A Semiótica Do Coração: Estudo Sobre O Fenômeno Do Emoji...
Transcript of A Semiótica Do Coração: Estudo Sobre O Fenômeno Do Emoji...
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
1
A Semiótica Do Coração: Estudo Sobre O Fenômeno Do Emoji Coração1
Jéssica Raissa Pessoa BARROS2
Marcos NICOLAU3
Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, PB
Resumo
Este artigo visa traçar um histórico do desenvolvimento imagético, no que tange
principalmente a iconografia, até os atuais emojis. O principal foco será no emoji coração,
que é um dos mais utilizados no mundo - o mais usado em alguns países - e fez parte de
uma revolução ao estar presente na primeira campanha publicitária na qual uma imagem
substitui uma palavra: a campanha “I LOVE NY”. Parte de um fenômeno mundial e da
comunicação, que é a expansão dos emojis, consta como importante objeto de estudo da
semiótica. Através da metodologia semiótica, será possível entender a construção desses
signos, as significâncias que os constituem e seu funcionamento.
Palavras-chave: semiótica; comunicação; emoticon; emoji; coração.
Introdução
No mundo conectado que vivemos, as barreiras da distância foram vencidas em
muitos aspectos, aumentando a interação entre pessoas de todo o mundo e tornando a
comunicação mais rápida e prática. Em meio a tudo isso, os emojis dominam nosso
cotidiano. Seja auxiliando na expressão de emoções, ilustrando campanhas publicitárias
e até mesmo em livros narrados através desses, etc., os emojis comunicam e, independente
do lugar no mundo, podem ser facilmente entendidos por quem os visualiza, unindo essas
pessoas em uma cultura comum – da internet – e uma linguagem comum – dos emojis.
Para entender melhor essa comunicação e a forma como funciona, a semiótica
como estudo das linguagens (escrita, imagética, sonora etc), e, por conseguinte, da
comunicação, apresenta-se como uma metodologia efetiva. Apesar das várias linhas de
1 Trabalho apresentado no GP Teorias do Jornalismo do XVII Encontro dos Grupos de Pesquisa em Comunicação,
evento componente do 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.
2 Estudante de Graduação. 8º semestre do Curso de Comunicação em Mídias Digitais da UFPB. Pesquisadora de
Iniciação Científica PIBIC/UFPB. E-mail: [email protected].
3 Orientador do Trabalho. Professor pós-doutor do curso de Comunicação em Mídias Digitais DEMID/UFPB. E-mail:
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
2
estudo existentes, para este projeto, convém a Semiótica peirciana concebida pelo
matemático, cientista, lógico e filósofo norte-americano Charles Sanders Peirce.
Para a Semiótica, a comunicação ocorre através de signos - tudo que se apresenta
à mente e por ela é interpretado -. Um signo que se apresenta é composto por vários signos
menores – denominado conhecimento prévio - que permitem compreendê-lo. O
conhecimento prévio decorre da experiência individual e da bagagem histórico-cultural.
As interpretações podem variar, de acordo com os conhecimentos prévios de cada
um, no entanto, no caso dos emojis, apesar de possíveis pequenas variações
interpretativas, em geral, esses universalizaram-se, de modo que, como dito
anteriormente, são entendidos em qualquer lugar do mundo. Assim sendo, enquanto
fenômeno da comunicação em expansão, são um importante objeto de estudo e interesse.
Neste estudo, será feito um recorte, focando no emoji coração, que, sendo um dos
mais usados no mundo, servirá de modelo para o entendimento do funcionamento dos
demais, enquanto signos e produtores de significância. Além de entender melhor o emoji
coração, será possível, também, ter uma melhor compreensão do fenômeno dos emojis.
