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REVISTA PORTUGUESA DE PNEUMOLOGIA Vol XII N.º 3 Maio/Junho 2006 281 Ventilação mecânica e obstinação terapêutica ou distanásia, a dialéctica da alta tecnologia em medicina intensiva Mechanical ventilation and medical futility or dysthanasia, the dialectic of high technology in intensive medicine Filipe Monteiro * Resumo Resumo Resumo Resumo Resumo Distanásia ou qualquer um dos seus sinónimos é uma consequência do excesso terapêutico em relação ao prognóstico esperado. A obstinação terapêutica é um dos dilemas éticos mais angustiantes no quotidiano de medicina intensiva, apesar de a sua apreciação encontrar um suporte normativo em várias instituições e organizações. A manutenção ou não suspensão da ventilação mecânica numa determinada circunstância de fim de vida pode ser considerado como um exemplo paradigmático de obstinação terapêutica. A compreensão desta postura passa pela análise e Artigo de Opinião Opinion Article Abstract Abstract Abstract Abstract Abstract Dysthanasia or any of its synonyms is a conse- quence of excessive technical science, without any reasonable chance of achieving a therapeutic be- nefit for the patient. Medical futility is a distressing ethical dilemma of intensive care medicine. Its recognition has led to a precept support in various institutions and or- ganizations. Not withdrawing or withholding mechanical ven- tilation in certain circumstances can be considered as a paradigmatic model of medical futility. The understanding of this posture implies a philo- * Assistente Hospitalar Graduado no Serviço de Pneumologia do Hospital de Santa Maria, Lisboa. Mestre em Bioética. Recebido para publicação/received for publication: 06.03.08 Aceite para publicação/accepted for publication: 06.03.30

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Ventilação Mecânica e Obstinação Terapêutica ouDistanásia, a Dialéctica da Alta Tecnologia em Medicina IntensivaFilipe Monteiro

Ventilação mecânica e obstinação terapêutica oudistanásia, a dialéctica da alta tecnologia em medicinaintensiva

Mechanical ventilation and medical futility ordysthanasia, the dialectic of high technology in intensivemedicine

Filipe Monteiro*

ResumoResumoResumoResumoResumoDistanásia ou qualquer um dos seus sinónimos éuma consequência do excesso terapêutico emrelação ao prognóstico esperado. A obstinaçãoterapêutica é um dos dilemas éticos maisangustiantes no quotidiano de medicina intensiva,apesar de a sua apreciação encontrar um suportenormativo em várias instituições e organizações.A manutenção ou não suspensão da ventilaçãomecânica numa determinada circunstância de fimde vida pode ser considerado como um exemploparadigmático de obstinação terapêutica.A compreensão desta postura passa pela análise e

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AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractDysthanasia or any of its synonyms is a conse-quence of excessive technical science, without anyreasonable chance of achieving a therapeutic be-nefit for the patient. Medical futility is a distressing ethical dilemma ofintensive care medicine. Its recognition has led toa precept support in various institutions and or-ganizations.Not withdrawing or withholding mechanical ven-tilation in certain circumstances can be consideredas a paradigmatic model of medical futility.The understanding of this posture implies a philo-

* Assistente Hospitalar Graduado no Serviço de Pneumologia do Hospital de Santa Maria, Lisboa. Mestre em Bioética.

Recebido para publicação/received for publication: 06.03.08Aceite para publicação/accepted for publication: 06.03.30

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A ética, ramo da filosofia que estuda osfactores que determinam a condutahumana em geral, tem como objectivo,no que respeita à medicina, a prossecuçãode um conjunto de regras de condutamoral, deontológica e científica dosprofissionais de saúde em relação aosdoentes. É sabido que, neste relaciona-mento entre o médico e o doente, atecnologia tem vindo a ocupar um espaçoimprescindível e a ganhar, rápida e pro-gressivamente, uma relevância cada vezmaior.O avanço no campo da tecnociência temdespertado, em alguns sectores dassociedades dos países mais desenvolvidos,preocupações éticas relacionadas com asconsequências que uma utilização indiscri-minada das suas realizações possa vir a terna vida dos indivíduos e das respectivas

comunidades. No que diz respeito àmedicina, a inquietude tem estadocentrada nas questões da eutanásia, daclonagem, das células estaminais e dosembriões excedentários, entre outras. Sempôr minimamente em causa a reflexão queestes temas merecem, parece-nos, con-tudo, que existem outras questões resul-tantes da aplicação da alta tecnologia noquotidiano da prática médica que deviamobter igual ponderação, mas que têmpassado à margem da contenda. Referimo--nos à questão da obstinação terapêutica(OT), um dilema ético que não tem gran-jeado, em nosso entender, a reflexão e odebate que seriam de esperar, tendo emconsideração que é um problema vividono dia-a-dia das unidades de cuidadosintensivos de todas as instituições hospita-lares e não uma questão em abstracto ou

reflexão do acto médico à luz de alguns conceitosético-filosóficos.

