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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA FJM Nº 70011205036 2005/CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. LICITAÇÃO E CONTRATO ADMINISTRATIVO. INEXECUÇÃO CONTRATUAL. APLICAÇÃO DA PENALIDADE DE MULTA. ART. 87, INCISO II, DA LEI Nº 8.666/93. DESCABIMENTO. PREVISÃO EDITALÍCIA DA VALIDADE DA PROPOSTA. DESISTÊNCIA DA EXECUÇÃO DA OBRA. POSSIBILIDADE. PRELIMINARES REJEITADAS. APELO PROVIDO. APELAÇÃO CÍVEL 21ª CÂMARA CÍVEL Nº 70011205036 PORTO ALEGRE RIESA CONSTRUÇÕES E PROJETOS LTDA., APELANTE; ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, APELADO; LUIZ CARLOS RIBEIRO PEREIRA, INTERESSADO. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Desembargadores integrantes da Vigésima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em rejeitar as preliminares e dar provimento ao apelo. Custas na forma da lei. 1

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PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA

FJMNº 700112050362005/CÍVEL

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. LICITAÇÃO E CONTRATO ADMINISTRATIVO. INEXECUÇÃO CONTRATUAL. APLICAÇÃO DA PENALIDADE DE MULTA. ART. 87, INCISO II, DA LEI Nº 8.666/93. DESCABIMENTO. PREVISÃO EDITALÍCIA DA VALIDADE DA PROPOSTA. DESISTÊNCIA DA EXECUÇÃO DA OBRA. POSSIBILIDADE.

PRELIMINARES REJEITADAS. APELO PROVIDO.

APELAÇÃO CÍVEL 21ª CÂMARA CÍVEL

Nº 70011205036 PORTO ALEGRE

RIESA CONSTRUÇÕES E PROJETOS LTDA., APELANTE;

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, APELADO;

LUIZ CARLOS RIBEIRO PEREIRA, INTERESSADO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Vigésima Primeira

Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em rejeitar as

preliminares e dar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os

eminentes Senhores Desembargadores MARCO AURÉLIO HEINZ e GENARO

JOSÉ BARONI BORGES.

Porto Alegre, 03 de agosto de 2005.

DES. FRANCISCO JOSÉ MOESCH, Presidente e Relator.

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RELATÓRIO

SR. PRESIDENTE (DES. FRANCISCO JOSÉ MOESCH - RELATOR) – Trata-

se de apelação interposta por RIESA CONSTRUÇÕES E PROJETOS LTDA.,

da sentença que julgou improcedentes os embargos opostos à execução fiscal

intentada pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, condenando-a ao

pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10%

sobre o valor da causa.

Nas razões recursais, afirma a apelante que se insurge contra a

sucinta sentença que julgou improcedentes os embargos, por negativa de

prestação jurisdicional, já que não foram apreciadas as razões apresentadas

na inicial e petições de fls. 91/92 e 97/99, às quais se reporta. Alega que a

Administração Pública alterou as condições da obra contratada após a

assinatura do contrato, o que tinge de nulidade o negócio jurídico. Além disso,

a Ordem de Início de Serviço só foi emitida após o prazo de validade da

proposta, impossibilitando a empresa de manter os preços avençados. Postula

a reforma do julgado para a procedência dos embargos.

Em contra-razões, o apelado requer, preliminarmente, o não

conhecimento do apelo, uma vez que não ataca objetivamente os fundamentos

da decisão. Afirma que não houve negativa de prestação jurisdicional, pois a

sentença apreciou devida e corretamente a prova contida nos autos, inclusive

referindo prazos, afastando as explicações lançadas pelo embargante com

relação à desistência da obra. Contudo, os argumentos utilizados pelo juízo

monocrático não foram devidamente enfrentados pela apelante em seu

recurso. No mérito, narra que o recebimento e abertura das

propostas se deu em 1º/10/97; a homologação do certame foi publicada no

DOE de 14/11/97 e firmado o Termo de Contrato de Obras e Serviços de

Engenharia em 06/11/97; em 08/12/97, foi publicada a súmula do Contrato.

