido pelo atual código civil que modificou as regras dos regimes de bens, existe a possibilidade jurídica de alterar o regime de bens para matrimônios realizados sob a égide do CC/16. APELO PROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70010447043, SÉTIMA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS, JULGADO EM 30/03/2005) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS ENTRE OS CÔNJUGES. Casamento celebrado sob a égide do antigo Código Civil. Alteração. Possibilidade. Sociedade comercial entre cônjuges. Art. 1.639, § 2º. O art. 2.039, constante das disposições finais e transitórias do Código Civil em vigor não impede a mudança do regime de bens para casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916. RECURSO PROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70009777947, OITAVA

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CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: ALFREDO GUILHERME ENGLERT, JULGADO EM 10/03/2005)

Por tais fundamentos, provê-se ao apelo, conferindo ao presente

pedido efeitos ex tunc, ressalvados direitos de terceiros, e observando-se, após o

trânsito em julgado, as determinações do Provimento da Corregedoria Geral de

Justiça nº 024/03, com as alterações realizadas pelo Provimento de nº 024/04. As

custas deverão ser rateadas entre os interessados.

DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS (REVISOR) - De acordo.

DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES - De acordo.

DESA. MARIA BERENICE DIAS - Presidente - Apelação Cível nº 70011082997,

Comarca de Vacaria: "PROVERAM O APELO. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: SILVIO TADEU DE AVILA