Rev Port Pneumol 2006; XII (3): 281-291

Palavras-chave: Ética, obstinação terapêutica,distanásia, medicina intensiva.

sophical approach and reflexion of medical prac-tice.

Rev Port Pneumol 2006; XII (3): 281-291

Key-words: Ethics, medical futility, dysthanasia,intensive medicine.

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de um futuro mais ou menos próximo.Entenda-se por OT uma atitude tera-pêutica excessiva (meios desproporcio-nados) em relação a uma determinadasituação e ao respectivo prognóstico. Poroutras palavras, trata-se de uma situaçãoem que há uma manutenção ou uma nãosuspensão da escalada terapêutica numacircunstância de fim de vida. A escaladaterapêutica implica determinados trata-mentos, nomeadamente a ventilaçãomecânica (o seu início ou o seu prolonga-mento), a hemodiálise, as manobras dereanimação, a alimentação artificial, asaminas simpaticomiméticas, etc.A OT é referida pelos autores francófonoscomo «encarniçamento terapêutico»,enquanto os anglo-saxónicos preferem aexpressão «futilidade terapêutica». Estasituação é também, por vezes, descritacomo distanásia (de origem grega, dys,«mal» ou «algo mal feito», e thánatos,«morte»). Este termo não é um sinónimona verdadeira acepção da palavra, dadoque, enquanto as expressões anteriores têmcomo fundamento a insistência numtratamento desenquadrado em relação aoprognóstico esperado, a distanásia implicaatrasar o processo da morte através da-quela atitude terapêutica. Contudo, naprática, é uma palavra utilizada com omesmo significado.Numa perspectiva ética, a OT pode seranalisada sob vários prismas. Decidimosconsiderar dois aspectos, que apresentamosem seguida.Em primeiro lugar, importará demonstrarque a OT não vai, em nosso entender, aoencontro dos objectivos do acto médico,onde o tratamento a instituir deve estarde acordo com o prognóstico esperado;

assim sendo, não respeita os princípioséticos — beneficência, não maleficência,autonomia e justiça — que devem reger omesmo. Nesta reflexão, tivemos emconsideração apenas os princípios debeneficência e de não maleficência,nomeadamente no que diz respeito aodever de não infligir o sofrimento e ao desuprimir o mal ou o sofrimento.Em segundo lugar, convirá tentar encon-trar uma explicação para a OT.Escolhemos, como paradigma de OT, aventilação mecânica prolongada numasituação de insuficiência respiratória agudaou crónica agudizada, nos estádios ter-minais de determinadas patologias. Estatemática tem sido, aliás, sede de inúmerosartigos em revistas da especialidade.1

Neste estudo, englobamos, a título exem-plificativo, quatro patologias: a pneumo-nia a Pneumocystis carinii nos doentes com asíndroma da imunodeficiência adquirida(SIDA), a neoplasia, a fibrose pulmonaridiopática e a doença pulmonar obstrutivacrónica (DPOC).No que diz respeito à primeira destaspatologias, a pneumonia a Pneumocystiscarinii, o prognóstico passou por trêsperíodos distintos2: antes de 1985, entre1986 e 1993, e a seguir a 1993. No primeiroperíodo, o prognóstico era francamentemau, sendo a mortalidade altíssima. Osegundo período correspondeu à intro-dução de agentes anti-retrovirais no trata-mento da SIDA e à corticoterapiaassociada ao antibiótico recomendado napneumonia a Pneumocystis carinii, o que se

