APST (IED)_TEORIA GERAL E HISTÓRIA DO PENSAMENTO JURÍDICO (PROF. JOSÉ E. MELHEN).pdf
-
Upload
quincasborba -
Category
Documents
-
view
19 -
download
0
Transcript of APST (IED)_TEORIA GERAL E HISTÓRIA DO PENSAMENTO JURÍDICO (PROF. JOSÉ E. MELHEN).pdf
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
1
Noo Elementar de Direito
Aos olhos do homem comum o Direito lei e ordem, isto , um conjunto de regras
obrigatrias que garante a convivncia social graas ao estabelecimento de limites
ao de cada um de seus membros. O Direito corresponde exigncia essencial
e indeclinvel de uma convivncia ordenada, pois nenhuma sociedade poderia
subsistir sem um mnimo de ordem, de direo e solidariedade. Um velho brocardo
latino fazendo referncia a isso dizia: Ubi societas, ibi ius; ubi ius, ibi societas (onde
est a sociedade, est o Direito; onde est o Direito, est a sociedade). O Direito
um fato ou fenmeno social; no existe seno em sociedade e no pode ser
concebido fora dela, o Direito uma coisa de homem para homem, de ser humano
para ser humano. Se houvesse apenas um ser humano na Terra, no haveria
sentido haver regras jurdicas, pois no haveria direitos alheios que pudessem ser
violados. O escritor ingls DANIEL DEFOE exps bem tal questo na obra A Vida
e as Estranhas Aventuras de Robinson Cruso.
uma disciplina essencialmente dinmica, no se podendo conceber um direito
esttico. Se a sociedade muda, o Direito deve acompanhar essa mudana. Com
muita razo GEORGES RIPERT afirma que Quando o Direito ignora a realidade, a
realidade se vinga ignorando o Direito.
O Direito est presente em todos os momentos da nossa vida (desde a concepo
no tero materno) e nos acompanha at mesmo aps a morte (art. 2, art. 12,
pargrafo nico e artigo 20, pargrafo nico, do CC).
Ainda assim, muitas vezes no damos conta da presena do Direito em nossa
jornada ou, por outro lado, no h interesse em pensar o Direito.
Com razo KARL ENGISCH ao firmar que: Quem se proponha familiarizar o
principiante ou o leigo com a Cincia do Direito (jurisprudncia) e o pensamento
jurdico, ao tent-lo v-se a braos com uma srie de dificuldades e dvidas que
no encontraria noutros domnios cientficos. Quando o jurista, situado no crculo
das cincias do esprito e da cultura, entre as quais se encontra a jurisprudncia,
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
2
olha ao derredor, tem de constatar, angustiado e com inveja, que a maioria delas
pode contar extra muros com um interesse, uma compreenso e uma confiana
muito maiores do que precisamente a sua cincia. Especialmente as cincias
(teorias) da linguagem, da literatura, da arte, da msica e da religio fascinam os
leigos devotados a assuntos de cultura numa medida muito maior do que a cincia
do Direito, se bem que esta, no s quanto matria mas ainda
metodologicamente, tenha com aquelas estreitos laos de parentesco. (...) Sem
grandes hesitaes se depositar um livro de arqueologia ou de histria da
literatura sobre a mesa dos presentes, mas a custo se far o mesmo com um livro
jurdico, ainda que este no exija da parte do leitor conhecimentos especiais. As
usuais introdues cincia jurdica, com raras excees, apenas parecem ter
algum interesse para o jurista principiante, mas j no para o leigo. (...) As razes
deste desinteresse do leigo pelo Direito e pena cincia jurdica so fceis de
descobrir. Todavia, trata-se de algo muito estranho. Com efeito, a custo qualquer
outro domnio cultural importar mais ao homem do que o Direito. H na verdade
pessoas que podem viver sem uma ligao ntima com a poesia, com a arte, com a
msica. H, tambm, na expresso de Max Weber, pessoas religiosamente
amusicais. Mas no h ningum que no viva sob o Direito e que no seja por ele
constantemente afetado e dirigido. O homem nasce e cresce no meio da
comunidade e - parte os casos anormais jamais se separa dela. Logo,
inevitavelmente, afeta-nos e diz-nos respeito. (...) Por que, pois, to pouca abertura
de esprito para o Direito e a jurisprudncia?
CARLOS ARI SUNDFELD procura responder s questes levantadas por
ENGISCH ao observar que O cientista do direito vive seu dilema. Se compe uma
obra para expor idias sobre o justo ou o injusto, o bom e o mau, conquista
simpatia, mas frauda seus leitores, porque no faz cincia do direito, mas filosofia
da justia. Se apenas descreve o funcionamento dos mecanismos de que se
compe o sistema jurdico, ou se expe certo sistema jurdico positivo (o brasileiro,
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
3
o francs...), cumpre adequadamente sua funo, mas seu trabalho perde charme
mundano.
Multiplicidade e Unidade do Direito
O Direito abrange um conjunto de disciplinas e regras, divide-se em duas grandes
classes: Direito Pblico e Direito Privado. As relaes que se referem ao Estado e
traduzem o predomnio do interesse coletivo so chamadas relaes pblicas ou
de Direito Pblico, por conseguinte, as relaes que interessam ao indivduo
enquanto particular dizem respeito ao Direito Privado. H em cada comportamento
humano, a presena, embora indireta, do fenmeno jurdico: o Direito est pelo
menos pressuposto em cada ao do homem que se relacione com outro homem.
Para alguns h uma categoria intermediria, um terceiro gnero, denominado
direito misto ou direito difuso (ambiental, trabalho, consumidor etc.). Preferimos,
porm, manter a diviso clssica, que remonta ao Direito Romano, na pessoa do
jurista Ulpiano, pioneiro a discorrer sobre tal diviso.
DIREITO E MORAL
A Teoria do Mnimo tico
Esta teoria, exposta pelo filsofo ingls JEREMIAS BENTHAM, consiste em dizer
que o Direito representa o mnimo de Moral declarado obrigatrio para que a
sociedade possa sobreviver. Como nem todos podem ou querem realizar de
maneira espontnea as obrigaes morais, indispensvel armar de fora certos
preceitos ticos, para que a sociedade no soobre. Assim sendo, o Direito no
algo de diverso da Moral, mas uma parte desta, armada de garantias especficas.
A teoria do mnimo tico pode ser reproduzida por meio da imagem de dois crculos
concntricos, sendo o crculo maior o da Moral, e o crculo menor o do Direito.
Haveria um campo de ao comum a ambos, sendo o Direito envolvido pela Moral.
Poderamos dizer que tudo o que jurdico moral, mas nem tudo o que moral
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
4
jurdico (non omne quod licet, honestum est). No exato dizer que tudo o que se
passa no mundo jurdico seja ditado por motivos de ordem moral. Alm disso,
existem atos juridicamente lcitos que no o so do ponto de vista moral. H regras
sociais que cumprimos de maneira espontnea, independentemente de haver
sano, so as chamadas normas de aceitao social (ex. se o art. 121 do Cdigo
Penal deixar de ser punido, no sairemos cometendo homicdios, porque temos
conscincia da necessidade de respeito vida alheia). Outras regras existem, que
os homens s cumprem em determinadas ocasies, porque a tal so coagidos, so
as chamadas normas de rejeio social (ex. a norma tributria s pagamos
tributos porque tememos a sano normativa).
A Moral o mundo da conduta espontnea, do comportamento que encontra em si
prprio a sua razo de existir. O ato moral implica a adeso do esprito ao contedo
da regra. No possvel conceber-se o ato moral forado, fruto da fora ou da
coao.
Distino entre Direito e Moral
Ambos tm pontos de contato e pontos de dessemelhana: tm eles uma comum
base tica, uma idntica origem, a conscincia social. Ambos constituem normas
de comportamento.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
5
O Direito e a Moral regulam atos de seres livres, os homens, tendo um e outra por
fim, o bem-estar do indivduo e da sociedade.
O campo da Moral mais amplo (non omne quod licet honestum est). A Moral
abrange os deveres do homem para com Deus, para consigo mesmo e para com
seus semelhantes. O Direito mais restrito, compreende apenas os deveres do
homem para com seus semelhantes.
O Direito tem coao, a Moral incoercvel. A principal oposio entre a regra
moral e a regra jurdica repousa efetivamente na sano. A Moral s comporta
sanes internas, que notoriamente se apresentam incuas. O Direito, por sua vez,
conta com a sano para coagir os indivduos. Sem esse elemento coercitivo, no
haveria segurana nem justia para a vida em sociedade. Visto isso podemos
afirmar que o conceito de coao (possibilidade de constranger o indivduo
observncia da norma), torna-se inseparvel do Direito.
A Moral visa absteno do mal e prtica do bem, enquanto o objetivo do Direito
evitar que se lese ou se prejudique a outrem.
A Moral se dirige ao momento interno, psquico, volitivo, inteno que determina
o ato, ao passo que o Direito se dirige ao momento externo, fsico, isto , ao ato
exterior.
A Moral unilateral, o Direito, bilateral.
O Direito mais definido, a Moral mais difusa.
Detalhe importante que se percebe que as normas morais tendem a se converter
em normas jurdicas.
Direito e Coao
O que distingue o Direito da Moral a coercibilidade: a Moral incoercvel e o
Direito coercvel. Coercibilidade uma expresso tcnica que serve para mostrar
a plena compatibilidade que existe entre o Direito e a fora.
H 3 posies h respeito da relao entre Direito e fora :
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
6
1) Uma teoria imbuda de eticismo absoluto sustenta que o Direito nada tem a ver
com a fora, no surgindo, nem se realizando graas interveno do poder
pblico;
2) Para Ihering o Direito se reduz a norma+coao. Segundo essa concepo,
poderamos definir o Direito como sendo a ordenao coercitiva da conduta
humana.
3) A teoria da coercibilidade diz que o Direito a ordenao coercvel da conduta
humana.
Podemos distinguir, assim:
Sano conseqncia desfavorvel imputada quele que descumpre uma norma
jurdica.
Coero ameaa potencial de sofrer sano (se praticar tal conduta, sofrer tal
conseqncia).
Coao sano concretizada por conta da violao da norma jurdica (praticou a
conduta e, em concreto, sofre a conseqncia).