Encaminhada a Ordem de Início de Serviço à empresa vencedora do processo

licitatório, essa comunicou, em 11/12/97, a falta de interesse em executar a

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obra na Escola, porquanto expirado o prazo de sessenta dias de validade da

proposta. Alega o apelado que, na data da assinatura do Contrato, a proposta

estava em plena vigência, o que motivou a rescisão do contrato e desencadeou

processo de apuração de eventual infração de parte da empresa vencedora,

culminando com a aplicação da multa ora contestada. Notificada, a empresa

apresentou defesa que não foi acolhida. Diante da recusa do pagamento na

esfera administrativa, foi inscrita em dívida ativa, da qual se extraiu a Certidão

que instruiu a Execução Fiscal ora embargada. Sustenta que correta a multa

aplicada, haja vista o disposto nos arts. 78, XIV e 87, II, da Lei nº 8.666/93,

assim como na cláusula 16, alínea ‘b’, do Contrato. Pugna pelo não

conhecimento do apelo e, caso seja conhecido, pelo seu desprovimento.

Neste grau de jurisdição, o parecer do Ministério Público é pelo

conhecimento e improvimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

SR. PRESIDENTE (DES. FRANCISCO JOSÉ MOESCH - RELATOR) –

Rejeitam-se as preliminares suscitadas.

Não há que se falar em negativa de prestação jurisdicional, uma

vez que, na sentença, apesar de sucinta, estão expostos os fundamentos para

a improcedência dos embargos. Na verdade, a ora apelante é que não

concorda com o que foi decidido, razão pela qual interpôs o recurso de

apelação.

Quanto à preliminar de não conhecimento do apelo, argüida pelo

Estado, também não merece acolhimento. Embora extremamente sucintas, as

razões de inconformidade da recorrente estão contidas no segundo parágrafo e

merecem ser apreciadas.

No mérito, merece provimento o apelo.

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RIESA CONSTRUÇÕES E PROJETOS LTDA. opôs embargos à

execução fiscal proposta pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, alegando

ser incabível a multa que lhe foi aplicada em virtude da desistência de

realização da obra licitada.

Pelo que se observa dos autos, a apelante foi a vencedora do

procedimento licitatório modalidade Convite nº 055/97, do tipo Menor Preço,

cujo objeto era a contratação de serviços de cercamento e/ou gradeamento de

uma Escola Estadual. Conforme o item 2.3 do Edital (fl. 44), a proposta

vigoraria pelo prazo de 60 dias, a contar da data da entrega das propostas, o

que ocorreu em 1º/10/97 (fls. 53/54). A empresa RIESA foi a vencedora do

certame, com o preço global de R$ 18.675,44. Em 06/11/97, ocorreu a

firmatura do Termo de Contrato de Obras e Serviços de Engenharia nº 287/97

(fls. 09/16), sendo publicada a Súmula do Contrato no DOE em 14/11/97 (fl.

63). Houve nova publicação da Súmula do Contrato nº 287/97 em 08/12/97 (fl.

17), após a qual foi expedido Ofício (Ordem de Início de Serviço – fl. 19),

autorizando a empresa a dar início à execução da obra. No entanto, a empresa

RIESA, em 11/12/97, comunicou que não tinha mais interesse em executar os

serviços na Escola (fl. 20), tendo em vista já ter expirado o prazo de 60 dias da

validade da proposta. Em 19/12/97, a empresa requereu a rescisão do

Contrato, apresentando, ainda, outro argumento, qual seja, a existência de

erros de cálculos e das especificações técnicas fornecidas (fls. 64/65), ficando,

por isso, prejudicada a previsão orçamentária para a obra. Não aceitas as

justificativas apresentadas, o Estado rescindiu unilateralmente o Contrato (fls.