1 Simonds, A. K. Simonds. Ethics and decision making inend stage lung disease.Thorax 2003; 58: 272-277.

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repercutiu numa melhoria significativa noprognóstico. No terceiro período, apesarda diminuição no número de doentes compneumonia, assistiu-se novamente a umagravamento no prognóstico;3 provavel-mente porque os doentes que adquirem apneumonia já o fazem em plena terapêuticacom anti-retrovirais e, ainda, porque aquelaevolui para uma insuficiência respiratóriacom necessidade de ventilação mecânica,não obstante a terapêutica com antibióticoe corticóides.No que diz respeito à duração da ventilaçãomecânica, há um estudo que demonstra quenão há sobreviventes quando o período deventilação ultrapassa os 15 dias.4 Contudo,o número de doentes envolvido nesteestudo era pequeno e houve outros estudosque foram discordantes.Em relação aos doentes com neoplasia,independentemente da sua localização,quando estes são internados em cuidadosintensivos por necessidade de ventilaçãomecânica decorrente de falência respira-tória, o prognóstico é também muitosombrio.5

Foi inclusivamente estudada uma situaçãoem que qualquer atitude terapêutica podeser considerada como um exemplo defutilidade.6 Na investigação em causa, osdoentes sujeitos a transplante da medula,com necessidade de ventilação mecânicapor lesão pulmonar aguda e de aminassimpaticomiméticas por mais de 4 horas,associada a falência hepática ou renal,acabaram por não sobreviver (mortalidadede 100%). Este estudo serviu de base paraprotocolos em várias instituições hospi-talares e, assim, os doentes naquelascondições passaram a ser desligados doventilador.

Nos doentes com fibrose pulmonaridiopática em estádio avançado e quenecessitem de ventilação mecânica porqualquer intercorrência, o prognóstico étambém deveras desanimador, chegandoalguns estudos, nestes casos, a propor aterapêutica paliativa como alternativa àventilação mecânica.7 Esta seria reco-mendada somente para aquelas situaçõesque estivessem indicadas para o trans-plante pulmonar.88

Por último, no que se refere aos doentescom a doença pulmonar obstrutiva cró-nica em fase avançada e insuficiênciarespiratória crónica agudizada comnecessidade de ventilação mecânicaprolongada — superior a 21 dias —, apesarde o prognóstico em relação ao desmameventilatório ser favorável na maioria doscasos, numa pequena percentagem (cercade 20%) a evolução é pouco favorável;mesmo naqueles que são sujeitos atraqueostomia.9

A experiência da Unidade de CuidadosIntensivos Respiratórios (UCIR) doServiço de Pneumologia (director: Prof.Doutor Bugalho de Almeida) do Hospi-tal de Santa Maria, local onde exercemosa nossa actividade clínica, é exemplificadapelo quadro e pela figura em anexo.Assim, o Quadro I mostra a mortalidadenas patologias acima referidas, enquantoa Fig. 1 apresenta, em termos globais, amortalidade na ventilação mecânicaprolongada (período ≥ 28 dias).

S Tern, tern JB, et al. Mal H, Groussard O, Brugière O,Marceau A, Jebrak G, Michel F. Prognosis of patients withadvanced idiopathic pulmonary fibrosis requiring mechani-cal ventilation for acute respiratory failure. Chest 2001;120:213-219.

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Do exposto se infere que, nas fasesavançadas de algumas patologias pul-monares complicadas com insuficiênciarespiratória, a instituição da ventilaçãomecânica e o seu eventual prolongamentono tempo devem merecer uma reflexãocuidada. De facto, a instituição ou ainsistência nesta atitude podem desvirtuara essência do acto médico, originando umasituação de manifesta obstinação tera-pêutica.A obstinação terapêutica por parte dosmédicos não se verifica apenas numadeterminada especialidade médica ou numdeterminado país. Num estudo realizadoem 16 países da Europa Ocidental,verificou-se que cerca de 73% dosintensivistas admitiam, na sua unidade,doentes sem qualquer perspectiva de umprognóstico favorável, apesar de estaremplenamente conscientes da escassez derecursos (camas) e da grande procura dosmesmos.10 O mais grave é que cerca de 40%insistiam no tratamento tendo a plenaconsciência da irreversibilidade dasituação.A inquietação com este procedimento vemdesde os tempos da Grécia Antiga, como

se pode inferir das palavras de Platão,quando afirmava que “Num corpogravemente doente não se deve prolongaruma existência miserável através da dieta,infusões ou sangria.”11. Embora numcontexto diferente, também Sócratesmanifestava ao discípulo Críton o seudesacordo em prolongar a ingestão decicuta, ao afirmar: “Tornar-me-ia ridículoaos meus próprios olhos com esse apego auma vida que já deu o que tinha a dar.”12