Direito e Heteronomia
A heteronomia pode ser definida como sendo a validade objetiva e transpessoal
das normas jurdicas, as quais se pem acima das pretenses dos sujeitos de uma
relao, superando-as na estrutura de um querer irredutvel ao querer dos
destinatrios. Baseia-se na sujeio a um querer alheio (ao contrrio da
autonomia).
Kant foi o primeiro a afirmar ser a Moral autnoma e o Direito heternomo. O
Direito heternomo, visto ser posto por terceiros aquilo que somos juridicamente
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
7
obrigados a cumprir, a partir disto poderamos afirmar que o Direito a ordenao
heternoma e coercvel da conduta humana.
Bilateralidade Atributiva
H bilateralidade atributiva quando duas ou mais pessoas se relacionam segundo
uma proporo objetiva que as autoriza a pretender ou a fazer garantidamente
algo.
Bilateralidade atributiva uma proporo intersubjetiva, em funo da qual os
sujeitos de uma relao ficam autorizados a pretender, exigir, ou a fazer,
garantidamente, algo. Da a dizer:
1) Sem relao que una duas ou mais pessoas no h Direito (bilateralidade em
sentido social, como intersubjetividade);
2) Para que haja Direito indispensvel que a relao entre os dois sujeitos seja
objetiva, isto , insuscetvel de ser reduzida, unilateralmente, a qualquer dos
sujeitos da relao (bilateralidade em sentido axiolgico);
3) Da proporo estabelecida deve resultar a atribuio garantida de uma
pretenso ou ao, que podem se limitar aos sujeitos da relao ou estender-se a
terceiros (atributividade).
MUNDO DO DIREITO X MUNDO DA NATUREZA
HANS KELSEN, criador da Teoria Pura do Direito, explicou com brilhantismo a
diferena entre as leis da natureza e as normas jurdicas, valendo-se do dualismo
de KANT entre o ser (sein) e o dever ser (sllen).
Discorrendo sobre o tema, CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO leciona que
O mundo do direito difere profundamente do mundo natural. O mundo normativo
tem a sua existncia prpria, diversa do mundo natural, desligada dele, como um
modo de ser e de existir prprio, diverso do mundo natural. (...) No mundo natural,
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
8
se soltarmos um cigarro, ele inelutavelmente cair, em razo da lei da gravidade,
que enuncia relaes que decorrem, efetivamente, da natureza das coisas. (...) No
mundo do direito as coisas no se processam assim. Os homens constroem,
livremente, situaes hipotticas e enlaam a esse antecedente um certo
conseqente. Figuram uma relao entre um antecedente, que livremente
construdo pelos homens, e um conseqente, tambm livremente institudo pelos
homens. (...) Por isso os sistemas jurdicos podem variar. Um dado sistema pode
impor que obrigatrio o voto. O enlaamento entre essas duas relaes feito
pela vontade do legislador. Ele relaciona antecedentes com conseqentes. No
mundo natural vigora a lei da causalidade, a relao de causa e efeito: se A for, B
ser. No mundo do direito vigora a relao de imputao: se A for, B dever ser.
Da afirmar-se que o Direito a cincia do dever ser. As conseqncias normativas
so aquelas que o legislador desejou (obviamente obedecendo os limites
constitucionais e considerando-se a dignidade da pessoa humana como seu
principal vetor).
a vontade do legislador, p. ex., que atribui ao comportamento matar algum, a
conseqncia: recluso de 6 a 20 anos (art. 121, do Cdigo Penal).
A diferena entre o ser (mundo da natureza) e o dever ser (mundo do Direito)
nos permite compreender por que a norma jurdica, mesmo desrespeitada,
continua existindo. A norma no descreve a realidade, no diz como ela , mas
apenas como deve ser.
DIREITO E CINCIA JURDICA
EROS ROBERTO GRAU afirma que O Direito no uma cincia. O Direito
estudado e descrito; , assim, tomado como objeto de uma cincia, a chamada
Cincia do Direito. (...) O Direito normativo. O Direito no descreve; o Direito
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
9
prescreve. A cincia que o estuda e descreve no , no entanto, normativa. ,
como toda cincia, descritiva. Impe-se distinguirmos, assim, o Direito e a Cincia
do Direito. Esta ltima descreve indicando como, porque e quando aquele.
O Direito, portanto, compe-se de normas, enquanto a Cincia do Direito compe-
se de um conjunto de proposies.
Ensina, ainda, EROS GRAU: Proposies jurdicas esclarece Kelsen, so juzos
hipotticos que enunciam ou traduzem que, de conformidade com o sentido de
uma ordem jurdica nacional ou internacional dada ao conhecimento jurdico,
sob certas condies ou pressupostos fixados por este ordenamento, devem
intervir certas conseqncias pelo mesmo ordenamento determinadas. As normas
jurdicas, por seu turno, no so juzos, isto , enunciados sobre um objeto dado ao
conhecimento. Elas so antes, de acordo com o seu sentido, mandamentos, e
como tais, comandos, imperativos. Mas no so apenas comandos. Em todo o
caso, no so como, por vezes, identificando o Direito como cincia jurdica, se
afirma instrues (ensinamentos). O Direito prescreve, permite, confere poder ou
competncia no ensina nada. (...) A cincia jurdica tem por misso conhecer de
fora, por assim dizer o Direito e descreve-lo com base no seu conhecimento. Os
rgos jurdicos tm como autoridade jurdica antes de tudo por misso
produzir o Direito para que ele possa ento ser conhecido e descrito pela cincia
jurdica.
Assim, temos:
a) o Direito composto por normas; a cincia jurdica composta por
proposies;
b) o Direito prescritivo; a cincia jurdica descritiva;
c) o Direito produzido por um rgo estatal; a cincia jurdica produzida
por cientistas;
d) a norma jurdica (o Direito) vlida ou invlida; a cincia jurdica
verdadeira ou falsa.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
10
CONCEITO DE DIREITO
Pode-se dizer que o Direito a ordenao bilateral atributiva das relaes sociais,
na medida do bem comum.
prprio do Direito ordenar a conduta de uma maneira bilateral e atributiva, ou
seja, estabelecendo relaes de exigibilidade segundo uma proporo objetiva. O
Direito no visa a ordenar as relaes dos indivduos entre si para a satisfao
apenas dos indivduos, mas, ao contrrio, para realizar uma convivncia ordenada,
o que se traduz na expresso: bem-comum. O bem-comum no a soma dos
bens individuais, nem a mdia do bem de todos; o bem comum a ordenao
daquilo que cada homem pode realizar sem prejuzo do bem alheio, uma
composio harmnica do bem de cada um com o bem de todos, tendo como vetor
o princpio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1, III, da CF).
O jurista romano CELSO definia o direito como a arte do bom e do justo (Ius est ars
boni et aequi).
a norma das aes humanas (norma agendi) na vida social (facultas agendi)
estabelecida por uma organizao soberana (justo) e imposta coativamente
observncia de todos (sano).
SILAS RODRIGUES, de maneira mais completa, d a seguinte definio: Direito :
objeto cultural, e a disciplina normativa, heternoma, da vida exterior e relacional
dos homens, bilateral, imperativo-atributiva, dotada de validade, eficcia e
coercibilidade, que tende realizao da segurana, equilbrio, bem-comum, numa
sociedade organizada pela aplicao do valor eterno: Justia.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
11
Estrutura Tridimensional do Direito
Uma anlise em profundidade dos diversos sentidos da palavra Direito, MIGUEL
REALE vislumbrou que eles correspondem a trs aspectos bsicos, discernveis
em todo e qualquer momento da vida jurdica: um aspecto normativo (o Direito
como ordenamento e sua respectiva cincia); um aspecto ftico (o Direito como
fato, ou em sua efetividade social e histrica) e um aspecto axiolgico (o Direito
como valor de Justia). a chamada Teoria Tridimensional do Direito, que
preconiza que a experincia jurdica (o Direito) surge da dialetizao fato + valor +
norma. Da a dizer:
1) Onde quer que haja um fenmeno jurdico, h, sempre e necessariamente um
fato subjacente; um valor, que confere determinada significao a esse fato,
inclinando ou determinando a ao dos homens no sentido de atingir ou preservar
certa finalidade ou objetivo; e uma regra ou norma, que representa a relao ou
medida que integra um daqueles elementos ao outro, o fato ao valor;
2) Tais elementos ou fatores (fato, valor, norma) no existem separados um dos
outros, mas coexistem numa unidade concreta;
3) Esses elementos ou fatores no s se exigem reciprocamente, mas atuam como
elos de um processo, de tal modo que a vida do Direito resulta da integrao
dinmica e dialtica dos trs elementos que a integram.
Acepes do termo Direito
Observando o Direito luz da realidade dos estudos Jurdicos contemporneos,
pode-se vislumbrar que o termo "direito" comporta pelo menos as seguintes
concepes:
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
12
a) Cincia, correspondente ao conjunto de regras prprias utilizadas pela Cincia
do Direito; O direito uma cincia social;
b) Norma jurdica, pois objetiva regulamentar o comportamento das pessoas na
sociedade por meio de normas editadas pelas autoridades competentes. Ex. O
Direito pune o homicdio, art. 121, do Cdigo Penal;
c) Poder ou prerrogativa, quando se diz que algum tem a faculdade, o poder de
exercer um direito; Ex. O maior de 16 tem o direito de votar; O Estado tem o
direito de cobrar tributos;
d) Fato social, quando se verifica a existncia de regras vivas existentes no meio
social. Ex. O Direito nasce do fato e ao fato se destina;
e) Justo, aquilo que cada pessoa deve fazer ou deixar de fazer em uma sociedade
bem ordenada e justa. Ex. Fiz tudo direito; O salrio direito do trabalhador.
O Direito um ideal sonhado por certa sociedade e simultaneamente um golpe que
enterra esse ideal. smbolo da ordem social e simultaneamente a bandeira da
agitao. O Direito garante a privacidade e a intimidade e, tambm, ao mesmo
tempo, a publicidade e quebra da intimidade.
S por esses exemplos percebe-se o grau de dificuldade que o manejar do
conceito "direito". Talvez por isso a chamada Cincia do Direito tenha acabado por
privilegiar um dos sentidos, dentre os vrios possveis.