68/69). Instaurado processo administrativo (fls. 71/88), foi aplicada à empresa

multa de 10% sobre o valor total atualizado do Contrato, com fundamento no

art. 87, inciso II, da Lei nº 8.666/93, no montante de R$ 2.425,29, por

inexecução total do objeto contratado. A RIESA apresentou defesa. Mantida a

penalidade e não efetuado o pagamento, foi a empresa inscrita em dívida ativa,

da qual se extraiu a Certidão que instruiu a Execução Fiscal ora embargada.

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Os argumentos do Estado e do douto magistrado para a

manutenção da multa é que o Contrato fora firmado em tempo hábil, ou seja,

dentro do prazo de validade da proposta. E, ao firmá-lo, a contratada

concordou plenamente com o ali estipulado, especialmente quanto à cláusula

nona (fl. 12), que dispõe que “as obras terão início no prazo de até cinco dias

úteis a contar do recebimento da autorização do serviço” e “a autorização

somente poderá ser emitida após a publicação da súmula do contrato no Diário

Oficial do Estado”, a qual ocorreu em 08/12/97. Logo, a empresa descumpriu o

Contrato, razão pela qual correta a multa cominada.

Entendo que não lhes assiste razão.

Se a apelante descumpriu o Contrato, ao desistir de executar a

obra porque a Ordem de Início de Serviço só foi emitida após o prazo de

validade da proposta, o mesmo se pode dizer do Estado no que se refere ao

Edital.

É sabido que o Edital vincula todos os licitantes e a própria

Administração. É a lei da licitação no caso concreto, não sendo facultado à

Administração usar de discricionariedade para desconsiderar determinada

exigência do instrumento convocatório.

Como bem afirma MARÇAL JUSTEN FILHO (in Comentários à

Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 9ª ed., p. 64), “a Administração

tem liberdade para escolher as condições sobre o contrato futuro. Porém,

deverá valer-se dessa liberdade com antecedência, indicando exaustivamente

suas escolhas. Tais escolhas serão consignadas no ato convocatório da

licitação, que passará a reger a conduta futura do administrador. Além da lei, o

instrumento convocatório da licitação determina as condições a serem

observadas pelos envolvidos na licitação. A vinculação ao instrumento

convocatório complementa a vinculação à lei.”

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E, caso concreto, o item 2.3 do Edital (fl. 44) exige declaração do

proponente de que sua proposta vigorará pelo prazo de 60 dias, a contar da

data marcada para a entrega das propostas, o que ocorreu em 1º/10/97 (fls.

53/54). Portanto, em 1º/12/97, findou o prazo de validade da proposta, sem que

a contratada pudesse iniciar a execução da obra.

Se há previsão editalícia de validade da proposta e se a

Administração não autorizou o início do serviço dentro desse prazo, entendo

que pode a contratada desistir da realização da obra, pois não tem a obrigação

de garantir o preço inicial da proposta.

O que não se pode admitir é que a Administração exija proposta

com validade de 60 dias e, em razão de trâmites burocráticos, autorize o início

dos serviços somente depois de expirado esse prazo e, ainda, aplique multa à

empresa por inexecução contratual.

Entendo que tal atitude afronta os princípios norteadores da

licitação, expressos no art. 3º da Lei nº 8.666/93:

“Art. 3º. A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhe são correlatos.”

Conclui-se, então, que o recurso merece provimento, anulando-se

a inscrição em dívida ativa do débito relativo à multa cominada por inexecução

do Termo de Contrato de Obras e Serviços de Engenharia nº 287/97.

Diante do exposto, rejeitadas as preliminares, dou provimento ao

apelo, invertidos os ônus sucumbenciais.

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DES. MARCO AURÉLIO HEINZ (REVISOR) - De acordo.

DES. GENARO JOSÉ BARONI BORGES - De acordo.

Julgador de 1º Grau: Murilo Magalhães Castro Filho

RFP

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