Aires e Duarte - FA Eas Tendencias Do Fim Do Sec XX

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i UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA Instituto de Ciências Políticas e Relações Internacionais Departamento de Relações Internacionais AS FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS E AS TENDÊNCIAS DO FIM DO SÉCULO XX Dermeval de Sena Aires Júnior Érico Esteves Duarte Brasília, 2005

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA Instituto de Ciências Políticas e Relações Internacionais

Departamento de Relações Internacionais

AS FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS E AS TENDÊNCIAS DO FIM DO SÉCULO XX

Dermeval de Sena Aires Júnior

Érico Esteves Duarte

Brasília, 2005

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA Instituto de Ciências Políticas e Relações Internacionais

Departamento de Relações Internacionais

AS FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS E AS TENDÊNCIAS DO FIM DO SÉCULO XX

PARTE I – O FIM DA GUERRA FRIA

PARTE II – AS DIMENSÕES FÍSICA E TECNOLÓGICA

ANEXO O Orçamento das Forças Armadas Brasileiras – 1970/1998

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A pesquisa para os estudos contidos neste volume e as suas redações aconteceram durante os anos de 1997 e 1998 sob a orientação de Paulo Roberto da Costa Kramer, professor doutor do Instituto de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade de Brasília. Eles foram financiados pelo Programa de Incentivo a Bolsas de Iniciação Científica � PIBIC/CNPq. Suas apresentações finais foram feitas em agosto de 1998 e para o mesmo ano receberam o prêmio de melhor trabalho da UnB na categoria de política internacional. Versão revisada, impressa em agosto de 2005.

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Resumo O tema das páginas que se seguem é o pensamento estratégico e a realidade material nas forças armadas brasileiras no período que transcorre entre o fim da Guerra Fria e o ano de 1996, marcado pelo lançamento do documento Política de Defesa Nacional. Dermeval de Sena Aires Jr. analisa altos níveis de reflexão e discurso sobre forças armadas em meio à nova realidade política e à discussão sobre seu papel. Érico Esteves Duarte trata dos seus aspectos materiais e tecnológicos vis-à-vis desenvolvimentos e tendências mundiais. Ao fim, o anexo redigido pelos dois autores examina o orçamento das forças armadas para o período 1970-1998.

Abstract The following pages examine strategic thought and material reality in the Brazilian Armed Forces during the interval between the end of the Cold War and the year of 1996, in which the landmark document National Defense Policy was issued by the Brazilian government. The first study, written by Dermeval de Sena Aires Jr., analyses high instances of discourse regarding the Armed Forces as they face new political realities and the discussion of their role. The second study, written by Erico Esteves Duarte, deals with material and technological aspects vis-à-vis world developments and tendencies. Annexed to the studies is an article written by both authors, critically examining the budget for the Armed Forces between 1970 and 1998.

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AS FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS E AS TENDÊNCIAS DO FIM DO SÉCULO XX

Sumário Detalhado Agradecimentos dos Autores x Apresentação, por Paulo Roberto da Costa Kramer, Orientador xi

PARTE I – O FIM DA GUERRA FRIA

Por Dermeval de Sena Aires Júnior

Introdução 02 A Base Legal e a Mudança no Quadro Mental 04 Funções Constitucionais 04 O Conceito Estratégico Nacional (CEN) 04 Política Militar Brasileira 05 O Pensamento Esguiano 06 Hipóteses de Guerra (HG) 07 O Documento Política de Defesa Nacional 09 A Atuação Internacional das Forças Armadas nos Anos 90 12 Missões de Paz da ONU 12

A Participação Brasileira 13 Assistência em Missões de Paz da OEA

e como Observador da MOMEP 15 Documentos e Discursos Presidenciais / Oficiais 16 Sarney, Collor, Franco (1988-1994) 16 Cardoso (1995-1996) 16 As Monografias da Escola Superior de Guerra 20 O Fim da Guerra Fria 21 Um Novo Papel para o Hegemon Estados Unidos 22 As Forças Armadas e a Amazônia 23 Mercosul e Segurança Hemisférica 25 Pensamento Militar Brasileiro 26 O Orçamento das Forças Armadas 27

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A Discussão nos Periódicos Intelectuais Militares 28 A Produção Civil de Pensamento Estratégico no Brasil 30 Pensamento Estratégico Específico sobre Forças Armadas 30 Pensamento Estratégico em seu Sentido Amplo 33 O Dilema da Segurança e as Medidas de Confiança Mútua 34 Conclusão: O Fim da Guerra Fria 38 Referências Bibliográficas para a Parte I 41

PARTE II – AS DIMENSÕES FÍSICA E TECNOLÓGICA

Por Érico Esteves Duarte

Os Instrumentos da Guerra 48 Forças Terrestres 48

Estilo Russo de Organização de Forças Terrestres � Estilo Ocidental de Organização de Forças Terrestres 49-50

Infantaria 52 Infantaria no Brasil 55 Tanques 56 Tanques no Brasil 58 Artilharias 59 Artilharia no Brasil 61 Aeronaves 61 Joint Strike Fighter � Sistema de Monitoramento 65-66 Helicópteros 67 Aviões e Helicópteros de Combate do Brasil 69 Força Naval 71 Força Naval do Brasil 75 Bombas e Mísseis 75 Guerra Aérea 75 Guerra Marítima 79 Tipos Especiais 80 Mísseis e Bombas do Brasil 81 Guerra Eletrônica 82

Aplicações Ofensivas � Aplicações Defensivas 82 Guerra Eletrônica no Brasil 83

O Capitalismo da Guerra: Indústria e Mercado Internacional de Armamentos 85

Alterações no Mercado Internacional dos Anos 90 87 Transformações nos Setores Industriais em Cada Região 88

Estados Unidos � Europa � Rússia � Ásia - Outros Países 88-94 Indústria e Comércio de Armamentos no Brasil 94

A Dimensão Tecnológica 99 Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) Militar nas Principais

Potências Militares 99

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Estados Unidos � Rússia � Ásia � Europa � Países do Terceiro Mundo 99-101

P&D Militar no Brasil 101 Principais Projetos e Estrutura para P&D Militar nas

Forças Armadas 103 Conclusão � A Real Dimensão da Tecnologia 105 Referências Bibliográficas para a Parte II 112

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ANEXO

O ORÇAMENTO DAS FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS – 1970 / 1998

Por Dermeval de Sena Aires Júnior e Érico Esteves Duarte

Pg. 117-122

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Gráficos e Tabelas Objetivos Nacionais Permanentes (ONP�s) do Manual da ESG 06 Hipóteses de Guerra (HG�s) 07-08 Diferentes Ações do Sistema ONU de Segurança Coletiva 12 Operações de Paz da ONU, de sua Criação até 1998 13 Participações Brasileiras nas Missões de Paz da ONU 13-14 Recorte de Temas nas Monografias da ESG 21 Organização Típica de uma Divisão Russa de Infantaria Mecanizada 50 Organização Norte-Americana de Forças Terrestres � Div. de Blindados 51 Diminuição dos Efetivos das Forças Armadas dos Membros da OTAN 52 Organização de Unidades de Infantaria Russa / Norte-Americana 54 Principais Armamentos da Infantaria 54 Típica Brigada do Exército Brasileiro 55 Brigada de Infantaria Brasileira 55-56 Armamento da Infantaria Brasileira 56 Principais Tanques do Mundo 58 Características dos Tanques Leves 59 Principais Peças de Artilharia 60 Alterações na Força Aérea dos Estados Unidos 67 Principais Aviões e Helicópteros de Combate 68 Bombardeiros 68 Monitoramento 69 Helicópteros 69 UAV�s 69 Aviões e Helicópteros de Combate Brasileiros 71 Principais Armamentos de Guerra Naval 73-74 Composição das Principais Forças Navais 73-74 Principais Armamentos Navais no Brasil 75 Força Naval Brasileira 75 Principais Mísseis Usados por Aviões 77-78 Principais Mísseis Antiaéreos 79 Principais Mísseis Navais 80 Principais Mísseis e Bombas no Brasil 81 Comércio Internacional de Armamentos � 1980/1997 86 Importação de Armamentos por Região, 1996 86 Exportação de Armamentos por Região, 1996 86 Exportações de Armamentos pelos Estados Unidos, 1980/1997 89 Importação de Armamentos pelos Estados Unidos, 1980/1997 89 Importação de Armamentos pela Europa, 1987/1997 91 Exportação de Armamentos pela Europa, 1987/1997 91

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Importação de Armamentos pela URSS / Rússia, 1980/1997 92 Exportação de Armamentos pela URSS / Rússia, 1980/1997 92 Importação de Armamentos pela Ásia, 1987/1997 93 Exportação de Armamentos pela Ásia, 1987/1997 93 Importação de Armamentos pelo Terceiro Mundo, 1987/1997 94 Exportação de Armamentos pelo Terceiro Mundo, 1987/1997 94 Importação de Armamentos pelo Brasil, 1980/1997 97 Exportação de Armamentos pelo Brasil, 1980/1997 97 Lista de Armamentos Adquiridos pelas FA no Período 1994/1997 97-98 Lista de Armamentos Exportados pelo Brasil, 1994/1997 98 Principais Projetos da Aeronáutica 103 Principais Projetos da Marinha 104 Características do Airland Battle 106 Gastos em Defesa de Alguns Países da América

com Relação ao PNB em 1991 117-118 Gastos Militares na América do Sul e em Alguns

Países Europeus em 1994 118 Quadro Demonstrativo de Gastos Militares, Percentual

do PIB Alocado para as Forças Armadas e Efetivo Orçamentário Militar por País em 1995 118-119

Gastos com Defesa em 1996 119 Participação das Forças Armadas no Orçamento da União 1970- 1998 121

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Agradecimentos dos Autores

A Paulo Roberto da Costa Kramer, orientador, pela experiência de trabalho e pela transmissão de ensinamentos e valores importantes.

Às seguintes pessoas, pelos valiosos comentários críticos e sugestões: Thomaz Guedes da Costa James Dunnigan Domício Proença Júnior

General Gleuber Vieira (EME)

Comandante Bezerril (Marinha) Comandante José Geraldo (Marinha) Comandante Fausto (Marinha) Coronel Montenegro (ESG) Antônio Jorge Ramalho da Rocha (UnB) Matias Spektor Daniel Lavarda Sinigaglia

Às seguintes equipes e instituições, pelo auxílio prestado: Biblioteca do Estado Maior da Armada Biblioteca do CEE / SAE

Equipes da Biblioteca e Reprografia da ESG Biblioteca da USIS, Casa Thomaz Jefferson de Brasília

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Apresentação A discussão dos assuntos militares por civis é uma característica de qualquer democracia madura. A carência brasileira em Estudos Estratégicos se mostra, entre outras coisas, no fato de que quando militares brasileiros escrevem ou publicam sobre seus próprios temas, recorrem a autores e institutos estrangeiros: Brassey�s, SIPRI, IISS e Jane�s, entre outros, ao invés de recorrerem a dados oficiais. Durante as últimas décadas, diversos estudiosos puderam salientar as várias deficiências em Estudos Estratégicos no Brasil e, por meio de suas importantes contribuições, diminuí-la. O maior mérito dos trabalhos que se seguem é estarem entre esses esforços. Eles são o resultado de um sólido ano de pesquisas feitas por Dermeval de Sena Aires Júnior e Érico Esteves Duarte em Brasília e no Rio de Janeiro sob minha orientação. Possuem caráter introdutório, são amplos e ricos em informações, perpassando com uma revisão detalhada diversas áreas cruciais para a compreensão das forças armadas nos anos 90. Ao longo da convivência entre orientador e pesquisadores, o trabalho realizado brilhou em lucidez e capacidade crítica, características indispensáveis ao analista de Relações Internacionais e ao estrategista em qualquer tempo. Como o leitor ou leitora poderá apreciar, alguns tópicos abordados lidam com questões de grande atualidade e importância. Destaco em especial as críticas às noções de dissuasão e �revolução� nos assuntos militares contidas nas duas conclusões específicas, bem como o instigante artigo escrito a quatro mãos sobre o orçamento das forças armadas, anexado ao final do volume. No pós-Guerra Fria, contrariamente ao que é defendido por diversos autores, o campo dos Estudos Estratégicos não se encontra menos fértil do que em qualquer outro momento histórico. Ao fim e ao cabo, a última década do século XX será possivelmente lembrada como um período que viveu uma febre de otimismo exacerbado a respeito dos temas de segurança internacional e, consequentemente, nacional. Como se fosse possível ignorar a verdadeira essência das relações internacionais, que, acima de tudo, continuam sendo precariamente conflituosas.

Paulo Roberto da Costa Kramer Instituto de Ciência Política e Relações Internacionais � UnB

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PARTE I – O FIM DA GUERRA FRIA

Por Dermeval de Sena Aires Júnior

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Introdução Após o fim da II Guerra Mundial em 1945, a humanidade se viu às voltas com uma confrontação não menos abrangente, mais sutil e duradoura: a Guerra Fria. Por mais de quarenta anos, planejamentos governamentais e análises intelectuais se fizeram sobre aquilo que se percebia ser ela. Na história do Brasil, o marco de adesão oficial ao bloco americano e início de uma fase de afirmação da segurança hemisférica foi a assinatura do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca, em 1947. O governo militar que ascendeu ao poder em 1964 passou a buscar um modelo de inserção estratégica com alinhamento praticamente irrestrito. Suas percepções incluíam um pensamento geopolítico nacionalmente orientado, ainda que partindo muitas vezes de noções estrangeiras1. Após 1967, com a ascensão política dos militares considerados �de linha dura�, o planejamento governamental intensificou a busca da auto-suficiência, justificada pelo discurso do �Brasil-potência�. Esse discurso reservava ao país um lugar estratégico próprio e, representando um ideal de grandeza, acompanhou as forças armadas em seu engajamento na luta contra o comunismo. Durante todo esse tempo, boa parte do pensamento sobre política internacional se destinou a discutir problemas, riscos e vicissitudes na ordem bipolar. Mesmo para o primeiro mundo, alguns autores latino-americanos e brasileiros também se destacaram com suas produções. A iminência de um confronto direto esteve, por quase meio século, associada a análises ricas em conceitos como �equilíbrio de terror�, �containment�, �zonas de influência� e �imperialismo político-militar�. Ao contrário do que se poderia prever, a década de oitenta trouxe consigo realidades novas. A tentativa de auto-suficiência brasileira se exauriu em meio a problemas de dívida interna e externa. Ao mesmo tempo, os governos militares da América Latina devolveram o poder político às mãos de representantes civis legítimos. Por fim, internacionalmente, viu-se o colapso da União Soviética e de seu bloco, e o conseqüente fim de toda uma era. As discussões recentes sobre os impactos do fim da Guerra Fria no delineamento de uma nova ordem � ou, segundo alguns, desordem � internacional são marcadas pela inquietude sobre oportunidades de inserção estratégica. Afirma-se 1 Para caracterização do comportamento político brasileiro durante a Guerra Fria, a referência

primária para este estudo é CERVO e BUENO, História da Política Exterior do Brasil, caps. 11-14. A importação de conceitos geopolíticos estrangeiros é analisada por MIYAMOTO em Geopolítica e Poder no Brasil.

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que os tempos mudaram, trouxeram novos perigos, desafios e demandas à política entre as nações. Entretanto, é difícil definir essas mudanças com precisão, chegar a um consenso sobre quais são elas e que relevância elas têm de fato. Academicamente, o resultado dessa inquietação é o surgimento de novas teorias de relações internacionais, que ressaltam ora questões de diferenças culturais e religiosas na delimitação de novos padrões relacionais2, ora o triunfo da economia internacional sobre as questões de defesa3. Há autores que aguardam a volta de padrões geopolíticos tradicionais na expectativa de que estes estivessem adormecidos à espera de uma nova bipolaridade4. Outros se esforçam em defender a importância revolucionária da tecnologia nos assuntos militares5. Diferentes sínteses efervesceram ao longo dos últimos anos. Este estudo cumprirá duas tarefas. A primeira delas é sistematizar o que se escreveu no Brasil sobre o papel das forças armadas no período que transcorreu entre o início da década de 90 e o lançamento do documento Política de Defesa Nacional em novembro de 1996. Serão expostas e analisadas as bases legais, os posicionamentos oficiais e as iniciativas políticas do período; em seguida, aquilo que se produziu e publicou nos círculos intelectuais militares, por meio de documentos da ESG e revistas institucionais; por fim, as principais questões da discussão civil. Em todos esses passos, serão focalizados a importância e o significado do fim da Guerra Fria para as forças armadas; quais seriam as novas percepções de ameaças para o Brasil? Como lidar com a década das incertezas? Que papel devem ter as forças armadas na nova conjuntura? A segunda tarefa, a ser levada a cabo na conclusão, é refletir criticamente os resultados dessas discussões.

2 HUNTINGTON, The Clash of the Civilizations and the Remaking of the World Order. Também BARBER, �Jihad vs. McWorld�. 3 FUKUYAMA, O Fim da História e o Último Homem. 4 CASTRO, �MERCOSUL: Enfoque Geopolítico�. 5 TOFFLER e TOFFLER, War and Anti War.

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A Base Legal e a Mudança de Quadro Mental

a) Funções Constitucionais O mais elevado documento que diz respeito às forças armadas é a Constituição Brasileira de 1988. Seu artigo quatro explicita os princípios pelos quais o país busca pautar a sua atuação exterior:

�Art. 4º � A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: I � independência nacional; II � prevalência dos direitos humanos; III � autodeterminação dos povos; IV � não-intervenção; V � igualdade entre os Estados; VI � defesa da paz; VII � solução pacífica dos conflitos; VIII � repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX � cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X � concessão de asilo político�.

O segundo trecho relevante da Constituição é o artigo número 142, que dispõe especificamente sobre funções constitucionais:

�Art. 142º � As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais, permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem�.

Afirma assim a natureza instrumental das forças armadas e sua subordinação ao poder político civil. Além da Constituição, não existe outro documento normativo com o caráter de lei a regular a sua atuação.

b) Diretrizes Principais O Conceito Estratégico Nacional No artigo �Segurança e Defesa no Brasil: a Visão das FA em 1989�, Domício Proença Jr. e Paulo Moreira Franco esclarecem que o mais elevado documento sobre segurança nacional no Brasil antes de 1989 era o Conceito Estratégico Nacional. Ele determinava �a natureza do ambiente de segurança, as hipóteses de conflito, os cenários e as expectativas a serem priorizados�, justificando os planejamentos militares e a política de defesa. Originalmente redigido em 1969, o CEN não haveria sido reformulado ou alterado nos anos 80. Tampouco veio a público: apenas por meio de entrevistas ambos autores foram capazes de mapear

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o seu conteúdo. Seu ponto de partida era a luta ideológica contra o comunismo. Em consonância com a Doutrina de Segurança Nacional (vide abaixo), o CEN vindicava um esforço hemisférico no combate ao inimigo mundialmente presente, enxergando �o conflito entre o ocidente e o comunismo como imanente e insuperável, tendo lugar em todas as esferas da atividade humana� (pg. 145-146). A Força na qual o documento encontrou sua maior penetração foi o exército, e não parece ter tido grande repercussão nas outras duas Forças. Em sua formulação original, o CEN previa os seguintes cenários de conflito. Em primeiro lugar, a ação interna no combate ao comunismo. Em segundo lugar, o combate hemisférico na possibilidade de uma confrontação entre leste e oeste. Os dois cenários simultaneamente seriam uma terceira possibilidade. Curiosamente, o documento não contemplava a princípio conflito regional algum envolvendo a Argentina. Este quarto cenário foi adicionado posteriormente. (pg. 146) A Força singular que disponibilizou uma interpretação do CEN ao público foi a marinha, com a publicação da Avaliação Estratégica Naval. No documento, são determinadas diretrizes para o Plano Básico da Marinha e hierarquizados os planejamentos da Força por período. Em seu Plano Básico, a marinha concebeu a defesa brasileira com base no princípio da dissuasão (pg. 150-153). Mesmo consultando especialistas da área militar, não é mais possível dizer com certeza se o CEN permaneceu nos anos 90 e passou por alterações; se foi substituído por algum outro documento de caráter confidencial; ou se não mais existe. No entanto, ele foi ainda citado em uma análise recente6. O fato, no entanto, é que com o fim da Guerra Fria e a aproximação política com a Argentina nos anos 90, o CEN perdeu o seu sentido. No texto de Proença e Franco, essa realidade se explicita no fato de que o documento não chegou a ser mais atualizado, assim como previa, em intervalos regulares até o fim da década passada (pg. 147-148).7 Política Militar Brasileira A Política Militar Brasileira é o documento militar de mais alto nível disponível ao acesso irrestrito nos anos 90. A primeira edição da PMB data de 1989. Uma segunda edição surgiu em 1992 sem grandes modificações. Seus pressupostos básicos são alguns dos princípios constitucionais com clarificações pontuais:

�a) O Brasil considera o território nacional definido, não admitindo sua 6 A exemplo de FORTUNA em �O Poder Marítimo como Projeção do Poder Nacional�. 7 Em �Política de Defesa: uma Discussão Conceitual e o Caso do Brasil�, pg. 17 Thomaz

Guedes da Costa afirmou: �o CEN é fugaz (...) além do Conceito de 1969, não se tem notícia de que outro tenha estado em vigor�.

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violação nem a discussão de questões reivindicatórias nesse campo; b) O Brasil respeita o princípio de auto-determinação dos povos e não admite intervenção em seus assuntos internos; c) O Brasil participa de alianças e organizações internacionais, visando à realização dos Objetivos Nacionais e à cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; d) O Brasil recorrerá à guerra: em legítima defesa de seus interesses vitais; em caso de agressão estrangeira; após esgotadas as possibilidades de solução, por negociação direta, arbitragem e outros meios pacíficos, nos conflitos externos em que o País venha a envolver-se; e) A Expressão Militar do Poder Nacional deve estar capacitada para defender a Nação, dissuadir agressões e respaldar decisões soberanas; f) A eficácia da Expressão Militar do Poder Nacional é função do grau de independência tecnológica e logística e da capacidade de pronto emprego de seus meios�.8

O Pensamento Esguiano A Escola Superior de Guerra foi berço, ao longo de 40 anos, da Doutrina de Segurança Nacional. A DSN preconizava a luta entre o ocidente e o comunismo e identificava inimigos internos, Objetivos Nacionais Permanentes e uma Vontade Nacional cuja interpretação estava a cargo das elites políticas. Objetivos Nacionais (Definidos pela ESG):

�São manifestações de vontade coletiva de necessidades, interesses e aspirações vitais que, em determinada fase de sua evolução histórico-cultural, a nação busca satisfazer� Os ONP �não são estabelecidos nem fixados por quem quer que seja. Eles derivam do processo histórico � cultural e emergem naturalmente, à medida que as necessidades e interesses da comunidade cristalizam-se na consciência nacional, representando aspirações que, independente de classes, região, credo religioso, ideologias políticas, origens étnicas ou outros atributos, a todos irmanam� (Manual Básico, pg. 51).

Mais tarde surgiram os conceitos de �Objetivos Nacionais Permanentes�, representando �aspirações vitais� que �subsistem por longo tempo�, e �Objetivos 8 Para GROMORI em �Adequação da Política Militar Brasileira�, a Política Militar Brasileira

�não leva em conta todas as implicações da nova conjuntura mundial�, em um mundo pós-bipolar (pg. 6). O objetivo desse texto é sugerir pontos de adição à PMB para que ela se torne mais atual diante do novo cenário internacional. Os cinco pontos, ou objetivos adicionais, que Gromori propõe são: �ação de presença das Forças Armadas em todo o território nacional� (com objetivos de integração territorial); �integração e colaboração na pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico e padronização do material de uso comum entre as Forças Armadas� (visando à nacionalização e racionalização de material militar e à economia de recursos financeiros); �intercâmbio e integração progressiva com as Forças Armadas de outras Nações� (para aumentar a solidariedade entre as FA do Mercosul e fomentar doutrina e pensamento militar regionalizado); �divulgação à sociedade da importância das Forças Armadas�; e �formação e preparo de contingentes profissionais das Forças Armadas�.

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Nacionais Atuais�, ligados às determinações gerais de governo com vistas à consecução dos ONP (Manual Básico, pg. 47-51). Os ONP�s representariam as manifestações da vontade coletiva, necessidades, interesses e aspirações vitais, frutos da evolução histórico-cultural da nação. São listados os seguintes ONP�s:

- Democracia - Integração Nacional - Paz Social - Progresso - Soberania�9

O instrumento do Estado para alcançar os ON�s seria o Poder Nacional em suas expressões Política, Militar, Psicossocial, Econômica e Científico-tecnológica.

�Poder Nacional é a capacidade de que a nação decidida dispõe para conquistar e manter os seus ON�s�. �É o conjunto integrado de homens e dos meios que constituem a nação, atuando na conformidade da vontade nacional, para conquistar e manter os objetivos nacionais (Manual Básico, pg. 168)�

Para transcender ao cenário desejado, configurava-se a Estratégia Nacional:

�É a arte de preparar e aplicar o Poder Nacional para, superando os óbices, conquistar e manter os ONP, de acordo com a orientação estabelecida pela Política Nacional� (Manual Básico, pg. 190)

O conceito de Poder Nacional é mantido na PMB. Esta, no entanto, não mais influencia diretrizes superiores de governo, e tampouco o faz a doutrina da ESG10. Hipóteses de Guerra No artigo �Estratégia e Defesa (1960-1990)�, Geraldo Cavagnari afirma: �até o fim da Guerra Fria, a perspectiva do alinhamento estratégico sempre esteve presente na estratégia brasileira� (pg. 46). Em consonância com a exposição de Proença e Franco sobre o CEN, Cavagnari aponta as seguintes quatro hipóteses principais de guerra para o período: • Hipótese de Guerra Alfa: guerra revolucionária na América do Sul; • HG Beta: guerra convencional ou nuclear entre os dois blocos antagônicos da Guerra Fria; • HG Gama: as hipóteses Alfa e Beta ocorrendo simultaneamente; • HG Delta: guerra convencional na América do Sul [de probabilidade mais remota, esta

quarta HG caminhou para a identificação da Argentina como inimigo (pg. 48-50)]. 9 ROSA, �As Despesas Militares e o Orçamento da União�, pg. 4-10. 10 COSTA, �Política de Defesa: uma Discussão Conceitual e o Caso do Brasil�, pg. 18.

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As quatro hipóteses de guerra foram abandonadas com a virada da década. As três primeiras foram eliminadas com o fim do bloco socialista e o retorno do comunismo à arena política legal brasileira. E a hipótese de guerra contra a Argentina evaporou em meio ao clima cooperativo de integração regional. O que restou após a perda das quatro hipóteses pode ser observado no documento Concepção Política Militar, produzido na ESG em 1994. De acordo com ele (pg. 8-10), o Brasil estaria convivendo com as seguintes hipóteses: Hipótese de Guerra Alfa: Contra país ou países regionais por motivos históricos (...) questões de limites, aproveitamento de rios ou outros recursos naturais, divergências de interesses econômicos ou políticos, proteção de cidadãos e bens brasileiros naqueles países, eclosão de conflitos regionais ou, finalmente, ameaça à segurança, à soberania ou à integridade do Brasil. Hipótese de Guerra Beta: Contra país ou países regionais que defendam interesses de potências militares e tecnológicas, de alianças ou megablocos de poder ou, mesmo, de organizações internacionais ou entidades supranacionais. Hipótese de Guerra Gama: De natureza revolucionária, decorrente da exacerbação de dificuldades internas ou externas, tais como corrupção, miséria, violência urbana ou rural, narcotráfico, terrorismo, demarcação de reservas indígenas, interesses de minorias ou alegadas agressões ao meio-ambiente, contando, muito provavelmente, com incentivo e ajuda de potências militares e tecnológicas externas à região, diretamente ou representadas por países regionais alinhados. Hipótese de Guerra Delta: Decorrente de intervenção de potência militar e tecnológica, em defesa de seus interesses, diretamente, ou socorrendo-se de mandado de organização internacional para lhe coonestar as ações. Essas intervenções, obrigando o Brasil (...) a aceitar as condições que pretendem impor, podem ter os mais variados pretextos: ameaça ao patrimônio da humanidade, agressões ao meio-ambiente, desrespeito aos direitos das minorias, sobretudo as indígenas, ameaça aos seus nacionais aqui residentes e ao patrimônio de suas empresas aqui instaladas, eclosão de conflitos regionais, facilitando a produção ou o tráfico internacional de drogas e, finalmente, o não pagamento de dívidas externas. Hipótese de Guerra Épsilon: Aquela em que as FA atuam na área estratégica do Atlântico Sul, da Costa Ocidental da África e da Antártida, em defesa de interesses vitais ou de países aliados que participem de uma coligação regional de forças no âmbito do Atlântico Sul. Hipótese de Guerra Zeta: Aquela em que as FA atuam fora do Continente Sul-americano e das águas do Atlântico Sul em defesa de seus interesses ou como conseqüência de alianças, ou solicitação de organismos internacionais dos quais faça parte. Aqui estão incluídas as forças de paz. Neste caso, as Forças Brasileiras, normalmente, comporão uma Força Multinacional, que contará com a participação de, pelo menos, uma potência militar e tecnológica. Assim, as novas hipóteses abandonaram uma concepção totalizante, que previa a mobilização de toda a sociedade contra um inimigo onipresente, para contemplar possibilidades de menor intensidade e urgência retórica.

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O Documento Política de Defesa Nacional O documento Política de Defesa Nacional foi apresentado por FHC à nação em novembro de 1996, após dois anos de maturação11. Apesar de ser vago em diversas questões, ele é um marco que atende à antiga demanda de uma declaração unificadora. No seu lançamento, o presidente Cardoso afirmou: �Ela [a Política de Defesa Nacional] não se esgota nas páginas deste fascículo, que servirá de orientação para uma Política Militar Brasileira e de guia para a adaptação de partes das políticas setoriais já existentes. Vejo como um de seus maiores méritos a criação de condições para a integração de estratégias e planejamentos, e, em conseqüência, para a otimização de esforços e recursos.� Sua parte inicial avalia o cenário internacional, aponta o fim da Guerra Fria e reconhece dificuldades de planejamento estratégico no mundo pós-bipolar: �desapareceu a previsibilidade estratégica (2.2)�, �Nesta fase de transição (...), caracterizada pela ausência de paradigmas claros...� (2.4), �O quadro de incertezas (...) marca o atual contexto mundial. (2.5)�. Na América Latina, �a região mais desmilitarizada do mundo�, os conflitos tendem a diminuir: �os contenciosos regionais têm sido administrados em níveis toleráveis� (2.6). Alude-se à necessidade de uma �inserção regional múltipla, baseada em uma política de harmonização de interesses (2.8)�. O documento menciona as seguintes preocupações: 2.11: �Apesar de conviver pacificamente na comunidade internacional, [o país] pode ser compelido a envolver-se em conflitos gerados externamente como conseqüência de ameaças ao seu patrimônio e aos seus interesses vitais.� 2.12: �Persistem zonas de instabilidade [regional] que podem contrariar interesses brasileiros. A ação de bandos armados (...) nos lindes da Amazônia brasileira e o crime organizado internacional são alguns dos pontos a provocar preocupação.� A parte seguinte é titulada �Objetivos� e possui uma importância especial, apesar de ser relativamente curta. Ela lista as metas e ambições nacionais: f: a projeção do Brasil no concerto das nações e sua maior inserção no processo decisório internacional; g: a contribuição para a manutenção de paz e da segurança internacionais. A maneira como o documento antevê o objetivo de uma �maior inserção no processo decisório internacional� não é desenvolvida de maneira mais específica, mas encontra respaldo no discurso das forças armadas sobre projetos específicos, como o FT 2000. Nos anos 80, o ideal de Brasil-potência se 11 Em abril de 1994, o CEE-SAE promoveu o Seminário sobre Política de Defesa, que formou

um Grupo de Trabalho Interministerial. Entre maio e setembro do mesmo ano, o grupo produziu o documento-base da PDN.

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deteriorou. Nos anos 90, algumas declarações expressam ideais comedidos de potência média; e por vezes exaltados, mas sem a intensidade dos anos 70. A quarta parte é titulada �Orientação Estratégica� e expõe linhas norteadoras da defesa nacional. Os princípios de relacionamento internacional são os mesmos de sempre, repetindo em parte as palavras da Constituição: fronteiras e limites perfeitamente definidos e reconhecidos internacionalmente; estreito relacionamento com os países vizinhos e com a comunidade internacional, em geral, baseado na confiança e no respeito mútuos; rejeição à guerra de conquista; e busca de solução pacífica de controvérsias, com o uso da força somente como recurso de autodefesa (4.2). No entanto, sugerem também uma característica de postura estratégica: a dissuasão de natureza defensiva. Em teoria de relações internacionais, o termo �dissuasão� se refere à capacidade de inibir agressões, mostrando ao eventual agressor o quão custosas seriam suas hostilidades. Nas palavras de Murillo Santos, dissuadir é �desencorajar o inimigo de qualquer ação militar, mostrando-lhe uma tal perspectiva de custo e risco pela perda que ultrapasse o seu ganho. (...) A dissuasão trabalha na intenção do inimigo; o valor da dissuasão por forças militares é seu efeito em reduzir a probabilidade da movimentação militar inimiga�12. O sucesso dissuasório está no fato de que o recurso à força não foi necessário; e é possível haver casos em que não se saberá jamais sobre interesses hostis, uma vez que o possivel inimigo tenha desistido de agredir. Dependendo da percepção de perigo, no entanto, é possível que um país queira se armar ao máximo possível. De fato, assim foi a movimentação entre as duas potências nucleares durante a Guerra Fria13. Por sua vez, o conceito de �defesa� se refere ao engajamento bélico propriamente dito, considerando-se que algum grau de agressão já tenha se desencadeado. Murillo Santos expressa-o da seguinte maneira: �Defesa significa redução de nossas perspectivas de custo e risco no caso de falha de nossa postura de dissuasão. (...) Defesa reduz a capacidade do inimigo em nos causar danos ou mesmo derrotar-nos; o valor da defesa por forças militares é seu efeito em reduzir as conseqüências que nos forem adversas por possíveis ações inimigas, sejam tais conseqüências perdas de nossos bens materiais ou danos de guerra. Talvez a maior diferença entre dissuasão e defesa seja de que a dissuasão é primeiramente um objetivo de tempos de paz, enquanto que a defesa é valor em período de guerra�14. O teórico norte-americano Robert Art aponta que um país pode também agredir sob a justificativa de estar se defendendo, ou seja, poderia agredir com objetivos preemptivos15. E a PDN contempla também essa 12 SANTOS, �Apresentação�, in PROENÇA e DINIZ, 1998, pg. 11-12. 13 A reconhecida discussão teórica sobre o tema pode ser conhecida no clássico artigo de

Robert ART, �The Four Functions of Force�, pg.2-3. 14 SANTOS, �Apresentação�, in PROENÇA E DINIZ, 1998, pg. 12. 15 �The Four Functions of Force�, pg. 4, 6, 10 e 11.

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possibilidade: �o caráter defensivo não implica que, em caso de conflito, as FA tenham de se limitar estritamente à realização de operações defensivas (...) (n)uma eventual agressão armada, o País empregará todo o poderio militar necessário, com vistas à decisão do conflito no prazo mais curto possível e com o mínimo de danos à integridade e aos interesses nacionais (4.4)�. Em conformidade com os objetivos f e g (ver acima), é mencionada a Orientação Estratégica para as FA: �as Forças Armadas deverão estar ajustadas à estatura político-estratégica da Nação e estruturadas de forma flexível e versátil, para atuar, com presteza e eficácia, em diferentes áreas e cenários (4.6).� A última parte do documento é uma lista de 20 diretrizes que resumem o anteriormente dito. Nove delas se referem à atuação exterior do Brasil fortalecendo o intercâmbio com FA estrangeiras, participando dos processos decisórios sobre desarmamento, ajudando em operações de paz e buscando a solidariedade regional. A Antártida e o Atlântico Sul também são mencionados16. Entre as nove diretrizes, seis são sistêmicas e duas apenas são regionais. As demais onze diretrizes versam sobre a ação dentro do Brasil pelas instituições de defesa. O norte do país é visto como prioridade pela diretriz (j), que visa a: �proteger a Amazônia brasileira, com o apoio de toda a sociedade e com a valorização da presença militar�, enquanto que a diretriz (l) determina �priorizar ações para desenvolver e vivificar a faixa de fronteira, em especial nas regiões norte e centro-oeste� (grifo adicionado). As nove diretrizes remanescentes possuem um marcado caráter desenvolvimentista e defendem também para as forças armadas melhores níveis de formação, coordenação, mobilização e aparelhamento. Elas reforçam a necessidade de contato, transporte, controle e comunicações dentro do território para a melhoria de sua vigilância. Ressalta-se o papel integrador e indutor das FA, que, para a PDN, continuará sendo estimulado. A última diretriz enfatiza a necessidade de sensibilização e esclarecimento da opinião pública, com vistas a criar e conservar uma mentalidade de Defesa Nacional, por meio do incentivo ao civismo e à dedicação à pátria (diretriz u).