Como, via de regra, as cincias em geral no tm muita dificuldade na descoberta
e fixao de seus objetos, a Cincia do Direito pretende o mesmo.
Dessa forma, optou por estudar um dos sentidos possveis do termo "direito": o de
norma jurdica e, especialmente, o de norma jurdica escrita.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
13
Assim que, na atualidade, os cursos de Direito esto voltados quase que
totalmente para o estudo da norma jurdica escrita, com mtodo tipicamente
dogmtico.
Mas no parece ter sido uma escolha muito feliz, uma vez que as dificuldades de
fixao de sentido que o termo "direito" revela ao investigador, antes de serem um
obstculo, apontam para uma riqueza de significaes que merecem estudo
aprofundado.
Contudo, ao invs de buscar superar o obstculo, penetrando em sua
complexidade fecunda, o cientista do Direito deu uma volta ao largo do problema e
levou consigo o sentido mais fcil de ser abordado.
Com isso, o que era de humano a impregnar o Direito acabou congelando-se no
conceito da norma jurdica escrita e perdendo-se no trabalho analtico de
investigador.
preciso resgatar a magnificncia da dignidade humana, que o fundamento
ltimo que d sustentao ao Direito.
Kelsen, em brilhante, porm inaplicvel, teoria vislumbrou o Direito como uma
cincia pura, despida da influncia de qualquer outro ramo do conhecimento das
cincias humanas. Trata-se, em verdade, de verdadeira tentativa de eugenia do
Direito. Nada obstante tenha sido o maior jurista do sculo XX, sua Teoria Pura do
Direito muito criticada, pois, se, de um lado, traz segurana, de outro, pode ser
fonte de vrias injustias, na medida em que o intrprete fica cerceado norma
jurdica e nada mais. Reduz a funo do juiz a um autmato (um rob ou um
computador) na aplicao da lei.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
14
Fontes do Direito
A metfora "fonte do Direito" o local de origem do Direito; , na verdade, j o
prprio Direito, mas sado do oculto e revelado ao mundo.
Fontes Estatais e No-Estatais
Fontes estatais: lei e jurisprudncia;
Fontes no-estatais: costume Jurdico e doutrina.
Fontes Estatais
Legislao
Legislao o conjunto das normas jurdicas emanadas do Estado, atravs de
seus vrios rgos, dentre os quais se reala, com relevo, nesse tema, o Poder
Legislativo.
A legislao (conjunto de normas jurdicas escritas) , tambm, conhecida como
"ordenamento Jurdico".
A estrutura do ordenamento Jurdico organizado hierrquica. Por hierarquia legal,
entende-se que umas normas so superiores s outras, isto , algumas normas
para serem vlidas tm de respeitas o contedo, formal e material, da norma
jurdica superior.
HANS KELSEN vislumbrou o ordenamento jurdico em um esquema piramidal,
para demonstrar a chamada hierarquia vertical das normas. Eis a Pirmide de
Kelsen:
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
15
Constituio Federal norma suprema no ordenamento jurdico brasileiro, fonte
de validade para as demais normas, que se lhe so inferiores. Traa critrios
genricos, os quais devem ser observados pelas demais normas. O que contraria a
CF no tem obrigatoriedade no cumprimento. Pode ser atacado de forma direta
(controle concentrado, art. 103, CF) ou de forma incidental (controle difuso,
qualquer rgo do Poder Judicirio).
A CF fruto da atividade do poder constituinte originrio, que inicial,
incondicionado e ilimitado, indica sempre uma revoluo no ordenamento (veculo
da CF). No esto obrigadas a respeitar direito adquirido, ato jurdico perfeito e
coisa julgada, mas nada impede que o faa. Ex. art. 17, do ADCT, da CF. Ocorre,
porm, que quando uma nova CF quebrar direitos adquiridos, ela deve dizer
expressamente, pois, em seu silncio, eles so preservados. Ex. Lei 6.969/81, cuja
CF de 1988, no silncio, preservou os direitos adquiridos com base nessa norma.
Emendas CF alteram o texto da CF, criando novas normas ou revogando as j
existentes. H limites, matrias que no podem ser objeto de emendas, ex: art. 60,
4, I, II, III e IV. Devem respeitar direito adquirido, ato jurdico perfeito e coisa
julgada (com excees, p. ex.: para beneficiar o ru).
Lei ordinria fruto da atividade tpica do legislador (legislar). Deve ser aprovada
pela maioria simples do Congresso Nacional (voto positivo do primeiro nmero
inteiro superior metade dos parlamentares presentes. Mas o nmero dos
presentes no pode ser inferior ao primeiro nmero inteiro superior metade dos
membros da casa art. 47, CF; ex. 513 membros: devem estar presentes 257; se
129 votarem, a lei ordinria aprovada). Em seguida deve ser sancionada ou
vetada pelo Presidente da Repblica.
A Lei ordinria regulamenta qualquer assunto que no seja de competncia
privativa de outras autoridades, devendo sempre estar em conformidade com a CF.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
16
Lei complementar distingue-se da lei ordinria pela exigncia de quorum de
maioria prprio e pela especificidade de suas matrias. O quorum de maioria
absoluta dos deputados e senadores (voto positivo do primeiro nmero inteiro
superior metade dos membros das Casas Legislativas art. 69, CF. Ex. 513: com
257 aprovada). Deve ser sancionada pelo Presidente da Repblica (59, 61, 65,
66 e 69, CF). Limita-se a regulamentar assuntos importantes, indicados na CF:
criao de um novo Estado Federal (18, 3, CF), fixao do nmero total de
membros da Cmara dos Deputados (45, 1). No h hierarquia entre a Lei
Complementar e a Lei Ordinria.
Lei delegada ato normativo elaborado pelo Presidente da Repblica aps
especfica autorizao do Congresso Nacional, por meio de Resoluo. Restries:
art. 68, 1, CF. Possui a mesma fora da lei ordinria. Est em desuso, as ltimas
foram editadas em 1992.
Medidas Provisrias sucessoras do antigo Decreto-Lei (antes da CF/1988). So
atos normativos tomados pelo Poder Executivo (federal, estadual ou municipal), em
caso de urgncia e relevncia, que possuem fora de lei formal. Deve ser aprovada
pelo Congresso Nacional em at 120 dias aps sua edio (sem computar os
perodos de recesso parlamentar). O prazo 60, prorrogvel por mais 60. Se for
aprovada, converte-se em lei ordinria; se no, perde sua validade. H limites: art.
62, CF. Governadores e Prefeitos podem lanar mo de medidas provisrias
somente se houver autorizao na Constituio do Estado (Governador) e na Lei
Orgnica do Municpio (Prefeitos),
Decretos legislativos ato normativo emitido pelo Congresso Nacional, no
sujeito sano do Presidente da Repblica. Regulamenta assuntos de
competncia exclusiva do Congresso Nacional (art. 49, CF). Ex. autorizar
referendo.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
17
Resoluo ato normativo emitidos em assuntos de exclusiva competncia da
Cmara dos Deputados ou do Senado (arts. 51, 52, 155, 2, IV e V, da CF) ou do
Congresso Nacional (art. 68, 2, CF), no necessita de sano do Presidente da
Repblica. Ex. eleio dos membros do Conselho da Repblica pela Cmara dos
Deputados.
Decreto regulamentar so normas elaboradas pelo Presidente da Repblica,
com o objetivo de concretizar as leis no sentido formal, providenciando o
necessrio para sua aplicao (art. 84, IV, CF).
Portarias, ordens de servios, circulares normas criadas por autoridades do
poder executivo para orientar a atividade da administrao a execuo das leis. Ex.
uma portaria do Ministrio da Sade.
Instruo norma emitida por um Ministro de Estado para regulamentar a
execuo das leis, decretos e regulamentos (art. 87, pargrafo nico, II, CF).
A Jurisprudncia
Jurisprudncia o conjunto das decises uniformes dos tribunais a respeito do
mesmo assunto, o modo uniforme e reiterado pelo qual os tribunais se orientam na
soluo de determinada questo jurdica. , tambm, chamada de costume
judicirio. Deciso isolada no constitui jurisprudncia, embora, em certo tempo,
possa influenciar para uma mudana jurisprudencial. O nome tcnico de uma
deciso isolada proferida por Tribunal acrdo escoteiro. A jurisprudncia sempre
emana de um rgo colegiado (mais de um julgador), nunca de um rgo singular
(ex. juiz de primeira instncia). Em nosso sistema os Juzes inferiores no esto
vinculados nem s decises, nem s smulas dos tribunais. Excees: Smulas
Vinculantes (art. 103-A, da CF e Lei 11.417/06), Smulas Impeditivas de Recursos
(art. 518, do CPC) e deciso proferida pelo STF em Ao Direta de
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
18
Inconstitucionalidade e em Ao Declaratria de Constitucionalidade (art. 102, 2,
CF).
Sob o aspecto lgico, o costume e a jurisprudncia se equiparam, porquanto
ambos so produzidos por induo: casos particulares que podem chegar a um
resultado generalizado, aplicvel a todos os outros da mesma espcie.
Fontes No-Estatais
Costume Jurdico
Costume Jurdico (no confundir com a jurisprudncia, que tambm conhecida
por costume judicirio) norma jurdica obrigatria, imposta ao setor da
realidade que regula, passvel de imposio pela autoridade pblica e em especial
pelo Poder Judicirio.
uma norma "no-escrita", que surge da prtica longa, diuturna e reiterada da
sociedade.
Distingue-se, assim, da lei, de plano, pelo aspecto formal. A lei escrita; o costume
no escrito.
O costume Jurdico tem outra caracterstica importante: aquilo que a doutrina
chama de convico de obrigatoriedade (opinio necessitatis), ou seja, a prtica
reiterada, para ter caracterstica de costume Jurdico, deve ser aceita pela
comunidade como de cunho obrigatrio.
H obrigatoriedade de cumprimento do costume Jurdico, porm no ficam muito
claras as conseqncias caso sua prescrio no seja observada.
Isso no significa dizer que no existe sano, mas sim que esse aspecto
secundrio, e, diante das circunstncias que fazem nascer o costume Jurdico, a
sano acaba ficando vaga.
