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Alteração do Código Florestal e o impacto sobre as Áreas de Preservação Permanente em topos de morro no Município de Nova Friburgo, RJ. Torres H, Mannheimer S 1 , Carvalho ACMG 1,2 1 Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro Grupo de Apoio Técnico Especializado. [email protected] 2 PonIJcia Universidade Católica do Rio de Janeiro Departamento de Engenharia Civil. [email protected] INTRODUÇÃO As Áreas de Preservação Permanentes (APP) são espaços territoriais protegidos por lei que desempenham importantes funções ambientais (Art. 3º, II, da Lei Federal 12.651/2012): “preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bemestar das populações humanas”. Salvo em situações excepcionais em que a legislação possibilita o uso antrópico, as APP desInamse à conservação ou à restauração, quando degradadas. Nesse contexto, servem como instrumento de manejo e conservação da Biodiversidade, na medida em que propiciam a formação de corredores ecológicos, através da ligação entre fragmentos remanescentes de vegetação naIva, disIntas categorias de APP e Reserva Legal, possibilitando o fluxo e as trocas gênicas entre fragmentos maiores. Em áreas de expansão urbana, as APP são instrumentos de ordenamento do uso do solo, sendo necessárias para a prevenção de desastres naturais, uma vez que a vegetação naIva proporciona proteção das encostas, topos de morro e margens de rio. No entanto, a nova redação do Código Florestal (Lei Federal 12.651/2012) alterou conceitos e critérios técnicos que norteiam a delimitação das áreas protegidas, em especial, a APP em Topo de Morro. ObjeJvo do trabalho analisar o impacto da nova redação do Código Florestal sobre as APP em topo de morro no 1º Distrito do Município de Nova Friburgo, Estado Rio de Janeiro (Figura 1). Nessa análise avaliase as possíveis consequências da nova lei na paisagem e nos serviços ecossistêmicos que desempenham. MATERIAL E MÉTODOS Foi realizada a demarcação da APP em Topo de Morro conforme critérios atualmente vigentes e previstos na lei anterior, com uIlização do Sojware ArcGis (Quadro 1). A parIr dos resultados, elaboraramse mapas em escala 1:5.000 através do cruzamento de informações de hidrografia e demarcação de outras categorias de APP (entorno de nascente e Faixa Marginal de Proteção de curso d’água). Em 2011 a Região Serrana do Rio de Janeiro, sofreu uma catástrofe natural através de uma série deslizamentos de terra e inundações. A atuação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro na região e a disponibilização das informações pelo NIMA/PUCRio (Núcleo Interdisciplinar de Meio Ambiente), moIvou o Grupo de Apoio Técnico Especializado (GATE/MPRJ) a realizar o presente estudo. ÁREA DE ESTUDO CONCLUSÃO Para o caso da Região Serrana do Rio de Janeiro, as alterações impostas pelo nova redação do código florestal resultou em redução de aproximadamente 82% da APP em topo de morro, comprometendo as diversas funções ecossistêmicas, como preconizado no Art. 3º, II do Código Florestal. Estas alterações contrariam o conhecimento cienqfico e o tratado da Biodiversidade do qual o Brasil é signatário. RESULTADOS E DISCUSSÃO A aplicação da Lei 12.651/2012, implicou na redução de 81,93% de áreas protegidas como APP de Topo de Morro (Figura 2). Apenas pequenas áreas isoladas (com dimensão entre 0,5 213,0 ha) sobre os cumes das maiores elevações permaneceram incluídas nesta categoria de APP. Legislação Revogada (Lei 4711/65, Resolução CONAMA 303/2002) Legislação Vigente (Lei 12.651/2012) Conceito de base da elevação superJcie de lençol d’água adjacente ou, cota da depressão mais baixa ao seu redor cota do ponto de sela mais próximo da elevação. Critério para inclusão da elevação Altura mínima da elevação medida da base ao topo 50m 100m Declividade linha de maior declividade superior a 30% (aprox. 