16 DPDN, Diretrizes a-h e s.

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A Atuação Internacional das Forças Armadas nos Anos 90

A atuação internacional das FA nos anos 90 se deu por meio da participação em missões de paz da ONU, da cooperação com a Organização dos Estados Americanos e da colaboração na resolução do conflito entre Equador e Peru. Missões de Paz da ONU As missões de paz são uma das principais atribuições do sistema de segurança coletiva das Nações Unidas. Desde sua fundação, a ONU coordenou 48 missões no mundo, em sua maior parte Operações de Manutenção da Paz. A decisão de criar uma missão é tomada pelo Conselho de Segurança, órgão máximo para a deliberação sobre emergências, conflitos e questões de segurança internacional. As operações podem assumir diferentes feições de acordo com a natureza do conflito em questão e as motivações políticas dos países-membros em relação a ele. A intensidade das operações pode variar desde o Peacekeeping até o envio de tropas em missões de Enforcement, assim como mostra a tabela abaixo:

Diferentes Ações Possíveis dentro do Sistema ONU de Segurança Coletiva

Peacekeeping Peace Enforcement Intervenção Humanitária

Enforcement

Meta Propiciar um ambiente pacífico,

que permita o estabelecimento

político

Implementação do cessar fogo e/ou dos

compromissos de paz

Criação de um ambiente seguro para ajuda

humanitária e/ou para a população civil

Restauração da paz e da segurança internas.

Meios Envio de soldados internacionais e

observadores militares sob o

comando e controle da ONU para tarefas

de observação, operar zonas tampão, manter

a lei, a ordem, etc.

Sanções; envio de soldados de combate

Sanções; envio de soldados de combate

Sanções; envio de soldados de combate

Pessoal Observadores militares, soldados de peacekeeping civis,

polícias civis

Soldados de combate Soldados de combate Soldados de combate

Base Legal Capítulo �VI ½�, poderes implicados

Capítulo VII da Carta da ONU

Capítulo VII da Carta da ONU

Capítulo VII da Carta da ONU

Autori-zação

Conselho de Segurança ou

Assembléia Geral

Conselho de Segurança Conselho de Segurança Conselho de Segurança

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Comando e Controle

Secretário Geral Secretário Geral ou Estado membro/Grupo de Estados Membros autorizados pelo

Conselho de Segurança

Secretário Geral ou Estado Membro/Grupo de Estados, autorizados pelo Conselho de Segurança

Comitê de Staff Militar ou Estados Membros/Grupos de

Estados, autorizados pelo Conselho de Segurança

Sobe-rania

Consentimento das partes (soberania

nacional é mantida)

Consentimento das partes ao(s) acordo(s) básico(s);

medidas de implementação concretas não necessitam ser aprovada pelas partes

Consentimento das partes é desejável, mas não

requerida (interferência com a soberania nacional

não está excluída)

Interferência com a soberania do agressor, assim como de todos os Estados Membros

(no caso de sanções em defesa do artigo 41 da Carta

da ONU Impar-ciali- Dade

A ONU é imparcial A ONU é imparcial A ONU é imparcial em princípio

As tropas da ONU se tornam uma das partes do conflito

(bellum iustum) Uso da Força

Somente em situações de óbvia

autodefesa

Uso médio da força, em caso de resistência

Uso médio da força, em caso de resistência

Emprego ostensivo Da força militar

Ex. UNMOGIP, UNIFIL UNOSOM II, IFOR UNITAF, "Opération turquoise"

Coréia 1950, Kuwait 1990

Fonte: Robert Diethelm: Die Schweiz und friedenserhaltende Operationen 1920 - 1995. Bern, Wien, Stuttgart, Paul Haupt Verlag, 1997. A seguinte tabela mostra os números das Operações de Paz durante a Guerra Fria e no período entre 1989 e 1996:

Operações de Paz da ONU, de sua criação até 1998 Completas Em Andamento Total Operações iniciadas antes de 1989. 8 5 13 Operações iniciadas entre 1989 e 1996. 22 7 29 Operações iniciadas entre 1996 e 1998. 2 4 6 Total de Operações conduzidas pela ONU entre sua criação e os dias atuais: 48 Fonte: Homepage da ONU em 15/04/98 (http://www.un.org/Depts/DPKO/overview.html). Como se pode ver, houve um aumento substancial no número de missões após 1989. Até então, a ONU conduzira 13 operações ao longo de 44 anos; já no intervalo dos 9 anos subseqüentes, surgiram 35 operações. Esse aumento foi possibilitado pela diminuição no uso do veto, um recurso amplamente utilizado pelas superpotências durante a Guerra Fria para assegurar a não-intervenção alheia em suas respectivas áreas de influência. A Participação Brasileira O Brasil participa de missões da ONU desde a primeira delas, o atendimento à manutenção da paz na guerra civil grega em 1947. Desde então, as FA já enviaram efetivos para 13 operações diferentes. A tabela abaixo as enumera:

Participações Brasileiras nas Operações de Paz da ONU LOCAL

OBJETIVO PERÍODO

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Grécia Observar uma possível intromissão de países vizinhos na guerra civil grega

1947 a 1951

Faixa de Gaza (Operação SUEZ)

Manter separados os beligerantes na guerra árabe-israelense. 1956 a 1967

Líbano e Jordânia Manter a estabilidade na região, evitando que se alastrassem os focos de insurreição.

1958 a 1961

Congo Evitar o genocídio perpetrado pelos separatistas, após a guerra de independência e proteger a retirada das tropas belgas da região

1960 a 1964

República Dominicana Restabelecer a ordem e a paz na República Dominicana 1965 a 1966 Nova Guiné, Paquistão e Chipre

Integrar Forças de Paz da ONU, evitando uma escalada de conflitos nesses países

1962 a 1966

El Salvador (ONUSAL) Verificar a obediência a acordos relativos à preservação de direitos humanos.

1991 a 1995

Uganda e Ruanda (UNIMUR)

Manter a estabilidade na região, evitando que se alastrassem os focos de insurreição.

1993 a 1994

Sérvia, Croácia, Bósnia-Hezergovinia e Macedônia (UNPROFOR)

Supervisionar os acordos de cessar fogo entre os litigantes, tentar solucionar os conflitos regionais pela via diplomática e promover proteção a comboios de natureza humanitária.

1992 a (em andamento)

Moçambique (ONUMOZ) Verificar o cumprimento dos acordos de paz entre o governo e a facção rebelde.

1992 a 1994

Angola (UNAVEM I) Verificar a retirada do efetivo militar cubano. 1989 a 1991 Angola (UNAVEM II)

Verificar o cumprimento dos acordos de paz entre o Governo de Angola e a UNITA.

1991 a 1995

Angola (UNAVEM III)

Promover condições para a instalação definitiva da paz em Angola e verificar a obediência a acordos relativos à preservação de direitos humanos.

1995 a 1997

Fonte: LEONEL, General Benedito Onofre Bezerra, �As Forças Armadas Brasileiras�, in Reuniões Ministeriais/ Empresariais, Anais do III Encontro Nacional de Estudos Estratégicos. Rio, 14 a 18 de outubro de 1996. Como se pode ver, entre 1947 e 1989, as FA estiveram presentes em 6 missões. Já entre 1989 e 1996, em 7. A mais longa e dispendiosa delas foi a UNAVEM, United Nations Angola Verification Mission, que observa os acordos feitos entre o governo Angolano e a frente revolucionária UNITA. Em 1997, já haviam sido enviados cerca de 4400 homens para os trabalhos de verificação17. Dos 38 países que compuseram a UNAVEM III, o Brasil foi o maior contribuinte de efetivos. A participação brasileira é possibilitada por uma coordenação interburocrática entre as FA e o Ministério das Relações Exteriores, interlocutor primário junto à ONU. As missões encontraram ampla motivação executiva durante o governo de FHC e até o momento não foi observada oposição no Congresso Nacional, o responsável pelos Decretos Legislativos que autorizam a cessão de contingentes. Entretanto, o Brasil não possuiu no período uma política de governo formal específica para essas participações. Em parte, essa carência foi suprida com o documento Política de Defesa Nacional. Na análise de Manoel Carlos Pereira, as duas condições externas para a decisão de participar das missões têm sido 1) a existência de um acordo político entre as partes do conflito e 2) um mandato claro e os objetivos para a Força perfeitamente definidos pelo Conselho de

17 O número 4400 vem da Mensagem do Presidente da República ao Cong. Nacional, 1998.

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Segurança18. Para as FA, a percepção de benefício das missões está no contato ganho em operações conjuntas entre as três Forças, na experiência em ambientes de conflito real, no intercâmbio com forças armadas de outros países e na execução de funções logísticas e emprego operacional19. Quanto aos objetivos políticos declarados de sua atuação, enfatiza-se a aposta do país em uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU no caso de uma mudança em sua estrutura de membros com direito a veto.20 Todas as participações brasileiras se enquadram na denominação Peacekeeping. Diante da possibilidade de participar da Guerra do Golfo em uma operação de Enforcement, na qual as tropas internacionais se tornam uma das partes do conflito, o governo recuou. Em seu artigo �Segurança Coletiva: Pensamento e Política no Brasil�, pg. 33, Thomaz Guedes da Costa sugere dois fatores explicativos para a decisão. O primeiro seria o intercâmbio no qual manufaturas e serviços eram enviados para o Iraque em troca de petróleo. O segundo, o fato de que trabalhadores brasileiros a serviços de engenharia não conseguiram deixar o país em meio à crise. Temeu-se assim que uma ação condenatória oficial desencadeasse incidentes e mortes entre eles. Assistência em Missões de Paz da OEA e como Observador da MOMEP Fora da égide da ONU, o Brasil esteve ainda presente em três outras missões21: a) A Força Interamericana de Paz que, sob a tutela da OEA atuou em São

Domingos no ano de 1965; b) Na Nicaragua e na Costa Rica, com o trabalho de supervisão dos acordos de

desminagem na fronteira entre os dois países, desde 1991. A mesma atividade vem sendo desenvolvida em Honduras, Guatemala e El Salvador;

c) No conflito entre Equador e Peru, desde março de 1995. A função das FA brasileiras, juntamente com as de outros países garantes do Tratado do Rio de Janeiro, Argentina, Chile e EUA, é a de ajudar a garantir a ordem entre os dois países em litígio, evitando que o conflito recrudesça ou aumente de proporções.

Uma vez mais, observam-se mais ações em curso após o fim da Guerra Fria � dois a um, para os anos 90.

18 PEREIRA, �Participação em Forças de Paz: a Experiência Brasileira�, pg. 14-15. 19 PEREIRA, pg. 12-13. 20 Ver COSTA, �Segurança Coletiva: Pensamento e Política no Brasil�, pg 30; MONTEIRO,

�Tropas de Paz da ONU�, pg. 184. 21 LEONEL, �As Forças Armadas Brasileiras�, pg. 14; PEREIRA, pg. 3.

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Documentos e Discursos Presidenciais/Oficiais O presidente da república é o comandante das forças armadas. O seu discurso, indispensável para o estudioso da política de defesa, é assim o mais alto nível da política declaratória do país e ponto de partida para o contraste entre o que se declara e o que se pratica. Do mesmo modo, ele é um parâmetro importante para as discussões que ocorrem em outros círculos e níveis institucionais. Sarney, Collor, Franco (1988-1994) Entre 1988 e o final do mandato de Itamar Franco, as mensagens anuais do presidente ao Congresso Nacional listam sempre, de um lado as �ações já realizadas�, e do outro os planos para o ano seguinte, para cada Ministério separadamente. Os discursos geralmente enfatizam aspectos ligados à renovação de material e desenvolvimento tecnológico, dando preferência para a compra de produtos nacionais. Neles é clara a gradual diminuição na retórica da auto-suficiência para a indústria bélica nacional. Preocupações a respeito da região amazônica são manifestadas pela primeira vez na mensagem de 1991. O início da década foi marcado por poucas iniciativas ligadas às forças armadas e os assuntos de defesa foram tratados com superficialidade. Durante os governos Collor de Mello e Itamar Franco, surgiram poucos documentos e declarações sobre política de defesa. Em Brasil, um Projeto de Reconstrução Nacional, Collor de Mello menciona o conceito de dissuasão, enfatizando profissionalização, prontidão operativa, desempenho tecnológico e mobilidade para as forças armadas (pg. 121-122). No entanto, as considerações relacionadas à defesa não vão além. Em sua apresentação aos alunos da ESG, Collor de Mello não abordou assuntos afins à questão da segurança e concentrou-se nos temas de inserção econômica internacional22. Do mesmo modo, em Diretrizes para a Ação de Governo Itamar Franco não faz menção alguma a assuntos de defesa23. Cardoso (1995-1996) Com Fernando Henrique Cardoso, a divisão de temas entre cada força singular na Mensagem Anual ao Congresso é abandonada, adotando-se uma sistemática de divisão por tópicos que inclui os quatro ministérios militares sob o título �defesa

22 O Brasil e o Mundo dos Anos 90. 23 Diretrizes para Ação de Governo, 1992.

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nacional�. Não há referência às forças armadas na mensagem de 1995. Na cerimônia de posse, FHC manifestou alguns dos posicionamentos que iluminariam questões relevantes ao longo de seu mandato: modernização das forças armadas, Política de Defesa Nacional e Ministério de Defesa24. No período em que governou, intensificou-se o pensamento de que o Brasil deveria participar mais ativamente do processo decisório mundial: mostrou-se assim o desejo de um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Seus discursos trazem três temas recorrentes: os valores brasileiros nas relações internacionais, as preocupações com a região amazônica e o orçamento das forças armadas. Em relação ao primeiro, enfatizam o abandono de antigas percepções sobre possibilidades de conflitos regionais, afirmam objetivos pacíficos para projetos de tecnologia dual, como o Veículo Lançador de Satélites, negam planos de desenvolvimento de bombas nucleares e delineiam uma postura militar dissuasória e defensiva25. Na palestra para alunos e estagiários dos cursos de altos estudos militares (nov. de 1996), porém, afirmou: �Estrategicamente [o país] tem uma atitude dissuasória defensiva, entretanto tem que estar pronta para se transformar em ofensiva, porque nós sempre temos que ter presente que diante de uma eventual agressão armada, nós temos que ter uma pronta resposta�. FHC ressalta o fortalecimento de relações, inclusive militares, no âmbito do Mercosul, creditando antigas desconfianças a percepções do tempo em que os dois países estavam sob o jugo de governos militares.26 No que diz respeito à Amazônia, demonstra preocupação com a atuação de grupos ilegais que, vindos de outros países, poderiam gerar ilícitos em território brasileiro e ameaçar a soberania. São mencionadas ameaças de narcotráfico e guerrilheiros cruzando as fronteiras e não encontrando grandes empecilhos a suas atividades, uma vez que a possibilidade de rastreamento na região antes do projeto SIVAM era

24 �Como Comandante-em-Chefe das nossas Forças Armadas, estarei atento às suas

necessidades de modernização, para que atinjam níveis de operacionalidade condizentes com a estrutura estratégica e com os compromissos internacionais do Brasil. Neste sentido, atribuirei ao Estado Maior das Forças Armadas novos encargos, além dos já estabelecidos. E determinarei a apresentação de propostas, com base em estudos a serem realizados em conjunto com a Marinha o Exército e a Aeronáutica, para se conduzir a adaptação gradual das nossas forças de defesa às demandas do futuro� Solenidade de posse no Congresso Nacional, Brasília, 01/01/95.

25 Sessão plenária do �1995 Mercosul Economic Summit�; também o Discurso de lançamento do avião EMB-145.

26 Despedida do navio escola �Brasil�. Ver também o Discurso de lançamento do avião EMB-145: �estamos ampliando esse tipo de relacionamento, que é um relacionamento construtivo, mas que é um relacionamento que requer uma, eu não diria preocupação, mas uma consideração da questão da nossa defesa e da questão militar. Nós não estamos perdendo de vista os nossos interesses quando tomamos decisões que nos levam a uma integração paulatina com os nossos vizinhos�.

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praticamente nula.27 A participação das FA no combate a essas ameaças é ligada ao fornecimento de apoio logístico e a repressão de infrações em si estaria fora de seu alcance, mais intimamente ligada à atuação da Polícia Federal. Repetidas vezes, enfatizou-se que as forças armadas não viveriam uma mudança nas suas funções constitucionais28 e não se dedicariam ao combate ao narcotráfico ou se especializariam em atividades policiais. O mesmo foi reafirmado por membros do alto escalão político-militar brasileiro.29 Ainda assim, as discussões envolvendo Amazônia não se dissociam do binômio Segurança e Desenvolvimento. Advoga-se maior presença militar na região como vetor de legalidade e manutenção da ordem, além de propiciar oportunidades de desenvolvimento por meio do programa Calha Norte30. O resumo por excelência dos posicionamentos presidenciais é o próprio discurso de lançamento da Política de Defesa Nacional:

�A prioridade que o governo vem dando à estabilização da economia e ao atendimento dos programas sociais, sem atender plenamente às necessidades de reequipamento dos órgãos de defesa deve-se, em grande parte, ao verdadeiro anel de paz construído em torno do país.�

�O fortalecimento do processo de integração, proporcionado pelo Mercosul, o estreitamento de relações com os vizinhos amazônicos, a intensificação da cooperação com os países africanos de língua portuguesa e a consolidação da zona de paz e cooperação no Atlântico Sul viabilizam essa concentração de esforços.�

�É preciso, todavia, não esquecer que persistem zonas de instabilidade, 27 �O projeto SIVAM, que foi tão mal falado, em parte foi mal falado por isso, porque ele é

um instrumento de controlar o tráfego aéreo. Toda a fronteira norte do Brasil não tinha controle. Até hoje não tem. Nós já pusemos uns radares, para controlar um pouco mais. Mas não tinha nenhum controle, zero. (...) E não havia nada. Não havia nada. Quer dizer, nós estamos articulando uma política global de combate, pelo menos, à entrada de drogas e contrabando. Nós estamos atuando. E acho que devíamos ter atuado a mais tempo e acho que nós, ainda, estamos muito aquém do necessário nessa matéria.� Entrevista concedida pelo Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, no encontro com jornalistas do projeto �Jornalista amigo da criança� � Andi.

28 Despedida do navio escola �Brasil�; Solenidade de apresentação dos novos oficiais generais; Apresentação dos estagiários da escola superior de guerra; Entrevista concedida ao programa �Jô Soares 11:30�; Palestra para alunos e estagiários dos cursos de altos estudos das escolas de guerra naval (EGN), de comando do estado maior do Exército (ECEME) e da Aeronáutica (ECEMAR) e da escola superior de guerra (ESG); Encerramento do XXV curso de formação profissional de agente de polícia federal; Discurso do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, na solenidade de apresentação dos estagiários da escola superior de guerra; Entrevista concedida pelo Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, no encontro com jornalistas do projeto �Jornalista amigo da criança� � Andi.

29 General LEONEL, �As Forças Armadas Brasileiras�, pg. 9. Também general CARDOSO, �Amazônia é Prioridade da Política de Defesa�, pg. 19-21.

30 O propósito é reafirmado nas Mensagens ao Congresso de 1996 e 1997.

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que podem contrariar os interesses brasileiros. A ação de bandos armados, que atuam em países vizinhos, nos limites da Amazônia brasileira, e o crime organizado internacional são alguns dos pontos que devem ser motivo de atenção das estratégias decorrentes dessa política de defesa.�

�Dentre outras razões foi, também, em atenção a esses aspectos que fiz inserir nas diretrizes para a consecução dos objetivos da política de defesa a proteção da Amazônia, com o apoio de toda a sociedade e com a valorização da presença militar e dos órgãos estimuladores de desenvolvimento e a priorização de ações para desenvolver e vivificar a faixa de fronteira, em especial nas regiões Norte e Centro-Oeste. E tudo isso com absoluto respeito ao meio ambiente e às populações locais.�31

Um possível aumento de orçamento para as FA, considerado justo, é no entanto visto como uma proposta difícil em meio ao contexto geral de preocupações com outras áreas públicas consideradas prioritárias.32

31 Cerimônia de anúncio da Política de Defesa Nacional, pg. 16-18. 32 �Acho que, evidentemente, nada disso será feito de uma maneira adequada, se nós não

melhorarmos o orçamento das Forças Armadas. Isso, eu acho que é óbvio, se junta à questão orçamentária geral. Mas nós temos tido muito empenho em que o Congresso - e o Congresso tem respondido favoravelmente - entenda as funções das Forças Armadas e dê os recursos às Forças Armadas, no seu preparo, no seu equipamento, na sua capacidade de desenvolver programas de ciência, de tecnologia que capacitem as Forças Armadas a estarem à altura do desafio."... Apresentação dos Estagiários da Escola Superior de Guerra.

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As Monografias da Escola Superior de Guerra Desde o início de suas atividades em 1950, a ESG tem sido o berço de boa parte do pensamento militar brasileiro. Durante a ditadura e mais adiante, a referência de concepções militares e o documento principal da doutrina que balizava a ação do exército brasileiro foi o seu manual básico. Domício Proença Jr. e Paulo Moreira Franco mostraram ainda em 1989 que o manual básico continuava valendo para os militares, apesar de ter perdido fôlego. Das três Forças, os únicos oficiais que ainda permaneciam altamente atrelados aos conceitos esguianos eram os do exército. Em algum grau, também foram encontrados laços entre o discurso dos oficiais da aeronáutica e a doutrina da ESG. Já os oficiais da marinha haviam dispensado suas concepções, tendo inclusive superado a confrontação leste-oeste antes mesmo que ela terminasse33. Os dois tradicionais cursos ministrados anualmente na ESG são o curso de altos estudos para civis em política e estratégia, CAEPE, e sua versão para alunos de procedência militar, CAEPEM34. Ao fim do ano letivo junto a instrutores em política e estratégia, cada aluno deve escrever uma monografia sobre um tema de sua escolha. As monografias ficam guardadas na biblioteca da ESG e cópias das melhores são enviadas para os ministérios militares em Brasília. Existe uma expectativa de que elas tenham qualidade elevada e sirvam para consulta na elaboração de políticas públicas. A maioria dos alunos de altos estudos da ESG possui procedência civil e não militar. O curso é aberto para ambos os gêneros e todas as profissões, sua meta é agregar diferentes áreas do conhecimento. Nos últimos dez anos, algumas dúzias de monografias foram escritas sobre diferentes temas com variados enfoques, alguns estratégicos, outros não. Como os instrutores da ESG não possuem produção acadêmica, conhecer essas monografias é uma maneira de compreender melhor as permanências e mudanças no pensamento da instituição e a maneira como ele é ensinado, por meio de seus resultados finais após o dispêndio do investimento. Ademais, os estudos do CAEPEM permitem um contato com algumas pessoas que estarão entre as elites

33 FRANCO, �Defesa, Indústria Bélica, C& T (...)�, pg. 115-138; PROENÇA e FRANCO,

�Segurança e Defesa no Brasil: a Visão das Forças Armadas em 1989�, pg. 139-170. 34 Três outros cursos de aprimoramento de oficiais são ministrados na ESG, habilitando a

funções dentro das Forças específicas: o curso de política e estratégia marítima, C-PEM, o curso de política, estratégia e alta administração do exército, CPEAEx, e o curso de política e estratégia da aeronáutica � CPEA. O CAEPEM tem como finalidade preparar oficiais para funções de chefia, comando e Estado-Maior combinados. É mais abrangente que os demais e fornece o guarda-chuva programático para eles.

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militares dentro de um horizonte médio (não existe uma estatística clara a respeito de quantos oficiais, dentre os que fazem os cursos, terminam tendo suas carreiras militares projetadas de alguma maneira com o decorrer do tempo para cargos políticos e/ou operacionais decisivos). Alguns autores ecoam o pensamento corporativista com grande fechamento doutrinário. Outros, por sua vez, mostram-se mais abertos. Algumas considerações metodológicas quanto ao recorte temporal 1989-1996: não foi possível obter acesso à maioria das monografias pré-1991, pois estavam guardadas em caráter reservado. Aquelas mencionadas abaixo datam em sua maioria dos anos 1994, 1995 e 1996. São elas, ao todo, dezesseis: uma de 1989, uma de 1990, uma de 1992, três de 1994, duas de 1995 e, finalmente, sete de 1996. O recorte temático obedeceu ao critério de conectividade com o tema deste estudo, e entre estas o acesso foi quase total. O resultado final soma dezesseis monografias em sete anos, recortadas a partir das seguintes questões. Cada uma delas trará abaixo um resumo dos posicionamentos encontrados, com seus pontos de contato ou discordância: • O Fim da Guerra Fria; • Um Novo Papel para o Hegemon Estados Unidos; • As Forças Armadas e o Mercosul; • As Forças Armadas e a Amazônia; • Pensamento Militar Brasileiro; • As Forças Armadas e o Orçamento da União. O Fim da Guerra Fria Muitas monografias repetem uma frase atribuída ao Almirante Vidigal, um intelectual militar brasileiro dos anos 90: �o fim da Guerra Fria implicou na mudança de um sistema de alta confrontação e baixa instabilidade para um sistema de baixa confrontação, mas alta instabilidade�. Ou seja, antes era possível ter algum grau de expectativa �x� ou �y� para as políticas militares dos países dentro dos blocos alinhados, bem maior do que o grau de expectativa nos planejamentos pós-bipolaridade. José Cosme de Azevedo esboça um pensamento semelhante: �o equilíbrio de terror foi substituído pelo reinado da insegurança�35. Alguns alunos identificam uma preponderância para os assuntos econômicos em relação àqueles de segurança internacional.36 A exemplo de Mário Carrazza:

�As questões militares vêm perdendo sua proeminência face às questões econômicas. A geoestratégia está sendo gradualmente sobrepujada pela

35 AZEVEDO, �Criação do Ministério de Defesa�, pg. 39. 36 CORTÊS, pg. 2; PEREIRA, �As Despesas Militares e o Orçamento da União�.

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geoeconomia. Acredita-se que cada vez mais a capacitação tecnológica, a força da cultura e, principalmente, o sucesso econômico, passem a exercer um papel preponderante no cenário internacional, o que indica a tendência do fator militar exercer um papel secundário, ou seja, atue mais como elemento de dissuasão ou persuasão.�37

Com igual freqüência, são identificados no mundo três superblocos econômicos: um na América do Norte, encabeçado pelos Estados Unidos e com a aderência imediata de Canadá e México, mas considerando toda a América como sua área de influência a longo prazo; outro composto pelos países da União Européia com influência imediata sobre o Leste Europeu, norte da África e Oriente próximo; e um terceiro agrupando os países asiáticos sob o comando do Japão e em meio ao extraordinário crescimento econômico da China. Na concepção tripartite, vê-se uma mudança no eixo da economia mundial do Atlântico para o Pacífico38. A nova dinâmica do poder mundial teria se deslocado do sentido leste-oeste para o norte-sul. A produção de tecnologia seria o novo diferencial segregador de países39 e as considerações de ordem econômica teriam se tornado mais cruciais. Os países são classificados em superpotência (EUA), megapotências (Alemanha, Japão), potências ascendentes (Brasil, Indonésia, China, Índia) e pseudo-potências (Argentina, Chile, África do Sul, México, Tigres Asiáticos)40. Os critérios que separam essas definições não são claros. Um Novo Papel para o Hegemon EUA Mesmo em um mundo economicamente multipolar, e apesar de potências como o Japão e a Alemanha, é recorrente nos textos a noção de uma única potência realmente completa, os EUA. Vitoriosos na Guerra Fria, os norte-americanos seriam os únicos com real capacidade de intervir militarmente em qualquer lugar do mundo41. Sobre suas relações com o Brasil, existe uma percepção de que teriam tomado para si, nos anos 90, o papel de �xerifes do mundo� e estariam empenhados em pressões para transformar as forças armadas de outros países em forças policiais destinadas ao combate de problemas como o narcotráfico e o crime organizado.42 Juntamente com outras potências, os EUA são acusados de

37 CARRAZZA, pg. 13. 38 Ver PEREIRA, pg. 11. 39 VILARINHO, pg. 8. AZEVEDO, pg. 30: �a dependência de tecnologia alienígena é, no

mundo atual, ponto comum, constituindo-se, mesmo, uma característica das FFAA dos países em desenvolvimento. Sendo as FFAA independentes, certamente o aparelhamento de cada uma far-se-á igualmente de forma independente e estanque, sem levar em consideração o interesse da Expressão Militar como um todo, com reflexos altamente negativos na sua eficácia global�. Para o conflito norte-sul, ver CARRAZZA, pg. 37.

40 ROSA, pg. 11-13; CORTÊS, pg. 7-8. 41 GROMORI, �Adequação da Política Militar Brasileira�, pg. 9. 42 CARRAZZA, �A Hegemonia Econômico-Militar dos EUA�, pg. 19 e pg. 37.

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iniciativas conspiratórias que visam a diminuir a capacidade de autodefesa e a soberania de nações menos fortes43. Surge assim, nos textos, a discussão sobre as possibilidades de ingerência internacional. Paralelamente, afirma-se que instituições como a ONU teriam se tornado �reféns� nas mãos dos EUA44. As Forças Armadas e a Amazônia As monografias são unânimes na defesa da Amazônia como a região mais prioritária para o Brasil após o fim da Guerra Fria. Demonstram insatisfação sobre o momento e acusam as organizações não-governamentais ali atuantes de serem os primeiros enviados dos países ricos para prepararem o caminho da internacionalização da floresta com apelos como �patrimônio da humanidade� e �pulmão do mundo�45. Segue um exemplo dessa argumentação:

�As transformações resultantes desse novo cenário mundial, encontram ressonância também em outros atores, que estão reformulando seus objetivos originais na busca de uma readequação aos desígnios da nova ordem. São os organismos internacionais, nascidos em um ambiente de reconstrução de nações destruídas pela guerra, concebidos para harmonizar os interesses dos países ricos. Não têm, portanto, desde sua gênese, muitos compromissos com o desenvolvimento das nações menos avançadas.46�

Algumas realidades marcam de forma categórica a desconfiança dos esguianos. Uma delas é o medo de um possível compartilhamento da soberania amazônica, considerado por eles uma ameaça real e imediata:

�A UNESCO, em 1948, lançou a proposta do Instituto Internacional da Hiléia Amazônica, visando a ocupação daquela área pelas nações da Europa. O governo americano, na gestão George Bush, pressionou o governo japonês no sentido da obstrução de uma linha de crédito, do chamado Fundo Nakasoni, para a construção da rodovia Brasil-Peru, que possibilitaria o escoamento da produção brasileira até o oceano Pacífico e, daí, aos mercados do Japão e Tigres Asiáticos. (...) Durante a Guerra Fria, surgiram muitas entidades privadas auxiliares da política externa de alguns países, conhecidas como ONG�s. (...) [Algumas de suas] �causas nobre� são: direitos humanos, direito das minorias, justiça social e proteção dos povos indígenas. Estes argumentos buscam a justificativa moral para a aplicação de certas �novas idéias� tais como: tarifa antidumping social � com vistas à promoção da justiça social; �selo verde� � como penalidade comercial, objetivando proteção ao meio ambiente; dever de ingerência e direito de intervenção � que se contrapõem ao antigo princípio da Guerra Fria, sobre a não interferência; reformulação do papel das forças armadas � que deveriam limitar-se à manutenção da ordem pública local, no conceito de Robert MacNamara, e, ainda, a soberania

43 CARRAZZA, , pg. 19. 44 CARRAZZA, pg. 37; CORDEIRO, pg. 15. 45 ROSA, �As Despesas Militares e o Orçamento da União�, pg. 40. 46 VILARINHO, �Mercosul como Estratégia de Segurança Nacional para a Amazônia, 12-13.

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limitada ou compartilhada � pela submissão das nações ao princípio da prevalência do direito da maioria sobre o da minoria, tese defendida por François Mitterand sobre a Amazônia. Estes conceitos são pronunciados por eminentes personalidades políticas internacionais com base no quadro de incertezas do mundo moderno, fundamentando-se no problema do narcotráfico, o contrabando de riquezas naturais, agressões à natureza, o desrespeito aos direitos humanos e a proteção à causa indígena. Nesse contexto, é expressiva a afirmativa de Boutros Ghali, Secretário Geral da ONU: �a noção de soberania dos Estados é um conceito flexível e cada caso é um caso��47

São mencionados ainda discursos de autoridades como Gorbatchev e Miterrand, senadores norte-americanos a declarações do Grupo dos Cem sugerindo que o Brasil aceite os movimentos de internacionalização da floresta48. Essa suposta �outra face� do ecologismo é denunciada ainda em 198949. Todas as oito monografias que tocam no tema tomam essa percepção como realidade efetiva. Apenas uma delas não compartilha a postura hostil das demais, e defende que o Brasil saiba tirar proveito da situação de outras maneiras50. Para os insatisfeitos, a defesa da Amazônia resulta em considerações desenvolvimentistas: seria preciso intensificar a política estatal de segurança e desenvolvimento na região. Há alguns indícios de que a tese da �orquestragem� internacional é transmitida aos alunos da ESG por seus instrutores. O argumento encontra vazão não apenas nas monografias, mas também em um dos seus documentos de estudo, a leitura sugerida publicada em 1995 por Luiz Carlos de Albuquerque Santos. Ela diz:

�Ainda não detectamos sinais de haverem os [países] mais ricos decodificado tal mensagem, e algumas de suas atitudes arrogantes complementam o quadro de injunções, mais ou menos veladas, que nos proporciona elementos para identificar as fontes mais prováveis de possíveis ameaças.�51

Ao contrário das posições esguianas, a valoração oficial brasileira da presença de ONG�s internacionais na Amazônia nos anos 90 é em geral positiva. Suas atuações foram bem-vindas e sua capacidade de trabalho, reconhecida. Durante o governo de FHC, no entanto, houve manifestação de altos escalões militares em tom de denúncia. O General-Ministro do então EMFA, Benedito Leonel, referiu-se a supostas �pretensões desnacionalizantes de tribos indígenas apoiadas por organizações internacionais� na Amazônia52 (o apoio oficial de governos a essas pretensões não deve ser, no entanto, inferido de suas palavras). As palavras de Leonel fazem coro, de maneira mais moderada, às do ministro do exército de Collor de Mello, Carlos Tinoco, que criticou a atividade das ONG�s e a presença 47 VILARINHO, pg. 13-14; ANTUNES, pg. 10. 48 GROMORI, pg. 34; PEREIRA, pg. 18-20 e 44. 49 LEITE, pg. 29. 50 COMBER, pg. 33. 51 SANTOS, �A Modernização das Forças Armadas dos Países do Cone Sul�. 52 LEONEL, �Perspectivas para as Forças Armadas Brasileiras�, pg. 42.