A Expansão Dos Signos
Ao longo da história, os signos imagéticos apresentaram-se de diversas formas,
dependendo de contexto e tecnologia da época, e interferindo direta e indiretamente na
concepção e semiose dos signos atuais. Hoje em dia, existem incontáveis signos. Sobre a
expansão dos signos e a importância da semiótica no entendimento desse processo,
Santaella (2002, p. XIII) afirma:
[...] venho desenvolvendo a hipótese de que os signos estão crescendo
no mundo. Basta um retrospecto para nos darmos conta de que, desde o
advento da fotografia, então do cinema, desde a explosão da imprensa
e das imagens, seguida pelo advento da revolução eletrônica que trouxe
consigo o rádio e a televisão, então com todas formas de gravações
sonoras, também como o surgimento da holografia e hoje com a
revolução digital que trouxe consigo o hipertexto e a hipermídia, o
mundo vem sendo crescentemente povoado de novos signos. Para
compreender esse crescimento e o consequente crescimento do próprio
cérebro humano, tenho considerado que a expansão semiosférica, quer
dizer, a expansão do reino dos signos que está tomando conta da
biosfera, longe de ser apenas fruto da insaciável produção capitalista, é
parte de um programa evolutivo da espécie humana[...].
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
3
Uma vez que se entende a importância da semiótica e que se nota o acelerado e
globalizado crescimento dos signos, compreende-se também a importância do uso dessa
ciência para o estudo do fenômeno dos emojis, uma vez que esses são signos cada vez
mais presentes no cotidiano, em especial o emoji de coração. Para tal, é fundamental
percorrer o caminho da imagem ao longo da história humana.
Os Primórdios Dos Signos Imagéticos E A Separação Da Imagem E Escrita
A comunicação é algo inerente ao ser humano, dê-se ela através de diversas
formas como imagens, sons, gestos, etc. Tal comunicação ocorre através de signos que,
em um diálogo à dois são representados por um e decodificados por outro. Tanto para a
transmissão como para a recepção, é necessária a construção de um repertório. Por trás
de todo o repertório existe a vivência do indivíduo, além da bagagem histórica de cada
signo. Logo, todo signo existente é decorrente de uma construção social e histórica.
Sobre os primórdios das representações imagéticas, Carlan, Funari e Moreira
(2015, p. 37) afirmam as pinturas rupestres como as mais antigas, com algumas datando
de 40 mil anos atrás, na Península Ibérica, por exemplo. Em geral, tais pinturas retratavam
aspectos da vida humana da época, como caça e reprodução, por exemplo.
Figura 01. Imagens pré-históricas
Fonte: CARLAN; FUNARI; MOREIRA (2015).
A figura 1 é um oportuno exemplo da construção de um signo. Apesar de possíveis
incertezas sobre aspecto simbólico (convencionado. Contexto social) das imagens, ainda
é possível identificá-la como ícone devido às suas qualidades, de modo que se reconhece
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
4
os humanos por serem representações eretas com cabeça, dois membros superiores
(braços) e dois membros inferiores (pernas), assim como ainda pode ser representado um
humano. É possível, ainda, reconhecer os bois por serem representados com qualidades
próprias: quatro patas e chifres. Apesar da distância temporal e de inúmeras variações,
tais representações se mantêm atualizadas e constituintes de nosso repertório sígnico.
As pinturas nas cavernas foram a primeira forma de representação e comunicação
imagética feita pelo homem, porém, como dito anteriormente, a comunicação é inerente
ao ser humano e as representações imagéticas, como recursos comunicativos, sofreram
adendos diversos, seja pelos seus contextos, propósitos ou avanços tecnológicos.
Além de ilustrar momentos da vida, por muito tempo, os signos foram utilizados
para registros em escrita imagética. Um exemplo conhecido são hieróglifos egípcios. De
acordo com Henriques (2002, p. 53), a escrita egípcia é uma mistura de símbolos de três
tipos: caracteres figurativos (reprodução de objetos - pictogramas), caracteres simbólicos
(ideias abstratas - ideogramas) e caracteres fonéticos (valor alfabético - fonogramas).
Figura 02. Hieróglifos egípcios
Fonte: http://www.infoescola.com/civilizacao-egipcia/hieroglifo/
A escrita através de hieróglifos não possuía independência em relação à
linguagem falada. Sendo uma linguagem extremamente complexa, era de domínio de
poucos. Sobre a mudança na linguagem escrita, Henriques (2002, p. 53) ainda afirma:
Só mais tarde surgiria um sistema que levasse em conta unicamente a
linguagem, isto é, que lembrasse ao ouvido os sons significativos das
palavras, tomando em geral o som inicial da palavra representada pelo
pictograma ou ideograma. Daí se chegou ao alfabetismo e, depois, à
decomposição da sílaba em letras, com a representação separada de
cada som. Assim, por exemplo, o pictograma semita taw, que
significava ‘cruz” e servia como marcador de propriedade, passou a
simbolizar o som inicial T de taw.