Pode nem haver sano clara, mas h obrigao de cumprimento, que
caracterstica decorrente da fora da sano, porquanto o no-cumprimento do
costume Jurdico pode ser exigido judicialmente, tal qual se faz com a lei.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
19
O costume Jurdico surge no e do prprio seio da coletividade.
Ele fruto da prtica social individualizada, caso a caso; nasce obrigatrio porque
as partes envolvidas assim o entendem e se auto-obrigam; provm da convico
interna de cada partcipe de sua objetivao em fatos sociais particulares, que
obriga a todos os que neles se envolverem. Formado com essa convico de
obrigatoriedade, pode-se t-lo como legtimo e atualizado.
Aquele que alega o costume tem o nus de prov-lo ao Juiz (art. 337, do CPC).
A doutrina classifica o costume em 3 espcies:
a) Segundo a lei (secundum legem) - quando a lei expressamente determina ou
permite a aplicao dele; ex. arts. 113, 165, 597, do CC);
b) Na falta da lei (praeter legem) - quando intervm na falta ou omisso da lei. Ele
funciona, no caso, preenchendo o ordenamento jurdico, evitando o aparecimento
de lacuna ou mesmo integrando eventual lacuna; ex. art. 4, da Lei de Introduo
s Normas do Direito Brasileiro (LINDB);
c) Contra a lei (contra legem) - quando contraria o disposto na lei. No aceito por
parte da doutrina.
Existem 2 tipos de costume contra legem:
- Desuso (desuetudo) - quando uma lei deixa de ser aplicada, por j no
corresponder realidade e em seu lugar terem surgido regras costumeiras; Ex. o j
revogado art. 217, do Cdigo Penal, que previa o crime de seduo: Seduzir
mulher virgem, menor de 18 (dezoito) anos e maior de 14 (catorze), e ter com ela
conjuno carnal, aproveitando-se de sua inexperincia ou justificvel confiana;
- Costume "ab-rogatrio" - cria nova regra, apesar da existncia da lei vigente
(ex. cheque ps-datado, que contraria a Lei 7.357/85, a qual estabelece que o
cheque uma ordem de pagamento vista e no para data futura).
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
20
Doutrina
o resultado do estudo que pensadores (juristas e filsofos do Direito) fazem a
respeito do Direito. Em nossa poca, quando a especializao se torna
fundamental e a velocidade das transformaes est exacerbada, a doutrina
assume papel extremamente relevante para o Direito. J no possvel que o
legislador, administrador ou Juiz, mesmo especialista, consiga dar conta do
universo de situaes existentes, tanto no mundo das normas quanto no da
realidade social. A doutrina nesse processo torna-se essencial para aclarar pontos,
estabelecer novos parmetros, descobrir caminhos ainda no pesquisados,
apresentar solues justas, enfim interpretar as normas, pesquisar os fatos e
propor alternativas, com vistas a auxiliar a construo sempre necessria e
constante do Estado de Direito, com o aperfeioamento do sistema Jurdico.
Por fim, a doutrina exerce papel fundamental, como auxiliar para entendimento do
sistema Jurdico em seus mltiplos e complexos aspectos.
A doutrina fonte do Direito.
A fundamento para a aceitao da doutrina como fonte do Direito surge da prpria
definio que unanimemente se d para a doutrina: o conjunto das investigaes
cientficas e dos ensinamentos dos juristas (pensadores do Direito).
O pensamento Jurdico dogmtico nada mais do que o conjunto de suas
doutrinas, e corresponde ao locus, onde o estudioso e pesquisador do Direito vai
aprend-lo e procurar respostas aos problemas encontrados.
Direito Positivo
Direito positivo o conjunto das normas jurdicas escritas e no-escritas (costume
Jurdico), vigentes em determinado territrio e, tambm, na rbita internacional na
relao entre os Estados, sendo o direito positivo a aquele estabelecido nos
tratados e costumes internacionais.
Esse direito positivo pode ser separado em dois elementos: de um lado, o direito
objetivo e, de outro, o direito e dever subjetivos.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
21
Ambos os elementos compem um mesmo direito, de tal forma que o primeiro no
pode existir sem os segundos e vice-versa.
Direito Natural
Corresponde a uma idia de Justia, algo que no necessita estar positivado, mas
est na conscincia das pessoas, o mnimo que deve ser assegurado s
pessoas, dada sua condio humana (art. 1, III, da CF).
Direito Objetivo
o conjunto, em si, das normas jurdicas escritas e no-escritas,
independentemente do momento de seu exerccio e aplicao concreta.
O direito objetivo corresponde norma jurdica em si, enquanto comando que
pretende um comportamento. aquele objetivado independentemente do momento
de uso e exerccio.
O direito positivo a soma do direito objetivo com o direito e o dever subjetivos.
Direito Subjetivo
a prerrogativa colocada pelo direito objetivo, disposio do sujeito do direito.
Essa prerrogativa h de ser entendida como a possibilidade de uso e exerccio
efetivo do direito, posto disposio do sujeito.
O direito subjetivo tanto o efetivo exerccio do direito objetivo quanto a
potencialidade do exerccio desse mesmo direito.
O direito subjetivo est j na potncia (possibilidade de exerccio) e est tambm
no exerccio efetivo.
Pode haver abuso no exerccio do direito subjetivo.
Direitos subjetivos no precisam do exerccio ou da constatao de sua
potencialidade para existirem (embora para se garantirem, por vezes, precisem da
utilizao de outros direitos subjetivos).
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
22
o caso dos direitos subjetivos inerentes pessoa, tais como o direito vida,
honra, imagem etc. So eles direitos subjetivos plenos, de fato, bastando para
tanto a existncia da pessoa de direito.
O direito subjetivo se caracteriza pela potencialidade e pelo efetivo exerccio do
direito objetivo, podendo o sujeito fazer uso da ameaa desse exerccio, que ao ser
efetivado no o pode ser de forma abusiva. Alguns direitos subjetivos, no entanto,
sendo inatos ao sujeito (por garantia e designao do direito objetivo), independem
do exerccio, mesmo em potencialidade, para existirem. E, como existem j
plenamente, no caso desses direitos subjetivos, no h que se falar em ameaa ou
mesmo abuso do direito exercitado.
No se confunda direito subjetivo com o chamado direito-funo, que o exercido
por um sujeito em funo de outrem. Ex. o ptrio poder, que exercido pelos pais,
em funo do direito subjetivo dos filhos.
O direito-funo antes dever subjetivo que direito objetivo, visto que tem que ser
exercido. antes obrigao que prerrogativa.
Dever Subjetivo
A norma jurdica pode pretender obter aes e comportamentos, o que faz
apontando as condutas que devem ser cumpridas, bem como fixando as sanes
(punies) a serem aplicadas queles que no cumprem as condutas prescritas, ou
atingem o ato Jurdico praticado de forma proibida ou no aceita pelas normas
jurdicas.
Juntando-se a noo de direito subjetivo com essa noo de obrigao ou dever de
cumprir certa conduta, percebe-se que, se, de um lado, tem-se o direito subjetivo,
isto , potencialidade ou exerccio de um direito, de outro, tem-se um dever
subjetivo, colocado em posio diametralmente oposta.
No h direito subjetivo sem o outro que o tenha de respeitar.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
23
E mesmo que estejamos falando de um direito subjetivo que independa do
exerccio da prerrogativa para poder existir, como, por ex., o direito vida, honra,
imagem etc., ainda assim sempre existir o outro. No caso, o outro so todos os
outros, que devem respeitar tais direitos. um direito que se impe erga omnes,
isto , a todos.
A noo de dever e dever subjetivo imanente ao conjunto de normas jurdicas
objetivas.
H algo que surge junto com o exerccio do direito subjetivo, limitando-o.
Se o direito subjetivo pode ser exercido, mas no de forma ilimitada ou
injustificada, sob pena de ser taxado de abusivo, ento o que existe junto desse
direito subjetivo , no exato momento em que surge o limite, um dever.
O exerccio desse direito est limitado por um dever subjetivo. Todo aquele que vai
exercitar seu direito subjetivo s o pode fazer at certo ponto.
Diviso no Direito Positivo
Diviso Geral: Direito Pblico e Privado
A separao est estabelecida desde o direito romano (jurista ULPIANO) e tem por
funo estabelecer dogmaticamente segurana e certeza para a tomada de
deciso.
A diviso em Pblico e Privado pode ser feita tendo por critrios os sujeitos
envolvidos e a qualidade destes quando esto na relao jurdica; e o Contedo
normativo e o interesse Jurdico a ele relacionado.
Direito pblico aquele que rene as normas jurdicas que tm por matria o
Estado, suas funes e organizao, a ordem e a segurana internas, com a tutela
do interesse pblico, tendo em vista a paz social, o que se faz com a elaborao e
a distribuio dos servios pblicos, atravs dos recursos indispensveis sua
execuo. Cuida, tambm, na tica internacional, das relaes entre os Estados.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
24
Direito privado aquele que rene as normas jurdicas que tm por matria os
particulares e as relaes entre eles estabelecidas, cujos interesses so privados,
tendo por fim a perspectiva individual.
Ramos do Direito Pblico Interno
Direito Constitucional
Engloba as normas jurdicas constitucionais, isto , aquelas pertencentes
Constituio, em toda sua amplitude, dentre as quais se destacam as atinentes
forma e organizao do Estado, ao regime poltico, competncia e funo dos
rgos estatais estabelecidos, aos direitos e garantias fundamentais dos cidados
etc. Principais normas CF e Emendas. Lembremo-nos do fenmeno denominado
Bloco de Constitucionalidade, hiptese em que a CF considera com uma norma
que se encontra fora de seu texto, com status de norma constitucional (ex. art. 5,
3, da CF). Ex. Decreto 6.949/09, que tornou norma interna a Conveno de Nova
York, ratificada pelo Brasil em 2007.
Direito Administrativo
Corresponde ao conjunto de normas jurdicas que organizam administrativamente o
Estado, fixando os modos, os meios e a forma para a consecuo de seus
objetivos.
Tais normas estruturam e disciplinam as atividades dos rgos da Administrao
Pblica direta e indireta, as autarquias, as empresas pblicas, as entidades
paraestatais etc.