Mais recentemente, entre nós, tambémBarahona Fernandes era bem claro, quandoescrevia, a propósito da obstinaçãoterapêutica: “Ao cuidar do sofrimento dohomem, temos que consciencializar quenem tudo o que é possível deve ser feito.”13

Do mesmo modo, Jorge Biscaia, numaexpressão que diríamos quase paradig-mática, personifica assim a situação:“Porque a ciência tudo consegue, cai-se namedicalização excessiva. Os exames suce-dem-se, as análises são exaustivas. Osmédicos são ouvidos em permanente rota-ção. Nos profissionais da saúde a técnicasubstitui a palavra. A multiplicidade deapoios técnicos é um pretexto para escon-jurar a dificuldade de enfrentar a aparentederrota que é a doença não curável.”14

Constatamos, também, que a OT está,quer em termos éticos quer deontológicos,

Quadro I – Unidade de Cuidados Intensivos Respiratórios(UCIR). Relação entre doentes ventilados e mortalidade –1990-2004

Patologia Ventilados Falecidos (%)

Pneumonia a Pneumocystiscarinii

Neoplasias

DPOC

Fibrose pulmonar idiopática

18

87

648

46

12 (66,66)

61 (70,11)

209 (32,25)

36 (78,26)

Fig. 1 — Unidade de Cuidados Intensivos Respiratórios (UCIR). Duração deinternamentos e mortalidade.

40,2%

< 28 dias > = 28 dias39,9%

59,8% 60,1%

Vivos Falecidos Vivos Falecidos

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em total desacordo com algumas deter-minações e articulados. Assim, a Dec-laração de Veneza da XXXV AssembleiaMédica Mundial (1983) admite a abstençãode tratamentos em determinadas circuns-tâncias e recomenda que não se pratique aobstinação terapêutica. Por outro lado, aDeclaração Universal dos Direitos doHomem (10/12/1948), ratificada peloEstado português na década de 70, diz, noseu artigo 5.º, que ninguém será subme-tido a tortura nem a penas ou tratamentoscruéis, desumanos ou degradantes.Por sua vez, o próprio Código Deon-tológico da Ordem dos Médicos, no artigo49, é bem claro quando afirma que “emcaso de doença comportando prognósticoseguramente infausto a muito curto prazo,deve o médico evitar obstinação tera-pêutica, podendo limitar a sua intervençãoà assistência moral ao doente e à prescriçãode tratamento capaz de o poupar asofrimento inútil, no respeito do seudireito a uma morte digna e conforme àsua condição de ser humano.”.Também a posição da Igreja católica temservido de referência a esta temática.Assim, no Catecismo da Igreja católica,encontramos a seguinte alusão: “A ces-sação de tratamentos médicos onerosos,perigosos, extraordinários ou despropor-cionados aos resultados esperados, podeser legítima. É a rejeição do excessoterapêutico. Não que assim se pretenda dara morte; simplesmente se aceita o facto denão a poder impedir. As decisões devemser tomadas pelo doente, se para isso tivercompetência e capacidade; de contrário,por quem para tal tenha direitos legais,respeitando sempre a vontade razoável eos interesses legítimos do doente.

Mesmo que a morte seja consideradaiminente, os cuidados habitualmentedevidos a uma pessoa doente não podemser legitimamente interrompidos. O usodos analgésicos para aliviar os sofrimentosdo moribundo, mesmo correndo-se o riscode abreviar os seus dias, pode ser moral-mente conforme com a dignidade humana,se a morte não estiver nas intenções, nemcomo fim nem como meio, mas somenteprevista e tolerada como inevitável. Oscuidados paliativos constituem uma formaexcepcional da caridade desinteressada; aesse título, devem ser encorajados.”15.A encíclica Evangelium Vitæ

16, de SS JoãoPaulo II, faz menção à obstinação tera-pêutica, ao veicular a ideia de que, perantea iminência e inevitabilidade da morte, sepode, em consciência, renunciar a trata-mentos que dariam somente “um prolon-gamento precário e penoso da vida.”Refere ainda que a obrigação moral dotratamento deve ser medida segundosituações concretas: “Impõe-se avaliar seos meios terapêuticos à disposição sãoobjectivamente proporcionados às pers-pectivas de melhoramento.” É peremp-tória ao indicar que “a renúncia a meiosextraordinários ou desproporcionados nãoequivale ao suicídio ou à eutanásia; ex-prime, antes, a aceitação da condiçãohumana perante a morte”.Perante evidências e recomendações detantas origens, como explicar então aobstinação terapêutica?Há um velho aforisma que diz: “Oconhecimento é função da ciência, ao passoque compreensão é função da filosofia.”Assim sendo, tentaremos, através de algunsfundamentos básicos da filosofia, encontraralgumas justificações para este agir.