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
5
Por volta de 1000 a.C., foram os Fenícios os responsáveis pela criação de um
alfabeto, predecessor do nosso. Do sistema egípcio, os fenícios tiraram suas letras,
construindo um alfabeto de 22 letras. A partir de tal momento, a linguagem escrita e a
imagética tomaram, cada uma, seu rumo, passando a ser estudadas separadamente.
Sobre o processo evolutivo da produção da imagem, Santaella propõe a existência
de três paradigmas. De acordo com essa, um paradigma é um conjunto de valores,
generalizações simbólicas, crenças e soluções partilhados por uma comunidade científica.
Os Três Paradigmas Da Imagem
Santaella (2015) propõe uma divisão do processo evolutivo da imagem em três
paradigmas: o pré fotográfico (primeiro paradigma), o fotográfico (segundo paradigma)
e o pós fotográfico (terceiro paradigma). O critério utilizado para tal divisão é puramente
materialista, ou seja, relacionado ao modo de produção de imagens (materiais, meios,
técnicas, mídias), uma vez que a autora (2015, p. 167) afirma que “nenhum processo de
signo pode dispensar a existência de meios de produção, armazenamento e transmissão,
pois são esses meios que tornam possível a existência mesma dos signos”.
O primeiro paradigma engloba as imagens feitas à mão (artesanalmente) pelo
homem. Inclui as imagens feitas nas pedras (como as mostradas anteriormente), os
desenhos, as pinturas, as gravuras e as esculturas. A sua principal característica é a
proeminente fisicalidade dos suportes, substâncias e instrumentos. Sua não
reprodutibilidade torna cada imagem produzida única. No entanto, sua não
reprodutibilidade e sua fisicalidade a tornam sujeitas aos efeitos do tempo.
O segundo paradigma engloba as imagens de processo automatizado por meio de
máquinas que podem ser ditas como próteses óticas. São fragmentos do mundo visível
captados por tais máquinas. Inclui as fotografias, a TV, o cinema, o vídeo e a holografia.
Há a necessidade da presença de objetos reais preexistentes para que tais registros sejam
feitos. A característica mais marcante desse paradigma é que, apesar de sua materialidade
e consequente sujeição aos efeitos do tempo, as imagens tornam-se reprodutíveis, o que,
ao mesmo tempo, evita a “perda” dessas, impele na sua não unicidade.
O terceiro paradigma engloba as imagens sintéticas ou infográficas, que são
inteiramente calculadas por computador. Diferente das imagens pertencentes aos
paradigmas anteriores, as do terceiro não possuem suporte matérico ou físico-
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
6
químico/maquínico, mas sim resultam do “casamento de um computador e uma tela de
vídeo”, como afirma Santaella (2015, p. 170). A imagem é produzida pela conversão de
uma matriz de números (que são, portanto, virtuais) em pixels (unidades elementares
constituintes de uma imagem), em tela de vídeo ou por impressão (tornando-se material).
Pertencem a essa categoria todas as imagens geradas por computador, podendo ser
visualizadas em computadores pessoais, tablets e celulares, por exemplo.
Santaella (2015, p. 171) ainda coloca o computador como, mesmo sendo uma
máquina, especial, visto que essa não opera sobre uma realidade física, mas sim de um
substrato simbólico que é a informação. Apesar da tela, permitindo que as imagens sejam
visualizadas de forma altamente icônica, tudo por trás delas é abstrato. Sobre as imagens
pertencentes ao terceiro paradigma, ainda é importante ressaltar que essas, uma vez que
virtuais, são imunes aos efeitos do tempo, além de facilmente reprodutíveis.
Semiótica Peirciana
Antes de refletir sobre a semiótica propriamente dita, é importante conhecer suas
origens. A semiótica foi desenvolvida pelo matemático, cientista, lógico e filósofo norte-
americano Charles Sanders Peirce. Assim como a maioria das ciências, faz parte da
Fenomenologia. Santaella (2015), define fenomenologia como a descrição e análise das
experiências vivenciadas. A observação gera generalizações e consequentes
classificações. Santaella (2015, p. 7) ainda afirma que:
Entendemos por fenômeno, palavra derivada do grego Phaneron, tudo
aquilo, qualquer coisa, que aparece à percepção e à mente. A
fenomenologia tem por função apresentar as categorias formais e
universais dos modos como os fenômenos são apreendidos pela mente.