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estrangeira na região amazônica, logo após o incidente do rio Traíra em 199153. Mercosul e Segurança Hemisférica Historicamente, os países Latino-americanos do sul possuem uma trajetória de cooperação militar que remonta ao período das Guerras de Independência. Em 1986, o então Presidente José Sarney alavancou a iniciativa de criar uma Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul, com o objetivo declarado de promover uma desmilitarização na área por meio de medidas de confiança mútua, afastando assim o Atlântico Sul dos centros do conflito bipolar irresolvido de então54. Essa iniciativa é vista pelos esguianos como um diferencial em uma história de desenvolvimento, �a partir de estímulos norte-americanos para o atendimento dos seus próprios interesses e não necessariamente dos países da região�55 (emerge assim uma vez mais o viés contra os EUA). A América Latina é vista como uma região calma e reunindo as condições que favorecem tentativas de integração regional bem sucedidas, inclusive militares. A integração regional, tal como se pautava até 1996, é vista pelos estagiários como geradora de ótimas perspectivas para a criação de exercícios conjuntos e mesmo coordenações mais arrojadas. A percepção reinante é a de que os resultados já obtidos no âmbito do Mercosul quase asseguram que, tanto para o Brasil quanto para a Argentina, o antigo inimigo se transformou no parceiro preferencial56. Cleonilson Silva apresenta até mesmo a proposta da formação de um bloco militar de defesa coletiva na região com base nos princípios de �adesão voluntária� e �manutenção de soberania�.57 Por sua vez, Vasconcelos Gromori sugere o aprimoramento da Política Militar Brasileira por meio de novas diretrizes, entre elas uma especificamente direcionada ao �intercâmbio e integração progressiva com as forças armadas de outras nações�58 e com vistas ao desenvolvimento de doutrina e pensamento militar conjunto. Em meio à separação das três grande regiões � Pacífico, Europa, América do Norte � o Mercosul é visto como um bloco periférico de menor importância. Entretanto, a possibilidade de políticas militares conjuntas é percebida como uma maneira de aumentar o poder político e dissuasório59. A noção de defesa coletiva é bem-vinda. Uma das monografias vislumbra para um horizonte temporal não

53 Diário do Congresso Nacional: Ata da 29ª sessão, em 4 de abril de 1991 � 1ª sessão

legislativa ordinária do Senado Federal, pg. 2. 54 SILVA, pg. 30-31. 55 SILVA, pg. 47. 56 SILVA, pg. 46. 57 SILVA, pg. 48-49. 58 GROMORI, pg. 40. 59 CARRAZZA, pg. 14.

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muito distante um recorte geográfico já definido: do Oiapoque à Patagônia60. Pensamento Militar Brasileiro O fim da ameaça platina é uma mudança importante no pensamento dos militares brasileiros. O que restou da antiga hipótese de guerra envolvendo a região foi uma percepção minguada de possibilidade de conflito.

�É aquela [hipótese] contra país ou países regionais por motivos históricos, tais como questões de limites, aproveitamento de rios ou outros recursos naturais, divergências de interesses econômicos ou políticos, proteção aos cidadãos e bens brasileiros naqueles países, eclosão de conflitos regionais ou, finalmente ameaça à segurança, à soberania ou à integridade do Brasil.�61

Do mesmo modo, foram também abandonados os pensamentos de guerra global e guerra subversiva. Uma boa síntese desse processo é a seguinte:

�Das três hipóteses de conflito (HC) que dominavam o pensamento militar: a Guerra Global, a Guerra Subversiva, e a Guerra Regional, as duas primeiras perderam a sua razão de ser ficando sem credibilidade e a terceira HC perdeu qualquer sentido desde que ficou evidente a necessidade dos países, de cada região, se aglutinarem em blocos econômicos e aumentarem a cooperação na esfera política, para em uma economia cada vez mais globalizada não ficarem à margem do processo mundial, restando a hipótese de emprego mais provável de nossas FA, em futuro previsível, seria em conflitos de baixa intensidade associados a atividades ilícitas (tais como o narcotráfico, mineração ilegal ou o contrabando) em áreas de fronteira ou à presença de guerrilheiros de países vizinhos em Território Nacional.�62

A conseqüência desse processo seria a falta de um pensamento militar claro no presente. A responsabilidade é atribuída por vezes à sociedade civil alheia aos assuntos militares63. Sente-se a falta de uma política coerente no estabelecimento de linhas de ação claras para as FA. Para uns, a solução deste problema estaria na criação de um ministério de defesa responsável pela elaboração de políticas integradoras. O texto de Cleonilson Silva pondera sobre a questão:

�Diferentemente do passado, a adaptação do pensamento militar sul-americano à realidade ora vivida por seus países depende mais de um processo autônomo de convencimento do que de fatores exógenos. Em verdade, a busca da integração de Forças Armadas que se desenvolveram de forma isolada, e tendo na outra um inimigo potencial, representa uma proposta de mudança da sua base estrutural de pensamento, sendo perfeitamente normal, pois, esperar-se a

60 ROSA, pg. 18. 61 Concepção Política Militar, pg. 9. 62 ROSA, pg. 39. 63 CORDEIRO, pg. 68-80.

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reação contrária da parte de vários dos seus setores.�64 No mais, permanecem as reivindicações usuais pela definição de uma política militar que balize os planejamentos, de forma urgente.

�Carece o Brasil de um pensamento militar. Temos, ao longo dos anos, trabalhando Doutrinas oriundas do pensamento de alguns militares, normalmente adaptados de modelos importados, ou injetados em nosso meio. Falta uma linha filosófica de pensamento que sirva como trilha para que, ao redor dela, se tracem as Doutrinas que permitirão a aplicação da Força segundo o desejo da Nação�.65

�Em face da nova conjuntura mundial, torna-se necessário o estabelecimento dos conceitos estratégicos, seja o nacional, sob a responsabilidade da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), seja o militar, a ser atualizado pelo EMFA. A ausência desses dois documentos básicos traz para as FS conseqüências altamente negativas, pois se vêem forçadas a realizar seus planejamentos de alto nível, baseados em premissas eleitas sob a óptica de cada uma, individualmente, com o grave risco da perda de unidade de propósitos.�66

O Orçamento das Forças Armadas Entre os assuntos tratados na ESG, o orçamento das forças armadas é o mais recorrente. Em quase todos os anos no período 1989-1996, o tema foi adotado em pelo menos uma monografia. Via de regra, argumenta-se que mesmo em um período de paz o país possui um grande patrimônio a zelar; que uma crise econômica não é motivo para o descuido quanto à defesa nacional; que o número aproximado de 300.000 militares não é suficiente diante do patrimônio a se proteger da cobiça alheia; e que o equipamento atualmente utilizado está obsoleto a níveis críticos, prejudicando assim o treinamento dos militares67. Para os esguianos, a cifra média de 0,5% do PIB destinada às FA nos anos 90 não condiz às suas tarefas e nem à dimensão que elas devem assumir68.

64 SILVA, pg. 46-47. 65 CORDEIRO, pg. 68. 66 AZEVEDO, pg 22. Sobre a falta de unidade na doutrina: pg. 23-24. 67 GROMORI, pg. 30-33. Ver também PEREIRA, pg. 29-39. 68 O argumento está presente nos estudos de LEITE, pg. 10-20; GROMORI, pg. 31;

CARRAZZA, pg. 31; SILVA, pg. 46-47; ROSA, pg. 30-37.

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A Discussão nos Periódicos Intelectuais Militares Os principais periódicos militares em que intelectuais de orientação teórica expressaram pensamentos de maneira mais extensa nos anos 90 foram A Defesa Nacional, a Revista da ESG e a Revista Marítima Brasileira. A influência desses intelectuais é patente: nas monografias da ESG, seus artigos sobre conjuntura nacional, mundial e forças armadas são universalmente citados. A possibilidade de intervencionismo internacional também está presente em suas percepções. Entretanto, mesmo para o mais categórico entre eles, Carlos de Meira Mattos, essa concepção não atinge os tons conspiratórios de várias das monografias. Em um artigo de 1994, o Mattos alude claramente à atuação dos países do G-7, o grupo dos mais ricos e desenvolvidos, no orquestramento de ingerências mundo afora. Seria assim preciso manter um �grau de ameaça convincente� de poder dissuasório69. Em sua análise, a dissuasão estratégica �deveria representar a base da sustentação de uma estratégia militar brasileira�70. Com uma visão moderada sobre o tema, Mário César Flores afirma que as pressões diplomáticas e das ONG�s sobre o Brasil seriam grandes, mas �a intervenção direta não é, no curto prazo, uma realidade plausível�71. Entre os dois na intensidade de suas opiniões, Armando Vidigal comenta a forte tendência intervencionista do fim do século sem especificar agentes. Da maneira como o seu texto se apresenta, apreende-se a sugestão de que o agente central no processo é a ONU72. Para Mário Flores, a ação brasileira de defesa deveria trabalhar sobre as seguintes linhas principais: a) tornar a pressão militar menos atrativa nas disputas brasileiras em assuntos globais; b) dissuadir aventuras regionais, consideradas então improváveis; c) exercer um papel em manutenção de paz em conflitos internacionais onde os interesses brasileiros se comprometam; d) manter um poder naval de acordo com convenções internacionais e dentro da jurisdição e economia brasileiros; e) ajudar no controle de guerrilhas, narcotráfico e contrabando, considerados conflitos de baixa intensidade, quando a polícia não o

69 MATTOS, �A Dissuasão Estratégica na Conjuntura Mundial�, pg. 71-73; �A Missão das

Nossas Forças Armadas na Perspectiva da Nova Ordem Mundial�. 70 MATTOS, �Reflexões sobre uma Estratégia Militar para o Brasil�, pg. 111; �A Amazônia e

a Dissuasão Estratégica�, pg. 85 a 88. 71 FLORES, �Amazônia, Realidades e Mitos�. 72 VIDIGAL, �Estratégia e o Emprego Futuro da Força�, pg. 58-59; �O Papel das Forças

Armadas no Novo Contexto Mundial�; �Atlântico Sul: uma Análise Pós-Guerra Fria�.

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puder fazer; e, finalmente, f) manter a ordem interna sob a Constituição73. Sua listagem ecoa nos escritos de Eduardo Pesce, que ressalta seis dimensões bastante similares para a nova conjuntura: �1) Dissuasão de intervenções ou pressões militares contra o Brasil, por potências extracontinentais; 2) dissuasão de conflitos e antagonismos regionais que ameacem a segurança e os interesses do Brasil; 3) defesa das fronteiras terrestres em situações de conflito de baixa intensidade associado à guerrilha ou a atividades ilícitas; 4) defesa dos interesses marítimos do Brasil e garantia da segurança nas águas sob jurisdição brasileira; 5) garantia da integridade nacional e da ordem pública no campo interno, e desempenho de atividades de defesa civil nas calamidades públicas; 6) garantia da estabilidade, da ordem e da vida humana em áreas de conflito no exterior, atuando em cooperação e sob mandato internacional�.74

73 FLORES, Bases para uma Política Militar, pg. 157. Citação extraída de BITTENCOURT,

�Brazilian Strategic Landscapes... or Sunset?�. FLORES também desenvolve tema no artigo �Preocupações Militares do Fim do Século (Ilações sobre o Caso Brasileiro)�, salientando a necessidade de a) uma capacidade defensiva �clássica�; b) força de projeção de poder; c) controle da Amazônia; d) controle das águas costeiras; e) capacidade de apoiar a ordem constitucional e legal em situações especiais (pg. 41).

74 PESCE, �O Estado Brasileiro e a Defesa Nacional no Mundo Pós-bipolar�, pg. 73.

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A Produção Civil de Pensamento Estratégico no Brasil Poucos autores se dedicam aos estudos estratégicos no Brasil. Por isso o material disponível é muitas vezes menor do que o dos outros campos ligados às relações internacionais. O que se segue é um recorte entre pensamento específico sobre as forças armadas e pensamento estratégico sobre a situação mundial nos anos 90. Pensamento Estratégico Específico sobre Forças Armadas A respeito das FA, destacam-se dois artigos escritos para o livro Uma Avaliação da Indústria Bélica Brasileira. Neles, os autores entrevistaram militares de altas patentes das três forças em busca do pensamento das elites militares ainda antes do fim oficial da Guerra Fria. São criticadas as dificuldades da pesquisa durante o regime militar na dificuldade de acesso a informações sobre os militares e na ausência de documentos disponíveis. Por outro lado, os autores afirmam que a receptividade dos entrevistados à iniciativa de um mapeamento foi grande75. Os posicionamentos dentro das três forças variaram bastante em alguns pontos. São apontados resquícios da Doutrina de Segurança Nacional fortemente arraigados no discurso dos entrevistados do exército, para os quais um conflito com a Argentina em 1989 ainda seria uma possibilidade. Os oficiais do exército mantinham-se fiéis à doutrina esguiana e afirmavam consensualmente que o Brasil estava despreparado para as ameaças da Guerra Fria. Acreditavam ainda na vocação para atuar no Atlântico e na possibilidade de guerra interna em caso de confrontação direta entre leste e oeste. Identificou-se entre eles a percepção de perigo envolvendo a Amazônia a partir de pressões exercidas pelos EUA e por movimentos ambientalistas internacionais76. No caso de envolvimento em algum conflito, acreditavam que teriam tempo para preparação enquanto o possível conflito real se intensificasse aos poucos. Em tempos de guerra, isso cuidaria de mobilizar o país e criar as capacidades de combate necessárias77. Os oficiais da marinha não compartilhavam essa visão. Para eles, a bipolaridade já teria terminado há tempo e, na hipótese de conflito interno, não caberia às forças armadas o papel de repressão. Sem se ater à doutrina esguiana e sequer 75 FRANCO, �Defesa, Indústria Bélica, C& T: o Ponto de Vista dos Atores�, pg. 115-138;

PROENÇA e FRANCO, �Segurança e Defesa no Brasil: a Visão das Forças Armadas em 1989�, pg. 139-170.

76 PROENÇA e FRANCO, �Segurança e Defesa no Brasil (...)�, pg. 168. 77 PROENÇA e FRANCO, �Segurança e Defesa no Brasil (...)�, pg. 169.

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mencionando-a, os oficiais da marinha pensavam estritamente na possibilidade de ameaças externas78. Das três forças, a marinha foi a única a clarificar melhor suas diretrizes aos cidadãos em seu Plano Básico, que se baseava no conceito da dissuasão defensiva e salientava quatro tarefas navais: �o controle da área marítima, a negação do uso do mar, o ataque à terra e a partir do mar e a demonstração de força�. A manutenção de uma guarda costeira era vista pelos seus oficiais como algo além de suas atribuições principais79. Na percepção dos oficiais de aeronáutica, não haveria ameaças externas. Sua Força não construiu cenários de conflito; trabalhou apenas na manutenção de um mínimo operacional factível. O apego à doutrina esguiana era intermediário entre o do exército e o da marinha, não chegando nem ao dogmatismo do primeiro nem à sua desconsideração. Durante as entrevistas, os oficiais da aeronáutica logo abandonava as premissas da DSN e passaram a questões de desenvolvimento tecnológico80: enfatizavam os aspectos de defesa ligados à unicidade do poder aéreo com estruturas utilizáveis tanto em tempos de paz quanto de guerra, e ressaltaram três prioridades: os projetos AMX, SINDACTA, e VLS.81 O que se discutiu sobre quais seriam as necessidades, os níveis adequados e o preço aceitável da defesa nacional? A situação se complica se as discussões fundamentais sobre o lugar e as ambições do país não estão claras: a indefinição termina se perpetuando nas decisões relativas à compra de material, nos efetivos treinados e na determinação de quanto e como deve ser investido em tecnologia nacional. Os resultados da falta de direcionamento são a formação de um agregado cheio de incertezas, a imperfeição na informação, a falta de transparência e racionalidade no emprego de recursos e na condução de programas, e o sub-aproveitamento de potenciais que poderiam ser melhor usados em planejamentos mais modestos ou direcionados.82 Ao coordenarem seu planejamento organizacional e apesar da ausência de uma política de defesa, as FA trabalharam sobre dois conceitos: a) a dissuasão e b) a organização em núcleos táticos e operacionais83. Sem ameaças claras, a tendência das Forças foi dedicar-se a atividades de preparo e preservação de capacidades de longo prazo. O estrategista Domício Proença Jr., no entanto, alerta que essa atitude é arriscada: facilitar a dispersão de esforços e a perda de noção de conjunto. Ao não se priorizarem áreas ou concentrarem esforços em função de finalidades claras, existe o perigo da busca de uma qualificação �adequada� em 78 FRANCO, �Defesa, Indústria Bélica, C& T (...)�, pg. 120-127. 79 PROENÇA e FRANCO, �Segurança e defesa no Brasil (...), pg. 150-153. 80 FRANCO, �Defesa, Indústria Bélica, C& T (...)�, pg. 128-129. 81 PROENÇA e FRANCO, �Segurança e Defesa no Brasil (...)�, pg. 158-165. 82 Sem dúvida, a discussão mais consistente já escrita sobre esses problemas é a de

PROENÇA e DINIZ, Política de Defesa no Brasil: uma Análise Crítica. 83 PEREIRA, �As Perspectivas da Indústria Bélica Brasileira nos Anos 90�, pg. 79.

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todas as áreas, não se conseguindo, na prática, níveis satisfatórios de resultados em nenhuma delas84. Para lidar com essa realidade, Proença propõe uma nova metodologia baseada no conceito de �Força Mínima�85. A Força Mínima pressupõe que, apesar de hipoteticamente válida, a percepção de que um país está livre de ameaças não elimina a incerteza inerente às relações internacionais: o fato de que não existe uma ameaça hoje não quer dizer que não existirá uma amanhã. Adicionalmente, pode-se lembrar que não existe uma garantia internacional ou instituição capaz de proibir os países de se agredirem e coagi-los a respeitar as convenções estabelecidas. Ainda que exista o mecanismo de segurança coletiva da ONU, esse aparato tem se mostrado aquém de sua idealização86; depende da capacidade real de aportes financeiros dos países membros da Organização e obedece a lógicas políticas que extrapolam a simples proibição do uso da força nas relações internacionais, tal como está explícito no artigo 2, parágrafo 4 da sua Carta87. A Força Mínima seria assim, em um contexto de ausência de ameaças claras, a manutenção de forças armadas com capacidades práticas satisfatórias, apesar de �mínimas�: atende ao princípio de que esforços devem ser continuamente empregados para a travessia de contextos nos quais as ameaças são difusas, a um custo aceitável. A determinação da Força Mínima, no entanto, é uma tarefa política, observando-se naturalmente os padrões de estado da arte da ciência militar. A discussão sobre o tamanho e a qualidade das forças armadas deve ser feita em instâncias como o Parlamento e o futuro ministério de defesa. Proença sugere uma concepção inicial de seus critérios mais importantes: considerações de natureza técnico-operacional e estratégico-logístico. Politicamente, o Brasil convive ainda hoje com a escassez de informações. O exemplo fundamental é a ausência de um �white paper�, o livro branco sobre defesa que é anualmente publicado e atualizado em diversos países, e no qual se pode observar discurso e prática no planejamento militar, bem como a superação do isolamento entre os militares e o Congresso, a opinião pública e os estudiosos. A sua necessidade é defendida até mesmo em declarações militares, como aquela feita em 1995 pelo Ministro General Benedito Leonel: �É indispensável que seja elaborado um livro branco das forças armadas, de livre acesso a qualquer cidadão

84 PROENÇA, �Prioridades para as Forças Armadas�, pg. 29-30. 85 PROENÇA, �Força Mínima. Notas sobre uma Defesa Mínima Suficiente do Brasil�. 86 Para os desafios da ONU e do direito internacional nos anos 90, ver AREND e BECK, pg.

4: �a ONU tem sido amplamente incapaz de utilizar efetivamente qualquer quantidade de poder que ela possua em teoria�.

87 �All members shall refrain in their international relations from the use of force against the territorial integrity or political independence of any states, or in any other manner inconsistant with the purposes of the United Nations�

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do país, contendo as informações básicas sobre as instituições militares�.88 Pensamento Estratégico em seu Sentido Amplo �Há sólidas evidências de que o pensamento estratégico brasileiro está conturbado (...) Depois de sessenta anos de domínio, um projeto nacional, de natureza autárquica, planejado centralmente e ambicioso na aspiração de projetar o Brasil como potência, transformou-se�. Com essas precisas palavras, Thomaz Guedes da Costa inicia um de seus escritos sobre segurança hemisférica89. O mesmo texto traz a definição de estratégia sobre a qual este estudo se baseia:

�É uma concepção globalizante de unidade e de direção de todas as decisões transfuncionais da entidade política autônoma, num ambiente interativo de oportunidades e riscos para interesses, para a transcendência de um cenário para outro�90.

A partir dela, é muito difícil entender as aspirações brasileiras nos anos 90. A postura crítica não se limita aos analistas e estudiosos, mas é compartilhada por pessoas que trabalham nas áreas públicas da inserção internacional do país91. A transição ao mesmo tempo interior e exterior vivida nos anos 90 foi marcada por um lado pela redemocratização do país e a retirada dos militares da política strito senso, deixando assim as posições hegemônicas de decisão e, gradualmente, retornando ao papel de instrumentos políticos. Por outro, o fim da Guerra Fria proporcionou uma quebra na previsibilidade nos planejamentos estratégicos, agora que a única certeza seria a de mudança92. Para Costa, a falta de um planejamento estrategicamente coeso é em parte fruto da transição entre um governo autoritário e os governos de natureza democrática, cujos processos políticos obedecem a novas dinâmicas eleitorais competitivas. Nos anos 90, a agenda política nacional se pulverizou e isso dificultou a formação de um projeto de inserção internacional. Adicionalmente, a abertura política do Brasil demite a antiga vertente interna da noção de segurança nacional, uma vez que a participação e a luta por poder foi ampliada para 88 LEONEL, �Perspectivas para as Forças Armadas Brasileiras�, pg. 41. 89 COSTA, �O Balanço Estratégico e o Brasil na Segurança do Hemisfério Ocidental�, p. 69. 90 COSTA, �O Balanço Estratégico (...)�, p. 70. 91 SARDENBERG, �A Inserção Estratégica do Brasil�, pg. 14: �Diante desse rico quadro de

possibilidades, será necessário que se promova o desenvolvimento de modalidades flexíveis e criativas de pensamento estratégico. Certos princípios diretores devem ser observados, ao mesmo tempo que se torna imperioso desenvolver a noção de projeto�. Também LEONEL em �Perspectivas para as Forças Armadas Brasileiras�, pg. 43 e AQUINO, �Cenário 2000: Forças Armadas para Quê? A Visão do Exército�, pg. 37.

92 Ver BITTENCOURT, �Brazilian Strategic Landscapes... or Sunset?�.

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diferentes correntes e posicionamentos e aumentou o espaço para a discussão e deliberação de questões de segurança. Diminuiu assim a possibilidade de planejamentos holísticos e dissociou a segurança nacional das agendas de política interna, sociais e de segurança pública. No campo externo, as incertezas geradas pelo fim da Guerra Fria e o desmantelamento de uma ordem congelada há meio século coincidem com o fenômeno de integração regional. No lugar da alegada rivalidade anterior, restaram uma série de concepções difusas sobre a utilidade da região no estabelecimento de medidas de caráter estratégico. A utilização de termos como �balanço militar� e �equilíbrio de poder� estaria assim fora das considerações brasileiras sobre como interagir com os seus vizinhos, exceto nos momentos de grandes compras de armamentos93. Costa afirma categoricamente: �o conceito de Cone Sul não encontra, hoje, utilidade operacional na reflexão estratégica brasileira�94. O Dilema da Segurança e as Medidas de Confiança Mútua O conceito do Dilema de Segurança é uma das construções mais influentes da teoria de Relações Internacionais; é uma noção tão antiga quanto a guerra, que nos tempos recentes foi operacionalizada de maneira reconhecida no artigo escrito por John Herz em 1950, Idealist Internationalism and the Security Dilemma. Sua formulação argumenta que diferentes países podem, dependendo de fatores geográficos e padrões históricos de amizade ou inimizade, estar de tal forma ligados em suas percepções mútuas que aquilo que um faz para aumentar a sua segurança pode terminar tendo o efeito de diminuí-la, ao gerar suspeita nos outros. Quando um país toma medidas para aumentar a sua segurança � por exemplo a modernização de suas forças armadas ou o desenvolvimento de tecnologias utilizáveis para fins bélicos � seus vizinhos e outros países podem se sentir ameaçados e, como reação, também se armarem. Assim, o primeiro país não aumenta a sua segurança e pode até diminuí-la; nos efeitos práticos sobre as ações de outros decisores, diminui a segurança de todos. Uma vez que os outros países da região se fortaleçam, o primeiro é realimentado em sua percepção de que necessita de se armar mais. Em uma bola de neve, esse fenômeno pode gerar corridas armamentistas. O ambiente internacional �anárquico�, no qual cada país precisa prover sua segurança por conta própria, propicia dilemas de segurança95.

93 COSTA, �O Balanço Estratégico (...), pg. 74. A afirmação encontra respaldo na entrevista

presidencial de 01/09/97: �Não vai haver corrida armamentista. Eu tenho tranqüilidade quanto a isso. Pode haver, e é necessário que haja, reposição de armamento, às vezes obsoleto, aqui ou ali. (...) Então, não há esse risco�.

94 COSTA, �O Balanço Estratégico (...)�, p. 73. 95 As referências clássicas do século XX para essa discussão são as obras de Hans

MORGENTHAU, Politics Among Nations e Dilemmas of Politics; e de Kenneth WALTZ, Man, the State and War e Theory of International Politics.

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As saídas para o dilema da segurança são a criação de condições de cooperação e diminuição da incerteza; a busca de transparência e a capacidade de desistir de aspirações e posicionamentos vistos por outros como ameaçadores. A discussão contemporânea sobre percepções mútuas começou na Guerra Fria: estudiosos norte-americanos chamavam a atenção para as condições nas quais a cooperação entre as duas potências diminuiria aquilo que Phillipe Delmas caracterizou como o �vértigo� nuclear96. Existiriam assim maneiras de aumentar a cooperação e diminuir a possibilidade de conflito aberto: comportamentos de �toma-lá-dá-cá� em que as partes se comprometem a, gradualmente, aumentar a previsibilidade de suas ações. Com compromissos factíveis cumpridos, pode-se caminhar para a cooperação a mais longo prazo e o aumento de benefícios entre as partes97. Costa adverte que o dilema pode surgir também na ausência de uma postura estratégica bem definida, em meio às tecnologias ditas duais � utilizáveis tanto para fins pacíficos quanto bélicos. Menciona o exemplo do projeto do submarino de propulsão nuclear, tido como prioritário para a marinha: tecnicamente um submarino de ataque, sua construção é oficialmente vindicada para aplicações doutrinárias defensivas. Mas esse tipo de projeto poderia gerar suspeita e causar dilemas da segurança. Em sua visão, é esse tipo de �cálculo� que aparenta estar longe das mentes dos decisores brasileiros98. Sua discussão menciona ainda as medidas de confiança mútua, MCM�s. Também chamadas medidas de fomento da confiança e segurança, elas se baseiam nos princípios de transparência e previsibilidade. Nas palavras de Francisco Aravena, são �um conjunto de medidas práticas que evitem que por um erro de interpretação se produza uma situação de tensão, com o conseguinte perigo de escalada�99, ��atos� habitualmente precedidos ou acompanhados de declarações favoráveis à paz, compreensão e harmonia entre os povos. Isso significa que se busca fazer conhecidas essas ações para que o auditório internacional seja testemunha, com o que dão maior força à obra�.100 Para que as MCM funcionem eficazmente, as intenções declaradas de um país se devem acompanhar de políticas setoriais e militares claras, compreensíveis por vizinhos e potenciais concorrentes, e acenem com a possibilidade de cooperação. Dentro do conceito, é fundamental que a prática esteja em conformidade com as declarações oficiais e que estas sejam coerentes. Do mesmo modo, os feitos práticos e as perspectivas de futuro devem estar visíveis. Não há que se legitimar apenas aquilo que já se fez ou está fazendo, mas também aquilo que se deseja fazer, de modo a afastar 96 DELMAS, El Brillante Porvenir de la Guerra, cap. 1. 97 OYE, �The Conditions for Cooperation in World Politics�; GRIECO, �Anarchy and the

Limits of Cooperation�; STEIN, Why Nations Cooperate, pg. 03 a 54. 98 COSTA, �O Balanço Estratégico (...)�, pg. 76. 99 ARAVENA, �Medidas de Confianza Mutua y Balance Estratégico: un Vínculo Hacia la

Distención y Estabilidad�, pg. 12. 100 ARAVENA, pg. 13.

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interpretações errôneas a respeito das políticas adotadas. Aravena menciona, ao todo, dez critérios interligados para a construção de confiança.101 As medidas devem ser: 1) transparentes e abertas, com vistas a estabelecer claridade sobre os objetivos que se perseguem ou sobre as ações que se desenvolvem; 2) previsíveis, como forma de estabelecer de um padrão de conduta confiável; 3) recíprocas e equivalentes, devendo existir uma simetria básica entre os compromissos, ou ao menos compensações; 4) acompanhadas uma comunicação adequada, lembrando sempre que o objetivo das medidas é a melhoria das percepções, através da interlocução; 5) estabelecer uma relação, ou um padrão de relação, com permanência no tempo; 6) serem factíveis, ou seja, realistas em sua execução, buscando a simplicidade de metas que possam ser alcançadas com custos plausíveis; 7) coerentes, estando em concordância com outras políticas, dentro daquilo que poderia ser chamado de projeto, ou �grande estratégia�; 8) verificáveis, preferencialmente trabalhando-se com prazos que possam ser cumpridos, e ampla liberdade de todas as partes para inspeção mútua; 9) possuidoras de suporte social, isto é, legitimidade e preferencialmente amplo consenso doméstico; e 10) variáveis segundo o número de agentes, isto é, respeitando lógicas específicas de relacionamento, à medida em que o processo de entendimento entre os decisores se multilateraliza. Apontando para a integração regional na América Latina na virada da década,102 Aravena identifica um processo que define como �transferência de instabilidade� e ressalta três fatores: o transbordamento de uma situação nacional aos vizinhos, a falta de controle sobre parte do e a desterritorialização de novas ameaças103. Para Costa, o fim da Guerra Fria enfraqueceu a noção de unidade hemisférica nos tomadores de decisão em política externa e de defesa no Brasil, uma noção que teria sido substituída pelo viés mais economicista de interdependência de mercados. Costa afirma: �a estrutura de conferências dos ministros das relações exteriores, no espírito da Conferência de Bogotá de 1948 e da Organização dos Estados Americanos, e o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca tornaram-se quadros falidos para transmitir noções de efetiva segurança para brasileiros�.104 Os instrumentos de representação e coordenação regional teriam assim se tornado débeis no atendimento das demandas de segurança coletiva nos anos 90, e em seu lugar entraram mecanismos informais de concertação como o Grupo do Rio. Em outro artigo, Costa aponta a importância do relacionamento entre Estados Unidos e América Latina, um relacionamento que não estaria ainda claro e manteria, como única certeza, o fim do intervencionismo característico da Guerra Fria sem apontar ainda um novo padrão. A coesão entre os países latino-americanos também teria se perdido no aumento da imprevisibilidade a respeito de concordâncias ou discordâncias com os EUA, incluindo as questões de 101 ARAVENA, pg. 16-19. 102 ARAVENA, pg. 6. 103 ARAVENA, pg. 9. 104 COSTA, O Balanço Estratégico (...), pg. 77.

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segurança internacional e hemisférica.105 O relacionamento entre Brasil e EUA não estaria contemplando privilégio algum; apenas um cordial aproveitamento de oportunidades em alguns setores. A intensificação do contato com os EUA seria assim apenas uma possibilidade a mais entre outras.106 Costa também identifica no discurso brasileiro de lisura e compromisso para com as convenções internacionais a ambição de um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Tal discurso, característico da primeira metade da década, foi repetido à exaustão durante o governo FHC. A possibilidade de revisão da Carta da ONU, de mudanças no Conselho e da inclusão do Brasil como um de seus membros com direito a veto teriam sido assim as principais apostas do país em segurança internacional na década107. Essa afirmação de Costa é amplamente amparada por discursos oficiais, afirmações de altos escalões das forças armadas, autoridades diplomáticas e materializa-se claramente nas cinco primeiras diretrizes do documento Política de Defesa Nacional.108

105 COSTA, �América Latina y los Nuevos Retos para Crear un Régimen de Seguridad

Internacional en la Posguerra Fría�, pg. 78. 106 COSTA, �O Balanço Estratégico (...)�, pg. 79. Ao discutir a Política de Defesa Nacional,

Costa afirma: �a dificuldade reside não na elaboração do planejamento estratégico, mas na gestão estratégica (...) é necessário dar uma unidade à gestão estratégica, para nos prepararmos para uma eventual execução de ações complexas�. Em �Workshop sobre Defesa Nacional�, pg. 27 e 29. Ver também BITTENCOURT, �Percepção de Ameaças e o Perfil Estratégico Brasileiro na �Nova Ordem Internacional�, pg 25 e SANTOS, �Segurança Defensiva � Idéias�, pg. 179.

107 COSTA, �Segurança Coletiva: Pensamento e Política do Brasil�. 108 a) contribuir ativamente para a construção de uma ordem internacional, baseada no estado

de direito, que propicie a paz universal e regional e o desenvolvimento sustentável da humanidade; b) participar crescentemente dos processos internacionais relevantes de tomada de decisão; c) aprimorar e aumentar a capacidade de negociação do Brasil no cenário internacional; d) promover a posição brasileira favorável ao desarmamento global, condicionado ao desmantelamento dos arsenais nucleares e de outras armas de destruição em massa, em processo acordado multilateralmente; e) participar de operações internacionais de manutenção da paz, de acordo com os interesses nacionais.

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Conclusão As Forças Armadas e o Fim da Guerra Fria

Como os capítulos deste estudo mostraram, o fato consensualmente reconhecido nas FA no período 1990-1996 foi a ausência de um direcionamento estratégico capaz de coordenar planejamentos. A base legal para a atuação das FA foi composta pelos princípios de relações internacionais e as funções delimitadas na Constituição de 1988. Oito anos depois, o lançamento do DPDN foi um marco importante no refinamento dos propósitos nacionais; entretanto, o documento não é capaz de clarificar diretrizes pontuais. Nas declarações oficiais, os governos Collor e Franco fizeram poucas menções sobre um redimensionamento para as Forças e a determinação das linhas de política de defesa e planejamento continuou acontecendo em cada ministério militar de forma insulada. No governo FHC, iniciativas pioneiras foram tomadas ao mesmo tempo em que cresceu a discussão sobre o papel dos militares. Estudiosos civis como Antônio Carlos Pereira, Domício Proença Jr., Oliveiros Ferreira e Thomaz Guedes da Costa despontaram em suas análises. Externamente, as Forças enviaram contingentes a diferentes partes do mundo em missões da ONU. Em dispêndios e números de efetivos, a participação principal foi a UNAVEM. O interesse do país nessas missões foi primariamente justificado no discurso oficial pela campanha por um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Como afirma Thomas Guedes da Costa, a marca da década de 80 foi o fim de um �ciclo estratégico� no qual o Brasil buscava se transformar em uma potência mundial. Um dos elementos mais importantes nesse momento foi a incapacidade brasileira �de neutralizar suas vulnerabilidades de interdependência externa�,109 alargando assim o planejamento autárquico ao máximo, por quanto tempo pôde sustentar. No plano interno, o mais importante evento foi a redemocratização. O fim da ideologia de combate ao comunismo significou a perda das quatro mais importantes percepções de ameaça, as causas-âncora que justificavam planejamentos e ações anteriores: guerra subversiva; confrontação bipolar; ambas ocorrendo simultaneamente; a ameaça platina. A perda de expectativas e sua desmistificação ideológica produziu um enorme impacto mental, colocando em questão o papel das FA. Em meio à indefinição, os planejamentos existentes foram mantidos em um nível mínimo operacional. Com a redemocratização, um

109 COSTA, �Premissas Estratégicas e Política de Defesa: Integração Internacional e

Dissuasão na Estrutura das Forças Armadas�, pg. 46.

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cenário político centralizado deu lugar à competição democrática, com seu método competitivo de escolha de lideranças. Houve de fato um pequeno descompasso temporal entre um evento e o outro � a redemocratização política do Brasil, de um lado, e o colapso do comunismo, de outro. Mas os efeitos conjugados de ambos os processos constituem de fato uma explicação poderosa para a crise programática de segurança nacional nesta década. Iniciou-se assim um período no qual a única certeza foi a da mudança. Os antigos �inimigos� não mais estavam presentes no pensamento estratégico e, como conseqüência o próprio pensamento estratégico ruiu. A antiga Doutrina de Segurança Nacional se esfacelou ao longo desse processo, perdendo fôlego na década de 90 apesar das atualizações feitas pelo EMFA e pela ESG no Manual Básico. Todo o aparato conceitual por ela construído se diluiu em meio à falta de um inimigo contra o qual pudesse ser aplicado o �poder nacional� na busca da manutenção de �objetivos nacionais�. As FA experimentam a carência de uma causa e do poder de influência decisória sobre o qual foi erigido o modus operandi anterior; e, com a abertura, reassumiram o papel instrumental subordinado à dinâmica política nacional. O efeito principal dessa mudança é apontado por Alexandre Barros em um ótimo comentário: no novo contexto, as FA �têm que fazer suas reivindicações orçamentárias e disputá-las política e tecnicamente. Precisarão, a partir de agora, não só explicar para que querem o dinheiro que reivindicam nas propostas orçamentárias, mas também vão ter que lutar por esse dinheiro na arena política�.110 As mudanças no quadro mental trouxeram novas percepções difusas sobre ameaças à soberania e conflitos de baixa intensidade, envolvendo principalmente problemas como narcotráfico, guerrilha e contrabando na Amazônia. Escritos militares do período e monografias da ESG levantaram a possibilidade de ingerência por parte de potências externas, enfatizando a urgência de projetos como o SIVAM e o Calha Norte e denunciando o orçamento destinado às FA. Os militares reclamam de dificuldades nunca antes vistas, num estrangulamento que gera problemas de continuidade nos projetos planejados e conduzidos. Acima de tudo, declarações oficiais e discussões entre estudiosos focalizaram o conceito de dissuasão: a manutenção da paz por meio de capacidades defensivas intimidatórias. Ao contrário da defesa nos contextos de hostilidades já em curso, o sucesso de uma dissuasão está na desistência do potencial inimigo diante de custos que superam os benefícios de uma eventual agressão. A eficácia de uma boa dissuasão se dá por meio de resultados dificilmente comprováveis: ela funciona bem quando conflito armado não acontece. Implica, portanto, em uma avaliação incerta: se não houve hostilidades, não é possível afirmar com cem por

110 BARROS, �O Novo Papel das Forças Armadas Brasileiras: a Reforma da Doutrina, da

Mentalidade e do Ensino�, pg. 14-15.