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A melhor maneira de entender a OT éanalisar o acto médico em toda a suaextensão. Assim, no nosso entendimento,e em primeiro lugar, o acto médico não éapenas uma relação de prestação deserviços entre o médico e o doente (ou outente, como é comum dizer-se). Aintrodução de um terceiro elemento, umparâmetro variável, é fundamental parauma visão mais abrangente. Este elementopode ser, entre outros, a família ou opróprio local (isto é, a instituição hos-pitalar onde o doente se encontra in-ternado).Num contexto em que estão presentesvárias partes, qual é então a responsa-bilidade de cada uma delas?No que diz respeito ao doente, não écomum, no nosso meio, que este manifestea sua vontade, através de alguma directriz,no sentido de serem utilizados todos osrecursos, independentemente do prog-nóstico da sua doença. Pelo contrário,dada a sua condição, por vezes, não seencontra apto a poder exprimir o seudesejo; e, noutros casos, numa atitudetotalmente “paternalista”, a sua vontadenão é, de modo algum, tida em conta.Em relação aos familiares, é enorme apressão que estes exercem nos médicos daunidade, no sentido de que se continue ainsistir em todas as atitudes terapêuticas.Esta quase coacção é consequência, entreoutras: do desconhecimento da situaçãomédica real; da avaliação arbitrária daqualidade de vida do doente; e docomplexo de culpa que alguns sentem emrelação ao doente, o qual foi, por vezes,quase ignorado nalgum lar de terceiraidade, nos últimos anos da sua vida.A maior parte da responsabilidade na OT

cabe naturalmente ao médico. Comoexplicar esta conduta?Na nossa apreciação, este comportamentopode ter como justificação os cincoargumentos que se analisam em seguida.

Medicina defensiva•A razão de ser da OT tem sido atribuída,por muitos, à medicina defensiva: umaprática que, infelizmente, tem vindo aalastrar-se cada vez mais. Por medicinadefensiva entende-se uma decisão ou acçãoclínica do médico, motivada, no seu todoou parcialmente, pela intenção de seproteger de uma acusação de má práticamédica. A medicina defensiva pode ser:• positiva — quando o médico leva a caboprocedimentos desnecessários para de-fender-se de riscos de incorrer em máprática médica;• negativa — sempre que o objectivo doclínico é evitar doentes ou procedimentosde alto risco para não ser confrontado coma acusação de má prática médica.No caso da OT, é a medicina defensivapositiva que está em causa. É nossaconvicção que, no nosso meio, apesar donúmero crescente de supostos casos denegligência médica, esta não é a causa majordesta atitude. Esta terá que ver, porventura,com a atitude cultural intrínseca aoportuguês, quando está em causa o arbítrio,e que, na opinião de José Gil, se traduz por“medo interiorizado, mais inconsciente doque consciente, de agir, de tomar decisõesdiferentes da norma vigente… A prudênciaé a lei do bom senso português.”17.

Fenomenologia do conhecimentoEm nosso entender, o leitmotiv na origemda obstinação terapêutica centra-se na

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contingência do erro diagnóstico, inerenteao acto médico. Esta pode ser explicadapela análise fenomenológica do conheci-mento. Contextualizando o acto médicoà luz desta apreciação, temos o médicocomo o “sujeito” (aquele que conhece),enquanto o doente é o “objecto” (aqueleque se pretende conhecer) e a doença é a“representação” através da qual o médicoconhece o doente.Para haver conhecimento é necessário queo sujeito (médico) apreenda o objecto(doente). Será possível que tal aconteça?A afirmação pela positiva — isto é, acre-ditar que o sujeito, através dos sentidos eda razão, consiga compreender na totali-dade o objecto — constitui o dogmatismo.No acto médico, uma atitude dogmáticaimplica da parte médica, em relação aodoente e à doença, assumir uma posiçãode confiança absoluta nos sentidos e narazão humana. É acreditar que, peloconhecimento científico, o diagnóstico, aterapêutica e o prognóstico são infalíveis.Na prática, o resultado final do actomédico está sujeito às leis da estatística,com todas as variáveis que determinam oresultado. Por isso, a incerteza, pormínima que seja, pode sempre existir.Numa situação em que o sujeito nãoconhece o objecto, não é possível oconhecimento. Nesse caso, está-se peranteo cepticismo, doutrina que nega apossibilidade de se atingir a verdade.Contudo, esta impossibilidade de sealcançar a verdade absoluta não se aplica,na sua essência, ao acto médico, porque aimpossibilidade do conhecimento abso-luto não implica, necessariamente, umdesconhecimento total em relação aoconhecimento.