Referem-se, ainda, ao Poder de Polcia da Administrao, o que envolve no s os
aspectos de segurana pblica, de garantia da integridade fsica e moral das
pessoas e das suas propriedades mas tambm o de Polcia Administrativa,
montado nos vrios setores de fiscalizao existentes, o controle e a preservao
dos bens pblicos e as limitaes dos direitos sobre bens dos particulares etc.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
25
Disciplinam tambm os servios pblicos e suas permisses e concesses, os
critrios de oportunidade dos atos discricionrios etc. Enfim, regulam todos os atos
e procedimentos administrativos. Principais normas: Lei de Improbidade, Lei de
Licitaes e Contratos Administrativos, Constituio Federal etc.
Direito Tributrio
Envolve as normas jurdicas voltadas para a arrecadao de tributos, bem como as
que cuidam das atividades financeiras do Estado, regulam do suas receitas e
despesas.
Seus principais instrumentos legais so a prpria Constituio Federal, o Cdigo
Tributrio Nacional e uma srie de leis esparsas.
Direito Financeiro
Compreende o conjunto de normas e princpios que disciplinam a atividade dos
rgos do Poder Judicirio e das pessoas que com eles entram em contato ou que
lhes prestam colaborao. a atividade estatal destinada a conseguir meios para
acudir s necessidades pblicas, ou seja, so os meios para o Estado
desempenhar as suas atividades fim. Principais normas: Constituio Federal, Lei
de Responsabilidade Fiscal e Lei 4.320/64.
Direito Processual
Regula o processo judicial, bem como a organizao judiciria.
Engloba as normas jurdicas que cuidam das regras relativas ao judicial, isto ,
do direito de ver qualquer pretenso sendo analisada e julgada pelo Poder
Judicirio.
O Direito Processual est dividido por reas relativas ao direito material, com 3
subdivises bsicas:
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
26
a) Direito Processual Civil - regula as situaes relativas rbita civil, comercial,
fiscal, administrativa, do consumidor etc.; seu principal instrumento o Cdigo de
Processo Civil.
b) Direito Processual Penal - regula as situaes relativas rbita penal; seus
principais textos legais so o Cdigo de Processo Civil, as leis das execues
penais e Lei dos Juizados Especiais Criminais.
c) Direito Processual do Trabalho - regula as situaes relativas rbita trabalhista.
Serve-se ele, subsidiariamente, para os casos no previstos, do Direito Processual
Civil; sua principal base legal a Consolidao das Leis do Trabalho e o Cdigo de
Processo Civil (que possui aplicao subsidiria CLT).
Direito Penal
Corresponde ao conjunto das normas jurdicas que regulam os crimes e as penas
aplicveis, e as contravenes penais com as correspondentes penas aplicveis.
Seus principais instrumentos legais so o Cdigo Penal e a Lei das Contravenes
Penais, acrescidos de diversas leis esparsas.
Direito Eleitoral
Compe-se do conjunto das normas jurdicas que disciplinam a escolha dos
membros do Poder Executivo e Legislativo.
Essas normas estabelecem os critrios e condies para o eleitor votar, para
algum se candidatar, bem como as datas das eleies, as formas das apuraes,
o nmero de candidatos a serem eleitos, fixando as bases para a criao e o
funcionamento dos partidos polticos etc. Principais normas CF, LC 64/90, Cdigo
Eleitoral, Lei 9.504/97.
Direito do Trabalho
Engloba as normas jurdicas que regulam as relaes entre o empregado e o
empregador (patro), compreendendo o contrato de trabalho, o registro do
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
27
empregado, a resciso, a despedida, as verbas trabalhistas, os salrios e seus
reajustes, a durao da jornada de trabalho etc.
Essas normas regulam, tambm, o chamado Direito Coletivo do Trabalho, que trata
dos acordos coletivos de trabalho, da organizao sindical, do direito de greve etc.
Seu principal diploma legal a Consolidao das Leis do Trabalho, de 1/05/1943,
acrescida e alterada por uma srie de leis esparsas (lei de acidente do trabalho, do
empregado domsticos, do Fundo de Garantia do Tempo de Servio - FGTS etc.),
bem como a prpria CF.
Direito Previdencirio
o ramo do Direito que engloba as normas jurdicas que cuidam da Previdncia
Social, atravs dos seus rgos (INSS etc.), estabelecendo os benefcios e as
formas de sua obteno (auxlio-doena, auxlio-maternidade etc.), regrando a
aposentadoria por tempo de servio e por invalidez, o direito penso na viuvez,
as formas de manuteno e custeio do sistema etc.
Seu principal instrumento legal a Consolidao das Leis da Previdncia Social e
a CF.
Direito Econmico
o ramo do Direito que se compe das normas jurdicas que regulam a produo e
a circulao de produtos e servios, com vistas ao desenvolvimento econmico do
Pas, especialmente no que diz respeito ao controle do mercado interno, na luta e
disputa l estabelecida entre as empresas, bem como nos acertos e arranjos feitos
por elas para explorarem o mercado. So normas que regulam monoplios e
oligoplios, tentam impedir concorrncia desleal etc. Tais normas esto espalhadas
em leis esparsas, dentre as quais se destacam a CF, a Lei Antitruste (Lei 8.884/94),
a Lei de Economia Popular, a Lei de Livre Concorrncia etc.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
28
Direito do Consumidor
No Brasil est elaborado atravs do Cdigo de Defesa do Consumidor, que seu
principal instrumento. Em vigor desde 1/03/1991 (Lei 8.078/90), o CDC regula as
relaes potenciais ou efetivas entre consumidores e fornecedores de produtos e
servios.
As normas do CDC, institudas para a proteo e defesa do consumidor, so de
ordem pblica e interesse geral.
Consumidor, para esse sistema legal, "toda pessoa fsica ou jurdica que adquire
ou utiliza produto ou servio como destinatrio final" (art. 2 CDC), ao qual se
equipara "a coletividade de pessoas, ainda que indeterminreis, que haja intervindo
nas relaes de consumo" ( nico do art. 2 CDC). Equiparam-se tambm ao
consumidor todas as vtimas de evento danoso (art.17 CDC), bem como "todas as
pessoas determinveis ou no, expostas s prticas" comerciais (art. 29 CDC).
Fornecedor " toda pessoa fsica ou jurdica, pblica ou privada, nacional ou
estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades
de produo, montagem, criao, construo, transformao, importao,
exportao, distribuio ou comercializao de produtos ou prestao de servios"
(art. 3 CDC).
Produto " qualquer bem, mvel ou imvel, material ou imaterial" ( 1 do art. 3
CDC).
Servio " qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante
remunerao, inclusive as de natureza bancria, financeira, de crdito e securitria"
( 2 do art. 3 CDC). Est excluda da abrangncias do CDC, como se viu, a
prestao de servio oferecida a ttulo gratuito. As de carter trabalhista tambm
esto excludas, e continuam regidas pela CLT e demais normas jurdicas
trabalhistas.
As relaes existentes entre os prprios fornecedores, isto , de fornecedor a
fornecedor, continuam regidas pela legislao j existente (civil, comercial, penal
etc.).
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
29
Direito Ambiental
composto das normas jurdicas que cuidam do meio ambiente em geral, tais
como a proteo de matas, florestas e animais a serem preservados, o controle de
poluio e do lixo urbano etc.
Tais normas jurdicas esto fixadas na CF e em uma srie de leis esparsas.
Direito Internacional Privado
o ramo composto pelas normas jurdicas que regulam as relaes privadas no
mbito internacional.
Como as normas jurdicas tm vigncia e eficcia apenas no territrio do respectivo
Estado, s podem produzir efeitos em territrio de outro Estado se este aceitar.
Trata-se, de fato, de "conflito de leis" e por isso h que se definir qual a lei a ser
aplicada: em funo da nacionalidade ou domiclio da pessoa; da situao da
coisa, objeto do direito; e do lugar em que foi realizado o ato.
A norma jurdica fundamental que cuida do assunto a Lei de Introduo s
Normas do Direito Brasileiro (LINDB), somente em seus arts. 7 a 19.
O Direito Internacional privado nacional e pblico.
Direito Internacional Pblico
Compe-se das normas convencionais (tratados internacionais, tambm chamados
de convenes, pactos, convnios, acordos) e dos costumes Jurdicos
internacionais.
Tratado internacional o acordo realizado por Estados independentes, visando
ordenao, atravs de clusulas que se tornam normas jurdicas, de temas de
interesse comum. As normas estabelecidas nos tratados obrigam os Estados que
vierem a ratific-los, ou que os celebrarem, ou que a eles vierem a aderir.
O Estado pode aderir a um tratado com reservas, isto , ressalvando por escrito,
expressa e especificamente, que no acata determinadas clusulas e normas l
estabelecidas.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
30
Pode, tambm, o Estado, aps celebrar o tratado, aderir a ele ou ratific-lo, desistir
dele, atravs do uso da "denncia". Por esse instrumento, entregue a todos os
outros Estados que so parte no tratado, o Estado expressa que no vai mais
observar as clusulas e normas nele contidas. O tratado passa a ter vigncia e
obrigatoriedade no regime de direito interno, aps celebrado pelo Presidente da
Repblica (CF art. 84, VIII) e aprovado pelo Congresso Nacional (CF art. 49, I). Os
costumes Jurdicos internacionais so os usos observados e reconhecidos de
forma uniforme pelos Estados soberanos, nas suas relaes. No so exatamente
como os costumes Jurdicos da ordem interna.
So mais usos e prticas aceitos como obrigatrios pelos Estados que assim os
observarem, resultando, ento, dos atos reiterados dos Estados nas relaes da
esfera internacional.
Vide, tambm, o disposto no art. 5, 3 e 4, da CF (introduzidos pela EC 45/04).1
Ramos do Direito Privado
Importante a partir da CF de 1988, o Direito Privado perdeu boa parte do seu
carter individualista, havendo uma srie de limitaes relacionadas ordem
pblica (ex. no possvel se casar e na escritura renunciar ao dever de fidelidade
ou a outros deveres previstos no art. 1566, do CC; ex. arts. 187, 421 e 422, do CC).
Direito Civil
tambm conhecido como direito comum. Ele engloba as normas jurdicas que
regem, entre outros, a capacidade e o estado das pessoas, o nascimento, o fim, o
nome, a maioridade etc.; as relaes familiares (casamento, separao, divrcio,
relaes de parentesco, ptrio poder etc.), as relaes patrimoniais e obrigacionais
(direitos reais e pessoais, posse, propriedade, compra e venda, contrato etc.), a
sucesso hereditria (diviso, esplio, meao, testamentos etc.).