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cento de certeza que isso aconteceu porque uma dissuasão foi bem sucedida ou porque não houve interesses hostis. O especialista Antônio Carlos Pereira, por exemplo, argumenta de maneira bastante convincente que o �desinteresse de terceiros de tomar a via de fato com o Brasil�111, e não a capacidade dissuasória do país é a principal causa da ausência de conflitos nos anos 90. A dissuasão envolve assim uma importante questão em sua elasticidade retórica. Existe um espectro fluido sobre o qual essa elasticidade pode se dar: uma de suas pontas é a percepção de guerra iminente, capaz de gerar uma mobilização política clara da sociedade. A outra ponta, por sua vez, corresponde à situação brasileira dos anos 90: não há ameaças claramente percebidas, e os assuntos de segurança se retiram do primeiro plano político. Nessas circunstâncias, é difícil legitimar gastos com defesa e modernização de forças armadas. Naturalmente, a realidade inclui também outros fatores determinantes no curso dos eventos: por exemplo, inércias institucionais, prestígio e legitimidade junto à sociedade e capacidade de influência política. Levando em conta todos esses fatores, a conclusão deste estudo é a concordância com o ponto de vista já defendido de maneira bastante consistente por Domício Proença Jr. e Eugênio Diniz112: como os objetivos políticos brasileiros são incertos, o conceito de dissuasão não resolve o problema a que se propõe. Sem objetivos claros, a dissuasão não difere em coisa alguma da pura e simples indefinição; a discussão sobre meios colapsa sem uma discussão de fins. O discurso sobre dissuasão tece considerações genéricas e, num contexto em que diversas outras áreas demandam recursos de maneira urgente, a legitimação de investimentos em defesa é dificultada. As boas-vindas à democracia, tanto para militares quanto para os políticos eleitos, implicam agora na resposta a uma desafiadora pergunta que permanece sem resposta: �os recursos são poucos para quê?�. Em meio à indefinição política e à inércia na condução dos projetos das FA, existe ainda o perigo do investimento em várias áreas para ao final ser bem sucedido em nenhuma delas, o que implicaria em má-utilização de recursos que são públicos. Nenhuma realidade poderia contribuir mais para a evolução do quadro do que o envolvimento do Parlamento nos espaços decisórios da política externa e de segurança, bem como a criação de um Ministério da Defesa realmente capaz de aumentar a sinergia entre as três Forças, responsabilizando-se de maneira madura e responsável pela contabilidade pública de seus recursos.

111 PEREIRA, �As Perspectivas da Indústria Bélica Brasileira nos Anos 90�, pg. 80. 112 PROENÇA e DINIZ, Política de Defesa: uma Análise Crítica.

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PARTE II – AS DIMENSÕES FÍSICA E TECNOLÓGICA

Por Érico Esteves Duarte

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Os Instrumentos da Guerra

A bibliografia que trata de analisar as forças armadas no mundo faz, geralmente, a seguinte tripartição: forças armadas de tradição ocidental que incluem, além de Estados Unidos, Canadá e países da Europa Ocidental, Japão, Taiwan, Coréia do Sul. e Israel; forças armadas de tradição russa/soviética: Rússia, países da Comunidade dos Países Independentes, Leste Europeu e Coréia do Norte; e por último, forças armadas do Terceiro Mundo que assimilam características dos outros dois grupos da forma que lhes convém e/ou possam arcar. A China, apesar de sofrer grande influência da tradição militar russa e não ser ainda denominado como país economicamente desenvolvido, não é consensualmente classificada. Alguns a alocam junto aos países do Terceiro Mundo, outros em grupo nenhum. Nesta pesquisa quando o assunto tocar a esse país, será mencionado individualmente. Leva-se em consideração, além da China possuir mísseis balísticos nucleares e diversas outras tecnologias de ponta, o fato de ela possuir, atualmente, a maior força armada do mundo em termos quantitativos. Obviamente, a descrição e comparação de armas e equipamentos militares é centrada nas forças armadas americanas e russas, por serem as que mais se desenvolveram nos últimos quarenta anos e devido a influência militar que exercem sobre os outros países No entanto, coloca-se sob análise as forças que servem de referência para às Forças Armadas do Brasil ou dos quais se adquirem mais sistemas de armas nos últimos anos, notadamente: Alemanha, Inglaterra, França, Itália e Suécia. Apesar de tanques, aviões e navios serem meios de engrandecimento de uma força, outros fatores vitais, dificilmente mensuráveis (não discutidos nesse trabalho), são liderança, logística e inteligência.

Forças Terrestres �A força terrestre é a unidade decisiva em uma guerra. Embora a tecnologia tenha possibilitado o domínio do ar e dos mares, é no chão que as guerras são decididas. É possível vencer uma guerra através de bombardeiros aéreos ou por bloqueios e ataques de navios de combate. Mas não é dessa maneira que a guerra é decidida.�113 Isso se deve por ser no solo que se garantem a subjugação do adversário através da destruição de suas forças e o domínio de suas cidades e recursos. É onde há o domínio físico e final do adversário. 113 DUNNIGAN, James F.; How to make War. Quill � Nova York , 1993, p. 27.

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Nesta seção do trabalho serão apresentados os principais componente das forças terrestre atuais. São elas: a infantaria, tanques e artilharia. Antecipadamente, será apresentado como as principais forças terrestres mundiais estão organizadas. Estilo Russo de Organização de Forças Terrestres As diversas divisões russas têm quase o mesmo tipo de organização, apenas diferenciando-se de três maneira em relação ao seu preparo As com maior grau de preparo são chamadas �grupos de força�. Eram estacionadas no Leste Europeu e apresentavam-se com os equipamentos mais novos e 100% em posição de combate. São um total de 30 divisões (15 de tanques e 15 de infantaria). Foram removidas, recentemente, para a Rússia ocidental e Ucrânia, com parte de sua capacidade reduzida.114 È fácil deduzir que estas são as divisões de primeiro emprego em caso de conflito e que, durante a Guerra Fria, seriam as primeiras a serem usadas em caso de decisão de invasão à Europa Ocidental. Ou seja, foram o pesadelo dos governantes daqueles países por muito tempo. A segunda categoria possui 43 divisões (11 de tanques e 32 de infantaria). São as seguintes no quesito equipamento, no entanto possuem 1.500 homens, 75 tanques e 50 peças de artilharia a menos. Em tempos de paz, apenas em torno de 50% delas ficam em estado de força total. Podem ser trazidas à ativa integralmente em dias e preparadas para combate em menos de um mês. O terceiro grupo de divisões é o que apresenta as piores condições devido a crise por qual passa o país. Seu arsenal tem uma má manutenção e são os mais velhos da força. Em torno de 50% das 92 divisões (20 de tanques e 72 de infantaria) estão em processo de desmantelamento O Exército Vermelho conta ainda com sete divisões de pára-quedistas e uma de forças anfíbias (diferente dos EUA, que possuem uma instituição militar específica para essa categoria � os Marines, a antiga União Soviética as mantém dentro de um mesmo comando que as forças terrestres). Várias outras brigadas e batalhões dessas duas últimas categorias ficam distribuídas pelo país; por último, possui em torno de 15.000 soldados de comando e forças especiais. .115 Devido à crise do fim da década passada, a ex-URSS passa por uma vertiginosa e, por vezes, desregulada redução de suas forças. E conta atualmente com menos de 100 divisões:116 é dito �apenas� porque durante o auge da Guerra Fria, a URSS tinha em suas mãos entre tropas ativas e reservistas 200 divisões!117 114 DUNNIGAN, James F.; Ibdem., p.54. 115 DUNNIGAN, James F.; Ibdem., pp. 54-55.. 116 SIPRI Yearbook 97. Military Expendure. 117 DUNNIGAN, James F.; Ibdem., p. 54.

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Como será comprovado e dito várias vezes durante esse trabalho, as forças ocidentais são mais bem treinadas e mais bem equipadas, no entanto, tendo em mente o contexto de Guerra Fria e de uma suposta guerra convencional, seria de alguma maneira possível vencer uma força armada de 200 divisões, sendo que cada uma divisão soviética/russa tem 13.400 homens? Somando-se a isso, as 57 divisões que possuíam os países do Leste Europeu? Em relação à composição de suas unidades, o Exército russo apresenta suas forças estendidas sobre a unidade denominada regimento. Tem a mesma função do batalhão ocidental, no entanto possui a capacidade de atuação mais independente no campo de batalha. Muitos países do terceiro mundo tem adotado a organização russa, todos pelas mesmas razão: terem menos recursos tecnológicos em comunicação como os exércitos ocidentais e por ser uma estrutura mais simples de manter e operar. Organização Típica de Uma Divisão Russa de Infantaria Mecanizada 118:

1 divisão de quartel geral: 380 homens; 3 regimentos de infantaria mecanizada: 2.700 homens cada; 1 regimento de tanques: 1.101 homens; 1 grupo de artilharia: 1.800 homens, 12 canhões de 100mm, 24 lançadores de foguetes de 124mm, 12

carros para transporte de tropas AT-5 com mísseis guiados anti-tanque, 4 lançadores de mísseis SS-21, 72 peças de artilharia auto-propulsados de 152mm;

1 regimento para defesa antiaérea: 302 homens, 20 lançadores de mísseis superfície-ar SA-8B e ou 6 SA-6;

1 batalhão de tanques independentes: 241 homens e 51 tanques; 1 batalhão de reconhecimento: 300 homens, 28 carros blindados para transporte de tropas, 6 tanques e

motocicletas; 1 batalhão de engenheiros: 380 homens; 1 batalhão de sinaleiros: 294 homens; 1 batalhão de defesa química: 150 homens; 1 batalhão de suporte técnico e manutenção: 294 homens; 1 batalhão médico: 158 homens; 1 batalhão de transporte: 217 homens; 1 companhia de aviação: 220 homens, 6 helicópt. Mi-2, 8 Mi-8 e 8 Mi-24; 1 companhia de controle de tráfego

A organização típica de uma divisão russa de tanques difere da anterior apenas em 3 regimentos de tanques, cada uma com: 1.580 homens, 94 tanques, 51 carros de transporte de tropas, 4 lançadores de mísseis ZSU-23, 4 SA-13 e 24 morteiros auto-propulsados de 122mm, 6 pontes autopropulsadas e 1 batalhão de infantaria mecanizada. Estilo Ocidental de Organização de Forças Terrestres As divisões dos países ocidentais são similares em tamanho e equipamento (mesmo entre suas próprias divisões, diferindo das russas que possui em alternância qualitativa e quantitativa de uma para outra), só diferem no modo de 118 DUNNIGAN, James F.; Ibdem., p. 56.

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serem usadas. A Alemanha é a única exceção: tem sua unidade de brigada atuando de maneira mais independente que os outros países ocidentais (mais parecida com o regimento russo) e possui melhor munição, artilharia e carros blindados para transporte de pessoal. Para evitar uma leitura desnecessária, iremos apenas descrever a constituição de uma força terrestre norte-americana que é a mais significativa: Organização Norte-americana de Forças Terrestres � Divisão de blindados:119

3 batalhões de quartel general: 130 homens cada; 5 batalhões de tanques; 4 batalhões de infantaria mecanizada; 3 batalhões de artilharia auto-propulsada: cada um com em torno de 800 homens, 36 peças de artilharia

de 155mm, 12 de 203 mm e 12 lançadores de foguetes; 1 bateria de radares; 1 batalhão de defesa aérea: 626 homens, 18 veículos com canhões, 18 veículos com mísseis superfície-

ar e 60 mísseis Stinger; 1 brigada de combate de aviadores: 1.270 homens, 60 helicópteros de ataque, 50 de escolta, 54 de

transporte e 12 helicópteros de guerra eletrônica, 3 veículos blindados de tropas M-3; 1 batalhão de sinaleiros: 582 homens; 1 companhia de polícia militar: 201 homens; tropas de suporte: 2.253 homens.

A organização de uma divisão de infantaria mecanizada é a mesma de uma de tanques, diferindo por ter um batalhão a menos de tanques e um a mais de infantaria mecanizada. Na divisão de infantaria leve, as únicas diferenças em relação às anteriores são: 9 batalhões de infantaria não mecanizada, nenhuma de tanques e 3 de artilharia não autopropulsada. Essas divisões são para emprego imediato em qualquer parte do país. Os Estados Unidos possuem, ainda, uma divisão de pára-quedistas e uma de assalto aéreo (tropas de comando e forças especiais). Como nas forças russas, o Ocidente tem tido o seu contingente diminuído de maneira constante (ver tabela em abaixo). Tal diminuição tem desencadeado várias atribulações políticas nos países, envolvendo a discussão sobre o relacionamento entre orçamento e o preparo futuro das forças armadas. Essa discussão (como será apresentada na última parte deste ensaio) também tange à idéia de uma revolução nos assuntos militares. Outra característica nas Forças ocidentais é o número cada vez maior de países transformando suas forças de conscritos (alistamento obrigatório) por forças de voluntários. As vantagens dessa mudança são: ter uma força mais capaz, redução dos gastos com treinamento e menos complicações em caso de redistribuição de pessoal por razões orçamentárias. A desvantagem é nem sempre conseguir

119 The Military Balance 96/97, p. 23.

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ocupar as vagas necessárias para preenchimento de quadro.120

Diminuição dos Efetivos das Forças Armadas dos Países-Membros da OTAN (em milhares de soldados)

Ano País 1992 1993 1997*

Bélgica 91 91 40 Canadá 84 80 76

Dinamarca 29 28 15 França 432 411 371

Alemanha 447 408 300 Grécia 159 159 159 Itália 354 325 297

Luxemburgo 0,8 0,8 0,89 Holanda 91 74 70 Noruega 33 29 25 Portugal 58 58 Sem informação Espanha 217 201 170/190 Turquia 560 480 360

Inglaterra 293 259 241 Estados Unidos 1,914 1,730 1,355 Fonte: The Military Balance 93/94, p.33.

Infantaria

A infantaria é a unidade militar mais antiga e que irá sempre persistir, mesmo nos dias de hoje quando se prega um mundo dominado pelas forças econômicas. Diante as novas dimensões que enfrentam as forças armadas das grandes potências, responsáveis por operações de paz e intervenções, e as características dos conflitos regionais buscando autodeterminação e mais suas complexas particularidades políticas fazem a infantaria ter a sua importância enaltecida. Sem mencionar que em algumas condições de terreno como montanhas, pântanos e florestas tropicais, não importa o que se consiga através da tecnologia, apenas a infantaria é capaz de combater. As inovações e pesquisas dentro dos centros de pesquisa militares estão relacionadas a característica de a infantaria ser a unidade terrestre mais suscetível a ataques do inimigo; a empecilhos de clima e terreno; e a falta de suprimentos, mesmo com a presença de carros blindados leves de transporte de tropas e outros tipos de equipes de apoio. O primeiro objetivo dos cientistas militares tem sido aumentar a capacidade de sobrevivência das tropas, aprimorando a sua resistência às influências do terreno, clima e vegetação através de filtros d�água individuais e desenvolvimento de vacinas com maior poder de imunização. Ainda tentando prover às tropas maiores chances de sobrevivência e, ao mesmo tempo, oferecendo condições para o cumprimento de suas missões, os exércitos dos países desenvolvidos têm incorporado receptores GPS. Uma das maiores 120 The Military Balance 93/94, p.33.

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causas de fatalidade de tropas era quando as tropas eram submetidas a regiões desconhecidas e se perdiam. O GPS é um sistema que inovou contra esse mal. Baseia-se em um dispositivo manual e portátil que recebe periodicamente sinais de satélite com informação de coordenadas. O dispositivo em mãos do soldado não emite sinais (para não ser detectado pelo inimigo), apenas recebe. O GPS foi desenvolvido e empregado pelo exército norte-americano com o nome US Navstar Global Positional System. Foi usado pela primeira vez em 1978, quando o primeiro satélite do sistema foi lançado. O sistema foi somente finalizado em 1993. Consiste em 21 satélites em seis planos orbitais diferentes a 20.000 Km de altura. O sistema além de prover a posição (necessário 3 satélites), pode prover posição e altura (4 satélites). Na Guerra do Golfo, o sistema ainda não estava completo, contando apenas com 13 satélites e não sendo o �serviço� oferecido o dia inteiro. No entanto, logo após o término desse conflito, foi feito a solicitação de uso desse equipamento por 11 países aliados da OTAN. Atualmente, são duas empresas privadas que gerenciam a comercialização do sistema de navegação GPS: a Trimble Navigation e a Magellon Systems Corporation. Já existe há algum tempo um modelo comercial portátil do tamanho de um rádio de carro custando em torno de 3.000 dólares.121. O GPS também é encontrado nos helicópteros de combate UH-1H e Cobra, caças F-111, Tornado, Jaguar, no bombardeiro B-52, navios, tanques e nos kits de sobrevivência de tripulação aérea. A última inovação tática feita em cima da tecnologia GPS foi o seu uso no refinamento de ataques aéreos e de mísseis. Um soldado de solo usando um receptor GPS e um telêmetro laser pode determinar a distância e melhor ângulo de ataque para unidades aliadas, ou dar aviso antecipado sobre artilharia antiaérea inimiga. A mira laser é uma outra inovação mais ou menos recente que oferece ao atirador uma indicação precisa de aonde haverá o impacto do tiro em uma distância de até 800 metros. Com o mesmo fim da mira laser, mas para uso noturno ou em péssimas condições de tempo, existem aparelhos de visão térmica para rifles com uma capacidade de 400 a 1.000 metros, dependendo das condições.122 Outros equipamentos que estão facilitando a vida de um soldado de infantaria são: o uso de rádios individuais mais potentes, mais duráveis e com sistemas especiais para dificultar a intercepção; laptops para comunicação mais refinada, avaliação de condições de terreno e situação de combate; softwares de comando e controle que oferecem um quadro de decisões cabíveis a determinadas

121 ANSON, Peter e CUMMINGS, Dennis; The First Space War. In The First Information

War. AFCEA International Press - Fairfax, 1992, pp. 126-127. 122 DUNNIGAN, James F.; Ibdem., pp.44-45.

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situações reais; detectores de minas mais precisos e armas mais leves e fulminantes123. Devido a todos a esses avanços, a principal tendência nas unidades de infantaria do mundo é a sua redução, porém aumento da eficácia. A redução deve-se, também, ao encarecimento do preparo e equipamento das tropas com a maior complexidade e custo de manutenção dessas novas tecnologias. A redução de ameaças e insuficiência de manter-se o nível de despesas em assuntos militares, da mesma forma, tem sido decisivo. Os EUA, por exemplo, de 18 divisões que seu exército possuía na Guerra Fria, tiveram 8 desativadas. 124 O aumento da eficiência da infantaria é, primeiramente, resultado do aumento no rigor do treinamento e utilização de sistemas de simulação mais realistas e que exigem mais do recruta. Uma das razões que levaram haver algum tempo entre a declaração de guerra dos EUA ao Iraque e o seu primeiro ataque (seis meses), foi devido as tropas norte-americanas estarem passando por um intenso treinamento nos desertos da Califórnia, simulando as condições e táticas necessárias para um combate no tipo de condição e terreno do Oriente Médio.

Tipos de Organização de Unidades de Infantaria Russa/Norte Americana

Categoria de unidades. Categoria Regimento russo Batalhão Companhia Pelotão

Números de unidades. 1 3/1 9/4 27/12 Homens 2.250 441/696 103/111 30/33 Tanques 40 0/0 0/0 0/0

Carros blindados 195 37/99 12/14 3/4 Artilharia autopropulsada. 24 0/0 0/0 0/0

Mísseis antitanque 116 36/12 212/23 3/7 Metralhadoras pesadas 234 73/108 21/27 6/9

Morteiros médios 24 8/0 0/0 0/0 Morteiros pesados 0 0/0 0/0 0/0 Canhões antiaéreos 4 0/0 0/0 0/0

Lançadores de mísseis superfície-ar

4 0/0 0/0 0/0

Lançadores de mísseis superfície-ar portáteis

27 9/7 0/0 0/0

Lançadores de foguetes antitanque

81 27/72 9/18 3/4

Fonte: DUNNIGAN, James; How to Make War, pp. 50

Principais Armamentos da Infantaria

Armamento País Calibre (mm) Tiros por minuto Alcance (m) Aplicação FN/G3 Alemanha 7,62 75 800

AK-47/M Rússia 7,62 90 400 M-16A1 EUA 5,56 80 600 AK-74 Rússia 5,45 100 500

Rifle padrão de

infantaria.

MG3 Alemanha 7,62 200 1200 M-60 LMG EUA 7,62 200 1200

PKM Rússia 7,62 200 1200

Metralhadoras

leves

123 DUNNIGAN, James F.; Digital Soldier. St. Martin Press - Nova York, 1996, pp. 37-39. 124 The Military Balance 96/97, p.15.

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RPK Rússia 7,62 120 800 RPK-74 Rússia 5,45 120 600

SAW EUA 5,56 200 800

Versões pesadas de rifles de assalto

Fonte: DUNNIGAN, James; How to Make War, pp.62. Infantaria no Brasil Mesmo o Exército Brasileiro possuindo, no total, 8 divisões terrestres (segundo The Military Balance 96/97), sua disposição e especialização de forças é baseada na unidade militar brigada. �É a unidade básica de combinação de armas e serviços, integrada por unidades de combate, de apoio ao combate e de apoio logístico, com capacidade de atuar independentemente e de durar na ação� 125 Em relação a forças terrestres estrangeiras, o Brasil apresenta uma grande especialização de suas tropas, devido à extensão geográfica e variedade de relevo e vegetação e, em segundo lugar, devido à restrição orçamentaria que requer uma maior racionalização na formação e disposição das tropas e equipamentos. A seguir, são enumerados os tipos de brigadas do Exército Brasileiro e suas composições mais comuns:

Brigada de infantaria blindada: cada uma com 2 batalhões de infantaria, 1 de blindados e 1 de artilharia; Brigada de infantaria motorizada: 26 batalhões; Brigada de montanha; Brigada de selva: 14 batalhões; Brigada de fronteira: 6 batalhões; Brigada de pára-quedistas: 2 batalhões; Brigada de infantaria leve: 20 helicópteros de combate HA-1 �Esquilo� e 16 HM-1 �Pantera� (não se

tem o número de batalhões).126 A brigada de infantaria leve foi composta recentemente, apresentando um grande diferencial qualitativo em relação às demais:. Possui uma estrutura organizacional diferenciada, equipamento de última geração (como GPS, óculos e lunetas de visão noturna, aparelhos de pontaria laser, modelos de rifles e lançadores de foguetes diferentes dos standard da Força ) e condição de emprego imediato. É, também, um tipo de laboratório de estrutura, doutrinas, táticas e armas para o restante da Força. De certa forma, teve influência na filosofia de emprego da divisão de infantaria leve dos Estados Unidos. A brigada de infantaria leve faz parte do programa do Exército denominado �núcleos de modernidade�. São iniciativas isoladas em que se aplica tecnologia de ponta e técnicas militares mais modernas no intuito de reduzir o distanciamento tecnológico. Brigada de Infantaria Brasileira127: 125 Revista do Exército Brasileiro. Centro de Comunicação Social do Exército - edição 1997,

p. 18. 126 The Military Balance 96/97, p.142. 127 O EB tem uma nomenclatura específica que usa parênteses para apresentar suas unidades

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2 Batalhões de infantaria (pode variar dependendo do emprego); 1 companhia (esquadrão) de cavalaria; 1 batalhão ( grupo) de artilharia de campanha; 1 companhia (bateria) de artilharia antiaérea; 1 companhia de comunicações; 1 companhia de engenharia; 1 batalhão logístico; 1 pelotão de polícia do exército; 1 companhia de comando de brigada.

Armamento da Infantaria Brasileira128 :

Fuzil standard: FAL (fuzil de ataque leve) 7,62 mm e fuzil tipo OTAN de 5,62 mm (ambos de origem belga produzidos sob licença);

Morteiros médios e pesados de 60, 81, 107 e 120 mm de origem tanto européia quanto nacional; Metralhadora leve de calibre 7,62 mm MAG (metralhadora de ataque a gás � de mesma origem dos

fuzis); Lança foguetes anti � tanque portáteis Eryx (francês). Recentemente, foram adquiridos foguetes anti-

tanque de origem russa para a unidade de brigada leve. Foi a primeira vez que o Brasil adquiriu um equipamento fabricado no Oriente129.

Tanques Os tanques foram introduzidos na Primeira Guerra Mundial provocando a primeira revolução militar deste século, ou seja, mudou completamente os padrões de condução da guerra. Atualmente, têm como características serem rápidos e possuírem altíssimo poder de fogo, sendo uma síntese de infantaria e de artilharia. No entanto, sua acessibilidade é restrita a certas condições de terreno. E diferente de outras unidades, cada país esforça-se em produzir seu próprio tanque, tendo em vista o terreno, a tática de combate, hipóteses de emprego e sua capacidade de produzi-los. 130 A Rússia tem por característica dar ênfase na potência do motor, grandes canhões e uma espessa armadura. No entanto, não desenvolveram um sistema de tiro tão bom como dos tanques ocidentais. Economizam em espaço interno e conforto para a tripulação, mas gastam muito na quantidade que produzem cada modelo. Isso acontece por ter a Rússia uma estratégia de guerra essencialmente terrestre. Segundo suas tradições e história militar, dão prioridade às forças terrestres e à quantidade, com apenas o estritamente necessário em qualidade. Nos Estados Unidos, dá-se prioridade a um pesado poder de fogo, proteção

de artilharia e cavalaria.

128 Como na tabela das forças estrangeiras, é descrito o equipamento padrão. Unidades de comando e de elite utilizam equipamento de origem e fabricante diferentes e qualidade superior.

129 SIPRI Yearbook 97. 130 DUNNIGAN, James F.; How to Make War, pp. 87-90.

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blindada resistente, conforto à tripulação e avançados sistemas de controle de tiro. Já a Alemanha tenta aplicar uma �filosofia� intermediária entre as duas anteriores: alto poder de fogo, qualidade do equipamento e velocidade, permitindo-se menor atenção em peso e proteção. A França esforça-se em tanques leves, enquanto a Inglaterra em menor velocidade e mais proteção. A Suécia tem seus tanques modelados para uma aplicação defensiva, menor alcance de tiro, não possuem torre giratória, mas um sistema de recarregamento automático de projéteis. Israel tem em seu modelo a característica, também, de ser usado defensivamente. Possuí uma pesada proteção e um enorme compartimento de munição. A tecnologia usada em tanques segue de perto, em nível de sofisticação, da utilizada em aviões e navios. No entanto, diferentemente desse dois últimos, os avanços mais significativos não foram no campo da eletrônica, mas nas áreas de tecnologia metalúrgica. A mais nova inovação nesta área é aplicada no tanque norte-americano M1A2. Resultado da mais nova armadura composta criada pela Inglaterra- (resultado de diferentes camadas e disposições de metal, plástico e cerâmica). Usado com sucesso na Guerra do Golfo, esse tanque se destaca em seu sistema de propulsão e na grande quantidade de comandos eletrônicos.131 A tecnologia de operação do veículo e sua sofisticação em facilitar seu manejo são únicas (como direcionamento do canhão, mira do alvo, introdução correta do projétil no cano de disparo, etc.). Toda iniciativa é apenas possível através do computador ( o que de certa maneira, é preocupante). Sendo este ter incluso em sua memória diversos softwares que armazenam varias aplicações de comando e controle, ou melhor, registrou-se todo o tipo de operação possível e indicada ao tanque em um combate, tornando-se um recurso valioso para momentos de dificuldade. Tal tecnologia foi desenvolvida pensando em economias de treino e disponibilização desse tanque a soldados de qualquer nível intelectual. Pensava-se em atribuir aos maiores gênios da força, tarefas que exigissem de maior brilhantismo e raciocínio, enquanto pudesse se utilizar de uma �mão-de-obra� mais barata para trabalhos mais braçais e arriscados.132 Além da armadura composta, existem a reativa e a espaçada. A reativa é uma armadura de proteção à projéteis penetrantes, ela tem uma primeira camada de proteção crivada de explosivos e uma segunda camada de real proteção, assim, quando um projétil toca a armadura uma pequena explosão o danifica. Esta tecnologia apresenta dificuldades e gastos excessivos, pois é necessário a troca constante do primeiro revestimento. É usada, principalmente, pelo exército russo. A armadura espaçada é o revestimento mais tradicional de todos: ela é formada por camadas intercaladas de revestimento metálico e espaço vazio. Em

131 DUNNIGAN, James F.; Digital Soldiers, p. 68. 132 DUNNIGAN, James F.; Digital Soldiers, p. 69.

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contrapartida, o exército norte-americano, pensando em proteções de tanques resistentes, desenvolveu projéteis penetrantes de alta velocidade que têm como característica atravessarem todo o casco do veículo de extremidade à extremidade. Estes projéteis possuem um revestimento que se aproxima de uma proteção de armaduras múltiplas dos tanques e sua ponta é de urânio enriquecido � material mais denso do mundo. Rússia e os EUA tinham grandes projetos em relação a tanques para o futuro com mais e melhores sensores, canhões maiores e outras inovações. Todos foram colocados de lado com o final da Guerra Fria. Como dizem alguns especialistas: �terão que esperar até a próxima competição armamentista�.

Principais Tanques do Mundo

Nome País Alcance (Km)

Peso (ton.)

Vel. Máx.

(Km/h)

Sistema de mira Canhão principal

(mm)

Alcance do disparo (m)

Ano

T-88 Rússia 400 42 60 Laser 125 3;000 1981 T-64 Rússia 400 42 60 Laser 125 3;000 1971 T-70 Rússia 500 40 60 Laser 125 2.000 1972 T-62 Rússia 480 37 60 Taqueométrica 115 1.500 1952 T-55 Rússia 300 36 50 StadiaG 100 1.000 1957

PT-76 Rússia 260 14 44 StadiaG 76 1.000 1955 M-1 EUA 560 58 72 Laser 105 4.000 1981

M-1A1 EUA 560 67 67 Laser 120 4.000 1986 M60A1 EUA 300 48 48 Laser 105 3.000 1977 M48A5 EUA 290 47 48 Óptica 120 2.500 1976

Leopard II Bélgica 350 50 68 Laser 105 3.500 1978 LeopardI Bélgica 375 40 65 Óptica 105 2.500 1965 AMX-30 França 400 36 65 Óptica 105 2.500 1967 S-Tank Suécia 250 39 50 Laser 105 3.000 1968

Merkava Israel 320 60 58 Laser 105 3.000 1978 Type 59 China 300 36 50 StadG 105 1.000 1957 Type 69 China 430 38 58 Laser 105 3.000 1962

Fonte: baseado em dados de DUNNIGAN, James; How to Make War, pp.96-97. Notas sobre a Tabela � Sistemas de mira: StadG: equipamento que mede a linha de estadia até o alvo. Linha de estadia é um sistema de medida que corrige a posição do disparo d a força gravitacional sobre trajetória do projétil; Mira taqueométrica: realiza a mesma correção da anterior por cálculos da taqueometria; Óptica: realiza a correção de mira através da junção de imagens de duas lentes objetivas, semelhante às câmeras de fotografia; Laser: equipamento computadorizado disponibiliza a posição de disparo certeiro através do cálculo do tempo que leva uma faixa de luz laser para atingir o alvo e o seu reflexo retornar ao tanque em posição de disparo.

Tanques no Brasil Apesar de ter projetado um dos melhores tanques do mundo, o Osório, nosso país tem se mostrado atrasado em relação a este sistema de arma. Até pouco tempo, não possuíamos tanques principais de batalhas, apenas tanques leves (utilizados

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em missões de reconhecimento, apoio e específicas operações de assalto), diga-se de passagem, com modernos sistemas de mira e controle de tiro. No entanto, os tanques principais de batalha M-60 e Leopard I que o Brasil comprou recentemente são peças excedentes das forças americanas e belgas, devido às determinações do Tratado de Limitação de Armas Convencionais na Europa, o CFE. São tanques razoáveis e ainda usados pelas forças estrangeiras, mas não são peças novas; pelo contrário, estão em via de fim de vida útil. As unidades de blindados e tanques no Brasil são compostas de maneira a dar, principalmente, apoio à infantaria, não possuindo grande destacamento próprio. Os tanques leves têm as seguintes características: 133

M-41B: motor diesel nacional, canhão de 90mm, sistema avançado de comunicação; M-41C: além dos itens acima, dispositivo de pontaria a laser, controle de tiro por computador, visão

noturna e projéteis perfurantes de alta velocidade; XMB-3: mesmas características do M-41C com maior peso, maior potência e canhão principal de 105

mm. (nota: não se conseguiu dados sobre o tipo de armadura usado). Nenhum desses equipamentos apresentavam essas características originalmente. Basicamente, são tanques já de uma certa idade que sofreram atualizações com tecnologia nacional, principalmente em eletrônica. Há projetos no Exército para o desenvolvimento de cerâmica para blindagem, no entanto, provavelmente não serão alavancados diante o alto custo de pesquisa e produção dessa tecnologia.

Artilharias Entre as unidades de combate terrestre, a mais temida é a artilharia. Com o passar dos anos e das guerras, ela tornou-se mais destrutiva, mais precisa, mais móvel e imperceptível a contra-ataques. É a arma que causa o maior número de mortes no campo de batalha. Atualmente, as forças armadas têm descentralizado a disposição das unidades de artilharia. Na Guerra Fria, a União Soviética já aplicava a descentralização de suas unidades, temendo a exposição destas às baterias ocidentais equipadas com melhores sistemas de comunicação e radares. Hoje, a razão é parecida, as unidades de outros países têm sido descentralizadas para evitar a exposição à infantaria adversária, cada vez mais mecanizada e blindada, o que aumenta sua locomoção, poder de fogo e potencial de comunicação com unidades aliadas de rastreamento. Regimentos, brigadas e batalhões já possuem a sua própria artilharia, sendo que as divisões, geralmente, mais alguns batalhões extras para serem somados rapidamente a essas outras unidades em caso de conflito mais intenso134. 133 PESSOA, �Desenvolvimento Conjunto de Equipamentos e Sistemas de Armas para as

Forças Armadas: Óbices e Possibilidades�. Rio: ESG, 1990, Anexo C. 134 DUNNIGAN, James; How to Make War, pp.120-121.