Sobre a percepção dos fenômenos pela mente, Peirce entende que esse se dá em
três momentos. A primeiridade, que é a sensação, a qualidade de algo. É o toque, a cor, o
som etc. A secundidade que é a reação, o reconhecimento do que é percebido. A
terceiridade, que é o ato de pensar sobre o fenômeno. É o processo de significação, ou
seja, de construção de signos. Logo, diante da observação de qualquer fenômeno, a mente
cria um signo, que é a mediação entre o indivíduo e o fenômeno. Peirce define:
Um signo, ou representamen, é aquilo que, sob certo aspecto ou modo,
representa algo para alguém. Dirige-se a alguém, isto é, cria na mente
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
7
dessa pessoa, um signo equivalente, ou talvez, um signo mais
desenvolvido [...] O signo representa alguma coisa, seu objeto. (Apud
SANTAELLA, 2000. p. 12).
O processo de construção do signo é denominado semiose, que é o objeto de
estudo da semiótica. Embora a Semiótica só tenha sido reconhecida como ciência dos
signos no século XX, o estudo das linguagens e signos vem desde os gregos. Desde de
suas origens, essa teve inúmeras concepções e ramificações. No entanto, como dito
anteriormente, para nós, interessa a semiótica concebida por Peirce.
A semiose, dentro da linha peirciana, advém da inter-relação de três partes: objeto,
interpretante e signo. Em uma situação de um indivíduo observando a foto de um
cachorro, em análise simplificada, a foto é um representante do cachorro, o qual é o
objeto. As concepções que essa fotografia está apta a produzir no indivíduo são os signos.
A semiótica peirciana é constituída, por inteiro, de relações de três. Em seu estudo
dos signos, Peirce construiu várias tricotomias. Em uma das tricotomias, estuda-se as
propriedades do signo na relação com seu objeto. Nessa classificação, ele entende que
essa relação pode ser icônica, indicial ou simbólica. O signo icônico assemelha-se em
suas qualidades ao objeto, sendo a fotografia um exemplo desse gênero. O signo indicial
é fundamentado na ligação de causalidade com o objeto, de modo que, por exemplo,
pegadas indicam passagem de alguém. Já o símbolo, é convencionado, de modo que, para
os cristãos, a cruz simboliza a crença em Jesus. Um signo pode encaixar-se em cada uma
dessas três categorias ou em mais de uma, dependendo da perspectiva de análise.
As Interfaces Gráficas E Os Ícones
Desde as pinturas rupestres, passamos pelas esculturas, pinturas em tela, gravuras
em metal, dentre outros. No entanto, vivemos em uma época de explosão tecnológica, na
qual, em menos de 100 anos, presenciamos uma transição para uma época mais repleta
de signos do que jamais houve antes. Com o advento do computador e, principalmente,
com seus avanços, vivemos um momento de comunicação extremamente icônica.
Os primeiros computadores exigiam conhecimento complexo de linguagem de
programação para que fossem utilizados, não sendo nada intuitivo e, logo, pouco acessível
para usuários comuns. Foi quando, em 1984, a Apple lança o primeiro Macintosh,
apresentando uma interface gráfica intuitiva através de ícones reconhecíveis aos usuários
comuns. Os computadores não mais apresentavam apenas textos, agora estavam repletos
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
8
de imagens. O ícone de uma lixeira representava onde arquivos poderiam ser jogados
fora, ícones de pastas representavam onde arquivos poderiam ser guardados, etc.
Figura 03. Interface gráfica do Macintosh
Fonte: http://www.techguru.com.br/video-ha-30-anos-atras-o-macintosh-revolucionava-o-
mercado/
As interfaces gráficas evoluíram notoriamente desde o Macintosh, adquirindo
cores e formas mais agradáveis e intuitivas. No entanto, foi a internet a responsável por
um maior surgimento e também pela maior divulgação de imagens e de ícones
considerados universais. Madureira e Souza (2015, on line) fazem a seguinte observação:
Com o advento da internet, aprofundou-se a comunicação entre pessoas
que estão geograficamente distantes e criou-se um intercâmbio cultural
para além do que os outros meios de comunicação poderiam oferecer.