17 o ) inclinação média maior que 25 o Quadro 1. Comparação entre os critérios técnicos anIgos (Lei 4711/65 e Resolução CONAMA 303/2002) e os atualmente vigentes (Lei 12.651/2012) para a demarcação das APP de Topo de Morro, em relevos ondulados Nas Figuras 3 e 4 evidenciase a perda da conecIvidade entre as diferentes categorias de APP, a parIr da aplicação da nova legislação. Município de Nova Friburgo 1º Distrito Figura 1 PerspecJva Expansão da urbanização e das aIvidades humanas sobre áreas anteriormente desInadas a preservação e/ou recuperação como APP (Figura 4). Aumento da pressão antrópica sobre os ecossistemas naturais e possibilidade de aumento da taxa de desmatamento, e maior fragmentação da paisagem. Redução de habitat e, consequentemente, do número de espécies que estes podem sustentar; Baixa qualidade do habitat e favorecimento de espécies mais generalistas como consequência da intensificação do efeito de borda em fragmentos menores; Redução da possibilidade de se consItuir corredores e “trampolins” ecológicos, e favorecer troca e o fluxo gênico entre populações isoladas. Esses Fatores, em sinergia, poderão, em médio e longo prazo, comprometer a as múlJplas funções desempenhadas pelas APP, em especial, a conservação da biodiversidade. Prováveis Consequências : Redução da Proteção das nascentes e cabeceiras de rios, podendo comprometer qualidade da água, do fluxo hidrológico e a qualidade do habitat da fauna aquáIcas; Possibilidade de ocupação de áreas de risco de escorregamento; Figura 3 Nascente e curso d’água Topo de Morro Leg. revogada Topo de Morro Leg. vigente Legenda ABSTRACT Brazil´s Forest Code defines areas as forest along rivers, steep slopes and hilltops as Permanent PreservaIon Areas (PPA), which are important instruments of environmental conservaIon to the extent that promote forest preservaIon and maintenance of forest fragments connecIvity. These areas play important ecological services, providing shelter and food for wildlife and maintenance of gene flow for a range of species of fauna and flora, thus contribuIng to biodiversity conservaIon. The Permanent PreservaIon Areas also play a key role for the integrity of physical environment by preservaIon of landscape and water resources. An amended of the Brazilian Forest Code, established by Law 12.651/2012, showed significant changes in concepts and technical criteria that guide the establishment of the protected hilltops areas. The aim of this paper is to analyze the impact of the amended Forest Code on former protected hilltops areas, in the city of Nova Friburgo, Rio de Janeiro state, using GIS tools (ArcGIS). Possible consequences of Law 12.651/2012 on the landscape and preservaIon of natural ecosystems are evaluated. The results showed that the applicaIon of technical guidelines of the amended Forest code led to a reducIon of approximately 82% of protected hilltops when compared to previously exisIng criteria. This reducIon of protected areas may have important consequences on the pazern of land use, leading to possible reducIon of forest areas. Figura 4. Detalhe da Figura 3. Figura 2 42,90 Km² 7,75 Km² Legenda Topo de Morro Leg. revogada Topo de Morro Leg. vigente