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Por longo tempo, os avanços tecnológicos da artilharia ficavam por conta da metalurgia e química. Mais recentemente, é a eletrônica que tem mais contribuído para melhorar a pontaria, a eficiência destrutiva dos projéteis, a agilidade no pronto emprego e o preparo do equipamento. A eletrônica está presente nos projéteis e nos sistemas de balística e mira das armas. Antigamente, as peças de artilharia eram transportadas por veículos aéreos. Atualmente, o que vigora são as armas automotoras, blindadas e auxiliadas por veículos menores transportadores de munição; como precaução a acidentes e maior praticidade e confiança no trabalho dos soldados, está prestes a ser aplicado uma técnica em que os projéteis são carregados com líquidos propelentes apenas no momento do disparo, sendo que a quantidade é indicada por computador; uso de projéteis mais sofisticados que não passam de containers ou caixas-robô que carregam dentro de si centenas de cápsulas de munição (anti-pessoais ou anti-tanques). Este tipo de arma foi, primeiramente, empregado na Guerra do Golfo, era o MLRS (Multiple Launch Rocked System). No entanto, já existe uma versão de mísseis de ataque ao solo mais aperfeiçoados para uso da plataforma MRLS com foguetes maiores (pesando em média 1,6 toneladas), maior alcance (150 Km � semi-balístico), maior precisão e maior número de submunições (950). É denominado ATACMS (Army Tactical Missile System) 135; radares mais poderosos e computadores para uma mais veloz comunicação; para se aumentar a precisão, tem sido utilizado o sistema GPS, sistema de pontaria laser e controle de tiro com correção de mira computadorizada; união entre o fogo de artilharia e os sensores de aeronaves de reconhecimento; união entre artilharia, helicópteros de ataque e aviões bombardeiros.

Principais Peças de Artilharia

Calibre (mm)

Nome País Alcance (Km) Disparos por Minuto

Mobilidade Peso (ton.)

105 M102 EUA 11,5 3 Rebocado 1,15 105 M101A1 EUA 11 3 Rebocado 2,26 105 L118 Inglaterra 19,5 3 Rebocado 1,8 122 M55/D74 Rússia 24 6 Autopropul. 5,50 122 BM-21 Rússia 20,5 4 Autopropul. 11,5 122 2S1 Rússia 15,3 8 Rebocado 16 122 M63/D30 Rússia 15,3 8 Rebocado 3,2 130 M46 Rússia 33 6 Rebocado 7,7 140 RPU-14 Rússia 9,8 4 Rebocado 1,2 152 2S5 Rússia 28 1 Autopropul. 21,4 152 2S3 Rússia 24 2 Autopropul. 28 152 M55/D20 Rússia 24 1 Rebocado 5,7 155 M109A6 EUA 22 6 Autopropul. 28,7 155 M198 EUA 30 2 Rebocado 7,2 155 M109A1 EUA 18 2 Autopropul. 23,8 155 M114A1 EUA 14,6 2 Rebocado 5,8 175 M107 EUA 32,7 0,5 Autopropul. 28,2

135 LAUR e LLANSON, Encyclopedia of Modern US Military Weapons, p. 276.

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203 2S7 Rússia 30 1 Autopropul. 30 203 M110A2 EUA 29 0,5 Autopropul. 28,2 220 BM-27 Rússia 40 1 Autopropul. 22,7 227 MRLS EUA 30 12 Autopropul. 25 240 2s4 Rússia 9,7 1 Autopropul. 32

Fonte: baseado em dados de DUNNIGAN, James; How to Make War, pp. 124 e LAUR, TimothyM. E LLANSO, Steven L.; Encyclopedia of US Modern Weapons, pp 237-75.

Artilharia no Brasil O Brasil possuí uma significativa artilharia, além dos batalhões que operam conjuntamente às brigadas de infantaria, cavalaria e blindados, ainda existem 28 batalhões (ou grupos) extras para serem somados em caso de agravamento do conflito e mais uma formação de artilharia denominada artilharias divisionárias. Estas últimas são unidades para salvaguarda de regiões fronteiriças e litorâneas (composta por artilharia de 57, 75, 120, 150, 152 e 305 mm � sem ficha técnica e dados sobre a origem). Recentemente, novas peças autopropulsadas foram compradas e as mais antigas ganharam controle de tiro computadorizado. O inventário nacional é formado pelas peças não autopropulsadas: M-101A1, M-102, e M-114A1, L-118 de 105 mm (caracterizados na tabela anterior) e o Model 56 105mm pack � modelo desmontável e portátil produzido nacionalmente sob licença italiana.136 E, também, os autopropulsados M-7 e M108 de 105 mm (sem ficha técnica e dados sobre origem).137 Conta ainda com: lançadores simples pesados de foguetes (RCL): M-18A1 de 57mm; M-20 de 75 mm; M-40A1 de 106 mm; mísseis guiados anti-tanque Cobra: guiado por fio; alcance de 700 a 2.000 m e peso de 10 Kg; lançador múltiplo de foguetes ASTRO II: autopropulsado com sistema avançado de comunicações, controle de tiro por computador, radar, GPS e navegação inercial. Ambos ASTROS e Cobra têm produção nacional.138

Aeronaves Os aviões foram introduzidos ao mundo bélico na I Guerra Mundial e eram usados, basicamente, para coleta de dados. Entretanto, foi durante a II Guerra que sofreram seus maiores desenvolvimentos, tanto de suas capacidades como de aplicações. Atualmente, diante do avanço tecnológico e a disposição de novos equipamentos, suas missões têm ficado mais restritas a ataques a alvos terrestres e, antes de mais nada, combater outras forças aéreas. UAV�s � Missões do tipo reconhecimento passam a ficar a cargo de satélites e de pequenos veículos não-tripulados chamados UAVs (Unmanned Aerial Vehicles �

136 O L-118 é uma versão atualizada do Model 56 105 mm. 137 The Military Balance 96/97, p.142. 138PESSOA, �Desenvolvimento Conjunto de Equipamentos e Sistemas de Armas para as

Forças Armadas: Óbices e Possibilidades�. Rio: ESG, 1990, Anexo C.

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veículos aéreos não tripulados) e Drones (aeronaves robôs sem interferência humana). Esses aviões têm sido usados desde a década de 60 para se evitar a perda de caças de reconhecimento e vidas de pilotos para áreas de defesa inimiga fortemente preparada. Eles têm sido a alternativa mais razoável para países que não podem arcar com os custos e complexidade de operação de um avião espião como o U-2.139 Os mais modernos UAV são feitos com material composto, por isso com pequena silhueta em radares. Devido a propulsores de baixa potência (24 a 115hp), deixam um rastro de calor fraco e baixo ruído o suficiente para não serem perceptíveis a mísseis orientados por infravermelho. Suas dimensões reduzidas e capacidade de voar a altas altitudes de operação impedem qualquer contato visual. Por essas razões, são de difícil intercepção por forças inimigas.140 Os primeiros UAVs foram feitos sobre a tecnologia de Droners (e não Drones) � alvos móveis para treinamento aéreo e antiaéreo. Hoje, apresentam-se em sua quarta geração, sendo Israel o maior expoente na sua produção e aplicação. Suas possibilidades de operação e tarefas cresceram proporcionalmente às necessidades no front e podem ser lançados de pista pavimentada, catapultados de lançador pneumático ou utilizar sistema de decolagem auxiliada por jato (principalmente em operações a bordo de embarcações ou na linha de combate). Suas principais aplicações são: reconhecimento de áreas marítimas, terrestres e aéreas; vigilância de áreas de valor tático; definição clara de posição, valor numérico e movimentação inimiga; análise e localização de alvos, ajuste de tiro de artilharia; eludir ou dispersar forças antiaéreas para posterior ataque de aviões-bombardeiros; análise de danos provocados por ataque aéreos e artilharia; link alternativo de telecomunicações para estações ou satélites desativados pela ação inimiga e guerra eletrônica.141 O desempenho de tais máquinas tem sido tão grande que os países já estudam a possibilidade da evolução dos UAV para UACV (Unmanned Aerial Combat Vehicle � veículos não-tripulados para combate). Seriam pilotados de um centro de execução conectados por satélites de comunicação e fibras ópticas de alta velocidade.. Aviões não tripulados para combate proporcionariam economia de espaço e além das vantagens difícil detecção, acima já mencionadas, proporcionaria a ampliação das capacidades dos caças em termos de velocidade e manobrilidade, já que a tolerância dos pilotos vêm chegando ao seu limite. Menciona-se velocidades hipersônicas (12-15 Mach) e capacidade de aceleração a 20 g (os caças atuais chegam a 9+ g).142 O tipo de missão que os aviões de combate têm surpreendido o mundo são os de ataque ao solo devido à precisão e letalidade das operações. Tal eficácia foi alcançada por meio de inovações e alterações em vários aspectos de um avião de combate. Estão cada vez mais 139 Até os EUA têm aposentado seus aviões espiões, restando apenas 5 SR-71 Blackbird. 140 PORTENGY, Silvio; Vigiando com Segurança. In: Força Aérea. Set/Out de 1998, p. 106. 141 PORTENGY, Silvio; Vigiando com Segurança. In: Força Aérea. Set/Out de 1998, p. 110. 142 LAMBETH, �The Technology Revolution in Air Warfare�, pp. 67-68.

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leves, através da aplicação de compostos de fibra de carbono, fibras sintéticas, ligas de alumínio, litío e titânio de alta performance. Essa obsessão por uma maior leveza do avião tem em mente o transporte de mais combustível, armas e maior liberdade de manobra aérea.143 Outro recurso que tem aplicado para aumentar a manobrabilidade dos aviões é o desenvolvimento de estruturas aerodinâmicas instáveis. A estabilidade é mantida graças a um microprocessador que, automaticamente, envia inúmeros comandos aos flaps. Novos controles de vôo por computadores e sistemas operantes baseados em transmissão elétrica e luz tornaram os novos aviões capazes de realizar missões em qualquer condição de tempo e hora do dia, aumentando a facilidade de uso, a velocidade e eficiência dos comandos e a durabilidade do equipamento. Isto se explica pelo fato de que fibras ótica e outros tipos de cabos são melhor protegidos e conservados do que sistemas mecânicos e hidráulicos. Muitos dos controles deixaram de ser exibidos apenas em displays à frente do piloto (sistema HUD � Head Up Display) e passaram para o visor do capacete do piloto, denominado sistema HMS (Helmet Mounted Sight). Um outro sistema que se tornou indispensável na guerra aérea é o LANTIRN (Low-Altitude Navigation and Targeting System). Ele é usado principalmente em F-16 e F-15. Baseia-se em dois containers em forma de bombas afixados na região central abaixo do avião. Um dos containers usa um radar de observação de terreno que permite ao avião ter performances com baixa altitude e alta velocidade em mau tempo. O outro possibilita ao piloto ver um alvo entre 5 e 15 mil metros de distância144 Com o tamanho reduzido dos equipamentos eletrônicos, tornou-se realizável o aumento da capacidade e variedade de radares, entre eles: ar-ar, ar-terra, search and track (procurar e travar alvo), multilateral track-while-scan (rastreamento e localização de múltiplas áreas), radares de mapeamento, pesquisa de terreno (topográfica) e pesquisa infravermelha.145 A precisão dos ataques deve-se, também, às bombas inteligentes que possuem sistemas especiais de precisão: por imagens de televisão, infravermelha ou laser (ver abaixo �Bombas e Mísseis�). Para facilitar a pilotagem dos aviões, tem-se investido substancialmente em inteligência artificial, sensores, robótica e computadores, de forma a deixar os comandos cada vez mais automatizados. Os joysticks e pedais tornaram-se obsoletos, em contramedida, passou-se a utilizar o que é chamado por HOTAS (Hands On Throlle and Stick � mãos no manche e manete). Forças aéreas ocidentais estão começando também a utilizar �pilotos associados� ou �co-pilotos artificiais�, um sistema de computadores que realiza os comandos

143 DUNNIGAN, James F.; Digital Soldiers, p. 55. 144 DUNNIGAN, James F.; Digital Soldier, p. 56. 145 DUNNIGAN, James F;. Ibdem, p.56.

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mais básicos e rotineiros, informando-os, logo após, ao piloto por voz humana. Da mesma forma, diversos comandos que eram realizados pressionando-se botões, passaram a ser possíveis oralmente. Esse sistema de computadores também coleta e analisa constantemente dados de sensores instalados em diversos pontos do avião.146 Lembrando a tecnologia dos tanques mais avançados, o piloto associado oferece análises e conselhos sobre melhor maneira de agir em determinadas missões e situações. É armazenado dentro da memória de um dos computadores com inteligência artificial as experiências de �ases� da aviação em situações críticas semelhantes. Se um avião inimigo é avistado, o computador indica a melhor manobra a ser realizada. Se o avião for atingido, relata as opções possíveis de emergência. Inteligência artificial e sistemas computadores foram desenvolvidos durante a década de 80 pela força aérea americana destinados, também, à área de planejamento de missões. São dois sistemas: o CAFMS (Computer Assistance Force Management) e o MPS (Mission Planning System). O primeiro tem como função auxiliar o comandante no planejamento e monitoramento das missões aéreas, faz a troca de informações entre o centro de comando e as unidades em operação e realiza um relatório final periódico dos resultados das missões programadas. Foi usado com relativo sucesso na Guerra do Golfo, tornando possível uma eficiente combinação entre as forças aéreas americanas da Marinha, Força Aérea, Marines e os aviões de outros países da Coligação. A sua aplicação baseia-se em uma central de computadores ligados por transmissões via satélite com as várias bases envolvidas. Na memória desses computadores, é armazenada toda a informação essencial coletada pelos centros de inteligência, como previsão do tempo, número e ordem de preparo das forças, pilotos presentes, localização dos alvos a serem destruídos e munição disponível. O CAFMS produz e distribuí às unidades, com ou sem intervenção dos técnicos do centro de comando, o ATOs (Air Taking Order). ATOs são documentos que dão instruções detalhadas de operação a cada unidade envolvida. São dadas informações sobre alvos, horários, rotas, código de reconhecimento, identificação de aliados em meio ao combate, freqüência do rádio a ser utilizada, altitude, pontos de contato, locais de reabastecimento e quais pilotos devem utilizar quais aeronaves.147 O segundo sistema de planejamento informatizado, o MPS, é um sistema que dá ao piloto, na tela do computador de seu caça, uma gama de informações relacionada a sua missão: a quantidade de combustível disponível, velocidade indicada, local de recarregamento de combustível, melhor maneira de atacar o alvo, tipo de resistência inimiga possível e o que deve ser feito em situações de crise. Uma atualização a esse sistema é um software que simula o vôo que deve 146 DUNNIGAN, James F.; How to Make War, p.167. 147 Para detalhes, ver: HYDE, John Paul, PFEIFFER, Johann W. e LOGAN, Toby C. CAFMS

Goes to War. In The First Information War - ACFEA International Press. Fairfax, 1995.

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ser realizado em determinada missão na tela do computador do avião. Graficamente, é mostrado como o alvo vai aparecer no radar e como a missão será vista do cockpit. O MPS é disponível em uma fita que o piloto lê/assiste antes de cada missão no próprio avião momentos antes de início da missão. 148 Outra tecnologia disponível que tem causado espanto, é a stealth. Stealth é a capacidade de uma aeronave ocultar-se às medidas de ratreamento adversárias. Baseia-se na combinação de novos designes e materiais (geralmente compostos não metálicos) de difícil detecção à radares, tintas produzidas de substâncias que absorvem ondas eletromagnéticas e sistemas de guerra eletrônica que emitem ondas eletromagnéticas que confundem, quando não inutilizam, os sistemas de detecção do inimigo. O último avião stealth desenvolvido pelos Estados Unidos foi o Aurora (os outros são o F-117A, o B-2 e o, ainda não operacional, F-22), avião espião de alta velocidade e altitude para substituição do SR-71.149 A Guerra do Golfo deu demonstrações de como tais tecnologias são úteis e eficientes. O avião F-117A foi o mais avançado bombardeiro usado; lançou 3% das bombas e desferiu 10% do total de destruição. Além dele, foram usados os caças-bombardeiros F-15E, A-6 e F-111F. Em relação a tecnologia stealth, o Departamento de Defesa dos EUA desenvolve sistemas de rastreamento à prova de tecnologia de camuflagem. O maior desafio no futuro para os países desenvolvidos serão os mísseis stealth. O desenvolvimento de aviões com essa tecnologia é caro e exige muita tecnologia, mas com os mísseis, a estória é outra. Joint Strike Figther Todos os especialistas, pilotos e técnico em aeronaves apontam esse avião, ainda, em projeto como o mais revolucionário em combate aéreo. Será o caça mais caro e versátil de todos os tempos. Tendo o esforço conjunto das maiores potências militares do ocidente, sendo a peça principal de suas forças aéreas no futuro. O seu projeto surgiu quando Navy, Air Force e Marines dos EUA passaram, separadamente, a planejar novos aviões. Todas suas prioridades foram somadas em torno de um único projeto que catalogaria tecnologias aviônicas já viáveis nas áreas stealth, propulsão, materiais e processo de manutenção. O JSF fará substancial uso de sensores externos, usando informação no cockpit de J-STAR, AWACS, UAVs e satélites. O JSF tornar-se-á uma família comum de aviões que reporá diversas forças, tendo alterações segundo a prioridade de cada uma delas. Os Marines dos EUA e Marinha Real Britânica desejam um JSF com jatos adicionais para pouso vertical, enquanto a Força Aérea americana usará o espaço para mais

148 DUNNIGAN, James F. Hoe to Make War, p. 169. 149 DUNNIGAN, James F. Hoe to Make War, p.172.

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combustível, por exemplo. O JSF substituiria até cinco aviões da Força Aérea americana (F-16, A-10, F-111, F-117A e F-15), um da Marinha (A-6), dois dos Marines (AV-8B Harrier e F/A-18) e toda a esquadrilha da Marinha Real Britânica (Sea Harrier). Terá ainda a participação da Noruega, Dinamarca, Bélgica e Holanda; caso bem sucedido, atrairá outros países europeus. O projeto provocará a mais acirrada competição entre as empresas americanas de defesa já visto, pois a empresa que vencer o contrato de produção será, provavelmente, a única companhia dos EUA a vender aviões de combate após 2015.150 Sistema de Monitoramento Outra característica que os norte-americanos continuam a trabalhar é a idéia de um avião de combate que monitore o espaço aéreo. O seu primeiro emprego foi em 1953, para monitoramento do espaço aéreo norte-americano de bombardeiros russos, com o EC-121. Este já possuía radares potentes, mas faltava ainda mais sofisticação eletrônica. O EC-121 também foi usado na Guerra do Vietnã. A conversão de um avião de grande porte em uma central voadora de radar e torre de controle só se deu, de forma satisfatória, com um protótipo em 1970 e uso efetivo em 1982 � o E-3 AWACS. O AWACS (Airborne Warning Avoidance Control System) pode, também, guiar um míssil de avião aliado até um inimigo aéreo. O mesmo pode ser feito com um míssil terra-ar como um Scud. Também na década de 1970, passou a ser desenvolvido o E-8 J-STARS (Joint Surveilliance Avoidance Radar System). A primeira tarefa deste avião é monitorar atividades no solo e, a segunda, integrar, da melhor forma possível, forças de terra e ar. Os radares deste avião têm dois módulos: wide area, com capacidade de 25 por 20 quilômetros, e análise detalhada, com uma varredura de 4.000 à 5.000 metros.151 A Força Aérea norte � americana, tendo em vista o sucesso que esses aviões fizeram na Guerra do Golfo, fechou um contrato no valor de $1,1 Bilhões de dólares com as empresa Lokcheed Martin, Boeing e TRW para construção de uma nova arma de defesa contra mísseis balísticos - o Airbone Laser ou ABL. Este é um sistema bélico montado em um Boeing 747- 400 que tem a capacidade de atravessar oceanos sem reabastecer e poder ficar em vôo durante horas em alturas superiores a 10.000 pés. Esse último Airbone, além da capacidade de monitoramaneto, terá a capacidade de detectar o lançamento de mísseis balísticos e derrubá-los, utilizando-se de um inovador e poderoso sistema de disparo à laser. Tem-se o objetivo de sempre derrubar o míssil inimigo em seu território, primeiro, porque é o território inimigo e, em segundo lugar, porque a fase de lançamento é o momento mais vulnerável deste tipo de míssil.

150 Strike Fighter. In Air Force Magazine � Outubro de 1996. 151 SWALM, Thomas; Joint Stars in Desert Storm. In The First Information War, pp. 167-170.

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Este é o tipo de arma que não ficará guardada somente para ser usada em momentos de conflito. Assim, como os outros Airbones de monitoramento, ficará disponível e, sempre que possível, sobrevoando o território norte - americano e de aliados como Europa e Israel.152 Notadamente, a Forças Aérea norte-americana é a mais poderosa do mundo e, assim, permanecerá por muito tempo, apesar de ser a Força Aérea de Israel a mais bem sucedida de todas as forças mundiais em combates aéreos. Na tabela abaixo, é demonstrado as principais mudanças que os Estados Unidos aplicará a sua força aérea.

Alterações na Força Aérea dos Estados Unidos

Avião Hoje 2002 2003 2007 B-52 50 10 0 0 B-1 58 52 52 20 B-2 12 21 21 21

AV-8B 140 120 90 72 A-10 162 72 0 0 F-14 172 140 100 0 F-16 816 762 690 642

F-15 A/C/D 344 300 250 174 F-15E 132 132 132 132

F/A-18 C/D 576 456 264 48 F/A-18 E/F 0 0 120 312

F-22 0 0 0 96 F-117 47 47 47 47 E-2C 55 55 55 55

E-3 (AWACS) 29 33 34 37 E-8C (JSTARS) 3 10 19 25

U-2 32 32 32 32 F-14 (TARPS)* 49 36 18 0 F/A-18 (RC)* 0 16 40 40

UAV tático 0 18 30 50 UAV de méd.

alcance 10 40 80 140

Drones 3 12 18 28 Fonte: BAKER, James; The American RMA [Revolution in Military Affairs] Force: na Alternative to the QDR

[Quadrennial Defense Review]. In: Strategic Review. Summer 1997, pp. 27-28. * Aviões de reconhecimento da Marinha norte-americana. Helicópteros Os helicópteros têm adquirido vários dos avanços que somente os aviões detinham, como mísseis ar-ar, HMS, sensores infravermelhos e dispositivos de guerra eletrônica. São usados tanto em operações de ataque tático, carregamento de carga e transporte como, mais recentemente, no suporte à artilharia. Modernos helicópteros de combate são um luxo para poucos países, embora sua

152 Lockheed Martin Press Release - 12 de Novembro de 1996.

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capacidade de destruição e eficiência em missões sejam elevadas. Como na maioria das vezes, EUA e Rússia disputam os mais avançados modelos, enquanto outros países têm tido sucesso no desenvolvimento e aplicação em outras áreas possíveis de aplicação de helicópteros. A França produz bons helicópteros de transporte e a Inglaterra destaca-se em helicópteros para guerra anti-submarina. A tabela abaixo foi compilada a partir de diversas fontes atualmente disponíveis. Ela mostra em detalhes os modelos de aviões e helicópteros utilizados pelas forças armadas no mundo:

Principais Aviões e Helicópteros de Combate Nome País Alcance Ano Peso Máx Vel. Máx. Carga míl. de (Km) (ton.) (Km/h) empuxo F-22 EUA 990 2001 32 3.100 0,38 F-15 EUA 990 1977 30,8 2.800 0,44 Rafale França 700 1998 14,5 1.500 0,31 Eurofighter Ale/Ing N/D 200? 15,4 2400 N/D JAS 39 Suécia N/D 1988 14,1 N/D N/D F-16 EUA 900 1980 16 2.300 0,57 F/A-18 EUA 1.000 1982 22 2.070 0,59 MiG-33 Rússia 1.100 1992 17 2.530 0,48 Mirage 2000 França 1.600 1983 16,5 2.645 0,40 MiG-29 Rússia 1.100 1984 17 2.530 0,48 F-14 EUA 1.000 1970 34 2.760 0,64 Tornado Inglaterra 1.300 1980 24 2.300 0,67 Kfir C2 Israel 780 1974 15 2.645 0,42 F-4 EUA 1.100 1963 28 2.300 0,57 SU-27 Rússia 1.500 1983 27 2.645 0,42 MiG-23 Rússia 960 1971 18 2.645 0,66 JÁ-37 Suécia 1000 1979 16,3 2,400 0,45 Mirage F1 França 1.000 1973 15 2.530 0,61 F-5 EUA 1.000 1972 11 1.840 0,61 Mirage III França 1.300 1963 14 2.530 0,39 MiG-21 Rússia 700 1956 9 2.124 0,41 MiG-31 Rússia 800 1958 41 2.800 0,43 F-8 China 1.100 1969 18 2.645 0,73 F-7 China 1.100 1982 9 2.415 0,41 F-6 China 680 1965 9 1.380 0,35 MiG-25 Rússia 900 1970 38 3.220 0,67 Yak-38 Rússia 300 1970 11,6 1.035 0,63

Bombardeiros B-2 EUA 7.200 1992 181 1.100 0,35 B-1 EUA 5.800 1984 217 2.530 1,17 B-52 EUA 16.000 1955 225 1.035 0,60 F-15E EUA 990 1988 32 2.700 0,57 F-111 EUA 2.000 1967 45 2.530 0,65 F-117A EUA 700 1981 16 1.000 0,67 TU-160 Rússia 5.200 1985 250 2.415 0,67 Jaguar Holanda 1300 1972 18 1.725 0,75 SU-24 Rússia 1.200 1974 41 2.415 0,84 A-6 EUA 750 1963 27 1.208 0,55 A-10 EUA 500 1977 23 644 0,49 SU-25 Rússia 500 1983 19 690 0,56

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A-7 EUA 550 1966 19 1.035 0,55 TU-22 Rússia 2.500 1974 130 2.312 0,79 TU-142 Rússia ? 1955 188 800 0,67 MIg-27 Rússia 400 1973 20 1.955 0,54 A-4 EUA 500 1960 20 1.058 0,80 AV-8A Inglat 400 1959 11 1.035 0,59 Alpha Holanda 520 1979 8 978 0,54 SU-17 Rússia 600 1972 18 2.415 0,44 F-104 EUA 1.200 1958 14 2.530 0,77 TU-16 Rússia 1.500 1955 75 886 0,45 Monitoramento País Alcance Ano Peso Máx. Vel. Máx. (Km) (ton.) (Km/h) E-2C EUA 2.583 1979 23,4 604 E-3 EUA 1.852 1976 147,4 876 E-8A EUA 12.415 1985 155 981 EA-6B EUA 3.861 1971 29,5 1.048 RC-12 EUA 2.224 1983 7,2 463 SR-71 EUA 4.828 1966 77 3.415 U-2 EUA 5.633 1957 18,5 850

Helicópteros AH-64 EUA 300 1985 9,5 300 RAH-66 EUA 2.335 200? 5 315 AH-1W EUA 635 1987 6,9 350 Ka-50 Rússia 400 1992 5 225 AH-1S EUA 180 1984 11 350 Mi-24 Rússia 160 1972 1,3 222 OH-58 EUA 200 1969 1,5 250 Mi-8 Rússia 150 1962 12 320 CH-53E EUA 1.852 1981 33,3 315 OH-6 EUA 200 1963 23 300 CH-46 EUA 676 1962 10,8 265 CH-47 EUA 2.059 1962 22,6 295 CH-53D EUA 1.640 1966 22,6 196 Mi-6 Rússia 210 1958 42 290 UH-60A EUA 370 1979 10,9 361 UH-1H EUA 493 1959 4,7 204 UAVs* Tempo de Peso máx Velocidade Vôo (horas) (libras) máx. (m/s) Pioneer Israel 185 9 530 51 Mastiff Israel 200 7,5 385 51 Scout Israel 100 7 431 50 Heron Israel 250 50 550 138 Searcher Israel 150 12 N/D 110 Spewer Hol/Bélg N/D 8 N/D 166 CL-89 OTAN 140 0,5 380 205 Fonte: baseado em DUNNIGAN, How to Make War, pp.184-5; Aviões de Caça, 1991; Revista Força Aérea Set/Out 1998, pp. 104-111; e LAUR e LLANSON, Encyclopedia of US Modern Military Weapons; pg. 54-152.

Notas: Carga de empuxo militar é razão entre o peso total e área da asa. È principal referência em relação a manobrilidade do avião. Teoricamente quanto menor sua razão, maior sua agilidade. * Israel possui ainda: Hunter, Ranger e Eye View. A África do Sul utiliza um modelo nacional chamado Seeker � todos sem dados técnicos fornecidos. Comentário sobre a tabela: a tabela acima tem uma função muito mais ilustrativa que comparativa. Embora tenham sido usadas várias categorias, elas não são as únicas e nem estas são suficientes ou exatas. Existem muitas outras variáveis que normalmente não são apresentadas em fichas técnicas ou que não são totalmente quantificáveis, mas que afetam o desempenho de um avião. Por exemplo, coeficiente de atrito, alterações do material devido variações de pressão, razão empuxo/peso e etc. Dados sobre a capacidade interna

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de combustível não são fornecidos, sendo esse dado fundamental na comparação de modelos. Aviões e Helicópteros de Combate do Brasil A Aeronáutica do Brasil tem atualmente um inventário obsoleto que compromete a realização de suas tarefas. No entanto, passará por uma intensa modernização com a compra de novos caças estrangeiros mais modernos, outros aviões e equipamentos de combate nacionais. Na lista de compra internacional disputam os modelos Su-27, MiG-29, Mirage 2000, F-16C, F/A-18 C/D e JAS 39 Gripen. A Força Aérea possui os caças Mirage III, que brevemente serão aposentados, e F-5E. Recentemente, foram integrados o AMX e o ALX, produzidos pela EMBRAER, (o primeiro em cooperação com as empresas italianas Alenia e Aermacchi). O AMX foi uma renovação à força e um esforço em capacitar a indústria nacional em aviônica (controle de tiro, controle de bordo e sensores). De forma a ser o AMX o melhor caça da Força nesse critério, além de sua avançada tecnologia em guerra eletrônica, radares e tecnologia stealth. É um avião subsônico para ataque ao solo em qualquer tempo. Já o ALX/Super Tucano é uma versão avançada e para combate do avião Tucano. Está em fase final de testes e contará com relativamente avançados sistemas de GPS, HOTAS, HUD e capacidade para operações noturnas. A Aeronáutica já requisitou 100 deste avião para vigilância da Amazônia e combate ao uso ilegal do espaço aéreo brasileiro.153 Ainda relacionado ao SIVAM, é a introdução do EMB-120 AEW (Air Early Warning). Baseia-se no uso do jato regional ERJ-145 da EMBRAER como base de uma torre aérea para monitoramento e rastreamento similar aos E-3 AWACS relacionados acima Conta com radares de aviso prévio suecos Erieye. A Marinha Brasileira, também, está adquirindo aviões de combate para o porta-aviões Minas Gerais, retomando a iniciativa da aviação naval. É o modelo de norte-americano A-4 (ver tabela de principais aviões e helicópteros de combate). Esses aviões foram usados na Guerra do Golfo e estavam excedentes na Força Aérea do Kuwait que adquiriu vetores mais modernos F/A-18. A compra desse modelo de avião não segue lucidamente qualquer linha estratégia de defesa nacional desde que o aerodrómo ligeiro Minas Gerais é apontado pela Marinha como uma base móvel para defesa e apoio tático das linhas de defesa nacionais. O problema é recalcado pelas características peculiares desses aviões serem de ataque ao solo, não possuindo grande desempenho em tarefas de superioridade aérea (combate) e interceptação. Mesmo sua capacidade de ataque a embarcações não é razoável. Não se penaliza a necessidade da Marinha possuir uma força aérea, mas é falta de senso constituir uma força aérea naval que não possua

153 ALX: A Nova Revolução. In: Revista Força Aérea. ano 3, no 10, mar/abril de 1998.

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capacidade de combate contra forças aéreas navais inimigas, ou de provocar grandes danos a própria força naval inimiga. Além disso, a Aeronáutica já supriu, satisfatoriamente, a necessidade de caças de ataque ao solo com o desenvolvimento e aquisição de caças de ataque ao solo AMX. Os helicópteros usados pelas forças nacionais são todos de origem estrangeira. Alguns são produzidos sob licença, destacando-se os da empresa européia Eurocopter. É um modelo dessa companhia que tem a função de ataque ao solo: o HB-350 Esquilo (no caso do Exército, uma versão atualizada denominada AS-550 Fennec), enquanto o restante tem como característica de emprego missões de transporte e reconhecimento (Super Puma e Sea King no caso da Marinha, Pantera no caso do Exército) e guerra anti-submarina (Super Lynx e Sea King).

Aviões e Helicópteros de Combate Brasileiros

Modelo País Alcance (Km) Peso máx. (ton.) Vel. Máx. (Km/h) Quantidade

AMX(A-1) Brasil/Itália 809 13 1160 55 ALX Brasil N7D 4,9 593 100**

AT-26 Xavante Brasil 1.850 5,6 867 86 A-4 Skyhawk EUA 1.500 5,7 1.058 28

BMB-120 AEW Brasil 2.460 16,9 833 8 Super Puma França 635 8,7 280 16 AS-350e 550 Brasil* 721 2 224 53

AS-355K Pantera Brasil* 150 2 200 36 UH-60 Blackhawk RUA 370 10,9 361 4

UH-IH EUA 493 1,7 204 9 SH-3D/H Sea King EUA/Itália 1.130 8.449 267 13 Super Lynx Mk 21A Inglaterra N/D N/D N/D 14

Fonte: Flap Internacional. Número 310 ano 35 e site da Marinha e Aeronáutica na Internet. * Helicópteros produzidos no Brasil sob licença francesa. ** Número pedido.

Força Naval

Os navios são, até hoje, os aparatos bélicos mais complexos e com mais alto nível tecnológico. A sua disposição de combate tem sido firmada diante as experiências que os países adquiriram através dos anos e, principalmente, da I e II Grandes Guerras Mundiais. Os Estados Unidos mantém-se líderes absolutos sob as águas desde a crise da ex-União Soviética, embora alguns países da Europa tenham uma tradição naval mais longa. Na Guerra do Golfo, o desempenho esperado pelas forças navais norte-americanas não foi alcançado. Apesar disso, como o resultado final foi a vitória, questionamentos e avaliações iniciais não surtiram efeito. Muito tem sido aplicado e generalizado em torno da guerra naval, mesmo que testes reais - as guerras - não aconteçam há 50 anos. Dessa maneira, muito leva a crer que nenhum dos dois estilos predominantes (o

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russo e o norte-americano) é completamente imbatível.154 Mesmo o declínio militar russo sendo evidente, seu estilo de combate naval irá persistir entre os países ex-membros do bloco socialista, países do Terceiro Mundo e até alguns países desenvolvidos do Ocidente. Ele se baseia em uma grande quantidade de navios, principalmente pequenos, muito bem armados mas com poucos técnicos e peças sobressalentes; possuem melhor propulsão e maior capacidade de permanência em alto-mar que a maioria do mesmo gênero. Apenas 15% de sua força naval fica ativa. O estilo russo é construído sobre a idéia de ter a iniciativa e combates intensos e decisivos. Já os navios de guerra ocidentais possuem melhores sensores, computadores e conforto. Sua tripulação é mais bem treinada e, em sua maioria, mantidos no mar o maior tempo possível. Isto é corroborado pela maior porcentagem de navios mantidos nos mares: 35%.155 O desejo permanente dos homens que lidam com a guerra naval é a diminuição da tripulação. Os navios são peças de guerra que, necessariamente, passam longos períodos em missão isolados. Os custos de formação e de manutenção de marinheiros são muito elevados, devido ao grande número deles necessário, à alta complexidade de operação e à diversidade de atividades de um navio moderno de combate. A redução da tripulação, também, possibilita a redução das dimensões do navio, o que significa economia. O maior esforço em solucionar essas questões está na, cada vez maior, automatização das belonaves. Mas as dificuldades são várias. A realidade de uma missão náutica é deveras diferenciada de uma missão incumbida a uma força aérea, onde se tem alta margem de emprego de aviões não tripulados, exclusivamente por serem missões de curta duração e os aviões terem uma liberdade de manobra em combate muito mais simples e um horizonte de observação maior do que se verifica em um combate naval. Outro ponto que dificulta a automatização é a constante necessidade de reparos, controle de danos e manutenção. Esse é o ponto mais combatido pelos cientistas dos centros de pesquisa militares da área.156 A maior atenção dos almirantes quanto à realidade de combate tem se focalizado na eficácia dos mísseis e na alta vulnerabilidade das naus a ataques aéreos. Contrapondo esses obstáculos, a Marinha dos EUA propôs em 1995 um navio arsenal Complementaria-se às qualidades de uma nau convencional a parcial capacidade de submergir, mais um alto nível de automação e um arsenal de 500 mísseis de lançamento vertical. Este navio-projeto teria uma capacidade quase completa de controle de danos automatizada. Outra característica seria um designe livre de pontos como os aviões stealth, para dificultar a detecção por

154 DUNNIGAN, James F.; How to Make War, p.229. 155DUNNIGAN, James F.; How to Make War, p. 218. 156 DUNNIGAN, James F.; Digital Soldiers, p.84.