Com efeito, a formação de cultura deixa de ser referência da localização
geográfica do ser humano. Desse modo, o sistema de signos que
compõe as línguas ao redor do mundo também se tornou global,
principalmente a dos ícones.
Além das imagens facilitarem a comunicação entre povos de diferentes
localidades, culturas e idiomas, a comunicação por ícones atendeu a uma nova
necessidade. Surgiram os dispositivos móveis e a esses foram implementadas, também,
interfaces gráficas. A comunicação tornou-se mais ágil e os ícones foram úteis para tal.
A experiência com a interface mais amigável e intuitiva mudou o
conceito de comunicação icônica, pois todos os recursos disponíveis no
aparelho eram identificados através de ícones. Os símbolos utilizados
para identificação tornaram-se populares no ambiente tecnológico, que
passam a fazer parte também da comunicação em outros ambientes que
não só o virtual. (MADUREIRA; SOUZA, 2015, on line).
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
9
Figura 04. Evolução dos ícones do Windows 7 para o Windows 10
Fonte: https://www.windowsteam.com.br/windows-10-build-10130-os-icones-do-windows-
foram-remodelados-de-novo/
Os Emoticons
Os computadores e dispositivos móveis popularizaram-se. As pessoas
comunicam-se, no mundo todo por mensagens, chat, dentre outros meios. Com essas
comunicações rápidas entre pessoas, surgiu a necessidade de expressar-se além do texto.
Somando à inicial limitação de caracteres por mensagem, fez-se surgir como alternativa
a união de sinais no teclado, de modo a tornar mais clara a expressão de sentimentos. Essa
combinação de sinais textuais foi denominada emoticon.
Foi no aplicativo de chats MSN, que os emoticons evoluíram de simples
combinações de sinais. As combinações passaram a ser atalhos para a criação de ícones
mais completos e complexos para a expressão de emoções e sentimentos dos usuários.
Figura 05. Alguns emoticons e seus respectivos atalhos
Fonte: http://www.uhull.com.br/02/18/significado-dos-emoticons/
Os Emojis
Em 1990, Shigetaka Kurita desenvolveu os primeiros emojis para a empresa
japonesa de telecomunicações DoComo. A palavra emoji tem origem em um pictograma:
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
10
e (imagem) + mó (escrita) + ji (caractere). Portanto, é uma escrita através de imagens,
possuindo ícones que representam rostos, comidas, atividades, etc.
E, ao contrário do que todos pensam, os Emojis não substituíram os
Emoticons. Pode-se chamar de Emoticon todos os ícones que
descrevem expressões faciais ou posturas corporais, os outros ícones
que não transmitem emoção ou atitude são classificados como Emojis.
Portanto, pode-se dizer que todo o Emoticon é um Emoji, mas nem todo
Emoji é um Emoticon. (MADUREIRA; SOUZA, 2015, on line).
Figura 06. Alguns Emojis
Fonte: https://www.infotechblogs.com/unicode-consortium-shall-publish-72-new-emojis-this-
june-2016/
Fonte e Caiado (2015) entendem que, atualmente, os emojis fazem parte de uma
comunicação que integra um discurso multimodal com sons, vídeos, imagens, textos,
dentre outros, na linguagem da internet. Tais recursos contribuem, semioticamente, para
a comunicação e para a criação e difusão de significâncias.
A Semiótica Peirciana Como Ferramenta De Análise Dos Emojis
Compreendendo a imagem como forma de linguagem, ou seja, de comunicação e
que essas tornam-se cada vez mais presentes no dia a dia, como uma forma rápida e
atrativa de comunicação, é bastante importante estudá-las e entender seu funcionamento.
Os emojis constituem um tipo de imagem bastante frequente em nosso cotidiano e faz
parte de um fenômeno de alta relevância, visto que estão por todos os lugares.
Como dito anteriormente, a Semiótica estuda o processo de significação, que é
denominado semiose. Como um estudo dos signos da comunicação, a Semiótica é,
portanto, fundamental no entendimento da efetividade comunicativa de uma imagem, dos
efeitos que está apta a produzir na mente interpretante.