Assim sendo, o cepticismo radical, quefundamenta a sua tese na impossibilidadede todo e qualquer conhecimento, deveser rejeitado. Um dos argumentos quepode ser utilizado para tal alicerça-se numaafirmação do próprio Pirro, mentor destaideologia: “Não devemos confiar nossentidos nem na razão, mas permanecersem opinião, sem nos inclinarmos parauma parte ou para outra, impassíveis.”18

A fazer fé neste juízo, seria impossível oexercício da própria medicina.Em alternativa a este cepticismo radicalestá o cepticismo moderado, que pode serconsiderado uma forma mitigada de dog-matismo, visto que admite que o sujeito écapaz de aprender o objecto e respectivarepresentação, mas de modo limitado.Reflectindo sobre as duas vertentes decepticismo moderado — o probabilismoe o relativismo —, verifica-se que o pro-babilismo se ajusta de uma maneira maisharmoniosa ao exercício da medicina,visto que a sua proposição sustenta quenão é possível um conhecimento rigoroso— não há certezas entre a formulação dojuízo e a realidade. Assim, não existe acerteza rigorosa, mas somente a proba-bilidade. Esta incerteza, inerente ao actomédico em si mesmo, pode explicar, comoreferimos, a obstinação terapêutica.No que diz respeito ao relativismo — odefensor da verdade relativa —, este podeassumir duas formas: o subjectivismo —que limita a validade da verdade ao sujeitoque conhece e julga —, e o relativismo —segundo o qual toda a verdade é relativa.Enquanto o primeiro faz depender oconhecimento de variáveis que residem nosujeito cognoscente, o relativismo subli-nha a dependência de factores externos.

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Assim, a obstinação terapêutica podetambém encontrar uma explicação querno subjectivismo — pela incerteza indi-vidual do médico em causa — quer norelativismo — ao fazer depender o conhe-cimento de factores externos (os quais, nocaso do acto médico, podem estarrelacionados com os meios comple-mentares de diagnóstico disponíveis).A grande herança de conhecimentos queo século XX nos deixa é, nas palavras dosociólogo Edgar Morin: “O conhecimentodos limites do conhecimento. A certezade ineliminabilidade de incertezas.”19

Dialéctica da tecnociênciaDialéctica da tecnociênciaDialéctica da tecnociênciaDialéctica da tecnociênciaDialéctica da tecnociênciaÉ sabido que a dialéctica está inerente àprópria tecnociência. A explicação para aobstinação terapêutica pode encontrar umsustentáculo na superespecialização, pecu-liar à alta tecnologia, que leva à parce-lização do saber; esta acarreta a frag-mentação das competências e culmina nadesresponsabilização nas decisões.Nos estádios avançados de determinadaspatologias, quando a falência multiorgâ-nica não augura um prognóstico favorável,a desresponsabilização dos vários espe-cialistas relativamente ao inevitáveldesenlace pode explicar a manutenção dotratamento.

Conflito de valoresConflito de valoresConflito de valoresConflito de valoresConflito de valoresA origem da obstinação terapêutica poderesidir no conflito de valores em relação àprópria vida, como se constata na própriaDeclaração Universal dos Direitos doHomem — enunciada em 10 de Dezembrode 1948 e ratificada pelo Estado portuguêsem Janeiro de 1978 —, a qual, no artigo3.º, garante o direito à vida e, no artigo

5.º, assegura que ninguém será submetidoa tratamentos cruéis, desumanos oudegradantes.20