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radares.157 Para diminuir a vulnerabilidade, vêm sendo buscados 1) sistemas de defesa contra torpedos com o uso de mísseis de dispersão. Estes são carregados de partículas metálicas que confundem os sensores do torpedo. O mesmo tem sido feito em relação a mísseis anti-radar. 2) CEC (Cooperative Mengagement Control): como os navios normalmente agem em conjunto em uma batalha, esse sistema permite um navio utilizar seu arsenal através dos sensores e sistemas de mira de outros navios aliados. O mais conhecido é o sistema norte-americano Aegis; 3) Capacidade stealth, uso de detectores de radares RCS (radar cross signature) e emprego na constituição do casco do navio materiais que absorvam as emissões de radar; 4) Um outro projeto da marinha norte-americana é o denominado Surface Combatanht-21 (SC-21). Terá como atividade a proteção de regiões marítimas, geralmente, em um raio de 600 quilômetros. Como arsenal: 256 mísseis de lançamento vertical (provavelmente Tomahawk � contra ataques terra-mar), mísseis contra navios Harpoons, mísseis antiaéreos Standard, dois canhões automáticos de 155mm com 2.400 �smart shells� (projéteis com sistema de direcionamento e perseguição próprios), dois torpedos de alto calibre (contra submarinos) e sistema de defesa anti-torpedos via mísseis de lançamento vertical. ntará, ainda, com os mais avançados sistemas de guerra eletrônica como os sistemas de telepresença, aparato que permite a condução total do navio na batalha através de sensores e redes de informação de outras unidades, sejam elas marítimas ou terrestres. Terá disponível dois helicópteros SH-60 (versão da marinha para os UH-60 Blackhawk), um veiculo aéreo não tripulado acionado por controle remoto (UAV), dois helicópteros via controle remoto caça-minas e dois veículos aquáticos movidos a controle remoto para ajuste de minas.158 Os submarinos continuam sendo as principais armas de combate naval com melhores sensores, mais silenciosos, equipados com maiores torpedos e mísseis de cruzeiro. A Rússia tem um grande número de submarinos equipados substancialmente com esses mísseis para ataque a navios inimigos de combate e mercantes. No entanto, atualmente apenas dez porcento de seus 200 submarinos de propulsão nuclear e metade dos 150 de propulsão à diesel estão em condições ótimas de emprego, o restante está obsoleto ou necessitando de conserto e re-equipamento de alto custo.159 Alguma pesquisa militar, também, tem sido dirigida a submarinos pelos laboratórios americanos, mas sua produção esta sendo retardada devido a falta de ameaças e o alto custo de novos submarinos. Era planejada a disposição de uma nova série chamada Seawolf, mas apenas alguns serão construídos ao custo de 2 bilhões cada um.

Principais Armamentos de Guerra Naval

157 DUNNIGAN, James.; Digital Soldiers, p.87. 158 DUNNIGAN, James.; Ibdem, pp. 89-91. 159 DUNNIGAN, James.; How to Make War, p.159.

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Canhões País Alcance

(Km) Calibre (mm) Tiros por

segundo Plataforma

Phalanx EUA 2 20 75 S ADMG-630 Rússia 2 30 40 S

ZSU-30 Rússia 4 30 40 S ZSU-23 Rússia 3 23 65 S ZSU-25 Rússia 6 57 4 S Vulcan EUA 2 40 50 S Emerlec EUA 10 30 11 S Mk75 EUA 16 75 1 S Mk42 EUA 21,8 127 -1 S

Torpedos Peso (libras) Velocidade (m/s) SUBROC EUA 55 400 400 U ASROC EUA 10 959 400 S Mk50 EUA 11 800 30 S,A Mk48 EUA 50 3.500 25 U Mk46 EUA 11 565 25 S,A Mk37 EUA 18 1.700 12 S,A

MBU 1200 Rússia 1,2 400 200 S MBU Rússia 6 500 200 S

Fonte: DUNNIGAN, James; How to Make War. pp204-205 e p242; e LAUS, Timoth M. & LLANSON, Steves L.Encyclopedia of Modern Us Military Weapons. Pp168-175 e pp297-299. Notas: S: navio, U: submarino. A: avião ou helicóptero.

Composição das Principais Forças Navais

Categoria Qte. Comprime

nto (m) Peso

(mil ton) Velocida-de (Km/h)

Alcance (mil Km)

Canhões Aero-naves

MAS MSS TT

EUA N 74 101 6 68 200 0 0 0 5 5 M 23 151 12 45 200 0 0 0 20 4 A 12 292 68 51 84 4 65 3 0 0 D 101 135 4 50 8 1 2 1 1 9

Rússia

N (N) 49 122 7 60 200 0 0 0 5 6 N (D) 19 77 2 38 28 0 0 1 0 7

M 10 180 14 44 200 0 0 0 17 6 A 5 297 52 61 112 14 48 6 12 30 B 2 247 23 58 200 10 2 13 20 14 C 38 159 8 59 11 7 1 4 2 36 D 13 136 4 60 8 7 0 4 2 33 E 106 66 1 59 6 4 0 1 2 10

França

M 5 133 12 40 9,26 0 0 0 0 4 N 12 64 1,5 50 11 0 0 0 4 6 A 3 261 40 47 N/D 2 42 2 0 0 D 40 143 6 47 26 6 1 1 6 5 E 36 95 3 34 11 4 0 0 3 4

Inglaterra

M 2 149 16 N/D N/D 0 0 0 0 Sim N 12 83 5 N/D N/D 0 0 0 1 5 A 3 210 20 N/D N/D 2 20 1 0 2 D 35 137 3 N/D N/D 1 1 2 4 4 E 32 72 3 N/D N/D N/D N/D N/D N/D N/D

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75

Alemanha

N 17 N/D 0,5 17 N/D 0 0 0 1 9 D 14 N/D 4 30 N/D 1 2 1 1 5 E 36 N/D 0,4 30 N/D 1 0 1 1 1

Fonte: DUNNIGAN. How to Make War, pp.232-235 e websites: Marinha de França, Alemanha e Inglaterra. Notas sobre a tabela: Tipos de Navios: M: submarinos nucleares com mísseis estratégicos; N: submarinos convencionais ou a propulsão nuclear para combate convencional; N (D): são os submarinos russos dotados de mísseis cruise; A: porta-aviões; B: navios de grande porte para missões independentes; C: navios de classe Cruzeiro, menores que os anteriores mas, geralmente, especializados em certas operações (guerra anti-submarino, anti-ataque aéreo, escolta e etc.); D: usados para escolta de navios mercantes e operações diversas de combate; E: navios de patrulha costeira.

Aeronaves incluem tanto aviões como helicópteros; MSA significa sistemas de lançamento de mísseis superfície-ar; MSS refere-se a sistemas de mísseis superfície-superfície; TT é o número de tubos de lançamento de torpedos e minas; Sim é colocado quando não se conseguiu determinar o número exato; Hífens foram usados quando não se conseguiu dados. * - Os números referidos aos equipamentos são médias de cada categoria. Não são incluídos na tabela navios de menos de 400 toneladas, anfíbios, navios mineiros e lanchas. Força Naval do Brasil A Marinha Brasileira é, das três forças, a mais antiga e talvez a mais bem preparada. Vem aplicando uma grande modernização de sua frota desde o começo da década. A maior ênfase tem sido dada às fragatas, corvetas, submarinos e navios patrulha, embora o aeródromo ligeiro Minas Gerais tenha passado por uma ampla reforma. Muito esforço tem sido aplicado na capacitação em submarinos convencionais e à propulsão nuclear (todos os submarinos do Brasil foram importados ou produzidos sob licença) com vistas à fabricação de um totalmente nacional. A Marinha tem se aplicado, ainda, em unidades de fuzileiros navais e forças especiais anfíbias de pronto emprego, equipadas com peças de artilharia e carros de combate não similares aos do Exército.

Principais Armamentos Navais do Brasil

Armamento Modelo Origem Plataforma Canhão Bofors/ 40mm Inglaterra Fragatas, Corvetas, Porta-avião, Navios-patrulhaCanhão Oerlikon/20mm Inglaterra Navio-patrulha Canhão Vickers/115mm N/D Corvetas, Fragatas Canhão N/D/127mm N/D Contratorpedeiros Torpedo Mk46 EUA Corvetas, Contratorpedeiros

Míssil-antisubmarino ASROC EUA Contratorpedeiros, Fragatas Torpedo Marconi Stingray Fran/Ale Fragatas Torpedo Mk24 Tigerfish Inglaterra Submarinos

Fonte: Site da Marinha do Brasil.

Força Naval Brasileira

Cate-goria

Qte. Compri-mento (m)

Peso (mil ton.)

Velocida-de (Km/h)

Alcance (mil Km)

Canhões Aeronaves MAS

MSS

TT

N 5 61 1,4 38 13 0 0 0 0 16A 1 210 19 43 19 10 12 4 0 0 D 18 120 3 54 7 2 1 10 4 6 E 35 46 0,4 43 3,5 5 0 0 0 0

Fonte: Site da Marinha do Brasil e The Military Bakance 96/97, p.214.

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76

Bombas e Mísseis Apresentam-se abaixo as principais bombas e mísseis da guerra aérea e marítima. Guerra Aérea Na Guerra do Golfo, dentre todos os artifícios usados, os ataques aéreos a alvos terrestres foram os que causaram maior admiração entre todos os que acompanhavam estas missões pela TV. Tal precisão foi alcançada graças aos modernos aviões utilizados (já descritos anteriormente) e os sistemas de bombas inteligentes. É a primeira categoria de bombas a ser empregada para destruição das principais defesas inimigas (no caso da Guerra do Golfo, em combinação com o caça F-117), abrindo caminho para ataques posteriores utilizando-se bombas convencionais (e mais baratas). Existem três tipos de bombas inteligentes: guiadas por imagens de televisão, infravermelhas e guiadas a laser. Estas bombas são feitas a partir da aplicação de kits modulares em bombas convencionais, recebendo o nome de GBU (Glide Bomb Unit � Unidade de Bomba de Planeio), no caso das guiadas laser, esses kits recebem a denominação Paveway II (mais antigas da década de 70)e Paveway III (atualização das anteriores). As guiadas por imagens de TV ou eletro-óticas têm acopladas uma câmera de televisão na ponta de suas fuselagens, cujas imagens são transmitidas por rádio a uma tela de TV no cockpit. Um operador faz as manobras necessárias por via de um joystick que são enviadas a aletas da bomba por data-link. Foram aplicadas primeiramente na guerra do Vietnã. As infravermellhas são conduzidas da mesma forma que as bombas guiadas por televisão. Apenas têm como incremento câmaras de televisão infravermelhas que possibilitam imagens no escuro e em mau tempo. São conhecidos como sistema de sensores FLIR (Foward Looking Infrared Radar). Por sua vez, as bombas à laser são usadas da seguinte maneira: após o piloto, com um joystick, Ter selecionado o alvo na tela de televisão através de câmaras - geralmente infravermelhas localizadas na região ventral do avião ou embaixo da asa - um designador laser do avião dispara um feixe laser no alvo. O reflexo da luz é detectada pelos sensores de bomba. Um microprocessador memoriza a localização do alvo e direciona a bomba, fazendo qualquer correção de trajetória que seja necessária após a liberação. Outros países já desenvolveram sistemas de bombas guiadas à laser mais avançados que os americanos. Israel desenvolveu uma bomba � a Griffin - que pode ser guiada por designadores da aeronave lançadora, unidades em solo, aviões aliados ou UAVs. Dessa maneira, o avião lançador não precisa, necessariamente, estar em uma posição favorável para realizar o ataque. Para alvos menores que necessitam ainda maior precisão, a Força Aérea de Israel desenvolveu a bomba ALGB (Advanced Laser Guided Bomb) que tem ajustado em sua ponta um sensor de busca giroestabilizado. Ou seja, ele não perde o foco mesmo em manobras bruscas devido a um sistema móvel estabilizador em sua

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77

base.160 Outro país avançado nessa tecnologia é a França. O mesmo receptáculo que contém o designador laser Litening é dotado de outros mecanismos: um sensor infravermelho para uso noturno, uma câmara avançada para uso diurno de sensores de TV, sistema de pontaria via navegação inercial, telêmetro laser e um sistema de navegação GPS. Entre os mísseis ar-ar, já há os que possuem radar de busca próprios e sistemas de contramedida (sistemas para dificultar intervenção inimiga). Dessa espécie, existem o AIM-54 Phoenix, da Marinha dos EUA e o AMRAAM (Advanced Medium-Range Air-to-Air Missile). Os outros dois tipos de mísseis ar-ar mais convencionais são de dois tipos: de busca infravermelha (atraídos por calor) e os anti-radar (detectam e seguem as ondas eletromagnéticas emitidas pelo radar adversário). Trabalha-se no aperfeiçoamento de um míssil (mais especificamente, o AIM-9) com um radar específico para detecção de outros mísseis, ou seja, tenta-se criar o míssil ar-ar anti-mísseis ar-ar.

Principais Mísseis Usados por Aviões

Mísseis ar-ar País Detecção Alcance (Km)

Peso (Libras) Velocidade (m/s)

Usado por

Phoenix EUA Ativa 200 1.008 1.600 F-14 AMRAAM AIM-120

EUA Ativa 100 335 1.200 Vários

Sky Flash Inglaterra

Ativa 55 425 1.000 F-4, Tornado

AA-12 �AMRAAMski�

Rússia Ativa 55 450 1.100 MiG29, Su27

Sparrow AIM-7F

EUA Ativa 40 514 1.200 F-4, F-14, F-5, F/A18

Python 3 Israel Passiva 15 268 800 Vários Sidewinder AIM-9M

EUA Passiva 14 190 820 Vários

Magic R550 França Passiva 10 200 1.000 Várias Sidewinder

AIM-9J EUA Passiva 10 185 820 Várias

AA-9 Amos Rússia Ativa 100 800 1.100 MiG25, MiG31

AA-11RH Alamo

Rússia Passiva 40 440 1.000 MiG29, MiG31

AA-10IR Alamo

Rússia Ativa 15 350 1.000 MiG29, Su27

AA-6RH Acrid Rússia Ativa 40 1.700 1.400 MiG25 AA-7RH Apex Rússia Ativa 30 700 1.100 MiG23 AA-6IR Acrid Rússia Passiva 20 1.300 1.400 MiG25 AA-7Ir Apex Rússia Passiva 16 600 1.100 MiG23

AA-8RH Aphid Rússia Ativa 15 200 800 MiG23 AA-8IR Aphid Rússia Passiva 7 120 800 Vários

Sidewinder AIM-9B

EUA Passiva 4 159 650 Várias

AA-3 Anab Rússia Passiva 10 500 800 Su9, Su11, Su15

AA-2 Atoll Passiva Passiva 7 155 700 várias

160 LORCH, Carlos. Uma Bomba e Bingo: as Bombas Inteligentesda Guerra Moderna. In:

Revista Força Aérea, ano 2, número 7, junho/julho de 97, p.89.

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Mísseis

ar-superfície País Detecção Alcance

(Km) Peso (Libras) Velocidade

(m/s) Usado por

Komoran Alemanha

Ambos 37 1.320 300 F-104

HARM AGM-86A EUA Passiva 20 807 1.200 F-4, A-7 Harpoon EUA Ativa 130 1.498 280 A-6, A-7 Exocet França Ativa 60 1.442 300 F-4

Shrike AGM-45A EUA Passiva 16 400 650 F-4, A-6, A-7

AlCM AGM-86 EUA Ativa 3.200 3.000 240 B-52 AS-5 Kelt Rússia Ativa 180 7.700 300 Tu16

AS-12 HARM Rússia Passiva 100 1.600 330 Su24 AS-13 Rússia Passiva 70 2.500 300 Su24

AS-4 Replacem Rússia Ativa 800 12.100 1.150 Tu-22M AS-6 Kingflish Rússia Ativa 250 10.600 800 Tu-22M AS-11HARM Rússia Passiva 80 1.100 300 Su24

AS-14 Rússia Passiva 12 1.500 600 MiG27, Su17, Su24

AS-9ARM Rússia Passiva 80 2.200 260 Su24 AS-15 Rússia Ativa 3.000 3.500 240 Tu95

Maverick AGM-56 EUA Passiva 20 462 670 Vários AS-4 Kicthen Rússia Passiva 300 13.200 400 Tu22M,

Tu22 Paveway EUA Passiva 4 2.100 200 Vários

SRAM AGM-69A EUA Ativa 100 2.240 1.000 B-52 AS-Vikhr Rússia Passiva 20 500 600 Su25

Walley AGM-52A EUA Passiva 4 2.400 200 Vários AS-10 Rússia Passiva 10 600 200 MiG27,

Su17 AS-7 Kerry Rússia Passiva 10 640 300 MiG27,

Su17 AS-3 Kangaroo Rússia Passiva 650 24.200 550 Tu95

AS-2 Kipper Rússia Passiva 210 9.330 400 Tu16

Bombas inteligentes

País Alcance (Km) Peso (Kg)

Detecção Bomba base Uso

Gbu-15 EUA 1.187 TV/IIR Mk84 F-15E,F-111 GBU-10E/B EUA 1.000 Laser/PII Mk84 GBU-12E/B EUA 370 Laser/PII Mk82 GBU-16C/B OTAN 453,5 Laser/PII Mk83 GBU-24A/B EUA 544 Laser/PIII Mk84

A-6, F/A-18, F-15E, F-16, F-111,

Jaguar, Tornado, A-10, AV-8B, OH-

58,AH-64, OV-10DGBU-27 EUA

14,5 a 36

907 Laser/PIII Caixa de aço penetrante F-117 AGM-84E �

1 SLAM EUA 111 619 IIR/GPS AGM-84 Harpoon A-6, A-7

AGM-130 EUA 48 1.352 TV/IIR Mk84 F-4E, F-15E, F-111Skipper II EUA 9,7 453,5 Laser/PII Mk83 A-6, F/A-18

Fonte: DUNNIGAN, James; How to Make Wa,. pp. 186-187; LORCH, Carlos; Uma Bomba e Bingo!. In Revista Força Aérea. Jun/jul de 1997; LAUR, , Timoth M. , & LLANSON, Steven L. Encyclopéia of Modern US Military Weapons. pp-263-264 e pp. 275-289. Nota sobre a tabela: detecção ativa é usada para mísseis que têm radares próprios e detecção passiva mísseis que

buscam calor e emissões de radares do alvo. Notas da última tabela: TV: guiagem por imagens de TV, IIR: guiagem por imagens infravermelhas; PII: kit de

guiagem Paveway II; PIII: Paveway III; GPS: navegação através da triangulação de informações provenientes de uma rede de satélites.

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Os mísseis de defesa anti-aérea já possuem um nível de desenvolvimento em que possuem radares e microprocessadores, de tal maneira que quando um míssil destes, após lançado, detecta um avião ele explode mesmo sem atingi-lo, calculando a melhor forma possível de provocar dano ou destruir o avião inimigo. Ao lado disso, mísseis antiaéreos têm sido associados aos radares de navios e bases antiaéreas por interface. Ou seja, logo após a detecção, automaticamente os lançadores são acionados. Não são usados apenas contra aviões e helicópteros, mas, também, contra outros mísseis como o Patriot na Guerra do Golfo. Incrementando o uso desses mísseis, maior capacidade de detecção, realizar manobras e computadores com maior poder de precisão e interpretação dos dados fornecidos por radares são as principais metas nas instituições militares de pesquisa. Apesar de todos as evoluções realizadas nos últimos anos em mísseis antiaéreos, a mais efetiva defesa continua sendo a superioridade aérea através do uso de outros aviões, principalmente a partir desta década, quando a tecnologia stealth começa a ser comum entre as forças aéreas.

Principais Mísseis Antiaéreos

Modelo País Altitude mínima

Altitude máxima

Alcance (m)

Calibre (mm)

Número de lançadores

Versão Naval

Mobilidade

Patritot EUA 100 24.000 60 410 4 não AP SM-2AER EUA 50 25.000 167 348 2 mesma Navio

AS-10b Rússia 900 30.000 80 500 2 não AP Improved

Hawk EUA 30 18.000 40 370 3

não Móvel

SA-10a Rússia 300 500 50 450 40 SAN6 Móvel SM-2Mr EUA 50 25.000 32 305 20 mesma Navio

Nike EUA 1.000 50.000 150 800 1 não Móvel SA-11 Rússia 30 14.000 30 400 4 SAN7 AP Hawk EUA 100 11.000 30 350 3 mesma Móvel 2S6M Rússia 15 3.500 8 170 9 não AP Roland Aleman

ha 10 3.000 6 163 4 não AP

SA-N3 Rússia 150 25.000 55 600 2 não Navio Avenger EUA 0 4.800 5 70 9 mesma AP SA-N3 Rússia 150 25.000 30 305 2 não Navio SA-4B Rússia 300 20.000 60 800 2 mesma Móvel Tartar EUA 50 20.000 20 300 2 não Navio

Sea Sparrow

EUA 15 5.000 5 200 8 mesma Navio

Stinger EUA 0 4.800 5 70 1 Mesma Portátil SA-6 Rússia 50 13.000 24 330 3 não AP

SA-2B Rússia 1.000 24.000 100 500 1 SAN2 Móvel Crotale França 50 3.600 8 156 4 mesma AP Rapler Inglaterr

a 10 3.000 7 133 4 não AP

SA-3 Rússia 300 13.000 35 450 2 SAN1 AP SA-8B Rússia 10 12.000 15 210 4 SAN4 AP SA-13 Rússia 20 4.000 8 120 4 não AP

Chaparral EUA 100 1.000 5 127 4 sim AP SA-14 Rússia 25 4.500 5 70 1 Não Portátil

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SA-7 Rússia 25 4.200 4 70 2 SAN5 Portátil SA-9 Rússia 50 4.700 7 110 1 não AP

Fonte: DUNNIGAN, James. How to Make War, pp. 204-205. Nota: AP: autopropulsado Guerra Marítima Mesmo a ex-União Soviética sendo pioneira em mísseis anti-navios e a principal fornecedora desse tipo de equipamento para países do Terceiro Mundo, os países desenvolvidos do Ocidente são mais avançados, principalmente, em relação a mísseis contra submarinos: adaptam vários de seus modelos de mísseis de guerra naval para serem compatíveis tanto por navios como submarinos e aviões. Isto reduz os seus custos de treinamento, manutenção e fabricação em série.161 O mais difundido sistema de bombardeio para combates navais são os mísseis Harpoon que possuem em seus narizes câmeras infravermelhas, de maneira similar às bombas inteligentes usadas por aviões. Existem, ainda, os mísseis de cruzeiro Tomahawk, lançados de navios em ataque a unidades inimigas terrestres. São capacitados de sensores e um potente microcomputador que visualiza o terreno através dos dados colhidos e, literalmente, realiza manobras seguindo um mapa armazenado em sua memória para atingir o alvo desejado.

Principais Mísseis Navais

Modelo País Alcance (Km) Peso (libras) Plataforma de

lançamento

Velocidade (m/s)

Tubo para torpedo ?

SSN-2B Rússia 40 3.500 S 250 N SSN-2C Rússia 80 6.000 S 250 N SSN-3B Rússia 450 12.000 S,U 450 N SSN-7 Rússia 60 7.700 U 250 N SSN-9 Rússia 120 6.500 S 250 N

SSN-12 Rússia 500 11.000 U 800 N SSN-14 Rússia 15 3.500 S 300 N SSN-15 Rússia 40 4.000 U 400 S SSN-16 Rússia 90 4.000 U 400 S SSN-19 Rússia 500 10.00 S,U 800 N SSN-22 Rússia 110 6.000 S 800 N SSN-25 Rússia 50 2.000 S 300 N

Skipper II EUA 9,7 1.283 A 575 N Harpoon EUA 110 3.200 A,S,U 280 S Exocet França 40 1.620 A,S 300 N

Tomahawk* EUA 450 2.700 S,U 240 S SUROC EUA 55 4.000 U 400 S ASROC EUA 10 959 S 400 N

Fonte: DUNNIGAN, James; How to Make War, p. 242. Notas sobre a tabela:

Plataforma de lançamento: A: avião, S: navio e U submarino. Tubo de torpedo: indica se o míssil pode ser lançado de submarinos.

161 DUNNIGAN, James.; How to Make War, p.243.

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* Tomahawk também é usado para ataques ao solo partindo de plataformas marítimas. Tipos Especiais Tem sido desenvolvida uma nova série de mísseis inteligentes que são de difícil alocação entre a categoria formal de artilharia. ou defesa antiaérea. Na verdade, funcionam como minas. São fixados sob solo e dotados de sensores próprios e, dependendo de sua sofisticação, podem atingir de carros blindados até helicópteros. Nesse estilo, existe o SADARM (Sense and Destroy ARMor) que consiste em um míssil penetrante inteligente com um sensor termal que realiza uma varredura constante em um raio de 100 metros. Após um alvo ter sido detectado, um sistema lançador atira o míssil de sua �toca� e, logo depois, o míssil segue seu alvo pelos seus próprios sensores. Por sua vez, o WAM (Wild Area Mine) possui as mesmas características do SADARM, a não ser por seus sensores serem de som e vibração, conseguindo diferenciar um carro de passeio de um tanque de combate graças a uma biblioteca armazenada na memória de seu microprocessador. Variações do WAM para ação anti-helicóptero também são possíveis. Há ainda o BAT (Brilliant Antiarmor Submunition), um modelo sofisticado do SADARM com capacidade de altitude e de manobras aéreas maior, devido anéis em sua fuselagem com função de flaps de avião. É um míssil com maior poder de varredura e pode derrubar um maior número de alvos. 162 Mísseis e Bombas do Brasil. As três casas militares têm um comprometimento diferente em relação a mísseis e bombas. Os sistemas de mísseis usados pela Marinha são os mísseis anti-navio MM 38/40 (Inglaterra) e Exocet (que consta na tabela dos principais mísseis navais), e mais os mísseis antiaéreos Mistral (francês) e Seawolf (inglês), ASPIDE e Abatros Mk2 (Itália). Dentre as Forças, é ela a que tem investido mais na aquisição de mísseis nos últimos anos. Não apenas quantitativamente, mas em qualidade igual ou superior as mais representativas forças navais do mundo. Para defesa antiaérea, o Exército utiliza apenas o sistema de míssil alemão Roland II apresentado (que consta em tabela de mísseis antiaéreos). Tanto o Exército como a Marinha não possuem projetos nesta área no momento. A Aeronáutica é bem menos dependente de produtos estrangeiros, embora importe mísseis ar-ar AIM9-B Sidewinder, e já desenvolveu alguns vetores. Entretanto, com certeza, terá que desenvolver ou importar modelos mais modernos com a aquisição de novos caças nos próximos anos. Os vetores nacionais são 163:

Bomba BFA-230 DE 230 Kg e Bomba BAFG de 460 Kg guiadas por imagens de TV; Bomba anti-pista convencional; Míssil MSA-1 �Piranha� ar-ar de busca termal.

162 DUNNIGAN, James.; Digital Soldiers, p.192 163 PESSOA, Antônio José Monteiro. Desenvolvimento Confunto de Equipamentos e Sistemas

de Armas para as Forças Armadas, Anexo E.

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As FAB deveriam dar mais ênfase a bombas e mísseis (inclusive mísseis de cruzeiro) e se esforçar no seu desenvolvimento conjunto. São os equipamentos militares que apresentam a melhor eficiência a relativo baixo custo das últimas décadas. São muito mais baratos que sistemas pesados como aviões e tanques, e sua tecnologia permite que um mesmo modelo seja eficiente no combate marítimo, aéreo e terrestre com apenas algumas alterações O Brasil possui capacidade tecnológica e industrial suficiente para ter sucesso nesta aérea. Guerra Eletrônica Esta é uma área que tem sido afirmada como uma nova dimensão do campo de batalha, tendo-se como referência a Guerra do Golfo. Historicamente, no entanto, a eletrônica passou a ser parte da guerra no momento em que foi introduzida, de maneira marcante, na II Guerra Mundial. Embora a dependência da comunicação por sistemas eletrônicos tenha se iniciado na Guerra Civil Norte-Americana, foi na II Guerra Mundial que o emprego de equipamentos e operações de detecção eletrônicos foram aplicados mais intensivamente e, em resposta a estes, o uso da criptografia e códigos eletrônicos. Mais recentemente, o uso de recursos eletrônicos para minar e surpreender foram usados com sucesso contra países sem qualquer capacidade nessa área para responder à altura � EUA contra Vietnã e, mais tardiamente, contra o Iraque e Israel em guerras do Oriente Médio. Conflitos em que ambos os lados possuíssem recursos de guerra eletrônica ainda não foram travadas. Espera-se que quando isso ocorrer a Guerra Eletrônica não será um fator simplificador, pelo contrário, tornará o combate mais complexo e incerto. Isso se deve à gama de possibilidades geradas e devido a cada vez maior dependência dos países em componentes eletrônicos. Para melhor compreensão, apresentar-se-ão a seguir as principais aplicações da Guerra Eletrônica164: Aplicações Ofensivas 1) Localização de alvos inimigos: sensores, medidas de vigilância eletrônica e processamento de sinais para o auxílio na determinação das atividades, força e posições das unidades inimigas, para ataques posteriores mais bem planejados e, talvez, com melhores resultados. Medidas de vigilância eletrônica baseia-se na atividade de identificar, catalogar e monitorar as emissões eletrônicas do adversário, seja as suas freqüências de rádio, tipos e potências dos radares, sensores e sonares, seja a �assinatura�/rastro eletrônica(o) de seu armamento (por exemplo, como determinado modelo de submarino inimigo pode ser apresentado na tela do sonar de um navio aliado). Evidentemente, é uma atividade preventiva e de execução anterior as hostilidades terem início. Processamento de sinais é algo quase similar à atividade anterior: reconhecimento e armazenamento de padrões identificadores dos equipamentos e armas adversárias como sons dos navios, vibrações sísmicas provocados por blindados e rastros de calor de aviões; 2) Rompimento do sistema C3I � comando, controle, comunicação e inteligência do inimigo por meio da detecção de suas comunicações e posterior interferência por emissões de sinais eletromagnéticos, envio de mensagens falsas e destruição de seus equipamentos de comunicação; 3) Destruição dos sistemas de sistemas eletrônicos do inimigo através da descarga de potentes emissões eletromagnéticas (mais conhecido como pulso eletromagnético).

164 DUNNIGAN,; James. How to Make War, pp. 372-377.

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Aplicações Defensivas 1) Assegurar as comunicações entre as unidades desenvolvendo sistemas eletrônicos para proteção de rádios, links e interface, como por exemplo, alternadores automáticos de freqüência de rádios; 2) Contramedidas eletrônicas: são usadas por aviões e navios em casos de iminência de mísseis anti-radar. O artifício mais comum é a liberação ao ar de partículas metálicas que confundem os sensores do míssil inimigo. As forças armadas de países ocidentais desenvolvidos são as mais dependentes de recursos eletrônicos e, por isso, os que mais investem e acreditam nas vantagens da Guerra Eletrônica. A Rússia é mais cética, buscando sempre formas alternativas de comunicação, organização e operação. Faz grande uso de bandeiras, fumaça e mensageiros. Suas unidades são muito mais autônomas, seguindo sempre a tradição de cumprimento total de ordens prévias antes de retomar contato com os centros de comando. Outras técnicas usadas pelos russos são: ao invés de desenvolver potentes e sofisticados sistemas de detecção como os ocidentais, eles produzem um grande número de simples detectores e acionam cada um à análise de uma freqüência específica. Mantém seus equipamentos em segredo, inclusive de suas próprias tropas até o momento do combate na certeza de que suas tropas aprenderam a operar o equipamento primeiro que os inimigos o detectem e saibam como reconhecê-los por vias eletrônicas. E por último, equipam seus tanques, navios e aviões muito mais fortemente que suas contrapartes ocidentais oferecendo aos seus soldados maiores opções de contramedidas à ação adversária ou no caso de defeito de equipamento.165 Sistema C3I Após a II Guerra Mundial, quando os aparatos eletrônicos começaram a ter relevância, criou-se um consenso de como deveria ser a base de organização de uma força no campo de batalha, são chamado sistemas C3I � comando, controle, comunicação e inteligência. O general apenas conseguiria instruir suas tropas de missões (comando) e conduzi-las e organizá-las no campo de batalha (controle) através de perfeitos sistemas de comunicação, principalmente com a expansão do espaço de batalha e aumento da complexidade na guerra moderna. No entanto, o melhor dos planejamentos e estratégias só são possíveis com o completo conhecimento da situação de sua própria força e a do inimigo (lembrando Sun Tzu) que é realizado após o processamento da informação (inteligência) comunicada pelas unidades de coleta de dados, espiões, sensores, observadores ou, simplesmente, relatórios de rotina sobre as unidades. Emergiu o argumento de que esse �paradigma� é ultrapassado devido o aumento da capacidade de destruição, locomoção, disposição de tropas e maior complexidade de unidades e equipamentos. Diante esta situação, uma força necessitaria ter computadores integrados ao sistema para facilitar e agilizar o uso dos componentes existentes. Assim, o campo de batalha moderno teria como parâmetros o termo C4I �

165 DUNNIGAN,; James. How to Make War, pp. 371-372.

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comando, controle, comunicação, computadores e inteligência. Guerra Eletrônica no Brasil. Para os militares brasileiros, a capacidade de Guerra Eletrônica é algo imprescindível e têm sido feitos esforços para dominar esta área. Porém, é evidente que embora possuam um significativo potencial para a pesquisa, para a aplicação efetiva de sistemas eletrônicos não há o mesmo êxito. Principalmente, devido à falta de cooperação das três forças em projetos e a incompatibilidade entre seus sistemas de armas. A Marinha se focaliza em projetos de contramedida e a Aeronáutica em projetos de detecção de radares inimigos. Ambos, também, têm projetos de radares mais apurados. O Exército se aplica em sistemas mais seguros e eficazes de telecomunicações.166 O EMFA e a SAE têm como prioridade a capacitação de equipamentos criptográficos para comunicações. Notadamente, são todos projetos de aplicação defensiva da Guerra Eletrônica.

166 PESSOA, Antônio José Monteiro; Desenvolvimento Conjunto de Equipamentos e Sistemas

de Armas para as Forças Armadas, Anexo B.

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O Capitalismo da Guerra: Indústria e Mercado Internacionais de Armamentos

Os primeiros e mais visíveis reflexos do final do equilíbrio estratégico da Guerra Fria e das mudanças estruturais nas forças armadas mundiais acontecem nos padrões de produção e do mercado internacional de armas. Cálculo de gastos e relação do inventário militar de cada país são possíveis e realizados. No entanto, a confiabilidade dos dados que são fornecidos pelos países não é alta. Descrever como as empresas de defesa vêm mudando seus padrões, relacionando-os com os últimos acontecimentos estratégicos, políticos e econômicos não é apenas conveniente, mas necessário. As dificuldades que enfrentam as indústrias de defesa internacionais se dão, sem nenhuma dúvida, pelo fim da Guerra Fria, apesar de outros fatores contribuíram para as drásticas quedas em vendas de armas. Com alguma demonstração já na I Guerra Mundial, mas, efetivamente na II Guerra e em diante, as forças armadas passaram a ter uma grande diversidade de unidades e equipamentos mais complexos. A partir da década de 50, armamentos com novas tecnologias como turbinas a jato, mísseis, eletrônicos e materiais compostos avançados passaram a fazer o preço de desenvolvimento de novas armas subir vertiginosamente. Sendo, dessa forma, o custo da sua produção e preço final cada vez maior para o orçamento dos países. A pressão extremamente forte dos gastos militares sobre as economias nacionais devido os compromissos políticos e ideológicos já não eram suportados antes do fim da Guerra Fria, muitos países europeus permitiram que suas forças armadas declinassem.167 Durante toda a década de 1980, o fluxo do comércio de armas convencionais foi atribulado. Pequenas quedas seqüenciais ocorreram no período 1981-85, sendo em 1986 que se teve uma retomada e em 1987 alcançou-se o maior pico desde a década de 50. Agravantes para a queda na venda de armas já na década de 80 são a crise financeira internacional em 82 e ter essa década se tornado a década perdida para os países em desenvolvimento. O pico deve-se, principalmente, pelas guerras no Golfo Pérsico que resultaram em um aumento dos gastos militares dos países árabes em até 25% (dado: SIPRI Yearbook 1997) e devido a retomada de gastos pelas duas superpotências reiniciada pelo governo Reagan. No entanto, o restante do mundo, com as suas economias sufocadas, iniciavam uma redução sistemática de seus gastos militares. 167 Strategic Survey 1996/97. IISS, pp-17-19.