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
31
Seu principal diploma legal o Cdigo Civil Brasileiro (Lei 10.406/2002), bem como
outras leis esparsas (Lei do Inquilinato, Lei do Divrcio, Lei do Bem de Famlia,
Estatuto da Criana e do Adolescente etc.).
Direito Comercial (Empresarial)
Engloba as normas jurdicas que regulam a atividade comercial, entendida esta
como a de fabricao, produo, montagem, distribuio, comercializao etc. de
produtos, nas relaes estabelecidas entre as prprias pessoas que exercem tais
atividades, bem como os servios prestados de umas s outras.
Seu principal instrumento legal o Cdigo Civil de 2002, que revogou a primeira
parte do Cdigo Comercial, bem como este ltimo e outras leis extravagantes (Lei
de Falncias e Recuperao Judicial de Empresas, Lei das Sociedades por Cotas
de Responsabilidade Limitada, Lei das Sociedades Annimas, Lei da
Representao Comercial etc.).
NORMA JURDICA
um comando, um imperativo dirigido s aes dos indivduos. regra de conduta
social, sua finalidade regular as atividades dos sujeitos em suas relaes sociais.
A norma jurdica imputa certa ao ou comportamento a algum, que seu
destinatrio.
A norma jurdica pressupe 3 elementos:
a) hiptese previso abstrata de uma situao ou de um comportamento;
b) mandamento comando, ditame de carter obrigatrio;
c) sano conseqncia desfavorvel imputada a algum pela violao da
norma.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
32
Ex. art. 121 do Cdigo Penal: Matar algum. Pena recluso de 6 a 20 anos.
Hiptese: matar algum; mandamento: no mate; sano: recluso de 6 a 20
anos.
Pertence ao mundo do dever-ser (sllen), operando com modais denticos, que
so:
- proibio;
- obrigatoriedade;
- permisso.
Distingue-se das normas morais por ser positivada e pela sano (embora haja
normas sem sano, as chamadas leis imperfeitas).
Subsuno amoldar do fato concreto hiptese (abstrata) prevista em lei.
Sano conseqncia desfavorvel (mal justo) imposta quele que transgride a
norma.
Coero ameaa abstrata de sano.
Coao sano concretizada.
A norma jurdica, portanto, tem as seguintes caractersticas:
a) generalidade se dirige a todos, sem qualquer distino (eficcia erga omnes);
b) imperatividade impe deveres e condutas para os membros da coletividade;
c) permanncia perdura at que seja revogada ou por outra ou que perca a
eficcia;
d) competncia deve emanar da autoridade competente, com o respeito ao
processo de elaborao estabelecido na Constituio federal;
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
33
e) autorizante a norma autoriza ou no autoriza determinada conduta (Kelsen)
Classificao das normas jurdicas
Quanto hierarquia: Pirmide de Kelsen.
Quanto natureza de suas disposies
a) substantivas (materiais) criam, declaram e definem direito, deveres e relaes
jurdicas; Ex. o Cdigo Civil.
b) adjetivas (processuais) regulam o modo e o processo para acesso ao Poder
Judicirio. Ex. o Cdigo de Processo Civil.
Quanto aplicabilidade
a) auto-aplicveis entram em vigor independentemente de qualquer norma
posterior;
b) dependentes de complementao declaram expressamente sua
necessidade de complementao por outra norma. Ex. art. 7, XI, 192, 195, 5,
XXXII, CF.
c) dependentes de regulamentao designam geralmente que rgos do
Executivo definiro e detalharo sua aplicao e executoriedade. Surgem em forma
de decreto regulamentar. Ex. Decreto n. 99.684/90, que regulamentou a Lei
8.036/90, explicitando, detalhando, tratando de infraes e da fiscalizao do
FGTS.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
34
Quanto sistematizao
a) constitucionais previstas na CF ou em outras normas que a CF considera
como constitucionais (bloco de constitucionalidade art. 5, par. 3, da CF)
b) codificadas norma que prev a regulamentao unitria de um mesmo ramo
do direito (ex. CC, CPC etc.)
c) esparsas tratam, com especificidade, de certo tema de um dos ramos do
direito.
d) consolidadas regulam, de maneira unitria, leis pr-existentes (ex. CLT, que
formada por um conjunto de leis esparsas, que acabaram sendo reunidas num
corpo nico).
e) estatutrias regulamentao unitria dos interesses de uma categoria de
pessoas (Ex. Estatuto do Idoso, Estatuto do ndio, Estatuto da Criana e do
Adolescente etc.). O CDC no pode ser considerado um Estatuto, pois no h
como identificar quem consumidor (potencialmente todos, indistintamente, so
consumidores).
f) compiladas - repertrio de normas organizadas em ordem cronolgicas ou por
matria.
Quanto obrigatoriedade
a) cogentes ou injuntivas (de ordem pblica) so leis de ordem pblica e no
podem ser modificadas pela vontade das partes ou do juiz. So imperativas quando
ordenam um certo comportamento e so proibitivas quando vedam um
comportamento. Ex. art. 11 ao 21, 421 e 422, do Cdigo Civil;
b) dispositivas ou supletivas (permissivas) tutelam interesses patrimoniais e,
por isso, podem ser modificadas pela vontade das partes. Ex. normas contratuais.
Quanto esfera do poder de que emanam
Federais, estaduais e municipais.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
35
Quanto sano
a) mais que perfeitas nulidade e pena. Pessoa casada se casar: art. 1548, II,
CC e 235, CP;
b) perfeitas nulidade. Alienao de bens sem outorga uxria, que torna nulo o
negcio;
c) menos que perfeitas pena: o divorciado que se casar sem realizar a partilha
dos bens sofrer como sano o regime da separao de bens, no obstante a
validade de seu novo casamento;
d) imperfeitas no h conseqncia (ou porque a norma no prev
conseqncia em caso de violao ou por tratar-se de norma meramente
explicativa, interpretativa). Ex. norma municipal que determina que antes de
adentrar ao elevador deve-se verificar se o mesmo se encontra parado no andar;
ex. art. 327, do CP, que define o que funcionrio pblico para fins penais.
Leis de efeito concreto
Produzem efeitos imediatos, pois trazem em si mesmas o resultado especfico
pretendido. Ex. lei que probe certa atividade. Via de regra, no cabe Mandado de
Segurana contra a lei, exceto se tratar-se, no caso, de lei de efeito concreto.
Leis quanto especialidade
a) normas gerais so as normas que discorrem sobre todo um ramo do Direito.
Temos, como exemplo, o Cdigo Civil que a norma geral do ramo civil;
b) normas especiais so as que regulam determinado ramo do Direito. Exemplo
claro a Lei do Divrcio, que trata de um aspecto dentro do ramo civil. Dentre as
leis especiais, h as de carter extravagante, que tm por objetivo cuidar de tema
j codificado. o caso da Lei de Locaes que modificou parte do Cdigo Civil
quanto ao referido contrato que, por sua vez, tambm era abordado de maneira
geral.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
36
A lei especial prefervel em relao lei geral, ante o fato de a primeira ter sido
elaborada com maior rigor pelo jurista, versando sobre uma determinada matria
com maior acuidade. Em verdade, h uma estratgia em criar leis especiais: evitar
que a lei geral seja demasiadamente ampla. Logo, tanto a lei geral quanto a lei
especial devem coexistir pacificamente.
Caso haja antinomia (conflito entre as disposies das normas), deve-se preferir a
norma mais recente, entendendo-se que a norma mais antiga foi tacitamente
revogada pela norma mais nova.
Quanto cronologia
a) permanentes no tm prazo certo para vigorar, ou seja, tm prazo de vigncia
indeterminado, vigendo at que outra a modifique ou revogue (artigo 2. da Lei de
Introduo s Normas do Direito Brasileiro - LINDB;
b) temporrias tm prazo certo para vigncia, subdividindo-se em:
- expressas: os prazos de vigncia esto expressamente disciplinados na prpria
norma. Nesse caso, a norma tem contedo auto-revogatrio (leis de vigncia
temporria);
- tcitas: apesar de tais normas no terem prazo de vigncia, so leis que vigoram
apenas para uma situao especial. Com a cessao do fato, ou da situao,
cessa tambm a norma (leis excepcionais).
A norma poder ser eficaz e no ser efetiva, como no caso do casamento pelo
regime dotal. uma norma eficaz, considerando sua no-revogao; no entanto,
no efetiva, pois caiu em desuso.
O princpio fundamental de que a lei posterior revoga a anterior.
A ausncia de norma denominada anomia ou (lacuna); o conflito (contradio)
entre normas chamado antinomia.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
37
INTERPRETAO DA NORMA JURDICA
O direito no composto apenas por normas, mas, tambm, por princpios. Essa,
pois a idia do chamado sistema no Direito. As normas nunca devem ser vistas
isoladamente, mas, sim, interagindo dentro do sistema (norma + outras normas +
princpios).
Nesse sentido, cabe ao operador do Direito a tarefa de descobrir a inteno do
legislador e a eventual incidncia e alcance do texto normativo ao caso concreto.
Para alguns autores, a exemplo de EROS ROBERTO GRAU, a norma surge pelo
confronto entre texto e caso concreto. Em razo disso, interpretar e aplicar o Direito
so expresses sinnimas. A interpretao do direito no pode ser dissociada da
sua aplicao, afirma que interpretar dar concreo (= concretizar) ao direito,
reconhecendo para tanto, como nico intrprete, verdadeiramente, autntico o Juiz,
que o responsvel pela construo da norma deciso.
Cabe, pois, a interpretao, para justificar um posicionamento adotado. O prprio
EROS GRAU diz que o juiz, ao se deparar com o caso concreto, j toma uma
deciso. Aps, vai buscar no sistema jurdico, embasamento para justificar sua
deciso. Em virtude disso, o mesmo caso, submetido a diversos juzes, no ter
deciso uniforme. Eis a atividade interpretativa.