Ainda outro exemplo vem do CódigoDeontológico Médico, que, preconizandoo princípio de benefício do doente21 emvários dos seus articulados, tem comonorma a obrigação de evitar ou atrasar amorte. Por outro lado, a Carta dosDireitos dos Doentes, elaborada pelosAssociação dos Hospitais Americanos em1973 e apresentada ao Parlamento Euro-peu em 1984, consagra o direito a morrercom dignidade.22

Entre nós, o Estatuto Hospitalar e a Leide Bases da Saúde (Lei 48/90, de 24 deAgosto) garantem ao doente, através daCarta dos Direitos e Deveres dos Doen-tes, “o direito a ser tratado no respeito peladignidade humana”.23

Como se depreende daquilo que se acaboude expor, estes articulados confrontam-seentre si, particularmente nos casos ondeaparentemente se está perante uma situa-ção de obstinação terapêutica. Encon-tramo-nos, portanto, perante uma situaçãode conflito de valores e direitos, e, assimsendo, na presença de um problema ético,pois estão em causa imperativos contra-ditórios.

Existencialismo e metafísicaExistencialismo e metafísicaExistencialismo e metafísicaExistencialismo e metafísicaExistencialismo e metafísicaO impacto da tecnologia no próprioconceito da morte mudou quase radical-mente nos países desenvolvidos a maneirade se encarar o fim da vida. O momentoda morte, um acontecimento que é indi-vidual e indizível — porque ninguém podemorrer a morte de outrem nem narrar asua própria morte — passou, pela inter-venção da tecnociência, a ser precedido

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pelo processo de morrer. Estas situações— o momento da morte e o processo demorrer — geram estados de alma dife-rentes. Assim, em relação ao primeiro, naopinião de Kierkegaard: “A consciência nasua individualidade e condição deu aohomem a percepção da sua morte. A quedana autoconsciência, a saída da confortávelignorância da natureza foi altamentepenalizadora para o homem: deu-lhe opavor da morte, a angústia característica,a mais intensa angústia do homem.”24

Por outro lado, o poder da tecnologia emdeterminar o processo de morrer podeexplicar a opinião de Ernest Bloch;segundo este, dá-se “a negação da angústiae a recusa em deixar a última palavra aofracasso, jamais perdendo de vista queainda há uma saída, a esperança”25.Verifica-se, assim, que a tecnociência podeservir como fuga para a angústia geradapelo momento da morte, bem comoexplicar o tempo de esperança natranscendência durante o processo demorrer.O existencialismo e a metafísica tambémpodem, como tal, explicar a obstinaçãoterapêutica.Concluindo: será que podemos resumir arazão de ser deste dilema ético utilizandoa conhecida máxima de Ortega y Gasset:“O homem é ele mais a sua circunstância”,e, assim sendo, admitir que a obstinaçãoterapêutica é uma realidade incontornávelna medicina intensiva?Temos da vida uma visão optimista e nãoperfilhamos esta dúvida. Pelo contrário,temos imensa fé na ciência; ou, como diriaKarl Popper: “A história das ciências,como a de todas as ideias humanas, é umahistória de sonhos irresponsáveis, de tei-

mosias e de erros. Porém, a ciência é umadas raras actividades humanas, talvez aúnica, na qual os erros são sistemati-camente assinalados e, com o tempo,constantemente corrigidos.”

Considerações finaisConsiderações finaisConsiderações finaisConsiderações finaisConsiderações finaisDesde os primórdios da Humanidade, aprocura da imortalidade tem sidodemandada de diversas maneiras, quiçáatravés da própria prática médica.Contudo, o exercício da medicina nãopassa pelo prolongamento da vida bio-lógica a todo e qualquer custo. A mortenão deve ser considerada como umaderrota; tal seria, em nossa opinião, umsinal de imaturidade profissional dealguém que não interiorizou os limites daciência e da técnica.Sendo a medicina uma ciência de proba-bilidades e não uma ciência exacta, a suaprática tem inerente a incerteza.Se, e quando, o médico ou a equiparesponsável forem confrontados comalguma dúvida em relação ao prognóstico,deverão continuar o tratamento até aoesclarecimento da situação, sendo que adecisão deve ser consensual, sempre quepossível.A actualização constante deve ser umimperativo ético dos médicos, e ainvestigação em cuidados intensivos deveter como um dos seus objectivos adeterminação dos marcadores predizentesda futilidade terapêutica.A prática médica passa pelo curar e pelocuidar. O médico tem o dever de criarempatia com o sofrimento do doente,tratando e curando quando possível, massempre aliviando e reconfortando.

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