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Alteração  do  Código  Florestal  e  o  impacto  sobre  as  Áreas  de  Preservação  Permanente    

em  topos  de  morro  no  Município  de  Nova  Friburgo,  RJ.    Torres  H,  Mannheimer  S1,  Carvalho  ACMG1,2  

                                                                                               1Ministério  Público  do  Estado  do  Rio  de  Janeiro  -­‐  Grupo  de  Apoio  Técnico  Especializado.  [email protected]  

                                               2PonIJcia  Universidade  Católica  do  Rio  de  Janeiro  -­‐  Departamento  de  Engenharia  Civil.  anacris@puc-­‐rio.br  

INTRODUÇÃO  

As   Áreas   de   Preservação   Permanentes   (APP)   são   espaços   territoriais   protegidos  por   lei   que   desempenham   importantes   funções   ambientais     (Art.   3º,   II,   da   Lei  Federal  12.651/2012):  “preservar  os  recursos  hídricos,  a  paisagem,  a  estabilidade  geológica,  a  biodiversidade,  facilitar  o  fluxo  gênico  de  fauna  e  flora,  proteger  o  solo  e  assegurar  o  bem-­‐estar  das  populações  humanas”.    Salvo  em  situações  excepcionais  em  que  a  legislação  possibilita  o  uso  antrópico,  as  APP   desInam-­‐se   à   conservação   ou   à   restauração,   quando   degradadas.   Nesse  contexto,  servem  como    instrumento  de  manejo  e  conservação  da  Biodiversidade,  na   medida   em   que   propiciam   a   formação   de   corredores   ecológicos,   através   da  ligação  entre  fragmentos  remanescentes  de  vegetação  naIva,  disIntas  categorias  de  APP  e  Reserva  Legal,  possibilitando  o  fluxo  e  as  trocas  gênicas  entre  fragmentos  maiores.    Em  áreas  de  expansão  urbana,  as  APP  são   instrumentos  de  ordenamento  do  uso  do  solo,  sendo  necessárias  para  a  prevenção  de  desastres  naturais,  uma  vez  que  a  vegetação  naIva  proporciona  proteção  das  encostas,   topos  de  morro  e  margens  de  rio.  No  entanto,  a  nova  redação  do  Código  Florestal  (Lei  Federal  12.651/2012)  alterou  conceitos  e  critérios  técnicos  que  norteiam  a  delimitação  das  áreas  protegidas,  em  especial,  a  APP  em  Topo  de  Morro.        ObjeJvo  do  trabalho    analisar  o   impacto  da  nova  redação  do  Código  Florestal    sobre  as  APP  em   topo  de  morro  no  1º    Distrito  do  Município  de  Nova   Friburgo,  Estado   Rio   de   Janeiro   (Figura   1).   Nessa   análise   avalia-­‐se     as   possíveis  consequências   da   nova   lei   na   paisagem   e   nos   serviços   ecossistêmicos   que  desempenham.  

MATERIAL  E  MÉTODOS  

Foi  realizada  a  demarcação  da  APP  em  Topo  de  Morro  conforme  critérios  atualmente  vigentes  e  previstos  na  lei  anterior,  com  uIlização  do  Sojware  ArcGis  (Quadro  1).  A   parIr   dos   resultados,   elaboraram-­‐se   mapas   em   escala   1:5.000   através   do  cruzamento  de  informações  de  hidrografia  e  demarcação  de  outras  categorias  de  APP  (entorno  de  nascente  e  Faixa  Marginal  de  Proteção  de  curso  d’água).    

Em  2011  a  Região  Serrana  do  Rio  de  Janeiro,  sofreu  uma  catástrofe  natural  através  de  uma  série  deslizamentos  de  terra  e  inundações.  A  atuação  do  Ministério  Público  do   Estado   do   Rio   de   Janeiro   na   região   e   a   disponibilização   das   informações   pelo  NIMA/PUC-­‐Rio   (Núcleo   Interdisciplinar   de   Meio   Ambiente),   moIvou   o   Grupo   de  Apoio  Técnico  Especializado  (GATE/MPRJ)  a  realizar  o  presente  estudo.    

ÁREA DE ESTUDO

 CONCLUSÃO  Para  o  caso  da  Região  Serrana  do  Rio  de  Janeiro,  as  alterações  impostas  pelo  nova  redação  do  código  florestal  resultou  em  redução  de  aproximadamente  82%  da  APP  em   topo   de   morro,   comprometendo   as   diversas   funções   ecossistêmicas,   como  preconizado  no  Art.  3º,  II  do  Código  Florestal.    

Estas   alterações   contrariam   o   conhecimento   cienqfico   e   o   tratado   da  Biodiversidade  do  qual  o  Brasil  é  signatário.  

RESULTADOS  E  DISCUSSÃO  

A  aplicação  da  Lei  12.651/2012,  implicou  na  redução  de  81,93%  de  áreas  protegidas  como   APP   de   Topo   de   Morro   (Figura   2).   Apenas   pequenas   áreas   isoladas   (com  dimensão   entre   0,5   –   213,0   ha)   sobre   os   cumes   das   maiores   elevações  permaneceram  incluídas  nesta  categoria  de  APP.    

Legislação  Revogada  

(Lei  4711/65,  Resolução  CONAMA  303/2002)    

Legislação  Vigente  

(Lei  12.651/2012)  

Conceito  de  base  da  elevação  

superJcie  de  lençol  d’água  adjacente  ou,  cota  da  depressão  mais  baixa  ao  seu  redor  

cota  do  ponto  de  sela  mais  próximo  da  elevação.  