EROS GRAU faz interessante metfora em relao interferncia do pesquisador
no objeto pesquisado: a metfora da Vnus de Milo. A metfora retrata a
contratao de 03 artistas para produzirem cada um, uma esttua da Vnus de
Milo. Como resultado, cada um produzir uma esttua diferente, mesmo todos
tendo o mesmo objeto. No so trs esttuas totalmente distintas umas da outras
(afinal so todas Vnus de Milo), mas no so as mesmas esttuas. Esse
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
38
tambm o resultado da interpretao, sendo distinta de acordo com o seu
intrprete.
A exegese um momento muito rico, mpar e necessrio. Os casos no so
idnticos, podem ser parecidos, mas nunca haver um caso idntico a outro. Por
essa razo, EROS GRAU chegou a dizer, em 1997, que a smula vinculante seria
um golpe, um estelionato, pois tolheria a atividade interpretativa do juiz.
Logo, na opinio de referido autor, a interpretao sinnimo de prudncia
(baseado nos ensinamentos de Aristteles), da falar-se em jurisprudncia,
sinnimo de decises reiteradas dos Tribunais (Brasil) ou entende-la como
sinnimo de Cincia do Direito (EUA e Europa).
Diferenas:
Hermenutica cincia que cuida da interpretao.
Exegese atividade prtica, concreta, de interpretar o Direito.
Importante: Todo exegeta um hermeneuta, mas nem todo hermeneuta um
exegeta (MIGUEL REALE).
Interpretao, portanto, o processo lgico que procura estabelecer a vontade
contida na norma jurdica. Por meio dela descobre-se O VERDADEIRO SENTIDO
DA LEI.
FUNES DA INTERPRETAO
MARIA HELENA DINIZ menciona que as funes da interpretao so as
seguintes:
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
39
a) conferir a aplicabilidade da norma jurdica s relaes sociais que lhe deram
origem;
b) estender o sentido da norma a relaes novas, inditas ao tempo de sua
criao;
c) temperar o alcance do preceito normativo, para faz-lo corresponder s
necessidades reais e atuais de carter social, ou seja, aos seus fins sociais e aos
valores que pretende garantir.
IMPRESCINDIBILIDADE DA INTERPRETAO
A interpretao sempre necessria, logo, o brocardo in claris cessat interpretatio
deve ser refutado, pois, para se chegar concluso de que uma norma clara,
necessrio, pois, que se a tenha interpretado anteriormente.
preciso que se tenha em mente o seguinte: na lei no h palavras inteis, tudo
tem um sentido e no se pode admitir a chamada antinomia (contradio).
Regras (ou tcnicas) de interpretao
Cumpre destacar que todas as regras (ou tcnicas) de interpretao a seguir
explicitadas no se operam isoladamente. Ao contrrio, elas se completam. KARL
ENGISCH recomenda que o cientista do Direito, na hermenutica, utilize todos os
mtodos (ou regras) a seguir apontados.
a) autntica HANS KELSEN utilizava essa denominao para designar a
interpretao contida na prpria norma jurdica (normas explicativas). No bem
uma interpretao, a prpria norma, pois procede do prprio legislador, sob a
forma de outra lei. KELSEN denominava as demais interpretaes como
inautnticas. Toda vez que uma lei elaborada para interpretar outra lei, est
presente a interpretao autntica (a fonte a mesma). Ex. art. 327 do CP, que
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
40
define o que funcionrio pblico; art. 150, 4 e 5, do CP, que definem o que
casa;
b) judicial feita por juzes e tribunais, por meio de suas decises. Essas
decises s tm fora no prprio caso julgado. Mas quando o mesmo assunto
decidido de forma reiterada, uniforme, pelos tribunais, pode influir em casos
semelhantes. Trata-se da jurisprudncia (tambm chamada de costume
judicirio). No obrigatria, exceto: smulas vinculantes (103-A, CF) e nas
decises proferidas pelo STF em ADI e ADECON (art. 102, 2, CF).
c) doutrinria a interpretao dos estudiosos do Direito, dos comentadores,
dos juristas, dos autores de livros, artigos, teses etc. Orienta, influi decises,
especialmente quando a interpretao defendida por grande nmero de juristas.
Tambm no obrigatria.
d) gramatical ocorre por meio da anlise das palavras do texto normativo, de
suas funes sintticas e semnticas. Por meio dela o intrprete mantm o primeiro
contato com o texto posto. Ex. art. 334, I, do CPC: fatos notrios independem de
prova. O que fato notrio??? Por meio da interpretao gramatical, tambm, se
corrigem erros de redao encontrados no texto normativo. Ex. CC/1916
art. 6 So incapazes, relativamente a certos atos (art. 147, I), ou maneira de os
exercer: I - os maiores de 16 (dezesseis) e os menores de 21 (vinte e um) anos
(arts. 154 a 156);
Ex. art. 421, CC/2002, onde consta erroneamente a expresso liberdade de
contratar, quando, em verdade, deveria constar liberdade contratual.
e) lgica leva em considerao os instrumentos fornecidos pela lgica para a
interpretao. Ex. artigo 235 do CP define o crime de BIGAMIA (BI = dois; isto ;
casar duas vezes). E trs, quatro, cinco casamentos, no seria crime? Claro que
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
41
sim (a poligamia est includa na bigamia). Se a lei probe o menos, deve proibir
tambm o mais.
f) sistemtica leva em conta norma inserida dentro do sistema jurdico (norma
isolada + demais normas + princpios), no somente a norma isolada. Ex. art. 157,
3, do CP - matou para roubar (latrocnio). Vai a jri? No, pois o crime est
inserido no ttulo dos crimes contra o patrimnio, dentro do CP.
g) teleolgica (logos de lo razonable) considera os fins os quais a norma se
dirige. Leva em conta a finalidade para a qual a norma foi criada. No se vale de
um raciocnio matemtico, mas, sim de uma lgica do razovel, do humano. Est
no artigo 5 da LINDB e um comando ao juiz, no uma faculdade. Ex. O Estatuto
da Criana e do Adolescente criou normas incriminadoras. Qual o fim? Proteger
crianas e adolescentes.
A expresso logos de lo razonable foi criada pelo jusfilsofo mexicano LUIS
RECASENS SICHES, que dissertou sobre o assunto em vrias oportunidades,
especialmente no livro "Nueva Filosofia de la Interpretacin del Derecho", publicado
em 1956, e referido em "Tratado General de Sociologia", Mxico, 1974, em nota de
rodap.
possvel, verifica-la, tambm, nas clusulas gerais, tcnica empregada na
elaborao do novo Cdigo Civil. Juiz tem campo maior para decidir, mas o vetor
ser a dignidade da pessoa humana.
h) histrica se preocupa em investigar os antecedentes da norma, o momento
histrico no qual ela surgiu, quais eram as condies sociais, polticas, econmicas
da poca. Ex. art. 233, do CP: ato obsceno. O ato obsceno de 1940, poca em que
o CP foi elaborado, tinha outro sentido em relao ao ato obsceno de hoje.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
42
i) declarativa (especificadora) verifica-se que o esprito da norma corresponde
exatamente letra da norma. Ex. artigo 141, inciso III, do CP: a expresso vrias
pessoas deve ser entendida como mais de duas pessoas, porque sempre que o
CP se refere se refere a um mnimo de duas pessoas, o faz de forma expressa
(como se verifica nos artigos 155, 4 , IV, 157, 2, II e 226, I, do CP)
j) restritiva verifica-se que a letra da norma falou mais que o esprito da norma,
logo, necessrio reduzir o alcance do texto. Ex. art. 28 do CP quando fala em
emoo, paixo e embriaguez no inclui essas formas patolgicas (porque a se
aplica o artigo 26). Ento o alcance do artigo 28 restrito s formas no
patolgicas.
l) extensiva verifica-se que a letra da norma falou menos que o esprito da
norma, logo, necessrio ampliar o alcance do texto. Ex. - artigo 260 do CP
...estrada de ferro... E o metr? tambm estrada de ferro? Sim, por extenso... ;
artigo 176, do CP restaurante (inclui lanchonete, bar etc.); artigo 130, do CP a
lei incrimina no s a situao de perigo, mas, tambm, o prprio dano.
m) progressiva o intrprete vale-se da interpretao progressiva quando novas
concepes entram no mbito da lei. As transformaes sociais, a evoluo
cientfica e jurdica determinam o aparecimento de novos conceitos que atualizam a
lei, sem necessidade de alterao legislativa. Ex.: artigo 129, 1, II do CP fala em
perigo de vida e o artigo 131 quando fala em molstia grave. Diante do avano
da Medicina, o perigo de vida e a molstia grave de 1940 (quando essas normas
foram elaboradas) no so os mesmos dos dias atuais. O mesmo se diga em
relao a ato libidinoso (art. 217-A, CP) e ato obsceno (art. 233, CP).
n) analgica permitida sempre que, aps uma frmula casustica, segue-se
uma clusula genrica. Aplica-se a casos anlogos.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
43
Exemplos:
- artigo 71 do CP e outras semelhantes
- artigo 61, II, c ou outro recurso
- artigo 157 por qualquer meio
- artigo 121, 2, IV ou outro recurso
- artigo 121, 2, III ou de que possam resultar perigo comum
Artigo 61
- frmula casustica: traio, de emboscada, ou mediante dissimulao.
- frmula genrica: ou outro recurso que dificultou ou tornou impossvel a defesa do
ofendido.
No se confundem analogia e interpretao analgica. Analogia mecanismo
de integrao da lei (art. 4, da LINDB e art. 126, do CPC). No interpretao. Na
analogia aplica-se o contedo de uma lei a casos no abrangidos pela vontade da
prpria lei.
o) legislao comparada interpreta-se a norma comparando-a com o direito
vigente em outros pases.
A Boa-f Objetiva como paradigma a ser considerado pelo intrprete
Boa-f objetiva uma regra de conduta a ser observada pelas partes envolvidas
numa relao jurdica. composta pelo dever fundamental de agir em
conformidade com os parmetros de lealdade e honestidade, antes, durante e aps
o exaurimento da relao jurdica (fit quod dicitur). uma clusula geral, no um
princpio. Ao interpretar-se a norma jurdica, sempre deve ser levado em conta o
paradigma da boa-f objetiva, decorrncia lgica do princpio constitucional da
dignidade da pessoa humana (art. 1, III, da CF).