O interpretante possui três níveis, sendo o primeiro o seu potencial interpretativo
(interpretante imediato), o segundo o efeito interpretativo de fato produzido (interpretante
dinâmico) e o terceiro (interpretante final) é o nível ideal no qual o signo chegaria ao seu
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
11
limite interpretativo em totalidade. Para esse estudo, compete compreender o seu
potencial interpretativo, visto ser difícil mensurar o efeito real produzido em cada mente.
Em seu processo, o fenômeno do signo apresenta-se à mente através de três
elementos já ditos: primeiridade, secundidade e terceiridade. Em sua relação com o
objeto, esse signo que se apresenta pode ser ícone, índice e símbolo.
O signo, quando ícone, relaciona-se ao objeto pela sua qualidade (primeiridade),
estando em aberto para o que tal qualidade pode indicar ou simbolizar, visto que a
qualidade apenas apresenta-se. Quando índice, relaciona-se ao seu objeto indicando-o
(secundidade), passando a existir como uma reação às qualidades. Quando símbolo,
relaciona-se ao seu objeto por caráter de lei (terceiridade), sendo o signo quando abstraído
pelo interpretante, de modo que, como afirma Santaella (2002, p. 13), “surgindo uma
determinada situação, as coisas ocorram de acordo com aquilo que a lei prescreve”.
As propriedades supracitadas e as demais relativas ao estudo do signo não são
excludentes entre si, podendo apresentar-se através de variadas categorias dependendo da
perspectiva da análise. A análise semiótica visual, no caso, parte da identificação das
qualidades e hipotetização do que elas indicam e das significações construídas, através
dos caráteres de lei conhecidos, seja por meio de estereótipos ou de outras convenções.
O Coração Como Símbolo Do Amor
Como Prates (2005, on line) afirma, “a simbologia foi criada pelo homem pela
necessidade de expressar através de objetos ou formas sua religião ou sua arte visual”.
Isso vale para o emoji coração. Esse que, em qualidades (signo icônico), pouco tem a ver
com o coração anatômico, é signo convencionado (símbolo), resultante de bagagem
histórico-cultural e que pode indicar (relação indicial) amor ou atenção, por exemplo.
Por volta do século 5 a.C., começa na Grécia Antiga um debate
palpitante sobre a localização da alma. Explica-se: os gregos não
concebem algo espiritual sem assinalar um lugar no corpo. Hipócrates,
o mais famoso médico da Antiguidade, diz que a inteligência se
encontra na cabeça. Platão discorda. Para ele, a alma imortal está na
cabeça, mas a alma mortal, responsável pela inteligência e os
sentimentos, está no coração. Os desejos sensuais, por sua vez,
procedem do fígado. Aristóteles contradiz essa separação. Só existe
uma alma, afirma, e ela se encontra no coração, o centro do ser humano,
o fogo interno que dá calor e vida. Fica assim estabelecido pelos séculos
seguintes a primazia do coração. (SCHEINBERG, 2007, on line)
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
12
Não apenas os gregos, mas por muito tempo - até, aproximadamente, o século
XVI - pouco houve de evolução no quesito anatomia do coração e circulação, havendo
maior foco no simbolismo criado acerca desse. À princípio é importante entender que tais
relações simbólicas são compreensíveis mediante alguns entendimentos. Ao amor -
principal associação com o coração -, por exemplo, são associados alguns signos
referentes, portanto, indiciais (que indicam, que referenciam), tais como o rubor da face,
o bater acelerado no peito, etc. Tais condições são devidas ao coração. Também quando
o coração para, cessa a vida. É então o coração símbolo da vida, do amor, das emoções.
Os cristãos agregaram mais significâncias ao coração ao universalizar o símbolo,
em suas qualidades - cor e forma -, similar à como o concebemos. O coração vermelho
com estreitamento na ponta inferior e uma concavidade no centro de seu canto superior.
Símbolo da bondade, amor e caridade cristãos, agregando tais significâncias ao coração.
Figura 07. Sagrado coração de Jesus
Fonte: https://formacao.cancaonova.com/espiritualidade/devocao/as-12-promessas-do-sagrado-
coracao-de-jesus/
O coração, analisando-se seu aspecto simbólico, é um signo que compreende
inúmeros outros signos que são responsáveis pela forma como esse é interpretado. Esses
signos constituintes são o repertório. Esse repertório, como anteriormente dito, é
constituído da experiência de vida individual e da bagagem histórico-cultural.