Critério  para  inclusão  da  elevação  Altura  mínima  da  

elevação  medida  da  base  ao  topo  

50m   100m  

Declividade     linha  de  maior  declividade  superior  a    30%    (aprox.  17o)  

inclinação  média  maior  que  25o  

Quadro  1.  Comparação  entre  os  critérios  técnicos  anIgos  (Lei  4711/65  e  Resolução  CONAMA  303/2002)  e  os  atualmente  vigentes  (Lei  12.651/2012)  para  a  demarcação  das  APP  de  Topo  de  Morro,  em  relevos  ondulados  

Nas   Figuras   3   e   4   evidencia-­‐se   a   perda   da     conecIvidade   entre   as   diferentes  categorias  de  APP,  a  parIr  da  aplicação  da  nova  legislação.    

Município de Nova Friburgo

1º Distrito

Figura 1

PerspecJva     Expansão   da   urbanização   e   das   aIvidades   humanas   sobre   áreas  anteriormente   desInadas   a   preservação   e/ou   recuperação   como   APP   (Figura   4).  Aumento   da   pressão   antrópica   sobre   os   ecossistemas   naturais   e   possibilidade     de  aumento  da  taxa  de  desmatamento,  e  maior  fragmentação  da  paisagem.  

•    Redução   de   habitat   e,   consequentemente,   do   número   de     espécies   que   estes  podem  sustentar;  • Baixa   qualidade   do  habitat   e   favorecimento   de   espécies  mais   generalistas   como  consequência  da    intensificação  do  efeito  de  borda  em  fragmentos  menores;  • Redução  da  possibilidade  de  se  consItuir  corredores  e  “trampolins”  ecológicos,  e  favorecer  troca  e  o  fluxo  gênico  entre  populações  isoladas.  

 Esses  Fatores,  em  sinergia,  poderão,  em  médio  e   longo  prazo,  comprometer  a  as  múlJplas   funções   desempenhadas   pelas  APP,   em  especial,   a   conservação  da    biodiversidade.    

Prováveis  Consequências  :    • Redução   da   Proteção   das  nascentes   e   cabeceiras   de  rios,   podendo   comprometer    qualidade   da   água,   do   fluxo  hidrológico  e  a  qualidade  do  habitat  da  fauna  aquáIcas;  • Possibilidade   de   ocupação  de   áreas   de   risco   de  escorregamento;  

Figura  3  

Nascente  e  curso  d’água  

Topo  de  Morro    Leg.  revogada  

Topo  de  Morro  Leg.  vigente  

Legenda

 ABSTRACT  Brazil´s   Forest  Code  defines   areas   as   forest   along   rivers,   steep   slopes   and  hilltops   as  Permanent  PreservaIon  Areas   (PPA),  which  are   important  instruments   of   environmental   conservaIon   to   the   extent   that   promote   forest   preservaIon   and  maintenance   of   forest   fragments   connecIvity.  These  areas  play  important  ecological  services,  providing  shelter  and  food  for  wildlife  and  maintenance  of  gene  flow  for  a  range  of  species  of  fauna  and   flora,   thus   contribuIng   to   biodiversity   conservaIon.   The   Permanent   PreservaIon   Areas   also   play   a   key   role   for   the   integrity   of   physical  environment  by  preservaIon  of  landscape  and  water  resources.  An  amended  of  the  Brazilian  Forest  Code,  established  by  Law  12.651/2012,  showed  significant  changes  in  concepts  and  technical  criteria  that  guide  the  establishment  of  the  protected  hilltops  areas.  The  aim  of  this  paper  is  to  analyze  the  impact  of  the  amended  Forest  Code  on  former  protected  hilltops  areas,  in  the  city  of  Nova  Friburgo,  Rio  de  Janeiro  state,  using  GIS  tools   (ArcGIS).  Possible  consequences  of  Law  12.651/2012  on  the   landscape  and  preservaIon  of  natural  ecosystems  are  evaluated.  The  results  showed  that  the  applicaIon  of  technical  guidelines  of  the  amended  Forest  code  led  to  a  reducIon  of  approximately  82%  of  protected  hilltops  when  compared  to  previously  exisIng  criteria.  This  reducIon  of  protected  areas  may  have  important  consequences  on  the  pazern  of  land  use,  leading  to  possible  reducIon  of  forest  areas.  

Figura  4.  Detalhe  da  Figura  3.  

Figura  2  

42,90  Km²  

7,75  Km²  

Legenda

Topo  de  Morro    Leg.  revogada  

Topo  de  Morro  Leg.  vigente