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
44
Recordando: qual regra de interpretao a correta? Todas, tudo depender do
caso concreto. Em princpio, a primeira a ser utilizada a gramatical.
A LEI DE INTRODUO S NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO (LINDB) (Dec.
Lei 4.657/42, alterado pela Lei 12.376, de 30 de dezembro de 2010)
Em verdade deveria ser denominada Lei Geral de Aplicao das Normas
Jurdicas, vez que seria uma nomenclatura mais tcnica. aplicvel a qualquer
ramo do Direito (com exceo do Penal e do Tributrio, no qual h aplicao
mitigada da LINDB).
A LINDB estabelece os alicerces de nosso sistema jurdico (arts. 1 ao 6) e
constitui nosso Direito Internacional Privado (arts. 7 a 19), sendo considerada
norma de sobredireito ou norma de apoio, de acordo com a definio da
doutrina, apresentando institutos e regras que abrangem todos os ramos do Direito.
Podemos encontrar vrios objetos para a referida lei. Os principais so:
Alcance da LINDB
Art. 1 - eficcia temporal das normas
Art. 2 antinomia conflito de normas validade e vigncia
Art. 3 - obrigatoriedade das normas por meio de erro de direito (princpio da
inescusabilidade)
Art. 4 - anomia (ausncia norma) figura da lacuna (aporia)
Art. 5 - hermenutica jurdica (regra fundamental)
Art. 6 - direito intertemporal (direito adquirido)
Art. 7 a 19 direito internacional privado (normas de conexo)
A LINB considerada lex legum do ordenamento jurdico, ou seja, uma
sobrenorma, pois sobrepaira o ordenamento. No sobrenorma por hierarquia, vez
que ela um decreto que hoje lei ordinria.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
45
A LINDB no contm regras de comportamento. Seu tema somente norma
jurdica e direito internacional privado.
Integrao da norma jurdica
Uma das caractersticas do direito dogmtico a proibio do non liquet, isto , o
magistrado deve solucionar todos os conflitos intersubjetivos compreendidos nos
limites de sua jurisdio e competncia. Ou seja, ele no pode alegar
desconhecimento ou lacuna (ausncia) da lei.
O sistema apresenta solues distintas:
a) quanto ao desconhecimento: o juiz s pode aleg-lo quando tratar-se de
direito municipal e estadual fora da sua jurisdio, direito consuetudinrio
(costumeiro) e estrangeiro. a regra do art. 337, do CPC. Exceo: para os pases
integrantes do Mercosul, existe o protocolo de Las Leas (Dec. 5/92), pelo qual se
acordou que o juiz no pode alegar desconhecimento nem pedir traduo
juramentada de leis de tais pases.
b) quanto s lacunas: o art. 4 da LINDB diz que quando a lei for omissa, o juiz
decidir o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princpios gerais do
direito. Lacuna/aporia: uma situao conflituosa que no encontra, em princpio,
uma soluo no ordenamento jurdico.
Quanto classificao ela pode ser:
a) normativa: inexistncia de lei no caso concreto;
b) ontolgica: a norma inadequada ao caso concreto ex: 1412, 2, CC;
c) axiolgica: a lei injusta para o caso concreto.
Assim tem-se a lei como mecanismo principal para a soluo de lacunas
(integrao da norma), e como mecanismos acessrios, a analogia, os costumes e
os princpios gerais do direito. Entretanto, analogia um uso indireto da lei no caso
concreto (onde h a mesma razo, deve haver o mesmo direito).
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
46
Deve-se obedecer ordem cronolgica do art. 4, da LINDB no caso concreto:
tentar a lei, se no der, usa-se a analogia e se no der usam-se os costumes...
MTODOS DE INTEGRAO DA NORMA JURDICA
a) analogia: o preenchimento de uma lacuna com base em norma j existente
para caso semelhante, pois, onde h a mesma razo, deve haver o mesmo direito.
Espcies:
- analogia legis: o juiz compara com a lei j existente. Ex. para casos
referentes ao contrato de distribuio, o juiz se vale da lei de
representao comercial;
- analogia iuris: o juiz compara com o sistema jurdico como um todo,
no se valendo de uma norma, mas de vrias normas.
b) costume: alm de fonte do direito, o costume mecanismo de integrao da
norma jurdica. Nasce em um determinado grupo social e tem como caractersticas
a diuturnidade (reiterao de comportamento no tempo) e a opinio necessitatis
(crena na obrigatoriedade em agir de determinada maneira). Obs: nus da parte
que alegar os costumes prov-los (art. 337, CPC).
c) princpios gerais de direito: so aqueles princpios sobre os quais a ordem
jurdica se constri. So princpios de justia, de liberdade, de igualdade, de
dignidade da pessoa humana. Constituem regramentos bsicos aplicveis a um
determinado instituto ou ramo jurdico, visando a auxiliar o aplicador do Direito na
busca da justia e da pacificao social. Ex. a mxima romana que preconiza que
os mandamentos do direito so viver honestamente, no lesar a ningum e dar a
cada um o que seu ou, ainda no direito romano, quando se afirmava que os
contratos deveriam ser respeitados (pacta sunt servanda).
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
47
Apesar do art. 4, da LINDB, silenciar, a doutrina admite um 4 critrio para
integrao da norma jurdica:
d) equidade: consiste em aplicar a lei de modo justo. Vem do latim aequitas,
designa equilbrio. a idia de justia que o juiz tem em funo do caso concreto.
Seu uso s permitido se o sistema permitir, devido ao alto grau de subjetivismo.
Exemplos: fixao de honorrios nas aes que no possuem valor econmico (art.
20, 3, CPC); reduo de clusula penal (art. 413, par. nico, CC); reduo de
valor de indenizao quando houver desproporo entre o dano e o grau de culpa
(art. 944, par. nico, CC).
Antinomia
a incompatibilidade de normas dentro do sistema jurdico, impossibilitando a
incidncia e a aplicao de uma delas em virtude de no ser consistente na
presena de outra norma ou fonte formal do direito
Classificao:
1- Quanto solubilidade:
a) reais: aquelas que no possuem qualquer regramento de soluo. O
intrprete deve apenas resolv-la no caso concreto sem elimin-la pelos critrios
hierrquico, cronolgico e da especialidade.
b) aparentes: so as contradies solveis por meio dos critrios citados
2- Quanto natureza:
a) prprias: se verificam por motivos formais, visto que enquanto uma norma
permite a outra probe. Ex: o CC probe o casamento entre tios e sobrinhos, mas o
Decreto 3200/41 autoriza-o desde que elaborado um laudo mdico que comprove
no haver prejuzo prole (malformao etc.);
b) imprprias: so as contradies que provm do contedo material das
normas. Ex: conflito entre os princpios acolhidos por normas que protegem valores
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
48
opostos, como no caso de uma norma que prestigia as empresas de tabaco e outra
que restringe a liberdade de sua comercializao.
Soluo das antinomias
1- critrio hierrquico: a lei superior revoga as leis inferiores, pouco
importando o momento de sua entrada em vigor
2- critrio cronolgico: a lei posterior revoga as lei anteriores em 3 situaes,
segundo o art. 2, 1, LINDB:
a) quando tem um comando revogador da lei ou dos dispositivos da lei
anterior;
b) quando tem incompatibilidade com ela, ou seja, quando tem um comando
que contraria ou quando impossibilita a aplicao de preceito da lei anterior
c) quando regula inteiramente a matria disciplinada pela lei anterior
Obs: quando a lei nova estabelea disposies compatveis com as j existentes,
em que possvel haver harmonizao, mantm-se a vigncia da lei anterior, pois,
como j dito, a existncia de normas gerais e especiais estratgica, busca evitar
que as normas gerais sejam muito extensas. Nesse sentido, elas devem (salvo
antinomias) coexistir pacificamente.
3- Critrio da especialidade: lei geral no revoga lei especial e vice-versa.
Entretanto, sempre prefervel que seja aplicada a lei pois, como mencionado,
ambas devem coexistir. um critrio meramente doutrinrio e principiolgico.
Antinomia de segundo grau: o conflito entre os critrios de soluo das
antinomias. O critrio hierrquico sempre se sobrepe aos outros e o critrio da
especialidade se sobrepe ao cronolgico.
Para VITOR KMPEL, o critrio da especialidade subsidirio aos outros. S se
aplica quando houver lacunas na lei geral ou quando houver comando limitador (ex:
arts. 1.711, 1.377, CC) que manda aplicar esse critrio.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
49
No h consenso, mas o melhor caminho escolha da norma que atenda ao
princpio mximo da justia no caso concreto e aos princpios fundamentais.
EFICCIA DA LEI NO TEMPO
Processo legislativo: iniciativa (origem do projeto) aprovao (discusso e
votao da matria nas Cmaras de Constituio e Justia tambm nas Comisses
Temticas, em ambas as Casas: cmara dos deputados e senado) sano
presidencial promulgao (confere existncia e autenticidade lei) publicao
(obrigatoriedade da lei) vacatio legis entrada em vigor da norma vigncia no
mundo jurdico at possvel revogao.
Planos de efeito da norma:
1- Existncia: o reconhecimento da autenticidade da norma determinando
seu ingresso no sistema jurdico. D-se com a sano presidencial, mas sua fora
executria com a promulgao.
2- Validade: a norma em consonncia com o ordenamento jurdico (validade
material) e com total observncia do seu processo de elaborao (validade formal)
3- Eficcia: a potencialidade de produzir efeitos concretos. D-se com a
publicao (se no tem vacatio) ou no primeiro dia aps a vacatio.
4- Efetividade: a eficcia social (reconhecer que a norma pegou). Nesse
plano h que se estabelecer a diferena entre vigncia e vigor. Vigncia o
perodo de tempo em que a norma goza de eficcia at sua revogao. Vigor a
fora vinculante da norma, fator condicionante do direito aos sujeitos.
Vacatio legis
o fenmeno jurdico que implica na suspenso da eficcia/obrigatoriedade da
norma, aps a mesma ter sido publicada. Portanto, a norma em vacatio nunca
obriga, s se pode entrar em vigor e depois retroagir.
-
TEORIA GERAL E HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO Prof. Jos E. Melhen - 1 bimestre - 2011
50
O objetivo da vacatio legis dar