Muito ainda resta de dúvidas sobre o surgimento desse símbolo e dos motivos que
levaram a sua configuração imagética, mas uma coisa é certa: ele se faz presente em vários
momentos da história da humanidade. Seja em pinturas em cavernas, representações
egípcias, babilônicas, dentre outras, todas essas foram responsáveis pelas significações
agregadas ao símbolo coração e pela forma como ele é interpretado e representado.
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
13
O emoji coração
Simples e fácil de ser reproduzido, mais do que simplesmente o seu contexto
(bagagem histórica propriamente dita), suas qualidades também se tornam relevantes em
sua compreensão. Como anteriormente dito, o signo apresenta-se a mente, constitui
relações e através dessas, é interpretado. O emoji é, portanto, também, uma composição.
Sua forma é, em geral, arredondada, transmitindo “suavidade”. O coração é
principalmente representado com a cor vermelha. Vermelho é a cor do sangue. Uma vez
que o coração e, consequentemente, o sangue são associados a vida, a cor passa a fazer
tal correspondência. Um corpo sem vida é frio e distante, portanto, o vermelho é associado
ao calor - há também, nesse quesito, a questão das cores quentes e frias na arte -, à
proximidade. A cor também é associada ao amor, à paixão - relação justificada pela
associação do órgão coração a tais sentimentos -.
Outro fator fundamental para tal escolha consta na história das pigmentações. Por
muito tempo, cores puras e vibrantes eram símbolo de status, devido ao alto custo de
produção e de conservação da cor no produto - necessitava de cuidados para não desbotar
-. A nobreza utilizava o vermelho-púrpura. Visto que as artes da época de difusão do
sagrado coração eram acessíveis apenas aos nobres, as melhores pigmentações eram
utilizadas. Na hierarquia das cores da época, era elencada a Jesus a cor vermelha.
Apesar da já alta difusão desse ícone, sua explosão foi no início dos anos 1970.
Em uma campanha publicitária que visava alavancar o turismo da cidade de New York, o
designer Milton Glaser desenvolveu a logo que entraria na história, criando um símbolo
que seria sempre associado à cidade - indicando-a - e reconhecido em todo o mundo. Em
“I LOVE NY”, pela primeira vez, uma imagem substitui uma palavra, nesse slogan criado.
A palavra love (amor, em inglês) não precisou se fazer presente para ser entendida, uma
vez que as associações semióticas do símbolo permitiram que ela se fizesse entender.
Figura 08. Logo “I LOVE NY”
Fonte: http://plugcitarios.com/2012/07/17/conheca-a-historia-da-logo-i-love-ny/
A mesma lógica aplica-se ao emoji coração. Isoladamente, ele já se basta, por ser
um signo degenerado (hipoícone), ou seja, de concepção conhecida universalmente.
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
14
Quando utilizado anexado a algo, como um texto em chat de rede social, por exemplo, o
emoji agrega em significação ao que é dito, ou seja, um “eu te amo” ganha mais ênfase,
um “se cuida” ganha feições de carinho, etc. Um dos emojis mais usados no mundo - o
mais usado na França -, o coração se mostra como parte de um fenômeno. Em 2014, a
palavra mais popular não foi uma escrita, mas sim um coração vermelho.
Considerações Finais
Foi considerada, nesse projeto, a importância do estudo do fenômeno dos emojis.
Esses são parte de uma era extremamente imagética, principalmente, devido à
necessidade de uma comunicação rápida e prática. Os emojis estão em nosso cotidiano,
seja em chats de conversa ou em livros totalmente narrados por esses, por exemplo.
Como fenômeno da comunicação, são importante objeto de estudo da semiótica.
Foi possível, nesse projeto, entender como esses signos se fazem presentes, como são
construídos e como as significâncias presentes nesses são importantes para a construção
de uma comunicação eficaz. No caso, da publicidade, por exemplo, na construção de um
produto de sucesso e entendimento universal.
Esse projeto fez-se importante ao traçar uma linha de desenvolvimento das
representações imagéticas, enquanto ferramentas comunicativas, desde os princípios até
os atuais emojis - ilustrados pelo emoji coração -. Para tal, provou-se a importância da
semiótica como metodologia de análise de signos e da construção de significância.