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Na Europa, os cortes de armas convencionais acertados no Tratado para Armas Convencionais para a Europa oficializou ou institucionalizou o processo já em andamento. Os países do Terceiro Mundo tiveram as suas razões depositadas na década de 80, a Década Perdida e, especificamente na África e América Latina devido aos constrangimentos políticos gerados no processo de democratização.168 Apesar do pico em 1987, o volume de transferência de armas inicia a sua maior queda do período logo em 88, seguindo continuamente até 94 quando há o início de uma muito reduzida recuperação.169Essas alterações são reflexos diretos dos

gastos militares pelos países que vieram caindo desde 88 até 94, em média, 4,5% ao ano, enquanto em 95 e 96 a queda foi atenuada a 1%.170 Os maiores cortes foram proporcionados, é claro, pela Rússia, apresentando, atualmente, um décimo de seus gastos em comparação aos de 87.171 O Sudeste Asiático foi a única região que aumentou seus gastos: em torno de 25% nos últimos dez anos.172

Fonte: SIPRI Yearbook 1998 168 ANTHONY, Ian; Current Trends and Developments in the Arms Trade In: The Arms

Trade Problems and Prospects in the Post-Cold War World, World -. Annals of the American Academy of Political and Social Science. Vol. 538, September 1994, pp. 36-37.

169 SIPRI Yearbook 97, Arms Trade. 170 SIPRI Yearbook 98, Arms Trade. 171 SIPRI Yearbook 97, Military Expendure. 172 SIPRI Yearbook 98. Military Expendure.

COMÉRCIO INTERNACIONAL DE ARMAS - 1980/97

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IMPORTAÇÃO DE ARMAS POR REGIÕES, 1996.

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19%8%

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Àfrica e Oceânia

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Europa

Am éricas

Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

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A m é r i c a

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Alterações no Mercado Internacional dos Anos 90 Desde o fim da Guerra Fria as empresas de defesa não podem mais contar com subsídios de seus países-matriz e contratos longos a preços inflacionados com países estrangeiros, como eram feitos naquele período devido a compromissos políticos. Para conseguirem vender algo nos dias de hoje, estão sendo forçadas a se adaptarem às regras de mercado e a realizarem melhorias estruturais internas, a fim de serem mais flexíveis, competitivas e responsáveis em relação ao seu mercado como fazem as empresas de artigos civis. A maior liberdade política e o excedente de produtos em oferta têm permitido aos compradores uma gama de oportunidade que não se via em muitos anos173. O fim da Guerra Fria permitiu um relaxamento nas atitudes dos governos em relação à transferência de tecnologias militares dentro de um grupo de países industrializados e os equipamentos russos já fazem parte das licitações de compra de armas de qualquer país do Ocidente. Tal fato derruba o argumento dos militares brasileiros, principalmente dentro da Escola Superior de Guerra, que embora o equilíbrio estratégico militar tenha mudado, e com ele constrangimentos e compromissos internacionais, a dificuldade e restrição à compra de armas avançadas e a transferência de tecnologia para o Terceiro Mundo continua. A melhor prova que esse �apartheid� não mais existe ou é muito mais reduzido do que se afirma é a própria concorrência brasileira para a compra de caças em que todas as empresas participantes oferecem as últimas versões dos modelos apresentados. A principal estratégia usada pelas indústrias para substituir as exportações tem sido o investimento direto. Ele tem sido realizado pelas empresas através de aquisições e fusões nacionais e regionais (que por serem mais específicos ao caso das empresas norte-americanas, serão discutido no próximo seguimento) e através de cooperação internacional. Com esses empreendimentos, as empresas têm como objetivos: sustentar os caros projetos de pesquisa e desenvolvimento, responder à demanda de economias de escalas e escoar o excedente de produção através do acesso a uma maior parcela do mercado.174 A cooperação internacional entre empresas do setor tem acontecido de duas formas: primeiro, a cooperação entre empresas rivais no desenvolvimento conjunto de novos sistemas de armas. Um bom exemplo é a união das duas

173 SKONS, Elisabeth e WULF, Herbert. The Internalization of Arms Industry, In: The Arms

Trade Problems and Prospects in the Post-Cold War World., pp. 44 174 SKONS, Elisabeth e WULF, Herbert. The Internalization of Arms Industry, pp. 53-54

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maiores empresas de defesa dos Estados Unidos, Lockheed Martin e Boeing McDonnel Douglas e, mais uma empresa menor, a TRW, para divisão de tarefas e custos de pesquisa no projeto AirBone Laser � ABL (relatado na seção Aeronaves). Na Europa essa cooperação é mais forte, sendo criado joint ventures entre firmas em setores rivais como a criação da Eurocopter, responsável atualmente pelos principais projetos de aeronaves da Europa, entre eles: o caça Eurofigther, helicóptero de combate Tiger II e o avião de carga FAT - Future Ais Transport. O segundo tipo de cooperação são os joint ventures estruturados como resultados de grandes negócios de países compradores que requerem produzir algumas partes do produto comprado como componentes e subsistemas, ou ficarem responsáveis pelo markenting e serviços pós-vendas. São as chamadas �compensações�. Exemplo é a aquisição pela Turquia de caças F-16. A primeira linha foi produzida inteiramente nos EUA, enquanto as demais .serão em cooperação entre empresas turcas e norte-americanas, podendo chegar a serem montados inteiramente na própria Turquia. Mesmo ocorrendo uma seleção natural no setor de indústria de armamentos e apenas as maiores estarem sobrevivendo, nenhum país quer ficar totalmente dependente ao pequeno grupo de fornecedores de armas. Querem manter um certo know-how local visando o futuro imprevisível. Existem ainda outros três fatores que incentivam os investimentos diretos por cooperação: barreiras comerciais, legais e técnicas, custos de transporte e serviços pós-vendas (manutenção e reparos). Resumindo, os dois principais desenvolvimentos nas indústrias de armamentos nos últimos anos são a diversificação geográfica através de aquisições e fusões e o redirecionamento estratégico para consolidação do produto a ser vendido. Transformações no Setores Industriais em Cada Região Estados Unidos Os Estados Unidos vêm consolidando-se com a maior fatia das exportações de armas do mundo, dominando metade do mercado (45-50%) tomando o lugar que foi por muito tempo da ex-União Soviética (20 bilhões por ano na década de 80). Além da queda da União Soviética, a liderança dos EUA no mercado de armas deve-se a campanhas comerciais persistentes. Possui, ainda, o maior orçamento em pesquisa e desenvolvimento do mundo e um grande e protegido mercado de armas (como na maioria de seus setores econômicos). No entanto, dois fatores podem limitar sua atual alta de exportações no futuro: o dilema de manter-se numa posição de dominação militar e querer liderar todas os setores de produção de equipamentos militares, o que é virtualmente impossível, mantendo uma auto-

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suficiência e nenhuma reciprocidade com seus parceiros; e o dilema tecnológico: que se baseia na questão de P&D militar nos EUA ser muito concentrado em instituições governamentais o que pode sucofá-lo no futuro com a redução orçamentária.175 Se a pesquisa e desenvolvimento (P&D) militar nos EUA continuar a ser centralizada em centros governamentais ela pode ser reduzida em períodos de necessidade de corte de gastos governamentais, quando somente a iniciativa privada (mesmo que controlada pelo governo) teria recursos suficientes dar continuidade em projetos iniciados. Uma das piores coisas para uma força é não ter continuidade em seus projetos de pesquisa e desenvolvimento militar.

A partir de 1994, os Estados Unidos, diferentemente de outras regiões do mundo, apresentaram uma retomada de sua produção.176 Isso se deve pela expansão da sua fatia do mercado internacional de armas e por ter sido nesse ano que a restruturação do setor foi iniciada, deixando as empresas americanas mais competitivas em relação às dos outros países. Num período de dois anos, foram realizadas �20 fusões e aquisições, sobretudo na indústria aeroespacial e eletrônica, surgindo um pequeno grupo de poderosos gigantes. O emprego no setor caiu de 3,9 milhões em 1987 para 2,1 milhões, mas a lucratividade aumentou�177 As alterações na área de indústria bélica norte-americana podem ser resumidas nas seguintes tendências178: Concentração ou afastamento total das empresas, como exemplo: Ford, IBM, General Eletronics e Westinghouse abandonaram a área, enquanto Boeing e 175 BROZCA, Michael e PEARSON, Frederic S.; Decelopments in the Global Supply of Arms:

Opportunity and Motivation, In: The Arms Trade Problems and Prospects in the Post-Cold War, pp. 60-62.

176 SIPRI Yearbook 96. Arms Production. 177 GRANT, Charles; A fusão faz a força . Gazeta Mercantil 17/07/97. 178 GRANT, Charles. A fusão faz a força.

EXPORTAÇÕES DE ARMAS PELOS ESTADOS UNIDOS -

1980/97.

02000400060008000

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Ano

Valo

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(U$S

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Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

IMPORTAÇÃO DE ARMAS PELOS ESTADOS UNIDOS - 1980/97.

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Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

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Rayethon intensificaram; Disputa entre as gigantes e grandes conglomerados por �empresas especializadas em eletrônica, a única área que cresce no setor. O Pentágono gasta com eletrônicos 45% de seu orçamento para compras de armas�, visando a atualização de plataformas e equipamentos para comunicações, links e interfaces entre unidades. Tamanho é crucial: esses gigantescos conglomerados, devido ao seu tamanho, possuem poder político, força em pesquisa e desenvolvimento, uma certa distribuição pelo país, facilidade na integração de diferentes divisões produtivas e a grande vantagem de negociar com apenas um governo. A quarta tendência é o afrouxamento da lei anti-truste. �OS EUA já possuem apenas uma empresa para fabricação de tanques (General Dynamics), uma de veículos blindados (United Defense) e uma de bombardeiros (Nothrop Gruman)�179, provavelmente, terá apenas uma de caças de combate e o mesmo nas demais áreas com exceção da construção naval que não sofreu uma alteração. Contudo, nem mesmo a dominação do comércio internacional de armas serviu para amenizar os imensos gastos da restruturação das empresas. Essas fusões não ocorrem sem risco, o débito médio aumentou de 36% em 1993, para 112% em 1996. O débito da Lockheed Martin aumentou em estimados 179%, enquanto a Northrop-Grumman aproxima-se de 265%. Esses riscos são baseados na possibilidade de contratos de longo prazo com o próprio governo americano (o maior filão do mercado que se pode encontrar), como os futuros programas: C-17, avião de transporte; o F-22 (já ganho pela Lockheed Martin), o Joint Advanced Strike Fighter Technology; e o Theater High Attitude Area Defense (THAAD), sistema de mísseis balísticos defensivos.180. Bill Clinton apóia a restruturação de maneira pública e através de medidas governamentais: �as empresas tiveram permissão de pedir reembolso de parte do custo das fusões e impulso às exportações. Em 1996, passou a vigorar um novo programa de financiamento às exportações para as empresas. O Tesouro garantirá empréstimos comerciais a países que comprarem equipamentos americanos até um valor total de 15 bilhões�.181 Europa As empresas européias estão tendo muito mais dificuldades na reestruturação de suas empresas que as norte-americanas. A queda no requerimento por armas faz impossível a manutenção de sua base industrial tão diversificada. Apesar do

179 GRANT, Charles. Ibdem. 180 Strategic Survey 96/97 � International Institute for Strategic Studies, pp. 70-71. 181 GRANT, Charles. A fusão faz a força.

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mercado de defesa europeu ser metade do norte-americano, a União Européia tem dez produtores de aviões, os EUA têm 5; 11 produtores de mísseis contra 5 americanas; dez de veículos blindados contra 2; e 14 construtores de navios contra 4 norte-americanas. A solução tomada tem sido mais pela via de joint ventures em áreas específicas entre empresas do que através de fusões. Como exemplo, temos a Eurocopter (Dasa da Alemanha e Aeroespatiale da França na área de aeronaves) e a Matra Marconi et Space (GEC da Grã-Bretanha e Legadére da França). No entanto, embora esses �joint ventures ofereçam alguma sinergia tecnológica e de economia de escala, cada componente é administrado como uma operação empresarial distinta�182. A meta é criar empresas multilaterais européias gigantes em determinados segmentos para fazer frente às empresas americanas. O primeiro esforço nesse sentido é liderado pela França e Alemanha na formação de uma Agência Européia de Armamentos com futura participação, de Holanda, Itália e Inglaterra, com a função de lidar com programas de procura de armas. Também evitam fusões com americanas no momento, por elas serem muito maiores, teriam uma posição acionária minoritária.

Apesar de tudo isto, tanto na criação de uma agência única como na tentativa de condução de programas cooperativos há divergências de origem sentimentalista e vaidosa. Há, ainda, desconfiança, insegurança econômica e incompatibilidade de interesses. A estrutura de armamentos da França é, na opinião de especialistas, o maior obstáculo para a restruturação européia por ser em sua maioria empresas de defesa estatais A prioridade desse país é a consolidação interna. Chirac quer a fusão entre a Dassault (privada) e a Aeroespatiale (estatal) para facilitar a aproximação com outras empresas européias. No entanto, há hesitações sobre a privatização da Thompson, maior empresa de eletrônicos da Europa. 182 GRANT, Charles. Nas Armas os Europeus estão longe da União. Gazeta Mercantil,

18/07/97.

EXPORTAÇÃO DE ARMAS PELA EUROPA - 1987/97.

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Ano

Valo

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Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

IMPORTAÇÃO DE ARMAS PELA EUROPA - 1987/97.

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I Fonte: SIPRI Yearbook 1998

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Rússia A redução da produção de armas na Rússia, assim como a redução de suas forças efetivas, tem sido feita, muitas vezes, de forma descontrolada. Em 1995, sua produção militar tinha caído para um sexto da produção de 91. Apenas a Ucrânia experimentou uma queda maior: um décimo em relação a sua produção de 91 183 Outros números apontam o descontrole russo: em 91 foram produzidos 900 tanques, a produção foi para 700 em 92 e 200 em 93; caças e caças bombardeiros: 325 em 91, 150 em 92 e 75 em 93; mísseis balísticos: 175 em 91, 70 em 92 e 35 em 93. Perdendo sua força para renovar seu parque industrial, resta a Rússia apenas a capacidade de produção em massa de equipamentos dos anos 70 e 80. Entre eles, os caças MiG-29M e Su-27/35, o lançador de mísseis S-300 e várias peças de artilharia. Armas potentes e desejadas pelos outros países e que podem proporcionar uma sobre-vida para as indústrias russas por algum tempo. As principais estratégias, além da tentativa de conversão para áreas civis de suas empresas militares, são: a exportação de produtos terminados sem transferência de tecnologia, podendo assim, manter uma ligação com o comprador vendendo posteriormente peças sobressalentes e serviços técnicos e, em segundo lugar, a cooperação com firmas ocidentais em campos tecnológicos selecionados. Evidentemente, em áreas mais custosas ou em que os ocidentais são tradicionalmente melhores, como eletrônica. A Rússia conta ainda com auxílios do Ocidente tanto financeiros, como técnicos em contrapeso a sua relativa passividade à expansão da OTAN para dentro de seus outrora domínios (Leste Europeu e ex-repúblicas soviéticas).

IMPORTAÇÃO DE ARMAS PELA URSS/RÚSSIA - 1980/97.

0500

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Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

EXPORTAÇÃO DE ARMAS PELA URSS/RÚSSIA - 1980/97.

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Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

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Ásia Japão e Coréia do Sul iniciaram, nos últimos anos, uma fase de tentativa de capacitar suas indústrias de defesa, sendo os únicos países do mundo (ao lado da Índia) que têm aumentado seus orçamentos em pesquisa e desenvolvimento militares.184 O Japão tenta ir mais longe: recentemente, uma reunião no Pentágono entre empresários do setor armamentos japoneses e norte-americanos sinalizou para os esforços do Japão em começar a exportar armas, ou pelo menos, componentes. No entanto, enfrentarão a dificuldade de ter uma cultura de produção de armas totalmente doméstica e inexperiente em competição internacional.185 Taiwan, da mesma forma, busca capacitar sua indústria, mas através da cooperação com empresas ocidentais. �Começou com a produção sob licença de armas americanas, como aviões F-5, fragatas e mísseis Patriot. Agora, o país está qualificado para projetar algumas armas por conta própria� como o caça Indigenous Defense Fighter.186

Por outro lado, as empresas ocidentais hesitam em intensificar relações com Taiwan, temendo represálias da China que tem um mercado muito mais interessante. A China tem, potencialmente, o maior mercado de armas do mundo por possuir, em termos quantitativos, a maior força armada e o maior parque de indústrias de defesa do mundo - mais de 3 milhões de empregados e 3 mil empresas neste setor. Seu objetivo é �ser completamente autônoma na produção de material bélico�.187No entanto, ela falha no mesmo ponto que as empresas 183 SIPRI Yearbook 96. Arms Production. 184 SIPRI Yearbook 97. Military Technology. 185 GRANT, Charles; O Japão é Avançado, porém Isolado. Gazeta Mercantil, 19/07/97. 186 GRANT, Charles. Caminhos Opostos na Busca pelas Armas. Cazeta Mercantil, 20/07/97. 187 GRANT, Charles. Caminhos Opostos na Busca pelas Armas.

EXPORTAÇÃO DE ARMAS PELA ÁSIA - 1987/97.

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Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

IMPORTAÇÃO DE ARMAS PELA ÁSIA - 1987/97.

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Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

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russas: bons centros de pesquisas, mas dificuldade em manufaturar novas armas. Todavia, o desejo de modernização tem provocado a realocação de dinheiro, diminuindo-se o efetivo e investindo mais em transferência de tecnologia, principalmente, da Rússia. (por exemplo, através da compra de componentes do caça tático russo Su-27, submarinos classe Kilo e um porta-aviões). Com essas transferência a China suporta projetos domésticos como caça multitarefa F-10.188. A Índia encontra-se com uma capacidade industrial excessivamente dependente do Estado, financeiramente, e das empresas estrangeiras, tecnologicamente. Terá, nos próximos anos, um verdadeiro desafio em compatibilizar seus recursos econômicos a problemas e ambições estratégicos. Outros Países Devido a meta de ser auto-suficiente durante o período de embargo, a África do Sul, também, está com um parque industrial bélico demasiadamente grande e tenta converter parte de suas empresas para setores civis e, como Israel, explorar o mercado asiático. Israel apresenta uma indústria de armas com tecnologia avançada e que se adaptou, facilmente, às novas regras do mercado internacional de armas e deverá aumentar sua participação.189 a década de 80 (em torno de 50%).190

Indústria e Comércio de Armamentos no Brasil Após a II Guerra Mundial, os aliados e vencedores Estados Unidos e Grã-Bretanha emergiram como os principais fornecedores de armas do mundo. Pouco mais tarde, França e União Soviética surgiram completando o pequeno grupo de fornecedores 188 GRANT, Charles; Caminhos Opostos na Busca pelas Armas. 189 SIPRI Yearbook 96. Arms Production. 190 CONCA, Ken. Ibdem, p. 106.

IMPORTAÇÃO DE ARMAS PELOS PAÍSES DO TERCEIRO

MUNDO - 1987/97.

010000200003000040000

1987

1989

1991

1993

1995

1997

Ano

Valo

r em

m

ilhõe

s de

dóla

res

(US

1990

)

Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

EXPORTAÇÃO DE ARMAS PELOS PAÍSES DO TERCEIRO

MUNDO - 1987/97.

010002000300040005000

1987

1989

1991

1993

1995

1997

Ano

Valo

r em

milh

ões

de d

ólar

es (U

S$

1990

)

Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

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de armas. EUA e União Soviética lideraram as vendas intra-blocos, enquanto França e Grã-Bretanha buscavam o mercado do Terceiro Mundo, principalmente suas antigas colônias. A França foi a primeira a buscar o mercado de armas para sustentar o alto preço de seus compromissos políticos e militares através da exportação de armas, passando a lucrar substancialmente nesse negócio a partir da década de 70. Sendo que, logo após, Itália e Alemanha Ocidental passaram a acompanhá-la nesta empreitada. Estes países europeus e outros fornecedores mais tardios do Terceiro Mundo (Brasil, China, Coréia do Sul e Israel ) tinham prioridades primeiramente econômicas que geopolíticas na venda de armas, assim, possuíam uma natureza comercial mais arrojada que as superpotências e passaram a abocanhar o mercado de armas para o Terceiro Mundo e potências médias, principalmente após a decisão norte-americana de restrição de armas avançadas ao Terceiro Mundo. Nos anos 70, os países industrializados, ansiosos com as exportações para o Terceiro Mundo, não se opuseram a transferir tecnologia militar. Foram muitos os acordos de sistemas de armas licenciados ou co-produzidos por países do Terceiro Mundo. Esses acordos eram desejados por países em desenvolvimento mais adiantados e que queriam adquirir know-how e participar do bom negócio de exportação de armas. O Brasil, apoiando-se com uma capacidade já adquirida pelo mercado civil nacional, apostou na empreitada A grande dependência na importação de petróleo levou o país a procurar primeiro os países árabes. Mais tarde, a exportação de armas abriu caminho para a venda de outros produtos e serviços para aquela região. O processo de comercialização do setor de armamentos e o crescimento da dinâmica do mercado internacional de armas fizeram surgir nesse mercado um fenômeno comum aos setores econômicos civis: a internacionalização da linha de produção. Os países produtores de armas do Terceiro Mundo cediam fases da produção do equipamento a ser vendido para seus compradores ainda mais atrasados e, assim, garantiam uma maior fatia do mercado. Como aporte tecnológico estrangeiro para as empresa brasileiras de armas, se destacam: Aeroespatiale, Dassault, Thomson e Matra (França); Oto Melara e Aermacchi (Itália); Vosper Thornycroft and Shorts (Reino Unido); MBB da Alemanha, Northrop e Sikorsky dos EUA. Outro fator que incentivou a industria de armamentos dos países do Terceiro Mundo, principalmente o Brasil, foi o tipo de equipamentos que exportavam. A disputa entre as superpotências e aliados nos laboratórios e centros de pesquisa, os fizeram diminuir a produção de equipamentos de tecnologia média, porém

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necessária para a guerra, como jeeps, carros blindados para transporte e carga, armas leves e médias. Em relação a armas de tecnologia mais complexa, os grandes investimentos em P&D militar pelas superpotências encareciam muito seus �produtos�, favorecendo os do Terceiro Mundo que, por serem mais �crus�, eram mais baratos. O inventário produzido no Brasil era basicamente composto por: veículos blindados sobre rodas de combate e transporte; veículos qualquer-terreno para transporte de pessoal e de material e para reboque de artilharia pesada, canhões e outros equipamentos; veículos anfíbios sobre rodas ou lagartas; kits para modernização ou repotencialização de viaturas; minas; morteiros; armas individuais; lança-chamas; canhões anti-carro; canhões automáticos ar-ar e sistemas de controle de tiro; centrais computadorizadas para artilharia de campanha; lançadores de foguetes; foguetes de saturação de área e suas centrais de direção de tiro.Destacou-se, ainda, por ser um transferidor de tecnologia militar para países menos desenvolvidos.. A natureza das industrias de defesa do Terceiro Mundo as deixou dependentes do mercado externo tanto para produzir e incrementar seus produtos (através da internacionalização), como para sustentá-las pela exportação. Frente à Crises do Petróleo(72-73/77) e, mais tarde, a Crise Cambial (82), os países fornecedores do Terceiro Mundo não conseguiam comprar muito sequer de suas próprias indústrias. O seu mercado alvo, composto em sua maior parte por países do Terceiro Mundo, também não tinham mias recursos para comprar armas. Dessa maneira, gerou-se uma queda brutal das exportações durante Devido às suas características particulares, as empresas brasileiras não tinham apenas suas vendas sensíveis aos seus compradores, mas, também, sua produção e financiamento. A queda brutal de demanda fez com que as vedetes nacionais de armamentos, Engesa e Ávibras entrassem rapidamente em crise, caindo por terra os �mitos da industria bélica brasileira�. Esta, em geral, não se mostrava tão eficiente e lucrativa como as informações controladas pela censura militar diziam. As empresas eram fortemente subsidiadas e a constituição desse parque industrial não era tão grande como se pensava. José Drumond Saraiva constatou que das 206 empresas apontadas como parte da indústria bélica brasileira, apenas 43 eram produtoras de armas leves, médias e pesadas. Sendo das restantes: 152 fabricantes de componentes e insumos diversos, equipamento e materiais cuja classificação como arma é duvidosa e fabricantes de subsistemas e 11 empresas de rápida conversão civil-militar 191

191 SARAIVA, Jogo de Palavras: O Caso da Indústria Brasileira de Armamentos, pg. 67.

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A alta dependência na tecnologia, componentes e subsistemas importados fazia o valor líquido das exportações serem na verdade menores do que era afirmado pelas fontes oficiais. Hoje, a indústria bélica apenas atende pequenos pedidos previamente acertados com as forças militares nacionais, como o avião ALX e algumas peças de artilharia para o Exército. O AMX também chegou ao fim de seu desenvolvimento e já faz parte da esquadrilha da Aeronáutica. Exportações, praticamente, não existem. Se no passado a indústria nacional não era a fornecedora dos principais equipamentos das Forças Armadas Brasileiras (como caças, submarinos, tanques e outros), atualmente, essa consideração é ainda mais válida.

O Exército vem realizando a importação de vários armamentos pesados (ver tabela abaixo) e a Aeronáutica, apesar dos AMX e ALX, inicia o processo de recomposição de caças supersônicos através de importação. A Marinha, um pouco diferente, vem mantendo mais ou menos a receita do passado: produções (basicamente de fragatas e submarinos) sob licença com forte dependência de componentes e subsistemas importados, mantendo a construção naval militar mais acesa em relação a outros setores. Todos estes fatores levam o Brasil a ser o maior importador de armas da região nesta década.

Lista de Armamentos Adquiridos pelas FFAA no Período 1994/1997

Origem Licença Número do Pedido Designação Descrição Ano do

Pedido Ano da Entrega

Número Recebido

EUA .. (90) M-60 Tanque

principal de batalha

199? 1996-97 (90)

Bélgica .. 87 Leopard-1A1Tanque

principal de batalha

1995 1997 33

França .. (100) Mistral Míssil terra-ar portátil 1994 1996-97 (100)

IMPORTAÇÃO DE ARMAS PELO BRASIL - 1980/97.

0200400600800

1980

1982

1984

1986

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1990

1992

1994

1996

Ano

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r em

m

ilhõe

s de

lare

s (U

S$

1990

)

Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

EXPORTAÇÃO DE ARMAS PELO BRASIL- 1980/97.

0

50

100

150

200

250

300

1980

1982

1984

1986

1988

1990

1992

1994

1996

Ano

Valo

r em

milh

ões

de

dóla

res

(US$

1990

)

Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

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França .. 2 Mirage-3E Aviões de combate 1996 1997 2

Alemanha Sim 2 SNAC-1 Submarino 1995 .. ..

Alemanha Sim 3 Type-

209/1400 Submarino 1984 1994-96 4

Alemanha .. 2 Grajau Class Navio-petrulha 1996 1997 (2)

Itália .. 13 Orion RTN-30X

Radar de controle de tiro 1995 .. ..

Itália .. 7 RAN-20S Radar de monitoramento 1995 .. ..

Itália .. (144) Aspide Mísseis navio-ar 1996 .. ..

Itália .. 6 Albatros Mk-2 Sistema de mísseis navio-ar 1995 .. ..

Cingapura Sim 2 Grajau Class Navios-petrulha 1995 .. ..

Suécia .. 5 Erieye Radar aéreo de aviso prévio 1994 .. ..

Suécia .. 0 RBS-56 Bill Míssil anti-tanque 1995 1996-97 (100)

Inglaterra .. 4 Type-967/968 Radar de monitoramento 1994 1995-97 4

Inglaterra .. 8 Type-911 Radar de controle de tiro 1994 1995-97 8

Inglaterra .. 9 Super Lynx Helicópteros anti-guerra submarina

1993 1996-97 (9)

Inglaterra .. 4 River Class Navios-varredores 1997 .. ..

Inglaterra .. 4 Broadsword Class Fragata 1994 1995-97 4

Inglaterra .. (128) Seawolf Mísseis navio-ar 1994 1995-97 (128)

Inglaterra .. 4 MM-38/40 ShShMS

Sistema de mísseis navio-

navio 1994 1995-97 4

Inglaterra .. 8 Seawolf GWS-25

Sistema de mísseis navio-ar 1994 1995-97 8

EUA .. 22 Bell-205/UH-1H Helicóptero 1996 1996-97 22

EUA .. 4 S-70A/UH-60L Helicóptero 1997 1997 4

EUA .. 14 LVTP-7A1 APC 1995 1997 14

EUA .. 6 AN/TPS-34 Radar de monitoramento 1997 .. ..

Fonte: SIPRI Yearbook 1998.

Lista de Armamentos Exportados Pelo Brasil, 1994/1997

Comprador No pedido

Designação da armas

Descrição da arma

Ano do pedido

Ano da entrega

Número entregue

Preço

France 50 EMB-312 Tucano Trainer aircraft 1991 1993-97 (50) US$ 170 milhões

Fonte: SIPRI Yearbook 1998 As empresas nacionais que não fecharam entre o final da década passada e esta, entraram em fase de conversão para setores civis. Algumas inclusive conseguindo sair da crise e lucrar, mantendo algumas seções de produção militar, como melhor exemplo a Embraer.

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A Dimensão Tecnológica Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) Militar nas Principais Potências Militares Embora os EUA não tenham nenhuma outra força militar que os ameacem, assumir que os EUA terão a superioridade militar indefinidamente é perigoso. A maioria das tecnologias apresentadas nesse trabalho, como já foi dito, são comerciáveis com pouca interferência governamental. São, praticamente, disponíveis a qualquer nação que tenha recursos. Elas podem facilitar mudanças doutrinárias e organizacionais, talvez não para se alcançar uma escala igual ao nível dos EUA, mas grande o suficiente para causar mudanças em equilíbrio militares regionais no futuro.192 No geral, os recursos destinados à P&D militar têm caído vertiginosamente. O gasto atual do mundo está em torno de 49 bilhões de dólares. Para ser ter uma idéia dos cortes, os gastos nesta área pelos países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) já no meio desta década eram menos de 110% dos realizados em 1983.193 Outra característica, que se acentua cada vez mais, é a concentração entre poucos países as despesas significativas em tecnologia militar. Dos 49 bilhões de dólares gastos em 1996, 43 bilhões foram pelos países membros da Organização Tratado do Atlântico Norte (OTAN).194 A seguir é apresentado um balanço das forças armadas mundiais e a pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias militares: Estados Unidos Os EUA são os líderes absolutos em tecnologia militar. Aplicam sete vezes mais recursos nesta área que o segundo colocado: França. No entanto, os gastos nesta área vêm caindo desde o fim da Guerra Fria e é estimado por fontes oficiais que ele caía mais 14% até o ano 2000.195 Sua principal ênfase tem sido em aviões de combate e em um sistema de mísseis balísticos defensivos, o THAAD (Theater High Attitude Air Defense) � sistema baseado no temido programa Guerras nas Estrelas. Seu destacamento em tecnologia militar faz com que as outras nações sejam muito dependentes de suas inovações, principalmente seus aliados mais próximos. Embora, os países europeus da OTAN tenham tentado no início desta 192 Strategic Survey 96/97, pp. 21-27. 193 SIP|RI Yearbook 98. Military Technology. 194 SIP|RI Yearbook 98. Military Technology 195 SIP|RI Yearbook 98. Military Technology.

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década dar uma nova orientação a Aliança, mais afastada da estrutura estratégico e militar dos EUA, tal tentativa foi em vão quando se mostrou iminente uma ação militar no Balcãs. Mesmo terem pensado inicialmente uma operação exclusivamente européia, convenceram-se de que sem a utilização de sistemas como o E-3 AWACS, aviões de reabastecimento e carga e sistemas integrados de C4I, em que os EUA são líderes absolutos, não poderiam ter realizado aquela operação de paz. Rússia Ironicamente, os analistas soviéticos foram os primeiros a destacar a tecnologia de informação como um novo componente no campo de batalha. Nos anos 70, militares soviéticos começaram a chamar atenção para inovações em eletrônica, incluindo computadores, sensores e sistemas de comunicação. Diziam que elas poderiam aperfeiçoar muito as armas convencionais, de forma que essas novas capacidades produzirem uma mudança qualitativa na arte da guerra convencional (questão discutida mais adiante). No entanto, a atual situação russa levará mais que algumas décadas para se reconstruir e avançar em novos projetos inovadores. Ásia Durante toda a maior parte da década de 90, os países asiáticos foram os únicos a aumentarem os gastos em P&D militar. Japão, Coréia do Sul e Índia são os maiores destaques. No entanto, apresentam sinais de que irão reduzi-los nos próximos anos. Estes países, especialmente o Japão, são levados pela forte atuação de suas indústrias civis em tecnologia e pelo desejo de possuírem indústrias de defesa independentes das americanas. Embora a possibilidade de um grande salto qualitativo na China não aconteça devido à complexidade e custo no desenvolvimento, infra-estrutura e manufatura de armas de alta tecnologia, uma reforma militar determinada junto a investimentos substantivos nas próximas décadas pode levar as forças armadas chinesas a serem uma formidável força regional, senão global. Fortemente influenciada pela Guerra do Golfo, a China tem procurado comprar sistemas vindos de fora do país (maioritariamente da Rússia) e tem expressado interesse em co-produções e co-desenvolvimento de programas com o Ocidente. As áreas de maior interesse atualmente são: guerra eletrônica, mísseis de cruzeiro, sistemas avançados de rastreamento e de C4I. No entanto, o maior atraso tecnológico chinês encontra-se na produção de aviões. Embora possua a mais numerosa força aérea do mundo � em torno de 4.000 aviões - são na sua maioria designes dos anos 50. A Índia apresentou recentemente a iniciativa de dobrar seus níveis atuais em P&D militar. Desde 1993, ela tem aplicado 500 milhões de dólares, algo em

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101

torno de 28% do fundo governamental para ciência e tecnologia. Se somarmos seus gastos de P&D nuclear, temos um dispêndio de 910 milhões de dólares, ou 68% do orçamento governamental para projetos científicos. Este índice é apenas superado pelos Estados Unidos.196 Europa As mudanças nas industrias de defesa na Europa não são garantias de melhores resultados na capacidade de desenvolvimento tecnológico. Isto só será alcançado com a adequação dessas industrias ao mercado comercial como as empresas civis. Na sua maior parte, os países europeus têm desenvolvido programas para atualização de seus equipamentos bélicos atuais, apesar dos poucos projetos mais ousados são feitos em parceria. A França vêm combinando investimento em satélites espiões (Hélios), mísseis de cruzeiro (Apache) e outras plataformas que possibilitem ataques aéreos precisos. Como foi dito, a França mantém-se como a Segunda maior investidora em tecnologia militar. A Alemanha passou por uma profunda restruturação de suas instituições militares para melhor adaptá-las aos a operações com a OTAN. Atualmente, busca renovar sua força e projeção aérea, dando grande estima aos projetos conjuntos do caça Eurofighter, avião de carga Future Aircraft Transport e o helicóptero de ataque Tiger (inclusive ênfase maior que os seus próprios parceiros nestes projetos: França e Inglaterra). Diferente dos anteriores, a atenção inglesa é maior para seus meios navais, especialmente no incremento de seus porta-aviões e desenvolvimento em conjunto entre sua marinha e exército de uma nova plataforma anfíbia. Países do Terceiro Mundo Devido à falta de recursos e capacidade técnica � estes países têm optado por dispor de forças heterogêneas: a maior parte constituída de tropas mal equipadas e mal treinadas e um reduzido número de tropas especiais mais bem treinadas e onde se aplicam tecnologias militares importadas e, em alguns poucos casos, desenvolvidas nacionalmente.. P&D Militar no Brasil �Os Estados Unidos foram os primeiros a perceberem a importância da articulação das forças armadas com o sistema produtivo e com as universidades,

196 SIPRI Yearbook 1998. Military Technology.

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criando um modelo que viria a ser adotado pelas demais potências. Sua adoção viria a consolidar a pesquisa e desenvolvimento como o setor mais dinâmico de ciência e tecnologia em alguns países, principalmente, o Brasil�.197Das 15 tecnologias fixadas no Brasil nas últimas décadas, 13 delas foram desenvolvidas em centros militares. São elas: construção naval, cartografia náutica, oceanografia, química fina, energia nuclear, informática e telecomunicações/radiocomuicações (Marinha), engenharia aeronáutica, foguetes/propelentes sólidos e motores a explosão (Aeronáutica), cartografia terrestre e química de explosivos, (Exército). As duas outras embora não fossem desenvolvidas por centros militares, ainda foram realizações de instituitos governamentais: biotecnologia (EMBRAPA) e prospecção submarina (PETROBRAS).198 A partir da década de 60 os militares brasileiros passaram a ver a ciência e tecnologia como a quinta dimensão do poder de um Estado (além do político, econômico, militar e psicossocial). A tecnologia, particularmente, seria o instrumento para a modernização (não só das forças, mas o país como um todo), defesa autônoma, construção da grande potência, busca de prestígio e o alcance de objetivos e interesses nas Relações Internacionais. Os três projetos que seriam o principal veículo para o alcance dessas aspirações eram: o projeto nuclear autônomo, projeto espacial e o da co-produção de um caça subsônico. Dos três, apenas o último foi terminado, o segundo apresenta-se relativamente adiantado, enquanto o submarino nuclear só estará pronto no próximo século. Detalhes sobre esses projetos não serão discutidos aqui devido o cuidado de como foram tratados, evidenciando Cavagnari (1992). No país, nunca houve uma política ou planejamento a longo prazo nacional de ciência e tecnologia pelo Governo Federal, que sempre teve uma ação descontínua na área. �Daí o significado de P&D militar para o desenvolvimento nacional já que ela foi capaz de manter continuidade, de se articular com o setor produtivo e criar um patrimônio tecnológico.�199. Apesar desse �legado�, a estrutura de pesquisa militar do país sempre foi dispersiva. Cada força sempre manteve sua estrutura de pesquisa isolada das outras forças. Investimentos e aquisições eram e são realizados sem que as outras sequer tomassem conhecimento. Caríssimos projetos desenvolvidos são �subutilizados por não atenderem às características de mais de uma organização,

197 CAVAGNARI, Geraldo Lesbat. P&D no Brasil: Situação, Avaliação e Perspectivas. 1992. 198 BRAGA, Mário Jorge Ferreira. Algumas reflexões sobre ciência e tecnologia na Marinha.

In: Revista Marítima Brasileira. V. 116 n0 4/6 Abril/Junho de 1996, p.25. 199 CAVAGNARI, Geraldo Lesbat. P&D no Brasil:Situação, Avaliação e Perspectivas �

1992.

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quando esse acréscimo não significaria um grande dispêndio�200 Atualmente, P&D militar no Brasil é muito fraco. Geralmente, argumenta-se que após o fim da Guerra Fria, as pressões políticas e orçamentárias prejudicam qualquer iniciativa. Todavia, na nossa opinião, os principais empecilhos são de origem administrativa-organizacional, embora os anteriores também existam O orçamento dos ministérios militares passaram apenas a serem suficientes para pagar a inchada folha de pessoal, principalmente, os não ativos. Ao passo que os recursos diminuíam e o custo de manutenção de forças aumentava, não foi feito o devido re-planejamento. O Poder Executivo foi, na maioria das vezes, ausente e o Congresso Nacional nunca teve um papel importante em discussões sobre defesa nacional. Principais Projetos e Estrutura para P&D Militar nas Forças Armadas Brasileiras Aqui são apresentados os principais projetos em andamento ou recentemente terminados pelas três forças separadamente. Um esquema de cada sistema de ciência e tecnologia dos ministérios militares é apresentado em seguida. A Aeronáutica tem em sua estrutura de ciência e tecnologia o centro que ofereceu maiores resultados efetivos, CTA � Centro de Tecnologia Aeroespacial. Entretanto, após a conclusão do projeto AMX, perdeu-se um pouco de força. A estrutura de P&D da Aeronáutica é o que se apresenta mais integrado com empresas civis, sendo seus projetos, em grande parte, em parceria com estes. Os principais projetos são201:

Alerta � radar: determina e identifica alvos contendo radares (aviões, mísseis, navios e tanques); Sistema imageador infravermelho termal: rastreia alvos pelo seu rastro de calor; Veículo não tripulado controlado por controle-remoto (UAV): primeira fase do projeto, o protótipo

Sacuã já concluído e segunda fase em andamento, aeronave Suiá; Materiais cerâmicos especiais para lançadores de mísseis e foguetes, turbinas e motores; compósitos e

carbonosos estruturais para engenhos aeroespaciais e nucleares; Giroscópicos óticos: sistema à laser e à fibra ótica para navegação de foguetes, mísseis e aviões de

combate e comerciais; Computação científica: como o Brasil não possui capacidade de construção de supercomputadores, este

projeto visa através do desenvolvimento de software, hardware e sistema de processamento paralelo, aumentar o potencial dos computadores nacionais para uso militar avançado;

Túnel transônico/supersônico para ensaios de aerodinâmica de mísseis, foguetes e aviões; Helicóptero de combate; Projetos relacionados à família Sonda e seu propelente; Enriquecimento de urânio a laser; Reator rápido regenerador (como o anterior parte do Programa Nuclear Brasileiro); Acelerador linear de elétrons.

200 PESSOA, Des. Conjunto de Equipamentos e Sistemas de Armas p/ as FA, p. 15. 201 PESSOA, Desenvolvimento Conjunto de Equipamentos e Sistemas de Armas para as FA,

Anexo E e CAVAGNARI, P&D Militar: Situação, Avaliação e Perspectivas. 1992.

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A Marinha é que apresenta, atualmente, os maiores recursos para P&D militar, tendo sua capacidade quase que totalmente tomada. O desenvolvimento de seus projetos é realizado em parceria com as universidades de São Paulo e São Carlos, Seus principais projetos são:

Navegação inercial: fornece ao veículo dados de latitude, longitude e velocidade baseado em seus próprios sensores, sem a necessidade de informações externas por exemplo, satélites e estrelas. Sistema usado, principalmente, por submarinos;

Foguete de dispersão: usado com o propósito de proteção contra ataque de mísseis orientados por reflexão de radar. Este foguete explode espalhando pequenas partículas metálicas que confundem os sensores do míssil inimigo;

Minas de contato e minas inteligentes; Detectores de radares, minas, sonares e torpedos; Sistema de controle tático integrado: sistema similar aos usados pelos países desenvolvidos que

integram em uma única sala, consoles eletrônicos que disponibilizam em tempo real as condições do navio;

Equipamento de contra medida eletrônica e de guerra eletrônica; Sistema digital de controle da propulsão; Sistema de apoio á decisão nos moldes aos apresentados na seção tanques e aviões; Sistemas de controle e comando.

O Exército é o que apresenta, tradicionalmente e atualmente, menores contribuições a pesquisa e desenvolvimento militar. Sua estrutura é totalmente centrada no Centro tecnológico do Exército � CTEx, no Rio de Janeiro. Tendo menor relacionamento com universidades e empresas privadas que as Forças anteriores. O acesso aos programas em andamento difícil, mesmo para pesquisas na área de autores militares. Sabe-se que ficou encarregado, como parte do Programa Nuclear Brasileiro, de desenvolver um reator de grafite e urânio, que poderá servir ao desenvolvimento de plutônio. Desenvolve ainda projetos.em materiais como cerâmica para blindados e componentes e pesquisas em explosivos.

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Conclusão A Real Dimensão da Tecnologia na Guerra

Defende-se nesta breve conclusão que a idéia de uma revolução militar tem mais um caráter especulativo do que real. Existe muito mais para servir a objetivos econômicos, políticos e de busca de prestígio de grupos que um fenômeno que esteja atualmente alterando a arte da guerra. Muitos defendem que a Guerra do Golfo teria sido o princípio de uma revolução militar tecnológica ou, talvez, algo mais abrangente: uma Revolução nos Assuntos Militares (RMA). A mídia ofereceu inúmeras vezes imagens dos ataques precisos e outras armas de avançada tecnologia usadas pela Coalizão, afirmando ter sido iniciado um processo revolucionário que mudaria os padrões de se fazer a guerra. O mesmo foi feito por diversas publicações de centros e institutos militares estrangeiros. No Brasil, essa idéia começa a tomar forma entre alguns militares. É argumentado por estes que nos encontremos em um período muito parecido com o Entreguerras, quando se teve o advento do tanque. Ou com o período posterior à II Guerra Mundial quando se desenvolveram as armas nucleares e os mísseis balísticos (que foram realmente revoluções militares). A atual revolução, no entanto, estaria acontecendo desde o começo da década de 70 e continuaria até o próximo século, baseando-se na cibernética e na automação das tropas geradas pela tecnologia de informação. Os indícios revolucionários estariam em três segmentos.202 1) sistema C3 associados aos sistemas de rastreamento e a capacidade de fusão de dados (inteligência) e seu máximo aproveitamento elevando a eficiência e a letalidade das operações militares. Essa relação é definida como �sistemas dos sistemas�. Pois, coordenaria os sistemas de armas terrestres, marítimos e aéreos; 2) munição precisa que pode ser lançada a longas distâncias, explorando as informações de sistemas de comando de informação e controle. Os melhores exemplos dessas munições seriam as bombas guiadas a laser, mísseis anti-radar; mísseis de cruzeiro, mísseis com navegação inercial e GPS; 3) desenvolvimento de avançadas simulações que fazem possível prover treinamento realístico individual, como para unidades inteiras. Há quem cite, ainda, a tecnologia stealth e o emprego de sistemas de armas

202 CARUS, W. S., Military Technology and the Arms Trade: Chances and their Impact. In:

The Arms Trade: Problems and Prospects in the Post-Cold War World, pp-166-168.

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automatizados como quarto e quinto indícios. A orientação tática oriunda dessa revolução seria a chamada �Airland Battle�, caracterizada pelos seguintes aspectos203:

destruir as facilidades de comando do inimigo; tirar de funcionamento seus sistemas de comunicação para interrupção de passagem de instruções

através da cadeia de comando; tomar a iniciativa; ataques pesados e precisos; realizar operações integradas( ar, terra e mar); impedir que o escalão de retaguarda do inimigo entre em ação; operações sincronizadas; evitar ataques frontais contra os pontos fortes do inimigo; saber sempre o que o inimigo esta fazendo e evitar que ele saiba o que você esta fazendo; salientar a importância do componente conhecimento.

O componente mais diferenciado da atual arte da guerra residiria na idéia de Information War. Tal termo foi primeiro empregado e defendido por Alvin e Heidi Tofler em War and Antiwar, sendo que os sistemas de armas dotados dessa particularidade seriam qualificados como da �Terceira Onda de Desenvolvimento�, países menos desenvolvidos seriam detentores de equipamentos da Segunda e Primeira Onda. Devido a esses conceitos, tal obra tornou-se a principal referência dos defensores de tal revolução.204 Embora não tão categoricamente, estes conceitos têm sido observados em monografias da ESG, artigos de revistas militares brasileiras e pronunciamentos de chefes militares.205O que preocupa devido as falácias que tais idéias carregam e que serão expostas a seguir. As argumentações sobre revolução militar são feitas sem o cuidado necessário de um conceito definido do que seria uma revolução militar e, também, sem prestar a devida atenção na evolução da arte da guerra e dos equipamentos usados para tal. Uma revolução militar de origem tecnológica ocorre quando uma nova tecnologia é incorporada dentro de um número significativo de sistemas militares que são combinados com conceitos de operação inovadores e uma nova estrutura organizacional adaptada, de forma a produzir uma melhora significativa na eficiência militar. Assim, a �adoção de uma nova tecnologia não constituí, por si própria, uma revolução. Esta é um fenômeno muito mais complexo, envolvendo novas idéias operacionais, mudança organizacional e outros aspectos das operações militares�.206 Mais que uma mudança física, uma revolução militar provoca alterações doutrinárias e nos próprios meios de condução da guerra. 203 TOFFLER, Alvin e Heidi. War and Antiwar� 1995. 204 Tal relação também é feita em MURRAY, Preparing to Lose the Next War?, p.52. 205 Ver CAMPOS, Ciência e Tecnologia: o Quinto Campo do Poder In: Defesa Nacional. No.

776, 2/3 � 1997; e Entrevista do Gen. Gleuber Vieira, Chefe do EME, dezembro de 1997.

206 GRIGGS, Roy A. Tecnologia e Estratégia � Air Power Journal, 1996, p. 60.

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A melhor ilustração para tal é a introdução da guerra mecanizada, na década de 20 e 30: embora os avanços no processo de combustão interna em motores, designe de aviões, carros blindados e comunicações eram igualmente dominados por França, Alemanha e Inglaterra, no entanto, somente a Alemanha conseguiu absorver as potencialidades operacionais e organizacionais desses avanços, explorando-os dentro do Blitzkrieg e atingindo decisivas vitórias. É importante ressaltar que revolução nos assuntos militares também pode acontecer pela incorporação de novas táticas, como por exemplo a tática de guerrilha tão bem exercida pelos vietnamitas. Em 1991, na Guerra do Golfo, é muito difícil dizer que se teve sinais de revolução na arte da guerra. Virtualmente todos os equipamentos bélicos utilizados vinham sendo desenvolvidos há décadas ou eram aperfeiçoamentos de modelos anteriores. O que houve foi uma incrível demonstração de novas tecnologias militares que não puderam ou não tiveram a oportunidade de serem usadas de maneira mais destacada nas décadas anteriores (70 e 80). É comum no mundo militar, existirem armas que foram desenvolvidas e aposentadas sem nunca terem sido usadas, deixando para a imaginação de especialistas a avaliação de sua eficiência Se o leitor voltar a primeira parte dessa pesquisa, verá que o sistema C3I (comando, controle, comunicações e inteligência) é um conceito oriundo da II Guerra Mundial. Mísseis de cruzeiro, anti-radar e bombas inteligentes foram usados primeiramente na Guerra do Vietnã. Da mesma maneira, sistemas de monitoramento e rastreamento por aviões, UAV e satélites foram usados em conflitos anteriores a essa década. Nenhuma das orientações táticas acima descritas são novidades: a importância de comunicações, inteligência e prática da dissimulação já são discutidos em A Arte da Guerra; tomar a iniciativa do combate através de ataques intensivos no centro de gravidade do inimigo são vistos nas campanhas de Napoleão e discutidos por Bulow, Debrut e Jomini; operações sincronizadas entre forças aéreas, navais e terrestres são, é óbvio, aplicações militares oriundas da Alemanha nazista. Na Guerra do Golfo, não se apresentaram, também, grandes inovações doutrinárias e organizacionais. Na verdade, as últimas mudanças dessa natureza pelos Estados Unidos (o maior ator daquele episódio) foram resultado mais de uma reavaliação interna nos últimos vinte anos em função da derrota no Vietnã, do que em razão de novas tecnologias que surgiam Pelo contrário, novos armamentos, como o JSTAR, surgiram correspondendo às determinações dessas alterações na doutrina.207

207 TOFFLER, Alvin e Heidi. War and Antiwar.

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Um dos pontos mais reforçados nessa reavaliação foi o recurso humano. Embora tenham sido gastos bilhões em equipamento, fortunas foram destinadas para a qualificação e aprimoramento de pessoal. Na Guerra do Golfo, 98% dos soldados norte-americanos voluntários tinham segundo grau completo e 88% dos generais possuem pós-graduação.208 Os soldados são submetidos a intensos treinamentos e aperfeiçoamentos por toda sua carreira. Até mesmo os reservistas são obrigados a três meses de treinamento por ano em clubes militares. �A tecnologia é menos importante que o Sistema em que ela está envolvida. A eficiência da tecnologia avançada empregada por forças militares dos EUA no Golfo deveu-se a grande combinação da qualidade do pessoal e da organização , doutrina e táticas que eles empregaram�209 - sem mencionar o que foi mais importante: uma decisão política clara e objetiva. O mais grave erro em que a idéia de uma Revolução em Assuntos Militares (RAM) incorre é de conceber uma visão sobre a guerra totalmente distorcida da realidade. Diante de tanta convicção sobre as mudanças no modo de se fazer a guerra, conceituam-na como sendo linear, mecânica, tecnocêntrica e independente de seu adversário e ambiente. Totalmente em oposto a esta definição, compartilhamos a idéia de que: .

A guerra não acontece em um mundo determinista, previsível e mecânico. Ela é muito mais caracterizada por ser complexa, randômica e sensível a condições iniciais. A guerra não é um sistema mecânico que pode ser manipulado através de esquemas precisos, positivamente controlados ou sincronizados e centralizados. Diferente disso, ela é um sistema altamente complexo e interativo caracterizado pela fricção, falta de previsibilidade, desordem e fluidez. Tal sistema é composto de inúmeros agentes independentes que interagem um com o outro, evoluindo e adaptando-se a partir desta interação. A guerra é um sistema aberto interagindo com seu ambiente externo (incluindo o inimigo) e caracterizado pelas complexa respostas a este ambiente e por sua dinâmica não-linear.210

Na concepção dos defensores da RAM, a clássica trindade de Clausevitz � violência primitiva, sorte e probabilidade, e subordinação da guerra à Política é substituída por tecnologias de inteligência, monitoramento e rastreamento; sistemas avançados de comando, controle, comunicação e computadores (C4); e munições de ataque preciso.211Fricção, sorte e incerteza são suprimidos, reduzindo a guerra a um problema de análise de custo/benefício, um cálculo finito de alvos destruídos e perdas impostas

208 TOFFLER, Alvin e Heidi. War and Antiwar. 209 GRIGGS, Roy A. Ibdem. P. 61. 210 OWENS, Mauckubin Thomas; Technology, the RMA, and Future War, p.65. 211 OWENS, M. T.; Technology, the RMA, and Future War. In: Strategic Review, p.67.

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A arte da guerra, historicamente, tem sido vista como a combinação de várias formas entre atrito (poder de fogo) e manobrilidade (manoeuvrei). Muitos dizem que com a emergência de novos recursos de comunicações, a tecnologia foi elevada acima desses dois conceitos primordiais. No entanto, estes analistas se esquecem que a tecnologia por si só não planeja planos de ação, não calcula e executa a destruição de alvos inimigos, ou transporta objetos físicos e tropas através de longas distâncias. É claro que ela favorece a aplicação mais precisa das tropas no campo de batalha e a concentração de força contra o centro de gravidade do inimigo de forma a maximizar o impacto da operação. Apesar disso, ela não resume ou simplifica a reação entre esses dois aspectos. Outra falácia conceitual é cometida quando se afirma que as forças capacitadas à Information War deterão ou derrotarão ameaças militares tradicionais com relativo baixo custo, através apenas de ataques punitivos a distância sem necessidade de ação direta e influência contínua sobre o território, pessoas e recursos do inimigo, o que não se comprova por serem estes os objetivos últimos da guerra devido, obviamente, a suas implicações políticas.212 Se as supremacia tecnológica bastasse para a vitória, não se verificariam nos últimos cinqüenta anos a derrotas da Holanda para a Indonésia, da França para a Indochina e Algéria, dos Estados Unidos para o Vietnã, União Soviética para o Afeganistão e da Rússia para a Chechênia.213 Assim, �tecnologia e o hardware baseado nela são apenas um dos muitos fragmentos requeridos para desenvolver as capacidades militares necessárias para lutar em guerras214. A característica política e a incerteza da guerra pode ou não prover um ambiente onde é possível a exploração da tecnologia como uma chave para o sucesso militar. A supervaloração da tecnologia poderia ser também uma ação consciente para se evitar mudanças necessárias, mas difíceis e dolorosas na organização e embasamento estratégico e doutrinário de uma força armada. Um equipamento com avançada tecnologia é tangível a qualquer momento. Sua performace é mais fácil de avaliar e executável em um centro de testes, satisfazendo questionamentos de repórteres e parlamentares. Enquanto, mudanças doutrinárias e organizacionais são críticas, lentas, complexas e seu resultado é incerto e apenas possíveis de serem avaliadas no único momento em que devem se mostrar perfeitas: o confronto. O desempenho da Coalizão foi apenas um sucesso acompanhado, detalhadamente, por milhões de pessoas através dos meios de comunicação. Psicologicamente, a Guerra do Golfo foi um show para os eleitores em geral. Ficou registrado a idéia de que aquilo era realmente um novo marco na

212 RIPER & SCALES, Robert; Preparing for War in the 21st Century, pp. 18-19. 213 RIPER & SCALES, Robert; Preparing for War in the 21st Century, p.15. 214 CARUS, W. Selth. Ibdem. p.168.

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condução e resolução de conflitos e tal �performance� seria sempre repetida por aqueles que detivessem tais equipamentos. Os gastos militares mundiais, que vinham caindo vertiginosamente, passaram a ter reduções bem mais suaves. Particularmente nos Estados Unidos, vários contratos militares milionários foram fechados, por exemplo o Airbone Laser (ABL). O aspecto tecnológico vem, a partir daí, sendo um �ótimo� argumento na requisição de verbas militares na maioria dos países, inclusive no Brasil. No entanto, outros aspectos como treinamento e reforma administrativa e organizacional para acomodar essas �inovações� não têm sido mencionados na mesma proporção. Sendo que, como foi apontado acima, são aspectos tão importantes quanto o tecnológico ou maiores. A idéia de revolução militar, também, é carregada de interesses particulares de indústrias de defesa e alguns militares, principalmente norte-americanos: como foi dito no segmento anterior do ensaio, as indústrias de defesa dos Estados Unidos estão tentando reagir aos déficit devido à restruturação e como, as indústrias de defesa em geral, tentam sobreviver a grande redução de demanda a mais de uma década. Os recursos destinados aos militares, também, vêm sofrendo grandes cortes. Assim, alguns militares e indústrias de defesa parecem estar recorrendo à difusão de uma revolução militar em andamento para aumentarem suas exportações e conseguirem contratos para desenvolvimento de novos e caros projetos, no caso das industrias, e impedir novos cortes de orçamento, no caso dos militares. Já faz mais de 50 anos desde o último conflito internacional de grande intensidade ou entre duas potências de porte equiparado. Isso faz gerar mitos e especulações, resultando em avaliações errôneas ou mal fundadas em torno do que é eficaz e do que não é. As lições do passado já não são muito lembradas e, muitas vezes, também �a dura realidade do terror, ambiguidade e incerteza características do campo de batalha�.215 Existindo ainda aqueles que se aproveitam dessa situação para interesses de grupo. Dunnigan, especialista no qual essa pesquisa se baseou imensamente, tem uma interessante sentença sobre a questão: �no passado, quando os soldados eram mandados lã para fora e descobriam que o que lhe contaram não era verdade ou não fazia mais sentido, os sobreviventes aprendiam rápido o que fazer para se sair bem. Na próxima guerra, será interessante ver como as máquinas irão se sair.�.

*** O cenário desenvolvido acima está também presente nas Forças Armadas Brasileiras; que, devido aos últimos acontecimentos globais e domésticos,

215 MURRAY, Williamson; Preparing to Lose the Next War?. In: Strategic Review, p.55.

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perderam seu modelo diretor. As suas principais hipóteses de guerra não existem mais e, as restantes, são de baixo risco; a situação estrutural, em geral, é preocupante; e a relação com o Congresso e a sociedade ainda é muito distante. Não possuem um mesmo princípio que molde sua conduta e dinâmica. As três forças estão dispostas de maneira completamente dispersa e sem coerência e coordenação entre suas atividades. Defendem a renovação de equipamento e aquisição de tecnologia avançada como únicos aspectos de uma �modernização� que, na verdade, deve ser mais profunda. Um modelo diretor só será possível e condizente com a realidade através da retomada do diálogo com a sociedade civil, avaliando qual deva ser sua conduta e dinâmica frente às capacidades e necessidades do país e da observação atenta e antecipação das tendências dos componentes da arte da guerra.

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Anexo

O Orçamento das Forças Armadas 1970 /1998

Dermeval de Sena Aires Júnior

Érico Esteves Duarte Em uma democracia, dados sobre o orçamento das forças armadas deveriam ser produzidos e apresentados à sociedade de modo transparente e rotineiro. Entretanto � e infelizmente � este não é o caso do Brasil. Os estudiosos que se ocupam das FA são unânimes em apontar as dificuldades na obtenção de dados precisos, e essas dificuldades se mostraram ao longo da pesquisa para este estudo também. Entre as três Forças, aquela que se mostrou mais acessível e organizada no fornecimento de informações foi a marinha. Ao mesmo tempo em que não se esforçam em trazer a público as suas dotações, as FA contraditoriamente reclamam que a deficiência orçamentária é o maior de seus problemas. A insatisfação com os percentuais destinados está universalmente presente nos escritos militares da década: afirma-se que o orçamento é insuficiente para a execução das missões constitucionais e para a manutenção dos projetos existentes, e busca-se mostrar o quanto esse mesmo orçamento é percentualmente menor que o dos países desenvolvidos e mesmo que a maioria dos países latino-americanos. Em meio ao discurso corporativista, monografias da ESG, artigos, publicações e participações em seminários tipicamente trazem tabelas e gráficos com dados como os seguintes:

Gastos em Defesa de Alguns Países da América com Relação ao PNB � 1991 PAÍS GASTOS COM A DEFESA EM %

DO PNB POSIÇÃO

Brasil 0,8 10º México 0,5 11º

Argentina 1,7 9º Venezuela 3,6 3º Colômbia 3,0 5º

Chile 3,2 4º Cuba 5,0 1º Peru 3,8 2º

Equador 2,2 7º Uruguai 2,7 6º Bolívia 2,0 8º

Fonte: The Military Balance 1992/1993. In PEREIRA, C. R. (1995), �As Despesas Militares e o Orçamento da União�. Rio: ESG, Monografia TE-95, DAM, anexo B.

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Gastos Militares na América do Sul e Alguns Países Europeus � 1994

PAÍS GASTOS COM DEFESA (EM US$

MILHÃO) EFETIVO DAS

FORÇAS ARMADAS

Argentina 3,262 69,800 Bolívia 127 33,500 Brasil 6,551 336,800 Chile 1,906 93,000

Colômbia 1,178 146,400 Equador 589 57,500 Guiana 6 1,700

Paraguai 81 16,500 Peru 730 115,000

Suriname 13 1,800 Uruguai 289 25,600

Venezuela 925 79,000 Total para a Am. Latina 15,657 976,600

França 42,724 409,600 Alemanha 34,848 367,300

Reino Unido 33,861 254,300 Itália 20,632 322,300

Espanha 7,416 206,500 Austrália 7,275 61,600

Suíça 4,082 29,800 Fonte: The Military Balance 1995/1996. In SILVA, C. N. (1996), �MERCOSUL: a Integração e a Celebração de uma Aliança Militar Sul-Americana�. Rio: ESG, Monografia TE-96, DAM, pg. 55. Quadro Demonstrativo de Gastos Militares, Percentual do PIB Alocado para as Forças Armadas e Efetivo

Orçamentário Militar por país (EM US$ BILHÕES) em 1995.

PAÍSES PIB GASTOS COM DEFESA % PIB COM DEFESA

África do Sul 171 2,9 1,69 Alemanha 1,331 32,2 2,41 Argentina 185 2,3 1,24

Brasil 785 4,6 0,58 Bélgica 218 3,8 1,74 Chile 43,7 1,28 2,92 China 500 7,2 1,44 Cuba 13,7 1,2 8,75

Dinamarca 95,6 2,94 3,07 Espanha 498 5,5 1,10

EUA 6,379 265 4,15 França 1,350 38,5 2,85 Grécia 93,2 3,7 3,97

Holanda 262,8 8,1 3,08 Índia 1,170 8,3 0,70

Inglaterra 980 35,4 3,61 Israel 65,7 7,45 11,30 Itália 967 15,8 1,63 Japão 2,549 53,8 2,11

Malásia 141 1,23 0,87 México 740 1,68 0,22 Portugal 91,5 2,65 2,89

República Checa 75 1,1 1,46 Suécia 153,7 5,25 3,41

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Tailândia 323 4,01 1,23 Turquia 90,6 5,1 5,62

Fontes: Military Technology 1/96, The Balance of Military Power 95/96, In ROSA, M. S. (1996), �As Despesas Militares e o Orçamento da União�. Rio: ESG, Monografia TE-96, DAM, pg. 35.

Gastos com Defesa em 1996. US$ milhão (preços de 1993) % do PNB Efetivo em 1.000 PAÍS 1985 1993 1994 1985 1993 1994 1985 1994 Argentina 4,758 3,026 3,262 3,8 1,7 1,7 108,0 69,8 Bolívia 167 126 127 2,0 1,5 1,4 27,6 33,5 Brasil 3,088 6,270 6,551 0,8 1,6 1,6 276,0 336,8 Chile 1,632 1,764 1,906 7,8 3,4 3,5 101,0 93,0 Colômbia 557 1,232 1,178 1,6 2,5 2,3 66,2 146,4 Equador 373 498 589 1,8 2,8 3,2 42,5 57,5 Guiana 26 6 6 9,7 1,4 1,4 6,6 1,7 Paraguai 79 74 81 1,3 1,4 1,4 14,1 16,5 Peru 842 770 730 4,5 2,1 1,8 128,0 115,0 Suriname 11 11 13 2,4 2,3 2,8 2,0 1,8 Uruguai 223 256 289 2,5 2,2 2,5 31,9 25,6 Venezuela 1,083 1,029 925 1.3 1,7 1,6 49,0 79,0 Total 12,839 15,062 15,657 3,2 2,0 2,1 835,2 976,6 Fonte: Military Balance 1995/1996, In SILVA, (1996), �MERCOSUL: a Integração e a Celebração (...)�, pg. 57. Essas tabelas exemplificam bem os problemas de obtenção de dados e análise de gastos em forças armadas no país. Em primeiro lugar, porque mostram que mesmo os autores militares que tratam do tema terminam recorrendo a periódicos estrangeiros para buscar informações. Em segundo lugar, porque tanto a abordagem como os valores mencionados podem levar a conclusões bastante distorcidas. Quando se baseiam em dados e tabelas como esses, as reclamações dos militares sobre o orçamento das FA no Brasil trazem os três seguintes vícios: 1) Quaisquer dados que apresentem apenas os repasses governamentais em um período serão insuficientes e imprecisos na contabilidade dos recursos obtidos pelas FA. Alguns importantes repasses extras normalmente não aparecem em relatórios governamentais. Entre eles incluem-se os pagamentos feitos à marinha por serviços de portos, marinha mercante e postos petrolíferos da Petrobrás; os pagamentos feitos pela Infraero à aeronáutica; e os financiamentos externos ocasionalmente concedidos às Forças para aquisição de equipamento estrangeiro. 2) O discurso corporativista compara gastos em relação ao PIB, de maneira tal que os percentuais nacionais são sempre menores que dos outros países latino-americanos. Mas o PIB brasileiro é bem maior que o desses países e, apesar das crises dos anos 80 e 90, sofreu um aumento percentual nos últimos trinta anos maior do que a maior parte do mundo. Quando se faz a relação entre PIB e gastos militares, o decréscimo resultante é sempre brutal; e os países com os maiores valores de PIB da América Latina � Brasil e Argentina tiveram os maiores gastos militares em termos absolutos � terminam nos últimos lugares da tabela.

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3) O argumento de que gastos militares devem acompanhar o tamanho populacional e territorial de um país é uma falácia injustificável; uma pessoa que o defende mostra, apenas por essa opinião, que não tem a mínima capacidade analítica sobre o fenômeno bélico ou conhecimento sério de estudos estratégicos. Ademais, a análise estatística de gastos militares não se assemelha de modo algum à de gastos governamentais em saúde ou educação, dois exemplos em que os fatores população e território são relevantes. A natureza dos gastos militares é totalmente diferente: eles obedecem a considerações políticas e percepções de ameaça. Naturalmente, essas três críticas não desconsideram a difícil situação orçamentária na qual as forças armadas espelham a realidade geral brasileira e observaram, de fato, uma redução ao longo dos anos 70, 80 e 90. Sempre eloqüente e preciso em suas análises, Antônio Carlos Pereira argumenta ainda que, a bem da verdade, �o processo é muito mais longo. O exame da participação dos ministérios militares no Orçamento da União mostra uma curva decrescente nos últimos, pelo menos, 40 anos, com dois breves anos de alívio em meados da década de 70�.216 Esse processo foi acompanhado pela incapacidade política dos governos militares e civis de promoverem mudanças institucionais e racionalizarem a aplicação dos recursos. O maior exemplo parece ter sido a inexistência de qualquer iniciativa com vistas a um redimensionamento das Forças e uma adaptação à crise do Estado e à sua situação institucional. Os grandes cortes feitos no orçamento militar das últimas décadas não foram acompanhados pela diminuição responsável dos seus efetivos e os pareceres de contas da União de 1993, 1994 e 1995 mostram uma realidade quase inacreditável: as FA gastaram elevados 61% de seu orçamento em pessoal de reserva. Não é de se admirar, portanto, que o treinamento de efetivos, as compras de armamentos e o desenvolvimento de tecnologias e equipamentos no cumprimento de suas tarefas tenham sido reduzidos a níveis irrisórios.217 A próxima página traz um gráfico geral confiável obtido no Ministério da Marinha, que mostra a participação percentual das FA no Orçamento da União. Nele, pode-se observar o verdadeiro padrão decrescente comum às três Forças. Um exemplo da grande diferença perceptível entre ele e as tabelas acima pode ser observado para o ano de 1994: enquanto as tabelas mostram um dispêndio de cerca de seis bilhões e meio, ele descreve um valor de aproximadamente nove bilhões.

216 PEREIRA, Antônio Carlos, �Uma Revisão Necessária�. In OESP, 22/02/1996, pg. A4. 217 PEREIRA, Antônio Carlos, �Fardas e Pijamas�. In OESP, 23/01/1996, pg. A4.

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O ano de 1969 foi marcado pelo início do governo Médici e a introdução da assim-chamada �linha dura� na condução política nacional. É neste governo que se apresentou a maior média percentual de participação das FA nas despesas da União do período, após uma pequena queda no percentual � 1969-18.64%, 1970-18.33%. O ano de 1971 apresentou a maior porcentagem dos gastos dos últimos trinta anos, 23,52%. Apesar do pico, após o governo Médici os gastos com FA entraram em forte declínio � de cerca de 20,00% em 1972 para 10,98% em 1974 �, situação que se perpetuou até 1981 Ela se deveu principalmente ao choque do petróleo e à conseqüente alta dos juros internacionais. Durante esse período, a diretriz �máximo desenvolvimento e mínima segurança� se desenvolveu entre os militares em meio à pretensão de transformar o Brasil em uma potência. Durante a década de 80, o declínio foi temporariamente estancado, observando-se subidas e declives até 1989, quando ocorreu mais um forte solavanco que coincidiu com o fim da Guerra Fria e o fim da Guerra Irã-Iraque. O contexto, portanto, foi um de queda drástica das exportações de armamentos brasileiros e crise no setor de defesa. Esses eventos foram acompanhados também de pressões internas e externas contra os programas oficiais nuclear e espacial. Embora alguns militares argumentem o contrário218, o governo de Fernando Henrique Cardoso não tem diminuído o orçamento das FA. Ao contrário, nesse governo elas apresentaram a maior porcentagem de participação no Orçamento da União da era pós-redemocratização, com um pico de 4,47% em 1996: ou seja, mais do que o dobro dos 2,04% de 1994. Ao mesmo tempo, as importações de armamentos convencionais foram retomadas aos níveis de 1989, quando a participação no orçamento era quase o dobro da atual219. Os maiores gastos ocorreram na aquisição de peças como tanques, fragatas e navios patrulha, bem como de equipamentos para modernização tais como receptores de navegação por satélite, radares e mísseis, em particular para os arsenais da Marinha e do Exército220. A Aeronáutica teve aprovada recentemente a compra de caças de combate modernos para substituição dos atuais Mirage III, além da atualização dos caças supersônicos F-5E e da incorporação dos caças de combate nacionais ALX e AMX. Outros gastos excedentes previstos e aprovados para os próximos anos são as implantações do Ministério da Defesa e da Agência Brasileira de Inteligência, a serem iniciadas em 1998. 218 Dois exemplos são o estudo de PEREIRA (1995), �As Despesas Militares e o Orçamento

da União�; e a transcrição da palestra feita no Conselho Nacional de Indústrias em 28 de outubro de 97: �Tendências Logísticas e Sistema de Aquisição do Exército Brasileiro�.

219 Ver o gráfico �Importações de Armamentos pelo Brasil�, pg. 97. 220 Ver a tabela �Lista de Armamentos Adquiridos pelo Brasil�, pg. 97-98.