REFERÊNCIAS
CARLAN, Cláudio Umpierre; FUNARI, Pedro Paulo; MOREIRA, Ronaldo Auad. Iconografia
e Semiótica: Uma abordagem histórica. São Paulo: Annablume. 2015.
De que maneira o coração está relacionado com as emoções?. 2010. Disponível em:
<https://www.amato.com.br/content/de-que-maneira-o-cora%C3%A7%C3%A3o-est%C3%A1-
relacionado-com-emo%C3%A7%C3%B5es>. Acesso em 20 de jun. 2017.
FONTE, Renata da; CAIADO, Roberta. Práticas discursivas multimodais no WhatsApp: uma
análise verbo-visual. Revista Desenredo. 2014. Disponível em:
<http://seer.upf.br/index.php/rd/article/view/4147/3089>. Acesso em: 15 de set. 2016.
FREIRE, Raquel. Entenda a diferença entre smiley, emoticon e emoji. 2015. Disponível em:
<http://www.techtudo.com.br/noticias/noticia/2014/07/entenda-diferenca-entre-smiley-
emoticon-e-emoji.html>. Acesso em 15 de set. 2016.
HELLER, Eva. A psicologia das cores. São Paulo: Editora GG Brasil. 2012.
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Curitiba - PR – 04 a 09/09/2017
15
HENRIQUES, Claudio Cezar. A volta dos hieróglifos. Revista Philologus, Rio de Janeiro, ano
8, n. 23, Maio/ Agosto: 2002. Disponível em:
<http://www.filologia.org.br/rph/ANO08/23/004.pdf>. Acesso em: 15 de set. 2016.
MADUREIRA, Gisela; SOUZA, Letícia Lisieux Galvão de. Da Pintura Rupestre Ao Uso de
Símbolos Na Troca De Mensagens Instantâneas de Celular. 2002. Disponível em:
<http://portalintercom.org.br/anais/nacional2015/resumos/R10-2916-1.pdf>. Acesso em: 19 de
set. 2016.
MEDEIROS, Juliana. Conheça a história da logo “I LOVE NY”. 2012. Disponível em:
<http://plugcitarios.com/2012/07/17/conheca-a-historia-da-logo-i-love-ny/>. Acesso em: 06 de
jul. 2017.
NICOLAU, Marcos. et al. Comunicação e Semiótica: visão geral e introdutória à Semiótica de
Peirce. Revista eletrônica Temática, João Pessoa, ano VI, n.08, Agosto. 2010. Disponível em:
<http://www.insite.pro.br/2010/agosto/semiotica_peirce_nicolau.pdf>. Acesso em 22 de jul.
2016.
PRATES, Paulo R. Símbolo do coração. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702005000300020>. Acesso
em 20 de jun. 2017.
PRODANOV, Cleber; FREITAS, Ernani. Metodologia do Trabalho Científico: Métodos e
Técnicas da Pesquisa e do Trabalho Acadêmico. Rio Grande do Sul: Universidade Feevale, 2013.
ROSSIN, Giovanna. Os emojis são a linguagem universal?. 2015. Disponível em:
<http://revistagalileu.globo.com/Revista/noticia/2015/04/os-emojis-sao-linguagem-
universal.html>. Acesso em 15 de set. 2016.
SANTAELLA, Lúcia. A teoria geral dos signos: Como as linguagens significam as coisas. São
Paulo: Editora Pioneira, 2000.
SANTAELLA, Lúcia. Imagem: cognição,semiótica, mídia. São Paulo: Iluminuras, 2015.
SANTAELLA, Lúcia. O que é Semiótica. São Paulo: Editora Brasiliense, 2012.
SANTAELLA, Lúcia. Semiótica Aplicada. São Paulo: Cengage Learning, 2015.
SCHEINBERG, Gabriela. Coração: o símbolo do amor. Revista Galileu. 2007. Disponível em:
<http://revistagalileu.globo.com/Galileu/0,6993,ECT624468-2989-1,00.html>. Acesso em 20 de
jun. 2017.
VOLTOLINI, Ramon. Emoji: como os emoticons inauguram uma nova linguagem digital. 2013.
Disponível em: <https://www.tecmundo.com.br/telecomunicacoes/38024-emoji-como-os-
emoticons-inauguraram-uma-nova-linguagem-digital.htm>. Acesso em 15 de set. 2016.